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PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE

SUMÁRIO

1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO-EVOLUTIVA DA PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE ................. 2


1.1. Evolução histórica do pensamento ambiental da gestão de recursos hídricos ............ 8
1.2. Fase da exploração desregrada ................................................................................. 9
1.3. Fase fragmentária ................................................................................................... 11
1.4. Fase holística .......................................................................................................... 12
2. CLASSIFICAÇÃO ambiental NA JURíDICA ........................................................................................ 15
2.1. Meio Ambiente Natural ....................................................................................... 16
2.2. Meio Ambiente Artificial ...................................................................................... 17
2.3. Meio Ambiente Cultural ...................................................................................... 18
2.4. Meio Ambiente do Trabalho ................................................................................ 19
3. CONCEITO CONSTITUCONAL DE MEIO AMBIENTE ....................................................................... 19
3.1. Competência Ambiental .......................................................................................... 22
4. OBJETO DA TUTELA AMBIENTAL ..................................................................................................... 27
4.1. A inserção da tutela ambiental no mundo jurídico ............................................. 28
4.2. A inserção da tutela ambiental no ordenamento jurídico brasileiro.......................... 32
4.3. O descompasso entre a realidade e legislação de proteção ao meio ambiente ........ 36
4.4. A posição da sociedade frente à negligência estatal ................................................ 39
5. O MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO COMO DIREITO FUNDAMENTAL... 42
5.1. O Direito Ambiental Comparado ............................................................................. 44
6. CONCLUSÃO ....................................................................................................................................... 45
7. BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................................... 47

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1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICO-EVOLUTIVA DA PROTEÇÃO AO
MEIO AMBIENTE

Fonte: meioambienterio.com

Texto extraído do autor Talden Queiroz Farias


Ao longo da história, antes que o Direito Ambiental se firmasse como um
ramo autônomo da Ciência Jurídica, inúmeros dispositivos jurídicos brasileiros e
portugueses ao longo da história previram a proteção legal ao meio ambiente.
Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin defende que a evolução da
legislação ambiental brasileira se desenvolve em três fases ou momentos
históricos, que são a fase de exploração desregrada, a fase fragmentária e a
fase holística.
Talvez seja mais adequado terminologicamente tratar esses mesmos
momentos históricos como fase fragmentária, fase setorial e fase holística,
porque na fase que Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin chama de fase
de exploração desregrada já existe uma legislação ambiental esparsa e na fase
que ele chama de fragmentária a legislação ambiental passa a existir em função
de cada área de interesse econômico.
É preciso dizer que essas fases históricas não possuem marcos
afirmativos precisamente delineados, de maneira que elementos

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caracteristicamente pertencentes a uma fase podem estar cronologicamente
relacionados a outra fase.
O primeiro momento histórico no que diz respeito à legislação ambiental
brasileira é aquele descrito como do descobrimento até aproximadamente a
década de 30 sendo chamado de fase fragmentária. Essa fase é caracterizada
pela não existência de uma preocupação com o meio ambiente, a não ser por
alguns dispositivos protetores de determinados recursos ambientais. Édis Milaré
faz um estudo da legislação ambiental desse período afirmando que o esbulho
do patrimônio natural e a privatização do meio ambiente eram muito comuns
nesse período.
Na época do descobrimento vigorava em Portugal as Ordenações
Afonsinas, cujo trabalho de compilação foi concluído no ano de 1446 durante o
reinado de Dom Afonso IV. É possível encontrar na Ordenações Afonsinas
algumas referências à preocupação com o meio ambiente, a exemplo do
dispositivo que tipificava como crime de injúria ao rei o corte de árvores frutíferas.
As Ordenações Manuelinas foram editadas em 1521 também contendo
dispositivos de caráter ambiental, a exemplo da proibição da comercialização
das colmeias sem a preservação das abelhas ou da caça de animais como
coelhos, lebres e perdizes com instrumentos que pudessem denotar crueldade.
A tipificação do corte de árvores frutíferas passou a ser punida com o degrado
para o Brasil quando a árvore abatida tivesse valor superior a trinta cruzados.
As Ordenações Filipinas, editadas durante o período em que o Brasil
passou para o domínio espanhol, proibiam que seja jogassem na água qualquer
material que pudesse matar os peixes e suas criações ou que se sujasse os rios
e as lagoas. A tipificação de árvores frutíferas é mantida, prevendo-se como
pena o degredo definitivo para o Brasil.
O primeiro Código Criminal de 1830 tipificou como crime o corte ilegal de
madeira e a lei nº 601/1850 discriminou a ocupação do solo no que diz respeito
a ilícitos como desmatamentos e incêndios criminosos.
Na prática só eram punidos aqueles que de alguma forme prejudicassem
os interesses da Cora ou dos latifundiários ou grandes comerciantes. Com a
proclamação da República a falta de interesse pela questão ambiental
permaneceu e talvez até tenha se acentuado. Durval Salge Jr. ressalta que sob

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o aspecto jurídico a preocupação com o meio ambiente sequer existia, tanto no
período colonial quanto no imperial e republicano
Nessa fase ainda não existe de fato uma preocupação com o meio
ambiente, a não ser por alguns dispositivos isolados cujo objetivo seria a
proteção de alguns recursos naturais específicos como o pau-brasil e outros.
Tais restrições se limitavam à preservação de um ou outro elemento da natureza,
destacando sempre a importância botânica ou estética ou o direito de
propriedade.
A segunda fase é chamada de fragmentária e se caracteriza pelo começo
da imposição de controle legal às atividades exploratórias tratamento ambiental
e tem como início o final da década de 20. Contudo, esse controle era exercido
de forma incipiente porquê de um lado era regido pelo utilitarismo, visto que só
se tutelava o recurso ambiental que tivesse valoração econômica, e de outro pela
fragmentação do objeto, o que negava ao meio ambiente uma identidade própria,
e em consequência até do aparato legislativo existente.
Edis Milaré destaca a importância do Código Civil de 1916 como
precedente de uma legislação ambiental mais específica ao trazer alguns
elementos ecológicos, especialmente no que diz respeito à composição dos
conflitos de vizinhança. Mas foi aproximadamente a partir do final da década de
20 que surgiu uma legislação ambiental mais completa, embora o meio ambiente
tenha continuado a ser compreendido de forma restrita.
Ricardo Toledo Neder afirma que o que marca o Estado brasileiro após a
década de 30 em relação ao meio ambiente é o estabelecimento do controle
federal sobre o uso e ocupação do território e de seus recursos naturais, em uma
atmosfera de disputa entre o governo central e as forças políticas e econômicas
de diferentes unidades da Federação. Para o autor, a “regulação pública sobre
recursos naturais no Brasil nasceu da coalização de forças políticas
industrialistas, classes médias e operariado urbano que deu origem à Revolução
de 30 e do modelo de integração (nacional e societária) daí decorrente”.
Os recursos ambientais como a água, a fauna, as floras passaram a ser
regidos por uma legislação diferenciada, de maneira a não existir articulação
entre cada um desses elementos ou entre cada uma das políticas específicas.

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Dessa forma, a saúde pública passou a ser regida pelo Regulamento de
Saúde Pública ou Decreto nº 16.300/23, os recursos hídricos passaram a se
reger pelo Código das Águas ou Decreto-lei nº 852/38, a pesca pelo Código de
Pesca ou Decreto-lei nº 794/38, a fauna pelo Código de Caça ou Decreto-lei nº
5.894/43, o solo e o subsolo pelo Código de Minas ou Decreto-lei nº 1.985/40, e
a flora pelo Código Florestal ou Decreto nº 23.793/34.
A partir da década de 60 começa a segunda etapa da fase setorial, que é
marcada pela edição de normas com maiores referências às questões
ambientais propriamente ditas do que as da fase anterior.
Entre os textos legislativos mais importantes se destacam o Estatuto da
Terra ou Lei nº 4.504/64, o Código Florestal ou Lei nº 4.771/65, a Lei de Proteção
à Fauna ou Lei nº 5.197/67, o Código de Pesca ou Decreto-lei nº 221/67 e o
Código de Mineração ou Decreto-lei nº 227/67.
Por conta da ênfase dada ao direito de propriedade não existia
efetivamente uma preocupação com o meio ambiente, já que não se considerava
as relações de cada dos recursos naturais entre si como se cada recurso
ambiental específico não influísse no restante do meio natural e social ao redor
de si.
O Estado reduzia sua atuação aqueles recursos ambientais naturais que
pudessem ter algum valor econômico. No entendimento de Ricardo Toledo
Neder, a legislação ambiental desse período tinha como objetivo viabilizar a
regulação administrativa centralizada de uma autoridade geopolítica em cima
dos recursos ambientais como tarefa da União.
Esse mesmo autor afirma que é na fase setorial, chamada por ele de fase
de gestão de recursos naturais, que o Estado passa a regulamentar o uso dos
recursos ambientais por meio de outorgas e concessões a particulares, que
assim poderia explorar a fauna, a flora, os minérios, os recursos hídricos, os
recursos pesqueiros e a exploração da terra.
Essa estrutura administrativa estava praticamente centralizada na União,
que desempenhava as políticas relativas a cada um dos tipos de recursos
ambientais por meio dos seguintes órgãos específicos: Departamento Nacional
de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), Instituto Brasileiro de Desenvolvimento
Florestal (IBDF), Departamento Nacional de Prospecção Mineral (DNPM),

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Superintendência do Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE) e Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
Cada um desses órgãos federais passou a desempenhar suas atribuições
e competências em todo o território nacional independentemente da atuação dos
demais, o que conduziu a ações descoordenadas e conflitantes. Ainda na
atualidade a Administração Pública ambiental é pautada pela existência de
lógicas setoriais de ação e de interesses que impedem a integração das políticas
públicas de meio ambiente.

