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Câmara dos Deputados

Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira

Estudo Técnico nº 03/2023

Regras e Mecanismos de Controle Fiscal


Análise Comparativa das normas fiscais vigentes no país

CONOF/CD
Elaboração (*):

Brasília, 24 de março de 2023.

(*) Consultores Designados: Eugênio Greggianin (coordenador); Dayson Almeida; Márcia R.


Moura; Ricardo A. Volpe; Analista: Arthur Kronenberger.

© 2023 Câmara dos Deputados. Todos os direitos reservados. Este trabalho poderá ser reproduzido ou transmitido
na íntegra, desde que citados os autores e a Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados. São vedadas a venda,
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inteira responsabilidade de seus autores, não representando necessariamente a opinião da Câmara dos Deputados ou
de suas comissões.
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

SUMÁRIO

I. RESUMO EXECUTIVO E PRINCIPAIS CONCLUSÕES 1


II. CONSIDERAÇÕES INICIAIS 6
III. REGRAS E MECANISMOS DE CONTROLE FISCAL 9
IV. LIMITE PARA DÍVIDA PÚBLICA 16
V. REGRA DE OURO 21
VI. META DE RESULTADO PRIMÁRIO 25
VII. A REGRA DO TETO 29
VIII. DESPESA TOTAL COM PESSOAL E ENCARGOS SOCIAIS 36
IX. REGRAS DE NEUTRALIDADE ORÇAMENTÁRIA (COMPENSAÇÃO) 40
X. RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS 43
XI. ANEXO – QUADRO-SÍNTESE

I. RESUMO EXECUTIVO E PRINCIPAIS CONCLUSÕES


1. Esta Nota atende solicitação de trabalho1 e contempla uma análise comparativa das
principais regras e mecanismos fiscais vigentes, bem como de sua funcionalidade, com o intuito
de contribuir para o debate que se estabelecerá em função da reforma fiscal prevista no art. 6º
da Emenda Constitucional - EC nº 126/2022 (“Novo Arcabouço Fiscal”), que substituirá, de forma
permanente, o regime fiscal implantado pela EC nº 95, de 2016 (teto de gastos).
2. A EC nº 126/2022 excluiu do teto de gastos R$ 24,1 bilhões e elevou o limite de despesa
em R$ 145 bilhões, sem, contudo, apontar contrapartidas fiscais - aumento de receitas ou
redução de despesas -, agravando o déficit previsto para 2023. De outra parte, previu lei
complementar para regular o "regime fiscal sustentável" previsto no art. 163 da CF. Vale salientar
que a revogação das disposições transitórias do NRF fará com que o método de correção das
emendas impositivas, dos pisos da saúde e da educação, bem como os limites orçamentários dos
Poderes Legislativo, Judiciário, MPU e DPU, deixe de tomar como base o IPCA, restabelecendo-se
a regra constitucional anterior2.
3. Para fins deste estudo, as regras vigentes foram cotejadas com os atributos de um modelo
simplificado de controle fiscal (vide Cap. III) aqui denominado mecanismo fiscal, o que requer
basicamente as seguintes definições: a) variável fiscal que se deseja controlar; b) indicadores e
os respectivos limites/gatilhos (prudenciais e máximos) que acionam medidas; c) medidas
adequadas3 de ajuste ou correção dos desvios; e d) eventuais sanções no caso de
descumprimento das regras. O modelo conceitual auxilia a identificação de eventuais
fragilidades e limitações das atuais regras fiscais, bem como a possibilidade de seu

1
Solicitação de trabalho nº 63/2023, do Dep. PEDRO PAULO/PSD-RJ, e Outros.
2 Os pisos da saúde e educação passarão a ser reajustados de acordo com a receita corrente líquida, ou da
arrecadação dos impostos, conforme o caso. Os limites para os demais Poderes e órgãos autônomos dependerão
dos parâmetros definidos anualmente nas LDOs. Alterações da regra de ouro dependem, igualmente, de PEC.
3
A calibragem das medidas inclui a definição de sua intensidade e duração.

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Estudo nº 03 /2023

aperfeiçoamento, o que pode subsidiar o propósito de integração das regras fiscais a que se
propõe o novo arcabouço fiscal. Vide, em ANEXO, quadro-síntese dessa análise.
4. O advento da pandemia teve como consequência vários aperfeiçoamentos da legislação
aplicável em situações excepcionais de calamidade pública nacional (art. 65 da LRF, EC nº
109/21). Assim, o chamado regime fiscal extraordinário, aplicável em caso de calamidade pública
nacional, com suas cláusulas de escape4, já contempla de forma razoável a necessária
flexibilização das normas fiscais em tais situações, bem como as respectivas medidas
compensatórias, não sendo objeto deste estudo.
5. O trabalho deteve-se, portanto, na análise do chamado regime fiscal ordinário regulado
pelas regras fiscais vigentes, que atuam de forma relativamente independente, listadas a seguir
em ordem decrescente de amplitude da variável fiscal que se propõem a controlar: limites para
a dívida pública5; regra de ouro (CF, art. 167, III e LRF, art. 12); meta de resultado primário (LRF
arts. 4º e 9º); teto da despesa primária total e percentual máximo de comprometimento com
despesas obrigatórias (ADCT, art. 106 e ss); despesa total com pessoal em relação à receita
corrente líquida (CF art. 169 e LRF); e, limites e condições voltados ao controle difuso
(compensação) de atos e proposições que aumentam despesas obrigatórias ou reduzem receita
tributária (LRF, arts. 14, 16 a 17).
6. No âmbito das finanças públicas, o princípio da ação fiscal responsável (LRF, art. 1º)
“pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios
capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas”. Não basta, portanto, fixar limites. É necessário
acionar medidas de ajuste necessárias e suficientes para corrigir os desvios e a tendência do
desequilíbrio. Os limites (gatilhos) que acionam tais ajustes devem ser determinados,
preferencialmente, de forma prudencial e preventiva, antes do limite máximo. A ausência ou a
demora no acionamento de medidas estabilizadoras foi identificado neste estudo como a
principal lacuna das regras fiscais vigentes.
7. Dentre as possíveis medidas de correção destacam-se aquelas voltadas ao controle do
crescimento das despesas obrigatórias (gasto legislado)6, que representam mais de 90 % da
despesa primária. Este controle deve ser acionado, de preferência, em estágios sequenciais, uma
vez que a dificuldade política da implementação das medidas correlatas é crescente na seguinte
ordem: a) vedação de reajustes em percentual superior ao da inflação (e.g. art. 167-A, inc. VIII);
b) vedação de quaisquer aumentos ou da criação de novas despesas (e.g. art. 167-A, inc. VII); c)
revisão da legislação permanente que regula os atuais benefícios ou despesas. Em qualquer caso,
as medidas que vedam o aumento ou novas despesas obrigatórias não impedem o crescimento
vegetativo dos gastos já legislados.
8. As sanções não se confundem com as medidas de correção. Enquanto as medidas de
correção atuam para corrigir determinada situação, tendo como efeito um resultado econômico-
fiscal que corrige os desvios da variável que se quer controlar, as sanções impõem consequência

4
Em suma, prevê a dispensa de cumprimento da regra de ouro, dos resultados fiscais, do teto e das regras de
compensação (apenas para as despesas diretamente relacionadas ao enfrentamento da calamidade).
5
CF (art. 48, XIV, e art. 52, VII, IX); na LRF (art. 30, I e II); e nas Resoluções do Senado (SF 40/2000; Res. SF
48/2007 e Res. SF 43/2001).
6
As despesas discricionárias são controladas diretamente pelo orçamento, seja na elaboração ou na execução
(contingenciamento). O controle das despesas obrigatórias pode se dar pela proibição do aumento ou da criação
de novas despesas, ou pela revisão da legislação atual.

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jurídica ao ente ou ao agente responsável pelo descumprimento da conduta prescrita, a exemplo


da violação de uma vedação.
9. O controle ou a sustentabilidade da dívida pode ser considerado o objetivo final do
conjunto de regras fiscais. Pode ser efetuado com medidas de correção diretamente relacionadas
ao estoque da dívida (relação dívida/PIB), ou de forma indireta, impondo-se limites às variáveis
de fluxo (receitas, despesas e resultados). Ou ainda de forma integrada, combinando-se o limite
da dívida com uma regra operacional de fluxo (resultado ou teto de gastos).
10. As regras fiscais de controle de fluxo adotam, como linguagem e referência, as
classificações utilizadas na lei orçamentária, segundo a categoria econômica (corrente x capital),
Grupo Natureza da Despesa (pessoal) e, mais recentemente, conforme o indicador de resultado
primário.
11. O quadro seguinte ilustra, para cada uma das regras analisadas, os grupos e itens de
receitas e despesas orçamentárias relacionados à apuração e ao cumprimento dos limites
segundo a regra fiscal adotada. Para tanto, foram marcados com “X” os grupos e itens de despesa
e receita cuja variação tende a afetar o nível de atendimento da respectiva regra, mantidas as
demais condições constantes. Assim, por exemplo, o aumento ou a redução de receitas primárias
afeta o alcance da meta primária, mas não tem relação com a regra do teto, pois esta é mais
restrita (alcança apenas as despesas primárias). Regras mais abrangentes evitam que o esforço
fiscal fique concentrado em determinados grupos ou itens orçamentários.
Quadro 1 – Grupos e Itens de Receitas e Despesas Orçamentárias relacionados com a Regra
Fiscal adotada
Despesa Primária Receita Primária
REGRA FISCAL Corrente Despesa Receita Demais
(LIMITES) Obriga Discricio Capital Corrente Capital Financeira Financeira (1)

tória nária
1 - DÍVIDA PÚBLICA X X X X X X X X
2 - REGRA DE OURO (2) (2) X (2) (2) (2) X (3) -
3 - META DE
X X X X X - - X
RESULTADO
4 - TETO X X X - - - - X
4.1 – LIMITE 95%
OBRIGATÓRIAS
X - - - - - - -
5 – PESSOAL/RCL X - - X (4) - - - -
6 - COMPENSAÇÃO X (5) - - X (5) - - -
Fonte: Legislação. Elab. Conof/CD.
Obs.
(1) Demais eventos ou operações com impacto patrimonial na dívida pública ou na despesa pública, mas que não tramitam pelo orçamento.
(2) Alterações nas despesas e receitas correntes podem afetar o montante de operações de crédito.
(3) Operações de Crédito.
(4) Receita Corrente Líquida.
(5) Atos e Proposições que implicam aumento de despesas obrigatórias e renúncias tributárias.

12. Segundo a OCDE, as regras fiscais devem combinar controles e indicadores de estoque
(dívida) e de fluxo, com flexibilidade suficiente para se ajustar aos ciclos econômicos.
13. O momento de verificação e apuração das regras fiscais deve ocorrer na aprovação do
orçamento, sejam créditos originais ou adicionais, e também durante sua execução.
14. Do exame das regras fiscais vigentes com base no modelo conceitual utilizado neste
trabalho (atributos dos mecanismos de controle) identificamos como principal lacuna a ausência

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ou a dificuldade de acionamento de medidas de ajuste ou correção. Segue uma breve síntese da


análise de cada uma das regras fiscais citadas:
a) Estoque da dívida pública (LRF) - a variável a ser controlada é o montante da
dívida (bruta ou líquida). Não há limite estabelecido para a União. Limites máximos foram
estabelecidos apenas para os Estados/DF e Municípios, sem limites prudenciais, sendo que as
medidas de correção na LRF são acionadas apenas quando a dívida ultrapassa o limite. Falta um
rol abrangente de medidas preventivas de ajuste quando verificada a tendência de desvio da
trajetória. A proibição do recebimento pelos demais entes de transferência voluntária da União
é uma sanção administrativa, e não propriamente uma medida de correção, porque não corrige
o desequilíbrio econômico-fiscal da dívida.
Quanto às operações de crédito, as medidas de correção e as sanções encontram-se
bastante detalhadas. Dada a grande volatilidade da dívida, sujeita a flutuações, seu controle
costuma ser feito de forma indireta, por meio de uma regra limitadora de fluxos de despesa (teto)
e/ou resultado (receita menos despesa) primário, calibradas de forma compatível com uma
estratégia de estabilização.
A relação dívida/PIB, indicador comumente utilizado, aumenta com os juros reais e
com os resultados primários abaixo dos requeridos para estabilizá-la. O resultado fiscal
necessário para estabilizar a dívida/PIB (esforço fiscal) depende do crescimento do PIB e da taxa
real de juros. O aumento do PIB reduz a relação Dívida/PIB. O crescimento médio anual do PIB
no Brasil, desde 1997, foi de cerca de 2,1%. O Boletim Macrofiscal do Ministério da Fazenda de
março de 2023 mostrou que a taxa de juros reais no Brasil é de 7,4%, a maior do mundo.
b) Regra de Ouro (CF, art. 167, III CF e LRF) - como aspecto positivo, a regra de
ouro, dentre as que controlam o fluxo, é sensível às variações de receitas e despesas, inclusive
financeiras, diretamente associadas ao controle da dívida. As insuficiências (excesso de
operações de crédito) se manifestaram, grosso modo, com o aumento de déficits e das despesas
correntes.
A regra de ouro proíbe realizar operações de crédito em montante superior às
despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos com finalidade precisa,
aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta. De um lado, não penaliza as despesas
com investimento (despesas de capital). Por outro lado, a cláusula de escape é um elemento
político da regra, o que traz elevado risco à gestão da dívida pública, no caso de inércia do
Legislativo em promover o afastamento da regra com o quorum especial previsto no art. 167, III
da Constituição. Apurado o desvio (excesso de operações de crédito), a única medida de correção
é a proibição pura e simples de operação de crédito para o atendimento de despesas correntes,
o que inclui as despesas financeiras. Não existem limites prudenciais e tampouco medidas de
contenção do crescimento das despesas correntes, ou de aumento de receitas correntes, como
forma de ajuste. O contingenciamento maior nos investimentos (despesas de capital) durante a
execução agrava o desequilíbrio.
c) Meta de resultado primário (LRF) - é bastante perceptível a correlação entre
resultado primário, que expressa o efeito conjugado das receitas e despesas, com a evolução do
endividamento. A regra fiscal prevista na LRF teve um bom desempenho inicial. Na falta de uma
baliza no médio e longo prazo, a meta foi sendo flexibilizada em virtude de demandas do processo
orçamentário, acatando-se várias exclusões e exceções promovidas e aprovadas no próprio texto
da LDO, além de alterações frequentes durante a execução, desvinculando-se gradativamente de
seu objetivo final de garantir a sustentabilidade da dívida.

