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1
Fábio Luiz Machioski é historiador pela Universidade Federal do Paraná (2004). Atualmente trabalha
junto ao Departamento de Cultura da Prefeitura Municipal de Colombo e está cursando Especialização em
Linguagens do Patrimônio Cultural na Universidade Tuiuti do Paraná. Atua principalmente nos seguintes
temas: Imigração Italiana, Município de Colombo, Patrimônio Imaterial, Italianidade e Dialeto Veneto.
2
ANDREAZZA, Maria Luiza & NADALIN, Sérgio Odilon. O cenário da colonização no Brasil Meridional e
a família imigrante. Revista Brasileira de Estudos de População, 11(1):61-87, jan./jun.1994, p. 62.
3
BALHANA, Altiva P. História Demográfica do Paraná. In: Un Mazzolino de Fiori; Vol. I. org. Cecília
Maria Westphalen. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002. p. 273.
2
estudo em nossa investigação. Este tipo de fonte se torna uma preciosidade para esse tipo
de análise ao considerarmos que os contingentes de imigrantes constituem durante muito
tempo uma comunidade relativamente fechada, na qual a organização da igreja e suas
práticas representam a mais antiga instituição desse grupo.
Algumas idéias, elaboradas pelos estudos anteriores a respeito da imigração, são de
fundamental importância para as discussões inseridas neste trabalho. Refiro-me,
principalmente, aos conceitos de cultura imigrante e, consequentemente, de contato
cultural. O primeiro refere-se à constituição de uma identidade cultural desenvolvida em
função dos anseios do imigrante e da resposta do mesmo em relação à sociedade receptora.
A segunda diz respeito à relação que esses grupos de estrangeiros e seus descendentes
passam a manter com a nova sociedade.
Dentro dessas perspectivas, existem ainda outras duas idéias caras a nossa
discussão, como a da autopreservação e da integração. São essas duas vertentes que
constituem ponto de partida da presente pesquisa, na medida em que se pretende verificar
até que ponto, em um grupo específico de italianos, são encontradas ações que tinham por
objetivo afirmar uma cultura imigrante, e ao mesmo tempo analisar como essas ações
serviram para integração dos estrangeiros com a sociedade receptora sem que o grupo
perdesse seus valores étnicos.
Em outras palavras o que se pretende apresentar são relações sociais do grupo, afim
de verificar a preservação da cultura imigrante e as formas que esse grupo estrangeiro
encontrou para se integrar à sociedade brasileira. Assim, a autopreservação e a integração
constituir-se-iam nas duas variáveis fundamentais que poderiam explicar todo o processo
de construção de um grupo étnico.5
Sendo bastante homogêneo o grupo analisado, e considerando que, como
acreditamos, seus membros agiram, mesmo inconscientemente, no intuito de preservar suas
tradições e suas práticas culturais, esse trabalho pretende ainda analisar a intensidade com a
qual essa identidade cultural foi preservada. O que se pretende, enfim, é analisar alguns
aspectos do processo de autopreservação do grupo, através das práticas religiosas e
familiares dos mesmos.
4
Ibid., p.273.
5
ANDREAZZA, Maria Luiza & NADALIN, Sérgio Odilon. O cenário da colonização no Brasil Meridional
e a família imigrante. Revista Brasileira de Estudos de População, 11(1):61-87, jan./jun.1994, p. 71.
3
6
BARTH, 1998: 194. Apud: NADALIN & BIDEAU. Comment des luthériens allemands sont-ils devenus
des brésiliens? (un essai methodologique). 14e Entretiens du Centre Jacques Cartier (Lyon, França, 2001.)
[Texto em português publicado no Boletim de História Demográfica. São Paulo, 10(29):01-39, 2003,
p. 04.
7
GÉLIS. Apud: NADALIN & BIDEAU, op. cit., p. 04.
4
CAPÍTULO 1
DA ITÁLIA PARA O BRASIL:
A TRAJETÓRIA DE UM GRUPO IMIGRANTE
8
ALVIM, Zuleika M.F. Brava Gente! Os Italianos em São Paulo (1870-1920). Brasiliense: 1986. p.11.
9
Segundo ANDREAZZA e NADALIN transição demográfica é a designação dada ao fenômeno populacional
ocorrido inicialmente na Europa e que se refere à passagem de uma sociedade que se equilibrava com níveis
elevados de natalidade e mortalidade, para uma fase que anunciava outro equilíbrio com níveis baixos de
natalidade e mortalidade. Como a natalidade manteve-se durante algum tempo nos antigos níveis, e a
mortalidade diminuiu, o fenômeno gerou excedentes populacionais na Europa. Imigrantes no Brasil,
Colonos e Povoadores. Nova Didática. p. 27.
5
mercado de trabalho das áreas urbanas. Assim surgiu em toda Europa um excedente de
mão-de-obra que a industrialização tardia de países como a Itália e a Alemanha, não tinham
como absorver.
Estes foram os principais motivos que impulsionaram a constante emigração
italiana. Em um primeiro momento, a tentativa para solucionar o problema da falta de
emprego foi a migração interna, do campo para a cidade. Porém, como já dissemos, a
industrialização italiana não era capaz de absorver os excedentes do campo. Então a
solução foi emigrar, atravessando o oceano. O que nos permite afirmar, finalmente, que a
emigração européia para a América pode ser vista como a continuidade da migração do
campo para a cidade.
Torna-se evidente, também, que a transição demográfica, a expansão do capitalismo
e as grandes migrações formam um conjunto de processos interligados igualmente no
espaço. As diversas ondas emigratórias européias, que atingiram o apogeu na passagem do
século XIX para o XX e retomaram com outras características no período entreguerras,
acompanharam de certa forma o avanço da transição demográfica e do capitalismo,
expandindo-se sucessivamente do Noroeste para o Sul e Leste Europeus.10
Isso explica, no caso da emigração italiana, o fato de que, entre as primeiras
correntes de estrangeiros dessa origem vindos para o Brasil, predominem italianos
setentrionais. É desta região que provém a maior parte do grupo de imigrantes instalado nas
colônias que estamos investigando, inauguradas entre 1878 e 1888. Talvez esta seja a
primeira resposta para nossa pesquisa, pois no momento em que definimos a região de
origem do grupo investigado podemos analisar a realidade vivida por este antes de emigrar.
Porém, antes de tratarmos do modo de vida que esses italianos apresentavam no
momento em que decidiram deixar a Europa, queremos afirmar de maneira mais concreta o
fato de que os estrangeiros dessa origem vindos para as colônias que estamos investigando
procedem das regiões setentrionais da Itália, sobretudo da região do Vêneto.
10
ANDREAZZA, Maria Luiza & NADALIN, Sergio Odilon. O cenário da colonização no Brasil Meridional
e a família imigrante. Revista Brasileira de Estudos de População, 11(1):61-87, jan./jun.1994, p.63.
6
Para isso construímos uma tabela, e posteriormente um mapa, com base nas atas de
casamentos dos imigrantes dessas colônias. Dos 518 indivíduos, registrados nos 259
assentos matrimoniais arrolados em nossa pesquisa, encontramos 271 imigrantes do qual se
conhece a região de procedência, observando-se a seguinte distribuição:
Fica claro que a origem regional da maioria dos imigrantes italianos instalados nas
colônias investigadas é o Vêneto, com quase 80% de representatividade, isso sem
somarmos a porcentagem de imigrantes dessa origem provavelmente inseridos entre
aqueles que o registro só faz menção a Itália em geral. De qualquer forma, todas as regiões
que aparecem são do norte, e considerando a área setentrional como um todo, podemos
levar em conta a semelhança das características sócio-econômicas entre as regiões que a
constituem.
Faz-se importante, para a compreensão do processo migratório, que analisemos de
maneira particular as características da região que forneceu o maior contingente de
emigrantes. Na pratica, a região do Vêneto se divide em áreas de colinas e montanhas,
como Vicenza, Treviso, Belluno e Udine, e áreas de planícies, como Verona, Rovigo,
Padova e Venezia. A divisão da propriedade obedecia o seguinte critério: pequenas e
médias nas regiões de montanha e colinas; grandes propriedades, já com caráter capitalista,
nas regiões de planície.11
As famílias que, num primeiro momento, abandonaram a Itália pertenciam, em
grande parte, ao universo dos pequenos proprietários e dos arrendatários. Isso se explica
pela forma como ocorreu a penetração capitalista no campo: concentração da propriedade;
altas taxas de impostos sobre a terra, que impeliram o pequeno proprietário a empréstimos e
ao conseqüente endividamento; oferta, pela grande propriedade, de produtos a preços
11
Ibid., p.28.
7
Não fica difícil entender porque foram eles, os pequenos proprietários, arrendatários
ou meeiros, os primeiros a abandonarem a Itália. É só nos aprofundarmos mais nas
condições de vida que essa porção da população italiana estava enfrentando para entender
a causa destes terem sido os primeiros a desembarcarem no Brasil.
A produção desses pequenos proprietários se apoiava no trabalho de toda família, e
era da terra que eles tiravam a maioria dos alimentos para a sua sobrevivência. Esse hábito
milenar ligado à pequena propriedade criava a ilusão, para esses camponeses, de
independência. As famílias vênetas, que contavam com doze ou até quinze elementos ao
todo, viviam do pequeno núcleo de terra que lhes pertencia. O pai era a autoridade máxima
e o grupo se mantinha unido enquanto a propriedade fornecia os recursos necessários à sua
manutenção.
