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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ

Patrícia Nogueira Ferreira

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA:


Aplicação do princípio da dignidade humana nas relações privadas

Macapá-AP
2017
Patrícia Nogueira Ferreira

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA:


Aplicação do princípio da dignidade humana nas relações privadas

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à


Universidade Federal do Amapá, como quesito
avaliativo para a disciplina TCC II.
Orientado pelo Prof. Me. Zacarias Alves de Araújo
Neto.
Área de concentração: Direito Constitucional

Macapá-AP
2017
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Biblioteca Central da Universidade Federal do Amapá

342.085
F383d Ferreira, Patrícia Nogueira.

Dignidade da pessoa humana: aplicação do princípio da dignidade


humana nas relações privadas / Patrícia Nogueira Ferreira;
orientador, Zacarias Alves de Araújo Neto. – Macapá, 2017.
39 p.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Fundação


Universidade Federal do Amapá, Coordenação do Curso de Direito .

1. Dignidade (Direito). 2. Dignidade humana. 3. Relações privadas.


I. Araújo Neto, Zacarias Alves de, orientador. II. Fundação
Universidade Federal do Amapá. III. Título.
Patrícia Nogueira Ferreira

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA:


Aplicação do princípio da dignidade humana nas relações privadas

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à


Universidade Federal do Amapá, como quesito
avaliativo para a disciplina TCC II.
Orientado pelo Prof. Me. Zacarias Alves de Araújo
Neto.
Área de concentração: Direito Constitucional.

_______________________________________________________
Prof. Me. Zacarias Alves de Araújo Neto (Orientador)

_______________________________________________________
1º Examinador

_______________________________________________________
2º Examinador

Macapá, ___ de ____________ de 2017


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACJ – Apelação Civil no Juizado Especial
Art. – Artigo
BGB- Código Civil Alemão
CRFB- Constituição da República Federativa do Brasil
DF – Distrito Federal
DJU – Diário de Justiça da União
EUA- Estados Unidos da América
LF- Lei Fundamental
OIT – Organização Internacional do Trabalho
ONU- Organização das Nações Unidas
RE – Recurso Extraordinário
RH – Recursos Humanos
RJ – Rio de Janeiro
SP – São Paulo
STF – Supremo Tribunal Federal
TRT- Tribunal Regional do Trabalho
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................8
2 APONTAMENTOS SOBRE O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA.......................10
2.1 Conceito de Dignidade da Pessoa Humana.........................................................................10
2.2 Reconhecimento da Dignidade Humana como Princípio Basilar.......................................16
3 A INFLUÊNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE NA CONSTRUÇÃO DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS................................................................................................20
3.1 O Avanço nos Modelos Constitucionais. Dignidade Humana, Valor a ser seguido...........21
3.2 Do Estado Liberal de Direito ao Estado do Bem-Estar Social...........................................22
3.3 Estado Constitucional Contemporâneo: o Novo Modelo Constitucional...........................24
3.4 O Constitucionalismo Brasileiro e a Dignidade da Pessoa Humana. Da Relação Vertical a
Relação Horizontal dos Direitos Fundamentais........................................................................25
4 DIREITOS FUNDAMENTAIS APLICADOS COMO REFLEXO DA DIGNIDADE
HUMANA.................................................................................................................................28
4.1 A Ineficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas e a Doutrina do „State
Action’, nos EUA......................................................................................................................28
4.2 A Eficácia Mediata e Indireta dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas.............30
4.3 A Eficácia Imediata e Direta dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas...............31
4.4 A Sustentação da Aplicação da Dignidade da Pessoa Humana nas Relações Privadas......32
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................38
REFERÊNCIAS........................................................................................................................40
RESUMO

O trabalho aborda acerca da sustentação da aplicação da dignidade da pessoa humana nas relações privadas,
considerando as discussões teóricas e julgados de Tribunais Brasileiros, no sentido da aplicação direta daquele
princípio. Para tanto, a pesquisa foi pensada a partir das diversas relações travadas no seio social, nas quais,
muitas vezes, tem um sujeito particular que viola a dignidade humana de outro sujeito da mesma relação jurídica.
A partir disso, surge como questionamento a sustentação da aplicação da dignidade da pessoa humana nas
relações privadas. A hipótese da pesquisa surge quando se constata que a imperatividade do princípio da
dignidade humana, posta na CRFB, de 1988, é tão intensa que vincula o Poder Público e os particulares à sua
observância. Para isso, o trabalho se valeu de uma abordagem qualitativa com enfoque interpretativo e
compreensivo, ambos pautados em levantamento bibliográfico e em pesquisa documental. Assim, partindo em
linhas gerais sobre discussões teóricas e julgados dos Tribunais Brasileiros que sustentam a incidência direta
daquele princípio nas relações privadas, os resultados mostram-se positivos, pois devido ao inequívoco contraste
que possui a sociedade brasileira, com forte disparidade econômica e social, os direitos conquistados pelos
indivíduos devem ser respeitados em todos os meios de relação, seja ela pública ou privada, pois ao contrário
disso, a dignidade humana se encontrará fortemente ameaçada.

PALAVRAS-CHAVE: DIGNIDADE HUMANA. RELAÇÕES PRIVADAS. SUSTENTAÇÃO DA


APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO. DISCUSSÕES TEÓRICAS E JUDICIAIS.
ABSTRACT

The paper deals with the sustainability of the application of the dignity of the human person in private relations,
considering the theoretical discussions and judgments of the Brazilian Courts, in the sense of direct application
of that principle. For this, the research was thought from the diverse relationships locked in the social sphere, in
which, often, it has a particular subject that violates the human dignity of another subject of the same legal
relation. From this, the question of sustaining the application of the dignity of the human person in private
relations arises as a question. The hypothesis of the research arises when it is verified that the imperative nature
of the principle of human dignity, put in the 1988 CRFB, is so intense that it binds the Public Power and
individuals to its observance. For this, the work was based on a qualitative approach with an interpretative and
comprehensive approach, both based on bibliographical research and documental research. Thus, starting from
the theoretical discussions and judgments of the Brazilian Courts that support the direct incidence of that
principle in private relations, the results are positive, because due to the unequivocal contrast between Brazilian
society and a strong economic and social disparity, The rights conquered by individuals must be respected in all
means of relation, be it public or private, because human dignity, on the other hand, will be strongly threatened.

KEYWORDS: HUMAN DIGNITY. PRIVATE RELATIONS. SUPPORT OF THE APPLICATION OF THE


PRINCIPLE. THEORETICAL AND JUDICIAL DISCUSSIONS.
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1 INTRODUÇÃO

Em virtude das diversas relações que são travadas no seio social por sujeitos
particulares ligadas às fortes influências de poderes sociais e econômicos, que um dos polos,
geralmente, o que possui maior barganha, desrespeita um atributo intrínseco do ser humano
que é a sua dignidade. Neste cenário, sob influência da intangibilidade do princípio da
dignidade humana, que ganhou status de valor supremo em disposições jurídicas
internacionais, como a Declaração Universal do Direitos do Homem de 1948 e a Carta da
Organização das Nações Unidas (ONU), de 1945, após o terror da Segunda Guerra Mundial, e
nas Constituições Democráticas, a exemplo da Constituição da República Federativa do Brasil
(CRFB), de 1988, que este trabalho, com supedâneo na doutrina alemã que elaborou teorias
para aplicação direta dos direitos nas relações privadas, discutirá sobre a sustentação da
aplicação da dignidade da pessoa humana nestas relações.
O trabalho foi pensado a partir de várias ofensas ao princípio da dignidade humana
praticadas por sujeitos particulares a outros particulares, que embora se encontrem na mesma
arquitetura jurídica, o forte poder social de uns, notadamente marcado pelas disparidades
econômicas, ressalta a sua posição no que se conhece por relações horizontais. Nessa
perspectiva, a pesquisa discute acerca da aplicação da dignidade da pessoa humana também
para as relações privadas, nas quais se nota que é no contexto social particular que alguns
indivíduos violam a dignidade do outro.
Tendo em vista o ambiente apresentado, busca-se responder ao problema científico:
qual a sustentação da aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana nas relações
privadas?
Assim, surge a seguinte hipótese deste trabalho: a imperatividade do princípio da
dignidade humana posta na CRFB, de 1988, é tão intensa que vincula o Poder Público e os
particulares à sua observância.
O objetivo geral é demonstrar as discussões teóricas e julgados de Tribunais
Brasileiros que sustentam a aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana nas
relações que têm como polos contrapostos sujeitos privados. Já quanto aos objetivos
específicos, serão apresentados: os apontamentos sobre o princípio da dignidade humana; a
influência daquele princípio na construção dos direitos fundamentais e; direitos fundamentais
aplicados como reflexo da dignidade humana.
10

Para isso, o trabalho segue uma abordagem qualitativa com enfoque interpretativo e
compreensivo, ambos pautados em levantamento bibliográfico e em pesquisa documental.
Dentre vários autores explorados neste trabalho, surgem como principais: Ingo Wolfgang
Sarlet, Daniel Sarmento, Luís Roberto Barroso e Carmem Lúcia Antunes Rocha.
A pesquisa está estruturada em três capítulos. No primeiro, trabalhou-se, a partir da
análise de algumas dimensões, sobre o conceito de dignidade humana e a sua posição como
status de valor supremo das Constituições Democráticas de Direito. No segundo capítulo,
abordou-se a construção dos direitos fundamentais, cuja influência decorreu do princípio da
dignidade humana. Assim, trabalhou-se os avanços dos modelos constitucionais, nos quais,
tinham e têm a dignidade humana como extensor dos direitos fundamentais. E no terceiro
capítulo, foi apresentado as teorias que negam e aceitam a aplicação direta nas relações
privadas. E, ainda a apresentação de julgados brasileiros e discussões teóricas a respeito da
aplicação da dignidade humana nessas relações.
A questão enfrentada na pesquisa, de início, foi a dificuldade em reunir acervo
doutrinário, justamente, no que tange ao princípio da dignidade da pessoa humana, visto que
as discussões em torno da aplicação direta daquele em ambientes privados, ainda são
incipientes. Mas no que tange aos julgados de Tribunais brasileiros, a aplicação do princípio
da dignidade humana nas relações privadas, vem sendo mais ressaltada, pois observa-se que
por ser o núcleo do ordenamento jurídico sua incidência deve se expandir também naqueles
ambientes. Assim, a pesquisa objetiva provocar reflexões teóricas acerca da necessidade de
sua aplicação para as relações particulares, visto que nesse ambiente, a sua violação também é
praticada.
11

