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DE S. MIGUEL DA MOTA:
O PONTO DE SITUAÇÃO
Thomas G. Schattner
Instituto Arqueológico Alemão – Madrid
Carlos Fabião
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Amílcar Guerra
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
1 http://arqueologia.igespar.pt/?sid=sitios.resultados&subsid=58435
Cadernos do Endovélico, n.º 1, Edições Colibri/Centro de Estudos do Endovélico, Lisboa,
2013, pp. 65-98.
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generosamente nos terem deixado trabalhar na sua propriedade, sem qualquer condicio-
nante ou entrave.
Os trabalhos têm sido sobretudo financiados pelo DAI e pela UL. Para o quadriénio de
2003-2006 recebemos um subsídio do (extinto) Instituto Português de Arqueologia
(IPA), no âmbito do Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos (PNTA), a Câmara
Municipal e a Junta de Freguesia do Alandroal têm prestado preciosos apoios à
logística das investigações.
4 Sobre alguns resultados concretos, embora não respeitantes a estas epígrafes, da troca
de correspondência de André de Resende com outros eruditos quinhentistas hispânicos
v. GIMENO, 1997, p. 157-159.
68 Cadernos do Endovélico
6 Uma detalhada relação dos trabalhos realizados por Vasconcelos em S. Miguel da Mota
conserva-se no Legado documental que doou ao Museu Nacional de Arqueologia. O
legado não foi ainda sistematicamente tratado, devido a vicissitudes várias – veja-se
COITO; COELHO, 1988-1989 – pudémos identificar entre essa documentação, na
pasta provisoriamente classificada como Apontamentos de Epigrafia, dois espessos
envelopes intitulados Endovélico 1 (contendo inúmeros apontamentos sobre o tema) e
Endovélico 2 (onde se conserva organizado, em maços de folhas manuscritas, o
conjunto de notas que deveriam constituir o estudo de conjunto sobre o santuário e a
divindade indígena. Todas as referências aqui feitas aos trabalhos realizados pelo
fundador do Museu Ethnologico foram extraídas desses apontamentos, que não
identificamos com maior rigor por aguardarem ainda a respectiva classificação arqui-
vística.
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Dos primeiros trabalhos que representam a sua iniciação arqueológica dá Vasconcelos
algumas notícias, a mais conhecida das quais na sua obra sobre as religiões da Lusitânia
(VASCONCELOS 1905: esp. 120-122), onde chega a anunciar uma monografia sobre
o tema (VASCONCELOS 1905: 112), projecto nunca concretizado (GUERRA –
SCHATTNER – FABIÃO – ALMEIDA 2003: 418), embora claramente esboçado e
trabalhado (veja-se nota anterior).
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A importância da exploração na antiguidade do anticlinal de Estremoz – Vila Viçosa
é amplamente reconhecida e referenciada, nomeadamente em ALARCÃO, 1988,
p. 135-136; RODÁ LANZA, 1999, p. 124, Analisou-se pontualmente o peso que
tiveram as produções de matérias-primas com esta origem em sítios como Conimbriga
(TAVARES, 1977, p. 271-272) e Torre de Palma (ANDRÉ 1997: 83-84).
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11 Sobre o eventual significado das formas originais deste hidrónimo e a sua eventual
relação com o culto de Endovélico v., mais recentemente, RIBEIRO, 2002, p. 82-83.
