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NO PROCESSO
De aco rd o com a N o va Reform a do
C ó d ig o de Processo Penal
E D IT O R A AFILIADA
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e-mail: editora@jurua.com.br
ISBN: 978-85-362-2539-5
iLUli
E D IT O R A
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CDD 345(22.ed)
CDU 343.2
Fábio Aguiar Munhoz Soares
Bacharel em direito pela PUCSP e Mestre pela Fadisp. Foi Procurador
do Estado de São Paulo, sendo atualmente Juiz de Direito e Professor em cursos
de graduação, pós-graduação e cursos preparatórios para carreiras jurídicas nas
áreas de Direito Penal e Processual Penal.
PROVA ILÍCITA
NO PROCESSO
D e aco rd o com a N o va Reform a do
C ó d ig o de Processo Penal
Curitiba
Juruá Editora
2011
A Andréa, minha esposa, com amor, admira
ção e gratidão por seu imensurável apoio ao
longo do período de elaboração deste tra
balho.
A Fernanda, Luíza e Carolina, minhas eter
nas princesinhas.
AGRADECIMENTOS
INTRODUÇÃO..................................................................................................15
4 -P R O V A ........................................................................................................ 47
4.1 Breves Anotações Sobre o Conceito de Prova....................................47
4.2 Classificações Sobre Prova................................................................. 49
4.3 Prova Ilícita no Processo e Suas Consequências.................................51
4.4 Correntes Doutrinárias Acerca da Admissibilidade da Prova Ilícita.....53
4.5 Princípio da Proporcionalidade e sua Aplicabilidade na Admissão
da Prova Ilícita no Processo................................................................ 60
4.6 Nossa Posição...................................................................................... 63
5 - INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL E COLISÃO ENTRE
PRINCÍPIOS...................................................................................................... 73
CONCLUSÃO..................................................................................................127
REFERÊNCIAS............................................................................................. 131
ANEXO............................................................................................................. 137
ÍNDICE ALFABÉTICO..................................................................................141
INTRODUÇÃO
mormente pelo fato de não se ignorar em tais casos, quando não existe
a aludida correspondência, ad exemplum, absolvições criminais serem
baseadas em julgamentos nos quais há convicção total e inequívoca
pelo magistrado de ser aquele sujeito posto no banco dos réus o ver
dadeiro responsável pelo crime ocorrido, mas que não pode ser conde
nado por haver, in casu, prova ilícita, que, pela Constituição Brasileira,
não é admitida no processo (art. 5o, inc. LVI), ainda que exprima a
verdade dos fatos.
Doutrina e jurisprudência, entretanto, a par da expressa ve
dação constitucional quanto à inadmissibilidade da prova ilícita no
processo, são concordes quanto ao fato de se admitir a prova ilícita na
esfera criminal, mas dês que em favor do réu, numa interpretação be
nevolente e em prol do princípio da dignidade da pessoa humana, não
admitindo, assim, é certo dizer, a prova ilícita em situação oposta, ou
seja, quando militar esta em prol da sociedade, ainda que em certos
casos a única forma possível de se verificar e constatar a culpabilidade
do réu seja por meio da utilização de prova obtida por meio ilícito.
Pouco se diz ainda da possibilidade de utilização de tal espé
cie de prova em lides envolvendo outros ramos do direito, envolven
do, v.g., direitos da criança e do adolescente, o que não se pode igno
rar, dado ter adotado a Constituição Federal, em seu art. 227, o princí
pio da proteção integral, assegurando à criança e ao adolescente, com
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educa
ção, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito,
à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los
a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, vio
lência, crueldade e opressão.
O mesmo se diga, ad exemplum, em relação ao meio ambien
te, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade, pelo art. 225, da Cons
tituição Federal, o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes
e füturas gerações.
Diante de tal panorama, a dúvida que surge não poderia ser
outra senão aquela, atinente à possibilidade de utilização nos proces
sos de provas ilícitas em situações previstas pelo legislador consti
tuinte como merecedoras de tutela diferenciada, em se considerando
para tanto o fato de ter a Constituição Federal vedado a admissibilida
de da prova ilícita de forma peremptória nos processos, mas de forma
Prova Ilícita no Processo 17
HISTÓRICO DA ADMISSIBILIDADE DA
PROVA ILÍCITA NO PROCESSO NO
BRASIL
1 Art. 179, VII - Todo o Cidadão tem em sua casa um asylo inviolável. De noite não se poderá
entrar nella, senão por seu consentimento, ou para o defender de incêndio, ou inundação; e de
dia só será franqueada a sua entrada nos casos, e peia maneira, que a Lei determinar.
2 Art. 179, VIII - Ninguém poderá ser preso sem culpa formada, excepto nos casos declarados
na Lei; e nestes dentro de vinte e quatro horas contadas da entrada na prisão, sendo em Ci
dades, Villas, ou outras Povoações próximas aos togares da residência do Juiz; e nos togares
remotos dentro de um prazo razoavel, que a Lei marcará, attenta a extensão do terrítorío, o
Juiz por uma Nota, por elle assignada, fará constar ao Réo o motivo da prisão, os nomes do
seu accusador, e os das testemunhas, havendo-as.
I X - Ainda com culpa formada, ninguém será conduzido á prisão, ou nella conservado estando
já preso, se prestar fiança idônea, nos casos, que a Lei a admitte: e em geral nos crimes, que
não tiverem maior pena, do que a de seis mezes de prisão, ou desterro para fóra da Comarca,
poderá o Réo livrar-se solto.
X - À excepção de flagrante delicto, a prisão não pôde ser executada, senão por ordem
cripta da Autoridade legitima. Se esta fôr arbitraria, o Juiz, que a deu, e quem a tiver requerido
serão punidos com as penas, que a Lei determinar. O que fica disposto acerca da prisão antes
de culpa formada, não comprehende as Ordenanças Militares, estabelecidas como necessári
as á disciplina, e recrutamento do Exercito; nem os casos, que não são puramente criminaes,
e em que a Lei determina todavia a prisão de alguma pessoa, por desobedecer aos mandados
da justiça, ou não cumprir alguma obrigação dentro do determinado prazo.
X I X - Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais
penas cruéis.
XXVil - O Segredo das Cartas é inviolável. A Administração do Correio fica rigorosamente
responsável por qualquer infracção deste Artigo.
Prova Ilícita no Processo 21
3 A rt 1o. A Nação brasileira adota como forma de Governo, sob o regime representativo, a
República Federativa, proclamada a 15.11.1889, e constitui-se, por união perpétua e indissolú
vel das suas antigas Províncias, em Estados Unidos do Brasil.
4 Art. 15. São órgãos da soberania nacional o Poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário,
harmônicos e independentes entre si.
5 Art. 72, § 22 Dar-se-á o habeas corpus, sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em imi
nente perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ou abuso de poder.
Art. 72, § 1 1 A casa é o asilo inviolável do indivíduo; ninguém pode aí penetrar de noite, sem
consentimento do morador, senão para acudir as vítimas de crimes ou desastres, nem de dia,
senão nos casos e pela forma prescritos na lei.
§ 1 3 A exceção do flagrante delito, a prisão não poderá executar-se senão depois de pronún
cia do indiciado, salvo os casos determinados em lei, e mediante ordem escrita da autoridade
competente.
Art. 72, § 1 8 É inviolável o sigilo da correspondência.
22 Fábio Aguiar Munhoz Soares
*üh' l 22- A Consf,íty,Ção assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no País o direito à
s o ' de' à se9urarÇa individual e à propriedade, nos termos seguintes:
s 6 A inviolabilidade do domicilio e de correspondência, salvas as exceções expressas em lei.
24 Fábio Aguiar Munhoz Soares
11 Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à proprie
dade, nos termos seguintes:
§ 24 Para proteger direito liquido e certo não amparado por habeas corpus , conceder-se-á
mandado de segurança, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso de
poder.
§ 38 Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulida
de de atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados, dos Municípios, das entidades autár
quicas e das sociedades de economia mista.
12 § 16 Ê garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro. Em
caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, as autoridades competentes po
derão usar da propriedade particular, se assim o exigir o bem público, ficando, todavia, asse
gurado o direito a indenização ulterior.
13 § 6 ° É inviolável o sigilo da correspondência.
§ 1 5 A casa é o asilo inviolável do indivíduo. Ninguém, poderá nela penetrar à noite, sem con
sentimento do morador, a não ser para acudir a vitimas de crime ou desastre, nem durante o
dia, fora dos casos e pela forma que a lei estabelecer.
Prova Ilícita no Processo 25
14 MELLO FILHO, José de Celso. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Saraiva, 1984.
p. 52.
15 Art. 150. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
§ 9° São invioláveis a correspondência e o sigilo das comunicações telegráficas e telefônicas.
§ 10 A casa é o asilo inviolável do indivíduo. Ninguém pode penetrar nela, à noite, sem con
sentimento do morador, a não ser em caso de crime ou desastre, nem durante o dia, fora dos
casos e na forma que a lei estabelecer.
§ 21 Conceder-se-á mandado de segurança, para proteger direito individual liquido e certo não
amparado por habeas co rp u s, seja qual for a autoridade responsável pela ilegalidade ou abuso
de poder.
§ 22 É garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou
utilidade pública ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro, res
salvado o disposto no art. 157, § 1o. Em caso de perigo público iminente, as autoridades com
petentes poderão usar da propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulte
rior.
§ 31 Qualquer cidadão será parte legítima para propor ação popular que vise a anular atos le
sivos ao patrimônio de entidades públicas.
26 Fábio Aguiar Munhoz Soares
16 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 28. ed. São Paulo: Malheiros,
2007. p. 105.
17 Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a
inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos
têrmos seguintes:
§ 9 ° É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e telefônicas.
Prova Ilícita no Processo 27
18 Art. 1o. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos:
I - a soberania:
II - a cidadania;
I I I - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo politico.
19 Art. 60.
§ 4o Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir.
I V - os direitos e garantias individuais.
20 Com efeito, o Min. Raphael de Barras Monteiro demonstra tal raciocínio ao asseverar: “os
Tribunais têm de julgar conforme as provas que lhe são apresentadas e não lhes compete inves
tigar se elas foram bem ou mal adquiridas pelo respectivo litigante. Essa investigação é estranha
ao processo e o juiz que a fizer exorbitará de suas atribuições processuais". Prova. Gravação de
conversa telefônica. Captação por meio criminoso. Violação de sigilo de correspondência. Meio
Probatório não previsto em lei. Livre apreciação, todavia pelo juiz (R T 194/157).
Art. 5o, LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
2
2.1 ITÁLIA
22 Dispõe o art. 191 daquele Código: “1. Le prove acquisite in violazione dei divieti stabiliti dalla
legge non possono essere utilizate" 2. Vinutilizzabilità è rilevabile anche di ufficio in ogni stato
e grado dei procedimento’’, tendo TONINI, Paolo (A Prova no Processo Penal Italiano. Tra
dução de Daniela Mróz e Alexandra Martins. São Paulo: RT, 2002. p. 77) anotado que "... a
proibição idônea a gerar a inutilizabilidade é somente aquela prevista por uma norma proces
sual. Isso pode ser extraído do nomen iuris do art. 191 do CPP, que se refere às provas ilegi
timamente adquiridas. Se a proibição tivesse como objeto a violação de uma lei penal subs
tancial, teria sido utilizada a expressão ‘p rova ilicitamente adquirida'. Em contrapartida, o
nomen iuris do art. 191 refere-se às provas 'ilegitimamente adquiridas'. Portando, as provas
obtidas por meio de violação de uma norma da lei penal substancial (denominadas provas ilí
citas) são, em regra, utilizáveis: tornam-se inutilizáveis se for violada uma norma processual
^ específica que disponha nesse sentido (exemplo: art. 188 do C P P f.
Nesse sentido, AVOLIO, Luiz Francisco Torquato (Provas Ilícitas. Interceptações telefôni
cas, ambientais e gravações clandestinas. São Paulo: RT, 2003. p. 47) “(.■■) a maior parte
da doutrina rechaçava as posturas em proi da admissibilidade das provas ilícitas. Vescovi prin-
30 Fábio Aguiar Munhoz Soares
2.2 ALEMANHA
c/piava por negar o conf/ífo entre o interesse privado da defesa de um direito violado com a
obtenção da prova ilícita e o superior interior público a ser atingido através do processo. Situa
va o conflito, assim, entre dois interesses públicos diversos: o da Justiça, pela busca da verda
de e o do respeito aos direitos individuais fundamentais. Acentuava que o processo não se re
sume a uma disputa, na qual triunfa o mais hábil, forte ou poderoso, mas num instrumento que
tende a consagrar uma conduta valiosa, conforme à regra moral e aos princípios da lealdade e
da probidade. No mesmo sentido, Allorio e Nuvolone. Nuvulone criticava a posição de Cordero,
segundo o qual a ilicitude da prova não a torna inadmissível, salvo se esta for em si mesma
inadmissível, ou se ocorre uma violação da norma processual, mas reconhece sua engenhosi-
dade".
24 GALANTINI, Novella. L’inutilizzabilità della prova nel processo penale. Padova' Cedam
1992. p. 65.
25 ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Provas ilícitas e proporcionalidade. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2007. p. 195.
26 Art. 253. (Oggeto e formalité del sequestro) - 1. L’autorité giudiziaria dispone con decreto
motivate il sequestro del corpo del reato e deite cose pertinenti ai reato necessarie per
I’accertamento dei fatti.
2. Sono corpo del reato le cose suite quali o mediante ie quali il reato é stato commesso non-
ché le cose che ne costituiscono il prodotto, il profitto o il prezzo.
3. Al sequestro procede personalmente 1’autorítá giudiziaria ovvero un ufficiale di polizia giudi
ziaria delegato com lo stesso decreto.
4. Copia del decreto di sequestro é consegnata aii'interessato, se presente.
27 Tal entendimento, é o que anota ÁVILA, Thiago André Pierobom de. (Provas... Op. cit, p. 195)
restringe sobremaneira as disposições concernentes ao art. 191 do Código de Processo Penal
Italiano.
28 Nesse sentido, observa AVOLIO, Luiz Francisco Torquato (Provas... Op. cit, p. 49), “O legis
lador, com surpreendente tempestividade, intervém já em 1950 para introduzir o “novo" § 136,
Prova Ilícita no Processo 31
sim, a doutrina alemã, não poder ser validada a prova produzida com
infração ao direito material.
É a jurisprudência alemã, outrossim, o marco inicial da apli
cação da teoria da proporcionalidade ( VerhãltnismàBigkeitsgrundsatz)
ou da razoabilidade29/30, pela qual se diminuem de certa forma os rigo
res do tratamento dispensado à prova ilícita no que toca à sua vedação,
já que a partir de tal teoria nenhuma garantia constitucional passa a ter
valor absoluto, sobrepondo-se à outra de mesmo grau, devendo sem
pre ser valorados os direitos postos em análise, tolerando-se, pois,
eventual detrimento a algum direito, ainda que de natureza constitu
cional293031, dês que no sopesamento de valores se verifique a existência
naquele momento de outro valor mais relevante32, o que será objeto de
nossos estudos mais adiante.
33 A respeito, confira-se: Patriot Act amplia poder das agências para combater terror. Jornal
Folha de S. Paulo. São Paulo, A 1 6 ,12 maio 2006. “Lançado após o 11 de Setembro, o Pa
triot A ct é um pacote de leis antiterroristas dos EUA, que prevê um conjunto de medidas
excepcionais de ampliação dos poderes de agências de combate ao crime para facilitar a
iuta contra o terrorismo. Por autorizar procedimentos contrários às liberdades civis - como
escutas telefônicas e monitoramento de e-maiis extrajudiciais e espionagem de prontuários
médicos ou de fichas de consultas em bibliotecas tem sido amplamente criticado. Seu
nome real é USA Patriot, acrônimo de Uniting and Strengthening Am erica by Providing
Appropriate Tolls R equired to Intercept and Obstruct Terrorism (unindo e fortalecendo
os EUA pela provisão de apropriadas ferramentas necessárias para interceptar e obstruir o
terrorismo). Em dezembro de 2005, o Congresso americano contrariou o desejo do presi
dente George Ví. Bush de tornar permanente o pacote de leis, aprovando apenas sua ex
tensão. Após meses de impasse no Congresso sobre como equilibrar direitos civis e a ne
cessidade de maior vigilância para evitar ataques, uma versão modificada da lei foi assina
da por Bush em março de 2006. Mudanças foram feitas para garantir que os cidadãos pos
sam contestar algumas das ações na Justiça".
34 Anota RAMOS, João Gualberto Garcez (Curso de Processo Penal norte-americano. São
Paulo: RT, 2006. p. 27): “diversas leis penais e processuais penais brasileiras, como a Lei
6.368/76 (entorpecentes), a Lei 7.492/86 (sistema financeiro nacional), a Lei n. 9.099/95 (jui
zados especiais criminais), a Lei 9.613/98 (lavagem de dinheiro), apenas para ficar com quatro
exemplos mais conhecidos, foram diretamente influenciadas pela experiência dos EUA. (...)
outra influência sobre a legislação brasileira, influência indiscutível mas sumamente contraditó
ria, tem sido a das prisões “supermáximas" (supermaxprisons), instituições prisionais totais,
em que os presos têm reduzidas quase todas as regalias e são submetidos a um regime disci
plinar severíssimo e, frequentemente, abusivo. Em 2005, havia aproximadamente 24 desses
estabelecimentos nos EUA. O “regime disciplinar diferenciado”, instituído no Brasil pela Lei
10.792/03, aponta precisamente nessa direção, inclusive quanto aos estabelecimentos prisio
nais, ao estabelecer que a “União Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Territórios pode
rão construir penitenciárias destinadas, exclusivamente, aos presos provisórios e condenados
em regime fechado, sujeitos ao regime disciplinar diferenciado (Lei 7.210/84, art. 87, parágrafo
único, acrescentado pela Lei 10.792/03)”.
