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B.

ACERCA DA UNIDADE E DIVERSIDADE DO MOVIMENTO

Trataremos da unidade e diversidade do movimento; depois da contrariedade,


que é uma espécie de diversidade.
O movimento pode ser dito uno de muitas maneiras, assim como o que é tomado
em comum também pode ser dito uno de muitas maneiras: principalmente, de acordo
com o gênero, espécie ou número; secundariamente, de acordo com a perfeição ou
regularidade.

1. PRINCIPAIS MODOS DA UNIDADE DO MOVIMENTO

a. Motus unus genere:


Se diz que o movimento é genericamente uno segundo as figuras dos
predicamentos. Pode-se dizer que todos os movimentos que pertencem à mesma
coordenação de predicamento são genericamente o mesmo movimento.
b. Motus unus specie:
Se diz que o movimento é uno segundo a sua espécie quando não só o é segundo
o seu gênero, mas também segundo a sua espécie individual ou mais especial, que já
não se divide em outras espécies.
Movimentos que se enquadram na mesma espécie subalterna de algum gênero,
mas que pertencem a diferentes subespécies, podem ser considerados especificamente
uno secundum quid.
OBSERVAÇÃO. Determinamos a unidade e a diversidade dos movimentos de
acordo com os gêneros e espécies em que ocorre, porque – como já foi dito – o
movimento se reduz quodammodo ao gênero in quo em que o movimento ocorre.
DUBIUM. Pelo que foi dito, parece que necessariamente dois movimentos que
vem do mesmo ao mesmo, isto é, cujos termos são idênticos, sempre pertencerão à
mesma espécie de movimento. Mas se isso for concedido, segue-se um inconveniente,
porque então o movimento reto entre dois pontos seria da mesma espécie que o
movimento circular entre esses mesmos dois pontos; e que a deambulatio de um animal
entre dois lugares seria especificamente igual à volutatio entre esses mesmos dois
lugares.
RESPOSTA. A espécie de movimento é determinada de acordo com o que in
quo o movimento é dado. Ora, para que um movimento seja da mesma espécie, não só é
necessária a identidade específica dos termos in quibus se dá o movimento, mas também
a identidade daquilo per quod transit o movimento. Portanto, dois movimentos que têm
o mesmo termo, mas o alcançam por caminhos especificamente diferentes, não são uma
espécie.
3º Motus unus numero
Segundo os modos anteriores, o movimento não é uno simpliciter, mas
secundum quid: ou segundo o gênero, ou segundo a espécie. O movimento uno
simpliciter é aquele que é numericamente uno segundo a sua essência.
Para determinar qual movimento é uno deste modo, é necessário distinguir quais
coisas são necessárias para o movimento. Pois bem, a unidade do movimento deve ser
considerada segundo três coisas: o sujeito, a espécie e o tempo.
Espécie. Para que um movimento seja numericamente uno, é necessário que
aquele no qual o movimento ocorre seja indivisível em relação à espécie, isto é, deve
pertencer (em todas as suas partes) a uma única espécie especialíssima.
Tempo. O tempo em que o movimento é realizado também deve ser único e
contínuo, sem interpolação.
Sujeito. Em todo movimento há necessariamente algo que se move. Pois bem,
para a unidade do movimento é necessário que o sujeito que se move seja algo uno. E
não basta que seja uno secundum accidens, já que o gramático e o gordo são o mesmo
sujeito, pois aprender gramática e ganhar peso são dois movimentos diferentes.
Também não basta que o sujeito seja um secundum speciem, pois dois homens curados
ao mesmo tempo podem ter o mesmo movimento quanto à espécie, quanto ao tempo e
quanto ao sujeito segundo a espécie, mas essas duas curas não são um único movimento
