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Adilson Aquino

A reconstrução histórica A reconstrução histórica

A reconstrução histórica do Serviço Social no Nordeste


Silveira Júnior

Professor Adjunto do Departa-


do Serviço Social do Serviço Social
mento de Serviço Social da Uni- no Nordeste no Nordeste
versidade Federal de Pernambu-
co (UFPE). Doutor e Mestre em Adilson Aquino Silveira Júnior
Este livro representa uma contribuição do projeto de extensão Memória e História do
Serviço Social da Universidade Organizador
Federal de Pernambuco. Coorde- Serviço Social em Pernambuco (MEHSSPE) para o conhecimento sobre as par�cularidades
na o projeto de extensão História históricas do Serviço Social, em especial daquelas tendências que �pificam a trajetória da
e Memória do Serviço Social em profissão nesse estado, mas também no Nordeste. Os textos cons�tuem o resultado de
Pernambuco (MEHSSPE). Desen-
estudos exploratórios avançando na apreensão de dimensões na trajetória do Serviço
volve pesquisas e publicações
com os temas Teoria Social,
Social em Pernambuco até então inexploradas. A esse conjunto, agregam-se sistema�zações
Polí�ca Social, Fundamentos e oriundas do professor coordenador do projeto de extensão, que encampa pesquisa
História do Serviço Social. própria sobre o desenvolvimento do Serviço Social no Nordeste; as contribuições de
docentes de outros estados, que permi�ram alargar o raio de mirada sobre a trajetória
regional da profissão; além das sínteses teóricas derivadas de uma pesquisa de mestrado
em andamento, dedicada as par�cularidades regionais do processo renovador no Nordes-
te. Os ar�gos publicados neste livro colaboraram para aperfeiçoar o quadro teórico atual
dedicado à reconstrução histórica da profissão; tarefa encarada como uma exigência para
as lutas travadas no presente, sendo tanto mais pro�cua quanto mais nutrir, teórica e
poli�camente, as forças do Serviço Social engajadas na construção da independência de
classe das maiorias exploradas e oprimidas.

QR Code ISBN
A reconstrução histórica
do Serviço Social
no Nordeste
Adilson Aquino Silveira Júnior
Organizador
Editora CRV - versão final do autor - Proibida a impressão e comercialização
Adilson Aquino Silveira Júnior
(Organizador)

A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO
SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE

Editora CRV
Curitiba – Brasil
2021
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Diagramadores e Designers da Editora CRV
Imagem de Capa: Gravura de Abelardo da Hora presente no Álbum Meninos Do Recife
(1962), que ilustra o Trabalho de Conclusão de Curso em Serviço Social (Universidade
do Ceará) de Inêssilvia Teixeira Arraes de Alencar, com o título Da contribuição para
uma tentativa de educar ocasionalmente um grupo (1963). O exemplar do TCC faz parte
do acervo do Memorial Denis Bernardes da Universidade Federal de Pernambuco
Revisão: Analistas de Escrita e Artes da Editora CRV

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


CATALOGAÇÃO NA FONTE

Editora CRV - versão final do autor - Proibida a impressão e comercialização


Bibliotecária responsável: Luzenira Alves dos Santos CRB9/1506

R294

A reconstrução histórica do Serviço Social no Nordeste / Adilson Aquino Silveira Júnior


(organizador) – Curitiba : CRV, 2021.
198 p.

Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-1297-8
ISBN Físico 978-65-251-1476-7
DOI 10.24824/978652511476.7

1. Serviço Social 2. Serviço Social – Nordeste I. Silveira Júnior, Adilson Aquino. org.
II. Título III. Série.

CDU 364 CDD 364


Índice para catálogo sistemático
1. Serviço social – 364

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2021
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004
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Simone Rodrigues Pinto (UNB)
Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA)
Sydione Santos (UEPG)
Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)
Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)

Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO............................................................................................. 9
Adilson Aquino Silveira Júnior

CAPÍTULO 1
NOTAS PARA UMA HISTÓRIA DA EMERGÊNCIA DO
SERVIÇO SOCIAL NA PARTICULARIDADE DO NORDESTE................... 15
Adilson Aquino Silveira Júnior

CAPÍTULO 2
PERCURSO HISTÓRICO DA CRIAÇÃO DA ESCOLA
DE SERVIÇO SOCIAL DA BAHIA................................................................. 47
Gilca Oliveira Carrera
Ivone Pires Ferreira de Oliveira
Alessandra Carvalho da Cruz

CAPÍTULO 3
O SERVIÇO SOCIAL NO PIAUÍ.................................................................... 67
Maria D’Alva Macedo Ferreira
Maria do Rosário de Fátima e Silva
Simone de Jesus Guimarães

CAPÍTULO 4
PRIMÓRDIOS DA EDUCAÇÃO POPULAR: a experiência de
Paulo Freire na Escola de Serviço Social de Pernambuco.............................. 81
Luanna Barbara Cavalcanti Soares

CAPÍTULO 5
ORGANIZAÇÃO PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL EM
PERNAMBUCO ENTRE OS ANOS 1950-1990.......................................... 107
Adilson Aquino Silveira Júnior

CAPÍTULO 6
O MOVIMENTO ESTUDANTIL DO SERVIÇO SOCIAL EM
PERNAMBUCO NOS ANOS 1950-1970...................................................... 135
Camila Sobral Leite Lyra Montalvão
CAPÍTULO 7
O TRABALHO DO SERVIÇO SOCIAL COM A CLASSE OPERÁRIA
EM PERNAMBUCO ENTRE AS DÉCADAS DE 1950-1960...................... 161
Larissa Ranielly Lima Dias
Lenita Maria Maciel de Almeida

CAPÍTULO 8
REGIÃO NORDESTE, SUDENE E O DESENVOLVIMENTO
DESIGUAL INTER-REGIONAL NO BRASIL.............................................. 181
Jesana Germano da Silva

ÍNDICE REMISSIVO.................................................................................... 191

SOBRE AS AUTORAS E OS AUTORES.................................................... 195


APRESENTAÇÃO
Este livro representa mais uma contribuição do projeto de extensão
Memória e História do Serviço Social em Pernambuco (MEHSSPE) para
o conhecimento sobre as particularidades históricas do Serviço Social, em
especial daquelas tendências que tipificam a trajetória da profissão nesse
estado, mas também no Nordeste. Esta produção soma-se às demais que o
MEHSSPE tem organizado e divulgado nos últimos anos: o catálogo Memó-
ria do Serviço Social em Pernambuco: inventário do acervo, de 2019; o
livro Serviço Social em Pernambuco: primeiras décadas da formação e
atuação profissional, de 2020; além do ensaio Coisas de não: trabalhadores
na obra de João Cabral de Melo Neto, também publicado em 2020. As ações
desenvolvidas pelo projeto, vinculado ao Departamento de Serviço Social
da Universidade Federal de Pernambuco, têm se desdobrado em três frentes:
organização e socialização do acervo histórico e de documentos do Serviço
Social no estado; incentivo a estudos sobre as dimensões e tendências da
profissão; divulgação de conhecimentos sobre essa história e memória. Todas
as ações de formação, produções e acervos são disponibilizados gratuitamente
através de site do projeto.1
Na esfera dos estudos sobre as dimensões e tendências da profissão ao
longo da história, o MEHSSPE conseguiu engajar, nas condições adversas
do último ano, afetado pela crise econômica e pandêmica, um grupo de estu-
dantes de Serviço Social, membros da equipe de execução da extensão, no
desenvolvimento de alguns estudos exploratórios, pesquisas de iniciação cien-
tífica e trabalhos de conclusão de curso. Os resultados foram sumariados em
alguns artigos deste livro, avançando na apreensão de dimensões na trajetória
do Serviço Social em Pernambuco até então inexploradas. A esse conjunto,
agregaram-se sistematizações oriundas do professor coordenador do projeto de
extensão, que encampa pesquisa própria sobre o desenvolvimento do Serviço
Social no Nordeste; as contribuições de docentes de outros estados, que per-
mitiram alargar o raio de mirada sobre a trajetória regional da profissão; além
das sínteses teóricas derivadas de uma pesquisa de mestrado em andamento,
dedicada às particularidades regionais do processo renovador no Nordeste.
O levantamento do quadro teórico sobre o desenvolvimento histórico
do Serviço Social no Nordeste2 revela uma miríade de iniciativas e sistema-
tizações que demonstra certa pulverização dos trabalhos. Em geral, são estu-
dos organizados em nível estadual, empreendimentos nucleados em algumas

1 Esse é o endereço eletrônico do site: https://mehsspe.wixsite.com/projeto.


2 O levantamento ao qual se faz referência encontra-se exposto, por estado, no primeiro artigo do livro. Nas
referências do referido artigo, são apresentados todos os detalhes dessas fontes bibliográficas.
10

instituições de ensino, quando muito aglutinando grupos de docentes do


mesmo curso em projetos coletivos de pesquisa. É patente a necessidade de
articulações acadêmicas que projetem linhas de investigação com eixos tota-
lizadores, que alcancem sínteses inclusivas e abrangentes sobre a particulari-
dade do Nordeste. Em muitos casos, os estudos e sistematizações existentes
são motivados por eventos e datas celebrativos, centrando-se no percurso de
algumas Escolas pioneiras da formação profissional nos estados. Raras são,
de fato, as elaborações derivadas de esforços mais sistemáticos e intensivos,
como os possibilitados através de pesquisas de pós-graduação, sobretudo
doutorados, mas também de mestrados. Se o trato histórico da dimensão da
formação profissional demonstra ser o mais recorrente, normalmente dedicado
ao resgate das primeiras décadas de existência de alguns cursos nos estados;
outros elementos constitutivos do universo profissional carecem ainda de
investigações mais profundas, como os afetos aos processos interventivos, os
espaços ocupacionais, a produção do conhecimento e a organização político-
-profissional, por exemplo. Ademais, na medida em que se avança na busca de
estudos englobando o estágio histórico da renovação profissional no Nordeste,
cujas balizas cronológicas são dadas pelo desenlace, consolidação e crise da
autocracia burguesa, torna-se mais rarefeito o quadro teórico disponível. Em
todos os casos, as fontes empíricas de que lança mão a bibliografia existente
já aparece bastante diversificada: o variado acervo de documentos das anti-
gas Escolas de Serviço Social e das organizações profissionais ou sindicais,
depoimentos de personagens e protagonistas docentes e profissionais, além
de matérias jornalísticas.
Esses trabalhos sobre o Serviço Social na história do Nordeste carecem
também de maior divulgação em nível nacional. Por outro lado, pesquisas
e coletâneas da área de conhecimento, protagonizadas por centros universi-
tários do eixo Sudeste e Sul, com foco nos fundamentos do Serviço Social
na história, demonstram ainda uma incipiente incorporação dos conteúdos
e reflexões sobre as tendências do desenvolvimento do Serviço Social na
realidade do Nordeste, sobre o modo como o que aí ocorria interagiu com
iniciativas de renovação profissional emergidas em outras latitudes do país,
rebatendo, direta ou indiretamente, nas suas resultantes.3
De várias maneiras, os artigos publicados neste livro colaboraram para
aperfeiçoar o quadro teórico atual dedicado à reconstrução histórica da profis-
são: o ensaio de abertura, por exemplo, envereda numa síntese totalizadora do
movimento histórico de emergência do Serviço Social na particularidade do

3 Pense-se na quase inexistência de referências históricas ao Nordeste em importantes e atuais produções


sobre os fundamentos e o processo renovador do Serviço Social, como as divulgadas em Iamamoto e
Santos (2021), Silva (2019) e Yazbek e Iamamoto (2019). O mesmo que acontece com outras bibliografias
já clássicas, como Iamamoto e Carvalho (2006) e Netto (2005).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 11

Nordeste; alguns artigos avançam na abordagem de aspectos da organização


política e profissional, do movimento estudantil, corporativo e sindical, princi-
palmente em Pernambuco, mas também no Piauí (sobre esse estado, também
adentra-se na trajetória da formação profissional); um estudo exploratório
evidencia, de modo inédito, as experiências que vinculam geneticamente o
Serviço Social à construção do pensamento e prática pedagógicos de Paulo
Freire, quando o mesmo atuava como docente da Escola de Serviço Social
de Pernambuco; outro estudo resgata as tendências ideais e interventivas da
atuação do Serviço Social junto à classe operária em Pernambuco, num estágio
de acirramento das contradições econômicas na região; um texto resgata a
trajetória de gestação da primeira Escola de Serviço Social da Bahia, um dos
estados pioneiros da formação no Nordeste, mas cuja história conta ainda com
raros estudos e pouquíssima divulgação; ademais, um último artigo apresenta
uma reflexão que oferece importante instrumental teórico para a apreensão
das bases sociais e políticas que particularizam a inserção do Nordeste na
transformação capitalista (dependente e desigual) no país, uma síntese com
importantes chaves de leitura para as pesquisas que desejam decifrar os cami-
nhos da renovação profissional na região.
Os artigos ficaram assim distribuídos ao longo do livro: o primeiro con-
siste no ensaio Notas para uma história da emergência do Serviço Social na
particularidade do Nordeste, do docente coordenador do MEHSSPE, Adilson
Aquino Silveira Júnior; em seguida, registra-se o texto Percurso histórico da
criação da Escola de Serviço Social da Bahia, das docentes do estado da Bahia
Gilca Oliveira Carrera, Ivone Pires Ferreira de Oliveira e Alessandra Carvalho
da Cruz; na sequência, o texto O Serviço Social no Piauí, das docentes desse
estado, Maria D’Alva Macedo Ferreira, Maria do Rosário de Fátima e Silva
e Simone de Jesus Guimarães; depois, quatro artigos aparecem dedicados à
realidade do estado de Pernambuco – o estudo intitulado Primórdios da Edu-
cação Popular: a experiência de Paulo Freire na Escola de Serviço Social
de Pernambuco, da estudante de Serviço Social Luanna Barbara Cavalcanti
Soares, o texto Organização profissional do Serviço Social em Pernambuco
entre os anos 1950-1990, também do coordenador do MEHSSPE, o artigo O
movimento estudantil do Serviço Social em Pernambuco nos anos 1950-1970,
da pesquisa de iniciação científica de Camila Sobral Leite Lyra Montalvão
e o texto O trabalho do Serviço Social com a classe operária em Pernam-
buco entre as décadas de 1950-1960, oriundo do Trabalho de Conclusão de
Curso em Serviço Social das discentes Larissa Ranielly Lima Dias e Lenita
Maria Maciel de Almeida; e, por último, o texto Região Nordeste, Sudene e
o desenvolvimento desigual inter-regional no Brasil, da mestranda em Ser-
viço Social da UFPE Jesana Germano da Silva. Isso posto, aproveitamos
para agradecer a valiosa disposição e colaboração intelectual das autoras na
construção desse livro.
12

Por fim, no MEHSSPE, desde o lançamento do inventário do acervo


em 2019, tomamos como pressuposto que a apropriação da história é uma
tarefa incontornável para as tendências profissionais engajadas na preserva-
ção e fortalecimento dos laços do Serviço Social com os movimentos e lutas
das classes exploradas nesse estágio de ofensiva ultraliberal, obscurantista
e imperialista na realidade brasileira (e mundial). Nenhum investimento de
reconstrução histórica pode se permitir ficar circunscrito a pretensões estri-
tamente memorialísticas, à mera satisfação da curiosidade sobre um passado
pretensamente perdido no tempo. Essa reconstrução é uma exigência (que se
mantém atualíssima) para as lutas travadas no presente, e será tanto mais pro-
fícua quanto mais nutrir, teórica e politicamente, as forças do Serviço Social
engajadas na construção da independência de classe das maiorias exploradas
e oprimidas.

Adilson Aquino Silveira Júnior


Coordenador do MEHSSPE
Recife, junho de 2021
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 13

REFERÊNCIAS
IAMAMOTO, Marilda Villela; CARVALHO, Raúl de. Relações sociais e
Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodoló-
gica. 19. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

IAMAMOTO, Marilda Villela; SANTOS, Cláudia Mônica dos (org.). A His-


tória pelo avesso: a reconceituação do Serviço Social na América Latina e
interlocuções internacionais. São Paulo: Cortez, 2021.

NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social. 7. ed. São Paulo: Cor-
tez, 2005.

SILVA, Maria Liduina de Oliveira e. Congresso da Virada e o Serviço Social


Hoje: reação conservadora, novas tensões e resistências. São Paulo: Cor-
tez, 2019.

YAZBEK, Maria Carmelita; IAMAMOTO, Marilda Villela (org.). Serviço


Social na História: América Latina, África e Europa. São Paulo: Cortez, 2019.
CAPÍTULO 1
NOTAS PARA UMA HISTÓRIA DA
EMERGÊNCIA DO SERVIÇO SOCIAL NA
PARTICULARIDADE DO NORDESTE
Adilson Aquino Silveira Júnior

1.
A emergência do Serviço Social supõe, em cada espaço onde germina e
se consolida como instituição profissional, um mínimo de desenvolvimento
das contradições sociais e políticas típicas do modo de produção capitalista
dominado pela lógica monopolista. Seu pressuposto elementar é a afirmação,
na realidade em questão, de relações de produção fundadas no antagonismo
entre capital e trabalho assalariado, acrescentando-se a necessidade de con-
creção dessa relação no âmbito da produção tipicamente capitalista, voltada
para acumulação ampliada através da produção de mercadorias, caracteri-
zada pela exploração da força de trabalho na grande indústria, voltada para
a extração da mais-valia absoluta e relativa, mediada pela maquinaria, com
atuação combinada e especializada no marco da divisão do trabalho etc. Esse
é o primeiro pressuposto, sem o qual não se constitui a base da chamada
“questão social” e suas refrações sociais e políticas, sobre as quais o Serviço
Social realiza algum nível de intervenção através dos espaços ocupacionais
criados pelo Estado com a afirmação de políticas sociais.4
Abstraindo-se os demais pressupostos, e examinando apenas esse primeiro
e mais elementar, se pode concluir que sua afirmação tardia na região Nordeste,
por si só, teria como decorrência um descompasso entre a emergência do Ser-
viço Social nesse espaço regional frente a outros, do mesmo país, em que a
transformação capitalista das relações de produção ocorreu mais concentrada
e rapidamente. O desenvolvimento desigual interno do capitalismo no Brasil
nos fornece a chave para a explicação desse descompasso regional, funcional
à emergência e desenvolvimento do capitalismo dependente, com inserção
também desigual e combinada no imperialismo.5 Encarada como um todo, a
4 O conjunto desses pressupostos é bastante conhecido, e encontra-se afirmado na literatura profissional,
principalmente em Iamamoto (1982), Iamamoto e Carvalho (2006) e Netto (2004, 2005).
5 Os pontos fundamentais dessa explicação da revolução burguesa e a transformação capitalista na realidade
dependente estão dados em Fernandes (1976).
16

região Nordeste revela, por isso, uma sobrevida maior de relações de produção
arcaicas e pré-capitalistas – inobstante a funcionalidade dessas relações para a
própria afirmação capitalista no país, comandada pelo Centro-Sul, ou os nexos
que a subordinam às necessidades de acumulação monopolista internacional.
Daí também um nível de descompasso, verificado na historiografia do Serviço
Social, entre a criação das primeiras escolas, no eixo Rio de Janeiro e São Paulo,
na segunda metade dos anos 1930, e a inauguração e funcionamento dos cursos
no Nordeste, em geral após meados dos anos 1940. Com efeito, e balizando-se
pela trajetória modelar de Recife, acreditamos que o período mesmo de gestação
do Serviço Social no Nordeste tenha atravessado o lapso temporal, no mínimo,
das décadas de 1940-1950, para se concretizar.6 Mas o que queremos enfatizar,
nesse momento – tomando a própria região como um “complexo de complexos”
(LUKACS, 2013) – é a existência de um descompasso na emersão do Serviço
Social no interior do próprio Nordeste, considerando, igualmente, a inserção
desigual e combinada dos estados que o compõem no processo de produção
social no qual se encontrou encerrada historicamente essa parte do país.
Na região Nordeste, pode-se notar uma diferenciação interna no pro-
cesso de emergência das escolas, considerando o modo desigual a partir do
qual foram se afirmando as relações e contradições sociais e políticas típicas
do modo de produção capitalista nos estados. A evolução interna do Serviço
Social no Nordeste demonstra uma diferenciação entre:7

1. Aqueles espaços econômicos dominantes da produção açucareira


agroexportadora no período colonial e de transição neocolonial, com
seus epicentros comerciais e urbanos em Recife e Salvador. Nessas
capitais, se localizam as primeiras Escolas de Serviço Social cria-
das no Nordeste – Escola de Serviço Social de Pernambuco, criada
entre 1938-1940, agregada à Universidade Federal de Pernambuco
em 1971; e a Escola de Serviço Social do Estado da Bahia, criada
em 1944, vinculada à Universidade Católica de Salvador em 1961.
Nesses casos, o antagonismo próprio da relação capital-trabalho
desponta quando, na longa fase declinante da produção açuca-
reira, se desenvolve uma mecanização da agricultura articulada à

6 Esse argumento foi explorado através de pesquisa documental em Silveira Jr. (2020).
7 Nossas informações sobre a história do Serviço Social nos estados do Nordeste foram recolhidas da seguinte
bibliografia, até agora localizada e reunida por estado: Ceará (BARBOSA, 2015; COSTA et al., 2010; CUNHA;
SILVEIRA, 2014; FRANCO, 2010; LEAL, 2017; MESQUITA, 2016); Paraíba (FREITAS et al., 2008; MACEDO
et al., 2007; NASCIMENTO et al., 2011; SILVEIRA et al., 2014; UEPB, 2014); Alagoas (ALVES, 2008; COSTA;
SOUZA, 2008; MEDEIROS, 2008; MORAES, 2014); Rio Grande do Norte (ARAÚJO et al., 2009; GOU-
VEIA, 1993; LIMA, 2005, 2006, 2012; LIMA, 2006; LIMA et al., 2009); Maranhão (SILVA et al., 2008); Bahia
(NASCIMENTO et al., 2011; PEREIRA, 2009); Pernambuco (GOMES, 1987; MEHSSPE, 2019; MOTA, 2019;
PADILHA, 2008; SILVA, 2019a, 2019b; SILVEIRA Jr., 2020; UFPE, 1985, 1990; VIEIRA, 1992).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 17

diversificação econômica, dada com a produção manufatureira (em


especial, indústria têxtil), as atividades comerciais, administrativas
e de serviços advindas da dinamização econômica e da decorrente
expansão urbana concentrada nas capitais, com seus reflexos na
hipertrofia da aparelhagem político-estatal. Essas transformações
econômicas são parteiras do trabalho assalariado na região – no bojo
do qual se desdobra um núcleo operário – sobretudo resvalando para
o centro urbano, mas se espraiando para os espaços da agricultura
em fase de mecanização, concentração e centralização.8 É lícito sina-
lizar que esse processo possui uma duração praticamente secular,
mas seus resultados mais decisivos são verificados nas primeiras
décadas do século XX, destacadamente em Pernambuco e Bahia.9
2. Aqueles espaços econômicos que satelizavam a produção açucareira
através do extrativismo ligado, principalmente, mas não apenas, à
agropecuária (ou que compartilhavam esse extrativismo com alguma
produção de açúcar), mas que, no estágio de crise do ciclo do açú-
car, passaram a se destacar através da produção algodoeira.10 Nesses
casos, as contradições tipicamente capitalistas precisaram esperar o
momento de maior lapso de expansão do algodão para germinarem,
impelidas pela necessidade de diversificação econômica – dado que a
produção algodoeira-pecuária em si mesma mantinha-se fundada em
relações basicamente pré-capitalistas de trabalho, embora enquadradas
no circuito de valorização financeira e comercial burguesa, e voltadas
para alimentar a expansão capitalista internacional e do Centro-Sul do
país. Em suma, a produção algodoeira-pecuária havia elevado esses
espaços como centros econômicos próprios e dinâmicos, mas vege-
tando através de relações de produção pré-capitalistas. Apenas com
a diversificação econômica dada no momento de maior acumulação
comercial e financeira do algodão e da pecuária (e a acentuação da

8 Essas transformações da economia no Nordeste foram abordadas por Oliveira (1981, 1987).
9 A criação de mais um curso em Pernambuco na Universidade Católica de Pernambuco, em 1971, nos parece
já estar enquadrada nas necessidades de intervenção estatal dadas pela industrialização que começa a se
operar no estado, como no Nordeste, através da SUDENE, na década em 1960 em diante.
10 Trata-se, aqui, pensando-se no ciclo dessa produção já no século XX, do surto da produção algodoeira,
ocorrido a partir de 1934, condicionado pela conjuntura econômica e política internacional de disputa impe-
rialista que abre a busca por centros fornecedores para a indústria têxtil no mundo. Diz Prado Jr. (2012, p.
276) que, nessas circunstâncias: “O Brasil apresentava excelentes condições para aquele fim: a decadência
da lavoura cafeeira tornara disponíveis grandes áreas de terra aproveitáveis e já preparadas, mão de obra
abundante, recursos técnicos [...] que se podiam facilmente aproveitar para a nova cultura.” Nesse caso,
com grande envolvimento norte-americano no contexto da Segunda Guerra em diante, estendendo-se sobre
a indústria do preparo e acondicionamento da produção (descaroçamento e enfardamento) e atividades
financeiras e comerciais paralelas. Algo correlato ocorreu com a expansão da produção do Cacau no Sul
da Bahia, num mesmo período histórico.
18

urbanização e da infraestrutura de transportes, por exemplo, advindas


desse processo) se criam bases para a constituição de contradições
tipicamente capitalistas nesses espaços; contradições que passam a
convulsionar socialmente quando essa produção algodoeira-pecuária
inicia sua crise. A diversificação econômica, de natureza capitalista,
que passa então a existir nessas circunstâncias, também se refere a
alguma produção manufatureira ligada à indústria têxtil, as ativida-
des comerciais, administrativas e de serviços advindas da dinami-
zação econômica e da decorrente expansão urbana concentrada nas
capitais (ou cidades que ganham destaque econômico no interior) com
seus reflexos na hipertrofia da aparelhagem político-estatal. Isso fez
com que a instituição do Serviço Social aparecesse de modo retarda-
tário, em relação aos tradicionais polos da produção açucareira. Nesse
espectro, se encontram as principais escolas de Serviço Social que
despontam na década de 1950: Instituto Social de Fortaleza, criado
na capital do Ceará em 1950; Escola de Serviço Social da Paraíba,
criada em João Pessoa, em 1952; Escola Maranhense, criada em São
Luiz, em 1953; Escola de Serviço Social de Sergipe, criada em 1954;
Escola Padre Anchieta, criada em Maceió no ano de 1957; Faculdade
de Serviço Social de Campina Grande, criada em 1957. Embora as
bases sociais para a germinação de relações de produção tipicamente
capitalistas no Rio Grande do Norte estejam inseridas nesse mesmo
quadro geral apontado aqui, a aceleração, em termos investimentos
de infraestrutura e serviços urbanos, galvanizada pela intervenção
norte-americana em Natal durante a Segunda Guerra, utilizando sua
posição geográfica estratégica para implantação de bases e operações
militares, se refletiu na criação da Escola de Serviço Social, nessa
capital, ainda em 1945. Também compõe esse universo a realidade
do estado do Piauí. Mas, nesse caso, ainda tardou mais o surgimento
da formação em Serviço Social, certamente já impulsionado pela
industrialização patrocinada pela SUDENE, com a criação de um
curso na Universidade Federal do Piauí em 1976. O que pode ser o
caso, também, da criação do Curso de Serviço Social na Universidade
Estadual do Rio Grande do Norte (Mossoró), em 1965.

Ao todo, essas eram as instituições presentes no Nordeste até finais dos


anos 1980, que ofertavam a formação em Serviço Social. É necessário ressalvar
que a inexistência de um curso de Serviço Social, em qualquer dos estados,
não significava diretamente a ausência de um corpo profissional de assistentes
sociais atuando nas fronteiras do território em questão. É possível testemu-
nhar – cada vez mais quanto mais se multiplicam as titulações a partir dos
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 19

anos 1940-1950 – a circulação de assistentes sociais formadas nas primeiras


escolas, em termos de seu deslocamento para estados onde ainda não existia a
formação profissional, mas onde as instituições assistenciais que começavam a
se implantar já criavam algum lastro de espaço ocupacional que atraía agentes
titulados em outros lugares; ou mesmo pode-se notar o fenômeno da migração
de candidatas a assistentes sociais para fora do seu estado natal, em busca da
formação nas cidades com escolas em funcionamento que, depois de titula-
das, retornavam para suas terras de origem para ocupar postos nos espaços de
intervenção que começavam a germinar. Com efeito, esse intercâmbio ocorria
entre estados da mesma região ou entre as regiões Nordeste e Sudeste. Mesmo
as grandes instituições sociais que começavam a se estruturar, principalmente
a partir dos anos 1940 (como a LBA, SESI, SESC), promoviam tal inter-
câmbio entre suas matrizes do Sudeste e as longínquas cidades do Nordeste,
carentes de instâncias para formação especializada, mas que começavam a
desenvolver seus serviços. Ademais, quando tais instituições começavam a
desbravar rincões quase inacessíveis, e não encontravam força de trabalho
com especialização técnica superior, lançavam mão, recorrendo às escolas de
Serviço Social mais próximas, ou mesmo dos seus próprios quadros, de cursos
rápidos de treinamento para a ação assistencial de agentes técnicos (auxiliares
ou visitadoras sociais) absorvidos na operacionalização dos serviços, mas ainda
carentes da escolarização de nível superior. Essas observações servem para
advertir que a inexistência de uma escola de Serviço Social não significava,
necessariamente, a ausência de algum corpo profissional num determinado
estado da região. No mínimo, significava que as contradições sociais próprias
da expansão capitalista, e as modalidades de intervenção estatal a elas corres-
pondentes, se encontravam, nesses espaços, num grau de incipiência tal que
não necessitavam de um núcleo de formação próprio.11

2.

A emersão de relações tipicamente capitalistas nesses espaços regionais


fornece apenas o terreno econômico sem o qual é impensável o desenvolvi-
mento do Serviço Social. Mas, para tanto, devem se germinar articuladamente,
desse terreno social: 1) as lutas políticas que marcam a realidade burguesa
em face das sequelas sociais da acumulação capitalista, com seus porta-vozes
políticos e intelectuais, individuais e coletivos, representantes das forças em
conflito; e 2) a intervenção do Estado, capturado pelos requisitos da valorização

11 Parece-nos que essa dinâmica entre oferta e demanda do mercado da força de trabalho para assistentes
sociais adquirirá um padrão diferenciado quando da multiplicação dos cursos com a mercantilização do
ensino superior, deflagrando o fenômeno que Iamamoto (2014) designará como a formação de um “exército
assistencial de reserva”.
20

e opressão capitalista, no sentido de promover políticas e instituições funcionais


à reprodução e controle contínuos da força de trabalho (ocupada e excedente).
Do ponto de vista dos dramas sociais condicionados pela afirmação capi-
talista no Nordeste – fundada na integração da região na expansão das relações
burguesas no país – três variáveis tornaram-se definidoras do que foi próprio
da “questão social” nessa realidade: em primeiro lugar, tais dramas foram
configurados pelas consequências sociais e políticas da mecanização da agri-
cultura e da acentuação do latifúndio, quando as usinas passaram a dominar
a produção açucareira em crise; em segundo lugar, as vicissitudes sociais do
Nordeste aparecem impelidas pelo atraso econômico, o parco desenvolvi-
mento das forças produtivas, a exploração e pauperismo extremo das regiões
sertanejas, dominadas pela economia algodoeira-pecuária; em terceiro lugar,
incluem-se também as colisões políticas e iniquidades sociais geradas pela
exploração operária no âmbito tipicamente manufatureiro (ou comercial).
A primeira contradição conformou a emergência de um proletariado
agrícola em formação, profundamente explorado e pauperizado, ademais das
pressões que o latifúndio acumulou com o campesinato. No centro urbano,
se robustece uma camada do proletariado empregada no capital comercial
dedicado ao transporte e venda, em especial da cana e o algodão, que ganha
densidade organizativa e política ao longo dos anos. A segunda contradição
implica uma leva de trabalhadores rurais pauperizados e famintos, engrossando
as fileiras de retirantes da seca que escoam para os centros urbanos em busca
de sobrevivência, e irão compor, junto com uma grande massa das outras
camadas anteriores, a população dos mocambos, morros, favelas e cortiços.
Da terceira desdobra-se a conformação de uma classe especificamente ope-
rária (nas indústrias têxteis e no comércio, principalmente) que constitui uma
força política potencial também superexplorada, embora embrionária, objeto
da intervenção do governo e dos industriais.
Josué de Castro forneceu alguns dos documentos históricos e científicos
mais contundentes sobre a calamidade humana deflagrada com essa agonia,
na particularidade do Nordeste, do sistema econômico fundado na grande
propriedade agrária e voltado para a produção exclusiva de alguns gêne-
ros de exportação de grande expressão comercial nos mercados mundiais.
Desde seus estudos sociais pioneiros sobre as condições de vida das classes
operárias no Nordeste na década de 1930 – publicados no Documentário do
Nordeste (CASTRO, 1968) – até suas sistematizações em Geografia da Fome
(CASTRO, 1984), publicadas em 1946 e então contemplando dois grandes
ensaios sobre o fenômeno da fome coletiva e específica que assolava os dois
nordestes, o da mata e o das secas: o primeiro assolado pela mecanização da
agricultura, o latifúndio e os miseráveis salários; o segundo convulsionando
com o cataclismo das secas periódicas irremediáveis, imantando uma massa de
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 21

refugiados para os centros urbanos mais importantes, idealizados pela propa-


ganda das políticas sociais e de trabalho estruturadas durante o Estado Novo.
A década de 1930 é particularmente severa, quando se trata da acen-
tuação das sequelas sociais dessa integração subordinada do Nordeste na
afirmação da dominação burguesa no país. Seja pelas consequências de uma
seca excepcional, de intensidade extraordinária, com seu epicentro em 1932
(afora o desgaste provocado por outras importantes secas anteriores, como a
de 1915 e a de 187712). Seja pelo acirramento da concorrência da expansão
algodoeira face à economia açucareira, paralela à crise da produção têxtil
regional em disputa com a expansão industrial do Centro-Sul. Seja pelo lapso
de crescimento da produção algodoeira canalizando investimentos para um
tipo de economia com relações de trabalho rudimentares, levando mesmo a
uma regressão das forças produtivas. Diz Oliveira (1981) que, na passagem
do século XIX para o XX, a economia açucareira, então centrada no Nordeste,
é premida de tal modo pela produção agroexportadora do café (em seguida
também pela industrialização que se desdobra com ela), e pela produção
algodoeira-pecuária, que recriava internamente mecanismos de acumulação
primitiva com processos e relações de produção pré-capitalistas (como o
“cambão”, mercados “cativos” de trabalho nas usinas, o “barracão”), com o
que se condenou à estagnação. Donde, durante a expansão do capital industrial
concentrada no Centro-Sul, o duplo papel do Nordeste como: a) uma reserva
do exército industrial de reserva, cujo efeito foi a migração em massa da força
de trabalho; b) uma fonte de capital – que ainda ali se formava – drenada para
aquela industrialização pela política econômica vigente (OLIVEIRA, 1981).
O proletariado moderno propriamente dito nasce, na região, com o pro-
gresso industrial que se desdobra, em finais do século XIX, ligado, em larga
medida, ao desenvolvimento das manufaturas têxteis, cuja localização obe-
decia aos critérios de densidade demográfica e vizinhança com as fontes
de produção da matéria-prima (quase exclusivamente o algodão). Assim, a
indústria têxtil concentrava-se no Rio de Janeiro (e em cidades próximas),
em Juiz de Fora e nos dois principais centros do Nordeste de população
densa e larga produção algodoeira, em Pernambuco e Bahia, assim como em
Caxias, no Maranhão. São Paulo, que assumiria a posição, no século seguinte,
de maior núcleo da produção industrial do país, ainda figurava em segundo

12 Prado Jr. (2012, p. 202) afirma que a decadência da produção açucareira do Nordeste, densamente povoado
desde a colônia, vai resultar em correntes demográficas fortes e constantes dirigindo-se para regiões com
melhores perspectivas: “Esse movimento das populações tornar-se-á particularmente ativo depois da grande
seca de 1877-80, que despovoará o interior nordestino do Ceará até a Bahia. As regiões beneficiadas por
essa emigração serão o vale amazônico (graças à extração da borracha); o sul da Bahia (produção de cacau
em progresso); finalmente e sobretudo São Paulo, o grande polo de atração.”
22

plano. Diz Prado Jr. (2012, p. 198) que a origem do proletariado industrial
brasileiro –quando o sistema escravista ainda não havia se desagregado de
todo – guarda relação com as soluções dadas para o problema da força de
trabalho necessárias para esses primeiros estágios da industrialização:13

A questão da mão de obra nesses centros maiores e onde se localiza a


indústria, resolver-se-á facilmente e a baixo preço. O que será aliás fator
máximo da sua prosperidade. Aí a população marginal, sem ocupação
fixa e meio regular de vida, era numerosa, fruto de um sistema econômico
dominado pela grande lavoura trabalhada por escravos. A população livre,
mas pobre, não encontrava lugar algum naquele sistema que se reduzia
ao binômio “senhor e escravo”. Quem não fosse escravo e não pudesse
ser senhor, era um elemento desajustado, que não se podia entrosar nor-
malmente no organismo econômico e social do país. Isso, que já vinha de
tempos remotos da colônia, resultava em contingentes relativamente gran-
des de indivíduos mais ou menos desocupados, de vida incerta e aleatória,
e que davam casos extremos nestes estados patológicos da vida social: a
vadiagem criminosa e a prostituição. Ambos se disseminavam largamente
em todas as regiões de certa densidade demográfica. A indústria nascente,
para que o trabalho escravo mostrar-se-á desde logo ineficaz, encontrará
naqueles setores da população um largo, fácil e barato suprimento de mão
de obra. E será essa a origem do proletariado industrial brasileiro, o que
explicará no futuro muito das suas características e evolução.

Daí o despontar do movimento sindical e da luta grevista, com mais


expressividade, na Bahia e em Recife, entre finais do século XIX e início do
seguinte, com intervalos de expressivos enfrentamentos, como entre 1917-
1921 e na primeira metade dos anos 193014 – donde, por exemplo, a criação de
um comitê estadual do PCB em Recife ainda em 1922, e a projeção eleitoral
do partido nessa capital no episódio das eleições para Assembleia Nacional

13 Num contexto de crescente controle imperialista inglês, esse primeiro surto industrial no Brasil (entre 1885-
1895, mas com antecedentes desde 1840) não ficou, entretanto, restrito à produção têxtil, manifestou-se
também em ramos como o da fundição-metalurgia, construção naval, transportes (marítimos e ferroviários),
construção civil. Em Hardman e Leonardi (1982, p. 31-39) encontramos exemplos históricos dessa produção
em Pernambuco, Bahia e Alagoas. Nessas primeiras fábricas, trabalhavam, muitas vezes, ao lado dos
operários, um bom número de escravos, como registram Hardman e Leonardi (1982, p. 90-97).
14 Sobre movimento operário e greves nos dois estados, consultar: Hardman e Leonardi (1982); Fontes (1982);
Bezerra et al. (2011), Lins (2016). Na Bahia, por exemplo, o trabalho de Fontes (1982) apresenta um pano-
rama do movimento grevista entre 1880 e 1930, com destaque para a participação, além dos têxteis, de
trabalhadores dos transportes urbanos, portuários, marítimos, fumageiros e ferroviários – frações bastante
próximas daquelas encontradas em ação no movimento operário em Pernambuco da mesma época, como
se verifica em Bezerra et al. (2011). Hardman e Leonardi (1982) registram as primeiras organizações operá-
rias, além da penetração das ideias socialistas e a imprensa operária, entre finais do século XIX e início do
seguinte, na Bahia, Pernambuco, Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte, Alagoas, Maranhão, Piauí, Sergipe.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 23

Constituinte, em 1933, e nas eleições municipais de 1935, através da legenda


Trabalhador, Ocupa Teu Posto. A década também é marcada pela deflagração
da insurreição político-militar de 1935, capitaneada por membros do exército,
em nome da Aliança Nacional Libertadora, e em conexão com a Internacional
Comunista e o PCB, precipitada em Natal – onde o Comitê Popular Revo-
lucionário permaneceu no poder durante quatro dias, antes de ser sufocado
– e depois em Recife-Olinda e Rio de Janeiro, onde os levantes foram mais
rapidamente reprimidos. Mesmo nos espaços dominados pela produção algo-
doeira-pecuária, a luta de classes não deixará de se expressar, especialmente
através da forma direta e violenta da ação dos coronéis e jagunços sobre os
camponeses, ou através da ação ambígua dos grupos de cangaceiros atuando
nas regiões da caatinga e da mata – com sua espécie de “banditismo social”
que assumiu grande projeção entre as décadas de 1920-1930.
Não casualmente, a III Semana de Ação Social ocorreu, em 1939, no
Recife, após a realização de um inquérito desenvolvido pelo Grupo de Ação
Social sobre as condições de vida do operariado urbano e rural, os serviços
assistenciais mantidos pelo Estado e a aplicação das leis trabalhistas.15 Rea-
lizado na Federação das Classes Trabalhadoras de Pernambuco, com algu-
mas sessões presididas pelo interventor federal e o Ministro do Trabalho, o
evento apresentou um relatório do problema habitacional e teceu considerações
sobre a organização familiar e a instrução do operariado urbano. Alguns anos
antes, em 1935, os Centros Educativos Operários também já começavam a se
estruturar em Recife, assim como os Círculos Operários Católicos passavam
a desenvolver alguma intervenção na cidade após 1937 (GOMINHO, 1998;
MEDEIROS, 1995). A III Semana de Ação Social contou com importante
apoio dos membros do movimento circulista; os mesmos que se envolviam,
então, com a criação da Escola de Serviço Social de Pernambuco, cujo germe
aparece na forma de um curso preparatório criado em 1938 pelo Juizado de
Menores, mas cuja fundação ocorrerá em 1940, articulado pelo Juiz de Direito
Rodolfo Aureliano, membro dos Círculos Operários Católicos e dirigente da
Liga de Higiene Mental. Da mesma forma, a implantação do Curso de Serviço
Social na Universidade Católica de Salvador, em 1944, contou com a articu-
lação do professor e médico Thales de Azevedo, vinculado à Ação Católica,
recebendo apoio da Escola de Serviço Social de São Paulo. Igualmente, no
Rio Grande do Norte, onde se encontravam muitas organizações da Ação
Católica, é criada, em 1945, a Escola de Serviço Social de Natal, por iniciativa
da Juventude Feminina Católica Brasileira de Natal (JFCBN), em convênio
com a LBA, que aprofundou sua presença na região com os impactos sociais

15 A primeira Semana de Ação Social havia ocorrido em 1936 no Rio de Janeiro, sendo considerada como marco
da introdução do Serviço Social na então capital da república (IAMAMOTO; CARVALHO, 2006, p. 181-185).
24

da entrada do país na Segunda Guerra e da presença norte-americana para


operações militares.

