Você está na página 1de 8

Leituras: "A Construção Estatística"

sociuslogia.blogspot.com/2009/02/no-sentido-de-suprimir-certas.html

No sentido de suprimir certas dificuldades peculiares à informação estatística é


necessário e indispensável expor os aspectos práticos e técnicos, ou seja a forma como
foi possível chegar aos dados dos quais nos servimos, exigindo desta forma uma análise
crítica. Tudo isto se deve ao facto de que as modalidades de construção dos dados
estatísticos influenciam os seus resultados, deste modo pretende-se uma melhor
compreensão dos dados estatísticos e a sua aplicação mais correcta.

As estatísticas do suicídio

O livro “O Suicídio” de Durkheim assenta em dados estatísticos o que fez dela uma obra
clássica fundadora de uma metodologia quantitativa.
Durkheim deparou-se, ao analisar as fontes estatísticas, numa diversidade de definições
utilizadas para o suicídio, o que implica uma diversidade de conclusões estatísticas. É
importante acrescentar que Durkheim, no seu estudo, utilizou de forma comparativa
vários dados estatísticos de diversas origens, no tempo e no espaço, por tanto é
necessário ter ciente que as definições de suicídio têm variado ao longo do tempo, no
sentido de se aperfeiçoarem, e diferem, também, de sociedade para sociedade.
Estas variações nos registos estatísticos devem-se ainda ao aperfeiçoamento das
condições de recolha dos dados. E ainda a variações das condições de registo segundo
grupos sociais, como é exemplo os registos de suicídio nas forças armadas e os suicídios
ocorridos na população civil, que poderiam, segundo Durkheim serem registados de
forma mais exacta nas forças armadas do que na população civil. Outro factor que pode
influenciar o registo do suicídio são os interesses sociais ou religiosos, é sabido que
segundo a igreja católico um indivíduo que cometa o suicídio não será admitido “junto
de Deus” o que pode afectar o registo dos suicídios alterando-os para mortes acidentais.
Durkheim constata ainda que os agentes, encarregues de registar este tipo de
informação levam, muitas vezes a constatações oficiais defeituosas pois decidir se
determinado óbito é ou não suicídio pode levar a interpretações subjectivas.

Durkheim tem, portanto, certas reservas em relação a algumas estatísticas que utiliza, no
entanto ele não se interrogou sobre as condições práticas da sua elaboração. Segundo
François Simiand é desejável fazer uma critica prévia do valor das estatísticas a utilizar
pois estas variam segundo os países e as datas, deste modo é importante descrever os
quadros administrativos dos diferentes países encarregues de recolher os dados.
Segundo alguns estatísticos é possível fazer uma avaliação correcta dos dados
estatísticos ainda que incorrectos, se for sempre calculada a sua margem de erro, isto se
os procedimentos de recolha forem estáveis. No entanto estes procedimentos não são
constantes pois varia segundo as condições sociais.
Um claro exemplo destas variações do instrumento de recolha verificou-se em França
onde os casos de suicídio ocorridos em espaços rurais são transmitidos com maior
1/8
regularidade aos serviços estatísticos pela polícia militar dos mesmos locais comparada
com a comunicação das ocorrências de suicídio em locais urbanos. Isto está “associado à
maneira diferente como a gendarmerie (nas zonas rurais) e as delegacias de polícia (nas
cidades) administram os dossiês depois de terem identificado a causa do óbito”. Este
erro é passível de ser alterado, corrigindo as séries estatísticas afectadas ou reformando
as práticas defeituosas de registo por parte destas administrações. No entanto existem
outras formas de variação estatística do suicídio pois “do suicídio à sua inscrição
estatística, existem diversos intermediários que são susceptíveis de falhas”.

