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Álvaro Loreto

POEMAS DE GELO
AO SOL
Volume Único
Segunda Edição

Editora magister Perotinus


São Paulo, Brasil
2016
© Álvaro Loreto, 2016
2ª Edição, 2016

Ilustração da Capa:
Raquel Loreto
Revisão:
Mércia Loreto
Dados internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Loreto, Álvaro, 1968

Poemas de Gelos ao Sol – Segunda Edição. São


Paulo, Editora Magister Perotinus, 2016

ISBN 978-85-916640-0-9

1. Poesia Brasileira: Loreto Filho, Álvaro


José.

869.93 CDD 869.935

Índice para catálogo sistemático:

1. Poesia : Século 21 : Literatura brasileira 869.935


2. Século 21 : Poesia : Literatura brasileira 869.935

Editora Magister Perotinus


R. Dr. José Luís Guimarães, 110 – Jd. Paraíso
CEP 02418-060 – São Paulo – SP
E-mail: magisterperotinus@outlook.com
SUMÁRIO

Houve um Tempo 6
Como se faz uma jangada? 9
Estava subindo a Brigadeiro. 10
Poema dado 11
Árvore de Paus 13
Na terça de carnaval 14
A linguagem é como se diz. 15
É vasto o espaço! 16
Sobre as crianças soro positivo no mundo 18
Escrever no Face 20
No céu espalhado. 21
Por aqui se vai... 23
Eram três as penas do anjo 24
Na areia fria do leito oceano 26
À noite não se ouvem os fazeres... 27
Doces são as mãos que tecem o tear. 28
O Relevo da Alma 29
Firme no seu ginete 30
Não desculpes o poema... 31
Página em branco 32
Sonata 34
Um jogador de basquete sem bola 35
Feche a porta. 36
Aquela Professora 37
Panapaná. 38
Pela ladeira 39
Sim, apenas as recolho. 41
Balaio 42
Coral na Febem 43
Satélites rodam por aqui (Link para partitura coral) 44
Minha Canção 46
Tua alma 49
Não mais que 7 anos 50
Koan 1 51
Dizem assim: 52
4 poemas sobre um Tsunami 53
Canção “Balé dos Minotauros” e seu link 54
Cançao: “Amor Citadino” e seu link 55
Joguei minha rede 56
Não ligo pro tempo 57
Se Deus não está 58
Satellites (Versão do poema “Satélites rodam por aqui” p.44 59
E na China 61
Chove 62
Pelos mais novos 65
O Tempo 66
Chorei, Chorastes 68
Nasceu-me uma poesia... 69
à Mércia e à Raquel
H ouve um tempo,

antigamente,
no qual as palavras, suavemente,
eram aladas,
se perdiam no vento.

Ossos leves,
pouquinha carne.
Voavam alegres
pelos parques.

Passava a vida,
tão serelepe
e as palavras pousavam
no guarda de quepe.

Cansadas, meio caladas,


tristonhas até, desconsoladas...

Juntavam os trapinhos,
formavam casais pelos beirais,
nos avarandados xaxins.

Faziam ninhos em tudo que era lado:


nos topos das árvores,
nas conchas abandonadas dos caramujos,
nos ovos vazios dos passarinhos!!
Os sons, assim abrigados, formavam ninhadas
de palavras que se espalhavam pela Terra...

Surgiam livros, enciclopédias, coleções,


bibliotecas, língua mãe... vinham à luz do dia
pra noite verdadeiras cidades, países!
Quando não era aqui, era ali. Uma febre!

E, naquela euforia de vida, um belo dia, uma


palavra há muito sonhada nascia afinal... era
a “poesia”...

A poesia... inspirava as outras palavras à


rebeldia! É assim que, se prestarmos bem
atenção, à tardinha, quando as palavras
estão meio impacientes...
irritadas de sua vida enlivrada, sentindo-se
enjauladas, elas se mechem...
estalam... desarrumam...
abandonam seus gravetos e

voam... ! pelos altos, bem livres, das pautas de


suas prisões...

As palavras, elas sentem, são todas, no fundo,


como a poesia... elas são o hálito breve que
emana, o fruir inconstante que reclama, brisa
de ar umedecida que passa, na gente, pelos

pulmões.
C omo se faz uma jangada?