Toda a população, desde os mais abastados até os mais pobres, alimentavam-se
basicamente de polenta, preparada com a farinha de milho. Quando a mesa era farta, o
12
ALVIM, Zuleika M.F. Brava Gente! Os Italianos em São Paulo (1870-1920). Brasiliense: 1986. p.23.
8
cardápio não passava de peixe, ovo, salames e verduras e raramente se comia pão de
farinha de trigo e carne de gado. O vinho era tomado somente na época da colheita da uva;
depois, só se consumia o “vinhete”, espécie de qualidade inferior obtido da segunda
prensagem das uvas com água.13
Não só a dieta desses camponeses era precária, mas também as suas roupas e suas
habitações eram deprimentes. Aquelas, tantos dos homens como das mulheres, eram
grosseiras, tecidas em casa. Em geral eram feitas de algodão cru e de lã mista. Seus sapatos
e tamancos também eram de confecção caseira, feitos de madeira e alguma lã qualquer. A
grande maioria vivia descalça e só cobriam os pés no inverno.14 A moradia desses pequenos
proprietários também deixava muito a desejar, como podemos perceber por meio de um
relato encontrado na obra de Zuleika Alvim, que descreve as casas dessa porção da
população italiana como
Portanto, o que observamos é que essa porção da população italiana vivia num
estado de extrema pobreza, e que, por esse motivo, gastavam suas vidas unicamente na luta
pela sobrevivência. Sendo assim, podemos imaginar que o mundo desses homens e
mulheres ligados a terra era formado pelos limites da comunidade, e que o ideal econômico
desses camponeses era o da auto-suficiência. Consequentemente a organização social e
familiar era estritamente local, onde o cotidiano variava do trabalho para a Igreja. Sem
dúvida eram esses dois valores, o amor a terra e a religião, que impulsionavam a existência
13
Ibid., p.31.
14
Ibid., p.32.
15
Cit. in: FRANZINA, E. Apud: ALVIM, Z, op. cit., p.31 e 32.
9
desses camponeses e os faziam dedicar a vida inteira para a manutenção de seu pedaço de
terra e de sua família.
Porém, essa tarefa de manter a sobrevivência da família por meio da pequena
propriedade se tornou cada vez mais difícil, e boa parte dessa dificuldade deve-se ao
problema da divisão continua da terra. Entre esses pequenos proprietários o hábito de
dividir a terra quando os filhos se casavam começara há muito tempo. Como conseqüência,
devido a falta de terra, a maioria dessas famílias de camponeses tinham filhos trabalhando
como braccianti, trabalhadores braçais, nas grandes fazendas, ou filhas nas pequenas
indústrias artesanais.16
Traçada essa paisagem de pobreza causada pela industrialização e pelo grande
aumento demográfico podemos entender quais os motivos que levaram muitos camponeses
a abandonar sua terra natal para se aventurarem em outros continentes. A falta de terra e a
falta de emprego na Itália fizeram com que muitas famílias encontrassem na emigração a
única solução para a sua sobrevivência. Assim fica fácil compreender o porque a pequena
propriedade se tornou sinônimo de pobreza, e ainda, proletarização sinônimo de expulsão.
Dessa forma podemos classificar o imigrante italiano que primeiro chegou ao Brasil
como pequeno agricultor proveniente das regiões montanhosas da parte setentrional da
Itália. Isso se afirma ao observarmos a tabela abaixo (tabela 2), que apresenta a maior parte
dos vênetos instalados nas colônias que aqui servem como objeto de pesquisa como
provenientes dessas regiões que abrigavam o pequeno proprietário italiano.
Assim, podemos definir quem foram os emigrantes de origem italiana que se
deslocaram num primeiro momento e que vieram instalar-se nas colônias por nós
estudadas, inseridas no contexto paranaense. Também, essa primeira analise nos permitiu
saber quais foram os motivos que fizeram esses camponeses abandonar a Itália. Cabe agora
definirmos quais foram os atrativos que os trouxeram para o Brasil. Porém, desde já
podemos afirmar qual foi o sonho desses homens e mulheres ao deixar a terra natal: uma
porção de terra que ficasse perto de uma igreja, onde pudessem se sentir independentes,
afim de reconstruir um mundo à semelhança do que deixaram para trás.
16
Os braccianti, como explica Zuleika Alvim, eram uma categoria de trabalhadores rurais temporários, que
só trabalhavam nos momentos de grande necessidade de mão-de-obra, e que recebiam por dia ou por cota.
10
Desde o período colonial havia no Brasil uma política imigratória com a finalidade
de ocupar vazios demográficos, para assim garantir aos portugueses a posse da terra.
Sobretudo, havia a preocupação em ocupar aqueles territórios que eram disputados com os
espanhóis. Portanto, havia uma política de colonização, uma vez que incentivava o
povoamento do Brasil.
Porém, até 1808, data da instalação da Corte Portuguesa no Rio de Janeiro, a
população do país, incluindo neste o território que hoje compõe o estado do Paraná, se
fizera exclusivamente de portugueses, escravos africanos e índios, formando essas raças a
sociedade tradicional do Brasil. Com a chegada de D. João VI adotaram-se medidas para
aumentar a população do país, principalmente no sul, onde as fronteiras estavam em litígio
devido a presença espanhola.
No que se refere ao território paranaense, porém, sua região era mal povoada, com
sertões brutos e desabitados, inclusive em áreas não muito distante de Curitiba.17 Neste
sentido, no mês de novembro de 1808 surgem duas Cartas Régias que almejavam resolver a
questão. A primeira, foi publicada em 5 de novembro e oferecia a concessão de sesmarias
aos que tomassem armas para conquistar em definitivo as terras dos Campos Gerais e de
17
WACHOWICZ, Ruy. História do Paraná. Curitiba: Imprensa Oficial do Paraná, 2001; p.145.
11
18
NADALIN, Sergio Odilon. Paraná: ocupação do território, populações e migrações. Curitiba: SEED,
2001. p. 61.
19
MARTINS, Romário. Quantos somos e Quem somos, dados para a história e a estatística do
povoamento do Paraná, pp. 58 e 59.
20
BALHANA, Altiva P.; MACHADO, Brasil P. e WESTPHALEN, Cecília M. História do Paraná. 1º vol.
Curitiba: GRAFIPAR, 1969; p.157.
12
Thereza, fundada pelo médico João Maurício Faivre em 1847, nas margens do rio Ivaí, com
imigrantes franceses. A segunda foi a colônia do Superaguy, fundada por Carlos Perret
Gentil em Guarequeçaba, no ano de 1852, com colonos suíços, franceses e alemães.22
Portanto, no momento de sua emancipação política, em 1853, a Província do Paraná
possuía apenas três colônias: a colônia Rio Negro (1829), a colônia Theresa (1847) e a
colônia Superaguy (1852).
Sendo assim, logo que assumiu a Província, o presidente Zacarias de Góes e
Vasconcelos percebeu que precisaria promover o aumento da população por meio da
criação de núcleos de colonização estrangeira. Além da necessidade de ocupação territorial,
a jovem província deparava-se com uma série de outros problemas, entre os quais os
principais eram a falta de trabalhadores para abrir e conservar estradas e a necessidade
urgente de desenvolver uma agricultura de subsistência para suprir a falta de alimentos.
O problema da falta de gêneros alimentícios deve-se ao fato de que um grande
número de escravos foi retirado das atividades de subsistência na década de 1850 para
atender a demanda de mão-de-obra nas grandes lavouras paulistas, principalmente de café.
Como resultado começou a decair a produção de alimentos em todo o país, fenômeno
conhecido como carestia. Devido ao desprezo manifestado pelo brasileiro, e pelo
paranaense em particular, ao trabalho agrícola, que era considerado uma atividade de baixo
status social, a vinda de “colonos morigerados e laboriosos” passou a ser considerada como
único meio adequado para solucionar o problema da crise de escassez e carestia de produtos
agrícolas.23
Nesse contexto a principal função da imigração no Brasil deixa de ser o
preenchimento dos vazios demográficos e outras duas necessidades passam a pautar a
entrada de imigrantes. Uma é a introdução de estrangeiros para substituir a mão-de-obra
escrava cada vez mais escassa nas grandes lavouras de café paulistas. Outra voltada para a
formação de colônias em pequenas propriedades que produzissem os alimentos de
subsistência.
21
NADALIN, Sergio Odilon. Op. Cit., 2001. p. 61.
22
Ibid., p. 67.
23
BALHANA, Altiva P. História Demográfica do Paraná. In: Un Mazzolino de Fiori; Vol. I. org. Cecília
Maria Westphalen. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002, p. 275.
13
24
BALHANA, Altiva P.; MACHADO, Brasil P. e WESTPHALEN, Cecília M. Alguns Aspectos Relativos
aos Estudos de Imigração e Colonização. In: Colonização e Migração. São Paulo, 1969, p.358.
25
Ibid., p. 358.
26
Relatório do Presidente Francisco Liberato de Matos, apresentado na abertura da Assembléia Legislativa
Provincial, em 7 de janeiro de 1858. Curytiba, Typografia Paranaense, 1857, p.21.