3.
Daí em diante, a criação das demais escolas de Serviço Social que se
espalham pelo Nordeste passa a ser impelida por essa combinação de condi-
cionantes então germinando – os mesmos condicionantes possibilitavam o
fortalecimento do ensino e da profissão nos estados que criaram suas escolas
ainda na década de 1940: o espraiamento e adensamento das organizações
católicas – em especial da Ação Católica – nesse espaço regional, com sua
imbricação nas ações assistenciais públicas e empresariais que passam a se
irradiar, seja de iniciativa local ou nacional – como no caso da estrutura-
ção da LBA, SESI e SESC pelos estados e municípios nordestinos, além do
desenvolvimento das grandes campanhas nacionais de saúde pública16 e do
crescimento dos Institutos de Aposentadorias e Pensões; o impacto social e
econômico provocado pela entrada do país da Segunda Guerra, na sequência
da qual passaria a se fortalecer a ingerência norte-americana na estrutura eco-
nômica, política e estatal do país; a ascensão dos projetos político-econômicos
voltados para a aceleração da industrialização, sob a rubrica da “ideologia
desenvolvimentista”; a acentuação das sequelas sociais da integração desigual
do Nordeste no avanço das dinâmicas típicas dos monopólios no país, numa
fase declinante do surto da produção algodoeira e de agonia da economia
açucareira, acentuação dos conflitos agrários, agravamento da situação social
dos retirantes atingidos pelas secas periódicas.
Alguns fenômenos são sintomáticos do acirramento das contradições
sociais e conflitos políticos no Nordeste nos anos 1950, assim como da arti-
culação de forças no sentido de deslanchar projetos políticos reformadores
modernizadores, tais como:

• A instituição de estudos, fóruns e agências debruçados sobre o pro-


blema do planejamento e desenvolvimento regional, articulando pro-
jeções de crescimento industrial e a elevação dos padrões de vida da
força de trabalho como requisito do surto industrializante aspirado.
É sintomática, por exemplo, a minuciosa pesquisa empreendida em

16 Especialmente importante a esse respeito foi: a estruturação, durante os anos 1950, dos serviços voltados
ao combate à tuberculose, no contexto da Campanha Nacional Contra a Tuberculose; e, principalmente,
as ações em torno da proteção à maternidade e à infância, sob o patrocínio do Fundo Internacional de
Socorro à Infância (FISI-UNESCO) operacionalizado pelo Departamento Nacional da Criança (DNCr) e suas
instâncias regionais – fornecendo, por exemplo, serviços, benefícios, assistência educativa, nucleação de
grupos (os “Clubes de Mães”), onde verificam-se experiências do Serviço Social com organização social
de comunidade, de expressa influência norte-americana.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 25

Recife, entre 1954-1955, pelo conhecido padre Louis Joseph Lebret,


economista e religioso católico dominicano francês, criador do centro
de pesquisas e ação econômica Economia e Humanismo; articulado
pela Comissão de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, o
estudo resultou no detalhado relatório Estudo sobre desenvolvimento e
implantação de indústrias, interessando a Pernambuco e ao Nordeste
(LEBRET, 2016). Também é digna de nota a realização, ainda em
agosto de 1955, do Congresso de Salvação do Nordeste na cidade de
Recife, com grande relevância para o movimento camponês, reunindo,
pioneiramente no país, mais de duas mil pessoas, entre autoridades,
parlamentares, representantes da indústria, do comércio, de sindicatos,
das Ligas Camponesas, profissionais liberais, estudantes, para discutir
abertamente os principais problemas socioeconômicos da região. Do
mesmo modo, compôs esse quadro a realização, em Campina Grande,
do I Encontro dos Bispos do Nordeste, no ano de 1956, configurando
um marco na redefinição da política econômica adotada para a Região,
evento que contou com a presença de intelectuais como Celso Furtado,
representantes das federações de indústria de todos os estados, Ministros
de Estado e de Juscelino Kubitschek, então Presidente da República,
prenunciando a criação da Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste (SUDENE), que viria a acontecer em 1959. No caso parti-
cular dessa cidade sede do encontro, Férriz et al. (2014) informam que
o mesmo representou importante impulso para a abertura do Curso
de Serviço Social em Campina Grande; o único a existir fora de uma
capital no Nordeste até os anos 1970, sua criação, ocorrida também
em 1956, estava envolta no clima criado em torno da efetivação política
das deliberações ali tomadas, com ênfase na educação e industrialização
como soluções para o desenvolvimento econômico, do qual derivaria
a melhoria das condições sociais do município e da região.
• A ascensão das lutas e organizações no campo, expressas com a
explosão das Ligas Camponesas no Nordeste, a partir de 1955,
como um movimento agrário que contagiou um grande contingente
de trabalhadores rurais – e também urbanos – em torno da luta pela
reforma agrária e a posse da terra. Alcançando seu apogeu na década
seguinte, as Ligas expandiram-se para diversos municípios de Per-
nambuco e para outros estados brasileiros: Paraíba, onde o núcleo
de Sapé foi um dos mais expressivos e importantes, chegando a
congregar mais de dez mil membros; Rio Grande do Norte, Bahia,
Rio de Janeiro; Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Rio Grande do
Sul, Goiás, Mato Grosso, Acre e também no Distrito Federal (Brasí-
lia). No encalço dessa movimentação, a multiplicação de sindicatos
rurais, sobretudo aqueles patrocinados pela Igreja, direcionados
26

pelo Serviço de Orientação Rural de Pernambuco (SORPE). Essa


agitação do campo, e tal ímpeto de organização sindical, levaram a
realização, por exemplo, do I Congresso de Lavradores e Trabalha-
dores Rurais do Norte e Nordeste do Brasil, no ano de 1962 em Ita-
buna. Um dos pontos altos dessa efervescência se deu com a greve
de cortadores de cana de Pernambuco (e da Paraíba) deflagrada
em novembro de 1963, enfeixando cerca de 200 mil trabalhadores
rurais, resultante da experiência inédita de unificação de todas as
forças políticas e sindicais que atuavam no campo no estado — a
Federação dos Trabalhadores Rurais de Pernambuco (FETAPE), os
sindicatos e as Ligas Camponesas. Advirta-se que esse acirramento
dos conflitos sociais no campo ocorre concomitante a mobilizações
grevistas sem precedentes, entre 1963 e início do ano seguinte, nos
centros urbanos mais importantes do país, em torno, principalmente,
da luta contra a deterioração dos salários frente à alta inflação.
• A criação de órgãos de assistência técnica e financeira para o desen-
volvimento agrário, como a Associação Nordestina de Crédito e
Assistência Rural (ANCAR), criada em 1954, financiada, princi-
palmente, pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB), e voltada para
desenvolver economicamente o Polígono das Secas, na esteira das
ações de implantação de projetos de extensão e crédito rural do
Acordo Ponto IV, através do Escritório Técnico de Agricultura Brasil
Estados Unidos (ETA). Antes disso, havia sido criada, em 1948, a
Comissão do Vale do São Francisco (CVSF), responsável por aplicar
programas de desenvolvimento, relativos ao potencial hidrelétrico da
região e a modernização dos transportes no Vale do São Francisco,
distribuindo-se em ações que diziam respeito à regularização do
regime fluvial, melhoria dos transportes e comunicações, construção
de centrais e usinas hidrelétricas e redes de transmissão, irrigação,
saneamento urbano e rural, saúde pública, fomento da produção
agrícola, pesquisa sobre aproveitamento de recursos minerais, reflo-
restamento e incremento da imigração e colonização.17
• O despontar de ações abrangentes na esfera da educação de base,
como as desenvolvidas pela Igreja em Natal – ainda em finais

17 Nos últimos anos da década de 1950, é significativa a presença da atuação pontual de assistentes sociais
num projeto piloto de Eletrificação Rural em Itacuruba e Rodelas, no sertão do São Francisco, patrocinado pela
Divisão de Assuntos Econômicos e Sociais da Organização dos Estados Americanos, em convênio com a CVSF
(BEZERRA, 1959). Lastreada no Desenvolvimento de Comunidade, a atuação do Serviço Social foi de realização
de inquérito para conhecimento das comunidades, nucleação e dinamização de grupos sociais e produtivos,
trabalho junto a instituições para mobilizar recursos. Além das ações dessa comissão, destaca-se, na época,
a criação da Companhia Hidroelétrica do Vale do São Francisco (CHESF) e da Comissão de Investimentos do
Nordeste (CIN), submetida ao Ministério de Viação e Obras Públicas, e cuja função era coordenar as atividades
e obras públicas na região, além de planejar uma série de estudos de emergência contra as secas.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 27

de 1950, e a partir de algum saldo de programas de desenvolvi-


mento de comunidade de lastro norte-americano existentes nos anos
anteriores – que se aglutinam, depois, no 1º Seminário de Educação
de Base em Aracaju. Daí foi projetado um amplo Movimento de
Educação de Base (MEB), institucionalizado em 1961, recebendo
recursos federais para ações de alfabetização em áreas pauperizadas
do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, alimentado por quadros da Ação
Católica. Iniciativas como essa se verificaram em outras experiên-
cias locais, como a do Movimento de Cultura Popular de Pernam-
buco (MCP), criado em 1960, durante a primeira gestão de Miguel
Arraes na Prefeitura do Recife; ou como a campanha De Pé no Chão
Também se Aprende a Ler, lançada em Natal, em fevereiro de 1961,
na gestão do prefeito Djalma Maranhão; ou, ainda, a Campanha
de Educação Popular da Paraíba (CEPLAR), criada em 1962 por
um grupo de jovens da Ação Católica da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras da Universidade da Paraíba, com apoio do governo
estadual e da diocese local, que se tornou um dos laboratórios do
Sistema Paulo Freire, especialmente em Sapé e Muri, áreas de vio-
lentos conflitos entre trabalhadores rurais e latifundiários e intensa
mobilização das Ligas Camponesas. Em algumas dessas campanhas,
as ações de redução do analfabetismo encontravam-se, em parte,
patrocinadas pelo Acordo Nordeste firmado entre o governo brasi-
leiro (e os estados) e o norte-americano através da Aliança Para o
Progresso. É conhecida a absorção, mais ou menos consequente,
nessas experiências, de princípios pedagógicos advindos da filosofia
educacional de Paulo Freire, que passaram a envolver as estratégias
de alfabetização com a busca de constituição de uma consciência
sobre a tradição cultural e os determinantes concretos das condições
de vida das massas sociais pauperizadas para as quais se destina-
vam; o que criava oportunidade de imantação da intelectualidade
(principalmente católica) pelas lutas dos explorados, principalmente
do movimento camponês que, através das Ligas, caminhava para
a contestação dos padrões semicoloniais de dominação capitalista
no país. Todas essas iniciativas foram sufocadas, no entanto, pela
repressão desencadeada com o Golpe de 1964.18

18 Nessa quadra, há importantes registros da associação de quadros estudantis e docentes do Serviço Social,
em capitais como Recife e Natal, com tais experiências de alfabetização. Um exemplo é o vínculo da Escola
de Serviço Social de Pernambuco (ESSPE) com o Movimento de Cultura Popular de Pernambuco (MCP).
28

Numa perspectiva panorâmica, o recrudescimento de tais condicionan-


tes, no curso dos anos 1940-1950, se expressa no quadro histórico particular
impulsionador do surgimento de outras instituições de formação no Nordeste,
tais como: o Instituto Social criado em Fortaleza, em 1950, para o ensino em
Serviço Social, por iniciativa da Associação de Educação Familiar e Social,
junto com a Congregação Sociedade Filhas do Coração de Maria; a Escola de
Serviço Social da Paraíba, fundada em 1951 e inaugurada em 1952, atrelada à
entidade mantenedora Congregação das Irmãs Missionárias de Jesus Crucifi-
cado; mesma entidade que, em 1953, junto com Arcebispado de São Luís, cria
a Escola Maranhense de Serviço Social, a partir de formações desenvolvidas
pela LBA nos anos anteriores; a Escola de Serviço Social de Sergipe, criada em
Aracajú, em 1954, sob incentivo do então governo do estado e o apoio também
da Congregação das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado; tal Congregação
aparece, ainda, no apoio à abertura, em Maceió, da Escola de Serviço Social
Padre Anchieta, em 1957, pela Fundação Arquidiocesana de Assistência Social;
a Faculdade de Serviço Social de Campina Grande, cuja criação, em 1957,
foi derivada de esforços articulados pela Diretoria de Educação e Cultura do
Município e das irmãs de Caridade da Sociedade São Vicente de Paula.
Até a primeira metade da década de 1960, portanto, os cursos de Serviço
Social existentes no Nordeste ficam assim distribuídos: aqueles inaugurados
na década de 1940, nas capitais de Pernambuco (1940), Bahia (1944) e Rio
Grande do Norte (1945); e aqueles criados na década de 1950, nas cidades de
Fortaleza (1950), João Pessoa (1952), São Luís (1953), Aracajú (1954), Maceió
(1957) e Campina Grande (1957).19 Eram instituições confessionais e particu-
lares, sustentadas por subvenções governamentais, instituições assistenciais
nacionais, doações públicas e particulares, além das mensalidades das próprias
alunas. Inobstante essa diversidade de fontes de financiamento, tais instituições

Em específico, o trabalho de uma aluna, Zaira Ary, orientada pela professora Dolores Cruz Coelho, na
localidade Poço da Panela, durante a fundação do primeiro Centro de Cultura Popular do Recife, em 1962
(Círculo de Cultura Dona Olegarina). Nesse momento, não apenas Paulo Freire era professor da ESSPE,
mas também outros fundadores do MCP (PADILHA, 2008, p. 230). Padilha (2008) afirma que as práticas
dialógicas, inspiradas nas aulas e trabalhos de Paulo Freire, foram aplicadas, ademais, em projetos de
desenvolvimento de comunidade nos bairros do Recife, Olinda, Cabo de Santo Agostinho, Jaboatão dos
Guararapes e outras cidades interioranas. Evany Gomes de Matos Mendonça, então diretora da escola
de Pernambuco, relata em entrevista, que existiam alunas de Serviço Social estagiando no MEB e MCP
(MENDONÇA, 2012). Também em seu depoimento em CFESS (2017), Iza Guerra Labelle, aluna da Escola
de João Pessoa entre 1960-1964, aponta sua participação na CEPLAR, a partir do vínculo com a JUC, e
se refere ao contato, nessa atuação militante, com a literatura marxista.
19 Após isso, e até finais de 1980, surgem apenas mais os seguintes cursos, já integrados nas instituições
universitárias regidas pelo sistema de ensino superior derivado da reforma de 1968: o Curso de Serviço
Social, criado em 1965, na Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, em Mossoró; o Curso de Serviço
Social, criado em 1971, na Universidade Católica de Pernambuco, em Recife; e o Curso de Serviço Social,
criado em 1976, na Universidade Federal do Piauí, em Teresina.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 29

padeceram, desde o início, de problemas financeiros, expressos em diversas


vicissitudes estrutural-funcionais – desde instalações limitadas para o desen-
volvimento pleno das atividades do ensino, até dificuldades de pagamentos dos
professores. Constituíam escolas isoladas, absorvidas, fundamentalmente, pelas
funções de ensino, sem frentes consolidadas na esfera da pesquisa, produção
científica criadora ou atuação extensionista sistemática e fundamentada.
As restrições financeiras e as dificuldades estrutural-funcionais passaram
a obrigar as escolas a se agregarem ou incorporarem às instituições universi-
tárias germinais que começavam a aparecer nos estados durante os anos 1950.
Notamos, porém, que essas agregações não provocaram maiores consequências
na subversão dos padrões administrativos e ideológicos de ensino precedentes
– visto que as primeiras instituições universitárias apenas agregavam formal-
mente as escolas isoladas, colaborando na sua sustentação financeira, mas
sem provocarem rupturas decisivas nas direções das instituições e no caráter
do seu ensino.20 Apenas com a estruturação do sistema de ensino superior
dado após a reforma universitária de 1968, que transformou o arremedo de
universidade existente nos estados nas conhecidas universidades federais, se
verificam mudanças de vulto nos padrões de organização no ensino, dos quais
os mais significativos foram: a perda da direção das organizações católicas
sobre a formação nos cursos, donde um duro golpe na perspectiva da formação
doutrinária, catalisando a laicização; a crescente profissionalização do trabalho
docente – antes uma atividade fronteiriça do trabalho voluntário religioso ou
militante, de profissionais que dividiam o ensino com as suas carreiras liberais
nos campos de intervenção direta; a crescente abertura para o desenvolvimento
da pesquisa em Serviço Social, principalmente com a estruturação dos primei-
ros cursos de pós-graduação nos anos 1970.
Embora as primeiras escolas de Serviço Social no Nordeste tenham ini-
ciado suas atividades nos 1940 (e a maioria no decênio seguinte), os processos
de diplomação de assistentes sociais na região efetivamente se desencadeiam
apenas na transição para a década posterior. A Escola de Serviço Social de
Pernambuco, por exemplo, a primeira criada no Nordeste, em 1940, no ano
de 1950 possuía apenas três diplomadas. Considere-se a baliza da participação
da delegação brasileira no congresso de Atlantic City (1941), mas, especial-
mente, a assídua presença de assistentes sociais (também professoras das
escolas) nos congressos pan-americanos de Serviço Social a partir de 1945,
nos quais se nota a assiduidade de profissionais e docentes do Nordeste desde o
princípio; e pode-se verificar que, na fase mesma de germinação ou preparação
para a criação das escolas nos estados, as mesmas já se encontravam expostas

20 Sobre o arremedo de universidade que derivou dessas instituições antes da reforma de 1968, ver Fernandes
(2020) que as classifica de “universidades conglomeradas”.
30

a influência do Serviço Social norte-americano. Penetração que passa a se


robustecer num momento em que as escolas pioneiras (Pernambuco, Bahia
e Rio Grande do Norte) estavam formando (ainda que parcialmente) suas
primeiras gerações de turmas diplomadas.
Isso porque, já em 1949, inicia-se um programa norte-americano de
bolsas de estudos para assistentes sociais brasileiros (a partir da articulação
iniciada no Congresso de Atlantic City). Tal ação de intercâmbio compunha
o Programa Ponto IV, firmado pelo Governo Truman objetivando conceder
ajuda técnica e financeira, visando o desenvolvimento do Brasil. Além de tais
meios, foi um canal de chegada da influência norte-americana, a partir dos
anos 1950, a assistência técnica fornecida pelas agências das Nações Unidas
ao Nordeste.21 Isso após a Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social
(ABESS) e Associação Brasileira de Assistentes Sociais (ABAS) serem criadas
em 1946, como desdobramento das articulações promovidas no 1º Congresso
Pan-americano de Serviço Social, ocorrido em Santiago no Chile, em 1945.
Na passagem da década de 1950 para a seguinte, o afluxo pan-america-
nista recrudesce, impelido pela agitação política latino-americana cujo caso
modelar foi a vitória da Revolução Cubana em 1959 – mesmo período em
que as Ligas Camponesas experimentam uma ascensão e as chapas eleitorais
oposicionistas ganham projeção (como em Pernambuco e Rio Grande do
Norte). Acirram-se as preocupações norte-americanas com os desdobramen-
tos das lutas no Nordeste brasileiro, e a atenção mirrada do Acordo Ponto
IV é substituída pela intervenção, mais consistente, promovida pela Aliança
Para o Progresso (com a mediação da Agência dos Estados Unidos para o
Desenvolvimento Internacional – USAID), associada aos trabalhos iniciais
promovidos pela SUDENE. Uma baliza importante do avanço norte-ameri-
cano, com essa nova iniciativa, foi a assinatura do chamado Acordo Nordeste22

21 Os registros da Escola de Serviço Social de Pernambuco da década de 1950 são exemplares da movi-
mentação que ocorre no intercâmbio entre as escolas do Nordeste e interlocutores norte-americanos no
período – em alguns casos, absorvendo vários estados da região: em 1952, ocorre a visita da assistente
social norte-americana Miss Katheryn Knapp, cumprindo o Acordo Ponto IV e patrocinada pela União
Pan-americana, para subsidiar os trabalhos assistenciais e da Escola durante um mês; em 1953, a visita de
Rose Alvernaz para discutir Serviço Social de Menores; em 1954, a concessão de bolsa de estudos, pela
Organização das Nações Unidas, para uma professora da Escola (a vice-diretora Maria Dolores Coelho)
estudar Cooperativismo na Dinamarca; em 1955, a exposição das atividades da Conselheira de Bem Estar
do Instituto de Assuntos Interamericanos do Ponto IV, Lavínia Keys; ainda em 1954, a visita das diretoras da
União Católica Internacional de Serviço Social (UCISS) para discutir a Ação Social na Bélgica e as atividades
da entidade; no mesmo ano, a promoção de um curso sobre Serviço Social de Grupo, por parte de Miss
Catherine Jennings, este contando com 182 alunos/as, entre professores/as, supervisores/as, estudantes e
pessoal de obras sociais de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará; no ano seguinte, o retorno
de Miss Jennings, com apoio de Lavínia Keys do Ponto IV, para complementação do curso; posteriormente,
uma conferência sobre Cooperativismo com o Padre Peter Nearing, do Canadá (SILVEIRA Jr., 2020).
22 Seu título oficial era Acordo entre o Governo dos Estados Unidos da América e o Governo dos Estados
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 31

em abril de 1962, entre Brasil e Estados Unidos. Através desse instrumento,


o governo americano se comprometia em investir o valor correspondente a
quase US$ 280 milhões no Nordeste em três anos. O acordo resultou dos
estudos elaborados por Celso Furtado e pelas recomendações do chamado
Relatório Bohan. Executar-se-ia um programa de ação imediata destinado
a obter resultados rápidos na satisfação das mais urgentes necessidades da
região. Além de colaborar na viabilização dos planos da SUDENE, essa ajuda
externa impulsionou ações nos estados nas esferas da Educação (especialmente
no combate e redução do analfabetismo), da Saúde pública (financiando o
aparelhamento dos serviços e a execução de programas), da Habitação popular
(pelos programas de construção de casas populares), além do financiamento
de núcleos de colonização em cidades rurais interioranas.23
Não apenas o adensamento dessas modalidades de intervenção (regional,
nacional e internacional) sobre as refrações da “questão social” no Nordeste,
entre finais de 1950 e início da década seguinte, constituíam um lastro imediato
para a precipitação das escolas nos estados em que ainda não existiam; esse
adensamento galvanizava, ademais, uma precoce diversificação técnico-pro-
fissional baseada na projeção de respostas profissionais para além do tradi-
cional tratamento do desajustamento individual do Serviço Social de Casos.
No momento mesmo de sua germinação, a formação de quadros profissionais
das instituições de ensino próprias da região encontravam as requisições da
abordagem microscópica convivendo com demandas e intervenções – no
início, ainda incipientes – próprias da organização e desenvolvimento de
comunidade (ou do Serviço Social de Grupos): estruturação de fichários de
instituições, levantamentos de obras sociais e potencialidades do meio comuni-
tário, pesquisa e planejamento social, administração de programas, nucleação
de grupos, capacitação de lideranças, dentre outros. Isso ocorre, acrescente-se,
na mesma época em que se firmaram marcos legais da constituição de normas
e agências para uma padronização e racionalização do ensino em nível nacio-
nal (Lei n. 1.889 de 13 jun. 1953 e o Decreto n. 35.311, de 2 abr. 1954) e do
reconhecimento do exercício profissional (Lei n. 3.252, de 27 ago. 1957, que
confere monopólio do exercício aos portadores do diploma; e o Decreto-Lei
n. 994, de 15 maio 1962, que regulamenta a referida Lei).
Por outro lado, aquele adensamento significa a composição de parâmetros
teórico-ideais marcados por uma articulação sincrética que transitava para além
daquela dada entre o pensamento católico e a visão higienista, presente nos anos

Unidos do Brasil sobre a Cooperação do Governo dos Estados Unidos da América para a Promoção do
Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste do Brasil.
23 A pesquisa sobre a Aliança para o Progresso no Nordeste, em específico em Pernambuco, pode ser encon-
trada em Barros (2017).
32

iniciais das primeiras escolas em São Paulo e no Rio de Janeiro.24 Os primeiros


quadros em formação nas escolas do Nordeste encontram, desde seu nascedouro,
nos currículos como nos espaços ocupacionais (no início mais naqueles do que
nestes), o que Iamamoto (2004) identificou de “arranjo teórico-doutrinário”.
Dada a quase imediata exposição à influência norte-americana, nos marcos do
pan-americanismo monroista e seu cerne anticomunista, o Serviço Social na
região emerge, desde cedo, caudatário dessa simbiose entre o discurso huma-
nista, calcado na filosofia aristotélico-tomista, próprio no movimento católico,
as chaves heurísticas da voga psiquiátrica e psicanalítica e das teorias fun-
cionalistas da sociedade e da mudança social; todas essas, a partir de meados
de 1950, confluindo como substrato da perspectiva desenvolvimentista, seja
de cariz nacional-reformista ou não.25 No caso da Igreja, um marco importante
da filiação à visão que passava a coadunar com essa perspectiva ocorre com a
criação, em 1952, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, imprimindo
um tom reformista ao movimento católico, significativamente em torno, por
exemplo, da reforma agrária, vinculado ao objetivo do desenvolvimento. Orien-
tação respaldada com o impulso renovador do Concílio Vaticano II (1962), mas
já se forjando a partir do pensamento social de fundo neotomista encontrado em
Jacques Maritain e Louis-Joseph Lebret, entre os anos 1930-1950.26
Todas as fontes disponíveis sinalizam que, até os momentos imedia-
tamente anteriores ao Golpe de 1964, eram essas vertentes ideais que se
combinavam (ou mesmo polarizavam fricções ideológicas) conformando
as direções teóricas e políticas do Serviço Social no Nordeste. Mesmo num
ponto mais à esquerda desse espectro teórico-político, cujo exemplo modelar
foi o engajamento da Escola de Serviço Social de Pernambuco na criação do
primeiro Centro de Cultura Popular do MPC em Recife, entre 1961-1962, e
sob a orientação de Paulo Freire, o que se verifica é um arco de referências
que vão: desde as aspirações – informadas pelas publicações dos programas
de desenvolvimento de comunidade da UNESCO – de “[...] integrar as massas
24 Sobre a ideologia católica presente nas primeiras escolas, ver Iamamoto e Carvalho (2006). As hipóteses
e a documentação sobre a influência do Movimento de Higiene Mental na trajetória do Serviço Social nas
escolas pioneiras foram apresentadas por Vasconcelos (2002).
25 Essa caracterização talvez apenas se aplique menos às escolas de Pernambuco, Bahia e Rio Grande do
Norte, criadas ainda na década de 1940, formando as primeiras turmas marcadamente sob a linha da
influência mais puramente franco-belga e higienista. Mas, mesmo nessas escolas, as primeiras turmas
diplomadas se mostraram, ou ainda pouco numerosas, ou com diplomação tardia e assistemática. Em
Pernambuco, a escola criada em 1940, depois de 16 anos de existência, havia formado, espaçadamente,
apenas 17 assistentes sociais – o que pode indicar seu caráter ainda embrionário por volta do início dos
anos 1950, conforme apontamos em Silveira Jr. (2020). Inobstante isso, encontram-se testemunhos que
indicam o caráter mais laico ou leigo da escola de Pernambuco, desde sua origem, além da existência de
contestações, nos anos 1950, de professores em torno da transplantação das visões europeias de “desa-
justamento social” do Serviço Social de Casos para a realidade brasileira; o que não isenta a condução
bastante moralizadora da formação pela instituição (MENDONÇA, 2002; COSTA, 2002).
26 Sobre as principais características do pensamento católico nessa vertente, consultar Schallenmüller (2011).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 33

na luta pelo progresso econômico, social e cultural de suas comunidades”


(ARY, 1963, p. 4); até os apelos, incluídos no próprio projeto do MCP, ao
papel da educação na construção da democracia avessa à “desumanização”,
“desespiritualização” e “massificação” do homem, originados de Karl Man-
nheim – cuja sociologia, define Mészáros (2004, p. 161), era motivada por
“[...] sua apologia social orientada para a harmonia e para a transformação
das classes sociais conflitantes em entidades lógicas fictícias.”27
Sobre esse aspecto, o próprio Paulo Freire (FREIRE, 1959, p. 131;
FREIRE, 1963, p. 12; BEISIEGEL, 1982, p. 35) reconhece a Escola de Ser-
viço Social de Pernambuco como um dos campos originários de influência
intelectual e experimentação de suas ideias e práticas pedagógicas, ao lado
dos trabalhos também desenvolvidos na Divisão de Educação de Cultura do
SESI no estado, onde também desenvolvia trabalhos associado à assistentes
sociais. Na atuação docente na Escola, articulada aos trabalhos no SESI,
detectamos três experiências exemplares em torno das ideias educacionais em
gestação: a primeira, mobilizada por católicos leigos através de uma obra de
restauração social da Igreja na comunidade paroquial em Casa Amarela, por
volta de 1954-1957; a segunda, uma tentativa de educação de adultos numa
fábrica de Camaragibe, com participação da Juventude Operária Católica,
também por volta de meados de 1950; a terceira, ocupada nos trabalhos iniciais
de implementação do primeiro Centro de Cultura Popular do Recife, no bojo
do Movimento de Cultura Popular de Pernambuco (MCP), entre novembro
de 1961 e novembro de 1962. Todas matizadas pelos métodos e técnicas do
Desenvolvimento e Organização de Comunidade, ficaram registradas em
Trabalhos de Conclusão de Curso da Escola: Figueredo (1954), Duarte T.
(1957), Duarte G. (1957), Ary (1963).
As ideias educacionais então em germinação – em seguida sistematizadas
nos textos de Paulo Freire até finais de 1960 (FREIRE, 1959, 1961, 1963, 1967)
– preconizavam um investimento numa educação e agir educativo voltados
para colaborar na transição de uma sociedade primitivamente em estado colo-
nial (ou semicolonial) para um regime capitalista democrático, nos termos
de Karl Mannheim e Zevedei Barbu, associados a elementos filosóficos de
Emmanuel Mounier e Jacque Maritain. Donde a vinculação dessa educação ao
processo de desenvolvimento – nos moldes do ISEB, na linha da “ideologia
do desenvolvimento” de Álvaro Vieira Pinto – e a imbricação da mesma numa
plataforma nacional-reformista, com destaque para o apelo à reforma agrária
e uma ampla reforma educacional. Tal marco econômico do capitalismo nas-
cente era um suposto elementar não questionado, para o qual se estabelecia

27 Sobre as marcas elitistas, irracionalistas e, inclusive, simpatizantes da organização teórico-política da Igreja


Católica, no pensamento de Mannheim, ver Mészáros (2008, p. 40-42, 2009, p. 23-24). Sobre o historicismo
relativista da sociologia do conhecimento de Mannheim, e sua relação com o marxismo, ver Löwy (2009).
34

o “desenvolvimento total e harmonioso” como um “imperativo de sua exis-


tência histórica” (FREIRE, 1959, p. 45). Essa via era apresentada como uma
alternativa, tanto ao estado colonial (ou semicolonial) remanescente, quanto à
“coisificação”, “acomodação” e “desumanização” eventualmente derivadas do
progresso técnico massificado – cujos exemplos, se infere, corresponderiam
aos regimes nazifascistas e às experiências de transição socialista burocrati-
zadas. Nessa perspectiva, não são determinados antagonismos fundamentais,
irreconciliáveis e impeditivos na sociedade de classes nascente – nem na sua
situação dependente e periférica face aos centros externos – que se defendia
necessário democratizar, mas “antinomias” entre esse horizonte societário
de “democratização fundamental” e a “inexperiência democrática” derivada
das raízes histórico-culturais do estado colonial e da economia complemen-
tar tradicional. Daí um esforço de consolidação das relações capitalistas no
espectro do nacional-reformismo e uma projeção que não ultrapassava os
limites liberais do radicalismo burguês.
Dentro desse horizonte, Paulo Freire – inspirando-se no pensamento edu-
cacional de figuras como Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo – projeta que a
educação comportaria uma “duplicidade de planos instrumentais”, colaborando
para a passagem de uma “consciência transitivo-ingênua” para uma “cons-
ciência transitivo-crítica” necessária à “democratização fundamental”: de uma
parte, o preparo técnico para a compatibilização com as necessidades de expan-
são industrial e urbana; de outra parte, a formação de disposições mentais para
adesão ativa, participativa e crítica do homem ao desenvolvimento, incluindo-se
a aceitação consciente dos traumas e restrições inescapáveis derivados da indus-
trialização e a canalização das irrupções de rebelião popular para os fluxos da
participação e autogoverno nas instituições ou agências sociais estabelecidas. O
cumprimento desse papel cultural, correspondente aos pressupostos de “demo-
cratização fundamental”, demandaria uma educação e agir educativo pautados
na “autencidade cultural” das populações envolvidas, na “descentralização”,
na experiência da participação e ingerência dos sujeitos, na “dialogação” e no
exercício da criticidade, no despertar do “espírito comunitário”, etc., contra
os padrões arcaicos balizados pela propedêutica, pelas ações assistencialis-
tas, pelos moldes antidemocráticos, pelo alheamento em face das condições
concretas da realidade, etc. Malgrado a exortação que o aporte teórico geral –
localizado entre finais de 1950 e meados da década seguinte – direciona para
a orientação racional e crítica do pensamento, a orientação ideal era forjada
pelo pensamento renovador cristão do qual não escapava alguma impregnação
explícita do discurso religioso28 (FREIRE, 1959, 1961, 1963, 1967).

28 Sobre esse aspecto, basta notar a discussão sobre a pluralidade de relações do homem com o mundo,
quando se discute a capacidade de transcendência do homem: “A sua transcendência está também, para
nós, na raiz de sua finitude. Na consciência que tem desta finitude. Do ser inacabado que é e cuja plenitude
se acha na ligação com seu Criador. Ligação que, pela própria essência, jamais será de dominação ou de
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 35

A aproximação então existente a elementos da tradição marxista no Serviço


Social no Nordeste – sejam prático-políticos (perspectiva da luta de classes,
projeção anticapitalista e anti-imperialista), sejam teórico-intelectuais (dialé-
tica do concreto, noção de práxis e de totalidade etc.) – ocorria nas fronteiras
do movimento estudantil, através da participação de alunas na JUC, quando
essa já esboçava se desgarrar da hierarquia católica. Somente com a criação da
Ação Popular, em junho de 1962, passaram a desaguar, de modo mais fluido,
elaborações reivindicando ideias marxistas (frequentemente arranjadas de modo
compósito com outras tradições teórico-culturais) no seio dessa militância estu-
dantil de Serviço Social, então dominada por esses quadros da esquerda católica.
De todo modo, mesmo até a virada para a década de 1970, as fontes empíricas29
indicam que nada disso transbordava para o interior da formação profissional
através da absorção explícita do debate marxista ou através da inclusão formal
dessas vertentes na estrutura curricular dos cursos. Até o golpe de 1964, no
âmbito das escolas, quando muito, apareciam nas ementas referenciais nacio-
nal-desenvolvimentistas, nas disciplinas de desenvolvimento e organização de
comunidade (ou correlatas); relatos mais pontuais sinalizam a adoção circuns-
tancial, por iniciativa individual ou de grupos docentes, de fontes bibliográficas
impregnadas por formulações de filiação marxista em componentes curricula-
res.30 O Golpe de 1964 vai cooperar diretamente para a criação de um clima de
domesticação, mas sempre de libertação.” (FEIRE, 1967, p. 40). A explicitação do conjunto de influências
heteróclitas de Paulo Freire entre as décadas de 1950 e 1960 foi pormenorizada na pesquisa de Beisiegel
(1982). Também Paulo Rosas (2003) propõe a apreciação panorâmica desses anos na vida de Paulo Freire.
29 O material empírico que sustenta nossas observações encontra-se nos depoimentos extraídos de Silva (1991),
sobretudo nas passagens das entrevistas de: Safira Ammann, aluna da Escola de Serviço Social de Natal
entre 1955 e 1957 (SILVA, 1991, p. 184-185); Maria Luiza de Souza, aluna da Faculdade de Serviço Social
de Aracajú entre 1959-1962 (SILVA, 1991, p. 192-194); Rosalina Santa Cruz Leite, formada em 1966 pela
Escola de Serviço Social de Pernambuco (SILVA, 1991, p. 223-224); Maria Helena de Almeida Lima, que
iniciou o curso em Pernambuco, em 1964, finalizando-o em Salvador, em 1967 (SILVA, 1991, p. 241-245).
Consideramos também o depoimento da aluna Rosalinda de Santa Cruz, aluna da escola de Pernambuco
entre 1963-1967 (CRUZ, 2002).
30 Aluna da Escola de Serviço Social de Pernambuco entre 1958-1962, Lúcia Freire testemunha a adoção, sob
influência do professor Paulo Freire, de leituras das revistas Brasiliense e Estudos Sociais em Seminários de
Formação, com presença de autores como Caio Prado Júnior, Florestan Fernandes, Octávio Ianni, Mariguella
(PADILHA, 2008, p. 284). Outras pesquisas irão apontar exemplos desse gênero na segunda metade de
década de 1960 ainda em Pernambuco (VIEIRA, 1992, p. 154) e em Campina Grande (FERRIZ, 2004, p.
293). No tocante à experiência docente de Paulo Freire na Escola de Serviço Social de Pernambuco, as suas
publicações da época (FREIRE, 1959, 1967) sugerem que o uso de autores reconhecidamente marxistas,
como Caio Prado Júnior, durante alguns momentos das aulas, se restringiria à fundamentação da leitura do
“estado colonial” e da “economia complementar” da época colonial que deveria ser superada por um regime
democrático nos marcos do capitalismo nascente. Sobre isso, a pesquisa de Beisiegel (1982, p. 67) indica
que “[...] embora já estivessem comprometidos com a mudança da vida social e buscassem atuar tendo em
vista a construção de uma sociedade mais justa, nesse período mesmo os setores cristãos de vanguarda,
com os quais o educador se identificava, ainda encontravam no marxismo e na atividade dos comunistas,
um dos principais adversários de seu movimento. Não é estranho, assim, que os recursos metodológicos
da explicação marxista das contradições do social estivessem ausentes do pensamento de Paulo Freire,
nesta etapa de suas investigações.”
36

intimidação teórica e política que faz reproduzir e aprofundar os componentes


ideais conservadores e regredir as tendências esquerdizantes que penetram em
algumas experiências de formação. Embora isso não significasse, ademais, a
inexistência de refrações prático-interventivas das tendências ideais críticas nos
campos de estágio e de atuação profissional, com todos os limites que envolviam
a tutela militar da vida política, institucional e cultural.
Por outro lado, as próprias escolas de Serviço Social do Nordeste ten-
tam se projetar para a conquista dos espaços profissionais nos órgãos de
desenvolvimento, expressando sua crescente filiação a essa perspectiva. No
I Encontro das Escolas de Serviço Social do Nordeste (1963), a garantia
da presença da SUDENE – na figura do seu Diretor do Departamento de
Recursos Humanos, a convite de docentes de Pernambuco – significava a
busca pela legitimidade nessa esfera, visando, inclusive, meios de sustentação
financeira das unidades de ensino. Nesse aspecto, foi tão frutífero o episódio,
que o Diretor, inicialmente desacreditado da possibilidade do Serviço Social
contribuir com o desenvolvimento regional, alterou sua visão, e iniciou um
processo de inter-relacionamento das escolas com a SUDENE. Daí a criação
de um Departamento de Ação Comunitária no órgão, em 1965, com a parti-
cipação de assistentes sociais (essa busca de adesão ao desenvolvimentismo
se aprofunda no II Encontro do Nordeste) (VIEIRA, 1992).
É nesses anos que vemos intensificar a interação entre a SUDENE e o
Serviço Social: no início da década de 1960, estabelece-se um convênio, por
exemplo, da escola de Pernambuco com a UNICEF, através da SUDENE;
em 1964, a SUDENE realizou um curso de Desenvolvimento Econômico e
Desenvolvimento de Comunidade, convidando vários assistentes sociais da
região Nordeste – curso que se encerrou abruptamente, em finais de março
de 1964, com a deflagração do Golpe; em 1965, a SUDENE incorpora em
seu III Plano Diretor o objetivo de associar, à ação econômica, um programa
específico de ação comunitária, donde a criação da Divisão de Ação Comuni-
tária; mesmo ano no qual ocorre o 1º Encontro SUDENE/DRH/AC/Escolas
de Serviço Social do Nordeste, comparecendo, além das escolas da região,
o CBCISS, a ABESS, o CRAS 4ª Região e o Centro Regional da ABAS de
Pernambuco – o encontro é mencionado em Vieira (1992, p. 196) e Ammann
(2003, p. 146). Esse intercâmbio entre as Escolas e a SUDENE possibilitou
a implantação de convênios que garantiram a sustentação do corpo docente
de algumas instituições de ensino, assim como equipamentos, livros etc.,
conforme detalha Vieira (1992, p. 196). Progressivamente, aparecem tensões
na relação entre as escolas e a Divisão de Ação Comunitária, como apontam
Vieira (1992, p. 197) e Ammann (2003, p. 157).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 37

O Serviço Social na particularidade do Nordeste, durante seu próprio


processo de gestação, encontrou-se exposto às variáveis que conformaram o
processo de erosão das formas tradicionais do exercício profissional.31 Mais
ainda, posto os conflitos de classe ali acirrados entre meados da década de 1950
e início da seguinte, sobretudo em torno do problema agrário e camponês, e
as correspondentes formas interventivas do Estado (articulado com agências
norte-americanas), do empresariado e da Igreja, supomos que o Nordeste tenha
oferecido um laboratório de importantes tendências renovadoras do Serviço
Social que irão ser precipitadas no ciclo autocrático – tendências cujo núcleo
teórico-ideal foi decifrado por Netto (2005). O caso mais emblemático e docu-
mentado que tivemos acesso se refere à relação entre as experiências e propos-
tas de educação popular e a fecundação da tendência renovadora identificada
por Netto (2005) como “intenção de ruptura com o Serviço Social ‘tradicio-
nal’”. Sobre isso, basta observar a declarada influência intelectual e técnica
de Paulo Freire na formação de Leila Lima Santos32 – uma das principais
formuladoras do “Método BH” – que, durante a vida estudantil, desenvolvera
o estágio no Setor de Educação de Base do MEB em Minas Gerais, orientada
pela linha da JUC e Ação Popular. Essa mesma influência intelectual e técnica
das práticas pedagógicas inspiradas nas ideias de Paulo Freire – das quais uma
fonte de experimentação, já mencionamos, foi oportunizada numa parceria com
a Escola de Serviço Social de Pernambuco – se verifica na trajetória de outros
conhecidos protagonistas teóricos da referida tendência renovadora, tais como
Safira Bezerra Ammann e Vicente de Paula Faleiros.33

31 Sobre a erosão do Serviço Social “tradicional” no Brasil, ver Netto (2005, p. 136-141).
32 Sobre essa influência, pode-se cotejar o depoimento da referida professora em Silva (1991, p. 198).
33 Pode-se ver, em Silva (1991, p. 183-234), o testemunho desses e outros personagens que – despertando,
na formação profissional, influenciados pelas experiências da educação popular de extração freiriana, arti-
culadas à militância universitária católica – numa fase profissional e intelectual mais madura contribuíram
para a introdução do pensamento marxista no Serviço Social.
38

REFERÊNCIAS
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CAPÍTULO 2
PERCURSO HISTÓRICO DA
CRIAÇÃO DA ESCOLA DE
SERVIÇO SOCIAL DA BAHIA
Gilca Oliveira Carrera
Ivone Pires Ferreira de Oliveira
Alessandra Carvalho da Cruz

1. Introdução

A recente produção de conhecimento sobre o Serviço Social evidencia um


relativo crescimento de estudos no campo da historiografia de sua institucionali-
zação como profissão no Brasil. Tal fenômeno pode ser apontado como produto
direto da expansão da pesquisa nesse campo do conhecimento, e, consequente-
mente, como fruto do seu amadurecimento observado nas últimas décadas do
século XX, quando da influência direta da teoria crítica sobre os referenciais teóri-
co-metodológicos que embasam o Serviço Social contemporâneo, de modo a con-
tribuir diretamente para a sua explicação no movimento histórico da sociedade.34
O aprofundamento das pesquisas sobre os processos sócio-históricos que
envolvem o advento do Serviço Social brasileiro tem despertado o interesse
de muitas pesquisadoras e pesquisadores que, em suas análises interpretativas,
procuram situar a trajetória de institucionalização da profissão a partir das rela-
ções de poder estabelecidas na sociedade capitalista e de suas consequências
materializadas nas múltiplas expressões da questão social; consequências que
justificam a introdução do Serviço Social como especificidade na divisão social
e técnica do trabalho e dão sentido próprio à sua inserção na sociedade brasileira
(IAMAMOTO; CARVALHO, 2005; MONTAÑO, 2007; YASBEK, 2009).
Nesta perspectiva, a institucionalização do Serviço Social no Brasil é
geralmente concebida como tendente consequência do estágio de industriali-
zação do capitalismo monopolista e resultado das múltiplas transformações,
de ordem social e política, experimentadas no interior dessa sociedade quando
do intenso processo de intervenção estatal na regulação das políticas sociais

34 De acordo com Montaño (2007, p. 10), existem duas teses explicativas principais sobre o desenvolvimento
do Serviço Social como profissão: as teses que situam “[...] abordagens tradicionais e conservadoras de
distintas matizes que desenvolvem uma análise evolucionista e endogenista acerca da origem da profissão” e
as teses que aludem a “[...] emergência da profissão nos marcos do desenvolvimento capitalista, legitimada
pelo papel que desempenha na ordem burguesa”, que se situam a partir de uma perspectiva histórico crítica.
48

que marcam o período profícuo em ações do Estado e do empresariado frente


às manifestações da questão social.
Como assinala Yasbek (2009), as análises sobre os fundamentos da pro-
fissão estão fincadas nas diversas condições históricas em que se desenvol-
veram a sua intervenção na realidade em que opera, isto é, no movimento
histórico que, por si mesmo, é dinâmico, nas particularidades da sociedade
ante o desenvolvimento do capitalismo brasileiro e dos seus desdobramentos,
que incidem sobre a forma como a profissão do Serviço Social se organizou
e buscou meios de se estabelecer socialmente.
Não obstante a ampliação de tal debate e a efetiva produção de conhe-
cimento sobre a história do Serviço Social no Brasil na atualidade, e esta,
por si mesma, se constituir num componente relevante dos fundamentos da
profissão como elemento que dá sentido à sua organização, institucionalização
e permanência na divisão sócio técnica do trabalho, notam-se muitas lacunas
existentes sobre “as histórias das escolas de Serviço Social no Brasil”, de
modo a dificultarem a socialização do conhecimento das particularidades
que envolvem o aparecimento dessas instituições pioneiras no ensino de tal
profissão no país.
Figurando entre os estados brasileiros que, a partir da terceira década do
século XX, inauguraram Escolas para formação de assistentes sociais, tam-
bém esteve a Bahia. Inaugurada no início dos anos 1940, a Escola de Serviço
Social da Bahia foi resultado do esforço da ação católica soteropolitana que,
acompanhando a tendência das discussões efervescentes no centro da Igreja,
terminou por impulsionar a expansão da profissionalização do Serviço Social
em todo o estado baiano.
Com o objetivo de contribuir para a reconstrução de um dado percurso
da história da criação da Escola de Serviço Social da Bahia, este texto busca
apontar alguns antecedentes históricos, sociais e políticos que permearam
as conjunturas nacional e local, bem como as particularidades que explicam
a sua fundação como instituição pioneira na formação das(os) assistentes
sociais baianos. A opção metodológica trilhada pelas autoras buscou enfatizar
a análise das condições sócio-históricas que justificaram a chegada do Serviço
Social na Bahia dos anos 1940, momento de grandes transformações políticas
e agravamento da questão social no estado.
As temáticas que envolvem a história do Serviço Social na Bahia vêm
sendo objeto de interesse do Grupo de Pesquisa em Serviço Social, Educa-
ção e Direitos da Criança (GESSED), no qual as autoras se integram como
pesquisadoras. Desde o ano de 2016, o GESSED vem buscando, através da
linha de pesquisa História do Serviço Social, catalogar e organizar o acervo
documental da atual Escola de Serviço Social (ESSO) que, desde 1961, está
vinculada à Universidade Católica do Salvador (UCSal).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 49

Tal esforço vem evidenciando que, desde a sua fundação, a ESSO se


constitui como um núcleo de referência e compromisso com a qualidade
da formação profissional das(os) assistentes sociais, de modo a expandir os
valores tão caros à profissão do Serviço Social: a democracia, a liberdade
e justiça social. Tais valores se expressam, principalmente, no estímulo ao
desenvolvimento de competências técnicas, éticas e políticas dos seus mais
de seis mil estudantes formados até o presente.

2. Constituintes e especificidades históricas no


surgimento do Serviço Social no Brasil

O surgimento do Serviço Social no Brasil se deu na década de 1930,


após a efervescência do movimento político-militar que empossou Getúlio
Vargas presidente e demarcou o declínio das oligarquias políticas historica-
mente constituídas como início do estabelecimento de um Estado notadamente
capitalista, materializado a partir das profundas mudanças que se deram, tanto
na estrutura econômica e industrial, quanto na organização social e política
do país dali por diante (CARRERA, 2014).
É na tessitura das grandes transformações empreendidas na chamada
Era Vargas, isto é, no período demarcado entre os anos 1930 e 1945, que
o Serviço Social será promovido, fundamentalmente pela tríade da Igreja
Católica, empresariado e burguesia, e se proliferará através de várias Escolas
fundadas nas capitais brasileiras que se encarregarão de promover a formação
das(os) primeiras(os) assistentes sociais do país.
Neste sentido, as particularidades da trajetória de profissionalização
das(os) primeiras(os) assistentes sociais no Brasil podem nos oferecer uma
chave interpretativa muito singular para o entendimento do projeto político
construído pelos ideólogos da Nova República de Getúlio Vargas.35 Não é à toa
que no auge da política populista de maior investimento na imagem de “Pai
dos Pobres”, Vargas autorizou a criação da Escola de Serviço Social de São
Paulo (1936). Combater a pobreza, transformando o “homem em cidadão” via
promoção do trabalho, era uma das principais estratégias políticas e ideológicas
de valorização do trabalho e se constituía como propaganda do governo Vargas.
É especialmente a partir desse período, segundo Gomes (1999), que a
pobreza passou a ser considerada como um obstáculo para o desenvolvimento
da Nação, deixando de ser vista como inevitável. A República Velha era
insistentemente responsabilizada pela sua incapacidade em resolver as
profundas mazelas deixadas pelo período da escravidão, além de muito
criticada pelo seu imobilismo diante da “questão social”.

35 Getúlio Vargas foi presidente de 1930 a 1945 e posteriormente de 1950-1954.


50

A questão social é entendida, nesse contexto histórico, como

[...] as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe


operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo
seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado
(TELLES, 1996, p. 85).

Para Telles (1996), a contradição entre o proletariado e a burguesia,


manifesta no cotidiano da vida social, requereu outros tipos de intervenção
que ultrapassavam os ideais de caridade e repressão, formas conhecidas então,
como atenuantes das tensões sociais. A questão social e seus impactos, tanto no
mundo do trabalho, quanto na eficácia e utilidade das pessoas ao sistema pro-
dutivo, passaram a interessar aos vários segmentos organizados da sociedade
nas primeiras décadas do século XX, quer seja por interesses institucionais,
sociais ou políticos.
No processo histórico do seu surgimento, o Serviço Social se faz como
profissão que busca respostas à questão social a partir de intervenções junto
a famílias e aos indivíduos, de modo a atendê-los em suas demandas sociais
mais objetivas, que perpassam, também, pelo monitoramento de questões
morais que afetam a ordem estabelecida em sociedade (YASBEK, 2009). A
possibilidade de intervenção junto às pessoas era um atrativo não somente à
Igreja, mas ao empresariado e ao Estado. Assistentes sociais, portanto, eram
necessárias(os) a uma conjuntura de desordem social, conflitos institucionais
e baixa produtividade nas relações de exploração da força de trabalho.
Desse modo, temos como ponto de partida a premissa de que, não
somente o interesse católico promoveu a institucionalização da profissão do
Serviço Social no Brasil, mas também o Estado e a burguesia. Ressaltamos
aqui que o amplo ideário de reforma social, promovido pela Igreja Católica,
empresariado e sociedade elitista, empreendeu a institucionalização da pro-
fissão como uma das estratégias de múltiplos interesses.
Para a Igreja Católica, o envolvimento com a institucionalização do
Serviço Social era relevante frente a um grande projeto de retomada de sua
força como instituição religiosa na sociedade. Aliás, a sua implicação com a
questão social integrava as muitas estratégias, vigentes naquele momento, de
tentativa de retomada da fé cristã no seio da sociedade e também de reafir-
mação da instituição no espaço político36, já muito neutralizado ao longo das
décadas de 1920 e 1930. Já para o empresariado, as(os) assistentes sociais se

36 No plano político, os resultados do esforço católico podem ser observados na Constituição de 1934, quando
da introdução do ensino religioso nas escolas públicas, da afirmação dos capelães militares no interior das
Forças Armadas e, principalmente, a subvenção estatal para as atividades assistenciais ligadas à Igreja
(AZEVEDO, 2004).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 51

constituíam como seguimento útil no arregimentar de trabalhadores disper-


sos e afetados pelo agravamento das condições de vida. E, para o Estado, a
atenção à questão social contribuía para a manutenção da ordem, o controle
dos fenômenos que emergiram do contexto social, político e econômico de
um país em intenso processo de reestruturação e crescimento.
Não obstante as tendências interpretativas internas sobre a gênese da
profissão no Brasil (MONTAÑO, 2007), é fato que, a partir dos registros
históricos já amplamente analisados (AGUIAR, 2011; IAMAMOTO; CARVA-
LHO, 2005; YASBEK, 2009), o contexto dos acontecimentos que antecedem
a criação da primeira Escola de Serviço Social, inaugurada em São Paulo no
ano de 1936, está amplamente entrelaçado ao movimento interno católico
que estimulou e potencializou o laicato a promover a difusão de ações que
constituíssem uma nova ordem social cristã, que, no seu bojo, terminasse
assegurando os valores conservadores da Igreja e as suas inquietações naquele
momento histórico em que a Ação Católica era conclamada a engajar-se na
cristianização dos indivíduos e das famílias.
A franca crise que a Igreja Católica atravessava, entre o final do século
XIX e início do século XX, se intensificou a partir da proclamação da Repú-
blica37, quando da oficialização da laicização do Estado. No entanto, desde
a década de 1920 se multiplicaram as iniciativas de ampliação das forças
políticas da Igreja, sobretudo no que diz respeito à afirmação do seu poderio
frente aos segmentos elitizados.
Na perspectiva do episcopado brasileiro, fração formada por represen-
tantes do magistério superior da Igreja que encabeçaria o intento católico de
reforma da sociedade, a reversão dos prejuízos sociais e políticos que atingi-
ram essa instituição só seria possível a partir da construção de uma série de
ações38 que perpassavam pelo investimento na educação católica, ou seja, na
capacitação dos leigos, arregimento de intelectuais a causa da Igreja e criação
de universidades.39
De fato, como parte desse projeto aguerrido, a formação de leigos mere-
ceu atenção e empenho das autoridades eclesiásticas, em razão da influência
das orientações papais previstas na Encíclica Ubi Arcano Dei (1922) de Pio
XI, que demandava a necessidade e valorização da ação de católicos leigos

37 A partir de 1890, pelo Decreto nº 119-A, que “Prohibe a intervenção da autoridade federal e dos Estados
federados em matéria religiosa, consagra a plena liberdade de cultos, extingue o padroado e estabelece
outras providencias”.
38 Pode-se destacar a criação das Confederações Católicas em São Paulo, Olinda e Rio de Janeiro na
década de 1920, o lançamento da Revista “A Ordem” (1921) e a inauguração do Centro Dom Vital (1922)
(AGUIAR, 1995).
39 Projeto concretizado com a criação da Universidade Católica do Rio de Janeiro, em 1940. A partir desse
ano, outras universidades católicas começariam a se instituir em várias capitais brasileiras.
52

fiéis ao apostolado hierárquico da Igreja. Essa carta papal determinou a cria-


ção da Ação Católica, que foi constituída em vários países e, no Brasil, seria
formalmente concretizada a partir de 193540 – ainda que ações de natureza
social viessem sendo desenvolvidas continuamente por grupos leigos da Igreja.
Foi através da organização dos segmentos leigos que se empreenderam
esforços no sentido de se requisitar a cooperação de representantes de ins-
tâncias católicas internacionais que vieram ao Brasil a fim de ministrarem os
primeiros cursos sustentados nas doutrinas da Ação Social da Igreja. Em plena
Revolução Constitucionalista em São Paulo (1932), a Ação Católica agen-
ciou a fundação do Centro de Estudos e Ação Social (CEAS), em São Paulo,
entidade que nasceria com a intenção de ser promotora de ações assistenciais
da burguesia paulista e, de modo efetivo, influenciaria segmentos católicos
diversos e contribuiria significativamente para o surgimento do primeiro Curso
de Serviço Social (IAMAMOTO; CARVALHO, 2005).
Em meio ao interesse católico de qualificação dos seus quadros leigos
para uma intervenção mais especializada, que serviria às funções dos seus
organismos internos, a própria conjuntura social do Estado brasileiro come-
çava a demonstrar, não apenas a necessidade de absorção de técnicos especia-
lizados no manejo das demandas sociais, mas passaria, também, a fomentar
políticas sociais diversas que demandariam especialização técnica. Período
profícuo de mudanças estruturais no Estado, por toda a Era Vargas é possível
identificar o crescimento das políticas e legislações de natureza social.
Em suas análises, Yasbek (2009) ressalta que são as exigências da repro-
dução da vida social dos segmentos trabalhadores empobrecidos que termina-
ram por pressionar o Estado em torno da efetivação de uma ação assistencial
mais sistemática que, de fato, se manifestaria como estratégia de regulação
de processos econômicos e sociais, favorecendo a industrialização em cres-
cimento a partir de 1930. Cada vez mais legitimado como regulador dos
processos sociais, e dos seus efeitos, o Estado vai assumindo o controle das
relações sociais, pois passa a intervir “[...] tanto na viabilização do processo
de acumulação capitalista, como no atendimento das necessidades sociais das
classes subalternas” (YASBEK, 2009, p. 9).