Fonte: www.amazonia-ibam.org.br

Tanto até esse quanto nos momentos anteriores a legislação ambiental


brasileira estava mais ou menos em compasso com a legislação internacional,
refletindo a falta de conscientização ambiental da época. Depois da 2ª Guerra
Mundial, com o aceleramento desordenado da produção agrícola e
principalmente da produção industrial, a esgotabilidade dos recursos naturais
ficou evidente.
Todavia, somente a partir de meados da década de 60, com a divulgação
de dados relativos ao aquecimento global do planeta e ao crescimento do buraco
na camada de ozônio na atmosfera, e com a ocorrência de catástrofes
ambientais, como o vazamento do petroleiro Torrey Canyon em 1967 e a ameaça
imobiliária contra o parque de Vanoise, na França, é que a sociedade civil
começou a gradualmente construir uma consciência ambiental.

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Em junho de 1972 a Organização das Nações Unidas organizou em
Estocolmo, na Suécia, a 1ª Conferência das Nações Unidas Sobre o Meio
Ambiente, aprovando ao final a Declaração Universal do Meio Ambiente que
declarava que os recursos naturais, como a água, o ar, o solo, a flora e a fauna,
devem ser conservados em benefício das gerações futuras, cabendo a cada país
regulamentar esse princípio em sua legislação de modo que esses bens sejam
devidamente tutelados. Essa declaração abriu caminho para que a legislação
brasileira, e as demais legislações ao redor do planeta, perfilassem a doutrina
protetiva com a promulgação de normas ambientais mais amplas e efetivas.
Édis Milaré afirma que no Brasil somente a partir da década de 80 a
legislação começou a se preocupar com o meio ambiente de uma forma global
e integrada. A Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente, é o primeiro grande marco em termos de norma de proteção ambiental
no Brasil. Essa legislação definiu de forma avançada e inovadora os conceitos,
princípios, objetivos e instrumentos para a defesa do meio ambiente, reconhecer
ainda a importância deste para a vida e para a qualidade de vida.
O segundo marco é a edição da Lei da Ação Civil Pública ou Lei nº
7.347/85, que disciplinou a ação civil pública como instrumento de defesa do
meio ambiente e dos demais direitos difusos e coletivos e fez com que os danos
ao meio ambiente pudessem efetivamente chegar ao Poder Judiciário.
A Constituição Federal de 1988 foi o terceiro grande marco da legislação
ambiental ao encampar tais elementos em um capítulo dedicado inteiramente ao
meio ambiente e em diversos outros artigos em que também trata do assunto,
fazendo com que o meio ambiente alcance à categoria de bem protegido
constitucionalmente.
O quarto marco é a edição da Lei de Crimes Ambientais ou Lei nº
9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas aplicáveis às
condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Essa Lei regulamentou
instrumentos importantes da legislação ambiental como a desconsideração da
personalidade da pessoa jurídica e a responsabilização penal da pessoa jurídica.
É preciso destacar que é somente na fase holística que surge o Direito
Ambiental propriamente dito, com princípios, objetivos e instrumentos peculiares.
Nessa fase desponta a ideia de intercomunicação e interdependência entre cada

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um dos elementos que formam o meio ambiente, o que faz com que esses
elementos devam ser tratados de forma harmônica e integrada.

1.1. Evolução histórica do pensamento ambiental da gestão de recursos


hídricos

Fonte: buscaarvore.com.br

Texto extraído do autor João Thiago Cavalcante


A gestão dos recursos hídricos no Brasil não é um fenômeno recente,
trazido pelo Código das Águas, em 1934, e consolidado com a Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988. Nos idos do Brasil - Colônia, no início
do século XVI, com as Ordenações Afonsinas (1480), Manuelinas (1520) e,
posteriormente, sob o domínio dos espanhóis, as Filipinas (1606), moldava-se
uma espécie de embrião da legislação ambiental.
Esse arcabouço legal, porém, foi implantado, segundo ALMEIDA (2002),
sob um viés de caráter econômico e sanitário, não preservacionista. Ou seja, as
primeiras preocupações da coroa portuguesa era conservar os recursos naturais
disponíveis para viabilizar a exploração econômica então vigente e de modo que
compatível com a saúde de seus colonizadores. A evolução histórica da gestão
de recursos hídricos está diretamente relacionada com a história evolutiva da
proteção ambiental.

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Nessa linha, estudaremos a divisão proposta pelo nobre professor Antônio
Herman de Vasconcelos Benjamin, que identifica três fases, indissociáveis e não
estanques, da evolução legislativo-ambiental brasileira: a Fase da Exploração
Desregrada, a Fragmentária e a Fase Holística.

1.2. Fase da exploração desregrada

Nesta primeira fase, que vigorou do descobrimento do Brasil, em 1500,


até o início da segunda metade do século XX, evidenciam-se poucas normas de
proteção ambiental que, nas palavras de BENJAMIN (1999): “(...) não visavam,
na vocação principal, resguardar o meio ambiente como tal. Seus objetivos eram
mais estreitos. Ora almejavam assegurar a sobrevivência de alguns recursos
naturais preciosos em acelerado processo de exaurimento (o pau-brasil, p. ex.),
ora, em outro plano, colimavam resguardar a saúde, valor fundamental este que
ensejou, não só entre nós, algumas das mais antigas manifestações legislativas
de tutela indireta da natureza”
Na intenção de conservar para explorar, resguardando indiretamente a
saúde de seus colonizadores, a coroa portuguesa seguia conivente com uma
exploração ambientalmente não sustentável.
Um aspecto destacado por ALMEIDA (2002) é que nos poucos artigos das
Ordenações Afonsinas (1480) e das Manuelinas (1520), relacionados às
questões ambientais, não havia legislação específica de proteção aos recursos
hídricos, ressaltando, quanto às Ordenações Manuelinas, as primeiras noções
de zoneamento ambiental, ao vedar a caça em determinados locais, bem como
a noção de reparação do dano ecológico.
As Ordenações Filipinas (1606), por sua vez, previram a primeira ideia de
poluição no parágrafo 7º do Título LXXXVIII do Livro V. Com isso, o dispositivo
em tela, se não inaugurou uma espécie de gestão dos recursos hídricos do Brasil
– Colônia, foi o seu precursor.
Sob a égide da Constituição de 1824, que embora não tenha normatizado
a proteção de recursos hídricos, vigorou o Código Penal de 1890, o qual dispôs
em seu artigo 162, in verbis:

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“Art.162. Corromper, ou conspurcar, a agua potavel de uso comum ou
particular, tornando-a impossível de beber ou nociva a saúde:
Pena de prisão celular por um a três anos. [sic]”
A primeira Constituição Republicana de 1891 limitou-se a normatizar a
competência privativa do Congresso para legislar sobre águas navegáveis. À luz
desta Constituição, foi promulgado o Código Civil dos Estados Unidos do Brasil
(Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916).
Nos artigos 563 a 568 desse código, o ordenamento jurídico então vigente
se referia à água, basicamente, como bem de valor não econômico e ilimitado,
vinculando-o ao direito de propriedade e de vizinhança. É dizer, o usuário poderia
utilizar as águas da forma que melhor o aprouvesse, desde que fossem
respeitados os direitos de vizinhança (ALMEIDA, 2002).
De maneira inovadora, a Constituição de 1934 estatuiu o embrião do que
hoje conhecemos como Outorga de Direito de Uso de Recursos Hídricos, ao
dispor em seu artigo 119 que o aproveitamento industrial das minas e das jazidas
minerais, bem como das águas e da energia hidráulica, ainda que de propriedade
privada, dependia de autorização ou concessão federal, na forma da lei,
reconhecendo, pois, o valor econômico das águas.
Na mesma época foi decretado o Código de Águas, o primeiro modelo de
gerenciamento de águas até então existente, rompendo com o paradigma da
legislação obsoleta que regulou a proteção jurídica das águas desde o
descobrimento, em 1500.
Comparativamente, ALMEIDA (2002) destaca que o Código das Águas
considera tal recurso hídrico como bem dotado de valor econômico a toda
coletividade, enquanto o Código Civil de 1916, além de não reconhecer o valor
econômico da água, a sua regulamentação fundava-se no direito de vizinhança.
Tanto a Carta Constitucional de 1937 quanto à de 1946 repetiram a
preocupação em estabelecer a competência exclusiva da União para legislar,
além da exploração econômica das águas vigente no Código das Águas.
A Ordem Constitucional de 1946, entretanto, quanto ao tema ora
desenvolvido, destacou-se em relação à anterior, por incluir as ilhas fluviais e
lacustres nas zonas limítrofes com outros países dentre os bens de domínio da
União (art. 46), bem como estabeleceu que as autorizações ou concessões

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seriam conferidas exclusivamente a brasileiros ou a sociedades organizadas no
país (art. 153, § 1º). Até esse ponto, verifica-se, ainda, a proteção do direito de
preferência no uso das águas ao proprietário do solo sob o manto do direito de
vizinhança.
Como observa ALMEIDA (2002):

[...] não havia qualquer fundamento constitucional que justificasse e


legitimasse as intervenções legislativas sobre matérias de cunho
estritamente ambiental. Os dispositivos supracitados não tutelavam a
proteção do meio ambiente, mas tão somente fixavam a competência
da União para legislar a respeito da exploração econômica de alguns
bens ambientais de domínio federal. [...]

