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PEDAGOGIA – AMPLI

COMPETÊNCIAS PARA
A VIDA
UNIDADE 1 – GERENCIAMENTO DE
EMOÇÕES
Aula 1. Emoções e comportamento

A resposta luta-fuga, também conhecida como resposta ao estresse


;agudo, representa as escolhas que nossos ancestrais tiveram de fazer
quando confrontados com o perigo em seu ambiente: lutar ou fugir. Em
ambos os casos, a resposta fisiológica e psicológica ao estresse prepara o
corpo para reagir ao perigo, sendo liberados hormônios que preparam o
corpo para confrontar a ameaça ou fugir para um local seguro.

Mais especificamente, o sistema nervoso simpático estimula as glândulas


adrenais, desencadeando a liberação de adrenalina e noradrenalina, que
provoca aumento na frequência cardíaca, pressão arterial e frequência
respiratória. A resposta de lutar ou fugir pode acontecer diante de um
perigo físico iminente (como encontrar um cachorro rosnando no meio da
rua) ou como resultado de uma ameaça psicológica (como se preparar
para fazer uma apresentação importante na faculdade ou no trabalho).

A resposta luta-fuga pode ocorrer como “alarme”, conhecido como parte


do primeiro estágio da síndrome geral de adaptação, um padrão
específico de resposta comportamental proposto por Hans Selye, em
1936, e que ajuda a explicar o efeito do estresse no corpo humano. De
acordo com a teoria (Figura 1 a seguir), existem três fases sucessivas de
resposta diante de um evento estressor: alerta, resistência e exaustão:
● Fase de alerta: ocorre quando o indivíduo entra em contato com o
agente estressor e o seu corpo perde o equilíbrio. Alguns sintomas
possíveis são dores no estômago (acidez estomacal), aumento de
sudorese, tensão nos ombros, insônia, mudança de apetite.
● Fase de resistência: nessa fase, o corpo busca voltar ao equilíbrio.
Há um aumento de liberação de cortisol e tem-se impressão de
controles esporádicos. Alguns sintomas possíveis podem ser
cansaço constante, problemas dermatológicos, problemas com
memória, gastrite prolongada, tonturas, sensibilidade emotiva
excessiva e obsessão pelo agente estressor.
● Fase de exaustão: na última fase, podem ocorrer diversos
comprometimentos físicos em forma de doença. Alguns sintomas
podem ser: diarreias frequentes, tiques nervosos, problemas
dermatológicos prolongados, tonturas frequentes, úlcera,
impossibilidade de trabalhar, taquicardia, insônia prolongada,
formigamento nas extremidades.

De acordo com Paul MacLean (1990), a progressão da vida pode ser vista
em nosso cérebro a partir dos níveis de desenvolvimento que ele possui:
reptiliano (primitivo ou instintivo), límbico (emocional) e neocórtex
(racional). Nossos tecidos corticais são mais complexos, lentos, situam-se
na periferia do cérebro (ou topo) e são responsáveis pelas nossas funções
executivas (tomada de decisão, raciocínio lógico, memória da linguagem).
No centro do cérebro, abaixo do córtex e acima do tronco cerebral, fica
nossa região subcortical, também conhecida como sistema límbico.

No centro do sistema límbico, no meio do caminho entre nossas orelhas e


atrás de nossos olhos, está a amígdala cerebral, envolvida,
principalmente, no processamento de emoções e nas memórias
associadas ao medo (Figura 2). Ela é peça-chave de como processamos
emoções fortes, como medo ou prazer, e responsável por disparar a
resposta luta-fuga.

Além disso, é interessante o mecanismo de contágio emocional que nosso


cérebro sofre. Quando ficamos encantados com um bebê sorridente ou
quando nos entristecemos diante de uma pessoa em situação vulnerável,
estamos nos conectando às outras pessoas, e essa também é uma
característica de nossa espécie: somos influenciáveis socialmente e
necessitamos do contato com outras pessoas. Isso ajuda a explicar o
fenômeno das redes sociais e seu amplo crescimento nas últimas
décadas.
O fato de que podemos desencadear qualquer emoção em outra pessoa –
e ela em nós – atesta o poderoso mecanismo por meio do qual os
sentimentos de uma pessoa se espalham para outras. Esses contágios são
a principal transação da economia emocional, o intercâmbio de
sentimentos que acompanha toda interação humana, não importa qual
seja o tema em questão.

De acordo com Paul Ekman (2016), temos emoções universais, ou seja,


compartilhadas por toda a espécie a partir de cinco rotas evolutivas. A
compreensão de nossas cinco rotas emocionais básicas nos permite saber
as bases de nosso comportamento:
● Medo: uma percepção de ameaça real e iminente.
● Raiva: aponta uma percepção de injustiça, algo que nos bloqueia.
● Tristeza: provoca nossa resposta diante da perda de algo de valor.
● Nojo: aponta nossos gostos e preferências pessoais.
● Alegria: indica percepção de algo de valor.

Cada uma dessas cinco rotas abre caminho para centenas de estados
emocionais secundários, como melancolia, ansiedade ou frustração,
perceptíveis em nossas relações de trabalho. Para cada “família”
emocional existem determinadas atitudes, e todas as emoções são “úteis”
no sentido de que nos trazem informações sobre nossa relação com o
mundo. No entanto, podemos utilizá-las a nosso favor, de maneira
construtiva (visando ao bem-estar e a uma melhor relação com a
realidade) ou destrutiva (quando não nos desvencilhamos dos estados
negativos ou prejudicamos outras pessoas).

Vamos, então, compreender alguns comportamentos possíveis para cada


uma das famílias emocionais, explorando respostas construtivas ou
destrutivas a partir de exemplos:
● Ações diante do medo: evitar a ansiedade (medo de uma ameaça
imaginada) pode ser construtivo, se nos ajudar a fazer uma
apresentação para uma sala cheia de pessoas, e destrutivo, se nos
impedir de confrontar nosso difícil relacionamento com nosso
chefe.
● Ações diante da raiva: suprimir nossa frustração pode ser algo
construtivo, se nos ajudar a evitar discussões, e destrutivo, se
estivermos magoados por não falarmos por nós mesmos.
● Ações diante da tristeza: renunciar a sentimentos de desamparo
pode ser uma ação construtiva para superar um luto intenso, porém
destrutiva, se não buscarmos apoio quando precisarmos ou se
formos vítimas de uma positividade tóxica (evitação extrema de
sentimentos negativos).
● Ações diante do nojo: evitar a aversão pode ser algo construtivo
para superar o preconceito, mas destrutivo se levar a um
envolvimento com uma pessoa prejudicial.
● Ações diante da alegria: expressar nossa alegria por um
comportamento extrovertido e brincalhão pode ser construtivo
como meio de compartilhar com amigos um final de tarde, mas
destrutivo se for em resposta a zombar de alguém.

Aula 2. A escola de Harvard de


inteligência emocional
Baseados no modelo de Gardner, os pesquisadores John Mayer e Peter
Salovey publicaram, em 1990, o primeiro artigo científico que fez menção
a uma inteligência emocional, ou seja, a um conjunto de habilidades
mentais para se lidar com as emoções. Esse modelo ficou conhecido como
quadrifatorial ou de ability cuja tradução é melhor definida como de
aptidões mentais para se lidar com emoções humanas.

De acordo com o modelo quadrifatorial, são quatro as habilidades de


inteligência emocional (Figura 1):
● Perceber emoções: identificar emoções em si, nos outros e em
coisas, bem como expressá-las acuradamente.
● Usar emoções: facilitar o pensamento e o julgamento a partir de
estados emocionais.
● Entender emoções: nomear emoções e sentimentos complexos e
compreender progressões.
● Administrar emoções: estar aberto aos sentimentos e gerenciar
emoções em si e nos outros.

No modelo quadrifatorial, todas as habilidades incluem as faculdades


interpessoal e intrapessoal, ou seja, a compreensão e a interação com nós
mesmos e com os outros. A principal contribuição desse modelo de
inteligência emocional é considerar que nossas emoções são informações
que podemos utilizar para melhor avaliarmos cada situação da vida e
como nos posicionarmos. Para Susan David (2018), nossas emoções
podem servir como guias ao nosso comportamento, uma vez que
sinalizam que valores nossos estão sendo acionados.

Enquanto navegamos pela vida, nós, humanos, temos poucas maneiras de


saber que rumo tomar ou o que vem pela frente. Não temos faróis que nos
mantenham afastados de relacionamentos problemáticos. Não temos
vigias na proa ou radares na torre atentos a possíveis ameaças submersas
que podem afundar nossos planos de carreira. Em vez disso temos nossas
emoções – sensações como medo, ansiedade, alegria e euforia – um
sistema neuroquímico que evoluiu para nos ajudar a navegar pelas
complexas correntes da vida.

De forma a promover a avaliação de competências socioemocionais de
executivos do mundo inteiro, Goleman e Boyatzis (2016) associaram-se à
Korn Ferry Hay Group e criaram o assessment ESCI – Emotional and Social
Competence Inventory, que serve de base para processos de
desenvolvimento gerencial e coaching sistêmico em equipes de liderança.
O instrumento ESCI é uma avaliação 360° que permite que um indivíduo
se avalie e seja avaliado por pares, clientes, líderes e liderados em relação
a 12 competências socioemocionais ligadas ao trabalho nas dimensões de
autoconsciência, autocontrole, consciência social e gestão de
relacionamentos:
● Autoconsciência: reconhecer e entender as próprias emoções.
Competência emocional associada (1): autoconsciência das
emoções.
● Consciência social: reconhecer e entender emoções em outros.
Competências emocionais associadas (2): empatia e consciência
organizacional.
● Autocontrole: efetivamente, administrar as próprias emoções.
Competências emocionais associadas (4): adaptabilidade, otimismo,
autocontrole, orientação para resultados.
● Gestão de relacionamentos: aplicar e entender as emoções ao lidar
com as emoções de outros. Competências emocionais associadas
(5): coaching e mentoring, gestão de conflitos, influência, liderança
inspiradora, trabalho de equipe

Além do assessment ESCI, existem diversas escalas para avaliação de


competências socioemocionais, algumas com validação científica, outras
não. O que se espera desse tipo de assessment é que possa contribuir para
que a organização possa medir a inteligência emocional de líderes e
liderados, aumentar a conscientização das pessoas a respeito de seus
comportamentos, desenvolver qualidades específicas para as interações
sociais e promover confiança e emoções positivas em indivíduos e
equipes.

Refletindo sobre a própria Inteligência Emocional (IE)

Uma dificuldade nos programas de desenvolvimento organizacionais é


medir o nível de consciência e ação emocional das pessoas. Nesse
sentido, há uma contradição em relação aos testes de Inteligência
Emocional, porque, se de um lado, somos pouco acurados em medir
nossas próprias habilidades emocionais (na maioria das vezes, quem
“menos precisa” de Inteligência Emocional é quem mais se beneficia de
programas de desenvolvimento), de outro, é interessante perguntar aos
outros sobre nosso comportamento, e isso faz com que as avaliações por
pares ou por informantes sejam largamente utilizadas. Porém, para que
essas avaliações sejam bem-sucedidas, é preciso treinamento quanto à
forma de condução e muito zelo com as informações coletadas, a fim de
que não promovam um clima de desconfiança e perseguição.
Aula 3. Quando falta inteligência
emocional
Todos estamos sujeitos a fenômenos afetivos, que, de acordo com o
professor Rafael Bisquerra, da Universidade de Barcelona, englobam:
● Emoções: respostas de nosso organismo aos estímulos que
recebemos.
● Sentimentos: tomada de consciência sobre essas emoções.
● Estados emocionais: podem ser entendidos como uma
predisposição dos indivíduos para uma determinada atitude,
comportamento ou decisão.

Esses fenômenos afetivos são modulados por crenças e valores pessoais,


isto é, o mesmo estímulo pode provocar respostas distintas nas pessoas, e
isso traz impactos não apenas em nosso comportamento individual mas
também nos relacionamentos interpessoais.

Vamos às competências:
● Autoconsciência: é a principal competência de inteligência
emocional, pois exerce grande influência nas demais, e é baseada
numa vontade de ter acesso a novas perspectivas e no
entendimento de si mesmo(a). Pessoas com essa habilidade têm
maior facilidade para o desenvolvimento pessoal.

Você demonstra autoconsciência quando:

- Dá-se conta de seus próprios sentimentos.

- Sabe o que causa esses sentimentos.

- Compreende as consequências de seus estados emocionais em seu


comportamento ou em suas decisões.

- Conhece suas forças e limites.

- Está aberto ao feedback.


● Autocontrole

O autocontrole provê direção, energia e restrição ao nosso


comportamento.

Ele nos permite regular as emoções no cotidiano e ter maior controle das
respostas emocionais em situações desafiadoras.

Você demonstra autocontrole emocional quando:

- Consegue lidar de forma calma com situações estressantes.

- Consegue regular a intensidade de suas respostas emocionais e


controlar seus impulsos.

- Mantém sua positividade e otimismo mesmo perante eventos difíceis.

- Consegue realizar suas entregas mesmo quando envolto em sentimentos


negativos.
● Consciência social

Consciência social tem a ver com entrar em sintonia com as


necessidades, expectativas, comportamentos e estados emocionais de
outras pessoas. Aqui, é necessário considerar pessoas e contextos.

Você demonstra empatia quando:

- Consegue ler pistas sobre os estados emocionais de outras pessoas de


forma precisa.

- Desenvolve escuta ativa.

- Entende as perspectivas e os pontos de vista de outras pessoas.

- Compreende as razões que motivam as outras pessoas.

Você demonstra sensibilidade ao contexto quando:

- Entende as forças políticas em seu trabalho, grupo ou organização.

- Consegue compreender as principais relações de poder existentes.

