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Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período

Professora: Sheilla Brasileiro

EIXO 1 - O PROCESSO DE EXCLUSÃO NA EDUCAÇÃO


GRUPO 1 A – EXCLUSÃO PRECOCE/ INCLUSÃO

Fragmento das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos,


Parecer CEB nº:11/2000, APROVADO EM:10.05.2000, Relator Conselheiro Carlos Roberto
Jamil Cury

X - O direito à educação

No Brasil, país que ainda se ressente de uma formação escravocrata e hierárquica, a EJA
foi vista como uma compensação e não como um direito. Esta tradição foi alterada em
nossos códigos legais, na medida em que a EJA, tornando-se direito, desloca a idéia de
compensação substituindo-a pelas de reparação e eqüidade. Mas ainda resta muito
caminho pela frente a fim de que a EJA se efetive como uma educação permanente a
serviço do pleno desenvolvimento do educando.
A concepção pela qual ninguém deixa de ser um educando, deve contar com a
universalização completa do ensino fundamental de modo a combinar idade/ano escolar
adequados com o fluxo regularizado, com a progressiva universalização do ensino médio e
o prolongamento de sua obrigatoriedade, inclusive possibilitando aos interessados a opção
por uma educação profissional. Neste sentido, a EJA é um momento de reflexão sobre o
conceito de educação básica que preside a organização da educação nacional em suas
etapas. As necessidades contemporâneas se alargaram, exigindo mais e mais educação,
por isso, mais do que o ensino fundamental, as pessoas buscam a educação básica como
um todo.
A nova concepção da EJA significa, pois, algo mais do que uma norma programática ou um
desejo piedoso. A sua forma de inserção no corpo legal indica um caminho a seguir.
A EJA é educação permanente, embora enfrente os desafios de uma situação sócio-
educacional arcaica no que diz respeito ao acesso próprio, universal e adequado às
crianças em idade escolar.
Os liames entre escolarização e idade podem até não ter conseguido a melhor expressão
legal, mas pretendem apontar para uma democratização escolar em que o adjetivo todos tal
como posto junto ao substantivo direito seja uma realidade para cada um deste conjunto de
crianças, adolescentes, jovens e adultos. A efetivação deste “direito de todos” existirá se e
somente se houver escolas em número bastante para acolher todos os cidadãos brasileiros
e se desta acessibilidade ninguém for excluído. Aí teremos um móvel da atenuação de
constrangimentos de qualquer espécie em favor de uma maior capacidade qualitativa de
escolha e de um reconhecimento do mérito de cada um num mundo onde se fazem
presentes transformações na organização do trabalho, nas novas tecnologias, na rapidez da
circulação das informações e na globalização das atividades produtivas, para as quais uma
resposta democrática representa um desafio de qualidade.
Os pareceres da Câmara de Educação Básica sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais do
Ensino Fundamental, do Ensino Médio e da Educação Profissional de nível técnico,
assinalam e reafirmam a importância, o significado e a contemporaneidade da educação
escolar, daí decorrendo a busca e as ações em vista da universalidade de acesso e de
permanência. Qualquer formação futura deve ter nas etapas da educação básica, cada vez
mais universalizadas, um patamar de igualdade e de prossecução. Assim sendo, a EJA é
um modo de ser do ensino fundamental e do ensino médio, com seus homólogos, voltado

para crianças e adolescentes na idade adequada são chaves de abertura para o mundo
contemporâneo em seus desafios e exigências mais urgentes e um dos meios de
reconhecimento de si como sujeito e do outro como igual.
De acordo com Bobbio (1987), a possibilidade de escolha aumenta na medida em que o
sujeito da opção se torna mais livre. Mas esta liberdade só se efetua quando se elimina uma
discriminação que impede a igualdade dos indivíduos entre si. Assim, tal eliminação não só
libera, mas também torna a liberdade compatível com a igualdade, fazendo-as
reciprocamente condicionadas. A superação da discriminação de idade diante dos itinerários
escolares é uma possibilidade para que a EJA mostre plenamente seu potencial de
educação permanente relativa ao desenvolvimento da pessoa humana face à ética, à
estética, à constituição de identidade, de si e do outro e ao direito ao saber. Quando o Brasil
oferecer a esta população reais condições de inclusão na escolaridade e na cidadania, os
“dois brasis”, ao invés de mostrarem apenas a face perversa e dualista de um passado
ainda em curso, poderão efetivar o princípio de igualdade de oportunidades de modo a
revelar méritos pessoais e riquezas insuspeitadas de um povo e de um Brasil uno em sua
multiplicidade, moderno e democrático. (p. 58 a 60)

(...) A educação de jovens e adultos remete, primordialmente, a uma questão de


especificidade cultural. É necessário historicizar o objeto da reflexão pois, ao contrário, se
falarmos de um personagem abstrato, podemos incluir, involuntariamente, um julgamento de
valor na descrição do jovem e do adulto em questão: se ele não corresponde à abstração
utilizada como referência, ele é contraposto a ela e compreendido a partir dela, e definido,
portanto, pelo que ele não é. O primeiro traço cultural relevante para esses jovens e adultos,
especialmente porque nos movemos, aqui, no contexto da escolarização, é sua condição de
excluídos da escola regular. O tema da exclusão escolar é bastante proeminente na
literatura sobre educação, especialmente no que diz respeito a aspectos sociológicos -
relações entre escola e sociedade, direito à educação, educação e cidadania, escola,
trabalho e classe social – e aspectos pedagógicos ou psico-pedagógicos - fracasso escolar,
evasão e repetência, práticas de avaliação (veja-se, por exemplo, Aquino, 1997,
Lahire,1997, Patto, 1990) Para a presente discussão, o aspecto específico desta ampla
questão que se destaca é como a situação de exclusão contribui para delinear a
especificidade dos jovens e adultos como sujeitos de aprendizagem. Um primeiro ponto a
ser mencionado aqui é a adequação da escola para um grupo que não é o "alvo original" da
instituição. Currículos, programas, métodos de ensino, foram originalmente concebidos para
crianças e adolescentes que percorreriam o caminho da escolaridade de forma regular.
Assim, a organização da escola como instituição supõe que o desconhecimento de
determinados conteúdos esteja atrelado a uma determinada etapa de desenvolvimento (por
exemplo, desconhecer a diferença entre aves e mamíferos e ter sete anos de idade seriam
fatores correlacionados); supõe que certos hábitos, valores e práticas culturais não estejam
ainda plenamente enraizados nos aprendizes; supõe que certos modos de transmissão de
conhecimentos e habilidades seriam os mais apropriados; supõe que certos aspectos do
jargão escolar estariam dominados pelos alunos em cada momento do percurso escolar.
Essas e outras suposições em que se baseia o trabalho escolar podem colocar os jovens e
adultos em situações bastante inadequadas para o desenvolvimento de processos de real
aprendizagem. De certa forma, é como se a situação de exclusão da escola regular fosse,
em si mesma, potencial geradora de fracasso na situação de escolarização tardia. Na
verdade, os altos índices de evasão e repetência nos programas de educação de jovens e
adultos indicam falta de sintonia entre essa escola e os alunos que dela se servem, embora
não possamos desconsiderar, a esse respeito, fatores de ordem sócio-econômica que
acabam por impedir que os alunos se dediquem plenamente a seu projeto pessoal de
envolvimento nesses programas. Um segundo ponto a ser mencionado no que diz respeito à
especificidade dos jovens e adultos como sujeitos de aprendizagem relacionada com o
processo de exclusão da escola regular é o fato de que a escola funciona com base em
regras específicas e com uma linguagem particular que deve ser conhecida por aqueles que

nela estão envolvidos. Conforme discutido em trabalho anterior a respeito de alunos de um


curso de pós-alfabetização para adultos, "o desenvolvimento das atividades escolares está
baseado em símbolos e regras que não são parte do conhecimento de senso comum. Isto é,
o modo de se fazer as coisas na escola é específico da própria escola e aprendido em seu
interior. As mais óbvias dessa regras, que configuram o 'modelo escolar', constituem um
estereótipo bastante generalizado em nossa sociedade letrada, mesmo entre indivíduos que
nunca estiveram na escola (e mesmo quando esse estereótipo não corresponde exatamente
às escolas reais em funcionamento) – praticamente todo mundo sabe que na escola há um
professor que ensina e estabelece as regras para um grupo de alunos que deve aprender e
obedecer; há um quadro negro e carteiras e as pessoas trabalham com cadernos, lápis e
borrachas. Em nível mais sutil, entretanto, dominar a mecânica da escola e manipular sua
linguagem são capacidades aprendidas no interior da escola e, ao mesmo tempo, cruciais
para o desempenho do indivíduo nas várias tarefas escolares. Muitas vezes a linguagem
escolar mostrou ser maior obstáculo à aprendizagem do que o próprio conteúdo. Alunos que
nunca haviam estado na escola tinham grande dificuldade de trabalhar com a linguagem
escolar, enquanto que aqueles que já haviam tido certo treino escolar demonstraram
dominar a mecânica geral da escola e considerar os diversos tipos de atividades como
aceitáveis no interior do mundo escolar, mesmo quando desconhecidas como atividades
específicas. Entretanto, ainda que esses alunos mais treinados soubessem bastante a
respeito da verossimilhança das atividades desenvolvidas em classe, a apresentação formal
das tarefas escolares continuou sendo um obstáculo ao seu bom desempenho.
Compreensão de instruções, particularmente quando por escrito, também constituía, ainda,
grande parte do problema a ser resolvido." (Oliveira, 1987: 19-29) Ainda que o foco da
presente discussão esteja nos aspectos referentes ao conhecimento e à aprendizagem, é
importante mencionar ainda que a exclusão da escola coloca os alunos em situação de
desconforto pessoal devido a aspectos de natureza mais afetiva, mas que podem também
influenciar a aprendizagem. Os alunos têm vergonha de freqüentar a escola depois de
adultos, muitas vezes pensam que serão os únicos adultos em classes de crianças e por
isso sentem-se humilhados, têm insegurança quanto a sua própria capacidade para
aprender. (Oliveira, 1989) Além da referência ao lugar social ocupado pelos jovens e adultos
definido por sua condição de excluídos da escola regular, sua especificidade cultural deve
ser examinada com relação a outros aspectos que os definem como um grupo relativamente
homogêneo no interior da diversidade de grupos culturais da sociedade contemporânea.
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

