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Religiões Afro-Brasileiras do Rio Grande

do Sul: Passado e Presente*

Ari Oro

Resumo

O texto divide-se em duas partes. A primeira apresenta dados sobre


o período escravocrata no Rio Grande do Sul, a estruturação das
religiões afro-brasileiras (Batuque, Umbanda e Linha Cruzada) neste
estado e o histórico e controvertido papel desempenhado no Rio
Grande do Sul por um príncipe africano que aqui viveu do final do
século XIX até 1935. A segunda parte analisa três aspectos
particularmente importantes na atualidade dessas religiões neste
estado: a presença de não-negros nas mesmas, a sua expansão
transnacional para a Argentina e o Uruguai, e o estreitamento de
relações com o poder político local..

Palavras-chave: Batuque, negro, relações raciais, Rio Grande do


Sul, Brasil, religiões afro-brasileiras.

Abstract

Afro-Brazilian Religions in Rio Grande do Sul: Present and Past

The article is divided into two parts. The first presents data about the
slavery period in Rio Grande do Sul, the structure of Afro-Brazilian
religions (Batuque, Umbanda and Linha Cruzada) in this state and the
historical and controversial role played by an African prince who lived
here from the late 19th century until 1935. The second part analyses
three particularly important aspects of these religions in Rio Grande
do Sul nowadays: the presence of non-Negroes in them, its
transnational expansion to Argentina and Uruguay, and the ever-
close relations with local political power.

Keywords: Batuque, Negro, racial relations, Rio Grande do Sul,


Brazil, Afro-Brazilian religions.
Résumé

Les Religions Afro-Brésiliennes de l'État du Rio Grande do Sul: d'Hier


et d'Aujourd'hui

Le texte se divise en deux parties. La première présente des données


sur la période de l'esclavage dans le Rio Grande do Sul, la
structuration des religions afro-brésiliennes (Batuque, Umbanda et
Linha Cruzada) dans cet état ainsi que le rôle historique et
controversé qui y a joué un prince africain de la fin de XIXème siècle
jusqu'à 1935. Dans la seconde partie, nous analysons trois aspects
particulièrement importants pour l'actualisation des ces religions dans
cet état: la présence de non-Noirs à ces religions, leur expansion
transnationale vers l'Argentine et l'Uruguay, ainsi que leur relation
étroite avec le pouvoir local.

Mots-clés: Batuque, Noir, relations raciales, Rio Grande do Sul,


Brésil, religions afro-brésiliennes.

Neste texto apresento alguns tópicos relativos às religiões afro-


brasileiras do Rio Grande do Sul (RS) que contemplam ao mesmo
tempo uma visão histórica e atual, com ênfase nas suas
características que mais se destacam na atualidade.

Inicio com dados historiográficos sobre o ingresso do negro escravo


no RS e sobre a estruturação do Batuque. Discorro então sobre os
distintos "lados" desta religião ao mesmo tempo em que aponto
alguns aspectos históricos e especificidades da Umbanda e da Linha
Cruzada neste estado. Em seguida, me atenho a um personagem
legendário do campo afro-gaúcho, um príncipe africano que residiu
neste estado a partir de 1899 e aqui faleceu em 1935. Na seqüência,
discorro sobre três importantes características atuais do campo
religioso afro-gaúcho, a saber: a presença de "brancos" nas religiões
de matriz africana; a transnacionalização do batuque e demais
religiões afro-brasileiras para os países do Prata; e a aproximação
dessas religiões no campo político estadual e municipal, sem, porém,
ocorrer o ingresso efetivo na esfera política, como fazem, por
exemplo, os evangélicos.

Os Negros e as Religiões Afro-Brasileiras no Rio Grande


do Sul
Os negros africanos e seus descendentes participaram diretamente
do desenvolvimento econômico dos dois primeiros séculos da história
do Rio Grande do Sul. Segundo Beatriz Loner, "praticamente não
houve profissão manual que não tivesse representantes dessa etnia
em seu desempenho, tanto no período imperial quanto na República"
(Loner, 1999:9). O mesmo, como se sabe, ocorreu nas demais
capitanias e províncias do Brasil onde, como diz Prandi, os escravos
africanos "foram sendo introduzidos [...] num fluxo que corresponde
ponto por ponto à própria história da economia brasileira" (Prandi,
2000:52).1

O marco inaugurador do Rio Grande do Sul é a fundação do Forte de


Jesus, Maria e José, na Barra de Rio Grande, no ano de 1737, pelo
brigadeiro José da Silva Paes, em cuja tropa, formada por 260
homens, havia escravos e negros libertos.

A historiografia do Rio Grande do Sul ainda se debate em torno da


questão de saber a procedência do negro escravo trazido para este
estado. Há, no entanto, algum consenso de que essa população se
dividia entre negros "crioulos", ou seja, indivíduos nascidos no Brasil
e para aqui transferidos, "ladinos", isto é, indivíduos que já haviam
trabalhado em outras regiões do país, e africanos, aqui chegados
após terem passado por algumas regiões brasileiras, entre elas,
Bahia, Pernambuco, São Paulo, Santa Catarina, e mesmo africanos
que chegaram ao Rio Grande do Sul provenientes da Argentina e do
Uruguai. A título de exemplo, um levantamento realizado junto aos
Inventários da Freguesia de Pelotas, no período compreendido entre
1850 e 1880, mostrou que num universo de 1.604 escravos, 460
eram crioulos, 556 indeterminados e 590 africanos (Assumpção,
1990). Estes últimos, por sua vez, dividiam-se em
diferentes nações ou grupos tribais. Por exemplo, por ocasião das
comemorações da Abolição, desfilaram em Pelotas os "Filhos de
Angola, Mina, Benguela, Erubé, Congo e Cabinda..." (Jornal Echo do
Sul, 10/6/1888 apud Loner, 1999:8).2 Seja como for, no Rio Grande
do Sul "os banto vieram em número muito superior aos sudaneses"
(Correa, 1998a:66).

A introdução do escravo no RS ocorreu a partir da primeira metade


do século XVIII. Trabalhavam na agricultura, nas estâncias e,
sobretudo a partir de 1780, na produção do charque, na região de
Pelotas. Segundo Correa, os negros compunham cerca de 30% da
população da Província em 1780, e 40% do total em 1814. Nesta
data, os negros perfazem cerca de 51% da população de Piratini e
60% de Pelotas (ibidem:65-66). Porém, com o início da chegada dos
colonos alemães em 1824 e dos italianos em 1875, verifica-se um
aumento da população branca e uma redução na porcentagem da
população negra em território gaúcho.
A produção das charqueadas — executadas pelo trabalho braçal
escravo em condições bastante desfavoráveis em razão das condições
climáticas, precariedade de infra-estrutura e exigências severas
ditadas pelo próprio regime escravocrata — foi de tal monta que em
1861 o charque contribuía com 37,7% do total do que o RS exportava
e os couros com 37,2% do total, juntos somando 74,9% do total da
produção gaúcha para fora da Província (Assumpção, 1990). A
relação entre o trabalho forçado dos negros e o desenvolvimento das
charqueadas era tal que na medida em que se aproximava a Abolição
também diminuiu o número de charqueadas. Assim, referindo-se a
Pelotas, Loner lembra que "de um total de 34 charqueadas existentes
em 1878 na cidade, elas reduziram-se a apenas 21 às vésperas da
Abolição e a 18, dois anos depois" (Loner, 2001:7), ocasionando a
diminuição do charque que servia de alimento dos escravos do
sudeste e desta forma acarretando problemas no mercado de
consumo deste produto.

A estruturação do batuque no Rio Grande do Sul constitui outro tema


que aguarda um aprofundamento investigativo. Tudo indica que os
primeiros terreiros foram fundados justamente na região de Rio
Grande e Pelotas. Para o historiador Marco Antônio Lirio de Mello —
que fez uma ampla pesquisa nos jornais de Pelotas e Rio Grande do
século XIX — a presença do batuque é atestada nesta região desde o
início do século XIX (Mello, 1995). Também Correa situa o período
inicial do batuque nesta região entre os anos de 1833 e 1859
(Correa, 1988a:69). Se assim for, permanece a dúvida de se saber se
a estruturação do batuque ocorreu posteriormente ou paralelamente
à estruturação do candomblé, uma vez que o primeiro terreiro de
candomblé teria surgido na Bahia no ano de 1830 (Jensen, 2001:2).
Aliás, a mesma dúvida M. Herskovits havia levantado em 1942, por
ocasião de uma "rápida viagem" pelo Rio Grande do Sul (Herskovits,
1948).3

No entanto, a partir das décadas de 70 e 80 do mesmo século, os


jornais dessa região apresentam, com alguma regularidade, em suas
páginas policiais, matérias sobre cultos de matriz africana. De fato,
nos jornais Correio Mercantil e Jornal do Comércio, de Pelotas, bem
como no jornal Gazeta Mercantil de Rio Grande, pode-se ler notícias,
infelizmente as mais recorrentes sendo de prisão de "feiticeiros" e
"feiticeiras", como esta:

Foram presas à ordem da delegacia, duas pretas feiticeiras que atraíam grande
ajuntamento de seus adeptos. Na ocasião de serem presas, encontrou-se-lhes um
santo e uma vela, instrumento de seus trabalhos [...]". (Jornal do Comércio,
Pelotas, 9/4/1878, p. 2 apud Mello, 1995:26)

Quanto ao mito fundador do batuque, há duas versões correntes:


uma que afirma ter sido o mesmo trazido para esta região por uma
escrava, vinda diretamente de Recife; e outra que não associa a um
personagem, mas às etnias africanas que o estruturaram enquanto
espaço de resistência simbólica à escravidão.

Já as notícias relativas ao batuque em Porto Alegre4 datam,


preferencialmente, da segunda metade do século XIX, isto sugerindo
que ou sua origem, ou, o que é mais provável, o seu incremento
pode ter ocorrido com a migração de escravos e ex-escravos da
região de Pelotas e Rio Grande para a capital. Novamente, as
principais fontes de referência são os jornais que reportam ações
policiais contra os terreiros. Lilian Schwarcz transcreve, por exemplo,
reportagem do Correio Paulistano, de 30/11/1879, intitulada "Os
feiticeiros do RS — Grande Caçada". Diz a reportagem:

a polícia tomou ontem em uma casa 42 pretos livres e escravos e 11 pretos minas.
A caçada deu-se às 10h30 da noite no momento em que o preto João celebrava
uma sessão de feitiçaria. Foi uma surpresa e um desapontamento que aqueles fiéis
crentes jamais perdoarão a polícia [...]. A polícia apreendeu cabeças de galo e
outros manipansos. Os principais atores da indecente comédia foram recolhidos à
cadeia e os escravos castigados. (Schwarcz, 1989:126, ênfases minhas)

Inútil dizer que as perseguições aos terreiros não deixam de


expressar um certo medo branco diante do poder de manipulação das
forças sobrenaturais por parte dos escravos e seus descendentes.
Obviamente que a perseguição era sempre precedida de um conjunto
de estigmas lançados sobre essas religiões, visando justificar aquele
procedimento.

Em Porto Alegre, a partir da segunda metade do século XIX, o maior


contingente de negros se encontrava nas cercanias da cidade, no
Areal da Baronesa, na cidade baixa, imediações da atual Rua Lima
e Silva,5 e nas chamadas Colônia Africana e "Bacia", atuais bairros
Bonfim, Mont Serrat e Rio Branco.6 Estas últimas tratavam-se, em
sua origem ("em torno da época da abolição"), de uma "zona
insalubre, localizada nas bordas de chácaras e propriedades que ali
existiam, de baixa valorização e de pouco interesse imediato para
seus donos, que foi sendo ocupada por escravos recém-emancipados"
(Kersting, 1998:111).7

Kersting mostra como, sobre essas áreas, foram criadas


representações que as associavam a criminalidade, vícios, perigo, e
seus habitantes tidos como membros de "classes perigosas". Por isto
mesmo, essas áreas foram deixadas a um relativo isolamento por
parte das autoridades públicas e, ao longo das décadas do século
passado, foram dissolvidas mediante um processo de "higienização
urbana".8 Evidentemente que por trás desta atitude existiam
interesses imobiliários de ocupação dessas áreas da cidade para
"modernizá-las", o que começou a ocorrer ainda nas primeiras
décadas do século XX, com o processo de branqueamento da
população, simultaneamente à abertura de ruas e de construções em
padrões arquitetônicos não populares. Por exemplo, parte da Colônia
Africana começa a receber iluminação elétrica em 1911, algumas ruas
são asfaltadas em 1912 e neste momento prevê-se também a
construção de uma rede de esgotos. Reitero que esse processo de
urbanização consiste fundamentalmente na descaracterização como
área essencialmente negra "até se transformar em
bairro saneado que se vê em 1922" (ibidem:195). Este autor informa
que a maioria dos não-negros que fixam residência na ex-Colônia
Africana são judeus, enquanto os negros são expulsos para áreas
mais periféricas e ainda desabitadas, como o bairro Mont Serrat,
destino primeiro dos exilados da Colônia Africana e onde algumas
famílias conseguiram estabelecer moradia até os dias de hoje.9

Simultaneamente a esse processo de modernização, justamente em


1912 a Colônia Africana passa a ser um bairro chamado Rio Branco.
Embora seja uma homenagem ao Barão do Rio Branco, não deixa de
ser irônico que um território anteriormente denominado Colônia
Africana, em razão da presença maciça de negros, seja chamado de
Rio Branco, caracterizando o predomínio de não-negros nesta área.

Há relatos da prática de cultos afro-brasileiros em todos os territórios


negros referidos. Relativamente à Colônia Africana, por exemplo, o
primeiro sacerdote da igreja de Nossa Senhora da Piedade, concluída
e inaugurada nesta área em 1913, cônego Matias Wagner, "aponta
para a presença desses cultos e para o fraco número de católicos
realmente fiéis" (ibidem:184). Assim, em seu livro "Paróquia de N. S.
da Piedade de Porto Alegre:1916-1958", o referido cônego escreve:
"Encontrei certa vez um homem que, dizendo-se muito católico,
apostólico e romano, era também dono e Pai Santo de uma casa de
batuque..." (apud Kersting, idem:186). O mesmo cônego refere
também que foi alvo de despachos de "parte daquela gente de
Umbanda". Aliás, o pároco se refere às religiões afro-brasileiras pelos
nomes de batuque, umbanda e espiritismo e, mais genericamente,
pelos termos etnocêntricos e preconceituosos de crendices,
superstições e feitiçarias.

No contexto das lacunas históricas sobre as religiões afro-brasileiras


no Rio Grande do Sul figuram também dados estatísticos sobre os
terreiros deste estado. Dispomos unicamente de informações parciais
sobre o número de terreiros de batuque para Porto Alegre, durante
20 anos, de 1937 a 1952, apresentados por Carlos Krebs (1988:16).

Tais dados constam das estatísticas oficiais do Rio Grande do Sul,


tendo o censo sobre a religião sido abandonado em 1952. Malgrado
sua precariedade, pode-se perceber um crescimento quase que anual
do número de terreiros em Porto Alegre, fato este que continua,
segundo dirigentes de federações, até os dias de hoje, onde existem,
no seu conjunto, cerca de dois mil terreiros na capital gaúcha.

O Batuque

Batuque é um termo genérico aplicado aos ritmos produzidos à base


da percussão por freqüentadores de cultos cujos elementos
mitológicos, axiológicos, lingüísticos e ritualísticos são de origem
africana. O batuque é uma religião que cultua doze orixás10 e divide-
se em "lados" ou "nações", tendo sido, historicamente, as mais
importantes as seguintes: Oyó, tida como a mais antiga do estado,
mas tendo hoje aqui poucos representantes e divulgadores; Jeje, cujo
maior divulgador no Rio Grande do Sul foi o Príncipe Custódio, sobre
o qual falaremos mais abaixo; Ijexá, Cabinda e Nagô, são outras
nações de destaque neste estado. Nota-se que o Keto esteve
historicamente ausente no RS, vindo somente nos últimos anos a se
integrar por meio do candomblé.

Vejamos alguns dados disponíveis sobre as mencionadas nações


neste estado:
OYÓ. Segundo a tradição local, esta nação chegou a Porto Alegre
vindo da cidade de Rio Grande. Foi cultuada no Areal da Baronesa e
dali no Mont Serrat onde se situaram as principais casas deste culto.

M. Herskovits e R. Bastide, por ocasião de suas estadas em Porto


Alegre, o primeiro em julho de 1942 e o segundo em 1944, referem-
se carinhosamente à Mãe Andrezza Ferreira da Silva, da nação Oyó
que, segundo Bastide, "formara-se com um velho babalorixá que
ainda tinha à sua volta alguns africanos nativos" (Bastide, 1959:238).
Segundo Carlos Krebs, Mãe Andrezza teria vivido de 1882 a 1951
(Krebs, 1988).

Hoje, como disse acima, trata-se de um culto praticamente em


extinção, restando algumas poucas casas no estado. Segundo
Pernambuco Nogueira,

[...] o último nome da antiguidade da nação Oyó que conhecemos foi Tim do
Ogum, já falecido, e que foi o iniciador da Delsa do Ogum, casa ainda em atividade.
Além deste vamos encontrar o Antoninho da Oxum e sua filha-de-santo a Moça da
Oxum (Lídia Gonçalves da Rocha), como nomes de projeção. Distinguiu-se entre os
praticantes do Oyó a figura de Fábio da Oxum quer pela beleza e suavidade do
orixá que recebia, quer pelo fato de ter sido um dos raros pais-de-santo que não
vivia da Religião (Nogueira, 2001b).

As especificidades da nação Oyó residiam, sobretudo, na ordem das


rezas, uma vez que chamavam primeiro os orixás masculinos e a
seguir os femininos, encerrando-se com as de Yansã (Oiá), Xangô e
finalmente Oxalá, o destaque para os dois orixás resultando do fato
de serem o Rei e a Rainha de Oyó. Também era próprio da nação Oyó
os orixás conduzirem em suas bocas, ao término das obrigações, as
cabeças dos animais oferecidos em sacrifício já em estado de
decomposição; finalmente, segundo os mais antigos, no Oyó os
ocutás eram enterrados, em vez de colocados em prateleiras
(ibidem).

IJEXÁ. Trata-se da nação predominante hoje no estado. Os deuses


invocados são os orixás e a língua ritualística é o iorubá. Renomados
babalorixás históricos (já falecidos) como Manoelzinho do Xapanã e
Tati do Bará, ambos iniciados na Cabinda, passaram mais tarde para
o Jeje e seus descendentes ingressaram todos no Ijexá, dizendo-se
então Jeje-Ijexá.

Segundo um depoimento colhido por Norton Correa junto ao já


falecido tamboreiro Donga de Yemanjá, o Ijexá predominava nas
regiões negras de Porto Alegre como o Mont Serrat e Colônia Africana
(Correa, 1998a:76).

JEJE. No dizer de Pernambuco Nogueira,


[...] foi, durante muito tempo, a Nação que predominou no Rio Grande do Sul, em
que pese o fato de jamais termos ouvido falar em voduns a exemplo dos cultuados
em São Luis do Maranhão. Sempre ouvimos dos que se diziam jeje puros falar e
invocar os orixás nagô. Dada a complexidade dos seus toques, a morosidade dos
mesmos e a dificuldade na preparação dos tamboreiros que, inclusive, deviam usar
os oguidavis, de difícil manejo, foram adotando as rezas do Ijexá [...]" (idem).

As figuras mais importantes desta nação foram Paulino do Oxalá


Efan, que reiniciou no Jeje o Manoelzinho do Xapanã e Tati do Bará,
oriundos da Cabinda, como disse acima. Um dos filhos de Paulino foi
João Correia de Lima, Joãozinho do Bará Agelú, morador do Mont
Serrat, talvez o primeiro e um dos mais importantes babalorixás que
"exportou" o batuque para além das fronteiras do Rio Grande do Sul
em direção aos países do Prata, como veremos abaixo. Outro
importante babalorixá desta nação foi Idalino do Ogum, que faleceu
com a idade de 104 anos. Enfim, outro personagem, este mitológico,
da nação Jeje foi o famoso Príncipe Custódio de Almeida, sobre o qual
falaremos a seguir.

