Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Modelo de Schmidt e
Cerebelo
SUMÁRIO
Estruturas do Controlo Motor
O Modelo Conceptual Explicativo da Prestação Humana de
Schmidt
Uma Explicação Neurológica dos Aspectos Motores das Nossas
Acções
Cerebelo
Aspectos Anatómicos
Divisão Funcionais
Camadas Citoarquitectónicas
Núcleos ProfundosAspectos Funcionais do Cerebelo
Funções das Divisões
Circuitos Cerebelosos
Papel do Cerebelo na Aprendizagem Motora
Psicofisiologia
P S I C O F I S I O L O G I A
Objectivos
Esta tese foi sendo progressivamente substituída por modelos fechados, que
derivaram da incapacidade dos modelos abertos explicarem as correcções
efectuadas durante a execução de movimentos lentos. A “novidade” é o feedback,
que chamaremos informação de retorno (IR, como proposto por Godinho,
Mendes, Melo, e Barreiros, 1999), que dá a possibilidade do sistema reagir a
alterações inesperadas do meio, portanto não consideradas na elaboração da
resposta.
Inf. Retorno
Figura 2 - Esquema de um Modelo Fechado
de IR.
Toda a IR é encaminhada, em tempo-real, para o comparador que, com base na
referência de correcção, vai verificando se tudo está a resultar como desejado, se tal
não acontece envia uma mensagem de erro que será detectada pelo sistema de
identificação de estímulo, fechando, desta forma, o circuito.
Este modelo serve para enquadrar algumas das estruturas que falaremos nas
próximas aulas. Por exemplo, poderemos incluir a 2ª UF no estádio de
identificação de estímulo, a área terciária da 3ª UF na selecção da resposta, a
secundária na programação e a primária na execução do programa motor.
Não avançado muito para a matéria que falarei mais à frente nesta aula, direi apenas
que o cerebelo é uma das estruturas que estará envolvida no processo de
comparação, aferindo se tudo está a funcionar como previsto, tipo “controlador
aéreo”…
Introdução a uma Explicação Neurológica dos Aspectos Motores das
Nossas Acções
Recordando o gráfico que lhes apresentei na primeira aula (ver figura 4),
verificamos que existem várias estruturas envolvidas nas acções motoras,
cumprindo funções diferentes mas relacionadas
entre si.
Assim, enquanto as estruturas da medula espinal
e tronco cerebral fazem a mediação das acções
reflexas e respostas automáticas simples, as áreas
motoras do córtex responsabilizam-se pelas
acções voluntárias mais complexas. Para esta
função, o córtex vai ser auxiliado por duas
estruturas – O Cerebelo e os Núcleos Cinzentos
da Base, que funcionam como “conselheiros”,
facultando informações que possibilitam um
melhor planeamento, coordenação e controlo do
movimento.
Não vou ainda aprofundar muito como é que
estes “conselhos” são veiculados, por agora,
importa saber que os Núcleos Cinzentos da Base
têm uma acção inibitória no córtex e
preocupam-se mais com os aspectos do
planeamento e coordenação a grande escala das
partes do nosso corpo. O Cerebelo também
participa no planeamento, mas com uma acção
excitatória no córtex, completando as suas
funções a coordenação, comparação e controlo
mais preciso e em tempo real do movimento. A
Figura 4 - Hierarquia do Sistema Motor (adaptado de Littel, 1990) função de comparação e controlo é possível
porque ele é informado continuamente do
estado do nosso corpo e do movimento que o
córtex pretende que seja efectuado.
Cerebelo
O Cerebelo situa-se na zona posterior do nosso
cérebro e, embora constitua 10% do volume
total das estruturas que estão dentro do crânio,
ele comporta mais de metade de todos os
neurónios do cérebro. Parece, assim, que é um
local onde se verifica uma grande actividade de
processamento de informação.
Numa revisão das teorias mais recentes sobre as
funções desta estrutura (Wolpert, Miall, e
Kawato, 1998) apontam para a possibilidade do Figura 6 - Localização Anatómica do Cerebelo (retirado
cerebelo agir como um comparador, aferindo se de Wickelgren, 1998)
a ordem enviada pelo cortex está a resultar como previsto e propondo alterações
caso tal não se verifique. Ora para realizar esta função têm de existir três condições:
1. Conhecer a proposta inicial do movimento
2. Conhecer a execução dessa proposta
3. Ter uma ligação com os centros de decisão do movimento que permita
propor alterações
O cerebelo parece ainda estar associado à aprendizagem motora, pois os seus
circuitos neuronais de comparação e controlo motor sofrem alterações conforme
se vai ficando mais eficaz na execução do gesto. Além disso, as informações que
veicula para o córtex são utilizadas em processos de memorização da melhor forma
de realizar o movimento.
