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CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 61

INDICADORES DE CULTURA
DA UNESCO PARA O
DESENVOLVIMENTO (IUCD)
Guiomar Alonso

Ferramenta valorosa e eficaz diante da dificuldade de avaliar o impacto da cultura nos pro-
cessos de desenvolvimento, os Indicadores de Cultura da Unesco para o Desenvolvimento
(IUCD) são capazes de orientar, justificadamente, as ações políticas e programáticas desti-
nadas à conquista desses objetivos. É bom que se diga, porém, que os resultados fornecidos
pelos IUCD devem ser utilizados de forma bastante consciente, para que haja um pleno
entendimento da definição de seu perímetro, que limita a comparação internacional, em
razão das diferenças entre os contextos históricos, sociais e políticos de cada país.

A
nova Agenda 2030 e seus 17 Objeti- Os principais atores e responsáveis p​​ ela
vos de Desenvolvimento Sustentá- implementação das políticas vinculadas à
vel (ODS) integram e reconhecem Agenda 2030 se questionam até que ponto
explicitamente, pela primeira vez desde 1950, os sistemas educacionais valorizam e reco-
o papel positivo que a cultura pode desem- nhecem a diversidade cultural e o papel da
penhar na promoção do desenvolvimento cultura no desenvolvimento (meta 4.7); de
sustentável. Várias das 169 metas da agenda que forma concreta as políticas públicas de
mostram a estreita relação que múltiplos as- turismo sustentável promovem a cultura e os
pectos da cultura têm com diversos objetivos produtos locais (meta 8.9); como a proteção e
(educação, crescimento econômico, desen- a promoção do patrimônio cultural e natural
volvimento urbano, mudança climática, bio- contribuem para a melhoria do habitat (meta
diversidade, paz, justiça). Desse modo, volta 11.4); e qual é o impacto da luta contra o trá-
à linha de frente da atualidade o debate sobre fico de bens culturais na construção de so-
a conceitualização e modelização dessa in- ciedades mais justas e pacíficas (meta 16.4),
terdependência entre cultura e processos de para citar apenas algumas das perguntas que
desenvolvimento, sobre uma metodologia de voltam a ser feitas atualmente.
mensuração quantitativa que seja capaz de Se medir a cultura é reconhecidamente
fornecer cifras e indicadores confiáveis d​​ essa uma tarefa complexa, mais ainda é avaliar
relação e, portanto, do nível de realização dos sua contribuição efetiva para o desenvolvi-
próprios ODS. mento. A prova tangível dessa realidade é a
62 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

notável ausência da cultura nos principais diferentes tentativas de responder à questão


instrumentos de mensuração do desenvol- de como abordar e medir metodologicamen-
vimento, sejam eles os do Banco Mundial, te as relações entre cultura e desenvolvi-
o Índice de Desenvolvimento Humano, do mento. A Unesco é historicamente um dos
Programa das Nações Unidas para o De- principais atores para liderar esse debate,
senvolvimento (PNUD), ou os indicadores além de fazer importantes contribuições,
de progresso da Organização para a Coo- tanto teóricas e conceituais quanto metodo-
peração e o Desenvolvimento Econômico lógicas e de referência prática: o Relatório
(OCDE). Em um ambiente em que os indi- da Comissão Mundial de Cultura e Desen-
cadores mostram os padrões das políticas volvimento (1996), os Relatórios Mundiais
de desenvolvimento a seguir, a ausência de da Cultura (1998, 2000), o Relatório Mun-
ferramentas confiáveis c​​ apazes de produzir dial sobre a Diversidade Cultural (2009) e
indicadores que avaliem eficazmente o papel os Indicadores de Cultura da Unesco para
da cultura representa uma grave desvanta- o Desenvolvimento (IUCD), de que trata-
gem, particularmente em um momento em remos em detalhe neste artigo, em razão
que a comunidade internacional está se pre- de sua atualidade e relevância particular
parando para implementar a nova agenda de no contexto da Agenda 2030.
desenvolvimento.
No entanto, apesar dos inúmeros fato- Projeto e contexto
res que dificultam a pesquisa e o processo A Unesco concebeu os IUCD em 2009, como
de construção de conhecimento nessa área, um projeto de pesquisa aplicada com o ob-
desde a década de 1980, especialistas e ins- jetivo de expressar em dados empíricos e
tituições têm feito esforços para oferecer tangíveis o abundante discurso teórico e

IUCD: FASES

2009 2010 2011 2012 2013

Revisão da literatura Desenvolvimento Fase de teste I Fase de teste II Índice composto


e projetos da metodologia (6 países) (6 países) – revisão de patrimônio
35 indicadores de indicadores
Encomenda de 10 do- Consultas com Harmonização dos
cumentos de trabalho especialistas, Segunda consulta Criação de índices resultados (5 países)
serviços estatísticos com os especialistas compostos: gênero
Desenvolvimento Finalização do
– outubro de 2011 e governança
do quadro teórico OCDE/Escritórios Manual Metodológico
e analítico Nacionais de Revisar indicadores,
Estatística estabelecimento de
Primeira consulta
condições para
com os especialistas
a implementação
– dezembro de 2009

