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Junho/2019
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Junho de 2019
Compilação dos Informativos nos 943 a 945
Data de divulgação 4 de julho de 2019
SUMÁRIO
Direito Administrativo
Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista
Venda de empresa estatal e autorização legislativa – 2
Organização da Administração Pública
Extinção de conselhos por decreto
Direito Constitucional
Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão
Homofobia e omissão legislativa – 4
Direito de Defesa
Possibilidade de sustentação oral em sede de agravo regimental
Poder Judiciário
Competência jurisdicional e validade das provas produzidas
Execução individual: mandado de segurança coletivo e servidor não filiado a sindicato –
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Reclamação
Reclamação e tribunal do júri – 2
Direito Penal
Execução Provisória
Execução provisória e Súmula 122 do TRF da 4ª Região
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Direito Tributário
Tributos
Limitação de compensação de prejuízos fiscais – 2
DIREITO ADMINISTRATIVO
EMPRESA PÚBLICA E SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
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Aduziu que a ausência de menção, pela Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais), à indispensabilidade da
autorização legislativa pode gerar expectativas ilegítimas e, consequentemente, insegurança jurídica,
sobretudo no contexto da flexibilização da alienação de ações de que trata.
O ministro Ricardo Lewandowski assentou que a alienação de controle acionário é forma clássica
de privatização. Sopesou ser possível a venda de parte das ações na Bolsa de Valores. Contudo, observou
que a alienação do controle acionário precisa de lei autorizativa e de algum processo licitatório.
Acrescentou que o caput do art. 37 da CF dispõe que toda a administração pública obedecerá aos
princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade. Além disso, seu inciso XXI consigna
que as alienações serão realizadas “mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de
condições a todos os concorrentes”.
O relator ressaltou o posicionamento segundo o qual a Constituição não autorizaria a alienação
direta de controle acionário de empresas estatais. Concluiu que permitir a aludida venda direta, de
maneira a impossibilitar a competição pública, poderia atentar contra o texto constitucional. Por fim,
sublinhou que o Decreto 9.188/2017, alegadamente fundado na Lei 13.303/2016, dela desbordou ao criar
procedimento de licitação não previsto na legislação, derrogando, ou pretendendo derrogar
implicitamente, a Lei 9.491/1997.
O ministro Edson Fachin acompanhou o relator. Declarou voto fundado na segurança da jurídica,
em seus pilares da coerência, consistência e equidade argumentativa.
Ressaltou que a alienação de ações de sociedade de economia mista e das empresas públicas que
implique a transferência, pelo Estado, de direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações
sociais está sujeita à autorização legislativa. A CF demanda lei porque as empresas estatais são
instrumentos de política pública do Estado. Não se trata de intervenção do Estado na economia, e sim
intervenção do Estado para realizar determinados fins, nomeadamente segurança nacional ou interesse
coletivo.
Sinalizou que a Lei 9.491/1997, disciplinadora do programa de desestatização dos ativos da União,
incide na matéria. Essa legislação não foi revogada pelo art. 29, XVIII, da Lei 13.303/2016, nem foi
afastada pela Lei das Estatais. A Lei 9.491/1997 indica faculdade atinente à licitação na modalidade
leilão. Logo, a faculdade prevista na norma diz respeito às modalidades licitatórias pelas quais o gestor
poderá optar. Seja como for, à míngua de especificação legal, é dever da administração pública direta ou
indireta licitar. Também alertou que o Decreto 9.188/2017 extrapolou os limites da Lei 9.491/1997. Numa
primeira visão, o decreto afronta a lei e a CF, porquanto teria dispensado, sem lei específica, a
transferência de ativos para terceiros sem o necessário procedimento de licitação.
Os ministros Cármen Lúcia, Rosa Weber, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Dias Toffoli
(Presidente) referendaram a medida com alicerce em parte do fundamento da cautelar.
A ministra Cármen Lúcia referendou a liminar para ratificar a necessidade de lei prévia a autorizar
a criação e alienação de empresas públicas e sociedades de economia mista. É preciso autorização
legislativa específica e prévia para a instituição da empresa-matriz. A autorização legislativa é
imprescindível, de igual modo, para sua alienação, pois deixa de ser estatal e muda sua natureza.
Entretanto, dissentiu do relator quanto às subsidiárias, coligadas ou controladas. Em juízo acautelatório,
aplicou a orientação firmada na ADI 1.649. Avaliou ser desnecessária a autorização legislativa expressa
para a criação de subsidiárias quando houver autorização legislativa da criação de empresa pública ou
sociedade de economia mista e nesta constar permissão genérica da possibilidade de criação de
subsidiárias. Não se exige lei específica a autorizar a criação de subsidiária e, pelo princípio do
paralelismo das formas, tampouco para sua alienação. Segundo a ministra, o Estado não está obrigado a
valer-se da autorização para a criação de estatais, porque não está a ela vinculado. Por conseguinte, o
Poder Público pode posteriormente deixar de dar efetividade à autorização concedida e, assim, afastar-se
e desinvestir em certa área.
A ministra Cármen Lúcia também referendou a liminar quanto à necessidade de licitação.
Reconheceu que, apenas em alguns casos, a licitação é dispensada, inexigível ou dispensável, como na
hipótese do art. 29 da Lei 13.303/2016. A Constituição determina o atendimento do processo licitatório.
Isso não significa que haverá de ser o mesmo procedimento licitatório.
Por seu turno, a ministra Rosa Weber confirmou a cautelar no ponto em que condicionou à prévia
autorização legislativa, sempre que se cuide de alienar o controle acionário, a venda de ações de empresas
públicas, sociedades de economia mista ou de suas subsidiárias ou controladas.
A ministra afirmou que o Tribunal estabeleceu a exigência de autorização, ainda que genérica,
mediante lei em sentido formal, para a criação de subsidiárias de empresas estatais. De maneira correlata,
pelo paralelismo ou simetria das formas, a extinção de subsidiária demanda autorização por lei. Deste
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modo, a alienação do controle acionário de subsidiárias ou controladas depende de prévia autorização,
que pode ser genérica, veiculada em lei em sentido formal. Acrescentou que a criação de subsidiárias
importa, em última análise, em exploração direta da atividade econômica pelo Estado.
Quanto à necessidade de licitação na venda de controle acionário, confirmou a liminar relativa às
empresas-matriz. Em juízo de delibação, compreendeu que o inciso XVIII do art. 29 da Lei das Estatais
se circunscreve às hipóteses de venda de controle societário fora do contexto do Programa Nacional de
Desestatização. Na sequência, afirmou inexistir ressalva, na Lei 9.491/1997, apta a dispensar
procedimento licitatório na alienação de controle acionário implementada no âmbito do Programa. Assim,
no que toca às subsidiárias ou controladas, a dispensabilidade da licitação deve observar, no mínimo,
procedimento competitivo que resguarde os princípios da administração pública e da razoabilidade.
Entretanto, se a venda do controle acionário das controladas ou subsidiárias estiver inserida num plano de
desestatização, é obrigatória a licitação pública.