EIXO 1 - O PROCESSO DE EXCLUSÃO NA EDUCAÇÃO


GRUPO 1 B – IMPACTOS DO RETORNO À ESCOLARIZAÇÃO

JORGE, Gláucia (1999). A sala de aula na EJA: Processos interativos. Belo


Horizonte, Dissertação de Mestrado, UFMG/FaE.

“ (...) ser escolarizado não garante, por si só melhoria das condições de vida, mas
assegura, mesmo que de forma ilusória, a possibilidade de sentir-se um pouco
menos oprimido, um pouco mais distanciado da sua realidade de marginalização e
exclusão. Enfim uma garantia legal e palpável ( o diploma) de ser visto como alguém
que passou pela escola e possui seus saberes oficializados e legitimados por ela e
por isso mesmo necessários e desejados.” (p.47)

“ A busca da escola pelos excluídos está além do diploma, do emprego ou das


alterações salariais. Falamos de desejos de completude, de menos diferença e de
mais auto-estima” (p.34)

(...) conseguir um diploma é também resgatar um pouco do amor próprio muitas


vezes perdido no processo de exclusão e marginalização em que se encontram
inseridos aqueles que um dia deixaram de freqüentar a escola.” (p.50)
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ZAGO, Nadir (2000). Processos de escolarização nos meios populares. In: Família e
Escola. Petrópolis:Vozes,p.17-44

“Pressionados pelas exigências do mercado de trabalho, os jovens que não


freqüentaram a escola na idade prevista tentam ou fazem projetos para retomar os
estudos, geralmente através do ensino regular noturno ou de fórmulas mais rápidas
que podem ser viabilizadas pelos cursos supletivos. Nas camadas populares, é
sempre dentro destas modalidades que o futuro escolar é projetado, na perspectiva
de conciliação entre estudo e trabalho. Porém, retornar à escola pode dar apenas
prosseguimento a uma escolaridade acidentada, conforme se pode verificar por
meio de vários exemplos nos quais essas tentativas foram também acompanhadas
de novas interrupções. Esses percursos acidentados (seja decorrentes de
reprovações ou de interrupções) aumentam a distância entre a idade cronológica e a
idade escolar, e quanto maior a diferença, mais improvável se torna a conclusão de
um ciclo completo de ensino. Estes dados se aproximam da realidade brasileira, que
historicamente vem reproduzindo altos índices de repetência, sobretudo nas
primeiras séries” .(p.27)
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SANTOS, Geovania (2001). Educação ainda que tardia: A exclusão da escola e a
reinserção em Programa de Educação de Jovens e Adultos entre Adultos das
Camadas Populares.. Belo Horizonte, Dissertação de Mestrado, UFMG/FaE.

“Estou feliz, porque minha estrela que estava se apagando voltou a brilhar, o mundo
quase me engoliu. A minha história estava pintada com tintas escuras e sem vida, as
dores do passado me corroíam, mas agora posso assumir o controle e mudar as
cores, tomei uma decisão, posso tudo com lápis e papel na mão.” Ao ouvir a leitura,
ela imediatamente se reconhece como autora e se emociona, fazendo o seguinte
comentário: “Mas não é tudo isso que eu te contei aqui? A minha história toda que
eu te contei, não tem tudo a ver com isso aí? Porque, realmente, o que era a minha
estrela que estava se apagando, eu já... olha para você ver, na idade em que eu
estava, em que eu estou, naquela época que eu escrevi isso, com os meus filhos...
acho que já estava desempregada, com problema no braço... quer dizer, é você se
sentir, a própria aposentadoria é um negócio que te joga no chão! Eu tinha uma
declaração de inválida e isso é muito sério! Agora, o mundo realmente quase me
engoliu. Agora, quando eu percebi esta coisa de estudar, de voltar, do poder, então,
assim, eu me percebo podendo modificar isso tudo. E uma das coisas que realmente
mais modificou na minha vida foi isso comigo mesmo, o meu Eu liberto. Que até
então, o meu Eu era prisioneiro de mim mesmo, e isso é muito complicado! Hoje eu
sei que não é poder tudo, mas é poder quase tudo. Ser livre é ajudar os meus filhos
a ter vontade de estudar. É poder pegar o material da escola... Eles chegavam com
o material: ‘Mãe o que é isso?’ Mamãe não sabia, mamãe não podia ajudar. A tal
vergonha de não saber! Não assumido, claro, mas é claro que é isso. Sabe, que
diferença, que o estudar faz essa diferença? É isso o que eu estou sentindo hoje. A
minha vida profissional e financeira não mudou em nada, mas eu sou livre. Isso é
ser feliz. É você poder olhar de frente para o outro e dizer: ‘oi, como é que vai?’ Isso
é ser feliz! Esses laços que quebraram. Porque o simples fato de eu ter feito uma
mudança de postura diante da vida, uma mudança de pensamento diante da vida...
As mágoas continuam, mas o simples fato de eu ter conseguido dar essa reviravolta
no meu pensar, para mim já é uma coisa muito assim... importante. Então eu acho
que valeu a pena, vale a pena estudar, claro que não posso fazer tudo, mas
bastante coisa eu posso, com certeza! Até o direito de ser livre eu tenho, eu posso!
Olha que coisa mais interessante é isso: é você poder, sabe...Isso é que é legal! È
não ter vergonha de olhar a minha cara no espelho; eu não tenho vergonha de mim,
eu me sinto bem comigo mesma. Tenho 39 anos, esse poder falar! Financeiramente
não mudei de casa, não comprei carro... mas quem sabe um dia, não é não? Vou
continuar, eu estou tentando, é por aí.” (p.102)
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HILDEBRAND, Maria Helena (1984). Os deserdados da educação brasileira: Análise


das expectativas de clientela aos exames supletivos. Porto Alegre, Dissertação de
Mestrado, UFRGS.

“Os candidatos enfrentarão, na volta à escola, os mesmos obstáculos que os


levaram a desistir da freqüência à escola regular: aulas à noite, após um dia inteiro
de trabalho; a matéria maciça dada em curto tempo, que, por sua vez não permite
faltar às aulas já que quebra a seqüência dos conteúdos programáticos, dificultando
seu acompanhamento.” (p.102)
DAYRELL, Juarez (1989). De olho na escola: As experiências educativas na ótica
do aluno trabalhador. Belo Horizonte, Dissertação de Mestrado, UFMG/FaE.

“Mesmo levando em consideração o peso do saudosismo, é possível apreender que


na representação destes alunos trabalhadores, a escola coloca-se com um espaço
de reflexão sobre si mesmo, de levantamento de dúvidas e de indagações, de
ampliação das curiosidades. E não só. Mas também de conhecer o mundo e a
política, ou seja, refletir sobre a organização social e sua lógica. E, com este leque
mais amplo, redefinir os caminhos da vida. Nesse sentido, podemos compreender
que a escola tem a faculdade de apontar caminhos, de ampliar as perspectivas de
vida.” (p.319)

“(...) além de tudo, o estudo traz respeito (...). Diante do desrespeito constante que
enfrentam no cotidiano do mundo do trabalho, vêem na escola, no estudo e no
diploma, um meio de serem respeitados, serem considerados cidadãos. A
escolarização é posta como condição para exercerem os direitos mínimos de
cidadão, funcionando como um mecanismo seletivo. Como grandes parcelas da
população são excluídas da escola, então temos cidadãos e meio-cidadãos. Ao
mesmo tempo em que assimilam esta concepção, buscam, com as armas do próprio
sistema, se fazerem respeitar.” (p.229)

“E é exatamente quando estão imersos no mundo do trabalho, vivenciando suas


contradições, que surge a expectativa de um retorno à escola. É significativo
perceber um movimento comum na vida destes jovens na sua relação com a escola.
Foi o trabalho, foram as condições em que este ocorria que realizaram/ justificaram a
saída da escola. Agora é também o trabalho que os leva de volta à escola.” (p.208)

