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A DÉCADA DOS MITOS

Marcio Pochmann

A DÉCADA DOS MITOS

E D I T O R A
Copyright  2001 Marcio Pochmann

Coordenação editorial
Camila Kintzel
Fábio Amancio

Preparação
Sandra Regina de Souza

Projeto de capa
Antonio Kehl

Diagramação
Global Tec - Produções Gráficas

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP )


(Câmara Brasileira do Livro, SP , Brasil)
Pochmann, Marcio, 1962-
A década dos mitos / Marcio Pochmann – São Paulo:
Contexto, 2001.

Bilbliografia.
ISBN 85-7244-174-3

1. Brasil – Condições econômicas 2. Brasil – Condições sociais


3. Emprego (Teoria econômica) 4. Liberalismo – Brasil. 5. Trabalho
e classes trabalhadoras I. Título.
01-1928 CDD-330.981

Índices para catálogo sistemático:


1. Brasil: Neoliberalismo e emprego : Economia 330.981
2. Brasil: Neoliberalismo e trabalho : Economia 330.981

Proibida a reprodução total ou parcial.


Os infratores serão processados na forma da lei.

2001

Todos os direitos desta edição reservados à


E DITORA C ONTEXTO (Editora Pinsky Ltda.).
Diretor editorial Jaime Pinsky
Rua Acopiara, 199 – Alto da Lapa
05083-110 – São Paulo – SP
PABX /FAX : (11) 3832 5838
contexto@editoracontexto.com.br
www.editoracontexto.com.br
Sumário

Apresentação ..................................................................................... 7

A ocupação a partir da reformulação do papel do Estado ......... 11

Abertura comercial, internacionalização da economia


e ocupação ....................................................................................... 39

As possibilidades da ‘‘nova economia’’ e seus efeitos no


trabalho no Brasil ............................................................................ 51

A redivisão regional do emprego .................................................. 79

Mudanças na distribuição da renda ............................................... 93

Alterações recentes no custo do trabalho no Brasil ................... 107

As políticas salarial e do salário mínimo ..................................... 127

Novas e velhas políticas do trabalho no Brasil ........................... 147

Referências bibliográficas ............................................................. 173


Apresentação

Este livro constitui um contraponto às teses que se transforma-


ram hegemônicas nos anos 1990 no Brasil, a partir de uma constante
propaganda pelos diferentes governos e da recorrente reprodução,
sem grande contestação, pelos meios de comunicação de massa e até
por certos setores mais progressistas. Mais precisamente, as teses go-
vernamentais liberalizantes são analisadas como mitos, já que demons-
traram ser idéias falsas, sem correspondência na realidade nacional.
Uma verdadeira fantasia neoliberal ganhou o país, capaz de
criar um enorme fosso entre o que dizia ser e o que se revelou
após a sua implantação. No passado que todos desejam esquecer,
o então ministro da propaganda do nazismo dizia que a repetição
de uma mentira por muitas vezes tornava-a uma verdade aceita
por muitos. Agora, percebe-se que esse perverso método de pro-
paganda não foi totalmente abandonado.
No Brasil, que também viveu a hegemonia do pensamento
único durante a década de 1990, verificou-se a sempre presente
tentativa de marginalização daqueles que ousavam pensar o con-
trário do que as teses neoliberais apontavam como verdades abso-
lutas, fossem eles movimentos políticos e sociais organizados ou
mesmo intelectuais que, isoladamente, se negavam a enxergar a
realidade através de uma lente só. Uma vez implementado o pro-
grama liberalizante no país, alcançam-se as condições necessárias
e suficientes para uma reflexão profunda e não convencional so-
bre a produção de uma década dos mitos.
Sob o prisma temático do trabalho, procura-se espetar o alvo de
oito mitos produzidos pelo neoliberalismo no Brasil durante a déca-
da de 1990. O primeiro mito surge da constatação de que o esvazi-
amento do papel do Estado levaria o país ao crescimento econômi-
co sustentado, com elevação no nível de ocupação. Por meio da
privatização seria possível reduzir o endividamento público e am-

7
pliar o gasto social, deixando ao setor privado o comando da expan-
são econômica. Não apenas foi registrado o pior desempenho eco-
nômico, com taxas de variação do produto praticamente equivalen-
tes às da população, indicando a estagnação da renda per capita,
como o endividamento cresceu, ao contrário do gasto social. O de-
semprego, por conseqüência, teve no esvaziamento do Estado uma
fonte importante de expansão.
O segundo mito encontra-se incrustado no pressuposto de que
a abertura comercial e a internacionalização da economia permiti-
riam a modernização do parque produtivo, assim como a redução
do desemprego. A queda das barreiras tarifárias e não tarifárias
num ambiente macroeconômico não isonômico (altas taxas de ju-
ros, moeda valorizada, ausência de políticas comerciais defensivas
e industriais ativas) resultou no rompimento de cadeias produtivas
diante da presença de maior quantidade de produtos importados.
Sem condições satisfatórias para melhor colocar a sua produção no
exterior, o país assumiu a posição de “exportador” de empregos,
pois parte dos que aqui existiam no setor industrial foram trocados
pela importação. Não apenas o desemprego aumentou, como pio-
rou a participação do Brasil no comércio internacional, indicando
o atraso a que o país foi submetido.
O terceiro mito vincula-se à hipótese heróica de que o avanço
da chamada “nova economia” seria favorecida no Brasil diante da
aceitação passível do tecnoglobalismo. Ou seja, a crença oficial de
que o abandono das políticas nacionais de ciência e tecnologia pela
possível compra de tecnologia de fora no mercado internacional
possibilitaria ao país reduzir o atraso técnico em relação às economi-
as avançadas, ao mesmo tempo que o capacitaria tanto para receber
novos investimentos quanto para gerar uma elevada quantidade de
novas ocupações com maior qualidade. Como o atraso tecnológico
não foi reduzido, pelo contrário, o Brasil transformou-se num país
mais dependente do exterior e responsável pela expansão da ocu-
pação doméstica, diante da redução do emprego e do tamanho da
chamada “nova economia” durante os últimos dez anos.
O quarto mito advém da análise do pressuposto de que o
rompimento com as políticas de desenvolvimento regional no Bra-
sil possibilitaria a conformação de um país menos desigual, com
acentuada expansão das regiões menos desenvolvidas, especial-

8
mente no que diz respeito ao nível de emprego. Os esforços
subnacionais para atração de investimentos privados, num quadro
de desinvestimento público, redundaram na guerra fiscal e na per-
da de sinergia entre os estados e municípios. Nesse quadro, não
causa espanto o ressurgimento da questão regional, indicando o
agravamento das desigualdades entre as grandes regiões, com o
desemprego aberto deixando de ser um fenômeno sul-sudeste para
se tornar importante nas pequenas cidades e nas áreas mais
depauperadas do país. O esvaziamento dos pólos industriais em
várias regiões menos desenvolvidas são expressão direta disso.
O quinto mito localiza-se na defesa da desconcentração da
renda a partir do estabelecimento da estabilização monetária. Uma
vez consagrado o fim das altas taxas de inflação, o país tenderia a
conhecer uma fase de melhor distribuição da renda nacional, pos-
to que a carestia do custo de vida era identificada com o principal
imposto sobre os pobres. Sem mexer nos problemas estruturais do
país, como a reforma agrária, a tributária e a social e o crescimento
econômico sustentado, a questão distributiva não foi alterada. Pelo
contrário, terminou sendo ainda mais potencializada diante da cri-
se do emprego que tem afastado os brasileiros do acesso à carteira
assinada. As ocupações geradas, além de insuficientes, na maioria
das vezes são muito precárias e têm baixa remuneração.
O sexto mito retrata a tese de que o custo do trabalho no Brasil
é muito elevado, ocasionando a perda de competitividade empresa-
rial e gerando desemprego e ocupações informais. Apesar da imple-
mentação de medidas direcionadas à flexibilização dos contratos de
trabalho e à desregulamentação do mercado de trabalho, o emprego
formal não aumentou, pelo contrário, acumulou déficit estimado em
3,2 milhões de postos de trabalho, assim como o desemprego alcan-
çou índices nacionais sem paralelo desde a década de 1930. O Plano
Real, imposto a ferro e fogo, produziu artificialmente o aumento em
dólar do custo do trabalho, somente reduzido sensivelmente com a
mudança do regime cambial, em 1999.
O sétimo mito surge de toda a argumentação favorável à
desresponsabilização do Estado para com o rendimento dos traba-
lhadores de salário de base, como forma de levar à redução da
desigualdade dos rendimentos do trabalho e à elevação dos salá-
rios de acordo com os ganhos de produtividade. Entretanto, o

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Brasil, que já era conhecido internacionalmente como uma econo-
mia de baixos salários, reforçou ainda mais essa posição, quando
abandonou a política salarial, a partir do Plano Real, e manteve
estacionado o valor real do salário mínimo num dos mais baixos
patamares dos últimos sessenta anos. Para um país com oferta
abundante de mão-de-obra, a ausência do Estado estimula uma
maior concorrência entre os trabalhadores, gerando o rebaixamen-
to salarial e a precarização generalizada da ocupação.
No oitavo mito chega-se à idéia – força de todo o projeto neoliberal
dos anos 1990: acabar com a Era Vargas. Em vez de indicar o rompi-
mento de acordos políticos com segmentos atrasados – conforme
realizados pelo pacto de dominação varguista e que foram responsá-
veis pela não realização, até hoje, de programas civilizatórios do “ca-
pitalismo tupiniquim”, como a reforma agrária para desconcentrar a
propriedade rural, a reforma tributária para fazer com que o rico pa-
gue imposto e a reforma social para universalizar o direito à cidadania
–, assistiu-se, nos anos 1990, à imposição de políticas neoliberais que
retiraram direitos sociais e trabalhistas de uma ampla parcela dos bra-
sileiros. Talvez por isso é que o fim da Era Vargas pode ser entendido,
também, por meio da desvalorização do trabalho.
Com a violência dos programas neoliberais adotados recente-
mente no Brasil foi consolidada a lógica da desconstrução de uma
nação, que um dia sonhou ser soberana, justa e democrática. Em vez
disso, ampliaram-se os sinais de passagem da construção de um país
para a de uma situação próxima a de acampamento, em que a ausên-
cia do Estado dá lugar à crescente violência, corrupção, desemprego;
enfim, ao atraso socioeconômico e à degradação do trabalho.
Ao longo das próximas páginas o leitor terá acesso a uma
espécie de inventário nacional sobre a ressaca neoliberal que se
manifestou na forma de mitos durante os anos 1990. Procura-se
fazer um balanço dos principais mitos que atuaram sobre a realida-
de socioeconômica nacional, considerando as diferentes dimen-
sões da estratégia que buscou colocar fim ao que a Era Vargas
tinha de melhor: a valorização do trabalho. Por conter referenciais
empíricos especiais que concedem à publicação certa singularida-
de na análise, optou-se pela ampla apresentação de gráficos e
tabelas, que dão maior consistência e clareza ao desvendamento
dos mitos neoliberais na década de 1990.

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A ocupação a partir da reformulação do
papel do Estado

Em dez anos de aplicação de políticas neoliberais foi possível


consolidar o mito de que o esvaziamento do papel do Estado no
Brasil levaria tanto ao crescimento econômico sustentado quanto à
expansão do nível de emprego. Isso não ocorreu, muito pelo con-
trário. Justamente após cinco décadas de ampla manifestação de
um padrão de intervenção do Estado favorável ao crescimento
econômico e ao emprego, observou-se, a partir de 1990, a adoção
de um novo modelo econômico que resultou pouco positivo para
a economia e para o trabalho no Brasil. Não apenas o desemprego
assumiu volume sem paralelo histórico nacional, como o rendi-
mento do trabalho alcançou uma das mais baixas participações na
renda nacional. Ao mesmo tempo, o novo modelo econômico ter-
minou por não recolocar a economia nacional no curso do desen-
volvimento sustentado, tendo, por isso mesmo, levado o país a
registrar a pior década quanto à variação do Produto Interno Bruto
de todo o século XX. A crença de que o esvaziamento do Estado
possibilitaria o reforço do setor privado, a ponto de conduzir ao
crescimento econômico desejado e duradouro, não se confirmou
nos anos 1990.
Após dez anos de iniciado o processo de privatização no Bra-
sil, pode-se encontrar uma literatura que se propõe a avaliar vários
aspectos da revisão do papel do Estado. Há, entretanto, uma es-
cassez de estudos sobre o que ocorreu com o emprego nas empre-
sas públicas. Não se pretende aqui esgotar a discussão sobre o
fenômeno de desestatização ocorrido ao longo da década de 1990

11
no país. A preocupação é fundamentalmente oferecer elementos
que permitam analisar os principais efeitos quantitativos e qualita-
tivos decorrentes do processo de revisão do papel do Estado e da
privatização no emprego dos trabalhadores com contrato regular
de trabalho. Dessa forma, coloca-se em evidência o primeiro
mito do projeto neoliberal que apontava para o enxugamento do
Estado como condição para a expansão econômica e, por conse-
qüência, do emprego no país1.
Cinco partes constituem esse estudo, que se inicia com a dis-
cussão acerca dos diferentes padrões de intervenção do Estado no
capitalismo; já a segunda parte trata da relação entre Estado e
desenvolvimento econômico no Brasil. A seguir busca-se analisar
as principais mudanças ocorridas no padrão de intervenção do
Estado brasileiro a partir de 1990, com a introdução de um novo
modelo econômico. A quarta parte enfoca o efeito emprego decor-
rente da revisão do papel do Estado e da década das privatizações.
Por fim, apresenta-se uma breve avaliação da estratégia brasileira
de promover mudanças significativas no curso do Estado no Brasil
durante os anos 1990.

PADRÕES DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NO CAPITALISMO

O Estado não representa um corpo estranho na evolução do


capitalismo. Pelo contrário, pode-se constatar, do ponto de vista
histórico, a manifestação de diferentes padrões de intervenção,
cujo objetivo é o de nortear a presença do Estado nas economias
de mercado, constituída, em maior ou menor medida, por um con-
junto ou frações de interesses públicos e privados.
Paralelamente, o papel econômico do Estado também toma
forma distinta ao longo do tempo, refletindo geralmente a nature-
za e a intensidade das modificações ocorridas no interior do pro-
cesso de acumulação de capital. Dessa forma, a atuação do Estado
tende a organizar, consagrar e reproduzir o processo de domina-
ção política, impondo compromissos entre múltiplos blocos no
poder e de certas frações sociais não dominantes, a partir da cons-
trução de consensos ideológicos majoritários (Poulantzas, 1978;
Habermas, 1975).

12
Nos últimos dois séculos, o padrão de intervenção do Estado
sofreu pelo menos duas alterações substanciais, associadas princi-
palmente às transformações mais gerais do capitalismo. O primei-
ro padrão de intervenção do Estado esteve condicionado pelo com-
portamento da economia capitalista verificado até o final do século
XIX, quando predominou uma fase mais concorrencial nos merca-
do, influenciada pela presença absoluta de pequenos negócios, o
que impedia o estabelecimento de oferta e preço por poucos em-
presários.
A estrutura material do Estado era contida, essencialmente vol-
tada para ações menos complexas, como o exercício de três tipos
diferentes de monopólio: o da violência (justiça e segurança públi-
ca); o da moeda (base monetária e arrecadação tributária) e o da
regulação (de contratos, da propriedade e do comércio externo).
Em conformidade com a ideologia liberal, a existência do Estado
(mínimo) seria assegurada somente como um instrumento de estí-
mulo à concorrência, jamais como interventor sobre os agentes
econômicos.
Aliás, convém ressaltar que durante o século XIX, a livre concor-
rência era identificada como uma forma constante de promoção do
“equilíbrio” econômico, capaz de permitir que o processo de acu-
mulação de capital ocorresse de forma auto-regulada, isto é, que as
crises econômicas pudessem ser resolvidas pelo próprio funciona-
mento do mercado, através da presença absoluta de pequenos ne-
gócios e de pequenos compradores. Assim, a crença na existência
de estruturas mais simplificadas de mercado, sem a existência de
poucos e grandes produtores e compradores, era fortalecida pelo
estágio ainda inferior do desenvolvimento capitalista.
Somente no final do século XIX, com o acirramento da concor-
rência entre os capitais, proporcionado pelo avanço de uma gran-
de onda de inovação tecnológica, que exigiu a concentração e
centralização do capital através do surgimento de grandes empre-
sas, as estruturas do mercado se modificaram intensamente. O apa-
recimento de grandes oligopólios e oligopsônios, controlando cres-
centemente tanto a produção quanto a venda de bens e serviços,
tornou ineficaz o espaço do mercado como mecanismo de
equalização das taxas de lucros.

13
O curso do processo de monopolização do capital assumiu a
forma de uma tendência ainda não percebida até então nas econo-
mias de mercado. Dessa forma, a mobilidade intersetorial do capital,
presente no século XIX, terminou sendo constrangida pelo aumento
no grau de concentração dos mercados e pelo crescente poder
monopolístico das grandes empresas nos mais diversos setores.
Apesar disso, somente com a Grande Depressão de 1929 ficou
mais evidente para a sociedade a incapacidade das forças de mer-
cado de produzirem a auto-regulação. O funcionamento das eco-
nomias de mercado requereria a ampliação do grau de intervenção
do Estado, como forma de evitar o aprofundamento da crise e
impulsionar a expansão capitalista em novas bases.
Não foi por outro motivo que a natureza e o papel do Estado
assumiram proporções inimagináveis até então, com capacidade
de direcionar e impulsionar a acumulação de capital através da
redistribuição de parte do excedente econômico e do exercício da
função nobre de procurar regular o sistema econômico em geral.
Tudo isso seria imprescindível, considerando que na fase recente
de monopolização do capitalismo não havia mais condições de
reproduzir as mesmas formas de auto-regulação que não fossem
aquelas exercidas pelo próprio Estado, diante da enorme capaci-
dade de produção das grandes empresas oligopolistas, bem acima
do ritmo de expansão econômica (obtenção de capacidade produ-
tiva ociosa não planejada).
Por conseqüência, as condições de produção e reprodução da
concorrência intercapitalista e das relações entre capital e trabalho
passaram a depender, cada vez mais, do Estado, que se constituiu
fonte de politização constante da economia. Não significa dizer
que o exercício da política passasse a ser necessário e exclusiva-
mente reflexo da situação econômica, embora a luta política fosse
crescentemente associada ao objetivo de alcançar o poder e o apa-
relho de Estado2.
Observa-se que nos últimos oitenta anos, o conteúdo intrínse-
co da regulação no capitalismo decorreu de uma profunda
reprogramação na natureza do Estado, que alterou significativa-
mente o comportamento do mercado. A remodelação das regras
de mercado por uma nova relação entre Estado e economia possi-

14
bilitou, por exemplo, avançar na definição de novas formas de
rendas diretas para o consumo coletivo, sem mais estar relaciona-
do às formas pretéritas de financiamento do consumo dos traba-
lhadores, cujo salário era isoladamente a única forma de acesso ao
consumo.
Com o avanço do planejamento e da capacidade provisional
exercida pelo Estado, bem como o estímulo às áreas sociais (edu-
cação, saúde, lazer, transporte), à ciência e pesquisa e à produção
(investimento produtivo e financiamento) houve singularidade no
funcionamento das economias de mercado no século XX3. O con-
sumo do trabalhador, por exemplo, passou a ser valorizado através
da ampliação das formas de rendimento, tendo o salário direto
acompanhado a produtividade, os encargos sociais financiado as
despesas com aposentadoria e qualificação e o salário indireto aten-
dido aos gastos de saúde, educação, transporte e habitação.
Nas três décadas após o encerramento da Segunda Guerra
Mundial, as economias avançadas registraram espetacular desen-
volvimento, com crescente participação estatal. Desde a década de

Gráfico 1 – Gasto total do setor público como proporção do PIB em países


selecionados, 1913-1999 (em %)

70

60

50

40

30

20

10

0
1913 1950 1970 1975 1980 1985 1990 1995 1999*

Alem anha EUA França Holanda Itália Noruega Reino Unido Suécia

Fonte: Maddison, 1991; OCDE, vários anos.

15
1970, no entanto, ampliaram-se os sinais de crise no padrão de
intervenção do Estado fundado na crise da ordem liberal na De-
pressão de 1929. Além de outras modificações nas economias de
mercado, assiste-se à transição do processo de monopolização ca-
pitalista de base praticamente nacional – caracterizado pela expan-
são do pós-guerra – para o de âmbito mundial.
A intensificação da concorrência intercapitalista acirrou ain-
da mais o processo de centralização e concentração do capital,
com o fortalecimento de fusões, incorporações, aquisições entre
as grandes empresas produtivas e financeiras. A constituição de
estruturas oligopolizadas e oligopsônicas de mercado no plano
mundial rompeu com o formato original da regulação estatal es-
tabelecida a partir dos anos 1930 no plano nacional, sem a
redefinição, até o momento, de um novo e bem-sucedido formato
regulatório supranacional.
O aprofundamento da crise do padrão de intervenção estatal
voltado para o espaço nacional fortalece o florescimento do ata-
que ideológico liberal-conservador, que imputa ao Estado as ra-
zões gerais pelos principais males vigentes nas economias de merca-
do5. Com isso, a ação estatal terminou passando por transformações
importantes nos anos 1980, embalado pelo conceito de Estado
Mínimo e pela retórica da busca de elevação da competitividade e
de maior participação de novos grupos organizados da sociedade
no processo de tomada de decisão governamental.
A reavaliação do papel do Estado e a aprovação das refor-
mas no setor público nas economias avançadas ocorreram nas
mais variadas formas, diferentemente do que propunham os de-
fensores do Estado Mínimo e sem levar, necessariamente, ao
desmantelamento do aparato estatal. Podem ser destacadas, por
exemplo, novas ações convergentes para o aumento da descen-
tralização nas atribuições de competências operacionais do Es-
tado, com a introdução de mecanismos de mercado e competi-
ção administrada, através da privatização de segmentos estatais
em setores produtivos.
De todo modo, não houve, em geral, perda do controle
estatal no direcionamento estratégico da política industrial, nas
áreas de pesquisa e na área social, nem tampouco redução de

16
participação do gasto público no produto. Prevaleceu a busca
pelo aperfeiçoamento da capacidade de intervenção estatal, com
ampliação do papel da gestão regulatória estratégica e elevação
contida das receitas públicas em relação ao PIB. (OCDE, 1997;
Number, 1995).

Gráfico 2 – Composição do gasto público nos países do G-7 em anos


selecionados (em %)

Fonte: OCDE, vários anos.

Deve-se destacar, entretanto, que a mudança na composição


do gasto público, refletiu, em parte para alguns países, a força do
pensamento neoliberal. Em outras palavras, houve a contenção
relativa de gastos comprometidos com esferas sociais, de investi-
mento e de consumo, em contrapartida à expansão das esferas de
gastos direcionadas ao pagamento do serviços financeiros e
de transferências e subsídios.
Na maior parte dos países do G-7 nota-se a expansão tanto
dos gastos com a seguridade social quanto com os juros. Em con-
trapartida, as esferas de consumo geral e de investimento foram
comprimidas.
A ausência de referências generalizadas acerca da decrescente
participação do emprego do setor público indica ainda a importân-

17
cia das instâncias do aparato estatal na economia. Países como
Holanda e Reino Unido constituem, até agora, experiências relati-
vamente isoladas no que se refere ao movimento de contenção do
emprego público, pois a maior parte das economias avançadas
segue mantendo a participação crescente de funcionários públicos
em relação ao total da ocupação.
Dessa forma, o setor público permanece exercendo também
papel importante na absorção de força de trabalho, contrapondo-
se à ocupação do setor privado. Em países como a Suécia, por
exemplo, o peso do emprego público atinge diretamente um terço
do total da ocupação, enquanto na Holanda encontra-se um pouco
abaixo dos 15%.

Gráfico 3 – Participação do emprego público na ocupação total em países


selecionados (em %)
35

30

25

20

15

10
1970 1975 1980 1985 1990 1995 1999*

Alemanha EUA França Holanda Itália Noruega Reino Unido Suécia

* Estimativa. Fonte: OCDE, vários anos.

A busca de maior avanço na capacidade de arrecadação e de


distribuição adequada de recursos constitui parte integrante do
programa de reformulação do papel do Estado realizado recente-
mente nos países avançados. Somente o exercício dessas funções
continuam a depender da presença de funcionários públicos, a
despeito da modernização funcional, administrativa e de infor-
mática naquele setor.

18
ESTADO E CAPITALISMO NO BRASIL

Uma breve comparação entre a evolução do papel do Estado


no Brasil e a em outros países permite observar diferenças impor-
tantes. Em geral, a presença do Estado nos países desenvolvidos é
bem mais significativa nas áreas sociais (previdência e alocações
diversas), enquanto nas economias não desenvolvidas prevaleceu
a intervenção no setor produtivo, de infra-estrutura e de energia,
por exemplo.
Em parte, essa diferença diz respeito tanto à defasagem exis-
tente entre o grau de desenvolvimento econômico alcançado nas
economias ricas e nas economias pobres quanto à forma de inser-
ção de cada país na economia mundial. Na tentativa de diminuir as
diferenças em relação às economias ricas, os países não desenvol-
vidos, sem condição de depender exclusivamente do setor priva-
do, terminam por utilizar o aparato estatal no esforço de expansão
do sistema produtivo.
No Brasil, o setor público compreende duas divisões impor-
tantes. A primeira diz respeito às funções de governo, tais como a
administração direta em todos os níveis, adicionada às autarquias e
demais atividades que dependem exclusivamente do orçamento
público.
A segunda refere-se às empresa públicas, que possuem, por
sua vez, dois segmentos: setor produtivo estatal, constituído pelas
grandes empresas e subsidiárias pertencentes à base econômica; e
empresas e organismos desvinculados das atividades produtivas,
especialmente nas áreas de serviços e transportes6.
Do ponto de vista da evolução temporal no papel do Estado
no Brasil, pode-se identificar a presença de três fases bem distin-
tas. A primeira refere-se até a década de 1920, quando o liberalis-
mo econômico era hegemônico.
Por conta disso, a participação do Estado no domínio econô-
mico era ínfima, limitando-se às funções de regulação, controle
monetário e arrecadatório. Apesar disso, cabia ao Estado o desem-
penho de funções marginais na economia, especialmente por meio
de empresas públicas, como o Serviço Postal e a Casa da Moeda,
que foram constituídas no século XVII.

19
Ao mesmo tempo, pelo menos durante o século XIX, o governo
buscou garantir taxa de retorno aos investimentos privados realiza-
dos no Brasil, principalmente aqueles provenientes de aplicações
inglesas nas ferrovias. Com isso, as despesas governamentais com
subsídios para companhias de navegação e de ferrovias chegaram
a garantir uma taxa de até 6% do total das importações (Villela e
Suzigan, 1973).
De outra parte, também era função do Estado a realização de
concessões de serviços de utilidade pública ao setor privado na-
cional e estrangeiro. Nos segmentos identificados com o monopó-
lio natural, como eletricidade e transportes (bondes), era grande a
presença de empresas privadas que atuavam por concessão do
Estado (Singer, 1975).
Antes da República, o Brasil havia criado algumas poucas
empresas públicas, como o Banco do Brasil, a Imprensa Régia e a
Real Fábrica de Ferro de São João de Ipanema. Com a instalação
da República, cerca de dois terços das ferrovias foram estatizadas,
assim como ganhou importância a atuação do Estado, por intermé-
dio das Caixas Econômicas, o que garantiu a presença de 25 em-
presas públicas no Brasil até 19307.
Com a Revolução de Trinta houve uma profunda modificação
no padrão de intervenção estatal no Brasil. O abandono do libera-
lismo abriu novas perspectivas para uma importante atuação esta-
tal que vai durar quase seis décadas.
Mas isso ocorreu influenciado sobretudo pela intenção das
forças sociais no Estado, com vistas a promover o desenvolvi-
mento econômico, através da industrialização. Dessa forma, bus-
cou-se garantir a ocupação de “espaços vazios”, ainda não aten-
didos pelo setor privado ou que apresentavam insuficiência na
escala de produção, de financiamento e de tecnologia. Entre 1930
e 1989, três períodos são relevantes para analisar sinteticamente
a evolução do padrão intervencionista do Estado na economia
brasileira.
O primeiro período transcorre entre 1930 a 1955, quando o
conjunto das ações do Estado na economia visou não apenas a
constituição de um novo aparelho de Estado (administração e for-
mação de quadros), com a regulação de vários setores de ativida-

20
des econômicas e sociais, mas principalmente a atuação direta no
processo de acumulação capitalista. Teve elevada importância a
constituição de empresas públicas como a Companhia Siderúrgica
Nacional (1941), a Companhia Vale do Rio Doce (1942), a Compa-
nhia Nacional Álcalis (1943), a Fábrica Nacional de Motores (1943),
a Companhia Hidrelétrica de São Francisco (1945), o BNDES (1952)
e a Petrobrás (1954).
Isso tudo ocorreu estimulado fortemente pela visão naciona-
lista, que exigia uma condução bipartite entre a atuação do Estado
e o desenvolvimento do setor privado nacional. Nos setores que já
possuíam a presença de capitais estrangeiros, como na navegação
e na eletricidade, a instalação de conselhos e a definição de códi-
gos regulatórios cumpriram as funções de controle da acumulação
de capital, conduzidas pelos recursos internacionais (Draibe, 1985;
Dain, 1979; Lessa, 1978; Prado, 1990).
O segundo período na evolução do padrão de intervenção do
Estado no Brasil desenvolve-se entre 1955 e 1964, com a imple-
mentação do Plano de Metas durante o governo JK. A partir desse
momento, o nacionalismo perdeu alguma importância, dando lu-
gar a uma nova articulação entre Estado, capital privado nacional e
capital privado internacional.

Gráfico 4 – Brasil: Participação do Estado no total do investimento (em %)

50

40

30

20

10

0
47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99

Fonte: Bacen, FGV, FIBGE, vários anos.

21
A constituição de uma articulação trilateral de interesses, en-
volvendo a presença de ampla participação de recursos externos,
possibilitou tanto ao setor privado quanto ao Estado o avanço na
internalização do padrão de industrialização, conforme anterior-
mente verificado nos países desenvolvidos. O salto industrializante
foi comandado pelo Estado, perseguindo o princípio original de
ocupar os “espaços vazios” deixados pelo setor privado (Benevides,
1976; Martins, 1977; Ianni, 1971; Lafer, 1975; Resende, 1980).
Por fim, o terceiro período na evolução do padrão de inter-
venção estatal se deu entre 1964 e 1989, quando o papel econômi-
co do Estado buscou não apenas assegurar o desenvolvimento de
“espaços vazios”, mas garantir a aplicação da ideologia de “segu-
rança nacional”. Durante o governo militar, a expansão das empre-
sas estatais foi expressão direta de uma ideologia, em que o Estado
avançou muito, alterando o quadro de desnacionalização inicial-
mente estimulado pelo governo de JK, ao proteger parcela signifi-
cativa do setor privado nacional (Tavares e Serra, 1970; Evans,
1980; Leff, 1975; Diniz, 1978).
A base de financiamento do Estado dentro do processo de
acumulação de capital dependia dos recursos orçamentários, dos
reinvestimentos das empresas estatais e de formas indiretas de tri-
butação e emissão monetária. O fortalecimento do Estado através
do autoritarismo e a ampliação da sua capacidade de captação do
excedente econômico favoreceu a constituição de uma nova arti-
culação entre a burocracia estatal e as grandes empresas públicas,
o que trouxe, por conseqüência, o descolamento de parte dos
interesses do setor privado nacional.
Por conta disso, na segunda metade dos anos 1970, surgiram
as primeiras críticas ao fortalecimento estatal. Não havia ainda a
manifestação direta de interesses favoráveis à privatização, mas
sim à associação crescente entre o autoritarismo e a estatização
econômica, ao passo que a manifestação dos primeiros sinais de
crise no padrão de intervenção do Estado instituído a partir de
1930, abriu uma primeira lacuna para o engrandecimento dos prin-
cípios neoliberais (Castro, 1984; Pessanha, 1981).
Nos anos 1980, com a crise da dívida externa, combinada à
opção de política econômica adotada na época (estatização da

22
dívida externa e transformação das empresas estatais em mecanis-
mos de ajuste, com a desvalorização dos preços e tarifas públicas e
estímulo ao endividamento, como forma de atrair recursos exter-
nos em quantias necessárias para o fechamento das contas exter-
nas), o setor produtivo passou a perder eficiência e eficácia. Com
isso, cresceu também a relação realizada entre a presença do Esta-
do na economia e o regime autoritário.
Dentro dessa perspectiva, o ano de 1990 marcou uma drástica
ruptura no padrão de intervenção do Estado na economia brasilei-
ra. Com a vitória de Collor nas eleições de 1989, não apenas as
medidas estabelecidas pelo “Consenso de Washington” passaram a
ser implementadas no Brasil, como foi constituído um novo mode-
lo econômico. A ênfase na revisão do papel do Estado teve, além
da realização das reformas administrativa, tributária e previdenciá-
ria, a preocupação com a promoção de um intenso programa de
privatização.
Em função disso, o desmonte do Estado transcorreu ao longo dos
anos 1990, fortalecido pelas idéias de transferência de ativos públicos
para o setor privado, como forma de estabelecer um novo condutor
do desenvolvimento econômico e social. Ao Estado coube um espaço
regulador, voltado ao estímulo da competição e da eficiência dos
mercados, bem como variável importante adotada no ajuste fiscal
(Giambiagi e Moreira, 1999; Velasco Jr., 1997; Pinheiro e Fukasaku,
2000; Pinheiro e Landau, 1995).

NOVO MODELO ECONÔMICO E IMPLICAÇÕES NO PAPEL DO ESTADO


BRASILEIRO DESDE 1990
O Brasil possui, desde 1990, um modelo econômico que se
diferencia profundamente do verificado entre as décadas de 1930
e de 1970. Em vez da defesa da produção e do emprego nacional,
privilegia-se a promoção da integração do sistema produtivo na-
cional à economia mundial.
Dessa forma, o padrão de intervenção estatal perdeu grande
parte de sua funcionalidade. Em nome da competitividade, seg-
mentos do setor público desapareceram, outros foram privatizados,
concedidos, terceirizados e reformulados.

23
Pode-se constatar que o atual modelo econômico representa a
experiência mais exitosa de interrupção do projeto de desenvolvi-
mento após 1930. Até então, duas tentativas realizadas
anteriormente visando a modificação no papel do Estado tinham
sido introduzidas, porém sem o sucesso verificado atualmente8.
Entre 1946 e 1947, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra,
ocorreu, por exemplo, uma primeira tentativa de rompimento do
padrão de intervenção estatal constituído ainda na década de 1930.
Nesse período, foi criticado, por um lado, a presença do Estado na
economia, associando-a ao Estado Novo (regime autoritário vigen-
te nos anos 1937-1945); e, por outro lado, foi defendido o liberalis-
mo econômico, através do abandono da Coordenação de
Mobilização Econômica e do controle de preços verificados entre
1942 e 1945. Ao mesmo tempo, o Conselho Nacional de Petróleo
tomou a iniciativa de abrir concorrência para a construção de refi-
narias por companhias privadas, enquanto a liberalização comer-
cial ganhou grande dimensão, comprometendo significativamente
as reservas internacionais acumuladas durante o período da Se-
gunda Guerra Mundial.
Quando se elegeu a inflação como problema a ser enfrentado,
o ingresso de oferta de produtos do exterior assumiu maior rele-
vância. Mas antes de dois anos, a ilusão das reservas internacionais
foi constatada, com o rápido esvaziamento dos recursos acumula-
dos, o que criou uma falsa visão do liberalismo. No período restan-
te, o governo Dutra tratou de recompor o modelo de
desenvolvimentismo anterior com apoio social.
A segunda tentativa de rompimento com o padrão de inter-
venção de Estado ocorreu entre 1964 e 1966, durante o primeiro
governo autoritário do regime militar, quando ganhou expansão a
retórica favorável ao desenvolvimento econômico com ênfase no
liberalismo e internacionalismo. Duas empresas foram privatizadas,
como no caso da FNM (Fábrica Nacional de Motores), vendida para
Alfa Romeu, e da Cosigua, que teve parte de suas ações adquiridas
pela Thissen Steel, bem como o setor petroquímico foi transforma-
do em espaço para investimentos de empresas privadas.
Durante o mesmo período de tempo, a política de combate à
inflação reuniu o realismo tarifário com a promoção do arrocho

24
salarial, através da manutenção de baixas taxas de expansão eco-
nômica. Os resultados promovidos pelo impulso liberal foi pífio,
tornando-se desacreditado pelos governos militares que sucede-
ram o general Humberto Castello Branco, levando-os a optarem
pela retomada do padrão estatal de intervenção econômica de
maneira redobrada.
Somente 24 anos depois, uma revisão profunda do papel do
Estado foi realizada. Através da desregulamentação da concorrên-
cia e da realização das reformas administrativa, previdenciária e
fiscal, aliada ao processo de descentralização e privatização ao
longo da década de 1990, foi rompido o padrão de intervenção
estatal no Brasil. Assim, o desmonte do aparato estatal terminou
sendo implementado.
Quatro novos segmentos do setor público foram constituídos,
através do núcleo estratégico (definição de leis e políticas públi-
cas), das atividades exclusivas (forças armadas, arrecadação e agên-
cias de regulação, fomento e controle), dos serviços não exclusi-
vos (educação, saúde, seguridade e pesquisa) e do setor de produção
de bens e serviços (empresas estatais). O novo formato do aparato
estatal foi exigido dentro do objetivo governamental de enfrentar a
crise fiscal, concedendo um novo papel ao Estado menos
intervencionista e muito mais regulatório (Pereira, 1997).
Em grande medida, a ênfase na reforma do Estado foi provocada
pelo recente avanço hegemônico da ideologia neoliberal, a partir
da difusão da concepção de que o aparato estatal impunha obstá-
culos à inovação tecnológica, sendo ineficiente na alocação dos
recursos na economia e na promoção da redução do déficit fiscal.
Em síntese, constitui-se uma interpretação equivocada de que o
padrão de intervenção estatal anterior evitava a modernização e a
eficiência econômica9.

REVISÃO DO PAPEL DO ESTADO, PRIVATIZAÇÃO E EMPREGO NO


BRASIL
O processo de desestatização não se constitui uma novidade.
Na Alemanha Ocidental, com a vitória eleitoral de Konrad Adenauer,
em 1957, foi lançado o primeiro programa de desestatização do

25
segundo pós-guerra, visando liberalizar a atuação de grandes em-
presas que possuíam presença do Estado, como no caso da
Volkswagen que, em 1961, deixou de ter a participação no Estado
alemão (Megginson, 1994).
Depois da experiência alemã, somente no início dos anos
1980, através de Margareth Thatcher, na Inglaterra, é que voltou
a ocorrer um amplo processo de privatização do antigo setor
estatal e de fornecimentos de serviços públicos. A experiência
inglesa transformou-se no ícone dos programas liberais, pas-
sando a ser adotada em maior ou menor medida em vários paí-
ses capitalistas10.
Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, e o automático
processo de transição das economias planejadas (socialistas) para
a economia de mercado, notou-se não apenas a privatização do
setor produtivo estatal, mas a adoção do princípio de generalizada
desestatização das economias, com a ampla venda de empresas
públicas, conforme a situação nacional.
O caso da Alemanha Oriental foi emblemático, pois chegou a
transferir para o setor privado em formação mais de 10 mil empre-
sas públicas. Noutras economias como Polônia, Hungria e Rússia,
o desmonte estatal também ocorreu, ainda que em ritmo e ampli-
tude diferenciados11.
Nos países capitalistas não desenvolvidos, a ênfase da revisão
no papel do Estado também ocorreu. Entretanto, os processos de
privatização não foram os mesmos.
Na América Latina, por exemplo, alguns poucos países já re-
gistravam desde 1980 algumas experiências de desestatização, como
no caso do Chile e México. Mas foi a partir do Consenso de
Washington, ao final dos anos 1980, quando as teses liberais torna-
ram-se hegemônicas na região, que o programa ampliado de pri-
vatização do setor produtivo estatal e dos serviços públicos ga-
nhou grande importância. A transferência de parte significativa dos
ativos do setor público para a iniciativa privada seguiu, em alguma
medida, três objetivos básicos12.
O primeiro objetivo esteve associado à constituição de um
novo modelo econômico, em que o Estado tivesse um papel resi-
dual na atividade econômica. Dessa forma, caberia ao setor priva-

26
do exercer plenamente suas funções, sendo o carro-chefe da dinâ-
mica econômica, conduzindo o investimento ao estágio superior.
O segundo objetivo ganhou importância com o desenvolvi-
mento do papel do Estado na função de regulação da concorrência
privada, tendo ainda participação focalizada e reforçada nas áreas
sociais, como educação e saúde. Assim, a redução do tamanho do
Estado na economia ocorreu com a realização de reformas admi-
nistrativa, previdenciária e tributária, além de representar uma
reconfiguração do setor público.
Por fim, o terceiro objetivo representou parte de uma estraté-
gia mais geral de combate à inflação. Como o modelo de estabili-
zação monetária perseguido esteve vinculado à constituição de
uma âncora cambial, houve a imposição de taxas de juros elevadas
para atrair o ingresso e a manutenção, por tempo necessário, de
reservas em moedas fortes, geralmente em dólar norte-americano.
Mas isso terminou gerando não apenas o crescimento do en-
dividamento externo, como também a expansão das dívidas do
setor público. Por isso foi realizada em profusão a desmobilização
do setor produtivo estatal e dos serviços públicos, como forma de
gerar receitas necessárias para servir de abatimento de parcela do
endividamento público.
No Brasil, depois de um ciclo importante de expansão do setor
produtivo estatal, assistiu-se, com o esgotamento do modelo de in-
dustrialização nacional, à adoção de medidas de desestatização.
Durante os anos 1980, embora a desestatização não tivesse relevân-
cia na agenda pública, algumas empresas estatais foram privatizadas,
com a eliminação de postos de trabalho localizados, paralelamente
ao aumento do nível de emprego no conjunto do setor público
estatal. Entre 1979 e 1989, o volume de emprego estatal aumentou,
com a abertura de 229 mil novos postos de trabalho.
Nos anos 1980, o processo de privatização tratou, na maior parte,
de uma reprivatização de empresas que anteriormente já pertenciam
ao setor privado, mas que por estarem em situação de insolvência,
tinham sido previamente estatizadas com o objetivo de saneá-las e
devolvê-las a normalidade empresarial. Na realidade, cabia ao BNDESPAR
a realização de operação-hospital no setor privado ineficiente, garan-
tindo recurso público para seu saneamento.

