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Rezende MA, Beteli VC, Santos JLF.

Avaliação de habilidades de linguagem e


pessoal-sociais pelo Teste de Denver II
em instituições de educação infantil*

Magda Andrade Rezende1


Vivian César Beteli2
Jair Lício Ferreira dos Santos3

Rezende MA, Beteli VC, Santos JLF. Avaliação de habilidades de linguagem e pessoal-
sociais pelo Teste de Denver II em instituições de educação infantil. Acta Paul Enferm 2005;
18(1):56-63.

RESUMO: Supervisão e promoção do desenvolvimento infantil são cuidados necessários às


crianças que freqüentam creches e pré-escolas. Organizações de saúde internacionais e
nacionais têm sistematizado estratégias para tal, porém nas instituições brasileiras estas ações
são pouco realizadas. Objetivo: Avaliar, pelo segundo ano consecutivo, habilidades das áreas
de linguagem e pessoal-social de uma coorte de crianças que freqüentam 3 creches da cidade
de São Paulo. Método: O grupo amostral foi constituído por 30 crianças de 0 a 4 anos, de nível
sócio-econômico homogêneo segundo instrumento para avaliação de nível de pobreza urbana.
Segundo este instrumento todas as famílias estavam na faixa superior de classificação. Para
avaliação do desenvolvimento foi usado o Teste de Triagem de Desenvolvimento de Denver II,
empregado em dois momentos distintos no primeiro ano de acompanhamento da coorte, e uma
vez no segundo ano. Resultados: Na área pessoal-social a melhora foi significante da 1ª para
a 2ª avaliação, o que não ocorreu na área de linguagem, ao longo das 3 avaliações. No entanto,
a partir dos 3 anos de idade as crianças passaram a obter resultados piores. Quanto aos sexos
não houve diferenças significantes nos desempenhos nas duas áreas. Conclusão: É possível
que as habilidades das crianças na área pessoal-social tenham sido incrementadas pelas
condições das instituições, o que não ocorreu na de linguagem. Não se pode afirmar a causa
destes acontecimentos, embora seja intrigante a proporção adulto/criança que diminui após as
crianças completarem 3 anos de idade, mas outras pesquisas são necessárias, inclusive a
continuidade desta coorte.

Descritores: Creches; Educação infantil; Cuidado da criança; Desenvolvimento infantil;


Linguagem infantil

• Artigo recebido em 16/07/04 e aprovado em 10/12/04

SUPERVISÃO DO nais têm sistematizado esta ação (1-3). crianças matriculadas nestas insti-
DESENVOLVIMENTO INFANTIL Entretanto, na maior parte de creches tuições. As crianças menores, que
e pré-escolas brasileiras, a supervi- freqüentam as creches são as que
Creches e pré-escolas são insti- são do desenvolvimento infantil vem permanecem mais tempo: quase
tuições destinadas a educar e cuidar sendo realizada de modo eventual, oito horas por dia. Considerando,
de crianças. As primeiras atendem a segundo a bibliografia e a nossa ex- inclusive, a vulnerabilidade desta
faixa etária de 0 a 3 anos de idade, e periência. idade compreende-se a importân-
as outras daí em diante, até 6 anos. O número de crianças que fre- cia da capacitação dos adultos que
Nestes locais é necessário supervi- qüentam creches e pré-escolas au- cuidam e educam estas crianças,
sionar o desenvolvimento infantil, e menta dia a dia em nosso país. Em bem como da organização do am-
organismos nacionais e internacio- 2003, havia oficialmente 6.393.234 biente físico.

1 Pesquisa parcialmente financiada pela Fapesp (processo 00/11890-7) e pelo CNPq (projeto 248/2002).
* Professora Doutora do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem da Universidade
de São Paulo. Orientadora do trabalho. E-mail: marezend@yahoo.com.br
** Enfermeira. Mestranda vinculada ao programa de pós-graduação da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo.
*** Professor Titular do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.