14
obras públicas, sobretudo a construção de estradas, o problema imigratório foi desde logo
colocado no sentido de criar-se uma agricultura de abastecimento.27
Outros dois fatores que favoreceram a implantação de colônias em terras
paranaense, assim como em toda a região Sul, foi a situação de clima e solo, que aqui se
apresentavam de maneira muito semelhante à Europa. Dessa maneira, acreditamos que seja
fácil compreender como o território da Província do Paraná inseriu-se na política
imigratória brasileira.
Sendo assim, o governo da província paranaense desenvolveu uma política
imigratória, sempre visando a criação de núcleos coloniais voltados para a agricultura de
abastecimento, que atraiu uma diversidade de europeus, oriundos de diversas regiões.
Primeiramente vieram contingentes alemães, suíços, franceses e ingleses e, mais tarde,
italianos e poloneses e, finalmente, ucranianos e holandeses, entre outros. Dentre esse
grupos, os que mais se destacam na contribuição demográfica do Paraná, em termos de
densidade, são os seguintes: Poloneses (49,2%), Ucranianos (14,1%), Alemães (13,3%) e,
finalmente, Italianos (8,9%), formando as outras etnias apenas 14,5%.28
27
BALHANA, Altiva P.; MACHADO, Brasil P. e WESTPHALEN, Cecília M. História do Paraná. 1º vol.
Curitiba: GRAFIPAR, 1969; p.162.
28
Idem, p.184.
29
MARTINS, Romário. Quantos somos e Quem somos, dados para a história e a estatística do
povoamento do Paraná, p. 176.
30
FERRARINI, Sebastião. O Município de Colombo. Curitiba: Champagnat, 1992; p. 53.
15
imigrantes eram embarcados em navios menores com destino às províncias, onde eram
aguardados.
Para os imigrantes que vinham para a jovem Província do Paraná a porta de entrada
era o porto D. Pedro II, em Paranaguá. Nesta localidade, mais uma vez passavam por um
registro, semelhante ao praticado na Ilha das Flores.31 Foi ao pé da Serra do Mar que os
italianos formaram os primeiros núcleos coloniais. Este local apresentava um solo muito
fértil e água em abundância, por isso foi escolhido pelo governo para implantação de
colônias.
O primeiro empreendimento foi instalado nessa região em 1875 e deve-se a chegada
da primeira leva de imigrantes italianos no Paraná. Assim surgiu a colônia Alexandra que
foi estabelecida pelo empresário de colonização Sabino Tripotti. Apesar dessas condições
favoráveis muitos dos primeiros colonos não se adaptaram à umidade, além de problemas
relacionados à má administração da colônia Alexandra por parte do empresário
mencionado. Ele não estaria preocupado com o estabelecimento dos colonos: na verdade
queria atrair o maior número de imigrantes simplesmente para obter mais lucros.
Em virtude dessas questões, o governo provincial criou a colônia Nova Itália para
receber os imigrantes que se recusavam ficar em Alexandra, como também as novas levas
de italianos que continuavam a chegar. Esse novo empreendimento tinha a sede em
Morretes e abrangia o total de doze núcleos coloniais, estendendo-se até Antonina. Porém,
a experiência anterior criou um clima desfavorável para a colonização no litoral paranaense
de modo que os estrangeiros ali instalados sentiram a necessidade de remigrar para o
planalto; para isso, contaram com o apoio do governo. Esse fato se insere no programa
colonizador elaborado na administração do Presidente de Província Adolpho Lamenha
Lins, que direcionou a atividade colonizadora para os arredores de Curitiba, e de modo
geral para o planalto curitibano.32
Dessa forma, foram fundadas as primeiras colônias de italianos localizadas dentro
ou perto da capital paranaense. Relativamente ao número de imigrantes entrados no período
forte da imigração italiana no Paraná, entre os anos de 1875 a 1878, foi pequeno o
contingente que se fixou em definitivo na região litorânea. Os demais, por iniciativa
31
Ibid., p. 63.
32
BALHANA, Altiva P.; MACHADO, Brasil P. e WESTPHALEN, Cecília M. História do Paraná. 1º vol.
Curitiba: GRAFIPAR, 1969; p.169.
16
33
BALHANA, A.P. Santa Felicidade: um processo de assimilação. Curitiba, 1958, p. 31.
34
Dezenove de Dezembro, 09/01/1879. Arquivo do Círculo de Estudos Bandeirantes. Jornais do século XIX.
17
já os lotes rurais eram dispostos em linhas vicinais e serviam para a atividade agrícola dos
colonos.35
Esse fato nos permite imaginar que a colônia foi induzida a formar não só uma
unidade de produção de alimentos de subsistência, mas também uma vila. Essas intenções
estão demonstradas na planta da colônia:
35
ANDREAZZA, Maria L.; NADALIN, Sergio O. Imigrantes no Brasil: colonos e povoadores. Curitiba:
Editora Nova Didática, p.45.
36
Planta da Colônia Alfredo Chaves. Acervo da Secretaria do Meio Ambiente do Estado Paraná. Redução
do original na escala 1:10.000.
18
Este último documento permite duas observações sobre os imigrantes dessa colônia.
Primeiro, a participação de um imigrante sacerdote, que com certeza serviu de líder para
esses colonos italianos remigrados do litoral para o planalto curitibano, indica que a cultura
desse grupo estava ligada a religião. Da mesma forma o fato de optar por uma região, ao
mesmo tempo que rejeitou outra, nos faz imaginar que esses imigrantes italianos formavam
um grupo homogêneo e que essa, provavelmente, foi uma atitude de autopreservação, na
medida em que o grupo não quis se misturar com outro.
Enfim, todos os documentos apresentados acima nos informam sobre a formação de
um núcleo colonial independente e de certa forma isolado, pois estava localizado a uma
distância considerável, na época, do centro urbano de Curitiba. Esse fato sugere que nesse
núcleo colonial formou-se um grupo étnico cultural bem homogêneo, capaz de agir mesmo
que inconscientemente para autopreservar suas tradições, suas práticas específicas, em
resumo sua identidade.
37
Leis do Estado do Paraná, volume dos anos 1890 – 1891, p.19.
38
Correspondência do Governo do Estado, livro 567, ano de 1879. Arquivo Público do Estado do Paraná.
19
39
Essas foram as cinco colônias instaladas em território que hoje pertencem ao Município de Colombo.
Diferentemente do que afirma Sebastião Ferrarini, na obra o Município de Colombo. Curitiba :
Champagnat: 1992, a colônia Santa Gabriela não foi instalada no bairro Ressaca da vila de Colombo,
consequentemente não fez parte deste grupo, essa colônia se localizava em território que hoje pertence a
municipalidade de Almirante Tamandaré.
40
Jurisdição religiosa referente a uma povoação pastoreada por um cura, um sacerdote que reside no local e
ali exerce a função vigário.
20
CAPÍTULO 2
O PAPEL DA RELIGIÃO NA PRESERVAÇÃO
DA IDENTIDADE ÉTNICA DOS IMIGRANTES ITALIANOS
41
BALHANA, Altiva P. Religião e Imigração no Brasil Meridional. In: WESTPHALEN, Cecília Maria
(Org.). Un Mazzolino de Fiori; v. III. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002, p.295.
2
SANTIN, Silvino. Integração sócio-cultural do imigrante italiano no Rio Grande do Sul. In: DE BONI, Luis
Alberto (Org.). A presença italiana no Brasil. v. 3. Porto Alegre: Fondazione Giovanni Agnelli, 1996. p.
595.
21
O fato era que esses imigrantes não descansavam enquanto não construíssem uma
capela e não tivessem um padre para rezar a missa.43 Nesse sentido, o primeiro passo
depois de obterem uma pequena porção de terra para construírem suas casas e
desenvolverem sua atividade agrícola, era unir forças para a construção de uma igreja. Este
local serviria para o encontro dos moradores da colônia, onde além de cumprirem com seus
preceitos religiosos poderiam conversar a respeito do seu dia-a-dia, trocar experiências,
escapando ao isolamento social.
Nessa perspectiva, podemos afirmar que esse processo unia os moradores da
colônia e fortalecia os seus laços de vizinhança, criando assim uma identidade para o grupo.
Isso na realidade era uma retomada da vida coletiva que era desenvolvida no país de
origem. Ou seja, através da prática religiosa os imigrantes queriam reorganizar-se social e
culturalmente, mantendo seus valores étnicos. Além da língua origem, o que criava um
sentimento de coletividade entre esses italianos e seus descendentes era o fato de que se
consideravam católicos, e essa catolicidade permitia que eles se identificassem uns com
outros.
O grupo de italianos que estamos observando com certeza passou por esse processo,
isso pode ser comprovado pelo documento que apresentamos logo abaixo. Trata-se de um
abaixo-assinado no qual quarenta e um italianos da Colônia Alfredo Chaves solicitam ao
Presidente da Província a construção de uma igreja e um cemitério.
43
ALVIM, Zuleika. Imigrantes: a vida privada dos pobres do campo. In: SEVCENKO, NICOLAU (Org.).
História da vida privada no Brasil. v.3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p.261.