Prova Ilícita no Processo 33
36 Como bem anota RAMOS, João Gualberto Garcez. (Curso... Op. c/f., p. 29), “a influência
estadunidense no campo penal tem sido importante. E, vistas as coisas com serenidade, não
se justifica tanto entusiasmo. Contudo, o que é preocupante é que a maioria dos entusiastas,
inclusive entusiastas de nome, não conhece realmente a estrutura e a dinâmica do processo
penal estadunidense. Um exemplo desse entusiasmo às vezes inexplicável foi a adoção, pelo
Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus 69.912, da “doutrina dos frutos da árvore en
venenadai” (fruits os poisonous tree doctrine), na consideração de um caso que a criadora
da doutrina, a Suprema Corte dos EUA, com certeza teria julgado de maneira diversa. Sim,
porque a observação da realidade tem revelado que a exclusão de provas com base nessa
formulação teórica é solução usada com enorme parcimônia pelo Judiciário estadunidense.
Basta conferir as estatísticas a respeito do impacto das “regras de exclusão" (exclusionary
rules) nas taxas de condenação. Segundo pesquisa conduzida por Peter Nardulli em nove ci
dades de porte médio dos EUA, entre 7.500 acusados por crimes graves (felonies) entre 1979
e 1980, em torno de 50 (0,69% do total) foram absolvidos com fundamento na ilicitude da pro-
va.(...) o impacto social da teoria dos frutos da árvore envenenada nos EUA é muito menor do
que freqüentemente se apregoa".
36 idem, p. 122.
37 Segundo ainda RAMOS, João Gualberto Garcez (Curso... Op. c/f., p. 125): “Tome-se o
exemplo da 4 a emenda. Ela garante o povo contra buscas e apreensões desarrazoadas e
proíbe a expedição de mandados, a não ser baseados em causa provável, suportada por
juramento ou afirmação por parte da autoridade pública respectiva, e particular descrição
do local a ser buscado e das pessoas e coisas a serem apreendidas. Ela não dispõe sobre
3 hipótese de seu desrespeito. Da mesma maneira, a 5a emenda. A Carta de Direitos dei
xa em aberto, pois, a situação do processo penal em que provas tenham sido produzidas
com a violação das garantias constitucionais. Não responde à pergunta crucial: o que fazer
com as provas? A regra de exclusão é, assim, uma verdadeira e própria criação jurispru-
dencial".
34 Fábio Aguiar Munhoz Soares
2.4 ESPANHA
38 Neste sentido: AMAR, Akhil Reed. The Constitution and criminal procedure: first principles.
New Haven - London: Yale University Press, 1997. p. 40-45.
39 KLEIN, Susan. Enduring principles and current crises in constitucional criminal procedure. L.&
Soc. Inq, n. 24, p. 533-573,1999; Erik G. Luna. Two models of criminal process. Buff. Crim-
L. Rev., n. 2, p. 425-441,1999.
40 O caso é Herring v. United States, 07-513, decidido em 14.01.2009.
41 MAILLO, Alfonso Serrano. Valor de las escuchas telefónicas como prueba en el sistema espafiol.
Nulidad de la prueba obtenida ilegalmente. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São
Paulo, a. 4, n. 15, p. 13-21, jul./set. 1996.
Prova Ilícita no Processo 35
42 Posicionam-se, dentre outros, contra a admissão da prova ilícita no direito espanhol: Munoz
Conde, Montón Redondo, De Marino, Queralt, Sentis Melendo e Devis Echandia. A este respeito,
confira-se: QUIROGA, Jacobo López Barja de. Las escuchas telefónicas y la prueba ile
galmente obtenida. Madrid: Akal, 1989. p. 89.
43 Garantismo é uma teoria idealizada por Luigi Ferrajoli, podendo ser vista em suas obras Dere-
cho y razón - Teoria dei garantismo penal. Madrid: Trotta, 1998 e Derecho y garantias -
La ley dei más débil. Madrid: Trotta, 1999. Por ela, se propõe numa acepção normativa de Di
reito, aplicada ao Direito Penal, modelo de estrita legalidade, próprio do Estado de Direito;
numa acepção epistemológica, um sistema cogniscivo ou de poder mínimo; numa acepção
política, como uma técnica de tutela capaz de minimizar a violência do sistema penal e maxi
mizar a liberdade; e numa acepção jurídica, como um sistema de limites impostos ao poder
punitivo do Estado em garantia dos direitos do cidadão. Em tal sentido, o garantismo é distin
guido em graus medidos entre as determinações do modelo constitucional e o funcionamento
prático do sistema - quanto mais observadas as disposições constitucionais pelo sistema in-
fraconstitucional, maior o grau de garantismo. De tal forma, o garantismo propõe um Estado
minimizador de restrições das liberdades dos cidadãos dentro de um Estado Social maximiza-
dor das expectativas sociais, com correlatas deveres, do próprio Estado, de satisfazer tais ne-
cessidades.
ZjU j, Marcos Alexandre Coelho. A Prova Ilícita e o Tribunal Penal Internacional: Regras de
Admissibilidade. Tese apresentada ao curso de Pós-graduação da Faculdade de Direito da
universidade de São Paulo. São Paulo, 2006, p. 134.
3
VERDADE E PROVA
45 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeira Linhas de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva,
1990. p. 327.
46 TUCCI, Rogério Lauria. Do Corpo de Delito no Direito Processual Penal Brasileiro. São
Paulo: Saraiva, 1978. p. 91.
38 Fábio Aguiar Munhoz Soares
47 CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 5. ed. São Paulo: Ática, 1995. p. 92.
Prova Ilícita no Processo 39
48 Idem, p. 93.
49 Ibidem, p. 95.
50 KELSEN, Hans (Teoria Geral das Normas. Tradução de J. F. Duarte. Porto Alegre: Sérgio
Antonio Fabris, 1986. p. 275 e 290) cita inclusive importante diferença entre a verdade de um
enunciado e a validade de uma norma. Em suas palavras: “consiste em que a verdade de um
enunciado precisa ser verificável, quer isto dizer, ser verificável como verdadeiro ou falso. A
validade de uma norma não é, porém, verificável. A validade de uma norma não é verificável
porque essa validade é sua específica existência e, portanto, nem pode ser verdadeira nem
falsa como a existência de um fato. Somente a verdade do enunciado sobre a existência de
um fato é verificável, pois verificar, autenticar, significa: provar a verdade. Discutível apenas
pode ser se o enunciado sobre a validade de uma norma é verificável. E esta questão tem de
ser respondida afirmativamente, visto que esse enunciado, como todo enunciado, pode ser
verdadeiro ou falso, e, portanto, precisa ser verificável'.
40 Fábio Aguiar Munhoz Soares
51 MITTERMAIER, em sua clássica obra Tratado de las Prueba. Madrid, 1983, p. 65, anotava
que “e/ legislador ha querido que en esta certeza razonable estuviese la base de la sentencia.
Pretender más seria querer lo imposible, porque no puede obtenerse la verdad absoluta en
aque/los hechos que salen dei domínio de la verdad histórica".
52 MALATESTA, Nicoia Framarino Dei. A lógica das provas em matéria criminal. Tradução de
J. Alves de Sá. Lisboa: Clássica, 1911. p. 25.
63 ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. A iniciativa instrutória do juiz no processo penal São
Paulo: RT, 2003. p. 114.
Prova Ilícita no Processo 41
54 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo: RT,
1997. p. 95.
55 Conforme AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Provas... Op. cit., p. 161.
56 CONDE, Francisco Munoz (Búsqueda de la verdad em el proceso penal. Buenos Aires:
Hamurabi, 2000. p. 97), leciona: “Esto no quiere decir, sin embargo, que el proceso penal ton
ga que renunciar, por principio y desde un principio, a la búsqueda de la verdad material en
tendida en su sentido clásico como adecuatio rei et intellectu, sino solamente que tiene que
atemperar esa meta a las limitaciones que derivan no solo de las propias leyes dei conocimiento,
sino de los derechos fundamentales reconocidos en la Constitucion y las normas, formalidades
e impurezas dei proceso pena!'.
57 MOREIRA, José Carlos Barbosa. A Constituição e as provas ilicitamente adquiridas. Ajuris.
Porto Alegre: Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, a. XXIII, n. 68, p. 13-27, nov. 1996.
58 TARUFFO, Michele. Note per una riforma del diritto delle prove. Rivista di Diritto Processule,
p. 249,1986.
42 Fábio Aguiar Munhoz Soares
62 Foi o que decidiu o TJDFT em caso envolvendo interesses do réu revel, portanto na esfera do
processo civil: “Direito Processual Civil. Revelia. Efeitos. Produção de provas pelo réu re
vel. Possibilidade. 1 - Apesar da ocorrência da revelia, não está o juiz vinculado ao julga
mento antecipado da lide, muito menos a julgar procedente o pedido, devendo, efetivamente,
buscar a verdade real (REsp. 15.1924/PR, Mina. Nancy Andrighi, DJ 08.10.2001), sopesandoa
necessidade de produção de outras provas pelas partes, inclusive, por aquele que foi declara
do revel, caso se manifeste nos autos anteriormente à fase de saneamento do processo. 2 -
Apelo provido". (Apelação Cível 20030110103693 (227814) - 4a Turma Cível do TJDFT -
Rei. Cruz Macedo - j. em 12.09.2005 - DJU 18.10.2005). Da mesma forma, confira-se julga
do do TJMG no mesmo sentido: “Ação de prestação de contas. Revelia. Presunção de ve-
racidade. Julgamento antecipado da lide. Art. 915, § 2°, do Código de Processo Civil.
Mantendo-se revel, caberá ao Magistrado proceder ao julgamento antecipado da lide, determi
nando ao requerido a apresentação das contas no prazo de 48 horas, sob pena de não poder
impugnar as que o autor posteriormente apresentar, conforme determina o art. 915, § 2° do
Código de Processo Civil. A presunção de que trata o art. 319 do CPC é relativa, não absoluta.
Assim, mesmo na hipótese de revelia, o Magistrado deve conduzir o processo com cautela
para tentar alcançar, ao máximo, a verdade real, decidindo a causa segundo seu livre conven
cimento". (Apelação Cível 1.0024.04.501529-4/001 - 12a Câmara Cível do TJMG - Rei.
Alvimar de Avila - j. em 22.03.2006, unânime, Publ. 13.05.2006).
63 CAMBI, Eduardo. Direito Constitucional à Prova no Processo Civil. São Paulo: RT, 2001 . p. 77.
64 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes Instrutórios do Juiz. 3. ed. São Paulo1 RT
2001. p. 145.
65 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Processo civil e processo penal: mão e contramão? Gênesis
- Revista de Direito Processual Civil, v. 12, p. 252.
44 Fábio Aguiar Munhoz Soares
. . . s e n o p ro c e s s o p e n a l v ig e o p r in c íp io d a v e rd a d e r e a l, o q u e ju s t i f i
c a r ia a fa s ta r a p r o v a ilíc it a p a r a e fe ito d e tu te la c o n d e n a tó ria ? S e rá
q u e s o m e n te o v a lo r lib e r d a d e e s tá a c im a d a g a r a n t ia c o n s titu c io n a l à
in tim id a d e ? E m n e n h u m a s itu a ç ã o p o d e r ia o j u i z c o n c lu ir q u e o in te
resse p ú b lic o n a c o n d e n a ç ã o d o a u to r d e c rim e r e a lm e n te h e d io n d o ,
co m o tr á fic o d e d ro g a s , é s u p e r io r a o v a lo r p r o te g id o p e la v e d a ç ã o à
p r o d u ç ã o dessa p r o v a ? S em f a l a r q u e esse tra ta m e n to d ife re n c ia d o
e n tre as p a r te s n o p ro c e s s o p e n a l ta m b é m o fe n d e v a lo r c o n s titu c io
n a lm e n te a s s e g u ra d o , q u a l s e ja a is o n o m ia ...6(\
PROVA
nhecidos pelo acusado. Mas de uma maneira geral, a doutrina alinha alguns fatos que, mesmo
no processo penal, não precisariam ser provados. São eles: a) as verdades axiomáticas. Ex: o
fogo queima; b) as presunções legais absolutas. Ex: o menor de 18 anos é penalmente iním-
putável. /4s presunções relativas, embora não precisem ser provadas, admitem prova em sentido
contrário', c) os fatos inúteis, ou seja, aquéles que não guardam qualquer relação com o fato que
está sendo julgado: e d) fatos notórios. Vale dizer, aqueles que são de conhecimento geral'.
81 CPP, art. 158. “Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de
delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado".
82 CPP, art. 159. “0 exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial,
portador de diploma de curso superiof.
83 CPP, art. 207. “São proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício
ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem
dar o seu testemunho".
CPC, art. 406, II - “a testemunha não é obrigada a depor de fatos a cujo respeito, por estado
ou profissão, deva guardar sigilo”.
84 Art. 401. “A prova exclusivamente testemunhal só se admite nos contratos cujo valor não exceda
o décuplo do maior salário mínimo vigente no país, ao tempo em que foram celebrados”.
50 Fábio Aguiar Munhoz Soares
85 CPP, art. 155, parágrafo único. “Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas
as restrições estabelecidas na lei civil’’.
86 Trata-se de terminologia amplamente aceita em nossa doutrina e preconizada por GRINOVER,
Ada Pellegrini {In: Liberdades Públicas e Processo Penai. As interceptações telefônicas. São
Paulo: Saraiva, 1976. p. 126), adotando os ensinamentos de NUVOLONE, P. Le prove vietate net
processo penate nei paesi di diritto latino. Riv. dir. proc. Padova, v. XXI, p. 442475,1966.
Prova Ilícita no Processo 51
87 AVOLIO, Luiz Francisco Torquato (Provas... Op. cit., p. 43), cita: “(...) A importância dessa
corrente doutrinária se verifica, outrossim, pelo fato de que a utilização da expressão “veda
das” já índica a sua opção pela inadmissibilidade, no processo, das provas obtidas por meios
ilícitos. Coincide, assim, perfeitamente, com o enunciado da garantia inserida pelo constituinte
brasileiro, no art. 5o, LVI: “São inadmissiveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos".
88 NUCCI, Guilherme de Souza. (Código de Processo Penal Comentado. 3. ed. São Paulo: RT,
2004. p. 328), discorda da conceituação adotada, escrevendo: “(...) Permitimo-nos discordar,
invertendo o conceito apresentado, porque, segundo cremos, equivocado. O gênero é a ilicitu-
de - assim em Direito Penal, quanto nas demais disciplinas, inclusive porque foi o termo utili
zado na Constituição Federal - significando o que é contrário ao ordenamento jurídico, contrá
rio ao Direito de um modo geral, que envolve tanto o ilegal, quanto o ilegítimo, isto é, tanto a
infringência às normas legalmente produzidas, de direito material e processual, quanto aos
princípios gerais de direito, aos bons costumes e à moral. (...) Em conclusão: conforme cre
mos, o ilícito envolve o ilegalmente colhido (captação da prova ofendendo o direito material,
v.g., a escuta telefônica não autorizada) e o ilegitimamente produzido (fornecimento indevido
de prova no processo, v.g., a prova da morte da vítima através de simples confissão do réu).
Se houver a inversão dos conceitos, aceitando-se que a ilicitude é espécie de ilegalidade, en
tão a Constituição estaria vedando somente a prova produzida com infringência à norma de
natureza material e liberando, por força da natural exclusão, as provas ilegítimas, proibidas por
normas processuais, o que se nos afigura incompatível com o espírito desenvolvido em todo o
capitulo dos direitos e garantias individuais".
89 CORDERO, Franco (Prove illecite nel processo penale. Rivista Italiana Diritto e Procedura
Penale. Milano, nuova serie, a. IV, p. 32-55,1961), assinala: “(...) a confissão e o depoimento
arrancados à força são processualmente irrelevantes (...) e não porque representem o resulta
do de uma conduta ilícita: a verdade é que eles não se adaptam ao respectivo modelo; está
52 Fábio Aguiar Munhoz Soares
"... não devem ser aceitos os extremos: nem a negativa peremptória de emprestar-se validade
e eficácia à prova obtida sem o conhecimento do protagonista da gravação sub-reptícia, nem a
admissão pura e simples de qualquer gravação fonográfica ou televisiva. A propositura da
doutrina quanto à tese intermediária é a que mais se coaduna com o que se denomina moder-
namente de princípio da proporcionalidade, devendo prevalecer, destarte, sobre as radicais...”
(NERY JR., Nelson. Proibição da Prova Ilícita - novas tendências do Direito (CF, art. 5°, LVI).
In: MORAES, Alexandre (Org.). Os 10 anos da Constituição Federal. São Paulo: Atlas, 1999.
p. 233-247).
