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O quadro seria mais parcial e distorcido caso não fosse os eventos na Espanha. O
conselho de regência de Cádis convocou a população para a eleição das cortes, uma
assembleia representativa encarregada de redigir uma constituição para instituir um poder
legitimo na ausência do rei. Votada e aprovada em 1812 e de caráter liberal, convidou
representantes americanos, os quais começaram preparativos para eleger seus constituintes
iriam para a Espanha. A exceção foi feita justamente aos territórios da Venezuela e do Rio da
Prata, que sob controle das respectivas juntas recusaram a reconhecer a autoridade do
Conselho de Regência de Cadis e decidiram por governar de modo autônomo.
Ainda que simpáticos às reinvindicações americanas, constituintes espanhóis
reafirmaram o princípio da primazia peninsular, dando mais um golpe na confiança e nas
expectativas dos crioulos ultramarinos. As reinvindicações por maior igualdade entre espanhóis
e americanos por liberdade de produção e comércio e livre acesso aos cargos civis,
eclesiásticos e militares foram frustradas. A constituição de Cádis foi indigesta para as Elites
crioulas. Demolia o absolutismo ao colocar a monarquia constitucional com limites ao poder
real; no entanto, era também uma réplica do espírito centralizador das reformas bourbônicas.
Além disso, desagradava por não garantir suficiente direito de representação igualitária, acesso
aos cargos e muito menos as liberdades econômicas reivindicadas.
A derrota francesa reconduz ao trono Fernando VII nos primeiros meses de 1814.
Dentro do novo contexto da ordem de Viena após a queda de Napoleão, o Rei anula a
constituição de Cádis e restabelece o absolutismo. Traídas as expectativas dos liberais
espanhóis e americanos, o Rei também estabeleceu o imediato envio de tropas para
restabelecer a ordem e a obediência à mãe-pátria, a começar pelas regiões aonde sua
autoridade tinha sido mais contestada: Venezuela e Rio da Prata. Foi a partir destes territórios
que a guerra propriamente dita teve início. O conflito representa um momento de luta franca
contra um império espanhol completamente hostil às reinvindicações de maior liberdade,
igualdade e autonomia. Os grandes responsáveis pelo término da guerra na parte sul da
américa espanhola seriam Simón Bolivar e José San Martin numa espécie de manobra de pinça
continental sobre as forças realistas que detiveram por último o controle dos Andes peruanos.
A despeito de primeiramente derrotado pelas forças realistas, é a partir de 1817 que
Simon Bolivar consegue trazer os llaneros venezuelanos para o seu lado e assim como começar
uma sequencia ininterrupta de triunfos. Ao situar sua base nas planícies de Orinoco, distante
de Caracas, atraiu este grupo de caubóis se utilizando de estratégias nativistas –
protonacionalismo que glorificava a ideia de uma identidade americana e foi instrumentalizada
pelos Criollos para liderar o movimento de independência sem alterar a hierarquia social. Ao
pegar os realistas de surpresa, as forças lideradas pelo exército de Bolivar conseguiu liberar
Bogotá.
Eventos externos também contribuíram para deixar as forças realistas em desacordo. A
revolução liberal em 1820 na Espanha faz de Fernando VII um monarca constitucional com
poderes limitados o que viria a impactar justamente o México. Na região central do império
espanhol, a teimosa guerrilha dos seguidores de Padre Morelos seguia, sobretudo ao sul da
Cidade do México, ainda que sem conseguir derrotar os realistas. A maré vira como
consequência da revolução liberal espanhola quando muitos realistas Criollos no exército e na
igreja se sentem traídos pelo desenrolar dos eventos espanhóis. Em questão de meses, uma
aliança é estabelecida entre o comandante do exército Criollo, Augustin Itubirde, e as forças
patrióticas. O Plano de Iguala, subscrito por Augustin, previa um México independente, com
suas próprias cortes, decidido a tanto proteger a igreja quanto ter um Bourbon como
soberano. A vitoriosa coalização liderada por Augustin estabelece uma monarquia
constitucional no México em 1821, fazendo o novo país alcançar a independência pela via
conservadora. Ainda assim, a solução monárquica não teve vida longa. Sendo Augustin Criollo
de nascença como seus pares e tendo o México passado por um processo prolongado de lutas,
uma série de convicções políticas e animosidades já haviam se estabelecido e firmado o
conceito da soberania popular como um pressuposto básico da ordem política. Após um ano
no poder, Augustin manda fechar o novo congresso formado, gerando como reação sua
deposição política pelos militares, os quais instauraram uma nova República.