“Podemos perceber que é o mundo do trabalho, nas relações ali vivenciadas que
vão experimentando na pele a desvalorização social de determinadas profissões, a
humilhação que sofrem ao exerce-las. Mas é também neste espaço, neste mesmo
embate, que alargam o projeto de futuro, descobrindo a possibilidade/ necessidade
de se afirmarem como trabalhadores qualificados, condição aspirada para uma
maior competitividade no mercado, melhores salários, como também, maior
dignidade como trabalhadores.” (p.219)

“Os depoimentos deixam clara a relação existente entre a auto-concepção negativa,


a palavra e o poder. Essa mesma relação pode ser constatada na dificuldade que
apresentam, inicialmente, em participar das aulas perguntando, questionando, em
expressar-se de qualquer forma em público. A aparente apatia e passividade, tão
reclamadas pelos professores dos cursos noturnos, fazem parte do mesmo conjunto
de problemas. Diante de alguém que consideram superior, no trabalho, ou na
escola, ou num meio que não o deles, calam-se, envergonham-se, sentem-se
tímidos. De um lado, a insegurança diante do código lingüístico dominante, imposto
como legítimo, que lhes foi negado pela própria escola. Em um e outro, a atribuição
individual da culpa: o que é a imposição social do silêncio, torna-se para eles timidez
e falta de cultura. Mas não só. O próprio poder de falar entre iguais é relativo. E o é
porque a questão não se resume apenas no falar, mas também na qualidade do que
se fala.” (p.325)
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

GRUPO 2 A – PERFIL DO ALUNO DA EJA

Fragmento do texto “Jovens e Adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem”, de


Marta Kohl de Oliveira (Trabalho encomendado pelo GT “Educação de pessoas jovens e
adultas” e apresentado na 22ª Reunião Anual da ANPEd – 26 a 30 de setembro de 1999,
Caxambu.)

O tema "educação de pessoas jovens e adultas" não nos remete apenas a uma
questão de especificidade etária, mas, primordialmente, a uma questão de
especificidade cultural. Isto é, apesar do corte por idade (jovens e adultos são,
basicamente, "não crianças"), esse território da educação não diz respeito a
reflexões e ações educativas dirigidas a qualquer jovem ou adulto, mas delimita um
determinado grupo de pessoas relativamente homogêneo no interior da diversidade
de grupos culturais da sociedade contemporânea. O adulto, para a educação de
jovens e adultos, não é o estudante universitário, o profissional qualificado que
freqüenta cursos de formação continuada ou de especialização, ou a pessoa adulta
interessada em aperfeiçoar seus conhecimentos em áreas como artes, línguas
estrangeiras ou música, por exemplo. Ele é geralmente o migrante que chega às
grandes metrópoles proveniente de áreas rurais empobrecidas, filho de
trabalhadores rurais não qualificados e com baixo nível de instrução escolar (muito
freqüentemente analfabetos), ele próprio com uma passagem curta e não
sistemática pela escola e trabalhando em ocupações urbanas não qualificadas, após
experiência no trabalho rural na infância e na adolescência, que busca a escola
tardiamente para alfabetizar-se ou cursar algumas séries do ensino supletivo. E o
jovem, relativamente recentemente incorporado ao território da antiga educação de
adultos, não é aquele com uma história de escolaridade regular, o vestibulando ou o
aluno de cursos extra-curriculares em busca de enriquecimento pessoal. Não é
também o adolescente no sentido naturalizado de pertinência a uma etapa bio-
psicológica da vida. (para uma discussão aprofundada da constituição da juventude
como conceito nas ciências sociais contemporâneas, veja-se Peralva e Sposito,
1997). Como o adulto anteriormente descrito, ele é também um excluído da escola,
porém geralmente incorporado aos cursos supletivos em fases mais adiantadas da
escolaridade, com maiores chances, portanto, de concluir o ensino fundamental ou
mesmo o ensino médio. É bem mais ligado ao mundo urbano, envolvido em
atividades de trabalho e lazer mais relacionadas com a sociedade letrada,
escolarizada e urbana. Refletir sobre como esses jovens e adultos pensam e
aprendem envolve, portanto, transitar pelo menos por três campos que contribuem
para a definição de seu lugar social: a condição de "não-crianças", a condição de
excluídos da escola e a condição de membros de determinados grupos culturais.
Com relação à condição de "não-crianças", esbarramos aqui com uma limitação
considerável da área da psicologia: as teorias sobre o desenvolvimento referem-se
as crianças. Os processos de construção de conhecimento e de aprendizagem dos
adultos são, assim, muito menos explorados na literatura psicológica do que aqueles
referentes às crianças e adolescentes. Palacios, em um artigo que sintetiza a
produção em psicologia a respeito do desenvolvimento humano após a
adolescência, comenta como a idade adulta tem sido tradicionalmente encarada
como um período de estabilidade e ausência de mudanças, e enfatiza a importância
de se considerar a vida adulta como etapa substantiva do desenvolvimento. Enfatiza
também a importância dos fatores culturais na definição das características da vida
adulta: "Se cada período da vida é suscetível de se identificar com uma série de
papéis, atividades e relações, não cabe dúvida de que a entrada no mundo do
trabalho e a formação de uma unidade familiar própria são identificadas como
papéis, atividades e relações da maior importância a partir do final da adolescência.
[...A forma como esses dois fenômenos ocorrem] e as expectativas sociais em torno
deles são claramente dependentes em relação a fatores históricos, culturais e
sociais." (Palacios, 1995: 315). No que diz respeito ao funcionamento intelectual do
adulto, o mesmo autor afirma que "as pessoas humanas mantêm um bom nível de
competência cognitiva até uma idade avançada (desde logo, acima dos 75 anos). Os
psicólogos evolutivos estão, por outro lado, cada vez mais convencidos de que o
que determina o nível de competência cognitiva das pessoas mais velhas não é
tanto a idade em si mesma, quanto uma série de fatores de natureza diversa. Entre
esses fatores pode-se destacar , como muito importantes, o nível de saúde, o nível
educativo e cultural, a experiência profissional e o tônus vital da pessoa (sua
motivação, seu bem estar psicológico...). É esse conjunto de fatores e não a idade
cronológica per se, o que determina boa parte das probabilidades de êxito que as
pessoas apresentam, ao enfrentar as diversas demandas de natureza cognitiva."
(Palacios, 1995:312) Embora nos falte uma boa psicologia do adulto e a construção
de tal psicologia esteja, necessariamente, fortemente atrelada a fatores culturais,
podemos arrolar algumas características desta etapa da vida que distinguiriam, de
maneira geral, o adulto da criança e do adolescente. O adulto está inserido no
mundo do trabalho e das relações interpessoais de um modo diferente daquele da
criança e do adolescente. Traz consigo uma história mais longa (e provavelmente
mais complexa) de experiências, conhecimentos acumulados e reflexões sobre o
mundo externo, sobre si mesmo e sobre as outras pessoas. Com relação a inserção
em situações de aprendizagem, essas peculiaridades da etapa de vida em que se
encontra o adulto quando não há menção explícita aos jovens, na verdade o sujeito
de que se fala aqui é mais especificamente o adulto. Isso faz com que ele traga
consigo diferentes habilidades e dificuldades (em comparação à criança) e,
provavelmente, maior capacidade de reflexão sobre o conhecimento e sobre seus
próprios processos de aprendizagem. Para além dessas características gerais,
entretanto, tratar o adulto de forma abstrata, universal, remete a um certo
estereótipo de adulto, muito provavelmente correspondente ao homem ocidental,
urbano, branco, pertencente a camadas médias da população, com um nível
instrucional relativamente elevado e com uma inserção no mundo do trabalho em
uma ocupação razoavelmente qualificada. Assim a compreensão da psicologia do
adulto pouco escolarizado, objeto de interesse da área de educação de jovens e
adultos, acaba sendo uma contraposição a esse estereótipo.
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

GRUPO 2 B – RELAÇÃO COM O CONHECIMENTO

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. Parecer CEB/00 p.


38-41.

X - As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação de Jovens e Adultos.

