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A implantação do Liberalismo em Portugal

Antecedentes e conjuntura (1807-1820)

Mostrar a coexistência do Antigo Regime com forças predispostas à


inovação no Portugal de inícios de Oitocentos.

Nos inícios de Oitocentos (século XIX), Portugal era, ainda, um país onde
permaneciam vivas as estruturas de Antigo Regime (sistema social,
económico e político que vigorou na Europa, aproximadamente, entres
os séculos XV e XVIII, correspondendo, cronologicamente, à Idade
Moderna). Persistiam, assim, as seguintes características:
- uma sociedade de ordens, fortemente hierarquizada, em que
prevaleciam os privilégios da nobreza e do clero;
- uma economia agrícola, de fraco rendimento, em que os
camponeses viviam na dependência dos senhores das terras;
- um sistema politico absolutista, submetido à regência do príncipe D. João
(futuro rei D. João VI) e à repressão ditada pela Real Mesa Censória e
pela Intendência-Geral da Polícia.
Contudo, simultaneamente, criava-se um clima propício à mudança. As
principais forças de inovação eram:
- a Maçonaria (organização secreta que defendia valores iluministas);
- a burguesia comercial, desejosa de se impor política e socialmente.

Explicar a invasão de Portugal pelas tropas napoleónicas


Em 1806, Napoleão Bonaparte decretou o Bloqueio Continental, que proibia
as nações europeias de comerciar com a Inglaterra. Portugal, aliado histórico da
Inglaterra, desrespeitou o Bloqueio e, em consequência, sofreu três invasões
francesas:
1ª liderada pelo general Junot em 1807-1808 (chega até Lisboa);
2ª comandada pelo marechal Soult em 1809 (chega até o Porto, cujo bispo
recusa a rendição; a tomada violenta da cidade redunda na fuga da
população pela ponte das Barcas, que desabou. Soult retira-se após o envio
de reforços de Inglaterra);
3ª chefiada pelo marechal Massena em 1810-1811 (graças às linhas
de Torres Vedras, fortificações construídas por iniciativa de Wellington,
a passagem do exército de Massena é intercetada, retirando-se em
1811).

Relacionar a conjuntura política, económica e social resultante das


Invasões Francesas com a Revolução Liberal de 1820
As invasões francesas podem ser consideradas como uma causa indireta da
Revolução Liberal portuguesa de 1820, na medida em que criaram uma
conjuntura propícia à mudança, a vários níveis: político, económico e social.
A Conjuntura política era caracterizada pela ausência da família real e pela
permanência dos ingleses em solo português. A família real, juntamente com
todos os que representavam a monarquia e os súbditos que quiseram
acompanhar a viagem em navios privados (cerca de 15000 pessoas, no total),
embarcaram para o Brasil (1807). A ideia não era nova, pois já em épocas
anteriores (por exemplo, aquando da invasão espanhola, em 1580) se havia
pensado nessa possibilidade. Porém, a mudança da Corte para o Brasil, apesar
de justificada, então, pela necessidade de preservar a independência de
Portugal e de evitar a dissolução da dinastia de Bragança, foi entendida, pelos
súbditos comuns, como uma verdadeira fuga, contribuindo, assim, para o
descrédito da monarquia absoluta.
Na ausência de D. João VI (que apenas regressaria em 1821), Portugal
ficou sob o domínio do marechal inglês William Beresford, tornando-se
presidente da Junta Governativa. Beresford organizou a defesa contra os
Franceses, controlou a economia e exerceu a repressão contra o Liberalismo
nascente. Conquistou o ódio dos militares, que perdiam os postos de
comando para os Ingleses, e da generalidade dos Portugueses que o viam
como prepotente (tendo-se salientado o episódio da execução do general
Gomes Freire de Andrade por envolvimento na conspiração liberal de 1817).
A Revolução de 1820 viria a ser desencadeada pelo sinédrio, aproveitando a
ausência de Beresford, que se havia deslocado ao Brasil no intuito de solicitar
ao rei poderes acrescidos.
A permanência dos Franceses no território português (apesar de serem
os invasores malquistos), bem como o exemplo da revolução liberal espanhola de
1820, contribuíram para disseminar as ideias liberais entre os
Portugueses.
A Conjuntura económica resultante das invasões francesas caracterizava-se
pela devastação e destruição. Para além de responsáveis pela destruição
material à passagem dos soldados, provocaram a desorganização em todos
os setores económicos e o défice financeiro. A situação do Brasil como sede
do reino (em consequência das invasões francesas) valeu-lhe a atenção do
regente que, durante a sua estadia, tomou medidas favoráveis à economia
brasileira, porem, muito contestadas pela burguesia da metrópole,
destacando-se: em 1808, a abertura dos portos do Brasil, obrigando a burguesia
portuguesa a competir com os estrangeiros pelo mercado brasileiro; em 1810, o
tratado de comércio com a Inglaterra, que favorecia a entrada de maquinufaturas
inglesas no Brasil.
Na Conjuntura Social destacamos a burguesia como sendo o grupo mais
afetado pela crise no comércio e nas manufaturas decorrente das invasões
francesas. Era também o mais descontente, logo, mais inclinado à preparação da
revolta. A tomada de consciência política traduziu-se na constituição do Sinédrio
(associação secreta fundada por Manuel Fernandes Tomás, ligada à Maçonaria),
que planificou a rebelião e contou com o descontentamento da nobreza e dos
populares.
Em 24 de agosto de 1820, ocorreu o pronunciamento militar do Porto, que
traduziu o descontentamento geral da população portuguesa face à conjuntura
económica, política e social acima descritas.

