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UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ – UNOCHAPECÓ

ÁREA DE CIÊNCIAS HUMANAS E JURÍDICAS


CURSO DE PSICOLOGIA / 8° PERÍODO
COMPONENTE CURRICULAR: PSICOFARMACOLOGIA
PROFESSORA: ANA CRISTINA ACORSI
ACADÊMICA: HELOISA BELLENZIER E BRYAN SAMUEL DE LUCCA

RESENHA CRÍTICA

Kinoshita RT. O circuito dos afetos na drogadição: uma explicação alternativa para a
servidão às drogas. Interface (Botucatu). 2021; 25: e200787.

O referente artigo apresenta uma explicação sobre como se dá o processo de vício e abuso
de drogas, e sobre como esse abuso não é apenas sobre como o vício se dá mas também
o porque ele se dá, quais os aspectos que levam uma pessoa a querer provar uma droga
mesmo tendo a total consciência de como ela pode ser prejudicial a saúde tanto física
quanto psíquica, e também retrata sobre como o superamento do abuso de drogas não se
faz apenas com "força de vontade" ou responsabilidade, já que algo muito mais complexo e
mais difícil de ser superado. O artigo vai primeiramente discutir tópicos que teoricamente
seriam os principais motivos do porque as pessoas entram nesse ciclo vicioso de abuso de
drogas e porque é tão difícil conseguir largar, trazendo as referências de Humberto
Maturana e Spinosa para embasamento desta teoria.
Maturana explica que em sua teoria todos os seres vivos funcionam com uma lógica de
conservação e organização fechada, onde nossos sistemas do organismos vão trabalhar
para manter uma organização de sua existência e providenciar meios adaptativos aceitáveis
para a situação e para a psique do sujeito em questão.
O sujeito opera de forma dinâmica e circular, onde a cada ciclo dessa dinâmica, e sempre
que o sujeito se vê em uma nova situação ele se reinicia, se abrindo a novas possibilidades
e deixando assim uma marca histórica e afetiva no corpo, na estrutura e na memória do
sujeito. Para Spinosa, se trata de estados emocionais, denominados por ele de alegria,
tristeza e desejo, e quando estamos em certo estado emocional isso acarreta mudanças de
percepção de realidade e de transformação. Esses conceitos podem ser usados para
elaboramos sobre as recaídas ao consumo de drogas, onde tecnicamente seria a repetição
de um ciclo já vivenciado, porém deve ser levada em consideração a nova situação e novo
sujeito a qual estamos presenciando, entendo assim que são novas maneiras de
aprendizagem e não apenas comportamentos repetitivos.
Nós sujeitos estamos em constante encontro e interação com outros sujeitos, e com isso
nos dividimos ao mesmo tempo que nos aproximamos e delegamos tarefas para ter uma
convivência harmoniosa sem que perdemos nossa individualidade. Spinosa chama esse
encontro de sujeitos de "bons encontros" quando eles aumentam nossa potência de agir e
causam bons afetos como alegria.
Nesta teoria a linguagem entre os sujeitos é uma forma de coordenação dinâmica de
corpos, dirigindo a si mesmo e comunicando outras direções aos outros (consensualmente),
sendo assim, linguagem é uma ferramenta de ação e emoção, sempre se transformando e
transformando a outros corpos de forma a expressar não só verbalmente, mas com
qualquer tipo de comunicação compreensível. Mas existe também uma ilusão de que
acreditamos que controlamos cada escolha de ação como se não fossemos influenciáveis,
mas já percebemos que sim, as escolhas de uma maioria acabam por interferir na
individualidade.
De acordo com Spinoza também, as forças inerentes ao sujeito podem ter quatro
desfechos, ganho ou perda de potência de ação, neutralidade (permanência) da potência de
agir e desintegração da potência de agir. Esses quatros desfechos podem também,
respectivamente, ampliação ou diminuição de intervenções adaptativas, manutenção ou
perda de organização do status quo. Como sujeitos de desejos, sempre queremos ter maior
potência de agir sobre alegria, e que ter desejo de potência a tristeza seria autodestruição,
sendo assim no que refere ao uso de drogas, seria como ter um desejo de tristeza (morte).
Ao interagirmos com outros corpos, nos modificamos, e nossa mente não entende
diretamente esses outros corpos, apenas as modificações que nos causam, assim como
também não percebemos como o mundo é por si só, mas sim apenas como nos afetam.
Somos sempre conduzidos por nossas emoções e afetos, logo a ideia de pensamentos