Em que pese as caracterizações pontuais de proteção ambiental e,


especificamente, aos recursos hídricos, o pensamento que vigorou até meados
do século XX ia de encontro à necessidade de conservar para explorar e
conquistar novas fronteiras agrícolas, minerárias e da pecuária. A relação
homem-natureza, como ensina o nobre jurista BENJAMIN (1999), “Tinha na
omissão legislativa seu traço preponderante, relegando-se eventuais conflitos de
cunho ambiental quando muito ao sabor do tratamento pulverizado,
assistemático e privatístico dos direitos de vizinhança”.

1.3. Fase fragmentária

Fonte: www.diariodonoroeste.com.br

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Nesta segunda fase de evolução histórica de proteção ao meio ambiente
e aos recursos hídricos, juridicamente buscou-se a regulamentação das
atividades exploratórias de forma esparsa, reprimindo e tipificando as condutas
danosas à natureza.
Influenciado pela Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente,
o Brasil passou a legislar setores ecológicos com vista a proteger os recursos
naturais, ainda sem a consciência de que esses recursos fazem parte de um
sistema uno e complexo.
Por exemplo, foi estabelecida a preservação de cursos e mananciais de
água (artigo 2º, VII da Lei nº 4.132/62). Foi instituída a Lei da Ação Popular (Lei
n. 4.717/65), que permitia ao cidadão acionar o Poder Judiciário em face de atos
ou contratos administrativos ilegais ou lesivos ao patrimônio público, inclusive ao
meio ambiente. Em 1965 foi promulgado o Código Florestal (Lei n. 4.771/1965).
Estabeleceu, em seu artigo 2º, a proteção das florestas e das matas ciliares
situadas ao longo dos cursos d'água, nascentes, lagos, lagoas ou reservatórios.
Após a promulgação da Constituição de 1967 e, posteriormente, a de
1969, ambas sem alteração significativa ao tratamento dado à água pelas cartas
políticas anteriores, dois decretos se destacaram quanto à forma de proteger
nossos recursos hídricos. O primeiro, Decreto n. 75.700/75, estabeleceu área de
proteção para fontes de água mineral. O segundo, Decreto n. 79.367/77,
estabeleceu as normas e o padrão de potabilidade de água.

1.4. Fase holística

Antes de discorrermos sobre o presente tópico, cumpre-nos elencarmos


o significado da palavra “holística”. Foi criada a partir do termo holos que em
grego significa “todo” ou “inteiro”. Nesse sentido, a palavra holística, segundo o
dicionário Aurélio, significa um estudo que defende uma análise global e um
entendimento geral dos fenômenos.
A fase holística aqui tratada rompe com o pensamento de proteção isolada
de alguns recursos naturais com vista a sua exploração econômica (Fase
Fragmentária) e constrói a noção de um verdadeiro sistema de proteção
ecológica. Segundo BENJAMIN (1999), resguarda-se a partir de agora todos os

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recursos naturais, inclusive os hídricos, a partir do todo: o Meio Ambiente
ecologicamente equilibrado.
E essa ideia de meio ambiente ecologicamente equilibrado foi insculpida
pelo legislador originário no rol dos direitos fundamentais estabelecidos pela
Constituição Federal de 1988, em seu art. 225.
Não obstante, foi a Lei nº 6.938/81, que criou a Política Nacional do Meio
Ambiente, a grande precursora da Fase Holística, onde, nas palavras do
professor Antônio Herman V. Benjamin, “o ambiente passa a ser protegido de
maneira integral, vale dizer, como sistema ecológico integrado”.
Ressaltou, ainda, o citado autor: “Só com a Lei n. 6938/81, portanto, é que
verdadeiramente começa a proteção ambiental como tal no Brasil, indo o
legislador além da tutela dispersa, que caracterizava o modelo fragmentário até
então vigente (assegura-se o todo a partir das partes). ”
Portanto foi a partir desse novo sistema integrado de proteção ao meio
ambiente que nos deparamos com institutos jurídicos garantidores da concepção
holística aqui pesquisada. Citamos, por exemplo, a avaliação de impactos
ambientais como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente
(art. 9º, inciso III), regulamentado pela Resolução nº. 001/1986, do Conselho
Nacional do Meio Ambiente – CONAMA. A citada resolução estabeleceu as
definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para
uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental.
Segundo o entendimento do CONAMA, disposto no artigo 1º da resolução,
considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades físicas,
químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria
ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente,
afetam a saúde, a segurança, o bem-estar da população, as atividades sociais e
econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e a
qualidade dos recursos ambientais.
Nesse diapasão, em conformidade com a fase atual de proteção jurídica
do meio ambiente, onde se busca a preservação de todos os recursos naturais
do país por meio de uma política una e complexa de gestão desses recursos, é
que incluímos a atual Política Nacional de Recursos Hídricos.

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No Brasil, vigora a Política Nacional de Recursos Hídricos, criada pela Lei
nº 9.433/97, a qual estabeleceu princípios e regras essenciais de proteção e
controle de nossas águas, tanto quantificativa como qualitativamente.
Não obstante, vimos que esse é o resultado da evolução histórica por que
passou o ordenamento jurídico-ambiental brasileiro desde o Brasil-Colônia, e
que se relaciona diretamente à evolução da gestão de nossos recursos hídricos.
O embrião do pensamento jurídico-ambiental da gestão de recursos hídricos
inaugurou a Fase Desregrada, em que a ordem era conservar para
explorar, e não preservar. Aliada a isso, havia a noção de que os recursos
hídricos eram infinitos e não dotados de poder econômico, respeitando apenas
os limites do direito de propriedade e de vizinhança.
A Fase Fragmentária, segundo momento histórico de evolução da
gestação de recursos hídricos no Brasil, promoveu a legislação esparsa do meio
ambiente, regulando as atividades exploratórias e tipificando condutas danosas
à natureza, incluindo o uso da água, como o Código Florestal de 1965 e a Lei da
Ação Popular.
Por fim, chegamos à Fase Holística de proteção de nossos recursos
hídricos, a partir da qual o ordenamento jurídico rompe com uma proteção
isolada de alguns recursos naturais e estabelece um sistema de proteção
ambiental uno e complexo, aliando-se ao mandamento fundamental do meio
ambiente ecologicamente equilibrado, insculpido no art. 225 da CRFB/1988.

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2. CLASSIFICAÇÃO AMBIENTAL NA JURÍDICA

Fonte: i0.wp.com

A partir dos conceitos de meio ambiente, é possível identificar áreas


distintas que integram e formam a totalidade do que se entende por Meio
Ambiente: a natural, a artificial e a cultural.
Fiorillo (2003) esclarece que a divisão do meio ambiente em aspectos que
o compõem busca facilitar a identificação da atividade degradante e do bem
imediatamente agredido. Não se pode perder de vista que o direito ambiental
tem como objeto maior tutelar a vida saudável, de modo que a classificação
apenas identifica o aspecto do meio ambiente em que valores maiores foram
aviltados.
Atualmente, utiliza-se uma classificação para Meio Ambiente que
identifica uma quarta área de estudo: o Meio Ambiente do Trabalho. Assim
sendo, o Meio Ambiente classifica-se, segundo a doutrina jurídica, em:
- Meio Ambiente Natural;
- Meio Ambiente Artificial;
- Meio Ambiente Cultural;
- Meio Ambiente do Trabalho.