- Compreende os valores e a cultura de seu grupo ou organização.

- Compreende os processos informais existentes em seu grupo ou


ambiente de trabalho.

- Entende quais comportamentos são valorizados e quais são


considerados inadequados em seu grupo ou ambiente de trabalho.
● Gestão de relacionamentos
A gestão de relacionamentos é a competência que nos permite "fazer a
diferença", influenciar e motivar outras pessoas, bem como aplicar o
entendimento emocional no trato com o outro, mantendo a assertividade
e o diálogo fácil para objetivos comuns.

Você demonstra uma boa gestão de relacionamentos quando:

- Consegue construir consenso e influenciar pessoas para apoiar suas


ideias e sugestões.

- Oferece feedback para melhorar o desempenho de outras pessoas,


reconhecendo suas forças e oportunidades de desenvolvimento.

- Consegue inspirar outras pessoas para atingir metas e objetivos,


extraindo o melhor de cada uma delas.

- Consegue promover confiança, cooperação e espírito de equipe nos


grupos em que atua.

Aula 4. Como desenvolver a gestão


emocional
De acordo com a Associação Americana de Psiquiatria (APA), a ansiedade
é uma emoção caracterizada por sentimentos de tensão, pensamentos
preocupados e mudanças físicas, como aumento da pressão arterial.
Pessoas com transtornos de ansiedade, geralmente, têm pensamentos ou
preocupações intrusivas recorrentes; elas podem evitar certas situações
por preocupação e apresentar sintomas físicos, como sudorese, tremores,
tonturas ou taquicardia.

Como outros estados emocionais, a ansiedade pode ser facilitada por


questões fisiológicas, mas é, das emoções aflitivas, a mais ligada ao modo
como projetamos nossa percepção da realidade. Ela é, portanto, uma
emoção ancorada no tempo futuro, geralmente, ocupando nossa mente
com situações sobre as quais não temos controle, mas desejamos
controlar.

De acordo com Laguaite (2011), são múltiplos os sintomas de ansiedade,


entre eles:
● Evitar amigos ou família.
● Preocupação constante.
● Choro.
● Sensação de irritação, cansaço ou tensão.
● Sentir que você precisa ser perfeito.
● Ter problemas para dormir.
● Ter problemas para se concentrar ou lembrar das coisas.
● Perder o interesse no seu trabalho.
● Comer demais ou de menos.

Existem situações que podem disparar nossa ansiedade e nos fazer


antecipar nosso desempenho diante de outras pessoas. No espaço de
trabalho, algumas delas são:
● Lidar com problemas de colegas.
● Montar e realizar apresentações.
● Acompanhar e atualizar as redes sociais.
● Reuniões, almoços de equipe e festas de escritório.
● Cumprir e definir prazos em equipe.
● Falar durante as reuniões.

Certos comportamentos não nos ajudam a lidar com preocupações e


ansiedades, como tentar suprimir os pensamentos, alienar-se com álcool
e outros vícios, superestimar o risco de algo ruim acontecer ou checar
repetidamente o status nas redes sociais. Ao contrário! O que pode
contribuir para a diminuição da ansiedades é ter clareza do que
efetivamente se pode controlar e uma certa apreciação da experiência,
ainda que a vida apresente novos riscos e incertezas a cada dia. Em
relação aos desafios diários, para diminuir a ansiedade, é importante
dedicar-se a uma atividade por vez, buscando pausas para observar o que
acontece e refazer as energias.

É importante compreendermos que a tristeza é uma emoção humana


normal, que todo mundo sente de vez em quando. Como vimos na
primeira aula, ela está associada a algum tipo de perda, podendo estar
vinculada à forma como entendemos alguma situação da vida. Uma
característica interessante da tristeza é que, quando a sentimos, é como
se “nunca tivéssemos” sentido a felicidade antes, além disso, facilmente,
ela é a emoção dominante. Quando em intensidade baixa, a tristeza
favorece a análise crítica e a empatia por outras pessoas; por essa razão, a
tristeza pode ser aliviada quando desabafamos, choramos ou,
simplesmente, entramos em contato com nossos sentimentos.

O mais importante em relação à tristeza é que ela é temporária. Se ela se


intensificar e não estiver mais vinculada a algum fato específico
(geralmente de perda), é possível que haja algo mais a se investigar, como
uma possível depressão, e, nesse caso, o ideal é procurar ajuda de um
profissional de saúde mental.

Ainda, a depressão pode ser desencadeada por uma predisposição


fisiológica, como uma forte alteração hormonal, ou devido a
circunstâncias externas. O termo "deprimido" é frequentemente mal
utilizado e muitas pessoas explicam estados de melancolia a partir do
sentimento de depressão. A depressão clínica, no entanto, só pode ser
diagnosticada por um profissional de saúde mental, que pode avaliar os
sintomas e recomendar o tratamento adequado.

Muitas são as práticas contemplativas, podendo ser generativas, quando


intentam gerar pensamentos e sentimentos de compaixão ou conexão
com algo superior (como orações e mantras), de movimento (como
caminhadas ou artes marciais) ou de quietude, quando buscam promover
calma e tranquilidade (como meditação sentada). Elas são chamadas
"práticas" porque se aperfeiçoam com o tempo e a repetição, modificando
a forma como experimentamos a realidade.

De acordo com a organização CMind (2021), as práticas contemplativas


podem incluir atividades como cantar, tocar música e tricotar, bem como
práticas como ioga ou tai-chi. Em comum, elas têm a característica de
promover uma melhora em nossa saúde emocional, afastando-nos de
emoções aflitivas e nos aproximando de estados de bem-estar e
apreciação da vida.

Mindfulness é uma expressão em inglês melhor traduzida como “atenção


plena” e diz respeito a uma observação da realidade de forma curiosa e
distanciada. Quando estamos “mindful”, percebemos o que acontece de
maneira livre de julgamentos, por isso, a prática de mindfulness

torna-se uma ferramenta poderosa para nos ajudar a controlar o


sofrimento que experienciamos, promovendo calma, apreciação da
experiência e felicidade.

UNIDADE 2 - PENSAMENTO CRIATIVO E


OPORTUNIDADE PARA A RESOLUÇÃO DE
PROBLEMAS
Aula 1. Facilitação emocional do
pensamento criativo
O processo de flow
Ao realizar uma tarefa em estado flow, a pessoa sente-se “livre” de ter de
pensar e simplesmente flui. Csikszentmihaliy explica que mesmo
atividades consideradas repetitivas, burocráticas ou cansativas, pode
oportunizar momentos de criatividade, gerando satisfação posterior. Para
isso acontecer, é necessário que os indivíduos dessas atividades tenham
o chamado perfil autotélico, que consegue reconhecer oportunidades
onde outros não reconhecem e tirar bem-estar psicológico a partir de
atividades consideradas difíceis para outras pessoas. A pessoa autotélica
cria condições para o flow acontecer. Outros exemplos são as atividades
de “abrir a massa” feita em algumas pizzarias artesanais ou de “soprar o
vidro” feita em vidraçarias tradicionais. Essas são tarefas aparentemente
banais que são transformadas criativamente por pessoas autotélicas, que
retiram satisfação e promovem um toque artístico no que fazem.

Algumas outras definições ajudam a compreender melhor o flow. É


necessário que a pessoa se sinta desafiada pela tarefa e, ao mesmo tempo,
tenha condições de executá-la. Daí a importância do amplo tempo de
dedicação para que se chegue ao flow. Se temos muito domínio sobre uma
atividade e não somos desafiados por ela, é fácil cair em um estado de
tédio. Já se temos pouca habilidade e o desafio da tarefa é muito grande,
entramos em estado de preocupação ou ansiedade, uma vez que não
vemos saída fácil. Essas diferentes relações entre o desafio e a habilidade
são explicadas pela Figura 1.

O indivíduo criativo em formação

Inspirado na teoria de Csikszentmihalyi, Howard Gardner explorou as


condições necessárias para as pessoas serem criativas. Ele analisou a vida
de sete personalidades criativas: Freud, Einstein, Picasso, Stravinsky,
Eliot, Graham e Gandhi e chegou à conclusão de que a criatividade não é
um fato isolado e restrito a indivíduos geniais, ao contrário, depende das
condições de formação do indivíduo criativo, do ambiente em que
cresceu, do afeto que recebeu e das oportunidades que encontrou.
Para explicar essas condições, Gardner (1996) propôs o triângulo da
formação (Figura 2), que traz três elementos centrais:

1. Da criança ao mestre – compreensão de como o indivíduo passa de


criança a mestre, como os talentos foram identificados e que meios
encontraram para florescer.
2. Campo de domínio – a relação entre o indivíduo e o trabalho em
que se envolveu.
3. Ambiente-comunidade – a relação entre o indivíduo e outras
pessoas que fazem parte do seu mundo, tais como familiares e
professores.

A interconexão desses três elementos faz com que se compreenda as


bases do processo de criatividade no decorrer de uma vida, inclusive
todos os afetos envolvidos.

Figura 2 | Triângulo da formação. Fonte: Gonzaga e Rodrigues (2018, p.


22).

Dessa forma, o triângulo da formação engloba aspectos individuais


(herança genética, temperamento, constituição básica); aspectos do
ambiente (influência de pais, professores e demais pessoas que julgam ou
emitem opiniões sobre o comportamento do indivíduo); e o domínio (o
estágio de desenvolvimento de uma dada disciplina em uma determinada
época). O mesmo triângulo já havia sido utilizado por Gardner para
explicar o conceito de Inteligências Múltiplas.

Alguns achados na formação do indivíduo criativo

De acordo com Gardner, todos os mestres criativos estudados mostraram


dons formidáveis na infância, havendo especial destaque para o nível
de habilidade do jovem Picasso. Um desenhista talentoso na primeira
década de sua vida, ele estava no final da adolescência pintando com
tanta sutileza quanto qualquer outro artista de sua época – e lançando as
bases para mais 75 anos de produtividade. Picasso oferece a
oportunidade de considerar as contribuições da prodigiosidade para as
primeiras realizações deslumbrantes e sua transmutação em uma forma
que permite a realização de contribuições mais duradouras.

Outra característica compartilhada pelos mestres criativos é que


vivenciaram diferentes culturas e contextos, não ficando restritos aos
códigos sociais de uma determinada região ou cidade e havendo inclusive
participado de movimentos criativos de seu tempo. O autor cita o
exemplo do escritor T.S. Eliot, que se tornou de certa forma “marginal”
em sua própria era, mesclando estilos diversos em sua obra.

Por último, todos os criadores tinham algum tipo de sistema de suporte


significativo. Isso incluiu apoio afetivo de alguém de quem colhia
suporte emocional e cognitivo. Em algumas situações, a mesma pessoa
supria ambas as necessidades, em outras ocasiões, foi necessária mais de
uma pessoa para os diferentes suportes. A relação entre o indivíduo
criativo e esse “outro significativo” se compara em utilidade a outros dois
tipos de relacionamento: a relação entre o cuidador e a criança no início
da vida, e a relação entre um jovem e seu ou seus amigos no decorrer do
crescimento. Em alguns aspectos, essa relação passa por algum tipo de
embate, em que o mestre tenta introduzir um novo jeito de ver as coisas e
seu amigo-confidente é o zelador da língua e cultura existente. O que se
reforça é que a criatividade passa pela ação de forças sociais e
afetivas, que agem no desenvolvimento do indivíduo criativo.
Facilitação emocional para criar

Antes de mais nada é preciso deixar de encarar as emoções como visitas


inoportunas que atrapalham nosso pensamento e começar a
considerá-las como componentes-chave para despertar nossa
cognição. Uma das mensagens mais importantes para nosso melhor
desempenho em tarefas cognitivas de criação é de que as emoções
podem melhorar nosso raciocínio.

Isso acontece porque nossos humores têm impacto direto sobre o


pensamento. Conforme nosso humor se altera, o mesmo ocorre com o
pensamento. Assim, se somos capazes de perceber como estamos nos
sentindo e em seguida conseguirmos alterar esse sentimento, facilitamos
o espaço para pensarmos criativamente. Porque a cada mudança de
humor muda também a forma como analisamos a realidade. E esse é
exatamente o “pulo do gato” que favorece o novo chegar. E melhor ainda
se estivermos sob efeito de emoções positivas.

Os humores positivos ajudam nossa mente a “abrir janelas” e pensar em


novas possibilidades. Por exemplo, se estamos de “bom humor” de
repente nos vemos elaborando com facilidade um determinado plano de
marketing, já que esse bem-estar fornece segurança psicológica e
favorece que pensemos sobre coisas que “não estão ali”. Quando nos
sentimos alegres e confiantes olhamos para fora da caixa, arriscamos dar
uma opinião em uma apresentação coletiva, topamos um passeio
diferente, acreditamos que as coisas “podem dar certo” e diminuímos a
percepção de risco.

O contrário acontece com os humores negativos. Eles nos abrem os


olhos para tudo que pode dar errado e nesse sentido podem ser um
empecilho a novas ideias. Mas se houver uma leve mudança de um estado
negativo pode-se abrir espaço para a criatividade, especialmente para
questões de organização e ordenamento. E eis que numa tarde um tanto
melancólica olhamos para as gavetas e, no meio de uma motivação
momentânea, nos vemos descobrindo uma forma criativa de disposição
das peças. Foi nosso humor que teve uma leve alteração, suficiente para
que o “pop up” mental da criação pudesse acontecer.

A pausa também pode ser um facilitador emocional para a criatividade.


Muitas vezes simplesmente pausar e ficar sem “fazer nada” é suficiente
para construir as bases para que uma nova ideia possa surgir. Eis aqui
uma prática revelada por muitos criativos: não é só buscando a solução
que a encontramos. Vale a pena se “abastecer de informações” a respeito
do que queremos resolver, mas também deixar um tempo de folga para
que a mente intuitiva possa trabalhar subliminarmente e, sem que
possamos antecipar, a solução simplesmente “aparece” no campo mental.