Desenvolvimento do
conceito de bateria
de indicadores
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 63

político relacionado à importância da cul- ferramenta inédita capaz de medir o papel que
tura no desenvolvimento dos países. A ideia a cultura desempenha nos processos de de-
era poder demonstrar aos atores culturais, senvolvimento de um país.
e principalmente a outros atores do cresci- A principal especificidade dos IUCD é
mento, a valiosa contribuição da cultura, que a abordagem pragmática e flexível, adaptada
a torna, mais do que um instrumento, uma às realidades estatísticas nacionais de países
finalidade do desenvolvimento. de média/baixa renda – caracterizadas pela
O projeto contou com o apoio da Agên- escassez de dados disponíveis e por capaci-
cia Espanhola de Cooperação Internacional dades limitadas de tratamento estatístico. Os
para o Desenvolvimento (Aecid), que entre IUCD transcendem as carências e as dificul-
2009 e 2014 disponibilizou para a Unesco os dades tradicionais ligadas a países “pobres”
recursos necessários para explorar, inovar e em informações e estatísticas. Privilegiam
produzir essa nova bateria de 22 indicadores. a adaptação de fontes de informação pró-
O projeto fez parte das primeiras experiências prias do país de estudo, o uso de proxys e
de aplicação da Convenção da Unesco sobre a indicadores alternativos caso não possam
Proteção e Promoção da Diversidade das Ex- ser construídos os indicadores centrais. A
pressões Culturais, particularmente de seu metodologia de construção dos IUCD gera
artigo 13. Assim, após um exaustivo processo um diálogo entre atores de desenvolvimento
de pesquisa colaborativa,1 de rigorosa expe- e atores culturais que chama a atenção para
rimentação prática, ajuste e validação em 12 a cultura e produz dados confiáveis, q​​ ue re-
países (que durou cinco anos) e duas fases sultam na apropriação e na sustentabilidade
de teste, a Unesco apresentou os indicadores dos processos, favorecendo a adoção de no-
IUCD à comunidade internacional como uma vas estratégias e políticas.

2014 2015 2016 2017 2018

Elaboração do Guia Difusão e apresenta- Armênia, Geórgia Tradução para o rus- IUCD como base
de Implementação ção de resultados, e Ucrânia lançaram so; revisão do méto- para os indicadores
– Desenvolvimento lançamento a implementação do de apresentação temáticos da cultura
Visual dos IUCD. México dos indicadores na Agenda 2030 –
Finalização de fer-
experimenta a nacional e urbano
Tradução para o ramentas, tradução Apresentação dos in-
implementação
francês e o espanhol para o árabe dicadores do sudeste
em escala urbana
europeu e México
Publicação, promo- (somente em três
ção e criação estados: Guerrero, Lançamento dos
Colima e Cidade indicadores para
Plataforma web do México) a Agenda 2030
64 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

Quadro analítico comportamento coletivo. Da mesma forma,


Neste artigo, apresentarei brevemente a em seu sentido restrito (setorial), como um
abordagem teórica e metodológica em que setor de atividade que organiza as diferentes
se baseia a concepção e o desenvolvimento manifestações da criatividade intelectual e ar-
dos 22 indicadores IUCD, incluindo alguns tística – tanto passada como presente – e que
exemplos práticos de uso e análise obtidos inclui indivíduos, organizações e instituições
em diferentes estudos nacionais, e termi- envolvidos em sua transmissão e renovação.
narei com uma reflexão sobre as conquistas No que diz respeito ao desenvolvimen-
alcançadas nesses nove anos. to, os IUCD propõem sua definição como o
A primeira tarefa metodológica con- processo de mudança e transformação das
sistiu em definir a estrutu- sociedades e a expansão das
ra conceitual e analítica na A matriz IUCD coloca liberdades, para que os in-
qual deveriam se sustentar a cultura como catalisador divíduos e as comunidades
os indicadores propostos. e motor do desenvolvimento, possam acessar a vida que
Cultura e desenvolvimen- ou seja, como fator de valorizam e que têm razões
to são conceitos difíceis de progresso econômico para valorizar. Nessa pers-
delimitar e para os quais e social, e também como pectiva, o desenvolvimento
um objetivo do próprio
existe uma gama de defini- é um processo voltado para
desenvolvimento, oferecendo
ções, cujas diferenças, com a melhoria da qualidade de
uma visão sistêmica do
base em várias razões (de desenvolvimento na qual vida dos indivíduos e im-
ordem semântica, intelec- a cultura tem um papel plica a geração de oportu-
tual, política), garantem a a desempenhar. nidades que permitam que
total ausência de consen- os indivíduos usufruam de
so. Somam-se a isso as particularidades de liberdades fundamentais, bem como que pro-
cada situação e contexto social, histórico ou movam a defesa dos direitos e deveres que
político de um país, que tornam ainda mais possibilitam sua expansão.
difícil medir seus aspectos mais intangíveis
e constituem obstáculos fundamentais para Matriz e indicadores
poder produzir dados estatísticos interna- As relações entre cultura e desenvolvimento
cionalmente comparáveis. A partir do reco- são multidimensionais e complexas. Os IUCD
nhecimento dessa complexidade, os IUCD não pretendem cobrir toda essa complexidade,
propõem definições de trabalho comuns que e, da mesma forma que delimitam as defini-
servem de base para todos os indicadores. ções de cultura e desenvolvimento, a opção é
Nesse contexto, a cultura é definida se concentrar em sete dimensões consideradas
em dois sentidos: primeiro, em seu sentido relevantes para explicar como a cultura – ou
amplo (antropológico), como o conjunto de seja, os valores que norteiam a ação humana,
normas, valores, saberes, crenças, modos o patrimônio e a criatividade – contribui para
de vida e práticas simbólicas que orientam criar valor econômico, social e ambiental, aju-
o comportamento individual e organizam o dando as pessoas e as comunidades em suas
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 65

escolhas de vida e, ainda, a se adaptarem às de estatística, do mundo acadêmico, das agên-


