Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
FIGUEIREDO
FORMAÇÃO D@ EDUCADOR(A)
DIALÓGIC@ NUMA PERSPECTIVA
DECOLONIALIZANTE
CONSELHO EDITORIAL INTERNACIONAL E NACIONAL
_______________________________________________________________________
ISBN: 9786586218978
DOI: doi.org/10.52139/livrologia9786586218978
© 2022
Permitida a reprodução deste livro, sem fins comerciais,
desde que citada a fonte.
Impresso no Brasil.
SUMÁRIO
PREFÁCIO........................................................................................................................7
PRIMEIRAS PALAVRAS..............................................................................................11
(IN)CONCLUSÃO.......................................................................................................199
REFERÊNCIAS............................................................................................................201
AGRADECIMENTOS
G
ratidão à Deus, à Francisco de Assis, ao Cristo. Iluminam minha jornada
sempre... Gratidão aos mais diverses parceires que me constituíram. Sou
tecido por tanta diferente gente. Destaco minha gratidão à parceires de
todas as jornadas, caminhos, tramas, teias que me constituíram. Minha melhor e
mais profunda emoção é de GRATIDÃO! Tenho tanto a agradecer que sei que vai
além neste lugar de amor. Agradeço a cada parceire que trilhou minha jornada, seja
no âmbito pessoal, seja no contexto acadêmico. Quero agradecer a minhas com-
panheiras de caminho no âmbito afetivo, as minhas filhas e meus filhos, amiges e
companheires de jornada.
Quero agradecer a colegas de ontem e de hoje, do Colégio Estadual Liceu do
Ceará, do Colégio Anchieta em Maranguape, do colégio no bairro do seminário em
Crato, do colégio em Ubajara.... Agradecer a parceiros que se somaram nas políticas
sindicais com quem militei... Agradeço às(aos) Colegas do CECITEC, em Tauá; aos
parceiros de Pró-reitoria na UECE. Quero expressar meu agradecer à todes parcei-
res da UFC... Agradeço a todes parceires que conheci e com quem convivi ao longo
da minha longa jornada no âmbito da Educação Popular e da Educação Ambiental...
Mas, particularmente, agradeço a todes que colaboraram mais diretamente com esse
trabalho e com essa tese.
Finalizo minha gratidão a registrar meus agradecimentos a tantas pessoas que me
ajudaram com suas reflexões e apoios, tais como todes parceires do Gead.
Gratidão a tantas outras pessoas que anonimamente me ajudaram.....
Gratidão a todes amparadores espirituais que me deram tudo o que precisei, realmente.
Gratidão ao amado Paulo Freire que sempre esteve por perto a me inspirar, realmente.
5
PREFÁCIO
Ana Maria Iorio Dias1
A
o ler este livro, você se (re)encontrará com João Batista Albuquerque Fi-
gueiredo. Trata-se de adaptação de uma Tese apresentada como pré-requi-
sito para progressão funcional à Classe de Professor Titular, na Faculdade
de Educação da Universidade Federal do Ceará–UFC. Neles, no livro e na Tese, você
se emociona com a trajetória pessoal e profissional narrada pelo Professor João, com
sua “teia de relações” e “contradições”, nos voos traçados em seu sensível “labirinto
epistemológico” e espiritual...
A espiritualidade dialoga com o “eu” do Professor João, apoiado em autores como
Allan Kardec, Sri Aurobindo, Satya Say Baba, Paramahansa, Yogananda, além de São
Francisco de Assis. Mas esse ser inquieto, pesquisador exímio, se encontra também
com o adorável mestre Paulo Freire; a partir daí, política e educação passam a dialogar
com a espiritualidade. A inquietude permanece e o Professor João, caminhando pela
Educação Popular e Ambiental se articula com a abordagem da decolonialização... e
esse passa a ser o nosso tema gerador: Educação Dialógica e Formação d@ Educa-
dor(a) Dialógic@ (Popular/Ambiental), numa perspectiva Decolonializante.
Você se encantará, na Introdução, com as memórias e as narrativas do Professor
João. Você vai rever, na prática, pela vivência do autor deste livro, os vocábulos ge-
radores freireanos de conhecimento de mundo: LEITURA, para imaginar, criar, (se)
desenvolver; REFLEXÃO, para analisar, compreender, medi(t)ar, voltar-se sobre si
próprio(a); ESCRITA, para comunicar, sentir, expressar, compartilhar,...; DIÁLOGO,
para interagir, conviver, criar vínculos; RESISTÊNCIA, para combater as injustiças,
entender a realidade, libertar-se, para não se acostumar...; TRANSFORMAÇÃO, para
conviver, para avaliar e mudar, para educar e educar-se.
Ou seja, você verá que tudo isso significa ter a Educação como um ato de leitura
de mundo e como resistência à chamada “educação bancária” que ainda, nos atuais
dias, tentam nos incutir. É pela Educação que passamos da “consciência ingênua” para
a “consciência crítica”, através do diálogo com outros/outras, com métodos reflexivos
e críticos.
O Capítulo I explicita o diálogo, a dialogicidade, em perspectivas freireana, eco-
-relacional e interculturalidade crítica, apontando para a decolonialidade semeando
a formação docente. O diálogo contribui, de forma efetiva, para a consolidação de
trabalhos coletivos, colaborativos; estimular a dialogicidade numa perspectiva eco-
1
Professora aposentada da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC),-
doutora em Educação(UFC), com pós-doutorado em Educação (UnB).
7
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
8
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
9
PRIMEIRAS PALAVRAS
G
ratidão pela vida... Gratidão por estar aqui agora... Gratidão por poder co-
roar minha jornada com essa tese e com esse livro. Sim, é a colimação de
um processo que começou a muito, muito, muito tempo atrás. É todo um
processo que envolve a complexidade de um paradigma emergente, no contexto de
uma sociedade em trânsito que requer novos modos, novas lógicas, novas ideias, no-
vos procedimentos, novos protocolos, novos modelos, novas relações que nos consti-
tuem como novos seres.
Esse trabalho foi possível com o financiamento da Capes, Coordenação de Aper-
feiçoamento de Pessoal de Nível Superior, por meio de bolsa de pesquisa através do
Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD), ao qual fiz jus por seleção, realizada
através de edital do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Fede-
ral Fluminense. Na sequência, aprofundei estudos dando a conformação de tese para
concorrer a condição de professor titular da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Ceará. Esse rico material, agora transformado em livro, serve aqui para
consolidar uma obra que traz um contributo para o campo das ciências humanas, em
especial para a educação.
Destacamos ainda a importância da banca de tese de titular, constituída por reco-
nhecidas e qualificadas pessoas do cenário da educação brasileira, com ressonância
internacional, tais como: Danilo Streck, Reinaldo Matias Fleury, Valdo Barcelos,
Maria Isabel Filgueiras Lima Ciasca, Fátima Vasconcelos; Patrícia Helena Carva-
lho Holanda.
Bem, mas vamos ao texto. Saliento que Paulo Freire tem sido meu parceiro de de-
zenas de anos. E é ele que me ensina a iniciar essa escrita com uma leitura reflexiva das
palavras geradoras, dos conceitos, que constituem esse tema, essa teia, essa trama, esse
caminhar, esse semear, essa metamorfose, essa transmutação. Era um procedimento
habitual que lhe orientava a práxis comunicativa.
Dito isso, ao buscar no dicionário o significado de tese encontramos que seria
uma proposição que se apresenta ou expõe para ser defendida em público. Atual-
mente, é considerado principalmente o trabalho acadêmico que apresenta o resul-
tado de investigação complexa e aprofundada sobre temas mais ou menos amplos,
com abordagem teórica definida. Essa é nossa pretensão. Espero, sinceramente aten-
der a essa minha expectativa.
Ao utilizar tudo que disponho e tenho direito, resolvi ter um prefácio, seguido de
uma apresentação. Em geral um prefácio é feito por alguém de destaque social ou aca-
dêmico, nesse fito, temos a professora doutora e amiga querida, Ana Maria Iorio Dias.
Esta parceira que tanto me apoiou em tantas empreitadas, inclusive como pró-reito-
11
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
12
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
faltava, Diante desse fato, ele percebe que não ficara feliz. Teve um insight e percebeu
que sua inteireza e completude mais desejável, que lhe realizava como ser, acontece na
relação com as pessoas, com os seres, com a vida.
Somos seres de relação, frutos do diálogo. E isso nos proporciona realização, senso de
integralidade. E, nesses encontros dialógicos vamos ativar as potências que carregamos
para atualizar. Faz sentido o que é incorporado mediante as interações, os diálogos.
E, no instante transformador da tomada de consciência, vamos nos habilitando a
voar, a reconhecer mais amplamente a realidade, a fazer conexões, a criar borboletean-
temente. As parcerias, os saberes frutificados nos relacionamentos que costuramos, são
frutos dessa semeadura. Cultivar entre parceir@s2 e com parceir@s, permite que o ter-
reno seja limpo, as coivaras amontoadas para a combustão solar, o assero é consolidado.
Então, plantamos e cuidamos para que possam germinar as sementes, desabrochar em
seu tempo e então crescer, dar frutos, sombra...
Os exercícios das metáforas se tornam essenciais por alguns motivos: 1. Por ser uma
abordagem que contempla as características da maioria de nossos estudantes de licen-
ciaturas, regra geral, que, estaria identificada com a cultural oral e/ou residualmente oral
(FIGUEIREDO, 2003), como pude constatar em pesquisa de Pós-Doutorado em 2007,
realizada junto ao PPGE do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Cata-
rina; 2. Por estar mais próximo do real, da realidade do que o conceito ou categoria, mais
identificada com as representações que arrogantemente considera mais próximo da ob-
jetividade; por estar mais identificada com a dimensão do inconsciente, do imaginário,
do imagético, traz uma potência natural para ancorar e gerar um conhecimento válido
no contexto da equilibração majorante (PIAGET, 1970).
Bem, fechando o parêntese, muitas relações ocorreram nessa jornada. Já não sou
eu singular que vivo são muitos os que vivem em mim, por isso mesmo sou singular
e plural. Eu agora sou nós! Gonzaguinha disse isso lindamente... são muitas pessoas
que me fazem. Entretanto, por limites pessoais, psíquicos, temporais, espaciais, vou
destacar aqueles e aquelas que, nesse contexto, favorecem, dão pretexto ao texto que
agora lhes apresento.
Assim, vou lhes relatar fragmentos da minha jornada pessoal, focada no profissional
freireano que me tornei. Vou apresentar a teia de relações marcada por aparentes contra-
dições que vão se reordenando na densa trama do meu labirinto epistemológico, que se
fez casulo e me permitiu voar. Nela eclode Francisco de Assis, que me marcou ao abrir
minha sensibilidade e percepção para algo maior do que “eu”.
2
Utilizamos este símbolo @ para levantar a questão política e cultural do sexismo de nossa lin-
guagem, que transforma o masculino no genérico.
13
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
3
Hippolyte Léon Denizard Rivail (3 de out. de 1804 a 31 de mar. de 1869), foi um influente
educador francês, discípulo de Johann Heinrich Pestalozzi. Sob o pseudônimo de Allan Kardec,
notabilizou-se como o codificador do espiritismo.
4
Sri Aurobindo (15 de agosto de 1872 a 5 de dezembro de 1950), foi filósofo, poeta e naciona-
lista indiano. Depois se torna Yogue e Guru. Criou um método denominado de Yoga Integral.
5
Paramahansa Yogananda (5 de janeiro de 1893 a 7 de março de 1952) foi um iogue e guru
indiano. É considerado um dos mais influentes divulgadores das antigas tradições da Índia para
o Ocidente.
14
PRIMEIROS PASSOS NO CAMINHO
Ninguém educa a ninguém, ninguém educa a si mesmo ... (Paulo Freire, 1983; p. 68).
Em verdade, não seria possível à educação problematizadora, que rompe com os es-
quemas verticais característicos da educação bancária, realizar-se como prática da liber-
dade, sem superar a contradição entre o educador e os educandos. Como também não lhe
seria possível fazê-lo fora do diálogo. (Paulo Freire, 1983; 68).
E
ste texto é uma mistura de ensaio; pesquisa de livros, artigos, teses, disserta-
ções, recortes digitais, pesquisa on-line – que envolve a pesquisa na internet;
bem como nos oferece uma pesquisa empírica que serve de exemplos estru-
turantes para a minha tese e nesse livro aqui apresentados.
Mas afinal que tese é essa e qual seu intuito? Minha tese é que a Dialógica de Pau-
lo Freire, enquanto proposta oriunda da Teoria da Ação Dialógica, geratriz de uma
Educação Dialógica, oferece um contributo inestimável para a formação docente, com
aportes que trazem a pauta contemporânea temáticas essenciais para o processo de
ensino e aprendizagem, com destaque para os princípios dialógicos ou dialogais, para
a contextualização dialógica, a interculturalidade crítica, a decolonialidade educativa e
didático-pedagógica, o lugar de diálogo e a Teoria da ação dialógica de Paulo Freire....
16
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
17
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Objetivos Específicos:
- Investigar pressupostos epistemo-metodológicos decorrentes dos Estudos de
Paulo Freire, dos Estudos da Colonialidade/Modernidade (Decolonialidade) e da
Interculturalidade Crítica que possam contribuir com projetos de formação de
educador@s dialógicos.
- Identificar e sistematizar experiências de práticas didático-pedagógicas, conside-
radas dialógicas por graduand@s dos cursos das áreas de humanas da UFC e da
UFF, que possam ser reconhecidas como afins com os estudos de Paulo Freire, em
particular com a dialógica.
18
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
19
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Outro ponto demarcado foi que apresentaríamos uma proposta em que @s discentes
apontassem professor@s que tiveram práticas dialógicas de ensino para com eles, po-
rém sem explicitar o que significa o conceito. Queríamos que el@s pudessem escolher
com base no que consideram dialógica e ações dialógicas.
Na Universidade Federal Fluminense foram aplicados mais de 290 questionários,
em 08 turmas de Didática, com estudantes de diversos cursos, tais como: Pedagogia,
História, Letras, Educação Física, Matemática, Biologia. Aplicamos os questionários
e tivemos a indicação de 16 professor@s. Dest@s, foi possível realizar 14 entrevistas.
Na Universidade Federal do Ceará, apliquei ao todo mais de 550 questionários em
11 turmas de Didática que atende diversos cursos, tais como: Química, Física, Biologia,
Matemática, Teatro, Pedagogia, Ciências Sociais, Filosofia, História. Dele decorreram a
indicação de 35 professor@s. Destes tivemos a oportunidade de realizar 25 entrevistas...
Nesse recanto, atemporalmente, relato à chegada a UFF, no primeiro dia de en-
contro com o campo amoroso-afetivo da pesquisa empírica que compõe os resultados
concretos que trazem definições e indícios e pistas para a implementação de uma Edu-
cação Dialógica, de uma Formação Docente Dialógica, em seu sentido mais empírico.
Marca fortemente a paisagem que se depara depois da curva que nos abre o ho-
rizonte da Faculdade de Educação, no campus de Gragoatá. O verde que define os
contornos da paisagem abre a expectativa de experienciar essa oportunidade. Registro
a intensa e profunda gratidão desde este instante. Na verdade, remete ao momento de
nossa chegada à cidade do Rio de Janeiro e, em seguida, à Niterói. Reencontro com um
sentimento especial de encantamento e de boas recordações associadas à beleza cênica
e afetiva que nos conecta com este lugar. Era 07 de março de 2017.
Durante esta estadia proporcionada pelo PPGE e, em especial, por minha super-
visora e parceira de velhos carnavais, Maria Teresa Esteban do Valle, pude realmente
aproveitar para aprofundar estudos, revisitar lições e assimilar novas aprendizagens.
Abro um lugar para o registro de minha mais profunda homenagem (póstuma) à
Regina Leite Garcia. Ela me apresentou ao Grupo Alfa, à UFF, aos diálogos no cotidiano,
aos diálogos sobre diálogos. Esteve comigo desde o momento que antecedeu meu dou-
toramento e me acompanhou em muitos momentos. Registro minha profunda gratidão
a Paulo Freire, que me inspirou e este junto comigo em tantos momentos e continua a me
inspirar e colaborar com esse projeto de um mundo no qual seja possível amar...
Por circunstâncias alheias à minha vontade, precisei me hospedar em Copacabana,
ao invés de ficar em Niterói, como era meu desejo e plano. Mas isso também agregou
experiências e leituras diferenciadas nas quais me era possível observar de perto e de
longe esse campo de investigação. Ia em geral de ônibus executivo e descia próximo ao
terminal de barcas e me deslocava a pé até a Universidade. Ocasionalmente retornava
para o RJ de barca. Outra boa experiência a registrar.... ver o Rio e Niterói se aproxi-
mando, se distanciando e potencializando outros olhares e sentires...
Dia 28 de junho dei meu último mergulho nas águas de Copacabana antes de retornar
para a realização da pesquisa empírica na UFC. Destaco ainda que em julho participei
como consultor de avaliação da Avaliação Quadrienal da CAPES, em Brasília. Mo-
mentos de muita aprendizagem. Saliento que já vinha compondo a comissão de ava-
liação da área de educação desde 2016, tendo participado anteriormente da avaliação
dos APCN’s, dos livros e periódicos.
20
O CAMINHO EXPLICA O CAMINHAR
DIALÓGICO: MEU ENCONTRO COM PAULO FREIRE
F
oi uma Relação Amorosa e Significativa desde os primórdios... A ‘recordA-
ção’ que me vem sobre a gênese dessa relação dialógica com Paulo Freire se
apresenta encharcada de emoções, sentimentos, amores. Ela está associada a
um momento especial da minha vida pessoal.
Saliento que desde quando optei por uma trajetória acadêmica, minha escolha foi
por uma licenciatura plena na qual eu pudesse integrar educação e saúde, já que meu
projeto de vida era poder contribuir com as pessoas, em geral. Desde muito cedo re-
conheço uma necessidade de partilha, de tecer com as pessoas, de colaborar com o
projeto de integralidade humana.
Nesse percurso, me deparei com tradições espirituais que me ajudaram a pensar
uma perspectiva holística de educação e saúde. Nessa direção me apropriei de conhe-
cimentos orientais, da Yoga, do Budismo, das Artes Marciais. Fui um autodidata e pra-
ticante... Naturalmente, incorporei às minhas práticas educativas esses conhecimentos
que se tornaram saberes.
Na Universidade praticamente nada ouvi falar sobe propostas que incorporassem a
dimensão política. Na verdade, conheci essa dimensão no concreto da vida, pois ainda
sofri rebarbas do golpe militar em minha formação acadêmica. Uma figura que muito
me ajudou a pensar a política, em seu sentido mais amplo e profundo, foi Francisco de
Assis. Esse mestre, considerado santo por algumas pessoas, considerado um revolu-
cionário por outras, para mim foi um extraordinário indicativo para todas as dimen-
sões da minha vida. Entretanto, confesso que conhecer Paulo Freire foi um diferencial
e um marco importante. Com ele, pude compreender a relevância e a premência de se
integrar conscientemente a politicidade na práxis educativa.
Conheci Paulo Freire num momento especial, no período do nascimento de minha
filha Clara8. Naquele momento da vida, morava em Maranguape, cidadezinha serra-
na do interior, vizinha de Fortaleza – CE. Havia ido para Fortaleza com o intuito de
aguardar o momento do parto.
8
Curiosamente minha filha, Clara Figueiredo (2018), concluiu seu doutorado em Comunicação
e Arte na USP, no ano de 2018, poucos tempo depois de sua data de aniversário que coincide
com meu primeiro encontro com Paulo Freire, em 1987...
21
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
22
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
23
TRAÇANDO MARCOS NO CENÁRIO
CONTEMPORÂNEO: A RELEVÂNCIA DA
DIALOGICIDADE HOJE
T
udo começou em um tempo no qual buscava fundamentos mais consisten-
tes e balizados e respaldados por experts acerca da estrutura da Crise Eco-
lógica. Essa trajetória de Significação fortemente consolidado num Percurso
Desejante (FIGUEIREDO, 2003; 2007; 2017). Bem, essa crise demonstrou ser bem
mais grave e profunda. Constatei se tratar de uma Crise Civilizatória, Crise de escolhas
e rumos definidos por uma lógica que, posteriormente, reconheci se tratar de uma
Crise Colonializante (QUIJANO, 1991; 2005; LANDER, 2005; FIGUEIREDO, 2009a;
2010a; 2010b; WALSH, 2008; 2009).
Nessa vertente, a leitura da realidade é balizada por uma pretensão de se caracteri-
zar como moderna, unívoca, monoepistemológica, imperialista, eurocêntrica-estadu-
nidense, capitalista, mercadológica etc. (FIGUEIREDO, 2009a; 2010a; 2010b).
Encontrei no meu orientador de Mestrado, prof. Manfredo Araújo de Oliveira,
apoio essencial, em todos os sentidos e desejos. Ele colaborou com minha compreen-
são acerca da Fundamentação. Essa possibilita reconhecer as bases epistemológicas
para a crise colonializante do saber. E, para apoiar essas afirmativas, vou resgatar em
seu livro “Sobre Fundamentação” (OLIVEIRA, 1993), essas pontes.
Manfredo começa apresentando o entendimento clássico de Filosofia, no qual se
pretendia descer aos fundamentos da vida humana e de toda a realidade: “sua primeira
pergunta foi entre os primeiros filósofos gregos, pela arché pánton” (OLIVEIRA, 1993,
p. 11). Essa busca se dava na tentativa de responder à primeira e última pergunta que,
segundo Manfredo Oliveira, estariam subjacentes a todas as outras questões filosófi-
cas: “Qual o sentido do mundo? Qual o sentido de minha vida?”. Elas, certamente, nos
remetem ao destino humano do autoconhecimento como essência de todas as outras
buscas. Ao encontrar quem somos, percebemos para onde e como vamos...
Segundo Manfredo Oliveira, a Filosofia contemporânea vive o dilema de um tem-
po pós-filosófico – tendo em conta o sentido original da Filosofia. Esse tempo se carac-
teriza por se pautar por determinações impostas desde o chamado Círculo de Viena.
Para esses pensadores só se fez real progresso em Filosofia mediante posturas cientifi-
cistas, por meio de critérios da verificação empírica.
“Neste contexto de morte da filosofia, emerge [...]: a pragmática transcendental”
(OLIVEIRA, 1993, p. 14). Nela há o encontro de duas fortes tradições da modernida-
de: a revolução linguística e a revolução pragmática. Ainda que tenhamos alternativas
25
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
26
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
27
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
28
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
29
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
30
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
continuar esta batalhar, ante a um pagão atrás do outro. Quem é pagão na reali-
dade? Até que nenhum permaneça à exceção de nós dois. A este ponto, de quem
será a vitória?
Francisco: Que benefícios terá o ganhador?
Sultão: Se ganhar, então estarei seguro de que Alá será louvado e que todas as
pessoas o adorarão somente a ele.
Francisco: Então, me parece que neste caso não deseja a paz, senão só a vitória.
Sultão: E qual a diferença? Se pode pôr fim a este terrível fratricídio, por que isso é o
que é. O sabe? Se podemos parar esta matança sem sentido, teremos finalmente a Paz.
Francisco: Porém Sultão, não é possível que em sua mente não creia que a Paz é
uma simples vitória, que uma "Vitória" pode eliminar os conflitos, e sabe bem que
levará somente ao ódio e contínuas tentativas de vingança, e não a Paz. Você sabe
que não nem paz e nem vitória quando uma das partes "ganha".
Sultão: Vejo que tenho adiante de mim um inimigo maior do que devia ter imaginado!
Francisco: Tenho de frente só um irmão contra o qual combates.
Sultão: Se somente podemos atuar com consciência de que todos procedem do
mesmo criador. Se somente podemos ver a um e a outro através dos olhos do Gran-
de Santo.
Francisco: Agora tuas palavras têm sentido. Finalmente deixou de falar de vitórias
e está começando a falar da realidade.
Poderia trazer aqui também o diálogo de Francisco de Assis com o lobo de Gúbio,
em que ele convida o lobo a reconhecer sua filiação divina e, portanto, ser irmão dos
seres humanos, que desumanamente destratavam-lhe. Mas que seria possível outra re-
lação de respeito mútuo e que essa só teria vantagens para tod@s. Assim, o lobo aceita
estabelecer essa outra maneira de se relacionar. Ou ainda, poderia trazer o diálogo
mais detalhado acerca da Perfeita Alegria, em que Francisco de Assis nos convida a
transmutar nosso mundo interior ao acolher de forma amorosa as adversidades, tais
como se fossem irmãos/irmãs a nos ensinar. Nesse sentido, ele caminha junto com Frei
Leão e lhe pede para escrever o que seria a perfeita alegria. E conta de dois homens que
caminhavam no frio inverno da Úmbria, como de fato estavam fazendo, só que depois
de muito caminhar, cansados e com fome, chegam a um eremitério e lá lhes é negado
abrigo e comida. Eles insistem e são enxotados agressivamente. Diz ele que os homens
se erguem da gelada via e continuam mantendo aberto o coração para a amorosidade,
digo para o diálogo e o entendimento, e diz que isso é a perfeita alegria. Esse depoi-
mento se encontra presente em seus escritos registrados por Frei Leão.
31
CAPÍTULO I
O CAMINHANTE SEMEADOR
“Mudar a linguagem faz parte do processo de mudar o mundo. A relação entre lin-
guagem-pensamento-mundo é uma relação dialética, processual, contraditória”
(Paulo Freire, 1994, p. 68).
A
té aqui tanto falamos em diálogo, mas o que é diálogo realmente? Para co-
meçar a ensaiar respostas, nos propomos uma busca na internet. Ainda
que haja certa resistência acadêmica em considerar a Wikipédia, o Google,
entendemos que são instrumentos de busca intensamente requisitados. Certamente,
precisamos exercitar intensamente um cuidado ao fazer uso desse recurso, até por-
que nele há uma tessitura parceira de temas, ideias, significados, passíveis, portanto, a
equívocos. Por outro lado, há uma abertura para correções e aprimoramentos cons-
tantes. Optamos por começar daí...
Conforme a Wikipédia, a enciclopédia livre10, o diálogo é assim apresentado:
Diálogo (em grego antigo: διάλογος diálogos) é a conversação entre duas ou mais
pessoas, costuma-se dizer erroneamente que significa ‘dois’, no entanto significa
‘passagem, movimento’, assim, diálogo significa a troca de intervenientes, que po-
dem ser dois ou mais. Embora se desenrole a partir de pontos de vista.
Diálogo. substantivo masculino. 1. fala em que há a interação entre dois ou mais in-
divíduos; colóquio, conversa. 2. p.ext. contato e discussão entre duas partes (p.ex.,
em busca de um acordo); troca de ideias. 3. conjunto das palavras trocadas pelas
personagens de um romance, filme etc.; fala que um autor atribui a cada persona-
gem. 4. obra em forma de conversação, ger. com fins expositivos, explanatórios
ou didáticos. 5. mús composição em que as vozes ou os instrumentos se alternam
10
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Diálogo>. Acesso em: 07 fev. 2018.
11
Disponívelem: <https://www.google.com.br/search?client=firefox=-b&dcr0=&ei=6AGIWtDz4GmRwgT74QSYBg&q-
Di%C3%A1logo&oq=Di%C3%A1logo&gs_l=psy-ab.12..35i39k1l2j0l8.4328.6051.0.8799.7.7.0.0.0.0.278.993.0j-
5j1.6.0....0...1c.1.64.psy-ab..1.6.988...0i67k1j0i131k1.0.9HB7FbNCBlE>.Acessoem:17fev.2018.
33
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Etimologicamente o termo ‘Diálogo’ resulta da fusão das palavras gregas dia e lo-
gos. Dia significa ‘através’. Logos foi traduzida para o latim como ratio (razão). Mas
tem vários outros significados, como ‘palavra’, ‘expressão’, ‘fala’, ‘verbo’ e, principal-
mente, ‘significado’ propriamente dito. Na acepção mais antiga da palavra, logos
significa ‘relação’, ‘relacionamento’.
Diálogo [do gr. diálogos, pelo lat. dialogu.]. Substantivo masculino. 1.Fala entre duas ou
mais pessoas; conversação, colóquio. 2.Obra literária ou científica em forma dialogada.
3.Troca ou discussão de ideais, de opiniões, de conceitos, com vista à solução de
problemas, ao entendimento ou à harmonia; comunicação: Sua maior dificuldade
na vida vem de não ter diálogo com os filhos. 4.Teatr. Colóquio entre os atores, mó-
vel da ação da peça, a partir do qual se desenvolveu o gênero teatral. [Cf. dialogo,
do v. dialogar.].
Por sua vez, o conceito de dialógico aparece no Aurélio (1988) como derivado do
grego, dialogikós. Enquanto adjetivo associado ao conceito de dialogal. Entendido
como relativo ao diálogo. Já a palavra dialogia seria um substantivo.
Ao acessar o Dicionário Paulo Freire (STRECK; ZITKOSKI, 2008; 2015), o fizemos
em busca dos seguintes conceitos associados a dialógica, Alteridade, amorosidade e
Diálogo/Dialogicidade. Nessa obra, começamos por tratar da alteridade e da amo-
rosidade por reconhecer que elas são essencialmente vinculadas a dialógica. O trato
da alteridade tangencia necessariamente o diálogo, e nessa direção, Sérgio Trombetta
(2015) afirma que essa questão perpassa toda a obra freireana na certeza de que a al-
teridade define a constituição do ser... no diálogo, na aceitação do outro como pessoa.
Para Paulo Freire o ser humano, diz esse autor, é subjetividade. E a subjetividade se
consolida na relação dialógica. Nas palavras de Trombetta, enquanto para Sartre ‘os
outros são meu inferno’, para Freire o outro é o lugar no qual é possível começar, por
meio do diálogo amoroso, a humanização, a libertação. Por sua vez, Leoni Fernandes
(2008, p. 37) traça uma definição de amorosidade na qual se materializa o compromis-
so com o outro, pautado na solidariedade e na humildade. Em vários trechos, Leoni
Fernandes articula amorosidade e diálogo/Dialogicidade.
Jaime José Zitkoski (2008) se dedicou a apresentar o Diálogo/Dialogicidade no
dicionário Paulo Freire. Segundo ele, a proposta freireana se pauta no Diálogo/Dia-
logicidade, como uma das categorias centrais de seu projeto pedagógico crítico. Na
leitura desse intelectual, Freire no capítulo terceiro do ‘Pedagogia do Oprimido’ nos
oferece o diálogo como processo dialético-problematizador por meio do qual pode-
12
Disponível em: <http://escoladedialogo.com.br/escoladedialogo/index.php/sobre-o-dialo-
go/>. Acesso em: 17 fev. 2018.
34
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
mos ler a realidade e transformá-la. Nesse sentido, enfatiza que o diálogo implica em
práxis social. De acordo com esse autor, o diálogo freireanos começa com a busca do
conteúdo programático. “O desafio freireanos é construirmos novos saberes a partir
da situação dialógica que provoca a interação e a partilha de mundos diferentes...”
(ZITKOSKI, 2008, p. 131).
35
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Paulo Freire em seu primeiro livro publicado, “Educação como prática da liber-
dade”, ao homenagear seus pais, enfatiza a importância da dialógica: “Com ambos
aprendi, muito cedo, o diálogo”. Já na abertura da obra, em sua primeira página, inicia
tratando de ‘relações’ que, no seu entender, está essencialmente ligada à dialógica e a
conquista da liberdade:
36
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
37
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
ora caindo em idealismo inativo, ora em uma empiria sem o fermento da crítica de
reflexão.
Compreendemos, com Paulo Freire, a relação direta entre linguagem-pensamen-
to-mundo. Desse modo, interagindo com a linguagem enquanto mediadora e mate-
rializadora do pensar e da ação das pessoas no mundo, pode-se intervir e transmutar,
permanentemente, o mundo, o pensamento, a linguagem.
38
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
39
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
40
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
41
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Salientam ainda estes autores, que mesmo em seus primeiros escritos Freire já cha-
mava seu método de dialogal. Afirmo que Paulo Freire ao dialogar com esses autores:
Álvaro Vieira Pinto, Nicol, Jaspers, Barbu, Zevedei, Buber, enriquece suas reflexões
acerca do diálogo. Porém, o diálogo em Freire desde o princípio traz a marca do com-
promisso com @s oprimid@s, o propósito libertador. É certo que adquire algumas
peculiaridades. Mas aprofunda sua densidade e impacto sociopolítico de fundamental
relevância e poder transformador, transcendendo o próprio Buber, Bakhtin, dentre
outros. A palavra prenhe de significação que se corporifica no diálogo supera a con-
dição de instrumento carregando reflexão e ação simultânea. Ambas, materializadas
na palavra historicamente datada e situada, empoderam o diálogo e são a essência do
próprio diálogo.
Mais uma vez enfatizo que fiz opções, tendo em conta autores que mais aparecem
no trato do diálogo, da dialógica, da dialogia, nesse diálogo com Paulo Freire. Desses
autores, destacaram-se Martin Buber, Mikhail Bakhtin, David Bohm e dois autores
com menos indicação – mas que nos parece interessante citar, por se tratar de uma
articulação contemporânea. Seriam: Matthew Lipman, com sua comunidade de inves-
tigação, e Carl Rogers e sua psicologia humanista.... Antes, porém, vamos avançar um
pouco mais nos elementos conceituais e articuladores com o campo empírico.
42
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
LANDER, 2005; FIGUEIREDO, 2009A; 2009B; 2010), bem como às práticas docentes
e formadoras associadas às questões socioambientais (BARCELOS, 2008; LOUREIRO;
2004; LAYRARGUES, 2000; 2002; GUIMARÃES, 1995; 2000; FIGUEIREDO, 2007).
Diante da premência e pertinência de refletir acerca da formação d@ educador(a)
numa perspectiva dialógica, que contemplasse a dimensão popular e ambiental, fo-
mos levados a optar por esse trabalho. Constatamos que os processos de formação
de professor@s e as concepções nele envolvidas habitualmente têm gerado resulta-
dos insatisfatórios. Por sua vez, as relações entre as práticas pedagógicas e os saberes
docentes denunciam que os paradigmas hegemônicos na formação docente deixam
de atender devidamente às demandas educativas contemporâneas, marcada pelas
mudanças e incertezas...
Vemos uma predominância de projetos de formação docente que se apoiam na
lógica colonializante, conteudística, bancária (FREIRE, 1983), de transferência de co-
nhecimentos, tendo o professor como único detentor e depositário dos saberes. Mo-
delo este, ainda hegemônico, que se respalda numa perspectiva técnico-instrumental,
com ênfase na formatação de professor(a) para adaptar-se à sociedade e manter às de-
mandas do mercado e as regras de mercantilização, com toda a carga de exclusão que
a acompanha e a produz, tal como nos propõe os estudos de Frigotto (2001), Kuenzer
(2000) e Shiroma (2000). E, neste cenário, nos parece muito pertinente uma alternati-
va de formação para @ educador(a) numa perspectiva dialógica.
Assim, ao nos referirmos à formação de educador@s dialógic@s no contexto con-
temporâneo, a partir de interlocuções com temáticas associadas à interculturalidade
crítica e à Decolonialidade, com vistas a uma formação crítica, contextualizada e am-
bientalizada, buscamos atender a essa demanda efetiva e afetiva.
Isto leva a um repensar paradigmático acerca da própria condição de ser educa-
dor(a), de ser professor(a), da práxis educativa e da formação docente. E, como tal, no
reconhecimento da célebre frase freireana de que nos educamos na relação e mediati-
zados pelo mundo, temos a convicção de que outra dinâmica societária pode se dar e
que a educação tem importante papel neste processo.
Diante da u-topia de uma educação dialógica, cabe a busca de fundamentos que
tragam esta lógica diferente da hegemônica. Santos (2008) e Freire (1983) falam que
é preciso superar a linha abissal, a opressão que nega humanidade e induz miséria.
Estes autores nos apontam que o horizonte desejável deve emergir do desvelamento
da subalternização inerente à modernidade e do entendimento do oprimido de que é
autor de sua libertação.
Esta proposta traz inovações e originalidade, muito embora reconhecendo o muito
que já existe de produção acerca da formação docente, da educação popular, da edu-
cação ambiental. Afinal, mesmo que exista, no Brasil, um repertório considerável de
estudos, pesquisas e práticas pedagógicas, ainda há muito que produzir nestes campos
de conhecimento, ao ter em conta a dialogicidade, a educação dialógica.