- Primeiro, um violão,
que pulse em sua pele madeira.
Agarre-se a ele, ferozmente!
Salvar-te-á nas corredeiras.

Um livro de cabeceira,
que também tenha por mãe a madeira.
Te levará tranquilo e sereno
sobre as redes dos teus inimigos.

Escolha os teus moinhos


todos, também, de madeira.
Flutuará, assim, como em asas
sobre as escarpas, as cordilheiras.

Sim! Não esqueça a cruz!


E stava subindo a Brigadeiro

naqueles instantes míticos,


a Paulista já a vista,
acrópole sitiada que chorava a libertação...

... a caminhada política transformava-se em


algo mais parecido com uma
procissão ...
Justo que, na Imaculada Conceição,
relembro a canção:

- "vem vamos embora que esperar não é


saber"

Na imagem que vi refletida na vitrine,


um professor abilolado
mergulhado na fumaça
lacrimogênia do passado.

A política reemergiu, súbita,


misturada ao zumbido
nascido da bomba de desafeto moral.

Sorte que sou devoto de São Silvestre!

(22-06-2013)
P oema dado

não é uma questão


de sorte.

Alguém o lançou
à vida
à tristeza
à morte.

Vem ao mundo
tendo por mãe
a solidão.
Por pai,
um velhote.

Rebenta à noite
em algum bar
entre
o Trianon e o Amargedon

Seu nascimento é sempre, e sempre será, seu

mote...

Mas pouco, ou nada disso,


talvez, realmente
importe!
Resta
que um poema dado,
diga-se de passagem,
não pode nascer, simplesmente,
à galope

nasce,
antes,
de um

corte.

(29/10/2013)
Á rvore de paus

frondosas copas
seu destino de ouros
é ser espadas.

Ou arco de flechas,
ou violino de arcos,
ou ripas de telhas,

ou cerejas,

limões,
framboesas,
ácidas laranjas,

ou suas doces mangas rosas.

Sua sombra espalhafatosa,


chapéu de rua,
mesmo na lua mimosa,
deita viril certeza
de uma última esperança

de uma humana bonança

Oxigenada.
N a terça de carnaval escrevo um poema

a lápis
nas tiras das serpentinas.

Notas, nos confetes.

...

No palco do salão escorrego a palheta pelas


cordas tensas de um Ré menor,
e a guitarra erra, erra.

era pelos ecos do salão.


A linguagem é como se diz:

a paisagem a partir do nariz.

Age no fundo da lousa:


dançarina dos olhos de giz....

na poça, viscosa massa pastel,


do céu doutros tons de anis

Enlaça meu coração e me diz,


- tua tristeza é só tua,
pobre de ti, aprendiz.

Não me amarra tua angústia


pois para mim tu és apenas
cicatriz.
É vasto o céu!!!

e,
há bilhões de anos,
a tudo, sem rancor,
abraça.
E, pela Terra, pelas praças,
há mais céu ainda a passar. Imagine-se!
Céu virgem de homens.
mulheres, nem pensar.
Céu daqueles espaciais, no qual a Terra ainda
não rodou,
nem sequer imaginou um dia
se distrair,
se florir,
se amar,
se casar,
se gerar,
se gastar,
e, por fim,
desfalecer
sem ar.
E o céu hoje, singular, tampouco, jamais viu
Terra assim, mais gorda.
Assim, torna-se inequívoco namorar
este céu vertiginoso
que veio aqui passear!
Levá-lo pra surfar.
Jumping pra lhe agarrar
as pernas no desfiladeiro.
Passear, de bicicleta,
por todo o Rio de Janeiro!
E ficas ai tão cansada...?
Na poltrona de frente pro seu computador,
com seu mesquinho
espaço
virtual...
Sai!
Vá à janela...
Suspirar!

(13/08/2013)
SOBRE AS CRIANÇAS SORO POSITIVA NO
MUNDO

Será que esta criança é preta?


Será que esta criança é parda?
Será que esta criança é branca?
A cor não é um acidente para a criança?

Será que os pais são pervertidos?


Alcoólatras? Maconheiros?
Fumam crack?
E fizeram-nas como fruto de sacanagem?
Mas os pais também não são um acidente
para a criança?

Ela é africana? Não é japonesa...?


Será sueca? Não é americana?
Mas, o lugar que esta criança nasce não será
também um acidente para ela?

