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Manoel Vargas
Introdução:
Esta é uma obra em construção e que estará em permanente evolução, inspirada nas
minhas aulas de Direito Comercial e Direito Societário na PUC-Rio, nos últimos vinte anos,
e em diversos seminários sobre a matéria. A minha ideia é refletir uma análise objetiva sobre
o Direito das Sociedades, desde a Parte Geral do Código Civil até a Parte Especial no
subtítulo sobre o Direito da Empresa, passando ao exame da Lei nº 6.404/76, conhecida
como Lei das Sociedades Anônimas, com comentários sucintos sobre a Lei nº 6.385/76, que
trata do Mercado de Capitais e da Comissão de Valores Mobiliários, no capítulo sobre as
companhias abertas, bem como à legislação e regulamentação complementar, sempre que
necessária à compreensão dos conceitos mais gerais, presentes em cursos de graduação,
como a Lei nº 13.874/19, sobre a Liberdade Econômica, complementada pela Lei nº
14.195/21, que, dentre outras matérias, introduziu as ações ordinárias com voto plural e
outras importantes inovações. Merecem ainda destaque, no sistema brasileiro de sociedades,
leis especiais que pela sua especificidade não serão abordadas neste trabalho, como a Lei nº
14.193/21, que trata da SAF – Sociedade Anônima do Futebol, e a Lei Complementar nº
182/21, que cria o marco legal das Startups. Quando oportuno, também serão abordados
tópicos de Direito Constitucional. O trabalho será completado e aperfeiçoado ao longo do
tempo. Por ora são notas singelas que exteriorizam minha visão sobre o tema.
2
É importante notar que desde 2020, com base no Decreto 10.139, foram editadas
diretrizes sobre a revisão e consolidação dos atos normativos federais. As normas da CVM
que regulamentam o mercado de valores mobiliários serão paulatinamente convertidas para
resoluções, em substituição às atuais instruções e deliberações. Ao longo deste trabalho são
referidas diversas instruções e deliberações da CVM aprovadas ao longo de 40 anos. Convém
conferir, ao se fazer trabalho de consulta, se tais atos já foram substituídos por resoluções
com nova numeração, se ainda estão em vigor e se foram modificados ou não. Nas revisões
do texto procurarei sempre atualizá-lo, mas há grande dinâmica na revisão dos atos da CVM
e a dificuldade adicional criada pela nova nomenclatura de resoluções. Convém assim
conferir a vigência dos atos normativos referidos no texto. A CVM já editou mais de uma
centena e meia de resoluções, com diferentes datas de eficácia e vigência, modificando
profundamente o cenário normativo pretérito.
Esta apostila tem o objetivo de explicar e descrever o sistema que rege as sociedades
anônimas e o mercado de capitais no Brasil, objeto dos meus cursos sobre companhias
(JUR1262/1232), contabilidade e finanças (JUR1353) e governança
corporativa/ESG/facilitação do diálogo (JUR1920).
Sumário
• 1. Características – artigo 1º
• 2. Objeto Social e prazo de duração – artigo 2º
• 3. Denominação – artigo 3º
• 4. Companhia aberta e fechada – artigos 4º e 4-A. Sistema financeiro
nacional. Mercado de capitais. Regulação pela Comissão de Valores
Mobiliários – CVM
• 4.1 Companhia aberta e fechada
• 4.2 Sistema financeiro nacional: mercado financeiro e mercado de capitais
• 4.3 A estrutura da Lei nº 6.385/76 pode ser assim resumida:
• 4.4 Regras de Autorregulação do Novo Mercado da B3
• 4.5 Fechamento do capital
• 5. A Governança Corporativa e a Responsabilidade ESG – Environment,
Social & Governance
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• 1. Subscrição particular:
• 2. Subscrição pública:
• 1. Características
• 2. Companhias abertas e companhias fechadas
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• 1. Organização da companhia
• 2. Assembleia geral. Disposições gerais e competência
• 3. Espécies de assembleias
• 4. Convocação
• 5. Instalação
• 6. Legitimação
• 7. Livro de presença
• 8. Mesa
• 9. Quórum de deliberações
• 10. Direito de retirada
• 11. Ata da assembleia
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• 1. Conselho de administração
• 2. Diretoria
• 3. Administradores
• 4. Requisitos e impedimentos
• 5.Investidura e garantia de gestão
• 6. Substituição e término da gestão. Renúncia e destituição
• 7. Remuneração
• 8. Deveres e responsabilidades dos administradores
• 9. Dever de diligência
• 10. Dever de lealdade
• 11. Conflito de interesses
• 12. Dever de informar
• 13. Responsabilidade dos administradores
• 14. Ação de responsabilidade dos administradores
• 15. Ação de responsabilidade da companhia
• 16. Órgãos técnicos e consultivos
• Seção I – Aumento
• 1. Capital Autorizado
• 2. Capitalização de reservas
• 3. Subscrição de novas ações
• 4. Direito de preferência
• 1. Dissolução
• 2. Liquidação
• 3. Extinção
• 1.Transformação
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• 2. Incorporação
• 3. Fusão
• 4. Cisão
1. Características -- artigo 1º
O desenvolvimento das sociedades anônimas desde o séc. XVII até hoje permitiu que
um instrumento que teve origem no direito público – representando uma concessão ou
autorização do Estado para que os capitais privados a ele se aliassem – passasse plenamente
ao direito privado, a partir da liberdade na criação de sociedades anônimas como hoje as
conhecemos. Mas a dupla regulação de direito público e privado, nas sociedades de
economia mista – quando o Estado, como antes, alia-se aos capitais privados para levar a
efeito empreendimentos de interesse estratégico e coletivo – ou nas companhias abertas, que
mesmo sendo privadas captam recursos monetários junto à poupança popular – via mercado
de capitais – e devem se submeter à regulação pelo Estado, em proteção à dita economia
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popular e como forma de evitar fraudes e excessos que tão duramente têm castigado a
credibilidade do mercado de capitais, desde os escândalos franceses e ingleses ainda no
século XVIII até os mais recentes excessos em economias desenvolvidas como a dos EUA,
da Alemanha e até no Brasil. Como resultado disso tudo, as companhias possuem elevados
padrões de conduta, estão sujeitas a sofisticada estrutura organizacional, a demonstrações
financeiras periódicas, a distribuição compulsória de resultados e à regulação pelo poder
público, ao captarem recursos junto à poupança popular.
O estatuto social deve definir o objeto de modo preciso e completo, embora possa ser
bastante amplo. Pode ser objeto da companhia qualquer atividade econômica – e, portanto,
de fim lucrativo – não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes. Geralmente esse
objeto é exercido pelo prazo de duração da companhia, em geral indeterminado, e pode ser
ampliado, diversificado ou restringido ao longo da vida da companhia.
A companhia será sempre empresária e se regerá pelas leis e usos do comércio. Logo,
a atividade social deve ser compatível com a empresarial, necessariamente. Atividades
intelectuais fim, como é o caso da advocacia, não são compatíveis com o tipo societário, pois
por definição exercem atividades não empresariais. Isso não se aplica a empreendimentos
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em que a atividade intelectual seja elemento da empresa, mas não exercida a título de
atividade fim, como é o caso dos médicos em relação a hospitais e casas de saúde e dos
engenheiros em relação a empresas de construção ou incorporação imobiliária, cuja
atividade fim compreende uma gama de atividades para as quais o elemento intelectual é
essencial, mas não o fim em si mesmo ( os hospitais e casas de saúde prestam serviços de
hotelaria, enfermagem, exames laboratoriais, de imagem, e outros; as empresas de
construção e incorporação imobiliária prestam serviços de construção de prédios e
equipamentos de grande porte, bem como a venda de unidades imobiliárias, dentre outros).
A companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades. Ainda que não
prevista no objeto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto. Assim, a
companhia pode participar do capital de outras sociedades que se dediquem a objeto social
compatível com o seu, que se insira dentro do escopo do objeto da companhia.
3. Denominação – artigo 3º
fantasia e não será utilizado como razão social. Exemplo disso é Metalúrgica Gerdau S.A. ou
Dedini Participações S.A., que utilizam nomes de famílias para realçar a denominação da
sociedade.
O § 2º do art. 3º da LSA, em linha com o art. 5º, inciso XXIX da CF, assegura a
exclusividade da denominação e o direito de requerer administrativa ou judicialmente a
modificação de denominação idêntica ou semelhante registrada posteriormente na junta
comercial. Como regra prevalece o registro mais antigo da companhia na junta comercial
(i.e. do ato societário que aprovou o estatuto social onde consta a denominação da
companhia). Tradicionalmente, o Judiciário interpreta como nome conflitante aquele que
possa causar confusão entre a identidade de uma companhia e outra. Para tanto, considera-
se o ramo de atividade e o espaço geográfico de atuação das companhias envolvidas. Embora
o registro na junta comercial seja estadual, o âmbito de proteção cobre todo o território
nacional, pois a proteção é prevista por lei federal e pela Constituição da República.
proporciona e seu acesso ao mercado de capitais está restrito à emissão pública com esforços
restritos de valores mobiliários representativos de dívida, como previsto na Resolução CVM
160, ou outras situações de isenção.
Por isso, a LSA diz de forma singela “que a companhia é aberta ou fechada conforme
os valores mobiliários de sua emissão estejam ou não admitidos à negociação no mercado
de valores mobiliários” (art. 4º).
A LSA aplica-se tanto a companhias abertas como a fechadas. Onde há, na lei,
dispositivos apenas aplicáveis a uma ou outra modalidade, aberta ou fechada, a LSA faz a
distinção expressa no texto.
Nas companhias abertas é muito importante estar atento aos ofícios circulares
periodicamente emitidos pela CVM para fins de orientação. Tradicionalmente, no início de
cada ano, a CVM expede um ofício circular da superintendência de empresas (SEP) que
consolida as principais normas regulamentares aplicáveis às companhias abertas, inclusive
sobre a realização de assembleias gerais.
As companhias fechadas que fizerem emissões de dívida com esforços restritos, nos
termos da Resolução CVM nº 160, também se submetem à regulamentação ali prevista.
Conforme previsto na Resolução CVM nº 61, passa a ser devida taxa de fiscalização nas
ofertas públicas dispensadas do registro, antes isentas.
O Sistema financeiro nacional, cujas diretrizes são fixadas pelo Conselho Monetário
Nacional, é dividido em dois grandes segmentos (além do universo dos seguros que foge ao
escopo desta análise). Um que tem como agência reguladora o Banco Central do Brasil, com
autoridade para regular e disciplinar o mercado financeiro, dividido em mercado monetário
(moeda, títulos públicos e de responsabilidade de instituições financeiras, exceto debêntures,
considerados quase-moeda), mercado de crédito (crédito em geral na economia,
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Isso aconteceu no Brasil, primeiro com a regulação pelo Banco Central do Brasil, na
década de 60 e depois com a criação da Comissão de Valores Mobiliários na década de 70,
separando a regulação do mercado financeiro e do mercado de capitais (ou de valores
mobiliários, são sinônimos).