O desemprego

Em relação ao desemprego, a sua implicação social é mais importante comparada com o


suicídio, só a sua publicação pode influenciar a sociedade portanto é necessariamente
controlado. Pretende-se aqui mostrar como os resultados estatísticos do desemprego
são afectados pelas modalidades da pesquisa.
Um dos motivos que dificulta uma definição homogénea do desemprego, prende-se
com o facto de existir uma pluralidade de fontes e indicadores utilizados pelos diferentes
organismos. “A escolha desses indicadores corresponde não somente a diferenças de
volume global, mas igualmente a divergências nas evoluções ou distribuição segundo
determinadas categorias sociais como idade, sexo, etc.
Os resultados estatísticos do desemprego variam de organismo para organismo devido
ao uso de indicadores diferente que implicam diferenças de definição, no entanto,
usando definições iguais pode-se obter avaliações diferentes segundo as modalidades
de pesquisa utilizadas para colocar as mesmas definições em prática. Exemplos disto são
os recenseamentos realizados em França nos anos de 1975 e 1982 onde o resultado
estatístico do desemprego difere. Isto porque ocorreu uma alteração no questionário da
pesquisa sobre o emprego em 1982, isto resultou numa dificuldade em comparar os
resultados de 1982 com os resultados dos anos anteriores, no entanto a definição dos
indicadores permaneceu inalterada. Desta forma as alterações nos resultados
estatísticos resultam não somente de diferenças de conceito mas também a
modalidades da pesquisa.
As variações podem também ocorrer num nível interno da pesquisa do desemprego, ao
nível da amostra permitindo obter resultados diferentes segundo as sub-amostras
utilizadas. É exemplo disso uma pesquisa realizada repetidamente em três anos
sucessivos, junto aos mesmos entrevistados nas mesmas moradias, estas quando são
ocupados por outros moradores efectua-se uma renovação parcial da amostra. Isto
resultou num inesperado resultado, porque foi observado que o desemprego na
amostragem renovada era sistematicamente superior ao observado pelos individuos
que já tinham sido entrevistados nos anos anteriores. Conclui-se que o facto desses
indivíduos serem repetidamente entrevistados provocou uma dissuasão a declararem-se
desempregados.

A contracepção

2/8
As pesquisas feitas sobre o uso ou não de métodos contraceptivos revelam divergências
de resultados devido a “uma diferença entre o fenómeno, claramente definido para os
organizadores da pesquisa, e a diversidade do que os entrevistados colocam sob as
mesmas palavras”. Existe, portanto uma preocupação para utilizar linguagem adaptada
aos entrevistados e fornecer-lhes informações úteis para a melhor compreensão das
perguntas. A pesquisa realizada em 1978 pelo INED e pelo INSEE sobre a contracepção
revela a necessidade absoluta de realizar estas duas adaptações. Neste sentido tiveram
como principais preocupações evitar constrangimentos que as entrevistadas pudessem
sentir ao falar sobre a sua vida intima portanto, as entrevistas forma realizadas apenas
por entrevistadoras, a entrevistada teria de estar sozinha, o vocabulário fora adaptado, e
a preocupação mais importante reflectiu-se no sentido a ser dado ao termo
“contracepção”.
O questionário iniciava-se com características gerais da entrevistada, seguindo um
parágrafo introdutório explicando o que era a contracepção, e são apresentadas as
perguntas de esclarecimento destinadas a fornecer informação. Somente depois de
fornecer as informações e as definições é que se colocava a pergunta: “Você está
utilizando, actualmente, algum método para evitar a gravidez?” perante uma resposta
negativa outra questão se seguiria no sentido de a reforçar, outra resposta negativa
levaria a um inventário das razões dessa não prática. Pretendesse mostrar no
questionário que o uso de contraceptivos é perfeitamente normal e a sua recusa é que
exige justificações, as perguntas suplementares pretendem evitar mal entendidos. “A
simples retoma da pergunta inicial “permitiu aumentar em 25% a estimativa do número
de mulheres que utilizam uma forma qualquer de contracepção”. Com efeito se todas
estas persistências e introdução de informações não ocorrem, para uma parte das
mulheres interrogadas os métodos contraceptivos seriam apenas os mais modernos e
medicalizados rejeitando os métodos mais tradicionais como verdadeiros métodos
contraceptivos levando a que não se declarassem como utilizadoras de métodos
contraceptivos. Desta forma se observa que é de extrema necessidade definir muito bem
o tema a estudar, acrescentar algumas informações sobre o objecto de estudo e reforças
as perguntas.