Foi a partir das reflexões de Aníbal Quijano (1991) que os Estudos da Colonialida-
de/Modernidade se alargaram desde os Estados Unidos, centro e fulcro da moderni-
dade/colonialidade contemporânea, até alguns recantos, ainda privilegiados, na Amé-
rica Latina (AL). Estes estudos se integraram à outra emergente corrente de pesquisa
acerca da Interculturalidade, que também se estendem desde o berço do eurocentris-
43
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
44
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
45
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
15
Para maior aprofundamento acerca da gênese da Perspectiva Eco-Relacional, ver o estudo de
FIGUEIREDO (2003).
16
O círculo dialógico significa a tentativa de ampliar o conceito de círculo de cultura proposto
por Freire, ao incorporar as dimensões epistemológica, ontológica, social, relacional, afetiva,
hermenêutica e o diálogo como processo e produto, que se dá a partir das próprias experiências
dos humanos que se relacionam.
46
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
47
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
48
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
49
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Abrimos aqui uma breve digressão sobre uma das contribuições decorrentes dos
estudos de Bakhtin sobre a dialógica, que forjou o círculo bakhthiniano; a Análise
Dialógica do Discurso (ADD); como também a ideia de que ideologia se forma na
externalidade do indivíduo, se caracterizando como um signo, passível, portanto, de
se reconfigurar socialmente.
Em diálogo com autor@s que articulam uma interlocução entre Freire e estes ou-
tros autores citados, vamos encontrar indícios e rastros interessantes que podem aju-
dar em nossa jornada em busca dos resultados dessa investigação.
Um artigo de Lima e Christians (1979) remete a uma boa discussão acerca da dia-
lógica. Na leitura desses autores, entendemos que, ainda que reconheçam a relevância
das contribuições de Buber e Bakhtin, Paulo Freire se destaca, principalmente pelo
caráter explicitamente político de sua proposta dialógica.
Ao falar sobre Buber e sua perspectiva dialogal, afirmam que ele é o arquétipo
da dialogicidade, mas que há certa ambiguidade política em seus escritos. Ainda que
em sua vida tenha sido assumidamente comprometido com as causas sociais. Decerto
aparenta em suas reflexões teóricas posturas românticas e ingênuas, dizem estes auto-
res. Daí sua teoria dialogal deixar de contemplar a mudança revolucionária. Mesmo
assim, ele traz de modo pioneiro e renovador a bidirecionalidade da comunicação.
Porém, longe de se comparar a importância de Paulo Freire quando incorpora a essa
bidirecionalidade comunicativa o aspecto político da comunicação dialogal.
Paulo Freire, por sua vez, de conformidade com Lima e Christians (1979), ofe-
rece seus pressupostos básicos: o amor como fundamento, a confiança recíproca e o
caráter intencionalmente a priori das relações entre os homens. Estes autores, com
os quais concordo, assumem em sua leitura que Freire propõe estabelecer o diálogo
como centro do processo de libertação humana, numa pretensão evidentemente re-
volucionária e comprometida politicamente com as transformações sociais em favor
das classes oprimidas. Eles afirmam categoricamente que isto sequer é encontrado em
outras orientações dialogais. Acreditam eles que uma peculiaridade que diferencia a
dialógica freireana, seria sua emergência em cenários concretos de práxis, sem teorizar
abstratamente. Em suas palavras:
Todos os livros que escrevi foram, sem exceção, o relato de alguma fase da ativida-
de político-pedagógica na qual me engajei desde minha juventude. Alguns relatam
experiências já concluídas. Outros surgiram em meio a experiências em andamen-
to [...] E, como a experiência descrita nos livros progride, sinto-me obrigado a
continuar a relatar experiências capazes de aprofundar as afirmações e a s análises
já oferecidas ou de corrigir algumas delas. (FREIRE, 1978)
O texto também apresenta uma síntese biográfica de Freire, em que destacam que
ele viveu ainda na infância a fome, podendo compreender a ‘fome dos outros’, sua
obra ocorre em resposta à questão dos processos opressores. Exilado no Chile vive
o processo de alfabetização politicamente engajada e pós-alfabetização aplicada aos
camponeses. Em seguida, como membro do Conselho Mundial das Igrejas e do Ins-
tituto para a Ação Cultural, alocado em Genebra, atua na África, pós-revolução, com
destaque para Guiné-Bissau, que lhe ajudaram a compreender as peculiaridades das
sociedades desumanizadas. Esses três países, tipificaram estas sociedades desumani-
50
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
51
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
texto e assume que estes três seriam pensadores que representariam o primado do
princípio dialógico.
Trazemos ainda uma pequena digressão para apresentar um pouco de dois autores
mais recentes no trato da dialógica, Lipman e Carl Rogers.
52
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Por sua vez, Carl Rogers, é uma boa descoberta, ainda que seja bastante limitado
seus contributos para a dialógica, para a dialogicidade, é interessante sua inserção no
campo da dialogicidade, pois traz mais valor e visibilidade para estas discussões. Fon-
seca (2018) consegue elaborar uma belíssima reflexão na qual demonstra que Rogers
reconheceu a relevância de Paulo Freire para o seu trabalho, porém, muito na pers-
pectiva de dizer da similaridade, ainda que considere que Paulo Freire utiliza muitas
abstrações e fala para oprimidos e minorias. Esse autor demonstra a leitura superfi-
cial formulada por Rogers em seus comentários sobre a importância da Pedagogia do
Oprimido. Porém, Rogers faz questão de frisar seu espanto diante da similaridade de
ideias entre sua abordagem e a de Paulo Freire.
No momento mesmo em que Rogers percebe a falta de uma dimensão política em
sua proposta que contemplasse as reflexões em torno do poder pessoal, fica evidente
para ele que sem essa dimensão haveria um déficit capaz de desqualificar sua aborda-
gem como humanista. Entretanto, parece a Fonseca, com o qual concordo, que Rogers
incorpora essa questão sem dar a densidade necessária à politicidade do ato educati-
vo-terapêutico.
Sua compreensão deixa de abarcar a largura da proposta dialógica de Paulo Freire
e ele tenta justificar esse fato por meio de uma redução da teoria freireana. Chega a
afirmar que se distinguem no que se refere ao público que atendem e diz que a Peda-
gogia do Oprimido focava em atender “camponeses amedrontados e oprimidos”. Diz
que Freire se coloca de modo abstrato, desconhecendo o impacto das contribuições da
dialogicidade no concreto da vida de milhares de pessoas das classes populares.
Outro ponto que vale destacar é o caráter individualista da dimensão política de
Carl Rogers em contraponto com a proposição fortemente coletiva de Paulo Freire. A
dinâmica de classe e suas ressonâncias é praticamente invisibilizada ou invisível para
Rogers e a abordagem centrada na pessoa (ACP). Na reflexão de Fonseca desconsi-
derar isso é impedir qualquer real possibilidade de compreensão da dialogicidade de
Paulo Freire.
Digno de destaque ainda é reconhecer que a práxis para Freire implica na base de
aprendizagem e de transformação social desejável na superação dos processos opres-
sores, fruto do capitalismo.
Ainda que admire e tenha como referência a pesquisadora da ACP, Maureen Mil-
ler O ‘Hara – adepta da utilização conjunta da obra de Rogers e Freire, discorda da
leitura que ela faz em certos aspectos, principalmente quanto ao desconhecimento
dessa peculiaridade da plena opção freireana de ter como foco o oprimido e a ideia de
superação dos processos opressores.
Em particular, discordo de Fonseca quanto ao fato de que Freire tenha na Filosofia
do Diálogo de Buber um ponto em comum com Rogers. A atitude e proposta dialógica
de Paulo Freire acontece no contexto crítico da realidade opressora, no reconhecimen-
to de um embate de classes sociais, na historicidade concreta dos grupos oprimidos
envolvidos. Por outro lado, a ACP desconsidera essas mediações socioculturais e ge-
neraliza sua atuação em torno de uma ‘pessoa’.
53
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Para finalizar esse ensaio em torno dessa articulação dialógica de Paulo Freire, Bu-
ber e Bakhtin, tendo ainda a presença de Bohm, Rogers e Lipman, trazemos para parti-
cipar uma figura importante para a continuidade da difusão do pensamento freireano,
do ponto de vista institucional: Moacir Gadotti.
Gadotti, em artigo apresentado no Fórum Paulo Freire – V Encontro Internacio-
nal, promovido pelo Instituto Paulo Freire de Valência, na Espanha, no ano de 2006,
ao dialogar sobre dialogicidade, Hermenêutica e Educação, inicia essa fala recordando
sua trajetória com a temática da dialógica. Afirma categoricamente que seu primeiro
contato com a pedagogia do diálogo ocorreu através das obras de Buber, Georges Gus-
dorf e Paulo Freire, no Curso de Pós-graduação em Filosofia da Educação da PUC-SP,
durante seu Mestrado em Filosofia da Educação, no ano de 1997. Ressalta Martin Bu-
ber, e seu "princípio dialógico” e Gusdorf com a fenomenologia da “relação mestre-
-discípulo”. Na leitura de Gadotti seriam duas vertentes da pedagogia do diálogo: a
liberal. Uma pautada na filosofia humanista cristã outra no judaísmo, no existencialis-
mo. É ainda Gadotti, em sua análise crítica que afirma:
Até aqui o diálogo é compreendido como uma relação privilegiada entre duas pes-
soas, em igualdade de condições, na ‘reciprocidade’, como dizia Buber. Daí essa
concepção ainda aristocrática do diálogo confrontar-se com as condições concre-
tas da prática pedagógica e esbarrar com as desigualdades sociais e toda a sorte de
impedimento à realização do ideal dialógico. Sob essas novas condições históricas
a noção do diálogo toma uma forma também nova: entra em cena um novo dado,
que é o dado político da relação educadora.
[...] Nesse contexto histórico de fracasso da educação e de nova esperança, surge
uma nova sistematização, cuja maior figura é Paulo Freire. Paulo Freire... ele dá um
caráter eminentemente político ao diálogo. Em Paulo Freire o diálogo dos oprimi-
dos, orientados por uma consciência crítica da realidade, aponta para a superação
do conflito destes com os seus opressores...
[...]. Em Paulo Freire o diálogo não é só um encontro de dois sujeitos que buscam
a significação das coisas (o saber), mas um encontro que se realiza na práxis, no
engajamento, no compromisso social. Dialogar não é trocar ideias. O diálogo que
não leva à organização dos oprimidos é puro verbalismo. Esta é a dimensão políti-
ca do diálogo em Paulo Freire”.
E, assim, começa de fato a dialogicidade em um novo contexto, com toda sua densi-
dade atual, que só Paulo Freire pode dar naquelas circunstâncias e com sua experiência de
vida e intuição. Com Paulo Freire constatamos o emergir de uma dialógica autêntica, com-
prometida com a transformação social do mundo, com a libertação da opressão, com a su-
peração desse modelo de sociedade moderna, capitalista, imperialista, dogmática, machis-
ta, colonializante. A dialogicidade, a dialógica, o diálogo freireano nasce no ventre mesmo
da Teoria da Ação Dialógica, no cenário de uma teoria social, pedagógica, epistemológica
que se propõe, por meio do diálogo efetivar relações revolucionárias e libertadoras dos
processos subalternizante e colonializadores da sociedade moderna.
E nesse clima de revolução dialógica nos aproximamos da pesquisa empírica e do
modo como realizamos a caminhada, constituindo o caminhar e o caminho por meio
de uma metodologia dialógica.
54
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Outro ponto que pretendo observar, numa aproximação com a dimensão educati-
va da dialógica freireana, é um aporte oriundo de notas de supervisão da Maria Teresa
Esteban, em que ela me apresenta, fruto de uma fala sua intitulada “América Latina,
colonialidade e sonhos de libertação: a práxis político-social de Paulo Freire”. Nesse
texto de embasamento da sua fala, ela dialoga com uma citação de Streck (2010), em
que ele afirma que Paulo Freire propõe uma ruptura com os sentidos da educação po-
pular, através da Teoria da Ação Dialógica, como educação do povo/pública ao ressig-
nificar o conceito como uma pedagogia d@ outr@. “Assim, reinventa a pedagogia, pois
desloca o seu eixo do indivíduo burguês educado para ser o cidadão, ‘para uma classe
social que ao mesmo tempo ensina e aprende’. Numa reviravolta pedagógica, podemos
dizer, desloca um processo centrado em métodos e técnicas para o compromisso com
a práxis transformadora”.
No artigo de Streck (2010), ele afirma que Paulo Freire, com sua proposta, con-
solida um pensamento pedagógico latino-americano, um momento de libertação da
pedagogia dos padrões tradicionais, de modo similar ao que ocorre com a libertação
da teologia com a teologia da libertação. Com Freire, a pedagogia se torna a pedagogia
do outro, do oprimido, afirma Danilo Streck. Avança ainda ao equiparar paradigma-
ticamente o deslocamento freireano ao de Rousseau, quando se propõe sair da ideia
de educar o indivíduo burguês para buscar educar o cidadão do contrato social. Nessa
linha, Streck afirma a opção por deslocar a educação do cidadão para a educação de
classe social, os oprimidos. Estes fatos se alinham para reforçar a relevância do diálogo,
da dialógica, da dialogicidade em Paulo Freire para as grandes transformações peda-
gógicas possíveis. Eu diria necessárias.
Como estamos aqui a escrever, a relatar através da escrita, passamos a exercitar o
diálogo por meio das indagações. Nessa reviravolta ao diálogo sobre o diálogo, talvez,
a primeira questão que emerge, nesse trecho do relatório, seja: há diálogo nessa escrita,
no relato, na narrativa? Talvez seja questionável começarmos com questões ao invés
de apresentarmos respostas. Talvez isso seja uma característica dialógica do diálogo?
Lembramos trecho de um artigo (FIGUEIREDO, 2009), no qual dizia que o pro-
blema é a questão. Nele, articulava a dificuldade de professor@s e cert@s educador@s
de se relacionar adequadamente com o diálogo, com perguntas inesperadas e desco-
ladas de respostas. Que isso decorre do desamor... A pedagogia da pergunta convém
estar alinhavada com a pedagogia do amor? Seria condição essencial? Paulo Freire,
no trato desse tema, ressalta que o medo da pergunta é uma das causas do estímulo às
ausências de perguntas. O medo é o outro lado do amor? Afirma, ainda, que há um
projeto de sociedade no qual a cultura do silêncio predomina e perguntas comprome-
tem isso, pois instigam a fala, o diálogo.
Relembramos uma observação de Paulo Freire, nesse mesmo diálogo, presente no
“Por uma pedagogia da pergunta” (FREIRE; FAUNDEZ, 1985), em que ressalta a im-
portância de ligarmos pergunta, resposta e ação... palavra-ação-reflexão no exercício
do diálogo, da dialogicidade. Lembro também de um caboclo sertanejo que me disse
que “no problema está a solução”.
A primeira parte de uma jornada de mil passos começa com a pergunta: para onde
quero ir? E essa foi antecedida por outra pergunta: Onde estou? Estes dois marcos
de referência possibilitam o percurso. Certamente, outras perguntas são necessárias:
Como irei? O que preciso levar? E aí recordo outro trecho daquele texto (FIGUEIRE-
55
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
56
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
esse processo e reconhecer, em seu texto, o pretexto de tudo que decorreu com a perda
da perspectiva matrística que perdurou em remotos tempos, mundo afora.
Quando nos deparamos com as características elencadas por Maturana (Op. Cit.)
inerentes à cultura matrística, percebemos essa sensibilidade quase infantil. Para en-
tendermos essas argumentações, creio ser importante definir três conceitos em sua
abordagem. O primeiro seria de linguagem/linguagear; o segundo seria emoção/emo-
cionar; e o terceiro seria cultura, nessa base relacional que emerge da sua teoria.
Maturana tem transformado os substantivos linguagem e emoção em verbos. Seu
intuito é trazer o sentido de ação no conviver cotidiano. Concordamos inteiramente
com o entendimento de que a linguagem e a emoção não são coisas isoladas, elas ocor-
rem no fluir das relações, são “relacionais” (FIGUEIREDO, 2007). Dessa maneira, a
linguagem acontece no linguagear, tanto como a emoção acontece no emocionar. Flui,
ocorre no movimento relacional do conviver e da coordenação, dos acordos e acertos,
dos combinados pautados pelas emoções.
Por sua vez, a cultura se define, nessas bases, como o que se tece e se mantém gera-
ção após geração, em torno de acertos relacionais de convivência, satisfatórios para a
comunidade em questão, orientados pela emoção expressa na linguagem que comunica.
Salienta ainda Maturana, que certos gestos, ações, movimentos possuem signifi-
cados distintos de acordo com a emoção que lhe gera; o discurso, igualmente, possui
caráter diferente de conformidade com sua gênese emocional. Em suas palavras, as
culturas podem ser entendidas como redes fechadas de conversações que produzem
a configuração do emocionar partilhado grupalmente, geratriz de ações socialmente
validadas. Seria nessa rede que se configuraria o caráter da cultura. Por isso, nos afirma
que é a emoção que guia, no fundo, o fluir histórico.
Como podemos concluir, as emoções estariam no centro dos processos evolutivos
de todos os seres vivos, ao definirem seus fazeres, suas ações, suas comunicações. Eu
diria que o foco seriam as relações pautadas nas emoções que lhes constituem e, daí
decorre suas ações. As ações dos seres vivos, portanto, são relacionais em sua origem.
São essas relações mobilizadas pelas emoções e vice-versa que definem onde se en-
contram, seus destinos, sua busca de comida, onde e com quem se reproduzem, onde
criam os filhotes etc.
Ao se ter isso em conta, podemos já ensaiar algo que nos interessa mais a frente,
que se identifica com as possíveis mudanças culturais. Estas ocorrem quando acon-
tecem mudanças no emocionar que vai impactar as redes do linguagear em que se
vive. As condições de vida, as pessoas, vão mudando suas ações, suas experiências, daí
resulta reflexões que impactam, potencializam querer mudar o viver. Salienta ainda,
Maturana, que as culturas e o próprio viver tendem à permanência, ao conservado-
rismo. Constata-se que as mudanças nas condições de vida estão imbricadas com as
mudanças na cultura.
Retomando nosso foco, constata-se que a cultura matrística perdeu lugar na socie-
dade moderna para a cultura patriarcal. Essa Cultura patriarcal é hoje hegemônica no
mundo inteiro, integra desintegrando o mundo globalizado. A diferença básica entre
esta cultura e a matrística, reside no fato de que a cultura patriarcal/matriarcal se cen-
tra em relações de dominação e submissão, exigências, desconfianças e controle. Por
sua vez, a cultura matrística, antecessora da cultura patriarcal/matriarcal, está centra-
57
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
58
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
59
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
60
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Então somos levados a reconhecer que a escola possui um papel dúbio, pois que
tanto pode favorecer a exploração quanto a parceria. A escola é uma forte instituição
mediadora da diversidade cultural, social e linguística, nas formações da atualidade,
possui papel de agenciar a relação entre culturas com poder desigual (opressor@s/
colonizador@s X oprimid@s/colonizad@s; mundo ocidental X mundo oriental; saber
formal escolar X saber informal cotidiano.
Historicamente, este complexo campo dos estudos da interculturalidade principia
no contexto Europeu e Americano com o intuito de amenizar os conflitos interétnicos;
promover a integração entre culturas, a superação de preconceitos, o acolhimento dos
estrangeiros e dos filhos de imigrantes. O termo Intercultura passa a ser usado pelos
documentos oficiais do Conselho Europeu a partir do início dos anos 80.
Somente depois, este debate entra nas temáticas acerca da formação da identidade
e valorização das diferenças. Surge inicialmente como mecanismo para compensar
os déficits culturais (culturas inferiores) – imposição de uma cultura considerada su-
perior. Passa por uma fase de aprendizagem da tolerância e aceitação do diferente,
através da promoção do reconhecimento da identidade de cada um e estímulo a coo-
peração grupal (perspectiva moral). Chega à reflexão sobre as atitudes e práticas dis-
criminatórias, o que visa o processo de mudanças nas relações e o reconhecimento da
diversidade cultural. Mas, sem uma discussão aprofundada acerca dos próprios limites
da cultura majoritária dominante...
Nesse crescente de criticidade, na América Latina os estudos acerca da Intercultu-
ralidade adquirem um caráter político mais contundente. Acontece o reconhecimento
das diferenças nas singularidades, sem mascarar os conflitos e utilização do diálogo
como possibilidade de convivência entre as culturas – caminho para uma perspecti-
va crítica. Emerge, no contexto das lutas contra os processos crescentes de exclusão
social, movimentos sociais que reconhecem o sentido e a identidade cultural de cada
grupo social, que valorizam o potencial educativo dos conflitos e buscam desenvolver
a interação e a reciprocidade entre grupos diferentes, como fator de crescimento cul-
tural e de enriquecimento mútuo.
Desse modo, em decorrência dessa maturação dos estudos interculturais, percebe-
-se que isto impacta nas práticas educacionais, constituindo uma perspectiva intercul-
tural que propõe novas estratégias de relação entre humanos e entre grupos diferentes.
Busca promover a construção de identidades sociais e o reconhecimento das diferen-
ças culturais. Mas, ao mesmo tempo, procura sustentar a relação crítica e solidária
entre elas.
O Brasil sempre se teve um ambiente bastante propício para se pensar as relações
interculturais, por ser um país marcado pela miscigenação de raças e cores. De forma
mais direcionada, este debate surge com o Lançamento dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (1996). Reinaldo Fleuri (1998, 2001, 2003), em seus estudos, afirma que o
reconhecimento da multiculturalidade e da perspectiva intercultural ganharam rele-
vância social e educacional no Brasil, com o Referencial Curricular Nacional para as
Escolas Indígenas, com as políticas afirmativas das minorias étnicas, com as propostas
de inclusão de pessoas portadoras de necessidades especiais na escola regular, com a
ampliação e reconhecimento dos movimentos de gênero etc.
A educação atual sofre de urbanidade mercantil, de usuras, de pragmatismo ime-
diatista, de consumismo e descartes no modismo de cada dia, de uma fantasia distor-
61
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
cida da realidade, de um sei não o que de futuro inexistente fora da história construída
no hoje. Mas, em paralelo, incorporamos novos paradigmas aliando-os aos discursos so-
ciais, políticos, econômicos, educativos numa perspectiva crítica. Começamos a ensaiar
a inclusão da dimensão cultural, dos diálogos interculturais, ainda que nesse momento
estejamos vivendo um contexto de retrocessos nas conquistas recentres acerca dessas
questões. Entrementes, nunca foi tão importante refletir sobre interculturalidade.
Ela nos oferece um corpus teórico para pensar e sentir acerca do diálogo entre cul-
turas, no entre lugar. A preocupação fundamental da Educação Intercultural passa a
ser a elaboração da diversidade de modelos culturais que interagem na formação d@s
educand@s. Tal deslocamento de perspectiva, legitima as culturas de origem de cada
indivíduo e coloca em xeque a opressão da cultura hegemônica. E este fato traz conse-
quências para a elaboração dos métodos e das técnicas de ação pedagógica e de com-
partilhamento de informações. Essa educação Intercultural crítica visa a incorporação
de um conjunto de propostas educacionais que buscam a promoção de relações de
respeito entre grupos socioculturais, mediante processos democráticos e dialógicos.
Nelas, há busca de projetos educativos que levem em conta a pluralidade e diversidade
cultural, em que o diálogo entre as culturas seja possível, no respeito às diferenças, na
democratização de acesso e permanência de todos no âmbito escolar.
A Educação Intercultural Crítica é uma forma de educação fundada nos direitos
humanos e promotora da democracia e da cidadania. Concebe o projeto educativo
como aquele que deve estar baseado na participação, para permitir a melhoria das
condições de vida dos indivíduos. Promove a tolerância e se expressa na capacidade de
respeitar cada pessoa com a base ética da paz, da segurança e do diálogo intercultural.
A Educação Intercultural Crítica inclui a ideia de intercâmbio, da interdependência,
da interaprendizagem, do diálogo e da negociação entre pessoas de culturas diferen-
tes, baseada no princípio fundamental da igualdade de condições. É uma proposição
democrática de diálogo de culturas, dentro de uma perspectiva complementar, alheia
à tentação perversa de hierarquizar as interações entre a cultura oral e a cultura escrita.
Ao refletir acerca da Interculturalidade e a Práxis Docente, cabe buscar uma Pers-
pectiva Intercultural Crítica que implica em processos educativos e de forma direta
na práxis docente a estes associados. Imaginar uma sociedade na qual seja possível a
convivência, aceitação e o respeito a pluralidade de seus indivíduos, torna-se necessá-
rio pensar processos educativos que visem a aprendizagem destes aspectos. Torna-se,
portanto, essencial repensar os processos formativos e por extensão a práxis docente.
Walsh (2009b, 2017), ao tratar da Interculturalidade, destaca a relevância de dis-
tinguirmos entre modelos distintos de interculturalidade. Afirmo que isso requer a
consciência de que modelos distintos de entender a interculturalidade, geram modelos
distintos de educação intercultural. Ao pensar sobre isso, estabelecendo estas ligações
vemos que a Educação Intercultural pode ser proposta para: Assimilar / Compensar
(adaptação unidirecional dos estudantes aos cânones culturais hegemônicos), Dis-
tinguir / Biculturalizar (currículos culturalmente diferenciados –e excludentes- por
“respeito” à diversa identidade cultural dos estudantes) ambas identificada com uma
interculturalidade funcional.
Por outro lado, pode ser proposta para tolerar / Educar contra o racismo (modelos
que incluem entre os seus destinatários estudantes da sociedade majoritária), numa
lógica bem pragmática. Mas, encontramos abertura para uma Educação Intercultu-
62
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
ral que seja proposta para Interagir e Transformar (educação intercultural através da
aprendizagem complexa), identificada com uma postura Crítico-Dialógica.
Finalizando esse exercício de uma brevíssima apresentação em torno da Intercul-
turalidade e da Educação Intercultural, queremos destacar a importância dos estudos
presenteados a nós por Catherine Walsh. Ela faz uma belíssima discussão ressaltando
porque precisamos abdicar dessas outras interculturas e assumirmos uma intercultu-
ralidade crítica e uma educação decolonial.
1.11 Decolonialidade
63
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
coisificação do ser humano. Com Walsh (2008), apoiada por Lander, Escobar e Coro-
nil, que têm discutido a problemática da natureza e sua destruição, refletimos sobre a
colonialidade do com-viver, denominada por ela de ‘Colonialidad de la madre natu-
raleza y de la vida misma’. Esta colonialidade decorre de uma dissociação falsa entre
razão, cultura, sociedade e natureza. A Colonialidade do conviver descarta o espiritu-
al-social, a relação milenar entre mundos biofísico humano e espiritual, incluindo aos
ancestrais, sustentáculos das comunidades tradicionais (WALSH, Op. Cit.).
A Colonialização afeta praticamente tudo. E ressoa em todas as dimensões, de tal
maneira que temos afirmado acerca da micro-colonialidade, relacionada às dimensões
do cotidiano, das relações face a face. Nesse sentido, a micro-colonialização, em sua
capilaridade, implica num processo que atua como um dispositivo opressor ou como
ação opressora, des-humanizante.
Vivemos um momento em que há uma disputa de discursos e ideais, mas há espe-
ranças que possibilitam alternativas. Neste contexto é possível elaborar um texto de-
colonializante. Oferecemos um conjunto de reflexões acerca da Colonialidade/decolo-
nialidade, das quais citamos algumas na sequência. Mas, primeiramente vamos eleger
um conceito que nos parece mais pertinente hoje, do que nos pareceu antanho. Temos
tratado como similar descolonialidade e decolonialidade, porém fomos convencidos
pela Catherine Walsh (2013) de que é pertinente uma opção crítica por utilizar o con-
ceito de decolonialidade ao invés de descolonialidade.
Diante do fato de haver uma aplicação indevida do conceito de “descolonial”, iden-
tificado com o que seria uma contraposição ao “colonialismo”, e o termo descoloni-
zação ser usado para identificar o processo histórico de ascensão dos Estados-nação,
após a ruptura com as administrações coloniais, Walsh opta por utilizar os termos
decolonial e decolonialização. Diz ela que essa expressão “decolonial” reconhece que
ainda não superamos a lógica colonial, pois na verdade ela ganhou fôlego através dos
procedimentos colonializantes, ou seja, através de operações mentais, afetivas e práti-
cas de alimentar uma ideologia de dependência e submissão à lógica eurocêntrica-es-
tadunidense. Walsh avança ao dizer que a ideia da supressão do “s” demarca distinção
bem mais ampla que engloba múltiplas dimensões, seja epistemológica, ontológica,
metodológica, pois que na verdade, ao delimitar, amplia ao assumir uma postura po-
lítica de contraposição a lógica colonializante. Em suas palavras: “[...]. Con este juego
lingüístico, intento poner en evidencia que no existe un estado nulo de la colonialidad,
sino posturas, posicionamientos, horizontes y proyectos de resistir, transgredir, inter-
venir, in-surgir, crear e incidir” (WALSH, 2013, p. 24-25).
Salientamos ainda que Walsh tem sido a principal interlocutora quanto as questões
educativas e pedagógicas da Colonialidade/Decolonialidade. Citamos de passagem,
importantes estudos que esta autora tem elaborado em torno dessas temáticas: In-
terculturalidade, Estado, Sociedade: lutas (de)coloniais do nosso tempo; Intercultu-
ralidade e pedagogia decolonial: surgir, reexistir e reviver; Interculturalidade crítica
e (de)colonialidade; Pedagogias decoloniais: práticas insurgentes de resistência, (re)
existência e (re) vida (WALSH, 2008; 2009; 2012; 2013). Destacamos ainda que ela tem
como principal referência Paulo Freire e Franz Fannon. Obviamente que incorpora
também outras reflexões que atualizam disputas em torno das questões raciais e de
64
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
gênero, como as propostas por Sylvia Wynter17 , Nelson Maldonado Torres18 e Jacqui
Alexander19.
Nessa tese e neste livro, há uma defesa de que a grande referência para uma edu-
cação decolonial, para uma pedagogia decolonial, para relações pedagógicas Decolo-
niais, é Paulo Freire, ainda que haja o reconhecimento de que se torna interessante a
inclusão dos debates contemporâneos em torno das questões étnico-raciais, de gênero,
das minorias ativas em geral, da diversidade social e cultural. Entretanto, há uma base
consistente na proposta da Teoria da Ação Dialógica (FREIRE, 1983), capaz de fazer
frente as posturas colonializantes que discriminam e negam a potência das diferenças
na formação humana, em geral.
Anunciamos aqui alguns textos nossos nos quais fazemos uma pequena digressão
histórica anunciando o advento dos Estudos da Colonialidade/Modernidade; da rela-
ção entre a proposta de Paulo Freire e os Estudos da Colonialidade/Decolonialidade;
da relação pedagógica entre os eixos da Colonialidade/Decolonialidade e a Teoria da
Ação Dialógica; de um conceito derivado de Colonialidade Ambiental. Nesses outros
estudos (FIGUEIREDO, 2016; 2002; 2010; 2009; 2009b; 2009c) trazemos elementos
para identificarmos a manifestação da colonialidade em diversas situações, bem como
em estratégias e práxis dialógica capaz de superação dessas situações subalternizantes
e opressoras.
Consideramos que a dimensão educativa é privilegiada. Na educação se tem uma
interface efetiva entre o macro e o micro social. Assim afirmamos a premência de
ações educativas micro-decolonializantes, na medida em que se pode contribuir para
superar a opressão entre seres humanos, daí a importância da incorporação de outras
alternativas de formação, em nossa proposta com os contributos da dialógica.
65
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
REDO; SILVA, 2018) para ilustrar o tema. Então vamos tracejar em torno de alguns
nomes interessantes nessa área de estudo.
Libâneo (1999) traz um retrato da conjuntura educacional com o intuito da forma-
ção continuada objetivada na atualização histórica e técnica d@s professor@s. Sacris-
tán (1999) afirma, quanto a formação, que geralmente @s professor@s só mudam suas
práticas diante de uma imposição concreta de mudança. Nesse meio tempo, Donald
Schön, trata sobre a nova epistemologia da prática profissional e traz o conceito de
professor(a) reflexiv@. Essas proposições serviram para que Schön (2000) retomasse
esse conceito e o ampliasse, com o intuito de destacar proposta para a qualificação
docente. Para além da crítica à racionalidade técnica, propõem a reflexão como parte
do processo de formação e de trabalho do professor.
Zeichner (2002), por sua vez, vem demarcar que o processo de ensinar e aprender
d@s professor@s se prolonga durante toda a sua carreira. Zeichner trata da valorização
e a autonomia profissional e acadêmica do trabalho docente, incluindo a dimensão
sociopolítica e cultural. Já Stenhouse trabalha fundamentalmente com o conceito de
professor pesquisador e suas implicações. Lembramos Freire quando já articula ele-
mentos em torno dessas proposições acima.
Pimenta (2002) retoma a discussão do professor reflexivo com ênfase na contri-
buição da reflexão para a formação do trabalho coletivo na intervenção profissional
e sua relação com a dinâmica social mais ampla. Destacamos ainda os trabalhos de
Contreras (2002), Alarcão (2001, 2008), Pereira (1999), Perez-Gómez (1992), Candau
(1993), que, em geral, elaboram suas contribuições em torno dos estudos sobre mode-
los de formação, na vertente de problematizar os paradigmas. A proposta crítico-re-
flexiva passa a valorizar o professorado e seus conhecimentos. Chegamos inclusive a
incluir uma nova dimensão ontológica identificada com a história de vida e formação
(NÓVOA, 1995). Valorizam esta proposta PINEAU, 1988; JOSSO, 2004; DOMINICÉ,
1988, 2006). Os estudos sobre a formação docente têm sido um tema bastante comum,
como nos informa Imbernón (2009; p. 7):
Diante disso tudo, somos compelidos a reconhecer que temos um vasto acervo de
teorias relacionadas a formação, mas é possível afirmar, com bastante concretude, o
quanto reconhecemos da presença dessas temáticas, já ínsitas na obra de Paulo Freire.
Assim, anunciamos que uma formação que se pense dialógica requer alguns pressu-
postos: É diferenciada dos modelos tradicionais que, em geral, privilegiam a reprodu-
ção, o tecnicismo, a fragmentação do saber, a opressão e a formatação definida a priori.
É considerada e potencializada em articulação com aspectos políticos, sociocul-
turais, econômicos, históricos, eco-ambientais, de forma integrada, numa dinâmica
66
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
que contemple os saberes populares, favorecida por relações dialógicas, pela dimensão
afetiva e relacional, pela busca da autonomia e da humanização.
É pautada pela ética, competência técnica, compromisso com a problematização
dos conteúdos, opção pela relação dialógica no processo formativo, rigorosidade me-
tódica, autoridade coerente e democrática, reflexão crítica.
Se corporifica ao dar a forma ou ter a forma de parceria em que, numa relação
horizontal, democrática, crítica, libertadora, decolonializante, o diálogo formativo se
instaura. Nesta formatação há um conceber, imaginar; aperfeiçoar com a busca por
promover o ‘ser mais’, no respeito à diferença, ao diferente.
Materializa-se no compartilhamento, nos conflitos e acordos, convencimentos que
se dão nas relações parceiras, democráticas, que se revestem de integralidade, de su-
peração dos modelos que oprimem os humanos em sua caminhada na direção do seu
ser mais.
Privilegia a humanização e a politicidade que traz para a formação, o sentido de
inconclusão e potencialidade humana para intervenção no mundo.
Ao se ter em conta Paulo Freire e os estudos que a tese traz como temas geradores
emergentes, pode se vislumbrar o alargamento do campo de leitura acerca da formação
docente, popular, ambiental, dialógica, com o propósito dessa formação diferenciada.
Por isto tudo, é que reconhecemos o quanto pode ser relevante para a formação
de educador@s dialógic@s, uma proposta que inclua estas temáticas. Acredito que o
diálogo entre estes conhecimentos favorece uma interculturalidade crítica realmen-
te decolonializante. Nesse procedimento conceitual, sem perder o nexo praxiológico,
vamos costurando os trechos de textos anteriores e o atual, bem como na busca de
alargar essa colcha de retalhos com o diálogo possível entre autores dialogais.
67
CAPÍTULO II
“O sujeito pensante não pode pensar sozinho; não pode pensar sem a co-
participação de outros sujeitos no ato de pensar sobre o objeto. Não há um ‘penso’, mas
um ‘pensamos’ que estabelece o ‘penso’ e não o contrário”.