3. Panorama sócio-histórico da Bahia no processo


de criação da sua Escola de Serviço Social

A Escola de Serviço Social da Bahia foi instalada na conjuntura polí-


tica singular que marcava o ano de 1944, isto é, num momento histórico
permeado pelo autoritarismo do Estado Novo, personificado na atuação da

40 Ano da instalação da Ação Católica em São Paulo.


A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 53

última intervenção federal militar no estado.41 Desde o governo provisório,


instalado após a Revolução de 1930, a nomeação de interventores civis e
militares em várias cidades serviu para acirrar as instabilidades observadas
no campo político em todo o território nacional. Segundo Silva (2000), em
Salvador a República Nova fora muito mal recebida pelas velhas lideranças
políticas. A interventoria de Juracy Magalhães – “um tenente, jovem e cea-
rense” 42 – em 1932, ferira os brios de uma elite acostumada com o poder de
mando local. Como consequência mais direta, observamos uma significativa
oposição ao governo de Vargas na Bahia.
A expressão do autoritarismo e do liberalismo que caracterizou a política
governista da Era Vargas foi demonstrada pela substituição de interventores
civis por militares, o que representou uma hábil estratégia para “atrair e subme-
ter as massas descontentes” (SAMPAIO, 1997, p. 62). Entre o período de 1930
a 1945, a Bahia foi governada por cinco interventores, na sua maioria militares.
Nos primeiros anos da década de 1940, o estado baiano começava a
sair de uma economia fortemente agroexportadora, mantida pelo mercado
externo, cujo maior sustentáculo era a lavoura cacaueira, que já vinha sen-
tindo os impactos da queda de preços e de outros efeitos que se somavam à
baixa arrecadação fiscal. Mesmo com as elevações observadas nos indicadores
sociais advindas das melhorias nos setores de infraestrutura, a Bahia buscava
meios de fortalecimento da economia interna, ainda muito voltada para a sua
subsistência (SILVA, 1992).
A indústria baiana encontrava-se em déficit, com a produção essencial-
mente voltada para o fabrico de tecidos e açúcar. Enfrentava-se forte escassez
da produção industrial, em razão da ausência de investimento em maquinário
e mão de obra qualificada, em função da alta taxa de analfabetismo no estado,
que era 73% (IBGE, 2007) e das más condições operativas para escoamento
da produção de mercadorias.
Essa produção industrial incipiente beneficiava-se do grande contin-
gente de mão-de-obra, “exército migratório”, que desenvolvia até trabalhos
autônomos, como carroceiros, ferreiros, marceneiros, carregadores, alfaiates,
vendedores de produto alimentares, dentre outros. Segundo Bairros (1987),
a mão-de-obra disponível favoreceu os altos índices de exploração da força
de trabalho, principalmente negra, “[...] disposta a suprir as necessidades das
empresas em troca de baixos salários” (BAIRROS, 1987, p. 47).

41 O coronel Renato Afonso Pinto Aleixo que foi interventor da Bahia de 1942 a 1944.
42 De acordo com Silva (2000, p. 72), esses eram os principais atributos que feriam os “brios de uma elite
consciente de seu poder”. Sob o movimento de “retomada da autonomia baiana”, essa elite passa a unir
forças oposicionistas antes dispersas, como integralistas, coronéis e intelectuais. Todos atraídos para fazer
frente ao governo e aos comunistas.
54

Todos esses fenômenos incidiram diretamente sobre as condições de vida


da população e, consequentemente, sobre o mercado de trabalho. Os dados
censitários de 1940 registram que a Bahia ocupava, nessa época, o terceiro
lugar em termos populacionais.
Salvador, mesmo sendo a capital do estado, era uma cidade com muitos
problemas sociais, oriundos, não somente dos acontecimentos das últimas
décadas, mas, sobretudo, do histórico de desigualdades acumuladas desde
os tempos coloniais, devido ao intenso processo de escravidão que o estado
baiano sofreu. Rodrigues (1998) assinala que, até meados do século XX, a rede
assistencial existente na capital era insuficiente e obsoleta, não respondendo as
demandas de sua população de 290 mil habitantes (IBGE, 2007). No relatório
do interventor Landupho Alves (1941), que governou a Bahia entre os anos
de 1938 e 1942, observa-se que, nesse período, Salvador enfrentava sérios
problemas estruturais que atingiam os índices básicos de desenvolvimento.
Deve ter sido esse o motivo da pobreza ter sido apresentada, por Jorge
Amado, como a principal atração da cidade, na primeira edição de Bahia de
Todos os Santos-guia de ruas e mistérios da cidade de Salvador (1945). No
romance, o autor descreve a realidade de Salvador, que contrastava com a
beleza de suas praias, dos seus antigos casarões e da sua topografia, desta-
cando o lado triste, pobre, miserável, quase “fúnebre” de Salvador. Ao falar
dos bairros operários, o autor mostra que a fome era a perspectiva mais ime-
diata, já que a população não ganhava o suficiente nem para comer, e vivia
numa rotina estafante, preenchendo as estatísticas de mortalidade infantil e
de casos de tuberculose.
Sobre esse aspecto, escreveu Amado (1945): em mil crianças nascidas
na cidade da Bahia, 385,38 morriam antes de completar um ano, citando as
estatísticas do Boletim Bioestatístico do Departamento de Saúde da Bahia, de
fevereiro de 1944. E concluiu: “Nesta cidade o coeficiente de mortandade é
de 37,71 por mil habitantes. O coeficiente normal é de 12 por mil habitantes.
O que mata tanto assim? A fome” (AMADO, 1945, p. 29).
A pobreza e a precarização das condições de vida da população baiana
eram fenômenos tão correntes que invadiam a poesia. Como forte expressão
cultural local, nos anos 1940, o samba também foi marcado por testemunhos
sobre a condição de vida do trabalhador baiano. A composição de Riachão,
intitulada Pobre do Pobre, sintetiza, de forma bem realista, as contradições
entre o capital e o trabalho observadas no cotidiano das relações sociais
da Bahia:

Pobre do pobre
carregado de filho
isso eu posso afirmar
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 55

Ele se não trabalhar é um louco


mas o que ganha é tão pouco
Não dá pra se alimentar
Por causa da carestia
Sente a barriga vazia
É só o que se vê
Pega o trabalho às 6 horas
Larga às 18 horas
Sem comer, sem beber
Daí é que chegam suas lágrimas
Ele não pode cantar
Foge a alegria do homem
Vendo seus filhos com fome43

Segundo Cruz (2006), sob o jugo de um Estado que criminalizava o


desemprego e fazia da carteira de trabalho uma porta de entrada para os
direitos da cidadania, quem fosse taxado de vagabundo acabava indo parar
na cadeia. Mas o trabalho não trazia o sustento da família. Apesar da tristeza
e do desalento, presente nos versos, a canção não deixa de expor os limites de
uma política de valorização do trabalho centrada na ideia de que a pobreza era
um mal a ser evitado e que a riqueza era um bem comum (GOMES, 1999).
Ante a realidade marcada pela pobreza, analfabetismo e vulnerabilidades
diversas, a qual estava submetida a maioria da população baiana, muitos seg-
mentos filantropos e caridosos44, instalados em Salvador, buscavam na prática
assistencialista direta meios de equacionar a questão social, não apenas dentro
da capital, mas também nas zonas mais carentes do estado.
A Escola de Serviço Social, surgida em 1944, teve como objetivo “[...]
a solução dos problemas sociais e assistenciais da Bahia”, ao menos era essa
a sua pretensão expressa no seu primeiro regimento (1957)45, que assinalava
como seus fins “[...] a formação de pessoal técnico habilitado para a exe-
cução e direção do Serviço Social” (ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL DA
BAHIA, 1957, p. 3).
Dada a configuração de sua primeira diretoria, pode-se afirmar que a elite
católica da cidade de Salvador se empenhou na criação da Escola, reunindo
os médicos Thales de Azevedo e Fernando São Paulo, oriundos da Faculdade

43 Pobre do pobre, de Riachão, trata-se de uma canção composta na década de 1950 e cantada em entrevista
concedida a Alessandra Cruz, em outubro de 2000.
44 Destaca-se, por toda a década de 1930, a atuação do médico higienista Alfredo Magalhães, que dirigiu o
Dispensário Infantil do Instituto de Proteção a Infância da Bahia (IPAI), e o grupo de senhoras filantropas
chamadas Damas da Assistência, formado por senhoras da sociedade soteropolitana que praticavam
trabalhos assistenciais diversos (CARRERA, 2014).
45 Conforme o Regimento da Escola de Serviço Social (1957, p. 3).
56

de Medicina da Bahia, e filantropas consagradas, como a conhecida “dama


da assistência da Bahia”, Henriqueta Martins Catharino46, e a professora
Anfrísia Santiago.47

4. A Escola de Serviço Social da Bahia


A Escola de Serviço Social da Bahia se instalou oficialmente em Salvador
no dia 15 de fevereiro de 1944, a partir do empenho de homens e mulheres
engajados em causas sociais da cidade. O seu idealizador, e primeiro diretor,
foi o médico, jornalista e sociólogo Thales de Azevedo48, reconhecido inte-
lectual baiano que, nessa época, já tinha ocupado, dentre outros, o cargo de
diretor do Conselho Estadual de Assistência Social (FGV, 2001).
Atribui-se a Azevedo, não somente a autoria do projeto de fundação
da Escola, como também o arregimento de outras personalidades atuantes
em instituições diversas de natureza social, principalmente dona Henriqueta
Martins Catharino, diretora do Instituto Feminino de Salvador, instituição
de destaque no meio das elites baianas. Outros nomes conhecidos daquela
sociedade aparecem listados como fundadores da Escola, como a professora
Guiomar Borges, dentre outros médicos e educadores que figuram nos docu-
mentos oficiais (ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL DA BAHIA, 1949).
Motivo de orgulho e ingresso na “atualidade”, a imprensa da época noti-
ciou com grande euforia a fundação da Escola de Serviço Social e sua impor-
tância como instituição inovadora no estado. Anunciada como um centro de
estudos da assistência social, sua implantação certamente avivou a esperança
de regulação da questão social através de conhecimentos técnicos científicos
da dita “assistência social”:

A Bahia vai ter uma Escola de Assistência Social. Sua estrutura será nos
moldes das existentes na França, nos Estados Unidos e na Bélgica. E o
fato se reveste de significação porque vamos figurar ao lado de capitais
como o Distrito Federal e São Paulo como centro onde a Assistência Social
encontra atenção e estudos.49

Guardando similitude com as escolas já fundadas no sudeste do país, a


Escola de Serviço Social da Bahia nasceu do seio da Ação Católica, haja vista

46 Henriqueta Martins Catarino, benemérita baiana, contribuiu com várias causas sociais em Salvador. Sua
atuação é marcante na história das instituições sociais da cidade. É considerada uma das primeiras ativistas
baianas nos processos de emancipação da mulher.
47 A professora e historiadora Anfrísia Santiago é tomada como referência na educação baiana. Convidada
por Anysio Teixeira, atuou na organização da educação pública do Estado da Bahia.
48 Thales Olímpio Góes de Azevedo, um dos pioneiros da moderna Antropologia Brasileira, nasceu em Salvador
(1904-1995) e dedicou-se a maior parte de sua vida à educação e à pesquisa (FGV, 2001).
49 Jornal Cidade de Salvador, 18 de Abril de 1945.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 57

que, à época, o diretor Thales de Azevedo, principal articulador e difusor da


necessária especialização do trabalho social no estado, já havia sido presidente
da Junta Arquidiocesana da Ação Católica brasileira e, naquele momento,
atuava como presidente do Departamento Arquidiocesano de Ação Social local.
Vários membros da diretoria também ocupavam cargos em instâncias
outras vinculadas à Ação Católica, tal qual José Newton Alves de Souza, nas-
cido em 1922, na Cidade de Crato (Ceará), que veio para Salvador em 1942
estudar Filosofia na Escola criada por Isaías Alves. Um dos fundadores da
Escola de Serviço Social da Bahia e, à época, conselheiro dos Homens da
Ação Católica, José Newton (último membro fundador da Escola de Serviço
Social da Bahia vivo, até a finalização deste texto) em entrevista concedida
em 201650, lembrou-se com carinho desse momento: “O Professor Thales teve
grande sensibilidade ao fundar a escola de Serviço Social já que a burguesia
não enxergava os graves problemas sociais da cidade do Salvador naquela
época”. Nas suas memórias, considera que o Serviço Social “[...] esteve e está
aí para perceber a questão social e sugerir soluções, o Serviço Social tem a
responsabilidade de lutar pela justiça social”.51

Fundadores da Escola de Serviço Social da Bahia. De batina, Monsenhor


Eugênio de Andrade Veiga, 1º Reitor da (UCSal), ladeado por intelectuais
baianos, entre eles o Prof. Thales de Azevedo e a Profª Marfísa Araujo.

Fonte: Arquivo da Escola de Serviço Social da Bahia – UCSal (s.d.).

50 Entrevista cedida ao Grupo de Estudos e Pesquisas em Serviço Social, Educação e Direitos da Criança, (GESSED).
51 Entrevista realizada pelo GESSED, em março de 2016, por ocasião das comemorações dos 80 anos do
Serviço Social no Brasil e 72 anos da Escola de Serviço Social (ESSO). Atualmente. o Professor José
Newton está com 99 anos de idade.
58

Antes de oferecer o chamado Curso Ordinário de Serviço Social, que


visava a formação de assistentes sociais, a Escola de Serviço Social da Bahia
também ofereceu um curso de formação prévia, teórico-prático, no qual se
inscreveram 60 pessoas de ambos os sexos que, na sua maioria, eram oriun-
das de instituições diversas da rede assistencial de Salvador que, em busca
de melhor qualificação de seus profissionais, efetivaram as suas matrículas,
quais sejam: a Legião Brasileira de Assistência (LBA), o Juizado de Menores,
organizações ligadas à Ação Católica, o Instituto de Preservação e Reforma,
o Instituto Feminino e o Sanatório Bahia. Dos inscritos, selecionados a partir
de documentação comprobatória de conclusão de curso secundário ou normal,
apenas 24 concluíram todos os créditos, incluída a parte prática, que consistia
na visita a obras assistenciais da cidade.
Não fugindo à configuração dos cursos pioneiros de Serviço Social do
Brasil, a Escola de Serviço Social da Bahia recebeu, desde a sua inauguração,
maior número de pessoas do sexo feminino, como postulantes ao título de
assistentes sociais. Esse fenômeno já foi amplamente debatido na literatura
especializada, e pode ser explicado pela demarcação rigorosa do traço de
gênero na profissão do Serviço Social, posto que, desde a sua institucionali-
zação, observa-se a tendência de “[...] disciplinamento das mulheres da classe
trabalhadora que se sustentava na perspectiva de compromisso moral de classe
para com a pobreza” (DELGADO; CARMO, 2018, p. 7).
O curso de formação prévia foi uma estratégia adotada que, além da
captação de possíveis alunos para o Curso Ordinário, visava elucidar esse
novo saber que se organizava no país com velocidade: o Serviço Social. Com
enfoque essencialmente higienista, o Curso de formação prévia era ministrado
por profissionais médicos e educadores atuantes em instituições assistenciais.
Sob a liderança de Thales de Azevedo, foram inicialmente ministradas aulas
de Sociologia, Fisiologia, Direito, Higiene, Alimentação e também Assistência
à maternidade e a infância. Acompanhando as discussões de interesse do seu
tempo, o currículo da formação prévia enfatizava o indivíduo, a higiene e a
salubridade do meio.
Já Curso Ordinário da Escola de Serviço Social da Bahia, semelhante
aos currículos que foram sendo elaborados no sudeste do país, apresentava
um forte apelo de conteúdos doutrinários, oriundos do pensamento social da
Igreja. A análise dos currículos vigentes, desde a ocasião da sua fundação até
os meados da década de 1960, demonstra a inspiração nos moldes norte-ame-
ricanos e na clássica divisão do Serviço Social de Caso, Grupo e Comunidade.
É perceptível a influência higienista, introduzida pelo pensamento médico,
conforme demonstrado no quadro abaixo:
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 59

Disciplinas do Curso ordinário de Serviço Social entre 1944-1965


1º Série 2º Série 3º Série Regime Obrigatório
Sociologia Política Administração de Administração de
Sociologia
e Religiosa Obras Sociais Obras sociais
Organização Social Organização Social de
Ética Geral Economia Social
da Comunidade Obras da Comunidade
Direito (Seguro Orientação do
Psicologia Social, Legislação Trabalho de Pesquisa Social
do Trabalho) Conclusão de Curso
Orientação do
Noções de Direito Ética Profissional ----- Trabalho de
Conclusão de Curso
Estatística Higiene Mental ----- -----
Higiene e
Pesquisa Social ----- -----
Medicina Social
Introdução ao
Atividades de Grupo ----- -----
Serviço Social
Serviço Social
----- ----- -----
de Casos
Serviço Social Organização Social
----- -----
de Grupo da Comunidade

Cultura Religiosa Cultura Religiosa ----- -----

Formação Social Formação Social


----- -----
(Seminários) (Seminários)

Fonte: Regimento da Escola de Serviço Social (1957).

No quadro acima, é possível notar a distribuição das disciplinas por ano


de formação. É interessante observar que, a partir do terceiro ano de formação
regular, “[...] o aluno deveria optar por um conjunto de disciplinas” (ESCOLA
DE SERVIÇO SOCIAL DA BAHIA, 1957, p. 5) que integravam os seguintes
“setores”: Família, que agregava disciplinas de “serviço Social da Família, como
puericultura, Economia Doméstica”; e Menores, que tratava do segmento de
crianças e adolescentes em situação de abandono, delinquência e/ou carência,
uma expressão da questão social muito debatida desde as primeiras até as últi-
mas décadas do século XX, que, na Bahia, se intensificou substancialmente a
partir do Estado Novo (CARRERA, 2016). Nesse conjunto de disciplinas, os
alunos estudavam, por exemplo, o Serviço Social de Menores, Direito do menor,
aspectos psicopedagógicos da conduta do menor. Outros “setores” também eram
disponibilizados para os alunos, como o Médico-Social, que previa os estudos
de Serviço Social médico, aspectos médicos sociais das moléstias e nutrição.
Também existia o setor Trabalho, que oferecia conhecimentos em Serviço Social
do Trabalho e técnicas auxiliares, Higiene e Segurança do Trabalho.
60

A efetiva inauguração do Curso Ordinário para a formação de assisten-


tes sociais só ocorreu no ano seguinte ao término Curso de formação prévia.
Com três anos de duração, o Curso regular de Serviço Social exigia que os
candidatos inscritos tivessem idade mínima de 18 anos, bem como docu-
mentação prévia em que constava, além do certificado de conclusão do curso
secundário, idoneidade de registro civil, atestado de vacinação, aplicação em
testes de saúde mental e aptidão, aprovação em exames vestibulares, além de
entrevista a ser realizada na Escola. A filiação do candidato a religiões diver-
sas e a partidos políticos era permitida desde que se respeitasse a orientação
católica da Escola (ESCOLA DE SERVIÇO SOCAL DA BAHIA, 1957). No
entanto, no primeiro regimento institucional, observa-se que o capítulo “Da
orientação do Curso” afirma que “Os cursos da Escola serão de orientação
espiritualista e católica.”
Como quase todos os Cursos inaugurados naquela época, buscou-se, na
Escola de São Paulo, os parâmetros para melhor implementar o funcionamento
da instituição. Uma das dificuldades encontradas pela diretoria era a ausên-
cia de professores capacitados, pois não havia muitos assistentes sociais no
estado. O assistente social Tostoi de Paula Ferreira, que estava em Salvador
a cargo da Divisão de Seleção e Aperfeiçoamento do Estado (DSP), assumiu
a responsabilidade técnica do Curso, e a assistente social Maria Aparecida
Chaib, que atuava no Serviço Social da Municipalidade de Campinas, foi
contratada com o apoio do Instituto Feminino da Bahia, a fim de exercer a
supervisão do Curso.
Com o apoio financeiro do Instituto Feminino, a Escola de Serviço Social
da Bahia enviou a São Paulo a professora baiana Marfisa Simões, que concluiu
o Curso de Serviço Social a fim de retornar habilitada para integrar o quadro
de professores locais. Com a sua volta em 1946, agora como assistente social
graduada, a Escola de Serviço Social prosseguiu com o oferecimento do Curso
regular e, sob sua supervisão técnica, manteve o “[...] professorado escolhido
entre pessoas de reconhecida dedicação e competência em assuntos sociais
e em problemas assistenciais bahianos” (ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL
DA BAHIA, 1949).
Como estratégia de promoção e divulgação, a instituição também pro-
curou realizar parcerias locais com órgãos públicos das três esferas, de modo
a permitir que o funcionalismo ativo de instituições vinculadas à assistência,
fosse a curto e médio prazo, buscando capacitação. Um desses Cursos foi reali-
zado em 1946, patrocinado pelo Departamento Nacional de Assistência Social,
que habilitou alguns dos funcionários das instituições vinculadas à previdência
que funcionavam na cidade de Salvador, como as Caixas de Aposentadoria
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 61

e Pensões dos Serviços Públicos e dos Ferroviários da Bahia e Sergipe, bem


como o Instituto dos Marítimos, Comerciários e Industriários. Ao final dessa
capacitação, foram estabelecidas as primeiras parcerias interinstitucionais
que promoveram bolsas de estudos para os alunos de melhor aproveitamento.
A criação de convênios e parcerias com instituições foi uma solução
encontrada, à época, que garantiu a permanência de alunos e assegurou os
recursos necessários à manutenção da Escola, haja vista que nos anos iniciais
a instituição se manteve muito mais por doações de benfeitores, apoio que
conservou a sua condição de entidade civil sem fins lucrativos. Entre os anos
de 1945 e 1948, vigoraram as primeiras bolsas de estudo patrocinadas pela
LBA, pelo Departamento Regional de Serviço Social e pelo Departamento
Nacional de Previdência Social.
Como uma instituição de matriz católica conservadora, a Escola de Ser-
viço Social manteve outros Cursos de pequena duração de forma sistemática,
não apenas como meio de arrecadação de recursos, mas, também, como forma
de difusão da moral e dos valores cristãos defendidos, como o Curso para
Noivas, incentivado pela Juventude Feminina Católica, e um Curso voltado
para as religiosas que, mantido pelo Departamento Arquidiocesano da Ação
Social, visava preparar as alunas para o trabalho nos hospitais e nas instituições
assistenciais destinadas às crianças. Com o apoio do Arcebispo Primaz do
Brasil, esse curso tinha ampla procura das ordens religiosas da Bahia e Sergipe.
A Escola de Serviço Social da Bahia, ainda que tivesse enfrentado difi-
culdades de organização, sobretudo pela ausência de professores assistentes
sociais atuantes no estado, demonstrou preocupação com a regularidade e qua-
lidade do seu Curso de formação de assistentes sociais, haja vista que, desde
a fundação da Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social (ABESS) e
da União Católica Internacional de Serviço Social em Bruxelas (ESSO, 1949),
esteve filiada a essas instituições.
Em relação ao currículo fundador do Curso de formação de assistentes
sociais, sua vigência tem data posterior ao primeiro curso de formação ini-
cial. No entanto, a sua prevalência perdurou, oficialmente, até meados dos
anos 1960, sendo alterado gradativamente, principalmente, quando da inten-
sificação dos debates acerca de aspectos teóricos e metodológicos do Serviço
Social, oriundos do chamado Movimento de Reconceituação.
A primeira turma de formandos, em 1948, diplomou 24 assistentes
sociais, após as defesas de seus Trabalhos de Conclusão de Curso.52 Verdadei-

52 Sobre os Trabalhos de Conclusão de Curso, observa-se que, desde o ano de fundação da Escola até os anos 1970,
os alunos deveriam apresentá-los ao final do terceiro ano, de modo a demonstrar que assimilou “a parte prática
e teórica do Curso”, sendo “de exclusiva autoria” (ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL DA BAHIA, 1949, p. 17).
62

ras “Teses” fundamentadas em trabalho de campo e pesquisas bibliográficas,


oriundas dos acervos doados pela Escola de Serviço Social de São Paulo, pela
Faculdade de Medicina e Faculdade de Filosofia da Bahia. Leda Jesuíno dos
Santos53, uma das primeiras assistentes sociais formadas na Bahia, lembra-se
com muita satisfação do pioneirismo da Escola de Serviço Social no estado:

Fui convidada pelo Professor Thales de Azevedo para ingressar na primeira


turma e contribuir com a minha formação de Filosófa para a orientação
de uma Assistência Social em áreas até então negligenciadas como a área
hospitalar, logo que me formei assumi e implantei o Serviço Social do
Hospital Santa Isabel.54

Como Leda Jesuíno, as(os) primeiras(os) assistentes sociais formadas


na Bahia foram responsáveis diretas(os) pela organização das redes assis-
tenciais do estado, desde meados do século XX. O legado dos seus afazeres
profissionais integra a história de muitas instituições que permanecem ativas
na atualidade. Até a década de 1990, a Escola de Serviço Social (ESSO), que
é vinculada à Universidade Católica do Salvador, permaneceu sendo a única
instituição de formação de assistentes sociais na Bahia. Por si mesma, essa
Escola, formadora de assistentes sociais, é um patrimônio imaterial da história
das instituições na Bahia e da história do Serviço Social no Brasil.

5. Considerações finais

Nas sete décadas de existência da Escola de Serviço Social da Bahia, não


somente a sua reformulação curricular, mas sua identidade enquanto insti-
tuição formadora de assistentes sociais vem seguindo o movimento histórico
da profissão de Serviço Social através da defesa dos valores essencialmente
democráticos, da crítica radical à ordem social vigente, da defesa do projeto
ético-político do Serviço Social, da legitimação das instâncias político-orga-
nizativas da profissão.
A atual Escola de Serviço Social (ESSO) tem se constituído num espaço
de resistência frente aos ataques à profissão do Serviço Social, particular-
mente àqueles direcionados à precarização das condições de trabalho das(os)

53 Leda Jesuíno nasceu em Salvador em 1924 (atualmente está com 99 anos). Após concluir o ensino médio,
tentou a carreira de Diplomata, mas, a época, Getúlio Vargas não permitia o ingresso de mulheres nessa
carreira. Então estudou na Faculdade de Filosofia da Bahia, até ser convidada por Thales de Azevedo para
integrar a primeira turma da Escola de Serviço Social da Bahia.
54 Aqui há uma referência ao Hospital Santa Isabel, hospital da Santa Casa de Misericórdia, fundado em 1893
em Salvador. Esse trecho refere-se à entrevista realizada pelo GESSED em março de 2016 por ocasião das
comemorações dos 80 anos da escola Serviço Social no Brasil e 72 anos da Escola de Serviço Social da Bahia.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 63

assistentes sociais, à diminuição da intervenção do Estado frente à questão


social, à retração das políticas sociais, ao avanço do pensamento ultraconser-
vador e seus impactos na sociedade brasileira.
Sua luta incansável a favor do ensino de qualidade vem se refletindo
através da permanência exclusiva do ensino presencial ao longo de sua exis-
tência. Como outras Escolas congêneres nascidas no seu tempo, essa institui-
ção alcançou a maturidade através do respeito da sociedade, pois vivenciou
intensamente os problemas sociais da Bahia. Nos seus 77 anos de fundação,
a Escola de Serviço Social continua revigorada, participando ativamente das
lutas societárias pela defesa dos valores que conduzam a uma interlocução
crítica com a sociedade.
64

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CAPÍTULO 3
O SERVIÇO SOCIAL NO PIAUÍ
Maria D’Alva Macedo Ferreira
Maria do Rosário de Fátima e Silva
Simone de Jesus Guimarães

1. Introdução

A história do Serviço Social no Piauí se confunde com a própria história


do desenvolvimento desse estado da federação. É a partir da chegada dos(as)
primeiros(as) assistentes sociais ao estado, que o Piauí, uma das regiões mais
pobres economicamente, passa a ter um maior incremento no seu desenvolvi-
mento. A Universidade Federal do Piauí, grande polo aglutinador da formação
universitária, contribuirá enormemente para esse desenvolvimento. E o curso
de Serviço Social, vinculado a essa Instituição de Ensino Superior, dará tam-
bém grande contribuição para o alavancar desse processo. É a história dessa
profissão que será demarcada no presente texto.

2. Origens do Serviço Social no Piauí

O Serviço Social no Piauí data dos anos de 1940 do século XX, quando
os(as) primeiros(as) assistentes sociais aportam no estado, formados(as) em
outras instituições de ensino superior, especialmente dos estados da região
nordeste, como o Ceará e o Maranhão (vizinhos ao Piauí), mas também do
Rio de Janeiro e do Pará. Entre esses profissionais, destacam-se Delma Basílio
e Paulo Mota, que foram os primeiros a se inserirem no mercado de trabalho
profissional.55 Os cursos de Serviço Social das hoje Universidade Federal do
Maranhão, da Universidade Estadual do Ceará, da Universidade Federal do
Pará, e de universidades do Rio de Janeiro, foram os principais formadores
de assistentes sociais do Estado do Piauí.

55 Além de Delma Basílio e Paulo, é digno de nota o registro dos nomes de Maria de Jesus Rocha, Aglair
Setúbal, Vera Nogueira, Dulce Silva, Yeda Moraes Sousa Machado, Graça Serra e Silva, Graça Silva, Jupira
Cavalcante, Ediane Atem, Conceição Silva, Zita Vilar, Marta Santos, Umbelina Jales de Carvalho, Vanda
Alvarenga, Maria do Carmo C. Rodrigues, Lúcia Maria M. Silva, Maria dos Remédios Alencar, Maria Teresa
Cardoso, Marília Ferro Raulino Teresinha de Jesus R. Sá, Lourdes Almeida, Marlene Barbosa, Bernadete
Duarte, Rosilar Pinheiro, Amélia Gutman, Solange Sinimbu, Teresa Santos, Janete Moraes, Maria de Jesus
Paz, Francisca das Chagas Melo, Maria Goes, Francisca Oliveira, Justina Cutrim, Maria Aparecida Maracajá,
Maria Lila Carvalho, Maria da Cruz Alcântara, Maria da Cruz Moura entre outros nomes. A maior parte
desses profissionais foi formada nos anos 1970.
68

A partir dos primeiros anos de chegada dos(as) assistentes sociais ao Piauí,


esse estado passa a ser um grande polo aglutinador dessa mão-de-obra pro-
fissional, fazendo, assim, com que haja uma grande expansão desse mercado
de trabalho profissional. Nesse sentido, instituições públicas e privadas, do
período, passam a contratar o(a) assistente social, tais como a Legião Brasileira
de Assistência (LBA), as Centrais Elétricas do Piauí (CEPISA), as Águas e
Esgotos do Piauí (AGESPISA), as Telecomunicações do Piauí (TELEPISA),
a Rede Ferroviária Federal do Piauí (REFFSA), a Companhia de Habitação do
Piauí (COHAB), a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMA-
TER), o Departamento Nacional de Obras contra a Seca (DNOCS), o Instituto
de Assistência e Previdência Privada do Estado do Piauí (IAPEP), entre outras
instituições, foram as primeiras contratantes de profissionais do Estado do Piauí.
Importa salientar que, somente no início de 1981, saem os(as) primeiros(as)
assistentes sociais formados(as) pela Universidade Federal do Piauí, num total
de 14 profissionais.56 É também nesse período que emerge o primeiro concurso
público para a área de Serviço Social. Neste, foram aprovadas três assistentes
sociais.57 A partir daí outros concursos foram realizados e, especialmente os
egressos do curso de Serviço Social, foram aprovados nos pleitos surgidos.58
Com a aprovação da Constituição de 1988, e suas leis subsequentes
(como a Lei Orgânica da Assistência – LOAS e a Lei Orgânica da Saúde –
mais conhecida como o Sistema Único de Saúde – SUS), profissionais de
Serviço Social de outros estados da federação passam a ser contratados por
instituições públicas, privadas e do chamado Terceiro Setor. Desse modo, boa
parte dos(as) profissionais, formados(as) ou não pela Universidade Federal
do Piauí, foi contratada por prefeituras, próximas ou não à capital do Estado
do Piauí.59 Esses dados são relevantes para ressaltar que: a) historicamente
a maioria da mão-de-obra profissional tem sido contratada por instituições,
sobretudo, de natureza pública ou privada; b) o Terceiro Setor, como forma de

56 O curso de Serviço Social da UFPI é da década de 1970. O Conselho Universitário dessa IES aprova,
através da Resolução 02/1976, o referido curso que, hoje, vincula-se ao Centro de Ciências Humanas e
Letras e ao Departamento de Serviço Social dessa instituição pública federal, que foi criado em 1970. No
ano seguinte à criação do curso, a UFPI oferece 40 vagas no seu vestibular, posteriormente acrescido de
mais 11 pessoas, totalizando, assim, 51 alunos. Desde a criação desse curso, a qualidade de sua formação
pode ser exemplificada pela aferição do conceito 5, atribuído pelo Ministério da Educação. Atualmente o
curso oferece 50 vagas no seu vestibular, sendo um dos mais concorridos dentro da UFPI.
57 Simone Guimarães (autora desse texto), Teresinha Learth e Maria das Graças Vidigal – formadas em outras
IES públicas.
58 Entre os egressos concursados, destacam-se as autoras desse texto: Maria D’Alva Ferreira e Maria do
Rosário Silva. Outros egressos que compõem o corpo docente são: Lúcia Vilarinho, Solange Teixeira, Rita
Sobral, Rosilene Sobrinho, Lila Luz, Masilene Rocha, Iolanda Fontenele, Teresa Costa, Sofia Laurentino,
Iracilda Braga, Reia Rios, Francineide Pereira, Roberto John G. da Silva. Desses, apenas o professor Roberto
John não está mais na ativa, pois se aposentou.
59 Essa realidade se deve ao fato de que o curso de Serviço Social do Piauí é um dos últimos a ser criado no país.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 69

inserção profissional, é uma realidade que se soma às demais, mas que não tem
se constituído em primazia no que se refere à contratação dessa mão-de-obra
qualificada; c) o Piauí não foge a essa realidade, sendo o setor público estatal
o principal contratante de assistentes sociais; d) instituições de cunho privado,
sem fins lucrativos ou não, têm se constituído em mercado de trabalho para
o(a) assistente social, embora essa realidade seja em menor escala.60
O exercício liberal da profissão passa a ser uma realidade para muitos
profissionais a partir da década de 1990, quando, por exemplo, governos
estaduais e municipais passam a contratar os(as) profissionais de Serviço
Social para assessorar, implementar, executar, avaliar, entre outras ações, as
políticas públicas de seus governantes pós Constituição de 1988. Essa forma
de inserção profissional também irá se verificar no chamado Terceiro Setor.61
Até os anos de 1990, o mercado de trabalho profissional está em franca
expansão. A partir daí, inicia-se uma retração dessa mão-de-obra qualificada, sendo
que o exercício liberal da profissão via assessoria e consultorias variadas passa a
se constituir em alternativa a ser posta em prática para segmentos dessa profissão.
É oportuno destacar que, nesse quadro de análise, acima enfatizado,
passam a surgir inúmeros cursos de natureza privada, polos importantes
de formação do(a) assistente social, sobretudo, pela modalidade de Ensino
à Distância (EAD), que colocam nesse mercado profissional inúmeros
profissionais, que nem sempre estão prontamente preparados para assumir
com mais qualidade o exercício profissional.62
Enfim, o mercado de trabalho profissional é amplo e diverso. E, ainda que
nesses anos de 2020 para cá, a conjuntura brasileira e piauiense seja de crise
sanitária (com o advento do coronavirus) e de um crescente desmantelamento
dos serviços públicos estatais pós Constituição de 1988, deve-se reafirmar: o
setor público estatal é o principal empregador de assistentes sociais.

3. Cursos de Serviço Social


O Curso de Serviço Social na UFPI foi o primeiro a ser criado no estado
do Piauí, instituição primeira a ser aglutinadora da formação universitária
nesse estado. O curso teve início na década de 1970, quando o Conselho Uni-
versitário aprova, em 1 de dezembro de 1976, através da Resolução 02/1976,

60 Uma pesquisa realizada em 2001, por Simone Guimarães, com a participação de estudantes do curso de
Serviço Social da UFPI, demonstrou que 103 profissionais cadastrados no Conselho Regional de Serviço
Social (CRESS) eram contratados tanto por instituições públicas quanto por instituições privadas.
61 A pesquisa de 2001 realizada por Guimarães também constatou que parte dos profissionais do Piauí
colocava-se no mercado de trabalho a partir do exercício liberal da profissão, prestando assessorias e
consultorias variadas e inúmeras entidades, entre essas, sindicatos e movimentos sociais variados, além
de entidades do chamado Terceiro Setor.
62 A nota de rodapé mais abaixo traz informações sobre os conceitos no ENADE de 2018 para os demais
cursos de Serviço Social existentes no Estado do Piauí.
70

sua criação, através de projeto elaborado pela professora Dra. Aglair Alencar
Setúbal, convidada pelo então Reitor José Camilo da Silveira para realizar
todos os procedimentos necessários à efetivação da proposta.
Após a sua criação, no ano de 1977, o curso ofereceu 40 vagas no pri-
meiro vestibular, cuja turma concluiu em abril de 1981. Atualmente o curso
oferece 50 vagas por ano de entrada. Segundo avaliação do ENADE de 2018,
o Curso de Serviço Social obteve nota 5, constituindo-se, assim, numa impor-
tante referência de formação profissional qualificada.
Outros cursos de Serviço Social passam a existir no estado no final da
década de 1990, na condição de cursos privados, como a Faculdade Adelmar
Rosado (FAR) (1999) e o Instituto Camilo Filho (ICF) (2002). Hoje existem
mais de 50 cursos nas modalidades presencial e/ou à distância, em ligação ou não
com outros congêneres nacionais, com características ou não de fins lucrativos.63

3.1 Projetos de formação em sintonia com


os processos de revisão do currículo

O Curso de Serviço Social, até o presente momento, teve 4 currículos. O


primeiro Currículo Pleno64, nesses quase 45 anos de existência, conforme o docu-
mento Projeto do Curso de Serviço Social (UFPI, 1976), teve vigência até 1984.65
Esse currículo atrelava-se ao Currículo Mínimo de 1970, aprovado pelo Conselho

63 Conforme site do Ministério da Educação (MEC), no Piauí existem atualmente 58 cursos de Serviço Social
nas modalidades presencial e/ou à distância. Excetuando-se o curso da UFPI, que é de uma instituição
pública federal, os demais são de instituições privadas com fins lucrativos ou não. O MEC informa, em
consulta de 3 de maio de 2021, que todos os cursos foram criados nos anos 2000. Desses, apenas o curso
da UFPI obteve o conceito 5 nas avaliações no ENADE DE 2018. Os demais cursos oscilam conceitos que
vão de 1 a 3 nessas avaliações. Sobre a relação dos cursos de Serviço Social no Piauí verificar Ministério
da Educação – Sistema e-MEC.
64 Era assim denominado na época da criação do curso.
65 O primeiro currículo era composto das seguintes matérias e disciplinas, a saber: 1) Ciclo Geral de Estudos
– dividia-se em dois núcleos: a) Núcleo Comum: Português I; Inglês I ou Francês I; Matemática I; Introdu-
ção à Metodologia Científica. b) Núcleo Diversificado: Introdução à Sociologia; Elementos de Economia;
Introdução à Filosofia; Introdução ao Serviço Social. 2) Básicas Obrigatórias: Teoria do Serviço Social (I,
II e III); Serviço Social de Casos (I e II); Serviço Social de Grupo (I e II); Serviço Social de Comunidade (I
e II); Desenvolvimento de Comunidade; Planejamento Social; Sociologia do Desenvolvimento; Economia
Social e do Desenvolvimento; Introdução à Psicologia; Psicologia Social; Psicologia da Personalidade;
Psicodinâmica das Relações Humanas; Direito Usual; Legislação Social; Estatística Aplicada ao Serviço
Social; Política Social; Filosofia Social; Ética Profissional; Introdução aos Trabalhos Práticos; Elementos
de Antropologia Cultural; Estágio Supervisionado (I, II e III). 3) Complementares Obrigatórias: Métodos de
Pesquisa Social; Introdução à Administração; Administração em Serviço Social; Educação Física; Estudo
de Problemas Brasileiros (I e II); Planejamento Social. 4) Optativas: Antropologia Brasileira; Elementos de
Economia Brasileira; Serviço Social Médico; Serviço Social de Empresa. Esse currículo baseava-se no
Currículo Mínimo de 1970, aprovado pelo Conselho Federal de Educação, predominava uma separação
entre as disciplinas de teoria e prática. Daí as disciplinas de Teoria (I, II e III), dos métodos do Serviço Social
de Caso, de Grupo e de Comunidade, da disciplina de Introdução aos Trabalhos Práticos.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 71

Federal de Educação. Nele havia uma separação entre as disciplinas de teoria e


prática. Nesses termos, colocava-se, separadamente, as disciplinas de Teoria (I, II
e III), dos “métodos” de Serviço Social de Caso, de Grupo e de Comunidade, bem
como da disciplina de Introdução aos Trabalhos Práticos (GUIMARÃES, 2001).
A análise que Guimarães (1995) desenvolveu, sobre os três currículos que
vigoraram no Curso de Serviço Social, afirma que: 1 – O enfoque do currículo I
é voltado para a área da psicologia; 2 – No currículo II ganham destaque as áreas
de sociologia; 3 – no currículo III ganha relevância a área de Filosofia. Para a
autora “[...] tanto no currículo II quanto no currículo III, disciplinas relativas ao
Serviço Social são retiradas do ciclo básico de estudo” (1995, p. 27). Prossegue
a autora: “Nos currículos II e III o Ciclo Profissional passa a ter uma primazia e
um peso significativo na formação profissional dos alunos do curso” (1995, p.
28); “As áreas de maior destaque no Ciclo Profissional têm sido, em primeiro
lugar, o núcleo de História, Teoria e Metodologia [...]. Em segundo lugar, vem
sendo o núcleo das disciplinas de Pesquisa” (GUIMARÃES, 1995 p. 27-29).
Para a autora, a revisão curricular do currículo III apresenta como prin-
cipal objetivo “desamarrar”, “desbloquear o currículo”, permitindo um fluxo
mais rápido do alunado na grade curricular (GUIMARÃES, 1995).
Ao se analisar os documentos que registram as mudanças que vem
ocorrendo nos currículos, em especial os Projetos Pedagógicos de 2012 e o
de 2020, verifica-se que desde a sua criação o Curso de Serviço Social tem
acompanhado as orientações dadas pela entidade de ensino (ABEPSS) no
âmbito das Diretrizes Curriculares aprovadas por essa entidade (UNIVER-
SIDADE FEDERAL DO PIAUI, 2012; VIANA; TEIXEIRA, 2020).
A Coordenação e o Departamento de Serviço Social, em suas últimas
gestões, têm empreendido esforços no sentido de finalizar uma nova proposta
curricular sintonizada com as atuais Diretrizes Curriculares, aprovadas em 1996.
O Núcleo Docente Estruturante, desde a sua formação66, manteve a consciência
da necessidade de realizar atualizações do referido projeto pedagógico do curso,

66 O Núcleo Docente Estruturante foi criado através da Portaria N° 66, de 23 de julho de 2010 da Pró-Reitora
de Ensino de Graduação (PREG/UFPI), atendendo ao que estabelece a Portaria Normativa N° 5, de 22 de
fevereiro de 2010 do MEC. Na referida Portaria, foram designados para compor o Núcleo Docente Estruturante
do Curso de Serviço Social, do Campus Ministro Petrônio Portela, as seguintes professoras: Lila Cristina Xavier
Luz, Lúcia da Silva Vilarinho, Maria do Rosário de Fátima e Silva, Marlúcia Valéria da Silva e Masilene Rocha
Viana. No entanto, nele já marcou presença ativa as Profas. Rita de Cássia Cronemberger Sobral e Lúcia
Cristina dos Santos Rosa, que passaram a integrá-lo por conta de substituições necessárias e, em alguns
casos, temporárias. Assim, o esforço aqui sintetizado de revisar o projeto espelha trabalho de uma equipe
para além da que compõe o núcleo na atualidade. A primeira proposta apresentada pelo Núcleo Estruturante
não foi a provada e um novo Núcleo Estruturante foi constituído que deu origem as atuais mudanças apresen-
tadas neste documento. O Projeto Pedagógico que está em sua fase final para ser implantado, contou com
a participação das professoras que compuseram o NDE no período de 2018 – 2020. Atualmente o Núcleo é
formado por: Prof.ª Dr.ª Solange Maria Teixeira, Prof.ª Dr.ª Rita de Cássia, Cronemberger Sobral, Prof.ª Dr.ª
Iolanda Carvalho Fontenele, Prof.ª Dr.ª Maria D’Alva Macedo Ferreira, Prof.ª Dr.ª Edna Maria Goulart Juazeiro.
72

realizando inúmeras incursões (reuniões periódicas, oficinas, pesquisas explora-


tórias junto aos docentes e discentes, entre outras), visando amadurecer reflexões
acerca dos principais problemas apresentados no curso, desde a implantação do
último projeto pedagógico ainda em vigor, e encontrar caminhos de superá-los.
O Projeto Pedagógico, que se encontra em fase de finalização se cons-
titui num

[...] instrumento de gestão, orientará todo o processo de decisão acadê-


mica da Coordenação do Curso de Serviço Social. Nele estão contidas
as orientações mais gerais para o curso explicitadas nos pressupostos,
princípios, competências e habilidades dos profissionais que se pretende
formar, além das demandas que se pretende atender (UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PIAUI, 2020 p. 30).

Enfim, acompanhar a dinâmica do Curso de Serviço Social no contexto


das relações sociais que se estabelecem pelas estruturas e conjunturas vividas,
põe para o Serviço Social inúmeros desafios a serem enfrentados no cotidiano
da formação profissional e das práticas sociais e institucionais.

4. Organização político-sindical do(a) assistente social no Piauí

4.1 Emergência e contexto

A iniciativa da organização política dos (as) assistentes sociais no Piauí se


deu através de um grupo de profissionais das instituições públicas, tendo por
motivação a preocupação em discutir a prática profissional e as dificuldades
vivenciadas no espaço institucional. Nesse sentido, os profissionais envolvi-
dos neste esforço de organização sentiam a necessidade de uma entidade que
respaldasse tais inquietações. Neste aspecto, podemos identificar dois eixos
mobilizadores do processo organizativo dos(as) assistentes sociais no Estado,
ou seja, a intervenção profissional e a inserção da profissão no momento his-
tórico de mobilização da sociedade civil local e nacional. O contexto político
que cercou o movimento organizativo da categoria profissional foi caracteri-
zado, por um lado, pelo processo de abertura do regime ditatorial militar e, por
outro, pela mobilização e rearticulação da sociedade civil brasileira e piauiense
através dos movimentos sociais e do movimento sindical. É o que afirma Silva:

O contexto geral refletia uma realidade marcada por crescente eferves-


cência de movimentos organizativos nos diversos setores da vida social
brasileira, os quais buscavam a cidadania, subtraída nos anos em que
predominou o arbítrio. A repercussão dessa mobilização no Piauí deu-se
através da reorganização do sindicalismo urbano e rural, e da organização
do movimento popular (SILVA, 1991, p. 72).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 73

Neste cenário de mobilização, emergiram as primeiras iniciativas de


organização política dos(as) assistentes sociais no Piauí, cuja intervenção
profissional era desenvolvida, na sua grande maioria, nas instituições estatais,
e vinculava-se diretamente aos setores menos favorecidos da população.
É importante destacar que a emergência desse processo de organização
da categoria no Piauí relaciona-se ao movimento desenvolvido, em nível
nacional, pela profissão no final dos anos de 1970, que questionava as bases
teóricas e metodológicas nas quais se firmava o Serviço Social enquanto
profissão. Os questionamentos buscavam explicitar e redimensionar as bases
que orientavam a formação profissional, bem como o compromisso político
do Serviço Social. Esse debate foi fortalecido pelos eventos realizados no
final da década de 1970, pelas entidades representativas dos (as) assistentes
sociais: Conselho Federal de Assistentes Sociais (CFAS, hoje CFESS), Con-
selhos Regionais de Assistentes Sociais (CRAS, hoje CRESS), Associação
Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS, hoje ABEPSS) e entidade
representativa dos estudantes de Serviço Social (ENESSO). Estes eventos
contaram com o apoio da academia em todo o país, destacando-se, em 1979,
os seguintes: a Convenção da ABESS, que aprova a nova proposta de currículo
do Serviço Social; o II Encontro Nacional dos Estudantes de Serviço Social
(II ENESS), que pautou o debate sobre a necessidade da revisão curricular dos
cursos de Serviço Social; o III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais,
conhecido como o “Congresso da Virada”, no qual o conjunto das entidades
sindicais, sob o comando da Coordenação Executiva Nacional de Entidades de
Assistentes Sociais (CENEAS), interviu politicamente exigindo a mudança do
caráter do evento, considerado elitista e distanciado da categoria profissional.
No Piauí, também motivado pelos grandes eventos da categoria em nível
nacional, foi realizado em 1979 o I Seminário de Temas de Serviço Social,
oportunidade em que se debateram temas ligados às questões teórico-práticas
do Serviço Social, contando com a presença de estudantes do Curso de Ser-
viço Social da Fundação Universidade Federal do Piauí (FUFPI, hoje UFPI),
o primeiro curso do Estado, que havia sido criado em 1976, com o primeiro
vestibular em 1977. Este evento foi uma iniciativa dos(as) assistentes sociais
de campo que atuavam nas instituições públicas, contou com a promoção da
Secretaria do Trabalho e Promoção Social do Estado e com o apoio do curso
de Serviço Social da UFPI. Este seminário foi considerado o marco de abertura
de um espaço de discussão dos (as) assistentes sociais do Piauí, em torno de
questões referentes à prática desenvolvida nessa realidade.