Será que este ser é uma criança?


O doutor perguntará mesmo: o que é ser
criança?
Será porque não tem pai, mãe, tio/avô?
Será que ela se assemelha 100% a uma
criança normal, nos moldes que vemos comer
no McDonalds?
Nossas perguntas não insistem em ver
acidentes e criar mais e mais acidentes para
as crianças?

Será que não brinca no esgoto, no lixão, nos


fundos da igreja, do prostíbulo?
Será que os pais não são ateus, presbiterianos,
católicos, marxistas, maoístas?
E isto não tem a ver com o Estado, o governo,
o capital?

As indústrias de remédios... Por que não se


quebram as patentes?

A criança o que diz sobre isto?

Pergunta-se: a criança teria algo, enfim, que


lhe fosse principal?

Sobra uma certeza: ter ela soro positivo... é,


entre todos os acidentes possíveis, o mais trivial
deles...

Mas há um principal, sim:


Há crianças que são para se cantarem,
Há crianças que são para se declamarem,
Há crianças que são para se lerem em
silêncio, orando.

Qual tipo de criança você prefere?


E screver no Face

é quase como falar... só que não é mais o


vento que nos leva as palavras embora e nos
deixa novamente só, no silêncio elástico do
ar...
Palavras de luz negra imergem na luz branca
que as conduz,
calmamente,
para baixo...
rumo, todavia,
ao mesmo terrível abismo do tempo, sem
janelas ou portas para escapar.
Guardam, porém o pequenino corpo que
serviu de morada para sua existência:
um fóssil iluminado.
Cientistas, e outros curiosos, quererão revê-las.
Aí será só nadar para baixo, para o profundo,
rumo a suposta areia que funda este frio
oceano... da memória...
Para esta visita (re) acontecer será só ir
baixando o cursor do lado direito da sua tela,
no computador... O passado morto e
sepultado da palavra no Face ressurgirá...
mas, cuidado, não são mais peixes pra
panela, são só
pixels para ornar a t e l a
N o céu espalhado:

nuvens, como
migalhas de
p
ã
o
n
a
t o
a
l h a.

O vento gelado vindo do horizonte solar,


entrava pela porta entreaberta.

Degelava, no sereno quintal,


o ar
que cheirava óleo de barbear,
da vizinhança madrugadeira.
O sol cegava.
O ônibus parou no
ponto.

Enxugou a gente da calçada. Partiu.


Sua face esquerda iluminada, a outra,
entristecida.

Ele assistia a luz


que se estilhaçava, que insistia, inundava,
propagava, espargia
suas radiações coloridas pelos vidros dos
carros]

pelo mundo.

ele

rezava.
P or aqui se vai...

e não consigo resumir em letras tais,


a doce geometria dos gentis bem-te-vis:

mundo maldito dos sinais...


E ram três as penas do anjo,

arranjadas, em cabana, junto à luz calada de


uma vela
à brincar.

Tudo na calçadinha
que o vento, frívolo,
não ousava avançar.

Em uma qualquer ruazinha estreita,


entre as lápides imperfeitas,
do velho e bom Araçá.

Havia uma paz tão presente


que o sono, muito docemente,
veio me enlaçar.

A minha busca, que vinha ensandecida,


caiu, desguarnecida,
no chão que o asfalto frio veio frear.

Sonhei e, neste sonho, dormi.


Dentro deste sonho,
tive um sonho que dormi de novo.

Disseram pra mim:


- Aqui foi o mais longe
que tu conseguistes chegar...
Escreve, ó pena, escreve!
Salmodeia pro universo ouvir.

Livra de mim o salubre


gosto desta lágrima
sem fim.

Retine o sino da manhã


Chamando pra gente rezar.

Todavia, correm outra vez,


bem distantes, os meninos com suas velhas e
boas pipas,
colorindo todo o ar.

Correm todos do cemitério


e das igrejas do mundo
à orar.

Deixam os mortos
para os seus mortos,
por fim, enterrar.

(2006)
N a areia fria do leito oceano,

a fina luz de um pensamento sol.

Um firmamento que se espraia, brando,

sobre um cocar de peixes em caracol.

Sobre as penas da palavra mal

divaga a vaga luz da bruma liquefeita.

Pastoso pássaro que alça voo do beiral

dos óculos aquosos da vida que é desfeita.

