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TRANSPORTE MARÍTIMO
Rio de Janeiro
Abril de 2022
A AMÔNIA COMO COMBUSTÍVEL ALTERNATIVO NO
TRANSPORTE MARÍTIMO
Examinado por:
iii
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço à Deus pela força, pela coragem e por ter me aju-
dado e me guiado durante toda esta longa jornada. Agradeço, também, aos meus
pais, Nelson e Márcia, e ao meu irmão, Ricardo, que sempre foram a minha base
nos momentos mais difı́cies, me apoiando e me incentivando nos momentos em que
eu mais quis desistir. Sem vocês, não teria sido possı́vel conquistar este tão sonhado
diploma.
Gostaria de agradecer, também, aos amigos que fiz no curso de Engenharia da
UFRJ: Isabela Garcia, Gabriel Amy, Bernardo de Almeida, Bruno Todeschini, Caio
Garcez, Eloisa Juan, Felipe Jorge, Luiz Gustavo Lima e Renata Borher. A parceria
de vocês foi essencial para suportar as noites em claro fazendo trabalhos/projetos
e os momentos de tensão durante os inúmeros perı́odos de provas, além de me
proporcionarem momentos de leveza e descontração.
Além disso, agradeço ao corpo docente do departamento de engenharia naval
e oceânica da UFRJ por sua dedicação e compromisso na formação dos alunos. Em
especial, agradeço ao professor Alexandre Alho, que é uma grande referência de
pessoa e profissional e foi essencial para minha formação e para conclusão deste
trabalho.
Por fim, agradeço imensamente à UFRJ por todas as oportunidades que me
foram disponibilizadas ao longo da gradução, por ter me proporcionado tanto apren-
dizado por meio das iniciações cientı́ficas, equipes de competição e o intercâmbio na
University of Strathclyde. Essas experiências foram essenciais para minha formação
como pessoa e como profissional.
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”Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles
que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu
propósito.”
(Romanos 8:28)
v
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/UFRJ como
parte dos requisitos necessários a obtenção do grau de Engenheiro Naval e Oceânico.
Abril/2022
Nos últimos anos, com o aumento da utilização do transporte, seja para locomoção
ou para o comércio, há uma preocupação crescente com o aumento das emissões dos
gases de efeito estufa (GEE) decorrentes da combustão nos motores térmicos. Diante
desse aumento de emissões, em 2018, a IMO apresentou sua Initial Greenhouse
Gas Strategy, direcionada para a redução das emissões dos gases de efeito estufa
produzidos pelo transporte marı́timo internacional. Várias medidas estão sendo
avaliadas para a redução das emissões de GEE pela indústria de transporte marı́timo,
tais como a otimização das linhas do casco e do projeto do propulsor, a redução de
velocidade de serviço da embarcação, bem como o uso de combustı́veis alternativos.
Dentre estas opções, a utilização de combustı́veis alternativos tem mostrado um
grande potencial. Este trabalho teve como objetivo analisar a amônia como um
potencial combustı́vel alternativo devido às suas propriedades como armazenadora
e portadora de hidrogênio, bem como em função da sua já consolidada infraestrutura
de produção e logı́stica.
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Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment
of the requirements for the degree of Naval Architect and Marine Engineer.
April/2022
In recent years, with the increase in the use of transport, whether for locomotion
or commerce, there is a growing concern about the increase in greenhouse gas (GHG)
emissions resulting from combustion in thermal engines. Faced with this increase
in emissions, in 2018, IMO presented its Initial Greenhouse Gas Strategy, aimed at
reducing greenhouse gas emissions produced by international maritime transport.
Various measures are being evaluated to reduce GHG emissions by the shipping
industry, such as optimizing hull lines and thruster design, reducing vessel service
speed, as well as using alternative fuels. Among these options, the use of alternative
fuels has shown great potential. This work aimed to analyze ammonia as a potential
alternative fuel due to its properties as a storage and carrier of hydrogen, as well as
due to its already consolidated infrastructure of production and logistics.
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Lista de Figuras
1.1 População e crescimento projetado (população total e menores de 5 anos)
(Fonte: Our World in Data) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 Emissões globais de CO2 do transporte por subsetor, 2000-2030 (Fonte:
IEA) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.3 Emissões globais de GEE por parte transporte intercional por subsetor e
previsões para os próximos anos (Fonte: IEA) . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.4 Comércio marı́timo internacional por tipo de carga (milhões de tonela-
das carregadas) (Fonte: REVIEW OF MARITIME TRANSPORT 2021 -
United Nations) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.5 Projeções de emissões de embarcações como porcentagem das emissões de
2008 (Fonte: Fourth IMO GHG Study 2020 – IMO) . . . . . . . . . . . . 4
viii
3.14 Redes de Armazenamento de amônia liquefeita e distribuição de oleodutos
no Centro-Oeste dos EUA - Os oleodutos de amônia Kaneb (linha laranja)
e Magellan Midstream (linha vermelha) têm, respectivamente, 2.000 milhas
e 1.100 milhas de comprimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
ix
Lista de Tabelas
2.1 Vantagens e desvantagens dos combustı́veis alternativos . . . . . . . . 13
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Sumário
1 INTRODUÇÃO 1
5 CONCLUSÕES 46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 48
xi
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, com o aumento da utilização do transporte, seja para
locomoção ou para o comércio, tem sido observada uma crescente preocupação com
o aumento das emissões dos gases de efeito estufa (GEE), provenientes do consumo
de combustı́veis fósseis em motores a combustão. Esse aumento de emissões se deu,
basicamente, devido ao aumento populacional no mundo nos últimos anos como
mostra a Figura 1.1. Tal crescimento fez com que se intensificasse a utilização de
meios de transportes movidos à motores de combustão interna, os quais emitem
GEE, tais como: carros, caminhões, aviões, trem e embarcações. É previsto um
aumento populacional para os próximos anos (Figura 1.1), o que irá impulsionar
ainda mais a utilização de meios de transporte de uma forma geral. Outrossim, os
hábitos de consumo observados na sociedade atual têm resultado em um aumento
do consumo per capita, o que demanda mais crescimento da indústria de transportes
de mercadorias, envolvendo os modais aéreo, rodoviário, ferroviário e marı́timo.
1
A variação das emissões de GEE originadas pela indústria de transportes
nos últimos anos é ilustrada nas Figuras 1.2 e 1.3. Observa-se um aumento na
quantidade global de emissão de CO2 desde 2000 até 2020. As Figuras 1.2 e 1.3
apresentam um previsão para os próximos anos, a qual já incorpora uma previsão
de redução das emissões devido aos regulamentos implementados pelas organizações
internacionais. É importante mencionar que os automóveis e os caminhões médios
e pesados representam os principais contribuintes para as emissões de GEE.
Figura 1.2: Emissões globais de CO2 do transporte por subsetor, 2000-2030 (Fonte:
IEA).
2
Figura 1.3: Emissões globais de GEE por parte transporte intercional por subsetor e
previsões para os próximos anos (Fonte: IEA).
Figura 1.4: Comércio marı́timo internacional por tipo de carga (milhões de toneladas
carregadas) (Fonte: REVIEW OF MARITIME TRANSPORT 2021 - United Nations).
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Nos últimos anos, vem se observando um aumento, mesmo que pequeno, das
emissões de GEE no transporte marı́timo. A parcela das emissões antropogênicas
globais atribuı́das ao transporte marı́timo aumentou de 2,76% em 2012 para 2,89%
em 2018 (IMO, 2020). De acordo com a IMO (2020), o total de emissões de gases
de efeito estufa (GEE) decorrente do transporte marı́timo (internacional, doméstico
e pesqueiro), incluindo dióxido de carbono (CO2 ), metano (CH4 ) e óxido nitroso
(N2 O), expresso em CO2 e (CO2 equivalente), aumentou de 977 milhões de toneladas
em 2012 para 1.076 milhões toneladas em 2018 (um aumento de 9,6%). As emissões
de CO2 alcançaram de 962 milhões de toneladas, em 2012, para 1.056 milhões de
toneladas, em 2018, o que representa um aumento 9,3%.