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Nas habilidades pessoal-sociais MÉTODO a criança estava acostumada que fi-


e de linguagem, como nas outras casse junto. Deste modo a aplicação
Cenário do estudo
áreas do desenvolvimento, as cri- do TTDD II pode ser bastante de-
anças dependem das oportunidades morada. Mas, é importante que
As 3 instituições, que atendem a
oferecidas pelo ambiente para de- crianças de 0 a 6 anos, cumprem ocorram estes cuidados para que a
senvolverem plenamente sua heran- vários critérios de bom atendimen- criança se sinta segura e a aplicação
ça genética. Ou seja, o desenvolvi- to: organização das crianças em pe- fidedigna. O modo de aplicação do
mento é um produto da interação quenos grupos, bom nível de edu- TTDD II já foi detalhado (10).
dessa com o meio, constituindo o cação e treinamento dos adultos, Cada um dos itens avaliados é
chamado interacionismo (4-5). Na baixa rotatividade destes, estabilida- classificado em: normal, cautela ou
área pessoal-social valoriza-se a de administrativa e índice remune- atraso. Normal: quando a criança exe-
conquista da independência da cri- ração mais alto do que a média lo- cuta atividade prevista para a idade.
ança para realizar tarefas cotidianas cal (5). Estão localizadas próximas Cautela: quando a criança não exe-
e importantes como lavar as mãos, umas das outras, na região oeste do cuta ou recusa-se a realizar atividade
alimentar-se e escovar os dentes, município de São Paulo. que já é feita por 75 a 90% das crian-
por exemplo. Segundo o Referen- ças daquela idade. Atraso: quando a
cial Curricular para a Educação In- Grupo amostral criança não executa ou recusa-se a
fantil as creches e pré-escolas de- realizar atividade que já é executada
vem criar condições para que as Compuseram a amostra inten- por mais de 90% dos que têm sua
crianças se interessem progressiva- cional (8) todas as crianças que pre- idade (11). A classificação destes itens
mente pelo cuidado com o próprio enchiam os critérios de inclusão é que foi usada para esta pesquisa.
corpo, executando ações relaciona- (idade gestacional conhecida, no Os resultados obtidos: normal, cau-
das à saúde e à higiene (6). No que caso de menores de 2 anos; ausên- tela ou atraso foram agrupados em
diz respeito à linguagem (7), impor- cia de mal formação congênita; não adequado (normal) e não adequado
tante para que a criança possa re- ter freqüentado creche anteriormen- (cautela e/ou atraso). O TTDD II não
solver problemas e planejar suas te, e não ser estrangeira, devido à foi criado para diagnosticar atrasos
ações, o mesmo documento propõe avaliação da área de linguagem). no desenvolvimento, e sim direcionar
um ambiente de acolhimento que dê Este grupo vem sendo avaliado des- o cuidado dos adultos para as crian-
segurança e confiança às crianças, de 2001, e conta, atualmente, com ças com riscos (9).
garantindo oportunidades para que 30 crianças.
experimentem e usem recursos para Cuidados éticos e análise das
a satisfação de suas necessidades, O Teste de Triagem de Desenvolvi- informações
expressando desejos, sentimentos, mento de Denver II (TTDD II)
vontades e desagrados. Assim, a O projeto foi aprovado por Co-
supervisão do desenvolvimento in- O TTDD II foi elaborado para mitê de Ética em Pesquisa confor-
fantil é um cuidado à saúde da cri- que profissionais da área de saúde me Portaria 196/96. A análise foi
ança e diz respeito, inclusive, à área fizessem a triagem de desenvolvi- realizada com testes não-paramé-
de enfermagem, motivo pelo qual mento em crianças de 0 a 6 anos. É tricos de Fisher, Wilcoxon e Teste
se propõe a sistematização desta composto por 125 itens, divididos dos sinais, que são usados em situa-
ação em creches e pré-escolas, a nas áreas: pessoal-social, motor fino- ções em que as mensurações são
fim de se otimizar os fatores adaptativo, linguagem e motor-gros- categóricas, ou, no máximo,
ambientais (isto é, adultos e condi- seiro. Para alguns itens pede-se que ordinais. Isto é, não é necessário que
ções físicas) na promoção do de- a criança realize determinadas tare- a distribuição seja gaussiana (12).
senvolvimento. fas, para outros se considera o rela- Assumiu-se risco a de 5% (13).
to dos responsáveis (9).
OBJETIVO Consideramos fatores de exclu- RESULTADOS E DISCUSSÃO
são transitórios: sono, fadiga, febre
Observar de modo sistematiza- ou medo. Nestas situações aguarda- As crianças foram avaliadas 3
do habilidades das áreas de lingua- mos até que fossem superados. A vezes: na 1ª suas idades variaram de
gem e pessoal-social de uma coorte aplicação era interrompida caso a 4 meses e 23 dias até 2 anos 4 me-
de crianças consideradas normais criança se cansasse ou precisasse ses e 12 dias. Na 2ª suas idades fo-
que freqüentam creches de bom pa- participar de alguma atividade. Nas ram de 10 meses e 20 dias até 2 anos
drão de qualidade da cidade de São situações em que a criança estranha- 10 meses e 28 dias. Na 3ª tinham de
Paulo va, pedia-se à educadora com a qual 2 anos e 15 dias até 4 anos. Na pri-

