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A implantação do Liberalismo em Portugal

 Antecedentes e conjuntura (1807-1820)

 Ao abrir o século XIX, Portugal parecia escapar aos ventos do liberalismo. O peso do
Antigo Regime fazia-se sentir nas pesadas obrigações senhoriais que condenavam os
camponeses à miséria e na intransigência do absolutismo assente na ação repressiva da
Inquisição, da Real Mesa Censória e da Intendência-geral da Polícia.

 No entanto, nos principais centros urbanos, burgueses e intelectuais, muitos deles filiados
em lojas maçónicas, discutiam ideias de mudança. Uma conjuntura favorável abriu
caminho à concretização das suas aspirações, devido, em grande, ao impacto das invasões
francesas.

 As invasões francesas e a dominação inglesa em Portugal

 Decidido a abater o poderio da Inglaterra, Napoleão Bonaparte decretou, em finais de


1806, o Bloqueio Continental, nos termos do qual nenhuma nação europeia deveria
comerciar com as ilhas Britânicas.

 Fiel à sua velha aliada, mas não querendo hostilizar o imperador dos franceses e arriscar
uma mais que certa invasão da França e da Espanha, o príncipe regente D. João adotou
uma política ambígua. Esta atitude custou ao país, de 1807 a 1811, o flagelo das três
invasões napoleónicas.

 O embarque da família real para o Brasil, que de colonia passou a sede de Governo,
permitiu a Portugal manter a independência do Estado. O preço a pagar revelou-se bem
alto. Não só pela devastação e pela destruição causadas por quatro anos de guerra com a
França, mas, especialmente, pelo domínio político e económico que a Inglaterra exerceu,
doravante, entre nós.

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 Corte ausente, ingleses presentes

 De 1808 a 1821, Portugal viveu na dupla condição de protetorado inglês e de colonia


brasileira. D. João VI teimava em permanecer no Brasil, proclamado reino em 1815, para
grande descontentamento dos portugueses, que sofriam a humilhação da presença inglesa.
O marechal Beresford, incumbido de reestruturar o exército e organizar a defesa do reino
contra os franceses, tornou-se generalíssimo e comandante-chefe das tropas portuguesas,
nas quais os britânicos ocupavam as mais altas patentes. Os seus poderes chegaram,
inclusive, a sobrepor-se aos da Regência. Beresford exerceu um rigoroso controlo sobre o
funcionalismo e a economia, enchendo as prisões de suspeitos de jacobinismo.

 A repressão de Beresford atingiu particular crueldade em 1817, quando o general Gomes


Freire de Andrade e mais 11 oficiais do Exército foram executados, por suspeita de
envolvimento numa conspiração.

 Entretanto, a situação económica e financeira assumia contornos de elevada gravidade: as


despesas ultrapassavam as receitas, a agricultura definhava e o comercio decrescia. Para
esta situação muitos contribuíram os seguintes fatores:
 A abertura dos portos do Brasil ao comercio internacional, em 1808 – a perda do
exclusivo comercial com a colonia, que abastecia a metrópole de alimentos e
matérias-primas e que constituía um mercado garantido de escoamento para os
produtos manufaturados nacionais, revelou-se desestruturante para a economia
portuguesa;
 O tratado de comercio de 1810 com a Grã-Bretanha – considerando uma espécie de
confirmação do Tratado de Methuen, permitiu a entrada com grandes facilidades das
mercadorias britânicas, nomeadamente as manufaturas, em Portugal e nos seus
domínios.

 Privada de lucrativos negócios, em consequência da conjuntura atrás relatada, a burguesia


portuguesa sofreu, naturalmente, sérios prejuízos.

 A rebelião em marcha
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 Não espanta, portanto, que a preparação da rebelião tenha ficado a cargo da burguesia,
com especial destaque para a que estava radicada no Porto, notável centro de atividade
mercantil.

 Manuel Fernandes Tomás, desembargador da Relação daquela cidade, fundou, em 1817,


uma associação secreta com o nome de Sinédrio, cujos membros pertenciam, na quase
totalidade, à Maçonaria. Atento à marcha dos sucessos políticos, o Sinédrio propunha-se
intervir logo que a situação se revelasse propicia, o que vejo, efetivamente, a acontecer
em 1820.

