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“[...] a apropriação do espaço por seus moradores através de uma resposta (pró)ativa,
ação e proposição em escala 1:1.” p16
Citação de
Borriaud, Nicolas, Postproduction, 2002:89
e Maier, Julia/Rick, Matthias, Raumlaborberlin. Acting in Public, 2008: editorial.
“‘Participar é completar um esquema proposto.’ Tomamos participação como a chave
para definir e entender o espaço urbano (em oposição à noção de transmissão e recepção
separadas). Coletividade – viver junto na cidade – serve como uma base para se
repensar questão sociais em termos urbanísticos: ‘a cidade é nosso potencial, e nós
somos seus construtores’.” p20
Citação de
Maier, Julia/Rick, Matthias, Raumlaborberlin. Acting in Public, 2008: editorial.
“A arquitetura pode ser definida em um nível mais amplo, como ‘espaço articulado, no
qual a vida cultural e social podem se desdobrar’. Se entendermos a arquitetura como
uma disciplina capaz de reagir em relação aos padrões urbanos (em constante mudança),
concentrando-se no espaço como elemento chave para trabalhar, poderemos revelar
campos urbanos específicos a partir da produção social do espaço (Raum) e um
repertório coerente as necessidades de planejamento urbano de nosso tempo.” p20
“Mas o que essa velocidade e vastidão significam tanto para aqueles que habitam
quanto para os que constroem a cidade? Como o modelo de urbanidade que apoiou a
existência humana durante séculos nos serve para compreender a forma emergente
cityness que o novo século de urbanização global maciça está apresentando? Qual é a
relação complexa entre forma urbana e vida na cidade; como intervir e gerar mudança
positiva? Essas são algumas perguntas que meus colegas e eu temos tratado no Urban
Age Programme da London School of Economics nos anos recentes, concentrando-nos
nas interações entre o físico e o social e alguma das maiores cidades ‘globais’, como
Istambul, Mumbai, São Paulo e Londres. Mas, quanto mais trabalho nessas questões,
mais percebo que há questões mais profundas sobre o descompasso da relação entre a
experiência individual do morador urbano e a macroescala da cidade. A política urbana,
ao que parece, define-se amplamente segundo um paradigma funcional que tenta
quantificar nossa experiência diária, em vez de estabelecer um conjunto de valores
humanos ou mesmo existenciais.” p116
“[...] No Egito, uma criança nasce a cada 20 segundos, e muitas pessoas mudam para o
Cairo no espaço de uma geração. Nessa cidade, mais de 60% da população vive em
assentamentos informais com edifícios de até 14 andares em uma cidade com apenas 1
metro quadrado de espaço aberto por pessoa (cada londrino, em contraste, tem acesso a
50 vezes essa quantidade).” p118
BUSENKELL, Michaela. O fluxo de Tóquio = Tokyo Fluxus, in:
Microplanejamento: práticas urbanas criativas = Microplanning, Urban
Creative Practices. – São Paulo: Editora Cultura, 2011.
“[...] Tóquio está na maior região metropolitana do mundo. Cada distrito possui
administração independente, como se fosse outra cidade. Isso resulta um grande número
de centros diferentes, com características bem distintas. E só por essa razão parece
impossível fazer qualquer generalização sobre a metrópole. A única constante que
caracteriza a cidade como um todo parece ser a mudança e a transformação contínuas.
[...]” p124
“[...] Mas os arquitetos mais jovens não estão interessados em repetir formas ou em
desenvolver uma arquitetura emblemática – como é o caso de Venturi –, e sim em
entender o comportamento e as necessidades de moradores urbanos a partir de
impressões da vida diária, e de lembrar-se delas enquanto planejam novos espaços.”
p128
“[...] A vida social acontece fora, na cidade, e a cobertura da casa deve se abrir para a
cidade; as fronteiras entre casa e cidade se tornam permeáveis. A questão é a mudança
de relacionamentos em todos os aspectos: hoje, a casa é, frequentemente, mais uma
cabana que um espaço fechado. [...]” p130
“[...] Morar na cidade significa, acima de tudo, tirar vantagem das possibilidades
oferecidas pelo lugar, com o objetivo de ficar ativo e viver sem vínculos. Para esse fim,
uma arquitetura provisória é suficiente.” p130
“As ações macro/micro, top down/bottom up, plano/tática podem ser compreendidas
enquanto dicotomias. No texto, essa ideia é trabalhada na acepção filosófica da dialética
platônica, ‘repartição de um conceito em dois outros, geralmente contrários e
complementares’. Essa compreensão nos sugere superar o debate que de forma pendular
apresenta ‘este’ como alternativa a ‘aquele’, para nos lançar à reflexão sobre quais são
os pontos de contato que permitem o emparelhamento dessas ações.” p136
“Em termos urbanos, no caso de São Paulo, é difícil encontrar algo mais dicotômico do
que os atributos que caracterizam os grandes sistemas de engenharia. Reconhecemos a
sua importância enquanto elementos de articulação do espaço metropolitano, na mesma
medida da sua capacidade de esgarçamento dos tecidos urbanos pelos quais atravessam.