Art. 2º, caput e § 1º: conceito de valores mobiliários: ações (representam capital das
companhias), debêntures (representam dívida das companhias), bônus de subscrição
(representam opção de compra de ações das companhias); recibos de subscrição, cupons,
direitos ou certificados de depósito de ações, cédulas de debêntures ou que representem
bônus de subscrição; cotas de fundos de investimento (regulados pelas Instruções CVM 555
e 578 e pela LLE); notas comerciais; contratos futuros, de opções e outros derivativos;
quando ofertados publicamente quaisquer títulos ou contratos de investimento coletivo que
gerem direito de participação e partilha de rendimentos. Não se incluem no conceito de
valores mobiliários os títulos públicos da União, Estados, Distrito Federal ou Municípios e
os títulos de emissão das instituições financeiras, exceto debêntures (tais títulos são
negociados no mercado monetário e estão sob a fiscalização do Banco Central do Brasil).
Art. 11 ao 14: poder sancionador e de polícia da CVM. Com base em tais poderes a
CVM pode conduzir processos administrativos sancionadores, impondo penalidades que vão
de advertência e multa à suspensão, à cassação, à inabilitação e à proibição temporária,
podendo envolver pessoas ou operações. O processo sancionador está regulado pela
Resolução CVM 45.
distribuir emissão de valores mobiliários, como agentes da companhia emissora ou por conta
própria, subscrevendo ou comprando a emissão para colocação no mercado; as sociedades
que tenham por objeto a compra de valores mobiliários em circulação no mercado para
revenda por conta própria; as sociedades e agentes autônomos que exerçam atividades de
mediação na negociação de valores mobiliários, em bolsa de valores ou no mercado de
balcão; as bolsas de valores; as entidades do mercado de balcão organizado; as corretoras de
mercadorias, os operadores especiais e as bolsas de mercadorias e futuros; e as entidades de
compensação e liquidação de operações com valores mobiliários (Resolução CVM 135).
Art. 27-C ao 27-F: tratam dos crimes contra o mercado de capitais: operações
simuladas ou fraudulentas para alterar artificialmente a formação de preços; uso de
informação relevante não divulgada ao mercado; exercício irregular de atividade no
mercado. O princípio básico do mercado é de que a informação disponível a todos deve
formar os preços dos valores mobiliários e que as operações devem ter fins lícitos e contar
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Inspirada pelo Neuer Markt, criado pela Bolsa de Frankfurt em 1997 para abrigar
empresas de tecnologia, e que foi reestruturado e expandido em 2003, pelo Prime Standard,
a B3, em 2000, criou o chamado Novo Mercado, para abrigar empresas com potencial de
crescimento e regras mais rígidas de governança. Atualmente, a B3 possui os seguintes
segmentos de companhias, regidos por regras de autorregulação disponíveis no site da B3,
que contemplam o ingresso e a saída de cada segmento e as eventuais sanções decorrentes
do não cumprimento das normas ali previstas:
g) Novo Mercado (pleno), idem Nível 2, com acréscimo de que todas as ações
devem ser ordinárias votantes (cada ação um voto).
A oferta pública de fechamento está regulada pela Resolução CVM 85, que requer a
aprovação de mais de 2/3 das ações em circulação no mercado para o fechamento. Isso
significa que mais de 2/3 das ações em circulação devem aceitar a oferta de compra das
ações e o fechamento do capital. A oferta é realizada em leilão geralmente feito na bolsa de
valores, com intermediação de corretoras de valores. As ações em circulação são todas as
ações da companhia, menos as do acionista controlador, dos administradores e as mantidas
em tesouraria (de propriedade da própria companhia).
descontado (projeção do fluxo de caixa por período de cinco a dez anos, descontado à taxa
de juros de mercado), que consiste na avaliação econômica da companhia. Essa avaliação
determina o preço justo por ação dentro de um intervalo mínimo e máximo. A oferta que
deve ser registrada na CVM deve observar a avaliação e fixar preço não inferior ao valor
mínimo da avaliação (que pode inclusive ser superior ao máximo, a critério da companhia
ofertante ou seu controlador).
A CVM pode também determinar que seja feita compulsoriamente oferta pública de
fechamento de capital se o acionista controlador adquirir no mercado uma quantidade de
ações que retire a liquidez das ações remanescentes – chamado ‘fechamento branco de
capital’ (art. 4º, § 6º). O critério fixado na Resolução CVM 85 é o aumento de participação
do acionista controlador ou pessoas ligadas mediante a aquisição de mais de um terço da
espécie ou classe das ações em circulação. Há discussão na doutrina sobre se o bem protegido
pela norma é a liquidez das ações ou o tratamento equitativo dos minoritários. Parece
razoável que seja o tratamento equitativo, até porque na década de 90, quando ocorreu a
revogação temporária do artigo 254 da LSA (restabelecido com diferente redação pelo artigo
254-A, na reforma de 2001, e que trata da OPA obrigatória na alienação de controle), houve
uma série de abusos na aquisição de controle de companhias abertas brasileiras e no
tratamento desigual dos minoritários. A proteção em apreço visa a assegurar tratamento
equitativo aos minoritários e preferencialistas, mesmo se as ações já tiverem a liquidez
prejudicada.
Como já abordado neste trabalho, a livre criação das sociedades anônimas foi
impulsionada pelas necessidades do empreendedorismo a partir da Revolução Industrial, no
século XIX. No final deste período começaram a ser formados os grandes grupos
econômicos, com a superposição de sociedades sob controle comum, fenômeno que se
acentuou com os esforços das duas Grandes Guerras.
No final do século XIX, como resposta ao poder e concentração econômica nos EUA,
em especial no setor de ferrovias, foi editado pelo Congresso norte-americano o Shearman
Act, em 1890, visando a inibir e controlar restrições indevidas ao comércio e a concentração
econômica monopolística. As leis antitruste se multiplicaram mundo afora desde então.
Freedom, publicada em 1962. Ali, o autor defende que a única responsabilidade social da
companhia seria gerar lucros para seus acionistas.
Essa doutrina prevaleceu com força em grandes economias e no mundo afora até que
começou a nascer a consciência ambiental a partir do final do século XX, com a realização
da ECO 92, no Rio de Janeiro, e o Acordo de Paris, em 2015. E ela foi associada à
consciência social, já que a desigualdade no mundo voltou a subir, após um período de
declínio com as duas Grandes Guerras (PIKETTY, 2014).
Houve também duas graves crises do capitalismo a partir dos EUA, com a quebra da
gigante Enron, em 2002, e a crise das hipotecas e a quebra do Lehman Brothers, em 2008.
E desde o final de 2019 a pandemia que se alastrou pelo mundo e já matou alguns
milhões de pessoas. Maior crise de saúde pública desde a gripe espanhola de 1918/9.
O mundo não suporta mais o crescimento das emissões na atmosfera que geram
aumento descontrolado das temperaturas. O controle ambiental é essencial para a
preservação da humanidade. Também não suporta o racismo, a exclusão de mulheres e
minorias. Esta é a agenda majoritária, nos países democráticos.
Assim, estão sendo criadas métricas pelos gestores e fundos de investimento para
avaliar as companhias comparativamente e direcionar recursos para aquelas que atendem aos
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requisitos ESG. Da mesma forma, segmentos especiais são criados pelas bolsas de valores e
requisição de informações pedidas pelos órgãos reguladores. As companhias, por sua vez,
criam estruturas de compliance e sustentabilidade, de forma a responder às crescentes
exigências de atuação responsável e conforme as melhores práticas éticas.
São os recursos que formam o patrimônio inicial da sociedade, apartados que são do
patrimônio dos sócios.
Pelo princípio da realidade a contribuição dos sócios tem que ser efetiva, em dinheiro
ou bens ou direitos suscetíveis de avaliação econômica. O capital é sempre expresso em
moeda nacional. Se a contribuição for feita em bens ou direitos é requisito a prévia avaliação,
como regulado no art. 8º da LSA.
gerados pela atividade da companhia. Mas não recebem o capital, que serve de cifra de
retenção, garantia aos credores da companhia.
1. Subscrição particular:
b) realização como entrada de ao menos dez por cento do preço de emissão das ações
subscritas em dinheiro e depósito no Banco do Brasil S.A (ou outro banco autorizado pela
CVM) desses recursos, em nome da companhia em constituição.
Uma vez subscrito o capital e realizado o depósito das entradas pode ser realizada a
assembleia geral de constituição da companhia (ou lavrada a escritura pública de
constituição), para o fim de:
2. Subscrição pública:
A constituição por subscrição pública é bem mais complexa porque já pressupõe que
será feita colocação de ações junto ao público na constituição da companhia, fazendo com
que ela seja companhia aberta.
Para esse efeito, tanto a companhia como a emissão dependerão de prévio registro na
CVM (Instrução CVM nº 480, consolidada na Resolução CVM 80) e a subscrição somente
poderá ser efetuada com a intermediação de instituição financeira (porque a companhia irá
acessar o mercado de capitais).
Uma vez aprovado o registro na CVM pode a subscrição pública ser iniciada, com
os esforços da instituição financeira para a colocação da emissão no mercado primário. Essa
subscrição é feita durante o período da oferta pública e distribuída entre os subscritores
conforme as regras da oferta, alocando entre eles as ações subscritas.
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b) realização como entrada de ao menos dez por cento do preço de emissão das ações
subscritas em dinheiro e depósito no Banco do Brasil S.A (ou outro banco autorizado pela
CVM) desses recursos, em nome da companhia em constituição.
Uma vez subscrito o capital e realizado o depósito das entradas pode ser convocada
e realizada a assembleia geral de constituição da companhia, para o fim de:
Releva ainda mencionar que a Instrução CVM nº 554 (alterada quanto a companhias
securitizadoras pela Resolução CVM 60) define investidores qualificados como sendo
investidores profissionais ou investidores com mais de R$ 1 milhão investidos e que se
declarem qualificados. Os investidores profissionais são os que têm mais de R$ 10 milhões
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Atenção especial deve ser dada ao livro de registro de ações nominativas, que
assegura o controle da propriedade das ações e onde são feitas averbações de transferência
de ações (cujo termo deve ser lavrado no livro de transferência) e de ônus ou gravames que
podem incidir sobre as ações (geralmente nas companhias fechadas).
O estatuto social deve fixar o número das ações em que se divide o capital social e
estabelecer se terão ou não valor nominal.
As ações são sempre iguais dentro da mesma espécie e classe. Assim, o valor nominal
não tem maior significação, no caso das ações, e coincide com o preço de emissão das ações
destinado ao capital social na constituição da companhia, e que pode ser alterado durante a
vigência da companhia em caso de modificação do capital social, desdobramento,
grupamento ou cancelamento de ações, na forma da LSA.
A partir da LSA passaram a ser admitidas ações sem valor nominal e essa prática
passou a ser predominante (a quase totalidade das companhias possuem ações sem valor
nominal).
O valor nominal não traz benefícios no caso das companhias – justamente porque
todas as ações são idênticas dentro da mesma espécie e classe, tanto em direitos políticos de
voto (cada ação votante tem um voto – art. 110 da LSA), como em direitos econômicos,
como recebimento de dividendos e demais direitos.
Quando há valor nominal este será o mesmo para todas as ações (§ 2º do art. 11). É
diferente no caso de sociedades limitadas e demais sociedades de pessoas nas quais o
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contrato social pode estabelecer valor nominal diferente entre as quotas da sociedade para
fins de exercício do voto e participação nos lucros. Por isso, o valor nominal é irrelevante
nas companhias e necessário nas sociedades limitadas e demais sociedades de pessoas.