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meira avaliação estavam freqüentan- 52,0 pontos)(14). Neste grupo todas pelos pais), mostrou não haver rela-
do as creches por períodos que va- as famílias tiveram pontuação entre ção entre desenvolvimento e renda
riavam de 1 dia até 5 meses, o que 45 e 52. Assim, todas são da catego- familiar (17). Como se vê os resulta-
não deve ter interferido nos resulta- ria baixa superior. dos ainda são controversos e podem
dos pois esta pesquisa não foi dese- Sabe-se da importância das con- estar relacionados às diferentes
nhada com o fim de se distinguir dições ambientais e do nível sócio- metodologias empregadas, uma vez
entre as influências respectivas da econômico na possibilidade da cri- que se sabe da importância da inser-
família e da instituição. O intervalo ança desenvolver suas habilidades. ção social e renda nas oportunida-
entre as duas primeiras avaliações foi Assim, avaliação de desenvolvimen- des de desenvolvimento que a famí-
de aproximadamente 6 meses e en- to realizada em Pelotas (RS) feita lia pode oferecer à criança.
tre a 2ª e a 3ª cerca de 1 ano. O com uso do TTDD II, mostrou re-
grupo é formado por 17 meninos e lação positiva entre possíveis atra- Área pessoal-social
13 meninas. sos de desenvolvimento e diminui-
O nível sócio-econômico foi ava- ção da renda familiar (15). Em outro A tabela 1 mostra os resultados
liado segundo instrumento para veri- estudo, que avaliou o desenvolvi- de cada criança nas três avaliações.
ficação do nível de pobreza de popu- mento de crianças de 0 a 13 meses Na primeira, 24 (80%) resultados
lações urbanas, composto por 13 de idade, não houve relação signi- foram adequados e 6 (20%) eram
itens: constituição da família, escola- ficante entre desenvolvimento e con- cautelas ou atrasos. Na segunda, 30
ridade e atividade dos pais, condições dição econômica(16). Além disto, pes- (100%) estavam adequados. Na ter-
de moradia e posse de bens. Cada um quisa realizada nos EUA em 10 cida- ceira, 28 (93,33%) estavam adequa-
dos itens é pontuado e a soma esta- des, destinada a avaliar os efeitos dos das e 2 (6,67%) não, havendo por-
belece o nível de pobreza: miséria (até diferentes tipos de cuidados à crian- tanto, melhora em relação à primei-
17,3 pontos), baixo inferior (17,3 a ça de 6 até 36 meses de idade (cre- ra avaliação e discreta piora em rela-
34,6 pontos) e baixo superior (34,6 a che, creche domiciliar, cuidada ção à segunda.

Tabela 1 – Resultados emparelhados das avaliações da área pessoal-social pelo Teste de Denver II de crianças de
3 creches. (São Paulo, 2001-2003).

Criança 1ª Avaliação 2ª Avaliação 3ª Avaliação

1 1 Cautela Adequada Adequada


2 1 Cautela Adequada Adequada
3 Adequada Adequada Adequada
4 1 Cautela Adequada Adequada
5 Adequada Adequada Adequada
6 1 Atraso Adequada Adequada
7 Adequada Adequada Adequada
8 Adequada Adequada Adequada
9 Adequada Adequada Adequada
10 Adequada Adequada Adequada
11 Adequada Adequada Adequada
12 Adequada Adequada Adequada
13 Adequada Adequada Adequada
14 Adequada Adequada Adequada
15 Adequada Adequada Adequada
16 Adequada Adequada Adequada
17 1 Cautela Adequada Adequada
18 Adequada Adequada Adequada
19 Adequada Adequada Adequada
20 Adequada Adequada Adequada
21 Adequada Adequada Adequada
22 Adequada Adequada 1 Cautela
23 Adequada Adequada Adequada
24 Adequada Adequada Adequada
25 Adequada Adequada 1 Atraso
26 1 Cautela Adequada Adequada
27 Adequada Adequada Adequada
28 Adequada Adequada Adequada
29 Adequada Adequada Adequada
30 Adequada Adequada Adequada
Teste dos sinais
1-2 P=0,016 significante 2-3 P=0,250 não significante 1-3 P=0,145 não significante