(2012)
À noite

não se ouvem os fazeres...


levemente, talvez, os prazeres.

não se pregam pregos, nem pragas


não se pregam preces, nem peças
não se pregam Jesus, nem Judas...
a madeira espera fria e rígida.

também não se coze o frango, nem o feijão,


não se cose a tripa, nem o botão,
não se limpa a latrina, nem o lampião,
não se ensina e não se aprende
sabe-se de coração!

à noite
é todo ausente o clamor,
como também é ausente a cor,
e é por isso ausente a flor

do criado-mudo da dor...

dorme-se logo
ao se por o luzeiro sol
pois que a faina amanhece antes
no cheiro do seu anzol.

J
D oces são as mãos que tecem o tear.

Doces
de lamber os dedos do açúcar,
do creme baunilha
do sonho
quando quer se realizar;

Doces são as mãos que tocam o violino.

Doces
de lamber os dedos do açúcar,
do amarelo ouro do creme baunilha
do sonho

de amar.
O relevo da alma:

sua ternura, sua candura, sua calma...

Solo de muito sangue pisado:


que virou húmus, que virou lumes,
que virou rumos...

De águas de planícies:
que correm fartas, que correm largas,
que escorrem grossas...

Pelo maternal rosto:


que chora lívido,
que chora sônico, que soluça em síncope...

que é de José, que é de Maria, que é de


Jesus
de Nazar

é
Firme em seu ginete

o guri sobe a encosta:


- se Deus gostasse do passado
não lhe largava as bostas!
N ão desculpes o poema...

a natureza deles é ferir.

Não desculpes a canção...


a natureza delas é sorrir.

Não desculpes, principalmente, a oração...


a natureza delas é o devir!

(04/2013)
ô ...,

página em branco que se expande


até o infinito!
Chega em meu tataraneto
e até mais...
Pra trás, volta à Europa, à Ásia e à mãe:
África.

Lá,
onde corríamos nas margens recém
encharcadas do
Nilo.
Onde
matávamos a
Ema
pra comê-la

e
onde fumávamos
cachimbos
de fumaça espessa
pra
esquecermos.
Na qual rabiscamos versos de amor

e
hinos à pátria
e
mesmo
obituários
e tenebrosos
autos
poli-
ciais
.

ô...,
página em branco
que tudo recebe,
Recebe meu beijo!
Comunica meu amor obsceno,
que declaro,
ensandecido,
a ti!

Doce e terna página em branco:


meu último
amuleto!

(2012)
SONATA

A língua fala,
Fálica lí n g u .
A boca fala,
Fálica boc .

Ah! O que amo num livro?


Além de sua pele papel,
além de sua letra tatoo,
além de seu silencioso abandon...?

Nada amo num livro mais que,


segurando sua lombada, olhar
seu rego na minha cara!

A minha língua, cantando no vão


obtuso de sua boca...
mesmo quando leio a letra miúda
do miúdo mundo
apertd n'm livr.

A língua canta no livro.


O livro prende na língua,
algo que está além...

Algo de sua coragem


em cantar
em
a b a n d o n...
U m jogador de basquete sem bola

é desengonçado.
Um marujo sem navio
é desengonçado.
Um professor sem lousa
é desengonçado.

Percebam que
devemos aos nossos instrumentos preferidos,
também, a tranquilidade
de não sermos engraçados
sem vontade de sê-lo.

Para evitarem-se situações inoportunas,


(regadas sempre no ácido certo de alguma
ironia),
nada como permanecermos sem ferramentas
nenhuma, no aconchego luminoso da
memória,

na virtualidade!
F eche a porta.

Ascenderei uma vela,

queimar-se-á a escuridão
A quela professora

tão levinha e tão tênue,


tinha um olhar de corisco
que destruía a gente.

Aquela professora
tão doce e tão meiga,
tinha um soco na lousa
que acordava até o indiferente.

Aquela professora
tão alegre e tão inteligente,
tinha um sonho tão louco
que nos deixou diferentes.

Aquela professora,
professorinha amada,
declarava, entusiasmada,
que será dente por dente:

"Cada minuto para a morte


será a estrela do norte
do minuto precedente.