N
esse ponto do texto, anuncio que, antes mesmo de apresentar a metodo-
logia da pesquisa e seus resultados, resolvi realizar uma pretensão antiga.
Essa pretensão era tentar entender um pouco os atravessamentos que ou-
tros autores realizam em torno do diálogo, da Dialogicidade. Realizei uma pesquisa
pelo estado da arte em torno do Diálogo, Dialogicidade, Dialógica. Nesse sentido,
novamente numa licença ‘poético acadêmica’, me permiti utilizar o Google para uma
pesquisa na internet em torno desses tópicos.
Identificamos 30 páginas nas quais aparecem sites que fazem conexão com a pala-
vra diálogo. O primeiro site que aparece é a definição que a Wikipédia oferece acerca
do que seria diálogo. Quanto a dialógica, encontramos 20 páginas com sites em torno
predominantemente da educação, mas trazendo alusão ao termo em inúmeras áreas,
desde a economia, engenharia, direito etc... Os primeiros sites a aparecerem trazem
uma definição do termo:
69
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
[PDF]Dialógica
wefithomologa.s3.amazonaws.com/wp-content/uploads/.../aprendizagem-dialógica.pd...
70
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Nestes sites foram mapeados 158 itens, entre artigos, resumos, dissertações e teses
em torno dessa temática que envolve os conceitos de diálogo, dialógica e dialogicida-
de. Certamente sabemos que, se nosso escopo fosse uma pesquisa acadêmica com o
intuito de apontar artigos, dissertações e teses publicadas em torno dessa temática, te-
ríamos resultados bastante amplos e interessantes como pode se perceber numa rápida
olhada na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD).
Em nosso caso, o intuito foi apontar o quanto aparece publicamente, para um pú-
blico não especializado em torno desses temas. Ainda que na pesquisa, tenhamos bus-
cado a percepção de estudantes de graduação e professor@s que atuam na graduação.
Porém, nossa intencionalidade era uma leitura desses temas a partir de discentes e do-
centes sem que, necessariamente os mesmos tivessem uma formação ou base teórica
em torno desse tema gerador.
Mesmo tendo em conta essa argumentação, fizemos um mapeamento via TEDE
UFC, e constatamos 15 trabalhos de pós-graduação em que aparece, no seu título ou
assunto, o conceito de Dialogicidade. Destacamos, em seguida, os mesmos:
Raphaell Moreira Martins. Título: Contextualização do ensino e dialogicidade na
educação física escolar: fazeres docentes em ação no ensino médio. Data da defesa:
26/01/2015.
Camilla Rocha da Silva. Título: Educação dialógica freireana nos cursos de licen-
ciatura na UFC. Data da defesa: 28/04/2017.
Katiane Oliveira Lobo. Título: Ações pedagógicas e concepções sobre educação
ambiental: um estudo de caso. Data da defesa: 31/01/2013.
71
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
72
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
73
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
74
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
75
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
76
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
77
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
78
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
79
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Não apenas as ideais, mas as próprias emoções são no [ser humano] artefatos cultu-
rais (Geertz, 1973; p. 95).
“... pedras de um lado e sonhos do outro – são coisas deste mundo. O que devemos
indagar é qual a sua importância: o que está sendo transmitido com a sua ocorrência
e através da sua agência... (op. cit.; p. 20 e 21).
O mais importante desse processo foi entrar em contato com esse conjunto que
emergiu da pesquisa, seja em sua fase mais ligada as leituras, seja o debruçar sobre o
rico material que conseguimos encontrar nos questionários e nas entrevistas. Como
afirma Paulo Freire:
“Para mim a realidade concreta é algo mais que fatos ou dados tomados mais ou
menos em si mesmos. Ela é todos esses fatos e todos esses dados e mais a percepção
que deles esteja tendo a população neles envolvida”.
“Se..., a minha opção é libertadora, se a realidade se dá a mim não como algo parado,
imobilizado, posto aí, mas na relação dinâmica entre objetividade e subjetividade,
não posso reduzir os grupos populares a meros objetos de minha pesquisa” (Freire,
1981; p.35).
80
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
MORAIS (1999, 2003), em dois outros artigos vem nos ajudar a realizar as etapas
que favorecem a análise do material resultante da pesquisa empírica. Em seu texto
“Tempestade de Luz”, pontua e amplia o diálogo inserido dimensões intersubjetivas
nos processos e enfatizando a dimensão da criatividade e da criação no definir das
categorias e reler e escrever o texto autoral.
Agora, vou aproximar mais do campo concreto que vivenciei durante a pesquisa
nos campis das duas Universidades que me permitiram essa investigação. Comecei no
Rio de Janeiro e finalizei em Fortaleza.
81
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Campo Empírico
Chego ao Rio de Janeiro, era um misto de medo, apreensão e expectativa espe-
rançosa. Essa cidade me deslumbra, como a muitas pessoas. Tenho um apreço e uma
sensação de familiaridade, talvez decorrente da energia gostosa que ela me proporcio-
na. Sua beleza estética se equipara à sua riqueza histórica. A mística carioca dá ares
de despojamento e alegria. Nem sei por qual motivo, para mim, é como se o Rio de
Janeiro tivesse um pouco do Ceará. Nem sei bem o quê...
Tive o primeiro encontro de supervisão com a Maria Teresa, no qual apresentei
minha proposta de abordagem para a pesquisa empírica. Expliquei minha intenção
e ela me ajudou a aprimorá-la. Fechamos uma proposição: Aplicação de um questio-
nário tendo como foco a indicação de professores/professoras que tivessem alguma
prática de ensino-aprendizagem que pudesse ser classificada de dialógica, pel@s estu-
dantes. No segundo momento, faríamos entrevista com est@s professor@s. A mesma
abordagem seria aplicada tanto na Universidade Federal Fluminense (UFF), quanto na
Universidade Federal do Ceará (UFC).
Definimos uma estratégia de articulação para viabilizar a aplicação dos questioná-
rios. Em virtude de o tempo dedicado ao Pós-Doutorado ter um limite relativamente
curto e haver o propósito de realizar essa parte empírica tanto no Rio de Janeiro quan-
to no Ceará, fizemos alguns recortes epistemológicos. Primeiramente, para aplicar os
questionários, combinamos de pedir aos professores/professoras de Didática naquele
semestre, 2017.1, que pudesse aplicar os questionários e, em seguida, conversar com as
turmas sobre Teoria Dialógica de Educação. Assim foi feito...
82
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Entrevistas UFF
Adriana Martins Correia (Educação) - 13/06/17
Alexandre Santos Moraes (História) - 14/06/17
Alice Yamazaki (Educação) - 06/06/17
Edson Pereira da Silva (Biologia) - 07/06/17
José Antônio Sepulveda (Educação) - 21/06/17
Leonardo Tadeu Silvares Martins (Matemática) - 13/06/17
Marcelo Mocarzel (Educação – substituto) - 23/06
Martha Copolilo (Educação Física) 20/06/17
Monica Vasconcelos (Educação) - 20/06/17
Patrícia Ferreira Neves Ribeiro (Letras - Língua Portuguesa) - 09/06/17
Martha Abreu (História) - 22/06/17
Paulo Antônio Cresciulo de Almeida - (Educação Física) 21/06
Rejany dos Santos Dominique (Educação) - 09/06/17
83
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Entrevistas UFC
Aline da Silva Souza (Educação - Substituta) – 30/11/17
Atilio Bergamini Júnior (Letras/Literatura) – 16/11/17
Bernadete de Souza Porto (Educação) – 16/11/17
Camilla Rocha da Silva (Educação – Substituta) – 26/11/17
Clarice Zientarski (Educação) – 29/11/17
Cláudia Freitas de Oliveira (História) – 14/11/17
Cristiane Amorim Martins (Educação - Substituta) – 14/11/17
Fernanda Nascimento (Educação - Substituta) – 29/11
Heulália Charalo Rafante (Educação) – 30/11
Inês Cristine de Melo Mamede (Educação) – 04/12
Ingrid Louback de Castro Moura (Educação) – 14/12/17
Jailson Pereira da Silva (História) – 27/12/17
José Roberto Feitosa Silva (Biologia) – 08/12/17
Kênia Sousa Rios (História) – 13/12/17
Luciane Germano Goldberg (Educação) – 16/11/17
Luiz Botelho Albuquerque (Educação) – 09/11/17
Luiz Fábio Silva Paiva (Sociologia) – 16/11/17
Marcelo Tavares Natividade (Sociologia) – 13/12/17
Meize Regina de Lucena Lucas (História) – 04/12/17
Neide Fernandes Monteiro Veras – 27/11/17
Paulo Meireles Barguil – 11/12
Raphael Alves Feitosa (Biologia) – 14/11/17
Suene Honorato de Jesus (Letras – Literatura) – 01/12/17
Tharyn Carvalho de Freitas (Teatro) – 17/11/17
Valdemarin Coelho Fernandes – 08/12/17
84
CAPÍTULO III
A aranha tece sua teia na expectativa de tecer o seu destino e expandir suas conquis-
tas e ampliar seu modo de ser e estar no mundo.
C
aminho por uma estradinha de terra que demarca o rumo no campus, em
direção ao local agendado para nossa entrevista. Possui fronteiras definidas
pelo espaço pisoteado do terreno em contraste com ambiente verde, uma
grama misturada com mato (ervas ditas daninhas) que nascem e crescem favorecidas
por não receberem o impacto das pegadas diárias de tantas outras gentes. Lembro de
uma música do Gonzaguinha que tem me acompanhado nesses tempos difíceis da
pandemia. Nela o poeta, fruto do nordeste com o Sudeste, do Rio de janeiro enchar-
cado de Exu de Pernambuco, e nos oferece a ideia de que somos tanta gente depois de
interagir com tanta gente.
Caminhos do Coração
Gonzaguinha
85
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Será mais uma marca no coração, uma tatuagem enraizada que difere daquelas ta-
tuagens que marcam superficialmente a epiderme, sem aprofundamento capaz de fazer
a diferença... Foi assim que comecei minha peregrinação em busca de uma trajetória
de significados que se entrelaçasse com meus Percursos Desejantes, sentidos no senti-
do cognitivo, mas também no sentido de sentir, de sentimentos e emoções que podem
emergir quando permitimos ser tocados amorosamente (FREIRE, 1983) pela vivência,
tornando-a experiência (DEWEY, 1959; LAROSSA, 2002). Comecei assim o encontro
com a professora Alice Yamazaki (Educação) no dia 06/06/17, no Campus de Gragoatá,
na UFF, bem como comecei minha jornada na UFC, com o professor Luiz Botelho Albu-
querque, no dia 09/11/17, na Faculdade de Educação, no campus do Benfica.
Na pretensão de apresentar resultados desse trabalho, alinhavando teoria e pesquisa
empírica, integrando as metáforas e as contribuições, iremos adiante nesse movimento.
Primeiramente vamos procurar realizar um exercício de associar as metáforas que esco-
lhemos para nos acompanhar e os princípios dialógicos que aparecem nesse texto.
Num ensaio disso, me deparo com a metáfora do caminhante, largamente utilizada
durante minha tese de doutorado. Também revisito a metáfora da teia e do labirinto
que utilizei durante meu mestrado. Busco a metáfora da borboleta que acompanha
minha trajetória enquanto coordenador de grupo de pesquisa e minhas próprias ela-
borações em torno da Perspectiva Eco-Relacional. Me aproximo da metáfora da trama
e da colcha de retalhos, muito forte no reencontro com os sertões nordestinos. Aqui
também me remete a metáfora do cultivo, do semeador.
Irei considerar os contributos metodológicos para análise decorrentes de Morais
(1999; 2003; 2006), de Bardin (1977) e da querida professora Marli André (1986;
2013), vamos propor nosso ensaio interpretativo. Efetivamente, temos a intuição asso-
ciada ao processo do método dialógico escolhido. A dialogicidade é mote, é movimen-
to, é inspiração e procedimento do ato de pesquisar e do ato de interpretar resultados
da investigação. Certamente, temos clareza que é uma tradução possível. E como toda
86
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
87
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
semestre não se ter turma de Didática ofertada para esse curso... Igualmente, supomos
que deve ter ocorrido com outros cursos e professor@s que deixaram de ter indicação
decorrente dessas situações. Entretanto, considero que isso em nada reduz a relevância
e impacto da pesquisa realizada e dos resultados conquistados.
88
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
da, que as categorias que mais se destacam na análise foram: Aprendizagem parceira;
contextualização e Estudantes atuantes. Podemos traduzir, tendo em conta a referên-
cia da Perspectiva Eco-Relacional, nas seguintes metáforas categoriais: Aprendizagem
Parceira, Contextualização e Autor(a) Epistêmico.
No trato da primeira categoria, a ‘aprendizagem parceira’, evidenciamos que
os discentes destacam a relevância de ser ter situações em sala de aula, nas quais
há lugar para que, respeitosamente, exista a escuta de tod@s @s envolvidos no ato
pedagógico, tanto para a assimilação de conhecimentos já sistematizados, quanto
para a elaboração de novos conhecimentos. Algumas práticas pedagógicas relatadas
como potencializadoras dessa aprendizagem parceira foram debates, roda de con-
versa e seminários. Podem ser apoiadas em textos, filmes ou documentários. Ainda
de conformidade com os depoimentos d@s estudantes, o que realmente importa é
que a exposição do conteúdo em estudo se relacione com situações do cotidiano ou
faça parte do imaginário possível da turma. Dessa maneira, há possível “troca de
conhecimentos e experiências”. Ainda há o indicativo da importância de se respeitar
opiniões divergentes e a busca por compreender cada fala. Afinal, essa práxis dialó-
gica na educação, favorecem a superação da logica colonializante, tão ao gosto do
capitalismo, do imperialismo, do fascismo.
Quanto a ‘Contextualização’, @s discentes destacam que se torna fundamental
que os conteúdos tratados em sala de aula se identifiquem com a realidade e o con-
texto de vida d@s estudantes para que a aprendizagem faça mais sentido, traga mais
significado. Segundo as respostas, uma aula dialógica “não é meramente expositiva
nos padrões mais tradicionais do ensino, mas aborda os conhecimentos dos alunos
(acumulados a partir de variadas experiências) e constrói um conhecimento mais li-
gado a realidade dos mesmos”. Esses conhecimentos prévios podem ser classificados,
conforme Paulo Freire (1983), de temas geradores, oferecendo situações limites para
a codificação/decodificação potencializando aprendizagens significativas e potencial-
mente transformadoras da realidade. Favorece um aprender participativo no próprio
ato limite de compreender criticamente o tema. Contextualizar é proveniente do latim
significando Tecer junto.
Temos ainda um contributo socialmente relevante que é a tomada de consciência
das situações opressoras e colonializante pautadas pela política e estruturação social
hegemônica. Há uma imposição alienante dessas estruturas colonializantes no imagi-
nário coletivo. Muitas vezes se apresentam como propostas educativas que oferecem
conteúdos e informações abstratas e distantes da realidade de vida d@s educand@s.
Tudo isso dificulta o reconhecimento e a aprendizagem. Além de favorecer a acomo-
dação e uma sensação de incapacidade e de fragilidade intelectual por não dar conta
de aprender o que é dissociado da realidade presente.
A terceira categoria foi intitulada como ‘estudante ativo’. Traduzimos pela metá-
fora categorial da PER, associada a ideia d@ “autor(a) epistêmic@”. Nesse item, @s
estudantes depoentes, ressaltam que @s discentes devem ser respeitados em suas falas,
ideias, reflexões, percepções. Que haja estímulo e condições favoráveis, sem serem jul-
gados nem criticados, para que possam participar e propor debates e assuntos na sala
de aula. Que possam se sentir parcela ativa na construção do conhecimento. Na PER
a ideia de autoria está associada a necessidade de saída da condição de passividade ou
submissão a representar um papel em um script proposto por outrem. Que estudantes
possam ter reconhecida sua capacidade de autoria, na qual propõe ações e transfor-
89
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
mações no cenário da vida. Salientam ainda que se faz imprescindível que educador@s
reconheçam isso como natural, direito legítimo e não uma concessão ou um favor que
está sendo oferecido que “dá espaço para o aluno falar”.
A partir disso, podemos compreender que a contribuição pedagógica que a edu-
cação dialógica oferece para a formação docente faz com que discentes e docentes se
constituam no ambiente dos grupos aprendentes de tal maneira que há o acontecimen-
to exitoso do ato de ensinar e de aprender dialógico, decolonializante e intercultural.
Uma formação docente dialógica é capaz de contributos baseados na decolonialidade.
Isso também empodera ações didático-pedagógicas que conseguem desconstruir prá-
ticas conteudista e bancárias.
Bem, mas antes de adentrar o universo docente e suas contribuições, cabe aqui in-
formar que chegamos nos estudos possibilitados por meio de um bom conjunto de en-
trevistas oferecidos generosamente por noss@s interlocutor@s, professor@s ligad@s ao
campo da formação docente da Universidade Federal do Ceará - UFC e da Universi-
dade Federal Fluminense – Universidade Federal Fluminense - UFF, indicad@s pelos
estudantes através dos questionários citados. Essa indicação tinha como recorte o fato
de serem professor@s considerad@s dialógic@s ou que ministraram exitosamente aulas
dialógicas. Relembramos que foram efetivadas 25 *- na UFC e 14 entrevistas junto a UFF.
Nesse caso, conseguimos excelentes resultados. Desse corpo de resultados, nossa
aplicação de métodos de análise já sinalizados, chegamos a definir nossas categorias
empíricas, descritivas, depois de um processo que envolveu o destrinchar das narra-
tivas com foco nos temas de nosso interesse. Algo bem interessante e que muito nos
favoreceu foi poder concentrar tanto os resultados tematizados pela ideia de profes-
sor(a) dialógic@, quanto pela aula dialógica, puderam se associar em quatro catego-
rias. Sendo elas: Escuta, Horizontalidade, Acolhimento e Criticidade. Agora vamos
a elas, vamos dialogar com cada uma e em seguida apresentaremos o diálogo entre
essas categorias e os depoimentos de professor@s.
Escuta
Em se tratando de escuta, precisamos começar por uma definição do dicionário.
Assim, Escuta é um substantivo feminino que retrata a ação de escutar, de ficar à es-
preita para ouvir. Também pode ser entendido como serviço de recepção de ondas
hertzianas emitidas por rádios, realizado com o objetivo de fiscalização e controle das
telecomunicações. Significa ainda lugar onde se escuta, pessoa incumbida de escutar
as conversas dos outros, atividade de vigilância, sistema eletrônico pelo qual se ouvem
e/ou se gravam, a distância, conversas telefônicas clandestina ou secretamente. No
âmbito militar significa processo de detecção da atividade inimiga pelo som. Juridica-
mente se associa a ideia de “escuta especializada enquanto procedimento de entrevista
sobre situação de violência ou ato judicialmente considerado.
Etimologicamente, conforme o Dicionário Aurélio, a palavra escuta provem do la-
tim escutare, significando: "tornar-se ou estar atento para ouvir; dar ouvidos a; aplicar
o ouvido com atenção para perceber ou ouvir" (AURÉLIO, 1988).
90
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Escuta ativa é outro conceito que encontramos nas pesquisas pelas redes virtuais.
Aparece mais em outras áreas, particularmente nas empresariais. Se trata do Conceito
de Escuta Ativa. Esta se caracterizaria por abertura para com o outro, uma atenção plena
sobre o que a outra pessoa deseja expressar. Algo pode ser diferente a sua própria opi-
nião, no entanto, escutar de forma ativa significa atender com respeito à outra pessoa.
Implicaria na busca de compreensão através da empatia.
Ela se manifestaria de diversas formas, tais como tomar as palavras de seu interlo-
cutor como base para expor suas ideias e argumentos; usá-las para reconfigurar suas
próprias ideias; reelaborar em parceria.
Um dos marcos dessa proposta é o não julgar e o respeito às suas emoções, sentimen-
tos e experiências. Estaria associada a ideia de inteligência emocional e se apoia fortemente
na empatia. Há de se ter também atenção para com a linguagem corporal, olhares, sorrisos,
gestos, expressões faciais, seriam também informações importantes nessa escuta.
20
Acadêmico é um termo de origem latina, “academicus”, que remete ao termo academia que
provém do Grego “akademeia. Acadêmico está provavelmente associada ao termo Grego “aka-
demos”, um herói grego. “O Bosque de Akademos”, reza a lenda, foi o terreno onde Platão esta-
beleceu sua primeira escola filosófica. Diante disso, diz então que acadêmico é o termo que se
refere à academia ou a algo pertencente a ela... (Dicionário Aurélio, 1988)
91
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
92
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Explicitamente, Paulo Freire trata dessa escuta, como essencial na feitura desse
novo ser dialógico, capaz de enfrentar e superar esse contexto social excludente e
opressor, no livro Medo e Ousadia (FREIRE E SHOR, 1985, p. 75). Assim se pronuncia:
“Se estou aqui recriando o professor como alguém que fala e escuta, também estou
induzindo o aluno, a se recriar como alguém que escuta e que fala, dentro de um
novo roteiro a ser seguido na sala de aula. Penso que, aqui, a arte é a reinvenção
verbal, a recriação vocal através do diálogo.
Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele. Mesmo que,
em certas condições, precise de falar a ele. O que jamais faz quem aprende a
escutar para poder falar com é falar impositivamente. Até quando, necessaria-
mente, fala contraposições ou concepções do outro, fala com ele como sujeito
da escuta de sua fala crítica e não como objeto de seu discurso. O educador que
escuta aprende a difícil lição de transformar o seu discurso, às vezes necessário,
ao aluno, em uma fala com ele. (p. 58).
No processo da fala e da escuta a disciplina do silêncio a ser assumido com rigor e a seu
tempo pelos sujeitos que falam e escutam é um ‘sine qua’ da comunicação dialógica. O
primeiro sinal de que o sujeito que fala sabe escutar é a demonstração de sua capaci-
dade de controlar não só a necessidade de dizer a sua palavra, que é um direito, mas
também o gosto pessoal, profundamente respeitável, de expressá-la. Quem tem o que
dizer tem igualmente o direito e o dever de dizê-lo. É preciso, porém, que quem tem o
que dizer saiba, sem sombra de dúvida, não ser o único ou a única a ter o que dizer. (...),
acrescento, quem tem o que dizer deve assumir o dever de motivar, de desafiar quem
escuta, no sentido de que, quem escuta diga, fale, responda. E intolerável o direito que
se dá a si mesmo o educador autoritário de comportar-se como o proprietário da ver-
dade de que se apossa e do tempo para discorrer sobre ela. (...). Ao contrário, o espaço
do educador democrático, que aprende a falar escutando, é cortado pelo silêncio inter-
mitente de quem, falando, cala para escutar a quem, silencioso, e não silenciado, fala. A
importância do silêncio no espaço da comunicação é fundamental. ... (p. 60).
93
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Ainda segundo o dicionário Paulo Freire, este verbete aparece em várias de suas
páginas, tais como: 34, 58, 102, 119, 149, 153, 159, 160, 176, 192, 295, 296, 299, 315,
331, 337, 356, 366, 372, 389, 392.
Horizontalidade
21
DUSSEL, Enrique. Método para uma filosofia da libertação. São Paulo: Loyola, 1986.
22
GALEANO, Eduardo. Veias continuam abertas na América Latina. Entrevista concedida a Mario
Augusto Jakobskind. Disponível em: <http://www.outerspace.com.br>. Acesso em: 4 nov. 2007;
23
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.pribe-
ram.org/horizontalidade [consultado em 10-09-2020]. https://www.dicionarioinformal.com.
br/horizontalidade/
94
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
95
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Juntamente com uma crítica ética e, sobretudo, política, daquilo a que Paulo Frei-
re deu o nome de educação bancária, por oposição a uma educação libertadora,
surgem e se difundem práticas de ensinar-e-aprender fundadas na horizontalidade
das interações pedagógicas, no diálogo e na vivência da aprendizagem como um
processo ativo e partilhado de construção do saber (p. 117).
Acolhimento
96
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
dar crédito a; dar ouvido a; levar em consideração. Pode ainda ser entendido como
admitir (alguém) em seu convívio. Esse é um importante significado psicossocial,
caracterizando que alguém foi aceito por um grupo, que foi admitido em uma asso-
ciação. Pode retratar o sentido de deferir algo (pedido, opinião, requerimento etc.);
atender, escutar, ouvir27.
Etimologicamente a origem desse conceito está ligada a palavra “acolher”. Ela vem
do Latim ACOLLIGERE, que se traduz por levar em consideração, receber. Ainda se
liga a ideia de AD, “a”, mais colligere, “reunir, juntar”, este formado por COM, “junto”,
mais LEGERE, “reunir, coletar, recolher”28.
Termo muito utilizado no Direito como sinônimo de aceitação. Quando se inter-
põe algum recurso, no pedido o recorrente espera que seja dada resposta favorável a
seu recurso, ou seja, espera que suas argumentações sejam acolhidas, isto poderia ser
interpretado como acolher a solicitação. Constata-se o advento de uma novo lógica no
campo da justiça criminal, identificada com a ideia de acolhimento, que aponta para
um novo modo de vivenciar a execução penal onde cumpridores e equipe técnica se
dispõem a reconhecer necessidades individuais e coletivas dos sujeitos em sua comple-
xidade, como consequentes das desigualdades29.
Avançando em direção aos significados mais relevantes aos interesses de nosso
estudo atual, constatamos em pesquisas na internet, que o termo aparece mais fre-
quentemente associado ao campo da saúde ou do serviço social. Comum identificar o
termo ao recebimento afetuoso de pessoas em situação de rua, acolhimento institucio-
nal, serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV), entre similares... O
mais frequente de fato se liga a ideia de acolhimento em saúde, em situações de risco
social, recuperação de usuários de drogas. Diante desse quadro, vejamos o que diz a
Política Nacional de Humanização (Ministério da Saúde, 2003)30:
97
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A amorosidade freiriana que percorre toda sua obra e sua vida se materializa
no afeto como compromisso com o outro, que se faz engravidado da solidarieda-
de e da humildade. Usando o prefixo com-, ganha força a ideia de compromisso
que pode significar prometer-se consigo e com o outro. (...), em um emaranhado
que envolve respeito como uma categoria de acolhimento das diferenças, não ape-
nas como categoria cultural, embora também o seja, mas sua essência se constitui
como categoria de conteúdo ético.
A confiança é construída por atitudes de respeito como acolhimento, nos limites
das relações humanas possíveis, entremeadas de afeto e de disponibilidade para
o diálogo. A confiança não é dada por relações abertas, ela é condição construída
junto com a humildade, com a crença de que o possível é também construção ética
a transitar entre o pessoal e o social, ou melhor, entre o individual e o social que
nos constroem pessoas situadas no e com o mundo.
Tudo isto nos remete a um entendimento de que que, ao ter como categoria o
acolhimento, estamos na verdade identificando nas falas de professor@s a ideia da
amorosidade aplicada nas interações de sala de aula. Seria o amor em ação no contexto
didático-pedagógico. Não que a amorosidade se restrinja ao acolher, mas reconhecer
que o acolhimento significa tecer lugar de confiança, cuidado, respeito, afeto, sentir,
ser tocado e se deixar tocar.
Criticidade
98
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
32
Dicionário Online de Português - https://www.dicio.com.br/critica/
33
https://origemdapalavra.com.br/pergunta/critica/
34
O professor crítico-reflexivo. https://educador.brasilescola.uol.com.br/orientacoes/o-profes-
sor-critico-reflexivo.htm.,
35
NÓVOA, Antonio. Formação de professores e profissão docente. In. Os professores e a sua
formação. Nóvoa, A.(org.) 2. ed. Portugal: Publicações Dom Quixote, 1995.
99
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Bem, mas também concordo com a afirmativa de que é em Paulo Freire que a
educação se encontra conscientemente com a criticidade e reflete sobre ela e com ela
institui uma jornada epistemológica, na qual o ingênuo se torna crítico, a consciência
ingênua se torna consciência crítica, o conhecimento ingênuo se torna crítico. Desse
modo, ao investigar a grande obra, o Pedagogia do Oprimido, nos deparamos com
inúmeras afirmativas e indícios da essencialidade da Criticidade na feitura do ser li-
berto, que supera a subalternidade, a opressão, a colonialidade.
Assim, já no prefácio do livro, o Professor Ernani Maria Fiori, utiliza a ideia de
crítica/criticidade dezoito vezes. Tal como, quando afirma categoricamente seu poder:
“Essas palavras, oriundas do próprio universo vocabular do alfabetizando, uma vez
transfiguradas pela crítica, a ele retornam em ação transformadora do mundo”.
Vamos então as próprias palavras de Paulo Freire, definindo a importância da cri-
ticidade, e delineando um tanto quanto da sua práxis. Ele nos conta, já nas primeiras
palavras do livro, ao se referir a resultados de experiências decorrentes dos trabalhos
em seus cinco anos de exílio, somados a observações feitas no Brasil, em atividades
educativas, que um dos aspectos que lhe surpreende, nos cursos que realizou: “Não são
raras as vezes em que participantes destes cursos, numa atitude em que manifestam o
seu "medo da liberdade”, se referem ao que chamam de “perigo da conscientização”. “A
consciência crítica (...dizem...) é anárquica”. (PAULO FREIRE, 198736, p. 12).
Na sequência, página seguinte, ao tratar da relação entre fanatismo e setorização
em contraponto a radicalidade, destaca que a criatividade e a criticidade alimentam
a radicalização. Se refere a isso desse modo: “A radicalização, (...), é sempre criadora,
pela criticidade que a alimenta. Enquanto a sectarização é mítica, por isto alienante, a
radicalização é crítica, por isto libertadora”.
Ao afirmar o espírito do Pedagogia do Oprimido em antítese a uma pedagogia
para o oprimido, Freire (1987, p 17) nos alerta que: “A pedagogia do oprimido, que
não pode ser elaborada pelos opressores, é um dos instrumentos para esta descoberta
crítica – a dos oprimidos por si mesmos e a dos opressores pelos oprimidos, como ma-
nifestações da desumanização”. Vai mais profundo, ao ressaltar que somente aos opri-
midos cabe lutar por sua libertação e aos que se solidarizam realmente com eles e, nes-
se processo libertador, se torna essencial “... ganhar a consciência crítica da opressão,
na práxis desta busca. Vai então delineando o caminho e ressalta que: “Desta forma,
esta superação exige a inserção crítica dos oprimidos na realidade opressora, com que,
objetivando-a, simultaneamente atuam sobre ela. E sublinha que: “... inserção crítica
e ação já são a mesma coisa. Por isto também é que o mero reconhecimento de uma
realidade que não leve a esta inserção crítica (ação já) não conduz a nenhuma transfor-
mação da realidade objetiva, precisamente porque não é reconhecimento verdadeiro.”
(Op. Cit., p. 21).
Avança em suas elocubrações, dialoga com Lukács, e diz que concorda com a ques-
tão da correlação entre inserção crítica na realidade através da práxis, pois como assu-
me “... nenhuma realidade se transforma a si mesma”. E fecha essa ideia ao dizer que a
Pedagogia do Oprimido requer que os oprimidos “... se saibam ou comecem critica-
mente a saber-se oprimidos...”. (FREIRE, 1987, p 22). E, em seguida: “...se o momento
já é o da ação, esta se fará autêntica práxis se o saber dela resultante se faz objeto da
reflexão crítica. (Op. Cit., p. 29).
36
PAULO FREIRE, 1987, Pedagogia do Oprimido, versão digital, p. 12).
100
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Mais adiante, na página 30, (Freire, 1987) correlaciona esse movimento às relações
educativas e, mais uma vez, destaca a importância da criticidade. Nos informa: “Edu-
cador e educandos (liderança e massas), co-intencionados à realidade, se encontram
numa tarefa em que ambos são sujeitos no ato, não só de desvelá-la e, assim, critica-
mente conhecê-la, mas também no de re-criar este conhecimento.
Ao começar sua explicação acerca da educação bancária, Freire (1987, p. 40) enfa-
tiza seu caráter anestesiante, inibindo o poder de criação dos educandos, enquanto a
educação dialógica, problematizadora, implicaria em constante desvelar da realidade:
No trato de ações concretas, na práxis didático pedagógica, mais uma vez Paulo
Freire (1987, p. 50) vai destacar a significativa relevância da criticidade ao dizer: “...: “a
constatação do “tema gerador”, como uma concretização, é algo a que chegamos atra-
vés, não só da própria experiência existencial, mas também de uma reflexão crítica
sobre as relações homens-mundo e homens-homens, implícitas nas primeiras.
Muito interessante é a alusão que ele faz ao poder decorrente da percepção crítica
de “..., na ação mesma, se desenvolve um clima de esperança e confiança que leva os
homens a empenhar-se na superação das “situações-limites”. (FREIRE, 1987, p. 51).
Retoma a caracterização da criticidade ao afirmar que “... a análise crítica de uma
dimensão significativo-existencial possibilita aos indivíduos uma nova postura, tam-
bém crítica, em face das “situações-limites”. (OP. Cit., p 55). E aí corporifica a práxis
no trato da decodificação associada a análise crítica, conforme pode se constatar no
rodapé da mesma página.
Outro ponto importante, para entendermos freireanamente a criticidade, é quando
Paulo Freire (1987, p. P. 57) alude ao fato de que uma investigação instituinte da práxis
educativa: “... se fará tão mais pedagógica quanto mais crítica e tão mais crítica quanto,
deixando de perder-se nos esquemas estreitos das visões parciais da realidade, das
visões “focalistas” da realidade, se fixe na compreensão da totalidade”.
E esmiúça a atividade acerca da codificação e decodificação aludindo ao fato de
que: “Os homens são porque estão em situação. E serão tanto mais quanto não só pen-
sem criticamente sobre sua forma de estar, mas criticamente atuem sobre a situação
em que estão. (FREIRE, 1987, p. 58). Por isso mesmo: “As codificações não são slogans,
são objetos cognoscíveis, desafios sobre que deve incidir a reflexão crítica dos sujeitos
descodificadores. (Op. cit., p. 62).
Olha que forte essa afirmativa e quão rica de significados: “Críticos seremos, verda-
deiros, se vivermos a plenitude da práxis. Isto é, se nossa ação involucra uma crítica
101
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
reflexão que, organizando cada vez o pensar, nos leva a superar um conhecimento
estritamente ingênuo da realidade. (FREIRE, 1987, p. 73).
Desde esse ponto, Paulo Freire vai ressaltar o quanto precisamos reconhecer nossa
condição de alojar @ opressor(a) e que é na criticidade que se pode reconhecer essa
aderência e a potência de criticamente superar essa contradição. Demonstra então que
na problematização da situação limite podemos exercer uma “análise crítica sobre a
realidade problema”. (FREIRE, 1987, p. 97). Daí: “... na síntese cultural, não há, invaso-
res, não há modelos impostos, [@s ator@s], fazendo da realidade objeto de sua análise
crítica, jamais dicotomizada da ação, se vão inserindo no processo histórico, como
sujeitos. (Op. Cit., p. 106).
Transitando para finalizar essa obra magistral do saber educativo, Freire (1987,
p. 107) vai destacar a essencialidade libertadora de se: “Ter a consciência crítica de
que é preciso ser o proprietário de seu trabalho”. E conclui suas reflexões acerca da
criticidade já na última página do livro ao proferir essa afirmativa autorreflexiva e crí-
tica: “Desta maneira, nos daremos por satisfeitos se, dos possíveis leitores deste ensaio,
surjam críticas capazes de retificar erros e equívocos, de aprofundar afirmações e de
apontar o Que não vimos.
Trazendo Freire, em Pedagogia da autonomia (1996, p. 32 e 33), ele afirma de for-
ma conclusiva: “A necessária promoção da ingenuidade a criticidade não pode ou não
deve ser feita a distância de uma rigorosa formação ética ao lado sempre da estética.
Decência e boniteza de mãos dadas”. Ainda nessa mesma obra, Freire trata expli-
citamente da criticidade no cenário da formação docente. São palavras suas: “... por
isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da
reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente sobre a prática de hoje ou de
ontem que se pode melhorar a próxima prática” (Freire, 1996, p. 39).
Bem, mas numa volta ao Dicionário Paulo Freire (STRECK, REDIN, ZITKOSKI,
2015) ao definir “Condicionado e Determinado, Jaime José Zitkoski nos fala que a
proposta de Freire foi eminentemente na intencionalidade de superarmos a condição
ingênua e atingirmos a criticidade da consciência como próprio da ontologia humana.
