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CATALOGRÁFICA
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 7
Andréa Lima Belfort Duarte, Danúsia Torres dos Santos
ARTIGOS
FUTURO
Em 2020, fomos assolados pela pandemia de COVID-19, que alterou muitas de nossas
práticas sociais cotidianas, principalmente, as educacionais. O ensino de línguas
mediado por tecnologias digitais passou a ser utilizado em muitas instituições, impondo
novas práticas aos professores que, muitas vezes, não se sentiam preparados para
tal, uma vez que a formação inicial ainda não privilegia, de forma institucionalizada e
integrada, o ensino de línguas mediado por computador (CALL - Computer Assisted
Language Learning). Este artigo traça um panorama do passado, presente e futuro
do ensino de línguas a partir do campo de estudos CALL e de uma pesquisa realizada
com professores de línguas que participaram de uma disciplina optativa sobre o ensino
de línguas mediado por tecnologias digitais entre 2017 e 2019. Buscamos identificar
práticas com essas tecnologias antes e durante a pandemia, bem como contribuições
da disciplina para sua prática docente neste período de ensino remoto. Concluímos com
algumas previsões sobre o impacto da pandemia no ensino de línguas e a importância
da formação inicial de professores de línguas voltada para a integração das tecnologias
digitais.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de línguas; Tecnologias digitais; Ensino de línguas mediado
por computador; Formação inicial de professores.
ABSTRACT
In 2020, we were impacted by the COVID-19 pandemic, which has altered many of our
daily social practices, especially in the educational field. Technology mediated language
learning became a common practice in many institutions imposing new practices to
language teachers, who many times, were not prepared for that, since initial teacher
education does not privilege Computer Assisted Language Learning (CALL) in an
institutionalized and integrated way. This paper presents an overview of the past, present
and future of language teaching from the perspective of CALL and from a case study
with language teachers who had participated in an elective discipline on technology
mediated language teaching between 2017 and 2019. The research aimed at identifying
these teachers’ practices with digital technologies before and during the pandemic and
the contributions of the discipline to their teaching practice during this time. Finally, we
present some predictions on the impact of the pandemic on language teaching and
reflect on the importance of initial teacher education aimed at the integration of digital
technologies in teaching and learning practices.
KEYWORDS: Language teaching; Digital technologies; Computer Assisted Language
Learning; Initial teacher education.
RABELLO. Tecnologia, ensino de línguas e pandemia: passado, presente e futuro.
Introdução
O ano de 2020 será marcado não somente pelo horror e sofrimento gerado pela
pandemia do novo coronavírus, mas também por enormes mudanças e transformações
nas práticas sociais mediadas pelas tecnologias digitais de informação e comunicação
(TDIC). Muitas dessas práticas já eram mediadas por tecnologias, mas, com a pandemia,
as TDIC assumiram um papel de destaque em diversas atividades cotidianas, permitindo a
continuação de processos comunicacionais, informacionais, comerciais e, principalmente,
educacionais.
O sociólogo Manuel Castells (2020) ressalta que, apesar de já vivermos em uma
sociedade dita digital, a pandemia veio nos mostrar que ainda não a havíamos assumido
totalmente. A transição para o digital imposta pela necessidade de afastamento físico
evidenciou o enorme fosso digital que ainda existe em nossa sociedade, não somente
em relação ao acesso a estas tecnologias, mas também na sua utilização eficaz para a
realização de diferentes atividades, principalmente nos processos educacionais.
O uso de tecnologias na educação não é nenhuma novidade trazida pela pandemia.
Na verdade, as tecnologias, tanto digitais quanto analógicas, sempre fizeram parte dos
contextos educacionais, servindo como instrumentos de mediação. No ensino de línguas
não é diferente. Leffa (2006) nos lembra que as tecnologias digitais sempre foram
utilizadas como ferramentas de mediação e Paiva (2015) traça um histórico de diversas
tecnologias utilizadas na educação e no ensino de línguas estrangeiras (LE), perpassando
por tecnologias analógicas, como a gramática e livros, até as “novas” tecnologias digitais,
como o computador e a Internet. No entanto, a transição para o ambiente digital imposta
pelo fechamento de escolas e universidades em virtude da pandemia não foi nada fácil,
gerando muito desconforto e sofrimento para muitos professores e alunos que não estavam
acostumados a utilizar estas ferramentas nos processos de ensino e aprendizagem.
Neste artigo, abordo alguns impactos da pandemia no ensino de línguas sob a
perspectiva do ensino de línguas mediado por computador (CALL) e de uma pesquisa
realizada em uma universidade federal no Rio de Janeiro. Para isso, apresento um
panorama do passado, presente e futuro das tecnologias digitais no ensino de línguas,
apontando para a necessidade de formação inicial e continuada de professores de línguas
para atuarem no contexto da sociedade digital contemporânea.
Como já mencionado, o ensino de línguas sempre foi mediado por alguma tecnologia
(cf. Leffa, 2006). Nesse sentido, o desenvolvimento tecnológico e a evolução das
tecnologias digitais têm trazido enormes mudanças nas salas de aula de LE. Em minha
trajetória pessoal como aprendiz e professora de língua inglesa, experenciei, ao longo de
25 anos, transformações em minhas salas de aula com a inserção de diferentes dispositivos
tecnológicos e metodologias de ensino baseadas na integração destas tecnologias com
as práticas educacionais. Neste breve período, utilizei tecnologias como fitas cassete,
projetores de slide e transparências, aparelho de televisão e vídeo cassete, gravadores de
fita cassete, projetores multimídia e telas retráteis, computadores, CD-ROM, internet,
quadros eletrônicos (e-boards), celulares e tablets, e mais recentemente, aplicativos de
realidade aumentada e óculos de realidade virtual. A introdução destas tecnologias impõe
uma mudança metodológica e pedagógica, uma vez que não basta apenas usar estas
tecnologias em velhas práticas educacionais, mas sim, buscar novas formas de ensinar
e aprender mediadas pelas TDIC, garantindo a centralidade do aluno e a aprendizagem
significativa.
Ao pensarmos no passado do ensino de línguas mediado por tecnologias digitais,
temos a emergência de um campo específico na Linguística Aplicada a partir da integração
de tecnologias da microinformática, como o computador, no ensino de LE. O campo
CALL, sigla em inglês para Computer Assisted Language Learning, ou em português,
Aprendizagem de Línguas Mediada por Computador, surge na década de 60 e vem, desde
então, se desenvolvendo tanto em pesquisas quanto em práticas pedagógicas voltadas para
a integração das diversas tecnologias digitais no ensino de línguas (cf. Torsani, 2016).
Warshauer (1996) define três fases do CALL com base no uso do computador e
da abordagem pedagógica empregada. Dessa forma, o autor define a fase behaviorista,
em que a tecnologia é utilizada como um tutor, possibilitando a realização de atividades
mecânicas de prática linguística, tais como language drills; a fase comunicativa, em que o
computador é usado como um estímulo para a interação e comunicação entre os estudantes;
e a fase integrativa, em que a tecnologia permite a utilização de diversos recursos e
linguagens para a aprendizagem de línguas, tais como a multimídia e a hipermídia e a
própria Internet. Warshauer destaca que
De forma semelhante, Bax (2003) define três modos de uso do computador nos
processos de ensino-aprendizagem de línguas. Para o pesquisador, há o modo restrito,
em que o computador não é integrado ao currículo e é utilizado, principalmente, sob
uma perspectiva estrutural de língua, por meio da interação entre o estudante e a
máquina (tecnologia) em atividades do tipo estímulo-resposta. Já no modo aberto há uma
variedade de atividades, tais como jogos e simulações, que têm como objetivo interações
mais abertas, tanto com o computador em si, quanto com outros indivíduos. Por fim,
no modo integrado, as tecnologias estão integradas ao currículo por meio de atividades
comunicativas, tais como a comunicação mediada por computador (CMC) e o uso de
diferentes ferramentas para interação entre os estudantes.
Refletindo sobre o uso da tecnologia na educação de forma mais ampla, Moreira
e Schlemmer (2020) defendem um novo conceito e paradigma de educação digital que
denominam de onlife, uma vez que as práticas online e offline (digitais e presenciais)
estão tão imbricadas na sociedade contemporânea que não podemos mais separá-las.
Nesse sentido, os autores apresentam um continuum da educação digital que compreende
diferentes formas de utilização das TDIC, tanto no ensino presencial quanto no ensino
híbrido e totalmente on-line. No ensino presencial enriquecido por tecnologias digitais, por
exemplo, as tecnologias estão integradas à sala de aula presencial por meio de diferentes
atividades, como por exemplo, uso de diversos recursos da Internet e aplicativos de celular
por alunos e professores durante as aulas, de forma a enriquecer e expandir as experiências
de aprendizagem. No ensino híbrido, há uma combinação de atividades presenciais e a
distância, realizadas com conteúdos e em ambientes digitais, ampliando a experiência de
aprendizagem para além do espaço e tempo da sala de aula presencial. Já na educação
on-line, os processos de ensino-aprendizagem são realizados totalmente em plataformas
digitais como Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs) e até mesmo territórios virtuais
criados em plataformas de realidade virtual, ampliando as oportunidades educacionais e
permitindo a aprendizagem em qualquer tempo e local.
[...] Na verdade, tal uso da tecnologia se tornou tão ubíquo em nosso cotidiano
que sua falta em nossa sala de aula é notável. Estas tecnologias são familiares
para muitos de nós, e aprender a utilizá-las em nossas vidas pessoais se tornou
uma norma social esperada. Entretanto, seu uso no ensino de línguas é geralmente
negligenciado. Infelizmente, muitos professores de línguas não têm familiaridade
com o extenso volume de pesquisa e prática de profissionais no campo do ensino
de línguas mediado por computador (CALL). (cf. Kessler, 2018, p. 206)
Portanto, concordando com Paiva (2013) que ainda se trata de ações isoladas,
venho desenvolvendo em minha universidade diferentes projetos de ensino e extensão
1 Ver: https://www.psicoedu.com.br/2020/03/textao-da-quarentena-professora-desabafo.html
2 Ver: https://www.youtube.com/watch?v=CCe5PaeAeew
3 Ver: https://www.institutopeninsula.org.br/em-quarentena-83-dos-professores-ainda-se-sentem-
despreparados-para-ensino-virtual-2/
cursos de idiomas optaram por adotar tecnologias digitais para a mediação das atividades
educacionais, realizei um estudo de caso descritivo (cf. Leffa, 2006) a fim de compreender
os impactos da pandemia no ensino de LE e as contribuições da disciplina optativa na
formação inicial de professores de línguas para atuação no contexto do ensino remoto
mediado por tecnologias digitais. Para isso, contactei todos os 26 estudantes que haviam
concluído a disciplina “Tecnologias Digitais no Ensino de Línguas Estrangeiras” entre
os anos de 2017 e 2019 e que estivessem atuando como professores de línguas em 2020.
Seis professores responderam positivamente ao convite e participaram de uma entrevista
semiestruturada por e-mail (cf. Mann; Stewart, 2000) que buscou identificar o contexto
de atuação, o uso que faziam das tecnologias para as práticas de ensino-aprendizagem,
antes e durante a pandemia, e as contribuições da disciplina para o ensino mediado por
tecnologias digitais no ensino remoto.
Os seis professores que participaram da pesquisa atuam com diferentes línguas e
em diferentes níveis e instituições de ensino. Neste artigo, são utilizados nomes fictícios
a fim de preservar a identidade dos participantes e suas falas são transcritas tais como
reproduzidas nas respostas às entrevistas. Assim, constituem participantes da pesquisa: (1)
Jéssica, professora da educação infantil em uma escola municipal e de língua portuguesa
em um pré-vestibular social com apoio da prefeitura; (2) Fabiana, professora de inglês
no Ensino Fundamental I em uma escola privada e também em um curso de idiomas; (3)
Laura, professora de inglês em um curso de idiomas; (4) Tânia, instrutora de alemão em
um curso de idiomas de extensão universitária; (5) Míriam, também instrutora de alemão
no mesmo curso de extensão; e (6) Rafael, professor de inglês no curso de extensão
universitária e professor substituto em um curso de graduação em Letras.
Jéssica informou fazer uso restrito de tecnologias em sua turma da educação
infantil antes da pandemia, tendo acesso apenas a um retroprojetor para suas aulas. Após
algumas semanas do início da pandemia, a escola solicitou que os professores preparassem
sequências didáticas e vídeos que seriam compartilhados com os alunos por meio de uma
plataforma de ensino a distância. No entanto, toda a gestão dos conteúdos é feita pela
Secretaria de Educação, que ficou responsável pela seleção e postagem dos materiais na
plataforma. Para os alunos que não têm acesso à internet, as atividades ficariam disponíveis
na própria escola. No pré-vestibular social, o uso de tecnologias em sala de aula também
era bastante restrito. Contudo, a professora mantinha um grupo de WhatsApp (criado pelo
coordenador do curso para todas as turmas) para comunicação com os alunos e envio de
materiais. A professora também mantinha uma pasta no Google Drive para compartilhar os
conteúdos das aulas com os alunos, mas como alguns alunos tinham dificuldade em acessá-
los, Jéssica compartilhava os materiais nos dois aplicativos (Google Drive e WhatsApp).
Com o início da pandemia e a suspensão das aulas presenciais, o coordenador do curso
criou uma turma no Google Classroom para que cada professor pudesse compartilhar suas
atividades, mas alguns professores não se sentiram confortáveis com este uso e optaram
por usar o grupo de WhatsApp para este fim.
A escola privada de Ensino Fundamental I em que Fabiana atua possuía um
sistema próprio que funcionava como uma “agenda on-line” em que os professores se
comunicavam com os responsáveis por meio de postagem sobre as atividades realizadas
nas aulas presenciais e agendamento de provas e testes. O uso das tecnologias digitais
na sala de aula, no entanto, era inexistente. Após um período de recesso com o início
da quarentena, a escola passou a disponibilizar atividades complementares e videoaulas
gravadas pelos professores para todos os alunos. Já no curso de idiomas privado, o uso
de diferentes tecnologias digitais já fazia parte da metodologia da instituição, que possuía
convênio com o Google for Education e já utilizava diversas tecnologias digitais nas
atividades realizadas em sala de aula, incluindo o uso de tablets, celulares e óculos de
realidade virtual, além de aplicativos como Kahoot e Quizzlet. Após um breve período
de suspensão das aulas com o início da pandemia, os professores começaram a utilizar as
plataformas Google Hangout (Google Meet) e Google Classroom para a realização das
aulas por meio de atividades síncronas e assíncronas.
A instituição em que Laura trabalha faz parte de uma franquia de cursos de idiomas e
a matriz disponibiliza conteúdo virtual por meio de um portal para os alunos. Contudo, este
conteúdo ainda não estava disponível para todas as filiais, e a filial em que Laura trabalha
não tinha acesso a esse portal antes da pandemia. Com a suspensão das aulas presenciais,
as aulas passaram a ser realizadas por meio de plataformas de videoconferência, iniciando
com o Zoom e depois migrando para o Jitsi Meet por questões de segurança. Segundo a
professora, as aulas seguem a mesma metodologia das aulas presenciais, com redução dos
exercícios feitos em grupo. Os alunos também passaram a ter acesso ao portal do curso
com acesso a vídeos, áudios, exercícios extras e simulados como suporte às aulas on-line.
O curso de extensão em que Tânia, Míriam e Rafael trabalham não adotava nenhuma
tecnologia ou plataforma como parte do curso, com exceção do e-mail para comunicação
com os alunos. No entanto, os instrutores podiam utilizar diferentes tecnologias a seu critério.
Nesse sentido, Míriam relatou utilizar arquivos em PDF, áudios e vídeos do YouTube para
complementar e ilustrar suas aulas e Rafael informou usar livros digitais.
[...] a escola não sinalizou nenhum suporte fixo para gravação das aulas, com
isso cada professor ficou livre para escolher qual ferramenta seria melhor para
ser utilizada. Todavia, a escola possui um grande número de funcionários que
não estão acostumados a utilizar as tecnologias em sala de aula, e como não
houve nenhum treinamento prévio foi gerado certo desconforto por parte da
equipe pedagógica. (Fabiana)
O que percebemos é que, apesar das diferentes realidades relatadas pelos participantes,
o principal impacto da pandemia nas práticas de ensino de línguas, na maior parte
das vezes, foi a transposição do modelo presencial para o ambiente on-line, ou seja, a
utilização de plataformas de videoconferência para a realização de aulas síncronas muito
semelhantes ao modelo presencial adotado antes da pandemia. Já na educação infantil e
no pré-vestibular social, as possibilidades de integração das TDIC nas práticas de ensino
mediadas pelo digital foram bastante limitadas em virtude da falta de acesso e dificuldade
de uso das tecnologias por muitos estudantes e professores, evidenciando a grande brecha
digital existente em nosso país e a falta de formação inicial e continuada de professores
para integração das TDIC ao ensino.
Apesar de algumas instituições fazerem uso das tecnologias digitais antes da
pandemia, percebemos que este uso era de certa forma limitado, se comparado com todas
as possibilidades apresentadas previamente. Muitas das tecnologias eram apenas utilizadas
No caso de Rafael, este relatou em outro momento que utilizava a versão paga
do Zoom para evitar a questão da interrupção da aula. Contudo, como a escolha foi a
critério de cada professor, ele mesmo pagava para o uso da plataforma a fim de garantir a
continuidade da aula.
Ao questionar os participantes sobre as contribuições da disciplina optativa cursada
durante sua formação inicial para sua atuação no ensino mediado por tecnologias digitais
durante a pandemia, todos os seis participantes indicaram que a disciplina contribuiu
significativamente permitindo, por exemplo, que tivessem mais segurança e confiança
para atuarem no ambiente digital e dispusessem de uma gama de recursos digitais para a
realização das aulas remotas. As contribuições da disciplina são destacadas nos excertos
a seguir:
Eu me sinto muito segura usando as ferramentas, até aquelas que não vimos
em aula, devido à base que adquiri durante a disciplina. Me causou um grande
alívio saber usar as ferramentas e ter um leque de opções para escolher e
testar, tanto que até dividi o que eu sabia com os meus colegas [...] (Míriam)
A disciplina mostrou uma gama de recursos digitais que podem ser utilizados na
educação, incentivando a criatividade e a participação do aluno, como aplicativos
de jogos, sites de criação de portfólio, ferramentas que permitem a produção
colaborativa, entre outros. Como o acesso à internet, a jogos, à informação
rápida, aos recursos áudio-visuais etc. já faz parte do cotidiano dos alunos e é
interessantes (sic.) para eles, a disciplina de TDELE foi essencial para ensinar
a usar esses recursos como aliados no processo de ensino-aprendizagem,
principalmente nesse momento em que as aulas estão sendo completamente no
modo digital. (Laura)
[...] não tivemos treinamento, tivemos que aprender a produzir essa elaboração
de sala de aula. Fiquei mais tranquila por ter tido a inclusão desses recursos
digitais, porque havia feito o curso de TDELE. Significativo. (Tânia)
Sim, contribuiu. Tenho, hoje, um pouco mais de confiança para utilizar alguns
recursos tanto para a pesquisa sobre o tema que a minha escola ficou responsável
em elaborar quanto para preparar as sequências didáticas. [...] Por outro lado, ter
tido conhecimento de como funciona o ensino na modalidade EAD, mesmo
tendo visto brevemente, me trouxe incômodo nesse momento, pois sei que é um
trabalho que exige tempo para a elaboração e que necessita de recursos apropriados.
Não é somente gravar uma história diante de uma câmera. (Jéssica)
fundamental para estes professores na transição para o ensino remoto. Pelas falas de alguns
professores, podemos inferir que, caso não tivessem cursado a disciplina, provavelmente
a transição para o ensino remoto teria sido mais difícil. Os excertos acima reforçam a
relevância da disciplina para a prática docente neste período emergencial de ensino remoto
mediado por tecnologias digitais e também para a atuação desses professores na cultura
digital. Portanto, a prática com essas tecnologias deve fazer parte da formação inicial
de professores de línguas, como parte constituinte do currículo, e não ficar relegada a
iniciativas isoladas ou disciplinas eletivas.
Por fim, o que podemos concluir a partir deste estudo é que, apesar dos diferentes
contextos analisados, o ensino de línguas mediado por tecnologias digitais (CALL) é uma
realidade ainda distante de algumas intuições de ensino de LE. Apesar das limitações desse
estudo, o CALL parece estar mais integrado apenas em cursos de idiomas voltados para a classe
média e alta, onde há um grande investimento na aquisição e capacitação dos professores para
a integração dessas tecnologias. Em cursos de idiomas menores e mais afastados dos grandes
centros urbanos, como no caso do curso de Laura, e o curso de extensão universitária, estas
tecnologias ainda são utilizadas como acessórias, ou seja, como atividades complementares às
aulas presenciais, não sendo utilizadas de forma integrada, como descrito por Bax (2003). Na
educação básica particular, apesar de a tecnologia estar presente, ela é utilizada, primordialmente,
para atividades administrativas e de comunicação com responsáveis, não sendo utilizada nas
atividades de ensino-aprendizagem. Por fim, na escola pública e pré-vestibular comunitário,
percebemos que estas tecnologias estão muito distantes da realidade dos alunos e também dos
professores, seja na falta de acesso a dispositivos, como computador e conexão à Internet, seja
nos letramentos e competências digitais para a utilização de tecnologias móveis como Google
Drive ou Google Sala de Aula na condução das atividades pedagógicas durante a pandemia.
O estudo também revela o despreparo por parte de muitas instituições de ensino para
lidar com o ensino mediado por tecnologias digitais e com o ensino remoto devido ao pouco
conhecimento sobre CALL e os princípios da educação on-line (cf. Pimentel; Carvalho, 2020)
e suas potencialidades (cf. Santos, 2020). Por fim, como conclui Fabiana, as dificuldades
encontradas neste contexto reforçam a relevância da formação dos professores de LE para o
ensino mediado por tecnologias digitais.
[...] acredito que essa situação vai deixar um grande aprendizado para todos de que
aulas online precisam de muita preparação, além do desenvolvimento de ferramentas
adequadas para tal modalidade de ensino, assim como a qualificação adequada dos
profissionais de ensino. (Fabiana)
Referências bibliográficas
RESUMEN
Lo que se comprende por una poética del paisaje es la capacidad que el sujeto
tiene para leer su entorno desde de su subjetividad, aportando para su lectura
de mundo sus experiencias. Así se puede afirmar que lo que se entiende por
subjetividad es atravesado por la noción de existencia que puede ser cambiable
según la experiencia de cada sujeto. La (contin)unidad que existe entre mundo-
cuerpo-espíritu también puede leerse como subjetividad(es)-lectura de mundo
y naturaleza-cultura. Cuando se vive la experiencia de un mundo pandémico se
cambia la existencia de este sujeto y ello se debe a los numerosos factores que
este nuevo tiempo exige. Cada sujeto construye su paisaje según lo que vive. En
este trabajo se desarrolló una producción audiovisual que se llevó como contexto
lo que los alumnos vieron en sus barrios, es decir, lo que vieron en su entorno
durante la pandemia y la carga que estos paisajes tenían como respuesta de sus
percepciones con la fórmula musical “el viento me confió cosas que siempre llevo
conmigo”, frase de la cantante argentina Liliana Herrero.
PALABRAS-CLAVE: Paisaje; Poesía; Texto; Subjetividad; Pandemia.
AZEVEDO & SEBOLD. Alrededor de la pandemia existe la confesión del viento: a paisagem como poesia, filosofia e texto
em uma turma de espanhol.
Introdução
Sobre a ideia da filosofia e poética da paisagem, o poeta francês Michel Collot pos-
tula a ampliação do conceito de natureza e de paisagem a partir de uma nova narrativa e
uma nova perspectiva àquilo que se encontra através das experiências sensoriais e afirma
que “o pensamento-paisagem é um pensamento partilhado, do qual participam o homem
e as coisas” (COLLOT, 2013, p.29).
No que diz respeito ao que se entende como paisagem e natureza, esta ideia ainda é
difundida pelo senso comum como aquilo que é bonito e agradável aos olhos, ignorando
o fato de outras experiências sensoriais estarem vinculadas ao que é paisagem. Com esta
redução de significado, o que é descartado deste padrão paisagístico é considerado ina-
propriado para a cidade, para o lugar.
Com o objetivo de ampliar esta ideia, Collot novamente diz que o resultado deste
processo de ressignificação da natureza é trazer a paisagem como pensamento e, sendo
ela pensamento, passa a ser narrativa, ou seja, poética. O pensamento-paisagem constrói
uma nova poética. O mesmo diz:
um outro que não possui relações com o sujeito. Com a perspectiva que Collot insere, o
sujeito não é mais alheio ao que está ao seu redor, mas também se integra a ele, faz parte
do que está a seu redor. A natureza passa a compor a sua subjetividade.