44
Correspondência Oficial da Província. Ano de 1879, Livro 583. p. 20 e 21. Arquivo Público
22
Fica claro por meio deste documento que esses imigrantes consideravam
indispensável para o seu “benefício moral” a existência de um local onde pudessem se
reunir em comunidade para “ter sua religião”. Isso se explica pelo fato de que o espaço
vital do homem vai além das dimensões biológicas, ele amplia-se a um sistema de valores,
ao qual chamamos de cultura.45
Outra informação que chama bastante atenção é que esse abaixo-assinado foi
organizado rapidamente, apenas quatro meses depois da instalação desse núcleo colonial
que foi inaugurado em setembro de 1878. Isso permite afirmar que, ao unir forças em favor
de sua prática religiosa, esse grupo de colonos rapidamente abandonou o isolamento social
no qual possivelmente estavam vivendo. Na verdade, acreditamos que, por de trás dessa
atitude de fé, esses estrangeiros carregavam também um outro desejo. Queriam ter um lugar
que fosse comum a todos, onde pudessem inserir-se socialmente, e que lhes possibilitassem
um sentimento de pertencimento.
Nessa mesma direção, podemos apresentar aqui outro acontecimento comum para
as colônias que investigamos, também inserido no campo da religiosidade, mas que acentua
a busca por um lugar de convívio social. O fato é que em mais de uma das colônias que
investigamos os imigrantes uniram suas forças para obter um terreno que fosse destinado
unicamente para a construção de uma capela. Além de pagarem pelo seus lotes particulares
eles juntavam as economias de todos os colonos no intuito de quitar um terreno que
pertence a todos da comunidade. Isso ocorreu, por exemplo, nos núcleos Presidente Faria e
Eufrazio Correia. Sobre o primeiro, os registros contidos no livro “Cadastro da Colônia
Presidente Faria” conservado pelo Arquivo Público do Estado do Paraná, trazem a seguinte
informação ao se referir sobre os proprietários dos lotes dessa colônia:
45
SANTIN, Silvino. Integração sócio-cultural do imigrante italiano no Rio Grande do Sul. In: DE BONI,
Luis Alberto (Org.). A presença italiana no Brasil. v. 3. Porto Alegre: Fondazione Giovanni Agnelli, 1996.
p. 599.
46
Cadastro do Núcleo Presidente Faria. Livro nº 10, 1886. Arquivo Público do Estado do Paraná.
23
47
Planta da Colônia Presidente Faria. Redução do original na Escala 1:10.000. Instituto de Terras e
Cartografia de Curitiba.
24
O mesmo ocorre para o núcleo Eufrazio Correa que teve seu lote número 20
separado para a construção da igreja e do cemitério, como nos informa o livro de cadastro
da respectiva colônia no momento em que trata dos nomes dos proprietários dos seus lotes:
48
Cadastro do Núcleo Eufrazio Correa. Livro nº 15, 1888. Arquivo Público do Estado do Paraná.
49
Planta da Colônia Eufrasio Correia. Redução do original na 1:10.000. Instituto de Terras e Cartografia de
Curitiba.
25
Porém essa questão não era resolvida simplesmente com a construção de uma
capela, pois outros fatores impediam que as necessidades religiosas desses imigrantes
fossem supridas de imediato. Entre estes, os mais importantes eram a distância dos núcleos
coloniais e a falta de sacerdotes para realizar as celebrações. Diante dessa realidade os
imigrantes da região que desejassem cumprir com os seus preceitos religiosos precisavam
deslocar-se até o perímetro urbano de Curitiba. Foi na Paróquia Nossa Senhora da Luz que
os italianos instalados nos núcleos que investigamos celebraram seus primeiros atos
religiosos indispensáveis, como batizados, casamentos e óbitos.
Outra forma de solucionar o problema da falta de assistência religiosa foi
apresentada somente em 1885. A partir deste ano os colonos passaram a receber visitas
esporádicas de missionários italianos que os confortavam espiritualmente. Em 1886, o
missionário apostólico Pe. Pietro Cobalcchini recebeu a autorização do Bispo Diocesano
Dom Lino Deodato Rodrigues de Carvalho para batizar e casar os colonos italianos do
Paraná.50
Porém, esse trabalho itinerante dos missionários não solucionou a carência religiosa
dos colonos italianos que almejavam ter o seu próprio pároco. Na tentativa de solucionar o
problema, no ano de 1887 o Pe. Pietro Colbacchini dirigiu-se às autoridades eclesiásticas
solicitando medidas para regularizar o atendimento religioso nessas colônias. Em 5 de
dezembro do mesmo ano o Bispo de São Paulo transferiu a responsabilidade ao Vigário
Geral Forense de Curitiba, para que este, conhecendo melhor as circunstâncias locais,
encontrasse a melhor solução para o problema.51 O resultado foi a criação de uma
Capelania Curada Italiana, inaugurada pelo decreto episcopal de 14 de fevereiro de 1888.
Este decreto estabelecia em seu primeiro artigo que essa capelania seria constituída pelos
seguintes indivíduos:
Também ficou determinado por esse decreto que a sede da Capelania ficaria
localizada na Colônia Dantas (atual bairro Água Verde em Curitiba) e que seu primeiro
Capelão seria o Padre Pietro Cobalcchini. Porém, em 1889 o referido cura fixou residência
na Colônia Santa Felicidade, transferindo para lá a sede da Capelania Italiana. Portanto, a
partir de 1888 os imigrantes italianos das colônias instaladas ao redor de Curitiba passaram
a receber assistência religiosa permanente. A partir desta data os registros de batizados e de
casamentos foram depositados nos livros dessa capelania.
Podemos afirmar que esse foi um passo muito importante para a construção da
identidade cultural desses colonos, na medida que agora possuíam um líder espiritual, e
mais que isso, um imigrante como eles. Padre Pietro Colbacchini era vêneto, como a
maioria de seus paroquianos, portanto portador das mesmas tradições culturais e podia
comunicar-se com eles no seu dialeto próprio.53
Este sacerdote permaneceu à frente da capelania até o ano de 1894, ano em que
regressou a Itália. Deste ano até o seguinte a assistência religiosa aos colonos italianos
ficou por conta do Pe. Francesco Bonato. Em 1895 chegaram mais dois missionários
italianos, os padres Faustino Consoni e Franscesco Bresciani, o que possibilitou uma
reorganização da capelania. Isso foi feito pelo decreto do Bispo de Curitiba, Dom José de
Camargo Barros, na data de 1º de novembro de 1895.54
Por meio deste decreto houve o desligamento de cinco colônias da Capelania
Italiana, Alfredo Chaves, Presidente Faria, Maria José, Antonio Prado e Eufrasio Correia,
todos situados perto ou dentro da recém criada Vila de Colombo. Conforme as
informações obtidas do documento apresentado a seguir, o desligamento dessas colônias
está relacionado a criação do Curato de Colombo, em 28 de outubro de 1895, data na qual o
52
Cópia da Portaria de 14 de fevereiro de 1888, referente à Capelania Italiana, transcrita no Livro 2 da
Vigararia Geral Forense, p. 118. Curitiba, 1888. Arquivo da Cúria Metropolitana de Curitiba.
53
BALHANA, Altiva P. Arquivo da Paróquia de Santa Felicidade. In: WESTPHALEN, Cecília Maria (Org.).
Un Mazzolino de Fiori; v. I. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002, p.299.
54
Idid, p.302.
27
Padre Francesco Bonato passou a residir na respectiva vila, ficando responsável pelos cinco
núcleos de imigrantes italianos que por ali se localizavam.
55
Livro Tombo, número I, p.1. Acervo da Paróquia Nossa Senhora do Rosário.
28
conduzidos a formar uma comunidade religiosa, com pessoas que possuíssem a mesma
identidade etno-cultural, buscando assim superar o abandono a que foram submetidos. Só
mais tarde veio o terceiro passo, a oportunidade de integração com os brasileiros e os
imigrantes de outras nacionalidades.
O que estamos investigando é o comportamento dos imigrantes italianos nessa
micro-sociedade por meio de suas práticas religiosas. Queremos perceber a especificidade
dos comportamentos desses estrangeiros diante do contato cultural dos mesmos com a
sociedade receptora e com os elementos de outra etnia imigrante. Acreditamos que a
identidade étnica é um modo particular de identidade social, construída pela situação
resultante dos contatos culturais; a identidade expressa-se em um conjunto de
representações que um grupo social se faz delimitando suas fronteiras e marcando suas
diferenças em relação aos outros grupos com os quais está em contato.56 Em outras
palavras, o que queremos afirmar é que a identidade étnica aparece no contraste das
relações interétnicas, ou seja, trata-se da afirmação de um “nós” diante dos “outros”.
O que nos permite dizer que o grupo estudado era homogêneo, além da realidade de
pertencerem a um mesmo contigente étnico, é exatamente o fato de que formaram uma
mesma comunidade religiosa. A homogeneidade do grupo não foi estabelecida tão somente
pelas fronteiras físicas da Vila de Colombo, ou seja, pelas colônias que se localizavam
dentro dos limites da dita vila. A união desses colonos deve-se muito mais a existência de
um curato, mas especificamente de um sacerdote, que portava os mesmos traços étnicos
desses imigrantes. Mas mais que isso, esse cura lhes oferecia uma unidade religiosa, onde,
ao mesmo tempo, podiam preservar seus valores culturais e integrar-se a sociedade
receptora. Isso fica constatado ao lermos um trecho do relatório da visita pastoral de 1897
feita pelo Bispo Diocesano Dom José de Camargo Barros, no qual refere-se a respeito das
capelas que faziam parte do Curato:
56
ORO, Ari Pedro. “Mi son talian”: Considerações sobre a identidade étnica dos descendentes de italianos do
Rio Grande do Sul. In: DE BONI, Luis Alberto (Org.). A presença italiana no Brasil. v. 3. Porto Alegre:
Fondazione Giovanni Agnelli, 1996. p. 611 e 612.