Vale aqui registrar que a origem do termo "jeje" é bastante


problemática. Lorand Matory, por exemplo, sintetiza uma série de
autores que tentam esclarecer o "mistério" em torno deste conceito e
propõe a hipótese de que se trata de uma construção transatlântica,
ou seja, um nome aplicado pelos comerciantes e donos de escravos
— alguns retornados, em suas idas e vindas entre Brasil, Cuba e
Golfo da Guiné — "a todos os africanos que eles consideraram seus
parentes, apesar de ser pouco provável que esses ‘parentes’ assim se
identificassem inicialmente" (Matory, 1999:64).

CABINDA. Trata-se de uma nação Banto, originalmente de fala


Kimbundo. O cemitério é o início da nação religiosa de Cabinda, diz
um pai-de-santo e estudioso do batuque. Segundo ele,

[...] o culto aos Eguns nesta Nação é tão forte que dificilmente se encontrará uma
casa-de-religião sem que tenha o devido assentamento de Balé (culto aos
egunguns), ou Igbalé (casa dos mortos). (Ferreira, 1994:59)

Já para o babalorixá Pernambuco Nogueira, nos rituais de Cabinda


que freqüentou no Rio Grande do Sul "jamais ouvimos falar de
Inkices. O que sempre foi cultuado foi o Orixá iorubano" (Nogueira,
2001b).

Segundo consta, este culto foi trazido para o Rio Grande do Sul por
um africano conhecido por Gululu, de cujas mãos saiu a figura mais
marcante do culto Cabinda no Rio Grande do Sul: Waldemar Antônio
dos Santos, do Xangô Kamucá. Dele descenderam as famosas Mãe
Maria Madalena Aurélio da Silva, de Oxum Epandá Demun, que
iniciou Romário Almeida, do Oxalá, e Henrique Cassemiro Rocha
Fraga, de Oxum Epandá Bomi, todos falecidos, e Mãe Palmira Torres
dos Santos, de Exum Epandá Olobomi, que iniciou João Cleon Melo
Fonseca, do Oxalá, que é tido hoje como o mais importante herdeiro
da tradição Cabinda do estado, embora, como diz Pernambuco
Nogueira, "de sua origem mantém apenas o rótulo: o conteúdo é
todo ele Ijexá" (ibidem).

NAGÔ. No dizer de Pernambuco Nogueira, [...] é uma nação que,


tendo sido a origem do Culto no Rio Grande do Sul, hoje está
praticamente extinta, restando pouquíssimas casas" (idem). Há, em
Porto Alegre, o terreiro Nova Era, do pai Jader, que pretende ser a
continuação dessa tradição longínqua no estado. Diferentemente dos
demais terreiros, neste, "a chegada dos orixás se faz como no
Candomblé (linha por linha, trabalhando e desincorporando) e a
matança é procedida com o animal no chão e não suspenso" (idem).

Ainda segundo Pernambuco Nogueira, "talvez situa-se nesta casa a


semente do culto africano plantada pelos escravos das charqueadas,
desde a sua origem em Rio Grande..." (idem).

Ao que consta, não dispomos de informações numéricas sobre a


incidência dessas nações no Rio Grande do Sul. O historiador Dante
de Laytano, em pesquisa realizada sobre o batuque em Porto Alegre,
em 1951, observou que as 71 casas por ele encontradas dividiam-se
em 24 de nação Nagô, 21 Jeje, 13 Oyó, 8 Ijexá e 5 "mistos"
(Laytano, s.d.:53). Na atualidade, porém, predomina no batuque do
Rio Grande do Sul o lado Ijexá, "quer pela facilidade do toque como
pela ausência de tamboreiros iniciados nos demais Cultos" (Nogueira,
2001b). Embora haja terreiros que se digam seguidores de
outros lados, trata-se, segundo o babalorixá Adalberto Pernambuco
Nogueira, "apenas de rótulos utilizados talvez para marcar a origem
dos fundamentos" (idem).11

A Umbanda

A primeira casa de umbanda no Rio Grande do Sul foi também


fundada na cidade de Rio Grande, em 1926. Chamava-se "Reino de
São Jorge" e foi fundada pelo ferroviário Otacílio Charão.

Como em todo o Brasil, também no Rio Grande do Sul a umbanda


surgiu defendendo padrões e comportamentos aceitos socialmente.
No entanto, não escapou à repressão policial, a tal ponto, informa M.
Caldas — um dos maiores intelectuais da umbanda e do espiritismo
no Rio Grande do Sul, hoje falecido — que nos primeiros tempos o
centro de Charão não possuía um endereço fixo, funcionando de
forma itinerante (seu endereço mudava toda semana). Também o
próprio espiritismo e o batuque se opuseram à umbanda nascente, o
primeiro desqualificando suas práticas mediúnicas, o segundo não
aceitando que seus orixás fossem invocados sem suas normas rituais,
o que denuncia que estava em jogo uma disputa de bens simbólicos
(Isaia, 1997:386).

De Rio Grande, a umbanda foi trazida para Porto Alegre, em 1932,


pelo capitão da marinha Laudelino de Souza Gomes, que fundou
nesta capital a Congregação Espírita dos Franciscanos de Umbanda,
existente até os dias atuais. Neste caso, é dupla a razão do
termofranciscano. Em primeiro lugar, pela sincretização entre São
Francisco de Assis e Lokô (termo yorubá), ou Irokô (termo jeje), ou
orixá tempo (Angola), isto é, a árvore gameleira branca; em segundo
lugar, pelo uso que seus membros fazem de uma espécie de bata
branca, com sandália e cordão em torno ao ventre, semelhante ao
que consta na iconografia histórica atribuída a São Francisco.

Pernambuco Nogueira esclarece que tanto Charão quanto Souza


Gomes não eram originários do Rio Grande do Sul e ambos estiveram
na África por algum tempo. No entanto, dedicaram-se quase que
exclusivamente à implantação e divulgação da Umbanda (Nogueira,
2001b). Outros importantes personagens divulgadores da umbanda
neste estado foram Norberto de Oliveira, que a introduziu no
município de Viamão; Jesina Furtado, fundadora da casa Mestre
Quatro Luas; e Astrogildo de Oliveira, fundador do Templo Rainha
Yemanjá Fraternidade Ubirajara. Segundo Pernambuco Nogueira, esta
última casa possuía

[...] a peculiaridade de ter construído, nos fundos, uma miniatura de todos os


reinos em que se efetuavam os rituais, inclusive uma calunga pequena (cemitério)
para ali realizar os trabalhos sem sair do local do Templo, preocupado com as
deturpações já então existentes. (ibidem)

Uma particularidade desses templos mencionados, e que hoje já não


mais vigora, reside no fato de que

a abertura dos trabalhos era efetuada por uma linha que hoje não mais
encontramos: a linha das Yaras que se apresentavam arrastando-se pelo chão,
como o fariam as sereias em terra seca, e promoviam a limpeza do templo
utilizando-se de água (idem).

No mais, na umbanda do Rio Grande do Sul são cultuados "caboclos",


"pretos-velhos" e "crianças" (Ibeji), aos quais não são realizados
sacrifícios de animais.12 Outrora era também cultuada a "linha", ou
"povo do oriente", hoje quase em extinção. Segundo a representação
dos umbandistas, tratavam-se de entidades bondosas, bastante
evoluídas e que transmitiam vibrações puras. Seus médiuns,
incorporados, adotavam a postura corporal e os gestos dos povos do
Oriente: chineses, indianos, árabes e ciganos. Nos trabalhos da casa
de Pernambuco Nogueira manifestavam-se duas entidades indianas:
Brahmayana e Nargajuna.

Hoje o "povo cigano" foi transformado em Linha de Exu. Quanto aos


guias orientais, manifestam-se em poucas casas que trabalham com
o que denominam de Junta Médica.

A Linha Cruzada

Trata-se de uma expressão religiosa relativamente nova, iniciada,


tudo indica, na década de 1960. Constitui, porém, a que mais tem
crescido neste estado, sendo cultuada hoje em cerca de 80% dos
terreiros. Segundo Norton Correa, esta modalidade ritualística
chama-se Cruzada

[...] porque, enquanto o Batuque cultua apenas orixás e a Umbanda caboclos e


pretos-velhos, a Linha Cruzada reúne-os no mesmo templo, cultuando, alem deles,
também os exus e suas mulheres míticas, as pombagiras, provavelmente
originários da Macumba do Rio de Janeiro e São Paulo. (Correa, 1998a:48)13

Ainda segundo Correa, as principais razões para o crescimento da


Linha Cruzada seriam os seguintes: os custos dos rituais são mais
baratos do que os do batuque; o aprendizado geral é mais simples do
que o do batuque; seus membros podem reunir e somar a força
mística do batuque com a da umbanda (ibidem:90).

A proliferação de terreiros cruzados tem se constituído num forte


motivo de polêmica e de acusação mútua entre os membros das
religiões afro-brasileiras do RS. Trata-se, em verdade, de um conflito
em parte intergeracional, em que os "mais velhos" na religião tendem
a considerar essa inovação como uma "deturpação" da religião dos
orixás por parte dos mais jovens, ao mesmo tempo em que expressa
em parte também um conflito entre os "conservadores" e os
"modernos", as mudanças sendo compreendidas pelos batuqueiros
mais apegados à tradição como uma violação dos fundamentos da
religião.

De uma maneira geral, são extremamente precários os números


acerca dos terreiros existentes no Rio Grande do Sul, bem como a
incidência de rituais dentro das três modalidades religiosas acima
referidas. Seja como for, e para dar ao menos uma idéia de
grandeza, sugiro que deva existir hoje cerca de trinta mil terreiros
em atuação14 neste estado, onde, em cerca de 80% deles são
celebrados rituais de Linha Cruzada, em 10% somente rituais de
Umbanda (caboclos e pretos velhos) e em 10% somente rituais de
Batuque (nação).
Neste estado, como já assinalou Correa (1996), a estruturação das
três diferentes expressões religiosas afro-brasileiras acompanha, até
certo ponto, as mudanças que atingiram a própria estrutura da
sociedade.

De fato, o batuque floresceu na segunda metade do século XIX e


adaptou-se às condições de um Rio Grande do Sul "tradicional",
eminentemente agrário, pois naquela forma religiosa a tradição regia
a estrutura ritual com os orixás formando uma grande família
patriarcal. Os sacrifícios de animais não ofereciam problemas num
estado pastoril e em uma Porto Alegre onde havia ainda bairros
"rurais". As iniciações podiam ser longas, pois as relações de trabalho
eram ainda relativamente frouxas.

Já a umbanda se instalou no RS na década de 30 num quadro social


em que a implantação do capitalismo encontrava-se numa fase mais
adiantada: a economia se monetarizava, iniciava-se o processo de
industrialização, já ocorria o êxodo rural. O tempo tomava nova
dimensão. As pessoas centravam suas vidas em tomo do trabalho. A
umbanda se adequou aos novos tempos: seus rituais não se
prolongavam noite adentro, não faziam uso de tambores e não
realizavam sacrifícios de animais. Dessa forma, os fiéis podiam
cumprir suas obrigações religiosas sem alterar o ritmo do cotidiano;
não se prejudicava o sono dos vizinhos e se levava em conta a
diminuição dos espaços para criar os animais que, além disso, se
tornavam uma mercadoria cara.

A Linha Cruzada surgiu a partir da década de 60 numa fase de


consolidação do capitalismo com o conseqüente incremento de graves
problemas, tais como desemprego, insegurança, doenças,
frustrações. Neste contexto, a Linha Cruzada torna-se uma religião
prática, pragmática, de serviço, que se especializa nas soluções
sobrenaturais daqueles problemas.

O Príncipe Custódio de Almeida

Detenho-me agora, mesmo que sucintamente, sobre um dos mais


controvertidos personagens do campo afro-gaúcho, um príncipe
africano, herdeiro do trono de Benin, que morou no Rio Grande do
Sul de 1899, quando chegou à cidade de Rio Grande, até 1935,
quando faleceu em Porto Alegre.

Segundo informações colhidas por Maria Helena Nunes da Silva junto


a diferentes fontes — bibliográficas, intelectuais africanos e,
sobretudo, dois filhos biológicos de Custódio — este descendia da
tribo pré-colonial Benis, dinastia de Glefê, da nação Jeje, do estado
de Benin, na Nigéria. Seu nome tribal era Osuanlele Okizi Erupê, filho
primogênito do Obá Ovonramwen (Silva, 1999).

Há diferentes versões sobre sua saída da terra natal. Todas, porém,


estão associadas à invasão britânica ao reino de Benin, em 1897,
diante da qual não se sabe ao certo se Osuanlele teria resistido, ou
fugido, ou, então, feito um acordo com os britânicos para deixar o
país e viver no estrangeiro, onde receberia mensalmente uma pensão
do governo inglês (a mais provável). De fato, Dionísio Almeida, filho
de Custódio, relatou a Maria Helena que seu pai teria deixado Benin
em direção ao Porto de Ajudá, acompanhado por oficiais ingleses e
por parte do seu Conselho de Chefes, onde teria permanecido por
cerca de dois meses, dali embarcando para o Brasil, tendo chegado
ao porto de Rio Grande em 7 de setembro de 1899, com uma
comitiva formada de 48 pessoas, em sua maioria membros do seu
Conselho. Segundo aquele informante, antes de chegar a Rio Grande
Custódio teria estado em Salvador, depois no Rio de Janeiro, tendo se
estabelecido em Rio Grande por orientação dos orixás, através
dos ifás.15 Custódio permaneceu nesta cidade até o dia 4 de outubro
de 1900, quando se transferiu para Pelotas, e no dia 4 de abril de
1901 veio para Porto Alegre, a convite do então presidente do estado,
Julio de Castilhos, que algumas semanas antes o teria procurado em
Pelotas como último recurso para remediar um câncer que tomava
conta de sua garganta. Como teve uma melhora temporária, teria
convidado Custódio a morar em Porto Alegre para continuar a tratá-lo
nesta cidade, o que não impediu, porém, a morte de Julio de
Castilhos aos 43 anos de idade, em 1903.

Em Porto Alegre, Custódio morou durante 35 anos na rua Lopo


Gonçalves, na cidade baixa. Mantinha-se com a pensão mensal que
recebia do governo inglês, via Banco do Brasil. Consta que se
apresentava em público sempre bem vestido, desfilava pela cidade
com uma carruagem puxada por parelhas de cavalos brancos e
pretos, dedicava-se ao seu esporte preferido, o turfe, possuía um
haras, era proprietário e treinador de cavalos de corrida, nunca se
casara e vivia em situação poligâmica. "Haras" e "harem", sintetizam
a vida do Príncipe Custódio em Porto Alegre, disse-me um velho e
bem informado batuqueiro.

Consta também que a partir do seu primeiro contato para fins


terapêuticos com o presidente da Província, este e outros políticos da
época, e mesmo o sucessor de Julio de Castilhos, Borges de
Medeiros, bem como Getulio Vargas, teriam visitado o Príncipe em
sua casa e este teria estado em várias oportunidades no palácio do
governo. Este é, porém, um tema controvertido, uma vez que à
primeira vista parece difícil que aqueles políticos, fervorosos
positivistas, procurassem o "feiticeiro" africano. Mas não seria ilógico
pensar que este nobre e político africano, durante os 35 anos de vida
em Porto Alegre, não pudesse ter sido socialmente contatado pelos
políticos ou por membros da elite local.

Também controvertido é o papel desempenhado por este Príncipe no


que diz respeito aos membros da sua etnia. No campo político,
enquanto por um lado diz-se que ele teria usado do seu prestígio
para conquistar melhor espaço para os negros locais e contribuído
para aliviar o preconceito e a discriminação que pesa sobre eles, por
outro, recrimina-se que ele teria usado suas relações políticas
unicamente em favor dos membros da sua família, empregando-os
no serviço público, por exemplo, pouco ou nada fazendo para os
negros em geral. No campo religioso paira a mesma controvérsia. Por
um lado, muitos são os pais e as mães-de-santo de Porto Alegre que
se dizem descendentes da linhagem religiosa do Príncipe, defendendo
que ele teria contribuído decididamente para a estruturação do
batuque na cidade, para o reconhecimento social do mesmo e para
diminuir as perseguições policiais; mas, por outro lado, afirma-se
também que ele não teria iniciado ninguém, pois sendo nobre não
teria "posto sua mão" em nenhum plebeu, e que teria atuado como
religioso somente para as elites e as pessoas de sua amizade e
família.

Seja como for, segundo consta na sua certidão de óbito, Custódio


morreu em 28 de maio de 1935, aos 104 anos, solteiro e deixando
bens. Sua morte foi noticiada nos jornais locais e seu enterro foi
bastante concorrido, contando inclusive com a participação de
políticos da época.

Hoje o Príncipe Custódio constitui um mito no imaginário negro do Rio


Grande Sul e, como escreveu N. Correa, "a figura ainda hoje mais
legendária que a memória dos integrantes do Batuque guardam [...]"
(Correa, 198a:77). No entanto, quanto à sua vida e realizações, e às
várias controvérsias que as envolvem, trata-se de mais um tema à
espera de pesquisadores que efetuem uma investigação
transatlântica.

Os Brancos nas Religiões Afro-Brasileiras do Rio


Grande do Sul

O Rio Grande do Sul é uma sociedade multiétnica e pluricultural


construída no "encontro de civilizações", como diria Bastide, onde os
nativos indígenas viram seu território sendo ocupado pelos
portugueses e espanhóis, aos quais foram associados os escravos
africanos e, posteriormente, os imigrantes europeus, com destaque
para os alemães e os italianos.16
Em termos gerais, hoje a composição multiétnica do Rio Grande do
Sul é assim constituída: 86,8% são brancos, 4,1% negros, 8,9%
pardos e 0,2% indígenas (PNAD, IBGE, 1999). Com estes números, o
Rio Grande do Sul constitui o estado mais "branco" do Brasil, depois
de Santa Catarina.17

Ora, neste território multiétnico, malgrado a posição superior que os


brancos ocuparam em relação aos negros e aos índios, ocorreram, de
alguma forma, trocas culturais em diferentes direções, sendo uma
delas a aproximação dos não-brancos, de diferentes etnias e de
diferentes camadas sociais, às religiões afro-brasileiras.

É praticamente impossível saber quando este encontro começou a


ocorrer. Tudo indica, porém, que data ainda do século XIX, tendo
aumentado nas primeiras décadas do século XX e se consolidado a
partir da segunda metade daquele século, quando, então, há notícias
de brancos que ocupam a condição de pais e mães-de-santo. Este
fenômeno, como se sabe, ocorreu em praticamente todo o Brasil,
chegando ao ponto em que hoje, em algumas regiões, como escreve
Prandi, referindo-se a São Paulo, "o Candomblé é uma religião que
não pode ser caracterizada como uma religião de negros" (Prandi &
Silva, 1987:4). Trata-se, antes, de religiões multiétnicas e universais
(Prandi, 1991).

A procura de terreiros por parte dos brancos pobres geralmente está


associada à busca de solução para problemas práticos como doenças,
desemprego ou dificuldade econômica, ou problemas legais,
geralmente relacionados à sua condição desfavorável de classe. Já os
brancos de maior poder aquisitivo o fazem na busca de solução de
problemas existenciais como os de sentido, identidade, afetivos, etc.
Também o caráter misterioso, exótico e fascinante da religião dos
orixás, associado à sua eficácia simbólica, contribui para a atração de
brancos.

