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“Onde já se viu moça de família trabalhar, você é escrava por acaso”

“Tem que arranjar um marido, o filho mais velho do duque está solteiro”
“Você é linda, mas deveria sorrir mais, assim os homens nunca irão se apaixonar por você”
Era só o que eu escutava, mas afinal, o que uma moça deveria fazer, os tempos são modernos, mas os
costumes não, eu vivo no ano de 1915, onde mulher fica em casa e arranja marido e filhos.
Mas eu não sou assim, eu quero trabalhar e me ver livre para fazer minhas próprias escolhas, quero sair
de casa e viver uma vida que eu não tenha que planejar nada, não tenha que pensar em casar e ter
filhos, viver só eu e minhas ideias. Bem, não é bem assim, não agora. O futuro é algo realmente
extraordinario, que pode mudar o mundo.

1 de Setembro de 1915.
-Kallia- minha mãe gritava meu nome pela casa- Kallia, venha já aqui.
-Sim mamãe, já estou indo- gritei em resposta
-Moças não gritam- Lauren me repreendeu
-A mamãe, a senhora também gritou- a lembrei, cuja qual me olhou com cara fechada
-Filha- me olhou seria- sua professora de etiqueta chegou, e pediu que a encontrasse na biblioteca
-Que maravilha, mais uma vez aprender a andar com livros na cabeça. Mamãe, eu ando perfeitamente
bem, a senhora mesma fala isso, converse com a senhorita Kafir para mudar o exercício, por favor.
-Sim meu amor, falarei com ela- mamãe respondeu me fazendo sorrir com satisfação
-Então- beijei seu rosto-deixe-me ir a minha aula. Me retirei da sala e fui em direção a biblioteca
-Kallia- senhorita Kafir me olhou com desaprovação- está terrivelmente atrasada
-Senhorita Kafir, peço desculpas, esta lendo um livro e perdi a noção do tempo-menti
-Livro?
-Sim senhorita
-Qual?- ela não deixaria passar batido
-A arte da mulher em sua casa e mulher, uma vida a se viver com o marido
-Livros bons- ela sorriu acreditando- agora vamos a aula, livros na cabeça.
Após uma hora de “livros na cabeça” minha mãe entrou na biblioteca
-Senhorita Kafir- cumprimentou
-Senhora Jackson- respondeu minha professora
-Gostaria de falar com a senhorita sobre as aulas de Kallia
-Pois sim?
-Acho que podemos interromper as aulas de postura, ela anda perfeitamente bem, e se senta ereta e com
postura
-Sim senhora
-Vamos passar para outras aulas, sim?
-Sim senhora, que tal culinaria?- as duas me olharam
-Claro- forcei um sorriso, as duas sorriram satisfeitas e mamãe saiu da sala
-Bem senhorita, a aula de hoje chegou ao fim, a vejo amanha mesmo horario- Senhorita Kafir sorriu
-Sim senhorita, agora se me der licença, eu irei ler um pouco perto do caramanchão.

Ler sempre foi um prazer para mim, isso era a única coisa em que “moça de família deve fazer” que eu
não reclamava nem um pouco.
Não fui ler perto do caramanchão, eu fui para um lugar mais tranquilo, fui para a beira do rio, mamãe
nunca gostou que eu ficasse por esses lados de nossas terras, mas eu gostava, precisava daquele silencio
e sossego.

