Você está na página 1de 6

CURSO ONLINE DE CINEMA - MATERIAL EXCLUSIVO

CINEMA NOVO BRASILEIRO - PARTE 1


Curso Online de Cinema - AULA 019

INTRODUÇÃO

O Cinema Novo representa o momento mais importante da história do cinema brasileiro. Na


primeira aula desta série de três, será apresentado o contexto histórico do início do
movimento e seus primeiros filmes.

A principal referência desta aula é o artigo de Fernão Pessoa Ramos sobre o Cinema Novo,
texto encontrado no livro ​Nova História do Cinema Brasileiro: Volume 2​.

CONTEXTO HISTÓRICO MUNDIAL

Nos anos 40 e 50, alguns movimentos surgem no mundo após a Segunda Guerra. Filmes
de baixo orçamento que buscavam novas formas de filmar, buscavam formas de retratar a
situação social do pós-guerra na Europa. Eram filmes que possuíam uma relação muito
próxima com a realidade.

Já no final da Guerra surge o Neorrealismo Italiano. O movimento representava temas


sociais. Os diretores filmavam de maneira mais crua, usavam locações reais e atores não
profissionais.

A Nouvelle Vague francesa, nos anos 50 e 60, tinha preceitos parecidos. Demonstrava uma
relação mais livre e espontânea com a linguagem.

Nos anos 60, na Alemanha, um grupo de cineastas começou a fazer filmes de baixo
orçamento com uma abordagem mais política. Esse movimento ficou conhecido como Novo
Cinema Alemão.

Aos poucos, essa abordagem moderna começa a se refletir no cinema brasileiro.

RIO, 40 GRAUS (1955) - Nelson Pereira dos Santos

Nos anos 50, essa estética do pós-guerra aparece no Brasil. ​Rio, 40 Graus ​(1955), de
Nelson Pereira dos Santos, mudou a história do cinema brasileiro. O diretor expressa uma
relação moderna com a linguagem e com o tema do filme.

A obra acompanha um dia na vida de cinco meninos moradores de uma comunidade do Rio
de Janeiro. Isso acontece de forma realista, que lembra o Neorrealismo Italiano pela
maneira como o filme retrata essa realidade social.
CURSO ONLINE DE CINEMA - MATERIAL EXCLUSIVO

São usadas locações reais que retratam uma movimentação urbana legítima, repercutindo
em uma visão mais humanista da realidade social das pessoas menos favorecidas.

RIO, ZONA NORTE (1957) - Nelson Pereira dos Santos

Dois anos depois, Nelson Pereira dos Santos lança ​Rio, Zona Norte (​ 1957). O filme junta a
abordagem realista de ​Rio, 40 Graus​ com uma aproximação melodramática.

O personagem principal, um sambista interpretado por Grande Otelo, cai de um trem em


movimento. O longa relembra momentos da vida desse homem enquanto ele aguarda a
chegada do socorro após sofrer o acidente. O diretor equilibra muito bem o retrato social
com o drama do personagem.

Nelson Pereira dos Santos é uma figura de transição entre o cinema moderno brasileiro e o
que a partir dos anos 60 foi denominado Cinema Novo.

O PÁTIO (1959) - Glauber Rocha

Em 1957, Glauber Rocha, a figura mais importante do Cinema Novo, começa a filmar o
curta ​O Pátio​, que veio a ser finalizado somente em 1959.

O filme não tem muita relação com a estética do Cinema Novo. É um curta experimental, no
qual um casal se movimenta e interage de maneira simbólica (que lembra o simbolismo de
Tramas do Entardecer,​ de Maya Deren), sobre um piso que parece um tabuleiro de xadrez.

REDENÇÃO (1959) - Roberto Pires

Em 1959, Roberto Pires fez o primeiro longa produzido na Bahia. ​Redenção é um filme que
remete ao cinema noir. Nele, dois homens hospedam em casa um indivíduo misterioso.

Roberto Pires era bastante interessado em cinema de gênero. Ele tinha uma abordagem
mais tradicional e mais narrativa do que os diretores do Cinema Novo.

Pires criou uma lente anamórfica para filmar em cinemascope. Em algumas cenas de
Redenção ele usa o enquadramento mais largo do cinemascope para criar efeitos
estilizados.