Este espaço de debate ganhou maior significado no cotidiano da categoria


no estado, com a instalação de fato da primeira entidade representativa dos
assistentes sociais, em 1981, ou seja, a Delegacia Seccional do Conselho
74

Regional de Assistentes Sociais (CRAS), 2ª Região, Maranhão e Piauí,


com a diretoria executiva eleita pelo conjunto da categoria e com estrutura
administrativa própria, capaz de absorver as exigências de regulamentação
do exercício profissional e encaminhar as aspirações de organização da
categoria e de discussões teórico-práticas (SILVA, 1991, p. 75-76).

Nos últimos anos, tem surgido em alguns estados, e no Piauí temos


também esse registro, um movimento que tenta retomar a discussão sobre a
volta dos sindicatos de assistentes sociais naquele formato anterior, ou seja,
da sindicalização por categoria profissional, mas este assunto não é consenso
no seio da categoria profissional, que vem seguindo a forma de nucleação
dos assuntos da categoria através do conjunto CFESS-CRESS e da ABEPSS.

4.2 Trajetória de organização dos(as) assistentes sociais no Piauí

Os esforços no sentido de iniciar e estruturar o processo de organiza-


ção política dos(as) assistentes sociais no Piauí foi assumido por um grupo
de profissionais, onde predominava a formação acadêmica mais recente, e
situada nos eixos teóricos do movimento de reconceituação da profissão. Este
processo ganhou reforço com o engajamento, no início da década de 1980,
de profissionais recém-formados, oriundos da primeira e segunda turmas do
curso de Serviço Social da UFPI, graduados em abril e dezembro de 1981,
respectivamente, os quais trazem para o movimento profissional a experiência
de militância política estudantil.
O processo de organização dos(as) assistentes sociais piauienses se dá
em articulação com o movimento organizativo da categoria em nível nacional,
e com o movimento de reorganização da sociedade em geral, bem como com
o processo de retomada do sindicalismo em âmbito local. Nesta perspectiva,
os(as) assistentes sociais piauienses aliaram-se aos “novos sujeitos”, aos
“novos personagens” presentes na cena política brasileira dos anos de 1980,
tão bem caracterizados por Eder Sader (1988), e que lutavam coletivamente
pelo restabelecimento de direitos, abrindo espaços para o resgate de suas
condições de cidadania.
A materialização do processo organizativo dos(as) assistentes no Piauí
se deu, incialmente, com a criação da delegacia seccional do CRAS/CRESS
em 198167, depois seguida pela criação da Associação Profissional dos Assis-
tentes Sociais (APAS-PI), em 1982, a partir do empenho da Comissão

67 Sobre a representação do CRAS do Piauí, Delegacia Seccional ainda ligada à Delegacia do Maranhão,
tinha a seguinte composição: delegada Dulce Silva; secretária Ruth Meireles; tesoureira Cirene Cortez. A
primeira diretoria da delegacia do CRAS-PI foi: delegada Graça Silva, secretária Antônia Jesuíta; tesoureira
Lila Castro; suplentes Justina Cutrim e Lígia Veras.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 75

Pró-APAS. Em 1984, a APAS transformou-se em Diretoria provisória do


Sindicato dos Assistentes Sociais do Piauí (SINDASPI), o qual foi oficializado
pelo Ministério do Trabalho com a carta sindical em 1986, quando então foi
eleita a primeira diretoria do Sindicato no Piauí.68 Estas entidades, tanto a
APAS, e depois o SINDASPI, vieram responder a um anseio de participação
política dos(as) assistentes sociais, na busca de um órgão que defendesse os
seus interesses, resgatasse a sua condição política enquanto cidadãs/cidadãos
e, também, oportunizasse o processo de revitalização da ação profissional.
Estas entidades, CRAS e APAS/SINDASPI, passaram a realizar, a partir
de 1982, o Encontro Estadual de Assistentes Sociais (ENASPI), espaço em
que se discutia temáticas sobre a realidade brasileira e piauiense; sobre a
teoria e prática do Serviço Social; e sobre a organização política e sindical
dos trabalhadores em geral e dos(as) assistentes sociais em específico. Com
o ENASPI sendo realizado anualmente na Semana do(a) Assistente Social69,
as entidades proporcionavam discussões e atualização da categoria profis-
sional quanto as questões da profissão e da conjuntura política. Este evento
significou maior aglutinação dos profissionais e articulação das entidades da
categoria com o curso de Serviço Social da UFPI, com o Centro Acadêmico
dos(as) estudantes de Serviço Social e ainda com a representação da ABESS/
ABEPSS, quando esta se fazia presente no estado.
O movimento organizativo dos(as) assistentes sociais do Piauí surgiu
sintonizado com a organização nacional da categoria. Neste sentido, participou
da articulação da CENEAS, da comissão organizadora do IV CBAS e dos
congressos que lhe deram sequência. Garantiu a participação de delegados na
I Assembleia Nacional dos Assistentes Sociais, em outubro de 1983, quando
foi fundada a Associação Nacional dos Assistentes Sociais (ANAS). Integrou
a primeira diretoria da ANAS, assumindo a vice-presidência da regional norte.
No campo do movimento sindical em geral, os(as) assistentes sociais
piauienses através de sua organização sindical, estiveram presentes no esforço
de articulação e concretização da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no
Piauí, integrando a coordenação estadual e compondo a sua primeira diretoria

68 A diretoria provisória do SINDASPI tinha a seguinte composição: presidente Simone Guimarães; vice-presi-
dente Guiomar Passos; primeira e segunda secretárias Rosário Silva e D’Alva Macedo; primeira e segunda
tesoureiras Gorete Firmino e Maria da Cruz Moura; diretoria cultural Francisca Oliveira; conselho fiscal
Francisca Duarte, Jesus Paz e Teresinha Sá. A primeira diretoria do SINDASPI era composta pelos seguintes
membros: presidente Rosário Silva; vice-presidente D’Alva Macedo; primeira e segunda secretárias Fátima
Vasconcelos e Graça Silva; primeira e segunda tesoureiras Francimélia Nogueira e Raimunda Oliveira;
diretora cultural Vera Lúcia Nogueira; conselho fiscal Jesus Paz, Aparecida Maracajá e Constância Soares.
69 De 1982 a 1989, foram realizados 8 ENASPIS. O IX evento, que seria realizado em 1990, apesar de pro-
gramado, não foi possível ser realizado, por falta de condições operacionais e conjunturais. No seu lugar,
as entidades organizaram um debate sobre o governo Collor e o Plano Brasil Novo (aspectos econômicos
e sociais) e os desafios para a profissão e para os profissionais.
76

executiva, central ao qual o SINDASPI posteriormente se filiou. O SINDASPI,


sob a orientação da nova perspectiva sindical nomeada como novo sindicalismo
no campo cutista, procurou dialogar com o poder público e privado local, em
torno de questões de interesse da categoria, encampando lutas em prol da ela-
boração e implantação de planos de cargos e salários, do estabelecimento de
um piso salarial para a categoria, bem como buscando a melhoria das condições
de trabalho. É importante ressaltar que a entidade sindical representou um salto
qualitativo à organização política dos assistentes sociais piauienses até o início
da década de 1990, quando, por indicação da CUT e da ANAS, ganhou força
no meio sindical a orientação para que os trabalhadores procurassem fortalecer
o sindicalismo por ramo de atividade, e não mais por categoria. Este encami-
nhamento levou a ANAS a propor a extinção dos sindicatos de assistentes
sociais em todo Brasil e a sua própria extinção, enquanto entidade de articulação
nacional da categoria, com a recomendação para que os profissionais buscassem
se engajar e fortalecer a sua organização junto as entidades representativas do
seu ramo de trabalho. Seguindo esse posicionamento, em 1992, o SINDASPI
deixa de existir no estado, ficando o CRESS, além da função de órgão regulador
do exercício profissional, também de articulador das demais necessidades da
categoria dos assistentes sociais. No entanto não resta dúvida que

[...] a organização política revelou-se um espaço importante de mediação


entre o discurso teórico e a possibilidade de sua concreção na prática.
Neste aspecto, propiciou a nível do debate o cruzamento entre o estrutural
(entendido aqui as determinações cotidianas de prática) e o conjuntural
(aqui compreendendo o regime político-econômico e as reformas que
ele impõe e ou sobrepõe à sociedade) interpretados à luz do discurso e/
ou matrizes teórico-metodológicas que foram sendo absorvidas pelo Ser-
viço Social como fundamento de análise do movimento contraditório e
itinerante da sociedade brasileira e piauiense (SILVA, 1991, p. 203-204).

Nos últimos anos, tem surgido em alguns estados, e no Piauí temos


também esse registro, um movimento que tenta retomar a discussão sobre a
volta dos sindicatos de assistentes sociais naquele formato anterior, ou seja,
da sindicalização por categoria profissional, mas este assunto não é consenso
no seio da categoria profissional, que vem seguindo a forma de nucleação
dos assuntos da categoria através do conjunto CFESS/CRESS e da ABEPSS.

5. Contemporaneidade da profissão no estado

A profissão de Serviço Social, no Brasil, tem conquistado, ao longo de


seus mais de 80 anos de existência, reconhecimento por sua importante contri-
buição ao desenvolvimento desse país. A atuação profissional, em suas diversas
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 77

modalidades de inserção nas sequelas da questão social, tem proporcionado


contribuir para a diminuição dos índices de pobreza e de outras inúmeras vul-
nerabilidades econômicas e sociais que experimenta a maioria da população
alvo das políticas sociais e públicas, com as quais convivem os(as) assistentes
sociais, diuturnamente, em seus exercícios profissionais, qual seja: o pobre e os
trabalhadores em geral. É com esse público que os profissionais lutam e resistem
para proporcionar melhores condições de vida e trabalho em suas jornadas
diárias de trabalho. Seja na docência, seja nas pesquisas, seja no planejamento,
na execução, na avaliação de políticas sociais, entre outras formas de inserção
profissional, os(as) assistentes sociais se constituem, com outros profissionais,
na vanguarda em dar respostas às sequelas da questão social e do mundo do
trabalho, no dizer de Antunes (1996, 2002). No Piauí não tem sido diferente.
A profissão tem conquistado seu espaço e é respeitada pelos seus contratantes.
Nesse contexto, a Universidade Federal do Piauí, desde sua implantação,
nos anos de 1970, tem dado a sua contribuição no sentido de preparar profis-
sionais de Serviço Social qualificados para o mercado de trabalho. O Curso
de Serviço Social, como se pontuou atrás, tem conceito elevado. Seus quadros
profissionais têm, no mínimo, o nível de doutorado, e suas diversas formas
de inserção (na docência, na pesquisa, na extensão, em assessorias etc.) têm
contribuído para que o exercício profissional do egresso seja de qualidade
e com respeito ao Código de Ética profissional. Essa IES tem oportunizado
campos de estágio em sintonia com as leis que regulamentam, tanto o estágio
curricular obrigatório, quanto o estágio extracurricular.
A preocupação, em nível nacional e local, tem sido o profissional que
se forma pela modalidade EAD. Embora a Associação Brasileira de Ensino
Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) estabeleça Diretrizes Curriculares para
o processo de formação profissional, tal entidade não consegue ter o controle
da qualidade da formação profissional oferecida por inúmeras instituições
existentes no país. O Conselho Federal de Serviço Social e seus respectivos
Conselhos também não dão conta de fiscalizar a contento o exercício profis-
sional dos(as) assistentes sociais cadastrados em cada região.
Mas, importa ressaltar mais uma vez: compete ao assistente social exercer
sua profissão com dignidade e respeito aos princípios basilares do seu Código
de Ética, dirigindo sua atuação profissional na direção dos pobres e oprimidos
econômica e socialmente por uma sociedade capitalista desumana e cruel.
Acredita-se que todos os profissionais do Piauí caminham nessa direção.

6. Conclusões

O Serviço Social no Brasil. e no Piauí em particular, tem conquistado


respeito, que pode ser avaliado, entre outras maneiras, por seu compromisso
78

com a vida de milhares de homens e mulheres dessa nação e desse estado. Os


princípios contidos no Código de Ética Profissional e nas Diretrizes Curri-
culares (que orientam os processos de formação do(a) Assistente Social) são
balizadores principais e fundamentais de um agir profissional comprometido
com a justiça, a equidade, a democracia e a efetivação, de fato, de direitos e
garantias sociais aos pobres e trabalhadores, público por excelência do ser e
fazer profissional.
Com a Constituição de 1988, e as leis daí advindas, tais direitos e garan-
tias sociais foram ampliadas, embora muitas das normativas surgidas desde
então não tenham se concretizado, levando a inúmeras dificuldades ao coti-
diano profissional, já que historicamente o(a) assistente social tem atuado com
as sequelas da questão social. E é no mundo do trabalho que metamorfoses
vêm ocorrendo desde os anos de 1990, pós proclamação dessa Constituição.
Após a redemocratização do país, inúmeros “pacotes” e medidas legais
têm se implantado, sobretudo no que se refere aos direitos sociais e traba-
lhistas. Mas, é nos anos 2000 que tais direitos têm sido alvo de políticas
governamentais (em suas diversas esferas) que visam diminuir, postergar e/
ou alterar os artigos constitucionais que possam garantir condições de vida
digna para os pobres e trabalhadores em geral. Afinal, vivemos numa socie-
dade capitalista, historicamente autoritária e elitista, cuja riqueza, produzida
pelos trabalhadores, concentra-se nas mãos de uma minoria sempre sedenta
de novos lucros, ainda que isso signifique a morte de milhares de homens,
mulheres, crianças, jovens, adultos e idosos e a destruição de sonhos de um
viver em plenitude.
O Serviço Social, como profissão inserida nas relações sociais, em seus
mais de 80 anos de Brasil, tem se caracterizado como de resistência e de luta.
O cotidiano dos(as) assistentes sociais é de combate a todas as formas de
preconceito e injustiça social. Como diz Iamamoto (2008), é na resistência
e na rebeldia que se coloca o assistente social em seus diferentes espaços de
inserção profissional e social.
As entidades da categoria como o CFESS e os CRESS, a ABEPSS e suas
Regionais, e a ENESSO, são entidades que diuturnamente lutam e orientam
os(as) assistentes sociais e estudantes de Serviço Social a se posicionarem
e a fazerem enfrentamentos a todas as formas de violação dos direitos dos
profissionais, dos estudantes, dos trabalhadores e dos públicos diversos com
os quais atua o profissional.
Ainda que nos últimos anos venham se verificando medidas que impedem
e/ou obstaculizam uma ação profissional comprometida com o Código de Ética
e as Diretrizes Curriculares, as entidades dos estudantes e de profissionais,
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 79

em suas diferentes instâncias e em diversas localidades desse país, bem como


em seus diferentes espaços de inserção pessoal, profissional e de militância,
têm se colocado na luta por novos horizontes de vida e de sociedade para o
país e para os pobres e trabalhadores em geral.
Enfim, é na luta e na resistência que os(as) assistentes sociais, em sua
maioria, colocam-se. Mesmo nesses tempos de crise sanitária, econômica
e política que vem atravessando o país nos últimos anos, verifica-se que
o(a) assistente social é um dos(as) trabalhadores(as) que não fogem à luta.
Coloca-se contra todos os desmandos que ocorrem na sociedade e que, em
última instância, possam violar direitos e garantias sociais conquistados com
a Constituição de 1988. Resistir, enfrentar e lutar têm sido lemas que norteiam
o Código de Ética e as Diretrizes Curriculares. Conformismo não tem sido a
marca histórica dessa profissão no Piauí e no Brasil.
80

REFERÊNCIAS
ANTUNES, Ricardo. Dimensões da crise e as metamorfoses do mundo do
trabalho. Serviço Social & Sociedade, n. 50. São Paulo: Cortez, 2002.

ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho. São Paulo: Cortez, 1996.

GUIMARÃES, Simone de J. Trajetória de vida, trajetória acadêmica:


alunos e egressos do curso de Serviço Social. Teresina, 1995.

GUIMARÃES, Simone de J. Perfil do Assistente Social de Teresina: mer-


cado de trabalho e práticas profissionais. Teresina, 2001.

IAMAMOTO, Marilda. Mundialização da economia, capital financeiro e


questão social. In: IAMAMOTO, Marilda. Serviço Social em tempo de
capital fetiche. São Paulo: Cortez, 2008, p. 108-128.

SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena: experiências,


falas e lutas dos trabalhadores da Grande São Paulo. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1988.

SILVA, Maria do Rosário de Fátima e. A Organização político-sindical como


mediação da prática interventiva do Serviço Social. Dissertação de Mes-
trado apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Serviço Social
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1991.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ. CURSO de Serviço Social. Núcleo


Estruturante. O projeto pedagógico do curso de graduação bacharelado
em Serviço Social. Resolução 169/2012 do Conselho de Ensino, Pesquisa
e Extensão da Universidade Federal do Piauí. Aprova alterações do Projeto
Pedagógico do Curso de Graduação Bacharelado em Serviço Social/UFPI.
Teresina, 2012.

VIANA, Masilene R.; TEIXEIRA, Solange M. Projeto Pedagógico do Curso


de Serviço Social. Teresina, 2020.
CAPÍTULO 4
PRIMÓRDIOS DA EDUCAÇÃO
POPULAR: a experiência de Paulo Freire na
Escola de Serviço Social de Pernambuco
Luanna Barbara Cavalcanti Soares

1. Introdução

Esse texto é resultado de um estudo exploratório que aborda a experiência


de Paulo Freire na Escola de Serviço Social de Pernambuco (ESSPE) entre
os anos 1950 e 1960, destacando a influência dos ideais da educação popular
nas dimensões e tendências do Serviço Social no estado. Para a análise, foram
utilizados os Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC’s) desenvolvidos pelas
alunas da instituição que apresentaram participação direta do educador, ou
influência indireta, com a presença da sua perspectiva pedagógica guiando
algumas dimensões dos estágios. Em parte das décadas de 1950 e 1960, Paulo
Freire atuou como docente da ESSPE, ministrando disciplinas e colaborando
com a orientação de experiências de estágio das discentes, das quais alguns
registros foram encontrados nos TCC’s. Os primeiros TCC’s analisados são
os de Duarte (1957) e Ary (1963), que contaram com a participação direta
de Paulo Freire nas atividades desenvolvidas. Em seguida, são analisados
os TCC’s de Pinheiro (1961), Dantas (1963), Campos (1964) e Almeida et
al. (1967), em cujas experiências percebemos a influência da perspectiva
pedagógica freiriana.
Esse primeiro momento do texto é dedicado ao contexto histórico da
época, apreciação indispensável para a compreensão da perspectiva pedagó-
gica de Paulo Freire, amparada nos ideais desenvolvimentistas, e da dinâmica
de atuação do Serviço Social, através da abertura para o chamado Desen-
volvimento e Organização de Comunidade (DOC). O segundo momento da
exposição corresponde a uma análise dos TCC’s de Duarte (1957) e Ary
(1963), nos quais pode-se observar a participação direta de Paulo Freire nos
projetos educacionais empreendidos e a sua influência no desenvolvimento
das intervenções. Também é apresentado, na sequência, um mapeamento
comentado dos TCC’s da ESSPE que apresentaram influência indireta de Paulo
Freire e da sua perspectiva pedagógica, dos seus ideais ou do seu método de
alfabetização, que estava começando a ser aplicado.
82

No Brasil, até a década de 1950, mesmo com um sistema democrático


desde 1945, a participação eleitoral era restrita (não votavam analfabetos,
soldados e marinheiros). A força de trabalho localizava-se predominantemente
na agropecuária, mas a industrialização de base começava avançar. No país,
predominava a população rural, mas a produção das mercadorias de consumo
familiar passava a ser mediada, crescentemente, pela grande indústria. A partir
dessa década, intensifica-se a mecanização do campo, além de importantes
transformações na produção, circulação e consumo das mercadorias, com a
passagem de uma industrialização restrita para uma industrialização pesada
(MELO; NOVAIS, 2009; NETTO, 2014).
Os anos 1950-1960 constituem a abertura de um período nacional de novas
condições de desenvolvimento econômico capitalista, com impactos na movi-
mentação política e na sociabilidade no país (NETTO, 2014). Presencia-se,
sobretudo após meados de 1950, um ciclo de crescimento econômico impul-
sionado pelo Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, patrocinado por capitais
estrangeiros (principalmente norte-americanos). Porém, segundo Netto (2014),
foi um crescimento econômico com acirramento dos desequilíbrios regionais e
da desigualdade na distribuição de renda, com aumento da concentração de terras
e desenvolvimento econômico mais concentrado no Sudeste. O papel do Estado,
nesse processo de crescimento, foi central, pois ele operou como catalisador e
estimulador da indústria nacional. Verificam-se, portanto, fortes investimentos,
a partir da articulação do tripé econômico Estado, capital estrangeiro (predo-
minantemente norte-americano) e capital nacional (esse último, bem menos
expressivo). Sobre esse intervalo histórico, diz Netto (2014, p. 40-41): “[...] na
entrada dos anos 1960, esgotou-se a fase expansiva da industrialização brasi-
leira que se iniciara no imediato segundo pós-guerra (inicialmente prolongado
a substituição de importações) e chegou ao auge entre 1956 e 1961 (quando o
processo se alargou para os setores da indústria pesada)”.
Essa transição econômica causou uma significativa instabilidade política,
acompanhada pelo aumento do conservadorismo. Getúlio Vargas foi pressio-
nado pelas forças conservadoras e reacionárias. Juscelino Kubitscheck teve
a posse ameaçada pelos mesmos setores que levaram Vargas ao suicídio. E
Jânio Quadros renunciou ao seu mandato, culminando na posse – também
ameaçada pelos militares e conservadores – de João Goulart, que tinha como
bandeira um projeto nacional-desenvolvimentista, orientado para as reformas
de base, sendo deposto por um golpe civil-militar. Além disso, a conjuntura
também era instável na política internacional, com as tensões da chamada
“Guerra Fria” e as crescentes intervenções dos EUA na América Latina.
Para Netto (2014, p. 41), a crise desse momento é expressa como “[...]
uma crise estrutural do capitalismo brasileiro que exigia uma reestrutura-
ção geral dos mecanismos e instituições necessários a um novo padrão de
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 83

acumulação”. Assim, a solução para o “subdesenvolvimento” não se resolveria


exclusivamente no plano institucional, nos marcos econômicos ou políticos
vigentes, mas demandaria um projeto que articulasse uma alternativa eco-
nômica com renovação política e transformações institucionais estruturais.
Na época, o que estava em jogo não era a opção entre capitalismo e
socialismo, pois as reformas de base não atingiriam os fundamentos do regime
capitalista, mas prometiam lançar o capitalismo brasileiro a um novo estágio
de desenvolvimento, deslocado da posição de país dependente.
Esse período, marcado pelo acirramento da luta de classes no Brasil, teve
seus reflexos na realidade de Pernambuco. Regionalmente, a sociedade civil
pernambucana apresentava uma configuração diferente de alguns estados, havia
maior participação dos trabalhadores urbanos e do campo no debate político
(COELHO, 2004). No momento de efervescência democrática, nos governos
de João Goulart (nacional) e Miguel Arraes (municipal e depois estadual),pô-
de-se observar maior sindicalização, fortalecimento das Ligas Camponesas e
do movimento estudantil, através da União Nacional dos Estudantes (UNE).
Nas esferas econômica e política, o desenvolvimentismo, que teve seu
auge nos anos 1950-1960, sob a roupagem nacional-desenvolvimentista, era a
bandeira amplamente assumida, com diferenciações entre os defensores da via
nacionalista e democratizante e os conservadores.70 Era hegemônica a perspec-
tiva de superação do atraso e do subdesenvolvimento através da industrialização.
Devido a isso, o Estado também passou por transformações e precisou se moder-
nizar e racionalizar suas práticas para impulsionar o crescimento econômico.
Com isso, se abriam possibilidades para o Serviço Social. De acordo com
Castro (2011), o conteúdo do discurso desenvolvimentista implicava maiores
possibilidades de êxito e ampliação do campo profissional.

E foi o que efetivamente ocorreu, sob as formas mais variadas – bolsas


de estudo e especialização, acesso a cargos hierárquicos, participação em
pesquisas multidisciplinares, ampliação e diversificação do mercado de
trabalho – entre as quais não são desprezíveis os casos de profissionais
contratados como funcionários internacionais ou incorporados a comissões
nacionais como no CBCISS brasileiro, que exerceram sensível influencia
na orientação profissional (CASTRO, 2011, p. 152).

As instituições de ensino superior e os profissionais tiveram que respon-


der às exigências do desenvolvimentismo, reorientando as teorias e práticas
de acordo com a nova perspectiva, que consistia na reorientação do Estado
brasileiro de acordo com:

70 O desenvolvimentismo também passou por uma fase modernizadora nos anos 1970, com a ditadura militar.
Não foi um ideal superado, mas que passou a ser intensamente subordinado aos interesses imperialistas.
84

[...] as novas relações de forças no imperialismo posterior à Segunda


Guerra, conformadas pelo capitalismo tardio, a ascensão da hegemonia
norte-americana, a polarização da chamada “Guerra Fria”, as mudan-
ças na divisão internacional do trabalho e das modalidades de interven-
ção do Estado (BEHRING, 2011; CASTRO, 2000; MANDEL, 1985;
NETTO, 2013, 2004, 2005); a transição industrial que marca a entrada
do capitalismo no Brasil para o estágio dos monopólios, da industriali-
zação restringida para a industrialização pesada, associadas aos câmbios
na divisão social do trabalho, internamente operantes, e no aparelho do
Estado – trata-se da fase de irrupção do capitalismo monopolista, no qual
ocorre a reorganização do mercado e do sistema de produção, através
de operações comerciais, financeiras e industriais da grande corporação
(predominantemente estrangeira, mas também estatal e mista) (FER-
NANDES, 1976; IANNI, 1977; MELO; NOVAIS, 1998; MELLO, 1986;
NETTO, 2004, 2005, 2014); a inserção desigual e combinada do Nordeste
no estágio do capitalismo monopolista no Brasil (OLIVEIRA, 2008); e o
metabolismo das lutas de classes e as formas concretas da “questão social”
em âmbito latino-americano, nacional e regional, nos anos 1950-1970.
(SILVEIRA Jr., 2020, p. 122).

Essa conjuntura revelou um traço da profissão: “[...] a sua vulnerabili-


dade em face de mudanças políticas, bem como o seu grau de dependência as
modificações na orientação dos Estados” (CASTRO, 2011, p. 153).
A influência dos EUA no Brasil – algumas organizações eram instru-
mentos de difusão do pan-americanismo, como a Organização dos Estados
Americanos (OEA), por exemplo– culminou na definição do método dessa
reorientação desenvolvimentista: o chamado Desenvolvimento de Comuni-
dade, que repercute em mudanças na teoria, na ideologia e nas estratégias de
intervenção do Serviço Social latino-americano:

[...] especialmente pela generalização da intervenção de profissionais no


então recentemente expandido campo do desenvolvimento de comuni-
dade – sobre o qual passou a exercer-se também a influência das ideias
progressistas do Pe. Lebret. Ademais de requisitar novas qualificações,
eminentemente técnicas, dos assistentes sociais (p. ex., as relacionadas ao
planejamento social), de colocá-los frente a problemáticas macro-sociais
(forçando a ultrapassagem dos limitados círculos do trabalho centrado
em indivíduos e com pequenos grupos, expressos no espaço do “psico-
-social”) e de levá-los a novas interações com a sua inserção em equipas
multiprofissionais, o desenvolvimentismo, dada a sua vocação promocio-
nalista e a sua genérica proposição da “mudança social”, abriu a via para
deslocar a centralidade da ação assistencial. Como observou M. Manrique
Castro, atento analista do Serviço Social periférico, foi precisamente na
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 85

quadra desenvolvimentista que os assistentes sociais pretenderam deixar


a condição de “apóstolos” para assumir a de “agentes da mudança” – no
curto prazo, muitos desses assistentes sociais compreenderam os limites
da “mudança social” reformista conservadora e radicalizaram as suas
propostas profissionais, transcendendo o campo do promocionalismo e,
inclusive, avançando na crítica do assistencialismo (NETTO, 2014, p. 21).

É nesse contexto de reorientação do Serviço Social brasileiro, e de transfor-


mações societárias significativas, que são desenvolvidas as experiências educa-
cionais das alunas da ESSPE e emerge a perspectiva pedagógica de Paulo Freire.

2. A relação de Paulo Freire com a Escola


de Serviço Social de Pernambuco

Dentro dessa perspectiva desenvolvimentista, ao analisar os métodos de


intervenção do Serviço Social, podemos destacar a presença da psicologia
social, da dinâmica de grupos, do incentivo à formação de lideranças e das
técnicas de educação popular e alfabetização de adultos. São instrumentos
essenciais manifestos nos TCC’s analisados, e presentes também na estratégia
utilizada por Paulo Freire em suas propostas educacionais que almejavam a
formação de indivíduos conscientes sobre os problemas comunitários, parti-
cipativos na resolução das ações coletivas, a tentativa de transformar a escola
em um centro comunitário (DUARTE, 1957) e o método de alfabetização de
adultos no Centro de Cultura do Movimento de Cultura Popular (ARY, 1963).
Em Educação e Atualidade Brasileira (1959), onde está registrada
uma síntese do pensamento de Paulo Freire à época, a educação “[...] viria
assim a ser compreendida fundamentalmente como processo de conscien-
tização” (BEISIGEL, 1982, p. 30). As análises da realidade feitas por ele
se estruturaram através da busca por respostas aos problemas e demandas
identificados na atuação educativa junto aos setores populares do Recife
(BEISIGEL, 1982). As ideias educacionais que estavam sendo construídas
(FREIRE, 1959, 1961, 1963, 1967) defendiam o investimento numa educação
e agir educativo que viessem a colaborar na transição de uma sociedade em
estado colonial (ou semicolonial) para um regime capitalista democrático.
Por isso, se vinculava essa educação ao processo de desenvolvimento e se
articulava a mesma numa programática nacional-reformista. Nessa perspec-
tiva, Paulo Freire – inspirando-se no pensamento educacional de intelec-
tuais como Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo – aponta que a educação
possuiria uma “duplicidade de planos instrumentais”, colaborando para a
passagem de uma “consciência transitivo-ingênua” para uma “consciência
transitivo-crítica” necessária à “democratização fundamental”: por um lado,
86

a educação cooperaria para o preparo técnico exigido pelos processos de


expansão industrial e urbana; por outro lado, ela confluiria para a formação
de disposições mentais de adesão ativa, participativa e crítica do homem
ao desenvolvimento. O cumprimento desse papel cultural demandaria uma
educação e agir educativo pautados na “autencidade cultural” das populações
envolvidas, na “descentralização”, na experiência da participação e ingerência
dos sujeitos, na “dialogação” e no exercício da criticidade, no despertar do
“espírito comunitário”, etc., contra os padrões arcaicos referenciados pela
propedêutica, pelas ações assistencialistas, pelos moldes antidemocráticos,
pelo alheamento em face das condições concretas da realidade, etc..
Em diversas oportunidades, Paulo Freire (FREIRE, 1959, p. 131;
FREIRE, 1963, p. 12; BEISIEGEL, 1982, p. 35) afirma o papel da ESSPE
como um dos campos de influência intelectual e experimentação de suas ideias
e práticas educativas, juntamente com os trabalhos realizados na Divisão de
Educação de Cultura do SESI, onde também desenvolvia atividades ao lado
de assistentes sociais. Assim, o SESI e a ESSPE foram determinantes para o
desenvolvimento de uma prática educativa que carrega um traço particular,
caracterizada, segundo Beisiegel (1982), pela união entre reflexão e prática.
Em depoimento, declara o próprio Paulo Freire:

Toda a minha prática, durante anos, no SESI e que se liga a uma prática
anterior em Jaboatão, foi importante pois representou a criação de desa-
fios que me levaram a iniciar as primeiras experiências... Naquela época
não escrevi nada... Não... Escrevi dois artigos, publicados no Diário de
Pernambuco, um sobre os círculos de pais e professores como educação
de adultos e o outro sobre assistencialismo... [...] naquela época, a dos
meus 24, 25, 26 anos... Creio que poderia ter dois polos de influência
sobre mim: de um lado assistentes sociais, a Escola de Serviço Social de
Pernambuco, assistentes sociais, todas católicas e Anita Paes Barreto que
em não sendo assistente social era, porém, primeiro do mesmo time dessas
assistentes sociais que eu vou citar e, segundo, era professora fundadora
dessa escola. É interessante recordar como mulheres de minha geração,
algumas um pouco mais velhas, outras um pouco mais jovens, três, quatro
ou cinco, me marcaram fundamentalmente – Anita Paes Barreto, Lourdes
de Moraes, Dolores Coelho, [...] Hebe Gonçalves71... Por isso mesmo é que
essa escola que me influenciou me chama para ela e eu fui professor da
escola de Serviço Social. [...]. Me lembro da ênfase que davam ao serviço
social de grupo, ao serviço social de organização de comunidade, se bem
que não desprezassem o trabalho com casos individuais (FREIRE, 1980
apud BEISIEGEL, 1982, p. 35).

71 Essas três últimas citadas foram as primeiras assistentes sociais de Pernambuco, atuando em diversas
instituições, e constituíram um importante núcleo docente da ESSPE durante toda a existência da instituição.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 87

O desenvolvimento das ideias e práticas de Paulo Freire estava anco-


rado na reflexão da interpretação cristã do homem e da realidade e na prática
estruturada através de experiências aqui analisadas no SESI, na ESSPE e em
clubes de pais e mestres. No SESI, vale ressaltar seu trabalho com os grupos
de trabalhadores nos Núcleos de Serviço Social, priorizando o diálogo com
as comunidades, a participação popular no processo educativo, a prática de
reuniões e outras estratégias para fazer da ação educativa um meio de elevação
de consciência de trabalhadores sobre seus problemas individuais e coletivos,
como é destacado por Paulo Freire:

Outro pólo foi exatamente a minha prática no SESI, pelo contato com os
trabalhadores, com grupos de trabalhadores, no que então chamávamos
Núcleos de Serviço Social, Comecei a trabalhar como assistente da Divi-
são de Educação e Cultura, logo depois fui para a direção dessa Divisão
e comecei a desenvolver um trabalho muito associado com as assistentes
sociais. [...]. Quando eu começo a trabalhar nos círculos de pais com
a escola, aí então eu tenho um aprendizado enorme com o povo e esse
diálogo com o povo foi elemento fundamental na minha formação. Foi o
segundo grande pólo e o mais fundamental mesmo de desafio a mim. Então
eu comecei um trabalho extraordinário com o povo, do ponto de vista de
sua linguagem, por exemplo, e de sua realidade, aí (FREIRE, 1980 apud
BEISIEGEL, 1982, p. 36).

A relação de Paulo Freire com a ESSPE e o SESI foram indispensá-


veis para a construção das suas ideias e práticas educacionais. E o uso dos
instrumentos do Desenvolvimento de Comunidade, que representam bem a
influência do desenvolvimentismo nas instituições e na proposta educacional
de Paulo Freire, consequentemente, são essenciais para a compreensão das
experiências e da sua participação nelas.

3. A participação direta de Paulo Freire nas experiências


da Escola de Serviço Social de Pernambuco

Considerando o contexto histórico exposto, nas partes seguintes do texto


constam as análises das duas experiências principais de Paulo Freire na Escola
de Serviço Social de Pernambuco, registradas nos trabalhos de Duarte (1957)
e de Ary (1963), que contaram com a participação direta dele na elaboração
e desenvolvimento dos projetos, fundamentadas pelos métodos e técnicas do
Desenvolvimento e Organização de Comunidade. A primeira, foi mobilizada
por católicos leigos através de uma obra de restauração social da Igreja na
comunidade paroquial em Casa Amarela, nos anos 1954-1957, constituindo
originalmente os trabalhos de estágio de Duarte (1957).
88

3.1 Atuação no âmbito da Escola em Casa Amarela

A experiência de Duarte (1957) foi realizada em uma comunidade paro-


quial, no bairro de Casa Amarela, em Recife, entre março de 1955 e abril
de 1957, visando despertar a colaboração da comunidade católica na obra de
restauração social da Igreja, tendo como base de dados uma pesquisa ante-
rior realizada por Wandith Figueiredo, em 1954 (FIGUEIREDO, 1954). O
método utilizado foi o de Organização Social de Comunidade, cujo objetivo,
segundo Duarte (1957), era o de promover o ajustamento progressivo daquela
comunidade, pois a ausência do trabalho comunitário, de organização e de
recursos era compreendida como impedimento para um possível sucesso ou
melhoria individual e coletiva. Nos projetos estavam envolvidos professores,
comerciantes, membros da Ação Católica, engenheiros, mães de família, ele-
mentos da ESSPE, assistentes sociais e alunos.
No primeiro encontro com a comunidade nessa experiência, que foi
registrado como um debate livre e informal, houve o informe e repasses sobre
o trabalho de pesquisa realizado anteriormente. O objetivo da reunião foi inter-
pretar a realidade social da vida paroquial e encontrar meios para desenvolver
programas que atendessem às necessidades da comunidade, registradas em
parte no trabalho de Figueiredo (1954). A conclusão foi de que havia a neces-
sidade de estudos parciais, mais aprofundados, coordenados por especialistas
em determinadas áreas, dos temas pesquisados. Nas reuniões subsequentes, já
com os indicativos de buscar soluções de ordem prática, foi definido que os
tópicos explorados seriam: aspectos demográficos, alfabetização (educação),
habitação, economia familiar, vida associativa e religiosa.
Na primeira fase da experiência, foi apresentada a ideia de como estavam
sendo os esforços com o objetivo de aglutinar as pessoas para lhes transmitir
a consciência de seus próprios problemas, incentivando a dinâmica de gru-
pos através das relações estabelecidas nas reuniões, onde eram analisadas
as possibilidades práticas para um trabalho comunitário na Paróquia. Nesse
momento, Duarte (1957) considera que, partindo do ponto de vista prático,
a experiência não poderia ser considerada nula, pois possibilitou a um grupo
oportunidades de participar de uma experiência democrática, ela aponta que:

Nota-se na Paróquia de Casa Amarela um certo grau de vitalidade, alguma


cooperação de interdependência entre as instituições e serviços ali existen-
tes. Entretanto, não se apresenta essa comunidade como um todo orgânico
suficientemente independente para a sua sobrevivência de outros recur-
sos e instituições próprias a agrupamentos maiores aos quais se encontra
vinculada. Todo o bairro de Casa Amarela está intimamente relacionado
e integrado em uma área maior, ou seja, a do Recife, por interesses como
o de ocupação e trabalho, recreação, comércio e outras relações sociais
(DUARTE, 1957, p. 30).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 89

A falta do trabalho coletivo é considerada como um dos motivos para a


dispersão dos interesses comuns da comunidade paroquial, tirando o sentido
da vida comunitária, que deveria direcionar os indivíduos e grupos para uma
ação coordenada visando atender aos interesses coletivos. A experiência do
estágio buscava germinar e fortalecer estas disposições necessárias e incentivar
a participação de todos nas soluções dos problemas comuns.
Nesse sentido, a participação de Paulo Freire foi desenvolvida no setor
da Educação, coordenado por ele, que após estudar os dados da pesquisa refe-
rentes à alfabetização, sugeriu um plano de atividades para as escolas situadas
no território da Paróquia. O objetivo dessa experiência educacional era o de
promover a aproximação entre a escola e a família e, mais tarde, transformar
as escolas em verdadeiros centros da vida comunitária. O plano foi submetido
à análise e debate entre os participantes do grupo de trabalho, em reunião.
Alguns comentários indicaram a pouca possibilidade de realização do plano
por dificuldades ocasionadas pela falta de verbas, ausência de pessoal, etc.
Ao final das discussões, o plano elaborado foi considerado para ser posto em
prática a título experimental. Sobre essa etapa:

O dr. P.F informa aos presentes dos recursos de que ele já dispõe, ou
seja, auxílio monetário, para início de atividades assim como a colabo-
ração de uma aluna da Escola de Serviço Social de Pernambuco. Acha
que ele já conta com os meios para iniciar as atividades preliminares
(DUARTE, 1957, p. 14).

O primeiro passo do programa foi a realização de um pequeno inqué-


rito para verificar como estavam se processando as relações entre a escola e
a família. A partir disso, foi criada uma comissão comunitária para estudos
pedagógicos e foram formadas subcomissões integradas para a troca de infor-
mações e orientação pedagógica dos pais e os Círculos de Pais e Mestres, para
criar e fortalecer vínculos comunitários. Dessa proximidade, esperava-se que
surgissem líderes naturais que passariam a integrar e alimentar ativamente
as comissões.
A partir das exposições realizadas nas reuniões, que eram conduzidas
numa perspectiva de exercer uma prática dialógica e problematizadora72, o
programa educacional era visto como o que levaria a Escola ao alcance de
um conhecimento mais amplo e ativo, em busca de soluções mais adequadas
e possíveis para os problemas comunitários. Essa intenção foi exposta por
Paulo Freire, em reunião. Disse ele:

72 Isso se exemplifica no próprio texto do “temário das reuniões”, onde estavam registrados pontos e perguntas
para provocar o debate. Além de incentivos para que outras perguntas e assuntos relacionados também
fossem levados para o espaço de reunião.
90

A posição da escola, realmente, dia a dia vai deixando de ser a do isola-


mento, a do fechamento em si mesma, sem contacto com outras Escolas,
sem contacto com as famílias dos alunos, sem contacto com a comunidade
onde se instala, escola tímida, medrosa de encontros, “introvertida”. A
posição da Escola atual é na verdade outra. É a de divulgadora da cultura
“de avaliação e assimilação de novas formas culturais”.
É a de instituição integradora da comunidade local. Por isso mesmo não pode
e não deve continuar sendo aquela casa distante de tudo, diferente da vida,
estranha aos valores socio-culturais da época, “incidente” dos padrões eco-
nômicos, sociais, históricos, da comunidade local onde se acha e das comu-
nidades maiores a que necessariamente se prende (DUARTE, 1957, p. 15).

Ou seja, havia a compreensão da Escola inserida numa realidade ampla,


comunitária, e não como uma instituição isolada, com um fim em si mesmo.
E, segundo esse entendimento, a escola deveria seguir o caminho de procurar
atender às necessidades das crianças cujas origens poderiam ser encontradas
na situação social de “desajustamento” da família, representada por problemas
principalmente de ordem econômica, que precisariam de soluções viabilizadas
pelo trabalho comunitário.
As atividades desenvolvidas na Paróquia de Casa Amarela, no setor de
Educação, foram levadas de modo a estimular as potencialidades individuais
e comunitárias para a resolução dos problemas de ordem prática da comuni-
dade, através do método de Organização Social de Comunidade e da prática
pedagógica de Paulo Freire. Ao discorrer a argumentação introdutória sobre
o desenvolvimento do programa, Paulo Freire explica que pretendia trans-
formar a Escola em:

[...] Qualquer coisa de mais vivo do que vem sendo, de mais alma, de
mais emoção. Fazer dela pelo seu comportamento amigo, consciente, um
centro de interesse das famílias de seus alunos, preparando-se assim para
o papel mais amplo – Centro da Comunidade [...] surgirão cursos para os
pais, clubes dos pais, clubes dos amigos da escola. Pela manhã a escola
vivendo a algazarra dos meninos; à noite, uma instituição da comunidade,
querida dos adultos, trabalhando com eles, aproveitando seus líderes, dan-
do-lhes cursos de educação de base, interessando-se em conhecer a vida,
os padrões da comunidade (DUARTE, 1957, p. 16).

Para a materialização do programa educacional que foi elaborado, foram


realizados diálogos preliminares com as diretoras das escolas primárias, para
fazer o convite, esclarecer e interpretar aquela realidade com o objetivo de
organizar a educação e sua relação com o trabalho geral da Paróquia. Esta-
vam presentes nas reuniões o autor do plano de trabalho, Paulo Freire, além
do Pároco de Casa Amarela, a Inspetora do Distrito e integrantes da ESSPE.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 91

Os primeiros Círculos de Pais e Mestres são registrados como de caráter


expositivo, sem grandes debates, devido à falta de preparo do grupo. A finali-
dade dos Círculos era incentivar, através da dinâmica de grupos, a introdução
desta metodologia no sistema pedagógico das Escolas, buscando levar os pais
a assumirem responsabilidades para com a instituição e, posteriormente, em
relação à própria vida comunitária (DUARTE, 1957).
As professoras das Escolas na área da Paróquia estavam cientes dos
assuntos apresentados e, mais ainda, mostravam-se dispostas a procurar solu-
ções de ordem prática para os problemas identificados. Antes das reuniões,
eram organizados temários e encontros prévios com as professoras sobre os
assuntos que seriam abordados nos círculos, de modo a aumentar o interesse
delas e fomentar o debate e interação dos pais na execução dos círculos.
O trabalho do grupo do setor de Educação acabou ficando limitado à
Escola de Especialização Ageu Magalhães, por ter sido o campo que se mos-
trou mais favorável, com maiores possibilidades de realização de um trabalho
dessa natureza, segundo Duarte (1957). No TCC em questão, há registros
acerca do planejamento de algumas reuniões e dos debates realizados.
Um desses registros diz respeito a uma reunião dos Círculos de Pais e
Mestres, onde o assunto foi a disciplina, e o temário o seguinte: “Que será
um menino disciplinado para o Sr? Será um menino que não vai a rua porque
o pai prende, ou porque tem medo de apanhar? Medo de fazer as coisas será
obediência? Será disciplina não fazer as coisas por medo? Que será então?”
(DUARTE, 1957, p. 58).
Iniciada a reunião, após a leitura do temário, estava marcado o momento
em que a palavra era passada aos presentes. É possível observar, através dos
relatos, que os pais encontravam-se divididos em várias opiniões. Alguém
argumentava que um menino disciplinado é aquele que faz o que o pai quer,
que a disciplina é ensinada através de castigos. Outra opinião indicava que,
pelo contrário, a disciplina se consegue com liberdade. E Paulo Freire indaga
o grupo: “Menino disciplinado é aquele que independente da presença dos
pais faz o que é certo. O menino que obedece porque tem medo não está
sendo disciplinado, mas amedrontado. Mais tarde, quando não temer mais
(fisicamente) será disciplinado?” (DUARTE, 1957, p. 59).
Além da promoção do diálogo, um dos principais trabalhos desenvolvidos
pelo Círculo de Pais e Mestres da Escola de Especialização Ageu Magalhães
foi a criação de uma comissão para lidar com a questão da merenda escolar
das crianças, que deveria ser mais nutritiva. A comissão foi integrada por seis
pais, um representante docente, uma assistente social e Paulo Freire.
A comissão definiu um programa de ação através de encontros periódicos
com o Secretário de Educação, onde solicitaram a construção de um fogão
de barro, com uma servente que ficasse à disposição da escola para o serviço
92

de merenda. Além disso, conseguiram a instalação de uma cacimba com uma


bomba d’água. Também solicitaram à Secretaria de Agricultura o plantio de
canteiros de verdura que seriam entregues às famílias. Os resultados desse
plano reverberaram na criação de um clube permanente com o objetivo de
acompanhar a solução do problema da merenda escolar, com os mesmos
membros que trabalharam no grupo inicial.
Essa integração dos pais à escola, e sua elevação de nível, trouxeram bene-
fícios e novas possibilidades para o programa educacional, pela ação corretiva
que ele desempenha nos problemas ligados às famílias (DUARTE, 1957). Os
Círculos de Pais e Mestres, inicialmente, cumpriram o objetivo de ser uma
ponte entre a escola e a comunidade, trazendo benefícios para a escola, como
a maior integração dos pais e docentes, melhoria do programa educacional das
escolas e maior participação dos alunos nas atividades escolares. E os bene-
fícios também se estenderam à comunidade, pois o Clube dos Pais também
desenvolveu cursos de corte e costura e problemas de educação. Os temas e
outras atividades foram definidos a partir de consulta às famílias, através do
inquérito aplicado inicialmente para estabelecer novas relações pais-escolas,
a fim de obter informações sobre a vida familiar e suas possibilidades para
a escola. “Como se pode concluir o Clube dos Pais da Escola de Especiali-
zação Ageu Magalhães já começa a se organizar para lançar na comunidade,
irradiando sua ação no ambiente do bairro” (DUARTE, 1957, p. 69).
Numa avaliação geral, a estagiária considera que, a partir dessa expe-
riência, notou que a comunidade não estava suficientemente trabalhada e
madura, ou seja, sem a orientação suficiente para que sejam desenvolvidos
novos hábitos e seria de grande importância que os problemas familiares
fossem solucionados junto às instituições que atuam no campo da assistência,
coordenadas com o programa da Paróquia do Bom Jesus do Arraial. Mas, no
Setor da Educação, a experiência é relatada de maneira muito positiva. E tanto
esse saldo positivo quanto os benefícios para a comunidade nesse aspecto,
indo de acordo com a metodologia adotada por Tereza Duarte e pela perspec-
tiva educacional de Paulo Freire, estão ilustrados em falas das reuniões dos
Círculos de Pais e Mestres.

O Sr. J tendo feito uma de suas costumeiras visitas à Escola de Especia-


lização Ageu Magalhães, tomou conhecimento de que algumas portas do
edifício se achavam sem nenhuma segurança pois faltava às mesmas ferro-
lhos, apesar de há muito ter sido comunicado esse fato à diretoria da Escola.
Contou-nos maravilhada a professora M. que após o recreio, de volta à
sala de aula, encontrara o Sr. J. trepado num tamborete de martelo, pregos
e ferrolhos em punho, consertando aquilo que, segundo suas próprias
palavras, como escola de seu filho era também sua e como tal lhe cabia
todo interesse e responsabilidade (DUARTE, 1957, p. 68).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 93

Assim, o objetivo educacional da experiência parece ter sido atingido


em parte, ao dar partida no estreitamento dos laços entre a Escola e a família
e promover as ferramentas necessárias – a exemplo dos Círculos de Pais e
Mestres – para a transformação da Escola em um centro comunitário, como
foi idealizada por Paulo Freire.

