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a r t e d e s i g n C U LT U RA C O NTE M P O R â n e a e t e c n olo g i a

ol af breuning
tony bellotto
jac leirner
antoni mu ntadas
constant dul aart

do cairo à cracolândia, é preciso ser jovem? MURAKAMI O JAPONÊS


ocupações reinventam a política Psicanalista , dermatologista QUE botou warhol
e filósofo respondem no chinelo

The Band,
de Olaf Breuning
Gugu-dadá
A infantilização da cultura em tempos de Big Brother
I S SN 2 2 3 6 - 3 9 3 9
fev/mar 2012
ANO 02 ESPECIAL 3D COM óculos para ver IMAGENS DE NOVO FILME EM ULTRA-HD
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index

FOFURAS E DIABRURAS
O P ÓS -PO P ALUCI NA DO D E TA KASHI M URA KA MI, N ASCIDO DO M ANGÁ E DO AN I M E 34

46 CULT URA DIGITAL 58 DESIGN 80 CURTO-CIRCUITO 102 COMPORTAMENTO 118 CRÍTICA

Google art Favor tocar Sempre jovem Precocidade total BBB não é coliseu
O artivismo usa e abusa das Não se reprima: há peças Cinco mais que jovens Os equívocos de um formato
ferramentas do maior site desenhadas para ser sobre a eterna juventude artistas de talento e uma obsoleto diante dos novos
de buscas da internet cutucadas e apalpadas como padrão de beleza tendência commodity sistemas de informação

FOTO: KAYKAYKIKI, CO LTD E LOUIS VUITTON

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sp-arte2012_an_select3.indd 3 13/01/12 12:06
index
96 portfólio

Cinema do futuro
Filme 3D em altíssima
resolução para ver
tudo muito além da
imaginação
Use os ócUlos
encartados na revista

90 capa 84 MErcado Editorial

Idiotia superséria É nóis na fita


Muita irreverência Com muita ginga,
e toneladas de ironia quadrinistas brasileiros
colocam a arte contra conquistam prestígio
a parede internacional

50 Mo da

Brincar de super-herói
Era uma vez, em um
reino muito, muito
distante, príncipes e
princesas fashion

SeçõeS 9 Editorial | 10 cartas | 14 NavEgação | 26 tribos do dEsigN | 28 MuNdo codificado


112 tErritório | 121 rEviEw | 124 coluNas MóvEis | 126 sElEcts | 128 obituário | 129 dElEtE | 130 rEiNvENtE

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expediente

EDITOR E DIRETOR RESPONSÁVEL: DOMINGO ALZUGARAY


EDITORA: CÁTIA ALZUGARAY
PRESIDENTE-EXECUTIVO: CARLOS ALZUGARAY

DIRETORA DE REDAÇÃO: PAULA ALZUGARAY


EDITORA-CHEFE: GISELLE BEIGUELMAN
EDITORA DE ARTES VISUAIS: ANGÉLICA DE MORAES
DIREÇÃO DE ARTE : RICARDO VAN STEEN
REPÓRTERES: JULIANA MONACHESI E NINA GAZIRE
COLABORADORES André Passos, Anna Dietzsch, Baptiste Demay, Bob Wolfenson, Camille Kachani, Clara Benfatti, Daniel Cavallero, Dimitri Mussard, Douglas Diegues, Ivan Cláudio, Marcelo Cipis, Mariasole Cecchi, Monica
Tarantino, Osvaldo Costa, Raquel Rennó, Roberto Wagner, Rodrigo Savazoni, Ronaldo Bressane, Talita Hoffmann, Tony Bellotto
PROJETO GRÁFICO Cassio Leitão e Ricardo van Steen
DESIGNER Bruno Pugens
ESTAGIÁRIO Adriano Vanni
PRODUÇÃO Anna Guirro
PESQUISA DE FOTOGRAFIA Vera Arruda Esteves
COPY-DESK E REVISÃO Hassan Ayoub
PRÉ IMPRESSÃO Retrato Falado
CONTATO faleconosco@select.art.br
SERVIÇOS GRÁFICOS GERENTE INDUSTRIAL: Fernando Rodrigues COORDENADORA GRÁFICA: Ivanete Gomes
OPERAÇÕES DIRETOR: Gregorio França GERENTE GERAL: Thomy Perroni ASSISTENTES: Luiz Massa, André Barbosa e Fábio Rodrigo OPERAÇÕES LAPA: Paulo Paulino e Paulo Sérgio Duarte
COORDENADOR: Jorge Burgati ANALISTA: Cleiton Gonçalves ASSISTENTE SÊNIOR: Thiago Macedo ASSISTENTES: Aline Lima e Bruna Pinheiro AUXILIAR: Caio Carvalho
ATENDIMENTO AO LEITOR E VENDAS PELA INTERNET: Dayane Aguiar. LOGÍSTICA E DISTRIBUIÇÃO DE ASSINATURAS: COORDENADORA: Vanessa Mira
COORDENADORA-ASSISTENTE: Regina Maria ASSISTENTES: Denys Ferreira, Karina Pereira e Ricardo Souza
VENDA AVULSA GERENTE: Rosemeire Vitório COORDENADOR : Jorge Burgatti ANALISTA: Cleiton Gonçalves ASSISTENTE: Bruna Pinheiro
MARKETING DIRETOR: Rui Miguel GERENTES: Débora Huzian e Wanderly Klinger REDATOR: Thiago Zanetin DIRETOR DE ARTE: Eric Müller
ASSISTENTE DE MARKETING: Marciana Martins
PUBLICIDADE DIRETOR NACIONAL: José Bello Souza Francisco GERENTE: Ana Lúcia Geraldi SECRETÁRIA DIRETORIA PUBLICIDADE: Regina Oliveira COORDENADORA ADM. DE PUBLICIDADE: Maria da Silva GERENTE
DE COORDENAÇÃO: Alda Maria Reis COORDENADORES: Gilberto Di Santo Filho e Rose Dias AUXILIAR: Marília Gambaro CONTATO: publicidade@select.art.br RIO DE JANEIRO-RJ: Diretor de Publicidade: Expedito
Grossi GERENTES EXECUTIVAS: Adriana Bouchardet, Arminda Barone e Silvia Maria Costa COORDENADORA DE PUBLICIDADE: Dilse Dumar; Tel.s: (21) 2107-6667 / (21)2107-6669 BRASÍLIA-DF: Gerente: Marcelo
Strufaldi; Tel.s: (61) 3223-1205 / 3223-1207; Fax: (61) 3223-7732 SP/CAMPINAS: Mário EsTel.ita - Lugino Assessoria de Mkt e Publicidade Ltda.; Tel./Fax: (19) 3579-6800 SP/RIBEIRÃO PRETO: Andréa Gebin -
Parlare Comunicação Integrada; Tel.s: (16) 3236-0016 / 8144-1155 MG/BELO HORIZONTE: Célia Maria de Oliveira - 1ª Página Publicidade Ltda.; Tel./Fax: (31) 3291-6751 PR/CURITIBA: Maria Marta Graco - M2C
Representações Publicitárias; Tel./Fax: (41) 3223-0060 RS/PORTO ALEGRE: Roberto Gianoni - RR Gianoni Com. & Representações Ltda. Tel.: (51) 3388-7712 PE/RECIFE: Abérides Nicéias - Nova Representações
Ltda.; Tel./Fax: (81) 3227-3433 BA/SALVADOR: Ipojucã Cabral - Verbo Comunicação Empresarial & Marketing Ltda.; Tel./Fax: (71) 3347-2032 SC/FLORIANÓPOLIS: Paulo Velloso - Comtato Negócios Ltda.; Tel./
Fax: (48)3224-0044 ES/VILA VELHA: Didimo Benedito - Dicape Representações e Serviços Ltda.; Tel./Fax (27)3229-1986 SE/ARACAJU: Pedro Amarante - Gabinete de Mídia - Tel./Fax: (79) 3246-4139/9978-8962
Internacional Sales: GSF Representações de Veículos de Comunicações Ltda - Fone: 55 11 9163.3062 - E-mail: gilmargsf@uol.com.br MARKETING PUBLICITÁRIO - DIRETORA: Isabel Povineli GERENTE: Maria
Bernadete Machado COORDENADORA: Simone F. Gadini ASSISTENTES: Ariadne Pereira, Regiane Valente e Marília Trindade 3PRO DIRETOR DE ARTE: Victor S. Forjaz REDATOR: Bruno Módolo
ASSINATURAS DIRETOR: Edgardo A. Zabala DIRETOR DE VENDAS PESSOAIS: Wanderley Quirino SUPERVISORA DE VENDAS: Rosana Paal DIRETOR DE TEL.EMARKETING: Anderson Lima GERENTE DE ATENDIMENTO AO
ASSINANTE: Elaine Basílio GERENTE DE TRADE MARKETING: Jake Neto GERENTE DE PLANEJAMENTO: Reginaldo Marques GERENTE DE OPERAÇÕES DE ASSINATURAS: Carlos Eduardo Panhoni GERENTE DE
TEL.EMARKETING: Renata Andrea GERENTE DE CALL CENTER: Ana Cristina Teen
GERENTE DE PROJETOS ESPECIAIS: Patrícia Santana

SELECT é uma publicação da EDITORA BRASIL 21 LTDA., Rua William Speers, 1.000, conj. 120, São Paulo - SP, CEP: 05067-900, Tel.: (11) 3618-4200 / Fax: (11) 3618-4100.
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IMPRESSÃO: PROL Editora Gráfica Ltda - Avenida Papaiz, 581 – Jd Nações – Diadema/SP – CEP.: 09931-610

Esta revista foi impressa em papel Couché Suzano Print® Gloss 75g/m
WWW.SELECT.ART.BR
da Suzano Papel e Celulose, produzido à partir de florestas renováveis de
eucalipto. Cada árvore utilizada foi plantada para este fim.
editorial
Paula
Alzugaray

Do GooGle-DaDá Ricardo
van Steen

à inteliGência coletiva
Giselle
Cheia de transgressão, irreverência e brincadeiras, seLecT está interessada nos sig- Beiguelman

nificados do que é ser jovem hoje. Se, por um lado, triplicamos nosso tempo de
vida em menos de cem anos (como afirma o dermatologista Otávio Macedo para a
jornalista Mônica Tarantino, na seção Curto-Circuito), por outro, a sociedade nun-
ca foi tão gugu-dadá. A infantilização da cultura – no que ela tem de mais fofo ou
perverso, retrógrado ou vital – é o tema desta quarta edição de seLecT. Angélica
de Moraes
Por isso chamamos Tony Bellotto para nos responder por que roqueiros não en-
velhecem, e convocamos o crítico de arquitetura da revista The New Yorker, Paul
Gold berger, para esclarecer o “efeito parque de diversões” que tomou conta das cidades
e dos museus. Recorremos também a Rodrigo Savazoni para refletir sobre o papel dos
recém-nascidos movimentos de ocupação na construção de uma inteligência coletiva.
Juliana
Afinal, cada um de nós sente na pele o quanto a natureza humana mudou na era da Monachesi
informatização. Mesmo que ainda engatinhemos no que diz respeito a domínio e
discernimento das novas ferramentas da cultura pós-moderna, vimos eclodir, em
2011, outro modo de fazer política, a partir das redes inteligentes. Mas também é
verdade que, no estágio de exploração sensorial em que nos encontramos em re-
lação às novas tecnologias (equivalente às fases tátil e oral dos bebês), a segurança Nina

da nossa vida digital nos é confortavelmente garantida por ambientes protegidos, Gazire

cálidos e aparelhados para suprimir qualquer perigo ou conflito.


Os ícones do bem-estar na era do “capitalismo fofinho” são tema de ensaio da edi-
tora-chefe Giselle Beiguelman. As redes são abordadas também na crítica da jorna-
lista Juliana Monachesi ao programa BBB, mostrando como o estágio gugu-dadá
da televisão brasileira, seus abusos, equívocos, mediocridade e obsolescência são Bruno
Pugens
colocados à prova por denúncias geradas nos novos sistemas de informação.
Mas assim como a internet é um poderoso instrumento político capaz de arti-
cular e desarticular todas as dimensões da vida, ela também é suscetível a jogos
de montar e desmontar. Atenta a esse fenômeno, a repórter Nina Gazire mostra
como o maior site de buscas da internet virou um parque de diversões nas mãos Anna
de artistas e artivistas do mundo todo. Guirro

Varias categorias de brinquedos estão contempladas nesta edição. Inclusive o lado


B do grande circo do entretenimento. A reportagem “Os idiotas contra o baixo-
-astral” mostra como a idiotia é uma poderosa arma de resistência contra a infan-
tilização da cultura. O perfil da edição não poderia deixar de ser o artista contem-
porâneo Takashi Murakami, que tem sua natureza ambígua – mistura de fofura e Hassan
perversidade – desvendada pela editora Angélica de Moraes. Ayoub

E, já que até Martin Scorsese se rendeu aos encantos da tecnologia 3D para realizar
seu primeiro filme para crianças, seLecT decidiu produzir em 3D o Portfólio desta
edição, para satisfazer os desejos mais pueris de seus leitores.

Boa diversão! Mariel


Zasso

Paula Alzugaray
D i reto ra d e re d a ç ã o

Adriano
Vanni
Ilustrações: rIcardo van steen, a partIr do aplIcatIvo face your mangá

Editorial-RF.indd 9 1/27/12 8:15 PM


cartas

A seLecT é uma revis- Escrevo para dizer que Alguém me dá um em- a r t e d e s i g n C U Lt U r a C O n t e M P O r â n e a e t e C n O LO g i a

ta que abre a cabeça! estou muito impressiona- prego na @revistaselect?


Augusto d e CA m p os
m Aurí C i o i An ês
ed i t h d erdy k

Carla Caffé, artista do com a revista seLecT. Jornalismo cultural de


m evi s & vAn d eurs en
J orge Lui s Borges

Em poucas edições, a pu- primeira, como sempre Quero escanear vo cê


Códigos de BArrAs pArA

Parabéns pela seLecT. blicação tornou-se uma sonhei fazer desde o ContAtos interAtivos

DEZ / JAN 2012


exclusivo

Muito boa a revista. E das minhas preferidas primeiro período de fa- Mac-usP eM branco
novo museu é temA de
ensAio fotog ráfiCo inédito

as fotos do Ricardo van pela relevância dos te- culdade. o dires Mlászh o
impressos virA m esCuLturAs,

Steen do MAC-USP es- mas. Parabéns pela revis- Rodrigo Azevedo,


CoLAg ens, reCortes
e inCisões

tão maravilhosas. ta, continuarei recomen- via Twitter

o futuro Do pApEl
literatura seM auto r
espeCiAListAs deBAtem
novos formAtos nA rrAtivos:

Roberto (Neco) Stickel, dando por aí.


ApLi CAtivos reALiz A rão
tArefAs do homem?

designer Fausto Sposito, A @revistaselect é uma A s re i nve n ç õ es d o l i v ro e d a a r te


n o m u n d o d i g i ta l
via Facebook publicação muito boa de
Versão iPad da @revista- arte, design, tecnologia,
select: Melhor aplicativo Amigos, parabéns. Não cultura etc.
editorial brasileiro que deixem esta excelente Thiago Z. Amâncio,

WWW.SElECt.Art.Br
conheço. Autores, textos, revista seguir pelo cami- via Twitter
fotos e edição fantásticos. nho daquela que, após

EDIÇÃO 03
jan 2012

R$ 14,90
anO 01
03
Pedro Mezgravis, passar para os auspícios Gostei muito da frase
da arvorezinha, virou “contra-atacar a falta de
capa_select_03_RF_V1.indd 1-2 11/22/11 3:55 PM

via Twitter
uma vitrine de anúncios e imaginação” no último
Parabéns pela seLecT! anunciantes. Inclusive no número da @revistase-
Revista maravilhosa. Da- campo das artes. lect, na matéria sobre o
quelas que vão passando Manoel Inacio Camilo hotel dirigível.
de mão em mão... Até Carreira, leitor Sergio Amadeu,
terminar de ler tive de fi- professor da Universi-
car vigiando para os ami- Descoberta da madruga- dade Federal do ABC
gos não levarem. Agora da: @revistaselect _ Pre-
mesmo já foi, com a pro- ciso de TODAS as edições Genial a entrevista de An-
messa de voltar. Duvido, impressas! Oh my God! gélica de Moraes com Jor-
mas tudo bem... O que é Rafael, via Twitter ge Luis Borges!
bom merece ser compar- Damara Bianconi,
tilhado! Muito obrigada! Adorei ver no site o vídeo artista, via Facebook
Valeria Boa Sorte, da grande banda Sex Gang
via Facebook Children (me lembrou a Fantástica, clara e justa
época das antigas que eu a afirmação de Borges
Estou adorando a revista. ouvia esse som) e o vídeo sobre o livro como “ex-
Parabéns e obrigada pelo do Don McLean foi muito tensão da memória e da
presente que ela é! legal, gosto do som des- imaginação”!
Lala Deheinzelin , se artista. Descobri vocês Arlete de Oliveira,
produtora cultural através da matéria do pro- artista, via Facebook
grama Vitrine, da Cultura.
Obrigado pela inclusão Edson, leitor Parabéns pela revista, une
da nota da hora sobre a tudo o que mais gosto!
mostra This Orient no site Angélica, querida, psico- @WhiteSkull,
escreva-nos
da seLecT! Fico feliz com grafaste isto? Touché! via Twitter
rua itaquera, 423,
a existência desta publica- Monica Paiva, de Nova York pacaembu, são paulo - SP
ção. Vi uma matéria sobre Duca, Angélica, sua en- cep 01246-030

a revista na tevê e achei Show de revista. Esta edi- trevista com Borges!
revistaselect
uma ideia incrível. Para- ção está duca!. Tonica Chaga, revistaselect
béns a todos vocês. Renato Valderramas, jornalista, de www.select.art.br
César Meneghetti, artista via Facebook Nova York faleconosco@select.art.br

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brígida baltar voar

curadoria
marcelo campos

07.02 > 10.03.2012


avenida europa 655
são paulo sp brasil
t 55 (11) 3063 2344
info@nararoesler.com.br
www.nararoesler.com.br
colaboradores

12

Ronaldo Bressane Camille Kachani Mônica Tarantino André Passos


é jornalista e escritor, autor do livro Céu de Atua como artista plástico há 12 anos Escreve sobre medicina e saúde para a Istoé. Ganhou prêmios nessa área e é autora de é fotógrafo com formação em
Lúcifer, entre outros. Em 2012, lança pela e já participou da Bienal da França e de PretoBrás, o livro de canções e histórias de Itamar Assumpção. – curto-circuito p 80 Londres, trabalhou para publicações
Companhia das Letras sua primeira graphic exposições em Cuba, China, EUA e outros internacionais como Harper’s Bazaar
novel, VISHNU. – mercado editorial p 84 países da Europa. – entretenimento p 76 e Purple. – moda p 50

Anna Dietzsch Roberto Wagner Douglas Diegues


é mestre em Desenho Urbano pela Harvard é fotógrafo, membro do coletivo SX-70 Nasceu no Rio e cresceu em Ponta Porã,
e trabalha na Davis Brody Bond Aedas. e colabora com revistas como Vogue, fronteira do Brasil com o Paraguai. é
Abriu uma filial do escritório em São Paulo, Trip, Mag e época Negócios. – ambiente poeta e autor de estudos sobre povos
onde coordenou projetos como a Valeo VSS corporativo p 64 indígenas e línguas híbridas como o
e a Praça Victor Civita. – arquitetura p 70 portunhol.– colunas móveis p 124

Marcelo Cipis Rodrigo Savazoni


Artista plástico, autor e ilustrador. é realizador multimídia e ativista da internet
Recebeu o prêmio Jabuti de melhor livre. é integrante da Casa da Cultura
capa por Como Água para Chocolate e Digital e um dos organizadores do Festival
Tony Bellotto publicou dois livros. mundo codificado p 28 CulturaDigital.Br. – territórios p 112
é guitarrista da banda Titãs. Desde 1995, escreveu sete livros. No Buraco, seu mais novo
romance, foi publicado em 2010 pela Companhia das Letras. – colunas móveis p 125

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Dimitri Mussard Osvaldo Costa Mariasole Cecchi


é francês e decidiu criar raízes por aqui. é designer e estudou moda e arte na Nasceu em Florença, Itália. é criadora da marca de acessórios LES PETITS JOUEURS.
Abriu a Acaju do Brasil, empresa de dis- escola Bunka, em Tóquio. Trabalha Atualmente vive no Brasil. – moda p 50
tribuição, importação e comunicação de como editor de moda e realiza editoriais
marcas internacionais. – moda p 50 para diversas publicações nacionais.
– moda p 50

Daniel Caballero Talita Hoffmann Clara Benfatti Carlos Jimenez


é artista visual residente em São Paulo. é artista plástica. Utiliza o desenho e é artista plástica nascida em Paris, mas é critico de arte e curador independente.
Sua obra aborda transformações dos a pintura como meios de desenvolver vive em São Paulo. As grandes cidades Professor de Estética da Univeridad
cotidianos urbano e doméstico. narrações de seu universo particular. e a arquitetura são suas maiores Europea de Madrid e autor dos livros
– entretenimento p 76 – entretenimento p 76 inspirações. – entretenimento p 76 Extraños en el Paraiso e Los Rostros de
Medusa. – crítica p 116

Baptiste Demay Ivan Claudio


é francês, estudou marketing de luxo e é jornalista e editor de Cultura da revista
moda em Londres e Paris, e vive em São Istoé. – reviews p 120
Paulo há dois meses, trabalhando para a
multimarcas LN-CC. – moda p 50

Bob Wolfenson
é fotógrafo. Colabora com as principais publicações nacionais e algumas
internacionais. é coeditor e cocriador da revista Sem Número. – comportamento p 102

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notícias + tEndências + transcEndências

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14

VidEoinstalação play dEad; REal timE, dE douglas goRdon, Em Exposição Em FRankFuRt

Exposição

ExErcício dE mEmória
Individual de Douglas Gordon em Frankfurt reúne
conjunto poderoso de trabalhos em videoarte e cinema

O Museu de Arte Moderna de Frankfurt, Alemanha


(MMK Museum für Moderne Kunst) possui em seu acervo
uma das obras mais importantes de Douglas Gordon: a
videoinstalação Play Dead: Real Time (this way), (that
way),(other way), de 2003, em que o prolífico artista
escocês, um dos mais importantes no cenário internacional,
desenvolve sua obsessão pela memória em profundidade
comovente. Essa videoinstalação ocupa lugar de honra
na grande retrospectiva do artista, em cartaz no MMK.
A exposição reúne fotografia, vídeo, videoinstalações,
D o u g l a s G o r d o n Até
arte sonora (sound art) e até mesmo os filmes de longa-
2 5 d e m a r ç o, n o M M K
metragem da sua produção recente. Entre eles está Zidane:
Museum für Moderne Kunst,
a 21th Century Portrait (2006), em codireção com Philippe
Frankfurt, Alemanha
Parreno, sobre o jogador de futebol francês Zinedine
Zidane, que teve première mundial no Festival de Cinema
www.mmk-frankfurt.de
de Cannes. AM
Confira a obra Play Dead: Real Time em http://vimeo.com/11514857

foto: Axel Schneider

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Convite à Viagem
– Rumos Artes
Visuais 2011/2013
de 9 de fevereiro a 22 de
abril. Itaú Cultural –
Avenida Paulista, 149 15

www.newmuseum.org

Notas PúBlicas (da série lemBretes), de Íris HeleNa, iNstalação fotográfica aBerta à iNterveNção do PúBlico

artes visuais

Convite à viagem
Projeto de mapeamento da produção emergente no Brasil é apresentado a partir
de fevereiro em São Paulo

A quinta edição do programa Rumos Itaú Cultural Artes Visuais propõe uma viagem pelo Bra-
sil por meio das mais de cem obras de 45 artistas de todo o País. O destaque é a produção
carioca, que ultrapassa São Paulo em número de selecionados (11 contra 8). Outra presença
grandiosa é a dos artistas gaúchos (7), maior de todas as edições do programa. Mas o que a
exposição coordenada por Agnaldo Farias traz de mais instigante vem do Norte e Nordeste. A
artista paraibana Íris Helena faz ampliações fotográficas (jato de tinta) sobre post-its amare-
los, nos quais os visitantes podem escrever suas anotações. O maranhense Thiago Martins de
Melo participa com quatro pinturas. Ele acaba de integrar a mostra Caos e Efeito, também no
Itaú Cultural, com pinturas desconcertantes que sobressaíam no módulo assinado pelo curador
Paulo Herkenhoff. JM

BeBida

Cerveja iConoClasta
BrewDog chega ao Brasil para agradar a paladares não conformistas

A cervejaria escocesa BrewDog foi criada em 2007 por dois jovens insatisfeitos com o mercado britânico
de cerveja. Martin Dickie e James Watt, ambos com 24 anos, eram dois amigos com uma missão: “Criar
algumas das mais extraordinárias e não conformistas cervejas artesanais conhecidas pelo homem”, con-
forme atesta o site da marca. As cervejas BrewDog são a epítome do punk, prossegue a propaganda-
manifesto: “Nós fabricamos cerveja intransigente, ousada e irreverente, cerveja com alma e propósito.
A nossa abordagem tem o mesmo desprezo pelo mercado de cerveja em massa que os punks da velha-
guarda tinham pela cultura pop”. A atitude e o sabor de suas long necks com nomes como Trashy Blonde
(ale frutada), 5a.m. Saint (o Santo Graal das ales vermelhas), Paradox (cerveja de malte “imperial”), Tac-
tical Nuclear Penguin (cerveja preta com 32% de teor alcoólico, resultado de um processo de maturação
em barril de carvalho de uísque escocês e diversos processos de congelamento sucessivos) logo caíram
no gosto dos mais exigentes e agora está disponível no Brasil com distribuição da Getec Trading. JM

Confira a receita em http://vimeo.com/32731091

Fotos: estúdio select e divulgação/Foto da artista

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16
aRQuitEtuRa FloREstal

vivEndo nas alturas


Escritório de arquitetura alemão
desenvolve projetos especiais
para casas em árvores

Construir uma casa na árvore tem sempre um toque de


nostalgia da infância, mas o estúdio de arquitetura ale-
mão Baumraum | Inhabitat dedica boa parte de sua pro-
dução profissional a projetos para casas desse tipo. O es-
túdio produziu casas com diversos tamanhos e com fins
diferentes não só na Alemanha, mas também em outros
países da Europa. Combinando arquitetura, paisagismo
e arboricultura, eles criam habitações nas copas das ár-
vores que se integram à paisagem florestal, preservando
a integridade das árvores que lhes dão suporte. Para rea-
lizar projetos ecologicamente corretos e sustentáveis, o
escritório possui uma equipe integrada de engenheiros
e especialistas em espécies de árvores, os quais analisam
a distância do solo e a quantidade de espaço disponível
para a construção da estrutura. No Brasil, onde temos
florestas de variadas espécies de grande porte, não seria
mal ter um escritório de arquitetura com essa especia-
lidade. NG

aRQuitEtuRa

Par EcE dE brinquEdo


Igreja holandesa lembra blocos de Lego

Durante milênios, o ato de construir igrejas foi o centro de expe-


rimentação arquitetônica. Brunelleschi inaugurou a arquitetura re-
nascentista ao projetar o domo da Igreja de Santa Maria das Flores,
em Florença. Gaudí misturou o moderno ao gótico, resultando um
estilo próprio ao projetar a Sagrada Família, em Barcelona. Depois
de tudo isso, por que não simplificar de vez e fazer uma igreja em
“estilo” Lego? É quase isso o que acontece com uma igreja holan-
desa, denominada Abondantus Gigantus, feita com blocos de con-
creto que pesam 545 quilos. Construída na cidade de Enschede, foi
projetada pelo artista e arquiteto Philip Jonker Michiel Wit para o
Grenswerk, um tradicional festival de artes do país. Mas não é só
na aparência que a igreja em “estilo” Lego confunde quem a vê. En-
gana-se também quem pensa que o local foi projetado para receber
orações mais descontraídas. O edifício foi erguido para receber as
atividades que aconteceram durante os dias de festival. NG

foto: creAtive commonS Attribution-noncommerciAl-no derivAtive WorkS 3.0 unported licenSe.