27
Dessa forma, ao longo da década de 1980, um conjunto de
empresas ex-privadas foi reprivatizado. Durante o governo
Figueiredo, vinte empresas estatais foram transferidas ao setor pri-
vado, como aquelas vinculadas à Riocell Celulose e Fiação e Tece-
lagem Lutfala. Na segunda metade da década de 1980, no governo
Sarney, mais dezoito empresas estatais passaram ao setor privado.
Entre as empresas privatizadas, destacaram-se os casos da Aracruz
Celulose, Caraibas Metais, Usibra, Siderurgia Cinetal e Sibra13.
O processo de privatização no Brasil somente sofreu uma
mudança substancial a partir da aprovação do Programa Nacional
de Desestatização em 1990, com o governo Collor. A partir de
então, a desmobilização do setor público assume papel central na
agenda governamental, sendo instrumento-chave do processo de
ajuste fiscal.
Tabela 1 – Brasil: evolução das empresas privatizadas e do ajuste do
emprego no setor estatal entre 1979 e 1999

Receita em Transferência de Empregados


Empresas
Período milhões de dívida pública em formais
privatizadas
dólares milhões de dólares envolvidos*
1979/84 20 274 16 146.980
1985/89 18 549 620 82.125
Anos 80 38 823 636 229.105
1990/92 44 15.128 2.664 –198.136
1993/94 35 17.320 3.752 – 47.732
1995/99 84 42.008 11.660 – 300.120
Anos 90 166 74.456 18.076 – 545.988
Fonte: SEST, BNDES e MTE. Elaboração própria.
* Refere-se ao saldo líquido de empregos destruídos e criados no setor estatal resultante do efeito
do conjunto das empresas privatizadas, fechadas e incorporadas.

Com isso, o Estado deixou de ser responsável direto pelo de-


senvolvimento socioeconômico, afastando-se rapidamente da fun-
ção de produção de bens e serviços. Em contrapartida, o setor
privado passou a ser o principal centro promotor da dinâmica eco-
nômica nacional.
Em outras palavras, a privatização transformou-se em impera-
tivo do modelo econômico adotado em 1990, quando a geração de

28
receitas públicas adicionais tornou-se necessária para abater parte
do endividamento produzido por juros expressivos, como susten-
táculo da estabilidade monetária. Ao mesmo tempo, a aposta go-
vernamental na tese do tecnoglobalismo influenciou a decisão de
atrair empresas transnacionais com o objetivo de elevar o investi-
mento, sendo a privatização de importantes empresas estatais um
passo fundamental no curso do processo de desnacionalização eco-
nômica da década de 1990.
Acompanhando a evolução do processo de desestatização eco-
nômica pode-se observar uma divisão temporal importante no que
diz respeito ao perfil da privatização. Entre 1990 e 1994, a privatização
realizada concentrou-se no setor produtivo estatal, basicamente na
indústria de transformação (petroquímica, siderurgia, mineração e fer-
tilizantes), ocasionando a perda líquida de 246 mil postos de trabalho.
A partir de 1995, a privatização voltou-se mais para os serviços
públicos, como telecomunicações, energia, transportes, bancos, entre
outros. Os efeitos sobre o volume de emprego no setor público
foram negativos, com a geração de um saldo líquido de 300 mil
postos de trabalho destruídos entre 1995 e 1999.
Em síntese, os últimos dez anos voltados para a adoção de
programas de reformulação do papel do Estado no Brasil repercu-
tiram negativamente no volume de emprego referente ao conjunto
das atividades sob intervenção do setor público estatal, uma vez
que houve a diminuição de quase 546 mil postos diretos de traba-
lho. Como se pode observar, o processo de privatização, fecha-
mento, incorporação e ajuste das empresas estatais concentrou-se
fortemente sobre o nível de emprego.
Do saldo total negativo de 3,2 milhões de empregos assalaria-
dos formais destruídos na economia brasileira durante a década de
1990, 17,1% foi de responsabilidade direta da reformulação do
setor produtivo estatal. Ou seja, de cada cinco empregos perdidos,
nos anos 1990, um pertencia ao setor estatal.

Perfil das modificações no emprego a partir da privatização


Ao longo da década de 1990, a intensa modificação no interior
do setor estatal brasileiro implicou não apenas a acentuada redu-

29
ção do nível do emprego, mas também a alteração do perfil ocupa-
cional. Considerando-se o conjunto das empresas que conformam
o setor estatal, nota-se que em 1999 o volume de emprego encon-
trava-se abaixo do de 1979 em cerca de 300 mil postos de trabalho
e de 546 mil vagas em relação ao ano de 1989.
Através da revisão do papel do Estado e da privatização, vá-
rios setores estatais perderam sensivelmente empregos, ainda que
o setor privado tenha mantido uma parcela com vínculos formais.
A privatização não permitiu, após dez anos de revisão no papel do
Estado, compensar o esvaziamento das ocupações anteriormente
existentes no setor estatal.
Em síntese, a implementação de um novo modelo econômico,
sustentado no imperativo do enxugamento do papel do Estado e
na transferência de atividades produtivas estatais para o setor pri-
vado, implicou significativo ajuste do nível de emprego. Os traba-
lhadores do setor público foram transformados na principal variá-
vel de ajuste do Estado no Brasil nos anos 1990.

Gráfico 5 – Brasil: evolução do volume de emprego direto assalariado com


contrato formal nas atividades estatizadas e após a privatização,
1979-1999 (em mil)

1300
1 231
1200 1 202 1 1 88 1 205 1 21 8
1 1 49 1 1 55
1 1 39
1 1 20
1100 1 076
1111
1 075
1 059
1 045 1 034
1000 1 002 994 1 005
976
949 932
900 906
848 838
800 763
71 8 729
700 686
638
600
534
500 501

400
300
200 1 95 1 85
116 1 25
100 56 70 84
40
0 0 16

79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99
Emprego total Emprego estatal Emprego privado

Fonte: SEST; MTE (vários anos). Elaboração própria.

Não apenas o instrumento da demissão de empregados foi


intensamente utilizado no antigo setor produtivo estatal, mas tam-
bém destacou-se a adoção de medidas orientadas para a maior

30
intensificação do trabalho, através da implementação de novos
programas de gestão de mão-de-obra. A terceirização, a
subcontratação e a rotatividade constituíram os novos mecanismos
adotados para a redução salarial e a subordinação dos empregados
que restaram, com o objetivo de gerar lucros a qualquer custo
tanto no setor estatal como nas novas empresas privatizadas. So-
mente a taxa de rotatividade passou de 7,3%, em 1989, para 24,8%,
em 1999.
A redução de 43,9% no total do emprego do setor estatal du-
rante a década de 1990 não ocorreu de forma homogênea. Os
empregos masculinos foram os mais atingidos, quando compara-
dos com o emprego feminino. Por conseqüência, a queda na mas-
sa de rendimento do setor público, estimada em 34,5%, foi mais
estimulada pela diminuição nos rendimentos dos empregados mas-
culinos do que dos femininos.
Em relação à evolução do emprego por faixa etária, nota-se
que as demissões concentraram-se mais em determinados segmentos
ocupacionais. Os empregados mais jovens foram os mais atingidos
pelas medidas de enxugamento de pessoal, especialmente pelo
processo de privatização.
Entre 1989 e 1999, o emprego de jovem no setor estatal foi
reduzido em 73,4%. O segmento etário de 25 a 49 anos foi atingido
de maneira menos intensa, ainda que quase 39% dos empregados
tenham perdido emprego no setor estatal. Para os
empregados com mais de 49 anos, a queda no volume de postos
de trabalho foi de quase 46%.
Também em relação ao grau de instrução, prevaleceu o ajuste
do emprego estatal, com base na contenção dos empregados com
baixa escolaridade. Para aqueles com até o primeiro grau, o em-
prego foi diminuído em 72,3%, enquanto, para os empregados
com nível universitário, a perda na quantidade de postos de traba-
lho ficou abaixo de 10%.
Em outras palavras, a educação transformou-se no novo crité-
rio de exclusão do acesso ao emprego anteriormente pertencente
ao antigo setor estatal, ainda que a maior escolaridade não seja o
imperativo decorrente de modificações substanciais no conteúdo
do trabalho. A maior concorrência no interior do mercado de tra-

31
balho termina estimulando, muitas vezes, tanto a elevação dos re-
quisitos de contratação por parte dos empregadores quanto a ado-
ção do critério de corte de empregos.
Uma outra característica recentemente introduzida no padrão
de emprego do setor estatal após a sua privatização foi a incorpo-
ração dos mecanismos de grande instabilidade nos contratos de
trabalho. Conforme apresentado anteriormente, o uso da rotatividade
tornou-se uma constante.
Com isso, o princípio da demissão atingiu, em maior escala,
parte dos trabalhadores com maior tempo de serviço na
mesma empresa. Enquanto os empregados com até um ano
na mesma empresa foram reduzidos em quase 46%, os emprega-
dos com três a dez anos de casa tiveram cerca de 66% dos postos
de trabalho destruídos. Somente os empregados com mais de dez
anos de tempo de serviço na mesma empresa foram os menos
atingidos pelo fenômeno da demissão.
Os empregados situados nas maiores faixas salariais sofreram
menos com a revisão do papel do Estado. Entre 1989 e 1999, quase
um terço dos empregados com mais de vinte salários mínimos de
remuneração perderam seus postos de trabalho, enquanto quase a
metade dos trabalhadores que recebiam até três salários mínimos
foi demitida. O segmento ocupacional mais atingido foi aquele em
que os empregados recebiam entre três a sete salários mínimos
mensais, com dois terços das ocupações perdidas.
Cabe ressaltar ainda o peso das grandes empresas no movi-
mento de contenção do total do emprego estatal. Entre 1989 e
1999, quase 51% das ocupações das empresas com mais de 499
empregados foram eliminadas. As micro e pequenas empresas
foram as que menos demitiram. Para os anos 1990, as
empresas com 50 a 249 empregados eliminaram quase 30% do
total dos empregos.
Por fim, em relação à evolução dos ocupações profissionais,
observa-se a importância de algumas quando compara-se o saldo
líquido verificado entre a destruição e a criação de novas vagas. Ao
se considerar as dez principais ocupações profissionais destruídas
nos anos 1990 no setor estatal, encontra-se, em primeiro lugar, a
de auxiliar de escritório, seguida da de auxiliar de contabilidade,

32
de mestre na produção e serviços, de ferroviários e de instaladores
e reparadores de telecomunicações.
Quando o critério de sistematização dos empregos for as ocu-
pações profissionais que mais postos de trabalho criaram, nota-se
a importância de setores que não foram privatizados. A principal
ocupação profissional em evidência foi a de mensageiro e carteiro,
que teve, entre 1989 e 1999, o acréscimo de quase 7 mil novas
vagas.
Em seguida, ganharam maior importância as ocupações pro-
fissionais de agentes administrativos, de gerentes financeiros e co-
merciais, gerentes administrativos e agentes de vendas. Como não
poderia deixar de ser, as empresas privatizadas procuraram valori-
zar as ocupações voltadas para o controle de custos, planejamento
tributário, administração financeira e vendas.

Tabela 2 – Brasil: evolução das dez principais ocupações profissionais


destruídas e criadas no setor estatal entre 1989 e 1999

Ocupações destruídas Número Ocupações criadas Número

Auxiliar de escritório – 61.777 Carteiros e mensageiros 6.693


Auxiliar de contabilidade – 17.981 Agentes administrativos 5.095
Mestres na produção e Gerentes financeiros e
serviços – 16.132 comerciais 4.442
Ferroviários e maquinistas – 15.604 Gerentes
Instaladores e reparadores administrativos 2.013
de telecomunicações – 15.155 Agentes de vendas 1.398
Condutores de caminhões Analistas de ocupações 754
e ônibus – 12.573 Técnicos em tributação 541
Guarda de segurança – 10.692 Supervisores de vendas
Engenheiro elétrico – 7.528 Vendedores de atacado 405
Operadores de produção e varejo 255
de energia elétrica – 7.404 Técnicos de controle da
Torneiro – 6.478 produção 125
Subtotal – 171.324 Subtotal 21.721

Fonte: SEST, MTE, vários anos. Elaboração própria

33
PONTOS FRACOS DE UMA ESTRATÉGIA

Ao longo de todo o século XX, a década de 1990 ficou marcada


no Brasil como aquela que produziu o pior desempenho econômi-
co. Por registrar uma variação média anual de apenas 1,9% no
Produto Interno Bruto, inferior à registrada nos anos 1980, o país
deixou de ter o que comemorar. A estabilização monetária, embo-
ra muito significativa para uma economia que conviveu por 15
anos contínuos com um processo hiperinflacionário, não se mos-
trou suficiente, nem mesmo para compensar a medíocre situação
econômica mais geral, quanto mais o agravamento do quadro so-
cial, em que o desemprego e a violência urbana emergem como
fenômenos de difícil enfrentamento. Conforme será possível ob-
servar adiante, nem mesmo o processo de concentração de renda
foi revertido.
A mudança no modelo econômico a partir de 1990 foi o grande
imperativo do processo de revisão do papel do Estado, especial-
mente com a adoção da privatização. O desmonte do setor estatal
foi alardeado como um dos principais passos para que o país pudes-
se alcançar uma situação superior à verificada na década de 1980.
Decorridos dez anos de revisão do papel do Estado, o Brasil
permanece prisioneiro do processo de financeirização da riqueza,
amargando a ausência de crescimento econômico sustentado. Por
conta disso, a dimensão dos problemas sociais cresce, empurran-
do o país, cada vez mais, para uma situação de esgarçamento do
tecido social sem expressão histórica anterior.
Até agora, o setor privado, diante da retirada do Estado do
setor produtivo, segue incapaz de promover o desenvolvimento
socioeconômico necessário e urgente. Mesmo com o ingresso de
grandes somas de recursos internacionais, responsáveis, em parte,
pela própria desnacionalização do setor produtivo estatal, não houve
a fundamentação de uma sólida base de produção.
Em 1999, cerca de 32,8% da totalidade dos serviços públicos
estavam concentrados no Estado, enquanto em 1989 eram 100%. A
participação do setor privado aumentou significativamente, tendo
especial atenção as empresas privadas estrangeiras, com 42% do
total das vendas realizadas nos serviços públicos.

34
Gráfico 6 – Brasil: participação relativa do Estado em setores de atividade
econômica selecionados antes e depois da privatização, 1989 e 1999
(em % das vendas)

Fonte: SEST, revista Exame, vários anos. Elaboração própria.

No setor financeiro, a participação do Estado caiu de 58,9%


para 35,6%. A participação relativa do setor privado estrangeiro
aumentou, em contrapartida, de 6% para 29,6%.
A ampliação da presença do setor privado no comando da
economia brasileira durante os anos 1990 veio acompanhada da
explosão do desemprego. Em grande medida, o processo de revi-
são do papel do Estado, estimulado pela privatização do setor
estatal, contribuiu para a explosão das demissões nas empresas
públicas, sem a necessária contrapartida da geração de novas va-
gas no setor privado.
O déficit no emprego ocorrido nas atividades econômicas ocu-
padas anteriormente pelo Estado foi de mais de meio milhão de
postos de trabalho nos anos 1990. Assim, quase 20% dos 3,2 mi-
lhões de empregos assalariados com contrato de trabalho destruídos
nos últimos dez anos foram de responsabilidade do processo de
revisão do papel do Estado no Brasil.
Em conformidade com as informações do BNDES, o processo de
privatização realizado no Brasil durante os anos 1990 foi responsá-
vel pela geração de receita pública adicional próxima de 74,5 bi-
lhões de dólares e de transferência de 18,1 bilhões de reais de

35
dívida que era do setor público para o setor privado14. Adicionan-
do-se ainda a elevação na carga tributária bruta ocorrida na década
de 1990, encontram-se evidências de maior receita ao Estado, sem
contrapartida na elevação no gasto social.
Aliás, deve-se destacar que um dos principais argumentos uti-
lizados pelos defensores da revisão do papel do Estado, com trans-
ferência do patrimônio estatal para o setor privado, era a centrali-
zação e o adicional dos gastos nas áreas sociais. Contudo, sem a
comprovação dos argumentos favoráveis à privatização inicialmente
utilizados, nota-se agora que foi a transferência de receita pública
para o setor financeiro, em atendimento do pagamento dos servi-
ços do endividamento, o real motivo da privatização. Até agora, os
procedimentos adotados para a privatização do setor público per-
seguem o ajuste fiscal, que se mostra de caráter permanente, en-
quanto a sustentação da estabilidade monetária continuar depen-
dendo de altas taxas de juros e, com isso, do endividamento do
setor público.

Gráfico 7 – Brasil: evolução dos índices de endividamento público, do


emprego no setor estatal e da carga tributária nacional, 1980-1999
(1989=100,0)

130

110

90

70

50
1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999

Carga Tributária Emprego no setor estatal Endividamento público Investimento

Fonte: SEST, MTE, Bacen. Elaboração própria.

36
Por fim, não se pode esquecer que para um país de graves
desigualdades regionais e sociais, o predomínio do acesso aos ser-
viços básicos a partir da iniciativa privada termina por potencializar
ainda mais as diferenças. Como norma de funcionamento do setor
privado, bens e serviços são fornecidos toda vez que houver capa-
cidade aquisitiva suficiente para cobrir custos e margens de lucros.
Em outras palavras, regiões geográficas menos desenvolvidas e
parcelas mais pobres da população correm o sério risco de ficar
desprestigiadas em investimentos e fornecimento de bens e servi-
ços toda vez que não apresentarem suficiente capacidade aquisiti-
va. Com isso, a desigualdade regional, social e econômica tende a
aumentar ainda mais. A respeito da evolução da questão regional
no Brasil ver o seu aprofundamento adiante.

NOTAS:
1 Para avaliar a situação do emprego organizou-se um grande conjunto de
informações sobre o setor público, a partir das seguintes fontes de dados: a)
Cadastro das Empresas Estatais do Ministério do Planejamento, através da
Secretaria de Controle de Empresas Estatais (SEST); b) Relação de Informações
Sociais e Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, ambos do Minis-
tério do Trabalho e Emprego; c) Banco Nacional de Desenvolvimento Econô-
mico e Social (BNDES). Ao todo foram 490 empresas e autarquias analisadas
pelo estudo, divididas em três ramos de atividades econômicas: setor produ-
tivo estatal, setor financeiro e atividades fins de governo na administração
indireta. Deve-se agradecer especialmente a disponibilização de dados por
parte do Ministério do Trabalho e Emprego e a sistematização das informa-
ções realizada pela Datamec. Ao mesmo tempo, Thiago Ribeiro contribui
favoravelmente na produção de uma síntese indispensável do conjunto dos
dados, enquanto a professora Sônia Tomazine estimulou a discussão e a pes-
quisa sobre o emprego estatal.
2 A literatura que trata do papel do Estado no capitalismo monopolista pode ser
encontrada em: Poulantzas, 1978; Mello, 1977.
3 Sobre a ação estatal, ver: Myrdall, 1962; Aglietta, 1979; Shonfield, 1968; Galbraith,
1968.
4 Sobre as transformações do Estado nacional, ver: Altvater, 1995; Kurz, 1995;
Fiori, 1999; O’Connor, 1977.
5 Ver especialmente: Hayek, 1983; Friedman, 1982; Crozier, 1987.
6 Sobre a experiência estatal brasileira, ver: Salama e Mathias, 1983; Reichstul e
Coutinho, 1983; Braga, 1983.

37
7 Sobre a presença do Estado através da empresas públicas, ver: Martone, 1984;
Palatnik, 1979.
8 Pode-se constatar que a partir da segunda metade dos anos 1970 houve uma
campanha contra a estatização promovida durante o governo militar. Inicial-
mente, ocorreu, em 1974, a eleição, pela revista Visão, de Eugênio Gudim – o
pai do atual neoliberalismo, – como Homem do Ano, enquanto, em 1975,
o jornal O Estado de S. Paulo publicou uma série de reportagens sobre os
caminhos da estatização. Depois disso, desencadeia-se uma campanha conti-
da contra a estatização movida por empresários. Mais tarde, estudiosos cons-
tataram que não se tratava da defesa de uma economia com menos interven-
ção, mas a pressão por participação nas decisões econômicas governamen-
tais, especialmente no caso do Conselho de Desenvolvimento Econômico,
que era somente formado pelo Presidente da República e ministros. Ver:
Ressanha, 1981.
9 Sobre as críticas ao Estado, ver: World Bank, 1997; Pollitt, 1996; Williamson,
1990.
10 A respeito do processo de privatização nas economias avançadas ver: Kikeri
et alli, 1992; Boubakri e Cosset, 1998; Megginson et alli, 1994; World Bank,
1996; Nestor e Mahboobi, 2000.
11 Sobre o processo de privatização nas economias em transição, ver: Nivet,
1997; Bolton e Roland, 1992; Dlouhu e Mládek, 1994; World Bank, 1996;
Borish e Noël, 1997.
12 Na América Latina, a literatura especializada pode ser encontrada em: Carnei-
ro e Rocha, 2000; Stiglitz, 1998; World Bank, 1993; Baer, 1994; Pinheiro e
Schneider, 1995.
13 Para melhor análise do processo de privatização brasileiro nos anos 1980, ver:
Pinheiro e Landau, 1995; World Bank, 1989; Werneck, 1987; Resende, 1980;
BNDES, 1992.
14 Esses valores não levam em consideração os gastos realizados no processo de
privatização, nem tampouco referem-se à receita recebida, pois uma grande
parte das empresas privatizadas foi financiada, enquanto outras receberam
como pagamento moedas podres, ou seja, sem valor de mercado. De acordo
com Biondi, um valor superior à receita gerada pela privatização foi gasto
com a preparação das empresas para a privatização, perdas de lucros e de
imposto de renda, subsídios de juros aos empréstimos para a privatização,
entre outros. Sobre isso ver mais em: Biondi, 1999 e 2000.

38
Abertura comercial, internacionalização
da economia e ocupação

Um segundo mito foi constituído através da adoção das políti-


cas neoliberais no Brasil, quando grande parte da população foi
levada a acreditar que a abertura comercial e a internacionalização
da economia seriam capazes de modernizar o parque produtivo,
bem como gerar mais e melhores postos de trabalho. Percebe-se
que durante a última década do século XX, a economia brasileira
foi fortemente atingida pelo movimento de internacionalização do
seu parque produtivo. Em grande medida, constituiu-se um novo
modelo econômico, fundado numa estratégia distinta de inserção
na economia mundial, a partir da atração de parte da liquidez
internacional, com ingresso de recursos estrangeiros responsáveis
pela ainda maior desnacionalização do parque produtivo no país.
Ao ter adotado o programa de liberalização produtiva, finan-
ceira, comercial e tecnológica, o país terminou expondo à compe-
tição internacional quase todo o sistema produtivo, sem paralelo
desde 1930. Os resultados foram, na maior parte das vezes, nega-
tivos para o conjunto do país, o que permitiu expor mais um mito
do neoliberalismo no Brasil.
De um lado, o país ampliou ainda mais o seu grau de
vulnerabilidade externa, diante da crescente dependência financei-
ra, produtiva, comercial e tecnológica, sem conseguir instalar um
novo estágio de desenvolvimento econômico sustentado. Depois da
década perdida, evidenciada nos anos 1980, assistiu-se, na década
de 1990, à consagração de um desempenho econômico ainda pior.
De outro lado, a liberalização econômica, financeira, produtiva
e tecnológica frustrou as expectativas quanto à evolução ocupacio-

39
nal. Decorridos dez anos de predomínio das medidas voltadas para
a liberalização comercial observa-se um saldo negativo no conjunto
das ocupações, considerando-se o decréscimo no nível de emprego
nos setores econômicos em que houve a ampliação da presença
tanto do capital externo quanto de produtos e serviços importados.
Na maior parte das vezes, os recursos provenientes do exterior
concentraram-se nas oportunidades especulativas oferecidas pela
própria condução da política macroeconômica, através da prática
de elevadas taxas de juros. Além disso, uma outra parte do capital
estrangeiro foi constituída de investimentos diretos.
Os investimentos diretos do exterior participaram tanto do pro-
cesso de privatização do setor produtivo estatal e dos serviços
públicos quanto da aquisição de patrimônio privado nacional. Ao
mesmo tempo, novas empresas financeiras e não financeiras se
instalaram no país, reforçando o caminho das transferências de
recursos ao exterior, especialmente nos setores de serviços, inca-
pacitados de gerar excedentes comerciais.
Por conta disso, o novo ciclo de internacionalização da econo-
mia trouxe, ao seu modo, implicações não desprezíveis para os
trabalhadores. Aqui, no entanto, procura-se analisar tão-somente a
situação do emprego industrial, uma vez que os dados existentes
são mais efetivos nesse segmento ocupacional. Inicialmente, trata-
se de apresentar as principais atualidades do contexto do comér-
cio mundial, para, em seguida, discutir a nova inserção econômica
brasileira. Por fim, analisa-se o quadro ocupacional que restou no
setor industrial decorrente, em parte, do processo de internacio-
nalização da economia brasileira.

ATUALIDADES DO SISTEMA MUNDIAL DE COMÉRCIO


Nas duas últimas décadas do século XX, o comércio internacional
registrou alterações significativas. Dois foram os principais vetores
responsáveis pelas modificações no sistema mundial de comércio.
O primeiro vetor encontra-se associado à constituição de novas
instituições mais presentes na dinâmica do comércio internacional.
O surgimento da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1993,
como resultado da realização das rodadas de discussões promovidas

40
desde 1986, no âmbito do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio
(GATT), proporcionou novidades ainda não constatadas desde as pri-
meiras tentativas de regulação do comércio internacional, ao final da
Segunda Guerra Mundial (Gonçalves, 2000; Rêgo, 1996).
Embora a OMC não deva ser confundida com uma instituição livre-
cambista, ela apresenta sinais, cada vez maiores, direcionados a pro-
mover a concorrência aberta num mundo marcado por elevadas desi-
gualdades produtivas, tecnológicas, trabalhistas e financeiras. Não causa
espanto, portanto, reconhecer que os países pobres tornam-se quase
irrelevantes no conjunto dos processos de negociações multilaterais,
ao passo que a OMC terminou aproximando-se mais dos interesses das
economias desenvolvidas e das grandes empresas estrangeiras.
Além da novidade no campo multilateral, com a criação da
OMC, também ganharam maior importância os acordos plurilaterais,
como no caso da União Européia, Nafta e Mercosul. Mais recente-
mente, as idéias voltadas para a constituição da Área de Livre Co-
mércio das Américas (Alca) no continente americano passaram a
ter maior centralidade nas agendas dos governos.
O exemplo mais avançado de acordo plurilateral tem sido, até o
momento, o da União Européia, que além da constituição de políti-
cas supranacionais consensadas, vem implementando um sistema
monetário regional. No que diz respeito ao Mercosul e ao Nafta, que
são experiências bem mais recentes que a União Européia, observa-
se, fundamentalmente, que o fluxo de comércio supranacional assu-
me o principal sustentáculo dos acordos plurilaterais.
Dessa forma, a queda das barreiras comerciais entre países esti-
mula o comércio supranacional, sem levar, entretanto, ao desenca-
deamento de um novo padrão de desenvolvimento econômico, espe-
cialmente em relação ao Mercosul. A proposta de criação da Alca
parece avançar no mesmo sentido, o que facilita ainda mais as nações
desenvolvidas.
O segundo vetor responsável pelas principais modificações re-
centes no sistema de comércio mundial refere-se à introdução de uma
nova agenda temática na dinâmica das negociações entre países. Di-
ante do predomínio do receituário neoliberal, houve grande conver-
gência na retórica diplomática favorável à liberalização dos mercados,
especialmente no âmbito comercial, financeiro, produtivo e tecnológico.

41
Nos mais diversos fóruns internacionais em que atuam as agên-
cias multilaterais como Banco Mundial, Fundo Monetário Interna-
cional e Organização Mundial do Comércio, a defesa da liberdade
dos mercados foi defendida não apenas nos discursos, mas pelos
programas de ajuda financeira e de cooperação técnica e comer-
cial. As posições pró-mercado somente não foram uníssonas no
plano internacional devido à posição da Organização Internacio-
nal do Trabalho, que se manteve, apesar das pressões em contrá-
rio, chamando a atenção para as especificidades da situação do
trabalho no mundo.
Na maior parte das vezes, a ênfase na eliminação das barreiras
nacionais visava, sobretudo, desobstaculizar as resistências à livre
circulação do capital. O mesmo não correu em relação ao trabalho.
Em geral, as barreiras montadas à circulação do trabalho per-
maneceram ou foram ainda mais fortalecidas. Dessa forma, perce-
be-se a manifestação concreta da globalização, consagrada especi-
almente ao capital, nas suas mais diversas faces.
Além disso, outros temas também repercutiram de forma im-
portante no interior da discussão sobre a regulação do comércio
internacional, como as discussões sobre a implementação de cláu-
sulas sociais nos critérios de normatização comercial.
A adoção de uma carta social regulando o comércio social-
mente injusto poderia constituir uma forma de o mundo pressio-
nar pelo fim de formas pretéritas de trabalho, como trabalho com-
pulsório, trabalho do menor, baixos salários, entre outros. Mas isso
foi discutido, no entanto, sem avançar. Alguns países, especial-
mente os mais pobres, argumentam que a introdução de cláusulas
dessa natureza poderia contribuir ainda mais para a marginalização
das economias não desenvolvidas.
Também teve destaque a discussão em torno da implementação
de selos de proteção ambiental nos produtos e serviços
comercializados. Seria essa uma nova oportunidade de controle e
até redução do comércio prejudicial ao meio ambiente. Essa discus-
são também não andou muito. A não ser a pressão direta das ONGS,
especialmente através de fóruns mundiais e ações concretas em ca-
sos específicos, o comércio mundial segue economicamente perver-
so, socialmente injusto e destrutivo ao meio ambiente.

42
A NOVA INSERÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL
O Brasil completou dez anos de vigência de um novo modelo
econômico que se tem pautado pela desregulamentação comercial
e financeira, reformulação do papel do Estado e desregulação do
mercado de trabalho. Na toada do programa liberal, sucessivos go-
vernos brasileiros implementaram, após 1990, diversas medidas que
deixaram de diferenciar o mercado interno do externo, com intuito
de promover a inserção competitiva, combinada com a intenção de
modernização produtiva e de diminuição da desigualdade social.
Ao procurar internalizar os pressupostos de um novo modelo
econômico, o Brasil alterou radicalmente a sua inserção na econo-
mia mundial. Assim, procurou estimular a liberalização comercial e
financeira, acompanhado de medidas favoráveis ao ingresso de
maior quantidade de recursos estrangeiros, bem como da
internacionalização do sistema produtivo1.
A desregulamentação da economia foi responsável pela am-
pliação das oportunidades de se estabelecer no Brasil uma nova
forma de inserção internacional. Da posição de terceiro maior ge-
rador de excedentes comerciais do mundo – alcançada nos anos
1980 – abaixo apenas do Japão e da Alemanha, o Brasil transfor-
mou-se, imediatamente após a adoção do Plano Real, numa eco-
nomia deficitária nas trocas de bens.
O eixo do conjunto das reformas implementadas durante os
anos 1990 esteve comprometido com a integração do Brasil à eco-
nomia internacional. Para isso, a estabilidade monetária assumiu
grande relevância, pois sem a volta da presença da função da moeda
como unidade de conta, as grandes empresas transnacionais não
teriam como avaliar precisamente o desempenho econômico, a
rentabilidade e os custos de produção e serviços.
Assim, o país que convivia com alta inflação por quase quinze
anos adotou um programa de estabilização ancorado na moeda
norte-americana, permitindo que o mercado interno internaciona-
lizasse seus custos e preços a partir de 1994. Ao mesmo tempo, o
combate à inflação foi acompanhado da maior abertura comercial
e financeira, diante de altas taxas de juros e câmbio valorizado
(Souza e Triches, 1993).

43
A drástica redução das tarifas alfandegárias favoreceu a am-
pliação da oferta de produtos importados, sem a contrapartida da
expansão dos bens e serviços exportados. Como conseqüência, o
Brasil passou de uma posição de superávit para a de déficit no
Balanço Comercial.
Desde 1995 o país vem acumulando déficits comerciais, en-
quanto entre 1983 e 1994 registrou superávits comerciais. Entre
1983 e 1994, por exemplo, o país registrou saldo comercial médio
anual 12,3 bilhões de dólares norte-americanos, que equivaleu a
3% do Produto Interno Bruto.
Apesar de todo o esforço comercial na construção de
megassuperávits na conta de comércio externo, o país não gerou
receitas suficientes para fazer frente ao déficit na conta de serviços
do Balanço de Pagamentos. Entre 1983 e 1994, foram 4,1% do PIB
transferidos anualmente para o exterior, como pagamento dos ser-
viços do endividamento externo.
A diferença entre as receitas provenientes da conta de comér-
cio externo e as despesas com a conta de serviços do Balanço de
Pagamento foi coberta pelo adicional endividamento externo que
aumentou em 54,7 bilhões de dólares. Entre 1983 e 1994, o endivi-
damento externo brasileiro cresceu de 93,6 bilhões de dólares para
148,3 bilhões de dólares.
Já entre os anos de 1995 e 1999, o déficit comercial médio
anual foi de 5 bilhões de dólares, enquanto a conta de serviços
passou a ser, como média anual, de 23,3 bilhões de dólares.
Apenas para comparação, entre 1983 e 1994 era de 13,9 bilhões
de dólares.
Dessa forma, a somatória dos déficits comercial e de serviços
alcançou 28,3 bilhões de dólares a cada ano, em média. Para o
financiamento dessa quantia, o endividamento, mais uma vez, foi
utilizado, resultando na sua ampliação de 148,3 bilhões, em 1994,
para 236,9 bilhões, em 1999. Ou seja, uma elevação, em cinco
anos, de 88,6 bilhões de dólares.
Como se pode notar, o financiamento do déficit comercial,
bem como da conta de serviços do Balanço de Pagamentos, ocor-
reu, basicamente, de duas formas. A primeira esteve associada ao
maior endividamento externo. Não apenas o setor público endivi-

44
Gráfico 8 – Brasil: Dívida externa, Investimento Direto Externo e déficit
em transações correntes, 1989 a 1999 (em bilhões de dólares)
300 0

-5

(Déficit em transações correntes)


250
(Dívida Externa e IDE

-10
200
-15

150 -20

-25
100
-30
50
-35

0 -40
1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999

Dívida externa Investimento Externo Déficit em transações correntes

Fonte: Bacen.

dou-se no exterior, como também o setor privado tornou-se im-


portante tomador de crédito externo. A combinação resultante entre
o maior endividamento externo, com a conseqüente ampliação
dos serviços de pagamentos externos a cada ano, e o déficit no
balanço comercial foi a maior dependência do financiamento ex-
terno. Enquanto houver o ciclo de crédito externo, a crise de um
novo endividamento não se deve manifestar, porém são armadas
as condições para que isso ocorra sem precedentes anteriores.
A segunda forma de financiamento resultou dos investimentos
externos. Inicialmente, a atração de recursos voluntários estrangeiros
dependeu de taxas de juros reais elevadas. Paralelamente, a abertura
da privatização aos capitais estrangeiros possibilitou fundar os inves-
timentos na compra de patrimônio nacional (público e privado).
Em diversos setores de atividade econômica houve, em con-
trapartida, a elevação no grau de internacionalização da produção.
Com a maior presença de empresas estrangeiras, determinados
setores passaram a ser controlados por capitais externos, como no
caso da indústria de alimentos, automobilísticos, informática, far-
mácia, higiene, limpeza, plástico, borracha, entre outros (Gonçal-
ves, 1999; Moreira, 1999).
Durante os anos 1990, após o recesso do ingresso voluntário de
recursos externos ocorrido na década de 1980, assistiu-se à presença
crescente dos investimento diretos do exterior. Comparando a parti-

45
cipação do Brasil no fluxo total de investimentos diretos mundiais,
nota-se que nos anos 1990, o país recebeu, em média, cerca de
2,9%, enquanto nos anos 1980 recebeu menos de 2%. Na década
de 1970, em pleno auge dos investimentos externos, o Brasil absor-
veu, em média, 7,5% do total dos recursos internacionais.
Gráfico 9 – Brasil: balança comercial e tarifa alfandegária média
(1989 a 1999)
20 45
40
15
35

10 30
(bi US$)

25

(%)
5
20
0 15
1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999
10
-5
5

-10 0

Balanço Comercial Tarifa Alfandegária


Fonte: Bacen.

Paralelamente à elevação dos investimentos diretos externos no


país, ocorreu a queda das tarifas aduaneiras. Em 1999, a média das
tarifas alfandegárias eram de 11,8%, enquanto em 1989 eram de 41,2%.
Diante da rápida queda na proteção à produção nacional, ocor-
reu uma acentuada elevação no coeficiente de penetração (impor-
tação sobre produção), que aumentou de 4,4% para 8,8%, enquan-
to o coeficiente de abertura (exportação sobre produção) passou
de 8,3% para 8,6%. Sem dúvida, a presença das importações foi
predominante nos anos 1990, especialmente após a implementa-
ção do Plano Real.
A adoção da desregulamentação comercial como um fim em si
mesmo, ou seja, como instrumento de ampliação da oferta de pro-
dutos importados e, por conseqüência, de combate à inflação, trouxe
sérios problemas. A economia brasileira, de um lado, perdeu a
oportunidade de usar a política comercial como estímulo as expor-
tações e de incorporação de novas tecnologias. Por conta disso, a
participação brasileira nas exportações mundiais de produtos ma-

46
Gráfico 10 – Brasil: participação na exportação mundial de produtos
primários e manufaturados, 1989 a 1999 (em %)

Fonte: WTO, Bacen.

nufaturados regrediu, enquanto o peso nas exportações de produ-


tos primários foi elevado. Guardada a devida proporção, os anos
1990 representaram a volta da dinâmica comercial próxima da
verificada no Brasil até 1930, quando exportava bens de baixo
valor agregado e pequeno conteúdo tecnológico e importava bens
de maior valor agregado e coeficiente tecnológico.
De outro lado, a abertura comercial drástica e desacompanhada
de políticas industriais e agrícolas adequadas levou à desarticulação
de algumas cadeias produtivas, provocando a substituição de pro-
dutos nacionais por importados, o que aumentou ainda mais a de-
pendência externa do país. Com a presença de medidas governa-
mentais voltadas para a valorização cambial, as exportações
encontraram uma barreira adicional, sem falar no estímulo acrescido
às importações de bens e serviços e gastos com serviços no exterior.
Diante disso, não causa surpresa constatar que o país tem
regredido a sua situação econômica em relação às principais na-
ções desenvolvidas. Bem ao contrário do que ocorreu entre 1930 e
1980, quando houve elevação da renda por habitante brasileiro em
relação à nos Estados Unidos, por exemplo. Somente a partir dos
anos 1980 o Brasil sofreu uma reversão na situação socioeconômi-
ca. Com a adoção das políticas macroeconômicas liberais nos anos
1990, aprofundou-se a regressão na renda per capita do brasileiro
em relação à do norte-americano.

