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Estudo produzido pelo prof.

Tércio Machado Siqueira, professor de Antigo


Testamento da FaTeo

Primeira parte: o medo do rei Acaz e o anúncio do Imanuel

A. Cenário histórico

O rei Acaz reinou Judá entre os anos 736 a 7l6 anos antes do nascimento de Jesus. Em
outras palavras, é o fim do século VIII a.C. O governo de Acaz estava medroso diante
das pressões internacionais (Is 7,1-9). Ao mesmo tempo, ele estava confiante na
promessa feita por Natã (por volta do ano 1000 a.C.), de que Deus daria e protegeria a
dinastia de Davi para sempre (2 Sm 7,1-17). Certamente, o rei Acaz sentia-se amparado
pelas palavras: Eu te livrarei de todos os teus inimigos (verso 11); Farei permanecer a
tua linhagem ... e firmarei tua realeza (verso 12); Estabelecerei para sempre o seu trono
(verso 13); A minha proteção não se afastará dele (verso 15); A tua casa e a tua realeza
subsistirão para sempre (verso16). Essa promessa lhe trazia muita confiança, bem como
a certeza de que os assírios não teriam sucesso no intento de invadir, dominar a cidade
de Jerusalém e destituir o rei Acaz. Entretanto, no ano 735-734 a.C., o profeta Isaías
adverte Acaz por seu medo diante da ameaça dos inimigos e sua atitude de não confiar
em Deus. Essa constatação está registrada em Isaías 7,1-9. Para o profeta, essa atitude
não era própria para um servo de Deus. A fé bíblica não legitima o medo (Sl 46).

(1) E aconteceu nos dias de Acaz, filho de Jotão, filho de Uzias, rei de Judá, subiu
Rezin, rei de Aram, e Peca, filho de Remalias, rei de Israel, a Jerusalém para a guerra
contra ela, mas não prevaleceu guerreando contra ela.

(2) E foi anunciado à casa de Davi, dizendo: Aram estabeleceu-se em Efraim. E fez
tremer seu coração e o coração de seu povo como tremem as árvores da mata diante do
vento.

(3) E disse Javé a Isaías: vai agora para encontrar Acaz, tu e um Um-resto-volta, teu
filho, para a extremidade do canal do Lago Superior, na estrada do campo do lavador

(4) e tu dize a ele:

Esteja atento
e tenha tranqüilidade;
não temas e
não vacila teu coração por causa dos dois tocos de achas fumegantes;
por causa do ardor da ira de Rezin e Aram
e o filho de Remalias:

(5) Por causa disso, atenção!

Aram,
Efraim e o filho de Remalia
planejaram contra ti maldade, dizendo:

(6) Subiremos contra Judá,


e amedrontemo-la,
e conquistemo-la para nós,
e instalaremos um rei em seu meio, o filho de Tabeal.

(7) Assim diz Adonai Javé:

Não erguerá!
e não acontecerá!

(8) Eis que!

O cabeça de Aram (é) Damasco,


O cabeça de Damasco (é) Rezim.
E em 65 anos, destruirá Efraim a partir do povo.

(9) E o cabeça de Efraim (é) Samaria,

e o cabeça de Samaria (é) o filho de Remalias.


Se não confiardes,
atenção!
Não permanecereis (Isaías 7,1-9)

Meditando sobre o texto

Esta reportagem sobre o encontro do profeta Isaías com o rei Acaz revela que havia um
conflito de opiniões entre os dois líderes. De um lado, o rei estava seguro e confiante no
seu cargo. Para ele, Deus concedeu à dinastia de seu ancestral Davi a segurança de que a
sua casa e a sua realeza subsistiriam para sempre (2Sm 7,1-17). Por conseguinte,
nenhum poder humano invadiria e tomaria o trono em Jerusalém. Por outro lado, estava
o profeta, recém chamado por Deus, para exercer uma missão muito difícil, em
Jerusalém. No relato de sua vocação, Isaías confessa assim: “Ai de mim, estou perdido!
Com efeito, sou homem de lábios impuros e vivo no meio de um povo de impuros
lábios” (Is 6,5). Isso significa que Deus chama Isaías para apontar erros na condução da
política dos reis que compõem a dinastia de Davi. O erro mais grave de Acaz era ter
medo das ameaças dos inimigos, isto é, não confiar em Deus (versos 2.4.6 e 9). O verso
9b é o cheque-mate do profeta: Se não confiardes, não permanecereis.