Estava concentrada lendo um romance de Jane Austen quando alguém sentou-se ao meu lado
-Uma moça não pode andar sozinha por ai- eu reconhecia essa voz
-Papai- larguei o livro e o abracei- estava com tantas saudades
-Também minha princesa- Ian, meu pai Barão e chefe da guarda real, ele e meu irmão Pedro haviam
ido em uma viagem de duas semanas para um país vizinho em um tratado de paz
-Onde está Pedro papai?- levantei em um pulo arrumando meu vestido
-Está com um amigo que veio passar uns dias em nossa residencia
-Que amigo?
-Guilherme, eles são amigos de faculdade
-A sim, o famoso Guigo- sorri- então, deixe-me aprontar-me para o almoço,me acompanha nobre
cavalheiro?
-Sim bela dama- papai sorriu- eu trouxe um presente para minha garotinha
-Não sendo um vestido de casamento- os dois rimos e voltamos para a casa grande conversando sobre
a viagem.
Fui para meu quarto e logo Alma entrou, Alma era a minha acompanhante e melhor amiga, ela me
ajudou a tomar banho e trocar-me para o jantar
-O amigo de seu irmão, o senhor Dunkin, é um rapaz muito bonito – Alma falou enquanto penteava
meus cabelos
-Hm- foi a unica coisa que respondi
-Ele fala bem e aparentemente tem um otimo gosto literario- continuou- e eles estavam falando de vcoê
-O que ?- me virei para ela
-Senhor Dunkin gosta muito de Jane Austen, e Pedro estava falando o quanto você aprecia a mesma
-Oh, sim, ele tem um bom gosto literario.- virei-me de costa novamente para ela terminar o trabalho.

Sai de meu quarto e fui rumo a sala de jantar, todos se encontravam a mesa, papai na ponta, mamãe em
sua direita, Pedro a sua esquerda e o amigo de meu irmão, Guilherme ao lado do mesmo. Sentei ao lado
de minha mãe após o beijo no rosto de papai e um na testa de Pedro
-Bom dia- falei para todos a mesa
-Bom dia irmã, faz muito que não a via, estava com saudades- Pedro sorriu, com seu sorriso branco e
caloroso
-Estava com saudades também querido irmão- respondi e continuei- espero que tenha-me trago
presentes
-Kallia, tenha modos- minha mãe ralhou comigo
-Há como senti falta disso- Pedro riu- sim irmanzinha, trouxe presentes para você. Sorri batendo
palmas e então lembrei do menino ao lado de meu irmão
-Que falta de educação a minha, me perdoe, o senhor deve ser o amigo de meu irmão, Sr Dunkin
-Sim senhorita Jackson- ele respondeu- ouvi muito sobre a senhorita
-Digo o mesmo sobre o senhor- abri meu melhor sorriso, nisso o almoço seguiu com meu pai e Pedro
falando de suas aventuras. Após o almoço fomos todos para a sala de estar tomar uma xícara de café e
ouvir mais historias.

2 de setembro de 1915

Hoje eu começaria as aulas de culinaria, acordei cedo e Alma me ajudou com a vestimenta.
Desci para o café em família e logo seguir para minha aula, mais uma vez só faltava eu na mesa, sorri
desejando bom dia a todos, após o café fui para a cozinha e senhorita Kafir já estava a minha espera
-Bom dia Kallia- ela sorriu
-Bom dia senhorita Kafir, já tomou seu café ?- perguntei sentando-me em um dos bancos perto do
balcão.
-Sim, vamos começar com a aula?
-Claro.
A aula foi melhor do que eu imaginava, descobri um gosto especial para a culinaria, assim que a aula
acabou, descobri que já estava perto da hora do almoço, então lavei minhas mãos e corri para a sala de
jantar, papai e o senhor Dunkin já estavam a mesa conversando alegremente, assim que os dois me
viram levantaram para me cumprimentar, sorri para o senhor Dunkin e dei um beijo em papai, sentei-
me a mesa e comecei a participar da conversa.
-Mas senhor Dunkin- ele me cortou
-Por favor senhorita Jackson, me chame de Guilherme- pediu, abri um sorriso
-Só se me chamar de Kallia
-Claro Kallia- rimos e prosseguimos a conversa
-Então Guilherme, você faz o que da vida?
-No momento, trabalho para seu pai
-Como o braço direito do braço direito- Pedro entrou na sala sorrindo- Irmã
-Lindo- lhe dei um beijo na bochecha
-Papai
-Filho
-Guigo
-Pedro. Meu irmão se juntou a nós na conversa ate nossa mãe chegar e servir o almoço, percebi o
quanto eles estavam me valorizando para Guilherme e já não estava gostando disso. O almoço
terminou, pedi licença, e fui para a beira do riacho ler, tranquila e perdida nas paginas de Orgulho e
Preconceito, não escutei Guilherme se aproximar.
-Um livro que particularmente gostei, as escritas de Jane são imprecionantes- sentou-se a meu lado
-E eu achei extremamente peculiar seu gosto literário- respondi olhando a água cristalina
-E um homem não pode gostar de romance?
-Claro que pode, mas é tão estranho- sorri
-Não mais do que uma menina que foge de passar horas e horas conversando e falando sobre vestidos e
festas.