de acordo com o número, eles são apenas de acordo com a espécie.
DUBIUM. Se o mesmo sujeito se movesse duas ou mais vezes segundo a
mesma coisa, de modo que se pudesse dizer que aquilo em que ele se move é
numericamente o mesmo, parece que esses movimentos deveriam ser considerados
numericamente unos. Por exemplo, se um homem se cura, perde a saúde e recupera esta
mesma saúde, parece que se trata de um único movimento.
RESPOSTA. Mesmo que o termo do movimento, por exemplo, uma qualidade,
seja numericamente uno, isso não significa que o movimento seja uno. Isso é visto no
movimento local, porque quando você caminha em direção a um determinado lugar
você tem um movimento, mas se você parar e depois continuar andando, não será mais
o mesmo movimento, embora o termo seja numericamente o mesmo. Portanto, não há
razão para dizer que duas curas para recuperar a mesma saúde são numericamente o
mesmo movimento.
DEMONSTRAÇÃO. Que para a unidade simpliciter do movimento é
necessária a unidade da espécie, do sujeito e do tempo, pode demonstrar-se do seguinte
modo:
O uno simpliciter é dito de duas maneiras: de uma maneira como o indivisível é
uno e de outra como o contínuo; ora, não se pode dizer que o movimento seja mais uno
simpliciter como indivisível, porque nenhum movimento é indivisível; resta, portanto,
que o uno simpliciter seja dito como o contínuo. Deste modo, para o movimento, ser
uno simpliciter consiste em ser contínuo, e a mera continuidade do movimento é
suficiente para sua unidade. Segue-se, portanto, que se o movimento é contínuo, é uno;
e tudo o que é necessário para a continuidade do movimento é necessário para sua
unidade.
Ora, três coisas são necessárias para a continuidade do movimento, as unitas
speciei, subiecti e temporis.
Unitas specei. Nem todo movimento pode ser continuado por outro movimento;
nem é indiferente em outras coisas contínuas que uma coisa possa ser continuada por
qualquer outra, mas apenas aquelas coisas cujos extremos são unos podem ser
contínuas, o que é da razão do contínuo, como já vimos. Ora, há coisas que não têm
extremos, como as formas e todas as coisas que são indivisíveis e, portanto, não pode
haver continuidade nelas. E há outras que são divisíveis e têm quantidade, mas cujos
extremos são equívocos, isto é, não concordam nem no nome nem na razão; e nestas
não pode haver continuidade ou mesmo contato. É evidente, então, que aquelas coisas
que pertencem a diferentes gêneros ou espécies não podem ser contínuas umas com as
outras: dos movimentos que diferem de acordo com gênero ou espécie, pode-se dizer
que se sigam imediatamente (esse habiti), como depois da corrida alguém começa a ter
febre ou como quando está de carro e continua a pé; mas não se pode dizer que sejam
contínuos, pois não têm um e o mesmo fim, que é a razão do continuum. Portanto, para
que o movimento seja contínuo, requer-se que seja uno segundo a sua espécie, o que
convém ao movimento da coisa em que se dá o movimento, visto que é indivisível
segundo a sua espécie.
Unitas subecti. Os movimentos de vários sujeitos também podem seguir-se
imediatamente, mas não podem ser contínuos, como quando se carrega a tocha de mão
em mão.
Unitas temporis. Finalmente, para a continuidade do movimento, é necessária
uma unidade temporal, para que o movimento não seja interrompido por alguma
imobilidade ou repouso, com o que haveria uma multiplicidade de movimentos e
nenhuma unidade. Mas a continuidade temporal não é suficiente para a continuidade do
movimento, pois dois movimentos especificamente diferentes podem ocorrer com
continuidade temporal, mas não são o mesmo movimento.