2 APONTAMENTOS SOBRE O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA


HUMANA

2.1 Conceito de Dignidade da Pessoa Humana

A dignidade da pessoa humana, conforme os apontamentos de Ingo Wolfgang Sarlet


(2009), encontra sua evolução na filosofia, uma vez que esta é responsável pelas
transformações do pensamento humano sobre dignidade e também pela compreensão do que é
ser pessoa e de quais os valores que lhe são inerentes. Contudo, a dignidade ainda é carente de
uma definição, haja vista ser caracterizada pela imprecisão, ambiguidade e porosidade.
Consoante se verifica que a dignidade é algo vivenciado concretamente por cada ser
humano, o Direito busca tutelar esse bem, reconhecendo-o e protegendo-o (SARLET, 2009).
Portanto, necessária será a busca de um conteúdo jurídico para a dignidade da pessoa humana.
Sarlet (2009), quando da busca de um conteúdo jurídico para a dignidade, traz
algumas dimensões1 acerca desse entendimento como princípio jurídico2 e, portanto, como
fundamento de direitos e deveres fundamentais que cada indivíduo possui, fazendo lembrar,
no entanto, que essas ideias, ou seja, dimensões não se excluem.
A primeira dimensão de que trata o autor é a respeito da ontologia (ciência que estuda
o ser), mas que para ele, não será necessariamente biológica da dignidade. Ensina que a
dignidade é uma qualidade intrínseca da pessoa, um valor próprio que cada pessoa possui pelo
fato de ser pessoa. Contudo, esse valor não se atribui necessariamente pela sua biologização,
geneticamente programada, tal como a cor dos cabelos, cor dos olhos, entre outros fatores
genéticos, isto é, que essa qualidade não seria exclusivamente uma qualidade biológica, mas
que também seria o reconhecimento dos indivíduos como iguais em dignidade e direitos.
(SARLET, 2009).
Na esteira de José Afonso da Silva (1998), a dignidade da pessoa humana por ser um
valor supremo, atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito
à vida. Isso se dá porque, segundo o autor, a dignidade é atributo intrínseco, da essência, da
pessoa humana, único ser que compreende um valor interno, superior a qualquer preço, que
não admite substituição equivalente.

______________
1
Quando trata das dimensões, refere-se à complexidade da própria pessoa humana e no meio no qual
desenvolve sua personalidade, e além disso, que a noção de dignidade da pessoa humana integra um conjunto de
fundamentos e uma série de manifestações.
2
Sobre este ponto, tratar-se-á em tópico apartado.
12

Este pensamento, de inspiração Kantiana, tem o homem como possuidor de valor


absoluto, pois ele, por ser dotado de razão, existe como fim em si mesmo e, portanto, não
pode ser considerado simplesmente como meio (DA SILVA, 1998).
Ademais, G. Dürig citado por Sarlet (2009) diz que na dimensão ontológica, a
dignidade da pessoa humana é um atributo, elemento integrante e qualificador do ser humano,
e como tal dele não pode ser apartado, sendo, portanto, irrenunciável e inalienável.
Sarlet (2009) explica ainda que pela dimensão ontológica de dignidade humana, não
há que se verificar as circunstâncias como cada pessoa se comporta, visto que a dignidade
independe das circunstâncias concretas, já que inerente a toda e qualquer pessoa.
E mais, seguindo o pensamento acima, embora a conduta praticada pelo ser humano
seja mesmo um comportamento indigno, ainda assim, deste não poderá ser privado os direitos
fundamentais que lhe são inerentes, não sendo concebido afirmar, como antes fazia São
Tomás de Aquino, a pena de morte ao homem que, ao delinquir, decaia em sua dignidade,
rebaixando-se a condição de bestas, pois se apartava da ordem da razão (DA SILVA, 1998).
Para a segunda dimensão de dignidade humana, busca-se ir além da pessoa
isoladamente considerada, indo, portanto, ao encontro de um conteúdo de interações, de
relações sociais com a comunidade. A esta dimensão Sarlet (2009, p. 23) define sob o título
“dignidade e intersubjetividade: a dimensão comunicativa e relacional da dignidade da pessoa
humana como o reconhecimento pelo(s) outro(s)”.
Nessa dimensão, a dignidade da pessoa, além de estar ligada a condição humana de
cada indivíduo, também se encontra ligada a relação social, constituída por cada indivíduo.
Nas palavras de Sarlet, o seguinte:
Mesmo sendo possível [...] sustentar que a dignidade da pessoa se encontra,
de algum modo, ligada (também) à condição humana de cada indivíduo, não
há como desconsiderar a necessária dimensão comunitária (ou social) desta
mesma dignidade de cada pessoa e de todas as pessoas, justamente por serem
todos reconhecidos como iguais em dignidade e direitos (na iluminada
fórmula da Declaração Universal de 1948) e pela circunstância de nesta
condição conviverem em determinada comunidade (SARLET, 2009, p. 23-
24).

Válidas são as contribuições de Patrícia Mattos (2016) para a dimensão ora tratada. A
autora aborda acerca dos estudos de Axel Honneth, no qual tem como enfoque a teoria do
reconhecimento presente nos primeiros trabalhos de Hegel, denominados trabalhos da
juventude de Jena. De acordo com Mattos (2016), Honneth acredita que os trabalhos do
jovem Hegel continham insights importantes, mas que não foram desenvolvidos em seus
13

estudos. A teoria do reconhecimento trabalha sob três perspectivas: o Amor, o Direito e a


Solidariedade
Com o intuito de trabalhar tais insights, Honneth tem como referência os estudos de
Mead, sobre a psicologia social envolvida no processo de reconhecimento recíproco. A sua
intenção era saber se as formas de reconhecimento deixam-se ordenar por formas recíprocas
de desrespeitos, através de sua articulação, propiciado por lutas de reconhecimento
(MATTOS, 2006).
Desse modo, combinando as experiências de Hegel e Mead, que Honneth tenta
mostrar como os conflitos sociais são essencialmente baseados numa luta pelo
reconhecimento social e esta, por sua vez, seria o motor das mudanças sociais (MATTOS,
2006). De tal sorte, o que Honneth quis deixar claro com seus estudos, é que a luta pelo
reconhecimento assegura as condições de liberdade interna e externa sob o critério
universalizante.
Neste contexto, a perspectiva intersubjetiva da dignidade da pessoa humana deve
implicar uma obrigação geral de respeito, onde traduzem-se em uma conexão de deveres e
direitos correlativos (SARLET, 2009).
Ao tratar da terceira dimensão, intitulada por Sarlet (2009, p. 27) como: “a dignidade
como construção: indispensabilidade de uma perspectiva histórico-cultural”, o autor aduz que
os apontamentos feitos anteriormente reforçam a observação de que a dignidade da pessoa
humana, por tratar-se de categoria axiológica aberta, não poderá ser conceituada de maneira
fixista, haja vista, possuir um pluralismo e diversidade de valores que se manifestam nas
sociedades democráticas contemporâneas.
Partindo desse ponto, o autor lembra que há apontamentos para o fato de não se
considerar a dignidade da pessoa apenas como algo inerente à natureza humana, pois a
dignidade também possui um sentido cultural, haja vista ser fruto do trabalho de diversas
gerações e da humanidade em seu todo. Ainda afirma que as dimensões natural e cultural da
dignidade se complementam e interagem mutuamente, e mais, guardam laços com o que
chama de dimensão prestacional3 (ou positiva) da dignidade (SARLET, 2009).
Para a dimensão ora estudada, é algo que necessariamente tem que se concretizar
histórico culturalmente, haja vista, que Sarlet (2009), ao citar Ernst Benda, concorda que a
noção de dignidade não deve se desvanecer como mero apelo ético, mas que o seu conteúdo

______________
3
Sobre este ponto, tratar-se-á na próxima dimensão de dignidade humana trazida pelo autor, tomando como
referência a doutrina de Dworkin.
14

seja determinado no contexto da situação concreta da conduta estatal e do comportamento de


cada pessoa humana.
Seguindo nesta linha de pensamento, o autor demonstra uma distinção entre dignidade
humana- explanando uma dignidade reconhecida a todos os seres humanos,
independentemente se sua condição pessoal, concreta - e dignidade da pessoa humana, onde
afirma ser concretamente considerada, no contexto do seu desenvolvimento social e moral
(SARLET, 2009).
Para demonstrar a respeito da dignidade da pessoa humana, o autor exemplifica esta
dimensão, abaixo:
[...] a evolução da natureza das penas em matéria criminal ao longo do
tempo, já que na mesma sociedade ocidental, que já reconhecia a dignidade
da pessoa como um valor até mesmo para o Direito, determinadas penas
inicialmente aceitas como legítimas, foram proscritas em função de
representarem violações da dignidade da pessoa humana (SARLET, 2009, p.
28-29)

Vê-se que, de fato, a dimensão da dignidade como construção: indispensabilidade de


uma perspectiva histórico-cultural ganha bastante sentido para o contexto social analisado
concretamente, pois, o que pode ser indigno para uma dada sociedade poderá não ser para
outra.
No que tange à quarta dimensão da dignidade, como limite e como tarefa, o autor trata
sobre uma dimensão que denomina como dúplice, haja vista, se manifestar simultaneamente
com expressão da autonomia e da proteção da dignidade.
Consoante entendimento do autor, essa dimensão dúplice é essencial, uma vez que as
pessoas possuem expressão de autonomia. Com isso, sendo possuidoras de autodeterminação,
tomam decisões cruciais acerca da sua existência. Para isso é necessário que tanto o Estado
como também a comunidade preste assistência, ou seja, deem proteção, especialmente quando
por qualquer circunstância lhes faltarem a capacidade de autonomia acerca da própria
existência (SARLET, 2009).
Seguindo esse raciocínio, a dignidade não poderá ser negligenciada. Assim, dada as
circunstâncias, poderá a autonomia da expressão sofrer limitação, prevalecendo, a perspectiva
assistencial, protetiva da dignidade (SARLET, 2009).
Sarlet (2009), lembra que a concepção dúplice de dignidade, é embasada na doutrina
de Dworkin, onde demonstra a dificuldade de se explicar que mesmo aqueles que, dada as
circunstâncias, devem também receber tratamento digno.
15

Afirma que Dworkin parte do pressuposto de que a dignidade possui tanto uma voz
ativa quanto uma voz passiva e que ambas se encontram conectadas. Encontrando, assim, no
valor intrínseco da vida humana, de todo e qualquer ser humano, a explicação para o fato de
que mesmo aquele que já não possui a consciência da própria dignidade merece ter a sua
dignidade considerada e respeitada (SARLET, 2009).
Partindo principalmente4 da doutrina de Ronald Dworkin que Sarlet (2009) apresenta a
dimensão dúplice de dignidade, apontando para uma paralela e conexa dimensão defensiva e
prestacional. Portanto constata que a dignidade é simultaneamente limite e tarefa dos poderes
estatais, e ainda também da comunidade em geral.
Como limite, a dignidade implica não apenas que a pessoa não pode ser
conduzida a condição de mero objeto da ação própria de terceiros, mas
também o fato de que a dignidade gera direitos fundamentais (negativos)
contra atos que a violem ou a exponham a graves ameaças. Como tarefa, da
previsão constitucional (explícita ou implícita) da dignidade da pessoa
humana, dela decorrem deveres concretos de tutela por parte dos órgãos
estatais, no sentido de proteger a dignidade de todos, assegurando-lhe
também por meio de medidas positivas (prestações) o devido respeito e
promoção (SARLET, 2009, p 32).