29
Este documento informa que o Curato de Colombo era constituído pelas seguintes
igrejas: a capela que servia de matriz localizada na Colônia Alfredo Chaves, a capela da
Colônia do Canguery – que correspondia aos núcleos Presidente Faria e Maria José –, a
capela do bairro denominado Ressaca, constituído por brasileiros, a capela da Colônia
Antonio Prado, que se localizava na Vila de Tamandaré e duas capelas que ficavam no
caminho para a localidade vizinha: a primeira, a capela do Espírito Santo, também formada
por brasileiros e ainda dentro dos limites da Vila de Colombo e a segunda, a capela São
Pedro, porém pertencia a Colônia Eufrázio Correa, que já estava nos limites de Bocaiúva.
57
Livro Tombo, número I, p.25. Acervo da Paróquia Nossa Senhora do Rosário.
58
Planta da Colônia Antonio Prado. Redução do original na 1:10.000. Instituto de Terras e Cartografia de
Curitiba.
30
O que chama atenção é o fato de que duas colônias, Antônio Prado e Eufrazio
Correa, estavam fora do perímetro da Vila de Colombo, porém faziam parte da unidade
religiosa criada neste local. Isso com certeza deve-se ao fato de que foi nesta unidade
religiosa que os colonos desses núcleos encontraram elementos que os permitissem
integrar-se à sociedade sem perderem sua identidade étnica. Assim fica confirmado que foi
esta comunidade religiosa, denominada Curato de Colombo, que permitiu que esses
imigrantes italianos construíssem uma cultura imigrante no momento em que se integravam
à sociedade brasileira.
59
BALHANA, Altiva P.; MACHADO, Brasil P. e WESTPHALEN, Cecília M. Alguns Aspectos Relativos
aos Estudos de Imigração e Colonização. In: Colonização e Migração. São Paulo, 1969, p.377.
31
60
Estamos considerando aqui que uma geração consiste o espaço de vintes anos ou um pouco mais.
32
61
Convém esclarecer que o livro número 1 foi dividido em 1 e 1b. Sendo o primeiro uma cópia dos registros
do livro 1 de Santa Felicidade, servindo apenas para a confirmação dos dados. E o segundo, denominado 1b,
consiste nos dados de 1892
62
BALHANA, Altiva Pilatti. Reconstituição de Famílias: instrumento de análise demográfica. In: Un
Mazzolino de Fiori; Vol. III. Org. Cecília Maria Westphalen. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002, p. 60 a 65.
63
ibid. p. 61.
64
ibid., p.61.
33
Portanto, do total de 442 genealogias, 178 foram classificadas como famílias do tipo
“E”, 259 como famílias do tipo “M”, e ainda 5 famílias foram constituídas de mães
solteiras. Para as uniões de tipo “E” foram encontrados 649 descendentes, já para os casais
65
ibid., p. 64.
34
do tipo “M” encontramos 808 crianças, e por fim, 5 descendentes provém de mães solteiras.
A diferença de um tipo de família para o outro se torna gritante, ao observarmos que as
descobertas que podemos fazer mudam bruscamente de uma para outra.
No caso das famílias “M”, podemos reconstituir até três gerações da genealogia,
graças ao registro de casamento que informa o nome dos pais dos cônjuges. Para as famílias
“E” podemos reconstituir apenas duas gerações, pois nos assentos de batismos não são
informados os nomes dos avós. Já para os casos de mães solteiras, não é possível nem
descobrir duas gerações inteiras, na medida que o nome do pai não aparece no registro de
batismo. Porém, em todos esses casos, podemos reconstituir a família “espiritual” dos
batizados, ou seja, podemos definir quem foram seus padrinhos. Dessa forma, a partir dos
registros religiosos, existe a viabilidade de seguir, ao longo do ciclo, as relações entre o
indivíduo, sua família, seus parentes mais próximos longínquos e sua comunidade, por
meio da escolha dos compadres e comadres.66
Assim, ao reconstituirmos as famílias desses imigrantes, podemos perceber as
relações existentes entre os membros do grupo, e também entre o grupo e a sociedade
receptora. Em outras palavras, os registros religiosos usados para reconstituir as famílias de
imigrantes mostram as relações desses estrangeiros com a comunidade, o comportamento
desses frente aos elementos portadores da mesma identidade e frente aos elementos de
outra identidade étnica.
66
ibid., p. 65.
35
CAPÍTULO 3
3.1 O MATRIMÔNIO
67
BALHANA, Altiva P. Santa Felicidade: um processo de assimilação. Curitiba: Tip. João Haupt & CIA
LTDA, 1958, 171.
68
ANDREAZZA, Maria L.; NADALIN, Sergio O. Imigrantes no Brasil: colonos e povoadores. Curitiba:
Editora Nova Didática, p. 45.
36
69
BALHANA, Altiva P. Santa Felicidade: um processo de assimilação. Curitiba: Tip. João Haupt & CIA
LTDA, 1958, p. 193.
37
e outros 5% são casais formados por italianos e mulheres de outras etnias imigrantes; por
fim, apenas 1%, o equivalente a um casal, apresenta a união entre brasileiro e italiana.70
A segunda fase corresponde aos anos em que o grupo integrou-se de forma mais
consistente a sociedade receptora, ao mesmo tempo que construiu uma cultura imigrante
para preservar seus valores étnicos. Para essa segunda fase encontramos 161 registros
matrimoniais que por sua vez tornaram possível a construção da seguinte tabela:
70
Ao classificar os cônjuges como italiano ou italiana estamos incluindo os descendentes dessa origem étnica.
38
Brasil ainda crianças, ou seja, eram italianos de fato que estavam casando-se e preferiam
um cônjuge que também tivesse essa origem étnica.
Já na segunda fase quem estava casando eram ítalo-brasileiros, ou seja, jovens que
já haviam nascido no Brasil. Nesse momento o número de casamentos endogâmicos
diminui, apesar dessa forma de união continuar apresentando a maior percentagem. De
qualquer forma, nesse segundo período notamos o aumento de casamentos interétnicos,
sobretudo entre italianos e brasileiros; esse fato confirma que nessa fase o grupo étnico
iniciou uma maior integração com a sociedade receptora.
Porém essa integração ainda estava no início e o que predominava era a preservação
da identidade étnica do grupo imigrante. Isso pode ser observado na tabela construída para
o período como um todo, 1888 a 1910:
Esses dados nos revelam que afim de consolidar sua identidade o grupo manteve um
comportamento endogâmico, observado principalmente na escolha do cônjuge. Essa
manutenção da identidade étnica deve-se ao crescimento vegetativo do próprio grupo.
Porém, foram encontrados alguns casos em que um dos cônjuges provinha de uma colônia
italiana vizinha que não pertencia ao grupo homogêneo, mas que portava as características
étnicas. Outro dado interessante é que encontramos alguns casos de casamentos
consangüíneos, que talvez se efetuaram na tentativa de preservar as características étnicas
familiar. Como exemplo podemos citar o registro de Angelo Cavalli e Anna Cavalli, nessa
ata de casamento encontramos registrada a dispensa de consangüinidade por 2º grau.
Por outro lado, os dados nos permitiram perceber o começo do processo de
integração do grupo a sociedade receptora. Isso é observado nas 37 uniões, correspondentes
a 14%, em que elementos de origem italiana se misturaram a indivíduos brasileiros.
Sobretudo, os homens de origem italiana uniram-se a mulheres brasileiras. Esse tipo de
casamento era mais cogitado do que os entre italianos e elementos de outra etnia imigrante;
no entanto, representou apenas 4% do total, correspondendo a 10 uniões conjugais. Isso se
deve ao fato de que nessa comunidade predominavam os indivíduos italianos e brasileiros.
Porém, os casamentos com os elementos de outras etnias imigrantes demonstram a
diversidade étnica da região, na medida que encontramos italianos e descendentes casados
com indivíduos de ascendência alemã, inglesa, austríaca, prussiana, e também polonesa,
pois uma das colônias que estudamos, o núcleo Antonio Prado, foi constituído por
imigrantes italianos e poloneses.
3.2 O COMPADRIO
Outra prática religiosa que pode nos informar sobre o processo de preservação da
cultura imigrante desses italianos e sobre a integração dos mesmos a sociedade receptora é
o compadrio. Estamos considerando que o compadrio também é um tipo de escolha de
parentesco, na medida que o padrinho e a madrinha ficam ligados espiritualmente a família.
Muitas vezes na falta dos pais, ou de um parente de sangue, são os padrinhos que acabam
zelando pela vida da criança.
40
71
LANA, Marcos P. D. A dívida divina: troca e patronagem no Nordeste brasileiro. Campinas, SP:
41
80,5%. Porém, essa forma de compadrio era a que predominava em todo o período (Tabela
A.1. em anexo) Os imigrantes e seus descendentes escolhiam indivíduos portadores da
mesma identidade etno-cultural para serem seus compadres; em outras palavras, os colonos
de origem italiana escolhiam elementos da mesma origem para apadrinharem seus filhos.