58 Fábio Aguiar Munhoz Soares
P a r a t a l te o r ia in te r m e d iá r ia , p ro p o m o s u m a n o v a d e n o m in a ç ã o : a do
in teresse p re p o n d e ra n te . E m d e te rm in a d a s s itu a ç õ e s , a s o c ie d a d e , r e
p re s e n ta d a p e lo E s ta d o , é p o s ta d ia n te d e d o is interesses re le v a n te s
a n ta g ô n ic o s e q u e a e la c a b e tu te la r, a d e fe s a d e um p r in c ip io c o n s ti
tu c io n a l e a n e c e s s id a d e de p e r s e g u ir e p u n ir o c rim in o s o . A s o lu ç ã o
d eve c o n s u lta r o in te re s s e q u e p r e p o n d e r a r e q u e , c o m o ta l, d e v e s e r
p re s e rv a d o m .
109 GRECO FILHO, Vicente (Tutela Constitucional das Liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989.
p. 112-113, assevera): “ (...) Haverá situações em que a importância do bem jurídico envol
vido no processo e a ser alcançado com a obtenção irregular da prova ievará os tribunais a
aceitá-la. Lembre-se, por exemplo, uma prova obtida por meio ilícito mas que levaria à ab
solvição de um inocente. Tal prova teria de ser considerada porque a condenação de um
inocente é a mais abominável das violências e não pode ser admitida ainda que se sacrifi
que algum outro de preceito legai. A norma constitucional de inadmissibilidade de provas
obtidas por meio ilícito vale, portanto, como regra, mas certamente comportará exceções
ditadas peia incidência de outros princípios, também constitucionais, mais relevantes (...)".
No mesmo sentido: GRINOVER, Ada Pelegrlni. A eficácia dos atos processuais à luz da
Constituição Federal. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. São Pau
lo, n. 37, p. 46:"... À primeira vista, a Constituição brasileira parece impedir essa solução,
quando não abre nenhuma exceção expressa ao princípio da proporcionalidade. Mas não
me parece que o caminho deva inevitavelmente ser esse, até porque existe, sem dúvida
nenhuma, um caso pacificamente reconhecido como de aplicação do princípio da propor
cionalidade e que induz a admitir, no processo penal, a prova obtida ilicitamente, quando se
trate de prova da inocência do acusado. Diz-se então que, se a prova foi obtida ilicitamente,
mas serviu para comprovar a inocência do acusado, o valor liberdade avulta perante os de
mais valores e a prova pode ser admitida...”.
110 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Yves Gandra da S. (Comentários à Constituição do
Brasil. São Paulo: Saraiva, 1989. v. 2, p. 276-276), traçam regras de admissibilidade da prova
ilícita: “(...) A primeira delas é a de que a prova a ser feita valer seja indispensável na defesa
de um direito constitucional mais encarecido e valorizado pela Lei Maior do que aquele cuja viola
ção se deu. Em segundo lugar é necessário que a produção desta prova se faça na defesa do
réu e não a favor do Estado, entendido este como autor da ação penai. E finalmente a prova
deve ser acolhida quando aquele que a exibe não teve nenhuma participação, quer direta ou
indireta, no evento inconstitucional que a ensejou)...)”.
Prova Ilícita no Processo 61
111 ARRUDA ALVIM, José Manuel de. Manual... Op. cit, p. 382.
62 Fábio Aguiar Munhoz Soares
112 FERNANDES, Antonio Scarance. Processo Penal Constitucional. 3. ed. São Paulo: RT,
2002. p. 86-87.
113 Idem., p. 88.
114 MOREIRA, José Carlos Barbosa. A Constituição e as provas ilicitamente obtidas. Revista do
Ministério Público. PGJ/RJ, n. 4, p. 105,1996.
Prova Ilícita no Processo 63
115 CARVALHO, Márcia Haydée Porto de. Hermenêutica Constitucional. Florianópolis: Obra
Jurídica, 1997. p. 104.
116 CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional. 5. ed. Coimbra: Almedína, 1992.
p. 232.
117 LAVIE, Quiroga. Derecho Constitucional. Buenos Aires: Depalma, 1993. p. 123.
64 Fábio Aguiar Munhoz Soares
118 “Réu condenado por formação de quadrilha armada não tem como invocar direitos fundamen
tais próprios do homem livre para trancar ação penal (corrupção ativa) ou destruir gravação
feita peia polícia. 0 inc. LVI do art. 5o da Constituição, que fala que “são inadmissíveis as pro
vas obtidas por meio ilícito”, não tem conotação absoluta. Há sempre um substrato ético a ori
entar o exegeta na busca de valores maiores na construção da sociedade. A própria Constitui
ção Federal Brasileira, que é dirigente e programática, oferece ao juiz através da “atualização
constitucional” (Verfassungsaktualisierung) base para o entendimento de que a cláusula
constitucional invocada é relativa. A jurisprudência norte americana, mencionada em prece
dente do Supremo Tribunal Federal, não é tranquila. Sempre é invocável o princípio da razoabili-
dade (Reasonableness). 0 princípio da exclusão das provas ilicitamente obtidas (Exclusionary
Rule) também tá pede temperamentos" (RT 755/580 - RHC 7216/SP - 1a Turma - Rei. Min.
Edson Vidigal - j. em 28.04.1998, com remissão ao REsp. 9012/RJ, DJU, de 14.04.1997,
daquele mesmo Sodaiício).
119 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 119.
120 Idem.p. 119.
Prova Ilícita no Processo 65
124 Entendemos em verdade, quando da ocorrência da persecução penal, não haver agressão
injusta por parte do Estado a caracterizar situação de legitima defesa, pois a persecução penal
é ato de soberania do Estado, não se vendo por onde possa ser qualificada como justa ou
injusta.
125 Em caso parecido: com a seguinte ementa: Constitucional. Penal, Gravação de conversa
feita por um dos interlocutores: licitude. Prequestionamento. Súmula 282-STF. Prova:
reexame em recurso extraordinário: impossibilidade. Súmula 279-STF. / - A gravação de
conversa entre dois interlocutores, feita por um deles, sem conhecimento do outro, com a fina
lidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada tem de ilícita, principalmente
quando constitui exercício de defesa. II - Existência, nos autos, de provas outras não obtidas
mediante gravação de conversa ou quebra de sigilo bancário. III - A questão relativa às provas
ilícitas por derivação “the fruits o f the poisonous free” não foi objeto de debate e decisão,
assim não prequestionada. Incidência da Súmula 282-STF. I V - A apreciação do RE, no caso,
não prescindiria do reexame do conjunto fático-probatório, o que não é possível em recurso
extraordinário. Súmula 279-STF. V - Agravo não provido. (AI-AgR 503617/PR - j em
01.02.2005 - 2a Turma - STF - DJ 04.03.2005, p. 30)
Prova Ilícita no Processo 67
126 ÁVILA, Thiago André Pierobom de (Provas... Op. cit, p. 249), aduz que o ponto de partida
para o conceito de crime grave deve emanar da própria Constituição: crimes hediondos, tráfico
de entorpecentes, tortura, terrorismo, racismo e ação de grupos armados, sem se olvidar da
criminalidade organizada e a que atinge a coletividade, sendo em tal ponto os pressupostos de
admissibilidade da prova ilícita do referido autor muito parecidos com o que vimos sustentando
no presente trabalho.
127 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes... Op. cit., p. 141.
68 Fábio Aguiar Munhoz Soares
129 Sem dúvida que os doutrinadores de outrora que advogavam a tese da inadmissibilidade da
prova ilícita e que continuam influenciando parte da doutrina e da jurisprudência brasileiras
desconheciam, v.g., o fato de o Brasil ser conhecido no exterior por como pais envolvido em
recolhimento de fundos do grupo terrorista Hamas, bem como do Hizbollah, na região da
Tríplice Fronteira (Brasil, Paraguai e Argentina). Vide a respeito notícia publicada no Jornal
Folha de S. Paulo, A12, 01.05.2007, com o título: Terror aumentou em 2006, dizem os
EUA. Ataques se concentraram no Iraque e no Afeganistão; relatório volta a mencionar Trípli
ce Fronteira.
130 Chamam-se interpretativistas os que, embora admitam que o aplicador da Constituição - tal
como o aplicador de qualquer norma jurídica - não deva prender-se à literalidade do texto,
mesmo assim consideram incompatível com o princípio democrático qualquer criatividade judi
cial em sentido forte, isto é, qualquer forma de interpretação dos enunciados normativos que
ultrapasse o âmbito do seu significado linguisticamente possível, porque isso implicaria atribuir
aos juízes uma legitimidade que é privativa dos titulares de mandatos políticos. A esse respei
to, confira-se: COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional. 2. ed. Porto Alegre:
Sérgio Antonio Fabris, 2003. p. 81.
131 É o que fazem os chamados não interpretativistas, para os quais - em nome do sentido mate
rial da Constituição - é legítima a invocação de outros valores para atribuir à magistratura uma
competência interpretativa em sentido forte, tendo em conta a historicidade e a estrutura do
texto constitucional - essencialmente conformado por princípios jurídicos abertos e indetermi
nados, devendo em tal sentido conferir-se liberdade ao intérprete para concretizá-los, renun
ciando-se, caso tal não ocorra, à pretensão de vivenciar a Constituição. A esse respeito, confi
ra-se: COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação... Op. cít., p. 83.
70 Fábio Aguiar Munhoz Soares
132 GOMES FILHO, Antonio Magalhães (Direito à Prova no Processo Penal. São Paulo: RT,
1997. p. 106), é um dos principais doutrinadores pátrios que entende não poder a prova ilicita
ser admitida no processo, salvo quando pro reo: “...no confronto entre uma proibição de prova,
ainda que ditada pelo interesse de proteção a um direito fundamental, e o direito à prova da
inocência parece claro que deva este úitimo prevalecer, não só porque a liberdade e a digni
dade da pessoa humana constituem valores insuperáveis, na ótica da sociedade democrática,
mas também porque ao próprio Estado não pode interessar a punição do inocente, o que po
deria significar a impunidade do verdadeiro culpado...’’. Prossegue o autor: “...não há incongruên
cia entre a rejeição do critério da proporcionalidade para a prova ilícita pro societate e essas
últimas afirmações, uma vez que a estatura dos valores confrontados com o direito à prova - o
interesse na punição dos delitos ou a tutela da inocência - é diversa...”.
133 O princípio da dignidade da pessoa humana pode sim, ceder lugar a outros princípios. A esse
respeito, confira-se: ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro
de Estúdios Constitucionales, 1993. p. 105-109.
134 Para nós, a norma do art. 5o, LVI, da CF/88, é, sim, princípio constitucional e não, regra, e por
isso admite ser relevada em certos casos. Neste sentido, confira-se ÁVILA, Thiago André Pie-
robom de. Provas... Op. cif, p. 3.
135 A esse respeito, confira-se COELHO, Inocêncio Mártires (Interpretação ... Op. cit., p. 100) que
cita decisão paragmática do STF sobre o modo como se desenvolve o jogo da aplicação dos
princípios jurídicos. Em tal decisão pelo autor mencionada (ADIn 319/DF - Rei. Min. Moreira
Alves), deixou assentado o STF que, em face da Constituição, para conciliar o fundamento da
livre-iniciativa e o princípio da livre concorrência com os princípios da defesa do consumidor e
da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social -
valores que se mostrariam inconciliáveis, se tomados em sentido absoluto - pode o Estado,
por via legislativa, regular a política de preços de bens e de serviços, abusivo que é o poder
econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros. Prossegue o autor dizendo que, em tal
decisão, nada mais fez o STF do que ponderar e relativizar o peso dos princípios concorrentes
e, diante das circunstâncias do caso, legitimar a intervenção legislativa do Estado em determi
nado setor da atividade econômica, sem que se tenha invalidado qualquer dos standards nor
mativos em conflito.
136 Idem, p. 100.
Prova Ilícita no Processo 71
137 COELHO, Inocêncio Mártires (Interpretação ... Op. cit., p. 102), citando Alexy, anota que é
precisamente nesta característica que reside o traço fundamental entre princípios jurídicos e
regras de direito: “O ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios reside em que os
princípios são normas ordenadoras de que algo se realize na maior medida possível, dentro
das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandatos de otimi
zação, caracterizados pelo fato de poderem ser cumpridos em diferentes graus, e a medida do
seu cumprimento^ não depende apenas das possibilidades reais, mas também das possibilida
des jurídicas. O âmbito dessas possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras
opostos. As regras, ao contrário, só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, en
tão há de se fazer exatamente o que ela exige, nem mais nem menos. Por conseguinte, as re
gras contêm determinações no âmbito do que é fática e juridicamente possível. Isto significa
que a diferença entre regras e princípios é qualitativa e não de grau. Toda norma ou é uma re
gra, ou é um princípio". (ALEXY, Robert. Teoria ... Op. cit., p. 163)
138 De forma coerente com o que aqui s_e defende, ÁVILA, Tiago André Pierobom de. (In: Pro
vas... Op. cit., p. 108), propõe a redação do seguinte enunciado sobre provas ilícitas, inspirada
em exemplo de Alexy: “Está proibida a admissão no processo de provas obtidas por meios ilí
citos, desde que estas não sejam necessárias para o cumprimento daqueles princípios opos
tos de nível constitucional (que podem referir-se a direitos fundamentais de terceiros ou a bens
coletivos) e que, devido às circunstâncias do caso, têm precedência frente ao principio da
inadmissibilidade".
5
INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL E
COLISÃO ENTRE PRINCÍPIOS
144 Em tal sentido, observe-se que o direito à vida, que poderia ser tido como direito absoluto,
para o legislador constituinte não o é, o que pode ser aferido pela previsão de pena de morte
em caso de guerra declarada (CF, art. 5o, XLVII, “a”), não se vendo ainda no texto constitucio
nal preocupação acentuada do legislador em relação aos crimes contra a vida, se comparados
tais com os crimes de racismo, de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitu
cional e o Estado Democrático, imprescritíveis que são (CF, art. 5o, XLII e XLIV) e, portanto,
em tese mais graves, o que não deixa de ser algo estranho, mas revelador de alguma forma
da escala de valores contida no texto constitucional e que pelo intérprete não pode ser des
considerada quando da ponderação de bens a ser feita na aplicação da regra da proporciona
lidade.
6
145 0 Ministro Celso de Mello em pronunciamento judicial deixou claro sua posição:"... vedar que
se possa trazer ao processo a própria ‘degravação’ das conversas telefônicas, mas admitir que
as informações neta colhidas possam ser aproveitadas pela autoridade, que agiu ilicitamente,
para chegar a outras provas, que, sem tais informações, não colheria, evidentemente, é esti
mular e, não reprimir a atividade ilícita da escuta e da gravação clandestina de conversas pri
vadas...’’ (Ação Penal 307-3/DF - Serviço de Jurisprudência do STF - Ementário 1.804-11
- Rei. Min. Celso de Mello).
146 RAMOS, João Gualberto Garcez. Direito... Op. cit., p. 123.
78 Fábio Aguiar Munhoz Soares
de uma certa maneira não se limita a dizer que ela não pode ser utili
zada em juízo, mas também reza que ela não pode ter efeito algum147.
Em razão de o precedente inicial estadunidense ser contrário
à admissão das provas ilícitas por derivação, por muito tempo e ainda
hoje são encontrados julgados em que prepondera o entendimento
pelo qual não deve mesmo e de nenhuma forma, tal espécie de prova
ser admitida no processo148.
147 Caso Silverthone Lumber Co. v. United States, 251 US 385 (1920).
148 Processo penal. Apelação. Estelionato. Art. 171, § 3o, CP. Alteração dos fundamentos da
absolvição. Ausência de interesse de recorrer. Não conhecimento. Prova ilícita. Inexis
tência de outros elementos suficientes para formar juízo de certeza. Absolvição manti
da. / - Não há interesse de recorrer para que se aitere a fundamentação legal da sentença
absolutória, feita com base no art. 386, VI do CPP, para fazer incidir o inciso III do art. 386 do
mesmo Diploma Legal. II - Sentença absolutória que conclui pela inexistência da tipicidade
penal não impede a ação civil reparatória. Pretensão que só seria viável diante da negativa de
autoria ou declaração de inexistência do fato, nos termos dos artigos 66 e 67, III do CPP e
art. 935 do Código Civil de 2002. III - Documentos arrecadados irregularmente por Comissão
Parlamentar de Inquérito e considerados provas ilícitas pelo STF, devem ser excluídos dos
autos, a fim de não surtir qualquer influência sobre o julgamento do mérito. I V - As provas co
lhidas em inquérito policial instaurado unicamente em função de prova ilícita e que fundamen
tam a denúncia, devem ser desconsideradas pelo julgador, pois o nexo de desdobramento en
tre a prova ilícita e a exordial acusatória caracteriza as mesmas como provas ilícitas por deri
vação. Há, portanto, vício de origem. V - Recurso do acusado não conhecido e recurso do
MPF conhecido, mas improvido, devendo a sentença absolutória ser mantida na sua totalida
de. (Apelação Criminal 4387/RJ (1991.51.01.040400-0) - 1a Turma Especial do TRF da
2a Região - Rei. Abel Gomes - j. em 15.08.2007, unânime, DJU 24.09.2007).
Tráfico de entorpecentes. Apreensão de três buchas de maconha na cadeia pública. Vi
olação ao sigilo de correspondência. Prova ilícita. Contaminação das demais provas.
Princípio denominado “fruits ofthe poisonous tree”. Aplicabilidade. Precedentes do STF.
Recurso ministerial desprovido. (Apelação Criminal 1.0329.06.997619-2/001(1) - 3a Câmara
Criminal do TJMG - Rei. Sérgio Resende - j. em 13.02.2007, unânime, Publ. 28.04.2007).