47
Gráfico 11 – Brasil: índice de evolução do PIB per capita em relação ao PIB
per capita dos EUA, 1890 a 1999 (1890=100)

Fonte: FIBGE, OCDE e BIRD . Elaboração própria.

OS EFEITOS SOBRE O EMPREGO INDUSTRIAL

Conjuntamente com a implantação das reformas neoliberais


no Brasil, os efeitos de regressão socieconômica foram se manifes-
tando. Inicialmente, constatou-se a presença de sinais de
desestruturação do mercado de trabalho.
Em outras palavras, o aparecimento de elevado desemprego
aberto, o dasassalarimento e a geração de postos de trabalho pre-
cários. Entre 1989 e 1999, a quantidade de desempregados am-
pliou-se de 1,8 milhão para 7,6 milhões, com aumento da taxa de
desemprego aberto passando de 3,0% da População Economica-
mente Ativa para 9,6%.
Da mesma forma, houve também uma redução do emprego
assalariado no total da ocupação. Em 1989, 64% do total da ocupa-
ção brasileira era de assalariados e, em 1999, passou para 58,7%.
Somente no mercado formal de trabalho, 3,2 milhões de trabalha-
dores assalariados perderam o emprego, sendo 2 milhões perten-
centes ao setor industrial.
Por fim, os postos de trabalhos gerados caracterizam-se por ser,
em sua grande maioria, precários. Nos anos 1990, a cada cinco ocu-
pações criadas, quatro referem-se ao conjunto de trabalhadores au-
tônomos, sem remuneração e assalariados sem registro formal.

48
Gráfico 12 – Brasil: Evolução dos índices de emprego, da produção e da
importação na indústria de transformação 1985 - 1999

Fonte: FIBGE - PIM; MICT; Bacen (dezembro de 1985 = 100,0).

Mas, considerando-se exclusivamente o movimento de libe-


ralização comercial e de internacionalização da economia brasilei-
ra nos anos 1990, podem-se perceber seus efeitos negativos sobre
o trabalho. Em relação ao emprego formal no setor industrial, nota-
se que entre 1990 e 1998, ocorreram cerca de 1,2 milhão de demis-
sões influenciadas pela ampliação do grau de exposição externa
do parque produtivo nacional.
Ao relacionar a evolução do emprego industrial (PIM-FIBGE) com
o coeficiente de penetração da indústria de transformação observa-se
a presença de evidências inegáveis de variações negativas para a ocu-
pação. A ampliação de produtos importados, sem grande elevação da
produção doméstica, indicou não apenas o efeito decorrente da subs-
tituição de produtos nacionais por importados, como, por conseqüên-
cia, a exportação de empregos de brasileiros para o exterior2.
A reversão da tendência de país superavitário no comércio externo
para a de deficitário implicou a redução das possibilidades de amplia-
ção de emprego. A mudança no mix de produção das empresas que
operam no Brasil, passando a depender, cada vez mais, de produtos
importados, retirou parte do potencial de criação de empregos do país.
No passado, aumentar a produção indicou geralmente a eleva-
ção da ocupação. Nos anos 1990, isso não mais significou necessa-
riamente a mesma coisa. A recuperação no nível de atividade eco-
nômica ocorrida entre 1993 e 1997 se deu sem ampliação do

49
Gráfico 13 – EUA: Evolução dos índices de emprego e da importação no
setor industrial (1980 - 1999)

Fonte: OCDE e BLS (1980=100,0)

emprego industrial, fato não identificado desde 1930. Atualmente,


produzir mais pode implicar elevação de produtos importados,
muito mais que o emprego de brasileiros.
No mesmo sentido, as empresas estrangeiras adotaram diver-
sos programas de redução de mão-de-obra, a partir de inovações
na gestão do trabalho, terceirização, subcontratação, entre outros.
Tudo isso mostrou ser negativo ao emprego.
Essa situação está relacionada ao modelo econômico adotado
no Brasil a partir dos anos 1990. Nos Estados Unidos, que também
passaram pelo programa neoliberal durante a década de 1980, ocor-
reu uma redução sensível do emprego industrial, comparativamente
à elevação das importações.
Na década de 1990, com o abandono da experiência neoliberal
e a adoção de políticas comerciais defensivas e de políticas industri-
ais ativas, os Estados Unidos voltaram a recuperar o emprego indus-
trial perdido. O exemplo dos Estados Unidos indica que, guardada a
devida proporção, é possível recuperar o tempo perdido no Brasil.

NOTAS:
1 Sobre a nova inserção econômica brasileira ver: Lacerda, 1999; Gonçalves,
2000; Correa e Moreira, 1996.
2 Números distintos podem ser encontrados em: Barros, 1996; Moreira e Najberg,
1997; Amadeo e Szkurnek, 1997.

50
As possibilidades da “nova economia” e
seus efeitos no trabalho no Brasil

Como terceiro mito gerado pelo neoliberalismo no Brasil tem-


se a construção simbólica de que o surgimento de uma “nova
economia” levaria à modernização tecnológica nacional, capaz de
garantir ampla geração de empregos novos e de alta qualidade.
Esse foi mais um grande engano, diante da redução dos empregos
de qualidade e ampliação dos postos de trabalho precários. Hoje
em dia, o Brasil é campeão da ocupação doméstica, enquanto
engenheiros, físicos e analistas de sistemas, entre outros, dirigem
táxis ou exercem atividades subocupadas que quase nada tem a
ver com a formação profissional que previamente tiveram.
Na maior parte das vezes, o modismo rasteiro que predomina
no debate socioeconômico do final do século XX, adota-se freqüente-
mente o termo “nova economia” como forma de evidenciar o
desencadeamento de um novo ciclo de acumulação de capital, não
mais sustentado pelos tradicionais fundamentos da economia que
predominaram durante os últimos cem anos. Por conta disso, o uso
do trabalho estaria sendo rapidamente transformado, dando lugar a
um novo tipo de trabalhador, mais qualificado e identificado com o
conjunto do processo produtivo. São muitos os argumentos que
procuram sustentar essa premissa, predominante nos discursos tan-
to dos agentes das aplicações especulativas (mercado financeiro)
quanto dos funcionários de governos e de instituições multilaterais
internacionais. Descolados, muitas vezes, de estudos empíricos con-
sistentes e nem sempre bem embasados teoricamente, os vários ar-
gumentos tornam-se vazios e despropositados.

51
Devido a isso, tem-se por objetivo aqui contrapor-se, em par-
te, ao conjunto de proposições que predominam no debate atual
sobre as perspectivas da economia capitalista e do trabalho. Pre-
tende-se inicialmente reorganizar o debate sobre os momentos de
radicais transformações nas economias de mercado. A partir disso,
busca-se evidenciar os fundamentos da chamada “nova economia”,
através da adoção de uma metodologia produzida para isolar o
setor industrial de tecnologia de informação e comunicação. Con-
fere-se especial atenção à evolução do emprego em países desen-
volvidos, como forma de observar a presença ou não de postos de
trabalho identificados com a chamada “nova economia”. A seguir,
procura-se afunilar a discussão sobre as evidências da “nova eco-
nomia” no Brasil, bem como seus principais efeitos no mercado de
trabalho, com base no balanço das ocupação em alta nos últimos
dez anos. O estudo é finalizado com uma breve discussão a respei-
to das possíveis razões que ajudam a explicar o insucesso brasilei-
ro nos anos 1990, que se transformou no terceiro mito do
neoliberalismo1.

O DEBATE SOBRE AS RADICAIS TRANSFORMAÇÕES ECONÔMICAS

A capacidade de constante mudança no processo produtivo


constitui uma das principais características intrínsecas ao desenvol-
vimento capitalista. Não sem motivo, o avanço da fronteira tecno-
lógica transforma-se recorrentemente na forma de potencializar o
processo de acumulação de capital e de eliminação dos concor-
rentes (Braudel, 1984; Marx, 1980; Schumpeter, 1982).
Embora a presença da inovação técnica seja uma constante ao
longo do desenvolvimento econômico, nota-se que, em determi-
nados momentos históricos, há uma verdadeira concentração de
modificações tecnológicas (clusters), com capacidade de alterar
radicalmente não apenas o processo produtivo, mas também a
conformação de toda uma sociedade. Além de modificar a base
técnica responsável pela dinâmica do ciclo de acumulação de ca-
pital, constata-se também que a rápida difusão de uma nova onda
de inovação termina por contaminar os mais distintos processos de
produção e de trabalho, a partir da explosão dos lucros, dos ganhos

52
de produtividade e da queda dos preços, especialmente nos seg-
mentos modernos e mais dinâmicos.
Em relação aos dois últimos séculos, podem ser identificados,
pelo menos, duas grandes ondas de profundas inovações, mais
conhecidas por Revolução Tecnológica. A Primeira Revolução Tec-
nológica, transcorrida entre 1760 e 1830, e a Segunda Revolução
Tecnológica, realizada entre 1870 e 1910, foram marcas constitutivas
da profunda modificação nas bases técnica e material do capitalis-
mo contemporâneo, capaz de assegurar novos ciclos de acumula-
ção de capital.
Primeira onda de inovação
O processo de industrialização original teve como núcleo di-
nâmico o desenvolvimento de atividades econômicas não voltadas
à produção de alimentos, suficiente para proporcionar à Inglaterra
o exercício da hegemonia no cenário internacional. Em grande
medida, isso foi possibilitado pela onda de inovação concentrada
naquele país.
A partir da segunda metade do século XVIII, com o surgimento
de novos materiais, como o carvão mineral substituindo o carvão
vegetal, de novos produtos, como o ferro derretido com coque, a
energia a vapor e, ainda, da mecanização das indústrias têxteis e
de vestuários houve saltos quantitativo e qualitativo na capacidade
de produção, especialmente no país sede das inovações, a Ingla-
terra. Com a expansão da produção têxtil ocorreu, em contraparti-
da, a difusão do emprego industrial, que passou de 100 mil traba-
lhadores, em 1770, para 350 mil empregados, em 1800, assim como
o aumento da produção de 4 milhões de libras de algodão, em
1770, para 300 milhões, em 1833 (Ayres, 1987).
Para uma elevação média anual de 7,1% na produção têxtil
inglesa ocorrida nas três últimas décadas do século XVIII, o nível de
emprego industrial aumentou a uma taxa média anual menor (4,3%).
Em parte, essa elevação pode ser explicada pelo avanço da meca-
nização, que destruiu postos de trabalhos associados ao padrão de
produção pretérito (indústria artesanal). Em 1830, por exemplo,
eram 85 mil teares com energia a vapor em uso na Inglaterra,
enquanto em 1813 o país contava com apenas 2,4 mil teares.

53
O combate à introdução e generalização do uso do tear mecâni-
co nas indústrias têxteis da Inglaterra foi encadeado pelo líder ope-
rário Ned Ludd, com base na avaliação negativa que parte dos diri-
gentes trabalhistas da época tinham sobre a tecnologia e a evolução
dos empregos. Em 1813, o movimento foi derrotado em York, Ingla-
terra, através de forte repressão policial, execuções e prisões.
Paralelamente à elevação da produção têxtil, aconteceu tam-
bém a redução de preços dos tecidos. Mas isso não possibilitou a
generalização da produção de tecidos pelo mundo, somente o seu
consumo, uma vez que a Inglaterra sozinha respondia por 60% da
produção de algodão consumida internacionalmente, seguida da
França (17%) e dos Estados Unidos (7%). Juntos, esses três países
concentravam 84% da produção mundial de tecidos (Deane, 1979).
Mas o domínio da tecnologia industrial pela Inglaterra, que a
tornava a oficina do mundo, vinculava-se, sobretudo, ao predomí-
nio da energia a vapor de alta pressão, a partir da difusão do motor
a vapor. Nesse sentido, os transportes terrestres e aquáticos ganha-
ram uma dimensão até então desconhecida, com a generalização
do trem (ferrovia) e do barco a vapor.
Por intermédio de James Watt, que em 1769 patenteou uma
máquina de condensação térmica, foi possível a produção de ener-
gia a partir do acionamento de bombas-d’água. Inicialmente, o seu
uso passou a ser praticamente universal, englobando da indústria
têxtil ao transporte de pessoas e produtos, como no caso da ferro-
via e de barcos a vapor.
Diante do concentrado e elevado avanço tecnológico, especi-
almente pela mecanização e pelo transporte a vapor, a produção
ganhou importante impulso. Ao mesmo tempo, a divisão do traba-
lho sofreu pronunciada transformação, com efeitos significativos
tanto na estrutura ocupacional quanto no conteúdo dos novos e
velhos postos de trabalho2.
A substituição dos métodos de trabalhos artesanais pela meca-
nização na grande empresa, que resultou na elevação da produti-
vidade do trabalho, foi fruto, em parte, da racionalidade patronal
na redução de custos e na maximização de lucros. A subordinação
do trabalhador ao ritmo da máquina, não apenas o tornou um
apêndice do equipamento, como também degradou o conheci-

54
mento necessário ao processo produtivo, ampliando ainda mais a
intensificação do trabalho.
Dessa forma, a simplificação das tarefas tornou-se, cada vez
mais, possível, através do processo de mecanização e de imple-
mentação de uma nova divisão do trabalho, responsável pela ocu-
pação de mão-de-obra menos qualificada. Com a Primeira Revolu-
ção Tecnológica, responsável pela ampla modernização produtiva,
o trabalho teve inserção mais subordinada ao ritmo de expansão
das atividades econômicas.
Segunda onda de inovação
Entre 1870 e 1910, foi possível constatar uma radical modifica-
ção na divisão do trabalho, o que coincidiu justamente com o
período referente à Segunda Revolução Tecnológica. Também na
forma de uma verdadeira onda de inovação, com a descoberta de
novos materiais, como o aço e petróleo, da energia elétrica, do
motor a combustão, do telégrafo, do telefone, entre outros, o capi-
talismo conseguiu garantir um novo ciclo de acumulação sem pre-
cedente.
O uso do aço veio revolucionar todo o material de engenharia
existente até então. Mas isso somente se tornou possível com o
uso do processo bessemer (Henry Bessemer) para produção de
aço, constituindo a base para a difusão de um novo material na
construção. Nos Estados Unidos, por exemplo, a produção máxi-
ma de 2 mil toneladas de aço ao custo de 170 dólares a tonelada
(contra 83 dólares a tonelada de ferro) foi alcançada no ano de
1867. Vinte e um anos depois, em 1898, a produção norte-america-
na de aço foi de 10 milhões de toneladas, com o preço de 15
dólares por tonelada.
Em relação à energia elétrica, o processo de descobrimento
também transcorreu estimulado por várias contribuições de cien-
tistas e pesquisadores de nações desenvolvidas, bem ao contrário
do que havia se dado durante a Primeira Revolução Tecnológica,
que se concentrou fundamentalmente na Inglaterra. Em 1840, sur-
giu o telégrafo elétrico, embora o uso comercial da energia elétrica
tenha ocorrido mais no final do século XIX, quando foram criadas
grandes empresas industriais geradoras de energia elétrica nos Es-

55
tados Unidos e Alemanha, a partir de cientistas e pesquisadores
como Thomas Edison, Alexandre Bell, George Westinghouse, Samuel
Morse, Werner Siemens, entre outros.
Tomando-se o caso dos Estados Unidos como referencial, ape-
nas para ilustrar o rápido e generalizado avanço no uso da energia
elétrica, observa-se que em 1899 havia em operação quase 17 mil
motores elétricos industriais, equivalendo a 500 mil cavalos de for-
ça. Dez anos depois, os Estados Unidos passaram a ter
quase 4 milhões de motores elétricos industriais, com aproximada-
mente 5 milhões de cavalos de força.
Da mesma forma, a expansão no uso da energia elétrica e do
telefone (descoberto em 1876) transcorreu rapidamente, colabo-
rando para a generalização da iluminação e da telefonia inicial-
mente nos locais de trabalho e posteriormente nas cidades e nas
moradias. Em 1910, por exemplo, as principais cidades européias
e norte-americanas contavam com eletricidade, assim como em
1929, os motores elétricos haviam substituídos praticamente os
motores a vapor d’água.
Uma outra inovação de fundamental importância nas transfor-
mações gerais tanto na sociedade quanto na economia capitalista
foi a difusão no uso do motor a combustão interna. Durante o
último quartel do século XIX, o esforço de cientistas e pesquisado-
res alemães, franceses e ingleses terminou por redundar no desco-
brimento e aperfeiçoamento do motor a combustão, inicialmente a
gás para depois evoluir para o petróleo como combustível, o que
permitiu inaugurar uma nova fase nos transportes terrestres (auto-
móvel, caminhão, trator e motocicleta), aquático (navios, barcos e
lanchas) e aéreo (avião e helicóptero).
A partir de 1890, com a participação de Rudolph Diesel, foi
desencadeada uma outra possibilidade mais eficiente de utilização
de energia alternativa ao gás, através da produção de motores com-
pactos e com alta potência, no caso de motores a diesel. Assim, a
exploração de petróleo ganhou importância inegável entre as na-
ções. Por possuírem reservas de petróleo, países sem grande rele-
vância econômica obtiveram maior presença no cenário mundial,
como no caso do Oriente Médio, que, em 1908, teve a exploração
de petróleo iniciada no Iraque e no Kuwait.

56
Com isso, as empresas que a pouco tinham começado a fun-
cionar no ramo de construção veículos (transporte de pessoas e
cargas, passeios, entre outros) transformaram-se em grandes
oligopólios de montadoras com dimensão mundial, conforme ex-
periência de engenheiros que empresariaram atividades industriais
como Gottlieb Daimler, Karl Benz, Henry Ford, entre outros. A
característica norte-americana de produção em massa de automó-
veis ganhou o mundo, bem como impôs modificações no trabalho
nas grandes empresas, através da organização científica do traba-
lho, desenvolvida, entre outros, por Taylor e Fayol.
Os Estados Unidos que, em 1900, tinham produzido 4,3 mil
carruagens sem cavalo, ao preço médio de mil dólares a unidade,
produziram, 11 anos depois, quase 35 mil automóveis pela Ford
Motor Company, ao preço médio de 780 dólares cada carro. Em
1921, a produção de automóveis Ford chegou a 1,2 milhão de
veículos, ao preço médio de 380 dólares cada3.
A despeito dos movimentos de concentração e centralização
das empresas e de reorganização do trabalho, com a instalação
generalizada das linhas de produção fordistas, o volume de em-
pregados entre 1910 e 1920 passou de 37 mil para 206 mil traba-
lhadores na indústria automobilística nos Estados Unidos. Ao mes-
mo tempo, a simplificação de tarefas e o esvaziamento do conteúdo
do trabalho imprimiram alterações substanciais na organização do
trabalho, na diferenciação das ocupações e na desqualificação da
mão-de-obra, abrindo a possibilidade para o emprego de trabalha-
dores menos qualificados (Braverman, 1981).
Diante da concentração de trabalhadores nas grandes empre-
sas, vingou a experiência de grandes sindicatos, que operavam
favoravelmente à geração de um mercado de trabalho mais homo-
gêneo. Assim, trabalhadores com distintos níveis de formação pro-
fissional passaram a receber remuneração menos diferenciada.
Terceira onda de inovação
Uma nova etapa de aprofundamento nas descobertas técni-
cas e científicas voltou a marcar o desempenho do capitalismo
neste último quartel do século XX. A notável generalização das
inovações nos campos da informática, telemática, dos novos ma-

57
teriais e da biotecnologia impulsiona a transformação do padrão
de organização da produção e do trabalho nas mais diversas ati-
vidades econômicas.
A cerâmica, a fibra ótica, entre outros novos materiais, contri-
buem para a renovação das bases técnica e material do capitalis-
mo, assim como a microeletrônica, a informática, a automação e as
telecomunicações criam oportunidades de rompimento com as si-
tuações tradicionais de produção, de trabalho e do modo de vida
pretéritos. Diante das novas possibilidades constituídas e de suas
perspectivas, alguns autores têm procurado tratar do conceito de
Terceira Revolução Tecnológica, na forma de distintos entendi-
mentos, como: revolução da informática (Harvey, 1992; Coriat, 1988),
sociedade informática e/ou da informação (Schaff, 1995; Lojkime,
1995), a sociedade do tempo livre e/ou a sociedade do conheci-
mento (Masi, 1999), a sociedade pós-industrial (Bell, 1973; Gorz,
1994) e a economia em rede (Castells, 1998).
A extensão da participação crescente do complexo
microeletrônico num ambiente de aprofundamento da competição
internacional desregulada e de adoção de estratégias empresariais
padronizadas contribui para a caracterização de um novo paradigma
técnico-produtivo (Piore e Sabel, 1984; Coutinho, 1992). Ao mes-
mo tempo, o avanço da computação reformula as bases das infor-
mações e comunicações.
Em grande medida, registra-se a presença de uma verdadeira
convergência nos meios de comunicação, capaz de alterar profun-
damente os modos de produção, de trabalho e de vida. Com o
aparecimento e desenvolvimento do computador e a sua mais re-
cente associação aos meios de comunicação já existentes, como a
televisão e o telefone, confirma-se a passagem para um estágio
superior na produção de informações e comunicações.
O aparelho telefônico tem passado por um aprimoramento
tecnológico sofisticado. Basta lembrar que o telefone, embora
tenha sido descoberto em 1876, foi usado somente na segunda
metade do século XX, como comunicação intercontinental, a par-
tir da instalação de cabos telefônicos submarinos. Em 1956, o
primeiro cabo telefônico possibilitava tão-somente 89 ligações
simultâneas.

58
A partir da revolução tecnológica e dos novos materiais, o
telefone ganhou um maior impulso. Em 1988, por exemplo, com a
instalação do primeiro cabo telefônico de fibra ótica intercontinen-
tal, a capacidade de transmissão passou a ser de 40 mil ligações
simultâneas. Mais atualmente, com o avanço da telefonia móvel e
por satélite, a comunicação por telefone ganhou mais importância.
O mesmo também pode ser observado em relação à televisão.
A primeira transmissão televisiva data de 1926. Mas a primeira
transmissão por satélite de comunicação privada ocorreu somente
em 1962. Já a transmissão por satélite comercial internacional, com
a transmissão de imagens ao vivo para todo o mundo, bem como
a propagação de canais a cabo de televisão, se deu em 1988.
Não obstante o avanço tecnológico, o mundo permanece pro-
fundamente desigual quanto ao acesso e ao uso das tecnologias
tradicionais de comunicação. Enquanto a cada duas pessoas uma
tem televisor e telefone nas economias avançadas, nos países po-
bres, a relação é de a cada dez pessoas, apenas uma possui televi-
sor e/ou telefone. O Brasil também registra baixo grau de difusão
no padrão de consumo das tecnologias de informação.
Por fim, em relação ao computador, que ao final do século XX
constitui uma tecnologia mais recente de comunicação, nota-se
que desde os anos 1960, as modificações no computador têm sido
amplas. Em 1967, um computador moderno da IBM, com o custo
de quase 168 mil dólares, podia armazenar 13 páginas de texto.
Vinte anos depois, o computador pessoal pentium podia realizar
mais de 200 milhões de cálculos. Além da ampliação da capacida-
de de processamento do computador, a sua miniaturização o tor-
nou um bem de consumo durável cada vez mais massificado4.
Assim, o acesso ao computador, através do seu uso em rede
(internet), possibilitou um novo salto nas comunicações em massa,
devido a sua rapidez e seu baixo custo. Apesar disso, no entanto,
é relativamente pequeno o segmento da população envolvida com
a comunicação eletrônica, mesmo com o crescimento muito rápi-
do e de maneira explosiva.
Também em relação ao acesso e ao uso do computador, a desi-
gualdade é profundamente elevada no mundo. Enquanto nos países
ricos, quase 20% da população têm acesso ao computador, nos paí-

59
ses semiperiféricos e periféricos somente menos de 7% e quase 2%,
respectivamente, usam o computador ao final do século XX.
Quando o enfoque é a quantidade de técnicos e pesquisado-
res envolvidos nas áreas de ciência e tecnologia, o resultado não é
diferente ao identificado em relação ao fechado e pequeno seg-
mento populacional com acesso ao computador. Em 1998, por
exemplo, os países periféricos e semiperiféricos possuíam, respec-
tivamente, 200 mil e 1,2 milhão de pesquisadores e técnicos dedi-
cados à pesquisa e desenvolvimento, enquanto os países ricos te-
riam 2,6 milhões de investigadores e técnicos em P & D.
Segundo dados das Nações Unidas, o Brasil representa apenas
1,9% do total da população mundial com acesso ao computador.
Em relação a P & D, seriam apenas 165 mil pesquisadores. Pelos
dados OCDE, as famílias norte-americanas com renda de até 10 mil
dólares, 4,5% possuía computador, enquanto as famílias com ren-
da acima de 80 mil dólares, o grau de penetração do computador
era superior a 62% (OCDE, 1997).
Com a possível convergência entre as três principais tecnolo-
gias de comunicação (telefone, televisão e computador) potencializa-
se um novo estágio em termos das comunicações, minimizando o
poder da geografia, através da redução da distância. No caso da
televisão digital, que tende a combinar o uso simultâneo e sincro-
nizado da internet, do telefone e da transmissão de imagens, a
comunicação, a interatividade e a personalização do entretenimen-
to passam a ocupar uma posição de destaque, sem paralelo histó-
rico, ainda que isso esteja concentrado em 15% da população
mundial, especialmente no segmento mais rico da sociedade. Ao
final do século XX, 50% da população mundial seguia sem nunca
antes ter realizado uma única chamada telefônica.
Em 1999, o clube dos ricos, que envolve somente aqueles com
mais de um milhão de dólares, reunia 7 milhões de pessoas, repre-
sentando uma renda global de 25,5 trilhões de dólares, enquanto
em 1996 eram 4,7 milhões de pessoas com renda de 18,1 trilhões
de dólares. No clube dos mais ricos do mundo, somente ingressa
uma minoria privilegiada que representa apenas 0,1% da popula-
ção do planeta. No Brasil, seria apenas um seleto grupo de 140 mil
pessoas pertencem ao clube do milhão.

60
Entre 1996 e 1999, a renda dos mais ricos do mundo cresceu
40%, muito mais do que a expansão da renda mundial (8,7%). Não
tem sido por outro motivo que não apenas a renda mundial conti-
nuou a se concentrar ainda mais, como também aumentou a po-
breza no planeta, conforme identificado pelo próprio Banco Mun-
dial (BIRD, 2000).

UMA “ NOVA ECONOMIA” ?

A partir da interpretação corrente sobretudo nos meios finan-


ceiros, tem sido difundido o termo “economia digital ou nova eco-
nomia”, como forma de enunciar a existência de um longo boom
de expansão das atividades econômicas no último quartel do sécu-
lo XX. Nesse caso, tem referência principal a articulação entre a
expansão da indústria de tecnologia de informação e de comuni-
cação, especialmente através do uso da internet – com capacidade
de realizar em crescente escala de conexões entre as diferentes
cadeias produtivas –, e a emergência do comércio eletrônico, es-
pecialmente nos Estados Unidos5.
Assim, a base da expansão da chamada “nova economia” esta-
ria ocorrendo diante da ocupação de uma nova fronteira tecnoló-
gica, associada tanto aos riscos quanto à obtenção de lucros ex-
cepcionais. Paralelamente, a organização da “nova economia”
tenderia a tratar mais do gerenciamento e da informação, o que
possibilitaria a expansão da organização da produção através de
redes globais de capitais, sustentando extraordinários lucros finan-
ceiros e especulativos, capazes de impedir a autonomização finan-
ceira do capitalismo do final do século XX.
Além disso, pretende-se, muitas vezes, no contexto referente
ao debate da chamada “nova economia”, associá-la ao comporta-
mento atual da economia dos Estados Unidos, que desde 1984
registra um percurso de crescimento sustentado, com a presença
de reduzida inflação, de taxas relativamente pequenas de desem-
prego aberto e de amplos investimentos na Indústria e Serviço de
Tecnologia de Informação e de Comunicação (ITIC). Tudo isso es-
taria apontando para um novo ciclo de negócios na economia
norte-americana.

61
Entretanto, deve-se alertar para o fato de que somente a partir
de 1994 que o setor de tecnologia de informação e comunicação
passou a sustentar taxas de expansão superiores aos demais seg-
mentos de atividade econômica nos Estados Unidos6. O sucesso
norte-americano atual é anterior à chamada “nova economia” e,
até certo ponto, independente do seu avanço e dinamismo.
Ainda assim, o conceito da “nova economia”, usualmente em-
pregado, atende mais às condições de superioridade tecnológica
dos Estados Unidos, embora os demais países desenvolvidos pos-
sam acompanhar pela disponibilidade de infra-estrutura e acúmu-
lo tecnológico (OCDE, 2000). Tudo isso indica que a “nova econo-
mia” não está aberta a todos, pois pesa a estrutura de mercado,
bem como outros fundamentos econômicos – juros, câmbio, tribu-
tos, pesquisa e investimentos, entre outros.
O termo “nova economia” está sendo muito mais justificado
pelo seu lado produtivo, sendo a indústria de tecnologia de in-
formação e comunicação (ITIC) a base técnica e material de im-
portante propagação do sistema capitalista. O papel da Indústria
de Tecnologia de Informação e Comunicação como promotor do
desempenho econômico tem sido crescente somente na segunda
metade dos anos 1990, ainda que isoladamente o setor represen-
te menos de 10% do PIB dos Estados Unidos. Entre 1990 e 1994, o
setor ITIC aumentou em 0,6 ponto percentual sua participação
relativa na economia norte-americana (passando de 5,8% para
6,4% do PIB), mas de 1994 a 1999 a sua expansão foi mais vigoro-
sa, com adicional médio anual de 1,7 ponto percentual (passan-
do de 6,4% para 8,1%).
De acordo com a nova concepção metodológica do Censo
Norte-Americano, através do North American Industrial Classification
Systems (NAICS), o setor industrial e de serviço associado às tecno-
logias de informação e comunicação compreende quatro distintos
subsetores7. O primeiro refere-se às indústrias que produzem com-
putadores e equipamentos (hardware), representado pelos
instrumentos de análise de laboratório eletroele-trônicos, compo-
nentes eletrônicos, semicondutores e tubos de elétrons, material
magnético e ótico, máquinas de cálculo e computadores, pesquisa,
entre outros.

62
O segundo subsetor concentra as indústrias de equipamento
de comunicação, abrangendo, por exemplo, componentes de rá-
dio e televisão, telefone e telecomunicações, material de áudio e
vídeo, pesquisa, entre outros. No terceiro subsetor localizam-se os
serviços de computação (software), como serviços de reparação,
preparação, programação e análise de computação, comércio e
atendimento dos serviços de computação, desenho de sistemas de
computação integrada, preparação de dados e processo e rede de
computação, serviços de instalação, de manutenção e de adminis-
tração, pesquisa, entre outros.
Por fim, o quarto subsetor vincula-se aos serviços de comuni-
cação, que atuam nas atividades de televisão a cabo, televisão paga
e filmagens, nos serviços das redes de televisões e rádio, propa-
ganda, serviços de telefonia e telecomunicações em geral, entre
outros. Em síntese, esses quatro subsetores associados ao setor
industrial de tecnologia de informação e comunicação (ITIC) con-
tribuem com cerca de um terço do total da expansão da economia
norte-americana desde 19958.
Além de registrar ritmo de expansão superior aos demais ra-
mos da economia norte-americana, o setor ITIC vem apresentando
queda substancial nos preços de seus produtos e serviços. Entre
1994 e 1999, por exemplo, a elevação dos preços médios dos pro-
dutos e serviços nos Estados Unidos foi de 11,9%. Para o mesmo
período de tempo, o setor industrial de tecnologia de informação e
comunicação teve o preço médio dos seus produtos e serviços
reduzido em quase 25%, segundo Census Data norte-americano
(Department of Commerce 1999; 2000).
Todas essas informações estatísticas e metodológicas são
ainda insuficientes para refletir, com maior exatidão, as trans-
formações em curso na estrutura produtiva, bem como avalizar
a existência, de fato, de uma nova economia capaz de ser sus-
tentada pelo setor ITIC, bem como reproduzir um novo boom de
longo prazo aos demais setores de atividade. A internet, por
exemplo, reflete, somente em parte, o potencial e os limites da
atual onda de inovação tecnológica, já que diz respeito mais a
prestação de serviços do que a base material de difusão do
sistema produtivo.

63
Apesar do explosivo avanço na quantidade de usuários da
internet nos últimos anos, ainda constitui um segmento muito sele-
to da população com acesso ao padrão de consumo mundial. Des-
de 1972, quando foi realizada a primeira transmissão via correio
eletrônico até o final dos anos 1980, pouquíssimas pessoas tinham
acesso à internet. Em 1990, apenas umas poucas universidades
norte-americanas faziam parte da rede de computadores, envol-
vendo não mais do que 3,5 milhões de pessoas.
Sete anos depois, a internet era acessada mundialmente por 71
milhões de pessoas. Em março de 2000, 304 milhões de pessoas
tinham acesso à internet, com expectativa de atingir 1 bilhão até
2003. Enquanto isso não ocorre, nota-se que ainda menos de 5,2%
da população participa da rede mundial de computadores, o que
representa, cada vez mais, um dos principais resultados do proces-
so de inovação nas comunicações e transações9.
Da mesma forma, parecem ser bastante favoráveis as possibi-
lidades de irradiação do uso da internet nas empresas, no comér-
cio e nos serviços. Além da economia de tempo e de custos, há
crescente desburocratização e diminuição da hierarquia nos negó-
cios, na produção e distribuição de bens e serviços.
Por conta disso, tem sido crescente a disponibilização de ser-
viços nas áreas da saúde, educação, comércio de bens e serviços,
lazer, turismo, entre tantos outros, que tendem a potencializar os
negócios e as atividades produtivas. Além da conexão entre indiví-
duos, a internet transformou no novo mecanismo de contatos e de
comércio intra e interempresas.
A EVOLUÇÃO RECENTE DAS OCUPAÇÕES NOS ESTADOS UNIDOS E NA
FRANÇA
O quadro geral de manifestação de uma nova onda de inova-
ção tecnológica tem gerado a propagação de uma literatura espe-
cializada voltada para a identificação, não apenas dos novos requi-
sitos contratuais, mas principalmente do futuro da ocupação10. Ao
tomar como referencial os pressupostos do determinismo
tecnológico, muitos autores tendem a superestimar o potencial de
geração de novas oportunidades de trabalho e a minimizar o de
outros setores econômicos.

64
Os argumentos a respeito das novas demandas de profissio-
nais, voltados para a maior capacitação e treinamento, preparação
para decidir, realizar múltiplas funções e utilizar novos instrumen-
tos de trabalho fundamentam-se, na maioria das vezes, na hipótese
de que o cenário atual de inovação tecnológica implica o enrique-
cimento do conteúdo do trabalho, não apenas do trabalhador. Em
certa medida, transfere-se a responsabilidade pela definição do
acesso ao emprego para o trabalhador, vitimado pelo possível
insucesso na procura de trabalho toda vez que estiver com baixo
grau de empregabilidade11.
O foco dessa discussão não estaria, portanto, nos fatores res-
ponsáveis pela geração de novas vagas nem mesmo nas mudanças
ou não no conteúdo do trabalho. Em geral, os teóricos da “nova
economia” assumem que ela exige crescentemente um trabalhador
de novo tipo, devido ao avanço tecnológico, à sofisticação dos
processos produtivos e à reorganização do trabalho no interior das
empresas.
Mas, diante da instabilidade tecnológica em curso, não há cer-
tezas quanto às mudanças no conteúdo do trabalho. Deve-se re-
cordar que também ao final do século XIX, durante a maturação da
segunda onda de inovação tecnológica, alguns autores assumiram
a hipótese de que o emprego se modificava, sendo responsabilida-
de do trabalhador preparar-se para poder conviver com o novo
mundo do trabalho nas grandes indústrias automobilísticas, quími-
cas, petroquímicas, entre outras12.
Entretanto, com a constituição do padrão tecnológico da se-
gunda onda de inovação, a partir das primeiras décadas do século
XX, ganharam importância as mudanças organizacionais na produ-
ção e de gestão de mão-de-obra, através da administração científi-
ca do trabalho, cujo papel principal foi o de simplificar tarefas,
fragmentar conteúdos dos postos de trabalho e verticalizar as ativi-
dades laborais. Em síntese, as exigências de contratação foram re-
baixadas, permitindo identificar sinais de desqualificação do traba-
lho (Braverman, 1981).
No final do século XX, diante da elevada insegurança do traba-
lho, associada às várias formas de manifestação do excedente de
mão-de-obra, como o desemprego aberto, o desemprego disfarça-

65
do e as ocupações precárias, a aposta na empregabilidade como
estratégia de inserção da mão-de-obra tende a ser reconhecida
como mais uma das novas formas de alienação ante a complexida-
de da ocupação no capitalismo do fim do século XX (Maillard e
Dassa, 1996; Aranha, 1999). Ao mesmo tempo, o processo de reor-
ganização do trabalho tem sido responsável pela geração de um
maior contingente de mão-de-obra sobrante, passível de ser utili-
zado de maneira pontual e descontinuamente. Nessas condições,
são escassas as relações de solidariedade, substituídas pela concor-
rência “darwinista” de sobrevivência nas vagas existentes.

Tabela 3 – Balanço das dez principais ocupações geradas entre


1988 e 1998 nos Estados Unidos e na França

De cada De cada
Principais ocupações nos 100 Principais 100
Estados Unidos vagas ocupações na França vagas
geradas geradas
Assistência maternal 11 Trabalhador no comércio 17
Trabalhador no comércio 10 Auxiliares de saúde 15
Auxiliares de saúde 9 Assistência Pessoal 10
Administração privada 8 Professor e auxiliares de
Emprego de cultura educação 9
e desporto 8 Informática e apoio à
Professor e auxiliar de indústria 9
educação 7 Serviço de família e criança 6
Funcionário público 6 Serviço de engenharia e
Trabalhador petroquímico 6 arquitetura 5
Segurança pública Trabalhador na construção
e privada 5 civil 5
Profissionais de Serviço de entretenimento
informática 4 e cultura 4
Funcionário público 4

Subtotal 74 Subtotal 84

Fonte: Ministère de l’emploi, 2000; Bureau Labor Statistics, 1999. Elaboração própria.

66
Conforme os dados referentes à evolução da ocupação entre
1988 e 1998 na França e nos Estados Unidos, pode-se observar como
é intenso o adicional de novas vagas geradas nos setores associados
à chamada “economia velha”. Mais do que isso, interessa também
destacar como continua expressiva a participação do gasto público
na elasticidade do emprego. Enquanto na França, a cada dez postos
de trabalho criados, seis possuem vinculação direta ou indireta com
o gasto público, nos Estados Unidos, a relação é de quatro em cada
dez novas vagas geradas no período de 1988 e 1998.
Tanto para o caso francês quanto para o norte-americano, o
trabalho no setor do comércio reflete o dinamismo das ocupações,
sendo responsável por 17% do total de vagas criadas nos Estados
Unidos e de 10% na França. Ao mesmo tempo, as atividades rela-
cionadas à assistência (maternal e familiar) seguem com expressi-
va força no volume da ocupação, representado 15% das ocupa-
ções criadas nos Estados Unidos e de 11% na França.
Um outro aspecto relacionado à geração de vagas diz respeito
aos setores de saúde, educação e entretenimento (desporto, cultura
e lazer), que significam 28% do total de emprego gerado nos Esta-
dos Unidos e de 24% na França entre 1988 e 1998. Mesmo o empre-
go público também tem destaque, responsável por 4% do adicional
de empregos gerados nos Estados Unidos e de 6% na França.
Por fim, o setor industrial de tecnologia de informação e co-
municação não registra importância destacada na geração do total
dos postos de trabalho nos dois países desenvolvidos seleciona-
dos. Na França, o setor de ITIC respondeu por 4% do acréscimo do
total de emprego, enquanto nos Estados Unidos representou 9%.
Nas indústrias tradicionais, a repercussão sobre o emprego
não se manifesta com expressividade. Na França, somente a indús-
tria petroquímica destacou-se, com participação relativa de 6% no
total de postos de trabalho gerados naquele país, ao passo que nos
Estados Unidos foi a indústria da construção civil, responsável por
5% do total de emprego criado entre 1988 e 1998.

O EMPREGO NA “ NOVA ECONOMIA” NO BRASIL


Como se observou anteriormente, a identificação da chamada
“nova economia” é complexa, mesmo nos países desenvolvidos.

67
Certamente, a identificação da “nova economia” em países não-
desenvolvidos é ainda mais complexa.
Com o objetivo de realizar uma primeira aproximação
investigativa sobre o que poderia constituir o setor industrial de
tecnologia de informação e comunicação no Brasil optou-se por
adotar a proposta metodológica do Censo Norte-Americano (NAICS),
definidora de quatro subsetores da “nova economia”: indústrias
que produzem computadores e equipamentos (hardware); indús-
trias de comunicação e de equipamentos; serviços de computação
(software); e serviços de comunicação. A despeito de as estatísticas
brasileiras não disponibilizarem as informações de uma forma que
possibilite dimensionar precisamente o setor ITIC, procurou-se con-
tornar, mediante a combinação de diferentes fontes oficiais de da-
dos nacionais, como indicação do que seria a “nova economia” no
país13.
Assim, estima-se que o setor e ITIC no Brasil representava 2,7%
do Produto Interno Bruto (PIB) em 1989 e, em 1999, havia sido
reduzido para 2,1% do PIB. Essa perda de importância dos segmen-
tos produtivos identificados com a chamada “nova economia” teve
repercussões no volume de emprego assalariado e condições de
trabalho.
Como se pôde observar nos últimos dez anos, o conjunto de
atividades considerado como “nova economia” no Brasil sofreu
um processo de enxugamento, ao mesmo tempo em que registrou
transformações significativas na composição ocupacional. Os seg-
mentos produtivos vinculados à produção industrial (informática e
comunicação) foram sensivelmente reduzidos nas suas participa-
ções relativas no total do emprego formal no setor e ITIC, enquan-
to as atividades de serviços (informática e comunicação) cresce-
ram rapidamente suas participações relativas.
Em 1989, os segmentos industriais eram responsáveis por
mais de 56% do total da ocupação que diz respeito à “nova
economia” no Brasil. Dez anos depois (1999), os mesmos seg-
mentos representavam menos de 34% do total da ocupação no
setor ITIC. Em contrapartida, os segmentos de serviços aumen-
taram suas participações relativas de menos de 44% para mais
de 66%.

68
Gráfico 14 – Brasil: distribuição do emprego formal no setor industrial
e de serviços de tecnologia de informação
e comunicação, 1989 e 1999 (em %)

Em 1989 Em 1999
9 ,4 6 ,2

3 3,4
2 7,4

4 8,4
47

1 0,2 18

Ind. informática Ind. comunicação Ind. informática Ind. comunicação


Serv. informática Serv. comunicação Serv. informática Serv. comunicação

Fonte: MTE-Rais/Caged. Elaboração própria.

Muito mais importante do que registrar as modificações na


composição ocupacional no setor de ITIC no Brasil durante os
anos 1990, cabe analisar a evolução do emprego formal . Isso
porque o setor ITIC registrou uma queda de quase 22% no total do
emprego entre 1989 e 1999, significando perda líquida de 174 mil
empregos na chamada “nova economia”.

Tabela 4 – Brasil: Evolução do emprego formal no setor industrial e de


serviços de tecnologia de informação e comunicação (1989 e 1999)
Variação Variação
Subsetor 1989* 1999*
absoluta* %
Indústria de informática e equipamentos 74.155 38.450 – 35.705 – 48,1
Indústria de comunicação e equipamentos 372.933 169.504 – 203.431 – 54,5
Serviços de informática 81.093 111.763 30.670 37,8
Serviços de comunicação 265.419 299.839 34.420 13,0
Total ITIC 793.602 619.556 –174.046 – 21,9

Fonte: MTE-Rais/Caged. Elaboração própria.


* em mil.

69
Nos segmentos industriais, foram perdidos 239 mil postos de
trabalho, sendo de 85% a responsabilidade das indústrias de co-
municação e equipamentos e de 15% das indústrias de informática
e equipamentos. Nos segmentos de serviços de comunicação e de
informática houve, no mesmo período de tempo, a abertura líqui-
da de 65 mil novas vagas, com 53% de responsabilidade dos servi-
ços de comunicação e de 47% dos serviços de informática.
Especificamente para os segmentos industriais pertencentes ao
setor ITIC pode-se observar que as mudanças mais expressivas ocor-
reram nos segmentos de administração e da produção, pois foram
os que registraram maiores perdas relativas no total do emprego.
Enquanto o segmento da produção perdeu participação relativa no
total de postos de trabalho, as atividades de montagem ganharam
maior expressão, indicando rompimento na tendência de produ-
ção interna por parte das empresas, ante a possibilidade de monta-
gem, através da aquisição de componentes vindos do exterior.

Tabela 5 – Brasil: Distribuição do emprego formal no setor industrial de


tecnologia de informação e comunicação, 1989 e 1999 (em %)

Indústria de informática e Indústria de comunicação e


Subsetor
equipamentos equipamentos
1989 1999 1989 1999
Direção 7,9 7,8 4,4 4,1
Administração 18,7 20,1 19,8 18,4
Produção 40,5 35,7 49,3 42,4
Montagem 22,2 26,6 26,5 35,1
Total 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: MTE-Rais/Caged. Elaboração própria.
* em mil.

Guardada a devida proporção, pode-se presenciar o fortaleci-


mento, no Brasil, da passagem dos segmentos industriais do setor
ITIC de complexa produção para simples montagem, tal como já se
observou no caso das indústrias mexicanas nos anos 1980. A cres-
cente presença das indústrias de maquiagem (maquiladoras) no
Brasil durante os anos 1990 diferencia-se pelo fato de que no Mé-
xico elas visam as exportações, enquanto aqui atendem mais ao
consumo interno (Ferreira Jr., 1994; Cepal, 1992; 1996).

70
A indústria maquiladora (de maquiagem), que é tradicional-
mente responsável pela montagem do produto manufaturado
(ensamble), caracteriza-se mais por sua baixa capacidade de gerar
maior valor agregado e empregos do que por praticar condições
de trabalho insatisfatórias, já que a compressão dos salários torna-
se fator de competitividade internacional e objeto de constante
decisão empresarial quanto à deslocalização de suas plantas pro-
dutivas. Ao mesmo tempo, o setor ITIC passa a assumir cada vez
mais um papel decisivo no balanço comercial, diante de sua cres-
cente dependência dos produtos importados, sem o necessário
comprometimento com as exportações.
Em 1999, por exemplo, o segmento industrial de comunicação
e equipamentos registrou déficit comercial externo de quase 3 bi-
lhões de dólares, enquanto em 1989, o déficit era de apenas 100
milhões de dólares. No mesmo período de tempo, o segmento
industrial de informática e equipamentos, o déficit comercial exter-
no passou de 177 milhões de dólares para um pouco acima de 2
bilhões de dólares.
Em síntese, o segmento industrial associado à nova economia
(ITIC) transformou-se numa das principais fontes de desestabilização
da balança comercial brasileira nos anos 1990, em face da depen-
dência tecnológica crescente (déficit agregado do setor industrial
subiu de menos de 300 milhões de dólares em 1989 para 5 bilhões
de dólares em 1999). Ao mesmo tempo, o país perdeu participação
relativa nas exportações mundiais do setor industrial identificado
com a chamada “nova economia”, pois representava 0,8% em 1989
e, em 1999, significou 0,5%.
Nem mesmo a expansão do ingresso de recursos estrangei-
ros no Brasil, a partir da implementação de novas empresas
industriais de comunicação e equipamentos e de informática e
equipamentos, mostrou ser suficiente para impulsionar substan-
cialmente o investimento. Em 1989, por exemplo, os investi-
mentos em pesquisas e desenvolvimento nas indústrias de
informática e equipamentos no Brasil representavam 6,4% do
total das vendas do setor, enquanto as indústrias de comunica-
ções e equipamentos investiam 13,4% em pesquisa e desenvol-
vimento.

71
Dez anos depois, as indústrias de informática e equipamentos
investiam em pesquisa e desenvolvimento 6,0% e as indústrias de
comunicação, 6,1% do total das vendas do setor (Porto e Pochmann,
2000). De certa forma, observa-se que a evolução dos investimen-
tos em pesquisa e desenvolvimento no segmento industrial da cha-
mada “nova economia” não acompanhou o comportamento do
coeficiente de importação no Brasil, movendo-se mais próximo do
desempenho negativo no emprego.

A EVOLUÇÃO RECENTE DAS OCUPAÇÕES NO BRASIL

A ocupação no Brasil terminou sofrendo fortemente as reper-


cussões negativas que decorrem do comportamento geral da eco-
nomia nos anos 1990, que registrou uma taxa média anual de ex-
pansão do produto de apenas 1,9% – a mais baixa de todo o século
XX. Por isso, o desemprego cresceu demasiadamente, além de pos-
tos de trabalho abertos serem mais caracterizados pela precarieda-
de nas condições e relações de trabalho. Os salários médios reais
permanecem na década de 1990 representando apenas dois terços
do que eram nos anos 1980.
Durante a década de 1990, o Brasil gerou quase 10 milhões
de novas ocupações, apesar de quase 16 milhões de pessoas
terem ingressado no mercado de trabalho. Do total de postos de
trabalho criados, 78 encontram-se concentrados em apenas dez
ocupações.
A principal ocupação criada nos anos 1990 foi a de emprego
doméstico, responsável por 23% de todas as vagas abertas. Logo
depois vem a ocupação de vendedor, que respondeu por 15% do
total de postos de trabalho abertos, seguido da construção civil
(10%), dos serviços de asseio e conservação (8%) e dos serviços de
segurança (6%).
Nesses segmentos ocupacionais em alta no Brasil durante a
década de 1990, pode-se constatar a presença de baixos salários e,
em grande parte das vezes, sem contrato formal de trabalho. Nos
setores ocupacionais com salários não tão baixos, como de funci-
onário público e de profissionais da educação e da saúde, o peso
na geração de vagas não foi tão expressivo.

72
Tabela 6: Brasil: Balanço das principais ocupações
geradas entre 1989 e 1999

De cada 100 Rendimento médio


Dez principais ocupações no Brasil vagas geradas (em reais de1999)
Emprego doméstico 23 168
Vendedor 15 253
Construção civil 10 219
Asseio e conservação 8 189
Segurança 6 437
Serviço administrativo 5 244
Funcionário público 4 417
Professor 3 453
Cozinheiro, garçom 2 211
Profissional da saúde 2 680
Subtotal 78 –

Fonte: IBGE (PNAD- ajustada), MTE. Elaboração própria.

A despeito da crescente importância da educação e do treina-


mento para o trabalho, as ocupações em alta no Brasil não são
aquelas que se caracterizam por elevados requisitos contratuais.
Talvez, a tese generalizada de que o avanço educacional seria su-
ficiente para superar as atuais mazelas no funcionamento do mer-
cado de trabalho brasileiro perde credibilidade, especialmente quan-
do o processo de aprendizagem encontra-se subordinado
exclusivamente a uma funcionalidade. Deve-se adiantar, contudo,
que não se trata de contestar o papel libertador que a educação
pode ter para a sociedade, quando associada à aprendizagem das
visões de mundo (aprender para fazer, para conhecer, para convi-
ver e para ser).
Procura-se esclarecer, entretanto, que o enfrentamento dos atu-
ais problemas do mercado de trabalho depende de fatores mais
amplos, como o crescimento econômico sustentado, investimentos,
gasto público, entre outros. Em outras palavras, a resolução das
mazelas do mercado independe exclusivamente do próprio funcio-
namento do mercado de trabalho, estando subordinada ao compor-
tamento geral da economia.
Não deve causar espanto, portanto, a observação de que no
Brasil têm sido justamente os trabalhadores com maior escolarida-

73
de os mais atingidos pelo desemprego. Nos anos 1990, por exem-
plo, o desemprego para pessoas com mais de oito anos de instru-
ção subiu 620%, enquanto para pessoas com menos de um ano de
instrução, o aumento foi de 189% (Pochmann, 2000).
Ao mesmo tempo, não parece haver comprovação empírica
suficiente para fazer crer que a elevação educacional coincida
necessariamente com a redução das desigualdades de rendimen-
to. Pelo contrário, observa-se que diante da piora no funciona-
mento do mercado de trabalho nos anos 1990, proporcionado
tanto pela ausência de crescimento econômico sustentado quan-
to pelas reformas neoliberais, a elevação do nível educacional
vem ocorrendo com a manutenção ou até ampliação das diferen-
ças de rendimentos.
Tudo isso estaria ocorrendo diante de postos de trabalho aber-
tos em bem menor quantidade do que a elevação da oferta de
mão-de-obra, permitindo que as empresas aumentassem os requi-
sitos contratuais, ao passo que substituem os trabalhadores com
menor nível de escolaridade por outros com nível maior. Dessa
forma, não são verificados sinais de mudanças substanciais, no
conteúdo do posto de trabalho, que exijam, em geral, um profissi-
onal mais qualificado, sendo muito mais um fenômeno de oferta
do que de demanda de trabalho.
Quando se analisa a estratificação socioeconômica no Brasil
nota-se que há, pelo menos, três modalidades de relacionamento
entre educação e nível de rendimento. Para as ocupações de dire-
ção na empresa, o nível de rendimento tende a ser superior ao de
escolaridade, enquanto nos postos de administração, há certa iden-
tidade entre grau de instrução e níveis de rendimento. Já nas ocu-
pações associadas à produção, a relação é inversa. Isto é, o nível
de rendimento encontra-se abaixo dos anos de escolaridade.
Como no Brasil as ocupações de direção respondem apenas
por 6% do total dos postos de trabalho e as de administração so-
mente 8,1%, constata-se que o grosso das vagas é vinculado à
produção (85,9%); setores em que a determinação da educação
sobre o nível de rendimento é bem restrita. Em síntese, a impor-
tância da educação para o rendimento tende a estar mais relacio-
nada aos cargos de maior qualidade no conteúdo do trabalho,

74
como de direção e de administração, do que as ocupações de
baixa qualidade, como as associadas à produção.

Tabela 7 – Brasil e Chile: escolaridade e rendimento em 1997

Anos de instrução Múltiplos de rendimento*


Ocupações
Brasil Chile Brasil Chile
Direção 9,8 11,9 15,4 25,4
Administração 13,1 14,9 13,1 12,3
Produção 5,9 9,5 3,6 4,2
Total 6,1 10,4 4,5 7,4

Fonte: Cepal, 2000


* Rendimento equivalente à linha de pobreza.

Além disso, convém destacar também que em países com maior


escolaridade, não há sinais de menor desigualdade no rendimento.
É o caso, por exemplo, do Chile que, apesar de possuir 10,4 anos
em média de instrução, registra desigualdade superior a do Brasil,
quando considerada a relação entre o rendimento médio do em-
pregador e o do operário (6,9 vezes no Chile). No Brasil, que
possui 6,1 anos em média de instrução, a desigualdade entre o
rendimento médio do empregador e o do operário é de 4,6 vezes.

RAZÕES DA CONTRAMÃO BRASILEIRA

Nos últimos dez anos, o setor de indústrias de tecnologia de


informação e comunicação aumentou a sua participação relativa
na produção e no emprego. Nos Estados Unidos, por exemplo, a
presença do setor ITIC cresceu de 5,8% para 8,3%, enquanto o
volume de empregados passou de 3,6 milhões para 5,2 milhões,
com adicional de 1,6 milhão de novos trabalhadores (Department
of Commerce, 2000).
O Brasil, ao contrário, vem registrando sinais de regressão no
desenvolvimento da chamada “nova economia”. Com base nos úl-
timos dez anos, não apenas o setor ITIC reduziu a sua presença
relativa estimada no Produto Interno Bruto (de 2,7 para 2,1%),
como também houve a perda absoluta de empregos, estimada em

75
174 mil trabalhadores a menos, cujo estoque passou de 793,6 mil
em 1989 para 619,6 mil empregados em 1999.
Nota-se que o país aponta para uma transformação radical no
seu sistema produtivo. Está deixando de ser produtor de bens e
serviços de maior valor agregado e de alto conteúdo tecnológico
para assumir uma posição industrial mais próxima a de montagem
(maquiagem produtiva) e de comprador de novas tecnologias.
A nova estrutura ocupacional que resulta do ajuste empresa-
rial implementado nos anos 1990 no setor de indústrias de tecnolo-
gia de informação e comunicação não parece deixar dúvidas quanto
ao crescimento da importância dos segmentos de montagem em
relação ao de produção. Ao mesmo tempo, cresce a dependência
do país na aquisição de produtos importados de maior valor
tecnológico, o que impõe déficit no balanço comercial externo de
cerca de 5 bilhões de dólares. Tudo isso sem comentar o esvazia-
mento do potencial tecnológico que deriva da dependência co-
mercial na chamada “nova economia”.
Em síntese, cai por terra a expectativa brasileira construída ao
longo da década de 1990 de que a abertura comercial e financeira
favoreceria o ingresso de capital estrangeiro, suficiente para acele-
rar a difusão de novas tecnologias no país. Percebe-se hoje a frus-
tração quanto ao acesso às novas tecnologias, gerando certa para-
lisia nas iniciativas estratégicas nacionais e desincentivo à promoção
de alternativas tecnológicas voltadas à realidade do país.
Deve servir de aprendizagem o equívoco acerca da hipótese
do técnico-globalismo aceita pelas autoridades governamentais, que
considera a tecnologia commodity, passível de ser transferida a
partir do mercado. Mas a tecnologia não pode ser identificada
como uma mercadoria, pois é de difícil transferência, encontran-
do-se condicionada às decisões políticas e institucionais, não ape-
nas às decisões dos agentes econômicos14.
Até agora, pelo menos, são insuficientes as informações que
confirmam a elevação das investigações no exterior, ainda que as
grandes corporações transnacionais possam descentralizar algumas
de suas atividades de pesquisas e desenvolvimento. A tecnologia
continua a permanecer uma atividade não globalizada, como es-
tratégia associada ao espaço nacional, de origem da grande

76
corporação transnacional responsável pelos investimentos em pes-
quisa e desenvolvimento.
O desenvolvimento nacional de sistemas de inovação conti-
nua fundamental para a plena incorporação da chamada “nova
economia”. Sem o encadeamento de arranjos institucionais entre
empresas, universidades e governos, apoiado em política ativa de
desenvolvimento tecnológico e crescentes recursos em pesquisa e
tecnologia, o Brasil deve seguir na contramão da “nova economia”.

NOTAS:
1 As informações empíricas foram retiradas das seguintes fontes estatísticas:
Organização Internacional do Trabalho - OIT (Yearbook of Labour Statistics,
World Employment Report, Key Indicators of the Labour Market e Economically
Active Population); Organização de Cooperação Econômica e Desenvolvi-
mento - OCDE (Historical Statistics, Labour Force Statistics, Economic Outlook
e Perspectives de l´Emploi), Nações Unidas - ONU (United Nations Industrial
Development Organization, United Nations Educational, Scientific and Cultu-
ral Organization e United Nations Statistics Division); Fundo Monetário Inter-
nacional (International Financial Statistics e Government Finance Statistics
Yearbook); Banco Mundial (World Development Report, World Development
Indicators e Global Economic Prospects); Banco de Desenvolvimento da Ásia
(Asia Development Bank); Ofício de Estatísticas da União Européia - Eurostat
(Statistical Office of the European Union); Ofício de Estatísticas do Trabalho
dos Estados Unidos - BLS (United States Bureau of Labour Statistcs); Banco
Interamericano de Desenvolvimento - BID (Progreso Económico y Social en
América Latina); e Comissão Econômica para América Latina e Caribe - Cepal
(Anuario de Estadísticas de América Latina). Ao mesmo tempo, dividiu-se o
conjunto de países em três blocos: centro, periferia e semiperiferia. Conside-
raram-se países do centro capitalista: Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca,
Finlândia, França, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Noruega, Suécia, Suíça,
Inglaterra, Espanha e Estados Unidos. Como países semiperiféricos: Austrália,
Nova Zelândia, Grécia, Portugal, Turquia, Bulgária, Checoslováquia, Hungria,
Polônia, Romênia, Rússia, Iugoslávia, Argentina, Brasil, Chile, México,
Venezuela, China, Índia, Irlanda, Coréia, Taiwan, Egito e África do Sul. Como
periferia, os países: Zaire, Tanzânia, Nigéria, Marrocos, Quênia, Gana, Etiópia,
Cote d’Ivoire, Tailândia, Filipinas, Paquistão, Indonésia, Burna, Bangladesh,
Peru, Colômbia, Paraguai, Bolívia, Nicarágua, Jamaica, Sri Lanka, Argélia, Ser-
ra Leoa, Gâmbia, Mauritius, Zimbábue, Botsuana, Tunísia, Bahamas, Barbados,
República Dominicana, Bermuda, Trinidad e Tobago e Equador.

77
2 Mais detalhes sobre as transformações tecnológicas ver: Landes, 1994; Devine
Jr., 1983.
3 Para mais detalhes sobre a evolução automobilística, ver: Womack, 1992;
Kranzberg e Pursell, 1967.
4 Sobre a discussão das novas tecnologias de comunicação, ver: Dertouzos e
Moses, 1979; Button, 1993; Cairncross, 1999.
5 Para maiores detalhes a respeito da economia digital. Ver: Department of
Commerce, 1998; 1999; 2000; Orlikowski, 1999; Carley, 1999.
6 Nos últimos 16 anos, a economia norte-americana registrou dois comporta-
mentos um pouco distintos, sendo entre 1984 e 1989 com variação média
anual de 4,2% e de 3,7% entre 1990 e 1999. Ademais, devem-se considerar as
condições satisfatórias da “velha economia” diante de baixas taxas de juros,
amplo crédito a oxigenar as atividades econômicas, taxas de câmbio adequa-
do e políticas de defesa da produção e do emprego nacional.
7 Sobre a discussão metodológica a respeito da nova economia, ver: D´Amico,
1999; Department of Commerce, 1999; Haltiwanger e Jarmin, 1999.
8 Em 1998, 32,7% do total dos investimentos do setor industrial norte-america-
no foi de responsabilidade das indústrias de tecnologia de informação e co-
municação contra 9,4% da indústria automobilística, 8,6% do setor farmacêu-
tico e 3,6% do setor aeroespacial, segundo a National Science Foundation.
9 Sobre isso ver mais em: Department of Commerce, 2000; Orlikowski, 1999;
Carley, 1999; Moulton, 1999; Crairncross, 1999.
10 Mais detalhes podem ser encontrados em: Kuenzer, 1995; Ferretti, 1994; Gentili
e Silva, 1994; Aranha, 1999; Cocco, 2000; Reich, 1994.
11 Sobre isso ver mais em: Banco Mundial, 1999; Acemoglu, 1997.
12 Para maiores detalhes ver: Salm, 1998.
13 Tomou-se como referência não apenas as pesquisas realizadas nos domicílios
(Censo, PNAD, PME e PED), como também pesquisas feitas em estabelecimentos
(PIM Censo Econômico e Sindicais) e por registro administrativo (Rais/Caged).
14 Sobre o papel da tecnologia, ver Fiori, 1995; Lastres at alii, 1998; Lópes e
Lugones, 1998; Aurea e Galvão, 1998; Freeman, 1998.

78
A redivisão regional do emprego

Um quarto mito decorrente do neoliberalismo adotado no Bra-


sil ganhou ênfase com o abandono das políticas de desenvolvi-
mento regional durante os anos 1990. A doutrina liberal fez crer
que a ausência do Estado na promoção de medidas corretivas no
plano geográfico nacional produziria um país menos desigual, com
expansão das regiões mais pobres acima das regiões menos ricas,
o que levaria à desconcentração da riqueza, a produção e o em-
p rego. Mais uma vez, um ledo engano. O Brasil pouco cresceu,
mantém-se tão ou mais desigual, marcado pelo aprofundamento
da competição entre as distintas unidades federativas nacionais
que disputam o jogo de soma zero. Quando uma unidade
subnacional ganha, outra perde, esfacelando-se a sinergia que an-
teriormente havia e marcava a grande unidade nacional.
Em apenas cinco décadas, como se sabe, o desenvolvimento
capitalista no Brasil possibilitou a rápida passagem de um país
agrário-exportador para uma economia urbano-industrial. Esse mo-
vimento estrutural ocorreu de maneira integrada, permitindo arti-
cular praticamente todo o espaço geográfico nacional, especial-
mente num país de dimensão continental. Mas a sinergia produtiva
expressa pelas profundas transformações socieconômicas se deu
moldada por uma ampla desigualdade regional. A despeito de ele-
vadas taxas de expansão econômica, percebeu-se que elas expres-
savam sobretudo o maior desenvolvimento de apenas algumas re-
giões geográficas. A concentração das atividades econômicas,
especialmente nas regiões Sul e Sudeste, e, por conseqüência, das

79
principais ocupações, foi percebida ainda no final dos anos 1950,
quando foram tomadas algumas iniciativas governamentais visan-
do conter a ênfase concentradora da evolução econômica. Ações
de parte do Estado foram adotadas, com o objetivo de amenizar o
impulso concentrador do projeto de industrialização nacional,
desconcentrando também os empregos na década de 1970.
Durante os anos 1980, apesar da presença de uma década
perdida, com baixas taxas de expansão econômica, observou uma
leve descentralização da renda. Mas com a adoção de um novo
modelo econômico a partir de 1990, a tendência de desconcentra-
ção foi interrompida, voltando a elevar a desigualdade regional,
especialmente devido ao abandono das políticas de desenvolvi-
mento regional e às medíocres taxas de expansão econômica.
Em virtude disso, assistiu-se, em relação ao emprego, ao de-
senrolar de duas tendências. De um lado, o avanço da desconcen-
tração das atividades vinculadas ao uso intensivo de mão-de-obra,
como nas indústrias têxteis, calçados e alimentícias. O objetivo de
redução de custos, entre eles o do trabalho, estimulou algumas
empresas a buscarem regiões onde a mão-de-obra represente o
menos possível na estrutura de custo das empresas.
De outro lado, verificou-se a presença do movimento de
reconcentração do emprego nas atividades econômicas intensivas
em capital. Ao buscar a maior competitividade, através de sua
vinculação com os principais centros consumidores do país, empre-
sas como de telecomunicação, informática, automobilística, do setor
financeiro, entre outras, voltaram a avançar sobre as regiões mais
desenvolvidas do país, implicando uma nova concentração regional.
Aborda-se neste momento, de maneira generalizada, o quarto
mito neoliberal no país, através da análise relativa à evolução re-
cente da redivisão regional do emprego nos anos 1990, em três
partes. Na primeira procura-se tratar da temática referente ao de-
senvolvimento regional. Na segunda parte discutem-se os princi-
pais efeitos regionais decorrentes da implantação de um novo
modelo econômico, especialmente em relação aos movimentos de
descentralização e reconcentração da produção. Por fim, na tercei-
ra parte são apresentadas as principais informações relativas à evo-
lução recente do emprego regional.

80
DESENVOLVIMENTO REGIONAL E EMPREGO NO BRASIL
O tema desenvolvimento e desequilíbrio regional assume grande
relevância na literatura nacional. Tradicionalmente, por se tratar de
um país de dimensão continental, as desigualdades espaciais são
objeto de importantes debates.
O padrão de desenvolvimento capitalista no Brasil foi hetero-
gêneo setorial e espacialmente. Ao fim de cinco décadas de rápido
crescimento econômico (1930-1980), o país não havia registrado
expressiva redução nas diferenças inter-regionais. Apenas quando
analisado do ponto de vista da evolução da renda per capita inte-
restadual e intra-regional constata-se uma tendência de queda da
desigualdade1.
Gráfico 15 – Brasil: evolução do índice de desigualdade do
Produto Interno Bruto per capita inter-regional, intra-regional e
interestadual (1980 =100,0)
140
130
120
110
100
90
80
70
60
50
40

Inter-regional Intra-regional Interestadual


Fonte: IBGE, Azzoni, 1997.
* Estimativa.

Nas duas últimas décadas do século XX, quando o país regis-


trou taxas relativamente baixas de variação do Produto Interno
Bruto, praticamente acompanhando o ritmo de expansão demo-
gráfica, a renda per capita praticamente manteve-se inalterada, ao
contrário do período anterior, quando a renda per capita cresceu
cerca de 4% ao ano, em média (1960-1980). Não obstante a relativa
estagnação da renda per capita nacional, a desigualdade inter-re-
gional apresentou sentidos distintos na sua variação.

81
Na década de 1980, houve uma leve redução no índice de
desigualdade da renda per capita inter-regional, enquanto nos anos
1990 a tendência foi de elevação da diferença de renda per capita.
Movimento parecido no mesmo sentido pode ser observado em
relação à desigualdade inter-estadual.
Somente em relação à desigualdade intra-regional ocorreu
movimento inverso. Ou seja, uma elevação na desigualdade da
renda per capita nos anos 1980 e uma redução na década de 1990.
Percebe-se que as macrorregiões geográficas do país tenderam
a ampliar o grau de desigualdade medido, através da renda por
habitante, enquanto no interior de cada macrorregião geográfica,
houve uma redução das desigualdades. Em síntese, no interior de
cada macro região houve maior identidade, ao passo que entre as
regiões cresceram as desigualdades de renda por habitante.
Diante de movimentos associados tanto à concentração quan-
to à desconcentração regional2, cabe identificar como se compor-
tou a ocupação. Tomando-se como referencial o comportamento
do PIB, nota-se uma relativa desaceleração da concentração nas
duas últimas décadas para as regiões mais desenvolvidas, ainda
que nos anos 1990, tenha havido uma leve recuperação.
Gráfico 16 – Evolução da participação relativa das grandes regiões
geográficas no PIB nacional (Brasil=100,0)

Fonte: IBGE.

82
Por conseqüência, a evolução do emprego formal também
aponta para uma relativa desconcentração nas duas últimas déca-
das para as regiões mais desenvolvidas. As regiões menos desen-
volvidas, em contrapartida, registram uma leve ampliação na parti-
cipação relativa do emprego assalariado com carteira assinada.
Mas não apenas em relação ao movimento do emprego assala-
riado com contrato de trabalho houve redução na participação
relativa das regiões mais desenvolvidas do Brasil. Também obser-
vou-se nas duas últimas décadas do século XX a desconcentração
do desemprego aberto.
As regiões mais desenvolvidas perderam participação relati-
va no desemprego aberto nacional. Em conseqüência, as regiões
menos desenvolvidas aumentaram suas presenças no total do de-
semprego aberto, ainda que nos anos 1990 ocorresse uma leve
diminuição.

Gráfico 17 – Evolução da participação relativa das regiões geográficas


no emprego formal total (Brasil=100,0)

Fonte: MTE.

Quando analisados do ponto de vista do emprego pode-se


notar que o emprego e o desemprego não apresentam o mesmo
comportamento. Não obstante a leve ampliação das regiões me-
nos desenvolvidas no total do emprego formal a partir dos anos
1980, constata-se também a maior presença relativa no total do
desemprego.

83
As regiões mais desenvolvidas perderam participação relati-
va no total do emprego assalariado com registro. Mas, em contra-
partida, também deixaram de representar tão intensamente o con-
junto de desempregados do país. Dessa forma o país segue
desigual, agravado pela desregulação imposta pelo neoliberalismo.
Isso precisa ser enfrentado, sob o risco de a fragmentação nacio-
nal tornar o país objeto de disputas regionais que superam o
projeto de nação.

NOVO MODELO ECONÔMICO, DESCENTRALIZAÇÃO E RECONCENTRAÇÃO


REGIONAL

Os distintos movimentos de concentração e desconcentração


regional refletem, em maior ou menor medida, modificações sig-
nificativas na estrutura produtiva durante as últimas sete décadas
no Brasil. A perda de importância do setor agrícola e o crescimen-
to relativo dos setores industriais e de serviços urbanos refletiram
alterações ocorridas no parque produtivo nacional e regional.
Na medida em que as regiões menos desenvolvidas foram am-
pliando a presença das atividades econômicas urbanas (serviços e
indústria), a composição do Produto Interno Bruto foi sendo alte-
rada, acompanhada, em parte, pelas modificações na estrutura ocu-
pacional. Certamente, as ações governamentais em apoio ao de-
senvolvimento regional, especialmente entre 1939 e 1980, mostraram
ser positivas no objetivo de reduzir as distâncias geradas por dife-
renças na evolução do produto e entre estados e regiões (Silva e
Affonso, 1995; Pacheco, 1998; Cano, 1997).
A partir dos anos 1980, a economia brasileira passou a viver
um ambiente econômico de relativa estagnação da renda per
capita. Mais importante do que isso foi a constatação sobre o
descolamento da relação entre evolução da renda e do emprego
formal nos anos 1990.
Em parte, reflete a presença de múltiplos movimentos de des-
concentração e concentração produtiva que foram expressão, em
maior e menor medida, do modelo econômico, devido aos seus
reflexos nas dinâmicas produtiva e ocupacional regional. Nos anos
1980, por exemplo, diante do ajuste exportador, a economia nacio-

84
nal alterou a sua relação com exterior, o que implicou maior opor-
tunidade de expansão para algumas regiões em detrimento de
outras.
Para fazer frente à crise da dívida externa, no início da década
de 1980, medidas governamentais favoráveis às exportações e
inibidoras das importações foram implementadas, abrindo novas
possibilidades de expansão regional diferenciada. A região Norte,
por exemplo, expandiu sua presença na pauta de exportação, como
conseqüência dos estímulos fiscais e financeiros recebidos.
Nos anos 1990, o predomínio de um quadro institucional de
crescente esvaziamento das políticas públicas de desenvolvimento
regional por parte do governo federal colocou aos governos locais
o uso de artifícios como a redução competitiva de tributos, com o
intuito de atrair empresas. Por conta disso, a antiga sinergia exis-
tente entre os estados perdeu importância, com a ampliação das
desigualdades regionais, num quadro de relativa estagnação da
renda per capita.

Gráfico 18 – Brasil: evolução dos índices do Produto Interno Bruto per


capita e do emprego formal por regiões geográficas (1980-1997)

Brasil Região Centro-Oeste

85
Região Norte Região Nordeste

Região Sudeste Região Sul

Fonte: IBGE e MTE. Elaboração própria.

Em geral, em maior ou menor medida, as macrorregiões regis-


traram, durante os anos 1990 uma divergência notória entre a evo-
lução da renda por habitante e o comportamento do emprego
assalariado com registro. Nas regiões mais desenvolvidas isso ocor-
reu de maneira mais evidente, sendo menos perceptível na região
Centro-Oeste.

86
No conjunto do emprego formal foram constatadas várias dife-
renças na evolução regional, embora os dados do Ministério do
Trabalho e do Emprego possam refletir resultados decorrentes do
avanço da cobertura das informações no período recente. Por conta
disso, permanece uma grande dificuldade na avaliação a respeito da
existência ou não da desconcentração ou da concentração regional.
Mas a análise no plano regional realizada através da dimensão
setorial em cada estado e macrorregião permite notar evidências
de tendências múltiplas e divergentes quanto a evolução das desi-
gualdades regionais. Em relação aos setores de atividade econômi-
ca mais intensivos no uso de mão-de-obra e de maior peso do
custo do trabalho na estrutura de despesas das empresas ocorreu,
em geral, um movimento de desconcentração regional nos estados
mais industrializados.
No caso das atividades como de calçados, têxtil, brinquedos e
alimentos podem ser identificados sinais de desconcentração da
produção e, por conseqüência, dos empregos. Nos anos 1990, as
regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste ampliaram a participação
relativa no emprego total nos setores como calçados (de 3,2%, em
1989, para 9,4%, em 1998) e têxtil (de 16,2%, em 1989, para 17,5%,
em 1998).
As principais razões que ajudam a entender essa nova situação
do emprego estão associadas à força do novo modelo econômico.
Diante da ausência de políticas públicas federais voltadas para o
desenvolvimento regional e da persistência de baixas taxas de cres-
cimento econômico, os governos locais lançaram mão de expedi-
entes fiscais, como artifício de atração de empresas, através da
redução de custos de financiamento das empresas.
As regiões menos desenvolvidas foram mais ousadas no ofere-
cimento de subsídios fiscais e creditícios, sempre que possível (Prado
e Cavalcanti, 2000). As empresas pressionadas pelo ambiente
macroeconômico de estagnação relativa da renda per capita, de
abertura comercial, de altas taxas de juros e de câmbio valorizado
procuraram reduzir custos no que foi possível.
Muitas vezes, a transferência da planta produtiva de uma re-
gião para outra terminou sendo a alternativa para conviver com
um ambiente macroeconômico desfavorável. A possibilidade de

87
praticar custos tributários menores e de reduzidos custos do traba-
lho terminou favorecendo a situação de empresas tradicionais e
intensivas em mão-de-obra.
Em contrapartida ao movimento de desconcentração produtiva
e ocupacional para alguns setores, assistiu-se ao fortalecimento da
tendência de reconcentração produtiva e do emprego para setores
de atividade intensivos em capital. Para as empresas tecnologicamente
mais avançadas e com maior coeficiente de geração de valor agrega-
do, a proximidade de centros consumidores, aliada à possibilidade
de uso de melhor infra-estrutura e de mais alta qualificação dos
trabalhadores, contribuiu para o reforço na concentração ocupacio-
nal e da produção nas regiões Sul e Sudeste.
Para as indústrias vinculadas ao setor de material elétrico e de
comunicações, as regiões Sul e Sudeste aumentaram a participação
relativa de 74,8% do emprego assalariado formal total, em 1989,
para 76,3%, em 1998. O mesmo se verificou nas indústrias de ma-
terial de transporte, que passou de 97,5% do total do emprego
formal, em 1989, para 97,9%, em 1998. Outras indústrias como
mecânica, material não-metálico, metalurgia, química, papel e pa-
pelão também reforçaram a concentração da produção e do em-
prego nas regiões mais desenvolvidas ao longo dos anos 1990.
Em síntese, as regiões menos desenvolvidas, movidas pela
guerra fiscal, atraíram produção e emprego pertencentes, em ge-
ral, a setores de atividade econômica mais intensivos em mão-de-
obra, enquanto as regiões mais desenvolvidas ampliaram a partici-
pação relativa nos setores mais dinâmicos e tecnologicamente mais
avançados. Por conta disso, o novo modelo econômico desfaz a
possibilidade de construir um país menos heterogêneo do ponto
de vista da espacialização da produção e do emprego.

A REDIVISÃO REGIONAL DO EMPREGO

O desempenho econômico medíocre nos anos 1990 ocorreu


paralelamente ao aumento dos desequilíbrios regionais. Ao mes-
mo tempo, a força do novo modelo econômico, desatrelado de
políticas públicas de desenvolvimento regional, conduziu o país
para uma relativa desarticulação de parte da estrutura produtiva.

88
Os efeitos decorrentes dessa nova realidade para o emprego
pode ser analisado do ponto de vista regional através de diferentes
formas. Optou-se por explorar dois diferentes enfoques sobre a
evolução da ocupação em distintas dimensões regionais durante
os anos 1990.
O primeiro enfoque busca analisar o comportamento quantita-
tivo do emprego nos chamados pólos industriais. No segundo en-
foque trata-se de analisar a evolução das diferentes formas de ocu-
pação nas macrorregiões geográficas.
Durante a década de 1990, como se sabe, a indústria foi o
setor mais atingido, especialmente em determinadas cadeias pro-
dutivas. Em virtude disso, os pólos industrias de desenvolvimento
regional terminaram sendo os mais prejudicados3.
Ao se utilizar como referencial de pólo de desenvolvimento
industrial, os municípios com mais de 15 mil empregados assalari-
ados formais, constata-se a perda de importância em várias regiões
geográficas nacionais. Em 1970, por exemplo, o Brasil possuía 23
pólos industriais, sendo vinte concentrados nas regiões Sul e Su-
deste, o que equivalia a 87% do total.
Em 1989, o país contava com 69 pólos industriais, sendo as
regiões Sul e Sudeste responsáveis por 57, ou seja, por 82,6% do
total. Em 1998, a quantidade de pólos industriais havia sido reduzida
para 48. As regiões Sul e Sudeste, responsáveis por quarenta dos
pólos industriais, ampliaram para 83,3% suas presenças relativas.
Quando se leva em consideração a evolução da massa de ren-
dimentos na evolução dos pólos industriais, observa-se o retorno
da importância das regiões mais desenvolvidas. Em 1970, as re-
giões Sul e Sudeste respondiam por 86,9% da massa de rendimen-
to dos trabalhadores empregados nos pólos industriais e, em 1989,
havia sido reduzido para 81,4%. Em 1998 voltou a aumentar para
85,9%, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego.
Ao mesmo tempo em que ocorreu a redução da importância
relativa dos pólos industriais no total do emprego formal constata-
se, paralelamente, a elevação do emprego assalariado com carteira
para os municípios menores. O crescimento do emprego industrial
nos municípios menores reflete, em grande medida, a força da
urbanização.

89
Com ele, aumenta a demanda por pequenas empresas industriais
de reparação de veículos, esquadrias metálicas, consertos de
eletroeletrônica, entre tantos outros serviços industriais de pequena
monta. Em geral, nos municípios menores, tamanho médio das empre-
sas industriais é de 467 empregados, enquanto nos pólos industriais, o
tamanho médio das empresas industriais é de 2,3 mil empregados.
Apesar de pequenos e médios municípios brasileiros terem
ampliado a sua participação relativa no total do emprego industrial
nos anos 1990, houve redução do estoque de empregos na indús-
tria. Entre 1989 e 1998, os municípios com menos de 15 mil empre-
gados no setor industrial registraram uma redução estimada de
350 mil postos de trabalho formais.
No mesmo período de tempo, os pólos industrias tiveram uma
diminuição de quase 1,7 milhão de empregos no setor industrial.
Percebe-se que o novo modelo econômico foi mais prejudicial ao
emprego justamente nas cidades que concentravam a maior quan-
tidade de trabalhadores industrias.
Em relação ao comportamento do conjunto das ocupações, tam-
bém podem-se notar importantes alterações regionais. Quando toma-
se como referencial a evolução da ocupação na indústria de trans-

Gráfico 19 – Brasil: evolução da divisão da ocupação e da renda por


grandes regiões geográficas*, 1992 e 1999 (em anos e em %)

Ocupação na indústria
de transformação

Em 1999 Em 1992
4 ,5 1 7 ,2 3 ,9 1 6 ,6

2 2 ,9 2 1 ,4

5 5 ,4 8 8 ,2

Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

90
Emprego formal
Em 1999 Em 1992

4 0 ,8
42
58
5 9 ,2

Brasil metropolitano Brasil não metropolitano Brasil metropolitano Brasil não metropolitano

Renda do trabalho
Em 1999 Em 1992

8 ,3 15 7 ,6 1 5 ,1

1 8 ,3 1 8 ,8

5 8 ,4 5 8 ,4

Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste

Fonte: IBGE - PNAD.


* Região Norte excluída devido a não inclusão pela PNAD de sua população rural. Elaboração
própria.

formação nota-se que nas grandes regiões geográficas do país hou-


ve aumento da participação relativa, excluindo-se a região Sudeste,
que é o principal pólo industrial do país.
Em 1999, por exemplo, a região Sudeste representava 55,4% da
ocupação total no setor industrial, enquanto em 1992 era 58,2%. Em
sete anos, a região Sudeste perdeu 2,8 pontos percentuais na sua
participação relativa nas ocupações da indústria de transformação.
Se a comparação for com base na evolução do total do emprego
com carteira assinada, também pode-se constatar uma perda de par-
ticipação relativa da região Sudeste. Mas essa diminuição é relativamen-
te menor, estimada em 1,7 ponto percentual entre 1992 e 1999, en-
quanto as demais regiões geográficas aumentam suas participações.

91
Ao se considerar ainda a evolução do total da renda do traba-
lho pode-se observar certa estabilidade na sua divisão regional. A
região Sudeste manteve intacta a sua participação relativa, enquan-
to a região Centro-Oeste aumentou a sua e as regiões Sul e Nor-
deste perderam participação relativa.
Por fim, quando se relaciona a evolução da participação do empre-
go e da renda no conjunto das regiões metropolitanas com o resto do
Brasil, também percebe-se a ampliação relativa das regiões não me-
tropolitanas. Tanto no emprego formal quanto na renda do trabalho
do setor industrial, as regiões metropolitanas perdem participação rela-
tiva, indicando uma expansão do interior do país durante 1992 e 1999.
A despeito desse conjunto importante de informações quanti-
tativas indicar a descentralização da ocupação, deve-se analisar
melhor o tipo de ocupação em expansão fora das regiões mais
desenvolvidas. Em síntese, há indicações de que, em geral, não
são postos de trabalho de qualidade, pois em caso contrário, a
participação na renda do trabalho das regiões menos desenvolvi-
das deveria ter crescido nos anos 1990. Mas isso não aconteceu.
Dessa forma, a década de 1990 implicou, na maior parte das
vezes, destruição de empregos de maior qualidade nas regiões
mais desenvolvidas e criação de ocupações de menor rendimento
nas regiões menos desenvolvidas. A permanência e até mesmo o
aumento no grau de desigualdade regional surgem como conse-
qüência direta do curso do novo modelo econômico de corte
neoliberal implementado no Brasil.
NOTAS:
1 Tradicionalmente, os estudos sobre evolução espacial da renda per capita
tomam como referencial a desigualdade inter-regional, quando se trata das
macrorregiões geográficas do país. Já o indicador de desigualdade intra-re-
gional tem sido usado como referencial das diferenças no interior das
macrorregiões geográficas e, ainda, a desigualdade interestadual, como ava-
liação das diferenças de renda per capita entre os estados. Para medir a desi-
gualdade de renda per capita utiliza-se como indicador o coeficiente de Theil.
Sobre isso ver: Azzoni, 1997; Hoffman, 1997.
2 Para maiores detalhes ver: Cano, 1985; Negri, 1992; Diniz, 1987; Guimarães
Neto, 1997; Azzoni, 1986; Pacheco, 1998.
3 A literatura sobre pólo industrial pode ser encontrada em Diniz e Crocco,
1996; Guimarães Neto, 1996; Lavinas, 1996.

92
Mudanças na distribuição de renda

A desconcentração da renda motivada pela adoção de políti-


cas neoliberais nos anos 1990 mostrou ser mais um mito para os
brasileiros. Ao contrário do que foi inicialmente anunciado pelos
fundamentalistas neoliberais, o Brasil segue campeão mundial em
desigualdades entre ricos e pobres, ao mesmo tempo em que a
renda do trabalho ficou ainda menor quando comparada com o
tamanho dos lucros dos capitalistas.
Não é novidade saber que a repartição extremamente desi-
gual da renda nacional constitui uma chaga marcante na evolu-
ção estrutural do capitalismo brasileiro. Mas, apesar de ser uma
referência internacional de regressão distributiva, o país parecia
viver, recentemente, com o êxito do Plano Real quanto à estabi-
lização monetária, uma situação mais confortável em termos de
bem-estar.
Adicionalmente aos aparentes resultados positivos promovi-
dos pela estabilidade no custo de vida para as famílias mais po-
b res, tem sido generalizada uma hipótese sobre a redução no
grau de dispersão dos rendimentos da População Economica-
mente Ativa ocupada, o que significaria uma melhora no perfil
distributivo. Mas isso, todavia terminou não se sustentando ao
longo dos anos 1990.
Ainda que sejam escassos os indicadores conjunturais sobre a
situação nacional de repartição da renda, tornam-se necessários o
acompanhamento de dados específicos e a continuidade das in-
vestigações sobre a situação da desigualdade dos rendimentos,

93
principalmente a partir da retomada do nível de atividade em 1993.
Tanto do ponto de vista da distribuição pessoal quanto funcional
da renda, não se percebe melhoria significativa durante a década
de 1990.
De um lado, a estabilização dos preços, a partir do segundo
semestre de 1994, terminou repercutindo favoravelmente no nível
de renda pessoal, trazendo efeitos positivos sobre o perfil dos ren-
dimentos dos trabalhadores ocupados. Nesse sentido, o acompa-
nhamento da evolução recente da desigualdade entre diferentes
escalas de rendimentos permite identificar movimentos gerais no
formato distributivo, especialmente a partir da retomada das ativi-
dades econômicas (1993) e da implantação do programa de estabi-
lização monetária (1994). Apesar disso, a desigualdade de renda
não foi alterada significativamente. Deve-se creditar ao comporta-
mento geral da economia brasileira, influenciada decisivamente
pelo novo modelo econômico, a responsabilidade pela permanên-
cia de elevada concentração da renda nacional.
Com base nos dados sobre a distribuição da renda produzidos
pela Fundação IBGE e do Dieese em convênio com a Fundação
Seade, realizou-se a organização das informações que possibilitou
acompanhar a evolução do grau de desigualdade de rendimento
ao longo dos anos 1990. Ao aliar-se a análise dos dados com a
revisão da literatura especializada foi possível produzir o que se
expõe a seguir. Na primeira parte, procurou-se recuperar sintetica-
mente os principais termos do debate sobre a distribuição de ren-
da no Brasil. Em seguida, buscou-se identificar o movimento da
desigualdade dos rendimentos a partir da implementação do novo
modelo econômico. Na última seção são analisados os principais
efeitos da estabilização monetária sobre a dispersão dos rendimen-
tos da PEA ocupada.

DESIGUALDADES NOS RENDIMENTOS NO BRASIL: BREVE RECUPERAÇÃO


DOS TERMOS DO DEBAT E

A redistribuição regressiva da renda nacional não constitui


um fato novo no Brasil. É relativamente ampla a literatura espe-
cializada que tem tratado do tema, especialmente a partir dos

94
anos 1960, quando o censo demográfico passou a incorporar a
variável renda.
As primeiras análises sobre os dados da distribuição de renda
contribuíram para reafirmar uma realidade de incorporação parcial
da sociedade brasileira.1 Não obstante as profundas e rápidas trans-
formações no capitalismo brasileiro, que permitiram ultrapassar
uma fase agrário-exportadora para ingressar rapidamente num
ambiente urbano-industrial, permaneceram os traços gerais de gran-
de concentração da renda para poucos grupos sociais.
Duas contribuições se mostraram importantes para a interpre-
tação geral do processo de concentração de renda no país. A pri-
meira está associada ao entendimento sobre a natureza e a form a
de constituição do padrão de acumulação de capital no Brasil, que
provocou uma elevada desigualdade nos rendimentos2 . A segunda
contribuição refere-se à identificação do verdadeiro charme do
capitalismo brasileiro, motivado pela reprodução de um significati-
vo movimento de mobilidade social em meio a uma profunda
ampliação da já elevada desigualdade social, de renda e riqueza3 .

Gráfico 20 - Distribuição do rendimento médio por décimos da Popula-


ção Economicamente Ativa com renda em países selecionados (em %)

Fonte: Banco Mundial, 1995.

No início dos anos 1970, a divulgação das informações sobre o


estágio da distribuição da renda impulsionou um interessante e

95
polêmico debate acerca dos mecanismos de concentração da ren-
da e dos grupos beneficiados e prejudicados pelo projeto de de-
senvolvimento socioeconômico do regime militar. De um lado, en-
contravam-se aqueles que identificavam a política macroeco-nômica
do governo autoritário como responsável pela maior concentração
da renda. De outro lado, encontravam-se os autores que, sem ne-
gar as restrições do movimento geral de repartição da renda, apre-
sentavam outras justificativas, como a falta de escolaridade e for-
mação profissional do conjunto dos trabalhadores4 .
Na década de 1980, a concentração da renda e da riqueza
nacional voltou a aumentar, sendo por isso objeto de vários estu-
dos. A crise no padrão de financiamento da economia brasileira e
a adoção de constantes programas de ajustes macroeconômicos se
mostraram responsáveis pela conformação de um processo
hiperinflacionário e de um ambiente de profunda oscilação do
produto, que terminaram gerando, por conseqüência, a estagna-
ção da renda e a concentração dos rendimentos em classes privile-
giadas da população brasileira5 .
Durante os anos 1990, os estudos sobre a distribuição da ren-
da depararam com fatos novos. A recessão econômica nos anos
1990–1992, o retorno de indicadores positivos no comportamento
do produto a partir de 1993 – sem repercussão positiva sobre o
nível geral de emprego regular e regulamentado –, o êxito do
plano de estabilização monetária, o ajuste no setor privado e a
privatização terminaram repercutindo, em alguma medida, sobre o
perfil da distribuição da renda nacional6 . Ainda que possam per-
manecer vários pontos de divergência nos estudos recentes sobre
a situação da repartição da renda nacional, parece haver, todavia,
uma grande sintonia nas análises sobre a permanência de elevada
regressividade distributiva no Brasil, principalmente quando rela-
cionada com a experiência internacional.

NOVO MODELO ECONÔMICO E A PERSISTÊNCIA NA CONCENTRAÇÃO DE


RENDA

A repartição da renda nacional pode ser estudada por intermé-


dio de diferentes métodos de estimação de análises. Além da distri-

96
buição pessoal e funcional (participação relativa da renda apropri-
ada por classes de rendimento ou por componentes constitutivos
da formação da renda), há também o critério de desigualdade dos
rendimentos, que objetiva medir o grau de dispersão da renda
entre distintas classes de remuneração da População Economica-
mente Ativa ocupada.
Usando diferentes critérios metodológicos, procurou-se anali-
sar a evolução da desigualdade de rendimento no Brasil, especial-
mente a partir de 1990, com a implementação de um novo modelo
econômico. Inicia-se com a abordagem referente à distribuição
pessoal da renda para, em seguida, tratar da distribuição funcional.
Antes de mais nada, deve-se recordar que um dos principais
a rgumentos utilizados para justificar a implementação do novo
modelo econômico a partir de 1990 foi a possibilidade de reverter
o vergonhoso processo de concentração da renda, riqueza e poder
que acompanha o país de longa data. A revisão no papel do Esta-
do, com a privatização do setor produtivo estatal, a reforma admi-
nistrativa e previdenciária, assim como a abertura comercial, a
desregulamentação financeira e a flexibilização do mercado de tra-
balho serviriam de fundamento, segundo o discurso oficial, para o
ingresso numa nova fase de redução da distribuição pessoal da
renda.
Sabia-se, antecipadamente, que a fase anterior de crescimento
econômico havia contribuído para o impulso ainda maior na desi-
gualdade da renda nacional. Entre 1960 e 1980, por exemplo, o
Brasil cresceu a uma taxa média de 6,9% ao ano, tendo o rendi-
mento médio dos 40% mais pobres registrado uma variação anual
de 3,9% ante 5,8% de expansão média anual do rendimento dos
10% mais ricos.
No período subseqüente, entre 1980 e 1999, a taxa de expan-
são anual da produção foi de apenas 2,1%, enquanto o rendimento
médio dos 40% mais pobres variou 0,6% ao ano contra 0,3% de
expansão média anual para o rendimento dos 10% mais ricos. Além
da situação de medíocre expansão da produção, a maior parte das
últimas duas décadas foi atingida por um dos mais longos proces-
sos hiperinflacionários do capitalismo do século XX, com inequívo-
co efeito sobre a renda dos brasileiros.

97
Entre 1980 e 1994, o rendimento dos 40% mais pobres caiu
7,9%, enquanto a dos 10% mais ricos foi reduzido em 8,6%. Ao
contrário do que se poderia imaginar, os dados oficiais indicam
uma inflexão superior na renda dos mais ricos em relação aos mais
pobres.
Apesar de atingir a estabilidade monetária, através do Plano
Real em 1994, não se identificou uma alteração substancial na dis-
tribuição pessoal da renda conforme anunciado insistentemente
por autoridades governamentais. Entre 1994 e 1998, por exemplo,
pode-se estimar que o rendimento dos 40% mais pobres cresceu
17,4%, levemente acima do rendimento dos 10% mais ricos (15,4%).
Com isso, o grau de desigualdade do ano de 1998 – último
dado produzido pela Fundação IBGE – foi ainda superior ao de
1992 em 10,2%, mas inferior em 25,9% ao de 1989. O atual grau
de desigualdade encontra-se próximo ao verificado na primeira
metade da década de 1980, sendo 50% maior que o registrado
em 1960.
Mas essa informação a respeito do grau de desigualdade da
renda encontra-se subestimada devido à presença de um novo
fator de diferenciação dos rendimentos pessoais. Trata-se, na reali-
dade, do movimento de desestruturação do mercado de trabalho,
responsável por altas taxas de desemprego aberto, do
desassalariamento (queda na relação entre assalariados e total de
ocupados) e da geração, em grande parte, de postos de trabalho
precários.
Considere-se que a metodologia tradicional de medição da
distribuição pessoal da renda leva em conta somente as pessoas
com mais de 10 anos e com rendimento, o que faz com que fi-
quem de fora os ocupados sem rendimento e os desempregados.
Como nos anos 1990, o que mais cresceu foi o desemprego, acom-
panhado das ocupações sem rendimento – que cresceram, em mé-
dia, 2,9% ao ano contra 13,6% do desemprego – nota-se que quase
4 milhões de pessoas não participaram do cálculo da distribuição
da renda. O motivo preciso disso é a ausência de renda.
Caso fossem incluídas, a desigualdade entre o rendimento médio
dos 10% mais ricos e o dos 40% mais pobres seria ainda mais
elevada, estimando-se o aumento de 13,4% na diferenciação do

98
rendimento dos 10% mais ricos contra os 40% mais pobres. Nessa
nova situação, o grau de desigualdade dos anos 1990 permanece
entre os mais altos da história recente do país, pelo menos desde
que foi realizado o primeiro informe censitário oficial de rendi-
mento, em 1960.
Sem a direta interferência sobre as causas estruturais da con-
centração da renda e da riqueza, dificilmente o Brasil abandonará
a posição de campeão internacional de desigualdades. Para isso, a
retomada do crescimento econômico sustentado na geração de
postos de trabalho apresenta-se como condição necessária, porém
não suficiente.
Urge também a implementação de reformas civilizatórias no
capitalismo brasileiro, através de uma efetiva reformulação fundiá-
ria e da implementação de uma estrutura tributária progressiva e
do avanço rumo ao estágio de bem-estar social, através da amplia-
ção dos gastos com infra-estrutura, saúde, educação, transporte e
lazer. O imobilismo perante essas questões condena fortemente o
Brasil, que ingressa no terceiro milênio tendo de conviver com
uma nova e pior desigualdade de renda.

Gráfico 21 – Brasil: evolução do grau de desigualdade de renda pessoal


média dos 10% mais ricos e dos 40% mais pobres (1960-1998)

Fonte: IBGE (censos e PNAD).

No caso da análise da distribuição funcional da renda também


se confirma o sinal do retrocesso, especialmente no caso do rendi-

99
mento do trabalho. No ano de 1999, por exemplo, o Produto Inter-
no Bruto (PIB) registrou uma elevação positiva de 0,6%, ao passo
que a renda do trabalho foi reduzida em 7,1%, segundo o IBGE. Em
síntese, as rendas das classes proprietárias, derivadas dos juros,
lucros e alugueis de imóveis, foram as que aumentaram, implican-
do diminuição relativa da participação do rendimento do trabalho
na renda nacional.
Ao longo dos anos 1990, a situação agravou-se muito mais.
Enquanto em 1989 o rendimento médio real do trabalhador equi-
valia a 560 reais, no ano de 1999 era de 525 reais. Para a renda do
trabalhador houve uma redução de 6,2% em termos reais ante a
expansão do PIB nacional de 19,4% para o mesmo período.
Conforme se pode observar, a teoria do bolo continua extre-
mamente atual. Só que nos anos 1990 ela terminou sendo pratica-
da por parte daqueles autores que nos anos 1970 eram os críticos
à política econômica do regime militar. Nota-se que na década de
1990, a renda não foi mais bem repartida, embora o bolo tenha
crescido, ainda que muito pouco, sem dúvida.
Nas últimas cinco décadas, a distribuição funcional da renda
piorou muito, sendo possível identificar a presença de quatro fases
distintas. Uma primeira ocorreu no segundo pós-guerra, durante a
experiência democrática, quando a expansão do país ocorreu acom-
panhada da manutenção relativa do rendimento do trabalho no
total da renda nacional. Entre 1949 e 1959, a parcela do trabalho
manteve-se estabilizada em torno dos 55% da renda nacional.
Uma segunda fase na distribuição funcional da renda se deu
durante o regime militar, quando o rendimento do trabalho perdeu
10% de sua participação relativa na renda nacional. Nessa fase, a
combinação do autoritarismo com o rápido e sustentado cresci-
mento econômico resultou na maior participação relativa da renda
das classes proprietárias no Brasil.
Numa terceira fase, distinguida pelo processo hiperinflacionário
dos anos 1980, o rendimento do trabalho perdeu, mais uma vez,
participação na renda nacional. A queda de 8% na parcela do tra-
balho na renda nacional foi estimulada não apenas pela alta cons-
tante do custo de vida, mas pela estagnação econômica, apesar do
movimento de redemocratização política do país.

100
Gráfico 22 – Brasil: evolução da distribuição funcional da
renda nacional brasileira (1949-1999)

Fonte: FIBGE.
* Estimativa.

Por fim, pode-se identificar a maturação de uma quarta fase na


distribuição funcional da renda, que se manifesta a partir da estabi-
lização monetária (Plano Real). Apesar da interpretação corrente
de que o desaparecimento do imposto inflacionário teria contri-
buído para a desconcentração da renda, isso não terminou sendo
verificado no país.
Em síntese, o processo atual de concentração na distribuição
funcional da renda é o pior das últimas cinco décadas. Sem a
alteração dos elementos estruturais que determinam a distribuição
da renda no Brasil, tais como o perfil e a sustentação do cresci-
mento econômico e a mudança substancial nas estruturas ocupa-
cional, social, fundiária e tributária, os pobres continuarão ficando
mais pobres, e os ricos, ainda mais ricos.

PLANO REAL E A INALTERAÇÃO DA DESIGUALDADE DE RENDA

Por fim, cabe analisar a experiência recente da estabilização


monetária e desequilíbrio da renda. Observa-se que em relação à
dispersão dos rendimentos antes e depois da introdução do Plano
Real, registraram-se significativos efeitos na região metropolitana
de São Paulo, sem alterar o sentido da concentração de renda.

101
Considerando-se o comportamento da desigualdade medida
pela relação entre o rendimento mínimo dos 10% mais ricos e o
rendimento máximo dos 10% mais pobres, pode-se observar entre
o período de janeiro de 1993 a maio de 1997 a existência de quatro
movimentos bem distintos:
• de janeiro de 1993 a março de 1994 houve grandes oscila-
ções no indicador de desigualdade dos rendimentos, com
variação negativa de 3,8% na diferença entre as duas classes
de rendimentos relacionados, que passou de 13,0 vezes para
12,5 vezes;
• no período de março a novembro de 1994, a desigualdade
de rendimentos aumentou rapidamente, passando de 12,5
vezes para 16,2 vezes, o que refletiu uma variação positiva
de 29,6%, seguida ainda de uma queda na desigualdade dos
rendimentos entre agosto e outubro de 1994 (–5,0%);
• nos meses de novembro de 1994 a março de 1996, a desi-
gualdade dos rendimentos diminuiu, passando de 16,2 vezes
para 10,7 vezes, o que significou uma variação negativa de
34,0%. Convém destacar que esse período foi marcado por
leves oscilações no nível de desigualdade dos rendimentos,
com dois movimentos de interrupção parcial de queda na
desigualdade, o primeiro entre março e maio de 1995 (1,7%)
e o segundo de setembro a novembro de 1995 (12,8%);
• a partir de março de 1996, observou-se a presença de sinais
apontando tanto para o esgotamento da tendência de queda
quanto para o aumento das desigualdades entre o rendimen-
to mínimo dos 10% mais ricos e o máximo do rendimento
dos 10% mais pobres. Em maio de 1997, o indicador de de-
sigualdade dos rendimento era de 13,2 vezes contra 10,7
vezes em março de 1996, o que significa uma variação posi-
tiva de 23,9%. É necessário informar que nesse período hou-
ve um momento de diminuição contida do grau de desigual-
dade, com variação negativa de 15,3% nos meses de setembro
e dezembro de 1996 e dois momentos de aumento na desi-
gualdade, o primeiro no período de março a setembro de
1996 (24,5%) e o segundo de dezembro de 1996 a maio
de 1997 (17,4%). Por fim, cabe destacar que o grau de desi-

102
gualdade dos rendimentos de maio de 1997 (13,2 vezes) é
maior do que o de janeiro de 1993 (13 vezes) e o de março
de 1994 (12,5 vezes), representando um perfil distributivo
atual pior do que a situação que antecede a implantação do
Plano Real.
Entre janeiro de 1993 e maio de 1997 foram registrados os
seguintes fatos que tiveram repercussão direta no grau de desi-
gualdade observado entre o rendimento mínimo dos 10% mais
ricos e o rendimento máximo dos 10% mais pobres na Região
Metropolitana de São Paulo:
• durante o período de implantação do Plano Real (URV e mu-
dança do padrão monetário) foi acompanhado de um movi-
mento de maior grau de desigualdade dos rendimentos;
• no período após a implementação do Plano Real, sobretudo
em 1995, houve um movimento de queda no grau de desi-
gualdade de rendimentos que se mostrou suficiente apenas
e tão-somente para fazer retornar a uma posição que antece-
de a implantação do Plano Real, ou seja, antes da aceleração
nas diferenças de rendimentos promovida durante a fase de
indexação de preços e salários (através da URV) e de mudan-
ça do padrão monetário. Essa aceleração foi especialmente
grave para os trabalhadores com menor rendimento, já que
aqueles com rendimento intermediário passaram por uma
situação aparentemente mais grave no ano de 1993, durante
o início da recuperação do nível de atividade econômica.
Para essa faixa da população (50% mais pobres), a redução
no grau de desigualdade dos rendimentos após a implemen-
tação do Plano Real não permitiu o retorno a uma situação
de desigualdade observada no ano de 1993. Dessa forma, a
queda na dispersão dos rendimentos ocorrida no período
após implementação do Plano Real não implicou, necessa-
riamente, melhora da situação de desigualdade dos rendi-
mentos dos trabalhadores ocupados;
• a partir do início de 1996 constatou-se o esgotamento dos
efeitos positivos da estabilização monetária sobre a redução
da desigualdade dos rendimentos, parecendo confirmar, por
outro lado, um movimento de elevação na dispersão dos

103
rendimentos e contribuir ainda mais para a piora do perfil
distributivo da renda dos ocupados.
Em síntese pode-se notar que para a região metropolitana de
São Paulo, conforme dados da Pesquisa de Emprego e Desempre-
go da Fundação Seade e Dieese, houve um aumento da desigual-
dade nos rendimentos a partir de 1996. A análise da situação da
Grande São Paulo possibilita identificar mais precisamente o movi-
mento mensal dos últimos quatro anos da desigualdade nos rendi-
mentos, ao mesmo tempo que não parece contrapor, em grande
medida, a situação de desigualdades em outras regiões metropoli-
tanas selecionadas.
Não parece haver dúvidas a respeito da diminuição no grau de
dispersão dos rendimentos da população ocupada ocorrida após a
implantação do Plano Real.7 Essa redução, que ocorreu sobretudo
em 1995 permitiu, na melhor das hipóteses, uma volta à situação
de desigualdade verificada no período anterior à implementação
da Unidade Real de Valor e de mudança do padrão monetário, isto
é, a fase pré-Plano Real.
Naquela oportunidade, a introdução da URV não promoveu,
como previa originalmente a coordenação do programa
antiinflacionário, uma sincronização na variação dos preços. A URV
terminou não funcionando como um balizador de reajustes para
todos os preços, salvo, principalmente, o salário8. Os aumentos de
preços, em geral, possibilitaram para muitas empresas o acúmulo
de algumas folgas, que permitiram conviver no período de estabi-
lidade, mesmo com alguns reajustes nos salários e mudanças nos
preços relativos.
O esgotamento dos efeitos positivos da estabilização monetá-
ria sobre as rendas mais baixas e o movimento recente de amplia-
ção das desigualdades podem indicar um novo retrocesso no perfil
distributivo no país, mesmo num patamar de baixa taxa de infla-
ção, uma vez que os elementos estruturais da repartição da renda
(emprego, tributos e políticas sociais) parecem não estar sendo
utilizados de maneira adequada à melhora do perfil distributivo
dos trabalhadores ocupados. Assim, um possível crescimento na
desigualdade dos rendimentos pode estar associado atualmente
não às altas taxas de inflação, mas à debilidade das intervenções

104
do Estado sobre os rendimentos e a ocupação da PEA com baixos
rendimentos. Possivelmente, a condução da política macroe-
conômica provoca um ambiente desfavorável à situação dos traba-
lhadores, sobretudo com a elevação na desigualdade dos rendi-
mentos.
A situação do mercado de trabalho e a ausência de uma in-
tervenção pública favorável às famílias de baixa renda terminam
contribuindo para a corrosão dos ganhos no perfil distributivo
obtidos na fase pós-implantação do Plano Real. O mesmo pode-
se dizer da parcela dos trabalhadores ocupados por conta pró-
pria, que durante os dois anos iniciais do Plano Real obtiveram
ganhos de rendimento decorrentes da ausência de competição
externa e da elevação da renda nacional. Posteriormente, a piora
do mercado de trabalho e a desaceleração na variação dos preços
do setor terciário e da renda nacional passaram a contribuir para
a reversão da tendência de diminuição da dispersão dos rendi-
mentos dos ocupados.
Diante disso, pode-se concluir que a permanência de um qua-
dro de estabilidade monetária não assegurou, por si só, a reversão
da histórica situação nacional de regressividade distributiva. No
momento atual, pelo contrário, há sinais de que a desigualdade de
rendimentos estaria aumentando, especialmente no caso de algu-
mas regiões metropolitanas analisadas pela Pesquisa de Emprego
e Desemprego da Fundação Seade e Dieese.

NOTAS:
1 Sobre isso ver, por exemplo, Cepal, 1967; Tavares e Serra, 1970.
2 Para esse enfoque ver: Souza e Tavares, 1981.
3 Sobre o movimento de mobilidade social no período da industrialização ver:
Quadros, 1991; Pastore, 1983.
4 Parte importante do debate sobre a distribuição de renda nos anos 1970 pode
ser encontrada especialmente em: Tolipan e Tinelli, 1975; Bonelli, 1982; Langoni,
1973.
5 A literatura que trata da distribuição da renda nos anos 1980 pode ser em
parte encontrada especialmente em: Camargo e Giambiagi, 1991; Hoffman e
Kageyama, 1986; Bonelli e Sedlacek, 1989; Barros e Mendonça, 1992;
Pochmann, 1991.

105
6 Parte da literatura atual sobre a distribuição da renda pode ser encontrada em:
Dieese, 1993; Considera e Neri, 1996; Cacciamali e Pires, 1996; Cepal, 1997.
7 Sobre isso ver especialmente: Rocha, 1996; Barros e Neri, 1996.
8 Ver a análise da URV em: Sicsú, 1996.

106
Alterações recentes no custo do trabalho
no Brasil1

Ao longo dos anos 1990, quando as políticas neoliberais foram


amplamente aplicadas no Brasil, construiu-se o argumento de que
o custo do trabalho era muito elevado, o que inviabilizava a mo-
dernização do país, além de produzir informalidade nas relações
de trabalho e desemprego. Apesar de provocar maior flexibilização
dos contratos de trabalho e estimular a desregulamentação das
relações de trabalho, com sérios impactos negativos para o custo
do trabalho, o desemprego aumentou, assim como a informalida-
de dos postos de trabalho. O mito do custo do trabalho foi produ-
zido pelo neoliberalismo, como forma de tornar ainda mais baixo
o peso dos salários nas despesas das empresas, sem que com isso
houvesse estímulo a geração de mais empregos. O bode expiatório
do custo do trabalho serviu como ajuste ao insucesso das políticas
neoliberais, responsáveis pelo retrocesso do país no comércio ex-
terno, com a elevação artificial dos custos em dólares das empre-
sas que operam no Brasil.
Inegavelmente, as transformações na economia brasileira na
década de 1990 deram maior relevância à temática do custo do
trabalho na agenda nacional. Em parte, porque o custo do trabalho
foi associado à competitividade empresarial, à estabilidade mone-
tária, à geração de emprego e renda e, ainda, ao grau de formalização
dos contratos de trabalho e suas implicações na previdência social.
Em outras palavras, os governos dos anos 1990 associaram os gas-
tos das empresas com o emprego de trabalhadores como respon-
sáveis pela elevação do custo Brasil. Este, por sua vez, inibiria o

107
combate à inflação e a maior competitividade, estimulando o forta-
lecimento das propostas de redução do custo do trabalho no curso
do novo modelo econômico. Dessa forma, interessa aqui a discus-
são sobre o custo do trabalho – sua composição (custos salariais e
não salariais) e dimensão quantitativa – tanto para os contratos de
trabalho regulares (custo do trabalho-padrão) quanto para o setor
informal. Por assumir a diferenciação no funcionamento do merca-
do de trabalho como marca da realidade brasileira, interessa res-
saltar as especificidades mais presentes quanto ao ajuste econômi-
co e laboral resultante da externalização de grande parte do processo
p rodutivo e, por conseqüência, da implementação de novas for-
mas de uso e remuneração da mão-de-obra (novos contratos de
trabalho, terceirização, subcontratação, entre outros). O fato de o
recente resgate da temática sobre o custo do trabalho no Brasil ter
ocorrido de maneira condicionada pelo predomínio de um am-
biente socieconômico marcado por um expressivo engessamento
da política macroeconômica, responsável pela maior rigidez – para
o alto – de taxas de juros, de regimes cambial e fiscal e de exposi-
ção do parque produtivo nacional à ampla competição externa ,
gerou, na maioria das vezes, análises restritas e simplistas, bem
como argumentos inadequados e inconsistentes simbolizados em
três versões.
Na primeira versão encontram-se as interpretações que emer-
gem justamente da difusão de uma metodologia imprópria à aferi-
ção do custo do trabalho no Brasil e sua comparação com o de
outros países. Pode-se constatar, por exemplo, que – sem base com-
parativa internacional, pois não conta com referência metodológica
de instituições que tradicionalmente realizam estudos e dados a res-
peito do mercado de trabalho no mundo2 -, grande parte das análi-
ses do custo do trabalho no Brasil termina confundindo cotização
patronal (encargo social ou custo não salarial) com rendimento do
trabalho (custo salarial ou salário bruto) e, por conseqüência, pro-
duzindo invariavelmente engodos técnicos.
Na segunda versão, constata-se que a predominância de abor-
dagem jurídico-contábil gera análises desfocadas, que obstaculizam,
geralmente, a possibilidade de perceber o custo do trabalho como
uma questão mais ampla e complexa, responsável que é, na maior

108
parte das economias de mercado, pelo financiamento parcial tanto
do padrão de consumo dos trabalhadores quanto das políticas so-
ciais. Em outras palavras, a composição do custo do trabalho refle-
te o grau de instrumentalização da intervenção pública quanto à
formação direta e indireta da renda dos trabalhadores.
Na terceira versão procura-se apresentar as inconsistências dos
a rgumentos de parte expressiva dos analistas, por desconsiderar a
temática do custo do trabalho como expressão do estágio de de-
senvolvimento das relações de trabalho em cada país. Por ser fruto
de um sistema de relações de trabalho pouco transparente e de
baixo grau de confiança entre os atores, o custo do trabalho no
Brasil não deixa de expor a ausência da cultura contratual, sobre-
tudo num país com mercado de trabalho pouco estruturado e com-
posto majoritariamente de micro e pequenas unidades produtivas,
não afeitas, em geral, à prática da contratação coletiva de trabalho.
O que se pretende, ainda que de forma sintetizada, é apresen-
tar, em quatro partes, uma dimensão pouco convencional no Brasil
sobre a temática do custo do trabalho. Inicia-se enfocando o custo
do trabalho nas economias avançadas e no Brasil, como referencial
da intervenção pública, para, em seguida, decompor o custo do
trabalho e apresentar seus valores em distintos segmentos do mer-
cado de trabalho, em termos nominal, efetivo e real nos anos 1990.
Após a análise referente à evolução do custo do trabalho no setor
industrial brasileiro, são comentadas as principais conclusões,
apresentando lacunas possíveis de serem exploradas numa refor-
mulação do atual estágio do custo nacional do trabalho.

C USTO DO TRABALHO E INTERVENÇÃO PÚBLICA


Nas economias de mercado do século X X, a renda da mão-de-
obra não resulta exclusivamente do funcionamento do mercado de
trabalho. Invariavelmente, os países possuem, em maior ou menor
grau, a presença de uma “cunha fiscal”, que corresponde à dife-
rença entre o custo suportado pelo empregador e o rendimento
efetivo recebido pelo empregado. Em síntese: a cunha fiscal refe-
re-se à somatória dos impostos diretos pagos pelo empregado,
mais a contribuição do empregado e mais a contribuição patronal.

109
Todos adicionais referentes à cunha fiscal são dados a partir do
salário bruto do empregado.
Dessa forma, a cunha fiscal representa o grau de interferência
do poder público na composição do custo do trabalho para o
empregador e do salário disponível para o trabalhador. A função
da cunha fiscal está associada diretamente às distintas formas de
financiamento do custo de reprodução da força de trabalho, que
retiram exclusivamente do salário bruto uma parte significativa da
responsabilidade pelo pagamento das despesas de sobrevivência
do trabalhador e de sua família. Assim, o custo do trabalho deixa
de ser expressão do salário bruto pago pelo empregador, pois
compreende vários componentes do rendimento do trabalho e mais
a parcela do financiamento da política social (educação, saúde,
formação profissional, lazer, entre outros). A cotização patronal
corresponde, em geral, a um dos principais pilares do financia-
mento das políticas sociais nas economias de mercado.
Gráfico 23 – Dimensão da cunha fiscal em economias
avançadas selecionadas*

Fonte: OCDE, 1994.


* % do custo do trabalho sobre o salário médio.

Ainda que guarde diferenças importantes entre as economias


avançadas, o grau de intervenção pública sobre o custo do traba-
lho é significativo. Em geral, encontra-se situado no intervalo de,
no mínimo, um quinto do salário médio do operário no Japão e,
no máximo, quase três quartos do salário médio do operário na
Dinamarca, o que indica uma presença marcante do poder público

110
no processo de formação tanto do custo do trabalho das empresas
quanto do rendimento do trabalhador.
Além disso, não há sinais de reversão da tendência de partici-
pação pública na dimensão e composição do custo do trabalho
nas economias avançadas. Nas duas últimas décadas, salvo as ex-
periências na Alemanha, na Inglaterra e nos Estados Unidos, nota-
se um avanço da cunha fiscal em relação ao salário médio dos
trabalhadores.

Formação do custo do trabalho nas economias desenvolvidas


Nas economias desenvolvidas, a composição do custo do tra-
balho é diferenciado, embora sejam nações que possuam por base
um padrão relativamente homogêneo de formação do rendimento
do empregado. Nos países em que parcela importante do financia-
mento das políticas sociais é dependente da taxação da folha de
pagamento das empresas, o peso das cotizações patronais tende a
ser maior, como no caso da França e da Itália. Já nas economias em
que as políticas sociais são financiadas por tributos que incidem
sobre toda a sociedade, a proporção da cotização patronal é rela-
tivamente menor. Nessa direção, destacam-se os países escandinavos
e a Inglaterra.
No conjunto de componentes que dizem respeito às cotizações
patronais encontram-se tanto aquelas que são obrigatórias (legisla-
ção social e trabalhista) quanto as que voluntariamente são
introduzidas por força do contrato coletivo de trabalho. Com isso,
o caráter individual do salário é substituído pelo chamado salário
social, não mais submetido exclusivamente à lógica do mercado
de trabalho.
Em geral, o financiamento das despesas do custo de vida do
trabalhador e de sua família dependia fundamentalmente do salá-
rio recebido, como contraprestação do emprego assalariado até o
início do século XX. Por conta disso, o seu padrão de consumo era
comprimido e limitado à cesta básica de sobrevivência (alimenta-
ção, habitação, vestuário, saúde, transporte, entre outros itens),
cujo acesso estava associado exclusivamente ao funcionamento do
mercado de trabalho.