 Em janeiro desse ano, na vizinha Espanha, uma revolução liberal restaurou a


Constituição de 1812. A Espanha tornou-se, então, centro de uma grande agitação política
e Portugal passou a receber muita propaganda liberal, que compreendia panfletos e
edições traduzidas da Constituição espanhola.

 Perante esta sucessão de acontecimentos, o pânico começou a fazer-se sentir entre os


membros da Regência, admitindo que os ventos liberais podiam também começar a
soprar em Portugal.

 Finalmente, em março, Beresford embarcou para o Rio de Janeiro, a fim de solicitar ao


rei dinheiro para pagamento das despesas militares, alem de mais amplos poderes para
reprimir a crescente onda de agitação.

 A ausência do marechal favoreceu a ação do Sinédrio, cujos membros se lançaram com


entusiasmo no aliciamento de figuras militares capazes de consumar a tão desejada
revolução.

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 A Revolução de 1820 e as dificuldades de implantação da ordem liberal
(1820-1834)
 O Vintismo

 O eclodir da revolução

 O pronunciamento militar sucedido no Porto, a 24 de agosto de 1820, processou-se de


forma pacifica e ordeira. O sucesso deste movimento ficou a dever-se à união de militares
e burgueses prejudicados nos seus interesses pela presença britânica: os primeiros, por se
sentirem afetados pela concorrência inglesa, nomeadamente no comercio com o Brasil.

 Ainda no dia 24 de agosto, o Conselho Militar reuniu-se com as autoridades municipais


do Porto e em conjunto declararam constituída a Junta Provisional do Governo Supremo
do Reino. Dela fizeram parte os principais dirigentes da revolução, como o brigadeiro
António da Silveira, os coronéis Sepúlveda e Cabreira e os burgueses Manuel Fernandes
Tomás, José Ferreira Borges e José da Silva Carvalho. Este governo provisório propunha-
se a substituir a Regência de D. João VI, mantendo-se em funções até à instalação das
Cortes que elaborariam a Constituição.

 A Manuel Fernandes Tomás coube a redação do Manifesto aos Portugueses, no qual se


davam a conhecer as razoes e os objetivos do movimento. Quanto às razoes, aponta a
situação catastrófica em que o reino se encontrava e a incapacidade de governar da
Regência. No que concerne aos objetivos, defende a convocação de Cortes que
aprovassem uma sábia constituição, defensora da autoridade régia e dos direitos dos
portugueses, reafirmando a submissão à fé católica. Por conseguinte, podemos concluir
que os homens de 1820, mais do que revolucionários empenhados em subverter
instituições, veiculavam um profundo respeito pela monarquia e pelo catolicismo.

 Manuel Fernandes Tomás, consciente de que o sucesso da revolução estava dependente


da adesão do resto do país, teceu também rasgados elogios ao papel desempenhado pelo
Exército. Com efeito, nem mesmo a reação da Regência evitou que o movimento
alastrasse a todo o reino.

 O triunfo da revolução vintista

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 A 15 de setembro foi a vez de Lisboa repetir um pronunciamento militar semelhante ao
do Porto, responsável pela expulsão dos regentes e pela constituição de um governo
interino.

 A 27 de setembro, em Alcobaça, os governos de Porto e Lisboa fundiram-se, formando


duas novas juntas nacionais. A Junta Provisional do Governo Supremo do Reino, de
carácter executivo, tinha como presente Freire de Andrade (principal decano da Sé de
Lisboa e perante do general martirizado em 1817), António da Silveira na vice-
presidência, e entre outros, Manuel Fernandes Tomás como encarregado dos Negócios do
Reino e Fazenda. Por sua vez, a Junta Provisional Preparatória das Cortes, como o
nome indica, avançou com todos os procedimentos necessários à convocação e
funcionamento das Cortes. José Ferreira Borges, José da Silva Carvalho e o coronel
Sepúlveda foram alguns dos seus mais destacados membros.