É importante salientar que a paisagem é dependente de um sujeito, ou seja, a paisa-
gem é assistida por um sujeito que interage através de seu olhar, mas nesta relação imagé-
tica a própria paisagem devolve ao sujeito um olhar – explosivo, terno, duro – que evoca
experiências sensoriais.
É nítida a relação que Michel Collot possui com o filósofo francês Merleau-Ponty.
O pensador escreveu “Fenomenologia da Percepção” (1999) e neste livro as questões da
paisagem (o que meu corpo encontra para além de mim) são postas segundo a ideia da
percepção. Para Merleau (1999, p.25), as questões da sensação “são mais confusas que se
pensa”. E, neste momento, adicionamos a ideia da sensação atrelada ao sujeito que perce-
be e se percebe neste lugar confuso que é a paisagem. O próprio Merleau diz:
Eu poderia entender por sensação, primeiramente, a maneira pela qual sou afeta-
do e a experiência de um estado de mim mesmo. O cinza dos olhos fechados que
me envolve sem distância, os sons do cochilo que vibram “em minha cabeça”
indicariam aquilo que pode ser o puro sentir. Eu sentirei na exata medida em que
coincido com o sentido, em que ele deixa de estar situado no mundo objetivo
e em que não me significa nada. O que é admitir que deveríamos procurar a
sensação aquém de qualquer conteúdo qualificado, já que o vermelho e o verde,
para se distinguirem um do outro como duas cores, precisam estar diante de
mim, mesmo sem localização precisa, e deixam, portanto, de ser eu mesmo. A
sensação pura será a experiência de um “choque” indiferenciado, instantâneo e
pontual. (MERLEAU-PONTY, 1999, p.25)
E com esta afirmação de Merleau, Collot também considera que a paisagem faz
parte de um sujeito perceptivo, que está em mútua relação com sua própria subjetividade-
-alteridade. Ele mesmo afirma que “não está diante de um espetáculo exterior, mas imerso
em um meio ambiente no qual está, num sentido próprio, interessado por uma série de
“affordances”: o termo, intraduzível, designa os recursos que certos objetos lhe oferecem
e que dão sentido e valor ao visível” (COLLOT, 2003, p.20).
O que se buscou neste presente trabalho foi explorar o limite da conceituação dua-
lizada que os alunos têm por paisagem e, sabendo disto, procurou-se expandir o conceito
para algo que fuja dessa dicotomia, mas que interpela à ideia de construção-sujeito-paisa-
gem.
Quando a proposta foi lançada para os alunos, cada um procurou entender o que
buscavam em suas subjetividades pelo que entendiam por paisagem. Trago um relato de
uma aluna que explicita a ideia dualizada da paisagem estar relacionada ao conceito de
natureza. Ela dizia que “seria impossível fazer um trabalho sobre paisagem estando em
quarentena e com as pessoas em isolamento social”. Collot (2013) falou sobre essa dico-
tomia ao afirmar que “por muito tempo, o local foi considerado como um modelo que a
arte devia imitar” (p.17) e Merleau-Ponty (1999) diz que “o pensamento objetivo ignora
o sujeito da percepção” (p. 279).
Depois de conversarmos sobre esta ideia, trouxemos um pouco sobre a ressignificação
que Collot dá à ideia de paisagem-natureza e os alunos ficaram mais confortáveis com
a possibilidade de que tudo o que é perceptível às nossas experiências e existências seja
paisagem, como Balzac disse“a paisagem tem ideias e faz pensar”. Para além disso,
surgiram algumas perguntas como:o que é paisagem? Pode um monte de lixo ser uma
paisagem? Por que toda vez que um livro didático apresenta uma imagem da natureza ela
sempre é bem verdinha e bem limpa?
Em seguida, escutou-se a música da cantora Liliana Herrero, pois o que compôs
esta produção audiovisual também foi, a partir da compreensão que a paisagem é uma
experiência sensorial, receber através do sussurro e da música uma paisagem repleta de
novas descobertas.
Com esta possibilidade de transitar pela paisagem e pela música, o que se fez então
foi registrar sensorialmente a recepção desta (re)conceituação com os alunos. Entendendo
isto, o próximo passo do trabalho era registrar em quinze segundos o sussurro com uma
frase da música, registrar em quinze segundos o seu bairro, sua vizinhança, tudo aquilo
que estava ao seu redor e registrar os corpos que transitaram neste lugar em um tempo
pandêmico. Segundo Merleau-Ponty
Ou seja, o que Merleau-Ponty quis dizer é que faz parte da paisagem os corpos.
Cada pessoa que passa pelos locais nos quais os alunos fazem seus registros compõem
inteiramente esta natureza, ora vazia, ora aglomerada, mas efêmera segundo a natureza do
próprio sujeito.
É importante salientar que, pelo fato de os alunos serem de regiões distintas do
estado do Rio de Janeiro, os registros visuais foram enriquecedores para este trabalho,
pois no material audiovisual encontra-se as mais variadas formas de paisagem: o escuro
da noite e a roda gigante iluminada ao fundo, a janela do apartamento com grades de pro-
teção e o Sol, a ciclista pedalando isolada em uma estrada de barro, a avenida principal
com vendedores de águas e ônibus superlotados em uma pandemia e o céu entre nuvens
de um entardecer com o revoar de urubus e bambuzais balançando-se pela força do vento.
Quando estes registros chegaram, percebeu-se que, de fato, os alunos haviam en-
tendido a complexidade e a amplitude do conceito, pois os registros conversam muito
com a compreensão de Collot sobre a paisagem. O que se pôde fazer foi reescrever a
poética da experiência, ou seja, aquilo que estes alunos encontraram de acordo com seus
sentidos. Foi o que ele mesmo afirmou ao dizer que:
Um romance, um poema, um quadro, uma peça musical são indivíduos, quer di-
zer, seres em que não se pode distinguir a expressão do expresso, cujo sentido só
é acessível por um contato direto, e que irradiam sua significação sem abandonar
seu lugar temporal e espacial (...) é a partir do fundo de sua subjetividade que
cada um projeta este mundo “único”. (MERLEAU-PONTY, 1999, p.209; 478)
Isso diz que a subjetividade está a todo tempo sendo negociada com as nossas
experiências, com o nosso meio e com a nossa história única que constrói um mundo
“único”. Quando conseguimos entender que este processo é de “entre” e nunca de fim,
entendemos a poética da paisagem e entendemos a filosofia como caminhos nos quais são
mais importantes os meios do que os fatores.
A tecnologia pode ser uma aliada ao ensino-aprendizagem, porém, mais que isso,
ela precisa ser encarada como uma ferramenta didática poderosa, capaz de ser auxiliar,
mas podendo ser também protagonista no processo do aprendizado. Para Kenski (2007),
a tecnologia possibilitou uma prática maior do conhecimento, pois usufrui do avanço
tecnológico para desencadear novas formas de produção, inclusive, produção didática,
pedagógica e acadêmica. Ainda sobre a tecnologia, Bueno a conceitua como
O aplicativo que foi utilizado para a junção dos vídeos chama-se ClipChamp e é
utilizado para a edição de vídeos, transposição de áudios em vídeos, recorte de cenas e
áudios e assim foi-se construindo o produto final deste trabalho, que trata sobre as nossas
percepções, desconstruções e ressignificações do que vem a ser a poética e a filosofia da
paisagem.
O vídeo ou o recurso audiovisual é uma ferramenta demasiadamente plural, pois
consegue, de forma ampla, comunicar, ensinar, descrever, e outras possibilidades que
surgem como uma multicomunicação digital. O vídeo para Moran possui um valor
A tecnologia nem sempre foi muito incentivada no meio do ensino e, muitas vezes,
foi atacada por construírem um discurso de que é uma grande vilã da educação. Aos pou-
cos, com a política das TICs, com as discussões sobre pesquisas educativas na internet foi
sendo possível introduzir o celular, o computador, o notebook e outros de forma pedagó-
gica.
Não seria possível a manutenção das instituições e do ensino no ano de 2020 sem
as ferramentas tecnológicas e, nesta perspectiva, a produção audiovisual dos alunos so-
mente foi possível devido a este resgate de alguns aplicativos que fariam esta função de
unir os vários vídeos e fomentá-los em um só.
Metodologia
O presente trabalho foi aplicado durante o mês de agosto do ano de 2020 para os
alunos que estavam cursando o nível I do curso de Espanhol do Curso de Línguas Aberto
à Comunidade (CLAC) da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A proposta foi apli-
cada para a turma do monitor Matheus Sena de Azevedo, um dos autores deste artigo,
gerando um total de dez aprendizes participantes da produção.
Nesse nível, o modo de organização do texto a ser trabalhado em sala de aula é
a descrição. Nas atividades síncronas e assíncronas, o monitor dá ênfase à descrição de
espaços, pessoas, lugares turísticos, aspectos físicos e aspectos de personalidade.
A produção foi dividida em partes: i) a escolha da música e do suporte para tal
produção; ii) o estabelecimento dos prazos para a entregas das produções; iii) o envio das
produções audiovisuais e iv) e o fomento da edição e criação do produto final – um único
vídeo.
Na primeira parte do trabalho, os alunos escutaram algumas músicas de países de
língua espanhola e escolheram unanimemente a música Confesión del viento, da cantora
argentina Liliana Herrero. Além desta escolha, discutiram qual ferramenta seria melhor
para executar tal edição e o ClipChamp foi o que respondeu melhor as nossas expecta-
tivas. Na segunda parte da produção, estabeleceu-se um prazo para a entrega das pro-
duções, que foi por volta de um mês.Na terceira parte do trabalho, eles enviaram o que
haviam produzido. Cinco alunos enviaram frases da música de forma sussurrada e outros
cinco alunos enviaram vídeos de seus bairros. Na quarta e última parte da produção, foi
feita a junção dos vídeos com os áudios e foi produzido um único vídeo que ilustrava a
reflexão sobre a filosofia e a poética da paisagem.
Considerações Finais
Neste estudo, tivemos como objetivo avaliar o conceito que os alunos tinham so-
bre o que é a paisagem, o que é a natureza e o que é texto, a partir de uma proposta que
visava ampliar essas pré-conceituações. Pretendíamos também, seguindo esta ampliação,
desenvolver um trabalho de produção audiovisual o qual se desenvolvia sob a atuação da
Referências Bibliográficas
HERRERO, L. Confesión del Viento. In: Confesión del viento. Argentina: EPSA Music
S. A., 2003.
DO PROJETO CLAC-UFRJ
RESUMEN
Las discusiones acerca del uso de las TICs en la enseñanza de lenguas extranjeras
constituyen un tema de investigación académica, y en este momento de aislamiento
social, se hizo necesario el desarrollo y aplicación de nuevas metodologías para la
enseñanza. El curso CLAC-UFRJ adoptó la enseñanza remota como una estrategia
para mantener sus actividades y, en el nivel II del curso de español, el uso de juegos
virtuales tuvo como objetivo adaptar y acercar a los alumnos a las clases, basándose
en los juegos como la simulación de realidad física (cf. Roberto, 2004). Para tanto, a
partir de la secuencia básica de Cosson (2014) actividades en la plataforma educativa
Kahoot y en el juego virtual Haddoz se desarrollaron como estrategias de motivación
y de interacción. De este modo, el objetivo de este trabajo es contribuir a la discusión
sobre el uso de las TIC’s en la enseñanza de español como lengua extranjera (ELE)
en forma remota, contribuyendo a la comprensión del uso de juegos en línea como
estrategia de motivación y comprometimiento. Los datos alcanzados indican que el
uso de juegos se volvió una herramienta esencial para motivar a los alumnos en una
realidad de enseñanza remota y creemos que su uso contribuye a un proceso más
dinámico y motivador en un contexto de bajo nivel de interacción social dentro y fuera
de las clases.
PALABRAS-CLAVE: Juegos; Enseñanza remota; Motivación; Interacción; Español
como lengua extranjera.
CAETANO ET AL. O uso de jogos no ensino remoto como estratégia de motivação e interação no curso de espanhol do
projeto CLAC-UFRJ.
Introdução
do curso de língua espanhola do CLAC; porém, a sua aplicação foi adaptada ao ensino
remoto. O professor doutor Graells (2007) afirma que o uso das TICS no ensino remoto
“implica novos papéis para os professores e alunos orientados ao trabalho autônomo e
colaborativo, crítico e criativo, à expressão pessoal, a investigar e a compartilhar recursos,
a criar conhecimento e a aprender.” (tradução nossa). Marca-se, dessa forma, como tal uso
ocorre a partir de uma ação pensada e refletida, não apenas automatizada.
As atividades trabalhadas com as TICS são orientadas pelo professor, exercitam a
autonomia dos alunos − visto que são eles que desempenham os papéis propostos pelas
atividades − e se adaptam ao tempo e espaço que o alunado dispõe, questões importantes
em um momento de isolamento espacial que modificou a distribuição de tempo de
diversas tarefas. Esses detalhes, então, foram importantes no momento de pensar no uso
de ferramentas tecnológicas na nova modalidade de ensino aplicada para tais estudantes
de língua estrangeira.
Pensando especificamente nos jogos, muitas vezes, são apontados, assim como
outros recursos, como ferramentas de distração antagônicas ao ensino e como se não se
pudesse conciliar seu uso em sala, mas, conforme Sant’Anna (2004 apud Costa, 2012, p.
7), “os recursos não são instrumentos de diversão ou dispersão. Ao contrário, favorecem a
atenção, concentração, reflexão, disciplina, cooperação e educação de maneira espontânea
e consciente”.
Acreditando, então, nos benefícios que os jogos podem trazer ao ensino e sabendo-se
que é um meio já utilizado como distração e entretenimento, utilizamos este recurso para
promover uma melhor interação dos alunos dentro do curso remoto de língua estrangeira
nas atividades síncronas e assíncronas.
No que diz respeito à formação dos docentes com o uso das TICs, Vasconcelos &
Oliveira (2017) falam sobre as inovações tecnológicas e que o professor precisa ampliar
suas práticas docentes. Além disso, discorre sobre a importância da reflexão das práticas
em um processo ativo fazendo parte, então, da rotina do docente.
Dentre as diversas TICs, escolhemos o jogo, pois, dentro da realidade virtual, ele
“se define como uma simulação da realidade física através de meios eletrônicos, o que
nos oferece a sensação de estar experimentando uma forma real de uma situação.” (cf.
ROBERTO, 2004, s/p, tradução nossa). Dessa forma, os jogos de competição e simulação
pensamos que as divisões e intenções de tal proposta se adequavam aos nossos propósitos.
Dividida em quatro etapas, tal sequência consiste em: motivação, introdução, leitura e
interpretação, sendo o último dividido em momento interior e momento exterior.
A etapa de motivação se define pelo momento anterior ao conteúdo principal da
aula, sendo como um aquecimento, uma preparação que objetiva instigar os alunos ao
tema que trabalharão de forma integrada ao texto principal. A introdução é basicamente
a apresentação e conversa sobre o autor e a obra, se pensarmos em um livro como parte
central do exercício. Em outras palavras, é a etapa de discutir a parte bibliográfica
relacionada à atividade principal proposta. O passo de leitura, como bem explicita o
título, se trata do contato próprio com a obra e, a última etapa, chamada de interpretação,
se divide em dois momentos. O primeiro, o momento interior, nas palavras do autor, é
“chegar à construção do sentido do texto, dentro de um diálogo que envolve autor, leitor e
comunidade” (COSSON, 2014, p. 64). O segundo momento, o exterior, seria externalizar
o conteúdo trabalhado através da interpretação do aluno.
Dentro de nossa experiência, os jogos especificamente foram utilizados na etapa
de motivação e de interpretação no momento externo, quando os alunos produzem o
conteúdo que lhes foi apresentado a partir do conteúdo discutido em aula. Pensamos que,
como introdução, os jogos poderiam apresentar em sua estrutura partes do conteúdo de
forma mais natural e menos esquematizada. Como interpretação no momento externo,
a simulação de um ambiente virtual em que eles poderiam montar e apresentar suas
próprias criações nos pareceu ajudar dentro do processo de elaboração dos alunos a partir
do conteúdo aprendido.
Metodologia
outra, 4, e a última, 12. Os aprendizes, por sua vez, também variavam bastante quanto ao
perfil − uma faixa etária que abrange dos 19 aos 56 anos − com os mais diversos níveis de
educação formal − desde ensino básico completo a cursos de pós-graduação.
Nesse contexto, aplicamos, da maneira descrita nas subseções desta parte, dois jogos
virtuais: o Kahoot e o Haddoz. O primeiro define-se como uma plataforma de aprendizagem
gratuita baseada em jogos, que traz engajamento e diversão para jogadores de todos os
anos na escola, no trabalho e em casa, fazendo com que seja divertido aprender, seja qual
for o tema, o idioma ou a idade, em qualquer dispositivo1. Já o segundo, apresenta-se
como uma comunidade virtual através da qual é possível conhecer outras pessoas e fazer
novos amigos de todos os países hispanofalantes.2
Esses jogos foram utilizados como ferramentas para abordar algumas habilidades
linguísticas exigidas pelo livro didático utilizado pelo CLAC-Espanhol, o Aula
Internacional 2 (CORPAS, GARMENDIA & SORIANO, 2014), no nível II. Com o
Kahoot, buscamos introduzir os conteúdos comunicativos propostos no livro: “relatar
y relacionar acontecimientos pasados” e “hablar del inicio y de la duración de una
acción” 3 (p. 23). Já com o Haddoz, objetivamos externalizar o conhecimento adquirido
acerca dos recursos comunicativos “describir una casa”, “ubicar objetos en el espacio”
e “describir objetos”4 (p. 35). Essas atividades faziam parte de sequências didáticas
distintas, relacionadas a diferentes unidades do livro.
Após a aplicação de ambas as atividades, ocorreu a avaliação por meio de um
formulário na plataforma Google Forms. Escolhemos essa ferramenta pela facilidade
de acesso aos alunos e pela integração com outras plataformas Google já utilizadas
pelos alunos, como o Google Meet e o Google Classroom. Objetivávamos conhecer as
impressões dos alunos sobre as atividades desenvolvidas e a sua experiência frente à
inserção dessas plataformas lúdicas como ferramenta de ensino.
quatro opções de respostas ou na forma verdadeiro e falso. É possível jogar junto com
a turma, projetando a tela do dispositivo do docente, ou criando desafios, de forma que
um link é enviado aos discentes e cada um tem acesso no seu próprio dispositivo; nesse
último, os alunos são listados segundo sua pontuação no quiz.
Utilizamos essa plataforma para introduzir o conteúdo “pretérito indefinido” aos
alunos, associado ao tema “curiosidades”, ora da América Latina, ora de personalidades
hispanofalantes. Para isso, seguimos o conceito de motivação de Cosson (2014), que diz
que “a construção de uma situação em que os alunos devem responder a uma questão ou
posicionar-se diante de um tema é uma das maneiras usuais de construção da motivação”
(COSSON, 2014, p. 55).
Assim, o Kahoot serviu como atividade inicial de duas aulas síncronas da unidade
destinada a estudar as formas de relatar no passado. Buscávamos fazer com que os alunos,
mesmo que não conhecessem as formas verbais apresentadas, já as reconhecessem no
quizz. Contudo, o objetivo principal das atividades era introduzir o tema central da aula,
ativando os conhecimentos prévios dos alunos.
O primeiro quiz utilizado tinha como título “Juego de las curiosidades históricas”
e apresentava as perguntas abaixo (apresenta-se, entre parênteses, as opções de resposta,
com destaque na correta).
2 - Una vez más en la medicina América Latina está presente. ¿Cuál de estas opciones
fue una creación latina? (cirugía plástica / trasplante de corazón / corazón artificial
/ transfusión de sangre)
7 - Cuba fue el primer país del mundo en eliminar la transmisión del sida de madre a
hijo. (Verdadero / Falso)
Os alunos tinham 30 segundos para responder cada questão. Esta era a primeira
atividade da aula, para motivar os alunos ao tema proposto: curiosidades sobre o mundo
latinoamericano. Após a realização do jogo, propusemos uma breve discussão sobre os
temas apresentados: se eles já conheciam essas informações, qual delas tinha impressionado
mais, entre outras questões.
O mesmo padrão foi utilizado na segunda semana dessa unidade, que mantinha o
conteúdo linguístico “pretérito indefinido” e a temática curiosidade, ainda que, dessa vez,
o foco estivesse em celebridades hispanofalantes. Nesse quiz, intitulado “El mundo de
las celebridades”, além do nome e fatos da biografia que os alunos deveriam acertar,
havia também a foto de cada uma das celebridades do jogo. As perguntas desse quiz
apresentam-se abaixo, e as opções corretas estão destacadas.
1. Maradona
Se inició en el mundo del fútbol a los siete años.
Se inició en el mundo del fútbol a los nueve años.
Se inició en el mundo del fútbol a los doce años.
Se inició en el mundo del fútbol a los once años.
2. Fonsi
En el año 1996 grabó su primer disco que titula Comenzaré.
3. Maluma
En el 2017, presentó 103 conciertos en América Latina, Estados Unidos, Europa e Israel.
En el 2017, presentó 105 conciertos en América Latina, Estados Unidos, Europa e Israel.
En el 2017, presentó 109 conciertos en América Latina, Estados Unidos, Europa e Israel.
En el 2017, presentó 84 conciertos en América Latina, Estados Unidos, Europa e Israel.
4. Shakira
Nació el 2 de enero de 1977 en Barranquilla, Colombia.
Nació el 2 de marzo de 1977 en Barranquilla, Colombia.
Nació el 2 de septiembre de 1977 en Barranquilla, Colombia.
Nació el 2 de febrero de 1977 en Barranquilla, Colombia.
5. Florinda Meza
Se integró al equipo de Roberto Gómez Bolaños en 1969.
Se integró al equipo de Roberto Gómez Bolaños en 1967.
Se integró al equipo de Roberto Gómez Bolaños en 1960.
Se integró al equipo de Roberto Gómez Bolaños en 1965.
6. Pablo Neruda
En 1978 recibió el Nobel de Literatura.
En 1976 recibió el Nobel de Literatura.
En 1971 recibió el Nobel de Literatura.
En 1974 recibió el Nobel de Literatura.
7. Antonio Banderas
Se casó con Melanie Griffith el 14 de marzo de 1996.
Se casó con Melanie Griffith el 14 de diciembre de 1996.
Se casó con Melanie Griffith el 14 de mayo de 1996.
Se casó con Melanie Griffith el 14 de agosto de 1996.
8. Arrascaeta
Cruzero renovó su contrato hasta junio de 2021.
Cruzero renovó su contrato hasta julio de 2021.
Cruzero renovó su contrato hasta mayo de 2021.
Cruzero renovó su contrato hasta octubre de 2021.
9. Anahi
El primer álbum de la cantante fue “¿mañana es hoy?”.
El primer álbum de la cantante fue “Anclado en mi corazón”.
El primer álbum de la cantante fue “Mi delirio”.
El primer álbum de la cantante fue “Inesperado”.
Mais uma vez, o quiz foi utilizado no início da aula, para introduzir o tema
curiosidades sobre celebridades; no entanto, dessa vez, eles teriam apenas 20 segundos
para responder cada questão. Notemos que o aluno teria nas alternativas de cada questão,
além da forma verbal estudada na aula anterior, estruturas que indicassem o início ou o
fim da ação, outro conteúdo linguístico abordado na unidade. Após a atividade, propomos
as perguntas abaixo para instigar o aluno a falar sobre suas vivências e gostos frente ao
tema.
Análise e discussão
Nesta seção, dissertamos sobre a impressão dos alunos e dos monitores com relação
ao uso das ferramentas digitais Kahoot e Haddoz, através do Google Forms. Para a
nossa análise, coletamos 16 respostas dos alunos das três turmas que, voluntariamente,
responderam ao formulário.
Na resposta (1), o aluno relata que teve dificuldades de acesso à plataforma e que
isso dificultou as realizações das tarefas. Na resposta (2), o aluno relata que, no momento
de encontro síncrono, realizou as atividades, mas que, nos momentos assíncronos, não.
5. “Sim, achei bem interessante e criativo. Fazia parte do tema da aula e eu,
particularmente, prefiro aulas neste formato.”
Em (5), percebemos que o aluno além de achar relevante e pertinente, afirmou seu
gosto pelas aulas com adesão às ferramentas digitais que tenham ligação com o tema
proposto para o encontro. Na resposta (6), percebemos que o aluno toca em questões de
interação não só com o professor, mas também com os outros colegas de classe. Isso é
um fator relevante, pois, com o novo modelo de aula remoto, a interação entre os alunos
ficou restringida.
Em (7), o aluno destaca apenas a relação da ferramenta com a parte lexical, mas
não viu relação das perguntas com a aula e tampouco achou a ferramenta totalmente
pertinente. Na resposta (8), o aluno não obteve êxito durante a realização da atividade e
tampouco achou pertinente.