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Apesar das naturais limitações com que devem ser encarados estes ele-
mentos, a indicação do nome da tribo com que se identificam os cidadãos,
constitui mesmo assim o dado mais fiável para aferir do âmbito geográfico
destas entidades administrativas. Este tipo de informação é relevante por se
dar a circunstância de Emerita e Ebora terem os seus cidadãos inscritos em
tribos diferentes: a primeira na tribo Papiria, a segunda na Galeria. 12 Anali-
sada a informação epigráfica pertinente, constata-se que, de uma maneira
geral, na região de Elvas se verifica uma especial concentração de indivíduos
integrados na Papiria, em Veiros (IRCP 442 e 461). Ao contrário, a sul e a
oeste ocorrem os registos de personagens inscritas na tribo Galeria, docu-
mentados nomeadamente em S. Pedro do Corval (IRCP 425) ou Azaruja
(IRCP 407). No que concerne especificamente à área em causa, a que se
encontra mais próxima do Guadiana, há a referir dois elementos com especi-
al interesse para a análise desta questão: em Bencatel (Vila Viçosa) foi
sepultado Q(uintus) Romanius Q(uinti) f(ilius) Gal(eria tribu) Tuscus (IRCP
467) e, sensivelmente à mesma latitude, mas junto ao citado rio, na Herdade
do Monte Branco, Juromenha (Alandroal, Portugal) regista-se o nome de um
cidadão, certamente emeritense, L(ucius) Caecilius C(aii) f(ilius) Pap(iria
tribu) [---] (IRCP 449). É por isso viável que o ager eborensis se separasse
do emeritensis por uma linha oblíqua, que colocaria cada um dos indivíduos
aqui documentados em âmbitos administrativos distintos. Desse modo,
poder-se-ia imaginar que os dois territórios fossem delimitados por uma
fronteira cuja orientação tomasse o sentido NW-SE que, nestas circunstân-
cias, não deveria passar longe da zona em que se insere o serro de S. Miguel.
Entre os cultuantes atestados na epigrafia deste santuário, encontra-se preci-
samente Q(uintus) Seuius Q(uinti) f(ilius) Pap(iria) Firmanus, circunstância
que não deve, naturalmente, decidir sobre a integração administrativa deste
lugar, onde confluíam seguramente pessoas de múltiplas origens e, como é
natural, muitos cidadãos emeritenses, como é o caso de Firmano. A este
nível parece mais relevante a localização da sepultura de Q(uintus) Roma-
nius Tuscus, identificada a norte de S. Miguel da Mota, a pouco mais de dez
quilómetros, a qual, pela integração do defunto na tribo Galeria, poderia dar
mais consistência à hipótese de se colocar o santuário do lado eborense.
No entanto, deve considerar-se seriamente a possibilidade de esse im-
portante lugar de culto não pertencer administrativamente a nenhuma das
entidades referidas, mas constituir uma realidade autónoma e, deste modo,
excluída de integração territorial numa dessas rei publicae. Não seria certa-
mente inédito que um santuário desta dimensão, com uma importância que o
projectava muito para além da sua região, adquirisse, também no plano
administrativo, uma situação especial.
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A maioria dos monumentos foi compilada e criteriosamente analisada há alguns anos
em ENCARNAÇÃO 1984: 561-692, onde se estuda um núcleo de 84 monumentos
(IRCP 482-565). Um repertório mais recente (GARCIA 1991: 310-329, n. 64-148)
adiciona a este núcleo apenas uma nova inscrição entretanto publicada (FE 15). Para
os achados mais recentes v. GUERRA; SCHATTNER; FABIÃO; ALMEIDA, 2005:
217-221 e GUERRA, 2008.
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A favor da identificação da domina de Hermes com a filha de Marco Aurélio se
pronunciam, entre outros, HÜBNER (CIL II, ad. n.) e FITA 1913: 532. Contra esta
identidade se manifesta ENCARNAÇÃO 1984: 578.
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Já Leite de Vasconcelos alvitrou a existência, nas proximidades do outeiro, de
“fabrica e deposito de aras e de outros monumentos”, destinada a satisfazer a
clientela variada que se dirigia ao santuário (VASCONCELOS 1905: 139-140).
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Sobre a utilização deste material na epigrafia do sul de Portugal, em especial no
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vemos razão, a priori, para se irem buscar modelos para a estátua de Endo-
vélico tão longe, a uma divindade como Silvanus, que na Hispânia poucos
seguidores tinha.
Pressupondo que o corpo de Endovélico se encontra representado de
uma forma ou outra entre os muitos fragmentos procedentes do santuário,
são três as estátuas que podem ser tomadas em consideração e que podem
transmitir uma ideia da reconstituição a conferir ao seu corpo:
1) o nu apoiado numa lança (Figs. 9, 10 e 11),
2) os togados (Fig. 12),
3) o baixo-relevo de nu (Fig. 13).
12. Togado.
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Referências: