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Introdução à Macroeconomia

ROMILSON RANGEL AIACHE

1
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

A228m

Aieche, Romilson Rangel.

Introdução à economia. Gama, DF: UNICEPLAC,


2022.

49 p.

1. Introdução à economia. 2. Economia. 3.


Macroeconomia. I. Título.

CDU: 32

Introdução à Macroeconomia

Sandroni (1989), define macroeconomia como parte da Ciência Econômica que


focaliza o comportamento do sistema econômico como um todo. Tem como objeto de estudo
as relações entre os grandes agregados estatísticos: a renda nacional, o nível de emprego e
dos preços, o consumo, a poupança e o investimento totais.

Mankiw (1992) sintetiza as razões para o estudo da Ciência Macroeconômica:

2
Não
estudamos macroeconomia apenas para explicar os fatos econômicos;
também queremos aperfeiçoar a política econômica. Os instrumentos
fiscais e monetários do governo podem exercer uma influência
poderosa – para o bem e para o mal – sobre a economia. O
conhecimento da macroeconomia ajuda as autoridades públicas a
avaliarem as políticas alternativas. Os economistas são chamados a
explicar o mundo econômico como ele é e a refletir sobre como poderia
vir a ser. (MANKIW, 1992, p. 3).

A macroeconomia ocupa-se basicamente de duas questões importantes:


questões conjunturais, de curto prazo, como a taxa de emprego, níveis inflacionários
etc., e questões estruturais, que envolvem as teorias de desenvolvimento econômico
e que requerem um prazo maior para implementação, sendo consideradas, portanto,
questões de longo prazo.

Vasconcellos e Garcia (2005) elencam quatro grandes objetivos da política


macroeconômica:

 Manutenção de algo nível de emprego - conjuntural;


 Estabilidade de preços - conjuntural;
 Distribuição de renda socialmente justa – estrutural; e
 Crescimento econômico - estrutural.

Para que esses objetivos possam ser atingidos, existem alguns instrumentos
de política macroeconômica que envolvem a atuação dos agentes econômicos, com
destaque para o governo. Esses instrumentos são conhecidos como políticas fiscal,
monetária, cambial e comercial, que serão vistos mais adiante.

1.1 Fluxo Circular de Renda

Antes, porém, convém relembrar a questão do fluxo circular de renda, visto


anteriormente de forma simplificada. A figura 5, a seguir, representa o fluxo da renda,
numa economia hipotética, fechada e sem a presença do governo.

Figura 5 – Fluxo Circular da Renda – Economia Fechada e sem governo.

3
Fonte: Banco do Brasil, Curso de Economia Básica (1987).

Conforme já visto, nesse modelo de fluxo, as empresas entregam às empresas


os fatores de produção e recebem como remuneração ou salários, aluguéis, juros e
lucros (remuneração pelos fatores de produção).

As famílias, por sua vez, adquirem bens e serviços produzidos pelas empresas
e efetuam pagamentos pelos bens e serviços adquiridos por meio dos salários, lucros,
aluguéis e juros recebidos.

Esse fluxo simplificado é apenas exemplificativo, uma vez que as economias


apresentam outros atores, quais sejam, o governo e o setor externo. Esses dois atores
são fundamentais para entendermos o funcionamento da economia como um todo,
ou seja, estudar a macroeconomia. Veremos, a seguir, duas outras figuras, a primeira
delas contemplando uma economia fechada com a presença do governo e a segunda,
uma economia aberta, com a presença do governo e também do setor externo.

Figura 6 – Fluxo Circular da Renda – Economia Fechada e com governo.

4
Fonte: Banco do Brasil, Curso de Economia Básica (1987).

A figura 6 apresenta um fluxo com a presença do governo. Qualquer governo,


por menor estrutura que contenha, exige que haja uma receita, para fazer frente a
seus gastos. Para obter essa receita, o governo fixa tributos diretos, que deverão ser
pagos pelas famílias e pelas empresas e indiretos, que incidem sobre a produção e o
consumo de bens e serviços.

Finalmente, temos a presença do resto do mundo (setor externo), cuja figura


tenta explicar o complexo funcionamento econômico mundial.

Figura 7 – Fluxo Circular da Renda – Economia Aberta

5
Fonte: Banco do Brasil, Curso de Economia Básica (1987).
Nesse caso, há a interação comercial entre países, além da presença de
brasileiros no exterior e estrangeiros no Brasil, que enviam recursos para dentro e
para fora do país. Esse funcionamento é regido por leis internacionais, que visam
disciplinar o relacionamento comercial, de forma a tornar as relações o mais justas
possível.

Entendido o funcionamento básico da economia internacional, da qual a


economia nacional faz parte, existem instrumentos internos para disciplinar e
regulamentar as relações econômicas. São diversas políticas, que compõem a
política econômica nacional. Veremos as principais.

1.2 Política Fiscal

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A política fiscal cuida dos mecanismos de que o governo, em todas as suas
esferas, dispõe, para arrecadar tributos – para tanto existe uma política tributária -, e
controlar suas despesas. Esses dois componentes tem como objetivo manter o
orçamento da União em patamares adequados, compatibilizando gastos com
receitas, considerando as necessidades de investimentos e de manutenção.

A política fiscal é utilizada, também, como indutor comportamental que


influenciarão outros fenômenos econômicos. Por exemplo, caso se verifique que é
necessário adotar medidas para redução da inflação, o governo pode adotar medidas
que reduzirão gastos da população, ou retirarão dinheiro da economia, como a
diminuição dos gastos públicos ou o aumento da carga tributária.

A distribuição de renda é uma das consequências da política fiscal. Os


impostos progressivos, por exemplo (como o imposto de renda), e os gastos do
governo em localidades menos favorecidas são exemplos disso.

Dois conjuntos de medidas podem ser adotados em função da situação ´que a


economia estiver vivenciando.

Caso a economia esteja funcionando com desemprego de recursos,


encontramos aí o fenômeno denominado hiato deflacionário. Nesse caso, a
economia está funcionando aquém de suas possibilidades, ou seja, há insuficiência
da demanda agregada, o que pode ocasionar a elevação das taxas de emprego. Para
tirar a economia dessa situação, são adotadas as seguintes medidas:

a) aumento dos gastos públicos;


b) diminuição da carga tributária;
c) subsídios e estímulos à exportação, para incentivar a produção interna; e
d) aumento de barreiras e tarifas alfandegárias.

Para os casos em que a economia esteja trabalhando com inflação – o hiato


inflacionário -, a demanda agregada supera a capacidade da economia de produzir
bens e serviços. É a chamada inflação de demanda. Os antídotos de política fiscal
para esses casos são:

a) diminuição de gastos públicos;


b) elevação de carga tributária sobre bens de consumo; e
c) redução de barreiras e tarifas alfandegárias.

1.3 Política Monetária

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Outro instrumento utilizado é a política monetária, onde o governo atua sobre
a quantidade de moeda em circulação e sobre os títulos públicos1.

Para Troster e Mochón (2002, p. 261), a política monetária é o conjunto de atos do


BACEN para controlar a quantidade de dinheiro e a taxa de juros e, em geral, as condições
de crédito.

A política monetária está sob o controle do Banco Central, que dispõe alguns
instrumentos clássicos de controle;

 Depósitos compulsórios – é um percentual dos depósitos à vista dos


bancos comerciais, que devem ser depositados no Banco Central;
 Operações de redesconto – são empréstimos que o Banco Central
realiza aos bancos comerciais;
 Operações de Open Market (mercado aberto) – compra e venda de
títulos da dívida pública pelo Banco Central;
 Regulamentação sobre o crédito e taxa de juros – o governo determina
(eleva ou reduz) a taxa de juros e permite o aumento ou diminuição do
crédito, de acordo com as necessidades da economia.

A política monetária pode ser expansiva ou restritiva, dependendo da situação


econômica em que se encontra o País. Uma política econômica restritiva engloba
um conjunto de medidas que objetivam reduzir a quantidade de dinheiro e a encarecer
os empréstimos, através do aumento da taxa de juros. Já a política econômica
expansiva abrange um conjunto de medidas que tendem a acelerar o crescimento da
quantidade de dinheiro em circulação e a baratear os empréstimos, por meio da
redução da taxa de juros.

Figura 8 – Instrumentos de Política Monetária no Brasil

1
Títulos Públicos ou Títulos da Dívida Pública são títulos emitidos e garantidos pelo governo (federal, estadual ou
municipal), que servem para financiar um déficit do orçamento público, ou garantir o equilíbrio do mercado do dinheiro.
De acordo com as suas características, pode ter a forma de apólice, bônus ou obrigação do Tesouro Nacional. (SANDRONI,
1989).

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Fonte: Troster e Mochón (2002, p. 267)

1.3.1 Efeitos da Política Monetária

A aplicação dos instrumentos de política monetária podem acarretar


consequências para a atividade econômica do país. Os seus principais efeitos,
segundo Troster e Mochón (2002), são:

a) Sobre a demanda agregada – Um aumento na oferta monetária reduzirá a


taxa de juros e aumentará a demanda agregada, pois os gastos com
consumo aumentarão, uma vez que os empréstimos de dinheiro sairão
mais baratos. Haverá, também, aumento de investimentos, pelas mesmas
razões. Uma vez que a demanda agregada estará aquecida, a economia
tenderá a crescer, reduzindo as taxas de desemprego. Ocorrerá, no
entanto, o inverso, caso a oferta monetária diminua.

b) Sobre a inflação – Para boa parte dos economistas, chamados


monetaristas, a inflação é causada pelo aumento excessivo na oferta
monetária, portanto, para eles, controlar o crescimento da oferta monetária
é fator fundamental para controlar o aumento de preços.

c) Sobre a entrada de capitais estrangeiros – Altas taxas de juros atraem


capitais estrangeiros e desestimulam a fuga de capitais, auxiliando a
controlar a contabilidade nacional.

1.4 Política Cambial

Para efeitos de política cambial, o país pode utilizar, basicamente, dois regimes
cambiais, o regime de taxas fixas e o regime de taxas variáveis ou flutuantes.
Vasconcellos e Garcia (2005), assim os definem:

1.4.1 Regime de Taxas Fixas

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Nesse regime, o Banco Central fixa de forma antecipada a taxa de câmbio com
a qual o mercado deverá operar. Como consequência, o país se obriga a possuir
reservas para honrar os compromissos (saídas de capital do país).