No vocábulo ‘Conflito’, no dicionário citado ((STRECK, REDIN, ZITKOSKI, 2015,
p. 144) constatamos Moacir de Góes afirmar que:
102
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Ainda como fruto desse processo de criação do Moreira, ele vai nos oferecer cita-
ções de Paulo Feire, presentes no Pedagogia do oprimido (1987), no qual Paulo Freire
concebe pensar certo como condição básica para a superação da curiosidade ingênua
em direção ao conhecimento crítico na formulação de: ... um conhecimento crítico
como base para a práxis transformadora”. Assim sendo, o pensar certo seria um pen-
sar crítico, é o que afirma Moreira, com o qual concordo. E, nesse processo de trans-
mutação da curiosidade ingênua em epistemológica, Esse autor nos oferece subsídios
oriundos do livro Pedagogia da autonomia (1997), no qual afirma Paulo Freire que o
educador é capaz de potencializar a construção do conhecimento pelos educandos, a
partir da definição conjunta de conteúdo a serem trabalhados por meio de um diálogo
‘crítico-problematizador’, na busca de formar “pessoas críticas, de raciocínio rápido,
com sentido de risco, curiosas, indagadoras” (FREIRE, 2000, p. 100).
Finalizando essa categoria de análise empírica, ainda informamos que segundo o
próprio dicionário Paulo Freire (STRECK; ZITKOSKI, 2015), é possível encontrar o
conceito de criticidade (atitude crítica) citado em várias de suas páginas: 29, 58, 61, 79,
81, 84, 88, 89, 97, 98, 99, 135, 144, 165, 180, 208, 246, 247, 268, 296, 299, 306, 307, 346,
347, 362, 356, 380.
Será que podemos associar essas categorias aos princípios dialógicos? Poderiam
se vincular assim: Escuta Fiel e esperançosa; Horizontalidade Humilde; Acolhimento
Amoroso; Criticidade Democrática. Poderíamos interligar essas categorias a metáfo-
ras categoriais da Perspectiva Eco-Relacional - PER? Tipo: Contextualização, grupos
aprendentes, autor(a) epistêmic@, saber parceiro?
103
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
enfatizar que a ideia de teoria e prática em Freire se diferenciam de outras lógicas e re-
ferenciais. Já que para Paulo Freire teoria e prática não se separam, há de se ter práxis,
ou seja, ação reflexão-ação para nos dar vida e orientar a vida.
Porém, ficaria inviável trazer como base desse diálogo todos os depoimentos e nar-
rativas de professores e professoras indicad@s como dialógic@s pel@s estudantes da
Universidade Federal do Ceará - UFC e da Universidade Federal Fluminense - UFF.
Por isso e por uma razão cientifica, já que o conhecimento científico utiliza procedi-
mentos que lhe permita considerar a validade desses conhecimentos produzidos.
Em virtude desses fatores, argumentos justos, optamos por trabalhar os depoimen-
tos colhidos através das entrevistas tendo como referência epistemo-metodológica a
Perspectiva Eco-Relacional - PER somada a ideia de uma Análise mais aprofundada.
Certamente, atravessamos o clássico mais utilizado no campo das ciências humanas,
a Análise de Conteúdo de Laurence Bardin (1977), seguimos rumo a uma abordagem
mais aprofundada com os contributos da professora Marli André (1986, 2013) e chega-
mos às proposições de Roque Morais (1999, 2003), com o que ele chama de processos
de análise textual qualitativa.
Nos encontramos plenamente com esse autor e sua proposta. Adotada essa práxis
de pesquisa, buscamos reouvir os depoimentos d@s professor@s, frutos das entrevis-
tas, reler todo o material, transcrições, observações do diário de campo, elaborados
durante meu pós-doutorado. Em seguida, efetuar recortes e marcar trechos mais sig-
nificativos.
Optamos por trabalhar com dois temas geradores: Aula dialógica e professor dialó-
gico. Eles teriam mais potência para nos ajudar a atender meus objetivos e consolidar
essa tese e suas contribuições.
Quando fomos verificar o tema gerador “Aula Dialógica”, tivemos, numa primeira
aproximação desse material, um conjunto de categorias que emergiram dos textos:
No trato do material inerente aos professores e professoras da UFC
Escuta, aprender com..., se formar com, ... se transformar com..., participação (ati-
va), horizontalidade, relação horizontal, ética, política, respeito, acolher, acolhimento,
formação reflexiva, reflexão crítica, criticidade, aprendizagem sentida/significativa,
troca, clima favorável, autonomia, reciprocidade,
No trato do material inerente aos professores e professoras da UFF:
Escuta, participar da construção do conhecimento, lugar de fala e escuta políti-
ca, tecer junto o conhecimento, realidade diferente, aprender com..., troca, partir da
experiência de vida dos estudantes, horizontalidade, provocativa, fazer sentido, dar
voz!!!, democrática, sentir junto, criticidade, espaço confortável para falar, perguntar,
concordar, discordar.
Depois de uma apreciação quanti-qualitativa chegamos à definição das quatro
principais categorias. Eles contemplavam o conjunto de respostas identificadas junto
ao corpo docente investigado, noss@s parceir@s nessa tese. Estas que apresentamos
anteriormente e com elas aprofundamos estudos e compreensões, para que pudessem
consubstanciar nossa interpretação dos resultados que apresentaremos em seguida.
104
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Escuta
• UFC
105
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
nosso próprio professor é aquele que professa e o nosso desafio hoje é exatamente
o acolhedor.
É uma questão de valores, né?... cada um tem os seus e entra na história do acolher.
Tem determinadas pessoas que tem outros valores e tenho que entender de uma
certa forma até que isso não me agrada que o outro pensa diferente, aja diferente
de mim, tenha outros valores, tenha outros princípios né, mas eu acho que é isso…
nós somos pessoas, nós somos um, mas somos diferentes, mas nós somos iguais
no sentido do projeto do humano, então nós somos iguais e somos diferentes...
... questão da hierarquia… quanto maior o controle, menor é a capacidade de
expressão, menor a possibilidade de se estabelecer relações igualitárias que
possam exercer continuamente a escuta. Eu entendo que aqui no ponto de vista
histórico… é um contexto de muito silenciamento de muito medo e associado ao
controle existe o medo, então as nossas relações são muito baseadas nisso do con-
trole, do medo. .... A gente precisa desenvolver nos estudantes da gente, a minha
responsabilidade como acolhedor… e que eles têm uma oportunidade de se ex-
pressar… discordarem uns dos outros, de mim…
Gardênia
• UFF
Agapanto
Então, (...) não é uma questão só profissional, eu acho que isso tem que está na
nossa vida. .... Assim, eu acho que a escuta do outro e a possibilidade de dialogar tem
106
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
que ser algo que é do meu cotidiano. (...) ... está na relação com meus alunos, mas tem
que está na relação com minhas filhas, com as pessoas que trabalham comigo, sempre
numa perspectiva de que o dialógico ele é a possibilidade de um diálogo, e aí o dialogo
já é algo que não é autoritário, sem me colocar como melhor que ele, embora reconhe-
cendo que tem alguns saberes que eu tenho e que aquelas pessoas não têm e vice versa
assim e dependendo do lugar onde eu esteja isso tem um valor, tem uma importância
como mãe, como professora, agora sempre fazendo uma tentativa de ouvir o que o
outro tem pra dizer e fazer sentido disso naquilo que, por exemplo, no caso da aula,
fazer sentido disso pro conteúdo que está sendo trabalhado.
Agapanto associa sua prática de escuta pedagógica a escuta do cotidiano, em to-
das suas instâncias de vida. Ressalta que precisa escutar como professora, como mãe,
como ser humano. E propõe que isso seja um sinal de escuta autêntica e de fala verda-
deira de seus/suas estudantes.
Sandra A (Educação): Eu trouxe pra eles assistirem uma fala de uma pessoa, uma
escritora da Nigéria eu acho Chimamanda Adichie, ela tem uma fala que ela fala
sobre história única. Aí eu trouxe esse vídeo pra gente pensar como que a gente
tem que ter esse cuidado do olhar pros conteúdos, que a gente tem que ter esse cui-
dado na relação com os alunos de não criar uma história única assim do mundo.
Eu peço pra eles lerem um livro, aí eu peço pra eles fazerem o seguinte, eles vão
ler o livro e eles vão ter que tematizar, eles tematizam e a partir dessa tematização
eles citam trechos literais do livro. Às vezes eles leem, às vezes eu leio e aí a gente
vai discutindo os sentidos daquilo né pra eles e aí começam a falar da experiência
deles como alunos principalmente assim.
Eles foram visitar a escola, eles tinham um roteirinho assim de coisas que eu acho
que eram importantes eles não deixarem de olhar. ... eles fazem entrevista com a
diretora, tirar foto e depois eles assistem uma aula e fazem uma entrevista com
o professor e com alguns alunos. Aí depois eles escrevem um relatório contando
como que foi.
Jacinto
... experiência de dar a voz para os alunos, principalmente os alunos mais carentes,
os alunos com mais dificuldades.... Então vem a leitura de mundo, ver o mundo que
se está... É sempre diálogo, tentar fazer uma mediação da fala, na escola básica eles
tendem ao silencio, a interdição então, você desconstruir isso é muito difícil. ...a gente
sempre trabalha muito com as questões das sensações que eles têm e... Então, se certa
forma o que eu faço é tentar compartilhar as nossas experiências, sem deixar de lado
os conteúdos que me cabem enquanto professor da disciplina. (...). Eu não consigo
entender educação ou o processo de ensino e aprendizagem em que o professor não
aprenda também. Então, é... eu preciso que me falem pra eu melhorar. Primeiro que
eu não gosto desse lugar de conforto... eu vi muitos anos as pessoas caladas, sem voz e
agora eu quero a voz... e pra dar a voz para as pessoas é muito difícil porque elas têm
medo de falar, tem medo do professor, tem medo da nota, tem medo dos colegas, tem
107
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
medo de tudo. Então... a construção tem que ser algo num lugar onde se sinta muito
bem. E pra que você se sinta bem eu tenho que estar me sentindo bem também. Então,
é um processo de troca. (...), eu sempre digo pra eles que eu não sou dono da verdade.
Jacinto fala em dar voz e atuar na mediação. Isso nos remete a ideia de uma frágil
escuta ou uma escuta que pode ser qualificada. Afinal, há uma distinção efetiva entre
o que se é o que se idealiza ser. E nesse trânsito nos costuramos enquanto agentes da
escuta sensível e afetiva. Tanto é real isso que sinaliza para a expectativa de se fazer
mais, como diria Freire com a pretensão de “ser mais”.
Lavanda
...tem que dar abertura inicialmente pra colocação dos alunos é… criar instru-
mentos e estratégias pra que eles possam se colocar e que a gente possa efetivamente
dialogar, ... então, eu acho que uma aula dialógica é uma aula que os alunos se sentem
confortáveis em se colocar, em perguntar e apresentar e que o professor tenha ciência
disso e não queira monopolizar a fala. (...).
Ainda há uma concepção de que tem que dar abertura, mas nos indica que isso está
imbricado a uma proposta autêntica de escuta ao projetar e tecer junto ambientes de
conforto para a fala e a escuta. E há uma provocação para que a fala ocorra e a escuta
seja promovida.
Escutar é verbo, princípio ativo que conclama, grita alto para que tenhamos a dis-
ponibilidade de consolidar espaços, ambientes, costurados coletivamente, nos quais
@s educand@s se constituam como possibilidade de ser autor(a) epistêmico (FIGUEI-
REDO, 2003; 2007) do processo de tessitura do conhecimento. E isso ocorrendo por
meio da escuta qualificada e atenta, paciente a ativa, que considera as interpretações
108
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Horizontalidade
UFC
Azaléa
Uma aula dialógica é uma aula... que todos... todas as pessoas podem participar
igualmente... não... igualmente não... (risos) deixa eu pensar... uma aula dialógica é
uma aula que estimula ou que permite a participação de todos os envolvidos, ou
seja, que a condução da aula não fica centrada no professor ou na professora né... o
professor planeja a sua aula de tal forma que os estudantes também possam participar
dessa construção de conhecimento coletivo. Uma aula que possibilite o... o despertar
do conhecimento que os estudantes já trazem, uma ideia meio socrática assim... e que
o conhecimento de cada um... de professor, professora e estudantes contribua junto
com os conteúdos, os temas que estão sendo ali estudados, os livros, os autores,
os textos... que tudo isso vai gerar um novo conhecimento pra cada um e também
coletivo que é maior do que o que era antes. Acho que uma das primeiras coisas é
estar aberta a aprender assim, com os alunos, reconhecer que mesmo eu tendo uma
caminhada maior do que a deles eu ainda posso aprender com eles e que eu estou
aprendendo...aprendendo sobre os conteúdos, sobre os temas, mas também aprenden-
do a ser professora o tempo todo, então essa coisa de que eu não estou formada... mas
de que eu estou me construindo como professora e estar aberta a isso. Estar aberta a
dialogar sobre as necessidades dos estudantes, as demandas deles, o que eles que-
rem aprender ali é... e buscar sempre essa horizontalidade. Não só de mim para
com eles, né... de uma forma equilibrada...(...). Acho que também inclui nisso, em ser
uma professora dialógica, a luta pelos direitos de todos, né... porque eu acho que a
educação é uma instancia fundamental na luta pelos direitos de todos e de todas.
Horizontalidade chama para o compartilhar, na leitura de Azaléia. É se colocar na
humildade que reconhece que tem o que aprender tanto quanto o que ensinar. E se
dispõe a reconhecer os limites e as potencias d@s discentes. E considera, ainda que isso
mobiliza e empodera para a busca dos direitos comuns a tod@s.
109
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Copo-de-leite
Uma aula dialógica é a que prima pela troca, pelo diálogo com o aluno, é... que não
tem uma hierarquia... no caso eu trabalho muito isso, eu procuro sempre ter uma re-
lação de igualdade com os alunos, então tá sempre aberta à palavra, a troca e o diálogo.
(...). Então, a gente conversa muito sobre tudo, né... e tudo é feito a partir do que
eles vão trazendo e a gente vai fazendo é... coletivamente.
110
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Copo-de-leite, reconhece que uma aula dialógica precisa ser experienciada como
troca, mas uma troca sem hierarquias opressoras e colonializantes. Ela se dispõe a
uma relação de igualdade. E isso abre espaço para o macramê, o fuxico37, para o fazer
coletivo compartilhado.
Kalanchoê
Eu acho que uma aula dialógica é uma aula que faz com que os alunos se coloquem
né... que trabalha e aí nesse sentido acho que o próprio Freire mesmo... (...). o meu
método de pedagogia de aula foi criado por Sócrates, é a maiêutica. (risos) eu gosto
de fazer perguntas, né... que são sempre essa perspectiva que parte do aluno. Uma das
maneiras é pedir que eles falem de algum modo sobre o conteúdo prévio que a gente
acordou. O que ele conseguiu ler... o que ele achou, como aquilo fala pra ele, esse foi
Fuxico é uma artesiana feita a muitas mãos, com as quais as colchas de retalhos são tecidas.
37
Momento que em círculo, em igualdade de condições as pessoas contribuem para a obra conjunta.
111
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
difícil, esse não foi... aí ele vai trazer um pouco da sua própria realidade... eu gosto de
conhecer os alunos, saber de onde vem, essa coisa toda de... (...) eu acho que é isso,
é horizontalizar a sala de aula né... tornar a sala de aula um lugar mais participa-
tivo... Eu gosto do texto do Ítalo Calvino porque diz... o clássico não tá na contramão
dessa vida...
Na perspectiva da horizontalidade Kalanchoê busca parturiar saberes parceiros
(FIGUEREDO, 2003; 2007). E nesse processo está a proposta de criar um lugar de
participação e cooperação na feitura de aprendizagens e tessitura de novos conheceres.
• UFF
Peônia
.... Isso, nesse sentido me parece que organiza a própria disciplina porque você
parte do pressuposto de que você não é a figura central ou não é a única figura do
processo de ensino aprendizagem. Você vê que essa disciplina precisa ser construída
coletivamente dentro de sala de aula de uma forma menos verticalizada do que se
for tradicionalmente. (...). Eu considero isso indispensável. … ainda que a gente as-
suma a… o ponto de vista Paulo Freireano, a ideia de que a dialética, que a… que a
troca faz parte da sala de aula, quer dizer, que a gente aprende ensinando e ensina
aprendendo (...). Me parece que a ideia é estimular a compreensão de que a sala de
aula é um espaço de construção coletiva do conhecimento … que seu sucesso depen-
de a ascensão dessa coletividade. (...). ... minha expectativa inicial é que de alguma
forma eles reconheçam que exista essa possibilidade da prática docente, o caminho
possível em que os alunos sejam ouvidos e reconhecidos em sua gênese. Me parece
que essa é uma demanda absolutamente necessária porque é uma questão política que
está em jogo. É a capacidade de exercer seu direito a palavra, de exercer sua posição,
de exercer democraticamente a ocupação legítima do espaço, tirando essa verti-
calização. ... acho que é importante que os alunos e as alunas estejam confortáveis
pra expor suas dúvidas, que podem se manifestar politicamente, enfim… rompendo
uma lógica de silêncio que eu acho que não tem mais espaço hoje em dia. (...)… acho
que é o principal resultado e torna a aula de fato mais agradável, e torna o encontro
mais motivador. Exatamente, talvez, pela questão do controle. (...) é uma questão in-
teressante, mas talvez quando você coloca, quando você se exime do poder de querer
112
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
controlar tudo o que acontece na sua sala de aula você também abre espaço pro novo,
você também permite que alguma coisa aconteça e se reserva o direito de escutar esse
acontecimento. De uma pergunta insólita, que uma questão que você não pensou, de
que o teu aluno te provoca a pensar e que você por sua vez levanta uma questão que
também não tinha sido colocada anteriormente e que faz com que o aluno tenha uma
visão diferente a respeito da própria experiência de mundo. Então, acho que tem uma
espécie de acontecimento que é próprio da aula dialógica....
Peônia começa sinalizando para a necessidade de deixar a centralidade nos pro-
cessos didático-pedagógicos. Destaca o fazer coletivo. Revisita a frase de Paulo Freire
de que é preciso aprender para poder ensinar realmente. E que ao ensinar, se aprende.
Que a legitima ocupação do espaço da sala de aula implica em uma postura democrá-
tica. E nos fala de algo extremamente caro aos tempos atuais, largar a ideia de controle
e de manter tudo sob sua batuta, pois que isso abre as condições para o advento do
inédito viável, o sonho possível.
Assim, podemos constatar nessa categoria a disposição para relações em que a di-
mensão das relações entre iguais, embora diferentes, definam e orientem a dialógica da
sala de aula. A horizontalidade: é percebida como estar disponível a compreender-se
em um processo de crescimento, de ensino e aprendizagem, fora de posturas hierar-
quizantes, castradoras, impondo submissão e utilizando de estratégias de dominação,
subalternização, opressão. Ao abrir mão de definir uma figura socialmente construída
do educador como figura “falante” que domina o processo de aprendizado, ocorre uma
atitude de respeitar @ educand@ e suas contribuições, no cenário de um processo que
prioriza a partilha de saberes e práticas na elaboração do ambiente da aula.
Acolhimento
• UFC
Amor-perfeito
Pra além dos termos freireanos, uma aula dialógica pra mim é uma aula que conse-
gue inverter a lógica tradicional da comunicação professor aluno. Pra que isso acon-
113
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
teça, pra que haja uma aula dialógica todos os elementos do ensino são modificados,
então a função da educação muda e por isso o papel do professor muda e é nesse
sentido que eu acho que haja uma inversão epistemológica em que o centro de todas as
decisões, né... de todo o processo de planejamento e avaliação do que acontece em
sala de aula é o aluno e a aprendizagem do aluno. Pra mim numa aula dialógica é a
aprendizagem do aluno que comanda todos os elementos do ensino.
Na narrativa dessa educadora, ela vai ressaltar a importância do cuidado amoroso,
do abrigar, agasalhar @s educand@s para que a aprendizagem ocorra. Redefinir tudo
com base no aprender implica que o ensinar se definiria pelo um conjunto de fatores
que atravessam @ outr@ e nos impulsiona a estar receptiv@ a esse outr, a essa outra,
que nos constitui.
1. Todo mundo lê um texto, só que tem um grupo que naquele dia vai tá respon-
sável por ler o texto e me mostrar como é que o ambiente muda tendo feito
aquela leitura, então eles vão vir pra arrumar a sala de tal modo que a compre-
ensão dele sobre o texto apareça no ambiente. Outro grupo vai ler o texto e vai
fazer uma atividade de acolhimento. Não pode ser uma dinâmica de grupo
qualquer. Tem que ser uma dinâmica de grupo que tenha a ver com o texto,
que ele tem que me mostrar uma habilidade de ser capaz de coordenar um
grupo conforme o texto lido. Que pedagogicamente, cientificamente na peda-
gogia eles aprenderam. Existe um grupo que vai trabalhar a sistematização das
informações no nível mais cognitivo, certo? Tem um outro grupo de vai tra-
balhar a confecção de um brinquedo ou uma brincadeira a partir do texto e o
último grupo seria assim, vocês vão me mostrar fora daqui o que aprenderam
nessa aula. Então eles vão pra escola pública, eles podem escolher espalhar
cartazes pela faculdade, tem gente que cria canal no YouTube pra mostrar o
que aprendeu, tem gente que posta notícia na internet como um todo, tem
gente que faz atividade em outra disciplina, é super curioso porque aquilo que
ele aprendeu com os colegas sobre aula, sobre dinâmica de grupo me mostra
que pegou e na aula de ensino de ciências ele aplicou aquilo né que é uma coisa
de cuidar da sistematização pra além da sala de aula. Então eu considero que
essa é uma unidade toda dialógica.
2. ... eu trabalho com três perspectivas de aprendizagem: aprendizagem das ci-
ências que seria uma coisa mais cognitiva eu não abro mão disso; a aprendiza-
gem do fazer, uma habilidade de ser pedagogo, desenvolver um conhecimento
pedagógico e a aprendizagem do ser.... eu tenho uma síntese do texto, eu tenho
a minha exposição do texto, eu tenho a minha sistematização do texto ou eu
ou os monitores né... mas isso dura geralmente, por exemplo, numa manhã
de quatro horas isso dura meia hora. O resto da manhã eles vão trabalhar as
transgressões da aprendizagem ou em termos cognitivos, então... aí são mil
recursos que a gente tem de metodologia ativa né... vamos elaborar material
didático, vamos fazer um gancho com a prática deles lá de pedagogo, de pro-
fessores né... e vamos geralmente trabalhar os valores que são princípios mo-
rais e éticos que estão envolvidos com aquela aprendizagem.
114
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
3. No começo eles vão estranhando porque aparece como uma novidade pra eles,
não só tem o direito de falar como eles passam a assumir a responsabilidade
sobre a sua fala e depois eu começo a geralmente ter uma experiência positiva
que eles começam a disputar... vir a disputar e fazer o melhor que pra mim é
uma experiência de crescimento muito grande. Eu aprendo muito com eles
e ao mesmo tempo me sinto... me sinto... importante na formação deles, no
sentido de eles acreditarem mais na educação... na potência do grupo...
4. ...eles pesquisam o pensamento da criança sobre o mundo, mundo natural.... o
que é que faz cócegas na cabeça das crianças de 5 a 12 anos. Como é que elas
olham pro universo em que elas vivem, o que ela tem maior curiosidade de
saber sobre o mundo e que a escola não responde. Eles fazem um levantamen-
to dessas questões e vão fazer uma intervenção com a professora da escola e
como eles vão planejar uma aula pra responder aquela criança. Se não houver
esse pensamento mais expandido, que eu acho que uma perspectiva crítica ou
uma perspectiva dialógica trazem eles não conseguem fazer uma boa aula. ...
porque é curioso que o grupo da pedagogia não saiba o assunto que os alunos
querem saber.... que as crianças querem saber... os futuros pedagogos geral-
mente não sabem por que a chuva cai em gotas, por que é que não é só dia e
por que não é só noite. Eles perguntam as coisas mais inusitadas do mundo,
então....eu digo assim “esse menino existe?” Ele está na sua sala de aula. Como
é que você planejaria pra esse conhecimento aí que não está previsto no script
do planejamento e mais do que isso os colegas têm que saberem a resposta
e terem que responder isso e com isso se cria uma sistematização de muitas
informações sem o peso que poderia ter, né... porque vai aparecer conteúdo
de física, de química, de biologia e eles vão planejando... as nossas crianças no
ensino fundamental, a grande curiosidade delas, com raras exceções é a natu-
reza. Que eu acho que é justificável porque é a origem das ciências, é a origem
do mundo humano, né, essa curiosidade. Só que os professores deixam de ter
essa curiosidade, aí esse meio do caminho os professores estão sendo forma-
dos metodologicamente só é possível se eu abrir pra que eles falem muito, que
eles não tenham medo de perguntar as coisas mais bobas, que eles reconhe-
çam o saber do outro e isso pra mim é dialógico.
5. É uma dificuldade... não só ler como escrever, pra mim é uma dificuldade
enorme. Eles precisam aprender a escrever porque eles não sabem. Não são es-
timulados, né... eu acho que uma das coisas é eu ofertar várias fontes de leitura
que inclusive é um choque pra eles. Ao invés de eu trazer um texto, eu mostro
vários textos. Eu digo “pelo menos um você vai gostar de ler” aí eu vou dizen-
do assim “se você quer se formar num ponto de vista de muita qualidade pra
responder a vários desafios da pedagogia você vai ter que ler todos, mas vamos
supor que você não tenha tempo e que não queira ler todos, você vai ter que
ler pelo menos um”.... Ele precisa estudar pra ser um bom professor, você pre-
cisa ter competência teórica. Eu sei que eu faço isso toda aula... ou lê canções,
ou lê textos que são da literatura, ou histórias, ou reflexões de pessoas como
Paulo Freire e também Rubem Alves que trazem um aspecto da formação do
professor que muitas vezes muitos textos acadêmicos não trazem, que é a for-
mação ética e moral do ser, do aprender a ser. Então é no lugar do sentimento
que eu acho que é o maior estímulo, que ele traz no pensamento, aquilo que
é mais potente pra aprendizagem dele que é o desejo de aprender. Aí eu vou
115
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
provocando esse desejo... por filmes, existem milhares de filmes curtos, filmes
de cinco minutos, várias historinhas, tem vários livros que trabalham já com
as temáticas que são teóricas .... Eu acho que o estímulo é pela sensibilidade.
Sem educação da sensibilidade fica sempre uma ordem externa e eu preciso
que essa ordem seja interna pra que ele queira estudar mais e estudar bem.
E, pra minha surpresa, vários me abordam “professora estou lendo esse livro,
ele é maravilhoso”. Eu nem pedi, eu nem obriguei... eles vão atrás. Se você me
perguntar por quê? É pela sensibilidade. Tem uma coisa que é assim... eu gosto
muito de gente, eu gosto muito de gente, eu gosto de ouvir história das pesso-
as, eu gosto... por isso que eu ando de ônibus porque eu adoro ouvir história,
adoro ouvir recortes da vida das pessoas, por isso que eu gosto de literatura,
porque tem recorte, por isso que eu gosto de bossa nova e de música brega
porque tem recorte do cotidiano. Eu adoro o cotidiano, né. ... eles sabem que
eu gosto muito deles, eles sabem que eu torço muito por eles, eles sabem que
eu faço tudo pra eles aprenderem. Eu já ouvi depoimentos de alunos assim......
“você cuida tanto da gente que é impossível de eu te sacanear”.
6. Vou te dar um exemplo, teve um dia aqui que vários iam sair da aula pra irem
fazer uma pesquisa obrigada numa escola aqui, uma visita obrigada, eles esta-
vam superchateados de fazer a visita e como teoricamente eu sou a boazinha,
eles vieram no começo da aula e de repente dez pessoas foram embora. Só
que a magia da Didática pra mim é que aquilo que acontece na minha aula é
teórico e eu estava discutindo objetivo do ensino, então eu enganchei aquela
evasão repentina com os motivos que eles vieram, muito respeitosamente, di-
zer só que eu levantei a questão. Eu digo “veja como é complicado a formação
ética das pessoas. Como você escolhe uma atividade que você está dizendo
que péssima, que é obrigatória, que você não vê o menor sentido de ir, que
você vai pra cumprir tarefa e você abre mão daquilo que você está dizendo
que é prazeroso pra você”. Sabe o que aconteceu? Foi a duas semanas atrás,
pelo WhatsApp eles avisaram aos colegas que não tinham saído daqui e todos
voltaram. Coagi pra eles voltarem? Não. Chamei a reflexão, porque se não eles
começam a privilegiar os castradores, os tradicionalistas, eles começam a estu-
dar muito pro texto da disciplina que vai lascar na cabeça deles e abandonam
o estudo que vai ter sistematização, mas não é pelo terror, não é pela imposi-
ção. Eu digo “presta atenção no que você tá escolhendo, porque esse mundo
se fala muito mal dele... é nosso. Então que horas você reproduz isso que a
teoria pedagógica está lhe convidando a não reproduzir? Por exemplo, eu digo
“vocês acham que a professora que vocês vão observar, que vocês tacam o pau
geralmente... vão pra escola pública e as professoras não prestam... em que
vocês são diferentes delas? Vocês acham que elas se rendem ao sistema não
foi porque passaram por essa formação? Por que será que elas se rendem ao
sistema? Tem uma ponte daqui pra escola e a gente cai no foço?” Não, somos
nós, então se todo dia eu não olhar o que eu to fazendo eu vou reproduzir.
Então, é pelo sentimento que chega lá, sabe.
7. Tem alguma ponta de formação na aprendizagem do ser que eu acho que é
uma coisa muito descuidada na formação inicial dos professores. Você traba-
lha bem com a teoria científica, você trabalha bem com a teoria pedagógica,
até isso, mas você não trabalha com aquilo que vai juntar uma coisa com a
outra. Entender que são princípios de sociabilidade.
116
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
8. ... se precisar reprovar eu reprovo, dou limite... tem gente agora que precisou
de um limite que se você olhar de fora vai dizer que isso é tradicional e eu vou
dizer pra você que isso não tem nada de tradicional. É o máximo da dialogia.
Eu lhe respeitar a tal ponto que eu digo “você não vai burlar esse sistema com
esse tipo de ação”. O máximo de dialogia pra mim é chegar nesse extremo que
parece ser um extremo tradicional.
Begônia
... uma aula dialógica é aquela que estabelece uma dialética como eu sempre falo
com os meus alunos. Quando eles chegam, eles trazem elementos das suas próprias
vivencias e eu tenho as minhas e ao longo do processo essas relações, elas se inter-
penetram ao longo do curso... nós trabalhamos juntos de forma que tanto na meto-
dologia, quanto na avaliação, quanto na didática, quanto na relação interpessoal é... ao
final eu saio transformada e eles também. E eu estabeleço um mediador nessa relação
que é o conhecimento... (...) por isso que eu digo pra eles “quando esse processo fina-
liza eu saio diferente e vocês também. Se a gente não se transformar nesse processo é
porque não houve essa dialogicidade”.
O eixo dessa narrativa da Begônia se configura ao redor do caminhar junt@ para
que possa semear e colher o resultado desse processo. Há um esperançar que se realiza
nesse projeto que envolve o acolher respeitoso e afetuoso e se manifesta em uma práxis
que entremeia o científico com o “senso comum”, os saberes acadêmicos com os sabe-
res de mundo que @s educand@s trazem para compartilhar.
Cravina
117
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
• UFF
Verbena
[...] uma aula dialógica é aquela aula em que eu dou espaço pro aluno construir
também sentido junto comigo, então é uma aula que lógico tem um momento de
exposição, de apresentação talvez mais indutiva de conceitos do que por dedução mais
por indução de conceitos e de certa maneira eu centralizo, controlo essa parte, entre
aspas, esse controle, como se isso fosse possível e a interferência, a intervenção dos alu-
nos na construção daquilo que a gente está teorizando, abordando... (...).Bem, quando
você fala professora dialógica, quando você está falando do dialógico eu penso logo
em Bakhtin, no conceito de dialogismo. Então é esse o entendimento de qualquer tex-
to que eu produzo em sala de aula a cada aula que eu dou não depende só de mim,
está na relação com o outro.
Verbena se dispõe a dar espaço para se caminhar junto na feitura do saber. Emerge,
porém, uma disposição ativista na qual, ainda que haja uma postura diretiva vertical
aparentemente, há uma intencionalidade democrática e o acolher afetuoso no ir junto
nesse semear de aprendizagens e colheitas de saberes.
118
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
1. [...] por exemplo, eu trabalho com produção de texto. “O quê que é texto pra
você?” Então é um dos aspectos que eu vou tratar no curso, concepção de texto, de
linguagem. Aí eu digo “é, mas que é curioso quando a gente tem uma voz passiva,
a gente tem um sujeito que é paciente, que não é agente”. Então é isso. É a partir de
uma experiência de estudo, de vida que a gente vai construindo a aula.
Lisianto
Pra mim o primeiro referencial é Paulo Freire. ... acho que esse diálogo pode acon-
tecer de diferentes formas. Eu entendo que é você, é essa troca de você falar e você
ouvir né. ... no sentido de entender o quê que ele traz, o quê que ele pode contribuir
e também de que lugar que ele está falando. Porque quando você se abra pra uma aula
dialógica vão aparecer diferentes visões de mundo né, diferentes concepções que es-
ses alunos têm. (...) eu não gosto muito dessa ideia de parassimetria porque eu acho
que tem a simetria sim de conhecimentos e de conteúdos em muitos momentos, mas
nem sempre essa simetria diz que eu conheço mais.... mas também entendendo que
em outros momentos o conhecimento pode ser construído a partir dessas experiên-
cias. (...) Também eu acho que assim, você tem que ter essa, você não fazer isso por
metodologia você fazer isso por acreditar. (...). E que você tem que se abrir ao im-
previsível. Principalmente porque é no imprevisível que você vai produzir com aquela
turma, com aquele grupo um conhecimento novo né.
Lisianto nos informa da troca de papéis entre o ouvir e o falar, entre o dar e o rece-
ber, entre o ser acolhido e o acolher. Nisso há um exercício de empatia e de alteridade,
compartilhando ligares intelectuais e afetivos. E que esse movimento decorre de uma
convicção intima de que é isso mesmo.
1. Adriana C (Educação): ... o tempo todo eu busco que eles me expliquem o quê
que eles tão entendendo com aquilo. Eu busco fazer sempre é que eles façam
relações com o mundo em que eles vivem.
2. ... eu jogava esse negócio totalmente estranho pra eles verem que esse estranho
não é estranho. Que esse estranho é extremamente familiar, tem tudo a ver
com a história.
Narciso
... nunca consegui dar aula sem conversar e sem saber o que que pensam meus
alunos.. A aula, necessariamente, tem que ter um espaço onde o aluno fala, interrogue,
explicite seu pensamento, então, de uma maneira geral... sempre fazendo essa ponte,
esse caminho, essa conexão com o que é o foco do conteúdo ali daquele curso. (...). ...ir
buscando essa articulação entre a vivência do aluno que é importantíssima, uma
coisa que eu valorizo muito, talvez até porque eu venha né de uma formação militante
no sindicato, (...) a gente tem que né trabalhar essa articulação né, entre a doxa, conhe-
cimento comum, e a episteme.
119
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Esse Narciso não é aquele que acha feio o que não é espelho. Considera impres-
cindível conhecer o pensar d@s educand@s e os interroga, empoderando a presença
intensa dess@ outr@. Acredita que a semente do amanhã é o que ess@ outr@ traz de
vivência/experiência.
1. O aluno dá opinião, ele fala, o outro dá, o outro... E isso vai se construindo
uma rede.
2. Depois a gente vem pra cá aí eles entram, em geral em dupla, pra fazer, pra
desenvolver uma proposta.
3. Então, partindo do interesse das crianças pelo Minecraft, a gente elaborou um
jogo de RPG, aí as próprias crianças fariam esse jogo de RPG e durante as
aulas construiriam juntos a história de onde se passa, os personagens. Dialogo
também com as inteligências e os conhecimentos que eles trazem. Então isso
também é um outro caminho porque você vai aprendendo a planejar e a pen-
sar com o outro, não a pensar sozinho. E diálogo também, é isso, com as sin-
gularidades de cada um, com os desejos de cada um. Você cria o personagem,
o seu avatar. E aí a gente colocou em forma de maquete, ou forma de esquete,
ou de teatro, alguma produção assim.
