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Universidade Presbiteriana

Neurociência
Aplicada à
Educação e
Aprendizagem 2
módulo

Cognição Social e Aprendizagem


Trilha 2 Percepção de emoções
Sumário

1 Introdução ao estudo da trilha de aprendizagem p. 4


2 Emoções p. 6
3 O desenvolvimento do processamento emocional p. 10
4 Síntese p. 20
5 Referências p. 22
4
Introdução ao
estudo da trilha de
aprendizagem

Na primeira trilha, vimos que a cognição social é um termo


guarda-chuva que implica a integração de diferentes
processos. Apesar de modelos explicativos distintos, há certa
concordância entre diferentes autores de que a percepção
de emoções é um componente importante da nossa cognição
social (PINKHAM et al., 2014; HAPPÉ et al., 2017; PANKSEPP
et al., 2011). Não apenas importante, mas é também a
habilidade mais estudada (MECCA; DIAS; BERBERIAN, 2016).

Estuda-se, por exemplo, a influência do estado emocional


no desempenho cognitivo, a capacidade de raciocinar
sobre eventos emocionais com o propósito de se adaptar
socialmente, a regulação das emoções e sua associação com
saúde e transtornos mentais, bem como os efeitos nocivos da
supressão das emoções (MIGUEL & CARVALHO, 2016).

O estudo das emoções não é recente e existem diferentes


teorias e abordagens que tentam explicar as causas e
consequências das emoções. Entre elas, podemos citar a
psicologia social, analítico-comportamental, a psicodinâmica,
a psicologia cognitiva, as neurociências, entre outras. Isto
implica em concepções diferentes a respeito da definição de
emoção e suas características em função da abordagem, da
lente pela qual olhamos o fenômeno.

Como estamos em um curso de Neurociências, esta


abordagem será o nosso viés. O objetivo desta trilha será
apresentar as principais características da percepção de
emoções e como ela se desenvolve ao longo da infância,
considerando aspectos mais simples como o reconhecimento
e nomeação de emoções básicas, até aspectos mais
5 complexos como emoções aprendidas em função do contexto
social e regulação emocional.

Entender como estas habilidades se desenvolvem e os


marcos para faixas etárias específicas permite identificar
possíveis atrasos e, desta forma, encaminhar a criança
para serviços de saúde adequados. Também permite
o planejamento de atividades de estimulação-precoce
preventivas com a finalidade de promover e aprimorar a
percepção emocional.
6
Emoções

... Como você reage quando está diante de uma situação de


perigo? Por exemplo, diante de um bicho peçonhento? Ou
quando está sozinho(a) em um lugar desconhecido, à noite,
e pouco movimentado? Como reage quando é acusado
injustamente de um erro que não cometeu? E quando está
diante de um alimento que está com um cheiro característico
indicando estar estragado?

Estas situações podem provocar reações fisiológicas


automáticas e que são importantes para nos mantermos
saudáveis e íntegros. Diante de um bicho peçonhento ou
estar em um lugar desconhecido que poderia representar
algum perigo, é esperado que seu corpo responda a esses
estímulos. Nota-se o aumento do diâmetro pupilar, dos
batimentos cardíacos, sudorese, a respiração fica mais
ofegante. Seu corpo está em alerta! Esse conjunto de sinais
é uma resposta de medo. O medo faz você estar mais atento,
aumentando seu nível de alerta para qualquer mudança
inesperada no ambiente, ou seja, ele o protege ao preparar o
seu corpo para fugir (ou lutar, se necessário).

Do mesmo modo, a reação de nojo diante de um alimento com


um cheiro e aspecto duvidosos impede-o de ingerir algo que
provavelmente esteja estragado. Já a raiva faz você reagir
diante de uma acusação. Faz você argumentar e se defender
de modo a não sofrer uma punição injusta no ambiente de
trabalho, por exemplo.

