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ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS.

Rudinei Borba

Pesquisador Independente e
Autodidata

Fevereiro / 2013

RESUMO
O propósito do nosso trabalho é estudarmos o ritual fúnebre conhecido como
Arísùn no Batuque do Rio Grande do Sul, onde traçaremos um paralelo com a diáspora
tradicional yorùbá, demonstrando que nosso culto preservou, mesmo que
resumidamente, a ritualística não aculturada yorùbá. Através deste texto, talvez
possamos entender melhor os conceitos que envolvem a morte e o culto dos Éégún.

PALAVRAS CHAVES: Batuque, yorùbá, morte, arísùn, éégún, ìgbàlè, ìsinkú,


ancestrais, funeral, velório, sono.

ABSTRACT
The purpose of our work is to study the funeral ritual known as Arísùn Batuque
in Rio Grande do Sul, where outline a parallel with the traditional Yoruba diaspora,
demonstrating that our worship preserved, even if briefly, the Yoruba acculturated not
ritualistic. Through this text, perhaps we can better understand the concepts that involve
death and the cult of Éégún.

KEYWORD: Batuque, yorùbá, death, arísùn, éégún, ìgbàlè, ìsinkú, ancestors, funeral,
wake, sleep.
ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

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ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

SUMÁRIO

1. Introdução.................................
Introdução........................................................
..............................................
..............................................
.................................5
..........5

2. A Importância do Culto Éégún..............................................


.....................................................................
..................................6
...........6

3. A Morte.............................................
Morte....................................................................
..............................................
..............................................
.......................10
10

4. O Ìsinkú (o Funeral).......................................
Funeral)..............................................................
..............................................
.................................15
..........15

4.1. A Exposição do Corpo Morto...........................................


Morto..................................................................
.....................................16
..............16
4.2. O Preparo do Caixão........................................
Caixão...............................................................
...............................................
...............................18
.......18
4.3. O Velório...........................................
Velório..................................................................
..............................................
..............................................
.......................20
20
4.4. O Cortejo Fúnebre..................................
Fúnebre.........................................................
..............................................
.........................................21
..................21
4.5. O Sepultamento...............................
Sepultamento......................................................
..............................................
..............................................
.........................22
..22

5. O Arísùn.............................................
....................................................................
..............................................
.............................................2
......................233

5.1. O Sacrifício dos Animais na Noite do Sexto Dia........................................


Dia..................................................25
..........25
5.2. A Mesa do Café: A primeira ou a última refeição com o morto?..........................26

6. O Ìgbalè.................................................
........................................................................
..............................................
..........................................27
...................27

7. Considerações
Considerações Finais........................................
Finais................................................................
...............................................
..............................29
.......29

8. Referências Bibliográficas.................................
Bibliográficas........................................................
..............................................
.............................30
......30
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SUMÁRIO DE IMAGENS

Imagem 1.........................................................................................................................33
Cortejo Fúnebre yorùbá (1) realizado na Rep. Pop. do Benin
Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto

Imagem 2.........................................................................................................................33
Cortejo Fúnebre yorùbá (2) realizado na Rep. Pop. do Benin
Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto

Imagem 3.........................................................................................................................34
Mulheres (Ìsokún) despedindo-se do morto na Rep. Pop. do Benin
Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto

Imagem 4.........................................................................................................................34
Bebida servida aos convidados do funeral na Rep. Pop. do Benin
Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto

Imagem 5.........................................................................................................................35
Um descendente tendo contado com Éégún na Nigéria
Foto sem informação

Imagem 6.........................................................................................................................35
Integrantes da aldeia levando tecidos novos para que fosse ofertado ao morto no
momento do preparo de seu funeral.
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INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é estudarmos o nosso ritual fúnebre conhecido por


Arísùn1 no Batuque do Rio Grande do Sul, buscando explicações filosóficas e culturais
na religião tradicional yorùbá2, onde poderemos ter um entendimento mais amplo dos
nossos rituais, observarmos o quanto o nosso culto conseguiu preservar algumas
particularidades em relação ao praticado pela diáspora africana não aculturada.
Não adentraremos no vasto conteúdo ritualístico do nosso Batuque, como
número e cor de velas, cor das aves e da pelagem dos animais a serem sacrificados, de
como sacralizar um ìgbàlè3, como montar sacos do carrego, etc. Entendemos que este
assunto já foi discutido por outros autores afro-gaúchos.
Focalizaremos nosso trabalho no entendimento da importância do culto ancestral
no Batuque, tentando desmistificar o sentimento de medo do culto Éégún4 e
registrarmos o quanto preservamos sua ritualística. O trabalho se dividirá em cinco
partes, como segue:
A Importância do Culto Éégún;
A Morte;
O Ìsinkú (funeral);
O Arísùn;
O Ìgbalè.