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Após, foram feitos três tipos de Os resultados obtidos nos 3 Área de linguagem
comparações (a 1ª com a 2ª avalia- momentos foram agrupados de acor-
ção, a 2ª com a 3ª e a 1ª com a 3ª do com o sexo, não tendo havido As informações estão na Tabela
avaliação) para aplicação do teste dos diferença significante (Teste exato de 2. Na primeira avaliação 23
sinais. Quando não houve alteração, Fisher, P= 0,516). Este resultado (76,67%) resultados foram adequa-
foi nomeado empate. Nos casos de contrasta com estudo realizado na dos e 7 (23,33%) não. Na segunda
mudança de cautela ou atraso para Turquia entre 1995 e 1996 com 1091 houve 25 adequações (83,33%), e 5
adequada considerou-se sinal posi- crianças, em que meninas obtiveram (16,67%) cautelas. Na terceira ava-
tivo e ao contrário negativo. melhores resultados (18). liação, 22 (73,33%) foram adequa-
Da 1ª para a 2ª avaliação, houve dos e 8 (26,67%) cautelas. Ao teste
incremento significante da área, se- dos sinais os resultados não foram
guido de estabilização. significantes, isto é, não houve alte-
rações entre os diferentes períodos.

Tabela 2 – Resultados emparelhados das avaliações da área de linguagem pelo Teste de Denver II de crianças em 3
creches. (São Paulo, 2001-2003)

Criança 1ª Avaliação 2ª Avaliação 3ª Avaliação

1 1 Cautela Adequada Adequada


2 1 Cautela Adequada Adequada
3 1 Cautela + 1 Atraso Adequada Adequada
4 Adequada Adequada Adequada
5 Adequada Adequada Adequada
6 Adequada Adequada Adequada
7 Adequada Adequada 1 Cautela
8 Adequada Adequada 1 Cautela
9 Adequada Adequada 4 Cautelas
10 Adequada Adequada 1 Cautela
11 Adequada Adequada 1 Cautela
12 Adequada Adequada 2 Cautelas
13 Adequada Adequada 1 Cautela
14 Adequada Adequada Adequada
15 1 Cautela Adequada Adequada
16 Adequada Adequada Adequada
17 Adequada 1 Cautela Adequada
18 Adequada Adequada Adequada
19 1 Cautela + 1 Atraso Adequada Adequada
20 Adequada Adequada Adequada
21 Adequada 1 Cautela Adequada
22 Adequada 1 Cautela 1 Cautela
23 Adequada Adequada Adequada
24 Adequada Adequada Adequada
25 1 Cautela Adequada Adequada
26 Adequada 1 Cautela Adequada
27 Adequada Adequada Adequada
28 Adequada Adequada Adequada
29 Adequada 1 Cautela Adequada
30 1 Cautela Adequada Adequada
Teste dos sinais
1 e 2 P=0,387 não significante 2 e 3 P=0,274 não significante 1 e 3 P=0,696 não significante

Os resultados foram analisados telas começam após os 3 anos de Fischer (P=0,00001). Destas, 7
em relação à idade das crianças idade, atingindo 8 das 10 crianças, o freqüentavam a mesma creche.
(Tabela 3). Percebe-se que as cau- que foi significante pelo teste de

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Tabela 3 – Resultados da 3ª. avaliação da área de linguagem das crianças de 3 creches segundo seus valores
crescentes de idade. São Paulo, 2002-2003.
Idades