Diga-se de passagem que as mesmas ou semelhantes razões


apontadas para a aproximação dos brancos das camadas populares
aos terreiros servem também para os negros ingressarem neles. No
entanto, não se pode imaginar uma convivência harmônica entre
negros e brancos nos terreiros multiétnicos gaúchos. Ocorre aqui uma
espécie de tolerância mútua ou, como Silva e Amaral referiram para
São Paulo, uma

espécie de negociação velada onde os brancos, com dinheiro, tornam-se


necessários à própria sobrevivência do terreiro de maioria negra e, assim, o que é
visto como negativo (a entrada dos brancos no candomblé) acaba adquirindo sinal
positivo, já que a concessão é necessária à manutenção das despesas da casa.
(Silva & Amaral, 1994:17)
Em outras palavras, parece prevalecer no Rio Grande do Sul a
representação negra segundo a qual é importante a presença
simultânea de brancos e de negros nos terreiros por serem, os
primeiros, detentores principalmente de capital econômico e os
segundos principalmente de capital simbólico, religioso, dado pela
tradição. Evidentemente que os atores sociais implicados no processo
nem sempre possuem esta consciência dos fatos. É mais recorrente
neles a afirmação de que "o axé não tem cor".

No entanto, há terreiros multiétnicos onde o preconceito de cor tende


a se manter. Isto se dá especialmente quando os brancos
implicados na religião detêm pouca consciência da origem africana
desta e não realizam uma aproximação mais efetiva com a etnia
negra. Há outros terreiros multiétnicos, porém, onde até certo ponto
e por um tempo limitado parece haver uma suspensão dos
preconceitos raciais; neste caso, negros e brancos juntam-se no
espaço religioso para se divertir, rezar e fortalecer uma identidade
social comum.

Os terreiros multiétnicos a que me refiro reúnem especialmente


pessoas das camadas populares. Isto porque os terreiros de camadas
médias tendem a ser predominantemente freqüentados por brancos,
enquanto os terreiros de camadas altas são freqüentados quase que
exclusivamente por brancos. Em todos eles, como mostrei em outro
lugar (Oro, 1998), são reproduzidas as desigualdades raciais
encontradas na sociedade gaúcha (e brasileira).

A Expansão das Religiões Afro-Brasileiras para os


Países do Prata

Um outro aspecto que sobressai no estudo do atual campo religioso


afro-gaúcho consiste na importância que ele tem para o
ressurgimento e introdução das expressões religiosas de matriz
africana nos países do Prata. Com efeito, a Argentina já teve uma
história de reprodução dessas religiões até o final do século XIX,
quando os atabaques, tocados até então pela comunidade afro-
argentina, silenciaram em razão do abrupto declínio
destapopulação.18 Já no Uruguai, não consta ter havido uma histórica
prática religiosa africana, mas importantes expressões musicais de
origem africana como o candombe.19 No entanto, em ambos os
países, a partir da década de 60 do século passado, verifica-se o
reingresso (na Argentina) e a introdução (no Uruguai) das religiões
de matriz africana, sobretudo através do Rio Grande do Sul.

Este processo ocorreu primeiramente nas cidades platinas fronteiriças


com o Rio Grande do Sul e dali alcançaram as capitais federais.
Deveu-se a iniciativas que partiram de ambos os lados da fronteira,
ou seja, de pais e mães-de-santo brasileiros que procederam à
expansão da religião para os países platinos e de cidadãos desses
países que procuraram terreiros brasileiros.

Na década de 70, o fluxo se estendeu até Porto Alegre, onde se


localizava o maior número de renomados batuqueiros que passaram
a ser visitados por argentinos e uruguaios. Estes para aqui vinham
em busca de iniciação religiosa junto a um famoso pai ou mãe-de-
santo, ao mesmo tempo em que buscavam o reconhecimento oficial
da sua condição de iniciados, ou sacerdotes, junto a uma federação
local. Sem tais documentos, tinham muitas dificuldades de praticar a
religião em seus países, sobretudo na Argentina, podendo até mesmo
sofrer perseguições policiais.

O período áureo das relações religiosas internacionais platinas


ocorreu na década de 80. Em relação à Argentina deu-se sobretudo
após o retorno à vida democrática, em 1983 (Frigerio & Carozzi,
1993), enquanto no Uruguai o crescimento do número de terreiros e
o incremento das relações religiosas com o Brasil coincidiram com o
período ditatorial, que se estendeu até 1985 (Hugarte, 1993).

Na década de 90 ocorreu um arrefecimento das relações religiosas


entre gaúchos e platinos e isto se deveu, segundo o discurso dos pais
e mães gaúchos, à crise econômica que se abateu sobre aqueles
países, sobretudo na Argentina, que reduziu os investimentos das
pessoas na religião, embora não tenha diminuído o interesse pela
mesma. Mas há um não-dito: o arrefecimento também se deveu à
concorrência religiosa que estão sofrendo naqueles países. Ou seja,
se até o início da década de 90 havia uma relação relativamente
assimétrica, mas aceitável, entre os pais e mães gaúchos e seus
filhos platinos — os primeiros colocando-se numa posição hierárquica
superior — a partir deste período estabeleceu-se uma relação
conflituosa entre alguns, senão a maioria dos pais-de-santo gaúchos
(cerca de 15 pessoas), que participam do circuito religioso platino,
sobretudo argentino, e os seus colegas deste país, posto que estes
últimos passaram a disputar poder pela ocupação do espaço religioso
afro-brasileiro e pelo exercício legítimo do sacerdócio naquele país.

Apesar disto, nos dias atuais continuam as viagens de membros das


religiões afro-brasileiras nos diferentes sentidos e foram criadas
verdadeiras redes internacionais de parentesco simbólico, as quais
constituem denominadores de fronteiras sociais e simbólicas que
contribuem para a construção de verdadeiras identidades
transnacionais. Ao mesmo tempo, essas redes constituem uma forma
de integração regional/internacional, legitimada religiosamente,
mediatizada pelas religiões afro-brasileiras, onde a nacionalidade e as
diferenças sociais e ideológicas não são anuladas, mas superpostas à
religiosa.

Evidentemente que a construção de identidades não significa a


formação de comunidades (no sentido tradicional do termo)
internacionais. Igualmente, a integração e a formação internacionais
de redes de famílias-de-santo não significa que as relações entre os
seus membros sejam harmônicas. Elas continuam a reproduzir
o ethos de rivalidade e aliança que caracteriza o campo religioso afro-
brasileiro.20

As Religiões Afro-Brasileiras no Rio Grande do Sul e


suas Relações com o Poder Político Local

Nos últimos anos, as religiões afro-brasileiras parecem ter


conseguido, em Porto Alegre, uma aproximação não alcançada até
então, e em nenhum outro local do estado, com o poder público local.
É sobretudo nas gestões do PT na prefeitura, especialmente na
segunda e na atual, em que o chefe do Executivo é
Tarso Genro,21 que aquelas religiões conseguem lograr apoios e
interagir diretamente com o gabinete do Prefeito e com algumas
secretarias, como da Cultura e do Meio Ambiente, tudo isto
ocorrendo, porém, não sem conflitos.22

Assim, em Porto Alegre, mediante Lei Municipal, e por intermediação


da Secretaria Municipal da Cultura e da Câmara Municipal de Porto
Alegre, desde o ano de 1996 comemora-se a Semana da Umbanda e
dos Cultos Afro-Brasileiros.Os eventos desta Semana são compostos
de palestras e rituais, celebrados no Parque da Harmonia, no centro
da cidade. Iniciam-se no dia 15 de novembro com uma sessão de
Umbanda e encerram-se em 20 de novembro, Dia Nacional da
Consciência Negra, com uma sessão de Batuque. Nestes eventos
comparecem autoridades civis, membros das religiões afro-
brasileiras, além de simpatizantes, curiosos e o povo em geral.

Outra atividade pública semelhante a essa, e que também consta


como Lei Municipal de Porto Alegre, é a Festa da Oxum, celebrada
desde 1996 em todos os dias 8 de dezembro, na praia de Itapema,
diante da imagem deste orixá erguida à beira do Rio Guaíba. Nesta
ocasião ocorre também uma sessão religiosa na praia em
homenagem à deusa das águas doces.

É digno de nota que ambas as atividades referidas, a Semana da


Umbanda e a Festa da Oxum, constam no calendário de eventos da
prefeitura de Porto Alegre.
Outra iniciativa de parceria com o poder público ocorreu entre as três
maiores federações do estado (Conselho Superior da Umbanda e dos
Cultos Afro-brasileiros, Afrobras e Aliança Umbandista e Africanista
do Estado) e as Secretarias Estadual e Municipal do Meio Ambiente,
ao editarem um caderno de orientação intitulado "A Educação
Ambiental e as Práticas das Religiões Afro-Umbandistas", com o
objetivo de "orientar as Casas de Religião e funcionários do poder
público municipal e estadual sobre procedimentos em relação a cultos
e colocação de trabalhos religiosos no meio ambiente". Trata-se de
um manual de aconselhamentos em relação às oferendas, tendo
como pressuposto a preservação da natureza.

As federações acima mencionadas também conseguiram, junto ao


poder público municipal e à Assembléia Legislativa do estado, o apoio
financeiro e logístico para realizar anualmente um Seminário Cultural
e Teológico da Umbanda e dos Cultos Afro-Brasileiros do Estado do
Rio Grande do Sul. Trata-se de um seminário que desde a sua
primeira edição, em 1996, é celebrado no salão nobre da Assembléia
Legislativa do estado e conta com palestrantes oriundos do próprio
campo religioso em questão e de pesquisadores dos mencionados
cultos, provenientes de diferentes regiões do Brasil e dos países do
Prata. O seminário tem duração de três dias e dele participam em
média 400 pessoas.

Principalmente neste evento, mas também nos demais referidos,


nota-se sempre a presença de políticos, dos Executivos e Legislativos,
municipal e estadual, de distintos partidos.

Outra forma de aproximação do campo religioso afro-brasileiro com o


político ocorre através de outorga de comendasetítulos honoríficos,
com que os governos locais distinguem alguns líderes destas
religiões. Assim, por exemplo, o babalorixá Cleon (Fonseca) de Oxalá
recebeu das mãos do então governador do Estado do Rio Grande do
Sul, Antônio Brito, em 30/6/1996, a medalha Negrinho do Pastoreio,
a mais alta comenda do estado. Três pais-de-santo receberam na
Câmara Municipal de Porto Alegre o título de cidadãos de Porto
Alegre. São eles: Ailton (Albuquerque) da Oxum, Jorge (Verardi) de
Xangô e Adalberto Pernambuco Nogueira — o primeiro nascido em
Pelotas (RS), em 3/11/1945, o segundo em Cruz Alta (RS), em
19/10/1949, e o terceiro em Belém do Pará, em 3/11/1928.

O último agraciado, Adalberto Pernambuco Nogueira, é presidente do


Conselho Estadual da Umbanda e dos Cultos Afro-Brasileiros do Rio
Grande do Sul (CEUCAB/RS), e uma das maiores lideranças desta
religião no estado. Devido o seu carisma e bom trânsito na esfera
pública, tem contribuído para as religiões afro-brasileiras
conquistarem maior e melhor espaço tanto no campo político quanto
no campo religioso institucional. Na área política tem participado,
enquanto representante das religiões afro-brasileiras, no Conselho
Político de Campanha da Frente Popular (formado então por cerca de
160 pessoas de destaque das várias áreas de atuação social e
profissional) por ocasião das últimas eleições municipais de 2000, e
atualmente integra o Conselho Político de Governo da Frente Popular
(formado por cerca de 300 pessoas). Igualmente, a partir de janeiro
deste ano foi escolhido como membro do Conselho Municipal de
Cultura.

Além destas atividades no meio político, Pernambuco Nogueira é o


representante mais solicitado das religiões afro-brasileiras por
ocasião de celebrações ecumênicas, ocorridas, por exemplo, por
ocasião das posses do governador do estado e do prefeito municipal,
no dia do aniversário da cidade de Porto Alegre (26 de março), no dia
das Mães e na celebração de 25 de agosto, dia de São Cristóvão,
padroeiro dos motoristas.

Em tais cultos ecumênicos comparecem representantes da igreja


católica, da igreja luterana, do islamismo, do budismo, do judaísmo,
do espiritismo, além dos cultos afros.

Mas, se, de um lado todos os fatos acima mencionados revelam uma


aproximação — que, como já disse, não ocorre sem tensões — entre
as religiões afro-brasileiras e o poder político no Rio Grande do Sul,
por outro lado, os representantes dessas religiões não logram
ingressar diretamente no campo político mediante a condução pelo
voto. Ou seja, malgrado as tentativas para sua viabilização de parte
de alguns renomados pais, não conseguiram eleger nenhum seu
representante nas Câmaras Municipais e muito menos na Assembléia
Legislativa do estado. O único precedente neste sentido data da
década de 1960, quando o umbandista Moab Caldas foi eleito para a
Assembléia Legislativa do estado, pelo PTB de Leonel Brizola e Jango
Goulart, e reeleito nos anos de 1964 e 1968. Foi cassado em 1968,
vindo a falecer em 1997.23 Também no ano de 1960 foram eleitos 3
prefeitos e cerca de 20 vereadores umbandistas no Rio Grande do
Sul.

Após este período não parece ter havido mais presença efetiva de
membros desta religião em cargos eletivos no Rio Grande do Sul,
malgrado algumas tentativas, como a do babalorixá Ailton
Albuquerque, de Porto Alegre, que se apresentou às eleições
legislativas gaúchas nas últimas eleições de 1998 pelo Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB). Não logrou se eleger, tendo obtido 3.425
votos, quando o mínimo necessário situa-se em torno de dez mil,
dependendo da situação da legenda.

Nas eleições de 2000 não consta ter havido algum líder desta religião
que tenha sido eleito em algum município do Rio Grande do Sul. Em
Porto Alegre, entre os 411 candidatos a vereador para a Câmara
Municipal, havia 5 representantes das religiões afro-brasileiras, 4
pais-de-santo e 1 presidente de um famoso terreiro. Foi, entre eles, o
presidente da Federação Afrobras quem obteve o maior número de
votos, 1.994, este montante representando, porém, somente um
quarto dos votos necessários para ser eleito. Os demais candidatos
obtiveram 1.668, 1.109, 451 e 421 votos, totalizando, juntos, 5.643
votos, quantia insuficiente para eleger um único candidato.24

O discurso eleitoral veiculado pelos pais-de-santo de Porto Alegre


para dentro da "comunidade" afro-umbandista era fundamentalmente
o mesmo: a necessidade de a "religião" ter representantes no
legislativo municipal para defender os seus direitos e para mostrar
sua força perante a sociedade e, sobretudo, perante os evangélicos
(pentecostais), que estão ampliando seu espaço na política e se
mostrando abertamente críticos em relação às religiões afro-
brasileiras. Ora, este discurso não produziu a eficácia esperada pelos
candidatos e, a meu ver, isto se deve, sobretudo, à própria estrutura
e ao ethos das religiões afro-brasileiras.

De fato, o modelo organizacional das religiões afro-brasileiras


repousa sobre uma variedade de federações e uma pulverização de
terreiros, sendo todos ao mesmo tempo autônomos e rivais entre si.
Como não existe, no âmbito desta religião, uma única hierarquia
religiosa, um poder centralizador e aglutinador dos centros religiosos,
estes constituem-se autônomos e, por isso mesmo, concorrentes
entre si. Em conseqüência disso, reconhece o candidato a vereador
Jorge Verardi, presidente da Afrobras, "cada um procura sua própria
autopromoção". "Não temos a organização dos aleluia", disse uma
mãe-de-santo.

Ora, este ethos constituído de permanente disputa, rivalidade entre


terreiros e desqualificação do outro, torna, como reconhece R. Prandi,
bastante remota a possibilidade de união entre terreiros e grupos,
mesmo em se tratando de proveito para a religião (Prandi,
1991:163).25

Considerações Finais

Malgrado os avanços alcançados nos últimos anos pelas ciências


sociais e humanas na compreensão da história e do presente do
negro e sua cultura no Rio Grande do Sul, muita coisa ainda resta a
ser investigada.

Talvez não pese hoje tão forte como há alguns anos atrás a frase
escrita em 1940 pelo historiador D. de Laytano quando afirmava que
"os nossos cronistas, os historiadores de compêndios oficiais e toda a
literatura gaúcha não se ocuparam do negro senão acidental, ligeira e
negligentemente" (Laytano, 1940). No entanto, malgrado produções
recentes, permanece atual a exortação de outro historiador, Mário
Maestri Filho: "a história do escravo sulino, proto-história do
proletariado gaúcho, ainda está por escrever-se" (Maestri Filho,
1979:67). Especificamente sobre as origens do negro gaúcho,
escreveu que "não sabemos rigorosamente nada" (idem, 1993:30),
enquanto Norton Correa afirmou que "ainda não foram perfeitamente
esclarecidas as origens das populações trazidas como escravos para o
Rio Grande do Sul" (Correa, 1998a).

A explicação para a desconsideração do negro pela academia, mas


não só ela, pode residir, como salienta R. Oliven, no próprio processo
de construção política e cultural do Rio Grande do Sul, onde ocorreu
um interesse massivo e concentrado em torno da figura do gaúcho —
que foi elevado à condição de "autêntico" representante desse
território — e do colonizador europeu, em detrimento de outros
grupos sociais aqui presentes desde o princípio da colonização, como
os negros e os índios. Estes parecem condenados ao silêncio e ao
esquecimento e comparecem no âmbito das representações de uma
forma extremamente pálida. Particularmente quanto ao negro
prevalece uma invisibilidade social e simbólica (Oliven, 1996) ao
mesmo tempo em que ainda predomina, no Rio Grande do Sul, a
auto-imagem de um estado branco e moderno, construído pelas
figuras "heróicas" dos gaúchos e dos imigrantes europeus e seus
descendentes.

No contexto de exclusão do negro e sua cultura no Rio Grande do Sul


figura também o batuque, cuja história, linhagens, tradições
religiosas e repressão policial, permanecem ainda com lacunas,
incógnitas e dúvidas não resolvidas, como pudemos constatar neste
trabalho.

Notas

1. Por se tratar de um texto que pretende ser, até certo ponto, um


vôo panorâmico sobre as religiões afro-brasileiras no Rio Grande do
Sul, este será, necessariamente, superficial em alguns aspectos;
porém, essa deficiência poderá ser em parte sanada com as
indicações bibliográficas respectivas para os interessados.

2. Ou seja, atuaram como mão-de-obra nos engenhos de açúcar de


Pernambuco e Bahia, na mineração aurífera de Minas Gerais, nos
campos de fumo e cacau da Bahia e Sergipe, no cultivo do café do
Rio de Janeiro e São Paulo, no algodão do Maranhão e Pará, nas
plantações de café também cultivado no Espírito Santo, na agricultura
e pecuária do Rio Grande do Sul e na mineração de Goiás e Mato
Grosso.

3. Sabe-se que durante algum tempo o envio para o Sul era tido
como um pesado castigo e forte ameaça aos escravos desobedientes,
por parte dos patrões de outras regiões do Brasil.

4. De fato, ao efetuar uma comparação entre o candomblé da Bahia e


o batuque o Rio Grande do Sul, Herskovits propunha a hipótese de
que a existência do africanismo no Rio Grande do Sul resulta de um
trabalho independente e paralelo, "de idênticos impulsos culturais
africanos primitivos". Ponderava, porém, de que tal hipótese deveria
ser revista com os avanços dos estudos historiográficos "sobre a
migração negra dentro do Brasil e da procedência tribal africana dos
negros importados para a parte sul do país" (Herskovits, 1948:64).

5. "Embora ocupada desde os meados do século XVIII por colonos


açorianos, Porto Alegre só começou a se desenhar após 1772, quando
se deu a primeira demarcação do espaço urbano e a distribuição de
datas de terras para esses açorianos. Só então a condição de ponto
estratégico daquele sítio vai transfigurar-se em funções comerciais e
político-militares" (Kersting, 1998:61). A instalação de Porto Alegre
como capital da província ocorre em 1773. Sua população era de
1.500 habitantes em 1780 e 12.000 em 1820.

