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No seu texto destaque os pontos abaixo:

- O lugar ocupado pelos escravos e como sua cultura era vista pelos brancos.
- Estabeleça um contraste entre a vida de Benedito, 50 anos (pouco mais, pouco
menos), negro de Angola, barbeiro sangrador, “preto forro” e a vida dos escravos
descrita no texto Açúcar, trabalho e vida dos escravos.

A intitulada por muitos como cidade maravilhosa e abençoada por Deus, Rio de Janeiro,
nem sempre fora descrita assim, tem como cenário durante o século XIX uma alta
concentração de povos africanos escravizados e que foram submetidos à ações desumanas
e criminosas, no entanto, para época não interpretadas dessa forma, considerando que não
era uma prática ilegal a compra nem venda de escravos pelo comércio transatlântico
durante esse período, chamada só após das Leis Abolicionistas, exemplo a Lei Eusébio de
Queirós, de “Tráfico Negreiro”.

No Rio de Janeiro, nos anos de 1808 até por volta de 1821, segundo o historiador Alberto
da Costa e Silva, nunca chegaram tantos africanos escravizados na cidade. Sob a ótica do
branco colonizador a região aparentava-se como sendo uma cidade africana, ainda que,
não enxergada da mesma maneira pelo negro escravizado quando desembarcava em
terras brasileiras e se deparava com uma mistura imensa de grupos étnicos africanos, na
qual distinguem entre si por dialetos, culturas, escarificação, desenhos nos corpos, dentre
outras característica que formavam algo mais similar com múltiplas África’s, e não somente
uma generalização que padece de análise entre os contrastes culturais desses povos.

O homem, mulher, criança e idoso africano passa nas mãos dos europeus pelo processo de
coisificação, deixa ser alguém para se tornar algo que se compra, em outras palavras, uma
mercadoria/objeto que pertence a um senhor. De conformidade com o olhar preconceituoso
sob o sujeito negro, as suas práticas religiosas africanas e de matriz africana também são
desprezadas e atribuídas como magia negra (então surge o emprego da palavra “negra” em
um sentido pejorativo), eram proibidas por serem vistas como crimes tanto pela Colônia
como também pelo Código Civil e Tribunal Eclesiástico, os escravos que foram denunciados
por envolvimento e invocação de feitiçaria eram condenados à morte; o direito de ser livre
não mais os pertencem (ao menos que paguem suas alforrias, o que para maior parte dos
escravos é algo inalcançável).

E como todo e qualquer produto, o escravo também tinha o modo de ser identificado, sendo
aplicada de forma similar a um código de barra dos itens que vemos em supermercados,
uns desses métodos eram não possuir calçados ou mantê-los nus. Em uma cena inicial do
curta O Sangrador e o Doutor, Rio de Janeiro, 1820, se é evidenciado esse fato com a
fala do juiz após Benedito, ex-escravo que tinha como ocupação de barbeiro sangrador, ter
dito que era forro liberto: “Deixa de mentira, preto. A primeira coisa que todo preto faz
quando consegue a liberdade é calçar os pés, eu não te vejo de sapatos [...] Diga o nome
do seu senhor, ou por acaso é preto fujam?”

Pegando um gancho com as personagens de O Sangrador e o Doutor, Rio de Janeiro,


1820, temos alguns pontos importantes sobre a obra: Benedito preto forro, proveniente da
Angola, servia ao senhor João Matoso como escravo de ganho, maior parte do lucro diário
iria para seu dono e o que sobrava ficaria consigo, a moradia dos escravos de ganho não
era tão bem definida, às vezes poderia morar com seus senhores ou junto de outros
escravos que formavam espécies de cooperativas, o que resulta em maior mobilidade pela
cidade. Os escravos urbanos poderiam até ter uma ilusão de liberdade, contudo, não eram
livres, haviam metas diárias em um valor considerável de dinheiro, ao caso de não serem
alcançadas acabavam em rígidas punições para o escravo. Ainda assim, de fato existia uma
diferença de designação dos trabalhos, trabalhar como curandeiro era uma oportunidade
de, ainda que pequena, melhora de vida em comparação às condições exaustivas ao
extremo que a produção de cana-de-açúcar ou café exigiam. Atribuo a isso a expectativa de
vida de um escravo que trabalha em uma área rural na Bahia, no século XVIII, ser tão baixa,
em média 23 anos, o que foge muito da idade de Benedito que era pouco mais ou menos
50 anos.

Como já apresentado, nem toda mão de obra era destinada à lavoura, existiam diferentes
serviços distribuídos como escravos urbanos, rurais, domésticos e alugados.
As ocupações de barbeiro, curandeiro, sangrador, parteira, mucama, vendedores
ambulantes, sapateiros eram muito importantes para essa época, apesar de não receberem
tais prestígios sociais. Em questão desses quatro primeiros ofícios para dispor do direito de
exercê-los era necessário a Fisicatura-mor, uma espécie de regulamento burocrático de
tudo que estivesse ligado à saúde pública, após se passar em inúmeros exames se recebia
um registro que comprova que aquele indivíduo estaria apto para as atividades.

Retomando a observação sobre o curta apresentado e fazendo um paralelo com o texto


Açúcar, trabalho e vida dos escravos, temos uma discrepância entre as duas vivências
do alforriado e do escravo de eito, faço uma ressalva que ambos sofrem preconceitos
sistemáticos de forma social, cultural e legislativa, no entanto, nota-se que os regimes
açucareiros brasileiros adotam medidas extremamente árduas: má alimentação;
alojamentos malpropícios; cargas de trabalho que podem chegar de 18 à 20 horas por dia
com mão de obra organizada em turnos; baixa locomoção do escravo que é mantido
somente na região rural; devido às condições insalubres o escravo sofria alto índice de
mortalidade e o baixo índice de fertilidade; trabalho era braçal e emprego de técnicas
integradas, como por exemplo, semear, cortar, moer, ferver e a secagem.

Pelo contrário, em contraste com o citado anteriormente, Benedito passou desde seus 15
anos trabalhando como barbeiro sangrador e acumulando sobras de dinheiro que era
repassado ao seu senhor, assim por volta de seus 40 anos conseguiu comprar a carta de
alforria pagando 102 mil réis pelo documento. O ex-escravo tinha um estabelecimento na
cidade, possuía também um escravizado chamado Vicente que o auxiliava nas sangrias,
muitos diziam que eles tinham o poder da cura, seus conhecimentos eram usados para
tratar das mais pavorosas enfermidades. Ainda assim, isso não foi um empecilho para que
Benedito fosse julgado e condenado, o motivo da condenação foi o culto à sua religião de
origem, o candomblé era visto como algo intrinsecamente relacionado ao demônio, logo,
qualquer prática religiosa que não fosse a católica seria punida severamente. Permeia no
imaginário do branco a ideia preconceituosa que o negro, sobretudo o preto sangrador,
chegava à cura através de ritual pagão, desse modo a representação religiosa africana
seria reprimida ao menor vestígio, o que foi o caso de Benedito penalizado por ser
calunduzeiro, devoto da religião afro-brasileira. Embora fosse alforriado, continuava sendo
preto em um sistema que desumaniza e mata corpos negros, ao fim, para que Benedito de
fato pudesse deter todos os privilégios e viver de forma digna só se nascesse branco,
homem e rico no século XIX.

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