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O VALOR DA CULTURA:

rumo a uma nova narrativa

GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS


CULTURAIS E CRIATIVOS

1 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
SUPERINTENDENTE ITAÚ CULTURAL
Jader Rosa

OBSERVATÓRIO
Coordenação
Luciana Modé

Equipe
Andreia Briene

EQUIPE PEOPLE’S PALACE


PROJECTS DO BRASIL

Diretor
Paul Heritage

Consultoria
Leandro Valiati

Editor
Gustavo Möller

Equipe
Karina Ruiz
Mariana Steffen
Natália Nunes Aguiar

Memória e Pesquisa | Itaú Cultural

O Valor da Cultura: rumo a uma nova narrativa: Guia de Aplicação para projetos
culturais e criativos / vários autores; organizado por Observatório Itaú Cultural e
People’s Palace Projects do Brasil; dirigido por Paul Heritage; consultoria de
Leandro Valiati; editado por Gustavo Möller . - São Paulo : Itaú Cultural ; People’s
Palace Projects do Brasil , 2023.
60 p. : E-pub.

Inclui bibliografia e índice.


ISBN: 978-65-88878-76-7

1. Economia da Cultura. 2. Indústrias Criativas. 3. Guia metodológico. 4.


Desenvolvimento sustentável. 5. Projetos Culturais e Criativos. I. Itaú Cultural.
II. Fundação Itaú. III. People’s Palace Projects do Brasil. IV. Observatório Itaú
Cultural. V.Título.

CDD 306.3

Bibliotecária Ana Luisa Constantino dos Santos CRB-8/10076

2 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
SUMÁRIO

04 APRESENTAÇÃO INSTITUCIONAL

06 INTRODUÇÃO

08 METODOLOGIA E QUESTÕES CONCEITUAIS

11 PRIMEIRA ETAPA – CONTANDO A SUA HISTÓRIA

SEGUNDA ETAPA – DEFININDO DIMENSÕES


15 E INDICADORES DE IMPACTO

23 TERCEIRA ETAPA – ELABORANDO QUESTÕES

33 QUARTA ETAPA – COLETANDO DADOS

38 QUINTA ETAPA – ANALISANDO SEUS DADOS

SEXTA ETAPA – APRESENTANDO


42 OS RESULTADOS
APRESENTAÇÃO
INSTITUCIONAL
Nestes 35 anos de trajetória, o Itaú Cultural (IC) participou
ativamente do fomento, da produção e da difusão do conhecimento
sobre arte e cultura brasileiras. São diversas ações que acompa-
nham os debates da contemporaneidade, estimulando reflexões
sobre temas que permeiam a sociedade brasileira, entre eles,
questões referentes à gestão, à economia e às políticas culturais.
Por meio do Observatório Itaú Cultural, criado em 2006, a or-
ganização sistematiza, torna compreensível e dissemina informa-
ções sobre os setores cultural e criativo, atuando como um espaço
de apoio ao desenvolvimento de políticas culturais.
Vale destacar algumas iniciativas: o “PIB da Economia e das
Indústrias Criativas” (Ecic) e a plataforma digital e interativa Painel
de Dados, que oferecem informações e indicadores sobre mercado
de trabalho, gastos públicos e comércio internacional; publicações
como a Revista Observatório e livros sobre gestão e economia cria-
tiva; e, no campo da formação, o Mestrado profissional em econo-
mia e política da cultura e das indústrias criativas, parceria entre
o IC e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Todas
iniciativas que estimulam o olhar para além do valor econômico,
mas também a compreensão do valor simbólico que impactam os
projetos e iniciativas culturais e artísticas.
Desta forma, em 2018, o Observatório Itaú Cultural – acredi-
tando nos valores e impactos das artes e da cultura – desenvol-
veu uma metodologia de pesquisa em parceria com a consultoria

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People’s Palace Projects para mediação do impacto de projetos
artísticos e culturais. Na ocasião, foi aplicada a primeira experiên-
Assista o vídeo sobre o
Manual aqui cia em cinco projetos da edição Rumos Itaú Cultural 2017-2018 e
aprimorada e validada em 2022 com 19 projetos da edição 2019-
2020. Assim nasce a pesquisa “Valor da cultura: rumo a uma nova
narrativa”, cujo objetivo é repensar as estruturas tradicionais de
mensuração do valor da cultura, utilizando referências dos cam-
pos social, artístico e econômico. A pesquisa procura identificar e
compreender as diferentes formas pelas quais a cultura é capaz de
transformar os indivíduos e contextos em seu entorno, a partir de
diferentes práticas e manifestações do campo cultural.
Com o compromisso de instrumentalizar artistas, produtores
e gestores culturais, desenvolvemos este manual a fim de divul-
gar a metodologia e o processo de sua construção – em conjunto
com as organizações e os agentes criativos parceiros –, além de
oferecer uma base a todos que queiram aprimorar suas práticas
de gestão e mensuração do valor simbólico da arte e da cultura
de seus projetos.

Boa leitura!
Itaú Cultural

5 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
INTRODUÇÃO
Qual é o valor da cultura? De que forma esse valor é definido e
mensurado, e que histórias podemos contar a partir dele? Essas são
algumas das perguntas que deram início ao debate que provocou a
realização da pesquisa “Valor da Cultura: Rumo a uma nova narra-
1
Esta pesquisa consiste tiva”1, realizada em conjunto pelo Observatório do Itaú Cultural e
em uma nova aplicação
da metodologia pelos professores Paul Heritage e Leandro Valiati (People’s Palace
desenvolvida pela
PPP, chamada Relative Projects do Brasil).
Values, que ocorreu
entre junho de 2017 e O principal objetivo da pesquisa é contribuir para a criação
maio de 2018 com 2 or-
ganizações brasileiras de uma narrativa que demonstre o valor da cultura para além de
(Agência Redes para
Juventude e Redes da medidas exclusivamente econômicas ou quantitativas, de modo
Maré) e 2 organizações
inglesas (Battersea Arts a incorporar outras dimensões que evidenciem como a cultura é
Centre e Contact Theatre).
Em 2019, o projeto capaz de alterar, de forma significativa, aqueles que estão envol-
Beyond Exchange (Rela-
tive Values II) adaptou vidos com ela, seja como realizadores, seja como consumidores.
a metodologia para
que fosse aplicada por Para isso, buscamos articular a dimensão da prática artística com
artistas e produtores
culturais, e não apenas a pesquisa, incentivando e possibilitando que indivíduos atuantes
por grandes organiza-
ções. Por último, em no campo da cultura assumam um papel protagonista na discussão
2021, o projeto Raízes
de Resiliência, em do valor da cultura.
parceria com o Insti-
tuto Inhotim, aplicou Assim, em uma primeira fase, em 2018, a pesquisa foi cocria-
a metodologia junto a
cinco organizações cul- da junto a cinco projetos selecionados pelo edital Rumos, do Itaú
turais do Quadrilátero
Ferrífero, em Minas Cultural: Editora e Gráfica Heliópolis (São Paulo, SP), Grupo Ninho
Gerais.
(Crato, CE), Hip Hop Caboclo (São Paulo, SP), Verdevez (Teresina, PI)
e Retratistas do Morro (Belo Horizonte, MG). A escolha dos projetos
foi realizada pela equipe de pesquisadores e do Observatório Itaú
Cultural, junto aos gerentes do programa Rumos. Desta primeira
fase, resultou uma série de indicadores construídos conjuntamente.