De acordo com Bear, Connors e Paradiso (2008), valorizamos


+ Como você pode o significado das emoções se tentarmos imaginar a vida sem
notar, as emoções elas. Imaginem um bebê faminto ou com dor sem expressar
são reações qualquer reação emocional diante destes eventos? A partir
automáticas,
da expressão emocional sinalizada pelo bebê é que o seu
necessárias à nossa
sobrevivência! cuidador poderá tomar as devidas providências. Sem nossas
7 experiências emocionais diárias, a vida nos pareceria uma
grande planície vazia, com pouco significado.

+ Sugestão de filme para compreensão da importância das


emoções: “Divertidamente”. Para uma análise do filme,
você pode ler o material disponível em: https://www.
culturagenial.com/filme-divertida-mente/. E os aspectos
científicos que embasaram a construção dos personagens
(emoções) em: https://www.youtube.com/watch?v=T2aH-
3W0VXQ.

Devido à sua importância e ao seu desenvolvimento bastante


precoce, o processamento de emoções é o componente
da cognição social mais conhecido e estudado. De acordo
com alguns autores, diversos processos fazem parte
desta característica mais ampla, que denominamos de
processamento emocional (IZARD, 2001 ; PINKHAM et al.,
2014), tais como:
• reconhecer/identificar emoções em contextos diversos
e diferentes níveis de intensidade;
• rotular e nomear diferentes emoções;
• identificar causas ou ativadores de emoções em si
mesmo e nos outros;
• compreender as relações entre emoção e
comportamento;
• reconhecer simulação emocional;
• identificar complexidades como co-ocorrência e
ambivalência de emoções.

Em um nível mais básico, está o reconhecimento de


expressões faciais, ou seja, a identificação de características
faciais e o entendimento destas como um dos principais
meios de expressão emocional. Também está o
reconhecimento de emoções a partir de dicas não faciais,
tais como gestos e postural corporal. Em um nível mais
complexo, está a compreensão das emoções, característica
que depende dos processos de aprendizagem, bem como o
gerenciamento das emoções (GREEN et al., 2008; PINKHAM
et al., 2014). Este corresponde ao processo mais complexo
8 relacionado à expressão emocional, ou seja, aos processos
de regulação emocional.

Os diferentes níveis indicam uma hierarquia do


processamento de emoções, conforme ilustrado na figura 1:

Percepção Identificação
do estímulo da emoção Controle
Figura 1 - Hierarquia emocional percebida, assim da resposta
do processamento (sistemas como suas causas emocional
sensoriais) e consequências
de emoções. Fonte:
Elaborado pelo autor.

O conhecimento a respeito deste processo nos ajuda a


pensar nas intervenções e nas estratégias e atividades de
estimulação que devem ser realizadas com o objetivo de
ensinar como regular as próprias emoções. A hierarquia do
processo deve pautar a sequência de habilidades a serem
ensinadas. Imagine, por exemplo, trabalhar com crianças
diversas estratégias para que elas fiquem mais calmas,
controlem a raiva e saibam expressar adequadamente
emoções negativas. Você acredita que delimitou bem
os objetivos e entende que esta habilidade favorecerá o
estabelecimento de relações e interações mais positivas
entre as crianças e destas com os adultos. No entanto:
• É possível trabalhar o controle da raiva sem que as
crianças saibam inicialmente perceber mudanças nas
expressões faciais, nos gestos, na prosódia, na postura
corporal?
• Além disso, ao perceber tais mudanças, a criança
consegue identificá-las como “raiva”?
• Ela sabe nomear e entender quais situações podem
causar esta emoção?
• Sabe que existem diferentes níveis de expressão da
raiva (do mais sutil ao mais intenso)?
• A criança é capaz de compreender as consequências
de uma expressão inadequada da raiva (exemplo: bater,
xingar, quebrar coisas etc.)?
9 Para que se estimule a regulação emocional, é importante
que a criança saiba reconhecer as emoções. Por isso, os
programas de intervenção costumam apresentar estratégias
que favorecem a aprendizagem de habilidades mais básicas
para, então, estimular a aprendizagem de habilidades mais
complexas.