Vejamos, primeiro, alguns aspectos anatómicos que nos ajudarão a entender estas
condições e as funções do cerebelo.
Aspectos Anatómicos
O cerebelo tem uma estrutura semelhante ao restante cérebro: (1) uma camada
cortical envolvente, (2) um conjunto de fibras brancas que faz a ligação dos
neurónios corticais a um (3) conjunto de núcleos profundos.
À imagem do proposto de MacLean para o SNC, também o cerebelo se divide em
três divisões respeitando uma ordem filogenética:
Arqueo-cerebelo. Situa-se mais próximo do tronco cerebral, portanto é a parte
mais anterior do cerebelo, e é a estrutura mais antiga em termos filogenéticos.
Recebe aferências do núcleo vestibular, estando ligado ao controlo do equilíbrio e
postura.
Paleo-cerebelo. Situa-se em sobreposição em relação ao arqueo-cerebelo e ocupa
os lobos anteriores dos hemisférios cerebelosos e uma zona denominada vermis
(porque se assemelha a um verme), que se situa no meio dos dois hemisférios. As
suas aferências provêm dos receptores proprioceptivos que lhe permitem executar
as funções de controlo do tónus muscular e equilíbrio (coadjuvando o arqueo-
cerebelo)
Neo-cerebelo. Ocupa os lobos posteriores recebendo aferências do cortex, sendo
a divisão que está associada à coordenação dos movimentos voluntários.
Figura 7- Anatomia do Cerebelo – não apresenta o arqueo-cerebelo, pois está “escondido” junto do tronco cerebral pelos lobos
cerebelosos – (adaptado de Ghez., 1991)
anteriormente, pelo que a diferenciação das suas funções passa pela informação
que lhes chega e para onde a enviam, não tanto no tipo de processamento que lá é
efectuado.
Para terminar os aspectos anatómicos, falta falar das aferências, dos núcleos
profundos e de uma curiosidade. Toda a informação que chega ao cerebelo é
conduzida por dois tipos de fibras: musgosas e trepadoras, cujo “baptismo” resulta
da sua estrutura. As musgosas são mais densas e curtas, envolvendo-se nos tais
glomérulos com os neurónios granulares e são as mais numerosas, derivando de
várias partes do SN. As trepadoras são mais “elegantes”, saindo apenas de um local
na medula e chegando até à camada molecular, onde se ligam com as árvores
dendríticas das células de Purkinje.
Os núcleos profundos são denominados: (1) Núcleos do Tecto (tamém chamado
de Fastigial); (2) Intermédios (Globoso e Emboliforme); e (3) Dentado,
respectivamente relacionados com o arqueo, paleo e neo-cerebelo.
A curiosidade é a de que, ao contrário do que se passa na maioria do SN, o
cerebelo não trabalha de forma contralateral mas sim ipsilateral, isto é, as
informações que são processadas no lado direito do cerebelo dizem respeito ao
lado direito do nosso corpo (o mesmo se passando com o lado esquerdo ,
obviamente), representando uma excepção a um dos princípios de organização dos
sistemas do SN.
cerebelo comparar o que foi proposto fazer com o nosso estado actual e verificar
se é possível realizar a acção imaginada pelo córtex.
Podemos, então, propor um trajecto de informação que permita enquadrar as
Planeamento
Núcleos
Cinzentos da
Base
Área
Áreas Sec. e
Secundária da
Terc. da 2ª UF
3ª UF Execução
Área Primária
Neo-Cerebelo Movimento
da 3ª UF
Informação de
Paleo-Cerebelo
Retorno
Figura 10 - Trajecto da informação relacionado com o papel do cerebelo no planeamento e execução dos movimentos voluntários (adaptado de Allen e
Tsukahara, 1974, in Ghez, 1991)
paralelas passam ainda pelas células em cesto, Golgi e estreladas, excitando esta
“gente toda”... É aqui que entram os circuitos de controlo, na forma de influências
inibitórias sobre as Purkinje por parte das células em cesto e estreladas, enquanto
que as Golgi ocupam-se em “acalmar” as granulares.