Esse regime é adotado quando os países enfrentam elevadas taxas de


inflação, uma vez que, com o câmbio fixo em termos da moeda nacional, o preço dos
produtos importados não se eleva com as variações cambiais (evidentemente, podem
sofrer alterações nas suas moedas de origem, mas não sofrem os efeitos
inflacionários da economia interna).

Como desvantagem, o câmbio fixo obriga aos países que o adotam (por regras
internacionais) a manter reservas para lastrear as operações cambiais. Isso deixa o
país vulnerável no caso de ataques especulativos, com ameaça de fuga maciça de
capitais. Para tentar frear essa fuga, o país é obrigado a elevar as taxas de juros,
mesmo que a situação econômica interna não o indique, ou seja, a economia fica
refém da questão cambial.

Uma alternativa para essa questão é a criação de um sistema de bandas


cambiais, no qual delimita-se valores superiores e inferiores, dentro dos quais o
câmbio pode variar. Embora haja uma flutuação, esse sistema é considerado como
um regime de taxas fixas.

1.4.2 Regime de Taxas Flutuantes

Nesse regime, as taxas de câmbio são determinadas pelo mercado, ou seja,


pela oferta e demanda de moeda estrangeira. Nesse caso, o BACEN não é obrigado
a disponibilizar suas reservas cambiais, embora não seja proibido fazê-lo.

Essa é a principal vantagem do regime, ou seja, a independência da política


monetária em relação à política fiscal.

Como desvantagem, temos a volatilidade, ou seja, a possibilidade de rápidas


e abruptas desvalorizações cambiais, impactando o preço de produtos importados
(petróleo, por exemplo) e causando inflação.

Nesses casos, o BACEN procura intervir indiretamente, através da compra ou


venda de divisas (dólares, euros etc.) no mercado, com o objetivo de estabilizar os
preços. Por exemplo, no caso do real estar desvalorizando-se demasiadamente em
relação ao dólar, o Bacen vende dólares, ou seja, oferece dólares ao mercado, na
expectativa que esse responda com a desvalorização do dólar em relação ao real. O
contrário ocorre quando a dólar está se desvalorizando demais em relação ao real,
quando a autoridade monetária compra dólares, para enxugar o mercado e forçar um
aumento na sua valorização.

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Esse
tipo de intervenção é frequentemente utilizado por vários países tem o nome de dirty
floating (intervenção suja).

O quadro 6, a seguir, traz a visualização das diferenças entre os dois regimes


cambiais:

Quadro 6 – Comparativo de Regimes Cambiais


Câmbio Fixo Câmbio Flutuante
Características  BACEN fixa a taxa de  O mercado determina a taxa
câmbio; de câmbio;
 BACEN é obrigado a  O BACEN não é obrigado a
disponibilizar as reservas disponibilizar as reservas
cambiais. cambiais.
Vantagens  Maior controle da inflação  Política monetária mais
(custo das importações independente do câmbio;
estável)  Reservas cambiais mais
protegidas de ataques
especulativos.
Desvantagens  Reservas cambiais  A taxa de câmbio fica muito
vulneráveis a ataques sujeita à volatilidade do
especulativos. mercado financeiro.
 Política Monetária fica  Maior dificuldade de controle
dependente do volume de das pressões inflacionárias,
reservas cambiais. devido às desvalorizações
cambiais.
Fonte: Vasconcellos e Garcia (2005, p. 170).

O gráfico 22, a seguir, traz um exemplo das consequências da variação cambial


no mercado de divisas. No exemplo, podemos observar que a curva O $ mostra a
oferta de divisas e a curva D$ mostra a demanda brasileira de divisas. Para uma taxa
de câmbio de R$ 1,00 por dólar, o mercado encontra-se em equilíbrio. Com uma
desvalorização do real frente ao dólar, passando a valer R$ 1,20 para cada dólar, há
um superávit de divisas. De outra forma, se houver uma valorização, passando o real
a valer R$ 0,80 para cada dólar, haverá um déficit de divisas.

Gráfico 22 – Mercado de Divisas

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Fonte: Troster e Mochón (2002, p. 295).

1.5 Política Comercial

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A Política Comercial define as ações de política econômica utilizada pelo país
em suas relações externas, que apoiam-se nas outras vertentes da política econômica
para sua efetivação. Sua importância é vital para a saúde da balança comercial do
país. Destacam-se duas ferramentas para esse fim: as alterações nas tarifas sobre
importações e a regulamentação do comércio exterior.

 Alterações das tarifas sobre importações: para proteger a produção


interna, eleva-se os impostos e taxas sobre produtos importados. Para
abrir a economia, procede-se da forma contrária.

 Regulamentação do comércio exterior: estabelecimento de quotas de


importação ou proibição de importação de determinados produtos, as
chamadas barreiras alfandegárias, são utilizadas quando se pretende
reduzir as importações. O contrário ocorre quando se pretende
aumenta-las.

O quadro 7, a seguir, compara o comportamento das exportações e


importações, de acordo com o comportamento dos preços de mercado e da política
comercial adotada.

Quadro 7 – Exportações x Importações


Situação Exportações Importações
Preços externos Se os preços dos produtos Se os preços dos produtos
em US$ brasileiros se elevarem no importados se elevarem no
exterior, as exportações exterior, haverá uma retração
tendem a se elevar. nas importações brasileiras.
Preços internos Se os preços internos de Se os preços internos de
em R$ produtos exportáveis se produtos exportáveis se
elevar, poderá haver elevar, poderá haver a
desestímulo às tendência de aquisição de
exportações e incentivo às produtos similares no
vendas internas exterior, elevando as
importações.
Taxa de câmbio Aumento na taxa de câmbio Aumento na taxa de câmbio
(desvalorização do real) (desvalorização do real) deve
deve estimular as desestimular as importações,
exportações, pois os pois os importadores
exportadores brasileiros brasileiros pagarão mais
receberão mais pelos pelos mesmos produtos que
mesmos dólares antes da antes da desvalorização.
desvalorização e os
compradores adquirirão
mais pela mesma
quantidade de dólares.
Renda Aumento da renda mundial Um aumento na renda
Nacional/Mundial estimula o comércio nacional estimulará a
internacional e estimula a

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importação de produtos demanda por produtos
brasileiros. importados.
Subsídios e Isenções de impostos e Definição de barreiras
incentivos taxas de juros menores alfandegárias desestimula as
para os produtos importações.
exportáveis estimulam a
exportação.
Fonte: adaptado de Vasconcellos e Garcia (2005).

1.6 O Balanço de Pagamentos

Balanço de pagamentos é o registro contábil de todas as transações de um


país com o resto do mundo num determinado período.

Antes, porém, de adentrarmos no Balanço de Pagamentos propriamente dito,


é necessário conhecer alguns conceitos macroeconômicos, referentes ao Produto
Interno Bruto (PIB) e ao Produto Nacional Bruto (PNB).

O Produto Interno Bruto corresponde à soma de todos os bens e serviços


produzidos internamente em um país, inclusive os valores produzidos por
estrangeiros que aqui residentes. Já o Produto Nacional Bruto é o valor de todos os
bens e serviços produzidos exclusivamente com o uso de fatores de produção de
propriedade de brasileiros tanto no país como no exterior. O PNB não inclui i montante
produzido pelos estrangeiros que moram no Brasil.

Desses dois agregados macroeconômicos, derivam outros, incluindo os


conceitos de preço de mercado e custo de fatores:

PIBpm = PIBcf + TI - Subs

PILpm = PIBpm - D

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PNBpm = PIBpm + RLE

Onde:
PIBcf Produto Interno Bruto a Custo de Fatores
PIBpm Produto Interno Bruto a Preço de Mercado
PILpm Produto Interno Líquido a Preço de Mercado
PNBpm Produto Nacional Bruto a Preço de Mercado
TI Tributos Indiretos
Subs Subsídios
D Depreciação
RLE Renda Líquida do Exterior

Custo de Fatores  é aquilo que as empresas pagam aos fatores de produção


(salários, juros, aluguéis e lucros).

Preços de Mercado  são os preços finais pagos, ou seja, os custos de fatores mais
os impostos indiretos (ICMS, IPI) menos os subsídios.

Subsídios  Subsídios são vantagens concedidas a pessoas ou empresas pelo


governo, por meio de redução de impostos, financiamentos a custos menores,
despesas para assumir prejuízos das empresas, benefícios orçamentários etc.

Depreciação  Segundo Vasconcellos e Garcia (2005), depreciação é o desgaste do


equipamento de capital da economia num dado período. ... A depreciação é justamente a
parte do produto que se destina à reposição do desgaste sofrido pelos equipamentos,
que os torna obsoletos, de forma que precisam ser repostos. Esse conceito diferencia
o investimento bruto do investimento líquido, assim como o Produto Nacional Bruto
do Produto Nacional Líquido.

Investimento Líquido = Investimento Bruto - Depreciação

Produto Nacional Bruto = Produto Nacional Líquido - Depreciação

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Renda Líquida do Exterior  Remuneração dos ativos, de acordo com o país de
origem. É a diferença entre a renda recebida do exterior e a renda enviada ao exterior,
na forma de lucros, juros, royalties e assistência técnica.

Vistos esses conceitos, vamos voltar ao Balanço de Pagamentos. A estrutura


do balanço de pagamentos segue padrões recomendados pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI). As transações são expressas em dólar americano, mesmo que
haja relações com outros países. As transações que resultam na entrada de divisas
recebem o sinal positivo (+), enquanto que as saídas de divisas recebem o sinal
negativo (-).

Normalmente, o balanço de pagamento retrata a situação do país no período


de um ano. As rubricas nas quais são registradas as transações estão demonstradas
no quadro 8, a seguir.

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Quadro 8 – Balanço de Pagamentos

A. BALANÇA COMERCIAL

A.1 Exportações
A.2 Importações

B. BALANÇA DE SERVIÇOS

B.1 Viagens internacionais


B.2 Transportes
B.3 Seguros
B.4 Rendas de Capitais
B.5 Serviços Governamentais
B.6 Outros Serviços

C. TRANSFERÊNCIAS UNILATERAIS

C.1 Donativos

D. BALANÇA DE TRANSAÇÕES CORRENTES

D.1 – A + B + C

E. BALANÇA DE CAPITAIS AUTÔNOMOS

E.1 Investimentos e reinvestimentos


E.2 Empréstimos e Financiamentos
E.3 Amortizações
E.4 Outros tipos de Capitais

F. ERROS E OMISSÕES

G. RESULTADO (SUPERÁVIT OU DÉFICIT)

G.1 – D + E + F

H. BALANÇA DE CAPITAIS COMPENSATÓRIOS = (-G)

H.1 Variações nas reservas internacionais


H.2 Outros

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1.6.1
Balança Comercial

Aqui são registradas as exportações e importações de mercadorias (bens


tangíveis). É uma conta de grande importância no balanço de pagamentos, pois seu
resultado acaba por direcionar ações econômicas do país, bem como define a direção
das demais contas do balanço.