Na busca de um conteúdo jurídico necessariamente aberto sobre dignidade da pessoa


humana, o autor irá abordar, além do que já foram expostos em linhas anteriores, a quinta
dimensão que parte da fórmula minimalista do homem-objeto para uma conceituação
minimamente objetiva, a fim de fazer um sentido concretizável.
Tal dimensão encontra no seu sentido a mesma concepção kantiana, de que o homem
não deve ser rebaixado a coisa, pois tem valor em si mesmo. Günter Dürig apud Sarlet (2009),
desenvolveu na Alemanha a fórmula do homem-objeto ou homem-instrumento. Para ele
sempre que o homem, no caso concreto, fosse rebaixado a mero instrumento, tinha sua
dignidade descaracterizada e ainda desconsiderado como sujeito de direitos.
Para Sarlet (2009), apesar de que a concepção do homem-objeto ou homem-
instrumento tenha um grande número de adeptos, sendo adotado inclusive no Tribunal
Constitucional da Alemanha, lugar onde a fórmula foi desenvolvida, não poderá, segundo ele,
oferecer uma solução global para o problema, haja vista não definir previamente o que deve
ser protegido, permitindo, contudo, a verificação, à luz do caso concreto, a existência de
efetiva violação da dignidade da pessoa humana.

______________
4
Assume relevância, dentre outros, nos estudos da dimensão da dignidade como limite e como tarefa: a dupla
dimensão negativa e prestacional da dignidade- os apontamentos de Dieter Grimm apud Sarlet (2009). Para ele a
dignidade, na condição de valor intrínseco do ser humano, gera para o indivíduo o direito de decidir de forma
autônoma sobre seus projetos existenciais e felicidades, ainda quando esta autonomia lhe faltar, mesmo assim
deverá sua dignidade ser respeitada pela sua condição humana.
16

Vale mencionar que, de acordo com o autor, tal fórmula fornece, ao menos, um
caminho a ser trilhado, pois ao longo do tempo, deu suporte à doutrina e à jurisprudência para
identificar uma série de posições que integram a noção de dignidade da pessoa humana e que
com isso, reclamam a proteção pela ordem jurídica (SARLET, 2009).
Consoante se verifica da fórmula minimalista do homem-instrumento é que onde não
houver respeito pela vida e pela integridade física e moral do ser humano, ou seja, quando não
houver o mínimo de condições para uma existência digna, onde não houver limitação do
poder, onde não houver liberdade e autonomia, enfim, onde uma série de garantias e direitos
fundamentais não forem reconhecidos e minimamente protegidos, não haverá lugar para se
falar de dignidade da pessoa humana e, portanto, a pessoa poderá não passar de mero
instrumento, objeto de arbítrios e injustiças (SARLET, 2009)
Com efeito, verifica-se que também para a ordem jurídico constitucional a concepção
do homem-objeto, com todas as suas nuances que devem ser extraídas, constitui, de acordo
com Sarlet (2009), justamente a antítese da dignidade da pessoa humana, apesar de que não
poderá ser analisada somente no sentido negativo, ou seja, na verificação da exclusão de atos
desumanos e degradantes, pois estaria, a restringir, por muito, o âmbito da proteção da
dignidade e, portanto, necessária a sua concretização por meio de outros princípios e direitos
fundamentais, que contemplem tanto o sentido negativo como o sentido positivo.
Neste sentido, consoante entendimento de Sarlet (2009), tem-se o delicado problema
de um conceito minimalista ou maximalista de dignidade que se encontra subjacente na
concepção desenvolvida por Boaventura Santos. Santos apud Sarlet (2009), a fim de ampliar
ao máximo a consciência da amplitude mútua entre diversas culturas por meio do diálogo,
sugere o que chama de hermenêutica diatópica.
Desse modo, sustenta que o conceito de direitos humanos e a própria noção de
dignidade da pessoa assentam num conjunto de pressuposto tipicamente ocidentais, mas que
segundo ele, em verdade, todas as culturas possuem. Apesar de que nem todas essas culturas a
concebam em termos de direitos humanos. De tal sorte que se impõe o estabelecimento de um
diálogo intercultural, com a finalidade de troca permanente de culturas e saberes, viabilizada
pela aplicação de uma hermenêutica diatópica (SARLET, 2009).
Por toda a exposição acerca das dimensões sobre dignidade da pessoa humana é que se
chega à conceituação jurídica desenvolvida pelo autor, a seguir:
A dignidade da pessoa humana é a qualidade intrínseca e distintiva
reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito
e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste
sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a
17

pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e


desumano, como venham a garantir as condições existenciais mínimas
para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa
e co-responsável nos destinos da própria existência com os demais seres
humanos (SARLET, 2009,p. 37, grifou-se).

O conceito que o autor apresenta faz sentido quando se visualiza a complexidade da


pessoa humana, pois nenhum indivíduo é igual ao outro e também a multiplicidade de fatores
que os rodeiam, influenciando em seu desenvolvimento. Os pontos abordados foram concisos,
no entanto, faltou o autor deixar mais claro, em seus estudos, o que seria ato de cunho
degradante e desumano e, ainda, o que seria condições existenciais mínimas para uma vida
saudável.

2.2 Reconhecimento da Dignidade Humana como Princípio Basilar

O reconhecimento da dignidade humana como valor fundante de um Estado


Democrático de Direito se dá de maneira paulatina, tendo, no entanto, desde tempos remotos
uma noção de valor humano (ROCHA,1999)5
Embora não tivesse sido erigida como axioma jurídico, a dignidade humana já de
muito tempo traz uma noção de valor humano, como por exemplo, na tragédia de Sófocles,
intitulada „Antígona‟. Após o duelo mortal entre os irmãos de Antígona, o então rei Creonte,
que assume o trono de Tebas, baixa um decreto dando todas as honras de sepultamento a
Etéocles, mas nega a Polinice, porque é considerado traidor. Com isso seu cadáver deveria ser
insepulto para que ficasse a mercê dos abutres (SÓFOCLES, 2005).
Inconformada com o decreto real, Antígona contesta a lei do homem em face da lei
divina, questionando: Como uma lei do homem pode dar tratamento desigual em relação aos
cadáveres de homens de bens e de homens criminosos? Se até Hades, que é o deus do
subterrâneo, dará o mesmo tratamento a seus irmãos (SÓFOCLES,2005).
Ganhando destaque na história das ideias, Luís Roberto Barroso (2010) explica que a
dignidade da pessoa humana, passa a figurar em documentos jurídicos, somente no final da
segunda década do século XX. Segundo o autor, a Constituição do México de 1917,
juntamente com a Constituição de Weimar de 1919 foram os primeiros diplomas jurídicos que
albergaram a dignidade da pessoa humana.

______________
5
Carmen Lúcia Antunes Rocha. O princípio da dignidade da pessoa humana e a exclusão social, texto
mimeografado, em palestra proferida na XVII Conferência Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Rio de
Janeiro, 29 de agosto a 2 de setembro de 1999.
18

Corroborando com o posicionamento acima, Sarlet (2009), cita como exemplo o art.
151, inc. III da Constituição de Weimar, onde tratava acerca da dignidade humana,
disciplinando assim, que a atividade econômica deve corresponder aos princípios da justiça,
com vista a assegurar uma existência humana digna para todos. Nesses limites, assegura-se a
liberdade econômica dos indivíduos.
Barroso (2010) ao lecionar sobre a trajetória da dignidade humana no século XX,
ensina que ela se tornou um objetivo político, almejado tanto pelo Estado como pela
sociedade e, que houve uma transposição gradativa para a seara jurídica, tudo em razão de
dois movimentos. Destaca o autor, como primeiro movimento o surgimento de uma cultura
pós-positivista, e o segundo consistente na inclusão da dignidade da pessoa humana em
diferentes diplomas jurídicos.
Desse modo, conforme a doutrina pós-positivista, busca-se ir além da legalidade
estrita, sem menosprezar o direito posto, procurando-se compreender uma leitura moral da
Constituição e das Leis, mas sem recorrer a categorias metafísicas, onde enxergava a mera
formulação de opiniões pessoais insuscetíveis de controle. (BARROSO, 2013).
No que tange a sua inclusão em pactos internacionais, foi somente após a Segunda
Guerra Mundial que a dignidade humana se tornou um dos grandes consensos éticos do
mundo ocidental, materializando-se em importantes diplomas nacionais e internacionais6.
(BARROSO, 2013).
Corroborando a lição exposta acima, no que tange ao reconhecimento nos sistemas
constitucionais positivos como fundamento e ainda concebendo a dignidade humana com
significado amplo, tendo o homem valor em si mesmo, este deu-se como reação contra
inaceitáveis excessos de ideologia nazista7, que cunhou a ideia de categorias diferentes de
homens, com direitos e condições absolutamente distintas. As formulações jurídicas após a
Segunda Guerra Mundial passam a ser embasadas pela dignidade da pessoa humana,
tornando-se valor caro sobre qualquer outra ideia e acentua-se como valor supremo (ROCHA,
1999).
No mesmo sentido, é a contribuição de Marcelo Novelino (2014), onde explica que
com o final da Segunda Guerra Mundial surge o neoconstitucionalismo. Tal termo denomina
o que se conhece por Constitucionalismo Contemporâneo, robustece e eleva o princípio da

