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CINEMA MARGINAL
A partir de meados da década de 1960, um conjunto de jovens
diretores, próximos inicialmente ao grupo cinemanovista, acentua e
radicaliza a linha da opção narrativa alternativa. Abandonam os
dilemas do engajamento e incrustam-se na exasperação, no deboche
e na curtição. Progressivamente se acentua a ruptura com a geração
anterior, na qual diversos diretores tiveram raízes. É o chamado
Cinema Marginal, nome que os cineastas receberam à sua revelia,
mas que os define bem, mostrando opções estilísticas e de produção
alternativas que escolheram conscientemente, além da sintonia com
outros grupos de vanguarda da época que receberam a mesma
denominação, como a poesia marginal. Hélio Oiticica, numa de suas
obras mais conhecidas do período, estampou a frase “seja marginal,
seja herói”. O grupo Marginal possui unidade bem mais dispersa que
o Cinema Novo e nunca se constituiu como um todo, envolvendo
relações de amizade e estratégias de produção perdurando por
décadas. Elas existiram, mas em períodos mais restritos e com
relações pessoais mais focadas. O conjunto de obras do Cinema
Marginal, no entanto, se apresenta de modo bastante orgânico e
estrutural. Ao examinarmos as condições de produção e o intervalo
histórico em que se constituem, delineia-se um conjunto com
unidade razoável. Há, portanto, uma “geração marginal” mais
próxima da contracultura que o Cinema Novo, também enfronhada
nos horrores da repressão e da luta armada, como opção não seguida.
Essa parcela mais jovem da “geração 1968” rompe com os
precursores cinemanovistas por uma questão de espaço no mercado
cinematográfico e recursos para produção, ou para assumir opções
estilísticas mais radicais.
É importante mencionar que houve proximidade, em
determinado momento, com o Cinema Novo, seguindo-se um maior
ou menor ressentimento no afastamento. Afastamento que
podemos encontrar testemunhado, em termos cinematográficos, no
curta tardio, Horror Palace Hotel (1978), de Jairo Ferreira. Dentro dos
Marginais que circularam pelo Cinema Novo, estão diretores que
mais tarde terão um papel central no cinema da nova geração, como
Júlio Bressane, Rogério Sganzerla, Neville d’Almeida, Geraldo
Veloso, Luiz Rosemberg, Eliseu Visconti e outros. A produção dos
primeiros filmes de Rogério Sganzerla em São Paulo, longe da
guarida do Cinema Novo, é sintoma desse distanciamento
progressivo. Ainda, Rogério participa solitário do Festival
Internacional de Cinema no Rio de Janeiro, patrocinado pelo INC e
boicotado pelo Cinema Novo. Essa participação só faz aumentar
ressentimentos mútuos. Em 1969, Júlio Bressane e Rogério
Sganzerla publicam artigos e fazem declarações ironizando o
Cinema Novo e suas propostas, o que provoca reações ressentidas da
geração mais velha. A polêmica atinge o ápice com a publicação, em
dezembro de 1970, de uma entrevista conjunta de Rogério Sganzerla
e Helena Ignez ao jornal O Pasquim66, em que ambos criticam
agressivamente o Cinema Novo, chamando-o de “conservador de
direita”, “paternalizador” e representante da “antivanguarda”.
Glauber Rocha não deixa esses ataques sem resposta, em
observações que, aparentemente, guardou para si: “Caiu a ponte de
gentilezas. O udigrúdi é um aborto restaurador do formalismo
decadente do amante de Anastacya. O primeiro e único filme
underground 68 é Câncer, made by Glauber Rocha”67. Um pouco
depois, não é surpreendente encontrarmos Glauber também
definindo o caráter “regressivo” dos Marginais em 1975 (na
contemporaneidade de seu longa bem “marginal”, Claro), no artigo
“Udigrúdi: uma velha novidade”. O tom do artigo destoa do espírito
contracultural “irracionalista” de “Eztetyka do Sonho”, em 1971.