mudanças.2 As sete dimensões da matriz dos cias de desenvolvimento e da sociedade civil. O
IUCD estão organizadas em 22 indicadores processo de implementação participativa foi
simples ou compostos. E os indicadores es- crucial para garantir a apropriação nacional
tão organizados em indicadores de referência dos resultados e o uso futuro dos IUCD no ní-
(benchmark) ou descritivos (de natureza con- vel político. Finalmente, todos os resultados
textual), abordando aspectos tangíveis, intan- técnicos e as interpretações da implementa-
gíveis, objetivos e subjetivos relacionados às ção dos IUCD foram compilados nos relatórios
condições de recursos, insumos e processos técnicos e analíticos para cada um dos países.
culturais em determinado país. Após o trabalho de harmonização e
A matriz IUCD coloca a cultura como análise dos dados de 12 países foi possível
catalisador e motor do desenvolvimento, ou elaborar o DNA nacional da cultura para o
seja, como fator de progresso econômico e desenvolvimento, realizar leituras cruzadas
social, e também como um objetivo do pró- que permitiram fazer análises comparativas
prio desenvolvimento, oferecendo uma visão aprofundadas – apesar de os dados nacionais
sistêmica do desenvolvimento na qual a cul- dos indicadores não estarem padronizados –
tura tem um papel a desempenhar. A análi- e compilar os dados no banco de dados dos
se resultante desse sistema de indicadores IUCD, normalizando os indicadores entre 0
permite estabelecer laços entre a cultura e e 1. A experiência dos IUCD durante as fa-
outros setores, a serviço do desenvolvimento ses de teste permitiu o desenvolvimento de
econômico e social inclusivo, da sustentabi- ferramentas complementares para facilitar
lidade ambiental, bem como da paz e da se- a implementação eficaz dos indicadores em
gurança. Essa contribuição para a produção outros países de forma autônoma.5
de valor econômico, social e cultural exige A partir de 2015, com financiamento pró-
a gestão de longo prazo dos recursos cultu- prio ou de outros doadores, 11 países lançaram
rais, a gestão de expectativas relacionadas ao a implementação dos IUCD, experimentando
acesso inclusivo e equitativo à vida cultural, também sua adaptação em nível federal (três
bem como a salvaguarda e defesa dos direitos estados do México) e em escala urbana.
humanos e das liberdades fundamentais.
Entre 2009 e 2015, o primeiro protótipo O sistema de indicadores IUCD
dos IUCD foi testado em seis países.3 O segun- Em seguida, tomando como referência o Ma-
do protótipo foi testado em sete outros países.4 nual Metodológico, descreverei brevemente
A metodologia definitiva dos IUCD foi formali- as sete dimensões já apresentadas e seus res-
zada no Manual Metodológico, publicado, assim pectivos indicadores, acrescentando, como
como o restante das ferramentas em francês, exemplo, alguns dos resultados obtidos em
inglês e espanhol, em 2015. Foram organizados países da América Latina que, sem dúvida,
24 workshops para refinar e validar os resul- contribuem para um melhor entendimento
tados, que reuniram inúmeros participantes das possibilidades de contextualização ofe-
vindos de ministérios, de institutos nacionais recidas em nível nacional.
66 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

DIAGRAMA INDICADORES

Dimensão indicadores Contribuição das atividades culturais Emprego


Economia para o PIB/valor agregado cultural

descrição Contribuição das atividades culturais Porcentagem de pessoas com empregos


privadas e formais para o PIB culturais em relação ao total da população
ativa empregada

indicadores Educação Educação


inclusiva multilíngue

Dimensão
Educação descrição Índice de escolaridade média Porcentagem de horas de instrução dedicadas
da população entre 17 e 22 anos à promoção do multilinguismo em relação
ajustado em função das desigualdades ao total de horas de instrução dedicadas ao
ensino de línguas (7º e 8º anos)

indicadores Quadro regulamentar em cultura Quadro político e institucional em cultura

Dimensão
Governança descrição Índice de desenvolvimento do quadro Índice de desenvolvimento do quadro
regulamentar para a proteção e promoção regulamentar e institucional para a proteção e
da cultura, dos direitos culturais promoção da cultura, dos direitos culturais e
e da diversidade cultural da diversidade cultural

indicadores Participação em atividades culturais fora Participação em atividades culturais


do domicílio fortalecedoras da identidade
Dimensão de
Participação
Social descrição Porcentagem da população que participou Porcentagem da população que participou
pelo menos uma vez em uma atividade pelo menos uma vez em uma atividade
cultural fora do domicílio nos últimos 12 meses cultural identitária nos últimos 12 meses

indicadores Desigualdades entre Percepção da igualdade


homens e mulheres de gênero
Dimensão
Igualdade
de Gênero descrição Índice de diferenças na situação de mulheres Níveis de avaliação positiva
e homens nos campos político, educacional e da igualdade de gênero
trabalhista e em legislações específicas sobre (abordagem subjetiva)
equidade de gênero (abordagem objetiva)

indicadores Liberdade de expressão Acesso e uso da internet

Dimensão
Comunicação descrição Índice de liberdade da imprensa escrita, Porcentagem de pessoas que usam a internet
rádio e televisão e dos meios
de comunicação baseados na internet

indicadores Sustentabilidade
do patrimônio
Dimensão
Patrimônio
descrição Índice de desenvolvimento de um
quadro multidimensional para a
sustentabilidade do patrimônio
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 67

Despesas domiciliares
com cultura

Porcentagem da despesa de consumo final


domiciliar com bens e serviços culturais com
relação ao total da despesa domiciliar

Educação Formação dos profissionais


artística do setor cultural

Porcentagem de horas de instrução dedicadas Índice de coerência e cobertura


à educação artística em relação ao total do sistema de ensino técnico
de horas de instrução (7º e 8º anos) e superior no campo da cultura

Acesso/distribuição Participação da sociedade civil


de infraestruturas culturais na governança cultural

Distribuição das infraestruturas culturais Índice de promoção da participação dos


selecionadas em relação à distribuição representantes dos profissionais da cultura e
da população nacional nas unidades político- das minorias nos processos de formulação e
-administrativas imediatamente execução de políticas, medidas e programas
inferiores ao nível estatal culturais que lhes dizem respeito

Tolerância intercultural Confiança interpessoal Livre determinação

Grau de confiança em relação às pessoas Grau de confiança interpessoal Resultado médio da livre
com diferentes origens culturais determinação percebida

Diversidade de conteúdos
de ficção na televisão

Proporção de tempo dedicado anualmente à


difusão de programas televisivos de ficção na-
cionais com relação ao tempo total dedicado
anualmente à difusão de ficção, nos canais de
televisão públicos abertos

Indicadores de referência

Indicadores descritivos
68 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

IUCD: INDICADORES DE CULTURA DA UNESCO PARA O DESENVOLVIMENTO (2009-2018)


Fase piloto 2009-2015: 12 países
Desenvolvimento 2015-2018: 11 países, 3 estados e 2 cidades

América Latina Sudeste e Leste Leste da África Países árabes


Colômbia Europeu Burquina Faso Jordânia*
Equador Albânia* Costa do
Peru Armênia*** Marfim**
Sudeste Asiático
Uruguai Bósnia-Herzegovina Gana
Camboja
Estados de Colima, Croácia*
Vietnã
Guerrero, Puebla e Geórgia***
Sul da África
México* (México) Montenegro
Namíbia
Cidades de Moldova* Suazilândia
Medellín* (Colôm-
bia) e México* Romênia* Zimbábue*
Sérvia*
Ucrânia***

*Implementados pelos Escritórios Regionais da Unesco em Amã, Harare, México e Veneza com fundos extraorçamentários.