1. Podendo ser traduzido como “Aquele que viu o sono” (a tradução é nossa), assunto que será
amplamente estudado no decorrer do nosso trabalho.
2. Os Iorubás (em iorubá: Yorùbá) são um dos maiores grupo étno-linguístico ou grupo étnico na África
Ocidental, composto por 30 milhões de pessoas em toda a região. Constituem o segundo maior grupo
étnico na Nigéria, com aproximadamente 21% da sua população total.
3. Casa dos mortos, Ilé-Éégun podendo ser traduzido como “terra dos ancestrais” (a tradução é nossa)
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A IMPORTÂNCIA DO CULTO ÉÉGÚN

Cultuar Éégún é a forma de manter viva nossa ancestralidade, pois sem a


presença desta não seríamos nada, não teríamos vivido e com certeza não estaríamos
escrevendo este texto. Acreditamos que existe a necessidade de colocarmos a
ancestralidade numa posição mais viva e presente, em um patamar digno, sem falsos
dogmas ou misticismos, para que a mesma deixe de ser temida, ou até mesmo deixar de
ser confundida e ou vinculadas a um Iwin5 ou até mesmo um Ajogun6.
Cultuar Éégún é o mesmo que cultuar o espírito de nossos mortos (ancestrais),
estes reverenciados em conjunto ou de forma individualizada no ìgbàlè. Ser
reverenciado como Éégún não é simples, pois o iniciado no culto de Òrìsà deve ter
passado por princípios de condutas exemplares no àiyé7, vivendo dentro dos princípios
básicos de honestidade, moral, ética e um caráter digno de ser louvável até mesmo após
a morte.
Abímbólá8 (1971, p. 03-04) descreve muito bem importância do culto Éégún
dentro do âmbito familiar e religioso, como segue:

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5. Espírito perturbador ou escurecido. Também conhecido como ser imaginário de forma humana.
6. São os Ajogun: Òfò – Prejuízos, Ègbà – Paralisia, Èjò – Problemas, Èpè – Maldição, Èwòn – Prisão,
Èse – qualquer outro malefício que possa afetar os seres humanos, entre outras energias maléficas.
7. Espaço visível que habitamos e que coexiste paralelamente com o espaço abstrato (òrun).
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Ao ler esta parte, percebemos que o Batuque também mantém vivo e presente a
forma de expor o corpo do morto, que é vestido com sua melhor vestimenta ritual, onde
os adeptos prestam suas últimas homenagens. Seguindo relato de padre Toninho, o
mesmo informa:

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Através do relato, entendemos que o culto do Batuque está muito próximo ao


tradicional africano não aculturado, onde os rituais fúnebres dos sacerdotes com nível
elevado são muito semelhantes entre ambas às culturas.
Segundo trabalho realizado pela Universidade da Geórgia 26, mostra à
importância da cerimônia fúnebre dos yorùbá, como segue:

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26. Disponível INTERNET, ver in: http://www.africa.uga.edu/Yoruba/unit_18/cultureunit.html


Importance of ceremonies in Yoruba Culture (Illustrations of Yoruba Ceremonies: Naming;
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Ao ler o texto percebemos que o Batuque Afro-Sul preservou essa mesma forma
de prática no culto, onde efetua os rituais fúnebres apenas de pessoas que atingiram
idade avançada e que merecerão serem lembradas após seu final de vida.
O texto ainda registra que a morte prematura é considerada trágica entre ambas
as culturas, onde nos faz entender que nem todos os espíritos poderão se tornar Éégún.

O Preparo do Caixão

No Batuque o caixão pode ser preparado no templo religioso, vestindo o defunto


com suas roupas religiosas, mas na maioria dos casos não são efetuados banhos
ritualísticos antes de por o morto no caixão, diferenciando nessa parte do costume
tradicional yorùbá.
Corroborando nosso estudo, Elenito de Souza 27, (2006, p. 59) registrou que: “só
são efetuados os rituais funerários completos se o iniciado possuir nível elevado dentro
do culto, caso contrário os rituais terminam no momento da preparação do caixão”.
Através da fala do autor, entendemos que não é realizado cortejo fúnebre nem
homenagens, caso à pessoa não tenha um nível elevado dentro da nossa sociedade
religiosa.

27. Hélio Elenito de Souza é conhecido no meio religioso do Batuque como “Pai Hélio de Xangô”,
Èsù Bí-omi
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Segundo Omotobàtálá (2003, p. 20) nos informa sobre os costumes yorùbá Nàgó
da preparação do corpo do morto, para posteriormente ser velado:

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nossa).