“Os princípios da contextualização e do reconhecimento de identidades pessoais e das


diversidades coletivas constituem-se em diretrizes nacionais dos conteúdos curriculares.
Muitos alunos da EJA têm origens em quadros de desfavorecimento social e suas
experiências familiares e sociais divergem, por vezes, das expectativas, conhecimentos e
aptidões que muitos docentes possuem com relação a estes estudantes. Identificar,
conhecer, distinguir e valorizar tal quadro é princípio metodológico a fim de se produzir uma
atuação pedagógica capaz de produzir soluções justas, eqüânimes e eficazes.
A contextualização se refere aos modos como estes estudantes podem dispor de seu tempo
e de seu espaço. Por isso a heterogeneidade do público da EJA merece consideração
cuidadosa. A ela se dirigem adolescentes, jovens e adultos cujas faixas etárias são
eloqüentes com suas múltiplas experiências de trabalho, de vida e de situação social, aí
compreendidos as práticas culturais e valores já constituídos. Diante dos ditames dos
pareceres considerados, a regra metodológica é: descontextualizá-los da idade escolar na
idade própria para, apreendendo e mantendo seus significados básicos, recontextualizá-los
na EJA. (...)
Uma das diversidades se expressa nos horários em que a EJA é oferecida, especialmente o
noturno. Se cansaço e fadiga não são exclusividade dos cursos da EJA, também métodos
ativos não são exclusividade de nenhum turno. Esta atenção não pode faltar também a
outros aspectos que se relacionam com o perfil do estudante jovem e adulto. A flexibilidade
curricular deve significar um momento de aproveitamento das experiências diversas que
estes alunos trazem consigo como, por exemplo, os modos pelos quais eles trabalham seus
tempos e seu cotidiano. A flexibilidade poderá atender a esta tipificação do tempo através de
módulos, de combinações entre ensino presencial e não – presencial e de uma sintonia com
temas da vida cotidiana dos alunos, a fim de que possam se tornar elementos geradores de
um currículo pertinente. É preciso conhecer qual o impacto dos meios de comunicação
sobre os estudantes. Pode-se dar, como exemplos, a procedência migratória de muitos e
seu gosto pelas manifestações das culturas regionais, derivando daí elementos significativos
para a constituição e sistematização de novos conhecimentos. Muitos estudantes de EJA,
face a seus filhos e amigos, possuem de si uma imagem pouco positiva relativamente a
suas experiências ou até mesmo negativa no que se refere à escolarização. Isto os torna
inibidos em determinados assuntos. Os componentes curriculares ligados à Educação
Artística e Educação Física são espaços oportunos e privilegiados para trabalhar a
desinibição e a baixa autoestima. Importante é também distinguir as duas faixas etárias
consignadas nesta modalidade de educação. Apesar de partilharem uma situação comum
desvantajosa, as expectativas e experiências de jovens e adultos freqüentemente não são
coincidentes. Estes e muitos outros exemplos deverão ser resignificados através do zelar
pela aprendizagem tal como disposto no art. 13 da LDB. Desse modo, os projetos
pedagógicos devem considerar a conveniência de haver classes homogêneas ou
heterogêneas para atender esta distinção. Impróprio é não perceber o perfil distinto destes
estudantes e tratar pedagogicamente os mesmos conteúdos como se tais alunos fossem
crianças ou adolescentes.
O momento privilegiado desta resignificação dos pareceres é o da elaboração e execução
dos projetos pedagógicos. O momento da elaboração do projeto pedagógico - expressão e
distintivo da autonomia de um estabelecimento - inclui o planejamento das atividades. A
organização dos estabelecimentos usufrui de uma flexibilidade responsável em função da
autonomia pedagógica. O projeto pedagógico resume em si (no duplo sentido de resumir:
conter o todo em ponto menor e tornar a tomar, sintetizar o conjunto) o conjunto dos
princípios, objetivos das leis da educação, as diretrizes curriculares nacionais e a pertinência
à etapa e ao tipo de programa ofertado dentro de um curso, considerados a qualificação do
corpo docente instalado e os meios disponíveis para pôr em execução o projeto.
No momento da execução, o projeto torna-se um currículo em ação, materializado em
práticas diretamente referidas ao ato pedagógico. Contudo, se muitos dos que buscam os
cursos supletivos da educação de jovens e adultos ou os cursos regulares noturnos são
prejudicados em seus itinerários escolares, não se pode reduplicar o prejuízo mediante uma
via aligeirada que queira se desfazer da obrigação da qualidade. Torna-se fundamental uma
formulação de projetos pedagógicos próprios e específicos dos cursos regulares noturnos e
dos cursos de ensino supletivo da educação de jovens e adultos.
Tais diretrizes assumem o ponto de vista do Parecer CEB 15/98 quanto a uma política de
qualidade dentro dos projetos pedagógicos. Estes associam-se ao prazer de fazer bem feito
e à insatisfação com o razoável, quando é possível realizar o bom, e com este, quando o
ótimo é factível. Para essa concepção estética, o ensino de má qualidade é, em sua feiúra,
uma agressão à sensibilidade e, por isso, será também antidemocrático e antiético. Neste
sentido, a EJA não pode sucumbir ao imediatismo que sufoca a estética, comprime o lúdico
e impede a inventividade.
Um momento específico desta referência é a recontextualização que se impõe à
transposição didática e metodológica das diretrizes curriculares nacionais do ensino
fundamental e médio para a educação de jovens e adultos. Neste sentido, a flexibilidade
posta no art. 23 da LDB aponta especificamente para, entre outras, uma organização
escolar que, com base na idade, poderá incluir a valorização da experiência extra – escolar
dos estudantes, segundo o art. 3 º X da mesma lei. Desse modo as experiências de vida do
aluno da EJA se qualificam como componente significativo da organização dos projetos
pedagógicos.
As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação de Jovens e Adultos se aplicam
obrigatoriamente aos estabelecimentos que oferecem cursos e aos conteúdos dos exames
das instituições credenciadas para tal.”

RIBEIRO, Vera Masagão. Educação de Jovens e Adultos: proposta curricular para o 1º


segmento do ensino fundamental. São Paulo/ Brasília: Ação educativa/MEC, 1997. P. 167-
169; 163-164

Os conhecimentos dos jovens e adultos e as aprendizagens escolares

“Jovens e Adultos com pouca ou nenhuma escolaridade anterior detêm uma grande
quantidade de conhecimentos sobre fenômenos naturais e sobre a dinâmica social,
econômica, política e cultural do mundo contemporâneo. Elaboram esses conhecimentos ao
longo de suas experiências de vida e trabalho, tendo já desenvolvido estratégias que
orientam suas condutas e hipóteses interpretativas relacionadas aos mais diferentes
aspectos da realidade. Suas vivências são também enriquecidas continuamente pelos meios
de comunicação de massa, que tornam acessíveis uma infinidade de informações sobre
fatos não imediatos à sua experiência. Com o acesso a novas informações e vivenciando
novas experiências, os jovens e adultos podem ir constantemente modificando a
compreensão que têm do mundo à sua volta.
Por vezes, entretanto, as vivências podem produzir uma compreensão muito parcial dos
fenômenos, ou as informações veiculadas pelo rádio e pela TV podem ser assimiladas de
forma mais ou menos desconexa. O estudo sistemático que se realiza na escola é uma boa
oportunidade para articular os conhecimentos de modo mais significativo e abrangente. Para
tal, os educandos precisam estabelecer conexões entre suas explicações e o conhecimento
escolar. Precisam relacionar os conteúdos escolares com aquilo que já conhecem. Muitas
vezes, seus esquemas de compreensão da realidade poderão ser enriquecidos ou
parcialmente modificados pelos conteúdos escolares; outras vezes, suas crenças ou
explicações deverão ser transformadas e, para tanto, eles precisarão convencer-se de que
uma nova explicação sobre um fenômeno é mais abrangente e significativa do que a que
eles tinham previamente.
É comum que os alunos memorizarem explicações e classificações científicas apresentadas
na escola como fatos isolados, pois não dominam ainda os conjuntos da disciplina científica
em que foram geradas essas explicações ou classificações. Quando isso acontece, eles
podem ser capazes de repeti-los ou utilizá-los de modo mecânico, sem entender o que
estão dizendo ou fazendo. Relacionar os conhecimentos científicos que a escola apresenta
com os conhecimentos prévios dos alunos é uma forma de garantir a memorização
compreensiva, a assimilação de conteúdos que o aluno realmente aprende porque se
incorporam à sua rede de conhecimentos. É uma forma também de evitar que os alunos
trabalhem com uma lógica dicotômica, separando conhecimentos que servem só para a
escola de conhecimentos que servem para a vida.
(...) É bastante possível que educandos jovens e adultos resistam mais do que as crianças a
explicitarem suas idéias. Muitas vezes, esses educandos não têm clareza que possuem
conhecimentos sobre os conteúdos escolares e reconhecê-lo pode ser o primeiro passo da
sua aprendizagem. Outras vezes, podem não identificar seu saber como adequado ao
espaço escolar e sentir receio de verbalizá-lo no grupo. Por esses motivos é fundamental
que o educador dedique atenção especial à criação de ambientes pedagógicos favoráveis
que estimulem os alunos a exporem suas idéias por meio de diversos tipos de linguagens.
(...) A complexidade da vida moderna e o exercício da cidadania plena impõe o domínio de
certos conhecimentos sobre o mundo a que jovens e adultos devem ter acesso. Os
conhecimentos deverão favorecer uma maior integração dos educandos em seu ambiente
social e natural, possibilitando a melhoria de sua qualidade de vida. Faz-se necessário,
porém, superar certa visão utilitarista da educação de jovens e adultos, baseada no suposto
de que os interesses dos educandos estão restritos às suas experiências imediatistas. A
pesquisa e a prática educativa revelam que eles se interessam tanto pelas questões
relativas à sua sobrevivência cotidiana como por temas aparentemente distantes como a
origem do universo, o desenvolvimento da informática ou a eclosão de conflitos religiosos
em outros continentes. Podemos nos surpreender com o prazer que sentem em fruir e
exercitar as diversas formas de arte e sua grande motivação para participar de atividades
que instiguem a imaginação.
Nessa perspectiva, além de propiciar o acesso a informações relativas às suas vivências
imediatas, espera-se estimular o interesse dos educandos por abordagens mais
abrangentes sobre a realidade.”

RIBEIRO, Vera Masagão. A formação de educadores e a constituição da educação de


jovens e adultos como campo pedagógico. In: Revista Educação & Sociedade, ano XX, nº
68, dez.1999. p. 184 - 201

“(...) Em um estudo sobre tendências curriculares do ensino de suplência, Jóia et al (1999)


identificam três idéias-força que impulsionaram as tentativas de construir a identidade dessa
modalidade educativa. A primeira consiste no reconhecimento dos jovens e adultos a que
essa educação se destina como membros das classes populares, segmentos excluídos não
só do sistema escolar regular, mas de outras instâncias de exercício de poder e acumulação
de recursos. Essa idéia remete à ênfase numa educação de adultos como prática política,
visando ao engajamento dos grupos populares em ações que transformem as estruturas
sociais produtoras da desigualdade e da marginalização. Outro vetor ideológico que dirige a
busca pela identidade dessa modalidade educativa consiste no enfoque privilegiado às
necessidades de aprendizagem de jovens e adultos, principalmente aquelas relacionadas à
sua inserção no mercado de trabalho, para o exercício da cidadania, para a promoção de
qualidade de vida e do convívio na comunidade e na família. Nesse caso, a funcionalidade
das aprendizagens escolares, ou seja, sua contextualização ou aplicabilidade no universo
cotidiano, emerge como questão central a ser equacionada. Finalmente, uma terceira linha
de abordagem seria a que considera a especificidade do modo de aprender de jovens e
adultos, os quais, em grau muito mais elevado do que às crianças já dispõem de um amplo
universo de conhecimentos práticos e concepções mais ou menos cristalizadas sobre
diversos aspectos da realidade social e natural. Em relação a esse ponto, o desafio seria
identificar a natureza desses conhecimentos práticos e desses supostos estilos cognitivos
próprios dos adultos, e investigar de que modo poderiam ser mobilizados para se adequar a
esse modo de pensar próprio que os jovens e adultos desescolarizados já teriam forjado ao
longo da vida.
(...) Compreender o que é específico do tipo de pensamento que a escola desenvolve é
fundamental para que os educadores não julguem erroneamente certas respostas dos
alunos adultos como respostas típicas de crianças. Se os alunos têm dificuldades em, por
exemplo, reagir a determinadas instruções da forma esperada, não é porque sofram de
algum retardo de desenvolvimento, mas porque não estão familiarizados com
procedimentos que são tipicamente escolares. É fundamental que os educadores entendam
que certas operações de tipo formal e mesmo certos estilos de aprendizagem – por
exemplo, os baseados na instrução verbal ou na explicação de procedimentos utilizados –
não são aquisições naturais de todos os seres humanos, mas dependem de um tipo
específico de exercício intelectual muito característico da prática escolar. Esse instrumental
teórico ajudaria também os educadores a distinguir mais claramente no que é que, de fato a
escolarização pode fazer diferença para jovens e adultos. Estariam mais aptos, assim, a
fazer escolhas pedagógicas mais acertadas diante da premência que caracteriza as
necessidades de aprendizagem de jovens e adultos, mediante suas condições reais de
dedicação aos estudos.
(...) Os jovens e adultos merecem experimentar novos meios de aprendizagem (...) que não
aqueles que provavelmente os impediram de levar a termo sua escolarização anteriormente.
(...)
Criar novas formas de promover aprendizagens fora dos limites da organização escolar
tradicional é uma tarefa, portanto, que impõe antes de mais nada um enorme desafio para
os educadores, principalmente no atual estágio de desenvolvimento das pesquisas sobre o
tema. Na verdade, romper o modelo de instrução tradicional implica um alto grau de
competência pedagógica, pois para isso o professor precisará decidir, em cada situação,
quais formas de agrupamento, sequenciação, meios didáticos e interações propiciarão o
maior progresso possível dos alunos considerando a diversidade que inevitavelmente
caracteriza o público da educação de jovens e adultos.”
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

GRUPO 2 C – PROCESSOS AVALIATIVOS

Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte. Caderno 3 – Educação de


Jovens e Adultos. Relatos de uma nova prática. Belo Horizonte: 1996

“Uma característica do conjunto de alunos é o resultado da relação entre o tempo de


escolarização e a habilidade para compreender e discutir os mais diferentes
assuntos. Ao assistirmos filmes, promovemos debates sobre assuntos como gênero,
raça, política, pudemos observar que os alunos com pouco tempo de escolarização
foram os que mais contribuíram na discussão. Alunos com mais tempo de vida
escolar e muitas vezes com bom domínio das disciplinas acadêmicas
(português/matemática) tiveram maior dificuldade em compreender filmes ou textos
sobre assuntos diversificados. A hipótese que temos levantado a esse respeito é
que os alunos adultos que tiveram experiência de multirepetência ou que saíram da
escola há muito tempo por motivos de sobrevivência trazem consigo as amarras do
sistema escolar e procuram a interpretação ‘correta’ para o filme ou para o texto.
Não trabalham com a hipótese de que em matéria de comunicação o necessário é
desenvolver as interpretações prováveis. Os alunos que, por sua vez, não estão, à
procura do acerto ou do mérito escolar advindos da resposta certa passam a
trabalhar nesse universo das interpretações prováveis. Esse processo de
“desamarrar” os alunos da procura do correto tem sido nosso objetivo nas
discussões de filmes e textos.” (p.34)

“(...) a mudança de lógica incide também sobre a avaliação, que deixa de ter cunho
punitivo e seletivo, passando a ser momento de reflexão e tomada de consciência do
processo de aprendizagem individual e coletivo.
Os instrumentos de avaliação também acompanham essa mudança de concepção,
sendo amplos e diversificados. Relatórios individuais, análise de problemas,
elaboração de documentos, produções de textos, são alguns dos instrumentos
utilizados, nessas experiências, para servir de análise e reflexão do processo vivido.
Outro aspecto fundamental que os relatos revelam é a necessidade de estar
socializando os olhares, as impressões, as análises. Colocar em xeque os vários
olhares – de alunos e professores – sobre o trabalho traz avanços e contribuições
efetivas para o redimensionamento do processo.
Assim, avaliar deixa de ser um instrumento de julgamento na mão dos educadores e
passa a ser fonte e forma de adquirir conhecimento. Nesse exercício o aluno adulto,
não tem o compromisso, apenas de demonstrar o que sabe, mas de opinar e
justificar sua opinião sobre o seu processo de aprendizagem. O professor participa
do processo “não para contabilizar, mas para organizar o que já foi aprendido e
dialogar.” A avaliação é vista, assim, como um exercício democrático de explicitação
e reflexão dos processos de aprendizagem vivenciados no cotidiano escolar.”
(p.108)
UFMG. Faculdade de Educação. Projeto Político Pedagógico da Fase de
Complementação do Ensino Fundamental do Profae. Belo Horizonte, 2000 (mimeo)

“A avaliação têm-se constituído historicamente em instrumento de aferição do nível de


excelência dos alunos, com uma hierarquização dos resultados em termos de êxito e
fracasso, com a penalização e culpabilização dos que estão situados abaixo de uma
média idealizada, como se todos pudessem aprender tudo, no mesmo ritmo, em tempos
parecidos, como se as condições de saída não fossem dadas por determinações sócio-
históricas e como se o processo de avaliação tivesse regras claras e objetivas. Não se
pode esquecer que estaremos lidando com alunos que sofreram algum processo de
exclusão de um tempo continuado de escolarização, por diversos motivos, e que os
processo de avaliação não podem contribuir para mais uma forma de excludência.
Em oposição a uma idéia de excelência pode-se dizer que uma função formativa da
avaliação seria a de regulara as aprendizagens, fazendo com que os professores
tenham atitudes diferenciadas, frente as aprendizagens em curso, e possam investir na
melhoria do processo. A concepção de avaliação da “Escola Plural” é um bom exemplo
de avaliação formativa e é evidenciada pelo menos três eixos: a continuidade da
avaliação e seu caráter permanente; a dinamicidade dada pela utilização de diversos
instrumentos e sujeitos envolvidos e, finalmente, seu caráter investigativo, tendo em
vista que visa levantar e mapear dados para a compreensão do processo do aluno e
oferecer subsídios para que o professor reflita sobre a sua prática pedagógica.
O projeto contará com duas vertentes de avaliação, articuladas entre si, quais sejam: a
avaliação do projeto como um todo e a avaliação da evolução do aluno participante.
Sobre a avaliação dos alunos trabalha-se com uma concepção processual e formativa
que leve me conta tanto o desenvolvimento individual dos alunos – sua progressão no
processo – como a avaliação do grupo e do grupo em relação às propostas do projeto.
Uma concepção formativa da avaliação implica em que os alunos estejam envolvidos na
análise do seu desenvolvimento e que os professores tomem as diferentes estratégias
de avaliação como uma forma de reconduzir o processo de cada um e do grupo e refletir
sobre o trabalho realizado. Assim, os diversos instrumentos criados, têm uma função de
informar sobre determinada situação para tomada de decisão sobre o encaminhamento
do curso sobre os progressos dos alunos, esses mediados também por objetivos que se
quer atingir.
Através de observação e registro, os professores e alunos podem criar estratégias tais
como: debate, exercício escrito, construção de produtos finais/ dossiês em que se possa
perceber a evolução do aluno ou do grupo, atividades de revisão de tarefas ou de
projetos para tomada de consciência dos aspectos cognitivos, procedimentais e entre
outros, diário de campo onde o professor poderá anotar dados básicos relacionados aos
alunos.
Alguns instrumentos como registros escritos individuais, por exemplo, prestam-se
melhor a verificação de aspectos cognitivos ligados a conhecimentos e conceitos; a
observação sistemática ou assistemática ou do grupo de alunos permite verificar melhor
o desenvolvimento de habilidades tais como o desempenho comunicativo, a
demonstração de raciocínios, a capacidade de trabalhar coletivamente, a liderança, a
aprendizagem de um procedimento. O debate ou discussão em classe são outra fonte
de informação sobre os alunos, desde que o professor saiba o que observar
concretamente, ou qual aluno observar com mais atenção. Os critérios de
acompanhamento do aluno devem ser claros e explícitos tanto para o professor quanto
para o aluno. Daí a necessidade da construção de instrumentos que possibilitem
comentar, rever e registrar o acompanhamento do desenvolvimento pessoal e coletivo
do estudante, dando ao professor uma imagem global do processo vivido e, ao aluno,
visibilidade e clareza naquilo que está sendo avaliado.” (p.91,92,93)
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