No que tange às impressões dos alunos sobre o Kahoot, as opiniões foram diversas
− ressaltamos o contexto em que 80% dos alunos não conheciam o Kahoot antes da
aplicação no encontro síncrono. Observemos as respostas (9), (10), (11) e (12):
9. “Gostei bastante dessa ferramenta, é fácil de ser usada e ainda é possível ver
quantos pontos cada participante tem”
da ferramenta antes da aplicação da atividade assíncrona, mais de 90% dos alunos não
conheciam a ferramenta, número esse superior ao que encontramos na ferramenta Kahoot,
como é possível perceber no gráfico a seguir:
No que diz respeito às dificuldades de acesso ao site, três alunos alegaram que
tiveram dificuldades e um aluno, inclusive, não conseguiu realizar a atividade. Sobre as
dificuldades nas realizações das atividades, as respostas foram diversas: alguns alunos
apresentaram muitas, outros nenhuma e alguns apresentaram dificuldades que foram
sanadas com os vídeos explicativos sobre o acesso à plataforma. Observemos as respostas
(13), (14) e (15).
14. “Nenhuma.”
15. “Tive dificuldade para achar mobiliário e posicionar no lugar que queria.”
16. “Gostei bastante também, ele não é tão fácil de usar como o Kahoot, mas é
possível aprender rápido.”
19. “É bem parecido, se não é o mesmo, só que com outro nome, com o Habbo
Hotel. Então já tinha uma certa habilidade, pois já conhecia o Habbo Hotel antes.”
20. “Péssimas.”
E as justificativas também foram amplas, visto que alguns indicaram que as ferramentas
trouxeram contribuições e outros, nem tanto. Vejamos os exemplos (21), (22) e (23):
21. “A proposta das atividades foram boas, mas, acredito que há maneiras mais
fáceis de aprender sobre certo tema.”
23. “Porque acredito que permitiram explorar e atividades em grupo que antes
eram feitas na sala de aula. De uma forma geral, acredito que o único ponto
negativo seja compatibilizar horário durante a semana para tarefas em dupla/
grupo.”
Em (21), o aluno destaca a utilidade das ferramentas, mas não acredita ser a maneira
mais fácil de aprender o tema. Diferentemente, em (22), encontramos uma relação com
o conteúdo e o tema específico proposto para o uso das ferramentas digitais. Já em (23),
ressalta-se a importância da atividade para o trabalho em grupo e aponta também uma
dificuldade encontrada, que é a compatibilidade de se reunir para realizar a atividade.
24. “Acho interessante, desde que não tome muito tempo e comprometa as aulas.
25. “Não, pois já estou exausta de qualquer coisa virtual. Não acho inovador
nem criativo, por vezes acho trabalhoso. Inserir mais ferramentas digitais só
tornará o ensino remoto ainda mais cansativo e chato.”
Considerações finais
Referências bibliográficas
COSSON, R. Letramento literário: teoria e prática. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2014.
COSTA, M. S. P. (Org.). Maquete como recurso pedagógico na construção do
conhecimento interdisciplinar. Anais IV FIPED. Campina Grande: Realize Editora,
2012. Disponível em: http://www.editorarealize.com.br/artigo/visualizar/421. Acesso
em: 25/11/2020.
OLIVEIRA, S. da S.; SILVA, O. S. F., & SILVA, M. J. de O. Educar na incerteza e
na urgência: implicações do ensino remoto ao fazer docente e a reinvenção da sala de
aula. Interfaces Científicas - Educação, v. 10, n. 1, p. 25-40, 6 set. 2020.
ROBERTO, A. La adquisición de segundas lenguas en ambientes virtuales: Nuevas
perspectivas para la enseñanza de segundas lenguas a través de las nuevas tecnologías.
Cuaderno Cervantes, p. 60-67, 2004.
RESUMEN
Introdução
propicie o desenvolvimento”.
Outro fator relevante no ensino contextualizado é a valorização da heterogeneidade
e pluralidade, principalmente no que diz respeito à língua espanhola, já que, ao aprender
o idioma, o aluno precisa estar em contato com as variedades linguísticas e culturais (cf.
Barros & Costa, 2010). Assim, tais elementos permitem que o estudante reflita sobre
as diversidades culturais, além do desenvolvimento de habilidades linguísticas. Logo, a
contextualização do ensino de língua estrangeira suscita o contato com diferentes culturas,
como demostrado por Labella-Sánchez & Estima (2017):
Por isso, é relevante que as atividades sejam desenvolvidas com um olhar voltado
a algum contexto que seja de possível interesse dos alunos através das práticas sociais.
Neste estudo, especificamente, a sequência didática elaborada tem por objetivo contribuir
para a aplicação de estratégias no âmbito profissional. Percebemos que a maioria dos
estudantes está ingressando no mercado de trabalho ou trabalha há pouco tempo. Assim,
acreditamos que a produção de materiais relacionados a esse tema permite que se engajem
na realização das atividades do curso e que também desenvolvam habilidades necessárias
na rotina profissional. Destacamos ainda que tarefas dessa natureza servem também como
preparação para seleções destinadas a vagas no exterior, uma vez que podem preparar-se
desde já nas aulas do curso CLAC.
É de suma importância destacar que, ao longo dos últimos anos, muito esforço tem
sido aplicado em implementar e desenvolver metodologias de ensino não presencial, e
que o foco principal é a elaboração do ensino a distância (EAD). Entretanto, no presente
trabalho, discute-se também sobre outro método não presencial, conhecido como ensino
remoto.
É crucial destacar que ensino remoto e ensino a distância não possuem a mesma
estrutura. O ensino remoto é uma solução temporária para dar continuidade a práticas
pedagógicas e acontece por meio da internet. Por outro lado, o EAD é estruturado e
planejado para que todas as questões relacionadas à educação aconteçam através de
métodos tecnológicos, tais como, plataforma de atividades e acompanhamento, apoio de
monitores, aulas gravadas etc (cf. JOYE, MOREIRA & ROCHA, 2020).
Dessa maneira, não podemos confundir esses dois formatos, pois um se inicia por
uma urgência, o remoto, enquanto o outro possui sua metodologia planificada para que
todo o processo de ensino aconteça dessa forma, o EAD. O curso CLAC adotou de forma
temporária o ensino remoto em 2020 por conta do isolamento causado pela pandemia do
novo coronavírus. Desse modo, devido ao isolamento social e à necessidade de realização
de atividades remotas, tornou-se indispensável o empreendimento de uma inovação nas
metodologias utilizadas no CLAC.
As TICs, sigla referente ao conceito de Tecnologias da Informação e Comunicação,
fazem parte da realidade de sala de aula há bastante tempo, caracterizadas pela utilização
de recursos tecnológicos e elementos que auxiliam o professor e o aluno numa melhor
relação no processo de aprendizagem (cf. ROJO, 2013). No entanto, é evidente que seu
uso se tornou mais abrangente no atual contexto. Antes do período pandêmico, se utilizava
a tecnologia como auxílio para a elaboração dos materiais didáticos, porém, no atual
cenário, é necessária a realização de todas as atividades por meio digital.
Compreendemos que os hábitos se modificaram no decorrer dos anos com os
avanços tecnológicos, entretanto, o ensino nas salas de aulas não seguiu tais modificações.
De acordo com Gastaldi (2017, p. 34), “devemos nos adequar às novas tecnologias
Por fim, outra questão relevante para o ensino remoto de língua estrangeira refere-
se às dificuldades que os envolvidos enfrentam, tais como o estresse e preocupação com
a pandemia, ausência de letramento tecnológico discente e docente, problemas com
equipamentos ou acesso à internet etc. Logo, nós, monitores, professores em formação,
precisamos aprender a lidar com os desafios corriqueiros da profissão e outros mais que
se somaram a fim de que nossos encontros e atividades permitam o alcance dos objetivos
estipulados para uma determinada sequência.
Dessa maneira, é evidente que o ensino de língua estrangeira no contexto remoto
gera muitos desafios para os profissionais da educação e estudantes. Além disso, utilizar as
novas tecnologias de forma que nos auxiliem no desenvolvimento das quatro habilidades
da língua-alvo é essencial no atual cenário. Por isso, a construção de vínculos afetivos e
ajuda mútua no processo de ensino-aprendizagem que vivenciamos são fundamentais para
a superação; sem isso não seria possível realizar uma adaptação rápida, que permitisse a
continuação de tais práticas.
A sequência didática
A aula iniciou-se com a leitura de um pequeno texto chamado “Mi nuevo yo: cosas
que hacemos en cuarentena y queremos mantener”2, que serviu de apoio à discussão inicial
sobre como o isolamento social causou mudanças na vida das pessoas, tema central do
texto. Junto a ele, apresentamos tabelas3 que indicavam, em números percentuais, como
alguns hábitos da sociedade argentina mudaram nesse momento. Com isso, visávamos
fomentar a exposição de experiências pessoais dos alunos referentes ao momento sócio-
histórico no qual nos inserimos. Para isso, propusemos as seguintes perguntas, ilustradas em (1).
1 Uma descrição do processo de seleção deste material para utilização do projeto pode ser observada em Gomes
et al. (2019).
2 Texto disponível em:
<https://www.redaccion.com.ar/mi-nuevo-yo-cosas-que-hacemos-en-cuarentena-y-queremos-mantener/>.
Acesso em: 24 de novembro de 2020.
3 Texto disponível em:
<https://www.pagina12.com.ar/260825-coronavirus-como-se-modificaron-los-habitos-con-el-aislamien>.
Acesso em: 24 de novembro de 2020.
(1) ¿Cómo te sientes en la cuarentena? / ¿Qué has estado haciendo durante ese
momento? / ¿Según el primer texto, por qué las personas cambiaron sus hábitos
durante el aislamiento? / ¿Has empezado a hacer algo nuevo? / ¿Has dejado de
hacer algo? / El segundo texto presenta cómo se ha modificado la vida de los
argentinos durante la pandemia. ¿Has vivenciado algún cambio en tu rutina?
¿Cuál? / ¿Qué deseas continuar haciendo después del aislamiento?
Após esse momento inicial de motivação, partiu-se para a leitura do texto principal:
“Coronavirus propicia el experimento de home office más grande de la historia”4. Esse
texto relaciona-se também com as atividades de motivação pela temática da pandemia,
porém já direciona a discussão para o tema da sequência didática: o trabalho. Como apoio
à compreensão do texto, propusemos as perguntas a seguir, ilustradas em (2).
(2) ¿Cómo la cuarentena cambió el trabajo de las personas? / Según el texto, ¿por
qué el teletrabajo no era bien visto? / ¿Estás trabajando o conoces a alguien que
está teletrabajando durante la pandemia? / ¿Cómo es esa experiencia? / ¿Cuáles
son las ventajas y desventajas de trabajar desde casa?
(1) ¿Es importante tener un buen currículo? ¿Por qué? / ¿Cuáles son los elementos
fundamentales en la construcción del currículo? / ¿Y cuáles son los elementos
que debemos evitar al hacer un currículo? /¿Podemos tener nuestro currículo en
cuáles plataformas en línea?
Com isso, os alunos foram capazes de criar os seus próprios currículos, utilizando
o conhecido adquirido, fosse acerca do gênero textual ou do conteúdo linguístico em
espanhol. Assim, esse gênero permitia o uso de estruturas linguísticas aprendidas não só
na unidade em questão, mas também nos semestres anteriores.
Além disso, propusemos outra atividade assíncrona: a criação de uma carta de
apresentação. Como material de apoio a essa produção, foi disponibilizado aos alunos o
acesso ao vídeo intitulado “Cómo hacer una BUENA CARTA de PRESENTACIÓN para
un TRABAJO FÁCIL Y RÁPIDO !!! MÉTODO”3 e, junto a ele, as seguintes perguntas de
compreensão oral, ilustradas em (4):
(3) ¿Te parece interesante hacer una carta de presentación? ¿Por qué? / ¿Cuáles
elementos son fundamentales en la construcción de la carta de presentación? /
¿Por qué crees que en Brasil todavía no tenemos la carta de presentación como
elemento común en nuestras selecciones?
Depois, realizamos a leitura do texto principal dessa aula: “¿Qué es lo más raro que te
ha pasado en una entrevista de trabajo?”5. Aqui, buscamos abordar a experiência pessoal
dos alunos em entrevistas de emprego, já os direcionando às propostas das atividades
assíncronas. Para nortear a exposição sobre essas experiências, propusemos as perguntas
abaixo, ilustradas em (7).
(7) ¿Cuál fue tu mejor entrevista de trabajo? ¿Y la peor? / ¿Cuál fue la pregunta
más inesperada que ya te han hecho? / Los relatos son ejemplos de entrevistas
de trabajo que no salieron como esperado ¿Alguna vez has vivenciado alguna
situación rara en una entrevista?
(8) ¿Cuál es el ambiente apropiado para la grabación? / ¿En cuál etapa debes invertir
más tiempo? ¿Por qué? / ¿Cómo nuestro videocurriculum puede llegar a diferentes
y diversos lugares?
(9) ¿Piensas que es necesario hacer un video currículo? ¿Por qué? / ¿Cuáles elementos
no deben faltar en tu video currículo?
na interação. Para isso, foi necessário, mais uma vez, introduzir os discentes a esse novo
gênero textual, a partir do texto “Entrevista”8, junto a um exemplo, com o vídeo “Buen
ejemplo: Puesto de trabajo y empresa”9.
Assim, apresentamos a seguinte proposta de atividade assíncrona, visando, por fim,
aplicar todo o conhecimento adquirido e aprimorado ao longo da sequência.
Grabar, en parejas, una entrevista de empleo en la que uno sea el reclutador y el otro, el
candidato. Utilizar, como apoyo, el currículo de la clase pasada.
Instrucciones generales para la entrevista:
Discussão
social e pessoal. Nas assíncronas, com exceção de um ou dois alunos de cada turma,
tivemos um bom quantitativo nas quatro atividades.
Foram nessas últimas que conseguimos perceber os principais resultados da nossa
sequência. A maioria dos alunos realizaram-nas de uma excelente maneira, seguindo
as orientações das atividades propostas e, principalmente, adequando-se aos gêneros
exigidos. De maneira geral, todos organizaram formalmente os textos, escritos e orais,
bem alinhados às características de cada um deles.
No currículo, por exemplo, observamos uma tentativa consciente de produzi-
los visualmente da maneira mais profissional e eficiente possível. Além disso, os
alunos conseguiram atingir, tanto nesse quanto na carta de apresentação, o objetivo
sociocomunicativo dos gêneros.
Isso deu-se também nos gêneros orais. É interessante destacar como o vídeo-currículo,
nessa perspectiva, refletiu a personalidade de cada aluno, visto que alguns criaram versões
extremamente criativas, enquanto outros, mais contidos, gravaram vídeos mais formais.
Contudo, isso não os afastou do modelo esperado pelo gênero e nem do grau de seriedade
exigido. Na gravação da entrevista de emprego, refletiu-se esse mesmo padrão: os alunos
prepararam as perguntas e, em alguns casos, usaram, inclusive, roupas adequadas a esse
gênero.
Nota-se que, ainda que tenha sido um processo seletivo fictício, os alunos
conseguiram adaptar-se à formalidade esperada. Essa formalidade apareceu não só na
forma dos gêneros, na maneira de se portar e se organizar visualmente, mas também nas
escolhas linguísticas na língua espanhola. Ainda que tenha sido usual a mescla das formas
de tratamento formais, caracterizadas em sua produção pelo uso do pronome “usted”, e
das informais, caracterizadas em sua produção pelo uso do pronome “tú”, dificuldade
comum na produção de aprendizes desse nível (cf. GOMES & SEBOLD, 2019), é clara a
preocupação em manter o discurso formal em todas as atividades assíncronas propostas.
Além disso, percebemos que o diálogo das atividades assíncronas com as atividades
síncronas foi fundamental no desenvolvimento das capacidades de uso da língua
necessárias às produções dos gêneros de âmbito profissional. Como já havia sido tratado
o tema do home office e de entrevistas de emprego, por exemplo, os alunos puderam
planejar seus textos com os conteúdos comunicativos abordados, além de terem utilizado
as formas verbais adequadas na situação de narrar experiências profissionais passadas.
Percebemos, também, uma recepção positiva dos alunos em relação às atividades
síncronas e assíncronas. Recebemos comentários positivos do quanto essa sequência
Considerações Finais
Referências bibliográficas
COSSON, R. Letramento literário: teoria e prática. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2014.
ABSTRACT
The pandemic has brought challenges never before faced by mankind. When it
comes to education things do not differ. Talking about foreign languages teaching
systems (whether it is an L2 or not), one could say that a pedagogical revolution in
techniques and methodologies happened, in an organic way, first at the praxis level
and then at a theoretical realm. What one can observe from Academic year 2020 -
2021, above all in the case of courses that before Covid-19 were presencial. What’s
been happening cannot even be called Distance Learning and it doesn’t happen in
a blended-learning environment, as some often affirm. This improvised hybrid: the
remote learning mediated by technology imposes new contingencies - and limits
- in a Common European Framework A1 foreign language classroom. Mainly in
literacy learning and teaching in a language with another alphabetic system, such
as Arabic. This is the focus point of this article, then: how this distance education,
mediated through technologies - and imposed on us by the new Coronavirus
pandemic - influences the Arabic language learning process at the literacy level. To
offer a better picture of this scenario, teaching tactics and materials used at class
focused on the development of specific linguistic skills − F.A.L.E., an acronym in
Portuguese for “Fala, Audição, Leitura e Escrita”, in English, “Speech, Listening,
Reading and Writing” − and its tangible qualitative and quantitative results will be
analyzed.
KEYWORDS: Distance learning; literacy; Arabic; A1-level foreign language class.
CAFFARO & FILHO. Al-farrábios da sala de casa: um relato das estratégias de alfabetização remota em língua árabe em
meio à pandemia do covid-19.
Introdução
2. E agora, o que fazer? Elaborar novas estratégias de ensino frente aos desafios
impostos
Sob a orientação da coordenação do CLAC de não postar materiais protegidos por direitos
autorais em sua integralidade no Google Classroom (plataforma escolhida pela UFRJ para sediar
suas aulas online, inclusive as do CLAC), também escolhemos não seguir nenhum método
pronto, disponível na internet, até porque há uma escassez crônica na oferta de materiais de
qualidade no ensino de língua árabe em português brasileiro. Optamos, portanto, em produzir
nosso próprio material didático, usar partes de livros e gramáticas, além de materiais de domínio
público disponíveis na internet. Mas, sobretudo, fazer com que os próprios alunos produzissem,
individual e coletivamente, como parte de suas rotinas de estudo neste período online, seus
próprios alfarrábios de alfabeto, vocabulário e gramática. Para tal fim, três estratégias foram
utilizadas: criamos pastas com os nomes completos de cada aluno, dentro da Google Classroom,
e nelas foram inseridos três documentos, com os seguintes títulos - “Memorial”, do “Banco de
Palavras” e “Caderno de Exercícios - ”. Tais estratégias serão descritas adiante.
Quando essas estratégias já haviam sido iniciadas com o grupo de 7 alunos da turma
inicial, a coordenação do CLAC nos informou a necessidade de fundir as turmas de mesmo
nívelno período online. Sendo assim, as duas turmas de Árabe I foram unificadas, triplicando o
número de alunos. Decidimos, então, manter as mesmas estratégias pedagógicas já delineadas.
No entanto, achamos necessário traçar novamente o perfil dos alunos, tanto os novos, advindos
originalmente da turma fechada de sábado, os meus próprios alunos da turma de sexta que,
agora, eram, de certa forma, pessoas diferentes das que conhecemos em março.
Com o objetivo de conhecer o perfil da turma, formulamos um questionário no Google
Forms intitulado “Conhecendo a turma CLAC Árabe I”. A partir deste perfil diagnóstico,
pôde-se pensar em meios específicos para que este grupo, ao fim de 20 horas/aula, estivesse
alfabetizado. A primeira informação solicitada foi seu perfil etário. Sabe-se, a partir dos estudos
sobre a aprendizagem enquanto processo, que a idade não é um fator determinante, mas é
condicionante da aprendizagem de uma língua estrangeira. Há uma miríade de informação
sobre estratégias e habilidades específicas a serem utilizadas e desenvolvidas, de acordo com
a idade dos aprendentes. Abaixo, a distribuição dos 15 alunos que declararam suas idades:
Apesar de uma clara maioria jovem, 9 alunos dos 20 aos 29 anos, observa-se também
a não desprezível presença de indivíduos mais velhos, 4 alunos dos 30 aos 39. E, em
menor escala, o grupo de 40+ também compunha a classe, com a presença de 2 alunos.
Com este perfil tão variado, impôs-se o uso de meios bem distintos, ao mesmo tempo,
Dos 15 alunos que responderam à pesquisa, a maioria disse ter contato com a cultura
e a língua árabes, 66,7%, ao passo que 33,3% dos alunos não têm contato orgânico com a
língua. Tal diagnóstico foi fundamental para que se incluísse o Tapete Cultural nas aulas,
momento de compartilhamento de dicas culturais, feitas semanalmente pelo monitor e por
alunos voluntários ou designados por ele, os quais compartilhavam conteúdos adaptados
aos interesses da turma, sobre a língua e cultura-alvo. Dentre os interesses mais comuns
citados pelos alunos estão enriquecimento pessoal, profissional, viagens e fins religiosos.
Vale à pena ressaltar que cada aluno pôde citar mais de um interesse ao mesmo tempo, ao
responder à pesquisa:
para cada uma das aulas (AULA I, AULA II, AULA III…), dentro das quais todos os
materiais pedagógicos usados na preparação e na apresentação das aulas síncronas seriam
disponibilizados para consulta dos alunos. Dentro das pastas de cada aula, os alunos também
encontram uma agenda de prazos para entrega das atividades assíncronas, além de arquivos
Google Docs ou Google Forms com exercícios, a serem digitados e/ou manuscritos, de
escuta, vendo ou gravando vídeos, ditados manuscritos ou digitados, ao vivo ou gravados,
e outros. Lá, também foram postados os vídeos das gravações de todas as aulas síncronas e
os slides nos quais as aulas síncronas foram baseadas.
Além disso, dentro das pastas de cada aula, foi também postado um arquivo do Google
Apresentações, com as letras aprendidas a cada aula, para que os alunos vejam as formas
de todas as letras sendo escritas, de forma animada. Essa estratégia visava, em alguma
medida, sanar a falta do quadro negro presente em sala de aula. Esse arquivo estava em
domínio público na internet, coube ao monitor só selecionar que slides referentes a quais
letras seriam disponibilizados e quando, de acordo com o nosso cronograma pedagógico
de alfabetização.
Outro fator positivo desse arquivo de apresentações é que o aluno pode consultar a
qualquer hora e em todas as horas em que fosse necessário escrever manualmente. Essas
apresentações funcionaram melhor do que se o monitor escrevesse em seu caderno e
mostrasse aos alunos pela câmera - devido ao efeito do espelhamento, viam sempre a letra
ao contrário. Além de que o sinal ruim de internet não permitia que eles acompanhassem o
traçar do lápis. O que eles viam, portanto, eram vídeos travados, quase que fotografias de
etapas da escrita das letras. Dessa forma, a mais efetiva das estratégias para demonstrar,
por exemplo, o traçar, o escrever das letras do alfabeto árabe, por onde começar, qual o
sentido seguir, ou quais são as formas isoladas, inicial, medial e final de quais letras, foi a
1 Dentro da pasta “AULA I”, dentro de “Atividades” no Google Classroom CLAC Árabe I.
áudios, músicas e outros, como meios para explorar e comparar as diferenças fonéticas.
Ou páginas de portais de notícia online com diferentes fontes, para reconhecerem as letras
mesmo que com fontes bem diferentes.
Com imaginação e pesquisa, havia muitas maneiras distintas de atingir efetivamente
os alunos, desde modelos ou esquemas gramaticais presentes em outros livros, até
materiais disponíveis online em domínio público, ou aplicativos educacionais como
EdPuzzle, Lingt, MentiMeter, Padlet, Quizlet, Flipgrid e outros.
3. Conclusão
Um período cheio de desafios e limites, mas com muita potência. Essa é uma das
vantagens específicas do ensino remoto, citada recorrentemente pelos alunos. O que
se observa no ano letivo de 2020, sobretudo em cursos que antes da pandemia eram
presenciais, não pode ser caracterizado nem como Ensino à distância (EaD) e nem
como sala de blended learning, com o uso intensivo de tecnologias, intrínseca à prática
pedagógica diária, como oficialmente tem se apregoado.
