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BIOPIRATARIA: A EXPLORAÇÃO DA BIODIVERSIDADE NO ESTADO DO

AMAZONAS E A NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO

BIOPIRACY: THE EXPLORATION OF BIODIVERSITY IN THE STATE OF


AMAZONAS AND THE NECESSITY OF REGULATION

Luis Felipe Avelino Medina∗

Maria Suely Cruz de Almeida∗∗

RESUMO
A Floresta Amazônica, como ecossistema mais diversificado do planeta, sempre semeou
a cobiça dos povos. Nos últimos anos, uma atividade vem crescendo na Amazônia: a
biopirataria, que consiste na retirada ilegal de material genético de seres vivos da
floresta. O aumento nos índices de contrabando de animais e plantas, a derrubada de
árvores nativas e a apropriação do conhecimento tradicional exigem que o Estado aja no
sentido de proteger a nossa biodiversidade, mantendo aqui as riquezas naturais, ou,
recebendo benefícios das entidades que utilizem o material genético amazônico.

PALAVRAS-CHAVE: BIOPIRATARIA – AMAZONAS - BIODIVERSIDADE.

ABSTRACT

The Amazon Forest, the most diversified ecosystem of the planet, has always seeded the
greed of people. In the last years an activity has been growing in the Amazon:
biopiracy, that consists in the removal of illegal genetic material of living beings of the
forest. The increase in the indicators for animal, plants and tree logs traffic, along with
the appropriation of traditional knowledge demand that the state act to protect our


Graduando pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas, Trabalho de Curso:Monografia.
∗∗
Mestre em Direito Público pela UFSC; professora universitária licenciada da UCP, Coordenadora de
Monografia do Curso de Direito do CIESA, no MARTHA FALCÃO professora de Projeto de Pesquisa e
Monografia, em Manaus; Advogada e Conselheira da Comissão de Ensino Jurídico da OAB-AM.
biodiversity, keeping the natural wealth or receiving benefits from the entities that use
genetic material from the Amazon.

KEYWORDS: BIOPIRACY – AMAZONAS - BIODIVERSITY.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho aborda a necessidade de regulamentação da exploração da


biodiversidade no Estado do Amazonas em razão da crescente atividade extrativista
predatória conhecida como Biopirataria, que ocorre livremente tanto no interior do
Estado quanto na capital.

A relevância do tema não é apenas ambiental ou étnico-cultural. Trata-se da


demonstração do valor da matéria prima extraída da Floresta Amazônica para o
desenvolvimento e majoração de ciências principalmente biológicas, assim como os
benefícios para a economia da região.

Deste panorama, infere-se que o Estado do Amazonas vem sendo prejudicado


pela destruição da Floresta Amazônica, tráfico de plantas e animais nativos e registro de
patentes de produtos amazônicos por empresas e nações estrangeiras, sem qualquer
retorno do lucro à população, ensejando urgente a manifestação da Administração
Pública em apreciar a matéria.

Como amazonida questiona-se: quais os prejuízos sofridos até hoje pela


Amazônia, em especial, pelo Estado do Amazonas em razão da biopirataria, como
conseqüência de descaso dos governantes e o que está faltando para que façam uma
regulamentação sobre a matéria?

Mostrar a importância da normatização da exploração da biodiversidade no


Estado do Amazonas e a necessidade de coibir a exploração e comercialização
predatória de material biológico sem fiscalização adequada, com o intuito de extinguir a
biopirataria é o papel que todo cidadão amazonense tem que desempenhar. Por trata-se
de assunto fundamental para a preservação da Floresta Amazônica, manutenção da
soberania nacional e desenvolvimento científico-social da região, em razão das riquezas
naturais disponíveis e ainda inexploradas.
1 A EXPLORAÇÃO DA BIODIVERSIDADE NO ESTADO DO
AMAZONAS.

A Amazônia é alvo de contrabando de produtos naturais desde os tempos do


Descobrimento. Esta é, na verdade, a razão das Grandes Navegações: encontrar rotas
para levar à Europa especiarias que ali não eram encontrados.

As descobertas de terras novas e sua colonização foram impulsionadas pelas


modificações sociais e econômicas que aconteciam na Europa nos séc. XV e XVI. Com
o fechamento das rotas de comércio terrestre com o Oriente em razão da ocupação dos
turcos otomanos, o continente europeu ficou privado das especiarias vindas da Ásia e
Oriente Médio.

Sem os benefícios do comércio com o Oriente, alguns países europeus


lançaram-se ao mar em busca de nova rota livre para o restabelecimento de sua
economia. Portugal e Espanha foram os mais importantes e bem sucedidos nesta nova
empresa.

Com a chegada dos europeus ao continente americano, uma nova fonte de


riquezas estava aberta. As expedições espanholas retornavam sempre cheias de riquezas,
principalmente o ouro dos saques contra os povos Asteca e Inca. Passados alguns anos,
outros europeus atentaram para as riquezas do Novo Mundo, suficientes para suprir as
necessidades de todo o Velho Continente, sem apresentar os riscos dos constantes
combates com os muçulmanos nas rotas para o Oriente.