Diante desse aumento de emissões, algumas projeções foram feitas para uma
série de cenários econômicos e energéticos plausı́veis de longo prazo. Estima-se que
de 2018 até 2050, as emissões devem aumentar entre 90-130% em relação aos nı́veis
observados em 2008 (Figura 1.5) (IMO, 2020).
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Em resposta a essas previsões, a Organização Marı́tima Internacional (IMO)
tem se dedicado ao tema da redução de emissões no transporte marı́timo já há alguns
anos, promovendo debates e discussões com o intuito de encontrar soluções de curto,
médio e longo prazo.
Em 2018, a IMO apresentou sua Initial Greenhouse Gas Strategy dedicada
à redução das emissões do transporte marı́timo internacional. Essa estratégia tem
como objetivo diminuir as emissões de GEE em pelo menos 40% até 2030 e 70%
até 2050 em relação à linha de base de 2008. Para atingir esses objetivos, a IMO
se propôs a identificar medidas de curto prazo (aprovadas em 2020), médio prazo
(entre 2023 e 2030) e longo prazo (além de 2030).
Assim, em 01 de janeiro de 2020 teve inı́cio, por meio da resolução MEPC.280
(70) (IMO, 2016), uma medida que impõe a limitação em 0,5% m/m do teor máximo
de enxofre no combustı́vel de navios, frente aos 3,5% m/m anteriormente praticados.
No mesmo ano, os paı́ses membros da IMO aprovaram um conjunto de medidas de
curto prazo para atingir a meta de reduzir a intensidade de carbono em 40% até
2030. As medidas adotadas incluem requisitos operacionais e técnicos baseados em
metas obrigatórias.
Os requisitos técnicos são baseados em um Índice de Eficiência Energética de
Navios Existentes (EEXI), sendo que a partir de 2023, metas especı́ficas de eficiência
energética serão aplicadas à frota de navios existente com base no tipo e tamanho
do navio. Por sua vez, os requisitos operacionais são baseados em um Indicador
de Intensidade de Carbono (CII), que relaciona a quantidade de CO2 emitido por
capacidade de carga e milha náutica. Assim, cada embarcação será avaliada em
relação a um CII de linha de base, que se tornará cada vez mais rigoroso ao longo
do tempo.
Outras medidas para a redução das emissões de GEE estão sendo avaliadas
por parte da indústria de transportes marı́timos, tais como a otimização de rota e a
redução de velocidade durante o trajeto da embarcação; utilização de scrubbers; e
uma medida que está sendo avaliada e estudada é a utilização de propulsão marı́tima
com combustı́veis alternativos.
Dentre as opções em estudo para a redução das emissões de GEE, a utilização
de combustı́veis alternativos em substituição ou composição com os combustı́veis
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fósseis tem recebido especial atenção da indústria marı́tima. Contudo, é importante
ressaltar que, apesar do grande esforço e investimento da indústria em desenvolver
soluções para o uso de combustı́veis alternativos em navios, há grandes desafios a
serem vencidos, envolvendo desde aspectos tecnológicos, relacionados à engenharia
dos motores, a questões pertinentes à produção e logı́stica de armazenamento e
distribuição de um combustı́vel em escala global.
Apesar dos evidentes benefı́cios à saúde humana e ao meio ambiente decor-
rentes da redução das emissões de GEE, é importante avaliar as medidas em estudo
quanto ao seu impacto no custo do transporte marı́timo. Em um primeiro momento,
a adoção de qualquer alternativa ao uso de combustı́veis fósseis em navios resultará
em um aumento de custos, cuja influência será sentida, em maior ou menor grau,
no preço do frete. Há, portanto, diversos desafios a serem vencidos para adequar as
embarcações aos requisitos de controle de emissões de GEE impostos pela IMO a
curto, médio e longo prazo. Dentro deste cenário, a inovação é um elemento de vital
importância na busca de soluções aplicáveis aos navios atuais, bem como às novas
construções.
Assim, este trabalho tem por objetivo abordar o tema da adoção de com-
bustı́veis alternativos como opção para a redução das emissões de GEE no trans-
porte marı́timo. Em particular, o presente trabalho aborda os aspectos envolvidos
no uso da amônia como combustı́vel alternativo em navios.
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2. COMBUSTÍVEIS ALTERNATIVOS NO TRANS-
PORTE MARÍTIMO
Os principais combustı́veis utilizados na indústria marı́tima são combustı́veis
de origem fóssil - HFO (Heavy Fuel Oil ), MDO (Marine Diesel Oil ) e MGO (Ma-
rine GasOil ). Esses combustı́veis apresentam diversas vantagens em sua utilização
quando comparados a outros combustı́veis, tais como alta eficiência energética, me-
lhor relação custo-benefı́cio, facilidade de extração e processamento, se destacando,
também, pela facilidade de armazenamento e de transporte, bem como uma infra-
estrutura bem madura de produção e logı́stica.
Entretando, há desvantagens em relação à utilização dos combustı́veis de ori-
gem fóssil. Combustı́veis fósseis, incluindo HFO, MDO e MGO, contém enxofre
em sua composição. Assim, durante o processo de combustão, o enxofre é oxidado,
formando os óxidos sulfuroso (SO2 ) e sulfı́drico (SO3 ), geralmente designados como
(SOX ). Além disso, óxidos de nitrogênio (NOX ) são emitidos durante o processo de
combustão que, juntamente com o SOX , são responsáveis pelo fenômeno da chuva
ácida. Cabe mencionar, ainda, a emissão de dióxido de carbono (CO2 ), um dos gases
causadores do efeito estufa, o qual representa um produto natural do processo da
combustão (Fritt-Rasmussen et al., 2018). Dessa maneira, a poluição atmosférica re-
sultante das emissões de SOX , NOX e CO2 decorrente da operação das embarcações
causa efeitos negativos cumulativos, ocasionando, por exemplo, impactos ao ambi-
ente, tais como a chuva ácida e o efeito estufa, bem como consequências diretas à
saúde humana.
Diante disso, algumas medidas têm sido adotadas a fim de reduzir as emissões
atmosféricas por parte da indústria de transportes marı́timo. Uma dessas medidas
é a utilização de combustı́veis alternativos, em conjunto ou em substituição aos
combustı́veis de origem fóssil, o que, em tese, reduziria as emissões gases polu-
entes. Contudo, tal discussão ainda está em fase de pesquisa e desenvolvimento,
com diversas empresas - como a MAN Energy Solutions e Wärtsilä - se empenhado
em desenvolver motores aptos ao consumo de combustı́veis alternativos. Dentro
desse cenário, alguns combustı́veis alternativos vêm recebendo especial atenção da
indústria marı́tima, dentre os quais podem ser citados o LNG, metanol, LPG, HVO,
hidrogênio e amônia.
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O LNG (Liquefied Natural Gas ou Gás Natural Liquefeito) é uma mistura
de vários gases, composta principalmente de metano (CH4 ), cuja concentração pode
variar de 70 a 99% em massa, dependendo da origem (ABS, 2020b). Outros hidro-
carbonetos comumente encontrados na composição do LNG são o etano (C2 H6 ), o
propano (C3 H8 ) e o butano (C4 H10 ) (ABS, 2020b). Pequenas quantidades de outros
gases, como nitrogênio (N2 ), também podem estar presentes. O LNG é considerado
o combustı́vel de hidrocarboneto com o menor teor de carbono e, portanto, com
grande potencial para reduzir as emissões de CO2 . No entanto, vale ressaltar que o
metano é um potente gás de efeito estufa, cujas ”fugas”para a atmosfera, usualmente
referenciadas como Methane Slip, devem ser mantidas sob controle.