Aula 2. Grupos criativos e solução de


problemas
Obstáculos à criatividade e o valor do diálogo
Todos podemos ser criativos, mas o que separa os grandes autores e
artistas dos que não criam é a crença na própria criatividade. É verdade,
no entanto, que existem alguns obstáculos à criatividade, desde
bloqueios simples de atenção até mais complexos. Eis aqui alguns deles:
1. Obstáculos da percepção – são aqueles provocados pelo próprio
ego, embates do raciocínio. A análise crítica, o julgamento e as
percepções negativas podem atrofiar o processo de criação.
2. Obstáculos emocionais – a emoção que mais bloqueia a
criatividade é o medo, em suas mais diversas formas: medo de errar,
medo do desconhecido e principalmente medo da rejeição. Algumas
pessoas dizem “tenho medo de falhar” e isso as paralisa.
3. Obstáculos intelectuais – nesse caso não há apenas a barreira do
ego, mas sim dificuldades de construção do raciocínio. Um exemplo
é algum tipo de bloqueio da linguagem e conotações específicas.
Por isso é tão difícil criar um texto em uma língua que não
dominamos.
4. Obstáculos culturais – muitas vezes ficamos presos à nossa
própria cultura. Barreiras culturais podem impedir o acesso a novas
possibilidades de ação e de pensamento.
5. Obstáculos ambientais – restrições de acesso, ação ou presença de
outras pessoas e dificuldades tecnológicas são exemplos de
barreiras à criação que independem da ação do criativo.

Muitos dos obstáculos são atitudes de autodefesa em que o indivíduo


procura evitar sentimentos ansiosos e interrompe a criação. Às vezes, a
remoção ou o afastamento dos obstáculos requer criatividade.

Alguns empecilhos para o bom diálogo são o excesso de preparação –


chegamos prontos para falar, não para ouvir – e o pensamento rígido a
respeito dos temas a serem tratados. Pessoas que pensam e conversam
com eficácia, favorecendo o processo criativo de um grupo, possuem as
seguintes qualidades:
● Escuta – Devemos ouvir não apenas os outros, mas a nós mesmos,
abandonando nossas suposições, resistências e reações.
● Respeito – Devemos permitir ideias diferentes das nossas serem
expressas, ao invés de tentar mudar as pessoas com um ponto de
vista diferente.
● Observação – Devemos suspender nossas opiniões, recuar, mudar
de direção e ver com novos olhos.
● Autonomia – Devemos falar nossa própria voz, sem termos agendas
predeterminadas com alguém ou alguma instituição. Encontrar a
própria autoridade é também desistir da necessidade de dominar.

A concretude da criatividade
Há um certo consenso de que os indivíduos criativos, sejam eles artistas,
líderes ou cientistas, têm em comum uma ampla capacidade de
observação, uma motivação e energia ímpar e às vezes uma forma
particular de viver e tomar decisões. Entende-se que seu pensamento é
mais livre e menos dependente da lógica, mais inclinado ao sonho e à
fantasia.
Contrapondo em parte essa visão, o sociólogo Domenico De Masi (2003)
desenhou um modelo para explicar grupos criativos que equilibram
razão e emoção, fantasia e realidade. De acordo com o autor, existem
quatro forças entre as quais a criatividade atua: a) o pensamento
primário, b) o pensamento secundário, c) a esfera emotiva e d) a esfera
racional.
O pensamento primário tem a ver com o funcionamento inconsciente da
psique, em que prevalece o sonho e algumas psicoses. Já o pensamento
secundário diz respeito ao funcionamento da mente desperta e serve-se
da lógica comum. A esfera emotiva é composta de emoções, sentimentos
e atitudes e a esfera racional de conhecimentos e habilidades.
Das intersecções entre esses quatro fatores surgem as condições para a
criatividade acontecer, conforme apresentado na Figura 1. Da
intersecção entre a esfera emotiva e o pensamento secundário surge a (1)
área das emoções administradas. Um exemplo dessa primeira intersecção
são os diálogos em torno de nossos sentimentos ou a dramatização em
forma de arte. Da união entre a racionalidade e a mente consciente surge
a (2) área da concretude, em que as soluções e inovações tornam-se
materiais e reais. Na intersecção entre emotividade e a mente
inconsciente está a (3) área da fantasia, em que os primeiros movimentos
involuntários do processo criativo podem surgir e entre a esfera racional,
e no pensamento primário está a (4) área das técnicas introjetadas, como
aqueles sonhos que não servem para o campo da realidade.
Assim, entende-se que a criatividade não se caracteriza apenas pela
imaginação e fantasia, mas também pelo movimento para sua realização
(concretude), ainda que na síntese do entroncamento entre fantasia e
concretude, entre emoções administradas e técnicas introjetadas
instala-se a criatividade, conforme resumido na figura a seguir.
O encontro com o artista

A arte é uma atividade do cérebro artista e sua linguagem é a imagem e o


símbolo. Por isso a linguagem do artista é sensual, alimentada pela
experiência e os cinco sentidos. Para Seaward (2009), as atividades
criativas envolvem uma combinação das funções dos hemisférios direito
e esquerdo do cérebro humano. Maslow (1987) concluiu que o processo
criativo e o caminho para a autorrealização eram o mesmo. Antecedendo
o pensamento de De Masi, ele dividiu o processo criativo em duas partes:
primária e secundária. A criatividade primária é a origem das ideias: uma
espécie de playground da mente em que as imagens são geradas, ainda
incipientes e não necessariamente úteis. Já a criatividade secundária é o
momento do processo criativo em que é traçado um plano estratégico
para que a ideia selecionada funcione na realidade, quando ela é posta
em ação.

Considerado pelo diretor Martin Scorsese como uma ferramenta valiosa


para se conectar com a própria criatividade, o livro O Caminho do Artista,
de Julia Cameron, propõe uma jornada de atividades para recuperação de
nosso eu criativo. Na base de todas as reflexões, Cameron (2019) propõe
duas ferramentas para o despertar criativo: as páginas matinais e o
encontro com o artista.

As páginas matinais são três páginas escritas à mão com livre associação.
Simplesmente isso, sem um plano prévio e sem necessidade de editar o
texto. A intenção é liberar as preocupações cotidianas ou as histórias que
passam em nossa cabeça, de forma que sobre o espaço para a criatividade
acontecer. As páginas permitem que nos afastemos de nossos censores ou
críticos internos e vão aos poucos permitindo que nos livremos de
medos, dúvidas, negatividade e outros humores que impeçam nossa ação
criativa.

Todas essas coisas que lhe provocam raiva, irritação e implicância,


escritas pela manhã, são um obstáculo entre você e sua criatividade.
Preocupações com o emprego, a lavanderia, o barulho esquisito que o
carro está fazendo, o olhar diferente do seu namorado – isso tudo fica se
revolvendo em seu subconsciente e enlameando seus dias. Deixe tudo no
papel. (CAMERON, 2019, p. 35)

A ferramenta de encontro com o artista é um tempo, talvez duas horas


por semana, reservado para alimentar a consciência criativa e o artista
interior. É uma hora “para brincar”, só que planejada com antecedência.
No momento do encontro é importante não ser interrompido.

Aula 3. Heurísticas e vieses


Os processos de tomada de decisão

Métodos racionais de tomada de decisão


Para muitos de nós, existe a percepção – e podemos dizer que, às vezes, a
esperança – de que o processo de tomada de decisão eficaz possa ter
como base uma escolha racional, que envolve identificação, escolha e
aplicação da melhor alternativa possível. Os métodos racionais são
estruturados geralmente no seguinte conjunto de etapas, conforme
Figura 1:

1. Identificar um problema ou uma oportunidade de maneira clara:


por vezes, agimos sem ter um entendimento completo do problema,
o que nos leva a resolvê-lo de maneira errada.
2. Definir o método a ser utilizado: identificação e priorização de
todos os objetivos por meio de critérios de avaliação para
selecionar a melhor opção considerando todos os aspectos
envolvidos.
3. Desenvolver possíveis escolhas ponderadas pela utilização dos
critérios: é recomendado envolver as equipes na tarefa de atribuir
peso relativo a cada problema para classificá-lo e priorizá-lo.
4. Identificar a solução otimizante: realizadas as primeiras etapas,
esta resultaria teoricamente do julgamento natural fundamentado
nas anteriores, facilitando o consenso. Recomenda-se fazer
previsões sobre eventos futuros, tentando avaliar as consequências
potenciais das escolhas.
5. Implementar a solução selecionada: deve-se avaliar, sempre que
possível, tanto a aderência aos planos quanto aos resultados
obtidos em relação aos esperados, propondo ajustes quando
necessário.

6. Avaliar a escolha selecionada: é recomendado que haja um


aprendizado sobre todo o processo, incluindo fatores não previstos
durante a implantação e diferenças de resultados entre planejado e
realizado, buscando-se aprimorar métodos e critérios para
processos futuros.

Métodos naturalistas

Os métodos naturalistas são, às vezes, a melhor opção recomendada,


dada a impossibilidade de utilização de métodos racionais em função de
fatores como:

● Problemas não estruturados que dificultam abordagens racionais.


● Presença de incertezas em ambientes dinâmicos, com ciclos que
realimentam o modelo a partir das primeiras escolhas realizadas.
● Objetivos mal definidos e mutáveis.
● Pressão do tempo para tomada de decisão.
● Múltiplos participantes com conflitos de interesse e dificuldade de
chegar a um consenso.
● O fato de que esses modelos não consideram de forma adequada as
consequências graves para o decisor, que talvez esteja inclinado a
posturas mais conservadoras ou menos arriscadas em relação às
indicadas pelos processos racionais.

A estrutura dos métodos naturalistas é apresentada na Figura 2.


Determinada situação ou problema gera estímulos que permitem o
reconhecimento de padrões adotados em situações ou casos semelhantes
que já vivenciamos. Esses padrões determinam a escolha de roteiros para
ação. A resposta pode ser mais rápida ou intuitiva ou ainda passar por
ciclos de refinamento com base nos padrões mentais que utilizamos para
análise e tomada de decisão.

Compreendendo melhor os Sistemas 1 e 2

As decisões eram influenciadas por sistemas de análise “laterais” que


colocam limites na abordagem do que se pode considerar um resultado
ótimo. Essa é a origem do Sistema 1 (rápido e intuitivo) e Sistema 2
(devagar e racional) de tomada de decisão. A evidência primária por trás
dessa dicotomia veio a partir do aprofundamento dos estudos do cérebro.
Nossos dois hemisférios cerebrais exibem uma divisão de trabalho: em
pessoas destras, o hemisfério direito desempenha um papel especial no
reconhecimento de padrões visuais e o hemisfério esquerdo nos
processos analíticos e no uso da linguagem, que é fundamental para
processos racionais de tomada de decisão.

Daniel Kahneman (2012), matemático e psicólogo também ganhador do


Prêmio Nobel em Economia em 2002, nos apresenta com mais detalhes
esses dois personagens que animam a mente:
● O Sistema 1 opera de forma automática e rápida, com pouco ou
nenhum esforço e nenhuma sensação de controle voluntário.
● O Sistema 2 atribui atenção às atividades mentais que a exigem,
incluindo cálculos complexos. As operações do Sistema 2 são
frequentemente associadas à filtros subjetivos.
Para Kahneman (2012), essas são as principais características do Sistema
1:
● Gera impressões, sentimentos e inclinações; quando endossados
​pelo Sistema 2, tornam-se crenças, atitudes e intenções.
● Opera automaticamente e rapidamente, com pouco ou nenhum
esforço e nenhuma sensação de controle voluntário.
● Cria um padrão coerente de ideias ativadas na memória associativa.
● Liga uma sensação de facilidade cognitiva a ilusões da verdade,
sentimentos agradáveis ​e vigilância reduzida.
● Infere e inventa causas e intenções.
● Negligencia a ambiguidade e suprime a dúvida.
● É tendencioso para acreditar e confirmar.
● Concentra-se nas evidências existentes e ignora as evidências
ausentes.
● Gera um conjunto limitado de avaliações básicas.
● Responde mais fortemente às perdas do que aos ganhos.

Simon (1987) destaca a importância desse sistema de tomada de decisão a


partir de seu estudo com grandes mestres enxadristas, que resolvem
problemas "criativamente" – de novas maneiras interessantes ou
socialmente valiosas – com base na experiência que acumularam em seu
campo ao longo dos anos e fazendo apostas calculadas com base em
conhecimento superior.

Já o Sistema 2 é sujeito a heurísticas e vieses, que são atalhos de


pensamento que adotamos frente a análises de situações por demasiado
complexas, em função de nossa racionalidade limitada.
Heurísticas e vieses – quando os Sistemas 1 e 2 se encontram

Em questões realmente complexas, o Sistema 2 não é suficiente para nos


ajudar a concluir por quais caminhos seguiremos em um determinado
processo de julgamento e tomada de decisão. Ou seja, os modelos
racionais utilizados não são suficientes por si só: eles são no mais das
vezes utilizados como instrumentos de apoio e análise para a tomada da
decisão em paralelo com o julgamento subjetivo do Sistema 1, estando
sujeitos ao que chamamos de heurísticas, vieses e falácias, que podem
ser definidos como atalhos de pensamento que tomamos ao fazermos
julgamentos e que possuem impacto na qualidade das decisões.