3.2 O Centro de Cultura Popular e a alfabetização de adultos

A segunda experiência foi desenvolvida no Movimento de Cultura Popu-


lar (MCP), no período subsequente à fundação do primeiro Centro de Cultura
Popular do Recife, entre novembro de 1961 e novembro 1962, com o ideal
de construção de uma sociedade mais democrática e desenvolvida através da
elevação da consciência do povo, por meio da educação.
A experiência foi realizada no primeiro Centro de Cultura, no Projeto
de Educação de Adultos do MCP, localizado no Poço da Panela, com base
no projeto de Centro de Cultura elaborado por Paulo Freire, com a aspiração
de “[...] utilizar os conhecimentos adquiridos na Escola de Serviço Social,
num trabalho essencialmente educativo” (ARY, 1963, p. 53), utilizando como
método de intervenção a Organização Social de Comunidade.
Numa instituição como o Movimento de Cultura Popular (MCP), a atua-
ção do Serviço Social, segundo Ary (1963), é voltada a ser um dos instrumen-
tos para a educação comunitária. O MCP se propunha a oferecer uma educação
de base comunitária, de acordo com os princípios inscritos no seu Estatuto.

1 – Promover e incentivar, com a ajuda de particulares e dos poderes


públicos, a educação de crianças e adultos.
2 – Atender ao objetivo fundamental da educação que é o de desenvolver
plenamente todas as virtualidades do ser humano, através da educação
integral de base comunitária, que assegure, também, de acordo com a
constituição, o ensino religioso e facultativo;
3 – Proporcionar a elevação do nível cultural do povo preparando-o para
a vida e para o trabalho;
4 – Colaborar para melhoria do nível material do povo através da educa-
ção especializada;
5 – Formar quadros destinados a interpretar, sistematizar e transmitir os
múltiplos aspectos da cultura popular (ARY, 1963, p. 4).

Em novembro de 1961, houve a implementação da primeira experiência


do projeto Centro de Cultura, no Centro de Cultura D. Olegarinha. O Poço da
Panela foi considerado como uma área de interesse por precisar de serviços
semelhantes aos que seriam oferecidos; além de não ser muito extensa, o que
poderia facilitar o desenvolvimento da experiência. No ponto central do Poço
94

da Panela, próximo ao Centro de Cultura, encontravam-se muitos mocambos,


casas antigas e a Igreja de N. S. da Saúde.
O Monsenhor Lobo, Vigário da Paróquia de Casa Forte, cedeu para o
Centro a Casa de D. Olegarinha para ser sua sede, o que foi muito significa-
tivo, pois era um local de grande importância histórica, como é destacado:

O Poço da Panela é uma área com características próprias, sendo tradicio-


nalmente “fechada”. Como já fizemos referência, o local é historicamente
importante. Colhemos algumas informações sobre sua história, de um dos
moradores mais antigos do Poço, Sr. J de B. (um preto de aproximada-
mente 90 anos). Ele nos contou que passou a residir no Poço em 1890,
onde, nesse tempo, só havia três casas, numa das quais residia o líder
abolicionista José Mariano. Disse que este que sua esposa, D. Olegari-
nha, protegia os escravos, fugitivos de seus senhores, e que muitas vezes
chegavam ali, quase que as portas da morte. [...]. D. Olegarinha tratava
dos ferimentos dos escravos e os embarcava no Rio Capibaribe, atrás de
sua casa (ARY, 1963, p. 11).

De início, foi realizado um estudo da área através de visitas às famílias


com a aplicação de um pequeno questionário e conversas sobre o que seria
o Centro de Cultura. Assim, a coleta de dados aconteceu por meio de obser-
vações, conversas informais e o resultado do questionário continha dados
relativos à situação social das famílias, vida política e seus interesses.
Em relação ao nível de instrução, havia um maior número de homens
analfabetos e as crianças em idade escolar estavam quase todas matricula-
das. Quanto à profissão, a mais comum é dos “canoeiros”, trabalhadores que
extraiam areia do rio e vendiam para uso nas construções. A situação dos
canoeiros era de total instabilidade e insegurança, pois não apresentavam um
contrato de trabalho regularizado.
O questionário utilizado teve a particularidade de levar em consideração
a vida política dos moradores da área. Havia perguntas sobre a participação
em sindicatos, associações ou clubes. Se os entrevistados votavam e se acre-
ditavam em eleições. Além disso, o elemento mais importante, segundo Ary
(1963), foi o questionamento sobre a crença em um trabalho cooperativo que
pudesse gerar a melhoria da vida local e o incentivo para que fossem dadas
sugestões para o Centro de Cultura, considerando as maiores necessidades
sentidas pelos moradores.
Quando Paulo Freire elabora o projeto do Centro de Cultura, ele destaca
sua perspectiva de que “[...] os meios modernos de difusão, de propaganda, de
comunicação com as massas, vêm pondo o homem desses centros [urbanos]
em atitudes preponderantemente acríticas, ingênuas. [...]. Corre-se o risco da
desumanização do homem, da sua massificação” (ARY, 1963, p. 53). Para
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 95

enfrentar essa realidade, buscava-se uma educação que formasse os sujeitos


criticamente, através de um método coletivo, e o Centro de Cultura é pensado
com o objetivo de ser esse elemento educativo que convoca os grupos em
prol de interesses comuns. “A televisão, a leitura, a costura e o arranjo da
casa, o recreio, a educação dos filhos são motivos geradores de atividades, a
congregar grupos, a se alongarem em clubes, que compõe o centro de cultura”
(ARY, 1963, p. 53).
O objetivo educacional do Centro não estava restrito ao sentido escolar.
Para além disso, ele se propunha auxiliar no desenvolvimento de uma nova
sociedade, mais progressista, organizada, democrática, através da elevação
da consciência do povo.

Se no trânsito que vivemos para uma sociedade “aberta” fatos novos estão
dia a dia pondo o homem brasileiro em atitudes mais democráticas, não
nos esqueçamos de que o nosso passado anti-dialogal, por isso anti-demo-
crático se afirma constantemente em nossas posições. [...]. Somos assim
dos que, participando felizes do trânsito que faz a sociedade brasileira,
vêem criticamente a necessidade que temos de não largar o homem para
que não se perca em posições massificadas. Dos que vêem a necessidade
de desenvolver a capacidade crítica do homem brasileiro, agregando-o
em grupos [...] (ARY, 1963, p. 53).

A Educação Popular era vista como um instrumento de melhoria das


condições de vida material da população em países subdesenvolvidos, justa-
mente para superar esse estágio de “subdesenvolvimento e atraso” econômico
e social, dando ênfase à elevação do nível cultural dos grupos sociais. “Não
há na verdade democracia sem consciência crítica e não há criticidade nas
posições massificadas. Daí a ênfase que teremos de dar à educação para a
criticidade” (FREIRE, 1963, p. 53, apud ARY, 1961, p. 1).
A partir dessa perspectiva, a experiência educativa poderia construir um
caminho de progresso econômico e cultural individual das comunidades e, con-
sequentemente, da nação. O projeto do Centro de Cultura previa que ele seria o
centro da vida comunitária, coordenando os esforços coletivos através das ativi-
dades educacionais desenvolvida sem prol de resolver os problemas identificados
e, a partir disso, elevar a consciência e aguçar o senso crítico dos indivíduos.

Essa educação deve levar os adultos a participarem, conscientemente, do


processo de mudança das estruturas econômicas e sociais, dentro de um
espírito comunitário, que supere os vícios do individualismo, em busca
de formas mais justas e autenticamente humanas de organização social.
O Centro de Cultura é um instrumento válido, em programas de educação
popular – aquelas em moldes democrático e comunitário (ARY, 1963, p. 48).
96

O planejamento das atividades se deu por meio das reuniões, o espaço


coletivo e deliberativo adotado. A primeira reunião foi realizada com o obje-
tivo de apresentar as finalidades do Centro, evidenciar a importância da par-
ticipação coletiva e pensar a inauguração do espaço. O Centro foi inaugurado
no dia 17 de dezembro, com a presença do Prefeito do Recife, o Pároco de
Casa Forte, o Presidente do MCP, Paulo Freire, autor do projeto, além da popu-
lação do Poço da Panela e outros convidados. Houve uma “aula inaugural”,
ministrada pelo professor Paulo Freire “[...] em que ele fez a ligação entre a
história do Poço, na luta pela libertação dos escravos, e a luta que então se
estava iniciando, por uma libertação cultural” (ARY, 1963, p. 18).
As atividades desenvolvidas surgiram tanto dos interesses manifestados
pelos moradores, através do questionário, quanto a partir dos objetivos do
Centro. Foram elas: aulas para adultos, um trabalho coletivo para resolver o
problema de abastecimento d’água, curso de corte e costura, clube de mães,
clube de jovens e um clube infantil, que constam no projeto elaborado.

O clube de leitura, o de corte, o Tele-Clube, etc., o clube de Pais congre-


gando pessoas em torno de seus núcleos motivadores não as desintegrem
do todo, que é o Centro de Cultura. Por isso mesmo é que as atividades
desses clubes são interdependentes e visam um mesmo objetivo – a edu-
cação da pessoa, dos grupos e da comunidade. Os clubes dentro do Centro
são dimensões próprias do Centro. Daí que não possam crescer sozinhos.
Nem distorcer-se. Nem perder o sentido da unidade de visão que carac-
teriza o Centro de Cultura (ARY, 1963, p. 54 apud FREIRE, 1961, p. 2).

A direção do Centro, que ficou com a assistente social do Movimento de


Cultura Popular (MCP), deveria passar a ser colegiada, ou seja, mais democrá-
tica, através de eleições entre os participantes de cada clube. E essa estrutura
administrativa representaria a materialização da educação democrática e da
formação de lideranças naturais e educadores populares, através dos clubes
e da dinâmica de grupos. Segundo Ary (1963), esse processo não aconteceu,
pois a formação dos clubes ocorreu lentamente e houve a criação de uma
diretoria provisória e comissões para realizar atividades internas do Centro e
solucionar as demandas da população do Poço da Panela, priorizando sempre
as deliberações das reuniões gerias e conversas com os grupos de moradores.
As reuniões gerais eram utilizadas como um instrumento para instigar
a participação das pessoas nas atividades. Os assuntos debatidos pela Dire-
toria eram levados também às reuniões gerais para discussão e deliberação
e, dependendo do tema, poderiam contar com convidados especialistas no
assunto: “Vemos, assim, que as reuniões gerais são de grande importância
para a vida do Centro, sobretudo como instrumento de educação democrática
e comunitária” (ARY, 1963, p. 24).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 97

Por exemplo, um problema bastante sinalizado pelos moradores nas visi-


tas, conversas e no questionário era a questão da falta d’água no Poço da Panela.
Os moradores iniciaram a reivindicação pela instalação de um chafariz e foi
formada uma comissão para tratar do assunto e cobrar da Prefeitura. O enge-
nheiro do Serviço Municipal de Instalação de Chafarizes foi convidado para
uma reunião geral do Centro, onde discutiu com a comunidade sobre a solução
do problema de abastecimento. Em reunião, houve a apresentação de argumen-
tos favoráveis à instalação do chafariz, como o número de famílias residentes,
o risco de comprometer a experiência do centro, e o engenheiro começou a
mudar de ideia, sendo também favorável a encaminhar uma solução. Outras
medidas foram tomadas, sempre com o intuito de cobrar do poder público o
andamento da questão e sua resolução. Ao final da mobilização comunitária
em prol da resolução do problema sinalizado, o chafariz foi instalado.

Realizou-se então, uma rápida solenidade de inauguração com discursos do


Mons. Lobo, do professor Paulo Freire e do Secretário D. S. Nessa ocasião,
demos ênfase ao fato de que se conseguira, afinal, a instalação do chafariz,
graças aos esforços dos moradores da área e sua persistência na reivindicação.
A conquista do chafariz obteve favorável repercussão no Poço da Paneja,
resolvendo um sério problema dos moradores dali e contribuindo para uma
maior confiança do povo no trabalho do Centro de Cultura (ARY, 1963, p. 28).

Além disso, uma das atividades mais requisitadas pela comunidade,


através do questionário, foi a “escola para adultos”. A partir disso, Paulo
Freire iniciou, em janeiro de 1962, o primeiro experimento de alfabetização
de adultos, no Centro de Cultura D. Olegarinha, onde aplicou publicamente
o seu método próprio de alfabetização pela primeira vez. A tentativa contou
com a participação de cinco moradores da área do Poço da Panela (quatro
homens e uma mulher) e o auxílio de uma universitária.

Em dois meses, com aproximadamente trinta horas, um dos alunos estava


lendo trechos relativamente difíceis. Isso representa um verdadeiro recorde
de tempo, em experiência de alfabetização. Por várias circunstâncias,
inclusive doença, houve desistência de quatro alunos; desse modo, apenas
um foi alfabetizado. Em março, formou-se uma nova turma, para repetir a
experiência obtendo-se resultados semelhantes (ARY, 1963, p. 25).

Paralelamente à alfabetização, também aconteceu uma turma para os


alfabetizados que passou a funcionar como um clube de leitura. No projeto do
Centro de Cultura, Paulo Freire aborda a leitura como um meio de desenvolver
a consciência crítica do homem e o espírito de comunidade, então o clube
de leitura seria um meio para que os participantes começassem a enxergar
criticamente os problemas da comunidade da qual faziam parte.
98

Ary (1963) considera que houve uma pequena procura pelas atividades
do Centro e que isso fez com que ela pensasse numa possível “inapetência
educativa” dos moradores, mas também reconhece que existiram obstáculos,
pontos positivos e que “[...] a luta pela recuperação ou conquista, através da
educação, das massas de adultos incultos” (ARY, 1963, p. 47) é uma tarefa
que leva tempo, e a experiência com o Centro de Cultura foi curta.
O maior destaque da experiência educacional no Centro de Cultura D.
Olegarinha foi a aplicação do método de Paulo Freire na alfabetização de
adultos em tempo recorde, e levando em consideração o cotidiano dos alu-
nos, para promover a elevação do senso crítico e do nível cultural do povo,
de acordo com o objetivo do Centro e reforçando a sua perspectiva de que:

Os centros urbanos brasileiros vêm apresentando um tipo preponderante


de consciência, que vimos chamando de transitivo-ingênua. [...] O passo
indispensável da transitividade ingênua para a crítica, há de ser, porém, o
resultado da educação fundada em condições culturais propicias. Se não
conseguirmos esse passo, corremos o risco de distorções – não de invo-
luções – que nos levem à ‘consciência fanática’, própria da massificação
(ARY, 1961, p. 55).

A participação de Paulo Freire nessas experiências educacionais eviden-


cia a união entre teoria e prática presente na sua pedagogia. Essa práxis se
destaca, na medida em que, principalmente em Ary (1963), a alfabetização
dos adultos é vista além da simples sistematização de palavras, mas busca
estimular, a partir da vivência, a consciência e a cidadania dos indivíduos de
modo que também compreendam sua própria realidade.

4. A influência da perspectiva pedagógica de Paulo


Freire em outras experiências da ESSPE
A influência, direta ou indireta, de Paulo Freire no Serviço Social em
Pernambuco não se limita às duas experiências exploradas aqui. Outros docu-
mentos também mostram a presença da sua visão pedagógica e ideológica
em trabalhos desenvolvidos por campos de estágio em Serviço Social nas
décadas de 1950 e 1960.
Pinheiro (1961), no TCC intitulado Uma comunidade face ao problema
do analfabetismo, registra uma experiência de Desenvolvimento de Comuni-
dade, aportando-se na perspectiva de despertar a população de Areias, bairro
de Recife, para o problema do analfabetismo. O objetivo foi conseguir a
criação de novas escolas, que também se transformassem em centros comu-
nitários, e que utilizassem os Círculos de Pais e Mestres como um meio de
ligar a família, a escola e a comunidade.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 99

[...] em Areias, pudemos observar o grande número de pessoas analfabetas,


através dos contatos diretos que tivemos com as famílias do bairro. Por
esse motivo, levando ainda em consideração o empenho dos dirigentes do
país, particularmente do Estado de Pernambuco, procurando desenvolver
um intenso programa de extinção do analfabetismo, nos propusemos a
cooperar nesse sentido, realizando um trabalho eminentemente educativo,
dentro do espírito do Serviço Social (PINHEIRO, 1961, p. 1).

No trabalho de Pinheiro (1961), a Fundação da Promoção Social e o


MCP são destacados como agentes de grande importância para elevar o nível
cultural do povo e atingir objetivos democráticos, uma visão bastante presente
no livro de Paulo freire, publicado em 1959, Educação e atualidade brasileira.
O Estado também é citado, junto às Dioceses e outras instituições de educação
de base, como patrocinadores da experiência.

A Fundação da Promoção Social e o Movimento de Cultura Popular,


assumem no Recife um papel de grande importância, procurando elevar
o nível cultural do nosso povo, e tendo nos seus objetivos o conceito
definido de implantação de uma sã democracia (PINHEIRO, 1961, p. 12).

Pinheiro (1961) conclui que a experiência foi exitosa e que o Serviço


Social Escolar possuía grande importância na relação entre a escola, a comu-
nidade e a família, além de potencial para despertar a comunidade para os
seus problemas, a fim de que se organizem para resolvê-los.
Dantas (1963), em Uma experiência de Estudo na Comunidade dos
Coelhos, tinha em vista a realização de um plano de educação popular na
comunidade dos Coelhos, uma ação que representasse um trabalho educativo
baseado na realidade e em contato com a comunidade proletária, através do
Colégio Padre Venâncio, pertencente à Companhia da Caridade e que estava
abandonado, transformando-o em um “[...] ponto de partida para um trabalho
na zona do grande Recife” (DANTAS, 1963, p. 2) e operando a restauração
do ensino profissional.

Via-se a necessidade de buscar permanentes valores da classe operária, da


família operária, da vida operária, para partir para um trabalho educativo
tanto quanto possível baseado numa realidade viva. Daí a importância
fundamental para a experiência que se iniciava, de um trabalho direto
com a comunidade proletária (DANTAS, 1963, p. 4).

O método utilizado também era o de Desenvolvimento de Comunidade,


e os Círculos de Pais e Mestres são considerados como uma estratégia de vin-
culação entre escola, comunidade e família. A experiência foi desenvolvida
100

pelo Serviço Social Escolar e o Movimento de Educação de Base (MEB),


mantido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em parceria
com o governo federal, com o “[...] objetivo principal levar educação de base
ao povo, para que este mesmo povo conscientemente assuma o papel que lhe
cabe no desenvolvimento do País” (DANTAS, 1963, p. 91).

O MEB não se preocupa com escolas radiofônicas, seu principal meio de


ação, mas, e principalmente, com o desenvolvimento de comunidade, com
o incentivo e ajuda técnica ao cooperativismo, sindicalismo rural, grupos
diversos e outras formas de capacitação do povo, procurando também
estimular e utilizar a cultura popular (DANTAS, 1963, p. 92).

A atividade educacional desenvolvida na comunidade dos Coelhos tinha


como objetivos gerais a promoção integral do homem, a formação profissional
de técnicos de nível médio, a formação de militantes para atuação na luta ope-
rária. Dantas (1963) avalia a experiência a partir de destaques sobre o trabalho
com uma comunidade proletária que apresentava características fundamentais a
serem analisadas, como a “[...] falta de condições para fazer projetos de longo
alcance, dentro da luta quotidiana pela subsistência” (DANTAS, 1963, p. 113).
A partir disso, aponta a falta de meios e o baixo nível de organização para
resolver os problemas coletivamente. E conclui: “Uma experiência de estudo,
em Serviço Social no âmbito de comunidade, em que se visa uma ação de
promoção humana, só é válida a medida em que os membros são despertados
para essa necessidade vindo a interferir no processo” (DANTAS, 1963, p. 115).
Nessa experiência, as ideias desenvolvimentistas, a perspectiva pedagó-
gica da promoção humana, da educação popular e da formação de líderes a
partir do trabalho do Serviço Social com os grupos e comunidades, mostram a
ligação com o pensamento de Paulo Freire e com as experiências educacionais
em que ele participou diretamente.
Por sua vez, Campos (1964) desenvolveu um trabalho em Nova Desco-
berta, intitulado Atuação do Serviço Social no trabalho de conscientização
do povo no bairro de Nova Descoberta, em parceria com o Departamento de
Assistência Escolar da Secretaria de Educação e Cultura, através do Serviço
Social de Grupo e comunidade: “O trabalho iria visar à melhoria do nível
cultural, com repercussão, consequentemente, no setor econômico”. (CAM-
POS, 1964, p. 8). A educação era colocada de maneira que deveria se estender
para além da sala de aula, integrando-se a vida da comunidade a qual as esco-
las pertencem, uma vez que deveriam ser um centro comunitário. Também
é bastante presente a metodologia dos Círculos de Pais e Mestres e reuniões
em grupo com a comunidade. A perspectiva adotada é de uma educação como
meio de desenvolvimento da consciência do povo.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 101

Na época em que nós vivemos caracterizada pela instabilidade de lutas


políticas, econômicas e sociais, só através de uma educação democrática,
como mudança consciente, se poderá promover a única base duradoura para
um progresso político e para evolução de um povo (CAMPOS, 1964, p. 12).

O combate ao analfabetismo, a alfabetização de adultos, era visto como


um elemento necessário para a educação popular: “[...] educado, convenien-
temente, o adulto, o Brasil crescerá em progresso e civilização, deixando de
somar entre os países subdesenvolvidos” (CAMPOS, 1964, p. 76).
O trabalho educacional, nesse sentido, foi realizado em escolas muni-
cipais – com participação do Movimento de Cultura Popular – e nas escolas
estaduais. Além disso, havia convênios com organizações internacionais,
principalmente norte-americanas, como o Programa Aliança para o Progresso.
Nesse momento, o método de alfabetização de adultos de Paulo Freire,
aplicado no Centro de Cultura Popular D. Olegarinha, sede do Movimento
de Cultura Popular (MCP), já era conhecido. O Governador, em palestra,
mencionou a aplicação do sistema Paulo Freire no MCP e a estagiária cita o
interesse de aplicação na experiência de Nova Descoberta.

[...] tomamos conhecimento, através de uma palestra do Sr. Governador,


sôbre a erradicação do analfabetismo, que o sistema Paulo Freire iria ser
aplicado pelo Movimento de Cultura Popular. Buscamos o MCP, que nos
pediu plano de trabalho e considerou a possibilidade de se fazer do Grupo
Escolar Clotilde de Oliveira um dos centros dos Círculos de Cultura.
Deveríamos esperar que fôssem inaugurados todos os Círculos de Cultura
da Capital (CAMPOS, 1964, p. 49).

O curso de alfabetização com o método de Paulo Freire não aconteceu


porque todas as monitoras do MCP estavam em treinamento do sistema e ape-
nas no ano seguinte uma delas poderia compor o Grupo Escolar. Mas Campos
(1964) insiste na aplicação de um método educacional que não só eduque,
mas conscientize os indivíduos e a comunidade oferecendo-lhes os meios
para intervir na realidade, de acordo com a visão pedagógica desenvolvida
na época e no pensamento e atividades de Paulo Freire também.
Campos (1964) conclui afirmando a necessidade de serem desenvolvidos
Cursos de Educação de Adultos que sejam orientados por métodos modernos
que vão além da alfabetização, que deem aos indivíduos recursos para que
ocupem seus lugares na comunidade com autonomia, consciência e promovam
mudança de mentalidade.
Em 1967, Almeida et al. (1967) desenvolveram o TCC intitulado A expe-
riência de um trabalho comunitário em Ponte dos Carvalhos, com o objetivo
102

de, através do Desenvolvimento de Comunidade, realizar uma atuação edu-


cacional no sentido de conscientizar a população sobre os problemas da sua
realidade, de forma crítica, para superar o subdesenvolvimento.

Numa outra etapa, dada a localização da área, num parque industrial em


expansão e da marginalização de sua população nesse processo, o trabalho
teve como objetivo precípuo, preparar a comunidade para compreender
e aproveitar do desenvolvimento industrial e assumir atitude crítica, face
ao mesmo. Tendo em vista esse objetivo, foram criados os subprojetos de
Alfabetização, de Mão-de-obra semi-especializada e de Saneamento do
meio (ALMEIDA et al., 1967, p. 8).

Na abordagem sobre o programa de alfabetização de adultos, há uma


menção ao método de alfabetização utilizado, que é o sistema Paulo Freire,
que poucos anos atrás havia mostrado êxito em outras experiências – com
destaque para a primeira, no MCP em 1962 e em Angicos em 1963.

Instaladas as classes, nossa atuação junto ao grupo de professoras tinha


em vista capacitá-las para os debates com os alunos, sobre situação da
vida cotidiana. Isso faz parte do método adotado que exige uma comple-
mentação de base sociológica, em função de palavras chaves, extraídas do
vocabulário usual da população. Foram utilizadas as seguintes palavras:
povo, tijolo, família, bodega, casa, farinha, máquina, chuva, trabalho,
almôço, enxada, terra sêca, escola, arte e classe (ALMEIDA; OLIVEIRA;
LIRA, 1967, p. 56).

E o subprojeto, na avaliação feita, possibilitou aos professores e alunos um


despertar crítico para a realidade e para a responsabilidade de cada um de parti-
cipar dos processos sociais e políticos vigentes, que pôde ser observado através
da evolução dos grupos, da organização e da participação nas atividades do
subprojeto e do trabalho comunitário (ALMEIDA; OLIVEIRA; LIRA, 1967).

Diante do exposto, consideramos válida nossa experiência uma vez que a


área por sua localização num parque industrial em expansão, exige uma
adaptação do Homem para se integrar no processo de industrialização.
Isso requer uma atuação no sentido de orientação quanto a substituição
de valores, adaptação ao novo sistema de vida, elevação do nível de aspi-
rações (ALMEIDA; OLIVEIRA; LIRA, 1967, p. 56).

A partir da remissão a essas outras experiências oportunizadas pela


ESSPE, pode-se perceber que a influência das ideias educacionais de Paulo
Freire esteve presente em muitas intervenções registradas nos TCC’s da época.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 103

Esse fato reafirma a importância dessas experiências educacionais na ESSPE


para a redefinição das dimensões e tendências do Serviço Social pernambu-
cano, no sentido de sua abertura para as perspectivas nacional-reformistas que
polarizavam as disputas políticas entre as décadas de 1950-1960.

5. Considerações finais

Os anos 1950-1960 correspondem a um período histórico de intensas


transformações societárias e acirramento das lutas de classes no Brasil e no
Nordeste, com direta repercussão na projeção de vertentes nacional-desen-
volvimentistas no Serviço Social, em particular na intervenção profissional
realizada em Pernambuco. A partir dessas transformações societárias, o Ser-
viço Social mobilizou rearranjos teórico-metodológicos e técnico-operativos;
novas tendências foram materializadas sob a égide do Desenvolvimento e
Organiza Social de Comunidade.
O nacional-desenvolvimentismo, presente nas ideias educacionais de
Paulo Freire, ainda em germinação, anunciava a necessidade de uma prá-
tica educativa voltada a superar o subdesenvolvimento para estabelecer uma
sociedade democrática de capitalismo desenvolvido. A partir da experiência
de Paulo Freire na ESSPE, através das práticas nascentes de educação popu-
lar, se notam reconduções na perspectiva pedagógica de atuação do Serviço
Social junto à classe trabalhadora. Os novos processos são caracterizados
pela concepção da “pedagogia da participação”; orientação que reorganiza
a prática do assistente social em termos da sua função educativa (ABREU.
2018). Desse modo, o Serviço Social é demandado a desempenhar funções
pedagógicas para estimular a participação popular como meio de promoção
do bem-estar social, seguindo as premissas das organizações internacionais
enquadradas no pan-americanismo “monroísta”.
Com efeito, há uma redefinição profissional, impelida através dos semi-
nários promovidos pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pela
Organização das Nações Unidas (ONU), impulsionando o reordenamento na
direção do Desenvolvimento de Comunidade. Esse movimento, sem horizonte
de rompimento com a perspectiva conservadora de enfrentamento da questão
social, reflete a tendência de aperfeiçoamento do tecnicismo na intervenção
profissional, de psicologização das relações sociais e de reorganização política
e cultural em sintonia com as transformações econômicas (ABREU, 2018).
A prática profissional começa a ser direcionada para a integração do
indivíduo na ordem social, de modo que caberia aos assistentes sociais a
colaboração para a promoção do bem-estar social; estes são assumidos como
agentes catalisadores para florescimento das capacidades, intrínsecas aos
104

grupos e comunidades, de solucionarem seus próprios problemas. Se antes


as expressões da questão social eram vistas como um problema moral-dou-
trinário; nesse momento, passam a ser consideradas como uma variedade de
vicissitudes culturais de grupos ou comunidades, passíveis de serem equali-
zadas por uma intervenção técnica voltada para o desenvolvimento. A parti-
cipação popular não é mobilizada com a intenção de fortalecer a organização
e a tomada de consciência do proletariado como classe independente, mas é
voltada à despolitização da questão social, responsabilização dos sujeitos pela
efetivação do “bem-estar” oferecido, e para dar respostas, através da interven-
ção profissional, que acelerem o projeto desenvolvimentista (ABREU, 2018).
Nesse quadro, a influência pedagogia freiriana representa o estágio de
transição entre o tradicionalismo e o movimento em direção à reconceituação
da profissão e suas dimensões. Ao estar inserida na lógica desenvolvimen-
tista reformadora, promove questionamentos sobre a condição do capitalismo
dependente brasileiro, opera uma aproximação com os anseios das lutas popu-
lares e os movimentos sociais, que estavam se fortalecendo em um momento
de efervescência democrática regional e nacionalmente – como as Ligas
camponesas, a UNE e o MCP. O trabalho educacional começava a se propor
a elevação da consciência, organização e autonomia dos dominados, impul-
sionando a formação de uma consciência nacional-popular (ABREU, 2018).
Com o golpe militar em 1964, essa tendência foi duramente perseguida
e abafada. A ruptura com os ideais desenvolvimentistas, a caracterização da
questão social na sua dimensão histórica, política e econômica e a busca de
construção de um projeto profissional com aspiração emancipatória se esbo-
çam no seio no movimento de reconceituação do Serviço Social na América
Latina e culminam na vertente de intenção de ruptura no Brasil, que reconhece,
nas experiências pedagógicas influenciadas por Paulo Freire, um legado.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 105

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nambuco: primeiras décadas da formação e atuação profissional. Curitiba:
CRV, 2020.
CAPÍTULO 5
ORGANIZAÇÃO PROFISSIONAL DO
SERVIÇO SOCIAL EM PERNAMBUCO
ENTRE OS ANOS 1950-1990
Adilson Aquino Silveira Júnior

1. Determinações e tendências da organização


profissional em Pernambuco

A organização política do Serviço Social envolve as dimensões do exer-


cício profissional, da formação profissional e da mobilização e luta estudantil,
no bojo das quais se expressam as diferentes forças que o compõe, com suas
particulares determinações, reivindicações, programáticas e projeções polí-
ticas, aparelhagens organizativas, trajetórias históricas e composição social.
Aqui, nos interessa as tendências de desenvolvimento das organizações afetas
ao universo do exercício profissional do Serviço Social em Pernambuco, objeto
que identificamos na ampla esfera da organização profissional. Propomos
uma reconstrução histórica da gestação e desenvolvimento desse objeto na
segunda metade do século XX, capturando variáveis que informam suas tra-
jetórias institucionais, tendências políticas e ideológicas.73 Tomamos como
suposto as determinações e condicionamentos econômicos, sociais e políticos
do capitalismo no Brasil que constituem o terreno da evolução da organização
profissional – cuja síntese, em parte, se encontra sistematizada em Silveira Jr.
(2020); sobre as tendências estruturais, ideológicas e político-institucionais
mais abrangentes, próprias do ciclo da autocracia burguesa, tomamos como
suposto, especialmente, as análises fornecidas por Netto (2004, 2005, 2014)
e Fernandes (1976), além das reflexões apresentadas por Oliveira (1981)
sobre a particularidade do Nordeste. O estudo se sustenta, especialmente, em
fontes documentais encontradas no acervo do Conselho Regional de Serviço
Social de Pernambuco – 4ª Região (boletins, relatórios, atas, ofícios, corres-
pondências, recortes de jornais, planilhas, fotografias etc.), além de matérias

73 Parece-nos que esse objeto tem comparecido escassamente na agenda de pesquisas do Serviço Social no Brasil,
especialmente quando se tratam de estudos históricos de fases mais remotas dessa organização profissional. Salvo
engano, os empreendimentos mais destacados, nesse campo, foram oferecidos por Abramides (1995, 2009, 2016)
e Ramos (1996, 2005), além da compilação de artigos sobre o tema, publicada em ABEPSS (2004).
108

coletadas do jornal Diário de Pernambuco, publicadas no intervalo histórico


a que se dedica o estudo.74
Sabemos que o despertar da organização profissional do Serviço Social
no Brasil ocorre como desdobramento do processo de institucionalização e
profissionalização, no curso da luta pelo reconhecimento da cidadania pro-
fissional e pela conquista de padrões dignos de carreiras e salários. A partir
do ponto em que a legislação opera o reconhecimento profissional do Ser-
viço Social, entre finais de 1950 e início de 196075, se impõe a necessidade
de entidades organizativas, orientadoras e fiscalizadoras-disciplinadoras,
para que a categoria concretize sua institucionalização e acesse as políticas
de proteção do trabalho no marco categorial dado pelo que Santos (1979)
identificou como “cidadania regulada” – cujos requisitos envolviam, por
exemplo, o registro profissional nos conselhos e a atuação reivindicativa e
sindical atreladas à burocracia estatal. Nesse processo, a institucionalização
profissional corresponde a uma mediação jurídico-política que coopera para
sancionar o assistente social como trabalhador assalariado; e a aparelhagem
corporativa e sindical a mediação organizativa que, de uma parte, constitui
variável dessa profissionalização – posto a “cidadania regulada” e as formas
setoriais e categoriais de acesso à política social no Brasil – e, de outra parte,
se impõem como instrumento incontornável da luta econômico-corporativa e
como canal para a vinculação de assistentes sociais com movimentos e formas
organizativas mais universais dos explorados.
Nessa contradição estão implicados os dilemas que envolviam a cons-
trução da organização profissional na particularidade do país: a aparelhagem
corporativa e sindical que devia ser erigida oficialmente instituía a subor-
dinação dos movimentos de assistentes sociais aos limites e controles da
burocracia estatal, tanto no plano sindical quanto no dos conselhos profissio-
nais; mas era essa mesma aparelhagem uma das vias, quase incontornáveis,
para aglutinar reivindicações e lutas corporativas e políticas dessa fração da
força de trabalho representada pelo corpo profissional do Serviço Social,
então praticamente em gestação. As capacidades, mais ou menos eversivas
e críticas, que essa aparelhagem passava a comportar em cada conjuntura
estavam hipotecadas às flutuações e tendências dos movimentos das forças
mais amplas do proletariado e demais explorados no país. Não é casual que

74 Trata-se de mais de duas centenas de recortes de matérias noticiando, entre as décadas de 1940-1990, a
atuação das organizações profissionais em Pernambuco, coletadas através da Hemeroteca Digital Brasileira da
Biblioteca Nacional. Já o acervo documental do CRESS, foi acessado através de visitas de campo realizadas
na entidade para a catalogação e organização do acervo através do projeto de extensão Memória e História
do Serviço Social em Pernambuco (MEHSSPE), desenvolvido na Universidade Federal de Pernambuco.
75 Referimo-nos à Lei n. 3.252, de 27 ago. 1957, que confere monopólio do exercício aos portadores do diploma,
e ao Decreto-Lei n. 994, de 15 maio 1962, que regulamenta a referida Lei.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 109

se deflagrem (ou esbocem) iniciativas de construção de organizações mais


consistentes para o Serviço Social em Pernambuco no início dos anos 1960,
no marco de um quadro geral de acirramento das lutas de classes no Brasil,
expresso na agitação do operariado urbano e na radicalização e fortalecimento
do movimento camponês. Também não é aleatório o fato de que, dado o
cerceamento e repressão política do golpe de 1964, algumas dessas organi-
zações, ou pereçam ou passem a subsistir de modo frágil e marcado por uma
condução político-corporativa complacente, quando não colaboracionista em
face da modernização engendrada pelo regime ditatorial. Por último, tam-
bém não é coincidência que um impulso renovador e crítico, de maior vulto,
das organizações sindicais (ou pré-sindicais) e corporativas se verifique no
desdobramento do afluxo do movimento operário e popular na crise do ciclo
autocrático-burguês.
Além das formas diretas de tutela e controle estatal sob a aparelhagem
corporativa e sindical (ou dos mecanismos abertos de repressão e censura
policial-militar), condicionam o ritmo moroso de gestação, as dificuldades de
galvanização política e os estágios iniciais de enquadramento das organizações
do Serviço Social, algumas determinações que particularizam a instituição
profissional: a base de classe e a inserção ocupacional a partir das quais se
estabeleceu o recrutamento e a atuação de assistentes sociais – de uma parte,
constituída predominantemente por mulheres da pequena-burguesia, de outra
parte, ocupando espaços ocupacionais subalternos nas entidades do Estado,
paraestatais ou da Igreja; a extração político-ideológica que majoritariamente
soldava os quadros vindos dessa base de classe, caracterizada pelo doutrina-
rismo católico, os laços com a aparelhagem dirigente da Igreja e a direção
vocacional e apostolar que impregnavam o engajamento com o Serviço Social
em gestação; e, ressalte-se, a condição tipicamente feminina que forjou deci-
sivamente a profissão, corroborando, sob as inserções e formas de desenvol-
vimento do Serviço Social, os papeis reiterativos, estritamente executores e
subalternos próprios da opressão da mulher sob a realidade burguesa.
A síntese dessas determinações implicou, para os esforços político-orga-
nizativos (sindicais ou corporativos), um acúmulo de restrições importantes:
a carência de tradições de lutas em que pudesse se apoiar para germinação,
um reiterado ausentismo das bases nas instâncias das organizações, a condi-
ção de cativa (ou a direção de seguidismo) em face da condução dada pelas
classes dominantes, através do Estado, para as modalidades de intervenção
que atravessavam as políticas sociais. Essas tendências passam a ser contrar-
restadas apenas quando o aprofundamento das relações capitalistas no país
passou a erodir a base das aludidas determinações, desdobrando mesmo um
acirramento das lutas de classes e a imantação de segmentos dirigentes da
profissão em face do movimento operário e popular – donde o deslocamento
110

das bases de recrutamento para estratos mais baixos das camadas urbanas,
os progressivos assalariamento, laicização e profissionalização do Serviço
Social e a redefinição do papel das mulheres no âmbito extradoméstico. As
mudanças mais sensíveis, nesse sentido, são observadas apenas na passagem
dos anos 1970 para a década seguinte, evidenciando que as organizações do
Serviço Social passavam a ultrapassar o estágio embrionário, para alcançarem,
tanto uma existência administrativo-financeira mais sólida e robusta, quanto
um metabolismo político que tendia a desgarrar da tradicional equalização
com as forças dominantes.76
Numa mirada panorâmica da trajetória da organização profissional em
Pernambuco, os anos 1950-1960 englobam um estágio larvar e embrionário,
marcado pelo surgimento, institucionalização e implementação das primeiras
entidades dedicadas às lutas econômico-corporativas e de fiscalização-discipli-
namento do exercício da profissão: desde as longínquas ações da Associação
Brasileira de Assistentes Sociais (ABAS), registradas, aproximadamente, a
partir do início da década de 1950, através da existência de um de seus centros
regionais no estado77 – o Centro Regional de Pernambuco da ABAS desta-
cou-se, sobretudo nos anos 1950, pelos esforços dedicados à promoção da
profissão e à luta pela sua regulamentação, com importância nas articulações
para a posterior sindicalização e instituição do conselho corporativo; até a fase
inicial de implantação e implementação do Conselho Regional de Assistentes
Sociais 4ª Região e a primeira tentativa (malograda) de formação de uma
Associação Profissional de Assistentes Sociais de Pernambuco (APASPE),
localizadas na década de 1960.78Como decorrência da institucionalização
profissional, a emergência dessas duas instâncias de caráter orientador, disci-
plinador, fiscalizador e de defesa de interesses econômico-corporativos nesse
decênio, quando não refluiu, como no caso da APASPE, foi caracterizada por
um estágio bastante primitivo de aparelhamento e organização, como demons-
tra a trajetória do CRAS 4ª Região. Por sua vez, os anos 1970-1980 encerram o
momento de depuração dessas instâncias, com o CRAS 4ª Região moldando-se
como órgão fiscalizador e a APASPE, agora recriada, envolvida na empreitada
da construção da vida sindical das assistentes sociais. Nessas décadas, há um

76 Advirta-se que, nas décadas de 1970-1980, os contingentes profissionais se multiplicavam rapidamente


em Pernambuco: se, na época do reconhecimento legal do exercício profissional, em finais dos anos 1950,
o número de assistentes socais habilitadas em todo o estado não ultrapassava três dezenas e meia; em
meados dos anos 1970 esse número era de três centenas e meia; e, quando encerrada a década de 1980,
por sua vez, o número de registros profissionais no CRESS 4ª Região já acumulava mais de três mil.
77 No Brasil, o surgimento da ABAS, assim como da Associação Brasileira de Escolas de Serviço Social
(ABESS), data da segunda metade dos anos 1940, como decorrência dos encaminhamentos do 1º Congresso
Pan-americano de Serviço Social, ocorrido em Santiago no Chile, em 1945.
78 Na primeira metade nos anos 1960, também aglutinou elementos da categoria profissional a representação
estadual no Comitê Brasileiro da Conferência internacional do Serviço Social (CBCISS).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 111

esforço de racionalização técnico-administrativa da atuação do Conselho,


associado ao sopro de ânimo de articulação político-profissional sob a base
das lutas do movimento operário e popular na crise da ditadura, projetando
a organização profissional para além do espectro econômico-corporativo.
Assim, no curso da segunda metade do século XX, a organização profis-
sional do Serviço Social em Pernambuco – como expressão particular do que
ocorria na profissão em pontos importantes do país – desdobra-se em duas
frentes diversas, mas intimamente vinculadas, tanto em termos da atuação
quanto da existência organizacional: 1º) aquela dedicada ao reconhecimento
legal, orientação, fiscalização e disciplinamento da atuação profissional,
dos quais são representativos os trabalhos do Centro Regional da ABAS em
Pernambuco e, depois, do CRAS 4ª Região; e 2º) aquela voltada para a mobi-
lização e direção de assistentes sociais na defesa de suas reivindicações
econômicas, representação e legitimação nos conflitos em torno da venda da
força de trabalho e constituição de sua ligação com as lutas coletivas dos
trabalhadores, representada, especialmente, pela atuação da APASPE e, pos-
teriormente, do Sindicato dos Assistentes Sociais do Estado de Pernambuco
(SINDASPE). Ressalte-se que as fronteiras em torno dos campos de atuação
dessas entidades – destacadamente o CRAS 4ª Região e a APASPE (depois
SINDASPE) – nunca foram rigidamente demarcadas, observando-se, ao longo
da sua existência, interseções e articulações, esforços comuns e mesmo o
compartilhamento de estruturas físicas.

2. Emergência e desenvolvimento da
organização corporativa e sindical

2.1 As protoformas da organização corporativa

A gestação e o evolver da organização corporativa do Serviço Social em


Pernambuco se objetivam no percurso e atuação de duas entidades em particu-
lar: o Centro Regional de Pernambuco da ABAS, num primeiro momento; e,
na sequência, progressivamente concentrando-se na ação do CRAS 4ª Região.
Os primeiros registros de atividades ligadas ao Centro Regional de Pernam-
buco da ABAS remetem ao início dos anos 195079; matérias do Diário de Per-
nambuco (13, 15 e 26 de abril de 1951) informam a mobilização realizada pelo
Centro com vistas à articulação de delegados para o 3º Seminário Regional
de Organizações de Comunidades, da Divisão de Assuntos Sociais da União

79 É bastante provável, no entanto, que esse Centro estivesse funcionando antes, posto que já em abril de 1951
estava procedendo a eleição para renovação de diretoria, como testemunha a nota do Diário de Pernambuco
de 13 de abril de 1951.
112

Pan-americana, a ser realizado em Porto Alegre, em maio daquele ano. Os


últimos registros de funcionamento da entidade, até agora identificados, datam
do início dos anos 1970, embora sua atuação tivesse começado a refluir em
fins dos anos 1960, após alcançado o objetivo principal da regulamentação
da profissão, e se desdobrado a criação dos órgãos próprios, previstos na lei,
para a orientação, disciplinamento e fiscalização do exercício: o conselho
federal e os conselhos regionais de Serviço Social. A seção regional da ABAS
tinha sua sede no próprio prédio da Escola de Serviço Social de Pernambuco
(ESSPE) e sua direção era ocupada por docentes da instituição ou assistentes
sociais recentemente formadas pela mesma.
Ademais do empenho da entidade em promover a profissão, em ampliar
o espaço profissional e lutar pela sua regulamentação, posteriormente também
buscando fazer respeitar o reconhecimento legal do Serviço Social, ela visava
o aperfeiçoamento cultural, técnico e social de assistentes sociais, promovendo
cursos, seminários, simpósios, publicações de livretos e palestras, almejando
impulsionar a profissão, impactando no intercâmbio de informações e expe-
riências. Contava com subsídio da Embaixada Americana, mas se sustentava
basicamente pela contribuição dos associados, convivendo sempre com dificul-
dades materiais e financeiras. Criada no mesmo ano de fundação Associação
Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS) no Brasil, em 1946, a ABAS
enquadra-se no estágio em que a influência norte-americana se robustece no
meio profissional, refletindo nos processos de racionalização, padronização
e tecnificação do ensino e da atuação, com repercussões importantes para o
adensamento da “abordagem comunitária” na intervenção profissional – a cria-
ção das duas associações no Brasil (ABESS e ABAS), inclusive, acompanha
as deliberações do 1º Congresso Pan-americano de Serviço Social, ocorrido
em Santiago no Chile, em 1945.
Nos anos 1950, e parte da década de 1960, o Centro Regional de Pernam-
buco da ABAS absorveu as funções de entidade de classe em âmbito estadual,
encampando as tarefas de aglutinação e defesa de interesses corporativos de
assistentes sociais, registro e representação desses quadros, porta-voz de rei-
vindicações e demandas da categoria, canal de articulação com as instâncias
da organização nacional do Serviço Social.80 Concretamente, operou como
uma das correias de transmissão do adensamento da influência norte-ameri-
cana, buscando garantir a participação local nos congressos pan-americanos
e a ligação com as organizações internacionais, colaborando no intercâmbio
com assistentes sociais estadunidenses, corroborando a perspectiva do desen-
volvimento e o viés promocionalista da “abordagem comunitária”, além de
80 É sintomático, nesse sentido, os trabalhos do Centro Regional na organização da 3ª Convenção Anual da
ABAS e da ABESS em Recife, em abril de 1952 (Diário de Pernambuco, 05 e 13 de abril de 1952), ocasião
em que, pela primeira vez, o encontro ocorre no Nordeste.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 113

representar um elo de ativação da interlocução de assistentes sociais com as


ciências sociais.81 Ao mesmo tempo, representou um canal para expressar a
colaboração de Pernambuco nos esforços para a regulamentação da profissão
e, depois, nos movimentos para fazer zelar esse reconhecimento legal, arti-
culando, na esfera estadual, a estrutura organizacional que ele demandava.82
Algumas de suas iniciativas se dirigiam mesmo para o fortalecimento de um
espírito de corpo do Serviço Social em Pernambuco, oportunizando espaços
de congregação e confraternização, comumente também aproveitados para as
necessidades de mobilização e direção teórico-política das assistentes sociais.83
Na primeira metade nos anos 1960, também aglutinou elementos da cate-
goria profissional, principalmente no âmbito da articulação nacional e inter-
nacional, e no aprimoramento técnico-científico, a representação estadual do
Comitê Brasileiro da Conferência Internacional do Serviço Social (CBCISS,
depois Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais).
Trata-se de um intervalo histórico em que as energias da própria ABAS pare-
cem ter sido canalizadas para as atividades da representação regional do
CBCISS – após esses anos, tanto vão se diluindo o próprio Centro Regional
da ABAS quando o então Comitê Regional do CBCISS. O impulso para a
consolidação do CBCISS é dado em 1958, quando ocorre a IX Conferência
Internacional de Serviço Social, em Tóquio. Naquele momento, encaminha-se
81 Sobre essas linhas de atuação, dão prova as matérias de jornal em que o Centro Regional divulga e mobi-
liza para a participação no 3º Congresso Pan-americano de Serviço Social (Diário de Pernambuco, 08 de
setembro de 1957). Além disso, o Centro Regional desenvolveu atividades de formação, como o Curso sobre
Assuntos Sociais Brasileiros, com uma série de palestras sobre o tema, em finais de 1955. Dentre as ativida-
des, destaca-se a palestra com o engenheiro Antônio Baltar sobre Habitação como problema de sociologia
urbana; e a aula com José Irineu Cabral, diretor executivo da ANCAR, sobre Problemas rurais brasileiros e
o Serviço Social (Diário de Pernambuco, 09 e 20 de outubro de 1955). Também é exemplo a promoção, em
finais de 1957, de um Curso de Psicologia Aplicada (Diário de Pernambuco, 05 de dezembro de 1957).
82 Em julho de 1956, por exemplo, o Centro Regional da ABAS em Pernambuco organiza debates com juristas e
deputados para construção de uma lei que regulamentaria a profissão de Assistente Social no estado (Diário
de Pernambuco, 21 de julho e 11 de agosto de 1956). Já em fevereiro e março de 1958, promove discussão
sobre o projeto de lei que iria regulamentar a legislação que dispunha sobre o exercício da profissão de
assistente social, aprovada em 1957. (Diário de Pernambuco, 15 de fevereiro e 04 de março de 1958). Em
junho de 1958, encabeça um movimento contra nomeações indevidas para o cargo de assistente social
ocorridas no governo do estado, quando foram nomeados para o cargo pessoas sem habilitação profissional
(Diário de Pernambuco, 14,17, 18, 21, 22 e 28 de junho de 1958). Além de colaborar em movimentos por
melhores posições do Serviço Social nos projetos de cargos e carreiras do funcionalismo público (Diário de
Pernambuco, 21 de agosto de 1960) e organizar o edital para as eleições da primeira diretoria do CRAS 4ª
Região, no início de 1963 (Diário de Pernambuco, 03 de fevereiro de 1963). Depois, inclusive, ajudando
a representar os interesses da categoria na negociação para a redução de taxas de anuidade do próprio
CRAS (Diário de Pernambuco, 04 de julho de 1964).
83 Além de promover (algumas vezes em parceria com outras instituições) as celebrações anuais do Dia do
Assistente Social (Diário de Pernambuco, 09 de maio de 1953, 09 de maio de 1957, 15 de maio de 1965),
o Centro Regional da ABAS em Pernambuco também organizava jantares e excursões para congregar e
confraternizar com a categoria (Diário de Pernambuco, 02 de agosto e 01 e 02 de setembro de 1956, 06
de junho, 20 de julho, 05 de setembro, 04 de outubro, 07 de novembro, 05 e 07 de dezembro de 1957).
114

a realização da XI Conferência Internacional, programada para 1962, no Bra-


sil. Esta decisão foi homologada na X Conferência Internacional, que teve
lugar em Roma, em janeiro de 1961. O temário para o conclave no Brasil
ficou definido para tratar do Desenvolvimento de Comunidade Urbana e Rural
(Diário de Pernambuco, 08 de agosto de 1958, 08 de fevereiro de 1959). A
partir desse momento, ganha densidade a atuação do CBCISS, que passou a
difundir a construção de representações em quase todos os estados do país.
O CBCISS representava a International Conference of Social Work
(ICSW), tornada órgão consultivo do Conselho Econômico e Social da Orga-
nização das Nações Unidas (ONU), e possuindo, ainda, ligações com a Organi-
zação dos Estados Americanos (União Pan-americana). Destinava-se, entre suas
atribuições estatutárias, a promover, coordenar e supervisionar a representação
brasileira nos congressos, seminários ou reuniões nacionais e internacionais
sobre assuntos relacionados ao Serviço Social e aos demais campos do chamado
“Bem-Estar Social”, além de cuidar dos Congressos Internacionais de Serviço
Social no Brasil. Também criado nos marcos do pan-americanismo, como
decorrência do I Congresso Pan-Americano de Serviço Social (Chile, 1945),
alcançando formalização institucional em 1957, o CBCISS viabilizava o inter-
câmbio internacional, sobretudo, para a difusão da influência norte-americana,
a ligação com os organismos multilaterais sob a hegemonia estadunidense, a
disseminação do pensamento desenvolvimentista e seus desdobramentos para
o Serviço Social em termos da “abordagem comunitária”. O significado e as
resultantes de suas atividades intelectuais para o processo de renovação do
Serviço Social no Brasil durante o ciclo autocrático-burguês foram sintetizados
em Netto (2005), na análise da “perspectiva modernizadora”.
Através da ação articuladora de um Comitê Regional do CBCISS em Per-
nambuco, docentes, profissionais e mesmo estudantes do estado, além de diri-
gentes de entidades da política social, passam a organizar-se sistematicamente
para tomar parte nos eventos do CBCISS e da ICSW. Ressalte-se, por exemplo,
a participação de representantes do estado na X Conferência Internacional de
Serviço Social, ocorrida em Roma, em 1961.84 Igualmente, é significativa a
participação de uma delegação de Pernambuco no II Congresso Brasileiro de
Serviço Social, realizado pelo CBCISS no Rio de Janeiro em 1961, inclusive
apresentando estudos e intervenções, contemplando, ainda, uma delegação estu-
dantil (Diário de Pernambuco, 24 e 28 de março e 11 de maio de 1961). Nesse
conclave, encaminha-se a construção de um encontro prévio (pré-conferência)

84 Segundo matéria do Diário de Pernambuco, de 06 de janeiro de 1961, foram enviadas para esse evento Hebe
Gonçalves e Jônia Lemos Sales de Melo, representando tanto o Centro Regional da ABAS, a ESSPE, o SESC
e a Secretaria de Ação e Cultura, nos quais atuavam. Adicionalmente, Hebe Gonçalves afirma, na matéria, que
aproveitaria para visitar outros países, como Israel, a fim de observar programas de desenvolvimento e organização
de comunidade, a partir do interesse da administração do SESC para aperfeiçoamento técnico de seu pessoal.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 115

da XI Conferência Internacional para ocorrer em Recife no ano de 1962, além


de um curso sobre desenvolvimento de comunidade, também organizado pelo
Comitê Regional do CBISSS, na mesma ocasião (Diário de Pernambuco, 26 de
agosto de 1960; 24 de maio de 1961; 24, 27 e 28 de fevereiro, 15 de junho, 20
de julho, 05, 07, 08, 09, 12 e 14de agosto de 1962).85 Esse adensamento da
influência norte-americana encontra-se sintonizado com o crescimento das
necessidades de controle no continente latino-americano na sequência da Revo-
lução Cubana e do acirramento das lutas de classes no Brasil, com destaque para
a expressividade que passaram a assumir as Ligas Camponesas no Nordeste.
É, ainda, na primeira metade dos anos 1960 que o Serviço Social no Brasil
vai constituir a principal estrutura dedicada a orientação, disciplinamento e
fiscalização corporativos, na forma do Conselho Federal e dos Conselhos
Regionais, como desdobramento e exigência da própria regulamentação
profissional. Essas entidades, para além das suas funções precípuas, alcan-
çaram, ao longo do tempo, um impacto também pedagógico e político sobre
a vida profissional – cujo efeito inicial foi o de assimilar as tarefas então
assumidas por organismos como a ABAS e, em parte, o próprio CBCISS. Em
Pernambuco, isso se expressou com a criação do Conselho Regional de Assis-
tentes Sociais da 4ª Região, abrangendo os estados de Pernambuco, Paraíba,
Alagoas, além do território de Fernando de Noronha.86 Como sinalizamos,
a coordenação das eleições para a constituição da primeira diretoria desse
órgão, ocorrida entre fevereiro e março de 1963, foi realizada pelo próprio
Centro Regional de Pernambuco da ABAS, autorizado pelo Conselho Federal
de Assistentes Sociais (CFAS), e seguindo os preceitos do Decreto nº 994,
de 15 de maio de 1962 (Diário de Pernambuco, 3 de fevereiro de 1963, p. 18).