2. MODOS SECUNDÁRIOS DA UNIDADE DO MOVIMENTO

Depois de apresentar os principais modos de unidade do movimento,


consideremos agora o que pertence mais a certas formas de unidade do que à própria
unidade. Trataremos da perfeição ou imperfeição do movimento, e sua regularidade ou
irregularidade.

1. Unidade de acordo com a perfeição


Quer se diga que o movimento é uno segundo o gênero, espécie ou número,
pode-se falar também de unidade segundo a perfeição, assim como em outras coisas
perfectum et totum pertence à razão da unidade, visto que não dizemos um homem ou
um sapato, mas o todo.
Embora também se possa dizer que o imperfeito é uno, desde que seja contínuo.
A diferença é que a unidade pode ser considerada ou segundo a quantidade, e
assim basta a mera continuidade da coisa para que se diga; ou de acordo com a forma
substancial, que é a perfeição do todo, e assim se diz que algo é perfeito segundo o todo.

2. Unidade de acordo com a regularidade


Há outra maneira secundária pela qual um movimento pode ser considerado uno,
se for dada atenção à sua regularidade ou uniformidade, assim como as coisas que têm
partes semelhantes também são consideradas unas. O movimento irregular parece ser
menos uno, porque é divisível em partes dissimilares, e o uno tem a razão de ser
indivisível. Assim, a unidade do movimento regular e irregular parece diferir segundo
mais e menos, assim como um corpo de partes iguais parece mais uno do que o de
partes desiguais.
A regularidade e a irregularidade dos movimentos podem ser encontradas em
todos os três gêneros de movimento. As diferenças que dão irregularidade ao
movimento podem vir de duas coisas:
Às vezes, ex parte rei in qua movetur, como se vê claramente no movimento
local, porque é impossível que um movimento que não passe (transit) por uma
magnitude regular ou uniforme seja regular. Uma magnitude é regular ou uniforme se
alguma de suas partes segue uniformemente outra, e uma pode sempre se sobrepor a
outra, como acontece com uma linha reta ou um círculo. Duas linhas que formam um
ângulo não podem se sobrepor diretamente, nem a parte que contém o ângulo pode se
sobrepor a qualquer outra, como podem os segmentos de uma linha. Portanto, o
movimento circular e o reto são regulares; enquanto os movimentos reflexos ou
oblíquos, ou que formam um ângulo, não são regulares nem de magnitude regular.
Outras vezes, a diferença que torna o movimento irregular não vem nem da
espécie, nem do tempo, nem do sujeito, mas ex diversitate modi motus, por velocidade
ou lentidão. É regular o movimento que tem a mesma velocidade em todas as suas
partes; e é irregular aquele que tem uma parte mais rápida que a outra.
O movimento irregular pode dizer-se uno enquanto contínuo, mas é menos uno
que o regular, pois a irregularidade introduz uma certa multiplicidade; o que se vê mais
no movimento reflexo, que quase se parece com dois movimentos.

a. A velocidade e a lentidão não são espécies de movimento, nem tampouco


diferenças específicas, porque atingem todas as espécies de movimento
determinando neles regularidade ou irregularidade; e nenhuma espécie ou
diferença pode ser seguida de todas as espécies de seu gênero.
b. A velocidade e a lentidão não são o mesmo que a gravidade ou leveza,
porque o que é pesado ou leve sempre se move para a mesma coisa: o que é
pesado como a terra sempre se move para baixo, e o que é leve como o fogo
sempre se move para cima; enquanto velocidade e lentidão ocorrem em
todos os movimentos.
c. Todo movimento que tem unidade pode ser regular ou irregular; o
movimento composto de diferentes movimentos segundo as espécies nunca
pode ser regular, pois não é uno nem contínuo.

C. ACERCA DA CONTRARIEDADE DOS MOVIMENTOS


Depois de termos tratado da unidade e da diversidade dos movimentos,
trataremos agora da contrariedade, que é certo tipo de diversidade. E o que
determinarmos da contrariedade do movimento nos permitirá determinar sobre a
contrariedade da quietude ao movimento e da contrariedade que pode ocorrer na mesma
quietude.