 Como a Junta Provisional do Governo Supremo do Reino reconheceu, a revolução


triunfou sem derramamento de sangue. Para este sucesso muito contribuiu a conjugação
de interesses entre militares e burgueses, sobretudo no desejo de afastar os ingleses do
comando militar e da ingerência nos negócios nacionais.

 No entanto, as tensões entre os principais atores revolucionários, já verificadas no período


de preparação da rebelião, acabaram por ensombrar os primeiros tempos liberais. De
facto, o movimento acabou por se dividir em dois grupos: o dos militares, encabeçado
pelo brigadeiro António da Silveira e pelo coronel Cabreira, pretendia controlar os
destinos da revolução sem o recurso a mudanças substanciais; o dos civis, liderado por
Manuel Fernandes Tomás, queria dotar o país de uma Constituição e de instituições e leis
liberais.

 A publicação, no dia 10 de novembro, do regulamento das eleições às Cortes


Extraordinárias e Constituintes agravou ainda mais o problema, com os militares a
considerarem que a lei favorecia a eleição dos magistrados. Estavam criadas as condições
para a tentativa de um golpe militar que ficou conhecido por “Martinhada”, por ter
ocorrido a 11 de novembro, dia de S. Martinho.

 O fracasso desta conspiração permitiu que o “partido civil” tomasse as rédeas do processo
revolucionário.

 As eleições para as Cortes Constituintes, através de sufrágio indireto, tiveram finalmente


lugar em dezembro de 1820. Os deputados eleitos eram, na sua maioria, militares,
magistrados, professores universitários e membros das profissões liberais, composição
socioprofissional que, claramente, influenciara a legislação emanada pela assembleia.

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 As Cortes Constituintes iniciaram, solenemente, os seus trabalhos na sessão preparatória
de 24 de janeiro de 1821, tendo sido admitidos “tantos espectadores quantos permitiu a
capacidades das Galerias”. Na sessão inaugural do dia 26 do mesmo mês, o conde de
Sampaio foi o primeiro a discursar. Perante os deputados, os “Ilustres Representantes da
Nação Portuguesa”, qualificou aquele dia como “glorioso e memorável”.

 A Constituição de 1822

 Nas primeiras reuniões das Cortes Constituintes, os deputados eleitos juraram ser fieis ao
rei, à Constituição e à religião católica. Entre as suas primeiras iniciativas, estiveram a
nomeação de uma nova regência e a redação de cartas a D. João VI, pondo o monarca a
par dos acontecimentos. Na verdade, o exilio dourado do rei no Brasil, desde 1807,
suscitava preocupações relativamente à sua adesão às mudanças verificadas em Portugal,
na sequencia da Revolução Liberal.

 Essas inquietações começaram a dissipar-se com a chegada a Lisboa de D. João VI, no


dia 3 de julho de 1821. O rei desembarcou no dia seguintes e fez o trajeto entre a Praça do
Comercio e o Palácio das Necessidades, sede das Cortes Extraordinárias e Constituintes,
também chamadas de Soberano Congresso. Aí prestou juramento às Bases da
Constituição, documento que havia sido aprovado a 9 de março de 1821 e que antecipava
uma nova era constitucional em Portugal.

 A Constituição de 1822 é um longo documento de 240 artigos, baseado na Constituição


espanhola de 1812 e nas Constituições francesas de 1791, 1793 e 1795. Nele estão
presentes os grandes princípios do constitucionalismo liberal: os direitos à liberdade, à
segurança e à propriedade, logo nos primeiros artigos; a igualdade perante a lei; a
soberania da Nação; a separação de poderes. Em contrapartida, não reconhece qualquer
privilégio ao clero e à nobreza e submete o poder real à supremacia das Cortes
Legislativas.