! A regulação emocional compreende o manejo adequado


da ativação emocional com vistas a um funcionamento
social efetivo. Isso inclui iniciar, manter, modular ou alterar
a ocorrência, intensidade ou duração de estados internos
e reações fisiológicas relacionadas à emoção (REIS et al.,
2016).

Sabemos que o desenvolvimento adequado dos processos


de regulação emocional está associado a maior probabilidade
de aceitação da criança pelos seus pares e a uma vida social
adaptada. Possibilita a reflexão sobre situações de conflito
e análise do ponto de vista da outra pessoa, o que permite
um comportamento mais empático e pró-social (REIS et al.,
2016). Devido a sua importância, vamos explorar melhor este
conceito?
10
O desenvolvimento
do processamento
emocional

De acordo com Ochsner, Silvers e Buhle (2012), a análise da


regulação emocional pode se dar em três níveis, conforme
apresentados na figura 2: nível do comportamento, nível do
processamento da informação e nível dos sistemas neurais.
No caso dos sistemas neurais, estudos de neuroimagem
mostram regiões e circuitarias que são ativadas durante uma
atividade que demanda processos regulatórios. Além das
observações das áreas associadas à regulação emocional,
é possível observar as respostas do indivíduo diante de
determinados estímulos (tanto a partir de questionários, como
tarefas), ou seja, observamos o comportamento para definir
se é uma resposta bem regulada ou impulsiva. Já a descrição
da forma como ocorre o processamento de informação,
ou seja, como ocorrem estes processos, não é passível de
observação direta, de modo que apenas fazemos inferências
baseadas no comportamento e no que se conhece a respeito
do funcionamento cerebral.

Nível de análise

Comportamento/
experiência Observável

Processamento
Figura 2 - Níveis de da informação Inferência
análise da regulação
emocional. Fonte:
Adaptado de
OCHSNER; SILVERS; Sistemas neurais Observável
BUHLE (2012).
11 Crianças com melhor desenvolvimento da regulação
emocional tendem a apresentar:
• melhores habilidades sociais;
• redução de comportamentos impulsivos;
• melhor desempenho escolar;
• menores níveis de agressividade;
• menor probabilidade de interações negativas com seus
pares e problemas de comportamento;
• demonstram maior tendência a resolver conflitos e se
reconciliar com seus pares;
• maior capacidade de comportamentos empáticos;
• maior frequência de comportamentos pró-sociais.

Os processos de regulação emocional são mais


complexos e dependem de características mais básicas
de percepção e compreensão das emoções. Portanto, é
necessário entendermos como se dá o desenvolvimento
do processamento de emoções para que o indivíduo possa
apresentar comportamentos que sejam indicativos de
regulação emocional. O quadro 1 apresenta os principais
marcos do desenvolvimento emocional:
12 Período do Características
desenvolvimento

Ao Demonstra preferência por faces e vozes em detrimento


nascimento de estímulos não sociais.

2 meses Discrimina expressões emocionais diferentes (percebe


mudança na expressão emocional); o bebê começa a sorrir
como resposta às pessoas que interagem com ele; usam
estratégias simples de regulação para se acalmar
(colocar as mãos ou objetos na boca).

4 e 5 meses Reconhece expressões bimodais. Sorri espontaneamente


para os outros e demonstra prazer na interação (exemplo:
pode chorar se o outro deixar de brincar ou interagir).
Imita com clareza expressões emocionais do outro.

6 meses Aumento significativo na responsividade e variabilidade


na expressão emocional.

9 meses Inicia respostas de medo diante de estranhos. Tende a


preferir adultos familiares. Expressa reações emocionais
positivas diante de seus brinquedos favoritos.

12 meses Demonstra timidez ou nervosismo diante de estranhos.


Chora quando sua figura de apoio/suporte se afasta.
Demonstra alegria diante de suas brincadeiras ou pessoas
de preferência.