6 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
Em uma segunda fase (2021/22), trabalhamos com outros 19
projetos contemplados pelo edital de 2019 do Rumos Itaú Cultu-
2
Os projetos selecio- ral.2 No processo, foram discutidos instrumentos de pesquisa e
nados para a segunda
fase de implementação de coleta de dados, bem como os indicadores resultantes da pri-
da metodologia são os
seguintes: 10 Desertos meira fase do projeto. Essa foi a primeira vez que muitos projetos
de Erros (Porto Alegre,
RS), A Voz da Espe- participaram da pesquisa, o que fortaleceu o entendimento de
rança (Quinta Capa
Quadrinhos - Teresina, que a metodologia desenvolvida em edições anteriores pode ser
PI), Aã (Córregos Vivos
- Belo Horizonte, MG), amplamente adaptada e replicada.
Baixada Sonora (Rio
de Janeiro, RJ), BREU Assim, elaboramos este guia com o intuito de divulgar nossa
(Salvador, BA), Cine-
máquina: Memória em metodologia, bem como os indicadores propostos, além do próprio
movimento (Aracaju,
SE), Concerto para vaca processo de elaboração, em conjunto com as organizações e os
e boi (Brasília, DF), EPA!
Encontro Periférico agentes criativos parceiros desses indicadores. Com isso, objeti-
de Artes - 5ª Edição
(Salvador, BA), Festival vamos ampliar o diálogo a respeito do que se tem realizado, bem
de Circo de Taquaruçu
(Palmas, TO), Gilda como oferecer ferramentas acessíveis para avaliar o impacto do
Cartonera (Ubatuba,
SP), Memórias de um trabalho na área cultural e apresentar os resultados em linguagem
Esclerosado (Portuñol -
Porto Alegre, RS), Meu compreensível e intercambiável entre contextos diversos.
caminho até a escola
(Rio de Janeiro, RJ), O manual é dividido em sete seções, para além desta introdu-
Mocambo (Maceió, AL),
Mochileiros Arquivistas ção, que seguem a mesma lógica do processo de pesquisa. Inicia-
(Salvador, BA), O vizi-
nho silencioso (Goiâ- mos com uma breve discussão metodológica e conceitual, seguida
nia, GO), Primavera
Para as Flores Negras, de outras seis seções com as diferentes etapas de aplicação da
por Funmilayo Afro-
beat Orquestra (São metodologia. Cada etapa é dependente da anterior e permite ao
Paulo, SP), Problemas
e aspirações do negro pesquisador desenhar sua própria avaliação de acordo com as ne-
brasileiro – 3º ato (João
Pessoa, PB), Publicação cessidades intrínsecas ao seu projeto. A jornada aqui detalhada
do primeiro dicionário
bilíngue Kaiowá-Por- é, antes, um incentivo ao descobrimento de caminhos, mais do
tuguês-Kaiowá (Belo
Horizonte, MG), Yvy que uma rota já traçada. Busca-se ampliar o poder das histórias
Pyte - Coração da Terra
(Belo Horizonte, MG). e narrativas em novos formatos e abordagens. Esperamos que
seja útil a todes que, assim como nós, têm como objetivo central
explorar e demonstrar o valor da cultura.

Boa leitura!
Equipe People’s Palace Projects do Brasil

7 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
Metodologia
e questões
conceituais

8
Para compreender os efeitos que as práticas culturais propor-
cionadas por um projeto ou organização geram nos indivíduos, é
preciso levar em consideração o contexto de cada um, incluindo
seu local e forma de atuação. Com isso em mente, sugerimos uma
abordagem que procura incluir e sistematizar dados referentes a
estes três tópicos: contexto, atuação e impactos.

EIXO I: CONTEXTO
Com foco no território, inclui estatísticas (dados secun-
dários) socioeconômicas para um panorama dos territórios
com que o projeto/organização se relaciona. São utilizados
dois grupos de dados: i) caracterização socioeconômica,
representada por informações como esperança de vida ao
nascer, renda per capita, índice de GINI e escolaridade; e ii)
dimensões específicas consideradas pelos agentes criativos
parceiros como essenciais para caracterizar o território em
que atuam – como, por exemplo, dados sobre produção e
equipamentos culturais.

EIXO II: ATUAÇÃO

Com foco no território, inclui estatísticas (dados secun-


dários) socioeconômicas para um panorama dos territórios
com que o projeto/organização se relaciona. São utilizados
dois grupos de dados: i) caracterização socioeconômica,
representada por informações como esperança de vida ao
nascer, renda per capita, índice de GINI e escolaridade; e ii)
dimensões específicas consideradas pelos agentes criativos
parceiros como essenciais para caracterizar o território em
que atuam – como, por exemplo, dados sobre produção e
equipamentos culturais.

9 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
EIXO III: IMPACTOS

O terceiro eixo de análise busca captar os impactos das


práticas culturais, isto é, os resultados mais duradouros
3
DRAIBE, S. M. Avaliação gerados pela transformação da realidade social3 propor-
de implementação:
esboço de uma meto- cionada pelos projetos. A unidade de análise para esse
dologia de trabalho em
políticas públicas. In: eixo é a experiência do participante do projeto, seja ele
BARREIRA, M. C. R. N;
CARVALHO, M. do C. B. público de uma peça, visitante de uma exposição ou um(a)
de. (Orgs.) Tendências
e perspectivas na escritor(a) que teve seu livro publicado. Coletamos, ainda,
avaliação de políticas
e programas sociais. informações de pessoas que tiveram diferentes relações
São Paulo: IEE/PUC/SP,
2001. com o projeto, seja participando da equipe, seja tendo
contato dentro do campo profissional/artístico.
Este último eixo é o foco do presente guia e busca apre-
sentar diferentes maneiras de mensurar o impacto da cultu-
ra. Durante a explicação da pesquisa nas seções seguintes,
além de traçar suas diferentes etapas, forneceremos insumos
para a compreensão de dimensões e indicadores, propondo
um questionário com variáveis básicas.

10 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
primeira etapa
CONTANDO A
SUA HISTÓRIA

11
I.Autoconhecimento: definição do trabalho
realizado e estruturação de narrativas
Para propor indicadores, é preciso saber o que desejamos me-
dir. As artes e a cultura podem ter impactos sociais e econômicos
dos mais diversos, os quais recaem sobre diferentes públicos. As-
sim, os efeitos positivos de iniciativas culturais podem percorrer
variados caminhos; assim, decidir em qual deles você quer focar é
o primeiro passo para identificar os pontos necessários para com-
preendê-los. Para isso, é importante que o trabalho desenvolvido
por você/sua equipe esteja bem definido para você(s). Perguntar-se
as questões a seguir pode ajudar a estruturar essa narrativa:

1. O que eu faço/O que nós fazemos? Que trabalho é realizado?


(Conteúdo).

