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EMOÇÕES
esquecer o que você fez, mas nunca irão esquecer como você as fez sentir”.
As emoções, portanto, dão qualidade às experiências e, por isso, a discussão
sobre este assunto acompanha a história da humanidade.
Na Grécia Antiga, utilizava-se a palavra pathéna (paixão) para desig-
nar passividade ou situações sobre as quais não se tem controle, no mesmo
sentido que hoje é atribuído à comoção provocada pelas emoções (Frijda,
2008). Platão advertia que as emoções impediam as pessoas de agir racio-
nalmente. Portanto, os objetivos dessas deveriam ser o controle e a capaci-
dade de refletir, pensar e filosofar sobre o problema (Plato, 1943). Aristóte-
les, por sua vez, afirmava que, para ter uma vida saudável, os seres humanos
deveriam estar atentos à moderação no que diz respeito às paixões: nem
demais, nem de menos, sendo esse equilíbrio fruto da ponderação racional
(Aristotle, 1984). Assim, desde os tempos remotos e, de certa maneira, até
os dias de hoje, as emoções vêm sendo vistas como algo inferior, quando
comparadas à razão. Essa visão tradicional advoga que as emoções devem
ser controladas pela razão (Aristotle, 1984).
Nas últimas décadas, entretanto, inúmeros estudos conjugando áreas
diversas, como neurociências, psicologia, medicina, filosofia, antropologia,
entre outras, têm demonstrado a real importância das emoções em guiar e
direcionar nossas vidas, muito antes de qualquer processo lógico e racional
entrar em cena. Os pensamentos e crenças, por melhor articulados que
sejam, não são considerados suficientes para gerar ação e mudança (Da-
masio, 1999; Frijda, 2005). No campo da psicoterapia, especificamente,
alguns autores descrevem a época atual como a de uma mudança de para-
digma. Depois de presenciar, durante os últimos 20 anos, o predomínio
dos aspectos cognitivos e racionais, temos, agora, em curso, a mudança
para a ênfase nos aspectos emocionais da experiência (Goldman & Green-
berg, 2015; Johnston & Olson, 2015; Whelton, 2004).
Damasio (2018) compreende que as emoções existem não apenas a
partir das pressões evolucionárias para a sobrevivência, mas também devi-
do à estrutura complexa e de sofisticação cultural da espécie humana. Na
perspectiva do autor, como são os sentimentos que comunicam ao corpo,
sem qualquer palavra, se a direção da vida é boa ou ruim, eles podem ser
considerados os catalisadores de processos particularmente humanos, como
o questionamento e a busca de entendimento e de solução de problemas.
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nos desperta medo (Greenberg, 2019; Mendes & Bruno, 2019). Essen-
cialmente, as emoções indicam que algo importante está acontecendo e
necessita ser observado e que mudanças no organismo ou na sua relação
com o ambiente podem ser necessárias para lidar melhor com a situação.
As emoções também se relacionam aos sistemas de significados cons-
truídos a partir das experiências. O medo está presente em todos nós quan-
do observamos algo ameaçador e nos sentimos desprotegidos. Podemos,
no entanto, experienciar fragilidade e medo em diversas situações que não
são necessariamente perigosas para todos. Falar em público, por exemplo,
apesar de não envolver ameaça direta à sobrevivência, pode adquirir signi-
ficado pessoal bastante aversivo, caso tenhamos passado por experiências
anteriores de vergonha, humilhação ou, ainda, de muita ansiedade, se a
situação é importante para a concretização de um objetivo.
Ainda, as emoções envolvem não apenas a relação com terceiros
(interpessoal), mas também conosco (intrapessoal), dependendo de nosso
grau de exigência e de expectativas, de nosso desejo de reconhecimento,
entre outros aspectos. Portanto, as emoções nos dão informações sobre a
qualidade das experiências, se elas são boas ou ruins para nós, se as coi-
sas estão caminhando como gostaríamos, nos guiando em direção ao que
necessitamos, bem como nos auxiliam a modificar, manter ou terminar
determinada relação com a situação ou com o objeto (Greenberg, 2019).
Além disso, muito mais do que buscar o prazer e evitar a dor, seres huma-
nos procuram dar sentido à sua existência, e as emoções fornecem qualida-
des que ajudam a construir esse mesmo sentido (Mendes & Pereira, 2018;
Mendes et al., 2021).
Somos sistemas dinâmicos e complexos. Como as experiências mol-
dam as emoções, cada um de nós é um verdadeiro labirinto de significa-
dos pessoais, no qual é muito fácil se perder. Para aproveitar o papel que
as emoções podem ocupar e para alcançar o conhecimento profundo e
corporificado do que sentimos, precisamos entrar em contato com nossas
experiências. As emoções informam o que realmente importa para as nos-
sas vidas.
Aumentando ainda mais essa complexidade, as emoções não são
entidades estáticas e facilmente distintas, com processos independentes.
A experiência emocional é o produto da síntese de inúmeros processos, que
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