______________
6
Surgem como principais documentos no plano internacional a Carta da ONU de 1945 e a Declaração Universal
dos Direitos do Homem de 1948.
7
Conforme Ingo Sarlet, o holocausto vivido na Segunda Guerra Mundial fez com que surgisse importantes
diplomas nacionais. Na Alemanha, por exemplo, o surgimento da Lei Fundamental de Bonn de 1949,
19

dignidade da pessoa humana a um valor axiológico atingindo status de valor supremo nas
Constituições.
Em que pese os perfis do novo modelo Constitucional adotado pelos Estados
Democráticos, Daniel Sarmento (2010) ressalta como uma das principais características do
Direito Constitucional Contemporâneo, a proeminência atribuída aos princípios, como
reconhecimento da sua força normativa.
Neste diapasão, a dignidade humana consagra e unifica todo o sistema de direitos
fundamentais, como bem elucidou Sarmento (2010), a dignidade se torna o âmago do sistema
constitucional, que irradia seus efeitos por todo o ordenamento jurídico. Nesse sentido, ainda
segundo o autor, a dignidade da pessoa humana é o princípio mais relevante da ordem
jurídica, alicerçando o direito positivo sobre profundas bases éticas.
Com isso, segundo os apontamentos feitos por Rocha (1999), a constitucionalização
do princípio da dignidade da pessoa humana, altera toda a construção jurídica, visto que tal
princípio delineia toda a elaboração do Direito, já que se torna elemento fundamental da
ordem constitucional e posta como matriz do sistema. Dessa maneira, a dignidade da pessoa
humana é havida como superprincípio constitucional.
Posto isso, para robustecer as contribuições dos autores citados, traz-se para melhor
compreensão acerca do tema, o art. 1º da Declaração Universal dos Direitos do Homem de
1948, que assim disciplina “Art. 1º Todos os seres humanos nascem iguais em dignidade e
direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com
espírito de fraternidade”.
No cenário nacional, sendo tema inédito8, a dignidade humana tem tratamento
explícito logo no artigo 1º inc. III da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB),
de 1988, erigida como fundamento da República, dessa maneira, assim dispõe:
“Art.1º A República Federativa do Brasil formada pela união indissolúvel dos Estados
e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como
fundamentos: [...] III- a dignidade da pessoa humana”.
Segundo os apontamentos feitos por Rocha (1999), ao referir-se sobre a recepção feita
pela Lei Maior Brasileira, no que toca a dignidade humana como fundamento, afirma que,
dessa maneira, é posta como fundamento da própria organização política do Estado
Democrático de Direito, pois existe para o homem, a fim de assegurar condições políticas,
______________
8
Conforme Rocha (1999), o tema sobre dignidade da pessoa humana é tratado pela primeira vez na Carta Magna
de 1988, já que nos textos constitucionais que a antecederam não havia nenhuma disciplina acerca daquele
princípio.
20

sociais, econômicas e jurídicas que permitam que ele atinja os seus fins. Complementa ainda
que, o homem é o fim em si mesmo, ou seja, como sujeito de dignidade, de razão digna e
supremamente posto acima de todos os bens e coisa, inclusive do próprio Estado.
Dessa maneira, ao erigir o princípio da dignidade da pessoa humana como valor
fundante e robustecido como valor axiológico, Rocha (1999, [s. p]) afirma o seguinte: “aquele
princípio se converteu, pois, no coração do patrimônio jurídico-moral da pessoa humana
estampado nos direitos fundamentais acolhidos e assegurados na forma posta no sistema
constitucional”.
21

3 A INFLUÊNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA NA CONSTRUÇÃO


DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

No que toca as várias acepções que a dignidade humana se apresenta, dentre as quais,
a carga valorativa que carrega, isto é, pela dimensão axiológica de dignidade, para Sarmento
(2010), é nesse plano ligado a ideia de justo e bom, que a dignidade humana se torna razão
moral dos direitos fundamentais.
Tal plano ético fez com que a dignidade humana, logo após a Segunda Guerra
Mundial, passasse a ser positivada em diversos documentos nacionais, como a Constituição
da Alemanha, do Brasil9, e, documentos internacionais, como a Carta da ONU de 1945,
Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, tornando-se valor fundamental, que
serve tanto como justificação moral como também fundamento normativo para os direitos
fundamentais (BARROSO, 2010).
Assim, a dignidade humana traduz-se num feixe de garantias e direitos fundamentais
que cabe a cada indivíduo. Como afirma Sarlet (2006), a dignidade humana, designadamente
na sua conexão com os direitos fundamentais, toma-se como sua função. Portanto, critério
para a construção de conceito materialmente aberto de direitos fundamentais na ordem
constitucional brasileira.
A fonte fática para a entronização da dignidade humana e a consequente garantia dos
direitos fundamentais foi justamente as reações contra a inaceitável ideologia nazista que,
cunhava o raciocínio de que havia categorias diferenciadas de homens, colocando aqueles que
não fossem considerados raça pura a mercê do seu direito de viver, visto que, cunhava-se a
consciência de que somente a raça ariana deveria existir. Esse pensamento que prevalecia na
Alemanha nazista não corroborava com a ideia de dignidade humana que hoje é concebida, na
qual assegura a todos igualdade de direitos, inviolabilidade da isonomia, da vida, da liberdade,
da integridade física e moral, além de outros direitos fundamentais (ROCHA, 1999).
Assim, entende-se a dignidade humana uma conquista da razão ético-jurídica
(RIZZATO NUNES, 2010). Nesse passo, importante para que se promova a proteção da
dignidade da pessoa humana, a observação do princípio da proporcionalidade.
Consoante Nunes (2010), o princípio da dignidade humana quando em colisão com
outros princípios fundamentais, deve ser analisado e ponderado. Diante disso, surge a
necessidade de ponderar qual princípio deve prevalecer, já que os princípios são normas

______________
9
A respeito desta constituição, tratar-se-á algumas considerações no tópico „o constitucionalismo brasileiro‟,
deste capítulo.
22

interpretativas, que consagram valores ou indicam fins a serem observados, sem, contudo,
indicar um comportamento específico. O princípio da proporcionalidade surge, nesse
contexto, como verdadeiro guia de instrumento para o intérprete.
A proporcionalidade também é princípio fundamental natural de qualquer sistema
jurídico que garanta os direitos fundamentais, haja vista, que orienta a aplicação da dignidade
da pessoa humana. Desse modo, mostra-se como solucionador de colisão de princípios. Para
isso, o princípio da proporcionalidade se apresenta em três aspectos: o primeiro é a
adequação, na qual o fim que se pretende chegar tem que ser útil e conforme as pretensões
deduzidas. O segundo é a exigibilidade, na qual escolhe-se o meio mais brando, dentre os
meios que se apresentam disponíveis, para que se preserve ao máximo os valores que são
tutelados. E, o terceiro é o da proporcionalidade em sentido estrito, na qual busca o emprego
do meio que se mostra mais vantajoso para o alcance do princípio prevalecente (NUNES,
2010).
Cabe ainda, a observação feita por Sarmento (2010), no que toca o princípio da
dignidade da pessoa humana como extensor dos direitos fundamentais. Segundo o autor, a
dignidade da pessoa humana nutre e perpassa todos os direitos fundamentais que, em qualquer
medida, seja em maior ou menor, podem ser declarados concretizações ou exteriorizações da
dignidade. E ainda, o princípio em comento, executa trabalho relevante na revelação de novos
direitos, que poderão ser exigidos quando se verificar que determinada prestação positiva ou
negativa revela-se vital para a garantia da vida humana com dignidade

3.1 O Avanço nos Modelos Constitucionais. Dignidade Humana, Valor a ser Seguido

Mister se faz, em linhas gerais, apresentar as principais bases assentadas nos modelos
políticos que antecederam o atual modelo Constitucional. Segundo a lição de Barroso (2013),
o Constitucionalismo Contemporâneo, na forma que hoje é estabelecido, teve uma gradual
transição.
Deste modo, o Estado liberal, que se pautando em uma ação abstencionista das
liberdades individuais, e que foi concebido através de lutas e reinvindicações, dá lugar a um
Estado Social de Direito, voltado para uma ação positiva por parte do Estado (NOVELINO,
2014).
Não obstante, segundo Barroso (2013), com os avanços no seio da sociedade, o
Estado Social de Direito ensejou que um novo modelo político fosse estabelecido, este
sedimentado nos valores principiológicos, interpretando as leis em conformidade com uma
23

Constituição rígida, fazendo-se instaurar o que se conhece como Estado Constitucional


Contemporâneo.

3.2 Do Estado Liberal de Direito ao Estado do Bem-Estar Social

O Estado Moderno se inicia no século XVI com o declínio do regime feudal,


assentando suas bases em um regime político absolutista. Encontrava na figura do monarca o
seu âmago, atribuindo-lhe o poder político como indispensável à soberania deste Estado.
Deste modo, a soberania concentrada na figura do rei tornou-se absoluta e indivisível
(BARROSO,2013).
Durante séculos, houve o predomínio dos regimes absolutistas nos quais se vedava
qualquer forma de participação. Do mesmo modo, não havia imposição de limites aos
governantes, considerados verdadeiras encarnações do monarca ou de entidades divinas
(NOVELINO, 2014).
Foi contra o absolutismo, juntamente com os privilégios da nobreza, do clero e dos
senhores feudais que se promoveu um conjunto de reformas para eliminar a aristocracia
(BARROSO, 2013).
Essas ondas de reinvindicações, experimentadas sobretudo nos EUA10 e na França11,
objetivando o declínio do regime absolutista, inspiraram a criação das primeiras constituições
escritas. Novelino (2014), quando fala do constitucionalismo moderno, explica que as
constituições liberais ou também chamadas de constituições clássicas consagram nos textos
constitucionais os direitos civis e políticos, direitos fundamentais de primeira geração,
compreendendo na liberdade o principal valor. Desse modo, a ação do Estado deveria ser
abstencionista em relação as liberdades individuais.
Registra o autor, que os EUA contribuíram para o Estado Liberal a partir de várias
experiências extremamente importantes. Com isso, contribuíram com a criação da primeira
Constituição escrita, elaborada em 1787, dotada de rigidez, pois, por terem experimentado a
onipotência do parlamento inglês, garantiu-se a supremacia da Constituição. Como corolário
da submissão das leis a uma constituição escrita, colaboraram com a criação do controle