1.2 Como e quando este trabalho/projeto começou a ser realizado?

1.3 De onde vem a minha ligação com este trabalho/tema/projeto?

2. Quem realiza as atividades/cada uma das atividades? (Equipe).


3. Onde elas ocorrem? (Localização e abrangência).
3.1 Como é a relação com esse local? Existe vínculo com o território?

4. Quando elas acontecem? (Periodicidade).


5. Como as atividades são feitas? (Descrição).
6. Com quem o trabalho é realizado? (Parcerias).
7. Para quem o trabalho é realizado? (Público e objetivos).
7.1 Como posso descrever as pessoas para as quais o nosso trabalho
é voltado?

7.2 Como é a nossa relação com essas pessoas/esse grupo de


pessoas/essa comunidade?

8. Por que meu/nosso trabalho é realizado? (Motivação).

12 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
Ao responder a essas perguntas, você e sua equipe poderão
elaborar narrativas que resumem as atividades e os projetos de-
senvolvidos por vocês. A partir dessa compreensão, fica mais fácil
identificar pontos como: quem são as pessoas/os grupos de pes-
soas envolvidos no seu trabalho e impactados por ele (equipe, par-
cerias e público); os efeitos que as atividades realizadas podem ter
(objetivos e motivação); que consequências vocês esperam ver ao
realizarem suas atividades (objetivos e motivação); a abrangência
do trabalho de vocês – e de seu impacto (localização, abrangên-
cia e periodicidade); bem como a relação com os territórios onde
vocês atuam.

II. O que pesquisar e com quem falar


Os impactos da cultura podem percorrer múltiplos caminhos,
e é preciso decidir entre eles para conseguir explorar a fundo e
compreender cada fio desse novelo de histórias. Por exemplo, pode
ser que você queira explorar os efeitos de um programa específico
desenvolvido por você/sua organização. Por outro lado, em vez de
focar em algum projeto específico, talvez você deseje mensurar o
valor dos vários projetos que você/sua organização desenvolveu. Da
mesma forma, você pode preferir compreender o impacto das suas
ações sobre sua rede de colaboradores e não sobre o público final.
Refletir sobre as perguntas a seguir e/ou discuti-las com sua
equipe contribui para consolidar o propósito da pesquisa e ajuda
a norteá-la:

13 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
1. O que, do meu trabalho, eu gostaria de entender melhor? Que história
eu gostaria de contar?

2. Quem está envolvido nessa história?

3. Com quem é preciso conversar para obter as informações necessárias


para contar essa história?

4. Como documentá-la?

5. Com quem eu gostaria de compartilhar minhas descobertas?.

Tendo estruturado as respostas a essas perguntas, torna-se


mais fácil identificar sobre que aspectos do seu trabalho você de-
seja pesquisar, bem como definir seu público-alvo (ou seja, quem
e quantas são as pessoas que vão participar da pesquisa). A partir
disso, você poderá avançar na reflexão sobre que perguntas devem
ser feitas para que você obtenha as informações de que precisa.
Finalmente, ter em mente possíveis interlocutores com quem
você gostaria de compartilhar seus achados (por exemplo: poten-
ciais financiadores, membros do poder público ou demais agentes
criativos) é um importante passo para delinear as informações a
serem obtidas e a forma como elas devem ser apresentadas.

14 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
segunda etapa
DEFININDO
DIMENSÕES E
INDICADORES
DE IMPACTO

15
Dois paradigmas parecem orientar a discussão sobre o valor
da cultura na sociedade contemporânea. Por um lado, há a pers-
pectiva que destaca o valor intrínseco dessas práticas, que remete
ao valor essencial das práticas culturais e aos efeitos subjetivos
que elas são capazes de gerar nos indivíduos que as experienciam.
De outro lado, há a ótica que enfatiza os valores instrumentais
das práticas culturais, isto é, entendendo-as como um meio para
se alcançarem objetivos específicos – sociais ou econômicos, tais
4
HOLDEN, J. How we como inclusão social, emprego, saúde etc.4. Neste cenário, ganhou
value arts and culture.
In: Sustaining Cultural espaço o debate sobre a economia criativa, promovendo o olhar
Development. Routle-
dge, 2016. p. 39-50. sobre a contribuição dos chamados setores culturais e criativos
5
UNESCO. Creative Eco- para o desenvolvimento social e econômico dos países5.
nomy Report. 2013.
Neste guia, buscamos conciliar ambas as visões, sugerindo
uma nova abordagem. Por meio da coleta de dados junto aos par-
ticipantes e/ou público relacionado a cada projeto, voltamos nosso
foco para os impactos que as práticas artísticas e culturais são
capazes de gerar nestes indivíduos.
Para isso, propomos indicadores desses impactos. Indicadores
são ferramentas que permitem quantificar conceitos abstratos
6
JANUZZI, P. Indicado- através de evidências da realidade social6. Para isso, é importante
res sociais no Brasil.
Campinas: Alínea, assegurar que estas quantificações estejam inseridas dentro do
2001.
contexto de cada projeto e reconhecer a relevância dos(as) parti-
cipantes e suas trajetórias.
É possível identificar uma série de dimensões individuais sobre
as quais as práticas culturais geram impacto. A partir da análise da
literatura relacionada, reunimos as dimensões consideradas mais
relevantes de acordo com os objetivos da pesquisa e as caracterís-
ticas dos projetos selecionados. Seguindo a proposta de cocriação
da pesquisa, as duas etapas de trabalho – com cinco e depois com
dezenove projetos selecionados no edital Rumos – propuseram as
seguintes dimensões:

16 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
ACESSO À CULTURA
7
LACERDA, A. P. Demo-
cratização da cultura
X democracia cultural:
os pontos de cultura
enquanto política A importância da formação de públicos é questão cen-
cultural de formação
tral para a ideia de democracia cultural, que busca pro-
de público. Anais do
seminário internacio- porcionar “o acesso, fruição, produção e distribuição da
nal. Políticas culturais:
teoria e práxis, p. 1-14,
cultura por todos os cidadãos”7, compreendendo a ação
2010. cultural a partir da pequena escala8. Reside aqui uma pro-
8
LOPES, J. M. T. Da
posta de dinamização da cultura local com base em suas
democratização da próprias práticas, respeitando as referências das dife-
Cultura a um conceito
e prática alternativos rentes comunidades9 e suas trajetórias e incentivando a
de Democracia Cultu- diversidade cultural.
ral. Saber & Educar, n.
14, 2009.

9
SOUZA, V. Cidadania
Cultural: entre a demo-
cratização da cultura e
a democracia cultural.
pragMATIZES - Revista IDENTIDADE
Latino Americana de
Estudos em Cultura,
Ano 8, número 14, Entendendo que a cultura é uma forma de lente pela
semestral, out/2017 a
mar/ 2018 qual os indivíduos enxergam e constituem a realidade,
compreendemos que ela é também “condição para a cons-
trução da história e da memória de um povo e, portanto,
formadora da sua identidade”.10 Assim, temos nas práticas
e nas ações culturais a possibilidade de representação
10
BARROS, J. N. Cultura,
Memória e Identidade:
da memória e da cultura de um povo, reforçando a sua
contribuição ao identidade – ou não, na medida em que essa história, essa
debate. Cad. hist., Belo
Horizonte, v. 4, n. 5, p.
memória, é ou não contada. Para Pollak (1992), memória e
31-36, dez. 1999 identidade são valores disputados, sendo que a memória
tem um papel fundamental enquanto elemento consti-
tuinte da identidade, na medida em que contribui para o
sentimento de continuidade dentro do tempo e de coe-
rência do indivíduo, elementos essenciais da construção
11
POLLAK, M. Memória da identidade11.
e Identidade Social.
Estudos Históricos, Rio
de Janeiro, vol. 5, n. 10,
1992, p. 200-212.