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17

tRês andaREs dE apaRtamEntos pRojEtados soBRE Rodas

constRução

novo jEito dE fazEr


a mudança
Empresa de engenharia
pRojEtos dE Estúdio alEmãopREsERVam intEgRiaddE das áRVoREs finlandesa projeta
primeiro edifício móvel

Foi em setembro de 2011 que o primeiro edifício móvel


do mundo começou uma viagem por mar, saindo de um
porto localizado na cidade finlandesa de Turku, locali-
zada no sudoeste do país. O bloco completo, com três an-
dares de apartamentos, foi entregue na sua futura locali-
zação, em uma ilha próxima à baia da cidade. Projetada
pelo escritório de arquitetura e engenharia NEAPO, a
estrutura foi levantada por meio de um chassi hidráulico
em um estaleiro, antes de ser colocada na barcaça que a
transportou. O edifício possui uma estrutura de aço con-
siderada suficientemente segura para o seu transporte,
incluindo decoração interior completa e telhas. O projeto
foi solicitado por uma empresa que pretende colocar o
imóvel para aluguel. A ideia é que o prédio possa mudar
de lugar assim que o contrato de aluguel termine. NG

crédito: Jouni SAAriSto e mArkuS bollen

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18
moda

HomEnagEns
ao quadrado
Arquivo de fotos de Daniel Buren
vira série limitada de lenços da
Hermès

Como qualquer indivíduo de qualquer


idade ou profissão, o artista francês Da-
niel Buren coleciona fotografias tiradas
em viagens. Só que, em vez de morrer em
álbuns de retratos, suas “fotos-souveni-
res” ganham vida em lenços de seda da
Hermès. Os temas variam de florais, ma-
rinhos e arquiteturas até fragmentos de
uma instalação realizada pelo artista no
Ateliê Hermès da Coreia do Sul. Intitu-
lada Photos-Souvenirs au Carré, a série
é formada por 365 peças únicas – obje-
tos de arte como monotipias ou pinturas,
mas desenhados para ser vestidos e não
expostos em paredes. Quatro dessas pe- lEnço HERmès dE daniEl BuREn
ças exclusivas chegaram à loja da grife
em São Paulo, em dezembro de 2011, à
venda por R$ 24 mil. Buren é o segundo
artista a personalizar os lenços da Her-
mès. Em 2008, Josef Albers realizou a sé- moda
rie Homage to the Square. PA
Para fadas
tEcnológicas
Coleção de estilista americana utiliza tecidos que exploram o LED
sem pirotecnia

Na onda dos objetos com bateria recarregável, que tal um vestido feito com tecido
luminoso para ser usado em sua noite mais brilhante? Essa é a proposta da coleção
Rhyme & Reason 1.0, da designer americana Mary Huang. Para quem possa inter-
pretar essas roupas como algum tipo de acontecimento natalino, a estilista afirma
que sua criação é atemporal: trata-se, afinal, de explorar novas tecnologias de gera-
ção de luz em tecidos. Em sua mais recente coleção, Huang embutiu uma trama de
LEDs que criam um efeito luminescente e diáfano sob a malha. Além disso, caso
a usuária não faça questão de sair parecendo uma fada e atraindo vaga-lumes e
borboletas ao seu redor, é possível desfilar o modelito simplesmente desligando-o.
Todas as roupas da coleção Rhyme & Reason 1.0 possuem baterias removíveis com
oito horas de duração. Não saia de casa sem recarregar o seu brilho. NG

Rhyme & Reason 1.0 www.fashion.rhymeandreasoncreative.com

foto: dAniel buren (AcimA) e mAry huAng (eSquerdA)

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19

dEsign

mErgulHo
socioambiEntal
Coleção alto verão de joias de Elisa Stecca
enfoca diversidade dos povos da floresta

Em vez de anéis, brincos e colares, a designer Elisa Stec-


ca criou adornos de braços, aros para a cabeça e joelhei-
ras. Toda inspirada em adornos corporais indígenas, a
coleção Anga Teriva (Alma Alegre, em tupi-guarani)
também não utiliza nenhum elemento orgânico, só
matérias industriais. Em vez de plumas, PVC reciclado.
“Eu não quis tirar nada da floresta. Preservar também
pEça dE Elisa stEcca
é assimilar. Assim, procuramos criar contrapontos en- inspiRada Em adoRnos
tre tradição e tecnologia”, diz Stecca. Para a campanha coRpoRais indÍgEnas
de lançamento, o fotógrafo Bico Stupakoff utilizou um
iPhone na captação de imagens subaquáticas com lentes
especiais. PA

www.elisastecca.com.br

foto: bico StupAkoff

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72

mEio amBiEntE

nitidEz E transParência
Papel e celulose brasileiros são pioneiros no uso
de estratégias verdes

FilosoFia A poucos meses da Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre


Desenvolvimento Sustentável que acontece de 20 a 22 de junho,
ProfEtas do chovem promessas “verdes”. Mas entre compromissos e sonhos
destacam-se os fatos já consumados. São dignas de nota as empresas
Pós-rancor que já colocaram em ação estratégias despoluentes ou aquelas que
incrementaram suas práticas para quantificar, reduzir e compensar
Série de programas produzidos por os gases de efeito estufa (GEE). Caso da Suzano Papel e Celulose,
seLecT, Fora do Eixo e Pós-TV discute que até o fim de 2011 estava entre as primeiras indústrias de
autores fundamentais para entender celulose do mundo a quantificar sua emissão de GEE com a pegada
a contemporaneidade de carbono, a mais eficaz medida de controle de um produto. Se os
altos índices de brancura, lisura, opacidade e alvura são alguns dos
Profetas do PosRancor é o nome da série de tevê on- pré-requisitos de papéis com alto padrão para impressão de livros
line que estreia dia 27 de fevereiro no site da revista e revistas, a transparência é condição primordial das empresas
seLecT. São quatro programas em que o teórico da comprometidas com a sustentabilidade. Os resultados dos cálculos
contracultura Claudio Prado, que formulou o con- de emissão de carbono da empresa estão disponibilizados no site
ceito do pós-rancor, discute suas matrizes filosófi- www.pegadadecarbonosuzano.com.br
cas. O termo, veiculado pela primeira vez em um
debate em 2010, vem desde então suscitando polê-
micas em listas de discussões e já se tornou até tese
acadêmica. Contudo, nunca foi explicado. A partir
de entrevistas conduzidas por Bruno Torturra, dire-
tor de redação da revista Trip e um dos coordena-
dores da Pós-TV, e do jornalista Alex Antunes, Pra-
do apresentará autores, livros e ideias que, segundo
ele, pontuam, ao longo dos séculos, uma filosofia
do pós-rancor. O psicanalista Erich Fromm, autor
de Medo à Liberdade, o futurologista Alvin Toffler,
autor de A Terceira Onda, e o médico Frederic Le-
boyer, autor de Nascer Sorrindo, estão entre os “pro-
fetas” que serão apresentados e terão trechos de suas
obras lidos e comentados por Claudio Prado. Edgar
Profetas do Th e Un govern a bles,
Morin, Bertrand Russell, Jung, Timothy Leary e o
PosRancor, estreia: 27 a partir de 15 de fevereiro.
pedagogo Anton Makarenko são outros. Segundo
de fevereiro New Museum, Nova York
Prado, são pensadores marcados por “desvios de
comportamento” que os tornaram párias de seu
meio e destilaram o rancor fundamentalista de seus
www.select.art.br
pares do século 20. Por isso mesmo são Profetas do
www.newmuseum.org
PosRancor, do século 21, diz ele. GB

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21
aRtE

tEcnologia dE
ProtEsto
Artista sul-africano desenha roupa de proteção para
manifestantes

No ano em que a revista Time concedeu ao manifestante o


título de “personalidade do ano”, o Museu de Arte Moderna
de Nova York expôs, entre suas aquisições recentes, a obra
Suited for Subversion (Vestido para Subverter), realizada pelo
artista sul-africano Ralph Borland em 2002. Fabricada com
náilon reforçado com PVC, estofamento e alto-falante, trata-
-se de uma roupa protegida contra cassetetes policiais, para
ser usada por manifestantes durante o exercício de defesa de
suas mais ardentes convicções.
Uma câmera instalada sobre a cabeça atua como testemunha,
gravando as ações policiais. Um alto-falante no centro do pei-
to amplifica e projeta o batimento cardíaco do usuário. Numa
ação grupal, quando várias pessoas vestem essas roupas, as
batidas aceleradas tornam-se audíveis na medida em que a
tensão e a excitação crescem. “O projeto baseia-se em meu
trabalho como ativista, envolvido em demonstrações de rua
em Nova York e influenciado pelo trabalho de outros mani-
festantes que vestem roupas de proteção e fazem usos criati-
vos de ferramentas e tecnologias de protesto”, afirma o artista
VEstido paRa suBVERtER, dE RalpH BoRland em seu blog. PA

aRtE

as urgências da gEração 2000


Jonathas de Andrade e Cinthia Marcelle participam da trienal do New Museum

Sob o título The Ungovernables (Os Ingovernáveis), a segunda edição da trienal do


New Museum, em Nova York, dedicada a investigar a produção de artistas emergentes,
apresenta obras de 50 artistas e coletivos, sendo nove latino-americanos, entre eles Ni-
colás Paris, Amalia Pica, Gabriel Sierra e os brasileiros Jonathas de Andrade e Cinthia
Marcelle. Uma geração que cresceu em um contexto caracterizado por instabilidade
política e econômica, disseminação do capitalismo global e eclosão do fundamentalis-
mo, os artistas selecionados pela curadora Eungie Joo “demonstram resiliência, prag-
matismo, flexibilidade e esperança notáveis”, afirma ela. Até o fim de abril, visitantes
do New Museum poderão conferir obras que exploram a impermanência e um en-
gajamento com o presente e o futuro, como as esculturas monumentais do argentino
Adrián Villar Rojas, que, feitas de argila crua, estão fadadas a quebrar e se desfazer, ou
tHE cEntuRy, VÍdEo dE cintHia maRcEllE E tiago mata
as performances fotografadas da finlandesa Pilvi Takala, que se infiltra em ambientes
macHado. copRoduzido com pincHuk aRt cEntRE, kiEV corporativos e finge trabalhar durante dias (e até semanas), até ser expulsa do local. JM

fotoS: divulgAção/corteSiA gAleriA vermelho

Navegacao-RF-V1.indd 21 1/27/12 7:38 PM


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22

dEsign

o mais autêntico
Punk britânico
Design gráfico arrojado e fora dos padrões
define a identidade visual das Olimpíadas
de Londres

Robôs? Celulares? Câmeras de vigilância? Difícil


avaliar a identidade de Wenlock e Mandeville, mas-
cotes das Olimpíadas e Paraolimpíadas de Londres
em 2012. Michael Morpurgo, o escritor de histórias
infantis que os nomeou e criou aventuras sobre eles,
afirma que são feitos da “última viga de aço do Es-
tádio Olímpico”. Wenlock foi inspirado na pequena
acima, pÔstER da aRtista RacHEl WHitEREad paRa as olimpÍadas dE
londREs. acima, à diR, logotipo do EVEnto cRiado pEla agência WolFF
cidade de Much Wenlock, na Inglaterra, origem do
olins. aBaixo, os mascotEs WEnlock E mandEVillE primeiro comitê para as Olimpíadas, em 1850. Já
o nome Mandeville deve-se ao Stoke Mandeville
Hospital, em Aylesbury, local que sediou os Jogos
Stoke Mandeville, em 1948, e que inspirou a cria-
ção dos Jogos Paraolímpicos. Independentemente
da origem, ambos são fofos e dóceis como todos os
mascotes devem ser. Polêmica – porque diferente e
fora dos padrões – é mesmo a logomarca do evento.
Criada em 2008 pela agência Wolff Olins, ela repre-
senta uma mudança de paradigmas para as logomar-
cas institucionais e parece estar concatenada ao es-
oFEREcimEnto tilo dinâmico do design de mídias digitais. Segundo
o ex-atleta e presidente do comitê organizador das
Olimpíadas de 2012, Sebastian Coe, a logo – feita
com uma fonte geométrica semelhante a um letreiro
em néon – tem como objetivo “estimular a participa-
ção do público jovem”.

fotoS: divulgAção

Navegacao-RF-V1.indd 22 1/27/12 7:38 PM


COBERTURA COMPLETA
DE INFORMAÇÃO E EMOÇÃO.
Falta pouco para começar a 30ª Edição dos Jogos Olímpicos, mas a
Editora Três já colocou seu time em ação.
De janeiro até agosto, as revistas ISTOÉ 2016, ISTOÉ, ISTOÉ DINHEIRO,
ISTOÉ GENTE, STATUS, PLANETA, MENU, MOTOR SHOW, SELECT e ISTOÉ
PLATINUM, vão trazer todos os lances, de dentro e de fora das arenas,
do maior evento esportivo do mundo. Tudo para ser lido nas páginas
impressas, na internet, no iPad e também nos dispositivos móveis.
Cobertura repleta de informação e emoção para você acompanhar
como se estivesse em Londres.

www.editora3.com.br

PATROCÍNIO: REALIZAÇÃO:
design industrial Nome: BigDog | CompaNhia: Boston DynAmics | aNo de Criação: 2009 |
país: eUA | Combustível: óleo Diesel | peso: 108 kg

24

Nome: Ar. Drone | CompaNhia: PArrot | aNo de Criação: 2008 | país: eUA
Combustível: BAteriA | peso: 379,88 g

Objeto
Pa u l a a l z u g a r ay

Equipamentos que simulam


as funçOes fIsIológicas do

identif
corpo humano, quadricópteros
guiados por celular e big hits
da robótica são objetos de
desejo e funcionariam bem até
em exposiçOes de arte

Nome: HAmmerHeAD
altitude máxima: 2.500 m
autoNomia: 482 km
veloCidade máxima: 400 km/hora

Design Industrial Robots-RF.indd 24 1/27/12 7:56 PM


25

Nome: ToileT Bike Neo | CompaNhia: ToTo


aNo da Criação: 2011 | país: japão
Combustível: produzido a parTir de lixo domésTico
peso: 500g

tos nÃo
tificados

fotos: divulgação Assista aos vídeos em http://bit.ly/upoAwF

Design Industrial Robots-RF.indd 25 1/27/12 8:25 PM


tribos do design

26

Lu dóf i los
Eles deixaram para trás a infância, mas sem perder
a ternura. O design meigo e aconchegante, de cores
festivas e bordas arredondadas, afaga corpos e
mentes desta tribo com alma de Peter Pan

Mint Backpack Peapod Concept NEV


Mais parece Baseado na plataforma de
um escaninho, veículos elétricos da GE Motors,
mas, acredite, o sorridente carro-conceito de
é uma mochila. 2009 da Chrysler é uma pérola
A Mint Backpack do design biofofinho
foi idealizada
pelo estúdio de Nokia Twist Celular
design Mint Pass. Sonho de consumo
É feita de plástico de amantes do design
ultraleve ergométrico, o protótipo
dobrável da Nokia possui
função touchscreen e é
multitarefas

Kotori In-Ear Bodum Bistro hand


Phones Vendidos mixer Esta batedeira de
exclusivamente mesa é ultracompacta,
no Japão, os fones com fio retrátil. Ao
de ouvido são contrário de outros
customizáveis e produtos semelhantes,
vêm em sete linhas permite variar Bed Bug Esta é para aqueles que não saem da frente
diferentes: pop, doce, seu comprimento, da televisão. Não é um sofá, é uma cama com estrutura
cool, vivaz, natural, de acordo com a de madeira e estofamento revestido de tecido e forro
animal e delícia necessidade. Até uma removível, garantindo fofice sinestésica
criança pode usá-lo

Nest 6 Food Preparation Bowl Set PumPack Vacuum


A coleção de utensílios de cozinha organizados como Suitcase Você pode
um ninho ocupa menos espaço e inclui tigelas, colheres não escapar da multa
de medição, uma peneira e um filtro. A linha da Joseph por excesso de peso,
Joseph prima pelo humor nas cores e na compactação mas conseguirá fechar
a mala facilmente. O
O-Zone Handheld modelo divulgado via
Vacuum Cleaner Yanko tem bomba
O aspirador manual a vácuo embutida
de pó acaba com na alça, que reduz
a dificuldade de limpar o volume em 70%,
áreas difíceis de alcançar. garantem os designers
O modelo é assinado
pela designer industrial
chinesa Linda Xinrui
Jiang, que já desenhou
molduras fofinhas para
tablets e outros
produtos divertidos

TribosdoDesign-RF.indd 26 1/27/12 8:30 PM


mundo codificado I nse p a r á v eIs d a m e m ó r I a
d e h o m ens, a p a r ecer a m n a
m e sm a é p o c a d a Ind ú st rI a
a u t o m o bIlí st I c a

28
1CArrinhOs
9OO

18OO c r Ia d o s n o s é c ul o 1 9, p a s s a r a m
UrsOs a se r c on h e c I dos c omo “ t e ddy-
dE bea r ” e m h ome n a ge m a o p r e s I de n t e
pElúCiA d o s eua t h e odor e roos e v e l t , q ue
se r ecu s ou a p a r t I c I p a r de uma
(EUA) ca ça d a de ur s os e m 1 90 2

179O
BiCiClEtA
pEsqUisA: gisEllE (frAnçA)
BEigUElmAn, ilUstrAçõEs: a s p r Im eI r a s
b I c Ic let a s er a m
mArCElO Cipis, infOgráfiCO: d e m a d eI r a e não
riCArdO VAn stEEn t Inh a m p ed a I s
E BrUnO pUgEns

1413
BOnECAs
(AlEmAnhA)
a p e s a r de
13OO A.C. exIstIrem desde
o e g Ito, h á
ChOCAlhO 5 mIl anos,
(EgitO) a p r I me I r a
os pr I meIros f á b r Ic a de
cho cal hos bonecas surgIu
s u r gIram no na alemanha
egI to por
vo lta de 136 0
séC. 6 A.C. no sec. 15

BOlA (ChinA)
a.c. e tI nham
fo r mato de
anI m aIs as bolas, eram feItas
d e p e lo s d e a nI m a I s
na c h Ina . são m a nI a
1OOO A.C. 5OO A.C. na cIo na l no b r a sI l ,
e m r a zão d o f u t e bo l,
iOiôs dE pEdrA (gréCiA) BAmBOlê (EgitO) Int r o d u z Id o a qu I n o
f Im d o sé cu lo 1 9 , p o r
c h a r le s m I lle r

o s pr ImeIros
Io Iô s eram
feI to s de marfIm
e fI o de seda. os
am er Icanos louIs
& d ave marx os
po pu la rIzaram
pelo m undo
os prImeIros bambolês
eram feItos com galhos, no
egIto. o bambolê de plástIco
colorIdo começou a ser
fabrIcado nos eua em 1958.

Fontes: http://www.museudosbrinquedos.org.br/ uoL-Crianças wikipedia

Mundo codificado-RF.indd 28 1/27/12 7:58 PM


C r i A d o p o r u M A M er i CA n o
d e seM p r e g Ad o , o j o g o T e M p o r bA s e
u M Mo d e lo p A r A ensi nA r A Te o r i A
e Co nôM i CA d A T A x A si M p les

1 93O 1BancO
936
imOBiliáriO (eua) 29
futeBOl de BOtÃO (Brasil)
Cr i A ção br Asil eirA do CArioCA
g er Aldo déC ourT. ATé sereM indusTriA-
li zAd o s , er AM feiTos CoM boTões de
Cu eCA, unifo rM es e CAMisAs.

Cr i A ção d o M A r C e ne i r o
d i nA M A r qu ês ole Ki r K
Ch r i sT i Ansen, o s blo C o s
1 949
d e p lá sT i Co d er A M legO
o r i g eM não só A o le g o , ( dinamarca)
eM 1958, MAs TAMbéM A
v á r i o s ‘ le g o lA nd s’ A v e r são p r o f i ss i on A l ,
T eM p i sT A d e 4 8 M e Tr os
d e ex T e nsão

1 956
autOrama
(inglaterra)

nA v er são
A r T e sA n A l ,
1958 ex i sT e M d esd e
o s A no s 1 9 30,
skate n As r u A s d A
O filósOfO Walter Benjamin (eua) C A li f ó r ni A

(1892-1940) escreveu que tÃO


erradO quantO pensar O
BrinquedO cOmO prOduçÃO
da criança é “ver a Brin-
1968
videOgame (eua)
cadeira exclusivamente na o priMeiro Console
o s b i C h i n h os
ChAMAvA-se odyssey
perspectiva dO adultO”. tinha 100. o dreAMCAsT, de 1998, virTuAis
iMAugurou A pArCeriA jAponeses forAM
razÃO. afinal, BrinquedO eTernA gAMe/inTerneT febre MundiAl.

que se preza só é lemBradO


pOrque funciOnOu, em algum 1974 1996
mOmentO de nOssas vidas, playmOBil tamagOtchi
(alemanha) (japÃO)
cOmO antídOtO dO mundO
chatO, pOvOadO de gente C o M seu CA b e li nh o
i nC o nf u nd í v el,
grande, que ninguém quer ex i sT e h o j e eM
M u i T A s v er sõ e s
imitar. rendam-se, pOrtan-
tO, terráqueOs, à magia das
lemBranças! 2OO9
angry birds (finlândia)
. p r o p õ e o i nsó li T o
C o nf r o nTo enT r e
p ássA r o s e p o r C o s v e r d es

Mundo codificado-RF.indd 29 1/27/12 8:29 PM


ensaio

30

A erA do
cApitAlismo
fofinho
e seus
dissidentes
Giselle BeiGuelman

ilustração bruno Pugens

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31

Web 2.0 celebra um mundo


cor-de-rosa e sem conflito,
mas há formas de ocupação
que questionam o que vem
sendo chamado de “a economia
neoliberal dos likes”
O processo de globalização colocou os teóricos diante da
necessidade de dar conta, sob novas perspectivas críticas,
da reconfiguração cultural e política da ordem mundial.
O capitalismo, que até o fim dos anos 1980 foi tratado
como o vilão conceitual por excelência do mundo aca-
dêmico – especialmente na Europa e na América Latina
– precisava, diante da crise das utopias de esquerda do
século 20 e dos modelos revolucionários tradicionais, ser
reavaliado. Não por acaso, desde meados dos anos 1990,
vêm sendo formuladas definições de diferentes matizes
ideológicos sobre o tema.