Alguns autores defendem que a inibição das células em cesto está relacionada com
os aspectos espaciais do movimento, enquanto que a acção das Golgi está
associada a aspectos temporais (Harting, Agosto, 1999).
Este controlo faz com que apenas os impulsos mais importantes e fortes sejam
objecto de uma resposta do cerebelo. Mesmo assim, este tipo de estimulação faz
com que as células de Purkinje disparem cerca de 50-100 por segundo, o que
permite a tal regulação do movimento em tempo real. Lembrem-se que as fibras
musgosas derivam de todas as partes do SN, por isso se a informação for
importante, quer seja de índole sensorial, quer seja de índole motora, o nosso
cerebelo é capaz de responder num espaço de tempo muito curto (na ordem das
centésimas de segundo, mas não se esqueçam que a informação ainda tem de ir até
aos centros de decisão ou regulação antes de haver movimento).
E o que se passa com as fibras trepadoras? Cada uma liga-se a poucas células de
Purkinje (de 1-10, e cada Purkinje recebe apenas uma fibra trepadora), mas a
ligação é extremamente forte, originando várias centenas de sinapses que
envolvem, quer o corpo celular, quer a árvore dendrítica na sua zona mais
próximal. Esta ligação faz com que, cada vez que a fibra trepadora dispara um
impulso a célula de Purkinje também dispara, só que a frequência dos impulsos é
bastante reduzida (apenas cerca de 1 por segundo) o que traz pouca influência aos
neurónios alvo das células de Purkinje que sofrem esta estimulação. O que se pensa
que se passa, então, é que estes estímulos servem para facilitar as ligações das
células de Purkinje com as fibras paralelas, e assim modular as suas respostas.
Quando é preciso mais acção as fibras trepadoras começam a disparar facilitando o
processamento da informação.
Estreladas
Fibras C. Molecular
Cesto
Paralelas
Purkinje C. Purkinje
Golgi
C. Granular
Granulares
Fibras Fibras
Subst. Branca
Musgosas Trepadoras
Influência Inibitória
Na próxima aula
Referências Bibliográficas
Essenciais
Ghez, C. (1991). The Cerebellum. In E. Kandel; J. Schwartz; T. Jessel (Eds.)
Principles of Neuroscience (3rd Ed.). Norwalk, Conneticut: Appleton & Lange. (pp. 627-
645)
Latash, M. (1998). Neurophysiological Basis of Movement. Champaign, IL: Human
Kinetics (pp.129-138)
Em Português
Godinho, M., Mendes, R., Melo, F., e Barreiros, J. (1999). Controlo Motor e
Aprendizagem: Fundamentos e Aplicações. Lisboa: Faculdade de Motricidade Humana
(pp. 21-31 e 79-93)
Thompson, R.F. (1984). Introdução à Psicofisiologia. Lisboa: Ed. Portuguesa de Livros
Técnicos e Científicos. (pp. 118 e 280-282)
Complementares
Wolpert, D.; Miall, R.; Kawato, M. (1998). Internal Models in the Cerebellum.
Trends in Cognitive Sciences, vol. 2, nº 9: 338-347
Voogd, J.; Glickstein, M. (1998). The Anatomy of the Cerebellum. Trends in
Cognitive Sciences, vol. 2, nº 9: 307-313
Thach, W. (1998). What is the role of the cerebellum in motor learning and
cognition?. Trends in Cognitive Sciences, vol. 2, nº 9::331-337
Wickelgren, I. (1998). The Cerebellum: The Brain's Engine of Agility. Science.
Volume 281, Number 5383, Issue of 11 Sep 1998, pp. 1588 - 1590
Schmidt, R. (1991). Motor Learning and Performance: From Principles to Pratice.
Champaign, Illinois: Human Kinetics (pp.46-79
Web
http://www.anatomy.wisc.edu/cere/text/cere/contents.htm
Tutorial da Universidade de Wiscosin, utiliza audio e imagens para apresentação
dos conteúdos.
http://thalamus.wustl.edu/course/cerebell.html
Sundsten, John W.; Mulligan, Kathleen A. (Março, 1999). Neuroanatomy
Interactive Syllabus. Universidade de Washington
Curso de Neuroanatomia da Universidade de Washington. Bastante acessível em
termos do conteúdo.