17 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
AUTOCONFIANÇA

Há diversos estudos apontando as diferentes formas


pelas quais práticas culturais geram bem-estar, sobretudo
enfocando grupos sociais que apresentam condições de
12
CROSSICK, G.; KAS-
saúde específicas.12 Para essa pesquisa, reconhecemos
ZYNSKA, P. Understan- a importância destes resultados, mas enfatizamos uma
ding the value of arts
and culture. Swindon:
concepção de bem-estar de caráter subjetivo e interativo,
Arts & Humanities que remete sobretudo ao indivíduo reflexivo, autônomo
Research Council, 2016.
e empático, também tocando na questão da autoestima
pessoal ou autoconfiança. Os indicadores apresentados
nessa dimensão remetem à percepção dos indivíduos so-
bre si mesmos após a participação e/ou contato com o
projeto selecionado. Perguntas abertas foram utilizadas
visando provocar a reflexão e a subjetividade dos parti-
cipantes.

REDES
13
HAMPSHIR, K. R.;
MATTHIJSSE, M. 2 Can
arts projects improve
young people’s well-
being? A social capital A concepção de redes sociais utilizada remete ao con-
approach. Social Scien-
ce & Medicine, 71,
ceito de capital social e enfatiza a construção de relações
p.708-716, 2010. duradouras entre os indivíduos. Com frequência, a litera-
tura traz esse processo associado à noção de bem-estar,
14
Para uma discus- sobretudo demonstrando que a construção de relações
são aprofundada
sobre a importância sociais pode implicar melhor saúde física e mental13. Para
e os benefícios da os fins deste guia, consideramos que a construção destas
construção de redes
sociais, ver: PORTELA, redes tem por si só importância, sem nos ater aos poten-
Marta; NEIRA, Isabel; ciais benefícios daí decorrentes14.
DEL MAR SALINAS-JI-
MÉNEZ, Maria. Social
capital and subjective
wellbeing in Europe:
A new approach on
social capital. Social
Indicators Research, v.
114, n. 2, p. 493-511,
2013.

18 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
TERRITÓRIO
O conceito de democracia cultural, já mencionado aqui,
chama a atenção para a ação cultural encarada “de baixo
15
Lopes (2009), grifos do para cima e de dentro para fora”15, isto é, emanando principal-
original.
mente do local em que é realizada segundo os repertórios
compartilhados pela comunidade. Nesse sentido, entra em
questão a ideia de território, entendido sob a perspectiva
da relação entre a identidade de uma comunidade e o
16
POLLICE, F. Traduzido espaço que esta ocupa16. A forma pela qual as práticas cul-
por OLIVEIRA, A. G.; turais proporcionadas pelos projetos selecionados afetam
CRIONI, R.; OLIVEIRA,
B. A. C. C. O papel da a relação dos participantes com os territórios abordados
identidade territorial – sendo ou não os de residência destes indivíduos –, cons-
nos processos de
desenvolvimento local. titui uma das dimensões de potencial impacto da cultura.
Espaço e cultura, UERJ,
RJ, n. 27, p. 7-23, jan./
jun. De 2010

ENGAJAMENTO
A última dimensão que trazemos trata do engajamento
social, entendido como ações conscientes e públicas, se-
jam individuais, sejam coletivas, realizadas para identificar
17
STERN, M. J.; SEIFERT, e tratar questões de interesse público17. Embora não seja
S. C. Civic Engagement uma demanda explícita dos projetos, entendemos que as
and the Arts: Issues
of Conceptualization questões que abordam e/ou as formas como se relacio-
and Measurement. nam com os participantes podem gerar impactos desta
Washington DC: Ameri-
cans for the Arts, 2009. natureza nos indivíduos, provocando reflexões de cunho
Disponível em: https:// político-social e ações propositivas.
animatingdemocracy.
org/sites/default/files/ Cada uma dessas dimensões conceituais pode se des-
CE_Arts_SternSeifert.
dobrar em diferentes características específicas, que cha-
pdf. Acessos em julho
de 2019. mamos de indicadores. Uma vez que você tenha refletido
sobre qual dimensão melhor se adequa a sua realidade,
tente elaborar/escolher indicadores que representem es-
sas dimensões. Essa é a temática da subseção seguinte.

19 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
I. Indicadores
Indicadores são ferramentas analíticas que sistematizam
informações da realidade por meio de códigos. Com isso, somos
capazes de organizar bancos de dados contendo variáveis que
representam informações mais ou menos objetivas (como o grau
de escolaridade de uma pessoa) ou abstratas (como a sensação
de bem-estar). Os indicadores expressam, portanto, propostas de
como medir atributos e fenômenos por meio de taxas ou índices,
compostos por uma ou mais variáveis. Neste guia, propomos in-
dicadores que sejam capazes de apreender o valor das atividades
culturais e artísticas desempenhadas por você/sua organização a
partir das dimensões conceituais supramencionadas.
Para elaborar indicadores, procure pensar sobre o que já se
sabe a respeito das pessoas afetadas pelo seu trabalho e quais
são os dados sociodemográficos disponíveis:

1. São pessoas majoritariamente negras, brancas, indígenas?

2. São mulheres, homens, pessoas cis, pessoas trans?

3. São pessoas com alto grau de escolaridade? E a renda?

4. São pessoas que atuam no mercado de trabalho informal?

5. Essas informações são importantes dentro do escopo do meu


trabalho?

Busque refletir sobre quais dessas informações são impor-


tantes para descrever globalmente essas pessoas. Procure pensar
também nos territórios onde você/sua organização atua:

20 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
6. Quais são os índices de criminalidade no local?
7. É um bairro/comunidade centralizado ou periférico?
8. Como é o acesso das pessoas a eventos de arte e cultura?

Para além desses dados oficiais, procure refletir a respeito


de outras informações que você possui sobre o público atingido
pelas atividades desenvolvidas por vocês: você já recebeu algum
retorno a respeito da participação deles em eventos e atividades
promovidos por vocês? De que forma vocês podem ter impactado
as vidas dessas pessoas?
Como um guia para essas reflexões, propomos os indicadores
resumidos no quadro a seguir, onde se detalham as dimensões dis-
cutidas anteriormente, bem como seus respectivos indicadores e
suas definições. Por certo, nem todas as dimensões ou indicadores
são aplicáveis a todos os projetos/organizações. Assim, o quadro
tem como intuito principal ser uma referência para o desenvolvi-
mento de indicadores.

21 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
DIMENSÃO INDICADOR DEFINIÇÃO

Desenvolvimento Percepção de desenvolvimento de novas habilidades artísticas,


Acesso à cultura
de habilidades criativas e culturais não antes desenvolvidas.