Criticidade
• UFC
Ciclame
Olhe... em geral, eu acredito que a aula dialógica seja aquela que... possibilita uma...
um respeito entre o professor e o estudante no caso, um reconhecimento daquilo que
já traz enquanto bagagem cultural, intelectual e a capacidade de expandir a parti-
cipação. Então, pra mim respeito, reconhecimento da bagagem e participação fazem
parte desse processo que culmina, de certa maneira, numa possibilidade de formação
crítica do aluno....
120
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Quando Ciclame traz a palavra respeito para a formação crítica, podemos identificar
a ideia de apreço, consideração. Mas também nos lembra o sentido original do termo
respeito que se liga a ideia de olhar novamente, admirar. E um segundo olhar implica
aprofundamento, em intencionar mais a atenção. Pedagogicamente se vincula forte-
mente a disposição de considerar @ outr@ como fundamento do conhecer, da expan-
são crítica da consciência.
Amarílis
É... inspiradas nas experiências de Paulo Freire. Seria uma aula com espaço... falo
de diálogo com os alunos... pela fala dos alunos, pela experiência de opiniões e me-
diada pelo professor. O professor vai... buscando estimular essas falas, de opiniões de-
les sobre os temas abordados, mas também estimular uma reflexão crítica.
Amarílis, nos fala de espaço de diálogo na feitura das experiencias. Há estimulo
aos posicionamentos e a reflexão crítica compartilhada. As opiniões são consideradas
como básicas para o aprofundar e ampliar criticamente o conjunto de saberes. Isso é
atravessado pela criticidade.
121
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
• UFF
Magnólia
A aula dialógica é uma aula em que o conhecimento, o tema tratado, abordado com
os alunos, ele tem que dialogar com a experiência de vida desse estudante... Então,
que as ideias desenvolvidas por determinados autores possam, de alguma forma, sus-
citar nos alunos a relação com a sua própria vivência e com a sua própria leitura de
mundo, sua experiência. Muitas vezes, a aula dialógica ela é provocativa, né, porque
às vezes o aluno vem marcado por uma visão de mundo, uma compreensão de rea-
lidade que não coincide às vezes com a referência teórica que a gente está estudando.
Então, às vezes a pessoa tem uma visão mais burguesa da realidade e aquela teoria está
tratando de aspectos que a pessoa não se deu conta na sua vivência (...). Olha, eu acho
que assim, a gente não é todo tempo dialógico, né? Dialógico nos termos que eu estou
falando... Agora, eu observo também que muitas vezes o aluno ele preferia uma coisa
meio pronta, meio padronizada, não tão personalizada.
Para Magnólia, uma aula dialógica se pauta na experiencia de vida d@s estudantes.
E no diálogo entre estes saberes de experiencia feito e os saberes científicos, se desvela
uma compreensão criticamente expandida e a aprendizagem do mundo e das palavras.
Há uma transmutação gradativa no mecanismo mesmo de provocar uma percepção
mais atenta e profunda do mundo.
122
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Perpétua
[...] eu começo essa desconstrução desde o primeiro período dizendo pra eles
“olha, aqui o diálogo, ele é foco, ele é central no nosso processo de construção do
conhecimento”. (...). Então, eu procuro fazer com que eles compreendam que aqui é
um espaço onde eles realmente têm voz, ou seja, que é pra que ele se coloque, é um
espaço que não é um espaço só de concordância. Eu costumo dizer “olha, o diálogo
comporta o consenso e o conflito”, (...). Então a ideia é de que o aluno seja sujeito
nesse processo de construção de conhecimento e acho que esse aluno só é sujeito nesse
processo se ele for um aluno que se posicione, que fale, que se coloque em relação às
suas convicções, posturas, suas ideias. (...) “olha, é… cada um a partir do seu lugar,
mas a gente precisa conversar, a gente precisa conversar pra gente poder entender onde
a gente quer chegar”. Claro que eu tenho os meus objetivos, tenho as minhas intencio-
nalidades pedagógicas, mas precisa vir dessa conversa, desse diálogo, digamos assim.
(...) eu acho que a aula dialógica… primeiro… ela oportuniza que esse aluno saiba que
ele tem direito, que tem um espaço ali... E outra coisa, acho que potencializa muito
essa questão da consciência crítica, dessa possibilidade reflexiva, daquela ideia de que
nada está pronto, daquela ideia de que não tem uma única verdade, um único caminho
possível por isso eu até costumo dizer pra eles…. eu trabalho muito com a ideia de
ampliar concepções e não de trazer conceitos.
Perpétua diz começar uma aula dialógica informando que o eixo articulador do
seu processo de ensino-aprendizagem é o próprio diálogo. E este comporta consensos
e conflitos. E se define as metas nessa ampliação de concepções, nesse transmutar de
uma consciência ingênua para uma consciência crítica. E nisso se tem a ideia de am-
pliar o conhecimento.
1. Martha C (Educação Física): [...] eu trabalho muito com eles a partir de dinâ-
micas... por exemplo, eu dou um texto pra eles que é um texto que diz que discute
certa questão ...Então eles se dividem em trios e cada um vai tirar do texto uma
questão que achou relevante. E aí vai dizer o porquê dessa questão. Primeiro pro-
voca um diálogo entre eles três porque justamente cada um com a sua leitura e
essas questões vão ser diversas e eles vão chegar a uma questão que vai representar
o tema e já provoca um diálogo. Depois eles colocam isso para o grupão...
1. [...] eu trabalho muito também com essa questão das vivências, eu tra-
balho com as vivências corporais, com as vivências de sensibilização,
conscientização corporal, do seu corpo em relação a outros corpos e
essas vivências também tem um momento. ... Eu costumo usar música,
em alguns momentos eu uso imagens e a gente também senta ali no
tatame, faz um círculo e conversa sobre essa vivência, como cada um se
sentiu, depois a gente conversa um pouco sobre o que aconteceu com
cada um, como cada um se sentiu.
2. Tem um momento que eu faço… eles têm um espaço grande, eles cir-
culam nesse espaço de qualquer maneira e eu peço “olhem nos olhos.
Cada vez que você passar por um colega olhe no olho” isso dá um di-
álogo bem interessante, essa coisa de que a gente olha, mas não vê, a
123
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
gente olha, mas não olha no olho, como é difícil olhar no olho do outro,
como é que eu fiquei constrangido quando o outro me olho nos olhos e
aí é uma outra forma da gente também fazer esses debates, essas coisas.
[...].
Eu não sei se eu vou definir o que é uma aula dialógica, eu vou te dizer quem são
os referenciais que norteiam a minha prática. Eu tenho um referencial epistemológico
duro que é... eu sou marxista leninista e como marxista não acredito em verdade, então
essa é a primeira coisa que é informada aos meus alunos, que não existem verdades,
logo o que a gente vai está discutindo lá são boas explicações para os fenômenos, elas
não são verdadeiras, a única certeza que a gente tem a respeito delas é que elas são
falsas. Que elas vão ser reformuladas em qualquer momento, então esse é um... é um...
não é um princípio, mas é um referencial teórico muito forte que tem nas minhas
aulas. (...) estou pouco interessado que eles acreditem no que eu estou falando porque
assim... a... não existem nenhuma petição de crença ou de acreditar no que eu estou
falando, mas a única coisa que eles são obrigados é a entender.... eu tenho... certeza que
eles têm ideias e eu quero ouvir as ideias, então eu tenho que instigá-los pra falar,
pra saber exatamente o que eles pensam, como é que eles pensam pra que eu possa
trabalhar com isso. Eu não tenho como chegar impondo coisas que provavelmente não
vão fazer sentido, inclusive de não dialogar com aquilo que eles percebem, que eles
sabem e assim por diante. A terceira coisa, que é um outro referência epistemológico,
é a epistemologia de Bachelard, ou seja, eu acredito que o erro é uma coisa importante.
Eu digo sempre para os meus alunos assim “olha, acertar não tem graça, só tem graça
vocês errarem porque quando vocês erram eu tenho oportunidade de corrigir, eu te-
nho oportunidade de saber aquilo que não foi bem entendido”. ... O outro referencial
teórico que eu uso é o Paulo Freire. Não é o Paulo Freire de você fazer uma grande
pesquisa do que é a realidade dos alunos... ! Mas eu acho que há uma Ética Freireana.
Há uma ética de saber que o outro tem coisas que sabe e precisam ser ouvidas e mais
do que isso, que todo conhecimento ele não tem importância e nem nexo nenhum se
ele não fizer um sentido dentro da realidade. E o último, considero eu, é uma coisa
meio romântica, embora tenha sido o que eu mais vi na vida, não é um referencial
teórico, mas é uma referência, a maiêutica socrática. É achar que assim... é aquela
coisa romântica,... o parteiro... você está ali parturiando a... as ideias, o conhecimento.
Embora, isso seja só uma ideia romântica porque eu não acredito que o conhecimento
seja parturiado, acho que ele é construído, como bom marxista, como bom bachelar-
diano, acho que ele é construído, acho que é uma realidade construída e tal, mas é só
aquela coisa romântica, assim de... naquela relação... né... é uma relação... Engraçado
né... afetivo. Seria legal colocar o afeto do lado do Freire, né!? Mas eu prefiro colocar o
afeto do lado do Sócrates, que é o racional, e não do lado do Freire, que é o afetivo. (...).
Vamos ser românticos, já que a gente já falou teoricamente bastante... é a oportunidade
de mudança. A oportunidade de se construir no tempo e no espaço das mudanças.
Tulipa fala da relatividade do que é verdade. Também incentiva a reflexão acerca de
uma ética freireana, que se definiria por reconhecer a essencialidade d@ outr@ no fa-
zer de si mesm@. E defende que a criticidade seria resultante de um processo natural,
ontológico, de se constituir um ser mais.
124
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
1. O que eu considero que os alunos consideram que seja dialógico na minha aula
é que eles não têm respostas. ... os alunos sentem desconforto imenso porque eles
querem a resposta certa. Então, assim... a coisa fundamental é você não ter res-
postas prontas.
2. Trazemos um tema e então vamos ler, vamos pensar o que é. ... todas as aulas são
dadas em termos de contradições entre as ideias. Existe um debate, essa é a tensão...
esses caras são bons nisso aqui, esses são bons nisso aqui... aqueles outros triunfam ali.
3. É uma perspectiva da realidade de que a realidade é movimento e o movimento
se dá por contradição e depois da contradição tem as sínteses. Essa é outra coisa
legal, essa é outra coisa legal. Uma contradição leva a uma síntese e o grande ba-
rato da síntese é que a contradição anterior perde o sentido. Não tem vitorioso
e perdedor. O sentido é perdido porque a síntese supera a contradição colocando
uma contradição nova. A história é contada em termos de contradição.
4. E quando são aulas mais técnicas, tipo seleção natural, mutação... são colocadas
em termos de conceito. O que aquele conceito significa? E a gente discute, discute,
discute qual é o objetivo e toda vez que eles vão dizendo “é isso” e eu descon-
truo, “é isso” e eu descontruo, “então não é nada?” eu digo não.
5. Existe conhecimento... [momentâneo]. Eles são ferramentas pra você poder in-
terpretar ideias, mas eles são ferramentas, eles não são a verdade. Eles são ferra-
mentas, você tem que usar essas ferramentas. ... digo, se o que você quer é... é um
negócio pra você fixar, porque fixar é ruim porque geralmente cai... Mas se você
quiser, tem um negócio fantástico que acabaram de inventar que chama livro...
aquilo não se discute. (risos) Aquele não discute as coisas, se você quiser as coisas
todas, tem uma coisa chamada livro, acabou de chegar, tá tudo lá.
Criticidade implica nessa categoria que também retrata um princípio dialógico, mui-
to querido por Paulo Freire e que registra esse movimento impactante que nos leva de
uma curiosidade desprovida de cuidado e densidade para uma curiosidade qualificada
de crítica que cria e desvela, que se imiscui e revela, que traz uma perspectiva episte-
mológica para a busca, no achado, na resposta e no compartilhar. Lugar articulado de
reflexão crítica, seja quanto aos processos políticos, históricos e culturais, seja quanto ao
indivíduo em si, suas complexas relações e psiquê. Induzido através de questionamentos
e problematizações quanto aos processos que envolvem as formações diversas dos edu-
cand@s, sempre nos leva além, adiante, sempre nos traz novos horizontes.
3.3.2.Professor(a) Dialógic@
125
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Vimos emergir conceitos, na Universidade Federal do Ceará - UFC, tais como: de-
mocratizar o conhecimento, partir do conhecimento do estudante, tecer juntos novos
conhecimentos / Aprender junt@, aquele que respeita estudante/ seus saberes), escuta,
há horizontalidade, vivencia o amor, participação ativa, troca real, autonomia, valori-
za a diversidade, possui compromisso ético, busca transformação social, significativa,
parceria, política. Por sua vez, Universidade Federal Fluminense - UFF verificamos
uma teia em torno de: espaço para conversa, para tecer junt@s; conhecimento constru-
ído a partir da realidade do estudante, troca de experiencias, horizontalidade, escuta,
dar voz, transformação do mundo, democrátic@, valoriza a diversidade, respeito. Dis-
so tudo, constatamos que as categorias que representavam mais amplamente esses dois
universos eram as mesmas que foram encontradas no estudo da aula dialógica. Dessa
maneira, apresentaremos em seguida os depoimentos d@s professor@s acerca do que
el@s consideram ser um(a) professor(a) dialógic@.
Escuta
• UFC
Begônia
..... é um professor que entende esse sujeito como participante também. Que não é só
aquele que vai receber esse conhecimento. Eu tenho que colocar esse aluno... o professor
que é dialógico, ele tem que colocar esse aluno na perspectiva ativa..., ele também vai
ser aquele sujeito que vai contribuir pra construção de novos conhecimentos.
Temos, portanto, aqui a ideia de um(a) professor(a) que estimula a participação
na feitura de novos conhecimentos. Se coloca ainda como co-participe desse processo
numa escuta efetiva de tod@s envolvid@s.
Gardênia
... Não é só uma questão de abrir espaço para o aluno falar né, tem uma questão que
seria de levar essa fala em consideração. Então partir dessa fala, valorizar essa fala,
trazer elementos dessa fala para dialogar com os conteúdos, trazer conteúdos que dia-
loguem com aquela fala. ... tentar fazer com que eu possa promover autonomia do Es-
tudante e também a minha autonomia ..... eu não me coloco diante do alguma... como
assim... diferente deles, como alguém que está acima superior ou que tem... enfim... eu
tenho ali uma especificidade de uma trajetória onde pode haver alguma diferença de
grau ou de quilometragem de leitura em relação aquilo mas nunca como algo que faz
de mim alguém que tem mais capacidade de pensar sobre aquilo. Insight de um aluno
em sala de aula me dá outra percepção do texto. E às vezes não é Insight, às vezes ele
está pesquisando também. ...diálogo, ele não pode ser só revezamento de turno de fala.
O diálogo tem que ser interação né. ...fiquei encantada com a proposta da Educação
do Campo. Foi aí que eu comecei a ler Paulo Freire, por exemplo, foi nesse momento
que eu comecei a ler Paulo Freire e tentar entender as coisas de outro modo ... ao invés
de ficar com raiva eu já estava caminhando nesse outro processo e eu passei a ter uma
postura mais de ouvi-lo de tentar compreender aquela situação né…
126
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Lírio
Eu acho que é... partindo dessa ideia de escuta. Escutar... e realmente escutar... não
só fingir que escuta e impor aquilo que você... tem por teu referencial, teu arcabolso
cultural, você pode trazer a tua experiência, mas partir da experiência do outro é
fundamental, o que ele sabe... ... Porque eu acho que isso faz com que a aprendiza-
gem seja mais... sentida, seja mais significativa. Que ele conseguiu encontrar uma
conexão com aquilo que... está sendo construído naquele momento ou uma resposta
pra aquele momento, ou uma resposta pra alguma problemática, pra alguma urgência,
ele se identifique... enfim..., mas é mais por uma questão mesmo de fazer sentido, de
trazer, de aproximar, de trazer pra perto um pouco. Se não tem relação com outro...
não tem relação comigo eu não vou me implicar nisso.
Lírio nos problematiza a escuta ressaltando o ‘realmente escutar’, sem fingimentos,
sem usar isso apenas como estratégia ou procedimento técnico. Há real valorização da
experiencia d@s estudantes. E esta fundamenta o ensino e a aprendizagem.
Crisântemo
Amarílis
Ser uma professora dialógica é um desafio tremendo né... porque... primeiro é li-
dar com a diversidade de pensamentos né, de saberes dos alunos de sala, de a gente
conseguir costurar isso a partir das próprias falas deles.... a gente tem uma tendência
a querer chegar e mostrar o que sabe né... e na verdade o meu desafio de ser uma
professora dialógica é exatamente não fazer isso. Não mostrar o que eu sei porque o
que eu sei não necessariamente é o que eles precisam saber naquele momento né. Eles
sabem que é tentar encontrar dentro da fala deles, despertar neles... costurar, como
eu disse, nessas falas esses saberes. ...
127
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Amarílis ressalta o desafio de ser dialógica enquanto professora por tratar de ou-
vir a diversidade, as diferentes falas e lugares de fala. Toca na ideia de um tecer a teia
epistêmica que costura novos saberes. E que isso decorre do reconhecimento de que
ninguém sabe tudo e que tod@s temos algo a ensinar.
Cravina
Eu acho que é fazer... compreender que o outro vale a pena, além desse respeito
formal ao cidadão, mas como portador de muitos saberes e de uma cultura escolar
considerável e que o diálogo faz sentido mesmo como troca de informações. Onde é
que entram os conteúdos específicos, aquelas coisas que estão na ementa e no plano de
curso? Então, entram pra tematizar cada um desses encontros e chamar a experiência
que eles têm pra refletir sobre aquele aspecto. Por exemplo, avaliação. Então, todo
mundo tem uma experiência relevante em avaliação, muitas vezes dramáticas e muitas
vezes completamente injustas que para os estudantes mais jovens é uma coisa muito
desestruturadora. Então, discutir avaliação na perspectiva da didática e depois colocar
essa coisa da vida mesmo, de um exemplo concreto como é a questão de avaliação, de
uma oportunidade de a pessoa se explicar é... nessa coisa de... alguns desses tópicos
da avaliação... por exemplo: assiduidade. (...) Conversar com o ser humano que está
num processo de formação onde é extraordinário eles terem um direcionamento de
vida ainda que isso coloque situações que são insolúveis do ponto de vista formal. São
solúveis do ponto de vista dialógico.
Trago aqui a afirmativa espetacular de Cravina para lhe dar o devido destaque,
quando nos anuncia que é imperioso: “... compreender que o outro vale a pena”. Que
nossa escuta deve estar num patamar superior ao simples ouvir, numa mera formali-
dade. Que é esperançar o chamar a fala d@s estudantes, suas experiências e com elas
ampliar nossa leitura de mundo.
Camélia
É uma professora que dá voz ao aluno, que não tem a percepção de que só ela sabe
das coisas, que só ela está acrescentando aí na disciplina. ... Então, é... é uma professora
que aprende com seu aluno também, não tem a postura em sala de aula apenas de
ensinar e que compreende também que os alunos aprendem entre si.
Camélia “dá voz”, mas tem consciência da importância da humildade, de relações
horizontais que fomentem o aprender com @ estudante e também reconhece a impor-
tância da escuta mútua entre estudantes e estudantes e professor(a).
Íris
É um professor que escuta. Um professor que ouve e nesse ouvir, nesse escutar ele
reelabora seus pensamentos em comunhão com esses pensamentos dos alunos.
Íris integra escuta e comunhão; fé na vida, fé no ser humano, no que virá... com
consideração ao fato de que é preciso ouvir amorosamente.
128
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Hortência
É ser um professor que se propõe a escutar, que se abre a escutar, que está aberto
a essa... porque escutar é sempre sofrer pequenas feridas narcisas, a gente leva umas
pancadas, ouve o que não quer, mas tá aberto a isso. Que os estudantes possam vir e
falar bem livremente assim sobre o que é... eles tão vivendo...
Abertura à escuta, se permitir sofrer pequenas dores narcísicas, com vistas a unir
escuta e acolhimento. Visa, em certa medida, contribuir com uma outra sociedade em
que seja possível realmente o escutar atento e afetuoso e transformador.
• UFF
Lisianto
Eu acho que você abrir esse espaço pra conversa. É você tentar, eu acho que tem a
simetria sim de conhecimentos e de conteúdos em muitos momentos, mas nem sem-
pre essa simetria diz que eu conheço mais. Então eu posso conhecer mais, mas tam-
bém entendendo que em outros momentos o conhecimento pode ser construído a
partir dessas experiências. ... trabalhar com a realidade do aluno...
Escuta qualificada que favorece a elaboração de conhecimentos por meio das ex-
periencias d@s estudantes, trabalhando com a realidade dos discentes. O professor
dialógico abriria esse espaço para conversa.
Prímula
É conhecer o aluno, é dialogar com o saber dele. O que que ele sabe e como é que
ele conta... E trocar experiências em situações em sala de aula. Trazer as experiências
deles para a gente refletir em sala. ...
Professor(a) dialógic@ significaria, para Prímula, conhecer @s estudantes e trocar
experiencias para reflexão.
Rosa do Deserto
é construir através do diálogo, desenvolver o conhecimento através do diálogo.
Consideremos que, ao tratar de professor(a) dialógic@, Rosa do Deserto considera
que fomentar a produção do conhecimento ocorre através do diálogo, da escuta.
Perpétua
Eu acho que estar disposta a ouvir porque professor fala… eu falo muito né… Tá
disposto a ouvir e compreender que cada um ali tem a sua história. Então não é ouvir a
história que eu quero, é ouvir a história que cada um tem pra contar, é ouvir um pouco
de como é que cada um ressignifica aquela leitura que você traz.
129
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Lavanda
Agapanto
(...). Assim, eu acho que a escuta pro outro e a possibilidade de dialogar tem que
ser algo que é do meu cotidiano. Então tem que ser algo que é com meus alunos. Essa é
como eu me coloco né. Eu penso que pra mim tem que tá na relação com meus alunos,
mas tem que tá na relação com minhas filhas, com as pessoas que trabalham comigo,
sempre numa perspectiva de que o dialógico ele é a possibilidade de um diálogo, e aí o
diálogo já é algo que não é autoritário né, acho que ter escuta pro outro de fato assim
né, sem me colocar como melhor que ele, embora reconhecendo que tem alguns
saberes que eu tenho e que aquelas pessoas não tem e vice versa.
Agapanto fala da escuta qualificada que decorre de uma experiencia de escuta ao longo
da vida e que, com isso, potencializa esse aprender junto, numa relação de horizontalidade.
Jacinto
Acho que tudo parte da abertura que você dá pra fala. Acho que é o fundamental.
Primeiro o aluno sentir que pode confiar em você, isso é um ponto... e sempre dentro
do limite do confiável de sala de aula. Então o professor pode te respeitar... isso e tal,
não sei o que, mas mesmo assim criterioso, não falta, está lá no horário... então, que ele
se sinta à vontade e que ao mesmo tempo tenha uma escuta.
Abertura para a fala, associada a confiança e o respeito, facultam uma escuta afeti-
va que potencializa o ser dialógico. E nesse impulso ígneo, vamos reconhecendo que a
fé nas pessoas nos oferece o poder da escuta verdadeira e a consequente aprendizagem
na relação de ouvir, falar, escutar, interagir.
Horizontalidade
• UFC
Azaléa
Acho que uma das primeiras coisas é... estar aberta a aprender assim, com os alu-
nos, reconhecer que mesmo eu tendo uma caminhada maior do que a deles eu ainda
130
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Copo-de-leite
Kalanchoê (Escuta)
Eu acho que não dá para ser um professor dialógico se não for militante, se for
somente academicismo não é dialógico, se seguir um diálogo vertical não é dialógico
tem que ser horizontal, tem que entender o aluno como alguém como um ator e um
sujeito na construção do conhecimento. ... Ser um professor dialógico é dar a voz e
a partir dessa voz começar a construir junto com eles o que está acontecendo ali. …
Kalanchoê traz importante lição de humildade ao nos alertar que para superarmos
posturas academicistas ou militantes no trato do fazer junto, com igualdade e equida-
de nas relações didático-pedagógicas.
131
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Ciclame
Botão-de-ouro
Uma professora que respeita os seus alunos, sabe... e nesse respeito elas os entendem
como sujeitos, sujeitos de direitos e deveres e aí também tem o compromisso ético. Lem-
bro muito do Saviani. Tendo um compromisso ético com o que eu estou fazendo aqui,
estou recebendo recurso público e eu tenho um compromisso com aprendizagem. ...
Botão-de-ouro porta aqui a ideia de compromisso ético no cenário da horizontali-
dade, do respeito aos fazeres pedagógicos, manifestos no respeito a tod@s.
Calêndula
... o professor dialógico, ele promove essas situações de trocas né... de trocas e ou
confrontos, eu estou chamando de confronto quando essas trocas ganham um calor
maior, de trocas e confrontos... ele promove isso, mas ele não é ausente do papel dele,
ele não se... extrai do papel de... também enriquecer em termos teóricos e de conteúdo
aquela compreensão que os alunos tão trazendo. ...Ele valoriza o conhecimento dos
alunos, as trocas dos alunos ele vai depois sistematizar um pouco, fazer uma síntese,
fazer uma organização daqueles conhecimentos todos que circularam naquela aula
né... .. que todos avancem no seu modo de compreender...
Calêndula utiliza a questão das trocas, que envolvem consensos e confrontos na
feitura de aprendizagens e novos conhecimentos. Há valorização dessa partilha nesse
avançar do ser como ser.
Girassol
Acho que é... respeitar os alunos, tentar ter uma relação horizontal com eles ...
não de imposição, mas também sem ter medo de ensinar. Eu acho que esse é um prin-
cípio que é importante. ... mas também não quer dizer que por eu saber um pouco
mais do que eles sobre determinadas temáticas... não quer dizer que eu vou sempre tá...
é... impondo de uma maneira desrespeitosa esse conhecimento, entendeu...... também
ética e também política dentro dessa perspectiva.
132
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
• UFF
Peônia
Acolhimento
UFC
Amor-perfeito
Uma professora que acha uma função social da educação no paradigma da demo-
cratização do conhecimento, do direito de todos ao conhecimento. Assume isso radi-
calmente, ou seja, tudo vale desde que o aluno aprenda. Faça pra que o aluno aprenda.
Ele se desafia em relação ao método, ele reinventa o método pra que o aluno reinvente
o conhecimento, então nesse sentido ele é um professor criativo. Pra que ele assuma o
conhecimento eu tenho que ... dialogar com as questões que ele traz. Não vou me-
nosprezar o conhecimento que ele traz, partir sim do conhecimento sempre dele, de
quem ele é concretamente. “Esse menino desenha muito bem.” Eu tenho que incluir o
desenho nessa história se não ele não vai chegar aqui... eles adoram usar o celular, você
acha que eu vou proibir minha turma de usar um celular? Eu não vou estar castrando
porque eles se comunicam muito bem. (...). Então, um professor dialógico pra mim é um
professor que gosta de estudar, gosta de descobrir, gosta de descobrir o ensino o tempo
todo, ele não se enfada.... eu tenho um monte de gente dentro de mim. Então, um pro-
fessor dialógico é um professor que a cada semestre carimba, tatua em si o aluno que ele
conseguiu dialogar. A gente vai se tornando enorme em termo de gente. Tem tanta gente
dentro de mim que na´... aqui na... a 59ª turma eu tenho uma multidão aqui. ... um pro-
fessor dialógico, ele respeita as pessoas, ele ama profundamente a humanidade. Não
tem como ser dialógico se ele no amar a humanidade na sua complexidade. Assim... de
ver beleza... de ver beleza nos erros, sabe... uma dificuldade nos professores é ver beleza
no erro. Ele erra “mas que maravilha esse erro” é vibrar com o erro dele, saber vibrar com
tudo que ele é capaz de fazer. Sempre acreditando que ele pode mais. Ninguém nunca
chega pronto, nem professor, nem aluno e nem nunca pode achar que consolidou tudo
que precisava ser consolidado. A gente está só se encontrando, né e trocando ideias.
133
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Gérbera
Ser uma professora dialógica é ser uma professora que tenta responder aquilo que
é... os alunos possivelmente estariam perguntando ... É um exercício não só dialógico,
mas poético mesmo, né... de encontro e desencontro e tem obviamente conflito. ...
Quando a gente abre pra uma perspectiva dialógica está tendo conflito, né. Então, são
aulas em que tem determinados momentos em que é... eles me perguntam o que eu
acho sobre determinado tema aí eu me apresento... e tem debate e alguns não concor-
dam e eu digo, “mas é na diversidade que a gente constrói o respeito”.
Gérbera vem nos falar que a caraterística de ser professor(a) dialógic@ estaria liga-
da a acolher as demandas de informação, de carinho, de afetos, num exercício poéti-
co-dialógico. Ressalta também que encontros e desencontros são naturais nas relações.
Igualdades e diversidades vão fomentando o aprender amoroso da dialogicidade.
Cravo
... professor preocupado com o que ele aprende quando ele ensina..... antes de tudo
eu digo também que eu não sou um professor muito preso ao conteúdo, eu acho que o
conteúdo ele é contornável, mas ele não pode ser o conteúdo sem sentido. O conteúdo
só fará sentido se a gente conseguir atribuir algum significado pra que o aluno guar-
de pra vida. Pra vida nas diferentes instancias, pro amor, pro trabalho, pro afeto, pra
existência, mas ele não pode ser um conteúdo que se justifique por si só. Então, um
professor dialógico é aquele que consegue, em alguma medida, discutir com o aluno,
apresentar essa possibilidade de significar o que ele aprende.
Cravo nos orienta que o professor dialógico se mante aprendente enquanto en-
sinante. Que os conteúdos são importantes, mas não o mais importante. Demarca
também que o que dá verdadeiro significado ao conteúdo é poder levá-lo para a vida
mesma, nas diferentes instancias.
• UFF
Magnólia
... a gente não é todo tempo dialógico, né? Dialógico nos termos que eu too falando.
Porque existem, por exemplo, agora mesmo eu tô me desafiando ... Então a gente é na
medida em que na construção do planejamento você levanta os anseios dos estudan-
tes e considera a perspectiva, o anseio deles por conhecimento pra definição do desen-
volvimento da disciplina, né? Agora, eu observo também que muitas vezes o aluno ele
preferia uma coisa meio pronta, meio padronizada, não tão personalizado.
134
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Magnólia suscita um bom debate ao ressaltar que nem sempre dá conta de ser
dialógic@. Ainda que discordemos, foi interessante esse pensar pois nos remete a en-
tender que isso estaria associado a incompreensões, a paradigmas elitistas, a ideologias
alienantes e alienadas, a limites autoimpostos ou a preconceitos derivados de ideias
que boicotam. Por outro lado, traz excelente contributo na tentativa de responder a
essa questão do que é ser um(a) professor(a) dialógic@, na medida mesma em que
instiga os anseios discentes e os recebe amorosamente, tendo-os como contributos na
conquista dos objetivos pedagógicos
Narciso
É um pouco disso tudo aí que eu tô falando. Eu nem sabia que eu era dialógica. Eu
fiquei até surpresa... Então, eu acho que um professor é dialógico quando ele não tá
fechado 1: no seu planejamento, 2: no seu conteúdo. Quando ele tem o planejamento
e o conteúdo como meios para sua organização e organização do grupo, mas não como
algo que se não for cumprido ele morreu. ...eu acho que essa dialogicidade é uma ma-
neira também do cara se sentir parte.... Talvez porque eu goste dos humanos. Então
assim, eu sei que existe, eu sei que existe N problemas, existe desqualificação teórica,
existe desqualificação pela religiosidade do outro, mas se existe uma escola democrá-
tica, uma sociedade democrática onde caibam todos por inteiro eu tenho que traba-
lhar com essa diversidade. E eu tenho que ouvir aquilo que me causa desconforto.
Professor(a) dialógic@ não se fecha diante do planejar, da definição de conteúdo.
Gosta de seres humanos e incentivam uma postura democrática e acolhedora das di-
ferenças sociais.
Criticidade
• UFC
Antúrio
Hibisco
135
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Formação Crítica
• UFF
Lótus
Bem, não sou freireana de carteirinha no sentido de ter domínio de toda a teoria.
Tenho pouca leitura sobre, mas gosto muito de Pedagogia da autonomia, mas Pedago-
gia do oprimido foi marcante porque tudo que eu li de Paulo Freire, foi por iniciativa e
eu desde o começo a primeira vez que eu li eu tinha 22 anos foi na graduação. E aquilo
me tocou profundamente. Também eu acho que tem muito isso... Eu venho das cama-
das populares. Minha mãe era empregada doméstica. Eu sou a única a ter concluído o
ensino médio, que dirá ser professora universitária. Então as reflexões do Paulo Freire
falam diretamente a mim. Porque eu conheço aquele lugar. Eu conheço o que é você
pertencer às camadas populares, o que é você ser excluído, o que é você está nadando
contra a correnteza pra tentar alcançar algum lugar né. Então aquilo a primeira vez
que eu li foi altamente impactante. ... eu sempre entro com alguma coisa do Paulo
Freire, não passo a disciplina toda, mas sempre entro com alguma coisa da autonomia,
do oprimido. ... quando eu penso num professor dialógico, penso um sujeito que não
se coloca num lugar de destaque, do mais importante. ... Nossos alunos, boa parte
deles vem de uma realidade, se você pegar o perfil da pedagogia... no geral eles são
estudantes que já vem de uma trajetória de desigualdade e aí eles se queixam muito
das relações que os professores estabelecem com eles, distantes e tal. Não foi isso que
me fez agir como eu ajo, mas eu venho de um ambiente onde ser excluído é o normal,
se sentir excluído, se sentir oprimido é o normal, é o natural né, se sentir diferente, se
sentir pior é o normal. Então eu fico preocupada, atenta cuidando dessa questão de
tentar estabelecer uma relação mais próxima que evite a hierarquização embora eu
entenda que a hierarquia tá posta e acho que de fato existem papeis marcados, mas eu
acho que o professor dialógico ele precisa ter essa delicadeza de tentar romper com
os padrões, não ser uma coisa tão marcada tão delimitada de quem sabe quem não
sabe, sabe?
Lótus faz um emocionante depoimento pessoal, no qual justifica optar por consi-
derar um professor(a) dialógic@ aquele comprometido com as camadas sociais mais
sofridas, os excluídos e ressalta a importância de ter a delicadeza de superar critica-
mente esses padrões opressores.
Tulipa
Tem que dar voz. Essa é a primeira coisa, tem que dar voz. E não é por nada, não.
É porque elas existem e se você não dá a voz você está sendo simplesmente autoritário,
autocrático, você está impedindo a diversidade, a pluralidade... Essa é a primeira coi-
sa.... a primeira coisa é no sentido de permitir que as vozes se expressem e a segunda
coisa é romper com essa perspectiva de que existe um referencial que é a verdade
e que todos nós temos que nos encaminhar para ele como um monolito .. Essa é a
questão. Se você acaba com esse referencial de verdades, esse referencial de poder... aí
você tem uma polifonia e você sabe que o conhecimento e apenas uma ferramenta
pra você lidar com a realidade. Uma ferramenta poderosa que além de transformar
136
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
a realidade natural, se bem que a natureza é cultural também, mas não só isso, mas
também de... humilhação, depressão... conhecimento é poder. É uma arma e vamos
lidar com ele com a mesma responsabilidade de quem lida com uma arma. .... essas
coisas tem... consequências lógicas, teóricas, políticas, epistemológicas e são violentas.
é uma responsabilidade com... essa... assim... lá no final... aquela coisa utópica, é a
transformação do mundo.
Tulipa começa dizendo que temos que “dar voz” ... Mesmo que apareça dessa ma-
neira ativo-passivo, constatamos em seguida que confronta as questões de poder e pro-
blematiza a polifonia e o entendimento de que o conhecimento é uma ferramenta de
enfrentamento do real, muito eficiente para transformar o mundo natural e cultural.
E conclui seu depoimento indicando a utopia da transformação do mundo desigual
num mundo melhor.
Talvez mais tempo de dedicação a encontrar essas práticas, sabe, mais concreta-
mente dialógicas. Eu faço por intuição muitas vezes, faço por convicção, mas talvez
quisesse fazer consciente disso.
Então eu acho que a quantidade de alunos eu acho que é um fator complicante. A
dificuldade inicial que eu sinto, a dificuldade mais marcante que eu sinto e que eu acho
que a maioria dos colegas que passam…. que adotam a mesma postura, que adotam
o mesmo princípio sempre é que o diálogo envolve a participação de duas partes, se
não o diálogo vira monólogo e muitas vezes os alunos têm lido muito pouco… e se
habituam a textos rápidos... você só lê aquilo que você quer saber.
