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Da imitação à inovação: a dinâmica do


aprendizado tecnológico da Coréia
Linsu Kim
Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005.

No que pese os custos das distorções incor- tado e das políticas industriais, e o sistema edu-
ridas, o processo de industrialização brasileiro lo- cacional e os fatores sócio-culturais condicionan-
grou em transformar uma típica economia expor- tes daquele processo. É nesta parte que ficam
tadora de bens primários em outra detentora de evidentes certas particularidades da economia sul-
uma ampla estrutura produtiva. No período de coreana que tornam sua experiência um tanto sin-
apenas meio século transcorrido entre 1930 e gular, notadamente o alcance de poder do Esta-
1980, formaria-se no país um parque industrial do sobre as instituições de mercado e sobre o
diversificado, ainda que por meio de mecanismos próprio comportamento do empresário e do tra-
protecionistas, subsídios creditícios e fiscais, e balhador. O autor, de todo modo, busca salien-
preços defasados tanto de serviços públicos quan- tar que, mesmo após a democratização política
to de determinados produtos das empresas esta- ocorrida na década de 1980, a partir de um rede-
tais. De qualquer forma, esse cenário não seria senho de suas instituições, os condicionantes fa-
muito diferente ao encontrado em outros países voráveis ao processo de aprendizagem permane-
— como, por exemplo, a Coréia do Sul — que ceriam presentes, sujeitando-se somente à devida
acabariam por se destacar ao longo das décadas mudança de paradigma.
seguintes. De fato, a diferença que determinaria A segunda parte, então, é dedicada à análi-
as distintas trajetórias tomadas pelos dois países se de determinados estudos de caso, constituin-
residia em sua orientação competitiva: enquanto do-se o ponto principal do livro. Após introdu-
o planejamento econômico deste país asiático ti- zir, no capítulo quatro, o arcabouço teórico sob
nha como meta a inserção em mercados externos, o qual se dará essa análise, o autor expõe a tra-
o caso brasileiro tinha como objetivo a satisfa- jetória das indústrias automobilísticas, de produ-
ção da demanda interna por produtos anterior- tos eletrônicos, de semicondutores e das peque-
mente importados. Dentro deste contexto, a obra nas e médias empresas. São explicitadas então as
de Linsu Kim, “Da imitação à inovação: a dinâ- estratégias tomadas pelo governo e pelas empre-
mica do aprendizado tecnológico da Coréia”, lan- sas de cada um desses setores em vistas ao apren-
ça luz sobre alguns dos aspectos que ajudam a ex- dizado tecnológico, ou seja, ao caminho traçado
plicar os diferentes caminhos traçados pelos países dentro desses setores com relação ao processo que
latino-americanos e asiáticos no trasnscorrer das daria o título à obra — da imitação à inovação.
últimas décadas. Já na última parte, Linsu Kim delineia as
Linsu Kim, falecido no início de 2003, foi implicações da experiência sul-coreana para os
de fato um dos pioneiros na análise do processo demais países em processo de catching-up. O au-
de aprendizagem tecnológico da Coréia do Sul, tor salienta quatro aspectos que poderiam ser re-
sendo que “Da imitação à inovação” ficaria co- produzidos por esses países: a atuação governa-
mo sua obra mais importante. Curiosamente, seu mental, as políticas industriais e educacionais e,
lançamento se daria em um momento infeliz, em por fim, a construção de crises por parte do go-
meio à crise asiática de 1997, o que exacerbaria verno.
o tom às vezes excessivamente entusiasta em re- Porém, Kim faz ainda algumas ressalvas.
lação à estratégia de desenvolvimento adotada Primeiramente, a respeito das diferenças ambien-
por esse país. Porém, passado quase uma década tais que hoje já não são mais reproduzíveis, prin-
desde então, no que pese esse teor por vezes en- cipalmente em virtude das regras da Organização
gajado, muitas lições podem ser extraídas da obra. Mundial do Comércio (OMC), da proteção dos
O livro se divide em três partes. Na primei- direitos de propriedade intelectual e das políticas
ra delas, o autor expõe o cenário sul-coreano sob protecionistas dos Estados Unidos e da Europa
o qual se deu o processo de aprendizagem tecno- tornando-se um empecilho a uma estratégia de
lógica. Ela é constituída por dois capítulos, nos desenvolvimento voltada às exportações.
quais se discute, respectivamente, o papel do Es- Em segundo lugar, Kim aponta certas parti-

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cularidades do processo sul-coreano, como os fa- idioma nacionais, e a organização militarista e
tores culturais que moldam e disciplinam o com- verticalizada das empresas sul-coreanas.
portamento individual e grupal, que claramente Com tudo isso, pode-se dizer que o lança-
não são passíveis de serem reproduzidos. Ainda, mento dessa obra no Brasil veio em boa hora. Ao
as dificuldades impostas pela Guerra da Coréia, mesmo tempo em que o país se mostra incapaz de
pelas condições físicas do país e por uma série de apresentar significativas taxas de crescimento eco-
privações históricas teriam sido, segundo o autor, nômico por mais de dois anos consecutivos, diver-
fundamentais para, respectivamente, a transfor- sos setores da sociedade têm se mostrado insatis-
mação da sociedade sul-coreana, a capacidade de feitos com as respostas dadas pelo atual debate
adaptação e a origem do espírito empreendedor econômico. A obra de Linsu Kim constitui então
e da dedicação ao trabalho por parte dos sul-co- um importante subsídio ao aprimoramento desse
reanos. debate, particularmente no que diz respeito a po-
Finalmente, o autor conclui recorrendo ao líticas de incentivo à inovação tecnológica e à in-
Paradoxo de Ícaro, segundo o qual a maior van- serção competitiva em mercados internacionais.
tagem de uma pessoa sobre as demais pode trans-
formar-se no fator determinante de sua queda. Alexandre Messa Silva
Fazendo a analogia com a economia sul-coreana, Pesquisador do IPEA, Professor
o autor aponta quatro desses fatores: a grande in- do Departamento de Economia
tervenção do governo na economia, a concentra- da Universidade de Brasília
ção econômica em torno das grandes corporações e Mestre em Economia
— os chaebols -, a preservação da cultura e do pela EAESP/FGV.

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