Portanto, as famílias de imigrantes italianos mantiveram sua identidade étnica
também na hora de escolher os padrinhos dos seus filhos. Isso se dava por meio de um
sistema de reciprocidade reforçado por meio do parentesco espiritual. Muitas vezes
encontramos um casal que homenageava outro, dando-lhe o filho para apadrinhar; em
seguida, e reciprocamente, recebia o filho dos compadres para o apadrinhamento, o que
servia para fortalecer os laços de vizinhança e de pertença ao grupo homogêneo. Também
era comum oferecer as crianças para pessoas da própria família batizar, como avós e os
tios, o que de modo igual reforçava o sentimento de pertença.
Porém, muitas vezes o desejo de aparentar-se espiritualmente com alguma pessoa
ou família de prestígio prevalece sobre os laços do parentesco de sangue.74 Isso pode ser
observado no grupo investigado na medida que alguns casais aparecem como padrinhos de
um número muito grande de crianças. Entre os padrinhos italianos, os casais mais cotados
são: Venanzio Trevisan e Rosa Bertolin e também Alfeo Puppi e Apollonia Bontorin. Já
entre os casais brasileiros mais requisitados podemos citar José Leal Fontoura e Francisca
Ceverina da Silva, assim como o Coronel João Gualberto Bithencourtt e Dona Ersilia
Bithencourtt.
Muitos ainda costumavam escolher o padrinho em uma família e a madrinha em
outra, para assim aparentarem-se espiritualmente com duas famílias diferentes. É nesse
contexto que se inserem muitos dos casais de padrinhos formados por um indivíduo de
origem italiana e por outro de origem diferente. Esse fato aponta para a integração do grupo
com as pessoas de outra origem étnica. Porém, a integração é melhor visualizada quando os
pais da criança escolhem compadres brasileiros. Esse tipo de compadrio é observado em
10,5% dos casos que encontramos, o que indica que uma parcela desse grupo se integrou
por laços de parentesco espiritual com a sociedade receptora.
74
BALHANA, Altiva P. Santa Felicidade: um processo de assimilação. Curitiba: Tip. João Haupt & CIA
LTDA, 1958, p. 176.
43
75
BARTH, 1998: 194. Comment des luthériens allemands sont-ils devenus des brésiliens? (un essai
methodologique). 14e Entretiens du Centre Jacques Cartier (Lyon, França, 2001.) [Texto em português
publicado no Boletim de História Demográfica. São Paulo, 10(29):01-39, 2003, p. 04.
76
GÉLIS. Apud: NADALIN & BIDEAU, op. cit., p. 04.
44
nos 1462 registros de batismos arrolados nesta pesquisa. Em um primeiro momento, afim
de encontrarmos um estoque para os nomes femininos e outro para os nomes masculinos,
separamos os registros pelo sexo das crianças.78 Essa primeira tarefa resultou em uma
tabela, que indica que no período investigado foram registrados os batismos de 765
meninos e 697 meninas.
Outro fato importante que convêm comentar é que foram encontrados nomes
combinados para uma boa parte, mais ou menos 1/3, dos descendentes desses imigrantes,
como podemos ver na outra tabela colocada logo abaixo.79 Dessa forma queremos deixar
claro que o número de prenomes contabilizados não corresponde ao número de registros.
77
NADALIN, Sérgio O. & BIDEAU, Alain. Como luteranos alemães tornaram-se brasileiros? 14e Entretiens
du Centre Jacques Cartier (Lyon, França, 2001.) [Texto em português publicado no Boletim de
História Demográfica. São Paulo, 10(29):01-39, 2003, p. 04.
78
Fizemos a separação para os vinte dois anos que analisamos, estes dados ano a ano estão em duas tabelas,
A1 e A2, respectivamente, colocadas na seção de anexos desse trabalho.
45
79
A contabilidade dos nomes simples e combinados foi feita ano por ano e seus resultados podem ser
visualizados nas tabelas A4 e A5, depositadas em anexo.
80
A tabela referente a todos os nomes que possivelmente foram emprestados do estoque cultural foi colocada
no anexo devido a sua extensão, corresponde a tabela A.9.
46
versão italiana que os pais chamavam os seus filhos, já que comumente falavam o dialeto
vêneto e não o português. Como exemplo podemos citar os seguintes nomes: João era
certamente chamado de Giovanni, Pedro de Pietro, Jacó de Giacomo, Jeronymo de
Girolamo, Catharina de Catherina, Luisa de Luigia, Dominga de Domenica, e assim por
diante.
Esses nomes também possibilitavam que os pais chamassem os filhos, e
consequentemente a comunidade étnica conhecessem os seus indivíduos, por meio de
apelidos, por exemplo: João podia ser apelidado de Gioanin, Nin ou Nini; José de Beppi;
Luis de Didio. Esses descendentes continuarão a se sentir imigrantes enquanto Francisco se
mantiver Francesco, Giuseppe continuar Beppi, e muitas vezes serem assim conhecidos,
mesmo que preconceituosamente, pelos nativos da sociedade. Da mesma forma esses
descendentes de italianos continuarão a se sentir imigrantes enquanto continuarem falando
em casa o idioma de seus pais e avós.81
Além de nomes possíveis de tradução outro conjunto de prenomes constituiu esses
estoque cultural imigrante: referimo-nos aos nomes de santos. Esses prenomes eram
atribuídos aos filhos de imigrantes e descendentes devido a grande religiosidade
apresentada pelo grupo. Nada mais natural para uma comunidade que pautava sua vida pelo
trabalho e pela religião. Assim compunha esse estoque uma série de nomes de santos e
santas, entre os quais: Antonio, João Baptista, Agostinho, Sebastião, Vicente, Maria, Rosa,
Anna, Magdalena, Cecilia etc.
Todos esses nomes não eram escolhidos aleatoriamente, pois obedeciam a uma
série de influências, sobretudo de natureza familiar: com freqüência, o nome atribuído à
criança era homenagem a um dos membros da família. Na tentativa de definir quais eram
essas influências, investigamos todos os nomes por meio das genealogias das famílias
desses descendentes de imigrantes. No âmbito familiar, as influências encontradas foram
dos avós, tanto paternos como maternos; da mesma forma, foram detectadas influências do
pai e da mãe e da família “espiritual”, ou seja, do padrinho e da madrinha.
Outras crianças ainda recebiam a influência religiosa, na medida que eram
batizados com os nomes dos santos de devoção dos pais, do santo do dia, ou próximo do
dia, do batismo ou nascimento. Em outros não percebemos influência, simplesmente
47
observamos que eram nomes contidos no estoque cultural (E.C.). Finalmente, algumas
crianças foram batizadas com outros nomes. Entre esses outros prenomes, estavam nomes
brasileiros, adjetivos como Benvenuta (Benvinda) e Fortunato (Sortudo), assim como
nomes referentes a lugares como America, Italia, Romano e Colombo.
Nessa direção, construímos tabelas para dois tipos diferentes de famílias, para
aquelas de tipo “M”, que nos possibilitaram saber o nome dos avós, e para aquelas do tipo
“E”, sobre as quais só sabíamos o nome dos pais e dos filhos. Essas tabelas foram
construídas separadamente para meninos e para meninas, assim como para a primeira e
segunda fase do período investigado. Também foram construídas tabelas separadas para os
prenomes combinados, na medida que esses eram formados por uma combinação de
influências.82
No caso dos meninos descendentes das famílias “M”, independente da fase em que
nasceram e como podemos observar nas duas tabelas abaixo, houve uma maior influência
por parte dos “nonos”, ou seja, dos avôs, sobretudo paternos. Em segundo lugar, esses
meninos eram influenciados pelos padrinhos, em terceiro pela figura do pai e em quarto
pelo religião, na medida que recebiam nomes de santo.83
81
ANDREAZZA, Maria L.; NADALIN, Sergio O. Imigrantes no Brasil: colonos e povoadores. Curitiba:
Editora Nova Didática, p. 08.
82
Foi possível montar uma tabela sobre os prenomes de forma combinada, esta encontrasse na seção de anexo
deste trabalho.
83
Para perceber a influência religiosa por meio dos nomes dos santos observamos se as datas de batismo ou
nascimento correspondiam ao dia, ou estavam próximas ao dia, que a igreja dedica ao referido santo. Para isso
tivemos a ajuda de manual intitulado Os santos de cada dia escrito por José Benedito Alves. SP: Paulinas,1990.
48
No caso das meninas oriundas das famílias “M”, como vemos nas duas tabelas mais
abaixo, percebemos uma maior influência por parte das “nonas”, das avós, sobretudo da
avó paterna. A segunda maior influência era a da madrinha, a terceira era religiosa,
sobretudo a influência de Nossa Senhora, e em quarto lugar essas meninas recebiam os
nomes dos “nonos”, avôs, na versão feminina.
TABELA 15 – CURATO DE COLOMBO –
ORIGEM DOS NOMES DAS MENINAS, FORMA SIMPLES. FAMÍLIAS “M” – 1888-1899
Origem Infl. Infl. Subtotal Outras influências
Paterna materna
Avô – versão feminina. 4 0 4 Santo * 1
Avó 14 13 27 Padrinho – versão feminina. 1
Mãe - 1 1 Madrinha 3
Pai – versão feminina. 0 - 0 Estoque Cultural 18
Outros 5
Total 18 14 32 Total 28
* Santo próximo do dia do nascimento ou do batismo; santo padroeiro das colônias.