B. Cenário histórico: a auto-confiança de Acaz e o anúncio da queda da dinastia de


Davi.

Para o profeta Isaías, Acaz era incapaz e incompetente: ele confiava na promessa de
Natã à dinastia de Davi de que ela seria eterna. Isaías não entendia assim. O
cumprimento da promessa dependia da confiança que ele depositasse em Deus. A
palavra de Isaías é importante para entender a advertência profética: Se não confiardes
(...) não permanecereis (Is 7,9). A compreensão da próxima ação do profeta Isaías (Is
7,10-17) depende dessa afirmação.

(10) E acrescentou Javé uma palavra a Acaz dizendo:

(11) Pede para ti um sinal de Javé, teu Eloim;


Pede da profundeza;
ou pede da altura da de cima.

(12) E disse Acaz: Não pedirei e não testarei Javé.

(13)E disse:

Ouvi, agora, Casa de Davi!


Não vos basta cansardes homens?
Eis que! Quereis fatigas também meu Eloim?

(14)Por isso dará Adonai para vós um sinal.

Eis! A jovem mulher conceberá


e dará à luz um filho,
e chamará seu nome Imanuel.

(15) Leite coalhado e mel ele comerá

para que saiba rejeitar o mal


e escolher o bem.

(16) Eis que! Antes que saiba o rapaz rejeitar o mal

e escolher o bem,
será abandonada a terra cultivável
diante de cujos dois reis tu tens medo.

(17) Javé fará vir contra ti,

contra teu povo,


e contra a casa de teu pai,
dias como não vieram desde o dia
em que Efraim se afastou de Judá.
O rei da Assíria.

Meditando sobre o texto

A relutância do vaidoso rei Acaz, em não aceitar a ajuda de Deus, deveu-se à convicção
de que Deus protegeria a dinastia de Davi para sempre (2Sm 7,1-17). Todavia, o profeta
Isaías constata que o rei não estava sendo fiel a um princípio básico da fé: confiar em
Deus. Após essa constatação, o profeta faz um desafio ao rei: Pede um sinal a Javé, teu
Deus (Is 7,11). Para conhecer o significado desse desafio, é preciso analisar o sentido do
termo hebraico ot que é traduzido por sinal. No AT, a palavra ot, sinal, é
freqüentemente empregada como sinônimo dos termos:

(a) mopet, maravilha, milagre.

(...) com provas,


com sinais ot
e com milagres mopet,
e com peleja,
e com mão poderosa,
e com braço estendido
e com grande espanto (Dt 4,34).

(b) zikaron, memorial, lembrança.

E será como sinal, ot na tua mão,


E por memorial zikaron entre teus olhos (Ex 13,9).

(c) totapot, frontal

E isto será como sinal, ot, na tua mão,


E por frontais, totapot, entre os teus olhos (Ex 13,16)

(d) ´edut, testemunha, sinal de advertência.

Servirá de sinal ot,


E de testemunho, ´edut, a Javé (...) na terra do Egito (Is 19,20).

(e) masah, prova.

Das grandes provas masah que viram os teus olhos,


e dos sinais, ot, e maravilhas,
e mão poderosa e braço estendido (Dt 7,19).

Qual então foi a intenção de Isaías ao recomendar ao rei Acaz pedir um sinal ot de Javé?
(Is 7,11.14).

(1) Fica claro que o profeta Isaías usou o termo ot, sinal, com o sentido teológico. No
AT, as ocorrências de ot, sinal, estão mais concentradas nos relatos dos eventos
históricos do êxodo.