A grande vantagem do LNG é que a tecnologia necessária para seu emprego
como combustı́vel em embarcações já está prontamente disponı́vel. Várias opções de
armazenamento de LNG, bem como equipamentos de processo, estão disponı́veis co-
mercialmente, além de existir uma infraestrutura consolidada de produção, logı́stica
e abastecimento.
Um aspecto negativo relacionado ao uso do LNG esta relacionado ao seu
ponto de ebulição, que é de aproximadamente –162 °C a 1 bar de pressão absoluta
(Alfa et al., 2020). Assim, uma das maneiras de armazenar o LNG é em tanques
isolados para aplicação criogênica, que estão associados ao alto custo em relação aos
sistemas convencionais de armazenamento e abastecimento de combustı́veis deriva-
dos do petróleo. Além disso, apesar de reduzir consideravelemente as emissões de
NOX e SOX , as emissões de CO2 são significativas na combustão do LNG (ABS,
2020b).
O metanol (CH3 OH), também chamado de álcool metı́lico ou álcool de ma-
deira, está disponı́vel em todo o mundo e tem sido usado em uma variedade de
aplicações por muitas décadas. Tem como caracterı́sticas ser um lı́quido incolor
à temperatura e pressão ambiente, apresentando um odor pungente particular. É
mais comumente produzido em escala comercial a partir do gás natural, mas também
pode ser produzido a partir de fontes renováveis, como biomassa ou eletrólise ali-
mentada por energia renovável e apoiada com tecnologia de utilização de captura de
carbono. Qualquer processo alternativo de produção associado ao processo conven-
cional em volumes crescentes poderia reduzir consideravelmente a pegada de dióxido
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de carbono (CO2 ) do metanol como combustı́vel alternativo.
O metanol é mais fácil de armazenar e manusear do que o LNG e demais
opções de combustı́veis alternativos, como a amônia (NH3 ) e os combustı́veis de hi-
drogênio. Há também menos desafios tecnológicos e logı́sticos na adoção do metanol
como combustı́vel marı́timo em comparação com o LNG ou o hidrogênio. O metanol
tem a maior relação hidrogênio-carbono dentre os combustı́veis lı́quidos, o que poten-
cialmente reduz as emissões de CO2 em comparação aos combustı́veis convencionais
(ABS, 2021c). Do ponto de vista ambiental, o metanol é facilmente biodegradável
em ambientes aeróbicos e aquáticos. Com uma meia-vida em águas superficiais de
um a sete dias, há menos impacto no ambiente marinho, na eventualidade de um
vazamento ou derramamento de metanol.
Contudo, devido às suas caracterı́sticas de massa especı́fica (780 kg/m3 ) e
poder calorı́fico (19,9 MJ/kg) (Alfa et al., 2020), o metanol requer tanques de com-
bustı́vel aproximadamente 2,5 vezes maiores do que os dos combustı́veis convenci-
onais (ABS, 2021c). Além disso, uma desvantagem do metanol como combustı́vel
alternativo é seu desempenho ambiental, uma vez que a presença de carbono em sua
composição resulta em emissõess de GEE.
O LPG (Liquefied Petroleum Gas ou Gás Liquefeito de Petróleo) é, por de-
finição, qualquer mistura de propano e butano na forma lı́quida. Misturas especı́ficas
de butano e propano são usadas para atingir caracterı́sticas desejadas de saturação,
pressão e temperatura. Existem duas fontes principais de LPG: como subproduto da
produção de petróleo e gás e como subproduto do refino de petróleo. NGL (Natural
Gas Liquids ou Lı́quidos de Gás Natural) provém de poços de gás natural e gás asso-
ciado da produção de petróleo. Os NGL são tratados para a remoção de água, CO2 ,
N2 e enxofre em uma usina de gás. Esse processo é a fonte de aproximadamente
60% da produção global de LPG (DNV-GL, 2017). Propano e butano também são
obtidos como subproduto de diversos processos nas refinarias de petróleo, o que cor-
responde a 40% da produção total (DNV-GL, 2017). O rendimento da produção de
LPG é de aproximadamente 1% a 4% do petróleo bruto processado, dependendo do
tipo de petróleo bruto e das caracterı́sticas da refinaria (DNV-GL, 2017). Também
é possı́vel produzir LPG de origem renovável. Por exemplo, o bio-LPG pode ser ob-
tido como subproduto na produção de biodiesel, por hidrogenação dos triglicerı́deos
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de óleos vegetais ou de gordura animal.
O uso do LPG como combustı́vel possibilita a redução de emissões em com-
paração com os combustı́veis convencionais, tanto em termos de emissões de gases
de efeito estufa quanto de outros poluentes. O uso de LPG praticamente elimina
as emissões de enxofre, o que é particularmente importante quanto ao cumprimento
das restrições locais e globais de SOX . Por sua vez, a redução das emissões de NOX
depende das caracterı́sticas do motor. No caso de um motor diesel de dois tempos,
por exemplo, as emissões de NOX podem ser reduzidas em 10 a 20% em comparação
com o HFO (DNV-GL, 2017). Além disso, o uso de LPG como combustı́vel permite
reduzir, em grande medida, as emissões de GEE e particulados em comparação com
HFO ou MGO.
No entanto, a experiência operacional no uso do LPG ainda é muito limitada,
necessitando que o nı́vel de maturidade em relação a sua utilização na indústria
marı́tima seja desenvolvido. Além disso, a falta de infraestrutura de abastecimento
representa uma barreira para o uso de LPG como combustı́vel marı́timo alternativo.
O HVO (Hydrotreated Vegetable Oil ou Óleo Vegetal Hidrotratado) é um bi-
ocombustı́vel gerado a partir de gorduras ou óleos vegetais puros ou misturados com
petróleo, refinados por um processo de hidrotratamento denominado fatty acidsto-
hydrocarbon hydrotreatment (Hidrotratamento de Ácidos Graxos a Hidrocarbonetos)
(ABS, 2021a). As emissões globais de GEE de um biocombustı́vel do tipo HVO de-
pendem da matéria-prima e do processo de produção adotados.
O HVO se enquadra razoavelmente bem como um combustı́vel alternativo
por ser considerado um combustı́vel drop-in. Um combustı́vel drop-in é aquele que
pode ser misturarado ou substituir totalmente um combustı́vel existente sem de-
mandar modificações em relação ao sistemas de armazenamento e de transferência,
bem como quanto ao consumidor final, sendo, assim, um substituto direto dos com-
bustı́veis convencionais à base de petróleo. Em geral, o HVO é compatı́vel com a
infraestrutura e os tipos de motores existentes nas embarcações, sendo necessárias
pequenas modificações para sua utilização.
Por outro lado, o HVO é caro e, atualmente, existe uma limitação quanto à
capacidade de produção e à disponibilidade de abastecimento de HVO, o que levanta
a questão de sua escalabilidade como combustı́vel para uso marı́timo. Outra questão
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está relacionada ao uso de sistemas de tratamento de gases de escape dedicado ao
controle das emissões de NOX , o que deve ser considerado quanto ao atendimento
aos requisitos atuais e futuros de emissões.
O hidrogênio (H2 ) é encontrado naturalmente como um composto de água
ou metano. Em condições padrão, o hidrogênio é um gás incolor, inodoro, insı́pido,
não tóxico, relativamente não reativo e altamente inflamável. O hidrogênio é co-
mumente produzido pela conversão de gás natural ou carvão em gás hidrogênio e
CO2 , embora para os objetivos de sustentabilidade de longo prazo, fontes de energia
renovável possam ser adotadas para a geração de hidrogênio por meio de eletrólise.
Atualmente, o hidrogênio é normalmente usado para produção quı́mica ou como
matéria-prima industrial.