Categorias socioprofissionais e qualificação

Tratamos de seguida de situações em que “a sensibilidade das respostas às questões de


opinião passa pela forma e formulação das perguntas”. A profissão é uma variável em
que a sua definição, ao contrário do suicídio, do desemprego e a contracepção, não
implica a vontade ou intenção dos agentes. Nas pesquisas realizadas sobre categorias
socioprofissionais nem sempre se explicam os seus procedimentos de classificação, pois
as categorias já se encontram por toda a parte e o seu vocabulário é de uso corrente, ou
os seus utilizadores julgam que a estas categorias lhes são atribuídas ao mesmo
conteúdo. No entanto, muitas vezes isto se revela falso.
As pesquisas feitas pelo mesmo organismo podem chegar a resultados muito diferentes
segundo o entrevistado solicitado, é caso disso uma pesquisa realizada pelo INSEE sobre
a estrutura socioprofissional dos assalariados proveniente pelas declarações sobre os
salários pelas empresas a serem estudadas que difere da estrutura obtida a partir das
3/8
pesquisas ou recenseamentos realizados com os próprios assalariados. Uma das
explicações possíveis seria que os entrevistados seriam tentados a se valorizarem
perante o entrevistador declarando um nível hierárquico superior enquanto que as
respostas das empresas seriam mais realistas. Existe, portanto, instabilidades das
respostas dadas a respeito da mesma pessoa sobre a sua qualificação, e foi constatado
que a resposta é tanto menos estável quanto mais baixa é a qualificação. Podemos
ainda distinguir variações nas respostas conforme os termos utilizados, se são idênticos
ou diferentes nos documentos das suas pesquisas e conforme a codificação que se
refere a uma imprecisão de numeração, no sentido em que o entrevistado é ou não
incluído na mesma categoria estatística. É necessário sabermos se os erros resultantes
nas pesquisas, se devem somente aos limites de um instrumento de medição, ou se não
se deverão também ao conteúdo e à significação sociológica.

Qual estatuto atribuir aos “erros”?

Até aqui foi demonstrada a sensibilidade dos resultados estatísticos às diferentes


técnicas de recolha e análise de dados. Existem vários tipos de “erros” presentes em
qualquer investigação, como por exemplo: os artefactos são variações atribuídas às
características do instrumento, não se devendo portanto ao objecto a ser avaliado; os
erros são responsáveis pelos artefactos; vieses são formas de erros atribuídos ao
instrumento e por ultimo as precauções que deverão ser tomadas para evitar os erros,
ou utilizando os erros tendo sempre consciência dos erros que possam comportar. Estas
atitudes surgem da ideia de que existe um fenómeno real que se quer analisar e que o
“erro” é teoricamente mensurável achando a diferença entre o que se trata de avaliar e
os resultados obtidos da pesquisa. Se fosse impossível garantir a sinceridade dos
informadores, só existiria uma estatística verdadeiramente exacta para quem sabe
“penetrar os pensamentos mais íntimos” e se apoiasse em observações directas.

Sociologia da produção estatística

Segundo a ideia da divisão do trabalho científico, distingue-se duas fases diferentes: a


recolha dos dados e a sua análise. Tal atitude implicaria que o trabalho estatístico fosse
somente descritivo e não comportaria a análise e interpretação dos fenómenos. No
entanto, a construção dos dados é, em si mesma teórica pois é necessária uma definição
teórica do objecto a estudar.
O seguinte exemplo serve para demonstrar a necessidade em restituir um estatuto de
facto social e não somente de informação (transparente ou enganadora). Marcel Granet
deparou-se no seu estudo com documentação, sobre a China antiga, não passível de ser
datada e que provavelmente teria sofrido uma deformação inevitável pela
reinterpretação nos processos da sua transmissão. Seria, portanto, de extrema
dificuldade de a sua tarefa fosse limitada a simplesmente “definir um conjunto de
atitudes que caracterizam o sistema social dos chineses da antiguidade”. (in Marcel
Granet (1929), La Civilisation chinoise)