(2) O sinal, mencionado por Isaías, não é uma concessão de sabedoria ou poderes
mágicos, como encontrado em Gn 4,15; 9,12-13; Ex 7,3 e 13,9. Contudo, o emprego do
termo ot, sinal, visa motivar o rei Acaz a crer na ação de Javé em sua vida e na sua
política de governo. As últimas recomendações da perícope anterior substanciam este
argumento: Se não crerdes (...) não permanecereis (verso 9b).

(3) Por outro lado, a resposta do rei Acaz carrega um tom de irritação: Não pedirei e não
testarei a Javé (7,12). A irritação e a negação de Acaz mostram que o rei se fechou para
a palavra de Deus. Acaz está esquivando-se de assumir a fé. Ele mostra ser um bom
teólogo, pois interpreta bem a promessa de Natã (2Sm 7,1-17) e conhece as Escrituras
Sagradas (Ex 17,2.7; Dt 6,16).

(4) Na verdade, Acaz estava escondendo-se atrás de uma teologia montada sobre textos
piedosos para justificar o seu medo dos adversários. Tomar o caminho da fé não é tentar
Deus, mas acreditar no Seu sinal que traz Sua ação salvífica.
C. Cenário histórico:

O profeta Isaías, corajosamente, anunciou ao rei Acaz que Deus decidiu substituir a
promessa da dinastia de Davi pela promessa do Imanuel. O conteúdo dessa nova
promessa está definida no próprio nome Imanuel: conosco está Deus. Deus não estava
satisfeito com o governo empreendido pela dinastia de Davi. Os motivos dessa
espetacular substituição são claros no texto:

(1) Acaz tem medo dos inimigos;

(2) Acaz não quer confiar no sinal, isto é, no milagre da intervenção de Deus.

Como no sentido do termo sinal, a palavra Imanuel também carrega os sentidos


salvífico e pastoral. São argumentos em favor da substituição da dinastia de Davi pelo
Imanuel. Na verdade, Imanuel guarda e expressa o juízo de Deus sobre a corte de
Jerusalém. Na perícope de 7,10-17, o menino Imanuel vem também para julgar a Casa
de Davi e levá-la discernir entre o bem e o mal (v. 15b). O menino Imanuel virá ao
mundo para restabelecer a presença de Deus junto ao povo. A descrição do Imanuel é
feita por Isaías 9,1-6:

(1)O povo que andava em trevas viu uma grande luz, Uma luz raiou para os que
habitavam uma terra sombria.

(2)Multiplicasse o povo,

Deste-lhe grande alegria;


Eles alegram-se na tua presença,
Como alegram-se os ceifadores na ceifa (...)

(3)Porque o jugo que pesava sobre eles,

A canga posta sobre seus ombros,


O bastão do opressor,
Tu o despedaçaste (...).

(4)... todo calçado que pisa ruidosamente no chão,

toda veste que se revolve no sangue,


serão queimadas,
serão devoradas pelo fogo.

(5)Porque um menino nos nasceu,

Um filho nos foi dado;


Ele recebeu o poder sobre seus ombros,
E lhe foi dado este nome:
Conselheiro-maravilhoso,
Deus forte,
Pai eterno,
Príncipe da paz,
(6)para que se multiplique o poder,

assegurando o estabelecimento de uma paz sem fim (...)


firmando-o e consolidando-o
sobre o direito e sobre a justiça (...).
O amor ciumento de Javé dos Exércitos fará isso (Is 9,1-6).

Meditando sobre o texto

O texto de Isaías 9,1-6 define bem a situação econômica, político-social e religiosa da


população de Judá e Jerusalém. Ele a descreve como uma realidade feia (verso 1).
Entretanto, a partir do verso 2, o profeta anuncia a superação das dificuldades.
Normalmente, o leitor espera por soluções práticas e racionais, porém, o profeta Isaías
apresenta como a solução uma criança, aquela que viria trazer luz, alegria e libertação
para o povo. Parece que o profeta está na contra-mão da história, pois o novo líder da
nação seria uma criança (Is 7,3.14; 8,3.18; 9,6). Para os adultos, a criança nada resolve,
é incapaz e plenamente dependente. Governar é tarefa somente para as pessoas adultas,
fortes e intelectualmente capazes. Contudo, Deus planeja restaurar o mundo a partir da
fragilidade de uma criança. Isso significa que Ele dá mais importância ao exemplo de
uma criança amar e perdoar do que a de um adulto que raciocina segundo o seu
interesse particular.