______________
10
Segundo Novelino (2014), os atos intoleráveis provocados pela Coroa Inglesa motivaram a instauração da
Revolução Americana. As então colônias estimularam uma comissão para a elaboração da Declaração de
Independência, sendo Thomas Jefferson o principal redator, assinada em 1776.
11
A Revolução Francesa, de 1789, foi fruto da opressão imposta à classe plebeia. Visava o declínio do modelo
aristotélico e instituir um Estado pautado sobre o lema „liberdade, igualdade e fraternidade‟(NOVELINO, 2014).
24

difuso de constitucionalidade, no importante julgamento “Marbury v. Madison”12, decidido,


em 1803, pelo juiz John Marshall. Os EUA, contribuíram também com a criação do
presidencialismo para substituir a figura do monarca. E ainda, com o surgimento do
federalismo, embora já houvesse existido como, por exemplo, a Aliança Externa dos Suíços, o
direito norte-americano concretizou a forma federalizada. Também contribuíram para a
declaração de direitos da pessoa humana e a rígida separação e o equilíbrio entre os poderes
estatais (NOVELINO, 2014).
Importante, do mesmo modo, as experiências vividas na França, trazendo uma
Constituição extremamente prolixa, embora não houvesse, como nos EUA, a força normativa
da Constituição, pois, era o parlamento que detinha a soberania. A Constituição francesa
continha em seu texto 402 artigos. Igualmente nos EUA, a França, em razão da obra escrita
por Montesquieu „O espírito das leis’, escrita em 1748, consagrou o princípio da separação
dos poderes. Importante ainda, inspirando-se na obra do Abade Emmanuel Sieyès “o que é o
terceiro Estado? ”, a distinção que se deu entre poder constituinte originário e o poder
constituinte derivado (NOVELINO, 2014).
Deste modo, as ideias liberais concretizaram-se, a liberdade torna-se o epicentro desse
modelo constitucional e o Estado passa a abster-se das esferas privadas. Segundo os
ensinamentos de Barroso (2013), a luta pela liberdade, a ampliação política, a consagração
econômica da livre iniciativa, os surgimentos da opinião pública, dentre outros, fizeram do
modelo liberal o ambiente propício para o renascimento do espaço público, sem comprometer
o espaço privado, visto o ensejo de uma constituição de um lado e o código privado, de outro,
expressaram um ideal de equilíbrio entre o que é público e o que é privado.
Não obstante, segundo Nathalia Masson (2016), em decorrência do crescimento
populacional, da forte industrialização da sociedade aliados as disparidades econômicas que
marcaram a virada do século XIX para o século XX, ansiava-se um papel mais ativo por parte
do Estado. Quem tinha poder econômico tornava-se cada vez mais forte, enquanto os que não
possuíam capital, cada vez mais distanciavam-se dos que tinham. Esperou-se, nesse contexto,

______________
12
Nesse julgamento, conforme Rodrigo Brandão (2015), a Suprema Corte norte-americana assentou a ideia de
controle difuso de constitucionalidade. O caso envolvia a diplomação para cargo de juiz de paz, que não fora
concedido a Willian Marbury, pelo então secretário de justiça, James Madison. Naturalmente Marbury impetrou
writ of mandamus para ter garantido seu direito. No entanto, o ponto em discussão pela Suprema Corte norte-
americana era saber de quem a competência para determinar a apreciação do writ of mandamus, se era da lei
(seção 13 do Judiciary Act, de 1789) que disciplinava a apreciação da matéria ou, se era da Constituição de
1787, que não fixou tal competência, deixando um grande conflito de normas. Desse modo, ficou assentado, que
quando houver conflitos de normas, entre a aplicação de uma lei em um caso concreto e a Constituição, deverá
prevalecer a Constituição, por ser hierarquicamente superior.
25

que o Estado corrigisse as fissuras sociais e desigualdades econômicas, através de uma ação
prestacional.
Em razão dessas crises, sobretudo a partir da Primeira Guerra Mundial, não se
esperava apenas que o Estado se abstivesse de interferir na esfera individual e privada das
pessoas, esperava-se também, ao menos idealmente, que se tornasse instrumento de ações
positivas, da sociedade para combater a injustiça social e conter o poder abusivo do capital
(BARROSO, 2013).
Desse modo, Novelino (2014) enfatiza que o liberalismo foi impotente diante das
demandas sociais que abalaram o século XIX, determinando uma nova etapa do
constitucionalismo, o Estado Social também chamado de Bem-Estar Social, que além de
promover a paz, a segurança e a justiça, passa a promover o bem comum.
Assim, surgiram a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar de
1919, que trouxeram em seu texto um ideal de igualdade material e de direitos prestacionais.
Contudo, em razão das atrocidades cometidas pela Segunda Guerra Mundial, barbárie
que foi justificada pelo manto do positivismo, no qual buscava a objetividade científica,
equiparando o direito à lei, afastando-se da filosofia e de discussões como legitimidade e
justiça, ensejou mais tarde um novo modelo de constituição, pautado na revalorização da
razão prática, na teoria da justiça e na legitimação da democracia, buscando ir além da
legalidade estrita e compreender uma leitura moral da Constituição e das Leis (BARROSO,
2013).
Nesses termos, surge o Estado Constitucional de Direito, subordinando a lei à uma
Constituição rígida, não só impondo limites ao legislador e ao administrador, mas lhe
determinando a sua atuação. Cria-se uma nova percepção da Constituição e de seu papel na
interpretação jurídica em geral, com ideias e mudanças de paradigmas que mobilizaram as
doutrinas e jurisprudência, em vários países (BARROSO, 2013).

3.3 Estado Constitucional Contemporâneo: o Novo Modelo Constitucional

A despeito da transição do Constitucionalismo Moderno que se pautava muito mais na


ideia de “império da lei” para o Constitucionalismo Contemporâneo que procura empreender
uma leitura moral das constituições e das leis, Barroso (2013), explica que esse processo se
deu sobretudo em decorrência da Segunda Guerra Mundial.
A Segunda Guerra Mundial, conforme explica Piovesan (2013), foi a barbárie que
significou a ruptura do paradigma dos direitos humanos, negando o valor da pessoa humana
26

como valor fonte do direito. Nessa toada, o rompimento da dignidade humana, no transtorno
da guerra, fez emergir, ao final dela, a necessidade de reconstruir os direitos humanos, para
que sirva de referência ética e aproxime o direito da moral.
Corroborando o enfoque acima, Barroso (2013) explica que o final da Segunda Guerra
Mundial fez com que o mundo ocidental discutisse acerca da dignidade da pessoa humana.
Desse modo, tornou-se um dos grandes consensos éticos mundial, na medida em que foi
sendo materializada em Declarações de Direitos, Convenções Internacionais e nas
Constituições.
Assim, materializando-se naqueles documentos jurídicos, a dignidade da pessoa
humana tornava-se um valor fundamental, sendo erguida como princípio jurídico de status
Constitucional, constituindo parte do conteúdo dos direitos fundamentais (BARROSO, 2013).
Importante lembrar, conforme o magistério de Barroso (2013), que o novo modelo
constitucional é marcado de forma profunda sob três mudanças de paradigmas. Segundo o
autor, no plano teórico, surgem três grandes transformações no que toca a nova aplicação do
direito constitucional que são: o reconhecimento da força normativa da Constituição13; a
expansão da jurisdição constitucional e; a reelaboração nas doutrinas para uma nova
interpretação da Constituição.
Em que pese as principais alusões ao desenvolvimento do novo modelo constitucional
na Europa, ao fim da Segunda Guerra Mundial, Barroso (2013) explica que a primeira
principal referência surgiu na Alemanha, com a Lei Fundamental de Bonn, de 1949,
sobretudo, após a instalação do Tribunal Constitucional Federal, em 1951. Já no que tange a
segunda principal referência, o autor lembra a Constituição da Itália, de 1947 e, logo após a
instalação da Corte Constitucional, em 1956.
A Lei Fundamental da Alemanha, de 1949, foi a primeira Constituição que acolheu a
dignidade humana como princípio fundamental encontrada logo no seu artigo de abertura.
Assim, dispõe o art. 1º da LF, de 1949: “A dignidade da pessoa humana é inviolável. Todas as
autoridades públicas têm o dever de a respeitar e proteger” (ROCHA, 1999 [s.p]).
No que tange ao Brasil, a dignidade da pessoa humana aparece pela primeira vez na
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Barroso (2013), explica que essa
Constituição promove, de maneira bem-sucedida, a travessia de um regime autoritário, na
qual até pouco tempo o Brasil foi palco.

______________
13
Vale observar que a constituição norte-americana, de 1787, já garantia a supremacia da constituição. Ademais,
em 1789, surge o Supremo Tribunal dos Estados Unidos.
27

3.4 O Constitucionalismo Brasileiro e a Dignidade da Pessoa Humana. Da Relação


Vertical a Relação Horizontal dos Direitos Fundamentais

A Constituição Brasileira de 1988 foi fruto da incessante reivindicação pela nação de


um modelo constitucional pautado nas liberdades e garantias fundamentais. A nação brasileira
encontrava-se profundamente rebelada contra o mais longo „eclipse‟ das liberdades públicas,
pois ao longo de mais de 20 anos, vivia-se sob o autoritarismo e ditadura (DE ANDRADE,
1991).
Segundo Paulo Bonavides Paes De Andrade (1991), para conseguir o poder, os
militares utilizaram-se da estratégia como a „intervenção cirúrgica‟, na qual tinha como
pretexto impulsionar a economia do Brasil, articulando-a mundialmente e, consequentemente
a promoção da democracia. Para isso, na dita “intervenção cirúrgica”, não era estabelecido
prazo para o seu término. Dessa forma, centralizaram e fortaleceram o poder executivo.
Como consequência do golpe militar em 1964, teve-se a edição, até o ano de 1966, de
quatro Atos Institucionais que esvaziavam direitos conquistados na Constituição de 194614,
como os direitos políticos e a rígida separação dos poderes. Mas ainda restava a esperança de
ser convocada as garantias individuais, como o habeas corpus, por exemplo. Contudo, o Ato
Institucional nº 5, editado em 1968, sepultou qualquer tipo de esperança, no que toca as
liberdades individuais. Concedeu total arbítrio ao Presidente da República, para decretar o
estado de sítio ou sua prorrogação (DE ANDRADE, 1991).
O povo brasileiro, através de organizações civis, entidades populares, advogados,
professores, dentre outros, não cessaram de requerer a volta do regime pautado na confiança e
na credibilidade dos poderes de governo e na maneira legítima como assumem o poder (DE
ANDRADE, 1991).
Segundo De Andrade (1991), esse processo se deu lentamente, até que em 1987 foi
convocada uma assembleia constituinte, na qual estabelecia o povo como legítimo detentor do
poder.
A nova Constituição Federal teve sua promulgação em 5 de outubro de 1988,
disciplinando a dignidade humana como um dos fundamentos da República. Foi nesta
constituição, que a dignidade humana aparece pela primeira vez. O princípio em comento
surge como fundamento da própria organização política do Estado Democrático de Direito,

______________
14
Tal constituição nasce do movimento nacional de repúdio ao Estado Novo de 1937, que sujeitava a nação a
uma ditadura pessoal de inspiração nazista da Alemanha e fascista da Itália. Tal constituição foi promulgada no
Brasil logo após o fim da Segunda Guerra Mundial.
28

assegurando ao homem, condições que assegurem a promoção a seus direitos fundamentais.