A Revolução de 1820 e as dificuldades de implantação da ordem liberal


(1820-1834)

Analisar a ação do Vintismo


A 24 de Agosto de 1820, no Porto, saiu vitoriosa a Revolução Liberal
portuguesa. Os objetivos da revolução, presentes no “Manifesto aos
Portugueses”, de Manuel Fernandes Tomás, eram, essencialmente, três: a
convocação das Cortes, a elaboração de uma Constituição e uma
governação justa, que recuperasse o país da crise em que se encontrava.
Formou-se, então, a Junta Provisional do Supremo Governo do Reino,
que governou o país durante quatro meses e organizou eleições para as Cortes
Constituintes (Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação
Portuguesa).
Da reunião das Cortes (1821-1822) resultou a Constituição de 1822,
elaborada de acordo com a ala mais radical de deputados. O Vintismo é,
assim, identificado com um Liberalismo de tipo radicalista, que vigorou em
Portugal através da Constituição, entre 1822 e 1826, muito embora
ameaçado por golpes absolutistas desde 1823. A ação do Vintismo
caracterizou-se, no essencial, pelas seguintes medidas:
- elaboração da Constituição de 1822 e instituição do parlamentarismo;
- instituição da liberdade de expressão: a Inquisição acabou, a censura
foi abolida (com efeitos importantes sobre a imprensa e o ensino);
- eliminação de privilégios do clero e da nobreza: foram abolidos o
pagamento da dízima à Igreja e os privilégios de julgamento; a reforma dos
forais (1821) libertou os camponeses da prestação de um grande número de
direitos senhoriais; a “Lei dos Forais” (1822) reduziu mas não eliminou) as
rendas e pensões que os camponeses tinham de pagar aos senhores das
terras.

Reconhecer no processo de independência do Brasil uma das


razões do fracasso do Vintismo
O Vintismo fracassou por vários motivos:
1. Pela oposição constante das ordens privilegiadas, que não queriam
perder os seus direitos.
2. Pelo descontentamento das classes populares, as quais
pretendiam uma reforma socioeconómica mais profunda, que anulasse as
estruturas de Antigo Regime; ao invés, a atuação vintista defendeu os
interesses da burguesia rural em detrimento do pequeno campesinato, pois
os deputados das Cortes eram, também, proprietários de terras. A Lei dos
Forais, nomeadamente, não surtiu o efeito desejado porque não se aplicava a
todas as terras e porque convertia as rendas (habitualmente pagas em géneros)
em prestações pagas em dinheiro, sem um critério de conversão uniforme.
3. Pela atuação antibrasileira das Cortes; apesar de o Brasil ter o
estatuto de reino desde
1815, toda a atuação das Cortes se orientou no sentido de lhe retirar
autonomia e de refrear o progresso económico:
- o regresso de D. João VI a Portugal em 1821, onde veio assinar a
constituição de 1822, interrompeu a obra de desenvolvimento que este
monarca havia iniciado no Brasil (por exemplo, permitindo a criação de
indústrias, ordenando a criação de um banco, de uma biblioteca, de um
teatro, de uma imprensa local). Ficou no Brasil, como regente, o seu filho Pedro.
- as Cortes, compostas por deputados que dependiam do comércio
colonial, aprovaram várias leis que tornavam o Brasil diretamente
dependente de Lisboa (por exemplo, os poderes judicial e militar eram
submetidos diretamente a Lisboa) e que retiravam a liberdade de comércio à
colónia (nomeadamente, só os navios portugueses podiam fazer o comércio do
porto em porto em todas as possessões do Império).
- o príncipe regente D. Pedro foi chamado a Portugal com o argumento
(pouco convincente) de ser educado na Europa.
Esta tentativa, por parte das Cortes, de retirar direitos que os colonos
sentiam como adquiridos resultou, em 1822, na independência do Brasil
proclamada pelo próprio D. Pedro, coroado Imperador do Brasil (foi D. Pedro I do
Brasil, entre 1822 e 1831, e D. Pedro IV de Portugal, durante uma semana
apenas, em 1826 antes de abdicar do trono português em favor da sua filha).
A perda da colónia americana foi um dos fatores de fracasso do
Vintismo, pois retirou importantes fontes de rendimento a Portugal, o que
provocou o descontentamento social. A independência do Brasil só viria a ser
reconhecida pela metrópole portuguesa em 1825.