Criança Idade 3ª Avaliação Dias Anos

24 2a 15d Adequada 745 2,04


25 2a 1m 10d Adequada 770 2,11
15 2a 1m 20d Adequada 780 2,14
26 2a 1m 24d Adequada 784 2,15
27 2a 2m Adequada 790 2,16
28 2a 2m Adequada 790 2,16
29 2a 2m 14d Adequada 1169 2,20
16 2a 4m 8d Adequada 858 2,35
17 2a 4m 29d Adequada 879 2,41
1 2a 6m 9d Adequada 919 2,52
2 2a 6m 9d Adequada 919 2,52
18 2a 6m 12d Adequada 922 2,53
19 2a 6m 27d Adequada 937 2,57
3 2a 7m 21d Adequada 961 2,63
4 2a 7m 24d Adequada 964 2,64
30 2a 8m 8d Adequada 978 2,68
21 2a 9m 7d Adequada 1007 2,76
20 2a 9m 14d Adequada 1014 2,78
5 2a 11m 7d Adequada 1067 2,92
6 2a 11m 13d Adequada 1074 2,94
22 3a 1m 2d 1 Cautela 1127 3,09
7 3a 1m 10d 1 Cautela 1135 3,11
8 3a 2m 25d 1 Cautela 1180 3,23
9 3a 5m 24d 4 Cautelas 1269 3,48
10 3a 6m 2d 1 Cautela 1277 3,50
11 3a 8m 13d 1 Cautela 1348 3,69
12 3a 8m 24d 2 Cautelas 1359 3,72
23 3a 9m 22d Adequada 1387 3,80
13 3a 10m 0d 1 Cautela 1405 3,85
14 3a 11m 5d Adequada 1430 3,92

Este resultado corrobora o de e dos familiares com a criança, lem- da instituição, que as crianças des-
outra pesquisa que, em 1993, avaliou brando que, acerca destes não te- ta fase parecem depender menos
2980 crianças de 1 a 11 anos atendi- mos informações. das educadoras, que, no entanto,
das em unidade básica de saúde lo- Até os 2 anos e 11 meses as pro- estão sempre perto e focalizadas
calizada na mesma região de nosso porções educadora/criança estão nas suas necessidades. Assim, é
estudo (19). Neste, a maior freqüência adequadas, porém após os 3 anos, possível concluir que a autonomia
de dificuldades ocorreu em crianças justamente a idade alterada, esta re- das crianças nesta idade as torna
de 3 a 6 anos, com ênfase da lingua- lação aumenta chegando a 13-15 mais suscetíveis em termos de
gem oral nas de 3. Para a autora, uma crianças por educadora, ao invés das desenvolvimento da linguagem, e
possível explicação seria a 10 recomendadas (20). Vale ressaltar que a interferência ambiental, ou
que as creches têm educadoras avul- seja, a menor proporção educador
imaturidade neurofisiológica para sas que auxiliam nos momentos de por crianças, pode contribuir
a aquisição e domínio da lingua- excesso de trabalho e eventualmen- para incrementar esta vulnera-
gem e também, aos fatores sociais te substituem educadoras ausentes. bilidade. Aliás, estudos têm mos-
relacionados à estimulação neces- Não as consideramos nos cômpu- trado que as crianças não estão
sária para que os padrões tos por que são compartilhadas por exercendo todas as suas potenciali-
lingüísticos se desenvolvam. várias salas. dades no que diz respeito à lingua-
É uma característica destas gem e isto vêm ocorrendo em di-
Em nosso caso levamos em con- creches o empenho em desenvol- versos contextos: creches públi-
ta especialmente este último e con- ver a autonomia da criança. Per- cas, universitárias e, inclusive, es-
sideramos a interação da educadora cebe-se, acompanhando a rotina colas privadas (10, 21-23).