Esse híbrido improvisado: o ensino remoto mediado por tecnologias impõe novos
desafios - e limites - dentro de sala de aula de língua estrangeira no nível A1 (de acordo
com o European Common Framework), sobretudo, numa classe de alfabetização em
línguas com outros sistemas alfabéticos, como o árabe. O maior desafio agora é entender
como este novo processo de aprendizagem de língua árabe, no nível de alfabetização, se
dá e, depois de analisar as táticas e materiais didáticos usados em sala de aula voltados ao
desenvolvimento de capacidades linguísticas específicas (F.A.L.E. - Fala, Audição, Leitura
e Escrita), conseguir mensurar seus resultados tangíveis, quantitativa e qualitativamente.
Referências bibliográficas
ALLEN, I. E. & SEAMAN, J. Class Differences: Online Education in the United States.
Sloan Consortium. 2010. Disponível em: <https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED529952.
pdf>. Acessadoem 15 out. 2020.
ABSTRACT
Brazil is a country of large ethnic and cultural diversity. Among the various
presences in the territory, we can highlight the refugees. When real testimonies
of the suffering faced by them are shown, the tendency is to feel grief for these
people. With Arab refugees, it couldn’t be different. Assuming that rational and
affection are not dissociated, and, therefore, the learning process mobilizes
affection as much as the intellect, the emergence of such a theme proves to be
useful for the study of the Arabic language, since the subject in question itself
arouses interest by inciting different feelings. Thus, in this article we will discuss
three Arabic Conversation II classes that had the refuge theme as the generating
motto for acquiring vocabulary and structures of the language, including the
participation of a refugee speaking with the class; we will see, in particular, how
the approach to the subject was adapted to remote lessons using the various
technological tools which ensured that different stories were known to students;
and, to conclude, we will show how this strategy enabled the students to relate
to the Arabic language more intimately, since, from then on, they can use it to
reach those people whose misfortune so much touched them.
KEYWORDS: Refugee; Teaching; Arabic language; Empathy; Media.
FRANCISCO & PEREIRA. Empatia e ensino: refúgio como temática para o aprendizado da língua árabe no contexto remoto.
Introdução
A primeira turma de Árabe Conversação II foi criada em 2020.1, tendo suas aulas
interrompidas logo após o primeiro encontro presencial. As atividades foram retomadas
remotamente em agosto, juntamente com todas as outras turmas do CLAC1. Em todas
as aulas – bem como nas atividades assíncronas –, diversos recursos tecnológicos foram
empregados, o que foi indispensável para o melhor aproveitamento2.
O curso de conversação consiste no uso da língua em diversos contextos
comunicativos, colocando em prática estruturas e vocabulários aprendidos até então, bem
como o aprendizado de expressões idiomáticas recorrentes nos dialetos mais conhecidos.
Envolve, pois, o desenvolvimento da Competência Comunicativa, ou seja, saber usar as
estruturas gramaticais e vocabulário sintática e semanticamente corretos e adequados a
cada contexto. Resta, pois, saber os contextos adequados a serem desenvolvidos.
Somos intelecto e afeto e, pensando nisso, o presente trabalho trará que o modo
mais eficaz de se aprender é quando temos o nosso afeto mobilizado juntamente com
nosso intelecto. Para tal, relataremos três aulas síncronas em que a temática tratada foi
a de refúgio e refugiados. A proposta foi feita pela monitora devido à visibilidade do
assunto nos últimos anos. A temática foi recebida com entusiasmo pela turma cujo perfil
é especialmente voltado para questões políticas.
As aulas consistiram nas etapas a seguir:
1ª etapa: discussão oral – em árabe – sobre quem são os refugiados; o que leva uma
pessoa a fugir do seu país; onde está a maior parte dos refugiados árabes; e perfil dos
refugiados no Brasil. Em seguida, a leitura da definição da ACNUR sobre a definição de
refugiado e, por fim, a exibição – e discussão oral – de um vídeo da BBC Árabe sobre a
refugiada síria Salsabil em São Paulo, capital.
2ª etapa: breve exposição sobre o que é o CONARE e como solicitar refúgio no
Brasil. Em seguida, a apresentação dos testemunhos de três refugiados conhecidos pela
monitora e do formulário de solicitação de refúgio.
3ª etapa: conversa com um refugiado árabe egípcio residente no Brasil.
Essas aulas foram particularmente proveitosas para a turma que muito se envolveu e a
retomou em diversos momentos. Por fim, concluiremos com todos os expostos que, quando
o tema da aula de línguas toca os afetos dos alunos, as estruturas aprendidas se fixam melhor.
1 Por questões éticas, os nomes das pessoas envolvidas foram substituídos por nomes fictícios.
2 Na nossa opinião, isso acabará por provar que, quando retornarmos às atividades presenciais, um ensino híbrido
será inevitável.
A competência comunicativa
[...] vai além das regras gramaticais, conhecimento de línguas é o que usamos para
alcançar objetivos comunicativos e o reconhecimento do uso da língua como um processo
dinâmico [...] consiste em conhecimento, competência e capacidade de implementar ou
executar essa competência [comunicativa] apropriadamente em uso comunicativo de
língua em contexto específico (FILHO & FRANCO, 2015, p.9).
Em suma, isso significa que o falante, a partir dos conhecimentos lexicais, morfológicos,
sintáticos e pragmáticos adquiridos sobre aquela língua, elaborará estratégias de discurso,
a fim de contemplar a necessidade comunicativa daquele contexto. Ou seja, elaborará
a melhor maneira para se comunicar o que quer ou que precisa, bem como entender a
resposta do(s) outro(s) interlocutor(es) a partir do que conhece sobre a língua em uso.
Mas, como o estudante de línguas vai adquirir essa competência? Pela exposição à
língua e sua prática contínua. Cabe, pois, ao professor viabilizar os contextos comunicativos
e deixar que os alunos elaborem suas estratégias cognitivas e intrapessoais para responder
às necessidades daquela situação discursiva.
Tal processo migratório foi especialmente intenso em meados do século XIX, quando
os árabes procuraram asilo no Brasil fugindo da violência e miséria consequentes da
ocupação otomana4. A manutenção desse fluxo migratório se manteve ao longo destes
séculos, acentuando-se novamente no início dos anos 2000 devido aos intensos conflitos
no Oriente Médio5.
Ao chegarem no território, os árabes trouxeram consigo seus costumes e crenças, que
foram sendo difundidos e incorporados à cultura brasileira. Tornaram-se conhecidos por
sua culinária, cultura artística, hábitos religiosos diferenciados e ainda, mais recentemente,
foram foco de comentários pela participação de descendentes árabes na política nacional6.
Diante de um cenário nacional com forte participação árabe, bem como a evidência
recente de tais países no contexto internacional, o interesse pelo estudo da língua cresceu.
Aí se encontra, pois, o aluno do CLAC de árabe.
Diante dessa demanda, a formulação do curso de conversação II encarou a
problemática de quais contextos de uso da língua deveriam ser abordados. O processo de
ensino-aprendizagem tende a se basear na aquisição de determinadas competências via
estratégias estritamente cognitivas, num impulso cartesiano de se pensar o conhecimento
(MAGIOLINO, 2013). Por esse modelo, aprender passa a ser a aquisição de informações
segmentadas para uso imediato, sem uma implicação direta no sujeito que é não apenas
intelecto, mas também afeto (SILVA & GOMES, 2017). Pensando no ensino de línguas,
isso significa que o aluno segue o modelo gramatical e vocabular mostrado pelo professor
para o utilizar apenas nas atividades em sala, ou seja, não é afetado pelo que lhe é
apresentado. Como então garantir que os saberes estudados em sala se enraízem na mente
do aluno, num processo de edificação do conhecimento? A resposta é: mobilizando o
afeto, que, segundo Paulo Freire (1999), não se dissocia da cognoscibilidade.
Para saber como tocar o páthos7 da turma, era necessário conhecer o seu perfil.
A turma de Árabe Conversação II era composta por sete alunos, todos especialmente
interessados em política, havendo, inclusive, três estudantes de Relações Internacionais e
um policial militar, o qual se preparava para atuar em missões de paz da ONU no Iêmen e
no norte da África. Ao longo das aulas, todos se mostraram particularmente interessados
na situação dos refugiados árabes cujo êxodo para o Brasil foi ocasionado pelos diversos
chegaram-ao-brasil>.
4 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Disponível em: <https://brasil500anos.ibge.gov.br/
territorio-brasileiro-e-povoamento/arabes/razoes-da-emigracao-arabe>.
5 Idem.
6 Fonte: Idem notas 4 e 5.
7 Palavra grega que pode ser traduzida como afeto; paixão; sofrimento.
8 Apêndice I. Material adaptado sobre a definição trazida pelo ACNUR. Disponível na íntegra em: <https://www.
unhcr.org/ar/4be7cc274c9.html>.
exposta numa rua no Brasil?”9. Tratava-se de um vídeo breve, em árabe, sobre uma
refugiada síria, chamada Salsabil, que participou de um projeto junto a uma fotógrafa,
tendo uma foto sua exposta no centro da cidade de São Paulo. O objetivo desse projeto era
fazer as pessoas se desligarem de seus afazeres corridos para prestarem atenção nas pessoas
à sua volta. No vídeo, a moça conta sua história e fala sobre a família, sua formação e
vida profissional. Discutimos o vídeo e, assim, pudemos exercitar um vocabulário básico,
a fim de que a temática passasse a ser a própria Salsabil.
Na aula síncrona seguinte, foi apresentado brevemente o CONARE10 e os meios legais
pela legislação brasileira para a solicitação de refúgio. Em seguida, lemos as histórias de
três refugiados residentes no Brasil11. Exploramos vocabulário e estruturas gramaticais,
e traduzimos suas histórias. Por fim, foi disponibilizado um formulário12, adaptado ao
modelo daquele utilizado pelo governo brasileiro, a fim de que os alunos o preenchessem
com as informações de um testemunho de sua escolha. O preenchimento foi feito como
atividade assíncrona, mas a leitura do documento foi feita ao final da aula síncrona. O
formulário fora vertido previamente ao árabe usando o vocabulário exercitado até então,
com palavras de cunho sociológico, humanitário e político.
Já na terceira aula síncrona, convidamos o egípcio A. para falar à turma. A. se
apresentou, contou-nos sua história e respondeu gentilmente às perguntas feitas pelos
alunos. Foi o ápice das atividades envolvendo a temática. Relacionaram-se, ainda que
virtualmente, e em árabe, com alguém cujo contexto sócio-humanitário havia sido até então
tratado na teoria, apenas. A discussão ganhou um rosto, uma voz e uma personalidade.
E os alunos, extasiados pela oportunidade, esforçaram-se ao máximo para se comunicar.
Atentaram-se à pronúncia, ao vocabulário e à construção das frases de forma coesa e
coerente. Repetiram as perguntas quando necessário, reformulavam-nas quando não eram
compreendidos, buscavam sinônimos quando não sabiam a palavra exata e recorriam,
inclusive, a gestos em última instância, numa entusiástica tentativa de interagir.
Assim, encerramos não o assunto, mas o trato direto à temática, que depois passou
a ser tratada de maneira diluída, sendo aludida com frequência nas aulas posteriores. Os
alunos passaram a utilizar a experiência como referência para se lembrarem de certos
Conclusão
Apêndice I
؟ئجاللا وه نم
ي َ ضرعتلا نم رربم فوخت ببسب هتيسنج ةلود جراخ دجوي صخش لك هنأ ىلع ئجال فَّر
ُ ع
ةيعامتجا ةئف ةيوضعل هئامتنا وأ هتيسنج وأ هنيد وأ هقرع ىلإ عجرت بابسأل داهطضالل
عازنللو برحلا راثآل ضرعتلا وأ ناسنالا قوقح كاهتنا وأ ةيسايسلا هئارآ وأ ةنيعم
فينعلا.
Quem é o refugiado?
É considerado refugiado todas as pessoas que precisam sair de seu país de origem
por causa de um medo real da exposição a perseguição por razões relacionadas a: sua
etnia, religião, nacionalidade, pertencimento a um grupo social específico, visão política,
violação de direitos humanos e exposição aos efeitos da guerra e de conflitos violentos
(conflito armado).
Apêndice II
ةيصخشلا ةذبنلا
قارعلا نم انأو دمحأ لاجاك يمسا/ناتسدرك. يف لصوملا ةنيدم يف تدلو انأ20 ربمفون
ماع يف1993 ةكرش يف ًةسدنهم لمعأ تنك كانهو اهيف اهلك يتايح تشعو. نيرهش لبق،
تضّرعت ُ ق نم باصتغاللو فاطتخالل ِ قارعلا يف ةيمالسالا ةلودلا( شعادلا ميظنت لب
صوصخ نييديزيلل ريطخ يقارعلا ناتسدرك كلذ ىلإ ةفاضإلاب برحلا لالخ )ماشلاو ً ا.
تعطتسا نكلو ليزاربلا يف لهأ يل سيل ُ يل مّدق يكيلوثاك ريد دوهج لضفب هيلإ لوصولا
ناريط ةركذت.
ءوجللا سمتلأ يتلا ىلوألا ةّرملا هذه.
لصوملا يف يناوخإو يبأو يمأ.
Perfil Pessoal
Meu nome é Kajal Ahmed e sou do Iraque/Curdistão. Eu nasci na cidade de Mossul,
em 20/11/1993, onde vivi minha vida toda e lá trabalhava como engenheira em uma
companhia. Há dois meses fui sequestrada e estuprada (lit.: exposta ao sequestro e ao
estupro) pelo grupo ISIS durante a guerra e juntamente a isso o Curdistão Iraquiano é
perigoso para os Yazidis especialmente.
Não tenho família no Brasil, mas consegui acesso a ele graças aos esforços de um
mosteiro católico que me deu uma passagem aérea.
Essa é a primeira vez que solicito refúgio.
Minha mãe, meu pai e meus dois irmãos estão em Mossul.
Apêndice III
ةيصخشلا ةذبنلا
ايروس نم ملسم انأو روصنم دمحأ يمسا. يف قشمد ةنيدم يف تدلو10 ماع يف رياني1990.
فصقلل قشمد بونج ضّرعت امدنع برحلا ةيادب ىتح كانه شيعأ تنكو بساحم يتنهم تناك
ماع يف ليربأ رهش يف خيراوصلاب2018. ءوجللا يبلاط يتلئاعو انأ انحبصأ كلذ دعب
ةنسلا سفن يف نيئجاللا قئاثو انملتساو ةرهاقلا يف.
رصم يف جلاعتأ نأ عيطتسأ الو زديإلاب باصم انأو سنجلا يلثم يننأ ًةفاضإ.
هيلإ لوصولا ىلع يندعاستس ةيليزارب ةقيدص نكلو ليزاربلا يف لهأ يل سيل.
ةرهاقلا يف يخأو يبأو يمأ.
Perfil Pessoal
Meu nome é Ahmad Mansour e sou um muçulmano sírio. Nasci na cidade de
Damasco em 10/01/1990. Minha profissão era de contador e trabalhava lá até o início
da guerra quando o sul de Damasco foi bombardeado (lit.: exposto ao bombardeio com
mísseis) no mês de abril do ano de 2018. Depois disso, eu e minha família nos tornamos
solicitantes de refúgio no Cairo e retiramos nossos documentos de refugiados no mesmo
ano.
Juntamente, sou homossexual e tenho AIDS e não consigo me tratar no Egito.
Não tenho família no Brasil, mas uma amiga brasileira me ajudará.
Minha mãe, meu pai e meu irmão estão no Cairo.
Apêndice IV
ةيصخشلا ةذبنلا
نميلا نم ملسم انأو راجن دمحم يمسا. يف زعت ةنيدم يف تدلو3 ماع يف رياربف1992.تناك
رجات يتنهم. ةيئادتبالا ةسردملا يف طقف تسرد. راصح يف اهنكل زعت يف شيعأ تنكو
يدلب اومكحي نأ ديري يذلا يثوحلا ميظنت نم. موي لك لافطألا دض صنقي. ةركذت تيرتشا
ةيدودحلا ةرجهلا ةئيه هيلإ يلوخد تضفر نكلو ادنك ىلا ناريط. ليزاربلا يف لهأ يل سيل
تعطتسا نكلو ُ ةركذت ينتطعأ يتلا ةيدودحلا ةرجهلا ةئيه ةدعاسم لضفب هيلإ لوصولا
ليزاربلا ىلا ناريط.
ءاعنص يف يتنبو ينباو يتجوز.
Perfil Pessoal
Meu nome é Mohammed Najjar e sou muçulmano do Yemen. Nasci na cidade de
Taz em 03/02/1992. Meu trabalho era comerciante. Estudei apenas na escola primária.
Eu vivia em Taz mas ela foi sitiada pelo grupo Al-Huthi que quer governar meu país.
Eles atiram contra crianças todos os dias. Comprei uma passagem aérea ao Canadá, mas
a autoridade migratória da fronteira recusou minha entrada. Não tenho família no Brasil,
mas consegui acesso a ele graças à ajuda autoridade migratória da fronteira que me deu
uma passagem aérea para o Brasil.
Minha esposa, meu filho e minha filha estão em Sanaa.
Apêndice V
Formulário ةرامتسالا
Nome مسالا
Sexo سنجلا
Nacionalidade نطولا / ةيسنجلا
Data de Nascimento داليملا خيرات
Religião ةنايدلا
Ocupação Profissional ةنهملا
Você foi vítima de violação de Direitos Humanos ؟ناسنإلا قوقح كاهتنال تضّرعت له
( ) الnão ( ) معنsim
ي
ُ بلط ىلإو كدلب ةرداغم ىلإ كتعفد يتلا بابسألاب رابخإلا ىجر
ليزاربلا يف ءوجللا
Por favor, informe as razões que o motivaram a sair seu país de origem para buscar asilo no
Brasil
O presente trabalho tem como objetivo discutir a noção de oficina a partir de uma análise histórico-
crítica. O estudo do termo tem como finalidade aprofundar o entendimento acerca das oficinas de
escrita criativa desenvolvidas pelo Grupo de Educação Multimídia (GEM), com foco nas atividades
realizadas no curso CLACquete – Práticas Audiovisuais, que teve como objetivo orientar os monitores
do Curso de Línguas Aberto à Comunidade (CLAC) sobre o uso crítico de ferramentas digitais para
atividades letivas. O CLACquete desenvolve oficinas produtivas de transposição de linguagem,
operando “traduções intersemióticas” (JAKOBSON, 2010) da literatura para o audiovisual, a partir
da articulação entre referências teóricas e técnicas com uma orientação histórico-crítica. O curso
utiliza-se da acumulação metodológica e dos princípios do GEM sobre politecnia (SAVIANI, 2007),
trabalho coletivo e interdisciplinaridade para o desenvolvimento de metodologias participativas de
ensino-aprendizagem para o ensino em ambiente remoto e com recursos digitais limitados. As
oficinas do GEM utilizam-se da organização coletiva do trabalho produtivo, articulando as diversas
linguagens aos interesses dos participantes. Com isso em mente, o objetivo do presente trabalho
é realizar uma análise histórico-crítica acerca de conceitos sobre oficina sob as perspectivas de
Sennett (2009); Pistrak (2011); Oulipo (ALENCAR; MORAES, 2005). Por fim, o objetivo central
desta pesquisa é investigar como o conceito de oficina de escrita tem sido abordado no CLACquete,
tomando como referência outras propostas de abordagens ativas que desconsideram a perspectiva
histórico-crítica.
PALAVRAS-CHAVE: Oficinas; Escrita; Politecnia.
ABSTRACT
The objective of this paper is to discuss the notion of workshop from a historical-critical analysis.
The study of the term has the finality of deepening the understanding about writing workshops
developed on Grupo de EducaçãoMultimídia (GEM), with the focus on the activities that were
developed on the course CLACquete – PráticasAudiovisuais. The objective of this course was to
orient the monitors from the Curso de LínguasAberto à Comunidade (CLAC) – Language course
opened to the community – about the critical use of digital tools on academic activities. CLACquete
develops productive workshops of language transposition operating on intersemiotic translations
(JAKOBSON, 2010) from literature to the audiovisual starting from the articulation between theoretical
and technical references with a historical-critical orientation. The course uses the methodological
accumulation and the principles of GEM regarding polytechnic (SAVIANI, 2007), the collective work
and the interdisciplinarity for the development of participative methodologies of teach-learning for
the teaching in a remote environment and with the limited digital resources. The GEM workshops
draw on the collective organization of productive work, articulating the diverse languages and the
interest of the participants. With this in mind, the objective of this work is to achieve a historical-
critical analysis about the concepts of workshop under the perspectives of Sennett (2009); Pistrak
(2011); Oulipo (ALENCAR; MORAES, 2005). To conclude, the central objective of this research is
to investigate how the concept of writing workshop has been approached on CLACquete, taking
as reference other proposals of active approaches that disregard the historical-critical perspective.
KEYWORDS: Workshops; Writing; Polytechnic.
GOMES; ALMEIDA & MAIA. Uma análise histórico-crítica de oficinas de escrita a partir do clacquete - práticas audiovi-
suais.
Introdução
O objetivo deste artigo é pensar e discutir, por meio de uma análise histórico-
crítica, o conceito sobre oficina a partir das perspectivas de três diferentes estudiosos,
sendo eles Richard Sennett (2009); M. M. Pistrak (2011); e a proposta de Oulipo, de
2005, que trazem distintos pontos de vista acerca das diferentes formas de oficina. Em
“O Artífice” (2009), Richard Sennett traça a concepção de oficina a partir da ideia do
aprendizado pela experiência, vinda da escola pragmatista americana. Em contrapartida,
em “Fundamentos da Escola do Trabalho”, de 1924, Moisey Pistrak traz o conceito de
oficina como a educação pelo trabalho dentro da politecnia, advinda da experiência do
período de formação cultural da União Soviética, que possui então um objetivo social
de educar por meio do trabalho coletivo, auto-organizado e crítico. No contexto pós-
surrealista, surge a oficina do Ouvroir de la Littérature Potentielle (OULIPO) com seu
caráter experimental e seu estímulo à criatividade e à autonomia das formas estéticas
sobre o mundo, a partir de um ponto de vista estruturalista.
A proposta de pesquisa surgiu a partir de experiências acumuladas no
desenvolvimento e realização de oficinas produtivas com foco em linguagens produzidas
através de parcerias entre o Grupo de Educação Multimídia (GEM/UFRJ) e instituições
educativas. A demanda por essas ações tem como origem o impasse de leitores na cultura
de massa, que tem feito com que haja uma diminuição considerável na leitura e escrita dos
alunos nas escolas e, consequentemente, que haja uma menor criticidade por parte desses
indivíduos. Desenvolver esta pesquisa e se aprofundar nas bases teóricas do conceito de
oficina é instrumento importante para o GEM e seu objetivo de desenvolver e difundir
metodologias de ensino para a formação de sujeitos críticos e criativos.
Com isso em mente, após a análise das três perspectivas, faremos uma análise mais
aprofundada em relação às oficinas de escrita criativa do GEM, tendo como objeto de
análise o curso CLACquete e o processo de escrita em suas oficinas realizadas em 2020.
As oficinas
Richard Sennett e sua oficina como aprendizado pela atividade
O movimento pragmático, que surgiu no fim do século XIX, busca “conferir sentido
filosófico à experiência concreta” (SENNETT, 2009, p. 319), ou seja, atrela a filosofia às
práticas e experiências humanas.
O GEM
O Projeto
Princípios e metodologia
Oficinas do Travessias
As oficinas são processos coletivos que possuem tempo e espaço limitado, o que
permite a geração de um produto e de um processo experimentado e sistematizado. O
objetivo do uso da tradução intersemiótica em processos coletivos e politécnicos é o de
estimular que os participantes explorem os potenciais presentes nas diferentes linguagens,
e, consequentemente, apropriem-se e desvendem o processo de leitura e escrita.
A oficina que será analisada advém do projeto Travessias e segue os mesmos
princípios e fundamentos presentes não só nele, mas também no GEM, como será visto
no próximo tópico.
Oficinas
As oficinas têm sido o meio pelo qual o GEM pesquisa, desenvolve e compartilha
sua metodologia para o ensino de linguagens. O caráter coletivo, restrito e prático desse
tipo de atividade associado ao trabalho com traduções intersemióticas e transcriações,
com o uso de tecnologias para expandir as possibilidades e criar engajamento, permite a
formação de sujeitos críticos e autônomos.
Assim como as oficinas medievais descritas por Sennett (2009), o laboratório é
um espaço de produção coletiva e transferência de conhecimentos através do trabalho.
Em ambos os contextos, a atividade produtiva está atrelada ao exercício e à prática do
pensamento, das noções necessárias para a execução. Porém, o compromisso com a
formação de uma consciência crítica nos sujeitos envolvidos nas oficinas do GEM supera
o pensar e saber fazer das oficinas de Sennett, ao estimular o pensar também sobre as
relações, interesses e estruturas que compõem o processo de fazer algo.