Está próximo, outra vez, às demandas de uma “progressão” (e não
regressão) racional na “crítica da história” pela obra de arte, para
combater o “caos social” (retornamos aos dilemas da segunda
metade da década de 1960). Descobre então que: “os filmes udigrúdi
são ideologicamente reacionários porque psicologistas e porque
incorporam o caos social sem assumir a crítica da história e
formalmente, por isso mesmo, regressivos”68. Glauber mostra-se
ainda ressentido com os desdobramentos Helena/Sganzerla: “os
jovens cineastas Tonacci, Sganzerla, Bressane, Neville e outros de
menor talento levantaram-se contra o Cinema Novo, anunciando
uma velha novidade: cinema barato, de câmara na mão e ideia na
cabeça”69.
Na geração Marginal, podemos destacar o grupo sediado no Rio
de Janeiro e, particularmente, Júlio Bressane como mais próximo à
tradição cinemanovista, embora o diálogo e a convivência sejam
intermitentes. Em São Paulo, onde o Cinema Novo nunca chegou de
verdade, a distância é mais fácil e aguda. Já dentro de uma linha de
contato direto com o mercado e ruptura maior com o que chamam
de linguagem “europeia e elitista” do Cinema Novo, Carlos
Reichenbach, João Callegaro, Antônio Lima, Jairo Ferreira, tendo
muito próximo Rogério Sganzerla, iniciam a produção de uma série
de filmes marcados pela absorção sem culpa da narrativa clássica
hollywoodiana, horizonte ausente do Cinema Novo. A questão do
público e da forma como atingi-lo aparece em primeiro plano. A
geração dos “novíssimos” emerge em sintonia com a primeira Boca
do Lixo e circula com agilidade por seus produtores (que também
iniciavam carreira), entre os quais reinava o comercialismo mais
selvagem. A ele se adaptam dentro do recorte do avacalho, sem
contradição com as demandas do contexto ideológico da
contracultura.
Existe ainda outra face do Marginal paulista que fica mais
próximo da vanguarda literária e teatral, que dialoga com as
experiências do grupo Oficina e os tropicalistas baianos, que nesse
momento moram em São Paulo. João Silvério Trevisan (Orgia ou o
homem que deu cria, 1970), Júlio Calasso (O longo caminho da morte,
1971), José Agripino de Paula (com o precoce Hitler no III Mundo,
1968) e Carlos Albert Ebert (República da traição, 1969) circulam com
agilidade nesse ambiente. Ainda mais ligado ao Oficina, André Faria
Jr. dirigiria, em 1971, Prata Palomares, e José Celso Martinez começa
também nesse ano o longo e acidentado trajeto de O rei da vela,
produção especificamente ligada ao Oficina que só terminaria na
década de 1980, tendo certificado de censura emitido em 1982. São
cineastas que também circulam pela Boca, já em plena ebulição e
onde tudo acontece no início da década, mas sua interação com os
produtores não possui a sintonia de um Carlão, do primeiro
Sganzerla, de um Callegaro. Andrea Tonacci faz parte do grupo,
inclusive por sua proximidade, desde os primeiros curtas, com
Rogério Sganzerla, mas articulará a produção de seu Bang bang por
fora da Boca, com o pessoal de Minas no Rio de Janeiro,
particularmente Lanna e Veloso.
Com participação orgânica na geração Marginal, Júlio Calasso e
Carlos Ebert são dois diretores que têm proximidade com o grupo
Oficina, e inserção simultânea no mundo do cinema e na Boca.
Calasso fez parte do elenco de Galileu Galilei, participa intensamente
de atividades diversas nos meios artísticos da época, com espírito
livre e aberto para experiências que não se restringem ao cinema.