-Não sou dessas, prefiro um bom livro e sentir a água correndo por meus pés.
-Percebi, por que saiu quase correndo da mesa?
-Vocês iam falar sobre politicas e guerras, preferi sair
-Sim, teve esse assunto- ele sorriu
-Vai ficar aqui ate quando Guigo?
-Não sei bem, acho que ate seu pai viajar novamente
-Ah, entendo- olhei para ele e sorri- acho melhor entrar-mos, logo minha mãe me chama. Levantei em
um pulo, quando meu pé se prendeu um uma raiz fazendo eu cair dentro D'água, especialmente aquele
momento a correntesa estava forte e eu estava tão assustada que não conseguia nadar e me salvar e foi
ai que senti alguém me agarrar me levando para a beira
-Kallia... Kallia- Guilherme gritava desesperado- Kallia respira. Senti uma forte pressão em meu peito e
então joguei fora toda a água que estava presa em minha garganta e eu nem havia sentido.
-Graças a Deus- Guilherme se jogou a meu lado
-Meu Deus, que coisa louca- respirei fundo- Amei. Guigo me olhou como se fosse louca balançou a
cabeça com raiva e saiu andando sem me esperar. Chegando em casa fui direto para os fundos atrás de
Alma, mamãe não poderia me ver assim, ela surtaria. Alma me conseguiu roupas leves e verificou de
mamãe não estava na sala, para que eu pudesse subir ate meus aposentos e me vestir, ela voltou
falando-me que só Guilherme e Pedro estavam na sala, corri escada a cima sem olhar para eles, Alma
me seguiu e ajudou-me a vestir minhas vestes
-Mas como isso aconteceu Kalli?- Alma finalmente perguntou- Primeiro o senhor Dunkin chega
molhado e agora você
-Eu cai no riacho e ele me salvou – respondi sem muito entusiasmo
-Ele, o senhor lindo de morrer Dunkin salvou você e é esse entusiasmo que ganhamos?- ela parou de
apertar meu corpete
-Alma, aperta, ou minha mãe ira brigar com você- reclamei
-Tudo bem, mas me conta como foi?- pediu, então contei
-E no final ele ficou bravo com o meu comentário e saiu andando sem olhar para traz
-Eu entendo ele, afinal, ele ficou todo preocupado, e você nem ligou para sua própria vida
-Alma, não aconteceu nada de mais, era melhor brincar do que ficar me lamentando
-Não acho- ela deu um forte puxão e amarrou o corpete- Aqui seu vestido senhorita.
Pelo visto Alma também estava chateada comigo, ela me ajudou a vestir o vestido em completo
silencio, a dispensei e eu mesma arrumei meu cabelo, o prendendo em um coque perfeito, sai do quarto
e encontrei Guilherme prestes a bater em minha porta
-Senhorita- ele falou, respirou fundo e continuou- mil perdoes por sair e a deixar sozinha naquele
estado.
-Guilherme, eu que peço desculpas, pela forma que agi, sei que uma moça não deve se comportar de tal
forma, entendo seu modo de pensar, foi infantil e irracional- a cada palavra que eu dizia, eu me batia
por dentro, não acreditava nisso, mas tinha que agir assim, ou seria julgada, não que eu me importasse
com isso, mas minha mãe se importa, e se importa muito.
-Acho que os dois tem culpa- ele passou a mão em seu cabelo e abriu um sorriso de lado
-Sim, acho que sim
-Então, tendo isso em conta, a chamo para dar um passeio comigo na cidade, quero conhecer, e Pedro
não quer ser visto com um homem tão feio quanto eu, segundo ele espantara as mulheres
-Então tendo isso em conta eu não aceito, não quero ser vista com pessoas feias- ri – só irei avisar
minha mãe.
-Estarei esperando na carruagem- Guigo saiu e eu fui para a biblioteca atrás de minha mãe, a encontrei
lendo o manual da boa esposa
-Mamãe- falei baixo
-Sim meu amor?- ela fechou o livro e me olhou
-Senhor Dunkin me chamou para ir a cidade, eu poderia acompanha-lo ?
-Claro minha filha- o rosto dela se iluminou – Você está linda, pode ir assim mesmo, precisa de
dinheiro para comprar algo la?
-Não, só irei acompanhar o senhor Guilherme
-Não se preocupem em voltar para o jantar, jantem naquele restaurante no centro
-Sim mamãe, ate mais- sai da sala e fui para a porta, a carruagem já estava la, Guilherme abriu a porta
para mim e me ajudou a entrar
-Para onde senhores?- Francis, nosso chofer perguntou
-Cidade Francis, por favor- respondi – Mamãe disse para experimentarmos a comida de um restaurante
onde o dono é amigo nosso
-Claro, sera um prazer jantar com a senhorita- Guilherme sorriu e nisso se engatou uma conversa
animada e muito boa, chegamos a cidade e logo as amigas de minha mãe e suas filhas se aproximaram
para falar “comigo”
-Kalli, você está tão aérea querida- Joana Felling falou sorrindo para mim
-Desculpe, estava pensando na vida- respondi
-Como consegue, com um homem lindo desse?
-Consigo o que Joana?
-Ficar pensando na vida?- isso estava me irritando
-Simples, eu não fico só pensando em macho como você- falei e me virei para Guilherme- Guigo,
vamos, ou vai ficar tarde.
-Claro, ate mais senhoritas- ele pegou em minha mão e me levou na primeira loja em que vimos-
Obrigada, elas estavam me sufocando
-Imagino, essas meninas sentem fogo na saia quando vêem um homem- reviro os olhos
-Deu para perceber, você quer algo?
-Não, obrigado
-Um vestido ?
-Tenho vários
-Um perfume ?
-Não
-Um calçado?
-Não
-Tudo bem então- ele riu, andamos por lojas e mais lojas, fomos no restaurante e logo passamos a
biblioteca, Guilherme foi procurar uns livros para ele e eu fiquei rodando ate parar em um estante onde
havia um livro diferente de qualquer um que eu tenha visto, sua capa era dura, com letras douradas de
autor anónimo, seu titulo que mais me chamou a atenção, era uma simples palavra mas que me fez
querer o livro “Mulher” só isso, me xinguei internamente por não ter pego dinheiro e fiquei la
namorando aquele livro
-Você quer ele?- Guilherme apareceu atrás de mim
-Oh Jesus não faça mais isso- sorri com a mão no coração- Sim, depois venho com dinheiro e compro
-Se quer assim- ele disse dando de ombros- vamos ?
-Claro.
-Só irei pagar esses livros
-Tudo bem, irei esperar na carruagem – sai de lá e fui me encontrar com Francis, que nos esperava na
carruagem
-Senhorita?- abriu a porta para mim
-Obrigado Francis – me sentei e olhei para o teto, repassei todo o dia de hoje e ri comigo mesma, afinal
de tudo, ate que a água estava boa para um banho.

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