As oficinas escolares idealizadas pelo projeto pedagógico de Pistrak no contexto da
URSS têm a politecnia como um de seus princípios. O foco desta proposta é a formação
de sujeitos técnicos que desenvolvem suas habilidades técnicas e sua consciência crítica
mediante processo histórico-crítico. Ainda que tenha pontos de convergência com o
trabalho produzido pelo GEM, é fundamental destacar que o laboratório se compromete
a produzir metodologias para a formação de sujeitos críticos que, ao ingressar como
trabalhadores em funções produtivas, não assumam uma posição alienada e passiva. A
divergência, pois, entre as duas visões não está nas bases que fundamentam o processo,
mas, sim, no que esse visa a produzir. Ademais, é fundamental destacar que as duas visões
apresentadas divergem na questão da formação de indivíduos conscientes e críticos por
meio de um processo histórico-crítico, característica que não está presente nas oficinas de
Sennett, mas sim no projeto de Pistrak.
É no ato de desvendar as tramas que formam as diferentes linguagens trabalhadas
nas oficinas que o sujeito se forma enquanto autônomo e é na libertação da linguagem
que o processo criativo é desmistificado e as potencialidades da literatura são reveladas e
popularizadas. Posto isso, as oficinas do Oulipo são referência para o GEM por trazerem
a ideia de experimentação a partir da reprodução e releitura de textos, não de forma
automática e inconsciente, mas de forma consciente e crítica como um meio de libertação
do sujeito. Por isso, o conceito de contraintes é usado nas oficinas do GEM, como uma
forma de libertar o processo de produção de um texto literário ou audiovisual de seu uso
rotineiro, abrindo portas para novas perspectivas que são intrínsecas à forma.Entretanto,
assim como nas outras oficinas, a do Oulipo distancia-se um pouco das realizadas pelo
GEM por também não trazer uma perspectiva histórico-crítica no processo de reelaboração
de textos e por não explorar perspectivas transdisciplinares.
Como parte das oficinas do GEM, o CLACquete foi pensado a partir de três
conceitos: o da educação para e pelo trabalho, presente nas oficinas de Sennett e no
projeto pedagógico de Pistrak; o da experimentação e da restrição, presentes nas oficinas
de Oulipo; e o do direito à palavra, também presente em Oulipo. Esses conceitos estão
associados à noção de tradução intersemiótica, dada por Jakobson, que é também uma
parte integrante das oficinas.
Com isso em mente, as etapas das duas oficinas realizadas no CLACquete foram
pensadas de forma que fossem trabalhados todos os conceitos ao longo do processo, com
Conclusão
Referências Bibliográficas
DISTANCIAMENTO SOCIAL
ABSTRACT
The purpose of this paper is divided into two complementary parts. Initially, we seek
to discuss the impressions regarding the CLAC project’s initiative to adopt the remote
modality during the quarantine months. In terms of interaction, the experience brought
numerous adaptations to the new perspectives in the teaching-learning process of
foreign languages. In the second instance, the article deals with the consequent
methodological choices made by observing the development of classes in one of
the Italian classes of the project. The focus here, therefore, will be on the decision
to apply the active methodology of flipped learning (cf. BERGMANN; SAMS, 2014)
as a core strategy when rethinking the classroom and its respective attributions, in
addition to giving value to the method, given its great functionality and contributions
, especially in this period in which objectivity, organization and instructive incentive to
autonomy by the teacher are crucial to maintain class participation and performance.
KEYWORDS: Remote education; inverted teaching; active methodology; autonomy.
FILHO & LACERDA. Aprendizagem invertida: reflexões sobre o uso e aplicabilidade da metodologia ativa em tempos de distan-
ciamentos social.
Introdução
É inegável que, mais do que nunca, a cultura digital tornou-se aliada imprescindível
da educação a partir dos transtornos trazidos pela pandemia do novo coronavírus, a qual
forçou a migração dos protagonistas das salas de aulas às plataformas virtuais de maneira
repentina e, em muitos casos, despreparada. O aporte teórico que a comunidade científica
compartilha até então sobre docência e práticas de ensino raramente se volta às discussões
em torno da modalidade de ensino remoto ou do uso de recursos tecnológicos e ferramen-
tas online como parte integrante da relação ensino-aprendizagem. Isso ocorre, pois, sendo
uma modalidade teoricamente recente, o ensino remoto tenha sido estereotipado como
inferior ao presencial, por acreditar-se que o aproveitamento não é o mesmo que se tem
em modalidade presencial, seja por motivos como falta de disciplina, seja pela ausência
do contato direto com o professor e colegas de classe.
Com a popularização dos dispositivos informáticos em rede, é possível desenvolver
novas estratégias interativas e imersivas de ensino-aprendizado de línguas estrangeiras.
Há inúmeros ambientes do ciberespaço que disponibilizam incontáveis acervos audiovi-
suais certificados por organismos oficiais. Neste momento, a sala de aula e suas metodo-
logias precisaram ser repensadas, incluindo todo este aparato digital, levando em conta os
princípios de interação deste âmbito, tendo em vista a produção de conhecimento acadê-
mico em paralelo à reformulação dos modelos de ensino até aqui conhecidos.
A práxis docente, certamente, requer movimento em diversos aspectos. O professor,
no seu exercício, se torna um colaborador ativo na trajetória de cada um de seus alunos
e precisa estar em constante cinesia tanto dentro quanto fora de sala de aula: ele observa,
se atualiza e insere aquilo que é funcional e relevante para o desenrolar das suas aulas.
A pandemia do novo coronavírus reduziu o movimento físico, cessou por alguns meses
os andares entre as carteiras e a linguagem corporal ficou mais escassa. O pensamento,
contudo, teve que se reinventar ainda mais, buscando outros meios metodológicos que
preenchessem as lacunas deixadas pela falta de preparação ao enfrentar o novo.
Foi implementada a experimentação de novas práticas na tentativa de entregar aulas
de língua que fossem minimamente próximas daquilo que é oferecido no ensino pre-
sencial. Entretanto, o grande abismo interacional instaurado por peculiaridades, como
a demora na resposta e/ou ausência da imagem de alguns alunos devido a conexão com
internet de baixa qualidade, ou por outras razões, acarretaram na defasagem principal-
mente na relação aluno-aluno durante os encontros síncronos. Diante disso, a solução para
amenizar tal conflito foi procurar por uma metodologia que incentivasse a autonomia de
cada um dos alunos de modo que se empenhassem, através da pesquisa e da descoberta,
nos conteúdos determinados pelo professor.
As considerações que serão feitas posteriormente seguem uma abordagem descriti-
vo-qualitativa e dizem respeito a uma metodologia que, por disposição e boa recepção de
ambas as partes − docente e discente − se mostrou muito funcional. Tal aplicabilidade, no
entanto, não é assegurada em todos os casos. Fatores internos − determinação, concen-
tração − e externos − acessibilidade, administração do tempo − pertinentes especialmente
aos alunos, são variáveis indispensáveis na consolidação da estratégia perfilhada.
A palavra método advém do grego méthodos, uma composição de meta, que inter-
preta-se como “ordem” e hodós, que denota “caminho”. Isso quer dizer que sua concep-
ção está ligada à decisão por um determinado caminho conjuntamente a uma ação orde-
nada por princípios, a fim de atingir fins e resultados específicos.
A literatura científica confere à concepção de método a ideia de “um conjunto de
etapas, ordenadamente dispostas, a serem vencidas na investigação da verdade, no estudo
da ciência, ou para um determinado fim”. (cf. Rampazzo, 2002, p.13 apud Vilaça, 2008,
p. 75). Ele é, de acordo com Balboni (2012), uma sucessão de procedimentos instru-
mentalizados e ordenados a serem seguidos de maneira linear, construídos com base em
objetivos pré-estabelecidos:
1 Il metodo è la traduzione dell’approccio in procedure operative, per mezzo delle quali organizzare e realizzare
le indicazioni dell’approccio stesso. Il metodo si occupa quindi di strumenti di organizzazione dell’educazione
linguistica. Può essere adeguato o inadeguato, coerente o incoerente.
Viver em tempos de pandemia não tem sido uma tarefa fácil. No campo da educação,
vários desafios surgiram quase que de repente, promovendo mudanças drásticas na rela-
ção e contato entre professor e aluno.
Uma das medidas acordadas pelo projeto CLAC2 e seus monitores, antes mesmo do
período remoto se iniciar, foi a reorganização da carga horária semanal de todos os cursos
de línguas. As horas de aula seriam, então, distribuídas entre encontros síncronos e assín-
cronos, de modo a tentar refrear a desmotivação e a possível evasão dos alunos.
Os desafios que enfrentaríamos estavam, de certa forma, fora do nosso campo de
visão, já que nunca havíamos adotado a modalidade remota nos cursos e nem todos esta-
vam equipados adequadamente para exercer a monitoria. Tudo foi definido e preparado
com agilidade, desde a formação didática dos monitores, treinamentos no uso de algumas
ferramentas digitais, até a adaptação de alunos às plataformas que serviriam como salas
de aula virtuais, de modo a não perder também o segundo semestre de 2020.
Questões como planejamento, material didático, uso de ferramentas complementa-
res e avaliação não se mostraram preocupantes. Entretanto, a dúvida sobre qual seria a
metodologia ideal para um contexto atípico como esse se tornou uma grande interrogação
poucos dias antes do início do semestre. A princípio, a iniciativa foi fazer uma sondagem
do perfil da turma, e a partir daí definir as estratégias metodológicas.
Composta por um total de 13 alunos, a turma se mostrou bastante heterogênea em
termos de nível, idade e objetivos. Alguns haviam retornado ao curso após um intervalo
de dois anos, outros admitiram não terem tido o aproveitamento esperado no nível ante-
rior e, por isso, ainda encontravam bastante dificuldades em certos tópicos já estudados.
Nos encontros de orientação, foi decidido que a distribuição da aula de aproxima-
damente quatro horas seguidas teria o seguinte formato: as três primeiras horas seriam
reservadas para o encontro assíncrono, no qual materiais autorais ou não seriam disponi-
bilizados e uma espécie de consultoria seria aberta para resolução de dúvidas durante a
realização das atividades propostas. O encontro síncrono aconteceria no final, com uma
hora de duração e, neste espaço, se investiria no aperfeiçoamento da competência oral/
auditiva dos alunos.
Coincidentemente, a ordem na atribuição e realização das tarefas já seguia aquilo
que posteriormente se elegeria como a metodologia mais adequada para o processo de
ensino-aprendizagem da turma em questão. Outros princípios regentes pertinentes a tal
estratégia foram acoplados gradualmente.
Os sujeitos envolvidos nas atuais circunstâncias estão sendo provocados por uma
nova relação com o conhecimento, em que, por ambas as partes, se percebe a necessidade
2 CLAC - Cursos de Línguas Abertos à Comunidade. Projeto de extensão da Faculdade de Letras da UFRJ, no
qual seus alunos de graduação, das diversas habilitações, atuam como monitores bolsistas de língua.
Embora muitas vezes definido de forma simplista como “trabalho escolar em casa
e trabalho de casa na escola’’, o Flipped Learning é uma metodologia ativa que permite
aos professores implementar outras metodologias, em suas salas de aula. O aprendizado
invertido parte do movimento da instrução direta do espaço de aprendizagem do grupo ao
espaço de aprendizagem individual, enquanto o primeiro é transformado em um ambiente
dinâmico e interativo de aprendizagem onde o educador orienta os alunos à medida que
aplicam conceitos e se envolvem criativamente no assunto discutido.
A metodologia começou a ser implementada no ensino básico entre os anos de 2006
e 2007, na escola Woodland Park, no Colorado, Estados Unidos e teve como idealiza-
dores os professores Jonathan Bergmann e Aaron Sams. Os docentes, que compunham
a equipe de química da instituição, buscavam alternativas para seus alunos que estavam
frequentemente ausentes em suas aulas devido ao fato de a escola se localizar em um lu-
gar de difícil acesso. Os alunos perdiam tempo demais com o trajeto.
Assim, Bergmann e Sams inspiraram-se na prática já existente de gravações de au-
las do tipo screencasting, fazendo, assim, com que os alunos que precisassem tivessem
acesso aos conteúdos, a qualquer momento e em qualquer lugar. No entanto, o que se pôde
notar foi que o acesso aos conteúdos gravados era total: todos os alunos passaram a consu-
mir os conteúdos em formato audiovisual e o impacto, durante a aula, era muito positivo.
A inversão da sala de aula e consequentemente da ordem tradicional no processo de
ensino-aprendizagem se dá também por dois questionamentos: “Qual o valor do tempo
da aula presencial se o aluno pode acessar facilmente o conteúdo mesmo sem estar em
sala e para que realmente os alunos precisam de um professor presente fisicamente?” (cf.
Bergmann; Sams, 2014, p. 10). Por fim, logo começaram a experimentar as práticas do
Bergmann & Sams (2014) utilizam vídeos em sala de aula como ferramenta didática,
no entanto, muitos adeptos à metodologia não utilizam vídeos como aparato didático. Ou
seja, o que importa para aplicá-la é adotar ferramentas tecnológicas e o ensino assíncrono
com uma abordagem voltada para o aluno, visando criar um ambiente estimulante à curio-
sidade, já que a metodologia é replicável, escalável e personalizável para cada professor.
Portanto, o Flipped Classroom não define ferramentas ou aparatos obrigatórios e
deixa a cargo do professor encontrar meios para inovar e aplicar os conceitos da “sala de
aula invertida”, buscando estimular os alunos a terem uma melhor experiência durante o
processo de aprendizagem. Entretanto, alguns princípios devem ser levados em conta du-
rante seu funcionamento, os quais formam a sigla FLIP: Flexible Environment, Learning
Culture, Intentional Content e Professional Educator (cf. Bergmann; Sams, 2014, p. 19).
O ambiente flexível (Flexible environment) diz respeito à criação de um espaço de
flexibilidade tanto para o professor quanto para o aluno. Permite ao docente aderir a uma
ampla variedade de modelos de ensino, e aos alunos permite rearranjar seu próprio tempo,
3 No original: Flipped learning isn’t a set process; It allows for many expressions of the model. There is no
single strategy that works in every class-room, for every teacher, and for each student. However. flipped learning
is adaptable to your style, methods, and circumstances. Each teacher can personalize their version of flipped
learning for their students. It also allows teachers to play to their individual strengths as educators. However,
there are some key components of all successful flipped learning environments.
Considerações finais
Este artigo, de modo geral, versou sobre os aspectos gerais da metodologia ativa
de aprendizagem invertida proposta por Bergmann e Sams (2014) e sua implementação,
entendida, nesta pesquisa, como uma estratégia de ensino híbrido que possibilita mais
autonomia ao aluno e flexibilidade didática ao professor.
Assim, acompanhando os objetivos estabelecidos, primeiramente foram apresenta-
das posições teóricas sobre o conceito de método, de forma a situar o leitor historicamente
nos diferentes tratamentos dados ao assunto e também para propiciar condições para que
se pudesse estabelecer um panorama comparativo em relação ao que consiste uma meto-
dologia ativa, em especial o ensino invertido. Para tanto foram feitas algumas considera-
ções sobre a era pós-método, período que levou a grandes mudanças na ideia de busca por
um método de ensino-aprendizagem perfeito.
Posteriormente, uma discussão foi levantada sobre os desafios enfrentados na edu-
cação durante o período de pandemia e quais seriam as metodologias ideais para um pe-
ríodo tão atípico como esse, em que as ferramentas virtuais se apresentaram como parte
indispensável da prática docente.
Diante disso, estrutura e princípios da metodologia ativa da aprendizagem inverti-
da foram formalmente elencados, assim como a experiência de sua aplicação, durante o
período remoto, em uma turma de italiano do projeto CLAC, expondo seus aspectos prá-
ticos em linhas gerais. Pode-se concluir que suas contribuições são muitas, pois acelera
o aprendizado por meio da absorção de conceitos em materiais retilíneos e intencionais,
flexibiliza os estudos pela otimização do tempo, promove mais precisão na performance
durante o encontro síncrono e favorece ainda mais a adesão do aluno devido ao protago-
nismo no seu próprio processo.
Com isso, para fins de conclusão, espera-se que o modelo metodológico sirva como
inspiração para os monitores de línguas estrangeiras do projeto CLAC, assim como para
quaisquer educadores que tenham contato com este artigo, ao elaborar seus projetos de
aplicação da sala de aula invertida.
Referências bibliográficas
_______. Flip Your Classroom: Reach Every Student in Every Class Every Day.
Washington DC: International Society for Technology in Education. 2012.
ABSTRACT
In this paper we will discuss the concept of literature’s critical reader from a
historical-critical perspective focusing on the instruction of readers in a reality
contingent by the mass culture (cf. Maia, 2020). We discourse about how such
idea is the basis for Grupo de EducaçãoMultimídia (GEM/UFRJ) projects while
analysing the course CLACquete – PráticasAudiovisuais. This course had as a
target audience the tutors of Curso de LínguasAberto à Comunidade (CLAC)
and its main goal is the creation of participatory methodologies, having as a
foundation the pedagogical principle of polytechnic training (cf. Saviani, 2007) in
remote environments experimenting the use of digital tools. Articulating Roman
Jakobson’s perspective of reading and writing to the historical-critical pedagogical
perspective, we highlight intersemiotic translation (cf. jakobson, 1976) as a
powerful methodological horizont to think about the matters of the reader in the
contemporary times and to develop a linguistic critical instruction.
KEYWORDS: Polytechnic education; Methodological development; Critical
reading.
LIMA, BRAGA & MAIA. Tô vendo uma esperança: reflexões sobre o conceito de leitor crítico a partir do uso de metodolo-
gias participativas nos meios digitais.
Introdução
O papel do leitor
a segunda, uma ressignificação. A partir desta informação, podemos pensar sobre a leitura
e o protagonista desta ação, o leitor, o indivíduo que, através de seu filtro formativo,
crítico e histórico-social, irá traduzir determinado texto.
A partir da análise de uma sociedade capitalista e no embate com esta, o elemento
fundamental da perspectiva histórico-crítica é o desenvolvimento de uma consciência de
historicidade e das relações sociais na formação dos sujeitos visando a transformação da
realidade através da apropriação, ressignificação e criação de novos valores morais de sua
sociedade, em oposição à hegemonia da cultura capitalista e das ideias da classe dominante
que hoje a definem (cf. Ramos e Moratori, 2017). É na apropriação de ferramentas que é
possível superar a alienação produzida pela lógica capitalista e definir novos sentidos para
a vida, o trabalho e a educação. Sendo assim, uma leitura dialética (histórico-materialista)
do mundo e dos produtos culturais e artísticos, tais quais os textos literários, se forma a
partir da fundamentação crítica, científica e cultural e corresponde a um olhar que analisa
o modo como ferramentas são usadas, como escolhas são feitas coletiva e historicamente,
e que analisa quem e o que se produz e para quem.
A literatura pode formar; mas não segundo a pedagogia oficial [...] Longe de ser um
apêndice da instrução moral e cívica (esta apoteose matreira do óbvio, novamente
em grande voga), ela age com o impacto indiscriminado da própria vida e educa
como ela, — com altos e baixos, luzes e sombras (Candido, 2002, p.84)
A Literatura em sua forma bruta, debatida através do seu contexto e das possibilidades
por ela apresentadas, portanto, convida o leitor para um campo de experiência que
transcende o debate para o campo da experiência diversa, convidando para reflexões de
assuntos que são apagados por recorte do “Verdadeiro, o Bom, o Belo, definidos conforme
os interesses dos grupos dominantes, para reforço da sua concepção de vida” (CANDIDO,
2002, p. 84). Desta forma, a partir da seleção de um material literário que interesse ao
objetivo de estudo e à demanda apresentada, preparam-se oficinas nas quais o leitor parte
para o embate com um texto que dialoga e que quebra com o paradigma estabelecido pela
cultura de massa e pelo modo de produção capitalista. A lógica capitalista tem como centro
o trabalho industrial, o qual se baseia na divisão social das tarefas e na fragmentação das
relações. Isso faz com que cada sujeito que realize uma etapa técnica o faça sem conhecer
ou entrar em contato com as outras etapas diferentes. Este é um trabalho unilateral. É
chamado de alienado por não permitir que os trabalhadores entendam para quê servirá
o trabalho, visto que este é isolado do seu resultado integral final. A lógica capitalista
é centralizada na reprodução de narrativas interessantes à manutenção desta ordem. O
processo de leitura crítica é provocado justamente pela tarefa árdua de transpor o texto
conhecendo-o a fundo a ponto de poder encontrar estratégias para transferi-lo a outra
linguagem.
Além disso, as oficinas contam com a articulação ativa com os saberes
multidisciplinares e técnicos, como o recorte e colagem, roteiro, fotografia e montagem,
operação de programas de computador e desenho, por exemplo. Ao fim da oficina, além
das reflexões e debates gerados pelo encontro com o texto, há também um produto
síntese do trabalho formativo e da organização dos participantes. Assim, a oficina visa
não só a quebra da lógica cultural estabelecida pelo sistema convencionalizado pelos
grupos dominantes no que tange ao objeto de estudo, mas estimula uma nova proposta
de organização do trabalho, rompendo com o modelo industrial, fundamentado em etapas
e na capitalização do tempo o’clock, envolvendo todos os participantes em um processo
participativo e ativo. Dessa forma, consolida-se a ideia do trabalho politécnico.
Neste sentido, a tradução intersemiótica pode ser entendida como metodologia que
organiza um trabalho omnilateral, isto é, um trabalho integral, sem uma consciência
fragmentada, e, assim, desenvolve criticidade e rompe com a lógica da produção capitalista,
unilateral. Segundo os conceitos fundamentados por Marx (1980), a oposição a esta
produção capitalista seria através do completo envolvimento dos sujeitos no processo
produtivo. Neste modelo integral, estariam envolvidos o aspecto físico e a corporeidade
subjetiva dos indivíduos, bem como o pensamento intelectual de caráter abstrato e o
pensamento crítico e cultural.
O curso CLACquete
Considerações finais
Neste artigo, buscamos refletir sobre o que é leitor crítico, bem como apresentar a
tradução intersemiótica como estratégia de formação de leitores ao engajar e dar sentido
à leitura de literatura visando à produção audiovisual. Nosso propósito é de, através de tal
metodologia, desenvolver a criticidade dos sujeitos participantes das oficinas produtivas,
para que estes se apropriem das mídias que fazem uso ou que consomem cotidianamente
e se tornem sujeitos ativos na leitura dessas mesmas ferramentas e também na produção
de novos textos.
Buscamos também sublinhar a riqueza no encontro de metodologias, saberes culturais
e didáticos entre os monitores do Cursos de Línguas Abertos à Comunidade e os bolsistas
do Grupo de Educação Multimídia a partir da experiência no CLACquete – Práticas
Audiovisuais e de como essa troca possibilita a contemplação do tripé universitário.
Referências bibliográficas
SAMUEL MALAQUIAS
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Graduando em Letras: Português-
Literaturas. E-mail: samuelmalaquias@letras.ufrj.br
ABSTRACT
Considering the pandemic caused by the new coronavirus, CLAC Writing courses were
forced to think about new strategies and methodologies to adapt to the new context. Such
changes were reflected particularly in the evaluation strategies. Because of the physical
and emotional detachment, resulting from remote teaching, it became imperative to
create evaluative activities to monitor the evolution of students. In addition, the use of
online and offline digital media imposes appropriate strategies to these tools, which may
or may not be equivalent to resources used in the face-to-face model. Thus, in the course,
we proposed synchronous and asynchronous textual production activities, segmented
in stages. These proposals were based on Luckesi (2012, p. 35), who affirms that the
evaluation is “a dialectical moment of“sense”of the stage in which it is and its distance in
relation to the perspective that is placed as a point to be reached at front”. The positive
evolution of the students, regarding the proficiency of reading argumentative texts and
writing of argumentative paragraphs, showed that the evaluation strategies adopted
met their purposes, in the context of emergency remote education.
KEYWORDS: Textual production; Evaluative strategies; Argumentation.
MALAQUIAS & ORSINI. Produção textual: um relato de experiência sobre a construção do parágrafo argumentativo no
ensino remoto do CLAC.
Introdução
durante o curso; pois uma avaliação pontual, por meio de provas, seria inadequada para o
novo contexto. Segundo Luckesi (2012), a avaliação é um instrumento para verificar em
que medida o conteúdo ensinado foi compreendido pelos alunos, orientando os próximos
passos. Serve, portanto, para que o monitor identifique se pode ou não prosseguir com o
conteúdo, se deve ou não aprofundar mais o assunto e quais medidas devem ser tomadas
para que o aluno aprenda. Por esse motivo, adotamos as seguintes estratégias de avaliação:
(i) a participação dos alunos nos fóruns de discussão e (ii) suas produções escritas e
reescritas, após os comentários feitos pelo monitor.