Destacamos aqui, como exemplo, alguns desses atalhos:


● Raciocínio por analogia – julgar uma situação com base em evento
anterior similar prevendo que os resultados serão os mesmos como
consequência do mesmo conjunto de ações.
● Âncora e ajuste – somos influenciados por um ponto de âncora
inicial e não nos afastamos suficientemente dele à medida que
novas informações são fornecidas. Um exemplo são as empresas,
preocupadas em impedir a entrada de novos concorrentes a seu
modelo de negócio atual, deixando de considerar o impacto das
inovações.
● Heurística de disponibilidade – estimar a facilidade de que algum
evento de impacto ocorra com base na facilidade de lembrar-se de
eventos de natureza semelhante. Temos mais facilidade em dar
crédito e aumentar a probabilidade de ocorrência de eventos
associados a fortes emoções ou eventos mais recentes.
● Falácia da satisfação – escolhemos as melhores opções dentro de
limites de tempo, orçamento, facilidade de acesso, etc., sem
necessariamente observarmos todas as alternativas. Por exemplo,
uma empresa que busca determinada solução tecnológica solicita
cotações e continua o processo de seleção até avaliar ter
encontrado uma solução satisfatória; no entanto, isso não significa
que tenha optado pela solução ótima.
● Falácia da eliminação por aspectos – por exemplo, há uma
quantidade muito grande de candidatos a uma vaga de emprego,
pela facilidade, eliminamos a maior parte dos candidatos pelos
critérios de proximidade da empresa e pretensão salarial para
verificarmos menos currículos, que já é uma análise mais
trabalhosa. Fazendo assim, corremos o risco de deixar de lado os
candidatos potenciais.

Daniel Kahneman et al. (2021), em seu mais recente livro, exploram outros
atalhos comuns no meio corporativo:
● Ilusão de compreensão: construímos narrativas para ajudar na
compreensão e dar sentido ao mundo. Procuramos causalidade
onde não existe.
● Ilusão de validade: analistas e especialistas tendem a
sobrevalorizar suas capacidades de análise e tomada de decisão.
● Falsa Intuição de especialista: algoritmos, mesmo os
aparentemente primitivos, aplicados com disciplina muitas vezes
superam os especialistas.
● Falácia de planejamento: essa falácia aflige muitas profissões e se
origina de planos e previsões que estão irrealisticamente próximos
do melhor caso e não levam em consideração os resultados reais de
projetos semelhantes.
● Otimismo e a ilusão empreendedora: a maioria das pessoas é
excessivamente confiante, tende a negligenciar os concorrentes e
acredita que eles terão um desempenho melhor do que a média.

Para Daniel Kahneman et al. (2021), nos casos de decisões complexas em


organizações, é essencial que se desenvolvam formas estruturadas de
análise da qualidade das decisões tomadas, as quais sejam conduzidas
por times de pessoas que trabalhem de forma independente e sem
conflito de interesse com as decisões tomadas e seus resultados e,
preferencialmente, apoiadas por métricas quantitativas da qualidade ou
do riscos associados às decisões.
Aula 4. Aprendendo a aprender
Um café no ciclo de Kolb

A teoria do estilo de aprendizagem experiencial de Kolb foi criada nos


anos 1980 e revolucionou a forma como pedagogos e professores do
mundo todo elaboram seus planos de ensino. Ela é representada por um
ciclo de aprendizagem de quatro estágios. Para que a aprendizagem seja
facilitada, a ideia é que o aluno possa acessar o conhecimento em cada
uma das bases. Os estilos de aprendizagem de Kolb são:
1. Experiência concreta – uma nova experiência ou situação é
encontrada, ou uma reinterpretação da experiência existente.
2. Observação reflexiva da nova experiência – permite fazer a
compreensão da experiência e verificar possíveis inconsistências.
3. Conceitualização abstrata – reflexão sobre o que foi aprendido,
que dá origem a uma nova ideia ou modificação de um conceito
abstrato existente.
4. Experimentação ativa – o aluno aplica suas ideias no mundo ao
seu redor para ver o que acontece.

A aprendizagem efetiva acontece quando a pessoa progride pelo ciclo de


quatro estágios: (1) há uma experiência concreta seguida por (2)
observação e reflexão sobre essa experiência, que leva à (3) formação de
conceitos abstratos (análise) e generalizações (conclusões) que são então
(4) usados para testar uma hipótese em situações futuras, resultando em
novas experiências.

Se em uma situação hipotética fôssemos ensinar alguém a fazer uma café


percorrendo todo o ciclo de Kolb, poderíamos: (1) começar com uma
sessão de degustação de diferentes cafés, (2) refletir sobre como
absorvemos a experiência e qual café nos agradou mais, podendo
inclusive escrever a respeito e depois (3) compreender os processos de
maturação dos grãos, formas de processamento e técnicas de produção
para (4) testar possibilidades alternando técnicas de moagem inovadoras,
que não havíamos experimentado antes.

Vários fatores influenciam o estilo de aprendizado de cada pessoa: o


ambiente em que ela cresce, suas experiências no campo educacional e
mais especificamente, conforme a teoria de Kolb, sua forma individual de
pensar.

Existem dois pares de variáveis que influenciam nossa forma de


aprender, duas dimensões com pares opostos: o par pensar/sentir e o par
observar/agir. Quando estamos experimentando determinada atividade
(experiência concreta) estamos pensando a respeito e quando paramos
para compreender o que essa experiência causou em nós
(conceitualização abstrata), estamos no campo das emoções e dos
sentimentos.
O melhor jeito de aprender

Da base do sistema de liderança das empresas até o nível de


desenvolvimento gerencial, as organizações investem todos os anos
milhões de reais em capacitação in company ou vinculada a instituições
de ensino superior, com o objetivo de preparar sua força de trabalho para
os diversos desafios do mercado. Assim, seja qual for a área de trabalho
em que se atua, há uma necessidade de contínuo aprendizado, conhecido
como “forever learning”.

Nos últimos anos, o grande desafio tem sido capturar a atenção das
pessoas, uma vez que o uso de imagem e vídeos em alta escala
transformou a figura do professor em um facilitador de diferentes
conhecimentos, encriptados em diversas “mídias”. Se antes o único meio
de ensino era da fala de um professor para um aluno, atualmente as
metodologias ativas de aprendizagem provocam o aluno para um maior
envolvimento em seu processo de aprendizagem.

Idealizada pelo psiquiatra americano William Glasser (1998), a pirâmide


de aprendizagem dá ampla ênfase às formas de aprendizagem ativa (ver
Figura 2), que dizem respeito a: discutir o que foi estudado (conversar,
perguntar, repetir, recordar, debater, nomear), praticar (escrever,
interpretar, traduzir, comunicar, catalogar) e ensinar (explicar, resumir,
estruturar, ilustrar). Essas três formas ativas de aprendizagem envolvem a
percepção subjetiva do aluno, ou seja, convidam às emoções, tanto pelo
entusiasmo que geram como pela interpretação que suscitam.

O efeito Netflix na tomada de decisão

Você já ficou perdido na busca pelo filme ou série ideal para assistir? Já
chegou ao ponto de esgotar as opções disponíveis de entretenimento? Na
Netflix existe a opção “me surpreenda”, disponível para aqueles
expectadores realmente indecisos, que procura “zerar” o perfil existente
e trazer novas possibilidades. Mas ainda assim há aqueles que desligam a
tela depois de muito tempo “zapeando”, havendo desistido de escolher.
Em seu discurso de formatura em Harvard, o orador Pete Davis (2018)
chamou esse fenômeno de dificuldade de tomar decisões e se
comprometer com uma única alternativa de “mantenha minhas opções
em aberto” e disse que é o típico estado mental que caracteriza toda uma
nova geração de trabalhadores.

A dificuldade de tomar decisões afeta diretamente na capacidade de


aprender. Isso porque seja qual for o tema que desperte nosso interesse, é
preciso comprometimento com o que estamos lendo, ouvindo ou
escrevendo de forma a produzir aquele sentimento de “a-há” que
caracteriza a produção de sentido e, por consequência, a aprendizagem. É
preciso também paciência para passar por trechos não tão interessantes,
não tão envolventes, para que em algum momento o conteúdo possa ser
todo absorvido por nossos canais cognitivos.

Como aprender melhor

Com a mudança nos modelos de carreira, já a partir dos anos 1990,


tornou-se crucial que tenhamos compromisso com nossa aprendizagem,
buscando cursos e qualificações que possam fornecer novas
competências ou aperfeiçoamento das habilidades que já possuímos.

Mas o que pode facilitar nosso processo de aprendizagem? Como


podemos aprender melhor?
Algumas variáveis importantes para considerarmos são o tipo de curso
certo, o currículo dos professores, a solidez da instituição de ensino, a
abordagem metodológica. Mas talvez a variável mais importante não seja
o curso em si e sim a postura de quem busca, ou seja, a qualidade do
aluno.

Diretor de Recursos Humanos de uma instituição financeira, Kehoe (2018)


estudou o comportamento de alunos de cursos on-line. Quatro hábitos
que contribuem para aprendermos novas habilidades:

1. Concentre-se em habilidades emergentes – no lugar de se inscrever


no curso mais famoso e badalado, é preciso ficar atento àqueles
requisitos de trabalho que estão evoluindo rapidamente.

Nos anos da pandemia, por exemplo, as habilidades ligadas à produção e


edição de vídeo passaram a ser extremamente valorizadas, não apenas
por profissionais liberais, mas também por organizações que precisaram
gravar suas reuniões e treinamentos e disponibilizar em rede.

A dica de Kehoe é ficar atento a ofertas de emprego recentes e mapear


que tipo de qualificação está surgindo ou conversar com líderes e
perguntar que tipo de habilidade eles consideram importante para tornar
um candidato viável.

2. Conecte-se com seu curso – vivemos uma época de amplo


crescimento da aprendizagem on-line. A vantagem de assistir às aulas
quando e onde for conveniente, com um custo reduzido, torna essa opção
muito atraente. O problema é que as experiências assíncronas costumam
ser solitárias, causando perda de motivação e queda na aprendizagem.
Nesse sentido, prefira formações que permitem algum momento de troca
síncrona. Caso isso não seja possível, defina atividades de rotina para
repassar os conteúdos ou estudar com olhar renovado o que foi abordado.

3. Implemente o aprendizado imediatamente – aplicar os


conhecimentos aprendidos de forma imediata permite completar o ciclo
de aprendizagem, facilitando a memória e melhorando a absorção dos
conhecimentos. O contrário também ocorre: se deixamos por muito
tempo um conteúdo sem uso, é altamente provável que venhamos a
esquecê-lo.

4. Defina objetivos claros – para manter o foco na aprendizagem, é


necessário te objetivos de médio e longo prazo – um novo emprego, uma
promoção na carreira, uma chance de fazer parte de uma grande equipe.
Saber que o que aprendemos pode contribuir com nossa carreira,
melhora nosso envolvimento com o que é ensinado.
UNIDADE 3 - COMUNICAÇÃO E
PROTAGONISMO DE VIDA
Aula 1. Do verbal para o não verbal
O que observar nas relações

De acordo com Dimitrius (2009), existem categorias de indicadores não


verbais: aparência física, linguagem corporal e voz são os mais
prementes, pois já permitem uma leitura emocional, ainda que em breve
interação. Primeiramente, vamos falar brevemente sobre essa tríade e na
sequência vamos aprofundar a leitura não verbal, entrando nos demais
indicadores:
1. Aparência física – a forma como uma pessoa se apresenta
transmite a informação que ela quer passar, mas também dados não
intencionais. Exemplo: alguém que esteja muito bem-vestido, mas
com as unhas totalmente ruídas pode indicar uma certa ansiedade
ou tema de preocupação. Essa é a “primeira impressão” que
captamos de uma pessoa e inclui características físicas, como
postura e altura, mas também escolhas afetivas, como estilo de
roupa, uso de maquiagem e acessórios em geral. O mais importante
vai ser comparar essa impressão com os demais indicadores
emocionais.
2. Linguagem corporal – esse é o indicador que mais fornece
informações emocionais, pois traz comportamentos que em geral a
pessoa não consegue disfarçar: movimentos leves do corpo,
maneirismos, gesticulação de mãos. Por ele é possível captar o nível
de energia de alguém (pessoas mais motivadas tendem a
movimentar-se mais), mas também é possível captar emoções como
medo, honestidade, nervosismo, alegria. Aqui já é interessante fazer
a comparação com a aparência física e ver se “combinam” ou são
incoerentes.
3. Voz – o mais importante nesse indicador não é tanto o que é dito,
mas como é dito, ou seja: se a voz sai alta ou baixa, aguda ou grave,
entrecortada ou contínua. O mais importante aqui é a intensidade
com que o traço aparece. Exemplo: um pequeno tremor na voz não
necessariamente indica nervosismo, especialmente se for pontual.
Mais uma vez é interessante comparar – voz, linguagem corporal e
aparência – vendo possíveis incongruências.

Outros indicadores e legenda emocional digital

Havendo captado a aparência física, linguagem do corpo e voz –


fundamentais para a leitura emocional – é possível, com o avanço de
tempo da interação, captar outros quatro indicadores não verbais: estilo
de comunicação, conteúdo da comunicação, ação e ambiente. Esses novos
indicadores permitem que, mais do que uma breve percepção de humor,
possamos captar crenças pessoais, valores, experiências e atributos
da personalidade de uma pessoa. Vamos falar um pouco sobre cada um
deles:
1. Estilo de comunicação – aqui estão contidas diversas técnicas de
comunicação, como: deixar de responder, responder breve ou
longamente, responder com perguntas, pausar, interromper,
divagar, mudar de assunto, trazer ou tirar atenção de si mesmo.
Muitas dessas ações são instintivas, outras são manobras
conscientes para dominar a conversa.
2. Conteúdo da comunicação – aquilo que é dito importa para se ler
uma pessoa e, especialmente, o que há de “embrulho” no conteúdo,
aquele tipo de ênfase que se dá a um assunto ou outro.
Especialmente, deve-se procurar por elementos como uso de gírias
(aponta base étnica ou cultural), temas repetidos, exageros e até
presença ou não de se falar de outras pessoas (fofoca).
3. Ação – a forma como uma pessoa se comporta com os outros
também fornece informações valiosas sobre seu comportamento,
assim como o tipo de atividade que ela executa. Por exemplo,
pessoas que passam muito tempo em posição de autoridade e
controle como atividade profissional tendem a levar para casa e
para as interações sociais esse tipo de atitude. Outras possíveis
leituras a partir desse indicador: como alguém reage sob pressão,
como a pessoa chega na casa de um estranho, como interage com
crianças, etc.
4. Ambiente – esse indicador fornece o “pano de fundo” em que as
interações humanas acontecem, nos fornecendo contexto. Por
exemplo, no espaço de trabalho é possível observar
comportamentos coletivos e até mesmo subculturas. Assim é que a
área de marketing tende a ser mais descontraída do que a área
financeira. Nesse sentido, o lugar em que as pessoas interagem
interfere diretamente no tipo de comunicação realizada.