Segunda parte

D. Cenário histórico

Miquéias foi um profeta contemporâneo de Isaías. Havia, porém, uma diferença entre
eles: Miquéias vivia e profetizava no campo, isto é, nas regiões que circundavam a
capital de Judá, Jerusalém. Vêm desse profeta essas palavras que pregou sobre a
esperança de um Messias. Miquéias não citou o nome Imanuel, mas sua expectativa
girava em torno da mesma figura que viria salvar o povo. O contexto da palavra
profética de Miquéias é a queda de Samaria (722 a.C.), o agressivo e inescrupuloso
domínio assírio e as demonstrações de infidelidade do povo israelita.

(1)E tu, Belém-Éfrata, pequena entre os clãs de Judá,

De ti sairá para mim aquele que governará Israel.


Suas origens são de tempos antigos,
de dias imemoráveis.

(2) (...)

(3) Ele erguerá e apascentará o rebanho pela força de Javé, pela glória do nome de seu
Deus. Eles se estabelecerão, pois então ele será grande até os confins da terra.(Mq 5,2-
5)

Meditando sobre o texto

É interessante observar que Miquéias continuava afirmar que o Messias viria de Belém
e que ele possuía as características de um pastor. Crescia e fortalecia a esperança de um
governo justo que conduziria povo com o cajado do pastor, negligenciando o uso do
cetro de ferro. Esse pronunciamento do profeta sugere que havia uma forte tensão entre
os que esperavam um messias guerreiro que comandaria a nação com o cetro de ferro e
os que aguardavam um messias que viesse governar o povo com as características de
um pastor. Para o profeta, o novo tempo esperado marcará o fim do sofrimento. A
característica desse novo tempo messiânico será o governo de paz.

Terceira parte

E. Cenário histórico: o germe justo anunciado na crise política do início do século


VI a.C.

A esperança de um salvador continuava viva no coração de um pequeno grupo de


pessoas, denominada resto ou remanescente (Is 7,3; Jr 8,3). Cem anos depois do profeta
Isaías, surgiu um profeta chamado Jeremias, em um momento muito grave da história
de Israel. O seu chamado deu-se em um difícil momento de transição política: os
assírios perderam o comando da política mundial para os babilônios. No ano 509 a.C.,
os babilônios invadiram as terras israelitas e exigiram total submissão aos seus
exércitos. Relutante, a população israelita, residente em Jerusalém, reagiu
negativamente à ordem dos inimigos invasores. O resultado foi a destruição da cidade
de Jerusalém e de seu Templo, o fim da monarquia e o exílio da nata da sociedade
israelita que residia na capital.

O profeta Jeremias, conhecedor das antigas promessas de salvação, exortou o povo a


confiar somente nas promessas de Deus.

Eis que dias virão, oráculo de Javé,


Em que suscitarei a Davi um germe justo:
Um rei reinará e agirá com inteligência
E exercerá na terra o direito e a justiça.
Em seus dias, Judá será salvo,
E Israel habitará em segurança.
Este é o nome com que o chamarão: Javé, nossa justiça. (Jr 23,5-6)

Meditando sobre o texto

Também Jeremias reafirma a esperança de um governo justo e inteligente, caracterizado


pelo exercício do direito e da justiça e proporcionando segurança e libertação a todo
povo. A designação do messias com o nome germe ou rebento justo é próprio de
Jeremias (23,5; 33,15) e está ligada a Isaías 11,1-2. A caracterização do germe justo está
perfeitamente afinada com o mais tradicional conceito de justiça do AT (conforme Jz
5,11). Aqui, o germe justo age com justiça e direito, providenciando segurança e
salvação ao povo. Por conseguinte, o profeta nega a legitimidade de um rei guerreiro e
conquistador violento, embora deixa claro que essa facção messiânica estava ativa entre
os residentes de Jerusalém, nos anos que antecederam o exílio babilônico. Fica claro
que o conceito de justiça, assumido por Jesus Cristo (conforme Mt 3,15), tem raízes
diretas com um movimento messiânico carregado e transmitido por um pequeno grupo
de crentes fiéis que os profetas chama de “remanescentes”.