Esse direcionamento ocorre porque, um déficit na balança comercial pode ser


compensado por meio de:

 Superávits na balança de serviços;


 Abertura para investimentos estrangeiros no país;
 Tomada de empréstimos e financiamentos no exterior.

Exemplo:
Balança Comercial do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)

Exportações de Mercadorias ................................................. (+) 52.900

Importações de Mercadorias ................................................. (-) 61.400

Saldo da Balança Comercial (Superávit ou Déficit) ............. (-) 8.500


Fonte: Banco do Brasil (1987)

1.6.2 Balança de Serviços

Na balança de Serviços registram-se os valores das transações e compra e


venda de serviços (bens intangíveis) entre o país e o exterior. Incluem-se na balança
de serviços os saldos líquidos:

 Viagens internacionais – dos gastos dos residentes (domiciliados no


país) em suas viagens ao exterior e dos não residentes (domiciliados
em outros países) em viagens ao país.

 Transporte – dos gastos de não residentes com a utilização de


equipamentos de bandeira nacional para movimentação de pessoas e
cargas, e os gastos dos residentes com a utilização de equipamentos
de bandeira estrangeira.

 Seguros – dos seguros relativos à movimentação de cargas e pessoas.

 Rendas de Capitais – das remessas de juros e lucros.

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 Serviços governamentais – gastos com manutenção de representações
diplomáticas ou de efetivos militares no exterior e contribuições
nacionais para fundos e organismos multilaterais.

 Outros serviços – conjunto de transações diversas que vão desde


pagamentos na área de telecomunicações até direitos autorais e
patentes.

Exemplo:
Balança de Serviços do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)

Viagens Internacionais ........................................................... (-) 4.400

Transportes ............................................................................ (-) 4.500

Seguros .................................................................................... (+) 100

Rendas de Capitais (lucros + dividendos + juros) ................ (-) 17.000

Serviços Governamentais ...................................................... (-) 300

Outros Serviços ....................................................................... (-) 2.000

Saldo da Balança de Serviços ............................................... (-) 28.100


Fonte: Banco do Brasil (1987)

1.6.3 Transferências Unilaterais

São pagamentos e recebimentos que não têm como contrapartida a compra e


a venda de bens e serviços. Entram nessa classificação os donativos feitos pelo
governo, entre famílias, operações com ONG etc.

Exemplo:
Saldo Líquido de Donativos do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)

Saldo de Donativos ................................................................ (+) 2.600


Fonte: Banco do Brasil (1987)

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1.6.4 Balança de Transações Correntes

É a soma dos saldos da balança comercial, da balança de serviços e das


transferências unilaterais.

Exemplo:

Balança de Transações Correntes do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)

Balança Comercial ................................................................. (-) 8.500

Balança de Serviços ................................................................ (-) 61.400

Transferências Unilaterais ........................................................ (+) 2.600

Saldo da Balança de Transações Correntes ....................... (-) 34.000


Fonte: Banco do Brasil (1987)

Obs.: o saldo negativo (déficit) das transações correntes indicam que as compras de
bens e serviços superaram as vendas, ou seja, o país comprou mais do que vendeu.

1.6.5 Balança de Capitais Autônomos

Representa as entradas e saídas de ativos financeiros, classificados em:

 Capitais de risco, atraídos pelas oportunidades de investimento no país;


 Financiamentos concedidos por bancos estrangeiros para transações
correntes;
 Empréstimos de curto e longo prazo tomados junto a organismos
internacionais; e
 Amortizações de dívidas externas;

Exemplo:
Balança de Capitais Autônomos do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)

Investimentos e Reinvestimentos .............................................. (+) 21.700

Empréstimos e financiamentos .................................................. (+) 25.000

Amortizações ............................................................................ (-) 21.400

Saldo da Balança de Capitais Autônomos ......................... (+) 25.300


Fonte: Banco do Brasil (1987)

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1.6.6 Erros e Omissões

É uma conta de acerto, destinada a contabilizar eventuais erros ou incluir dados


que foram deixados de fora do balanço.

Exemplo:

Erros e Omissões na contabilização do Balanço de Pagamentos do País TriMundial


em 2014 (em US$ Milhões)

Saldo de Erros e Omissões .................................................... (+) 2.000


Fonte: Banco do Brasil (1987)

1.6.7 Saldo do Balanço de Pagamentos

Contempla o somatório dos saldos da balança de transações correntes, da


balança de capitais autônomos e de erros e omissões. Caso seja positivo, significa
que houve entrada líquida de divisas (reservas cambiais), caso contrário, as saídas
de divisas foram superiores às entradas.

Exemplo:

Balança do Balanço de Pagamentos do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)

Saldo da Balança de Transações Correntes ............................ (-) 34.000

Saldo da Balança de Capitais Autônomos ............................... (+) 25.300


Saldo de Erros e Omissões
(-) 2.000
........................................................
Saldo do Balanço de Pagamentos (déficit ou superávit) ..... (-) 10.700
Fonte: Banco do Brasil (1987)

Obs.: O déficit apresentado indica que o País TriMundial perderá divisas (reservas
internacionais).

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1.6.8 Saldo dos Capitais Compensatórios

É uma conta que registra os empréstimos solicitados ao FMI para regularizar


eventuais déficits no balanço de pagamentos e também as variações ocorridas nas
reservas internacionais.

Exemplo:

Saldo dos Capitais Compensatórios ........................................ (+) 10.700

= (-) Saldo do Balanço de Pagamentos ................................. (-)(-) 10.700


Fonte: Banco do Brasil (1987)

Balanço de Pagamentos do País TriMundial em 2014 (em US$ Milhões)


A. BALANÇA COMERCIAL
A.1 Exportações ................................................................ 52.900
A.2 Importações ................................................................ 61.400
Saldo da Balança Comercial ............................................ 8.500

B. BALANÇA DE SERVIÇOS
B.1 Viagens internacionais ..................................................... 4.400
B.2 Transportes ...................................................................... 4.500
B.3 Seguros ............................................................................ 100
B.4 Rendas de Capitais .......................................................... 17.000
B.5 Serviços Governamentais ................................................ 300
B.6 Outros Serviços ............................................................... 2.000
Saldo da Balança de Serviços ............................................. 28.100

C. TRANSFERÊNCIAS UNILATERAIS
C.1 Donativos ....................................................................... 2.600

D. BALANÇA DE TRANSAÇÕES CORRENTES


D.1 A + B + C ...................................................................... 34.000

E. BALANÇA DE CAPITAIS AUTÔNOMOS


E.1 Investimentos e reinvestimentos ................................. 21.700
E.2 Empréstimos e Financiamentos .................................. 25.000
E.3 Amortizações ................................................................. 21.400
Saldo da Balança de Capitais Autônomos ......................... 25.300

F. ERROS E OMISSÕES ............................................................... 2.000

G. RESULTADO (SUPERÁVIT OU DÉFICIT)


G.1 D + E + F ...................................................................... 10.700

22
H. BALANÇA DE CAPITAIS COMPENSATÓRIOS = (-G) 10.700
Fonte: Banco do Brasil (1987)

A análise do Balanço de Pagamentos é uma ferramenta importante, pois


permite verificar as tendências da economia do país, bem como possibilita a
discussão sobre a política econômica adotada.

2. Economia e o Meio Ambiente

As riquezas naturais são inesgotáveis; e não podendo ser multiplicadas,


nem esgotadas, não constituem objeto das ciências econômicas. Jean-
Baptiste Say.

A afirmação de Say não poderia estar mais equivocada, mas retrata a visão
sobre a exploração de recursos naturais em um mundo com uma população pequena
e com um nível de exigência muito menor que o atual.

Além disso, praticamente todo o sistema produtivo baseava-se em energia fria,


regida pelas leis da mecânica – hidráulica, ação humana, energia eólica etc.

Crescimento populacional, novas tecnologias, globalização da economia,


dentre outros fatores, aumentaram significativamente o consumo de produtos e,
consequentemente, a utilização de recursos renováveis e não renováveis.

Isso se dá, pois a partir da Revolução Industrial, a mecânica é substituída pela


termodinâmica nos processos produtivos. A partir daí, as transformações que
demandam cada vez mais energia, são feitas a partir da injeção do calor. Dessa forma
gera-se muito mais energia, mas também ocorre o aumento da entropia (2ª leis da
termodinâmica)

Segunda Lei da Termodinâmica - toda mudança que ocorre no


universo é decorre do aumento da entropia, assim, o nível de desordem
aumenta constantemente. As reações químicas trabalham em um
sentido único e irreversível, sem possibilidade de retorno ao seu estado
original.

Mas o que a economia tem a ver com a entropia? Georgescu-Roegen (1971) afirma
que a atividade econômica extrai do meio ambiente energia e matéria prima de baixa
entropia, ou seja, fortemente organizadas; e as transforma em matéria e energia
altamente entrópicas, ou seja, extremamente desorganizadas, sem possibilidade de
voltarem 100% à situação de origem.

23
Daí
decorrem duas preocupações: a economia precisa continuar crescendo, mas os
recursos precisam ser utilizados racionalmente, sob pena de simplesmente faltarem.

Entra em cena o conceito de sustentabilidade que, em resumo, pretende


abranger essas duas questões.

“Conceitua-se desenvolvimento sustentável para as populações


tradicionais o processo de transformação no qual a exploração dos
recursos, a direção dos investimentos, a orientação do
desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional se harmonizam,
reforçando o potencial presente e futuro do meio ambiente para suporte
das atividades econômicas dessas populações, a fim de melhor atender
as suas necessidades e aspirações, respeitando a livre determinação
sobre a evolução de seus perfis culturais”. (IBAMA, 1996).