O ministro Gilmar Mendes referendou parcialmente a medida, com vistas a confirmar que a venda
de ações de empresas públicas e de sociedades de economia matrizes exige prévia autorização legislativa,
sempre que se cuidar de alienação do controle acionário. Contudo, por paralelismo, declarou ser
dispensável a autorização legislativa específica para a alienação do controle acionário de subsidiárias de
empresas estatais quando a respectiva lei autorizadora da instituição da empresa estatal já permitir a
criação de suas subsidiárias.
No que tange à licitação, conferiu interpretação conforme à CF ao art. 29, XVIII, da Lei
13.303/2016, afirmando-se que a dispensa de licitação para a alienação de ações de empresas públicas e
sociedades de economia mista, quando envolver a perda do controle acionário do Estado, deve observar
procedimento que espelhe os princípios constitucionais e legais licitatórios, não sendo admitida a
contratação direta. Observou que a Lei 13.303/2016 foi regulamentada pelo Decreto 9.188/2017, editado
com base em recomendação do TCU. Entretanto, o art. 29, XVIII, da Lei das Estatais não contém menção
expressa à necessidade de observância de procedimento competitivo a ser previsto em regulamento. Com
o intuito de afastar qualquer insegurança jurídica sobre o tema, considerou necessário dar a interpretação
conforme. Salientou que o afastamento do processo licitatório contido na Lei das Estatais impõe
motivação administrativa, ainda que em face da dispensa do art. 29, XVIII. Em juízo de cognição
sumária, compreendeu que, no caso da alienação de ativos das sociedades de economia mista, o regime
especial de desinvestimento do Decreto 9.188/2017 mostra-se apto a concretizar os princípios
constitucionais, motivo pelo qual não merece subsistir a medida cautelar no ponto.
Por sua vez, o ministro Marco Aurélio referendou a medida formalizada, apenas para dar
interpretação conforme, jungindo a alienação que implique a transferência do controle acionário de
subsidiária à feitura, em si, da licitação. Para tanto, ponderou que o inciso XVIII do art. 29 da Lei
13.303/2016 versa a alienação de ações de subsidiária, e não de ações de sociedade de economia mista.
Interpretou os incisos XIX e XX do art. 37 da CF à luz do disposto no seu art. 173. Consignou ser
objetivo do constituinte a iniciativa do Executivo e o crivo do legislador para a criação das entidades
mencionadas nos dois incisos, ou seja, para atuar na atividade econômica, que encerra exceção. É preciso
lei específica para chegar-se à criação de subsidiária. No entanto, a Constituição não exige lei para sua
extinção ou alienação. Assim, é dispensável a autorização normativa para o desfazimento de subsidiária.
Não emitiu entendimento quanto à transferência do controle acionário de empresa-matriz, por
compreender que não está em jogo.
O ministro Dias Toffoli (presidente) referendou em parte a liminar. Assinalou ser necessária lei
para autorizar a criação e alienação do controle acionário de empresa-matriz. Já a empresa subsidiária
prescinde de lei se houver a autorização para _ria-la. Quanto ao aspecto licitatório, alinhou-se ao voto
enunciado pelo ministro Celso de Mello.
Os ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Luiz Fux e Celso de Mello negaram
referendo à cautelar.
O ministro Alexandre de Moraes partiu da premissa de que a Lei 13.303/2016 não trata de
privatização, estabelece o estatuto jurídico das empresas públicas com base no art. 173, § 1º, da CF.
Ademais, no art. 29, XVIII, o diploma legal traz hipótese de dispensa licitatória.
Discorreu sobre a evolução do afastamento do Estado do domínio econômico. Acentuou que a
análise da presença dos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo depende da
vontade dos Poderes Legislativo e Executivo. Com a Emenda Constitucional (EC) 19/1998, lei
complementar fixa a área de atuação, lei específica autoriza a criação de empresa pública ou sociedade de
economia mista e, se quiser, o Congresso Nacional pode autorizar a empresa-mãe a criar subsidiárias. A
previsão do inciso XX do art. 37 permite a criação de subsidiárias pela empresa-mãe por autorização
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legislativa genérica. A expressão “em cada caso”, nele contida, não é sinônimo de lei específica, refere-se
às áreas de intervenção econômica. Significa que deve ser para cada caso em que a lei complementar
estabeleceu ser possível a intervenção, por exemplo, gás canalizado, telecomunicações.
O ministro afirmou que, em relação às subsidiárias, exige-se autorização genérica para sua criação.
Daí o Estado, como empresário, poderá criar, fundir, investir, vender todas as ações de um determinada
subsidiária, tornar sua participação majoritária ou minoritária. Ele deterá o comando e estará submetido às
regras de mercado do direito privado. Deve-se possibilitar a agilidade empresarial. O que não pode é
vender o controle acionário da empresa-mãe, pois configuraria privatização. Aduziu que, em nenhum
momento, a Lei 13.303/2016 permitiu privatização, para a qual inclusive há lei específica. Dessa maneira,
a cessão ou alienação do controle acionário da empresa-mãe reclama lei formal específica.
Sublinhou que, após a EC 19/1998, a CF direcionou a estatuto jurídico a regulamentação da
licitação e contratos de empresa pública, sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que
explorem atividade econômica [CF, arts 37, caput e inciso XXI; e 173, § 1º, III (3)]. Adveio, então, a Lei
das Estatais, norma especial na matéria, que observa os princípios licitatórios e a competitividade. Assim
como a Lei 8.666/1993, a Lei 10.303/2016 previu, como regra, a licitação e estabeleceu
excepcionalidades: a dispensa, no art. 29 e a inexigibilidade, no art. 30. No inciso XVIII do art. 29, o
legislador admitiu dispensa licitatória na compra e venda de ações, de títulos de crédito e de dívida e de
bens que produzam e comercializem. Apesar da dispensa licitatória na Lei das Estatais, o Poder Executivo
regulamentou, no Decreto 9.188/2017, o inciso XVIII do art. 29 relativamente a sociedades de economia
mista. Ao reproduzir conclusões do Tribunal de Contas da União (TCU), o ato regulamentar exigiu
procedimento composto de várias fases para as operações constantes do inciso XVIII, denominadas de
desinvestimento. O decreto visou evitar direcionamentos, favorecimentos e prejuízos ao Poder Público.
O ministro Roberto Barroso registrou que a CF não exige autorização legislativa para a venda de
ações, mesmo que corresponda ao controle acionário. A submissão das estatais e de suas subsidiárias ao
regime jurídico próprio das empresas privadas não admite a acepção de que é necessária a edição de lei
para vender ações, uma vez que essa exigência não se aplica à iniciativa privada.
Em sua visão, o argumento do paralelismo das formas não possui lastro jurídico, até porque criar é
diferente de vender ações. O texto constitucional determina que haja lei para a criação de empresa estatal
e subsidiária, porque a intervenção do Estado no domínio econômico é exceção. Por ser exceção, é
preciso ter a participação do Congresso Nacional. Entretanto, o cumprimento da regra constitucional de
não intervir na ordem econômica ou desinvestir, quando agir intervindo, prescinde de lei. Na espécie,
volta-se à regra constitucional. Deste modo, a alienação do controle acionário de empresas subsidiárias
por empresas públicas e sociedades de economia mista não exige autorização legislativa, menos ainda lei
específica.