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As metas deficitárias, a partir de 2015, não foram acompanhadas de medidas de


correção suficientes que pudessem inibir o crescimento dos gastos obrigatórios ou o aumento da
renúncia de receita. Se utilizada como âncora fiscal, é fundamental que seja fixada de forma a
garantir uma trajetória sustentável da dívida. Ademais, em caso de déficits primários ou de
resultados insuficientes para conter o crescimento da dívida, deve-se prever gatilhos com
medidas de correção mais abrangentes, com aumento de receitas e contenção de novas despesas
obrigatórias, e não apenas a limitação das despesas discricionárias durante a execução
(contingenciamento).
d) Limite das despesas primárias - teto de gastos (ADCT) – criada pela EC nº
95/2016, a regra fiscal do teto tornou-se a mais importante da União, na medida em que garantiu
previsibilidade na gestão fiscal e orçamentária. O método de correção restritivo (apenas IPCA),
associado às inúmeras alterações do limite (ampliação do limite e exclusão de despesas do teto),
fez com que perdesse credibilidade. Considerada uma regra fiscal de cunho operacional, aos
moldes da meta de resultado, padece da mesma deficiência, qual seja, não estar associada a um
parâmetro plurianual estável relacionado à estratégia de sustentabilidade da dívida. Com efeito,
a nos três primeiros anos de vigência da regra do teto (período anterior à pandemia), o
percentual da DLGG/PIB passou de 47,77% (dez/2016) para 57,27% (dez/2019).
Havia originalmente, na regra do teto, um problema de acionamento das medidas de
correção, que exigia o descumprimento do limite máximo, o que poderia gerar responsabilização.
Diante disso foi inserido, pela EC nº 109, um limite prudencial que aciona medidas quando a
proporção da despesa primária obrigatória em relação à despesa primária total atinge 95%. Esse
percentual, contudo, mostrou-se muito elevado, devendo ser ajustado dentro do propósito de
conter novas despesas obrigatórias e preservar um mínimo de despesas discricionárias (custeio
e investimento).
O fato é que as medidas de ajuste não foram acionadas. Tivessem sido, vários
aumentos ou renúncias teriam sido contidos ou compensados, e a União poderia estar em melhor
condição fiscal. As medidas de correção previstas na atual regra do teto, quando acionadas, não
obrigam os Poderes e órgãos autônomos a tomar decisões para reduzir as atuais despesas
obrigatórias, mas apenas os impedem de aumentar as já existentes, ou de reajustá-las acima da
inflação. A ampliação das exceções (despesas excluídas do teto) e o aumento do limite adiaram a
necessidade de ajuste no método de correção, além de não acionar as vedações.
A EC nº 126/22, em particular, ampliou o espaço fiscal em R$ 169,1 bilhões, sendo o
teto ampliado em R$ 145,0 bilhões apenas para 2023, o que elevou ainda mais o déficit primário,
cuja previsão na lei orçamentária é de cerca de 230 bilhões. Na hipótese de a atual regra do teto
estar vigente quando da aprovação (em 2023) da lei orçamentária para 2024 – isto é, enquanto
não entrar em vigor a lei complementar referida no art. 6º da EC 126/2022 (Novo Arcabouço
Fiscal) -, haverá um impasse na elaboração do PLOA, uma vez que a base de cálculo e o método
de correção do limite serão aqueles do NRF, que não refletem o novo contexto de ampliação do
gasto permanente com o programa Bolsa Família. Deve-se salientar que a redução do elevado
déficit primário projetado exigirá medidas adicionais no lado da despesa e da receita (redução
de renúncias e aumento de receitas).
e) Limite das despesas totais com pessoal (CF e LRF) – a regra que prevê limites
prudenciais e máximos das despesas com pessoal (ativos, inativos e pensionistas) como um
percentual da receita corrente líquida – RCL encontra-se prevista na LRF. Contempla todos os
elementos típicos e desejáveis de um mecanismo de controle fiscal. As medidas de correção,
acionadas desde o limite prudencial, encontram-se devidamente formuladas na LRF, em especial
no final de mandato, o que inclui as recentes alterações da lei fiscal (LC nº 173/2020). Dada a

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Estudo nº 03 /2023

relevância das despesas com pessoal, seu controle tem sido objeto de inúmeras disposições
constitucionais e legais. É fato que, no caso da União, os limites máximos devem ser melhor
calibrados. Ainda assim, não houve crescimento dessas despesas, seja em relação ao PIB ou em
relação à RCL, ao contrário. Nos Estados/DF e Municípios, no entanto, a contenção das despesas
com pessoal é ingrediente importante na manutenção do equilíbrio fiscal e orçamentário.
f) Regras de neutralidade orçamentária - compensação do aumento das despesas
obrigatórias e das renúncias de receita (LRF) – trata-se de regras que promovem o controle
difuso ou procedimental de atos e proposições que acarretam aumento de despesa obrigatória
ou redução de receita tributária. Além da estimativa do impacto fiscal, exige-se para a aprovação
de tais atos normativos e proposições, medida compensatória que tem como propósito preservar
o nível de equilíbrio da lei orçamentária vigente. No âmbito do Legislativo, o cumprimento pleno
da regra da neutralidade depende de aperfeiçoamento no texto constitucional, já que nem
sempre as propostas que criam novas despesas obrigatórias, ou aumentam a renúncia de receita,
identificam as respectivas fontes orçamentárias compensatórias. A questão adquire maior
complexidade quando o desequilíbrio é promovido diretamente por emendas constitucionais, a
exemplo das Emendas Constitucionais nºs 123, 2022 (Kamikaze); 126/2022 (Transição); e
127/2022 (piso aos profissionais de saúde dos Estados/DF e Municípios). De qualquer modo, a
maior transparência acerca do impacto fiscal de cada decisão (exigência do art. 113 do ADCT) e
um controle centralizado dessas proposições (observância das margens de expansão a serem
fixadas na LDO) podem dar bons resultados em termos de gestão fiscal.

II. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

15. O art. 6º da Emenda Constitucional - EC nº 126/2022 previu a revogação do “Novo Regime


Fiscal” (NRF - teto das despesas primárias) quando da aprovação de lei complementar que
instituirá o “regime fiscal sustentável”7 - RFS. A mudança, que ainda será proposta pelo
Executivo8, repercutirá no conjunto de normas voltadas ao controle fiscal9. A EC nº 109/21 já
identificava a necessidade de se integrar, por meio de lei complementar, as regras fiscais com o
objetivo de garantir a sustentabilidade da dívida pública (art. 163, VIII)10.
16. O anúncio antecipado da revogação da regra do teto criou apreensão, uma vez que, apesar
das deficiências, a mesma vinha sendo utilizada como “âncora fiscal” da dívida da União. A LOA

7
Art. 6º O Presidente da República deverá encaminhar ao Congresso Nacional, até 31 de agosto de 2023, projeto
de lei complementar com o objetivo de instituir regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade
macroeconômica do País e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico, inclusive quanto à
regra estabelecida no inciso III do caput do art. 167 da Constituição Federal.
8 Foi apresentado, como contribuição antecipada ao debate da nova âncora fiscal, o PLP 62/2023, do Dep. Pedro
Paulo. Disponível: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2345738
9
Ressalte-se que a revogação do Novo Regime Fiscal tem como consequência a exclusão dos limites
orçamentários para os demais Poderes e órgãos autônomos, do limite de 95 % das despesas obrigatórias e
também o método de correção dos pisos da saúde e educação e das emendas parlamentares impositivas).
10
A lei complementar deverá contemplar os indicadores e níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com
a trajetória da dívida; a trajetória de convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação;
bem como medidas de ajuste, suspensões e vedações autorizando, inclusive, a aplicação das vedações já
previstas no art. 167-A da Constituição, que basicamente replicam aquelas previstas no art. 107 do ADCT
(controle do aumento de despesas obrigatórias).

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2023 (governo central) estima um déficit orçamentário de cerca de 226 bilhões. De acordo com
a STN/ME11, a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) alcançou 73,3% do PIB em dezembro de
2022 (quase R$ 6 trilhões)12, sendo que a taxa de juros real é a maior do mundo 13. O superávit
primário obtido no final do exercício de 2022 não reflete a tendência das contas públicas,
especialmente por dispor de receitas extraordinárias e de não incorporar novas despesas projetadas
para 2023 (LOA 2023).
17. Como ponto de partida para a substituição do atual regime, a lei complementar prevista
na EC nº 126/2022 deverá demonstrar a superioridade do regime proposto quanto ao critério
da sustentabilidade. Não será suficiente que se aponte a atual situação fiscal do país (déficit
primário na LOA 2023) como única justificativa para a mudança, pois a regra do teto foi
igualmente concebida em situação semelhante, com o intuito de “reverter, no horizonte de médio
e longo prazo, o quadro de agudo desequilíbrio fiscal em que nos últimos anos foi colocado o
Governo Federal”14.
18. A “sustentabilidade” pode ser compreendida sob dois aspectos: fiscal (contenção da
trajetória da dívida) e político (atendimento de demandas sensíveis). Considerado o primeiro
aspecto, será necessário analisar como as novas regras teriam se comportado no período de
vigência do NRF, além de projetar, sob diferentes cenários, como se comportarão no futuro. Em
relação aos aspectos políticos, justificar por quais razões a maior resiliência do novo modelo não
o afastaria do objetivo primordial de estabilizar a dívida no longo prazo.
19. A proposta de revisão das regras fiscais ocorre após recorrentes déficits primários a
partir de 2014, culminando com a EC nº 126/2022 (EC da transição). As situações emergenciais
vivenciadas após o início da pandemia (2020), provocaram uma sequência de alterações
constitucionais15, com flexibilização da legislação fiscal. Primeiramente, de forma transitória
(enfrentamento à pandemia, auxílio e ações emergenciais). De outra parte, as ECs nºs 114, 126 e
127, mais recentes, excluem despesas que tendem a se propagar nos orçamentos futuros.
20. As alterações com reflexos plurianuais são aquelas decorrentes da alteração do regime
dos precatórios, e, especialmente, da ampliação do limite em montante de R$ 145 bilhões, dos
quais R$ 70 bilhões destinados às despesas obrigatórias de duração continuada (auxílio
brasil/bolsa família) e o restante (R$ 75 bilhões) para o atendimento de diversas políticas

11
Plano Anual de Financiamento PAF. Disponível em:
https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:46035.
12
O percentual de vencimentos da DPF em 12 meses ultrapassa 20% do estoque. O custo médio acumulado em
doze meses da DPMFi alcançou 10,80% a.a., em dezembro/22.
13
Fonte: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/secretaria-de-politica-economica-
apresenta-o-primeiro-boletim-macrofiscal-de-2023
14
Exposição de motivos da PEC 241/2016.
15
Dentre as principais medidas de flexibilização fiscal a partir de 2020 destacamos:
a) EC nº 106, de 07/05/2020 (e LC nº 173/2020) (Regime Extraordinário);
b) EC nº 109, de 15/03/2021 (Emergencial);
c) EC nº 113, de 08/12/2021;
d) EC nº 114, de 16/12/2021 (Precatórios);
e) EC nº 123, de 14/07/2022 (Kamikaze);
f) EC nº 126, de 21/12/2022 (Transição).
g) EC nº 127, de 22/dez/2022 (piso aos profissionais de saúde dos Estados/DF e Municípios).

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Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
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públicas, todas aprovadas sem contrapartida fiscal. Além disso, foram excluídos do teto despesas
no valor de R$ 24 bilhões. Vale lembrar que, a partir de 2027, os precatórios não pagos e
acumulados até o exercício de 2026 terão que ser considerados para fins de limites de
pagamento.
21. Neste momento que antecede a apresentação de nova legislação fiscal, prevista para o
primeiro semestre deste exercício, julgou-se pertinente realizar uma análise comparativa das
atuais regras fiscais de modo a identificar em que medida as mesmas se mostram insuficientes
ou disfuncionais, apontando-se eventuais falhas, sejam relacionadas à formulação da norma ou
ao comportamento dos agentes.
22. Para a avaliação das regras atuais, as mesmas serão confrontadas com os atributos
básicos de um modelo de controle denominado “mecanismo” fiscal (item seguinte), um conjunto
articulado de disposições voltadas ao controle de determinada variável fiscal, retroalimentado
com medidas de ajuste e correção dos desvios, além de eventuais sanções de ordem pessoal ou
institucional.

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III. REGRAS E MECANISMOS DE CONTROLE FISCAL

23. As demandas da sociedade quase sempre extrapolam as disponibilidades financeiras do


estado, razão pela qual existem normas fiscais estabilizadoras que tentam conter o desequilíbrio
orçamentário e a tendência de endividamento crescente16. As regras fixam limites e condições
que desestimulam e atenuam os déficits, além de servir como salvaguarda de agentes públicos
contra pressões por aumento de despesas públicas e por redução de receitas (renúncias,
incentivos).
24. Uma diretriz fiscal adequada reduz a discricionariedade dos governantes e aumenta a
transparência e previsibilidade da política fiscal, modulando diferenças entre governos na
condução da gestão fiscal. A existência de norma que sanciona condutas, por sua vez, aumenta o
poder de dissuasão, induzindo os agentes políticos a abdicar de seu interesse de curto prazo em
favor do equilíbrio intergeracional.
25. As normas fiscais devem prescrever ações e vedações diante do atingimento de
determinados limites. Tais preceitos são abundantes na legislação em todos os níveis
(constituição, leis complementares, leis ordinárias, atos infra legais), podendo contemplar
exceções, condições, requisitos, etc. São quase sempre regras objetivas e não apenas princípios.
Impõem ao agente público ora uma obrigação (a exemplo da obrigação de a LDO contemplar
metas fiscais), ora uma proibição (a exemplo das vedações do art. 167 da CF) ou também uma
permissão.
26. Dentro do universo de “regras fiscais”, algumas atuam de forma conjunta e coordenada
voltadas ao controle de determinada situação fiscal. Definem um parâmetro de controle e
possuem medidas de correção dos desvios (feedback). Funcionam como um sistema de controle
cuja finalidade é manter uma situação ou um processo em equilíbrio, dentro de limites
predeterminados.
27. Os sistemas de controle ideais devem produzir respostas de reequilíbrio capazes de
corrigir a tendência da variável que se quer controlar, acionando-se, automaticamente ou pela
ação do agente público, medidas de correção.
28. Sua formulação tem como ponto de partida a definição do objeto do controle, ou seja, a
variável que se quer controlar. Será necessário ainda estabelecer um indicador17 e uma
referência ou limite (gatilho), a partir do qual devem necessariamente ser acionadas medidas de
correção, em uma ou mais etapas, que consistem em ações que amortecem ou corrigem os
desvios (retroalimentação).

16
A percepção dos credores da dívida quanto à capacidade de pagamento do Tesouro tem potencial para induzir
a elevação das taxas e o aumento das despesas com juros, um círculo vicioso bastante conhecido. Além dos
juros, o estoque da dívida é especialmente sensível ao crescimento econômico e aos resultados fiscais.
17
O Indicador é a unidade que possibilita medir a variável fiscal (de estoque ou de fluxo) que será controlada.
Permite aferir a situação fiscal, verificar se o limite predefinido foi atingido e analisar sua tendência. A referência
ou limite sinaliza o momento de acionamento das medidas.

9
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

Figura 1 – Sistemas de Controle

29. No campo das finanças públicas, as respostas obtidas com as medidas de ajuste nem
sempre são imediatas ou suficientes, além do que atuam várias interferências e situações de
ordem econômica e política. Diante disso, a formulação de mecanismos fiscais deve possuir certa
flexibilidade, com cláusulas de escape para situações justificadas18.
30. A situação que se pretende controlar ou manter equilibrada (o problema a ser
enfrentado) pode depender de várias causas e múltiplos fatores, do que resultará a definição das
medidas adequadas de correção, sempre que ultrapassados os limites de referência (gatilhos).
31. As medidas aqui consideradas são aquelas determinações legais objetivas (ex. art. 9º, art.
22 e 23 da LRF; art. 167-A CF), aplicáveis quando verificado o desvio, e que visam um resultado
de natureza econômico-fiscal. As medidas devem ser suficientes e viáveis, pelo tempo necessário.
Devem identificar os agentes públicos competentes e responsáveis.
32. A abrangência ou a amplitude das medidas, bem como sua intensidade, devem ser
compatíveis com o propósito de retorno à situação fiscal desejada, o que exige calibragem. Deve-
se definir o momento - na elaboração e/ou durante a execução da lei orçamentária - e o período
de apuração desses desvios (anual, quadrimestral, etc.), o termo inicial e a duração das medidas.
33. As medidas que obstam aumentos reais de despesas obrigatórias têm maior chance de
êxito do que medidas mais restritivas, que exigem redução das atuais despesas, não apenas sob
o aspecto político, mas pela maior dificuldade em termos jurídicos.
34. As sanções não se confundem com medidas de correção. As sanções decorrem do
descumprimento de uma conduta imposta ao agente público, dentro de sua esfera de
competência. As sanções, por si só, não corrigem o desvio da variável que se deseja manter
equilibrada, mas estimulam e induzem a observância das normas. As sanções podem ser
meramente administrativas, ou se resumir a obrigatoriedade de explicações públicas do gestor
(custos de reputação).
35. Não deve haver sanção quando a variável fiscal extrapola o limite em função de fatos
econômicos desprovidos e desvinculados de uma conduta específica do gestor. Ou quando o

18
Fundo Monetário Internacional (FMI) https://www.imf.org/en/Publications/Staff-Discussion-
Notes/Issues/2018/04/12/Second-Generation-Fiscal-Rules-Balancing-Simplicity-Flexibility-and-
Enforceability-45131.