Elucidar as mortes “não-naturais”

4/8
Douglas levantou dúvidas em relação as estatísticas do suicídio. Pois a definição de
suicídio variam segundo a perspectiva social levando a inevitáveis dissimulações.
A observação do trabalho realizado pelos coroners, que têm como objectivo classificar
os óbitos não-naturais ou suspeitos, leva à conclusão que muitas das suas conclusões se
devem a factores subjectivos, pois a experiência destes deve-se a um saber prático,
dificilmente codificável. No sentido em que, para os coroners, um suicídio “deve ser
semelhante a um e o indivíduo deverá ter razoes para se suicidar”, a pesquisa destes irá
incidir somente sobre a cena do óbito, certas cenas como o enforcamento levam à
classificação de suicídio, outras de acidente, como os acidentes de trânsito, e o
afogamento será o mais indeterminado pois irá depender da estação do ano, do lugar e
afins. Desta forma algumas características objectivas poderão ser posta de parte dando
relevância a critérios subjectivos ou relativos às circunstâncias do óbito levando a que
alguns enforcamentos de crianças sejam considerados como um acidente.
Portanto, a conclusão alcançada em relação a um óbito terá de ser socialmente aceitável
e a “classificação resulta sempre de um conjunto de inteirações entres as partes
envolvidas (e não simplesmente da aplicação de regras formalizáveis) ” por toda esta
série de razões nos deparamos com uma influência extremamente subjectiva, ou seja, as
classificações de certos óbitos dependerão de características de uma opinião ou atitude
marcada por sentimentos, impressões ou preferências pessoais. Este conjunto de
factores leva a que as estatísticas do suicídio sejam, “do ponto de vista social,
inutilizáveis: ou a definição que, na prática, aplicam difere da definição do sociólogo que,
nesse caso, pode não utilizar, para seus próprios objectivos teóricos, as observações que
não se adaptem a eles.”

Desemprego, formas de desemprego, atitudes em relação ao desemprego

É de extrema dificuldade interpretar o desemprego de forma comparativa em séries


cronológicas longas ou dados de países diferentes. Na medida em que o desemprego
está associado a determinada formação social, a modificação desta, ao longo de algumas
décadas faz com que sob o nome desemprego sejam consideradas coisas muito
diversificadas.
A variabilidade da medida estatística permite fazer a seguinte questão: “será o indicador
(de um fenómeno constante) que se deforma, ou será que as suas variações remetem
para as variações da própria natureza do fenómeno em relação ao qual funciona como
indicador?”. Tendo como exemplo as pesquisas realizadas em 1936 e 1982 onde as
estatísticas do desemprego não falam exactamente das mesmas coisas, esta diferenças
resultam não só nas diferentes técnicas de questionamento mas também porque o
próprio conteúdo do desemprego sofreu modificações.
Exemplos destas modificações são a definição “moderna” de emprego que se resume ao
trabalho assalariado rejeitando o trabalho no domicílio. Desta forma a noção de não-
trabalho, necessária para o seu recenseamento altera-se devido à percepção de trabalho
como emprego assalariado e a necessidade dos desempregados estarem inscritos
institucionalmente num estatuto. Na Argélia de 1960, num meio mais rural, poucos
homens se declararam desempregados pois o seu papel social implicava algum tipo de
actividade, enquanto que nas zonas mais urbanizadas a declaração de desemprego por
5/8
parte dos homens foi maior pois já detinham uma definição de emprego mais moderna
e nãos consideravam os “biscates” como uma forma de emprego.
Uma outra característica que alterara a forma de perceber e declarar o desemprego foi:
a extensão do trabalho feminino. Determinadas mulheres registaram-se como
desempregadas pois desejavam encontrar um emprego.
“As medidas administrativas tomadas contra o desemprego podem, antes de tudo,
afectar directamente o seu registo.” Desta forma quando o desemprego começa a ser
entendido como um aspecto de uma crise económica geral sobre a qual os políticos se
devem pronunciar a forma como o desemprego é percebido e declarado altera-se. “O
desemprego aparece, assim, não como uma noção com alcance trans-histórico e trans-
cultural, mas como indissociável de um contexto social específico.”