Além disso, o ministrou anotou que o art. 29 da Lei 13.303/2016 explicita ser dispensável a
realização de licitação e, sem dúvida, poderia assim dispor, pois a própria CF ressalva os casos
especificados na legislação (art. 37, XXI). Para ele, no fundo, não se trata de dispensa de licitação, e sim
de dispensa do procedimento da Lei 8.666/1993. Concluiu que as operações de alienação podem ser
realizadas com dispensa de licitação, desde que sigam procedimento que propicie a escolha da proposta
mais vantajosa para a administração pública e assegure a competitividade entre potenciais interessados.
No particular, observou existir procedimento competitivo definido no Decreto 9.188/2017, com diversas
etapas. Este decreto, que regulamenta processo competitivo de venda de ações, satisfaz o mandamento
constitucional.
O ministro Luiz Fux destacou a importância do princípio da eficiência. Frisou que a extinção e a
alienação do controle acionário de empresa pública e sociedade de economia mista exige autorização
legislativa.
Ao tratar da controvérsia sobre a licitação, disse que a Lei 13.303/2017 versa a licitação atinente às
estatais atuantes na atividade econômica. Complementa o complexo normativo da CF o Decreto
9.188/2017. Ele estabelece, com base na dispensa de licitação prevista no art. 29, XVIII, da Lei das
Estatais, regime especial de desinvestimento de ativos de sociedades de economia mista federais e visa
disciplinar a alienação de seus ativos. Desinvestimento não é desestatização e com ela não se confunde.
Demais disso, enfatizou que, na circunstância de existir sigilo, este não será oponível à fiscalização
realizada pelo TCU, de acordo com o decreto. Ponderou não ser oportuno invocar decisões judiciais de
outrora, porquanto houve mudança completa de paradigma no Direito Administrativo e o advento de lei
de licitações voltada à nova realidade econômico financeira do Brasil.
O ministro Celso de Mello acompanhou o voto do ministro Alexandre de Moraes. Ressaltou que a
autorização para a criação de empresa pública e sociedade de economia mista demanda lei formal
específica, bem assim para permitir a cessão e a alienação do seu controle acionário. Para a criação de
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subsidiária, exige-se autorização legislativa genérica, que pode ser concedida na lei específica que
autorizou a criação da empresa matriz. No entanto, não há necessidade de qualquer autorização legislativa
para a cessão ou alienação de suas ações, inclusive no tocante ao controle acionário.
No que se refere à exigência de licitação, apontou que a Lei 13.303/2016 observa de modo integral
a regra constitucional inscrita no inciso XXI do art. 37 da CF. Cuida-se de programa de desinvestimento.
Sopesou ser preciso interpretar a Lei 13.303/2016 (art. 29, XVIII) em conjunto com o Decreto
9.188/2017. As operações de alienação de controle acionário podem ser realizadas com dispensa de
licitação, caso respeitem os procedimentos competitivos viabilizados pelo próprio decreto que a
regulamentou. Por fim, vislumbrou existir, no Decreto, publicidade entre os concorrentes, porquanto é
divulgada a proposta apresentada para que, eventualmente, possa vir a ser superada.
(1) Lei 13.303/2016: “Art. 29. É dispensável a realização de licitação por empresas públicas e sociedades de economia
mista: (...) XVIII – na compra e venda de ações, de títulos de crédito e de dívida e de bens que produzam ou comercializem.”
(2) CF/1988: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também,
ao seguinte: (...)”
(3) CF/1988: “Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo
Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme
definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas
subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo
sobre: (...) III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;”
ADI 5624 MC-Ref/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 5 e 6.6.2019. (ADI-5624)
(Informativo 943, Plenário)
Parte 1 - Parte 1 -
Parte 2 - Parte 2 -
Parte 3 - Parte 3 -
Parte 4 - Parte 4 -
Parte 5 -
Parte 6 -
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natureza regulamentadora, descrito no inciso VI, voltado à fiel execução da lei em sentido formal.
Franqueou-se ao chefe do Executivo a possibilidade de dispor sobre a estruturação da Administração
Federal – ressalvada a instituição de medidas que impliquem aumento de despesa, criação e extinção de
órgãos públicos –, instituindo-se, no ponto, verdadeira hipótese de reserva legal, na forma do inciso XI do
art. 48 (4) da CF.
Surge intuitiva a necessidade de perquirir se os colegiados citados nos incisos do art. 2º do Decreto
questionado – a saber, conselhos, comitês, comissões, grupos, juntas, equipes, mesas, fóruns e salas –
devem ser considerados órgãos públicos para o fim de enquadramento nas previsões contidas nos
mencionados preceitos constitucionais.
A resposta não é autoevidente, considerada a amplitude semântica do vocábulo “órgão”, instituto
derivado do fenômeno de desconcentração administrativa, por meio do qual é promovida a especialização
de funções no âmbito da estrutura estatal, sem a criação de novas pessoas jurídicas.
Ausente solução definitiva e a salvo de dúvida razoável quanto à natureza dos colegiados em jogo,
a indeterminação semântica do disposto na Constituição Federal exige a análise da melhor opção
interpretativa sob o ângulo conceitual, observados o princípio da separação de Poderes e a necessidade de
reconhecer espaço legítimo de interpretação constitucional aos demais agentes políticos de cúpula do
Estado.
Sob essa perspectiva, é desnecessário examinar se os colegiados mencionados nos incisos do art.
2º do Decreto 9.759/2019 revelam-se “órgãos públicos” com vistas ao enquadramento no que disposto
nos arts. 48, XI, e 84, VI, da CF. A questão resolve-se, isso sim, a partir da verificação de atuação anterior
do Parlamento no sentido de promover, sob o influxo dos ares democráticos da Carta de 1988, a atuação
dos diversos grupos representativos da sociedade civil organizada na tomada de decisões importantes da
vida nacional, ante a previsão, em lei, da existência de determinado colegiado, mostrando-se irrelevante o
veículo normativo mediante o qual efetivamente implementado.
Isso porque, por instrumentos de democracia participativa, compreende-se mais do que a
corriqueira referência aos projetos de lei de iniciativa popular e aos institutos do referendo e do plebiscito.
Traduzem-se em toda e qualquer forma legal de controle, pela sociedade, dos atos da Administração,
considerada a influência da atuação popular na formulação das decisões políticas e na gestão da coisa
pública, fornecendo-lhes a necessária legitimidade democrática.
Ao consagrar, junto aos mecanismos representativos, o princípio de participação direta na gestão
pública, o texto constitucional, no que dotado de inequívoca força normativa, promoveu a emergência de
diversos institutos alusivos à gestão ou à fiscalização de políticas públicas.
A conclusão constitucionalmente mais adequada, em sede precária e efêmera, consiste em
suspender, até o exame definitivo da controvérsia, a extinção, por ato unilateralmente editado pelo chefe
do Executivo, de órgão colegiado que, contando com assento legal, viabilize a participação popular na
condução das políticas públicas – mesmo quando ausente expressa “indicação de suas competências ou
dos membros que o compõem”.