10
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

gestor adotou todas as medidas (obrigações de fazer e de não fazer) que estavam ao seu alcance,
sendo que essas não se mostraram suficientes.
36. A dependência da ação humana e o tema da responsabilização do agente público serão
examinados no Capítulo X.
37. Diante do exposto, o modelo de mecanismo fiscal adotado como referência para fins de
verificação da funcionalidade das principais regras fiscais vigentes contempla os seguintes
elementos: identificação da situação fiscal desejada, objeto do controle pretendido; escolha do
indicador da variável fiscal a ser controlada, bem como a fixação de limites (gatilhos que
acionam as medidas de correção); definição das medidas de ajuste e correção, comandos legais
dirigidos ao gestor que servem para prevenir e corrigir os desvios, do que decorre uma conduta
necessária; e sanções, que se destinam a dissuadir e punir o descumprimento da conduta
prescrita.

Situação Fiscal Desejada


(nível de equilíbrio)

Sanções pelo Indicador da Variável


descumprimento de Fiscal a ser controlada.
condutas (vedações) Limites (referências).

Medidas de Correção
(amplitude, duração,
calibragem, etc.) em casos
de desvios

Figura 2 – Mecanismo de Controle Fiscal

38. Quanto à definição da situação fiscal desejada, manter o estoque ou a trajetória da dívida
pública em padrões sustentáveis é considerado o propósito mais abrangente ou a síntese da
política e da gestão fiscal planejada.
39. A variação do estoque da dívida em cada exercício, por sua vez, decorre da combinação de
fluxos de entradas e saídas, o que inclui, em uma relação de causa-efeito, as despesas com juros,
as alterações da legislação da receita e da despesa, as oscilações nas variáveis econômicas (taxas
de juros, inflação, câmbio, massa salarial, crescimento, etc.) e também outros eventos
patrimoniais que repercutem no patrimônio público (contingências, decisões judiciais, riscos
fiscais, etc.).
40. Ainda que a sustentabilidade da dívida possa ser considerada o objetivo último do
conjunto das regras fiscais, diferentes preceitos encontram-se formulados na legislação atual a
partir de objetivos intermediários específicos, a serem examinados neste trabalho: manter o
equilíbrio do orçamento corrente (regra de ouro); garantir resultados fiscais fixados na LDO;

11
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

conter despesas primárias (teto) e a proporção de despesas obrigatórias (subteto de 95%);


conter despesas com pessoal (limite em relação à RCL); compensar o aumento das despesas
obrigatórias e a redução das renúncias de receita.
41. Vale ressaltar que, exceto quanto ao controle do estoque da dívida pública, os demais
mecanismos tentam controlar o fluxo de receitas e despesas em cada exercício, ou também de
resultados, o que determina forte conexão dessas regras fiscais com a elaboração e execução do
orçamento.
42. O quadro 2 seguinte mostra que as regras fiscais de controle de fluxo adotam, como
linguagem e referência, as classificações utilizadas na lei orçamentária, segundo a categoria
econômica (corrente x capital), Grupo Natureza da Despesa (pessoal) e, mais recentemente,
conforme o indicador de resultado primário (distingue receitas e despesas primárias e
financeiras, e despesas obrigatórias e discricionárias).
Quadro 2 - Regras Fiscais de Controle de Fluxo x Classificações Orçamentárias
Regra Fiscal x Classificação Receita Orçamentária Despesa Orçamentária
orçamentária
Corrente19 Capital20 Corrente21 Capital22

Regra de Ouro (*) Limite (*) Despesas de


Operações de Capital
(CF, art. 167, III; LRF, art. 12)
Crédito
Meta de Resultado Fiscal Receita Primária23 Despesa Primária 24
(LRF, art. 4º e 9º)
Limite Despesa Primária - Limite Despesa Primária 25
(ADCT, art. 107)
Limite 95% Despesa Obrigatória/ - Despesa -
Despesa Primária (ADCT, art. 109) Obrigatória 26

19
As receitas correntes arrecadadas dentro do exercício aumentam as disponibilidades financeiras do Estado, em
geral com efeito positivo sobre o Patrimônio Líquido. Incluem tributos, contribuições e outras (MTO 2023).
20
As receitas de capital aumentam as disponibilidades financeiras do Estado. Porém, não provocam efeito sobre
o Patrimônio Líquido. São representadas pelas Operações de Crédito, Alienação de Bens, Amortização de
Empréstimos, Transferências de Capital e Outras Receitas de Capital (MTO 2023).
21
As despesas correntes não contribuem, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem de capital,
classificadas em: pessoal e encargos sociais, juros e encargos da dívida e outras despesas correntes. (MTO 2020).
22
As despesas de capital contribuem, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem de capital,
classificadas em: investimento, inversões financeiras e amortização da dívida. (MTO 2020).
23
Segundo o MTO, as receitas primárias referem-se, predominantemente, às receitas correntes que advêm dos
tributos, das contribuições sociais, das concessões, dos dividendos recebidos pela União, da cota-parte das
compensações financeiras, das decorrentes do próprio esforço de arrecadação das Unidades Orçamentárias
(UOs), das provenientes de doações e convênios e outras também consideradas primárias.
24
Classificação utilizada no cálculo do resultado primário, despesas necessárias para o atendimento dos serviços
públicos à sociedade, desconsiderando o pagamento de juros
25
Além do teto para as despesas primárias (art. 107 do ADCT), o art. 109 do ADCT estabeleceu um limite
prudencial que ativa medidas de ajuste (vedações) sempre que verificado, desde a aprovação da lei orçamentária,
que a relação entre a despesa obrigatória primária em relação à despesa primária total supera 95%.
26
No caso da União, além do limite prudencial de 95%, o gatilho também é acionado automaticamente com a
decretação de estado calamidade de âmbito nacional (CF, art. 167-G).

12
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

Regra Fiscal x Classificação Receita Orçamentária Despesa Orçamentária


orçamentária
Corrente19 Capital20 Corrente21 Capital22
Limite com Pessoal RCL27 - Despesa -
(CF, art. 169; LRF, arts. 19 a 23) c/pessoal
Neutralidade Orçamentária Renúncia - Aumento -
(Compensação): de Receita Despesas
Tributária Obrigatórias
Aumento de Despesa Obrigatória (art.
Continuadas 28
17 LRF); Renúncias de Receita
Tributária (art. 14 LRF)

(*) A regra do art. 167, III da CF, em linhas gerais, limita despesas correntes em função das receitas não decorrentes de
endividamento.
Fonte: Legislação, MTO 2023. Elab. Própria.

43. Quanto mais abrangente a variável fiscal que se quer controlar e o indicador utilizado
maior a variedade de medidas controladoras que podem ser acionadas. De outra parte, maior a
instabilidade e a imprevisibilidade do resultado. Por exemplo, o propósito de se controlar
diretamente o estoque da dívida sofre interferências originadas de uma grande variedade de
eventos patrimoniais e orçamentários (receitas e despesas) que influenciam sua trajetória, como
já relatado.
44. Dentre as regras de controle de fluxo, a regra de ouro é a mais abrangente, visto que a
necessidade de operações de crédito é direta e indiretamente sensível às variações de todas as
receitas e despesas, inclusive financeiras.
45. Quanto à regra que fixa metas de resultado primário, a situação desejada pode ser
alcançada pelo aumento de receita ou pela redução de despesa primária, um indicativo
relativamente abrangente do esforço fiscal em cada exercício. O resultado nominal, de outra
parte, varia em função da dívida, sendo assim influenciado por déficits passados que se traduzem
em aumento dos encargos da dívida.
46. Regras que limitam exclusivamente despesas (a exemplo da regra do teto) são
consideradas mais previsíveis e fáceis de manejar, especialmente se destinadas às despesas
discricionárias sob gestão direta do governo e com orçamento flexível. De outra parte, tendem a
concentrar o ajuste fiscal apenas na despesa, omitindo-se quanto à necessidade de preservar ou
de aumentar as receitas, bem como em relação a outras medidas com impacto na dívida.
47. Por fim temos as regras da LRF que visam garantir a neutralidade orçamentária de atos e
proposições que implicam aumento de despesa ou renúncia de receita, exigindo-se de tais atos a
devida compensação (existência de fonte de custeio). Tais preceitos são aplicados de forma
particular ao processo legislativo, porque se configuram como uma condição de admissibilidade
da aprovação de legislação que tenha impacto fiscal, controle procedimental promovido no
exame da adequação orçamentária e financeira.
48. O quadro 3 ilustra de que forma a escolha e a definição da variável fiscal objeto de controle
delimita as medidas de correção:

27
Receita Corrente Líquida, definida na LRF.
28
Despesas obrigatórias são aquelas que decorrem de legislação prévia que cria vínculo obrigacional de sua
orçamentação e execução.

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Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

Quadro 3 - Abrangência da Variável Fiscal x Classificações Orçamentárias


VARIÁVEL FISCAL OBJETO DE CONTROLE PRINCIPAIS ITENS (ex.)

Transferências Constitucionais
(repartição de receita).

DESPESA PRIMÁRIA Benefícios Previdenciários.


Obrigatórias
Pessoal e Encargos Sociais.
RESULTADO PRIMÁRIO

Corrente
Outras Obrigatórias - Abono e Seg. Des.
LOAS/RMV, compensação RGPS, Demais
Poderes, Sentenças, Subsídios, etc.
DÍVIDA PÚBLICA (estoque)

RESULTADO NOMINAL

Discricionárias Custeio administrativo e operacional.

Capital Discricionárias29 Investimento, (obras /equipamentos).


Corrente Tributárias, Contribuições. Demais.
PRIMÁRIA
RECEITA

Capital Alienação de bens (privatizações, concessões, etc.).

Corrente Juros recebidos, etc.


RECEITA
FINANCEIRO

Operações de Crédito (refinanciamento da dívida, emissão de


Capital
títulos, etc.). Amortização de empréstimos.

Corrente Juros e encargos da dívida pagos.


DESP. .

Capital Amortização da dívida, inversões financeiras.

Outros fatores (política econômica, taxa real de juros, PIB, reconhecimento de dívidas, riscos fiscais,
operações do banco central, etc).
Fonte: Classificações Orçamentárias. Elab. Conof

49. Segundo a OCDE30, as regras fiscais devem combinar indicadores de estoque e de fluxo,
com flexibilidade suficiente para se ajustar aos ciclos econômicos. Dentre as condições para
garantir a efetividade das regras fiscais foram destacados: a) existência de base jurídica sólida;
b) definição de atribuições e responsabilidades institucionais; c) informações e contabilidade
transparente, com relatórios abrangentes; e, d) sanções adequadas, evitando-se aquelas que
oneram a sociedade.

As despesas de capital “obrigatórias” são pouco significativas.


29

30
Ter-Minassian, Teresa. Fiscal Rules for Subnational Governments: Can They Promote Fiscal Discipline?
OECD Journal on Budgeting Volume 6 – No. 3.

14
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

50. Moutinho31, com base na literatura técnica e com o propósito de comparação dos
atributos das principais propostas de novo arcabouço fiscal, apresenta um conjunto organizado
de critérios de avaliação, aqui reproduzidos de forma sintética.
a) Grau de detalhamento: verifica se a regra contempla apenas princípios ou se traz
preceitos objetivos a serem cumpridos pelo gestor.
b) Abrangência: verifica a amplitude das variáveis fiscais controladas pela regra;
c) Caráter pró-cíclico/anticíclico: espera-se que a regra fiscal atue como um
elemento estabilizador da política fiscal, evitando-se o risco da regra aprofundar
os momentos de recessão e de crescimento.
d) Cláusulas de escape: capacidade da regra se manter em períodos excepcionais.
As regras de escape devem ser transparentes e delimitadas ao enfrentamento da
questão fática, com limites temporais definidos.
e) Grau de estruturação: uma âncora fiscal voltada ao objetivo final do controle que
atende as expectativas de médio prazo e de sustentabilidade (ex. estoque da
dívida); e uma regra operacional de curto prazo, associada ao atendimento da
“âncora fiscal”, de forma a evidenciar o que e como será feito para o atingimento
dessa meta mais ampla (ex. resultado orçamentário).
f) Seletividade no tratamento das despesas: relaciona-se com a abrangência da
variável controlada, de modo a se evitar que a regra faça recair a maior parte do
esforço fiscal em determinadas despesas (ex. investimento).
g) Previsibilidade de recursos para despesas prioritárias: o objetivo é garantir
previsibilidade de recursos, atributo importante em especial para as despesas
discricionárias consideradas prioritárias.
h) Ancoragem da regra fora do processo político ordinário: A regra fiscal deve
balizar previamente o processo decisório político anual do orçamento, contendo
assim a tendência de elevação do gasto, déficit e dívida. O propósito principal do
arcabouço fiscal é a fixação de resultados antecipados à decisão orçamentária
anual.

31
Novo Arcabouço Fiscal - Critérios de desenho e uma discussão preliminar das alternativas em debate.
Fernando Moutinho Ramalho Bittencourt: https://www12.senado.leg.br/orcamento/documentos/estudos/tipos-
de-estudos/orcamento-em-discussao/edicao-49-2023-novo-arcabouco-fiscal-criterios-de-desenho-e-uma-
discussao-preliminar-das-alternativas-em-debate.

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Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

IV. LIMITE PARA DÍVIDA PÚBLICA

Situação Fiscal Desejada


Sustentabilidade da Dívida
(trajetória de convergência)

Sanções
Indicador. Limites.
LRF - proibição de transferência
União - inexsitente; Est/DF/Mun.
voluntária e OC; Crime de
Responsabilidade (Lei 1079/50) e Dívida Consolidada/Receita
Código Penal. Corrente Líquida.

Medidas de Correção
Vedação OC, Obtenção Superávit,
Proibição Rec. Transferência
Voluntária

Figura 3 - Mecanismo de Controle da Dívida


51. Legislação e breve histórico. A existência de limites para a dívida, concessão de garantia
e operações de crédito encontra-se na CF (art. 48, XIV, e art. 52, VII, IX); na LRF (art. 30, I e II); e
nas Resoluções do Senado (Res. SF 40/2000; Res. SF 48/2007 e Res. SF 43/2001). O art. 52, inc.
VI atribui ao Senado Federal fixar, por proposta do Presidente da República, limites globais
para os montantes da dívida consolidada da União, Estados/DF e Municípios, o que também
é contemplado no art. 30, I da LRF. Os limites já foram propostos pelo Poder Executivo, sendo
que a Resolução do Senado nº 40/2001 aprovou apenas os limites para estados e municípios.
Quanto à dívida mobiliária, compete ao Senado Federal apenas a definição dos limites para
Estados e Municípios, sendo do Congresso Nacional a competência para fixar limites da União.
Deve-se observar que a LRF permite que o anexo de metas da LDO fixe metas para a dívida, e não
apenas para os resultados fiscais.
52. Importante salientar que a EC nº 109, de 2021, inclui no art. 164-A o princípio pelo qual
os entes da federação devem conduzir suas políticas fiscais de forma a manter a dívida
pública em níveis sustentáveis. O parágrafo único do mesmo artigo evidencia o papel central
da gestão fiscal para a sustentabilidade da dívida: "A elaboração e a execução de planos e
orçamentos devem refletir a compatibilidade dos indicadores fiscais com a sustentabilidade da
dívida." A referida Emenda Constitucional incluiu o inciso VIII ao art. 163 da CF prevendo a
necessidade de lei complementar dispor sobre a sustentabilidade da dívida, destacando-se: os
níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida; a trajetória de
convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação; e as medidas de
ajuste, suspensões e vedações.
53. O art. 6º da Emenda Constitucional - EC nº 126/2022 previu o envio da referida lei
complementar, por parte do Presidente da República, que instituirá o novo arcabouço fiscal,
sendo, com sua sanção, serão revogadas as disposições relativas ao teto de gastos da EC nº 95,
de 2016.