**Implementados por consultores Cids, com o apoio da Unesco. Financiamento nacional ou de terceiros.

***União Europeia/Associação Oriental – Cultura e Criatividade financiadas pela UE.

Economia Uma multiplicidade de fatores contribui


Com essa dimensão, procura-se demonstrar para a complexidade metodológica que im-
a contribuição instrumental do setor cultural plica a medição exata e completa da contri-
para o crescimento econômico por meio de buição do setor cultural por meio desses três
três indicadores centrais: indicadores. Podemos citar, entre outros, a
• a contribuição das atividades cul- dificuldade de identificar com precisão o se-
turais para o produto interno bruto tor cultural, os códigos estatísticos e as clas-
(PIB) dos países; sificações estatísticas nacionais, bem como
• o emprego gerado pelas atividades o alto grau de informalidade em que essas
culturais; atividades são desenvolvidas na maioria
• a demanda por bens e serviços cul- dos países-alvo. A metodologia IUCD não
turais por intermédio das despesas pretende uma mensuração exaustiva des-
domiciliares. sas variáveis, mas adota voluntariamente
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 69

uma postura pragmática de abordagem do que possibilita comparações entre os paí-


fenômeno. Seu método e sua abrangência ses. Podemos citar o caso do Equador,6 em
não cobrem todo o setor e, em particular, que os IUCD geraram um dado inédito
não cobrem o setor informal ou os efeitos sobre a importante contribuição do setor
indiretos ou induzidos em outros setores cultural para o PIB em 2010 (4,76% do PIB
da economia da cultura. total), com 42,6% provenientes de ativida-
No entanto, e apesar dessas limi- des culturais de equipamento e apoio – ou
tações, podemos afirmar que os IUCD seja, de indústrias que permitem ou facili-
oferecem resultados conclusivos sobre a tam a criação, a produção e a distribuição
contribuição da cultura em termos de de- de produtos culturais –, enquanto 57,4%
senvolvimento econômico, pela primeira vêm de atividades culturais centrais.
vez, na maioria dos países de rendas mé- Assim, pode-se afirmar que as indús-
dia e baixa onde foram aplicados. Ao tomar trias produtivas diretamente relacionadas
como referência a base de dados global à criação, à produção, à distribuição e ao
IUCD, a contribuição da cultura para a eco- usufruto de conteúdos culturais represen-
nomia nacional é significativa e representa taram uma contribuição de 2,73% para o
entre 1,5% e 5,7% do PIB, empregando até PIB em 2010. Essa cifra representa uma
4,7% da população ativa. Os IUCD forne- contribuição similar à de setores como o
cem uma contribuição inovadora e ofere- cultivo de banana, café e cacau (2,6%), e su-
cem uma referência metodológica comum perior à produção de produtos da refinaria

PORCENTAGEM DA CONTRIBUIÇÃO DAS ATIVIDADES


CULTURAIS PRIVADAS E FORMAIS PARA O PIB

4,76% 42,6%
Atividades
de apoio

57,4%
Atividades
centrais

Fonte: Censo Econômico, Inec (2010). | Metodologia: IUCD-Unesco


70 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

PORCENTAGEM DAS DESPESAS DE CONSUMO FINAL DOS DOMICÍLIOS EM ATIVIDADES,


BENS E SERVIÇOS CULTURAIS, CONFORME OS QUINTIS DE RENDA

5%
7%
Quintil 1

12% Quintil 2

54% Quintil 3

Quintil 4

Quintil 5

22%

Fonte: Enquete Nacional de Renda e Despesas, Dane (2007). | Metodologia: IUCD-Unesco

de petróleo (2,0%). Esse dado, que por si a demanda. Por exemplo, na Colômbia, em
só já é significativo, representa apenas a 2007, o consumo cultural domiciliar foi de
ponta do iceberg da contribuição global do 2,75%. Esse porcentual varia muito conforme
setor. De fato, e como já indicado, os IUCD o nível de renda domiciliar: mais da metade
não incluem, por definição, contribuições do total das despesas culturais anuais (54%)
como as atividades realizadas em esta- foi feita pelos domicílios no quintil mais alto,
belecimentos culturais do setor informal enquanto apenas 5% foram realizadas pelo
nem as atividades culturais não comerciais quintil mais baixo. E há uma diferença sig-
oferecidas por órgãos públicos ou por ins- nificativa entre o consumo dos domicílios
tituições sem fins lucrativos, que são de urbanos (1,14%) e rurais (0,30%). Tanto essas
grande importância no Equador. Também desigualdades como a predominância de des-
não estão incluídas nessa cifra outras ati- pesas com equipamento/apoio merecem ser
vidades-chave fortemente vinculadas à consideradas na formulação e na aplicação
cultura, como a renda de hotéis, restauran- das políticas e medidas para promover um
tes e transportes associados a atividades acesso mais inclusivo à vida cultural.7
ou locais culturais e patrimoniais.
O indicador de consumo domiciliar Educação
fornece informações valiosas sobre as prá- Com essa dimensão, procura-se analisar a
ticas de consumo cultural e para analisar prioridade estabelecida pelas autoridades
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 71