O Parlamento é a arena preferencial de deliberação no âmbito da democracia representativa, de
modo que, ao prever, em sede legal, a existência de determinado colegiado como mecanismo de
participação direta da sociedade civil na gestão da coisa pública, acaba por fornecer, mediante a
institucionalização de espaços de participação social, concretude ao que se poderia denominar “espírito de
1988” – a ser levado em conta, linear e indistintamente, por todos os Poderes da República.
Ao fazê-lo, as Casas Legislativas partilharam, em alguma medida, de prerrogativa que lhes é
própria: discutir, em sede deliberativa, fiscalizatória e legiferante, as grandes questões nacionais e as
diretrizes de atuação do Estado na condução de políticas públicas. Observada a organicidade da ordem
constitucional, é razoável condicionar a extinção de determinado órgão colegiado com assento legal à
prévia chancela parlamentar.
Interpretação em sentido diverso esvaziaria importante espaço institucional de diálogo entre os
Poderes, o que não se confunde com eventual tentativa de manietar o Executivo com a supressão ou
limitação das atribuições essenciais do chefe do Poder no desempenho da função de gestor superior da
Administração.
É nítida a tentativa, empreendida pelo chefe do Executivo, de escantear o Legislativo de tal
processo, uma vez que, conforme previsto no art. 7º e reforçado pela Advocacia-Geral da União em
manifestação juntada ao processo, competirá ao Executivo, mediante a atuação das “Pastas ministeriais”,
“decidir sobre os colegiados a serem mantidos”.
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Sob o ângulo do perigo da demora, mostra-se presente o requisito para a concessão da medida
acauteladora, ante a extinção de órgãos colegiados alcançados pela aplicação do preceito impugnado, não
obstante definidos em lei – o que, em parte, já se deu com a edição do Decreto 9.784/2019, por meio do
qual foi declarada a revogação de cerca de 50 conselhos da Administração Federal, em observância ao
disposto no art. 9º do Decreto 9.759/2019 (4).
A louvável preocupação com a racionalização do funcionamento da máquina pública e a economia
de recursos públicos, traduzida na redação dos incisos do art. 6º do Decreto 9.759/2019 e citada na
exposição de motivos subscritas pelo titular da Casa Civil da Presidência, não legitima atalhos à margem
do figurino legal.
Não conduz à conclusão contrária o fato de parte dos órgãos colegiados da Administração Federal
encontrarem-se, na prática, inativos, havendo inclusive a revogação das leis que lhe justificam a
existência. Descabe fulminá-los de cambulhada, sob pena de apanhar-se órgãos em pleno e efetivo
funcionamento.
Assentada a necessidade de ter-se suspensos os efeitos do preceito impugnado, cumpre reconhecer,
por decorrência lógica, a impossibilidade de manter-se hígidos os atos normativos posteriores que, com
fundamento no art. 9º do Decreto 9.759/2019, promovam o efetivo afastamento desses órgãos do cenário
normativo.
Vencidos os ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Celso de
Mello, que concederam integralmente a cautelar por considerarem haver, além da inconstitucionalidade
formal, vício de inconstitucionalidade material.
(1) Decreto 9.759/2019: “Art. 1º Este Decreto extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da
administração pública federal direta, autárquica e fundacional § 1º A aplicação deste Decreto abrange os colegiados instituídos por:
(incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) I – decreto; (incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) II – ato normativo inferior a decreto; e
(incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) III – ato de outro colegiado. (incluído pelo Decreto nº 9.812/2019) § 2º Aplica-se o disposto
no § 1º aos colegiados instituídos por ato infralegal, cuja lei em que são mencionados nada conste sobre a competência ou a
composição. (incluído pelo Decreto nº 9.812/2019)”
(2) Decreto 9.759/2019: “Art. 9º Até 1º de agosto de 2019, serão publicados os atos, ou, conforme o caso, encaminhadas à
Casa Civil da Presidência da República as propostas de revogação expressa das normas referentes aos colegiados extintos em
decorrência do disposto neste Decreto.”
(3) CF/1988: “ Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) VI – dispor, mediante decreto, sobre: a)
organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos
públicos;”
(4) CF/1988: “Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o
especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre: (...) XI – criação e
extinção de Ministérios e órgãos da administração pública;”
ADI 6121 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 12 e 13.6.2019. (ADI-6121)
(Informativo 944, Plenário)
Parte 1 - Parte 1 -
Parte 2 - Parte 2 -
Parte 3 - Parte 3 -
Parte 4 - Parte 4 -
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DIREITO CONSTITUCIONAL
Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão
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O ministro Marco Aurélio inadmitiu o MI, diante dos limites impostos ao exercício, pelo STF, da
jurisdição constitucional. Admitiu, em parte, a ADO, para julgar, nessa extensão, improcedente o pedido,
por não assentar, peremptoriamente, que se tenha “criminalizar” no vocábulo “punirá”, contido no inciso
XLI do art. 5º da CF. Em decorrência disso, não reconheceu a omissão legislativa quanto à criminalização
específica da homofobia e da transfobia. Concluiu que, respeitada a liberdade legiferante franqueada ao
legislador ordinário, espera-se que a sinalização do STF quanto à necessária proteção das minorias e dos
grupos socialmente vulneráveis contribua para a formação de uma cultura livre de todo e qualquer
preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em
termos penais.
(1) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes: (...) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do
racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;”
(2) CF/1988: “Art. 5º (...) XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;”
ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13.6.2019. (ADO-26) (Informativo 944,
Plenário)
MI 4733/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 13.6.2019. (MI-4733) (Informativo 944,
Plenário)
Direito de Defesa
HC 164593, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 11.6.2019. (HC-164593) (Informativo 944,
Primeira Turma)
Poder Judiciário
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Os autos em curso em primeiro grau foram recebidos nesta Corte, resultando na autuação dos
seguintes procedimentos: Inq 4.335, Pet 6.353 e AC 4.285.
Diante dessa decisão, a Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou ação cautelar para a
apreensão dos elementos probatórios arrecadados por meio de ordem judicial oriunda do juízo reclamado.
Prevaleceu o voto do ministro Edson Fachin (relator). O ministro afirmou que as imunidades
parlamentares almejam conferir condições materiais ao exercício independente de mandatos eletivos.
Funcionam, dessa maneira, como instrumento de proteção da autonomia da atuação dos mandatários que
representam a sociedade. A finalidade dessa proteção, naturalmente, não se aplica a agentes públicos que
não se encontrem investidos dessa condição.
A determinação de busca e apreensão nas dependências do Senado Federal, desde que não
direcionada a apurar conduta de congressista, não se relaciona com as imunidades parlamentares.
Ao contrário do que ocorre quanto às imunidades diplomáticas, as prerrogativas e imunidades
parlamentares não se estendem aos locais onde os parlamentares exercem suas atividades nem ao corpo
auxiliar.
O relator enfatizou que os indícios coligidos não levaram a conclusão segura de que os policiais
legislativos teriam agido por iniciativa própria.
A prévia presença desses indícios impede a aplicação da Teoria do Juízo Aparente, de modo que a
investigação é irregular.