Ali, então, o mundo surgirá


para todos que se declararem

valentes!"
P anapaná:

violetas principalmente;
Panapaná:
vindo ao meu encontro;
Panapaná, Paraná:
nos sóis e nas nuvens,
nos eucaliptos;
Panapaná:
figura de mulher
se construindo, se diluindo.

(Do livro Poesia Diversa - 1989).


P ela ladeira

de sua cidade vaporosa


(da memória) você subia.

Tua vida subia então em direção à igreja


concreta
na qual teus semelhantes
veneravam, acima de suas próprias
Ilusões etéreas,
acima de suas próprias vidas
miseráveis
a imagem de um Santo.

Você
trazia nos sapatos o
barro de que fora feita.
e acabara de desbravar o mistério
lacônico e insólito que te infiltraram.

E tinhas um pátio bélico


onde antes era o paraíso.

Via que os meninos faziam


de si o comércio tétrico do alimento
na porta do Templo.

Porém, as cordas estiradas de sua cidade


(móbile)
eram cortadas, uma a uma,
e seus semelhantes, marionetes
fingiam não olhar.

Enfim: estavam agora enterrados


debaixo de sua carcaça
que dormia anestesiada na cachaça,
ao som do
Jornal Nacional.

(A partir de poema do livro "Poesia Diversa"


de 1989.)
S
im, apenas as recolho, em braças

Seres espaçosos, minhas poesias.


Palavras... não

A alegria!

(Do livro Poesia Diversa - 1989).


B alaio.

Ferramentas soltas:

minha vó ouvia

o tempo.
CORAL NA FEBEM

Dia das mães na quadra:


um sol solitário e esbranquiçado.
refletido na pasta, no plástico,
nas pautas, e no som de uma cristalina
quinta justa que ecoava.

Houve uma matutina mãe


que declarou a todos seu sorriso, e lágrimas.

Depois do concerto, um abraço,


um beijo também.
Houve carinho!

Foram mais ou menos


2 minutos de uma alegria chorada, entre
(mãe e filha)
S atélites rodam por aqui

no largo céu estrelado.

Céu negro,
são pontos que cruzam a órbita,
de lado a lado,

... voam solitários,


obscuros ...
como crianças abaladas

em exíguas câmaras de viagem


rumo ao retorno.

Outros, descolados
à Terra, viajam há anos luz...
mandam cartas...
...poemas de gelo
ao sol...

Os meninos
veem outras galáxias:
jardins exclusivos,
com suas balanças e carrosséis de celestiais
dimensões,
imersos, inexplicavelmente, em frio e silêncio.
As meninas,
com suas longas tranças abandonadas
na pia,
ainda gravitam e vigiam a mãe, Terra,
que anda rebolando
rumo ao pedicuro.

Tristes...

as crianças caçam vida


pelas terras ressequidas
para rechear-lhes as entranhas.

Bisbilhotam
ilhotas
de corações
extintos...

milênios!
M inha canção,

só,
irá
caminhar em silêncio
pela prancha que voa.
A tua procura
cairá!
Ou sorrirá, à toa,
ou sentirá,
em fim,
a
carne
que
arpoa.
(17/03/2014)
N o chão,

na
desértica
areia,
o cocar
de um menino
índio
serpenteia.
Pena só
que voa,
branca,
e o vento
que pelo sertão
escoa
levava uma canção:
Não tem mais nada lá, não,
o menino de então,
agora é morto
é morto,
é morto.
Na esquina da avenida paulistana
passa de janela em janela
uma sombra
que murmura,
envolta em
fumaça...
as seguintes palavras...
- Me veja uma moeda!
Me compra uma cachaça!
Me traz meu coração,
que seja uma cereja,
dentro de uma cabaça.
Que seja um violão,
que seja uma mulata!
Seja, talvez, uma azeitona,
no seu martini, gelada.
Traga meu coração!
Mesmo que seja já morto
Dentro deste seu carro de lata.
(18/02/2014)
Tua alma é

joia de outro ourives...

lumiará só,
sem pedires...

as vezes
quando tua alegria for triste
ou, na tua tristeza, sorrires.

Porventura, quando distraíres...

Ou quando
pelo teu coração, sentires,
estando, no mais das vezes,
prestes
a
partires
N ão mais que 7 anos

empurrava, na balançinha do jardim, a


menina mais bonita da escola.

Esperei tanto tempo por aquele momento.