Quando há valor nominal – e como todas as ações devem ter o mesmo valor nominal
– é vedada a emissão de ações por preço inferior ao seu valor nominal. Se o preço for maior
que o valor nominal, a diferença será destinada à reserva de capital (ágio) e não ao capital
social. Isso acarreta desvantagens e retira flexibilidade às companhias com ações com valor
nominal, pois após a constituição da companhia – como veremos ao longo da obra – passa a
ser relevante o valor de patrimônio líquido da ação ou seu valor econômico ou de mercado.
O valor nominal não tem função pois todas as ações são iguais dentro da mesma espécie e
classe e remete apenas ao valor histórico do preço de emissão destinado ao capital na
constituição da companhia e eventuais alterações do estatuto em caso de modificação do
capital, desdobramento, grupamento ou cancelamento de ações, na forma da LSA. Não
guarda relação com o valor efetivo de uma companhia em operação.
As ações sem valor nominal têm maior flexibilidade e os acionistas devem pagar o
respectivo preço de emissão, que pode ser todo destinado ao capital social ou parte à reserva
de capital (ágio), dependendo das necessidades de cada momento da companhia (há
situações muito especiais em que pode haver necessidade de atribuir parte do preço de
emissão à reserva de capital, como quando se estabelecem ações que podem receber,
excepcionalmente, dividendos mesmo na inexistência de lucros (art. 17, § 6º da LSA) ou
quando é necessária a criação de reserva de capital para permitir à companhia comprar as
próprias ações (artigos 44 e 45 da LSA).
As ações de fruição, que são raríssimas e dificilmente existem na vida prática, não
constituem espécie em separado, pois são ações ordinárias ou preferenciais que tenham tido
seu valor de reembolso antecipado, sem resgate, com as características previstas no art. 44,
§ 5º da LSA.
3. Ações ordinárias
Como o nome indica são as ações comuns ou ordinárias que conferem em regra um
voto por ação (a lei brasileira só permite voto plural nas companhias mediante a previsão
estatutária de uma ou mais classes de ações ordinárias, nas condições previstas no art. 110-
A da LSA, introduzido pela Lei nº 14.195/2021, e que será objeto de exame no item 3.1
abaixo) e conferem idênticos direitos econômicos aos acionistas detentores de tais ações.
Todas participam por igual dos lucros e demais direitos. Se a companhia só tiver ações
ordinárias de classe única todas as ações serão iguais entre si e conferirão idênticos direitos
aos acionistas, que decorrem das disposições da LSA.
Nas companhias abertas só se admitem classes diferentes de ações ordinárias (art. 15,
§ 1º) se criadas em conformidade com o art. 110-A da LSA (item 3.1 abaixo). Assim, as
ações ordinárias sempre serão iguais numa companhia aberta, exceto se houver uma ou mais
classes com voto plural.
Nas companhias fechadas poderão ser previstas uma ou mais classes de ações
ordinárias com voto plural, como autorizado pelo art. 110-A da LSA (item 3.1 abaixo). Além
disso, excepcionalmente (tendo em vista que a faculdade muito raramente é utilizada),
admitem-se classes ou diferenciação em razão de três outras matérias, cumulativas ou não:
conversibilidade em ações preferenciais (quando o estatuto contém autorização para a
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Até a Lei nº 14.195/2021 não se admitiam no direito brasileiro ações ordinárias com
voto plural. Tal lei alterou os artigos 15 e 16 da LSA e introduziu novos artigos 16-A e 110-
A para estabelecer a previsão de dual class shares, i.e., a possibilidade de classes distintas
de ações ordinárias, atribuindo-se a uma ou mais voto plural.
a) é admitida a criação de uma ou mais classes de ações ordinárias com voto plural,
não superior a dez votos por ação, na companhia fechada e na companhia aberta
que ainda não tenha negociado ações ou valores mobiliários conversíveis em
ações em mercados organizados de valores mobiliários;
d) o voto plural terá prazo de vigência inicial de até sete anos, podendo ficar sujeito
a evento ou outro termo, e podendo ainda ser prorrogado por qualquer prazo, pela
maioria absoluta das ações votantes e preferenciais sem voto ou com voto restrito
(estas, se houver), salvo maior quórum previsto no estatuto, assegurando-se aos
dissidentes o direito de retirada;
i) não será adotado o voto plural nas votações da assembleia geral sobre
remuneração de administradores e celebração de transações entre partes
relacionadas que atendam aos critérios de relevância definidos pela CVM;
j) as disposições sobre o voto plural devem estar todas detalhadas no estatuto social,
inclusive número de votos e prazo de vigência;
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4. Ações preferenciais
Ações preferenciais sem voto ou com voto restrito não podem ultrapassar cinquenta
por cento das ações emitidas pela companhia. Até a reforma de 2001 da LSA o limite era de
dois terços do total de ações (e companhias anteriores à reforma puderam manter o maior
percentual de ações não votantes, face ao direito adquirido). Foi reduzido para cinquenta por
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cento das ações emitidas em virtude de política legislativa (historicamente sempre houve
polêmica quanto à existência de ações sem voto e a proporção entre poder político e poder
econômico nas companhias).
A prática brasileira mostrou que boa parte das companhias abertas retiravam o voto
das preferenciais e conferiam como vantagem econômica, em contrapartida, apenas a mais
débil das prioridades, que é o reembolso do capital sem prêmio, em caso de liquidação da
companhia (jamais será exercido se não houver o fim da companhia, e ainda assim
concorrerá por igual com os demais acionistas, pois não há prêmio. Significa apenas que a
preferencial não deve receber o reembolso depois da ordinária e só isso).
a) o primeiro é que a companhia destine ao menos vinte e cinco por cento do lucro
que auferir no exercício social (período de doze meses, no Brasil geralmente de 1º de janeiro
a 31 de dezembro de cada ano) à distribuição aos acionistas – chamado de dividendo
obrigatório, conforme art. 202 da LSA, e, dentro deste limite, pague às preferenciais, como
dividendo prioritário, ao menos três por cento do valor de patrimônio líquido da ação;
c) o terceiro, que necessariamente deve ser combinado com um dos dois anteriores
ou com a regra geral de prioridade a dividendos ou ao reembolso de capital, consiste em
permitir que as ações preferenciais participem da oferta pública obrigatória em caso de
aquisição do controle da companhia por terceiro (art. 254-A da LSA), oferta esta que nos
termos da lei só é obrigatória para as ações ordinárias.
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Os dividendos, ainda que prioritários, não podem ser pagos em prejuízo do capital
social (conceito da intangibilidade do capital social). Em regra, só podem ser pagos com
lucros do exercício. A única exceção e bastante rara é quando o estatuto autoriza a ação
preferencial com dividendo prioritário cumulativo (se não for pago num exercício social fica
acumulado para o exercício seguinte, até o pagamento) a recebê-lo, na insuficiência de lucro,
à conta da reserva de capital, se houver (art. 17, §§ 3º e 6º).
A LSA tem ainda regra supletiva bastante útil e elucidativa de que, salvo disposição
diferente do estatuto (e geralmente não há), o dividendo prioritário não é cumulativo, a ação
com dividendo fixo não participa dos lucros remanescentes e a ação com dividendo mínimo
participa dos lucros distribuídos em igualdade de condições com as ordinárias, depois de a
estas assegurado dividendo igual ao mínimo (art. 17, § 4º).
Quando a ação preferencial tem o voto restrito, o estatuto social pode permitir a
eleição em separado para cargos da administração e o direito de veto a matérias, alterações
estatutárias ou deliberações da assembleia geral (artigos 17, § 7º, 18 e 19 da LSA). O estatuto
pode subordinar as alterações estatutárias que especificar à aprovação, em assembleia
especial, dos titulares de uma ou mais classes de ações preferenciais. Como ocorre, por
exemplo, no regulamento do Novo Mercado da B3. Isso deve implicar na possibilidade de
direito de veto, de forma reativa, mas não de propor ativamente alterações na estrutura da
companhia em assembleia geral, de forma propositiva, pois do contrário haveria risco de
subversão do princípio majoritário da LSA, cujo comando cabe às ações votantes.
As ações sem voto ou com voto restrito só adquirem o exercício do direito de voto
no regime do dividendo prioritário, fixo ou mínimo, se a companhia deixar de pagar os
dividendos prioritários a que fazem jus, por três exercícios consecutivos (se o estatuto social
não contemplar prazo menor), e até o pagamento de tais dividendos, a teor do disposto
expressamente no artigo 111, § 1º, da Lei nº 6.404/76.
atribuído à ação ordinária – dez por cento, no caso do modelo mínimo do art. 17, § 1º; outros
múltiplos em casos concretos diversos (como Azul e Gol).
NELSON EIZIRIK, em estudo sobre o tema (EIZIRIK, 2007, p. 23), demonstra que
(a) a Lei nº 9.457/97, que introduziu a nova modalidade de dividendo diferenciado da ação
preferencial, ao menos 10% (dez por cento) maior do que o dividendo da ação ordinária, não
alterou o artigo 111, § 1º, da Lei nº 6.404/76, para incluir a nova modalidade dentre aquelas
que adquirem direito de voto pelo não pagamento de dividendos; (b) a matéria foi
amplamente debatida com a promulgação da Lei nº 10.303/2001, que dá a feição atual do
artigo 17 da lei de sociedades anônimas, tendo prevalecido a tese de que “a obtenção de voto
quando não houver distribuição de dividendos só deve ser permitida às ações com dividendo
fixo ou mínimo”; e (c) a CVM já firmou entendimento de que só adquirem voto as ações
preferenciais cuja vantagem patrimonial seja o dividendo fixo ou mínimo. Conclui o aludido
autor:
Embora exista posicionamento diverso por parte da doutrina (WALD, 2001, p. 29; e
LOBO, 2002, p. 95), a fundamentação é desenvolvida essencialmente com a extensão
analógica da regra prevista no § 1º do artigo 111 da Lei nº 6.404/76, que sem embargo refere-
se exclusivamente às ações não votantes com dividendos prioritários, consoante menção
anterior. Quisera o legislador estender o voto ao dividendo preferencial diferenciado, deveria
tê-lo feito de forma expressa. Essa posição divergente da doutrina serviria como proposta de
lege ferenda, é bem-intencionada e visa à proteção das ações preferenciais. Mas tem o grande
inconveniente de prejudicar situações lícitas de capitalização de companhias brasileiras, que
43
total de ações emitidas (art. 15, § 2º, da LSA). Tal limitação deve ser interpretada
sistematicamente com os demais dispositivos do sistema jurídico, que, antes de vedar,
autorizam a distribuição desigual de lucros e do acervo da companhia nos regimes do
dividendo prioritário e do dividendo preferencial diferenciado, a autorizar a supressão
permanente do voto no último deles, e na prioridade do reembolso do capital, com prêmio,
na liquidação da companhia.
A situação é extravagante e assim deve ser considerada. É evidente que não se tratará
de estrutura corriqueira. Contudo, conforme nosso entendimento, não se deve tolher a
criatividade e a construção de alternativas jurídicas e lícitas, quando se justifiquem, a
permitir o desenvolvimento e a capitalização das companhias brasileiras.
As ações, assim como demais valores mobiliários, devem ser nominativas, ou seja,
devem estar registradas nos livros da companhia ou nos registros da instituição financeira
depositária, se forem escriturais, em nome do respectivo titular.