Quanto menos envolvimento dos alunos pior é a aula. A aula melhora significativa-
mente quando os alunos participam mais, então acho que a dificuldade é essa.
... penso que em alguns lugares ter um estudante questionador e que traga diferen-
tes visões, visões que às vezes nem sempre a gente compartilha, né, mas essa multipli-
cidade que o ser humano é capaz de pensar
Resisto. É o que me cabe, é uma ética.
137
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Eu acho que essas um pouco que eu te falei né… essa possibilidade de você é…
ouvir o outro… essas possibilidades de você ressignificar conhecimentos que você já
tem, de criar outros conhecimentos, essa possibilidade de você entender que a diferen-
ça existe, tá ali… a ideia de entender até onde eu não concordo com aquilo que você
pensa, mas até onde eu preciso respeitar aquilo, a ideia do não convencimento, eu acho
complicado uma aula que seja uma ideia de convencimento, quer dizer…
“olha, vocês tão e ouvindo falar aqui e eu ouço vocês também, vocês quando me
escutam falar escutam as próprias vozes.
Eu acho que é esse conhecimento ele é problematizado pelo aluno, talvez ele nunca
tenha pensado naquilo, então talvez, por exemplo, quando ele dá uma opinião
... começa a construir uma nova posição a respeito daquele tema. Eu acho que essa
é a principal contribuição.
138
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Me parece que a aula fica de fato mais atrativa… ela provoca mais, envolve mais os
alunos, eles se sentem mais partícipes do processo de aprendizagem, eles se sentem de
fato agentes do que acontece em sala de aula
... pra que a escola se democratize, abra mais oportunidade pros estudantes, para
outras vozes estarem presentes na escola, no ambiente escola, né, no ambiente educativo.
De um modo geral? Eu acho que é… enfim… é a questão da construção do conhe-
cimento. Saber expor, argumentar e discutir. Conhecimento, essencialmente aquele
que você está construindo.
Primeira vantagem é… e aí totalmente egoísta, é muito mais prazerosa pro pro-
fessor. Eu acho que quando você pra uma aula que você tem resposta, que os alunos
interagem com você, os alunos te devolvem e criam…
Primeiro eu fico muito mais feliz (risos), segundo eu acho que é isso os alunos se sen-
tem mais confortáveis, é uma forma de ensinar, de ajudar a pensar, formar o professor…
As pessoas ficam mais livres para pensar.
Acho que estabelecimento de relações entre estudantes e estudantes, estudante e
professor. Penso que a possibilidade de rever, reformular suas concepções, seus conhe-
cimentos. A possibilidade de redesenhar, de redefinir a própria profissão...
Participação, construção coletiva, auto-organização, democracia na aula, autonomia.
Primeiro que eu falo menos. Eu acho que segundo você trabalha a sociabilidade, as
diferenças, e a possibilidade de conviver, de dialogar com a diferença. Você trabalha os
conhecimentos e a cultura né. Pra mim como professora eu aprendo mais.
Primeiro eu acho que a compreensão dos textos e dos conceitos são mais efetivas.
E outra coisa que eu gosto muito que é o que me motiva pra dar aula é conhecer
outras realidades. Da mesma forma que eu conheço, outras pessoas vão conhecendo
outras realidades e isso é muito motivador.
Aula dialógica:
1 Escuta - 5
2 Horizontalidade - 4
3 Acolhimento -6
4 Criticidade -5
Professor(a) dialógic@
1 Escuta - 14
2 Horizontalidade - 15
3 Acolhimento - 7
4 Criticidade – 4
139
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Análise quanti-qualitativa:
Em processo de finalização desse capítulo, temos uma escuta que nos mobiliza em
direção a uma “Pedagogia freireana da escuta”. Ela nos convida a agir com amor e res-
peito. Ter como pretensão uma escuta afetiva, amorosa, na qual se reconhece @ Outr@
como legitimo em si mesm@. Nos possibilita autoridade e historicidade, estar atent@
ao que é dito... Curios@ e acolhedor.
Essa perspectiva de acolhimento amoroso, por sua vez, organiza a compreensão
de que a mente funciona muito bem como instrumento de corte, seleção, organização,
entretanto, precisamos da dimensão afetiva para impulsionar e agregar, definir e man-
ter. Certamente que isso pode e é bem mais interessante e prazeroso de se fazer, ao se
manter o desapego, a flexibilidade, a atenção e o cuidado.
Horizontalmente somos recordados da importância da humildade na feitura de
nós mesm@s. Somos porque somos no plural e no singular, simultaneamente. E con-
sequentemente podemos perseverar no desvelamento do mundo e de seus mistérios
por meio da Criticidade. E com ela superamos as aparências e as ilusões e adentra-
mos no cerne mesmo da vida, do viver e nos relacionar... Aí sim, encontramos a nós
mesm@s na relação plena, amorosa, humilde, repleta de fé, confiança e esperança e
criticidade na feitura desse mundo melhor que desejamos e aspiramos e imaginamos
e podemos realizar.
Num ensaio que se propõe dialógico fica inadmissível imaginá-lo constituído ape-
nas da dimensão teórica. Consideramos que a pretensão de compatibilidade com os
princípios freireanos nos ‘exige’ coerência e nesse sentido, faz-se necessário uma cons-
tante interlocução teoria e prática, que forjam a práxis pedagógica dialógica.
Ao analisar esse belíssimo material que nos foi disponibilizado generosamente pe-
los meus colegas e parceiros professor@s, tanto da UFC – instituição na qual trabalho
–, quanto da UFF – que me acolheu tão gentilmente –, nos deparamos com uma rique-
za de narrativas e partilhas de experiências.
Em virtude de pouc@s professores que se sentiram desconfortáveis com a exposi-
ção explícita de seus nomes nesse trabalho, fomos levados a optar por retirar o nome
próprio de todos os depoimentos. Lastimo pela perda da autoria partilhada, por mim
reconhecida. Desse modo, selecionamos uma maneira de nominar os parceiros den-
tro dos limites do possível, para não descaracterizar a referência aos cursos nos quais
noss@s parceir@s docentes atuam em geral. Para dificultar a identificação, retiramos
a instituição em que atuam e optamos por utilizar siglas ao invés do nome explícito.
Mas, no trato do que efetivamente é mais importante, as experiências exitosas, nos
parece que há uma tendência em adequar procedimentos acadêmicos habituais ao
novo modus operandi – procedimento operacional – associado à Dialogicidade. Nisso
nenhuma intenção de crítica depreciativa há. Apenas enfatizamos que, em geral, apa-
rece bastante a indicação de gerar práxis didático-pedagógicas dialógicas a partir das
leituras de textos. Ainda que a grande maioria d@s que opta por esse procedimento
reconhece que a maior parte das tentativas traz uma certa decepção pela ausência da
140
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
leitura de boa parte do grupo discente. Por outro lado, existem exercícios de superação
desse limite concreto na utilização de estímulos quase sempre ligados a uma tarefa
associada à leitura, tal como levantar questões, elaborar críticas favoráveis ou desfavo-
ráveis, identificar dificuldades na leitura e no entendimento do texto, organizar uma
síntese, um resumo ou uma reflexão escrita sobre o mesmo. Há, ainda, a ideia de or-
ganização de seminários de uma maneira mais articulada e cooperativa com o fim de
elencar questionamentos e incitar curiosidade. Nessa direção, nos parece que a experi-
ência mais exitosa se associa à ideia de induzir a curiosidade pela leitura do texto e ter
um complemento de leitura em sala de aula e diálogo em torno dos temas geradores
que emergem dessa leitura crítica. Em nossos estudos das referências utilizadas aqui
nesse trabalho, com fundamento em Freire, principalmente, mas tendo ainda a inspi-
ração de Buber, Bakhtin, dentre outros, podemos indicar e pertinência de se buscar na
utilização de textos, a ideia de uma investigação temática e de um estímulo afetivo para
que o processo de leitura ocorra e potencialize o diálogo em sala de aula.
Ao buscar experiências pertinentes, nos deparamos com atividades que já utiliza-
mos com regularidade, tendo demonstrado sua validade por anos de prática, que é a
feitura do plano de curso em parceria com @s estudantes, tendo como meta a consoli-
dação do que podemos chamar de Grupo Aprendente, inspirado no círculo dialógico
de Paulo Freire, mas que pode se apoiar em contributos do círculo bakhtiniano e nos
Grupos de Investigação, tal como tem feito Lipman, ainda que eu prefira os grupos
aprendentes, tal como temos utilizado.
Num exercício de releitura e reelaboração das falas, até para dar algum tratamen-
to ao material que ‘coletamos’, vamos aqui trazer trechos traduzidos embasados nas
respostas ofertadas pelos parceir@s que nós entrevistamos. Ainda nesse preâmbulo,
somos tentados a evidenciar algumas problemáticas que decorrem do diálogo entre
nossas referências, nossa compreensão e o que advém das narrativas d@s professor@s
aqui apresentadas.
Mas, vamos retomar o diálogo com recortes dos resultados das aulas dialógicas...
E, em continuidade ao que iniciamos pouco antes, uma das indicações bastante recor-
rentes foi o trabalho com textos – o que nos parece um padrão das aulas em universi-
dades brasileiras. O diferencial seria a base teórica dialógica que orienta essa prática e
procurar utilizar frequentes problematizações ou apoiar o estudo partilhado por meio
de prévias diretrizes propostas pel@s estudantes. As perguntas seriam um forte dife-
rencial... perguntas que instigassem a curiosidade, que potencializassem a vontade da
leitura, a vontade da partilha. Que explorassem os diferentes entendimentos e valores.
Outro recurso utilizado em alguns exemplos de aulas dialógicas, foi a utilização de ou-
tras linguagens em conjunto com textos para favorecer a dinâmica dialogal, tal como
o uso de filmes, pequenos vídeos, músicas, imagens...
A contextualização é uma recomendação bem frequente também. Aparece de for-
mas distintas, mas, em todas, a ideia é estabelecer uma integração com os debates, con-
teúdos e propostas teóricas ao Cotidiano, à vida vivida e experienciada por discentes e
docentes. E isso pode ser feito através de exemplos de vida, histórias de vida, histórias,
estórias, causos etc.
Outra ideia interessante é a produção parceira – professor@s e estudantes – de mate-
rial que possa ser utilizado didaticamente, tanto na própria sala de aula, como também
em outras atividades pedagógicas e docentes. Neste tópico, aparece desde a sugestão
141
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
142
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
tegorias que emergiram da pesquisa empírica com o que virá em seguida. Em nosso
entendimento há uma possível correlação criativa entre essas categorias e os princípios
dialógicos e as metáforas que escolhemos.
Certamente são possíveis outras interpretações. Aqui apenas usamos a ideia do
colapso da função de ondas, dos estudos quânticos de Schroedinger, para definir nossa
escolha. E optamos por alinhar a categoria “Acolhimento” com o Princípio Dialógico
da “Amorosidade”; a “Horizontalidade” identificamos com a “Humildade; a “Escuta”
conjugamos com a Fé e a “Criticidade” com a “Criticidade” e nem podia ser diferente
nesse caso, salvo melhor juízo. Vamos assim da teia para o casulo. A teia pode enredar
um casulo e dar surgimento a borboleta.
143
CAPÍTULO IV
P
rincípio (do latim principiu) significa o início, fundamento ou essência de
algum fenômeno. Também pode ser definido como a causa primária, o mo-
mento, o local ou trecho em que algo, uma ação ou um conhecimento tem
origem. Sendo que o princípio de algo, seja como origem ou proposição fundamental,
pode ser questionado. Para o Dicionário Aurélio Eletrônico (1988), princípio significa:
o primeiro impulso dado a uma coisa; origem; o que constitui a matéria; o que entra na
composição de algo; regras ou conhecimentos fundamentais e mais gerais.
A definição de princípio para o Dicionário Eletrônico Michaelis é: momento em
que uma coisa tem origem; aquilo do qual alguma coisa procede na ordem do conheci-
mento ou da existência; característica determinante de alguma coisa; regras ou código
de (boa) conduta pelos quais alguém governa a sua vida e as suas ações; lei, doutrina
ou acepção fundamental em que outras são baseadas ou de que outras são derivadas.
‘Princípios’ seriam um conjunto de normas ou padrões de conduta que orienta-
riam pessoas ou instituições. A conceituação dos princípios está relacionada ao come-
ço ou início de algo. Etimologicamente, segundo o site Origem da palavra40, PRINCÍ-
PIO derivaria do termo latino ‘principium’, significando origem, causa próxima, início,
ou ainda de ‘prin’, do grego, traduzido como “o que vem antes”.
Podemos então afirmar, com base nessa pesquisa acerca do significado de Princí-
pio, de princípios, que princípios dialógicos seriam a própria Origem do Dialógico,
ou o que dá origem ao dialógico. Isso, mais do que demonstra (é uma das teses que
aqui defendo), que os princípios dialógicos representam uma instancia mais do que
necessária a se visitar, desde que se pretenda experienciar uma proposta educativa ou
uma formação educativa dialógica. E, mais do que isso consideramos que se faz essen-
39
SATER, Almir e TEIXEIRA, Renato. Tocando em Frente. Género(s): Sertanejo. Gravado-
ra Philips, 1990.
40
(https://origemdapalavra.com.br/palavras/principio/)
145
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Inicialmente trarei aqui uma pesquisa extensiva que envolve desde uma pesquisa sobre
os conceitos constitutivos dos princípios dialógicos freireanos nos dicionários, em seus
sentidos etimológicos bem ao gosto de Paulo Freire; um estudo mais aprofundado desses
princípios nas suas principais obras, no caso optamos por seu primeiro livro publicado, o
Educação como Prática da Liberdade, seu principal e coração de sua obra, o Pedagogia do
Oprimido e o Pedagogia da Esperança. Desde esses lugares adentramos nessa busca por
transformação para o concreto de nossas relações mais próximas e fomos dialogar com
parceir@s sobre o que representaria esses princípios pensados em sua possível origem e
sentidos e significados compartilhados. Realizamos ainda um círculo dialógico em torno
desses princípios no contexto do grupo de pesquisa que coordeno (Gead).
Ao buscar os dicionários, nos apoiamos principalmente no Aurélio e no Michae-
lis41. E através desses dicionários consultados trouxemos esse conjunto de definições
acerca dos vocábulos que constituem os Princípios Dialógicos. Cremos que em cer-
ta medida estes significados foram considerados mais ou menos por Paulo Freire ao
propor eles como pressupostos essenciais para desencadear uma dialógica autêntica.
Somos tentados a afirmar que se faz necessário que contemplemos esse conjunto de
princípios para que tenhamos uma autêntica dialógica ocorrendo, mais ainda quando
se tratar de aulas dialógicas ou interações educativas, didático-pedagógicas, que se
intitulem dialógicas em toda sua plenitude.
Amorosidade
Amoroso traz como significado: aquel@ que tem ou sente amor, ou é propenso ao
amor; que denota amor; relativo ao amor, a coisas de amor. Traz ainda a ideia de que é
carinhoso, terno, meigo; ou aquele que tem ou sente amor; aquele que está apaixona-
do. amorosidade. Amorosidade implica na qualidade do que é amoroso.
41
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.DicionárioAurélio básico da língua portuguesa. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira,1988 DICIONÁRIO Michaelis. Disponível em: <www.michaelis.uol.
com.br>. Acesso em: set. 2020.
146
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Mas também temos frase com autoria como essa: “É preciso ter amor na educação”,
seu autor é Taddy Blecher, fundador da primeira instituição de ensino superior gratui-
ta sul-africana. Ele afirma que o ensino tradicional não desenvolve plenamente as pes-
soas. O Instituto Maharishi, foi criado em 1997, já formou mais de 18 mil pessoas por
meio de um sistema autofinanciável. Encontramos a frase maravilhosa de Guimaraes
Rosa, em Grande Sertão: Veredas: “Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra
pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho
de saúde, um descanso na loucura”.
Alex Bretas42, estudioso de Maturana, cita Charles Eisenstein com o conceito de
interser para reforçar a relevância do amor, tão extensa e profundamente tratada por
Humberto Maturana, em várias de suas obras. É de Bretas a frase que se segue: “O
amor explicita essa conexão, e ao explicitá-la, podemos aprofundar nosso entendi-
mento sobre o que e quem nos cerca. Somos mais inteligentes com o amor. O amor é a
união daquilo que a falta de amor teimou em separar”.
Estes, são apenas pequenos exemplos diante de uma enormidade de estudos que si-
nalizam, para o amor como essencial nos processos educativos. Lembro que podemos
extrair lições muito importantes inclusive nos tratados sobre o amor romântico-afe-
tivo. Eles trazem boas metáforas, tal como a música nordestina de Lucy Alves quan-
do problematiza o amor fugidio, os modismos atuais de relacionamentos vaporosos,
como fala Bawman (2001), e o despertar para o amor que lhe mobiliza na direção do
ser amado, através das distancias físicas e do tempo.
147
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Humildade
Fé
Esperança
148
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Confiança
Criticidade
Nesse momento, sou estimulado a fazer uma viagem para dentro das obras básicas
de Paulo Freire, no caso selecionamos o Educação como Prática da Liberdade, por ser
seu primeiro livro publicado; o Pedagogia do Oprimido, por representar sua grande
obra; nela inaugurar esse diálogo sobre a Teoria da Ação dialógica e organizar de ma-
neira mais sistemática uma apresentação sobre a dialógica e a dialogicidade, ainda que
já houvesse tratado desse tema quando de sua tese em 1959, naquela época denomi-
nando a ideia de “dialogação”. O que na verdade me parece bem interessante por trazer
o conceito de diálogo e de ação associados. E também trazemos para essa jornada o
Pedagogia da Autonomia, por se tratar de seu último livro publicado por ele mesmo,
por apresentar uma práxis educativa voltada para a escola com o embasamento do
Pedagogia do Oprimido, portanto, da Teoria da Ação Dialógica, da Educação como
prática da liberdade, da Educação Dialógica.
149
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Este foi seu primeiro livro publicado. Com ele inaugura uma jornada que levou até
seu último livro escrito, organizado e publicado por ele mesmo, em 1996, o Pedagogia
da Autonomia. Por isso iniciamos aqui nossa peregrinação, em busca do casulo perdi-
do, ou seria o Santo Graal? Enfim, foi uma garimpagem que nos ofereceu uma riqueza
de reflexões. Foi um revisitar dessas obras com uma leitura crítica focada nos princí-
pios dialógicos. Vale salientar, que nem todas as vezes que aparecerem vocábulos, que
podem se associar aos princípios, traremos aqui, pois que em alguns casos podem ter
sentidos distintos do que nos interessa ao nosso estudo.
“A radicalização, que implica no enraizamento que o homem faz na opção que fez,
é positiva, porque preponderantemente crítica. Porque crítica e amorosa, humilde
e comunicativa. O homem radical na sua opção, não nega o direito ao outro de
optar. Não pretende impor a sua opção. Dialoga sobre ela. Está convencido de seu
acerto, mas respeita no outro o direito de também julgar-se certo. Tenta convencer
e converter, e não esmagar o seu oponente. Tem o dever, contudo, por uma questão
mesma de amor, de reagir à violência dos que lhe pretendam impor silêncio.
Nesse trecho acima, já faz correlação direta entre amor e revolução, entre uma
postura que respeita como princípio ético e político que se propõe a educar, convencer,
jamais impor, registra a importância de buscarmos nossa essência, nossas raízes como
fator de decisão, ainda que haja profunda alteridade quanto as escolhas das outras
pessoas, até por se pautar pelo amor. Mas, destaca que em respeito e amor a humani-
dade jamais deve se calar diante da opressão. E enfatiza que: “A posição radical, que é
amorosa, não pode ser autoflageladora. Não pode acomodar-se passivamente diante
150
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
do poder exacerbado de alguns que leva à desumanização de todos, inclusive dos po-
derosos” (FREIRE, 1967, p. 50).
Em seguida, Freire (1967, p. 51) traz um depoimento que me parecer estar falando
de hoje, em um livro de 53 anos atrás... Mantive na integra por ser tão incrível... E nos
remete ao amor como estratégia de re-existência, de resistência.
“Mas, infelizmente, o que se sente, dia a dia, com mais força aqui, menos ali, em
qualquer dos mundos em que o mundo se divide, é o homem simples esmagado,
diminuído e acomodado, convertido em espectador, dirigido pelo poder dos mitos
que forças sociais poderosas criam para ele. Mitos que, voltando-se contra ele, o
destroem e aniquilam. É o homem tragicamente assustado, temendo a convivência
autêntica e até duvidando de sua possibilidade. Ao mesmo tempo, porém, incli-
nando-se a um gregarismo que implica, ao lado do medo da solidão, que se alonga
como “medo da liberdade”, na justaposição de indivíduos a quem falta um vínculo
crítico e amoroso, que a transformaria numa unidade cooperadora, que seria a
convivência autêntica.”
Na página 97 da mesma obra, Paulo Freire vai nos conectar essa proposta educativa
e o amor como essência do processo: “A educação é um ato de amor, por isso, um ato
de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discus-
são criadora, sob pena de ser uma farsa”.
E chegamos ao cerne desse livro ao inaugurar em obra publicada. Lembramos que
ele já que havia anteriormente tratado da questão, em sua tese apresentada durante
o concurso da Universidade do Recife: Educação e Atualidade Brasileira, com vistas
ao atendimento das exigências para efetivação na cadeira de História e Filosofia da
Educação. Podemos afirmar se tratar do cerne de sua obra, aqui melhor delineada e
que integra os princípios dialógicos, já anunciados e defendidos. Vejamos Paulo Freire
(1967, p. 107 e 108):
E que é o diálogo? É uma relação horizontal de A com B. Nasce de uma matriz crí-
tica e gera criticidade (Jaspers). Nutre-se do amor, da humildade, da esperança,
da fé, da confiança. Por isso, só o diálogo comunica. E quando os dois polos do
diálogo se ligam assim, com amor, com esperança, com fé um no outro, se fazem
críticos na busca de algo. Instala-se, então, uma relação de simpatia entre ambos.
Só aí há comunicação.
“O diálogo é, portanto, o indispensável caminho”, diz Jaspers, “não somente nas
questões vitais para nossa ordenação política, mas em todos os sentidos do nosso
ser. Somente pela virtude da crença, contudo, tem o diálogo estímulo e significa-
ção: pela crença no homem e nas suas possibilidades, pela crença de que somente
chego a ser eu mesmo quando os demais também cheguem a ser eles mesmos”.
O antidiálogo que implica numa relação vertical de A sobre B, é o oposto a tudo
isso. É desamoroso. É acrítico e não gera criticidade, exatamente porque desamo-
roso. Não é humildade. É desesperançoso. Arrogante. Autossuficiente. No antidiá-
logo quebra-se aquela relação de “simpatia” entre seus polos, que caracteriza o di-
álogo. Por tudo isso, o antidiálogo não comunica. Faz comunicados. Precisávamos
151
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Humildade no EPL
Curioso que nesse livro “humildade” é o princípio que menos é anunciado. Por que
seria? Entretanto como podemos constatar, na página 107 citada acima ele anuncia a
humildade como um dos princípios da dialogicidade e ressalta que o diálogo se nutre
do amor, da humildade, da esperança, da fé, da confiança. No rodapé dessa mesma
página Freire retoma para definir a essencialidade desses princípios, enquanto matriz
da dialógica: “Relação de “simpatia” entre os polos, em busca de algo. Matriz: Amor,
humildade, esperança, fé, confiança, criticidade. E na finalização do livro adverte
que a humildade está ligada diretamente a esperança e reconhece que jamais cabe a
arrogância, o desamor, a autossuficiência, como estratégias do diálogo.
Fé e Confiança no EPL
Fé e confiança são outros princípios que pouco foram dialogados nessa obra, fé
aparecendo apenas 5 vezes ao longo do texto e Confiança 4. Como exemplo de citação
relativa à fé e confiança, encontramos esse trecho em que Paulo Freire (1967, p. 43).
diz: “(...) sem esperança e sem fé, domesticado e acomodado: já não é sujeito. Rebai-
xa-se a puro objeto”. As outras vezes foram citadas anteriormente quando do trato da
amorosidade.
Esperança no EPL
Esse é um dos princípios que aparece bastante, 16 vezes, entretanto, em geral num
texto sem o sentido definidor da palavra enquanto princípio dialógico, certamente em
minha leitura, com exceção destas passagens aqui apresentadas.
O clima de esperança das sociedades desalienadas, as que dão início àquela volta
sobre si mesmas, auto-objetivando-se, corresponde ao processo de abertura em
que elas se instalam. Ora, qualquer ameaça de recuo neste trânsito, de que o irra-
cionalismo sectário é causa e efeito, e de que resulte um retorno ao fechamento,
constitui um impacto destruidor ou quase destruidor da esperança.
A desesperança das sociedades alienadas passa a ser substituída por esperança,
quando começam a se ver com os seus próprios olhos e se tornam capazes de proje-
tar. Quando vão interpretando os verdadeiros anseios do povo. Na medida em que
vão se integrando com o seu tempo e o seu espaço e em que, criticamente, se desco-
brem inacabados. Realmente não há por que se desesperar se se tem a consciência
exata, crítica, dos problemas, das dificuldades e até dos perigos que se tem à frente.
Nessas duas passagens, constatamos a correlação que Freire (1967, p. 51 e 53) faz
da esperança com a saída da condição de subalternidade quase plena para uma so-
44
Os negritos são meus para destacar os aspectos mais relevantes em nossa leitura. Bem como,
o sublinhado para demarcar os princípios em questão.
152
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A com B = DIÁLOGO/comunicação/intercomunicação
→←
Relação de “simpatia” entre os polos, em busca de algo.
Matriz: Amor, humildade, esperança, fé, confiança, criticidade.
ANTIDIÁLOGO
Relação de A
“simpatia” |
quebrada. B = sobre comunicado
MATRIZ — Desamoroso, inumilde, desesperançoso, sem fé, sem
confiança, acrítico.
Este princípio, junto com a amorosidade, é o qua mais é tratado nessa obra, apa-
rece 20 vezes no texto: E configura um marco tanto nesse livro quanto no Pedagogia
do Oprimido. No primeiro momento em que trata do tema Paulo Freire (1967, p. 39)
conecta criticidade e o conceito de relações, o que é muito importante e essencial para
ele. Posso afirmar que a educação como prática da liberdade, a pedagogia do oprimido,
a pedagogia da esperança, a pedagogia da autonomia, poderiam ser intituladas de Pe-
dagogia das Relações ou Pedagogia Relacional. Observemos: “O conceito de relações,
da esfera puramente humana, guarda em si, como veremos, conotações de pluralidade,
de transcendência, de criticidade, de consequência e de temporalidade”.
153
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
dado a outro, ou um fato a outro, é naturalmente crítica, por isso, reflexiva e não
reflexa (Op. Cit., p. 40)
No rodapé dessa página Freire ainda adensa a reflexão acerca da criticidade e ins-
taura a ideia de que existir implica em criticidade que transcende o simples viver:
Existir ultrapassa viver porque é mais do que estar no mundo. É estar nele e com
ele. E é essa capacidade ou possibilidade de ligação comunicativa do existente com
o mundo objetivo, contida na própria etimologia da palavra, que incorpora ao
existir o sentido de criticidade que não há no simples viver. Transcender, discernir,
dialogar (comunicar e participar) são exclusividades do existir.
Na página seguinte (Freire, 1967, p.41) encontramos esta nota que complementa a
reflexão: “Insistimos, em todo o corpo de nosso estudo, na integração e não na acomo-
dação, como atividade da órbita puramente humana. A integração resulta da capaci-
dade de ajustar-se à realidade acrescida da de transformá-la a que se junta a de optar,
cuja nota fundamental é a criticidade”. E, no rodapé da página 60, vem nos ajudar a
entender sua definição de criticidade:
A criticidade para nós implica na apropriação crescente pelo homem de sua po-
sição no contexto. Implica na sua inserção, na sua integração, na representação
objetiva da realidade. Daí a conscientização ser o desenvolvimento da tomada de
consciência. Não será, por isso mesmo, algo apenas resultante das modificações
econômicas, por grandes e importantes que sejam. A criticidade, como a entende-
mos, há de resultar de trabalho pedagógico crítico, apoiado em condições históri-
cas propícias.
Nosso querido interlocutor (FREIRE, 1967, p. 61), nos adverte que: “O que carac-
teriza o comportamento comprometido é a capacidade de opção. Esta exige, como já
salientamos, um teor de criticidade”. E orienta que esse compromisso com a liberdade
requer (Op. Cit., p 62): “(...) uma educação capaz de corresponder a este fundamental
desafio — o da ascensão da ingenuidade à criticidade”. Em seguida, na página 92, re-
toma a noção de responsabilidade em lutar pela superação da ingenuidade em direção
à criticidade. E busca em Eric Fromm, apoio para advertir quanto ao risco de nos
quedarmos na alienação da linguagem, como é possível verificar nas páginas 94 e 95:
Não seria, porém, com essa educação desvinculada da vida, centrada na palavra,
em que é altamente rica, mas na palavra “milagrosamente” esvaziada da realidade
que deveria representar, pobre de atividades com que o educando ganhe a experi-
ência do fazer, que desenvolveríamos no brasileiro a criticidade de sua consciência,
indispensável à nossa democratização.
154
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
E nesse ponto da jornada rumo a borboleta, Freire (1967, p. 96) adentra mais in-
tensamente no relacionamento entre educação, pesquisa e diálogo: “À nossa cultura
fixada na palavra corresponde a nossa inexperiência do diálogo, da investigação, da
pesquisa, que, por sua vez, estão intimamente ligados à criticidade, nota fundamental
da mentalidade democrática”. E conecta com suas atividades de estudioso da educação,
também no âmbito da Alfabetização (Op. Cit., p. 103 e 104): “Desde logo, pensávamos
a alfabetização do homem brasileiro, em posição de tomada de consciência, na emer-
são que fizera no processo de nossa realidade. Num trabalho com que tentássemos a
promoção da ingenuidade em criticidade, ao mesmo tempo em que alfabetizássemos”.
E retoma os princípios quando nos orienta como realizar esta educação, tal como já
informado como presente nas páginas 107 e 108.......
Bem, essa é a grande referência da tese e da obra de Paulo Freire. Constatamos que
os dois princípios mais citados na obra são o amor e a criticidade, ainda que criticidade,
enquanto princípio, apareça bem menos. Portanto, o grande destaque, “o pulo do gato”,
Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens. Não
é possível a pronúncia do mundo, que é um ato de criação e recriação, se não há, amor
que a infunda.
Paulo Freire
155
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Paulo Freire já havia feito essa mesclagem resultando no seu corpo de princípios
dialógicos. E o amor em Paulo Freire é ato político por excelência, além de ser o
foco articulador de sua Educação como prática da Liberdade, de sua Pedagogia do
Oprimido, da autonomia.
O amor aparece 31 vezes em trechos do livro Pedagogia do Oprimido. Porém, tanto
nesse princípio quanto nos demais, apresentaremos aqui apenas aqueles recortes que
fizerem efetiva alusão aos princípios dialógicos, em nosso entendimento. E já na sua
apresentação do livro, por ele intitulada de PRIMEIRA PALAVRAS, traz essa profunda
e rica chamada: “Aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim
descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam”. Aqui já inicia sua
articulação entre o amor e a práxis libertadora. Assume uma opção pelos “pobres”, re-
trato de tod@s oprimid@s. Para Paulo Freire, eram oprimid@s todas as pessoas que se
encontravam na situação de risco social, de discriminação, de colonialização, de subal-
ternização. @s oprimid@s são as mulheres e negros, em geral; são homossexuais e ho-
moafetivos, @s morador@s de rua, por exemplo. Isso manifesta esse amor enquanto ato
político desde o início até o final do Pedagogia do Oprimido. Me permitam trazer um
trecho mais longo no qual explicitamente utiliza o vocábulo ‘amor’, por se tratar de um
depoimento pessoal (FREIRE, 1987, p. 13) relevante para nos debruçarmos:
Entre estes, haverá, talvez, os que não ultrapassarão suas primeiras páginas. Uns,
por considerarem a nossa posição, diante do problema da libertação dos homens,
como uma posição idealista a mais, quando não um "blablablá” reacionário. “Bla-
blablá” de quem se “perde” falando em vocação ontológica, em amor, em diálogo,
em esperança, em humildade, em simpatia. Outros, por não quererem ou não po-
derem aceitar as críticas e a denúncia que fazemos da situação opressora, situação
em que os opressores se “gratificam”, através de sua falsa generosidade.
Paulo Freire (1987, p. 17) vai reafirmar essa intima conexão-acoplamento, enfatizan-
do que é o ato de amor d@s oprimid@s o que viabiliza a libertação dos processos opres-
sores, colonializadores, subalternizantes. Esse ato de amor é ato político de libertação.
Por isso mesmo, como enfatiza (FREIRE, 1987, p. 20), o oposto é inviável. Opres-
sor aparenta amor, pseudo amor, falso amor, com intuitos políticos de exploração,
alienação, manipulação: “O opressor só se solidariza com @s oprimid@s quando o
seu gesto deixa de ser um gesto piegas e sentimental, de caráter individual, e passa a
ser um ato de amor àqueles”. E, mesmo a violência da reação d@s oprimid@s está, em
geral, associada ao amor com o qual buscam ir além dessa relação de poder opressora,
vertical e necrófila:
156
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Na verdade, porém, por paradoxal que possa parecer, na resposta [d@s oprimid@s]
à violência dos opressores é que vamos encontrar o gesto de amor. Consciente ou
inconscientemente, o ato de rebelião d@s oprimid@s, que é sempre tão ou quase
tão violento quanto a violência que os cria, este ato d@s oprimid@s, sim, pode
inaugurar o amor. (FREIRE, 1987, p. 24).
Não basta que os homens não sejam escravos; se as condições sociais fomentam a
existência de autômatos, o resultado não é o amor à vida, mas o amor à morte. Os
oprimidos que se "formam” no amor à morte, que caracteriza o clima da opressão,
devem encontrar, na sua luta, o caminho do amor à vida, que não está apenas no
comer mais, se bem que implique também nele e dele não possa prescindir.
Sendo fundamento do diálogo, o amor é, também, diálogo. Daí que seja essen-
cialmente tarefa de sujeitos e que não possa verificar-se na relação de dominação.
Nesta, o que há é patologia de amor: sadismo em quem domina; masoquismo nos
dominados. Amor, não, Porque é um ato de coragem, nunca de medo, o amor é
compromisso com os homens. Onde quer que estejam estes, oprimidos, o ato de
amor está em comprometer-se com sua causa. A causa de sua libertação. Mas, este
compromisso, porque é amoroso, é dialógico. Como ato de valentia, não pode ser
piegas; como ato de liberdade, não pode ser pretexto para a manipulação, senão
gerador de outros atos de liberdade. A não ser assim, não é amor. Somente com a
supressão da situação opressora é possível restaurar o amor que nela estava proibi-
do. (PAULO FREIRE, 1987, p. 45)
157
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
de ser caráter biófilo. Guevara47, ainda que tivesse salientado o “risco de parecer
ridículo”, não temeu afirmá -la. “Dejeme decirle (declarou dirigindose a Carlos
Quijano) a riesgo de parecer ridiculo que el verdadero revolucionario es animado
por fuertes sentimientos de amor. Es imposible pensar un revolucionário autênti-
co, sin esta cualidad”.
Paulo Freire (1987, p. 72) continua sua descrição da lagarta que procura se aliar
para entrar no casulo revolucionário. Essa lagarta sabe que carece de apoio, de parce-
rias para poder transmutar. Há uma busca por lideranças, por alianças revolucioná-
rias. Essas lideranças também requerem o reconhecimento de que a revolução só se
dá com o povo, nunca para o povo e nem sobre o povo. Ela jamais pode prescindir de
diálogo autêntico, confiança mútua, amorosidade:
... ao se descrer do povo, ao temê-lo, a revolução perde sua razão de ser. É que ela
nem pode ser feita para o povo pela liderança, nem por ele, para ela, mas por am-
bos, numa solidariedade que não pode ser quebrada. E esta solidariedade somente
nasce no testemunho que a liderança dá a ele, no encontro humilde, amoroso e
corajoso com ele.
O casulo vai se abrindo com vagar, requer um tempo de maturação, que as asas es-
tejam prontas para o voo. Não adiante precipitar, mas também não há de se esperar na
pura espera. Há de se esperançar. Carecemos de parcerias, solidariedade, nessa feitura
das condições prévias para o voar...