Já o Banco Mundial, procurou elaborar uma definição para o tema, que


abrangesse os custos e os benefícios:

“ ... . No passado, os benefícios da atividade humana foram


frequentemente exagerados, enquanto os custos das perdas
ambientais foram ignorados. ... . Às vezes argumenta-se que os
benefícios dos investimentos humanos são temporários, enquanto os
benefícios de um meio ambiente imperturbado resta para sempre. Isto
tem levado a que se advogue o uso de taxas de desconto baixas nas
análises de projeto. Mas isto pode levar a mais danos (dirigindo os
investimentos) ao invés de menos. A resposta não está ligada a uma
baixa artificial nas taxas de desconto, mas em assegurar que os
benefícios de uma economia em expansão sejam reinvestidos. ...
Baseando as políticas de desenvolvimento ambiental na comparação
dos benefícios e dos custos, e numa cuidadosa análise
macroeconômica, fortaler-se-á a proteção ambiental e conduzir-se-á o
bem estar ao crescimento ao crescimento e ao nível sustentável.”
(IBAMA, 1996)

Aiache(2003) afirma que a importância dos conceitos vistos até aqui,


particularmente das medidas de variação do bem estar do consumidor, está em
analisar o comportamento do consumidor – e da sociedade – para variações na sua
utilidade frente a disponibilização ou não de bens ambientais já que o objetivo é
estudar a valoração de bens ambientais, como parte da análise de custo benefício
para bens dessa natureza. Sobre isso, Buarque (1989, p.201) explica que para medir
o custo ou benefício de uma atividade econômica, do ponto de vista da coletividade
em geral, é necessário um padrão de medida diferente daquele utilizado para medir
os custos de oportunidade2 privados. Isso pode ser visto, teoricamente, no caso das

2O custo de oportunidade de um recurso é definido como o valor dos usos alternativos deste recurso que tiveram que ser
sacrificados para que este uso específico fosse realizado. (Seroa da Motta, 1998, p. 21). Já Margulis (1990, p.160) afirma

24
variações equivalentes e compensatórias para um bem que não tenha preço no
mercado.

Uma vez que um dos pontos básicos de uma análise de custo-benefício reside
na hipótese de que o nível de satisfação ou bem-estar dos indivíduos pode ser
mensurado pelos preços que eles estão dispostos a pagar pelo consumo de bens e
serviços (Mota, 2001, p. 89), as medidas de variação e excedente são importantes
para melhor definir essa disposição a pagar.

Pearce e Turner (1990, p.172) afirmam que haverá quatro medidas referentes
a benefícios de uma melhora ambiental ou a perdas relativas a danos ao ambiente:

 Disposição a pagar para assegurar um benefício;


 Disposição a Receber para renunciar a um benefício;
 Disposição a Pagar para prevenir um dano;
 Disposição a Receber para aceitar um dano.

Essas medidas podem ocorrer, dependendo da análise considerando quem é


o proprietário dos bens em questão. É o conceito de direito de propriedade, composto
por um conjunto de leis que descrevem o que os indivíduos podem fazer com suas
respectivas propriedades. Entretanto, a ação desses proprietários pode exercer
consequências positivas ou negativas à proprietários de outros bens ou a bens de uso
coletivo. O efeito dessas ações no bem estar de outrem é chamado de externalidade
(Tolmasquim, 1998, p. 325).

Para bens ambientais e outros de caráter público, a utilidade do consumidor é


afetada de acordo com a quantidade disponível desse bem. Perman at all, (1999, p.
128) explica que os mercados podem falhar ao tentar por si próprios alocar recursos
eficientemente, portanto, a intervenção do setor público é uma alternativa institucional
para alterar comportamentos e conduzir para padrões eficientes a alocação dos
recursos. Para o caso de bens ambientais, há diversas classificações dos
instrumentos de intervenção, com destaque para as de Baumol e Oates (1979) e
Jacobs (1991), citadas em Nogueira e Medeiros (1998, p. 13), que afirma que o papel
do formulador de política pública (ação normativa estatal) é identificar a natureza da
falha de mercado e descrever a melhor forma de mitigá-la. Existem alguns critérios
para a avaliação de projetos dessa natureza. Mota (2001, p. 80-99) relaciona três
análises: a análise custo-benefício, a análise custo-eficácia e a análise de decisão
multicritério. O próximo tópico trata com mais detalhes a análise de custo e benefício.

que o custo de oportunidade corresponde ao valor que poderá ser obtido, em alguma época futura, da exploração do
recurso em apreço. Este custo tem que ser incorporado quando se procura determinar o caminho ótimo no tempo de
exaustão e utilização de um recurso exaurível. A condição de eficiência é dada, pois, pela equação: PREÇO DO PRODUTO
= CUSTO MARGINAL DO PRODUTO + CUSTO DE OPORTUNIDADE.

25
2.1 A Análise Custo-benefício

Para obter um máximo de bem-estar para o todo da sociedade, é preciso


considerar os custos e benefícios marginais sociais. A teoria do bem-estar busca
também a análise sob o ponto de vista social, já que seu conceito a caracteriza como
parte do estudo da economia que explica como identificar e alcançar alocações de
recursos socialmente eficientes (Miller, 1981, p.439,461). Podemos entender como
eficientes, aquelas soluções que agreguem máximo benefício líquido – utilidade - ao
menor custo possível. No caso de projetos ou programas públicos, é importante
estabelecer se os ganhos ou benefícios advindos da política proposta são superiores
aos custos dos recursos empregados. Os gastos, para se alcançar a eficiência, devem
se realizar até que os benefícios adicionais igualem-se aos custos adicionais, ou seja,
os benefícios marginais devem ser iguais aos custos marginais para proporcionar
esses benefícios (Pearce e Turner, 1995, p. 169).

Em mercados que não são perfeitamente competitivos, os seus preços não


correspondem ao custo econômico de oportunidade. Assim, é preciso corrigir os
valores, de forma que representem valores mais próximos dos preços sociais. (Seroa
da Motta, 1998, p. 200). No Gráfico 23, esses valores são representados na curva de
custo social, e não na curva de custo privado.

Gráfico 23 - Preço Social (PS) e Preço Privado (PP)

Fonte: Margulis (1990, p.114)

26
Quando ocorre uma falha de mercado, o preço de equilíbrio pode ser diferente
do preço ótimo. Assim, o benefício marginal social de uma unidade extra de um bem
não é igual ao seu custo marginal social. Dessa forma, a curva de custo ou benefício
marginal social será diferente da curva de custo ou benefício marginal privado. Na
figura 6 podemos observar que o nível de produção considerado socialmente ótimo é
QS, dado pela interseção das curvas de benefício e custos sociais, ao preço PS.

No entanto, falhas de mercado fazem com que o observado seja as curvas de


benefício e custo privados marginais, ao preço P. A diferença entre as curvas privadas
e sociais faz com que uma avaliação de custos e benefícios de uma decisão de
investimentos privados não represente a variação de bem-estar sob o ponto de vista
da sociedade como um todo.

Utilizando os preços sociais seria possível medir a divergência dos benefícios


e custos sociais dos seus respectivos valores privados, a qual representaria os
ganhos e as perdas de bem-estar social não captados sob a ótica privada.

A condição de Pareto, pressupõe a situação hipotética de que não é possível


determinado agente econômico melhorar sua situação social, sem que isso venha
provocar uma piora na situação de outro agente. Entretanto, essa concepção poderia
inviabilizar a análise, por essa razão, a ACB baseia-se no critério de Kaldor-Hicks3,
segundo o qual, os recursos devem ser alocados de tal forma que a melhoria de bem-
estar de algumas pessoas seja suficiente para compensar a perda de bem estar de
outras e ainda permitir algum benefício.

Conceitualmente, a análise custo-benefício ou benefício-custo é um


procedimento usado para identificar, avaliar e comparar os custos sociais e os
benefícios sociais atribuíveis a uma política, plano, programa ou projeto, descontados
no tempo e expressos em um valor monetário presente (Gilsinho, 1996, p.35).

Pode-se comparar os benefícios e os custos totais de diversas formas. Uma


delas é subtrair os custos totais dos benefícios totais e obter os benefícios líquidos.
Outra forma é tratar como uma relação, para se obter uma razão matemática. Dessa
forma, se analisada sob a ótica dos benefícios sobre os custos, quanto maior a
relação, melhor será o resultado, e vice-versa (Field, 1997, p.135).

O conceito da ACB tem origem na França, por intermédio do engenheiro Jules


Dupuit, no século XIX. Há, entretanto, contestações sobre essa origem. Hanley &
Spash (1993, p.4) afirmam que “as agências federais de água dos Estados Unidos,
principalmente o Bureau de Reivindicação de Terras e a Subdivisão de Engenheiros
das Forças Armadas dos EUA, estavam entre as primeiras a fazer uso da análise de
custo-benefício.

3 Refere-se ao trabalho de Nicholas Kaldor (1908-86) e John R. Hicks (1904-89).

27
Já no ano de 1808 Albert Gallatin, Secretário do Tesouro dos EUA, havia
recomendado a comparação de custos e benefícios nos projetos relacionados à água.
Isso precede os muito citados escritos sobre custo-benefício do francês Jules Dupuit,
em 35 anos”. Mas, somente a partir de 1936 começou a se desenvolver aplicações
práticas nos EUA.

Em 1958, a publicação de livros de autores como Eckstein, Krutila e Mckean


influenciou positivamente na disseminação da utilização da técnica, em outros países,
notadamente a Grã-Bretanha (Gilpin, 1996, p.37). As décadas seguintes foram ricas
em publicações a respeito do assunto.

Existem abordagens distintas de diversos autores sobre como seria a estrutura


de uma ACB. Para Hanley e Spash (1993, p.8-13) detalham oito estágios principais:

 Definição do projeto: inclui a identificação do que será avaliado e dos possíveis


ganhadores e perdedores com a sua implementação;

 Identificação dos Impactos do Projeto: é a relação de todos os impactos


resultantes da sua implementação;

 Definição de quais impactos são economicamente relevantes: aqui são


considerados os impactos positivos ou negativos em relação ao bem-estar dos
agentes envolvidos. São considerados como impactos positivos, aquilo que até
aqui chamamos de benefícios, que irão também aumentar na quantidade ou
qualidade de bens que geram utilidade positiva ou uma redução no preço para
o que são supridos. Os impactos negativos são quaisquer decréscimos na
qualidade ou quantidade de tais bens, ou aumento no preço. Esses efeitos
negativos também incluem o gasto de recursos no projeto, uma vez que
devemos considerar o seu custo de oportunidade;

 Quantificação Material de Impactos Relevantes: esse estágio envolve


determinar os montantes materiais de custo e benefício correntes para um
projeto, e identificar quando em tempo eles irão ocorrer. O uso de Análise de
Impacto Ambiental é importante nesse momento;

 Avaliação Monetária de Efeitos Relevantes: a fim de que as medidas materiais


dos impactos sejam avaliadas, elas precisam ser calculadas em unidades
comuns. Para a ACB, essa unidade comum é a unidade monetária. Uma vez
que os mercados geram os valores relativos de todos os bens e serviços
comerciais, os preços muito úteis nas comparações. Cabe ao analista de ACB:

 Predizer preços para valores correntes estendidos para o futuro;


 Corrigir preços de mercado onde necessário; e
 Calcular preços (valores relativos em unidades comuns) onde
não exista nenhum.