EIXO 3 – CONCEPÇÃO DE EJA - Grupo 3 A


DA CONCEPÇÃO COMPENSATÓRIA À CONCEPÇÃO ANTECIPATÓRIA1

Na Europa está acontecendo uma mudança fundamental na visão e na prática da


educação de jovens e adultos, mudança que vai desde a CONCEPÇÃO
COMPENSATÓRIA à CONCEPÇÃO ANTECIPATÓRIA.
A concepção compensatória corresponde a uma concepção velha, e a concepção
antecipatória a uma nova concepção na educação.

Educação Compensatória
Podemos destacar três características da educação compensatória ou supletiva tão
presente, ainda, na educação de jovens e adultos:
A primeira característica é que a visão compensatória olha para o passado. As
políticas de Educação de Jovens e Adultos se justificavam porque as pessoas
tiveram pouca ou má escolarização, ou seja, um nível baixo de educação escolar.
Os tradicionais cursos de suplência e supletivo se fundamentam nesta concepção
compensatória do passado. E a prática que dominou por décadas em todos os
países.
A segunda característica da concepção compensatória é supor que se a
necessidade de educação de jovens e adultos é provocada pela má ou pouca
escolarização tida no passado, a solução está em garantir escolarização de
qualidade na educação fundamental. Em outros termos, essa concepção pensa que
as reformas na educação fundamental resolvem de vez o problema da necessidade
de educação de jovens e adultos.
Para não ter que compensar, suprir a educação não recebida no passado, a
prioridade é a reforma escolar - melhoremos agora a educação básica, para acabar
com a suplência. Itália, Grécia e Portugal tinham este tipo de política de educação.
Até 1987, a Espanha também tinha essa visão. Nos últimos anos sentiu-se a
necessidade de fazer uma mudança de mentalidade na maioria dos países.
A terceira característica da concepção compensatória supletiva tem como
fundamento a idéia de que há uma idade apropriada para a aprendizagem. É o
pensamento de que aprendemos melhor quando somos crianças e que quando nos
tornamos adultos aprendemos menos! A infância e a adolescência seriam os tempos
apropriados para aprender. A vida adulta é tempo de praticar o aprendido, de
trabalhar.
Esta concepção supletiva ainda está muito arraigada nas políticas educacionais e na
prática de muitos profissionais. Estaria sendo superada em outros países?

1
Nos permitimos reproduzir livremente as reflexões feitas em encontro realizado no CAPE/SMED entre os
professores de jovens e adultos da Rede Municipal de Belo Horizonte e o Professor Ramón Fecha, Barcelona.
Educação Antecipatória
A educação de jovens e adultos está sendo repensada na maioria dos países a
partir de uma nova concepção. É a concepção antecipatória que supera essas três
características ou justificativas da visão compensatória ou supletiva. Por que a
concepção antecipatória passa a orientar as políticas educacionais?
Em primeiro lugar, porque as políticas educacionais pensam nos jovens e adultos no
presente e no futuro, não nas carências acumuladas no seu passado. O que importa
é sua condição de vida, como cidadão e trabalhador, como pessoa no presente e no
futuro.
No final da década de 80 fomos convencendo-nos que o jovem de 18 - 20 anos será
o adulto do ano 2.000. Olhamos para o futuro e não para o passado dos educandos.
A necessidade da educação de jovens e adultos justifica-se olhando para o futuro de
uma nova sociedade, da sociedade de que necessitamos. O que os jovens
aprendem e tem de aprender depende do que a sociedade de seu tempo lhes
demanda, lhes pede. Temos que melhorar sua educação, temos que capacitá-los
mais porque a sociedade exige mais.
Por exemplo, antes dos anos 90, acreditava-se que teria que haver mais educação
de jovens e adultos nos países subdesenvolvidos, onde muitos não completaram a
educação fundamental. Infelizmente, não é assim. No Japão, por exemplo,
aumentou e é muito boa a educação de jovens e adultos.
Na Espanha houve uma explosão na educação de jovens e adultos, em pouco
tempo, passou-se de 6% para 14%. Este fato está ocorrendo em toda a Europa, a
sociedade de informação está sendo mais valorizada, está mudando rapidamente a
vida das pessoas e aumenta a necessidade de reeducar os jovens e adultos.
Em segundo lugar não se confirma a expectativa de que melhorando a educação
básica seria reduzida a demanda de educação de jovens e adultos. As reformas
educacionais dos anos 70 expandiram a escolarização. Entretanto, não
solucionamos o problema da demanda de educação de jovens e adultos, pelo
contrário, o fizemos maior, mais grave. porque com mudanças tão grandes na
sociedade. o nível de informação vai subindo, O nível de informação proporcionado
pela escola até 1980 era um. O nível de informação que a educação proporciona
agora, nos anos 90, é outro. E maior um fato que pode ser comprovado. Mas a
escola não dá conta do crescimento de informações que a sociedade produz e
demanda. A juventude e a vida adulta passam a ser tempos de aprendizado de
informações e de saberes novos. Além dos aprendidos no tempo da educação
fundamental. Quanto maior a percentagem de adolescentes que completam a
educação fundamental e quanto melhor a qualidade dessa educação, maior a
capacidade de incorporar novas informações e maior a demanda de novas
informações na juventude e na vida adulta.
Em terceiro lugar as teorias pedagógicas avançaram e atualmente não se aceita que
apenas a infância e a adolescência sejam idades da aprendizagem e que a
juventude e a vida adulta não sejam mais idades de aprendizagem. Toda idade é
apropriada para educar-se: não é verdade que uma criança de 10 anos aprenda
mais que uma pessoa de 60 ou 70 anos. Em cada idade há uma aprendizagem
diferente. Aprendemos distintamente em cada idade, mas não mais ou menos. É um
ponto a ser trabalhado na nossa tradição pedagógica.
Novas Políticas de Educação de Jovens e Adultos
Há uma tendência a que esta concepção antecipatória, e não mais compensatória,
oriente as políticas e as práticas de educação de jovens e adultos. Da concepção
antecipatória (ou antecipadora) surgiram avanços que estão orientando a prática dos
educadores.
Cada vez mais, propostas estão centradas nos educandos, na sua condição de
jovens e adultos, orientadas pela confiança na capacidade das pessoas que
freqüentam as aulas. O que mais provoca a aprendizagem nas pessoas é o fato de
acreditarmos nelas, em sua capacidade de percepção e aprendizagem. E uma
“profecia que se cumpre”. Se acreditamos que a pessoa vá aprender muito, ela
aprende, se não acreditamos, ela não aprende. Todas as pesquisas estão nos
levando a crer que uma pessoa normal aumenta sua inteligência até os 60, 65 anos.
Cada vez mais é dada centralidade aos processos de apreensão do conhecimento
próprios do jovem e adulto. Em que tempos e espaços o adulto aprende? Uma
pessoa de 25 anos, por exemplo, no 1º grau, quantas horas tem para aprender se a
compararmos com as crianças?
Uma criança de 8 anos, por exemplo, tem 180 dias ao ano, 4 horas ao dia, mais as
horas que dedica a fazer os exercícios, os deveres de casa. Um adulto que tenha 2
anos de suplência ou supletivo, por exemplo, terá muito menos tempo de estudo.
Tem de trabalhar. Ele não pode ser tratado na mesma lógica das crianças que se
submetem a aulas de Matemática, História, Ecologia, por exemplo. Para o jovem e o
adulto não podemos ter a mesma lógica. Temos que incorporar os outros tempos de
aprendizado, que são mais ricos do que as experiências da infância.
Os adultos gastam várias horas da semana em entretenimento, vídeo, televisão,
trabalho, militância etc.. Estas experiências são educativas, trazem informações,
aprendizados que eles levam aos tempos de aula. Como incorporá-los, organizá-
los? Qual a relação específica do adulto com o conhecimento? Por exemplo, nas
horas de lazer assistem a filmes, e, entre estes filmes alguns de conteúdo histórico.
Mas não se fixam no conteúdo histórico dos mesmos. Que poderíamos fazer? É
comum haver, nos Centros de Educação para adultos, uma sala, ou uma biblioteca
com uma enciclopédia. Que poderíamos fazer para levar estes adultos a consultá-
la? Como podemos incorporar esses tempos formadores na educação de jovens e
adultos?
Nas aulas de História, por exemplo, primeiro podemos passar o filme juntamente
com um questionário. Os alunos assistem e respondem às perguntas. No segundo
momento, outro questionário e os alunos necessitarão da consulta à enciclopédia.
Haverá um terceiro momento onde se fará um trabalho de grupo sobre a consulta à
enciclopédia. Em síntese, o adulto aprende incorporando os diversos tempos de
experiência, de trabalho e cultura no projeto de educação escolar.
Podemos constatar ainda que a funcionalidade é outra característica da educação
atual de jovens e adultos. As pessoas que vêm aprender, não são somente
estudantes, são trabalhadores, fazem outras coisas. As pessoas tentam melhorar de
emprego ou buscam outro emprego. Estes cursos devem ser funcionais, devem
servir para o projeto de vida do jovem e adulto.
No primeiro dia de aula de alfabetização, por exemplo, a pessoa deve levar para
casa algo que aprendeu, seu nome, por exemplo. Do contrário, abandonará as
aulas. Voltando à funcionalidade: para explicarmos o corpo humano a um adulto, por
exemplo, como podemos motivá-lo? Explicando o esqueleto e os nomes dos ossos e
dos músculos? Isto não serve para nada. Que interesse há para as pessoas em
aprender esses nomes? O melhor será partir de uma vontade de ser informado
sobre as doenças, por exemplo. Falar de doenças pode ser uma forma de
interessar-se sobre o corpo. Os centros de educação para adultos podem chamar os
médicos dos centros de saúde e os médicos do planejamento familiar para dar aulas
aos adultos. Os adultos que vêm no primeiro dia chamam outros colegas para o
segundo dia, os do 2º dia chamam outros para o 3º dia de aula e assim por diante.
É preciso levar em conta as capacidades adultas para aprender. Muitos adultos têm
muita dificuldade porque o conteúdo das aulas está muito distante do seu cotidiano e
dos saberes que dominam. Não por que o adulto tenha menos capacidade de
aprender. Tem formas diferentes de relacionar-se com o conhecimento.
Por exemplo, uma pessoa responsável pela compra ou venda de material para uma
loja, ou um funcionário vendedor de uma padaria, sabe somar, multiplicar, porém
com uma lógica diferente da que lhe é exigida na aula de matemática. Com entender
sua lógica e avançar, em vez de ignorá-la?
Todas estas questões que foram levantadas mostram o quanto está sendo
interrogada a educação de jovens e adultos em outros países.
O encontro dos professores do CAPE com o professor Ramón Fecha, de Barcelona
permitiu uma oportunidade para continuar buscando novas concepções e novas
práticas de educação que dêem corda da especificidade na vida adulta como tempo
de formação.