As terras encontradas foram divididas entre Portugal e Espanha, e por um


longo período, os portugueses hesitaram em abandonar a faixa litorânea próxima ao
ponto em que aportou Pedro Álvares Cabral. Frei Vicente de Salvador, ainda no século
XVI apontava que: “os lusos se contentam de andar arranhando ao longo do mar o
território como caranguejos1”.

A chegada efetiva à Amazônia se deu, primeiro, por obra dos espanhóis, alguns
anos após sua chegada. Em 1531 o espanhol Francisco Pizarro chegou à capital inca,
onde hoje é o Peru e ali se estabeleceu, reunindo informações sobre as riquezas da
região. Em 1541 Francisco Pizarro, vice-rei do Peru organiza uma expedição em busca

1
SALADOR, frei Vicente do. História do Brasil: 1500-1627. São Paulo: Melhoramentos, 1975. p.59
apud NADAI, Elza. NEVES, Joana. História do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1995. p36.
do “país da canela”, e dá o seu comando a seu irmão Gonzalo Pizarro e a Francisco
Orellana, governador de Guayaquill. Esta foi a primeira expedição européia em busca
de um produto natural, diferente de ouro ou prata, mas também de alto valor mercantil
naquela época. A canela era produto de grande importância naquela época, razão pela
qual a expedição foi constituída por 220 espanhóis a cavalo, 4.000 índios, 2.000 lhamas,
4.000 porcos e 1.000 cães dos quais retornaram apenas Orellana e outros 80 espanhóis,
entre eles frei Gaspar de Carvajal2.

Embora a expedição tenha chegado, de fato, ao “país da canela”, a canela


amazônica não apresentava a qualidade da oriental, proporcionando um valor de
mercado bem mais baixo. O fato mais importante, no entanto, foi a expedição em si, e
não sua descoberta, visto que esta foi a primeira vez que os europeus percorreram o Rio
Amazonas em toda a sua extensão.

Além da canela, espanhóis, e logo depois portugueses, ingleses, franceses,


holandeses, entre outros, tomaram conhecimento das riquezas naturais oferecidas pela
Floresta Amazônica através dos relatos de frei Gaspar de Carvajal, o primeiro a
documentar a viagem através do rio Amazonas cortando todo o território amazônico. A
estas riquezas, deu-se o nome genérico de “Drogas do Sertão”.

As drogas do sertão eram soluções altamente lucrativas aos comerciantes


europeus, principalmente em razão das dificuldades encontradas no comércio com o
Oriente, sempre tumultuado por batalhas com as nações locais, os turcos otomanos e
entre os próprios europeus. A América se mostrava como uma opção muito mais
pacífica e abundante.

Eram classificados como drogas do sertão os mais diversos produtos. Dentre


eles estavam o cacau, baunilha, cravo, pimenta, salsaparrilha, açafrão (a tinta da planta
de urucu), piaçava, madeira, sementes oleaginosas, castanha-do-pará e muitos outros.

Houve várias tentativas de colonização do território amazônico por parte,


principalmente, da França, Inglaterra e Holanda, que tinham muito interesse na região,
ao contrário de Portugal e Espanha. O primeiro interessava-se mais pelos territórios
mais ao sul, e o segundo por estar satisfeito com a produção de ouro no Andes.

2
BRASIL, Altino Berthier. Desbravadores do Rio Amazonas, Disponível em:
<http://www.amazoniaenossaselva.com.br/Pal2.asp?Cod=9&Sld=$>. Acesso em: 18.10.2006
A partir da unificação dos países ibéricos sob uma mesma coroa, colocou-se
em prática uma política agressiva para rechaçar as outras nações e estabelecer de vez
seu predomínio na região.

As batalhas aconteciam ferozmente e a ajuda dos povos indígenas a quaisquer


dos envolvidos era fundamental. Pouco a pouco os invasores eram derrotados e
empurrados para fora do território português, até que, finalmente, o domínio português
prevaleceu, com a Espanha ficando mais a oeste, por toda a extensão do Pacífico e a
criação das colônias de Suriname (Holanda), Guiana Francesa (França) e Guiana Inglesa
(Inglaterra).
Aos missionários jesuítas, carmelitas, franciscanos e mercedários o dever
de manter o controle da região em nome de Portugal. Sua ação foi fundamental para o
comércio das drogas do sertão. Os nativos transmitiam seu conhecimento aos
missionários, reuniam as preciosas especiarias que eram despachadas para a Europa
constantemente.
As orientações da coroa portuguesa aos militares e jesuítas destacados ao
povoamento da região foram3: a) Servir a Deus e à fé católica; b) Promover o lucro do
Império e c) Enobrecer a terra e sua gente.
O domínio dos missionários sobre os povos indígenas era tanto que
começou a fazer frente à coroa portuguesa. Nos idos de 1759 o marques de Pombal,
ministro da coroa portuguesa, ordenou a expulsão imediata de todos os jesuítas tanto de
Portugal quanto das colônias, temendo que o poder crescente dos religiosos, detentores
do monopólio da educação colonial, do comércio de especiarias das colônias americanas
e de um imenso patrimônio constituído por terras, rendas e escravos.