Até a reforma de 1990, tanto as ações como demais valores mobiliários seguiam a
tradição dos títulos de crédito e podiam apresentar três formas distintas: nominativas
(quando estão registradas em nome do titular e se submetem a procedimento de transferência
nos livros da companhia ou da instituição financeira); endossáveis (quando o certificado de
ações admite endosso para transferência de titularidade); ou ao portador ( quando o nome do
titular não consta do certificado de ações e presume-se proprietário o detentor de boa-fé do
certificado).
6. Indivisibilidade
7. Negociabilidade
As ações de companhia aberta só podem ser negociadas depois de pagos trinta por
cento do preço de emissão. No mundo real as ações são geralmente negociadas depois de
inteiramente integralizadas (pagos cem por cento do preço de emissão).
A LSA (art. 30) veda a negociação pela companhia com as próprias ações, exceto,
em regra, se utilizadas reservas de lucros ou de capital, ou em situações de retirada de
acionistas (uma das conotações do termo reembolso) autorizadas pela LSA. Dentro dos
limites das reservas de lucros (exceto a legal) ou de capital a companhia pode recomprar
suas ações (ações em tesouraria), observados os limites e condições fixados pela CVM em
caso de companhias abertas (Resolução CVM 77).
46
9. Propriedade
ou direito de preferência à sua aquisição). Para eficácia dos direitos reais ou ônus e oposição
a terceiros deverá ser feita a averbação junto à companhia (se nominativas simples) ou à
instituição financeira (se nominativas escriturais).
Instituição financeira autorizada pela CVM pode emitir valor mobiliário designado
certificado de depósito de ações, com lastro em ações que receber em depósito, que passa a
circular no mercado de capitais em lugar das ações depositadas. O certificado pode ser
resgatado pelo seu titular contra a entrega à instituição depositária das ações
correspondentes.
O resgate consiste no pagamento do valor das ações para retirá-las de circulação com
o seu cancelamento. É operação útil em várias circunstâncias, como na compra de
participações residuais no fechamento de capital (art. 4º, § 5º LSA).
A amortização é operação que geralmente não faz sentido no universo das ações e
consistiria na distribuição aos acionistas, no todo ou em parte, do valor que caberia às ações
amortizadas em caso de liquidação da companhia e aí podem ser criadas ações de fruição, se
for total a amortização (só faria sentido se houvesse tratamento fiscal mais favorável do que
a distribuição de dividendos).
48
Permite que até dez por cento dos lucros sejam pagos ao detentor do título
(geralmente o fundador da companhia ou o acionista controlador). Geralmente são gratuitas,
embora possam ser onerosas.
Nos dias de hoje seria muito raro encontrar justificativa razoável para emissão de tal
título, por isso podemos dizer que está em desuso, ressalvada alguma situação especial em
companhia fechada.
1. Características
A criação das debêntures deve ser autorizada pela assembleia geral (órgão de reunião
dos acionistas) e pelo conselho de administração (órgão superior da administração da
companhia com funções deliberativas), nos termos do artigo 59.
Na autorização deve ser aprovado o valor da emissão e sua divisão em séries, se for
o caso; o número e o valor nominal das debêntures; as garantias, se houver; a
conversibilidade ou não em ações e respectivas condições; vencimento, amortização e
resgate; remuneração; modo de subscrição; outras condições aplicáveis.
4. Emissões e séries
Sendo o dinheiro mercadoria, são fixados juros devidos até a devolução integral dos
recursos emprestados via a subscrição das debêntures. Os juros geralmente são fixos ou pré-
fixados, obedecendo a padrão de remuneração que tem como referência a remuneração dos
títulos públicos (as companhias geralmente pagam remuneração superior à dos títulos
públicos pela presunção de solvência do Estado). A remuneração também pode ser variável
ou estabelecer participação no lucro da companhia (art. 56). Mas em regra a debênture é
título de renda fixa.
7. Conversibilidade em ações
8. Espécies
53
Como se vê, quanto menor o nível da garantia maior o risco dos debenturistas. E isso
pode se refletir no nível da remuneração do título. Maior risco, geralmente maior
remuneração.
Companhias em situação sólida podem emitir debêntures com garantia real, garantia
flutuante ou quirografárias, dependendo das condições de mercado. Debêntures
subordinadas geralmente são subscritas pelos próprios acionistas ou em situações especiais.
Há uma possibilidade não tratada pela LSA que são debêntures garantidas pela
alienação fiduciária de bens (hipótese expressamente prevista para ações dadas em garantia
de pagamento). É possibilidade lícita que criaria debêntures de espécie ou tipo especial, cujas
obrigações de pagamento seriam garantidas pela alienação fiduciária de bens do devedor ou
de terceiros. Na ordem hierárquica seria mais privilegiada do que as debêntures com garantia
real, pois o bem alienado fiduciariamente não integra o patrimônio do devedor da obrigação
e não se submete ao juízo universal da falência.
9. Forma e registro
averbações deverão ser feitas nos órgãos próprios (artigos 62 a 65). Idem em relação a
eventual alienação fiduciária de bens em garantia.
A assembleia pode ser útil para estabelecer waiver em favor da companhia se alguma
cláusula da escritura de emissão não puder ser cumprida e, ainda assim, a companhia estiver
adimplente com suas obrigações de pagamento. Ou outras situações que recomendem a
revisão das condições da escritura. Há casos em que as partes, companhia e debenturistas,
repactuam as obrigações originais.
É o título que pode ser emitido por instituição financeira tendo debêntures como
lastro (art. 72).
13. Extinção
Tal valor mobiliário pode ser emitido como facilitador na emissão de ações ou
debêntures ou para assegurar direitos de subscrição de ações em situações que dependam de
eventos futuros (por exemplo, joint venture dependente de êxito num leilão ou licitação
pública, sendo a companhia emissora veículo da associação).
O assunto é regulado em detalhe nos artigos 106 a 108 da LSA. O acionista que não
pagar as ações subscritas, nas condições previstas, é considerado remisso e poderá ser
cobrado em processo de execução, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada
de capital como título executivo extrajudicial. Pode ainda a companhia, à sua opção, vender
as ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista remisso (oferta única em leilão
em bolsa geralmente prescinde de abertura de capital).
Se a companhia não tiver êxito na integralização das ações poderá fazer suas as
entradas e integralizá-las com reservas disponíveis, passando as ações à propriedade da
companhia (ações em tesouraria, que poderão ser revendidas). Se não for possível a
integralização das ações no prazo de até um ano o capital social deverá ser reduzido
(princípio da realidade).
2. Direitos essenciais
a) participar dos lucros sociais (ainda que a repartição possa ser desigual, como no
regime das ações preferenciais com dividendos prioritários ou diferenciados);
c) fiscalizar na forma prevista na LSA a gestão dos negócios sociais (os minoritários
e preferencialistas podem ter assento nos órgãos de fiscalização da companhia, como
conselho de administração e conselho fiscal);
2.1 Arbitragem
O §3º do artigo 109 prevê que o estatuto da companhia pode estabelecer que
divergências entre os acionistas e a companhia ou entre o acionista controlador e os
minoritários sejam solucionadas por arbitragem. É o que ocorre na regulamentação da B3
sobre o chamado Novo Mercado da Bolsa, cujos estatutos das companhias listadas em tal
segmento devem fixar que divergências entre companhia e acionistas ou entre controlador e
minoritários sejam resolvidas por arbitragem perante a Câmara de Arbitragem do Mercado,
mantida pela B3. Em outras situações, o estatuto pode também estabelecer cláusula
compromissória arbitral.
O processo judicial é mais lento, em regra, pois se submete a pelo menos duas
instâncias de julgamento, além de eventual revisão pelos tribunais superiores.
O processo é pautado pela ética e requer boa-fé e cada etapa do diálogo deve ser
percorrida com o emprego do tempo necessário para as Partes. O diálogo pode ser facilitado
por um negociador, facilitador ou mediador. A mediação é o método autoimplicativo mais
estruturado e requer certo formalismo. As Partes, muitas vezes, optam por alternativa menos
formal, podendo ocorrer negociação direta ou assistida ou mesmo mera contratação de um
terceiro para facilitar o diálogo.
Em palestra feita na Universidade de Genebra, URY destaca seis itens essenciais para
uma boa negociação:
a) Balcony – o negociador deve ter uma visão espacial das Partes e do problema,
deve se colocar como se estivesse no balcão de um teatro, deve se retirar
momentaneamente do palco ou da arena e se colocar na assistência, com visão
ampla. Cada Parte pode fazer o mesmo em relação à outra;
d) Reframe – posições devem ser substituídas por interesses que muitas vezes estão
sob as posições, submersos ou escondidos. É fundamental que as Partes alterem
a atitude adversarial para uma atitude cooperativa;
3. Direito de voto
ser relevante em companhias com capital pulverizado, onde não exista acionista
controlador).
Em outras jurisdições, como nos Estados Unidos, também é admitido voto plural e
isto pode facilitar a manutenção do controle, via classe de ações votantes com voto plural. O
assunto é polêmico e está em transição no Brasil, com a recente introdução em nosso
ordenamento do citado artigo 110-A da LSA.
O direito de voto não é direito essencial e pode ser retirado das ações preferenciais
pelo estatuto social, ou restringido, nos termos do artigo 111 (cada preferencial também fará
jus a um voto., se o direito de voto não for retirado ou restringido pelo estatuto).
Face ao princípio da indivisibilidade das ações, a LSA, nos artigos 113 e 114, regula
o exercício do direito de voto no penhor, na alienação fiduciária e no usufruto (o direito de
voto deve ser regulado no ato de instituição do gravame).
O §1º do artigo elege duas situações objetivas em que o voto é vedado a priori: o
acionista não pode votar em deliberações da assembleia geral relativas ao laudo de avaliação
de bens que ele contribuir para o capital social, ou na aprovação de suas contas como
administrador. Entende-se aí que há conflito de interesses (GALGANO, 1988, v.7), quando
existem dois interesses em conflito, o interno, da companhia, e o externo, do acionista (a
única exceção a admitir o voto em tais circunstâncias ocorre quando todos os acionistas
forem condôminos do bem a ser conferido ao capital ou todos forem administradores da
companhia, mas subsiste em tais casos o dever rigoroso de observar o melhor interesse da
companhia).
Além das duas situações objetivas os acionistas não podem votar em outras matérias
que possam beneficiá-los, de modo particular, ou em que tiverem interesse conflitante.
Como já dizia MIRANDA VALVERDE, “o regime comum das nulidades não teve
acolhida no decreto-lei vigente. Não há nem pode haver, sociedade anônima nula de pleno
direito ou inexistente” (VALVERDE, 1959, vol. I, p. 313). Este padrão, a nosso ver, se aplica
ao direito societário em geral. Os atos se convalidam com o tempo, se há vícios ou defeitos
devem ser sanados ou serão anuláveis, mas não há nulidades de pleno direito ou atos
inexistentes, como regra.
O art. 82 do DL 2.627 estabelecia que “o acionista não pode votar nas deliberações
da assembleia geral relativas ao laudo de avaliação dos bens com que concorrer para a
formação do capital social, nem nas que venham a beneficiá-lo de modo particular”.