[...] Sua natureza sistêmica resulta de uma organização de partes e elementos
inter-relacionados que os fazem funcionar de forma conjunta, mas muitas vezes
desconsideram os lugares por onde passam, sem criar nenhum tipo de enraizamento,
tampouco oferecendo os seus serviços a esses mesmos setores. [...] E, curiosamente, é
ao longo dessas redes que encontramos os mais instigantes exemplos de como a
população transforma espontaneamente, por vezes de forma transgressora, artefatos
técnicos em lugares ativos para a vida cotidiana. [...]” p136
“Não se trata de apropriação usual de espaços residuais. Nesse caso, o que ocorre é a
ressignificação de uma infraestrutura urbana reativada a partir de suas características
intrínsecas de suspensão do solo, linearidade e de acolhimento de fluxos. [...]” p140
“Há quem diga que sistema viário expresso se transforma em espaço público, mas não
nos parece correto fazer tal afirmação. O Minhocão é um artefato técnico ao qual,
temporariamente, lhe é atribuído um valor de ‘domínio público’. Essa é uma distinção
importante a registrar.” p142
“Navegar sobre as imagens de satélite de São Paulo nos permite reconhecer a existência
de uma infinidade de campos de futebol espalhados pelas áreas periféricas. Áreas de
grandes proporções contrastam com a densidade dos setores subnormais fragmentados
que os circundam. Ocupam os melhores terrenos, planos e ensolarados. Curiosamente
não são tomados para a habitação ilegal. Muitas vezes são construídos pelos
proprietários dos terrenos para ser disponibilizados à população. O intuito é evitar a
invasão. Em um contexto em que as relações são usualmente mediadas pela violência, a
construção do campo de futebol é uma estratégia de negociação pacífica. Troca-se a
integridade de uma posse fundiária particular pela franquia a uma atividade de elevado
valor coletivo.” p142
“Os espaços lineares de fluxo abrigam e potencializam essa dinâmica, o que nos ajuda a
compreender por que um espaço árido, inóspito e repudiado pela opinião pública é
intensamente ocupado por atividades lúdicas, de maneira mais intensa do que a
encontrada nas praças formais da área central.” p144
“A mudança paradigmática de métodos top-down (de cima para baixo) para práticas
bottom-up (de baixo para cima) pode ser considerada a inovação mais importante em
planejamento urbano, para a realização da ‘cidade inclusiva’. Participação, autoajuda
assistida e transferência de poder a atores locais têm sido amplamente reconhecidas
como pré-requisitos para ‘a boa governança urbana’ e para a integração de grupos
marginalizados com igual participação no espaço urbano. Assim, com o reconhecimento
de processos informais, construções independentes, organizações comunitárias como
forças propulsoras da ativação e renovação do território urbano negligenciado, as
municipalidades começaram a constatar o potencial do microurbanismo incorporando
iniciativas de interessados locais em seus programas oficiais e estratégias de
urbanização.” p150
“[...] As letras que formam a palavra ‘dignidade’ colocadas no meio da rua não são
apenas uma manifestação de um grupo de ativistas políticos, mas também um apelo
para a reorganização do espaço urbano, dando prioridade ao direito de cada morador.”
p154
“[...] Por definição, o papel dos representantes oficiais é agir de acordo com programa
que foi estabelecido pela política e agenda públicas. As iniciativas municipais precisam
seguir os interesses dos habitantes da cidade na íntegra, enquanto o papel do ativista
político se limita a representar os direitos de partes negligenciadas da população. O
governo municipal opera pelas estruturas administrativas complexas e instrumentos
analíticos, enquanto os interessados locais se mobilizam com base em organizações
comunitárias e no apoio mútuo. [...]” p156
“Se a noção de publicidade (Öffentlichkeit) um dia já foi pensada por alguns teóricos,
como Jürgen Habermas ou Hannah Arendt, como caráter ou o sentido público de algo,
como a condição desse algo tornar-se público, ou seja, se um dia essa noção já foi
pensada dentro da esfera de interesses principalmente públicos, hoje o termo
publicidade está inequivocamente ligado a propaganda, marketing, merchandising, é a
‘voz’ do mercado, com interesses prioritariamente privados. O que já foi pensado
enquanto opinião pública, debate público ficou resumido à mera pesquisa de mercado,
cujo principal objetivo é atuar como uma eficiente fábrica de consensos. Na atual fase
da sociedade do espetáculo não há, de fato, lugar para qualquer tipo de espaço de
dissensual ou contra-hegemônico, o que resulta no empobrecimento da própria
experiência urbana, em particular da experiência sensível e corporal das cidades, aquilo
que vai além da pura visualidade imagética. O consenso busca também uma
homogeneização das sensibilidades, das diferentes formas de ‘partilha do sensível’,
como diz Jacques Rancière.” p164
“Os projetos urbanos contemporâneos são realizados no mundo inteiro segundo uma