1. A CONTRARIEDADE NOS MOVIMENTOS

EM GERAL

Modos. Existem cinco modos para encontrar a razão de contrariedade do


movimento em geral
1. Se a razão de contrariedade for tomada conforme o acesso ou recesso ao
mesmo termo, na forma que se diz contrária à geração: motus ad esse, e
corrupção: motus ab esse.
2. Se o motivo da contrariedade dos movimentos for tomado de acordo com a
contrariedade dos termos a quibus (termo inicial), os movimentos começam
ao modo de contrários, como por exemplo a perda da saúde e a melhora da
doença.
3. Segundo a contrariedade dos termos ad quos (termo final), os movimentos
terminam entre o ficar bom e o adoecer.
4. Segundo a contrariedade do termo a quo com respeito ao termo ad quem; ou
seja, entre perder a saúde e adoecer.
5. Segundo a contrariedade de ambos os termos, como entre o movimento da
saúde à doença e o movimento da doença para a saúde.
É necessário tomar a razão da contrariedade de acordo com um ou mais desses
modos, já que não há outras maneiras pelas quais os movimentos possam ser opostos
entre si.
REDUÇÃO. Desses cinco modos, o segundo e o quarto devem ser excluídos. O
quarto, porque embora sejam consideradas razões diferentes, o movimento a que se
referem pode ser o mesmo, pois o que se aproxima da doença se afasta da saúde; e os
contrários não podem ocorrer ao mesmo tempo no mesmo sujeito, e nem nada pode ser
contrário a si mesmo.
A segunda, porque a razão de contrariedade não deve ser tomada à luz do termo
a quo, por três razões:
1. Dois movimentos que tendem à mesma coisa não são contrários; ora, dois
movimentos que partem de opostos podem tender para algo uno e idêntico que é um
meio entre eles, assim como tanto a perda de frio quanto a perda de calor podem ser
ambos um movimento de aquecimento.
2. A razão da contrariedade nos movimentos deve ser tirada daquilo que os torna
mais contrários: Ora, a contrariedade dos termos ad quos parece ser mais causa de
contrariedade do que a dos termos a quibus; porque dizer que dois movimentos partem
de termos contrários, significa uma remoção da contrariedade, ao passo que dizer que
eles acedem aos contrários, se diz que adquirem contrariedade.
3. As coisas recebem a contrariedade desse mesmo nome e espécie, porque a
contrariedade é a diferença segundo a forma, como se diz na Metafísica 2. Ora, cada
movimento se denomina e toma sua espécie mais do termo ad quem do que do termo a
quo, como por exemplo, ir da doença para a saúde chama-se cura e ir da saúde para a
doença chama-se adoecer.
O terceiro e o quinto modo, embora difiram segundo a razão, são na realidade o
mesmo modo, porque os movimentos que tendem a termos opostos necessariamente
também se afastam dos opostos. Existem, portanto, apenas dois modos, o primeiro e o
quinto.

EM PARTICULAR

Contrariedade nos movimentos em sentido estrito. Movimentos em sentido


estrito são, como dito, aqueles que mudam ex subiectum in subiectum (de sujeito para
sujeito), possuindo dois termos, ao contrário das outras mutações que possuem apenas
um. Nesse caso, o primeiro modo também se reduz ao quinto, e resta que, para a
contrariedade nos movimentos, seja necessária a contrariedade de ambos os extremos.
De modo que dois movimentos são propriamente contrários, se um se move de um
contrário ao outro, e o outro deste contrário ao primeiro.
Isso pode ser visto por indução. Na alteração corporal, adoecer é contrário à cura
porque aquela alteração é da saúde para a doença e esta é da doença para a saúde. Nas
alterações da alma, addiscere é contrário a decipere ab alio, porque um é um
movimento da ignorância à ciência e o outro da ciência à ignorância
1. Nos movimentos locais, sursum é contrário a deorsum segundo o
comprimento, ad dextrum contrário a ad sinistrum de acordo com a latitude, ad ante é
contrário a ad retro secundum altitudinem.
2. Contrariedade nas mudanças que não são movimento. Nas gerações só há
termo ad quem e nas corrupções só termo a quo; portanto, nesses casos a contrariedade
é determinada segundo a primeira modalidade, por acesso ou recesso do mesmo termo.
Contrariedade nos movimentos com médio prazo. Nos movimentos que
terminam em um meio termo, a contrariedade é determinada da mesma forma que nos
movimentos entre opostos, porque o meio é como um contrário em relação a qualquer
um dos extremos.