Quanta engenharia envolvida naquela


"coincidência".

E ela ia até as nuvens e voltava como um


algodão doce...

E Pedro gritou...:

- Álvaro, vem!! A aula vai começar!!!

- Ora, Pedro, não vê,,,

PUFFF

Mu naruz sungrou muito nuquela ólinha d'


música.
T udo cabe no tempo

assim como
tudo cabe no espaço...

Coma tudo, meu bem,

é hora do almoço!

A comida vai esfriar!


D izem assim: uma foto é igual a mil

palavras.
Na verdade, a foto continua cabendo em
apenas em uma palavra: foto
E não diz mais nada.
O movimento precisa de equilíbrio !

Por isso, entre os barcos que


se salvaram do Tsunami
havia muitas baleias.
Em cada baleia, dois barcos.

O equilíbrio precisa do movimento !

Por isso, entre os elefantes que


se salvaram do Tsunami
havia muitos motociclistas.
Em cada moto, dois elefantes.

O futuro não precisa mais do passado !

Quando olho por cima dos escombros


só procuro alguém com vida
para que possa me achar a mim também.

O passado não precisa mais do futuro !

Porque lá nunca haverá Tsunami.


BALÉ DOS MINOTAUROS

Na baía dos homens à tarde, a maré.


Os olhos de uns homens perdidos na fé
de enxergar dali outros mundos,
até:
nos olhos das meninas
universos de
balé.
A ponta do Ice-berg, o mundo, ou Pelé.
Batuques, minotauros, o sol de Noé.
Gravados pelos céus uns dizeres, assim,
que deixava nos homens
saudades sem
fim.
Na baía dos homens de sais de jasmins,
nos olhos de uns homens de luz, Serafins,
Gravados pelos céus uns dizeres, assim
que deixava nos homens saudades
sem fim.
(1995)
( Gravação: https://soundcloud.com/alvaro-loreto/bale-dos-minotauros )
Ao violão o Sr. Ney Lodos e o Contralto a Sra Roze Mattos
AMOR CITADINO
Os seus olhinhos, devagar,
à flor da noite, escureceu.
Escuro quadro da janela
o quarto dela se escondeu.
As roupas no varal,
a malha do enxoval,
o dia foi dormindo
como um sonho no real.
Até seu moço chegar.

Pela cidade os seus olhos vagueavam, sem


razão.
Tudo era triste, no neón
a rua toda a serenar.
A praça do relógio,
o homem da estação,
a noite transbordava versos
no seu coração.
E viram que à janela
um vulto surgiu.
Um rosto envolto em brumas
levemente sorriu
A moça do olhar,
o moço tão gentil,
andam se encontrando
nestas noites de frio.
(1995)
Soprano: Mércia Morais Marques Loreto
Violão: Josimar Alves Fonseca
(Gravação: https://soundcloud.com/alvaro-loreto/amor-citadino )
J oguei minha rede no passado...

Nada pesquei.

Joguei minha rede no futuro...


Pesquei nada.

Deitado na rede...
pesquei tudo,
tudo .

Pra nada.

Me resta muito pouco


pra viver
consolado...

Que acho preso,

embrulhado,

nas cordas do meu

violão,

enrolado...
N ão ligo pro tempo

Que ele passe por mim...


Sem dizer adeus...
Sem reticências...

Não ligo pro tempo...


Com suas contumazes fugacidades...
Com seu cigarro feito de
beijos e abraços e esperanças
transformando tudo
em fumaças esverdeadas
Não ligo pro tempo...
- Alô!?
- É engano...
- Não, não é !
se Deus não está dentro de ti

estará em algum lugar


...
?
Se Deus,
está em algum lugar
já esta, a esta hora,
fora de si,
por ti
a procurar.
SATELLITES
Satellites wheel around here
in the wide starry sky.
They are points that cross the orbit,
from one side to the other,

... Fly loners


obscure ...
like abandoned children
in confined travel chambers
toward the return.
Some, taken off to the Earth, traveling light
years ...
send letters ... :
... Ice poems
written to the sun ...
the boys see other galaxies: unique gardens,
with their swings, and heavenly carousels
dimensions,
inexplicably immersed in cold and silence...
The girls, with its long abandoned braids in the
sink,
still gravitate and watch the mother, the Earth,
walking wiggling
for the chiropodist.
Saddened ...
children hunt life
by the parched lands
to fill their bowels.
gossiping islets
extinct hearts ...
for
millennia.
E na China,

já amanheceu?
Já terá luz
os escuros olhos
da menina?