47
Ernesto Guevara: Obra Revolucionária, México, Ediciones Era-S.A., 1967, pp. 637-38.
158
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
É na amorosidade que Paulo Freire (1987, p. 99) se respalda com o intuito de po-
tencializar a práxis revolucionária. E, tem consciência de que essa só se torna real na
comunhão de propósitos: “A comunhão provoca a co-laboração que leva liderança a
massas àquela “fusão” (...). Fusão que só existe se a ação revolucionária é realmente
humana, por isto, simpática, amorosa, comunicante, humilde, para ser libertadora”.
Humildade no P.O.
Não há, por outro lado, diálogo, se não há humildade. A pronúncia do mundo, com
que os homens o recriam permanentemente, não pode ser um ato arrogante. O
diálogo, como encontro dos homens para a tarefa comum de saber agir, se rompe,
se seus polos (ou um deles) perdem a humildade. Como posso dialogar, se alieno a
ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca em mim?
Freire (1987, p. 46) vai alinhavar esse princípio com a ideia de que, habitualmente,
as pessoas confundem arrogância com a ideia de que não precisam de outras pessoas.
E essa “independência” no mal sentido, a falta de humildade em outras palavras, vai
fomentar o distanciamento. E, como podemos constatar na Teoria da Ação Dialógica,
a divisão favorece a opressão:
Foi assim, no seu diálogo com as massas camponesas, que sua práxis revolucioná-
ria tomou um sentido definitivo. Mas, o que não expressou Guevara, talvez por sua
159
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Fé no P.O.
“Não há também, diálogo, se não há uma intensa fé nos homens. Fé no seu poder
de fazer e de refazer. De criar e recriar. Fé na sua vocação de ser mais, que não é privi-
légio de alguns eleitos, mas direito dos homens” (FREIRE, 1987, p. 46). Começamos
assim a esmiuçar esse princípio, no Pedagogia do Oprimido. É preciso fé para amar ou
é preciso amor para se ter fé? O certo é que é preciso amor para poder pulsar (Sater e
Teixeira). Ainda na mesma página Paulo Freire vai tocar no cerne da fé enquanto pres-
suposto do diálogo e integrá-la à criticidade. É preciso paz pra poder seguir, é preciso
a chuva para florir, como disseram os poetas, e atrair as borboletas.
A fé nos homens é um dado a priori do diálogo. Por isto, existe antes mesmo de que
ele se instale. O homem analógico tem fé nos homens antes de encontrar-se frente
a frente com eles. Esta, contudo, não é uma ingênua fé. O homem dialógico, que é
crítico, sabe que, se o poder de fazer, de criar, de transformar, é um poder dos ho-
mens, sabe também que podem eles, em situação concreta, alienados, ter este po-
der prejudicado. Esta possibilidade, porém, em lugar de mata no homem dialógico
a sua fé nos homens, aparece a ele, pelo contrário, como um desafio ao qual tem de
responder. Está convencido de que este poder de fazer e transformar, mesmo que
negado em situações concretas, tende a renascer. Pode renascer. Pode constituir-se.
Sem esta fé nos homens o diálogo é uma farsa. Transforma-se, na melhor das hipó-
teses, em manipulação adocicadamente paternalista”.
Fecha esse princípio, juntamente com o amor (FREIRE, 1987, p. 107), a última pá-
gina do livro, um desfecho do Pedagogia do Oprimido: “Se nada ficar destas páginas,
algo, pelo menos, esperamos que permaneça: nossa confiança no povo. Nossa fé nos
homens e na criação de um mundo em que seja menos difícil amar”.
Esperança no P.O.
Como já anteriormente informado, trazemos aqui apenas os trechos que nos aju-
dam a entender o princípio e seus contributos. Situações nas quais aparece o vocábulo,
mas que não apresentam estes aspectos, são desconsideradas. Portanto, apesar de essa
apalavra aparecer 16 vezes na obra, trazemos aqui estes poucos recortes.
Na p. 13 já tivemos um recorte que foi citado. Posteriormente, temos uma obser-
vação importante formulada por Paulo Freire (1987, p. 47) na qual diferencia a espera
enquanto mera espera e a espera enquanto parceira da práxis. E nessa esperança ativa
há movimento que potencializa o “ser mais”, nesse “quefazer”:
Se o diálogo é o encontro dos homens para Ser Mais, não pode fazer-se na deses-
perança. Se os sujeitos do diálogo nada esperam do seu quefazer já, não pode haver
diálogo. O seu encontro é vazio e estéril. É burocrático e fastidioso.
160
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Confiança no P.O.
Esta é a razão pela qual não são as “situações limites”, em si mesmas, geradoras de
um clima de desesperança, mas a percepção que os homens tenham delas num
dado momento histórico, como um freio a eles, como algo que eles não podem ul-
trapassar. No momento em que a percepção crítica se instaura, na ação mesma, se
desenvolve um clima de esperança e confiança que leva os homens a empenhar-se
na superação das “situações-limites”.
“É que a confiança, ainda que básica ao diálogo, não é um a priori deste, mas uma
resultante do encontro em que os homens se tornam sujeitos da denúncia do mundo,
para a sua transformação” (FREIRE, 1987, p. 98). Portanto, a confiança é fruto, é co-
lheita desse processo dialógico, porém se consorcia com ele na disposição mesma de
transformar.
161
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Já tratado extensamente no capítulo anterior, por coincidir como uma das catego-
rias empíricas eleitas, nos reservamos, até para não parecer redundante e nem exte-
nuante, evitar trazer estas citações acerca da criticidade aqui, apenas retomaremos o
vocábulo “pensar crítico”, que aparece 5 vezes no livro, para refletirmos sobre ele, em
particular.
Ainda que tenhamos tratado desse trecho do Pedagogia do Oprimido antes, vamos
encarar mais uma vez esse recorte para uma breve reflexão acerca do pensar crítico,
pois que nesse ponto do livro Freire (1987, p. 47), ao definir os princípios do diálogo
coloca o pensar crítico como estrutural ao diálogo verdadeiro e define o pensar críti-
co como um pensar verdadeiro: “...., não há o diálogo verdadeiro se não há nos seus
sujeitos um pensar verdadeiro. Pensar crítico. Pensar que, não aceitando a dicotomia
mundo-homens, reconhece entre eles uma inquebrantável solidariedade”. E aí, Frei-
re, ainda na mesma página, contrapõe o pensar ingênuo ao crítico na feitura de uma
transformação permanente da realidade e do ser humano.
E chega uma daquelas frases marcantes de Paulo Freire (1987, p. 47): “Somente o
diálogo, que implica num pensar crítico, é capaz, também, de gerá-la”. Ou seja, diálogo
e pensar crítico estão imbricados e indissociáveis. E ricamente nos oferece este pensar
que o pensar crítico que implica numa perspectiva situada e historicamente datada,
em que os era se percebe habilitado a romper com as trevas da realidade opaca criada
pelas situações de opressão e colonialidade. O pensar certa cria condições de emergir e
sair do casulo como esvoaçante borboleta que singra ares e horizontes infindos.
Esta reflexão sobre a situacionalidade é um pensar a própria condição de existir.
Um pensar crítico através do qual os homens se descobrem em “situação”. Só na medi-
da em que esta deixa de parecer-lhes uma realidade espessa que os envolve, algo mais
ou menos nublado em que e sob que se acham, um beco sem saída que os angustia e
a captam como a situação objetivo-problemática em que estão, é que existe o engaja-
mento. Da imersão em que se achavam, emergem, capacitando-se para inserir -se na
realidade que se vai desvelando. (FREIRE, 1987, p. 58).
Portanto, “Se as massas associam à sua emersão, à sua presença no processo his-
tórico, um pensar crítico sobre este mesmo processo, sobre sua realidade, então sua
ameaça se concretiza na revolução”. (FREIRE, 1987, p. 84). Viva a Revolução, a possi-
bilidade crítica, dialógica, de sua realização.
162
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A tarefa coerente do educador que pensa certo é, exercendo como ser humano a
irrecusável prática de inteligir, desafiar o educando com quem se comunica e a quem
comunica, produzir sua compreensão do que vem sendo comunicado.
Paulo Freire
Amorosidade / Amor no P.A.
Humildade no P.A.
163
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A arrogância farisaica, malvada, com que julga os outros e a indulgência macia com
que se julga ou com que julga os seus. A arrogância que nega a generosidade nega
também a humildade. que não é virtude dos que ofendem nem tampouco dos que
se regozijam com sua humilhação. O clima de respeito que nasce de relações justas,
sérias, humildes, generosas, em que a autoridade docente e as liberdades dos alunos
se assumem eticamente, autêntica o caráter formador do espaço pedagógico. (Op.
Cit., p. 47, 48).
Mais adiante no texto, Paulo Freire (2002, p. 53), dialoga como professor com pro-
fessor@s, recomendando que estejamos capacitados para ensinar adequadamente que
é esse preparo jamais deve ser motivo de arrogância, ao contrário deve pautar a humil-
dade enquanto essência de uma educação dialógica:
Assim como não posso ser professor sem me achar capacitado para ensinar certo
e bem os conteúdos de minha disciplina não posso, por outro lado, reduzir minha
prática docente ao puro ensino daqueles conteúdos. Esse é um momento apenas de
minha atividade pedagógica. Tão importante quanto ele, o ensino dos conteúdos, é o
meu testemunho ético ao ensiná-los. É a decência com que o faço. É preparação cien-
tífica revelada sem arrogância, pelo contrário, com humildade. É o respeito jamais
negado ao educando, a seu saber de “experiência feito” que busco superar com ele.
Nesse ponto de seu livro, proposto para fundamentar uma educação dialógica,
Paulo Freire (2002, p. 61 e 62), vai estabelecer uma preciosa articulação entre prin-
cípios dialógicos, a amorosidade e a humildade, e o gosto pela vida, pela alegria, pela
possibilidade de sempre estarmos abert@s às inovações:
É preciso que saibamos que, sem certas qualidades ou virtudes como amorosida-
de, respeito aos outros, tolerância, humildade, gosto pela alegria, gosto pela vida,
abertura ao novo, disponibilidade à mudança, persistência na luta, recusa aos fa-
talismos, identificação com a esperança, abertura à justiça, não é possível a prática
pedagógico-progressista, que não se faz apenas com ciência e técnica.
164
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Fecha estas citações acerca da humildade com uma mensagem muito especial: “No
fundo, o educador que respeita a leitura de mundo do educando, reconhece a historici-
dade do saber, o caráter histórico da curiosidade, desta forma, recusando a arrogância
cientificista, assume a humildade crítica, própria da posição verdadeiramente científi-
ca”. (FREIRE, 2002, p. 63)
Fé no P.A.
Nada aparece referente a fé no Pedagogia da Autonomia.
Esperança no P.A.
165
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
E Paulo Freire (Op. Cit., p. 38) brinca seriamente com a contradição entre o esperançar
e a desesperança: “É preciso ficar claro que a desesperança não é maneira de estar sendo
natural do ser humano, mas distorção da esperança. Eu não sou primeiro um ser da deses-
perança a ser convertido ou não pela esperança. Eu sou, pelo contrário, um ser da esperan-
ça que, por "n" razões, se tornou desesperançado”. É enfático ao problematizar a ideia de
uma história determinista, na qual o futuro já está posto. Há de se reconhecer que a nossa
condição de seres históric@s, abre o presente para a feitura de um porvir esperançoso:
Jamais receei ser criticado por minha mulher, por minhas filhas, por meus filhos,
assim como pelos alunos e alunas com quem tenho trabalhado ao longo dos anos,
porque tivesse apostado demasiado na liberdade, na esperança, na palavra do ou-
tro, na sua vontade de erguer-se ou reerguer-se, por ter sido mais ingênuo do que
crítico. (FREIRE, 2002, p. 55).
Alia-se as demais pessoas quando depõe acerca de outr@s que podem se aliar na
busca por esse outro mundo possível, no qual seja viável o amor. E que a escola é um
lócus de esperança na colaboração para esse sonho possível:
E aí, Paulo Freire (Op. Cit., p. 74) vai nos contar que há um compromisso ético
integrado com essa esperança que nos pôde mobilizar em direção a estes sonhos e
u-topias. E que nosso compromisso pessoal conosco é também compromisso com esse
projeto social libertador, autônomo e solidário:
166
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Não sendo superior nem inferior a outra prática profissional, a minha, que é a
prática docente, exige de mim um alto nível de responsabilidade ética de que a
minha própria capacitação científica faz parte. É que lido com gente. Lido, por
isso mesmo, independentemente do discurso ideológico negador dos sonhos e das
utopias, com os sonhos, as esperanças tímidas, às vezes, mas às vezes, fortes, dos
educandos. Se não posso, de um lado, estimular os sonhos impossíveis, não devo,
de outro, negar a quem sonha o direito de sonhar.
Confiança no P.A.
Como informei no trato do Pedagogia do Oprimido, aqui também não irei tratar
dessa categoria, por ter sido amplamente estudada quando da apresentação da catego-
ria empírica que com ela se identifica. Porém, a caráter de finalização desse trecho da
tese, retomo a afirmativa presente, mas abro exceção nesse diálogo com o Pedagogia
da Autonomia, último livro publicado por Paulo Freire, no qual em três capítulos traz
o Pedagogia do Oprimido para a formAção Docente. Nesse livro Paulo Freire, em
seu capítulo primeiro interliga discencia a amorosidade, ressalta o rigor da pesquisa
enquanto constitutiva do educador, o respeito enquanto ética e estética, em que afirma
que boniteza é tão importante quanto o fazer certo. No capítulo dois nos fala da humil-
dade de não se supor capaz de transmitir conhecimentos. E finaliza o livro ressaltando
a fé e a criticidade enquanto aliadas na emergência da borboleta que saiu do casulo.
“A tarefa coerente do educador que pensa certo é, exercendo como ser humano
a irrecusável prática de inteligir, desafiar o educando com quem se comunica e a
quem comunica, produzir sua compreensão do que vem sendo comunicado. Não
há intelegibilidade que não seja comunicação e intercomunicação e que não se fun-
de na dialogicidade. O pensar certo por isso é dialógico e não polêmico. (FREIRE,
2002, p. 19 e 20).
Como ser educador, se não desenvolvo em mim a indispensável amorosidade aos
educandos com quem me comprometo e ao próprio processo formador de que sou
parte? (Op. Cit., p. 35).
167
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Amorosidade/amor
168
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
• Amor não é fonte ou causa de sofrimento. Amor é solução. Amor não mata,
não destrói. Amor constrói, transforma. O que destrói e a falta dele. Amor não
diminui quando se compartilha, multiplica se.
• Amor é resultante do nosso aperfeiçoamento moral e espiritual. E um apren-
dizado. Vamos expandindo a nossa capacidade de amar ao longo da vida de-
pendendo das circunstâncias e das experiências.
• E preciso amar... e preciso amar incondicionalmente .... a todos....estamos lon-
ge disso ainda ....a sociedade está fincada na competição entre os indivíduos e
no egoísmo...no individualismo...nas exigências da vaidade e do orgulho...do
ter e do poder....temos muito que caminhar, que aprender
• Amor é a chama que metaforicamente acende nosso peito, conduzindo nossas
ações e sentidos para o respeito a si e ao outro.
• Amor, penso que o amor romântico chega por identidade afinidade, aos ou-
tros desejos (falta) e talvez uma transformação da carência afetiva que todos
temos; o amor de mãe eu incluo nesta categoria.
• O amor vem do autoconhecimento. Conhecendo a nós mesmos, tomamos
consciência acerca do outro. O amor é acima de tudo cuidado e respeito. Lugar
de afetos e desafetos, mas onde existe amor sempre existe respeito.
• Tudo emana do AMOR. O AMOR é a energia essencial que move o univer-
so. Somos todos, humanos, fragmentos do amor total que alguns denominam
Deus.
• O amor vem da vontade de se doar ao outro e da esperança de um mundo
melhor e de uma vida mais feliz.
• Da compreensão da importância do outro na minha vida, na falta que ele pode
me trazer, na minha consciência agora. Da saudade do que vivi e saber da im-
portância para seguir em frente.
• A natureza do amor é amar.
• Da compreensão da importância do outro na minha vida, na falta que ele pode
me trazer, na minha consciência agora. Da saudade do que vivi e saber da im-
portância para seguir em frente.
• Amor vem da empatia (estar no lugar do outro)
• O Amor vem de Deus, ou o nome que quiserem dar para essa manifestação da
espiritualidade que vai para além da matéria. Deus é o amor
• O amor vem da empatia, vem de você se reconhecer no outro, se identificar
com o outro.
• O amor vem do autoconhecimento. Conhecendo a nós mesmos, tomamos
consciência acerca do outro. O amor é acima de tudo cuidado e respeito. Lugar
de afetos e desafetos, mas onde existe amor sempre existe respeito.
• Penso que o amor é próprio do ser humano. Ele pode ser entendido como o
sentimento mais forte que temos por outra pessoa, seja num relacionamento
ou com filhos, amigos, parentes. Sendo assim, ele vem de dentro de nós, au-
169
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
menta e se espalha nas relações que temos conosco mesmo, com os outros e
com o mundo. É o olho no olho, a mão na mão, o face a face. É indispensável
a vida.
• Penso que o *AMOR* em suas várias formas de se manifestar nasce de um sen-
timento forte que nos impulsiona a prática do bem, da verdade, da justiça, da
ética, da humildade, da fé, da esperança, do respeito ao outro, da compreensão,
entre outros aspectos. O *AMOR* liberta. Quem ama se doa pelo bem do outro.
• O Amor é um sentimento gratificante e que nos realiza, nos torna plenos. E va-
riado... amor-próprio, ao outro.... universal... filial, materno ou paterno, con-
jugal, fraterno. .... nasce pequenino como uma centelha divina dentro de nós,
pode crescer ao infinito ou não...precisa ser exercitado.... É algo que se apren-
de, que se desenvolve com a força da Boa vontade. Sempre faz bem a quem
ama e a quem é dirigido o amor. Amor é luz. Amor é paz. Amor é doação da si.
• O amor é tudo. Amar é o que nos faz humano.
• Ei sei *amar* mas confesso que não sei dizer de onde vem o amor.
• A semente do amor está em nós, basta só plantar, regá-la com carinho em
terra fértil, cuidar dela sem falta que dela nascerão humildade, confian-
ça, criticidade, fé e esperança , porque somente a partir de uma postura
amorosa podemos ser humildes, ter confiança em nós e nos outros as/ ,
olhar para o mundo de forma crítica no sentido de contemplar todos os
lados, termos fé em nós mesmos e na s /o s outr as/ os e a esperança que
nos leva a movimentar montanhas. De fato, sem amor não há perspectiva.
A Humildade
• Pra mim a humildade é o que Paulo Freire define como gentetude, vem dessa
nossa capacidade humana de encontrar, dialogar e valorizar o outro e a gente
como ele(a) é e como também somos, incluindo aí todas as diferenças e confli-
tos. A humildade viabiliza o encontro, a nossa capacidade de aprender sempre,
em qualquer situação e tempo e as significações possíveis e particulares do
mundo, das relações numa dimensão horizontal e das experiências em nós.
• A Humildade surge na consciência de que o elétron só é elétron por existir
quem o atraia da mesma forma que um órgão só existe por haver um corpo
e que uma pessoa só existe por haver uma sociedade. A Humildade é o saber
que só somos por haver algo que nos dá a nossa razão de ser.
• Humildade é a capacidade de ter consciência de suas capacidades e habilida-
des para sentir-se igual aos outros.
• A Humildade vem da percepção de que preciso do outro. Significa a aceitação
de seus limites e dos limites do outro.
170
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
• Humildade é quando percebemos que não somos o único e que "ser com o
outro" podemos ser melhores
• A humildade vem do reconhecimento de nossas limitações, que não estamos
no controle. Em uma maior dimensão, é o reconhecimento que fazemos parte
de algo maior.
• A humildade nasce do nosso sentimento de pequenez em relação a Deus. Sa-
ber que Deus ama toda a humanidade nos faz crer que não somos melhores
que o outro. Entender isso, nos faz perceber que a vida traz situações em que
essa compreensão é necessária e nos permite viver melhor. Sentimentos de
disputa, competitividade e superioridade nos tornam infelizes, enquanto o
oposto nos traz plenitude, confiança e paz.
• A Humildade vem da capacidade de compreensão do que realmente somos
diante da imensidão do universo e do sentimento de que somos todos iguais
apesar das diferenças. E algo que se cultiva, se busca, se conquista
• Humildade é um estado de consciência de que somos todos UM e ao mesmo
tempo somos o todo. Quando reconheço falhas no outro, na verdade percebo
o que há em mim. Quando reconheço minhas falhas e a do outro, sem julga-
mento, entro em estado de humildade.
• A humildade a meu ver é fruto do reconhecimento de que existe algo maior,
algo que nos rege, uma força que vai muito além do que a mente humana é
capaz de imaginar... a humildade nos faz pequenos mesmo na nossa grande-
za, pois nos permite o olhar permanente de que sempre estamos aprendendo,
evoluindo e que aprendemos principalmente nas relações de uns com os ou-
tros... ser humilde é reconhecer sua pequenez diante do mundo, qualquer que
seja o impacto que você acredita causar sobre ele.
• Humildade é reconhecimento do outro como igual (estar com o outro)
• A Humildade vem da evolução espiritual. Do entendimento de nossa insigni-
ficância. Quem inventou a insignificância foi o poeta Manoel de Barros. Lendo
ele, entendemos isso
• A humildade vem de você se reconhecer como ser inacabado, em constante
aprendizado. Aberto para o mundo e para o outro.
• A humildade a meu ver é fruto do reconhecimento de que existe algo maior,
algo que nos rege, uma força que vai muito além do que a mente humana é
capaz de imaginar... a humildade nos faz pequenos mesmo na nossa grande-
za, pois nos permite o olhar permanente de que sempre estamos aprendendo,
evoluindo e que aprendemos principalmente nas relações de uns com os ou-
tros... ser humilde é reconhecer sua pequenez diante do mundo, qualquer que
seja o impacto que você acredita causar sobre ele.
• Se é húmus então vem da terra, traduz estar abaixo, mas não inferior. É im-
portante sem aparecer. Humildade é a capacidade que temos de ensinar sem
parecer sábio e de aprender sem parecer ignorante. Humildade é um estado de
espírito, um jeito de ser, um modo de vida.
171
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
• Sem amor não há humildade, pois está pressupõe colocar-se no lugar do outro,
abrir mão de sua perspectiva em favor de outras. Ser humilde é escuta; é um
ato de respeito ao outro; um modo de dizer que não somos donos da verdade.
• A *humildade* vem do amor pleno que se manifesta sem orgulho, sem pre-
potência, sem arrogância. É compreender que em nossas diferenças somos
iguais. Como bem diz Freire: não existem saberes mais e nem menos existem
saberes diferentes.
A Fé
• A fé, pra mim que não tenho uma religião definida, vem e acontece quando
aprendemos a observar o mundo, reconhecemos a sua complexidade e perce-
bemos como de uma forma profundamente harmonia tudo está interligado e
integrado. Nesse momento percebemos que algo maior existe, e somos apenas
parte e aprendizes dessa experiência planetária e espiritual.
• A Fé é a força que persiste quando não há atração, é a busca de algo que não
existe ou deixou de existir. O pequeno elétron que está prestes a se soltar da-
quele núcleo ainda se agarra a aquele átomo com a força da fé, pois qualquer
mudança sempre vai exigir dele uma energia que não quer desprender. assim
ele tem a fé de que algo ainda existe para que possa se agarrar um pouco mais
antes de se desprender. Da mesma maneira que um órgão haverá de se dedicar
até o seu último suspiro na esperança de que o corpo reconheça a sua função
para com o órgão sendo a fé a esperança do acontecimento.
• A fé é aquilo que precisamos para seguir quando nossas forças estão esgarça-
das no caminho pedregoso.
• A fé vem da percepção da finitude. Significa a aceitação de que somos peque-
nos, mas não desimportantes para o mundo, para Deus.
• A fé são instantes constantes da vida em que posso compreender o que o outro
acha incompreensível
• A fé nasce a partir da necessidade que temos, sobretudo diante dos desafios
da vida, de acreditar em algo maior. Por mais que tenhamos fé, em nós mes-
mos, força e vontade para solucionar as dificuldades que a vida nos impõe,
percebemos, principalmente nos momentos mais duros, que a vida não está
sob nosso controle. Crer em uma força motriz que nos impulsiona para um
caminho seguro, apesar das pedras no percurso, é algo que nos fortalece. A
conexão com Deus, através da prece, da meditação, da observação da natu-
reza, do universo, engrandece a nossa fé. A fé é algo difícil de descrever, mas
em termos comparativos, é um sentimento que se assemelha a paz que uma
criança sente, quando sabe que está sendo cuidado por uma mãe ou por um
pai. A diferença, nesse caso, é que Deus é um Pai que não enxergamos ou to-
camos, apenas sentimos.
172
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A Esperança
Esperar sem espera vã, já dizia Paulo Freire. E aqui encontramos o amanhã no hoje;
manter o positivo em pauta; é fruto da fé. Vem do vácuo onde mora o nada que pode
ser tudo. É o inédito viável, o sonho possível.
• Vem quando percebemos que acordamos com uma presença/postura no hoje,
potencializada por uma projeção/visualização de um amanhã transformado,
na maioria das vezes não só numa condição subjetiva, pessoal, mas princi-
palmente numa dimensão sociocultural e coletiva. Ter esperança é sentir que
somos sementes e estamos em tempo de plantio, ou em constante (re)plantio.
• A esperança é a fé em movimento, um pequeno átomo solto no firmamento
lidando com a sua falta de fazer parte de um algo, ele espera um acontecimen-
to com fé de que aconteça pois quando avaliou através da criticidade da sua
existência ele confia no propósito do seu ser participar de um algo maior, que
é de onde vem a sua humildade. Quem, mesmo sendo o menor dos elétrons, já
sentiu a atração sabe que depois que sente o amor, o mesmo entende que sem
amor não há existência.
• Esperança é não deixar que o negativo se sobreponha à nossa potência de vida.
• A esperança vem do sonho de outros mundos possíveis. Ela significa alento e
força para continuarmos buscando sermos mais.
173
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
174
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A Confiança
175
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
quando estou nos extremos dos problemas a serem enfrentados. Sei que sai-
remos dessa situação. Afinal atravessamos o mar em navios negreiros. Nossos
corpos são tudo isso, carregados de confiança. Olhamos todo dia para o mar.
Atravessamos, mas não perdemos nossos laços.
• Confiança é acreditar na capacidade do outro.
• A confiança nasce da esperança de que o nosso melhor será reconhecido pelos
que amamos.
• A confiança vem das relações verdadeiras, desprovidas de julgamentos e co-
branças. Portanto não faz parte do repertório dos banqueiros e agiotas.
• A confiança vem de você reconhecer sua própria história, os desafios que foi
capaz de enfrentar, e reconhecer que, apesar das desventuras chegou onde está.
• Confiança é um ato solidário, é acreditar que o outro nunca vai te trair, por-
tanto, implica na reciprocidade. Confiança é ter a certeza que de tudo o que foi
combinado vai acontecer como o combinado, é seguir em frente sem precisar
olhar para trás, é ter certeza do caminho. É o passo a passo juntos, é caminhar
na mesma direção com a certeza que o mais importante é o caminho, o pro-
cesso, não a chegada ou a partida.
• A *confiança* nasce das relações maduras plenas de amor e respeito de uns
para com os outros.
• Confiança é o apurado exercício do convívio.
A Criticidade
176
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Finalizando esse trecho da tese, trago dois depoimentos que trazem um desfecho
interessante, ao integrar esses princípios que constituem um corpus único e indissoci-
ável, em certa medida. Afinal, é na conjugação desses princípios que podemos de fato
ter uma perspectiva dialógica em práxis efetiva.
177
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Amorosidade / Amor
Humildade
Humildade: é humus que fertiliza; estar ligado aos ciclos da terra, da vida; cheias e
vazantes; acolher e respeitar os diferentes saberes e ritmos; respeito a(o) outr@; inter-
dependência; simplicidade; desconsiderado pela lógica do capital.
Numa frase síntese: Humildade é húmus- fertilizante, cheia e vazante e fica o hú-
mus. ... tão mal visto na sociedade capitalista, é um elemento importante na Decolo-
nialidade. Implica em reconhecer limitações. Entretanto, ninguém sabe mais ou me-
nos. São saberes diferentes. Respeito ao outro... acolher a diferença...sensibilizar com
a dor do outro.
Fé
178
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
vê e no que vê; crença em dias melhores; fécula (o que dá liga e alimenta); força que
mobiliza; potência de mover; fidelidade.
A fé assim se move na frase síntese: Fé é algo mais subjetivo. Acreditar no intangí-
vel. Grande conflito do homem ocidental. O coletor, habitante das cavernas, diante dos
ciclos das estações... após longo inverno, haveria prosperidade que gera fé e esperança
em dias melhores. Fé que transforma ou aliena... nos move ... É potência de realização.
Fé leva a mudança... A fé projeta a ação... fé move montanha...Fé e esperança são im-
possíveis de dissociar... Fécula relação implica em acreditar, ficar e realizar.
Esperança
Confiança
Confiança: Com fé; construção parceira; requer esforço mútuo; fruto dar acordos;
envolve tempo e entrega; muda tudo; essencial as relações; implica em relações e pro-
cessos; fiar com...; entrega; decorre do amor; depositar fé em alguém; fruto da dispo-
sição de amar.
Na frase síntese assim é anunciada: Confiança é construção. Requer o esforço de
tod@s @s envolvid@s. Requer muito cuidado, muito zelo. Conhecer o outro. Por na-
tureza somos desconfiados. Requer esforço, zelo, não é rápido. Requer coerência entre
o que se diz e o que se faz. Por isso as relações hoje são tão frágeis... Não se espera o
tempo, os processos... então se fragiliza e fragilizam os relacionamentos. Confiança é
processo de se relacionar com o outro. É processual e surge da relação. Confiar é depo-
sitar fé em alguém. Decorre do conhecer ou se dispor a conhecer a verdade do outro,
da disposição de amar... obriga essa arqueologia de nós mesmos...Reconhece o outro
como lugar de nossa realização humana. Confiança vem de um ato de amor, se dispor
a acreditar e estabelecer essas relações. É relacional e surge do ato de amor.
Criticidade
Pensar Crítico: é problematizar para transformar; olhar para a realidade com cons-
ciência; reconhecer que tem o que aprender; ir para além do ingênuo; buscar entender;
leitura atenta do mundo; fruto da problematização; ir além do aparente; pensar o real
desde dentro; busca da razão de ser.
179
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A frase síntese que define criticidade define que: Criticidade seria o processo de
problematizar a realidade para transformá-la. criticidade emerge do reconhecer que a
gente não sabe tudo, de que não sabe que leve a busca de novos conhecimentos. olhar
para a realidade, mas fora do pensamento automático e não apenas através da razão,
mas também com o sentimento. Aí entra a intuição. leva também a problematizar o
já imposto. Surge da problematização. É um processo contínuo e dialógico. Somos
seres críticos, acontece que vamos sendo moldados, vamos perdendo... Pensar crítico
gera diálogo no ir além do aparente. pensar crítico é pensar a realidade de dentro da
realidade. Busca de razão de ser
Então, essa releitura dos princípios dialógicos nos ajudam a alargar nossa per-
cepção sobre eles. Favorecem que possamos reconhecer uma amplitude maior e nos
mobiliza para o exercício de nossa própria definição e os entrecruzamentos que po-
demos realizar.
A borboleta borboleteia com borboletas em voos especiais que potencializam no-
vos horizontes de percepção. São alargadas as consciências. Entretanto, ainda pode-
mos encontrar subsídios para a implementação dos Princípios dialógicos e que, certa-
mente, integrados favorecem o sucesso das empreitadas dialógicas. Um desses proce-
dimentos no contexto da Teoria da Ação Dialógica que nos favorecem muito é a ideia
de integrar amor, arte e alegria, os três As. Com essa pretensão em coração e mente e
corpo, reconhecemos que o uso das metáforas e tudo o que elas podem representar,
trazem esse valioso aporte para as experiencias dialógicas. E com elas também vamos
chegando a última parte dessa tese. Que fique junto nossa esperança, fé e confiança de
que o amor, a humildade e a criticidade se misturem com a vivacidade das simbologias
que abrem o horizonte da imaginaçao-aprendezagens-ensinagens intensamente vivas
e potentes.
4.4 Metáfora
Manoel que só podia ser de barros nos conta que “uma árvore bem gorjeada passa
a fazer parte dos pássaros que a gorjeiam48". É no adiante dessa afirmativa que se pode
cantar a vida que passa a nos en-cantar e o caminhante, ao caminhar, se torna cami-
nho que se faz junto, colado, mergulhado um no outro, se fazendo indissociavelmente
um(s). Árvore, sombra, flores, frutos, nós, eus, vocês, nos fazendo ‘ser mais’...
João Figueiredo
A meta está fora... mas precisa ter suporte dentro. É desde dentro que podemos es-
tabelecer metas. Se desconhecemos o nosso lugar de origem, será difícil chegar aonde
pretendemos ir. Porém, se temos o conhecimento do nosso lugar, podemos conhecer
outros lugares. Se sabemos o que pretendemos, nosso propósito, podemos comparti-
lhar. Entretanto, nem sempre seremos entendidos ou reconhecidos em nosso querer e
menos ainda em nosso ser. A metáfora, em geral, simboliza. Manifesta um recurso cul-
tural de tentar ser entendido, reconhecido. Mas, se torna imprescindível reconhecer-
mos que nem sempre o sentido é o mesmo. Sinais trazem significados compartilhados,
por outro lado limitam e circunscrevem. Os signos abrem o leque de possibilidades
interpretativas. Os símbolos são signos abertos à interpretação, mas que trazem a pau-
Trechos do poema “Administrador do Inútil”, autoria de Manoel de Barros. http://www.algu-
48
mapoesia.com.br/poesia/poesianet061.htm.
180
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
181
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
4.4.2.Dispositivo Dialógico
Dispositivo de Diálogo por sua vez pode ser caracterizado como estratégias, ins-
trumentos e procedimentos que favoreçam o diálogo, a amorosidade em particular,
mas ao mesmo tempo tenha em consideração a propriedade dos princípios dialógicos
interagindo entre si e desde aí criando condições pertinentes ao dialogar, ao dialógico,
à dialogicidade. O dispositivo dialógico por excelência seria a implementação do uso
das metáforas e movimentos e estratégias que com elas se aliam.
182
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
nas ações de propaganda e marketing. Segundo estudos da língua, afirmam que usa-
mos em média 4 metáforas a cada minuto, em uma conversa informal. Entretanto,
geralmente, o fazemos sem consciência da potência e da capacidade comunicativa das
metáforas, bem como os riscos inerentes ao seu uso descuidado inconsciente ou, pior
ainda, inconsequente.
Cabe então esse alerta, uma advertência, quando do uso das metáforas. Aconte-
ce que as metáforas geram sempre interpretações múltiplas, em razão da sua própria
polissemia. Assim sendo, é pertinente observar esse fato para evitar conflitos interpre-
tativos mais sérios. Estamos vivendo um tempo em que a complexidade nos favorece,
mas pode também gerar incompreensões. Interessante observar quer sempre possibi-
lidades edificantes, construtivas, integrativas, e, portanto, aproxima ações ao invés de
que interpreta ações que gerem distanciamento, resistência. Belicosidade.
Portanto, quando uma palavra é utilizada fora de um contexto concreto, literal,
temos ali o uso de imagens metafóricas que induzem uma comparação implícita, su-
bentendida no texto. Se caracteriza por comparar sem que sejam empregados termos
comparativos.
A metáfora, didaticamente, pode ser considerada uma comparação que não usa,
mas que apresenta de forma literal uma equivalência que é apenas figurada. Consiste
no uso de palavras, imagens, objetos, sensações, emoções, sentimentos, habitualmente
oriund@s de outros contextos de significação que são transpostas enquanto informa-
ção, para outro contexto e situação com a intenção de estabelecer um melhor acesso ao
significado possível ao sentido pretendido.