Crime de moeda falsa. Cédula apreendida em virtude do cumprimento de mandado de
busca e apreensão. Ausência de fundamentação da decisão que a deferiu. Ilicitude da
prova assim obtida. Contaminação das demais provas dela decorrentes. Aplicação da
doutrina dos frutos de árvore venenosa. 1. A decisão que determina a expedição do man
dado de busca e apreensão deve ser devidamente fundamentada, sob pena de nulidade do
ato judicial e de ilicitude da prova obtida (Carta Magna, arts. 5o, LVT, e 93, IX), porquanto o Có
digo de Processo Penal é expresso ao prever a necessidade da existência de fundadas razões
a autorizá-la (art. 240, § 1o). Precedentes do STF. 2. Não tendo sido fundamentada a decisão
que determinou a expedição do mandado de busca (que visava a obter prova relativa ao tráfico
ilicito de entorpecentes), é nulo o ato judicial respectivo e ilícita a apreensão de uma cédula
falsa de US$ 100.00 (cem dólares americanos) encontrada, conforme relataram as testemu
nhas, na carteira pessoal do acusado, durante a busca realizada em sua residência (Carta
Magna, arts. 5o, LVI; e 93, IX). 3. Sendo ilícita a apreensão da cédula falsa de US$ 100.00
(cem dólares americanos), todas as demais provas decorrentes de sua inconstitucional apreen
são são contaminadas pela ilicitude (a confissão do acusado, o laudo de exame em papel mo
eda e os depoimentos das testemunhas), uma vez que em nosso sistema jurídico é aplicável a
Prova Ilícita no Processo 79
doutrina dos frutos de árvore venenosa (“fruits of the poisonous tree doctrine” - CPP,
art. 573, § 1o), conforme tem reiteradamente decidido o Supremo Tribunal Federai, o que im
põe sejam eias consideradas como não existentes nos autos, pois são inadmissíveis no pro
cesso as provas obtidas por meio ilícito (Carta Magna, art. 5o, LVI). 4. Estando todas as provas
existentes nos autos, contaminadas pelo vício inicial da apreensão ilícita da cédula falsa em
questão, e não havendo neles “prova autônoma e não decorrente de prova ilícita“, impõe-se a
absolvição do acusado por ausência de prova suficiente para a condenação (CPP, art. 386,
VI). 5. Apelação provida. (Apelação Criminal 01000371486/MG - 3a Turma Suplementar do
TRF da 1a Região - Rei. Convocado Juiz Fed. Leão Aparecido Alves - j. em 17.06.2004,
unânime, DJU 29.07.2004).
Eleições municipais de 2004. Recurso eleitoral. Ação de impugnação de mandato eleti
vo. Questões preliminares. Cerceamento de defesa. Contradita de testemunhas. Rejei
ção. Prova ilicita. Filmagem sub-reptícia. Violação à garantia constitucional da inviolabi
lidade domiciliar. Ausência de idoneidade para formar o convencimento deste órgão jul
gador. Provas ilícitas por derivação. Aplicação da teoria dos frutos da árvore venenosa.
Mérito. Abuso do poder econômico. Corrupção eleitoral. Captação ilícita de sufrágio.
Ausência de provas robustas e incontroversas. Ônus probatório dos ímpugnantes. Não
demonstrada a ilicitude. Recurso provido. Sentença reformada. O juiz eleitoral detém o
poder-dever de realizar ampla diiação probatória, devendo, ao final, por força do princípio da
livre apreciação das provas (art. 23 da LC 64/90), aferir todo o conjunto probatório, identifican
do, inclusive, as circunstâncias de eventual ilicitude dos meios de obtenção da prova. A grava
ção contida no vídeo de fl. 932 configura prova ilícita, pois obtida sorrateiramente, sem o con
sentimento do morador e desprovida da necessária autorização judicial. Nenhuma das hipóte
ses constitucionais que legitimariam a medida restou configurada, o que torna inviável sua
admissão em juízo, pois obtida com violação à garantia constitucional da inviolabilidade domi
ciliar. Por conseguinte, as imagens dela decorrentes são imprestáveis para a imposição de um
decreto condenatório. As demais provas decorrentes da gravação sub-reptícia também serão
excluídas do acervo probatório, por aplicação da doutrina dos frutos da árvore venenosa, se
gundo o qual a prova ilícita originária contamina as demais provas dela decorrentes. Recurso
conhecido e provido. Sentença reformada. (Recurso Ação Impugnação Mandato Eletivo
11052 - TRE/CE - Rei. Celso Albuquerque Macedo - j. em 21.06.2006, unânime, DJ
05.07.2006).
49 Vide nota 34, no item 2.3 da presente obra.
80 Fábio Aguiar Munhoz Soares
160 DINAMARCO, Cândido Rangel (In: Instituições de Direito Processual Civil III. São Paulo:
Malheiros, 2003. p. 51, § 783), ao comentar a teoria dos frutos da árvore envenenada, deixou
assente que a extremada radicalização de tal teoria compromete de morte o acesso à justiça e
constitui grave ressalva à promessa constitucional de tutela jurisdicional a quem tiver razão.
7
161 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 35.
84 Fábio Aguiar Munhoz Soares
162 Prova. Fitas gravadas. Conversa por telefone. Sigilo não quebrado. Aplicação do art. 383
do Código de Processo Civil de 1973. Agravo desprovido, £ eficaz a prova fonogràfica em
desquite, revelando conversa telefônicas da mulher com terceiros, que positivariam a prática
do adultério, reafirmando outras provas produzidas ou a produzimos autos (Al 91 - 3a C. Civ
do TJ - Rio de Janeiro - j. em 07.08.1975. - Agte.: M.H.M.C.R. - Agdo.: F.M.C.R. - Rei. Des.
Goulart Pires - Pres. Paulo Alonso. RT 488/205).
Prova. Transcrição de gravação de fita magnética. Possibilidade. Agravo provido. As re
produções fotográficas, cinematográficas, fonográficas ou de outra espécie valem com prova
se aquele contra quem foram apresentadas admitir-lhes a conformidade. Se for impugnada a
autenticidade da reprodução mecânica, o juiz ordenará a realização de exame pericial (Al
59.992-1 - 6a C. Civ. do TJSP - j. em 18.04.1985 - Pres. e Rei. Des. Camargo Sampaio -
Agtes: Giusepe Gíerse e sua m ulher-Agda: Cecília Back. RT 599/66).
163 Constitucional. Penal. Prova Ilícita. Degravação de Escutas Telefônicas. CF art. 5°, XII.
Lei 4.117/62, art. 57, II, “e”. Habeas Corpus. Exame da Prova. O sigilo das comunicações
poderá ser quebrado, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para
fins de investigação criminal ou instrução processual (CF, art. 5°, XII). Inexistência da lei que
tornará viável a quebra do sigilo, dado que o inciso X II do art. 5°. não recepcionou o art. 57, II,
“e ”, da Lei 4.117/62, a dizer que não constitui violação de telecomunicação o conhecimento
dado ao juiz competente, mediante requisição ou intimação deste. É que a Constituição, no in
ciso X II do art. 5°, subordina a ressalva a uma ordem judicial, nas hipóteses e na forma esta
belecida em lei (HC 69.912-0/RS).
Prova Ilícita no Processo 85
164 Habeas corpus preventivo. Interceptação telefônica e de dados. Decisão judicial que
defere tal medida sem qualquer motivação, em flagrante violação ao disposto na Lei 9.296/96,
que regula a matéria. Decisão manifestamente nula. Determinação judicial, emanada através
de ofício, dirigida à diretoria jurídica de operadora de telefonia, de forma genérica, indetermi
nada quanto aos atingidos e por prazo que exorbita o iimite legal. Constrangimento ilegal evi
dente. interesse processual da paciente em obter a ordem, para evitar eventual e futura res
ponsabilização por crime de desobediência. Ordem concedida, com extensão aos demais des
tinatários da mesma decisão de interceptação (TJPR - 2a Câmara - HC 468.681-3 - Rei. Lílian
Romero - j. em 14.02.2008 - DOE 29.02.2008).
165 Considera ilícita ainda a prova quando admitida por juízo incompetente, o que se verifica no
seguinte aresto: Crimes militares. Interceptação telefônica decretada pela Justiça Comum
Estadual. Incompetência. Nulidade da prova colhida. "Somente o juiz natural da causa, a
teor do disposto no art. 1o, Lei 9.296/96, pode, sob segredo de justiça, decretar a interceptação
86 Fábio Aguiar Munhoz Soares
de comunicações telefônicas. Na hipótese, a diligência foi deferida pela Justiça Comum Esta
dual, durante a realização do inquérito policial militar, que apurava a prática de crime propria
mente militar (subtração de armas e munições da corporação, conservadas em estabeleci
mento militar). Deve-se, portanto, em razão da incompetência do juízo, declarar a nulidade da
prova ilicitamente obtida. Ordem concedida". (STJ - HC 49.179/RS - 5a T. - Rela. Mina. Laurita
V a z - j. em 05.09.2006, v.u., publ. 30.10.2006)
166 Em tais termos, numa interpretação literal quanto à inadmissibilidade da prova: Prova. Inter-
ceptação telefônica. Juntada de fita magnética em que gravada pela parte conversa tele
fônica mantida com a outra parte, porém sem conhecimento desta - Inadmissibilidade -
Prova obtida por meio ilícito. Consentimento da gravação que afastaria a violação ao di
reito constitucional de sigilo das comunicações telefônicas. Lei 9.296/96. Recurso des
provido. (Agravo de Instrumento 200.671.4/4 - 5a Câmara de Direito Privado do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo - Rei. Rodrigues de Carvalho)
167 Interceptação telefônica e gravação de negociações entabuladas entre os sequestradores, de
um lado, e policiais e parentes da vítima, de outro, com o conhecimento dos últimos, recipien-
dários das ligações. Licitude desse meio de prova. Precedentes do STF (HC 74.678 - 1a Tur
ma, 10.06.1997).
Processo penal. Prova obtida mediante gravação feita em fita magnética. Intimação da
defesa para audiência de oitiva de testemunha a gravação foi feita por um dos interlocu
tores. Tal circunstância exclui a ilicitude do meio de obtenção da prova. O Supremo Tribunal
Federal, nesta esteira, tem entendido que não há qualquer violação constitucional ao direito de
privacidade quando “a gravação de conversa telefônica for feita por um dos interlocutores ou
com sua autorização e sem o conhecimento do outro, quando há investida criminosa deste úl
timo" (HC 75.338/RJ - Rei. Min. Nelson Jobim - DJU 25.09.1998).
168 Processual Penal. Recurso ordinário em habeas corpus. Art. 332, do Código Penal.
Poder investigatório do Ministério Público. Gravação de conversa por um dos interlocu
tores (gravação clandestina). Não configura prova ilícita. / - Na esteira de precedentes
desta Corte, malgrado seja defeso ao Ministério Público presidir o inquérito policial propria
mente dito, não lhe é vedado, como titular da ação penal, proceder investigações. A ordem ju
rídica, aliás, confere explicitamente poderes de investigação ao Ministério Público - art. 129,
incs. VI, VIII, da Constituição Federal, art. 8°, incs. li e IV, e § 2°, e art. 26 da Lei 8.625/1993
(precedentes). II - Por outro lado, o inquérito policial, por ser peça meramente informativa, não
é pressuposto necessário à propositura da ação penal, podendo essa ser embasada em outros
elementos hábeis a formar a opinio delicti de seu titular. Se até o particular pode juntar peças,
obter declarações, etc., é evidente que o Parquet também pode. Além do mais, até mesmo
uma investigação administrativa pode, eventualmente, supedanear uma denúncia. III - A gra-
Prova Ilícita no Processo 87
vagão de conversa realizada por um dos interlocutores é considerada prova lícita, e difere da
interceptação telefônica, esta sim, medida que imprescinde de autorização judicial (preceden
tes do STF e do STJ). Recurso desprovido. (Recurso Ordinário em Habeas Corpus
19.136/MG (2006/0037989-1) - 5a Turma do STJ - Rei. Felix Fischer - j. em 20.03.2007,
unânime, DJ 14.05.2007).
A gravação de conversa telefônica própria, feita por um dos interlocutores, sem o co
nhecimento do outro, não se enquadra no conceito de interceptação, constituindo-se
em prova lícita, mesmo sem autorização judicial, por não ferir o princípio constitucional.
(Apelação 2.363 (18.533) - TJMMG - Rei. Jair Cançado Coutinho - j. em 14.06.2005 -
unânime, Publ. 28.06.2005)
Habeas corpus. Pedido de trancamento de persecução penal. Alegação de que as apu
rações têm por objeto prova ilícita não comporta acolhimento. Hipótese de gravação de
conversa telefônica por parte de um dos interlocutores. Não caracterização de indevida
interceptação telefônica não autorizada. Ordem denegada (Habeas Corpus 65 (154226) -
TRE/SP, São José dos Campos - Rei. Waldir Sebastião de Nuevo Campos Júnior - j. em
27.10.2005, unânime, DOE 08.11.2005).
169 ÁVILA, Thiago André Pierobom de. Provas... Op. cit., p. 234, cita precedente do STF não
condizente com os princípios que norteiam o processo penal e que revela uma hipertrofia da
garantia da inadmissibilidade. Trata-se de caso, diz o autor, em que o STF não admitiu prova
ilícita produzida por particular, trancando assim inquérito policial, que tinha por sustentação
apenas a interceptação telefônica realizada sem autorização judicial. De fato, se se tratava de
gravação realizada pelo próprio interlocutor, em verdade não havia qualquer ilicitude. Mas se
se tratava de gravação realizada por terceiro e com efeito não teria tal prova o condão de
contaminar todas as demais provas a serem colhidas por força da investigação que se iniciava
para apuração de crime praticado por conselheiro de Tribunal de Contas, que cobrava propina
para realização de contrato público.
170 Habeas Corpus 74.678-1/SP - Rei. Min. Moreira Alves - 1a T., v.u., DJ 15.07.1997.
Prova. Conversa telefônica. Gravação de fita magnética. Recorrente figurando como
interlocutora. Admissibilidade. Meio lícito. Recurso provido. Inexistente a pretendida clan
destinidade que não vai ocorrer pela simples circunstância de a pessoa que se encontra do
outro lado da linha desconhecer a gravação, e inexistente também escuta obtida ilicitamente,
não há cuidar de prova vedada. (Rei. Fonseca Tavares - Agravo de Instrumento 187.942-
1/SP - 03.02.1993)
88 Fábio Aguiar Munhoz Soares
feita pelo destinatário das assertivas iníquas sem que o outro saiba,
não tem aparência de ilicitude.
Destarte, para fins de aproveitamento de tal espécie de prova
nos processos, não é necessária a aplicação do princípio da proporcio
nalidade, já que, sendo lícita a prova, não se vislumbra haja contrapo
sição de tal prova a qualquer outro direito material, mormente no que
toca àqueles de índole constitucional.
A conclusão exposta reforça-se quando estão em jogo ocupan
tes de cargos públicos no exercício destes, que invocam o direito à
intimidade como escudo para práticas criminosas171, pleiteando ainda
indenização por danos morais, dada a exposição ocorrida na mídia172.
Diferente situação ocorre, entretanto, quando há veiculação
pela mídia de fatos ligados a pessoas públicas sabidamente falsos ou
com grosseiro desconhecimento da verdade pelo órgão de imprensa, já
que em tais situações vislumbra-se haver afronta ao direito à intimida
de da pessoa atingida, ainda que se alegue direito também constitucio
nal de informação pelo órgão de mídia173.
171 Com efeito, o TJSP já admitiu eficácia de gravação ambientai como prova de improbidade
em ação de cassação de mandato de vereador, que exigia dinheiro para alteração de de
terminada lei municipal (Apelação 195.674-5/2 - j. em 18.12.2002 - Des. Paulo Travain. RT
815/242).
172 Lei de Imprensa. Dano moral. Divulgação de gravação em fita de vídeo em programa jorna
lístico televisivo contendo imputação de prática de ilícito pelo apelante, inocorrência de detur
pação, adulteração ou sensacionalismo exacerbado a implicar em divulgação de fato inexato,
falso ou em contexto inverídico. Histórico, ainda, de acusações mútuas de corrupção a envol
ver membros de Câmara Municipal que deixa claro o porquê da divulgação da gravação. Dano
moral passível de reparação não configurado, inclusive por não ser ilícita a gravação efetuada
por iniciativa de um dos interlocutores visando a defender-se de investida, em tese, ilícita (civil
e criminalmente) e que se realizou em local não privado a envolver pessoas ocupantes de car
gos públicos no exercício destes mesmos cargos. Ação improcedente. Recurso de apelação
provido para afastamento da decadência. Ação, contudo, improcedente (Apelação
226.997.4/1-00 - TJSP - Rei. Randolfo Ferraz de Campos).
173 São as palavras de BARROSO, Luís Roberto (In: Colisão entre liberdade de expressão e
direitos da personalidade. Critérios de Ponderação. Interpretação Constitucional Adequada do
Código Civil e da Lei de Imprensa. Revista de Direito Privado, n. 18, p. 132): "... O conheci
mento acerca do fato que se pretende divulgar tem de ter sido obtido por meios admitidos pelo
direito. A Constituição, da mesma forma que veda a utilização, em juízo, de provas obtidas por
meios ilícitos, também interdita a divulgação de notícias às quais se teve acesso mediante co
nhecimento de um crime. Se a fonte da notícia fez, e.g., uma interceptação telefônica clandes
tina, invadiu domicílio, violou o segredo de justiça de um processo de família ou obteve uma
informação mediante tortura ou grave^ameaça, sua divulgação não será legítima. Note-se ain
da que a circunstância de a informação estar disponível em arquivos públicos ou poder ser ob
tida por meios regulares e lícitos torna-a a pública e, portanto, presume-se que a divulgação
Prova Ilícita no Processo
desse tipo de informação não afeta a intimidade, a vida privada, a honra ou a imagem dos en
volvidos...".