Os expedientes jungidos aos autos indicavam, em relação à realização de uma das varreduras, que
a ordem teria partido de senador. Isso pode ser depreendido, em cognição sumária, do: a) memorando
dirigido diretamente ao senador, no qual o diretor da polícia legislativa informa a data de realização das
varreduras, mencionando que tal providência constitui atendimento à solicitação do parlamentar; b)
posterior ofício em que o chefe de gabinete do senador indica ao diretor da polícia legislativa outros
endereços que deveriam ser alvo de diligência; c) depoimento do policial legislativo declarando que uma
das varreduras teria sido solicitada pelo próprio parlamentar.
Da mesma forma, em relação a determinada senadora, a ordem teria partido de ofício oriundo de
seu gabinete. É óbvio que não se pode atribuir ao parlamentar automática responsabilidade por fato
executado por subordinado. Contudo, causaria espécie que diligências dessa natureza fossem
implementadas em endereços particulares de congressista sem seu conhecimento e consentimento, de
modo que tais atos seriam merecedores de elucidação em sede própria.
Ao apreciar outros pedidos cautelares, o juízo de origem ponderou que o diretor da polícia
legislativa teria agido “cedendo a pedido ou influência de outrem”, embora, na sua visão, atuasse com
posição de comando em relação aos atos materiais executados pelos demais policiais legislativos.
Conquanto não seja identificado, com precisão, o possível responsável pelo suposto pedido ou influência,
o contexto processual evidencia a factibilidade de que foram os senadores que titularizam os espaços que
foram alvo das diligências, o que se amolda aos elementos já sopesados.
Portanto, revela-se impróprio que a instância de primeiro grau avalie intrincada matéria atinente à
ausência de elemento subjetivo quanto aos parlamentares que teriam ordenado os atos tidos como
delituosos.
O ministro relator salientou ainda que eventual nulidade decorrente da inobservância da
prerrogativa de foro não se estende aos agentes que não se enquadrem nessa condição.
As diligências investigativas devem ser potencialmente controladas, mas não impulsionadas pelo
juiz. A Constituição, apenas em hipóteses excepcionais e expressas, optou pela submissão de diligências
naturalmente invasivas (interceptação telefônica, busca e apreensão, quebra de sigilo etc.) à cláusula da
reserva jurisdicional, casos em que o controle judicial prévio funciona como elemento de legitimação da
produção do elemento probatório.
Essa realidade, contudo, não se estende a todo e qualquer ato de investigação. Ao contrário, na
medida em que a regra é a dispensa de prévia autorização judicial, resguardando-se, em qualquer
hipótese, o controle posterior [Constituição Federal (CF), art. 5º, XXXV].
Embora não se ignore a relevância do juiz natural para fins de legitimação da persecução penal,
sua eventual inobservância não acarreta a nulidade da prova colhida na hipótese em que não atuar como
fator decisivo à sua produção.
Apontou que eventual irregularidade não gera automática invalidade, incumbindo, sob a ótica da
instrumentalidade das formas, a aferição do gravame suportado pelo interessado. Referida análise não se
traduz, simplesmente, a partir de eventual resultado probatório desfavorável. É imperioso que o
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interessado evidencie certo nexo causal entre o ato tido como irregular e a consequência jurídica que
almeja combater, bem como que aponte, ao menos de forma indiciária, a possibilidade efetiva de reversão
do resultado processual se ausente a irregularidade ventilada.
O ministro sublinhou que não estão contaminados os elementos probatórios cuja produção
prescindem de prévia autorização judicial.
A interceptação telefônica, por sua vez, constitui medida sujeita à cláusula da reserva de jurisdição
(CF, art. 5º, XII), de modo que a violação ao Princípio do Juiz Natural quanto à apreciação do
deferimento do referido meio de obtenção de prova alcança seu ciclo de produção e constitui causa de
nulidade em relação aos agentes detentores de foro por prerrogativa.
Ressaltou que essas provas colhidas não admitem convalidação, pois a eficácia prospectiva da
apreciação judicial e a própria natureza desses elementos também impedem a aplicação da Teoria da
Descoberta Inevitável. Enfatizou que conclusão diversa poderia, por exemplo, ser encampada na hipótese
de quebra de sigilo, porque, nesse caso, a ordem judicial superveniente, proferida pelo órgão competente,
alcançaria idêntico resultado probatório.
Os diálogos captados, portanto, devem ser descartados mediante destruição dos respectivos
registros, anotando-se que não foram empregados como fundamento do deferimento da busca e
apreensão, deixando de exibir nexo de causalidade em relação à aludida diligência.
Pontuou que o juízo reclamado autorizou a exibição de extratos telefônicos dos policiais
legislativos investigados, diligência sujeita ao prévio crivo do Estado-Juiz. Assim, essa prova também é
ilícita em relação aos agentes detentores de prerrogativa de foro.
Revela-se adequada a apreensão de documentos e equipamentos associados à polícia do Senado
Federal e aos policiais legislativos alvo de investigação, na medida em que tais elementos podem
contribuir para a formação da convicção do titular da ação penal. Ganha especial relevo, nesse cenário, a
apreensão de equipamentos supostamente utilizados na cogitada empreitada e que poderiam demonstrar
eventual registro da realização das contramedidas de inteligência atribuídas aos agentes legislativos.
Feitas essas considerações, a pretensão formulada pelo Ministério Público é merecedora de
acolhimento, recomendando-se a manutenção da apreensão efetuada, com o natural e necessário
prosseguimento das diligências.
Vencidos, em parte, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e
Dias Toffoli, que julgaram procedente o pedido formulado na reclamação em maior extensão e
indeferiram o pleito da ação cautelar.
Entenderam que a competência para, no caso, determinar busca e apreensão é do STF. Dessa
forma, declararam a ilicitude da prova produzida. Afirmaram não ser possível analisar se há ou não
autoridade com prerrogativa de foro a posteriori.
Vencidos os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, que julgaram improcedente o pedido
formulado na reclamação e indeferiram pleito da ação cautelar. Pontuaram não haver envolvimento de
parlamentar a ditar a vinda desse procedimento para o STF.
Rcl 25537/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 26.6.2019. (Rcl-25537) (Informativo 945,
Plenário)
AC 4297/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 26.6.2019. (AC-4297) (Informativo 945,
Plenário)
Parte 1 -
Parte 2 -
Parte 3 -
A Primeira Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, deu provimento a agravo interno
para declarar a incompetência do Supremo Tribunal Federal (STF) e determinar a devolução dos autos ao
tribunal de origem (Informativo 936).
Na espécie, iniciada liquidação coletiva requerida por sindicato, o tribunal de justiça a quo
determinou que a execução se limitasse aos servidores filiados até a data da impetração do writ. A
recorrente alegava ser parte legítima para propor a ação de execução individual do título coletivo,
independentemente de comprovação da sua filiação ou autorização expressa para ser representada no
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processo de conhecimento, haja vista que a decisão exequenda não limitou o direito apenas àqueles
servidores.
Em razão de o provimento jurisdicional beneficiar alguns servidores do tribunal local que são
parentes de desembargadores, os autos foram encaminhados ao STF com base no art. 102, I, n, da
Constituição Federal (CF), que prevê a competência originária do STF para ações em que mais da metade
dos membros do tribunal de origem esteja impedida.
Na decisão ora agravada, o relator extinguiu, por ilegitimidade ativa, a execução individual da
sentença concessiva do referido mandado de segurança.