Quarta parte
F. Cenário histórico: a chama da esperança messiânica não apaga entre os
exilados.

O povo israelita fora levado cativo para a Babilônia, pelos exércitos de Nabucodonosor,
em três levas:

em 597 a.C.;
em 587 a.C.;
em 592 a.C.

A destruição de Jerusalém e do Templo, o fim da monarquia e o exílio da liderança


político-religiosa da população israelita provocaram uma mudança radical na cabeça do
povo bíblico.

A Bíblia registra que dois profetas estavam entre os exilados, na Babilônia: Ezequiel e
um outro anônimo que nos deixou os capítulos 40-55, incluídos no livro de Isaías. Foi
em meio ao desespero e sofrimento do povo que Ezequiel fez este pronunciamento:

Tomarei do cimo do cedro,


Da extremidade dos seus ramos um broto
E plantá-lo-ei eu mesmo sobre monte alto e elevado.
Plantá-lo-ei sobre o alto monte de Israel.
Ele deitará ramos
E produzirá frutos, tornando-se cedro magnífico,
De modo que à sua sombra habitará toda espécie de pássaros,
À sombra dos seus ramos habitará toda sorte de aves.
E saberão todas as árvores do campo que eu, Javé,
é que abaixo a árvore alta
e exalto a árvore baixa;
que seco a árvore verde
e faço brotar a árvore seca.
Sim, eu, Javé, o disse e o faço. (Ez 17,22-24).
(...)

Suscitarei para eles um pastor que os apascentará, a saber, o meu servo Davi:
Ele os apascentará ,
Ele lhes servirá de pastor.(Ez 34,23-31).

Meditando sobre o texto

Em meio ao desespero e à angústia do povo exilado, Ezequiel reafirma a pregação dos


profetas que vieram antes dele. A atuação do messias seria semelhante a de um pastor. É
interessante constatar que o termo pastor, no AT, era também um título real e
governamental. Isso significa que o messias, anunciado no AT, também carrega
algumas características da realeza (conforme Ezequiel 34). Isso lança luzes sobre os
textos dos Evangelhos que mencionam Jesus como pastor e rei.

Reafirmando a esperança de um messias-pastor, Ezequiel fala de paz e de segurança


para todo o povo (verso 25); de ausência de guerra e abundante produção do fruto da
terra (versos 26-27).
Quinta parte

Cenário histórico

Por volta do ano 520 anos antes do nascimento de Jesus, o profeta Zacarias foi um
daqueles que levou a bandeira da esperança e da fé na vinda de um líder que pudesse
trazer justiça e paz para o povo, agora, abatido, dividido e desorganizado diante da
possibilidade de retornar à terra de Judá. Como um dos componentes de um dos grupos
que decidiu retornar do exílio para a terra, Zacarias anunciou alto e bom som a
esperança da chegado do messias salvador.

Exulta muito, filha de Sião!


Grita de alegria, filha de Jerusalém!
Eis que o teu rei vem a ti: Ele é justo e vitorioso.
Humilde, montado sobre um jumento,
sobre um jumentinho,
filho da jumenta.
Ele eliminará os carros de Efraim
e os cavalos de Jerusalém;
Será eliminado o arco de guerra.
Ele anunciará a paz às nações.
O seu domínio irá de mar a mar
E do rio às extremidades da terra (Zc 9,9-10).