6. "Era uma região insalubre, fora do centro urbano, habitada por


uma população pobre, essencialmente negra, estigmatizada pelos
órgãos oficiais, pela imprensa e por tudo aquilo que era
considerado sociedade na época" (Kersting, 1998:148). A palavra
"Areal" tem sentido ambíguo. Trata-se de uma corruptela da palavra
Arraial, mas também área de depósito de areia do fluxo da foz do
riacho Ipiranga com o rio Guaíba. A palavra "Baronesa" refere-se à
proprietária dessa chácara, de então, a Baronesa do Gravataí.

7. "Como limites mais ou menos definidos da Colônia Africana,


podemos estabelecer a Rua Ramiro Barcelos, a Avenida Protásio
Alves (antigo Caminho do Meio) até a altura da Rua Dona Leonor,
seguindo pela parte alta até aproximadamente o atual Instituto Porto
Alegre (IPA), e deste até a rua Castro Alves, descendo por essa até a
Ramiro Barcelos, de onde partimos" (Kersting, 1998:102).

8. O número de moradores dessas áreas não é preciso. Relativamente


à Colônia Africana, era de 3.460 em 1910; 4.299 em 1912 e 5.636
em 1917. Estes números correspondem respectivamente a 2,66%,
2,92% e 3,15% do total da população de Porto Alegre nesses anos
(Kersting, 1998:128-129).
9. Este autor mostra como a análise dos registros de ocorrências
policiais da virada do século em relação à Colônia Africana não são
superiores às de outras áreas da cidade, mesmo o centro,
considerado "civilizado" e "moderno". Entretanto, sobre este não
foram construídas representações sociais excludentes como em
relação àquele território negro da cidade (Kersting, 1998).

10. A expulsão se dá mediante a expansão da cidade com a


conseqüente valorização da área, que implica em aumento de
impostos, impossível de ser pago por moradores de baixa renda.

11. São os seguintes os principais orixás cultuados no batuque: Bará,


Ogum, Oiá, Xangô, Odé (Otim), Ossanha, Obá, Xapanã, Bêdji, Oxum,
Iemanjá e Oxalá. O anexo I apresenta um conjunto de elementos
vinculados a cada um desses orixás, segundo a tradição batuqueira
gaúcha.

12. Segundo Paulo Tadeu B. Ferreira, na Nação Cabinda, por


exemplo, a língua ritualística deveria ser o Bantu (Kunbundo) e os
deuses chamados de Inkices. Na prática cultuam-se os orixás em
lingua yorubana. Na Nação Jeje (Jeje), a língua deveria ser o Ewe e
os deuses os voduns. Na prática adotam o mesmo procedimento da
Cabinda, que é o mesmo do Ijexá e do Oyó (Ferreira,1997:42).

13. O anexo II apresenta algumas especificações das entidades acima


mencionadas.

14. O anexo III apresenta os nomes e algumas concepções relativas


às principais entidades da Linha Cruzada praticada no Rio Grande do
Sul.

15. Este montante é aproximado, mesmo porque "terreiro" é uma


categoria ampla que reúne desde um congá familiar onde seu dono
recebe clientes para "jogar", até um espaço onde são realizados
rituais de distintas expressões religiosas afro-brasileiras no âmbito de
uma comunidade religiosa local. Seja como for, mesmo os terreiros
no Rio Grande do Sul, segundo esta última observação, podem ser
considerados de tamanho pequeno ou médio, pois o número médio
de freqüentadores situa-se entre 10 e 30 pessoas, sendo reduzidos os
terreiros que reúnam num único espaço ritualístico em torno de 100
pessoas.

16. Eis, textualmente, o depoimento de Dionísio:


"[...] o Forte de São João Batista de Ajudá era comandado por um
baiano, o qual tornou-se amigo do papai e indicou-lhe a Bahia como
lugar adequado para viver no Brasil. Isto porque José Maria só
conhecia a Bahia, nada sabendo dos outros estados brasileiros.
Quando Osuanlele chegou à Bahia ele jogou novamente seus ifás e,
em resposta, obteve que ainda não era aquele lugar o escolhido. Da
Bahia ele foi para o Rio de Janeiro. Conheceu algumas pessoas que
professavam a religião africana. Bem, na Bahia ele também conheceu
importantes figuras que estavam ligadas diretamente à religião
africana. Lembro que ele nos dizia que tinha muitas coisas que ele
entendia sobre a sua religião. Homenagens foram feitas a ele"
(Dionísio, 13/5/1988 apud Silva, 1999:71).

17. De fato, os alemães desembarcaram no Rio Grande do Sul a partir


de 1824, tendo chegado a mais de 60.000 indivíduos até 1939. Os
imigrantes italianos, por sua vez, chegaram a partir de 1875 e a
última vaga desembarcou em 1914. Neste período, entre 70.000 e
100.000 italianos se estabeleceram no Rio Grande do Sul.

18. Segundo a mesma fonte, a distribuição étnica de Santa Catarina é


de 91,0% de brancos, 2,1% de pretos, 6,4% de pardos e 0,5% são
índios (PNAD, IBGE, 1999).

19. O último depoimento sobre um ritual religioso de tipo afro-


americano em Buenos Aires é de 1903 (Segato, 1991). Ainda
segundo esta autora, a população negra era de 30% em Buenos Aires
no início do século passado e caiu para 2% no final do mesmo século.
As causas mais importantes do desaparecimento dessa população
foram as guerras e as pestes. É possível também que seus últimos
componentes tenham emigrado para o Sul do Brasil. Rita Segato
aponta, no entanto, que o desaparecimento do negro na Argentina foi
antes ideológico, cultural e literariamente construído, do que
propriamente físico. Ou seja, na imagem que os políticos e os
intelectuais argentinos se fizeram de nação homogênea e depurada
não havia lugar para o negro (id. ibid.).

20. Para uma análise sobre o candombe uruguaio ver Ferreira (1997).

21. Para uma análise mais aprofundada do processo de


transnacionalização das religiões afro-brasileiras do Rio Grande do
Sul para os países platinos ver Oro (1999).

22. O PT está no comando da prefeitura de Porto Alegre há 12 anos,


tendo sido prefeitos Olívio Dutra (1989-1992), Tarso Genro (1993-
1996), Raul Pont (1997-2000) e Tarso Genro (2001-2004).

23. Talvez o conflito maior resida na própria administração municipal


e, sobretudo, no interior do PT, onde vozes do partido, movidas por
brios ideológicos, se erguem em desaprovação às relações
estabelecidas pelos organismos executivos com as religiões afro-
brasileiras e, mesmo, com as religiões em geral.
24. Diana Brown recorda que em 1960 os umbandistas também
elegeram para a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro Atila Nunes
— um radialista umbandista que havia sido eleito vereador em 1958
(Brown, 1985). Maria Helena Villas-Boas Concone e Lísias Nogueira
Negrão fazem uma análise histórica dos distintos momentos da
relação da umbanda com a política e o estado, onde prevaleceu a
perseguição até o golpe de 1964 e a sua cooptação política a partir
de então. Mais especificamente analisam o envolvimento político-
partidário da umbanda paulista nas eleições de 1982 e analisam a
derrota dos candidatos umbandistas (Concone e Negrão, 1985).

25. No entanto, não estamos emitindo nenhum juízo de valor sobre


este permanente conflito entre líderes de terreiros das religiões afro-
brasileiras. Há mesmo alguns autores, como N. Correa que, baseado
em G. Simmel, levanta a hipótese de que o conflito referido não
representa algo negativo na vida social dessas religiões, posto que
ele constitui a chave para explicar a permanência histórica e o
crescimento das religiões afro-brasileiras, em razão do seu papel
também construtivo e agregador em termos sociais (Correa, 1998b).

Referências Bibliográficas

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*Este texto foi originalmente apresentado na 53ª Reunião Anual da


Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada
em Salvador, Bahia, de 14 a 17 de julho de 2001, no Simpósio: Afro-
Diversidade no Brasil, coordenado por Reginaldo Prandi (USP).
Custódio Joaquim de Almeida
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Osuanlele Okizi Erupê, que no Brasil adotou o nome José Custódio Joaquim de
Almeida, Príncipe de Ajudá (Golfo da Guiné, África ?, 1832 - Porto Alegre, 28 de
maio de1935), segundo diversas publicações no Rio Grande do Sul que são objeto de
estudos, foi um dirigente tribal africano, exilado no Brasil, onde se tornou famoso
como curandeiroe líder religioso.[1]
Ninguém sabe como e nem em que circunstâncias, ao final do século XIX este príncipe
governante deixou São João Batista de Ajudá, no Dahomey (hoje República de Benim), no
passado um dos principais entrepostos de escravos para o Brasil, mas o certo é que ele
partiu ante a promessa solene dos Ingleses de que o seu povo não sofreria o que haviam
sofrido os grupos vizinhos ante a violência dos Alemães e Franceses.
Os portugueses, antes senhores da região, tinham se contentado com uma parte
da Guiné e com as Ilhas de São Tomé e Príncipe cedendo as suas fortalezas. As
condições para que o Príncipe de Ajudá não oferecesse qualquer resistência aos
invasores, além do respeito à vida dos seus súditos, era a de que se exilasse e jamais
voltasse aos seus domínios. E, como parte do convênio, a Grã-Bretanha se comprometia a
fornecer-lhe uma subvenção mensal paga em qualquer parte do mundo onde escolhesse
residir, por intermédio dos seus representantes consulares.
Por qual motivo o exilado escolheu o Brasil, não se sabe. Talvez por haver aqui grande
número de descendentes dos escravos nativos da Costa da Mina - os chamados "pretos-
mina" - ou outra qualquer razão. A sua chegada ao país foi assinalada como tendo
acontecido em 1864, dois anos depois de ter deixado Ajudá. Inicialmente, fixou-se em Rio
Grande. Mais tarde, foi para o interior de Bagé, onde ficou conhecido por manter viva a
tradição religiosa do seu povo - com a prática do que agora se conhece como Batuque -
além de mostrar conhecimentos das propriedades curativas da flora medicinal brasileira,
atendendo a muita gente doente que o procurava, tratando de minorar-lhes os males por
meio de ervas e rezas dos ritos africanos.
De Bagé mudou-se para Pelotas e depois Porto Alegre, onde chegou em 1901, com 70
anos de idade. Foi morar no atual Bairro Cidade Baixa, na Rua Lopo Gonçalves, nº 498,
cujos fundos davam para a Rua dos Venezianos (hoje Joaquim Nabuco), mas logo que o
Príncipe – que havia adotado o nome brasileiro de Custódio Joaquim de Almeida – ali se
instalou, passou a rua a ser preferida pela gente de cor que procurava com isso acercar-se
do homem que incontestavelmente, era um líder de sua raça.
O Príncipe Custódio - como então era chamado - iniciou ali uma nova etapa de sua
aventurosa vida, cercando-se em Porto Alegre de um aparato digno de um verdadeiro
fidalgo.
A família do príncipe de Ajudá aos poucos foi crescendo e não demorou a atingir o número
de 26 pessoas, sem contar os empregados em boa quantidade.
Os fundos da casa onde morava serviam como sua coudelaria, pois possuía nada menos
do que nove cavalos de raça – alguns importados da Inglaterra – os quais todos os
domingos disputavam corridas. Para manter e cuidar esses animais havia um grupo
selecionado de empregados, jóqueis, etc., sob a supervisão direta do Príncipe, que se
classificava como "tratador".
O Príncipe Custódio tinha oito filhos, três homens e cinco mulheres (atualmente ainda
estão vivos um homem – Dionísio Joaquim Almeida, funcionário aposentado da EBCT –
em Porto Alegre, e duas senhoras, uma residindo no Rio de Janeiro e outra em São Paulo)
e para esses oito filhos, quando pequenos, mantinha quatro empregados, um para cada
dois.
Seus conhecimentos de idioma português não eram muito corretos, porém podia
expressar-se fluentemente em inglês e francês, além de falar ainda vários dialetos das
tribos africanas que havia governado.
As festas que promovia periodicamente em sua casa – notadamente na data de seu
aniversário – duravam três dias com a casa sempre cheia de gente, da manhã à noite,
quando se comia e se bebia do bom e do melhor, ao som dos tambores africanos que
batucavam sem parar naquelas setenta e duas horas. Nesses dias, o Príncipe recebia a
visita da gente mais ilustre da cidade, inclusive do presidente do estado, Borges de
Medeiros que, conhecendo a ascendência daquele homem sobre a população de cor, ia
felicitá-lo, talvez mais por motivos políticos do que por outra coisa.
Naquelas festividades era certo o comparecimento de senhoras e cavalheiros da melhor
sociedade porto-alegrense, além de capitães da indústria e comércio que dele precisavam
o apoio para o perigo de greves e outras imposições. As mais finas bebidas eram
importadas diretamente da Europa, especialmente para aquelas ocasiões especiais,
embora elas nunca faltassem à mesa do príncipe exilado.
A casa do príncipe vivia sempre lotada de gente, de visitantes e de pessoas que ele
encontrava nas ruas e lhe pediam auxílio. Mandava essas pessoas embarcarem na
carruagem em que estivesse e as levava para a sua residência onde sempre havia lugar
para mais um. Todos ali ficavam até que quisessem ir embora. Entre os que viveram muito
tempo junto ao príncipe estava um branco, descendente de alemães oriundo de São
Sebastião do Caí, que tinha feito estudos de Medicina e dessa maneira o auxiliava no
atendimento aos doentes que continuamente o procuravam em busca dos remédios e dos
"trabalhos" religiosos. Alguns estudos sugerem que não apenas africanos e seus
descendentes procuravam a ajuda espiritual do Príncipe, mas também importantes figuras
da sociedade branca gaúcha, como o presidente do estado Júlio de Castilhos que, ainda
em Pelotas, teria lhe procurado para tratar de um câncer na garganta, [2] e seu
sucessor Borges de Medeiros, que seria supostamente "filho de santo" de Pai Custódio.[3]
Para os rigores do inverno o Príncipe Custódio adotou o poncho gaúcho, embora não
dispensasse o gorro que marcava a sua personalidade, não o deixando nem quando
visitava o Palácio Piratini onde sempre era bem vindo e onde havia ordens superiores de
bom atendimento, e onde ele muitas vezes usava o seu prestígio para conseguir alguma
coisa que lhe fosse solicitada por qualquer membro de sua comunidade.
Durante todos os anos em que viveu em Porto Alegre – 31 ao todo – nunca manteve
correspondência ostensiva com parentes ou amigos deixados em terras africanas. De lá
recebia informações e daqui envia notícias suas em mãos por intermédio de marítimos que
tripulavam vapores vindos à nossa metrópole transportando e levando mercadorias.
Também nunca se soube o teor dessas correspondências. De incentivo ao seu povo para
uma possível rebelião não era. Pois ele sabia ser isso humanamente impossível. Além
disso, a Inglaterra, em todo o longo período do seu exílio, sempre cumpriu religiosamente
o que fora estipulado. Mensalmente o consulado britânico local entregava-lhe um saquinho
cheio de libras esterlinas, cuja troca em mil-réis servia para manter a pequena corte da
Rua Lopo, a família numerosa, os agregados, os empregados, e ainda serviam àqueles
que o procuravam nos momentos de aperturas financeiras.
No verão, em janeiro, o programa era conhecido. Ia todo mundo para a casa de
propriedade de Custódio Joaquim de Almeida, na Praia de Cidreira. A viagem para o velho
balneário era qualquer coisa de sensacional e folclórico. Embora fosse dono de carruagem
e tivesse dinheiro para alugar quantas diligências quisesse, o príncipe gostava de viajar
em carretas puxadas por bois na maior calma e na mais incrível lentidão. E ainda mais: a
viagem era feita por etapas em ritmo de passeio, parando em muitos lugares onde ele era
sempre esperado com festas e cerimônias religiosas africanas, muita comida e muita
bebida, pois todos sabiam que tudo seria pago pelo viajante ilustre. Dessa maneira nunca
o trajeto de Porto Alegre a Cidreira era feito em menos de uma semana. Quando eram
gastos apenas cinco dias, considerava-se um recorde de velocidade.
Com as carretas de transporte dos passageiros seguiam outras carregadas de
mantimentos, inclusive muitos sacos de milho e dezenas de fardos de alfafa, aos cuidados
dos empregados, pois os cavalos de corrida do príncipe também iam aos banhos de mar.
Isso, ele como treinador e tratador, fazia questão fechada.
A maior festa que a Cidade Baixa já viu foi quando Príncipe Custódio completou cem anos
de idade. Nesse dia muita gente "bem" foi abraçá-lo em sua casa, e ele, dando
demonstração de sua vitalidade exuberante, montou a cavalo sem receber qualquer ajuda.
Aliás, isto ele fez até poucos dias antes de sua morte, quatro anos depois.
No dia 26 de Maio de 1936 morreu o Príncipe Custódio aos 104 anos de existência. Seu
velório e seu enterro, atendendo ao pedido expresso do morto, foi feito dentro das
tradições africanas com muito batuque e muitos "trabalhos", em intenção do morto.
Com ele desapareceu uma das figuras mais impressionantes e esquisitas da nossa
cidade, e muita gente ficou desamparada, pois a subvenção paga mensalmente em libras
pelo governo inglês extinguiu-se com a morte do príncipe de Ajudá.

Referências
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Porto Alegre, in "Um rio chamado Atlântico". Rio de Janeiro:
Nova Fronteira;UFRJ, 2003
2. Ir para cima↑ ORO, Ari Pedro; Religiões afro-brasileiras do Rio
Grande do Sul: passado e presente.. Estudos Afro-Asiáticos,
Brasil, v. 24, n.2, p. 345-384, 2002.
3. Ir para cima↑ CORREA, Norton. Os vivos, os mortos e os
deuses. Porto Alegre. Dissertação (Mestrado em Antropologia
Social) – Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1988.
Batuque

Batuque (religião)
Festa
de Ibeji - Sociedade Beneficente
Africana São Origem:
Gerônimo Wikipédia,
- Porto a enciclopédia livre.
Alegre RS
(Redirecionado de Odé no Batuque)
Religiões
cita fontes afro-brasileiras
confiáveis e independentes, mas que não
údo (desde maio de 2015).Por favor, adicione mais referências
Princípios Básicos
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Deus
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Jeje | Mawu | Vodun
Nota:
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Religiões semelhantes
Religiões
Africanas Santeria Palo AraráLukumí
Regla de Ocha Abakuá Obeah
Batuque é uma forma genérica de denominar as religiões afro-brasileiras de culto
aos orixás encontrada principalmente no estado do Rio Grande do Sul, Brasil, de onde se
estendeu para os países vizinhos tais como Uruguai e Argentina.
O batuque é fruto de religiões dos povos da Costa da Guiné e da Nigéria, com as
nações Jêje, Ijexá, Oyó, Cabinda e Nagô.