Além de Luckesi (2012), fundamentamo-nos em Antunes (2006). A autora afirma
que a atividade de produção textual não se resume a propor um tema, que deve ser
desenvolvido pelos alunos e, em seguida, corrigido e encerrado. Tal perspectiva, que vê o
texto como produto, é questionada por Antunes (2006), para quem o texto é um processo.
Desta forma, a correção do texto de um aluno constitui uma das etapas do processo.
Antes dessa etapa, o aluno deve discutir o tema e planejar o seu texto para, em seguida,
escrevê-lo e revisá-lo. Após a revisão, o aluno entregará seu texto ao monitor que irá
corrigi-lo, isto é, irá tecer comentários e fazer as correções. Na sequência, o texto é
devolvido ao aluno para ser reescrito. A atividade de reescritura é indispensável para a
evolução do aluno.
Embora o curso de Redação, no modelo presencial, já investisse em atividades
avaliativas processuais, o ensino remoto emergencial trouxe a urgência de um modelo
de avaliação que contribuísse para o melhor acompanhamento e monitoramento da
aprendizagem dos alunos, tendo em vista as novas circunstâncias em que estes e os
monitores responsáveis pelas turmas se encontravam. Por esse motivo, no lugar de provas,
optamos por acompanhar seu desenvolvimento no decorrer do semestre.
Nas seções que se seguem, relataremos as atividades avaliativas desenvolvidas em
2020.2. Porém, apresentaremos, primeiramente, de forma breve, o perfil dos alunos do
curso.
nível superior, em áreas distintas, música, química e teologia e três estavam cursando
Letras, na própria UFRJ.
Estratégias de avaliação
Além das estratégias formais de avaliação, por meio do fórum de discussão e da escrita
e reescrita de parágrafos argumentativos, é importante ressaltar que consideramos a
participação dos alunos no curso através da realização das atividades e do cumprimento
dos prazos. Assim, tais aspectos também foram observados no momento do cálculo da
média final.
Passamos agora à descrição das estratégias avaliativas que nortearam o curso na
modalidade remota.
Neste fórum de discussão, os alunos, que tiveram seus nomes preservados, mostram
posicionamento contrário à reabertura das escolas, defendendo tal ponto de vista por meio
de argumentos, como o fato de as crianças serem transmissoras do vírus da Covid-19, o
que poderia afetar os mais velhos, bem como a ausência de uma sistema de teste que fosse
eficiente.
Cada fórum de discussão, que era parte da nota final, valia 1.5 ponto. Sendo o
nosso principal interesse fazer com que a etapa do fórum contribuísse para a produção
da primeira versão do parágrafo, avaliamos a participação do aluno com base na relação
entre as ideias presentes nele e sua relação com o texto produzido.
Deste modo, o fórum de discussão mostrou-se como uma estratégia alternativa
adequada ao modo como as discussões vinham sendo travadas no presencial – ou seja,
permitiu aos alunos um aprofundamento e, em alguns casos, um primeiro contato com o
tema acerca do qual ele teria que escrever.
De acordo com Santos, Cuba Riche e Teixeira (2012, p.103), “quando a escrita é
vista como um processo, há várias etapas até a produção final do texto”. O debate e a
reflexão acerca do tema constituem uma das etapas e, no modelo remoto, ocorreram por
Marcuschi (2008) defende que os gêneros se organizam em “estilo”, que diz respeito às
escolhas linguísticas feitas pelo enunciador; “estrutura composicional”, referente à forma
e à disposição dos elementos no texto; e, por fim, “conteúdo”, isto é, o tema de que trata
o texto. Tais elementos são regulados pelo cotexto, ou seja, a situação, os interlocutores e
seus propósitos, entre outros fatores.
Considerando, pois, que os textos se materializam em situações reais, com base no
seu propósito e nos interlocutores (MARCUSCHI, 2008), no formato remoto, recorremos
à formulação de uma situação interacional e indicamos os interlocutores a fim de dar ao
aluno uma finalidade para escrever. Na figura 4, apresentamos o enunciado disponibilizado
para o aluno no Google Classroom.
A etapa seguinte corresponde à reescritura por parte do aluno, com base nas correções/
sugestões do monitor. Como é possível observar na figura 6, a primeira reescritura revela
significativa melhora, sobretudo no que diz respeito à organização das ideias.
Figura 6. Reescrita
As atividades de escrita e reescrita tiveram maior peso na avaliação, pois, além dos
motivos mencionados na seção anterior, envolviam maior complexidade. Além disso, por
não estarem acostumados a fazer reescrituras de seus textos, o maior peso dessa etapa
funcionou como um fator importante para garantir a adesão dos alunos.
Conclusão
Referências
ISOLAMENTO SOCIAL
RESUMEN
Introdução
Dessa forma, buscamos, com este trabalho, contribuir para a discussão sobre o
empreendimento de novas metodologias de ensino de língua estrangeira em período de
distanciamento social. Mais especificamente, pretendemos desenvolver uma atividade
assíncrona que visa a promover a interação entre os alunos durante o ensino remoto de
espanhol como língua estrangeira do nível 1 do CLAC.
Este artigo está organizado da seguinte maneira: na primeira seção, discorremos
sobre a interação no ensino de língua estrangeira; na segunda seção, tratamos do ensino no
formato remoto; na terceira, descrevemos o processo de formulação e aplicação da tarefa
desenvolvida para este estudo; na quarta seção, apresentamos uma discussão a partir da
participação dos discentes; e, por fim, na última seção, apresentamos as considerações
finais do estudo.
Como aponta Martins (2017), durante grande parte da história da educação, o ensino
de língua estrangeira esteve baseado na tradução e versão de textos (abordagem tradicional,
mais usada no ensino de línguas clássicas), no ensino de vocabulário (abordagem direta),
no exercício de estruturas das línguas, na repetição de um estímulo auditivo (abordagem
áudio-oral) ou na memorização de diálogos (abordagem audiovisual). Todas essas
abordagens exigiam pouca participação do aluno e o professor era visto como a figura
principal do processo de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, a concepção de ensino de
língua mais privilegiada foi a que compreendia os elementos internos à língua como mais
importantes.
Alguns acontecimentos mudaram esse panorama. Novas abordagens, como o método
comunicativo, a perspectiva acional e a abordagem plurilíngue, promoveram a reversão do
pensamento anterior, visto que se diferem das demais metodologias em dois aspectos muito
importantes: o foco do processo e a comunicação. O pensamento produzido, sobretudo no
final do século XX, reconhece o papel do aprendiz no processo de ensino-aprendizagem,
fazendo o professor perder seu monopólio sobre o conhecimento. Além disso, o ensino
baseado no uso ganha mais importância. Nesse sentido, o aluno não necessariamente tem
que saber explicitamente todos os elementos gramaticais da língua estrangeira, mas deve
ser capaz de interagir e se comunicar (cf. Martins, 2017; Schlatter; Garcez; Scaramucci,
2013; Fabrício, 1999).
Um avanço importante no estabelecimento dessa visão foi a elaboração das
vezes, impõe tal papel ao monitor, visto que o contato é intermediado pela tela de um
equipamento eletrônico. Como há resistência dos estudantes em ligar a câmera, com
frequência, a interação tende a ocorrer sobretudo entre professor e aluno. A interação
entre os aprendizes, que é muito importante no processo de aprendizagem, parece ser a
mais prejudicada no formato remoto.
Portela (2006, p. 53) diz que “os métodos comunicativos têm em comum como
característica – o foco no sentido, no significado e na interação propositada entre
sujeitos na língua estrangeira”. Podemos perceber, portanto, a clara adoção de práticas
comunicativas no nível 1 do curso de espanhol. Isso porque algumas bases do curso são o
aprendizado por meio da comunicação da língua-alvo, o uso de textos autênticos durante
a aprendizagem e o aproveitamento das experiências pessoais para a comunicação na
sala de aula. Tudo isso contribui para um ensino interativo e centrado no aluno. Além
disso, visa-se, com essas práticas, ao desenvolvimento da competência comunicativa dos
estudantes, por meio da utilização da língua-alvo na modalidade de uso adequada para
cada situação comunicativa.
Entretanto, é difícil promover essa interação no formato remoto. Por isso, este trabalho
tem por objetivo contribuir para o desenvolvimento de metodologias que permitam a
interação entre os alunos mesmo não havendo contato presencial.
O ano de 2020 foi marcado pela pandemia causada pelo Coronavírus. O confinamento
gerou mudanças no comportamento da população. Com isso, as aulas presenciais foram
suspensas e houve a necessidade de se adotar o modelo de ensino remoto no segundo
semestre de 2020.
Ao longo desta seção, discorremos sobre alguns pontos que dizem respeito ao ensino
de espanhol em formato não-presencial. Ainda que se estabeleça uma diferença entre
EAD e Ensino Remoto, acreditamos que, devido às semelhanças que tais modalidades
possuam, é possível discutir afirmações sobre a primeira que nos auxiliem na compreensão
da segunda.
A transposição direta de aulas presenciais de língua estrangeira para o formato remoto
parece não ser possível completamente, visto que esse modelo possui suas especificidades.
Por conseguinte, estratégias comumente empregadas em aulas presenciais, como dinâmicas
em grupos durante a aula síncrona, são inviabilizadas nesse modelo de educação.
A preocupação com o desenvolvimento de um ensino comunicativo em modo não-
presencial não é recente. Como se pode ver, Selvero (2014), ao estudar a interação na
disciplina de Língua Espanhola do curso de Licenciatura Letras Espanhol e Literaturas
na modalidade de ensino a distância da UFSM, verifica que é possível manter os alunos
motivados e criar estratégias para a interação dos aprendizes no ensino a distância, como
é possível ver a seguir:
Nesse sentido, Selvero (2014, p. 6) mostra que, mesmo com as limitações do ensino
a distância, algumas estratégias, como atividades assíncronas, podem ser utilizadas
para intensificar o processo de interação entre professores e alunos. Com o intuito de
relacionarmos os alunos com o cenário atual e de contribuirmos para o desenvolvimento
das habilidades comunicativas de nossos alunos, modificamos um pouco a proposta de
Selvero (2014) e elaboramos a oitava atividade assíncrona do semestre, para estimular
a interação entre alunos. Esta consistiu na realização de uma videochamada, na qual os
alunos deviam falar sobre a sua nova rotina nesse período de pandemia.
Tal iniciativa revelou-se necessária nos primeiros dias de aula, em que percebemos
a baixa interação entre os estudantes e nos questionamos sobre possíveis prejuízos ao
desenvolvimento da habilidade comunicativa dos aprendizes. Estivalet e Hack (2011), ao
analisar a habilidade oral de alunos do Curso de Graduação em Letras - Licenciatura em
Inglês, na modalidade a distância, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
constataram a insuficiência de garantias de qualidade na aprendizagem da habilidade oral,
conforme se pode notar a seguir:
Desse modo, percebe-se que o EaD, que é um modelo de educação pensado para
a educação não-presencial, necessita desenvolver estratégias diversificadas para que o
ensino seja efetivo e, assim, os objetivos do ensino possam ser plenamente alcançados. O
ensino remoto, que foi adotado pelo CLAC, difere-se do EaD, pois trata-se de uma solução
rápida para dar continuidade às atividades de ensino. Logo, não se trata propriamente
de uma modalidade de ensino. Ainda assim, verifica-se que, assim como no EaD, é
necessário postular adaptações metodológicas para desenvolver um ensino eficiente de
língua estrangeira.
Metodologia
atividade assíncrona do semestre. A tarefa proposta foi aplicada a duas turmas de espanhol
do CLAC. Ambas as turmas eram de nível 1, cujo conteúdo corresponde ao grau A1 do
Marco Comum Europeu de Referência (Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2019, p.
30). As turmas nas quais a atividade foi aplicada tinham aulas aos sábados pela manhã.
Apesar das semelhanças quanto ao nível e horário, as turmas divergiam em um aspecto
muito relevante: a quantidade de alunos. Enquanto uma turma era composta por 13 alunos,
sendo apenas 8 com participação efetiva nas aulas, a segunda turma era composta por 24
alunos, sendo 23 participantes assíduos nas aulas.
No Catálogo do CLAC (cf. UFRJ, 2019), são apresentadas as habilidades esperadas
de um aluno de espanhol 1. Espera-se que os alunos do nível 1 do CLAC sejam capazes
de desenvolver as seguintes habilidades: descrever a si e o seu entorno, com relação
à apresentação pessoal e uso de formas de tratamento adequadas, aspectos da rotina,
descrição física e psicológica, interesses, gostos pessoais, descrições de ambientes que
frequenta e o uso de formas simples de obrigação e proibição.
A fim de desenvolver tais habilidades, estipula-se que o aluno de espanhol 1 deve
estudar ao longo de um semestre os seguintes conteúdos: presente do indicativo de verbos
regulares, irregulares e reflexivos, pronomes interrogativos e possessivos, construção
impessoal com se, preposições, artigos definidos e indefinidos, adjetivos, substantivos,
gênero e número, pronomes demonstrativos, perífrases verbais (como “tener que +
infinitivo”, “hay que + infinitivo” e “deber + infinitivo”), adjetivos possessivos, advérbios,
pronomes de objeto direto e suas posições, verbos, como gustar, encantar, apetecer,
orações condicionais simples, e a diferença entre hay e está(n) (cf. UFRJ, 2019, p. 37).
A atividade que elaboramos nesse contexto foi baseada na unidade 6 do livro Aula
Internacional 1 (CORPAS; GARMENDIA; GARCÍA, 2018)1 da editora Difusión. Nesta
unidade, os temas abordados englobam a descrição de hábitos e a rotina dos alunos.
Alguns conteúdos que se destacam nessa unidade são os verbos irregulares no presente,
verbos reflexivos no presente do indicativo, dias da semana e vocabulário de atividades
básicas do dia a dia.
Para realizar a atividade que elaboramos, os alunos precisavam organizar-se em duplas,
trios ou quartetos. A tarefa consistia em gravar uma videochamada em que conversavam
sobre a nova rotina promovida pela pandemia. Ficou a cargo dos próprios alunos a escolha
pelo grau de formalidade da conversa e o tipo de hábitos que iriam abordar. Contudo, o
1 O processo de escolha dessa coleção para uso no curso de Espanhol no CLAC encontra-se descrito em Gomes et
al. (2019).
A atividade foi apresentada aos alunos como na figura 1. A apresentação foi sintética,
pois a explicação mais detalhada foi dada durante a aula síncrona. Vale ressaltar que os
alunos puderam esclarecer quaisquer dúvidas sobre a realização da tarefa até a data de
entrega. Caso quisessem, os alunos podiam entregar um rascunho antes da entrega oficial
da tarefa para auxiliar a gravação do vídeo.
Resultados e análise
A atividade foi realizada, no total, por uma dupla e seis quartetos, sendo a dupla e um
quarteto da turma A e os demais quartetos da turma B. Tivemos, portanto, a adesão de seis
alunos na turma A e de vinte e quatro na turma B. Dessa forma, consideramos que houve
grande envolvimento dos aprendizes de ambos os grupos.
Foram apresentados nos vídeos diferentes tipos de relações e, consequentemente,
diferentes níveis de formalidade. Dentre elas, havia conversas entre amigos, entre
familiares, entre namorados e também entre colegas de trabalho. Além disso, os alunos
não abordaram somente o tema da rotina, mas também assuntos como saúde mental,
autoconhecimento, desenvolvimento de novas habilidades, empatia e amor ao próximo.
Portanto, apesar da atividade ter um tema específico, os estudantes conseguiram
relacioná-la a outros assuntos que acreditamos possuir também suma importância na
formação crítica dos discentes, o que tornou a atividade ainda mais produtiva. Destacamos
que houve bastante interação entre os alunos nas conversas gravadas, algo que não ocorria
nas aulas síncronas e nas demais atividades assíncronas.
A atividade foi recebida de uma forma muito positiva pelos discentes. Ambas as
turmas relataram ter sido uma tarefa dinâmica e divertida de se realizar. Diferentemente
das outras atividades assíncronas, nessa videochamada, os alunos puderam se conhecer
melhor, trocar conhecimento entre si, desenvolver a expressão oral e pôr em prática os
conhecimentos adquiridos ao longo do semestre.
Alguns grupos enviaram rascunhos escritos antes de gravar a videochamada, a fim
de que os monitores das turmas pudessem sinalizar possíveis melhorias. Esses rascunhos
consistiam em esquemas, tópicos ou resumos do tema que o grupo pretendia abordar
na tarefa. Essa etapa da atividade não tinha o objetivo de realizar muitas correções
gramaticais, visto que a atividade servia de diagnóstico para o estado das habilidades dos
alunos. Verificamos principalmente questões relacionadas à adequação e coerência da
tarefa.
A atividade foi avaliada com base nos parâmetros já utilizados pelo CLAC, a saber:
adequação à proposta, fluência, correção, planejamento e coerência. A adequação refere-
Considerações finais
Referências bibliográficas
Este trabalho pretende apresentar uma experiência com o ensino de língua árabe na modalidade
remota, no que diz respeito aos problemas que esse modelo gerou e às soluções encontradas
para superar tais desafios em um momento ímpar da educação brasileira, assim como da
sociedade em geral. Trata-se de um relato de experiência em uma turma do CLAC (Cursos de
Línguas Abertos à Comunidade), turma de Árabe II, no segundo semestre de 2020, em tempos
de pandemia da COVID-19. Foram utilizadas algumas estratégias com o objetivo de dirimir os
problemas apresentados pela turma, a saber, (i) a deficiência da escrita, já que a turma estava
em processo de alfabetização, o qual se inicia no primeiro período e, muitas vezes, é consolidado
apenas no segundo; (ii) a dificuldade de diferenciar fonemas, devido à qualidade de som e
velocidade de internet, dificultando a compreensão. Além disso, foi identificado um terceiro
problema, porém, neste caso, trata-se do resultado da descontinuidade dos estudos e da falta
de contato com o árabe, uma língua pouco divulgada no Brasil e com pouca disponibilidade
de materiais para falantes de português. Tomou-se por base os pressupostos da Linguística
Aplicada ao ensino de língua estrangeira, no que diz respeito à análise dos problemas de
ensino-aprendizagem e às estratégias utilizadas para solucioná-los. Por fim, deseja-se, ainda,
apresentar a experiência de adaptação de ensino com as ferramentas tecnológicas e métodos
de avaliação.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino remoto; Língua árabe; Linguística Aplicada.
ABSTRACT
This article has as a goal to present an experience with the learning of the Arabic language
in the distance teaching, about the problems that this type of learning has created and the
solutions found to overcome the challenges in a particular moment of the brazilian education,
as in the world. It is a report of an experience in a class of CLAC (Cursos de Línguas Abertos
à Comunidade), class of ArabicII, in the second semester of 2020, during the global pandemic
COVID-19. Some strategies were used to end the difficulties coming from the class, that were:
(i) writing deficit, as the class was in a literacy process, that starts in the first semester and
a lot of times is consolidated just in the second; (ii) the obstacle to distinguish phonemes,
due to the quality of the sound and the velocity belonging to theinternet, preventing the
comprehension. Beside this, a third problem was identified, but, in this case, it is about the
result of the interruption of studies and the missing of contact with Arabic, a language not
often widespread in Braziland with little resources to people whose speak portuguese. Based
on the principles of Applied Linguistics to the learning of foreign language, with regard to the
analysis of problems of teaching-learning and the strategies to solve them. At last, there is
the intention to show the experience of adaptation of the teaching with the technology and
methods ofevaluation.
KEYWORDS: Distance teaching; Arabic language; Teaching-learning.
MOTA & SILVA. Língua árabe em modalidade remota: desafios e soluções.
Introdução
encontrados−, sendo o objeto de análise uma turma de Nível 2. Para isso, apresentamos
algumas reflexões sobre o ensino de língua, principalmente com a internet como
instrumento e a relação com a Linguística Aplicada, cuja importância para este trabalho está
relacionada aos procedimentos práticos no âmbito do ensino e aprendizagem de línguas,
na busca de refletir sobre métodos de soluções de problemas do ensino (MENEZES, 2009
apud HANNA, 2012).
Para Souza (2009), as perspectivas teóricas em linguística aplicada “têm tido grande
influência na análise dos contextos e contingências favorecedoras da aprendizagem de
línguas estrangeiras” (p.211). Hanna (2012, p.96), conceitua Linguística Aplicada como
um “amplo campo interdisciplinar de estudo que identifica, investiga, e oferece soluções
para problemas que envolvam o uso e os usuários de línguas estrangeiras; é o estudo da
língua em relação aos problemas práticos do mundo real”. Essa perspectiva interdisciplinar
é o motivo de assumirmos essa teoria como aparato para o trabalho, considerando (i) sua
abrangência no campo do ensino de língua estrangeira no que diz respeito às reflexões
sobre os métodos e metodologias; (ii) a motivação de se pensar nos problemas de ensino-
aprendizagem e nas soluções possíveis para alcançar os objetivos pretendidos; e (iii) as
reflexões sobre o uso da internet e suas ferramentas no ensino de línguas estrangeiras,
principalmente, no contexto remoto que, no caso da experiência observada neste trabalho,
trata-se de um campo inovador, experimental.
O que desejamos refletir com a representação gráfica é que a Linguística Aplicada
percorre a prática de ensino de línguas − no caso, o árabe −, observa e reflete sobre essa
prática na interação com a internet como instrumento.
Essa perspectiva está enquadrada na ideia de se pensar a prática de ensino de línguas;
uma preocupação da Linguística Aplicada que subjaz o projeto de extensão CLAC, em
que está ofertado o curso de língua árabe que ora apresentamos.
Quando pensamos em uma experiência de forma remota, pensamos ser uma nova
modalidade de ensino-aprendizagem de línguas, ainda que o modelo remoto não seja algo
novo.
No campo do ensino de línguas estrangeiras, as diferentes abordagens e métodos
No caso desta experiência com ensino de árabe, a primeira maneira citada corresponde
ao modelo remoto de aulas síncronas (em tempo real) e as assíncronas. E, nas palavras de
Braga (2009), sobre as vantagens da internet no ensino,
exemplo.
Considerando a competência comunicativa como um conjunto de habilidades que o
usuário de uma língua possui relacionadas à capacidade de usar recursos léxico-gramaticais,
textuais, fonológicos e adequá-los aos contextos e situações comunicativas desse idioma,
entendemos que o uso das ferramentas digitais pode favorecer o desenvolvimento do
estudante de língua estrangeira pela exposição aos contextos de produção comunicativos.
Os recursos da web são vastos e a cultura alvo pode ser facilmente visitada e explorada
em todo o seu potencial, diferente do que é possível em aulas presenciais. Araújo (2009)
referenda que:
utilizam como língua litúrgica. Mesmo assim, essa língua ainda é considerada
um mistério para o ocidente, por conta do alfabeto diferente e do distanciamento
com essa cultura tão diversificada.
Ao clicar em cima, o cartão se vira e mostra o termo traduzido para o português, como
podemos ver na figura 2. O editor da atividade tem a possibilidade de inserir imagens, e
ainda é possível pesquisá-las no idioma alvo.
Na língua árabe, o alfabeto possui 28 letras que podem se modificar de acordo com
sua posição inicial, medial ou final; e a escrita árabe é cursiva, da direita para a esquerda,
Grupo 2:
Letra خ ح ج
Valor fonético [x] [ħ] [ʒ]
encontro síncrono, foi trabalhado, com imagens, o vocabulário já conhecido pela turma. A
proposta do CLAC de disponibilizar um plantão de dúvidas durante a semana também foi
adaptada; o horário foi dividido para solucionar dificuldades específicas de cada aluno.
Aos poucos, os alunos conseguiram fazer a junção consoante + vogal de forma gradual e,
consequentemente, a leitura de palavras completas.
Ainda que o Ensino Remoto, neste caso, represente uma modalidade de ensino
emergencial devido ao tempo de pandemia, podemos pensar em muitas vantagens desse
modelo de interação on-line, pois facilitou o compartilhamento de materiais autênticos e
a visualização de vídeos e plataformas interativas, já que no ensino presencial era mais
difícil essa dinâmica devido ao fato de os recursos tecnológicos serem mais limitados nas
salas de aula.
Avaliação a distância
A avaliação no CLAC se dava por meio de duas provas orais e duas provas
escritas. Com o ensino remoto, as formas avaliativas também precisaram ser adaptadas.
Desde o início, os alunos estavam apreensivos sobre como se daria a avaliação na nova
modalidade. Como orientado pelo CLAC, a maior parte das avaliações aconteceram
de forma assíncrona, com a finalidade de “compensar” o tempo de aula. Pensando na
exploração das habilidades linguísticas, as atividades foram feitas em diversos formatos.
Algumas foram as de gravação de áudios com leituras de palavras e sintagmas nominais;
apresentação dos familiares e seus nomes; gravação de vídeos falando sobre si; e descrição
de objetos ou fotos tiradas pelos alunos, usando palavras do vocabulário estudado.