O Governador do Estado do Grão-Pará e Maranhão, Francisco Xavier de


Mendonça Furtado, consciente da vocação da terra sob seu governo, escreveu, em 1752,
carta ao Ministro dos Negócios Ultra-marinos de Lisboa, dando seu parecer acerca do
que deveria ser feito na região. Samuel Isaac Benchimol 4 compilou da seguinte forma:

3
CAMBRINI, Roberto. O Espelho Índio. Os Jesuítas e a destruição da alma indígena. Rio de Janeiro:
Espaço e Tempo, 1988, p. 83-86. Apud DA SILVA, Marilene Corrêa,. O Paiz do Amazonas. Manaus:
Valer, 2004, p.88.
4
BENCHIMOL, Samuel Isaac. Grupos culturais na formação da Amazônia brasileira e tropical. In:
Encontro Regional de Tropicologia, 2, 1985, Recife. Anais... Recife: Massangana, 1989. p. 115-144.
Disponível em: <http://www.tropicologia.org.br/conferencia/1985grupos_culturais.html>. Acesso em:
03.11.2006.
1. Devemos cultivar o arroz, o cacau, o café, o algodão, o açúcar, o carrapato, a
canela, os couros em sola, a couranha, o gergelim e o tabaco.

2. Também será de grande utilidade que se produza o anil, o almíscar, a andiroba, a


baunilha, o cravo, o carajuru, a castanha, o puxuri, o pinhão e o urucu.

3. O arroz, nas piores terras, cada alqueire dá semente de 30 de novidade, chegando


a dar 100 nas terras mais naturais.

4. Devem-se produzir os azeites de todas as qualidades, especialmente o pinhão, o


carrapato, o gergelim, a andiroba, a castanha, a abacaba.

5. Incentivar a cultura da canela, do cravo, da copaíba, da baunilha e do puxuri.

6. Com relação às tintas é importante cultivar o carajuru e o urucu, e com relação


aos produtos medicinais a jalapa, o gengibre e a ipecacuanha, bem como o breu
e a almacega.

7. No que toca às fibras, além do caraú, é importante plantar o ambé, o tucum e a


piaçaba, além do castanheiro para tirar o breu para calafetar navios, e o algodão
para fazer fazendas e chitas.

8. Além de tudo há uma infinidade de madeiras, tanto para navios como para
móveis, que são tratadas com tal desprezo e ignorância nas roças, que queimam
madeiras que valeriam muitos mil cruzados para semear uns poucos feijões;

9. Se se cultivasse tudo isso seria de muito maior utilidade, porque além de dar
melhor fruto, poupava muitos dias metidos nos matos, em busca desses gêneros,
quando os podiam ter muitos melhores à sua porta.

10. Por não fazerem esta arte, o Estado está no último precipício da miséria e da
pobreza, pois podendo ser um Estado poderoso ficou na condição de pedir
socorro e esmola como qualquer pobre.

2 BIOPIRATARIA: BIODIVERSIDADE E A NECESSIDADE DE


REGULAMENTAÇÃO

Um dos capítulos mais importantes na história da biopirataria mundial é o que


envolve a retirada da borracha da Amazônia para o cultivo em países da Ásia.

No ano de 1876 o inglês Henry Wickham contrabandeou 70.000 sementes de


seringueira do Brasil para a Malásia, então colônia inglesa, onde foi implantado um
sistema diferenciado de cultivo da seringueira, superando em muitas vezes a eficiência
do cultivo silvestre que ocorria na Amazônia.

As tribos indígenas utilizavam a borracha em diversas formas. As primeiras


referências ao seu uso datam dos astecas, segundo pinturas rupestres existentes no
Museu Nacional do México. Colombo, ainda em sua segunda viagem ao Continente
(entre 1493 e 1496), registrou seu contato com povos indígenas que utilizavam a
borracha. O látex era extraído das árvores locais e dela eram preparadas bolas, sapatos,
capas, couraças, como fármaco para o tratamento de hemorróidas, como iluminação nas
danças noturnas, eram utilizados para confeccionar flechas incendiárias, além de um uso
bastante curioso: os recém-nascidos eram untados com látex para mantê-los aquecidos5.

O princípio da utilização industrial da borracha é incerto. Historiadores e


pesquisadores apresentam datas diferentes para os mesmos acontecimentos, no entanto,
podemos concluir que a atividade começou por volta de 1735, principalmente como
borrachas para apagar lápis. Alguns anos depois, em razão do constante comércio entre
os povos nativos e os missionários, calçados de borracha já eram utilizados no Pará e
também nas maiores cidades de Portugal.

Indústrias de todo o mundo utilizavam a borracha amplamente. Dificilmente


uma fábrica funcionava sem a presença de borracha. Com o passar do tempo, o produto
brasileiro foi tornando-se cada vez mais necessário ao desenvolvimento da economia.