Fonte: Registros de Batismos e Registros de Casamentos.
Sobre este fato podemos citar um exemplo curioso encontrado na genealogia do casal João
Baptista Lovato e Joanna Carlesso. O primeiro filho do casal recebeu o nome do avô
paterno, Giacomo Lovato. Porém o primogênito veio a falecer, então o segundo filho
homem do casal voltou a ser batizado com o nome do avô paterno, mas da mesma forma
essa criança acabou falecendo. Na continuidade, o terceiro filho homem do casal, mais uma
vez, foi nomeado com o nome do avô paterno, Giacomo Lovato.
Portanto, verificamos que a maior influência na escolha dos nomes dos
descendentes resultava da influência paterna, sobretudo dos avós. Isso deve-se ao fato de
que essas famílias eram estruturadas de maneira patriarcal, de forma que o pai era
autoridade do núcleo familiar e todos deviam honrá-lo antes de qualquer outra pessoa.
Sobre o fato de serem os avós que mais transferiam os seus nomes para os netos, podemos
afirmar que se tratava de um vínculo entre as gerações, que destacava os laços entre os
“nonos” e seus netos, preservando assim a memória e a história da família, apesar da
distância espacial que as vezes separava os seus membros. Também, devido a grande
religiosidade apresentada por esse contigente de imigrantes e seus descendentes eram
atribuídos aos filhos o nome dos padrinhos, assim como o nome de santos que eram
venerados pelos pais.
Dessa forma podemos observar como a nomeação dos descendentes serviu para a
preservação da identidade etno-cultural do grupo de imigrantes italianos que investigamos.
Os nomes que os descendentes recebiam originavam-se ou da família, contando aqui a
família “espiritual”, ou da religiosidade do grupo. Normalmente esses nomes possuíam sua
versão em italiano, de modo que, dessa maneira, o descendente de imigrante poderia se
sentir portador das mesmas características étnicas de seus pais e seus avós, preservando
dessa maneira seus a cultura imigrante do grupo.
84
Devido ao tamanho, as tabelas sobre os prenomes combinados encontram-se no anexo, são elas as tabelas
A.10 a A.17.
52
CONCLUSÃO
Ao concluirmos essa pesquisa podemos afirmar sem medo que o grupo de italianos
e seus descendentes, que formaram a freguesia do Curato de Colombo, construiu uma
cultura imigrante de fato, pois conseguiu afirmar a sua homogeneidade frente à variedade
étnica da sociedade em que fora inserido. As fontes permitiram a análise de um período
delicado para o grupo, pois tratavam das primeiras relações sociais capazes de fazer com
que esses estrangeiros e seus descendentes mantivessem contatos culturais permanentes
com os indivíduos de outra origem étnica.
Nessa direção, o que percebemos é que o grupo não se fechou por completo, mas
agiu para preservar sua identidade. Isso ficou confirmado no momento em que
visualizamos os dados quantitativos capturados nos assentos religiosos do grupo
investigado. Esses dados nos informaram que a maioria dos imigrantes e descendentes
preferia estabelecer laços de convívio permanente, como o são o matrimônio e o
compadrio, com indivíduos que portassem a mesma identidade étnica que a sua. Tal atitude
visava preservar a identidade cultural do grupo.
Ao analisarmos a primeira geração de descendentes desses italianos percebemos
que os valores etno-culturais estavam fortemente presentes, de forma que essa geração
pautou seu modo de viver do mesmo jeito que seus pais, mesmo antes de abandonarem a
Itália. Estamos nos referindo aos valores da terra, da família e da religião. Foi em grande
parte por meio das práticas religiosas que esse contingente étnico construiu sua cultura
imigrante e afirmou suas características próprias. Isso foi observado sobretudo no
matrimônio, na constituição de famílias homogêneas, em que o casal se estabelecia por
meio de uniões endogâmicas.
Isso pode ser verificado sobretudo para os primeiros doze anos de vida do grupo
homogêneo, fase de transição, na medida em que o local de convívio social desses
estrangeiros e seus descendentes, constituído pela instituição religiosa, passou a ser o
mesmo da sociedade receptora. Foi nesses primeiros anos que o grupo teve de encontrar
formas para se relacionar com a sociedade brasileira sem abandonar os seus valores étnicos.
Porém, como já afirmamos, o cenário da comunidade religiosa propiciava ao grupo
manter contatos culturais com os brasileiros e também com outras origens imigrantes. Isso
53
fez com que uma pequena parcela iniciasse o processo de integração a sociedade brasileira.
Esse fato se deu sobretudo no momento da escolha conjugal, na medida em que alguns
italianos ou descendentes uniram-se a brasileiros, fato esse que deve nos deixar intrigados
ao imaginar quais foram os motivos que levaram alguns indivíduos, mesmo sendo poucos,
a não preservarem sua cultura étnica e irem logo se misturando a sociedade receptora.
Talvez esse possa ser o problema de um próximo estudo tendo o grupo como objeto.
Porém, o fato é que, via de regra, esse processo de integração se consolida de uma
forma lenta, na medida que pretende evitar o fechamento do grupo e de outro lado não
provocar uma abertura total. Esse diagnóstico, em um primeiro momento, pode parecer
desanimador, pois afirma que mudanças bruscas não são possíveis de serem encontradas
em um grande número. Ou seja, ao contrário, indica que as mudanças se dão de forma
contínua e isso pode ser percebido nas gerações seguintes. Tais observações nos animam a
se debruçar sobre a segunda e terceira gerações desses imigrantes, afim de perceber em que
momento a maioria do grupo étnico irá se integrar de fato com a sociedade receptora, por
meio de uma mistura de valores.
Por fim, deixando de lado as tentativas de imaginar futuros estudos para esse
mesmo objeto, temos que dizer que este presente trabalho nos deixou satisfeitos pelo fato
de ter respondido a nossa problemática e, consequentemente, termos alcançado os nossos
objetivos. Nessa direção, temos que concluir a presente pesquisa afirmando que de fato o
grupo de imigrantes italianos preservou sua identidade cultural e que isso se deu por meio
de práticas ligadas a sua religião. Dessa forma concluímos afirmando que o Curato de
Colombo foi uma instituição religiosa que propiciou a preservação da identidade cultural
para um grupo imigrante italiano.
54
ALVES, José Benedito. Os Santos de cada dia. São Paulo: Paulinas, 1990.
ALVIM, Zuleika. Brava Gente! Os Italianos em São Paulo, 1870 – 1920. São Paulo:
Brasiliense, 1986.
________. Imigrantes: a vida privada dos pobres do campo. In: SEVCENKO, Nicolau.
História da vida privada no Brasil; v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
________. A vida familiar em Santa Felicidade. In: WESTPHALEN, Cecília Maria (Org.).
Un Mazzolino de Fiori; v. II. Curitiba: Imprensa Oficial, 2003.
________. Santa Felicidade: um processo de assimilação. Curitiba: Tip. João Haupt &
CIA LTDA, 1958.
Cadastro do Núcleo Presidente Faria. Livro nº 10, 1886. Arquivo Público do Estado do
Paraná.
Cadastro do Núcleo Eufrazio Correa. Livro nº 15, 1888. Arquivo Público do Estado do
Paraná.
COSTA, Rovílio. Valores da Imigração Italiana cem anos após. In: Imigração Italiana:
Estudos, Anais do I e do II Forum de Estudos Ítalos-Brasileiros. Caxias do Sul:
Universidade de Caxias do Sul, 1979.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. O Brasil Monárquico; reações e transações. São Paulo:
Difusão Européia do Livro, 1969.
Livro de Batismo I, 1888 – 1895. Paróquia Nossa Senhora do Rosário. Colombo, PR.
Livro de Batismo II, 1895 – 1900. Paróquia Nossa Senhora do Rosário. Colombo, PR.
Livro de Batismo III, 1900 – 1908. Paróquia Nossa Senhora do Rosário. Colombo, PR.
Livro de Batismo IV, 1908 – 1920. Paróquia Nossa Senhora do Rosário. Colombo, PR.
Livro de Batismo I, 1888 – 1892. Paróquia São José. Santa Felicidade, Curitiba, PR.
56
Livro de Casamento I, 1895 – 1910. Paróquia Nossa Senhora do Rosário. Colombo, PR.
Livro de Casamento Ib, 1888 – 1897. Paróquia São José. Santa Felicidade, Curitiba, PR.
________ & BIDEAU, Alain. Comment des luthériens allemands sont-ils devenus des
brésiliens? (un essai methodologique). 14e Entretiens du Centre Jacques Cartier (Lyon,
França, 2001.) [Texto em português publicado no Boletim de História
Demográfica. São Paulo, 10(29):01-39, 2003.
ORO, Ari Pedro. “Mi son talian”: considerações sobre a identidade étnica dos descendentes
de italianos do Rio Grande do Sul. In: DE BONI, Luis Alberto. A presença italiana no
Brasil, v. III. Porto Alegre: Ed. Est., 1996.