2. A CONTRARIEDADE NO REPOUSO

Visto que não apenas o movimento, mas também o repouso, parece contrário ao
movimento, devemos determinar como o movimento e o repouso são contrários; logo
como o repouso se opõe as mutações que não são estritamente movimento.

A. DA CONTRARIEDADE DO REPOUSO E DO MOVIMENTO

O movimento é contrário ao movimento simpliciter, proprie et perfecte. O


repouso é contrário ao movimento apenas quodammodo (segundo algum modo), porque
o repouso se opõe ao movimento como privação, e a privação é de certo modo um
contrário. Como se diz na Metafísica 3, a privação e o hábito constituem a primeira
contrariedade, porque em todos os opostos se salva a razão da privação e do hábito, pois
um oposto é sempre como a privação do outro oposto, como o preto em relação ao
branco e o amargo em relação ao doce.
DUBIUM. É evidente que nem todo repouso se opõe a todo movimento, mas
que o movimento segundo o lugar se opõe ao repouso segundo o lugar e assim por
diante. O que não é tão óbvio é se o movimento em um término, por exemplo no
branco, se opõe ao movimento que esta in álbum (no branco): o dealbatio
(embranquecimento), ou o movimento que está ex albo (do branco): o denigratio
(escurecimento), se opõe ao resto em um termo, por exemplo no branco.
SOLUÇÃO. O movimento que vai do termo a quo ao termo ad quem, é
contrário ao repouso que permanece no termo a quo; isto é, o movimento que vai do
branco ao preto é contrário ao repouso no branco, e o que vai do preto ao branco é
contrário ao repouso no preto. A razão é que o repouso no termo ad quem é mais a
consumação e perfeição do movimento do que seu oposto; porque o movimento para o
termo, é repousar naquele termo: o movimento para a brancura faz com que a coisa
permaneça branca; ora, se o movimento é a causa desse repouso, não pode ser seu
oposto, porque nenhum oposto é causa de seu contrário.
A partir disso, pode-se ver que os repousos em termos contrários são contrários
entre si; porque são contrários a movimentos contrários e os opostos dos opostos são
contrários entre si.

B. DA CONTRARIEDADE DO REPOUSO NAS GERAÇÕES E


CORRUPÇÕES

Nas mutações que não são movimento, ou seja, nas gerações e corrupções
simpliciter, a contrariedade se dá, como dissemos, por acesso e recesso do mesmo
termo. Assim, a mutação que é ex esse: a corrupção, opõe-se à mutação que é in esse: a
geração.
Nessas mutações que não estão entre opostos, não há repouso que lhes seja
oposto, mas o que se opõe a eles é antes a imutação ou não mutação. Porque o que é
capaz de se mover está parado e em repouso, mas o que é gerado ou corrompido é ou
não é, mas não se move.
DUBIUM. Assim como o movimento se opõe ao repouso no termo a quo,
também a corrupção, que é a mudança ex esse, se opõe à não mutação in esse; mas a
geração é a mudança ex non esse in esse e, portanto, se opõe à não mutação no non-esse.
Como isso deve ser entendido?
SOLUÇÃO. O non-esse pode ser entendido de duas maneiras.
1. De certa forma, pode ser entendido como tendo algum sujeito, tanto um
sujeito em ato, como se diz do corpo que não é branco (sujeito da geração secundum
quid); seja um sujeito que é um ente in potentia tantum, pois a privação da forma
substancial ocorre na matéria prima (sujeito da geração simpliciter).
2. Caso contrário, o non-esse pode ser entendido não em um sujeito, mas como o
que é omnino non est.
Se entendermos o non-esse da primeira maneira, como tendo algum sujeito,
então podemos dizer que a não-mutação no não-ser é contrária à geração e também é
contrária à não-mutação no ser. Se entendermos o non-esse da segunda maneira, não se
poderá falar em não mutação ou repouso no non-esse, porque nada se pode dizer do que
é omnino non est. E como a mutação no ser deve ter como oposto a não mutação no não
ser, aquele non esse a quo (geração) e in quo (corrupção), deve ser sempre entendido
como um non esse habens subiectum.
C. SOLUÇÃO DE ALGUMAS DÚVIDAS