Terá depois carreira independente e variada. Com recursos
mínimos, realiza O longo caminho da morte (1971), no qual se sente
fortes pitadas do “espírito” marginal, embora partindo de uma
temática histórica com corte fora do marginal-cafajeste. Ebert é
figura tradicional no meio cinematográfico, com posterior carreira
ampla de fotógrafo e vínculos claros com a geração cinéfila do
Marginal paulista que remonta a Escola Superior de Cinema São
Luiz. Fez câmera em O Bandido da Luz Vermelha e fotografou Prata
Palomares. Dirige República da traição, contemporâneo na realização
de Gamal (1969), contando com Júlio Calasso na direção de
produção e contatos com o grupo Oficina. É filme bem típico da
estética Marginal com exaltação expressa em gritos guturais, vômito,
sangue. Sente-se o peso da dramaturgia do Oficina da época. A
explosão de cores de República da traição brilha com força única nos
filmes Marginais, boa parte em preto e branco e fotografia precária
(faz par com o cinerama de Copacabana mon amour). Revela o
cuidado que o talentoso fotógrafo Ebert teve com a luz e a revelação
do negativo, em seu único longa. André Faria também circula no
grupo teatral e dirigiria Prata Palomares, filme marcado por uma
espécie de cruzamento entre “tropicalismo/Oficina/Cinema Novo-
Marginal”, respirando o clima político da época. Em troca da
assistência de câmera em República da traição, Ebert fotografou Prata
Palomares. Esse recorte do Marginal paulista evolui com certa
independência da Boca do Lixo e nunca possuiu a intimidade,
inclusive em termos de produção, dos “cafajestes”.
No trabalho de João Silvério Trevisan, Orgia ou o homem que deu
cria (1970), como também no de João Batista de Andrade, em Gamal,
o delírio do sexo (1969), nota-se traços de apelo ao público (o título
erótico, por exemplo) que revelam a presença de uma preocupação
de atingir o mercado exibidor. Orgia, no entanto, é um filme ainda
fortemente marcado pela estética da representação do Brasil, sua
história e suas forças sociais, características da última fase do
Cinema Novo. Na composição dos quadros que simbolizam o Brasil,
sente-se igualmente a presença de traços tropicalistas. Trevisan se
afirmaria em seguida como uma espécie de teórico do Cinema
Marginal, na ruptura com os cinemanovistas. Mantém polêmica
acesa com Glauber, tanto nos debates estéticos como na valoração
da questão de gênero/sexualidade, no horizonte da contracultura.
Possui análise lúcida sobre o Cinema Marginal e seu significado para
a época. João Batista de Andrade é companheiro de época dos
Marginais, depois seguindo carreira própria. Em Gamal dirige um
longa meio fora de esquadro em sua obra, um dos filmes da geração
que vai mais fundo na fragmentação narrativa: nele só se respira
agonia e exasperação, e a expressão é sintonizada no modo gutural.
O fato de João Batista, com carreira posterior diversa, haver sido
cooptado na órbita Marginal é significativo da intensidade que esse
núcleo estético e ideológico exerce de modo horizontal na época.
Maurice Capovilla com seu O profeta da fome (1969) pode ser
analisado na mesma linha de atração. Tomadas de O profeta da fome
aparecem em Audácia!, filme manifesto do cinema cafajeste.
Em 1968, Rogério Sganzerla dirige em São Paulo O Bandido da Luz
Vermelha, que marca o ponto de transição entre a geração
cinemanovista e a ruptura Marginal. A narrativa tem giro numa
intertextualidade centrifugada em velocidade que o Cinema Novo
não acompanha. Traz para junto de si o universo de referências
cinematográficas da nova cinefilia, indo do brega sem complexos
(incluindo a trilha sonora) ao kitsch reiterado dos cenários, a mídia
sensacionalista, o estilo radiofônico fora de sua gravidade, a
presença recorrente dos quadrinhos, da ficção científica, das
citações de filmes de gênero, tudo trabalhado em um modo
citacional, intertextual, fundado na consciência reflexiva, marca
desse momento de ruptura no cinema brasileiro. Embora filmado na
Boca do Lixo, com produção própria e da Boca (em seus primeiros
tempos), aparentemente teve apoio do Cinema Novo antes da
ruptura, se acreditarmos nas declarações de Glauber à revista
Hablemos de Cine concedidas, no Rio de Janeiro, em abril de 1969.