Índice
[esconder]

 1História
 2Crenças
 3Orixás
o 3.1Bará
o 3.2Ogum
o 3.3Oyà
o 3.4Sangó
o 3.5Ibeji
o 3.6Odé
o 3.7Otin
o 3.8Obá
o 3.9Ossaim
o 3.10Xapanã
o 3.11Oxum
o 3.12Iemanjá
o 3.13Oxalá
 4Templos
 5Rituais
 6Egun
 7Sacerdócio
 8Outra definição
 9Referências
 10Bibliografia
 11Ligações externas

História[editar | editar código-fonte]


A estruturação do batuque no estado do Rio Grande do Sul deu-se no início do século XIX,
entre os anos de 1833 e 1859 (Correa, 1988 a:69). Tudo indica que os primeiros terreiros
foram fundados na região de Rio Grande e Pelotas. Tem-se notícias, em jornais desta
região, matérias sobre cultos de origem africana datadas de abril de 1878, (Jornal do
Comércio, Pelotas). Já em Porto Alegre, as noticias relativas ao batuque, datam da
segunda metade do século XIX, quando ocorreu a migração de escravos e ex-escravos da
região de Pelotas e Rio Grande para Capital.
Os rituais do batuque seguem fundamentos, principalmente das raízes da nação Ijexá,
proveniente da Nigéria, e dá lastro as outras nações como o Jêje do Daomé,
hoje Benim,Cabinda (enclave Angolano) e Oyó, também, da região da Nigéria.
O batuque surgiu como diversas religiões afro-brasileiras praticadas no Brasil, tem as suas
raízes na África, tendo sido criado e adaptado pelos negros no tempo da escravidão. Um
dos principais representantes do batuque foi o Príncipe Custódio de Xapanã. O nome
batuque era dado pelos brancos, sendo que os negros o chamavam de Pará. É da Junção
de todas estas nações que se originou esta cultura conhecida como batuque, e os nomes
mais expressivos da antiguidade, e da atualidade, que de uma maneira ou de outra
contribuem para a continuidade dos rituais são:

 Ijexá — Paulino de Oxalá Efan, Maria Antonia de Assis (Mãe Antonia de Bará), Manoel
Matias (Pai Manoelzinho de Xapanã), Jovita de Xangô; Miguela do Bará, Pai Idalino de
Ogum, Estela de Yemanjá, Ondina de Xapanã, Ormira de Xangô, Pedro de
Yemanjá,Pai Tuia de Bará,Pai Tita de Xangô; Menicio Lemos da Yemanjá Zeca
Pinheiro de Xapanã, Mãe Rita de Xangô Aganju,entre outros.
 Oyó — Mãe Emília de Oyá Lajá, princesa Africana , Pai Donga da Yemanjá, Mãe
Gratulina de xapanã, Mãe "Pequena" de Obá, Mãe Andrezza Ferreira da Silva, Pai
Antoninho da Oxum, Nicola de Xangô, Mãe Moça de Oxum, Miguela de Xangô, Acimar
de Xangô, Toninho de Xangô, Tim de Ogum, Pai André do Ogum entre outros.
 Jêje — Mãe Chininha de Xangô, Príncipe Custódio de Xapanã, João Correa de Lima
(Joãozinho do Exú By) responsável pela expansão do batuque no Uruguai e Argentina,
Zé da Saia do Sobô, Loreno do Ogum, Nica do Bará, Alzira de Xangô, Pai Pirica de
Xangô;Mãe Dada de Xangô; Leda de Xangô; Pai Tião de Bará; Pai Nelson de Xangô,
Pai Vinícius de Oxalá entre outros.
 Cabinda — Waldemar Antônio dos Santos de Xangô Kamuká; Maria Madalena Aurélio
da Silva de Oxum, Palmira Torres de Oxum, Pai Henrique de Oxum, Pai Romário de
Oxalá, Pai Gabriel da Oxum, Mãe Marlene de Oxum, Pai Cleon de Oxalá, Pai Adão de
Bará, Pai Mário da Oxum, Pai Nazário do Bará, Pai Didi de Xangô, Pai Enio de Oxum
Miuá, entre outros.
O nome Cabinda parece ser recente na etnografia, pois a tradição oral coletada por Norton
Correa (1996, 55)[1] registra o nome de Cambina. Devido à similaridade, pode ter sido
associdada ao enclave angolano citado. Estudos recentes mostram possibilidades da
nação Cambina ter suas origem entre os Iorubás, e não os bantus (Wolff, Revista Olorun,
Julho 2014, n. 18).[2]
As entidades cultuadas são as mesmas em quase todos terreiros, os assentamentos tem
rituais e rezas muito parecidos, as diferenças entre as nações é basicamente em respeito
as tradições próprias de cada raiz ancestral, como no preparo de alimentos e oferendas
sagradas. O Ijexá é atualmente a nação predominante, encontra-se associado aos rituais
de todas nações.

Crenças[editar | editar código-fonte]


O batuque é uma religião onde se cultuam vários orixás, oriundos de várias partes da
África, e suas forças estão em parte dentro dos terreiros, onde permanecem seus
assentamentos e na maior parte na natureza: rios, lagos, matas, mar, pedreiras,
cachoeiras etc., onde também invocamos as vibrações de seus Orixás.
Todo ser humano nasce sob a influencia de um orixá, e em sua vida terá as vibrações e a
proteção deste Orixá que está naturalmente vinculado e rege seu destino, com
características individuais, em que o Orixá exige sua dedicação, onde este poderá ser um
simples colaborador nos cultos, ou até mesmo se tornar um Babalorixá ou Iyalorixá.
Há uma questão de ordem etimológica no Termo Pará, onde afirma-se ser este o outro
nome pelo qual é conhecido o batuque, ora sabe-se que todo frequentador de Terreiros
chama na verdade o Peji ou quarto-de-santo de Pará e não o ritual sagrado dos orixás,
este sim o batuque.
Esta questão já está dimensionada desde os anos 50, nas pesquisas etnográficas
de Roger Bastide sobre a religião africana no Rio Grande do Sul.
São consideradas Religiões afro-brasileiras, todas as religiões que tiveram origem
nas Religiões tradicionais africanas, que foram trazidas para o Brasil pelos escravos.
As religiões afro-brasileiras são relacionadas com a religião yorubá e outras religiões
africanas, e diferentes das religiões afro-caribenhas como a santería e o vodu.

Orixás[editar | editar código-fonte]


O culto, no batuque, é feito exclusivamente aos orixás, sendo o Bará o primeiro a ser
homenageado antes de qualquer outro, e encontra-se seu assentamento em todos os
terreiros, no candomblé o chamam de Exú.
Entre os orixás não há hierarquia, um não é mais importante do que o outro, eles
simplesmente se completam cada um com determinadas funções dentro do culto. Os
principais orixás cultuados são: Bará, Ogum, Oiá-Iansã, Xangô, Ibeji (que tem seu ritual
ligado ao culto de Xangô e
Oxum), Odé, Otim, Oba, Osanha, Xapanã, Oxum, Iemanjá,Oxalá e Orunmilá (ligado ao
culto de Oxalá).
E há também divindades que nem todas nações cultuam como: Legba, Gama (ligada ao
culto de Xapanã), Zína, Zambirá e Xanguín (qualidade rara de Bará) que só os mais
antigos tem conhecimentos suficientes para fazer seus rituais.
Bará[editar | editar código-fonte]
Significa Corpo em Yorubá, é a denominação do orixá Exu, no Batuque - religião afro-
brasileira praticada no Rio Grande do Sul.
Por ter várias características pertencentes aos homens, Bará se apresenta como o Orixá
mais humano de todos os Deuses africanos. É um Orixá prestativo e presente, segurando
todas as futuras necessidades dos homens, mas deve ser sempre o primeiro Orixá a ser
servido em qualquer obrigação - caso contrário, algo desagradável pode acontecer. Mas
basta servi-lo primeiro e assim o ritual estará bem encaminhado. É o Orixá responsável
pela boa abertura dos trabalhos, para os negócios e as vidas, destrancando caminhos e
abrindo portas ou trancando e fechando, dependendo do merecimento e do cumprimento
de tarefas pelo responsável.
No passado, as obrigações do Orixá Bará eram dadas somente a homens, como por
exemplo, a limpeza dos Acutás e somente os mesmos, eram aprontados para o Orixá
Bará. Hoje já existem mulheres aprontadas ao Orixá Bará, principalmente aos que
chamamos de "dentro do templo", como Lanã, Adague e Agelú. Mas não podemos
esquecer que suas raízes africanas, tanto yorubá quanto bantu, estão ligadas aos cultos
masculinos, pois independente da qualidade, ele é o Orixá Bará, energia de virilidade
masculina e ímpar.
No aprontamento de um filho do Orixá Bará na Nação Religiosa de Cabinda, uma das
nações do Batuque, segue-se algumas escolhas importantes, como um Babalorixá de
orixá "dito" masculino e o Padrinho de religião, também obedece o mesmo procedimento.
Caso o iniciado tenha outros padrinhos por conta de outros Axés, a hierarquia e o respeito
de se ter um homem de orixá masculino e com aprontamento superior se repete. [3]
Uma de suas características mais marcantes, está presente em uma das milhares de
lendas existentes sobre este Orixá. Conta a lenda que certo dia Bará desafia Oxalá, a
discussão em pauta era saber quem era o mais antigo. Logo aquele que deveria receber
mais respeito, e se tornar o soberano em relação ao outros, após uma batalha cheia de
peripécias e truques, Oxalá domina a cabaça de Bará, onde está sua concentração de
poderes, tornando-lhe assim seu eterno servo.

 Saudação: Alúpo ou Lalúpo


 Dia da Semana: segunda-feira ou sexta-feira (Bará Agelu)
 Número: 7 e seus múltiplos
 Cor: vermelha
 Guia: corrente de aço (para alguns), vermelha escura (para a força feminina:
Elegbara), vermelha sangue (Lanâ, Lodê, Adague e Agelú)
 Oferenda: pipoca, milho torrado, sete batatas inglesas assadas no [azeite de dendê]
 Ferramentas: corrente, chave, foice, moeda, búzios, entre outros
 Ave: galo vermelho
 Lugares na natureza: encruzilhadas.
Qualidades

 Bará Lodê (Olodê): Guardião da parte externa do templo


 Bará Lanã (Onã): Guardião da porta do templo
 Bará Adagbe: Guardião da parte interna do templo
 Bará Agelú (Jelú): Guardião dos orixás "chamados mel ou praia" e das areias da praia
 Bará Elegbará: Como Lodê, também faz a segurança a parte externa do templo
Ogum[editar | editar código-fonte]
Ogum é o dono do ferro e de todos os seus derivados, como armas e ferramentas.
Também é dono da bebida alcoólica e é considerado o senhor da guerra. É esposo
de Iansã, que o traiu com Xangô após embebedá-lo com atã.
Por ser o dono do "obé" (faca), sem ele não tem como outros orixás serem feitos.
Qualquer sacerdote de orixá tem que ter Ogum em seus assentamentos, pois este é o
dono do axé das facas. Por ser dono das armas, é invocado para vencer demandas. Pela
mesma razão é o protetor dos policiais e dos soldados.
A diferença entre as obrigações de faca de Ogum e Bará é que o primeiro é firmado para a
ritualística de somente Orixás, enquanto que o segundo é firmado para serviços de Egúns
e trocas.
Na Nação de Cabinda, existem três classes de Ogum: Avagã: Cultuado na parte externa
do templo. Junto com o Bará Lodê, faz a proteção externa do local. Tem tendência a ser
usado em trabalhos de maior demanda. Onira: Cultuado na parte interna do templo. Tem
como missão proteger todo espaço do culto contra demandas de morte e feitiços.Adiolá:
Ogum da parte interna do templo. Trabalha principalmente com os orixás de praia.
Em algumas casas da Nação de Cabinda, há uma quarta classe de Ogum, que recebe o
nome de Olobedé. Trabalha também na parte interna do templo, com ações de limpeza e
afastamento de energias maléficas. É um Ogum muito severo, mas de grande consciência.
Na Nação Ijexá são cultuados Ogum Avagã, Ogum Onire e Ogum Adjolá. Este último é um
guerreiro guardião que trabalha na beira da água a mando de Oxum, Iemanjá eOxalá.
Ogun Avagã tem seu assentamento junto a Bára e Oyá.
Na Nação Nagô são cultuados Ogun
Wari, Alagbede, Olode, Alé, Ògúnjà, Meje, Onire e Soroke.
Características
As suas cores são o vermelho e o verde[4] (para o Meje, verde e branco). O dia da semana
consagrado a Ogum é a terça-feira (segunda-feira para Ogum Avagã), e o
seusincretismo é com São Jorge (em algumas nações Ogum Avagã é sincretizado com
São Paulo). A sua saudação no batuque, "Ogunhê!", é muito usada nas procissões em
comemoração ao Dia de São Jorge (23 de abril)[5] , juntamente com saudações
ao santo católico.
As suas armas e ferramentas são: a espada,a lança, a bigorna, o escudo, o capacete,
a ferradura, o martelo, a marreta, a enxada, o ancinho, o alicate, o bisturi e o serrote(para
Ogum Avagã, um revólver). Os seus metais são o ferro, o aço e o chumbo, e sua pedra é
o diamante.
As suas atividades são a agricultura, a batalha, as viagens, os caminhos, e a caça. Na
Nação de Cabinda, seu fio é feito com uma conta verde-mato e uma vermelho-sangue.
Algumas casas também adotam o fio com 7 contas para cada uma na sequência, por ser
seu número. Já Avagã, suas cores são o verde e o vermelho escuro. Na Nação Ijexá, a
sua guia (fio-de-contas) é feita com uma conta verde e uma vermelha para Ogum Onira e
Ogum Avagã; para Ogum Adjola, contas azuis são incluídas. No Jeje a sua guia é feita em
verde e branco, com predominância do verde.
Lugares na natureza: campos, matas e encruzilhadas[5] .
Oferendas

 Uma costela de boi com 3, 5 ou 7 ripas


 Miãmiã gordo (farinha de mandioca com azeite de dendê)
 Pipoca, folhas de alface (para Ogum Adjolá), uma maçã vermelha (para Ogum Onira),
uma laranja de umbigo (para Ogum Avagã)
 Vela: verde com vermelha; verde escuro para Ogum Avagã (Nação de Cabinda e
Ijexá); verde com branca (Jeje)
Lenda da coleta dos búzios
Devido à traição de Oiá, Ogum e Xangô jamais se reconciliaram e, por diversas vezes,
acabavam por se defrontar em acirradas disputas.
Certa vez, Ogum propôs a Xangô que realizassem uma trégua nessas lutas, pelo menos
até à lua seguinte. Xangô respondeu com alguns gracejos, que Ogum revidou, mas propôs
uma aposta: que ambos se dirigissem à praia e recolhessem o maior número
de búzios que conseguissem. O perdedor ofereceria ao vencedor o fruto da sua coleta.
Estando acertados, Ogum deixou Xangô e dirigiu-se à casa de Oyá, solicitando-lhe que
pedisse a Ikú (a morte) que fosse à praia na hora em que ele havia combinado com
Xangô. Oiá exigiu uma certa quantia em ouro, que prontamente recebeu de Ogum.
No dia seguinte, Ogum e Xangô amanheceram na praia, iniciando a coleta. De vez em
quando se entreolhavam, e Xangô lançava ditos jocosos contra Ogum, sem perceber que
Ikú se aproximava de si. Ao levantar os olhos, deparou-se com Ikú, que riu de seu
espanto. Assustado, Xangô abandonou a sua sacola com os búzios colhidos, se
escondendo. No fim do dia, Ogum procurou Xangô mostrando a sua coleta. Xangô,
envergonhado, abaixou a cabeça e entregou ao guerreiro o fruto da sua coleta.
Oyà[editar | editar código-fonte]
Oyà de tradução yoruba, que significa nove. É associada a sensualidade, a força feminina
e a guerra. Orixá dos ventos e das tempestades, foi esposa de Ogum, o qual deixou por
amor a Xangô; Dentre os os Orixás femininos é considerada com Obá, uma das mais
guerreiras.
Oyá é tradicionalmente conhecida como uma manifestação jovem, sendo o nome Yansã
(que sopra o vento), conhecida como sua forma mais madura e muito utilizado também na
umbanda popular. É o primeiro Orixá feminino a ser cultuada na hierarquia do Batuque em
todas as Nações.
Está associada aos ventos, raios e tempestades. Muito comum entre os batuqueiros ao se
perceber uma forte ventania, diz se que Oyá está “abanando a saia”. Também rege a
sexualidade feminina e, por conseguinte, a sedução e as paixões. É a “dona do teto” e da
panela, portanto para os batuqueiros, quem tem Oyá nunca fica desabrigado, e nem passa
fome. Pelo fato de dominar os Eguns, é sempre invocada quando o problema se trata de
uma possível perturbação causada por estes espíritos não evoluídos. Por ser um Orixá
diretamente associado a Ogum, é cultuada nos mesmos lugares e em companhia deste
Orixá, sendo que aceita melhor suas oferendas, se depositadas junto a uma pitangueira,
árvore consagrada a ela. Suas cores são a combinação do vermelho com o branco, dando
ênfase ao vermelho. Na Nação de Cabinda além de Ogum, Oyá também faz adjunto com
Xangô, Bará e Xapanã.
Número: 7
Guia: 7 contas vermelhas e 7 contas brancas cristais
Dia da semana: Terça-feira
Saudação: Paieio
Qualidades: Oyá, Timboá, Dirá e Yansã.
[6]

Sangó[editar | editar código-fonte]


Sangó (em yorubá) é um dos principais Orixás do Batuque. Na
tradição temos Xangô Agodô (mais sábio) que é sincretizado com São
Jerônimo, Xangô Aganju ( o mais jovem) com São Miguel
Arcanjo e Xangô Aganju de Ibeje (criança) com Cosme e
Damião. Sàngó Aganjú Ybeji, na realidade é uma qualidade de Sàngó
Aganjú que tem seu assentamento lado a lado com o assentamento
de orixá Ybeji especificamente quando o elegun = (yawo) quê é do
orisá Sàngó Aganjú tem alguma ligação orisá Orisá Ybeji ou vice-
versa, E Sàngó Kamuká quê especificamente é considerado orei da
nação Kabinda, Estas são as qualidades de Xangô nas Nações de:
Oyó, Kabinda, Jeje, Ijesa, Nagô E Congo.
Sua comida preferida é o [amalá] é seu dia da semana é Quarta-feira,
juntamente com Oyá. Suas cores são o vermelho e o branco e sua
saudação é kao kabecile.
Xangô é considerado o Rei de várias nações. No Batuque do RS, a
Nação de Oyó e de Kabinda o tem como seu Rei supremo. Talvez daí
a grande importância, pois no ritual a principal dança o alujá, é
dedicado a Xangô, como coroamento das obrigações de 4 patas feita
nas Nações.
Além de ser o dono da Balança (Kassun), é considerado o pai dos
Ibejes, sendo também um dos regentes dos Egúns no Batuque.
Durante a Balança, a presença de Xangô é imprescindível, pois ele
gera a harmonia e força para a confirmação das obrigações que estão
sendo realizadas. Orixá da justiça e das escritas, suas ferramentas
são o machado de dois fios e um fio, o livro e a balança. A pedreira é
o local de oferendas a Xangô, de preferência se for perto de algum rio
ou praia. Seus assentamentos são tratados com epô, mas Xango
Ibeje, também recebe mel em seus trabalhos. Na mitologia africana,
Xangô teve três esposas: Oxum, Oyá e Obá, que geralmente são
seus adjuntos na Nação de Cabinda.

 Saudação: Kao Kabecile


 Número: 6 e seus múltiplos
 Cor: vermelho e branco
 Guia: 6 contas vermelhas e 6 contas brancas
Ibeji[editar | editar código-fonte]
Ìbejì (yoruba), Ibêje ou Ibeji, na Nação Ijexá e na Nação de
Cabinda do Batuque, são entidades Gêmeas que formam um único
orixá. São Orixás infantes.
Seu assentamento é feito em "vultos" (orixás feito em madeira). A
homenagem aos Ibêjes, chamada de Mesa de Ibêje consiste numa
mesa (toalha arreada no chão) na qual se serve somente crianças até
sete anos de idade e mulheres grávidas, para comerem canja feita
das aves que foram sacrificadas aos Ibêjes, doces de toda
qualidade, brinquedose balas.
Geralmente, Xangô e Oxum ocupam seus filhos de santo para
prestigiar. Yemanjá e Oxalá também podem ser fazer presentes na
cerimônia. Não é comum a presença de outros orixás chegando a
Mesa de Ibêje por se tratar de um rito doce e onde a energia da
fecundidade está muito presente.
São os melhores para trabalhar na Nação pois possuem o mel de
uma criança e o azedo de um adulto.
Diferente do Candomblé, onde Ibêje é cultuado como Orixá ímpar, no
Batuque eles são cultuados como qualidades de seus pais. Tanto
Xangô Agandju Ibêje, quanto Oxum Epandá Ibêje, recebem as
oferendas e pedidos de quem precisam de suas preces.
Na África, Ibêje é o que indica a contradição, os opostos que
caminham juntos, a dualidade. Ibêje mostra que todas as coisas, em
todas as circunstâncias, têm dois lados e que a justiça só pode ser
feita se as duas medidas forem pesadas, se os dois lados forem
ouvidos. Por isso de sua herança e importância na cultura afro
brasileira.