Série Reflexões sobre a Prática Pedagógica na Escola Plural, Caderno 3, Educação


de Jovens e Adultos: Relatos de uma Nova Prática, Secretaria Municipal de
Educação Prefeitura de Belo Horizonte: Centro de Aperfeiçoamento dos
Profissionais de Educação Coordenação Político-Pedagógica
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

EIXO 3 - GRUPO 3 B - CONCEPÇÃO DE EJA

Fragmentos das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos,


Parecer CEB nº:11/2000, APROVADO EM:10.05.2000, Relator Conselheiro Carlos Roberto
Jamil Cury

“As novas competências exigidas pelas transformações da base econômica do


mundo contemporâneo, o usufruto de direitos próprios da cidadania, a importância
de novos critérios de distinção e prestígio, a presença dos meios de comunicação
assentados na micro-eletrônica requerem cada vez mais o acesso a saberes
diversificados. A igualdade e a desigualdade continuam a ter relação imediata ou
mediata com o trabalho. Mas seja para o trabalho, seja para a multiformidade de
inserções sócio-político-culturais, aqueles que se virem privados do saber básico,
dos conhecimentos aplicados e das atualizações requeridas podem se ver excluídos
das antigas e novas oportunidades do mercado de trabalho e vulneráveis a novas
formas de desigualdades. Se as múltiplas modalidades de trabalho informal, o
subemprego, o desemprego estrutural, as mudanças no processo de produção e o
aumento do setor de serviços geram uma grande instabilidade e insegurança para
todos os que estão na vida ativa e quanto mais para os que se vêem desprovidos de
bens tão básicos como a escrita e a leitura. O acesso ao conhecimento sempre teve
um papel significativo na estratificação social, ainda mais hoje quando novas
exigências intelectuais, básicas e aplicadas, vão se tornando exigências até mesmo
para a vida cotidiana.
Mas a função reparadora deve ser vista, ao mesmo tempo, como uma
oportunidade concreta de presença de jovens e adultos na escola e uma alternativa
viável em função das especificidades sócio-culturais destes segmentos para os
quais se espera uma efetiva atuação das políticas sociais. É por isso que a EJA
necessita ser pensada como um modelo pedagógico próprio a fim de criar
situações pedagógicas e satisfazer necessidades de aprendizagem de jovens e
adultos.
Esta função reparadora da EJA se articula com o pleito postulado por inúmeras
pessoas que não tiveram uma adequada correlação idade/ano escolar em seu
itinerário educacional e nem a possibilidade de prosseguimento de estudos. Neste
momento a igualdade perante a lei, ponto de chegada da função reparadora, se
torna um novo ponto de partida para a igualdade de oportunidades. A função
equalizadora da EJA vai dar cobertura a trabalhadores e a tantos outros segmentos
sociais como donas de casa, migrantes, aposentados e encarcerados. A reentrada
no sistema educacional dos que tiveram uma interrupção forçada seja pela
repetência ou pela evasão, seja pelas desiguais oportunidades de permanência ou
outras condições adversas, deve ser saudada como uma reparação corretiva, ainda
que tardia, de estruturas arcaicas, possibilitando aos indivíduos novas inserções no
mundo do trabalho, na vida social, nos espaços da estética e na abertura dos canais
de participação. Para tanto, são necessárias mais vagas para estes "novos" alunos e
"novas" alunas, demandantes de uma nova oportunidade de equalização. (pág. 8).
(...) “Não se pode considerar a EJA e o novo conceito que a orienta apenas como
um processo inicial de alfabetização. A EJA busca formar e incentivar o leitor de
livros e das múltiplas linguagens visuais juntamente com as dimensões do trabalho e
da cidadania. Ora, isto requer algo mais desta modalidade que tem diante de si
pessoas maduras e talhadas por experiências mais longas de vida e de trabalho.
Pode-se dizer que estamos diante da função equalizadora da EJA. A eqüidade é a
forma pela qual se distribuem os bens sociais de modo a garantir uma redistribuição
e alocação em vista de mais igualdade, consideradas as situações específicas.
Segundo Aristóteles, a eqüidade é a retificação da lei onde esta se revela
insuficiente pelo seu caráter universal. (Ética a Nicômaco, V, 14, 1.137 b, 26). Neste
sentido, os desfavorecidos frente ao acesso e permanência na escola devem
receber proporcionalmente maiores oportunidades que os outros. Por esta função, o
indivíduo que teve sustada sua formação, qualquer tenha sido a razão, busca
restabelecer sua trajetória escolar de modo a readquirir a oportunidade de um ponto
igualitário no jogo conflitual da sociedade.(pág. 8 a 9)
“A educação, como uma chave indispensável para o exercício da cidadania na
sociedade contemporânea, vai se impondo cada vez mais nestes tempos de
grandes mudanças e inovações nos processos produtivos. Ela possibilita ao
indivíduo jovem e adulto retomar seu potencial, desenvolver suas habilidades,
confirmar competências adquiridas na educação extra-escolar e na própria vida,
possibilitar um nível técnico e profissional mais qualificado.
Nesta linha, a educação de jovens e adultos representa uma promessa de efetivar
um caminho de desenvolvimento de todas as pessoas, de todas as idades. Nela,
adolescentes, jovens, adultos e idosos poderão atualizar conhecimentos, mostrar
habilidades, trocar experiências e ter acesso a novas regiões do trabalho e da
cultura. Talvez seja isto que Comenius chamava de ensinar tudo a todos. A EJA é
uma promessa de qualificação de vida para todos, inclusive para os idosos, que
muito têm a ensinar para as novas gerações. Por exemplo, o Brasil também vai
conhecendo uma elevação maior da expectativa de vida por parte de segmentos de
sua população. Os brasileiros estão vivendo mais. Segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), o número de brasileiros com mais de 60 anos estará
na faixa dos 30 milhões nas primeiras décadas do milênio. É verdade que são
situações não generalizáveis devido a baixa renda percebida e o pequeno valor de
muitas aposentadorias A esta realidade promissora e problemática ao mesmo
tempo, se acrescenta, por vezes, a falta de opções para as pessoas da terceira
idade poderem desenvolver seu potencial e suas experiências vividas. A consciência
da importância do idoso para a família e para a sociedade ainda está por se
generalizar.
Esta tarefa de propiciar a todos a atualização de conhecimentos por toda a vida é a
função permanente da EJA que pode se chamar de qualificadora. Mais do que
uma função, ela é o próprio sentido da EJA. Ela tem como base o caráter
incompleto do ser humano cujo potencial de desenvolvimento e de adequação pode
se atualizar em quadros escolares ou não escolares . Mais do que nunca, ela é um
apelo para a educação permanente e criação de uma sociedade educada para o
universalismo, a solidariedade, a igualdade e a diversidade. (pag. 9 a 10 )
“Na base da expressão potencial humano sempre esteve o poder se qualificar, se
requalificar e descobrir novos campos de atuação como realização de si. Uma
oportunidade pode ser a abertura para a emergência de um artista, de um intelectual
ou da descoberta de uma vocação pessoal. A realização da pessoa não é um
universo fechado e acabado. A função qualificadora, quando ativada, pode ser o
caminho destas descobertas.
Este sentido da EJA é uma promessa a ser realizada na conquista de
conhecimentos até então obstaculizados por uma sociedade onde o imperativo do
sobreviver comprime os espaços da estética, da igualdade e da liberdade. Esta
compressão, por outro lado, também tem gerado, pelo desemprego ou pelo avanço
tecnológico nos processos produtivos, um tempo liberado. Este tempo se configura
como um desafio a ser preenchido não só por iniciativas individuais, mas também
por programas de políticas públicas. Muitos jovens ainda não empregados,
desempregados, empregados em ocupações precárias e vacilantes podem
encontrar nos espaços e tempos da EJA, seja nas funções de reparação e de
equalização, seja na função qualificadora, um lugar de melhor capacitação para o
mundo do trabalho e para a atribuição de significados às experiências sócio-culturais
trazidas por eles.
A promessa de um mundo de trabalho, de vida social e de participação política
segundo as “leis da estética” está presente nas possibilidades de um universo que
se transforma em grande sala de aula virtual. O mundo vai se tornando uma sala de
aula universal. Assim, as realidades contemporâneas, ao lado da existência de
graves situações de exclusão, contêm uma virtualidade sempre reiterada: os
vínculos com uma cidadania universal. A nossa Lei Maior e a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional não se ausentaram desta perspectiva de encontro
entre uma concepção abrangente da educação com uma cidadania universal. A
primeira coloca a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade
como princípio de nossa República nas relações internacionais (art. 4 º , IX). A
segunda consigna, em seu art. 1º , um amplo conceito de educação que abrange os
processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana,
no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
A função qualificadora é também um apelo para as instituições de ensino e
pesquisa no sentido da produção adequada de material didático que seja
permanente enquanto processo, mutável na variabilidade de conteúdos e
contemporânea no uso de e no acesso a meios eletrônicos da comunicação .
Dentro deste caráter ampliado, os termos “jovens e adultos” indicam que, em todas
as idades e em todas as épocas da vida, é possível se formar, se desenvolver e
constituir conhecimentos, habilidades, competências e valores que transcendam os
espaços formais da escolaridade e conduzam à realização de si e ao
reconhecimento do outro como sujeito.” (pág. 10 a 11)
Disciplina: Educação de Jovens e Adultos – 7º período
Professora: Sheilla Brasileiro