64
O art. 95 do DL 2.627 prescrevia que “responderá por perdas e danos o acionista que,
tendo em uma operação interesses contrários aos da sociedade, votar deliberação que
determine com o seu voto a maioria necessária.”
Em tal caso, esclarecia MIRANDA VALVERDE que não havia proibição do voto -
embora esta medida fosse acertada, a seu ver, com base inclusive nas lições de VIVANTE.
Mas a opção adotada foi a de admitir o voto do acionista com interesse contrário ao da
sociedade, mas puni-lo com perdas e danos, se a deliberação foi tomada porque o seu voto
influiu para a obtenção da maioria necessária (VALVERDE, 1959, vol. II, p. 118 e 119).
Por derradeiro, o art. 100 do DL 2.627 estabelecia que na aprovação pela assembleia
geral “do relatório, do balanço, da conta de lucros e perdas e do parecer do conselho fiscal...
não poderão tomar parte na votação os membros da diretoria e do conselho fiscal.”
Como se vê, o artigo 115 da LSA condensa as três disposições tratando como regra
geral no caput o abuso de direito e o conflito de interesses lato sensu, onde o voto conflita
com o interesse da companhia ou de demais acionistas.
65
Na segunda parte do §1º estão definidas situações de interesse particular que podem
caracterizar conflito formal, como aprovação de partes beneficiárias gratuitas, em favor do
acionista, ou renovação do prazo de validade de classe de ações ordinárias com voto plural,
onde o art. 110-A exclui da votação os titulares de ações da classe cujo voto plural é objeto
de prorrogação.
Ainda na segunda parte do §1º, trecho final, estão estabelecidas demais situações de
conflito de interesses, que precisam ser concretizadas e, portanto, tratadas material ou
substancialmente. Devem ser verificadas a posteriori e serão passíveis de responsabilidade
e de anulabilidade se acarretarem danos para a companhia ou demais acionistas.
Por fim, o §4° do art. 115 estabelece que qualquer deliberação da assembleia geral
tomada em decorrência do voto de acionista que tem interesse conflitante com o da
companhia é anulável; e que o acionista responderá pelos danos causados e será obrigado a
transferir para a companhia as vantagens que tiver auferido. Tal dispositivo, como já dito
acima, se aplica a qualquer situação envolvendo conflito de interesses lato sensu.
6. Acionista controlador
Essa é uma das discussões mais atuais no mundo. As companhias não devem visar
apenas ao lucro, mas também atentar para o bem-estar geral, como meio ambiente e as
relações sociais.
Veremos mais adiante que nos grupos econômicos há ação específica prevista na
LSA para que acionistas minoritários possam responsabilizar o acionista controlador por
danos causados à sociedade sob seu controle (artigo 246).
7. Acordo de acionistas
O acordo de acionistas tem natureza contratual e está regulado no artigo 118 da LSA.
É um contrato fundamental e de enorme utilidade para regular as quatro matérias previstas
no dispositivo: compra e venda de ações; preferência para compra de ações; exercício do
direito de voto; e exercício do poder de controle. O acordo só pode versar sobre essas quatro
matérias (numerus clausus), mas elas têm enorme amplitude, como discutiremos em seguida.
Suas disposições não eximem o acionista de responsabilidade no exercício do direito de voto
(art. 115) e do poder de controle (artigos 116 e 117), conforme art. 118, § 2º.
Se o acordo dispuser sobre outro assunto, terá natureza de contrato atípico, e não
gozará da força do acordo de acionistas, mas será válido, se lícito, observada a autonomia
da vontade.
68
Embora as matérias que podem ser objeto de acordo de acionistas sejam limitadas,
têm enorme abrangência:
a) compra e venda de ações: neste tema podem ser reguladas promessas de compra e
venda e toda sorte de opções de compra e de venda, chamadas de call ou put. Inclusive
opções de compra ou venda, chamadas de buy or sell (quando um acionista pode manifestar
a opção irrevogável de comprar as ações do outro acionista e este pode aceitar vender ou
comprar as ações do ofertante, nas mesmas condições, também em caráter irrevogável).
Prevalece a autonomia da vontade e geralmente é combinada com o direito de preferência;
o desejo de vender e os demais acionistas contratantes têm o direito de fazer primeira oferta,
num determinado prazo. O ofertante terá prazo adicional para obter preço superior de um
terceiro e, em tal caso, pode vender ao terceiro. Como proteger os demais acionistas contra
um sócio indesejado? O direito de primeira oferta geralmente é associado ao direito dos
acionistas remanescentes de exercer a opção de vender junto e nas mesmas condições do
ofertante (essa opção de venda chamada de tag along). E se o ofertante só encontra
comprador para todas as ações? O direito de primeira oferta também pode ser associado ao
direito do ofertante de incluir as ações dos demais na venda, nas mesmas condições de venda
do ofertante (essa opção de compra chamada de drag along). Aqui também prevalece a
autonomia da vontade. Diferentes cenários de situações lícitas poderão ser criados e
combinados contratualmente, inclusive opções buy or sell, put e call;
para deliberar como deverão votar quando a matéria for submetida à assembleia de sócios
da companhia e aos órgãos da administração da companhia. Segundo tal sistemática, o
acordo estabelece quórum entre os acionistas dele integrantes para aprovação ou rejeição de
uma matéria especificada no acordo. Conforme a decisão tomada na reunião prévia de
acionistas (geralmente chamada de RPA), então os acionistas deverão votar uniformemente
na assembleia de sócios ou orientar o voto de seus representantes nas reuniões dos órgãos de
administração da sociedade. Ainda que a decisão tomada na RPA pelo quórum de maioria
previsto no acordo seja contrária à posição manifestada pelo acionista que restou vencido.
A assembleia geral pode suspender o exercício dos direitos do acionista que deixar
de cumprir obrigação determinada pela lei ou pelo estatuto, cessando a suspensão quando
71
1. Organização da companhia
Pela importância econômica e social das sociedades anônimas, tanto abertas como
fechadas, a LSA cria estrutura mínima de organização, submetida ao princípio da
publicidade, que deve ser atendida por todas, numa estrutura piramidal que tem no vértice a
assembleia geral, órgão de reunião dos sócios, e logo abaixo os dois órgãos da administração,
a administração superior, representada por órgão deliberativo denominado conselho de
administração (é facultativo em companhias fechadas sem capital autorizado), e abaixo dele
a administração executiva, com poderes de representar ativa e passivamente a companhia,
representada pelos diretores eleitos (geralmente reunidos no órgão denominado diretoria).
Há, ainda, eleito pela assembleia geral, quando em funcionamento, o conselho fiscal, órgão
encarregado de fiscalizar a administração e que desempenha tais atribuições junto com o
conselho de administração, que também fiscaliza os diretores.
A assembleia geral é o órgão soberano da companhia, tem poderes para decidir todos
os negócios relativos ao objeto da companhia e tomar resoluções que julgar convenientes à
sua defesa e desenvolvimento. Os demais órgãos da companhia devem acatar as deliberações
da assembleia geral.
3. Espécies de assembleia
A assembleia geral ordinária (AGO), regulada nos artigos 132 a 134 da LSA, é
realizada uma vez no ano, dentro dos quatro primeiros meses seguintes ao término do
73
exercício social (prazo foi prorrogado em 2020 por conta da pandemia covid-19), para tratar
dos seguintes assuntos (numerus clausus):
Ela só se realiza uma vez ao ano e só pode tratar dos assuntos acima. Se for necessária
nova assembleia no ano, mesmo que para os assuntos de AGO ( um administrador se afastou
e é necessário eleger substituto, v.g.) ou se for deliberado assunto diverso (reforma do
estatuto para aumento do capital social, v.g.), então será necessária uma assembleia geral
extraordinária (AGE), que pode ser simultânea, sucessiva e cumulativa com a AGO, com a
mesma convocação, realizadas no mesmo local, data e hora, e instrumentalizadas em ata
única, conforme art. 131 (segundo a práxis as assembleias cumulativas são sucessivas,
realizando-se primeiro a AGO e, em seguida, a AGE. A ata vai indicar que houve uma
assembleia geral ordinária e extraordinária e as ordens do dia e deliberações tomadas em
cada uma delas).
b) demonstrações financeiras;
quitação. Essa quitação só pode ser modificada por anulação da deliberação da AGO por
erro, dolo, fraude ou simulação (art. 286).
Nos demais casos, inclusive envolvendo reforma do estatuto social, a assembleia será
em regra extraordinária (artigos 131e 135 a 137), salvo se for assembleia especial de ações
em circulação no mercado (art. 4º-A) ou de preferencialistas (§1º do art. 136, v.g.).
4.Convocação
Note-se, porém, que como os documentos da AGO devem ser colocados à disposição
dos acionistas com um mês de antecedência e na companhia aberta é feito pelo sistema de
rede pública utilizado pela CVM, junto com a primeira convocação, é comum que a AGO
de companhia aberta seja convocada com um mês de antecedência (Resolução CVM 81).
5.Instalação
75
6. Legitimação
7. Livro de presença
8. Mesa
9. Quórum de deliberações
Como previsto nos artigos 129 e 136, o quórum de deliberações em geral será a
maioria dos votos dos presentes (inclusive à distância), não se computando os votos em
branco, e, nas matérias mais relevantes, previstas no art. 136, a maioria absoluta de votos
(metade mais um da totalidade dos votos), se maior quórum não for exigido pelo estatuto de
76
companhias que não tenham ações negociadas no mercado. Nas companhias abertas com
ações negociadas no mercado prevalece sempre o princípio majoritário de maioria simples
ou maioria absoluta, dependendo do grau de complexidade da matéria, como regulado nos
dispositivos acima.
i) dissolução da companhia.
Nos termos do artigo 137, a aprovação das matérias previstas no artigo 136 pode
ensejar o exercício do direito de retirada dos acionistas dissidentes, como ali regulado,
ensejando o pedido de reembolso das ações (artigo 45).
77
Vale pontuar que a LSA dificulta sobremaneira a retirada face ao interesse maior e
coletivo de manutenção da sociedade e prosseguimento da empresa. A estabilidade e
continuidade da sociedade anônima é pressuposto da proteção.
Para validade da ata basta a assinatura de quantos bastem para a formação da maioria
exigida, conforme a natureza da deliberação.
A ata pode ser lavrada em forma de sumário apenas com a ordem do dia da
assembleia e as deliberações tomadas. Documentos, votos e protestos apresentados podem
ser recebidos e arquivados junto à companhia, mas não precisam ser transcritos na ata.
1. Conselho de administração
a) fixar a orientação geral dos negócios da companhia (ou seja, fixar as grandes linhas
e planos da companhia);
Nas companhias abertas, a LSA desde a reforma de 2001 admite a eleição de até dois
membros do conselho, em votação em separado, excluído o controlador, sendo um pela
maioria dos titulares de ações com direito a voto, que representem ao menos quinze por cento
das ações com voto; e outro pelas ações preferenciais sem voto ou com voto restrito, desde
que representem ao menos dez por cento do capital social e não tenham tido a prerrogativa
estatutária de eleger membro do conselho (art.18). Se nenhum dos dois atingir o quórum, a
LSA admite a reunião dos minoritários votantes e preferencialistas na eleição de um
membro, desde que em conjunto somem dez por cento do capital (art. 141, §§ 4º a 8º). Se
não houver ações preferenciais os minoritários votantes podem atingir o quórum de dez por
cento do capital para eleger um membro. As ações que votarem nesta rodada da eleição ficam
excluídas da eleição dos demais membros do conselho.