A borracha tornou-se realmente imprescindível a partir de 1839 quando


Charles Goodyear desenvolveu a técnica de vulcanização. Essa técnica conferia
resistência ao frio, calor e mantinha a elasticidade do produto. Deste ponto em diante,
principalmente em razão do crescimento da indústria automobilística, a borracha foi
considerada uma das matérias primas mais importantes.

A ascensão da Região Amazônica foi tão grande, impulsionada pelo inédito


volume de dinheiro, que não são incomuns as estórias de seringalistas – os donos dos
seringais – que acendiam seus charutos com notas de 500.000 réis. A riqueza conhecida
nos anos seguintes foi única na região.

5
REIS, Arthur César Ferreira. Seringal e o Seringueiro. Manaus: Ed. Universidade do
Amazonas: 1997.
Uma passagem constante da Enciclopédia Britânica6 demonstra a vida dos
seringalistas: “O seringalista, no barracão da margem do rio navegável, era um nababo
primitivo. O do seringal Iracema, no Alto-Acre, vestia smoking para jantar. Era um
jantar aparatoso, ao som da orquestra que contratara em Belém ou Manaus. Bebia-se
champanha como se fosse água. O preço não importava. [...]. Desciam com a borracha
para Manaus ou Belém. Subiam com mercadorias”.

As cidades mais beneficiadas com o comércio da borracha foram Belém e


Manaus. Na primeira, foram edificadas a Basílica de Nazaré, Panteão de mármore,
Santa Casa (hospital, à época, superior a qualquer outro no país), o Teatro da Paz (o
primeiro de todo o continente americano); Na segunda, houve o Teatro Amazonas, o
Bonde Elétrico, a luz elétrica, O Palácio da Justiça, o Porto de Manaus, serviço de
esgoto e o Prédio da Alfândega, este vindo da Inglaterra a navio, a ser montado no local.

Segundo dados de Nelson Piletti e José Jóbson de A Arruda7, as exportações


de borracha chegaram a representar, em seu apogeu, no ano de 1912, quase 40% de toda
a exportação brasileira, participando com um total de 42.000 toneladas, figurando como
o segundo item mais exportado pelo país. Esta quantidade impressiona pelo fato de que,
em 1827, a produção brasileira foi de medíocres 31 toneladas.

Não apenas a economia da região foi inflada nos anos do período áureo da
borracha, mas também a sua população. Em 1890 a população da Amazônia estava em
torno de 476.000 habitantes. Dezesseis anos depois, este número já era superior ao seu
dobro. Em 1906 haviam na região mais de 1.100.00 habitantes, vindos de todo o país
em busca da borracha, principalmente do nordeste (Maranhão e Ceará).

A partir do ano de 1852 foi iniciada uma linha regular de transporte de


mercadorias e trabalhadores para o trabalho nos seringais. A Companhia de Navegação
e Comércio do Amazonas, criada pelo Barão de Mauá, foi responsável pelo transporte
de milhares de nordestinos, que fugiam da seca na terra natal em busca da riqueza
anunciada por campanhas de publicidade financiadas pelos governos estaduais e pelas
empresas de transporte internacional.

6
Enciclopédia Britânica. Encyclopaedia Britannica Editores Ltda. : São Paulo. 3v – BORRACHA, a
Civilização da. 207p. 1977.
7
ARRUDA, José Jóbson de a Arruda; PILETTI, Nelson. Toda a História. Ed. Ática: São Paulo 7ed.
Samuel Benchimol, em sua obra Romanceiro da Batalha da Borracha8, traz o
testemunho de um destes nordestinos, impedidos até mesmo de desembarcar nas
capitais em razão do estado deplorável em que se apresentavam:

Vim mode conhecer isso aqui. Todos me diziam que o Amazonas era
uma terra de bondade. Se ajuntava dinheiro com ciscador. Era só
apanhar dinheiro com as mãos e voltar. Então, eu disse comigo, que eu
ainda hei de conhecer essa terra. Gosto do inverno, sem comparação.
Eu estava em União. A moda lá é vir pro Amazonas. É só o que se fala
por lá. A animação no Ceará é grande. Só se fala no Amazonas, nas
suas riquezas, nas suas facilidades. As coisas por lá andam mesmo
ruim. A terra anda virando pó. Está tão seca que nem língua de
papagaio. Não há ninguém que podendo vir não vem. Sempre tive
vontade de conhecer isto aqui. Todo mundo me falava nela. Eu vim
antes que fosse tarde demais. Dois anos que faz seca. Estamos entrando
no terceiro. Lá é assim: um ano só verão, no outro não há inverno. Não
há quem possa viver.

O preço pago por um quilograma de borracha crua no ano de 1825 era de 220
réis. Em 1910, o mesmo quilograma era negociado a 17.800 réis.