174 Lei de imprensa. Tutela inibitória ou interditai pleiteada por candidato a deputado federal,
com o propósito de extrair do site de revista eletrônica, trechos de conversas telefônicas
interceptadas pela polícia, com autorização judicial, nas quais seu nome é mencionado
como sendo o preferido dos membros do PCC, conhecida facção criminosa - Inadmissibili
dade, sob pena de constituir censura ao direito de informação - Interpretação dos arts. 461,
do CPC e 220, caput e § 1o, da CF - Provimento (Al 470.128-4/2 - TJSP - Rei. Des. Enio
Santarelli Zuliani).
90 Fábio Aguiar Munhoz Soares
175 A expressão foi cunhada por STRECK, Lênio Luiz. In: As interceptações telefônicas e os
Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997. p. 58, quando cogita da
possibilidade de ocorrência de interceptações telefônicas em crimes de responsabilidade, o
que não deixa de ser interessante e digno de nota pela ausência de previsão legal, num esfor
ço interpretativo do autor quanto ao real desiderato do legislador quando da edição da Lei
9.296/96.
176 Trata-se de decisão proferida pela magistrada Luciana Leal Junqueira Vieira, do DIPO (De
partamento de Inquéritos Policiais e Corregedoria da Policia Judiciária da Capital de São Pau
lo), nos Autos de Inquérito 050.06.053.169-0, em que assim deliberou: "... Verifica-se, outros-
sim, em tese, a presença das hipóteses autorizadoras da interceptação ambiental, nos moldes
dos arts. 1o e 2o, caput, da Lei 9.034/95, vez que a presente demanda cautelar encontra-se
vinculada a procedimento investigatório criminal que tem como objetivo apurar os atos ilícitos
em princípio praticados por lideranças de organizações criminosas. O pleito, porém, nos mol
des em que formulado, envolve também outras questões e garantias fundamentais. Senão
vejamos: a Constituição Federal de 1988, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais do
cidadão, em seu art. 5o, inc. X, prevê a inviolabilidade do direito à intimidade e à vida privada
do indivíduo. Em complementação a esta norma, o art. 41, inc. X, da LEP, assegura ao preso o
direito de visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos, em dias determinados.
Necessário, porém, ressaltar, que consoante nos ensina ALEXANDRE DE MORAES: “os di
reitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consa
grados no art. 5o da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escu
do protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco como argumento para afastamento
ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consa
gração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito" (In: Direito Constitucional. 3. ed.
São Paulo: Atlas, 1998. p. 53). De fato, tais direitos não são ilimitados, mas sim relativos, po
dendo ter sua amplitude reduzida quando em conflito com outros direitos e interesses, tais
como a segurança pública ou a preservação da ordem jurídica (princípio da relatividade ou
conveniência das liberdades públicas). Tanto é assim que o parágrafo único do art. 41 da LEP
prevê a possibilidade de suspensão ou restrição do direito de visitas, pela autoridade adminis
trativa, dispositivo este reconhecidamente recepcionado pela ordem constitucional vigente. No
caso em exame, na medida em que os averiguados estão custodiados, alguns deles em tocai
onde imposto Regime Disciplinar Diferenciado, e outros em local onde ordenada a interrupção
dos sinais de telefonia móvel, à evidência, toda e qualquer comunicação externa necessaria
mente será realizada através dos visitantes recebidos. De outro vértice, temos que patente a
imprescindibilidade da medida para a investigação dos fatos e demonstração do iiame subjeti
vo entre os comparsas, que consoante informações trazidas pela Secretaria da Administração
Penitenciária, efetivamente pertenceriam e participariam da organização criminosa menciona-
Prova Ilícita no Processo 91
da na inicial (fls. 18/26). Logo, temos que presente hipótese em que os direitos individuais dos
averiguados, de intimidade e privacidade, estão a servir de proteção para o exercício de ativi
dade criminosa e ilícita, devendo, pois, ceder em face dos interesses do Estado, no sentido de
impedir a prática de outros delitos, preservar a segurança dos presídios, impedir a prática de
fugas ou motins, e assegurar o direito à vida e segurança dos demais cidadãos, também cons
titucionalmente previstos (CF/88, art. 5o, caput). Não é demais lembrar, aliás, que a própria
Constituição Federal, no art. 5o, inc. XLIV declara constituir crime inafiançável a ação de gru
pos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Obser
vo, em seguida, que há ainda nos autos requerimento para escuta das entrevistas dos investi
gados com seus advogados, consoante agendamento de fls. 07/12. Neste passo, note-se o
Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB prevê como direito do ad
vogado “comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração,
quando estes se achem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares,
ainda que considerados incomunicáveis" (Lei 8.906/94, art. 7o, inc. III). A Lei de Execuções
Penais, por sua vez, assegura ao preso o direito de entrevista pessoai e reservada com advo
gado (art. 41, inc. IX). Tais direitos têm fundamento também na norma constitucional que as
segura aos acusados a ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes (CF/88,
art. 5o, LV). Contudo, da mesma forma em que na situação anterior, temos que tais direitos
não têm natureza absoluta e ilimitada. Com efeito, também aqui estamos diante de situação
em que se impõe a aplicação do denominado “princípio da relatividade ou conveniência das li
berdades públicas”. Ora. Notadamente, ao mesmo tempo em que indispensável assegurar, ao
sentenciado, o direito de manter contato reservado com seu procurador, para fins de tornar
efetiva a garantia da ampla defesa, quer se tratando de detento que responde a ação penal
em andamento, quer se tratando de caso de mera execução de sentença, independentemente
da existência de procuração nos respectivos autos, de outro vértice, não se pode admitir que
tal direito do preso e prerrogativa do advogado sirva como meio para assegurar e contribuir na
prática de delitos. Ao contrário, havendo indícios de que o profissional faz uso da sua prerro
gativa funcional para contribuir e participar da atividade criminosa de seu cliente, de rigor a re-
lativização da garantia, em prol da investigação criminal e do acautelamento da ordem pública
e das liberdades públicas alheias. Neste aspecto, impossível deferir o pedido da forma genéri
ca, tal como formulado na exordial. De fato: nem todos os profissionais que agendaram as vi
sitas de fls. 07/12 estão relacionados na documentação de fls. 27/57 e 75/100 (consigno desde
logo que as relações xerocopiadas a fls. 58/74 foram sumariamente desconsideradas porque a
falha quando da reprodução dos documentos impede a conferência do número de inscrição
dos advogados junto à OAB). Muito embora no tocante a vários deles haja, realmente, fundada
suspeita de intensa movimentação, com visita aos mais variados detentos, nas mais diversas
penitenciárias, a indicar que a atividade exercida não se restringe à mera defesa dos envolvi
dos, mas sim a possibilitar contato e articulação da empreitada criminosa, com relação a ou
tros tantos, a principio, porque sequer citados naquele rol, não há nos autos qualquer ele
mento a justificar e autorizar a exceção à regra da inviolabilidade. Diante de tais circunstânci
as, e em razão de todo o exposto, DEFIRO PARCIALMENTE O PEDIDO formulado para: 1)
autorizar a captação e interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos, acústicos
e/ou similares, no pariatório do Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes,
no tocante ESPECIFICAMENTE às conversas mantidas pelos sentenciados elencados a fls.
02 e seus familiares, nos dias 23, 24, 25, 26 e 30 de maio p. f. 2) autorizar a captação e inter
ceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos, acústicos e/ou similares, no pariatório
do Centro de Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes, no tocante ESPECIFICA-
MENTE às conversas mantidas pelos sentenciados elencados a fls. 02 e os seguintes causídi
cos...3) autorizar a captação e interceptação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos,
acústicos e/ou similares, nos parlatórios da Penitenciária II de Presidente Wenceslau, no to
cante ESPECIFICAMENTE às conversas mantidas pelos sentenciados elencados a fls. 03 e
92 Fábio Aguiar Munhoz Soares
seus familiares, nos dias 23, 24, 25, 26 e 30 de maio p. f. 4) autorizar a captação e intercepta-
ção ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos, acústicos e/ou similares, nos parlatórios da
Penitenciária II de Presidente Wenceslau, no tocante ESPECIFICAMENTE às conversas man
tidas pelos sentenciados elencados a fls. 03 e os seguintes causídicos ...Vedada a escuta e
gravação de conversas outras que não as expressamente consignadas e delimitadas na pre
sente decisão...".
177 Trata-se do caso Richtofen, julgado em última instância pelo STJ, em que o Rei. Min. Nilson
Naves, a par da evolução da teoria dos frutos da árvore envenenada já dantes mencionada,
aduz, sem fazer qualquer distinção, ter a parte ruim da prova o condão de contaminar, com
sua nocividade, todas as outras partes dos elementos de prova colhidos. Em suas palavras:
“...Um acontecimento nocivo tem aptidão para contaminar os demais acontecimentos.... E no
caso de que estamos cuidando, a entrevista, toda ela, se se trata de prova ou não, está con
taminada. Há, por conseguinte, de ser retirada dos autos principais...”. Segue ementa do acór
dão: Advogado. Sigilo profissional/segredo (violação). Conversa privada entre advogado
e cliente (gravação/impossibilidade). Prova (ilicitude/contaminação do todo). Exclusão
dos autos (caso). Expressões injuriosas (emprego). Risca (determinação). 1. São inviolá
veis a intimidade, a vida privada e o sigilo das comunicações. Há normas constitucionais e
normas infraconstitucionais que regem esses direitos. 2. Conversa pessoal e reservada entre
advogado e cliente tem toda a proteção da lei, porquanto, entre outras reconhecidas garantias
do advogado, está a inviolabilidade de suas comunicações. 3. Como estão proibidas de depor
Prova Ilícita no Processo 93
178 Neste sentido: Criminal. HC. Tráfico de entorpecentes. Nulidade. Prova ilícita. Invasão de
domicílio. Crime permanente. Flagrante. Exceção constitucional. Ilegalidade não demons
trada. Ordem denegada. / - Hipótese em que se sustenta a nulidade do acórdão que manteve a
condenação do paciente, ao argumento de que a prova colhida seria ilícita, posto que sua obten
ção teria ocorrido com invasão de domicílio, e, à noite. I I - A Carta da República, em seu art. 5o,
inc. XI, assegura a inviolabilidade do domicílio, mas excepciona as hipóteses de prisão em fla
grante, desastre, prestação de socorro ou determinação judicial. III - Caracterizado o delito de
tráfico de entorpecentes, cuja permanência lhe é própria, podem os agentes públicos adentrar o
domicílio do suspeito, independentemente de mandado judicial, para reprimir e fazer cessar a
ação delituosa. Precedentes. IV - Ordem denegada. (Habeas Corpus 39082/RS (2004/0150524-
4) - 5a Turma do STJ - Rei. Min. Gilson Dipp. - j. em 17.02.2005, unânime, DJ 07.03.2005).
Penal. Artigo 12 da Lei 6.368/76 - absolvição por ilicitude da prova. Inviabilidade. Materiali
dade e autoria demonstradas. Recurso improvido. Unânime. Em se tratando de crime per
manente, como o é o tráfico ilícito de entorpecentes, o estado de flagrância perdura enquanto não
cessar a permanência, sendo prescindível, nesse ínterim, a apresentação de mandado judicial
para proceder à busca e apreensão. Havendo provas suficientes de que o recorrente mantinha
em depósito, para fins de difusão ilícita, considerável quantidade de substância entorpecente,
descabido é o pleito absolutório (Apelação Criminal 20040110297200 (239939) - 2a Turma
Criminal do TJDFT - Rei. Romão C. Oliveira - j . em 10.11.2005 - DJU 29.03.2006).
179 Em sentido contrário e devido ao novo tratamento dispensado ao usuário de entorpecente pela
Lei 11.343/06: Apelante processado e condenado, acusado da prática do crime definido no art. 33
Prova Ilícita no Processo 95
181 Confira-se a respeito ARRUDA, Élcio. In: Crimes tributários: perspectivas na Europa e eficácia
do pagamento. Boletim IBCcrim, n. 171, fev. 2007, São Paulo, no qual cita o autor exemplo
francês de punição de crimes tributários, nos quais o pagamento do imposto, total ou parcial
mente, não enseja mitigação especial de pena. Em Portugal, as infrações tributárias referem
disciplina apartada (Lei 15, de 05.06.2001). Bifurcam-se em crimes e contra-ordenações:
àqueles, aplica-se pena de prisão de até 8 (oito) anos ou multa de 10 a 600 dias, além de se
guirem o procedimento traçado no Código de Processo Penal; as derradeiras - infrações colo
cadas à margem do Direito Penal - se subdividem em simples (coima não excedente a 3.750
euros) e graves (coima superior a 3.750 euros ou expressamente declaradas como tais na lei),
sob o procedimento específico do ilícito de mera ordenação social. A modulação da sanção do
crime atende, sempre que possível, ao gravame causado pelo agente. A pena privativa de li
berdade de até 3 (três) anos pode ser “dispensada" se, concorrentemente, a gravidade do fato
e a culpabilidade do agente não forem acentuados, houver se operado o adimplemento total
da prestação tributária (com os acréscimos) e não objetarem razões de prevenção. Impossível
a dispensa da pena, a reposição da verdade fiscal e o pagamento integral da exação, até a fi
nal decisão, impõem sua atenuação especial. Ainda quanto aos crimes, a pena de prisão é
susceptível de suspensão, sob condição de adimplemento total da prestação tributária, no pra
zo de até cinco anos da condenação, além do eventual pagamento — se assim o pronunciar o
juiz — do limite máximo estabelecido para multa. Ausente o adimplemento no interstício deli
mitado, ou se exigem garantias, ou se prorroga o período de suspensão até a metade, sem
exceder o máximo tolerado (5 anos), ou se revoga a suspensão da pena privativa de liberdade.
Prevê-se a imposição cumulativa de penas acessórias, de duração não excedente a três anos
e relacionadas às condutas tipificadas: a) interdição temporária ao exercício de atividades e
profissões; b) vedação ao recebimento de subvenções/subsídios públicos, suspensão de qual
quer benefício/franquia tributário e inibição do direito de obtê-los; c) proibição à participação de
licitações públicas; d) encerramento do estabelecimento, dissolução da pessoa coletiva a que
se relacione o agente; e) cassação de licenças/concessões e suspensão de autorizações; f)
publicação da sentença condenatória, às expensas do condenado. Na Espanha, o Código Pe
nal de 1995, alterado em 2003, na disciplina dos crimes contra a Fazenda Pública e a Seguri
dade Social (delitos contra la hacienda pública y contra la seguridad social, Título XIV), atrela a
tipicidade a um montante mínimo de sonegação tributária ou de indevida apropriação: 120.000
(cento vinte mil) euros. Na determinação da quantia, em se tratando de tributos, retenções, in
gressos à conta de devoluções, períodos ou de declarações periódicas, observa-se cada perí
odo ímposítivo ou de declaração; se os interregnos forem inferiores a doze meses, o montante
deverá se referir ao ano natural. A pena é tabulada em 1 (um) a 4 (quatro) anos de prisão e a
multa equivale à quantia sonegada/apropriada, a última passível de aumento até o seu sêxtu-
plo. A reprimenda comporta exacerbação, até a metade, quando se evidenciar o escopo de
acobertar o verdadeiro responsável tributário, mediante utilização de interpostas pessoas, e
quando se verificar a especial transcendência e a gravidade da defraudação, à luz do mon
tante sonegado e da existência de estrutura organizada com poder de afetar uma pluralidade
de obrigados tributários. Ao condenado, automaticamente, sob a rubrica de pena acessória,
aplica-se a vedação à obtenção de subvenções, ajudas públicas e ao direito de gozar de in
centivos fiscais e de seguridade social, num interstício de 3 (três) a 6 (seis) anos. A sonegação
contra a Fazenda da União Européia, se o objeto material for igual ou superior a 50.000 (cin
quenta mil) euros, é igualmente passível de censura penal. Há isenção de responsabilidade se
a situação tributária do agente é regularizada antes ide ser notificado peia administração tríbu-
Prova Ilícita no Processo 97
(ária a respeito do início das atuações tendentes à determinação das dívidas tributárias ou,
quando inexistirem autuações, antes de o poder público interpor querela/denúncia ou antes de
o Ministério Fiscal ou o juiz de instrução realizarem atuações permitindo o conhecimento for
mal da iniciação das diligências: é dizer, a regularização fiscal deve preceder à formal atuação
das agências públicas (Código Penal Espanhol, arts. 305 e 307). Na Alemanha, a primeira lei
de luta contra a criminalidade econômica (1976) incorporou ao Código Penal Alemão os crimes
de fraude de subvenções públicas (§ 264-a), de estafa de crédito (§ 265-b). Também cunhou
figuras abarcando a moderna delinquência financeira (crimes do colarinho branco: white-collar-
crime), sob a fórmula de tipos de perigo, onde a subministração da informação falsa é sufici
ente à punibilidade, dispensada a ocorrência de dano patrimonial a que o dolo se endereça.