Isso significa uma proporcionalidade no preenchimento dos cargos. Quem tem dez
por cento dos votos elege dez por cento dos membros, por exemplo. Num raciocínio
matemático simples, se dividirmos o número de ações votantes pelo número de cargos a
preencher obteremos o número de ações necessário para eleger um conselheiro. Os livros de
doutrina trazem fórmulas matemáticas que expressam este raciocínio.
Por derradeiro, cumpre referir que nas sociedades de economia mista e empresas
públicas controladas pela União, direta ou indiretamente, os empregados têm direito a eleger
um membro do conselho de administração, por força do disposto na Lei nº 12.353/2010.
80
Há, ainda, os §§1º e 2º do art. 140 da LSA introduzidos pela Lei nº 14.195/21, que
estabelecem que o estatuto pode prever a participação no conselho de representantes dos
empregados, escolhidos pelo voto destes, em eleição direta, organizada pela companhia, em
conjunto com as entidades sindicais que os representam; e que na composição do conselho
de companhias abertas é obrigatória a participação de conselheiros independentes, nos
termos e prazos definidos pela CVM. Pelas regras do Novo Mercado da B3, e, também, em
função de parâmetros contemporâneos de governança corporativa e boas práticas, é cada vez
mais comum a eleição de certo percentual de membros independentes para o conselho de
administração, em companhias com controle definido.
2. Diretoria
Até o máximo de um terço dos cargos de diretor pode ser preenchido por membros
do conselho de administração. Mas nas companhias abertas é vedada a acumulação do cargo
de presidente do conselho de administração e do cargo de diretor-presidente ou de principal
executivo da companhia, exceto nas companhias de menor porte e conforme regulamentação
da CVM (conforme §§ 3º e 4º introduzidos ao art. 138 da LSA pela Lei nº 14.195/21, com
vigência em 27.8.2022).
81
3. Administradores
4. Requisitos e impedimentos
Quando o cargo exigir qualificação técnica, tal qualificação deverá ser atendida pelo
administrador. De qualquer forma, o administrador deve ter reputação ilibada e experiência
para o exercício da função.
São inelegíveis pessoas condenadas por crimes que impeçam o acesso a cargos
públicos ou impedidas por lei especial, bem como as inabilitadas por ato da CVM, na
companhia aberta (art. 147, caput e §§1º e 2º).
Salvo dispensa da assembleia geral, não pode ser eleito conselheiro de administração
alguém que tenha interesse conflitante com o da sociedade ou exerça cargo relevante em
sociedades concorrentes no mercado. Na companhia aberta é exigida declaração por escrito,
82
para fins de posse no cargo, de que o conselheiro não está em situação de conflito de
interesses com a companhia (Art. 147, §§3º e 4º e Resolução CVM 80).
A investidura dos administradores é formal, feita mediante termos lavrados nos livros
de atas do conselho de administração ou da diretoria, conforme o caso (art. 149). A
investidura deve ocorrer no prazo de trinta dias da nomeação, salvo justificativa aceita pelo
respectivo órgão da companhia (art. 149).
7. Remuneração
O tema está regulado pelos artigos 153 a 160. Como veremos, a LSA é bastante
cuidadosa com o assunto.
9. Dever de diligência
Desta regra surge a obrigação de não usar informação relevante sobre a companhia
ainda não divulgada, em benefício próprio ou de terceiros, inclusive nas negociações no
mercado de capitais.
Assim, o administrador responde em caso de culpa ou dolo, por atos praticados dentro
de suas atribuições ou poderes (responsabilidade subjetiva), ou em qualquer caso por atos
praticados com violação da lei ou do estatuto (responsabilidade objetiva, caracterizada pela
culpa presumida e inversão do ônus da prova em tais situações).
A ação de responsabilidade pode ser proposta pela companhia (chamada ação social
ut universi) ou por qualquer acionista, em ação derivada (chamada ação social ut singuli), se
a companhia não a propuser no prazo de três meses da deliberação.
Uma distinção que parece relevante é entre os acionistas que integram o grupo de
controle ou estão conectados ao grupo de controle, como fundos de pensão patrocinados pela
própria companhia, e os investidores de mercado, acionistas minoritários, que compõem o
free float. Os últimos, a princípio, são afetados pelo exercício do poder de controle e estariam
legitimados a eventual reparação de prejuízos, sempre que houver ato ilícito, dano e relação
causal demonstrável entre um e outro, o nexo de causalidade. Quanto aos primeiros é preciso
identificar em que medida são responsáveis ou vinculados direta ou indiretamente pelos atos
abusivos de controle ou pelo exercício de tal controle, participando, em alguma medida,
direta ou remotamente, dos atos que ensejaram danos à companhia e aos minoritários.
O artigo 160 prevê que o estatuto pode criar outros órgãos técnicos e consultivos e
seus membros ficam sujeitos às mesmas disposições sobre deveres e responsabilidades dos
administradores, no que for aplicável.
1. Características gerais
A fiscalização externa das companhias abertas é feita no Brasil pela CVM, agência
reguladora que tem poder de polícia, e pelos auditores independentes.
90
Se o conselho fiscal não for permanente, sua instalação pode ser pedida em qualquer
exercício à assembleia geral (inclusive na AGO), conste ou não da ordem do dia, por
acionistas que representem dez por cento ou mais do capital votante ou cinco por cento ou
mais das ações sem voto ou com voto restrito, e seu funcionamento terminará na AGO
seguinte à instalação, quando poderá ser pedida nova instalação, e assim sucessivamente.
Conforme art. 162, somente podem ser eleitos para o conselho fiscal pessoas naturais,
residentes no País, com diploma universitário ou com experiência mínima de três anos como
administrador de empresa ou fiscal.
Não podem ser eleitos para o conselho fiscal pessoas impedidas para o cargo de
administrador (art.147), administradores (estendendo-se ao cônjuge e parentes até o terceiro
grau) ou empregados da companhia ou de sociedade do mesmo grupo econômico.
A remuneração dos conselheiros fiscais deve ser fixada pela assembleia geral que os
eleger e não pode ser inferior a dez por cento da remuneração média fixa dos diretores (não
91
Compete ao conselho fiscal, por qualquer de seus membros, que têm autonomia de
atuação, embora deliberem de forma colegiada, fiscalizar a gestão dos administradores, na
forma detalhada no art. 163.
Importante notar que os membros do conselho fiscal devem exercer suas funções no
exclusivo interesse da companhia, e não no interesse dos que os elegeram (art. 165, §1º).
O capital social é fixo, em moeda corrente nacional, mas pode ser aumentado ou
reduzido nas hipóteses previstas nos artigos 166 a 174 da LSA. O aumento é a regra, com
recursos próprios ou novos recursos, e a redução a exceção.
1. Capital autorizado
O capital autorizado é exigido pela LSA sempre que a companhia outorga opção de
compra de ações a administradores (§3º do art. 168); o estatuto confere ao conselho de
administração poderes para deliberar sobre a emissão de debêntures conversíveis em ações
(§2º do art. 59); ou a companhia emite bônus de subscrição (art. 75). Nos demais casos é
opcional, um facilitador para aumentos de capital.
93
A autorização para o aumento pode ser utilizada tanto para incorporação de reservas
ou para subscrição de novas ações, com ingresso de novos recursos. Em seguida trataremos
de um caso e outro.
2. Capitalização de reservas
O preço de emissão deve ser fixado sem diluição injustificada dos acionistas
existentes, considerando os critérios de valor econômico (perspectiva de rentabilidade da
94
A subscrição tanto pode ser pública ou privada (art. 170, § 5º), observado o disposto
no artigo 82 quanto ao registro da emissão pública e o oferecimento de prospecto aos
investidores, bem como as deliberações da assembleia geral e do conselho de administração
da companhia, em consonância com o estatuto social.
4. Direito de preferência
O exercício social tem a duração de um ano ou doze meses (art. 175). No Brasil,
geralmente o exercício social corresponde ao ano calendário, de 1º de janeiro a 31 de
dezembro de cada ano. Em países do hemisfério norte é comum o exercício social de 1º de
julho a 30 de junho.
1. Introdução
a) balanço patrimonial;
geral. Se houver alguma retificação determinada pela assembleia geral (o que é raro) as
demonstrações financeiras devem ser retificadas e republicadas.
2. Noções básicas
4. Relatório da administração
5. Balanço patrimonial
A vida real da companhia ocorre nos ativos e nos passivos exigíveis. A soma de
ativos e passivos exigíveis representa tudo que a companhia possui e tudo que deve a
terceiros. O patrimônio líquido é mera representação gráfica dos recursos próprios da
companhia, decompostos, conforme a origem, em capital social, reservas e demais itens do
patrimônio líquido, listados acima.
Vide também artigos 178 a 184-A da LSA sobre o conteúdo analítico e significado
do balanço patrimonial.
Só é exigida nas companhias abertas e tem por objetivo informar o valor da riqueza
criada pela companhia no período e a sua distribuição pelos fatores de produção (capital e
trabalho) e Estado (pagamento de tributos). É demonstrada a destinação do resultado a
acionistas, empregados, retenção em reservas, financiadores, meio ambiente, comunidade,
recolhimento de tributos (art. 188, II da LSA).
d) contabilidade passa a ser de toda a empresa, e não apenas do contador. Todos são
responsáveis, em especial os administradores;
Um ativo deve ser reconhecido no balanço patrimonial quando for provável que
benefícios econômicos futuros dele provenientes fluirão para a sociedade e seu custo ou
valor puder ser mensurado com confiabilidade.
Um passivo deve ser reconhecido no balanço patrimonial quando for provável que
uma saída de recursos seja exigida em liquidação de obrigação presente e o valor pelo qual
essa liquidação se fará puder ser mensurado com confiabilidade.
Não devem ser registradas obrigações que puderem decorrer de fatos geradores
futuros. No tocante a passivos com prazo ou valor incertos deve ser feita provisão, quando
há probabilidade de uma obrigação presente, que decorre de um evento passado, onde há
probabilidade de saída de recursos e pode ser feita estimativa confiável.
que os possam compensar integralmente é que prejuízos acumulados devem ser registrados
como conta redutora no patrimônio líquido da companhia.
Há ainda a reserva de capital (art. 182, §1º e art. 200), que não é formada com a
retenção de lucros, mas constituída pelo ágio na subscrição de ações (parte do preço de
emissão que não é destinada ao capital), geralmente, e em hipóteses raríssimas (pois em
regra são gratuitos) pelo produto da alienação de partes beneficiárias e bônus de subscrição.
Esta reserva só pode ser utilizada para absorver prejuízos que ultrapassarem as reservas de
lucros; resgate, reembolso ou compra de ações da companhia; resgate de partes beneficiárias
(se a reserva tiver sido formada com o produto da venda de partes beneficiárias, situação
teórica pois dificilmente ocorrerá); incorporação ao capital social; e pagamento de
106
Em jurisdições de direito anglo saxão é sabido, por exemplo, que sequer há, em
regra, dividendo obrigatório. A tradição nos Estados Unidos é que cabe ao board of directors
(equivalente a nosso conselho de administração, mas com autoridade mais ampliada) a
deliberação discricionária sobre a distribuição ou não de lucros aos acionistas, observado o
disposto nos respectivos atos constitutivos. O professor GEVURTZ faz uma síntese de tal
tradição:
acionistas fundadores de destinar de forma cogente parcela maior ou menor do lucro líquido
do exercício à distribuição aos acionistas, que deve naturalmente refletir os planos de
reinvestimento traçados pelos acionistas.