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2.1. Meio Ambiente Natural

Fonte: netnature.files.wordpress.com/

O Meio Ambiente Natural, também chamado de Meio Ambiente Físico, é


composto pela atmosfera, águas (subterrâneas e superficiais, mar territorial),
solo e subsolo, fauna e flora e o patrimônio genético. A tutela do Meio Ambiente
Natural se dá pelo artigo 225 da Constituição Federal, em seu parágrafo 1º,
incisos I e VII, e parágrafo 4º:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se
ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público:
I - Preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o
manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoque a extinção de espécies ou
submetam animais à crueldade.
§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua

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utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

2.2. Meio Ambiente Artificial

O Meio Ambiente Artificial “é compreendido pelo espaço urbano


construído, consistente no conjunto de edificações (chamado de espaço urbano
fechado), e pelos equipamentos públicos (espaço urbano aberto) ” (FIORILLO,
2003, p. 21). O Meio Ambiente Artificial é uma área que está diretamente
relacionada ao conceito de cidade.
A tutela constitucional do Meio Ambiente Artificial está presente no artigo
225 da Constituição Federal, que trata especificamente do Meio Ambiente, mas
também nos artigos 21, inciso XX e 182 (que trata da Política Urbana) da carta
constitucional, dentre outros:
Art. 21. Compete à União:
XX - Instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive
habitação, saneamento básico e transportes urbanos.
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder
Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei têm por objetivo
ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o
bem-estar de seus habitantes.

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2.3. Meio Ambiente Cultural

Fonte: conteudo.imguol.com.br

Integra o Meio Ambiente Cultural o patrimônio artístico, paisagístico,


arqueológico, histórico e turístico. Vale pontuar que, apesar de serem bens
produzidos pelo Homem e, portanto, também serem caracterizados como
artificiais, eles diferem dos bens que compõem o Meio Ambiente Artificial em
razão do valor diferenciado que possuem para uma sociedade e seu povo.
O Meio Ambiente Cultural é tutelado especificamente pelo artigo 216 da
Constituição Federal brasileira:
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza
material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços
destinados às manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

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2.4. Meio Ambiente do Trabalho

O Meio Ambiente do Trabalho é constituído pelo ambiente, local, no qual


as pessoas desenvolvem as suas atividades laborais, remuneradas ou não
remuneradas, “cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na
ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos
trabalhadores, independentemente da condição que ostentem” (FIORILLO,
2003, p. 23).
A tutela do Meio Ambiente do Trabalho também está contida na
Constituição Federal nos artigos 225 e 200, inciso VIII:
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições,
nos termos da lei:
VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do
trabalho.
Ressalta-se que a tutela do Meio Ambiente do Trabalho difere da tutela
dos direitos trabalhistas. As normas e leis que integram o Direito do Trabalho
disciplinam as relações jurídicas entre empregado e empregador, ao passo que,
a tutela do Meio Ambiente do Trabalho refere-se à segurança e saúde do
trabalhador no ambiente em que ele trabalha (FIORILLO, 2003).

3. CONCEITO CONSTITUCIONAL DE MEIO AMBIENTE

Fonte: vignette2.wikia.nocookie.net

19
Texto extraído do autor Carolina Grosso de Souza
A Constituição Federal, como lei supremo do Brasil, traça os limites do
ordenamento jurídico nacional. Devido a este motivo, que apontaremos na
norma constitucional os fundamentos da proteção ao meio ambiente.
Nas primeiras discussões constitucionais o debate ambiental surgiu
atrelado a outro direito fundamental, o legislador buscava a proteção ao meio
ambiente com o fim de proteger a saúde humana. Este é o primeiro fundamento
constitucional da proteção ao meio ambiente, a saúde humana, sendo
pressuposto a saúde ambiental.
Como já mencionado a Constituição Federal de 1988 foi inovadora quanto
ao direito ao meio ambiente, as Constituições posteriores não apresentam tal
tutela. Referente ao histórico das Constituições brasileiras Édis Milaré (2005,
P.183) apresenta a conclusão:
Do confronto entre as várias Constituições brasileiras, é possível extrair
alguns traços comuns:
a) Desde a Constituição de 1934, todas cuidaram da proteção do
patrimônio histórico, cultural e paisagístico do pais;
b) Houve constante indicação no texto constitucional da função social
da propriedade, solução que não tinha em mira – ou era insuficiente
para – proteger efetivamente o patrimônio ambiental;
c) Jamais se preocupou o legislador constitucional em proteger o
meio ambiente de forma específica e global, mas, sim, dele cuidou de
maneira diluída e mesmo casual, referindo-se separadamente a alguns
de seus elementos integrantes (agua, floresta, minérios, caça, pesca),
ou então disciplinando matérias com ele indiretamente relacionadas.
Nossa atual Constituição Federal é tida como uma das mais avançadas
do mundo, pois traduz em vários dispositivos a tutela ambiental. Contudo,
importante lembrar que juntamente com a CF/88, temos outros diplomas
originados do Poder Público, que visam a proteção do patrimônio ambiental do
Brasil como: Lei 7.735/1989 (cria o IBAMA), Lei 9.974/2000 (Lei de Agrotóxicos),
Lei 9.433/1997 (Política Nacional de Recursos Hídricos), Lei 9.795/1999 (Política
Nacional de Educação Ambiental), entre outras.

20
Outro fundamento constitucional que visa à proteção ao meio ambiente é
a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, ambos os princípios da
ordem econômica nacional previstas no art. 170 da CF/88. A relação de defesa
do meio ambiente com tais princípios é complexa, mas de suma relevância para
a efetividade dos interesses difusos e coletivos. Neste sentido, esclarece Édis
Milaré (2005, p. 186):
De qualquer modo, cabe ressaltar que, nos termos da Constituição, estão
desconformes – e, portanto, não podem prevalecer – as atividades decorrentes
da iniciativa privada (da pública também) que violem a proteção do meio
ambiente. Ou seja, a propriedade privada, base da ordem econômica
constitucional, deixa de cumprir sua função social – elementar para sua garantia
constitucional – quando se insurge contra o meio ambiente.
Seguindo a ideia do meio ambiente como um direito difuso, apontamos o
art. 225 da CF/88, em que define o meio ambiente ecologicamente equilibrado
como um direito da coletividade, como sendo de uso comum do povo e essencial
para a sadia qualidade de vida. Assim, com base na “sadia qualidade de vida”
podemos apontar ainda, outro fundamento constitucional que protege o meio
ambiente, o direito à vida.
Ainda se referindo ao art. 225 da CF/88, por ser determinado como um
direito difuso e da coletividade, possui caráter de direito fundamental, sendo
indisponível. Quanto a indisponibilidade explana Mirra (1994, p.13):
Ressalta-se que essa indisponibilidade vem acentuada na Constituição
Federal pelo fato de mencionar-se que a preservação do meio ambiente deve
ser feita no interesse não só dos presentes, como igualmente das futuras
gerações. Estabeleceu-se, por via de consequência, um dever não apenas
moral, como também jurídico e de natureza constitucional, para as gerações
atuais de transmitir esse “patrimônio” ambiental as gerações que nos sucederam
e nas melhores condições do ponto de vista do equilíbrio ecológico.
Assim, podemos afirmar que os titulares do direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado não são apenas os cidadãos do país, representados
pelas gerações presentes, mas também, aqueles que poderão existir,
representados pelas gerações futuras.

21
Com base nos fundamentos constituições apresentadas, direito a saúde
humana, princípio da ordem econômica, direito a vida e indisponibilidade, que o
meio ambiente merece proteção constitucional. A Constituição Federal de 1988
inseriu o direito ao meio ambiente no título VIII – Da ordem social, dedicando o
Capítulo VI somente ao meio ambiente. Assim, mesmo o direito ao meio
ambiente não estando no art. 5º da CF/88, em que especifica os direitos
fundamentais, ele é um direito fundamental e possui proteção constitucional.
A proteção constitucional do meio ambiente como direito fundamental já
está superada pela doutrina e jurisprudência. O meio ambiente não é direito
fundamental somente no Brasil, e por isso deveria estar descrito no art. 5º da
CF/88. O meio ambiente é um bem mundial, que deve ter uma atenção global.
Não devemos preservar o meio ambiente para as gerações futuras brasileiras,
mas sim para “todas” as gerações futuras, de todo o planeta Terra. Esta é uma
das argumentações que justificam o direito ao meio ambiente como direito
fundamento, demonstrando que não é necessário que ele esteja expresso no art.
5º da CF/88, para ser considerado um direito fundamental.