Sua sucessora, a segunda lei contra a criminalidade econômica (1986), buscou ajustar o Di
reito Penal às variações técnicas e econômicas de operação no tráfico de negócios, em ordem
a combater a criminalidade de informática (§ 263-a), criminalizar o branqueamento de capitais
(§ 261) e agregar mecanismos idôneos a melhor arrostar a criminalidade organizada atuante
no segmento. A retenção e malversação de contribuições arrecadadas dos trabalhadores para
a seguridade social - correspondente à apropriação indébita previdenciária nacional - é ape-
nada com privação de liberdade de até 5 (cinco) anos e multa (§ 266-a). É possível a dispensa
da censura penal, quando o agente, (1) até a data de vencimento ou imediatamente depois,
comunicar, por escrito, à autoridade arrecadadora o montante das cifras retidas e (2) expuser
o porquê da impossibilidade de recolhê-las dentro dos prazos assinaíados, apesar do sério
esforço em fazê-lo. Havendo restituição das contribuições dentro do prazo assinalado pela
autoridade arrecadadora, dês que cumprida a primeira providência (1), a pena não é imposta
(§ 266-a-5). A lei geral tributária alemã de 1977 (Abgabenordung - AO/1977), nos parágrafos
369 a 376, tipifica os crimes tributários. A sonegação de cunho profissional e relativa a bens
roubados (§§ 373 e 374) é passível de configurar crime de lavagem de dinheiro ou ocultação
de bens havidos ilicitamente (CP Alemão, §261). Se o crime se implementar a partir de dados
incompletos ou incorretos, é possível a dispensa na aplicação da pena, contanto que o agente
suplemente ou recupere os dados omitidos, antes de qualquer atuação da autoridade fiscal
(AO, § 371). Prossegue o autor: na maioria dos sistemas, o integral adimplemento da presta
ção tributária, de ordinário, surge como legítima terceira via do direito repressivo. Às vezes,
antecipam-se-lhe os efeitos, ora se obviando a persecução penal, ora permitindo-lhe o estan-
camento, sempre, porém, a partir de marcos temporais. Nenhuma disciplina perfilha a irrestrita
“benevolência" da legislação brasileira, onde o pagamento do tributo sonegado ou da contri
buição apropriada, independentemente de quando efetuado, ostenta aptidão à extinção de pu
nibilidade (Lei 10.684/03, art. 9°, § 2°). Entre nós, hoje, é indisfarçável o escopo meramente ar
recadador da incriminação. A bem da verdade, quando o caso aporta em juízo, tem-se genuí
na “ação penai de cobrança”.
98 Fábio Aguiar Munhoz Soares
182 A nosso ver, o julgado abaixo é típico exemplo de relativização de direitos fundamentais,
porque colocados em rota de colisão com princípio constitucional, considerada num primeiro
momento lícita a prova obtida, sem prejuízo de posterior análise acerca de sua possível ilicitu-
de, ante os dados colhidos e a necessidade de se fazer exame mais aprofundado da prova a
ser colhida:
Processual penal e penal. Busca e apreensão. Desnecessidade da existência de inquéri
to policial ou ação penal em curso. Providência autorizada em sede de investigação
preliminar. Inquérito policial. Decisão de natureza eminentemente cautelar. Cabível re
curso de apelação. A lt 593, II, do CPP. Pedido de ingresso de terceiro na ação penal.
Assistente simples ou litisconsorcial. Art. 3° do CPP. Aplicação analógica. Art. 268 do
CPP prevê hipótese de assistente da acusação que não é o caso. Inexistência de prova
de ser o requerente investigador ou correntista do banco. Medida originária em prova
supostamente ilícita. Gravação de conversa entre duas pessoas sem conhecimento do
seu interlocutor. Registro provavelmente editado. Avaliação da apontada ilicitude pos
tergada. Decisão sem conteúdo decisório. Distinção entre prova ilícita e prova ilegítima.
Gravação ambiental feita por um dos interlocutores ou por terceiro autorizado. Existên
cia ou não de justa causa para o ato para aferição da licitude ou não dessa prova. Ine
xistência de nulidade no fato de todos os mandados de busca e apreensão serem do
mesmo teor. Requerimento circunstanciado. Fatos investigados são da mesma nature
za. Desnecessidade de discriminação. Mandados apontando satisfatoriamente todas as
condições legais necessárias ao cumprimento das ordens emanadas do juiz. Busca em
andar diverso do constante do mandado. Inexistência de irregularidade. Possibilidade
de dados relacionados ao caso estarem armazenados no disco rígido do servidor do
banco. Busca em local resguardado por sigilo. Banco apelante. Terceiro na relação jurí-
dico-penal em discussão. Dever de guardar sigilo dos dados e operações de seus
clientes. Ressalvadas as hipóteses permissivas previstas em lei. Limites da perícia
Prova llicita no Processo
á esfera abrangida pela garantia constitucional de sigilo, é ilicita. Da mesma forma, as provas
eventuais extraídas de dados profissionais e sigilosos decorrentes das atividades protegidas
por sigilo dos apelantes pessoas físicas. XXIV - A imprensa vem noticiando fatos gravíssimos
e que podem ter interferência no caso ora em andamento, os quais deverão ser apurados.
X X V - Recurso de apelação recebido. Pedido de admissão de suposto cliente do banco ape
lante na qualidade de assistente iitisconsorcial e/ou simples rejeitado. Recurso de apelação
parcialmente provido para determinar que a separação dos arquivos de informática e posterior
perícia, sejam realizadas nos termos do expendido. XXVI - Considerando que o Brasil e a Itá
lia firmaram Tratado sobre Cooperação Judiciária em Matéria Penal, promulgado pelo Decreto
862, de 09.07.1993, de ofício, resta determinado: (I) expedição, de ofício ao Ministério Público
Federal para que tome as providências inseridas em sua competência; (II) o MM. Juiz Federal
de primeiro grau de jurisdição, valendo-se das condições do acordo internacional celebrado
entre a Itália e o Brasil, deverá diligenciar no sentido de obter a íntegra do depoimento presta
do e referido pela imprensa, bem como outros elementos de interesse ao caso. (Apelação
Criminal 18232/SP (2004.61.81.009685-2) - 2a Turma do TRF - 3a Região - Rela. Cecilia
Mello - j. em 12.12.2006 - DJU 30.03.2007).
183 Conceito obtido no relatório “Patterns of Global Terrorism - 2000”, do Departamento de Estado
dos Estados Unidos da América.
102 Fábio Aguiar Munhoz Soares
184 Extradição 855-2 - Rei. Min. Celso de Meilo - Pleno do STF - DJ 01.07.2005.
Prova Ilícita no Processo 103
185 Trata-se de representação formulada pela 2a Delegacia Seccional de Policia da Capital, tendo
este autor no exercício de sua judicatura junto ao DIPO (Departamento de Inquéritos Policiais
e Corregedoria da Policia Judiciária da Capital/SP), assim decidido: “...Segundo menciona a d.
autoridade policiai, grupos criminosos agem na conhecida Favela Água Espraiada, tendo sido
recentemente feito pela polícia judiciária minucioso levantamento dos delitos lá ocorridos,
constatando-se quase a totalidade das infrações penais referir-se ao tráfico de entorpecentes,
sendo ainda os fatos noticiados na mídia, tamanha a ousadia dos marginais, que chegaram a
mudar o itinerário de coletivos em razão das ofensivas policiais e instalar serviço de “drive
thru” para aquisição de entorpecente por usuários mais abonados. Relata a d. autoridade poli
cial por fim que mencionada favela estende-se pela Avenida Águas Espraiadas, esquinas, be
cos e vielas, juntando na sua representação levantamento fotográfico da região a ser coberta
pela almejada ordem judicial. É o relatório. Sem dúvida que em última análise os fatos narra
dos peia d. autoridade policial guardam relação com os últimos acontecimentos ocorridos
nesta capital, eis para tanto significar o alto número de infrações registradas na mencionada
favela a completa ausência do Estado, fazendo com que grupos locais surjam e se sintam à
vontade para exercer poder não exercido pelo Estado, chegando inclusive a enfrentá-lo, como
se estivéssemos a tratar de guerras em que a dominação de um território por um ou por outro
seja a meta a ser alcançada. Ora, em tal contexto, cumpre consignar não ser concebivel possa
o Estado se sujeitar a grupos criminosos, devendo então reassumir seu papel, ainda que te
nhamos como hipótese a ser cogitada a sobreposição do bem comum a ser alcançado pelo
Estado a direitos e garantias fundamentais do cidadão. Obtempere-se para tanto que o relato
da d. autoridade policial é firme quanto à ocorrência de no mínimo 12 ocorrências de tráfico de
entorpecentes em janeiro deste ano, 13 em fevereiro, 13 em março e 13 em abril, o que não é
pouco para uma mesma localidade e que tem no poder local ligado ao tráfico o quanto neces
sário a fomentar e a financiar a guerrilha urbana exercida pelo famigerado Primeiro Comando
da Capital (PCC) contra o Estado. Não é exagero concluir então diante de tal quadro estar a
comunidade local refém do narcotráfico, pouco ou nada podendo fazer as pessoas de bem, eis
ser do conhecimento de todos ser a pena de morte a que se destina aos delatores do crime
organizado, a exigir, pois, resposta imediata e severa do Estado. Cita-se aqui, a corroborar o
quanto supra asseverado, trecho da r. decisão do eminente magistrado Marceio Matias Pereira
em caso análogo também neste DiPO: “...A população ordeira não pode se curvar ao suposto
poderio do narcotráfico. Tempos excepcionais exigem medidas também excepcionais, com o
intuito da manutenção do Estado Democrático de Direito e a ordem pública. Segundo o princí
pio da proporcionalidade deve o julgador sopesar os bens jurídicos em conflito, no momento
de proferir sua decisão. Conforme a melhor doutrina constitucional os direitos individuais não
são absolutos, mas sim relativos, tanto é que existem medidas próprias para que sejam os
mesmos violados, quando em conflito com interesses maiores, vale dizer coletivos. Assim
sendo, o interesse coletivo sempre prepondera sobre o interesse individual, razão pela qual
são constitucionalmente previstas as limitações a estes, vale dizer a possibilidade de violação
do domicílio nas hipóteses previstas no art. 5°, inc. XI, da CF. No caso dos autos, a represen
tação das d. autoridades policiais dá conta de que a população daquela base territorial está
refém do narcotráfico, o qual impõe a “lei do silêncio", bem como outras normas de conduta,
exigindo o seu cumprimento, sob pena de execução sumária de pena de morte, violando o
domicílio das pessoas trabalhadoras e honestas, que residem nesta comunidade, transbor
dando suas ações do limite territorial em questão, submergindo o poder paralelo, a ponto de
atingir toda a coletividade, que, nos últimos dias, viu-se atemorizada com a verdadeira onda de
terror, bem como em razão da prática de atos de terrorismo, promovidos por suposta organi
zação criminosa. O deferimento da presente medida representa, na realidade, o resgate da
Prova Ilícita no Processo 105
189 MS 2004.01.00.047315-1/M T - TRF da 1a Reg. - 2a Seção - Rei. Des. Fed. Hilton Queiroz - j.
em 09.03.2005, v.u., com a seguinte ementa: “Constitucional. Mandado de Segurança
contra ato judicial. Sequestro de bens. Busca e apreensão. Quebra de sigilo bancário.
Nomeação de gestor judicial como interventor. Medida concedida genericamente. Im
possibilidade”.
190 Confira-se: Entorpecente. Uso próprio. Prova ilícita. Guardas municipais que, a mando de
autoridade policial, ingressaram na residência do acusado e procederam à busca e
apreensão de substância tóxica. Inadmissibilidade. Atividades de exclusiva atribuição
da Polícia Militar e Civil. Prova inidônea originária a contaminar as demais dela decor
rentes. Rejeição da denúncia mantida. Aplicação dos arts. 5o, LVI, 30, V, e 148, § 8°, da
CF e art. 43, III, do CPP. (Recurso em Sentido Estrito 322.030-3/6 - Itu, 3a Câmara Criminal
Prova Ilícita no Processo 107
do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - v.u., negaram provimento - Rei. Des.
Gonçalves Nogueira). No corpo do acórdão, destaca-se entendimento do relator para quem:
“...incogitável de se dar azo ao princípio da proporcionalidade, ou do interesse preponderante”,
como prefere CAMARGO ARANHA (Da Prova no Processo Penal. 4. ed., p. 56). Releva no
tar que se ocupa in casu tão-só de modalidade branda e relacionada ao mero porte de usuário,
figura típica de escassa reprovabilidade. Sem a mínima pertinência buscar-se um ponto de
equilíbrio no confronto com os elevados interesses da sociedade ou com a preservação da or
dem pública, porquanto deveras longe o delito em apreço dos casos excepcionais, de mar
cante violência e extremamente graves. Aliás, até mesmo objeto de debate sobre sua descri-
minação, em pauta o nodal argumento de necessitarem os toxicômanos, ao invés de punição,
de tratamento e assistência para livrá-los do pernicioso vício. Em reforço do posicionamento:
“Da explícita proscrição da prova ilícita, sem distinções quanto ao crime objeto do processo
(CF, ah, 5o, LVI), resulta a prevalência da garantia nela estabelecida sobre o interesse na bus
ca, a qualquer custo, da verdade real no processo. Consequente impertinência de apelar-se ao
princípio da proporcionalidade - à luz de teorias estrangeiras inadequadas à ordem constitu
cional brasileira - para sobrepor, à vedação constitucional da admissão da prova ilícita, consi
derações sobre a gravidade da infração penal objeto da investigação ou da imputação“. (STF -
1a T - HC 80.949-9/RJ - Rei. Min. Sepúlveda Pertence - j. em 30.10.2001).
108 Fábio Aguiar Munhoz Soares
7.4 TORTURA
Ainda que não se trate de exemplo concernente à busca pessoal, como são os exemplos de
que cuida o presente item, pode ser citado o caso de prova obtida em interceptação telefónica,
quando a operadora telefónica cumpre ordem emanada por autoridade judicial destituída de
competência para tanto, julgando estar agindo de acordo com a lei.
192 Na mesma senda, é o caso, p. ex., de prova obtida em interceptação telefônica, que elucida
crime diverso daquele posto em investigação, mas que com ele se relaciona por algum critério
de conexão, ou não, servindo, pois, como prova emprestada. Esta, aliás, é a opinião de
FERNANDES, Antonio Scarance. Processo... Op. cit, p. 110.
193 ÁVILA, Thiago André Pierobom. Provas... Op. cit, p. 222. Em caso diverso (RHC 90.376/RJ),
mas que revela a tendência do STF em pouco se importar com a gravidade delitiva e com a
busca da verdade, a 2a Turma do Supremo Tribunal Federal anulou sentença do Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro, que havia condenado agente por vários crimes de estelionato e fal
sificação de documento particular, em concurso material. Como consequência, foi restabeleci
da sentença de 1° grau que havia considerado inepta a denúncia contra o réu, por ter sido ba
seada em prova ilícita. O relator do caso, ministro Celso de Mello, aduziu que as provas consi
deradas ilícitas pelo juiz de primeiro grau da 19a Vara da Comarca do Rio de Janeiro foram
colhidas pela polícia quando o agente estava sendo preso por outra condenação e, segundo
informa a sentença de primeiro grau, os agentes policiais resolveram apurar outras’ supostas
praticas delituosas que teriam sido cometidas pelo condenado e forçaram a entrada no apo
sento que este ocupava num quarto de hotel. Lá eles localizaram e apreenderam provas que
resultaram na abertura de novo processo criminal, que culminou na condenação do agente
pelo TJRJ. A defesa do condenado recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, alegando ilicitude
da prova, que teria sido apreendida sem mandado de busca e apreensão, o que caracterizaria
desrespeito do princípio da inviolabilidade de domicílio (Constituição Federal, art. 5°, inc. XI). O
STJ decidiu manter a sentença do TJRJ por apontar "insuficiência fática" para esclarecer os
termos do mandado de prisão cumprido em desfavor do agente. Para o ministro Celso de Mello
o juiz de primeiro grau deixou explícito que agentes policiais invadiram o quarto de hotel contra
a vontade do agente, quando estavam cumprindo mandado de prisão expedido por motivo de
outro processo condenatório. Entretanto, tal mandado de prisão não viabilizaria a busca e
apreensão de objetos que se encontravam no apartamento e que serviram de prova em pro
cesso criminal. Ao prover o recurso, sua Excelência, o Min. Celso de Mello citou princípio
constitucional, segundo o qual as provas obtidas por meios ilícitos devem ser repudiadas pelos
tribunais por mais relevantes que sejam os fatos por elas apurados (Constituição Federal art
5°, inc. LVI), uma vez que contaminam a ação penal. ’
Prova Ilícita no Processo 109
194 Os atentados de 11 de setembro foram uma série de ataques contra alvos civis nos Estados
Unidos em 11 de setembro de 2001. Na manhã daquele dia, quatro aviões comerciais foram
desviados, sendo que dois deles colidiram contra as torres do World Trade Center em
Manhattan, Nova York. Um terceiro avião, American Airlines Flight 77, foi reportado pela auto
ridades norte-americanas como tendo sido intencionalmente derrubado contra o Pentágono
pelos sequestradores, no Condado de Arlington, Virgínia. Os destroços do quarto avião, United
Airlines Flight 93, foram vistos espalhados num campo próximo de Shanksville, Pensilvâma. A
versão oficial apresentada pelo governo norte-americano reporta que os passageiros enfrenta
ram os supostos sequestradores e que durante este assalto o avião caiu. Desde a g, esse foi o
primeiro ataque de efeitos psicológicos e altamente corretivos imposto por forças inimigas em
território americano. Mesmo se tratando de vítimas inocentes, para se ter uma ideia quantitati
va de seu arrasador resultado, só o ataque em si excedeu o saldo de aproximadamente 2400
militares norte-americanos mortos no ataque sem um aviso prévio dos japoneses à base militar
de Pearl Harbor, em 1941. Além disso, tudo indica que os ataques foram caprichosamente
planejados e direcionados contra ícones americanos, agravando-se ainda mais por terem sido
110 Fábio Aguiar Munhoz Soares
transmitidos ao vivo pelas cadeias de TV do mundo inteiro com a própria tecnologia america
na. Os ataques, sem precedentes em toda a história da humanidade, que feriram profunda
mente o orgulho americano, superaram e muito o efeito moral imposto às tropas americanas
pela força aérea japonesa. Os mortos nos ataques de 11 de Setembro de 2001 foram milha
res: 265 nos aviões; pelo menos 2.602 pessoas, incluindo 242 bombeiros, no World Trade
Center e 125 no Pentágono. 3.234 pessoas foram mortas. Além das Torres Gêmeas de 110
andares do World Trade Center, cinco outras construções nas proximidades do World Trade
Center e quatro estações subterrâneas de metrô foram destruídas ou seriamente danificadas.