4. Dividendos intermediários
O art. 204 da LSA prevê que a companhia que por força de lei ou de disposição
estatutária levantar balanço semestral pode declarar, por deliberação dos órgãos da
administração, se autorizados pelo estatuto, dividendos à conta do balanço do semestre.
A legislação fiscal também permite o pagamento de juros sobre capital próprio (que
pela legislação societária são computados como antecipação de dividendos) em períodos
trimestrais, com base em balanços levantados em tais períodos.
5. Pagamento de dividendos
Os dividendos devem ser pagos à pessoa titular das ações na data do ato de
declaração dos dividendos. Salvo declaração em contrário, devem ser pagos dentro de
sessenta dias. Em qualquer caso, deverão ser pagos dentro do exercício social. Isto significa
que os dividendos, referentes a um dado exercício, deverão ser pagos até o final do exercício
seguinte, quando deverão ser declarados.
110
1. Dissolução
Pode ainda a sociedade ser dissolvida judicialmente quando: (a) anulada sua
constituição, em virtude de algum vício insanável do ato de constituição, a pedido de
qualquer dos sócios; (b) exaurido o fim social, ou verificada sua inexequibilidade, em ação
111
proposta por acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social; ou (c) em
caso de falência, na forma da lei.
2. Liquidação
3. Extinção
112
1. Transformação
estatuto ou contrato social, consistem no valor de patrimônio líquido das participações objeto
da retirada).
2. Incorporação
Consiste na incorporação de uma ou mais sociedades por outra, que lhes sucede em
caráter universal em todos os direitos e obrigações, extinguindo-se as incorporadas e não
havendo solução de continuidade da incorporadora, que subsiste agregando a seu patrimônio
o patrimônio das incorporadas. A incorporação deve ser aprovada por todas as envolvidas,
incorporadora e incorporadas, observados os respectivos tipos societários.
3. Fusão
Consiste na fusão de duas ou mais sociedades, com a criação de sociedade nova, que
lhes sucede em caráter universal em todos os direitos e obrigações, extinguindo-se as
sociedades fusionadas. O patrimônio da sociedade nova é formado pelo somatório do
patrimônio das sociedades fusionadas, que devem aprovar a fusão, observados os respectivos
tipos societários.
bem como sobre a distribuição do capital e a nomeação dos peritos e aprovação dos laudos
de avaliação dos respectivos patrimônios (devendo os sócios de cada sociedade fusionada
abster-se de deliberar sobre o laudo de avaliação de sua sociedade, a não ser que todos os
sócios das referidas sociedades sejam sócios de todas as sociedades fusionadas, onde então
a abstenção será impossível, como no aumento de capital com integralização de bem de
propriedade de todos os sócios), autorizando-se os administradores da nova sociedade a
praticarem os demais atos pertinentes, inclusive arquivamento dos atos de fusão no registro
próprio.
4. Cisão
sociedades envolvidas e das novas sociedades, se for o caso, a praticarem os demais atos
pertinentes, inclusive arquivamento dos atos de cisão no registro próprio.
1. Introdução
Entre nós foi histórica a criação do Banco do Brasil, em 1808, já naquele tempo
espécie de sociedade assemelhada à companhia anônima de economia mista – como a
conhecemos hoje –, criada com a vinda do Príncipe Regente, D. João de Bragança, em fuga
dos exércitos de Napoleão, cuja corte veio a se abrigar no Brasil em tal época, bastante
anterior ao Código Comercial brasileiro de 1850 e à liberdade de constituição de sociedades
anônimas no País (Lei 3.150/1882). Não deixava de ser sociedade assemelhada à de
economia mista, porque possuía como acionistas privados minoritários banqueiros
portugueses, associados à Coroa, e atuava como banco comercial. Atuava também, de outro
lado, como emissor de moeda e fez as tarefas de banco central até a criação deste já no século
seguinte. O Banco do Brasil já traz em si a natural tensão entre público e privado, entre ação
estatal e exploração privada da economia. Entre regulação e atividade competitiva.
da CSN encerrou forte polêmica nacionalista e foi concretizada em 1993, no governo Itamar
Franco.
etc.); indústria de aeronaves e jatos comerciais (Embraer, etc.); telefonia móvel e fixa
(Telesp, Telerj, etc.); gás (CEG, CEG-Rio, etc.); energia elétrica – produção, transmissão e
distribuição (Eletropaulo, Light, etc.); mineração (Vale S.A., anteriormente denominada
Companhia Vale do Rio Doce – CVRD, etc.); sistema financeiro e de resseguros (com
destaque para os bancos dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro – Banespa e Banerj, e as
atividades do IRB, estas antes monopolistas); transporte ferroviário de cargas e passageiros
(RFFSA, etc.); água e saneamento (hoje ainda incipiente); portos e aeroportos (Galeão,
Guarulhos, etc.); rodovias e pontes (ponte Rio-Niterói, rodovia Castelo Branco-Raposo
Tavares, dentre várias outras).
Por força do artigo 173 da Constituição Federal, que contém as normas de fundo
sobre as sociedades de economia mista, estas estão sujeitas ao regime próprio das empresas
privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e
tributários, sem prejuízo dos princípios da administração pública – legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência –, inclusive licitação e contratação de
obras, serviços, compras e alienações, na forma da lei, pois integram a administração
indireta. Consubstanciam a exploração direta e excepcional pelo Estado da atividade
econômica, só permitida quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a
relevante interesse coletivo.
Restou assim decidido que as sociedades de economia mista que possuam permissão
genérica na lei que autorizou sua criação podem livremente constituir e participar do capital
de outras sociedades. Estas sociedades, mesmo que controladas, não são sociedades de
economia mista. Da mesma forma, só a alienação do controle de sociedades de economia
mista e de empresas públicas requer lei autorizativa, porque caracteriza a privatização ou
desestatização do ente estatal. A alienação de subsidiárias e outros investimentos independe
de lei, pois constitui mero desinvestimento.
A intenção pode ter sido a melhor, mas o resultado é que as sociedades de economia
mista brasileiras criaram vastos grupos econômicos, aqui e no exterior, o que traz uma
primeira questão sobre o controle e governança dessas sociedades.
mais profundas e menos visíveis, pela técnica da diversificação e verticalização dos grupos
econômicos.
Isso reforça a governança e cria duas instâncias internas de fiscalização. Além disso,
as sociedades que possuem ações ou títulos negociados no exterior, ou que sejam instituições
financeiras de grande porte ou companhias mais sofisticadas, geralmente possuem ainda
comitê de auditoria, como órgão auxiliar do conselho de administração (e essa exigência de
instituição do comitê de auditoria vem de ser tornada geral para as estatais pela Lei nº
13.303/2016).
Em que pese opinião de parte da doutrina que sustenta que entes públicos não podem
ter obrigações ilimitadas, o fato é que não se pode dissociar o Estado controlador da
sociedade de economia mista por ele controlada, instrumento de intervenção direta do Estado
no domínio econômico.
Além do mais, se a sociedade de economia mista depende de lei para sua criação,
somente mediante autorização legislativa seu controle poderá ser alienado (como
efetivamente ocorreu nos programas de desestatização federais e estaduais, desde as décadas
de 80 e 90 do século passado).
Com efeito, se é estabelecida a presunção juris tantum de que haveria algum nível de
confusão patrimonial entre controlador e controlada, em grupo de sociedades, de fato ou de
direito, a mesma interpretação deveria ser estendida ao Estado controlador, que possui o
dever de fazer a sociedade cumprir sua função social (em adição, e como matéria de fato, as
sociedades de economia mista de grande porte geralmente compõem grupos econômicos de
expressiva complexidade e relevante valor patrimonial).
Questão mais densa diz respeito ao artigo 238 da LSA, no sentido de que o Estado
controlador tem os deveres e responsabilidades do acionista controlador, mas pode orientar
as atividades da sociedade de economia mista de modo a atender ao interesse público que
justificou sua criação. Tal dispositivo encontra guarida no artigo 173 da Constituição, que
limita a intervenção do Estado, via companhia de economia mista, a ‘imperativo de
segurança nacional ou relevante interesse coletivo’. O mesmo conceito também é reiterado
pela Lei nº 13.303/2016, que se reporta à Lei societária.
Ao analisar a questão sob a ótica do artigo 238 da LSA, de que o controlador estatal
pode orientar as atividades da companhia de modo a atender ao interesse público, a CVM
distingue o interesse público primário protegido pela norma, que se circunscreve ao interesse
coletivo inscrito no artigo 173 da Constituição Federal, do interesse público secundário, que
consubstancia o interesse próprio ou particular do Estado, mas que não se confunde com o
interesse da coletividade propriamente dito, confiado à tutela do Estado.
Retirando a União do abrigo do interesse público protegido pelo citado artigo 238 da
LSA, caminhou a CVM pela análise da colisão de interesses entre a União e a Eletrobras, no
caso, pois o indigitado programa de redução de custos era programa de governo que a União
decidiu impor à Eletrobras, ainda que os legítimos interesses da última restassem vulnerados.
Concluiu, por conseguinte, a CVM pela violação do artigo 115, § 1º da Lei das
Sociedades Anônimas, pelo voto e aprovação pela União de matéria em situação de claro
conflito de interesses, como formuladora da política em questão e, simultaneamente, na
qualidade de acionista controladora da Eletrobras.
A CVM não chegou a encaminhar a questão pelo abuso de controle e pela violação
do artigo 117 da aludida Lei, eximindo-se de avaliar o mérito da política governamental em
questão, embora registrando que a União, autora da política, não poderia ter isenção para
aprová-la na assembleia geral de acionistas da Eletrobras. Isso sem embargo da ação
deliberada de fazer a companhia atender a determinação de governo contrária a seus
legítimos interesses.
que a Sabesp utiliza e vem utilizando regularmente os reservatórios de água da EMAE para
abastecimento da cidade de São Paulo, sem, todavia, pagar qualquer remuneração ou
compensação em contrapartida. A EMAE apresenta perdas e prejuízos pela impossibilidade
130
de geração de energia face à utilização da água pela Sabesp (outra destinação dada aos
reservatórios da EMAE).
Logo, o Estado de São Paulo, como controlador de ambas, não poderia ter se omitido
ao longo dos anos na solução de pleito legítimo da EMAE, eis que na sua esfera de interesse.
Pela omissão do Estado de São Paulo, a CVM entendeu que houve violação dos
deveres fiduciários para com os acionistas minoritários da EMAE, previstos no § único do
artigo 116 da Lei das Sociedades Anônimas.
privados como Itaú Unibanco e Bradesco, todos fazendo parte dos principais conglomerados
financeiros das Américas. A Eletrobras é um gigante no setor elétrico. E assim por diante.
É fundamental que sejam bem geridas e com responsabilidade.
A Eletrobras deve gerar e distribuir energia, com responsabilidade. Não pode ser
instrumento de políticas de curto prazo para baixar o preço da energia a qualquer custo, como
comprovado no processo da CVM acima relatado.