“Ter filhos é não ter desejado evitá-los”

As ambiguidades ou dificuldades presentes nas estatísticas resultam muitas vezes da


definição adquirida através do estudo que subentende a pesquisa, mas também da
forma como os entrevistados compreendem o objecto de estudo pelo qual são
questionados.
Relativamente à concepção, esta é definida “como uma conduta para evitar um risco (…),
ela pressupõe consciência, mas antes de tudo, existência de risco e, por conseguinte, a
delimitação de uma população que corre riscos”. Essa população seria, as mulheres de
20 a 45 anos; distingue-se mulheres que têm um parceiro das mulheres sós. São
excluídas as mulheres estéreis, ou que têm parceiros estéreis, (no entanto aqui elas
teriam de o saber) estéreis por natureza ou por esterilização; as mulheres grávidas e
ainda as mulheres que pretendem ter um filho.
No entanto não é certo que estas numerosas distinções sejam tão bem definidas. Existe
uma discrepância entre a vontade de te filho de um conjugue e a vontade do outro. Esta
ambiguidade reflecte-se, também na proporção de mulheres casadas que desejam ter
outros filhos mas usam métodos contraceptivos o que as exclui logo à partida de
pertencer à estatística.
As discrepâncias entre a definição social de contracepção e a definição que organiza o
modo de questionamento podem ser observadas quando se pretende saber (no caso de
se utilizar diversos métodos contraceptivos) qual é o método principal. O demógrafo
entende como principal o método que é utilizado no meio do ciclo (a periodicidade da
exposição ao risco e a eficácia dos diferentes métodos) e privilegia os métodos mais
modernos. Esta classificação pode divergir da classificação adoptada pelas mulheres
interrogadas que podem considerar como método principal o método que citaram em
primeiro lugar.
Seria interessante contabilizar as mulheres que não declararam, na primeira questão o
uso de contraceptivos mas que se apresentam como usuárias de contraceptivos, e evitar
confundi-las as outras que responderam espontaneamente o seu uso na primeira
pergunta, assim como distingui-las segundo o tipo de método utilizado que é geralmente
métodos tradicionais.
“Trata-se de um aspecto da realidade social da contracepção que se exprime pela
negação dessa característica, ou hesitação em reconhece-la, a certas práticas menos
6/8
legítimas ou medicalizadas do que aquelas que são mencionadas pelas revistas.” Desta
forma a dificuldade que as pesquisas estatísticas têm em apreender a contracepção
pode-se converter numa fonte de informação capaz de enriquecer a análise.
Pretende-se mostrar como o demógrafo, regido pela sua concepção de contracepção,
apesar de saber que a sua significação não é universal, não procura saber o que é a
contracepção para as mulheres interrogadas.

As denominações de profissões como desafio

As dificuldades de registo da variável profissão ou categoria profissional, resultantes da