A Turma afirmou que o STF não é competente para julgar originariamente o feito, pois não há
impedimento dos desembargadores que não mantêm relação de parentesco com o servidor que figura
especificamente no processo de execução individual [Código de Processo Civil (CPC), art. 144, IV] (1).
Além disso, para os fins do art. 102, I, n, da CF, o impedimento deve ser afirmado nos autos do
processo cujo deslocamento se pretende, o que não ocorreu no caso.
Ademais, o tribunal de origem não se declarou incompetente para julgar o mérito do mandado de
segurança coletivo, de modo que não há, em princípio, óbice para apreciar as execuções individuais, as
quais devem estrita observância à coisa julgada formada no processo de conhecimento. Eventual alteração
na composição do tribunal, que tivesse acarretado o impedimento de mais da metade de seus membros,
deveria ter sido demonstrada no caso concreto, não sendo suficiente a manifestação em outra execução
individual.
Vencido o ministro Alexandre de Moraes (relator), que negou provimento ao agravo. Considerou
que, embora se possa admitir que a recorrente seja também titular do interesse individual homogêneo
objeto do processo coletivo, os efeitos da sentença nele proferida não a alcançam, justamente por não ser
filiada ao sindicato autor no momento da impetração do mandado de segurança.
(1) CPC: “Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo: (...) IV – quando for
parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o
terceiro grau, inclusive;”
AO 2380 AgR/SE, rel. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento
em 25.6.2019. (MS-2380) (Informativo 945, Primeira Turma)
Reclamação
14
A Turma asseverou que a reclamação, por expressa determinação constitucional, destina-se a
preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões.
Na espécie, cuida-se de reclamação ajuizada por um dos filhos da vítima do homicídio. A alegação
de violação da decisão do STF em vista da nova absolvição prolatada pelo TJ/MT, pelos mesmos
fundamentos anteriormente afastados, autoriza o reconhecimento da legitimidade ativa do filho da vítima,
ainda que não tenha se habilitado como assistente de acusação no curso da ação penal. Conforme se extrai
dos autos do RE 594.104, o patrocínio daquele recurso foi produzido pela mesma advogada que atua nos
autos da presente reclamação, tendo atuado em defesa de um dos filhos da vítima.
Logo, mostra-se inequívoco o interesse da família da vítima no deslinde do caso. Não se pode, por
excessivo apelo formal, afastar a relação de pertinência subjetiva do autor da reclamação em comento,
que, como filho da vítima, atua também na qualidade de representante dos interesses da família.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que acolheu o pedido formalizado no agravo. Inicialmente,
assentou a ilegitimidade do reclamante, porquanto não integrou a relação subjetiva no processo-crime.
Ato contínuo, assinalou que o tribunal de justiça não estava impedido de apreciar as causas de pedir
colocadas na ação de revisão.
(1) CF/1988: “Art. 5º (...) XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
(...) c) a soberania dos veredictos;”
Rcl 29621 AgR/MT, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 25.6.2019. (Rcl-29621) (Informativo 945,
Primeira Turma)
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DIREITO PENAL
Execução Provisória
(1) Enunciado 122 da Súmula do TRF da 4ª Região: “Encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a
execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário.”
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DIREITO PROCESSUAL PENAL
Ação Penal
Aplicação indevida de verbas públicas por prefeito: transferência para conta centralizada
municipal e ausência de proveito próprio
A Primeira Turma, por maioria, julgou procedente ação penal instaurada contra deputado federal
para condená-lo às penas cominadas no inciso III do art. 1º do Decreto-Lei (DL) 201/1967 (1).
O parlamentar, no exercício do mandato de prefeito, aplicou indevidamente verbas públicas
federais oriundas do Fundo Nacional de Saúde (FNS) destinadas ao programa nacional de combate a
doença epidêmica para o pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde com o instituto
municipal de previdência.
Inicialmente, o colegiado, por maioria, afastou a preliminar de incompetência do Supremo
Tribunal Federal (STF). Isso porque, embora os fatos apurados na presente ação penal sejam estranhos ao
mandato parlamentar, o procedimento já havia alcançado e superado a fase de alegações finais, situação
processual que se enquadra em uma das hipóteses de prorrogação da competência da Corte.
Vencido, no ponto, o ministro Marco Aurélio, que acolheu a preliminar. Para ele, incide a
incompetência por inexistir ligação entre o exercício do mandato do parlamentar e o crime praticado por
ele quando prefeito. Está-se diante de competência funcional, absoluta.
Quanto ao mérito, a Turma entendeu que a conduta narrada na denúncia se amolda, com precisão,
ao tipo previsto no inciso III do art. 1º do DL 201/1967. Considerou que os elementos probatórios
produzidos na instrução processual demonstram que o réu, com plena consciência da ilicitude dos seus
atos, atuou na forma descrita na peça acusatória, ausentes as causas de exclusão da ilicitude ou da
culpabilidade.
Afirmou que o crime previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em o administrador público
aplicar verba pública em destinação diversa da prevista em lei. Não se trata, portanto, de desviar em
proveito próprio, sendo irrelevante a verificação de efetivo prejuízo para a Administração.
Esclareceu que, no caso, havia uma conta específica para a utilização dessa verba federal, da qual
foram transferidos valores para uma conta única do Fundo Municipal de Saúde. Desta última, saíram os
recursos destinados ao cumprimento de uma ordem de pagamento em favor do instituto municipal de
previdência. Asseverou que nenhuma razão, salvo a tredestinação, justificaria a transferência do dinheiro
dessa conta específica para uma conta única geral. Portanto, a mera transferência para a conta geral já
seria indício grave do desvio.
Reputou ser evidente o conhecimento do fato pelo ex-prefeito, que assinou a ordem de pagamento
para a transferência, a demonstrar domínio do fato e o poder de gestão dos recursos efetivamente
empregados em finalidade diversa da estabelecida por lei. Observou que, na véspera da referida
transferência, houve uma reunião com os corréus na qual foi decidida a destinação das verbas. Ressalte-se
que um deles até mesmo declarou que o parlamentar sabia da operação ilegal descrita na denúncia.
Ademais, no mesmo dia da citada reunião, foi enviado ofício do Gabinete da Secretaria Municipal de
Saúde, que fez remissão à “determinação superior” e encaminhou à Secretaria Municipal de Finanças a
relação das contas referentes às transferências “fundo a fundo”, para que fosse processada a imediata
centralização dessas contas em uma única conta.
Vencidos os ministros Luiz Fux e Alexandre de Moraes (revisor), que julgaram improcedente a
ação penal para absolver o parlamentar, por considerarem não comprovadas a materialidade e a autoria
delitivas.
(1) DL 201/1967: “Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder
Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (...) III – desviar, ou aplicar indevidamente, rendas
ou verbas públicas;”
AP 984/AP, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 11.6.2019. (AP-984) (Informativo 944,
Primeira Turma)
Cumprimento de Pena
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A Primeira Turma, por maioria, concedeu parcialmente habeas corpus impetrado em favor de
condenado pela prática do crime de tráfico privilegiado, previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 (1),
para alterar para aberto o regime inicial de cumprimento da pena.