1. SOBRE A CONTRARIEDADE SECUNDUM NATURAM E


EXTRA NATURAM

Por que no movimento local se encontra certo movimento e repouso secundum


naturam e outro extra naturam, enquanto nos outros tipos de movimentos parece que
isso não ocorre? Porque o movimento local e o repouso para acima e para abaixo são
naturais, enquanto à esquerda e à direita não o são; mas parece que todos os
movimentos de alteração são de acordo com a natureza, porque mesmo quando a
sanatio é produzido pelo médico, não parece ser menos natural que a aegrotatio
contraria, pois ambas são de acordo com um princípio intrínseco. Nem parece que se
possa falar de um aumento e diminuição que não seja de acordo com a natureza; e
menos ainda no que diz respeito à geração e corrupção.
Isto não contradiz o que se diz em De Caelo II, que todo defeito e corrupção é
contra a natureza; porque aí se considera a natureza particular de cada coisa, à qual se
opõem ao defeito e a corrupção, visto que cada natureza procura a conservação e a
perfeição do seu próprio sujeito; mas se considerarmos a natureza universalmente, então
tudo o que procede de um princípio intrínseco é dito natural, como quando a corrupção
do animal é produzida pela contradição intrínseca do quente e do frio.
SOLUÇÃO. O movimento de acordo com a natureza e contra a natureza é
encontrado na verdade em todos os tipos de movimento. O natural é aquele cujo
princípio é intra; Já o violento é extra naturam, porque violento é aquilo cujo princípio
é extra nihil conferente vim passo. E assim como o extra naturam é contrário ao que é
secundum naturam, assim também o violento é contrário ao o que é natural. Ora, há
gerações e corrupções que são violentas, assim como há aumentos e diminuições
violentos e alterações violentas. Portanto, em todos os gêneros há mudanças contra a
natureza.
Há gerações e corrupções violentas que não procedem segundo a ordem das
causas naturais, como quando rosas e outras frutas nascem fora de estação por algum
artifício. Há também aumentos violentos e extra naturam, como aqueles que atingem a
puberdade muito cedo porque são alimentados com alimentos deliciosos e abundantes;
ou quando o trigo cresce de maneira não natural devido à abundância de humores, não
se tornando espesso e sólido porque não foi digerido adequadamente. E também há
alterações naturais e violentas, como por exemplo na cura; pois alguns são curados pela
febre naturaliter, enquanto outros são curados mediante algum medicamento.
OBJEÇÃO. Se o que é extra naturam é contrário ao que é secundum naturam,
se houvesse algumas gerações e corrupções segundo a natureza e outras contra a
natureza, seguir-se-ia que haveria gerações contrárias às gerações e corrupções às
corrupções. Mas foi dito que a geração é contra a corrupção. E não pode ser que a
mesma coisa seja contrária a outras duas.
RESPOSTA. Nada impede que haja gerações contrárias às gerações e
corrupções às corrupções, mesmo sem considerar a contradição entre o que está de
acordo e o que está contra a natureza. Por exemplo, a geração e a corrupção que
ocorrem quando o mais nobre é gerado a partir da corrupção do menos nobre (como
quando o fogo é gerado pela corrupção do ar), são contrárias à geração do menos nobre
pela corrupção do mais nobre (se o ar for gerado a partir do fogo). E isso não significa
que a geração não se oponha à corrupção, porque a geração se opõe à corrupção
simpliciter, isto é, universalmente por causa de seu gênero; enquanto a geração se opõe
à geração secundum quid, isto é, particularmente em razão de sua própria espécie (assim
como a avareza se opõe à liberalidade em razão de seu gênero, segundo o fato de que o
vício se opõe à virtude [II-II, 118, 3], mas se opõe ao vício da prodigalidade segundo a
razão de sua própria espécie [II-II, 119, 1]).
COROLÁRIO. Não só na geração, mas universalmente em todo movimento e
repouso existe a contrariedade secundum naturam et extra naturam. Por exemplo, no
movimento local, o movimento ascendente é contrário ao movimento descendente, pois
os lugares são opostos. E esta contrariedade pode ser considerada como secundum
naturam, visto que é natural que o fogo se mova para cima e a terra para baixo; ou
também como uma contradição entre o que é secundum naturam e extra naturam se
considerarmos o mesmo corpo, porque o movimento natural da terra para baixo se opõe
ao movimento violento para cima.
O mesmo pode ser visto em relação ao repouso. Pois o repouso para acima, é
contrário ao movimento de cima para baixo e o repouso para baixo; portanto, o repouso
para cima, que é natural ao fogo, é contrário ao repouso para baixo, que é natural a terra;
e o repouso para acima extra naturam da terra é contrário ao movimento natural da
terra, que é de cima para baixo, e ao repouso natural para abaixo.

