Oscar Di Simplicio é um historiador italiano especialista em história moderna.
Neste texto, trata sobre populações camponesas de três países diferentes, os alemães, espanhóis e italianos. O primeiro caso tratado é o alemão, onde Simplicio afirma que a Guerra dos Camponeses alemães de 1525 foi a rebelião que deixou a marca mais profunda na história posterior do país. Ele explica que essa foi uma experiência chocante e que gerou terror para a nobreza e para os príncipes dos territórios. Teve uma ampla adesão social, pois houve a união da ideologia de projetos revolucionários com o sentido profundo das reformas religiosas. Os antecedentes dessa revolta são a diminuição dos recursos disponíveis e com isso as diferenças entre os mais ricos e os mais pobres ficavam mais acentuadas, a formação e a consolidação dos estados territoriais provocavam choques entre a média nobreza e a alta. Além disso havia uma política de proteção territorial às comunidades camponesas, pois assim, manter as aldeias sob a sua jurisdição permitia servir delas como bases fiscais para o Estado, cujos gastos eram altos e estavam em crescimento. Acredito que isso levou a um sentimento de revolta por parte dos camponeses, que além de pouca renda e produção deviam pagar mais tributos para os seus senhores. Ainda anteriormente a 1525 houveram revoltas locais contra a deterioração das condições de vida dos trabalhadores da terra, pois para a população do campo as reações eram legítimas já que eram contra medidas que não eram previstas pela tradição. É interessante notar o peso da tradição nessas relações, que para Geroge Rudé seria a ideia de um retorno à épocas com menor cobrança fiscal. Esses pequenos movimentos se limitavam a eliminação de tributos, mas a relação de fidelidade entre o senhor e camponês ainda se mantinha intacta. Entretanto, o conflito entre camponeses e senhores laicos ou eclesiásticos teve como resultado uma crise nas relações dentro da própria lógica da servidão. E com a Guerra Camponesa, somada a própria reforma com a difusão de uma nova ideologia mais voltada ao camponês, houve a criação do novo pensamento de transferência da fidelidade do senhor para a Bíblia. O autor afirma que a historiografia mais recente demonstrou que houveram cerca de sessenta revoltas entre 1525 e 1789. Essas agitações tinham origens de uma combinação entre fatores econômicos e políticos, pautados na resistência à imposição principesca. A partir de 1525 os nobres colocaram as disputas no âmbito jurídico, a fim de evitar novas comoções contra a sua exploração. Para os camponeses não houve abandono de formas tradicionais de resistência, mas se desenvolveu a tendência de chegar a um reconhecimento jurídico dos conflitos sociais. Desta forma, esse estudo mais recente das revoltas camponesas alemãs mostra a flexibilidade e o pragmatismo das suas ações a partir do século XVI. O caso seguinte das rebeliões tratadas pelo autor ocorreram na Península Ibérica, mais precisamente na a Espanha. Escreve que a condição dos camponeses espanhóis era a mais infame e oprimida que se podia encontrar. Em primeiro momento se havia uma boa impressão quanto ao trabalho campal para os espanhóis, entretanto com o tempo essa relação foi se invertendo, passando a ter sinônimos de vulgaridade ou pobreza. Esse fenômeno para o autor se deu pela oposição de valores de campo e cidade em um momento particular da história da Espanha. Grande parte dos agricultores estava esmagada por impostos, pois em Castela a imposição real cresceu sem limites entre 1560 e 1640, a renda dos proprietários aumentava e o dízimo era pesadíssimo. A partir da segunda metade do século XVI a monarquia espanhola perdia o controle da administração periférica do país precisamente no momento em que seus rivais europeus começavam a estabelecer uma ordem monárquica capaz de unir todos ao centro. O fluxo de metais preciosos vindos da América deu lugar a uma ilusão de riqueza que enfraqueceu as forças produtivas, com isso o país ficou imóvel e houve o prolongamento da estagnação, que retraiu durante séculos o surgimento de uma classe média em condições de vitalizar a economia. Essa ausência de uma classe média e de mobilidade social foi a consequência da depressão econômica espanhola, pois quem possuía riqueza apenas a acumulava ou comprava títulos no Estado, e pouco ou nada do que se tinha era destinado aos setores de produção. A situação dos camponeses era de abandono, um arrendatário de terras vivia preso ao temor de cair em uma condição de vida mais miserável, isto é, no mundo dos marginais, mendigos, vagabundos ou bandidos. A pobreza assim se originou de uma injusta distribuição de riqueza, provocando o bem estar de poucos e a privação da massa, o que levou a um abandono de pessoas do campo para a cidade. Simplicio tenta mostrar o porquê das populações rurais serem tão estagnadas e porque não se revoltaram contra a coroa. Para ele, o motivo desta inércia rural pode ser buscado na extensão dos territórios comunais, que conservavam dimensões consideráveis ao alcance de colonos. Além disso, é provável que a caridade praticada em grande número pelas ordens religiosas atenuou os problemas econômicos mais graves como a fome e a miséria. Havia também as saídas práticas da extrema pobreza, como a de fuga para as cidades, de virar sacerdote, soldado, bandido ou tentar a sorte nas colônias. A Catalunha foi o único lugar que contrastou a submissão do resto do território, onde havia motivos parecidos com os do sul da França. A revolta catalã foi dupla, pois além de ser uma revolta contra a tentativa do controle castelhano, foi uma revolução “espontânea”, isto é dos pobres contra os ricos. Por fim, Simplicio trata do caso camponês italiano, onde é interpretada a ideia do bandoleirismo organizado de 1550 e 1660 como uma expressão do profundo mal estar do o mundo rural. Explica que de Abruzos ao Vêneto ingressaram grandes quantidades de camponeses para o bandoleirismo, sendo mais uma necessidade que uma tentação. Em Nápoles, para o autor, a questão foi diferente. A revolta anti espanhola em Nápoles se aproxima muito pela sua violência com outras comoções rurais na Europa, não a um banditismo. Oscar di Simplicio afirma que há paralelismos entre a revolta catalã e a napolitana, em particular a pressão fiscal que a corte madrilenha submeteu os reinos associados a monarquia. O caso catalão se deu mais pelo medo de cair na mesma ruína econômica que Castela, já o de Nápoles a causa da insurreição era a busca por melhores condições econômicas para as massas rurais e urbanas. Em outras regiões da Itália, com o colapso da agricultura no final do século XVI e posteriormente o da indústria urbana, o país entrou em uma fase de depressão econômica em que o campo sofreu talvez mais que as cidades. As aldeias foram privadas de meios e recursos por distintas vias, seja pela legislação de vínculo urbano, impostos ao consumo e a concentração de terras comunais por parte dos proprietários nobres ou eclesiásticos. O salto populacional a partir do século XVIII produziu um aumento de necessidades de alimentos, o que revitalizou a demanda pela agricultura. Porém, as dificuldades crônicas de abastecimento que afligiam o país tanto na cidade quanto no campo chegaram a ser endêmicas. O autor então conclui o caso italiano como se estivesse sobre a condição de uma “guerra fria” entre o senhor de terras e o camponês, que levava a eventuais explosões de vandalismo rural. Porém, em conjunto o sistema se mantinha bem, pois era o tradicionalismo camponês que agia como freio dessas relações. Referências Bibliográficas: TEXTO: SIMPLICÍO, Oscar di. Las revueltas campesinas en Europa. Capítulo 3: Las Revueltas en Alemania, España e Italia. Barcelona: Editorial Critica, 1989.
RUDÉ, George. A Europa no século XVIII. Lisboa: Gradiva, 1988.
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