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No entanto, temos sempre em deve somente a esta última não se do a freqüentar as creches. No en-
mente que o estudo tem limitações pode dizer, mas, considerando que tanto, as habilidades da área de lin-
devido ao pequeno tamanho da amos- nestas instituições as crianças per- guagem não apresentaram os mes-
tra e ao fato de não ter sido desenha- manecem durante todo o dia, fre- mos resultados. Não se pode afir-
do de modo a definir as respectivas qüentar a instituição não as prejudi- mar a causa destes acontecimentos,
influências das creches e das famíli- cou. Isto é importante uma vez que embora seja intrigante a proporção
as. No que diz respeito à estas últi- se sabe que ambientes adequados adulto/criança que diminui após as
mas lembramos, como exemplo, que potencializam tanto as habilidades de crianças completarem 3 anos de ida-
aumento da escolaridade materna linguagem quanto as cognitivas, de de. Além disto, vê-se que esta dimi-
corresponde também a aumento sig- acordo com estudo realizado nos nuição afeta a área de linguagem,
nificativo de conhecimentos sobre Estados Unidos, com uma coorte de mas não a pessoal-social, o que é
o desenvolvimento das habilidades 1158 crianças avaliadas em 10 cida- curioso uma vez que a criança é bas-
de linguagem da criança (24). des diferentes (17). tante dependente de outros para o
Finalmente as informações ob- Quanto à área de habilidades de desenvolvimento de ambas. Por este
tidas nas 3 avaliações foram analisa- linguagem, aparentemente não hou- motivo pretende-se complementar
das quanto aos sexos sem que hou- ve qualquer modificação por fre- este trabalho com outro, a fim de
vesse diferença significante (Teste qüentarem as creches. Isto pode ser definir as respectivas esferas de in-
exato de Fisher P= 0,469) o que interpretado de dois modos: ou já fluências da família e da instituição.
corrobora alguns autores (15,16), mas estavam em um bom patamar ao De qualquer modo gostaríamos de
não outros (18,25). começarem a freqüentá-las, ou as frisar que é uma tentativa de de-
instituições não estão favorecendo o monstrar o quanto a supervisão do
CONSIDERAÇÕES FINAIS desenvolvimento máximo das desenvolvimento é uma ação de saú-
potencialidades das crianças. A pri- de importante, e deve ocorrer seja
Vale ressaltar que os resultados meira possibilidade não é plausível: qual for o ambiente em que a crian-
das 2 áreas foram diferentes, o que havia 7 crianças (23,3%) em 30 com ça vive. Sabe-se que atualmente,
também foi evidenciado em um es- cautelas e atrasos, sendo 7 cautelas em nosso país, são pouquíssimas as
tudo comparativo entre crianças de e 2 atrasos. Na área pessoal-social instituições de educação infantil que
creches públicas e privadas da cida- estas mesmas 30 crianças apresen- fazem acompanhamento sistema-
de de São Paulo (26). As crianças ti- taram 5 cautelas e 1 atraso. Estes tizado do desenvolvimento infantil,
veram desenvolvimento semelhante dados foram emparelhados e com- mas ressaltamos que esta ação de
na área cognitivo-social, mas na lin- parados usando-se teste de saúde é necessária e este pequeno
guagem as de creches públicas apre- Wilcoxon, cujo resultado não foi trabalho foi realizado para ajudar a
sentavam ritmo de desenvolvimento significante. Para a aplicação do demonstrá-lo.
mais lento, resultado atribuído ao Wilcoxon atribuiu-se escore 3 (três)
menor nível de escolaridade das para adequado, 2 (dois) para 1 cautela AGRADECIMENTOS
educadoras e das mães. Isto reforça ou 1 atraso e 1(um) para 1 caute-
a importância de condições favorá- la+1 atraso. Ás crianças que estão partici-
veis para criança desenvolver-se Isto é, como as crianças ao in- pando deste trabalho, a seus respon-
plenamente. gressarem na creche estavam com sáveis, aos funcionários das institui-
Outra pesquisa, também reali- desenvolvimento semelhante nas áre- ções envolvidas, à Profa.Dra.Márcia
zada em creche pública da cidade de as pessoal-social e de linguagem, e Pedromônico da Disciplina “Distúr-
São Paulo, igualmente detectou o na primeira melhoraram significati- bios da Comunicação Humana” da
quanto as crianças estavam sendo vamente após cerca de 6 meses, es- UNIFESP-EPM (São Paulo) pela
afetadas na área de linguagem (22). perava-se que o mesmo ocorresse permissão do uso do formulário do
Nos 3 grupos analisados (12 a 23 na área de linguagem. Isto não ter TTDD II traduzido por ela e sua
meses, 24 a 35 meses e 36 a 47 ocorrido sugere a possibilidade de equipe, à Fernanda Guedes Lima que
meses) as alterações foram respec- que o desenvolvimento pleno não participou voluntariamente em parte
tivamente 57%, 46% e 50%. A área foi alcançado. do trabalho, à FAPESP e ao CNPq.
pessoal-social foi menos afetada, tal
como em nosso trabalho. CONCLUSÕES
Em nossa coorte a área pesso-
al-social parece que não sofreu in- As habilidades das crianças na
fluência da proporção adulto/crian- área pessoal-social melhoraram sig-
ça. Até que ponto este resultado se nificativamente após terem começa-