111
Tabela 8 – Estrutura do custo total do trabalho na indústria de
transformação* em economias avançadas selecionadas (em %)
Itens Alemanha Dinamarca Espanha França Inglaterra Itália
Salário bruto 76,4 96,2 74,3 68,0 85,5 70,0
Salário direto 56,2 83,1 55,5 51,4 73,0 50,3
Bônus e prêmios 8,8 0,8 7,0 6,2 1,3 7,9
Pgto. dias não
trabalhados 11,4 12,3 12,4 10,4 11,2 11,8
Cotização
Patronal 23,6 3,8 25,1 32,0 14,5 30,0
Obrigatória 16,9 1,9 22,1 19,1 7,3 28,6
Voluntária 4,6 1,1 1,7 9,4 4,6 1,4
Outras 2,1 0,8 0,6 3,5 2,2 0,0
Custo do
trabalho 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: Eurostat, 1996.
* Para empresas com mais de dez empregados.

Naquele período, o baixo salário médio real impedia, por con-


seqüência, o financiamento adequado do acesso aos bens e servi-
ços básicos para a reprodução socioeconômica do trabalhador e
de sua família, assim como o ingresso na sociedade de consumo
de massa. A grande marca nas sociedades dos países desenvolvi-
dos era a divisão em dois mundos (pobres e ricos), sem grande
presença de mecanismos institucionais de mediação, conforme res-
saltam historiadores do século XIX. (Hobsbawm, 1994).
Somente com a crescente interferência pública sobre o custo
do trabalho tornou-se possível ampliar o financiamento das despe-
sas com saúde, transporte, habitação e educação para além do
salário bruto. Mas isso passou a ocorrer com o estabelecimento
dos contratos coletivos e com as ações do Estado, necessárias que
foram tanto para interromper os efeitos perversos da Grande De-
pressão dos anos 1930, como o New Deal nos Estados Unidos e os
programas de saída democrática da crise econômica nos países
escandinavos, quanto para a reconstrução econômica e social eu-
ropéia do imediato segundo pós-guerra.
De um lado, a reforma tributária foi o instrumento necessário
para canalizar maiores recursos ao poder público, o que permitiu
elevar a carga tributária bruta da faixa de 10 a 15% do Produto

112
Interno Bruto nas economias avançadas, predominante até a Pri-
meira Guerra Mundial, para a faixa de 33 a 55% do PIB no período
posterior a Segunda Guerra Mundial. Com a constituição de gran-
des fundos públicos foi possível difundir subsídios ao transporte
coletivo e à habitação popular, bem como à universalização públi-
ca da educação e saúde. Dessa forma, o acesso ao padrão de
consumo de massa contou com o financiamento de parcela consi-
derável do custo de vida do trabalhador e de sua família, através
da reforma tributária.
Além de ajudar no financiamento do custo de vida da popula-
ção trabalhadora, a reforma tributária também mostrou ser neces-
sária para a estratégia de justiça fiscal. A montagem de uma estru-
tura tributária progressiva, que onerasse proporcionalmente mais
os ricos em detrimento dos pobres, foi capaz de impor restrições
ao tradicional processo de concentração da renda nas economias
de mercado. Em outras palavras, o financiamento de grande parte
das transferências de renda entre ricos e pobres ocorreu por inter-
médio dos impostos diretos, em maior quantidade que os impos-
tos indiretos.
De outro lado, a definição de um parâmetro básico de remu-
neração aos empregados evitou a ampliação das diferenças
intersalariais. Colaborou para isso, por exemplo, o salário mínimo,
que passou a funcionar tanto como farol à evolução da remunera-
ção pela contratação coletiva de trabalho entre sindicatos e entida-
des patronais quanto como dinâmica de elevação do rendimento
dos trabalhadores de salário de base, o que consagrou a generali-
zação do padrão de consumo de massa.
Da mesma forma, também a difusão do crédito ao consumo
mostrou-se necessária como mecanismo da garantia de acesso dos
assalariados aos bens de consumo de maior valor unitário (automó-
vel e casa própria). Em parte, porque os ganhos salariais estabeleci-
dos pelos contratos coletivos de trabalho e o financiamento de par-
cela importante do custo de reprodução da força de trabalho, por
meio das políticas sociais, não eram suficientes para a generalização,
por si só, das normas gerais de consumo de massa (Aglietta, 1979).
Para isso, a dinâmica do mercado de trabalho esteve fundada
na sua completa estruturação (situação do quase pleno emprego)

113
e no estabelecimento de relações de trabalho estáveis e transpa-
rentes. Junto com a expansão sem precedentes do emprego assala-
riado transcorreu o movimento de homogeneização ocupacional
em torno de uma norma básica de uso e remuneração da força de
trabalho. A consolidação do standard employment relationship ter-
minou sendo a característica marcante da evolução do mercado de
trabalho nas economias avançadas, com pleno emprego e uma
ampla rede de garantias de proteção social aos desempregados.
Assim, o comportamento do custo do trabalho deixou de re-
fletir diretamente o funcionamento do mercado de trabalho menos
desfavorável ao empregado, possibilitando a incorporação genera-
lizada dos ganhos de produtividade e a elevação do custo de vida
ocorrida a partir do segundo pós-guerra.
No período mais recente, somente os Estados Unidos apre-
sentaram taxa de variação anual média negativa para a evolução
do custo do trabalho. As demais economias avançadas seleciona-
das registraram variação positiva no custo do trabalho, embora
em ritmo de decrescente quando comparada com as de décadas
anteriores.

Formação do custo do trabalho no Brasil


No Brasil, a composição do custo do trabalho apresenta gran-
de diferenciação entre os vários segmentos do mercado de traba-
lho. Em vez da estruturação do mercado de trabalho verificada nas
economias avançadas, o país registra forte grau de desestruturação
do seu mercado de trabalho, favorecendo ainda mais a predomi-
nância de elevada heterogeneidade no custo do trabalho.
Da mesma forma, sem ter atingido a condição salarial plena,
com taxa de assalariamento inferior a três quintos do total da ocu-
pação, e ter mantido uma estrutura tributária regressiva, sustentada
por impostos indiretos e fortemente concentrada em poucos e es-
pecíficos segmentos socioeconômicos e, ainda, com elevada restri-
ção das linhas de crédito ao consumo, o Brasil constituiu, pelo
menos, dois padrões distintos de formação do custo do trabalho:
segmento organizado do mercado de trabalho e segmento não
organizado do mercado de trabalho3. A seguir, apresenta-se, sinte-

114
ticamente, a formação do custo do trabalho nos distintos segmen-
tos do mercado de trabalho brasileiro.

Segmento organizado do mercado de trabalho e o custo do


trabalho
Nas ocupações do segmento organizado do mercado de traba-
lho, o custo do trabalho para o empregador segue sistemático não
muito distinto do verificado nas economias avançadas.4 Por não
registrar cultura generalizada de contratação coletiva, o custo do
trabalho no Brasil apóia-se fundamentalmente na legislação social
e trabalhista.
De um lado, o salário bruto recebido pelo empregado não re-
presenta o único custo salarial para a empresa, pois há outras despe-
sas compulsórias que atuam sobre a folha de pagamento, como o
décimo terceiro salário, o adicional de um terço de férias, o Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a multa de 40% sobre o
montante depositado do FGTS, para os casos em que ocorre ruptura
no contrato de trabalho por parte da empresa e sem justa causa. Da
mesma forma, o salário bruto constitui-se também da remuneração
por unidade de tempo efetivamente trabalhado, como os dias pa-
gos, porém não trabalhados, ou seja, o tempo de trabalho remune-
rado pelo empregador sem que o empregado esteja disponível para
o exercício do trabalho na empresa (férias de trinta dias, repouso
semanal remunerado, feriado e ausência remunerada).
De outro lado, a cotização patronal (encargo social) represen-
ta um outro conjunto de despesas que incidem sobre a folha de
salários da empresa, como as contribuições para o Instituto Nacio-
nal de Seguridade Social (INSS), o Seguro-Acidentes de Trabalho, o
Salário-Educação, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra), o Serviço Social da Indústria (Sesi), o Serviço Na-
cional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Brasileiro de
Apoio às Pequenas e Micro-Empresas (Sebrae).
Deve-se destacar também que diante de novidades legais ins-
tituídas recentemente quanto às novas formas de contratos mais
flexíveis, passaram a existir custos do trabalho ainda mais diferen-
ciados, mesmo no interior do segmento organizado do mercado

115
de trabalho. Além do contrato por tempo indeterminado, há o
contrato por prazo determinado, por jornada parcial e por período
de experiência.
Na comparação entre o contrato por tempo indeterminado e
por tempo determinado, nota-se, por exemplo, a existência de um
diferencial de custos do trabalho estimada em 9,13%, sendo que
14,04% correspondem à cotização patronal e de 7,9% referente ao
salário bruto5.
Pode-se observar, na tabela a seguir, distinta composição do
custo do trabalho para os dois principais tipos de contrato de tra-
balho no segmento organizado (contrato por tempo indeterminado
e por tempo determinado). Observa-se que para um custo total do
trabalho de 100,00%, o salário bruto representa 79,9% no Contrato
por Tempo Indeterminado (CI) e de 81,1% no Contrato por Tempo
Determinado (CD). Deve-se ressaltar que os adicionais ao salário
contratual computados devem-se exclusivamente às exigências es-
tabelecidas pela legislação social e trabalhista6.

Tabela 9 – Estrutura do custo do trabalho por contrato por prazo


indeterminado e por tempo determinado no setor organizado para o
pessoal de produção no setor industrial

Discriminação Composição(%)
CI* CD**
Salário bruto 79,93 81,12
Salário direto1 56,57 61,67
Bônus e prêmio2 7,74 1,59
Pagamento de horas não trabalhadas3 15,62 17,86
Cotização patronal 20,07 18,88
Fiscal4 17,83 15,67
Institucional5 2,24 3,21
Custo total do trabalho 100,00 100,00

1. Salário contratual, décimo terceiro salário e adicional de um terço de férias; 2. Fundo de


Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), rescisão contratual e incidência do FGTS sobre o décimo
terceiro salário e sobre um terço de férias; 3. Férias, descanso semanal remunerado, feriados e
ausências remuneradas; 4. Instituto Nacional de Seguridade Social (I.N.S.S), seguro-acidente de
trabalho, salário-educação e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra); 5. Ser-
viço Social da Indústria (SESI), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e Serviço
Brasileiro de Apoio às Pequenas e Micro-Empresas (Sebrae).
* CI=Contrato por Tempo Indeterminado;
** CD=Contrato Especial por Tempo Determinado.

116
Diante da diferenciação na formação do custo do trabalho
imposta pela legislação para os dois tipos de contratos de trabalho,
podem ser estimadas as cotizações patronais, ou seja, as despesas
que o empregador realiza com a contratação formal do trabalha-
dor, sem que ela seja absorvida diretamente pelo trabalhador em-
pregado. Em outras palavras, trata-se do mecanismo de financia-
mento das políticas públicas nacionais, mais conhecidas no Brasil
como encargos sociais.
Em síntese, o custo do trabalho para cada emprego assalariado
por contrato por tempo indeterminado no segmento organizado
do mercado de trabalho é composto de 20,07% de cotizações pa-
tronais7 e de 79,93% do salário bruto. Para cada empregado por
contrato por prazo determinado, a composição do custo do traba-
lho é de 81,12% do salário bruto e de 18,88% para a cotização
patronal.
Em comparação com um conjunto de economias de mercado,
avançadas ou não, o Brasil coloca-se em posição intermediária no
que diz respeito ao peso das cotizações patronais no custo total do
trabalho. Há países onde as cotizações patronais representam qua-
se um terço do custo do trabalho (França e Itália), enquanto para
outras encontram-se abaixo de 15% (Inglaterra e Dinamarca).

Gráfico 24 – Participação das cotizações patronais no custo total da


mão-de-obra na indústria de transformação em países selecionados

Fonte: CERC 1992, CESIT, 1994 e Eurostat, 1996.

117
Na maior parte dos países selecionados no gráfico, as cotizações
patronais representam entre 20 a 25% do custo do trabalho. Na
faixa próxima a do Brasil encontram-se países como os Estados
Unidos, Alemanha, Uruguai, Argentina e Coréia.

Segmento não organizado do mercado de trabalho e o custo do


trabalho
As ocupações do segmento não organizado possuem custo do
trabalho inferior, em média, às do segmento organizado, pois não
há a incorporação de todas as despesas salariais e não salariais. Em
geral, o salário bruto recebido pelo trabalhador representa o único
custo do trabalho para o empregador. Por conta disso, dificilmente
pode ser identificada, no segmento não organizado do mercado de
trabalho, a presença de outros itens adicionais de despesas com-
pulsórias de pessoal estabelecidos tanto pela legislação trabalhista
quanto pelas negociações coletivas de trabalho, que tradicional-
mente incidem sobre a folha de pagamento do empregador do
setor organizado.
De outra forma, o custo salarial do segmento não organizado
não tem a adição, em geral, tanto dos pagamentos diferidos no
tempo, como o décimo-terceiro salário, o adicional de um terço
de férias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e a multa de
40% sobre o montante depositado do FGTS, quando da ruptura do
contrato de trabalho por parte da empresa e sem justa causa,
quanto dos itens que distinguem a remuneração por unidade de
tempo efetivamente trabalhado, como os dias pagos, mas não
trabalhados (férias, repousos semanais remunerados e feriados).
Assim, o custo do trabalho nas ocupações do setor não organiza-
do do mercado de trabalho brasileiro não incorpora todos os
custos salariais (salário bruto) e as cotizações patronais destina-
das às instituições governamentais e aos organismos empresariais
do setor organizado.
O custo total do trabalho no segmento não organizado termi-
na sendo muito distinto do custo do trabalho no segmento organi-
zado das ocupações. Para a medição do custo efetivo do trabalho
nas ocupações do setor não organizado optou-se pela adoção de

118
um conjunto de fatores de conversão do custo do trabalho dos
empregos do segmento organizado8.
O custo do trabalho no setor não organizado do mercado de
trabalho não apresenta a mesma composição do verificado no seg-
mento organizado. Em síntese, o custo do trabalho tende a ser
praticamente idêntico ao salário bruto, sem acréscimo de todos
adicionais do salário direto e tampouco das cotizações patronais.
O risco de a empresa operar à margem da legislação trabalhista e
das ações da contratação coletiva de trabalho não é levado em
consideração, deixando de incorporar, nesse caso, possíveis mul-
tas a serem implementadas por instituições de fiscalização pelo
uso da mão-de-obra em condições que podem ser identificadas
como ilegais.
Diante disso, o custo do trabalho no setor não organizado do
mercado de trabalho tende a ser 35,04% inferior, em média, ao
custo total do trabalho no contrato por tempo indeterminado no
setor organizado (28,51% para contrato por tempo determinado).
O menor custo do trabalho no segmento não organizado deve-se a
18,7% no custo salarial e de 30,9% no custo não salarial.
Além dessa diferença na composição do custo de trabalho,
deve-se destacar que a distinção de rendimentos (custo salarial)
entre as ocupações nos segmentos organizados e não organizados
são relativamente grandes, o que resulta em diferenças muito mais
relevantes no custo monetário do trabalho, conforme apresentado
a seguir.

QUANTIFICAÇÃO DO CUSTO DO TRABALHO NO BRASIL


Procura-se apresentar, nesta parte, as evidências empíricas do
custo monetário do trabalho no emprego total dos segmentos or-
ganizado e não organizados. Destaca-se que no Brasil os estudos
sobre custo do trabalho tendem a apresentar tradicionalmente os
indicadores gerais apenas para o setor industrial.
Todavia, conforme já observado em outra referência bibliográ-
fica9, o custo do trabalho em economias continentais, com eleva-
das diferenças setoriais, regionais e municipais, tende a registrar
elevados diferenciais em torno do indicador nacional. A presença

119
de expressivos graus de heterogeneidade ocupacional provoca di-
retamente a diferenciação nos custos do trabalho.
No segmento organizado do mercado de trabalho, o custo médio
horário do trabalho para o conjunto da economia nacional foi esti-
mado para o ano de 1996 em US$4,74, com base no contrato de
trabalho por tempo indeterminado10. No segmento não organiza-
do, o custo médio horário foi estimado em US$1,1311.
Com o objetivo de identificar o efetivo custo médio horário em
dólar do trabalho em todos segmentos do mercado de trabalho (or-
ganizado e não organizado) foi necessário, em conformidade com a
metodologia adotada, levar em consideração a composição das ocu-
pações nos segmentos organizados e não organizados em 1996. De
acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras a Domicílio de 1996
(PNAD-FIBGE), 42,4% do total das ocupações eram de responsabilida-
de do segmento não organizado (sem contrato de trabalho) e 57,6%
pertenciam as ocupações do segmento organizado.
Utilizando como critério de diferenciação o custo do trabalho
no segmento organizado (CTO) e o custo do trabalho efetivo (CTE),
que resulta da composição da ocupação nos segmentos organiza-
do e não organizado do mercado de trabalho, obtém-se um me-
lhor conhecimento a respeito dos distintos padrões de custo do
trabalho no Brasil.
A identificação da composição dos dois distintos custos do traba-
lho, a partir da proporção entre o emprego com contrato (segmento
organizado) e sem contrato de trabalho (segmento não organizado),
permite apontar o custo médio horário do trabalho efetivo para 1996.12
A partir dos dois custos do trabalho (US$4,74 no segmento organiza-
do e US$1,13 no segmento não organizado), chega-se ao custo médio
horário do trabalho efetivo no Brasil de US$3,21, em 1996. Este valor
era 32,3% inferior ao custo médio horário do trabalho para emprega-
dos com contratos (segmento organizado) e 2,8 vezes acima do custo
do trabalho das ocupações não organizadas.
Através da decomposição das ocupações nos dois distintos
segmentos ocupacionais, observa-se uma nova situação para o custo
médio horário efetivo13. Levando-se em consideração a variável
tempo, podem-se identificar ainda significativas alterações no cus-
to do trabalho.

120
NOVO MODELO ECONÔMICO E O COMPORTAMENTO DO CUSTO DO
TRABALHO INDUSTRIAL

A análise sobre a evolução do custo efetivo do trabalho em


dólar na indústria de transformação brasileira ao longo da década
de 1990 é desenvolvida a seguir. Para isso, os valores do custo do
trabalho no setor industrial – obtidos por intermédio de dados
provenientes da Relação Anual de Informações Sociais do Ministé-
rio do Trabalho, da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar e da
Pesquisa Industrial Mensal, ambas da Fundação IBGE – foram cor-
rigidos pela variação cambial estabelecida pelo Banco Central do
Brasil.
Por intermédio desse procedimento metodológico foi possível
obter os valores em dólar do custo médio horário do trabalho no
segmento organizado e do custo médio horário efetivo (composi-
ção dos custos do trabalho nos segmentos organizado e não orga-
nizado do mercado de trabalho). Percebe-se, por exemplo, que
durante a década de 1990, a evolução do custo médio horário do
trabalho efetivo no setor industrial brasileiro apresentou três movi-
mentos distintos.
O primeiro movimento ocorreu entre 1989 e 1993, com o pre-
domínio de uma relativa estabilidade na evolução do custo do
trabalho efetivo em dólar, apesar de uma ligeira elevação em 1992
e queda em 1993. O uso da política cambial ativa, com desvalori-
zações freqüentes da moeda nacional, combinado com a alta infla-
ção e queda no nível de atividade econômica, mostrou-se favorá-
vel à contenção do custo do trabalho efetivo no setor industrial.
O segundo movimento, entre 1994 e 1998 registrou uma con-
tínua expansão do custo do trabalho efetivo em dólar. As princi-
pais características desse período foi a recuperação do nível de
atividade econômica, a estabilidade monetária e o predomínio de
uma política cambial passiva, capaz de permitir a crescente valori-
zação da moeda nacional e, por conseqüência, contribuir favora-
velmente para a rápida elevação em dólar do custo do trabalho no
setor industrial brasileiro.
Por fim, o terceiro movimento iniciou-se em janeiro de 1999, a
partir da desvalorização desorganizada do real. Diante da recessão

121
da economia nacional, do elevado déficit comercial e da rápida
redução nas reservas internacionais, a desvalorização cambial for-
çou bruscamente a queda no custo do trabalho em dólar.
Gráfico 25 – Brasil: Evolução do custo total horário do trabalho
no segmento organizado (CUTO), do custo horário do trabalho efetivo
(CUTE) e do custo horário do trabalho efetivo ajustado pela
produtividade (CUTEP) na indústria de transformação (1989-1999*)

* Estimativa.
Fonte: Rais/Caged - MTb, IBGE-PIM e PNAD’s ajustadas. (INPC restrito e câmbio definido pelo Bacen).
Elaboração própria.

Além das diferentes fases de evolução do custo do trabalho


(no setor organizado, efetivo e ajustado pela produtividade), pode-
se notar como os ganhos de produtividade ocorridos nos anos
1990 tenderam a ser convertidos, em alguma medida, em mecanis-
mos de compensação de parte da elevação do custo do trabalho
em dólar. Quando ajustada a variação da produtividade no setor
industrial, a evolução do custo do trabalho em dólar também regis-
tra os mesmos três movimentos distintos nos anos 1990, embora
ocorridos com valores inferiores.
As diferenças entre os custos do trabalho medidos em dólar
durante a década de 1990 são expressão direta da capacidade em-
presarial em transformar o padrão de uso e remuneração do em-
prego tradicional do setor industrial, sustentado fundamentalmen-
te no segmento organizado do mercado de trabalho. Na medida
em que externalizou parte do processo produtivo, que subcontrata

122
mão-de-obra, entre outras formas de afastamento do emprego for-
mal, o setor empresarial pode reduzir parcialmente o custo do
trabalho, ou ainda amenizar o impacto decorrente da valorização
cambial sobre o custo total de produção.
Ao mesmo tempo, quanto maior foi a capacidade empresarial
de alterar o ritmo da produtividade do trabalho, maior a tendência
a encontrar melhores condições para compensar os efeitos decor-
rentes do processo de valorização cambial. A drástica modificação
do regime cambial em janeiro de 1999 não apenas possibilitou a
melhora nas condições de competitividade empresarial, como tam-
bém contribuiu para a acentuada redução no custo do trabalho
medido em dólar no Brasil.

EQUÍVOCOS NA INTERPRETAÇÃO DO CUSTO DO TRABALHO

Pôde-se perceber na discussão anteriormente realizada sobre


o custo do trabalho no Brasil, bem como a sua evolução durante a
década de 1990, o quanto é restrita a interpretação do custo Brasil.
Uma vez identificadas as diferenças no funcionamento do merca-
do de trabalho no Brasil, especialmente em relação às economias
avançadas, bem como as modificações introduzidas tanto no pro-
cesso produtivo pelos empresários quanto no padrão de uso e
remuneração do trabalho, buscou-se dimensionar os distintos cus-
tos do trabalho no Brasil, seja no segmento organizado do merca-
do de trabalho, seja no segmento não organizado.
A maior presença do segmento não organizado do mercado de
trabalho no processo de formação do custo efetivo do trabalho deve-
se, por um lado, às alterações na estrutura ocupacional ao longo dos
anos 1990, através da elevação do desemprego, do desassalariamento
e da geração de postos de trabalho, em grande medida, precários.
Por outro lado, as ocupações do segmento não organizado também
resultam das novas formas de gestão e organização do trabalho,
fundadas na externalização de parte do processo produtivo, na
subcontratação da mão-de-obra e na terceirização de ocupações.
Ao mesmo tempo, a adoção da produtividade como um dos
mecanismos de compensação dos custos do trabalho mostrou-se
mais freqüente nos anos 1990 no Brasil. Até 1993, por exemplo, a

123
política cambial era relativamente ativa, pois, através de constantes
desvalorizações da moeda nacional, tornava-se possível o rebaixa-
mento ou a estabilidade do custo do trabalho efetivo medido em
dólar norte-americano.
Entre 1994 e 1998, o custo do trabalho foi expressivamente
elevado em dólar, sem que o salário bruto ou mesmo as cotizações
patronais tivessem sido objeto de aumentos reais significativos. O
principal responsável por isso foi a aplicação de um regime cam-
bial que promovia a valorização do real diante do dólar. Somente
em janeiro de 1999 foi aberta uma nova fase na evolução do custo
do trabalho, diante do esgotamento do antigo regime cambial.
Para não incorrer em tradicionais enganos e omissões algumas
vezes presentes nos estudos que tratam da mensuração do custo do
trabalho e, por decorrência, nas análises dos chamados encargos soci-
ais, optou-se por adotar uma metodologia de uso corrente internacio-
nalmente para investigar o custo do trabalho e sua evolução recente
no Brasil. Dessa forma, chegou-se a diferentes dimensões tanto em
relação à dimensão do custo do trabalho quanto à sua evolução.
Na comparação internacional, através de utilização de base
metodológica comum, pode-se perceber que o Brasil apresenta bai-
xo custo do trabalho, com participação não muito expressiva nas
cotizações patronais. Países como a Alemanha e Itália, por exemplo,
têm cotização patronal medida em dólar superior ao que os empre-
sários brasileiros pagam pelo custo total do trabalho horário.
Mesmo que desfeita a base que sustenta, em grande medida,
as abordagens tradicionais sobre o custo do trabalho, o debate no
Brasil não perde importância. Há espaço para uma reformulação
necessária do custo do trabalho, que pode ser tratado através de
pelo menos três aspectos fundamentais.
O primeiro diz respeito à composição do custo do trabalho. Ape-
sar da cotização patronal representar um quinto do custo do traba-
lho no segmento organizado do mercado, deve-se destacar a pos-
sibilidade de sua diminuição, tendo em vista sua parcial dependência
nas imposições de natureza fiscal (salário-educação e Incra). Nesse
caso, a alteração da composição do custo do trabalho dependeria da
realização de uma ampla reforma tributária que levasse em conside-
ração o financiamento da educação e da política agrária no Brasil.

124
Gráfico 26 – Custo do trabalho, do salário bruto salarial e da contribui-
ção patronal em dólares por hora no setor industrial em
países selecionados (1995)

Fonte: FIBGE, BLS, OIT e CER., In: Santos e Pochmann, 1996.

O segundo aspecto da reformulação do custo do trabalho está


associado ao processo de formação dos chamados dos custos não
salariais. A presença de um complexo código de trabalho (Conso-
lidação das Leis do Trabalho e Constituição Federal) sobre o seg-
mento organizado do mercado de trabalho torna automática a de-
finição dos componentes do custo do trabalho, pois a cultura de
negociação no país não se encontra consagrada ainda sob princí-
pio da contratação coletiva de trabalho. Nesse caso, a modificação
no processo de formação do custos do trabalho no Brasil exigira
uma reforma no sistema de relação de trabalho, tornando difundi-
da a organização por local de trabalho, a redução das culturas da
rotatividade e do dissídio trabalhista e a presença de maior trans-
parência e confiança entre os atores sociais.
O terceiro aspecto direcionado à reformulação do custo do traba-
lho está vinculado à retomada do crescimento econômico, capaz de
interromper o movimento de desestruturação do mercado de trabalho
que ganhou forte dimensão nos anos 1990. A drástica dimensão do
segmento não-organizado do mercado de trabalho requer taxas ex-
pansivas de aumento da produção, assim como uma adequação das
atividades do poder público quanto a fiscalização do código do traba-
lho. Com a elevada heterogeneidade no custo do trabalho entre os
distintos segmentos do mercado de trabalho esvazia-se a premissa da
competição intercapitalista em bases comuns.

125
NOTAS:
1 Com base em estudos realizados especialmente para IEDE e para OIT.
2 Os principais organismos internacionais que investigam a temática do custo
do trabalho são: Organização Internacional do Trabalho, Organização de
Cooperação e Desenvolvimento Econômico, Bureau Labor Statistics norte-
americano e Conseil Supérieur de l´Emploi, de Revenus et de Coûts francês.
3 O segmento organizado compreende os postos de trabalho mais homogê-
neos, gerados por empresas tipicamente capitalistas, que se fundamentam no
uso difundido de empregos regulares assalariados. O segmento não organiza-
do, em contrapartida, consiste nas formas de ocupação mais heterogêneas,
cuja orientação não assume característica tipicamente capitalista, mais pecu-
liar às formas de produção e consumo de economias com estágio no subde-
senvolvimento. Mais informações sobre o custo do trabalho nos segmentos
do mercado de trabalho ver: Pochmann, 1998.
4 Essa parte foi realizada com base em Santos e Pochmann, 1997, cujos dados
originam-se de uma pesquisa mais ampla. Ver: Cesit, 1994.
5 Sobre isso ver mais em Pochmann, 1998.
6 Não estão incluídos os adicionais passíveis de imposição por intermédio da
negociação coletiva de trabalho ou de deliberação patronal.
7 Sobre esses dados ver também Amadeo, 1994; Dieese, 1997; Santos, 1995.
8 A literatura sobre a estimação de custos do trabalho em setores econômicos
pouco organizados pode ser encontrada em: Harberger, 1968; Holanda, 1970.
9 Estudos realizados no Brasil indicam elevada heterogeneidade no custo do
trabalho no setor industrial. Ver: Santos e Pochmann, 1996.
10 As informações a respeito das ocupações no segmento organizado referem-se à
Relação Anual de Informações Sociais, pertencentes ao Ministério do Trabalho e à
Pesquisa Nacional por Amostras em Domicílio e Pesquisa Industrial Mensal do IBGE.
11 As informações referentes as ocupações no segmento não organizado refe-
rem-se à Pesquisa Nacional por Amostras em Domicílio, pertencente ao IBGE.
12 Optou-se por manter os trabalhadores por conta própria no total da ocupação
por decorrência do processo de terceirização de mão-de-obra verificado no
Brasil nos anos 1990, que até agora permanece sem uma verificação empírica
mais apropriada. Por isso, os trabalhadores por conta própria seriam identifi-
cados como uma proxy de trabalhadores terceirizados que passaram a atuar
para a empresa ou para o público. Não foram considerados, no entanto, os
empregadores, as ocupações sem remuneração e de autoconsumo.
13 Projeção dos dados da PNAD-FIBGE de 1996 e do emprego formal com base na
Rais/Caged do Ministério do Trabalho de 1996.
14 As informações oficiais disponíveis sobre a participação de empregados com
contratos de trabalho por tempo determinado indicam uma insignificante pre-
sença, até o presente momento, no total dos empregos do segmento organi-
zado da economia brasileira. Por conta disso, optou-se pelo uso do custo do
trabalho para contratos por tempo determinado.

126
As políticas salarial e do
salário mínimo

Um outro mito que resultou da adoção das políticas neoliberais


no Brasil esteve relacionado à desresponsabilização do Estado para
com os salários, especialmente dos trabalhadores de salário de base.
A doutrina neoliberal assegurava que o afastamento do
Estado da regulação dos rendimentos do trabalho redundaria tanto na
ampliação do nível de emprego quanto na melhora da qualidade dos
postos existentes. Depois de dez anos de esvaziamento do papel do
Estado no mercado de trabalho, constata-se a piora na qualidade dos
postos de trabalho, assim como o aumento do desemprego.
A política salarial, após de ter sido utilizada em profusão du-
rante três décadas, com a sua implementação no início do regime
militar em 1964, deixou de existir com o Plano Real. Para um país
de enormes desigualdades de rendimento do trabalho e de ampla
concentração de renda e riqueza, o fim da política salarial e espe-
cialmente da indexação salarial trouxe repercussões não desprezí-
veis para o processo de repartição funcional da renda. Já em rela-
ção à política de salário mínimo registra-se que têm sido recorrentes
as propostas de esvaziamento do seu poder aquisitivo, através do
rebaixamento do seu valor real em geral, da regionalização de sua
fixação, da separação entre o valor do mínimo nacional e o do
piso da previdência social, a distinção do mínimo do setor privado
e do setor público, entre outras1 .
Conforme autores que reconhecem o papel do salário mínimo
com a função protetora do limite da pauperização dos trabalhado-
r es é necessária a adoção de uma política pública que seja

127
capaz de alterar as tendências inerentes ao funcionamento do
mercado de trabalho que instabilizam a vida dos empregados e os
custos das empresas2 . Ao contrário do que se poderia imaginar, o
contorno da recente polêmica do salário mínimo parece ocorrer
sem muita referência e apoiado em estudos aprofundados sobre a
atualidade do salário mínimo, suas repercussões e possibilidades
de superação no médio e longo prazos.
Em virtude disso, optou-se por tratar da temática das políticas
salarial e do salário mínimo sob a égide neoliberal em cinco partes.
Na primeira analisa-se a experiência recente de finalização da po-
lítica salarial no Brasil, especialmente num país de baixos salários
e de grave concentração funcional da renda nacional, enquanto na
segunda parte recuperam-se, rapidamente, os traços principais da
experiência de sessenta anos da política do mínimo no país. Na
terceira parte, são apresentados alguns elementos de comparação
internacional do salário mínimo, enquanto na quarta parte procu-
ra-se desvendar o brasileiro de salário de base. Na quinta e última
parte, relaciona-se a presença de um novo modelo econômico
com a situação do salário mínimo na última década do século X X.

F IM DA POLÍTICA SALARIAL NUMA ECONOMIA DE BAIXOS RENDIMENTOS


Ao contrário do observado em outras economias que avança-
ram no seu processo de industrialização, o Brasil permaneceu sen-
do um país de baixos salários. De um lado, pode-se constatar que
a implantação de uma ampla política salarial pelo regime militar
em 1964, e que durou por trinta anos, não se mostrou suficiente
para evitar a abertura do leque salarial nem para ampliar a partici-
pação do rendimento do trabalho na renda nacional.
Na maior parte das vezes, a política salarial terminou valori-
zando muito mais a contenção do rendimento dos trabalhadores,
como forma de combater a elevação de custos das empresas. A
despeito disso, também deve-se reconhecer que a política salarial
representava uma oportunidade pouco utilizada, especialmente
numa economia de baixos salários, de grande desorganização do
mercado de trabalho e de ausência de relações de trabalho confiáveis
entre trabalhadores e empregadores.

128
Além disso, não se deve esquecer que apesar da permanência
de enorme quantidade de trabalhadores recebendo tão reduzidas
remunerações, a renda por brasileiro foi multiplicada por quase
cinco vezes entre 1940 e 1999. Com o desaparecimento da política
salarial e da indexação salarial a partir de 1994, o rendimento do
trabalho passou a depender cada vez mais da dinâmica do merca-
do de trabalho, bem como da ação sindical.
A política do salário mínimo, que poderia compreender um
papel destacado, segue desde os anos 1960 tendo cada vez menor
participação relativa na renda por habitante. Em 1957, por exem-
plo, o salário mínimo anual chegou a representar 2,7 vezes a renda
per capita dos brasileiros, enquanto em 1999 significou apenas
28%, uma das menores indicações desde 1940.
O mesmo procedimento tendeu a ocorrer na comparação en-
t re a evolução do salário médio na indústria de transformação e a
do salário mínimo. Nos anos 1950, o salário mínimo chegou a
representar quase 90% do salário médio industrial, mas a partir da
década de 1960, no período do chamado “milagre econômico”
(1969-1973), houve uma queda na participação relativa estimada
de 55,8%.
Nas décadas de 1980 e 1990, o quadro de estagnação da renda
per capita foi acompanhado de maior esvaziamento da participa-
ção do salário mínimo no salário médio na indústria de transforma-
ção, com diminuição estimada de 62,8%. Em 1999, o salário míni-
mo representou apenas 16% do salário médio industrial, enquanto
no final dos anos 1970 esteve acima de 40%.
É importante também ressaltar a profunda mudança no padrão
de política de salário mínimo ocorrido a partir da interrupção do
Estado de direito, em 1964. A derrota imposta à política ativa de
salário mínimo como política de sustentação de renda dos traba-
lhadores de salário de base segue incólume desde então, apesar
do retorno ao regime democrático desde 1985, apesar da existên-
cia de um amplo conjunto de regras de estabelecimento da corre-
ção dos salários em cada data base.
Nesses termos, o fator político é que ganha maior dimensão
na discussão a respeito das razões explicativas do estágio de bai-
xos salários e de péssima distribuição de renda no país. Isso tende

129
a ficar mais claro ainda quando se relaciona, ao longo do tempo, a
quantidade de trabalhadores de baixa renda e com o valor do
salário mínimo real.
No caso de o salário mínimo ter mantido o poder aquisitivo
estabelecido em 1940 até o ano de 1998, a quantidade absoluta de
trabalhadores de salário mínimo seria majoritária no total da popu-
lação ocupada. Em 1940, por exemplo, eram 10,2 milhões de tra-
balhadores que recebiam um salário mínimo (ou 68,7% da popula-
ção ocupada), passando para 12,1 milhões em 1960 (ou 52,7% do
total dos ocupados), para 19,4 milhões em 1980 (ou 42,6%
dos ocupados) e para 39,6 milhões em 1998 (ou 56,5% da
população ocupada).
Como o salário mínimo não manteve o poder aquisitivo esta-
belecido em 1940, apresentando uma trajetória de queda substan-
cial desde a década de 1960, pode-se perceber que os salários em
geral terminaram tendo uma performance menos regressiva que o
valor real do piso nacional. Dessa forma, desde os anos 1960 vem
sendo possível, ainda que de maneira artificial, haver uma dimi-
nuição na quantidade de trabalhadores com salário mínimo no
Brasil. Em 1980, por exemplo, o número de brasileiros com rendi-
mento até o valor nominal do salário mínimo (que era 38,2% infe-
rior ao de 1940) foi de 13,6 milhões, enquanto em 1998 foram 14,9
milhões de trabalhadores com rendimento até o valor nominal do
piso nacional (que era 73,4% inferior ao de 1940). Assim, a redu-
ção relativa dos trabalhadores de salário mínimo de 29,9% em 1980
para 21,3% em 1998 termina sendo ilusória, pois no mesmo perío-
do o mínimo perdeu 57,0% do seu valor real.
Por ser uma economia de baixos salários, não causa espanto a
permanência de elevada desigualdade de renda e enorme abertura
no leque de salários. Ao analisar-se a evolução da distribuição
funcional da renda, isto é, a participação do rendimento do traba-
lho no total da renda nacional, pode-se perceber o movimento de
concentração nas outras formas de renda que não do trabalho,
sobretudo desde os anos 1980.
Entre as décadas de 1940 e 1950, quando prevaleceu a presen-
ça de uma política de manutenção – quando não de elevação – do
valor real do salário mínimo, a participação do rendimento

130
do trabalho na renda nacional manteve-se relativamente inalterada.
Nos anos 1960 e 1970 ocorreu uma leve queda da participação
relativa do rendimento do trabalho em paralelo com a diminuição
do poder aquisitivo do salário mínimo.

Gráfico 27 – Brasil: evolução da distribuição funcional da renda nacional


e do poder aquisitivo do salário mínimo (100,0=1940)

*Estimativa.
Fonte: FIBGE e Dieese.

Durante as duas últimas décadas do século X X, quando a ren-


da per capita nacional permaneceu estagnada, a queda na partici-
pação relativa do rendimento do trabalho na renda nacional foi
brutal, assim como o verificado na redução do poder aquisitivo do
salário mínimo. Em 1998, a participação do rendimento do traba-
lho na renda nacional foi de 35,2% inferior a de 1949, enquanto a
queda acumulada do poder aquisitivo do salário mínimo é 37,1%
no mesmo período.

S ESSENTA ANOS DE POLÍTICA DO MÍNIMO NO BRASIL


A política do mínimo no Brasil está completando sessenta anos
de existência. Da introdução do valor do primeiro salário mínimo
(1940) até os dias de hoje, a política do mínimo passou por pro-
fundas modificações, seja no que diz respeito ao seu objetivo, seja
no que se refere ao seu resultado. Pode-se destacar, pelo menos, a
existência de três fases distintas na condução da política de salário
mínimo no país: 1940-1951, 1952-1964 e pós-64.