16
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

54. Situação Fiscal Desejada. A situação fiscal desejada, a sustentabilidade da dívida, deve
orientar a política fiscal de modo a fixar uma trajetória de sua convergência no médio e longo
prazo.
55. As alterações do estoque da dívida sofrem inúmeras variações e demoram em dar
resultado, exigindo medidas que se prolongam no tempo, para além dos mandatos, o que dificulta
o estabelecimento de limites fixos na legislação. O desafio é conter o crescimento da dívida
pública em relação ao PIB, criando condições para a redução dos juros e o crescimento
econômico. A dívida cresce com os juros reais e com os déficits. De outra parte, o maior
crescimento do PIB faz com que a relação Dívida/PIB diminua e menor o resultado primário
necessário para estabilizar a dívida. Quando os juros reais ultrapassam o crescimento do PIB, a
relação dívida/PIB aumenta. Quanto maior os juros, maior o resultado primário requerido. O
crescimento médio anual do PIB no Brasil (IBGE), desde 1997, foi de cerca de 2,1%. O Boletim
Macrofiscal do Ministério da Fazenda de março de 2023 mostra que a atual taxa de juros reais
ex-ante no Brasil é de 7,4% (a maior do mundo)32.
56. Na União, a falta de um limite fixo não impediu no passado a fixação na LDO de objetivos
de médio alcance na gestão da dívida pública federal, ainda que sem caráter vinculante, a
exemplo da “estabilização da dívida líquida do setor público”, ou da contenção da dívida bruta
do governo geral em relação ao PIB. Mais recentemente, diante dos déficits primários e do
agravamento das contas decorrente da pandemia, a diretriz passou a ser a “redução gradual da
dívida no médio e longo prazo”, dado o inevitável crescimento no curto prazo. Tão importante
quanto reduzir o estoque da dívida é criar condições para que as despesas com juros se
mantenham reduzidas, daí a importância de resultados fiscais favoráveis, que reduzem a
necessidade de emissão de novos títulos, um jogo de expectativas com múltiplos fatores. 33
57. Indicador. Quanto aos demais entes, o indicador é a relação Dívida Líquida
Consolidada/Receita Corrente Líquida34. A escolha do indicador como percentual de
comprometimento da receita corrente líquida faz com que a regra tenha natureza pró-cíclica, ou
seja, favorece o aumento de despesas em períodos de maior crescimento econômico e maior
arrecadação.
58. O limite é 200% para Estados e Distrito Federal, e 120% para Municípios. Não existe um
limite definido para a dívida da União, sendo que a União normalmente utiliza como indicador
em suas projeções o estoque da dívida bruta do governo geral e a dívida líquida do setor público,
ambas em percentual do PIB (DBGG/PIB e DLSP/PIB).
59. Como dito, a eleição do estoque da dívida pública (em % do PIB) como indicador fiscal
incorpora todos os eventos que afetam sua formação (fluxos de receita e despesa, inclusive
financeiras, crescimento e demais parâmetros macroeconômicos, passivos contingentes, riscos
de ordem diversa, etc.) 35. Em contrapartida, maior é a sua volatilidade.

32 Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/centrais-de-conteudos/publicacoes/boletins/boletim-


macrofiscal/2023/apresentacao_macrofiscal-marco2023.pdf
33
As despesas com juros refletem os encargos obrigatórios decorrentes da posição devedora acumulada pelo
governo ao longo do tempo. Dependem, dentre outros fatores, do tamanho do estoque da dívida, da política
econômica (PIB, etc.), da atuação do Banco Central (taxa Selic), dos resultados primários e da reação do mercado
financeiro.
34
O limite para Estados/DF e Municípios encontra-se na Resolução nº 40, de 2001, do Senado Federal.
35
Para um exame mais detalhado vide Anexo de Riscos Fiscais que acompanha o PLDO 2021.

17
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

60. Em relação ao quesito flexibilidade da regra atual, deve-se observar que o § 5º do art. 30
da LRF possibilita o Presidente da República enviar ao Senado Federal (limite de dívida dos
entes) ou ao Congresso Nacional (dívida mobiliária), conforme o caso, proposta de manutenção
ou alteração dos limites e condições.
61. O gráfico seguinte mostra a evolução da DBGG e da DLSP, além do superávit primário, no
período de 1997 a 2022, em percentual do PIB. O endividamento público cresceu a partir de
2014, junto com os sucessivos déficits primários. As despesas de enfrentamento dos efeitos da
Covid geraram forte incremento da dívida a partir de 2020, situação ainda não totalmente
revertida a despeito de ganhos recentes na arrecadação.
Gráfico 1 – DBGG, DLSP e Resultado Primário do Setor Público - 2006 a 2022 (% PIB)

Fonte: STN. Elab. Própria.


62. É bastante perceptível a correlação entre resultado primário (comportamento conjugado
das receitas e despesas) e a evolução do endividamento.
63. O gráfico seguinte mostra a variação da DBGG/PIB, comparado com o crescimento. Como
se pode constatar, o desempenho da atividade econômica é fator condicionante da evolução do
indicador DBGG/PIB. Períodos de recessão levaram a uma deterioração relevante do indicador
de dívida.

18
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

Gráfico 2 – DBGG e Crescimento Real do PIB - 2006 a 2022 (% PIB)

64. Medidas de correção. De acordo com a LRF (art. 31), se ultrapassado o limite da dívida,
essa deverá ser reconduzida no prazo de doze meses, com redução de 25% do excedente no
primeiro quadrimestre do período de ajuste. Enquanto o excesso perdurar o ente não poderá
realizar novas operações de crédito, internas ou externas, ressalvadas as destinadas ao
pagamento de dívidas mobiliárias (art. 31, § 1º, I).
65. Além disso, deverá obter superávit primário compatível com a recondução da dívida ao
limite (art. 31, §1º, inciso II). Vencido o prazo para retorno da dívida ao limite, e enquanto
perdurar o excesso, o ente ficará também impedido de receber transferências voluntárias da
União ou do Estado (art. 31, §2º).
66. Não foram definidos limites prudenciais. As medidas de correção foram previstas na LRF
apenas para os casos em que a dívida ultrapassa o limite máximo. Falta um rol mais abrangente
de medidas preventivas de correção quando verificada a tendência de desvio da trajetória.
67. Impedir o ente de receber transferência voluntária não é propriamente medida de
correção porque não tem relação causa-efeito com o retorno à situação de equilíbrio desejada, já
que não reduz sua dívida. Trata-se apenas de uma espécie de sanção (administrativa). A
proibição de realizar operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, e de obtenção
de garantias, configura-se como medidas de correção, porque relacionada com o objeto de
controle.
68. O art. 30 da LRF prevê mecanismos de revisão de limites em caso de instabilidade
econômica ou alterações nas políticas monetária ou cambial. Em havendo calamidade pública,
nos termos do art. 65 da LRF, ficam suspensas a contagem dos prazos e as disposições do art. 31
da mesma lei.
69. Além do controle da dívida consolidada, a LRF traz também condições e limites para as
operações de créditos, os restos a pagar e para as despesas em final de mandato.

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Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

70. Sanções. A tipificação de condutas proibidas com vistas ao controle da dívida e das
operações de crédito é relativamente detalhada e extensa na legislação. Vide em especial art. 1036
da Lei 1.079/50, Resoluções do Senado, arts. 359-A do código penal e art. 1º, XVI e XX do DL
201/67.
71. Existem também sanções que envolvem o pagamento de multa que pode chegar a 30%
dos vencimentos anuais, a inabilitação para o exercício da função pública por um período de até
5 anos e a perda do cargo público e a cassação de mandato, e, até pena prevista no código penal.

36
Art. 10. São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária: (...) 5) deixar de ordenar a redução do
montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor
resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado Federal; 6) ordenar ou autorizar a abertura de
crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária
ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal; 7) deixar de promover ou de ordenar na
forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de
crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei; 8) deixar de promover
ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os
respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro; 9) ordenar ou autorizar, em
desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação,
inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou
postergação de dívida contraída anteriormente; 10) captar recursos a título de antecipação de receita de tributo
ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido; 11) ordenar ou autorizar a destinação de recursos
provenientes da emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a autorizou; 12) realizar ou
receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei.

20
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

V. REGRA DE OURO

Situação Fiscal Desejada:


Equilíbrio do Orçamento Corrente

Sanções
Crime de Responsabilidade: Lei Indicador. Limite.
1079/50. Lei 10.028/00. Código Operações de Crédito excedem
Penal. Despesas de Capital

Medidas de Correção
Proibição de operação de crédito
que exceda o montante

Figura 4 - Mecanismo de Controle da Regra de Ouro


72. Legislação e breve histórico. A regra de ouro encontra-se prevista no inciso III do art.
167 da Constituição, na LRF (art. 12, § 2º; 32, §3º) e na Resolução nº 48/2007 37 do Senado
Federal (art. 6º). De acordo com o texto constitucional, o montante de operações de crédito
realizadas não deve ultrapassar o montante de despesas de capital. A limitação das operações de
crédito foi a forma prevista na CF 88 de garantir o equilíbrio do orçamento corrente. A
possibilidade de realização de operações de crédito para despesas de capital (inclui
investimento) é justificada pelos efeitos econômicos que trazem para gerações futuras.
73. A regra pretende evitar que operações de crédito financiem despesas correntes. Sua
aplicação deve se restringir ao âmbito do orçamento fiscal e da seguridade social. A crise fiscal
revelou dificuldade crescente no cumprimento da regra de ouro, o que tem guarda relação com:
o crescimento das despesas correntes obrigatórias; o aumento das despesas financeiras
correntes; a ausência de resultados primários; e a perda de receitas correntes.
74. Situação desejada: pretende-se garantir o equilíbrio no orçamento corrente. Alguns
estudos apontam várias limitações e deficiências da regra de ouro da forma como adotada no
Brasil38. Um dos principais problemas é o de não prever medidas de correção. A regra estipula

37
De acordo com a Resolução nº 48 do Senado, as receitas das emissões de títulos serão consideradas apenas no
exercício financeiro em que elas forem utilizadas para pagamento de despesas. Receitas de emissões que
excedam as despesas de capital são separadas em uma subconta específica da Conta Única, e podem ser
utilizadas para amortização da dívida pública em exercícios posteriores.
38
Conorf/Senado Federal. Orçamento em Discussão. Regra de Ouro: Falhas de Concepção e de Aplicação no
âmbito a União. Os autores apontam interferências, a exemplo das receitas na alienação de ativos e amortização
de empréstimos concedidos, e nas despesas com a cobertura do déficit do Banco Central e com a atualização

21
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

como cláusula de escape (art. 167, III) o afastamento puro e simples da limitação, bastando a
aprovação, por maioria absoluta, sem qualquer outra providência.
75. O equilíbrio da regra de ouro deve ser observado desde a elaboração da LOA (art. 12, § 2º
LRF ). Ocorre que, neste momento, não se pode contar com a cláusula de escape, vez que
39

créditos suplementares e especiais só existem após a aprovação da lei. Diante disso, a solução
encontrada para aprovar orçamentos com excesso de operações de crédito em face das despesas
de capital (vide gráfico seguinte) tem sido a de incluir autorização na LDO que permite o ingresso
antecipado na LOA de receitas de operações de crédito e de despesas (correntes), ambas
condicionadas, ou seja, cuja eficácia fica condicionada à aprovação futura de créditos
orçamentários pela maioria absoluta do Congresso Nacional.
76. Essa forma de contornar a regra de ouro cria embaraço, qual seja, a aprovação pelo
Congresso Nacional de uma lei orçamentária precária, onde a autorização de montante
relativamente elevado de despesas correntes, inclusive obrigatórias40 (a exemplo de benefícios
previdenciários e despesas com pessoal) passam a depender de nova aprovação durante a
execução, quando o mesmo Congresso é chamado para aprovar projeto de crédito adicional, com
quórum qualificado, e assim confirmar tais despesas.
77. Assim, prorroga-se a aprovação de um orçamento corrente deficitário já se sabendo que
não haverá alternativa. De fato, não seria razoável a recusa do Legislativo de aprovar créditos
destinados a despesas obrigatórias. Ademais, a ausência de autorização de operações de crédito
para despesas financeiras acarretaria graves consequências na gestão da dívida pública.
78. O gráfico mostra publicação41 do Tesouro Nacional acerca do cumprimento da regra de
ouro, mostrando os valores de (in)suficiência a partir de 2009, durante a execução do orçamento.
As insuficiências (operações de crédito superam as despesas de capital) se manifestam, grosso
modo, com déficits elevados, insuficientes para o pagamento das despesas correntes. A LOA 2023
prevê um excesso de operações de crédito em relação às despesas de capital (insuficiência da
regra de ouro), no âmbito do orçamento fiscal e da seguridade social, no valor de cerca de R$ 200
bilhões.
79. A EC nº 126/2022, no art. 6º, estabeleceu o envio pelo Presidente da República ao
Congresso Nacional, até 31 de agosto de 2023, de projeto de lei complementar com o objetivo de
instituir regime fiscal sustentável, inclusive quanto à regra de ouro (inciso III do art. 167). Ocorre

monetária da dívida. Também são citadas a sensibilidade a estratégias de dívida e a sensibilidade a regras e
estratégias de gestão financeira, bem como a forma de cômputo das operações de crédito realizadas no contexto
da gestão da dívida. E concluem que a utilização da regra de ouro como indicador deveria ser precedida de uma
revisão. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/orcamento/documentos/estudos/tipos-de-
estudos/orcamento-em-discussao/edicao-46-2020-regra-de-ouro-falhas-de-concepcao-e-de-aplicacao-no-
ambito-da-uniao>. Acesso em 12 set 2020.
39
Art. 12 [...] § 2º O montante previsto para as receitas de operações de crédito não poderá ser superior ao das
despesas de capital constantes do projeto de lei orçamentária.
40
No PLOA 2021, dentre as programações condicionadas à futura aprovação legislativa de que trata o inciso III
do art. 167 da CF, R$ 272,1 bilhões corresponde a benefícios previdenciários e R$ 119 bi a despesas com pessoal
e encargos sociais. Também estão condicionadas despesas com sentenças judiciais e complementação Fundeb.
41
Disponível em:
<https://www.tesourotransparente.gov.br/visualizacao/painel-da-regra-de-
ouro#:~:text=Essa%20regra%20impede%20que%20governos,Constitui%C3%A7%C3%A3o%20Federal%20d
e%201988%3B%20art.>. Acesso em 27 fev 2023.

22
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

que o art. 167, III não ficará revogado pelo que consta no art. 9º da mesma EC, o que delimita a
eventual regulamentação nesta lei complementar.

Gráfico 3 - Suficiência da Regra de Ouro 2009-2022

Fonte: Tesouro Nacional.


80. Medidas de correção. Apurada a possibilidade de desvio (excesso de operações de
crédito), a única (e inviável) medida de correção prevista na regra de ouro é a proibição de
operação de crédito excedente. Não foram previstas medidas de prevenção do aumento das
despesas correntes ou de acréscimo de receitas correntes, variáveis responsáveis pelo
desequilíbrio. Além disso, o maior contingenciamento sobre investimento (despesas de capital)
agrava a funcionalidade da regra de ouro. A única hipótese de escape é a autorização das
despesas excedentes durante a execução, ”mediante créditos suplementares ou especiais com
finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta” (art. 167, III CF).
81. A mera aprovação de créditos orçamentários com maioria absoluta não gera recursos, não
corrige o desequilíbrio corrente e nem a trajetória da dívida, onde o crescimento inercial das
despesas obrigatórias tem peso relevante.
82. Uma iniciativa para corrigir essa disfunção constou da PEC 438/201842, que substituiu a
atual cláusula de escape - aprovação com maioria absoluta, cuja natureza é essencialmente
política -, por medidas de natureza econômico-fiscal voltadas à recondução do equilíbrio. Além
disso, incluiu sanções, esclarecendo que a punibilidade é excluída quando os gestores
responsáveis pelas finanças públicas comprovam que observaram as medidas preconizadas na
norma.
83. No âmbito dos Estados/DF e dos Municípios, a preservação do equilíbrio no orçamento
corrente, semelhante ao propósito da regra de ouro, encontra-se disciplinada no art. 167-A da
CF. De acordo com essa regra, se apurado que, no período de 12 (doze) meses, a relação entre
despesas correntes e receitas correntes supera 95%, fica facultado aos Poderes e órgãos
autônomos, enquanto permanecer a situação, aplicar o mecanismo de ajuste fiscal, enumerando

42
A proposta de emenda constitucional foi apresentada pelo Deputado Pedro Paulo/RJ. Disponível em:
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=C3392DD400C800AD0BE0BDE
5CF0E8A04.proposicoesWebExterno2?codteor=1679711&filename=PEC+438/2018

23
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

uma série de medidas de correção, as mesmas que devem ser acionadas pela União em caso de
calamidade pública nacional ou quando a relação entre despesa obrigatória e despesa primária
atinge 95% (art. 109, ADCT). As medidas, em suma, impedem o aumento de despesas correntes
e proíbem a renúncia de receitas tributárias. Ainda que as medidas de ajuste sejam facultativas,
existem sanções - concessão de garantias por outro ente e tomada de operações de crédito pelo
ente envolvido - se as medidas não forem adotadas, (art. 167-A, § 6 º)
84. Conclui-se pela necessidade de aperfeiçoamento da regra de ouro tal como atualmente
encontra-se formulada na Constituição e na LRF.
85. Sanções. A legislação contempla punições severas ao responsável pela realização de
operações em desconformidade com a lei (crime de Responsabilidade: art. 85, VI da CF; Lei
1079/50 (art. 9, item 4; 10, itens 7 e 9; e art. 11, item 3), LRF (art. 32, § 1º, V); Código Penal: art.
359-A. Lei nº 8.429/92 (art. 73 LRF).