3.1. Competência Ambiental

Fonte: www.polpharma.pl

22
A Constituição Federal de 1988 é bem claro quanto às regras de
competência legislativa, embora seja apresentado um sistema complexo. As
regras de competência ambiental são classificadas em: competência material
exclusiva, competência legislativa exclusiva, competência material comum e
competência legislativa concorrente. Lembrando que a classificação de
competência ambiental segue as regras da competência em geral entre os
poderes.
A competência legislativa exclusiva ambiental diz respeito a competência
privativa da União, taxada no art. 22 da CF/88:
Art. 22 – Compete privativamente à União legislar sobre:
I – Direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo,
aeronáutico, espacial e do trabalho;
II – Desapropriação;
III – requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo
de guerra;
IV – águas, energia, informática, telecomunicações E radiodifusão; V –
serviço postal;
VI – Sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais; VII
– política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;
VIII – comércio exterior e interestadual;
IX – Diretrizes da política nacional de transportes;
X – Regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e
aeroespacial;
XI – trânsito e transporte;
XII – jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;
XIII – nacionalidade, cidadania e naturalização;
XIV – populações indígenas;
XV – emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de
estrangeiros;
XVI – organização do sistema nacional de emprego e condições para o
exercício de profissões;
XVII – organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria
Pública do

23
Distrito Federal e dos Territórios, bem como organização administrativa
destes;
XVIII – sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais;
XIX – sistemas de poupança, captação e garantia da poupança popular;
XX – Sistemas de consórcios e sorteios;
XXI – normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias,
convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares;
XXII – competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária
federais; XXIII – seguridade social;
XXIV – diretrizes e bases da educação nacional;
XXV – registros públicos;
XXVI – atividades nucleares de qualquer natureza;
XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as
modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e
fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o
disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia
mista, nos termos do art. 173, § 1º, III; XXVIII – defesa territorial, defesa
aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional; XXIX –
propaganda comercial.
Assim, as matérias arroladas neste artigo são privativas da competência
da União, devido a sua importância geral, ou seja, são questões se suma
importância para a nação, que só podem ser tratadas pelas autoridades máximas
do país. Neste sentido aponta Raul Machado Horta (1995, p.415): “competência
de legislação privativa é, por sua natureza, monopolística e concentrada no titular
dessa competência. ”
Referente ao campo ambiental a competência material comum aos entes
governamentais: União, Estados, Distrito Federal e Municípios, está disposta no
art. 23 da CF/88, incisos III, IV, VI, VII e XI.
Art. 23 – É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios:
I – Zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições
democráticas e conservar o patrimônio público;

24
II – Cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das
pessoas portadoras de deficiência;
III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico,
artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios
arqueológicos;
IV – Impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de
arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
V – Proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;
VI – Proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas
formas;
VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;
VIII – fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento
alimentar;
IX – Promover programas de construção de moradias e a melhoria das
condições habitacionais e de saneamento básico;
X – Combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização,
promovendo a integração social dos setores desfavorecidos;
XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de
pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;
XII – estabelecer e implantar política de educação para a segurança do
trânsito.
Parágrafo único – Leis complementares fixarão normas para a
cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo
em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.
Este artigo não traz somente a competência comum de defesa ao meio
ambiente, mas sim um “poder-dever”, devido obrigação de proteção ambiental
imposta pela Constituição Federal. Assim, o art. 23 da CF/88 atribui uma
cooperação administrativa entre os entes federados, para atuarem na sociedade
de forma recíproca, buscando o bem comum. Com base neste dispositivo, alguns
doutrinadores intitulam a competência comum, em administrativa ou
fiscalizatória.

25
A competência legislativa concorrente do meio ambiente, ou seja, a
possibilidade de os entes governamentais legislar sobre matéria ambiental, é
disciplinada pelo art. 24 da CF/88, que dispõe sobre a competência específica:
Art. 24 – Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
I – Direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; II
– orçamento;
III – juntas comerciais;
IV – custas dos serviços forenses;
V – produção e consumo;
VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do
solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
VII – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e
paisagístico;
VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a
bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; IX –
educação, cultura, ensino e desporto;
X – criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas;
XI – procedimentos em matéria processual;
XII – previdência social, proteção e defesa da saúde;
XIII – assistência jurídica e defensoria pública;
XIV – proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência;
XV – proteção à infância e à juventude;
XVI – organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis.
Sobre a competência concorrente afirma Sirvinskas (2006, p.92):
A competência concorrente permite que dois ou mais entes da federação
possam legislar sobre a mesma matéria. Essa competência pode ser dividida em
competência concorrente cumulativa e não-cumulativa. A primeira é aquela que
permite a União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre matérias a eles
atribuídas sem limites prévios, enquanto a não-cumulativa não permite aos entes
federativos legislar plenamente, devendo respeitar a competência vertical dos
entes de hierarquia superior. Nossa Constituição Federal adotou a competência
concorrente não-cumulativa no sentido de atribuir a União responsabilidade de

26
legislar sobre normas de caráter geral, e aos Estados e Distrito Federal, sobre
normas específicas.

4. OBJETO DA TUTELA AMBIENTAL

Fonte: www.bayerjovens.com.br

O objeto de tutela jurídica, assevera José Afonso da Silva, não é tanto o


meio ambiente considerado nos seus elementos constitutivos. O que o Direito
visa a proteger é a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida.
Pode-se dizer, ensina o autor, que há dois objetos de tutela, no caso: um
imediato, que é a qualidade do meio ambiente; e outro mediato, que é a saúde,
o bem-estar e a segurança da população, que se vem sintetizando na expressão
“qualidade de vida” (SOUSA, 2014).
É certo que a legislação protetora toma como objeto de proteção não tanto
o ambiente globalmente considerado, mas dimensões setoriais, ou seja: propõe-
se a tutela da qualidade dos elementos setoriais constitutivos do meio ambiente,
como a qualidade do solo, do patrimônio florestal, da fauna, do ar atmosférico,
da água, do sossego auditivo e da paisagem visual (SOUSA, 2014).
É verdade que a Constituição tenta organizar a proteção ambiental
segundo uma visão mais global do objeto de tutela, conforme se vê dos §§ 1º e
4º de seu art. 225, que se voltam para a proteção imediata de processos e
conjuntos constitutivos do meio ambiente e da realidade ecológica, como forma

27
de assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado.

4.1. A inserção da tutela ambiental no mundo jurídico

Fonte: ricosurf.com.br

Texto extraído da autora Suzana Carolina Dutra


A todo instante, estamos nos deparando com inúmeros e variados problemas
ambientais, seja por meio da nossa realidade empírica, seja através das fontes
de informação que noticiam diuturnamente as agressões ao meio
ambiente.
De forma progressiva, o patrimônio natural da humanidade vem sendo
dilapidado e os seus recursos explorados de forma indiscriminada. Além disso,
problemas como o desmatamento, a queima de combustíveis fósseis, o uso
intensivo de agrotóxicos e fertilizantes no solo, dentre outros fatores, têm
representado alterações diversas das características do meio ambiente,
degradando-o.
A degradação da qualidade ambiental gera consequências que afetam
não apenas a biota, mas também a saúde, a segurança e o bem-estar da

28
população, por vezes de forma irreversível, geralmente para atender aos
interesses de uma minoria privilegiada que se apropria dos recursos naturais,
apenas socializando com o restante da população as externalidades ambientais.
Segundo Milaré (2004), o homem, para a satisfação de suas novas e múltiplas
necessidades, as quais são ilimitadas, disputa os bens da natureza,
naturalmente limitados. Afirma esse autor que o processo de desenvolvimento
dos países se realiza, basicamente, à custa dos recursos naturais vitais,
provocando a deterioração das condições ambientais em ritmo e escala até
ontem ainda desconhecidos. A paisagem natural da terra está cada vez mais
ameaçada pelas usinas nucleares, pelo lixo atômico, pelos dejetos orgânicos,
pela chuva ácida, pelas indústrias e pelo lixo químico. Por conta disso, em todo
o mundo – e o Brasil não é nenhuma exceção -, o lençol freático se contamina,
a água escasseia, a área florestal diminui, o clima sofre profundas alterações, o
ar se torna irrespirável, o patrimônio genético se degrada, abreviando os anos
que o homem tem para viver sobre o planeta. (MILARÉ, 2004, p. 48, grifo do
autor).
Da transcrição retro, observa-se que o desequilíbrio ecológico é uma
realidade concreta, que a degradação ambiental se acentua progressivamente,
e que a inserção de modelos econômicos insustentáveis está destruindo as
condições essenciais à existência humana na Terra. Esse cenário, configurado
pela exigência de restabelecimento do equilíbrio ambiental, torna patente a
necessidade de se criar meios para frear as condutas que degradam o meio
ambiente. A sociedade se vê, então, obrigada a pressionar o Estado para que
sejam desenvolvidos mecanismos de preservação do equilíbrio do meio
ambiente.
Um desses mecanismos diz respeito à elaboração de normas protetivas
ambientais de direito interno e internacional, fazendo ex surgir uma realidade
inversa à anterior, pois, como lembra Reale (1987, p.297), se antes recorríamos
à natureza para dar uma base estável ao Direito – e no fundo esta é a razão do
direito natural – assistimos hoje a uma trágica inversão, sendo o homem
obrigado a recorrer ao Direito para salvar a natureza que morre.
Essa trágica inversão da realidade é o resultado de um fenômeno social
que os cientistas vêm caracterizando como uma crise ambiental. A percepção

29
de tal crise desencadeou, já na década de 1960, um processo de
conscientização de alguns segmentos sociais que acabou tomando dimensões
internacionais, conduzindo as nações a uma discussão, nos grandes foros
internacionais, da problemática ambiental. Como consequência, tem-se a
elaboração de importantes conferências, convenções e tratados sobre a
necessidade de proteção ambiental.
Na década de 1970, realiza-se em Estocolmo, capital da Suécia, a
primeira conferência em nível internacional, visando à sistematização de
mecanismos de proteção ambiental. Esse evento, promovido pela Organização
das Nações Unidas – ONU, contou com a participação de 113 países e foi
denominado de Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano. Desse evento resultou um Plano de Ação para o Meio Ambiente, com
109 recomendações centradas em três grandes tipos de políticas, relativas à
avaliação, gestão do meio ambiente mundial e medidas de apoio, como
informação, educação e formação de especialistas. Também foi instituído o
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.
A Conferência de Estocolmo foi resultado da percepção das nações ricas
e industrializadas sobre a degradação ambiental causada pelo seu modelo de
crescimento econômico, o qual desencadeia a progressiva escassez de recursos
naturais.
Em verdade, tal conferência decorreu da necessidade de se discutir temas
ambientais que poderiam causar conflitos internacionais, pois as nações
economicamente mais desenvolvidas – consideradas como ricas pelo autor
citado – acreditavam que o crescimento econômico de base industrial e o
crescimento demográfico dos países em desenvolvimento eram os grandes
responsáveis pela poluição e degradação dos recursos naturais não renováveis.
Portanto, tais países tinham como meta barrar a pretensão de industrialização
dos países em via de desenvolvimento e não desenvolvidos, acreditando que
poderiam permutar tecnologias com commodities primárias para os países de
capitalismo periféricos. Essa intenção não se mostrou compatível com os
interesses dos países em via de desenvolvimento, os quais reivindicavam o
evolver da industrialização, ainda que isso implicasse em poluição.