Em certas aulas, principalmente as que continham textos mais longos, os alunos
mostravam-se mais excitados por, dentro de um contexto, reconhecer seus conhecimentos
já adquiridos.
Com o objetivo de diminuir a subestimação dos alunos consigo mesmos, houve
a proposta de uma avaliação final, de peso leve, para que conseguissem visualizar sua
evolução durante o semestre, principalmente sobre a construção de sintagmas e orações.
A avaliação foi feita durante um encontro síncrono, onde tinham a possibilidade de, a
qualquer momento, sanar dúvidas referentes aos enunciados.
Considerações finais
Universidade Federal do Ceará, escreveu, na introdução do livro “Internet & Ensino: novos
gêneros, outros desafios”, sobre o medo dos professores de usar a internet. Mencionou
a expressão criativa “Tsunami digital”, utilizada por professores da educação básica,
refletindo que a comparação das práticas discursivas em ambiente digital à catástrofe
evidencia “um grito de socorro” dos docentes em relação ao uso da rede.
Essa questão nos interessa e nos servirá de conclusão das reflexões deste artigo
porque a experiência ora apresentada constituiu-se em um desafio e superação desde o
momento em que o curso foi planejado até seu encerramento, já que, neste caso, a internet
foi a mantenedora do ensino remoto; foi a única possibilidade de efetivação das aulas
(síncronas e assíncronas). Reportando-nos à fala do professor sobre o medo da internet há
mais de 10 anos, o ensino remoto parece um salto; porém, ao mesmo tempo, a experiência
com essa modalidade de ensino demonstrou se tratar, ainda, de uma questão de desafio e
superação.
No entanto, não podemos deixar de mencionar o outro lado da questão no que
diz respeito ao ensino do árabe, porque, como sempre se tratou de uma experiência de
desafios devido aos vários motivos mencionados, dentre eles, a escassez de materiais, a
internet foi, ao mesmo tempo, desafio e superação, medo e coragem, problema e solução.
Essa experiência, ainda que muito emergencial e completamente experimental, mostrou-
nos um campo fértil de materiais que não eram usados, sequer mencionados, mas que, a
partir de agora, serão explorados como recurso de fontes didáticas e de contextualização
cultural que poderão dirimir o distanciamento entre as culturas nativa e alvo.
A turma segue preparada para o nível seguinte; a monitora e a orientadora seguem
mais experientes com contextos de emergência no ensino, entendendo que a língua árabe
pode ser ensinada para falantes do português presencialmente, ou de maneira remota;
com materiais impressos ou virtuais. Certamente o momento de ensino-aprendizagem ora
relatado será um marco para o ensino de línguas de um modo geral, assim como para esse
idioma semítico, considerado misterioso, pouco acessível e desafiador.
Referências Bibliográficas
ARAÚJO, J. C. et al. Internet & Ensino: novos gêneros, outros desafios. 1.ed. Rio de
Janeiro, 2007.
ARAÚJO, A. D. Computadores e ensino de línguas estrangeiras: uma análise de sites
instrucionais. Linguagem em (Dis)curso. Palhoça, SC, v .9, n.3, p. 441-461, set./dez.
2009.
ABSTRACT
Introdução
aprendizagem e não como um detentor de todo o conhecimento a ser passado para o aluno
do CLAC. Em outras palavras, incentiva-se o desenvolvimento da autonomia, tanto por
parte do aluno que busca o CLAC para aprender o idioma russo, como do monitor que
aprimora suas habilidades atuando no projeto de extensão, ministrando aulas, organizando
eventos, desenvolvendo pesquisas, participando de reuniões de orientação.
Para desenvolver a comparação proposta neste trabalho, baseamo-nos em observações
empíricas, experienciadas pela monitora do nível de língua russa I, na modalidade
presencial, e do nível de língua russa II, na modalidade remota. O nível de língua russa
I foi ministrado no segundo semestre do ano de 2019, ocorrido de agosto a dezembro do
referido ano, e o nível de língua russa II foi ministrado no primeiro semestre do ano de
2020, que, em função da pandemia, ocorreu no período entre agosto e novembro de 2020.
Nesse contexto, alunos e monitora se mantiveram os mesmos nas duas turmas.
O objetivo central da comparação consistiu na observação do impacto do ensino
remoto emergencial em aspectos como a interação dos alunos entre si e com a monitora
na sala de aula, o desenvolvimento da autonomia dos alunos e da monitora, bem como
o grau de motivação para se estudar o idioma. Assim, para além das observações da
monitora em sala de aula, pautadas pelo acompanhamento dos alunos, pelas discussões
nas reuniões com o orientador e pela reflexão crítica da metodologia de ensino adotada em
relação aos níveis do curso, a monitora elaborou um questionário, que foi desenvolvido
como um formulário da plataforma Google Forms e enviado aos alunos do curso. Foram
feitas perguntas sobre o período de ensino remoto emergencial, tais como “qual o impacto
do ensino remoto em seus estudos?”, “você se sente motivado a estudar remotamente?”,
“se o CLAC ofertar futuramente ensino remoto, você estaria disposto a prosseguir com os
estudos?”, entre outras, utilizadas para esclarecer pontos da observação do comportamento
dos alunos no período remoto.
Os níveis de russo analisados dispõem de um alunado bastante reduzido, o que em
certa medida facilitou as observações da monitora, assim como as análises desenvolvidas
nas reuniões de orientação. Abaixo, na próxima subseção, exibimos os resultados dessa
análise comparativa entre os semestres avaliados.
que esta apresenta mais tempo de aula, apesar das dificuldades citadas mais acima.
Em ambos os períodos, 2019.2 e 2020.1, as salas designadas foram as ímpares
do bloco H, o menos conservado do prédio da Faculdade de Letras. Tais salas são
organizadas em um esquema expositivo, com cadeiras de alunos fixas ao chão e a mesa
do professor em um tablado, o que parece ser conflitante para uma aula de ensino de
línguas que utilize elementos de uma abordagem comunicativa. Além disso, devido ao
baixo número de alunos e o tamanho relativamente grande da sala, o eco prejudicava a
comunicação de ambas as partes — alunos e monitora —e os ventiladores eram velhos e
barulhentos, reforçando não só a questão da dificuldade de comunicação, mas também o
consequente desconforto físico em dias quentes. Com o ensino remoto emergencial, além
da necessidade de locomoção supracitada, o ambiente de ensino deixa de apresentar as
características físicas comentadas e passa ocorrer em um ambiente virtual de ensino, com
aulas síncronas e assíncronas, a partir das casas da monitora e dos aprendizes.
Aqueles que aderiram ao período remoto apresentaram condições suficientes para
assistir às aulas síncronas. Eles não tinham problemas significativos com equipamento ou
conexão de internet, e o ambiente doméstico não aparentava ser um empecilho. Por outro
lado, se antes, no regime presencial, o eco da sala e o ruído do ventilador prejudicavam
a compreensão do outro, no ambiente virtual essa dificuldade se traduz em problemas de
conexão. Embora tais problemas tenham existido, eles ocorreram raramente no nível dois
de língua russa do CLAC. Logo, a comunicação dos alunos se deu de maneira mais clara
quando comparada ao período presencial, possibilitando maior interação entre eles. Com
isso, foi criada a possibilidade de aulas de conversação, nas quais os alunos conversam
apenas entre si, sem a interferência direta da monitora. Com exceção de eventuais ruídos,
como latidos de cachorro, ou problemas pontuais com a internet, as aulas remotas seguiram
de maneira tranquila. Todavia, cabe ressaltar que essa não é a mesma realidade para todas
as turmas que adotam o ensino remoto e que, desse modo, a turma de russo em questão
foi afortunada.
Comparando ambos os contextos, presencial e a distância, e considerando o fator
interação, é possível fazer algumas análises do primeiro período de língua russa e do
segundo. Na sala de aula física, a interação ocorria com mais facilidade e naturalmente,
a linguagem corporal era um fator relevante, que se perde em uma sala virtual. Na sala
de aula virtual, dos três alunos, inicialmente apenas dois mantinham a câmera ligada,
mas um deles passou a desligá-la também; o terceiro aluno alegava não ter uma webcam.
Presencialmente, os turnos de fala eram orgânicos por conta da leitura da linguagem
corporal e, além disso, os alunos podiam interagir nos intervalos, antes e depois da aula.
Essa possibilidade permitia que eles se conhecessem melhor, podendo criar amizades – o
que é um fator relevante para a permanência no curso. Em um ambiente virtual, os turnos
de fala eram ditados conforme o aluno abria ou fechava o microfone, gerando certos
momentos de silêncio, pois os alunos não conseguiam saber se deveriam falar ou não,
destacando a necessidade de uma leitura visual do outro e o impacto da falta da câmera.
No questionário apresentado aos alunos, um deles menciona sua avaliação negativa em
relação à interação em sala de aula no período remoto e cita como fatores de impacto
as câmeras dos demais alunos desligadas e o tempo de duração das aulas mais curto em
relação ao ensino presencial.
Além do fato apresentado acima, deve-se considerar que o ensino a distância síncrono
também acentua as dificuldades comunicativas e interacionais já existentes no presencial.
Um dos três alunos sempre teve dificuldade de interagir tanto com a monitora quanto com
os colegas de turma, falava baixo e tinha certa resistência a participar por conta própria
em atividades interativas. Durante as aulas remotas, a sua insegurança aumentou, ele
não conseguia acompanhar a matéria e entender os colegas, além de não conseguir se
fazer entender. Por conta desses fatores e de alguns outros de cunho pessoal, esse aluno
abandonou as atividades síncronas um pouco depois da primeira avaliação1. Além disso,
através das respostas ao questionário apresentado, foi constatado que esse aluno tinha
maior preferência por aulas assíncronas, como vídeos já gravados, pois assim não seria
necessário se expor e interagir nas chamadas em vídeo.
Embora a interação seja mais natural no contexto presencial, como descrito
anteriormente, no primeiro período de língua russa os alunos não tinham o costume de
interagir ativamente entre si. Durante os intervalos, a maioria dos alunos ficava dentro da
sala, ocasionalmente saindo para comprar algo para comer, mas raramente conversavam.
Já no período remoto, com a presença de apenas dois alunos, fez-se necessário que a
turma se aproximasse. Para facilitar a interação, a monitora desenvolveu atividades
que permitissem os alunos conhecerem um ao outro, encontrando gostos em comum.
Além disso, os exercícios assíncronos foram adaptados para que eles interagissem fora
do horário do encontro síncrono, através de mensagens em um grupo do WhatsApp da
turma, compartilhando músicas e expondo a sua opinião sobre certos assuntos. Essas
atividades foram, inclusive, ressaltadas como pontos positivos do período remoto, por um
dos alunos, no sentido de facilitar a interação também com a monitora.
2 Google Classroom foi a plataforma de ensino assíncrona utilizada no âmbito do projeto CLAC para o ensino remoto.
exibir certo grau de autonomia, embora não vocalizasse suas dúvidas tão frequentemente.
Esse aluno buscava aplicar construções e palavras que ele adquiria através de conteúdo
externo, mas não questionava mais profundamente as eventuais correções que eram feitas,
aceitando-as como fato, sem maiores discussões.
Por fim, abordamos a relação da motivação dos alunos com o estudo de língua russa.
Os alunos do curso de russo geralmente exibem motivações diversas para estudarem
o idioma, que muitas vezes apresentam pontos de interseção. Geralmente, os alunos
já conhecem uma língua estrangeira e desejam aprender uma terceira língua que seja
diferente daquelas já amplamente divulgadas e estudadas no Brasil. Esse parece ser um
dos motivadores dos dois alunos que permaneceram no curso de russo até o final do
segundo período, ministrado de forma remota.
É de se esperar que um aluno mais motivado queira dedicar mais tempo à língua em
questão, o que se relaciona diretamente com outros aspectos, como sua autonomia e a própria
interação em sala de aula. Para manter os alunos motivados, as aulas foram ainda mais
adaptadas às necessidades e gostos dos dois alunos. Foi constatado que eles tinham maior
preferência às aulas de conversação, além de apreciarem a participação de convidados,
como, por exemplo, em uma aula que foi dedicada à leitura e ao estudo de poemas russos
com a participação de uma aluna do sétimo período da graduação. Esse tipo de adaptação
permitiu que as aulas fluíssem com mais interesse, perdendo o ar de obrigatoriedade e
transformando-se em um momento de divertimento e troca de conhecimentos. Durante
a aula em questão, os alunos foram extremamente participativos, fazendo questões tanto
relativas aos aspectos literários do poema quanto sobre as construções e o vocabulário.
Por outro lado, considerando as respostas dos alunos no questionário, em relação
a uma autoavaliação durante o período remoto, podemos observar que o impacto dessa
forma de ensino em um dos alunos não foi de todo positivo. Dentre os dois alunos que
permaneceram até o final das aulas síncronas do período remoto, o aluno que apresentou
menor grau de autonomia e participação justificou não ter se adaptado a essa modalidade
de ensino, já que divide o computador com outros membros da família e não consegue
absorver bem o conteúdo a distância. Talvez seja possível relacionar suas dificuldades
pessoais referentes ao período remoto com o seu desempenho em sala de aula e no curso
de modo geral. Além disso, não é possível avaliar com cem por cento de certeza se o
motivador da desistência do terceiro aluno em relação aos seus estudos de russo está ou
não correlacionada com a modalidade de ensino remoto emergencial.
A presente análise comparativa não visa a esgotar as possibilidades existentes de
comparação. No entanto, acreditamos que foi possível apresentar acima alguns pontos
principais para se refletir brevemente sobre interação, autonomia e motivação à luz da
complexidade, o que pretendemos fazer na próxima subseção.
mudança brusca na modalidade de ensino presencial para ensino remoto parece ter causado
um aumento no grau de autonomia de ambos os alunos do curso, talvez proporcionado
pela intensificação na relação entre os participantes no processo, com a criação de outros
canais de comunicação que não exclusivamente a sala de aula física. Como a monitora
incentivou a interação entre os alunos de forma mais intensa no período remoto, em
comparação ao período presencial, um aluno mais autônomo, a partir do momento que
passa a interagir mais com um aluno menos autônomo, pode estimular ambos a buscarem
outras formas de conhecimento, a perguntarem mais e a refletirem mais criticamente em
relação a seu próprio aprendizado. Talvez isso tenha ocorrido durante o processo, já que
a monitora pôde evidenciar de forma sistemática o aumento no grau de autonomia de
ambos os alunos, em proporções distintas.
Por fim, tais fatores não podem ser considerados isoladamente em relação ao
subsistema de motivação. A mudança da modalidade presencial para a modalidade remota
parece não ter se refletido igualmente em todos os alunos do curso. Foram observadas três
situações distintas para cada aluno: a modalidade remota parece ter facilitado o abandono
das atividades síncronas do curso por parte de um deles (embora esse não tenha sido o
único motivador do abandono); a modalidade remota parece ter causado algum impacto
negativo no desenvolvimento de um dos alunos, embora não tenha acarretado desistência
e, em algum grau, possa ter melhorado sua interação e sua autonomia (no questionário o
aluno ressalta o impacto negativo e sua não adaptação ao ensino remoto); e a modalidade
remota não causou impacto negativo, de modo que, pelo contrário, parece ter trazido
muitos pontos positivos para um dos alunos, no que se refere ao estudo do idioma. Esses
pontos levantados nos remetem às relações entre o subsistema de motivação e as diferenças
individuais dos aprendizes, mediadas por fatores psicossociais, econômicos, cognitivos
etc. Como relatado acima, no ensino remoto, um dos alunos precisava compartilhar
o computador com os demais membros da família, já outro tinha dificuldades com a
interação nas atividades síncronas, desejando que apenas conteúdo assíncrono fosse
fornecido. O terceiro não revelou restrições quanto à nova modalidade de ensino e parece
ter conseguido manter-se motivado durante todo o curso. Coincidentemente ou não, trata-
se do aluno que mais interagia e que exibia o grau mais elevado de autonomia.
Considerando os fatores elencados para discussão, podemos observar uma rede
de subsistemas correlacionados entre si (interação, autonomia e motivação), que não
se encerram em si mesmos, mas exibem correlações com outros sistemas de natureza
diversificada, inclusive com aspectos relacionados à monitoria (como vimos, a maior
experiência por parte da monitora proporcionou que as dificuldades impostas pela distância
física entre os alunos se convertesse na possibilidade de conversação via internet). Se um
fator relacionado a esses sistemas é alterado - no caso, a modalidade de ensino - observamos
uma reacomodação da rede de subsistemas de modo a se adaptar à mudança ocorrida.
Evidentemente, essa adaptação se manifesta de modo diferente para cada participante no
processo. Para um dos participantes, tal modificação resultou em sua desistência de estar
presente às aulas síncronas; para outro, em um bom aproveitamento e provavelmente em
sua permanência no curso. Para além dos extremos nessa linha de impacto em relação aos
aprendizes, encontra-se o aprendiz que, apesar das dificuldades com as quais se deparou
no decorrer do processo, conseguiu se desenvolver no curso remoto, embora tenha
manifestado claramente que se sente prejudicado por essa modalidade. Nesse último
caso, permanece a incógnita sobre sua permanência futura no curso, caso este continue a
ser ministrado remotamente.
Outro ponto a ser analisado diz respeito à monitora como participante do processo
de ensino-aprendizagem. A modalidade de ensino remoto causou impacto não só sobre os
aprendizes matriculados como alunos do curso de russo, mas também sobre a monitora
que atuou com a turma tanto na modalidade presencial, no nível 1, como na modalidade
remota, no nível 2. Evidentemente, o fato de a aluna já ter atuado como monitora
no primeiro nível e ter obtido alguma experiência de ensino, tanto através das aulas
ministradas, como através das reuniões de orientação, treinamento e demais atividades
relacionadas à extensão, causou impacto positivo na forma como atuaria durante o
ensino remoto emergencial. Além disso, fatores também correlacionados às diferenças
individuais da monitora em relação a outros monitores podem ter influenciado no que ela
avalia como experiência positiva com o ensino remoto emergencial.
Considerações finais
O presente trabalho buscou apresentar uma breve reflexão sobre a complexidade
no ensino de língua russa no CLAC, dada a mudança drástica na modalidade de ensino
adotada no referido projeto de extensão, do modo presencial para o modo remoto.
Buscamos observar em que medida a mudança no regime das aulas impacta aspectos
como interação, autonomia e motivação, tendo em vista que esses são subsistemas do
sistema adaptativo complexo que é o ensino-aprendizagem de segunda língua.
Este trabalho se coloca como um primeiro passo em direção à abordagem dos
Referências bibliográficas
Diante da conjuntura de pandemia no ano de 2020, foi necessária uma adaptação, do modo presencial
para o remoto, no curso de Português Língua Estrangeira (PLE) que integra o Projeto de Extensão Cursos
de Línguas Abertos à Comunidade (CLAC), da Faculdade de Letras da UFRJ. Sendo assim, repensar o
processo de ensino-aprendizagem de línguas tornou-se compulsório, pois tanto nós, professoras, junto
à coordenação, quanto os alunos, precisamos nos adaptar ao contexto do ensino remoto. Portanto,
o objetivo deste trabalho foi descrever alguns dos desafios enfrentados durante todo o processo.
Pretendemos refletir, em especial, sobre os papéis de professores e alunos no ensino remoto; a importância
redobrada da autonomia da aprendizagem nesse contexto; a autoavaliação como caminho para favorecer
o desenvolvimento dessa autonomia; e a possível interferência das emoções no ensino-aprendizagem de
línguas. Para tanto, foram coletadas, por meio das plataformas do Google, narrativas dos alunos, orais
e escritas, e aplicadas autoavaliações. Como base teórica, utilizamos, principalmente, os conceitos de
avaliação formativa, autoavaliação e autonomia. A partir da análise dos dados, percebemos que houve
mudança no papel do professor, que deixou de ser visto como o elemento principal do processo de ensino-
aprendizagem, e do aluno, que passou a ser mais agentivo, desenvolvendo sua autonomia. Notamos,
ainda, que os estudantes colaboradores desta pesquisa se mostraram, em sua maioria, adaptados ao novo
modelo de ensino, relatando não terem tido grandes dificuldades em lidar com as plataformas.
PALAVRAS-CHAVE: Autoavaliação; Autonomia; Emoção; Ensino-aprendizagem de línguas; Português
língua estrangeira.
ABSTRACT
Upon the conjecture of pandemic in the year 2020, it was necessary to adjust, from the classroom to the
remote mode, in the course Portuguese as a Foreign Language (PortuguêsLínguaEstrangeira – PLE), which
is part of the Extension Project Language Courses open to the Community (Projeto de ExtensãoCursos de
LínguasAbertos à Comunidade - CLAC), offered by the UFRJ Liberal Arts College. This way, rethinking the
language teaching-learning process became mandatory, once teachers, along with the coordination office,
as well as students need to adjust to the remote learning context. Therefore, the objective of this work
was to describe some of the challenges faced during the whole process. We intend to specially reflect over
the roles teachers and students developed in the remote learning: the doubled importance of autonomy
in learning within this context; self-evaluation as a way to favor the development of such autonomy; and
the possible interference of emotions in language teaching and learning. In order to do so, students’ oral
and written narratives were collected by Google platforms and self-evaluation instruments were applied. As
theoretical framework, we mainly used the concepts of formative evaluation, self-evaluation and autonomy.
From data analysis, we realized there have been changes in the role developed by teachers, who are no
longer seen as the main element of the teaching and learning process, and in the student’s role, who
became more agentive, developing autonomy. We also observed that most of the students who cooperated
in this research are adapted to the new learning model and reported having no great difficulties dealing
with the platforms.
KEYWORDS: Self-evaluation; Autonomy; Emotion; Language teaching and learning; Portuguese foreign
language.
SANTOS ET AL. Do presencial para o remoto: desafios para o ensino de ple no contexto pandêmico.
Introdução
desses estudantes, como Alemanha, Benin, Colômbia, Congo, Cuba, Egito, Haiti, Irã,
Iraque, Itália, Palestina e Síria e residem em diferentes bairros da cidade do Rio de Janeiro
ou até mesmo em municípios vizinhos. De acordo com as informações coletadas no
formulário da primeira autoavaliação, pouco mais de um quarto dos alunos assistia às
aulas síncronas do local de trabalho, em contraste com a grande maioria, que assistia às
aulas da própria residência. Ainda segundo os dados desse mesmo formulário, metade
deles acompanhava as aulas pelo celular enquanto os outros utilizavam um computador
ou notebook para essa finalidade.
Esta pesquisa se justifica na medida em que, em razão da pandemia, fomos submetidas
a um novo contexto de atuação. Dessa forma, tornou-se premente investigar sobre as
condições de organização e funcionamento da nova conjuntura educacional, bem como
compreender quais as melhores estratégias de ensino-aprendizagem para o ensino remoto.
Outro aspecto fundamental, ao qual precisamos nos dedicar, foi como ocorre a relação
entre alunos e professores nesse contexto e o que difere do ensino presencial. Nesse
percurso de adaptação, o planejamento e a realização das aulas também se apresentaram
como questões cruciais, e o conceito de sala de aula invertida, conforme debatido em
Ofugi e Figueiredo (2017, p.57)1, imprescindível, mas não nos aprofundaremos com
relação a esse aspecto no presente artigo.
Os objetivos deste trabalho foram descrever, refletir e buscar melhor compreender os
desafios enfrentados durante todo o processo, desde lidar com a situação da pandemia, até
ter que mudar o modelo de curso oferecido, de curso intensivo para curso regular. Outro
desafio inevitável foi a avaliação da aprendizagem, que nos revelou desdobramentos
instigantes, os quais são aqui apresentados. Desse modo, ao longo das reuniões de
orientação, a equipe logo percebeu a importância da avaliação formativa, da autoavaliação,
do desenvolvimento da autonomia do aluno nesse contexto e da possível interferência
das emoções no processo de ensino-aprendizagem, decidindo, então, planejar aulas e
elaborar autoavaliações que viabilizassem o registro da percepção dos alunos em relação
às múltiplas adaptações requeridas pelo semestre letivo em andamento.
Quanto à metodologia, a pesquisa foi de natureza qualitativa, baseada nos
pressupostos metodológicos da pesquisa-ação, em que buscamos compreender melhor o
1 Segundo Ofugi e Figueiredo (2017, p.57), a sala de aula invertida “pressupõe que a apresentação de conteúdos,
tradicionalmente feita em sala pelo professor, seja realizada em casa por meio de material desenvolvido ou
designado por ele, geralmente em formato de vídeos que são hospedados online, enquanto atividades de
compreensão e aprofundamento que seriam passadas para casa são realizadas durante a aula, com o auxílio do
professor e de colegas”.