públicas para desenvolver um sistema edu- como a avaliação e compreensão da


cacional que valorize a interculturalidade, a diversidade cultural);
diversidade cultural e a criatividade; promo- • o indicador sobre a educação artística
ver a valorização da cultura entre o público; no ensino secundário (abordagem dos
produzir a criação de públicos informados; níveis de fomento da criatividade e da
e influenciar o empoderamento cultural de formação de públicos informados);
seus cidadãos e a promoção de uma classe • o índice de coerência e cobertura
criativa competitiva. Essa dimensão é com- dos sistemas de formação técnica e
posta de quatro indicadores: superior em áreas relacionadas com
a cultura.
• o índice de implementação do direi-
to cultural à educação e de formação O indicador de uma educação inclusiva –
de capital humano (ensino primário uma escolaridade completa, inclusiva e in-
e secundário entre os jovens de 17 tegradora – representa, para o Equador, uma
a 22 anos, ajustado em função das cifra de 0,97 de um máximo possível de 1.
desigualdades); Esse resultado evidencia o esforço realizado
• o indicador do multilinguismo no pelas autoridades públicas (Plano Nacional
ensino secundário (como uma abor- para o Bem Viver) em prol de uma educação
dagem para a análise dos níveis de completa, equitativa e integradora, por meio
fomento da interculturalidade, bem de iniciativas como a adoção de medidas em

ÍNDICE DE ESCOLARIDADE MÉDIA DA POPULAÇÃO ENTRE 17 E 22 ANOS


AJUSTADO EM FUNÇÃO DAS DESIGUALDADES
Resultado final: 0,97/1

1,0
0,9
0,8
0,7
0,6 0,97/1
0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0,0
Bósnia-Herzegovina Vietnã Equador Gana Colômbia

Fonte: Censo de População e Domicílio, Inec (2010). | Metodologia: IUCD-Unesco


72 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

favor da conclusão de estudos ou da intro- Governança e institucionalidade


dução de reformas para a melhoria progres- Essa dimensão analisa e avalia os mecanis-
siva da qualidade da educação. O indicador mos de regulamentação políticos e institucio-
mostra que o número médio de anos de nais capazes de favorecer os direitos culturais,
escolaridade da população-alvo com idade promover a diversidade e fomentar a cultura
entre 17 e 22 anos é de 11,1 anos. A maioria como parte essencial do desenvolvimento.
dos jovens cidadãos equatorianos usufrui, Os compromissos e resultados em termos
portanto, do direito cultural à educação e de governança e institucionalidade cultural
participa dos espaços-chave de construção são abordados por meio do nível de ação das
e transmissão de valores, competências e autoridades públicas na formulação e na im-
atitudes culturais, assim como do empode- plementação de quadros regulamentares, po-
ramento pessoal e social, que são o ensino líticos e institucionais. Essa dimensão inclui a
primário e secundário. disponibilização de infraestruturas culturais
Os 3% restantes da população-alvo con- e, portanto, o acesso da população, bem como
siderada estão em situação de dificuldade os mecanismos para participar em processos
educacional, ou seja, têm menos de quatro por meio dos quais as políticas culturais são
anos de escolaridade. Isso evidencia a per- formuladas e implementadas.
sistência de iniquidades e lacunas no usu- Essa dimensão é composta de quatro
fruto do direito cultural à educação que ainda indicadores:
devem ser preenchidas, particularmente no • o índice composto do grau de desen-
que se refere à população afro-indígena, que, volvimento do quadro regulamentar;
considerando todas as faixas etárias, apre- • o índice composto do contexto políti-
senta os índices mais baixos de escolaridade co e institucional em cultura;
quando comparados aos da população bran- • o indicador sobre a distribuição ter-
ca/mestiça. ritorial das infraestruturas culturais;
O Equador como um todo está próxi- • o índice de participação da sociedade
mo do máximo relativo desse indicador em civil e das minorias nos processos de
relação a outros cinco países que também o formulação e execução de políticas,
implementaram.8 Ao tomar como referência medidas e programas culturais que
o banco de dados global IUCD, nota-se que lhes dizem respeito.
ainda há muito a ser feito para que os siste-
mas educacionais formem futuros públicos Os índices e indicadores dessa dimensão fo-
abertos ao diferente e com senso crítico. As ram recém-criados e nos permitem fornecer
horas dedicadas à educação artística, que re- informações inéditas nos países-alvo para
presentam de 2,4% a 17% das horas de ensino monitorar a implementação dos objetivos
secundário, e as oportunidades limitadas de nacionais estabelecidos e identificar os de-
formação profissional mostram deficiências safios. Normalmente, os países com dados
no atendimento às necessidades dos setores dos IUCD mostram que, embora tenham
culturais em expansão. políticas e estruturas jurídicas completas,
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 73

DISTRIBUIÇÃO DAS INFRAESTRUTURAS CULTURAIS SELECIONADAS EM RELAÇÃO À DISTRIBUIÇÃO


DA POPULAÇÃO NACIONAL NO SEIO DAS UNIDADES POLÍTICO-ADMINISTRATIVAS IMEDIATAMENTE
INFERIORES AO NÍVEL ESTATAL (DESVIO-PADRÃO)

Eixo Y = Distribuição das infraestruturas culturais


Eixo X = Distribuição da população
Quanto mais acima da linha ótima, maior a concentração de equipamentos culturais em relação à população local.