2.2 As primeiras décadas do Conselho Regional de Serviço Social

Depoimentos recolhidos por Nascimento et al. (1989, p. 75) informam


que existia, entre finais de 1950 e o início da década seguinte, um pequeno
grupo de profissionais em Pernambuco empenhado na construção de um órgão
que aglutinasse e direcionasse a categoria, com vistas à futura sindicaliza-
ção; empenho que não havia alcançado efetividade naquele momento, mas
demonstrava o estímulo, em nível regional, do crescimento da sindicalização e

85 Após a XI Conferência Internacional, em 1962 no Rio de Janeiro, novamente se identifica a atuação do Comitê
Regional do CBCISS no sentido de garantir uma delegação de Pernambuco na XII Conferência Internacional,
que iria ocorrer em Atenas, em novembro de 1964 (Diário de Pernambuco, 13 de junho de 1964).
86 O território que hoje conforma a região Nordeste, nesse momento, estava sendo referenciado por quatro
Conselhos Regionais: CRAS 4ª, referido acima; CRAS 2ª Região, com Maranhão e Piauí, sede em São
Luiz; CRAS 3ª Região, com Ceará e Rio Grande do Norte, sede em Fortaleza; CRAS 5ª Região, com
Sergipe e Bahia, sede em Salvador.
116

dos movimentos grevistas no Brasil durante essa quadra histórica.87 Dadas as


dificuldades para a criação de uma associação profissional, os esforços foram
direcionados para a constituição do Conselho Regional de Assistentes Sociais,
enquanto instância então recentemente estabelecida legalmente. Os integran-
tes da primeira diretoria do CRAS 4ª Região haviam ocupado, na década
de 1960, cargos na ABAS, sendo também um grupo vinculado ao Instituto de
Aposentadorias e Pensões dos Industriários (IAPI). O primeiro presidente do
Conselho foi Cláudio José Viana Pereira, anteriormente presidente da ABAS,
com Margarida Espinheiro como vice-presidente. Em entrevista, Cláudio José
(CRESS, 1988, p. 34) afirma que, na ocasião, era um dos gerentes do Serviço
Social Rural, com Margarida Espinheiro também vinculada ao órgão, ambos
obtendo certas facilidades estruturais para instalação dos trabalhos; e foi na
sua área de Desenvolvimento Comunitário, no interior do Serviço Social Rural,
que se criou a infraestrutura para desencadear o processo de implantação do
CRAS (apoio técnico, recursos humanos, instrumentos de divulgação etc.).
Nessa primeira década de existência, as diretorias do CRAS 4ª Região
(1963-1972) concentraram-se nos esforços de instrumentalização e formali-
zação técnico-burocrática, com cadastramento de profissionais, composição
de apoio técnico (advogado e contador), fixação de fluxos de atendimento a
profissionais e aparelhamento. Além disso, a exemplo da ABAS, o Conselho
expressava uma preocupação constante com o reconhecimento e divulgação
da profissão, donde a criação de um boletim, o CRAS Informativo, com pre-
tensão de periodicidade mensal, além da emissão de correspondências para
profissionais e instituições. Desde a década inicial, se verifica a preocupação
em incorporar, nas diretorias, representantes de todos os estados envolvidos,
objetivando descentralizar encargos e viabilizar a comunicação com as bases.
Entre os anos de 1972 e 1984, em três das quatro diretorias, não houve reno-
vação do cargo de presidente, concentrado num mesmo membro durante nove
anos. No período, há um reforço de ações de reorganização administrativa,
financeira e política do Conselho: mudança no aspecto físico da sede, atuali-
zação do cadastro geral de profissionais, contratação de advogado e contador,
busca de transformação das representações estaduais do CRAS em Delegacias.
São reconhecidos como resultados políticos e organizativos da década
a indicação de membro do CRAS 4ª Região para compor chapa do CFAS,

87 Basta cotejar, como demonstra Netto (2014, p. 45), o aumento no número de sindicatos no Brasil, no
pequeno intervalo entre 1960 e 1964, que saltou de 1608 para 2049; o crescimento do número de greves,
que foram 105 em 1961, 128 em 1962 e 149 em 1963, algumas com caráter nacional e teor não apenas
econômico, mas com evidente dimensão política; além da expressividade do movimento camponês, atra-
vés da ampliação dos sindicatos rurais, das greves no campo e da atuação das Ligas Camponesas, com
importante repercussão em Pernambuco.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 117

até então ausente de representações do Nordeste88; engajamento na luta pelo


plano de classificação de cargos da esfera federal89; a realização do II Con-
gresso Brasileiro de Assistentes Sociais, em 1976, no Recife; além de eventos
e atividades de formação, como o início das edições da Semana do Assistente
Social, cursos intensivos com intelectuais estrangeiros como Natálio Kisner-
man90 e Herman Kruse91, ou de renome nacional, como Sérgio Fhurmannn92,
Maria do Carmo Brant Carvalho Falcão93, Seno Cornelly94. De todo modo,
Nascimento (1989, p. 91) caracteriza a atuação no período como de caráter

88 Tratou-se da indicação de Luciene Osias, então presidente do conselho fiscal do CRA 4ª Região, para o CFAS
em 1975, na ocasião do primeiro CBAS. A representante do CRAS conseguiu compor a chapa de Integração
CFAS/CRAS, liderada pelo presidente do CRAS 9ª Região, Luiz Pedrosa (Diário de Pernambuco, 05 de janeiro
de 1975). No início da década seguinte, em 1981, a própria presidenta do CRAS 4ª Região, Selma Castro, que,
durante os anos anteriores, se reconduziu por três mandatos, assume a presidência do Conselho Fiscal do CFAS.
89 Trata-se de um protesto contra o plano de reclassificação do funcionalismo público federal de nível superior da
administração do governo de Pernambuco, colocado pelo governador Eraldo Leite. A proposta, apresentada
em 1974, pelo decreto nº 6.730, assinado pelo governador, reproduzia uma hierarquia de níveis entre profis-
sionais universitários, prejudicando categorias como as de enfermeiros, nutricionistas e assistentes sociais, em
detrimento da elevação de cargos isolados das bibliotecárias. Algumas reportagens sobre o caso aparecem no
jornal Diário de Pernambuco de 14 e 16 de agosto de 1974, e no Jornal do Comércio, de 14 de agosto de 1974.
90 O jornal O Norte, de João Pessoa, noticia, em 08 de outubro de 1974, a presença do argentino Natálio
Kisnerman na capital, convidado pelo CRAS 4ª Região para ministrar um Curso de Atualização em Serviço
Social, orientado pela vinculação do assistente social no processo de desenvolvimento, numa ancoragem
nacional e voltada para os problemas concretos da população. Também o Jornal de Alagoas, em 28 de
novembro de 1974, anuncia a realização de um Curso sobre Reconceitualização do Serviço Social a ser
ministrado em 1975 pelo assistente social argentino.
91 Em 12 e 26 de janeiro de 1975, o Diário de Pernambuco noticia a realização de um curso sobre Desen-
volvimento de Comunidade, a ser ministrado no mês de fevereiro, pelo assistente social uruguaio Herman
Kruse, técnico de várias organizações internacionais.
92 Registra-se a presença do professor paulista na programação da III Semana do Assistente Social, em 1975,
ministrando palestra sobre O papel do Assistente Social no campo empresarial. O evento foi encerrado sob
a presidência do então governador biônico de Pernambuco, Moura Cavalcanti, diretamente nomeado pelo
general Ernesto Geisel, então presidente sob a ditadura. (Diário de Pernambuco, 09 de maio de 1975). Além
disso, a matéria de 18 de maio de 1975 informa que Sérgio Fhurmann havia ministrado um curso de 20 horas
em Recife com a participação de 200 assistentes sociais, depois de já ter realizado ação correlata em Natal e
Mossoró, patrocinada pelo SESI e SESC do Rio Grande do Norte. O interesse pelo papel do Serviço Social
nas empresas estava relacionado à expansão industrial promovida pelo II PND, no contexto do qual se passou
a tornar obrigatório a contratação de assistentes sociais em empresas com mais de 100 funcionários.
93 Em 1978, as edições de 04 e 12 de novembro do Diário de Pernambuco registram a realização de um curso
da referida assistente social (então assessora da Reitoria da PUC-SP e professora de outras faculdades
no Rio de Janeiro) com o tema Serviço Social – uma nova visão teórica (FALCÃO, 1978), o mesmo título
de um livro recém publicado pela mesma. Lastreada pela ideia de uma “nova visão teórica” e reclamando a
perspectiva da “reconceituação”, a obra efetivamente explora as veredas abertas pela “perspectiva moder-
nizadora” (NETTO, 2005) no Brasil, dadas desde a realização do Seminário de Araxá, de 1967.
94 As edições de 24 de abril e 03 e 19 de maio de 1979 do Diário de Pernambuco noticiam a realização de um
curso, organizado em parceria entre o CRAS 4ª Região e a UNICAP, para maio, sobre Planejamento Social,
ministrado pelo professor Seno Cornelly, voltado para o tema no planejamento na empresa privada e na
administração pública. Seno Cornely era então técnico da Metroplan do Rio Grande do Sul e membro da
Diretoria do Instituto Brasileiro de Planejamento, além de presidente da ALAETS e professor universitário.
118

eminentemente defensivo, sem envolvimento em manifestações políticas mais


amplas ou colidentes com o regime ditatorial, além da orientação para uma
defesa restrita da categoria – circunscrevendo-se, as articulações mais sólidas,
às parcerias com a APASPE, a ABESS e outros CRAS.
As fontes da década de 1970 evidenciam o empenho, por parte do CRAS 4ª
Região, em fomentar um potencial sinérgico e de colaboração do Serviço Social
em face das políticas de desenvolvimento do ciclo autocrático-burguês: seja
pela constante defesa do assistente social como um profissional alinhado com o
desenvolvimento integrador (com funções educativas, “humanizantes” e “pro-
mocionalistas” para o “bem-estar social”) e a colaboração entre empregadores
e empregados; seja pelo intercâmbio teórico com intelectuais desenvolvimen-
tistas nas ações de capacitação; seja pela atenção em garantir solenemente
a presença de autoridades administrativas e políticas do aparelho de Estado
nos eventos da categoria; seja mesmo pelo complacente silêncio no tocante
ao patrulhamento ideológico e repressão policial-militar do dissenso político.
São episódios sintomáticos da constituição desses laços com as políticas do
regime, nos anos 1970, as edições da Semana do Assistente Social, iniciadas
a partir de 1973 no estado; e o II Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais,
em 1976, sediado em Recife. A direção teórico-ideológica dominante nesse
último estava sintonizada com aquela forjada pela “perspectiva modernizadora”
até a primeira metade da década, conforme já analisado por Netto (2005). Com
o próprio General Ernesto Geisel na presidência de honra, como patrono, e
com o temário balizado pela problemática do desenvolvimento, a realização do
congresso em Pernambuco colabora, ademais, para demonstrar o protagonismo
regional na colaboração para o enraizamento da perspectiva modernizadora.
Por outro lado, é elucidativo expor algumas tendências presentes no desen-
volvimento das Semanas do Assistente Social em Pernambuco, posto se tratar
de um espaço em que, de modo mais definido, pode-se verificar as disposições
teórico-políticas locais (e regionais). Em 1973, por exemplo, foi celebrada a
primeira Semana do Assistente Social, entre 9 e 15 de maio – à época, o estado
contava com um contingente profissional de, aproximadamente, 331 assisten-
tes sociais. O evento culmina, em 15 de maio, com uma mesa, presidida pelo
Delegado do Trabalho, dedicada a uma exposição do intelectual de ponta da
“perspectiva modernizadora”, José Lucena Dantas, sobre O papel do Assistente
Social no Desenvolvimento Brasileiro (Diário de Pernambuco, 15 de maio
de 1973). Uma matéria do Diário de Pernambuco (10 de maio de 1973) noticia
o jantar de confraternização dessa Semana do Assistente Social, realizada em
associação com o Clube dos Diretores Lojistas do Recife, celebração em sin-
cronia, também, com a comemoração do Dia das Mães naquele momento. Nos
registros da palestra da então presidente o CRAS 4ª Região, Selma de Castro
Lima, a matéria afirma que a mesma “[...] destacou a importância do trabalho
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 119

que essas profissionais [assistentes sociais] exercem no processo de desenvol-


vimento do País, quando atuam como elo de aproximação entre empregados e
empregadores”. A matéria registra também que a “[...] criação de um setor de
assistência social em cada empresa, seja industrial ou comercial, foi apontada
pela palestrante [Selma Castro] como uma medida da mais alta importância
no relacionamento capital-trabalho, não só no seu aspecto humano, mas, e
sobretudo, como fator de elevação da produtividade.” Na programação geral
do evento, encontrava-se, igualmente, a divulgação de uma missa de ação
de graças, com confissão comunitária e celebração da páscoa da Associação
dos Deficientes Motores, na Capela do Colégio Salesiano. Se insinua, nesses
episódios, não apenas o papel que a entidade corporativa absorvia no sentido
de sintonizar suas bases com as vanguardas intelectuais da vertente moder-
nizadora e as aspirações do empresariado local, mas de reproduzir o caráter
conservador também presente, transigindo com aspectos do tradicionalismo e
expressando a dimensão do transformismo de que fala Netto (2005) ao tratar
dessa vertente renovadora do Serviço Social.95
No início dos anos 1980, as Delegacias criadas nos outros estados (Ala-
goas, Campina Grande e João Pessoa) foram transformadas em Conselhos
– em 1982, cria-se um Conselho Regional na Paraíba, e em 1983 é a vez de
Maceió. Também a atuação do CRAS em Pernambuco buscou deslocar-se de
uma noção e aspiração punitiva do ato da fiscalização (sobre as instituições
irregulares e profissionais em débito)96 para um entendimento mais amplo e
educativo do mesmo. A partir de 1984, houve uma renovação integral dos qua-
dros de direção do Conselho, agora movidos pela pretensão de reorientação da
prática organizativa, facilitada pela extinção da legislação que previa a super-
visão, pelo Ministério do Trabalho, das entidades fiscalizadoras do exercício
profissional, que as colocava sob o controle e tutela direta do órgão federal.97
Além da perspectiva educativa da fiscalização, o CRAS passou a buscar maior
participação dos profissionais nas funções da entidade, com a realização de
95 As reminiscências do tradicionalismo em meio ao afluxo modernizador se mostram, tanto nos resquícios
de um missionarismo, na existência de espaços de formação teórico-profissional com representantes da
hierarquia católica, nas celebrações profissionais contemplando atos litúrgicos (missas solenes, missas de
ação de graças, confissões) e no atrelamento a valores e comportamentos ligados aos papeis femininos.
96 Um exemplo dessa postura, com viés mais punitivo, se mostra numa reportagem do jornal Gazeta de
Alagoas, de 25 de abril de 1971, com o título Assistentes Sociais defendem profissão, onde se noticia uma
reunião do CRAS 4ª Região em Maceió, voltada para a denúncia de empresas que contratavam pessoas
sem diploma para o cargo de assistente social. A manifestação anunciava a condução mais rígida da
fiscalização, sinalizando a necessidade de providências junto aos órgãos competentes. Trata-se de um
dos poucos registros da década em que se verifica uma postura abertamente colidente (e de denúncia) do
Conselho em face das instituições empregadoras.
97 A legislação que extinguiu essa tutela corresponde ao Decreto Lei nº 2299 de 1986 e o Decreto nº 93.617
de 1986. A partir de então, apenas as prestações de contas dos Conselhos permaneciam inspecionadas
pelo Tribunal de Contas da União.
120

reuniões ampliadas da Diretoria, além da ampliação da esfera de atuação polí-


tica, através da interlocução com movimentos sociais. A partir desse momento,
passa a ser contrarrestada a dupla tendência anterior de alinhamento e convi-
vência com o regime e atuação restrita aos limites econômico-corporativos.98
Essa recondução acompanha, não apenas a evolução da tendência de
“intenção de ruptura com o Serviço Social ‘tradicional’” (NETTO, 2005),
que opera avanços teóricos e políticos importantes entre finais de 1970 e a
primeira metade dos anos 1980 – seja, apenas para citar dois marcos mais
significativos, com a manifestação contra o regime ocorrida no III Congresso
Brasileiro de Assistentes Sociais em 1979; seja com a influência que ganha
a elaboração teórica de Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho. São desloca-
mentos importantes da relação do Serviço Social com as classes sociais no
Brasil, amplamente condicionados pela crise da autocracia burguesa, o afluxo
do movimento operário e popular, além do processo de distensão do regime,
que passam a manifestar-se de modo combinado a partir de finais de 1970.
Assim, são exemplos das linhas de atuação do CRAS, a partir da segunda
metade dos anos 1980: a participação na discussão do Plano de Classificação
dos Cargos da Previdência e da reestruturação do Serviço Social no Insti-
tuto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social, no movimento
pela Reforma Sanitária e o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde, o
envolvimento nos debates sobre o código de ética e da Lei de Regulamentação
da profissão; a luta, conjuntamente com a APASPE, para a fixação do piso
salarial, promoção de cursos de capacitação técnica e política.
Os materiais empíricos e estudos disponíveis (NASCIMENTO et
al., 1989; QUEIROZ et al., 1992) indicam que o CRAS nunca alcançou,
até finais de 1980, desempenhar satisfatoriamente a fiscalização do exercí-
cio profissional, dada a carência de instrumento legal e de pessoal, além da
inexistência de denúncias, restringindo o contato com a categoria a eventos
celebrativos, ações de formação e capacitação. No período que se abriu a
partir dos anos 1980, percebe-se que houve uma alteração na composição das
diretorias, com deslocamento de representações sempre constantes durante
toda a década de 1970, renovando-se os quadros. Sobretudo após meados da
década de 1980, algumas tendências e episódios significativos da atuação

98 É sintomático da abertura para um redirecionamento na atuação e manifestação pública do Conselho, a


partir da década de 1980, uma matéria do Diário de Pernambuco (26 de fevereiro de 1980) em que Seno
Cornely – convidado, pela prefeitura de Recife, para o I Seminário de Ações Comunitárias, e, pelo CRAS,
para uma palestra com o tema Serviço Social e Momento Atual – apresente, em entrevista ao jornal, críti-
cas a ausência de participação popular na administração do governo, acusando o caráter centralizador e
autoritário do Estado, reclamando uma reforma agrária e urbana, sinalizando para as forças populares em
afluxo. Essa é a primeira vez que se registra, no material empírico disponível, manifestações contrárias ao
regime em materiais vinculados à trajetória do CRAS em Pernambuco.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 121

organizativa (política e corporativa) no CRAS de Pernambuco se manifestam


nas ações que desenvolvia em parceira com a APASPE, principalmente em
termos de vincular-se às lutas pela afirmação da democracia política no país
e aos movimentos pela defesa e consolidação dos direitos sociais.99

2.3 A trajetória das primeiras entidades sindicais

Desde o início da década de 1960, o Serviço Social em Pernambuco


começa a ensaiar e, com o tempo, constituir organismos próprios de mobi-
lização e direção de assistentes sociais na defesa de suas reivindicações
econômicas, representação e legitimação nos conflitos em torno da venda da
força de trabalho e constituição de sua ligação com as lutas coletivas dos
explorados. Com efeito, desde, aproximadamente, a década de 1950, essas
frentes eram absorvidas, parcial e limitadamente, pelo Centro Regional de
Pernambuco da ABAS. Na década subsequente, os limites da natureza insti-
tucional dessa entidade, a necessidade de constituição de um aparelho espe-
cializado e reconhecido legalmente para assumir as tarefas de representação
sindical, o acirramento das contradições econômicas e das lutas de classes
no país, estimulam setores da categoria em Pernambuco a construção de
uma associação profissional que desencadearia a afirmação posterior de uma
entidade sindical de assistentes sociais no estado.
Assim, a Associação Profissional de Assistentes Sociais de Pernambuco
(APASPE) – depois transformada em Sindicato de Assistente Sociais de Per-
nambuco (SINDASPE) – constituiria um equivalente a uma entidade pré-sindi-
cal, cuja busca de constituição pelo Serviço Social revela o intuito de aglutinar
e direcionar a categoria com vistas à futura sindicalização da profissão. A
criação da primeira APAS no Brasil data de 1954, fundada no Rio de Janeiro e
transformada em sindicado já em 1956, no contexto da luta pela regulamenta-
ção da profissão. Em Pernambuco, a partir da década de 1960, evidenciam-se,
periodicamente, algumas tentativas de fazer deslanchar a APAS: em julho
de 1960 é divulgada sua criação, mas sem desdobramentos da atuação para
além desse ano, indicando um primeiro malogro dessa iniciativa; no início
de 1969, novamente registra-se a informação de criação da APAS, aparente-
mente sem consequências práticas sistemáticas, o que aponta para mais uma
tentativa frustrada, certamente afetada pelo período de recrudescimento da

99 Há um evidente deslocamento da forma tradicional de condução a organização profissional a partir de


finais de 1980, uma recondução que ganha expressão nos boletins e jornais das entidades, mostrando-se
em sintonia com as vanguardas do Serviço Social ligadas ao processo de ruptura com o conservadorismo.
Uma movimentação com articulações mais orgânicas entre conselho e sindicado conduz a posições mais
combativas e politizadas, em face das políticas liberalizantes, sobretudo àquelas com efeitos regressivos
sobre as políticas de Seguridade Social, em especial a Assistência Social e a Saúde.
122

repressão policial-militar; apenas em finais de 1977, encontram-se notícias,


mais uma vez, da criação da APAS em Pernambuco, a partir de então conse-
guindo apresentar um trabalho permanente até, finalmente, a constituição de
um sindicato em finais dos anos 1980. O que ocorre nesse último estágio é
condicionado pela crise econômica e política que acompanha a agonia do ciclo
autocrático-burguês, galvanizando o afluxo do movimento operário e popular.
Percebe-se que a primeira tentativa de construção da APASPE ocorre,
portanto, já no início dos anos 1960 – sendo noticiada a criação em 26 de julho
de 1960 no Diário de Pernambuco de 6 agosto de 1960.100 O primeiro esboço
de construção da APASPE foi galvanizado pelas disputas reativas em torno
da proposta de Plano de Reclassificação do Funcionalismo Público Civil da
União (equivalente, hoje, aos Planos de Carreira do serviço público), exigido
pelo Estatuto dos Funcionários Públicos Civis da União (1952), que foi, mais
de uma vez, objeto de veto por parte de Juscelino Kubitschek. A sua última
versão, conhecida como Lei Jarbas Maranhão, Lei nº 3.780, de 12 de julho
de 1960, recebeu inúmeros vetos do executivo federal, obstruindo diretamente
melhorias salariais (vencimentos, abonos e salário família, por exemplo) para
categorias de servidores num contexto de carestia. O ato foi, com isso, objeto
de protesto de inúmeras categorias. No caso de assistente sociais, uma notícia
do Diário de Pernambuco (7 de setembro de 1960) afirma que a APASPE e o
Centro Regional de Pernambuco da ABAS estavam integrando um movimento
nacional, dirigido pelos Sindicados de Assistentes Sociais, com o objetivo de
rejeitar o veto do presidente no que se referia ao acesso da carreira de Assis-
tente Social ao nível 18 do Plano de Reclassificação. A manutenção do veto
restringiria o acesso de assistentes sociais aos postos de assessoria e super-
visão, nivelando executores e supervisores, desestimulando os que exerciam
supervisão – processo que exigia aperfeiçoamento técnico, como curso de
especialização. Por sua vez, supomos que o segundo intento de criação da
APASPE, em 1969, tenha ocorrido, igualmente, como saldo da articulação
para a melhoria da inserção do Serviço Social no Plano de Classificação do
Funcionalismo Estadual, associada ao clima geral de efervescência política
acumulado até 1968; mobilização para a qual o Centro Regional da ABAS foi
o principal protagonista. Porém, esse segundo intento ocorre num momento de
profunda ofensiva sobre as liberdades democráticas e de organização política
do proletariado, expressa no Ato Institucional nº 5, de 1968.

100 Numa matéria do Diário de Pernambuco, de 11 de setembro de 1962, o Centro Regional de Pernambuco
da ABAS aparece convocando seus associados para discutir a posição de assistente sociais no projeto de
reclassificação do funcionalismo estadual. Nessa matéria, por suposto de interesse também da APASPE,
a mesma não aparece. Isso corrobora os dados que apontam para a diluição da entidade criada em 1960.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 123

O trabalho de Nascimento (1989, p. 44) identifica que, malgrado


a eleição de várias diretorias para a Associação, a mesma não chegou a se
concretizar legalmente na década de 1960, sofrendo com o reduzido contingente
de profissionais e a baixa adesão à construção da entidade. Com isso, os
esforços foram redirecionados para implantação do CRAS, já estabelecido
legalmente após a regulamentação da profissão. Apenas em finais de 1960,
o empreendimento de construção da APASPE foi reiniciado, a partir de uma
articulação molecular para viabilização de uma assembleia na tentativa de for-
mar chapas para a diretoria; o pleito organizou-se com apenas uma chapa, que
permaneceu entre 1968 e 1971, enfrentando uma reduzida participação da base
e restrições financeiras. As tarefas iniciais da diretoria eleita consistiam na
busca por despertar, nas assistentes sociais, a importância da organização. Nas-
cimento et al. (1989) registra, como uma das principais conquistas associadas
à atuação da APASPE nesse período, a elevação do nível funcional da carreira
do assistente social de 1 para 3 no Plano de Classificação do Funcionalismo
Estadual, num engajamento comum em um movimento com várias categorias
profissionais. Após o fim desse mandato, em 1971, a APASPE voltou a ficar
desativada até 1974, sem alcançar a adesão na convocação das eleições. O ano
de 1977 marca a passagem de um período praticamente vegetativo de existência
(atuação restrita ao grupo dirigente, promoção de cursos de capacitação) para a
uma atração da categoria às reivindicações imediatas, como as ligadas a questão
salarial. A APASPE consegue se registrar em 1977, participando, pela primeira
vez, de um congresso da categoria (III CBAS, em 1979), articulando-se a movi-
mentos populares, atuando conjuntamente com outras entidades e categorias
profissionais (sindicatos, federações, CFAS, ABESS, CRAS e CELATS).
Esse ímpeto novo de organização da categoria está ambientado na crise do
ciclo ditatorial, quando ocorre a reativação de entidades sindicais e pré-sindicais
em todo o país, a partir de 1977, catalisada por importantes greves operárias
ocorridas no ABC paulista entre 1978-1980. Nesses anos, a articulação do Ser-
viço Social no campo sindical desperta através dos Encontros Nacionais de
Entidades de Assistentes Sociais, a partir de 1978, sempre com representação dos
estados do Nordeste. A partir de 1983, essa articulação nacional ocorre através
das Assembléias Nacionais de Assistentes Sociais (ANAS), onde, desde o início,
se refletem majoritárias as posições defendidas pela tendência mais combativa
do movimento sindical nacional, colocada na perspectiva de construção da
Central Única dos Trabalhadores (CUT) e contra a estrutura sindical vigente.
Nos anos 1980, mantinham-se as dificuldades relativas às condições
estruturais (como ausência de sede própria e adequada, carência de pessoal
técnico-administrativo) e a sustentação financeira, além do ausentismo das
bases nos espaços deliberativos ordinários (sobretudo assembleias e reuniões).
Uma importante bandeira de luta, nos primeiros anos da década, dizia respeito
124

à elevação de nível da categoria no Plano de Classificação de Cargos (PCC)


dos servidores públicos federais. Observa-se, ainda: um esforço articulador,
com a presença da APASPE em encontros nacionais de entidades (desde a
primeira I ANAS em 1983); o estímulo para a construção de APAS em outros
estados (como no exemplo da Paraíba); o engajamento de um grupo alinhado
com os setores que buscavam a criação da CUT e a vinculação da ANAS à
mesma, o que ocorre em 1985; a inserção da APASPE em fóruns de defesa de
direitos sociais, como na VIII Conferência Nacional de Saúde; a perspectiva
da necessidade de constituição de espaços sindicais aglutinadores de outras
categorias; envolvimento ativo na campanha de luta pelo piso salarial (Projeto
de Lei nº 4645, de 1984, da Deputada Cristina Tavares, vetado na íntegra
em 1986) (NASCIMENTO et al., 1989; QUEIROZ et al., 1992).
Malgrado os limites estrutural-funcionais e de mobilização da entidade, as
atividades da APASPE – frequentemente em parceria com o CRAS 4ª Região
– expressam uma tendência de politização e fortalecimento político-sindical da
categoria profissional no estado. A entidade constitui-se um elo com o movi-
mento sindical estadual e nacional, além de mostrar-se instância mediadora
da colaboração do Serviço Social em Pernambuco na luta pela afirmação dos
direitos democráticos na crise da ditadura e, na sequência, pela garantia dos
direitos sociais alcançados constitucionalmente em 1988. É, principalmente, em
torno dessa movimentação que se descortina, de modo mais nítido, a passagem
da organização profissional – até então, em geral, restrita aos limites econômi-
co-corporativos, complacente em face dos pressupostos da institucionalidade
vigente – para um momento em que passam a se conjugar a mobilização em
torno das reivindicações profissionais e as lutas democráticas, colidentes com o
ordenamento estatal, e conducentes à construção de laços com as mobilizações
mais amplas das classes exploradas. Pense-se, por exemplo, nas manifestações
expressas em um dos Boletins Informativos da APASPE, de abril de 1984, no
qual, tanto se afirma a adesão ao movimento de reivindicação por eleições
presidenciais diretas no Brasil, ocorrido entre 1983 e 1984, quanto se mani-
festa a denúncia das violências a que estavam submetidos os canavieiros em
Pernambuco, convocando os assistentes sociais a unirem-se aos protestos dos
trabalhadores do campo.
No plano das mobilizações em torno da afirmação dos direitos sociais,
então recentemente instituídos pela Constituição Federal de 1988, observa-se a
participação do recém-formado SINDASPE e do CRAS 4ª Região nos trabalhos
de elaboração da Lei Orgânica de Recife, em 1989, formulando uma proposta
de Política de Assistência Social para o município, na perspectiva de construção
da mesma como política social de direitos, regida por mecanismos de controle
democrático. Naquele ano, finalmente o Sindicato havia sido criado, com seu
estatuto publicado no em 19 de maio, passando imediatamente a se integrar
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 125

nas discussões e encaminhamentos das leis complementares à Constituição


Federal. Não é causal que, em setembro de 1990, em parceria com o CRAS 4ª
e o Sindicato dos Médicos de Pernambuco (SIMEPE), o SINDASPE tenha
realizado o I Seminário sobre Seguridade Social, com apoio do Núcleo de
Estudos de Saúde Coletiva, da Plenária Estadual de Saúde e do Governo de
Pernambuco. O evento visava envolver os trabalhadores da Seguridade Social
no debate sobre as áreas de ação das suas políticas, as diretrizes e a legislação
decorrente, além de buscar instrumentalizá-los para uma intervenção prática
qualificada, fortalecendo, ainda, sua organização. Naquele momento, a condu-
ção teórico-política da intervenção alinhava-se com as posições dos segmentos
que estavam construindo o Partido dos Trabalhadores e CUT. Na primeira
metade dos anos 1990, no entanto, o SINDASPE é diluído, acompanhando as
orientações colocadas para a construção dos sindicatos por ramos de atuação,
conforme deliberação da própria CUT na década anterior.101

3. Considerações finais

Nas quatro décadas que se estendem a partir dos anos 1950, as organiza-
ções profissionais do Serviço Social, com expressão no estado de Pernambuco,
percorrem uma trajetória que se estende desde (I) suas protoformas – galva-
nizadas pela afirmação da influência norte-americana e suas organizações
– então envolvidas no processo de afirmação e defesa do reconhecimento,
institucionalização e regulamentação da profissão; passando (II) pelo estágio
de gestação e desenvolvimento incipiente dos aparelhos próprios e legais da
categoria, dedicados à orientação, disciplinamento e fiscalização da atuação
profissional; até (III) o período subsequente no qual esforços mais consistentes
de aperfeiçoamento técnico-administrativo e de mobilização associam-se a
resultados mais sólidos de ativação da vida sindical e fixação de vínculos com
as reivindicações e movimentos mais amplos das classes exploradas no país.
No início, não apenas a intervenção dessas organizações ocorria, em
geral, nos limites das formas econômico-corporativas de luta; ela concorria,
ademais, para ativar a colaboração de assistentes sociais com as políticas
sociais e econômicas da ordem burguesa no país – seja aproximando-se de
posições nacional-reformistas do espectro desenvolvimentista, num momento
inicial, seja atrelando-se à perspectiva diretamente modernizadora do desen-
volvimento, no curso do ciclo autocrático-burguês – e isso vale especialmente
para a aparelhagem dos conselhos. Apenas na crise da autocracia burguesa,
quando se precipitam as lutas de classes, lastreadas no afluxo do movimento

101 Numa assembleia do SINDASPE de 16 de março de 1993, foi votado, por unanimidade, a extinção do
sindicato, deixando-se a cargo de uma comissão concretizar os trâmites legais necessários para tal (baixa
no cartório, extinção do CGC, etc.
126

operário, as tendências econômico-corporativas e colaboracionistas passam a


ser problematizadas no seio da organização profissional em Pernambuco, na
corrente do movimento de ruptura com o monopólio conservador no Serviço
Social no Brasil.102 Com efeito, na passagem para os anos 1980 – e avançando
na década seguinte – passam a ser contrarrestados três traços que acompanham
a organização profissional desde seu início: suas vicissitudes estrutural-fun-
cionais, refletindo em incapacidades crônicas de atendimento das funções
precípuas das entidades; a condução econômico-corporativa do trabalho de
mobilização e luta reivindicativa da categoria; e a posição de colaboração
com os projetos políticos, econômicos e as estruturas institucionais da ordem
dominante. Trata-se de uma quadra histórica de transição que envolve, inclu-
sive, uma renovação geracional dos quadros das entidades. A rearticulação das
lutas e movimentos estudantis do Serviço Social no estado e o impulso para
a elaboração intelectual crítica fornecida a partir da abertura do Programa de
Pós-graduação em Serviço Social na Universidade Federal de Pernambuco,
retroagem catalisando os descolamentos político-organizativos da profissão,
na corrente do processo de busca de ruptura com o conservadorismo que se
desdobrava em nível nacional.

102 Todas as evidências indicam que tais deslocamentos são deflagrados, inicialmente, a partir das movimen-
tações das organizações sindicais e pré-sindicais, repercutindo, depois, nos conselhos da categoria.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 127

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SEMINÁRIOS regionais nos países sul-americanos. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 126, n. 86, p. 3, domingo, 15 abril de 1951.

SEMINÁRIO de organização de comunidade. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 126, n. 94, p. 3, quinta-feira, 26 abril de 1951.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 129

PROSSEGUEM os trabalhos da Convenção Nacional de Assistentes Sociais.


Diário de Pernambuco, Recife, ano 127, n. 81, p. 2, sábado, 5 abril de 1952.

ENCERRAM-SE trabalhos da Convenção Nacional de Assistentes Sociais.


Diário de Pernambuco, Recife, ano 127, n. 87, p. 3, domingo, 13 abril
de 1952.

COMEMORAÇÕES ao dia da assistente social. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 128, n. 103, p. 3, sábado, 09 maio de 1953.

CURSO sobre assuntos sociais brasileiros. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 130, n. 230, p. 15, domingo, 9 outubro de 1955.

PROBLEMAS rurais e Serviço Social. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 130, n. 239, p. 9, quinta-feira, 20 outubro de 1955.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 131, n. 166, p. 15,


sábado, 21 julho de 1956.

ASSISTENTES sociais. Diário de Pernambuco, Recife, ano 131, n. 176, p.


6, sábado, 2 agosto de 1956.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 184, n. 131, p. 6,


sábado, 11 agosto de 1956.

HOMENAGENS. Diário de Pernambuco, Recife, ano 131, n. 201, p. 12,


sábado, 1 setembro de 1956.

ASSISTENTES sociais excursionarão à Garanhuns. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 131, n. 202, p. 3, domingo, 2 setembro de 1956.

DIA do assistente social. Diário de Pernambuco, Recife, ano 132, n. 104,


p. 14, quinta-feira, 09 maio de 1957.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 132, n. 128, p. 10,


quinta-feira, 06 junho de 1957.

ASSOCIAÇÃO Brasileira de Assistentes Sociais. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 132, n. 162, p. 11, sábado, 20 julho de 1957.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 132, n. 202, p. 17,


quinta-feira, 05 setembro de 1957.
130

ASSOCIAÇÃO de Assistentes Sociais. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 132, n. 204, p. 7, domingo, 8 setembro de 1957.

ASSOCIAÇÃO Brasileira de Assistentes Sociais. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 132, n. 226, p. 7, sexta-feira, 4 outubro de 1957.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 254, p. 7,


quinta-feira, 07 novembro de 1957.

ASSOCIAÇÃO Brasileira de Assistentes Sociais. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 133, n. 277, p. 15, quinta-feira, 05 dezembro de 1957.

ASSISTENTES SOCIAIS. Diário de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 277,


p. 15, quinta-feira, 05 dezembro de 1957.

CENTRO Regional da Associação Brasileira de Assistentes Sociais. Diário


de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 279, p. 3, sábado, 07 dezembro de 1957.

CONFERÊNCIA Internacional de Serviço Social. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 133, n. 178, p. 14, sexta-feira, 08 agosto de 1958.

CENTRO de assistentes sociais. Diário de Pernambuco, Recife, ano 133,


n. 37, p. 6, sábado, 15 fevereiro de 1958.

ASSISTENTES Sociais em Pernambuco. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 133, n. 49, p. 6, terça-feira, 04março de 1958.

PROTESTAM assistentes sociais contra tentativas de nomeações irregulares.


Diário de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 133, p. 20, terça-feira, 14 junho
de 1958.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 135, p. 10,


terça-feira, 17 junho de 1958.

MAIOR amplitude à campanha de protesto das assistentes sociais. Diário de


Pernambuco, Recife, ano 133, n. 136, p. 8, quarta-feira, 18 junho de 1958.

10 diretórios acadêmicos apoiam a campanha das assistentes sociais. Diário


de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 139, p. 8, sábado, 21 junho de 1958.

ASSISTENTES SOCIAIS. Diário de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 140,


p. 4, domingo, 22 junho de 1958.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 131

NENHUMA pessoa sem habilitação será nomeada assistente social. Diário


de Pernambuco, Recife, ano 133, n. 144, p. 3, sábado, 28 junho de 1958.

OUTRA conferência mundial no Brasil. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 134, n. 33, p. 6, domingo, 08 fevereiro de 1959.

CONCLAVE Internacional de Serviço Social será no Recife. Diário de Per-


nambuco, Recife, ano 137, n. 45, p. 14, sábado, 24 fevereiro de 1960.

ASSOCIAÇÃO Profissional de Assistentes Sociais de Pernambuco APASPE.


Diário de Pernambuco, Recife, ano 135, n. 188, p. 10, domingo, 21 agosto
de 1960.

PERNAMBUCO tomará parte no Segundo Congresso Brasileiro de Serviço


Social. Diário de Pernambuco, Recife, ano 135, n. 192, p. 5, sexta-feira, 26
agosto de 1960.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 135, n. 202, p. 17,


quarta-feira, 7 setembro de 1960.

PERNAMBUCO na Conferência Mundial de Serviço Social. Diário de Per-


nambuco, Recife, ano 136, n. 5, p. 18, sexta-feira, 06 janeiro de 1961.

PERNAMBUCO no Segundo Congresso Brasileiro de Serviço Social: temas.


Diário de Pernambuco, Recife, ano 136, n. 68, p. 5, sexta-feira, 24 março
de 1961.

ESTUDANTES no Congresso de Serviço Social. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 136, n. 71, p. 6, terça-feira, 28 março de 1961.

JÁ constituída de delegação ao Congresso de Serviço Social. Diário de Per-


nambuco, Recife, ano 136, n. 106, p. 3, quinta-feira, 11 maio de 1961.

CONFERÊNCIA do Serviço Social será no Recife. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 136, n. 117, p. 6, quarta-feira, 24 maio de 1961.

NO RECIFE, Diretor nacional do SESC. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 137, n. 47, p. 9, terça-feira, 27 fevereiro de 1962.

CONSTITUÍDO Comitê da Pré-Conferência. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 137, n. 48, p. 5, quarta-feira, 28 fevereiro de 1962.
132

ESCOLA de Serviço Social e CISS promoverão curso para especialistas per-


nambucanos. Diário de Pernambuco, Recife, ano 137, n. 134, p. 11, sexta-
-feira, 15 junho de 1962.

COBERTURA publicitária da Pré-Conferência Internacional de Serviço


Social. Diário de Pernambuco, Recife, ano 137, n. 161, p. 6, sexta-feira, 20
junho de 1962.

TÉCNICOS de 35 nações vão reunir-se nessa capital. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 137, n. 175, p. 5, domingo, 5 agosto de 1962.

INSTALA-SE a Pré-Conferência Internacional de Serviço Social. Diário de


Pernambuco, Recife, ano 137, n. 176, p. 3, sexta-feira, 7 agosto de 1962.

INSTALADA a Pré-Conferência Mundial do Serviço Social. Diário de Per-


nambuco, Recife, ano 137, n. 177, p. 5, quarta-feira, 8 agosto de 1962.

O BRASIL precisa de novas técnicas sociais. Diário de Pernambuco, Recife,


ano 137, n. 178, p. 9, quinta-feira, 9 agosto de 1962.

PRÉ-CONFERÊNCIA de Serviço Social encerra-se amanhã. Diário de Per-


nambuco, Recife, ano 137, n. 181, p. 13, domingo, 12 agosto de 1962.

ENCERRADA a Pré-Conferência de Serviço Social. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 137, n. 182, p. 19, terça-feira, 14 agosto de 1962.

ASSOCIAÇÕES. Diário de Pernambuco, Recife, ano 137, n. 205, p. 19,


terça-feira, 11 setembro de 1962.

ASSOCIAÇÃO Brasileira de Assistentes Sociais Centro Regional de Pernam-


buco. Diário de Pernambuco, Recife, ano 138, n. 29, p. 18, domingo, 03
fevereiro de 1963.

DEZ técnicos pernambucanos em Serviço Social. Diário de Pernambuco,


Recife, ano 139, n. 135, p. 3, sábado, 13 junho de 1964.

PAGARÃO taxas em parcelas. Diário de Pernambuco, Recife, ano 139, n.


150, p. 3, sábado, 04 julho de 1964.

ASSISTENTE social comemora dia. Diário de Pernambuco, Recife, ano 140,


n. 108, p. 4, sábado, 15 maio de 1965.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 133

ASSISTENTES sociais no CDL-Recife. Diário de Pernambuco (Primeiro


Caderno), Recife, ano 148, n. 123, p. 8, quinta-feira, 10 maio de 1973.

SEMANA da assistente social será encerrada hoje na SMP. Diário de Per-


nambuco (Primeiro Caderno), Recife, ano 148, n. 128, p. 2, terça-feira, 15
maio de 1973.

LIDERANÇAS sindicais debatem decreto. Diário de Pernambuco (Primeiro


Caderno), Recife, ano 149, n. 218, p. 3, sexta-feira, 16 agosto de 1974.

FUNCIONALISMO universitário faz crítica à discriminação. Diário de Per-


nambuco (Primeiro Caderno), Recife, ano 149, n. 216, p. 3, quarta-feira, 14
agosto de 1974.

NUTRICIONISTAS do Estado estão revoltadas devido a falta de reclassifi-


cação. Jornal do Comércio, quarta-feira, de 14 de agosto de 1974.

SERVIÇO SOCIAL deve dar resposta concreta a problemas do povo. O norte,


João Pessoa, terça-feira, 8 outubro de 1974. (Acervo CRESS – Recortes
de Jornais).

CRAS deseja implantar delegacias. Jornal de Alagoas, Maceió, quinta-


-feira, 28 novembro de 1974 (Acervo CRESS – Recortes de Jornais).

INFORMAÇÕES. Diário de Pernambuco (Primeiro Caderno), Recife,


ano 150, n. 11, p. 2, domingo, 12 janeiro de 1975.

INFORMAÇÕES. Diário de Pernambuco (Primeiro Caderno), Recife,


ano 150, n. 4, p. 2, domingo, 05 janeiro de 1975.

ASSISTENTES sociais. Diário de Pernambuco (Primeiro Caderno), Recife,


ano 150, n. 25, p. 6, domingo, 26 janeiro de 1975.

ASSISTENTES sociais iniciam comemorações hoje à noite. Diário de Per-


nambuco (Primeiro Caderno), Recife, ano 150, n. 122, p. 3, sexta-feira, 09
maio de 1975.