Caso seja produzido a partir de fontes de energia renováveis, o hidrogênio
tem o potencial para ser um combustı́vel marı́timo de zero carbono. Assim sendo,
a produção de hidrogênio deve ser considerada quanto às emissões globais de GEE
durante seu ciclo de vida. Além disso, o hidrogênio é caracterizado por apresentar o
maior teor de energia por massa, cerca de 120,2 MJ/kg, em comparação com demais
combustı́veis marı́timos (ABS, 2021b). Por exemplo, o hidrogênio excede o MGO
em 2,8 vezes, enquanto em relação aos álcoois sua razão energia por massa é de cinco
a seis vezes superior (ABS, 2021b). Portanto, o uso de hidrogênio como combustı́vel
possibilita o aumento da eficiência dos motores a combustão e, consequentemente,
reduzir o consumo especı́fico de combustı́vel.
No entanto, devido à sua menor densidade de energia (energia/volume), o
hidrogênio lı́quido exige uma maior capacidade de armazenamento em comparação
ao MGO (cerca de 4 vezes) e ao LNG (cerca de 2 vezes) (ABS, 2021b). O hidrogênio
requer temperaturas abaixo de -253° C (-423,4 °F) e pressão entre 350 - 700 bar (ABS,
2021b). Devido a essa caracterı́stica, o armazenamento de hidrogênio lı́quido requer
especial atenção quanto aos aspectos de isolamento térmico e sua interação com a
estrutura das embarcações.
A amônia (NH3 ) é um composto de nitrogênio e hidrogênio e, à pressão
atmosférica e temperatura ambiente, é um gás incolor com um cheiro pungente
caracterı́stico. Em pressões mais altas, a amônia se torna um lı́quido, facilitando
seu transporte e armazenamento. Outro fator importante é que a amônia é uma
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armazenadora e portadora de hidrogênio e, sendo um combustı́vel livre de carbono,
não emite CO2 como produto da combustão em motores.
Atualmente, é um produto quı́mico amplamente utilizado em diversas indústrias.
A maior parte da amônia produzida atualmente deriva do gás natural, por meio do
processo Haber-Bosch, sendo possı́vel também sua produção a partir da nafta, do
óleo combustı́vel pesado ou do carvão. Todavia, a utilização dessas matérias pri-
mas resultam em maiores emissões de CO2 por unidade de energia utilizada em sua
produção. Por sua vez, a energia necessária para a produção da amônia pode ser
obtida a partir de fontes renováveis, como energia eólica ou solar, o que a torna um
combustı́vel livre de emissões de GEE.
A amônia possui uma infraestrutura madura tanto de logı́stica de transportes
quanto de produção, por ser uma das substâncias quimı́cas mais utilizadas no mundo,
principalmente na indústria de fertilizantes. A amônia apresenta uma temperatura
de condensação mais alta que o hidrogênio (-33°C versus -253°C), sendo cerca de
50% mais densa em energia por unidade de volume do que o hidrogênio lı́quido (Alfa
et al., 2020). Tais caracterı́sticas representam importantes vantagens em termos de
armazenamento e distribuição em comparação com o hidrogênio.
O poder calorı́fico tı́pico da amônia é semelhante ao do metanol (Alfa et al.,
2020). Contudo, a amônia apresenta algumas desvantagens como combustı́vel para
motores Diesel, como, por exemplo sua temperatura de auto-ignição muito alta
(Erdemir e Dincer, 2021). Além da sua alta toxidade, a amônia é corrosiva para
materiais a base de cobre, nı́quel e plásticos. Tal como acontece com a maioria dos
combustı́veis alternativos, a amônia possui uma densidade de energia inferior a dos
combustı́veis tradicionais (Alfa et al., 2020).
Na Tabela 2.1, é apresentado um resumo das vantagens e desvantagens das
opções de combustı́veis alternativos em análise. Dentre as opções em estudo pela
indústria marı́tima atualmente, a amônia se apresenta como a alternativa mais pro-
missora para a substituição dos combustı́veis fósseis no que tange à redução das
emissões de gases poluentes. Isso por conta do enorme potencial oferecido pela
infraestrutura de produção e logı́stica já existente, bem como de suas qualidades
superiores como armazenadora e portadora de hidrogênio.
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Tabela 2.1: Vantagens e desvantagens dos combustı́veis alternativos
Vantagens Desvantagens
- Tecnologia pronta para aplicação. - Custo de armazenamento à bordo alto.
LNG - Boa infraestrutura de produção e logı́stica. - Altas emissões de CO2 ao longo da combustão.
- Potencial redutor de emissões de GEE. - Altas emissões de GEE ao longo do processo de produção.
- Mais fácil de ser armazenado e manuseado do - Requer tanques 2,5 maiores do que o MGO por unidade
Metanol que LNG, NH3 e hidrogênio. de Energia.
- Potencialmente, reduz as emissões de GEE. - Altas emissões de GEE em seu processo de combustão.
- Reduz as emissões de GEE. - Falta de infraestrura de abastecimento.
LPG - Combustı́vel já utilizado em embarcações, o que - Altas emissões em seu processo de produção, quando
torna a sua tecnologia razoavelmente conhecida. produzido utilizando fontes de energia fósseis.
- Considerado um combustı́vel ( drop-in).
- É um combustı́vel caro.
HVO - Reduz as emissões de GEE.
- Infraestrutura de produção e abastecimento limitados.
- Necessita de poucas modificações na embarcação.
- Necessita de grande volume de tanque, cerca de 4x mais
- Potencial de ser um combustı́vel com zero carbo- espaço do que o MGO.
no e com zero emissões de GEE, quando produzi- - Dificuldade transporte e armazenagem devido a sua baixa
Hidrogênio do a partir de fontes renováveis. temperatura de liquefação.
- Possui o maior teor de energia por massa de to- - Combustı́vel caro sob o ponto de vista tecnológico, devido
dos os combustı́veis. ao que foi mencionado acima.
- Combustı́vel inflamável.
- Boa infraestrutura de produção e logı́stica.
- Potencial combustı́vel com zero carbono, se pro-
- Problemas na combustão.
duzido a partir de fontes renováveis.
- A amônia é corrosiva, tóxica e inflamável.
Amônia -Potencial armazenador e transportador de hidro-
- Demanda um volume cerca de 2,4 vezes maior do que o
gênio.
de combustı́veis de tradicionais
-Mais fácil de transportar, armazenar e distribuir
do que o hidrogênio.
13
3. AMÔNIA NOS DIAS ATUAIS
14
3.2 Aspectos Relativos à Produção
De acordo com IEA (2021), a China é, atualmente, o maior produtor mundial
de amônia, respondendo por 29% da produção global em 2019, seguida pela Rússia
(10%), Estados Unidos (9%), Oriente Médio (9%), União Europeia (8%) e Índia
(8%), conforme mostrado na Figura 3.1.
Ao longo das últimas três décadas, a estrutura do lado da oferta não mudou
significativamente em termos de participação de mercado - os principais produtores
da economia global permaneceram os mesmos. Já a comparação dos valores com
dados de 1990 mostra alterações drásticas: a produção da China continua a crescer,
com um aumento de cerca de 50%; a participação da União Europeia reduziu à
metade; o Oriente Médio viu sua participação triplicar (IEA, 2021). As regiões com
maior aumento no consumo aparente de amônia nas últimas duas décadas são Ori-
ente Médio, África e Rússia, com aumentos de demanda de aproximadamente 140%,
110% e 80%, respectivamente (IEA, 2021). Vale mencionar que o consumor aparente
é definido como envolvendo a produção industrial doméstica e as importações, dedu-
zidas as exportações desse bem. Nesse perı́odo, a demanda praticamente estagnou
na União Europeia, nos Estados Unidos e na América do Sul.
Figura 3.1: Consumo Aparente e Produção de Amônia em 2019 (Fonte: IEA, 2021).