Meditando sobre o texto

Zacarias inicia a sua pregação apelando para o povo abatido, diante das ruínas da cidade
e do Templo de Jerusalém, pelos sucessivos reveses políticos: Exulta! Grita de alegria!
(9,9). Como os outros profetas, anteriores a ele, sua pregação parecia não ter lógica. Ele
anunciava a vinda de um rei humilde, negando trazer os artefatos necessários para uma
guerra de conquista. O seu plano de governo é a justiça que restaura a vida dos humildes
e a sua palavra de ordem é o anúncio da paz às nações. Provavelmente, a maioria dos
ouvintes não entendeu este pronunciamento de Zacarias, pois o messias anunciado aqui
é tão singular e diferente de todos os reis existentes, mesmo Davi e Josias que possuíam
poder e exército. O perfil do rei-messias, aqui apresentado, aprofunda a idéia de um
governante esvaziado de toda pompa, poder e arma de morte. Mas essa idéia não é
novidade na pregação messiânica: Miquéias, no fim do século VIII a.C., afirmou que o
projeto do rei-messias era converter as espadas em relhas de arado e lanças em
podadeiras (4,3); Isaías também anunciou que o rei-messias iria julgar os pobres com
justiça (11,4).

Sexta parte

Cenário histórico e teológico: A chegada do Messias-Cristo

O domínio romano sobre a terra de Israel, agora denominada Palestina, começa em 63


anos antes do nascimento de Jesus. Nesses anos que antecedem o nascimento de Jesus,
destacamos o governo de Herodes que nasceu em 73 a.C. e morreu em 4 a.C. O seu
governo foi caracterizado, primeiramente, pelos grandes e notáveis empreendimentos
arquitetônicos que, ainda hoje, causam admiração aos especialistas: o palácio-fortaleza
de Herodium, próximo a Belém e de Massada, próximo ao Mar Morto; em Cesaréia,
ergueu o porto entre outras obras. Por outro lado, a vida e obra de Herodes estão
pontilhadas de gestos desabonadores: o historiador Flávio Josefo, bem como o texto de
Mateus 2, revelam o lado feio de seu governo. Entre tantas denúncias, uma fica muito
clara: nas grandes construções, um detalhe fica evidente, a saber, o povo que trabalhou
em suas construções foi extremamente sacrificado. Assim, mais uma vez justificava a
reportagem do profeta Isaías: O povo que andava em trevas viu uma grande luz. Uma
luz raiou para os que habitavam uma terra sombria (Is 9,1). Foi em um cenário de
opressão e tirania que Jesus veio ao mundo.

É interessante observar que o nome Emanuel volta a ser registrado em um documento


da tradição histórica, depois de 735 anos. Isso mostra que a vida e obra de Jesus têm
muito a ver com as características esboçadas pelo profeta Isaías.

A origem de Jesus Cristo foi assim: Maria, sua mãe, comprometida em casamento, com
José, antes que coabitassem achou-se grávida pelo Espírito Santo. José, seu esposo,
sendo justo e não querendo difamá-la, resolveu repudiá-la em segredo. Enquanto assim
decidia, eis que o Anjo do Senhor manifestou-se a ele em sonho, dizendo: “José, filho
de Davi, não temas receber Maria, tua mulher, pois o que nela foi gerado vem do
Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e tu o chamarás com o nome de Jesus, pois ele
salvará o seu povo dos seus pecados”. Tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que
o Senhor havia dito pelo profeta:

Eis que a virgem conceberá


e dará à luz um filho
e o chamarão com o nome de Emanuel o que traduzido significa:
“Deus está conosco” (...) (Mt 1,18-25).

Meditando sobre o texto

A teologia bíblica mostra, inicialmente, o Deus-Criador. Ele faz tudo bom, mas a
reportagem de Gênesis 3 mostra que Ele ficou frustrado com a desobediência humana.
A partir desse episódio, Deus procura resgatar o mundo bom da criação. Muitas
tentativas foram feitas: lavar o mundo de toda maldade (Gn 6,5-8,22) para estabelecer
uma nova ordem do mundo (Gn 9,1-17); organizar o mundo em família, dando ao justo
Abraão essa missão (Gn 12,1-50,26); libertar, organizar o povo como nação e dar-lhe
uma terra para morar, plantar e criar suas famílias. O principal ingrediente desse povo,
que o alimentava e sustentava em todos os seus empreendimentos, era a esperança da
presença do Deus-Criador-Salvador entre ele. A proclamação de uma figura, ungida por
Deus, não era novidade. O que foi difícil de aceitar foi a descrição do perfil desse
messias-ungido. Essa característica foi sempre mantida através dos séculos na pregação
dos profetas. O evangelista Mateus resgata a memória da pregação de Isaías (Is 7,14;
8,10).