18 meses Início do uso da fala para expressão emocional.


Maior frequência de ataques de birra para expressar
descontentamento. Expressa medo de estranhos de forma
mais consistente. Pode demonstrar insegurança/medo
em situações novas, permanecendo junto ao cuidador.
Compartilha prazer/interesses com os outros.

2 anos Desenvolvimento do vocabulário emocional.


Pode apresentar comportamento desafiador.

3 anos Expressa emoções complexas devido aos processos de


socialização, tais como: como vergonha, culpa e orgulho,
embora ainda não nomeie ou identifique de forma
adequada. Não confunde emoções de valências opostas.
Mostra afeto por pares sem ser incentivado.

4 e 5 anos Boa capacidade de nomeação e reconhecimento de


emoções básicas (alegria, tristeza, medo, nojo, raiva
e surpresa).

A partir dos 6 Maior consciência, identificação e nomeação de emoções


Quadro 1 - anos até o final complexas em si e nos outros; consciência de que sente
Principais marcos da infância vergonha e orgulho; diferencia culpa e vergonha; regula
e controla melhor suas emoções; verbaliza emoções
do desenvolvimento conflitantes; conhecimento das regras da cultura para
emocional. Fonte: expressão emocional de modo aceitável. As emoções
afetam a opinião sobre si próprio.
Elaborado pelo autor.

Um dos marcos importantes para o desenvolvimento


emocional é o apego.
13 Apego é um tipo de vínculo no
qual o senso de segurança está
estreitamente relacionado à figura
de apego. No relacionamento com
a figura de apego, a segurança e
o conforto experimentados pela
criança permitem que seja usado
como uma base segura, a partir
da qual poderá explorar o resto do
mundo. (BOWLBY, 1979)

+ Para mais informações sobre o desenvolvimento do apego,


ouça o audioblog da trilha 2 e leia o texto: DALBEM, J. X.;
DELL’AGLIO, D. D. Teoria do apego: bases conceituais e
desenvolvimento dos modelos internos de funcionamento.
Arq. bras. psicol., Rio de Janeiro, v. 57, n. 1, p. 12-24, jun.,
2005.

Conforme os principais marcos do desenvolvimento


emocional apresentados no Quadro 1, as emoções são
a primeira forma de comunicação na qual as crianças
compartilham seus estados internos. A partir da observação
das expressões emocionais dos seus parceiros sociais, as
crianças também são capazes de processar informações
relativas ao estado afetivo do outro. Uma característica
importante do desenvolvimento emocional em fases
tão precoces da vida dos bebês é que a capacidade de
discriminar as emoções não depende de habilidades verbais,
ou seja, ela está presente antes mesmo de a criança saber
nomear as emoções e compreender os seus significados
(ANDRADE et al., 2016).

Mas o que de fato são as emoções? De acordo com Miguel


(2015), a definição de emoção pode parecer óbvia e simples,
porque utilizamos esta palavra no cotidiano com bastante
frequência. A partir de uma revisão de literatura, este autor
descreve emoções como:
14 Condições complexas e
momentâneas, que surgem
em experiências de caráter
afetivo, provocando alterações
no funcionamento psicológico e
fisiológico, preparando o indivíduo
para uma ação.

+ Você pode encontrar uma revisão sobre as teorias das


emoções em: MIGUEL, F. K. Psicologia das emoções:
uma proposta integrativa para compreender a expressão
emocional. Psico-usf, 20(1), p. 153-162, 2015.

Não há consenso a respeito de um único modelo teórico


que explique o funcionamento emocional, bem como sobre
quais são as emoções básicas. No entanto, diversos autores
costumam citar as seguintes emoções ou alguma variação
delas: alegria, tristeza, nojo, medo, raiva e surpresa.

A Alegria

Figura 3 - A alegria.
Fonte: NEGRÃO et al.
(2021).