15
Os principais paı́ses e regiões exportadores de amônia são Rússia, Trinidad
e Tobago e Oriente Médio, representando respectivamente 24%, 23% e 15% das
exportações globais de amônia em 2019. As principais regiões e paı́ses importadores
são União Europeia, Índia e Estados Unidos, responsáveis por 24%, 14% e 13% das
importações globais, respectivamente (IEA, 2021).
O principal motivo dos grandes volumes de comércio de amônia e seus de-
rivados é a diferença de custo de produção nas diferentes regiões do mundo. Os
paı́ses com reservas abundantes de gás natural - que serve como matéria prima para
o processo de Haber-Bosch - e acesso a centros de demanda próximos são capazes de
produzir amônia a um custo relativamente baixo e se especializar em sua produção
como um produto para exportação.
Segundo a IEA (2021), Trinidad e Tobago converte cerca de 20% do gás
natural que produz localmente em amônia, ao invés de exportar o próprio gás,
aumentando, assim, o valor agregado do produto final. A grande participação da
indústria de amônia do paı́s em relação ao tamanho de sua economia também foi
impulsionada para atender à demanda nos Estados Unidos, da ordem de 1,5 Mt
de amônia por ano. Trinidad e Tobago exporta mais 3 Mt para mais de 25 outros
paı́ses. Outros paı́ses também adotaram um modelo voltado para a exportação,
muitas vezes como forma de aproveitar o gás natural produzido em conjunto com
a extração de petróleo, principalmente no Oriente Médio e no Norte da África. A
produção da Arábia Saudita mais do que dobrou desde 2005 (em comparação com
um aumento global na produção de 26%), e a produção da Argélia quadruplicou no
mesmo perı́odo. Esses paı́ses hoje exportam cerca de 30% e 40% de sua produção,
respectivamente (IEA, 2021).
Além disso, uma importante rede de portos, dutos e instalações de armaze-
namento dedicadas apoia o comércio de amônia. Só os Estados Unidos têm mais
de 10.000 locais de armazenamento de amônia, muitos dos quais estão conectados a
uma rede de dutos que se estende por mais de 3.000 km e conecta o Golfo do México
ao Meio-Oeste. O maior duto de amônia do mundo é o duto Tolyatti-Odessa, que
vai da Rússia à Ucrânia, com um comprimento de 2.471 km (IEA, 2021).
16
3.2.2 Previsões Para a Demanda e Produção de Amônia
Figura 3.2: Projeção do uso de combustı́veis marı́timo para 2050 (Fonte: ABS, 2020a).
17
Segundo a ABS (2020a), existe uma previsão de que, em 2050, a amônia cor-
responderá por cerca de 35% do consumo de combustı́veis na indústria de tranportes
marı́timos, como pode ser visto na Figura 3.2. Dessa maneira, é necessário analisar
se o mercado de produção e logı́stica relacionado a amônia será capaz de atender a
uma demanda de tal magnitude.
De acordo com Erdemir e Dincer (2021), há uma previsão de que a produção
e o consumo de amônia irão crescer exponencialmente nos próximos anos, principal-
mente devido a sua utilização como combustı́vel na indústria marı́tima. A Figura
3.3 ilustra (linha azul) a quantidade de amônia produzida em todo o mundo até o
ano de 2017, além de realizar uma projeção de cosumo de amônia até 2050 (linha
pontilhada vermelha).
Como mostrado na Figura 3.3, há uma previsão para 2050 de produção global
de amônia de 1,2 bilhão de toneladas métricas. Ou seja, é possı́vel concluir que, em
2050, serão produzidas quase 8,2 vezes mais amônia do que a quantidade produzida
em 2019, o que exigiria da indústria de produção de amônia uma expressiva expansão
nos próximos anos para atender a tal demanda, assim como uma expansão da infra-
estrutura de portos e instalações de armazenamento. Apesar do grande otimismo do
mercado e da grande maturidade da indústria, por se tratar de uma substância que é
18
globalmente utilizada, existe uma incerteza sobre a viabilidade, tanto de produção,
quanto de logı́stica, em atingir tais previsões.
Figura 3.4: Emissões de gases de efeito estufa de produtos quı́micos com alto volume de
produção em 2010 (Fonte: Bird et al., 2020).
19
seguir.
A amônia convencional é produzida a partir de matéria-prima fóssil, na mai-
oria das vezes gás natural, podendo também ser obtida a partir de carvão. A pegada
de CO2 da amônia convencional depende da eficiência da planta de produção e das
caracterı́sticas da matéria-prima utilizada. Atualmente, as plantas de produção de
amônia apresentam, tipicamente, pegadas de CO2 da ordem de 2,0 toneladas de CO2
por tonelada de amônia, enquanto as mais eficientes alcançam valores da ordem de
1,6 t CO2 / t NH3 (Alfa et al., 2020). Por sua vez, as plantas à base de carvão
podem apresentar pegadas de até 3,0 t de CO2 por tonelada de amônia (Alfa et al.,
2020).
A amônia azul é produzida, basicamente, da mesma forma que a amônia
convencional. No entanto, o CO2 produzido na obtenção da amônia azul é cap-
turado, liquefeito e transportado para armazenamento permanente, processo esse
denominado de CCS - Carbon Capture and Storage.
A amônia verde, ou amônia renovável/sustentável, é produzida sem a uti-
lização de matérias-primas fósseis, sendo produzida unicamente à base de ar e água,
e a partir de uma fonte de energia elétrica renovável. Assume-se que a pegada de
CO2 da amônia verde seja zero, ignorando-se a análise completa do ciclo de vida,
que deve incluir a construção da planta e o transporte para o local de abastecimento.
As estimativas iniciais quanto à redução das emissões durante o ciclo de vida para
a amônia verde são de cerca de 90% para amônia baseada em energia eólica e 75%
para amônia baseada em energia fotovoltaica (Alfa et al., 2020).
Destaca-se ser necessário levar em consideração as emissões de CO2 ao longo
da cadeia de produção de energia renovável, principalmente com relação aos insumos
e materiais utilizados ao longo do processo. Por exemplo, as pás das turbinas eólicas
são produzidas em fibra de vidro, que é um material produzido à base de petróleo
(não renovável) e não reciclável. Já as placas fotovoltaicas são feitas a partir de
silı́cio dopado, o qual, apesar de reciclável, não é um material renovável. Assim
como o alumı́nio, a produção de silı́cio a partir da fonte natural, dióxido de silı́cio,
consome quantidades consideráveis de energia.
A amônia hı́brida é a amônia produzida em plantas hı́bridas que são alimen-
tadas tanto por combustı́vel fóssil quanto por eletricidade renovável. As plantas de
20
produção de amônia verde podem ser originalmente construı́das para tal finalidade
ou adaptadas a partir de plantas convencionais. Tal possibilidade é interessante,
pois representa uma transição economicamente viável para a produção de amônia
verde.
Vale ressaltar, que a amônia não contém carbono e nenhum CO2 será emi-
tido por um navio ao consumir amônia, seja convencional ou verde. Além disso, en-
quanto os diferentes processos de fabricação da amônia carregam pegadas de dióxido
de carbono muito diferentes, o produto final é o mesmo. O uso de amônia como
combustı́vel marı́timo pode, do ponto de vista operacional, ser amônia convencional
ou verde, ou qualquer mistura de ambas. Este fato reduz significativamente qual-
quer risco relacionado ao investimento em um navio operando com amônia como
combustı́vel, uma vez que a amônia convencional é uma commodity comercializada
em grandes quantidades. Um armador pode começar a usar amônia convencional
e, então, alterar a parcela de amônia verde conforme o cenário do mercado (custos,
legislação etc) ou seu interesse em contribuir com um transporte marı́timo cada vez
mais sustentável e neutro em carbono.
21
Figura 3.5: Evolução do preço da amônia (Fonte: CRU - Fertilizer week).
Tabela 3.1: Resumo das estimativas de preços de mercado para as diferentes classes
de amônia (Fonte: Alfa et al., 2020).