30
Por conseguinte, os esforços dos países industrializados, responsáveis,
eles sim, pela anunciada crise ambiental, eram contrapostos aos interesses dos
países em via de desenvolvimento, interessados em modificar iniquidades. Essa
divergência de interesses, ganhando dimensão política, conduziu a discussões
acerca da necessidade de se promover desenvolvimento econômico
harmonizado com exigência de sustentabilidade socioambiental. Os debates
políticos remeteram a um consenso quanto à premência de se instaurar uma
Nova Ordem Econômica Internacional, capaz de conjugar a ideia de progresso
com a de conservação ambiental e equidade social.
Vinte anos após a Conferência de Estocolmo, foi realizada a Conferência
das Nações de Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), em 1992, na
cidade do Rio de Janeiro. Esse evento, que ficou mais conhecido como ECO/92,
foi a segunda manifestação solene da ONU em prol do meio ambiente,
resultando na elaboração da Declaração sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento e no estabelecimento da Agenda 21.
A Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento é um documento
em que ficou consignada a necessidade de proteção ambiental centrada no ser
humano, e neste reafirmava-se a expressão desenvolvimento sustentável,
enquanto a Agenda 21 consiste em guia de implantação de ações para proteção
ambiental no século XXI. Essas ações devem ser implementadas pelos
Governos, Agências de Desenvolvimento e Grupos Setoriais, independente da
área onde a atividade humana afete o Meio Ambiente, devendo a Agenda 21 ser
entendida como proposta de estratégia destinada a subsidiar um planejamento
estratégico, adaptado no tempo e no espaço às peculiaridades de cada país e
ao sentimento de sua população, com plena observância de todos os princípios
contidos na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.
De acordo com Almeida e Apolinário (2009, p.30), foi na CNUMAD que
pela primeira vez o atual modelo de desenvolvimento econômico foi criticado,
sendo considerado injusto socialmente e perdulário do ponto de vista ambiental.
Nesse evento também foi proposto o caminho para uma nova sociedade, justa e
ecologicamente responsável, produtora do desenvolvimento sustentável.
Observa-se que a Conferência de Estocolmo e a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (ECO/92) foram os marcos

31
mais importantes para a tutela do direito ambiental internacional. Com relação à
Conferência de Estocolmo, afirma Soares (2001, p.70) que desde a realização
da Conferência das Nações Unidas em Estocolmo, 1972, emergiu e fortaleceu-
se por toda comunidade internacional uma enraizada consciência de que as
questões relativas à proteção da ecologia diziam respeito não só aos elementos
componentes do meio, tomados isoladamente ou em conjunto, mas com
particular ênfase na atuação e finalidade de proteção ao próprio homem.
Em relação à ECO/92, foi consagrada a ideia, nascida em Estocolmo, de
desenvolvimento sustentável e integrado. Segundo as deliberações da ECO/92,
somente essa forma de desenvolvimento amenizaria as desigualdades sociais,
um dos fatores que contribuem para a degradação do meio ambiente. Assegurar
possibilidades para uma melhor condição de vida para aos seres humanos é,
portanto, uma das formas de fazê-los desfrutar um meio ambiente saudável,
somente possível com o equilibro ecológico entre fatores bióticos e abióticos
existentes nos planetas, haja vista ser ele um grande ecossistema.
Vale ressaltar ainda que outras contribuições surgiram, posteriormente,
tentando articular a necessidade de desenvolvimento com a de conservação
ambiental, sobretudo no campo jurídico.

4.2. A inserção da tutela ambiental no ordenamento jurídico brasileiro

Fonte: www.iorise.com

32
No Brasil, foi somente a partir de 1970 que se deram os primeiros passos
efetivos na história da proteção jurídica ao meio ambiente, década em que
surgiram os primeiros diplomas legais tutelando a qualidade ambiental. A
necessidade de combate à poluição nas áreas industrializadas, principalmente
em Cubatão, polo industrial em que a população foi vitimada pela degradação
ambiental, sobretudo da qualidade do ar, em virtude da grande quantidade de
fumaça liberada pelas chaminés das indústrias ali instaladas, além, das
alterações adversas às características do meio ambiente, em face do nível crítico
de degradação ambiental, conduziram a sociedade a lutar pelo seu bem-estar e
segurança social.
Em 1980, com objetivo de proteção ambiental, foi editada, em âmbito
federal, a Lei nº 6.803/80, dispondo sobre diretrizes básicas para o Zoneamento
Industrial nas áreas críticas de poluição. No ano de 1988, objetivando a
preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida e
visando a assegurar, no país, condições ao desenvolvimento socioeconômico,
aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida
humana, foi editada a Lei nº 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio
Ambiente (PNMA).
Esse último diploma legal mereceu especial atenção, pois se preocupou
em trazer os conceitos de meio ambiente, poluição e degradação do meio
ambiente, além de estabelecer diretrizes destinadas a orientar a ação dos
Governos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos
Municípios quanto à preservação da qualidade ambiental e manutenção do
equilíbrio ecológico. Por meio dessa Lei, foi instituído também o Sistema
Nacional do Meio Ambiente/ SISNAMA e o Cadastro Técnico Federal de
Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental.
O SISNAMA tem como finalidade estabelecer uma rede de agências
governamentais nos diversos níveis da Federação que pudessem assegurar os
mecanismos capazes de implantar eficientemente a PNMA.
Com a instituição da PNMA, a legislação brasileira deu um passo à frente
em termos de proteção ambiental. Entretanto, na realidade empírica, não
representou um avanço, na medida em que contraria os interesses
desenvolvimentistas do capitalismo, motivo por que não se verificou a sua

33
concreta implementação, o que só veio a acontecer posteriormente, com a
Constituição Federal de 1988.
Apesar da PNMA, até 1988 observa-se que a defesa ambiental foi objeto
de leis setoriais, conquanto não havia um tratamento unitário à tutela ambiental,
não obstante a necessidade de se tratar tal problemática segundo uma visão que
inter-relacionasse todos os setores associados ao meio ambiente. Nesse
diapasão, afirma Soares (2001, p. 39):
Faltavam, até então, normas constitucionais que fundamentassem uma
visão global da questão ambiental, que propende para a proteção do patrimônio
ambiental globalmente considerado em todas as suas manifestações, em face
da atuação conjunta dos fatores desagregantes de todos os objetos de tutela
(água, ar, solo e sossego).
As Constituições brasileiras anteriores a 1988 nada trouxeram,
especificamente, sobre a proteção do meio ambiente natural, nelas encontrando-
se apenas uma orientação quanto à competência da União para legislar sobre
água, florestas, caça e pesca, possibilitando, assim, a criação de leis e códigos
de proteção a esses elementos, tais como o Código Florestal e os Códigos de
Água e de Pesca.
A Constituição de 1988, em um ato de pioneirismo, deu um tratamento
constitucional à problemática ambiental ao destinar um capítulo inteiro à
questão, firmando o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado e impondo ao poder público e à coletividade o dever de defender e
preservar a natureza para presentes e futuras gerações, consagrando assim o
chamado princípio intergeracional. Por força do texto constitucional, o direito ao
meio ambiente hígido passou a ser considerado direito fundamental de terceira
geração, ou seja, direito de titularidade coletiva e difusa. A esse tipo de direito,
associa-se um poder que se atribui não ao indivíduo, identificado em sua
singularidade, mas, em um sentido verdadeiramente mais abrangente, à
coletividade, considerando que é elemento essencial à manutenção das
condições de existência humana.
Silva (2007) explicita que no qualificativo fundamental (grifo do autor)
encontra-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais o
ser humano não é capaz de se realizar, de conviver e, por vezes, nem mesmo

34
sobreviver. Ainda de acordo com o referido autor, direito fundamental é aquele
que a todos, por igual, deve ser reconhecido, não apenas no plano formal, mas
concreta e materialmente efetivado. Nessa condição se encontra o direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, diante da sua essencialidade à
manutenção da vida no planeta.
Nessa mesma linha de raciocínio apresenta-se Medeiros (2004), quando
afirma que ao incluir o meio ambiente como bem jurídico passível de tutela, o
constituinte delimitou a existência de uma nova dimensão do direito fundamental
à vida e do próprio princípio da dignidade da pessoa humana, haja vista ser o
meio ambiente o espaço em que se desenvolve a vida em todas as suas formas,
sobretudo a humana.
Analisando a evolução da tutela ambiental na história do
constitucionalismo brasileiro, observa-se que o tratamento dispensado à matéria
após 1988 representou um processo evolutivo, porquanto se antes tínhamos
constituições que não disciplinavam a matéria ambiental, agora temos uma Carta
Magna que, além de reconhecer as necessidades de proteção do meio ambiente,
busca compatibilizar crescimento econômico com a exigência de
desenvolvimento sustentável.
Não obstante os avanços constitucionais, a realidade empírica tem
mostrado que há um descaso por parte do poder público com relação ao dever
de tutela ambiental, situação justificada, principalmente, em face da prevalência
dos interesses econômicos sobre os interesses difusos em uma sociedade
capitalista.