Chorar, vá lá, ser sina.


Não dormir, tomar quilos de aspirina...
mas, que horas serão?
Serão vespertinas?

Por dentro, vai-se o tempo


que, quando chega aos olhos, só ensina
que ainda não amanheceu
na
China.

Agora, tarde noite em Berlim


entrei no trem, trampolim.
Toca chaminé, à Pequim
um amor que voa,
clarim!

Dois corpos nus se encontrarão


à luta mansa
no jardim.
A boca de leão no mato.
O murmurar do regato.
Beijará as costas o
capim.

E na China,
o sol,
amanhecerá,

pra mim.
C hove.

Na moleza do quarto de dormir: quartinho,


cama, tevê, travesseiro, lençol, radinho,
chinelas,
tapetinho.
Dorme e acorda, acorda e dorme: uma moça
e seu ursinho, uma mulher e seu dedinho, uma
velha e seu espelho, uma pura e uma puta,
todas juntas na mesma caminha
de solteiro.
Ascende a luz: está chovendo; Liga o rádio:
está chovendo. Tevê: sempre chove depois
do hino... O mundo todo chove e está frio:
será que aquele diabinho não desce aqui pra
ajudar eu dormir?
Põe a mão no bolsinho do velho pijaminha e
tira uma fotografia, e é como se sacasse de
um revolver... mas, pelo cano do trabuco, é
doce a imagem que se vê.
E recomeça a chorar e o mundo todo
chove.
P elos mais novos

tenho muito amor e dó...


pelos vastos verões
que andarão calados e
sós.

Pelos avós
só tenho amor e dó...
por desatarem os nós, e
pelas pegadas no
pó.
De você
só quero um dó
para que cantemos,
largos e afinados:
"que falta eu sinto de um bem,
que falta me faz um xodó
..."
Alvaro Loreto e Gilberto Gil.
(12/03/2015)
U m salto no espaço

seria mortal
à frente de um tiro
que iria atingir alguém especial...

Mas isso não acontece todo dia


e é porque Deus não quer, oras,
poupando a gente da velocidade
supersônica...

Mas, há alguns sorrisos, os irônicos...


Ah! Como eu queria ter velocidade, Deus,
de me arremessar pelo espaço
pra te salvar.

O sorriso daquelas palavras... como é mesmo?

deixa pra lá...


C horei, chorastes.

Outros Ets chegam ao espaço diariamente


Fazer o que?
Bem livres daqui,já, em suas respectivas
espaçonaves, buzinam no túnel do tempo.

Aos domingos, lembram de nós, terráqueos,


nossas idiossincrasias
e riem.

Chorei, chorastes. Mas eles tiveram de partir,


É muito humilhante estar aqui e ser tratado
como igual... não sendo.

Vai. PARTE!!! Some daqui desta maldita ilha


amarelindia.

Um dia, não esquece, vem me buscar!!!


Deve haver algum Horto por aí pra gente
passear,
ainda uma vez,
de mãos dadas.
N asceu-me uma poesia...

Logo que a vi
achei-lhe certa graça...

mas não iria sobreviver: molenga, pernas


finas... pálida.

Já ia lançá-la ao mar,
uma bola de concreto ao pescoço...

Mas ela tinha uma coragem no olhar.

Mas ali estava um daqueles dóceis poemas,


bom da gente dormir lendo...
seria pura vergonha!
Acendi a fogueira. Numa cruz de ferro, decidi
queimá-la.

Mas tinha os seus longos cílios.

Iria, então, enforcá-la, à noite... esfaqueá-la

Mas ela era só serena, doce, pequena...

No fundo queria salvá-la,


achei-lhe certa graça...
A virei no verso,
do avesso...
conferi se lhe havia alguma santidade... um
dom... uma utilidade qualquer...

Nada...

Mas, presta atenção, ela me abraçava,


e seus olhos... lágrimas?

Optei,
finalmente.

Abandoná-la então...
aqui mesmo, no Internet, sem coleira.

Mas,

confesso,
de vez em quando...
sonho com seu olhar

Tinha tanta esperança...

(2016)

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