capitalismo fofinho-RF.indd 31 1/27/12 7:59 PM


ensaio

32

Para o sociólogo espanhol Manuel Castells, autor do


referencial A Sociedade em Rede, vivemos hoje um
#SOPAblackout,
capitalismo informacional e baseado na produção, que uniu ativis-
consumo e circulação de informações. Para Anto-
nio Negri e Maurizio Lazzarato, o que vigora é um
tas, Wikipedia e
capitalismo cognitivo, em que a posse do saber é a sites de corpo-
riqueza (e não mais a posse do trabalho do outro).
Até Bill Gates arriscou o seu conceito _ capitalismo rações contra tsunami? A jornalista sumiu na Líbia? Ótimo, você
criativo _ conclamando os grandes empresários a votação de lei pode apertar o botão Like e curtir isso tudo com
investir parte de seus lucros em atividades sociais. seus amigos. No limite, isso cria uma verdadeira
A essas definições propomos mais uma: capitalismo antipirataria, rede antissocial, pois esse modelo tende à rarefação
fofinho. Trata-se de um regime cuja lógica se expli- é exemplo das dos conflitos, uma vez que suprime a necessidade de
cita na iconografia da Web 2.0. Ele celebra, por meio negociação entre as partes.
de ícones gordinhos e arredondados, um mundo Zonas Tempo- Consolidam-se aí mundos planos, de comunidades
cor de-rosa e azul-celeste que se expressa a partir de
onomatopeias e exclamações pueris. Essa celebração
rárias que põem cujos membros replicam os gostos uns dos outros
e no qual entram apenas aqueles que são nossos se-
opera por meio de um design de informação, cujo ob- em questão as melhantes. Isso não implica, porém, que organizem
jetivo parece ser suprimir a possibilidade de conflito. redes de inteligência coletiva ou vocação para o co-
A forma mais bem acabada desse tipo de design é a
retóricas do mum. Pelo contrário, fomentam, paradoxalmente,
do Facebook, o empreendimento online mais bem- capitalismo uma aspiração individualista que calibra o sucesso
sucedido de todos os tempos. de sites como Is It Old? (www.isitold.com).
Espaço de relacionamento protegido, espécie de jar-
fofinho O Is It Old? é um programa de busca que pretende
dim murado de redes dentro das redes, o Facebook proteger seus usuários de passarem por trouxas. “An-
é uma máquina de aceitação feliz do mundo. O pai tes de fazer papel de bobo quando envia um link para
do seu amigo morreu? O Japão foi inundado por um seus amigos, colegas ou seguidores no Twitter, insira-

créditos: Jake thomas, occupy Labs, ashLey carter, eL passo Libre e phLoating man

capitalismo fofinho-RF.indd 32 1/27/12 7:59 PM


33

Trata-se de uma ocupação da web que se dá na periferia


e nos interstícios das redes corporativas, contestando
o que vem sendo chamado da economia neoliberal
dos likes (ícones de aprovação do Facebook), que
se justificam pelas suas ações pontuais e locais. São
verdadeiras Zonas Autônomas Temporárias – uma
conceituação de Hackim Bey para grupos que se
unem em razão de objetivos comuns, em formatos
não hierárquicos, como bandos efêmeros.
Um bom exemplo disso foi o #SOPAblackout,
que uniu ativistas, Wikipedia e sites de corpora-
ções, como Google e Flickr, contra a votação da
lei antipirataria norte-americana, no dia de sua
apresentação à Câmara dos Deputados nos EUA,
retirando mais de 100 mil sites do ar por um dia.
(Leia especial sobre o assunto na seLecT online).
Outras formas de ocupação que também questionam
as dinâmicas do capitalismo fofinho são movimentos
como o Occupy Cyberspace, que propõe a formação
de uma rede social dos ativistas do OWS, a Global
Square, e redes alternativas, como a Diaspora.com e
Unthink.com, em operação desde o ano passado.
Extremamente bem cuidadas do ponto de vista do
webdesign – clean no caso da Diaspora, e contem-
porâneo no da Unthink –, apostam em uma estética
menos infantilizada e em políticas de preservação
da privacidade de seus membros. Comprometidos
com agendas transformadoras, buscam, acima de
tudo, outros parâmetros de sociabilidade que não
redundem em uma abordagem quantitativa das afe-
tividades balizada pela competição por números de
-o aqui para ter certeza de que é novo o bastante”, Designers propõem amigos e seguidores.
uma linguagem
adverte a home page. Caso já tenha sido tuitado mais Na mesma direção, com plataformas menos ambi-
visual Das ocupações
de uma meia dúzia de vezes, o site vocifera: “Ridicu- ciosas, porém não menos críticas, merecem desta-
lamente velho! Isso já está cheirando mal. Já foi tuita- que projetos como o Hatebook, que parte do pres-
do 120 vezes e há mais de 200 dias”. suposto de que ninguém tende a ser mais seu amigo
Contudo, são em grande parte os mecanismos dis- do que o inimigo do seu inimigo, e o My Frienemies,
poníveis nas redes sociais e no seu imaginário o no qual nos cadastramos com informações sobre o
que permite também a articulação de novas formas que não gostamos.
de fazer política, grupos de contestação que estão São nesses espaços que a ideia de ocupação, palavra
dando cara ao século 21, como ficou patente com prenhe de significados militaristas, ganha novas di-
a Primavera Árabe, as ações do WikiLeaks e dos mensões propondo um território de confluências e
Anonymous, todas bastante discutidas nas mídias objetivos temporários, baseados em princípios que
de todos os portes. não cabem mais em cartilhas de esquerda e direita,
Mais diluídas e, no entanto, cada vez mais constantes mas que pressupõem a construção coletiva de novas
são as infiltrações que se espalham nas redes sociais, agendas comuns. Elas reinventam as formas de so-
através do Twitter e do Facebook, e tensionam o cam- brevivência, de convivência e especialmente de fazer
po do design de informação e a retórica do mundo política, que deixam de ser feitas na internet, ou fora
sem pontas e sem perigos do capitalismo fofinho. dela, para vazar nas redes de todos os tipos e formas.

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©TA
O ja pO nê s que sup erOu
34

a n dy WarhO l n a p rOduçãO
g lO ba li zada e m assiva

KA
d e arte , faz u m p ó s -pOp
a m b í guO, m i stu ra d e
fO fu ra e p e rve rsi dade

SHI
angélica de moraes

mu
The FacTory (a Fábrica), o míTico esTúdio que andy
Warhol criou nos anos 1960 na rua lexingTon, em
nova york, para inundar o mundo das arTes com
uma produção verTiginosa, Fica minúsculo na
comparação. o mundo das artes mudou definitivamente de
escala. Warhol tinha meia dúzia de auxiliares e seu mercado eram

rA
os eua e, depois, alguns países europeus. Takashi murakami vende
para os cinco continentes, mora entre Tóquio, nova york e los an-
geles e mantém ocupada uma centena de assistentes, em três “fábri-
cas”: em Tóquio, trabalham 50 assistentes no estúdio central e mais
uma dezena no estúdio de animação.
na sede norte-americana, em long island (ny), há outros 40 auxi-
liares e mais uma dezena no escritório nova-iorquino, que coordena

KA
a produção executiva de sua agenda de exposições ao redor do mun-
do, em estreito diálogo com as galerias que o representam. a próxi-
ma exposição individual de murakami será inaugurada em 9 de fe-
vereiro e fica em cartaz até 24 de junho, no qatar museum, em doha
(golfo pérsico). denominada sugestivamente de ego, é a primeira
em grande escala do artista no oriente médio. acontece depois do
sucesso da individual no palácio de versalhes (França), em 2010, e na
galeria gagosian de roma, no ano passado.

mI
em pouco mais de duas décadas, murakami criou um império onde
jamais o sol se põe: o kaikai kiki company limited. o nome da
empresa dá a pista para entender sua produção. são dois persona-
gens onipresentes na obra: kaikai é um bebê róseo e feliz metido
em uma fantasia de coelho, kiki tem expressões diabólicas e dentes
serrilhados de diabinho. ambos saltaram do universo otaku, ou seja,
da cultura de massa japonesa baseada no animê (desenho animado)
e no mangá (história em quadrinhos).

cortesia takashi murakami/ kaikai kiki co., ltd.

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murakami na parada de thanksgiving day


de 2010, em nova york, com os balões de
seus personagens kaikai e kiki ao fundo

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perfil

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TAN TAN BO PUKING - A.K.A. GERO TAN, 2002 acrílica sobre tela

cortesia galeria perrotin, paris

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perfil

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A cultura oficial japonesa detesta as manifestações otaku na mesma misturadas a personagens, quem prefigurou o universo planar do
medida em que venera a cerimônia do chá. Mas Murakami é a melhor desenho animado de qualquer latitude. Também da mesma época
representação da cultura japonesa contemporânea. Uma cultura mul- (Período Edo, séculos 16 a 19), a pintura Kanô (fundo de ouro), é
tifacetada que trata as fraturas do pós-guerra e as sequelas atômicas de rigorosamente planar ao criar cenas em diversas distâncias e tam-
Hiroshima e Nagasaki desenvolvendo uma fascinante relação de amor e bém influenciou Murakami, que focou seus estudos universitários
ódio com o Ocidente. Algo novo que refaz os mitos de bravura não mais nesse assunto.
pelas sagas dos samurais, mas pela ação dos super-heróis apropriados da Warhol, autodidata alérgico a teorias, também transformou suas
tradição ocidental dos estúdios de HQ da Marvel e da Disney. pinturas em superfícies planares e esse é um dos traços a unir a
arte pop do norte-americano ao pop otaku de Murakami, além do
De Warhol à Disney A aparente banalidade da obra de Muraka- uso de matrizes serigráficas na pintura. Mas a personalidade dos
mi é apenas isso: aparente. O artista é autor do Manifesto Superflat dois não podia ser mais diversa. Warhol ganhou de seus assisten-
(2000) texto sofisticado em que defende uma arte feita de superfícies tes o apelido de Drella, por combinar a candura de Cinderela e o
planas, em oposição à tradição ocidental da perspectiva renascen- utilitarismo vampiresco de Drácula. Algo a ver com Kaikai e Kiki?
tista. Seria possível imaginar a maestria de desenho de Murakami Difícil saber diante da notória discrição oriental. Mas Warhol não
sem que houvesse, antes, o mestre nipônico da gravura em madeira costumava criar oportunidades profissionais para seus assistentes.
(xilogravura) Hokusai? Foi Hokusai, com as séries de panorâmicas Murakami já tem uma década dessa prática. “Kaikai Kiki também

cortesia galerias perrotin, paris; gagosian, ny e marianne boesky, ny

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acima, à esquerda, wARhOl/sIlvER, 2009, acrílica com folha de platina


sobre tela. acima, KAIKAI KIKI ANd mE - fOR BETTER OR wORsE, IN GOOd TImEs
ANd BAd. ThE wEAThER Is fINE, 2010, acrílica com folha de platina sobre tela.
abaixo, sUPER NOvA (1999), acrílica sobre tela

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perfil

40

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trabalha para nutrir e desenvolver a próxima gera-
ção de artistas”, diz ele em seu site oficial http://en-
glish.kaikaikiki.co.jp.
Murakami concebeu e organiza, desde 2001, a Gei-
sai Art Fair, uma feira de arte originalíssima, em que
não há a mediação de galerias. Os jovens talentos são
selecionados por um júri de curadores de prestígio e
participam de uma mostra com duração de um único
dia, com acesso direto a colecionadores e a um pú-
blico especializado. A próxima feira Geisai acontece
dia 14 de setembro, em Tóquio. O evento anterior foi
apresentado em paralelo à feira Miami Basel, em de-
zembro.
Além disso, Murakami participa de coletivas com
seus assistentes mais talentosos, revelando nomes
como Yoshitomo Nara e, atualmente, Akane Koide
(que começou a expor na Geisai com 15 anos), au-
tora de retratos de uma juventude que se autoflagela

M u ra k aMi
co n c eb e u e
o rga ni za ,
des de 20 0 1 , a
g e i sai art Fai r,
u M a Fe i ra de
arte jove M e M
qu e n ão há a
M e d i aç ão de
ga l e r i as

à esquerda e à direita, as esculturas


em fibra de vidro my lONEsOmE cOwBOy
(1998), vendida por us$ 15,2 milhões na
sotheby’s, e hIROPON (1997)

cortesia kaikai kiki co, ltd

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à esquerda, OvAl BUddhA GOld (2007/10), na


exposição realizada no palacio de versailles
(frança), em 2010. acima, bolsas louis vuitton
da série mONOGRAm chERRy BlOssOm (2003) e
mONOGRAm cERIsE (2005). ao lado, ThE wORld Of
sPhERE (2003), acrílica sobre tela

com lâmina como reação ao vazio consumista.


Assim como Nara no passado e Koide na atu-
alidade, muitos jovens povoam os estúdios de
Murakami, somando competências para exe-
cutar projetos do astro.
O processo de trabalho assemelha-se ao dos
estúdios Disney, onde o roteiro e as caracterís-
ticas dos personagens são esboçados pelo autor
e completados pela equipe. Curto-circuito no
conceito de autoria? Sim, toneladas disso. Mas
o artista garante que acompanha todos os deta-
lhes e estágios de produção de uma peça. A in-
ternet e a webcam estão aí mesmo para tornar
essa versão aceitável como verdadeira.
As cores, por exemplo. Ninguém que já teve o
privilégio de ver ao vivo uma pintura de Mu-
rakami deixou de ficar impressionado com a
sutileza das centenas (centenas!) de camadas
de tinta sobrepostas com total controle de re-
gistro de impressão serigráfica, bordas nítidas
e cromatismo intenso e complexo.

cortesia louis vuitton e kaikai kiki co, ltd

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perfil

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acima, RElEAsE chAKRA’s GATE AT ThIs INsTANT (2008), acrílica e folha de platina sobre tela. na página ao lado, BEyONd ThE PAlE Of vENGEANcE (2011), acrílica sobre tela

Luxo e arte Em entrevista ao site www.paris-art.com em novem-


bro de 2006, quando de sua exposição de pinturas na parisiense a obra de M uraka Mi teM
Galerie Perrotin, o artista confirmou que “a serigrafia me permite
trabalhar com camadas sucessivas; a pintura se acumula e os tons
mudam em razão desse acúmulo. A textura evolui nesse processo.
taMbéM u M lado tr á gi co,
(...) O trabalho serigráfico, mecânico, permite obter uma base de
trabalho que depois é terminado à mão”. Nas fases preparatórias,
que r eMet e ao t rauMa da
observa ele ainda, “o computador é muito útil, para desenvolver a
ideia principal e estabelecer um plano geral. Logo a seguir, meus boM ba at ôMica
assistentes executam o meu projeto. Dirijo e acompanho tudo que
acontece e, no fim das contas, é como se eu mesmo pintasse todas
as peças”.
A aparente fofura do elenco de personagens de Murakami, molda-
do nas histórias em quadrinhos infantis, guarda diversos signos do
mal-estar cultural gerado pelo embate entre o Japão tradicional e o no meio do espaço expositivo de sua mostra retrospectiva, em 2007,
Japão do século 21. Os cogumelos vermelhos com bolinhas bran- no Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles (Moca), com bol-
cas, constantes nos trabalhos do artista, remetem ao cogumelo alu- sas de tiragens especialmente criadas para ser vendidas nesse local.
cinógeno Amanita muscaria, mas também ao grande cogumelo, Como obras de arte.
o maior de todos: o da bomba atômica. Um de seus protagonistas “Isso significou o ponto mais alto dessa colaboração entre o mundo da
ganhou o nome de Little Boy (garotinho), o mesmo nome da bom- arte e o mundo da moda”, disse Yves Carcelle, presidente internacional
ba que foi lançada sobre Hiroshima. (CEO) da marca. Marc Jacobs observa que o evento no Moca “foi um
Assim como Warhol, Murakami fez do mundo da moda e da pu- monumental casamento entre arte e comércio, para ser registrado tanto
blicidade algo integrado à sua produção. A convite do designer nos livros de história da moda como de história da arte. A melhor parte
Marc Jacobs, diretor artístico da Louis Vuitton, Murakami de- disso tudo é que continua, cresce, se transforma e fascina”.
senvolveu, a partir de 2000, séries de padronagens para bolsas e Para Murakami, “essa experiência na indústria do luxo é transferível
outros acessórios fashion. As mais famosas e disputadas são as ao mundo da arte. A comparação funciona perfeitamente. A sede de
séries Eye Love Monogram (2003) e Cerises (Cerejas, 2005). Mas novidade é tão grande quanto, ela é a marca de fábrica da arte contem-
novamente Murakami foi muito além: instalou uma loja Vuitton porânea, que vive bradando pela renovação”.

cortesia galerias blum & poe, los angeles e gagosian, ny

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fotos: edouard fraipont/cortesia galeria vermelho

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cultura digital

Um
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parque de
diversões
chamado Artivistas apropriam-se
de uma das maiores
empresas do mundo
para contestar,
fazer arte ou
dar muita risada

NiNa Gazire

“Don’t be evil!” (Não seja mau!) é o slogan do Google, empresa ava-


liada em US$ 39,7 bilhões e a quinta marca mais valiosa do mundo. Esse precei- No fundo da página ao lado, imagem do trabalho
to “googleano” serviu como provocação para alguns artivistas dispostos a tudo Google Will Eat Itself, feito pelo duo UBERMOR-
para questionar o monopólio e o poderio econômico da empresa. É o caso do GEM em parceria com os artistas Alessandro
polonês Piotr Parda, do holandês Constant Dullaart e da parceria entre o duo, Ludovico e Paolo Cirio. O objetivo é comprar
suiço-austríaco-norte-americano, UBERMORGEN com os italianos Alessan- ações do Google por meio de anúncios publicitá-
dro Ludovico e Paolo Cirio. Eles protagonizam notórios casos de mobilização rios criados pelos próprios artistas
ideológica – ou gozação mesmo –, que também podem ser interpretados como
trabalhos artísticos.
À direita, de autoria anônima, Google Gravity, a
Em 2002, Piotr Parda realizou On Ocasion, uma série de trabalhos modificando
página do Google desaba, caindo na tela assim
a logomarca do Google, que causou muita polêmica. Retrabalhando as letras, ele como um objeto cai no chão, e Google House, dos
fez uma espécie de Google Doodle – modificações temáticas no logo da empresa artistas Marika Dermineur & Stéphane Degoutin,
– com temas como nazismo, Ku Klux Klan e os conflitos de Darfur, no Sudão. em que uma casa é construída com imagens do
O artista questionava a estética do Google e também o fato de o logo fazer, en- Google Image
tão, apenas modificações que celebrassem eventos norte-americanos, apesar de
seu alcance ser mundial. “Senti necessidade de criar meus próprios rabiscos, em

fotos: divulgação

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vez de ‘assumir’ o Google como uma ‘ideologia’ ou um ‘sistema’. Senti a necessidade de


pintar os doodles usando lápis-aquarela. Na verdade, todos os logos de On Ocasion, que
foram expostos em galerias de diferentes partes do mundo, são aquarelas scaneadas”, diz
o artista.
Constant Dullaart, outro netartista, questionou a hegemonia da empresa em Google
Disco Disease (Doença Disco do Google), de 2009. Nessa obra, ele apresenta buscas por
imagens relacionadas à palavra disease, inserindo uma solicitação de cor específica as-
sociada à busca (azul, amarelo ou vermelho, por exemplo). As páginas de resultados são
apresentadas em sequências cronometradas, criando um certo clima discoteca, com di-
reito a trilha sonora de fundo.
Um dos mais polêmicos projetos, contudo, é o Google Will Eat Itself (O Google Come-
rá a Si Próprio), de 2005, de autoria do UBERMORGEN com os artistas Alessandro Lu-
dovico e Paolo Cirio. A intenção do projeto era implodir o Google comprando todas as
ações da empresa. “A motivação prévia para a Google Will Eat Itself foi o desgosto com
os projetos de arte com o Google”, comentou Hans Bernhard, do UBERMORGEN.
Em GWEI, sigla pela qual o trabalho ficou conhecido, a dulpa produz anúncios com
o Google Adense, serviço de publicidade oferecido pelo site, exibindo-os em sites de
redes privadas ligadas aos autores do trabalho. Com o dinheiro gerado pelos anúncios,

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cultura digital

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eles compram ações do Google com o objetivo de se
tornarem, gradualmente, proprietários.
Caso o empreendimento dê certo, prometem entre-
gar todas as ações para o GTTP Ltd. (Google To The
People Public Company), de propriedade dos artistas
criadores do projeto. Essa associação, a GTTP Ltd., é
encarregada de receber clicadores que se cadastram
voluntariamente para acessar os anúncios providos
pelo AdSense criados pelos artistas.
Atualmente, o GWEI detém 819 ações do Google,
que, somadas, valem mais de US$ 400 mil. Esse di-
nheiro foi arrecadado com base em mais de 1,5 mi-
lhão de cliques em anúncios e é enviado para uma
conta aberta em um banco da Suíça. Com base nos
ganhos atuais, o artista Bernhard, do UBERGMOR-
GEN, calcula que dentro de 200 mil anos eles se tor-
narão os donos da empresa.

Anônimos e divertidos
Nem só transgressão e rebeldia fazem a Google Arte.
Grande parte das apropriações é feita de irreverência
e brincadeira. Um desses exemplos é Where in The
World Is The Loira do Banheiro? (Em Qual Lugar
do Mundo Está a Loira do Banheiro?), do brasileiro
José Carlos Silvestre. Foi em 2007 que o artista, ao
realizar um trabalho para uma disciplina do Pro-
grama de Pós-Graduação em Tecnologias da Inte-
ligência e Design Digital da PUC-SP, criou uma das Nem só transgressão e rebeldia
obras mais divertidas da rede. O trabalho é um dos fazem a Google arte. Grande
primeiros a se apropriarem de outra ferramenta do
Google, o Google Maps. Para isso ele escolheu a fa-
parte das apropriações é feita
mosa lenda urbana da Loira do Banheiro, em que o de irreverência e brincadeira

À direita, Google Fight , dois ter-


mos quaisquer são colocados para
disputar o título de mais procurado
do Google. À esquerda, Google Disco
Disease, onde a palavra “disease” é
procurada pelo Google Color Search
em tempo real

fotos: divulgação

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suposto espírito de uma estudante assombra os banheiros quer um que se diz especialista em “Google Fun”.
das escolas em diferentes partes do mundo. Muito mais do Talvez o trabalho que resume melhor toda a ambiguidade do Google, curio-
que aguçar a curiosidade adolescente ou de quem acredita samente, não se dê em rede, mesmo utilizando o Google Street View para
na história, a brincadeira acabou por revelar que existem transformá-lo em uma animação. Criado, em 2011, pela The Theory, pro-
diferentes versões do “mito” atraindo participantes de ou- dutora inglesa de filmes publicitários, Address Is Approximate (Endereço
tros lugares do planeta. Aproximado) é realizado por meio da técnica de stop motion e tem enredo
Participar de Where in The World is The Loira do Banhei- estilo Toy Story. Os brinquedos que enfeitam a mesa de um escritório ga-
ro? é simples. Basta acessar o site http://bogotissimo.com/ nham vida quando o ambiente está livre da presença humana. O desejo de
mapas/loira.php e dar as coordenadas locais da última visão abandonar o lugar, ainda que impossível de ser realizado no “mundo real”,
do fantasma. Se possível, relatar de que maneira o encontro é atingido quando os robozinhos usam um carro de brinquedo estacionado
se deu e clicar em enviar. Os dados serão adicionados ao re- em frente à tela do computador. Eles simulam uma viagem pelo Google
gistro e em seguida um fantasminha aparecerá no Google Street View, percorrendo diferentes lugares do mundo.
Maps indicando o local de ocorrência do fenômeno. “Como O Google, que se tornou a principal porta de entrada para a internet, nos
história de fantasma é uma espécie de meio-termo entre o dá um pouco dessa ilusão de Address is Approximate: a de nos possibilitar
documental e o criativo, achei que seria uma boa forma de “viajar” pelo mundo infinito da informação e, de vez em quando, nos fazen-
começar a trabalhar com o Google. Você pode seguir um do esquecer de que há um lindo dia de sol brilhando lá fora.
viés mais propriamente político, mas também partir da im-
Acesse as obras citadas em http://bit.ly/tG1UID
portância que esses sistemas ganharam para a nossa subjeti-
vidade e expor sua influência por meio da subversão tecno-
lógica”, diz Silvestre.
Nem todos os projetos famosos têm autoria conhecida. Clássi-
cos como Google Gravity, que ao ter a página aberta provoca
um efeito de desabamento do logo do Google, ou o Google
Fight, em que um mecanismo simula a luta entre dois termos
quaisquer pelo título de mais procurado, são trabalhos anô-
nimos e que fazem a graça desse grande parque de diversões
chamado Google. Ainda nessa onda estão outras “performan-
ces” como o Google Winnie, no qual o logotipo vai diminuin-
do gradativamente, o Google Epic, em que o logo vai aumen-
tando até ocupar a tela inteira, e o Google Demolition, onde
a marca é implodida. Os responsáveis por essas empreitadas
não deram as caras, mas suas criações são citadas por qual-

Acima, o trabalho On Ocasion, do artista Piotr Parda. Em 2002, as


logomarcas foram feitas em protesto contra as datas comemora-
tivas escolhidas pelo Google. Relembram as mortes causadas pelo
nazismo, pela Klu Klux Klan e os conflitos de Darfur, no Sudão

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moda

Ao infinito e
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o e Além! *
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eles são heróis e seus


cavalos só falam inglês.
elas são princesas lindas,
noivas intergalácticas
inacessíveis. Assaltantes
de armários dos pais,
reinventam roupas para
criar armaduras, vesti-
dos de baile e fantasias
de sonho
Fotos a n d r e pa s s o s , edição de moda o s va l d o c o s ta
da esquerda para a direita, Baptiste veste Carré e gravata Hermès,
Blazer viComte a., Calça laCoste, meias Falke, tenis twins For
peaCe. osvaldo veste parka missoni, Blazer Brunello CuCinelli,
gravata Hermès, Calça viComte a., meias Falke, Botas louis vuitton,
Cinto anderson’s. dimitri veste parka e CasaCo surFaCe to air, Carré
gravata e sapatos Hermès.

*grito de guerra do astronauta Buzz ligHtyear no Filme toy story

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moda

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Baptiste e Dimitri vestem casacos Da cavalaria militar De Napoleão BoNaparte (acervo pessoal), calças e polos vicomte a., coelho empalhaDo
e Broches Da taBela perióDica Da loja Do Bispo.

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Baptiste veste Carré e Cinto Hermès, parka surfaCe to air, Calça laCoste, Botas louis vuitton. Cléo veste BomBe de equitação, fouet, gravatas, pulseira e
sellier talaris tudo Hermès. Corset e saia marita de dirCeu, Cinto e sapatos louis vuitton, tailleur Weill

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moda

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da esquerda para a direita, Mariasole usa vestido


de sr alber elbaz para lanvin feito para a loja H & M
eM paris, sapatos CHristian louboutin. torre eiffel,
Cano de ar-CondiCionado e baCk ligHts loja do bispo.
baptiste usa guarda-CHuva rua 25 de Março, polo,
blazer e berMuda viCoMte a., Cinto anderson’s,
Meias falke , botas louis vuitton, gravata HerMès.
Cléo usa Colete de peças de Metais glória CoelHo
sobreposto eM trenCH de reinaldo lourenço e
sapatos CHristian louboutin.

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moda

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aciMa: baPtistE vEstE chaPéu hErMès, cashMErE Missoni, Polo E shorts vicoMtE a. , MEias FalkE, saPatos louis vuitton. baMbolês rua 25 dE Março. diMitri
vEstE cashMErE Missoni, Polo E shorts vicoMtE a. , MEias FalkE, saPatos hErMès. cléo vEstE colEtE E vEstido Glória coElho , saPatos osvaldo costa Para
sarah abstrato , Minicasaco MulticorEs udi la Galinha.
à dirEita: MariasolE vEstE rEinaldo lourEnço, bolsa MariasolE cEcchi Para lEs PEtits jouEurs, saPatos christian louboutin. clEo vEstE rEinaldo lourEnço,
bolsa MariasolE cEcchi Para lEs PEtits jouEurs, saPatos osvaldo costa Para sarah abstrato. back liGht loja do bisPo.

Produção ExEcutiva: anna Guirro. ModElos: MariasolE cEcchi, clEo dobbErthin, diMitri Mussard, baPtistE dEMay E osvaldo costa. bElEza: bruno Miranda
aGradEciMEntos: FazEnda catuçaba, loja do bisPo, hErMès

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design e arte

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tátil, tangível
Designers e artistas colocam a mão na massa para
PA U L A A L Z U G A R AY

criar espaços e objetos que atingem altos níveis de sedução tátil.


É o contra-ataque da gestualidade e do palpável?

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À esquerda: Girafa em crocodilo (2011), criada por Marjolijn Mandersloot para o ateliê petit H. nesta página: instalação diG (2011), de snarkitecture

à esquerda: CoCo amardeil; à direita: Peter a lee

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aciMa, Ghost chair, de snarkitecture, da galeria Baró; Os BuBBle Games Bem que tentaram. Vi-
aBaixo, puff tato-White Bunny, de Maurizio galante, feito
eM poliuretano Macio coBerto coM tecido tecnológico e
raram mania em laptOps e palmtOps,
iMageM iMpressa, da firMa casa cOmO que reVerBerandO em uníssOnO:
O que a pOnta dOs dedOs nãO tOca O
cOrpO nãO sente. mas isso até aparecerem mo-
biliários inteiramente revestidos por plástico bolha,
devolvendo-lhe a condição de “material” e redimen-
sionando suas relações sensoriais. ao criar a Bubble
chair, os designers brasileiros rodrigo almeida e
Guto requena evocaram a memória infantil de estou-
rar as bolhinhas com os dedos, mas amplificando-a
para todo o corpo. “decidimos penetrar essa bolha e
seguir um caminho que guiou nossos pensamentos
para um universo onírico e de fantasias, obedecendo
apenas à vontade do material e dos estímulos que ele
proporcionava”, afirmam eles. como almeida e re-
quena, há diversos artistas e designers que trocam o
tato da tecla do computador pela criação de espaços
tangíveis e tridimensionais.
quando a dupla Humberto e Fernando campana
deixou a zona de conforto dos produtos industriais
macios, abandonando-a pelo tensionamento entre re-
alidades tão contraditórias como o vime e o plástico,
chegou a uma obra que explora por completo o fas-
cínio das matérias. isso fica evidente em seus objetos
artesanais, como o cabideiro de couro em forma de
árvore seca, uma de suas últimas criações. na França,
a manualidade faz a diferença do petit h, laboratório

fotos: marCos Cimardi (BuBBle Chair), Baleri (Pufe tato-tatoo), daniel malhao

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À direita, BuBBle cHair (2011), de rodrigo alMeida e guto
requena, feita de plástico BolHa; aBaixo, as esculturas Hercule
(2011) e la Monégasque (2011), de joana Vasconcelos

Ao criar a Bubble Chair,


Rodrigo Almeida e Guto
Requena evocaram a
memória infantil de
estourar as bolhinhas
com os dedos, mas
amplificando-a
para todo o corpo

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design e arte

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criativo da Hermès, que desde 2010 aproxima desig- loja do estilista richard chai, em nova York. seu de-
ners e artesãos em atividades de reaproveitamento de sign tátil e tangível inclui também a Ghost chair, co-
matéria-prima. a responsável pelo projeto, pascale berta pela pele de um falso tecido. efeito ótico e desejo
mussard, define a produção como “objetos poéticos tátil também se combinam nos trabalhos do italiano
não identificados”. maurizio Galante, que chegou ao design pela via da
O trabalho manual chega às últimas consequências alta-costura. seus pufes tato-tatoos são objetos que
em daniel asrham/snarkitecture, tornando-se um despertam os sentidos de cuidado e afeto, pets que pe-
impulso tátil corporal. na instalação performática dem para ser abraçados.
diG, realizada em nova York, em 2011, o artista, ar- sentar, deitar e rolar é o tipo de relação que todo de-
mado de martelos, picaretas e cinzéis, mergulhou em sign tangível pede. mas o que acontece quando obras
blocos de isopor, criando um ambiente tridimensio- de arte, que não devem ser tocadas – especialmente
nal que denomina “arquitetura da escavação”. “nós quando expostas em galerias e instituições – atin-
não usamos modelagem paramétrica. todo o nosso gem altos graus de sedução tátil? “reconheço que o
trabalho é criado pelas mãos”, diz asrham, que com meu trabalho tem esse elemento de tatilidade, e que
o mesmo empenho braçal manufaturou as paredes da a abundância de cor, as texturas, as formas e o mo-

fotos: fernando lazlo

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63

na página ao lado, instalação sem título (2009, coleção Bernardo paz), de Maria nepoMuceno,
feira de cordas, contas, resina e fiBra de Vidro; À esquerda, manceBo caatinGa (2011), eM couro,
dos irMãos caMpana, da firMa casa; aciMa, escultura Hallyu (2011), de joana Vasconcelos

Nas esculturas de vimento convidam o corpo a interagir”, diz a artista


portuguesa Joana Vasconcelos. em trabalhos de pa-
Maria Nepomuceno e rede, como Hallyu, de 2011, o desejo do tangível deve
Joana Vasconcelos, ser satisfeito pelo tato do olho. mas, na obra da artista,
o desejo do a interação física pode ser alcançada em instalações
tangível deve ser como passerelle, spin e ponto de encontro.
a dicotomia palpável/não palpável move também a
satisfeito pelo obra da brasileira maria nepomuceno. entre suas ins-
tato do olho talações destacam-se objetos em forma de redes feitas
de cordas, palhas, contas e colares, que instigam visão
e olfato, encantam pelos brilhos e cheiros, mas que não
podem ser usados. “acho que um desenvolvimento na-
tural da obra é que ela se torne de fato absolutamente
tátil e possa ser experimentada pelo corpo plenamente.
essa é uma das questões da minha obra e em algum mo-
mento essa entrega/desapego vai acontecer!”, anuncia.

agradeCimentos: a gentil CarioCa, galeria firma Casa, galeria Baró

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ambiente corporativo

64

O trabalho, que em suas origens era sinônimo


de sofrimento, é a diversão do século 21 Giselle BeiGuelman

Sorria, você eStá


trabalhando!
Nas líNguas latiNas, a palavra trabalho é derivada do termo tripalium, um
iNstrumeNto de tortura romaNo de três paus, Na forma de pirâmide, utilizado para
supliciar os escravos. a associação entre trabalho e sofrimento está relacionada ao fato de o trabalho, até o
fim da idade média significar a perda da liberdade. trabalhavam aqueles que não eram patrícios, senhores, nobres
ou clérigos. isso não foi exclusividade do ocidente. basta lembrar que, em hebraico, as palavras trabalho (avodá) e
escravidão (avdut) são derivadas do mesmo radical.

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65

VanEssa MonTEIro DE barros Marco assub


Profissão: arquiteta e diretora de arte Profissão: publicitário
Há quanto tempo tem a coleção de snow globes? Desde a primeira vez Idade: 32
que vi o filme cidadão Kane, nos anos 70, me apaixonei. sempre trago Há quanto tempo tem a coleção? Desde 2005.
na bagagem de todas as viagens. Tem outras coleções? sneakers. Exponho nas ruas diariamente!
Tem outras coleções? Tenho outra ainda maior, de miniaturas de monu-
mentos arquitetônicos: Torre Eiffel, Empire state, coliseu, big ben etc.

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ambiente corporativo

66

a modernidade trouxe uma nova dimensão ao trabalho e a mentalidade burguesa o LuIzão


converteu em um signo de elevação moral e enobrecimento da alma. hoje, na era da in- Profissão: publicitário
terface, o trabalho, para profissionais corporativos, é uma espécie de palco e confunde-se Idade: 41 anos,
com uma performance e um ritual de encenação. o computador explica, em parte, essa Há quanto tempo tem a
coleção? Desde 2004.
transformação. é para ele que convergem, cada vez mais via browser, os canais de co-
Tem outras coleções?
municação pessoal, sociabilidade, tarefas cotidianas – como banco e compras – guia de só tenho essa, que
ruas, espaços de entretenimento, bibliotecas, playlists de toda sorte e, como não mencio- aumenta cada vez mais.
nar, o trabalho. em volta dele projetam-se, quase naturalmente, os cenários que revelam
os gostos, as manias, os desejos e as vontades dos seus protagonistas: os felizes traba-
lhadores do século 21. seLecT visitou alguns desses espaços e mostra como se divertem
diretores, produtores e criadores de várias áreas enquanto, acredite, trabalham.

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GIacoMo aLbanEsE
Profissão: engenheiro civil
Idade: 53 anos.
Há quanto tempo tem a coleção? 1998
Tem outras coleções? Flâmulas de futebol,
soldadinhos de chumbo, rótulos de cerveja,
cartões- postais do brasil, tudo que se
relacione ao sPFc, fotografias e pôsteres de
cinema, memorabilia da revolução de 1932
e arte sacra.

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ambiente corporativo

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PauLa TrabuLsI
Profissão: cineasta
Idade: 48 anos.
Há quanto tempo tem a coleção?
Há mais de 20 anos. são cerca
de cem peças.
Tem outras coleções? Gente bem-
humorada ao meu redor

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MarcELo DuarTE
Profissão: jornalista e editor da Panda books
Idade: 47 anos.
Há quanto tempo tem a coleção? Desde
1999, quando abri a editora.
Tem outras coleções? coleciono tudo Produção ExEcutiva: anna Guirro, Produção dE objEtos/locação: solanGE
Porto / tatiana stEPanEnko, FotoGraFia - robErto WaGnEr, assistEntE dE
relacionado à coca-cola. com minha esposa, FotoGraFia: adriano vanni, dirEtor dE artE: ricardo van stEEn
faço coleção de girafas e com meu filho, aGradEcimEntos: bossa nova Films, box arquitEtura E artE, tribbo Post,
miniaturas de vilões. tErra E Panda books.

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arquitetura

70

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Por uma
D e n o v a Y or k , AnnA Dietzsch

arquitetura Para 71

além do esPetáculo
e do consumo

Paul Goldberger, crítico


de arquitetura da
revista The New Yorker,
fala sobre a proximidade
entre museus, cidades e
parques de diversões

Desde a construção das pirâmides, a arquitetura revela seu lado espeta-


cular, pontuando a história humana com estruturas que nos fascinam.
Em 2012, na era do consumo e do individualismo exacerbado, o espetá-
culo se vulgariza para permear nossas cidades e edifícios, nos induzindo
a consumir imagens em vez de lugares e espaços. Paul Goldberger, res-
peitado crítico norte-americano, autor do livro A Importância da Ar-
quitetura, no qual teoriza sobre o papel da arquitetura nas nossas vidas,
conversa com seLecT sobre essas tendências e sobre Frank Gehry, con-
siderado por muitos o profissional mais representativo da “arquitetura-
-espetáculo”. Goldberger está escrevendo a biografia de Gehry, é critico
da revista The New Yorker e já publicou vários livros sobre o assunto.

fotos: Raga Jose/ PRisma/glowimages e fRidmaR damm/CoRbis

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“Museus são hoje E m s u a v i s i ta a o B r a s i l , n o f i m d o


a n o pa s s a d o , o s E n h o r a f i r m o u q u E
prédios especiais, “ o s m u s E u s s ã o a s n o va s c at E d r a i s ”.

com uma ambição p o d E r i a fa l a r u m p o u c o s o B r E i s s o ?

que a todos afeta, G o l d b e r G e r Eu não os estava comparando


em termos arquitetônicos, mas querendo dizer que
como antes eram as ocupam o mesmo plano simbólico dentro de uma
catedrais” comunidade. Museus são hoje prédios especiais,
com uma ambição que a todos afeta, como antes
Paul Goldberger
eram as catedrais. E não acho que isso seja verdade
somente para os museus, mas para o edifício cul-
tural em geral. Veja, estou nesse momento em Los
Angeles, em frente ao Walt Disney Hall, de Frank
Gehry, e a alguns quarteirões está a catedral dese-
nhada por Rafael Moneo. Acho que, se você trouxer
alguém aqui que não conheça a cidade e lhe pergun-
tar qual é a caixa onde se toca música e qual é a cate-
dral, ele provavelmente escolherá o edifício de Gehry
para catedral, porque parece ser mais especial.

Acervo do entrevistAdo

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73

Hoje somos atraídos pelo consumo onde


quer que estejamos. aeroportos fazem as
vezes de sHopping centers e museus são
projetados como espaços de entreteni-
mento. o senHor não acHa que o museu está
mais próximo do parque de diversões do
que propriamente da catedral?
Não acho que o “efeito parque de diversões” te-
nha tomado conta de tudo, mas, é claro, tem hoje
uma maior representatividade. De uma certa
maneira, o parque de diversões tomou conta da
cidade e o museu é apenas um dos seus compo-
nentes. Antes, não se podia fazer negócio sem a
cidade, era ela que aproximava as pessoas para
que pudessem comerciar e negociar. Hoje em dia,
podemos cuidar dos nossos negócios estando em
qualquer lugar, sem necessariamente ficar em
contato direto com alguém. Escolhemos estar
nas cidades porque nos dão prazer, nos distraem,
nos estimulam, e essas são qualidades inerentes a
um parque de diversões. Aqui em LA, por exem- “Escolhemos estar nas
plo, se você já foi aos Universal Studios, pode cidades porque nos distraem,
entender isso bem. Aquilo é um shopping center
disfarçado de parque temático, ou é um parque nos estimulam, e essas são
que quer ser shopping? A mesma coisa com Ro-
deo Drive, em Beverly Hills, que é simplesmente
qualidades inerentes a um
uma versão muito chique da Rua Principal na parque de diversOes”
Disneylândia. A conf luência entre a cidade e o
parque de diversões é um fenômeno interessan-
te das últimas gerações e é inevitável que afete o mente poderia ficar imune a isso. Acho, no entanto,
museu. Mas acho que o museu se beneficia com que esse fenômeno tem precedentes. Não conheço
a grande expansão do seu público e, como nada ninguém melhor em autopromoção e manipulação
é de graça, paga um preço por isso. Esse preço é da mídia do que Frank Lloyd Wright, que praticou
justamente a sua maior comercialização e o fato arquitetura há cem anos, tendo morrido há mais de
de que tem de agradar de uma maneira como 50. Hoje, talvez esse fenômeno seja mais visível por-
antes não precisava. que a “marca” tornou-se uma forma de identidade
em nossa cultura.
n a n o s s a c u lt u r a d e c o n s u m o , c o i s a s
to rnam -se pro d utos e a pró pria a “arquitetura do espetáculo” exacerba
a r q u i t e t u r a pa r e c e t e r - s e t o r n a d o a visualidade e, com o advento da
u m d e l e s . a r q u i t e t o s fa m o s o s c H e g a m tecnologia, a forma passa a ter
ao s tat u s d e “ m a r c a” e p o d e m o s possibilidades infinitas. a arquitetura
“ c o m p r a r u m f r a n k g e H ry o u u m a é muitas vezes concebida na tela do
z a H a H a d i d ”. o s e n H o r p o d e r i a fa l a r computador e construída para ser
s o b r e e s s e f e n ô m e n o? consumida como imagem de revista.
Numa época em que muita coisa virou “marca” e qual a sua opinião sobre essa tendência
as pessoas referem-se a si próprias como “marcas”, da arquitetura, de relegar para um
não há dúvida de que a arquitetura e os arquite- plano secundário aquilo que é da sua
tos também se tornaram “marcas”. Vivemos numa natureza espacial? por que somos mais
época de culto à celebridade e a arquitetura dificil- lady gaga e menos alvar aalto?

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Museu GuGGenheiM BilBao, espanha Rua pRincipal da disney WoRld, oRland

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“Rodeo Drive, em Beverly Hills, é simplesmente uma versão mui-


to chique da Rua Principal na Disneylândia. A confluência entre
a cidade e o parque de diversOes é um fenômeno interessante
das últimas geraçOes e é inevitável que afete o museu”

Bom, não há duvida de que a arquitetura de Aalto ser imitados. Somente Frank Gehry pode ser
seja o oposto do superficial e do bidimensional, Frank Gehry, da mesma maneira que há poucos
mas para entendê-lo é preciso também entender que conseguiram fazer uma arquitetura de vidro
a Finlândia, o mundo onde sua arquitetura se como Mies (van der Rohe). Mas entendo o que
inseria. Mas, na época de Alvar Aalto, nem toda você esta dizendo; creio que Gehry dá a impres-
a arquitetura era como a de Aalto. É um gran- são de que é fácil fazer edifícios espetaculares e
de erro pensar que antigamente tudo era sério e isso leva a uma arquitetura que é mais superficial.
apropriado e hoje vivemos no mundo da superfi-
cialidade. Nessa, vamos dizer, “era Gehry” tende- O s e n h O r p O d e n O s c O n ta r s O b r e O
mos a pensar que é assim, mas me lembro, anos livrO que está escrevendO sObre
atrás, quando Michael Graves era proeminente. FranK Gehry?
As pessoas achavam que tudo estava sendo feito Estou escrevendo uma biografia de Gehry que ain-
“à Michael Graves” e reclamavam de que não ha- da está muito no início. É um grande desafio, por-
via mais “seriedade” na arquitetura. Quando ar- que é a minha primeira biografia e estou fascinado
quitetos de menor talento tentam imitar algo com com a possibilidade de conseguir conectar a obra
certa complexidade acabam produzindo pastiches e a vida numa só narrativa. Muito do que estou
que, obviamente, serão superficiais. Bons arqui- tentando fazer é entrar na mente do arquiteto para
tetos criam edifícios que não podem nem devem tentar desvendar por que certas coisas são como

fotos: thomas KaKaliK/ Panthermedia/GlowimaGes, suPerstocK/GlowimaGes e alan coPson

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WoRld, oRlando, eua Rodeo dRive, los angeles, eua

75

são e explicar a história da sua vida em conexão com O s e n h O r ac h a q u e O u t r O s a rq u i t e tO s


a sua obra. Poderia dizer que estou escrevendo uma s e g u i ra m O pa ra d i g m a d e g e h ry, O u s ua
“biografia crítica”. a r q u i t e t u ra e st á est r i ta m e n t e l i ga da
a u m a h i st ó r i a p e ss Oa l?
O s e n h O r cO n cO r da cO m a n O ç ã O d e q u e Alguns arquitetos como Owen Moss e Tom Maine
s e u s e d i f í c i O s s ã O m a i s e s c u lt u ra s d O se aproximaram de Gehry, trabalhando com su-
q u e a rq u i t e t u ra? cesso numa direção parecida. Creio que se podia
Não posso concordar com a noção de que sua ar- falar, sim, numa Escola de LA, principalmente
quitetura é puramente escultural, muito embora nos anos 80 e 90. Mas acho que isso se dissipou
ache que esse elemento esteja presente com muito e hoje pensamos mais em arquitetos como indi-
mais força em Gehry, do que em outros arquitetos. víduos, menos em um grupo ou escola. Acho que
Se você for ao museu em Bilbao (Guggenheim), verá isso tem a ver com, a arquitetura como “marca”
que a maioria das galerias – fora, é claro, a gran- e o fato de que nossa cultura está mesmo empur-
de galeria do térreo, com as esculturas de Serra – é rando tudo nessa direção. Acontece também com
bastante tradicional, permitindo o display da arte a arte. Não pensamos mais em escolas de pintura
de forma tranquila e não agressiva. Acho que é um ou escultura como antes fazíamos, mas há vários
museu bem desenhado e funcional, com os cuida- artistas bem-sucedidos que são muito proemi-
dos que um museu precisa. nentes e discutidos.

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entretenimento

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A HISTÓRIA DE QUATRO POP STARS


QUE chegaram à imaginária
Shangri-lá nas asas
da juventude de seu público

Forever
young
giselle beiguelman

Shangri-lá é um lugar paradiSíaco e fictício criado pelo eScritor


inglêS JameS hilton, autor de horizonte perdido (1933). é um lugar
imaginário onde todoS vivem em harmonia e o tempo para. Seus habitan-
tes são quase imortais e os sinais de envelhecimento quase não se fazem presentes em sua pele.
a utopia retoma um tema recorrente, especialmente entre os ocidentais.
Basta lembrar do elixir da Juventude – ou da longa vida, uma substância mítica capaz de
prolongar a vida e curar todas as doenças –, que aparece em diversas lendas antigas e foi
uma das pesquisas mais constantes dos alquimistas, que o associavam à pedra filosofal.
essa busca não povoa apenas a ficção e a mitologia. evidência disso é um ramo da medicina
contemporânea chamado medicina da longevidade, que investiga formas cientificamente
comprovadas de prolongar a juventude. para além dos mitos e das pesquisas de ponta, um
grupo muito particular de criadores, atravessa gerações e parece ter encontrado a fórmula
da eterna mocidade, dispensando, às vezes, o kit básico de Botox e silicone, verdadeiro feijão
com arroz das celebridades de nossa era. a receita ninguém entrega, mas passa, com certeza,
pela sabedoria de conviver eternamente com os mais novos.

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Dinho Ouro Preto , Curitiba (PR), 1964. Líder e vocalista do Capital Inicial desde 1983. A banda, que se separou em 1993, voltou aos
palcos em 1998, mantendo os milhares de fãs. Lançou dois discos-solo e odeia a data do seu aniversário. “Acho que na real não gosto de ficar mais
velho”, explica em seu site o “cantor das multidões”. i l u s t r a ç Ã O da n i e l c a b a l l e r O

77

I wanna be...
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entretenimento

78

Serginho Groisman , São Paulo (SP), 1950. Apresenta e comanda programas de entrevistas com adolescentes desde os anos 1980, quando lançou, na
TV Cultura, o Matéria-Prima, avô do atual Altas Horas, seu programa na TV Globo desde 2000. i l u s t r a ç Ã O c l a r a b e n fat t i

Marcelo Tas , Ituverava (SP), 1959. Entrou para a história do telejornalismo brasileiro com o repórter Ernesto Varela, nos anos 1980, voz da geração
criada durante a ditadura. Tornou-se a cara da juventude conectada à frente do Vitrine, na TV Cultura. Como um híbrido desses dois personagens, pilota o CQC
na Bandeirantes desde 2008. i l u s t r a ç Ã O c a m i l l e k ac h a n i

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79

Xuxa , Santa Rosa (RS), 1963. A eterna Rainha dos Baixinhos já foi modelo nas passarelas das altinhas, namorada dos campeões Pelé e Ayrton Senna, esposa de
Luciano Szafir, pai de sua filha. Atriz de cinema, fez história em um filme de arte de Walter Hugo Khouri, que retirou de circulação, e protagonizou inúmeros outros sucessos
de bilheteria passageira de verão. Apresenta programas infantis desde 1983. i l u s t r a ç Ã O ta l i ta h O f f m a n n

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curto-circuito

80

a .c .
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3
te 3

D e u s a g r e g a A f r o d i t e , 3 0 0 a .c .
mu
ma
e de
dent
e um d
artir
ta a p
, fei

ale
nus

A psicanalista Miriam Chnaiderman,


o dermatologista Otávio Macedo e o
filósofo Luiz Felipe Pondé discutem
ser jovem é s
a obsessão pela juventude e os prós e contras da
infantilização da produção cultural
ilustrações por ricardo van steen

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c e s a s , 2012
G i s e l e B ü n d c h e n , 2007

a f ra n
mod
o de de senho na s esc ola s de
62
o e , 19
Monr
g r e s , 186 2

Marily n
ra d e In

Model
intu
ep
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co
r
Tu
ho
an

B
do
ta
ro
Ga

é ser belo? Há gr andes investimentos tecnológicos na criação de tr a-


tamentos mais eficientes e r ápidos par a o r ejuvenescimen-
to facial e corpor al. as novidades nesse segmento são temas frequentes de
revistas e programas de tevê que sustentam: apagar as marcas da passagem do tempo
o quanto antes seria a atitude mais inteligente. para discutir esse fenômeno que varre o
mundo, seLecT convidou a psicanalista, cineasta e ensaísta miriam chnaiderman, o re-
quisitado dermatologista e especialista em rejuvenescimento otávio macedo, e o filósofo,
professor universitário e colunista da folha de s.paulo, luiz felipe pondé. por diferentes
M ô n i c a Ta r a n T i n o caminhos, os entrevistados revelam o que está na epiderme e no interior dessa questão.

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curto-circuito

82
O u v i r q u e v O c ê n ã O pa r e c e t e r a i d a d e
q u e t e m s Oa cO m O e lO g i O, i n cO m O da
Ou ambOs?

M i r i a M C h n a i d e r M a n Quando alguém
nos elogia, tranquiliza nossa relação com nossa
imagem corporal. Complicado é que o parâmetro
para o elogio seja aparentar menos idade e anular a
presença de um corpo que envelhece. Se alguém me
diz que não pareço ter a idade que tenho, isso não me
soa como elogio. Acho que a grande questão é poder
ter a idade que tenho e agradar, ser gostada.

OtáviO MaCedO Soa como um cumprimento


e um reconhecimento, pois na maioria das vezes é
verdade. Mas há situações em que é apenas um elogio
MiriaM ChnaiderMan OtáviO MaCedO
simpático, baseado na crença atual de que mais jovem
é melhor, o que, convenhamos, nem sempre é verdade.

L u i z F e L i p e p O n d é Elogio. Mas não


me preocupo com a idade e acho que não vou fazer
nada para parecer mais jovem. Para os homens é mais O objetivo dos tratamentos de que dispomos é obter a melhor aparência possível,
fácil: a questão é continuar sendo capaz de penetrar respeitando-se a idade e as condições de vida de cada um.
as mulheres.
p O n d é Quase sempre necessidade, se você não quer se sentir sozinho. É mais
usar Os recursOs da medicina e das in- um traço da nossa cultura maníaca pela juventude e saúde. Acho isso tudo brega e
dústrias da beleza e da mOda para apa- está em toda parte.
gar as marcas dO tempO é OpçãO Ou ne-
cessidade? quais as cOnsequências da cOrrida cOntra O tempO das nO-
vas tecnOlOgias da medicina?
C h n a i d e r M a n É uma opção muitas vezes
vivida como necessidade pelas pressões sociais. As ChnaiderMan O repúdio ao próprio corpo é apenas mais uma
marcas da passagem do tempo parecem assustar consequência do processo de depreciação de si mesmo. A identidade de
porque sinalizam a transitoriedade e a morte. Assim, qualquer pessoa depende, em grande parte, da relação que ela tem com seu
o idoso passa a querer anular a presença do corpo corpo. Para se construir enunciados sobre a própria identidade, de modo a
envelhecido, movido pelo mito do corpo jovem a poder criar uma estrutura psíquica harmoniosa, é necessário que o corpo seja
qualquer preço. Isso é muito violento. Outra coisa predominantemente vivido e pensado como local de vida e prazer. Muitas
seria usar dos recursos atuais em prol do bem-estar vezes a tatuagem, o piercing e o se cortar são modos desesperados de se sentir
e do envelhecer com dignidade. Aí a utilização dos existindo.
recursos da medicina, das indústrias da beleza e da
moda pode ser importante. MaCedO Conquistamos algo sem paralelo na natureza, que é triplicar o
nosso tempo de vida, em menos de cem anos. Uma aparência saudável – e
M a C e d O As marcas da passagem do tempo dão- não artificialmente jovem – é parte dessa vida excepcional que podemos ter
se internamente. É a alma que envelhece e, neste caso, hoje. Apostar que estamos corrompidos pelo culto da beleza é desprezar o bom
não há o que fazer. Resta a aparência, que, sim, é uma senso e o progresso que temos conseguido. Nunca estivemos tão bem.
necessidade e não uma opção. Isso fica mais claro em
relação aos dentes. Hoje, com os implantes, podemos p O n d é A juventude cada vez mais será um produto caro e não um estado
ter uma terceira dentição. Ninguém julga que ter biológico ou psicológico. O futuro é dos retardados afetivos, que associam afeto
dentes limpos e bem tratados seja apagar as marcas com felicidade e significado da vida com vida como balada. A lógica do capital
do tempo. Mas há questionamento e até preconceito vale nessa questão. Não é só o emprego, é a própria fisiologia que é a mercadoria.
quanto ao tratamento da pele, do abdome, do corpo. O velho é lento e por isso não valeria nada.

ilustrações por ricardo van steen

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83
Qual é o impacto do privilégio à juventude Cildo, afirma que a memória é o melhor lugar para uma obra de arte. A ausência
na produção cultural e intelectual? de memória é a impossibilidade de criação. O apagamento das marcas do corpo
confunde-se com o apagamento da memória.
Chnaiderman Há uma infantilização da
arte e da cultura. Freud falou do quanto a cria- m a C e d o Falar em corrida contra o tempo é um equívoco. Trata-se
ção artística passa, necessariamente, por algo da busca pela conservação e pela saúde, fugindo do que pode nos dar um
que tem a ver com o infantil. Na criação, o ar- aspecto cansado, envelhecido e descuidado. A conquista disso envolve fazer
tista resgata o brincar. Isso é bem diferente do ajustes no estilo de vida, como atividade física e nutrição adequada. As
infantilizar o mundo. Resgatar a capacidade de mulheres já perceberam isso e hoje a balzaquiana derrotada pelos anos não
brincar é parte da fruição e da produção artísti- existe mais. O que existe são mulheres lindíssimas, sensuais, conservadas,
ca. Mas não como prótese de um mundo perdi- cuidadas em seus 40, 50, 60, 70 anos, desejáveis e saudáveis. Este me parece
do, e sim como abertura libertadora para possi- o ethos mais atual da civilização.
bilidades inusitadas de construção da vida.
P o n d é A breguice de ser jovem quando não se é mais. O pior estrago é
maCedo Antes dos anos 1960, ser jovem era quando você está diante do espelho, sozinho. A mãe quer ser como a filha, o
ser imaturo, incapaz e rebelde. A geração dos que implica que a filha não tem futuro. Há o cultivo de retardo mental alegre
anos 1960 tornou ultrapassado tudo o que re- como modo de ser. Porque ser maduro hoje é como ser podre. Mas o lado
presentava ser adulto e afirmou que ser jovem é interessante dessa busca pela juventude para a geração que está envelhecendo
que era bom. Isso transformou todos em eternos é não se tornar tão escravo de falsas verdades, como casamento, família e
jovens e continua sendo um mantra em nossa paternidade. Ruim com eles, pior sem eles.
civilização, embora já se perceba uma revisão
nesses conceitos. A ideia não é negar o valor da
juventude, mas afirmar que temos de manter o
nosso espírito jovem.

Pondé Isso deixa os jovens de verdade perdidos.


Eles não têm narradores de vida porque os pais
querem ser filhos para sempre. Narrar a vida é dar A mãe quer ser
significado a ela. Para isso você tem de ser adulto e como A filhA, o
bancar alguma certeza em um mundo em dissolu-
ção como o nosso. O difícil não é amar quando se que implicA que
é jovem, mas quando já se sabe que a vida nunca
satisfaz nossos delírios de felicidade. A filhA não tem
futuro. mAs o
Quais aspectos chamam a sua atenção
em uma cultura Que preza cada vez mais lAdo interessAnte
a aparência jovem?
dessA buscA pelA
C h n a i d e r m a n A vida passou a ser juventude pArA A
descartável, na medida em que a morte violenta se
banaliza nos noticiários cotidianos. Hanna Arendt, gerAção que está
referindo-se a essa cultura que nos aprisiona, diz: “É
a durabilidade que dá às coisas do mundo sua relativa envelhecendo é
independência diante dos homens que as produzem não se tornAr tão
e as utilizam. Sua objetividade as faz suportar,
resistir e durar, pelo menos por algum tempo, escrAvo de fAlsAs
diante das vorazes necessidades de desejo de seus
produtores e usuários vivos”. Esta é uma afirmação verdAdes, como
saudosista, na busca de uma estabilidade perdida. Luiz FeLiPe Pondé
cAsAmento, fAmíliA
Hoje temos outros recortes, como o nomadismo e
a transitoriedade. Cildo Meireles, no documentário e pAternidAde

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mercado editorial

84

Ronaldo BRessane

fotos: divulgação

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quadrinho da hq inédita Furry Water,
de rafael Grampá +

85

Há sinais por
todos os lados,
mas seLecT falou
com quadrinistas,
editores e críticos
para entender:
o Brasil chegou à
Era de Ouro dos
quadrinhos?

Mauricio de Sousa dar autógrafos por cinco horas se-


guidas é uma cena normal – afinal, trata-se de uma
lenda viva dos quadrinhos: seus personagens já ven-
deram 1 bilhão de exemplares no mundo todo. Mas
presenciar autores independentes autografando e
rabiscando fanzines durante o mesmo período era
impensável anos atrás. O clima de beatlemania em
relação aos quadrinistas nacionais, com direito a as-
sédio de marias-nanquim e paparazzi mirins rolou
em novembro no FIQ 2011, o Festival Internacional
de Quadrinhos de Belo Horizonte. O tradicional
evento reuniu 150 mil pessoas em cinco dias – há
dois anos, havia a metade disso –, culminando uma
sequência que começou na Gibicon de Curitiba, em
julho, e se popularizou na RioComicon em outu-
bro. O estilo yes we can dos três festivais, somado
à emergência de novos artistas e expressivas ven-
dagens – só a Companhia das Letras, que publica
quadrinhos há apenas dois anos, vendeu mais de
160 mil exemplares de seus romances gráficos –,
faz formular o diagnóstico: o Brasil vive sua Era de
Ouro da HQ. Quem é do meio confirma, mas vários
pedem calma e outros até refutam a tese.

rafael grampá

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mercado editorial

86 quadro do livro Quando


“Sim, a HQ brasileira vive sua Era de Ouro”, afir- meu Pai se encontrou com
ma categoricamente Rogério de Campos, diretor o et Fazia um dia Quente,
editorial da Conrad, que trouxe ao mercado tanto de lourenço Mutarelli.
à direita, Quase nada, de
luxuosas edições de gringos como Milo Manara e Fábio Moon & Gabriel bá,
Robert Crumb quanto graphic novels de Marcelo autores que já FiGuraraM
Quintanilha e Allan Sieber. Campos acredita que na lista dos Mais vendidos
do new York tiMes
houve momentos em que os quadrinhos eram mais
fortes nas bancas de revista e tinham tiragens maio-
res que as atuais – e também houve um tempo em
que o gênero tinha mais influência cultural (como
no Pasquim, por exemplo). “Mas nunca tivemos
tantos quadrinistas com tanto domínio técnico e
tanta variedade de estilos e gêneros sendo explora-
dos ao mesmo tempo”, analisa.
“O reflexo desse momento vai aparecer mais tarde
e, enquanto isso, é preciso manter o trabalho”, diz
André Conti, editor do selo Quadrinhos na Cia., da
Companhia das Letras. “Nossas vendas excelentes
mostram duas coisas: que há público para os mais
diferentes tipos de quadrinhos e que o crescimento
das HQs nas livrarias demonstra que há um públi-
co novo, ou que parte do público das bancas migrou
para as livrarias”, explica.
O quadrinista e editor Odyr Bernardi sublinha:
“Agora, além de termos mais roteiristas – alguns
vindos do cinema e da literatura –, temos artistas
pensantes, com um jeito todo particular de contar
histórias e gerir a carreira”. Bernardi também tem
uma graphic novel no forno da Quadrinhos na Cia.
Jornalista especializado em quadrinhos, Delfin lem-
bra que a HQ nacional viveu uma época dourada nos
anos 50/60 com sua superpopulação de gibis de terror
e mistério, e também nos anos 70, quando surgiram
Laerte, Angeli, Glauco e Luiz Gê. “Mas acho que te-
mos uma nova Era de Ouro despontando diante de
nossos olhos, desde a publicação do primeiro fanzine
10 Pãezinhos, de Fábio Moon e Gabriel Bá”, diz.
De fato, a carreira dos gêmeos paulistanos os coloca
como os pop stars dessa Era. Agraciada com o prê-
mio Eisner, considerado o Oscar do gênero, sua HQ
Daytripper figurou entre os livros mais vendidos da
lista de quadrinhos do jornal New York Times, pro-
vando ser possível debutar no mercado americano
desenhando super-heróis e mais tarde devolver para
o mesmo mercado uma história brasileira e nada he-
roica – como é a trajetória de Brás, um obituarista

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87

Mas, tirando Mauricio de Sousa e Disney, não se sabe


Especialistas apontam tiragem e vendagem de quase nada de uma forma
que, agora, além de concreta”, alerta Nasi.
O escritor Joca Reiners Terron é frio ao analisar o
mais roteiristas, momento. Responsável pelo projeto que idealizou a
série de graphic novels reunindo escritores e qua-
também temos drinistas publicada pela Companhia das Letras,
Terron detesta expressões do tipo “Brasil, celeiro
artistas pensantes de gênios”. “A Era de Ouro continuam a ser os anos
40/50/60. Mas talvez estejamos assistindo a uma
época dourada de divulgação das HQs, do papel à
que sonha em levar uma vida menos ordinária. Télio webcomic”, pondera.
Navega, que cobre quadrinhos no jornal O Globo,
também aponta os gêmeos como principais nomes Cadê o meu?
dessa cena otimista, mas tempera a euforia com o fa- Mais realistas, os próprios quadrinistas se ressen-
tor econômico. “A boa fase está atrelada à estabilida- tem da falta do ouro nos bolsos para consolidar essa
de brasileira e ao grande número de livros comprados Era. “Economicamente estamos no bom caminho,
pelo governo federal através do Programa Nacional mas falta muito para a tal Era Dourada”, avalia Ra-
Biblioteca da Escola”, lembra. fael Coutinho, desenhista e corroteirista da graphic
novel Cachalote e (não custa lembrar) filho de Laerte
Pera lá! Coutinho, “o Buda das HQs”, segundo Eduardo Nasi.
Há, no entanto, quem prefira ir devagar com o andor. “Temos de lidar com o baixo consumo de livros e
É o caso do jornalista Eduardo Nasi, que recorda: a HQs em comparação com Argentina, França, Japão,
expressão Era de Ouro nos quadrinhos apareceu nos EUA e Bélgica. Mas há cinco anos não havia uma es-
EUA dos anos 50, quando os títulos de super-heróis tante de quadrinhos nas principais livrarias do País,
vendiam milhões – e nem sequer eram considerados e hoje todas têm, nem tanto editor gringo vinha pes-
uma forma sofisticada de arte, como hoje. “Ainda soalmente rastrear a cena.”
temos um mercado pequeno tentando acomodar “Vivemos é a Era do Fervor”, prefere Rafael Gram-
muitos talentos emergentes. Dados concretos? Só a pá, também detentor de um prêmio Eisner, faturado
diversidade e a qualidade dos trabalhos que surgem. com sua revista Mesmo Delivery – aliás, em processo

À direita, Lorenço MutareLLi; aciMa, Fábio Moon e gabrieL bá

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quadro do livro Quando meu Pai se encontrou com o et Fazia um dia Quente, de lourenço Mutarelli.

TOP
JOCA REINERS TÉLIO
TERRON NAVEGA
JÁ É
FIVES Laerte, Guazzelli, Angeli,
Lourenço Mutarelli, Fábio
Fábio Moon & Gabriel Bá, coletivo
Beleléu, coletivo Mondo Urbano,
Moon & Gabriel Bá Samba, Golden Shower
Artistas e profissionais
ouvidos por seLecT falam quem
são os talentos consolidados Rafael Coutinho, Rafael Vitor Cafaggi, Chiquinha, André
Grampá, El Cerdo, Gabriel Kitagawa, Rodrigo Rosa, Shiko
e quem são as apostas para o
Góes, Eduardo Medeiros
futuro da HQ brasileira

Se LIGA

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89
Nosso estilo tem mais ginga: nossos
quadrinistas já passaram por design,
animação, graffiti e artes plásticas

de adaptação para o cinema. “Temos boas HQs,


muitas medianas e inúmeras ruins, mas pou-
quíssimas excelentes”, condimenta.
Todos os profissionais ouvidos por seLecT lem-
bram: o bom período da arte serial pode ser só
o início de uma fabulosa convergência, no meio
digital, de plataformas artísticas, editoriais e
comerciais. Tudo bem, mas digamos que essa
Era de Ouro do quadrinho brasileiro se conso-
lide e se multiplique em livros, revistas, games,
tablets e telas. Teremos um estilo único, forte
para brigar na cena internacional? “Já ouvi que
temos um estilo solto e ‘sinuoso’, que valoriza
o traço gestual em detrimento da precisão rea-
lista”, conta Coutinho. Terron e Nasi lembram
que o estilo brasileiro funda-se no humor dos
cartuns. Já Navega e Delfin acham que nossa
HQ prescinde de uma marca. “E torço para que
não tenha: quanto mais plural, melhor”, pede
Navega. “A HQ brasileira pode se alegrar de não
ter estilo nem estigma”, define Delfin. Grampá
lembra que, para sobreviver, os brasileiros já fi-
zeram de tudo. “Têm artistas que passaram por
design, animação, graffiti, artes plásticas e HQ
de super-herói. Tudo isso influencia o quadri-
nho. Daí nosso estilo ter mais... ginga!” quadro de Hq de rafael CoutinHo

ODYR EDUARDO RAFAEL SIDNEY


DELFIN
BERNARDI NASI COUTINHO GUSMAN

Rafael Coutinho, Daniel Lourenço Mutarelli, Fábio Moon & Gabriel Bá, Rafael Fábio Moon & Gabriel Bá, Rafael Fábio Moon & Gabriel Bá,
Galera, Lobo, Lourenço Laerte, André Dahmer, Grampá, André Dahmer, Marcelo Coutinho, coletivo Beleléu, Danilo Beyruth, Rafael
Mutarelli, Guazzelli Fábio Zimbres, Jaca Quintanilha, Lourenço Mutarelli coletivo Quarto Mundo, Lobo Albuquerque, Gustavo Duarte,
André Diniz

Marcelo D’Salete, Yuri Rafael Coutinho, Rafael Yida & Acioli, Wesley Os Cafaggi, “Osmoleques” (Felipe Vitor Cafaggi, Mário Cau,
Moraes, Bruno Maron, Grampá, El Cerdo, Gabriel Rodrigues, Pedro Franz, Nunes, Pedro Cobiaco e João Eduardo Damasceno, Luís
Maturi, Tito Góes, Eduardo Medeiros Vítor & Lu Cafaggi, Gêmeos Montanaro), coletivo Quadrinhos Felipe Garrocho, Shiko
Marcelo e Magno Costa Rasos, Mario Cau, Danilo Beyruth

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artes visuais

90

Fat Convertible (2005), de erwin wurm; à direita, White SnoW and dopey (2011), de mccarthy

Os idiOtas cOntra O baixO -


Há uma divertida, corrosiva e irônica família de ar
FoFices à parte, a era gugu-dadá também tem seu lado ne-
gro. alguns trabalhos de arte recentes podem ser toma-
dos como sintomas do pueril, da idiotia e do mau gosto
grassando no inconsciente cultural. é o caso da foto, feita por
olaf breuning, de um homem de quatro coberto de macarrão (spaghetti dog,
2005). ou da branca de neve e o anão dunga da escultura monumental de madeira
maciça de paul mccarthy, que amalgama os personagens criando um deformado
conto de fadas mutante. participam do mesmo universo as animações de massinha
de nathalie djurberg, em que animais fofos protagonizam roteiros lascivos. J u l i a n a M o n ac h e s i

Fotos divulgação/cortesia galeria Xavier HuFkens, bruXelas (acima) e tHomas mueller/cortesia galeria Hauser & wirtH, ny

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91

O - astral
de artistas que virou o mundo das artes do avesso

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artes visuais

92

Collage Family (2007), fotomontagem de olaf Breuning: “a arte se leva muito a sério”, diz

Também integra o elenco a futilidade levada às raias da loucura no vídeo de


Ryan Trecartin, em que uma adolescente tenta o suicídio bebendo uma garra-
fa de Listerine. Ou, ainda, as regras de comportamento politicamente incor-
Imersão na
retas das fotos de Erwin Wurm, ensinando a cuspir na sopa alheia ou tirar um
cochilo no banheiro da empresa. Esse breve panorama permite detectar uma
cultura pop e
corrente artística que se vale da carga política e poética de atitudes infantis
ou simplesmente ridículas.
humor adolescente
O império do mau gosto tem vultosos precedentes na história da arte contem-
porânea: toda a filmografia de John Waters, as esculturas de Jake & Dinos
Chapman ou Mike Kelley e, acima de tudo, o filme Os Idiotas (1998), de Lars
são a marca
von Trier, que marcou uma geração ao sinalizar a potência revolucionária de
atitudes débeis. A radicalidade de forma e conteúdo da obra-prima do cine-
regIstrada do
asta dinamarquês logo seria enfraquecida em diluições ao estilo do programa
de televisão Jackass.
suíço olaf BreunIng
Na teoria da arte, esse tipo de produção foi abordado em Informe – exposi-
ção e livro de Yve-Alain Bois e Rosalind Krauss que releem o modernismo
a partir da filosofia de Georges Bataille –, em Nosso Grotesco (subtítulo da
curadoria de Robert Storr no site Santa Fe 2004), e na curadoria sobre idiotia,
dAfT, de Mathieu Borysevicz, realizada em uma galeria de Xangai em 2011.

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Olaf Breuning, artista suíço residente em Nova York,
faz suas fotografias, esculturas, desenhos e vídeos
como uma criança que destrói e reconstrói seus
brinquedos. Os utensílios domésticos estão entre seus
materiais de trabalho preferidos: luvas de borracha fa-
zem as vezes de pelos de cachorro e sandálias Crocs
estão no lugar das patas. Vasilhas, talheres e outros
apetrechos de cozinha dão forma a robôs e figuras
antropomórficas que habitam instalações bizarras
do artista, juntamente com outras tantas quinqui
lharias compradas nos mercados populares nova-
iorquinos de Canal Street e Chinatown.
Nas fotografias de grupo, Breuning cria encenações
que parecem egressas de filmes B de terror, com es-
pecial predileção por zumbis e motosserras, cabelos
ou barbas compridas e máscaras toscas, em ambientes
sombrios e esfumaçados. Ele cria ainda cenas (table-
aux) pseudo-históricas, reunindo índios (Primitives,
2001), cavaleiros em armaduras (Knights, 2001) ou vi-
kings empunhando pranchas de surfe longboard (Vi-
kings, 2005). Quando os protagonistas das fotos não
são estranhos grupos uniformizados, eles são perso-
nagens com desenhos, alimentos e utensílios acopla-
dos ao corpo. É assim em Brian (2008), que tem cara
de porco e bolas de tênis no lugar das orelhas, pepinos Double (2002), de Breuning: “A vidA AdultA é cArregAdA de proBlemAs AutogerAdos”
como dedos da mão e uma das pernas mutilada na al-
tura do joelho, com o sangue artificial mal encobrindo
a perna dobrada.

Para o crítico da revista ArtForum Michael Wilson,


a imersão na cultura pop é uma crítica de Breuning
à codificação excessiva da arte recente. “Enfatizando
uma continuidade entre a vida diária e os universos
oníricos da moda, do cinema e da tevê, ele recusa a
possibilidade de uma verdade única e singular. E,
como Mike Kelley antes dele, emprega humor ado-
lescente para contornar quaisquer expectativas per-
sistentes de uma conclusão adulta e sem graça”, es-
creveu em resenha da exposição do artista na galeria
Metro Pictures, em 2004.
“A arte em geral é muito cheia de si e se leva muito a
sério”, afirma Breuning em entrevista à seLecT. “Bons
os velhos tempos do dadaísmo, quando ainda era pos-
sível ser um artista verdadeiramente malvado.” Para o
artista, enquanto “a vida adulta parece ser carregada
de tantos problemas autogerados”, a visão infantil so-
bre as coisas fundamentais é menos filtrada. “Os pro-
blemas estúpidos ainda não estão lá. Elas são capazes
de fazer um desenho de uma casa, de um cavalo ou de
um carro sem pensar em todos os modelos possíveis de i never invite my frienDs again they are weirD! (2003), outrA oBrA de olAf Breuning

Fotos divulgação/cortesia do artista

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artes visuais

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Spit in Someone’S Soup, fotografia Da série instructions on How to Be Politically incorrect, Do artista austríaco erwin wurm

um carro. É isso que ainda estou fazendo aos 41 anos: procuro falar sobre as coisas prática em um minuto pelo próprio artista, por per-
de uma forma universal e não filtrada.” formers ou por visitantes de suas exposições.
Apesar do humor por vezes infantil, o artista recu-
O artista austríaco Erwin Wurm, respondendo à mesma pergunta sobre infantili- sa o rótulo: “Definitivamente, não crio obras para
dade como motor da produção, recusa a aproximação: “Não há nada de infantil no entreter as pessoas nem tampouco para fazê-las rir.
meu trabalho. Faço um trabalho sério, sobre assuntos sérios. Ele pode ser engra- Eu faço obras como One-Minute Sculptures e Ins-
çado para algumas pessoas, mas de fato é um trabalho preocupado politicamente, tructions on How to Be Politically Incorrect certo
não é sobre essa absurda realidade em que, em pleno século 21, há pessoas na Áfri- do poder subversivo e anárquico, da relação absurda
ca do Norte acreditando que a sociedade deve ser governada por 65 leis islâmicas e estranha entre objetos e pessoas”.
dos séculos 14 e 15”. Wurm admite que os dadaístas estão entre suas re-
“O que me interessa são pessoas vivendo realidades tão díspares ao mesmo ferências: “Meus trabalhos têm maior relação com a
tempo. A realidade é dez ou cem vezes mais absurda do que as pessoas gostam ideia do absurdo e das diferentes percepções da reali-
de acreditar. Como artista estou interessado em observar o mundo e comentar dade que cada pessoa tem. A palavra ‘infantil’ não se
ou lançar perguntas sobre essa nossa realidade”, afirmou à seLecT, por telefone, aplica de maneira alguma. Minha obra tem mais a ver
de seu ateliê em Viena. com a liberdade de poder rir de si mesmo ou poder
Wurm é conhecido pela ironia que beira o cinismo de suas esculturas rechon- agir de maneira ridícula e não se envergonhar disso
chudas – carros, casas, figuras humanas – e também pelas performances fotogra- nem com todas as coisas que socialmente costumam
fadas da década de 1990, as One-Minute Sculptures (Esculturas de Um Minuto), constranger as pessoas. Tem a ver com não precisar
em que ações desafiam a mesmice do cotidiano. São poses absurdas envolvendo agir de maneira apropriada ou como a sociedade con-
objetos do dia a dia, como acessórios de moda ou itens de escritório, postas em sidera normal. Isto sim é uma ideia subversiva”.

