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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
METODOLOGIA DA HISTÓRIA
DOCENTE: TELMA FERNANDES

RESENHA DA SEGUNDA UNIDADE


Matheus Cabral Chaves Bezerra

PORTELLI, Alessandro – O que faz a história oral diferente

As discussões acerca dos modos de se fazer história perpassam séculos,


onde são desenvolvidas novas formas de pensar e analisar as fontes
historiográficas. O caso da vez tem como autor o historiador italiano Alessandro
Portelli, conhecido por suas contribuições para a história oral, especialmente em
relação ao estudo da memória coletiva, história popular e história social. Em seu
texto “O que faz a história oral diferente”, o autor pretende discutir a história oral
como um modo à parte de ser fazer história, diferente de qualquer outro, traçando
contrapontos em relação à história escrita.
De início, Portelli introduz tratando de uma problemática na academia italiana
que, segundo o próprio, descartava a história oral antes mesmo de procurar
entendê-la, como se houvesse um temor da história oral substituir e deixar
completamente de lado a história escrita convencional. Segundo ele, as duas
vertentes não são excludentes, embora requiram “instrumentos interpretativos
diferentes e específicos”. Nessa linha de pensamento, Portelli busca destrinchar as
características e singularidades da história oral, constantemente traçando paralelos
com a escrita.
Em primeiro lugar, o italiano procura destrinchar o que parece óbvio: a
oralidade é diferente da escrita. Tentar reproduzir gravações de oralidades em textos
transcritos é um equívoco, tendo em vista que essa transcrição inevitavelmente
geraria ruídos e mudanças na interpretação da fonte. Vários são os fatores pelos
quais a oralidade se torna única: a forma de falar, as expressões, o discurso popular,
as pausas. Essas variáveis trazem significados que são imperceptíveis quando
transcritas em um simples texto. Se a escrita é caracterizada pela regularidade no
discurso, em que um texto segue o mesmo ritmo, a oralidade é marcada pelo
contrário, isto é, a oscilação. Nas emoções, no ritmo da fala, nos dialetos usados e
nos volumes estão conotações sociais e significados implícitos que não podem ser
reproduzidos na escrita. Além disso, a história oral é uma narrativa. Há de
acontecer, por exemplo, significados na velocidade que a história é narrada. Se o
narrador desenvolve muito mais um assunto que o outro, isso pode traduzir a
importância do episódio, da mesma forma em que há a possibilidade de estar
fugindo de algum assunto delicado.
Outro ponto que o autor traz em seguida é a subjetividade e a parcialidade
do expositor, isso é, a história oral trata mais de significados do que fatos em si.
Segundo ele, “fontes orais não nos contam apenas o que o povo fez, mas o que
queria fazer, o que acreditava estar fazendo e o que agora pensa que fez”. Ou seja,
é sobre analisar a perspectiva do entrevistado sobre o fato, sua visão dentro de
determinado contexto, e não apenas saber o que aconteceu. A fonte oral pode não
dizer exatamente o tamanho de uma construção, por exemplo, mas certamente dirá
como o operário se sentia diante dela, ou o simbolismo que ela tinha na visão de
seus colegas, entre inúmeras possibilidades.
Ao decorrer do capítulo, Portelli trata de alguns preconceitos sofridos pela
história oral. O primeiro deles é acerca da veracidade. Ora, como acreditar em uma
fonte tão distante dos eventos sucedidos? Não seria a memória falha um problema?
A verdade é que esse empecilho também acontece em muitas fontes escritas, nas
quais os relatos são escritos anos depois dos acontecimentos. Ademais, a memória,
além de um “depositário passivo de fatos”. Como dito, ela ativamente cria
significações, capazes de mudar a própria perspectiva do narrador em relação ao
passado.
Por fim, há uma reflexão acerca do papel do entrevistador na história oral. os
documentos da história oral são resultado do relacionamento compartilhado entre
entrevistador e o entrevistado. O narrador é, também, um dos personagens ao se
contar a história, em que há um envolvimento com a história contada incapaz de se
conseguir num documento escrito. Portelli compara a história oral à novela moderna,
onde o narrador é “empurrado para dentro da narrativa e se torna parte da história”.
Esse capítulo é crucial para se entender história, seja ela oral ou não. Ele
elenca características e aspectos das fontes orais de maneira admirável, com uma
narrativa contínua e com constante uso de comparações, o que facilita totalmente a
compreensão do texto. É interessante perceber como o Portelli durante o texto
busca definir a história oral a partir de características da história escrita. Esses
paralelos fazem com que o leitor – principalmente os acadêmicos italianos da época
– reconheça a importância de se tratar história oral, tanto para o entrevistador,
quanto para o narrador.
Em dado momento do capítulo, o autor caracteriza a escrita como, de certo
modo, monótona, muito decorrente de sua regularidade. Portanto, percebo que, para
o autor, a singularidade da história oral está justamente no oposto disso. De ser algo
oscilante, variável e imprevisível. De nunca haver uma resposta igual, tanto em
palavras, quanto em emoções, simbolismos e cultura. De haver a possibilidade de
trabalhar em inúmeros pontos de vista, de modo que essas parcialidades continuem
inconclusas, dificilmente alcançando uma “história total”. É isso que faz a história
oral diferente.
E de fato, quanto menos monótono, melhor.

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