28
 Desconto dos Custos e Benefícios Correntes: uma vez que todo custo e
benefício relevantes devem ser expressos monetariamente, é necessário
trazê-los ao seu valor atual (Present Value), através da aplicação de uma taxa
de desconto4;

 Aplicação do teste do valor presente líquido: o critério aplicado é o teste do


Valor Atual Líquido (NPV – Net Presente Value). Ele simplesmente questiona
se a soma de ganhos descontados excede a soma de perdas descontadas. e

 Análise de sensibilidade: a incerteza em relação ao futuro faz com que o


analista tenha tido que fazer algumas predições no decorrer da análise. Estas
podem ser imprecisas, além do que parâmetros podem mudar com o tempo.
Assim, um estágio final essencial de qualquer ACB é conduzir uma análise
sensitiva. Isso significa recalcular o NPV quando os valores de certos
parâmetros-chave são mudados. Esses parâmetros incluirão:

 a taxa de desconto;
 quantidades materiais e qualidades de força;
 preços sombra dessas forças;
 quantidades materiais e qualidades de produção;
 preços sombra dessas produções; e
 duração de vida do projeto.

Nogueira e Medeiros (1998, p.3) observam que a análise separada dos


benefícios e dos custos de programas pode justificar, socialmente, investimentos ou
gastos públicos que resultem em melhorias de bem-estar para a sociedade.

Bellia (1996, p.113-114), argumenta que os custos e os benefícios de medidas


relativas ao meio ambiente podem ser definidos como variações dos custos
associados ao dano e dos ganhos ou perdas do bem-estar social associados a essas
medidas, e apresenta como exemplo, uma tentativa de identificar benefícios e custos
numa análise de projeto rodoviário, que está reproduzido no quadro x, a seguir:

4Taxa de desconto pode ser definida como a taxa à qual um indivíduo está disposto a ceder parte do seu
consumo atual para obter mais consumo futuro. (Miller, 1978, p.137)

29
Quadro 9 - Exemplos de Custos e Benefícios em Rodovias

Custos e Benefícios Impacto Exemplo de


(Exemplo) apropriação para
análise B/C
Grupo Subgrupo

Custos dos danos Custos diretos Eliminação do bosque Valor da mata como
ambientais recurso renovável
para produção de
carvão - custo
Custos indiretos Contaminação da água Valor do potencial da
por acidente com carga produção pesqueira
perigosa que se perder - custo
Custos das medidas Custos de - Valor das despesas
de proteção regulamentação e com fiscalização –
controle custo
Custos financeiros - Valor dos custos de
oportunidade das
medidas – custo
Custos do aumento de Custos de preexistente redução do número e
capacidade do meio recuperação de da gravidade de
ambiente capacidade acidentes - benefício
deteriorada
Custos de criação de - perda de trechos de
novas capacidades estrada por
ambientais impedimento de
tráfego – benefício
Custos de - obras específicas
preservação visando proteção de
monumento – custo
Custos Sociais realocação involuntária custos totais
(desapropriação) incorridos para
restauração do bem-
estar dos afetados -
custo
Fonte; Bellia e Bidone, 1990

A análise de custo-benefício com frequência é aplicada para políticas e


programas compostos de produtos fora do mercado, como é o caso de
melhoramentos na qualidade ambiental. Segundo Field (1997, p. 131), esta análise é
atualmente a principal ferramenta de avaliação econômica de programas públicos
para a administração de recursos naturais. Ainda para Field (op. Cit.), a ACB
representa para o setor público o mesmo que um fluxo de perdas e ganhos para uma
empresa privada. Jacobs (1995, p.369) justifica essa opção do setor público pela
ACB, ao argumentar que é preferível ponderar custos e benefícios de um modo
sistemático do que deixar simplesmente ao gosto e preferências dos políticos a
decisão sobre o que é melhor para a sociedade.

Tendo sido definido que é preciso comparar os custos com os benefícios


advindos de determinado projeto, é preciso expressá-los em uma mesma unidade. A
partir daí, a ACB passa a preocupar-se em atribuir valores monetários, que servirão
como régua de medida para permitir essa comparação. Após a definição desses

30
valores, dado que a duração de um projeto pode ser longa, há a necessidade de
aplicação de uma taxa de desconto para traze-los ao seu valor atual. O próximo tópico
abordará a questão da valoração econômica de bens ambientais.

2.2 Valoração de Bens Ambientais

Uma das formas de pensar sobre a proteção ambiental é questionar o quanto


o meio ambiente é valioso. Em um passo seguinte, transformar essa quantificação em
algo mensurável, em um valor, que pode ser monetário, por exemplo. FIELD (1995,
p.155) afirma que os benefícios da qualidade ambiental são gerados graças à redução
dos danos e, para medir uma função de danos por emissões, são necessários 5
passos: medir as emissões; determinar a qualidade do ambiente resultante com essas
emissões; calcular o grau de exposição humana; medir os impactos (à saúde,
estética, recreação, etc.); e, por fim, calcular os valores desses impactos.

Smith (1998, p.35) em Mota (2001, p.84) observa que o significado do termo
valor pode ter duas conotações. Algumas vezes designa utilidade de determinado
objeto, outras, o poder de compra que ele possui em relação a outras mercadorias. O
valor econômico dos recursos ambientais geralmente não é observado no mercado
através de preços que reflitam os seus custos de oportunidade. É preciso, então,
quantificar os preços não valorados no mercado. Esses preços derivam de todos os
seus atributos (recreação e turismo, proteção de bacias hidrográficas, educação e
pesquisa, proteção à biodiversidade etc.). Ocorre que esses atributos podem ou não
estar associados ao seu uso.

De forma geral, pode-se afirmar que o valor dos bens e serviços ambientais
pode ser medido a partir das preferências dos agentes pela utilização ou conservação
desses ativos. Para o caso de bens para os quais os agentes econômicos exprimem
um consentimento em pagar e esse valor decorre do seu uso corrente, temos um
conceito de valor de uso (Faucheaux e Noël, 1995, p.252). Esse conceito é melhor
explicado por Marques e Comune (1995, p. 30): “o valor de uso refere-se ao uso
efetivo ou potencial que o recurso pode prover.”

O valor de uso pode ser decomposto em valor de uso direto, que é o valor
atribuído aos recursos pelos indivíduos e pelas organizações que usufruem dos
insumos e dos produtos do meio ambiente (Haddad e Resende, 2001, p.59); valor de
uso indireto, que está afeto às funções do meio ambiente relativos à manutenção da
biodiversidade; e valor de opção, que diz respeito à disposição dos indivíduos em
conservar os recursos ambientais para evitar o risco de que eles não estejam mais
disponíveis para uso no futuro.

31
Para os casos em que os atributos dos bens ambientais não estão associados
ao seu uso, temos o valor de não uso, ou seja, aquele que “reflete um valor que reside
nos recursos ambientais, independentemente de uma relação com os serem
humanos, de uso efetivo no presente ou de possibilidades de uso futuro.” (Marques e
Comune, 1995, p. 31).

Alguns autores, como Pearce Turner (1995) subdividem o valor de não uso em
valor de existência e valor de legado. O primeiro ocorre quando há atribuição de valor
para o recurso apenas pela sua existência, independente do seu uso futuro (Mota,
2001, p. 144). Já quando o desejo de pagar para preservar um ativo ambiental está
vinculado aos benefícios que este ativo poderá trazer para os seus descendentes,
temos o caso do valor de legado (Haddad e Rezende, op. cit.).

Não há portanto, concordância entre os autores sobre as definições, termos e


classificações desses valores (Freeman III, p. 266 em Kopp e Smith), mas a
composição de todos eles valores nos leva ao Valor Econômico Total. O quadro a
seguir permite melhor visualização dessa composição, seguindo a classificação
citada por Marques e Comune (op cit):

Quadro 10 - Valor econômico total

Valor Econômico Total

Valor de Valor de
Uso Não- Uso

Valor de Valor de
Valor de Valor de Valor de
Uso Uso
Opção Existência legado
Direto Indireto

Fonte: Marques e Comune (1995, p. 31)

Se todos os componentes do VET forem conhecidos, não haverá problema de


valoração. Entretanto, muitos dos bens ambientais não são transacionados em
mercados convencionais e nem mesmo por eles são considerados. Além disso,
quando fazem parte de algum mercado, nele existem imperfeições, que dificultam a
valoração.

32
A definição de métodos para valoração econômica é uma tentativa de
minimizar os efeitos das imperfeições ou da inexistência de mercados para atribuir
valores mais próximos dos reais para bens ambientais.

Faucheaux e Noël (1995, p.262) dividem as técnicas de “medição de vantagens


ambientais” em avaliações diretas, que procuram obter uma avaliação monetária dos
ganhos e perdas, e as avaliações indiretas, que procuram medir as relações Dose-
Resposta, ou causa e efeito. Esses autores citam Houvenagel (1994b) quando
classificam o método de preços hedônicos5, o método de custo de transporte (ou
custo de viagem) e a avaliação contingente como métodos diretos e o método dose-
resposta como indireto. Marques e Comune (1999, p.41-42) classificam os métodos
de valoração em três categorias:

 A dos que utilizam informações de mercado obtidas direta ou indiretamente


(apreçamento hedônico ou valor de propriedade;
 Os que se baseiam no estado das preferências, através de pesquisas ou
contribuições financeiras feitas aos órgãos de preservação; e
 Métodos que procuram identificar as alterações na qualidade ambiental (dose-
resposta).