131
A primeira fase – 1940-1951
A primeira fase correspondeu tanto ao momento de imple-
mentação e consolidação do valor do mínimo pelo governo de
Getúlio Vargas (Estado Novo, de 1937 a 1945) quanto à reação a
essa medida de intervenção no mercado de trabalho pelo governo
liberal de Gaspar Dutra (1945-1950). Decorrido um longo tempo
de negociação política – iniciado em plena década de 1930 –, a
fixação em 10 de maio de 1940 do primeiro valor do salário míni-
mo representou uma vitória das forças políticas comprometidas
com o movimento de industrialização nacional, sustentado em tor-
no da construção do mercado interno de consumo.
A ação do poder público direcionada para a institucionalização
do valor do mínimo nacional, além de ter sido favorável ao movi-
mento de industrialização (estruturação das remunerações), desem-
penhou um papel importante na regulamentação do mercado de
trabalho, como mecanismo de proteção dos trabalhadores de salário
de base. Segundo a interpretação de Oliveira Vianna (1951), um dos
ideólogos da legislação trabalhista de Vargas, a criação do salário
mínimo teve por objetivo a correção das injustiças promovidas pelo
desenvolvimento industrial, incorporando ao mercado de consumo
aqueles que se encontravam no limite da pauperização. Mas o salá-
rio mínimo era limitado para os empregados com carteira de traba-
lho nas cidades e diferenciava-se regionalmente. Nos centros indus-
triais como São Paulo e Rio de Janeiro, que eram responsáveis por
cerca de 50% do total dos empregos urbanos registrados, o valor do
primeiro salário mínimo ficou abaixo da média dos menores salá-
rios, enquanto no restante das cidades, o mínimo legal foi superior à
média das menores remunerações.
A fixação de um piso com valor elevado para o acesso ao
mercado de trabalho organizado, durante os primeiros anos da
década de 1940, atendia às necessidades essenciais do trabalhador,
embora estimando-se que para as despesas familiares representas-
se apenas 40% do custo total. Na segunda metade dos anos 1940,
o poder de compra do mínimo caiu rapidamente3.
Com o fim do autoritarismo representado pelo Estado Novo, a
vitória da coalizão conservadora em 1946 concedeu maior peso às
forças de mercado para a determinação dos salários. Para que isso

132
fosse possível, o governo Dutra utilizou-se da intervenção nos prin-
cipais sindicatos, da perseguição a líderes políticos e da cassação
de partidos políticos (PCB). Embora houvesse a retomada do regi-
me democrático e a definição constitucional (1946) do salário mí-
nimo com dimensão familiar, na prática percebeu-se que o seu
poder aquisitivo (1944-1951) correspondeu a tão-somente dois ter-
ços das necessidades estimadas para um indivíduo e de 24% para
uma família. Durante essa fase havia dezessete níveis de salário
mínimo no Brasil.

A segunda fase – 1952-1964


Do início da década de 1950 até a primeira metade dos anos
1960, o poder aquisitivo do salário mínimo recuperou as perdas
anteriores e passou a incorporar parte dos ganhos de produtivida-
de nacional. A existência de coalizões políticas que incluíam os
interesses das classes subalternas permitiu que o salário mínimo
chegasse a representar, na média do período 1952-1964, 2,4 vezes
a renda per capita, enquanto no período 1944-1951 representou,
em média, 1,3 vez o PIB per capita.
A forte atuação sindical durante os anos 1950, apesar de sua
ausência nas fábricas, permitiu o desenvolvimento de campanhas
nacionais de defesa da elevação do salário mínimo, como forma
de possibilitar o aumento do conjunto dos salários urbanos. A pre-
sença de interesses sociais organizados representados na agenda
do Estado foi resultado do desenvolvimento do chamado
“sindicalismo populista”. Para os empregos urbanos com carteira
assinada houve a proteção dos trabalhadores de salário de base,
enquanto os ocupados no meio rural permaneceram afastados dos
efeitos diretos da elevação do valor do mínimo. Apesar disso, a
segunda fase da política de salário mínimo (1952-1964), esteve
solidária com o padrão de desenvolvimento do setor de bens de
consumo não duráveis. Através da decisão política de elevação do
valor do salário mínimo urbano foi possível a generalização de
uma norma de consumo adequada à estrutura produtiva de bens e
salários (Souza e Tavares, 1981).
O valor do mínimo registrou taxas de crescimento que permi-
tiram atender às necessidades essenciais individuais de consumo,

133
ainda que durante o movimento de forte industrialização e urbani-
zação o custo de reprodução do trabalhador adulto houvesse tido
que incorporar novas despesas, até então distantes do assalariado
urbano (transporte, aluguel, remédios etc.). Comparando-se o pe-
ríodo 1952-1964 com os anos 1944-1951, pode-se observar que
houve encarecimento, em média, de 12,2% no custo de reprodu-
ção do trabalhador assalariado, bem como a evolução positiva do
salário mínimo nos anos 1952-1964. Durante esse período, o salá-
rio mínimo registrou 29 níveis distintos no Brasil.

Gráfico 28 – Brasil: evolução do poder aquisitivo médio decenal


(1940-1999)

Fonte: FIBGE e Dieese (SM real=100,0 em 1940)

A terceira fase – pós-64


A terceira fase de condução da política de salário mínimo teve
início com a interrupção do regime democrático, em 1964, quando
o valor do mínimo deixou de estar vinculado diretamente ao custo
de reprodução da força de trabalho. Embora permanecesse o me-
canismo de intervenção do poder público no mercado de trabalho,
a política do mínimo, no que se refere à proteção dos trabalhado-
res de salário de base, esteve distante do atendimento dos objeti-
vos estabelecidos pela legislação de 1940. Nos anos 1965-1974,
por exemplo, o valor do mínimo registrou uma queda no seu po-
der aquisitivo de 33,5% atendendo tanto à sustentação de uma

134
base de apoio político do regime militar (pequenos negócios) quanto
à composição das medidas ortodoxas de combate à inflação.
Em virtude disso, a incorporação gradual dos empregados ru-
rais e dos autônomos nas legislações social e trabalhista ocorreu
de forma incompleta e precária. Os trabalhadores rurais passaram
a ter o direito à remuneração mínima e, parcialmente, aos demais
direitos trabalhistas a partir da década de 1960, enquanto as em-
pregadas domésticas somente foram incorporadas plenamente com
a Constituição de 1988.
Os baixos valores para o salário mínimo foram acompanhados
pelos benefícios previdenciários. Diante da política de arrocho do
valor do mínimo e a flexibilização do regime de contratação e
demissão da mão-de-obra (FGTS), as políticas de regulação do
mercado de trabalho passaram a estar descomprometidas com a
melhora das condições de vida das classes trabalhadoras. Obser-
vou-se, assim, o fortalecimento das forças de mercado, especial-
mente no que diz respeito ao movimento de generalização do
mínimo para o campo e à unificação nacional do seu valor.
A política de salário mínimo, a partir da segunda metade dos
anos 1960, foi passiva diante do processo de generalização das
legislações trabalhista e social aos trabalhadores rurais. Noutras
palavras, o salário-hora do homem do campo aproximou-se do
valor do mínimo muito mais pela queda do poder aquisitivo
do salário mínimo do que pela elevação acentuada de sua remune-
ração. Dessa forma, a maior abrangência de empregados de salário
mínimo e no regime formal de trabalho deixou de provocar modi-
ficações profundas no nível de remuneração dos novos segmentos
incorporados ao mercado de trabalho.
No mesmo sentido, não se verificou a elevação do custo do
trabalho propalado pelos conservadores, apesar de a formalização
das relações de trabalho implicar a introdução de adicionais sobre o
salário de base (contribuições sociais e direitos trabalhistas). Em
grande medida, porque o movimento de unificação nacional do
salário mínimo ocorreu paralelamente à queda do poder aquisitivo
do maior valor do mínimo, fazendo com que permanecesse inalterada
a situação dos baixos salários. Enquanto em São Paulo o salário
mínimo teve reduzido em 48% o seu poder de compra nos anos

135
1960-1984, na Bahia, no mesmo período, houve aumento de 2,4%.
Nos anos 1960 havia dezessete níveis distintos de salário mínimo,
reduzindo para cinco nos anos 1970 e um a partir de maio de 1984.
Com isso, o movimento de unificação nacional do salário mí-
nimo praticamente não trouxe alteração no nível de diferenciação
geográfica da remuneração dos trabalhadores de salário de base,
uma vez que foi o maior valor do salário mínimo adequado ao
menor poder aquisitivo do mínimo praticado nas regiões tradicio-
nalmente de baixos salários. Esse movimento favorável às regiões
atrasadas e às empresas de baixa produtividade permitiu manter
intacta parte da base de sustentação política do regime militar (pe-
quenos negócios e oligarquias regionais). Com isso, pode-se dizer
que o salário mínimo pouco contribuiu para a redução da hetero-
geneidade do mercado de trabalho.
Mesmo nos anos do “milagre econômico” (1968-1973), quan-
do o país registrou taxas significativas de expansão do emprego e
do produto, o poder aquisitivo médio do mínimo nacional conti-
nuou apresentando queda. Isso, de certa forma, confirma a tese de
que, a partir de 1964, não foi por razão econômica que o salário
mínimo perdeu poder aquisitivo. Ainda hoje os argumentos de
natureza econômica têm sido utilizados pelos conservadores para
evitar qualquer elevação real do valor do mínimo.
Em relação ao período 1975-1982, por exemplo, o salário mí-
nimo apresentou, pela primeira vez em termos de média anual
desde 1940, valores anuais inferiores à renda per capita. Desde
1975, o salário mínimo anual passou a ser inferior à renda nacional
por habitante, enquanto nos anos anteriores o salário mínimo anual
atingia valores nominais superiores à renda nacional dividida pelo
número de habitantes.
No período subseqüente (1982-1999), a tendência de queda
do valor real do mínimo não foi alterada. Representando tão-so-
mente, em média, cerca de 25% da renda per capita, 50% do custo
das necessidades mínimas do trabalhador individual e 16% do cus-
to familiar, o salário mínimo continuou afastando-se dos objetivos
para o qual havia sido criado em 1940.
Nos anos 1990, o esvaziamento adicional da política de sa-
lário mínimo se deu aliada ao fim da política salarial e à maior

136
desregulamentação do mercado de trabalho, o que proporcio-
nou o estabelecimento do menor patamar de poder aquisitivo
do mínimo nacional nos últimos sessenta anos. Apesar do
descompromisso da atual política do salário mínimo com a re-
produção adequada da força de trabalho, o seu valor ainda con-
tinua representando, de forma figurada, o centro de gravitação
das remunerações dos empregados de salário de base. Por ser a
remuneração de ingresso no mercado de trabalho organizado e
a base da hierarquia de remunerações de grande parte das em-
presas, o valor do mínimo continua sendo um referencial de
salário dos empregados secundários (não-chefes de família,
mulheres e jovens), dos empregos com alguma qualificação no
início da carreira e, sobretudo, de trabalhadores (chefes de fa-
mília) sem qualificação.

ELEMENTOS DE COMPARAÇÃO INTERNACIONAL DO SALÁRIO MÍNIMO

A experiência internacional do salário mínimo revela a perma-


nência do seu papel destacado na regulação econômica e social.
Além da garantia de um patamar mínimo para o estabelecimento
da remuneração dos trabalhadores de salário de base, compreende
também o instrumental fundamental na reparticipação da renda,
na limitação da desigualdade de rendimento e na proteção dos
trabalhadores insuficientemente cobertos pelas negociações coleti-
vas de trabalho.
Após o vendaval das teses neoliberais nas economias desen-
volvidas, passou a ressurgir com força o reconhecimento de que a
defesa do salário mínimo tornou-se fundamental como medida jus-
ta de luta contra as desigualdades que se elevaram (OCDE, 1998).
Dessa forma, volta-se ao consenso construído em 1929 entre os
países membros da Organização Internacional do Trabalho, quan-
do da promulgação de diversas convenções sobre o salário míni-
mo4.
Embora prevalecendo uma diversidade relativamente grande
de práticas institucionais nos países de estabelecimento do salário
mínimo, pode-se acompanhar a sua ação em termos da evolução
mais recente de seu poder aquisitivo. No conjunto de apenas seis

137
países, percebe-se que desde 1975, o Brasil apresentou uma traje-
tória bem distinta no poder aquisitivo do salário mínimo.
Diante do patamar de renda per capita muito diferenciado,
pode-se constatar, por outro lado, que a participação do salário
mínimo anual encontra-se submetida à existência de dois limites: o
inferior e o superior. Entre os países desenvolvidos, os Estados
Unidos representam o exemplo de limite inferior do salário míni-
mo em relação à renda per capita, estimado em 39% em 1999, e a
Dinamarca representa o exemplo do limite superior, estimado em
66% em 1999.

Tabela 10 – Comparação do Produto Interno Bruto per capita e de sua


relação com o salário mínimo em países selecionados (1999)

Países Renda per capita em dólar SM/PIB per capita em %


Dinamarca 33.014 66,2
Estados Unidos 32.856 38,7
Suécia 26.220 39,7
França 24.619 49,6
Inglaterra 23.784 50,7
Espanha 15.289 54,9
Argentina 7.921 42,9
Uruguai 6.032 47,5
México 4.364 41,4
Venezuela 4.173 51,3
Brasil 3.396 28,6
Peru 2.460 35,4
Egito 1.180 63,1
Bolívia 985 54,8

Fonte: FMI; OCDE; FIBGE.

Para países não desenvolvidos, o limite superior do salário


mínimo pode ser encontrado em países como o Egito, com o salá-
rio mínimo em relação à renda per capita, estimado em 66%, en-
quanto o Brasil representa o exemplo do limite inferior, estimado
em 28%, de acordo com o conjunto de países com informações
disponíveis em 1999. Apesar de possuir renda per capita maior do
que a de países como o Peru, Bolívia e Egito, o Brasil destaca-se
por apresentar baixa participação do salário mínimo anual no PIB

138
por habitante. Não deve causar espanto, portanto, o fato de o país
ser conhecido internacionalmente pelas enormes diferenciações
de rendimentos entre os ocupados.
Comparando-se o valor do mínimo com a hierarquia salarial dos
trabalhadores ocupados no setor industrial, percebe-se que as dife-
renças são exorbitantes no Brasil. A diferença entre o salário médio
do operário e o salário médio da administração na indústria de trans-
formação brasileira é de 9,4 vezes, enquanto na Alemanha é de 1,6
vez, de 2,8 vezes na França, de 2,1 vezes na Holanda, de 1,8 vez na
Dinamarca e de 1,7 vez na Itália (Santos e Pochmann, 1996).
De outro lado, a capacidade sindical de estabelecer o piso
salarial da categoria profissional mostra ser fundamental no
dimensionamento do intervalo entre o maior e o menor salário
pago pelo empregador. O salário mínimo, obviamente, contribui
com o sindicato na luta pela elevação do piso salarial, na medida
em que estabelece o limite inferior de contratação do trabalhador
por parte do empregador.
Conforme estudo do Dieese, a capacidade sindical na defini-
ção do piso salarial das categorias não consegue ir muito além do
salário mínimo oficial. Em 1996, por exemplo, 59,2% dos pisos
salariais dos sindicatos selecionados tinham seus valores abaixo de
2,5 salários mínimos. Considerando o valor real do salário mínimo
de 1940, que em 1996 equivalia em termos reais a 4,0 SM nominais
do mesmo ano, somente 11% dos pisos salariais estariam acima do
valor do mínimo nacional.

O ATUAL TRABALHADOR DE SALÁRIO MÍNIMO NO BRASIL


O segmento da População Economicamente Ativa que recebe
o salário mínimo compreendeu, em 1998, 14,9 milhões de brasilei-
ros. Do conjunto de trabalhadores com rendimentos (70 milhões),
21,3% tinham suas remunerações mensais equivalentes a até o va-
lor do salário mínimo.
O recebimento de remuneração equivalente ao salário mínimo
não diz respeito apenas ao trabalhador assalariado. Tem até em-
pregador que recebe o valor do salário mínimo no Brasil. No ano
de 1998, do total de 14,9 milhões de brasileiros com rendimentos

139
que recebem o equivalente ao salário mínimo, 7,8 milhões eram
homens (52,3%) e 7,1 milhões eram mulheres (47,7%). O setor
urbano possuía 10,6 milhões de brasileiros de salário mínimo
(71,1%), enquanto o setor rural era responsável pela existência de
4,3 milhões pessoas com rendimento equivalente ao piso nacional
(28,9%).
Ainda em relação ao universo de trabalhadores de salário mí-
nimo, pode ser destacada a presença de 2 milhões de pessoas que
pertenciam ao setor industrial (13,4%); 1,6 milhão ao comércio
(10,6%); 6,6 milhões aos serviços privados (44,2%), 442 mil ao
serviço público (2,9%) e 4,3 milhões ao setor agrícola (28,9%).
A região Nordeste concentra mais da metade dos trabalhado-
res de salário mínimo no Brasil. No ano de 1998, a segunda grande
região geográfica em quantidade de trabalhadores de salário míni-
mo era a Sudeste com quase 25% do total, seguida da região Sul
(11,3%).
Do conjunto de trabalhadores de salário mínimo, apenas 2,6
milhões contribuem para a Previdência Social (17,4%), sendo 1,9 mi-
lhão assalariados com registro formal (12,7%) e 0,7 milhão autôno-
mo e empregador (4,7%). Dessa forma, 12,3 milhões de brasileiros
de salário mínimo não contribuem para a Previdência Social (82,3%)
e 12,3 milhões de brasileiros encontram-se fora do marco legal do
mercado de trabalho (82,6%).
Para os trabalhadores assalariados, nota-se que o salário míni-
mo encontra-se mais concentrado para as mulheres sem carteira
assinada, sobretudo no emprego doméstico que tem 76% dos 5
milhões de seus postos de trabalhos informais. No emprego públi-
co, também é a mulher que possui maior participação relativa nos
postos de trabalho de salário mínimo.
Entre os 14,9 milhões de brasileiros de salário mínimo, 7 mi-
lhões possuíam até 3 anos de escolaridade (47,0%), sendo 3,6 mi-
lhões com menos com menos de 1 ano de instrução (24,1%), en-
quanto 888 mil possuíam mais de 11 anos de escolaridade (6,0%).
Além disso, observa-se também a presença de extensas jorna-
das de trabalho praticada intensivamente pelos trabalhadores de
salário mínimo. A qualidade dos postos de trabalho e a sua instabi-
lidade, bem como o baixo rendimento, tornam a jornada de traba-

140
lho prolongada, uma forma de compensar a baixa produtividade
pelo lado patronal além de uma via de complementação da redu-
zida remuneração mensal pelo lado laboral. Em 1998, por exem-
plo, entre os 14,9 milhões de trabalhadores de salário mínimo,
havia 5,5 milhões que trabalhavam mais de 44 horas semanais
(36,9%).

NOVO MODELO ECONÔMICO E SALÁRIO MÍNIMO

Entre 1940 e 1964, o valor do salário mínimo correspondeu,


em maior ou menor medida, ao custo de vida dos trabalhadores de
salário de base, tendo nas comissões tripartite de salário mínimo o
instrumento de representação política dos interesses organizados
da sociedade. A partir do regime militar, a política de salário míni-
mo foi profundamente alterada, esvaziando o seu principal objeti-
vo de guardar relação com a cesta de sobrevivência dos trabalha-
dores de menor renda.
O rebaixamento do valor do mínimo nacional foi utilizado nos
anos 1960 tanto para combater a inflação como para favorecer o
ajuste exportador no início da década de 1980, através da redução
dos custos das empresas. Com a introdução do novo modelo eco-
nômico em 1990, o rebaixamento do valor do salário mínimo tem
sido utilizado para auxiliar no ajuste fiscal. Recorrentemente faz
parte da retórica conservadora das autoridades governamentais para
impedir a ampliação dos gastos da Previdência Social.
Por isso, a evolução do salário mínimo real foi negativa, acu-
mulando queda no seu poder aquisitivo estimada em 36,2% na
comparação entre os anos 1989 e 19995. Essa perda ocasionada no
poder aquisitivo do salário mínimo anual terminou por se refletir,
invariavelmente e em maior ou menor o grau, sobre outras variá-
veis socioeconômicas.
Em relação, por exemplo, ao comportamento da pobreza e da
desigualdade de renda foi possível identificar uma associação dire-
ta e inversa à evolução do poder aquisitivo do salário mínimo. Por
outro lado, quanto ao emprego, percebe-se uma relação direta e
no mesmo sentido com a evolução do valor real do salário míni-
mo, conforme pode-se observar a seguir.

141
Em 1999, o salário mínimo anual equivaleu a 28,6% da renda
per capita nacional, enquanto em 1989 chegou a representar quase
44%. A diminuição na participação relativa do salário mínimo na
renda por habitante ocorreu porque houve uma queda estimada
em 9,4% no PIB per capita, entre 1990 e 1992, enquanto o salário
mínimo real caiu 36,2%.

Gráfico 29 – Brasil: evolução do salário mínimo real


e a renda per capita (1989-1999)

Fonte: IBGE, Dieese e MTb.

Na fase de recuperação do PIB per capita, estimada em 13,5%


entre 1993 e 1997, o salário mínimo real acumulou uma leve dimi-
nuição de 3,0% no seu poder de compra. Nos anos 1998 e 1999,
diante da nova queda da renda per capita de 2,1%, o salário míni-
mo registrou uma elevação de 2,6% no seu poder aquisitivo.
A queda no emprego formal foi menos acentuada que a dimi-
nuição do salário mínimo real nos últimos dez anos. Para uma
diminuição de 18,1% no emprego formal, o salário mínimo regis-
trou redução de 36,2%. Coincidência ou não, o equivalente ao
dobro da diminuição do salário mínimo ocorrida entre 1989 e 1999.
Ao mesmo tempo em que foi registrada a redução do salário
mínimo real ocorreu a expansão das ocupações consideradas in-
formais (assalariamento sem registro formal e trabalho autônomo).
Assim, os dados a respeito da evolução da ocupação apontam para

142
uma situação inversa entre a evolução do poder aquisitivo salário
mínimo e as ocupações informais e direta e no mesmo sentido
entre o salário mínimo e o emprego formal.
Também em relação ao comportamento do desemprego pode-
se observar que a presença de evolução inversa à trajetória do
poder aquisitivo do salário mínimo. Entre 1989 e 1999, o índice de
desemprego nacional foi multiplicado por 3,5 vezes, enquanto o
salário mínimo acumulou uma perda real de 36,2%.
Nos anos 1990, a evolução da pobreza comportou-se de ma-
neira circular. Ou seja, houve aumentou relativo da quantidade de
pobres entre 1990 e 1993 e entre 1996 e 1999, enquanto no perío-
do de 1994 a 1996 foi registrada uma queda. Na fase em que ocor-
reu a diminuição da desigualdade de renda, o poder aquisitivo do
salário mínimo manteve-se quase inalterado, enquanto na fase de
elevação da diferença dos rendimentos, o poder aquisitivo do mí-
nimo caiu acentuadamente.
Em relação à desigualdade, nota-se que durante a recessão
econômica, ocorrida entre 1990 e 1992, tanto a desigualdade de
renda quanto o valor real do salário mínimo diminuíram. Entre
1994 e 1996, com a recuperação do nível de atividade e a estabili-
zação monetária, a desigualdade de renda voltou a decrescer, en-
quanto o salário mínimo anual sofreu uma leve elevação (0,5%).
Nos anos 1998 e 1999, quando a desaceleração econômica tomou
conta do país, a desigualdade voltou a crescer levemente, junto
com a redução de 2,1% no poder aquisitivo do salário mínimo.
Interessante notar que durante os anos 1990, a arrecadação
líquida da Previdência Social foi positiva, sendo, em 1999, 55%
superior à verificada em 1989. No mesmo período, o valor real do
salário mínimo foi reduzido em 36,2%.
Durante a recessão econômica do governo Collor, a arrecadação
líquida da Previdência Social no Brasil foi decrescente durante a
recessão, porém com a recuperação econômica pós-1992 a arrecada-
ção cresceu expressivamente em termos reais. Ainda que o compor-
tamento do emprego formal não tenha sido positivo, a Previdência
Social aumentou sua receita, tendo desde 1994 operado com déficit.
Do conjunto de aposentados e pensionistas da Previdência So-
cial, estimado em 18,8 milhões de brasileiros em 1999, constata-se

143
Gráfico 30 – Brasil: evolução do salário mínimo e Previdência Social
(1989/1999)

Fonte: MPAS/SPS, Dieese e MTE.

que 66,9% recebem até um salário mínimo. Percebe-se que mesmo


diante do achatamento do salário mínimo praticado na última déca-
da do século XX e nem mesmo ao que parece a recente reforma
previdenciária mostram-se suficientes para resolver seus problemas
estruturais. Não seria, portanto, a permanência do achatamento do
valor do salário mínimo que resolveria a crise da Previdência Social
no Brasil. Somente a retomada do crescimento econômico sustenta-
do, com a incorporação dos trabalhadores de fora do sistema
previdenciário, que em 1998 significava 51 milhões de um total de
70 milhões de ocupados, poderá criar condições mais satisfatórias
para a estabilização das despesas superiores às receitas.
Também quanto à evolução da carga tributária bruta, com relação
ao comportamento do Produto Interno Bruto brasileiro, observa-se
uma elevação expressiva, estimada em 32,5% entre 1989 e 1999. Mas
o aumento da receita do poder público não foi acompanhado lamen-
tavelmente pela evolução do poder aquisitivo do salário mínimo.
Dos 5,1 milhões de funcionários públicos em 1997, segundo o
Ministério do Trabalho, apenas 378,7 mil (7,4%) recebiam até um
salário mínimo. Na União, o peso dos funcionários até um salário
mínimo era de 3,2%, enquanto no conjunto dos estados era de

144
3,5% e na totalidade dos municípios de 13,5%. Deve-se destacar
que a União é responsável por 12,1% do total dos funcionários
públicos do país, sendo os estados responsáveis por 47,2% e os
municípios responsáveis por 40,7%.

SALÁRIO MÍNIMO E IMPLICAÇÕES


De acordo com a Constituição Federal de 1988, o salário míni-
mo deve ser fixado por lei, nacionalmente unificado, capaz de aten-
der às necessidades vitais básicas tanto do trabalhador quanto de
sua família, com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, ves-
tuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes perió-
dicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua
vinculação para qualquer fim. Apesar de estar prevista no artigo 7º,
inciso IV da Constituição Federal, não há dúvidas acerca do seu
descumprimento pelo real poder aquisitivo do salário mínimo atual.
Para atender ao consumo de 13 alimentos básicos para uma só
pessoa, o salário mínimo mostra-se suficiente. Mas para uma família
e o atendimento das demais despesas definidas pela Constituição
Federal percebe-se a sua clara insuficiência. Em São Paulo, por exemlo,
o valor de uma cesta básica composta de apenas 13 tipos de alimen-
tos equivalia, em 1999, a quase 86% do salário mínimo líquido.
Diante dessa triste realidade, a política de recuperação do salá-
rio mínimo é urgente e fundamental para um conjunto não despre-
zível de trabalhadores. São cerca de 28 milhões de pessoas diretamente
envolvidas com o valor do salário mínimo no Brasil, sendo 12,6 mi-
lhões de aposentados e pensionistas, 14,9 milhões de trabalhadores
ativos e deste total 1,9 milhão de assalariados com carteira assinada.
Do conjunto de trabalhadores ativos que recebem o salário
mínimo, a imensa maioria pertence ao setor privado (14,5 milhões
ou 97,4%), pois menos de 380 mil (2,6%) encontram-se no setor
público. Erra o foco, portanto, aqueles que entendem que a resis-
tência ao aumento do salário mínimo encontra-se no setor público.
Deve-se ressaltar que o objetivo da política de salário mínimo
é procurar contra-arrestar as tendências do mercado de trabalho
que levam inexoravelmente ao rebaixamento dos salários e à mai-
or desigualdade de rendimentos. O foco da política de salário mí-
nimo deve ser, portanto, o mercado de trabalho.

145
Conforme apresentado anteriormente, o rebaixamento do va-
lor do salário mínimo vem acompanhado do aumento da pobreza,
da desigualdade de renda, da informalidade e do desemprego. De
forma contrária ao que muitas vezes se procura difundir no país, a
elevação real do salário mínimo pode atuar contra o desemprego e
favorecer a expansão do emprego formal, a diminuição da desi-
gualdade de renda e a pobreza.
O Brasil pode pagar salário mínimo maior. Aliás, já pagou no
passado recente, quando a economia era menos eficiente e com-
petitiva. Embora possível, a luta em torno do valor do salário míni-
mo não deixa de revelar apenas parte dos interesses políticos que,
desde a derrota da condução da política de salário mínimo ativa
em 1964, continuam influenciando a decisão a respeito do piso do
porão na economia conformada em cima dos baixos salários.
Para o âmbito das políticas sociais, no caso específico da previ-
dência social, o valor do salário mínimo é decisivo. Assim como
para os trabalhadores ativos, o aumento do valor real do salário
mínimo não representa apenas e tão-somente custo (visão estática),
mas sobretudo renda (visão dinâmica) e, portanto, consumo. Como
o consumo agregado no país formado de baixos salários representa
cerca de 82% do Produto Interno Bruto, o adicional no valor do
mínimo nacional impõe não apenas o movimento do crescimento
econômico como uma mudança no atual modelo econômico, atra-
vés da valorização da produção e do emprego nacional, bem como
a redução da pobreza e da absurda concentração de renda.

NOTAS:
1 A gênese da manifestação contrária ao salário mínimo no Brasil pode ser
encontrada em Gudin, 1954; Kingston, 1960; Kafka, 1954.
2 Sobre a natureza da visão progressista do salário mínimo no Brasil, ver: Ianni,
1986; Rangel, 1963; Tavares, 1985.
3 Maiores detalhes podem ser obtidos em Pochmann, 1994.
4 Em 1928 foi estabelecida a convenção número 26 sobre os métodos de fixa-
ção do salário mínimo, enquanto em 1951 nasceu a convenção 99 sobre o
salário mínimo na agricultura. Depois, em 1962, veio a convenção 117 sobre
a política social e o salário mínimo e a convenção 131, em 1970, sobre a
generalização do salário mínimo.
5 Utilizou-se como deflator o Índice de Custo de Vida do Dieese.

146
Novas e velhas políticas do trabalho no
Brasil

O neoliberalismo tem como referencial no Brasil o rompimen-


to com a chamada Era Va rgas. Especialmente em relação ao pa-
drão de relações de trabalho estabelecido a partir da Revolução de
T rinta, a adoção das políticas neoliberais pressupõe a
desconstitucionalização dos direitos trabalhistas, assim como o es-
vaziamento do código do trabalho, através da introdução de uma
série de medidas flexibilizadoras das relações de trabalho.
Embora não fosse possível constatar nos anos 1990 nenhuma
ampla reforma trabalhista nos moldes neoliberais, o país não deixou
de registrar diversas medidas governamentais voltadas para a altera-
ção do padrão de relações de trabalho, estimuladas pela propagan-
da de melhorar as condições de trabalho e ampliar o volume de
emprego. Mas tudo isso transformou-se num verdadeiro mito, posto
que o mercado de trabalho registrou uma intensa piora em seu
desempenho. Apesar de grandes e profundas alterações ocorridas
na base econômica e na estrutura social, a estrutura corporativa deu
sinais de se manter praticamente inalterada. Mesmo com a implanta-
ção de um novo modelo econômico e das reformas neoliberais, as
características gerais de funcionamento das relações de trabalho
permanecem ainda fundadas no padrão de representação de inte-
resses, nas funções típicas de organização, financiamento e funcio-
namento das entidades sindicais (patronal e laboral) e nas regras de
administração dos conflitos trabalhistas (negociação coletiva, greve
e intervenção da Justiça do Trabalho). No entanto, mesmo com a
ausência de mudanças substanciais na estrutura corporativa, perce-

147
be-se uma elevada capacidade de adaptação à dinâmica das rela-
ções de trabalho, ao mesmo tempo que tem crescido, como nunca
antes, a parcela de empresas e de trabalhadores que fica de fora do
marco regulatório. Em 1980, quase 50% dos trabalhadores ocupados
estavam vinculados, de alguma forma, ao sistema de relações de
trabalho. Vinte anos depois, apenas um terço.
O esvaziamento da efetividade do marco regulatório do mer-
cado de trabalho não foi maior devido às diferentes ações e tenta-
tivas sindicais voltadas para o rompimento do Sistema Corporativo
de Relações de Trabalho ao longo dos últimos sessenta anos. O
s u rgimento do “novo sindicalismo”, que completou duas décadas
de existência, exerceu forte influência nos anos 1980 para que a
estrutura corporativa fosse remodelada, apresentando de maneira
concreta projetos de transição para um sistema democrático de
relações de trabalho.
Nos anos 1990, contudo, o predomínio de ações “antilabor”
motivadas pelo projeto neoliberal, aliadas as dificuldades pelas
quais tem passado o movimento sindical ante a desfavorável con-
juntura econômica, apontou para uma situação de maior
reacomodação à estrutura corporativa. De um lado, os interesses
dos setores solidários ao sindicalismo oficial são fortalecidos, ao
mesmo tempo que, de outro lado, o ataque neoliberal à agenda do
trabalho torna cada vez mais arriscada uma estratégia de transição
de rompimento com a estrutura corporativa.
Para discutir a estabilidade recorrente da estrutura sindical
corporativa no Brasil procura-se, na primeira parte, recuperar ra-
pidamente os históricos movimentos sociais em torno do rompi-
mento e da acomodação ao Sistema Corporativo de Relações de
Trabalho. Na segunda parte, procura-se discutir as mudanças es-
truturais que ocorreram nas relações de trabalho nos anos 1990
no Brasil, cujas características gerais apontam para sua maior he-
terogeneidade. Na terceira parte, os sinais recentes de acomoda-
ção dos atores sociais à estrutura sindical corporativa são desta-
cados e, na quarta parte, como considerações finais, são explorados
os possíveis efeitos da reacomodação sindical ao Sistema
Corporativo de Relações de Trabalho no Brasil desde o âmbito
do novo modelo econômico.

148
PERÍODOS DE ROMPIMENTO E ACOMODAÇÃO DO SISTEMA
CORPORATIVO DE RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL (1930-1989)
Com o capitalismo industrial foram abertas novas oportunida-
des de expansão e consolidação das relações de trabalho no regi-
me de assalariamento em países com economias avançadas1. No
Brasil, somente a partir da década de 1930, com a definição de um
projeto de industrialização nacional é que pareceu ser possível
ampliar as possibilidades de difusão do assalariamento urbano e,
com isso, a consolidação do Sistema Corporativo de Relações de
Trabalho.
Além de fortalecer e dinamizar as forças produtivas, o Estado,
através de sua atuação favorável à industrialização, direcionou tam-
bém a sua intervenção às relações de trabalho. Com isso, foi esta-
belecida uma nova estrutura sindical, potencialmente de massa
para a época (sindicatos gerais/industriais) e com capacidade de
lançar à cena política não apenas parte da força de trabalho vinda
do campo como os segmentos industriais que regionalmente con-
viviam desorganizadamente2. Nesse sentido, tanto empresários quan-
to trabalhadores sofreram impactos diretos da ação organizada do
Estado desde a Revolução de Trinta no Brasil.

Tabela 11 - Brasil: Indicadores comparativos dos períodos de forte


atuação sindical (média anual)
Itens 1945/46 1961/64 1978/89
Número médio de greves 50,5 101,7 1.462,7
% de greves na indústria 52,0 30,0 40,0
% de greves nos serviços 48,0 70,0 60,0
% de greves em São Paulo 62,1 54,5 53,9
Número médio de grevistas* 2.367,5 3.174,0 5.540,1
Taxa de sindicalização urbana (%) 13,1 14,4 27,8

(*) Em mil.
Fonte: Sandoval, 1994; Noronha, 1994; Dieese, FIBGE. Elaboração própria.

A estrutura corporativa abriu novas possibilidades de incorpo-


ração de parte da população trabalhadora urbana nacional que se
encontrava excluída dos espaços político e social, ao mesmo tem-
po em que se transformou em um instrumento de controle estatal

149
dos sindicatos3. Desde sua montagem até os dias de hoje, o mode-
lo corporativo de relações de trabalho no Brasil permaneceu rela-
tivamente estável. As rápidas e profundas transformações ocorri-
das ao longo do tempo na estrutura da economia nacional, no
funcionamento do mercado de trabalho e no regime político prati-
camente não afetaram as regras básicas de relacionamento entre o
capital e o trabalho.
As constantes resistências às mudanças nas legislações sindi-
cais, contudo, têm retirado, mais recentemente, graus de efetividade
nas formas de representação dos interesses sociais e de regulação
das relações de trabalho. Nas últimas seis décadas, o sistema de
relações de trabalho passou por três experiências distintas de obs-
trução, porém acompanhadas sucessivamente por movimentos de
acomodação de interesses e de compatibilização das relações de
capital/trabalho, sem significar, portanto, a concretização do rom-
pimento da estrutura corporativa de organização e representação
dos interesses, conforme procura-se destacar a seguir.

Consolidação e primeira tentativa de rompimento do Sistema


Corporativo de Relações de Trabalho (1930-1948)
A Revolução de Trinta veio acompanhada da introdução de
novas institucionalidades no mundo do trabalho urbano. Logo
com a criação do Ministério do Trabalho, foram introduzidas
leis que acabaram conformando o Sistema Corporativo de Rela-
ções de Trabalho no Brasil, identificado em 1943 pela Consoli-
dação das Leis do Trabalho (CLT). Não obstante os importante
embates durante os anos 1930, foi a partir do Estado Novo que
o marco legal das relações de trabalho foi estabelecido, inicial-
mente para o meio urbano e, posteriormente nos anos 1960,
para o meio rural.
O primeiro movimento voltado para o rompimento da estrutu-
ra corporativa de representação de interesses ocorreu entre os anos
1944 e 1947, por decorrência da luta contra o Estado Novo
(1937-1944). Com o término da Segunda Guerra Mundial, assistiu-se
no Brasil a um significativo movimento de pressão social pela
redemocratização das instituições políticas. Através da atuação sin-
dical grevista articulada por organizações paralelas à estrutura

150
corporativa, foi possível atingir elevados graus de contestação ao
sistema corporativo de relações de trabalho.
Na maior parte das vezes, os dirigentes sindicais envolvidos
com o movimento grevista possuíam alguma ligação com o Partido
Comunista. A reivindicação de um padrão democrático de relações
de trabalho, com a contratação coletiva e novos mecanismos de
representação de interesses dos assalariados, como centrais sindi-
cais e comissão de fábrica, obteve grande apelo entre os sindicatos
do centro-sul do Brasil. (Maranhão, 1979; Telles, 1962; Rodrigues,
1991).

Acomodação forçada e segunda tentativa de rompimento do


Sistema Corporativo de Relações de Trabalho (1949-1964)
A relutância patronal em aceitar novas formas democráticas de
relacionamento entre o capital e o trabalho terminou contando
com o apoio do governo Dutra, que dois anos após a eleição
presidencial utilizou-se do poder repressivo para colocar em reflu-
xo o então emergente sindicalismo. Um período de acomodação à
estrutura corporativa de representação de interesses teve início,
sustentado pela forte repressão imposta pela ação governamental
e apoio empresarial no meio urbano.
A redução na quantidade de greves e na sindicalização, o de-
saparecimento das instituições paralelas e a congregação das ações
em volta do Ministério do Trabalho possibilitaram o retorno ao
Sistema Corporativo de Relações de Trabalho. Somente na década
de 1950, com o segundo governo de Vargas, os sindicatos voltaram
a recuperar o seu papel na agenda política nacional.
Agora em sua fase populista, os sindicatos atuaram dentro da
estrutura oficial, com momentos de fortes conflitos, como nos anos
1953-1954 e 1957 (Moisés, 1978; Weffort, 1972; Rodrigues, 1968).
Mas esse segundo período de expansão das ações sindicais levou,
a partir do final dos anos 1950 – quando o ambiente conflitivo
alcançou níveis expressivos –, ao desenvolvimento de novas for-
mas de articulação de interesses e de questionamento da estrutura
sindical oficial. Sem controle estatal, as organizações paralelas cri-
adas, a exemplo do que ocorrera nos anos 1944-1948, passaram a
envolver várias parcelas da sociedade, com mobilizações em torno

151
das bandeiras centradas na questão nacional (reformas de base) e
na alteração da estrutura corporativa (Delgado, 1986; Leite, 1983;
Neves 1981; Loyola, 1980). A defesa da negociação e contratação
coletiva de trabalho e da ampla liberdade sindical, que ocorreu a
partir da instalação das grandes empresas privadas durante o Pla-
no de Metas, constituiu um leque de propostas que visava a demo-
cratização dos sistema de relações de trabalho.