Glauber acusaria Sganzerla de ser ingrato (“um oportunista que quer
obter patrocínio do INC”) e não reconhecer em seus vínculos
iniciais com o Cinema Novo: “[Rogério Sganzerla] não conta que fez
seu filme [O Bandido da Luz Vermelha] em São Paulo e enviou todas
as contas à Difilm para que as pagasse, causando-lhe um prejuízo de
Cr$ 9 milhões”. Rocha menciona também na entrevista
adiantamentos da Dilfilm e, portanto, do Cinema Novo, aos filmes
iniciais de Bressane, Cara a cara, e Neville, Jardim de guerra70.
Bandido evolui dentro de um estilo em “transe”, que não deixa
de lembrar figuras glauberianas. Possui ainda rastro de origem na
produção do Cinema Novo, como mostra a demanda premente pela
representação do Brasil e de sua história, mas já está em outro
patamar, fechando-se na agonia do deboche e do avacalho, sem que a
dimensão da má consciência ou os dilemas existencialistas sobre a
liberdade no compromisso político deixem a mais leve marca. Nesse
sentido, a ruptura é bem resumida pela frase-chave do filme, que
virou lema dos Marginais, em seu circuito fechado no desbunde:
“quando a gente não pode fazer nada, a gente avacalha – avacalha e se
esculhamba”. Efetivamente, o que restava a fazer, a partir do
fechamento agudo da sociedade brasileira em 1970, era se
esculhambar, no sentido de uma volta ao próprio ego dilacerado:
mergulhar no “dentro-de-si mesmo”, esculhambando os afetos até o
desbunde – ao mesmo tempo que se avacalhava expectativas
movidas à razoabilidade que ainda traziam a dimensão da práxis no
horizonte. O fato é que O Bandido da Luz Vermelha é um filme de
ruptura, fora do esquadro cinemanovista, e foi recebido com forçada
indiferença pelo grupo. Geraldo Veloso descreve bem a recepção
pelo Cinema Novo de O Bandido, aprofundando a fissura já esboçada
em um caminho sem volta:
NOTAS
1 Cf. entrevista no documentário O mundo de um filme, de Clara Linhardt, Camila
Maroja e Daniel Caetano, Filmes do Serro e Departamento de Cinema e Vídeo –
UFF, 2012.
2 Cf. André Gatti, “Difilm”, em: Fernão Pessoa Ramos e Luiz Felipe Miranda
(orgs.), Enciclopédia do cinema brasileiro, São Paulo: Edições Sesc São Paulo;
Editora Senac, 2012.
3 Glauber Rocha, “O Cinema Novo e a aventura da criação”, Visão, 2 fev. 1968, p. 44.
Cf. também Glauber Rocha, Revolução do Cinema Novo, São Paulo: Cosac Naify,
2004, pp. 127-50.
4 Gustavo Dahl, “Cinema Novo e estruturas econômicas tradicionais”, Revista
Civilização Brasileira, Rio de Janeiro: mar. 1966, n. 5-6.
5 Cf. entrevista de Glauber Rocha em: Federico de Cárdenas e René Capriles,
“Glauber: el ‘transe’ da América Latina”, Hablemos de Cine, Lima: maio-jun. 1969,
n. 47, p. 34-8, apud Glauber Rocha. Revolução do Cinema Novo, op. cit., p. 189.
6 Governador de Minas Gerais que foi um dos líderes civis do golpe de 1964. Cacá
Diegues, Vida de cinema: antes, durante e após o Cinema Novo, p. 198.
7 Ibidem.
8 Ibidem, p. 148.
9 Jean-Claude Bernardet, “Para um cinema dinâmico”, Revista Civilização
Brasileira, Rio de Janeiro: maio 1965, n. 2.
10 Ibidem.
11 Jean-Claude Bernardet, “Apelo, um documentário”, O Estado de S. Paulo, São
Paulo: 30 set. 1961, Suplemento Literário.
12 Roberto Schwarz, “O cinema e Os fuzis”, Revista Civilização Brasileira, Rio de
Janeiro: set.-nov. 1966, n. 9-10.
13 Idem, “Cultura e Política, 1964-1969”, em: O pai de família e outros estudos, Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1978.
14 Glauber Rocha, “Eztetyka da fome 65”, Revolução do Cinema Novo, São Paulo:
Cosac Naify, 2004.