 Demasiado progressista para o seu tempo, a Constituição de 1822 foi fruto da ala mais
radical dos deputados presentes às Cortes Constituintes, cuja ação é conhecida por
vintismo. Desde o inicio da reunião da assembleia, tornou-se clara a existência de uma
tendência moderada, respeitadora da monarquia e do catolicismo e que se inclinava para a
adoção de uma Constituição conservadora, e de uma tendência radical, democrática, cujos
principais lideres eram Fernandes Tomás, Ferreira Borges e Borges Carneiro. A fação
radical conseguiu transpor para o texto constitucional as suas conceções políticas e até
religiosas. Com efeito, num claro sinal de tolerância, o artigo 25.º permitia “aos
estrangeiros o exercício particular dos seus respetivos cultos”.

 Aprovado a 23 de setembro de 1822, o texto constitucional consagrava a divisão


tripartida dos poderes, assim distribuídos:
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 Legislativo - entregue a uma única camara, as Cortes Legislativas, cujos deputados
eram eleitos atraves de sufrágio direto por homens maiores de 25 anos (ou maiores de
20, se fossem casados) que soubessem ler e escrever;
 Executivo – exercido pelo rei, que podia recorrer ao veto suspensivo, isto é, quando
não concordasse com uma lei, poderia remetê-la ao Congresso para efeito de segunda
votação, mas esta seria definitiva e de aceitação obrigatória para o monarca;
 Judicial – exercido pelos juízes e tribunais, com absoluta independência perante as
Cortes e o rei.

 No fundo, a verdadeira soberania residia nas Cortes, representativas da nação. A


autoridade régia saía profundamente diminuída, o que não inviabilizou a aceitação e
juramento da Constituição por D. João VI, no dia 1 de outubro.

 A legislação vintista

 Embora centradas na elaboração da Constituição e na instauração do primeiro sistema de


governo parlamentar, as Cortes legislaram em muitos outros domínios, propondo grandes
reformas para eliminar as estruturas do Antigo Regime. Entre as medidas mais
significativas que as Cortes tomaram contam-se:
 A extinção da Inquisição;
 A abolição da censura prévia e a instituição da liberdade de empresa;
 A fundação do primeiro banco português, o banco de Lisboa;
 A transformação dos bens da Coroa em bens nacionais;
 O encerramento de numerosos mosteiros e conventos e a supressão do pagamento da
dizima à Igreja;
 A eliminação dos privilégios judiciais quanto a assuntos criminais e civis.

 Os deputados vintistas, respondendo a inúmeras petições chegadas às Cortes, procederam


ainda a uma reforma dos forais. Para conseguir desembaraçar a agricultura de obstáculos
que impediam o campesinato de aceder mais plenamente aos seus frutos, suprimiram,
pelo decreto de 20 de março de 1821, todo um conjunto de direitos banais e tributos
pessoais.

 No entanto, a “Lei dos Forais” (3 de junho de 1822), mesmo reduzindo para metade as
rendas e pensões devidas pelos agricultores, não agradou ao pequeno campesinato dos
rendeiros por dois motivos: primeiro, as arbitrariedades na conversão das rendas em
prestações fixas em dinheiro; segundo, nas terras não regulamentas por cartas de foral, os
tributos tradicionais mantiveram-se.

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 Na verdade, a ação do vintismo revelou-se plena de contradições. Se, no plano político,
foram adotadas medidas inequivocamente liberais, no domínio socioeconómico, a
legislação vintista manifestou-se precária. O facto de muitos deputados serem
proprietários rurais explica a atitude protecionista das Cortes liberais, comprovada pela
continuidade dos privilégios económicos da Companhia da Agricultura das Vinhas do
Alto Douro e pela proibição da importação de produtos como os cereais, o azeite e o
vinho.

 A independência do Brasil
 A caminho da separação

 A corte portuguesa residiu no Brasil de 1808 a 1821, período de um extraordinário


progresso económico, politico e cultural daquele território, elevado a reino em 1815. Com
seus portos abertos à navegação estrangeira e dotado de indústrias, de um banco nacional,
de tribunais, de instituições de ensino, de uma biblioteca e de uma imprensa local, o
Brasil abandonava a sua condição de colónia e o Rio de Janeiro assumia-se como a sede
da monarquia portuguesa.