Alegria é a expressão emocional associada à felicidade


e ao prazer. É uma resposta positiva que ocorre diante da
resolução de um objetivo ou depois da atenuação de um
estado interno negativo. A alegria/felicidade é uma das
respostas fisiológicas associadas a um estado subjetivo
15 que nos move para a ação, ou seja, está associada à volição
e motivação. Também ocorre como uma recompensa, por
exemplo, quando alguma meta é alcançada ou algum desafio
superado. A partir disso, as pessoas tendem a reproduzir
comportamentos e situações que irão eliciar esta resposta
de alegria/felicidade de acordo com as suas experiências
prévias.

Em termos de respostas fisiológicas e neurobiológicas,


observa-se na expressão de alegria um aumento da
frequência dos batimentos cardíacos e uma melhor
frequência respiratória. Além disso, regiões cerebrais
associadas ao processamento emocional liberam mais
endorfina e dopamina, que são neurotransmissores
associados à sensação de prazer e bem-estar.

A Tristeza

Figura 4 - A tristeza.
Fonte: NEGRÃO et al.
(2021).

A expressão emocional de tristeza implica em


uma redução do estado de ânimo. Essa diminuição
é acompanhada também de uma redução na cognição
(processos de aquisição de conhecimento e habilidades) e
no comportamento. Apesar de ser considerada uma emoção
negativa, essa redução do ânimo, do comportamento, possui
um importante papel em situações sobre as quais o indivíduo
16 não possui controle ou não pode tomar nenhuma ação direta
que possa mudá-las. Ao reduzir os níveis de atividade, a
tristeza adequa o corpo para economizar energia/recursos e
evita esforços nestas situações em que nada pode ser feito
(exemplo: perder um emprego, a doença de um amigo, perder
um ente querido). Outro ponto é o seu papel protetivo. A
tristeza aumenta o nível de alerta para estímulos negativos,
ou seja, para aquilo que pode ser prejudicial ao indivíduo,
evitando problemas. Além disso, ela pode ser um indicativo
importante da necessidade de busca por ajuda profissional ou
suporte social.

O Nojo

Figura 5 - O nojo.
Fonte: NEGRÃO et al.
(2021).

O nojo é uma sensação de repulsa ou de evitação. Esta


expressão emocional ocorre diante da possibilidade de
contato (geralmente de ingerir) com substâncias que sejam
perigosas ou com propriedades contaminantes. Ressaltando
que essa possibilidade de contato pode ser real ou mesmo
imaginária. A sensação subjetiva é de grande desconforto/
desagrado e uma forte aversão ao estímulo considerado
“nojento”. Trata-se, portanto, de uma reação emocional
associada ao nosso instinto de sobrevivência.

Os efeitos fisiológicos associados ao nojo se manifestam por


problemas gastrointestinais e reações de náuseas. Também
há um aumento geral de atividade no corpo.
17 O Medo

Figura 6 - O medo.
Fonte: NEGRÃO et al.
(2021).

O medo é um estado emocional negativo e adverso,


também associado à necessidade de sobrevivência.
Implica um alto nível de alerta/ativação produzido para evitar
e escapar de situações (reais ou imaginárias) perigosas. A
experiência do medo tem um papel fundamental no preparo
do corpo para lidar com possíveis perigos, ou seja, lutar ou
fugir. Por isso, os sintomas fisiológicos são rápida elevação da
ativação da atividade cardíaca e a respiração acelerada.

A Raiva

Figura 7 - A raiva.
Fonte: NEGRÃO et al.
(2021).
18 A expressão emocional da raiva surge quando um
indivíduo se encontra em situações que produzem
sensação de frustração ou aversão. É uma experiência
bastante desagradável e vem acompanhada de tensão que
impulsiona a reação imediata, com prejuízos no autocontrole.
É uma emoção ambígua e que apresenta múltiplas facetas.
É ambígua porque nem sempre se justifica e o objeto da
raiva nem sempre é claramente identificado. A raiva tem
uma função evolutiva importante, uma vez que oferece os
recursos necessários para resolução de problemas, tais como
lidar com situações frustrantes. Quando passamos por uma
situação de perigo ou quando precisamos enfrentar eventos
estressores e superar desafios, a raiva permite gastar
recursos para aumentar a ativação e consequentemente ajuda
a ter êxito.