Conhecimento de temas antes não familiares, incluindo, mas não restrito aos
seguintes tópicos: Cultura afro-brasileira; Culturas indígenas; Representatividade e/
ou direitos da população LGBTQIA+ (incluindo pessoas não-binárias); Acessibilidade
e direitos de pessoas com deficiência; Saúde pública; Preservação do meio ambiente;
Preconceito racial ou Violência racial (a depender do projeto); Violência policial;
Violência contra mulheres e meninas; Intolerância religiosa; História de grupos
sociais marginalizados; Literatura não convencional; Cinema não convencional e/
Acesso à cultura Exposição a temas ou periférico; Culturas regionais; Tecnologia e sociedade; Cultura sonora; Práticas e
atividades lúdicas/de entretenimento; Patrimônios culturais e imateriais; Preservação
cultural e memória; Preservação audiovisual; Lutas populares e mobilização social;
Ritmos africanos; Manifestações culturais populares e/ou regionais; Vigilância
digital; Direito e cidadania digital; Produção cultural e curadoria; Políticas públicas
de cultura; Mercado da música; Estrutura e planejamento urbano; Preconceito social
ou cultural; Culturas regionais; História familiar e atavismo; Questões de classe;
Políticas públicas de demarcação de terras indígenas; Conflitos geracionais.

Acesso à cultura Atividades culturais Aumento de frequência nas práticas de atividades culturais e criativas diversas.

Estabelecimento de
Ampliação ou criação de contatos profissionais
Redes redes de contato
relacionados às profissões culturais e criativas.
profissional

Estabelecimento
Redes de redes de Ampliação ou criação de contatos de maneira generalizadas.
contato pessoal

Autoconfiança para Percepção de ser capaz de liderar o desenvolvimento de


Autoconfiança
realizar atividades atividades diversas de cunho político, social e cultural.

Sentimento Percepção de ser capaz de efetuar mudanças no futuro


Autoconfiança
de eficácia da comunidade/território/cidade/país.

Identificação com Identificação direta com uma determinada comunidade, que pode
Identidade
uma comunidade ser racial, territorial, de ofício, de hábitos ou gostos etc.

Curiosidade sobre Curiosidade sobre a cultura da região/de uma comunidade/do


Identidade
uma cultura território e/ou populações indígenas e/ou afro-brasileiras.

Identificação Intensidade com que os projetos alteram a relação dos


Território
com o território participantes com os territórios de atuação.

Ocupação de
Território Reposicionamento da percepção sobre o espaço mais amplo da cidade e/ou território.
novos lugares

Atenção para Geração de ações conscientes e públicas, sejam elas individuais ou coletivas,
Engajamento
questões sociais realizadas para identificar e tratar questões de interesse público.

Percepção sobre
Engajamento Viabilização de reflexões de cunho político-social e ações propositivas.
arte e política

22 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
terceira etapa
ELABORANDO
QUESTÕES

23
I. Termo de consentimento e conduta ética
Por mais que, algumas vezes, o fato de a pessoa saber que
está participando de uma pesquisa influencie as suas respostas,
é necessário sempre deixar claro para as pessoas que se trata de
uma pesquisa e que elas podem desistir de responder ao questio-
nário a qualquer momento.
Para garantir que as pessoas recebam todas as informações
necessárias para decidirem se responderão ou não ao questionário
e para que elas possam expressar claramente se aceitam ou não
participar da pesquisa, construa um termo de consentimento. Nele:

• Indique qual é o tema da pesquisa e seu título;

• Identifique qual é a instituição e/ou as pessoas por trás


dessa pesquisa e informe os contatos pertinentes;

• Informe que tipos de dados serão coletados (indique se as


respostas são anônimas ou não);

• Indique se, como, com quem e em que termos os dados


coletados na pesquisa podem vir a ser compartilhados com
18
Lei Geral de Proteção terceiros (e aja sempre de acordo com a LGPD18);
de Dados (LGPD): Lei
nº 13.709 de 2018,
“dispõe sobre o • Esclareça que a participação das pessoas na pesquisa é
tratamento de dados
pessoais, inclusive nos voluntária e não acarreta nenhum tipo de despesa ou re-
meios digitais, […] com
o objetivo de proteger muneração;
os direitos funda-
mentais de liberdade
e de privacidade e o ◦ Caso haja remuneração pela participação, deixe claro qual é
livre desenvolvimento
da personalidade da essa remuneração, como e quando ela será efetivada, bem
pessoa natural”.
como que essa remuneração não está condicionada às
respostas que a pessoa der para as perguntas realizadas;

• Informe que as pessoas podem pedir que seus dados sejam


excluídos da base de dados, caso seja possível identificar
quais dados correspondem àquela pessoa (no caso de pes-
quisas anônimas, isso geralmente não é possível).

24 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
ATENÇÃO:

• Tenha meios de garantir a segurança dos dados que


você vier a armazenar, sejam eles bancos de dados
de pesquisas online, áudios e vídeos, questionários
em papel ou anotações, especialmente se a pesquisa
abordar temas sensíveis.

• Lembre-se também de que pesquisas com adolescen-


19
Conforme a Resolução tes e, sobretudo, crianças, seguem regras específicas19.
nº 466 de 2012 do
Conselho Nacional de
Saúde (especialmente
itens II.2 e IV.6). Dis-
ponível em: <https://
www.inca.gov.br/sites/
ufu.sti.inca.local/files//
media/document//
resolucao-cns-466-12.
pdf>. Acessado em 03 II. Tipos de questão
jan. 2023.

Questionários fechados, os chamados surveys, são compostos


quase totalmente por questões também fechadas, já que ofere-
cem as opções de resposta. Esse tipo de abordagem é importante
porque consegue alcançar um número maior de pessoas e cobrir
variados temas num mesmo formulário. Além disso, quando as
opções de resposta são pré-determinadas, os dados coletados
podem ser comparados de maneira mais direta e objetiva. Cada
tipo de questão, por sua vez, tem vantagens e limitações especí-
ficas. A escolha entre elas deve ser bem informada e atender às
suas necessidades.

Questões binárias

São questões fechadas com apenas duas opções de resposta


– não há uma opção como “Outro(s)”. As opções de resposta são,
quase sempre, categorias, e não números – como “Sim” ou “Não”.

25 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
Atenção: em geral, tratam-se de questões que representam in-
terpretações limitadas/limitantes de um dado fenômeno.

Exemplo: Você assistiu ao filme XXXXX?


( ) Sim
( ) Não

Questões de resposta única

Há várias opções de respostas dentre as quais apenas uma


deve ser escolhida. As alternativas podem ser números ou catego-
rias. Geralmente, oferecem as opções “Nenhuma das anteriores”,
“Não sei” e “Prefiro não responder”.

Exemplo: Qual meio você mais utiliza para assistir a filmes


e documentários?
( ) TV a cabo
( ) Cinema
( ) Plataformas de streaming (Prime Video, Disney+, MUBI,
Netflix etc.)
( ) TV aberta
( ) Torrent
( ) Prefiro não responder
( ) Não sei

Questões de múltipla escolha

São questões com várias opções de resposta, dentre as quais


você pode escolher mais de uma opção. Pode haver limite de esco-
lhas ou não. Geralmente, esse tipo de questão inclui opções como

26 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
“Outro(a)”. Nesse caso, essa opção funciona como uma questão
aberta, onde a pessoa pode inserir qualquer resposta.

Exemplo: A leitura de histórias em quadrinho levou você a


ter contato com algum dos temas abaixo? (Marque quantas
alternativas achar necessário).
( ) Cultura afro-brasileira
( ) Culturas indígenas
( ) Preservação do meio ambiente
( ) Preconceito racial
( ) Outro (especifique)

Saiba mais: Na hora da análise desse tipo de questão, cada


opção é considerada como uma questão binária em que sua res-
posta é “sim”, caso você marque aquela opção, ou “não”, caso você
a deixe em branco.