Comparar a Carta Constitucional de 1826 com a Constituição de 1822


A Constituição de 1822 é um diploma arrojado para o seu tempo. Eis
as suas principais deliberações:
1. Os direitos dos cidadãos foram assegurados (art.º. 1 – “A Constituição
política da Nação
Portuguesa tem por objetivo manter a liberdade, segurança e propriedade
de todos os
Portugueses”). Porém, a ausência de representação das classes populares nas
Cortes (os deputados eram, maioritariamente, magistrados, proprietários e
comerciantes) repercutiu- se na afirmação do sufrágio não-universal (Título III,
Capítulo I, item 33 – “Na eleição dos deputados têm voto os portugueses que
estiverem no exercício dos direitos de cidadão
[…]. Da presente disposição se exceptuam […]).
2. O poder real foi limitado: o rei, a quem cabia o poder executivo,
tinha direito de veto suspensivo sobre as Cortes, isto é, podia remeter
uma lei já aprovada às Cortes Legislativas, mas teria de acatar o resultado
dessa segunda votação. Assim, o absolutismo foi abolido, pois a soberania
residia nas Cortes e não no rei (Título II, item 36 – “A soberania reside
essencialmente em a Nação”).
3. A sociedade de ordens foi abolida, pois não se reconheciam
quaisquer privilégios à nobreza e ao clero (Título I – item 9 – “A Lei é
igual para todos”). Esta determinação motivou, aliás, a oposição cerrada das
ordens privilegiadas ao radicalismo vintista.
4. A responsabilidade de elaboração das leis foi entregue a uma
Câmara única (Cortes Legislativas), o que retirava às ordens superiores a
possibilidade de terem um órgão de representação próprio (Título III,
Capítulo V, item 105 – “A iniciativa direta das leis somente compete aos
representantes da Nação juntos em Cortes.”).
5. A religião católica era aceite como religião oficial dos Portugueses.
A Carta Constitucional de 1826, ao contrário da Constituição de 1822,
é um documento moderado. A Carta foi outorgada por D. Pedro IV, após a
morte do pai, D. João VI, em 1826 (“Faço saber a todos os meus
súbditos portugueses que sou servido decretar, dar e mandar jurar
imediatamente pelas três Ordens do Estado a Carta Constitucional […]. “
Procurava conciliar o Antigo Regime e o liberalismo, através das seguintes
medidas:
1. O poder real foi ampliado: graças ao poder moderador de que passa a
usufruir (Título V, art.º 71 – 2º poder moderador é a chave de toda a
organização política e compete privativamente ao rei […]”), o monarca
podia nomear os Pares, convocar as Cortes e dissolver a Câmara dos
Deputados, nomear e demitir o governo, vetar a título definitivo as resoluções
das Cortes (Título III, art.º 59 – “O rei dará, ou negará, a sanção em
cada decreto […]”) e suspender os magistrados.
2. Os privilégios da nobreza foram recuperados (Título VIII, art.º 45,
item 31 – “Garante a nobreza hereditária e suas regalias.”).
3. As Cortes Legislativas passaram a ser compostas por duas
Câmaras: a Câmara dos Deputados, eleita por sufrágio indireto e censitário, e
a Câmara dos Pares, reservada a elementos das ordens superiores nomeados
a título vitalício e hereditário (Título III, art.º
14 – “As Cortes compõem-se de duas Câmaras […]”.
4. A liberdade religiosa não era admitida.
5. Os direitos do indivíduo só aparecem no fim do documento (Título VIII,
art.º 45.º - “[…] a liberdade, a segurança individual e a propriedade […]” e
o sufrágio era censitário e indireto.
A Carta Constitucional teve três períodos diferentes de vigência:
1º - entre 1826 e 1828.
2º - entre 1834 e 1836.
3º - entre 1842 e 1910 (embora sujeita a alterações desde 1851).

