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trabalhar-em-sala-de-aula
Publicado em NOVA ESCOLA 17 de Julho | 2023

Literatura

Julho das pretas: 12


autoras negras para
trabalhar em sala de aula
25 de julho é o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-
Americana e Caribenha; conheça autoras para apresentar
às turmas da Educação Infantil, Fundamental e Ensino
Médio
Tatiane Calixto

Obras podem apoiar o debate sobre temáticas que representam desafios para
as mulheres negras e mais: promover diversidade nas aulas. Getty Images
Exaltar e dar visibilidade à luta contra o racismo e o machismo. É esse o objetivo
do Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha,
comemorado em 25 de julho. No Brasil, a data é duplamente importante, já que
aqui também é o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. Por
isso, o mês vem sendo chamado de Julho das Pretas, centralizando debates
sobre a temática negra feminina – o que pode, claro, ser aproveitado nas salas
de aula.
Tereza de Benguela virou símbolo de resistência à frente do Quilombo
Quariterê, que reunia negros e indígenas escravizados no Mato Grosso, no
século 17. A ideia da data é trazer visibilidade para o protagonismo, não apenas
da líder quilombola, mas também de outras mulheres negras que fizeram e
fazem história mesmo diante do apagamento, preconceito e machismo.
O Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, por sua
vez, foi instituído em 1992, após um encontro que reuniu grupos de feministas
negras na República Dominicana para debater o impacto do machismo e do
racismo na vida das mulheres negras e exaltar a luta de todas.
Realidade da mulher negra mostra urgência do
debate
No segundo trimestre de 2022, enquanto o índice geral de desemprego no
Brasil girava em torno de 9,3%, entre as mulheres negras o percentual era de
13,9%. Para homens e mulheres brancas as taxas eram de 6,1% e 8,9%
respectivamente, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE).
Por outro lado, o Atlas da Violência, do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea), aponta que, em 2019, 66% das mulheres assassinadas no Brasil
eram negras. Segundo o estudo, para cada mulher não negra morta, morrem
quase duas negras no país.
Para marcar a data, a NOVA ESCOLA ouviu professoras que dão dicas de
autoras e livros que podem apoiar o debate dessas temáticas, valorizar a
atuação de mulheres negras na sociedade, além de promover diversidade nas
aulas.
Confira obras de autoras negras e sugestões de
abordagens
Sonia Rosa
Para o dia 25 – e principalmente para todo o ano – a colunista da NOVA ESCOLA,
professora Selene Coletti, que tem experiência na Educação Infantil e Anos
Iniciais, indica a escritora carioca Sonia Rosa.
“Os textos são de um ritmo gostoso, muitas vezes, com rimas. Trazem temas
relevantes e bastante reflexivos, como o Menino Nito, que trabalha a questão
do choro para os meninos”, explica. Já o livro Alice vê chama atenção pela
ilustração que dá para ser explorada, ‘relida’ e, por que não, reescrita,
principalmente pelas turmas da Educação Infantil. “É de uma singela poesia”,
define Selene.
Outra opção de Sonia Rosa é Enquanto o almoço não fica pronto. A história
aborda o papel do homem na família, mostrando que ele também compartilha
tarefas domésticas, além de trazer uma família negra como protagonista,
“permitindo às crianças pretas se verem retratadas nas histórias. Assim, a
autora pode ser lida tanto pelas crianças da Educação Infantil como dos Anos
Iniciais, aprofundando as conversas de acordo com a turma”, aconselha a
educadora.
Tereza Cárdenas
A professora de Língua Portuguesa, Ana Cláudia Santos, dá aulas nos Anos
Finais, na rede estadual de Minas Gerais, há mais de 20 anos. Também colunista
da NOVA ESCOLA, ela afirma que uma boa escolha é trabalhar com a obra
Cartas para a Minha Mãe, da cubana Tereza Cárdenas.
“Tereza sentia falta de personagens negras em livros infantis. Cartas para Minha
Mãe é a história de uma menina preta que, depois de ficar órfã, começa a
escrever cartas para a mãe. Por meio de sua escrita, descobrimos que as primas
a maltratavam e queriam que ela fizesse um esforço para disfarçar sua cor para
ficar mais parecida com uma pessoa branca”, detalha Ana Cláudia.
Teresa escreveu também o livro Cachorro Velho, com o qual recebeu o Prêmio
Casa de las Américas, na categoria literatura para crianças e jovens. As duas
obras foram publicadas no Brasil.
Carolina de Jesus e Maria Firmina dos Reis