(ROCHA, 1999).
Dessa forma, embora tardia em comparação a outras constituições que, a exemplo da
LF da Alemanha, que consagrou a dignidade humana em seu texto em 1949, a CRFB de 1988
conseguiu estampar em seu texto, protegendo os indivíduos frentes aos abusos do Estado.
Tal proteção, segundo Masson (2016), é chamada de eficácia vertical dos direitos
fundamentais, uma vez que, faz uma leitura da arquitetura jurídico-social dos polos
contrapostos, que de um lado tem o Estado, com grandes poderes e, portanto, o mais forte da
relação e, do outro, tem o indivíduo, que é o lado mais enfraquecido da relação jurídica. Nesse
contexto, os direitos fundamentais, no Brasil, surgem para promover a dignidade humana que
por muito tempo foi usurpada pelo Estado que agia de forma autoritária e sem nenhuma
garantia de proteção aos direitos mais caros do indivíduo.
O Direito Contemporâneo, conforme lembra Masson (2016), vem reconhecendo a
expansão da dignidade humana também nas relações que têm como polos contrapostos
indivíduos particulares. E no que concerne ao Brasil, tanto a doutrina como vários julgados
nacionais vêm adotando sua aplicação. À essa tendência que surgiu na Alemanha, tem-se o
nome de eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
29

4 DIREITOS FUNDAMENTAIS APLICADOS COMO REFLEXO DA DIGNIDADE


HUMANA

Inconteste que a dignidade da pessoa humana se tornou valor básico do sistema na


qual se alberga, como espinha dorsal da elaboração normativa, exatamente os direitos
fundamentais (ROCHA, 1999).
Segundo o pensamento elucidado, sendo, pois, a dignidade da pessoa humana,
princípio viga mestre do Estado de Direito, deverá ter sua promoção e proteção pelos direitos
fundamentais consagrados na Carta Magna de 1988, onde o Estado, por ser hierarquicamente
superior ao indivíduo, se sujeitará aos mandamentos da Lei Maior.
No que tange a proteção frente aos sujeitos privados, verifica-se, que a dignidade da
pessoa humana vem tendo sua incidência nas relações horizontais. Tal expansão dos direitos
fundamentais para as relações entre os particulares é tendência do atual modelo
constitucional, o Direito Contemporâneo.
Antes que se adentre na discussão que os tribunais brasileiros e a doutrina nacional
vêm fazendo acerca da aplicação dos direitos fundamentais, responsáveis pela proteção da
dignidade da pessoa humana, nas relações entre indivíduos particulares, será apontado, em
breves linhas, as principais teses que surgiram nos Estados Unidos e na Alemanha.

4.1 A Ineficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas e a doutrina do ‘State
Action’, nos EUA.

Daniel Sarmento (2010), leciona que a teoria do State Action, surgida nos Estados
Unidos, nega a aplicação dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares. Esta
teoria, segundo o autor, é praticamente um axioma do direito constitucional norte-americano,
quase que universalmente aceito tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência.
No que tange a sustentação da tese naquele país, dá-se sobretudo, pelo argumento
liberal, uma vez que a Constituição Estadunidense de 1787, ao estabelecer os direitos
fundamentais previstos no Bill of Rights, de 168915, vincula apenas os Poderes Públicos, com
exceção da 13ª Emenda, que vincula os indivíduos privados, proibindo a escravidão.
Ademais, invoca-se, o argumento da autonomia privada, onde a liberdade individual estaria

______________
15
Dispõe, assim, segundo Sarmento (2010), que o Bill of Rights é uma Carta de Direitos que disciplinava os
direitos individuais dos cidadãos e restringia o poder dos governantes. Foi criada e aprovada pelo Parlamento da
Inglaterra em 1689, após a destituição do rei Jaime II promovida pela Revolução Gloriosa, em 1688, sucedendo
ao trono Guilherme de Orange.
30

restringida se a constituição dos Estados Unidos tivesse de estabelecer limites a autonomia de


liberdade (SARMENTO, 2010)
Além do argumento liberal sustentada pela doutrina do „state action’ – Ação do
Estado-, Sarmento (2010), aponta também o argumento ligado ao federalismo, visto que
naquele país compete aos Estados e não a União legislar sobre direito privado. Desse modo, a
doutrina do “state action” é sustentada pela preservação do princípio do federalismo,
assegurando a autonomia de cada Estado legislar sobre direito privado.
A Suprema Corte Americana, em meados da década de 40 do século XX, com o
intuito de fazer alguns temperamentos, sem renegar, contudo, a doutrina do „state action’,
passou a adotar a chamada public function theory -teoria da função pública. Esta teoria se
dava quando os particulares, que agindo no exercício de atividades de natureza tipicamente
estatal, por delegação das suas funções típicas, estariam também sujeitas as limitações da
Constituição (SARMENTO, [s. d]).
Consoante entendimento de Sarmento [s. d], além de não admitir, em princípio, a
vinculação dos particulares aos direitos fundamentais, a jurisprudência norte-americana,
partindo de uma visão de extremo individualismo, ainda colocava obstáculo ao legislador
ordinário quando da tutela dos direitos fundamentais no direito privado. Trata como exemplo
emblemático de impasse ao legislador ordinário, a decisão proferida em 2000, pela Suprema
Corte Americana, no caso Boy Scouts of America v. Dale16.
O autor observa, que embora a doutrina „public function theory’, ter dado
temperamento a doutrina do „state action’, aquela não proporciona um tratamento adequado
aos direitos fundamentais. Assim, a sua conclusão:
Enfim, a doutrina da state action, apesar dos temperamentos que a
jurisprudência lhe introduziu, não proporciona um tratamento adequado aos
direitos fundamentais, diante do fato de que muitos dos perigos e ameaças à
pessoa humana provêm não do Estado, mas de grupos, pessoas e
organizações privadas. Ademais, ela não foi capaz de construir standards
minimamente seguros e confiáveis na jurisdição constitucional norte-
americana. Tal teoria está profundamente associada ao radical
individualismo que caracteriza a Constituição e a cultura jurídica e social dos
Estados Unidos. [...] (SARMENTO, [s. d. s. p]).

______________
16
530 U. S. 640 (2000). Em New Jersey, havia uma lei Estadual disciplinando a proibição de qualquer
discriminação contra homossexuais. No entanto, ao descobrir a orientação sexual de um membro da Boy Scouts
(organização privada de escoteiros), a organização resolveu expulsa-lo da entidade. O jovem ingressou com uma
ação judicial questionando o ato, fundamentando-se na referida lei estadual antidiscriminatória, mas a
inconstitucionalidade da norma foi arguida, chegando o caso à Suprema Corte. O julgado afirmou que a
aplicação da lei estadual no caso violava a liberdade de associação, por obrigar que um grupo ligado por valores
comuns – dentre os quais a rejeição ao homossexualismo – fosse integrado por pessoa indesejada. Desse modo,
não teve êxito o membro da associação ao expressar sua orientação sexual e continuar membro da entidade.
(SARMENTO, [s.d])
31

4.2 A Eficácia Mediata e Indireta dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas

Em 1956, Günter Dürig, desenvolveu na Alemanha, a teoria da eficácia mediata dos


direitos fundamentais. Esta tomou grandes adeptos e hoje é adotada pelos juristas alemães e
pela sua Corte Constitucional (SARMENTO, [S. D.]).
Conforme os apontamentos de Masson (2016), quando se fala nessa teoria, significa
dizer que a aplicação desses direitos nas relações particulares se efetiva quando da produção
de leis infraconstitucionais. No que toca os seus efeitos, nas relações entre indivíduos da
mesma relação, a aplicação dos direitos fundamentais estaria condicionada a mediação
promovida pelo legislador ou mesmo pelo juiz, que deve ler o direito infraconstitucional com
os óculos da Constituição.
Em complementação aos apontamentos acima, Sarmento [s. d.], lembra que, Dürig
admite a necessidade de construir certas pontes entre o Direito Privado e a Constituição, a fim
de conformar o direito privado face aos valores constitucionais.
Com isso, a ponte que Dürig imagina é representada pelas cláusulas gerais e pelos
conceitos jurídicos indeterminados acolhidos pelo legislador, que seriam verdadeiras “portas
de entrada” dos direitos fundamentais no Direito Privado, os quais devem ser interpretados e
aplicados pelos juízes sempre em consonância com a ordem de valores refletidas aos direitos
fundamentais. Assim, afirma que: “Neste sentido, a teoria da eficácia mediata liga-se à
concepção da Constituição como ordem de valores, centrada nos direitos fundamentais e, em
especial, no princípio da dignidade da pessoa humana” (SARMENTO [s. d. s. p.]).
Importantes também os apontamentos de Sarlet (2005), explicando que, para os
adeptos da teoria da Eficácia Mediata, os direitos fundamentais não são diretamente
oponíveis, como direitos subjetivos, nas relações entre indivíduos particulares. Isto quer dizer,
que é tarefa do legislador a aplicação dos direitos fundamentais nas relações privadas, através
de normas legais privadas. Ou ainda, na falta dessas normas privadas, a intermediação será
feita pelos órgãos judiciais, por meio de uma interpretação dos direitos fundamentais, e
eventualmente, quando houver lacunas, por meio de integração de julgados.
De acordo com Robert Alexy (2015), os direitos fundamentais, por serem „normas
objetivas‟ ou „valores constitucionais‟, influenciam e são critérios de interpretação do direito
privado. Lembra, contudo, que embora tenha influência dos direitos fundamentais, as normas
do direito privado devem permanecer como normas de direito privado, e que os direitos e
deveres por elas estabelecidos permanecem como direitos e deveres no âmbito daquela. Tem-
se, pois, o efeito irradiador dos direitos fundamentais para as normas de direito privado.
32

Conforme, Sarlet (2005), de vários casos com a aplicação da doutrina da Eficácia


Mediata, o caso Lüth é o que ficou mais conhecido na jurisprudência da Corte Constitucional
Alemã, haja vista as construções teóricas que sedimentou. Abaixo, o seguinte caso:
Em 1950, Erich Lüth, diretor do Clube de Imprensa de Hamburgo, sustentou
boicote público contra o filme “Unsterbliche Gelibte” (amada imortal),
dirigido pelo cineasta Veit Harlan, que havia produzido filme de cunho
notoriamente anti-semita, durante a ditadura nazista. Harlan obteve decisão
do Tribunal de Justiça de Hamburgo no sentido de que Lüth se abstivesse de
boicotar o filme, com base no § 826 do Código Civil (BGB). Contra essa
decisão, Lüth ingressou com reclamação constitucional
(Verfassungsbeschwerde) perante a Corte Constitucional, argumentando que
a decisão do Tribunal de Hamburgo violou sua liberdade de expressão, que –
segundo Lüth – protege também a possibilidade de influir sobre outros
mediante o uso da palavra. O Tribunal Constitucional, por sua vez, acolheu o
recurso, argumentando que os tribunais civis podem lesar o direito
fundamental de livre manifestação de opinião, aplicando regras de direito
privado. Entendeu a Corte que o Tribunal Estadual desconsiderou o
significado do direito fundamental de Lüth (liberdade de expressão e
informação) também no âmbito das relações jurídicoprivadas, quando ele se
contrapõe a interesses de outros particulares. (SARLET, 2005, p.213).