EIXO 3 - GRUPO 3 C –
A EJA COMO ESPAÇO SÓCIO-CULTURAL

DAYRELL, Juarez Tarciso. (1989) De olho na escola:As experiências educativas na


ótica do aluno-trabalhador.Belo Horizonte(Dissertação de Mestrado):UFMG/FaE

“A existência de um espaço de encontro, assim como de diversas atividades dentro


e fora de sala, os trabalhos realizados em grupo, as assembléias de aluno, as
dramatizações etc., tudo isso fez com que muitos fossem adquirindo e/ou
aperfeiçoando a capacidade de reflexão, de abstração, de elaboração verbal, do
saber duvidar, questionar, indagar, habilidades fundamentais em todas as
dimensões da vida.[...] Para eles, a escola foi o espaço prioritário para aprender e
exercitar tais habilidades, que, sendo internalizadas, são aplicáveis em qualquer
dimensão da vida cotidiana.” (p.322).

“Mesmo levando em consideração o peso do saudosismo, é possível apreender que


na representação destes alunos trabalhadores, a escola coloca-se com um espaço
de reflexão sobre si mesmo, de levantamento de dúvidas e de indagações, de
ampliação das curiosidades. E não só. Mas também de conhecer o ´mundo e a
política´, ou seja, refletir sobre a organização social e sua lógica. E, com este leque
mais amplo, redefinir os caminhos da vida. Nesse sentido, podemos compreender
que a escola tem a faculdade de ´apontar caminhos´, de ampliar as perspectivas de
vida.” (p.319).

DAYRELL, Juarez Tarciso. (1996) A escola como espaço sócio-cultural.


In:____.(org.). Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: Editora
da UFMG, 1996, p. 136-161.

“[...] os alunos que chegam à escola são sujeitos sócio-culturais, com um saber, uma
cultura, e também com um projeto, mais amplo ou mais restrito, mais ou menos
conscientes, mas sempre existente, fruto das experiências vivenciadas dentro do
campo de possibilidades de cada um. A escola é parte do projeto dos alunos.
O que implicam estas considerações a respeito da diversidade cultural dos alunos?
Um primeiro aspecto a considerar é que a escola é polissêmica, ou seja, tem uma
multiplicidade de sentidos. Sendo assim, não podemos considera-la como um dado
universal, com um sentido único, principalmente quando este é definido previamente
pelo sistema ou pelos professores. Dizer que a escola é polissêmica implica levar
em conta que seu espaço, seus tempos, suas relações podem estar sendo
significados de forma diferenciadas, tanto pelos alunos, quanto pelos professores,
dependendo da cultura e projeto dos diversos sociais nela existentes”. ( p.144).
“Analisar a escola como espaço sócio-cultural significa compreendê-la na ótica da
cultura, sob um olhar mais denso, que leva em conta a dimensão do dinamismo, do
fazer-se cotidiano, levado a efeito por homens e mulheres, trabalhadores e
trabalhadoras, negros e brancos, adultos e adolescentes, enfim, alunos e
professores, seres humanos concretos, sujeitos sociais e históricos, presentes na
história, atores na história. Falar da escola como espaço sócio-cultural implica,
assim, resgatar o papel dos sujeitos na trama social que constitui, enquanto
instituição.
Este ponto de vista expressa um eixo de análise que surge na década de 80. Até
então, a instituição escolar era pensada nos marcos das análises macro-estruturais,
englobadas, de um lado, nas teorias das análises funcionalistas (Durkheim, Talcott
Parsons, Dreeben, entre outros), e, de outro, nas teorias da reprodução (Bourdieu e
Passeron, Baudelot e Establet, Bowles e Gintis, entre outros). Essas abordagens,
umas mais deterministas, outras evidenciando as necessárias mediações expõem a
força das macroestruturas na determinação da instituição escolar. Em outras
palavras, analisam os efeitos produzidos na escola pelas principais estruturas de
relações sociais que caracterizam a sociedade capitalista, definindo a estrutura
escolar e exercendo influências sobre o comportamento dos sujeitos sociais que ali
atuam.
A partir da década de 80, surgiu uma nova vertente de análise da instituição escolar,
que buscava superar os determinismos sociais e a dicotomia criada entre homem-
circunstância, ação-estrutura, sujeito-objeto. Essa vertente se inspira num
movimento existente nas ciências sociais, direcionado por um paradigma emergente
que, no dizer de Santos (1987), tem como característica a superação do
conhecimento dualista, expresso na volta do sujeito às ciÊncias: ‘O sujeito que a
ciência moderna lançará na diáspora do conhecimento irracional, regressa investido
da tarefa de fazer erguer sobre si uma nova ordem científica.’ O reflexo desse
paradigma emergente é um novo humanismo, que coloca a pessoa, enquanto autor
e sujeito do mundo, no centro do conhecimento, mas, tanto a natureza quanto as
estruturas estão no centro da pessoa, ou seja, a natureza e a sociedade são antes
de tudo humanas.
Nessa perspectiva, Espeleta e Rockwell (1986) desenvolvem uma análise em que
privilegiam a ação dos sujeitos, na relação com as estruturas sociais. Assim, a
instituição escolar seria resultado de um confronto de interesses: de um lado, uma
organização oficial do sistema escolar, que ‘define conteúdos da tarefa central,
atribui funções, organiza, separa e hierarquiza o espaço, a fim de diferenciar
trabalhos, definindo idealmente, assim, as relações sociais’; de outro, os sujeitos –
alunos, professores, funcionários, que criam uma trama própria de interrelações,
fazendo da escola um processo permanente de construção social. Para as autoras,
em ‘cada escola interagem diversos processos sociais: a reprodução das relações
sociais, a criação e a transformação de conhecimentos, a conservação ou destruição
da memória coletiva, o controle e a apropriação da instituição, a resistência e a luta
contra o poder estabelecido.’ (idem). Apreender a escola como construção social
implica, assim, compreende-la no seu fazer cotidiano, onde os sujeitos não são
apenas agentes passivos diante da estrutura. Ao contrário, trata-se de uma relação
em contínua construção, de conflitos e negociações em função de circunstâncias
determinadas. (p.136-137)

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