Questões ordinais (ou de escala)

Envolvem escolher entre opções de resposta previamente or-


denadas em uma escala – que pode variar de tamanho.

Exemplo: Em uma escala de 1 a 10, em que 1 significa comple-


tamente desinformado, e 10 significa totalmente informado,
como você avalia seu conhecimento sobre cinema nacional?

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

27 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
a. Escala Likert

A escala Likert é um tipo específico de questão escalar co-


mumente usada para avaliar o grau de concordância/discordância
com uma dada afirmação. Utiliza-se uma escala unidimensional,
contendo, na maior parte das vezes, números ímpares de alterna-
tivas (geralmente 5 ou 7).

Exemplo: Entre 1 e 5, em que 1 significa que você DISCORDA


totalmente e 5 que você CONCORDA totalmente, o que você
acha da seguinte frase?

“O contato com o circo despertou minha curiosidade sobre


a cultura da minha região”.
( ) 1 – Discordo totalmente
( ) 2 – Discordo parcialmente
( ) 3 – Nem concordo, nem discordo
( ) 4 – Concordo parcialmente
( ) 5 – Concordo totalmente

Questões de classificação

As questões de classificação (ou de rankeamento) demandam


que os respondentes classifiquem as alternativas de resposta na
ordem de sua preferência. Ou seja, as opções não são previamente
ordenadas.

28 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
Exemplo: Dos 19 projetos contemplados pelo edital Rumos
Itaú Cultural e participantes do projeto Relative Values, da
People’s Palace Projects do Brasil, indique quais são os seus
três favoritos, em ordem de preferência:
( ) Projeto A
( ) Projeto Ф
( ) Projeto γ
( ) Projeto ч
( ) Projeto X
( ) Projeto ζ

Questões abertas

Apresentam perguntas sem oferecer opções de resposta. No


entanto, podem (e tendem a) estabelecer critérios de resposta,
como limite de caracteres ou de linhas.
Exemplo: O projeto influenciou a forma como você entende a re-
lação entre arte e política? De que maneira?

III. Formulando as perguntas


do questionário

III. I. Questões sociodemográficas

É preciso conhecer seu público-alvo. Mesmo que você tenha


uma boa ideia de quem é atendido pelos seus projetos, participa
das suas atividades ou compõe sua equipe, é importante traçar
um perfil detalhado dessas pessoas. Informações sociais e de-
mográficas, como gênero, raça e faixas de idade, escolaridade e
renda, são essenciais.

29 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
O detalhamento de algumas informações e a inclusão de de-
terminadas questões dependem das necessidades da pesquisa,
como é o caso do local de moradia: você pode desejar saber o
estado, o município, o distrito ou até o bairro onde alguém vive.
Do mesmo modo, ao perguntar o gênero de alguém, podem-se
oferecer as opções “feminino”, “masculino”, sem distinção entre
pessoas cis e trans, ou pode ser preciso coletar dados mais deta-
lhados. Outro exemplo é a ocupação: para alguns, saber qual é o
trabalho das pessoas também é relevante, e não apenas sua renda.
Assim, estabeleça quais informações sociodemográficas são
importantes para traçar o perfil do seu público-alvo e proponha
questões que consigam acessá-las. A seguir, apresentamos as
questões utilizadas na edição de 2021/22 do projeto.

30 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
VARIÁVEL PERGUNTA OPÇÕES DE RESPOSTA OPÇÃO “OUTRO(A)”

Idade Qual a sua idade? - -

Você se identifica Masculino


Gênero como sendo de Feminino “Outro (especifique)”
que gênero? Não-binário

Em que estado “Não moro no Brasil


UF Unidades da Federação (Brasil)
você reside? (informe o país)”

Em que município
Município - -
você reside?

Nunca estudei
Ensino Fundamental incompleto
Ensino Fundamental completo
Qual a sua Ensino Médio incompleto
Escol. -
escolaridade? Ensino Médio completo
Ensino Superior incompleto
Ensino Superior completo
Pós-graduação

Qual é, mais ou
menos, a renda
mensal na sua Até 1 salário-mínimo
casa? Ou seja, Mais de 1 até 3 salários-mínimos
Renda qual é a soma Mais de 3 até 6 salários-mínimos -
da renda de Mais de 6 até 9 salários-mínimos
todas as pessoas Mais de 10 salários-mínimos
que moram na
sua casa?

Negra
Você se identifica Branca “Outra”
como sendo de Amarela – Especificar “Especifique (caso tenha
Raça
qual raça ou origem familiar (chinesa, respondido Amarela,
origem étnica? coreana, japonesa etc.) Indígena ou Outra)”
Indígena – Especificar etnia

III.II. Questões relacionadas a indicadores

Para além das questões sociodemográficas, procure propor


entre 10 e 12 questões que dialoguem com indicadores-chave
para expressar o valor do seu trabalho. Os tópicos e os indicado-
res propostos na edição de 2021/22, bem como as questões que
procuraram mensurá-los, são:

31 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
TIPO DE
DIMENSÃO INDICADOR QUESTÃO
QUESTÃO

Seu envolvimento com o [nome do projeto]


Desenvolvimento
Acesso à cultura Likert levou você a desenvolver novas habilidades
de habilidades
(artísticas, culturais, criativas)?

Conhecer e/ou se envolver com o [nome


Múltiplas
Acesso à cultura Exposição a temas do projeto] levou você a ter contato
respostas
com algum dos temas abaixo?

Conhecer e/ou se envolver com o [nome do


Atividades Múltiplas
Acesso à cultura projeto] levou você a realizar alguma das
culturais respostas
seguintes atividades com maior frequência?

Estabelecimento
Você conheceu (novos) artistas, produtores
de redes
Redes Likert ou outros profissionais na área da cultura
de contato
através do [nome do projeto]?
profissional

Estabelecimento
É possível dizer que você conheceu novas pessoas
Redes de redes de Likert
através do seu contato com o [nome do projeto]?
contato pessoal

Autoconfiança Depois do seu contato com o [nome do


Múltiplas
Autoconfiança para realizar projeto], você se sente mais confiante para
respostas
atividades realizar alguma das seguintes atividades?

Sentimento Você acredita que consegue mudar o futuro da


Autoconfiança Likert
de eficácia sua cidade/do seu país/da sua comunidade?

Depois do contato com o [nome do projeto],


Identificação com eu me sinto parte ou me identifico com uma
Identidade Likert
uma comunidade comunidade (essa comunidade pode ser racial,
territorial, de ofício, de hábitos ou gostos etc.).

O contato com o [nome do projeto] despertou


minha curiosidade sobre a cultura da minha
Curiosidade sobre
Identidade Likert região/de uma comunidade/do território
uma cultura
onde moro/atuo ou já morei/atuei das
populações indígenas e/ou afro-brasileiras.

Depois de conhecer e/ou me envolver com o


Identificação
Território Likert [nome do projeto], eu me identifico (ainda mais)
com o território
com o território onde moro ou já morei.