O contrabando das sementes de seringueira para o Extremo Oriente começou a


dar frutos por volta de 1900. Naquele ano, segundo dados retirados da Enciclopédia
Britânica, o mundo produziu 53.900 toneladas de borracha. Desse total, apenas 4
toneladas eram provenientes das plantações asiáticas.

Na Amazônia, a forma de retirada do látex da seringueira era muito


dispendiosa e lenta devido à distância entre as árvores. O seringueiro era obrigado a
morar sozinho no meio da floresta, onde armava uma barraca para morar e defumar o
látex. Sua rotina diária se limitava a, ainda de madrugada, tomar um dos caminhos
preordenados (chamados “estradas”) e fazer os cortes na casca da árvore. O caminho
saia e chegava na barraca. Logo após a primeira passagem, que terminava próximo ao
meio dia, fazia uma breve refeição e retornava à “estrada” para recolher a seiva, tarefa
que levava a outra metade do dia. Antes de dormir, ainda devia reunir todo o látex e
defuma-lo, para produzir as bolas de borracha, que era vendida ao seringalista.

A Floresta Amazônica é o ecossistema mais diversificado do planeta, e, até


hoje, muito pouco disso é conhecido e explorado. Encontram-se facilmente espécies

8
BENCHIMOL, Samuel. Romanceiro da Batalha da borracha. Manaus: Imprensa Oficial, 1992
vegetais e animais capazes de, manipuladas corretamente, agir em prol de toda a
população mundial por meio de remédios, vacinas, alimentos, cosméticos, e outros
produtos.

A exploração da biodiversidade amazônica, no entanto, vem sendo feita de


maneira imprópria, sem qualquer fiscalização ou supervisão em razão da inexistência de
normas que regulamentem a questão, sem qualquer respeito aos Princípios que regem o
Direito Ambiental e Constitucional, principalmente o caráter difuso do meio ambiente e
a Soberania Nacional. O material genético que compõe, no geral, a Floresta Amazônica
é objeto de cobiça de qualquer pessoa ou entidade, principalmente empresas que atuem
na área farmacêutica ou medicinal.

Vê-se o interesse de uns é social, e de outros é unicamente econômico dado à


potencialidade e possibilidade econômica contida em um mero metro quadrado de
Floresta.

Em toda a cadeia do processo de extração, pesquisa, desenvolvimento e


aplicação de material genético da biodiversidade amazônica, o Amazonas é pouco
beneficiado. E a Administração Pública pouco ou nada tem feito para manter no Estado
aquilo que daqui é tirado, perdendo muito na corrida pelo conhecimento científico da
Amazônia.

Observe-se o seguinte excerto do texto de Ceci Almeida9: “... Entre 1995 e


1999, o Brasil recebeu quatro mil pedidos de patentes de biotecnologia, a grande
maioria de produtos oriundos da biodiversidade...”.

Diante deste panorama ameaçador em que o Estado do Amazonas se encontra a


necessidade imediata para que sejam mantidos ideais de Soberania Nacional, do meio
ambiente como bem difuso e a criação e aplicação efetiva de uma legislação que
regulamente a matéria, semeando o terreno para o desenvolvimento do assunto com a
finalidade principal de benefício de todos.

A Constituição Federal de 1988 é taxativo quando trata da responsabilidade da


preservação do meio ambiente, em seu art. 225:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,


bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-

9
ALMEIDA, Ceci,. UNB Revista, Brasília: Ano 1, n.º 1, 2001.
se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para
as presentes e futuras gerações.

§1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

[...]

II – Preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do


País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de
material genético;

Analisando este dispositivo constitucional, identifica-se o interesse do Estado


em salvaguardar o patrimônio genético do país, não apenas da Floresta Amazônica. A
Constituição Federal de 1988 prevê, portanto, atividade biotecnológica, no entanto,
deve apresentar formas de se proteger de maneira eficaz contra inevitáveis abusos
advindos da atividade fiscalizando e preservando o meio ambiente10.

O dispositivo constitucional acima é norma programática, necessita de


legislação infraconstitucional para dar cumprimento a seus preceitos. Aí é que se entra
no cerne da questão aqui abordada. É imprescindível que esta norma infraconstitucional
seja específica para cada Estado, se necessário cada município, dados os diferentes
ecossistemas no país.

O Estado do Amazonas, parte da principal floresta tropical do mundo deve,


sobremaneira, ter o assunto regulamentado quanto antes, tanto em razão do histórico de
contrabando de produtos e subprodutos da floresta, como pelo interesse previsível que
desperta.

No que assiste à proteção à biodiversidade e o material genético, entretanto,


apesar de todas as razões mais claras e cristalinas, o Governo do Estado, como um todo,
não tem em vigência, nenhuma lei que os proteja, ficando à mercê de biopiratas e
caçadores de gens11.

Esta situação é inaceitável, pois estas pessoas agem livremente, sob


prerrogativas diversas, tais como, a de prestar assistência às populações ribeirinhas, aos
índios, ou mesmo vem travestidos de turistas e pesquisadores idôneos.