Museus Espaços de exibição Bibliotecas Linha ótima


Prov. Const. del Callao

Madre de Dios
Huancavelixa

Lambayeque
La Libertad

San Martín
Moquegua
Cajamarca
Amazonas

Ayacucho
Apurímac

Arequipa

Huanuco

Tumbes
Ancash

Ucayali
Loreto
Cusco

Pasco

Tacna
Junin

Puno
Piura
Lima
Ica

Fonte: Atlas de Patrimônio e Infraestrutura Cultural das Américas: Peru (2011). | Metodologia: IUCD-Unesco

o acesso equitativo à vida cultural continua Participação social


sendo um obstáculo para a maioria. Assim, Essa dimensão mede os níveis de partici-
a distribuição média da infraestrutura re- pação da população na vida cultural nacio-
vela profundas desigualdades no acesso e nal com a intenção de avaliar e abordar o
na concentração de equipamentos culturais nível de vitalidade cultural, a apropriação
nas principais áreas urbanas. É o caso mar- social das atividades culturais e as fratu-
cante da Colômbia, do Equador e do Peru. ras ou exclusões existentes no seio de uma
Nesses países, a cifra obtida com esse in- sociedade. A liberdade e a possibilidade de
dicador e a visualização das disparidades acesso às atividades e ao consumo de bens
focalizaram as prioridades políticas e a alo- e serviços culturais, bem como o desenvol-
cação de recursos, como pode ser observado vimento de práticas culturais, têm o poten-
no caso peruano (veja acima). cial de influenciar a qualidade de vida dos
74 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

indivíduos e, portanto, o desenvolvimento. meta prioritária para que toda a população


Nesse sentido, a dimensão aborda até que possa usufruir de liberdades sem sofrer dis-
ponto as sociedades são capazes de promo- criminação. Os valores e as aptidões cultu-
ver a liberdade de participar da vida cultu- rais podem influenciar tanto a persistência
ral e viver como desejam de acordo com os como a redução e o desaparecimento da dis-
motivos que valorizam. Aborda também o criminação contra as mulheres.
nível de confiança, abertura à diversidade Com base nesse postulado, a dimensão
e tolerância da população, procurando pro- da igualdade de gênero examina as correla-
porcionar uma compreensão das aptidões ções ou lacunas existentes entre a promo-
para a cooperação indispensáveis à conse- ção e a valorização da igualdade de gênero
cução do desenvolvimento. por meio de políticas e ações concretas, as-
Essa dimensão é composta de cinco in- sim como as percepções da igualdade. Em
dicadores, que abrangem as seguintes áreas: suma, mede-se até que ponto as políticas e
estratégias nacionais de desenvolvimento
• os níveis de participação em atividades promovem o respeito aos direitos humanos
culturais fora do domicílio – próprias e favorecem a construção de uma sociedade
do setor cultural convencional – e em aberta e inclusiva.
atividades culturais fortalecedoras da Essa avaliação resulta de dois indicado-
identidade – ligadas, na maioria dos res compostos que refletem:
casos, a formas e expressões do patri-
mônio intangível; • as diferenças em termos de resul-
• as relações entre cultura e capital so- tados entre homens e mulheres em
cial e confiança, por meio de três indi- domínios-chave, como a educação
cadores, que se enquadram no âmbito ou o acesso ao mundo do trabalho,
dos valores subjetivos declarados: entre outros;
• os níveis de tolerância baseados no • até que ponto as atitudes e percep-
grau de confiança diante da popu- ções individuais são favoráveis ​​à
lação com diferentes origens cul- igualdade de gênero.
turais;
• os níveis de confiança interpessoal, Assim, a análise das correlações ou lacunas
determinantes do capital social; entre os resultados objetivos em termos de
• o nível de percepção da liberdade de igualdade de gênero e os resultados sub-
autodeterminação dos indivíduos. jetivos ligados ao papel atribuído às mu-
lheres na sociedade gera uma abordagem
Gênero das inter-relações entre políticas, meios
A igualdade de gênero é um dos aspectos e valores culturais e atitudes que fornece
centrais do desenvolvimento sustentável. informações muito úteis para influenciar
A igualdade de oportunidades sociais, eco- positivamente a conquista da igualdade de
nômicas, políticas e culturais constitui uma gênero.
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 75

Comunicação modos de comunicação entre as


Essa dimensão examina até que ponto uma pessoas, bem como das formas de
interação positiva entre a comunicação e acesso, criação, produção e difusão
a cultura é promovida por meio da avalia- das ideias, das informações e dos
ção do direito à liberdade de expressão, das conteúdos culturais;
oportunidades existentes para acessar novas • a diversidade de conteúdos de ficção
tecnologias (NTIC) e o conteúdo que essas na televisão pública, a fim de avaliar
tecnologias transmitem, e, finalmente, da ofer- a existência de condições que favore-
ta de produção nacional na televisão pública: çam uma participação cultural dis-
cricionária com base em opções, bem
• o respeito e a promoção do direito à li- como o acesso a espaços de radiodi-
berdade de expressão, entendida como fusão, em particular para produções
pilar do desenvolvimento de socieda- e conteúdos locais.
des participativas e abertas e condição
de um ambiente favorável para a criati- O indicador relativo à diversidade de con-
vidade e a diversidade cultural; teúdos de ficção oferecidos pela televisão
• a promoção do acesso às tecnologias pública mostra que, em 2011, 6% do tempo
digitais e, em particular, à internet, de transmissão dedicado a programas de
como fatores de transformação dos ficção televisiva na televisão pública aberta

PROPORÇÃO DE TEMPO DEDICADO ANUALMENTE À DIFUSÃO DE FILMES DE FICÇÃO


NACIONAIS EM RELAÇÃO AO TOTAL DE TEMPO DEDICADO ANUALMENTE À DIFUSÃO
DE FILMES DE FICÇÃO NOS CANAIS DE TELEVISÃO PÚBLICOS ABERTOS

0,2%
Nacional

Internacional

94% 5,8% Coprodução

Fonte: Observatório Ibero-Americano de Ficção Televisiva (2011). | Metodologia: IUCD-Unesco


