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Erick Jonatha Luiz da Silva

Resenha fílmica: Rio, 40 graus (1955)

Vitória/ES
2021.2
Erick Jonatha Luiz da Silva

Resenha fílmica: Rio, 40 graus (1955)

Trabalho apresentado à disciplina de


Cinema e História do Brasil, ministrada pelo
Prof. Rossana Gomes Britto para obtenção de
nota.

Vitória/ES
2021.2
“Rio, 40 graus” é um filme brasileiro de 1955. A obra, dirigida por Nelson Pereira dos
Santos, acompanha situações cotidianas vividas por diferentes personagens num dia de verão
no Rio de Janeiro. cinco garotos do morro que vendem amendoim, um grupo de torcedores
numa partida de futebol, um coronel visitando a cidade e um casal que planeja o futuro
diante de uma gravidez inesperada.
A obra foi bastante inovadora para os filmes da época devido a sua abordagem
temática e estrutura narrativa. O filme surgiu na época em que o Brasil passava por vários
processos de estabilizar uma indústria cinematográfica própria, então havia a presença de
algumas grandes companhias de cinema, em especial a Atlântida e a Vera Cruz. A primeira
surgiu na década de 1940 e produziu quase 70 filmes até os anos 1960, sendo responsável
pela popularização da chanchada e dando destaque a artistas como Oscarito, Grande Otelo e
Anselmo Duarte e produzindo obras como Moleque Tião (1943), Carnaval Atlântida (1950) e
Matar ou Correr (1954). A segunda também surgiu aproximadamente na mesma época, mas
encerrou as atividades antes, em meados da década de 1950, deixando como legado obras
como Caiçara (1950), Tico-Tico no Fubá (1952) e Floradas na Serra (1954).
Ambas iniciaram as atividades inspiradas em modelos norte-americanos de produção,
mas a tentativa de investir em melodramas não funcionou, o que explica o sucesso mais
duradouro da Atlântida, que fez sucesso através do investimento na chanchada.
Dado o contexto, podemos afirmar que Nelson Pereira dos Santos investiu num filme
que não era melodrama clássico e muito menos um filme de entretenimento, como as
chanchadas da época. Isso, claro, gerou muita polêmica e debate na época, levando o chefe
do Departamento Federal de Segurança Pública (DFSP) do Rio de Janeiro, o coronel Geraldo
de Meneses Cortes, a censurar o filme, proibindo a exibição em todo o país. Dentre as
alegações estava: a degradação da imagem do país, por mostrar a realidade das favelas do Rio
de Janeiro, servir a interesses comunistas, e enganar o povo, afirmando que a cidade nunca
atingiu a temperatura de 40 graus. Após a decisão, o filme só foi lançado comercialmente em
1956, com a candidatura do então presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961).
Outra questão importante sobre a obra, que a diferenciou dos filmes produzidos da
época, foi sua estrutura narrativa. A princípio, Nelson Pereira dos Santos faria uma
chanchada, visto que era o gênero de sucesso na época, inclusive a priori o nome do filme
seria Cidade Maravilhosa (slogan popularizado do Rio de Janeiro), mas a produção acabou
tomando um rumo totalmente diferente.
O filme foi diretamente influenciado pelo Neorrealismo Italiano, em especial pelas
obras de Roberto Rossellini. O neorrealismo foi um movimento que surgiu na Itália após o
fim da Segunda Guerra Mundial. Como o país estava devastado pela tragédia deixada pelos
eventos que levaram à derrota do Partido Nacional Fascista, liderado por Benito Mussolini,
alguns cineastas se utilizaram daquele contexto para criar cinema.
Algumas das características do neoreralismo são a presença de atores
não-profissionais protagonizando as histórias; o foco em questões pós-guerra, contando a
relação dos italianos com a miséria e a crise que o país enfrentava; cenários reais de
destruição, visto que não havia recursos para filmes de estúdios; sub-tramas sem apenas um
protagonista, mostrando as faces de diversos grupos; dialetos locais, focando na linguagem e
comunicação com o público local, além da câmera-registro, sem a utilização de efeitos
especiais e processos de manipulação.
A partir desses pontos já é notável que o neorrealismo estava do lado oposto à
narrativa clássica de Hollywood, bem como várias semelhanças com a obra de Nelson Pereira
dos Santos, e tudo isso não é coincidência.
Rio, 40 Graus, faz recortes de classe e raça, muito evoluídos para a época, ilustrando
pequenas histórias de diversos grupos, além de utilizar cenários reais num momento em que o
país investia em grandes estúdios aos moldes de hollywood, e utilizar das gírias e dialetos
locais para contar a história das favelas. Tudo isso explica a revolta de parte conservadora da
sociedade que condenou o filme.
Assim, podemos afirmar que, Nelson Pereira dos Santos não foi a toa o pai do Cinema
Novo Brasileiro - movimento muito inspirado no neorrealismo italiano e nouvelle vague
francesa - e Rio 40 Graus é objeto de estudo até os dias atuais, sendo uma das maiores obras
originalmente brasileira.
É notável a inspiração de diversos cineastas que vieram depois de Nelson Pereira, e
sua influência em obras de Glauber Rocha, e até filmes mais recentes como Cidade de Deus
(2002). Rio, 40 graus é uma obra que nos faz refletir sobre nossa sociedade e questionar
como, para quem e quais histórias estamos contando no cinema brasileiro até os dias de hoje.
REFERÊNCIAS

ROCHA, Glauber. Revolução do Cinema Novo. São Paulo, CosacNaify, 2004.

DESBOIS, Laurent. A Odisséia do Cinema Brasileiro: Da Atlântida a Cidade de Deus, São


Paulo, Companhia das Letras, 2016.

POR QUE Rio, 40 Graus é tão importante? 30 mai. 2020 1 vídeo (9 min). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=8erev5ZaYj0 Acesso em: 27 set. 2021.

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