Apesar dos apontamentos acima, na doutrina brasileira, a tese da Eficácia Mediata dos
direitos fundamentais é francamente minoritária, uma vez que os tribunais brasileiros e a
maioria da doutrina vêm adotando a tese da Eficácia Imediata dos direitos fundamentais
(SARMENTO [s. d]).

4.3 A Eficácia Imediata e Direta dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas

Esta teoria proposta, inicialmente pelo alemão Hans Carl Nipperdey, em meados da
década de 1950 e, mais tarde, resgatada e trabalhada pelo também alemão Walter Leisner, foi
elaborada para refutar os argumentos que a teoria da Eficácia Mediata defendia.
(SARMENTO [s. d]).
De acordo com Nipperdey apud Sarmento [s. d.], apesar de alguns direitos
fundamentais estarem presentes na Constituição Alemã e vincular apenas o Estado, outros,
pela sua natureza, podem ser invocados diretamente nas relações privadas,
independentemente de qualquer mediação por parte do legislador, revestindo-se de
oponibilidade erga omnes. Seu argumento se apoia na constatação de que os perigos que
ameaçam os direitos fundamentais no mundo contemporâneo não provêm apenas do Estado,
mas também dos poderes sociais e de terceiros em geral.
A teoria também foi reforçada pelo alemão Walter Leisner, que sustenta a concepção
de uma vinculação direta dos particulares aos direitos fundamentais, uma vez que, os direitos
33

fundamentais, por constituírem normas que expressam valores aplicáveis para toda a ordem
jurídica, pois, decorrente do princípio da unidade da ordem jurídica e ainda em virtude do
postulado da força normativa da Constituição, não poderia ensejar que o Direito Privado
viesse a formar uma espécie de gueto a margem da Constituição. Desse modo, não deveria
haver uma vinculação apenas do poder público aos direitos fundamentais (SARLET, 2005).
Para Masson (2016), falar desta teoria, seria, portanto, dispensar qualquer mediação,
seja por parte do legislador (que não mais precisaria criar lei que serviria de “ponte” entre os
particulares e a observância dos dispositivos constitucionais), seja por parte do órgão judicial
(ao interpretar a norma de direito privado a luz da constituição).
Nessa toada, Sarmento (2010), compreende que o princípio da dignidade da pessoa
humana sendo o núcleo do ordenamento jurídico e, portanto, legitimador e condicionador do
direito positivado, justifica a aplicação direta nas relações entre os particulares, pois se
rechaçar esse modo de incidência e condicionar a garantia da dignidade humana à
interpretação das cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados do Direito Privado, ou
ainda, condicionando à vontade do legislador, significaria abrir espaço para, diante de
omissões legislativas, o comprometimento da proteção da dignidade do ser humano.
Assim, conforme Masson (2016), para a teoria da eficácia Direta, os direitos
fundamentais estariam aptos a vincular de modo imediato os agentes particulares, sendo
desnecessária a intermediação legislativa.

4.4 A Sustentação da Aplicação da Dignidade da Pessoa Humana nas Relações Privadas

Cabe relembrar, conforme Sarlet (2006), que a dignidade humana não se trata de um
direito fundamental a ser conquistado, pois sendo uma qualidade intrínseca da pessoa
humana, não poderá ser ela em si concedida pelo ordenamento jurídico, isto é, a dignidade
humana é anterior a qualquer ato e já nasce com a pessoa humana.
Feito isso, a dignidade humana, sendo intrínseca a qualquer ser humano, porque este é
dotado de valor, tem sido, em muitos casos, principalmente, pelo fator da desigualdade
econômica, desrespeitada. Geralmente, as relações travadas entre os particulares não são de
paridade, pois, mesmo que estes estejam, em tese, em uma mesma posição de hierarquia,
diferente do Estado, que está hierarquicamente superior ao indivíduo, muitas vezes o poder
que provem de indivíduos particulares, com forte influência sobre os demais indivíduos, abala
a dignidade humana destes. E é nesse sentido que Sarlet (2012), sustenta aplicação de uma
eficácia direta nas relações privadas, pois diferentemente do Estado clássico e liberal de
34

direito17, no Estado Social, não foi apenas o Estado que ampliou seus poderes, mas também a
sociedade que detém de poder social e econômico e, sendo, pois no âmbito da sociedade que
as liberdades se encontram particularmente ameaçadas.
Masson (2016), ao se posicionar sobre o assunto, aduz que é inequívoca a incidência
dos preceitos fundamentais nas relações entre os particulares, afinal, deve-se ter em mente que
as opressões aos indivíduos não provêm apenas do Estado, mas que da mesma forma, outros
particulares se fazem opressores.
Segundo Sarmento (2010), a dignidade humana por ser princípio consagrador da
República Federativa do Brasil e, que delineia toda a ordem jurídica dos direitos
fundamentais, representa a essência da ordem constitucional. Com isso, irradia seus efeitos
sobre todo o sistema jurídico e prescreve não somente os atos estatais, como também todas e
quaisquer formas de relações privadas que se evoluem no âmbito da sociedade civil.
Do mesmo modo, de acordo com Sarlet (2006), a própria eficácia dos direitos
fundamentais nas relações entre os indivíduos particulares tem detectado importante
fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, sustentando-se que aqueles direitos
vinculam também diretamente os particulares nas relações entre si, em função de um
fundamento maior que é a dignidade humana do particular.
Ademais, o autor lembra a frase citada pelo o alemão Jörg Neuner, “não importa de
quem é a bota que desferiu o chute no rosto do ofendido”, para afirmar a eficácia vinculante
dos particulares, no que tange a aplicação da dignidade humana (SARLET, 2006, p.112 e
113).
Nesse sentido, ao se verificar a incidência da aplicação direta da dignidade humana
também no âmbito das relações privadas, os tribunais brasileiros vêm tratando sobre o tema.
São, portanto, incidências do princípio em comento nas relações que o indivíduo trata com
outros sujeitos particulares.
Isto posto, segue parte do teor do julgamento realizado pela 12ª Turma do Tribunal
Regional do Trabalho de São Paulo (TRT/SP), no Processo nº 0002197-66.2012.5.02.0311,
de relatoria do Desembargador Marcelo Freire Gonçalves, com data em 11 de junho de 2015,
publicado em 19 de junho de 2015:
RECURSO ORDINÁRIO. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA. VEDAÇÃO A DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. EFICÁCIA
HORIZONTAL DOS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS. O
postulado da dignidade da pessoa humana alçado pelo inciso III do art. 1º
______________
17
No contexto do Estado liberal, o indivíduo tinha proteção aos seus direitos fundamentais em face apenas das
ingerências do Estado, ou seja, apenas proteção dos direitos mais caros aos indivíduos numa relação de
verticalidade.
35

da CF à condição de princípio-guia do sistema jurídico fornece ao órgão


julgador uma diretriz inafastável na aplicação e concretização de qualquer
norma jurídica positivada. É por isso que o direito de propriedade, o direito
potestativo de rescisão contratual e a própria autonomia privada da vontade
devem ser interpretados e aplicados no caso concreto à luz do princípio da
dignidade da pessoa humana [...] É incontroversa a eficácia dos direitos
fundamentais na relação entre o particular e o Estado - mais conhecida como
eficácia vertical dos direitos fundamentais - já que os direitos fundamentais
originariamente surgiram como forma de limitação da ação estatal na esfera
de direitos do indivíduo, ou seja, para a defesa das liberdades individuais. Já
nas relações privada (ou horizontais) a doutrina e a jurisprudência brasileiras
sob forte influência do direito constitucional alemão e português passaram a
reconhecer os efeitos dos direitos fundamentais nas relações entre
particulares. Desse modo, é inegável que a proibição à discriminação não se
dirige apenas ao Estado, mas também ao particular nas relações privadas.
Em atendimento ao manancial de direitos e princípios que resguardam a
dignidade da pessoa humana, rejeitando a discriminação manifestados no
inciso III e IV do art. 1º; incisos I, III e IV do art. 3º; caput e incisos I e XLI
do art. 5º, todos da CF, além da função social da propriedade privada e da
busca do pleno emprego expressos nos incisos III e VIII do art. 170 da CF,
respectivamente, e da função social do contrato e da boa-fé contratual
indicados nos artigos 421 e 422 do Código Civil, respectivamente e,
finalmente, em obediência às Convenções 111 e 117 e à Declaração sobre os
Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 1998, todas da OIT, o
legislador infraconstitucional editou a Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995,
na qual se veda expressamente a adoção de prática discriminatória para
acesso ao emprego ou sua manutenção. Com efeito, o legislador
infraconstitucional albergou expressamente um direito fundamental a
ser aplicado, inclusive, na relação privada. (Grifou-se)

Trata-se de ação trabalhista, na qual o reclamante foi dispensado pelo fato de


encontrar-se em uma situação delicada, uma vez que tinha um tumor maligno no pé, que o
impedia inclusive o uso de calçado. Assim, ausentando-se justificadamente, com cirurgia
marcada, a reclamada, mesmo sabendo da doença o dispensou. Em sua defesa, alegou que não
sabia da doença do reclamante, embora o Recursos Humanos (RH) da reclamada houvesse
recebido e-mail do reclamante informando sua situação. Dessa maneira, a reclamada assumiu
o risco de dispensa discriminatória.
No caso em tela, segundo o julgamento, ainda que a reclamada não houvesse o dolo de
dispensar o reclamante por questões discriminatórias da doença que era portador, caberia a ela
provar que a dispensa de seu empregado não foi por motivo de discriminação, mas desse ônus
não se desincumbiu.
No voto do relator, demonstra-se acerca da importância do princípio da dignidade da
pessoa humana como fonte de princípios fundamentais, cujos princípios devem ser
interpretados e aplicados no caso concreto à luz daquele princípio, que é denominado
princípio-guia do ordenamento jurídico
36