Kopp e Smith (1993, p. 131) identificam quatro métodos de avaliação: o modelo


do custo de viagem, o modelo de preços hedônicos, modelos de produção doméstica
e o método de valoração contingente. Para esses autores, apenas esse último é um
método de avaliação direta. Nogueira (2001, sp) toma como referência a classificação
de Hanley & Spash (1993), que sugere seis principais métodos de valoração, quais
sejam: o Método de Valoração Contingente (MVC), o Método Custo de Viagem
(MCV), o Método de Preços Hedônicos (MPH), o Método Dose-Resposta (MDR), o
Método Custo de Reposição (MCR) e o Método de Custos Evitados (MCE). Também
não há unanimidade quando à classificação dos métodos. Será considerada nesse
trabalho a classificação de Hanley e Spash.

2.2.1 O Método de Valoração Contingente (Contingent Valuation Method)

O Método de Valoração Contingente (MVC) procura medir a disposição das


pessoas a pagar (DAP) pela conservação de bens e serviços ambientais ou a (DAC)
disposição em aceitar uma perda (Pearce e Turner, 1990, p.128-129), considerando
que existem diferentes níveis de preferência por esses bens, com base na função de
utilidade do consumidor.

Field (1997, p.173) explica que o método se chama valoração contingente,


porque se propõe a fazer com que as pessoas expressem de que forma atuariam em

5 As explicações sobre cada um dos métodos serão dadas logo a seguir.

33
determinadas situações contingentes. Trata-se portanto, de um método com base em
modelos de comportamento econômico, que, segundo Carson (1995, p. 1-2)
conseguem captar elementos essenciais dos consumidores para subsidiar decisões
sobre problemas envolvendo o meio ambiente.

A valoração contingente se fundamenta no conceito elementar de que se


alguém deseja saber a disposição de outrem a pagar por algo, deve-se perguntar
diretamente a essa pessoa. Através da aplicação de questionários de pesquisa
(surveys) cuidadosamente elaborados, cujos resultados são tabulados, procura-se
determinar a função de demanda desses consumidores, ou seja, a medição dos
benefícios proporcionados pelos recursos aos indivíduos.

Esse método, também conhecido como survey method é um método direto de


avaliação, pois envolve atividades diretas de coleta de informações sobre como as
pessoas reagem (usam, valoram, respondem a estímulos) quando se trata de
consultas a bens e serviços não negociados no mercado (Kopp & Smith, 1993, p.132-
133). Segundo esses autores, uma das diferenças básicas entre os métodos diretos
e os indiretos é que estes se baseiam em respostas atuais para condições anteriores
dos recursos analisados. Já o método direto (CVM) precisa extrair das respostas da
pesquisa como os indivíduos reagirão ou atribuirão valor para uma situação hipotética.

Para Hanley e Spash (1993, p. 54-58), a aplicação de um MVC pode ser


dividida em 6 estágios:

 Estágio 1: corresponde à definição do cenário, ou seja, todos os componentes


do mercado hipotético que se pretende valorar, incluindo as razões do estudo,
e a forma do questionário;

 Estágio 2: O segundo estágio seria a definição da forma da entrevista, se por


telefone, por correio ou entrevista pessoal. Nesse caso, os indivíduos são
questionados sobre sua máxima disposição a pagar por determinado bem ou
serviço ambiental, ou para prevenir sua deterioração ou sobre sua máxima
disposição a receber para ficar sem aquele bem ou serviço. Isso pode ser feito
de maneiras distintas. Os autores citam quatro maneiras principais:
1. Jogos de leilão (bidding games) – a partir de um valor mínimo, são
sugeridos valores maiores sucessivamente, até o ponto em que os
entrevistados demonstram seu limite máximo.
2. Referendum – é sugerido um valor para que os entrevistados
concordem ou discordem, portanto, permite apenas uma resposta
binária (sim ou não).
3. Cartão de pagamento – Uma série de valores é apresentada num
cartão, onde o entrevistado indica a sua preferência.
4. A questão aberta – Os indivíduos são questionados sobre a sua
máxima DAP, sem que qualquer valor de referência seja sugerido.

34
 Estágio 3: Cálculo da média da DAP ou da DAR – é preciso desprezar os
valores extremos, bem como as respostas de protesto6. Usualmente é utilizada
a mediana para esse cálculo;

 Estágio 4: estimativa das curvas de oferta (no caso seriam os valores ofertados
pelos entrevistadores, a sua DAP) isso se traduziria na demanda por bens e
serviços ambientais. A DAP ocorreria em função de variáveis como a renda
(Y), educação (E), idade (A) e variação na dotação do bem ambiental (Q):

DAP = f (Y, E, A, Q)

Obs.: Mota (2001, p.147) exemplifica uma função da DAP: DAP = f (R, I, G, S), onde R = renda
do usuário, I = idade, G = grau de instrução e S = sexo do usuário;

 Estágio 5: agregação de dados – seria a análise dos dados coletados, como a


relevância da população escolhida, a análise do comportamento da população
total pelos valores coletados na amostra e a escolha do período de tempo em
que os benefícios serão obtidos;
 Estágio 6: é a avaliação do método aplicado, a verificação de que as questões
foram entendidas pelos entrevistados, se o mercado hipotético criado foi capaz
de absorver todos os atributos do bem analisado, ou seja, se o objetivo foi
atingido.

Segundo Carson (1995, p. 11), para um trabalho de valoração contingente, são


necessárias três condições:

 bem em questão (não negociado em mercado) deve ser bem definido;


 cenário precisa estabelecer meios plausíveis de provisão; e
 é preciso existir um mecanismo de trade-off entre o consumo de bens privados
e dos bens públicos em questão.

Algumas peculiaridades na aplicação do método podem afetar a sua confiabilidade


e devem ser cuidadosamente observados na construção, tanto do questionário,
quanto na seleção da amostra a ser pesquisada. São os chamados vieses do método.
Existem diversas citações de diversos autores sobre esses vieses. Seroa da Mota
(1998, p.43-48), baseando-se em Willis (1995) e Bateman e Turner (1993), elenca
dez desses vieses:

 Viés estratégico: visto, normalmente sob duas formas. A primeira, quando por
ocasião da pesquisa o entrevistado pressentir que futuramente terá que pagar
o valor obtido na pesquisa, tenderá a informar valores menores do que
normalmente o faria. Outra forma é obter respostas dos entrevistados em
6 É um dos problemas da entrevista. Será explicado mais adiante, juntamente com outros problemas do método.

35
valores maiores do que a sua verdadeira DAP, de forma a influenciar a decisão
sobre a provisão do bem em questão, de forma a garantir seu bem-estar,
sabendo que não arcará com os custos a ele associados;

 Viés Hipotético: decorre do fato da pesquisa se basear em um mercado


hipotético e pode resultar em valores diferentes daqueles que os indivíduos
realmente preferem. É mais significativo no caso da DAR, provavelmente pelo
fato de que os indivíduos estão mais familiarizados em efetuar pagamentos do
que receber compensações;

 Problema parte-todo: O autor coloca a expressão “parte-todo” como tradução


do embedding effect, em que os entrevistados podem apresentar dificuldade
em distinguir um bem específico de um conjunto mais amplo de bens, com isso,
podem atribuir valores distorcidos em relação ao que o fariam caso essa
distinção fosse bem entendida;

 Viés da informação: o método é contingente a um cenário, portanto, as


respostas da entrevista podem ser afetadas pela forma como esse cenário é
descrito. É importante a qualidade da informação ao entrevistado para que ele
possa responder adequadamente;

 Viés do entrevistador: o comportamento do entrevistador – considerando sua


aparência, educação etc. – pode interferir nas respostas do entrevistado. Ele
pode, por exemplo, ficar inibido frente à eloquência do entrevistador e distorcer
o resultado;

 Viés do veículo de pagamento: dependendo do método de pagamento, a DAP


pode mudar. Pagamentos através de aumento de impostos podem ser vistos
de forma pior do que taxas de entrada para pagamento de uso e conservação;

 Viés do ponto inicial (ou ancoramento): no caso dos jogos de leilão (bidding
games), a sugestão do ponto inicial pode influenciar o lance final (normalmente
baixos lances iniciais levam a baixos lances finais e vice-versa). A utilização de
cartões de pagamento amenizam esse efeito, embora crie um ancoramento
(condicionamento) aos lances sugeridos no cartão;

 Viés da obediência ou caridade (warm glow):- é o constrangimento que as


pessoas podem ter em manifestar uma posição negativa para uma ação
considerada correta sob os olhos da sociedade, mas que em sua visão pessoal
não haveria intenção de apoiar;

 Viés da sub aditividade: ocorre quando detecta-se que serviços ambientais


estimados em conjunto apresentam um valor total inferior à soma de suas
valorações em separado;

 Viés da sequência de agregação: pode ocorrer quando a DAP ou a DAR é


mensurada antes ou depois de outros bens que podem ser seus substitutos.

36
Sobre os vieses do MVC, Salgado (2002, sp) cita, ainda, o chamado viés de
respostas de protesto, onde o entrevistado pode apresentar um comportamento de
forma a protestar contra algum quesito da pesquisa, ou até mesmo contra a pesquisa,
deixando para um segundo plano a explicitação de sua preferência em relação ao que
está sendo pesquisado.

Independentemente dos vieses existentes, o MVC é o único método adequado


para medir valores não de uso. Sua aplicação é mais utilizada para valorar recursos
de propriedade comum ou de amenidades e recreação. Por essa razão estaremos
analisando no capítulo quatro a sua utilização em dois estudos distintos: o Parque
Nacional do Iguaçu e o Parque Nacional de Brasília.

2.2.2 O Método do Custo de Viagem (Travel Cost Method)

O Método do Custo de Viagem (MCV) pode ser considerado a mais antiga


técnica de avaliação de bens não transacionados em mercados. É utilizado
predominantemente para avaliação de bens de recreação ou lazer. Sua origem é
atribuída a uma carta enviada pelo economista Harold Hotteling, em que propunha
essa forma de avaliação ao diretor do Serviço de Parques nos EUA, em 1947.
Somente em 1958, por meio de dois economistas chamados Wood e Trice e em 1966,
por Clawson e Knetsh, o modelo foi incluído na literatura sobre o tema (Hanley e
Spash, 1993, p. 83).