Legendas emocionais no mundo digital

Nas últimas décadas, ampliamos muito a facilidade de comunicação e


acesso a outras pessoas. No início dos anos 2000 lembro-me de uma amiga
executiva me confidenciar em um aeroporto, enquanto aguardávamos um
voo: “amiga, recebi mais de 300 mensagens em meu Blackberry hoje”.
Lembro de ter ficado horrorizada. Naquela época o meio principal de
comunicação era o e-mail. Hoje, temos WhatsApp, Direct, Chat pelo
Teams e, sim, e-mail. Trabalhamos na redundância também: por exemplo,
enviar um Whats dizendo que envio um e-mail. Se somarmos a essas
mensagens rápidas o arsenal de notificações de aplicativos de redes
sociais que recebemos em nosso celular, vemos que ganhamos em
quantidade na troca de informações e perdemos, muito, em qualidade.
Daí que se configura importante sabermos fazer a legenda emocional, a
partir do tom da mensagem e do uso de emojis ou interjeições mais
amigáveis. Alguns exemplos a considerar:
● E-mail – aqui o principal é como abrimos e como finalizamos a
mensagem. A intenção é ser breve, mas não taquigráfico. Um cordial
“bom dia” e no final “um abraço” (caso nos sintamos à vontade com
o interlocutor) tiram o ar tão formal que o e-mail ainda tem.
● Mensagens instantâneas – emojis demais trazem infantilidade ou
informalidade para a mensagem e emojis de menos trazem a
sensação de uma troca mais rígida e formal. Áudios merecem ser
curtos e poucos, geralmente para pontuar algo muito específico.
Uso de figurinhas é liberado em trocas com amigos ou familiares,
cuidando para não exagerar no deboche.

O que cada emoção nos diz

Em nossa busca por bem-estar contínuo e evitação de sentimentos


negativos, por vezes não conseguimos ver com clareza a realidade que se
apresenta. Nossos estados emocionais de base – medo, raiva e tristeza –
fornecem um determinado “filtro” para nossa leitura de mundo. Essas
emoções e seus estados emocionais decorrentes (como frustração,
ansiedade ou culpa) podem dificultar que vejamos com objetividade
nosso próprio comportamento ou de outras pessoas. Assim, tendemos a
tomar decisões baseados em evitar o que é doloroso ou buscar o que é
agradável para nós no momento.

No entanto, compreender as razões de base para nossas emoções pode


permitir uma tomada de consciência e uma orientação para nosso
comportamento, como já vimos em nossas primeiras aulas. Assim é que “o
coração tem motivos que a razão desconhece”, como dizia Pascal. E nos
beneficiamos muito em conhecer as bases emocionais de nosso
comportamento.

Por isso, vamos explorar aqui como a tríade de emoções negativas, medo,
tristeza e raiva, influencia nossa percepção da realidade.
● Medo – a força para evitarmos a perda, a dor ou a morte é o desejo
mais primitivo em todos nós, nosso motivador primário. Por isso, a
tentativa de puramente evitá-lo é infrutífera. Devemos, ao
contrário, compreender qual é exatamente a situação que tememos.
Explorar cenários e possibilidades que desejamos e investigar as
possibilidades que aconteçam. A melhor arma contra o medo é o
conhecimento.
● Tristeza – Na leitura interpessoal, a emoção da tristeza acaba
aparecendo em comportamentos de carência e privação afetiva,
uma vez que quando estamos tristes acabamos interrompendo o
fluxo de trocas e “nos isolando” em nós mesmos. Quando estamos
carentes, tendemos a “precisar” de soluções ou respostas rápidas.
Uma boa saída é ganhar tempo e verificar se aquilo que tanto
desejamos é mesmo necessário e urgente ou se só estamos tentando
preencher algum vazio interior.
● Raiva – a principal barreira para compreender a realidade que a
raiva oferece é a incapacidade de ouvir que ela provoca. Quando
estamos nos sentindo acuados, tendemos a só ver as coisas de
nosso ponto de vista, nos tornando incapazes de conhecer as razões
de outras pessoas. Aqui a estratégia de saída é buscar conhecer
mais todos os elementos envolvidos. Só assim conseguimos ter
nosso melhor julgamento.

Aula 2. Influência positiva


Fazer amigos e influenciar pessoas

Adicionalmente, que eles pudessem expressar suas ideias com clareza


eficiência e equilíbrio nos seus contatos comerciais. Posteriormente,
tornou-se um fenômeno mundial de vendas, já tendo chegado a mais de
50 milhões de pessoas. Seus conselhos são interessantes de resgatarmos
aqui na disciplina, por apontarem princípios básicos das interações
humanas. Como a teoria de base, ancora-se no comportamentalismo, ou
do inglês, behaviorismo. Como veremos posteriormente, esses princípios
não dão conta de alguns desafios nos relacionamentos que os tempos
atuais oferecem e podem estar na contramão da influência obtida a partir
da autenticidade.

São nove os princípios de liderança de Carnegie (2012):


1. Comece com um elogio ou uma apreciação sincera.
2. Chame a atenção para os erros das pessoas de maneira indireta.
3. Fale sobre os seus erros antes de criticar os das outras pessoas.
4. Faça perguntas ao invés de dar ordens indiretas.
5. Permita que a pessoa salve seu próprio prestígio.
6. Elogie o menor e todo progresso, seja sincero na sua apreciação.
7. Proporcione à outra pessoa uma boa reputação para zelar.
8. Empregue o incentivo, torne o erro fácil de ser corrigido.
9. Faça a outra pessoa sentir-se feliz realizando aquilo que você
sugere.

Como pode-se perceber, no centro dos princípios de Carnegie está que


devemos apreciar as pessoas, elogiar seu bom desempenho, evitar
criticá-las abertamente, incentivá-las a repetirem os comportamentos
delas desejados. A teoria de base para esse ensinamento advém do
psicólogo B. F. Skinner, que já pontuava nos anos 1930 que qualquer
animal, quando recompensado por seu “bom comportamento”, aprenderá
com mais facilidade e rapidez do que se for castigado por mau
comportamento.

Em outras palavras, nós seres humanos tendemos a nos comportar de


forma a evitar o sofrimento ou buscar o prazer, sendo ambas forças que
modelam nosso comportamento. Nesse sentido, a crítica, dura e
contundente, provoca em nós sentimentos negativos de autodepreciação
e culpa (sofrimento), funcionando como um reforço negativo. Já o elogio,
por promover sentimentos agradáveis de alegria, satisfação e felicidade,
funciona como um reforço positivo.

Não há nada de errado em elogiar as pessoas. Todos gostam de ser


recompensados pelo bom cumprimento de uma tarefa. Porém existe o
contexto ideal para cada elogio. Há, por exemplo, o entendimento de que
“é melhor elogiar no coletivo e criticar no privado”. Nem sempre isso é
verdade. Por exemplo, se uma pessoa é elogiada coletivamente, havendo
também participação das outras na entrega que é mencionada no elogio,
isso pode ser considerado injustiça e gerar intrigas em uma equipe de
trabalho. Ainda, se um elogio vem logo após uma crítica, ainda que ela
seja sutil, ambos podem sair esvaziados, ficando o interlocutor confuso
sobre seu comportamento. Também importa de quem vem o elogio e,
acima de tudo, se é sincero. Ao contrário, uma crítica bem
contextualizada e com intenção construtiva torna-se uma semente de
aprendizado. Ou seja, mais importante do que se diz é como se diz e com
que intenção.
Formando alianças

As relações profissionais exercem impacto em diferentes frentes, desde a


disposição para exercer nossas habilidades até a facilidade de acesso a
informações relevantes. No contexto de trabalho, formar alianças
permite que se encontre uma identidade coletiva e que se estabeleça um
bom convívio nas interações. De acordo com Dillon (2018, p. 166), formar
uma aliança é “tomar a decisão de encontrar e cultivar relações
profissionais com pessoas que você respeita, de quem gosta e com quem
deseja trabalhar”. Existem, porém, linhas tênues para separar a prática de
formação de alianças saudáveis – que permite que as pessoas se
desenvolvam e atuem em um bom clima de trabalho – das formações
tóxicas, como as que dividem as pessoas em “panelinhas”, o que pode ser
bastante nocivo para as trocas entre equipes.

Para formarmos boas alianças, é necessário ter clareza de que pessoas


queremos nos vincular, de que forma podemos contribuir com elas e elas
conosco. Ser um bom aliado é ser útil para as pessoas, contribuir para seu
desenvolvimento, participar com entusiasmo de atividades que o outro
organize.
Assim como as amizades, as alianças precisam de cuidados para
permanecerem saudáveis. O contato regular ajuda a manter a sintonia. A
comunicação precisa ser assertiva, por isso a crítica construtiva, assim
como a desculpa sincera, são movimentos que podem ajudar a estreitar
laços e promover confiança.

Em alguns momentos, pode ser necessário se afastar, especialmente


quando o aliado começa a agir de maneiras que vão em direção oposta a
seus valores pessoais. Isso porque o mau comportamento de um aliado
pode se refletir em quem está ao seu lado.

Alianças saudáveis são aquelas que permanecem enquanto as diferentes


partes podem contribuir uma com a outra. E tudo bem serem podadas ou
renovadas, uma vez que o que torna o laço forte é a utilidade que tem
para o bem-estar coletivo.
Influência, autenticidade e poder

“Ser autêntico e ter sabedoria são dinâmicas humanas intimamente


relacionadas, que se reforçam e constroem mutuamente.”

Kets de Vries (2012, p. 266)

Na contramão das selfies, autenticidade implica ser verdadeiro consigo


mesmo e as demais pessoas, viver de forma integrada aos próprios
valores e princípios, encontrar significado no que se faz. Uma pessoa
autêntica tem a disposição de se aceitar como é e não tenta se fazer
passar por outra coisa ou outra pessoa. Tem a coragem de dizer como são
as coisas, consegue encarar a verdade e fazer a coisa certa porque isso é
correto. Consegue ver seus pontos fortes e os seus pontos fracos, sendo
paciente com as próprias falhas (DE VRIES, 2012).

A autenticidade aumenta a coragem de sermos diferentes e seguirmos o


que nossos corações e mentes pedem, não o que os outros querem. Por
isso, os maiores testes de autenticidade surgem quando nossa opinião ou
nosso jeito de ser não combina com o da maioria. Ser autêntico implica
fazer coisas que façam sentido para nós e que nos tornem úteis para a
sociedade.

Disso decorre a relação entre a autenticidade e a influência: uma pessoa


autêntica torna-se influente porque tem clareza do que prefere fazer e
como fazer. No mundo das incertezas e da validação de comportamento a
partir do olhar do outro torna-se inspirador ver uma pessoa “com luz
própria”, que não busca dissuadir olhares, e sim aceita-se como é. A
exemplo disso, voltando-se à analogia das redes sociais, tem-se o
movimento de “body positive”, em que pessoas postam fotos reais de seus
corpos e produzem simpatia pela veracidade que buscam divulgar.
Mas qual a relação entre influência e poder?

Poder é a capacidade de influenciar o comportamento de outras pessoas


para conseguir o que se deseja. Em nossas vidas, o poder traz
consequências negativas ou positivas, a depender da maneira como essa
colaboração do outro é obtida. Entre as consequências negativas
podemos apontar a corrupção, a autocracia, o abuso moral. Quando
aplicado com inteligência social e positivamente, o poder pode produzir
alinhamento, senso de identidade e bem-estar entre as pessoas.

De acordo com especialistas em comportamento organizacional, existem


seis fontes de poder (McSHANE; VON GLINOW, 2014). Em cada situação
podemos ter uma delas ou todas, ficando assim mais influentes:
● Poder legítimo – que vem da posição hierárquica exercida em uma
organização.
● Poder de recompensa – habilidade de fornecer recompensas,
como pagamentos ou posições de interesse dos outros.
● Poder coercitivo – habilidade de retirar punições ou exercê-las.
● Poder de especialista – aquele que vem do conhecimento ou de
habilidade específica.
● Poder de informação – similar ao de especialista, porém diz
respeito ao acesso à informação.
● Poder por referência – daquele que tem características pessoais
que outras pessoas desejam.