ANEXOS
135.Pellegrina Maria 1
136.Pasqua Lucia 1
137.Rosa Maria 2
138. Rosa Zefferina 1
139.Rosa Catharina 1
140.Rosalia Escolástica 1
141.Rosa Frederica 1
142.Rosa Maria Cristina 1
143.Rosa Antonia 1
144.Rosalia Maria 1
145.Santa Izabel 1
146.Santa Thereza 1
147.Theresia Dominga 1
148.Ursula Lucia 1
149.Veronica Maria 2
150.Virginia Joanna 1
151.Zefferina Theresia Maria 1
152.Zefferina Maria 1
152 201 132 180
Pronomes Descendentes Pronomes Descendentes
Combinados Femininos com Combinados Masculinos com
Femininos Prenome Combinado Masculinos Prenome Combinado
Fonte: Registros de Batismos.
81. Laura 2 2 -
82. Natalia 2 1 1
83. Pia 2 - 2
84. Paulinia 2 2 -
85. Paula 2 1 1
86. Severina 2 - 2
87. Tranquilla 2 2 -
88. Annunziata 1 1 -
89. Alexandrina 1 - 1
90. Alice 1 - 1
91. America 1 - 1
92. Alvernia 1 - 1
93. Aguida 1 1 -
94. Alinda 1 1 -
95. Brasilia 1 1 -
96. Barbara 1 1 -
97. Brigida 1 1 -
98. Bertolina 1 1 -
99. Clotilde 1 1 -
100. Carola 1 1 -
101. Cizera 1 1 -
102. Clelia 1 1 -
103. Carmelina 1 1 -
104. Cirila 1 1 -
105. Conceptião 1 - 1
106. Carmela 1 - 1
107. Casilda 1 - 1
108. Daluz 1 - 1
109. Dijanira 1 1 -
110. Ermelina 1 1 -
111. Ediwige 1 1 1
112. Esperança 1 1 -
113. Eufemia 1 1 -
114. Frederica 1 - 1
115. Francelina 1 1 -
116. Fausta 1 1 -
117. Fabiana 1 1 -
118. Gironda 1 - 1
119. Guilhelmina 1 - 1
120. Guerrina 1 1 -
121. Isaura 1 1 -
122. Jeronyma* 1 1 -
123. Liolanda 1 - 1
124. Lindaura 1 - 1
125. Lurdes 1 - 1
126. Letizia 1 1 -
127. Linda 1 1 -
128. Melania 1 - 1
129. Malvina 1 1 -
130. Mafalda 1 1 -
131. Minerva 1 1 -
132. Mônica 1 1 -
133. Mercedes 1 1 -
134. Nisena 1 - 1
65
135. Olímpia 1 - 1
136. Olinda 1 1 -
137. Olegaria 1 1 -
138. Otilia 1 1 -
139. Otacilia 1 1 -
140. Orlanda 1 1 -
141. Plácida 1 - 1
142. Prima 1 1 -
143. Palmira 1 1 -
144. Petronilla 1 1 -
145. Pulqueria 1 1 -
146. Romana 1 - 1
147. Rufina 1 1 -
148. Rosina* 1 1 -
149. Serafina 1 - 1
150. Theodora 1 1 -
151. Ursulina* 1 1 -
152. Veneranda 1 1 -
153. Zaga 1 1 -
154. Zenobia 1 1 -
154 Prenomes 903 (100%) 488 415
50 Prenomes do E.C. 736 (81,5%) 398 338
104 Outros 167 (18,5%) 90 77
Fonte: Registros de Batismos.
25. Ermenegildo 6 6 -
26. Santo (Sante) 6 2 4
27. Valentino (Valentin) 6 3 3
28. Venancio (Venanzio) 6 3 3
29. Egídio 5 4 1
30. Julio 5 5 -
30. Sebastião 5 2 3
31. Vicente 5 2 3
32. Aloisio* 4 1 3
33. Alfredo 4 3 1
34. Alberto 4 3 1
35. Frederigo 4 1 3
36. Gaspar 4 4 -
37. Isidoro 4 3 1
38. Olivo* 4 3 1
39. Placídio 4 3 1
40. Paulo 4 2 2
41. Romano 4 2 2
42. Rinaldo 4 2 2
43. Alexander 3 3 -
44. Abraham 3 3 -
45. Benianino 3 3 -
46. Colombo 3 - 3
47. Cirilo 3 1 2
48. Estevão (Estefano) 3 2 1
49. Fioravante 3 2 1
50. Fortunato 3 2 1
51. Leão (Leone) 3 1 2
52. Miguel 3 2 1
53. Marcos 3 3 -
54. Primo 3 1 2
55. Pio 3 2 1
56. Victor* 3 2 1
57. Vitorino* 3 2 1
58. Aurélio 2 - 2
59. Adriano 2 - 2
60. Arcangelo* 2 2 -
61. Amadeus 2 2 -
62. Americo 2 2 -
63. Basilio 2 2 -
64. Bernardo 2 2 -
65. Belmiro 2 1 1
66. Celeste 2 2 -
67. Clemente 2 2 -
68. Casimiro 2 2 -
69. Evaristo 2 - 2
70. Jordano (Giordano) 2 2 -
71. Ismael 2 2 -
72. Josué 2 2 -
73. Lourencio 2 1 1
74. Mansueto 2 2 -
75. Natale 2 1 1
76. Orlando 2 - 2
77. Pascual 2 - 2
67
78. Rizziere 2 1 1
79. Roque 2 2 -
80. Silvestro 2 1 1
81. Theofilo 2 2 -
82. Walfrido 2 2 -
83. Waldemiro 2 2 -
84. Zefferino 2 - 2
85. Alvino 1 - 1
86. Armando 1 - 1
87. Angelino* 1 - 1
88. Ari 1 - 1
89. Adolfo 1 - 1
90. Augusto 1 - 1
91. Osvaldo 1 - 1
92. Odorico 1 - 1
93. Alessandrino 1 - 1
94. Alessandro 1 1 -
95. Annibale 1 1 -
96. Alessio 1 1 -
97. Ascanio 1 1 -
98. Aquilles 1 1 -
99. Archimedes 1 1 -
100. Arpice 1 1 -
101. Alipio 1 1 -
102. Affonço 1 1 -
103. Arlindo 1 1 -
104. Braz 1 - 1
105. Benedito 1 1 -
106. Celestino 1 - 1
107. Ceveral 1 1 -
108. Christofero 1 1 -
109. Carolo 1 1 -
110. Custodio 1 1 -
111. Demetrio 1 1 -
112. Dorsilio 1 1 -
113. Dante 1 1 -
114. Enrico 1 - 1
115. Emiliano* 1 - 1
116. Edoardo 1 1 -
117. Elpidio 1 1 -
118. Florentino 1 - 1
119. Faraone 1 - 1
120. Filisberto 1 1 -
121. Flávio 1 1 -
122. Felicio 1 1 -
123. Florindo 1 1 -
124. Gedeão 1 - 1
125. Gustavo 1 - 1
126. Giocondo 1 - 1
127. Galdino 1 - 1
128. Gaetano 1 1 -
129. Guilherme 1 1 -
130. Germano 1 1 -
131. Guerrin 1 1 -
68
132. Innocente 1 1 -
133. Jorge 1 - 1
134. Jeremias 1 1 -
135. Liberato 1 1 -
136. Laurindo 1 1 -
137. Matheo 1 - 1
138. Martino 1 - 1
139. Marciliano 1 1 -
140. Macidio 1 1 -
141. Mirando 1 1 -
142. Nazario 1 - 1
143. Narciso 1 1 -
144. Nicolão 1 1 -
145. Ovídio 1 1 -
146. Oscar 1 1 -
147. Ozorio 1 1 -
148. Oliverio 1 1 -
149. Oreste 1 1 -
150. Ottavio 1 1 -
151. Prudente 1 1 -
152. Pellegrino** 1 1 -
153. Redentor 1 - 1
154. Remigio 1 - 1
155. Raimundo 1 - 1
156. Rigomario 1 - 1
157. Ranholt 1 - 1
158. Romão 1 1 -
159. Ruggieri 1 1 -
160. Ricardo 1 1 -
161. Silvio 1 - 1
162. Sezefrido 1 1 -
163. Serafin 1 1 -
164. Severino 1 1 -
165. Teodoro 1 - 1
166. Thomaz 1 1 -
167. Ulderico 1 - 1
168. Ubaldo 1 1 -
169. Virgilio 1 - 1
170. Vivaldo 1 - 1
171. Vito 1 1 -
172. Wimfrido 1 1 -
172 Prenomes 940 (100%) 595 345
42 Prenomes do E.C. 728 (77,5%) 438 270
130 Outros 212 (22,5%) 137 75
Fonte: Registros de Batismos.
69
05. Outras Influências combinado com Influências Familiares, Culturais e/ou Religiosas
05.1 Outro nome e nome do Estoque Cultural 2
05.2 Outro nome e nome da Avó Paterna 2
05.3 Outro nome e nome de Santa* 2
05.4 Outro nome e nome da Mãe 2
05.5 Outro nome e nome da Avó Materna 1
05.6 Outro nome, nome da Avó Materna e nome da Madrinha 1
05.7 Outro nome e nome da Madrinha 1
05.8 Outro nome e Outro nome 1
Subtotal 12
TOTAL 88
*Santa próximo do dia do nascimento ou do batismo; santo padroeiro das colônias.
Fonte: Registro de Batismos.