 Se ao desenvolvimento atras enunciado acrescentarmos a influencia do profundo


sentimento de liberdade coletiva que, desde o início do século, vinha arrastando as
colónias americanas da Espanha para a independência, compreenderemos, enfim, os
anseios autonomistas dos brasileiros. Em 1789, ocorreu uma rebelião nacionalista em
Vila Rica (atual Ouro Preto), dirigida por estudantes e homens esclarecidos que chegaram
a projetar a independência de Minas Gerais e a formação de um governo republicano. A
revolta ficou conhecida por Inconfidência Mineira e teve em José da Silva Xavier, o
Tiradentes, um dentista ex-militar, único condenado à morte, o grande herói da libertação
nacional. Outro movimento independentista sucedeu em 1817: foi a Revolução
Republicana de Pernambuco que, embora condenada ao fracasso, defendeu o separatismo
do Nordeste brasileiro.

 A atuação das Cortes Constituintes

 A política antibrasileira das Cortes Constituintes de Portugal acabou por acelerar o


processo de independência daquele território. A maioria dos deputados queria,

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efetivamente, restituir o Brasil à condição de colonia, rejeitando o estatuto de “Reino
Unido” de que usufruía.

 Com esse objetivo, legislaram no sentido de anular os benefícios comerciais atribuídos ao


Brasil, ao longo da permanência de D. João VI, e de o subordinar administrativa, judicial
e militarmente a Lisboa. Golpe profundo mo patriotismo brasileiro foi dado com a ordem
de regresso a Lisboa, em setembro de 1821, do príncipe regente D. Pedro, a pretexto de
concluir a sua educação na Europa.

 Aconselhando a desobedecer, D. Pedro permaneceu no Brasil num ambiente de elevada


tensão e animosidade contra as Cortes Constituintes. Chegou-se ao ponto, inclusive, se
serem consideradas inimigas as tropas portuguesas que desembarcassem no Brasil.

 A independência declarada por D. Pedro nas margens do Ipiranga, em São Paulo, a 7 de


setembro de 1822, só viria a ser reconhecida por Portugal em 1825, tendo, para o efeito,
contribuindo o esforço da diplomacia britânica, sinceramente empenhada no domínio do
mercado americano após ter perdido as suas colonias da América do Norte.

 Traumática para Portugal, a separação do Brasil representou, especialmente, um rude


golpe para os revolucionários vintistas. Não só pôs em causa os seus interesses
comerciais e industriais, como comprometeu a recuperação financeira do país, fazendo
crescer o descontentamento e a oposição.

 A resistência ao Libertismo
 A oposição absolutista

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 A Revolução de 1820 deparou-se com várias dificuldades. Para começar, sucedeu num
tempo em que as grandes potencias procuravam eliminar os vestígios da Revoluçã o
Francesa. Com efeito, vá rios diplomatas portugueses que se opunham à instauraçã o
do Liberalismo no nosso país procuraram apoio externo junto de forças
conservadoras europeias.

 A nobreza e o clero mais conservadores estavam descontentes com o radicalismo da


Constituição e sentiam-se prejudicados pela abolição de antigos privilégios senhoriais.
Animados pela ideia de uma contrarrevolução absolutista, encontraram o apoio necessário
junto da rainha D. Carlota Joaquina, que em novembro de 1822 recusou jurar a
Constituição.

 A contrarrevolução eclodiu em 1823, animada pela intervenção estrangeira na vizinha


Espanha, onde a monarquia absolutista fora restaurada na pessoa de Fernando VII, irmão
de D. Carlota Joaquina. Dois regimentos de Lisboa, mandados para defender a fronteira
de um eventual ataque, revoltaram-se em Vila Franca, tendo-se-lhes juntado o infante D.
Miguel, que assumiu a direção do movimento. A revolta, conhecida por Vila-Francada,
terminou quando o rei D. João VI retomou o comando da situação, defendendo a
alteração da Constituição.

 As Cortes ordinárias, manifestando a sua oposição relativamente a qualquer modificação


do texto constitucional, interromperam as sessões. Controlada a resistência parlamentar,
D. João VI remodelou o governo, entregando-o a absolutistas e liberais moderados, e
nomeou D. Miguel comandante-chefe do Exército.