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Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

VI. META DE RESULTADO PRIMÁRIO

Situação Fiscal Desejada


Resultados Fiscais consistente
com a política fiscal e
econômica

Indicador. Limite.
Sanções Específicas Diferença entre Receita e
Lei 10.028/00; Lei 8.429/92 Despesa Primária. Limite é a
meta fixada na LDO.

Medidas de Correção
Limita despesas discricionárias
(art. 9º LRF).

Figura 5 - Mecanismo de Controle de Resultado FIscal

86. Legislação e breve histórico. A LRF (art. 4º, § 1º) determinou a necessidade de o projeto
de LDO conter metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas,
resultado nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e
para os dois seguintes. Desde o início, o caráter obrigatório e vinculante foi atribuído apenas às
metas de resultado primário previstas para o primeiro ano.
87. O saldo primário, desde a LRF e até a aprovação da EC 95/2016 (teto de gastos), era o
principal mecanismo de controle fiscal, utilizado como âncora fiscal na elaboração e execução
dos orçamentos. De acordo com a lei fiscal, os orçamentos devem ser compatíveis com as metas
fixadas na LDO. O Congresso Nacional praticamente não altera a meta de resultado proposta pelo
Executivo. Uma vez fixada para o exercício, em havendo frustração na receita estimada ou
aumento da despesa obrigatória na execução, é o gestor obrigado a limitar as despesas
discricionárias. A meta de resultado é considerada pró-cíclica, na medida em que impõe maior
redução na despesa pública em situações de baixo crescimento com perda de arrecadação.
88. O gráfico seguinte mostra, no âmbito da União, a evolução das receitas primárias (líquidas
de transferências) versus despesas primárias no período de 1997-2022, indicando também os
montantes previstos na LOA 2023. O resultado primário positivo vinha se mantendo em torno
de 2% do PIB, com alguma variação, até 2014, quando se inicia um processo que associa queda
de receita43 44 com a elevação da despesa primária.
89. A partir de 2017 os resultados se recuperam lentamente, até o advento da Covid 19 em
2020, que exigiu grande aumento de despesas. O represamento de gastos e o adiamento de
precatórios, aliada ao aumento de receita extraordinária, contribuíram para o resultado positivo

43
A variação da receita primária líquida deflacionada nos anos de 2014, 2015 e 2016 foi, respectivamente, de -
3,8%, -6,5% e -2,1%. Fonte: Nota Técnica Conjunta PLOA 2021 – Tabela 7.
44
Em setembro de 2015 o Brasil perdeu o grau de investimento.

25
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

em 2022. No exercício de 2023, no entanto, o aumento de despesas autorizado pela EC 126/2022,


de R$ 168 bilhões45 (Bolsa Família e Políticas Públicas), elevou o déficit primário orçamentário
para 2,2 % PIB.

Gráfico 4 - Governo Central - Receitas e Despesas Primárias Líquidas de Transferências


Resultado Primário 1997-2023 (% PIB)

90. Situação fiscal desejada. Trata-se de adotar como variável fiscal a ser controlada uma
meta de resultado fiscal consistente com o contexto da política econômica e fiscal. A LRF não
prevê uma meta específica, mas determina que caberá às LDOs de cada ente fixá-las,
acompanhadas de demonstrativo (art. 4º, § 2º, II) que evidencie a consistência das mesmas “com
as premissas e os objetivos da política econômica nacional”. Os projetos de LOA (art. 5º, I da LRF)
devem ser elaborados de forma compatível com as metas aprovadas na LDO.
91. O objetivo da política fiscal declarado nas LDOs variou ao longo do tempo. Por um algum
período o compromisso era o de estabilizar a relação dívida líquida/PIB. Ainda antes da
pandemia, passou a ser o do menor déficit primário possível, ou também de garantir uma
trajetória sustentável no médio e longo prazo.
92. Os demonstrativos que acompanham as LDOs não trazem informação suficiente para
aferir se o resultado primário fixado para o exercício a que se refere e para os dois seguintes é
compatível, do ponto de vista estrutural, que abstrai flutuações sazonais, com a desejada
estabilização ou sustentabilidade da dívida no médio e longo prazo.
93. A partir da instituição do teto de gastos, a meta primária perdeu relevância e passou a ser
consequência do volume de arrecadação, dado que o montante de gastos ficou pré-estabelecido.
Nas propostas orçamentárias, especialmente a partir de 2014, metas deficitárias foram fixadas
com ampla margem para cumprimento, adotando-se expectativas mínimas para o desempenho

45 A EC nº 126/22 ampliou o teto em R$ 145 bilhões, além de R$ 23 bilhões (investimentos fora do teto).

26
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

da arrecadação e ausência de medidas voltadas a recuperar a capacidade arrecadatória, que


seguiu uma trajetória de queda de 2010 até 2020.
94. Uma trajetória sustentável da dívida exige a fixação de metas de resultado consistentes
do ponto de vista temporal, o que depende de diversas variáveis. O superávit primário
necessário para manter a relação dívida/PIB estável depende, principalmente, do
crescimento do PIB e dos juros reais46. As metas projetadas para os dois exercícios seguintes ao
que se refere a LDO, tal como consta no Anexo de Metas Fiscais, têm caráter meramente
indicativo, garantia pouco eficaz da continuidade do esforço fiscal. Vale lembrar que dispositivo
vetado na LRF previa, como parte integrante do PPA, um Anexo de Política Fiscal onde
constariam os “objetivos e metas plurianuais de política fiscal a serem alcançados durante o
período de vigência do plano, demonstrando a compatibilidade deles com as premissas e
objetivos das políticas econômica nacional e de desenvolvimento social".
95. De acordo com a atual regra de resultado primário, se durante a execução do orçamento
houver frustração da receita estimada ou aumento das despesas obrigatórias (art. 9º LRF)47, em
relação ao que constou da LOA, deve o gestor promover a limitação de empenho e pagamento
das despesas discricionárias (contingenciamento). Nos últimos anos não tem havido
contingenciamento, visto que a folga na meta primária é menos restritiva que o limite
estabelecido no teto de gastos. Isso porque a arrecadação é superior à projetada na lei
orçamentária, não havendo necessidade de contenção de despesas para cumprimento desta
regra fiscal.
96. A preservação dos resultados fiscais é exigida também quando da aprovação de ato que
aumenta a renúncia de receita (art. 14 da LRF) ou a despesa obrigatória (art. 17). Contribuiu para
a perda de prestígio da regra o fato de poder ser alterada durante o exercício, por meio de projeto
de lei que altera a LDO. Metas fiscais pouco exigentes tornam inócuo o ajuste pretendido pela
LRF e reduzem a eficácia das regras de compensação.
97. Indicador. O indicador utilizado para medir resultados primários é a diferença entre
receita e despesa primária, cuja memória de cálculo e metodologia encontra-se no anexo de
metas fiscais. Algumas LDOs, no passado, previam a possibilidade de reduzir as metas fiscais
durante a execução, dentro de certa margem, em benefício de determinadas despesas (projetos
prioritários - PPI/PAC, restos a pagar, desonerações, etc.) ou para compensar suposto “excesso”
de meta no ano anterior.
98. A União não trabalha com metas de resultado nominal, fixando-se no texto da LDO apenas
as metas primárias.48
99. Para auxiliar na apuração do resultado primário, todas as despesas da LOA são
classificadas segundo o “identificador de resultado primário – RP”, que adota a metodologia de
cálculo do demonstrativo das necessidades de financiamento do governo central.

46
Quanto maior o crescimento do PIB, menor o superávit primário necessário (menor a relação Dívida/PIB).
Juros reais maiores do que o crescimento do PIB aumentam a relação dívida/PIB, exigindo maior superávit
primário.
47
O aumento identificado das despesas obrigatórias durante a execução torna obrigatório maior
contingenciamento das despesas discricionárias. Isso porque o § 2º do mesmo art. 9º esclarece que as despesas
obrigatórias não serão objeto de contingenciamento.
48
As tentativas do Congresso Nacional de fixar metas de resultado nominal, ainda que referenciais, foram
vetadas.

27
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

100. Após a EC nº 95/2016, a regra de resultado coexiste com a regra do limite de despesas
primárias. Na presença de duas regras fiscais (teto e resultado primário) prevalecerá sempre a
mais restritiva.
101. Medidas de correção. De acordo com a LRF, em caso de desvio da meta, a correção da
trajetória é feita por meio do contingenciamento de despesas discricionárias. O acionamento
ocorre sempre que identificado, durante a execução da lei orçamentária, frustração de receita ou
aumento de despesa obrigatória49. Caso surjam novas receitas ou nas situações em que despesas
obrigatórias se mostrem superestimadas, a limitação de despesas discricionárias pode ser
afastada. Antes da EC nº 95/2016, o contingenciamento era bastante usual.
102. O art. 9º da LRF previu a possibilidade de a LDO ressalvar despesas do contingenciamento.
Os decretos de contingenciamento não identificam as programações específicas cujos empenhos
e pagamentos ficam bloqueados, apenas fixam limites orçamentários e financeiros por órgão.
103. O monitoramento da meta fiscal prevista para o exercício é feito no final de cada bimestre,
o que exige a publicação de relatórios a cargo do Poder Executivo, fixando-se os limites de
empenho e pagamento, aplicáveis a todos os demais Poderes e MP. A apuração dos montantes de
contingenciamento é avaliada a partir da atualização dos parâmetros macroeconômicos, da
projeção da receita e das despesas obrigatórias.
104. A fixação de metas deficitárias a partir de 2015, esgotada a possibilidade de compressão
das despesas discricionárias, não foi acompanhada de medidas de restrição às novas despesas
obrigatórias e de contenção das renúncias, ou mesmo de aumento da receita.
105. Sanções. De acordo com o art. 5º da Lei 10.028/2000, constitui infração administrativa
contra as leis de finanças públicas: (...) II – propor lei de diretrizes orçamentárias anual que não
contenha as metas fiscais na forma da lei; III – deixar de expedir ato determinando limitação de
empenho e movimentação financeira, nos casos e condições estabelecidos em lei;
106. Identificado durante a execução da lei orçamentária o risco de não cumprimento da meta
de resultado fiscal constante da LDO vigente, é obrigação do Presidente da República efetuar o
contingenciamento. De acordo com a LRF, cabe aos Tribunais de Contas fiscalizar o cumprimento
das metas, as avaliações bimestrais e se as medidas estão sendo tomadas.

49
Não está expresso no texto da LRF, mas tem sido prática corrente.

28
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

VII. A REGRA DO TETO

Situação Fiscal Desejada


Limitar o crescimento das despesas
primárias por Poder/ Órgão Autônomo

Sanções Específicas Indicador. Limite.


Crime de Responsabilidade (CF, art. 85, Despesa Primária 2016 corrigida pelo
VI; Lei 1.079/1950. Lei nº 8.429/92; IPCA
Cód. Penal

Medidas de Correção
Vedações ao aumento das despesas
obrigatórias, etc.

Figura 6 - Mecanismo de Controle da Despesa Primária Total/Poder e Órgão


Autônomo
107. Legislação e breve histórico. A EC nº 95/2016, com vigência por vinte exercícios a partir
de 2017, estabeleceu que as despesas primárias dos orçamentos fiscal e da seguridade social da
União devem observar limites individualizados para cada Poder e órgão autônomo, nos termos
do art. 107, caput, incisos I a V do ADCT50.
108. Quando da aprovação da EC nº 95/2016 já se encontrava razoavelmente assentado o
diagnóstico de que o principal problema das contas da União era o crescimento das despesas
(correntes) obrigatórias51, razão pelo qual as medidas de contenção vedam a ampliação de vários
itens dessas despesas.
109. O Gráfico 5 mostra a evolução dos grandes grupos de despesa primária - benefícios
previdenciários, pessoal e encargos sociais, outras despesas obrigatórias52, despesas com
controle de fluxo53 e despesas discricionárias - no período de 2008-2022 e estimadas na lei
orçamentária de 2023. Não foram incluídas as despesas com transferências constitucionais por
repartição de receita que, no mesmo período, cresceram de 3,1% para 4% do PIB.

50
A soma dos limites individualizados do Poder Executivo e dos demais Poderes e Órgãos, estabelecidos pela
EC nº 95/2016, alcança no PLOA 2021 R$ 1.485,9 bilhões.
51
Desde a LRF, exige-se compensação prévia para a aprovação de legislação que crie ou aumente despesa
corrente obrigatória, além de outras disposições de mesmo propósito constantes das leis de diretrizes
orçamentárias. No entanto, as disposições no plano infraconstitucional - LRF - apresentaram eficácia
relativamente baixa.
52
Despesas com seguro desemprego e abono salarial, LOAS/RMV, Fundeb, Demais Poderes, Sentenças
Judiciais e Precatório, Subsídios e subvenções, etc.
53
Despesas necessárias ao atendimento dos pisos da saúde e educação, bolsa família, auxílios a servidores, etc.

29
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

Gráfico 5 – Principais itens de Despesas Primárias - 2008 a 2023 (% PIB)

110. O histórico das despesas discricionárias parece indicar que existe na União um nível de
resistência de cerca de 2% do PIB, que, na prática, funciona como um piso, haja vista o nível de
comprometimento das atividades de estado e dos investimentos públicos quando essa classe de
despesas ficou em torno de 1,5% (2020 a 2022).
111. Quanto às despesas obrigatórias, o item que mais cresceu foi as previdenciárias. As
despesas com pessoal, em relação ao PIB, e também em relação à RCL, mantiveram-se
relativamente estáveis com queda mais acentuada nos últimos anos em virtude da ausência de
reajustes. Depois da reforma previdenciária, vários itens de despesas obrigatórias já foram
objeto de propostas de redução: precatórios, abono salarial, promoções e progressões; redução
proporcional de jornada de trabalho e vencimentos; e aquelas apresentadas no contexto da
reforma administrativa (controle do teto remuneratório e das parcelas indenizatórias). No caso
dos precatórios houve adiamento de pagamentos, o que afetará sensivelmente as despesas
obrigatórias a partir de 2026. As despesas obrigatórias com controle de fluxo54 quase dobram de
participação em 2023 em relação ao início da série, em decorrência do novo patamar para o
atendimento do programa Bolsa Família, que passará de 0,3% do PIB em 2008 para 1,7% do PIB
em 2023.
112. Vale lembrar os principais pontos que balizaram o teto de despesas quando de sua
formulação, em um contexto de déficit público:
a) ajuste fiscal exclusivamente pelo lado da despesa primária, de modo a não
requerer aumento da receita (manutenção de carga tributária); crescimento real

54
Classificação adotada pela STN de despesas que, apesar de decorrerem de determinação legal ou
constitucional, possuem características tais que permitem uma flexibilidade relativa na programação
orçamentária e financeira, a exemplo das despesas com piso da saúde e educação, benefícios a servidores, bolsa
família, etc. São exemplos de despesas obrigatórias que não se sujeitam a controle de fluxo as despesas com
pessoal, previdência, repartição de receita, etc., ou seja, encargos da União líquidos e certos, com data certa de
pagamento, sem qualquer flexibilidade.