Relacionar a guerra civil de 1832-34 com a resistência ao


Liberalismo
O Liberalismo português sofreu várias ameaças:
- as primeiras reações absolutistas lideradas pelo infante D. Miguel foram
apoiadas pela sua mãe, a rainha D. Carlota Joaquina, pela nobreza e pelo
clero. Beneficiando de uma conjuntura externa favorável ao retorno das
monarquias absolutas, D. Miguel pôs em prática dois movimentos militares:
a Vilafrancada, em 1823 e a Abrilada, em 1824. Apesar de fracassados (D.
Miguel é exilado em Viena de Áustria) puseram termo ao projeto progressista do
Vintismo. D. João VI remodelou o governo, que passou a integrar liberais
moderados, e muitos dos liberais (ou “malhados”, como lhes chamavam os
partidários de D. Miguel) fugiram do país;
- em 1828, Portugal tornou-se, de novo, um país absolutista. Perante o
problema da sucessão ao trono após a morte de D. João VI, D. Pedro, então
imperador do Brasil, confirmou a regência de Portugal pela sua irmã, a infanta
D. Isabel Maria e abdicou dos seus direitos à Coroa em favor da filha D.
Maria da Glória (rainha D. Maria II). Porém, como a sua filha tinha apenas sete
anos, ficaria como regente D. Miguel, o qual casaria com a sobrinha e juraria a
Carta Constitucional. O casamento não se chegaria a realizar pois D. Miguel,
após ter regressado do exílio, convocou Cortes onde se fez aclamar rei
absoluto. Assim, entre 1828 e 1834, Portugal viveu sob o regime
absolutista, o que conduziu à fuga de um grande número de liberais;
- entre 1832 e 1834 desenrolou-se a guerra civil entre os liberais
(chefiados por D. Pedro desde 1831) e os absolutistas (liderados por D.
Miguel). A implantação definitiva do Liberalismo revelou-se muito difícil, pois
D. Pedro apenas dispunha de um pequeno exercito (de cerca de 7500 homens).
Foi a partir da ilha Terceira dos Açores (que já se havia insurgido
militarmente contra o absolutismo em 1828 e em 1829) que D. Pedro organizou
a resistência. Em 1832 desembarcou em Pampelido (Mindelo), dirigindo-se para a
cidade do Porto, onde foi cercado, durante dois anos, pelas forças absolutistas
(Cerco do Porto). A vitória liberal só aconteceu em 1834, e foi selada
pela convenção de Évora-Monte. D. Pedro morreu, pouco tempo depois, de
tuberculose, enquanto o seu irmão D. Miguel foi exilado para o resto da sua vida.
D. Maria II, rainha desde os sete anos de idade, só então, com quinze anos, pôde
sentar-se no trono português.

O novo ordenamento político e socioeconómico (1832/34 – 1851)

Analisar o papel da legislação de Mouzinho da Silveira e


outros na liquidação do Antigo Regime
José Xavier Mouzinho da Silveira, ministro da Fazenda (finanças) e da
Justiça durante a regência de D. Pedro (1832-1833), promulgou decretos
fundamentais para a consolidação do Liberalismo, atacando as estruturas de
Antigo Regime:
- na agricultura, aboliu os dízimos, os morgadios e os forais, libertando
os camponeses das dependências tradicionais;
- no comércio, extinguiu as portagens internas e reduziu os impostos sobre a
exportação, de maneira a retirar os entraves à atividade comercial;
- na indústria, acabou com os monopólios, nomeadamente o da
Companhia das Vinhas do Alto Douro;
- na administração, dividiu o país em províncias, comarcas e concelhos;
também instituiu o Registo Civil para todos os recém-nascidos, retirando a
questão do nascimento da alçada da Igreja;
- na justiça, organizou o país segundo uma hierarquia de circunscrições
(divisões territoriais), submetendo todos os cidadãos à mesma lei;
- nas finanças, criou um sistema de tributação nacional, eliminando a
tributação local que revertia, em grande parte, a favor do clero e da
nobreza; substituiu o Erário Régio (criado pelo Marquês de Pombal) pelo
Tribunal do Tesouro Público para controlar a arrecadação de impostos;
- na cultura, mandou abrir aulas e instituiu a Biblioteca Pública do Porto.
Ferreira Borges desempenhou, igualmente, um papel importante na
liquidação do Antigo Regime em Portugal, ao elaborar o Código Comercial de
1833, onde se aplicava o princípio fundamental do liberalismo económico: o
livre-câmbio, ou seja, a livre circulação de produtos (por oposição ao
protecionismo), através da abolição de monopólios e de privilégios, bem
como da eliminação do pagamento de portagens e de sisas.
Joaquim António de Aguiar, ministro da Justiça, mereceu o epíteto de
“mata-frades” pela sua intervenção legislativa (1834-1835) contra os
privilégios do clero, em particular do clero regular, identificado com o projeto
miguelista:
- aboliu o clero regular, através do Decreto de Extinção das Ordens
Religiosas que acabava com “todos os conventos, mosteiros, colégios, hospícios
e quaisquer casas de religiosos de todas as Ordens Regulares” masculinas; as
ordens religiosas femininas eram, indiretamente, aniquiladas por meio da
extinção dos noviciados (preparação para o ingresso numa ordem religiosa);
- os bens das ordens religiosas foram confiscados e nacionalizados;
- em 1834-1835, esses bens, juntamente com os bens da Coroa, das
Rainhas e do Infantado, foram vendidos em hasta pública – beneficiando a alta
burguesia – e o produto da venda foi utilizado, pelo ministro da Fazenda (Silva
Carvalho), para pagar dívidas do Estado.