A produtora Iglu Filmes, de Pires, produziu vários filmes nos anos 60, como ​Barravento
(1962), o primeiro longa de Glauber Rocha.

Por buscar uma estética mais tradicional, Roberto Pires ficou de fora do núcleo do Cinema
Novo.
CURSO ONLINE DE CINEMA - MATERIAL EXCLUSIVO

O NÚCLEO INICIAL DO CINEMA NOVO

Na virada dos anos 50 para os anos 60, enquanto na Bahia a Iglu Filmes de Roberto Pires
fazia filmes mais tradicionais, jovens cineastas cariocas buscavam novas formas de cinema.

Glauber Rocha então passa a se interessar por essa estética. Rocha começa a viajar para o
Rio de Janeiro e na cidade forma-se uma espécie de núcleo inicial do Cinema Novo.
Glauber Rocha, Paulo César Saraceni e Joaquim Pedro de Andrade foram as figuras mais
importantes dessa época. Saraceni e Joaquim Pedro fizeram, no início dos anos 60, dois
curtas que deram início oficial ao Cinema Novo.

ARRAIAL DO CABO (1960) - Paulo César Saraceni, Mário Carneiro

Arraial do Cabo (1960) mostra uma comunidade de pescadores afetada por uma indústria
que se instala na região. Saraceni codirigiu o curta com Mário Carneiro, um grande diretor
de fotografia. O curta apresenta imagens bem estilizadas e expressivas da comunidade e
do ambiente no qual é filmado.

Mário Carneiro utiliza ângulos interessantes. Filma tanto a indústria como a paisagem
natural de maneira expressiva. O filme tem alguns momentos didáticos, narrados por uma
voz off, mas é um documentário que depende mais do aspecto visual.

COURO DE GATO (1960) - Joaquim Pedro de Andrade

Couro de Gato ​(1960) conta a história de alguns garotos de uma comunidade do Rio de
Janeiro que tentam roubar gatos para que o couro dos animais seja usado para fazer
tamborins. É um curta com uma narrativa dinâmica. Ele mistura situações. A fotografia
também é de Mário Carneiro. Joaquim Pedro concilia um olhar lírico com o retrato da
realidade popular.

Tanto ​Arraial do Cabo ​como ​Couro de Gato ​foram para festivais europeus e tornam-se
conhecidos. Eles refletem o novo olhar do cinema brasileiro da época.

A trilogia formada por ​Arraial do Cabo​, ​Couro de Gato ​e ​Barravento estabelece o movimento
nomeado em um artigo do crítico Ely Azeredo como Cinema Novo. Sendo assim, o
movimento nasce oficialmente no Rio de Janeiro.
CURSO ONLINE DE CINEMA - MATERIAL EXCLUSIVO

BARRAVENTO (1962) - Glauber Rocha

Barravento (1962) é um filme mais tradicional em comparação às obras seguintes de


Glauber Rocha.

Quando assistimos ao filme, é visível um certo aspecto moderno e o retrato de uma


realidade que remete ao realismo europeu, porém ainda não é apresentada a estética
característica de Glauber, mais livre e espontânea. Não existe uma encenação que concilia
elementos alegóricos com elementos realistas como em ​Deus e o Diabo na Terra do Sol
(1963).

PORTO DAS CAIXAS (1962) - Paulo César Saraceni

Em 1962, Paulo César Saraceni lança seu primeiro longa. ​Porto das Caixas é um filme
sobre uma mulher pobre de uma cidade do interior do Rio de Janeiro que quer encontrar
alguém para matar o marido, que a faz muito infeliz.

O trabalho chama a atenção por lidar com a estética realista de uma maneira muito mais
intimista. Saraceni gostava dessa abordagem mais lírica. ​Porto das Caixas i​ lustra, além dos
temas sociais característicos do movimento, temas existenciais. A fotografia usa o contraste
do preto e branco de um modo sombrio, mas ainda lírico e poético.

OS CAFAJESTES (1962) - Ruy Guerra

Em 1962, Ruy Guerra também lança seu primeiro longa. ​Os Cafajestes conta a história de
dois homens que tiram fotos comprometedoras da amante do tio de um deles para
chantageá-lo.