30
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

nulo até 2026, com a revisão do método de correção em 2026; desincentivo às


reestimativas de receitas na aprovação do orçamento;
b) expectativa de que o teto traria queda gradual e persistente da despesa
primária/PIB e da relação dívida/PIB;
c) o mesmo limite disputado entre despesas discricionárias e obrigatórias deveria
representar um guia das reformas voltadas à redução
(desindexação/desvinculação) de despesas obrigatórias;
d) caráter anticíclico (ou acíclico), modulando os efeitos da variação do PIB na
receita, o que poderia preservar investimento público em períodos de crise;
e) alteração da metodologia de reajuste dos mínimos constitucionais da saúde e
educação, bem como do montante destinado às emendas impositivas; e,
f) limites válidos tanto para a execução financeira (inclui restos a pagar) como para
os montantes orçamentários autorizados, o que antecipa decisões de gestão
pública e permite maior previsibilidade.
113. Dentre as posições críticas aos fundamentos da EC nº 95/2016, destacaram-se:
a) o método de correção do teto da despesa, restrito ao IPCA, não considera o
crescimento médio55 da economia (e da arrecadação), nem o crescimento
(vegetativo) populacional; mantido por muitos anos, atua como uma regra de
política econômica para reduzir a participação do estado no PIB, e não somente
como regra fiscal;
b) o controle limitado à despesa não estimula o debate acerca da necessidade de
preservação ou aumento de receita pública (controle das renúncias de receita,
combate à sonegação, etc.), nem sobre os riscos fiscais de índole patrimonial
(contingências);
c) a correção dos pisos da saúde e da educação apenas pelo IPCA não considera o
crescimento populacional;
d) a redução das despesas discricionárias, mantido o método de correção apenas pelo
IPCA, atinge fortemente o investimento público; e
e) falta de acionamento das medidas de correção, mesmo com as alterações da EC
109.
114. Durante a tramitação da EC nº 95/2016 chegou-se a discutir a exclusão das despesas com
precatórios (dependem apenas do Judiciário), ou aquelas financiadas com recursos próprios -
sob o argumento de sua neutralidade fiscal - ou mesmo dos investimentos - sob o argumento de
seu efeito multiplicador na economia, o que não teve sucesso.
115. Posteriormente, em especial em virtude da pandemia e de seus efeitos econômicos e
sociais e diante de pressões orçamentárias, várias alterações foram aprovadas, ora excluindo
determinadas despesas do teto, ora aumentando o limite:
a) EC nº 102/2019 - exclui transferências por conta dos leilões dos volumes
excedentes/revisão da cessão onerosa (art. 107, § 6º, V, ADCT), montante de R$
74,8 bilhões;
b) EC nº 108/2020 - remissão, para fins de exclusão do limite, de dispositivo
permanente do Fundeb (art. 107, § 6º, I, ADCT);

55 O Brasil cresceu no período de 1996 a 2022, em média, 2,16 % do PIB (IBGE).

31
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

c) EC nº 109/2021 - Prevê despesas com auxílio emergencial de até R$ 44 bilhões,


excluídas do teto; cria gatilho para aplicação de medidas de contenção de
aumentos de despesa obrigatória, que passa a ser o atingimento da proporção de
95% entre despesa obrigatória primária versus despesa primária total (art. 109,
ADCT).
d) EC nº 113/2021 - altera metodologia de correção dos limites56 (art. 107, § 1º, II,
ADCT) e majora o limite destinado exclusivamente a despesas de vacinação contra
a covid-19 ou ações emergenciais em até R$ 15 bilhões para o exercício de 2021.
Foi revogada57 a possibilidade de alteração no método de correção do teto dos
gastos, anteriormente prevista para 2026 (art. 108, ADCT).
e) EC nº 114/2021 - limita até o final de 2026 as despesas com sentenças judiciais de
que trata o art. 100 da Constituição, as quais não podem ultrapassar a despesa
paga com essa finalidade em 2016, incluídos os restos a pagar pagos, corrigida pelo
IPCA (art. 107-A, ADCT). O espaço fiscal aberto pela PEC dos precatórios58 foi de
R$ 45 bilhões em 2022.
f) EC nº 123/2022 – Cria o estado de emergência com despesas podendo ser
atendidas por meio de crédito extraordinário (não sujeitas ao teto), sem
compensação. Para enfrentamento ou mitigação dos impactos decorrentes do
estado de emergência, a PEC autoriza o pagamento, até 31.12.2022, de uma série
de benefícios (auxílio brasil e outros), no valor de cerca de R$ 41,25 bilhões;
g) EC nº 126, de 21/12/2022 (Transição) - Aumenta o teto em cerca de R$ 167
bilhões para a ampliação do programa de transferência de renda (R$ 70 bilhões) e
o atendimento de diversas políticas públicas. Prevê a revisão do arcabouço fiscal
com a revogação do Novo Regime Fiscal.
h) EC nº 127, de 22/dez/2022 (piso aos profissionais de saúde dos Estados/DF e
Municípios) - exclui do teto as despesas e transferências destinadas ao pagamento
de despesas com pessoal para cumprimento dos pisos nacionais salariais de
categorias da saúde.
116. O acionamento dos gatilhos, na redação original da EC 95, dependia do atingimento dos
limites máximos de despesa, o que não se mostrou exequível dada a incerteza quanto à
responsabilização dos agentes públicos. Com a mudança da EC 109 foi criado um gatilho
automático que aciona vedações a partir do atingimento de 95% na proporção entre as
despesas primárias obrigatórias59 e o teto individualizado, aplicável por Poder ou órgão

56
A nova redação, em contraposição àquela do texto anterior, fez com que os limites de despesa primária, quando
da elaboração da LOA, se tornassem instáveis e provisórios, porque fixados com base em projeções do IPCA
no exercício em que se elabora o PLOA.
57
Diante do esgotamento das alternativas de contenção das despesas primárias submetidas ao teto, obrigatórias
e discricionárias, imaginava-se uma revisão antecipada do método de correção do teto, mantendo-se o atual
paradigma, e não sua revogação.
58
Os precatórios devidos e não pagos em 2022 aproximam-se de R$ 30 bilhões. As sentenças devidas e não
pagas entre 2022 e 2026, com correção monetária, possivelmente na casa de centenas de bilhões de reais,
representam esqueleto a ser desembolsado em 2027 e salto significativo na dívida pública federal.
59
A eventual aplicação deste dispositivo exigirá uma definição mais clara acerca das despesas obrigatória. Vide,
a propósito, o Estudo Técnico 13/2018 - Vínculo Obrigacional e Grau de Rigidez das Despesas Orçamentárias.
Disponível em: https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/estudos/2018/et13-2018-vinculo-
obrigacional-e-grau-de-rigidez-das-despesas-orcamentarias.

32
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

autônomo, uma espécie de limite prudencial com o propósito de reduzir o crescimento das
despesas obrigatórias antes do limite máximo. Contudo, esse nível mostrou-se nitidamente
elevado, vez que seu acionamento dependeria de uma redução insustentável de despesas
discricionárias.
117. A figura seguinte ilustra a dificuldade de se manter por muitos anos um teto reajustado
apenas pelo IPCA, diante do fato de que grande parte das despesas obrigatórias crescem
acima da inflação, destacando-se os precatórios, os benefícios previdenciários e assistenciais
(ampliação do auxílio-brasil /bolsa-família).

Fig. 7 - Compressão das despesas discricionárias (custeio e investimento)


118. A regra do limite à despesa primária deveria ser integrada com o objetivo final da política
fiscal, que é a sustentabilidade da dívida, e não como um fim em si mesmo. A necessidade de a
regra ser melhor estruturada pode ser exemplificada, por exemplo, para o caso do regime geral
da previdência social, cuja autonomia é resguardada pela Constituição. Ao se abstrair os
ganhos/perdas de arrecadação no âmbito do RGPS perde-se o estímulo quanto à necessidade de
se acionar medidas arrecadatórias voltadas ao equilíbrio atuarial60. Se os aumentos de receita
previdenciária acima do IPCA fossem levados em conta na correção do teto, parte do aumento
das despesas do RGPS estaria compensada, sem qualquer prejuízo para o controle da dívida. O
mesmo se aplica em relação às despesas custeadas com doações, ou com recursos próprios, com
as devidas cautelas.
119. A dificuldade de se acionar medidas de ajuste em condições normais - que exige uma
proporção de despesas obrigatórias maior do que 95% - contrasta com o regime aplicável em
situações de calamidade pública, onde sua decretação em âmbito nacional é condição suficiente
(art. 167-G da CF) para acionar imediatamente as mesmas medidas de contenção.
120. Situação Fiscal Desejada. Diante do aumento das despesas primárias (correntes e
obrigatórias) em percentual do PIB, a proposta original do teto visava reduzir esse crescimento.
121. De acordo com a EC nº 126/2022, o Novo Regime Fiscal será revogado após a sanção da
lei complementar que terá o objetivo de "instituir regime fiscal sustentável para garantir a
estabilidade macroeconômica do País e criar as condições adequadas ao crescimento
socioeconômico", inclusive quanto à regra do art. 167, III da Constituição Federal.
122. Indicador. O indicador escolhido na União é a despesa primária, por Poder e órgão
autônomo, no âmbito dos orçamentos fiscal e da seguridade social. Na aferição do limite do art.
109 do ADCT é utilizado como indicador a relação entre a despesa obrigatória primária e a total.

60
Ver a propósito estudo acerca dos efeitos da Reforma da Previdência (EC nº 103/2019) na regra do teto (EC
nº 95/2016): proposta de ajuste metodológico no cômputo dos limites

33
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

É necessário uma definição mais precisa do que seja despesa “obrigatória”, evitando-se
contabilidade criativa61.
123. Para os demais entes, o indicador é a relação despesas correntes/receitas correntes.
124. Os limites estabelecidos aplicam-se tanto para o valor autorizado (lei e créditos
adicionais) como para a execução financeira (inclui restos a pagar). A existência de um limite
desde a autorização dos créditos orçamentários mostrou-se positiva em inúmeros aspectos da
gestão fiscal e orçamentária (previsibilidade, segurança, etc.) e na estipulação de limites aos
demais Poderes e Órgãos autônomos.
125. Os limites por Poder e órgão autônomo foram determinados num primeiro momento com
base no valor de 2016, devidamente corrigidos a cada ano pelo IPCA.
126. Na aplicação dos limites foram incluídas operações, mesmo que não orçamentárias, que
afetam o resultado primário. E foram excluídas as despesas obrigatórias que decorrem da
repartição de receitas e da complementação da União ao Fundeb. Também foram excluídos os
créditos extraordinários62, as despesas sazonais para a realização de eleições e o aumento de
capital de estatais não dependentes.
127. O objetivo implícito das exclusões no âmbito da União é o de retirar do limite as despesas
obrigatórias que decorrem de causas sobre as quais o governo tem pouco ou nenhum controle
sobre as mesmas. Quase todas as despesas excluídas são obrigatórias63, tratando-se de um rol
limitado (numerus clausus).
128. Medidas de correção. As medidas de correção são aquelas dos incisos do art. 109 do
ADCT, acionadas quando atingida a relação de 95% entre despesas obrigatórias e despesas
primárias totais. Consistem em vedações relacionadas ao aumento de despesas com pessoal,
criação ou aumento acima da inflação de despesa obrigatória, revisão geral anual, etc. Aplicam-
se “até o retorno das despesas aos respectivos limites”, ou seja, as proibições deixam de existir
apenas depois de confirmado o retorno ao limite anual.
129. Importante destacar que as medidas de correção do art. 109 do ADCT não obrigam o
Legislativo a tomar decisões para reduzir despesas obrigatórias, mas apenas o impede de criar
novas despesas e assim conter seu crescimento. As medidas que vedam novas despesas
obrigatórias também não obstam o crescimento vegetativo dos gastos já legislados (benefícios
previdenciários e assistenciais, etc.).
130. Inclui-se também na proibição a criação ou expansão de programas e linhas de
financiamento, bem como a remissão, renegociação ou refinanciamento de dívidas que
impliquem ampliação das despesas com subsídios e subvenções; a concessão ou a ampliação de
incentivo ou benefício de natureza tributária. Curioso observar, com base no modelo de
referência utilizado neste trabalho, que algumas dessas medidas não têm relação com as
despesas primárias, ou seja, não corrigem o desvio. Logo podem ser consideradas como sanções
administrativas.

61
No PLOA 2020, várias despesas discricionárias (investimentos na área militar) estavam classificadas como
despesas obrigatórias, uma forma de evitar o contingenciamento.
62
Houve temor, inicialmente, que essa exclusão pudesse ser utilizada de forma indevida. No entanto, revelou-
se oportuna. Sua utilização regular permitiu o enfrentamento da calamidade, sem prejuízo para as demais
despesas.
63
As despesas com aumento de capital de empresas estatais não dependentes não são obrigatórias. Sua exclusão
foi uma escolha política.

34
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

131. As medidas não incluem a restrição das despesas discricionárias, já que tais despesas
funcionam como variáveis de ajuste no contexto do limite geral.
132. Os incisos do art. 109 do ADCT impõem o dever de abstenção em relação aos atos que
especifica. Adicionalmente, o caput contempla um dever genérico dos órgãos e entidades de
adotar “outras medidas” para o retorno das despesas aos respectivos limites.
133. As vedações aplicam-se em especial às proposições legislativas (§ 4º do art. 109).
134. É fato que, se algumas das medidas de ajuste tivessem sido acionadas desde o início da
vigência da EC nº 95/2016, as despesas discricionárias (custeio e investimento) estariam menos
comprimidas64. Diversas despesas obrigatórias (a exemplo do aumento do teto remuneratório,
das PECs dos servidores dos ex territórios federais, do aumento dos militares, da criação de
cargos no TRF 6, do aumento dos policiais do DF, etc.), refinanciamentos de dívidas (setor
agrícola, Pró-Santas Casas, etc.), e novas renúncias (desoneração folha de pagamento), não
teriam sido aprovadas sem a devida compensação.
135. Sanções. A autorização ou a execução financeira de despesas acima dos limites
estabelecidos (descumprimento do teto) é sensível à eventual imputação de crime de
responsabilidade (CF, art. 85, VI; Lei 1.079/1950, art. 9º, 465; art. 1066 e art. 1167).
136. Em se comprovando lesão ao erário, seja por ação ou omissão, o ato pode ser considerado
como de improbidade (art. 10, IX da Lei 8.429/92), nos seguintes termos: (...) IX - ordenar ou
permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; e, XI - liberar verba
pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a
sua aplicação irregular. O código penal tipifica como crime contra as finanças públicas ordenar
despesa não autorizada por lei (art. 359-D).
137. Em relação ao limite de 95% das despesas obrigatórias, o dever jurídico diz respeito à
observância das vedações, sendo que as sanções seriam aplicáveis apenas em caso de conduta
contrária.
138. Quanto ao atingimento dos limites máximos (art. 107, § 4º do ADCT), a norma diz que as
despesas primárias autorizadas na lei orçamentária anual não poderão exceder os valores
máximos68 previstos no § 3º do mesmo artigo.

64
Novas despesas obrigatórias teriam sido contidas. Não teria atingido despesas obrigatórias cujo crescimento
vegetativo é inercial, o que depende da legislação vigente.
65
Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: 4 - expedir ordens ou fazer
requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição;
66
Art. 10. São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária: (...) 4 - Infringir, patentemente, e de qualquer
modo, dispositivo da lei orçamentária.
67
Art. 11. São crimes contra a guarda e legal emprego dos dinheiros públicos: 1 - ordenar despesas não
autorizadas por lei ou sem observância das prescrições legais relativas às mesmas; 2 - Abrir crédito sem
fundamento em lei ou sem as formalidades legais;
68
Art. 107, § 3º. A mensagem que encaminhar o projeto de lei orçamentária demonstrará os valores máximos
de programação compatíveis com os limites individualizados calculados na forma do § 1º deste artigo,
observados os §§ 7º a 9º deste artigo.