35
4.3. O descompasso entre a realidade e legislação de proteção ao meio
ambiente

Fonte: animais.culturamix.com

O crescimento de projetos e práticas relacionadas à proteção do meio


ambiente pressupõe um despertar, na sociedade, de uma consciência quanto à
necessidade de conjugar desenvolvimento econômico com sustentabilidade
ambiental. A percepção dos efeitos decorrentes das alterações adversas às
características do meio natural associa-se a essa tomada de consciência social,
responsável pela fragilização da concepção antropocêntrica e da ideia de que
por meio da ciência e da tecnologia o ser humano sempre encontra uma solução
para os problemas causados ao meio ambiente.
Na perspectiva antropocêntrica, o ser humano é o centro de toda a
atividade realizada no orbe, não sendo o planeta compreendido em sua
totalidade e, por isso, dissociado do entendimento de que esse todo constitui-se
pelas partes, formando um imenso ecossistema,
Portanto, não se situando o ser humano como parte integrante dessa
cadeia ecológica, não poderia estabelecer uma relação harmônica com o meio
ambiente, percebendo a natureza apenas com um mero fator de produção
material, ou seja, algo de interesse meramente econômico e mercadológico.
Como consequência, os modelos de desenvolvimento econômico têm sido
responsáveis por relações de produção de caráter predatório quando se trata do

36
uso dos recursos naturais, indiscriminadamente explorando-os, despreocupados
da necessidade de garantia do direito fundamental à qualidade ambiental.
Esse modelo civilizatório, de base antropocêntrica, tem, portanto,
associado a si, um modelo material de produção que não respeita os limites dos
recursos naturais, explorando-os até a exaustão, o que levará, como alerta o
sistema econômico mundial ao colapso por absoluta escassez de fontes
energéticas e alimentares. As perspectivas de um colapso das condições de
manutenção da vida no orbe têm conduzido a sociedade a pressionar o Estado
para assegurar a conservação do meio ambiente, dando azo à criação de um
mecanismo jurídico que limite as ações sobre o meio ambiente.
O Brasil atualmente dispõe de uma vasta legislação de proteção ao meio
ambiente, influenciando, de forma positiva, o ordenamento jurídico nacional, haja
vista ser o direito um sistema normativo e não um mero conjunto de normas.
Entretanto, não obstante a existência de uma forte legislação ambiental,
a realidade empírica vem demonstrando um descompasso entre o escopo do
ordenamento jurídico ambiental e as ações econômicas sobre o meio ambiente:
A produção capitalista é por sua própria natureza anti-ambiental, inclusive
com a progressiva degradação ou exaustão dos recursos naturais. Sem
esquecer que em alguns setores não há ainda alternativa para proceder de forma
ambientalmente correta, como é o caso dos derivados de energia fóssil (petróleo
e carvão). A racionalidade do sistema a curto e a longo prazo implica no domínio
e destruição dos recursos naturais, desvelando o viés da insustentabilidade, uma
vez que toda a natureza passa a ser compreendida como bens naturais com fins
de apropriação privada.
Não se pode negar que, além do interesse capitalista na
desregulamentação das normas de proteção do meio ambiente, a estrutura
burocrática estatal não se encontra devidamente preparada para garantir a
efetivação das leis ambientais. Conforme Duarte (2003), constatam-se
problemas de carência de informações e de planejamento, restrições de
natureza política e orçamentária, falta de integração entre as políticas públicas,
deficiências regulatórias e conflitos institucionais.
O entendimento de que a preservação do meio ambiente impede o
desenvolvimento econômico responde pela falta de recursos financeiros para

37
uma adequada implementação das políticas ambientais pelos órgãos
burocráticos, gerando, com essa insuficiência orçamentária, problemas que vão
desde a falta de verbas para contratação de pessoal, em regra despreparados e
em números escassos, até a incapacidade de custeio de ações fiscalizatórias
ostensivas e impedimento de definição de metas, principalmente a longo prazo.
Além disso, as políticas públicas, em sua maioria, estão sendo vistas
pelos administradores como políticas de governo, o que gera a descontinuidade
das ações governamentais, sendo bastante comum no sistema político brasileiro
a paralisação de planos, programas e projetos elaborados pela gestão anterior,
principalmente quando o sucessor possui diferente vinculação político-partidária.
Essa prática gera graves prejuízos ao meio ambiente e, por conseguinte, à
população.
Assim, se por um lado houve um aperfeiçoamento da ordem jurídica,
observa-se que em face da inércia estatal diante do dever constitucional de
conservação do meio ambiente há, ainda, uma forte prevalência dos interesses
mercadológicos, incompatíveis com as leis da natureza.
Portanto, todo o aparato normativo existente não vem sendo, por si só,
capaz de permitir a efetiva proteção ambiental, dependente de ações executivas
e políticas dos organismos estatais. Dessa forma, a consagração, em nossa Lei
Maior, do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado não
tem sido suficiente para que tal direito seja efetivamente assegurado, não basta
apenas legislar, mas torna-se essencial que o Estado se lance ao trabalho de
concretizar as regras postas.
Diante desse descompasso entre a produção legislativa e realidade
vivenciada, a sociedade hodierna passa, agora, a enfrentar o desafio de
pressionar os governantes a assumirem uma postura ativa no tocante ao dever
de proteção ambiental.

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4.4. A posição da sociedade frente à negligência estatal

Fonte: imgs.mongabay.com

A nossa Constituição Federal dá uma atenção especial ao direito


ambiental, que também passa a ser objeto do dever de proteção e defesa por
parte do Estado e da coletividade, uma vez que, nos moldes do artigo 225,
impõe-se ao Poder Público o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
A tutela da qualidade ambiental deve ser exercida pelo Poder Público, nas
três esferas de poder, cabendo-lhe o desenvolvimento de ações capazes de
assegurar, conforme termos da CF de 1988: 1) a preservação e restauração dos
processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e
ecossistemas; 2) a diversidade e a integridade do patrimônio genético do país e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material
genético; 3) definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e
seus componentes a serem especialmente protegidos; 4) exigir, na forma da lei,
para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa
degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental; 5) controlar
a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias
que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; 6)

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promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente; 7) e proteger a
fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua
função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais
a crueldade.
Assegura ainda a nossa Lei Maior que as condutas e atividades
consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas
ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da
obrigação de reparar os danos causados e a obrigação de recuperar o meio
ambiente degradado daquele que explorar recursos minerais, de acordo com
solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
Em que pese essa proteção constitucional do meio ambiente, a exigência
de uma elogiável legislação ambiental e o fato do Brasil ser signatário de
inúmeras convenções internacionais sobre o meio ambiente, contraditoriamente
o Estado não tem se mostrado capaz de resolver a problemática do meio
ambiente.
Diante da essencialidade da proteção ambiental, configura-se
imprescindível que a sociedade se organize com o objetivo de exigir que o Poder
Público torne eficazes as normas ambientais, assegurando higidez ao meio
ambiente.
Problemas como carência de informações e de planejamento, restrições
de natureza política e orçamentária, falta de integração entre as políticas
públicas, deficiências regulatórias e conflitos institucionais, citados por Carneiro
(2001), precisam ser resolvidos, não podendo a população ficar passiva diante
da inércia estatal ao dever de assegurar o direito fundamental à qualidade
ambiental.
Isso porque, como explica o referido autor, a carência de informações e
planejamento não contribui para que se compreendam os efeitos que as diversas
atividades produtivas, em especial as capitalistas, acarretam aos processos
ecológicos fundamentais, bem como os custos sociais e econômicos
decorrentes dessa produção. A ausência, limitação e desatualização ou
imprecisão dos dados relativos às variáveis ambientais inviabiliza o
planejamento das ações do poder público. Essa realidade estatal malfere a