Aula 3. Tornando a comunicação


empática e assertiva
Bases da comunicação não violenta (CNV): conhecendo os próprios
valores

“A violência é a expressão de uma frustração impossível de ser manifesta


em palavras.” D’Asembourg (2018, p. 17)

Formas violentas de comunicação fazem parte de nosso inconsciente


coletivo. Na base estão as emoções de raiva e medo, atuando em nós por
meio das palavras. A violência nas relações surge como efeito da ausência
de consciência e surge não para criar, estimular ou proteger nossas ideias
ou bens, e sim para exercer pressão sobre outras pessoas. Na maior parte
das vezes, a violência é sutil, não chegando a agressões físicas ou verbais,
e sim imposta como uma pressão no campo afetivo e psicológico. Ao
contrário, quando somos mais conscientes, conseguimos exprimir nossa
intenção e vontade sem agredir a outra pessoa, nos comunicando de
forma empática e assertiva.
O processo de comunicação não violenta foi proposto pelo psicólogo
Marshall Rosenberg nos anos 1960, em sintonia com o movimento dos
direitos civis americano. Durante esse período, Rosenberg atuou com
arbitragem e forneceu treinamento em sua recém-criada técnica
comunicativa CNV (comunicação não violenta). Muitos anos se passaram
e a tecnologia revolucionou nossa comunicação. Basta, no entanto, uma
zapeada nas redes sociais para que encontremos comentários raivosos e
posicionamentos que isolam as pessoas em seus pontos de vista. Também
em organizações a comunicação tornou-se mais ágil e ganhou novas
mídias, mas seguem as trocas ácidas e os comentários belicosos.

Atualmente, a CNV é utilizada na resolução de conflitos em mais de 65


países do globo, sendo aplicada para o desenvolvimento de sistemas
sociais, na justiça restaurativa, nas organizações e na área de educação.
Em suas diversas aplicações, permanece tendo por base a consideração
do bem comum e uma atitude baseada em empatia, por isso também
chamada de comunicação empática ou comunicação compassiva. Para
facilitar a compreensão em nossa aula, vamos nos referir a ela
simplesmente como CNV.

De acordo com D’Ansembourg (2018), a CNV nos estimula a parar e refletir


sempre que reagimos fortemente a alguma coisa ou situação. O processo
da CNV é composto por quatro fases: observação da situação, leitura dos
sentimentos envolvidos, compreensão da necessidade de base e
formulação de um pedido.

Mas por que temos dificuldade de expressar nossas necessidades? Uma


explicação possível é de que somos seres sociais. Crescemos nos
acostumando a perceber a reação das outras pessoas e buscando
corresponder ou nos antepor às necessidades delas. Por isso, muitas
vezes, “partimos do princípio” de que estamos atendendo a necessidade
de alguém quando, na verdade, não chegamos nem mesmo a
compreendê-la. Podemos, aliás, estar simplesmente projetando.

Julgamentos e rótulos

Julgamos os comportamentos de outras pessoas o tempo todo. Vemos


passar aquele colega tatuado e imaginamos que sua vida inteira é muito
descolada. Não sabemos nada a respeito da vida dessa pessoa e nem
imaginamos que não é um cara “de Humanas”, mas sim um engenheiro de
qualidade. Construímos nosso mundo a partir do pouco que vemos do
outro e, assim, “assumimos” algumas verdades que acabam por atalhar
nossas interações.

O primeiro componente ou fase da CNV pede para que observemos a


realidade de nossa troca tal como ela aparece, livres de julgamentos e
preconcepções, ou seja, observar sem avaliar. Abrindo-nos ao que está
acontecendo e conhecendo nossos próprios valores e crenças, podemos
abrir espaço para chegar às nossas emoções e necessidades pessoais.
Percebendo emoções e necessidades

No segundo momento da comunicação empática, passamos a ficar mais


atentos a nossos próprios sentimentos e aos sentimentos do outro.
Deixamos de jogar a responsabilidade do que sentimos para as pessoas
(“você me fez sentir raiva de...”) para colocar a responsabilidade em nós
mesmos: “estou com raiva porque meu valor de ... foi violado”.

Os benefícios de se enriquecer o vocabulário emocional aparecem nos


relacionamentos pessoais e no mundo profissional. Expressar a nossa
vulnerabilidade pode ajudar a ampliar o espaço de confiança nas
conversas e trocas e resolver ou diminuir conflitos (BROWN, 2013).
Especificamente conhecer nossos sentimentos permite que possamos
saber quais necessidades estão ou não sendo atendidas, pois são por elas
que nossas emoções são ativadas.

Chega-se então ao terceiro momento da CNV: a compreensão de nossas


necessidades. Fundamental é esse momento de acolher o fato de que
temos desejos intrínsecos, necessidades relacionadas às nossas questões
fisiológicas, necessidades ligadas à segurança, aos relacionamentos, de
estima e de realização pessoal ou crescimento. Nesse sentido, é
interessante trazermos a Teoria da Hierarquia de Necessidades (Figura 1),
proposta por Maslow nos anos 1980 e amplamente difundida no âmbito
acadêmico.

Identificar nossas necessidades provoca alívio e bem-estar, ainda que


não tenhamos condições imediatas de satisfazê-las. No entanto, podem
surgir divergências quando partimos do princípio de que as outras
pessoas, especialmente as mais próximas, têm a obrigação de conhecer e
até satisfazer as nossas necessidades. Por isso é fundamental que
saibamos formular pedidos.

Aprendendo a fazer pedidos e praticar a CNV

Falamos até aqui sobre o valor de considerarmos nossas emoções e


conhecermos nossas necessidades. Esses movimentos são fundamentais
para que possamos chegar ao último componente da CNV: fazer pedidos.

Muitas vezes, confundimos pedidos com necessidades, e vice-versa. Por


isso, é importante separarmos sentimento (S), necessidade (N) e pedido
(P).

Praticando a CNV

Havendo compreendido os quatro componentes da CNV de observar (O),


sentir (S), perceber a necessidade (N) e fazer pedidos (P), é importante
aplicar todos os componentes ao mesmo tempo e, para isso, é
fundamental recebermos a realidade do outro com empatia.

A empatia permite que se faça uma compreensão respeitosa do que as


outras pessoas estão vivendo ou sentindo e para acontecer faz uso de
todos os nossos sentidos. Só conseguimos ser empáticos quando
esvaziamos a nossa mente de ideias preconcebidas. Quando empáticos,
preferimos perguntar e ouvir, em vez de falar. O hábito da pergunta
amplia nosso espaço na interação com o outro e a escuta favorece a
abertura a falar de sentimentos.

Um outro cuidado para favorecer a empatia é evitar pensar demais já


que o excesso de trabalho cognitivo atrapalha a troca afetiva, uma vez
que ficamos tentando encontrar causas e efeitos na fala do outro e
perdemos sinais importantes de como a pessoa está se sentindo. Dois
bons sinais de que estamos de fato praticando um diálogo empático: (1)
não sabemos o que vamos dizer a seguir e precisamos da fala do outro
para construir nosso posicionamento e (2) na linguagem não verbal do
outro, a partir por exemplo do tom de voz e movimentos do corpo, é
possível perceber sinais de calma e bem-estar. A conversa segue fácil e de
forma confortável.

Aula 4. Inteligência social


As bases do contágio emocional

Os primeiros anos de nosso milênio trouxeram para a pesquisa científica


um campo emergente: a neurociência social. Estudos recentes revelam o
que acontece no cérebro humano enquanto as pessoas interagem. O que
se descobriu é a força da empatia. Quando entramos em contato com os
sentimentos de outras pessoas e compreendemos seus motivos, temos
nossa química cerebral afetada, assim como afetamos o outro. Não se
trata apenas de dois cérebros reagindo independentemente, mas, ao
contrário, dois cérebros que funcionam como um único sistema
(GOLEMAN; BOYATZIS, 2008).

A compreensão desses poderosos circuitos sociais do cérebro permitiu


que se ampliasse a nossa teoria de inteligência emocional (IE) –
anteriormente fundamentada em teorias de psicologia individual ou
intrapessoal –, compreendendo-se agora que existe uma vasta zona
interpessoal de ação da IE. Inteligência social é então definida como um
conjunto de competências interpessoais construídas em circuitos neurais
específicos (e sistemas endócrinos relacionados) que inspiram outras
pessoas a serem eficazes (GOLEMAN; BOYATZIS, 2008).

As interações que temos com as pessoas atuam como reguladoras de


nossas emoções, acionadas pelo sistema límbico de nosso cérebro.
Quanto mais forte nossa ligação emocional com alguém, maior é a força
com que os cérebros se influenciam. Por isso, nossas trocas mais potentes
ocorrem com pessoas que passamos mais tempo e aquelas que mais
importam para nós, ou seja, mais vezes são acessadas em nossos
sentimentos e pensamentos (GOLEMAN, 2019).

Nossos sentimentos têm consequências biológicas de longo alcance,


sendo espalhados em nosso corpo por meio da ação de
neurotransmissores (acetilcolina, noradrenalina, serotonina, dopamina,
ocitocina, etc.), que regulam os sistemas biológicos, do coração às células
do sistema imunológico. Por isso, de acordo com Goleman (2019), nossos
relacionamentos moldam nossa experiência e nossa biologia.

O mais interessante é que, além de influenciar nosso corpo e nossas


interpretações da realidade, nossas interações podem também influenciar
diretamente o que estamos sentindo. Esse fenômeno é conhecido como
contágio emocional.

Quando pessoas despejam sobre nós seus sentimentos tóxicos –


explodindo de raiva ou fazendo ameaças, demonstrando repulsa ou
desprezo – ativam em nós circuitos que provocam essas mesmas emoções
aflitivas. (GOLEMAN, 2019, p. 23)

Quando as emoções trocadas são negativas, há muita força no contágio,


uma vez que somos programados evolutivamente para captar tudo que
possa nos ferir ou nos causar perda. Nossa amígdala cerebral está sempre
vigilante, por isso é mais fácil se contagiar com as emoções negativas.

Mas o contágio emocional pode também ser positivo. E eis que nos vemos
gargalhando após vermos outra pessoa gargalhar ou quem sabe fiquemos
felizes tão somente por ver uma criança sorrir. O fato é que participamos
o tempo todo de uma espécie de economia emocional, em que são feitas
trocas entre as pessoas a partir da forma como se sentem. Tudo isso
ocorre de forma subconsciente, o que faz com que seja muito importante
termos consciência de que tipo de mensagem não verbal estamos
emitindo, a partir da expressão de nossos sentimentos e o que estamos
conseguindo captar.
Relações ressonantes e salutares

“É por observação que no futuro eles não vão se lembrar do que você disse,
eles não vão se lembrar do que você fez, mas vão se lembrar de como você
os fez se sentirem.”

Maya Angelou (apud DOUGLAS, 2019, p. 67)

A inteligência social pode ser compreendida como o conjunto de


habilidades socioemocionais que utilizamos na interação com outras
pessoas. No modelo de Goleman e Boyatzis (2016), mencionado em nossa
Unidade 1, a inteligência social diz respeito às dimensões de empatia e
gestões de relacionamentos. Já Albrecht (2006) entende que são cinco as
dimensões da inteligência social:
1. Consciência situacional – radar social ou habilidade de ler
situações e interpretar comportamentos de outras pessoas, assim
como suas possíveis intenções, estados emocionais e propensão à
interação.
2. Presença – incorpora padrões verbais e não verbais, como
aparência, postura, qualidade da voz e movimentos do corpo.
3. Autenticidade – o quanto somos percebidos como honestos,
abertos, éticos e confiáveis.
4. Clareza – nossa habilidade de explicar, esclarecer ideias, transmitir
dados, articular visores e cursos de ação de forma a conquistar a
cooperação alheia.
5. Empatia – sentimento compartilhado de duas pessoas que se
vinculam e interagem de forma a cooperarem positivamente.

No modelo de Albrecht, a inteligência social tem um significado análogo à


inteligência intrapessoal de Gardner (2009), o que você já deve ter
estudado. Por isso, sua definição de inteligência social é “habilidade de
interagir bem com outros, fazendo com que cooperem com você”
(ALBRECHT, 2008, p. 23). Ao mapear os diferentes comportamentos para
construir seu modelo, Albrecht (2006) percebeu que pessoas com baixa
inteligência social tendem a ter atitudes tóxicas, que contribuem para
alienação, conflito e animosidade, enquanto pessoas com alta inteligência
social conduzem os outros à empatia, compreensão e cooperação, tendo
assim uma atitude salutar no comportamento de outros. As atitudes
salutares fazem com que as pessoas se sintam valorizadas, capazes,
amadas, respeitadas e apreciadas. Por isso, pessoas com alta inteligência
social tornam-se magnéticas para as outras, afinal, todos apreciamos a
interação com pessoas que fazem com que nos sintamos bem.

O conceito de atitudes salutares assemelha-se à ideia de liderança


ressonante, de Boyatzis e McKee (2006). A analogia ao conceito de
ressonância vem da física: reforço ou prolongação do som a partir da
reflexão ou sincronicidade de vibração. Da mesma forma, o líder
ressonante promove conexão emocional, “sincronia”. Nesse caso, a partir
da relação líder-liderados, a mensagem original “ressoa”, reverberando
para outros níveis da organização, de forma construtiva e positiva.
Atuando com escuta ativa e atitude vibrante, os líderes ressonantes são
aqueles que conseguem tirar o melhor das pessoas, promovendo nelas
uma visão compartilhada e inspirando sentimentos de confiança e
esperança no futuro. Na contrapartida, quando interagem com líderes
ressonantes, as pessoas sentem-se apreciadas, contribuindo
positivamente para os grupos em que atuam.
Aprendendo a perceber contextos

Um contexto é feito de pequenas unidades. Paradoxalmente, segundo


Carl Rogers (2017), nós como indivíduos não mudamos ninguém, mas,
quando nós mudamos, podemos mudar o outro também. Ou seja, somos
indivíduos em relacionamentos que se formam dentro de grupos, que se
formam dentro de organizações, que se formam dentro de comunidades.
Vivemos em um sistema social complexo, porém fundamentalmente
interdependente. E cada nível do sistema social influencia o
comportamento do indivíduo. Assim, a ressonância não se constrói a
partir da ação de cada pessoa. Afinal, nossa realidade emocional é
compartilhada o tempo todo.