76 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

no Equador9 foram dedicados a programas nos domicílios, revelando uma demanda sig-
de ficção nacional. Isso indica uma baixa nificativa e uma oportunidade de expandir a
porcentagem de ficção nacional incluída na oferta de conteúdos locais.
programação pública, abaixo da média de to-
dos os países que implementaram os IUCD, Patrimônio
de 25,8%. O aumento do apoio à difusão de Em suas diversas formas – natural, cultu-
programas de ficção nacionais aumentaria ral, tangível, intangível, móvel e imóvel –,
a variedade da programação e também po- o patrimônio é tanto um produto como um
deria contribuir para informar questões de processo que fornece às sociedades recursos
relevância cultural, fortalecer identidades “frágeis” que exigem políticas e modelos de
e promover a diversidade cultural. A inter- desenvolvimento para preservar e respei-
pretação desse indicador se inter-relaciona tar sua diversidade e singularidade, já que,
facilmente com dois dos indicadores econô- depois de perdidos, não são renováveis. Os
micos, que sugerem baixos níveis de criação IUCD propõem um índice de desenvolvimen-
de produtos e serviços culturais nacionais e, to de uma estrutura multidimensional para
ainda, o consumo de bens e serviços culturais a proteção, a salvaguarda e a promoção da

ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DE UM QUADRO MULTIDIMENSIONAL


PARA A SUSTENTABILIDADE DO PATRIMÔNIO
Resultado final: 0,75/1

Registros e inscrições: 0,77/1 Proteção, salvaguarda Transmissão e mobilização


e gestão: 0,73/1 de apoios: 0,78/1
1,0
0,9
0,8
0,7
0,6
0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0,0
Nível Nível Conservação, Criação de Participação Sensibilização Estimulação
internacional nacional valorização capacidades da comunidade e educação do apoio
e gestão e conhecimentos

Fonte: consultas a contrapartes (2013). | Metodologia: IUCD-Unesco


CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 77

sustentabilidade do patrimônio. Esse índice Nesses dez anos, a implementação dos


integra aspectos como: IUCD apresentou provas tangíveis de sua efi-
cácia, gerando dados inéditos em países onde
• os “registros e inscrições”, que for- até hoje os dados e as análises estatísticas re-
necem uma indicação estrutural do lacionados à cultura e áreas afins eram precá-
grau de prioridade atribuído à prote- rios ou até mesmo inexistentes. A produção de
ção do patrimônio; indicadores e sua análise geraram impactos
• a “proteção, salvaguarda e gestão em pelo menos três áreas. Em primeiro lugar,
do patrimônio”, que permite anali- facilitaram e estruturaram o diálogo entre ins-
sar até que ponto a vontade pública tituições e atores. Foi o caso do Equador, com
– refletida por meio de registros e a introdução de objetivos ligados à cultura no
inscrições – se traduz em políticas Plano Nacional de Desenvolvimento, ou da
e medidas concretas de proteção, Namíbia, em que os IUCD levaram à introdu-
salvaguarda e valorização do patri- ção da cultura no Quadro das Nações Unidas
mônio, incluindo a promoção de uma para Assistência ao Desenvolvimento para
gestão sustentável, o reforço de capa- 2014-2018. Mais recentemente, serviram de
cidades e o fomento à participação base de discussão na Armênia, na Ucrânia e
das comunidades; na Geórgia. Em segundo lugar, informaram
• a “transmissão e mobilização de políticas e decisões em escala nacional. Foi
apoios”, elementos indispensáveis o caso da Colômbia, onde os IUCD nos per-
para um melhor entendimento da mitiram visualizar um desafio conhecido por
sociedade sobre o valor e o sentido do todos, a desigualdade de acesso entre as re-
patrimônio e sua transmissão para as giões, e acompanharam a nova abordagem de
gerações futuras. desconcentração. Um terceiro efeito é o refor-
ço das capacidades dos sistemas estatísticos
Com um resultado de 0,75/1, o exemplo do para coletar dados e interpretar as estatísticas
Uruguai mostra o alto nível de prioridade ligadas à cultura. Nos últimos anos, a meto-
dada à proteção, salvaguarda e promoção da dologia IUCD ganhou vida própria e evoluiu,
sustentabilidade do patrimônio pelas auto- adaptando-se às necessidades daqueles que
ridades públicas. Grande parte do esforço desejam ter uma visão geral da situação e dos
público é dedicada a registros e inscrições, à dados que lhes permitem situar-se em relação
participação da comunidade e ao estímulo ao a outros países.
apoio entre a sociedade civil e o setor priva-
do. Ainda existem lacunas na sensibilização, Conclusão
na criação de capacidade, na conservação e A Agenda 2030 e seus Objetivos de Desenvol-
na gestão, fatores em que são necessárias vimento Sustentável (ODS) mostram, mais
ações adicionais. O Equador apresenta um uma vez, o papel positivo que a cultura pode
resultado de 0,84/1, a Colômbia de 0,86/1 e e deve desempenhar na consecução desses
o Peru de 0,65/1. objetivos. Diante da patente dificuldade de
78 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

apreender e avaliar o impacto tangível da cul- favoráveis ​​q ue permitem a sua


tura nos processos de desenvolvimento, os renovação e a introdução de mu-
Indicadores de Cultura da Unesco para o De- danças positivas na vida dos in-
senvolvimento (IUCD) são uma ferramenta divíduos e das sociedades. Seria
eficaz e comprovada, capaz de esclarecer conveniente aprofundar essa linha
esse impacto e, portanto, apoiar e orientar de pesquisa;
de forma justificada as ações políticas e • os IUCD são orientados prioritaria-
programáticas propícias para a consecução mente aos países de renda média e
desses objetivos. baixa, onde a disponibilidade de da-
No entanto, os resultados fornecidos dos e a capacidade de seu tratamento
pelos IUCD devem ser utilizados de forma são limitadas. A abordagem partici-
totalmente consciente, ou seja, com pleno pativa que possibilita sua construção
entendimento da definição precisa de seu fortaleceu as capacidades na produ-
perímetro, que limita a comparação inter- ção e na manipulação de dados.
nacional em razão das diferenças intrínsecas
entre os países e seus contextos históricos, A possível evolução exigiria uma atua-
sociais e políticos. lização das abordagens e dos padrões
utilizados, a capacitação de mais espe-
Gostaria também de enfatizar alguns aspec- cialistas na metodologia e o fortaleci-
tos relacionados aos IUCD: mento da troca dos materiais com outras
agências e redes, enfatizando a comuni-
• a natureza pragmática de sua me- cação de resultados e a publicação de pes-
todologia, cujo objetivo consiste em quisas. A metodologia dos IUCD poderia
avançar na quantificação de um cam- ser melhorada ampliando as dimensões,
po de estudo historicamente sujeito especialmente a urbana e patrimonial,
a múltiplas discussões intelectuais simplificando alguns cálculos desneces-
que se estendem por décadas sem sariamente complexos e fortalecendo a
resultados tangíveis; leitura transversal dos dados.
• os IUCD são simplesmente um Em suma, e ainda sem poder se tor-
primeiro ponto de apoio para nar uma referência absoluta das situações
construir posteriormente fases de particulares de cada país, pode-se afirmar
desenvolvimento e aperfeiçoamen- que os IUCD constituem um sólido ponto
to. A segunda fase poderia aplicar, de partida para essa análise. Também é
em diferentes áreas e dimensões, um fato que a maioria dos países partici-
a abordagem para a construção de pantes de seu desenvolvimento e aplica-
novos indicadores; ção os considera uma ferramenta eficaz e
• os IUCD abriram o caminho para valiosa para o diagnóstico de suas respec-
modelar as relações entre os re- tivas políticas públicas e a interpretação
cursos culturais, os ambientes de suas realidades.
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 79