Como reação fisiológica, observa-se um aumento significativo


da ativação e da preparação para a ação, ou seja, uma
reação. Há aumento da atividade cardíaca, tônus muscular e a
frequência respiratória e adrenalina no sangue.

A Surpresa

Figura 8 - A
surpresa. Fonte:
NEGRÃO et al.
(2021).

A expressão emocional de surpresa é uma reação


provocada por algo inesperado, novo ou estranho.
Geralmente, ocorre quando surge uma situação, um estímulo
19 (coisas, pessoas, possibilidades) em que o indivíduo não
havia pensado ou previsto anteriormente. A experiência
subjetiva da surpresa é uma sensação de incerteza.
Normalmente, há uma diminuição na frequência cardíaca e
aumento do tônus muscular, a respiração é mais profunda, e a
pessoa faz vocalizações/sons espontâneos.

+ Você sabia que existe um sistema para categorizar as


expressões faciais? O Facial Action Coding System (FACS)
foi desenvolvido na década de 70 e passou por uma
revisão em 2020. Este sistema faz a leitura da contração
ou relaxamento de um ou mais músculos da face para
categorizar, por exemplo, se um sorriso é espontâneo e
verdadeiro, ou se ele é falso e controlado. Para conhecer um
pouco mais sobre o FACS, assista ao vídeo disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=NYmpGq34BWs.

É praticamente unânime a compreensão de que a capacidade


de expressar emoções é inata. Diversos estudos mostram
que a expressão das emoções básicas, universais, costuma
ser idêntica em diferentes povos. No entanto, estudos
apontam que o contexto cultural e a história individual podem
exercer influência sobre a avaliação de quais estímulos
provocam emoções e em quais momentos pode-se ou deve-
se expressar quais emoções (MIGUEL, 2015).
20
Síntese

Em suma, sabemos da importância das emoções, bem


como expressá-las de forma adequada de modo a
produzir interações sociais mais positivas. Ao pensar no
desenvolvimento do processamento emocional, não podemos
nos esquecer de que existe uma maturação neurobiológica,
que permite a aquisição e expressão de determinadas
emoções, bem como o conhecimento a respeito delas. A
figura 9 sintetiza os principais marcos do desenvolvimento
emocional na infância:

2 meses

Discriminação de
expressões.
4-5 meses

Expressões bimodais.

6 meses

Variabilidade e
responsividade.
18 meses

Linguagem e emoção.
Constrangimento,
2 anos empatia, ciúmes.

Vocabulário
emocional.
3 anos

Culpa, vergonha e
orgulho. Valências
4-5 anos opostas.

Nomeação e
reconhecimento de
emoções básicas. 6 anos

Consciência de
emoções complexas.
Figura 9 - Marcos 7-8 anos

do desenvolvimento Nomeação de
emocional na conceitos emocionais
complexos.
infância. Fonte:
Elaborado pelo autor.
21 Não deixe de ouvir o audioblog sobre o desenvolvimento
do apego, um dos aspectos que possui influência no
desenvolvimento social e emocional durante a infância. Reflita
sobre como estilos de apego podem impactar nas reações
emocionais diante do outro e consequentemente influenciar
nos vínculos afetivos que serão estabelecidos pelo indivíduo
ao longo de sua vida.

Reflita também sobre o desenvolvimento do processamento


emocional como um processo de nível hierárquico,
constituído por habilidades mais simples, até aquelas
mais complexas. Conhecer este processo pode auxiliar na
identificação de possíveis prejuízos, bem como contribuir
para a elaboração de estratégias coletivas ou individuais
de estimulação/intervenção e que irão favorecer o
desenvolvimento da compreensão e regulação emocional ao
longo da infância.
22
Referências

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Universidade Presbiteriana

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