 Dia da semana na Nação de Cabinda: Terça-feira (Xangô


Agandju Ibêje). Sábado (Oxum Epandá Ibêje)
 Numero: 6 para Xangô Agandju Ibêje e 8 para Oxum Epandá
Ibêje (Nação de Cabinda)
 Cor: Todas as cores, menos o preto
 Sincretismo: Cosme e Damião e Nossa Senhora de Fátima
Odé[editar | editar código-fonte]
Odé é o orixá das matas e florestas onde vive a caçar. É o protetor
dos caçadores e seu nome deriva desta palavra. Seus filhos são
espertos, rápidos e atentos.
Descrição
Considerado uma das mais belas danças nos cultos afro brasileiros,
pois ocupa seus filhos dançando com um arco e com bela
movimentação. No Candomblé, é conhecido mais como Oxóssi. Em
grande parte dos itóns (lendas), aparece como o irmão caçula de Bará
e Ogum. Na Nação de Cabinda, sua dança é sempre acompanhada
de sua grande companheira, Otim. Considerado na Africa antiga, o
Rei de Ketu. Teve suma importância no desenvolvimento religioso e
intelectual entre os yorubás, mas seu culto é difundido em todas as
nações do Batuque do RS. Apesar de ser o grande caçador e arqueiro
entre os Orixás, nos cultos puramente africanos, suas oferendas eram
devolvidas a natureza, pois é considerado o protetor dos animais. Em
suas oferendas, são oferecidas comidas a base de porco, como
costelas. Seu principal adjuntó é Otim. Mas Odé também pode fazer
adjuntó com Yemanjá em raras vezes.
Característica

 Símbolo: Arco e flecha e a lança


 Cor: Azul marinho;
 Dia da semana: Segunda-feira; Na Nação de Cabinda, sexta-feira
 Saudação: Oquê oquebamo
 Número: 7. Outras nações adotam o 8.
 Alimento: Algumas nações cultuam somente com epô (azeite de
dendê), outras também utilizam o mel.
 Guia: 1 conta azul, 1 conta rosa, 1 conta branca - (Nação de
Cabinda)[7]
 Sincretismo: São Sebastião.
 Filho único da orixá Yemanjá, tendo sido criado junto de Ogum e
Bará, sendo estes grandes companheiros.
Otin[editar | editar código-fonte]
Otin (yorubá) ou Otim (usado na grafia do Batuque), significa rio que
embriaga, transborda.
Em uma das centenas de itóns (lendas), temos Odé como o terceiro
filho de Yemanjá com Oxalá senhor da caça e Rei do Ketu o único
verdadeiro amor de Oxum. Diz uma lenda que Odé um dia saiu de
casa e ficou preso nas matas de Ossaim apesar de sua mãe o ter
avisado, mas teimoso foi até as matas e Ossanha fascinado por suas
habilidades o prendeu lá. Yemanjá ficou muito triste com a ausência
de seu filho e se pôs a chorar. Então Oxalá deu ordem para Ossanha
soltar Odé para ver sua mãe, mas, por ter passado muito tempo, Odé
se acostumou a viver nas matas. Sendo assim, visita sua mãe, mas
sua morada ficou sendo as matas, onde a partir daí conhece Otin.
Outra versão:
Companheira inseparável de Odé, vive no mato em sua companhia.
Esta Iyabá é pouco cultuada no Brasil, mas seu fundamento foi
conservado nas Nações de Batuque no Sul do país. É raro encontrar
iniciados a Otin. É uma Orixá que se alimenta de todo tipo de caça,
porém seu alimento preferido é a carne de porco. Por conta disso, um
dos arquétipos dos filhos de Otin é a gula.
Ela reina toda a fauna (fêmeas) protegendo as florestas e o
ecossistema. Dentro da religião, muitos comentam que não há
ocupação de Otin em seus cavalos de santo ou até mesmo não se dá
Ori a Otin. Tanto na Nação Cabinda, Jeje ou Ijexá, o aprontamento de
Otin já é fato corriqueiro. Geralmente Otin é adjuntó de Odé e vice-
versa. Em alguns templos, o tratamento de Otin é feito somente com
epô, mas alguns sacerdotes também adotam o epô com mel em suas
feituras.

 Saudação: Oquê Oquebamo


 Número: 7 ou 8, dependendo da Nação
 Cor: Azulão, rosa e branco (3 contas de cada cor) na Nação de
Cabinda
 Sincretismo: Santa Bernadete
Obá[editar | editar código-fonte]
Obà, (Rainha em yoruba) Obá (usado em sentido literário no Batuque,
mas que significa Rei) é a Orixá associada as lutas e de grande
virilidade feminina. Seu culto é cheio de tabus, principalmente para os
mais antigos. Não é muito fácil encontrar filhas (os) de Obá. Diz-se
que no passado na Nação de Cabinda, somente mulheres eram
iniciadas e se tem notícias ainda hoje, que durante suas rezas no
passado, os homens não tinham permissão de dançar, da mesma
forma que as mulheres não dançavam para qualquer qualidade do
Orixá Bará. Nos antigos terreiros da Nação de Cabinda, somente as
Yalorixás de orixás femininos poderiam aprontar filhas de Obá, sendo
que somente Madrinhas de Religião também de orixás femininos,
podiam ser escolhidas para seus aprontamentos. Obá sempre foi um
orixá de fortes tabus. Seu aprontamento se reserva a detalhes bem
específicos, que é de conhecimento dos mais antigos. Diferente do
culto das outras iyabas, nela não há presença de homens e até
mesmo crianças dentro de seu culto. Mas de anos para cá, talvez o
orixá tenho se "adaptado e/ou aceitado" algumas situações como
aprontamento de homens ou até mesmo o orixá como passagem de
alguns orumalés masculinos. No Candomblé (Ketú), Obá é tratada
como uma orixá da justiça e das águas revoltas. Em geral, no
Batuque, ela está mais ligada como orixá das rodas e do corte, apesar
de se tratar da mesma orixá, mas que demonstra toda tenacidade
deste (a) orixa.
Obá foi uma das três esposas de Xangô, na qual diz a lenda que ao
tentar agradar o marido, foi convencida por Oxum a cortar sua orelha.
Em uma das rezas de Obá, dança-se com uma das mãos nas orelhas
em homenagem a este itón (lenda).
Em grande parte das Nações que compõem o Batuque do RS, as (os)
filhas (os) Obá tem como adjuntó o Orixá Bará ou Xangô ou Xapanã.
Em todas as suas obrigações, ela é tratada com Epô (azeite de
dendê) e sempre invocada em caso de brigas e de reequilíbrio do
sistema físico emocional.

 Dia da semana na nação Ijexá é segunda-feira,


 Dia da semana na nação de Cabinda é quarta-feira.
 A cor é rosa, mas na nação de Cabinda também se adota o
marrom, porém é pouco usual e mais utilizada pelo antigos,
segundo Paulo T. B. Ferreira, em sua obra "Fundamentos
Religiosos da Nação dos Orixás".
 É sincretizada com Santa Catarina de Alexandria. Em outras
nações com Santa Joana D´Arc.
 A saudação no Batuque é EXÓ. Já no Candomblé e outras
nações não afro-gauchas a saudação é Oba-xirê
 A cor da guia é rosa ou marrom. Também pode ser feita com
estas cores intercaladas.
 Seu número é 7.
Ossaim[editar | editar código-fonte]
Ossaim, é o médico das Nações que compõem o Batuque. É o dono
das plantas medicinais e seus estudos. Sua importância é
fundamental nos ritos africanos desde uma simples lavação de
cabeça até o assentamento de orixás começam com o uso de
suas ervas.
Todas as ervas, chás, folhas e vegetação pertencem a Ossaim; é ele
quem libera a propriedade mágica das folhas nos rituais dos Orixás.
Divide com Xapanã o axé sobre a saúde física.

 Na Nação de Ijexá sua cor é o verde claro e amarelo. Na Nação


de Cabinda, se usa o verde e branco
 Dia da semana na nação Ijexá e na nação Cabinda é segunda-
feira. (Fundamentos Religiosos da Nação dos Orixás - Paulo
Tadeu B. Ferreira. Ed Toqui).
 Seu número é o 7 e seus adjuntos são Oxum e Yemanjá na
Nação de Cabinda.
O Orixá Ossanha é o senhor das folhas. A este Orixá pertencem
todas as folhas e ervas utilizadas no culto. A lenda diz que foi Oyá
que abanou a saia e fez com que os ventos espalhassem as folhas,
para que desta forma, os demais Orixás pudessem apoderar-se de
algumas, mas que de maneira geral pertencem mesmo a Ossanha.
Também se conta que este Orixá teve uma das pernas amputadas,
por isso na maioria das vezes, quando manifestado, ele dança e se
movimenta numa só perna. Logicamente que Ossanha rege a flora, e
devido ao poder de cura das plantas, sendo ele o detentor do
conhecimento sobre a eficácia de cada uma delas, é um dos Orixás
“médicos” do Orunmalé. Além da homeopatia, o conhecimento de
cura das doenças ligadas ao esqueleto ósseo humano também tem
colaboração de Ossanha. As oferendas a Ossanha devem ser
entregues no interior da mata, sendo o coqueiro a árvore consagrada
a este Orixá. Como se torna cada vez mais difícil encontrar áreas de
mata dentro da cidade, é muito comum depositarem suas oferendas
em áreas gramadas junto a coqueiros ou palmeiras, (praças, por
exemplo), ou até mesmo junto a figueiras, que é uma árvore
consagrada a outro Orixá “médico”, mas que mesmo assim, é aceito
de bom grado por Ossanha. Suas cores são a soma do verde e do
amarelo ou verde com o branco e a mistura destas, resulta em um
verde bem clarinho. Seu dia da semana é a sexta-feira e o seu
sincretismo afro-católico, São José na Nação Ijexá e na Nação de
Cabinda é na segunda-feira[8]
Xapanã[editar | editar código-fonte]
Xapanã no Batuque, é o Orixá da varíola e de todas as doenças
contagiosas, senhor da saúde e das doenças, pois tanto pode
produzi-las, como curá-las, no Candomblé é também conhecido como
Obaluayê ou Omulu, dependendo da Nação que o cultua.
Xapanã, vem de Sànpònná (fon), idioma do povo Jêje do antigo
Daomé, atual Benin, que significa Dono da Terra. Os daometanos
sempre foram muito temerosos, já que seus cultos estão originados
no sacrificio e poder que os orixás tinham sobre o povo. O nome
Obaluayê e Omulu, aparecem depois, com as ligações dos deuses
daometanos com os dos yorubás. Os nomes em yorubás significam
títulos recebidos por Xapanã pelas conquistas que aconteceram no
passado, onde o primeiro significa Senhor da Terra e o segundo, Filho
do Senhor da Terra.
Atualmente há uma grande corruptela no meio literário, principalmente
da corrente da "Magia Divina", que passou a se identificar ou a usar a
"roupagem" umbandística tempos atrás, dando denominações
diferentes da Tradição milenar africana, mesmo sendo estes três
nomes o mesmo orixá, só que nos idiomas dos seus povos, Jêjes
(idioma Fon) e Nâgos (idioma yorubá).
Embora seja Rei de Jejê, é muito cultuado em todas as nações do
Batuque. Muitos o colocam como Orixá do cemitério e associado a
morte. Na verdade, era o grande guerreiro dos Jêjes, que o temia,
porque além das guerras, trazia as epidemias e doenças e por conta
disso nas religiões afro-brasileiras, ficou muito vinculado ao lado de
grandes catástrofes.
No Batuque é o dono da vassoura, com que varre os males dos
nossos caminhos. É o legitimo dono da limpeza. Na maioria dos
trabalhos de religião que envolva limpezas das mais complexas,
sempre Xapanã é reverenciado.
Geralmente seus filhos trazem como adjuntó Oyá, Obá e raramente
Oxum. Sempre é representando com a palha da costa encobrindo as
feridas de seu rosto guerreiro. O tratamento de seus assentamentos é
sempre com epô.

 Suas cores são o vermelho e preto (Jubeteí e Belujá) e roxo


(Sapatá) -
 Sua vassoura para trabalhos tem sete cores.
 Sincretizado com Nosso Senhor dos Passos, São Lázaro e São
Roque.
 Dia da semana na Nação de Cabinda e Ijexá é quarta-feira e
segunda-feira no Candomblé.
 Seu número é 7 e seus múltiplos. Alguns Babalorixás da Nação
de Cabinda adotam também o 9.
Oxum[editar | editar código-fonte]
Osùn (yoruba) ou Oxum no Batuque, significa "águas". Na verdade
não existe um nome exato para a tradução de seu nome dentro do
grupo linguístico latino, mas é representada pela riqueza, ouro e
águas doces. Rege a fecundidade feminina, protege o feto e
a gestação. Mulheres grávidas ou que querem engravidar recorrem
sempre aOxum para que lhe dê proteção durante todo processo de
crescimento de seus filhos.
Oxum é uma das orixás mais cultuadas no Brasil. Em grande parte,
ela se apresenta maternal, receptiva, mas também possui seu lado
guerreiro e altivo. Sua dança é sempre majestosa, com ritmos
sinuosos, leves podendo chegar a movimentos mais performáticos.
Dona das línguas e envolvida com a grande magia sacerdotal
feminina, Oxum sempre foi uma orixá onde independente dos seus
reinos de domínio é procurada por todos os adeptos do afro-gaúcho
para alcançar harmonia e prosperidade em vida.
Oxum também é responsável dentro da Nação pela Mesa de Ibeje,
juntamente com Xangô. Esta é uma das principais obrigações de
aprontamento para que os filhos tenham uma vida doce e próspera
em sua nova jornada. Em uma de suas danças, Oxum joga perfume
em toda assistência, como forma de benção e de abrir caminhos a
fecundidade, refletindo a beleza suave e magistral desta grande orixá.
Dentro da Nação de Cabinda, temos algumas qualidades abaixo
reverenciadas:

 Oxum Adocô: A grande matriarca e sábia.


 Oxum Olobá: A Oxum da "lomba". Relacionada aos problemas de
saúde e risco de morte nas gestações e crianças menores.
 Oxum Demum: A grande conhecedora da cura pelas folhas e dos
segredos das cachoeiras mais afastadas.
 Oxum Epandá: Moça, coquete, vaidosa e guerreira.
 Oxum Epandá Ibeje: a mais jovem das oxuns em sua forma
infante.
No Candomblé, segue abaixo algumas particularidades;

 Oxum Agba Ilu: matriarca e idosa.


 Oxum Ijimu: velha e feiticeira.
 Oxum Aboto: Oxum idosa.
 Oxum Opara: Oxum jovem.
 Oxum Ajagurá: outra Oxum jovem e guerreira.
 Oxum Ipondá: moça, elegante e vaidosa.
 Oxum YeYe Oke: guerreira.
 Oxum YeYe Karé: Oxum jovem.
 Oxum YeYe Odo: guerreira do rio.
 Oxum Iyáomí: ligada a Yemoja. Braços de rio com o mar.
Geralmente Oxum faz adjuntó no Batuque com Bará, Xangô, Ossanha
e Oxalá. Raramente com Xapanã e Ogum.

 Cor: Amarela
 Número: 8 e seus múltiplos (Nação de Cabinda)
 Guia: Desde a amarela clara, passando por amarela gema e
amarelo ouro. Para Epanda de Ibeje, todas as cores menos o
preto.
 Sincretismo: Nossa Senhora Aparecida
 Dia da semana: Sábado
Iemanjá[editar | editar código-fonte]
Yemojà (yorubá) signfica filha do peixe. Iemanjá no
Batuque, divindade das águas salgadas, dos mares e
oceanos, Orixá que gera o movimento das águas e protetora da vida.
Deusa da pérola, protetora dos pescadores e marinheiros. Senhora
dos lares, que traz paz e harmonia para toda a família. Considerada a
orixá do pensamento. Por este motivo que recorremos a ela para
solucionar problemas de depressão e de instabilidade emocional. ::
Enquanto Oxum está mais presente na energia de fecunidade,
Yemanjá tem sua força na vida (manutenção e consciência).
As Qualidades de Yemanjá no Ijexá:

1. Olo-bomí - na África é mulher de Obatalá;


2. Bomi - ligada a Jobokun e Orunmilà;
3. Bocí - ligada a Obokun;
Na Nação de Cabinda; 1. Boci - A mais jovem - Rege as partes rasas
das aguas 2. Bomi - A mais idosa - Rege o alto mar. 3. Nanã Borocum
- Dona da origem da vida, não há culto direto a Nanã Borocum, por
este motivo, ela é considerada em algumas casas da Nação, como
uma qualidade velha de Yemanjá
Yemanjá tem como seu adjunto geralmente Oxalá, mas em alguns
casos pode ser Odé.
As Qualidades de Yemanjá no Candomblé:

1. Iyáogunté - ligada a Ogun Alagbede;


2. Iyásagbá - ligada a Oxalufã e Orunmilà;
3. Iyásesu - ligada a Olokun e Obaluayê;
4. Iyá Atará Mogbá - ligada ao rio;
5. Yeyemowo - da terras de Ifé ligada a Obatalá;
6. Iyámasémalé - das terras de Oyó ligada a Xangô;
7. Maiylewá - da terras de Ijexá, ligada a Ossain;
As ervas de yemanjá são: rosa branca, palma, erva Santa Lúzia e
Santa Bárbara, chapéu de couro, açucena, pata e unha de vaca, fruta
da condessa, algas marinhas coco do iri, e outros mais.
Em suas oferendas come ovelha, cabra, galinhas brancas, angola,
pomba. Suas comidas são canjica branca no dendê, arroz com mel,
manjar, champanhe,vinho branco e peixe assado na folha de banana.
A maior quizila de yemanjá é a poeira e o sapo e seu feitiche é a
pedra polida pelas águas; a sua saudação nos búzios "Eru Yá" quer
dizer Salve sra. do cavalo marinho, mas na Nação se usa Omi-odo

 Número: 8 e seus múltiplos (Cabinda)


 Cor: azul claro
 Guias: Azul claro e lilás (Nanã Borocum)
 Dia da semana: Sábado
 Sincretismo: Nossa Senhora dos Navegantes
Oxalá[editar | editar código-fonte]
Pai de todos os Orixás e mortais, Oxalá é o mais respeitado Orixá nas
Nações africanas, a paz e a harmonia espiritual são as características
deste que é o Criador e Administrador do Universo. Quando moço, se
manifesta em seu Cavalo-de-Santo dançando como os outros Orixás,
quando se apresenta em suas passagens velhas, chega quase se
arrastando, caminhando com dificuldade, muitas vezes fica parado no
lugar esperando o auxílio de algum Orixá moço. Pertence a Oxalá de
Orumiláia a visão espiritual, como consequência o jogo de Búzios

 Saudação: Epaô Babá!


 Dia da Semana: No Ijexá e no Cabinda Domingo para Orumiláia ,
ou Oxalá Velho, Quarta-feira para Oxalá Novo, no Nagô sexta-
feira para todos Oxalás.
 Número: 08 e seus múltiplos.
 Cor: Branco e amarelo com preto (no Jeje), branco com preto
para Oxalá de Orumiláia (Oió, Cabinda e Ijexá)
 Guia: toda branca em todas as nações, amarelo com preto no
Jeje, branco com preto em Oió, Cabinda e Ijexá e no Nagô
amarelo com verde para Orumilaia .
 Oferenda: canjica branca em todas as nações, no nago inhame
para os Ajagunãs.
 Ferramentas: jóias em prata, caramujo (ebi), sol, cajado, pomba
de prata, moedas e búzios, para Oxalá de Orumiláia
acrescentamos olhos de prata
 Ave: Galinha branca e galinha preta para Oxalá de Orumiláia,
usado apenas no axé de Búzios e para os outros Oxalás,
somente galinha branca.
 Quatro pé: cabrita branca e com pequenas manchas pretas para
Oxalá de Orumiláia.
Qualidades de Oxalá no Ijexá e no Cabinda:

 Oxalá Obocum: Rei de Ilesá, confundido com Oxaguiãn.