15 Cf. “Helena Solberg”, em: Memória do cinema documentário brasileiro: histórias de
vida, Fundação Getúlio Vargas/CPDOC: 2015, disponível em: <goo.gl/qZTbMP>,
acesso em: maio 2017.
16 O subtítulo do filme já enuncia: “aventuras e desventuras de Luzia e seus 3
amigos chegados de longe”.
17 Glauber Rocha, “Como e por que realizei Terra em Transe”, Estado de Minas, Belo
Horizonte: 18 set. 1982.
18 Glauber Rocha, Revolução do Cinema Novo, op. cit., pp. 248-51.
19 Idem, “Eztetyka do sonho”, em: Revolução do Cinema Novo, op. cit., p. 249, grifos do
original.
20 Ibidem, p. 249.
21 Cf. entrevista em: “Cassy Person Jones picha todo mundo”, Jornal Pasquim, Rio
de Janeiro: 5-11 jun. 1973, ano v, n. 205.
22 Jean-Claude Bernardet, Brasil em tempo de cinema, Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1967.
23 Gustavo Dahl, “O Cinema Novo e seu público”, Revista Civilização Brasileira, Rio
de Janeiro: 12 mar. 1967, n. 11.
24 O texto tem origem em comunicação apresentada em Pesaro, no tradicional
festival de cinema. Cf. Glauber Rocha, “O Cinema Novo e a aventura da criação”,
op. cit., p. 44. Cf. também: Glauber Rocha, Revolução do Cinema Novo, op. cit., pp.
127-50.
25 Ibidem, p. 130.
26 Joaquim Pedro de Andrade, “Crítica e autocrítica: O Padre e a Moça”, Revista
Civilização Brasileira, Rio de Janeiro: maio 1966, n. 7.
27 Vinicius de Moraes, Vinicius fala de sua garota, disponível no Acervo Cinemateca
do Museu de Arte Moderna (MAM).
28 Ibidem.
29 Cf. entrevista de Glauber Rocha em: Federico de Cárdenas e René Capriles,
“Glauber: el ‘transe’ da América Latina”, op. cit., pp. 179-80.
30 Ibidem, p. 181.
31 Ibidem, p. 180.
32 Ibidem.
33 Cf. Theo Costa Duarte, Marcas do experimental no cinema: um estudo sobre Câncer,
tese (doutorado em Comunicação), Universidade Federal Fluminense, Rio de
Janeiro: 2012, p. 16. O autor menciona ainda, nesse bom estudo sobre o filme, a
possibilidade, sem comprovação, de que “tivessem sido realizadas 27 tomadas
que então seriam decompostas nos 59 planos finais”.
34 Glauber também se refere à finalização do filme em 1971, em carta a Jairo
Ferreira.
35 Em DVD do Tempo Glauber, na cópia em 4K, essa imagem inicial é percorrida
por legendas em francês. Também as canções ficaram com legendas em francês,
em função do negativo original perdido.
36 As filmagens de Deus e o diabo são do segundo semestre de 1963, e as de Dragão da
maldade, do segundo semestre de 1968.
37 Helena Salem, Nelson Pereira dos Santos – o sonho possível do cinema brasileiro, Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1987, p. 215.
38 Cf. Nelson Pereira dos Santos, Manifesto por um cinema popular, 1975, Acervo da
Cinemateca Brasileira.
39 Ivana Bentes, Joaquim Pedro de Andrade: a revolução intimista, Rio de Janeiro:
Relume Dumará, 1996.
40 Meire Oliveira, Liturgia da pedra: negro amor de rendas brancas, São Paulo:
Alameda, 2016.
41 Cf. entrevista em: “Programa Luzes”, Câmera nº 31, TV Cultura, 8 jun. 1976,
disponível em: <https://goo.gl/x1W189>, acesso em: maio 2017. A entrevista
encontra-se reproduzida também no catálogo da mostra Vida en movimiento:
Joaquim Pedro de Andrade, Buenos Aires: Museu Malba, 2007, p. 54.