mesma estratégia: homogeneizadora, espetacular e consensual. Esses buscam
transformar os espaços públicos em cenários, espaços desencarnados, fachadas sem
corpo: pura imagem publicitária. As cidades cenográficas contemporâneas estão cada
dia mais padronizadas e uniformizadas. As imagens de marca de cidades distintas (e
seus cartões-postais), com culturas singulares, se parecem cada vez mais entre si. Isso já
ocorre com os espaços padronizados das cadeiras dos grandes hotéis internacionais ou,
dos aeroportos, das redes de fast-food, dos shopping centers, dos parques temáticos, dos
condomínios fechados e demais espaços privatizados. As intervenções contemporâneas
sobre os territórios ditos históricos ou culturais também obedecem a esse ritmo de
produção, o que cria uma superambulância mundial de cenários e simulacros para os
turistas. [...] Hoje, paradoxalmente, a referência do espaço público ‘de qualidade’ passa
a ser um espaço privado, na maior parte das vezes, espaço interno, cercado e com
segurança privada.” p164
“Quais seriam, então, as resistências ou desvios possíveis a esse processo? [...] Essas
alternativas passariam então, necessariamente, pela ação, pela experiência corporal na
cidade. [...]” p166
“[...] A cidade vivida – que corresponde a essa ‘outra cidade’ escondida, ocultada,
apagada ou tornada opaca por todas essas estratégias de marketing que criam imagens
urbanas pacificadas e consensuais – existe e resiste por trás de todos os cartões postais
de cidades espetaculares contemporâneas, e a sua experiência pode ser vista como uma
forma de resistência ao processo de espetacularização.[...]” p168
“Podemos pensar que os conflitos urbanos não só precisam ser considerados como
legítimos e necessários, mas que é exatamente da permanência da tensão instaurada por
eles que depende a construção de uma cidade menos cenográfica (espetacular), que
mistura permanentemente, embaralha e tensiona as fronteiras entre espaços opacos e
luminosos (lisos e estriados, nômades e sedentários), mantendo entre eles o que
podemos chamar de ‘zonas de tensão’, ou seja, precisamos urgentemente aprender a
trabalhar com os conflitos e a manter essas tensões no espaço público, aprender a
melhor agenciá-los, atualizá-los e incorporá-los nas teorias e práticas urbanas, é a arte
crítica – a experiência sensível enquanto microresistências sobre ou no espaço público –
pode vir a ser, efetivamente, uma grande aliada. Talvez os artistas, que já trabalham
criticamente com essas ‘zonas de tensão’, possam efetivamente nos ajudar a inventar –
recuperando as nossas três questões-pontos de partir desse texto – um urbanismo mais
incorporado, dissensual e vivaz.” p172
“[...] Entendo por ‘intervenções políticas’ aquelas estratégias de narração que, em vez
de consolidar laços com o mundo do comércio, nascem contrário, por uma vida urbana
cotidiana.” p192
“[...] Até agora, nenhuma das reformas e intervenções em grande escala resultou em um
modelo de cidade mais viável, amplamente aplicado e justo do que aquele que produziu
as assimetrias das cidades no Hemisfério Sul. Iniciativas que envolvem a rápida
mudança em larga escala – a demolição de favelas, a transferência de populações,
infusões de dinheiro para as grandes obras públicas – em geral fracassaram, porque um
sistema complexo como uma cidade dificilmente absorve grandes mudanças de uma só
vez. Além disso, o desafio da mudança refere-se menos aos recursos disponíveis ou à
possibilidade técnica e mais à mudança filosófica e cultural – mudança no estilo e na
expectativa de vida.” p200
“A falta de teorias capazes de lidar com novos fenómenos urbanos é evidente. Este texto
introduz uma abordagem arquitetônica a estratégias urbanas e definir o performativo
como uma forma de lidar com o desenho urbano, aproveitando esse aspecto básico da
arquitetura, qualquer que seja a escala que esta possa abranger. Isso leva a uma
abordagem arquitetônica do urbanismo, com ênfase na relação entre substância espacial
e contingência, que é uma das diferenças produtivas em urbanismo.” p214
“O espaço não é algo exterior ao indivíduo, mas um meio (centrado) baseado em torno
dele. A sociedade coletiva gera espaço/espaços como um produto social. Além de
enfocar o aspecto social, definimos espaço em um sentido antropológico, como uma
extensão do corpo humano, ou como uma interpretação do mundo orientada para o
corpo. [...]” p216-218
“Além disso, é óbvio que a arquitetura não pode ser reduzida a objetos arquitetônicos
canonizados – edifícios, espaços abertos formalmente desenhados etc, Como vimos nos
casos de microintervenções coletadas neste livro, muitas delas poderiam não ser
consideradas arquitetura, no sentido convencional. No entanto, são arquitetura por
articularem espaço e criarem uma expressão especial de um ambiente social. Dão vida
às fronteiras e ativam espaços vazios; projetam seu ambiente espacial de modo
produtivo, possibilitando que as pessoas locais o habitem.” p222