 Oxalá Jobocum: Oxalá Velho.
 Oxalá de Orumiláia: Dono dos oráculos.
 Oxalá Olocum: Ligado as aguas.
 Oxalá Dacum: Oxalá de meia-idade.
Qualidades de Oxalá no Nagô:

 Oxalá Olufon: Rei de Ifon, carrega Opaxorô;


 Oxalá Ajaguna: Rei de Ejigbo, comedor de inhame;
 Oxalá Oke: Da Montanha;
 Oxalá Oko: Da Agricultura;
 Oxalá Danko: Do bambu branco;
Na Nação de Cabinda, não existe ocupação de Oxalá de Orumilaia.
Por estar relacionado ao Oráculo do axé de búzios, seu assentamento
é somente para para este tipo de caso. Geralmente faz adjuntó com
Oxum e Yemanjá, regendo também a vida e a prosperidade.

Templos[editar | editar código-fonte]


No Rio Grande do Sul a área de conservação das
religiões africanas vai de litoral à fronteira do Uruguai, com os dois
grandes centros de Pelotas e de Porto Alegre.
No batuque, os templos terreiros são quase que em sua totalidade
vinculados as casas de moradia. É destinado um cômodo, geralmente
na parte da frente da construção onde são colocados os
assentamentos dos Orixás. Neste local são feitos todos os
fundamentos de imolações e trabalhos determinados, oferendas para
os orixás, e o local é considerado sagrado, pessoas vestidas de preto,
mulheres em dias de menstruação não entram. Junto a esta parte da
casa, chamada de quarto de Santo ou Peji, há o salão onde são
realizadas as festas para os orixás.
O estado do Rio Grande do Sul foi o maior responsável pela
exportação dos rituais africanos para outros países da América do
Sul, entre eles Uruguai e Argentina, que também procuram seguir a
maneira de cultuar os orixás, e a construção dos templos seguem
exemplos dos seus sacerdotes.
Todos os orixás são montados com ferramentas, Okutás (pedras) etc.
e permanecem dentro da mesma casa, com exceção do Bará Lodê e
do Ogum Avagãn, que tem seus assentamentos numa casa separada,
ficando à frente do templo onde recebem suas oferendas e sacrifícios.
A casa dos Eguns também tem lugar definido, é uma construção
separada da casa principal, na parte dos fundos do terreiro, onde são
feitos diversos rituais.
Em caso de falecimento do babalorixá ou iyalorix, dono do terreiro,
fica a critério da família o destino do templo, geralmente não tendo um
familiar que possa suceder o morto o templo é fechado. Na maioria
dos casos na morte de um sacerdote, todas as obrigações são
despachadas num ritual especifico chamado de Eresum, semelhante
ao axexê do candomblé, por este motivo é muito difícil encontrar ilês
(casas) com mais de 60 anos, são muito poucos os sacerdotes que
destinam seus axés a um sucessor, para dar prosseguimento à raiz.

Rituais[editar | editar código-fonte]


Os rituais são próprios e originais e embora tenha alguma
semelhança com o "Xangô de Pernambuco", é muito diferente
do candomblé da Bahia.
Os rituais de Jêje tem suas rezas próprias (fon), e ainda se vê este
belo ritual em dois grandes terreiros na cidade de Porto Alegre, as
danças são executadas de par, um de frente para o outro. Há também
muitas casas que seguem os fundamentos da nação Oyó que se
aproxima muito do ijexá, já que, estas duas provem de regiões
próximas naNigéria.
A principal característica do ritual do Batuque é o fato do iniciado não
poder saber em hipótese alguma que foi possuído pelo seu orixá, sob
pena de ficar louco.
Cada babalorixá ou iyalorixá tem autonomia na prática de seus rituais,
não existem nomenclaturas de cargos como tem no candomblé,
exercem plenos poderes em seus ilês. Os filhos de santo se revezam
nos cumprimentos das obrigações.
No mínimo uma vez por ano são feitos homenagens com toques para
os Orixás, mas as festas grandes são de quatro em quatro anos.
Chamamos de festa grande a obrigação que tem ebó, ou seja quando
há sacrifícios de animais de quatro patas aos orixás, cabritos,
cabras, carneiros, porcos, ovelhas, acompanhados
de aves como galos, galinhas epombos.
Esta obrigação serve para homenagear o orixá "dono da casa" e dos
filhos que ainda não possuem seu próprio templo. A data é
geralmente a mesma que aquele sacerdote teve assentado seu orixá,
a data de sua feitura. As festas têm um ciclo ritual longo, que
antigamente duravam 32 dias de obrigações, hoje diante das
dificuldades duram no máximo 16. O começo de tudo são as limpezas
de corpo e da casa, para descarregar totalmente o ambiente e as
pessoas, de toda e qualquer negatividade; em seguida são
preparados as oferendas e sacrifícios ao Bará. A partir deste
momento, os iniciados já ficam confinados ao templo, esquecendo
então o cotidiano e passam a viver para os orixás por inteiro até o
final dos rituais. No dia do serão (dia da obrigação de matança), todos
os orixás recebem sacrifícios de animais. Os cabritos e aves são
preparados com diversos temperos e servidos a todos que
participarem dos rituais, tudo é aproveitado, inclusive o couro dos
animais, que sevem para fazer os tambores usados nos dias de
toques.
No dia da festa o salão é enfeitado com as cores dos orixás
homenageados. A abertura se dá com a chamada (invocação aos
Orixás), feita pelo sacerdote em frente ao peji (quarto de santo),
usando a sineta (adjá), saudando todos orixás. Ao som dos tambores,
as pessoas formam uma roda de dança em louvor aos orixás, a cada
um com coreografias especiais de acordo com suas características.
No final das cerimônias são distribuídos os mercados, (bandejas
contendo todo tipo de culinária dos Orixás como: acarajé, axoxó
(milho cozido e fatias de coco), farofa de aves, carnes de cabritos
(cozidas ou assadas), frutas, fatias de bolos etc.), alguns consomem
ali mesmo, outros levam para comer em casa.
Durante a semana são feitos outros rituais de fundamentos para os
orixás, inclusive a matança de peixe, que para os batuqueiros significa
fartura e prosperidade, os peixes oferecidos são da qualidade Jundiá
e Pintado; estes são trazidos vivos do cais do porto ou do mercado
público, onde o comércio de artigos religiosos é intenso.
No sábado seguinte é feito o encerramento das obrigações, com
mesa de Ibejes e toque, novamente em homenagem aos orixás, neste
dia são distribuídos mercados com iguarias e o peixe frito,
significando a divisão da fartura e prosperidade com os participantes
das homenagens aos orixás. Após o encerramento, o sacerdote leva
os filhos que estavam de obrigações ao rio, à igreja, ao mercado
público e à casa de alguns sacerdotes, que fazem parte da família
religiosa, para baterem cabeça em sinal de respeito e agradecimento;
este passeio faz parte do cumprimento dos rituais. Após o passeio
todos estão liberados para seguirem normalmente o cotidiano de suas
vidas.

Egun[editar | editar código-fonte]


No batuque também temos a parte dos rituais destinados ao culto
dos eguns. Este é um ritual cheio de magia e segredos onde poucos
sacerdotes têm o completo domínio.
A casa dos Eguns (espíritos dos mortos) fica numa construção
separada da casa principal, nos fundos do terreno, onde são feitos
diversas obrigações em determinadas datas e quando morre alguém
ligado ao terreiro; este local é denominado Balê.
Aos eguns também são oferecidos sacrifícios de animais, e comidas
diversas que fazem parte somente deste ritual, não podendo ser
usados em outras ocasiões.
Os eguns, assim como os orixás, tem suas rezas (cânticos) próprias,
feitos na linguagem yorubá, e em dias de obrigações recebem toques
ao som de tambores frouxos e com o acompanhamento de agê
(instrumento feito com uma cabaça inteira trançada com cordão e
contas diversas).
Cada nação tem rituais diferentes para este tipo de obrigação.

Sacerdócio[editar | editar código-fonte]


O babalorixá ou iyalorixá tem a responsabilidade de formar novos
sacerdotes, que darão continuidade aos rituais. Para isto é preciso
preparar novos filhos de santo, que durante um certo período de
tempo aprenderão todos os rituais para preservação dos cultos.
O sacerdote chefe deve passar aos futuros pais ou mães de santo,
todos os segredos referente aos rituais tais como: uso das folhas
(folhas sagradas), execução de trabalhos e oferendas, interpretação
do jogo de búzios, e até mesmo como preparar um novo sacerdote.
Geralmente o futuro sacerdote já nasce no meio religioso, onde
conviverá acompanhando todos os diversos rituais que darão suporte
a seus afazeres dentro do culto, e terá pleno conhecimento de todos
os tipos de situações que enfrentará em seu futuro templo.
O tempo de aprendizado é longo, não se forma um verdadeiro
sacerdote de Orixás com menos de sete anos de feitura, e os
ensinamentos são passados de acordo com a evolução da
capacidade de aprendizado que o noviço tem, já que os ensinamentos
são feitos oralmente, não há livros para ensinar os rituais, a melhor
maneira de aprender tudo é conviver desde cedo dentro dos terreiros.
A partir do momento que um noviço se torna um sacerdote de Orixá,
terá as mesmas responsabilidades daquele que lhe passou os
ensinamentos.

Outra definição[editar | editar código-fonte]

Tambores usados em batuques no Rio Grande do Sul


O batuque, também chamado por vezes de nação, é uma religião
afro-brasileira, e por vezes chamada de afro-gaúcha, já que está
presente quase que apenas no estado do Rio Grande do Sul e em
lugares vizinhos a ele (como Santa Cataria, e outros países como
Uruguai e Argentina). Alguns registros supõem que tenha se
estruturado no século XIX, e que os primeiros terreiros foram
fundados na região de Rio Grande e Pelotas.[9] [10] O batuque possui
aspectos bastante semelhantes com o Xangô Pernambucano ou
Tambor de Mina. É por vezes confundido com o Candomblé.
Do Rio Grande do Sul, o batuque migrou para o Prata, onde hoje há
muitas casas "de religião", para usar um termo usado por seus
integrantes, na Argentina, Uruguai, Paraguai e outros países vizinhos.
O batuque tem seu culto voltado aos orixás, sendo fruto de religiões
dos povos africanos da Costa da Guiné e da Nigéria, com as nações
Jeje, Ijexá, Oyó, Cabinda e Nagô (e as chamadas “mistas” como Jeje-
Ijexá, Jeje-Nagô, Nagô-Ijexá, etc). Apesar das diversas nações, o
culto do Batuque é praticamente homogêneo em todas as casas,
predominando a cultura Ijexá que cultua doze orixás (Bará, Ogum
Oyá, Xangô, Odé e Otin, Ossanha, Obá, Xapanã, Oxun, Yemanjá e
Oxalá), além dos Ibejis (crianças).

Referências
1. Ir para cima↑ Norton Correa, Norton F. Correa
(1992). O Batuque do Rio Grande do Sul 1992
ed. (Porto Alegre: Editora da UFRS).
p. 55. ISBN 85-7025-234-x Verifique |isbn=
(Ajuda).
2. Ir para cima↑ Erick Wolff (01/072014). «A
entronização do Alaafin e sua sobrevivência na
Kambina». Revista Olorun ISSN 2358-3320.
Consultado em 20/11/2014.
3. Ir para cima↑ [ORIXÁ BARÁ - Paulo T. B.
Ferreira - Ed. Toqui]
4. Ir para cima↑ ORO, Ari Pedro. «Religiões Afro-
Brasileiras do Rio Grande do Sul: Passado e
Presente». Estud. afro-asiát. vol.24 no.2 Rio de
Janeiro, 2002. ISSN 0101-546X.
5. ↑ Ir para:a b JAQUES, André Porto. «A Geografia
do Batuque: estudos sobre a territorialidade
desta religião em Porto Alegre-RS.» (PDF).
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
6. Ir para cima↑ JAQUES, André Porto. A
Geografia do Batuque: estudos sobre a
territorialidade desta religião em Porto Alegre-
RS. Universidade Federal do Rio Grande do
Sul.pdf
7. Ir para cima↑ Os fundamentos religiosos da
nação dos Orixas - Paulo T. B. Ferreira
8. Ir para cima↑ [JAQUES, André Porto. A
Geografia do Batuque: estudos sobre a
territorialidade desta religião em Porto Alegre-
RS.. Universidade Federal do Rio Grande do
Sul.]
9. Ir para cima↑ [1]
10. Ir para cima↑ [2]

Bibliografia[editar | editar código-fonte]


 Paulo T. B. Ferreira, Os Fundamentos Religiosos na Nação dos
Orixás -
 Leopoldo Bettiol. Do batuque e das origens da umbanda:
simbolismo, ritualismo, intepretação. Gráfica Editôra Aurora; 1963.
 Norton Figueiredo Corrêa. O batuque do Rio Grande do Sul:
antropologia de uma religião afro-rio-grandense. CA, Cultura &
Arte; 2006.

Candomblé
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Candomblé

Candomblé é uma religião derivada do animismo


africano[1] onde se cultuam os orixás, voduns ou nkisis,
dependendo da nação.[2]Sendo de origem totêmica e familiar, é
uma das religiões de matriz africana mais praticadas, tendo
mais de três milhões de seguidores em todo o mundo,
principalmente no Brasil.[2] Também é possível encontrar o
chamado povo do santo em outros países
como Uruguai, Argentina[3] , Venezuela, Colômbia, Panamá, Mé Ilê Axé Iyá Nassô
xico, Alemanha[4] , Itália, Portugal e Espanha[5] [6] . Oká - Terreiro da
Cada nação africana tem, como base, o culto a um único orixá. Casa Branca - a
A junção dos cultos é um fenômeno brasileiro em decorrência casa de candomblé
daimportação de escravos onde, agrupados mais antiga de
nas senzalas nomeavam um zelador de santo também Salvador, na Bahia
conhecido como babalorixá no caso dos homens e iyalorixá no
caso das mulheres.
A religião tem, por base, a anima (alma) da Natureza, sendo, Religiões afro-
portanto, chamada de anímica. Os sacerdotes africanos que brasileiras
vieram para o Brasil como escravos, juntamente com
seus orixás/nkisis/voduns, sua cultura, e seus idiomas,
entre 1549 e 1888, é que tentaram de uma forma ou de outra Princípios
continuar praticando suas religiões em terras brasileiras. Foram Básicos Deus queto
os africanos que implantaram suas religiões no Brasil, juntando | Olorum | OrixásJej
várias em uma casa só para a sobrevivência das mesmas.
Portanto, não é invenção de brasileiros.[7]
e | Mawu | Vodun B
anto | Nzambi | Nkis
Diz Clarival do Prado Valladares em seu artigo "A Iconologia i
Africana no Brasil", na Revista Brasileira de Cultura (MEC e
Conselho Federal de Cultura), ano I, Julho-Setembro 1999,
p. 37, que o "surgimento dos candomblés com posse de terra
na periferia das cidades e com agremiação de crentes e prática Templos afro-
de calendário verifica-se incidentalmente em documentos e brasileiros Babaçuê
crônicas a partir do século XVIII". O autor considera difícil para | Batuque |Cabula |
"qualquer historiador descobrir documentos do período anterior Candomblé | Culto
diretamente relacionados à prática permitida, ou sub-reptícia, de Ifá | Culto aos
de rituais africanos". O documento mais remoto, segundo ele, Egungun | Quimban
seria de autoria de dom Frei Antônio de Guadalupe, bispo
visitador de Minas Gerais em 1726, divulgado nos da | Candomblé de
"Mandamentos ou Capítulos da visita". caboclo |Macumba |
Omoloko Tambor-
Embora confinado originalmente à população de negros
de-Mina | Terecô |
escravizados, inicialmente nas senzalas, quilombos e terreiros,
proibido pela igreja católica, e criminalizado mesmo por alguns Umbanda Xambá |
governos, o candomblé prosperou nos quatro séculos, e Xangô do
expandiu consideravelmente desde o fim da escravatura em Nordeste Sincretism
1888. Estabeleceu-se com seguidores de várias classes o| Confraria
sociais e dezenas de milhares de templos. Em levantamentos
recentes, aproximadamente 3 milhões de brasileiros (1,5% da
população total) declararam o candomblé como sua religião.
[8] Literatura afro-
Na cidade de Salvador existem 2.230 terreiros registrados na
Federação Baiana de Cultos Afro-brasileiros e catalogados brasileira Terminol
pelo Centro de Estudos Afro-Orientais da UFBA, (Universidade ogia SacerdotesHier
Federal da Bahia) Mapeamento dos Terreiros de Candomblé arquia
de Salvador.
Entretanto, na cultura brasileira as religiões não são vistas
como mutuamente exclusivas, e muitas pessoas de outras Religiões
crenças religiosas — até 70 milhões, de acordo com algumas semelhantes Religi
organizações culturais Afro-Brasileiras — participam em rituais ões
Africanassantería P
alo Arará Lukumí R
egla de
Ocha AbakuáObeah
do candomblé, regularmente ou ocasionalmente.[9] Orixás do candomblé, os rituais, e as
festas são agora uma parte integrante da cultura e uma parte do folclore brasileiro.
O candomblé não deve ser confundido com umbanda, macumba, e/ou omoloko, e
outras religiões afro-brasileiras com similar origem; e com religiões afro-
americanas similares em outros países do Novo Mundo, como o vodou haitiano,
a santería cubana, e o obeah, em Trinidade e Tobago, os shangos (similar
ao tchamba[10] [11] africano, xambá e aoxangô do nordeste do Brasil) o ourisha, de
origem iorubá, os quais foram desenvolvidas independentemente do candomblé e são
virtualmente desconhecidos no Brasil.