MERCADO é maio para assistente social na região. Diário de Pernambuco


(Primeiro Caderno), Recife, ano 150, n. 131, p. 5, domingo, 18 maio de 1975.

ASSISTENTES sociais fazem curso na Unicap. Diário de Pernambuco (Pri-


meiro Caderno), Recife, ano 153, n. 301, p. 24, sábado, 4 novembro de 1978.
134

ASSISTENTES sociais têm novo curso. Diário de Pernambuco (Primeiro


Caderno), Recife, ano 154, n. 309, p. 13, domingo, 12 novembro de 1978.

CONSELHO inscreve a curso. Diário de Pernambuco (Primeiro Caderno),


Recife, ano 154, n. 109, p. 8, sábado, 24 abril de 1979.

ASSISTENTE festeja semana. Diário de Pernambuco (Primeiro Caderno),


Recife, ano 154, n. 117, p. 8, quinta-feira, 3 maio de 1979.

CRAS encerra curso sobre planejamento social hoje à noite. Diário de Per-
nambuco (Primeiro Caderno), Recife, ano 154, n. 133, p. 24, sábado, 19
maio de 1979.

SENO Cornely coordena seminário. Diário de Pernambuco (Primeiro


Caderno), Recife, ano 155, n. 54, p. 8, terça-feira, 26 fevereiro de 1980.
CAPÍTULO 6
O MOVIMENTO ESTUDANTIL DO
SERVIÇO SOCIAL EM PERNAMBUCO
NOS ANOS 1950-1970
Camila Sobral Leite Lyra Montalvão

1. Introdução
O tema deste estudo é a trajetória do movimento estudantil de Serviço
Social em Pernambuco entre as décadas de 1950-1970. O movimento estu-
dantil é considerado como partícipe fundamental do processo de organização
política da categoria dos(as) assistentes sociais no Brasil (RAMOS; SAN-
TOS, 1997). Devido ao seu importante papel de aglutinador das juventudes,
este movimento constitui-se como canal de expressão coletiva destes profis-
sionais em formação, que são incluídos, pelos demais sujeitos coletivos da
profissão, como um dos segmentos que constroem o processo organizativo
do Serviço Social, destacando-se a sua importante presença em significativos
momentos de mudança, como na elaboração do Código de Ética, em 1993, e
das Diretrizes Curriculares, em 1996.
No Brasil, a relação entre as tendências críticas do processo de renovação
do Serviço Social e os movimentos das classes trabalhadoras e subalternas
é orgânica. Dentre as mediações dessa conexão social e política se encontra,
conforme Netto (2005), a luta do movimento estudantil, que se robustece
nas Escolas de Serviço Social ao longo do desenvolvimento da instituição
profissional. Abramides (2016), por exemplo, aponta a atuação do movimento
estudantil em Serviço Social, no período entre a deflagração do golpe de 1964
e o ano 1968, como uma variável a ser considerada no processo de ruptura com
o conservadorismo profissional, sendo este um aspecto ainda pouco explorado
em pesquisas da área. O período delimitado pela autora corresponde ao inter-
valo entre a irrupção do golpe e a publicação do Ato Institucional Nº 5 (AI-5),
de 13 de dez. 1968, momento que o regime ditatorial se torna mais rígido e
ampliam-se as tentativas de repressão às formas de organização coletiva e
de expressão política, como sindicatos, movimentos populares, estudantis e
rurais. Nesse momento histórico, as entidades estudantis foram fechadas, com
vários de seus dirigentes presos pelos militares. Militantes foram perseguidos,
tendo que recorrer ao exílio e, a partir de 1971, de forma mais extensiva,
muitos foram torturados e mortos (ABRAMIDES, 2016).
136

Com o objetivo de reconstruir historicamente a trajetória do movimento


estudantil de Serviço Social na particularidade de Pernambuco, o presente
estudo se debruçou sobre algumas entrevistas realizadas pelo Centro de Pes-
quisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da
Fundação Getúlio Vargas, como parte do projeto Memória da assistência
social no Brasil: constituição de banco de entrevistas; além disso, foram ana-
lisados depoimentos gravados durante o curso Serviço Social em Pernambuco
entre 1940-1970, realizado pelo projeto Memória e História do Serviço Social
em Pernambuco (MEHSSPE) em 2019, sobre a memória da renovação do
Serviço Social no Nordeste. Também foram utilizadas, como fontes de dados,
as matérias do jornal Diário de Pernambuco das décadas de 1950 e 1960 em
que se evidenciam a atuação e movimentação estudantil das alunas da Escola
de Serviço Social do estado.

2. Aspectos do movimento estudantil no Brasil


e na particularidade do Serviço Social

De acordo com nossos levantamentos, o marco inicial do movimento


estudantil de Serviço Social no Brasil é ainda indeterminado. Em seu estudo,
Santos (2007) identificou atas de reunião, datadas de 1953, do Centro Acadê-
mico do Instituto de Serviço Social de São Paulo (CAISS)103 que evidenciam,
não apenas a existência de organização política estudantil em nível local, como
de uma articulação nacional entre estudantes a respeito da regulamentação
do próprio curso superior de Serviço Social. Um dos registros encontrados
pelo autor sugere, ainda, o papel do Diretório Acadêmico de Serviço Social
de Pernambuco (DASS) como um sujeito coletivo articulador de ações:

“O Sr. Presidente, ainda no uso da palavra, no item diversos da pauta do


dia, propôs, diante do ofício recebido do Diretório Acadêmico do estado de
Pernambuco, cidade de Recife, que, se enviasse ofícios as autoridades do
governo federal e ao congresso solicitando [...] o cumprimento da lei que
regulamentou o curso (palavra não compreendida)”. Em outra passagem
do documento, “o Sr. Presidente declarou, que diante da regulamentação
oficial dos cursos de Serviço Social, e a sua publicação pela imprensa
nacional, tornou-se desnecessária a medida deliberada em reunião anterior.
Entretanto deverá ser respondido ao Diretório Acadêmico de Pernambuco,
cidade de Recife a medida tomada” (CAISS, 1954 apud SANTOS, 2007).

103 Segundo Santos (2007), o CAISS era a entidade representativa de estudantes de Serviço Social da instituição
(atual Faculdade Paulista de Serviço Social), que oferecia curso de Serviço Social apenas para o público
masculino e funcionava no mesmo prédio da Escola de Serviço Social de São Paulo, voltada para mulheres
(atual Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 137

Ainda sobre a participação no cenário nacional, em matéria do jornal


Diário de Pernambuco (17 jun. 1959), encontramos uma notícia de envio
de telegrama, por parte do DASS de Pernambuco, ao Presidente Juscelino
Kubitschek, em apoio ao rompimento do mesmo com o Fundo Monetário
Internacional (FMI)104 em junho de 1959, revelando-se a defesa de uma pers-
pectiva nacional-desenvolvimentista:

Exmo. Presidente Juscelino Kubitschek.


Através de seu Diretório Acadêmico as alunas da Escola de Serviço Social,
de Pernambuco enviam inteiro apôio ao digno ato de V. Excia. referente
ao Fundo Monetário Internacional, em defesa da economia brasileira. (a)
Marluce Cordeiro, presidente.

De acordo com Vasconcelos (2003), a década de 1960 foi um marco na


organização estudantil, quando já eram realizados encontros regionais e nacio-
nais. A União Nacional dos Estudantes (UNE), fundada no final dos anos 1930,
e que no início da década de 1950 adota um direcionamento direitista, apenas
a partir de 1956 volta a protagonizar um papel progressista. Na entrada dos
anos 1960, especialmente com a criação do Centro Popular de Cultura (CPC),
a entidade passa a incidir para além dos meios acadêmicos (NETTO, 2014).
Sobre o movimento de estudantes de Serviço Social, através de depoi-
mentos de assistentes sociais entrevistadas por Silva (1991), encontram-se
referências de que, em 1961, já ocorriam os Encontros Nacionais dos Estu-
dantes de Serviço Social (ENESS) e, em 1963, havia sido fundada a Executiva
Nacional dos Estudantes de Serviço Social (ENESSO)105 na ocasião de um
encontro realizado na cidade de Porto Alegre. Cabe destacar que, segundo
Netto (2005), durante a década de 1960, o movimento estudantil nas Escolas
de Serviço Social foi hegemonizado pela ala esquerda da Igreja Católica – ini-
cialmente, através da Juventude Universitária Católica (JUC), desdobrada, em
seguida, na Ação Popular (AP).106 Netto (2005) afirma que muitos dirigentes

104 Em resposta ao pedido de empréstimo do Governo Kubitschek, o FMI impõe ao Brasil, como condicionalidade,
a adoção de uma série de medidas contracionistas e uma reforma cambial. Esse governo, por sua vez, não
suportaria, além das medidas contracionistas, uma reforma cambial que aumentasse ainda mais o custo
de vida e colocasse em risco as bases de apoio do governo. Após um ano de negociações, o Brasil rompe
com o Fundo. Em fevereiro de 1960, com a visita ao Brasil do presidente estadunidense, Dwight Eisenhower,
o Brasil reata com o FMI, que concede empréstimo ao Brasil em maio do mesmo ano (YOUNG, 2013).
105 “A ENESS teve sua atuação até meados de 1968, quando o Movimento Estudantil sofreu perdas significativas
após o desmantelamento de sua organização política pelos militares no congresso da UNE em Ibiúna no
mesmo ano” (SANTOS, 2007, p. 112).
106 A JUC, coordenada pela Ação Católica Brasileira, se torna, no início da década de 1960, uma força dirigente
na UNE, fazendo alianças com os setores da esquerda estudantil. Após sofrer a JUC críticas e restrições,
por parte da hierarquia da Igreja Católica, cria-se a AP, para converter-se em uma organização política mais
ampla e laica (DIAS, 2009).
138

estudantis da época, com ativa militância no momento católico, integraram,


posteriormente, os quadros docentes dos cursos de Serviço Social.
Em julho de 1968, durante o Congresso da UNE realizado em Forta-
leza, foi aprovada a tese defendida pelo setor hegemônico da Ação Popular
Marxista-Leninista (APML),107 uma das muitas organizações clandestinas de
esquerda existentes no período. Segundo Abramides (2016, p. 461),

A tese sustentava que a profissão deveria ter como referência a realidade


brasileira e sua inserção no modo de produção capitalista para a formação e
o exercício profissional; expressava ainda os direitos e lutas sociais sufocados
pela forte repressão da ditadura militar e o compromisso com os trabalhadores.

O movimento estudantil se posicionava contra o Acordo MEC-USAID, a Lei


Suplicy de Lacerda (nº. 4.464, 9 nov. 1964), e o Decreto nº 477, de 26 de fev. 1969,
que materializavam o processo da reforma do ensino superior brasileiro baseado
no modelo estadunidense para os países da periferia capitalista, tidos como países
de “terceiro mundo”. Como imposições baseadas nesse modelo, frente às quais
os estudantes se levantavam contrários, Abramides (2016, p. 461) menciona:

[...] cursos de curta duração, educação a distância, com orientação tecnicista,


além de conteúdos da ideologia da segurança nacional impostos pela ditadura
militar; expulsão de estudantes que atuavam politicamente e proibição da orga-
nização política nos CAS, DCES livres, Uees e UNE colocados na ilegalidade.

Ademais, nesse contexto o movimento defendia a aliança operário-cam-


ponesa-estudantil na luta contra o regime, o imperialismo e o capitalismo, na
perspectiva da revolução social, expressando solidariedade ativa às greves
operárias de Osasco e Contagem, em julho de 1968 (ABRAMIDES, 2016).
Ainda segundo Abramides (2016), o movimento estudantil participou efe-
tivamente de atividades culturais, como o CPC da UNE e a efervescência
cultural de forte contestação no período em voga e, durante o Congresso
de 1968, algumas experiências de debates críticos à formação profissional
de orientação tecnicista e conservadora foram apresentadas.
Após 1968, mesmo com uma conjuntura adversa, marcada pelo cer-
ceamento das liberdades políticas, observam-se registros de estudantes de
Serviço Social que mantiveram suas atividades, mesmo que na condição de
clandestinidade. Diz Santos (2007, p. 113) que as ações militantes aconteciam
mesmo nas condições de abafamento político, uma vez que se encontram

107 Parte da AP assume a identidade marxista-leninista, enviesado no maoísmo, no contexto de recrudescimento


da ditadura empresarial-militar, após 1971 (DIAS, 2009).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 139

[...] evidências do contato dos estudantes com o Movimento de Recon-


ceituação na América Latina no período de 1965 a 1975 e o contato das
vanguardas estudantis com as teorias críticas. Tais vanguardas assumiram
posteriormente os postos de docências nas universidades, fundamental
para o acumulo teórico e crítico no âmbito universitário para o processo
de ruptura com o conservadorismo.

Ao final da década de 1970, inicia-se, de forma lenta, gradual e restrita,


a abertura política do Brasil, no bojo das lutas pela democratização do país
e da ebulição dos movimentos sociais. É nesse contexto que o movimento
estudantil começa a se reorganizar em âmbito nacional e são realizados alguns
encontros por área e cursos (RODRIGUES, 2008). Concomitantemente, o
MESS volta a se articular, umbilicalmente ligado ao movimento estudantil
geral através da UNE, com a realização do I Encontro Nacional dos Estudantes
de Serviço Social, em 1978, na cidade de Londrina, reunindo, aproximada-
mente, duas dúzias de cursos, e cujo tema foi O Serviço Social e a Realidade
Brasileira (ENESSO, 1994, p. 4). Mesmo com a realização de encontro nacio-
nal antes do golpe de 1964, fora convencionado calcular os ENESS a partir
da reorganização do movimento. Nesse encontro, foi formada uma comissão
nacional para a organização do II ENESS e para discussão da reformulação do
currículo mínimo para o curso de Serviço Social, expressando a necessidade
de continuidade dos debates, o compromisso com a formação profissional e
o rompimento com o conservadorismo da profissão.
Materiais confidenciais do Serviço Nacional de Informações (SNI)108
comprovam que as atividades do MESS eram vigiadas por órgãos governa-
mentais. No documento Informação Nº 656 (BRASIL, 1978), são relatadas
informações referentes ao I ENESS. Além da Escola de Londrina, o evento foi
organizado por mais sete Escolas de Serviço Social, sendo duas de São Paulo,
duas do Rio de Janeiro e uma de Belo Horizonte, outra de Vitória e a última
de Campos. Segundo o referido documento, compareceram ao evento cerca
de 800 estudantes, e o número de Escolas relatado foi de 26 instituições de
ensino, em sua maioria da região Sudeste. Da região Nordeste, participaram
apenas representantes dos estados da Bahia e da Paraíba. O sentimento de
insegurança por parte dos(as) estudantes é percebido também em trecho que
informa a mudança de local das atividades do evento pela desconfiança de
que dispositivos de gravação tivessem sido instalados por órgãos de segurança
do Estado no local anteriormente escolhido para a realização dos debates
e reuniões do movimento. Nesse ENESS, colocava-se a defesa da maioria
explorada e a necessidade de conscientização da população:

108 Criado em 1964, o órgão tinha o objetivo de superintender e coordenar nacionalmente as atividades de
informação e contrainformação, sendo o principal meio de vigilância da Ditadura.
140

Cabe ao Serviço Social a importância da tomada de uma posição política,


aproveitando as contradições existentes no sistema.
- O profissional de Serviço Social; bem como os estudantes devem atuar
dentro da realidade, isto é, apoiar as classes trabalhadoras junto as bases
e ensinar a eles a importância do papel de suas reivindicações, as quais
devem ser feitas e exigidas por eles próprios.
- Durante o debate deste tema [Conjuntura Nacional] a estudante MARIA
ALICE PAVAN (líder ativa no ME local) defendeu a posição do profis-
sional do Serviço Social para que fique ao lado dos oprimidos, porque ele
também é um oprimido e seu objetivo é conscientizar para transformar a
realidade (SNI, 1978, p. 5).

A partir desse cenário, em nível nacional, se dá o espraiamento da perspectiva


de ruptura em meio a uma conjuntura de luta intensa pela hegemonia no interior
das entidades organizativas do Serviço Social. Luta colocada publicamente com o
III Congresso de Brasileiro de Assistentes Sociais, conhecido como Congresso da
Virada, em 1979; evento que só foi possível, segundo Mota (2017), pela politiza-
ção e organização dos profissionais do Serviço Social e das instituições de ensino.
Com a reorganização do movimento, os Encontros passam a fazer parte
da agenda política dos(as) estudantes de Serviço Social, ocorrendo anualmente.
Em 1981, ocorreu o IV ENESS, sediado em Recife pela Universidade Federal do
Pernambuco (UFPE), marcado pela presença de profissionais e diversos partidos
políticos, contribuindo no debate estudantil. No nível de formação profissional,
os debates propostos evidenciavam a necessidade do rompimento com o modelo
tradicionalista norte-americano e a superação da dicotomização entre teoria e prá-
tica. É nesse encontro que se garante representatividade estudantil na estrutura da
Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS) – atual Associação
de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) – que começou a contar com
a participação de um(a) estudante por região (ENESSO, 1994).

3. As primeiras décadas do movimento estudantil


de Serviço Social em Pernambuco

Encontram-se evidências da existência do DASS na Escola de Serviço


Social de Pernambuco (ESSPE) já na década de 1950. Com sede na própria
ESSPE, e, segundo depoimento da professora Célia Castelo Branco, vice-
-presidente do DASS na década em questão, o Diretório funcionava com a
contribuição do corpo estudantil e promoção de eventos, recebendo ajuda do
Diretório Central para participação em congressos nacionais de estudantes
(PADILHA, 2008). O DASS possuía uma atuação ativa, participando de mobi-
lizações nacionais e locais e na realização de diversas atividades. Os primeiros
indícios remetem ao engajamento do DASS na movimentação em defesa da
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 141

regulamentação profissional e a solidariedade às reivindicações que se acu-


mulavam em torno das necessidades de reforma da universidade no Brasil.
Em junho de 1958, por exemplo, as estudantes de Serviço Social se uni-
ram em mobilização da categoria contra nomeações indevidas para o cargo
de assistente social ocorridas no governo do estado, quando foram nomeadas
pessoas sem habilitação profissional para a função pública (Diário de Pernam-
buco, 18 e 21 de jun. 1958). A campanha, iniciada pela Associação Brasileira
de Assistentes Sociais (ABAS), ocorreu um ano após a regulamentação da
profissão pela Lei nº 3.252 de 27 ago. 1957, que conferiu monopólio do exer-
cício profissional aos portadores de diploma. Apesar de contar com base legal,
o movimento é descrito como “insólito e descabido” pelo então secretário do
Interior e Justiça, demonstrando que havia entraves para um reconhecimento
mais amplo, perante o governo estadual, do Serviço Social como profissão.109
Em articulação com o Centro Regional da ABAS em Pernambuco, o DASS
reuniu o corpo discente da ESSPE em assembleia geral para discutir a sua
atuação diante das nomeações indevidas. Atendendo a convocatória do DASS,
presidentes dos Diretórios Acadêmicos (DAs) de outras dez Escolas e cursos
das Universidades do Recife e Católica110 também participaram da assembleia.
Na ocasião, segundo a presidente do DASS, Maria de Fátima Assunção, a
categoria, com o apoio dos universitários de outras Escolas, deveria manter-se em
“atitude de protesto e vigilância”. Ainda conforme a discente, “[...] era a política
surgindo para desmoralizar as profissões universitárias, que demandavam anos
e anos de trabalho e estudos e deviam ser colocadas aos abrigos das manobras
eleitoralistas” (Diário de Pernambuco, 21 jun. 1958, p. 8). Como encaminha-
mentos da assembleia, fora decidido enviar telegramas a todos os DAs de Serviço
Social do país, pedindo a solidariedade da classe, além de ter sido redigida nota
pública de protesto, assinada pelos representantes dos DAs presentes.
Já em 1960, o DASS aderiu à greve estudantil nacional em apoio aos
estudantes baianos em protesto contra o reitor Edgar Santos. Iniciado na Bahia,
o movimento teve como estopim a instalação de um grupo de estudantes
estadunidenses numa residência estudantil, construída para essa finalidade,
109 Antes da Lei 3.252/1957, o Serviço Social em Pernambuco contava com a Lei Estadual n. 427, de 31 de dez.
1948, que criou cargos isolados de Assistentes Sociais e na entrada da década seguinte, a Lei estadual de
n. 965, em 14 de dez. 1950, que dispôs sobre as nomeações para os cargos de Assistentes Sociais a serem
criados pelo estado e suas autarquias. A partir dessa última, as nomeações para os cargos foram condicionadas
àqueles que possuíssem diploma de Assistente Social – ainda podendo ser admitidos como contratados alunas
da ESSPE, exigindo-se, nesse caso, a conclusão do curso no prazo regulamentar. Além disso, existiam marcos
legais referentes à constituição de normas e agências para uma padronização e racionalização do ensino em
nível nacional (Lei n. 1.889, de 13 jun. 1953 e o Decreto 35.311, de 2 abr. 1954) (SILVEIRA Jr., 2020).
110 Participaram da Assembleia Geral do dia 19 de junho os presidentes dos seguintes DAs: Enfermagem Nossa
Senhora das Graças; Escola de Enfermagem do Recife; Escola de Engenharia; Faculdade de Ciências
Médicas de Pernambuco; Escola Politécnica da Universidade Católica; Escola de Belas Artes; Farmácia
da Universidade do Recife; Escola Superior de Química da Universidade do Recife; Ciências Econômicas
da Universidade Católica; Faculdade de Filosofia do Recife.
142

enquanto os estudantes baianos reivindicavam maior investimento na política


de assistência estudantil, especialmente na melhoria da moradia estudantil e
alimentação (BRITO, 2008). A greve atingiu outros estados e contribuiu para
colocar em pauta nacional a questão da reforma universitária.
Em Pernambuco, o movimento obteve grande adesão dos círculos universi-
tários, homologando a decisão da UNE, que pretendia, através de greve nacional,
o atendimento das reinvindicações estudantis pelo Ministério da Educação (Diário
de Pernambuco, 11 de ago. 1960) (ver imagem a seguir). Entre 20 e 27 de maio
de 1961, a UNE organizou o I Seminário Nacional de Reforma Universitária
em Salvador. Como resultado desse seminário, foi construída a Declaração da
Bahia, em que, pela primeira vez, os estudantes universitários formularam uma
opinião sistemática sobre a situação da universidade no país (FÁVERO, 2009).

Editora CRV - versão final do autor - Proibida a impressão e comercialização


Em Greve Diversas Escolas Superiores

Fonte: Diário de Pernambuco, 11 ago. 1960.


A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 143

Entre a década de 1950 e início de 1960, o DASS posicionava-se a


favor do nacional-desenvolvimentismo, seguindo a tendência geral do
movimento estudantil, conforme demonstram as matérias do Diário de
Pernambuco. Além da citada publicação da carta de apoio a Juscelino
Kubitschek, encontramos outra notícia sobre a realização da Semana de
Interpretação do Serviço Social na ESSPE, em 1961, que corroboram com
tal afirmação. O evento tinha como objetivo “[...] a criação de estruturas
condizentes com o desenvolvimento integral da pessoa humana” (Diário
de Pernambuco, 24 set. 1961, p. 5) (ver imagem abaixo). Em entrevista
concedida ao jornal, Maria de Lourdes Antunes, presidente do DASS,
relata durante o evento:

Sentimos que a sociedade está vivamente despertada para os diversos


problemas dos países subdesenvolvidos e bem assim para que sejam
reformuladas estruturas. A criação de organismos como a SUDENE
representa uma grande esperança para a região e, de um modo especial,
para o Recife.

Em outro trecho, a estudante aponta o papel do Serviço Social na reso-


lução dos problemas advindos da condição de subdesenvolvimento, desta-
cando o uso do método de Organização e Desenvolvimento de Comunidade:

Quando o desenvolvimento e a mudança da sociedade constituída de


poucos privilegiados é a preocupação de todos, os estudantes e inte-
lectuais ficam interessados em promover reformas para o bem comum.
É necessário que se conheça o papel do Serviço na solução dêsses
problemas, principalmente no campo de Organização e Desenvolvi-
mento de Comunidade, através de um trabalho junto ao povo, conhe-
cendo melhor seus pontos de vista e partindo, com êle, para o sucesso
da iniciativa. Várias experiências feitas têm demonstrado excelentes
resultados (Diário de Pernambuco, 1961, p. 5).

O evento também contou com a presença de Dom Távora, arcebispo


de Aracajú, convidado para ministrar uma palestra sobre as Experiências
de Serviço Social em Programas de Educação de Base.
144

Estudantes da ESSPE concedendo entrevista ao jornal Diário de Pernambuco

Fonte: Diário de Pernambuco, 24 set. 1961.

A adesão às ideias desenvolvimentistas no meio estudantil do Serviço


Social era corroborada também pela participação de discentes da ESSPE nos
eventos pan-americanistas. A delegação estudantil tomou parte no II Congresso
Brasileiro de Serviço Social, no Rio de Janeiro, promovido pelo Comitê Bra-
sileiro de Conferência Internacional do Serviço Social (CBCISS)111 em 1961.
Participaram do evento, como representantes de Pernambuco, cinco estudantes
da Escola e profissionais do Serviço Social da Indústria (SESI), Divisão de
Tuberculose, Associação Nordestina de Crédito e Assistência Rural, dentre
outros espaços (Diário de Pernambuco, 28 de mar. 1961). O evento teve
como tema central Desenvolvimento Nacional para o Bem-estar Social e teve
o caráter de ato preparatório para a XI Conferência Internacional de Serviço
Social, marcada para acontecer em Petrópolis, em 1962. Segundo Iamamoto
e Carvalho (2014), neste Congresso ocorre a adesão das entidades represen-
tativas do Serviço Social ao desenvolvimentismo, mantendo-se dentro dos
limites do projeto governamental de Jânio Quadros.

111 Depois renomeado como Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais (CBCISS).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 145

O espraiamento do pensamento desenvolvimentista está vinculado à ten-


tativa dos países de capitalismo central de responder à tomada de consciência
nas periferias e semiperiferias do capital acerca do subdesenvolvimentismo,
despertada com os deslocamentos dos mesmos na divisão internacional do
trabalho. Segundo Netto (2013), as lutas sociais intensificadas nos anos 1950-
1960 nas regiões da Ásia, na África e na América Latina dinamizaram posições
anti-imperialistas e anticapitalistas e promoveram mudanças em instituições
até então inteiramente conformadas com o status quo. Assim, forçaram a
emergência de organizações supranacionais, de forma a promover o desenvol-
vimento, cruzada que se expressou nas “ideologias desenvolvimentistas”. No
Serviço Social dos países da periferia, o desenvolvimentismo abriu a via para
que os assistentes sociais deixassem a condição de “apóstolos” para assumir a
posição de “agentes da mudança”.112 Em curto prazo, os limites da “mudança
social” reformista conservadora foram compreendidos por esses profissionais,
que radicalizaram as suas propostas profissionais, transcendendo o campo do
promocionalismo e avançando na crítica do assistencialismo.
No Nordeste, devido à conjuntura dos anos 1950-1960, marcada pelo
nacional-desenvolvimentismo e articulação das Escolas de Serviço Social em
processos socioinstitucionais que demandavam ações no campo da educação
popular, emergem movimentos de caráter progressista no Serviço Social. Mota
(2019) afirma que as demandas postas à categoria profissional foram travejadas
tanto pela ação social da Igreja Católica quanto pelo Estado, almejando a reali-
zação das Reformas de Base, num contexto de intensa movimentação política.
Ainda segundo Mota (2019), a região vivenciava um processo de industria-
lização tardia e capitalização do campo, esfera em que se concentrava a maior
parte da população brasileira até então. Desde o levante comunista de 1935, o
Nordeste foi palco de uma ofensiva do anticomunismo por parte do Estado e da
Igreja, acirrada nesse período por conta das Ligas Camponesas, e expansão do
método de alfabetização de Paulo Freire, professor da ESSPE, que impulsionou
o movimento de educação popular com forte influência no Serviço Social.
Sobre as reinvindicações estudantis em meados dos anos 1960, Celina
Leite (2019), aluna da ESSPE na primeira metade da década, aponta que as
demandas não se restringiam às pautas dos estudantes. Em suas mobilizações,
os estudantes reivindicavam a reforma universitária, mas também a reforma
agrária, jurídica e bancária. Também relata que o movimento tinha ligações

112 De acordo com Netto (2013), a noção de “mudança social” (quase sempre articulada à de “moderniza-
ção”) está vinculada ao pensamento sociológico funcionalista norte-americano sobre o Serviço Social
nos anos 1950-1960. Ainda segundo o autor: “Construiu-se, à base daquele pensamento, uma ‘sociologia
do desenvolvimento’ segundo a qual a ‘solução’ para o subdesenvolvimento, implicando ‘mudança social’
e ‘modernização’, era sobretudo um equacionamento ‘técnico’, demandando essencialmente um eficaz
‘planejamento social’” (2013, p. 21, nota).
146

com o grupo de mães chilenas, existente durante o governo de Eduardo Frei


Montalva, presidente do Chile entre 1964 e 1970, e com movimentos sociais
franceses, recebendo bastante influência destes.
Em depoimento de ex-alunas, o ambiente da ESSPE é comumente des-
crito como um espaço aberto ao debate político e movimentação dos estudan-
tes. Ainda segundo Celina Leite (2019), na Escola era possível a realização de
reuniões, grupos de estudo, encontros regionais e discussões com estudantes
de outras faculdades e escolas de ensino superior em Recife:

A Escola realmente era como me disseram: Aqui, a origem da palavra


escola é o lugar do ócio, lugar de pensar. Então eu vivi esse privilégio,
porque a escola era aberta, tanto para estudos da gente, quanto para reu-
niões, como para encontros. Tanto que chamavam até de Moscouzinho.
[...] Na época da Ditadura, tinha os alunos, um bom grupo, Serviço Social,
Arquitetura, Ciências Médicas, Agronomia [...] (LEITE, 2019).

Tal ambiente mostrou-se favorável para a construção da consciência


política das estudantes de Serviço Social no estado e o incentivo à tomada
de posicionamento, por parte das assistentes sociais em formação, negando a
pretensa neutralidade profissional. Rosalina Santa Cruz, estudante da ESSPE
na década de 1960 e ex-militante da JUC e da AP, afirma, ao ser questionada
sobre se a ESSPE poderia ser considerada um lugar propício para a movi-
mentação estudantil e a construção de uma consciência política libertária:

Nessa perspectiva, sim, tanto nas aulas como no compromisso... Pelo


menos nas aulas de serviço social, a gente tinha muito claro, eu acho,
nas nossas aulas, a necessidade de se ter um compromisso com a classe
trabalhadora. De uma assistente social que se forme assim: estou do lado
dessa classe, estou comprometido com o projeto, vou construir uma outra
alternativa. Era também pela profissão, não era uma coisa só da militância
pessoal e política. Eu acho que havia assim, entre a gente, a discussão
de que se poderia juntar a política militante e o serviço social; conseguir
também dar uma resposta (SANTA CRUZ, 2002, p. 4).

Rosalina Santa Cruz também informa, em outro momento, outros aspectos


da sua participação no movimento estudantil e da formação política existente:

A minha formação na universidade foi muito rica, tanto nos grupos de


estudo quanto na própria formação que a faculdade dava; a participação
da gente no movimento estudantil, em congressos, em encontros. Como
eu tinha uma vinculação com a JUC, e depois com a AP, durante o pro-
cesso de estudante... Porque aí a gente começou a discutir a questão do
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 147

marxismo e tal, e nos filiamos à AP. Então é um período onde eu participei


muito. Participei muito de encontros, participei das lutas assim... lutas
populares, passeata dos cinqüenta mil, que lá não foi cem mil (SANTA
CRUZ, 2002, p. 3).

Como visto, na Igreja Católica temos a formação da JUC, que deriva da


Ação Católica, e se renova e passa a respirar sob o clima da convocação do
Concílio Vaticano II113 e que, depois, há um desdobramento político radica-
lizado na AP. Para Evany Mendonça, diretora da ESSPE entre 1961 e 1971,
o período em que esteve no cargo foi marcado pela efervescência de movi-
mentos populares, e a ESSPE contava com núcleo organizado da JUC como
a ala mais progressista da Escola:

Nós tínhamos na Escola um núcleo de JUC, que era um núcleo muito


avançado em termos de posição diante da realidade e tudo. Era membro
do conselho técnico da Escola membro e coordenador assistente de JUC,
o professor Almeri Vieira de Melo. Grande amigo meu, até hoje. Nessa
ocasião já se tinha uma posição dentro da Escola muito crítica em relação
à realidade. Paulo Freire era professor da Escola e declara isso em vários
de seus livros (MENDONÇA, 2002, p. 22).

O professor e padre Almeri Bezerra114, citado por Evany Mendonça,


é apontado como um dos mais dedicados coordenadores da JUC e um dos
articuladores para o surgimento da AP (SALDANHA, 2019). Foi de sua res-
ponsabilidade a elaboração de documento a ser lido no Encontro da JUC
realizado em 1962, em Belo Horizonte, sendo este documento, transformado
em discurso, considerado como marco fundador da AP.115 Em sua fala, Celina
Leite confirma a forte presença da Ação Católica na ESSPE:

Então, era o pessoal da Ação Católica, todo mundo altamente motivado


por uma causa mais profunda. Basta dizer quem conheceu... Parecia paró-
quia, porque eu tinha 3 professores padres: [...] Almeri Bezerra, Padre
Luiz Carlos, Padre Guedinho [...] e quem não era padre, era da Ação
Católica. Esses padres todos assessoravam a Ação Católica. Almeri era
da Juventude Universitária, Luiz Carlos era Juventude Operária, porque
era JAC, JEC, JIC, JOC e JUC – e que a Ditadura acabou com essa. JAC

113 Anunciado pelo Papa João XXIII em 1959, o Concílio Vaticano II consistiu numa série de conferências
realizadas para modernizar a igreja, realizadas entre 1962 a 1965.
114 Apesar de ter sido citado como Almeri Vieira por Evany Mendonça, ao longo das pesquisas, cremos que se
trata de Almeri Bezerra de Melo, também citado por Celina Leite (2019).
115 No encontro realizado em Belo Horizonte foi escolhido o nome Ação Popular. No entanto, foram encontradas
divergências quanto ao marco fundador da AP. Alguns autores consideram o Encontro realizado no ano
seguinte, em Salvador, como verdadeiro marco (MENDES Jr., 1982).
148

– Juventude Agrária, JEC – Juventude Estudantil Secundarista, JOC –


Juventude Operária, JIC – Juventude Independente e JUC – Juventude
Universitária Católica. A força desse movimento era a sua metodologia
que é “Ver, julgar e agir”. Então, para nós do Serviço Social, era uma força
muito grande a metodologia. Paulo Freire dizia que a força desse curso
é que “coloca o aluno em contato com a realidade logo no começo”. [...]
Aí nesse tempo tinha da Ação Católica: Evany Mendonça (JIC), Lourdes
Morais (JIC), Dolores Coelho (JIC), Paulo Freire (JIC), Paulo Rosa (JIC),
Augusto Burle (JIC) (LEITE, 2019).

Apesar de partirmos da compreensão de que os anos de 1950 marcam o


estágio de desenvolvimento do Serviço Social (em níveis regional e nacional),
no qual se verifica o processo de laicização e ruptura do Serviço Social com
as formas filantrópicas e confessionais desenvolvidas desde a sua emergência
na sociedade burguesa, percebe-se, com base nos dados primários, ainda a
forte influência da igreja. A presença da Igreja Católica representa um traço
de continuidade do Serviço Social com as protoformas que o antecederam,
porém, nas falas das entrevistadas, o domínio da igreja apresentava-se de
forma mais sutil do que nas outras Escolas, representando uma particularidade
local. Desde o seu início, o grupo de juristas, médicos e padres, fundador da
ESSPE, inscrevia-se na ala mais progressista da igreja (e mesmo leiga), com
cariz humanista (PADILHA, 2008).

Era bem claro para nós [diz a ex-diretora da ESSPE, Evany Mendonça]
que isso não tinha vínculo apostólico. A Escola não era por aí. Era um
pessoal católico de Lourdes Morais, mas o trabalho não era de apostolado.
Era um trabalho leigo, tinha que se respeitar a liberdade de cada um e não
tinha nada que ver com apostolado (MENDONÇA, 2002, p. 21).

Com a instalação da autocracia burguesa, a partir do golpe de 1964, foram


sufocadas as primeiras iniciativas críticas que, durante o período desenvol-
vimentista, tiveram lugar nos trabalhos comunitários e de educação popular.
Derrotada politicamente em 1964, a esquerda conquista hegemonia no âmbito
da cultura, seja na arte, teatro, música, na universidade e no movimento estu-
dantil. Como aponta Abramides (2016), são desse período as peças teatrais:
Eles Não Usam Black-tie, Arena Conta Zumbi, Arena Conta Tiradentes, Gra-
cias Señor, Feira Paulista de Opinião, Liberdade liberdade, Gota d’água,
Roda viva e o Morte e Vida Severina; e as músicas de contestação de canto-
res como Chico Buarque de Holanda, Geraldo Vandré, Edu Lobo e Sérgio
Ricardo. A autora também destaca o uso da canção Pra não dizer que não
falei de flores, de Geraldo Vandré, como hino de resistência dos estudantes
presos no XXX Congresso da UNE em Ibiúna, enquanto se deslocavam entre
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 149

o local do evento e os ônibus e caminhões que os levariam para o presídio,


percorrendo a pé cerca de 14 quilômetros.
Enquanto existia abertura legal para manifestações culturais, o DASS,
em conjunto com o DA de Medicina, promoveu a encenação do livro Morte
e Vida Severina, escrito entre 1954 e 1955 por João Cabral de Melo Netto
(Diário de Pernambuco, 10, 12, 15 e 17 dez. 1965) (ver imagem abaixo). De
enredo crítico e centrado na figura do retirante sertanejo que segue o Rio Capi-
baribe em direção a Recife, a peça utiliza como pano de fundo a inserção do
Nordeste na transformação capitalista dependente, as relações entre as classes
sociais e denuncia a exploração e opressão às quais a classe trabalhadora era
submetida, em especial, os trabalhadores rurais.

Divulgação da peça Morte e Vida Severina

Fonte: Diário de Pernambuco, 10.12.1965. A notícia se repete


em 12.12; 15.12 e 17.12 deste mesmo ano, 1965.

Na ESSPE, parece não ter se aplacado de modo intenso as medidas


punitivas da ditadura sobre o corpo discente e docente da Escola em com-
paração a outras instituições de ensino superior. Apenas poucos professores
tiveram que se afastar do ensino ou se exilar do país, posto suas ligações mais
estreitas com a JUC e movimentos populares, alguns com projeção nacional
(VIEIRA, 1992, p. 168). Mas Evany Mendonça destaca que a Escola não
estava isenta da vigilância do militares:

Era 1968, e como a Escola era universitária [no sentido de abrigar um


curso de ensino superior], tinha um espaço, mas não era da universidade,
era mais livre. Eu fui chamada uma vez. Não posso dizer que sofri perse-
guição visível: era vista de longe. Mas eu fui chamada no quartel-general,
[...] [sendo questionada] “A sua Escola está em greve?” “Está. Todas as
150

Escolas universitárias, no Recife, estão em greve.” “Os seus alunos estão


dando alguma alteração?” “Não. Não havia alteração especial não. Estão
em greve.” “A senhora precisa de alguma ajuda?” “Não. Nenhuma. De
jeito nenhum.” “Se precisar de qualquer coisa...” “Tudo bem, muito obri-
gada.” E saí dali. (MENDONÇA, 2002, p. 24).

No início de 1968, de acordo com Abreu e Lima (2008, p. 175), ocorre-


ram diversos protestos organizados por estudantes no Brasil, com as seguintes
demandas: “[...] por mais vagas, mais verbas, contra aumento no preço das
refeições dos restaurantes universitários, por mais democracia nas universi-
dades e contra decisões arbitrárias de reitores e professores, contra os acordos
MEC-USAID”. Já no segundo semestre do ano, os atos e greves se tornaram
cada vez mais difíceis com o endurecimento das restrições a passeatas. Dentre
os atos ocorridos ao longo do ano, identificamos duas grandes mobilizações
estudantis em Pernambuco, as quais Evany Mendonça pode estar fazendo
referência no depoimento anterior. A primeira, uma greve ocorrida no mês de
março de 1968, teve como principal causa o aumento de 1.000% no valor das
refeições oferecidas no restaurante da Universidade Rural de Pernambuco e se
estendeu devido à reação da reitoria, que adotou uma postura repressiva desde
o início das mobilizações, tentando enquadrar os organizadores no Decreto
Aragão (ABREU; LIMA, 2008).116 Na data da matéria, o período em greve
já se estendia por 17 dias. No mesmo documento, os estudantes denunciam
perseguições movidas contra lideranças estudantis da universidade. Com
exceção de Administração, Biblioteconomia, Enfermagem, Farmácia, Direito
e a Faculdade Frassinetti do Recife, as demais escolas e faculdades da Univer-
sidade Federal de Pernambuco (UFPE) se unem ao movimento grevista em
solidariedade aos estudantes da UFRPE e por demandas específicas ao corpo
discente da UFPE, como a manutenção do preço das refeições no restaurante
universitário (Diário de Pernambuco, 22 e 23 mar. 1968).
Outro movimento grevista, realizado em outubro do mesmo ano, ocorreu
em advertência contra possíveis punições a estudantes acusados de invadirem
o gabinete do reitor Murilo Guimarães da UFPE ao reivindicarem mais recur-
sos para o Hospital Pedro II. Em diversos pontos de Recife foram realizados
comícios relâmpagos, com a participação de presidentes de DAs e estudan-
tes secundaristas. Numa das manifestações, Bernardo Jofili, presidente da
União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), foi preso (Diário de
Pernambuco, 11 de out. 1968). Neste último movimento, não encontramos
menção ao DASS nas matérias do Diário de Pernambuco.

116 Decreto-Lei n. 228, de 28 de fev. de 1967, conhecido como “Decreto Aragão” devido ao nome do ministro da
educação que o promoveu, Raimundo Muniz de Aragão. O decreto-lei alterava a Lei Suplicy, aumentando
o controle sob as atividades estudantis.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 151

O ano de 1968 é retratado por Fávero (2009) como um momento de


protestos da juventude, com sérias crises e violentas manifestações estudantis
em diversos países. Segundo a autora, no Brasil, fatores internos conjugam-se
e contribuem para reforçar esse movimento quase mundial de mobilizações,
como a situação econômica e política vivida no país e a tendência à privatização
do ensino superior. As passeatas desse ano revelam a organização maior por
parte dos estudantes, possuindo como pauta a falta de recursos, oposição aos
acordos estrangeiros e contra a repressão. Contudo, Fávero (2009) aponta que
a morte do estudante secundarista Edson Luís, no restaurante do Calabouço no
Rio de Janeiro, em 28 de março, provoca mudanças no caráter das mobilizações
e do próprio movimento estudantil. No dia seguinte ao assassinato, entram em
greve estudantes em vários estados, notas são distribuídas por DAs apoiando o
movimento e declara-se luto oficial. O episódio convulsiona o país, impelindo
protestos de enfrentamento ao regime, com destaque para a realização da Pas-
seata dos Cem Mil em 26 de julho de 1968.117 Diz Fávero (2009, p. 76-77):

A partir de abril de 1968, recrudesce a crise estudantil com manifestações


de rua e choque entre estudantes e policiais. O governo restringe as ver-
bas das universidades. Entre as reivindicações específicas dos estudantes
universitários, destacam-se reforma universitária, mais verbas, rejeição
da proposta de transformar as universidades autárquicas em fundações.
São constituídos, na maioria das instituições, grupos de professores e de
alunos visando analisar, em conjunto e com maior profundidade, a situação
da universidade, não apenas em face das medidas impostas, mas, também
relacionando-as com o processo político global. Do trabalho desses grupos
amplia-se a consciência de que a contestação da situação universitária
implica a contestação das estruturas dominantes na sociedade brasileira.

Na ESSPE, Evany Mendonça menciona o interesse, por parte das estu-


dantes, por uma estratégia política de luta de ação direta. Outra questão, apon-
tada pela mesma, foi a presença de tendências conservadoras e progressistas
que conviviam contraditoriamente no mesmo espaço da Escola, refletindo
as contradições existentes na realidade histórica da época. Num contexto
de expressivas mudanças na relação de forças com o movimento de 1964, é
fortalecida uma ala esquerda da Igreja que passa a influenciar contingentes
maiores de profissionais da categoria, seja pela sua convivência no interior do

117 Após a passeata dos Cem mil no Rio de Janeiro, realiza-se no dia 2 de julho do mesmo ano em Recife, “[...]
uma mobilização expressiva de cerca de quinze mil pessoas, com a presença, aqui também, de padres e freiras,
artistas e intelectuais, parlamentares, trabalhadores, com direito a vários discursos e a queima da bandeira
dos Estados Unidos, sem repressão e com a Polícia Militar nos quartéis” (ABREU; LIMA, 2008, p. 177).
152

bloco católico, seja por meio das Escolas e do movimento estudantil (IAMA-
MOTO; CARVALHO, 2014).118 Recorda Evany Mendonça:

Eu me lembro, por exemplo, que, a partir de um determinado momento, na


Igreja, a chamada ala progressista tomou uma posição muito avançada. O
pessoal da JUC mesmo, que foi o que deu origem à AP, tinha uma posição
que era muito avançada. Mas também era muito dividida. Então tinha aquele
grupo que era mais avançado e tinha aquele grupo extremamente retrógrado.
E nós, que éramos dentro da Escola o grupo avançado – porque dentro da
Escola, na universidade, em todo canto a gente teve o grupo que era con-
siderado de esquerda, o grupo que era considerado mais reacionário, mais
conservador – queríamos discutir as transformações com mais ênfase. Aí
veio a história da luta armada. Então isso era uma coisa muito questionada.
E nós sentíamos que a Igreja como um todo, até como esse movimento
mesmo, tinha um certo medo desse tipo de coisa.[...] E entravam coisas na
Escola que nem eu me dava conta! Eu já como diretora, de repente vinha
uma pessoa assim: ‘Olha, eu posso fazer uma reunião aqui na Escola e tal...’
Isso aí já depois do Golpe de 1964. Estava sob o regime. ‘Eu vou fazer uma
reunião aqui na Escola.’ ‘Reunião do quê?’ O cara que era do Ceará, era
jornalista, trabalhava na ABM, sei lá, um nome assim. E que era ligado ao
não sei quê. E aí queria fazer uma palestra na Escola. ‘Mas palestra de quê?’
‘A gente vai discutir a realidade.’ ‘Posso assistir?’ ‘Pode!’ Aí eu fui. Quando
eu vi, tinha mapa, era negócio de guerrilha! (MENDONÇA, 2002, p. 23).

Segundo Abreu e Lima (2008), parte das lideranças estudantis, inclusive


secundaristas, tornaram-se militantes de partidos clandestinos. As possibilida-
des de realização de ações de massa já estavam limitadas antes do AI-5; depois
da sua publicação, foram cerceadas ao extremo. Concomitante à radicalização
de segmentos da juventude, ocorre o contato dos mesmos com uma literatura
mais crítica, encontrando-se no movimento estudantil um espaço de forma-
ção e debate nesse sentido. Rosalina Santa Cruz relata o seguinte sobre esse
contato, a partir de sua trajetória como estudante da ESSPE entre 1963-1967
e participante do DASS:

118 Celina Leite (2019) menciona a sua presença no enterro do Padre Antônio Henrique Pereira, torturado
e morto pelo grupo do Comando de Caça aos Comunistas em 1969. Na ocasião, estudantes e pessoas
vinculadas ao Padre Henrique foram presas e tinham faixas denunciando as atrocidades do regime militar,
com os dizeres “A ditadura que baleou Candido, matou o padre Henrique”. O cartaz também fazia referência
à tentativa de assassinato de Cândido Pinto, presidente da União dos Estudantes de Pernambuco (UEP),
ocorrida no mesmo ano e que o deixou paraplégico. Na entrada do Cemitério da Várzea, um enorme aparato
policial aguardava a chegada do caixão e o grande público que acompanhava o cortejo desde o bairro
do Espinheiro até o cemitério. Para evitar um confronto entre os militares e os militantes presentes, Dom
Helder Câmara pediu, como homenagem ao Padre Henrique, que todos saíssem em silêncio. O relato de
Celina, de certa forma, demonstra a influência e a articulação da ala progressista do bloco católico com o
movimento estudantil.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 153

Então, rapidamente, eu me integrei no marxismo, rapidamente eu comecei


a ler, a acompanhar o debate... Já nesse momento, e logo depois... desse
final, de luta armada, luta de massas, sociedade socialista, caminhos para
a revolução. Isso foi muito discutido. Nessa época, eu sei que eu li... Eu
comecei lendo os clássicos que vinham de uma formação mais religiosa,
não é. Então comecei a ler... Michel Quoist... Estou me lembrando. Carl
Rogers. Esse... “Encontro de Marx e Cristo”. Aí depois... Aí foi a leitura
de JEC. E comecei a ler, junto com outras pessoas, “O Capital”, depois,
Marta Hanecker... a Marta, o próprio Marx, alguns textos do Mao, alguns
textos sobre a prática, e fui entrando numa discussão assim. E depois,
nesse período também, já me chegou às mãos o Debret, com a questão da
luta armada, o... como é? O da luta armada. O chinês lá... O Giapp. [...] O
Guevara também. O diário do Che (SANTA CRUZ, 2002, p. 6).

Com o AI-5 e a Reforma Universitária de 1968, os sujeitos politicamente


ativos refluem para a ação clandestina ou para a ação possível na legali-
dade, mas a sua formação está hipotecada no pré-1968 (NETTO, 2005). Em
finais de 1960, essas tendências passam a ser sufocadas ao mesmo tempo
em que a ESSPE é incorporada à UFPE, onde o controle policial-militar
era institucionalizado.