É um filme que não dialoga nem com a vertente mais social do Cinema Novo e nem com a
abordagem mais lírica do Saraceni. ​Os Cafajestes remete muito mais à Nouvelle Vague
francesa. É filmado de maneira moderna, tem uma decupagem espontânea e possui
personagens imorais.

O filme conta com um dos planos mais icônicos de todo o cinema brasileiro. Nele, os
personagens do Jece Valadão e Daniel Filho deixam a personagem da Norma Bengel sem
roupa em uma praia. Os homens dirigem ao redor dela nua enquanto tiram fotos.

O PAGADOR DE PROMESSAS (1962) - Anselmo Duarte

O Pagador de Promessas ​(1962) é o único trabalho brasileiro até hoje a ganhar a Palma de
Ouro no Festival de Cinema de Cannes.
CURSO ONLINE DE CINEMA - MATERIAL EXCLUSIVO

O filme de Anselmo Duarte é baseado na peça homônima de Dias Gomes. ​O Pagador de


Promessas conta a história de um homem que fez uma promessa em um terreiro de
candomblé para salvar seu burro. O animal é salvo e o homem tenta pagar a promessa
carregando uma cruz nas costas até a Igreja de Santa Bárbara, em Salvador, mas é
impedido de entrar. A história gera reflexão sobre crenças e a identidade brasileira de modo
geral.

O filme não faz parte do Cinema Novo. O diretor propõe uma abordagem mais tradicional e,
tecnicamente, é mais sofisticado. Porém é uma obra essencial para entendermos o contexto
do cinema brasileiro da época.

GANGA ZUMBA (1963) - Cacá Diegues

Em 1963 o cineasta Cacá Diegues, um dos integrantes do núcleo inicial do Cinema Novo,
lança seu primeiro longa, ​Ganga Zumba. O personagem que dá nome ao filme foi um dos
líderes do Quilombo dos Palmares. O filme mostra a fuga de alguns escravos de um
engenho de cana de Pernambuco, entre eles o próprio Ganga Zumba.

É um trabalho bastante interessante por sua temática, no entanto a articulação de Cacá


Diegues com a linguagem é relativamente genérica.

CONCLUSÃO

O contexto apresentado nessa aula foi o do começo do Cinema Novo. As obras


mencionadas são algumas das principais que marcam o início do movimento na virada dos
anos 60.

O ápice expressivo acontece com ​Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), ​Vidas Secas
(1963) e ​Os Fuzis (1964). Esses três filmes têm abordagens diferentes, mas que são muito
fortes com o que propõem. Eles serão abordados na segunda parte da aula.

CITAÇÕES DA AULA

FILMES
Alemanha, Ano Zero (1948) - Roberto Rossellini
Os Incompreendidos (1959) - François Truffaut
Acossado (1960) - Jean-Luc Godard
O Medo Consome a Alma (1974) - Rainer Werner Fassbinder
Os Não-Reconciliados (1965) - Jean-Marie Straub
Rio, 40 Graus (1955) - Nelson Pereira dos Santos
Rio, Zona Norte (1957) - Nelson Pereira dos Santos
Vidas Secas (1963) - Nelson Pereira dos Santos
O Pátio (1959) - Glauber Rocha
CURSO ONLINE DE CINEMA - MATERIAL EXCLUSIVO

Tramas do Entardecer (1943) - Maya Deren


Redenção (1959) - Roberto Pires
Tocaia no Asfalto (1962) - Roberto Pires
Arraial do Cabo (1959) - Paulo Cesar Saraceni, Mário Carneiro
Couro de Gato (1960) - Joaquim Pedro de Andrade
Barravento (1962) - Glauber Rocha
Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) - Glauber Rocha
Porto das Caixas (1962) - Paulo Cesar Saraceni
Os Cafajestes (1962) - Ruy Guerra
Os Fuzis (1964) - Ruy Guerra
O Pagador de Promessas (1962) - Anselmo Duarte
Ganga Zumba (1963) - Cacá Diegues

LIVRO
Nova História do Cinema Brasileiro - Fernão Pessoa Ramos e Sheila Schvarzman (org.)

Você também pode gostar