Após o contato com o [nome do projeto],


Ocupação de
Território Likert passei a frequentar novos lugares ou
novos lugares
espaços – físicos ou virtuais.

Atenção para Seu envolvimento com o [nome do projeto] chamou


Engajamento Aberta
questões sociais a sua atenção para alguma questão social?

Engajamento Qual questão? Aberta Se sim, qual(quais)?

Percepção sobre O projeto influenciou a forma como você


Engajamento Aberta
arte e política entende a relação entre arte e política? Como?

32 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
quarta etapa
COLETANDO DADOS

33
I. Com quantas pessoas falar
A quantidade de pessoas que você precisará consultar para
obter as informações de que precisa depende diretamente do que
você decidiu pesquisar (qual história você quer contar) e, portanto,
do seu público-alvo. Por exemplo, se você quer entender como
seu último projeto, realizado em uma comunidade quilombola,
impactou sua equipe, então, seu público-alvo será a equipe que
trabalhou com você neste projeto. Essa equipe, por sua vez, pode
ser composta por 4, 10 ou 30 pessoas e isso influenciará sua abor-
dagem. Se você tiver uma equipe reduzida, a imersão nas informa-
ções que essas pessoas têm para te passar, em suas experiências
e narrativas, será muito maior. Por outro lado, se sua equipe for
grande, a melhor abordagem é aplicar questionários fechados,
com perguntas e opções de resposta pré-definidas a esse público.
Quando você tem um público-alvo extenso, você pode tentar
alcançar todas as pessoas que o compõem ou apenas uma parcela
dessas pessoas, que chamamos de amostra. Uma amostra pode
representar todas as pessoas de um grupo grande em relação a
vários aspectos (como idade, renda, gênero, atitudes e opiniões,
por exemplo). Existem fórmulas e técnicas para se construírem
amostras representativas de uma população-alvo. No entanto,
esses aspectos técnicos são necessários quando o objetivo da
pesquisa é apresentar um retrato fiel de um grupo muito grande.
E parte das técnicas para formular amostras requer que haja in-
formações prévias sobre o público geral.
No nosso caso, porém, o objetivo da pesquisa é conhecer um
grupo de pessoas e entender como ele pode ser impactado por
nossas ações culturais e artísticas. Por isso, mais do que se preo-
cupar com cálculos amostrais e margens de erro, o importante é
procurar alcançar o maior número de pessoas possível dentro do
universo escolhido como público-alvo da pesquisa e buscar incluir
pessoas diversas em suas características. Por exemplo, se você

34 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
decidir analisar o impacto de um projeto que só envolveu mulheres
negras, incluir várias faixas de idade na pesquisa é importante. Por
outro lado, se você for avaliar o impacto de seus vários projetos,
é importante conversar com pessoas que fizeram parte de cada
um desses projetos, sem excluir nenhuma.

II. Quantas respostas esperar


Por mais que haja esforço para alcançar o maior número possí-
vel de pessoas dentro do universo que compõe o público-alvo
da pesquisa, é importante saber que nem todas essas pessoas
responderão ao questionário, especialmente se ele for aplicado
online. Responder a um questionário demanda tempo e atenção,
bem como requer que a pessoa se sinta confortável e confiante
a respeito da pesquisa. Por isso, muitas pessoas podem não ter
interesse em responder ou podem abandonar o questionário no
meio – especialmente quando a aplicação é virtual.
Além disso, questões que abordam tópicos mais delicados,
como a renda familiar; ou questões mais demandantes, como as
que pedem que a pessoa escreva, tendem a ter um número maior
de ausência de respostas. Portanto, não se assuste caso a taxa
de respostas completas do seu questionário seja inferior a 75%,
ou haja menos respostas a determinadas questões. O importan-
te é manter constante a divulgação do questionário e procurar
entender as causas de eventuais proporções muito elevadas de
desistência durante o preenchimento do formulário.
Por isso, é crucial construir questionários sucintos e objetivos,
bem como evitar questões confusas ou muito demandantes.

III. Aplicação da pesquisa


Existem algumas maneiras de aplicar questionários fechados.
Na entrevista face a face, você fala pessoalmente com alguém e

35 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
preenche o questionário em papel ou em um aparelho eletrôni-
co. Outra maneira de você mesmo(a) preencher o questionário é
aplicando-o por telefone com a pessoa entrevistada. Finalmente,
você pode optar por enviar um link em formulários online para
que a própria pessoa responda a pesquisa. Cada uma dessas al-
ternativas tem vantagens e desvantagens, além de apresentarem
algumas especificidades na coleta de respostas e montagem do
banco de dados.

I.I. Aplicação face a face

Essa opção tende a ser menos custosa para quem res-


ponde, pois, em geral, quem preenche o questionário é quem
está aplicando. Assim, esse método costuma viabilizar mais
respostas completas. Por outro lado, também é mais comum
que os respondentes sintam mais o peso de pressões sociais
em relação a determinados temas mais sensíveis. Nesse senti-
do, respostas mais “desejáveis” socialmente tendem a ser mais
numerosas do que em outras formas de aplicação.
A aplicação face a face pode ser feita tanto em um apa-
relho eletrônico que lança as respostas em um site quanto em
papel. Nesse caso, os dados devem ser inseridos em uma plani-
lha manualmente, o que requer atenção e algum conhecimento
de como construir bancos de dados. Além disso, é essencial
enumerar os questionários aplicados e recolher as assinaturas
do Termo de Conduta previamente à aplicação da pesquisa.

36 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
I.II. Aplicação por telefone

A alternativa de aplicar pesquisas por telefone mantém


a vantagem de reduzir desistências no meio do questionário
e ameniza o problema das respostas socialmente desejáveis.
Porém, é mais difícil acessar os respondentes por telefone e
conquistar sua confiança. Além disso, é mais difícil coletar o
consentimento formal em participar da pesquisa. No mais,
o uso de aparelhos eletrônicos ou papel para coletar as res-
postas e suas consequências sobre a montagem do banco de
dados se assemelham à pesquisa face a face.

I.III. Aplicação online

As ferramentas de coleta de dados remota são muito di-


fundidas e facilitam a organização dos dados, uma vez que
disponibilizam bancos de dados montados, em formatos diver-
sos. Existem variados sites de aplicação online de formulários,
havendo versões gratuitas e pagas. Survey Monkey e Google
Forms são, provavelmente, os mais reconhecidos. A versão
gratuita deste oferece mais recursos do que aquele. Por isso,
recomendamos seu uso.
Contudo, o alcance desse tipo de pesquisa tende a ser
menor, uma vez que o número de pessoas que responde a
disparos de pesquisas online é reduzido, e, dentre os que co-
meçam a responder o questionário, muitos abandonam no
meio. Nesse sentido, elaborar formulários objetivos e simples
é muito importante. Além disso, em pesquisas online, não é
possível sanar eventuais dúvidas dos(as) respondentes, o que
pode afetar as respostas recebidas. Dessa forma, é essencial
utilizar uma linguagem acessível e direta.

37 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
quinta etapa
ANALISANDO
SEUS DADOS

38
I. Primeiramente, você deve explorar seu banco
de dados: examinar cada variável e o número
Conheça
de respostas recebidas, além de avaliar onde
seus dados há mais respostas faltando e identificar uma ou
outra tendência.