Havendo interesse coletivo relevante, o setor público ainda é indispensável, deve ser
gerido com responsabilidade e receber os investimentos necessários à sua atuação na
economia.
Ninguém tem dúvida de que o Estado deve ser eficiente nas políticas públicas, tanto
na atuação direta como na indireta. Mas que é preciso repensar o País e agir de maneira
pragmática, sem o viés ideológico paralisante que leva o Brasil ao caos econômico e social
de hoje.
Os grupos de fato são resultado das relações de fato de controle e coligação entre
sociedades e estão regulados no capítulo XX da LSA, que é capítulo riquíssimo, com normas
especiais sobre prestação de contas aos acionistas; participação recíproca entre sociedades
do grupo; regime de responsabilidade dos administradores e sociedades controladoras (e
regime de relacionamento de cooperação entre as sociedades do grupo, vedado o
favorecimento de uma sociedade em detrimento de outra); regime especial de demonstrações
financeiras, reconhecimento contábil de investimentos e consolidação de demonstrações
contábeis; subsidiária integral (sociedade anônima que tem como único acionista - cem por
cento do capital – outra sociedade brasileira).
Além de tal acervo complexo de normas, o capítulo XX ainda trata das ofertas
públicas na alienação e na aquisição de controle de companhia aberta; da autorização para
alienação de controle de companhia aberta e aquisição de controle por companhia aberta; e
da incorporação de companhia controlada.
sociedade seja administrada no seu melhor interesse, que não pode ser prejudicado em
benefício do grupo ou da sociedade de comando.
Embora nos grupos de sociedades haja o interesse do grupo, cujo valor conjunto
geralmente pode suplantar o valor individual de cada sociedade, é preciso cuidado na gestão
dos interesses do conjunto para não ferir interesses individuais das sociedades grupadas,
residindo a limitação na coordenação de interesses legítimos, quando se tratar de grupo de
fato.
2. Participação recíproca
Nos artigos 245 e 246 da LSA fica bem assentada a regra de que a cooperação é a
medida máxima permitida nos grupos de fato. Não se admite subordinação nos grupos de
fato.
5. Subsidiária integral
Se alienar parte das ações a terceiros (ou em qualquer situação em que a sociedade
passe a ter dois ou mais sócios) a companhia deixa de ser subsidiária integral e passa a ser
sociedade sob o regime contratual, observando-se o art. 253.
A oferta pode ser feita em dinheiro ou contemplar a permuta, total ou parcial, das
ações por ações da ofertante ou outros valores mobiliários. Em caso de permuta o registro
prévio da OPA na CVM é obrigatório (§1º do art. 257). Em qualquer caso a oferta deverá
ser comunicada à CVM imediatamente (§ único do art. 258).
É admitida oferta concorrente, como previsto no art. 262. Isso significa que se for
feita oferta pública para aquisição de controle de companhia aberta terceiros interessados
141
podem interferir e fazer ofertas concorrentes, disputando a aquisição do controle com a oferta
original, observada a regulamentação da CVM (Resolução CVM 85).
Se o preço de emissão ultrapassar uma vez e meia o maior dos três valores referidos
acima, o acionista dissidente da deliberação da assembleia geral terá direito de retirada, se
as ações não tiverem liquidez e dispersão no mercado (art. 137, inciso II).
143
A CVM recomenda que as relações de troca em tais operações sejam aprovadas por
comitês independentes formados nas sociedades que fazem parte da operação. Se adotado
tal caminho, é importante ter cuidado de preservar a autoridade e atribuições dos órgãos de
administração das sociedades envolvidas, que são indelegáveis. Assim, eventual atuação de
comitês independentes deve ter caráter consultivo e se submeter à autoridade de tais órgãos
competentes.
Os grupos de direito estão regulados no capítulo XXI da LSA, e são assim chamados
porque decorrem de contrato entre a sociedade de comando e suas controladas, denominado
convenção de grupo. Além da relação contratual, outra distinção marcante com o grupo de
fato é a admissão, nos grupos de direito, da subordinação das sociedades integrantes do grupo
aos interesses do grupo ou da sociedade de comando, nos limites da convenção de grupo.
São uma criação inspirada no direito alemão pós II Guerra. Acabaram se tornando pouco
utilizados por uma série de razões: ausência de tratamento fiscal adequado; dificuldade de
definição contratual de relações dinâmicas, como relacionamento entre sociedades.
A ideia dos formuladores da LSA era fazer com que o grupo de direito pudesse
funcionar como uma única sociedade não personificada, ensejando o recolhimento de
144
imposto de renda de forma consolidada, podendo o grupo compensar lucros com prejuízos
dentre as sociedades dele integrantes.
Esta proposta não foi acolhida pelas autoridades fiscais e as sociedades continuaram
a ser tributadas individualmente. Este fato, associado à dificuldade de regular
contratualmente relações dinâmicas, como as que existem entre sociedades, fez com que os
grupos de direito não sejam efetivamente utilizados pelas companhias brasileiras, com
raríssimas exceções.
Vale também registrar que os grupos econômicos, em todo mundo, são geralmente
constituídos por grupos de fato, que se originam nas relações de fato de controle e coligação
entre sociedades, que convivem com as questões delicadas de conflitos de interesses onde
há várias sociedades e um comando comum.
Assim, o capítulo sobre grupo de sociedades de direito tem mais interesse teórico e
científico do que prático.
A LSA regulou de forma singela contrato essencial para a cooperação entre diferentes
sociedades na consecução de empreendimento comum.
O consórcio pode ser classificado como sociedade não personificada, pois visa a
execução de determinado empreendimento e a partilha de resultados, cujo contrato deve
estabelecer as prestações das partes e normas sobre receitas e despesas comuns, dentre outros
fatores (art. 279).
Embora deva ser registrado na junta comercial do local da sua sede e ter a certidão
de registro publicada (§ único do art. 279), o consórcio não tem personalidade jurídica e as
consorciadas se obrigam nas condições previstas no contrato de consórcio, sem presunção
145
O consórcio tem boa eficiência tributária e evita bitributação, pois pelas regras fiscais
as receitas podem ser reconhecidas pelas consorciadas, evitando dupla incidência fiscal
(Instrução Normativa RFB nº 1234, artigo 17).
Capítulo XXII - Sociedade em comandita por ações – artigos 280 a 284 da LSA
Está regulada no Código Civil e na LSA. É um tipo societário em total desuso pela
responsabilidade ilimitada e solidária dos sócios diretores, pessoas naturais.
A proposta do projeto da LSA era permitir que pessoas jurídicas pudessem ocupar as
posições dos sócios gestores, com responsabilidade ilimitada e solidária. Isso poderia dar
enorme utilidade às sociedades em comandita por ações, como ocorre em diversos países
relevantes, como Alemanha, França e Luxemburgo, e na comunidade europeia em geral.
A LSA trata todos os prazos como de prescrição – técnica anterior ao atual Código
Civil – e, por isso, é preciso cuidar dos prazos de prescrição e decadência. Os prazos de
cobrança, visando uma prestação da outra parte geralmente são de prescrição (cobrança de
dividendos); os prazos visando modificar um estado de coisas geralmente são de decadência
(anulação da constituição da companhia).
A primeira diz respeito ao art. 289, que trata das publicações ordenadas pela LSA, e
que tradicionalmente requeria que tais publicações fossem feitas no órgão oficial da União
ou do Estado ou do Distrito Federal, conforme o local da sede da companhia, e em jornal de
grande circulação editado na localidade da sede da companhia, sem prejuízo de publicação
adicional determinada pela CVM, em jornal de grande circulação nas localidades em que os
valores mobiliários de companhias abertas forem negociados em bolsa ou mercado de
147
balcão, ou que de outro modo possa permitir ampla divulgação e imediato acesso às
informações.
O caput do dispositivo foi alterado pela Lei nº 13.818/2019, com vigência a partir de
1º de janeiro de 2022, para determinar que a publicação geral seja restringida a jornal de
grande circulação da sede da companhia, de forma resumida e com divulgação da íntegra
dos documentos na página do mesmo jornal na internet, com certificação digital de
autenticidade, sem prejuízo das atribuições da CVM em relação a companhias abertas. No
tocante a demonstrações financeiras, a Lei nº 13.818 estabelece que a publicação resumida
deve conter, no mínimo, comparação com dados do exercício anterior, informações ou
valores globais relativos a cada grupo e a respectiva classificação de contas ou registros,
assim como extratos das informações relevantes das notas explicativas e dos pareceres dos
auditores independentes.
A segunda refere-se ao art. 291, que trata das situações de companhias abertas onde
a CVM pode, em função do valor do capital social, reduzir o quórum previsto no texto da
LSA para exercício de direitos pelos acionistas minoritários ou preferencialistas, como ali
previsto. Neste sentido, releva notar que a Instrução CVM nº 165 reduz o quórum para
pedido de exercício de voto múltiplo, na eleição dos membros do conselho de administração,
na escala de dez a cinco por cento, e a Instrução CVM nº 324 reduz o quórum para pedido
de instalação do conselho fiscal, na escala de oito a dois por cento, para ações votantes, e de
quatro a um por cento, para ações não votantes. Mais recentemente, e em linha com o
fortalecimento dos direitos dos acionistas minoritários de companhias abertas brasileiras, a
Instrução CVM nº 627 reduz o quórum, na escala de cinco a um por cento do capital votante,
nas seguintes hipóteses: ação derivada contra administradores (art. 159, § 4º); ação de
148
responsabilidade contra sociedades controladoras sem prestação de caução (art. 246, § 1º,
‘a’ ); exibição de livros (art. 105 ); convocação da assembleia geral (art. 123, § único, ‘c’);
pedido de informações a administradores ( art. 157, § 1º ); requisição de informações ao
conselho fiscal (art. 163, § 6º ). A Resolução CVM 70 atualizou a regulação da matéria e
consolidou as Instruções CVM 165, 324 e 627.
Por último, o art. 294, que reduz exigências de publicação e manutenção de livros de
companhias fechadas de pequeno porte, alterado pela Lei Complementar nº 182/2021
(Marco legal das Startups), que estabelece que as companhias fechadas com receita bruta
anual de até R$ 78 milhões de reais podem realizar as publicações ordenadas na LSA de
forma eletrônica e substituir os livros previstos no artigo 100 por registros eletrônicos ou
mecanizados.
Prescreve ainda o novo parágrafo 4º do art. 294, também introduzido pela LC 182,
que na omissão do estatuto sobre dividendos obrigatórios não se aplicará o art. 202 da LSA
e os dividendos serão livremente fixados pela assembleia geral, observados apenas eventuais
dividendos prioritários de preferenciais, se houver.
Por fim, cria a LC 182 novos artigos 294 A e B para estabelecer que a CVM
regulamentará condições facilitadas para acesso de companhias de menor porte ao mercado
de capitais, estas definidas com receita bruta anual inferior a R$ 500 milhões de reais. A
CVM já estabelecera na Instrução 588 condições para ofertas públicas de distribuição de
valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias de pequeno porte, com dispensa
de registro por meio de plataformas eletrônicas de investimentos participativos
(crowdfunding), com o fim de assegurar a proteção dos investidores e possibilitar a captação
pública por parte de tais sociedades. Tal regulação foi objeto de atualização com a edição da
Resolução CVM 88, que fixa novos limites e condições de captação.
FIM