Acomodação forçada e terceira tentativa de rompimento do


Sistema Corporativo de Relações de Trabalho (1965-1989)
O golpe militar de 1964 impôs o fim das organizações parale-
las, intervindo em sindicatos combativos e prendendo lideranças
sindicais expressivas, como forma autoritária de reenquadrar a
ação sindical ao marco da legislação trabalhista vigente. Através
de forte repressão, o regime militar pôde conter, por longo tem-
po, as tentativas de articulação sindical, como as experiências das
greves de Osasco e Contagem em 1968 (Weffort, 1972) que não
deixaram de expressar a insatisfação dos trabalhadores com os
controles da estrutura sindical oficial que foi levada ao limite
pelo governo autoritário.
Nos anos 1970, o regime autoritário possibilitou a combinação
de uma fase de taxas significativas de expansão da economia na-
cional com a exclusão de grande parte dos trabalhadores da distri-
buição dos frutos do crescimento econômico. A disseminação de
diferentes formas de organização social (associação de moradores,
contra a carestia, comunidades eclesiais de base, entre outras) e de
algumas formas de articulação de empregados nos locais de traba-
lho, sobretudo nos principais centros industriais do país, expressa-
ram sinais de descontentamento (Sader, 1988; Moisés, 1982).
O aparecimento dessas novas formas de organização social
ainda na década de 1970 impulsionou o ressurgimento da ação
sindical, inicialmente nos ramos mais dinâmicos da economia na-
cional e, posteriormente, para os demais setores de atividade do
país. Apesar da repressão policial praticada pelo regime militar e
da intransigência patronal, a retomada das atividades sindicais foi
potencializada sob novas bases de atuação, que diferenciavam-se
das do passado. O sucesso do processo de industrialização até o

152
final dos anos 1970 havia levado ao desenvolvimento de segmen-
tos produtivos modernos, responsáveis pela concentração regional
de ampla parcela de assalariados.
No terceiro período de ascensão dos conflitos trabalhistas, no-
vamente emergiram alguns sinais de rompimento com a estrutu-
ra corporativa. Com fortes atritos no ambiente de trabalho e cres-
centes taxas de sindicalização, o padrão de regulação do trabalho
fundado na negação dos conflitos trabalhistas, na ampla mediação
do Estado e na colaboração de classes parecia ter perdido cada vez
mais a sua vitalidade. A explosão das greves, a ampliação das
negociações coletivas e a maior presença dos sindicatos na agenda
política nacional marcaram os anos 19804.
Com a Constituição de 1988 ocorreram algumas alterações
importantes nas formas tradicionais de atuação sindical, tais como
a aceitação de centrais sindicais (pluralismo na cúpula sindical,
unicidade sindical e estrutura confederativa), a livre criação de
sindicatos sem prévia autorização do Estado e sem qualquer inter-
ferência no seu funcionamento, a liberdade de filiação e de defini-
ção de contribuição confederativa descontada em folha (mantido o
imposto sindical), o delegado sindical, entre outras.
Além disso, a nova Constituição, sem ter autorizado nem mes-
mo proibido a realização de contratos coletivos de trabalho, confir-
mou a função do sindicato direcionada à centralização dos interes-
ses coletivos da categoria e à defesa dos direitos dos trabalhadores.
Permaneceu, contudo, grande parte dos direitos trabalhistas defi-
nidos por ampla e minuciosa legislação, enquanto os acordos/
convenções coletivas de trabalho procuraram incorporar, quando
possível, situações superiores às estabelecidas por lei.

TRAÇOS GERAIS DAS MUDANÇAS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO NOS


ANOS 19905

No Brasil, as relações de trabalho não podem ser consideradas


uma variável independente em cada espaço geográfico nacional,
pois elas sofrem influências diretas e indiretas de múltiplos fatores.
De maneira objetiva, podem ser identificados dois conjuntos de
fatores condicionantes das relações de trabalho no Brasil: os

153
condicionantes exógenos e os condicionantes endógenos. A com-
paração dos dois condicionantes entre os anos 1980 e 1990 visa
fornecer elementos objetivos sobre as transformações recentes nas
relações de trabalho.

Condicionantes exógenos
Os condicionantes exógenos das relações de trabalho repre-
sentam a base sobre a qual se desenvolvem as relações entre capi-
tal e trabalho. No Brasil, os condicionantes exógenos podem ser
representados: pelo cenário político, pelo ambiente econômico,
pelo comportamento da inflação e pelo desempenho do mercado
de trabalho, comentados a seguir.

O cenário político
O processo de transição política fundado na passagem do re-
gime autoritário para o democrático prevaleceu durante os anos
1980 no Brasil acompanhado por crescente presença sindical, in-
clusive nos momentos eleitorais. Nesse cenário político, foi confor-
mada uma nova geração de dirigentes sindicais, responsável pela
reformulação do papel desenvolvido pelos sindicatos, especial-
mente comprometida com o processo democrático e com uma
maior articulação entre as reivindicações específicas dos trabalha-
dores e as aspirações do conjunto da sociedade brasileira.
Nos anos 1990, todavia, tem-se verificado uma perda relativa
do espaço sindical no plano político nacional. Parece haver maior
dificuldade em associar as reivindicações específicas dos trabalha-
dores aos anseios do conjunto de toda a sociedade. A consolida-
ção do regime democrático e a permanência da crise econômica
tenderam a fragmentar bastante os interesses sociais, dificultando a
construção de uma pauta de reivindicações dos trabalhadores inti-
mamente associada aos anseios do conjunto da sociedade.
Em contraposição a isso, pode-se observar no período recente
uma expansão significativa da atuação laboral em vários fóruns
institucionais (Conselhos do Codefat, FGTS, PBQP, PCDT, Conselho
Nacional do Trabalho, BNDES), o que tem atenuado um possível
descolamento das posições dos dirigentes sindicais dos interesses
gerais dos trabalhadores. Ao mesmo tempo caberia uma melhor

154
avaliação acerca desse papel institucionalizado dos sindicatos na
conformação das políticas públicas, lamentavelmente não realiza-
da aqui por não ser objeto privilegiado do enfoque desse trabalho.

Ambiente econômico
A instabilidade monetária e a oscilação no nível de atividade
econômica, com a estagnação do produto, marcaram os anos 1980.
A partir da crise da dívida externa, em 1982, foram implementadas
as medidas orientadas pelo Fundo Monetário Internacional. De-
pois de três anos de recessão (1981 a 1983), houve uma rápida
recuperação (1984 a 1986) e posterior estagnação do produto (1987
a 1989). Dentro desse quadro de redução do nível dos investimen-
tos e de aceleração da inflação, as empresas ajustaram seus patri-
mônios através das oportunidades financeiras abertas pelo endivi-
damento público, distanciando-se da atualização produtiva.
Nos anos 1990, apesar de uma alteração qualitativa no cenário
econômico internacional, não se verificou uma mudança radical
no movimento oscilatório nas atividades econômicas, com uma
redução da produção entre 1990 e 1992, recuperação entre 1993 e
1995 e desaceleração desde 1996. Diante da maior exposição da
produção interna à competitividade internacional, o mix de produ-
ção das empresas tornou-se cada vez menos dependente de bens
e serviços nacionais. Parte do empresariado que não conseguiu se
ajustar a tempo foi eliminada pela desnacionalização e especializa-
ção da produção brasileira, sem que o país voltasse a retomar o
crescimento econômico sustentado.

Comportamento da inflação
O processo hiperinflacionário dos anos 1980 veio acompanha-
do por uma crescente rede de mecanismos de indexação de pre-
ços e salários, insuficiente para impedir retrocesso no rendimento
assalariado. O fracasso de cinco planos de estabilização reforçou
ainda mais as tensões políticas concentradas nos poderes legislativo,
judiciário e executivo em torno das políticas salariais e regras de
indexação de preços6.
A partir de 1994, a contenção do processo hiperinflacionário
tornou-se efetivo em um cenário absolutamente favorável ao in-

155
gresso de recursos voluntários externos, pedra angular da estraté-
gia de combate à inflação que se torna predominante na América
Latina no período recente. Mas a permanência de intensa fragilida-
de externa tem comprometido tanto a retomada sustentada do cres-
cimento econômico quanto a consolidação do êxito completo do
combate à inflação. Nesse sentido, parece haver uma encruzilhada
entre a sustentação da estabilidade monetária e a retomada do
crescimento econômico sustentado, conforme indicaram as crises
financeiras no México e na Ásia.

Desempenho do mercado de trabalho


Na década de 1980, o comportamento geral do mercado
de trabalho indicou haver uma relação positiva entre evolução
do nível de atividade e emprego. Num cenário de estagnação
produtiva, o avanço limitado no estoque de empregos regula-
res ocorreu por conta da ampliação das ocupações no setor
público e de mudanças na composição do emprego, com maior
peso nos segmentos não organizados do mercado de trabalho
devido ao maior fechamento da economia à concorrência
internacional.
Nos anos 1990, o desempenho do mercado de trabalho foi
alterado, refletindo uma mudança no comportamento da produção
e do emprego assalariado (recuperação pós-93 ocorreu sem im-
pacto positivo no nível de emprego formal). De um lado, as taxas
de desemprego tornaram-se o dobro do que eram no final dos
anos 1980. De outro, verificou-se uma redução do emprego assala-
riado no total da população ocupada, acompanhada da geração de
postos de trabalho precários e de baixa produtividade, que se refe-
rem fundamentalmente a estratégias de sobrevivência dos traba-
lhadores sem emprego.
Nos centros metropolitanos, principalmente os que mais de-
pendem do setor industrial, os problemas do emprego tornaram-se
ainda maiores. Nas regiões menos desenvolvidas, o mercado de
trabalho, mesmo dependendo mais da dinâmica do emprego pú-
blico e dos serviços, não deixou de apresentar sinais de degrada-
ção, ainda que não na mesma intensidade do verificado nas re-
giões industrializadas7.

156
Os condicionantes endógenos
No Brasil, os condicionantes endógenos das relações de traba-
lho estão associados aos atores e às instituições que dão substân-
cia ao relacionamento capital/trabalho, como: o poder público; a
conduta empresarial e a organização sindical.

Poder público
O poder público apresentou um lento e gradual movimento
favorável à liberalização das regras de relacionamento entre o ca-
pital e o trabalho nos anos 1980. A Constituição Federal de 1988
consagrou um movimento político que reivindicava maior garantia
social, liberação sindical dos laços do Estado (afrouxamento dos
aparelhos repressivos e interventores), acompanhado de um novo
perfil de atuação do ministério e secretarias estaduais do trabalho
como interlocutores dos atores sociais nos conflitos trabalhistas.
Nos anos 1990, o papel de intermediação trabalhista do Ministé-
rio e das Secretarias do Trabalho perdeu importância, com a substi-
tuição dos temas associados às relações de trabalho por ações pon-
tuais no campo da formação profissional, do seguro-desemprego,
da geração de emprego e renda e da desregulamentação do merca-
do de trabalho. Paralelamente o movimento sindical tornou mais
institucionalizado as suas ações por intermédio da maior participa-
ção nos fóruns de definição das políticas públicas (PBQP, câmaras
setoriais, Codefat, BNDES, FGTS, PACTI, entre outros). Nesse contexto,
perfil da atuação sindical foi gradualmente sendo alterado, com per-
da de eficácia nas ações grevistas e negociais coletivas de trabalho e
a maior efetividade na definição das políticas públicas.

Conduta empresarial
A defasagem no acesso às inovações tecnológicas e na difusão
de novas formas de gestão da produção e organização do trabalho
se refletiram na ausência de grandes transformações empresarias
durante os anos 1980 no Brasil. Em geral, as empresas mantive-
ram-se verticalizadas e com baixo grau de subcontratação de tra-
balhadores e elevado uso da rotatividade dos empregados.
A partir dos anos 1990, as empresas tiveram de se adaptar ao
novo cenário de estabilidade monetária, de abertura comercial, de

157
câmbio valorizado e de juros elevados. De forma restrita e pontual,
as grandes empresas realizaram investimentos direcionados à ab-
sorção de avanços tecnológicos, enquanto a maioria do setor em-
presarial difundiu o uso de programas de gestão da produção e de
reorganização do trabalho, através da desverticalização da produ-
ção, da subcontratação da mão-de-obra e das novas formas de
relacionamentos entre empresas e fornecedores. Essas medidas
resultaram no acentuado enxugamento de postos de trabalho e de
hierarquias funcionais, bem como na aquisição de maior quantida-
de de componentes importados (novo mix de produção interna
proporcionado pelas desregulamentações comercial e financeira
da economia), o que possibilitou a recomposição do perfil dos
empregados (faixa etária, sexo, cor e escolaridade) com rotinas
laborais associadas à ampliação da jornada de trabalho (uso inten-
sivo de horas extras) e elevação do contingente de empregados
mais escolarizados e com menor rotatividade.

Organização sindical
A difusão das negociações coletivas ao longo dos anos 1980
esteve associada tanto à possibilidade de ampliação de cláusulas
trabalhistas, principalmente aquelas voltadas para a proteção dos
salários diante do processo hiperinflacionário, quanto à capacida-
de de organização e luta dos trabalhadores durante o processo de
redemocratização do país. A permanência de métodos tradicionais
de gestão da mão-de-obra pelas empresas manteve mais ou menos
homogêneos os interesses do conjunto dos trabalhadores, o que
favoreceu uma atuação sindical menos divergente possível, mes-
mo com a pluralidade na cúpula sindical e a pulverização das
bases sindicais. Os sindicatos, nesse sentido, puderam convergir
suas ações no plano nacional com as reivindicações mais imedia-
tas dos trabalhadores do chão da fábrica, mesmo dispondo de um
sistema híbrido de organização sindical definido pela Constituição
Federal de 1988, sem que alterações substantivas no marco legal
fossem realizadas.
Nos anos 1990, as mudanças no interior das empresas (redu-
ção do emprego, nova organização do trabalho e remuneração
variável) levaram a maior segmentação entre os trabalhadores que

158
representam o núcleo duro das empresas (mais enxuto, escolarizado,
baixa rotatividade e salários variáveis) e os trabalhadores
terceirizados e os desempregados (baixa escolarização, alta
rotatividade, baixos salários etc). A multiplicação da quantidade de
sindicatos – em parte influenciada pela incorporação dos funcio-
nários públicos à estrutura corporativa – veio acompanhada da
pulverização das entidades laborais, da fragmentação das negocia-
ções e da polarização da cúpula sindical (seis centrais sindicais),
bem como uma ampliação da participação dos trabalhadores em
vários fóruns institucionais.

NOVO MODELO ECONÔMICO E O SISTEMA CORPORATIVO DE RELA-


ÇÕES DE TRABALHO
A força do novo modelo econômico neoliberal tornou as rela-
ções de trabalho ainda mais heterogêneas nos anos 1990. O que já
era uma característica marcante do padrão de relacionamento en-
tre o capital e trabalho ao longo do desenvolvimento econômico
das últimas cinco décadas, assumiu a forma ainda mais ampliada
diante das transformações socioeconômicas mais recentes.
Atualmente no país, cada vez mais, transita-se de formas mo-
dernas de trabalho, como em células de produção na manufatura,
em serviços informatizados e de última geração, em grupos semi-
autônomos nas empresas industriais e nos serviços de ponta, entre
outras, para formas atrasadas como o trabalho infantil e escravo, a
geração de ocupações sem rendimento, o trabalho independente,
o desassalariamento e a ampliação do desemprego.
De um lado, a incorporação de novos programas de gestão da
produção e de organização do trabalho pode ser encontrado em
praticamente todos os estabelecimentos, enquanto o acesso aos no-
vos pacotes tecnológicos continua concentrado nas grandes empre-
sas nacionais e transnacionais, que representam não mais do que
10% do total de estabelecimentos existentes em todo o país. Mesmo
que as inovações tecnológicas tenham sido incorporadas de forma
desigual pelas empresas e que o uso dos novos programas de ges-
tão da mão-de-obra tenha sido transformado num elemento adicio-
nal de redução de custos, não há como negar a existência de um

159
segmento empresarial que necessita de um novo padrão de relacio-
namento entre o capital e trabalho. Algumas inovações procedidas
nos acordos/convenções coletivas em determinadas categorias pro-
fissionais sobre participações nos lucros, remuneração variável às
metas de produção e vendas, transparência nas informações sobre
desempenho econômico-financeiro da empresa, incorporação de
tecnologia, demissão e contratação de trabalhadores etc., podem
indicar alguns avanços nas relações de trabalho no segmento orga-
nizado do mercado de trabalho. O lamentável é que esse segmento
perde participação relativa no total da ocupação.
De outro lado, a persistência dos atraso no segmento não or-
ganizado do mercado de trabalho (pequenas e microempresas,
pequenos negócios, ocupações assalariadas sem registro, por con-
ta própria e sem remuneração) condiciona a permanência de ele-
vada precarização das condições e relações de trabalho, o que
contribui para a manutenção do atraso nas relações de trabalho.
Para esse segmento do mercado de trabalho que aumenta rapida-
mente sua participação relativa no total da ocupação, a sindicalização
é praticamente inexistente, a legislação trabalhista tem difícil aces-
so, a densidade sindical é reduzida e as relações de trabalho são
autoritárias e sem transparências.
Toda essa complexa realidade que expressa a atualidade das
relações de trabalho não deixa de ser fruto do atual processo de
reorganização da economia brasileira que atinge desigualmente os
atores sociais relevantes. Com isso, o leque de situações possíveis
de relações de trabalho no Brasil torna-se mais heterogêneo, re-
percutindo por sua vez na posição dos atores perante o Sistema
Corporativo de Relações de Trabalho.
Até o final dos anos 1980, pareceria inegável que a estrutura
corporativa encontrava-se fortemente questionada, diante da cres-
cente efetividade dos sindicatos e de sua insatisfação com o Siste-
ma de Relações de Trabalho. Na década de 1990, contudo, o grau
de contestação foi contido diante do aumento das resistências às
mudanças pelos atores solidários à velha estrutura sindical, dos
novos riscos colocados pelas transformações econômicas e da au-
sência de maior convergência entre os atores sociais relevantes na
construção de um novo sistema de relações de trabalho8.

160
Não há dúvidas de que a ação do chamado novo sindicalismo
tem demonstrado possuir capacidade de bloquear algumas tentati-
vas liberais-conservadoras de buscar o reenquadramento sindical à
estrutura corporativa, recompondo as fissuras ocorridas no Sistema
de Relações de Trabalho. Todo esse esforço, no entanto, terminou
inviabilizando a apresentação de resultados satisfatórios por parte
dos sindicatos combativos na luta pela implantação de um sistema
democrático de relações de trabalho (Comin, 1994; Oliveira, 1994).
Há avanços realizados, sobretudo nos sindicatos mais
combativos (Cardoso e Comin, 1997; Cardoso, 1997), mas não há
como generalizá-los para todos os segmentos sindicais do país.
Além disso, a imposição de uma agenda liberal para o trabalho por
parte do governo condiciona as possibilidades de ação sindical,
diante da repressão aos movimentos grevistas nacionais (petrolei-
ros e carteiros), do abandono das políticas concertadas (câmaras
setoriais, comissão do salário mínimo, Conselho Nacional do Tra-
balho, entre outras), do enfraquecimento do poder do Ministério
do Trabalho (esvaziamento da fiscalização das leis trabalhistas, trans-
ferência da política de salário mínimo para o Ministério da Fazen-
da, fim das políticas salariais e marginalização das ações voltadas
para a intermediação nos conflitos trabalhistas), do apoio oficial à
parcela do movimento sindical e da aplicação de medidas
desregulamentadoras do mercado de trabalho.
Não bastasse isso, o conjunto dos sindicatos tendeu no perío-
do recente a concentrar parcela de suas ações em torno da realiza-
ção de lutas decorrentes do descumprimento da legislação traba-
lhista, num contexto de grande escassez de empregos. Durante a
década de 1980, a maior parte das greves era fortemente influen-
ciada pela situação salarial diante das altas taxas de inflação e das
taxas de desemprego relativamente baixas.
Talvez seja por isso que nesse cenário sindical, a Consolidação
das Leis do Trabalho ainda continue sendo referencial básico na
regulação das relações de trabalho. Para uma parte importante dos
sindicatos de empregados assalariados urbanos ela pode expressar
um certo atraso nas formas de regulação das relações de trabalho,
mas para uma outra parcela não desprezível dos sindicatos assala-
riados urbanos (de pequeno porte), de profissionais liberais e de

161
trabalhadores rurais, a CLT não deixa de ser ainda um parâmetro de
atualidade em face das dificuldades de organização dos trabalha-
dores, da baixa taxa de assalariamento da economia, da alta
rotatividade no trabalho, ao pequeno tamanho dos estabelecimen-
tos e do conservadorismo patronal.
É possível, por isso mesmo, identificar também a retomada de
laços de conformismo e resistência à mudança da CLT, consolida-
dos ao longo das seis décadas de sua existência no país. Não pare-
ce ser reduzida a parcela de dirigentes sindicais patronais, de pro-
fissionais vinculados à Justiça do Trabalho e de lideranças sindicais
de trabalhadores que teme a implementação de um sistema demo-
crático de relações de trabalho, pois isso pode significar não ape-
nas o fim da carreira profissional como a perda de espaço político
nacional.
Gráfico 31 – Brasil: número estimado de greves (1978-1999)

Fonte: Noronha, 1994 e Dieese.

Nos anos 1990, o movimento sindical apresenta pelo menos


cinco importantes alterações básicas no seu desempenho: a queda
na quantidade de greves; a redução na taxa de sindicalização; a
proliferação do número de sindicatos; a fragmentação das nego-
ciações e a diminuição na quantidade de cláusulas acordadas.
Em relação ao movimento grevista, observa-se uma nítida
desaceleração nos anos 1990. Entre 1990 e 1992 a queda na quan-

162
tidade de graves foi bastante acentuada, porém a partir de 1993
apresentou uma lenta recuperação. Esse movimento de recupera-
ção, contudo, apenas permitiu que as greves realizadas anualmen-
te voltassem ao patamar inicial verificado na primeira metade dos
anos 1980.
No caso da taxa de sindicalização de trabalhadores urbanos
também é possível perceber a existência de sinais que apontam
para a sua diminuição nos anos 1990. Desde o início da década
parece haver certo enfraquecimento do número de sindicalizados
vis-à-vis a quantidade de trabalhadores, principalmente a partir de
1993, quando a economia voltou a registrar taxas de recuperação
do nível de atividade.
De certa forma, a performance econômica recente não pro-
porciona a elevação do nível de emprego formal. Pelo contrário,
tem ganhado importância o desassalariamento, isto é, a redução
relativa da participação dos assalariados no total da ocupação. Além
da geração de postos de trabalho não assalariados, o vazamento
de ocupações formais para empregos sem carteira também
condiciona as possibilidades de ampliação da sindicalização entre
os trabalhadores urbanos.

Gráfico 32 – Brasil: evolução da taxa de sindicalização*


de trabalhadores urbanos

* Em % da PEA assalariada.
Fonte: FIBGE.

Uma terceira alteração importante no comportamento sindical


recente está associada à rápida proliferação na quantidade de enti-

163
dades sindicais. Ainda que a estrutura corporativa, por definir o
monopólio da representação sindical de acordo com a categoria
profissional e a base mínima geográfica municipal possibilite, por
definição, a criação de muitos sindicatos, percebe-se um recente
movimento de criação de novos sindicatos, em parte influenciada
pela incorporação dos funcionários públicos na estrutura sindical
oficial.

Gráfico 33 – Brasil: número total de sindicatos, urbano e rural


em períodos selecionados

15000

12000

9000

6000

3000

0
anos 70 anos 80 anos 90

total urbanos rurais

Fonte: Córdoba, 1985; IBGE e MTb.

Cabe destacar como mais uma alteração das ações sindicais


nos anos 1990 a redução na quantidade de cláusulas negociadas
nos acordo ou convenções de trabalho para algumas categorias
sindicais. Em certa medida, a estabilidade monetária contribuiu
para a retirada de várias cláusulas dos acordos e convenções de
trabalho que diziam respeito à indexação de salários ou ainda para
a introdução de acordo sobre remuneração variável. O centro das
negociações coletivas, no entanto, parece localizar-se no tema do
emprego.
A quinta alteração no comportamento sindical refere-se ao cres-
cimento e à fragmentação das negociações coletivas realizadas nos
período recente. Em parte, a proliferação do número de sindicatos
repercute na realização de acordos e convenções de forma

164
desagregada, cada vez mais focalizada na realidade local. Por ou-
tro lado, a tendência recente permite identificar o fortalecimento
dos acordos coletivos em detrimento das convenções, caracteri-
zando uma tendência de maior fragmentação do poder sindical no
estabelecimento das negociações coletivas de trabalho.

Gráfico 34 – Quantidade de cláusulas anuais acordadas em categorias


sindicais selecionadas (1978-1996)

Fonte: Dieese, in: Prado, 1998.

Como se pode observar, a natureza desses acordos/convenções,


por ser realizados cada vez mais no âmbito da empresa, termina
dificultando a difusão de cláusulas acordadas de uma categoria sin-
dical para outra, conforme a experiência dos anos 1980. A fragmen-
tação das negociações não indica, por outro lado, uma maior apro-
ximação dos sindicatos aos interesses das empresas, nem tampouco
a maior organização dos trabalhadores por local de trabalho.
Em certos setores econômicos, parece haver condições mais
adequadas para o desenvolvimento da ação sindical mais próxima
ao empregado, o que pode contribuir para o fortalecimento dos
sindicatos ante os assalariados regulares. Em relação aos demais
setores de atividade econômica há o risco de maior marginalização,
com dificuldades adicionais de organização e manutenção das en-
tidades laborais.

165
Observa-se, por exemplo, que no caso dos trabalhadores demi-
tidos, a contumaz recorrência à Justiça do Trabalho está levando a
números significativos de processos trabalhistas protocolados. Essa
realidade pode indicar um reforço do papel do Judiciário Trabalhista
nas relações de trabalho, seja para os trabalhadores que recorrem
individualmente, seja para os sindicatos com menor capacidade de
negociação e garantia dos direitos dos empregados.
Todos esses indicadores de mudanças muito heterogêneas nas
relações de trabalho parecem apontar numa direção. Depois do
auge nas lutas sindicais pela implantação do Sistema de Relações
de Trabalho no Brasil durante a década de 1980, assiste-se a um
movimento de reacomodação laboral à estrutura sindical oficial.

Os efeitos possíveis
A estabilidade da legislação corporativa constitui uma das prin-
cipais propriedades do Sistema Corporativo de Relações de Traba-
lho no Brasil. A sua relativa inalteração, por mais de sessenta anos,
revela uma grande capacidade de adaptação tanto às transforma-
ções do mercado de trabalho quanto às diferentes fases de evolu-
ção da economia e da política nacional.
Com a crise econômica dos anos 1980 e, sobretudo, com a
adoção de um novo modelo de integração externa competitiva
para o Brasil nos anos 1990, não apenas o ciclo de industrialização
foi interrompido como o sistema de relações de trabalho passou a
ser questionado como fator incompatível com as mudanças ocorri-
das na economia nacional. Os argumentos sobre a disfuncionalidade
e a ineficiência do conjunto de leis trabalhistas ganham importân-
cia nos debates, expressando certa insatisfação por parte dos ato-
res com o atual estágio de relacionamento capital e trabalho, bem
como motivando propostas de alteração do próprio Sistema
Corporativo de Relações de Trabalho.
Apesar disso, a estrutura corporativa tem permanecido pratica-
mente intacta, mostrando grande capacidade de acomodação à
crescente heterogeneidade que se pode observar nas formas mais
recentes de relacionamento entre o capital e o trabalho. Apesar
disso, o sistema de relações de trabalho parece atender menos aos
interesses dos trabalhadores empregados nas grandes empresas e

166
nos setores avançados da economia, que se reestruturam e inter-
nacionalizam-se, e muito mais aos segmentos ocupacionais locali-
zados nas atividades tradicionais da economia que se tornam cada
vez mais fragilizados.
Por outro lado, há uma parcela significativa de trabalhadores
que está ficando de fora do conjunto das leis trabalhistas, por de-
corrência do movimento de desestruturação do mercado de traba-
lho pós-1990 (amplo desemprego, desassalariamento e geração de
ocupações não assalariadas, precárias e de baixa produtividade).
Com isso, percebem-se sinais de inversão na tendência de inclusão
condicionada que ocorria desde os anos 1930, quando o movi-
mento de estruturação do mercado de trabalho (1940-1980) vinha
acompanhado do fortalecimento do assalariamento e, por conse-
qüência, de uma menor exclusão dos trabalhadores do Sistema
Corporativo de Relações de Trabalho.
Atualmente, os assalariados com registro (incluídos) perdem
participação para o conjunto de desempregados e ocupados pre-
cariamente (excluídos). Para uma PEA estimada em 73 milhões de
pessoas em 1996, cerca de 43 milhões (59%) seriam assalariados e
apenas 23 milhões empregados com registro formal, restando 20
milhões de trabalhadores assalariados sem registro.
Em virtude disso, parcela importante dos argumentos contrários
ao Sistema Corporativo de Relações de Trabalho aponta atualmente
para a necessidade de desregulamentação do mercado de trabalho,
retirando parte da proteção trabalhista e generalizando apenas al-
guns direitos. Mas essa proposta, em vez de contribuir para a demo-
cratização das relações capital-trabalho, pode levar ao retrocesso,
com a desorganização da estrutura de representação de interesses.
Prevalecendo a proposta governamental de organização sindi-
cal por empresa, poderia significar, possivelmente, a existência de
sindicatos fundamentalmente nas grandes empresas, que no Brasil
representam algo em torno de 10% do universo empresarial. Nesse
modelo, o horizonte poderia ser a explosão do número de sindica-
tos, podendo levar à criação de 60 mil a 70 mil novas entidades,
conforme a experiência japonesa. Para as pequenas e
microempresas, possivelmente a organização sindical, se não exis-
tente, funcionaria com baixa eficácia.

167
Ao mesmo tempo, setores sociais comprometidos com a de-
mocratização das relações de trabalho encontram maiores dificul-
dades, neste cenário, para tornar realidade as suas propostas. Por
conta disso, os riscos das mudanças sem controle na estrutura
corporativa assumem maior proporção. O impasse parece predo-
minar nos anos 1990, sinalizando, mais uma vez, um movimento
de acomodação de interesses, com mudanças pontuais no Sistema
Corporativo de Relações de Trabalho no País.

FRACASSOS DAS POLÍTICAS NEOLIBERAIS PARA O TRABALHO

Desde a Revolução de Trinta, o Brasil constituiu um dos mais


estáveis padrões de desenvolvimento do trabalho no conjunto das
economias periféricas. Essa estabilidade se mostrou funcional ao
projeto de industrialização nacional, influenciando positivamente
o movimento orientado para a estruturação do mercado de traba-
lho, que tinha na ampla expansão do emprego assalariado formal
a sua principal característica. A cada dez novas vagas de trabalho
abertas, oito eram assalariadas, sendo sete com registro formal entre
1940 e 1980.
Apesar dos avanços, o país não alcançou os mesmos indicado-
res de homogeneização do mercado de trabalho verificados nas
economias avançadas. Permaneceu registrando, após cinco déca-
das de forte crescimento econômico, sinais compatíveis com o sub-
desenvolvimento, diante da presença generalizada de baixos salá-
rios, da informalização dos contratos de trabalho, da desigualdade
de condições de trabalho e relações trabalhistas autoritárias.
Tudo isso contribuiu para deixar à margem dos frutos do de-
senvolvimento econômico uma ampla parcela dos trabalhadores,
não obstante o registro da inclusão de restrito segmento de empre-
gados no padrão de consumo moderno. Ao mesmo tempo, a au-
sência de democracia nas relações de trabalho terminou por confi-
gurar um quadro trabalhista de ausência de transparência e confiança
entre os atores sociais.
Sem a adoção do contrato coletivo de trabalho, instrumento
central de democratização das relações de trabalho, prevaleceu a
figura jurídica do contrato individual de trabalho, com forte ênfase

168
na Justiça do Trabalho. A singularidade do padrão de desenvolvi-
mento do trabalho durante o projeto de industrialização nacional
exigia reformulações, conforme defendidas pelos sindicatos du-
rante a década de 1980, a partir do processo de redemocratização
nacional.
Entretanto, a partir de 1990, uma segunda onda de dilapidação
dos direitos sociais e trabalhistas passou a ser imposta no país,
através da adoção de políticas neoliberais para o trabalho. Em meio
à implementação de um novo modelo econômico fundamentado
nos pressupostos do Consenso de Washington, as políticas do tra-
balho neoliberais foram favoráveis à flexibilização dos contratos
de trabalho, desregulação do mercado de trabalho e transferência
exclusiva da responsabilidade pela trajetória ocupacional para o
indivíduo, através da adoção das políticas de formação e qualifica-
ção profissional.
Deve-se ressaltar, no entanto, que a primeira onda de
liberalização do trabalho havia sido posta em marcha logo no iní-
cio do regime militar. Tão logo os sindicatos foram controlados e
esvaziados pela repressão pós-1964, processou-se: o fim da parti-
cipação dos trabalhadores na gestão de instituições previdenciárias
e nas comissões de salário mínimo; a flexibilização dos contratos
individuais de trabalho, através do Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço (flexibilidade para demitir e admitir); o controle dos
salários com a generalização da política salarial; a retirada do po-
der normativo da Justiça do Trabalho e o esvaziamento do Ministé-
rio do Trabalho.
Por conta disso, ganhou maior impulso no país a cultura pa-
tronal da elevada rotatividade da mão-de-obra, com a presença de
contratos de curta duração e ampla instabilidade e falta de com-
promissos nas relações de trabalho. Somente com o movimento de
redemocratização dos anos 1980, houve um contraponto, com a
intensa ação sindical e da sociedade em torno da reconstrução de
uma nova base social, tendo na Constituição Federal de 1988 a
reafirmação dos direitos sociais e trabalhistas.
Tudo isso, contudo, foi rapidamente interrompido com a con-
formação de uma segunda onda liberal sobre o trabalho, que se
tem manifestado, desde 1990, na forma de reformas em migalhas

169
no marco regulatório do mercado de trabalho provenientes de
políticas de corte neoliberal. Além dos projetos parciais já existen-
tes, podem ser contabilizadas principalmente sete medidas impor-
tantes que, de forma anestésica, estão modificando o curso da
legislação trabalhista: o fim da política salarial; a abertura do co-
mércio aos domingos; a instituição da figura do mediador nas ne-
gociações coletivas e das comissões de arbitragens; a desregulação
dos contratos através das cooperativas de trabalho; a redução de
parte dos encargos sociais para trabalhadores rurais; a introdução
do regime SIMPLES para contratação de trabalhadores para as
microempresas e a maior flexibilização dos empregos através dos
contratos especiais de trabalho.
O objetivo governamental tem sido o de sufocar o atual quadro
jurídico, através do seu engessamento e da perda de eficiência, com
leis que atendam a interesses minoritários e particulares. Assim, as
instituições de representação de interesses sociais (patronais e laborais)
perdem associados, com multiplicação de entidades, fragmentação
dos acordos/convenção trabalhista, decréscimo da cobertura das ações
e fortalecimento de formas de intermediações externas às relações
de trabalho. Das 6,4 mil instituições de representação de interesses
existentes no final da década de 1980 (3 mil sindicatos patronais e
3,4 mil laborais), chegou-se a cerca de 16 mil nos anos 1990 (6 mil
sindicatos patronais e 10 mil de trabalhadores).
Atualmente, encontra-se em curso um desejo mais forte, de
desconstitucionalizar os direitos do trabalho do artigo 7º da Carta
Magna, ou, de outro modo, de criar paralelamente uma possibili-
dade de negociação coletiva à margem do código social e traba-
lhista. É algo mais sofisticado, porém com efeito similar, pois dian-
te do elevado excedente de mão-de-obra provocado pela maior
crise do capitalismo brasileiro, que passa por duas décadas de
medíocres taxas de expansão da riqueza, de não livre negociação,
apenas de imposição patronal.
Aliás, não é isso que vem ocorrendo nos últimos dez anos. A
violência do mercado de trabalho tem gerado, além de pessoas
sem trabalho, ocupações à margem do marco regulatório do mer-
cado de trabalho, fazendo com que muitos sindicatos “aceitem”
perda de direitos anteriormente negociados em troca da manuten-

170
ção do emprego. Tudo isso sem falar na flexibilização de fato,
através da redução da fiscalização do trabalho e do predomínio do
emprego assalariado sem carteira.
Uma autoridade governamental, talvez sem desejar, terminou
revelando publicamente o objetivo do novo intento oficial, ao afir-
mar que seria melhor abrir possibilidade da negociação coletiva,
pois a cada dez postos de trabalho gerados no país, oito são sem
carteira assinada. Ou seja, a negociação coletiva nesses termos é
pior do que é garantido por lei.
As políticas neoliberais do trabalho adotadas incluem ainda o
amplo apelo à formação e qualificação profissional. Entre 1995 e
2000, segundo Ministério do Trabalho e Emprego, formaram-se 10
milhões de trabalhadores qualificados, justamente no período em
que o desemprego mais cresceu, passando, segundo o IBGE, de 4,5
milhões de trabalhadores para 7,6 milhões.
Nos últimos quatro anos, o volume do desemprego foi aumen-
tado em 3,1 milhões de trabalhadores, fazendo com que a taxa
nacional de desemprego oficial passasse de 6,1% para 9,6%. Do
total de pessoas sem ocupação em 1999, 48% eram homens, en-
quanto 52% dos desempregados eram do sexo masculino em 1995.
Pode-se concluir que nos últimos quatro anos, o desemprego cres-
ceu mais para o sexo feminino, apesar de 63% dos postos de traba-
lho abertos no Brasil serem ocupados pelas mulheres.
A pesquisa do IBGE também permite constatar que entre 1995
e 1999 a quantidade de brasileiros com escolaridade abaixo de 3
anos foi reduzida em 6,7%, enquanto o volume de pessoas com
mais de 11 anos de escolaridade aumentou 32,8%. Apesar da nítida
melhora no nível educacional da população, não houve, paralela-
mente, impacto sensível no nível ocupacional do país.
Ao que parece, a população vem fazendo a sua parte. Isto é,
apostando na educação. Lamentavelmente, a política macroe-
conômica dos anos 1990 não vem contribuindo. Por gerar um cres-
cente excedente de mão-de-obra, influencia o maior acirramento
do mercado de trabalho, o que leva ao rebaixamento dos salários
dos ocupados.
Nesses termos, a política neoliberal para o trabalho adotada ao
longo da década de 1990 resultou não apenas desfavorável ao

171
conjunto dos trabalhadores, como um grande fracasso no que diz
respeito à geração de novas oportunidades de desenvolvimento
socioeconômico nacional. Na realidade, o Brasil assistiu rapida-
mente à ascensão dos mitos neoliberais, cuja inconsistência procu-
rou-se ressaltar nas páginas anteriores.
Somente a constituição de uma alternativa ao neoliberalismo
no Brasil pode conter o avanço do projeto de desconstrução do
país. Na toada dos anos 1990, apenas um quinto de toda a popula-
ção têm assegurada a sua inclusão socioeconômica, isto é, somen-
te 20% dos brasileiros têm acesso aos benefícios do novo modelo
econômico, o que transforma o projeto neoliberal numa máquina
de produção de mitos que anestesiam a população, enquanto a
exclusão e o atraso ganham maior dimensão.

NOTAS:
1 Por sistema de relações de trabalho entende-se um conjunto de normas (for-
mais ou informais, gerais ou específicas) que registram o emprego assalaria-
do, sendo definidos por atores coletivos ou individuais. Sobre isso ver: Cella
e Treu, 1988; Hyman, 1975.
2
3 Sobre o debate que trata originalmente do papel do Estado na institucionali-
zação do mercado de trabalho no Brasil, ver: Oliveira Vianna, 1951; Ferreira,
1937.
4 Sobre os estudos de longo prazo sobre as greves no Brasil, ver: Sandoval
1994; Noronha, 1994.
5 Essa parte do estudo foi desenvolvida com base no trabalho realizado para
OIT. Ver: De Decca, Pochmann, Oliveira, Wilnês e Quadros, 1998.
6 Sobre as políticas salariais ver: Brandão, 1991; Dieese, 1991; Pochmann, 1994.
7 Sobre a situação nacional e regional do mercado de trabalho, ver: Corseuil,
1996; FIPE, 1997; Quadros e Pochmann, 1997; Pochmann, 1997.
8 Sobre as mudanças na ação sindical nos anos noventa, ver: Pochmann et alii,
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