Através da fala de Omotobàtálá, percebemos que palavra Arísùn é traduzida


como Arésùn. Não é nossa intenção dizer qual a forma certa da tradução da palavra,
onde preferimos utilizar a nossa interpretação.
O autor informa que há um momento para se chorar no culto, onde pensamos
que seja feito uma consulta oracular para ver que tipo de morte a pessoa teve, como
vimos anteriormente. Entendemos que caso for uma morte natural seria dado um tipo de
cerimônia, a com honras, diferente de uma morte trágica, onde seria motivo de grande
tristeza e choros.
Essa mesma importância ritual de preparar o corpo do morto e dar o devido tipo
de enterro foi registrada por Babayemi (1980 p. 49), onde diz:

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Segundo a fala de Laura Fortes 30, podemos ver o quanto é importante dar um
funeral adequado para nossos ancestrais, pois os mesmos poderão não responder a nosso
favor do òrun. Somos em partes, responsáveis pelo caminho que um ancestral deve
tomar após sua morte, portanto devemos nós do Batuque sempre ter em mente o quanto
isso é importante e necessário.

O ARÍSÙN

No Batuque a expressão Arísùn é usada para informar o dia em que serão


efetuados os rituais fúnebres, estes que geralmente tem seu início no sexto dia após a
morte do adepto religioso. Neste devemos ter adquiridos todos os animais, comidas e
apetrechos pertinentes para dar início a ritualística.
Entendemos que a expressão Arísùn faz alusão a aquelas pessoas que
participaram da primeira etapa do culto, ou seja, a parte do velório e do sepultamento,
que posteriormente poderão ser chamadas de “Aquele que viu previamente o sono”,
onde o espírito não morre e sim descansa (dorme), como vimos anteriormente.
Acreditamos que o Éégún só será homenageado após sabermos se o mesmo
alcançou seu status de ancestral, como vimos no caso do saudoso Verger apresentado
por nós. Caso seja positiva a resposta oracular, pensamos que o Éégún será acordado
neste sétimo dia, mencionado também por Omotobàtálá (2003, pg. 23) quando utiliza a
expressão: “fifa Éégún okú wàlé (trazemos o Éégún do morto a casa)”
A expressão apresentada pelo autor dá o entendimento de trazermos o espírito do
morto de volta a casa, caso esse venha a ser instalado no ìgbàlè para ser homenageado
ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

por seus descendentes, bem como, para poder continuar agindo como intermediário
entre os adeptos do culto.
Pensamos que nesse instante o Éégún passa a ser um protetor de sua família
instalado no ìgbàlè, mas entendemos que o mesmo também poderá ajudar seus
descendentes mesmo que não instalado “individualmente”, onde passará a ser cultuado
na forma ancestral coletiva, desde que tenha merecimento é claro.
Thompson Drewel (1992, p. 41) menciona que o ritual é dividido em “sete”
partes, ou seja, em sete dias para ter êxito no envio do espírito do falecido ao òrun, pois
acredita também que o espírito não desaparece com a morte.
Drewel diz que o funeral marca o fim e o começo de uma nova
vida, denominando o primeiro dia como “Ojo Ìsinkú” sendo o mais importante e
também o primeiro dia do ritual funerário. Classifica o terceiro dia de “Itaokú”, estando
reservado para a festa e celebração. O quarto dia, “Irenokú”, é o dia do jogo adivinha
tório e ao sétimo dia, o “Ijekú”, marca o fim da celebração ritual, que na qual
chamamos no Batuque de Arísùn.
O autor na mesma página, explica melhor a ritualística empregada nesses dias,
como segue:

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ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

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+@  (a tradução é nossa).

Através do texto do autor, pensamos que o Batuque conseguiu preservar os


rituais ao longo dos tempos, onde ambos envolvem sete dias para serem realizados os
preceitos. Chama-nos a atenção que Drewel também menciona o sétimo dia como sendo
o dia em que poderemos saber se o morto alcançou seu status de ancestral ou não,
igualmente como vimos anteriormente.

O Sacrifício dos Animais na Noite do Sexto Dia

Na noite do sexto para o sétimo dia no Batuque, são realizados os sacrifícios no


ìgbàlè para homenagear o ancestral, caso esse tenha merecimento. Nesta noite os
ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

IMAGENS

Imagem 1- Cortejo Fúnebre yorùbá (1) realizado na Rep. Pop. do Benin


Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto

Imagem 2- Cortejo Fúnebre yorùbá (2) realizado na Rep. Pop. do Benin


Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto
ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

Imagem 3- Mulheres (Ìsokún) despedindo-se do morto na Rep. Pop. do Benin


Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto

Imagem 4- Bebida servida aos convidados do funeral na Rep. Pop. do Benin


Foto tirada pela fotógrafa Veera Lehto
ARÍSÙN - O Ritual Fúnebre no Batuque do RS – Rudinei Borba

Imagem 5- Um descendente tendo contado com Éégún na Nigéria


Foto sem informação

Imagem 6- Integrantes da aldeia levando tecidos novos para que fosse ofertado ao morto
no momento do preparo de seu funeral.
Foto tirada por Padre Toninho e divulgada no site informado no nosso texto.

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