42 Cf. o poema de Carlos Drummond de Andrade “Confidência do itabirano”.
Sobre a relação entre Minas e Joaquim Pedro com foco na literatura, cf. Meire
Oliveira, Liturgia da pedra: negro amor de rendas brancas, op. cit.
43 Cf. “Com a palavra Joaquim Pedro de Andrade”, disponível em: <
https://goo.gl/NkS4er>, acesso em: maio 2017. O texto foi publicado no
primeiro press-book do filme em 1969.
44 Mário Carneiro, depoimento concedido a Claudio Bojunga, “O rigor e o risco”,
Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 18 set. 1988, Caderno B Especial, p. 7. Já com mais
idade, em entrevistas da década de 1990 e 2000, Mário Carneiro cita outras vezes
o episódio do rocambole, relacionando-o também a críticas que Rodrigo de
Andrade teria feito ao roteiro de O padre e a moça (e não Macunaíma). Parece ser
mais verossímil, no entanto, a versão estabelecida no depoimento a Bojunga, em
1988. Em sua biografia de Joaquim Pedro de Andrade, Ivana Bentes cita o
episódio usando a versão do depoimento de Mário Carneiro a Claudio Bojunga.
45 Joaquim Pedro apud Heloísa Buarque de Hollanda, Macunaíma, da literatura ao
cinema, Rio de Janeiro: José Olympio, 1978, p. 115. No último capítulo desse livro,
intitulado “Joaquim Pedro”, Heloísa Buarque de Hollanda constrói, conforme
detalha na Introdução (“Explicação”, p. 19), uma espécie de montagem segundo
a qual “Joaquim avalia, numa colagem de recortes de jornais, o projeto e o
momento do filme; e onde a presença exagerada de imagens oferece uma 4ª voz”.
Não são citadas pela autora as fontes primárias dos originais da “colagem”,
embora alguns trechos possam ser localizados em entrevistas da época.
46 Heloísa Buarque Hollanda, Macunaíma, da literatura ao cinema, op. cit., p. 115.
47 Roberto Schwarz, “Cultura e política, 1964-1969”, op. cit.
48 Macunaíma é um ano e meio anterior ao Manifesto, que é de maio de 1928.
49 Haroldo de Campos percebe bem o movimento textual, em camadas
sobrepostas do livro, embora sua análise tenha marca de época. Sente-se em
Campos a tentativa, talvez um pouco desajeitada, de carregar Mário de Andrade
para o panteão concretista, com Mallarmé no topo. O método, puxado pelas
orelhas, tem o mérito de apontar no corpo de “Macunaíma, o herói sem nenhum
caráter” diversas camadas textuais e retirá-las, de modo inédito, da tabela
valorativa do símbolo. Mário sempre foi muito claro, inclusive nos Prefácios não
publicados, que Macunaíma não era símbolo de nada. Cf. Haroldo de Campos,
Morfologia do Macunaíma, São Paulo: Perspectiva, 1973.
50 Paulo Emílio Sales Gomes, Cinema: trajetória no subdesenvolvimento, São Paulo:
Paz e Terra, 1980, p. 77.
51 Mário de Andrade, Macunaíma: o herói sem nenhum caráter, Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2015. Cf. apresentação e estabelecimento de texto por Telê Porto
Ancona Lopez e Tatiana Longo Figueiredo, p. 191.
52 Ibidem, p. 91.
53 Ibidem, pp. 191-2.
54 Heloísa Buarque de Hollanda, Macunaíma, da literatura ao cinema, op. cit., p. 115. O
“sem-caratismo” macunaímico, tão atraente para a sensibilidade
contemporânea, é mistura que acha o ponto entre o deslumbramento eufórico
no vira-latismo por tudo que é estrangeiro e os períodos de profunda depressão
que o país, e Macunaíma periodicamente, se afundam. É a “tristeza de Brasil”,
traço do caráter nacional que atravessa a obra e a personalidade de Macunaíma
(talvez descendendo das próprias depressões periódicas de Mário). O livro é
dedicado a Paulo Prado, que lança, no mesmo ano de Macunaíma, o herói sem
nenhum caráter (1928), o seu Retrato do Brasil, com o subtítulo significativo:
Ensaio sobre a tristeza brasileira, obra que começa com frase que caberia no
romance pelo tom: “Numa terra radiosa vive um povo triste”. Prado foi o grande
financiador e mecenas dos modernistas, e ambas as obras já estavam prontas em
1928, mas sua convergência é significativa. Joaquim Pedro tem razão ao
pressentir em Macunaíma um herói triste.