No caso, o impetrante pretendia a alteração do regime inicial de cumprimento da pena, fixado em
semiaberto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), bem como a conversão da pena privativa de liberdade
em restritiva de direitos.
O colegiado aplicou a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido da
impossibilidade de fixação de regime de cumprimento de pena fechado para crime de tráfico de drogas
sem a devida justificação. Observou que o único fundamento apontado pelo STJ para justificar o regime
semiaberto foi o fato de ser crime de tráfico, não obstante se tratar de tráfico privilegiado e ser o réu
primário, com bons antecedentes. Ou seja, a justificativa do STJ foi a de que a reprovabilidade se deu
pelo delito praticado.
Concluiu não se poder chancelar a fixação automática em relação ao regime semiaberto pelo
simples fato de ser tráfico privilegiado. Além disso, salientou inexistir, no caso, sequer justificativa maior
quanto à quantidade da droga.
Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que indeferiu a ordem. Segundo o relator, o STJ
observou não só o art. 33 (2), mas também o art. 59 (3) do Código Penal (CP). Ressaltou não haver de se
cogitar de sobreposição no que se considerou determinada circunstância judicial na fixação da pena base
posteriormente. Voltou-se a essa circunstância judicial, dado o regime de cumprimento. Por fim, entendeu
que, a teor do art. 44 do mesmo diploma legal, não cabe a substituição da pena privativa de liberdade
pela restritiva de direitos quando as circunstâncias judiciais são negativas.
(1) Lei 11.343/2006: “Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda,
oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda
que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15
(quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no
§ 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes,
não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.”
(2) CP/1940: “Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em
regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. § 1º Considera-se: a) regime fechado a execução
da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola,
industrial ou estabelecimento similar; c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. §
2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os
seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos
deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não
exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto; c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual
ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. § 3º A determinação do regime inicial de
cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código. § 4º O condenado por crime contra a
administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à
devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.”
(3) CP/1940: “Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos
motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja
necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I – as penas aplicáveis dentre as cominadas; II – a quantidade de pena
aplicável, dentro dos limites previstos; III – o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV – a substituição da
pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.”
HC 163231/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento
em 25.6.2019. (HC-163231) (Informativo 945, Primeira Turma)
Nulidades
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jurisdicionais foram exarados, quando as principais figuras públicas hostilizadas pelos apoiadores do
impedimento eram a ex-presidente e o paciente; (v) na condenação do paciente, reputada injusta pela
defesa técnica; (vi) na atuação impeditiva ao cumprimento da ordem de soltura do paciente exarada por
desembargador, em decisão liminar proferida nos autos de outro writ; e (vii) na aceitação do magistrado
prolator da sentença condenatória ao convite feito pelo presidente da República eleito em 2018 para
ocupar o cargo de ministro da Justiça, a indicar que toda a sua atuação pretérita estaria voltada a tal
desiderato.
O ministro Gilmar Mendes, que já havia indicado adiamento da devolução do seu pedido de vista
em virtude do congestionamento da pauta, referiu-se a novas circunstâncias que corroborariam a
necessidade dessa prorrogação, até mesmo para que fossem apurados os fatos mencionados pelos
impetrantes e pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Enfatizou recente divulgação, por sítio
eletrônico, de diálogos entre o magistrado de primeira instância e membro do Ministério Público que
revelariam as minúcias das circunstâncias históricas em que ocorreram os fatos discutidos no writ.
Assinalou a manifestação da PGR acerca dessas publicações, que ressalta que os vazamentos devem ser
verificados e conclui que os fatos alegados pelo impetrante não conduzem, diante da fundada dúvida
jurídica sobre eles até o momento, à procedência do pedido de suspeição.
Em seguida, o ministro Gilmar propôs a concessão de medida liminar por vislumbrar a presença
do fumus boni iuris e do periculum in mora. Ressaltou a situação do paciente, preso há mais de 440
dias. Considerou a plausibilidade jurídica do pedido a partir dos citados fatos novos apontados pela
defesa, mas, essencialmente, dos elementos já constantes da impetração desde a sua apresentação original.
Destacou, entre os fatos que a defesa elenca como determinantes da parcialidade do magistrado de
primeiro grau, a interceptação telefônica de diversas pessoas relacionadas ao paciente, inclusive de
conversas entre o paciente e seus advogados.
O ministro Edson Fachin (relator) rejeitou a proposta de concessão de liminar e, por não constatar
demonstração de constrangimento ilegal imputável à autoridade coatora, reiterou os fundamentos do voto
anteriormente proferido para não conhecer do habeas corpus. Rememorou que os quatro primeiros
argumentos levantados pela defesa estão acobertados pela preclusão, na medida em que foram rechaçados
pela corte regional em sede de exceção de suspeição, e que os demais não foram previamente examinados
pelas instâncias antecedentes.
O relator teceu observações acerca das graves alegações de monitoramento de advogados do
paciente. Salientou não se discutir a relevância da atuação da defesa técnica e da indispensabilidade de
irrestrita obediência e observância da imunidade profissional que instrumentaliza a realização de seu
essencial múnus. Entretanto, verificou que, da interceptação do terminal em comento, inexiste suporte,
para fins de reconhecimento de suspeição, de deliberado monitoramento de advogado ou ainda da alegada
inimizade capital. Acrescentou que não há notícia de que esse episódio teria resultado em produção
probatória. Assim que detectada a irregularidade, a interceptação teria sido prontamente interrompida.
Aparentemente, o terminal estava erroneamente indicado em registro de órgãos públicos, contexto que
atrai a incidência do art. 565 do Código de Processo Penal (CPP) (1).
Após salientar a distinção entre neutralidade e imparcialidade, o ministro Edson Fachin afirmou
que o que cabe perquirir em tais casos não é o conteúdo de posições e compreensões subjetivas do
julgador, ou ainda eventuais desvios de natureza ética. Nesses casos, cabe aferir se, em determinados atos,
sua atuação jurisdicional, que deve funcionar como verdadeira ferramenta de heterocomposição, é
conduzida por critérios de objetividade e racionalidade, desvelando-se que o funcionamento judicante seja
desenvolvido sob balizas de uma concreta atuação subjetivamente comprometida e submetida à ordem
jurídica.
No que se refere às citadas recentes divulgações dos diálogos, o relator não encontrou razões para
alterar seu voto, visto que as informações noticiadas pela defesa não permitem, no momento e nesta sede,
o reconhecimento do alegado constrangimento ilegal. Esclareceu que não se tem notícia de ter sido o
material submetido a escrutínio pelas autoridades judiciárias antecedentes, descabendo ao Supremo
Tribunal Federal conhecer originariamente da matéria, sob pena de indevida supressão de instância.
Ademais, não se trata de fato notório em sentido técnico processual, apto a prescindir de qualquer prova,
até mesmo quanto à licitude do material. Além disso, ainda que se admitisse a possibilidade, em tese, de
uso em favor do acusado de prova ilicitamente obtida, essa providência estaria inserida no campo da
validade. Nada obstante, a confiabilidade desses elementos dependeria de prévio exame e
reconhecimento, em sede jurisdicional própria, de sua autenticidade e integridade.