 Os ânimos, no entanto, continuaram ao rubro. Em abril de 1824, os partidários de D.


Miguel prenderam os membros do Governo e semearam a confusão em Lisboa, no
sentido de levar o rei e abdicar e a confiar a regência à sua esposa. Auxiliado pelo corpo
diplomático, D. João VI conseguiu, mais uma vez, travar o golpe, conhecido por
Abrilada, e disciplinar o filho rebelde, a quem apontou o caminho do exílio.

 A Carta-Constitucional e a tentativa de apaziguamento político-social

 O falecimento de D. João VI, em 1826, agravou as tensões que marcavam a cena política.
D.Pedro considerou-se o legitimo herdeiro da Coroa portuguesa e, a 26 de abril,
confirmou a regência provisoria da sua irmã, a infanta D. Isabel Maria. No dia 29,
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outorgou um novo diploma constitucional, mais moderado e conservador – a Carta
Constitucional.

 Sendo um diploma outorgado pelos governantes, ao contraio das Constituições, que são
aprovadas pelos representantes do povo, era de esperar uma recuperação do poder real e
dos privilégios da nobreza. Na verdade, a Carta de 1826 representou um manifesto
retrocesso relativamente à Constituição de 1822, introduzindo várias medidas
conservadoras:
 As Cortes passaram a funcionar num sistema bicamaral – uma Câmara dos Deputados
eleita através de sufrágio indireto e censitário; uma Câmara dos Pares constituída pela
alta nobreza, o clero, o príncipe real e os infantes, nomeados a título vitalício e
hereditário;
 Reforço do poder régio – através do poder moderador, o rei podia nomear os Pares,
convocar as Cortes e dissolver a Câmara dos Deputados, nomear e demitir o Governo
e até vetar a título definitivo as resoluções das Cortes;
 Os direitos do indivíduo foram relegados para o fim do diploma.

 D.Pedro acabou por abdicar dos seus direitos à Coroa portuguesa na filha mais velha, a
princesa D. Maria da Glória, de 7 anos de idade. Esta deveria celebrar esponsais com seu
tio, o infante D. Miguel, que, ao regressar do seu exilio em Viena de Áustria, juraria o
cumprimento da Carta Constitucional e, de imediato, assumiria a regência do Reino de
Portugal.

 A guerra civil

 D. Miguel regressou a Portugal em fevereiro de 1828 e ainda prestou juramento à Carta


Constitucional, parecendo honrar o compromisso assumido com o seu irmão. Todavia,

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esta adesão ao Liberalismo foi efémera, porque logo em julho se fez aclamar rei absoluto
por umas Cortes convocadas à maneira tradicional, isto é, por ordens.

 Milhares de liberais, temendo perseguições, partiram para o exilio na França e em


Inglaterra, onde organizaram a resistência. Os que ficaram sujeitaram-se a uma repressão
sem limites, período conhecido por terror miguelista.

 Em 1831, D. Pedro abdicou ao trono brasileiro e veio lutar pela restituição à filha do
trono português. Mobilizando influencias diplomáticas nas cortes europeias, conseguiu os
recursos necessários à constituição de um pequeno exército. Em fevereiro de 1832, cerca
de 7500 homens partiram da ilha Terceira, bastião da resistência liberal, desembarcando,
em julho, no Mindelo. Seguiu-se a ocupação da cidade do Porto, contrariando as
expectativas do exército miguelista, concentrado, mas proximidades de Lisboa. Na cidade
do Norte, cercada pouco depois pelas forças absolutistas, viveu-se o episodio mais
dramático do confronto entre liberais e absolutistas – o Cerco do Porto.

 A guerra civil durou, ainda, dois longos anos, no decorrer dos quais os exércitos de D.
Pedro organizaram uma expedição ao Algarve e tomaram Lisboa. As batalhas de
Almoster e Asseiceira confirmaram a derrota de D. Miguel, que depôs as armas, assinou a
Convenção Évora Monte e partiu, definitivamente, para o exilio. Definitivamente,
também, o liberalismo instalou-se em Portugal.

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