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legislação ambiental, impossibilitando a superação dos efeitos negativos da
atividade produtiva e uma conciliação dos interesses socioambientais com a
necessidade de desenvolvimento, que precisa ser sustentável. Isso exige a
formalização, implantação e avaliação de políticas públicas.
Entretanto, o movimento empírico, no Brasil, tem demonstrado que as
políticas públicas são vistas pelos governantes como meras políticas de governo,
gerando descontinuidade das ações formuladas e já implementadas pelos
governos antecessores.
A paralisação de planos, programas e projetos elaborados pela gestão
anterior, que ocorre, principalmente quando o sucessor possui diferente
vinculação político- partidária, gera graves prejuízos para o meio ambiente e, por
conseguinte, para a qualidade de vida da população.
Pelo exposto, constata-se que todo o aparato normativo existente não
vem sendo capaz de permitir o efetivo zelo pelo ambiente, uma vez que tal direito
depende da ação concreta dos organismos estatais. A mera edição de leis não
é suficiente para a efetiva solução da problemática ambiental, sendo necessária
a mudança da postura da população e dos órgãos competentes, de modo a dar
concretude ao disposto no caput do artigo 225 da CF/88.
Para que isso ocorra, o ordenamento jurídico deve assegurar a adoção de
medidas preventivas e um processo educacional que possibilite, além de hábitos
em favor da proteção ao meio ambiente, uma consciência crítica sobre as reais
causas da crise ambiental.
Imprescindível se faz a aplicação concreta e efetiva dos instrumentos de
gestão ambiental, como a contabilidade, auditoria, licenciamento, além da
aplicação de medidas coercitivas em caráter retórico e não punitivo, ou seja, de
modo a convencer o possível infrator a não cometer determinada infração, pois
seu cometimento acarretará mais prejuízo que possíveis lucros, levando as
empresas poluidoras à compreensão de que é preciso toda cautela antes de agir
sobre o meio ambiente.

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5. O MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO COMO
DIREITO FUNDAMENTAL

Fonte: img.over-blog-kiwi.com

Texto extraído do autor Sérgio Quezado Gurgel E Silva


Deve-se iniciar o assunto seguinte com a apreciação de julgado de nosso
Supremo Tribunal Federal no sentido de declarar a qualidade e importância do
meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental, in verbis.
“Agravo regimental no recurso extraordinário. Constitucional. Ação civil
pública. Defesa do meio ambiente. Implementação de políticas públicas.
Possibilidade. Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência.
Precedentes. 1. Esta Corte já firmou a orientação de que é dever do Poder
Público e da sociedade a defesa de um meio ambiente ecologicamente
equilibrado para a presente e as futuras gerações, sendo esse um direito
transindividual garantido pela Constituição Federal, a qual comete ao Ministério
Público a sua proteção. 2. O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode
determinar que a Administração pública adote medidas assecuratórias de
direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais sem que isso

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configure violação do princípio da separação de poderes. 3. Agravo regimental
não provido”.
Entende-se que o direito ao meio ambiente é direito fundamental de
terceira dimensão – ou geração –, sendo estes garantidores da fraternidade e da
solidariedade entre os sujeitos. Expressamente, o Ministro do STF, Celso de
Mello já assim qualificara este direito, quando do julgamento do MS 22.164 em
30.20.1995.
Muito embora nossa Carta Magna contemple aos dispositivos constantes
ao Título II de sua redação a alcunha de “Dos Direitos e Garantias
Fundamentais”, a doutrina e jurisprudência já é pacífica no sentido de que o rol
não é exaustivo, e que outras disposições em artigos esparsos são
contempladas com a mesma fundamentabilidade.
Ademais, saliente-se que o próprio art. 225 concebe seus direitos como
essenciais, e que o art. 5º, LXXIII prevê a utilização de ação popular para a
defesa do meio ambiente, que não poderia ser outra cousa senão algo
fundamental, sob esta ótica.
José Afonso da Silva acerta com precisão ao lecionar que “o que é
importante é que se tenha a consciência de que o direito à vida, como matriz de
todos os demais direitos fundamentais do Homem, é que há de orientar todas as
formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. Cumpre compreender
que ele é um fator preponderante, que há de estar acima de quaisquer outras
considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao direito de
propriedade, como as da iniciativa privada. Também estes são garantidos no
texto constitucional, mas, a toda evidência, não podem primar sobre o direito
fundamental à vida, que está em jogo quando se discute a tutela da qualidade
do meio ambiente. É que a tutela da qualidade do meio ambiente é instrumental
no sentido de que, através dela, o que se protege é um valor maior: a qualidade
da vida”.

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5.1. O Direito Ambiental Comparado

Fonte: www.cidadederibeiraopreto.com.br

Consigne-se, entrementes, que para uma melhor apreciação dos


paradigmas brasileiros de proteção ambiental, interessante tomar parâmetros de
caráter internacional a fim de se atentar se a guarida constitucional do tema é
satisfatória ou carece de explanações sobre pontos que são tratados em outras
Leis Maiores.
Com efeito, é a Carta Magna Portuguesa de 2005 para definir, em seu art.
66, item 1, que “todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e
ecologicamente equilibrado e o dever de o defender”, demonstrando
basicamente os mesmos fundamentos basilares de nossa Carta Magna, bem
como abraçando, com afinco, o princípio da participação.
Em seu item seguinte, ainda no mesmo artigo 66, estabelece os encargos
do Estado para a mantença do meio ambiente, donde podemos vislumbrar
princípios conhecidos, como o da precaução e prevenção, da educação
ambiental, do desenvolvimento sustentável, et cetera.
A Constituição Federal Espanhola, por sua vez, ao art. 45, I, expõe que
“todos tienen el derecho a disfrutar de un médio ambiente adecuado para el
desarrollo de la persona, así como el deber de conservarlo”, seguindo o mesmo

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padrão português já comentado, em seus itens seguintes, estabelece os
princípios da prevenção e precaução, do desenvolvimento sustentável, do
poluidor-pagador e da educação ambiental
Em pesquisa junto às Leis Maiores da Itália, Alemanha e Estados Unidos
da América, não fora possível encontrar dispositivos que tratassem da matéria
ambiental.
Pela análise do exposto, observa-se que o direito positivado e princípio
lógico de cunho ambiental em nossa Constituição/88 é ainda mais abrangente e
aprofundado que as das Cartas Magnas ibéricas, o que não implica em uma
equivalência de efetividade, haja vista que o campo do dever ser brasileiro ainda
está bastante além do que se aplica faticamente.

6. CONCLUSÃO

Fonte: 4.bp.blogspot.com

Com profunda clareza a importância com que a Carta Magna de 1988


delineia sobre o Direito Ambiental, ramo jurídico que vem tomando cada vez mais
o cenário hodierno do direito público.

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Urge salientar, contudo, que muito embora sejam as disposições
normativas constitucionais condizentes com o que se espera de uma nação
direcionada a resguardar e respeitar o meio ambiente, o Brasil não busca a
efetivação de suas utópicas leis, dentre elas a própria Constituição Federal.
O Direito Ambiental infraconstitucional é esparso e, com efeito, dificulta
em muito a educação mais aprofundada da população leiga, haja vista que são
inúmeras resoluções, leis estaduais e federais que dispõem sobre o assunto,
sendo que para o correto entendimento de seu fim, faz-se necessário ter
conhecimento de todo o arcabouço legislativo ambiental que certamente poucas
pessoas detêm.
A aparente necessidade de se regulamentar cada mínimo detalhe acaba
produzindo efeitos diferentes do que se espera, dificultando a aplicação prática
dos princípios da efetividade e da educação ambiental, bem como da
participação da sociedade nas políticas ambientais.
A distribuição de competências é mais um efetivo óbice à efetivação
destas políticas, ainda porque estabelece divisões burocráticas e pouco úteis de
atribuições dos órgãos públicos, sendo que, por exemplo, qualquer atentado a
dunas de certa espécie a competência seria do órgão federal – IBAMA –, já de
outras características, seria do órgão estadual de fiscalização ambiental.
Estes formalismos também dificultam quando do conhecimento de
normas, ad exemplum, o crime de poluição sonora, previsto no art. 54 da Lei
9.605/1998 deverá ser apurado de acordo com a Resolução 001/1990 do
CONAMA, a qual adota padrões para aferição do nível de ruído das regras da
NBR 10.151/2000 e 10.152/2000, sem prejuízo de demais legislações municipais
sobre o tema a variar de região para região. Acaso trate-se de ruído emitido por
automóveis, deve-se levar em consideração a Resolução 008/1993 do
CONAMA, ressalte-se.
Desta forma, observa-se que o legislador preocupa-se tanto em dividir
especificamente as competências e atribuições de cada ente público, de tratar
com minúcias as leis e resoluções de modo a não permitir lacunas, porém, olvida
da principal questão: o modo de dar efetividade a seu objetivo preventivo ou
reparador.

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7. BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Caroline Corrêa de. Evolução histórica da proteção jurídica das


águas no Brasil. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002.
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