A metáfora é o recurso estilístico responsável por transpor o sentido literal para o
figurado. Ela cria novos sentidos ou possibilidade de novos sentidos, ao transfigurar
um sentido literal, dando-lhe um sentido figurado. Temos as metáforas de uso e as de
invenção. As de uso são as que regularmente se manifestam no cotidiano. As metá-
foras de invenção, melhor apresentadas por Paulo Ricouer52, possuem o condão de
possibilitar interpretações surpreendentes e, até mesmo, em novas significações. É o
que acontece bastante em músicas e poesias. Gilberto Gil nos oferece belas metáforas
para apresentar metáforas:
Metáfora
Gilberto Gil
Uma lata existe para conter algo
Mas quando o poeta diz: "Lata"
Pode estar querendo dizer o incontível
Uma meta existe para ser um alvo
Mas quando o poeta diz: "Meta"
Pode estar querendo dizer o inatingível
Por isso, não se meta a exigir do poeta
Que determine o conteúdo em sua lata
52
Paul Ricouer deixou sua contribuição para nosso entendimento das “metáforas de invenção:
“... a interpretação metafórica, fazendo surgir uma nova pertinência semântica sobre as ruínas do
sentido literal, suscita também uma nova visão referencial.” (p. 289). RICOEUR, P. La metáphore
vive. Paris, Seuil, 1975.
183
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
184
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
indo para além do três, sem se caracterizar como o quatro. Rsrs... Em outras palavras,
mais identificadas com a dimensão do concreto, num processo científico ou filosófico
que se constitui por meio da dialética da linguagem, qualquer tese está aberta à antí-
tese para que se elabore uma nova síntese. Isso é o processo habitual de fomenta. Ela
congrega elementos relevantes e essenciais e vai direto ao ponto. Oferece uma nova
perspectiva ao “olhar”, ao “sentir”, ao “perceber”.
No campo da Linguística constatamos que desde a antiguidade clássica até início
do século XX, a metáfora era reconhecida no campo da linguagem, exclusivamen-
te como um tropo poético objetivando embelezar os textos, numa lógica própria do
pensar aristotélico. Somente a partir da década de 1970, os pressupostos científico-fi-
losóficos do objetivismo começam a ser questionados, e ganha vulto a subjetividade
e se avança rumo à intersubjetividade. Dessa maneira, a metáfora ganha outras pos-
sibilidades. A linguagem passa a ser reconhecida não apenas como representação da
realidade, mas a própria realidade representada. E se constata o poder constituinte que
ela adquire. E essa pretensão ganha ares de verdade e impacta mais amplamente, como
informam Lakoff e Johnson; Black e Réddy (apud: ALMEIDA, 2005) tendo este último
proposto reflexões seminais para esse novo olhar sobre a metáfora. A metáfora então
adquire novo status e passa a se postular também ‘metáfora criativa’, com o intuito su-
perior ao estético, como constitutiva do mundo fenomênico. Este foi um exemplo da
riqueza que as metáforas vêm adquirindo ao longo dos últimos tempos. Já no campo
da educação, optamos por trazer um belíssimo estudo do professor Danilo Streck, no
qual nos oferece uma oportuna contribuição ao tratar das metáforas no cenário da
educação. No presente momento, temos ciência de novo trabalho seu em que elabora
um aprofundamento das correlações em torno do uso educativo, didático-pedagógico
das metáforas, por meio da metáfora do labirinto para dialogar com a educação popu-
lar latino-americana.
Streck (2001) inicia seu ensaio ao apresentar o tema “Metáforas em educação”. Nele
inicia afirmando que: “Não podemos imaginar a comunicação humana sem metáfora”
(p. 13). Danilo Streck avança na demonstração e poder das metáforas, alinhavando
ideias, tais como quando destaca que: ... as ciências dificilmente avançariam em suas
descobertas se não buscassem analogias entre aquilo que desejam explorar e áreas ou
objetos já conhecidos e que fornecem elementos para exprimir o ainda inominado”
(STRECK, 2001, p.14).
Em outro trecho nos relembra de Assman (1996) com seu livro “Metáforas novas
para reencantar a educação”, em que considera a pertinência de novas metáforas que
possam nos empoderar. O fulcro principal do texto de Danilo Streck era defender a
ideia de que Paulo Freire utilizou explicitamente a metáfora da trama com evidente
centralidade no “Pedagogia da Esperança”. Defende que essa proposta estaria conec-
tada com duas outras metáforas fundamentais usadas por Paulo Freire em obras ante-
riores, como comprovação da utilidade pedagógica dada por Freire ao uso desse dis-
positivo dialógico, seriam: “linha” e “ruptura”. Teríamos, então, um conjunto triádico
de metáforas que ao mesmo tempo se sucedem e se complementam na obra de Paulo
Freire” (STRECK, 2001, p. 16).
Desde aí, Streck (2001, P. 16) continua ao informar que o livro “Educação como
prática da liberdade” apresentava a ideia de uma sociedade (brasileira) em transição,
de sociedade-objeto para sociedade-sujeito, tal como uma ‘linha que se rompe’ ... Des-
de aí, chega-se ao Pedagogia da Esperança com a “vida como trama”. “Há de se con-
185
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
siderar, portanto, muitos fios para fazer sentido da trama desta existência” (STRECK,
2001, p.21). E em seguida, consegue demonstrar com várias citações do livro de Paulo
Freire a presença forte dessa ideia de trama como fio condutor e amarra firme com a qual
desenrola suas reflexões. “(...) é no jogo das tramas de que a vida faz parte que ela – a vida
– ganha sentido (FREIRE, 1996, p. 65). E, na leitura atenta de Streck ele vai desfiando o
novelo de fios que tecem essa trama, ao desfilar a interligação constitutiva da trama; a
interligação dos fios; a complexidade; o contexto que ela apresenta; a unidade na diver-
sidade; a historicidade; futuro aberto; os saberes percebidos enquanto trama; valoriza a
subjetividade; a interdependência; liga passado e futuro no presente; do eu ao nós; novo
imaginário. No contraponto, pode prender, aparenta inércia. Diante desses desafios Stre-
ck propõe metáfora vivas, autopoiéticas, auto criativas, auto-organizadas.
Como podemos constatar as metáforas que durante bom tempo se limitaram ao
campo da ornamentação, em especial na orbita dos estudos da linguagem. Porém, a
partir dos anos de 1970 se expande e chega a ter impacto nos circuitos da cultura em
geral, com forte influência na educação e na saúde. Trazemos uns poucos recortes de
freirean@s que Streck et al nos presenteia para assuntarmos acerca dessa interlocução
entre Metáfora e Cultura. Antes, porém, peço permissão para trazer alguns tópicos,
oriundos da minha tese de doutorado (FIGUEIREDO, 2003), que considero perti-
nentes ainda na intencionalidade de reconhecermos o poder transformador que as
metáforas trazem.
Primeiramente, é cabível reconhecer que na metáfora, em potência, há manifesta
leitura de mundo, tema gerado, situação-limite, representações sociais, narrativas. Em
outras palavras a metáfora oferece a mediação da linguagem no entendimento freire-
ano que ressalta haver necessidade da leitura de mundo preceder a leitura da palavra,
mas também, entender que na proposta dialógica de educação que Paulo Freire nos
brinda, há um movimento de buscar no mundo elementos constitutivos do diálogo,
para daí estabelecermos as codificações e decodificações que criam abertura para o
ensinar e aprender dialógico. Interpretar códigos simulam criticidade e garantem ex-
pansão de consciência. Reconhecer que nas metáforas temos conteúdos escondidos
que precisam de desvelamento, ajudam por meio da transposição informacional, por
favorecer o entendimento que a vida mesma, discursos e retóricas requerem a busca
da razão de ser, do que está atrás do aparente. Como afirma Paulo Freire (1992, p. 77):
“Não há palavra verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira seja
transformar o mundo”.
Na conjuntura das representações sociais e, comumente, tendo em conta a con-
vicção de que a maioria da população brasileira se caracteriza por ser oriunda de uma
cultura oral, ou residualmente oral, há de se reconhecer suas características e como
podemos usar isso em favor do ensino-aprendizagem dialógico. Nessa vertente, Lane
(1995) nos apresenta as categorias fundamentais do psiquismo humano, na esteira
de Vygotsky, Luria e Leontiev, elege a atividade, a consciência e a personalidade, me-
diadas pela linguagem e pelo pensamento nas relações com os outros. Ela inclui a
afetividade nessa estrutura, propondo-a também como mediadora na constituição do
psiquismo humano (Lane & Codo, 1989; Lane & Sawaia, 1995; Leontiev, 1978; Luria,
1986; Vygotsky et al., 1989).
186
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Emoção, linguagem e pensamento são mediações que levam à ação, portanto so-
mos as atividades que desenvolvemos, somos a consciência que reflete o mundo e
somos a afetividade que ama e odeia este mundo, e com esta bagagem nos identi-
ficamos e somos identificados por aqueles que nos cercam. (LANE, 1995, p. 62).
187
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Nesta tese/neste livro, optamos por fazer um pequeno exercício com as metáforas
que elenquei. Saliento que na minha dissertação de mestrado trabalhei com a metáfora
do caminho, o Tao Ecocêntrico que anunciava a importância de novos paradigmas
epistemo-metodológicos.
No doutorado a metáfora foi a do caminho que se entretecia com a teia..., mas nada
mais aprofundado. Aqui nos propomos a retomar um pouco essas metáforas e trazer
outra que me é cara, a da borboleta. Como falei no início desse trabalho, a ideia era ir
da teia à borboleta. E começamos pelo caminho anteriormente anunciado, passamos
pelo semear no caminho, passamos pelo labirinto que convida ao fio que reabre os
caminhos, avançamos na tecelagem da teia, chegamos a teia, a trama e a, daí fomos ao
casulo que revifica essa caminhada em direção a voos mais altos e mais largos, alargan-
do os horizontes da lagarta que se reconhece borboleta.
Temos dito que Antonio Machado, poeta espanhol nos afirma que: “Caminhante,
não há caminho, o caminho se faz ao caminhar”, eu afirmo que não há caminho, nem
caminhar, nem caminhante, estes se fazem ao caminhar. Contudo, trago de um artigo
intitulado “O problema é a questão” (FIGUEIREDO, 2009) que há de se saber a origem
da caminhada e a que se destina, pois sem isso é improvável chegar a algum lugar que
se pretenda.
O entrecruzamento entre o caminhar e o semear é carreado por meio do reconhe-
cimento de ambas as metáforas como constitutivas do ser que se reconhece no cami-
nho. E entende que precisa deixar frutos por onde passar. Caminhar é constitutivo de
nosso ser e do modo de ser. Ficar parado não leva a lugar algum, obviedade relevante
para nos pôr em movimento. O primeiro passo, habitualmente é o mais difícil pois
implica na motivação, nas razoes que nos impulsionam a caminhar.
Quais os possíveis significados para o conceito de caminhante? Mais do que con-
ceituar cabe entender as razoes que nos tornam caminhantes, peregrinos. Muitos dirão
que os motivos para fazer o Caminho passam por: viajar, conhecer lugares diferentes
ou de uma maneira diferente, pode ser a busca por superar desafios (físicos e emocio-
nais), ainda pode estar associada a ideia de evoluir espiritualmente, aprender a com-
partilhar, conhecer gente e culturas diversas, de diferentes lugares, potencializa ainda
praticar o desapego, a generosidade, entre muitos outros.
Semear, por sua vez, está ligada ao objetivo de fomentar sombra, afinal nada me-
lhor que descansar sob a sombra de uma árvore; gerar frutos é ter a garantia de um
alimento saudável e fresquinho; oferecer flores, mesmo quando a sementeira não dá
frutos, ela pode dar lindas flores, enfeitam o mundo inteiro; favorecer a fauna, pois a
188
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
planta atrai os animais para mais perto... É uma forma de se aproximar da natureza; me-
lhora a qualidade do ar, pois as plantas respiram retirando gás carbônico da atmosfera,
contribuindo também para melhorar a qualidade do ar. Tudo isso é um Colaborar com
o futuro, semear hoje garante que as próximas gerações sobrevivam. Metaforicamente,
sombrear é criar um ambiente confortável diante das intempéries; frutificar pode signifi-
car a compartilha de suas realizações; florescer pode se ligar a ideia de embelezar a vida;
ser parceiro da fauna é ser parceiro da natureza; melhorar a qualidade dos processos
respiratórios se conecta até mesmo ao trato das emoções, das interações consigo e com
@s outr@s. Somos convidad@s, enquanto seres viventes a contribuir com a continuidade
da vida, sem isso inexiste razoes para continuar a caminhada...
Trago ainda aqui um conto e uma música. O conto vem da tradição do Zen Budis-
mo. Nele se relata sobre a metáfora do bambu para se refletir sobre a educação. A partir
da leitura de um conto zen (autor desconhecido), a ideia é reconhecermos o quanto
carecemos de entender que a temporalidade e a sazonalidade do ato de educar exige de
nós, educador@s, pais, muito de nossa perseverança, fé, esperança, confiança e amor.
Todo bom agricultor sabe que uma boa colheita requer boa semente, adubo e água em
quantidade adequada. É óbvio que o semeador sabe que de nada adianta praguejar ou
se impacientar diante do cultivo, a semente precisa de seu tempo de maturação. No
caso do bambu japonês, temos uma curiosidade que requer ainda mais a paciência
característica do oriental. Depois de semear e ter os cuidados comuns, o tempo passa,
passa, passa, sete anos e nada parece estar acontecendo. Depois dos longos sete anos e
aproximadamente sete semanas a planta de bambu crescem mais de 30 metros. Duran-
te os primeiros sete anos de aparente inatividade, o bambu desenvolveu uma complexa
teia de raízes que lhe permitiram o crescimento a tal altura.
Caminhos do Coração
Há muito tempo que eu saí de casa
Há muito tempo que eu caí na estrada
Há muito tempo que eu estou na vida
Foi assim que eu quis, e assim eu sou feliz
Principalmente por poder voltar
A todos os lugares onde já cheguei
Pois lá deixei um prato de comida
Um abraço amigo, um canto pra dormir e sonhar
E aprendi que se depende sempre
De tanta, muita, diferente gente
Toda pessoa sempre é as marcas
Das lições diárias de outras tantas pessoas
E é tão bonito quando a gente entende
Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá
É tão bonito quando a gente sente
Que nunca está sozinho por mais que pense estar
É tão bonito quando a gente pisa firme
189
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
54
Fuxicos são artesanias que criam pequenos círculos feitos com retalhos de tecido e franzidos
com linha.
190
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
A teia tem sido um tema recorrente em meus trabalhos, me parece ser uma metá-
fora que me acompanha e representa muito, pois que com ela identifico a possibilidade
de outros paradigmas adiante do que se tem como referência de ciência eurocêntrica-
-estadunidense.
A teia transborda em múltiplos sentidos e significados. Encontro a teia diante de
diversos movimentos que realizei na minha tese de doutorado e aqui retomo, em certa
medida para ressaltar a profusão de significados e sentidos poder ser percebidos e
identificados na leitura da teia.
Antes, porém de trazer minhas analogias, quero trazer um pouco dos significados
estudados pelos dicionários. Ao considerar o que estes dicionários consultados nos
trazem (AURÉLIO, PRIBERAM, MICHAELIS, CALDAS AULETE55), sintetizamos,
que o vocábulo Teia significa: tecido ou pano feito em tear; trama; conjunto de pesso-
as, coisas, ideias etc. interligadas numa organização semelhante a uma trama; conjunto
55
Dicionário Aurélio, 1988; Dicionário Michaelis, https://michaelis.uol.com.br/moderno-por-
tugues/busca/portugues-brasileiro/. Dicionário Priberan da Língua Portuguesa, 2008-2020,
[consultado em 23-09-2020]; Dicionário Caldas Aulete -http://www.aulete.com.br/teia.
191
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
4.6.5.1Teia de Aranha
Uma teia de aranha é uma armação de fios de seda extremamente finos criada
por aranhas a partir de glândulas produtoras de uma fibra proteica excretada de suas
fieiras. Conforme o Dicionário Aurélio, zoologicamente seria tela elástica de fios finís-
simos, feita pelas aranhas. No Caldas Aulete teia de aranha seria uma rede de fios que
as aranhas segregam e tecem como armadilha para insetos.
Em pesquisas na internet56, constatamos algumas informações e curiosidades inte-
ressantes que trazemos aqui para uma breve noção da complexidade da teia de aranha,
do ponto de vista biológico.
A grande maioria das aranhas tecem suas teias utilizando fios de seda produzidos,
produzidos em glândulas especiais, localizadas no seu abdômen. A seda é expelida
em estado líquido por meio de fúsulas existentes na parte posterior do abdômen. Em
contato com o ar a seda solidifica-se, formando um fio, e a aranha constrói com ele
sua teia. A teia tem propriedades que ajudam a filtrar o som e controlar a temperatura.
Proporcionalmente as teias são cinco vezes mais fortes do que aço, e podem ser estica-
das até quatro vezes o seu comprimento sem se partir. Há inúmeras variações de teias,
as circulares, são apenas um dos muitos tradicionais estilos.
Para iniciá-la, a aranha se aproxima de um local que possa servir de base e expele a
seda. Depois vai puxando os fios de dentro para fora, juntando-os no centro, onde fica
para fazer raios e formar a teia. Em geral, são utilizadas para captura alimentar, mas
também protege de predadores e, algumas, utilizam como berçário.
Culturalmente as metáforas com aranhas e suas teias é milenar. Foram represen-
tadas na cultura popular de diversos povos e tradições, da mitologia grega ao folclore
Africano, a aranha tem sido usada para representar uma variedade de coisas, e perdu-
ra até os dias atuais, com personagens como Spider-Man. Tem sido considerada em
sua complexidade e potência e artimanha ao longo do tempo, Sua virtude simbólica
mais identificada tem sido a da paciência, persistência e astúcia. A aranha tem uma
demorada espera de sua presa para enredá-los. Conectada a mitos de origem e a seres
mitológicos que retratam várias mensagens. Inúmeras culturas atribuem a capacidade
da aranha de teias com a origem da fiação, tecelagem , cestaria etc. Estas estão associa-
das aos mitos da criação, por tecer seus próprios mundos. Mais recentemente, com o
advento das novas tecnologias digitais, passou a se usar muito a teia de aranha como
uma metáfora ou analogia, Internet ou World Wide Web, por evocar a interconectivi-
dade de uma teia de aranha.
No folclore e mitologia, a aranha, juntamente com sua teia, é destaque em fábulas
mitológicas, cosmologias, representações espirituais artísticas, e em tradições orais em
todo o mundo desde os tempos antigos. Aparece como Uttu, a antiga deusa suméria.
Já no Egito Antigo, a aranha foi associada com a deusa Neith em seu aspecto como
fiandeira e tecelã do destino. Na mitologia Africana, a aranha é personificada como
56
http://www.ninha.bio.br/biologia/teia-de-aranha.html
https://www.portalsaofrancisco.com.br/biologia/teia-de-aranha
192
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
193
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Utilizei também na tese o conceito de cultura, conforme Geertz (1973), no qual ele
se refere a metáfora da teia para ressaltar que o ser humano é um animal amarrado a
teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e
as sua análise.
Nisso, propusemos que a confecção das teias temáticas envolvendo o diálogo em
torno de palavras–geradoras, situações-limites, corporificando problemas efetivos fos-
se o meio de estabelecer as relações dialógicas e a tessitura de conhecimento relacional,
parceiro, resultante do intercâmbio entre o saber popular e o saber científico tendo em
vista a construção do inédito-viável. (FIGUEIREDO, 2007, P. 177). Esse procedimento
dialógico gerava a teia de significados indicando, de algum modo, a singularidade do
grupo e a inter-relação entre os nós da teia, vinha demonstrar “a realidade na forma
de trama, de teia de aranha, que se conecta em todos os seus pontos, essa interação
entre todos os pontos da teia, se dá através dos nós agregadores dos fios, tecidos na
constituição das representações sociais, que compõe a teia da vida”. (FIGUEIREDO,
2007, p. 180). E, finalizamos essa reapresentação de fios da teia que constituíram a teia
de relações da minha tese de doutorado.
4.7 A Borboleta
194
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Proteção Às Borboletas
Eu sou como a borboleta
Tudo o que eu penso é liberdade
Não quero ser maltratado
Nem exportado desse meu chão
Minhas asas, minhas armas
Não servem para me defender
As cores da natureza pedem
Ajuda pra eu sobreviver
Você que me vê voando
Como a paz de uma criança
Você sabe a minha idade
Eu sou sua esperança
A ordem da humanidade
Não deve ser destruída
Quando eu voar me proteja
Sou parte da sua vida
Eu sou como a borboleta.
(Benito Di Paula, 1975)
195
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
196
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
197
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Para Freire, a educação é vista como ato de enfrentamento amoroso. Nesse con-
texto, o diálogo se erige como instância transformadora, crítica. Essa abordagem
dialógica é, essencialmente, uma educação que potencializa os seres humanos para
a amorosidade, para a compreensão e resolução de questões fundamentais da vida
do lugar... É centrada em uma práxis que pretende trans-referenciar um bem viver
compartilhado. Observemos que a totalidade do real impõe necessidade de múltiplos
olhares, trans-referencialidade, trans-disciplinaridade, trans-versalidade, politicidade,
eticidade, esteticidade, eco-relacionalidade; em síntese: diálogo contextualizado com
@s outr@s na práxis.
A cultura emerge como campo de embate, mas também como ambiente de encon-
tro, pelos desejos e significados. O mundo não está dado, mas se faz por meio do diálo-
go-práxis, palavr-ação permanente. A história se produz pelos seres em suas relações.
Dialogar é transformar...
A amorosidade é o coração dos princípios que requerem uma incorporação con-
junta e, é possivelmente, a dinâmica mais profunda e complexa da qual o humano
pode participar. Inicia-se a partir do momento em que um ser se liga a outro pelo
‘amor’, pela aproximação cuidadosa. Dentre os critérios fundamentais: o respeito e o
cuidado por si e pel@s outr@s. Cuidar é um ato consciente que pode ser ensinado, e
consiste, por sua vez, num dos maiores geradores de prazer que a percepção humana
conhece.
O amor diz que o que realmente importa é se importar com @ outr@. Assim se faz
o amor que transmuta. E, se ninguém ensina a ninguém, se ninguém aprende só, só
se aprende com... amor! Nessa trajetória o saber de experiência feito, encharcado de
afetos, de amores e desejos, dão consistência ao diálogo, enriquecem a vida, as lições
da escola, das relações cotidianas. Dessa maneira, aqui se oferece parcerias, possibili-
dades, alternativas, diálogos freireanamente tecidos.
198
(IN)CONCLUSÃO
“... um poema, uma canção, uma escultura, uma tela, um livro, uma música, um fato,
um feito, um acontecimento, jamais têm, explicando-os, uma única razão. Um aconte-
cimento, um fato, um gesto, de amor ou de ódio, um poema, um livro se acham sempre
envolvidos em densas tramas, tocados por múltiplas razões de ser, de que algumas
estão mais próximas do ocorrido ou do criado, de que algumas são mais visíveis enquan-
to razão de ser” (Freire, 1994; p. 120).
F
inalizando, estamos conscientes da necessidade de reconhecer que estas res-
postas são decorrentes do que est@s professor@s consideram apropriado
apresentar acerca de suas práticas e teorias... há de se ter uma relativização
desses depoimentos. Diante das nossas questões, temos respostas tipo, o que ele quer
que eu responda.... o que devo responder ... o que devo evitar responder... Há uma
tradução, por parte dest@s professores, que el@s nos oferecem acerca de suas vivências
e experiências. Há uma tradução da minha parte aqui, quando dialogo com este/esse
material de conformidade com as leituras que posso realizar, como fruto de minhas
outras relações praxiológicas e teórico-conceituais e mesmo de minhas escolhas me-
todológicas.
Sabemos que o que estamos aqui apresentando, tudo isso, traz diversos vieses,
próprios de uma pesquisa científica... Mas acreditamos que existem aportes e con-
tributos interessantes para quem quer dialogar sobre práxis dialógica em processos
de ensino-aprendizagem, particularmente aplicados no ensino superior, na formação
universitária...
Constatamos que a maioria dos depoimentos circulam em redor de um buraco que
é a teorização da prática... Há uma leitura que tende a apresentar elaborações teóricas
acerca do que fazem, ao invés de aparecer atividades concretas que foram realizadas
pelo grupo de professor@s entrevistad@s. Vez ou outra aparecem... Isto não retira a
importância dos resultados, ainda que nossa expectativa fosse outra.... Esperamos ain-
da avançar com a práxis dialógica corporificada em diversas aulas dialógicas a serem
disponibilizadas em futuro breve.
A estética, a arte, muito nos ajudam nisso, os mecanismos associados à dimensão
estética favorecem a superação desses modos de ser, ineptos para a dialogicidade. Ve-
nho conclamando os 3 As: Amor, alegria e arte como antídotos diante dessa loucura
199
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
200
REFERÊNCIAS58
ALMEIDA, Custódio L.S. Método vivencial(?): reflexões para uma crítica epistemoló-
gica. Fortaleza, Ce., 1994. (Mimeografado).
ALMEIDA, R.L.T. A educação formal e as metáforas do conhecimento: a busca de
transformações nas concepções e práticas pedagógicas. In: Ciências & Cognição. ver-
são On-line ISSN 1806-5821. Ciênc. cogn. vol.6 no.1 Rio de Janeiro nov. 2005. http://
pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-58212005000300003.
Acesso em setembro de 2020.
ANDRÉ, Marli E. D. A. O que é um estudo de caso qualitativo em educação? In: Re-
vista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 22, n. 40, p. 95-103,
jul./dez. 2013.
______ e LÜDKE, Menga. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo:
EPU, 1986.
ARAGÃO, Ana Lúcia Assunção e NAVARRO, Almira. Diálogos em diálogo: David
Bohm, Paulo Freire e Mikhail Bakhtin. Revista em Questão. v. 19, n. 5 (2004). UFRN.
Acessível em: https://periodicos.ufrn.br/educacaoemquestao/article/view/8646. Aces-
so em 05/02/2018.
AZIBEIRO, Nadir E. Movimentos Sociais, Paradigma da Complexidade e Intercultura:
algumas considerações para discussão em sala-de-aula. Cadernos do NEPP, nº 1. Flo-
rianópolis: FAED/UDESC, maio 2001.
______. Ecologia do corpo coração mente espírito: tecendo reflexões acerca de inter-
cultura e bem viver. In: DOSSIÊ - EDUCAÇÃO INTERCULTURAL: APRENDER
COM OS POVOS ORIGINARIOS DO SUL A DECOLONIZAR A EDUCAÇÅO. Re-
vista. Interinstitucional Artes de Educar (UERJ/FFP, UFRRJ/IM-IE, UNIRIO). V. 4, v.
4, n. 3, 2018.
BARBIER R., L'approche transversale, l'écoute sensible en sciences humaines, Paris,
Anthropos, coll. Exploration interculturelle, 1997.
BARBIER, René, Escuta sensível na formação de profissionais de saúde (*) René Bar-
bier (Universidade Paris 8, CRISE) http://www.barbier-rd.nom.fr/ Conferência na Es-
58
Aqui, mais uma vez, vamos usando nossa licenciosidade e transgrediremos a norma para
apresentar nas referências um bom número de artigos e livros que foram considerados em nossa
leitura e elaboração, embora deixem de aparecer explicitamente no corpo do texto. Mesmo as-
sim, os mantivemos nas referências bibliográficas por reconhecermos a pertinência no sentido
de viabilizar indicações de leituras futuras para nossos leitores e interlocutores dialógicos.
201
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
202
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
203
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
204
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
205
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
206
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
207
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
MORAES, Roque. Análise de conteúdo. In: Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n.
37, p. 7-32, 1999.
______. Tempestade de luz. In: Ciência & Educação, v. 9, n. 2, p. 191-211, 2003.
______ e GALIAZZI, Maria do Carmo. Análise textual discursiva: processo Recons-
trutivo de múltiplas faces. In: Ciência & Educação, v. 12, n. 1, p. 117-128, 2006.
MOSCOVICI, Serge. A representação social da psicanálise. Rio de Janeiro, RJ: Zahar
edit., 1978.
NETO, João C.M. Barbosa, Rafael G.R. O Diálogo como fundamento da educação inter-
cultural: Contribuições de Paulo Freire e Martin Buber. Anais do V Colóquio Interna-
cional Paulo Freire - Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 2005.
NICOL, Eduardo, Los Princípios de Ia Ciência, México, Fondo de Cultura Econômica,
1965.
OLIVEIRA, Manfredo A. Tópicos sobre dialética. Porto Alegre, RS: EDIPUCRS, 1997.
______. Sobre a Fundamentação. RS: Editora EDIPUCRS. Coleção: Filosofia 8, 1993.
PENA, Alexandra Coelho. Diálogo, alteridade e agir ético na educação: um encontro
entre Martin Buber, Mikhail Bakhtin e Paulo Freire. Acessível em: www.seer.ufu.br/
index.php/EducacaoFilosofia/article/download/32727/21221. Acesso em 09/02/18.
PIAGET, J. Epistemologia Genética. Petrópolis: Vozes, 1970.
QUIJANO, Aníbal. Colonialidad y Modernidad/Racionalidad. Revista Perú Indígena,
Lima, v. 13, n. 29, p. 11-20, 1991.
______. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, Ed-
gardo (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires,:
Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales – CLACSO, 2005. p. 107-130.
RÉDDY, M.J.. A metáfora do conduto: um caso de conflito de enquadramento na nossa
linguagem sobre a linguagem. Trad.: Ilesca Holsback, Fabiano B. Gonçalves, Marcela
Migliavacca e Pedro M. Garcez. Em: Garcez, P.M. (org.). Cadernos de tradução do
Instituto de Letras n.º 9, Porto Alegre: UFRS, 2000.
REIGOTA, Marcos. Meio ambiente e representação social. São Paulo, SP: Cortez, 1995.
______. A floresta e a escola: por uma educação ambiental pós-moderna. São Paulo,
SP: Cortez, 1999.
______. O que é educação ambiental. 1ª reimp. São Paulo, SP: ed. Brasiliense, 1996.
(Coleção Primeiros Passos).
SANTOS, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo: para uma nova cultura política.
2. ed. São Paulo: Cortez, 2008. (Coleção para um novo senso comum, v. 4).
208
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
______. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de sabe-
res. In: SANTOS, ______; MENEZES, M. P. Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez,
2010. p. 23-71.
SÃO FRANCISCO DE ASSIS: escritos e biografias de São Francisco de Assis. Crônicas
e outros testemunhos do primeiro século Franciscano. 2ª. Ed. Petrópolis, RJ: Editora
Vozes, 1982
SMUTS, J. C. Holism and Evolution. Londres, Inglaterra. Editora MacMillan, 1926
SATER, Almir e TEIXEIRA, Renato. Tocando em Frente. Género(s): Sertanejo. Gra-
vadora Philips, 1990.
STRECK, Danilo. Pedagogia no encontro do tempo. Petrópolis: Editora Vozes, 2001.
______, Redin, E., & ZITKOSKI, J. J. (org). 2ª. Edição revista e ampliada. Dicionário
Paulo
Freire. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2015.
______, Redin, E., & ZITKOSKI, J. J. (org). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte:
Editora Autêntica, 2008.
______. Paulo Freire e a consolidação do pensamento pedagógico na América Latina.
In: STRECK, D. R. (Org.). Fontes da pedagogia latino-americana: uma antologia. Belo
Horizonte, MG: Autêntica Editora, 2010.
______., REDIN, Euclides, ZITKOSKI, Jaime José (Organização). Dicionário Paulo
Freire. Belo Horizonte: Autêntica editora. 2008. 2ª. Edição revista e ampliada, 2015. -
Aqui utilizamos a edição impressa e a versão digital.
TUAN, Y Fu. Espaço e lugar: a perspectiva da experiência. TrAD. Lívia de Oliveira.
São Paulo, SP: Difel, 1983.
VALLA, Victor Vincent. Procurando compreender a fala das classes populares. In:
VALLA, V. V. (org.) Saúde e educação. Rio de Janeiro (RJ): DP&A; 2000. p. 11-32.
WALSH, Catherine. Interculturalidad, plurinacionalidad y decolonialidad: las insur-
gencias político-epistémicas de refundar el Estado. Revista Tabula Rasa, Bogotá, v. 9,
p. 131-152, julio-diciembre 2008.
______. Interculturalidad, estado, sociedade: luchas (de)coloniales de nuestra época.
Quito-Equador: Universidade Andina Simón Bolívar/Ediciones Abya-Yala, 2009.
______. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial (em português). In. CAN-
DAU, Vera Maria (Org): Educação intercultural na América Latina: entre concepções,
tensões e propostas. Rio de janeiro, RJ: Editora 7Letras, 2009.
______. Pedagogias Decoloniales. Práticas Insergentes de resistir, (re) existir e (re)
vivir. Serie Pensamiento Decolonial. Editora Abya-Yala. Equador, 2017.
209
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
210
ÍNDICE REMISSIVO
A
A borboleta 4, 143, 150, 155, 157, 167, 194, 195, 200
Amorosidade 9, 27, 28, 29, 30, 31, 34, 37, 40, 47, 59, 60, 94, 97, 98, 134, 146, 152, 153,
158, 159, 163, 164, 167, 181, 182, 187, 196, 198, 200
C
Caminhante Semeador 3, 33, 200
D
Decolonialidade 7, 8, 15, 45, 64, 65, 80, 90, 197
Dialogicidade 7, 12, 19, 35, 36, 37, 41, 43, 45, 49, 50, 51, 53, 54, 55, 56, 58, 70, 71, 74,
76, 79, 86, 87, 92, 97, 105, 117, 127, 134, 135, 142, 149, 152, 158, 167, 182, 188, 199,
200, 204, 205
Diálogo 7, 153
Diálogo freireano 54
E
Educação como Prática da Liberdade 22, 79, 146, 149, 150, 178
esperança 9, 29, 37, 38, 39, 40, 54, 59, 60, 101, 109, 140, 148, 149, 151, 152, 153, 156,
160, 161, 163, 164, 165, 166, 169, 170, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 180, 181,
182, 189, 195, 196, 200, 206
F
formação docente 7, 8, 15, 18, 19, 43, 44, 65, 66, 67, 79, 90, 99, 102, 137, 204
H
humildade 9, 30, 34, 37, 38, 39, 40, 59, 60, 94, 95, 98, 109, 128, 131, 140, 149, 151, 152,
153, 156, 158, 159, 160, 161, 163, 164, 165, 167, 170, 171, 172, 173, 177, 180, 181, 182,
196, 200
L
lugar de diálogo 4, 15, 181
M
Metáforas 8, 12, 13, 18, 47, 48, 86, 89, 103, 143, 147, 180, 181, 182, 183, 184, 185, 186,
187, 188, 192, 196, 197, 201
P
Pedagogia da Autonomia 79, 92, 93, 96, 146, 149, 150, 163, 165, 167, 196, 206.
Pedagogia do Oprimido 4, 155
Perspectiva Eco-Relacional 8, 17, 18, 22, 23, 37, 40, 41, 42, 45, 46, 48, 60, 78, 79, 80,
81, 86, 89, 103, 104, 178, 197
Práxis 8, 11, 16, 18, 19, 21, 26, 35, 37, 38, 39, 40, 43, 44, 48, 50, 53, 54, 55, 59, 60, 62, 65,
71, 87, 89, 92, 99, 100, 101, 103, 104, 117, 137, 140, 146, 149, 156, 159, 160, 161, 163,
177, 186, 194, 196, 197, 198, 199, 200, 203, 205
Princípios dialógicos 8, 12, 15, 18, 86, 103, 143, 145, 146, 150, 151, 156, 158, 164, 168,
177, 178, 180, 182, 196
S
Ser mais 9, 37, 38, 39, 40, 48, 58, 67, 92, 108, 117, 124, 160, 165, 168, 174, 180, 197
T
Teia epistêmica 128, 193, 197, 200
Teoria da ação dialógica 15
Editora Livrologia
www.livrologia.com.br
Título
Formação d@ educador(a) dialógic@ numa perspectiva decolonializante
Organizadores
João B. A. Figueiredo
Assistente Editorial
Nicole Brutti
Bibliotecária
Karina Ramos
Arte da capa
Larissa Rogério Bezerra (Drª. em Educação - UFC)
Formato
15,5 cm x 22,5
Tipologia
Minion Pro, entre 8 e 10 pontos
Papel
Capa: Suprema 280 g/m2
Miolo: Pólen Soft 80 g/m2
Publicação: 2022
Queridos leitores e queridas leitoras:
EDITORA LIVROLOGIA
Avenida Assis Brasil, n° 4550, sala 130, torre B,
Bairro São Sebastião, Porto Alegre-RS
livrologia@livrologia.com.br