Carolina de Jesus retratou a sua vida na favela do Canindé (SP), na época em


que era catadora de materiais recicláveis. Foto: Wikimedia Commons.
A professora Ana Cláudia sugere ainda apresentar à turma a primeira
romancista negra brasileira: Maria Firmina dos Reis. Ela publicou o conto A
Escrava, ainda no período escravocrata. A obra apresenta três vozes que podem
guiar as atividades em sala de aula, confrontando os pensamentos de
escravocratas, abolicionistas e da escravizada Joana.
“E não poderia deixar de mencionar Carolina Maria de Jesus, com a obra Quarto
de Despejo, que pode ser trabalhada em consonância com Cartas a uma negra,
da francesa Françoise Ega, analisando os respectivos processos de escrita”,
orienta Ana.
Preta Rara e Veronica Oliveira
Jessica Machado dos Santos é professora de Geografia nos Anos Finais, em
Ribeirão Preto (SP). Ela, que participou da websérie ProfessoreZ, da NOVA
ESCOLA, sugere mostrar os desafios e as lutas das mulheres negras pela
perspectiva das empregadas domésticas.
“Preta Rara (Eu, empregada doméstica) e Veronica Oliveira (Minha vida passada
a limpo) foram empregadas domésticas e abordam a questão da exploração de
trabalho dessa classe, além de levantarem temas como racismo e machismo. As
duas autoras falam também da importância da Educação, independentemente
do trabalho que se exerce. São duas obras bem legais para trabalhar com os
Anos Finais e Ensino Médio”, opina.
Chimamanda Adichie, Djamila Ribeiro e Conceição Evaristo

Conceição Evaristo: professora aposentada da rede pública do Rio de Janeiro,


doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense (UFF)
e vencedora do Jabuti: Lis Pedreira / Divulgação
Roberta Duarte, professora de História dos Anos Finais na rede municipal de
Jaboatão dos Guararapes (PE), indica três obras que já utilizou com suas
turmas. Segundo ela, os três livros abordam as questões de raça com uma
linguagem simples, entendida com facilidade pelos estudantes: O perigo de
uma história única, da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie; Pequeno Manual
Antirracista, de Djamila Ribeiro, e Olhos D´água , de Conceição Evaristo.
Lélia Gonzalez
A professora Lavini Castro dá aulas de História nas redes pública e privada do
Rio de Janeiro, é coordenadora da Rede de Professores Antirracistas e colunista
da NOVA ESCOLA. O primeiro nome que ela cita é o de Lélia Gonzalez. “É de
suma importância levar o pensamento de Lélia para a sala de aula,
primeiramente, por ser uma personalidade ativa e fundadora do Movimento
Negro Unificado (MNU) e por ser precursora do feminismo negro”, explica a
educadora.
Para Lavini, Lélia é uma referência de intelectualidade ao abordar o conceito de
amefricanidade que pode ser trabalhado em sala de aula quando se fala da
questão da colonização, pois diz respeito às experiências de mulheres e
homens negros na diáspora, bem como às experiências de mulheres e homens
indígenas contra a dominação colonial.
“Em seus escritos, Lélia traz a experiência de vida para analisar o racismo
cotidiano e o racismo estrutural, e como a contribuição das mulheres negras
nos modos de falar, sentir e pensar da sociedade brasileira são importantes
para mexer nas estruturas da sociedade, fornecendo ferramenta teórica para
descolonizar o currículo e o pensamento”.
Leia também: O que é e como construir um currículo decolonial?
Helena Teodoro
Outra pensadora negra indicada pela colunista Lavini é a professora Helena
Theodoro. Doutora em Filosofia e mestre em Educação, a intelectual atuou
junto à Lélia Gonzalez na Assembleia Nacional Constituinte de 1987-88. A ideia
era considerar o conceito de amefricanidade para investigar o espaço do negro
na história constitucional brasileira do pós-abolição.
“A professora Helena Theodoro atua com pesquisas no campo da
aprendizagem, com conceito de identidade, cultura afro-brasileira e destaca a
importância da educação da História Africana e Afro-brasileira nos currículos do
sistema de ensino, porque crianças negras eram expostas a imagens e fatos
históricos que apresentavam negros e indígenas em posições subalternas”.
Por outro lado, a cultura da população negra tende a ser considerada como
folclore, sendo desvalorizada em sua potência criativa. Por isso, Helena mostra
o quanto é necessário valorizar as manifestações artísticas e religiosas que se
expressam de maneira distinta do padrão europeu. “Esse aspecto é ressaltado
pelo fato de que as tradições africanas e afro-brasileiras são fortemente
fundamentadas na oralidade, o que levava as professoras Lélia Gonzalez e
Helena Theodoro a frisarem a necessidade de valorizar a contribuição africana
na formação da Língua Portuguesa”, finaliza Lavini.

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