Os recursos ambientais recreacionais não têm preço no mercado


convencional, mas há atribuição de valor a eles pela sociedade. Esse valor decorre
da busca pelo lazer e pelos gostos e preferências de cada indivíduo. O método
pretende que essas diferenças sejam captadas através da quantia que os visitantes
estão dispostos a pagar para usufruir desses recursos, ou seja, trabalha no sentido
de apurar valores gastos por indivíduos ou famílias nas suas viagens, supondo que
esses montantes poderiam servir de base para medir os benefícios usufruídos por
esses agentes. Utiliza, então, o comportamento do consumidor mediante seus gastos
para obtenção dos dados a serem tabulados. Essa DAP resultará num modelo
econométrico de demanda, onde o número de visitas é função do custo da viagem,
da renda familiar do visitante, de variáveis educacionais, demográficas e binárias
(Mota, 2001, p. 157-159).

O custo de viagem pode ser composto de gastos com combustível, gastos com
a permanência no local da visita (hospedagem, alimentação, souvenirs etc.), gastos
com taxas de entrada, além do custo de oportunidade do tempo. Sob esse último,
Pearce e Turner (1995, p. 201-202) destacam a sua importância para a definição da
curva de demanda. Segundo esses autores, o consumidor escolhe entre o trabalho e

37
o
laser e, ao optar pelo segundo, a partir do tempo que nele despende, estará
declarando a sua disposição a pagar por aquele recurso, considerando os custos de
viagem e o valor do seu tempo, onde poderia estar produzindo e sendo remunerado
por isso. McConnell (1993, p.176) corrobora esse pensamento ao afirmar que o
elemento crítico nos custos de acesso é o valor do tempo.

Uma vez que o princípio que norteia o modelo estabelece que a quantidade de
visitas é função de variáveis socioeconômicas e de comportamento, podemos
representá-lo através de funções. Há no entanto, duas variantes do método, uma
individual e outra por zona. A variante individual é definida como o número de visitas
feitas por cada visitante durante um dado período a determinado local. Pode ser
realizado através de um survey aplicado aos usuários de um local de recreação. Os
dados coletados servem para estimar uma curva de demanda, cuja função pode ser
assim representada:

QVij = f (CDij, Tij, Fij)

onde : QVij = número de visitas feitas pelo indivíduo “i” ao local “j”;
CDij,= custo da distância do indivíduo “i” para visitar o local “j”;
Tij = tempo (custo de oportunidade);
Fij = custo da entrada no local de recreação.

A variante por zona segrega o território de origem dos visitantes num


determinado número de zonas (por círculos concêntricos, normalmente, conforme
mostrado na figura 9).

Figura 9 - Zonas populacionais por distância do sítio

Localização do sítio
C

B
A
A

Fonte: Salgado(2000, sp)

38
Assim, a variável dependente é uma taxa de visitação, resultante da razão do
número de visitas efetuadas a partir de cada zona, pela população daquela zona,
durante determinado período.

Vij = f (Cij, Pi,Si)

onde: Vij = viagens da região i para o local j;


Ci = custo da viagem;
Pi = população da região i; e
Si = variáveis socioeconômicas.

Qualquer que seja a variante do método, após os levantamentos, deduz-se


uma curva de procura pelos bens ou serviços recreacionais do sítio estudado e, por
consequência, o excedente do consumidor. A soma dos excedentes dos
consumidores refletirá o benefício global daquele sítio (Faucheaux e Nöel, 1995, p.
264-265). O gráfico 24 ilustra esse excedente

Gráfico 24 - O excedente do usuário

Fonte: Mota (2001)

Hanley e Spash (1993, p. 86-90) descrevem seis tipos de problemas básicos


que podem ocorrer na aplicação do MCV. São eles:

 a escolha da variável dependente: há basicamente duas opções de escolha: o


número de visitas feitas a determinada zona ou visitas feitas por determinados

39
indivíduo. A primeira opção é expressa por visitas per capita e a segunda é
uma coleta de dados de visitas por ano e por indivíduo. Ambas podem
apresentar resultados diferentes e não há consenso sobre qual é a mais
adequada;

 viagens com finalidades distintas (multiobjetivo): existe a possibilidade do


visitante aproveitar para visitar outros locais, com finalidades distintas,
inclusive. Seria necessário determinar um escore de importância das visitas
para cada um desses locais, o que, na prática, é muito difícil;

 Viajantes e residentes: existe a possibilidade de distorção na pesquisa quando


há para um mesmo sítio visitantes que residem nas proximidades do local em
análise, além de viajantes que deslocam-se de longas distâncias, ou seja, se
o indivíduo é residente ou turista eventual;

 cálculo dos custos da distância: saber quais os custos que serão considerados
e como calculá-los constitui-se num grande problema. Além disso, há que se
considerar a desutilidade da viagem (dificuldades no caminho, riscos etc.).
Todos esses aspectos são difíceis de mensurar;

 valor do tempo: uma vez que o tempo despendido na viagem e na recreação


poderia ser utilizado no trabalho (ou em outra atividade alternativa), há um
custo de oportunidade que deve ser mensurado. Também não há consenso
sobre qual a melhor forma de calculá-lo; e

 problemas estatísticos: as variáveis dependentes são truncadas, pois apenas


os visitantes são entrevistados, havendo poucas informações sobre o que
determina ou determinaria a decisão de visitar um sítio. Além disso, como a
pesquisa é feita durante o período da visita, não traz informações sobre a
opinião do visitante em outros períodos. Para solucionar esse viés, é
necessário escolher cuidadosamente o método de estimação.

O MCV é utilizado exclusivamente para avaliação de locais de atividades


recreacionais e não é capaz de mensurar valores de não uso, mas será analisado
adiante, em função da sua aplicação em dois parques nacionais no Brasil.

40
2.2.3 Outros Métodos

A literatura sobre o assunto contempla outros métodos. O Método de Preços


Hedônicos (MPH) é muito utilizado na área imobiliária, até mesmo pelo cuidado que
os consumidores têm com os aspectos relacionados ao ambiente onde irão se
instalar. O método parte do princípio que, na composição do preço de determinado
bem, estão incluídos aspectos adjacentes a ele, tais como características ambientais,
de localização, nível de ruído, odores, vizinhança, etc. Assim, o preço de um imóvel
seria uma função de todas essas características.

Batalhone (2000, p. 35) descreve essa função da seguinte forma:

Phi = Ph (Si, Ni, Qi), onde Ph é o preço da residência, Si representa


características para a i-nésima unidade residencial (características físicas do
imóvel, tais como: número de quartos, metragem, idade, acessórios, etc.), Ni
representa as características da vizinhança (composição étnica, escolas na
redondeza, hospitais, supermercados, acessibilidade a local de trabalho, taxa
de criminalidade) e Qi representa as características ambientais (qualidade do
ar, nível de ruído, etc.).

Esse método parece ser mais aplicável à área imobiliária, porém, com alguns
dificultadores. O principal deles é a tendência da utilização da função apresentada,
ignorando a segmentação característica do mercado imobiliário. Isso pode trazer
desvios à própria função, tornando-a questionável sob o ponto de vista da
confiabilidade. Por outro lado, não ignorar tal segmentação pode se tornar por demais
oneroso, uma vez que para alcançar tal objetivo, seria necessário estimar uma função
hedônica para cada segmento do mercado.

Os métodos anteriores baseiam-se nas estimativas de respectivas curvas de


demanda para tentar medir o bem-estar. Isso não ocorre com o Método Dose-
Resposta (MDR) nem com os outros dois métodos subsequentes (o MCR e o MCE).
O MDR analisa a qualidade ambiental como se fosse um fator de produção. Isso
porque parte do pressuposto que uma melhor qualidade ambiental contribui para uma
maior produtividade (no caso de bens agrícolas, por exemplo), que, por sua vez,
concorrerá para a formação de um preço mais competitivo. O contrário ocorreria caso
a qualidade ambiental fosse pior.

O método busca medir a dose, em termos monetários, de recursos necessários


à correção de problemas ambientais que venham a prejudicar determinada produção
ou simples utilização de bens ambientais, como o ar e a água. Utiliza-se de modelos
matemáticos e estatísticos para detalhar e traduzir os dados numéricos em

41
interpretações econômicas, sem, contudo, conseguir evitar as incertezas quanto à
confiabilidade dos resultados obtidos.

O Método Custo de Reposição (MCR) talvez seja o mais direto de todos os


apresentados. Isso não significa que seja o mais adequado a todos os casos. Parte
do pressuposto que o benefício esperado pode ser medido através do custo de
reposição ou reparação de um bem ambiental danificado, o que nem sempre é
verdade, pois há casos em que os benefícios esperados excedem os custos, por
maiores que estes sejam. Assim, o método deve ser utilizado como um valor piso.
NOGUEIRA (2000, p. 16) chama a atenção para a sua utilização nos casos de danos
que concorrem para a chamada restrição à sustentabilidade. Para esses casos, afirma
Nogueira, “... os custos de reposição se apresentam como uma primeira aproximação
dos benefícios ou danos.”

O Método de Custos Evitados (MCE) procura na prevenção praticada pelos


indivíduos, quando esses percebem alterações na qualidade ambiental, valorar
através dos gastos por eles praticados na aquisição de bens substitutos ou
complementares.

Um problema com este método é pressupor sempre a existência de bens


substitutos perfeitos. Caso eles não existam, ou existam apenas substitutos
imperfeitos, os gastos preventivos ou defensivos não traduzirão com rigor o benefício
esperado.

2.2.4 Critérios de Avaliação

Uma preocupação externada por Hanley e Spash (1993, p.111-120) é verificar


se os métodos de valoração produzem resultados aceitáveis para subsidiar uma ACB,
ou seja, se possuem credibilidade – premissa básica para qualquer análise. Para
tanto, definem dois critérios que devem ser verificados: o de repetibilidade e o de
validade.

O primeiro objetiva possibilitar que os métodos possam ser replicados, sob as


mesmas circunstâncias e obter os mesmos resultados ou com diferenças
insignificantes, de forma análoga aos testes feitos por cientistas naturais, na validação
de seus experimentos.

O critério de validade é subdividido em validade de conteúdo – que busca


verificar se os resultados obtidos medem, de fato, aquilo que se procurava medir -;
validade teórica - se o método foi aplicado de forma consistente e de acordo com a
teoria econômica -; e a validade de convergência – se um determinado bem ambiental
pode ser avaliado por métodos distintos, obtendo resultados similares.

42
Sobre a validade de convergência, Nogueira e Medeiros (1997, p. 80), ao
analisarem o valor de existência sugerem a possibilidade de comparar e contrastar
resultados de métodos de valoração direta e indireta e, mais especificamente, os
resultados alcançados em análise utilizando o MVC com os obtidos com o MCV. A
preocupação, neste trabalho, embora não abandone os outros critérios, estará
direcionada para a validade de convergência, quando serão analisadas quatro
aplicações de métodos de valoração distintos (MVC e MCV) em dois bens ambientais
também distintos (Parque Nacional do Iguaçu e Parque Nacional de Brasília).