10
DEL NERO, Patrícia Aurélia, in Propriedade Intelectual: A tutela jurídica da biotecnologia. São
Paulo. Revista dos Tribunais, 1998.
11
HOMMA, Alfredo, In Biopirataria na Amazônia: Ainda é tempo para salvar? Disponível em:
<http://www.atech.br/agenda21.as/download/amazonia2.pdf> Acesso em: 28.008.06
Por todos os motivos apontados, fica demonstrada a urgência com que uma lei
que regulamente o estudo, exploração, manejo e desenvolvimento de tecnologias
relacionadas ao material genético da Floresta Amazônica, aplicando penas e sanções a
quem deixar de observá-la, com a finalidade de proteger o Amazonas e explorar a sua
biodiversidade de maneira consciente e benéfica a todos.
Porque nos últimos anos, com a crescente repercussão dos benefícios dos
produtos naturais da Amazônia, a facilidade de difusão de informação, a busca por uma
vida mais saudável e o valor econômico agregado a produtos com a marca “Amazônia”
aumentaram os casos de biopirataria na região.
Frutas, sementes e até mesmo animais são patenteados por empresas
multinacionais todos os anos, sem qualquer contrapartida para aqueles que passaram o
conhecimento adiante ou mesmo para o país ou os locais onde são achados e colhidos.

Alguns dos casos mais significativos estão elencados abaixo, e demonstram a


facilidade e a audácia com que agem as empresas internacionais:

2.1 CUPUAÇU (Theobroma Grandiflorum)

No recente ano de 2001, as autoridades brasileiras tomaram conhecimento do


resultado prático da biopirataria e suas conseqüências para a região.
Naquele ano, uma empresa multinacional de gêneros alimentícios com sede no
Japão patenteou o cupuaçu. A patente era relativa ao processo de fabricação do
chocolate proveniente do cupuaçu e o próprio nome “cupuaçu” foi registrado como uma
marca. Há, ainda, patente sobre a produção e uso da gordura e da semente do cupuaçu.
A multinacional em questão – Asashi Foods Corporations – ameaçava
qualquer pessoa que apresentasse o nome da fruta em qualquer rótulo de qualquer
produto com multas no valor mínimo de US$ 10.000,00.
Esta empresa já comercializa o chocolate produzido a partir do cupuaçu,
conhecido como “copulate”, muito embora seu processo de produção tenha sido
desenvolvido no Brasil, pela EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária. Esta é uma demonstração do descaso com que são tratadas as descobertas
científicas no país, principalmente em se tratando de produtos naturais, embora
apresentem enorme capacidade econômica.
A multinacional não foi a primeira a patentear produtos do cupuaçu, embora
tenha sido o caso de maior repercussão na mídia. Em 1998, uma empresa inglesa – The
Body Shop International Pic. – patenteou o extrato do cupuaçu, não com finalidade
alimentícia, mas para a produção de cosméticos, demonstrando a versatilidade e
variedade de usos de um único fruto amazônico.
Em 2002, a empresa Cupuaçu International Inc. também procurou patentear a
produção e uso da gordura da semente da fruta.
O cupuaçu tem diversos usos, podendo ser utilizado completamente, da
semente à casca, em alimentação (sucos, cremes, geléias e o próprio chocolate, mais
saudável que aquele produzido a partir do cacau), cosméticos (cremes, xampus, óleos) e
até mesmo na homeopatia, seguindo o uso de tribos indígenas para aliviar dores
abdominais, e outros ainda não constatados.
O preço de mercado do quilograma de cupuaçu faz jus à sua versatilidade,
girando em torno de US$ 2,00 e US$ 4,00/kg.
No ano de 2004, no entanto, o registro da patente sobre o cupuaçu foi anulado
pelo Escritório de Marcas e Patentes japonês. A organização não governamental GTA,
Grupo de Trabalho Amazônico, contando com a subscrição da ONG Amazonlink, da
Associação de Produtores Alternativos (APA-RO) e ainda do Instituto de Direito e
Comércio Internacional (Ciited), o governo brasileiro, e um grupo de advogados
brasileiros agiu constantemente desde o conhecimento do registro da patente junto ao
órgão do governo japonês responsável, obtendo êxito em março daquele ano.
Poucos dias antes, a empresa Asashi Foods sofreu outra derrota, o
cancelamento registro da patente do Cupulate. Esta decisão baseou-se em documentos
que provaram que as técnicas de produção do chocolate eram idênticas àquela
desenvolvida pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA12.
O registro da patente sobre o cupuaçu foi cancelado em razão de acordos
internacionais sobre patentes, mais especificamente, a Convenção da União de Paris, de
1883, que, em conjunto com outros acordos multilaterais, determinam que as matérias-
primas, animais ou vegetais, não podem ter seus nomes populares registrados. Outro
ponto relevante quanto ao registro de nomes populares é que pode levar a propagandas
levianas, enganosas ao consumidor, pois os empresários detentores da marca podem
utilizar o seu nome para mascarar produtos diversos.