2025-2030 2040-2050
Assumed renewable electricity price 30EUR/MWh 20EUR/MWh
Price Per Ton USD/MT Price per GJ LHV USD/GJ Price Per Ton USD/MT Price per GJ LHV USD/GJ
VLSFO - very Low Sulphur Fuel Oil (<0.5%S) 500-600 12.5-15 500-600 12.5-15
Conventional ammonia 250 13.5 250 13.5
Blue ammonia 350-400 18.8-21.5 350-400 18.8-21.5
Green ammonia 400-850 21.5-45.7 275-450 14.8-24.1
Hybrid Green ammonia 300-400 16.1-21.5 250 13.5
22
no futuro.
Vale ressaltar, que já existe uma infraestrutura de armazenamento e trans-
porte de amônia devido ao seu uso difundido como matéria-prima para fertilizantes
inorgânicos. As rotas comerciais marı́timas internacionais estão bem estabelecidas
e há uma rede abrangente de portos em todo o mundo que lida com amônia em
grande escala (Figuras 3.6 e 3.7).
Figura 3.6: Mapa dos fluxos globais de comércio de amônia (Fonte: Fertecon IHS Markit).
23
Atualmente, existem 138 terminais especializados no transporte marı́timo
de amônia, sendo 38 terminais dedicados à exportação, 88 dedicados à importação
e apenas 6 terminais aptos a ambas operações (Alfa et al., 2020). Muitos desses
terminais são integrados a plantas de produção de amônia e fertilizantes.
Em outros casos, os terminais de amônia estão localizados distantes das plan-
tas de produção e dispõem de infraestrutura própria de armazenamento de amônia,
ou fazem parte de complexos portuários maiores. O armazenamento é geralmente
composto de tanques isotérmicos especiais (até 30.000 toneladas) e tanques esféricos
pressurizados (1.000 - 2.000 toneladas). As Figuras 3.8, 3.9, 3.10, 3.11, 3.12 e
3.13 mostram como os terminais de amônia estão amplamente difundidos ao redor
do mundo, proporcionando um excelente ponto de partida para o desenvolvimento
da infraestrutura de abastecimento necessária ao uso da amônia como combustı́vel
marı́timo.
24
Figura 3.9: Terminais de amônia no mar mediterrâneo (Fonte: Fertecon IHS Markit.).
Figura 3.10: Terminais de amônia na bacia do caribe e américa do norte (costa oeste e
Golfo do México) (Fonte: Fertecon IHS Markit.).
Figura 3.11: Terminais de amônia no Oriente Médio e no sul da Ásia (Fonte Fertecon
IHS Markit.).
25
Figura 3.12: Terminais de amônia na Ásia-Pacı́fico e Oceania (Fonte: Fertecon IHS
Markit.).
Figura 3.13: Terminais de amônia na América do Sul e África do Sul (Fonte: Fertecon
IHS Markit.).
26
amônia está localizada no Estado de Iowa, com mais de 1.000 instalações e uma
capacidade total de armazenamento de cerca de 800.000 toneladas. O transporte
de amônia nos EUA é realizado através dos modais rodoviário, ferroviário e fluvial,
sendo também conduzido através de uma rede de 3.000 milhas de dutos, os quais
transportam 2 milhões de toneladas anuais através de 11 estados. (Bird et al., 2020).
27
vado da amônia) de nitrogênio e outros produtos à base de nitrogênio são transpor-
tados com segurança, armazenados e usados sem incidentes. Contudo, ao longo dos
anos, alguns acidentes demonstraram os perigos do manuseio inadequado da amônia.
Alguns dos maiores acidentes incluem o desastre no porto da Cidade do Texas em
1947 (Lourenço e de Castro, 2019), que foi provocado por um incêncio a bordo do
cargueiro francês SS Grandcamp, que estava carregado de nitrato de amônio. Igual-
mente, em 2020, o acidente ocorrido no Porto de Beirute teve como causa a explosão
de nitrato de amônio inadequadamente armazenado (Simplicio et al., 2021).
Esses acidentes estiveram entre os catalisadores dos rı́gidos regulamentos e
diretrizes relacionados ao transporte e manuseio de amônia que os governos e a
indústria implementaram em muitos paı́ses e regiões. Exemplos de tais medidas
incluem: na União Europeia, o regulamento de Registro, Avaliação, Autorização e
Restrição de Produtos Quı́micos (REACH); no Reino Unido, o esquema voluntário
de garantia da indústria de fertilizantes (FIAS); e no Canadá, o Código de Prática
do Nitrato de Amônio (Código AN). Em nı́vel internacional, o programa Protect and
Sustain da International Fertilizer Association ajuda a definir padrões de referência
globais para o manejo de fertilizantes.
Dessa maneira, é esperado que a experiência com a utilização, manuseio e
transporte da amônia na indústria de fertilizantes sirva de referência para as demais
indústrias e, tais regulamentos representem uma base para a utilização da amônia
em outras indústrias, em especial, na indústria de transporte marı́timo.
Logo, é possı́vel concluir que a amônia é uma substância amplamente comer-
cializada e possui utilização em diversos setores. Além disso, já existe uma infra-
estrutura bem madura de produção, bem como uma logı́stica estruturada para o
transporte tanto marı́timo, quanto terrestre, da amônia, considerando-se que diver-
sos portos ao redor do mundo já realizam seu manuseio e armazenagem. Tal infraes-
trutura torna a amônia uma forte canditada a se tornar um combustı́vel alternativo
no transporte marı́timo. É evidente que, caso a amônia seja de fato adotada, novos
investimentos e desenvolvimentos deverão ser feitos para que se atenda à demanda
esperada. Porém, o fato de existir uma infraestrutura tanto de produção quanto
de logı́stica já implementada, representa uma vantagem comparativa importante em
relação às demais alternativas atualmente existentes.
28
4. AMÔNIA: UM COMBUSTÍVEL ALTERNA-
TIVO
Os motores Diesel representam a principal alternativa de motor a combustão
interna adotada no transporte marı́timo. As caracterı́sticas de desempenho dos
motores Diesel envolvendo, particularmente, sua ampla faixa de torque máximo, bem
como sua robustez, representam as principais motivações para sua ampla utilização
como motor de propulsão e geração de eletricidade em embarcações.
Os motores Diesel operam segundo o ciclo teórico de combustão a pressão
constante (Ciclo Teórico Diesel a Ar, Figura 4.1), sendo a ignição do combustı́vel
baseada no fenômeno da autoignição. Tais caracterı́sticas resultam em:
3. Taxas de compressão elevadas, variando entre 12:1 e 20:1, enquanto nos mo-
tores Otto essa relação situa-se normalmente entre 8:1 a 10:1 (Pimentel);
29
A constante demanda por instalações cada vez mais eficientes impulsionou
o desenvolvimento dos motores Diesel marı́timos, resultando no surgimento de con-
cepções especı́ficas para cada aplicação. Os motores Diesel atuais são classificados
segundo sua faixa de rotação de operação, compreendendo os motores de baixa (70-
250 rpm), média (450-1000 rpm) e alta (1600-2500 rpm) rotação. De fato, cada con-
cepção apresenta caracterı́sticas construtivas especı́ficas, envolvendo, por exemplo,
os componentes internos do motor, bem como as peculiaridades dos seus sistemas
auxiliares.
Os motores Diesel de baixa rotação representam a solução tipicamente ado-
tadas em navios oceânicos de médio e grande portes. Tal cenário decorre não apenas
de seu reduzido valor de consumo especı́fico de combustı́vel, mas também devido à
sua flexibilidade quanto ao consumo de combustı́veis de diferentes especificações e
nı́veis de qualidade.
Tais caracterı́sticas, aliadas às condições tı́picas de temperatura e pressão
observadas durante o processo de combustão, tornam os motores Diesel particular-
mente aptos ao consumo de amônia. Todavia, há ainda desafios tecnológicos a serem
superados, tanto em relação à combustão em motores Diesel quanto aos aspectos de
armazenamento e movimentação a bordo, para que a amônia se consolide como um
combustı́vel marı́timo alternativo.