Caracterizar o Setembrismo
O reinado de D. Maria II (1826-1853) correspondeu a um período conturbado
da história política portuguesa de Oitocentos. Começou a reinar,
efetivamente, em 1834, sob a vigência da Carta Constitucional redigida
pelo seu pai, D. Pedro (1834-1836: etapa designada por Cartismo). Porém,
em Setembro de 1836, uma revolução de carácter civil obrigou a rainha a revogar
a Carta e a jurar a Constituição de 1822.
O Setembrismo (1836-1842) foi um projeto político da pequena e média
burguesias, com o apoio das camadas populares (contra o predomínio da
alta burguesia, que havia sido favorecida pela Cartismo). Os mentores do
Setembrismo, que integravam o novo governo, eram Sá da Bandeira e
Passos Manuel.
A política setembrista, apoiada na nova Constituição de 1838
caracterizou-se, essencialmente, pelas seguintes medidas:
- o rei (neste caso a rainha) perdeu o poder moderador (embora mantivesse
o direito de veto definitivo sobre as leis saídas das Cortes);
- a soberania da Nação foi reforçada;
- adotou-se o protecionismo económico, sobrecarregando com impostos as
importações, de modo a tornar mais competitivos os produtos industriais
nacionais (sem grande sucesso);

- investiram-se capitais em África, como alternativa à perda do mercado


brasileiro;
- reformou-se o ensino primário, secundário e superior, com destaque
para a criação dos liceus, por Passos Manuel, onde os filhos da burguesia se
preparavam para o ensino superior o que lhes permitiria exercer cargos de
relevo;
- as taxas fiscais aplicadas aos pequenos agricultores não foram
abolidas, o que contribuiu para o fracasso económico do Setembrismo.

Mostrar que o Cabralismo se identificava com o projeto cartista da


alta burguesia
Entre 1842 e 1851, vigorou a ditadura de António Bernardo da Costa Cabral.
O país enveredou, novamente, pela via mais conservadora: enquanto o
Setembrismo se inspirava na Constituição de 1822, o Cabralismo repôs em
vigor a Carta Constitucional de 1826, identificando-se, assim, com o
período do Cartismo (1834-1836). Tal como aconteceu com o Cartismo, as
medidas tomadas durante o período do Cabralismo favoreceram, em
primeiro lugar, a alta burguesia. Destacam-se, nomeadamente:
- o fomento industrial (fundação da Companhia Nacional dos Tabacos,
difusão da energia a vapor);
- o desenvolvimento de obras públicas (criação da Companhia das Obras
Públicas de Portugal para a construção e reparação das estradas; construção da
ponte pênsil sobre o rio Douro);
- a reforma fiscal e administrativa (publicação do Código Administrativo
de 1842, criação do Tribunal de Contas para a fiscalização das receitas e
despesas do Estado).
No entanto, as Leis da Saúde Pública, em especial a proibição do
enterramento dentro das igrejas, a par do descontentamento com o acréscimo
de burocracia e com o autoritarismo de Costa Cabral, despoletaram duas
movimentações de cariz popular – a revolta da “Maria da Fonte” e a
“Patuleia” – que se transformaram em guerra civil (1846/47) e acabaram
por conduzir a queda de Costa Cabral, em 1847. Este regressaria ao
poder em 1849, sendo afastado definitivamente em 1851, pelo golpe do
marechal-duque de Saldanha.
Depois de uma primeira metade de século extremamente agitada, nos
últimos 50 anos de Oitocentos, Portugal iria gozar a paz e o progresso material
do período da Regeneração.

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