Quadro teórico
Avaliação formativa
Ao fazer uma retrospectiva sobre a avaliação, Duboc (2014), com base em Álvarez
Méndez (2002), lembra que as características frequentemente a ela atribuídas, como
objetividade, linearidade e homogeneidade, começam a ser discutidas sob a influência
da antropologia e da sociologia na segunda metade do século XX. A partir daí, são
relembrados os propósitos do ato de avaliar, intrinsecamente subjetivo:
Recuperar a noção de avaliar como ato subjetivo possibilitou uma melhor percepção
dos diferentes tipos de avaliação, definidos de acordo com seus objetivos. Segundo Bessani
e Behar (2009, p.95), alguns deles são: i) avaliação diagnóstica, que é aplicada com a
finalidade de averiguar o que o aluno já sabe sobre o conteúdo de determinada disciplina
ou curso; ii) avaliação formativa, inerente ao processo de ensino-aprendizagem na
medida em que o conhecimento vai se engendrando por meio das atividades pedagógicas
realizadas; iii) avaliação somativa, normalmente acontece no final do processo de ensino-
aprendizagem com o intuito de verificar se os objetivos estabelecidos foram atingidos. A
prova e/ou teste são exemplos emblemáticos da avaliação somativa e, devido ao fato de
ser a mais frequentemente adotada, é mimetizada como a única modalidade de avaliação
educacional possível.
Segundo Luckesi (2014, p.192), “a avaliação é uma prática que necessariamente
está presente em todos os atos humanos. Ela é subsidiária da busca do melhor resultado
em qualquer ação humana.” No âmbito do presente trabalho, ressalta-se a importância
da prática avaliativa para o processo de ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras.
Contudo, em primeiro lugar, cabe pontuar que conferir uma nota difere-se de avaliar.
Assim, a nota escolar representa“uma forma de registrar o testemunho do educador
ou da educadora de que ele (ela) acompanhou o educando” (LUCKESI, 2014, p.192),
enquanto avaliar se relaciona com essa busca por melhores resultados. Essa distinção
também é destacada por Rodrigues (2019, p.13), para quem “o uso de notas na avaliação
[…] está associado à decisão sobre aprovação e reprovação dos estudantes”, o que foge
do objetivo de aprendizagem e melhoria, pois foca apenas no resultado e não no processo.
Isso posto, Luckesi (2014) diz ainda que, para a prática avaliativa, é preciso haver
um planejamento da ação, o que novamente converge com a visão de Rodrigues (2019,
p.13):
Ademais, os docentes precisam saber com clareza o que avaliar e como avaliar, além
de ser fundamental que os alunos entendam esse processo avaliativo. Essa concepção
se justifica pela visão da avaliação formativa, cuja função, segundo Brown (2006, apud
RODRIGUES, 2010, p.7), é “avaliar os alunos no processo de ‘formar’ suas competências
e habilidades com o objetivo de ajudá-los a continuar esse processo de crescimento”.
Nesse quadro, o feedback é um elemento fundamental (RODRIGUES, 2019, p.16), visto
que situa o aluno no seu processo de aprendizagem e ajuda o professor a aperfeiçoar o
ensino de acordo com as necessidades do aprendiz.
Logo, entendemos que a avaliação formativa não deve ser vista como um produto
final, ao qual será atribuída uma nota e uma eventual aprovação ou reprovação, e sim como
um recurso didático integrado ao processo de ensino-aprendizagem. “Diferentemente da
prova”, conforme destaca (Rodrigues, 2019, p.18), “a autoavaliação não é um instrumento
tão utilizado em sala de aula, porém pode ser considerada uma potencializadora da
avaliação formativa”. Sendo assim, cabe discutir agora o conceito de autoavaliação, o
qual também preza pela busca de melhores resultados através do processo avaliativo.
Autoavaliação
De acordo com Régnier (2002), a autoavaliação pode ser definida como um processo
no qual o indivíduo se julga de forma voluntária e consciente, uma vez que o objetivo
é o melhor conhecimento de si, de suas ações, condutas e do aperfeiçoamento do seu
desenvolvimento. Assim, “a autoavaliação é uma grande aliada da avaliação formativa e
uma forte estratégia metacognitiva” (VILLAS BOAS, 2008, p. 74), pois serve como um
recurso para se conhecer os avanços conquistados pelos estudantes. Além disso, fomenta
o exercício da autonomia e da reciprocidade das relações, já que a autoavaliação possui
como essência convidar o estudante a participar da avaliação.
A autoavaliação pode ser um instrumento importantíssimo para o processo de
aprendizagem de línguas, tanto no ensino presencial quanto no remoto, visto que o
estudante é incentivado a se conscientizar com relação ao seu desenvolvimento e
também a buscar caminhos para preencher lacunas que possivelmente ainda precisam ser
resolvidas. Logo, conforme enfatiza Silva, Bartholome e Claus (2007), é fundamental dar
destaque para as conclusões chegadas por meio de uma autoanálise e, principalmente, que
elas se tornem benefícios para o aprendizado. “Portanto, ao se conscientizarem de seu
nível, de suas limitações e potencialidades, alunos, professores e instituições poderão ser
capazes de oferecer uma melhor contribuição para o aprimoramento do processo ensino/
aprendizagem.” (SILVA; BARTHOLOMEU; CLAUS, 2007, p. 92).
Dessa forma, o estudante assume um papel ativo no processo em que é autor e
avaliador. Por isso, como afirma Régnier (2002), esse processo é complexo, visto que os
indivíduos (professores e alunos) possuem como objetivo um melhor conhecimento deles
mesmos. Tratando-se especificamente de estudantes de PLE de nacionalidades diversas,
essa avaliação tende a ser ainda mais afetada por suas diferentes culturas. Por isso, é
preciso considerar as especificidades de cada um para que o processo de autoavaliação
não gere desconfiança, conforme salienta o mesmo autor: “essa desconfiança é oriunda
de um receio de subestimação, mas sobretudo de superestimação de uma competência.”
(RÉGNIER, 2002, p. 14).
Portanto, é importante que a divergência de opiniões (dos estudantes com relação a
si mesmos e dos professores) não influencie no processo de modo que se perca aquilo que
merece destaque: a intenção de desenvolver a capacidade autoavaliativa no aluno para
que ele reflita sobre seu aprendizado e se adapte conforme seus desejos e necessidades,
despertando, assim, sua autonomia.
Autonomia
autonomia por parte do aluno para que o seu aprendizado seja exitoso.
Para discutirmos sobre o conceito de autonomia nesse novo contexto educacional,
utilizaremos como suporte teórico as visões de Henri Holec (1981) e Dickinson (1987),
pioneiros na inserção desse conceito no ensino de línguas e, ainda, a visão de Paulo Freire
(1996). Enquanto os dois primeiros autores discutem a visão de autonomia dos alunos,
o último elucida também a importância da autonomia do professor, até mesmo visando
promovê-la nos educandos. Assim, para compreendermos melhor tais perspectivas,
buscamos entender como cada um dos autores define esse conceito.
Para Henri Holec (1981 apud NICOLAIDES; FERNANDES, 2003, p. 79),
autonomia seria “a habilidade de encarregar-se de sua própria aprendizagem”. De
acordo com Dickinson (1987 apud PERINE, 2014, p. 205) seria “uma situação na qual o
aprendiz é totalmente responsável por todas as decisões relativas ao seu aprendizado e à
implementação dessas decisões”.
Dessa forma, a responsabilidade do aluno diante do seu aprendizado é fundamental
para o seu bom desempenho. Uma vez que os aprendizes são capazes de desenvolver
sua autonomia, podem, consequentemente, obter bons resultados em seus processos de
aprendizagem. Todavia, trabalhar a autonomia não é uma tarefa fácil, por isso,segundo
Holec (1990 apud FERNANDES, 2002, p. 23), “para desenvolver autonomia, o aprendiz
precisa estar preparado psicológica e praticamente”.
Outro ponto indispensável para ser debatido quando falamos sobre autonomia do
aluno é o lugar que ocupa o professor no processo de aprendizagem em que se requer
mais responsabilidade e agentividade do aluno. É importante salientar que ter autonomia
no aprendizado não significa dispensar o educador, uma vez que “o simples fato de o
aluno trabalhar sozinho não significa que estará desenvolvendo autonomia” (Dickinson,
1994, p. 3 apud NICOLAIDES, FERNANDES, 2003, p. 90). Assim, a autonomia será um
fator muito importante para o educando, mas não determinante. Cabe ainda ao professor,
no seu papel de especialista, promover atividades, apresentar e ensinar novos conteúdos,
propor tarefas e estimular o educando a praticar aquilo que está aprendendo.
Paulo Freire (1996) também chama a atenção para o fato de a autonomia do aluno
ser imprescindível, considerando que o professor deve respeitar e aceitar a colaboração
dele, de forma a não atuar como único detentor de poder. Assim, segundo o autor,
já salientei em como ter uma prática educativa em que aquele respeito, que sei
dever ter ao educando, se realize em lugar de ser negado.[...] (FREIRE, 1996, p.33)
Além disso, Paulo Freire (1996) também ressalta que no exercício da nossa profissão
é preciso refletir sobre todo o percurso de ensino-aprendizagem, o que inclui tanto o lugar
do professor quanto o lugar do aluno nesse processo. Desse modo, o autor dá continuidade
a essa ideia explicando que:
[...] Isto exige de mim uma reflexão crítica permanente sobre minha prática através
da qual vou fazendo a avaliação do meu próprio fazer com os educandos. O ideal é
que, cedo ou tarde, se invente uma forma pela qual os educandos possam participar
da avaliação. É que o trabalho do professor é o trabalho do professor com os alunos
e não do professor consigo mesmo.” (FREIRE, 1996, p. 33)
Emoção e Aprendizagem
influenciariam nesse processo. Considerando que, para Arnold e Brown (1999, p. 8 apud
ARAGÃO, 2008, p. 2656) há uma influência das emoções no processo de aquisição,
sendo marcado por “traços individuais da personalidade que residem no aprendiz (...)
fatores intrínsecos do aprendiz”, e que Larsen-Freeman (2001, p. 16 apud ARAGÃO,
2011, p. 168) afirma que “muitos traços individuais de personalidade diferentes facilitam
ou inibem a aquisição de segunda língua”, buscamos observar como os traços individuais
dos estudantes poderiam influenciá-los diante do desafio da pandemia e do ensino remoto.
Sendo assim, outro aspecto interessante seriam as variáveis afetivas, isto é, os fatores
que são responsáveis pelo modo como agimos diante de uma situação. Assim, um aluno
pode se considerar motivado ou desmotivado, animado, ansioso, a partir da forma como
ele se sente e, consequentemente, atua em determinado contexto. Gardner e MacIntyre
(1993, p. 1 apud ARAGÃO, 2011, p.168) explicam que “por variáveis afetivas definimos
aquelas características emocionalmente relevantes que influenciam na maneira como
reagiremos a uma situação qualquer”.
Entendemos, então, de acordo com a perspectiva emocional no aprendizado de
línguas, que é muito “importante compreender como os alunos abordam sua aprendizagem,
suas expectativas, seus eventos marcantes e as razões que os movem na aprendizagem,
como argumentam Aragão (2005, 2007) e Miccoli (2007)” (ARAGÃO, 2011, p.168).
Analisar tais aspectos dentro do contexto pandêmico torna-se um desafio ainda maior,
visto que cada aluno pode lidar com essa situação de uma determinada maneira, tendo
como interferência diferentes motivações.
Portanto, objetivamos, nesta pesquisa, investigar algumas das diferentes
interpretações e reações dos nossos alunos no processo de aprendizagem durante a
pandemia, bem como de que forma os estudantes se adaptaram à repentina mudança
de modelo de ensino, analisando quais foram os pontos destacados pelos alunos para
justificar suas reações.
2 Trecho do Artigo 3º do Capítulo I (Da concepção, das diretrizes e dos princípios) da Resolução Nº 7, de
18/12/2018, doMEC/CNE/Câmara de Educação Superior.
Fonte: <https://covid.saude.gov.br/>.
A atividade de produção escrita, que também compõe o corpus, foi enviada ao final
da aula síncrona em que discutimos os temas anteriormente citados. O objetivo dessa
proposta foi observar, também, as opiniões dos alunos sobre as aulas remotas e verificar
se as narrativas feitas durante a aula por vídeo estavam de acordo com o que eles relataram
na escrita, buscando uma triangulação dos dados. A atividade foi enviada pelo Google
Classroom com a proposta destacada a seguir.
Em seguida, na Seção 2, foi elaborada uma sequência de assertivas para que os alunos
marcassem apenas uma opção de resposta para cada uma, explicitando suas opiniões
sobre como estava se desenvolvendo o processo de aprendizagem no ensino remoto. As
assertivas foram as seguintes: 1) Estudei por minha conta, além das aulas; 2) Cheguei
pontualmente para as aulas por vídeo; 3) Frequentei adequadamente as aulas por vídeo;
4) Participei ativamente das aulas por vídeo; 5) Assisti às gravações sempre que não pude
estar presente no momento da aula; 6) Fiz perguntas quando não entendi alguma coisa;
7) Demonstrei interesse nos assuntos trabalhados nas aulas; 8) Participei das atividades
propostas no Google sala de aula; 9) Respeitei o prazo para o envio das atividades; 10)
Cumpri todas as atividades propostas. E as opções para marcar como resposta foram: sim;
às vezes; poucas vezes e não.
A segunda autoavaliação propôs que o aluno relatasse como percebeu o seu processo
de aprendizagem ao longo do semestre, a partir do enunciado que segue abaixo.
recursos digitais, em especial o Google Classroom que possibilita que o professor organize
previamente os materiais e as atividades em tópicos, além de contar com um mural que
pode servir como recurso para interação nos momentos assíncronos e o Google Meet,
plataforma utilizada para os encontros síncronos.
No caso específico do curso de português para estrangeiros, foi necessário ajustar
o módulo para que ele fosse extensivo (com duração de 4 meses) e não mais intensivo
(com duração de 2 meses) como era antes; assim, a adaptação do ensino presencial para
o remoto foi desafiadora tanto para nós, monitoras, quanto para os alunos. Desse modo,
foi preocupação constante da equipe manter os canais de comunicação abertos, tanto por
meio das plataformas Google quanto pelo Whatsapp, com o intuito de sanar dúvidas e de
conversar com os alunos sobre temas relacionados às aulas, permitindo acompanhar seus
processos de adaptação ao ensino remoto e suas percepções, inclusive em interações mais
espontâneas.
Sendo assim, houve um cuidado da equipe com relação à utilização das plataformas
pelos alunos, em especial no que concerne aos estudantes mais velhos e/ou com pouca
familiaridade com o mundo digital, para quem o processo de adaptação às plataformas
poderia ser mais penoso. Para que os alunos fossem se adaptando aos poucos às plataformas,
a equipe de PLE preparou dois vídeos iniciais para os alunos: um de boas-vindas e outro
de apresentação das plataformas, além da indicação de tutoriais disponíveis na internet.
Mesmo assim, como previsto, alguns alunos relataram dificuldades enfrentadas ou receios:
1 - No início eu tive a dificuldade para intervir na aula porque não sabia como
ligar o microfone. (estudante do nível 3)
2 - Mesmo dessa forma de vídeo deu pra se adaptar, confesso que não foi fácil
no início, mas ao decorrer do tempo nos acustumamos. (estudante do nível 3)
3 - No começo foi difícil e com o tempo foi ficando mais fácil. Assisti a maior
parte das aulas e sempre estive presente regularmente e também terminei
todas as atividades e sempre fui ativo nas aulas. (estudante do nível 1)
Por outro lado, ainda sobre o processo de adaptação, alguns alunos ressaltaram a
escolha da plataforma como fator determinante para o aprendizado, além de elencarem
ressalvas no que diz respeito aos recursos digitais utilizados no curso:
4 - No início eu acho que vai ser muito ruim estudar on-line, mas aparentemente
eu acho que vocês prepararam muito bem a plataforma. Eu acho que a gente não
vai aprender como no presencial, mas depois que experimentei eu achei legal,
não tem muita diferença entre o que vou aprender nessa plataforma e o que vou
aprender no presencial. (estudante do nível 3)
5 - Pra mim o mais difícil foi me adaptar a todos os programas que todos são
diferentes e também para carregar as atividades que eles enviaram era muito
diferente porque eram diferentes plataformas. Outra coisa é que o pessoal não
fica muito focado, muito concentrado por muito tempo. (estudante do nível 3)
Podemos observar, assim, que a maior parte dos alunos do grupo pesquisado se
adaptou bem ao ensino remoto e que se mostrou razoavelmente confortável com o uso dos
recursos utilizados nas aulas. Embora alguns tenham relatado dificuldades no início, no
decorrer do curso, ratificaram que o uso das plataformas foi favorável, conforme veremos
ao longo desta seção do artigo.
No que tange à autoavaliação, vimos como é importante a conscientização das
limitações e potencialidades de alunos e professores, visando o aprimoramento do
processo de ensino/aprendizagem (SILVA; BARTHOLOMEU; CLAUS, 2007, p. 92); por
isso, utilizamos esse recurso para fazer com que os alunos tivessem um papel ativo nesse
processo. A partir de algumas informações presentes na Seção 1 da primeira autoavaliação,
percebemos que a maior parte dos alunos não sentiu muita diferença entre os modelos
de ensino presencial e remoto. Um deles declarou, ainda, que sentiu mais facilidade no
modelo remoto.
6 - Pessoalmente não encontrei nenhuma diferença ou dificuldade para falar nas aulas
remotas do curso e a professora sempre dá oportunidade de falar. (Estudante do nível 3)
7 - Porque para mim são iguais, seja qualquer forma vai me facilitar a falar bem
português. (estudante do nível 3)
8 - Quase não senti diferença nenhuma pois a forma que o curso é dada, é como se
fosse presencial. A explicação é a mesma, a atenção da professora sobre tirá dúvida é a
mesma e a forma de lecionar também é a mesma, isso me ajudou muito a não sentir a
diferença com o curso dado no presencial. (estudante do nível 3)
9 - Achei mais fácil que no presencial. E muito diferentenas aulas presenciais, na hora
das provas e dever de casa temos mais tempos para enviar. (estudante do nível 4)
12 - No meu caso, eu me adaptei muito fácil ao novo formato remoto que estamos
praticando atualmente. Nos primeiros dias tive uma certa dificuldade apenas
para aprender a respeito de todos os recursos que o site Google Sala de Aula nos
proporciona, mas usando por alguns dias eu consegui captar o que ele é capaz de
fazer e a praticidade realmente é fenomenal. (estudante do nível 3)
que deve ser considerado e que foi o foco das práticas avaliativas realizadas durante o
ensino remoto, é o percurso, conforme preconiza a avaliação formativa, e não apenas o
resultado final obtido numa única prova, tornando indispensável a autoavaliação.
Como vimos, a autonomia é um fator fundamental no processo de aprendizagem, uma
vez que é muito importante que os alunos busquem, para além das aulas e do professor,
estratégias que possam auxiliá-los nesse processo. Esse foi um dos motivos da escolha
da autoavaliação como possibilidade avaliativa no curso remoto de PLE, pois, assim,
buscamos fazer com que o aluno tomasse consciência do seu processo de aprendizagem
e da responsabilidade que precisa assumir para que possa aprender.
Dos dados da Seção 1 da primeira autoavaliação, selecionamos algumas respostas
referentes às perguntas “Em comparação com o curso presencial, como foi para você
trabalhar a fala/ a oralidade nas aulas remotas durante a pandemia?” e “Em comparação
com o curso presencial, como foi para você trabalhar a escrita nas aulas remotas durante
a pandemia?”. Como respostas, surgiram opiniões divergentes dos alunos, alguns
considerando mais fácil acompanhar as aulas remotas e outros, mais difícil.
13 - Achei mais difícil que no presencial. Na escrita foi muito difícil porque
eu não tinha tempo para ser acompanhado na correção dos erros gramaticais.
(estudante do nível 4)
14 - Nao tem como entender as coisas, não é igual a sala de aula. (estudante do
nível 4)
16 - Achei mais fácil do que o presencial, por que nós podemos \guardar tempo.
E a professora faz tudo muito semples. (estudante do nível 1)
aprendizagem.
No comentário seguinte, outro aluno destacou “não ser igual” à sala de aula. Podemos
inferir, com base no modo como esse aluno se expressou, que ele não reconhece, ainda, as
plataformas do Google como um tipo de “sala de aula”.
A partir da seleção de algumas respostas da segunda autoavaliação, em que os alunos
tiveram que escrever um relato falando um pouco sobre o seu processo de aprendizagem,
podemos perceber a postura e a adaptação dos alunos. Nos trechos abaixo, eles apontaram,
por exemplo, as dificuldades que tiveram.
17 - Uma possível dificuldade foi a utilização do Google Sala de aula, devido aos
recursos que ele oferece, mas com uma semana lendo e mexendo bastante no site
pude aprender praticamente tudo que ele oferece. (estudante do nível 2)
18 - Quanto aos exercícios que nos foram enviados, já os tinha feito antes da data
que nos foi dada porque quero muito aprender português. (estudante do nível 2)
Nessas falas, podemos observar que, apesar das dificuldades encontradas, a vontade
de aprender provocou a iniciativa nos alunos de agirem de forma autônoma, buscando
sanar as adversidades e possibilitando a continuidade do processo de aprendizagem. Essa
situação mostra exatamente o que aponta Dickinson (1987 apud PERINE, 2014, p. 205)
sobre o fato de o aprendiz ser totalmente responsável pelas suas decisões diante do seu
processo de aprendizagem.
Além das autoavaliações, buscamos analisar as opiniões dos alunos a partir das
discussões nas aulas síncronas, visto que, nesse momento, eles puderam dar seus pontos
de vista em um contexto de interação espontânea. Alguns alunos destacaram ter percebido
que no modelo remoto é preciso mais responsabilidade e compromisso para que o
aprendizado seja efetivo.
20 - Professora, eu acho que a modalidade online é muito boa, mas aqui a gente
tem que ter maior compromisso para estudar (estudante do nível 2)
21 - Tem que se organizar muito mais porque quando é presencial é claro que
e sempre esse horário e também agora, por exemplo, esse encontro aqui, fazer
as tarefas e também enviar online, ver online, tem que se organizar muito mais
(estudante do nível 3)
22 - Uma coisa que eu falo com a (…) é que a gente precisa falar entre nós em
português para praticar (estudante do nível 2)
23 - Estar animado me afetou positivamente, foi mais fácil para mim aprender
melhor e praticar o que aprendi. (estudante do nível 3)
29 - Fiquei dominada pelo medo e pela ansiedade, mas não desisti de pesquisar
e aprendi, me beneficiando com o emprego de novas tecnologias de informação
e comunicação. (estudante do nível 2)
É interessante destacar que, em algumas falas das aulas síncronas sobre o tema
em pauta, alguns alunos demonstraram se sentir confortáveis para expressar alguns
sentimentos em relação ao novo modelo de ensino e ao momento da pandemia:
Com base nas nossas análises, foi possível perceber que muitos alunos gostaram
da experiência com o ensino remoto, apesar das dificuldades encontradas no percurso.
Notamos, também, que muitos deles se sentiram animados pelo simples fato de que esse
novo modelo foi o que possibilitou que eles continuassem os estudos. A continuidade do
curso é especialmente importante para solicitantes de refúgio e para pessoas em processo
de naturalização, por exemplo, pois o certificado, obtido no término do curso, é primordial
para consecução desses objetivos.
Merece destaque, ainda, bastante distante do conceito da avaliação formativa, o
último comentário apresentado acima, em que o aluno diz se sentir com medo no “dia da
avaliação”. Nessa fala, notamos a percepção engessada que, muitas vezes, os alunos, e
alguns professores, têm de aprendizado, considerando a avaliação algo pontual, e não um
processo, como salienta Brown (2006 apud RODRIGUES, 2010, p.7).
É importante mencionarmos que embora representem a minoria entre os colaboradores
desta pesquisa, alguns alunos expressaram preferência pelo modelo de ensino presencial.
Ao serem questionados sobre o ensino remoto e se gostariam que as aulas continuassem
nesse modelo mesmo após a pandemia, alguns alunos responderam:
34 - Acho que nas aulas presenciais aproveito mais. Aprendo mais. (estudante
do nível 3)
35 - Com certeza essa experiência foi boa mas para falar sério, temos saudades
dos alunos , amigos, e claro do professores. (estudante do nível 4)
Considerações finais
Referências bibliográficas
Linguagem & Ensino, Pelotas, v.20, n.2, jul./dez. 2017. Disponível em: <https://periodicos.
ufpel.edu.br/ojs2/index.php/rle/article/view/15235>. Acesso em: 19 dez. 2020.
TRIPP, D. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, set./dez, 2005. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ep/v31n3/a09v31n3.pdf >. Acesso em: 10 de out. 2020