12
Cupuaçu: registro da marca é cancelado no Japão. Publicado por: Rota Brasil Oeste. Disponível em:
<http://www.brasiloeste.com.br/noticia/908/>. Acesso em: 30.10.06.
Esta foi uma vitória dos povos amazônicos e de toda a Amazônia em si, porém
é apenas um grão de areia.

2.2 O AÇAÍ (Euterpe precatoria)

O Açaí é outra fruta regional que oferece inúmeras aplicações práticas. A


principal delas é o creme ou suco de açaí, uma das bebidas mais apreciadas pela
população regional e, nos últimos anos, no resto do país e no mundo. O médico
americano Nicholas Perricone, escritor de vários livros de sucesso sobre saúde, elegeu o
açaí como a primeira colocada de uma lista dos dez “super alimentos” (top ten list of
super foods13), apresentou sua lista em um dos programas mais conhecidos e de maior
audiência naquele país, garantindo espaço privilegiado à fruta e despertando o interesse
de diversas empresas.
De seus frutos, há ainda a possibilidade de produção de licores e vinhos, os
caroços são aproveitados no artesanato e como adubo, dos cachos podem ser feitas
vassouras ou, após queimados, repelentes para insetos. Do caule do açaizeiro extrai-se o
palmito e, finalmente, a partir de suas raízes, produz-se infusões utilizadas no combate a
hemorragias e verminoses.
O Governo Brasileiro está, no momento, envolvido em uma contenda judicial
com a empresa Açai GMBH, sediada na Alemanha, que registrou o nome “açaí” em
toda a União Européia, obrigando qualquer pessoa que use o nome da fruta a pagar seus
royalties. Foram detectadas, ainda, registros da palavra “açaí” no Japão e nos Estados
Unidos. No primeiro o processo judicial está em trâmite, e no segundo, o pedido de
registro ainda não foi finalizado, o que abre a possibilidade de recorrer-se a um processo
administrativo.

2.3 A ANDIROBA (Carapa Guanensis Aubi)


A Andiroba é uma árvore regional cujas sementes fornecem um óleo utilizado
pelos índios nas mais diversas formas. Suas sementes fornecem um óleo utilizado pelos
povos indígenas como repelente para insetos, como remédio e combustível para
iluminação rudimentar.

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http://www.theacaiberrycompany.com/about.htm
Da casca da andiroba é produzido um chá utilizado para combater febre e
verminoses. Se transformado em pó, a casca pode ser utilizada também como
cicatrizante.
A andiroba é indicada, ainda, contra gripe, tosse, pneumonia, depressão,
infecções do trato respiratório superior, dermatites, úlceras, escoriações, diabetes,
reumatismo, protetor solar e também cosméticos.
São tantas aplicações da andiroba que a indústria internacional não se demorou
muito em tentar se apropriar do nome. Em 1999, antecipando o lucro dos produtos
retirados da árvore, a multinacional Rocher Yves Biolog Vegetable (participantes da
França, Japão e Estados Unidos) e a japonesa Morita Masaru fizeram o pedido para
registro de patente no Japão e na União Européia.

2.4 A COPAÍBA (Copaifera Langsdorfi)

A copaíba, assim como a andiroba, é uma árvore cujos produtos apresentam


diversas aplicações.
A árvore fornece óleo com grande potencial medicinal, recomendado como
poderoso antiinflamatório no tratamento de caspa, dermatites, dermatoses e úlceras de
estômago.
Pode ser utilizada como diurético, expectorante, desinfetante, estimulante,
vermífugos, anticoncepcional, como combustível para lampiões, na fabricação de
vernizes, perfumes, farmacêuticos e até mesmo na indústria fotográfica, na revelação de
fotografias.
Há registros de patentes sobre a árvore na Europa e nos Estados Unidos. Em
1993 a empresa Technico-Flor S.A. requereu o registro da patente e a empresa Aveda
Corp em 1999.

2.5 AYAHUASCA (Banisteriopsis caapi)

Ayahuasca é o nome indígena do cipó da planta Banisteriopsis caapi, cujo


nome em português significa “cipó da alma”. Sua utilização pelos indígenas está
diretamente ligado ao misticismo, na realização de cerimônias religiosas de cura,
encontro com espíritos (espíritos-guia, guardiões, familiares), deuses e para receber
visões do futuro.
Trata-se de uma planta que, transformada em bebida, assume características
alucinógenas, poderosas e capazes de levar quem a ingerir a um estado de êxtase, razão
pela qual é utilizada em cerimônias com aquelas finalidades. A importância do cipó é
tanta, que algumas tribos indígenas a consideram sagrada.
Em 1986, Loren Miller, americano, obteve a patente de uma espécie vegetal
batizada oir eke de “Da Vine”, uma “variação” da Banisteriopsis caapi.
à época, houve contestação desta patente por parte da Coordenadoria das
Organizações Indígenas da Bacia Amazônica – COICA, representante de
aproximadamente 400 grupos indígenas da América do Sul, sob argumentos de que seu
registro atentara contra a natureza sagrada da planta.
O COICA ainda obteve êxito no intento, conseguindo o cancelamento da
patente após pedido de revisão do registro, no entanto o sucesso foi apenas
momentâneo, pois em 2001 a patente foi restaurada.
Do cipó da Ayahuasca produz-se o “santo daime” e a bebida utilizada pela
União do Vegetal, seitas fundadas no Brasil que têm na planta o cerne de suas
sociedades.
Apesar de serem seitas fundadas no Brasil, já existem plantações nos Estados
Unidos, em vários estados daquele país, Alemanha, Austrália e Suíça.