No total, foram 25 prédios danificados em Manhattan. Em Arlington, uma parte do Pentágono
foi seriamente danificada pelo fogo e outra parte acabou desmoronando. Alguns passageiros e
tripulantes puderam fazer chamadas telefônicas dos vôos condenados, relatando que vários
organizadores dos ataques de 11 de Setembro estavam em cada avião. Um total de 19 se-
qüestradores foram posteriormente identificados, cinco na maioria dos vôos, quatro no vôo 93
da United. Segundo informações, os sequestradores assumiram o controle das aeronaves,
usando facas para matar as atendentes de bordo, pilotos, e/ou ao menos um passageiro. No
vôo 77 da American Airlines, um dos passageiros relatou que os sequestradores usavam pu
nhais. Foi relatado o uso de algum tipo de spray quimico nocivo, chamado gás de efeito moral
para manter os passageiros longe da primeira classe nos vôos 11 da American Airlines e 175
da United Arlines. Ameaças de bombas foram feitas em três aviões, mas não no 77 da Ameri
can. As gravações da caixa preta revelaram que os passageiros tentaram assumir o controle
do avião dos sequestradores e como chacoalhar o avião não foi o suficiente para subjugar os
passageiros, os sequestradores derrubaram o avião num descampado entre Shanksville e
Stonycreek Township no Condado de Somerset, Pensilvânia, às 10:03:11 da manhã, horário
local (14:03:11 UTC). Em 29.10.2004, Osama bin Laden assumiu explicitamente a
responsabilidade pelos ataques. Ele afirmou que “nós decidimos destruir as torres na América
... Deus sabe que não nos ocorreu originalmente essa idéia, mas nossa paciência se esgotou
diante da injustiça e inflexibilidade da aliança entre americanos e israelenses contra o nosso
povo na Palestina e no Líbano, e então a idéia surgiu na minha mente.” O grupo militante islâ
mico al-Qaeda elogiou os ataques e os lideres do grupo haviam previamente dado a entender
que tinham participação nos ataques. De fato, pouco depois dos ataques, o governo dos Esta
dos Unidos declarou-os, juntamente com o líder deles, Osama bin Laden, como principais sus
peitos. Em 2004, a comissão do governo norte-americano que investigou os ataques oficial
mente, concluiu que os ataques foram concebidos e implementados por pessoal da al-Qaeda.
A comissão que investigou os ataques relatou que, embora tenha havido contatos com o
Iraque durante a presidência de Saddam Hussein, não foram encontradas “relações colabora-
tivas” entre o Iraque e a al-Qaeda quanto ao ataque de 11 de setembro em especial. Disponí
veis em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Ataques__de_11_de_setembro>. Acesso em: 16 abr. 2007.
195 Michael Ignatieff, membro do parlamento canadense, deputado líder do partido liberal do Canadá e
deputado lider da oposição na Casa dos Comuns no Canadá, morou nos EUA de 2000 a 2005,
onde foi diretor do Harvard's Carr Center for Human Rights Policy, é um dos autores que vêm dis
cutindo o tema e dizendo que o debate sobre tortura não é tão simples como pode parecer. Em
suas palavras: “Those of us who oppose torture under any circumstances should admit that ours is
an unpopular policy that may make us more vulnerable to terrorism'1. (IGNATIEFF, Michael. If torture
works... Prospect Magazine. Issue 121, April 2006). Disponíveis em: <htpp://www.prospect-
magazine.co.uk/article_details.php?search_term=michael+ignatieff&id=7374>. Acesso em: 16
Prova Ilícita no Processo 111
abr. 2007. Defende o referido autor, entretanto, o banimento da tortura. São suas palavras:
I end up supporting an absolute and unconditional ban on both torture and those forms of coer
cive interrogation that invoive stress and duress, and I believe that enforcement of such a ban
should be up to the militaryjustice system plus the federal courts. I also believe that the training
of interrogators can be improved by executive order and that the training must rigorously ex
clude stress and duress methods, fazendo entretanto a ressalva do lado contrário: “...Those of
us who oppose torture should also be honest enough to admit that we may have to pay a price
for our own convictions...”
196 A doutrina estrangeira mais antiga entende que em casos assim, deva a prova ser utilizada
apenas para salvar as vidas das pessoas, mas não, para processar o criminoso (v. GRINOVER,
Ada Peiegrini. Liberdades... Op. cit, p. 145, citando caso discutido entre BAUR, SMIT e
CAPELLETI, em conferência realizada em 1971, em Florença). Para nós, a hipótese não é tão
cerebrina, como devia ser na década de 70 e por isso deve ser repensada nos dias atuais.
197 Dados obtidos no relatório anual sobre terrorismo divulgado pelo Departamento de Estado dos
EUA e publicados também no Jornal Folha de S. Paulo, A12, 01.05.2007.
198 Em 1978, a Corte Europeia de Direitos Humanos, investigando as técnicas de interrogatório
utilizadas pela Inglaterra na Irlanda do Norte no início da década de 70, concluiu que muitas
delas constituíam práticas desumanas e degradantes, mas não qualificadas como tortura. O
mesmo se deu na Suprema Corte de Israel, que, ao deliberar sobre as técnicas de interrogató
rio israelenses em 1999, que incluíam a mantença de presos com paus em posições doloridas
e o chacoalho de cabeça e ombro de forma vigorosa, concluiu que tais práticas eram desuma
nas e degradantes, mas não poderiam ser qualificadas como tortura.
199 “Since no state wants to be seen as torturing suspects but all states want to be able to extract
information to protect their citizens, the key question is whether states can use methods of
“coercive interrogation’’ that do not qualify as torture”. Disponíveis em: <htpp://www.kimsoft.
com/2000/kub_ix.htm>. Acesso em: 16 abr. 2007.
200 Human rights activists want to collapse the distinction between “coercive interrogation" and
“torture”, and to ban any physical or psycological coercion. But there is a significant distinction
between the two. As legal theorist and federal judge Richard Posner has argued, “almost all
official interrogation is coercive, yet not all coercive interrogation would be called ‘torture’ by
112 Fábio Aguiar Munhoz Soares
any competent user of English language”. Prossegue o magistrado: "Both may be repugnant,
but repugnance does not make them into the same thing. Ver a respeito interessante entrevista
concedida pelo renomado advogado norte-americado Alan Dershowitz à CNN e publicada no
site: <htpp://www.cnn.com/lawcenter>. Disponível em: 23 jan. 2007, em que há intenso debate
entre as idéias de Dershowitz e as de Ken Roth, diretor executivo da Humans Rights Watch.
201 Trata-se ainda das aludidas idéias contidas no debate citado na nota anterior.
202 É para nós a retomada da doutrina utilitarista de Jeremy Bentham (1748/1832), pela qual não
se deve, a partir de princípios abstratos, extrair, ilimitadamente, por meio de inferências lógicas,
como o são os postulados referentes à prova ilícita, certas consequências. Deve-se, isto sim,
interpretar as normas sob o ponto de vista dos efeitos reais por elas produzidos quando apli
cadas. Seriam, sob a óptica utilitarista, justas as normas que, ao serem aplicadas, produzis
sem efeitos bons, enquanto seriam injustas as que, em sua aplicação, originassem conse
quências desfavoráveis. O critério objetivo, segundo Bentham, para qualificar aqueles efeitos,
era a utilidade, segundo a qual bom é o que produz prazer e mau, o que causa dor e, sob o
prisma social, bom ou justo é o que tende a aumentar a felicidade de todos ou de um grande
número de pessoas. Com isso, firmou-se a idéia de que a função da ciência do direito consistia
em determinar, no conjunto dos interesses de uma sociedade, quais os valiosos, isto é, os
quem devem ser levados em consideração, estabelecendo uma hierarquia entre eles e fórmu
las para conciliar o maior número possível de interesses licitos (DINIZ, Maria Helena Com
pêndio de Introdução à Ciência do Direito. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 58).
Prova llicita no Processo 113
da dignidade de uma única vida humana, o que faz com que, repita-se,
muitas vezes nos deparemos com escolhas difíceis203.
Em outras palavras: liberdade e segurança, que são direitos
igualmente fundamentais (CF, art. 5o, caput), são, muitas vezes, postos
em rotas de colisão, de tal maneira que a escolha de um deles pode
significar, em muitos casos, a escolha de um mal, o qual pode ser menor
ou pior, dependendo da escolha feita.
É dizer: nenhuma sociedade será reconhecidamente civiliza
da se torturar barbaramente e por capricho, mas nenhuma sociedade
será capaz de sobreviver se reduzir a complexidade da vida moral a
uma luta simplória entre contrários, como se estivéssemos num roteiro
bem bolado de filme204, o que exige, deva o tema ser melhor discutido
e não ser posto, como se fora uma luta do bem contra o mal, ou seja,
torturar ou não torturar.
203 Nos EUA, o juiz federal Richard Posner e o filósofo político Jean Bethke Elshtain, colocando-se
contra qualquer rigidez moral que possa dificultar a distinção entre tortura e interrogatórios
coercivos, já se manifestaram em favor da necessidade da prática de “interrogatórios coerci
vos” contra um pequeno número de terroristas que possam ter informações vitais com o fim de
serem salvas vidas de pessoas inocentes. Assim se manifesta o juiz Posner: “...saving the
lives of many counts more, in moral terms, than abusing the body and dignity of a single indi-
viduaf. Por outro lado, assim se manifesta Elshtain: “good consequences cannot justify bad
acts, but bad acts are sometimes tragically necessary. The act remains bad, and the person
must accept the moral opprobrium and not seek to excuse the inexcusable with the justifica
tions of necessity'. (IGNATIEFF, Michael. If torture works... Prospect Magazine. Issue 121,
April 2006). Disponível em: <http://www.prospect-magazine.co.uk/article_details.php7search__
term=michael+ignatieff&id=7374>. Acesso em: 16 abr. 2007.
204 COUTINHO, João Pereira. Os lobos e os cordeiros. Folha de S. Paulo, E 2 ,05 abr. 2006.
8
205 Apelação. Roubo majorado. Recurso interposto fora do prazo legal. Extemporâneo.
Ocorrência. Preliminar de ofício. Não conhecer do recurso. Acervo probatório frágil.
Ausência de elementos hábeis a ensejar uma condenação. Absolvição decretada. Sendo
o recurso interposto fora do prazo legal, o não conhecimento do mesmo é medida que se im
põe, face a sua intempestividade. Delações obtidas em fase extrajudicial, não podem, isola
damente, basear um decreto condenatório porque produzidas no inquérito policial, momento
este em que ausentes os princípios do contraditório e da ampla defesa, ainda mais, quando
àquelas não foram ratificadas em juízo, e tampouco foram corroboradas por outros elementos
de prova. Não havendo outro elemento de convicção, diverso dos colhidos em fase policial,
com força probante a ensejar um decreto condenatório, impõe-se a absolvição dos acusados
na estrita observância do princípio do in dubio pro reo. O inquérito policiai é peça meramente
informativa, não podendo por si só, servir de alicerce a uma sentença condenatória. (Apelação
Criminal 1.0024.98.118778-4/001 - 5a Câmara Criminal do TJMG - Rei. Vieira de Brito - j.
em 09.05.2006, unânime, Publ. 23.06.2006).
Apelação criminal. Provas colhidas em juízo que não autorizam a condenação. Preva
lência do princípio do in dubio pro reo. Decisão mantida. £ defeso ao Magistrado condenar o
116 Fábio Aguiar Munhoz Soares
réu com base nas provas obtidas durante o inquérito policial e não confirmadas em Juízo, de
vido à ausência do contraditório e da ampla defesa na fase investigatóría. (Apelação Criminal
324.824-3/4 - 1a Câmara Criminal do TJSP - Rei. Canellas de Godoy - j. em 02.05.2005,
unânime).
Embora nos autos existissem alguns indícios para denunciar o policial militar, os mes
mos não ganharam força probatória, após regular instrução, para confirmar a denúncia.
Para validade da condenação com base em dados do inquérito, é necessário que estes este
jam em sintonia com o apurado em Juízo, em face do princípio de que todas as provas são
relativas e do princípio do livre convencimento do Juiz. (Apelação Criminal 005132/02
(029769/01) - 2a Câmara do TJMSP - Rei. Lourival Costa Ramos - j. em 30.09.2004, unâ
nime).
Prova Ilícita no Processo 117
206 Wcfeitem7.
207 Caso Silverthone Lumber Co. v. United States, 251 US 385 (1920).
208 Tribunal do júri. Homicídio. Denúncia. Princípios da congruência e do contraditório.
Exclusão de qualificadora. Prova ilícita por derivação. Teoria dos frutos da árvore en
venenada. Inocorrência. 1 - Não hâ que se falar em violação ao princípio da congruência
quando desde a denúncia até a sentença não se alterou a classificação jurídica dos fatos
imputados ao recorrente e se manteve a correlação entre os dois atos processuais. 2 - Ao
ser modificado o fundamento de admissibilidade da qualificadora do art. 121, § 2°, inc. IV do
CP, preexistente desde a denúncia em razão de hipótese que emergiu durante a instrução,
opera-se a mutatio libelll sem aditamento, não se caracterizando violação ao princípio do
contraditório. 3 - A qualificadora somente pode ser excluída quando de forma incontroversa
mostrar-se absolutamente improcedente e sem amparo nos autos. 4 - Considera-se prova
ilícita quando resta violada regra de direito material em sua obtenção, fazendo de qualquer
outra dela advinda, ilícita por derivação, conforme preconiza a teoria dos frutos da árvore
envenenada. (Recurso em Sentido Estrito 20050110182740 (246224) - 1a Turma Crimi
nal do TJDFT - Rei. Edson Alfredo Smaniotto - j. em 04.05.2006, unânime, DJU
14.06.2006).
209 São as três teorias outrora citadas quanto à atenuação da regra de exclusão da prova. São
elas: a doutrina da atenuação (attenuation doctrine), doutrina da fonte independente (independent
source doctrine) e doutrina da descoberta inevitável (inevitable discovery doctrine).
Prova Ilícita no Processo 119
210 Processual Penal. Agravo regimental no habeas corpus. Arts 213 e 214 c.c. art. 224 a
e art 147 todos do Código Penal. Gravação clandestina. Degravaçao. Prova ilícita.
Ordem concedida pelo e. Tribunal a quo para determinar o desentranhamento ^ referi
da prova. Pretensão de aplicação da teoria dos frutos da arvore envenenada^ ^depen
dência entre as provas reconhecida pelo e. Tribunal a quo. Necessidade de acura
exame do material cognitivo. Impossibilidade na via eleita. Não ha como fpo/tjer a<preten-
são do recorrente de aplicação da teoria dos frutos da árvore envenenada (the ! ru't s ° fJ f '
Doisonous treeJ haja vista que o vergastado acórdão reconheceu a mdependencia entre
P
; " S iS e as a la is , iJ o pala „sal a n l a a * , * > ;^ Z Í£ Z T u o
exame acurado do material cognitivo, o que, a toda evidencia, se moshm i n m ^ m a m a
restrito e expedito do writ. Recurso desprovido. (Agravo ^ e n t a t ^ Habeast3orp
40089/MG (200410172124-9) - 5a Turma do STJ - Rei. Min. Felix Fischer j.
28.06.2005, unânime, DJ 29.08.2005).
9
seja aderente ou o país em que tenha sido praticado o crime seja tam
bém um daqueles que aderiu à sistemática do Tribunal Penal Interna
cional, possibilitando-se o processo de criminosos quando o sistema
judicial de um país deixar de existir ou quando for constatada a inércia
da jurisdição nacional causada por desídia política ou por incapaci
dade da máquina persecutória2122134, como aconteceu em Ruanda e no
Afeganistão.
Em tal contexto, pois, adotado o princípio da complementa
ridade, quanto à admissibilidade, ou não, da prova ilícita no processo,
o conflito de posições surge da interpretação do Estatuto Internacional
em conjunto com a Constituição Brasileira, que, de forma peremptó
ria, veda o ingresso da prova ilícita no processo, ao contrário do Tri
bunal Penal Internacional, que admite o ingresso de toda e qualquer
prova, sem distinções, portanto, quanto a eventual caráter ilícito da
prova.