35
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

VIII. DESPESA TOTAL COM PESSOAL E ENCARGOS SOCIAIS

Situação Fiscal Desejada:


Controle das Despesas com
Pessoal

Sanções Específicas
Indicador
Lei 10.028/2000 (Infração
administrativa), Lei 8.429/92; % Despesa total por
DL nº 201/67; CP art. 359-D, F Poder/Órgão Autônomo / RCL
eG

Medidas de Correção
CF, art. 169; LRF art. 21 a 23

Figura 8 - Mecanismo de Controle das Despesas Totais com Pessoal/Poder-Órgão


Autônomo
139. Legislação e breve histórico. A preocupação com a tendência de crescimento dos gastos
com pessoal e encargos sociais vem de longa data. Tais despesas, ainda que necessárias ao
cumprimento das funções de Estado e a prestação dos mais variados serviços públicos e
demandas sociais, requerem controle específico, aspecto considerado crítico nos estados/DF e
municípios.
140. A Constituição, no §1º do art. 169, criou uma dupla condição para a aprovação de atos que
implicam aumento de gasto com pessoal: autorização específica na LDO e comprovação da
existência de dotação prévia e suficiente no orçamento. O art. 169 da CF foi disciplinado
primeiramente, em 1995, pela Lei Camata I e II69, revogada pela LRF, a qual passou a determinar
limite para a União de 50%, e para os demais entes em 60% de suas respectivas receitas
correntes líquidas, repartidos por Poder e órgão autônomo.
141. Na União, ambas as citadas condições encontram-se remetidas pela LDO70 para anexo
específico que integra a lei orçamentária (Anexo V). O referido documento contempla as
autorizações específicas para a criação de cargos e aumentos em geral, e as respectivas dotações
orçamentárias. Assim, autoriza, em cada exercício financeiro, as alterações legislativas71 e

69
A Lei Complementar 82, de 1995, da Deputada Rita Camata, foi depois transformada na Lei Complementar
96, de 1999.
70
A Constituição determina que a autorização específica deve constar da LDO. A experiência mostrou que esse
arranjo não era funcional, uma vez que as autorizações na LDO não eram acompanhadas da devida dotação, o
que dificultava qualquer controle quantitativo. Por isso essa autorização, a partir da LDO 2001, migrou para um
anexo específico da LOA, compatibilizada com as respectivas dotações que constam em reserva específica.
71
Enquanto não aprovada a legislação específica, as despesas orçamentárias são consideradas como de natureza
“discricionária” (não obrigatórias).

36
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

também o provisionamento, em reservas orçamentárias específicas, dos recursos necessários e


suficientes para os aumentos pretendidos. O crescimento vegetativo de despesas com pessoal,
em cumprimento à legislação vigente (despesas obrigatórias), não depende de autorização
específica na LDO. Esse arranjo se mostrou bastante funcional e tem permitido um controle
orçamentário razoável, dentro do contexto político-fiscal, das despesas com pessoal no âmbito
da União,
142. A ideia de que as despesas com pessoal devem ser controladas é reforçada pelo disposto
no art. 167, IX, da CF, que veda a transferência voluntária e a concessão de empréstimos de um
ente para outro para pagamento de despesas com pessoal, e também inúmeras disposições que
tratam da administração pública e dos servidores (teto remuneratório, etc.).
143. O gráfico seguinte mostra o montante de despesas com pessoal e encargos sociais, no
âmbito da União, como percentual do PIB. A despesa chegou a representar 4,8% do PIB em 2001,
caindo lentamente até chegar ao patamar de 4,2% do PIB em 2020. A falta de reajustes no
período seguinte contribui para que a despesa chegasse a 3,5% do PIB.
Gráfico 6 - Despesas com Pessoal e Encargos Sociais 1997 a 2023 (% PIB)

144. O próximo gráfico mostra como as despesas com pessoal se comportaram na União em
termos de percentual da RCL. O percentual de comprometimento encontra-se em patamar
inferior ao máximo admitido para o Executivo da União (37,9 %). O indicador utilizado (% da
RCL) é sensível às variações da receita, o que explica as grandes variações no período de 2020 a
2022, destacando a perda de receita na pandemia e as receitas extraordinárias em 2022. O
indicador pode ser aperfeiçoado se considerado, na sua apuração, não apenas os últimos 12
meses, mas um período maior, de forma a suavizar os eventos sazonais.

Gráfico 7 - Despesas com Pessoal do Poder Executivo 2000 a 2023 (% da RCL)

37
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

Fonte: Relatório de Gestão Fiscal - Tesouro Nacional.

145. Situação fiscal desejada. A situação fiscal desejada é a de manter sob controle o
montante destinado às despesas com pessoal e encargos sociais (ativos, inativos e pensionistas),
dada sua elevada rigidez e a tendência de crescimento, uma forma de não comprometer as
demais demandas do ente da federação, ou mesmo do serviço da dívida.
146. Indicador. O indicador utilizado para aferir a situação fiscal desejada é a proporção entre
despesa total com pessoal (art. 18 da LRF), em cada período de apuração, e a receita corrente
líquida - RCL (art. 2º, IV da LRF). Os limites são aqueles que constam dos arts. 19 e 20 da LRF. Os
percentuais para a União revelaram-se relativamente folgados no âmbito do Executivo, diante do
crescimento da RCL.
147. O planejamento orçamentário das despesas com pessoal e encargos sociais, na União, é
feito por meio da aprovação de reservas orçamentárias que constam do Anexo V da LOA, pré-
requisito à aprovação da respectiva legislação. Este mecanismo de controle - definição prévia da
margem de expansão orçamentária de despesas obrigatórias - poderia ser estendido às demais
despesas obrigatórias.
148. No âmbito dos estados/DF e municípios, as despesas com pessoal e encargos sociais são
as principais responsáveis pelo desequilíbrio fiscal. Dentre as inconsistências que erodem a regra
fiscal, a principal é a subestimativa dos gastos com pessoal, muitas vezes classificados como
custeio geral.
149. Medidas de correção. Se a despesa ultrapassar 95% do limite (prudencial), nos termos
do art. 20 da LRF, veda-se ao Poder ou órgão que houver incorrido no excesso:
Art. 22 (...)
Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco
por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que
houver incorrido no excesso:

38
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

I – concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a


qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal
ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da
Constituição72;
II – criação de cargo, emprego ou função;
III – alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;
IV – provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer
título, ressalvada a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento de
servidores das áreas de educação, saúde e segurança;
V – contratação de hora extra, salvo no caso do disposto no inciso II do § 6º do
art. 57 da Constituição e as situações previstas na lei de diretrizes orçamentárias.
150. Observe-se que a maior parte dessas medidas é também acionada quando do
descumprimento dos limites da despesa (teto), inclusive quando atingida a proporção de 95%
entre despesas obrigatórias e despesas primárias, e também em situações de calamidade pública
nacional.
151. O art. 23 da LRF determina que se a despesa total com pessoal, por Poder ou órgão
referido no art. 20, ultrapassar os limites máximos definidos, sem prejuízo das medidas citadas
no art. 22, haverá um prazo de oito meses para o ajuste. Nesse período devem ser tomadas as
providências previstas nos §§ 3º e 4º da Constituição: a) redução em pelo menos 20 % das
despesas com cargos em comissão e funções de confiança; b) exoneração dos servidores não
estáveis; c) demissão de servidores estáveis, por meio de ato normativo motivado, especificando
a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal.
152. Assinale-se que foram promovidas recentemente alterações na LRF por meio da Lei
Complementar nº 173/2020, com disciplina mais rigorosa nos aumentos de pessoal em final de
mandato.
153. Sanções. O art. 23 da LRF prevê que, não alcançada a redução das despesas no prazo
estabelecido e enquanto perdurar o excesso quanto ao limite máximo, o Poder ou órgão não
poderá: I - receber transferências voluntárias; II - obter garantia, direta ou indireta, de outro
ente; III - contratar operações de crédito, ressalvadas as destinadas ao pagamento da dívida
mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal.
154. De acordo com o art. 5º da Lei 10.028/2000, constitui infração administrativa contra as
leis de finanças públicas: (...) IV – deixar de ordenar ou de promover, na forma e nos prazos da
lei, a execução de medida para a redução do montante da despesa total com pessoal que houver
excedido a repartição por Poder do limite máximo. Nos últimos cento e oitenta dias do mandato
dos titulares dos Poderes e órgãos citados no art. 20, nenhum ato que aumente a despesa com
pessoal poderá ser expedido (art. 21).
155. O aumento de despesa total com pessoal no último ano do mandato ou legislatura é
tipificado no código penal73. O art. 21 determina que é nulo de pleno direito uma série de atos
que provocam aumento de despesas com pessoal e que não atendem às normas da LRF.

72
A ressalva na concessão, de que trata o inciso I, diz respeito à revisão geral anual do inciso X do art. 37 da
CF.
73
Art. 359-G. Ordenar, autorizar ou executar ato que acarrete aumento de despesa total com pessoal, nos cento
e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da legislatura.

39
Regras e Mecanismos de Controle Fiscal
Estudo nº 03 /2023

156. Quando houver descumprimento das condições estabelecidas na LDO, os atos podem ser
considerados atentatórios ao princípio da legalidade ou até lesivos ao erário e punidos pela lei
de improbidade administrativa: perda da função, multa, suspensão dos direitos políticos (Lei nº
8.429/92, arts. 10, IX e XI). A contratação disfarçada de mão-de-obra através de contratos de
prestação de serviços pode ser considerada irregular e sujeitar os agentes a sanções por
improbidade administrativa. Cabe aos Tribunais de Contas verificar os cálculos das despesas e
da receita corrente líquida. E aplicar sanções se houver manipulação ou fraude nas informações.
A prática de ato visando fim proibido em lei sujeita-se ao art. 11 da Lei. Nº 8.249/92.
157. Existem também sanções relacionadas às despesas com pessoal no DL nº 201/67, art. 5º,
IV; no Código Penal, arts. 359-D, F e G.

IX. REGRAS DE NEUTRALIDADE ORÇAMENTÁRIA (COMPENSAÇÃO)

Situação Fiscal Desejada


Neutralidade Fiscal de
novas despesas
obrigatórias / novas
renúncias

Sanções Específicas Indicador. Limite.


LRF. Impacto Orçamentário do ato
ou proposição

Medida de Correção
Compensação

Figura 9 - Neutralidade Orçamentária dos Atos e Proposições

158. Legislação e Breve Histórico. Trata-se de um conjunto de preceitos fiscais que tentam
garantir, por meio do mecanismo de compensação, a neutralidade orçamentária de nova
legislação que aumenta despesas obrigatórias ou reduz receita tributária, uma forma de tentar
conservar o nível de equilíbrio atual. Exige-se que seja indicada a origem dos recursos quando a
proposição aumenta despesa obrigatória, ou em caso de renúncia de receita.
159. Esse princípio é expresso, quanto às despesas obrigatórias de pessoal, no art. 169, § 1º,
como visto. Quanto aos novos benefícios ou serviços da seguridade social, o § 5º do art. 195
determina que "Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado
ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total". Mais recentemente, a EC nº 95/2016
inseriu o art. 113 do ADCT, passou a exigir que toda proposição legislativa que crie ou altere
despesa obrigatória ou renúncia de receita seja acompanhada da estimativa do seu impacto
orçamentário e financeiro.

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Estudo nº 03 /2023

160. Na LRF, partiu-se da premissa de que o equilíbrio implícito na lei orçamentária – aprovada
de forma compatível com as metas da LDO – deveria ser preservado durante a execução, em
obediência ao princípio da ação fiscal planejada. Assim, além da estimativa do impacto, a
existência de prévia dotação orçamentária foi considerada uma condição necessária para a
aprovação de legislação que cria (aumenta) novas despesas obrigatórias (ou novas renúncias).
161. Tais disposições constam dos arts. 17 e 14 da LRF, e também do demonstrativo de que
trata o inciso V do §2º do art. 4º da LRF (estimativa e compensação da renúncia da receita e
margem de expansão das despesas obrigatórias).
162. As regras de neutralidade orçamentária possuem grande potencial de contenção de novos
gastos obrigatórios e de prevenção de perda de receita. Configura-se como um controle difuso
(específico) e prévio de proposições e demais atos que criam despesas obrigatórias e aumentam
renúncias. Depois de aprovada a despesa obrigatória inócuo74 fixar restrições orçamentárias. As
despesas obrigatórias, uma vez aprovadas, não se submetem aos limites do orçamento. Ao
contrário, é o orçamento que fica submetido às mesmas. De outra parte, restou ainda à lei
orçamentária controlar as novas despesas obrigatórias, o que é feito pela exigência da
identificação prévia dos recursos orçamentários, inclusive na forma de reservas, como ocorre
com as despesas com pessoal na União.
163. Vale ressaltar ainda que, quando da elaboração da LRF, o controle do aumento de
despesas obrigatórias (e das renúncias) foi concebido sob duas óticas de compensação.
164. A primeira é o controle difuso já referido de cada ato ou proposição (art. 17 e 14). Exige-
se previamente a estimativa do impacto e a comprovação da existência dos recursos. No caso das
despesas obrigatórias, a compensação deve ter origem no aumento (permanente) de receita e na
redução permanente de despesa. Quanto à renúncia de receita, exige-se igualmente
compensação com o aumento de outra receita, ou comprovação de que a redução já foi
considerada (já constou) na estimativa de receita do orçamento. Garante-se, assim, a
neutralidade orçamentária de cada nova despesa obrigatória ou renúncia que se pretende criar
ou aumentar, mantendo-se o sistema equilibrado.
165. Outra possibilidade de compensação é a prevista no demonstrativo que integra o anexo
de metas fiscais, qual seja, no caso de se identificar eventual margem de expansão das despesas
obrigatórias continuadas e das renúncias de receitas. O demonstrativo compara o aumento
permanente da receita com o crescimento dos gastos obrigatórios. Nesse caso, o controle
(agregado) não é de cada ato ou proposição, mas do conjunto de atos e proposições que podem
ser aprovadas no exercício (margem de expansão). No Brasil esse planejamento nunca foi
implantado, exceto quanto às despesas com pessoal (vide anexo V da LOA), como já referido.
166. Não se identificou ainda interesse do Executivo em definir previamente espaços fiscais,
porque poderia perder protagonismo. De outra parte, o processo legislativo opera com uma
lógica processual diversa, ou seja, as proposições são aprovadas em sequência (série), sem um
cronograma definido, e não de forma conjunta e articulada com o processo orçamentário,
condição para se promover um controle agregado.

74
A falta de orçamentação das despesas obrigatórias não impede o fato gerador e o consequente aumento do
endividamento. Para maiores detalhes sobre a natureza das despesas obrigatórias vide:
https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/estudos/2018/et13-2018-vinculo-obrigacional-e-grau-de-
rigidez-das-despesas-
orcamentarias#:~:text=Na%20avalia%C3%A7%C3%A3o%20do%20grau%20de,que%2C%20genericamente
%20autorizadas%20por%20norma Acesso em 07 set 2020.

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167. Não existe disposição regimental prevendo o uso de eventual reserva orçamentária
(margem de expansão) entre as inúmeras proposições concorrentes, nem critérios de alocação
entre as diversas comissões, aos moldes do processo legislativo orçamentário norte-americano
(concurrent resolution).
168. As regras de neutralidade orçamentária têm grande potencial no sentido de conservar o
equilíbrio orçamentário, mas exigem planejamento, disciplina e engajamento dos Poderes.
169. Uma situação de difícil equacionamento, além de recorrente, ocorre quando o aumento
de despesas obrigatórias, ou a renúncia de receitas, é promovido por emenda constitucional,
proposições que, a rigor, não se submetem à exigência da compensação prevista na lei
complementar (LRF).
170. O gráfico seguinte mostra a evolução das despesas obrigatórias e das discricionárias no
período de 2000 a 2022.
Gráfico 8 - Despesas Obrigatórias e Discricionárias - 2008 a 2023 (% PIB)

171. Situação fiscal desejada. As regras fiscais voltadas à garantir neutralidade orçamentária
das proposições que aumentam despesa obrigatória, ou reduzem receita, tem como propósito
preservar o equilíbrio fiscal implícito na lei orçamentária. É também uma forma de evitar o
aumento do percentual de comprometimento do orçamento com despesas correntes
obrigatórias (rigidez orçamentária).
172. Indicador. O indicador da neutralidade orçamentária é o próprio impacto orçamentário
que decorre da aprovação do ato ou da proposição, que, depois de compensado, deve ser igual
ou menor que zero. Assim, o impacto orçamentário do ato ou a proposição, após compensação,
deve ser nulo ou negativo, de modo não comprometer os resultados fiscais da LOA. No caso do
controle agregado, viabilizado a partir do demonstrativo da margem de expansão, o indicador
corresponderá aos valores obtidos a partir dos referidos demonstrativos (inciso V do §2º do art.
4º).
173. Medidas de correção. O aumento das despesas obrigatórias ou a renúncia de receitas, se
não compensados, geram desequilíbrio. A medida de correção, portanto, é a compensação. A falta
de identificação de uma fonte permanente de custeio tem como consequência o aumento do
déficit orçamentário.