Índice
[esconder]

 1Etimologia
 2Nações
 3Crenças
 4Sincretismo
 5Templos
 6Hierarquia
 7Sacerdócio
 8Temas polêmicos
o 8.1Preconceito
o 8.2Homossexualidade
o 8.3Aborto
o 8.4Sacrifício
o 8.5Mudança de hábitos e costumes
 9Ver também
 10Referências
 11Bibliografia
 12Ligações externas

Etimologia[editar | editar código-fonte]


O termo "candomblé" é uma junção do termo quimbundo candombe (dança
com atabaques) com o termo iorubá ilé ou ilê (casa): significa, portanto, "casa da dança
com atabaques".[12]

Nações[editar | editar código-fonte]


Barracão de candomblé em Pernambuco
Os negros escravizados no Brasil pertenciam a diversos grupos étnicos, incluindo
os yorubás, os ewe, os fon e os bantus. Como a religião se tornou semi-independente em
regiões diferentes do país, entre grupos étnicos diferentes evoluíram diversas "divisões" ou
"nações", que se distinguem entre si principalmente pelo conjunto de divindades
veneradas, oatabaque (música) e a língua sagrada usada nos rituais.[13]
A lista seguinte é uma classificação pouco rigorosa das principais nações e sub-nações,
de suas regiões de origem, e de suas línguas sagradas:

 Nagô ou yorubá
 Ketu ou Queto (Bahia) e quase todos os estados - Língua yorubá (Iorubá ou Nagô
em português)
 Efan na Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo
 Ijexá principalmente na Bahia
 Nagô Egbá ou Xangô do Nordeste no Pernambuco, Paraíba, Alagoas, Rio de
Janeiro e São Paulo
 Mina-nagô ou tambor de mina no Maranhão
 Xambá em Alagoas e Pernambuco (quase extinto).
 Banta, Angola e Congo (Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas
Gerais, São Paulo, Goiás, Rio Grande do Sul), mistura de
línguas bantas, quicongo equimbundo.
 candomblé de caboclo (entidades nativas indígenas)
 Jeje: a palavra "jeje" vem do ioruba adjeje, que significa "estrangeiro, forasteiro".
Nunca existiu nenhuma nação Jeje na África. O que é chamado de nação jeje é o
candomblé formado pelos povos fons vindo da região de Daomé e pelos
povos mahis ou mahins. "Jeje" era o nome dado de forma pejorativa pelos iorubas
para as pessoas que habitavam o leste, porque os mahis eram uma tribo do lado leste
e Saluvá ou povos Savalu do lado sul. O termo Saluvá ou Savalu, na verdade, vem de
"Savé", que era o lugar onde se cultuava Nanã. Nanã, uma das origens das quais
seria Bariba, uma antiga dinastia originária de um filho de Oduduá, que é o fundador
de Savé (tendo neste caso a ver com os povos fons). O Abomey ficava no oeste,
enquanto os axântis eram a tribo do norte. Todas essas tribos eram de povos jejes,
[14]
(Bahia, Rio de Janeiro eSão Paulo) - língua ewe e língua fon (jeje)
 Jeje Mina: de língua mina, de São Luís (Maranhão)
 Babaçuê:[15] Belém (Pará)

Crenças[editar | editar código-fonte]


O candomblé é uma religião monoteísta,[16] [17] embora alguns defendam a ideia que são
cultuados vários deuses, o deus único para a Nação Ketu[18] é Olorum, para a
NaçãoBantu[19] é Nzambi e para a Nação Jeje é Mawu, são nações independentes na
prática diária e em virtude do sincretismo existente no Brasil a maioria dos participantes
consideram como sendo o mesmo Deus da Igreja Católica.
Os orixás/inquices/voduns recebem homenagens regulares, com oferendas de
animais, vegetais e minerais, cânticos, danças e roupas especiais. Mesmo quando há na
mitologia referência a uma divindade criadora, essa divindade tem muita importância no
dia a dia dos membros do terreiro, mas não são cultuados em templo exclusivo, é louvado
em todos os preceitos e muitas vezes é confundido com o Deus cristão.

 os orixás da mitologia ioruba[20] foram criados por um deus supremo, Olorun (Olorum)
dos Yoruba;
 os Voduns da Mitologia Fon[21] foram criados por Mawu, o deus supremo dos Fon;
 os Nkisis da mitologia banta,[22] foram criados por Zambi, Zambiapongo, deus supremo
e criador.
O candomblé cultua, entre todas as nações, umas cinquenta das centenas deidades ainda
cultuadas na África. Mas, na maioria dos terreiros das grandes cidades, são doze as mais
cultuadas. O que acontece é que algumas divindades têm "qualidades" que podem ser
cultuadas como um diferente orixá/inquice/vodun em um ou outro terreiro. Então, alista de
divindades das diferentes nações é grande, e muitos orixás do queto podem ser
"identificados" com os voduns do jeje e inquices dos bantos em suas características, mas
na realidade não são os mesmos; seus cultos, rituais e toques são totalmente diferentes.

Adeptos do candomblé
Orixás têm individuais personalidades, habilidades e preferências rituais, e são conectados
ao fenômeno natural específico (um conceito não muito diferente do Kami do
japonês xintoísmo). Toda pessoa é escolhida no nascimento por um ou vários "patronos"
Orixás, que um babalorixá identificará. Alguns Orixás são "incorporados" por pessoas
iniciadas durante o ritual do candomblé, outros Orixás não, apenas são cultuados em
árvores pela coletividade. Alguns Orixás chamados Funfun (branco), que fizeram parte da
criação do mundo, também não são incorporados.
Acreditam na vida após a morte, e que os espíritos dos babalorixás falecidos possam
materializar-se em roupas específicas, são chamados de babá Egum ou Egungun e são
cultuados em roças dirigidas só por homens no Culto aos Egungun, os espíritos
dasiyalorixás falecidas são cultuados coletivamente Iyami-Ajé nas sociedades
secretas Gelede, ambos cultos são feitos em casas independentes das de candomblé que
também se cultuam os eguns em casas separadas dos Orixás.
Acreditam que algumas crianças nascem com a predestinação de morrer cedo são os
chamados abikus (nascidos para morrer) que podem ser de dois tipos, os que morrem logo
ao nascer ou ainda criança e os que morrem antes dos pais em datas comemorativas,
como aniversário, casamento, e outras.
Sincretismo[editar | editar código-fonte]
No tempo das senzalas, os negros, para poderem cultuar seus orixás, nkisis e voduns,
usaram, como camuflagem, um altar com imagens de santos católicos e ,por baixo,
osassentamentos escondidos. Segundo alguns pesquisadores, este sincretismo já havia
começado na África, induzida pelos próprios missionários cristãos para facilitar
aconversão.
Depois da libertação dos escravos, começaram a surgir as primeiras casas de candomblé,
e é fato que o candomblé de séculos tenha incorporado muitos elementos docristianismo.
Imagens e crucifixos eram exibidos nos templos, orixás eram frequentemente identificados
com santos católicos, algumas casas de candomblé também incorporam entidades
de caboclos, que eram consideradas pagãs como os orixás.
Mesmo usando imagens e crucifixos, inspiravam perseguições por autoridades e pela
Igreja Católica, que viam o candomblé como paganismo e bruxaria, muitos mesmo não
sabendo o que era isso.
Nos últimos anos, tem aumentado um movimento em algumas casas de candomblé que
rejeitam o sincretismo aos elementos cristãos e procuram recriar um candomblé "mais
puro" baseado exclusivamente nos elementos africanos.[23]

Templos[editar | editar código-fonte]

Ilê Axé Opó Afonjá


Os templos de candomblé são chamados de casas, roças ou terreiros. As casas podem
ser de linhagem matriarcal, patriarcal ou mista: Casas pequenas, que são independentes,
possuídas e administradas pelo babalorixá ou iyalorixá dono da casa e pelo Orixá principal
respectivamente. Em caso de falecimento do dono, a sucessão na maioria das vezes é
feita por parentes consanguíneos, caso não tenha um sucessor interessado em continuar
a casa é desativada. Não há nenhuma administração central.
Casas grandes, que são organizadas tem uma hierarquia rígida, não é de propriedade do
sacerdote, nem toda casa grande é tradicional, é uma Sociedade civil ou beneficente.
A lei federal 6 292, de 15 de dezembro de 1975, protege os terreiros de candomblé no
Brasil contra qualquer tipo de alteração de sua formação material ou imaterial. O Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e o Instituto Patrimônio Artístico e
Cultural daBahia (IPAC) são os responsáveis pelo tombamento das casas.
A progressão na hierarquia é condicionada ao aprendizado e ao desempenho dos rituais
longos da iniciação. Em caso de morte de uma ialorixá, a sucessora é escolhida,
geralmente entre suas filhas, na maioria das vezes por meio de um jogo divinatório Opele-
Ifa ou jogo de búzios. Entretanto, a sucessão pode ser disputada ou pode não encontrar
um sucessor, e conduz frequentemente ao rachar ou ao fechamento da casa. Há somente
três ou quatro casas em Brasil que viram seu 100° aniversário.

Hierarquia[editar | editar código-fonte]


Ver também: Hierarquia do candomblé
No Brasil, existe uma divisão nos cultos: Ifá, Egungun, Orixá, Vodun e Nkisi são separados
por tipo de iniciação ao sacerdócio.

 No culto de ifá, participam tanto homens quanto mulheres, sendo um culto patriarcal
conduzido pelos babalaôs.
 No culto aos egunguns, participam tanto homens quanto mulheres, sendo Culto
patriarcal que lida diretamente com a ancestralidade, conduzidos pelos Ojé.

 No candomblé queto, participam tanto homens quanto mulheres, sendo conduzido


tanto por homens (babalorixás) quanto por mulheres (ialorixás), entram em transe com
orixá.
 No candomblé jeje, participam tanto homens quanto mulheres, sendo conduzido tanto
por homens quanto por mulheres Vodunsis, entram em transe com vodun.
 No candomblé banto, participam tanto homens quanto mulheres, sendo conduzido
tanto por homens quanto por mulheres iniciadas muzenzas: entram em transe
com nkisi.

Sacerdócio[editar | editar código-fonte]


Nas religiões afro-brasileiras, o sacerdócio é dividido em:

 Axogun - Um dos cargos mais importante do Candomblé. Porém, como não é rodante,
não pode iniciar ninguém sem a participação de um babalorixá ou iyalorixá.
 Babalawo - Sacerdote de Orunmila-Ifa do Culto de Ifá
 Bokonon - Sacerdote do Vodun Fa
 Babalorixá ou Iyalorixá - Sacerdotes de Orixás
 Doté ou Doné - Sacerdotes de Voduns
 Tateto e Mameto - Sacerdotes de Inkices
 Ojé - Sacerdote do Culto aos Egungun
 Babalosaim - Sacerdote de Ossaim
 Lista de sacerdotes do candomblé

Temas polêmicos[editar | editar código-fonte]


Preconceito[editar | editar código-fonte]
Manuel Raimundo Querino foi um abolicionista ferrenho, lutou contra
as perseguições existentes aos praticantes das religiões afro-brasileiras que eram
rotuladas de religiões bárbaras e pagãs.
Procópio de Ogum teve o seu reconhecimento por ter participado da legitimação da
religião do candomblé, durante a perseguição às religiões afro-brasileiras promovida pelas
autoridades do Estado Novo. Nesse período, o Ilê Ogunjá foi invadido pela polícia baiana,
sob a supervisão do famoso delegado Pedrito Gordo. Procópio foi preso e espancado. O
jornalista Antônio Monteiro foi uma das pessoas que ajudou na libertação de Procópio. Tal
acontecimento - caso Pedrito - registrou o nome de Procópio na história popular baiana,
chegando mesmo a fazer parte de uma letra de samba-de-roda:

"Não gosto de candomblé que é festa de


feiticeiro quando a cabeça me dói serei um dos
primeiros Procópio tava na sala esperando santo —
chegá quando chegou seu Pedrito Procópio
passa pra cá Galinha tem força n’aza o galo no
esporão Procópio no candomblé Pedrito é no
facão." "Acabe com este santo Pedrito vem aí lá (Alvarenga,
vem cantando ca ô cabieci" 1946, p. 200)

O Jornal da Bahia, de 3 de maio de 1855, faz alusão a


uma reunião na casa Ilê Iyá nassô: "Foram presos e
colocados à disposição da polícia Cristóvão Francisco
Tavares, africano emancipado, Maria Salomé, Joana
Francisca, Leopoldina Maria da Conceição,
Escolástica Maria da Conceição, crioulos livres; os
escravos Rodolfo Araújo Sá Barreto, mulato;
Melônio, crioulo, e as africanas Maria Tereza,
Benedita, Silvana... que estavam no local

chamado Engenho Velho, numa reunião que Pierre
chamavam de "candomblé"". Verger.

Brasília - Ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial para


Políticas de Promoção da Igualdade Racial, com a Baiana Mãe de
Santo Raida, naConferência Regional das Américas
Abdias do Nascimento conta, em uma entrevista concedida ao Portal Afro:

Os cultos afro-brasileiros eram uma questão de polícia.


Dava cadeia. Até hoje, nos museus da polícia do Rio de
Janeiro ou da Bahia, podemos encontrar artefatos
cultuais retidos. São peças que provavam a suposta
delinquência ou anormalidade mental da comunidade
negra. Na Bahia, o Instituto Nina Rodrigues mostra
exatamente isso: que o negro era um camarada doente
da cabeça por ter sua própria crença, seus próprios
valores, sua liturgia e seu culto. Eles não podiam aceitar
isso. —

[24]

Homossexualidade[editar | editar código-fonte]


A homossexualidade está presente na maioria das religiões, porém oculta,
indiscutivelmente abafada por princípios e muitas vezes negada pelos ex-homossexuais.
No candomblé, a homossexualidade é amplamente aceita e discutida nos dias atuais, mas
já teve um período que homens heterossexuais e homossexuais não podiam ser iniciados
como rodantes (termo usado para pessoas que entram em transe), não era permitido em
festas que um homem dançasse na roda de candomblé mesmo que estivesse em transe.
O mais famoso e revolucionário homossexual do candomblé foi sem dúvida Joãozinho da
Goméia, que afrontou as matriarcas e ocupou seu espaço tornando-se conhecido
internacionalmente. Tiveram muitos outros, mas nenhum conseguiu suplantá-lo em
ousadia e popularidade.
Aborto[editar | editar código-fonte]
As religiões afro-brasileiras, que, na maioria, são religiões derivadas das religiões tribais
africanas, são contra o aborto: o africano vê o filho como a continuação da própria vida,
filho é o bem mais precioso que o homem africano possa ter. Em consequência disso,
foram trazidos para o Brasil alguns conceitos.

 No conceito social: amparam e orientam adolescentes e mulheres grávidas.


 No conceito religioso: Oxum é quem rege o processo de fecundidade, cuida
do embrião, evita o aborto espontâneo, não aprova o aborto provocado, mantém
a criança viva e sadia na barriga da mãe até o nascimento. Uma mulher quando não
consegue engravidar, recorre à Oxum.
 No conceito jurídico: só aprova a interrupção da gravidez, nos casos previstos em lei.
Mas, como em toda religião, quando acontece uma gravidez indesejada, muitas mulheres
procuram soluções alternativas fora dos terreiros, como: chás, remédios e até mesmo
clínicas de aborto.
Sacrifício[editar | editar código-fonte]
No candomblé, esta parte do ritual denominada de sacrifício não é propriamente secreta;
porém não se realiza senão diante de um reduzido número de pessoas, todos fiéis da
religião.
Uma pessoa especializada no sacrifício, o Axogun, que tem tal função
na hierarquia sacerdotal, é quem o realiza ou, na sua falta o babalorixá. O Axogun não
pode deixar o animal sentir dor ou sofrer porque a oferenda não seria aceita pelo Orixá. O
objeto do sacrifício, que é sempre um animal, muda conforme o Orixá ao qual é oferecido;
trata-se, conforme a terminologia tradicional, ora de um animal de duas patas, ora de um
animal de quatro patas, galinha, pombo, bode, carneiro. Na realidade não se trata de um
único sacrifício: sempre que se fizer um sacrifício a qualquer Orixá, deve ser antes feito um
para Exú, o primeiro a ser servido.

 Projeto de lei acende debate sobre direito animal


Mudança de hábitos e costumes[editar | editar código-fonte]
As casas de candomblé são frequentadas e habitadas por um número variável de
pessoas, pode variar de 20 a 300 pessoas dependendo do tamanho da casa e da ocasião
ou do evento. Fora do período de festas na casa só ficam as pessoas residentes, mas nas
obrigações e festas além dos residentes virão os outros filhos de santo da casa, os
visitantes e convidados. Quanto maior o número de pessoas, maior será a preocupação
com a higiene e alimentação. Os animais são abatidos pelo Axogum e limpos,
ascomidas são preparadas sempre sob a vigilância encarregada da cozinha e responsável
pela qualidade dos alimentos tanto para os orixás como para as pessoas.
A maior preocupação nas casas de candomblé e das outras religiões afro-
brasileiras sempre foi com as doenças infecciosas, principalmente
a tuberculose e hepatite, por serem transmissíveis através de copos e talheres. Por esse
motivo, cada filho da casa deve ter seu prato e caneca identificados, iyawos durante o
período de recolhimento não usam talheres, só passam a usá-los depois da caída de
quelê. A higiene com pratos, talheres e copos sempre foi constante. Nos tempos
modernos, quando já existem os materiais descartáveis, ficou um pouco mais fácil de lidar
com o problema.
Com o surgimento de novas doenças como a aids,[25] muitos hábitos e costumes do
candomblé tiveram que ser mudados.[26] Na iniciação os Iyawos tinham suas cabeças
raspadas e curas feitas por uma única navalha que a Iyalorixá recebia de sua mãe-de-
santo quando da posse do cargo, isso passou a ser feito com mais cuidado, adotando-se
navalhas individuais ou descartáveis.
Um dos maiores problemas enfrentados nas casas de candomblé tem sido com a dengue,
principalmente nas regiões onde os focos do mosquito estão sendo combatidos. Os potes
de abô (infusão de folhas sagradas) foram esvaziados para evitar possível proliferação do
mosquito, os banhos são preparados com água e folhas frescas e usados imediatamente.
A presença de crianças durante as festas de candomblé tem sido foco de discussões nos
terreiros da Bahia, após a proibição feita pela Federação Baiana do Culto Afro-Brasileiro. [27]

Ver também[editar | editar código-fonte]


 Conferência Mundial da Tradição dos Orixás e Cultura
 Conferência de Intelectuais da África e da Diáspora
 Alaiandê Xirê
 Candomblé Ketu
 Candomblé Jeje
 Candomblé Bantu
 Críticas ao candomblé
 Templos afro-brasileiros
 Religiões afro-brasileiras
 Terminologia de religiões afro-brasileiras
 Lista de federações e associações de umbanda e candomblé

Referências
1. Ir para cima↑ L'animisme au Bénin
2. ↑ Ir para:a b Religions - Candomblé. BBC. 15 de setembro de 2009.
Página visitada em 7 de janeiro de 2014.
3. Ir para cima↑ Umbanda e candomblé enfrentam a tradição
católica argentina e constroem terreiros na terra do tango
4. Ir para cima↑ Umbanda e candomblé na Europa
5. Ir para cima↑ Cadastro de terreiros, ilês, tendas, casas de culto
de umbanda, candomblé e outros cultos afros situados em
Portugal e na Europa
6. Ir para cima↑ Europa discute fortalecimento do candomblé
7. Ir para cima↑ Revista da USP-De africano a afro-brasileiro: etnia,
identidade, religião-por Reginaldo Prandi
8. Ir para cima↑ Identidade também nas religiões
9. Ir para cima↑ Candomblé e umbanda no mercado religioso
Prof.Reginaldo Prandi
10. Ir para cima↑ Mama Tchamba
11. Ir para cima↑ http://mamiwata.com/tchamba.html Mami
Wata]
12. Ir para cima↑ CUNHA, A. G. Dicionário etimológico Nova
Fronteira da língua portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova
Fronteira. 1982. p. 146.
13. Ir para cima↑ Antonio Gomes da Costa Neto, A Linguagem
no Candomblé um estudo linguístico sobre as comunidades
religiosas afro-brasileiras
14. Ir para cima↑ A origem da palavra Jeje
15. Ir para cima↑ As duas africanidades estabelecidas no Pará
16. Ir para cima↑ Festivais da Mitologia e Religião Yoruba
17. Ir para cima↑ Religiões africanas são monoteísta
18. Ir para cima↑ Negritude e Experiência de Deus por Josuel
dos Santos Boaventura *Teocomunicação, Porto Alegre, v. 37,
n. 156, p. 203-222, jun. 2007
19. Ir para cima↑ Bantus no Brasil
20. Ir para cima↑ O Culto de Ifá e UNESCO
21. Ir para cima↑ Vodoun
22. Ir para cima↑ Mitologia Bantu
23. Ir para cima↑ Mãe Stella: "Candomblé não é brincadeira"
por Claudio Leal
24. Ir para cima↑ Preconceito ainda marca religiões afro
25. Ir para cima↑ AIDS: O que é e como evitá-la
26. Ir para cima↑ Pais-de-santo querem evitar Aids em
candomblé da Bahia
27. Ir para cima↑ Crianças no candomblé

Bibliografia[editar | editar código-fonte]


Ver também: Lista de livros com tema afro-brasileiro

 Clarke, Peter B. "Candomblé". Encyclopedia of New Religious Movements. Ed. Clarke,


Peter B. Londres: Routlege. 92-95. ISBN 9780415267076 Consultado em 2015-12-06.

Você também pode gostar