C50 H102 + 77, 5(O2 + 3, 76N2 ) → 50CO2 + 51H2 O + 291, 4N2 (4.1)
30
óxido nı́trico (NO) é formado, ele não é decomposto, mas pode aumentar em concen-
tração durante o restante do processo de combustão se a temperatura permanecer
alta. Ambos, CO2 e NOX são gases causadores do efeito estufa.
Outro importante elemento causador do efeito estufa decorre da presença de
enxofre nos combustı́veis de origem residual. Durante o processo de combustão, o
enxofre presente no combustı́vel é oxidado em dióxido de enxofre (SO2 ). Uma pe-
quena fração do SO2 , cerca de 3-5%, pode ser ainda oxidada em trióxido de enxofre
(SO3 ) dentro da câmara de combustão e no duto de exaustão (EGCSA). A quanti-
dade total produzida de SOX (SO2 e SO3 ) depende das condições de temperatura e
pressão durante a combustão, do excesso de ar e do teor de enxofre do combustı́vel.
Após a combustão, ocorre a reação entre o SO3 e o vapor de água para formar ácido
sulfúrico (H2 SO4 ). As Equações 4.2 e 4.3 mostram o processo de oxidação do SO2 e
a reação do SO3 com a água para formar ácido sufúrico.
31
Figura 4.2: Resumo das emissões tı́picas de um motor diesel baixa rotação (Fonte:
EGSA).
32
4.1.1 Alta Temperatura de Ignição
33
Figura 4.3: Alternativas para o consumo de amônia em motores de combustão interna:
(A) entrada de uma mistura de amônia (na forma gasosa) com o ar e (B) entrada da amônia
lı́quida diretamente na câmera de combustão separadamente do combustı́vel tradicional
(Fonte: Erdemir e Dincer, 2021).
34
Figura 4.4: O efeito da variação da proporção da mistura de amônia-combustı́vel na
potência gerada (Fonte: Erdemir e Dincer, 2021).
35
Este problema é observado tanto em motores de ignição por centelha quanto
em motores de ignição por compressão. Portanto, o uso de amônia em um motor
convencional não é possı́vel sem perdas de potência. No entanto, quando se leva
em consideração que a amônia é um combustı́vel livre de carbono e, consequente-
mente, seu grande impacto para a redução das emissões de carbono, seu potencial
como combustı́vel alternativo para os motores marı́timos permanece atraente. As
soluções anteriormente descritas também são aplicáveis quanto à questão da baixa
velocidade de chama, ou seja, a utilização de uma mistura de amônia-combustı́vel,
o pré-aquecimento da amônia e taxas de compressão mais altas.
A taxa de reação quı́mica é a velocidade com que uma reação quı́mica ocorre,
sendo também definida como a velocidade na qual os reagentes se convertem nos
produtos. A taxa de reação quı́mica da amônia é mais lenta do que a dos com-
bustı́veis tradicionais devido à sua alta temperatura de ignição e baixa velocidade
de chama. Tal caracterı́stica resulta no aumento do risco de ocorrência de uma com-
bustão incompleta, na qual parte da amônia admitida não é completamente oxidada
durante o processo de combustão.
Vale ressaltar, que a baixa taxa de combustão da amônia faz com que a
combustão seja inconsistente sob baixa carga e/ou condições de operação de alta
rotação do motor. A maioria dos motores de combustão existentes que usam amônia
como combustı́vel normalmente requerem um promotor de combustão (ou seja, um
segundo combustı́vel, como gasolina, hidrogênio etc.) para ignição, operação em
baixas cargas do motor e/ou alta velocidade do motor. No entanto, essa abordagem
geralmente requer sistemas de armazenamento duplo de combustı́vel, sistemas de
entrega dupla e sistemas de injeção dupla, adicionando peso, complexidade e custo
adicionais ao sistema do motor.
De acordo com Erdemir e Dincer (2021), a solução mais comum para o au-
mento da taxa de reação quı́mica da combustão de amônia é a adoção de ativadores
de combustão (combustion promoters). Os combustı́veis tradicionais e o hidrogênio
podem ser utilizados como ativadores em motores movidos a amônia, aumentando,
assim, a taxa de reação quı́mica da combustão de amônia. Além disso, NaCl, BaCL2
36
e NaF são alguns exemplos de substância que podem ser utilizadas como ativadores
para melhorar a cinética quı́mica da combustão de amônia (Erdemir e Dincer, 2021).
37
Figura 4.5: Emissões de CO2 (A) e NOX (B) para diferentes misturas amônia-combustı́vel
(Fonte: Erdemir e Dincer, 2021).
38
Tabela 4.1: Comparação das propriedades dos combustı́veis (Fonte: Alfa et al.,
2020).
P (M W ) = P CI ∗ CM ∗ Ef iciência (4.5)
39
refrigerados à -33°C porém, como combustı́vel, a forma mais adequada de arma-
zenamento da amônia a bordo é através de tanques pressurizados. A Tabela 4.1
informa que a pressão de armazenamento da amônia à temperatura ambiente impõe
uma pressão mı́nima de armazenamento de 7,6 bar g. Tal caracterı́stica faz com
que o armazenamento da amônia a bordo, em tanques pressurizados, ocorra em
forma semelhante ao que se observa em navios movidos à LPG, em que os tanques
são armazenados no convés, seja na região de carga ou de popa. Logo, apesar dos
exemplos de armazenagem de navios movidos à LPG, é necessário avaliar qual será
a melhor disposição para a armazenagem da amônia em tanques pressurizados a
bordo.
Além disso, de acordo com a Tabela 4.1, é possı́vel observar que os com-
bustı́veis fósseis de hidrocarbonetos, incluindo o LNG, LPG, HFO e metanol, contri-
buem com a emissão de CO2 , enquanto que o hidrogênio e a amônia não contribuem
devido ao fato de não possuirem carbono em sua composição quı́mica.
40
Tabela 4.2: Nı́veis de exposição à toxicidade de amônia (Fonte: Alfa et al., 2020).
41
2. Vestuário de proteção à prova de gás;
Vale ressaltar, que estes requisitos são aplicados ao caso em que a amônia é
uma carga. Contudo, a utilização da amônia como combustı́vel em navios requer que
sejam desenvolvidas medidas de proteção especı́ficas, a fim de previnir ou minimizar
os efeitos de possı́veis eventos de risco, tais como um vazamento de amônia na
praça de máquinas de uma embarcação. A combinação de soluções, dispositivos e
procedimentos desenvolvidos pela indústria sobre o manuseio seguro de amônia a
bordo, representa um bom ponto de partida para o desenvolvimento de diretrizes
especı́ficas para a utilização da amônia como combustı́vel em embarcações.
A amônia é altamente corrosiva em relação aos metais cobre, zinco, nı́quel
e suas ligas. Geralmente, o ferro e o aço são os únicos metais usados em tanques
de armazenamento e nas tubulações que operam com amônia, pois devido a seu pH
situar-se entre 9,0 e 9,4, a amônia não é corrosiva para materiais ferrosos (Cames
et al., 2021). Esse método de armazenamento não será adotado para a amônia com-
bustı́vel, além de ser muito especı́fico, os aços inoxidáveis podem ser considerados
insensı́veis à ação corrosiva da amônia sob quaisquer condições. Um aspecto im-
portante refere-se aos materiais utilizados nas vedações. Geralmente, a borracha
nitrı́lica é usada no lugar da borracha convencional, pois a borracha convencional é
decomposta pela amônia.
Assim, é necessário avaliar qual seria o melhor material a ser utilizado para a
armazenagem e movimentação da amônia a bordo. Como exemplo, navios quı́micos
aptos a transportar amônia são equipados com tanques de aço inoxidável, o que pode
ser utilizado como referência para armazenar amônia a bordo. Neste caso, instalar
em um navio tanques de armazenamento de amônia de grandes dimensões fabricado
em aço inoxidável, traz algumas preocupações, principalmente, com relação ao custo
e ao peso.