instabilidade das respostas e da sua numeração, podem mostrar uma informação
positiva sobre as situações que as produzem.
Para a análise sociológica, a profissão implica tipos de experiência social e estatutos
sociais. “Na nossa sociedade, a profissão aparece como um aspecto importante ou
sensível da imagem social dada e recebida: funciona como um meio incomodo de
etiquetagem social e desempenha um grande papel na apresentação de si”. (in D. Merllié,
J. prévot; 1996)
A declaração da actividade profissional pode resultar em apresentações diversificadas,
devido à precisão da resposta e aos níveis de linguagem na sua formulação, desta forma
camponês não é agricultor e estes não se identificam com o vinhateiro. O registo das
declarações das profissões podem ser controladas, deturpadas pelos informadores, pois
a profissão a declarar tem uma função de classificação social, acontece quando declaram
a sua própria profissão assim como quando declaram a dos pais. Isto foi observado
numa pesquisa realizada junto dos estudantes, onde estes sempre tentam iludir a
declaração da profissão dos seus pais, pois esta implica um enraizamento num meio
social e não querem ser socialmente rotulados simplesmente pelas profissões dos pais,
pois estas simbolizam o meio de origem. Por tudo isto, esta prática social pretende dar
uma imagem de si, a imagem de origem, por exemplo, os dirigentes políticos comunistas
terão uma origem camponesa ou operária, os bispos tendem a declarar origens mais
modestas. Assim,” segundo as situações e os contextos, coexistem tendências a
subavaliar e super-avaliar o nível social de origem.” A análise sobre estas declarações
“deturpadas” deve ser levada em consideração não só para uma tentativa de a corrigir,
mas também para se estudar a significação que a reveste, no sentido de permitir uma
análise sociológica da pluralidade destas significações sociais.
Existe ainda uma ser flexibilidade nas denominações de profissão que resultam da
ambiguidade da linguagem corrente e do facto de que a significação das palavras
depende muito do contexto da sua avaliação. Esta ambiguidade pode resultar da função
social das expressões utilizadas.
Desta forma todas estas incertezas ou “erros” na comunicação estatística podem ser
portadora de uma significação social que merece um estudo mais aprofunda que
permite, assim, enriquecer a informação estatística.

A comunicação estatística

7/8
Num questionamento o entrevistado não responde com a clareza pretendida, segundo a
definição já estabelecida do objecto de estudo, a suas respostas são indissociáveis à sua
interpretação e significado que ele lhe dá. Desta forma a informação estatística resulta
de uma série de trocas entre várias representações da realidade social que podem ser
constituídas ou autónomas.
A elaboração dos dados estatísticos é bastante formalizada, visando a padronização das
informações e divide o trabalho na sua produção, tudo isto para alcançar a
homogeneidade para permitir a comparabilidade, racionalizando a comunicação e
tentando evitar os mal-entendidos. No entanto este processo demasiadamente
mecanizado, pode ser um factor de deformação.

A relação sociológica com o mundo social

Como podemos observar ao longo deste texto, o registo estatístico é indissociável de


critérios subjectivos, de pontos de vista particulares, no entanto isto não faz da
estatística algo desprovido de significação.
No campo da sociologia o objecto de estudo sofre um tratamento e selecção, a sua
selecção é feita dentre um conjunto de características possíveis, a definição da variável é
imposta pela instituição e o tratamento passa por interrogatórios e julgamentos
efectuados, neste caso a delinquentes. Será, portanto, possível não correr o risco de
atribuir certas características, aos delinquentes, predeterminadas pala história da sua
produção? A construção estatística da definição de delinquência submetesse ao pré-
construído, a um aspecto particular, trata-se da definição imposta e produzida pela
instituição (policial e judiciaria). O sociólogo terá de analisar esta construção de
categorias como uma realidade “natural”. Citando o texto: “O sociólogo encontra-se
sempre na situação de analisar uma realidade que, sob formas mais ou menos
elaboradas, se apresenta como uma encenação: ele deve tomar distância em relação a
essa realidade e, ao mesmo tempo, ser capaz de explica-la. A estatística pode constituir
um interessante objecto de estudo para a sociologia. No entanto a oposição a este
processo debatesse com a distinção entre o “quantitativo” e o “qualitativo” impedindo a
análise sociológica da produção estatística. Esta atitude de oposição pretende dar uma
visão ilusória da estatística apresentando-a como uma linguagem homogénea, destituída
de ambiguidades.

Dominique Merllie, “A construção estatística" 1998. In CHAMPAGNE, Patrick e tal (org.) –


Iniciação à Prática Sociológica. Petrópolis: Vozes, pp. 107-170

8/8

Você também pode gostar