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174. Sanções. Os arts. 14 e 17 da LRF não distinguem atos do Executivo ou do Legislativo.


Aprovada o ato ou a lei que contraria a LRF, a sanção prevista é a da nulidade da norma, ou em
alguns casos a suspensão de sua eficácia75, mas essa decisão vai depender do Judiciário.
175. Saliente-se que decisões judiciais podem criar novas despesas obrigatórias, estendendo
benefícios com base em princípios abertos da Constituição, sem qualquer estimativa do impacto
e muito menos com a indicação da origem dos recursos.
176. De acordo com a lei 1.079/50 e com DL 201/67, é crime de responsabilidade ordenar
despesa “não autorizada”. A expressão requer interpretação, uma vez que a legislação material,
ainda que aprovada sem compensação, tem presunção de validade, enquanto não for objeto de
veto, revogação ou decisão judicial contrária. Nesses casos, a respectiva despesa orçamentária
(obrigatória) acaba sendo incluída a posteriori.
177. Se houver descumprimento das condições estabelecidas no texto da LOA ou na LDO, os
atos podem ser considerados atentatórios ao princípio da legalidade ou até lesivos ao erário e
punidos pela lei de improbidade administrativa: perda da função, multa, suspensão dos direitos
políticos (Lei nº 8.429/93, arts. 10 e 11). De acordo com o art. 10 da lei 8.429/93, constitui ato
de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer lesão ou omissão, dolosa ou
culposa, (...) IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou
regulamento.
178. Por fim, pode-se considerar também como uma espécie de sanção a suspensão da
tramitação da proposição por até vinte dias, a requerimento de um quinto dos membros da Casa,
nos termos regimentais (art. 114, ADCT). A EC nº 126/2022 prevê a revogação dessa espécie de
questão de ordem, tão logo seja sancionada a lei complementar da sustentabilidade da dívida.
179. Questão relevante, como já afirmado, consiste em encontrar uma solução que evite a
aprovação de emendas constitucionais que criam ou aumentam despesas obrigatórias e outros
encargos sem a identificação da fonte de custeio, o que tem ocorrido, apesar da exigência referida
no § 5º do art. 195 da CF, quanto aos benefícios da seguridade social.
180. Ademais, o § 7º76 do art. 167 da Constituição - incluído recentemente pela EC 128/2022-
, prevê restrição ao aumento ou transferência de encargos, inclusive para os demais entes, sem a
previsão da fonte de custeio.

X. RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS

181. O tema da responsabilização pessoal no âmbito das finanças públicas tem merecido
atenção crescente do legislador, a exemplo dos crimes definidos pela Lei 10.028/2000, aprovada
em conjunto com a LRF. O objetivo aqui é tão somente trazer uma visão geral sobre o assunto,

75
O inc. II do § 2º do art. 8º da LC 173/2020, quanto às despesas obrigatórias de caráter continuado, prevê que,
enquanto não implementada a prévia compensação, a lei ou o ato será ineficaz.
76
Art. 167 (...) § 7º A lei não imporá nem transferirá qualquer encargo financeiro decorrente da prestação de
serviço público, inclusive despesas de pessoal e seus encargos, para a União, os Estados, o Distrito Federal ou
os Municípios, sem a previsão de fonte orçamentária e financeira necessária à realização da despesa ou sem a
previsão da correspondente transferência de recursos financeiros necessários ao seu custeio, ressalvadas as
obrigações assumidas espontaneamente pelos entes federados e aquelas decorrentes da fixação do salário
mínimo, na forma do inciso IV do caput do art. 7º desta Constituição.

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uma avaliação simplificada acerca do teor e da consistência das penalidades que induzem ao
cumprimento das leis (enforcement).
182. O agente responsável pelo descumprimento da norma, seja obrigação de fazer ou de não
fazer, encontra-se sujeito a sanções de natureza diversa. A tipificação das condutas torna a norma
fiscal mais efetiva, quando se cotejam os incentivos e os custos da indisciplina. O bem jurídico
protegido é a integridade das finanças públicas. As sanções encontram-se em legislação esparsa,
e são de natureza diversa: política (perda de cargo, suspensão de direitos políticos);
administrativa (limitações ao órgão ou ao ente da federação); cível (multas, perda de bens,
ressarcimento, etc.) e penal (penas restritivas de liberdade).
183. De acordo com o art. 73 da LRF, as infrações de seus dispositivos serão punidas segundo
o Decreto-lei nº 2.848/1940 (Código Penal); a Lei nº 1.079/1950 (Crimes de Responsabilidade);
o Decreto-lei nº 201/196777 (responsabilidade dos prefeitos e vereadores); a que dispõe sobre
as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de improbidade administrativa)78 ; e demais
normas da legislação pertinente.
184. Os crimes comuns contra as finanças públicas foram incluídos no código penal (Decreto-
Lei nº 2.848/1940) pela Lei 10.028/2000, sendo julgados pelo Poder Judiciário. As condutas
típicas encontram-se nos arts. 359-A a 359-H79. As infrações administrativas encontram-se
previstas no art. 5º da Lei 10.028/200080.
185. Os crimes de responsabilidade, diferentemente dos crimes comuns, são infrações
cometidas por agentes políticos em razão dos mandatos, julgados pelo Legislativo. Importa a
conduta do agente e sua responsabilidade administrativo-política. A punição é a perda do cargo
e inabilitação para o exercício de qualquer função pública (direitos políticos). Não existe a pena
de perda de liberdade ou a patrimonial. O art. 85 da Constituição caracteriza como crime de
responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição e
especialmente contra: (...) V – a probidade na administração; VI – a lei orçamentária; VII – o
cumprimento das leis e das decisões judiciais. A Lei 1.079/1950 81 detalha os crimes de

77
Vide art. 1º, itens XVI a XXIII; Art. 5º (infração administrativa)
78
Vide art. 37, § 4º da CF, e Lei nº 8.492/92. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao
erário, qualquer lesão ou omissão, dolosa ou culposa, (...) VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem
a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; (...) IX - ordenar ou permitir a
realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita
observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;
79
Condutas típicas: contratação de operação de crédito, inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar,
assunção de obrigação no último ano de mandato ou legislatura, ordenação de despesa não autorizada, prestação
de garantia graciosa, não cancelamento de restos a pagar, aumento de despesa total com pessoal no último ano
do mandato ou legislatura, oferta pública ou colocação de títulos no mercado
80
Art. 5º Constitui infração administrativa contra as leis de finanças públicas:
I – deixar de divulgar ou de enviar ao Poder Legislativo e ao Tribunal de Contas o relatório de gestão fiscal, nos
prazos e condições estabelecidos em lei; II – propor lei de diretrizes orçamentárias anual que não contenha as
metas fiscais na forma da lei; III – deixar de expedir ato determinando limitação de empenho e movimentação
financeira, nos casos e condições estabelecidos em lei; IV – deixar de ordenar ou de promover, na forma e nos
prazos da lei, a execução de medida para a redução do montante da despesa total com pessoal que houver
excedido a repartição por Poder do limite máximo.
81
Na Lei 1.079/50, vide em especial: Art. 9º. São crimes de responsabilidade contra a probidade na
administração: (...) 4) expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da
Constituição; 5) infringir no provimento dos cargos públicos, as normas legais; Art. 10: Art. 10. São crimes de
responsabilidade contra a lei orçamentária: (...) 2) exceder ou transportar, sem autorização legal, as verbas do

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responsabilidade das autoridades da União e dos Estados e regula o respectivo processo de


julgamento.
186. A lei 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de
improbidade administrativa, de que trata o § 4º do art. 37 da Constituição Federal, prevê as
sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de
mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional 82.
A improbidade administrativa visa o controle da atividade administrativa e a observância de seus
princípios. Atinge, portanto, todos os agentes públicos, e não apenas os agentes políticos. Os atos
de improbidade administrativa importarão “a suspensão dos direitos políticos, a perda da função
pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas
em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”. Atos que contrariam o princípio da legalidade podem
ser enquadrados como de improbidade, a exemplo do descumprimento da LDO.
187. A Lei nº 14.230/2021, alterou o sistema de responsabilização por atos de improbidade
administrativa, exigindo-se, para a configuração dos atos de improbidade administrativa que as
condutas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 sejam dolosas, ressalvados tipos previstos em leis
especiais. Ademais, o mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem
comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade
administrativa. Outra alteração importante é a que afasta a caracterização da improbidade a
“ação ou omissão decorrente de divergência interpretativa da lei, baseada em jurisprudência,
ainda que não pacificada, mesmo que não venha a ser posteriormente prevalecente nas decisões
dos órgãos de controle ou dos tribunais do Poder Judiciário”.
188. A aplicação de sanções exige a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta do
responsável e o fato que configura ilícito, conforme previsto na legislação. A questão se torna
mais complexa no ambiente federativo (governo central e demais entes) onde o cumprimento
das medidas depende de ação conjunta e cooperação de todos os entes83. Ademais, os órgãos de
controle têm diferentes interpretações quanto à aplicação da legislação.
189. Outro desafio refere-se a como garantir que os órgãos colegiados, quando da aprovação
de atos ou leis, cumpram a Constituição e a legislação quanto aos requisitos fiscais das
proposições (neutralidade orçamentária, observância dos limites, etc.). Aprovada um ato ou uma

orçamento; 3) realizar o estorno de verbas; 4) infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da Lei
orçamentária; (...) 12) realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição
estabelecida em lei. Além de outros crimes relacionados às providências para redução da dívida,
descumprimento de limite ou condição relacionada às operações de crédito (vide item específico); e Art. 11: São
crimes de responsabilidade contra a guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos: 1) ordenar despesas não
autorizadas por lei ou sem observância das prescrições legais relativas às mesmas; 2) abrir crédito sem
fundamento em lei ou sem as formalidades legais.
82
De acordo com o art. 10 desta lei, constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer lesão ou omissão, dolosa ou culposa, (...) VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a
observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; (...) IX - ordenar ou permitir a
realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; (...) XI - liberar verba pública sem a estrita
observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular.
83
Fiscal Federalism 2016. Makin Decentralisation Work. Monitoring sub-central government debt: Trends,
challenges and practices. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/sites/9789264254053-
en/index.html?itemId=/content/publication/9789264254053-en>. Acesso em 24 set 2020.

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lei que contraria a LRF, a sanção prevista é a da nulidade da norma, ou pelo menos da suspensão
de sua eficácia, o que depende de declaração pelo órgão competente.84

XI. ANEXO - QUADRO-SÍNTESE DAS REGRAS FISCAIS

84 A alteração recente do art. 21 da LRF (pela LC 173/2020), acerca de aumentos de pessoal em final de
mandato, esclareceu que a nulidade atinge todas as etapas de produção da norma, ou seja, a aprovação, a edição
ou a sanção, por Chefe do Poder Executivo, por Presidente e demais membros da Mesa ou órgão decisório
equivalente do Poder Legislativo, por Presidente de Tribunal do Poder Judiciário e pelo Chefe do Ministério
Público, da União e dos Estados. O inciso II do § 2º do art. 8º da LC 173/2020, ao estabelecer restrições até
31/dez/2021, prevê que, “não implementada a prévia compensação, a lei ou o ato será ineficaz enquanto não
regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade. ”

1
ANEXO 1 – QUADRO SÍNTESE DAS REGRAS FISCAIS
MEDIDAS DE CORREÇÃO DO DESVIO, SE
REGRA FISCAL, LEGISLAÇÃO INDICADOR/GATILHO QUE ACIONA
SITUAÇÃO DESEJADA DESCUMPRIDO O LIMITE OU AS SANÇÕES POTENCIAIS – LEGISLAÇÃO BÁSICA
BÁSICA MEDIDAS DE RECONDUÇÃO
CONDIÇÕES
União – não definido;
Sustentabilidade da Vedação de: Operação de Crédito (exceto
1 - DÍVIDA PÚBLICA Estados/DF - limite Dívida Cons. Líquida Crime de Responsabilidade: Lei 1079/50 (art. 10,
Dívida (trajetória de refinanciamento) e recebimento de
CF, art. 163, VIII; LRF (art. 31 e excede 200% da RCL; itens 5 e 9). Resoluções do Senado. Arts. 359-A do
sustentabilidade). transferência voluntária (LRF, art. 31).
ss), Resoluções do Senado. Municípios - limite excede 120% RCL. código penal e art. 1º, XVI e XX do DL 201/67.
Obtenção de superávit primário. Etc.
Limite OC/garantia União (60% RCL)
Proibição de operação de crédito que
Crime de Responsabilidade: art. 85, VI da CF; Lei
2 - REGRA DE OURO exceda o montante.
Equilíbrio do Orçamento Montante de Operações de Crédito 1079/50 (art. 9, item 4; 10, itens 7 e 9; e art. 11,
CF, art. 167, III; LRF art. 12, § Obs. A aprovação de crédito suplementar
Corrente. excede Despesas de Capital. item 3), LRF (art. 32, § 1º, V); Código Penal: art.
2º; 32, §3º; LDO. ou especial com quorum qualificado afasta
359-A. Lei nº 8.429/92.
a regra (e as sanções).
Resultado fiscal Contingenciamento (redução da despesa
3 - META DE RESULTADO Diferença entre receita e despesa
consistente com a discricionária) na execução, sempre que Lei 10.028/2000 (Infração administrativa - art.,
FISCAL (primário) primária. O gatilho /limite é a meta
política fiscal e necessário ao cumprimento da meta. LRF 5º, II; e art. 5º, III).
LRF art. 4º, § 1º e art. 9º; LDO. fixada na LDO.
econômica. art. 9º.
Limitar as despesas
4 – LIMITE DE DESPESAS Despesa Primária por Poder e Órgão. O Até a EC nº 109/21, as medidas de Crime de Responsabilidade (CF, art. 85, VI; Lei
primárias por Poder e
PRIMÁRIAS (TETO) limite individualizado é o montante de contenção eram acionadas se descumprido 1.079/1950, art. 9º, 4; art. 10, 4). Lei nº 8.429/92
Órgão Autônomo
EC 95/16. ADCT art. 106 e ss. gasto em 2016, corrigido pelo IPCA os limites individualizados. ADCT art. 109. (art. 10, IX); Cód. Penal Art. 359-D.
(vigência NRF)
A partir da EC nº 109/21, são acionadas as
4.1 – LIMITE DE DESPESAS Conter a proporção de Crime de Responsabilidade (CF, art. 85, VII; Lei
Proporção entre despesas obrigatórias e mesmas medidas de contenção das
OBRIGATÓRIAS (95%) despesas obrigatórias 1.079/1950, art. 9º, 4; art. 11, 1). Lei nº 8.429/92
despesas primárias. Limite 95%. despesas obrigatórias (e renúncias de
EC nº 109/21. ADCT art. 109. (rigidez orçamentária) (art. 10, IX); Cód. Penal Art. 359-D.
receita). ADCT art. 109.

Manter as despesas com Atingido 95% do limite: art. 22 da LRF;


5 – LIMITES COM PESSOAL Percentual de despesa com pessoal / LRF, arts. 21 a 23; DL nº 201/67, art. 5º, IV; Cód.
pessoal em níveis que
Art. 169 da CF e arts. 19 a 23 RCL. Percentuais prudenciais e máximos Atingido 100 % do limite: redução 20% CC Penal arts. 359-D, F e G. Lei nº 8.429/92 (art. 10,
não comprometam as
LRF. de comprometimento da RCL. e FCs, exoneração de servidores. IX).
demais despesas

Limitar a expansão de Impacto Orçamentário da medida


6 – NEUTRALIDADE
(novas) despesas (controle difuso). Inexistência de
ORÇAMENTÁRIA. Aumento Compensação do impacto orçamentário-
obrigatórias/renúncias margem líquida de expansão das DOCC LRF, arts. 15 e 21.
Desp. Obrigatórias, Renúncias financeiro do ato ou da proposição.
de receita. Controlar a (metodologia do anexo de metas fiscais
LRF, arts. 17 e 14, art. 4º, § 2º;
rigidez orçamentária. da LDO) .

Fonte: Legislação. Elab. Conof99933993/CD

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