2. SOBRE A CHEGADA AO REPOUSO


No caso de um repouso que não é permanente, mas foi alcançado em algum
momento, deveríamos falar de uma geração do repouso? Isso poderia ser chamado de
“parar” (stare), não o confundindo com o mesmo repouso, mas a chegada ao repouso
(pervenire ad quietem).
SOLUÇÃO. Parece que se deve falar apenas da geração do repouso ou
“detenção” para a chegada ao repouso natural e não ao repouso violento. Além disso, a
detenção só se distingue em razão do movimento natural. Vamos explicar esses dois
pontos.
Todo repouso é alcançado pelo movimento precedente: o repouso antinatural
pelo movimento violento e o natural pelo movimento natural. Mas o repouso do
movimento natural ocorre de maneira contrária ao repouso do movimento violento;
porque o movimento natural torna-se mais rápido à medida que se aproxima do repouso,
enquanto o movimento violento se torna mais negligente. Ora, a coisa gerada é a
perfeição do movimento de geração, e o que se aproxima de sua perfeição torna-se mais
virtuoso e intenso. Portanto, apenas a chegada ao repouso natural pode ser considerada
geração (já que somente ela tende ao seu fim quanto à sua perfeição). O repouso
violento não tem "detenção", ou seja, geração.
O repouso natural tem geração porque procede de alguma causa per se factiva
quietis, enquanto o repouso violento não tem causa per se mas per accidens, pois é
produzido por defeito da virtude que inferiu a violência. Daí o movimento violento in
fine remittitur (liberação) enquanto o natural in fine intenditur (destinação). A geração
de repouso e movimento natural são idem subiecto, mas diferentes ratione. Porque o
termo do movimento natural é estar no lugar natural; ora, esse in loco naturali et
quiescere in eo sunt idem subiecto; portanto, eles só diferem de acordo com a razão

3. ACERCA DO REPOUSO E SEU MOVIMENTO CONTRÁRIO


Foi dito que o repouso em um termo é contrário ao afastamento desse termo.
Mas isso parece falso, porque quando algo se move de um termo, como quando sai de
um lugar, ou qualidade, ou quantidade, enquanto ainda está se movendo, tem algo
daquilo que é rejeitado ou deixado. Pois o lugar não é deixado repentinamente, mas
sucessivamente; e o mesmo vale para a brancura. Portanto, enquanto se move, ainda
permanece no termo a quo. Mas se o repouso pelo qual algo permanece no termo a quo
é contrário ao movimento pelo qual se afasta dele, segue-se que dois contrários são
simultâneos, o que é impossível.
SOLUÇÃO. O que se move saindo do termo, repousa no termo a quo não
simpliciter, mas secundum quid, ou seja, ainda permanece no termo non totaliter, mas
em parte. Porque é universalmente verdadeiro que o que se move está em parte no termo
a quo e em parte no ad quem. E não é inconveniente que um contrário se misture
secundum quid com o outro; mas quanto mais impermixtum, mais contrário é. Assim, o
movimento é mais contrário ao movimento, com o qual nunca se mistura, do que ao
repouso, com o qual se mistura de certa maneira.

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