Para isso, precisamos ter clareza de quem somos – nossas forças e


fraquezas – e quem desejamos ser, nosso eu ideal. Raramente temos
clareza de para onde estamos indo e por que, mas quando atingimos esse
lugar, conquistamos nossa integridade pessoal, algo que o psicólogo Carl
Rogers (2017) entendia como Congruência. Quando congruentes, temos
os eu real e eu ideal alinhados e estamos totalmente conectados à nossa
experiência, não desejando ser nada diferente do que somos. E se você
não se sente assim tão integrado, não se preocupe. A maioria de nós está
nessa busca e o trabalho de crescimento pessoal serve para que possamos
promover ressonância enquanto aprendemos sobre nós mesmos e nossos
relacionamentos.

Para melhor compreensão dos conceitos de inteligência social, vale agora


fazer um exercício em três etapas:
1. Conheça suas aspirações pessoais – a forma como nos
conectamos com nossos sonhos diz muito sobre nós mesmos.
Assim, precisamos ter clareza de onde queremos chegar e perceber
como nossas aspirações se encaixam nas intenções das pessoas de
nosso convívio e grupos de trabalho.
2. Analise a própria liderança – uma outra observação interessante
de ser feita no caso de você ocupar alguma posição de liderança é:
como você lidera pessoas? Gosta de desenvolver novas habilidades
em seus liderados? E caso ainda não atue como líder, vale
perguntar sobre algumas outras habilidades da liderança: como
você atua em conflitos? Você é um bom colega de trabalho, gosta de
compartilhar ideias? Consegue obter o melhor das pessoas? Esse
tipo de pergunta permite que possamos ser honestos a respeito de
nossas habilidades interpessoais, reconhecendo pontos fortes e
oportunidades de melhoria.
3. Peça feedback – havendo investigado suas aspirações e suas
habilidades de liderança, peça feedback sobre a forma como se
relaciona: você é um bom ouvinte? As pessoas costumam se sentir
bem após uma interação com você?

De posse dos elementos dessa reflexão elabore pontos a melhorar,


descobertas interessantes que fez sobre si mesmo e temas sobre os quais
gostaria de continuar aprendendo.

UNIDADE 4 - Autogestão e realização


Aula 1. O caminho para o self ideal
Uma psicologia para o pleno potencial humano

No final dos anos 1960, emergia um movimento psicológico, capitaneado


pelos psicólogos Abraham Maslow e Carl Rogers, que se opunha à visão
do ser humano proposta pela psicanálise (considerada pessimista e
determinista) e do comportamentalismo (considerada maniqueísta).
Nascia a psicologia humanista, com a crença de que qualquer pessoa
contém em si o potencial para um desenvolvimento sadio e criativo. Era
até o momento uma lufada de otimismo e esperança, uma vez que o
passado não era mais determinante de sucesso pessoal e o
comportamento não era tão programável e organizável. Percebia-se o ser
humano como um organismo integrado, conectado à sua realidade e às
suas experiências, em que a compreensão de sentimentos e pensamentos
passava a ser essencial para o bem-estar e desenvolvimento pessoal.

Abraham Maslow (1908-1970) é mais conhecido pela hierarquia de


necessidades, já vista na Unidade 3, em que passamos por necessidades
de sobrevivência (fisiológicas e de segurança), de relacionamento, de
estima e, no topo, a necessidade de autorrealização. Sobre essa última
vamos nos deter aqui. Maslow acredita que somos inerentemente
motivados a satisfazer nossas necessidades, mas também a nos
autorrealizarmos, ou seja, sermos nosso melhor, em nosso maior
potencial. Para isso, contamos com um motivador interno para a
autoatualização, nos tornando a cada experiência mais próximos da
melhor versão de nós mesmos (MASLOW, 2013).

Carl Rogers (1902-1987) traz uma visão de ser humano similar à de Maslow
e propõe que há uma incongruência entre o eu real e o eu ideal que nos
causa desconforto e sofrimento. Ao contrário, quando por meio da
descoberta de nós mesmos nos aproximamos de nosso eu ideal, entramos
em estado de congruência e adquirimos o melhor funcionamento que
podemos ter.

Nesse estado, nossos sentimentos são totalmente acolhidos e somos


nossa própria pessoa-referência, ou seja, não desejamos ser ninguém
senão não nós mesmos. Para nos tornarmos mais próximos desse máximo
potencial, Rogers (2017) entende que precisamos desenvolver a aceitação
incondicional de quem somos.
Bases para a autogestão

A abordagem humanista da psicologia inspirou a criação de movimentos


em torno da gestão de pessoas e comportamento organizacional e, mais
recentemente, programas de coaching, realizados dentro ou fora do
mundo empresarial. Por ter como base a mente consciente, permite que
as pessoas realizem a compreensão de si mesmas, com ou sem
acompanhamento, a partir da autorreflexão ou acessem programas de
desenvolvimento pessoal, não necessariamente associados a processos
psicoterapêuticos. Entende-se, porém, que ter alguém para dividir as
interpretações da própria vida, provocando reflexões relevantes, seja um
líder ou um coach, pode contribuir para o melhor aproveitamento das
próprias reflexões. Assim, algumas suposições fundamentais da
psicologia humanística servem a propósitos que extrapolam a
psicoterapia e passam a contribuir com a autogestão:
● O que experimentamos pelos nossos sentidos conscientes
(pensamentos e sentimentos) e podemos lembrar é base para a
compreensão de nosso comportamento.
● Uma compreensão precisa do comportamento humano não pode
ser alcançada estudando animais e, ao contrário, nossas próprias
experiências cotidianas são base para compreendermos a nós
mesmos.
● A necessidade de atingirmos nosso máximo potencial é algo
inerente ao ser humano.
● As pessoas são inerentemente boas e o ambiente em que se
desenvolvem é fundamental para seu melhor desenvolvimento.
● Cada pessoa e cada experiência é única, por isso nosso
desenvolvimento deve levar em consideração essa biografia e
compreensão da realidade.
● Nosso comportamento não é predeterminado, nem por forças
inconscientes nem pelo passado. O livre arbítrio existe, por isso
devemos assumir a responsabilidade pessoal por nosso crescimento
e autorrealização.

Algumas dessas suposições vão diametralmente contra pesquisas de


comportamentalismo, por exemplo, os estudos com animais; e contra a
psicanálise, como dizer que nosso comportamento tem por base
puramente a consciência. Havendo negado a força do inconsciente, os
humanistas não negaram nossas bases biológicas, nem evolutivas, apenas
deram ênfase à nossa experiência e às interpretações que fazemos dela.

Fazendo-se hoje um balanço desses postulados, é importante não irmos


“nem tanto ao céu nem tanto à terra”. Na nova abordagem humana da
inteligência emocional, por exemplo, agregam-se diferentes bases
epistemológicas. Assim, entende-se que nosso comportamento é
influenciado por (1) forças biológicas e ancestrais, mas também pelos (2)
registros de nossas experiências (nosso passado), que moldam nossos
circuitos neurais e pela (3) forma como (re)interpretamos nossa realidade
e projetamos nosso futuro, promovendo novos circuitos
(neuroplasticidade). Nesse sentido, as novas teorias ligadas à
neurociência social agregam variáveis, não as descartam.
Adicionalmente, também consideram pesquisas quantitativas, mais do
que qualitativas, como base para a compreensão do comportamento
humano.
Exercitando o sentir e o pensar

A genética e a interação com o ambiente formam, conjuntamente, nossa


noção própria de “self”. Tanto a natureza (no inglês, nature) como nossa
criação (no inglês, nurture) permitem que possamos modificar nossas
estruturas cerebrais. O cérebro aprende melhor em ambientes em que
pode exercer sua liberdade, afastando-se das ameaças mais prementes e
incorporando-as como desafios possíveis de serem vencidos. As
experiências moldam e transformam nosso cérebro. Novas experiências
trazem o aprendizado de novas formas de pensar, sentir e agir, criando
novas rotas neurais e fisicamente modificando o cérebro. (NELSON; LOW;
HAMMET; SEN, 2013).

Nessa direção, a melhor relação intrapessoal que você pode ter é


caracterizada por aceitação incondicional, como comentamos, e por
respeito, curiosidade, autocompaixão, honestidade e motivação para se
tornar a melhor versão de si mesmo. Isso porque nossos
comportamentos, incluindo nossas reações emocionais, são relacionadas
a essas rotas neurais, a como o cérebro processa, armazena e retém as
informações do cotidiano. Cada um de nós tem um jeito próprio de
construir a própria realidade e, consequentemente, aprender sobre ela.

Nosso aprendizado depende da experiência (emocional) e do


processamento cognitivo (pensamento) que atuam de forma
colaborativa. Sendo a cognição mais conhecida, vale reforçar o valor da
mente emocional, uma vez que não há apreciação de conhecimento sem
participação de nosso mundo emocional e que para toda informação que
recebemos já temos crenças e valores associados: que apontam o que
importa ou não, o que é moralmente correto ou não, o que apreciamos ou
não.

Nessa direção, algumas escolas de desenvolvimento salientam a


importância de exercícios de autorreflexão, em que confrontamos nossas
interpretações a partir da separação entre o que queremos (base de
nossas preferências emocionais) e o que precisamos fazer (base de nossa
mente racional) para, por exemplo, definir e priorizar tarefas de rotina.

Aula 2. O jeito positivo de ver a vida


Uma visão positiva para o humano

Um dos mais proeminentes temas de estudo da Psicologia Positiva é o


otimismo, considerado como “tendência a esperar o melhor” da vida,
ainda que as situações não nos sejam favoráveis. Ele aparece em oposição
ao pessimismo, pelo qual assumimos que as coisas vão continuar ruim ou
piorarem. Seligman (2006) acredita que podemos aprender a ser otimistas
e, com isso, obtermos mais facilmente bons resultados de nosso
comportamento ou, no mínimo, nos recuperarmos mais rápido dos vieses
da vida. De acordo com ele, formas habituais de pensar não precisam
ser para sempre e uma das mais significativas descobertas da psicologia
nos últimos anos é que os indivíduos podem escolher a forma como
pensam.

As emoções positivas

Antes de considerarmos o papel de nossas emoções positivas, vamos


relembrar por que temos emoções negativas. O que emoções como medo
e raiva fazem é sinalizar situações que requerem nossa atenção e
disponibilidade de resposta imediata. Da mesma forma, o mecanismo de
resposta automática da luta-fuga permite que tenhamos ações de
autoproteção e possamos garantir a nossa sobrevivência. Ainda, o nojo e
a tristeza surgem para que possamos lidar com nossas preferências
pessoais e possamos trabalhar nossas perdas. Porém, se prolongadas em
nosso corpo e alimentadas por nossos pensamentos, as emoções
negativas se tornam aflitivas (LAMA; CUTLER, 2000). Como já estudamos
na Unidade 1, nossas emoções são orientadas por nossos valores
pessoais. E nesse ponto é interessante pensar o papel específico das
emoções positivas.

As emoções positivas não são tão estudadas como as emoções negativas.


De acordo com Fredrickson (2009), o propósito principal de nossas
emoções positivas é fazer com que nos sintamos bem em relação à vida,
razão pela qual nos estudos em inglês os autores se refiram a elas como
“feels good emotions” (emoções para nos sentirmos bem). Em contraste
com as negativas, as emoções positivas permitem uma expansão criativa
ao nosso pensamento e oferecem recursos adicionais para o nosso
comportamento em quatro categorias:
1. Intelectual – a partir de habilidades de solução de problemas.
2. Física – promovendo força e saúde cardiovascular.
3. Social – facilitando a qualidade dos relacionamentos e a
quantidade de amigos e conexões.
4. Psicológica – desenvolvendo habilidades de resiliência e otimismo.

Em resumo, a experiência das emoções positivas oferece uma “espiral


positiva” de efeitos físicos, comportamentais e psicoemocionais, nos
preparando para lidarmos com os desafios da vida.
Comportamento reflexivo

O comportamento humano é em boa parte automático, acontecendo sem


participação de nossa consciência ou pensamento que o anteceda. No
entanto, cada vez que reagimos a uma situação, seja na interação com
estressores ou em um evento qualquer da vida, existe a possibilidade de
direcionar o comportamento, para que passe de reativo a reflexivo.

O comportamento reflexivo é aquele que traz o que escolhemos fazer,


deixando assim de ser automático. Nesse caso, há uma brevíssima, mas
fundamental pausa, suficiente para que nossa inteligência emocional
seja acionada e possamos substituir a reação automática pela ação
intencional. Isso não quer dizer que as respostas automáticas não sejam
necessárias, já que dizem respeito a rotas evolutivas de nosso
comportamento, em que a mente emocional é acionada de forma que
tenhamos uma resposta rápida diante de algo importante que merece
nossa atenção, como alguém nos atacando ou um perigo imediato que
ameace nossa sobrevivência. Assim, o comportamento autodirecionado
ou reflexivo corresponde à integração das mentes emocional e
cognitiva, de forma que se favoreça nosso desempenho e nossa saúde
como um todo (NELSON; LOW; HAMMETT; SEN, 2013).

Mas como podemos fazer isso? Nosso cérebro pode ser estimulado pela
imaginação, assim como pela percepção do que acontece em tempo real.
Isso porque a mente emocional não distingue entre uma imagem
imaginada e uma real. Dessa forma, a imaginação torna-se uma poderosa
ferramenta para a mudança pessoal. Técnicas de imaginação ativa nos
colocam em situações de melhor desempenho, em que atuamos
exatamente como desejamos. Nesse processo, entendemos que o melhor
cenário é uma realidade possível de ser alcançada. Por isso é tão
importante nos questionarmos: onde queremos chegar? Qual é a situação
por nós desejada? Só respondendo essas perguntas sobre uma visão de
futuro desejado é que chega o momento de buscar a colaboração da
mente racional e de afirmar: “ok, agora que esse cenário é possível e
tangível em minha melhor visualização, é hora de me colocar em ação e
caminhar para chegar lá”. Sem dúvida traçar o plano de ação e a agenda
de atividades é muito mais fácil após termos delimitado qual é nosso
destino desejado.

Lições de felicidade

De acordo com Seligman (2019), a resposta é sim, temos predisposições


genéticas para sermos mais risonhos e bem-humorados, por isso existem
pessoas que são, por natureza, mais felizes. Afinal, todo mundo conhece
aquela pessoa que, a despeito das poucas posses ou conquistas pessoais,
está sempre sorridente e bem-disposta, não é mesmo? Isso significa que a
felicidade tem em si um componente de personalidade. Porém também
podemos aprender a nos sentirmos assim. Novamente faz-se presente a
composição dupla de nature (genética) e nurture (criação), que já
mencionamos em aulas anteriores.

Alguns hábitos contribuem para que possamos reter a felicidade por mais
tempo. Por exemplo, estudos mostram que pessoas felizes conseguem
reter por mais tempo suas experiências positivas, inclusive pensando
que ocorrem em maior número. Fato exatamente oposto às pessoas que se
sentem infelizes: elas só conseguem lembrar do que dá errado. Outro
exemplo é que pessoas felizes vivenciam o momento presente com mais
intensidade.
Isso me faz lembrar de um dos melhores livros de psicologia positiva que
tive o privilégio de encontrar: Conversas com Minha Gata, de Eduardo
Jáuregui (2015). O livro conta a história de Sara, que, prestes a fazer
quarenta anos, descobre que não é feliz. Seu trabalho não a motiva mais e
seu relacionamento com o namorado não é mais o mesmo. Como resposta
de uma fase de exaustão emocional, ela experimenta um colapso nervoso
e passa a ouvir uma elegante e misteriosa gata amarela, chamada Sibila. A
gata traz conselhos tão interessantes quanto ensinamentos de um mestre
Jedi e ensina Sara a viver no momento presente, apreciando inteiramente
sua experiência de vida, diminuindo o poder das emoções negativas e dos
pensamentos que transitam entre o passado e o futuro.

“O sentido da vida? Deixe de bobagem. Só existe uma coisa que você


precisa saber: ao comer, coma; ao caminhar, caminhe” (Sibila, a
gata). (JÁUREGUI, 2015, p. 69)

Aula 3. Temas fundamentais para


autogestão
Perguntas de base para a gestão de si mesmo

Os modelos de carreira modificaram-se imensamente a partir dos anos


1990. Antes da chegada da internet e, com ela, de toda a gama de
profissões e informações que o mundo digital proporcionou –, era comum
planejarmos uma profissão “para a vida”. Esse antigo pacto foi quebrado
assim que as pessoas não puderam mais contar com trilhas de carreira em
uma mesma organização e precisaram se responsabilizar por sua jornada
de desenvolvimento.

Atualmente, estão em vigor os novos modelos de carreira, em que não


dependemos mais de uma organização para apontar nossa contribuição
no mundo, ao contrário, estamos constantemente polindo nossas
competências técnicas e socioemocionais, nos preparando para cada
novo desafio profissional que se configura. Saímos do enfoque no
trabalho e na organização para o enfoque no indivíduo, bem como suas
aspirações e potencialidades.

Assim, a autogestão de si mesmo e da carreira torna-se mais uma das


competências do mundo do trabalho. Precisamos constantemente
reavaliar nossa posição e verificar se estamos usando nosso melhor
potencial naquilo que fazemos.
O valor da administração do tempo

O ritmo do trabalho na vida moderna é cada vez mais acelerado. Por um


lado, temos diversos aplicativos e facilitadores para nossa organização
das ideias e do tempo, por outro, estamos com muitas “janelas mentais”
abertas, pois estamos expostos a mais informação e mais interação.
Antigamente, cerca de 10 anos atrás, as pessoas abriam suas caixas de
e-mail e levavam a primeira meia hora da manhã para respondê-los, quem
sabe também a primeira hora da tarde. Com o advento da comunicação
instantânea, no entanto, por meio de Snapchat, WhatsApp e outros
meios, ficou quase impossível terminar uma tarefa sem que sejamos em
algum momento interrompidos em nosso fluxo de raciocínio por algum
tipo de notificação. Em muitas atividades profissionais, o excesso de
reuniões coloca mais pressão no sistema, fato que se multiplicou
enormemente no período mais crítico da pandemia, quando as pessoas
saiam de uma reunião virtual para outra e sobrava pouco tempo para
execução das tarefas acordadas.

Como resposta a isso, muitas pessoas entendem que o ideal é aumentar a


carga horária em torno das respostas e das tarefas, o que causa prejuízos
físicos, emocionais e mentais. Eis que o tão sagrado turno da noite, que
era usado para relaxarmos e prepararmos nosso corpo para o descanso é,
em muitos casos, utilizado para finalizar as tarefas administrativas,
cuidar da casa, realizar um curso de aperfeiçoamento. E assim, apesar de
toda tecnologia, trabalhamos cada vez mais e temos cada vez menos
tempo livre.

O problema de aumentar nossa carga horária de trabalho é que o tempo é


um recurso finito, assim como nossa disposição e disponibilidade
cognitiva. Não é porque estamos à frente da tela que conseguimos
produzir magicamente todas as soluções, é preciso que tenhamos as
informações necessárias e a atenção concentrada, no mínimo. Como
então tirar o máximo possível do tempo que temos?

De acordo com Schwartz e McCarthy (2018), precisamos reabastecer


nossas fontes de energia física, emocional, mental e espiritual. Isso pode
ser feito a partir de rituais e programações de otimização, resumidas na
Tabela 2.

Exercite sua resiliência

“Nossa maior glória não é nunca falhar, mas sim nos erguermos a cada vez
que falhamos.” Confúcio (apud CASTRO, 2016, p. 64)

Sobre essas questões tratamos quando pensamos em resiliência. Ao


contrário do que possa parecer, resiliência não diz respeito a suportar as
pressões da vida – isso seria resistência –, mas sim ser capaz de retornar a
nosso melhor eixo o mais rápido possível, logo após uma adversidade.

Mais especificamente, quando falamos de resiliência nos referimos à


nossa habilidade de seguir em frente diante das dificuldades, de
retornar a nosso melhor o mais rápido possível, após algum infortúnio e
manejar nossas emoções negativas de forma mais efetiva ao invés de
deixá-las nos levar em uma espiral de negatividade
(GREENVILLE-CLEAVE, 2012).

Normalmente, pensamos que a resiliência é um traço de personalidade,


uma característica que algumas pessoas têm e outras não. Na verdade, a
resiliência também pode ser aprendida. Ainda, pesquisas sugerem que se
tornar resiliente em um domínio da vida, por exemplo no trabalho, pode
ajudar na resiliência em outras áreas, como nos relacionamentos.

De acordo com o Hanson (2019), existem práticas que contribuem para


vivenciar, desenvolver e utilizar recursos mentais fundamentais para o
bem-estar resiliente. O autor elencou 12 potencialidades que se
sustentam muito mutuamente e contribuem para a vida resiliente, como
pontos de uma rede. Elas são: compaixão, atenção plena, aprendizado,
garra, gratidão, confiança, calma, motivação, intimidade, coragem,
aspiração e generosidade. Essas potencialidades contribuem para que
possamos reconhecer nossos estados emocionais, buscar recursos
internos para fazer frente às adversidades, gerenciar nossas emoções
negativas e nos relacionarmos mais ativamente com as outras pessoas,
promovendo em nós emoções positivas.

Aula 4. Fazendo acontecer


O valor de cada escolha

Estudos na área da psicologia positiva sugerem que o sentimento de que


estamos no controle de nosso destino é vital para a nossa saúde
psicológica e que a limitação de nossas escolhas pessoais pode reduzir o
bem-estar. Escolher significa ter liberdade para viver e para nos
expressarmos como indivíduos. Porém, ter muitas opções para escolher
também causa estresse (GREENVILLE-CLEAVE, 2012).

Há mais de cinquenta anos, Toffler (1970) entendeu que lidar com a


mudança e a escolha nos traz uma variedade muito grande de
sentimentos. Ele chamou a constante reação à mudança e à diversidade
de opções de future shock, algo como um choque ou uma dificuldade de
adaptação na nossa tentativa de lidar com o futuro. Ele teorizou que
encarar muitas opções de escolha, em um curto período, configura uma
dificuldade de processamento de informação que pode tornar nossas
reações mais lentas, assim como nossas decisões, e ainda causar efeitos
psicológicos indesejados, como depressão, estresse e comportamento
neurótico
Elementos do bem-estar e relacionamentos positivos

A felicidade é a satisfação com a vida. Quando estamos felizes, nos


sentimos bem, é fácil fazer qualquer tarefa, somos cercados de leveza.
Esse “bem-estar” é composto de vários elementos e nenhuma parte
específica da vida pode explicá-lo, sendo influenciado por múltiplos
fatores.

Na busca por compreender os elementos que compõem o bem-estar,


Seligman (2011) chegou em cinco fatores, todos intercambiáveis e ao
mesmo tempo independentes: emoção positiva, engajamento, sentido,
relacionamentos positivos e realização. Na Tabela 1, apresentamos cada
um deles.

O valor dos relacionamentos saudáveis


De todos os elementos para o bem-estar, o que é mais independente
apenas de nós mesmos, aquele que define nossa interação com o mundo,
é o de relacionamentos, por isso vale aqui um pouco mais de
detalhamento. De fato, em todos os modelos para construção de uma vida
próspera e feliz aparecem os relacionamentos como elemento-chave,
mais inclusive que conquistas materiais. Aqueles com os quais
compartilhamos nossa caminhada importam mais que o próprio caminho.
Afinal, é fácil perceber como nossas conexões com outras pessoas trazem
grande contribuição para a nossa saúde física e psicológica.

O contrário também acontece. Quando estamos sob efeito de


relacionamentos tóxicos, todas as áreas de nossa vida começam a decair:
trabalho, autocuidado, espiritualidade, até mesmo nossa motivação. Um
relacionamento é tóxico quando nos fazem sentir insegurança, medo,
culpa ou inadequação, quando sentimos que nossa identidade não é
valorizada ou quando somos desrespeitados em nossa autonomia e forma
de ver o mundo.

Mas o que caracteriza um relacionamento positivo ou saudável? Além de


nos proporcionar emoções positivas, existem características na interação
com pessoas saudáveis que vale a pena reforçarmos. Pessoas saudáveis
(SARKIS, 2019):
● Incentivam a expressão de opiniões, ainda que não concordem com
tudo o que dizemos.
● Dizem o que sentem e sentem o que dizem, ou seja, são sinceras.
● Dizem de forma direta e gentil quando você as magoou.
● São capazes de compartilhar ideias e sentimentos, favorecendo a
afetividade da relação.
● Confiam nos outros.
● Têm comportamentos genuínos, relacionados a seus valores.

É fácil ler essa lista e pensarmos que por vezes nós mesmos não somos
assim tão saudáveis ou que as pessoas “tropeçam” em seus
comportamentos e nem por isso vamos descartá-las de nosso círculo de
amizades. A questão aqui não é acertar sempre, mas ter em mente que o
relacionamento positivo é nutridor, nos faz sentir bem, enquanto o
relacionamento tóxico nos traz sentimentos negativos. Por isso, caminhar
em direção ao bem-estar compartilhado é a melhor intenção que
podemos ter em qualquer relacionamento.
Motivação na base da realização

Motivação é a energia que nos leva a agir, o motor de nosso


comportamento, o “motivo para a ação”.

Um motivo é um processo interno que energiza e direciona o


comportamento. Esses motivos podem ser internos, dizendo respeito a
nossas próprias necessidades, emoções, crenças e pensamentos, ou
externos, como dinheiro, conquistas materiais ou aprovação social
(REEVE, 2006).

É interessante perceber o que causa a falta de motivação. Essa ausência


de energia vital em nosso comportamento nos torna apáticos.
Desmotivados deixamos de acreditar em nosso potencial, interrompemos
o investimento da energia para a ação, não temos mais direção ou
propósito. Nos tornamos invisíveis e pouco interessantes.

Por outro lado, não é preciso muito esforço para ver a motivação
manifesta no comportamento de outras pessoas. Basta que estejam
executando alguma tarefa e, se estiverem motivados, será possível ver o
grau de engajamento, a disposição física, a persistência, a concentração
de esforços. A motivação é também contagiosa: eis que motivamos mais
quando estamos motivados.

Quando estamos motivados, nosso comportamento é direcionado e


energizado, não é preciso muito esforço para a consecução de nossos
objetivos porque nos “fundimos” àquilo que está sendo realizado. Assim,
somos mais realizadores – tornamos real nossa intenção – quando
estamos motivados. Como então podemos ampliar nossa motivação? O
que fazer para fornecer energia e motivo à nossa ação?

De acordo com Goleman (2019), a motivação é parte inerente ao processo


de autogestão das emoções. A pessoa motivada é aquela ativada por suas
conquistas e algumas características de seu comportamento são a paixão
pelo trabalho e novos desafios, disposição incansável para melhorar e
otimismo diante do fracasso.

Eis aqui então algumas características de pessoas que têm o


comportamento motivado:
● Elas estão sempre buscando melhorar seu desempenho e gostam de
saber como estão se saindo.
● Elas são otimistas, procurando sempre ver o lado bom das coisas e
não esmorecendo quando algo dá errado.
● Elas são abertas e curiosas, gostam de descobrir novas formas de
fazer as coisas.
● Elas persistem, não esperando resultados imediatos de suas ações.

Uma das formas mais simples de nos motivarmos é buscarmos reproduzir


o comportamento motivado. Isso porque a própria ação mobiliza nossos
esforços e coloca em marcha o movimento da motivação.

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