4. Considerações finais

A partir da década de 1950, encontramos, não apenas evidências da


organização estudantil de Serviço Social na ESSPE através do DASS, mas
também vestígios de que a entidade ensejava articulações nacionais em torno
da regulamentação no ensino. Alguns dos primeiros indícios remetem também
ao engajamento do DASS na movimentação em defesa da regulamentação pro-
fissional e na solidariedade às reivindicações dos estudantes baianos; reivin-
dicações essas que, rapidamente, galvanizaram as forças que se desdobraram
no movimento pela reforma da universidade no Brasil. Em todo caso, entre
finais de 1950 e início de 1960, o conteúdo político-ideológico das posições
do DASS equalizava-se com a perspectiva nacional-desenvolvimentista.
Num contexto de expressivas mudanças nas relações de forças, provo-
cadas pelo golpe de 1964, observa-se uma radicalização de segmentos da ala
esquerda da Igreja que passa a influenciar contingentes maiores da categoria
e do corpo discente do Serviço Social. No caso do movimento estudantil,
evidencia-se a presença majoritária da JUC, que manifesta sua radicalização
quando quadros importantes se projetam para a criação da AP. Nesse momento,
o DASS em Pernambuco promove manifestações culturais e se envolve cada
vez mais nos protestos e greves que defendiam uma educação pública e de
154

qualidade, mas que também contestavam o próprio regime imposto. Sobre o


período que se abre a partir da promulgação da Reforma Universitária e do
AI-5, em 1968, e a incorporação da ESSPE à UFPE, em 1971, as evidências
acerca das movimentações políticas do MESS no estado se tornam escassas,
sendo um período que deve ainda ser explorado em pesquisas mais profundas.
A monografia de Umbelina Maria Urias Novais, intitulada O movimento
estudantil e a formação profissional dos estudantes de Serviço Social (1982),
nos traz indícios do que pode ter ocorrido no MESS em Pernambuco após a
integração da ESSPE à UFPE. Diz Novais (1982) que, entre 1968 e 1979, o
MESS na UFPE estava desmobilizado, provavelmente sem o funcionamento
regular de uma entidade estudantil do curso de Serviço Social. O marco da
reorganização do MESS no estado teria ocorrido com a participação de estu-
dantes (não organizados) no II ENESS, em Salvador, no ano de 1979. Novais
(1982) ressalta a integração entre os cursos de Serviço Social da UFPE e da
Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) para garantir a participação
das estudantes no evento. Após esse II ENESS, as discentes teriam desper-
tado o processo de reorganização na UFPE, inicialmente pela formação do
Conselho de Representantes de Turma, além da realização de pesquisa sobre
o histórico do DASS e estudo para discussão e elaboração do estatuto da enti-
dade. Em 1980, representações discentes do estado participaram do I Encontro
Regional de Estudantes de Serviço Social (ERESS) em Campina Grande. Na
ocasião, ocorreram debates sobre o processo de organização do MESS em cada
Escola; e a UFPE aparecia como a única instituição em que a reconstrução
do Diretório Acadêmico estava em curso de forma mais avançada. Ao final
do I ERESS, o curso da UFPE foi eleito polo da Região 2, que congregava
Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. Novais (1982) relata o
engajamento do DASS em diversas iniciativas importantes até 1982, como
o 34º Congresso da UNE, um dos congressos da UEP e discussões sobre o
cenário político de reabertura democrática, expressando a articulação com o
movimento nacional, estadual e de luta em defesa da democracia.
Através do resgate dessa história, visamos reunir aportes para ampliação
da produção teórica e, consequentemente, para o avanço da reconstrução his-
tórica e coletiva do MESS. No atual contexto de aprofundamento da crise do
capital, com rebatimentos diretos sobre as formas de organização e resistência
da classe trabalhadora, nos deparamos com um cenário de desafios no interior
do MESS, expressos nas desarticulações e desmobilização das suas bases e
direções, tanto a nível nacional quanto regional, reafirmando a necessidade
de seu fortalecimento enquanto sujeito político coletivo.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 155

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10 diretórios acadêmicos apoiam a campanha das assistentes sociais. Diário


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APOIO dos alunos da E.S.S. a JK. Diário de Pernambuco, Recife, ano 134,
n. 137, p. 3, quarta-feira, 17 junho de 1959.

EM Greve Diversas Escolas Superiores. Diário de Pernambuco (Primeiro


caderno), Recife, ano 135, n. 179, p. 9, quinta-feira, 11 agosto de 1960.

ESTUDANTES no cong. de Serviço Social. Diário de Pernambuco (Primeiro


caderno), Recife, ano 136, n. 71, p. 6, terça-feira, 28 março de 1961.

ESTUDANTES promovem Semana de Interpretação do Serviço Social: Expo-


sição e palestras. Diário de Pernambuco (Primeiro caderno), Recife, ano 136,
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A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 159

“MORTE e Vida Severina”. Diário de Pernambuco, Recife, ano 140, 10, 12, 15
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COMISSÃO parlamentar vai esclarecer motivos da greve na Universidade


Rural. Diário de Pernambuco (Primeiro caderno), Recife, ano 143, n. 66,
p. 6, sexta-feira, 22 março de 1968.

GREVE terminou ontem em algumas faculdades, mas começou em outras.


Diário de Pernambuco (Primeiro caderno), Recife, ano 143, n. 67, p. 6,
sábado, 23 março de 1968.

CONSELHO universitário reúne-se hoje para punir invasores da reitoria da


UFPe. Diário de Pernambuco (Primeiro caderno), Recife, ano 143, n. 237,
p. 6, sexta-feira, 11 outubro de 1968.
CAPÍTULO 7
O TRABALHO DO SERVIÇO
SOCIAL COM A CLASSE OPERÁRIA
EM PERNAMBUCO ENTRE AS
DÉCADAS DE 1950-1960
Larissa Ranielly Lima Dias
Lenita Maria Maciel de Almeida

1. Introdução

O objetivo deste estudo é apreender as características e significados


da atuação dos/as assistentes sociais com a classe operária em Pernambuco
entre as décadas de 1950 e 1960. Esta análise utiliza estratégias da pesquisa
documental e bibliográfica, e está fundada na perspectiva teórico-metodoló-
gica crítico-dialética. O principal material empírico do estudo consistiu em
dez Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs) da Escola de Serviço Social
de Pernambuco (ESSPE), a partir dos quais buscamos determinar: as práticas
utilizadas na intervenção profissional com os operários e suas famílias; os
principais referenciais teóricos mobilizados nas mesmas; e as ideologias que
embasaram o pensamento e prática das profissionais em formação. Os TCCs
escolhidos relatam as experiências de trabalho e estágio em Serviço Social
no interior de duas entidades diretamente voltadas ao público operário em
Pernambuco: o Serviço Social da Indústria (SESI) e o Instituto de Aposenta-
doria e Pensão dos Industriários (IAPI).
Através de seus TCCs, Maria Adélia Collier (1955), Maria Angélica
Collier (1955), Cornelia de Paula Gomes (1958) e Terezinha de Jesus Oliveira
(1960) descrevem as ações desenvolvidas no Subnúcleo do SESI da cidade
de Camaragibe, onde atendiam, principalmente, os operários da Companhia
Industrial Pernambucana (CIP), conhecida como da Fábrica de Camaragibe.
Por sua vez, o TCC de Maria Amalia Araújo (1959) relata a atuação no Núcleo
Anibal Cardoso, também do SESI, intervindo diretamente no meio operário
da fábrica do Cotonifício da Torre S/A, na cidade de Recife. O TCC de Maria
do Carmo Bezerra de Lima (1963) apresenta sua experiência no Clube Sale-
siano, a partir de seu estágio no Núcleo Barbosa Lima Sobrinho do SESI na
comunidade do Jatobá, em Olinda. E o TCC de Afra Amaral Albuquerque
162

(1965) descreve sua atuação no Núcleo David de Souza do SESI, que abrangia,
desde o bairro de Sítio Novo, passando por Peixinhos, Salgadinho, Águas
Compridas, Campo Grande, Beberibe e Santo Amaro – territórios localizados
em Recife e Olinda. Já o TCC de Maria Amália Jatobá (1959) informa sobre
a experiência no Ibura, dentro do programa habitacional da Vila do Sesi de
Recife; e o TCC de Anail Amaral de Albuquerque (1966) aborda a ativi-
dade no Núcleo Joseph Turton do SESI, em Água Fria, que prestava serviços
médicos, assistenciais e educacionais. Por último, temos o TCC de Dinorah
Rodrigues Barbosa (1959), que descreve seu trabalho dentro do ambulatório
da Previdência Social do IAPI na capital, atuando com o chamado Serviço
Social Médico, na Divisão de Tuberculose.
A metodologia utilizada neste trabalho se baseia na teoria social crítica
marxista, e fundamenta-se na categoria totalidade para reproduzir a dinâ-
mica da sociabilidade capitalista e as contradições presentes em seu desen-
volvimento. Compreendemos que as experiências de estágio e trabalho das
assistentes sociais, citadas acima, estão permeadas pela estrutura imposta
pelo Modo de Produção Capitalista, alicerçado na propriedade privada dos
meios de produção e na exploração da força de trabalho da classe proletária.
Tal estrutura conforma o modo de ser da sociedade em questão e as relações
sociais presentes nela, as suas ideologias e instituições.
Na sociedade capitalista, existem duas classes fundamentais: a burguesia
e o proletariado. Tais classes são opostas e têm interesses distintos. A forma-
ção da classe operária está atrelada ao desenvolvimento do próprio sistema
capitalista e, na medida em que ele se expande, adquire novas formas e carac-
terísticas. O proletariado encontra-se destituído dos meios de produção e, con-
sequentemente, de sua fonte de subsistência, sendo, assim, obrigado a vender
a única mercadoria que ainda possui: sua força de trabalho. Ao mesmo tempo
em que o trabalhador produz a mais-valia e valoriza o capital, tal riqueza per-
manece concentrada nas mãos da classe burguesa, não havendo socialização
do lucro gerado por esse trabalho excedente. Aqui, nos concentramos em
estudar a parcela da classe trabalhadora que estava presente nos espaços de
trabalho das assistentes sociais: a classe operária. O proletariado industrial
(ou operariado) representa o núcleo da classe trabalhadora e possui particula-
ridades, fazendo parte do que Marx denomina como trabalhadores produtivos
(BOTTOMORE, 2013; BRAZ; NETTO, 2006; MARX; ENGELS, 2013).
No Brasil, a classe operária vai se consolidando no início do século XX,
com a afirmação de polos industriais no país e com o fim da escravidão. O
trabalhador, então “livre”, seria o responsável pela sua própria manutenção e
reprodução a partir do salário. Contudo, nos primeiros estágios do desenvolvi-
mento das forças produtivas capitalistas no país, a exploração era sobrenormal,
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 163

a configuração do operariado era, em sua maioria, de imigrantes europeus, os


salários eram ínfimos para suprir as necessidades básicas do operário e sua
família, parcelas dessa população, que já viviam nos centros urbanos, eram
extremamente pauperizadas, acumulando-se em aglomerados de bairros insa-
lubres, com frequente falta de água, luz e esgoto. Essas condições precárias
fazem surgir, no operariado, a revolta e a necessidade de lutar por condições
dignas de vida, o que a burguesia passa a ver como “[...] ameaça a seus mais
sagrados valores – moral, religião e ordem pública”; e, sendo assim, “[...]
impõe-se a necessidade do controle social da força de trabalho”, através de
leis sociais que surgem em determinadas conjunturas históricas e deslocam a
“questão social” para o centro das contradições que atravessam a sociedade
(IAMAMOTO; CARVALHO, 2011, p. 134-135).
O Serviço Social, nesse processo, possuía o papel de colaborar no exer-
cício do controle sobre a classe operária. A atuação das assistentes sociais
era guiada por um discurso doutrinário e apologético, além de reforçar uma
perspectiva culpabilizadora dos indivíduos, obscurecendo as bases estruturais
das contradições sociais e políticas imperantes. As ações tinham cunho pater-
nalista e educativo, baseado na moral cristã, de conciliação das relações entre
capital e trabalho, mistificação da estrutura do sistema capitalista.
Para contribuir com o debate acerca da natureza da classe operária em
Pernambuco, também nos debruçamos sobre estudos pioneiros de Josué de
Castro (1968) e Louis Joseph Lebret (2016) sobre as condições de vida dos
trabalhadores no Nordeste e em Pernambuco na primeira metade do século
XX. Os dois autores definiram Pernambuco, principalmente a capital, como
centro industrial do Nordeste entre as décadas de 1930 e 1950. Cada um
definiu caminhos distintos para obtenção de seus resultados: Josué de Castro
(1968) colocou-se como objeto de estudo a questão da fome, apresentando
esse fenômeno, de forma mais específica, e com mais detalhes, no caso dos
assalariados em Recife, mostrando a condição de vida dos trabalhadores na
capital. Utilizou tanto a sociologia, como a biologia, para analisar os motivos
das condições físicas, sociais e econômicas para apreender o problema da
fome. Levantou informações sobre a renda das famílias operárias e seus os
gastos em três aspectos: alimentação, habitação e vestuário, além da distri-
buição da renda entre esses três blocos. A alimentação foi verificada como o
maior gasto entre as famílias no período estudado; e, contudo, tais dispêndios
mostravam-se irrisórios para a garantia básica de segurança alimentar. Já
Louis Joseph Lebret (2016), realizou um estudo mais sistemático, primeiro
para entender as condições do Nordeste nos quesitos geográfico, econômico,
social, cultural e biológico, com a finalidade de obter dados para um pro-
grama de desenvolvimento industrial. Escolheu Pernambuco como polo de
164

investimento; Recife aparecia como polo industrial, com maior densidade e


posição geograficamente estratégica.
Castro (1968) e Lebret (2016), mesmo com metodologias distintas,
focando em intervalos históricos diferenciados da primeira metade do século
XX, expuseram as difíceis condições de vida da classe operária em Pernam-
buco, seja em termos da questão da habitação, da alimentação e do poder
econômico. Os dois autores destacaram o salário como escasso para obtenção
de recursos mínimos para a manutenção da vida, como higiene, alimentação,
habitação, cultura e lazer. Na questão da alimentação, Recife destacou-se entre
as cidades líderes em subnutrição, com alta mortalidade de sua população,
realçando-se as aviltantes condições fisiológicas dos operários e suas famílias.
No plano habitacional, a precariedade dos mocambos era uma realidade em
todo o intervalo histórico. A condição do trabalhador industrial em Pernam-
buco era de insegurança alimentar e subnutrição, que cerceava suas capacida-
des físicas e intelectuais. Entre mocambos e vilas, as estruturas domiciliares
eram insuficientes para as famílias, com sua insalubridade contribuindo para
o alastramento de doenças. Os salários eram irrisórios para a manutenção da
vida face às condições de trabalhos maçantes. E os programas de assistência,
ofertados aos operários, eram escassos para remediar os dramas mais recor-
rentes entre os assalariados.
Essas contradições sociais, ampliadas nas décadas de 1950 e 1960, acen-
tuam a necessidade de quadros técnicos para as políticas assistenciais do
Estado, Igreja e entidades empresariais. O Serviço Social passa a ser cres-
centemente mobilizado face ao acirramento dos conflitos entre as classes em
Pernambuco, com destaque para aqueles envolvendo os operários industriais.
A profissão é colocada como um dos instrumentos de intermediação entre
Estado, setores industriais e segmentos médios urbanos para lidar com a
crescente massa de operários pauperizados.
Na sequência, abordaremos as mediações operacionais e ideais através
das quais as assistentes sociais no estado materializavam as respostas profis-
sionais frente às expressões da “questão social” no meio operário da época.
Inicialmente, iremos resgatar a história das instituições sociais apresentadas na
análise, descrevendo sua formação e seu papel no trato com a classe operária.
Em seguida, discutiremos a trajetória do Serviço Social em Pernambuco, em
especial a experiência das profissionais nos espaços ocupacionais mencio-
nados. Posteriormente, iremos refletir acerca dos objetivos e desafios então
expressos pelas autoras dos TCCs, a fim de reconstruir o trabalho do Serviço
Social, as projeções teórico-metodologias utilizadas e as mudanças ocorridas
ao longo do desenvolvimento da instituição profissional.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 165

2. Serviço social no SESI e no IAPI

A criação do Serviço Social da Indústria (SESI), em 1946, é uma conse-


quência das mudanças no sistema produtivo e no comportamento do empre-
sariado frente à “questão social”. A instituição nasceu no segundo pós-guerra,
num momento de surgimento de diversas instituições de cunho assistencial,
com as atribuições de estudar, planejar e executar medidas que contribuíssem
para o bem-estar do trabalhador da indústria, com funções como a defesa dos
salários reais do operariado, a assistência em relação aos problemas domés-
ticos, pesquisas e atividades educacionais e culturais etc. Seus idealizadores
partiram da constatação das dificuldades surgidas do pós-guerra e da pre-
missa do dever do Estado em incentivar e estimar a cooperação das classes
em iniciativas a fim de promover condições básicas de bem-estar, propor-
cionando assistência social e melhores condições de habitação, nutrição e
higiene ao operariado.
O surgimento do SESI se enquadra numa fase marcada pela maior orga-
nização do empresariado brasileiro, que buscava definir e homogeneizar uma
série de posições relacionadas à nova situação internacional, o novo estatuto
econômico do pós-guerra e seus efeitos na economia interna. Essa organiza-
ção foi sendo construída desde 1943, a partir de congressos e outros eventos
dessa classe empresarial, que debatiam sobre a reorganização da economia
no pós-guerra e buscavam alternativas e uma programação a longo prazo,
com subsídio estatal, para reorientar o aprofundamento capitalista no plano
nacional e internacional. Durante a Conferência das Classes Produtoras,
em 1945, os principais temas abordados foram a desagregação do Estado Novo
e as respostas ao fim do conflito bélico, pautando o combate ao pauperismo,
aumento da renda nacional, desenvolvimento das forças econômicas, demo-
cracia econômica e justiça social. Apareceu, nessa reunião, uma insuspeita,
até então, preocupação com as condições de vida do proletariado e em como
assegurar um mínimo de recursos para uma existência digna.
O cerne das soluções apontadas pelo grupo seria de elevação da renda
nacional, compreendida como uma justa solução para a “questão social” e ao
mesmo tempo para prosseguir com o desenvolvimento econômico. Segundo o
empresariado, um caminho viável seria o aprofundamento da industrialização,
“racionalização da agricultura”, redução da “deficiência do homem como agente
da produção”, dando-lhes condições dignas quanto a alimentação, educação,
habitação e eficiência nos métodos de produção. A indústria passa a reclamar o
aumento do nível cultural do proletariado e a solução seria através da ampliação
da instrução, pública e particular, recreação adequada e melhores condições de
higiene. Recomendam a expansão da previdência social, criação de cooperativas
166

de consumo e de outros meios de assistência às famílias operárias. Ao Estado


caberia um papel essencial para viabilizar, de forma indireta primeiramente, o
aumento no nível de renda da população e de sua produtividade. Dessa forma,
seria possível “[...] integrar as amplas camadas da população aos frutos do desen-
volvimento econômico, conquistar sua adesão para esse processo de mudança
e eliminar as causas que possibilitam a perigosa expansão de ideologias dissol-
ventes dentro de seu meio” (CARVALHO; IAMAMOTO, 2011, p. 286-287).
Pode-se observar, então, que o controle ideológico da classe operária fazia parte
do projeto da burguesia de crescimento produtivo.
O SESI em Pernambuco surgiu em 1947 e sua forma de organização
estava dividida em um Conselho Regional e quatro divisões (Divisão de Pes-
quisas Assistência Jurídica e Divulgação – DPAJD, Divisão Administrativa –
DA, Divisão de Ação Social – DAS, Divisão de Educação e Cultura – DEC).
Como estratégia de executar a assistência, os trabalhos foram organizados
em núcleos de acordo com as zonas mais povoadas por operários, sendo elas:
Santo Amaro, Água Fria, Sítio Novo, Beberibe, Casa Amarela, Mustardinha,
Mangueira, Barro, Cordeiro e Torre. De acordo com as pesquisas realizadas
na época, os serviços seriam orientados para resolver problemas educacionais
e morais dos operários. Os núcleos tinham como objetivo se tornarem centros
de formação. As unidades sociais eram divididas nesses núcleos, ofertando
assistência médica, educacional, recreativa e jurídica. O público prioritário
na atuação do SESI era de operários e suas famílias, e o trabalho realizado
pelo Serviço Social incluía-se nos diversos núcleos de atuação da instituição,
desde a assistência educacional ao programa habitacional.
Por outro lado, o ano de 1933 marcou o início de uma nova fase na his-
tória do Seguro Social brasileiro, quando foi estabelecida uma organização
previdenciária em torno das categorias de trabalhadores. Assim, no dia 29
de junho daquele ano, foi criado o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos
Marítimos (IAPM), o primeiro no gênero. A partir disso, surgiram várias insti-
tuições com essa finalidade, entre elas o Instituto de Aposentadoria e Pensões
dos Industriários (IAPI), criado durante o Estado Novo, em 31 de dezembro
de 1936. De todas as entidades, o IAPI foi a que mais se destacou, por reunir
em seu interior um grupo avançado de técnicos e especialistas em Previ-
dência Social. A influência desse grupo foi marcante, e dele sairiam muitos
dos dirigentes dos órgãos de previdência criados posteriormente. Obtiveram,
também, bastante destaque no setor habitacional119, no desenvolvimento de

119 No artigo “A PRODUÇÃO DA HABITAÇÃO E OS CONJUNTOS HABITACIONAIS DOS INSTITUTOS DE


APOSENTADORIAS E PENSÕES – IAPs” de Cristina Maria Perissinotto Baron, 2011, encontra-se o papel
essencial dos IAP’s no setor habitacional do Brasil na década de 1940 e 1950. O IAPI foi um dos mais
atuantes na área habitacional, inclusive desenvolvendo projetos como o do Conjunto Residencial de Realengo,
no Rio de Janeiro em 1943.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 167

projetos de moradias populares nas grandes cidades. O Serviço Social foi


chamado, em 1958, para completar o quadro de funcionários do IAPI, e alguns
assistentes sociais foram direcionados para a Divisão de Tuberculose, sendo
responsáveis por afastar os “problemas sociais” que estivessem dificultando
a recuperação dos enfermos. Para Barbosa (1959, p. 21), autora de um dos
TCCs estudados sobre o IAPI:

[...] pretendíamos ajudar o médico na compreensão psicológica do cliente,


interpretando a personalidade do associado, esclarecendo problemas e
dificuldades sociais que estivesse atravessando.

Os relatos evidenciam que as práticas desses profissionais estavam res-


tritas, num primeiro momento, aos ambulatórios e conjuntos residenciais
vinculados aos Institutos, desenvolvendo Serviço Social Médico, através da
abordagem individualizante de casos. Apenas no final da década de 1950,
houve inserção de assistentes sociais nas Delegacias desses Institutos, desen-
volvendo trabalhos de orientação e informação sobre os seguros.
Os TCCs descrevem a prática do Serviço Social principalmente dentro
das indústrias situadas em bairros e comunidades operárias, que se desen-
volviam ao redor das empresas, pois a maioria dos moradores também eram
trabalhadores dessas instituições. Segundo Collier (1955), que desenvolveu o
estágio na Companhia Industrial Pernambucana (CIP), ligada à produção têxtil
em Camaragibe, o território era despovoado e, com o surgimento da indústria,
começou uma comunidade. O presidente da cooperativa expôs que os primei-
ros trabalhadores eram do setor de construção e estava planejado para que
se retirassem quando a fábrica ficasse pronta; esse fato contribuiu para uma
comunidade incipiente de várias categorias profissionais. A CIP trabalhava
com diversos projetos, com o objetivo de criar e consolidar a organização
operária cristã idealizada por Carlos Alberto Menezes. A priori, para direcionar
moralmente e materialmente os operários e suas famílias, tinha como principal
objeto a religiosidade. Entre os projetos para Fábrica de Camaragibe estão:
a criação, em 1894, de uma capela dirigida pela Congregação dos Padres do
Sagrado Coração de Jesus, com o intuito de garantir uma “estabilidade” moral;
em 1895, ano que consolidou os funcionamentos da Fábrica, o surgimento
da Sociedade Cooperativa de Consumo; a Associação das Filhas de Maria
dos Santos Anjos; foi abastecida a Cooperativa (uma instituição econômica)
que tinha como intuito evitar a exploração dos operários pelos “barracões”;
em 1895 foi criada uma escola para as mulheres que funcionava na parte da
manhã e da noite, que tinham um clube musical, dramático, diversas associa-
ções religiosas (Apostolado da Oração, Associação das Mães Cristãs, Santa
Filomena, destinada para meninas, e São Luiz, destinado para os meninos).
168

Com relação à educação das meninas, foi destinado o trabalho das religiosas da
Sagrada Família, e, para os meninos, dos Irmãos Maristas. Já em 1900, surgiu
a possibilidade da fundação da Corporação Operária, organização dividida
em três partes: central, sociedade cooperativa, sociedade mútuo socorro. A
parte central dividida em sessão religiosa, escolas e a sessão de distrações,
que tinha uma subdivisão composta pelo clube musical, clube dramático e a
sociedade de tiro ao alvo; a sociedade cooperativa fornecia alimentos, vesti-
mentas e artigos de consumo no geral; e a sociedade mútuo socorro tinha como
função a garantia ao atendimento médico, fornecimentos de medicamentos,
enterros e sepulturas.
Contudo, a partir de 1929 há uma mudança de conjuntura com o surgi-
mento das Leis Trabalhistas e Previdenciárias, e os operários passam a exigir
modificações com relação às suas condições de trabalho, o que, segundo o
dono da empresa, prejudicou o andamento do projeto. O Serviço Social é então
chamado a ingressar na instituição e as profissionais defendem a utilização
do Serviço Social de Casos, porque era entendido que os “clientes” tinham
como condicionante os “fatores culturais”, e criam uma Agência de Serviço
Social que funcionaria junto com a Fábrica, tirando-a da responsabilidade
da assistência. No primeiro momento, era realizada uma entrevista com os
operários para entender as problemáticas em que eles estavam inseridos e
assim direcionar o trabalho focando não só no operário, mas também para
constituir um plano dirigido para a sua família e a comunidade onde residia.
O que diferia, na atuação desses profissionais, eram os setores onde seriam
alocados, algumas em programas de saúde, voltados aos operários, outras em
setores de educação, com Cursos Populares para os jovens da comunidade
operária, ou em projetos de habitação desenvolvidos pelas empresas.

3. A experiência do Serviço Social com


o operariado em Pernambuco

Entre as décadas de 1950 e 1960, o Serviço Social passava por contí-


nuas transformações em sua prática. A demanda por profissionais de Serviço
Social ganha força com a criação de diversas instituições de cunho social e
o crescente interesse do meio empresarial em torno da situação de vida da
classe operária. Tal interesse estava diretamente relacionado à conjuntura
aberta com a implantação do Estado Novo, a Segunda Guerra Mundial e
as mudanças produtivas que ocorriam no sistema capitalista. Os primeiros
espaços ocupacionais do Serviço Social encontravam-se diretamente relacio-
nados à conjuntura da ditadura varguista, que implementou o Estado Novo,
reprimiu os movimentos de trabalhadores autônomos e revolucionários e
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 169

criou políticas públicas (restritas), a fim de controlar e reproduzir parcela do


proletariado urbano da época. A política econômica desse período é focada no
processo de industrialização, afastando os mecanismos econômicos voltados
ao modelo agroexportador e desenvolvendo diversas formas de incentivo às
indústrias básicas.
Contudo, o incentivo à industrialização trouxe consigo o crescimento
exponencial do proletariado urbano e fomentou as reivindicações por melhores
condições de trabalho e de vida dessa classe, que, a partir de 1945, ganha mais
força. Assim, abriu-se um novo quadro político no país e a estrutura corpora-
tivista compreendeu que era essencial incorporar essas novas camadas a sua
agenda, com o objetivo de fortalecer seu projeto e, também, de neutralizar
os componentes autônomos e revolucionários destes. Segundo Iamamoto e
Carvalho (2011), o processo de surgimento e desenvolvimento das entidades
assistenciais influenciou diretamente a legitimação e institucionalização do
Serviço Social, foi a partir dos campos de trabalho que se abriram com essas
instituições, que a profissão pode se firmar e romper – não totalmente – com
sua origem ligada ao bloco católico. A partir desse processo, há uma guinada
nas práticas e na metodologia da profissão em gestação.
O Serviço Social em Pernambuco teve sua emergência já nesse período
de mudanças no perfil da profissão, a Escola de Serviço Social de Pernam-
buco foi fundada em 1940, pelo Juiz de Direito Rodolfo Aureliano, sendo
apoiada pela ala mais progressista da Igreja Católica. Os primeiros espaços
sócio-ocupacionais foram ocupados ainda por estudantes da ESSPE. Segundo
Silveira Jr. (2019), cabia às alunas praticamente construir as alternativas de
inserção do Serviço Social nas instituições orientadas pelas professoras da
ESSPE encarregadas do Estágio. Esse movimento é esclarecido nas experiên-
cias relatadas nos TCCs dessas alunas, pois remontam ao que era o Serviço
Social da época e sua prática.
Os trabalhos selecionados para análise mostraram uma prática profissio-
nal ainda em construção e com uma base metodológica não consolidada. O
Serviço Social da Indústria (SESI) e o Instituto de Aposentadoria e Pensões
dos Industriários (IAPI) foram dois dos principais espaços que inseriram
assistentes sociais em sua grade profissional e pôde-se observar que o método
mais utilizado era o Serviço Social de Caso, que fazia parte do que Abreu
(2008, p. 85) define como “pedagogia da ajuda”. De acordo com a autora, o
perfil pedagógico da profissão foi construído em dois eixos que guiaram as
práticas educativas do Serviço Social: a ajuda e a participação. A primeira,
presente desde a institucionalização do Serviço Social como profissão nos
Estados Unidos, é entendido enquanto “ajuda psicossocial individualizada”
centrada no desenvolvimento da personalidade e “ajustamento” do indivíduo
170

ao meio, apoiada na teorização de Mary Richmond. Orientava-se para uma


assistência “particular”, direcionada para a reforma moral, uma visão que
reduzia a “questão social” às suas expressões privadas.
Em geral, as autoras dos TCC’s relataram diversas áreas de atuação e
ações relacionadas a intervenção de assistentes sociais. Um dos procedimen-
tos mais realizados eram as visitas domiciliares que, segundo Maria Angé-
lica Collier (1955), ofereciam a oportunidade de “observar o cliente em seu
ambiente natural”, “estabelecer ou melhorar nossas relações com o cliente”,
“fazer uma justa avaliação da situação descrita no plantão”, “esclarecer situa-
ções duvidosas, servindo de contra-inquérito”, para ter um conhecimento
mais apurado dos casos como situação pessoal, familiar, social e, a partir
disso, concluir o diagnóstico e realizar os “tratamentos” adequados. Esse
recurso era aplicado pelo Serviço Social nos programas de educação, saúde
e habitação existentes nas instituições. Nos TCCs de Maria Angélica Collier
(1955) e Gomes (1958), observamos que foi montada, dentro da Fábrica de
Camaragibe, uma Agência de Serviço Social de Casos, que prestava auxílio de
serviço médico e pedagógico. O funcionamento da Agência ocorria através de
plantões, entrevistas, visitas domiciliares e estudo para intervenção em cada
caso. Segundo Maria Angélica Collier (1955), o Serviço Social na fábrica
de Camaragibe se propôs a atuar como agente de ligação entre os operários
e a direção; através dos plantões, desenvolveram “o estudo, diagnóstico e
tratamento” aplicando a técnica de entrevista. Já as visitas domiciliares eram
feitas a partir das solicitações realizadas pelo trabalhador.
O processo de consolidação dos referenciais teóricos é outro fator da
formação do Serviço Social. As assistentes sociais se utilizavam de diversas
áreas do conhecimento para escreverem seus TCCs, como teologia, sociolo-
gia e filosofia. Porém, a fonte primária de informações eram outros TCCs da
ESSPE, documentos institucionais, regimentos do SESI, IAPI e, especifica-
mente, das fábricas onde ocorreram as atividades.
A utilização das ciências humanas para embasar as discussões ficou mais
evidente nos TCCs na transição dos anos 1950 para 1960, devido ao processo
de tecnificação do Serviço Social. Contudo, não havia uma teoria única como
base, o que gerou algumas particularidades, como a utilização da filosofia
clássica (Aristóteles e Platão) para refletir sobre essência humana,

[...] já em tempos remotos, o conceito aristotélico afirmava que o homem


é um animal político, o que significa que só pode viver na “polis”, isto
é, na sociedade, em grupos. Em virtude da palavra “política” – haver
tomado sentido diverso, quando não pejorativo, dizemos modernamente
ser o homem um animal social (LIMA, 1963, p. 8).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 171

O processo de laicização do currículo se acentuou nos anos 1950 e 1960,


cravejando o processo de profissionalização do Serviço Social com fortes
influências norte-americanas:

[...] os anos 1950 constituem o período em que se desencadeiam os proces-


sos de racionalização e tecnificação da formação profissional do Serviço
Social. A normatização nacional do ensino expressa-se numa padroniza-
ção cuja consequência é a relativa laicização do currículo da ESSPE. O
estreitamento das relações do Brasil com os EUA resulta em iniciativas de
intercâmbio que adensam a influência norte-americana na formação pro-
fissional no Nordeste, em especial em Pernambuco (SILVEIRA, Jr., 2020,
p. 95-96).

Essa evidência acerca da influência norte-americana é hegemônica no


campo de aplicação dos métodos de Serviço Social, com Mary Richmond
como a principal representante da área de estudo do método de Serviço Social
de Caso. Segundo Maria Adélia Collier (1955), as bases para o Serviço Social
de Caso se estabelecer foram colocadas pelos livros What is Social Case Work
e Diagnóstico Social, que sistematizaram o método que possuía duas fases:
sociológica e a psicológica, usado para exemplificar os casos citados nos TCCs
que usaram esse método. Outros autores do Serviço Social mais utilizados
foram Annette Garrett, Balbina Ottoni Vieira, Gordon Hamilton, Simone Paré,
Glaydys Ryland, Getrude Wilson, Artur Hillman e Katherine Knapp.
Mesmo com a institucionalização do Serviço Social, ainda ocorria uma
persistência da doutrina católica como influência na formação profissional
das estudantes. A evidência para esse aspecto encontra-se, principalmente,
nos intelectuais usados para identificação do objeto de estudo, eram teólogos
como Karl Adam, Josef – Léon Cardijn, Louis-Joseph Lebret e o sacerdote
francês Henri Antoine Groués, conhecido como Abbe Pierre, com a principal
obra O drama da habitação popular de 1958, presente em todas as mono-
grafias estudadas.
Ao institucionalizar-se, a formação deixou de ter como componente obri-
gatório, constitutivo da profissão, a orientação católica. Com um currículo
mínimo de caráter modernizador, a persistência dos conteúdos de natureza
católico-doutrinária nas décadas seguintes dar-se-ia pela via do currículo
pleno. A ESSPE – que havia antecipado a adoção de alguns componentes
– assume, já em 1953, esse novo currículo, embora garantindo a formação
doutrinária, na formação plena, através das disciplinas de Religião, Doutrina
Social, e de um Seminário de Formação com caráter de monitoramento moral-
-pedagógico (SILVEIRA Jr., 2020, p. 126).
172

A influência, tanto da doutrina católica, quanto de autores norte-ame-


ricanos expressa direcionamentos específicos. Nota-se que as estudantes,
ao desenvolverem a problemática do objeto de estudo, possuíam influência
da doutrina católica para o direcionamento moral-pedagógico da profissão,
enquanto os autores específicos do Serviço Social se restringiam à aplicação
do método usado para a intervenção no campo de ocupação. As profissionais
também trabalhavam com os programas de habitação oferecidos pelas ins-
tituições. Era da ordem do Serviço Social a distribuição de casas. Segundo
Gomes (1958), a habitação era um dos problemas centrais na Vila Operária, os
assistentes sociais encaminharam para o Companhia Industrial Pernambucana
as necessidades de cada família para que fossem fornecidas casas mais apro-
priadas. Outras atividades também colocadas como parte do Serviço Social
eram de admissão de menores na fábrica, realização de festa de Natal, pedido
de auxílio econômico, pedido de providências no setor médico, internamento
de menores com “problemas de conduta”, pedidos de emprego na fábrica etc.
A admissão de “menores” às fábricas também era parte das demandas
do Serviço Social. De acordo com Portela (1960), seu trabalho, inicialmente,
era apenas de admitir esses aprendizes na fábrica. Contudo, sua experiência
com esses jovens mostrou um déficit intelectual, evidenciando-se, então, a
necessidade de um trabalho educativo junto a esses aprendizes. Assim, por
intermédio do subsetor de formação social do SESI, foi criado o curso popular
para aprendizes. Os responsáveis pelo curso tinham como objetivo construir
um programa que estimularia a intelectualidade dos jovens, além de ajudar
no desenvolvimento de uma personalidade colaborativa e responsável em
cada um. As escolhas de matérias e assuntos pretendiam contribuir nessa
realização, sendo eles: formação política, pessoal e social; higiene, ciências
e pronto-socorro, além de matérias do curso primário oficial. Todo esse currí-
culo era baseado no programa da União Nacional de Educação para Adultos.
A formação política pretendia levar os jovens a compreensão e cumprimento
dos deveres como cidadãos, estimulando a participação da vida política do
país. A formação social procurava ajustar os alunos aos grupos sociais, ensi-
nando a prestar colaboração e aproveitar os benefícios que a sociedade pre-
tensamente oferecia. As atividades realizadas pelo Serviço Social dentro do
subnúcleo SESI tinham como objetivo instruir os jovens aprendizes da Fábrica
de Camaragibe sobre o trabalho a ser realizado, preparando estes para a vida
de trabalhador, de família e da comunidade, sempre baseada na conduta social
cristã, contribuindo para o desenvolvimento educativo dos aprendizes, já que
foi apreendido que a maior parte deles não tinha o curso primário completo.
Outros TCCs estudados, em especial aqueles realizados entre o final da
década de 1950 e início de 1960, passaram a descrever um tipo de prática
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 173

que utilizava o método do Serviço Social de Grupo, também constitutivo da


“pedagogia da ajuda” descrita por Abreu (2008). Essa prática, conhecida como
“ajuda psicossocial individualizada”, se espalhou como modelo de intervenção
do Serviço Social após a Segunda Guerra Mundial, e chegou ao Brasil e outros
países da América Latina durante o processo de modernização conservadora
da profissão, nas décadas de 1950 e 1960. Segundo Abreu (2008, p. 88), esses
métodos tinham uma técnica de intervenção de cunho moralizador, pautada
nos princípios ético-religiosos da filosofia neotomista e harmonizados com
valores políticos da democracia liberal, priorizando os componentes indivi-
duais e subjetivos da “questão social”, “deslocando o que é a expressão dos
antagonismos de classes para o campo psicológico”.
Nesses trabalhos, fica evidente que a utilização do método de grupos
ainda era incipiente dentro das instituições e era usado, especialmente, den-
tro de programas de educação que as empresas realizavam com os operários
e suas famílias. De acordo com o TCC de Araújo (1959, p. 3), o regimento
interno da instituição na qual ela estava inserida afirmava que “[...] competia
ao Serviço Social prestado pelo SESI, através dos núcleos, atuar nos casos
individuais, de grupo e de organização da comunidade”, com o Serviço Social
de Grupo abrangendo pré-adolescentes, adolescentes e adultos. Algumas fun-
ções desses profissionais eram atender os inscritos nos núcleos, fazer triagens
e encaminhá-los aos serviços assistenciais. Eram, ainda, responsáveis pela
realização da educação dos operários, juntamente com a ação de formação
social. Sua atuação buscava, através de trabalhos educativos, atenuar ou
apagar as causas menos favoráveis, atuando junto às famílias e procurando
“modificar” o ambiente do lar, fortalecendo os laços para resolver as pro-
blemáticas. Utilizando as entrevistas como instrumento de levantamento da
realidade desses jovens e de suas famílias, a autora compreendeu que muitos
adolescentes tinham um desejo por independência, mesmo não estando pre-
parados para os desafios da mesma e os pais permaneciam, quase sempre,
alheios a essas inquietações. Em geral, ela descreve as condutas de forma
moralizante, focando na questão da obediência, submissão a ordem dos pais
e das autoridades, tanto familiares, quanto da escola. Relata, ainda, sobre as
condições financeiras das famílias e as dificuldades em sustentar os filhos,
principalmente com famílias compostas por vários filhos. Enfatiza a orienta-
ção religiosa da família e analisa subjetiva e moralmente o comportamento
das meninas, usando termos como: “má criada” ou “boa filha”. Descreve a
importância do Serviço Social de Grupo e seu objetivo de contribuir para o
melhor relacionamento do indivíduo no próprio grupo social, tanto com a
família, quanto com amigos, colegas de escola etc.
174

Outra experiência com o Serviço Social de Grupo foi relatada por Lima
(1963) e seu trabalho junto ao Clube Salesiano em 1963. Ela promovia,
baseada no método, orientações e dinâmicas para formação de grupos, pos-
suindo como base a criação e direcionamento dos grupos, para, assim, faci-
litar o entrosamento entre os participantes. Visava prestar auxílio material e
pedagógico, a fim de promover um “espírito de união e solidariedade” entre
os operários. Já Albuquerque (1965) afirma que um dos motivos pela esco-
lha do método de grupo do Serviço Social era devido à falta de estrutura e
organização da instituição e do próprio Clube. O Serviço Social atuava junto
com os pré-adolescentes e adolescentes do sexo masculino, trabalhando como
coordenador do Sesinho Clube, que proporcionava cursos de culinária, corte
e costura, trabalhos manuais e atendimento a família do trabalhador.
O Serviço Social também tinha atuação junto aos programas médicos,
como relatado nos TCCs anteriores. Contudo, o trabalho que mais informa a
experiência sobre a prática do Serviço Social Médico é o de Barbosa (1959),
exercido dentro do ambulatório de previdência social. A instituição onde
atuava era o IAPI, e a autora descreve a atuação do Serviço Social em alguns
casos. As profissionais atuavam na Perícia Médica, no preparo psicológico
do paciente para que recebesse melhor o tratamento médico, em ações edu-
cativas, encaminhamentos, articulações entre as áreas de saúde e habitação,
reforçando a importância do Serviço Social ocupar esse espaço.
Em suma, como apontado por Faleiros (2011, p. 31), essas práticas evi-
denciam a ideologia presente no Serviço Social da época, métodos que favo-
reciam os valores e pensamentos da classe dominante, os colocando como
universais e inquestionáveis. De acordo com o autor, essa prática isola os
indivíduos de sua classe, os colocando como responsáveis pelos problemas
de “desajustamentos” e a profissão operando como apaziguadora de conflitos.

4. As finalidades e limites no trabalho com a classe operária

A fixação de objetivos e resultados no espaço de trabalho, e a avaliação


que as próprias assistentes sociais faziam sobre sua intervenção, aparecem
relacionados aos métodos aplicados por elas, entre eles o Serviço Social de
Grupo, Serviço Social de Caso e Serviço Social de Comunidade, revelando
uma tendência metodologista de apreensão das possibilidades profissionais.
Os TCCs que aplicaram o Serviço Social de Caso expuseram seus objetivos
de acordo com a maior necessidade encontrada nas fábricas. As principais
demandas que chegavam para as assistentes sociais eram de saúde, habitação e
saneamento básico. As intervenções realizadas por elas eram de forma direcio-
nada e individualizada para cada operário e seus familiares e as intervenções
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 175

eram dependentes dos programas ofertados pelas fábricas. Nos trabalhos de


Adélia Collier (1955), Angélica Collier (1955), Gomes (1958) e Barbosa
(1959) é apresentado um conjunto de críticas ao campo de estágio na Fábrica
de Camaragibe e no Ambulatório da Previdência Social. Devido a essa con-
dição de dependência às políticas e programas condicionados às fábricas, as
assistentes sociais concluíam a insuficiência da aplicação do Serviço Social de
Caso, não pelo método em si, mas por falta de estrutura física, material e eco-
nômica destinada ao setor de Serviço Social. A alta demanda de trabalho era
uma crítica recorrente. Como no TCC de Maria Adélia Collier (1955, p. 61):

Encontramos dificuldades com relação à aplicação do processo de Serviço


Social de Casos, no que diz respeito à obra. A primeira foi ver-nos forçadas
a arcar com tarefas estritamente profissionais que nos sobrecarregavam em
detrimentos de nossa função específica. A falta de compreensão e interesse
daqueles a quem estava afeta a solução desta dificuldade, nos levaram
a assumir estas incumbências para ter um mínimo de possibilidades de
realizar o nosso programa.

São frequentes os relatos entre as assistentes sociais, que aplicaram


Serviço Social de Caso, evidenciando uma crítica acerca dos “clientes”
da Agência:

Dentro das primeiras destacam-se a pouca confiança que podíamos depo-


sitar nas informações prestadas. Isto nos preocupou muito no início do
serviço. Dificultava sobremodo a avaliação da situação e nos levou, em
certa fase, a desconfiar demais. Eram flagrantes as contradições e sentía-
mos que alguns não perdiam ocasião de ludibriar-nos. Não o faziam por
má fé, mas talvez por instinto de defesa, de qualquer modo isto dificultava
o trabalho (COLLIER, Maria Adélia, 1955, p. 63).

Com relação aos trabalhos em que o método utilizado foi Serviço Social
de Grupo, como os de Lima (1963), Albuquerque (1965), Belo (1965), Albu-
querque (1966), os objetivos estavam voltados a aspectos mais subjetivos na
comunidade: “O inter-relacionamento dos grupos veio despertar o sentido
comunitário e de cooperação, dando-lhes, ao mesmo tempo, senso de ajuda
mútua e de responsabilidade” (ALBUQUERQUE, 1966, p. 63).
No método de Serviço Social de Grupo, foram encontrados mais resul-
tados positivos, segundo as autoras. As assistentes sociais sempre relatam
uma dificuldade inicial presente no público ao qual era destinado o método,
mas que, no decorrer das atividades, o grupo acabava por corresponder às
expectativas e revelar uma mudança significativa na comunidade.
176

[...] A experiência veio mostrar, a possibilidade da realização de um traba-


lho de comunidade, partindo do SESI e sob sua orientação, desde que haja
apoio da Instituição e a população esteja devidamente motivada (ALBU-
QUERQUE, 1966, p. 63).

Mesmo que no método de Serviço Social de Grupo as respostas positivas


fossem avaliadas como maiores, o apoio da Instituição era fundamental para
os bons resultados:

[...] É igualmente patente a necessidade de reforçar o interesse do poder


público ao pronto atendimento de grupos, que solicitem ajuda para solução
de seus problemas, desde que esses grupos não se encontrem em condições
de, por si sós, assumir os encargos de uma programação (ALBUQUER-
QUE, 1966, p. 63).

O TCC de Belo (1965), que recorreu ao Desenvolvimento de Comuni-


dade, apresentou muita dificuldade na aplicação do método, devido à com-
plexidade que demandava a execução de um programa de habitação popular.
A abordagem comunitária necessitava de um aporte estrutural-funcional e
econômico maior do que aqueles fornecidos para o setor na época, principal-
mente quanto à fatores de infraestrutura como habitação e saneamento básico.

[...] Dentro das condições de trabalho em que atuamos, é impossível se


conseguir um resultado “ótimo”, como experiência válida para o Serviço
Social. Lutamos contra os recursos da comunidade, que são insuficientes;
contra a mentalidade existente do SESI, que nos tornou desacreditada
perante grande parte da comunidade; contra o poder público, que serviu de
desestímulo para que os moradores tentassem novas investidas em prol da
solução de seus problemas, e contra os próprios membros da comunidade,
que na sua maioria continuavam acomodados, esperando desta maneira que
seus problemas fossem solucionados, tendo em vista o espírito paternalista
de que são possuidores (BELO, 1965, p. 162).

Foi comum a todas as dificuldades apontadas pelas assistentes sociais,


no âmbito específico das fábricas, a falta de programa e financiamento para
sanar as demandas sociais apresentadas pelos operários e familiares; as fábri-
cas que possuíam alguns programas, revelavam sua capacidade irrisória de
atendimento. No âmbito da intervenção do Estado, a falta de uma política para
habitação, saneamento e saúde integrada, e voltada para a classe operária,
era apontada como determinante na incapacidade do Serviço Social alcançar
suas finalidades.
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 177

5. Considerações finais

Os TCCs da ESSPE são essenciais para compreender e reconstruir a


atuação do Serviço Social junto à classe operária em Pernambuco, eviden-
ciando as técnicas e métodos que estavam em construção, além da influência
do pensamento norte-americano nesse processo. Do ponto de vista técnico, o
Serviço Social possuía uma atuação centrada nos indivíduos. Estava passando
por um processo de abertura para os métodos de grupo e de desenvolvimento
comunitário, mas encontrava dificuldades em sua implementação devido à
parca estrutura das instituições onde atuava e as condições de trabalho inci-
pientes. A atuação conduzia-se para corroborar na reprodução da força de
trabalho do operariado e no alcance de suas condições de subsistência, por isso
grande parte das profissionais trabalhava em programas de saúde e habitação
oferecidos pelas entidades. Outro foco de atuação era na formação moral e
intelectual dessa classe operária, voltadas para a um maior preparo técnico da
força de trabalho e ajuste ideológico do operariado. Para as assistentes sociais,
era essencial o trabalho junto às famílias dos operários; a família era encarada
como uma instituição decisiva a ser valorizada na sociedade. As experiências
reveladas pelos TCCs indicam que a atuação profissional estava empenhada,
em grande medida, no fortalecimento dos laços familiares e na perpetuação
as construções sociais desiguais de gênero.
Do ponto de vista da composição ideológica, a profissão passava por uma
mudança: sua visão doutrinária, ligada ao pensamento católico, era impac-
tada pelos métodos psicologizantes e as técnicas burocráticas. Contudo, a
perspectiva doutrinária assumia novas formas na formação intelectual desses
profissionais, pois parte da Igreja estava expandindo sua visão para o campo
desenvolvimentista e sua ala progressista ganhou força na disputa pela dire-
ção do Serviço Social. Observamos que as referências dos TCCs possuem
influência tanto de intelectuais norte-americanos, ligados às correntes de pen-
samento mais tecnicistas, quanto de pensadores ligados à doutrina cristã e à
visão neotomista.
Esperamos, com isso, que o estudo tenha contribuído para o conhecimento
histórico da prática profissional e das ideologias que embasavam o Serviço
Social entre as décadas de 1950-1960, coadunando com as pesquisas sobre
as dimensões e tendências da profissão na particularidade de Pernambuco.
178

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CAPