Referência: HUR, Domenico Uhng. Psicologia, Politica e Esquizoanálise. 2ª Ed. Campinas: Alínea, 2019.
O bem e o mal, são imperativos sociais bastante propagados, estão
diretamente atrelados ao exercício da Dominação e da obediência. Sabemos que a moral, o bem, o mal e a culpa, trazem mais infelicidade do que realização e satisfação. Espinosa afirma que tal configuração é resultante do desconhecimento da ordem das causas no agenciamento entre os corpos. Ele denuncia a consciência, os valores, as paixões tristes e os fatores que mantêm esse desconhecimento como sendo a ilusão e a servidão. Dessa forma, os valores, a consciência e as paixões tristes encobrem e bloqueiam as potências do corpo. Espinhosa também aponta que não sabemos o que pode um corpo, pois não conhecemos sua potência. Ele defende que ao invés da consciência, devemos utilizar o corpo como um outro modelo que ultrapasse a própria consciência. Domenico Uhng Hur em sua obra Psicologia, politica e esquizoanálise, compreende os regimes de composição e de afecções entre as forças e os corpos constituem os modos de existência. De acordo com o que afirma o autor, a cartografia do corpo é causada pelo agenciamento de movimento e de afeto. Ao considerar o corpo como território, não como substância, ele deve ser apreendido pelo seu funcionamento, os seus regimes de forças e afecções. Assim, o corpo pode ser considerado através da dupla dimensão: longitude e latitude. Dessa forma, a longitude refere-se a sua cinética e dinâmica dos movimentos e estagnação, das velocidades e lentidões. Na latitude, se considera o gradiente de afecções, quanto a intensidade de variação e quanto ao poder de afetar e de ser afetado por outros. Espinosa discute o entrelaçamento de forças, a partir dessa modalidade de relação, que decorre da conexão entre os corpos, de onde se derivam os afetos correlatos, ou seja, as afecções alegres ou tristes. Na relação de agenciamento entre os corpos, há coesão quando um corpo compõe com outro potencializando, formando um todo mais potente, dessa forma é considerado um bom encontro, esta composição se dá mediante forças ativas, gera adição e a afecção resultante é a alegria e este constructo é capaz de potencializar o corpo. Este é considerado um bom encontro, pois quando um corpo está preenchido por afecções ativas eleva-se sua potência de agir e as capacidades de realização. No entanto, quando culmina na subtração do outro e ocorre uma despotencialização, diminuição de sua potência, este pode ser qualificado como um mal encontro. Nas relações tóxicas, como as de sexo-gênero, marcadas pelo machismo, é comum o homem subtrair a potência da mulher, o que resulta dessa união é a decomposição da potência do outro e o afeto correspondente é a tristeza. Ocorre um movimento no sentido da descontinuidade, de perecimento. É uma afecção passiva e a potência que decorre deste encontro é a de sofrer. O interessante é que para Espinosa, o grau de potência é mensurado pelo grau de afectação, pelo grau de possibilidade de ação de determinado corpo, dessa forma, a potência do corpo vai ser diretamente relacionada ao quanto pode ser afetado. Esses encontros podem elevar ou mesmo diminuir potencial de agir de um corpo, a depender da natureza da paixão, pois existem as paixões alegres e as paixões tristes. Dessa forma, as paixões alegres são tomadas como uma afecção que é útil ao corpo e por ser um bom afeto, aumentam a potência de ação deste corpo. Quando o corpo é preenchido por uma afecção positiva, busca manter a alegria ou o objeto que a fomenta, cultivando assim um ciclo com tendência ativa. Neste caso, pode também ocorrer as relação de retroalimentação com co-dependência mútua, onde um corpo não funciona sem o outro. Tem uma passagem do Espinosa que ele fala que a mente é capaz de pensar tanto quanto forem as maneiras pelas quais um corpo pode ser arranjado, assim, quanto mais um corpo pode ser afetado, tem relação com os diferentes regimes de contato, com os diferentes arranjos. Se mente é capaz de pensar, a potência do corpo também tem estreitas relações com o não deixar se decompor através dos maus encontros e isso nos remete as micropolíticas ativas das quais nos falava Rolnik.