2.6 O CURARE

O curare é uma mistura de substâncias extraídas de plantas regionais cujo


resultado é um composto natural extremamente tóxico.
Trata-se de um veneno utilizado por tribos indígenas da Região na caça, pesca
e quando em guerra entre si.
O seu preparo, secreto até o ano de 1939, é aplicado em pontas de lanças,
flechas e afins e funciona com rapidez impressionante. A presa é paralisada em poucos
segundos, dada a grande eficiência do produto. Embora a toxicidade do veneno era
muito eficaz, seus efeitos são totalmente reversíveis, e foi este o motivo que chamou a
atenção das indústrias.
Alexander Von Humboldt foi o responsável pela descrição dos ingredientes
que compõem a fórmula do curare, e em 1943 foi criado um analgésico a partir do
ingrediente principal, o d-tubowrarine.
2.7. O SAPO KAMBÔ (Rã Phillomedisa Bicolor)

A partir de estudos realizados na secreção cutânea desta espécie de rã, foram


criados vários produtos farmacológicos. As doenças tratadas com base nas secreções da
rã são das que mais afligem a humanidade.
Dentre elas estão o Mal de Parkinson, a AIDS, câncer e depressão. É utilizada
também em compostos analgésicos e no fortalecimento do sistema imunológico.
Existe, hoje em dia, algo em torno de dez registros de patente em que aparece
o nome phillomedusa bicolor espalhadas pelo mundo, nos Estados Unidos, União
Européia e Japão.

2.8. A QUININA (Chinchona afficinalis


A quinina é produto retirado da casca de uma árvore de chinchona, utilizada
pelos povos indígenas da região como remédio para febre. Por este motivo, ficou
conhecido como “a casca de febre dos índios” (indian fever bark).
Já no século XVI, em decorrência da febre que assolou a Europa naquela
época, foi levada da Amazônia para ampla utilização, e um século mais tarde teve seu
nome mudado para “casca de febre de jesuíta”, em razão do contato destes com os
índios.
Na década de 1920, a quinina voltou a ser bastante procurada em razão do
tratamento de malária nos Estados Unidos. Nesta época, a maior parte do quinino
utilizado era proveniente de Java, para onde foi contrabandeada em 1895 pelo inglês
Charles Ledger.
Apesar de contrabandear a planta, o inglês foi responsável pela sua
manutenção até os dias de hoje, pois, percebendo a crescente dificuldade de achar
árvores de chinchona, devido ao processo extremamente predatório de extrativismo do
quinino, foi capaz de observar que logo não haveria mais árvores de pé.

CONCLUSÃO

A biopirataria no Amazonas, portanto, é uma atividade que poderia


conferir ao Estado um status único no mundo, o de maior provedor de material genético
e conhecimento tradicional do mundo, no entanto, a ação de agentes interessados apenas
em lucro, sem qualquer escrúpulos, somado ao fato de que não há, sequer, uma previsão
legal ou tipo penal para o crime de biogrilagem, concorrem para o tráfico de produtos e
subprodutos da Floresta, bem como a exploração dos conhecimentos dos povos da
floresta, sem qualquer contrapartida para o Estado ou para os detentores do saber.

É de extrema importância a regulamentação da exploração da


biodiversidade no Estado do Amazonas, pois se a situação continuar desta forma, restará
apenas o pandemônio, com a abertura total das fronteiras brasileiras à iniciativa
internacional que busca apenas o lucro, sem qualquer respeito ao regime das florestas e
às populações tradicionais.

A preservação da Floresta Amazônica e o desenvolvimento do Estado do


Amazonas são assuntos interdependentes, ou seja, o sucesso de um só é possível na
medida do sucesso do outro. As riquezas presentes da Floresta são bem difuso, assim
entendido não apenas como pertencentes ao povo brasileiro, mas à população mundial.
No entanto, o território amazônico contido no território brasileiro é inalienável, e o
aproveitamento de qualquer de seus componentes, se agregados a valores econômicos,
devem oferecer uma contrapartida econômica, é dizer, se o material genético retirado do
Amazonas for utilizado com fins econômicos, e outrem se beneficia desta valoração,
esta deve, no mínimo, oferecer como recompensa uma parte de seus lucros.

Desta feita, a regulamentação da exploração da biodiversidade no Estado


do Amazonas é necessária, tanto para proteger a Floreta quanto para oferecer à
população local um benefício pelo sua manutenção e compartilhamento com toda a
humanidade.

REFERÊNCIAS

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