A solução de tal embate, em princípio, é dada pelo próprio
Estatuto de Roma, que, em seu artigo 69.7, prevê a inadmissibilidade
de provas obtidas com violação do Estatuto ou das normas de direitos
humanos intemacionalmente reconhecidas, quando a violação suscite
sérias dúvidas sobre a fiabilidade2'3 das provas ou a sua admissão
atente contra a integridade do processo ou resulte em grave prejuízo
deste.
Sob tal óptica, portanto, o padrão de legalidade da prova a
ser admitido no processo penal internacional é o da subordinação e
estrita observância dos direitos humanos2'4, reputando-se, pois, como
ilícita a prova obtida com o emprego de meios contrários às disposi
ções do Estatuto de Roma e das normas de direitos humanos215, o que,
212 Estatuto de Roma, artigo 17. A jurisdição do TPI somente é exercida quando constatada a
inércia da jurisdição nacional causada por desídia política ou por incapacidade da máquina
persecutória.
213 Trata-se de vocábulo mal traduzido do espanhol fiabilidad.
214 Marcos Alexandre Coelho Zilli, doutor em Direito Processual Penal pela USP e professor da
mesma disciplina por aquela mesma faculdade, é um dos estudiosos do tema que entende a
existência do Tribunal Penal Internacional, por ser expressão de um consenso da comunidade
internacional, como submissa a um padrão de respeitabilidade da dignidade humana, razão
por que o caminho em direção à verdade no processo penal internacional deve ser sinalizado
pela necessidade de respeitabilidade dos direitos humanos, não podendo ser trilhado a qual
quer custo, por mais nobres que sejam os valores lesados e protegidos pela norma material. A
este respeito: ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. A prova ... Op. cit., p. 187.
215 ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. A prova ... Op. cit., p. 183.
Prova Ilícita no Processo 123
216 A este respeito, ZILLI, Marcos Alexandre Coelho (A prova ... Op. cit, p. 191), esclarece que,
"... em um quadro de confronto entre o exercício do poder punitivo internacional, de um lado, e
a observância de um padrão processual ético, de outro, o legislador inclinou-se, à primeira
vista, para o primeiro, decerto sensibilizado pela gravidade das condutas iesivas e pela impor
tância dos bens jurídicos tutelados... Em síntese, do embate entre o meio proibido e a verdade
por ele revelada, a tendência seria pela prevalência do último, desde que nos limites de uma
certa suporabilidade de sacrifícios dos direitos humanos...".
217 Artigo 120, do Decreto 4.388, de 25.09.2002, que promulga o Estatuto de Roma: “Não são
admitidas reservas a este Estatuto".
218 ESTATUTO DE ROMA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL
Preâmbulo
Os Estados Partes no presente Estatuto.
Conscientes de que todos os povos estão unidos por laços comuns e de que suas culturas fo
ram construídas sobre uma herança que partilham, e preocupados com o fato deste delicado
mosaico poder vir a quebrar-se a qualquer instante,
Tendo presente que, no decurso deste século, milhões de crianças, homens e mulheres têm
sido vítimas de atrocidades inimagináveis que chocam profundamente a consciência da huma
nidade,
Reconhecendo que crimes de uma tal gravidade constituem uma ameaça à paz, à segurança
e ao bem-estar da humanidade,
Afirmando que os crimes de maior gravidade, que afetam a comunidade internacional no seu
conjunto, não devem ficar impunes e que a sua repressão deve ser efetivamente assegurada
através da adoção de medidas em nível nacional e do reforço da cooperação internacional,
124 Fábio Aguiar Munhoz Soares
Decididos a por fim à impunidade dos autores desses crimes e a contribuir assim para a pre
venção de tais crimes,
Relembrando que é dever de cada Estado exercer a respectiva jurisdição penai sobre os res
ponsáveis por crimes internacionais,
Reafirmando os Objetivos e Princípios consignados na Carta das Nações Unidas e, em parti
cular, que todos os Estados se devem abster de recorrer à ameaça ou ao uso da força, contra
a integridade territorial ou a independência política de qualquer Estado, ou de atuar por qual
quer outra forma incompatível com os Objetivos das Nações Unidas,
Salientando, a este propósito, que nada no presente Estatuto deverá ser entendido como auto
rizando qualquer Estado Parte a intervir em um conflito armado ou nos assuntos internos de
qualquer Estado,
Determinados em perseguir este objetivo e no interesse das gerações presentes e vindouras,
a criar um Tribunal Penal Internacional com caráter permanente e independente, no âmbito dò
sistema das Nações Unidas, e com jurisdição sobre os crimes de maior gravidade que afetem
a comunidade internacional no seu conjunto,
Sublinhando que o Tribunal Penal Internacional, criado pelo presente Estatuto, será comple
mentar às jurisdições penais nacionais,
Decididos a garantir o respeito duradouro pela efetivação da justiça internacional,
Convieram no seguinte:
219
ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. (A prova ... Op. cit, p. 236), ao contrário, é taxativo quanto à
inadmissibilidade de ingresso da prova ilícita no processo, pois, por mais que o Estatuto de
Roma tenha outorgado à confiabilidade um importante papel na superação dos questiona
mentos sobre a admissibilidade da prova, não representa ela o único critério, já que devem ser
observados, ainda, os efeitos danosos à integridade do processo caso a prova a ele nele
incorporada, sendo dificil deixar de reconhecer o dano em face de uma prova obtida mediante
violação de direitos humanos consagrados internacionalmente. A prova arremata o autor não
poderia ser admitida.
220
A este respeito ver o profundo desenvolvido por ZILLI, Marcos Alexandre Coelho. A prova
Op. cit p. 136-138; LENSING, Hans. General Comments. In: BRADLEY, Craig (Ed.). Criminai
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Prova Ilícita no Processo 125
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Prova Ilícita no Processo 133
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s e -
praticar esses atos ou tendo em vista a prossecu 3. Para efeitos do presente Estatuto, entende-
ção dessa política; se que o termo "gênero" abrange os sexos mas
b) 0 "extermínio" compreende a sujeição culino e feminino, dentro do contexto da socieda
intencional a condições de vida, tais como a de, não lhe devendo ser atribuído qualquer outro
privação do acesso a alimentos ou medicamentos, significado.
com vista a causar a destruição de uma parte da Artigo 8o
população; Crimes de Guerra
c) Por "escravidão" entende-se o exercício, 1 .0 Tribunal terá competência para julgar os
relativamente a uma pessoa, de um poder ou de crimes de guerra, em particular quando cometidos
um conjunto de poderes que traduzam um direito como parte integrante de um plano ou de uma
de propriedade sobre uma pessoa, incluindo o política ou como parte de uma prática em larga
exercício desse poder no âmbito do tráfico de escala desse tipo de crimes,
pessoas, em particular mulheres e crianças;
2, Para os efeitos do presente Estatuto, en
d) Por "deportação ou transferência à força tende-se por "crimes de guerra":
de uma população" entende-se o deslocamento
a) As violações graves às Convenções de
forçado de pessoas, através da expulsão ou outro
ato coercivo, da zona em que se encontram Genebra, de 12 de Agosto de 1949, a saber,
qualquer um dos seguintes atos, dirigidos contra
legalmente, sem qualquer motivo reconhecido no
direito internacional; pessoas ou bens protegidos nos termos da Con
venção de Genebra que for pertinente:
e) Por "tortura" entende-se o ato por meio do i) Homicídio doloso;
qual uma dor ou sofrimentos agudos, físicos ou
mentais, são intencionalmente causados a uma ii) Tortura ou outros tratamentos desumanos,
pessoa que esteja sob a custódia ou o controle do incluindo as experiências biológicas;
acusado; este termo não compreende a dor ou os iii) 0 ato de causar intencionalmente grande
sofrimentos resultantes unicamente de sanções sofrimento ou ofensas graves à integridade física
legais, inerentes a essas sanções ou por elas ou à saúde;
ocasionadas; iv) Destruição ou a apropriação de bens em
f) Por "gravidez à força" entende-se a priva larga escala, quando não justificadas por quais
ção ilegal de liberdade de uma mulher que foi quer necessidades militares e executadas de
engravidada à força, com o propósito de alterar a forma ilegal e arbitrária;
composição étnica de uma população ou de v| 0 ato de compelir um prisioneiro de guerra
cometer outras violações graves do direito inter ou outra pessoa sob proteção a servir nas forças
nacional. Esta definição não pode, de modo algum, armadas de uma potência inimiga;
ser interpretada como afetando as disposições de vi) Privação intencional de um prisioneiro de
direito interno relativas à gravidez; guerra ou de outra pessoa sob proteção do seu
g) Por "perseguição" entende-se a privação direito a um julgamento justo e imparcial;
intencional e grave de direitos fundamentais em vii) Deportação ou transferência ilegais, ou a
violação do direito internacional, por motivos privação ilegal de liberdade;
relacionados com a identidade do grupo ou da viii) Tomada de reféns;
coletividade em causa; b) Outras violações graves das leis e costu
h) Por "crime de apartheid" entende-se qual mes aplicáveis em conflitos armados internacio
quer ato desumano análogo aos referidos no nais no âmbito do direito internacional, a saber,
parágrafo I o, praticado no contexto de um regime qualquer um dos seguintes atos:
institucionalizado de opressão e domínio sistemá i) Dirigir intencionalmente ataques à popula
tico de um grupo racial sobre um ou outros grupos ção civil em geral ou civis que não participem
nacionais e com a intenção de manter esse diretamente nas hostilidades;
regime; ii) Dirigir intencionalmente ataques a bens
i) Por "desaparecimento forçado de pessoas" civis, ou seja bens que não sejam objetivos
entende-se a detenção, a prisão ou o sequestro de militares;
pessoas por um Estado ou uma organização iii) Dirigir intencionalmente ataques ao pes
política ou com a autorização, o apoio ou a con soal, instalações, material, unidades ou veículos
cordância destes, seguidos de recusa a reconhe que participem numa missão de manutenção da
cer tal estado de privação de liberdade ou a paz ou de assistência humanitária, de acordo com
prestar qualquer informação sobre a situação ou a Carta das Nações Unidas, sempre que estes
localização dessas pessoas, com o propósito de tenham direito à proteção conferida aos civis ou
lhes negar a proteção da lei por um prolongado aos bens civis pelo direito internacional aplicável
período de tempo. aos conflitos armados;
Prova Ilícita no Processo 139
iv| Lançar intencionalmente um ataque, sa xvi) Saquear uma cidade ou uma localidade,
bendo que o mesmo causará perdas acidentais de mesmo quando tomada de assalto;
vidas humanas ou ferimentos na população civil, xvii) Utilizar veneno ou armas envenenadas;
danos em bens de caráter civil ou prejuízos exten xviii) Utilizar gases asfixiantes, tóxicos ou ou
sos, duradouros e graves no meio ambiente que tros gases ou qualquer líquido, material ou dispo
se revelem claramente excessivos em relação à sitivo análogo;
vantagem militar global concreta e direta que se xix) Utilizar balas que se expandem ou acha
previa; tam facilmente no interior do corpo humano, tais
v) Atacar ou bombardear, por qualquer meio, como balas de revestimento duro que não cobre
cidades, vilarejos, habitações ou edifícios que não totalmente o interior ou possui incisões;
estejam defendidos e que não sejam objetivos xx) Utilizar armas, projéteis; materiais e mé
militares; todos de combate que, pela sua própria natureza,
vi) Wlatar ou ferir um combatente que tenha causem ferimentos supérfluos ou sofrimentos
deposto armas ou que, não tendo mais meios para desnecessários ou que surtam efeitos indiscrimi
se defender, se tenha incondicionalmente rendido; nados, em violação do direito internacional aplicá
vii) Utilizar indevidamente uma bandeira de vel aos conflitos armados, na medida em que tais
trégua, a bandeira nacional, as insígnias militares armas, projéteis, materiais e métodos de combate
ou o uniforme do inimigo ou das Nações Unidas, sejam objeto de uma proibição geral e estejam
assim como os emblemas distintivos das Conven incluídos em um anexo ao presente Estatuto, em
ções de Genebra, causando deste modo a morte virtude de uma alteração aprovada em conformi
ou ferimentos graves; dade com o disposto nos artigos 121 e 123;
viii) A transferência, direta ou indireta, por xxi) Ultrajar a dignidade da pessoa, em parti
uma potência ocupante de parte da sua população cular por meio de tratamentos humilhantes e
civil para o território que ocupa ou a deportação degradantes;
ou transferência da totalidade ou de parte da xxii) Cometer atos de violação, escravidão
população do território ocupado, dentro ou para sexual, prostituição forçada, gravidez à força, tal
fora desse território; como definida na alínea f) do parágrafo 2o do
ix) Dirigir intencionalmente ataques a edifí artigo 7o, esterilização à força e qualquer outra
cios consagrados ao culto religioso, à educação, forma de violência sexual que constitua também
às artes, às ciências ou à beneficência, monumen um desrespeito grave às Convenções de Genebra;
tos históricos, hospitais e lugares onde se agru xxiii) Utilizar a presença de civis ou de outras
pem doentes e feridos, sempre que não se trate pessoas protegidas para evitar que determinados
de objetivos militares; pontos, zonas ou forças militares sejam alvo de
x) Submeter pessoas que se encontrem sob o operações militares;
domínio de uma parte beligerante a mutilações xxiv) Dirigir intencionalmente ataques a edifí
físicas ou a qualquer tipo de experiências médicas cios, material, unidades e veículos sanitários,
ou científicas que não sejam motivadas por um assim como o pessoal que esteja usando os
tratamento médico, dentário ou hospitalar, nem emblemas distintivos das Convenções de Genebra,
sejam efetuadas no interesse dessas pessoas, e em conformidade com o direito internacional;
que causem a morte ou coloquem seriamente em xxv) Provocar deliberadamente a inanição da
perigo a sua saúde; população civil como método de guerra, privando-
xi) Wlatar ou ferir à traição pessoas perten a dos bens indispensáveis à sua sobrevivência,
centes à nação ou ao exército inimigo; impedindo, inclusive, o envio de socorros, tal
xii) Declarar que não será dado quartel; como previsto nas Convenções de Genebra;
xiii) Destruir ou apreender bens do inimigo, a xxvi) Recrutar ou alistar menores de 15 anos
menos que tais destruições ou apreensões sejam nas forças armadas nacionais ou utilizá-los para
imperativamente determinadas pelas necessida participar ativamente nas hostilidades;
des da guerra; c) Em caso de conflito armado que não seja
xiv) Declarar abolidos, suspensos ou não ad de índole internacional, as violações graves do
missíveis em tribunal os direitos e ações dos artigo 3o comum às quatro Convenções de Genebra,
nacionais da parte inimiga; de 12 de Agosto de 1949, a saber, qualquer um
xv) Obrigar os nacionais da parte inimiga a dos atos que a seguir se indicam, cometidos
participar em operações bélicas dirigidas contra o contra pessoas que não participem diretamente
seu próprio país, ainda que eles tenham estado ao nas hostilidades, incluindo os membros das forças
serviço daquela parte beligerante antes do início armadas que tenham deposto armas e os que
da guerra; tenham ficado impedidos de continuar a combater
140 Fábio Aguiar Munhoz Soares
• Busca e apreensão.............................................................................................. 93
c
• Classificações sobre prova................................................................................. 49
• Código de Processo Penal, art. 157. Prova ilícita.............................................115
• Colisão entre princípios. Interpretação constitucional....................................... 73
• Conceito de prova. Breves anotações.................................................................47
• Conceito de verdade. Breves anotações............................................................. 37
• Conceituação de verdade (Marilena Chauí)....................................................... 39
• Conclusão......................................................................................................... 127
• Consequências. Prova ilícita no processo.......................................................... 51
• Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891. Histórico
da admissibilidade da prova ilícita no processo no Brasil.................................21
• Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934. Histórico
da admissibilidade da prova ilícita no processo no Brasil.................................22
•Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Histórico da
admissibilidade da prova ilícita no processo no Brasil..................................... 24
•Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Histórico da
admissibilidade da prova ilícita no processo no Brasil..................................... 26
• Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937. Histórico da admissibi
lidade da prova ilícita no processo no Brasil.....................................................23
• Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Histórico da admissibi
lidade da prova ilícita no processo no Brasil.....................................................23
• Constituição Política do Império do Brasil de 1824. Histórico da admissibi
lidade da prova ilícita no processo no Brasil.....................................................19
• Correntes doutrinárias acerca da admissibilidade da prova ilícita.................... 53
• Interceptação ambiental.....................................................................................89
• Interceptação. Prova em áudio (interceptação, escuta e gravação telefôni
cas)..................................................................................................................... 83
• Interpretaçãoconstitucional e colisão entre princípios....................................... 73
• Introdução...........................................................................................................15
• Itália. Breve histórico acerca da admissibilidade da prova ilícita no processo
em outros países................................................................................................. 29
144 Fábio Aguiar Munhoz Soares
• Referências. 131
Prova Ilícita no Processo 145
s
• Substância e forma. Verdade substancial e verdade formal..............................40
• Tortura.............................................................................................................. 108
• Tribunal Penal Internacional. Estatuto de Roma. Anexo................................. 137
• Tribunal Penal Internacional. Prova ilícita.......................................................121
• Verdade e prova................................................................................................. 37
• Verdade formal ou mentira formal no processo. Visão crítica.......................... 42
• Verdade substancial e verdade formal............................................................... 40
• Verdade. Busca da verdade pela prova..............................................................44
• Verdade. Conceito. Breves anotações................................................................37
• Verdade. Conceituação de verdade (Marilena Chauí)....................................... 39
• Visão crítica. Verdade formal ou mentira formal no processo..........................42