55 Ibidem, p. 115.
56 Jabor aproveita-se da captação de remessas de lucros da Columbia Pictures.
57 Veio já vislumbrado, noutra dimensão, em A opinião pública, documentário
realizado na estilística do cinema verdade.
58 É o caso de Neville D’Almeida, por exemplo.
59 Carlos Alberto Mattos, Walter Lima Júnior: viver cinema, Rio de Janeiro: Casa da
Palavra, 2002, pp. 133-43.
60 Cf. Carlos Alberto Mattos, Walter Lima Júnior: viver cinema, op. cit., pp. 181-3.
61 Ismail Xavier, Alegorias do subdesenvolvimento: Cinema Novo, tropicalismo, Cinema
Marginal, São Paulo: Cosac Naify, 2014, p. 233.
62 Ibidem, p. 234.
63 Em O Bandido da Luz Vermelha, filme de Sganzerla do mesmo ano, conforme já
vimos, o fosso da agonia desmedida se faz bem mais presente e próximo.
64 Carlos Alberto Mattos, Walter Lima Júnior: viver cinema, p. 152.
65 Lima esteve na Bahia no famoso Carnaval de 1972, que marcou a volta dos
exilados Caetano e Gil e que talvez seja inspiração para a obra.
66 Cf. entrevista em: Rogério Sganzerla e Helena Ignez, “A mulher de todos e seu
homem”, O Pasquim, Rio de Janeiro: 5-11 dez. 1970.
67 Pelas referências no texto, o artigo foi provavelmente escrito por Glauber em
1970. Sua publicação, no entanto, com o título “O cinema foi a sétima arte”,
ocorre na primeira edição de Revolução do Cinema Novo, em 1981. Cf. Glauber
Rocha, Revolução do Cinema Novo, op. cit., p. 245.
68 Glauber Rocha, “Udigrúdi: uma velha novidade”, Revista Crítica, 1-7 set. 1975. As
citações seguem reprodução do artigo em Arte em Revista, maio 1981, ano 3, n. 5, p.
80.
69 Ibidem, p. 80.
70 Cf. entrevista de Glauber Rocha em: Federico de Cárdenas e René Capriles,
“Glauber: el ‘transe’ da América Latina”, op. cit., p. 189. A referência à data e ao
local da entrevista consta no índice do livro, p. 528.
71 Geraldo Veloso, “Por uma arqueologia do ‘outro’ cinema”, Estado de Minas, Belo
Horizonte: 17 maio 1983-14 jun. 1983.
72 Carlos Reichenbach, s. d. Parte inicial de texto datilografado para a Universidade
Federal Fluminense (arquivo pessoal). Acervo Multimeios, Centro Cultural São
Paulo, Prefeitura Municipal de São Paulo.
73 Cf. o Paulo Emílio de Cinema: trajetória no subdesenvolvimento, op. cit., p. 84 ou o
Robert Stam de “On the Margins: Brazilian Avant-Garde Cinema”, em: Robert
Stam e Randal Johnson, Brazilian Cinema, New Jersey: Associated University
Press, 1982, p. 312.
74 “A badaladíssima dos trópicos x os picaretas do sexo” e “Amor 69”.
75 O encontro com Oiticica se dá, na verdade, numa projeção de Jardim de guerra.
76 Geraldo Veloso, “Por uma arqueologia do ‘outro’ cinema”, op. cit.
77 Rogério Sganzerla e Helena Ignez, “A mulher de todos e seu homem”, op. cit.
78 André Barcinski e Ivan Finotti, Zé do Caixão – maldito: a biografia, Rio de Janeiro:
DarkSide Books, 2015, pp. 218-21.