Cenário histórico e teológico

Se a menção do Emanuel é importante para a teologia bíblica, também o é a referência à


Belém como local do nascimento de Jesus. Isso é muito mais do que uma referência
geográfica. É uma afirmação teológica. Belém é periferia e é lugar de pastores de
ovelhas, porque é semi-deserto. É nesse ambiente que viveram os patriarcas da Bíblia.
Como tal, é lugar de gente trabalhadora, pobre, oprimida e sem força entre os políticos.
É aí que Jesus nasceu.

Tendo Jesus nascido em Belém da Judéia, no tempo do rei Herodes, eis que vieram
magos do Oriente a Jerusalém, perguntando:”Onde está o rei dos judeus recém-nascido?
(...) Ouvindo isso, rei Herodes ficou alarmado e com ele toda Jerusalém. E, convocando
todos os chefes dos sacerdotes e os escribas do povo, procurou saber deles onde havia
de nascer o Cristo. Eles responderam: “Em Belém da Judéia, pois é isto que foi escrito
pelo profeta:

E tu, Belém, terra de Judá,


De modo algum és o menor entre os clãs de Judá,
Pois de ti sairá um chefe que apascentará Israel, o meu povo”
(...) (Mt 2,1-12)

Meditando sobre o texto

Herodes, cognominado Magno ou o Grande, é conhecido, pelos historiadores, por seu


despotismo, sua crueldade e sua grande ambição pelo poder. Os romanos o fizeram rei,
mas os judeus o odiavam. O relato de Mateus diz que Magos do Oriente vieram a
Belém, conduzidos por uma estrela. Provavelmente, eles eram sábios, astrônomos da
Pérsia, que conheciam a esperança messiânica dos israelitas. Há um detalhe especial: os
Magos vieram a Jerusalém, mas o Messias estava em Belém. O texto de Mateus é
coerente com a tradição do Messias: nasce em Belém e carrega a característica de um
chefe de governo que não vem para reinar, conforme Salomão, Herodes entre outros,
mas apascentar o povo.

Cenário histórico e teológico

É muito claro que o Evangelho segundo Lucas forma com o livro Atos dos Apóstolos
uma só obra. A intenção básica de Lucas é destacar o significado dos testemunhos dos
primeiros seguidores de Jesus. Isso quer dizer que o relato do nascimento de Jesus está
na base da história da salvação (Lc 2,8-20).

Lucas, o autor dessa obra histórica, não perdeu o contato com a remota tradição bíblica:
primeiro, a origem do messias está entre os pastores de ovelhas (verso 8). Em segundo
lugar, o medo é uma realidade concreta nos dias do nascimento de Jesus. Finalmente,
essa reportagem tem muita relação com o texto de Isaías 7,1-17: a constatação do medo
(verso 10); o nascimento de Jesus é o sinal esperado por todo o povo crente (verso 12);
a paz na terra é a conseqüência após o nascimento de Jesus (verso 14).

Na mesma região havia pastores que estavam nos campos (...). O anjo do Senhor
apareceu-lhes e a glória envolveu-os de luz (...). O anjo, porém, disse-lhes: “Não
temais! Eis que vos anuncio uma grande alegria, que será para todo o povo: Nasceu-vos
hoje um Salvador, que é o Cristo-Senhor, na cidade de Davi. Isto vos servirá de sinal:
encontrareis um recém nascido envolto em faixas deitado numa manjedoura”. E de
repente juntou-se ao anjo uma multidão do exército celeste a louvar a Deus dizendo:
“Glória a Deus no mais alto dos céus
E paz na terra aos homens que ele ama”!
(...) (Lc 2,8-20).

Meditando sobre o texto

A descrição de Lucas é muito sugestiva, pois ela resgata a figura dos pastores, da luz
que irrompe nas trevas da noite, da humildade, do medo e da alegria. O outro detalhe é a
reafirmação que o alvo da vinda do Messias é a paz no mundo, particularmente, entre os
seres humanos.

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