2.2.5 Críticas à valoração de recursos ambientais

As críticas aos métodos de valoração iniciam pela sua própria base teórica, a
teoria do bem-estar, como parte da teoria econômica neoclássica, passando por
restrições à análise de custo-benefício e culminando na condenação parcial ou total,
por alguns autores, dos métodos de valoração. A base teórica neoclássica supõe que
os indivíduos maximizam a sua utilidade, estendendo essa suposição para os
mercados, mas passou a reconhecer que as inter-relações entre o meio ambiente e
a economia, muitas vezes, ocorre fora do âmbito desses mercados, e começou a
preocupar-se em procurar formas de internalizar os custos provocados por excessos
ao meio ambiente.

A Teoria das Externalidades de Pigou7 é um claro exemplo disso. Embora haja


um avanço em relação à postura anterior, em que a teoria econômica desconsiderava
o meio ambiente ou tratava-o como neutro ou passivo, a economia ambiental, ainda
sob o domínio da escola neoclássica, adota uma postura por demais otimista,
considerando que o progresso técnico e a substitutibilidade entre os recursos
produzidos conduzam à sustentabilidade global (Mueller, 2001, p.53-55).

Esse otimismo neoclássico defende que os avanços tecnológicos serão


capazes, como foram até então, de suprir os recursos necessários, evitar a depleção
acelerada e outras vantagens que contribuirão para a manutenção do equilíbrio
ecológico. Krutilla (1967) discorda dessa visão, argumentando que dificilmente os
progressos tecnológicos serão capazes de ressuscitar espécies extintas ou “promover
maravilhas geomorfológicas” e sintetiza as críticas à visão neoclássica ao perguntar
o porquê de não existir um mercado desenvolvido destinado à conservação do meio
ambiente.

7Pigou (1877-1959) coloca os fundamentos da teoria das externalidades, segundo a qual um agente, ao fornecer a outro
determinado serviço pelo qual receba um pagamento, ocasiona também vantagens ou inconvenientes que não estão
contemplados àqueles que se beneficiam das vantagens ou àqueles que sofrem os inconvenientes. Para o caso de bens
ambientais, a economia ou a deseconomia externa é passível de análise em termos da divergência entre o custo privado
e o custo social.

43
Esses questionamentos à visão neoclássica partem de outra tendência da
economia, a economia ecológica, rebatizada por Mueller de economia da
sobrevivência. O conjunto dessas ideias não chega a ser uma corrente organizada e
influente como a neoclássica, mas preocupa-se em analisar os fenômenos,
considerando um horizonte temporal mais amplo do que uma ou duas gerações.
Justamente em razão desse horizonte temporal é que parte uma de suas críticas mais
diretas à análise custo benefício.

Mueller (1996, p. 270-271) aborda a questão da ACB afirmando que os


métodos criados para atribuir valores monetários a custos ambientais que não tenham
valor de mercado carregam muitos problemas, na maioria dos casos, em função do
alto grau de complexidade existente nas inter-relações entre a economia e o meio
ambiente, “complicadas pela insistência da teoria neoclássica em mensurar tudo em
termos monetários”.

A ACB, segundo Faucheaux e Nöel (1995, p.217-218), não é plenamente


aplicável quando a resiliência do meio ambiente é inexistente ou quando poluentes
têm efeitos biológicos que contribuem para o acúmulo da poluição de estoque. A
simples análise de custos e benefícios com os métodos econômicos de valoração
podem resultar em graves danos para o ambiente.

Sobre o assunto, Jacobs (1991, p.371) reforça essa preocupação, ao afirmar


que, na prática, tem-se observado que os gestores públicos demonstram preferência
em projetos que tenham grande retorno financeiro, independentemente do dano que
causem ao meio ambiente. Isso pode indicar, de um lado, a tendenciosidade desses
gestores, mas também falhas no processo de avaliação, uma vez que o valor do
recurso ambiental não estaria sendo adequadamente captado para subsidiar a
análise.

Outra objeção é feita em relação à taxa social de retorno para recursos


naturais não renováveis. Segundo Mueller (1996, p.276-277), se a taxa de juros de
mercado for maior que a taxa social de retorno, o desconto no tempo do fluxo líquido
dos benefícios da exploração (se feito com base na taxa de mercado) levaria à
extração rápida do recurso. A seleção da taxa de desconto é um assunto
controvertido, pois reflete a visão da geração atual sobre a importância relativa por
determinados custos e benefícios que se darão no futuro (Field, 1995, p.140-141).

Além disso, há uma objeção ética do desconto dos benefícios das gerações
futuras. Solow (1974, p.8-9) em Mueler (op cit), afirma ser “eticamente indefensável a
sociedade descontar as utilidades do futuro. Indivíduos podem fazer isso (...) pois têm
a consciência de que a vida é curta. No processo de decisão social, entretanto, não
há desculpa para tratar de forma desigual as diferentes gerações, e o horizonte
temporal é, ou deveria ser, muito longo.”

44
Jacobs (1995, p. 373) enfatiza uma incompatibilidade existente entre a ACB e
a sustentabilidade, quando aborda a questão das gerações futuras. Esse autor afirma
que o problema não é apenas a determinação da taxa de desconto, mas a atribuição
do valor, ou seja, o ponto crítico da análise seria a incapacidade dos métodos de
valoração em determinar com precisão os valores a que se propõem, além de não
captarem a opinião de quem está à distância.

Gewirth (1990, p.206-211) divide a ACB em econômica e moral e explora as


divergências entre ambas argumentando que a ACB econômica considera custos e
benefícios por critérios monetários, portanto objetivos, enquanto que a ACB moral
utiliza critérios como os direitos humanos, por exemplo. Entretanto, estimativas
econômicas e morais muitas vezes apresentam resultados diferentes, até mesmo pela
subjetividade da avaliação moral. A vida humana, a segurança e a saúde são o
enfoque da ACB Moral, que tendem a ser reduzidos a valores monetários pela ACM
econômica. Seguindo esse raciocínio, a ACB econômica poderia induzir que um
grande risco de morte pode ser compensado por determinada quantia em dinheiro (no
caso, um risco de morte humana), negligenciando, assim, a ACB moral.

A ACB recebe, também, críticas em relação à distribuição de custos (quem


paga) e benefícios (quem recebe). Segundo Field (1995, p.144) a análise distributiva
deve ser incorporada aos estudos da ACB, com vistas a buscar a equidade.
Entretanto, calcular de forma individual o total dos impactos distributivos, é uma tarefa
muito difícil. Gewirth (op cit) também tece comentários a esse respeito, considerando
insatisfatória a ausência de um peso distributivo para custos e benefícios, pois julga
restrito o julgamento pelo critério de verificação se o total dos ganhos excede os total
das perdas. Isso, segundo o autor, pode levar a uma distribuição equivocada, não
equânime, possibilitando que ricos sejam beneficiados em detrimento de pobres.

Outra restrição que se faz é citada por Field (op cit) e diz respeito a censuras
que estão sendo feitas às entidades públicas por utilizarem a ACB para justificar
projetos sociais, com o entendimento de que esse fato constitui uma intenção de
frustrar o processo de discussão e tomada de decisão. Jacobs (1995, p. 413) afirma
que os movimentos ambientalistas preocupam-se também com esta questão,
supondo que as autoridades governamentais podem manipular procedimentos
supostamente imparciais, para direcionar os resultados ao encontro de seus
interesses. Embora não deixe de ser uma crítica, trata-se de divergência no campo
político e não uma condenação de um instrumento técnico.

As restrições aos métodos de valoração normalmente são vinculadas aos seus


vieses, que, embora identificados e com definições de critérios e cuidados para evitá-
los ou minimizá-los, são insuficientes, segundo alguns autores para caracterizá-los
como confiáveis. Uma das mais severas críticas diz respeito ao comportamento do
consumidor, que em muitos casos vai de encontro ao comportamento do cidadão. Um
indivíduo, ao expressar sua opinião como cidadão, pode expressar seu desejo de

45
defesa do meio ambiente e exprimir uma disposição a pagar por essa defesa. No
entanto, ao agir como consumidor, adquire bens e serviços que provocam a
degradação ambiental (Jacobs, 1995 p. 405).

Carson (1995, p.8-9) identifica dois problemas com o MVC. O primeiro é a


aparente (mas não real) facilidade e baixo custo dos surveys. Em consequência,
existe um grande número de estudos dessa natureza em andamento, mas muitos
deles carecem de qualidade. O outro diz respeito ao comportamento dos próprios
economistas, que seriam céticos em relação a dados coletados em surveys. Os
críticos desse método preocupam-se com a qualidade das informações colhidas, que
poderão distorcer os resultados e apresentar desvios – quase sempre superestimar –
os valores a pagar.

Kahneman e Knetsch (1992, p. 57-70) colocam que um grande problema do


MVC é o embbeding effect. Esse é um dos vieses já citados neste trabalho, mas a
visão desses autores apresenta um aspecto ainda não abordado. Se um bem ou
serviço ambiental apresenta valor muito maior quando avaliado sozinho do que
quando avaliado como parte de um “pacote” de bens, é preciso saber qual das duas
medidas é correta.

A literatura não é unânime sobre quais seriam os princípios que definiriam


como deve ser a avaliação nesses casos. Na ausência desses princípios, os
resultados da CVM se tornam arbitrários. Mas os efeitos do embedding são
estendidos a bens cuja DAP dos indivíduos indica uma satisfação moral em preservar.
Como o grau de satisfação moral difere de pessoa para pessoa, a avaliação pode
conter distorções. Os autores citam o exemplo de disposição em salvar o Panda, que
é maior do que salvar um inseto, ou ainda, salvar o Panda (uma intenção mais
limitada) pode ser preferido pelas pessoas do que salvar espécies em extinção (mais
amplo).

Dentre as desvantagens do MCV, citadas por, um ponto crítico desse método


é a determinação do valor exato (ou mesmo aproximado) da parcela que significaria
a DAP do indivíduo pela conservação do ambiente que se está analisando. Ou seja,
separar os objetivos da viagem, seus benefícios diretos dos indiretos e valorar cada
um deles é tarefa extremamente difícil e que certamente sofre variações
consideráveis em função dos gostos e preferências de cada um.

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