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Para o artista e crítico Rafael Campos Rocha, o idio
tismo e a infantilidade podem ter um “poder corro-
Os artistas
sivo sobre o estabelecido e as estruturas de dominação
que o sublime e, principalmente, o edificante dificil-
mente conseguem”. Rocha há dez anos ministra cur-
que fazem
sos livres de história da arte e atualmente é professor
no Instituto Tomie Ohtake, onde sempre inclui uma
crítica sOcial
aula sobre Paul McCarthy, centrada no vídeo Painter
(1995).
a sériO sãO
“Trabalhos como os de Paul McCarthy têm muito
mais força do que, por exemplo, a obra de Hélio Oi-
ticica, mesmo na crítica do capitalismo que os dois,
hipócritas, já
acredito, exercem. Primeiro, porque HO exige o tem-
po inteiro um estatuto de arte para a própria obra.
uma pOstura
E a arte é o produto perfeito do capitalismo, a mais
brilhante face da mercadoria-fetiche. Enquanto o
idiOta cOlOca
brasileiro luta por manter o estatuto da arte como al-
ternativa ao mundo, McCarthy ridiculariza inclusive
o sonho modernista como sendo autoritário, com o
em dúvida O
seu genial Painter, porque o mundo que Oiticica al-
meja, como o dos futuristas, é um mundo onde ele, o
estatutO da
artista-criador, ocupa uma posição de poder. E justa-
mente ridicularizar as posições de poder é o que os
arte e de seu
melhores artistas fazem”, observa Rocha.
Paul McCarthy, norte-americano que encena fanta-
sias regressivas, violentas e perversas em videoper-
entOrnO Santa with Butt Plug (2007), de mccarthy
formances, esculturas e instalações, nos confronta
com “um pesadelo de sexualidade polimorfa e deca-
dência física que só poderia ser o mau sonho de uma
cultura do consumo tão espectral e desencarnada
como a nossa própria”, conforme análise do curador caótica”, McCarthy estaria agora considerando o “potencial subversivo da beleza”.
nova-iorquino Ralph Rugoff. Para Wurm, a estratégia de McCarthy tem mesmo a ver com a mudança dos
Pinóquio (Pinocchio Pipenose Householddilemma, tempos: “Nos anos 1980, qualquer discurso sobre a realidade tendia a ser cheio de
1994), Papai Noel (Santa Chocolate Shop, 1997) e paixão e excessos, como uma espécie de sobrepeso. Quando eu penso no traba-
diversos outros personagens de contos de fadas e da lho dos minimalistas e dos estruturalistas, considero obras de uma importância
Disneylândia já foram objeto da perversão do uni- ‘pesada’. Hoje trabalhos sobre essas questões são mais possíveis, como a obra de
verso infantil de McCarthy, que em sua mais recen- McCarthy, Martin Kippenberger ou Maurizio Cattelan. Eu chamo meu método
te exposição na galeria Hauser & Wirth, em Nova de ‘cinismo crítico’ e creio que se aplica ao trabalho desses artistas também. Acho
York, no fim de 2011, se dedicou aos Sete Anões (The que é possível manter a importância daquele discurso, mas tornando-o absurdo a
Dwarves, the Forests). partir dos elementos cínicos da nossa vida”, defende.
“Os artistas evitam rir deles mesmos para manter uma posição de respeito
Ken Johnson, em crítica no jornal New York Times, dentro da hierarquia social e, dessa forma, serem recompensados por isso. Ao
sugeriu que as obras da exposição poderiam ser in- manterem firme a posição da arte na sociedade, reforçam a suposta ‘naturali-
terpretadas como “monumentos de resistência à hi- dade’ dessa sociedade, ainda que aparentemente a critiquem. São porta-vozes
pócrita cultura dominante”, situados em uma tradição do status quo do capitalismo, do fetiche da mercadoria e da exploração, ainda
que vai de Rimbaud a Dash Snow. Isso porque estão que aparentemente digam o contrário. Com raras, raríssimas exceções, não
“baseados na convicção de que enlouquecer é a única passa de hipocrisia. Já uma posição pouco séria coloca em dúvida o estatuto
resposta sã à vida moderna”. Detendo-se na escultura da própria obra e, por consequência, de seu produtor, lançando uma nuvem
Branca de Neve e Dunga (2011), entretanto, o crítico de dúvida sobre tudo que a cerca, principalmente a Arte. Acho essa posição
sugere que, “tendo exaurido as possibilidades da feiura mais saudável e mais honesta”, completa Rafael Campos Rocha.

fotos divulgação/cortesia galeria thaddaeus ropac, paris (esquerda) philippe de gobert courtesy the artist and hauser & Wirth (direita)

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portfólio powered by

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abre-alas
estereoensaios, Filme brasileiro 3d
em altíssima resolução, inaugura
visualidades e Faz a ponte entre
o pré e o pós-cinema A n g é l i c A d e M o r A e s e g i s e l l e B e i g u e l M A n

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o tema do carnaval rendeu ângulos e detalhes inusitados

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portfólio

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acima e ao lado: a tridimensionalidade salta nos fios das ligações


clandestinas (“gatos”) das favelas cariocas e na banda de músicos

EstErEoEnsaios é o primEiro filmE rEalizado no


Brasil na mais alta dEfinição dE imagEm dispo-
nívEl no mErcado, com uma câmEra quE capta 5
milhõEs dE pixEls (5k) E Em tErcEira dimEnsão (3d).
para se ter uma ideia do que isso significa, o que chamamos de tevê
de alta definição (hdtv) tem 2 milhões de pixels e não é estereos-
cópica. isso mostra a diferença entre as imagens a que estamos nos
acostumando a ver e as que vêm por aí, embaladas na tecnologia
desse filme dirigido por Jane de almeida, professora da pós-gra-
duação do mackenzie e realizado pela rede nacional de pesquisa
(rnp) e pelo laboratório de aplicações de vídeo digital (lavid),
da universidade federal da paraíba (ufpB).
tudo nele, exceto o comprimento das narrativas, é grandioso. a

fotos: divulgação

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73

a imagem, em torno de 10 milhões de pixels,


desafia os equipamentos do circuito exibidor

câmera, de 48 quilos e sistema de lentes superpostas, aumenta as ancestral mais antiga do cinema em terceira dimensão”. Foi o que
dimensões de tudo. Que o diga Fabio Pestana, fotógrafo e came- o grupo de trabalho responsável pelo filme realizou, em parte, ao
raman do projeto. Afinal, muitas das imagens foram feitas com o trazer o estereógrafo norte-americano Keith Collea para orientar
equipamento nos seus ombros. Ele comenta: “É cinema do século os efeitos estereoscópicos dos equipamentos de última geração usa-
21, mas parece que você está lidando com as câmeras de 1910. Pe- dos na filmagem. Keith Collea é especialista em 3D e trabalhou nas
sadíssimas!” filmagens do blockbuster Avatar, do diretor James Cameron. As
O projeto enfrentou vários desafios tecnológicos, desde o par úni- câmeras Red Epic em 3D que ele trouxe ao Brasil são as mais inova-
co de câmeras, equipamento ainda desconhecido dos especialistas, doras do cinema mundial.
passando pelo processamento de imagens, com cerca de 10 milhões Do ponto de vista estético, o trabalho aposta na substituição da an-
de pixels de definição, até a exibição do filme em projetores espe- siedade quase demente que comanda a edição dos disaster movies
ciais, ainda em fase de estabilização. O objetivo da experimentação, hollywoodianos (notórios clientes dessa tecnologia na atualidade)
esclarece Jane, foi não só “formar uma competência técnica no País, por um olhar desacelerado, prazeroso, flâneur. O filme organiza-se
mas também somar a tecnologia atual à história da estereoscopia, em torno de imagens-padrão do Rio de Janeiro (paisagem, futebol,

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portfólio

a edição apostou no olhar desacelerado,


100 que privilegia a paisagem do rio de janeiro

favela e samba), além de imagens inusitadas das estruturas de concreto sob a ponte magem e ficaram intrigadas ao não ver as câmeras
Rio-Niterói e guindastes trabalhando na área portuária carioca. A busca de ima- perseguindo seus quadris para o fatal enquadramento
gens convencionais teve o objetivo de retirar a ênfase da potência narrativa da ima- em close das coberturas televisivas. “Vendo a câmera
gem para mostrar a diferença que a filmagem em 4k e 3D promove na espessura e apontada para seus pés, elas ficavam arrumando a rou-
na definição da imagem. pa, como se pensassem que havia algo de errado com
Quem nunca viu uma passista de escola de samba, com seus enormes penachos de elas.” As imagens são encantadoras. Inesquecíveis
plumas na cabeça? Em 3D, essa experiência ganha contornos inéditos: as plumas, também são as do mar. Em alguns trechos, parece
filmadas de cima para baixo, ameaçam tocar nosso nariz. As saias rodadas da ala que a água vai vazar da tela, apontando para um
das baianas da Mangueira, filmadas com a câmera quase no chão, mostram todos novo momento da reinvenção da paisagem, que tan-
os seus detalhes decorativos. Os fios de um poste de luz da favela (cheio de ligações to ocupou os pioneiros da estereoscopia.
clandestinas) estendem-se no espaço tridimensional, formando uma escultura ci-
nética. O barco que singra a Baía de Guanabara parece estar nos levando na proa.
Trata-se de um exercício de desmontagem dos clichês, a partir dos próprios cli-
chês, que implicou momentos muito interessantes na filmagem. Jane, a dire-
tora, conta que as sambistas da Mangueira não sabiam o que se passaria na fil-

fotos: divulgação

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101

no sentido horário: equipe de filmagem em cena metalinguística e duas imagens com a


paisagem horizontal da baía de guanabara que homenageia os pioneiros da estereoscopia

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comportamento

102

Nascidos eNtre 1984 e 1987, ciNco


artistas relatam seus camiNhos para
as artes visuais e refletem sobre o
atual coNtexto, em que “jovem artista” virou commodity
ElEs têm obras dE gEntE grandE, mas ingressaram muito cedo no circuito da arte e construíram uma
trajetória artística com apenas vinte e poucos anos. sofia borges, 27, Felipe bittencourt, 24, rafael Carneiro, 26,
Flávia Junqueira, 26, e andré Feliciano, 27, são jovens precoces que estão inscrevendo seu pensamento e sua ati-
tude na conversa da arte contemporânea brasileira.

Produção: AnnA Guirro. Assistente de FotoGrAFiA: Pedro BonAcinA / renAtA terePins / cAiuA FrAnco, cenoGrAFiA: Aécio AmArAl

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103

RETRATO J U L I A N A M O N AC H E S I f OtO b O b w O L f E N S O N

DO ARTISTA QUANDO
(MUITO) JOVEM
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comportamento

104

DECRETAdO O FIM DO CONTEMPORÂNEO


André Feliciano, o mais precoce entre os precoces, rias, em Minas Gerais, mas não sabia se essa memória provinha de uma experiên-
que formulou seu primeiro (de muitos) manifesto cia ou de uma fotografia. Passei muitos anos com essa dúvida que, de certa forma,
sobre arte ainda no colegial, atende hoje pelo nome nutriu minha vontade de querer entender mais sobre a natureza da fotografia”,
Jardineiro de Arte. Ele já teve outros codinomes ao conta o Jardineiro André.
longo de uma breve e acintosamente frutífera carrei- Uma dificuldade de mobilidade aos 17 anos levou-o a começar a fotografar. “Por
ra de artista: foi moderno (2000-2001), foi Pós-mo- algum motivo misterioso tornei-me uma fotografia: não tinha ação própria, não
derno (2002-2005), Contemporâneo (2005-2006) e, conseguia me comunicar e vivia em um espaço plano”, explica. Ele elaborou, em
por fim, encontrou a verdadeira vocação, que não é, 2001, um manifesto sobre o que seria a arte do futuro, intitulado Neo-pós-pós,
segundo ele, ser artista, mas “cultivar a natureza da passou a criar e costurar as próprias roupas e conseguiu “sair do mundo estático
arte”, como Jardineiro. e fotográfico” em que havia se metido.
“A arte surgiu na minha infância como uma dúvida: Em 2002, Feliciano ingressou na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap)
eu tinha uma memória muito forte de brincar em um e, por que deixou “de ser espontâneo”, adotou o codinome Pós-Moderno. “No
galinheiro, em um sítio que visitava sempre nas fé- ambiente intenso de criação em que me encontrava no final do colegial, eu não

fotos divulgação

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105
À ESquErda, Flávia Junqueira Florescentista há cinco anos, o Jardineiro vem se de-
protagoniza aS própriaS fotoS,
como nESta cEna EntrE alEgrE
dicando a cultivar a natureza da arte em lugar de su-
E mElancólica clicada durantE perpovoar o mundo com mais obras de arte. Escritos
uma rESidência na cité dES artS, florescentistas, festas florescentistas e conversas flores-
Em pariS, intitulada “ElE ainda
não EStá aqui (2011)”
centistas perfazem sua obra hoje. Nas festas, por exem-
À dirEita, doiS momEntoS da pEr- plo, o anfitrião serve apenas comidinhas em forma de
formancE “palhaço Ergométri- câmera, que simbolicamente fotografam os convivas.
co (2011)”, dE Felipe Bittencourt,
Em quE o artiSta pEdala uma
“A minha entrada no circuito das artes começou de
biciblEta Ergométrica até quE fato com a exposição Ecológica no MAM-SP. Depois
a maquiagEm SE dESfaça pEla dessa iniciativa, as pessoas dizem que entenderam mais
ação do Suor
o que eu tento falar há muitos anos. Entretanto, meu
trabalho é um longo cultivo, mas a poética do meu tra-
balho não está pronta”, avalia. Em 2011, Jardineiro fez
duas exposições em Nova York, na Bonni Benrubi Gal-
lery e em um prêmio internacional de jovens artistas no
Brooklyn, e tem prevista para março sua primeira indi-
vidual na Galeria Zipper, em São Paulo.

O que significa ser


“jOvem artista”
A artista e professora de artes visuais da Faap Dora
Longo Bahia faz uma diferenciação entre “artista jo-
vem” – “uma denominação retroativa que pressupõe
a existência de uma obra feita por alguém que faz arte
(o artista)”, como subentendido no título do roman-
ce de James Joyce – e “jovem artista”, designação que
prescinde da obra. “O jovem artista é uma categoria
que existe antes da arte; é uma promessa do mercado,
é uma aposta que pode dar certo (valorizar) ou não”,
defende. As escolas de arte, hoje, ainda segundo Bahia,
ensinam os alunos a ser “jovens artistas”, a se inserir
no mercado e até a usar dispositivos de “subversão”.
Uma marca dos jovens artistas no contexto atual é a
diversidade de meios que escolhem para se comuni-
car. Apesar de certo predomínio da pintura figurativa
(basta visitar a exposição Os Primeiros 10 Anos, em
cartaz no Instituto Tomie Ohtake até 26 de fevereiro,
conhecia outra possibilidade a não ser cursar uma faculdade de artes. Perdi um para perceber que esse suporte é o cavalo de batalha
pouco a noção de realidade durante o curso e me aprofundei nas questões sobre a da nova geração), os artistas também fazem farto uso
natureza da fotografia”, conta. do vídeo, da fotografia e do tridimensional.
No percurso de formação, o artista introjetou de tal maneira o pensamento sobre Mesmo na pintura há visadas marcadamente distin-
a fotografia e as experimentações intensas com o meio (técnica e simbolicamente) tas, como no caso da obra de Rafael Carneiro. Ele se
que voltou a se sentir, no último ano do curso, estático e com dificuldade de se co- vale de um olhar mediado ou maquínico, capturado
municar. “Tornei-me o próprio contemporâneo. Só consegui sair do buraco com por câmeras de segurança ou stills de filmes de Alfred
ajuda do meu orientador, que me ensinou a ler e escrever textos de modo claro e Hitchcock, como base para uma pintura que faz ques-
estruturado para, enfim, conseguir me comunicar.” tão de figurar a própria artificialidade. “Tento resolver
Orientado por Felipe Chaimovich em seu trabalho de conclusão de curso, em o mal-estar cultural em meu trabalho. Para mim, a
2006, o que o Jardineiro André Feliciano fez foi ousar reescrever a história da arte obra de arte não tem nada a ver com sublimação, acho
moderna a partir de uma perspectiva fotográfica e decretar o fim do contemporâ- que o que existe é a tentativa de solucionar o jogo de
neo e o surgimento de um novo ciclo histórico: o Florescimento. necessidades psicológicas em um objeto”, afirma.

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comportamento

106 Ao lAdo, no sentido horário, “sem título (2011)”,


pinturA de Rafael CaRneiRo que se bAseiA em pAisAgem
retirAdA de um filme de Alfred hitchcock;
“JArdim fotográfico (2010)”, de andRé feliCiano, nA
exposição ecológicA (mAm/sp), e detAlhe de umA dAs
flores fotográficAs do JArdim; “pepitA (2011)”, impressão
JAto de tintA sobre pApel-Algodão, de Sofia BoRgeS

O problema é, na opinião do artista, que no mercado


de arte aquecido existe pouco espaço para a subjetivi-
dade. “Não posso negar que a pintura hoje é algo ven-
dável. Mas uma pintura minha leva um mês para ser
feita, cinco horas por dia. Ter uma galeria me obrigou
a ter a responsabilidade de trabalhar, mas a investi-
gação crítica nunca deixou de ser parte integrante do
trabalho”, defende um desencantado Carneiro, suge-
rindo que nem todo mundo que está pintando con-
segue conciliar demanda e consistência de pesquisa.

Transparência e opacidade
De família tradicional, Flávia Junqueira cursou direi-
to e filosofia antes de estudar artes também na Faap.
“A decisão pela faculdade de artes plásticas não foi
fácil. Cresci em ambiente familiar que sempre me deu
esTabilidade econômica fa
liberdade de escolha, porém, por estar imersa em um
contexto de valores mais tradicionais, me sentia pres-
sionada a escolher profissões que proporcionassem mances fotografadas, simulando o ambiente multicolorido de festas infantis
maiores garantias no mercado de trabalho”, conta. (pilhas de presentes, balões, casa de bonecas, flores), nos quais se insere vestida
Quando se formou, em 2009, a artista já tinha uma boa de menininha e com expressão melancólica.
inserção institucional com participações em salões e Flávia Junqueira e Sofia Borges trabalham em limites diametralmente opostos do
editais, e também no mercado. “Esse caminho me espectro da investigação fotográfica: a primeira se vale da transparência e a segun-
possibilitou começar a apresentar meu trabalho fora da, da opacidade. A melancolia do set infantil de uma tem, entretanto, um paralelo
da faculdade, o que despertou o interesse de galerias. com as indecifráveis encenações da outra, que modifica pouco o ambiente de forma
A maior dificuldade que encontrei foi entrar no mer- direta. As transformações desse set solitário e desolado são produzidas no interior
cado muito jovem. Tive de aprender a dividir o tempo do processo fotográfico, da iluminação ao processamento na ampliação.
entre dar continuidade ao processo criativo e admi- “Eu sempre soube que trabalharia em alguma área ligada à criação. Durante o
nistrar tarefas além da produção. Isso é muito difícil, colegial cheguei a resolver que seria escritora. Mas, quando, morando em São
pois estou em um processo inicial de construção do Paulo havia dois meses (aos 19 anos), visitei uma exposição de arte contemporânea,
trabalho. Percebo que muitos jovens artistas também me dei conta de que havia uma área do conhecimento na qual eu poderia exercer
acabam tendo essa dificuldade, da pouca experiência aquele tipo de prática. Ao me dar conta disso, decidi cursar artes plásticas”,
aliada à demanda comercial, o que pode comprometer lembra Borges, que já saiu da USP, em 2008, com galeria (Virgilio, em São Paulo).
a produção e a concentração”, desabafa. A entrada no mercado de arte é menos cristalina no caso de alguém trabalhan-
Um universo solitário de referências infantis marca do com performance. Felipe Bittencourt conta que sua inserção foi “bem torta”:
a produção de Junqueira. A artista realiza perfor- carioca vivendo em São Paulo, participou da primeira mostra coletiva no Rio de

fotos divulgação

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107
formance por dia durante o período de um ano, lan-
çando, assim, um desafio e tomando a ação de dese-
nhar diariamente como performance. Nenhuma foi
desenhada com o intuito de acontecer de fato. Não
havia limitações financeiras, lógicas ou de segurança
nas ideias desenhadas.”

Hegemonia de um
padrão de gosto
“A arte está cada vez mais colada na moda, operando
segundo uma mesma lógica: assim como as marcas
lançam coleções sazonais, também as faculdades e ins-
tituições lançam artistas sazonalmente”, analisa Dora
Longo Bahia. “Hoje, o jovem artista tornou-se uma
mercadoria, é uma commodity como as ações do mer-
cado de futuros, pois a arte reproduz o sistema econô-
mico”, continua. “A descontextualização da experiência
do artista em seu ateliê em relação à obra formatada
para estar nos museus e galerias é muito perversa.”
Com base em uma pesquisa de Tiago Mesquita para
o livro Pintura Brasileira Século 21, que a editora
Cobogó lança em fevereiro, a exposição no Instituto
Tomie Ohtake promove relações entre a onipresente
produção de pintura de nomes que despontaram no

a facilitou a profissionalização
Janeiro. “Meu trabalho foi extremamente desrespeitado, assim como o de muitos cenário da arte na última década com obras em outros
outros: um edital enganoso e um espaço precário que não atenderam a nenhuma suportes de colegas de geração. Mesquita, que é cocu-
exigência dos artistas. Decepcionado, não produzi por um tempo”, lembra. De rador da exposição, atribui a profissionalização dos jo-
uma série de decepções pessoais surgiu o projeto de realizar performances de vens artistas a fenômenos novos como a continuidade
limite físico, que foram os trabalhos que lhe deram projeção e renderam convites do processo democrático e, de seis a oito anos para cá,
para expor pelo Brasil em espaços institucionais e festivais internacionais. Um à estabilidade econômica do Brasil.
exemplo é a ação de apontar vários lápis durante três horas, até sangrarem os “Esse contexto permite uma continuidade na traje-
dedos. “Testo o limite do objeto e o objeto testa o meu limite”, explica o artista. tória dos artistas; não há muitos sobressaltos. Além
Bittencourt trabalhou na exposição Objeto Transitório para Uso Humano (2008), disso, há muita organização do meio de arte nos dias
de Marina Abramovic, na então Galeria Brito Cimino, na qual as pessoas podiam de hoje”, afirma Mesquita. A facilidade do acesso
interagir com os objetos e propostas da artista. “Minha função era performar a informações – seja pela quantidade de livros cir-
ações durante 12 horas, todos os dias, por um mês, como exemplo vivo e constan- culando na internet, seja pela facilidade de se fazer
te na exposição. Foi um contato muito forte e uma grande influência em minha uma viagem de formação – também contribui para
produção”, conta ele. “A constante crítica de que minha produção não renderia a continuidade de uma investigação artística, na opi-
dinheiro foi outro fator importante no meu processo como artista, porque resolvi nião do curador. “Parte da produção brasileira atual
produzir somente pela arte e não pelos seus fins financeiros”, observa. é muito marcada pela hegemonia do mercado inter-
Um exemplo disso é o belíssimo projeto de performance diária que Bittencourt nacional de arte, pela hegemonia de um padrão de
iniciou em 8 de dezembro de 2010. “Minha proposta foi fazer uma ideia de per- gosto, e isso é um problema”, diz.