completamente racionais sem deixar as emoções afetar e praticamente impossível aos
seres humanos, e é importante entendermos isso para entender o consumo de drogas, já
que ela não atua pelo racional, mas sim pelo emocional, então mesmo que saiba que não é
bom consumir a droga racionalmente falando, isso não se interliga com nossos afetos.
Levando em consideração todos os conceitos trazidos por Maturana e Spinosa, o ato de
consumir drogas pode ser movido por desejo de alegria ou de tristeza. Os afetos de alegria
são obviamente pelo desejo de potência de agir, já o de tristeza é mais complexo, pois ela
age na base de imaginação de uma potência de agir, mas ao passar o efeito da droga, o
sujeito sente tristeza (medo, vergonha e culpa) devido a condenação que a sociedade faz
ao uso de drogas, então o sujeito, para escapar desses sentimentos tristes, consome a
droga novamente, e então entra em um ciclo.
Mas não é exatamente o objeto 'droga' que é procurado, mas sim o que a droga causa na
existência do sujeito, não é sobre o objeto e sim sobre os efeitos, tanto que você consegue
ter os efeitos das drogas em outras situações não envolvendo ela, é apenas uma
ferramenta facilitadora para esses efeitos. Esse abuso também é influenciado pelo contexto
do sujeito quando faz o consumo da droga, levando em consideração suas relações com
ambiente e com outros corpos, a situação somada com a droga gera uma paixão.
Para uma possível estratégia de solução para abuso de drogas temos que considerar
primeiramente cada contexto de cada sujeito em sua total complexidade, pensando em sua
individualidade, afetos, emoções, potências e desejos, lembrando que essa possível
solução é processual e pode levar tempo e ter recaídas que fazem parte desse processo.
Quanto às forças de afeto de culpa, vergonha e medo falados anteriormente, a culpa se
entrelaça com o ideal de Livre-Arbítrio, que todos temos total controle de nossas escolhas
individuais, mas esse ideal falso que a sociedade impõem gera culpa pois se o sujeito tem
esse controle, logo é só escolher mudar, mas sabemos que não é simples assim, como já
falamos anteriormente. A vergonha é ligada a necessidade de aprovação do outro sujeito,
sem considerar seus próprios limites e suas próprias capacidades naquele momento. O
medo vem da incerteza, da imperfeição e da incapacidade, acaba também por gerar
afastamento de outros corpos que poderiam dar maior potência de agir.
Todos esses sentimentos levam a emoção da tristeza e logo traz uma recaída em sua
potência de agir, ou seja, são sentimentos que devemos evitar quando pensamos nas
estratégias de tratamento para superação do uso de drogas.
As estratégias deve ser realizada de forma multiprofissional, penando também que esses
profissionais estão inseridos no meio social e podem trazer suas próprias subjetividades em
pauta, ou seja, a condenação que está inerente a estrutura social, é necessária então ter
um cuidado maior para que esses fatores não prejudiquem tanto o tratamento.
Ajudar o paciente usuário de drogas a entender os seus próprios afetos e desejos, assim
como a interferência de seu meio social é fundamental para que esse sujeito possa tentar
negar aquilo que é desejo de morte e tentar superar esse abuso, mas psicólogo também
não é onipotente, logo se o sujeito não quer verdadeiramente superar não adianta o obrigar
ao tratamento (a menos que esteja se machucando e machucando outros), por isso o
sujeito precisa, acima de tudo, ter desejo de recuperação para o tratamento acontecer.
Trazer os conceitos de Spinosa em perspectiva é realmente interessante para compreender
o comportamento e a visão de mundo que uma pessoa que está viciada em drogas, pois
entender como suas ações não estão baseadas na razão e sim na emoção, abre um
parâmetro para um tratamento mais humanizado e compreensivo, fugindo daquilo que é
senso comum e pensando mais nas complexidades dos sujeitos. Vimos em aula que
apenas um tratamento medicamentoso sem considerar as subjetividades e humanização
dos sujeitos não traz resultados efetivos, tendo isso em vista, esse artigo ajuda a entender
como uma teoria uqe considera esses aspectos pode ajudar a construi um tratamento mais
eficaz, a acreditamos que seja um exelente aspecto unir a psicologia social de Spinosa com
o tratamento para abuso de drogas.

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