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REFEFÊNCIAS 13. Siegel S. Estatística não-pramétrica 23. Costa PS, Pontes PB, Rezende MA.
para as ciências do comportamento. O desenvolvimento infantil em creches
1. Ministério da Saúde. Secretaria de Polí-
São Paulo: Mc Graw-Hill; 1975. e pré-escolas segundo o Teste de Tri-
ticas de Saúde. Atendimento integrado
agem de Desenvolvimento de Denver
à saúde e desenvolvimento da criança: 14. Issler RMS, Giugliani, ERJ. Iden-
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São Paulo: Escola de Enfermagem da
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USP; 2004.
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73:101-5. 24. Cardoso RM. Conhecimento de mães
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62 Acta Paul Enferm 2005; 18(1):56-63


Avaliação de habilidades de linguagem e pessoal-sociais...

Rezende MA, Beteli VC, Santos JLF. [Evaluation of language and Rezende MA, Beteli VC, Santos JLF. [Evaluacion de habilidades
personal social abilities by the Denver Test II in institutions of de lenguaje y personal-sociales por el Test de Denver II em
infantile education.] Acta Paul Enferm 2005; 18(1):56-63. instituiciones de educacion infantil.] Acta Paul Enferm 2005;
18(1):56-63.
ABSTRACT: Supervision and promotion of development are
important care given to children enrolled in day-care centers and RESUMEN: La supervisión y promoción del desarollo infantil son
pre-schools. International and national organisms have cuidados necesários a los niños que frequentan jardines infantiles
systematized strategies to supervise child development but in y pré-escolares. Las organizaciones de salud internacionales y
Brazilian day-care centers this action is not well performed. nacionales tienem sistematizado estratégias para tal, pero en jar-
Objective: To assess, after a two-year follow-up, personal and dines infantiles y pré-escolares brasileñas esa ación és poco
social language abilities in a cohort of children enrolled in three realizada. Objetivo: evaluar por el segundo año consectivo, habi-
day-care centers, in the city of São Paulo. Methods: The sample lidades de las áreas de lenguaje y personal-social de uma cohorte
group consisted of 30 children from 0 to 4 years, of a homogeneous de niños que frecuentan 3 jardines infantiles de la ciudad de São
socioeconomic level according to the tool of evaluation of urban Paulo. Metodo: el grupo estudiado fué conformado por 30 niños
poverty level. According to this tool all the families were in the desde los cero hasta los cuatro años, de nivel-sócio econômico
upper level of the assessment. To evaluate the child development homogeneo según instrumento para evaluación de nivel de pobre-
was used the Denver II, applied at two different moments, in the za urbana. Según este instrumento todas las famílias estaban en
first year of follow-up of the cohort and once in the second year. la faja superior de clasificación. Para evaluación del desarollo fué
Results: In the personal and social areas, a significant improvement utilizado el Test de Triage de Desarollo de Denver II, empleado en
difference was observed from the 1st to the 2nd evaluation. In the dos momentos distintos en el primer año de acompanhamiento de
language area no differences could be observed among the three la cohorte y una vez en el segundo año. Resultados: en el área
evaluations, although age had a significant role as 3-year old personal-social la mejora fué significativa de la 1ª para la 2ª
children presented the worst results. Regarding sex, no significant evaluación, lo que no ocurrió en el área de lenguaje a lo largo de
differences were observed in the performance of the two areas. las 2 evaluaciones. Por lo tanto, a partir de los 3 años de edad los
Conclusion: It is possible that performance in the personal and niños pasaron a obtener resultados peores. En cuanto a los se-
social areas has been improved by the day-care center conditions, xos no hubo diferencias significativas en los desempenhos de las
what didn´t happen in area of language. Regarding this area, it dos áreas. Conclusión: és possible que las habilidades de los
could be affected by the adult/child ratio as with children older niños en el área personal-social hayan sido incrementadas por las
than 3 years, but further researches are needed inclusive continuity condiciones de las instituiciones, lo que no ocurrió en el área de
to this cohort. lenguaje. No se puede afirmar la causa de estos acontecimientos,
aunque sea intrigante la proporción adulto/niño que disminuye
Descriptors: Child day-care centers; Child rearing; Child care; después de que los niños cumplen 3 años de edad, pero otras
Child development; Child language investigaciones son necesárias aun la continuidad de esta cohorte.

Descriptores: Jardines infantiles; Crianza del niño; Cuidado del


niño; Desarollo infantil;Lenguaje infantil

Acta Paul Enferm 2005; 18(1):56-63 63

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