Por fim, o ministro Edson Fachin relembrou que o debate nestes autos, nos limites da hipótese de
cabimento prevista no art. 5°, LXVIII, da CF (2), consiste na análise de eventual caracterização de
constrangimento ilegal imputável ao STJ em razão de julgamento que, segundo a defesa, traduziria lesão
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ou ameaça ao direito de locomoção do paciente. Para tanto, sustenta-se a configuração de suspeição da
autoridade judiciária que subscreveu a sentença condenatória, por força de alegada inimizade capital em
relação ao paciente. Portanto, o debate não envolve, no momento, o acerto ou desacerto dos atos
jurisdicionais praticados em primeiro grau, ou mesmo eventuais contrariedades normativas desses atos,
aspectos passíveis de controle pelas vias recursais próprias. Para o relator, eventuais irregularidades que
acaso comprometam o devido processo legal devem efetivamente ser objeto de atenção e controle a serem
exercitados pelo STF. Entretanto, nesse caso, isso deve ser implementado com irrestrito lastro na ordem
normativa e com observância dos lindes dos instrumentos de impugnação previstos no sistema processual.
Os ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia também indeferiram a proposta de concessão da
medida liminar.
O ministro Ricardo Lewandowski ficou vencido quanto ao adiamento do processo, que, segundo
ele, contém todos os elementos necessários para a apreciação das alegações da defesa. De igual modo,
ficou vencido quanto à concessão da liminar, ao acompanhar o ministro Gilmar Mendes.
(1) CPP: “Art. 565. Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou
referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse.”
(2) CF/1988: “LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência
ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;"]
Prova
A Segunda Turma, por maioria, deu provimento parcial a reclamação para declarar a nulidade de
entrevista realizada por autoridade policial no interior da residência do reclamante, durante o
cumprimento de mandado de busca e apreensão, em flagrante contrariedade à autoridade da decisão do
Supremo Tribunal Federal (STF) nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)
395 e 444.
O reclamante sustentava ter sido interrogado por delegado de polícia sem ser informado de seu
direito ao silêncio, além de ter-lhe sido exigida a senha de acesso ao seu smartphone, em flagrante
violação ao princípio da não autoincriminação.
No tocante à entrevista, prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator). Em seu
pronunciamento, observou que, nas ADPFs 395 e 444, a Corte decidiu pela impossibilidade de se
conduzir coercitivamente os suspeitos de prática de crimes com o intuito de serem interrogados. Entre o
rol de direitos potencialmente atingidos pela conduta, destacou a violação do direito à não
autoincriminação e ao silêncio.
Aduziu que a contrariedade aos referidos direitos ocorreu com a realização de interrogatório
travestido de entrevista, na medida em que utilizada técnica de interrogatório forçado, proibida a partir do
julgamento das ADPFs 395 e 444. Observou que o reclamante foi interrogado em ambiente intimidatório
que diminuiria o direito à não incriminação. Além disso, na entrevista formalmente documentada, não se
oportunizou ao sujeito da diligência o direito à prévia consulta a advogado, tampouco certificou-se, no
respectivo termo, o direito ao silêncio e à não produção de provas contra si mesmo, nos termos da
legislação e dos aludidos precedentes.
Por sua vez, o ministro Edson Fachin ressaltou não se tratar, na hipótese, de aderência estrita de
um conjunto de elementos fáticos que se submeteriam à vedação da condução coercitiva. Contudo,
assinalou a existência de desrespeito ao direito de não incriminação e ao direito ao silêncio, conforme os
fatos apresentados. Isso ocorreu mediante metodologia atípica e descolada de qualquer fundamentação
que permita esse tipo de procedimento.
Quanto à conduta adotada pela autoridade policial em relação ao celular do reclamante, o
colegiado, por maioria, não vislumbrou suporte à sua alegação no sentido de que teria sido coagido ou
obrigado a fornecer a senha. Explicitou inexistir expressamente, na decisão judicial, a expressão “autorizo
a apreensão do aparelho celular”. Entretanto, o ato decisório conteve o deferimento ao acesso, à
exploração e cópia do conteúdo de mídias, dispositivos e dados armazenados em nuvem, bem assim a
determinação de que deveria constar, expressamente no mandado, a autorização de acesso a dados
telefônicos e telemáticos armazenados nos dispositivos eletrônicos apreendidos.
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O ministro Ricardo Lewandowski acrescentou não ser possível exigir do juiz que minudencie
todos os objetos de interesse do processo que serão encontrados no local da busca e apreensão.
No ponto, ficou vencido o ministro relator, que reconheceu, de ofício [Código de Processo Penal
(CPP), art. 654, § 2º (1)], a inconstitucionalidade e a ilegalidade da apreensão e do acesso aos dados, às
mensagens e informações contidas no aparelho celular, haja vista a ausência de prévia e fundamentada
decisão judicial que justificasse a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da medida.
(1) CPP: “Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como
pelo Ministério Público. (...) § 2º Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando
no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.”
Rcl 33711/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 11.6.2019. (Rcl-33711) (Informativo 944,
Segunda Turma)
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DIREITO PROCESSUAL PENAL MILITAR
Ação Penal
HC 137741 AgR e AgR-segundo/RS, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 25.6.2019. (HC-
137741) (Informativo 945, Primeira Turma)
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DIREITO TRIBUTÁRIO
Tributos
(1) Lei 8.981/1995: “Art. 42. A partir de 1º de janeiro de 1995, para efeito de determinar o lucro real, o lucro líquido
ajustado pelas adições e exclusões previstas ou autorizadas pela legislação do Imposto de Renda, poderá ser reduzido em, no
máximo, trinta por cento. (Vide Lei 9.065, de 1995) Parágrafo único. A parcela dos prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro
de 1994, não compensada em razão do disposto no caput deste artigo poderá ser utilizada nos anos-calendário subsequentes.
(...) Art. 58. Para efeito de determinação da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, o lucro líquido ajustado poderá ser
reduzido por compensação da base de cálculo negativa, apurada em períodos-base anteriores em, no máximo, trinta por cento.
(Vide Lei 9.065, de 1995)”
(2) Lei 9.065/1995: “Art. 15. O prejuízo fiscal apurado a partir do encerramento do ano-calendário de 1995, poderá ser
compensado, cumulativamente com os prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994, com o lucro líquido ajustado pelas
adições e exclusões previstas na legislação do imposto de renda, observado o limite máximo, para a compensação, de trinta por
cento do referido lucro líquido ajustado. Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que
mantiverem os livros e documentos, exigidos pela legislação fiscal, comprobatórios do montante do prejuízo fiscal utilizado para a
compensação. Art. 16. A base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, quando negativa, apurada a partir do encerramento do
ano-calendário de 1995, poderá ser compensada, cumulativamente com a base de cálculo negativa apurada até 31 de dezembro de
1994, com o resultado do período de apuração ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação da referida contribuição
social, determinado em anos-calendário subsequentes, observado o limite máximo de redução de trinta por cento, previsto no art. 58
da Lei nº 8.981, de 1995.”
(3) CF/1988: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios: (...) IV - utilizar tributo com efeito de confisco;”
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RE 591340/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 27.6.2019. (RE-591340) (Informativo
945, Plenário)
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