A correta seleção dos materiais para os equipamentos em contato com a
amônia deve satisfazer a requisitos especı́ficos. O Código IGC, por exemplo, estabe-
lece os seguintes requisitos para tanques de carga e tubulações, válvulas, conexões
42
e outros itens de equipamentos normalmente em contato direto com o lı́quido ou
vapor da carga, no caso de amônia:
1. Mercúrio, cobre e ligas contendo cobre e zinco não devem ser usados para
manuseio de carga de amônia e para equipamentos normalmente em contato
com lı́quido ou vapor de amônia;
Além disso, o Código IGC (Capı́tulo 17.13) fornece, também, algumas in-
dicações com relação a como minimizar o risco de rachaduras por corrosão devido a
tensão causada pelo efeito da amônia em contato com os materiais.
43
equivalente de HFO com base no seu poder calorı́fico inferior. Em comparação em
termos de quantidade de energia armazenada, um tanque de 1000 m³ de HFO, o
volume requerido para um tanque de amônia é cerca de 2,8 maior (MAN Energy,
2019). Cabe ressaltar, ainda, que os requisitos de capacidade dos tanques de ar-
mazenamento de amônia também sofrem influência da eficiência da combustão da
amônia.
A instalação de tanques de armazenamento de combustı́vel de maior capa-
cidade nos navios movidos à amônia pode resultar em perda de espaço de carga.
Para contornar esse problema, há a possibilidade de se reduzir o raio de ação da
embarcação, o que resultaria na redução dos intervalos de abastecimento. Contudo,
uma frequência de abastecimento mais alta impõe restrições à capacidade operacio-
nal da embarcação, o que impacta na geração de receitas.
Um estudo realizado sobre a aplicação de células de combustı́vel de hidrogênio
em rotas marı́timas internacionais de transporte de contêineres no Oceano Pacı́fico
indica, no entanto, que a perda de espaço de carga devido a tanques de combustı́vel
maiores provavelmente será muito limitada e que as paradas para reabastecimento
podem ser evitadas em troca de uma porcentagem muito pequena de perda de
espaço de carga, mesmo em rotas de longa distância (Jin et al., 2020). De acordo
com a DNV (2017), espera-se que um intervalo tı́pico de abastecimento para amônia
liquefeita provavelmente seja semelhante a navios movidos a LNG com duração de
semanas a meses.
O abastecimento de amônia pode ocorrer por meio de terminais ou navios
de abastecimento (bunkering ship). O carregamento e descarregamento seguro de
amônia em terminais é possı́vel, mas a segurança das instalações em terra pode ser
melhorada, caso o abastecimento ocorra por meio de um navio de abastecimento
(DNV, 2020a). Especialmente no caso de grandes quantidades de amônia, como
para navios que operam em longo curso, o uso de um navio de abastecimento deve
ser preferido, bem como em áreas densamente povoadas (DNV, 2020a).
Para uma expansão rápida e econômica do abastecimento de amônia, peque-
nos navios-tanque de gás podem ser convertidos em barcaças cisterna de amônia
(Alfa et al., 2020). O uso de navios de abastecimento também foi aplicado para
LNG, a fim de reduzir os custos de investimento em infraestrutura de abastecimento
44
e proporcionar flexibilidade. De acordo com o código IGF, os tanques tipo A (to-
talmente refrigerados) e C (semi ou totalmente pressurizados) são utilizados para
o transporte de amônia como carga e também podem ser usados como tanques de
combustı́vel (Cames et al., 2021). As condições de temperatura e pressão do tanque
de amônia a bordo podem nem sempre ser as mesmas condições de armazenamento
do navio ou terminal de abastecimento. A DNV (2020a) recomenda o uso de tanques
pressurizados, pois permitiria o abastecimento de navios (com tanques pressurizados
ou semi-refrigerados) sem grandes modificações. Além disso, um tanque pressuri-
zado Tipo C também permite uma instalação flexı́vel no convés ou em um projeto
integrado de um navio (Alfa et al., 2020).
45
5. CONCLUSÕES
Com o aumento da utilização do transporte, nos últimos anos, seja para lo-
comoção ou para o comércio, tem sido observada uma crescente preocupação com
o aumento das emissões dos GEE, provenientes do consumo de combustı́veis fósseis
em motores a combustão. Esse aumento das emissões foi percebido, também, na
indústria de tranportes marı́timos, o que impulsionou a IMO a desenvolver es-
tratégias com objetivo diminuir as emissões de GEE e, para atingir esses objetivos,
a IMO se propôs a identificar medidas de curto, médio e longo prazo. Dentre as
opções em estudo para a redução das emissões de GEE, a utilização de combustı́veis
alternativos em substituição ou composição com os combustı́veis fósseis tem recebido
especial atenção da indústria marı́tima.
Assim, dentro desse cenário, alguns combustı́veis alternativos vêm sendo con-
siderados na indústria marı́tima, dentre os quais podem ser citados o LNG, metanol,
LPG, HVO, hidrogênio e amônia. Dessa maneira, dentre as opções em estudo pela
indústria marı́tima atualmente, a amônia se apresenta como a alternativa mais pro-
missora para a substituição dos combustı́veis fósseis no que tange à redução das
emissões de gases poluentes por ser um combustı́vel livre de carbono em sua com-
posição. Isso por conta, também, do enorme potencial oferecido pela infraestrutura
de produção e logı́stica já existente, bem como de suas qualidades superiores como
armazenadora e portadora de hidrogênio.
A amônia é uma substância amplamente comercializada e possui utilização
em diversos setores. Além disso, já existe uma infraestrutura bem madura de
produção, bem como uma logı́stica estruturada para o transporte tanto marı́timo,
quanto terrestre, da amônia, considerando-se que diversos portos ao redor do mundo
já realizam seu manuseio e armazenagem. Tal infraestrutura torna a amônia uma
forte canditada a se tornar um combustı́vel alternativo no transporte marı́timo.
Apesar das vantagens da amônia mencionadas, existem alguns desafios tec-
nológicos que precisam ser analisados e vencidos para a utilização da amônia como
combustı́vel marı́timo, tais como a sua combustão em motores Diesel, sua alta toxi-
cidade e corrosividade, a questão da segurança do manuseio a bordo, a armazenagem
a bordo e o procedimento de abastecimento de amônia a bordo.
Conclui-se, então, que a amônia é um combustı́vel muito promissor do ponto
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de vista da redução das emissões de gases poluentes, de ser uma portadora e amaze-
nadora de hidrogênio e de sua infraestrutura de produção e logı́stica já estabelecida.
Contudo, devido aos desafios tecnológicos que ainda precisam ser vencidos, a sua
implementação na indústria de transportes marı́timos ainda deve demorar a acon-
tecer, tendo uma previsão para o final desta década. Além disso, é evidente que,
caso a amônia seja de fato adotada como combustı́vel no transporte marı́timo, novos
investimentos e desenvolvimentos deverão ser feitos para que se atenda à demanda
esperada. Entretanto, o fato de existir uma infraestrutura tanto de produção quanto
de logı́stica já implementada, representa uma vantagem comparativa importante em
relação às demais alternativas atualmente existentes. Sendo assim, espera-se que,
com o desenvolvimento tecnológico da indústria de transportes marı́timos, possibi-
lidades para trabalhos futuros poderiam envolver uma análise detalhada da perda
de espaço de carga devido aos tanques de amônia a bordo da embarcação se com-
parado aos tanques de combustı́veis marı́timos convencionais. Além disso, poderia
ser feito um estudo comparativo entre o custo de implementação de um sistema
propulsivo utilizando amônia como combustı́vel e outros combustı́veis alternativos
concorrentes.
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