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cultura digital

108

Line For Heaven


Você acredita que se for um bom menino vai para o céu
depois de morrer? Outras mil pessoas também. Elas fazem
parte dessa rede social para aqueles que acreditam que
existe vida após a morte. http://www.lineforheaven.com

C A D A
REMCloud
Teve um sonho louco na noite passada e não tem coragem
de contar para ninguém? A rede permite usar o Twitter
anonimamente para desabafar se você não tem dinheiro
para ir ao terapeuta. E, claro, fazer amizade com outros v
sonhadores por aí. http://remcloud.com

U
Ralvery

M
Rede social dedicada a quem gosta de tricô, crochê e bor-
dado. Porém, para entrar tem de mostrar algum trabalho
que você tenha tricotado. Boa sorte!
https://www.ravelry.com

MYFreeImplants
Quantas vezes você trocou o silicone? Não tem dinheiro
para aumentar seus seios? Essa é a rede social para quem
já fez ou quer fazer alguma cirurgia plástica.
http://myfreeimplants.com

fotos: divulgação

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LOSTZombies 109
Rede social para quem gosta, quer ser ou é fã de filmes de
zumbi. http://www.lostzombies.com

N Desde que a INTERNET se tornou


popular nos anos 1990, muito se fala
sobre SEU potencial de conexão.
Hoje, no auge da web 2.0, essa

O
noção de associação por afinidades,
contudo, beira as raias da bizarrice

Antes das redes formadas


pelos meios de comunica-

v Q U A ção, nós já vivíamos em re-


des: cidades, bairros, famí-
lias, e por aí vai. Também
é anterior ao fenômeno o
fato de nos sentirmos ins-
tigados a filtrar os tipos de

D R A
relações sociais que quere-

S mos estabelecer por meio


de afinidades. Mas algumas
vezes a organização dada
pelas redes sociais digitais
parece potencializar os ca-
minhos das pedras de um

E U D O
jeito muito juvenil. Tem-se a
sensação de não termos saí-
do daquela fase adolescente,
na qual só queremos andar
com nossos iguais, sem dar
muito espaço para a dife-
rença. Há quem diga, ainda,
que a rede social da internet
2.0 apenas reproduz em um
NiNa Gazire ambiente virtual as estruturas

Respectance.com
Essa é só para quem já morreu. Se você perdeu algum
ente querido pode registrá-lo nesta rede. Funciona como
uma espécie de obituário digital em tempo real, em que
também é possível compartilhar experiência sobre a dor do
luto. http://www.respectance.com

Redes sociais bizarras-RF.indd 109 1/27/12 9:56 PM


cultura digital

sociais preexistentes.
A plataforma aSmallWorld,
110 por exemplo, é uma rede que
só aceita triliardários bem-
-nascidos, que são obrigados
a mostrar o extrato bancário
para ser aceitos. A pretensão
de aSmallWorld é ser uma
Spiritual Community versão de um Country Club
Você prevê o futuro? Vê fantasmas? Esta é uma rede na web, porém de maneira
social só para médiuns, videntes e paranormais. muito inocente. É muito fácil
http://www.psychics.co.uk enganar alguém falsificando
dados e saldos bancários na
internet, não é mesmo?
De fato, essas características
do anonimato e da incerteza
nas redes sociais convivem,
ao mesmo tempo, com o
esgotamento da noção de
privacidade e intimidade. Se
na web 2.0 ficou mais fácil
descobrir o pulo de cerca do
HAMSTERster namorado, também ficou
Rede social só para quem gosta de hamsters. Sem mais mais fácil exacerbar as nossas
comentários. http://www.hamsterster.com
v personas: quem nunca entrou
em chat e fingiu ser loira
e alta que atire a primeira
pedra. As possibilidades
lúdicas tornaram-se infinitas
e hoje em dia encontramos
redes sociais para todos os
gostos e vontades. Conheça
aqui uma lista do que há de
mais estranho no quesito
rede social. Se antes “de
FUBAR perto todo mundo era louco”,
Uma rede social que pretende ser um pub virtual. Por meio
agora você pode escolher a
de webcams pessoas se reúnem para beber e falar sobre
cerveja. Só é permitida a entrada de maiores de 18 anos. distância aqueles que têm
http://fubar.com uma maluquice parecida com
a sua. Não se sinta sozinho.

Stache Passions
Para aquelas que são chegadas em caras de bigode, ou
para aqueles que querem cultivar um. Bigode hoje é coisa
de hipster. http://www.stachepassions.com

Redes sociais bizarras-RF.indd 110 1/27/12 9:56 PM


A MAIS ATUAL DESDE 1867

A MODA BRASILEIRA ESTAVA


ESPERANDO POR ISSO.

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Untitled-1 1 20/01/12 19:39


território / ocupações

112
RodRigo savazoni
Redes, ocupações, Revoluções:
o caminho da libeRdade é a Rua

Da Praça Tahir, no Cairo, meio do site colaborativo do Centro de Mídia Inde-


ao Occupy Wall Street e o pendente (CMI), lançado no fim da década de 1990,
que a cena se forjou. Aquele www.indymedia.org era
OcupaRio.org a sequência o ponto de encontro e de registro da história. E quem
virtuosa de ocupações e geria a infraestrutura, as máquinas, e detinha a pro-
priedade das informações eram os ativistas, e não uma
manifestações orquestradas grande corporação criada para extrair de nós o bem
em rede, estamos diante de mais valioso que hoje detemos: a informação. No Fes-
um dado novo que devemos tival CulturaDigital.Br, realizado no Rio de Janeiro em
dezembro de 2011, eu, ao lado de Ivana Bentes, Sergio
celebrar: a aceleração de uma Amadeu da Silveira, Cláudio Prado e Pablo Capilé, do
(des)organização que devolveu Circuito Fora do Eixo, chamamos uma arena – uma
roda de conversa embaixo dos pilotis do Museu de
a esperança às ruas Arte Moderna – com o mesmo mote deste artigo: re-
des, ocupações, revoluções. Tinha gente do OcupaRio
NAOMI KLEIN, uMA DAS GRANDES CABEçAS DA NOSSA GERAçãO, DI- que tomou a principal praça da capital fluminense, a
zIA há CERCA DE DEz ANOS quE, GRAçAS à NET, AS MOBILIzAçõES Cinelândia, e se desfez depois que a realidade desigual
DO MOvIMENTO ANTIGLOBALIzAçãO Ou ALTERMuNDISTA SE DES- das ruas brasileiras se impôs. Tinha um camarada
DOBRAvAM “COM POuCA BuROCRACIA E hIERARquIA MíNIMA”. Nes- do movimento dos moradores de rua, o pessoal do
sa época, tínhamos no governo dos Estados unidos um Bush filho proclamando Democracia Real Já! (Espanha) e da organização das
guerras em nome da liberdade. Nós, jovens ativistas, por nosso lado, gritávamos Marchas da Liberdade e OcupaSalvador (no Brasil).
bem alto essa mesma palavra – liberdade –, para que ela não sumisse, apropriada Tinha gente que foi muito atuante na época do alter-
por aqueles que gostam de sangue. O movimento foi à rua, nos dias de ação glo- mundismo, e também estiveram conosco os tropica-
bal que tiveram como epicentro as manifestações de Seattle (N30), Praga (S26) e listas Gilberto Gil e Jorge Mautner, que ocupam ruas
Gênova (A21), e no Fórum Social Mundial, cujas três primeiras e antológicas edi- e mentes desde os anos 1960, entre várias outras pes-
ções ocorreram em Porto Alegre, no Brasil. Como escreveu a jornalista e ativista soas. “Eu, sem dúvida, festejo e celebro o abraço afe-
Klein, em sua obra-prima No Logo, o livro que conta a história dessa balbúrdia tuoso que as novas gerações fazem a essas novas pos-
global, esse movimento já estava moldado pela internet “à sua imagem”, com uma sibilidades, o abraço maravilhoso que a gente dá no
dinâmica de “troca de informações constante, frouxamente estruturada e, às vezes, computador, no ciberespaço, no mundo digital. Mas
compulsiva”. Não é de hoje, portanto, que a internet é mais que um instrumento fica claro que isso não passa de mais uma ferramenta,
para a organização política. Poderia, inclusive, dizer que, criada pelo improvável de mais um instrumento, de mais uma oportunidade
arranjo descrito por Manuel Castells (big science + militares + contracultura), a para que a gente continue enfrentando as grandes di-
rede surgiu como um poderoso instrumento político, capaz de articular e desarti- ficuldades e os grandes problemas postos pelo rio da
cular todas as dimensões da vida. No caso do movimento altermundista, foi por história”, disse Gil naquele dia, fazendo uma espécie

As siglas N30, S26 e A21 significam respectivamente 30 de novembro, 26 de setembro e 21 de agosto,


datas em que esses eventos aconteceram, conforme o jargão dos manifestantes. foto: Anders GrAnberG/rex feAtures/GlowimAGes

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113

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114

de resumo do que foi o nosso encontro das redes de cultura digital. mil pessoas marcharam pacificamente. Na Turquia, as
Nossas redes nos deram a potência de tomar as ruas. O ano de 2011 mostrou isso. manifestações contra as tentativas de censura na rede
Foi uma época bem agitada da perspectiva da rearticulação do movimento liber- ganharam as ruas no mês de agosto e demonstraram
tário global. Começou em janeiro, em duas localidades: na Praça Tahir, no Cairo, que os jovens não pretendem deixar que essa infra-
onde jovens foram às ruas depois de se articularem por meio de sites de redes estrutura potencialmente emancipadora seja desarti-
sociais e depuseram Hosni Mubarak; e na Tunísia, onde a rede cumpriu papel de- culada pelos governantes. A explosão final ficou por
terminante na articulação das manifestações contra o ditador Zine Al-Abidine Ben conta do Occupy Wall Street, que começou em 17 de
Ali, que caiu. Era a Primavera Árabe, cujos ventos sopraram e refizeram a rota setembro, quando ativistas tomaram as ruas do centro
dos mouros em seu encontro com a Europa. Em 15 de maio, a Espanha também financeiro global. Em várias cidades dos Estados Uni-
se levantou com o movimento 15M (15 de Maio), que reuniu milhares de pesso- dos e de outros países, movimentos semelhantes tive-
as e produziu um enorme acampamento na Praça Porta do Sol, em Madri e em ram início. O Occupy Wall Street lembra que somos
outras cidades. No Brasil, o ponto alto foram as Marchas da Liberdade, que mos- 99% das pessoas do planeta que querem outra vida,
traram a cara de uma nova geração de ativistas. A marcha de São Paulo teve início não subordinada aos interesses de um capitalismo ge-
após a proibição e repressão à Marcha da Maconha, no início de junho. Vários nocida, e que o 1% que governa os mercados deveria
movimentos de todo o Brasil se reuniram e chamaram uma nova marcha para a nos ouvir. Em 15 de outubro foi feito um chamado de
semana seguinte, que novamente foi proibida. Desta feita, no entanto, cerca de 5 ação global. Isso me faz pensar que a história é cíclica

fotos: giselle beiguelman / studio select

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O cu pa ç õ es da s p ra ç a s p O r 115
j Ov e n s d O m u n d O tO d O
m Ost ra m q u e a p O l í t i ca d O
s é cu lO 2 1 pa ssa p O r n OvOs
fO r m atOs d e O r ga n i z a ç ã O

Dez anos atrás,


montavam-se protestos
nos momentos em
que os líderes da
globalização se reuniam
e, como num passe de
mágica, as cúpulas
e as manifestações
se dissolviam. Agora
as ruas estão cheias
de pessoas que não
pretendem ir embora, até
conseguirem o que foram
nelas buscar

e que ainda estamos nos primórdios dela. Houve vários outros momentos em que ra, até conseguirem o que foram nelas buscar. Além
as novas tecnologias desempenharam papel central em processos políticos, como disso, chamou a atenção para o caráter pacífico das
no caso do Irã, em 2009, ou mesmo da mobilização espanhola após os atentados ocupações. Há dez anos, o movimento tolerava pro-
de 11 de março de 2004, quando a população, por meio de tecnologias móveis, testos violentos, os quais, em geral, eram articulados
convocou uma manifestação contra o primeiro-ministro que havia mentido sobre pelos Black Bloc, uma tática de protesto radical que
a razão da explosão no metrô. A culpa era da Guerra do Iraque, para a qual José resultava em destruir símbolos do capitalismo, como
María Aznar tinha enviado tropas e não uma ação de radicais do ETA. A partir de lojas do McDonald’s e outras grifes. Esses atos faziam
2011, no entanto, com a sequência virtuosa de protestos, manifestações, ocupações com que, na imprensa mundial, toda a articulação
e revoluções orquestradas em rede, nos colocamos diante de um dado novo, que fosse vista como violenta, o que não era o caso. Nos
devemos celebrar: a aceleração dessa (des)organização que devolveu a esperança movimentos em rede atuais, impera a política da afe-
às ruas. Em sua ida ao Occupy Wall Street, Naomi Klein disse que duas caracte- tividade, o olhar ao outro e a ideia de que precisamos
rísticas diferenciam o movimento atual daquele iniciado na virada do século. Em reinventar as práticas de sociabilidade por inteiro. E já
primeiro lugar, destaca ela, as manifestações não são esporádicas. São ocupações. aprendemos: o caminho da liberdade é a rua.
Dez anos atrás, montavam-se protestos nos momentos em que os líderes da glo- Acesse o resumo do encontro com Gilberto Gil no
balização se reuniam e, como num passe de mágica, as cúpulas e as manifestações Festival CulturaDigital.Br em (http://www.ustream.tv/
se dissolviam. Agora as ruas estão cheias de pessoas que não pretendem ir embo- recorded/18903392)

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crítica
116

carlos jiménez, de madri

atenção Às evidências
exposição de antoni Muntadas no Museo Reina sofía mapeia as reflexões
do artista sobre o ambiente midiático que define a atualidade

fotos: oscar Balducci, Joaquín cortés/román lores

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117

Muntadas está entre os artistas que


Melhor respondeM aos desafios apre-
sentados por nossa época, tão radicalmente
marcada pelo propósito compartilhado entre estado
e Mercado de moldar ao seu gosto a vida cotidiana,
a vida comum. esta é a conclusão definitiva ofereci-
da pela visita à grande exposição sobre sua obra, em à esquerda , insta l aç ã o T he boar d ro o m ( 1 9 87 );
cartaz desde novembro de 2011 e que vai até março de acima , mi rar V e r Pe rc i bi r (2009)

2012, no Museu reina sofía de Madri, que mostra tan-


to a riqueza poliédrica de seu trabalho quanto seu obs-
tinado interesse pelos meios e técnicas que permitem
essa crucial manipulação. a grande mostra no reina sofía inclui ainda outra
na busca de seus objetivos, Muntadas optou com fre- obra emblemática do artista: stadium, que interroga
quência por uma tática que não é descobrir o que está tanto a história de um arquétipo arquitetônico ori-
escondido, mas chamar a atenção sobre o que é eviden- ginário do circo romano quanto os usos esportivos
te. foi assim que ele realizou, em 1980, The limousine e políticos que ele tem em uma sociedade definitiva-
project, colocando para circular em Manhattan uma mente entregue ao espetáculo. cabe mencionar ain-
imponente limusine preta com vidros escuros e monito- da situación 2011, uma intervenção realizada entre
res de vídeo nas janelas traseiras, exibindo imagens que os edifícios de francesco sabatini e Jean nouvel, que
enfatizavam os traços enigmáticos desse símbolo de po- servem de sede ao reina sofía. esse trabalho anali-
der e status social característico de nova York. nenhum sa tanto as diferenças entre edifícios de épocas tão
nova-iorquino ignora a existência desses automóveis, distintas quanto as existentes em termos de políticas
mas é provável que poucos deles, antes da intervenção expositivas e concepções museográficas que orienta-
de Muntadas, tenham se dedicado a refletir sobre a os- ram o projeto inicial do centro de arte reina sofía e
tentação de poder que o seu uso faz supor. o atual Museo nacional centro de arte reina sofía.
essa estratégia elíptica valeu a Muntadas o questio- em relação à importância da televisão na obra de
namento eficiente de duas maneiras muito poderosas Muntadas, deve ser dito que ele qualifica de Media
de controle da vida contemporânea: a arquitetura e as landscape (paisagem Midiática) o ambiente eletro-
mídias. a exposição traz architektur/räume/Gesten, acústico que tem na televisão seu principal meio de
peça crucial de 1991, composta da reunião, em uma sé- realização e projeção. na exposição sobram exem-
rie de slides, de imagens de exteriores de edifícios im- plos do que Muntadas fez com essa paisagem, come-
ponentes com imagens de escritórios onde se tomam çando pelas tentativas de democratizá-la, nos anos
as decisões e os gestos corporais característicos dos 70, com os projetos de televisão comunitária cada-
que efetivamente comandam essas decisões. a arquite- qués canal local e Barcelona distrito uno. ou ain-
tura revela-se nessas imagens como um dispositivo de da de sabotá-la, como em acción tV, que pretendia
poder formalmente congruente com a retórica gestual interromper as transmissões normais da televisão
daqueles que o agenciam e representam. com um vídeo em que o artista aparece com a letras
o mesmo assunto ocupa a instalação de t e V tapando seus olhos.
Antoni Muntadas -
1987, The Board room, uma grande sala talvez o projeto com formato televisivo mais ambi-
Entre/Between, Museo
de reuniões na penumbra, de cujas pare- cioso do artista catalão seja o que explora o medo,
Nacional Centro de Arte
des pendem retratos de 13 personalida- sentimento que divide mais do que as fronteiras fí-
Reina Sofía, Madri, Espa-
des religiosas, políticas e televisivas, com sicas. esse assunto aparece em duas versões: fear/
nha. Até 26 de março
um pequeno monitor de vídeo em vez da Miedo, realizada na fronteira entre tijuana (México)
boca, emitindo fragmentos de seus dis- www.museoreinasofia.es
e san diego (eua), em 2005, e Miedo/Jauf, realizada
cursos habituais que, sobrepostos, geram na região do estreito de Gibraltar, entre tarifa (espa-
um rumor ininteligível. nha) e tanger (Marrocos), em 2007. impressionantes.

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crítica / televisão
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Juliana Monachesi *

O shOw tem de parar


reação da rede Globo à denúncia de estupro no BBB escancara
moralismo, sexismo e equívocos de um formato que se mostra
obsoleto diante dos novos sistemas de controle pulverizado

A 12ª edição do Big Brother BrAsil co- nique para protagonizar uma cena de sexo. o programa de domingo mostrou
meçou mAl: no primeiro diA dA gincA- cenas dos dois na cama, os corpos escondidos sob um edredom, e o rapaz reali-
nA gloBAl (terçA, 10 de jAneiro), os 16 zando movimentos indubitavelmente correspondentes aos de um ato sexual. A
pArticipAntes se comprimirAm den- cena foi arrematada por Bial com a infame frase “o amor é lindo”, a pérola que
tro de um cArro pArA disputAr umA faltava para adornar sua brilhante carreira de jornalista.
imunidAde (regAliA de não poder ser no programa de segunda-feira 16, após a enxurrada de protestos em redes so-
mAndAdo pArA o pAredão nA primeirA ciais e na blogosfera, a direção do BBB consentiu que houve algo de podre no
semAnA). Quem aguentasse mais tempo no carro reino da dinamarca. pedro Bial anunciou que daniel havia sido eliminado do
– privado de água, comida e sono – ganhava a prova programa por comportamento inadequado. e arrematou: “o show tem de conti-
(e também o carro). Quando foi ao ar o programa do nuar”. A partir daí, tudo se passou como se o participante nunca tivesse existido.
dia seguinte, o apresentador pedro Bial comunicou ninguém tocou mais no assunto, obviamente sob coerção, direta ou internaliza-
aos espectadores que três participantes permane- da, do grande irmão.
ciam na disputa e, orgulhoso, afirmou que dali a 20 o que é mais perverso? endossar um suposto crime – veiculando imagens no
minutos a prova de resistência completaria 24 horas. mínimo duvidosas em um contexto de romance – ou vetar, em seguida, qualquer
considerando que dois dos três heróis da resistência menção ao assunto? um crítico de televisão comparou o episódio da mudança de
eram mulheres, e que 24 horas sem esvaziar a bexiga postura da globo, do domingo para segunda, com a manipulação da cobertura
pode causar infecção urinária, o mais razoável que do comício das diretas já, em 1984, mascarada em festa pelo aniversário de são
se podia esperar da produção do reality show era que paulo. “2012 não é 1984”, concluiu o crítico.
a imunidade fosse concedida aos três e a prova ter- Vale notar que tampouco 2012 é 2002, quando a primeira edição do BBB foi ao
minasse ali. Ao final do programa, no entanto, Bial ar. naquela temporada de estreia, por exemplo, a mesma competição de perma-
apenas comemorou o marco das 24 horas e os teles- nência dentro de um carro durou “míseras” 14 horas. os participantes têm mais
pectadores viram a atração acabar com a cena dos resistência física dez anos depois? não. eles resistem melhor ao funcionamen-
três abandonados à própria sorte dentro do veículo to de reality shows. na quarta 18, monique se esbaldou na festa seguinte à do
(a prova terminou seis horas depois, batendo todos “incidente” e, em conversa com outra participante, contou que brincava de Big
os recordes de edições anteriores). Brother quando era criança – “A gente tinha uma poltrona na sala que a gente
prenúncio de que o programa seria recordista em filmava e fazia de confessionário”, disse. em 2002, ela tinha 13 anos, assim como
excessos por parte de seus diretores? três dias de- a maioria dos integrantes desta 12ª edição. esta é uma geração que cresceu vendo
pois, ocorreu a festa em que, supostamente, daniel BBB, conhece todos os seus códigos e, provavelmente, não considera o filme o
se aproveitou do estado de semiconsciência de mo- show de truman (1998) uma metáfora distópica.

foto frederico rosado

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o que é mais perverso:


endossar um suposto crime
– veiculando imagens no
mínimo duvidosas em um
contexto de romance – ou
vetar, em seguida, qualquer
menção ao assunto?

vítima ou atriz numa fa rsa pó s -o rw ellia na , mo niqu e é o c e n t ro das at e n ç õ es

Outro motivo por que 2012 não é 1984 (nem 2002) de real nesse “show da vida”, esvaziando o interesse por ele. Manter a transmissão
é a vigilância distribuída, este novo player do jogo aberta pode desembocar em novas infrações de preceitos do Código Brasileiro de
que coloca em xeque o modelo de vigilância advo- Comunicações, que prevê, entre as sanções cabíveis, desde multa até a interrupção
gado pela Globo na condução do BBB. Esse modelo dos serviços. Não seria hora de rever as regras do jogo?
de controle centralizado foi apropriado da figura li- Entretenimento tem limite e televisão não é coliseu. O diretor do programa, em
terária de George Orwell para dar o falso poder de uma última manobra de manipulação, chamou o público de racista. Preconcei-
controle à audiência (por meio da votação para deter- tuosa foi a postura dele, ao usar a raça do participante para chamar aqueles que
minar quem sai e quem fica) sobre os albergados na denunciaram o episódio de burros. Mobilizações em resposta aos desmandos da
casa “vigiada”. A emissora disponibiliza durante direção do reality mostram que a inteligência é mesmo coletiva. O Movimento
24 horas imagens em tempo real da casa cenográ- Defesa da Mulher, do Rio de Janeiro, e dois outros coletivos de direitos humanos
fica tanto em seu site quanto por meio de sistema decidiram atacar o inimigo pelo bolso e enviaram uma carta de apelo aos patroci-
pay-per-view na tevê a cabo, para garantir a cre- nadores do BBB para se posicionarem em nome da responsabilidade social.
dibilidade da edição. Então, como imaginar que Com participantes e espectadores ultraespecializados na novela do século 21 que
interpretações moralistas, sexistas e cínicas dos a Globo foi pioneira em criar (nos outros 23 países onde a atração da holandesa
fatos serão engolidas em massa por um público Endemol é replicada, não ocorre nem de longe a mesma repercussão na socie-
que, paralelamente, compartilha sua própria inter- dade), ou bem ela faz radicais transformações no formato – como, por exemplo,
pretação em um sistema de controle pulverizado, admitindo um processo de edição tão compartilhado quanto a função de vigilân-
desmascarando qualquer manipulação: a internet? cia – ou, como escreveu uma amiga no Twitter, depois do ”show must go on” do
Tirar do ar o streaming do Big Brother seria como ex-repórter, opta pela saída mais nobre: “The show must stop”.
assinar uma declaração oficial de que não há nada *
Colaborou NiNa Gazire

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reviews

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Exposição

HETERoTopiAs
conTEMpoRânEAs
GisEllE bEiGuElMAn

Em mostra retrospectiva, Jac Leirner exibe Na págiNa ao lado, a ção. Mais do que desfazer a lógica das sintaxes previ-
iNstalação Nomes, com
a arte de monumentalizar o cotidiano pela síveis, o conjunto em exposição brinca com as nossas
sacolas plásticas; acima,
ironia da noção de valor a aquarela 4 yellows, de referências mais sutis e também arraigadas. Desfaz
Um dos segredos do fascínio que as listas provocam Jac leirNer a relação entre valor e perenidade, por operações de
é sua ambivalência. Elas, aprendemos com Umberto inversão que transformam o transitório (como o ano-
Eco, oscilam o tempo todo entre a abertura para um nimato das frases escritas em notas de 100 cruzados)
infinito et cetera e um mundo que se fecha em si mes- em monumento: o Livro (dos cem), de 1987. E o pró-
mo. Impossível não pensar nisso ao visitar a retrospec- prio dinheiro é transformado em objeto descartável.
tiva de Jac Leirner, em exposição na Estação Pinacote- Leirner problematiza, como assinala o curador da
ca do Estado de São Paulo. exposição, Moacir dos Anjos, “os padrões formais
O conjunto de 60 obras, realizado entre 1980 e 2011, é estabelecidos pelo racionalismo nos movimentos
uma sequência de projetos que reorganiza, metódica artísticos (Arte Concreta e Minimalismo)”, e se ins-
e delirantemente, elementos do cotidiano. Para criar, titui, como referência da arte que inquieta porque
a um só tempo, um universo próprio e um jogo que nos impede, como as heterotopias de Foucault, de
poderia não terminar jamais. nomear “isso e aquilo”.
As obras são construídas com cartões de visita, co-
bertores, saquinhos de vômito e cinzeiros de avião,
etiquetas de preço de maços de cigarro, cédulas de ARTE
dinheiro, sacolas plásticas de lojas, adesivos, rolos de
Durex, coleções de todos os portes, cores e formas. MiRAdA sobRE A coR
No conjunto, constituem uma enciclopédia do sécu-
lo 20, cuja única variável constante parece ser a sua ivAn clAudio
capacidade de “perturbar todas as familiaridades do
pensamento”, como escreveu o filósofo Michel Fou- Com curadoria exemplar, retrospectiva
cault no prefácio de As Palavras e as Coisas. de Carlos Cruz-Diez, em Buenos Aires,
Foucault comentava aí um texto de Borges, em que persegue a materialidade da cor na obra
ele discorre sobre uma enciclopédia chinesa que as- do artista venezuelano. A grande retrospectiva
sim enumerava a divisão dos animais: “a) Pertencen- dedicada ao artista franco-venezuelano Carlos Cruz-
tes ao imperador; b) Embalsamados; c) Domestica- Diez, em cartaz no Museo de Arte Latinoamericano
dos; d) Leitões; e) Sereias; f) Fabulosos; g) Cães em Ja c Lei rn er, Esta ç ã o de Buenos Aires (Malba), até 5 de março, é exemplar
liberdade; h) Incluídos na presente classificação; i) Pinacoteca. Largo General por vários motivos. Organizada originalmente
Que se agitam como loucos; j) Inumeráveis; k) Dese- Osório, 66 . Tel. (11) 3334- para o Museum of Fine Arts of Houston, no Texas,
nhados com um pincel muito fino de pelo de camelo; 4990. De terça a domingo, a mostra reúne apenas obras de primeira grandeza
l) Et cetera; m) Que acabam de quebrar a bilha; n) das 10 às 18h00. R$ 6 e R$ 3 – o que, de resto, deveria ser o objetivo de qualquer
Que de longe parecem moscas”. (meia). Grátis aos sábados. retrospectiva. Ao dispô-las segundo a simples
Essa ordem, que paradoxalmente desordena as certe- Até 26 de fevereiro cronologia, a curadoria minimiza a intervenção,
zas, é o que as obras de Jac Leirner põem em circula- esconde a escolha meticulosa e chega a passar a falsa