II. Caso haja respostas faltantes (aqueles casos


Limpe os em que a pessoa deixou de responder a uma ou
mais questões), é necessário avaliar se é preciso,
dados
conforme o escopo da pesquisa, excluir esses
dados. Além disso, é preciso eliminar respostas
que não correspondem ao escopo da pesquisa
(alguém que não faz parte do público-alvo, por
exemplo).

III. Faça tabelas de frequência:


Explore as • Absoluta: a quantidade de vezes que a mesma
tendências resposta é dada. Por exemplo, o número total de
dos dados pessoas do gênero feminino que responderam.
• Relativa (percentual): a quantidade de vezes
que a mesma resposta é dada em relação ao
número total de respostas. Por exemplo, 65
pessoas do gênero feminino representam qual
porcentagem de todo mundo que respondeu?

É importante ter em mente que analisar e vi-


sualizar variáveis numéricas (que são medidas
em valores numéricos que fazem sentido) é
diferente de analisar variáveis categóricas (cujos
valores são divididos em faixas e categorias e
expressos por palavras). No caso das variáveis
numéricas, frequentemente usar imagens para
ilustrar os dados é mais indicado do que usar
tabelas.

39 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
IV. Tabelas são estruturas usadas para organizar
dados. Ao passo que em uma tabela de frequên-
Faça
cia simples vemos informações sobre uma única
análises variável, que pode ser categórica ou numérica,
combinadas nas tabelas cruzadas estruturamos comparati-
vamente duas ou mais variáveis categóricas. Por
isso, essas tabelas têm dois sentidos de análise:
as colunas e as linhas.

Por meio das tabelas cruzadas (também conhe-


cidas como tabelas dinâmicas, pivô ou multidi-
20
Nas tabelas dinâmicas, mensionais20), podemos estruturar, resumir e
existe a possibilidade
de inserir valores
exibir uma grande quantidade de dados, avaliar
de uma variável a interação entre as variáveis e detalhar sua re-
numérica, ao invés
da contagem de lação em números absolutos, percentuais totais
observações em uma e percentuais por combinações de categorias. O
célula correspondente
a uma combinação de conteúdo dessas tabelas inclui:
variáveis. Por exemplo,
a partir da variável 2. Contagem da célula: número de observações
numérica “salário”, po-
demos calcular a média
para aquela combinação de categorias.
salarial de mulheres
negras (sendo “sexo” 3. Percentual da linha: percentual que cada
a primeira, e “raça”
a segunda variável
célula representa dentro de uma linha da tabela.
categórica analisada). Ele é calculado dividindo o número de observa-
ções daquela célula pelo total de observações
daquela linha.
4. Percentual da coluna: percentual que cada
célula representa dentro de uma coluna da
tabela. Ele é calculado dividindo o número de
observações daquela célula pelo total de obser-
vações daquela coluna.
5. Percentual do total: é a porcentagem que
cada célula representa em relação às observa-
ções totais inseridas na tabela. É calculada divi-
dindo as observações daquela célula pelo total
geral de observações da tabela.

40 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
V. Existem vários softwares para análise e
Programas visualização de dados quantitativos, como, por

estatísticos exemplo, Excel, SPSS, Stata e R, sendo os dois


primeiros os mais intuitivos. O Excel tem as fer-
ramentas necessárias para análises descritivas e
visualizações básicas. Por isso, sugerimos seu uso.
Também há softwares para análise de tex-
tos, como Atlas.ti e Nvivo. Para a visualização de
dados em texto, como a elaboração de nuvens de
palavras, por exemplo, é possível utilizar várias
ferramentas. O site https://www.wordclouds.com/
é uma ótima opção para gerar nuvens de palavras
online de maneira fácil e intuitiva.

41 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
sexta etapa
APRESENTANDO
OS RESULTADOS

42
Para além de analisar nossos dados e gerar tabelas, gráficos
e outras figuras que auxiliam a visualização e a compreensão dos
resultados, a forma como apresentamos as nossas descobertas
também merece atenção. Por isso, é importante estruturar nossos
relatórios de maneira estratégica, didática e atrativa, bem como
acessar outras fontes de evidência para nossas conclusões, pro-
postas e demandas.

I. Ordem de exposição dos assuntos

1. Contexto: é necessário contextualizar nossos interlocuto-


res a respeito da pesquisa e, principalmente, a respeito do
projeto/organização sobre o qual estamos falando. Para
ajudar a estruturar essa contextualização, lembre-se das
questões de autoconhecimento da primeira etapa deste
guia. Além disso, contextualizar o trabalho e a pesquisa
também requer que o território abarcado pelo projeto seja
detalhado. Aqui, é importante levantar informações que
descrevam esse território.

2. Perfil: depois do contexto, é recomendado traçar o perfil das


pessoas envolvidas na pesquisa: quem são essas pessoas?
Quais são suas principais características? Perguntas como
as que seguem são um bom direcionamento:
• Essas pessoas são de que gênero? Existe um desequilíbrio
quanto a essa característica?

• Elas se consideram como sendo de quais raças? Existe al-


guma raça que seja predominante?

• E quanto à faixa de idade, à renda, à escolaridade…? O que


sabemos sobre isso?

43 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
3. Impacto: finalmente, é o momento de apresentar os resul-
tados centrais da análise de impacto que foi desenvolvida
sobre seu projeto/sua organização. Para organizar seus
achados, separe as principais conclusões por temas (di-
mensões) e os costure de maneira coerente, sem deixá-los
soltos no relatório.

4. Demandas e proposições: seu relatório pode ser voltado


para diferentes públicos, como potenciais financiadores,
parceiros e ex-parceiros, poder público ou mesmo sua equi-
pe. Por isso, suas conclusões também vão variar conforme
o público que você tem em mente. Nesse sentido, você
pode retomar as descobertas que fez e propor caminhos
de atuação da sua organização, bem como novos projetos,
ou pode, por outro lado, apresentar demandas para ges-
tores públicos e outros atores que têm impacto no setor
cultural e artístico.

II. Materiais de apoio


Para auxiliar na apresentação dos seus achados, é interessante
buscar materiais de apoio que exemplifiquem os dados. Dessa
forma, conseguimos dar mais materialidade aos nossos achados
e deixamos o relatório mais intuitivo. Boas opções são:
• Vídeos e áudios com depoimentos de pessoas impactadas
(lembre-se de pedir a autorização de cada pessoa para pu-
blicar sua imagem e sua voz).

• Relatos recebidos por e-mail, mensagens em aplicativos ou


SMS ou mesmo escritas à mão.

• Imagens.

44 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
III. Como lidar com resultados negativos
Se houver resultados negativos (ou seja, se aquilo que você
imaginou previamente não foi amparado pelos dados), desafiado-
res ou contestadores, procure apresentá-los em conjunto com uma
proposta de enfrentamento ou solução. Resultados inesperados e
negativos fazem parte do cotidiano de pesquisas e não deixam de
enriquecer o debate e as alternativas de atividades futuras. Por
isso, não é preciso se preocupar ou focar apenas esses resultados.
O importante é procurar entender por que você obteve esses re-
sultados e como lidar com essa informação de maneira propositiva.

45 O VALOR DA CULTURA: RUMO A UMA NOVA NARRATIVA – GUIA DE APLICAÇÃO PARA PROJETOS CULTURAIS E CRIATIVOS
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