No que tange a sua aplicação nas relações privadas, entendeu-se que negar a aplicação
dos direitos fundamentais, seria o mesmo que negar a força vinculante da constituição federal
nessas relações e sua supremacia na pirâmide das normas.
Ademais, sustentou-se que a ofensa aos direitos fundamentais não é uma exclusividade
do Estado. Nas relações entre os particulares também se verifica a agressão a direitos
fundamentais por uma das partes e, ainda, que a dignidade humana é pressuposto essencial
para a garantia da isonomia de todos os seres humanos, que não podem ser submetidos a
tratamento discriminatório e arbitrário.
De acordo com Judith Martins apud Sarlet (2006), a dignidade da pessoa humana, por
ser uma autêntica fonte de valor que justifica e anima o ordenamento jurídico, e dessa
maneira, o sustentáculo para a observância dos direitos fundamentais, o Supremo Tribunal
Federal vem entendendo sua incidência no âmbito das relações privadas.
No Recurso Extraordinário 201. 819-8/RJ, julgado pela Segunda Turma, cuja Relatora
foi a Ministra Ellen Gracie, data do julgamento 11 de outubro de 2005, publicado no Diário
da Justiça (DJ), no dia 27 de outubro de 2006, o STF se posiciona acerca do assunto.
O julgamento a seguir, assim como os demais, corrobora toda a discussão teórica em
torno da aplicação dos direitos fundamentais nas relações entre os particulares, no que serve o
caso brasileiro.
Segue, assim, parte da ementa do Recurso Extraordinário (RE), no que concerne, não
especificamente ao princípio da dignidade humana, mas como leciona Sarmento (2010), que o
princípio da dignidade humana, por ser exteriorização dos direitos fundamentais, torna-se
necessário que se expanda por todas as esferas da vida humana. Desse modo, assim como o
Estado deve observar direitos dos indivíduos, as observâncias desses direitos fundamentais
também vinculam os particulares frente a outros particulares.
SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO
BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM
GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO.
EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES
PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO.
I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES
PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no
âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações
travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os
direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente
não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção
dos particulares em face dos poderes privados.
II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À
AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-
constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a
possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial,
37

dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da


Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e
garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela
Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios
constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus
associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem
jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos
direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede
constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no
domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as
restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força
normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações
privadas, em tema de liberdades fundamentais.[...]

Na Apelação Civil no Juizado Especial (ACJ): 20060710239707/TJ-DF, cujo Relator


foi Héctor Valverde Santana, da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Civis e
Criminais do Distrito Federal, data do julgamento, 14/08/2007, publicada em 05/09/2007, no
Diário de Justiça da União (DJU), que em sua origem, foi proposta Ação Declaratória c/c
Indenização por Danos Morais pela recorrente contra a requerida Comunidade Maçônica do
Distrito Federal.
O Recorrente relatou que era membro associado à requerida e, após ter solicitado
formalmente o seu desligamento da Associação, a Requerida editou os atos normativos de nº
29 e 30/2005-2008, que consideravam o Recorrente como indesejável. Ressaltou ainda que
tais atos normativos foram lidos em todas as sessões maçônicas, sendo ouvidos por todos os
integrantes da associação, ligados à Grande Loja Maçônica de Brasília, sendo ainda, os atos
divulgados na Internet. Dessa maneira, pleiteou a revogação ou suspensão dos atos
normativos nº 29 e 30/2005-2008, que a recorrida editou e, ainda, indenização por danos
morais.
Sua demanda foi julgada improcedente na primeira instância. Entendeu-se a não
configuração do dano moral, assim como a não configuração de ilicitude no fato de a
Assembleia da recorrida ter decidido pela proibição do recorrente de frequentar as lojas a ela
associadas. Tais proibições eram disciplinadas na Constituição Maçônica, cujo artigo 68,
inciso XII, determinava que os maçons desligados mantêm a identidade maçônica. Com isso,
entendeu-se que a recorrida agiu em exercício regular de direito.
Diante disso, o recorrente inconformado com a decisão da primeira instância, recorreu
para a Turma Recursal dos Juizados Civis e Criminais do Distrito Federal, argumentando que
a sentença não estava em consonância com o entendimento dos Tribunais. Destacou alguns
precedentes, como do e. Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do
38

Sul que destacam a eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Por conseguinte, ao recurso
foi dado provimento parcial.
Na ementa da ACJ, destacou-se que os particulares, no trato da vida civil, devem
observar as regras mínimas de respeito à dignidade da pessoa humana.
No voto do relator, destacou-se a evolução das garantias mínimas para abranger
também as relações privadas:
É cediço que o surgimento da ideia de direitos fundamentais da pessoa
humana surgiu em um contexto político de garantias mínimas do cidadão
frente ao poderio estatal. Contudo, com a evolução da hermenêutica
constitucional, a doutrina e jurisprudência pátrias atentaram para a
importância da observância desses mesmos direitos nas relações
particulares: trata-se da eficácia horizontal dos direitos fundamentais (ACJ.
2006071023907/TJ-DF).

Ademais, no que toca o respeito à dignidade da pessoa humana, segue o seguinte:


Na nova compreensão interpretativa dos direitos fundamentais, portanto,
impõe-se não somente que o Estado respeite as prerrogativas conferidas
aos cidadãos, mas que os próprios particulares observem regras
jurídicas mínimas para respeitar, em última instância, a dignidade da
pessoa humana. (ACJ. 20060710239707/TJ-DF, grifou-se)

No mesmo sentido, observou-se no voto, que quando da divulgação da punição


imposta injustamente ao recorrente pela recorrida provocou além do abalo a sua imagem
perante à comunidade maçônica, o abalo ao sentimento íntimo de dignidade.
Nesse interim, as discussões teóricas e julgados de alguns Tribunais brasileiros que
corroboram a aplicação do princípio da dignidade humana nas relações privadas.
39

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cabe relembrar a hipótese dessa pesquisa, na qual devido a constante evolução da


sociedade, a alteração das conjecturas passa a influenciar o direito. A dinâmica da sociedade
toma como consequência a aplicação de novas interpretações para a leitura de dispositivos
jurídicos que devem se amoldar àqueles fatos. A imperatividade do princípio da dignidade
humana posta na CRFB, de 1988, é tão intensa que vincula o Poder Público e os particulares à
sua observância.
Percebeu-se que em virtude de muitas disparidades no seio social, houveram
transições para modelos políticos que se pautando na dignidade humana, conceberam aos
indivíduos direitos e garantias frente aos abusos do Estado. No entanto, somente vinculando o
Estado a obediências de direitos e garantias fundamentais. Com a evolução, principalmente na
doutrina alemã, sobre a eficácia direta e imediata nas relações interprivadas, percebeu-se que
a tendência, no Brasil, é a aplicação direta dos direitos fundamentais que tem em seu âmago a
dignidade da pessoa humana.
Para tanto, a pesquisa demonstrou as discussões doutrinárias e alguns julgados dos
Tribunais Brasileiros que vêm sustentando a aplicação do princípio da dignidade da pessoa
humana também para aquelas relações.
Assim, no que tange as discussões doutrinárias, ficou observado que, embora as
relações entre os particulares sejam feitas de forma horizontal, pois diferente das relações que
são travadas com o Estado, ou seja, de verticalidade, ainda assim, por fatores que predominam
na sociedade, como o forte poder econômico e social de alguns indivíduos, a dignidade da
pessoa humana é abalada em virtude de dissabores provocados pela forte desigualdade social.
E, ainda, da mesma forma que o Estado se faz opressor de direitos fundamentais outros
particulares também, em muitos casos, se fazem opressores. Com isso, as discussões teóricas
justificam a sustentação da aplicação do princípio em tela nessas relações.
No que diz respeito aos julgados dos Tribunais Brasileiros, observou-se que o
princípio da dignidade da pessoa humana foi invocado como postulado gravitacional da
ordem jurídica, que rege os direitos fundamentais. Por conseguinte, no trato da vida civil entre
pessoas privadas, os direitos fundamentais têm eficácia direta nessas relações. Impõe-se, pois,
não só frente aos arbítrios do Estado, mas também de pessoa privadas, pois, estas abalam a
dignidade humana, do mesmo modo, quando se encontram em uma relação de total
disparidade econômica e social.
40

Portanto a hipótese da pesquisa foi confirmada. As suas minúcias se deram da seguinte


maneira:
a) Apontamentos sobre o princípio da dignidade humana;
b) Influência do princípio da dignidade da pessoa humana na construção dos direitos
fundamentais e;
c) Direitos fundamentais aplicados como reflexo da dignidade humana.
Deste modo, a aplicação da dignidade humana, nas relações privadas, assegura a
concretização dos princípios fundamentais. Ao contrário disso, ao se ignorar que a sociedade,
principalmente a Brasileira, tem um inquestionável contraste, na qual tem alijado as benesses
dos direitos estampados no sistema jurídico do país e que exclui cada vez mais os indivíduos
por suas condições menos favorecidas, estar-se-á mascarando todas as exclusões sociais,
miséria e arbitrariedade nesse meio.
No entanto, de acordo com o que foi observado na doutrina e nos julgados sobre a
aplicação da dignidade da pessoa humana nas relações particulares, ao se aceitar que o forte
contraste da sociedade, que favorece as arbitrariedades praticadas por algumas pessoas mais
forte socialmente, e, assim desrespeitando os direitos que foram aos poucos sendo
conquistados pelos cidadãos, a aplicação direta frente aos particulares se torna preponderante
para fazer frear tais desrespeitos, que alguns indivíduos praticam.
Vale, contudo, ressaltar, que a aplicação da dignidade da pessoa humana não irá
resolver o problema da exclusão social no Brasil, mas reduzir desrespeitos a direitos
conquistados pelo cidadão.
41

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho (2ª região). RO (00021976620125020311 SP).


Recorrente: PBL Assessoria de Comércio Exterior Ltda., Recorrido: Wesley Lopes de
Relator: Juiz Marcelo Freire Gonçalves, 11 de junho de 2015. Publicação 19/06/2015

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