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Livros

A cor ocupA o espAço em


Em busca do ovo
ideia de um artista em evolução ascendente, sem altos e
baixos. Sob essa falsa aparência, no entanto, identifica-
obrA AmbienAl de cArlos
cruz-diez, no mAlbA, em
buenos Aires
da sErpEntE
se o vetor que, se não orienta totalmente a produção
de Cruz-Diez, termina por ser a visão norteadora da angéLica dE moraEs
curadoria, assinada pela diretora do MFAH, Mari
Carmen Ramírez. E qual seria essa mirada? A cor, Em O Cemitério de Praga, Umberto Eco
Carlos Cruz-Diez: El Color
em sua materialidade pura, evidenciada no título da cria um romance de enorme voltagem de
en el Espacio y en el Tiempo,
retrospectiva, El Color en el Espacio e en el Tiempo. denúncia política Não é uma leitura fácil nem
até 5 de março. Malba –
É fácil perceber a cada segmento da mostra como, o autor pretendeu criar um mero entretenimen-
Fu nd a c ió n C osta ntini,
a partir da fase figurativa inicial, a cor começa a to. “Apenas editores de livros e alguns jornalistas
Buenos Aires, Argentina
se desprender da forma e como a própria forma se acreditam que o público quer coisas simples. O
desprende do fundo e nega o suporte. Esse processo público está cansado de coisas simples e quer ser
é visível também em artistas que buscaram a desafiado”, diz Umberto Eco sobre seu romance O
tridimensionalidade e o ambiental, a exemplo de Cemitério de Praga.
Hélio Oiticica e Lygia Clark, mas numa retrospectiva O novo livro do escritor, teórico da comunicação e
tão completa como essa de Cruz-Diez – que soma 120 bibliófilo italiano situa a ação na segunda metade
peças de coleções como da Tate Modern, do Centre do século 19 e segue o estilo literário praticado na
Georges Pompidou, da Daros Latinamerica, de época, com acréscimos de flash-backs do cinema do
Pratricia Phelps de Cisneros etc. – se chega ao ponto século 20. Narra as aventuras farsescas e escusas de
do didatismo. O trabalho de Cruz-Diez tem raízes na Simone Simonini, exímio falsificador de documen-
pop art e na arte cinética, mas foi tão aprofundado na tos cartoriais que, à noite, se disfarça para assumir a
fisiologia da percepção e nos fundamentos da física e personalidade do abade jesuíta Dalla Piccola.
da óptica que acabou por abrir uma trajetória singular, Eco volta a um de seus temas prediletos: a conspira-
afastando-o de conterrâneos como Jesús Soto – é bom ção. Assim como no seu famoso romance de estreia
ter em mente que o cinetismo teve terreno fértil no (O Nome da Rosa, 1980), há um mistério a ser re-
país de Hugo Chávez. solvido. O crime? A falsificação de um documento.
Isso fica patente na série de Fisiocromias (40 ao todo), A dúvida: quem é o falsificador? Nesse momento,
cujas linhas de cores em sequência vertical, algumas como em inúmeros outros ao longo da narrativa,
delas saltando do quadro, têm as tonalidades alteradas misturam-se fatos reais e inventados. E surge até
de acordo com a incidência da luz ambiente. Outra um doutor Froïde, referência ao pai da psicanálise,
série, Cor Aditiva e Indução Cromática, trabalha com Sigmund Freud, contemporâneo da ação narrada.
o princípio da persistência retiniana – o olho cria uma A falsificação realmente aconteceu e é a questão
cor virtual ao se expor a duas cores complementares. central de todo o livro. A investigação é pela autoria
São conceitos que se repetem e ganham plenitude nas de Os Protocolos dos Sábios do Sião, texto apócrifo
três obras ambientais que fecham a mostra. Ao escolher escrito no século 19 para denunciar suposta conspi-
Cruz-Diez para comemorar os dez anos de existência, O Cemitério de Praga ração dos judeus para dominar o mundo. Esse texto
o Malba reafirma a sua aposta no embaralhamento Umberto Eco, Editora forjado foi amplamente citado como verdadeiro no
de noções entre centro e periferia e busca os pontos Record, 480 págs. R$ 49,40 livro Mein Kampf (Minha Luta), de Adolf Hitler,
comuns a uma experiência latino-americana. São (papel), Breve em e-book fornecendo as bases teóricas que resultaram no na-
questões que certamente virão à luz quando a mostra zismo e no Holocausto.
chegar ao Brasil, em julho, na Pinacoteca do Estado, e Equilibrando-se entre ficção e história, Umberto
poderá ser aproximada, por exemplo, ao trabalho de Eco traça uma envolvente narrativa que busca as
Abraham Palatnik e Lothar Charoux. origens do antissemitismo. Nota-se que o teórico da

Fotos: Divulgação

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comunicação dirige a cena escrita pelo ficcionista.


O personagem Simonini/Dalla Piccola encarna to-
dos os preconceitos repugnantes veiculados em Os
Protocolos e os defende em minúcias já no início do
livro, criando uma barreira quase intransponível
aos que não notam esse artifício da ficção de Eco.
A leitura literal apontaria uma defesa do antisse-
mitismo, mas Eco está denunciando pelo avesso e
pela ironia mordaz. Afinal, como observa o escritor,
o que lhe interessa é a influência dos documentos
forjados na construção da história. “Uma das prin-
cipais características da linguagem humana é a pos-
sibilidade de mentir. O cão não mente. Quando ele
late, isso significa que há alguém lá fora.”

Cinema

Sobre relógioS
e filmeS
O herói hugO, sua amiga
isabelle e O autômatO no momento em que o nome Méliès é pronunciado.
prOtagOnizam lOnga-
metragem de scOrsese
Em uma cena luminosa, Hugo descobre que Tio
Paula alzugaray sObre a Origem dO cinema Georges (Ben Kingsley), o vilão da loja de brinquedos
e padrinho de sua única amiga, Isabelle (Chloe
Martin Scorsese presta homenagem ao Grace Moretz), é, na realidade, um grande mestre
mestre Georges Méliès em seu primeiro do cinema, do ilusionismo e dos efeitos especiais.
filme para crianças Esquecido. Como num passe de mágica, o que
Martin Scorsese conduz a cena de abertura de era sentimental torna-se comovente. Ilumina-se a
seu primeiro filme, realizado em 3D e destinado a história e volta-se aos primórdios, quando a ideia de
públicos de todas as idades, com uma trilha sonora cinema nasce para o ator e prestidigitador Georges
ostensiva e um plano-sequência com movimento de Méliès, depois de assistir às primeiras projeções de
câmera de tirar o fôlego. A câmera logo acalma, mas Atualidades dos Irmãos Lumière.
a trilha prossegue grandiloquente, acompanhando São deslumbrantes os remakes que Scorsese faz
o drama do menino órfão e maltrapilho Hugo (Asa dos filmes de Méliès, que foram mais de 500 – com
Butterfield), que vive de pequenos furtos e de dar personagens tão fantásticos quanto sereias, diabos
corda nos relógios de uma estação ferroviária na e lagostas alienígenas –, mas que foram em sua
Paris do início do século 20. maioria destruídos com a Primeira Guerra Mundial,
Hugo passa seus dias entre as fugas de um policial juntamente com os sonhos e as fantasias da sociedade
pastelão (Baron Cohen), as duras disputas com europeia da época. De escola realista, o diretor de
um velho ranzinza proprietário de uma loja de Hugo, direção de Martin Touro Indomável e Os Bons Companheiros não se
brinquedos e as tentativas frustradas de consertar Scorsese, EUA, 126 minutos deixa impregnar pelo lirismo surrealista de Méliès.
um boneco autômato, herdado do pai. Sob a tensão Previsão de estreia no Brasil Em vez dos truques ilusionistas do mestre a quem
de longos acordes sentimentais, a melancolia dá o 17/2 homenageia, prefere dedicar-se às metáforas entre
tom do primeiro terço do filme. Mas Scorsese começa relógios e cinema. Ainda assim, o espectador não
a revelar a que vem no momento em que conclui a vê o tempo passar, até que o grande diretor de Uma
fase de apresentação dos personagens. O flerte com o Viagem à Lua (1902) seja redescoberto na estação de
clichê e a sensação de déjà vu ganham um acorde final Montparnasse.

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colunas móveis / fronteira

Douglas Diegues
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City Maravishoza

Toneladas de muamba son konfiscadas


todos los años en los asfaltos selvagens
do Rio de Janeiro pero igual todos los dias
son comercializadas klandestinamente
toneladas de muamba nel kamelódromo
de la calle Uruguaiana entre los edificios
históricos del centro antiguo assim como
assim en otras calles de otros bairros de la
zona sul y de la zona norte y del resto de la
city maravishoza
Buena parte dessa muamba es muamba triplefrontera
procedente de várias partes del mundo y que adentra la
selva urbana carioca generalmente via Paraguaylandia para
animar la fiesta de los pobres y los ricos que se deliciam
con el contrabando exótiko. Kontrabando de brinquedos,
fetiches de pelúcia y plástico, eletrônicos, objetos que hablan,
brinquedos para crianzas adultas y para adultos crianzas,
sensaciones de plazer seudo refinado primermundista a y dá choke. ¿Cómo se llama essa porkería? Se llama choke. ¿Y para
precios baratellis, obscuros y claros objetos del deseo de qué sirve? Para assustar a las personas com choke eléctrico me lo
miles de consumidores infantilizados por los atributos de la kontesta un vendedor pedestre que camina por las calles ofrecendo
magia kapitalista, que nunca perdona un miserable centavo. um arsenal de pequenas bugingangas, incluso remédios tipo Pramil
Exotismo kitsch, exotismo posmo, exotismo brega, exotismo e Viagra avulsos, para los viejos faunos turistas que están yirando
chic, tudo es exótico bajo los sovacos del cristo redentor. por el sábado salvaje.
Para ficar por dentro de las nobidades es necessário disponer Pero los brinquedos mais rarófilos que pueden ser ubikados nel paradizo
de uma rede de informaziones de negocios prohibidos. del contrabando exótiko son los brinqueditos erótikos. Vibradores de
Lo mais óbvio proveniente de Paraguaylandia son los 15 hasta 25 cm para yiyi ninguma poner defectos. Vibradores com
eletrónicos, los brinquedos de fumar tipo crack, maconha, dois falos de borracha flexible para dupla penetracione simultanea
cigarros importados, cigarros paraguayos falsificados, y unipersonal, además de los famozos falos hespanholes para duos
los brinquedos de matar: fuzil AR15, metralhadoras uzi, de amantes lesbis. Porongos de chocolate podem servir para hacer
lanza míssil de fundo que quintal, pistolas 765, revólver um regalito pascualino a la novia ou ser degustados tipo sobremesa
taurus 38, espingarda calibre 12, armamento pesado en la cama redonda de los moteles del suburbio ou de la zona chic.
para rebolucionário ninguno reclamar. La pirataria y el Algunos vibradores, que loco puede ser todo, tienen cara de duende.
contrabando muebem juntos mais de 1 trillón de reales por Y hay vibradores que tienen cara de teletubies pokemonizados!
año en todo el mundo. Trata-se de una suma dos vezes más Pílulas levanta defunto também tienen expressivo público. Gorra de
alta que la movida por el narcotráfico. marinero y de kapitán, tipo Querelle fassbinderizado, para fantasias
En Brasil son sonegados cerca de 30 millones de reales por carnavalescas erotikonas gay, trans ou hetero. Hay cassetetes também,
año. Muitas vezes com ajuda ofiziale. En los dias que corren, para los desesperados, los famosos cachiporros policialescos, y
miles de brinquedos esperan los consumidores nel mercado chicotinhos, para los domadores de humanos. Hay que ver para creer
posmo klandé de muamba rarófila de la guanabara. Una de de que modo la ficción del contrabando exótiko supera diariamente la
las nobidades es un aparelho inútil que faz um ruído idiota realidade aduanera de la city maravishoza…

À esquerda, douglas diegues; À direiTa, ilusTração sobre foTo de Theo Wargo/Wireimage

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colunas móveis / música

Tony BelloTTo
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roqueiro não envelhece?

Numa Noite coNturbada, em que delírios


etílicos se misturam às faNtasias eróticas de
praxe, toca o telefoNe. Vislumbro entre névoas de
remela o iphone: 3h15 da matina.
“alô?”, balbucio, zoado.
É a esfinge. ela me liga de vez em quando, sempre me propondo
enigmas inúteis em horários proibitivos.
“isso é hora, esfinge? 3h15?”
“roqueiro de merda”, diz a esfinge – sim, não há cerimônias
entre nós –, “você não era assim, belo”.
uma pausa rápida, para que se entenda um pouco mais da
esfinge: ela fala com sotaque italianado, com um timbre de voz
idêntico ao da falecida atriz Nair belo (às vezes, acho que a
esfinge é a Nair belo).
“o tempo passa, esfinge. as coisas mudam. Não tenho mais
25 anos nem a mesma predisposição para atravessar em claro
noites escuras.”
“ah, você fala como o corvo, de edgar allan poe! só falta me
dizer agora: ‘Nunca mais’.”
“Nunca mais o quê, Nair?”.
“por que você sempre me chama de Nair?”
“essa é a pergunta que você quer me fazer? quer dizer que a
esfinge me liga às 3h15 da manhã só pra saber por que eu às
vezes a chamo de Nair? Você também não era assim, bela.”
“Vá tomar no cu, italiano de merda. minha pergunta é: por que
roqueiro não envelhece?”
e desliga.
Não sei vocês, mas, quando a esfinge me propõe alguma
questão, preciso responder, sob pena de ser devorado – sou um
titã, afinal, envolvido até as vísceras com a mitologia grega,
vocês entendem.
levanto-me, vou até o banheiro e me encaro no espelho: por
que roqueiro não envelhece? como assim? à minha frente
está um sujeito razoavelmente enrugado, com cabelos brancos
nas têmporas, testa cada dia mais larga, manchas senis no
rostinho cansado de um cinquentão conservado em barris de
carvalho, exalando pelos poros os profundos questionamentos brian Jones, Kurt cobain, bradley Nowell, renato russo, cazuza,
de um homem de meia-idade: será que creme de babosa retarda marcelo fromer, cássia, John lennon, elvis, raul. mas e os que não
mesmo a calvície? tenho certeza de que esses pneuzinhos morreram?, pergunta aquela metade de mim que vive enchendo o
estavam menores ontem à noite. saco da outra: mick Jagger, iggy pop, Keith richards… peraí, Keith
eureka!, penso de repente. Já sei por que roqueiro não richards não é velho? ele é o quê? um maracujá guitarrista?
envelhece! pelo simples fato de que roqueiros morrem antes Volto pra cama. amanhã vou dizer à Nair belo que ela precisa ler o
de ficar velhos: Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim morrison, retrato de dorian Gray, de oscar Wilde.

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selects / acessórios

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Raquel Rennó E l m ed i co d e m i h i j @ Nerd B a by

GooGle-dadá
na cabeça! b i t .ly/9 G RyGO b i t .ly/sWq wOV

Adultos falando tatibitati, pediatras xiitas, U m blog fe ito p or um exp e r ie nte Produtos para o seu pequeno cientista,
barrigões embrulhados para presente. Há p e dia t ra q ue t ra t a com res p e ito a s mesmo que ele ainda esteja no berço.
vida inteligente no mundo da maternidade? d úv ida s dos pa is e ev it a os ra dica lis m os
Alguns sites mostram que sim. e exces sos t ã o na m oda a t ua lm e nte.

Code Babies P i k ku Ka k ko n en Pregn a n cy Chicke n

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Livros como HTML para Bebês e CSS para Se o seu bebê é pequeno demais para “Porn para grávidas”, “
Crianças podem ser encontrados neste entender uma conversa, não há melhor Povo da Walmart: uma exploração do incrível”,
site. Como diz Dan Frommer, do site de modo de interação que entrar na onda. “Ideias de fantasia de Halloween para grávidas”
tecnologia SplatF, “Ensine seus filhos a Site com excelentes games, vídeos são apenas alguns dos posts que podem ser
codificar, não a falar chinês”. e áudios educativos para crianças. encontrados neste site que entende de verdade
Totalmente em finlandês. o humor tão especial da gravidez. E sem culpa.

Stark Raving Ma d Mom my Ra n ts f ro m m o m my la n d Ac kwa rd fa mily photos

bi t . ly/93 J gfg b i t .ly/9 Pn n ur b i t .ly/S FoVl

M a tern ida d e ri m a t an to co m fel i c i d ad e No site são discutidas dúvidas do mundo Este blog já é um clássico da web,
qu a n to co m i n s an i d ad e e o b log t rat a materno como: “Era pra ser assim tão difícil?” continua valendo mais que muitas
desses temas co m m u i t a i n tel i g ên c i a. “Isso é normal?” “Que cheiro é esse?”. sessões de terapia para traumas pós-
festas de fim de ano e reuniões familiares
em geral.

My milk toof Super Duper Raquel Rennó

é professora do
Departamento de
bi t . ly/c IH 4 I H b i t .ly/xO8l 7 T
Artes e Design da
UFJF, consultora dos
Dentinhos de leite retratados em várias Um blog sensato, sem regras e ameaças, cursos de extensão
aventuras. Para explicar para onde eles com muita informação de quem topou a universitária em
vão depois da visita da fada do dente. maternidade como ofício. Arte e Tecnologia da
Universitad Oberta de
Catalunya (UOC) e mãe
de Sofia, de 8 meses

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EM FEVEREIRO NAS BANCAS

www.gooutside.com.br
obituário

128

PC - computador
pessoal (1971-2012)

Soberano inconteste
dos lares e empresas
do fim do século 20, o
computador chega ao
fim da primeira década
do século 21 como
trambolho dos tempos
da imobilidade

Nascido nos anos 1970, o computador pessoal (PC) parecia con- – com tesoura – e colagem com incontáveis tubos de cola Prit.
solidar as utopias acalentadas por décadas na ficção científica, No começo tinham nomes, como Commodore e Atari, que lem-
desde os tempos em que Flash Gordon enfrentava os maléficos bravam espaçonaves e embates entre jogadores de GO, mas de-
habitantes do planeta Mongo. pois, com a Apple, foram assumindo ares mais humanos, anun-
Em contraposição aos mastodônticos computadores empresariais ciando uma época de naturalização das tecnologias.
mainframe, que chegavam a ocupar uma sala e ser maiores que uma Com a internet, a partir de meados dos anos 1990, chegaram a
geladeira, eram carinhosamente chamados de “micro” por seus donos. ser os soberanos das empresas e dos espaços domésticos, trans-
Espécie de televisores “verde e preto” pendurados em teclados, não formando-se nos melhores amigos do homem contemporâneo.
serviam para muito mais que salvar a vida de datilógrafos disléxicos. Abalados pelo poder de comunicação instantânea dos celulares,
E isso já era muito, rendendo-lhes o trunfo de entrar para a história têm sua morte dada como certa, em 2012, aos 40 anos de idade,
como implacáveis assassinos de litros de corretor branquinho. Coloca- esganados pelo poder de seus filhos mais pródigos, os tablets,
ram fim a uma era de ruídos em redações jornalísticas e eclipsaram para que prometem, com o parricídio iminente, uma era de conexão
sempre técnicas de edição literalmente cut & paste, baseadas em recortes e mobilidade. Amém. GB

FOTO: DIVULGAÇÃO

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delete

129

no ca rnava l de sa lva do r, só quem po de se saco de

Abadá, um flagelo sociológico


Camarotes e abadás passam um cordão de isolamento
nas utopias do carnaval AngélicA de MorAes

Em clima de carnaval, Delete põe som na caixa e samba mais altas no circuito Dodô (Barra-Ondina). Segundo os sites www.abadaweb.
no pé. Nosso enredo desta edição é inspirado em com.br e www.meuabada.com.br, o preço para pular o sábado de folia no
“Plataforma”, de autoria do compositor mineiro João bloco Nana Banana, do grupo Timbalada, liderado por Carlinhos Brown,
Bosco. Ele reivindica: chega a R$ 750. O preço mais módico é do Araketu: R$ 150. Pela média, o
extenso festejo baiano (uma semana) custa R$ 3 mil só no item abadá. Haja
Não põe corda no meu bloco fôlego financeiro e pulmonar.
Nem vem com teu carro-chefe Mas tem também o camarote, outra engrenagem para estabelecer diferenças
Não dá ordem ao pessoal diante da patuleia. O mais caro, o Salvador 2012, cobra R$ 1.040 para
Não traz lema nem divisa, homens frequentarem o local no sábado, com open bar. O mais barato,
Que a gente não precisa com o rótulo Skol, custa R$ 330 para homens e R$ 290 para mulheres.
Que organizem nosso carnaval A rua é o espaço público, afirmam os sociólogos. Nela, deve imperar a lógica
do convívio e do compartilhamento igualitário dos espaços. Roberto DaMatta
O carnaval mudou de dono. A tal “maior festa popular esclarece que “a rua é o oposto da casa, espaço privado por excelência, onde
do planeta” tirou o povo da frente, passou um cordão de estão ‘os nossos’, que devem ser protegidos e favorecidos”.
isolamento para deixar bem clara essa história de elite e Propomos deletar o abadá e seu cortejo de privilégios momescos. No livro O
colocou seguranças parrudos a vigiar o cercadinho vip que Que Faz o Brasil Brasil?, DaMatta observa que o carnaval cumpriria um papel
segue os carros de som dos blocos. Tudo para atender os especial entre nós. Numa sociedade “que tem horror à mobilidade social”,
diferenciados portadores de abadás. Essa curiosa roupa/ o carnaval seria “a possibilidade utópica de mudar de lugar, de posição. De
passaporte é vendida a preços extorsivos que esclarecem a realmente inverter o mundo em direção à alegria, à abundância, à liberdade e,
quem se destinam. O carnaval baiano pratica as cotações sobretudo, à igualdade de todos perante a sociedade”.

Foto: Adenilson nunes/lAtinContent/Getty imAGes

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reinvente

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C HUR RASC ã o dA ge n t e di f e Rê n CiAdA l evoU À C RACo lândiA , em S ão pAU lo, 1.500 peSSoAS, 100Kg de CAR ne, lingUi ç A e v i n Ag R e t e

Viva as rugas das


estado e do município de São Paulo na área da Luz, conhecida
pejorativamente como Cracolândia, deu visibilidade a vários de-
les. Polêmica, a ação que propõe “estratégia de dor e sofrimento”,

cidades
no seu plano de erradicação do enclave dos dependentes de crack
Giselle BeiGuelman do centro de São Paulo, gerou uma onda de protestos. Variados
e veementes, vão da contestação às políticas urbanas que teriam
Sociedade civil organiza-se em objetivo de higienizar socialmente o centro para favorecer a es-
peculação imobiliária, passando pela crítica ao despreparo da
pequenas associações e restaura os Polícia Militar e chegando à confusão entre saúde e segurança
afetos entre cidadãos e cidades pública. Mas isso tudo não se faz à custa da perda do bom humor
– que parece ser uma das características da geração “pós-rancor”.
Um dos marcos desse processo foi o Churrascão de Gente Dife-
renciada – Versão Cracolândia, que reuniu ativistas diversos na
A palavra rua tem origem latina e vem de ruga, sulco, rego, vinco. área em 14 de janeiro.
Como as dobras da pele, as ruas são linhas que retêm a memória Nem todos os grupos que vêm discutindo o problema são forma-
da passagem do tempo e suas histórias. O cronista João do Rio dos por urbanistas, como a associação AmoaLuz, paulistana. Ou-
(1881-1921) dizia que a rua “é a agasalhadora da miséria.” Todos tras, como a BaixoCentro, também de São Paulo, são formadas por
os renegados ali encontram seu espaço e é ali também que a cul- ativistas que procuram reinventar a sociabilidade, a partir de redes
tura se reinventa, interferindo na língua, “matando substantivos, locais, reivindicando que “as ruas são para dançar”. O fenômeno
transformando a significação dos termos, impondo aos dicioná- não se restringe a São Paulo nem ao Brasil e muitas vezes se arti-
rios as palavras que inventa”, escreveu ele. cula com conglomerados multidisciplinares, como o Hackitetura,
Território de criação, moradia, lembrança – pessoal e urbana –, a coletivo espanhol de artistas, ativistas, programadores e arquitetos,
rua é hoje diretamente relacionada ao seu valor imobiliário. Re- e o Fabrique Hacktion, francês, um grupo de designers que propõe
beldes como João do Rio, que decidiu não compactuar com os “enxertos” nos equipamentos urbanos para melhorar o uso dos es-
livros que veem as ruas como mera sucessão de fachadas, várias paços públicos. De diferentes perfis e escalas, ecoam uma pulsação
organizações e coletivos vêm propondo ações independentes para comum que é a restauração do homem como ser político por exce-
repensar e viver as cidades. A recente operação dos governos do lência, tendo a cidade, a polis, como seu lugar no mundo.

FOTO: adrianO vanni

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