Paralelamente, na segunda região central do império espanhol, convergiam os
exércitos patrióticos de Venezuela e Argentina. Por volta de 1822, as forças de Bolivar já
haviam capturado Caracas e Quito, tendo sobre controle todo o norte da América do Sul. O
movimento americanista que havia começado pela região de Buenos Aires já controlava todo o
Sul por volta de 1814 e 1817. Um combinado Argentino-Chileno, liderado pelo general José de
San Martín, atravessa os Andes e lança um decisivo ataque surpresa que derrota as forças
realistas no Chile. O encontro histórico dos exércitos de Bolivar e San Martin em Guayaquil em
1822 resulta na saída de cena de San Martin e a condução das operações militares finais sob
liderança de Bolivar. O último bastião das forças realistas cai em 1824, quando os patriotas, sob
comando do General Antônio José de Sucre, derrubam o vice-reinado do Peru após a Batalha
de Ayacucho. As profundas cisões entre o exército real e as elites crioulas e a desorientação
vinda dos eventos na Espanha, cumpriram papel relevante no enfraquecimento das forças
realistas. O ruir da ultima trincheira põe fim definitivo ao império espanhol.
Do ponto de vista externo, o comércio acaba por ser a força preponderante que orienta
as ações Britânicas na América Latina enquanto efeito da Revolução Industrial. A pressão
regular a notória de industriais e comerciantes a favor da abertura de mercados foi o que deu o
tom dos tratados desiguais de 1810. É importante ressaltar que na fase mais aguda dos
conflitos napoleônicos entre 1809 e 1811, quando mercados europeus estavam fechados pelo
bloqueio continental, as exportações para América Latina chegaram a constituir 35% do total
de vendas externas da Inglaterra; ainda que depois da paz as exportações tenham declinado,
continuaram expressivas. Só em 1812, o ano da invasão à Rússia, o Brasil importou da Grã-
Bretanha 25% a mais que a Ásia inteira, metade das importações dos Estados Unidos e das
Indias Ocidentais e 4/5 do total das vendas à América do Sul. Após 1815, o mercado brasileiro
continuou absorvendo 2/3 das vendas às colônias estrangeiras na América Latina e em 1820 o
Brasil consumiu metade do conjunto da Ásia ou das Índias Ocidentais, 2/3 das importações
norte-americanas e ¾ das exportações destinadas às colônias espanholas e portuguesas nas
Américas. Boa parte destes produtos eram de algodão. Um intercâmbio marcado pelo
desequilíbrio, convém ressaltar; dado que, mesmo constituindo um importante mercado
consumir, o Brasil permaneceria uma fonte secundária de importação para os ingleses.
O processo gradual de separação política das metrópoles também significa o processo
de modernização da inserção das antigas colônias no contexto mundial. De toda forma, sem
constituir ruptura com as estruturas econômicas e sociais da colônia: a produção de bens
primários, da agricultura e pecuária para os mercados externos, e o sistema pré-salarial e de
força de trabalho majoritariamente escravizada. Um verdadeiro anacronismo dentro de uma
economia mundial que se industrializava. As arcaicas condições e o forte contraste entre
transformações socioeconômicas na Europa e na América levariam ao problema das “das ideias
fora de lugar” – a difícil adaptabilidade de instituições e normas importadas do liberalismo
econômico nas condições locais.