Guiomar Alonso
Conselheira regional de cultura no escritório da Unesco em Sahel (Dakar), na África
Ocidental, Guiomar estudou no Institut des Hautes Études de Défense Nacionale, em
Paris, na University at Albany, em Nova York, e na Universidad Complutense de Madrid,
na capital espanhola.

Notas

1 Durante cinco anos, sob a direção de Guiomar Alonso Cano e com Melika
Medici como chefe do projeto, mais de 150 especialistas provenientes de
administrações públicas nacionais, institutos de estatística, organizações
da sociedade civil, bem como do mundo acadêmico, contribuíram para o
desenvolvimento dos IUCD. A equipe da Unesco era composta de jovens
pesquisadores de econometria e desenvolvimento: Naima Bourgault,
Guillaume Cohen, Annya Crane, Keiko Nowacka e Molly Steinlager.

2 Essa escolha foi inspirada no relatório da Comissão Mundial de Cultura e


Desenvolvimento Nossa Diversidade Criadora, de 1996. No entanto, ao longo do
projeto, houve necessidade de incluir outras dimensões, como saúde ou meio
ambiente, que interagem muito estreitamente com a cultura.

3 Bósnia-Herzegovina, Colômbia, Costa Rica, Gana, Uruguai e Vietnã.

4 Burkina Faso, Camboja, Equador, Montenegro, Namíbia, Peru e Suazilândia.

5 A caixa de ferramentas dos IUCD inclui o Manual Metodológico, que oferece


uma metodologia de acompanhamento detalhado para coleta de dados,
cálculos e elaboração e análise de indicadores; o Guia de Implementação, com
uma análise detalhada do processo de elaboração; o checklist de requisitos
para a implementação; planilhas de Excel criadas para oferecer um quadro
comum de tratamento de dados em nível nacional; e o banco de dados global
dos IUCD. Disponível em: <https://es.unesco.org/creativity/>. Acesso em: 17
nov. 2019.

6 Disponível em: <https://es.unesco.org/creativity/sites/creativity/files/cdis/


resumen_analitico_ecuador_0_1.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2019.

7 Disponível em: <https://es.unesco.org/creativity/sites/creativity/files/cdis/


resumen_analitico_iucd_-_colombia_0_1.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2019.
80 OBSERVATÓRIO ITAÚ CULTURAL

8 Disponível em: <https://es.unesco.org/creativity/sites/creativity/files/cdis/


resumen_analitico_ecuador_0_1.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2019.

9 Disponível em: <https://es.unesco.org/creativity/sites/creativity/files/cdis/


resumen_analitico_ecuador_0_1.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2019.

Referências

Unesco IUCD – Caixa de Ferramentas


Tabelas e banco de dados
<https://es.unesco.org/creativity/indicadores-de-desarrollo/caja-de-
herramientas>
Guia de Implementação
<http://www.lacult.unesco.org/docc/Guia_Implement_IUCD_es.pdf>
Manual Metodológico
<https://es.unesco.org/creativity/sites/creativity/files/iucd_manual_
metodologico_1.pdf>

Unesco IUCD – Relatórios por País


Bósnia-Herzegovina, Burkina Faso, Camboja, Colômbia, Equador, Gâmbia, Montenegro,
Namíbia, Peru, Uruguai e Montenegro (2009-2015).
Resumos analíticos: <https://es.unesco.org/creativity/cdis>

Albânia (2016)
<http://www.unesco.org/new/en/unesco/events/albania/?tx_browser_
i1%5BshowUid%5D=33285&cHash=62d817a640>

Armênia (2017)
<https://www.culturepartnership.eu/en/article/cdis-armenia>
Resumo analítico:
<https://www.culturepartnership.eu/upload/editor/2017/Policy%20
Briefs/171128%20CDIS%20Armenia%20Analytical%20Report%20English.pdf>

Geórgia (2017)
<https://www.culturepartnership.eu/en/article/cdis-georgia>
Resumo analítico:
<https://www.culturepartnership.eu/upload/editor/2017/Policy%20Briefs/
CDIS%20Georgia%20Analytical%20and%20Technical%20Report.pdf>
CULTURA E DESENVOLVIMENTO Guiomar Alonso 81

México (2013-2018)
Estados de Colima, Guerrero, Puebla e México, México DF
<http://www.unesco.org/new/es/mexico/press/news-and-articles/content/
news/la_oficina_de_la_unesco_en_mexico_entrega_el_sistema_de_ind/>

Ucrânia (2017)
<https://www.culturepartnership.eu/en/article/culture-for-development-
indicators>

Resumo analítico:
<https://www.culturepartnership.eu/upload/editor/2017/2017/CDIS%20_%20
Analytical%20Brief%20_%20ENG%20(1).pdf>

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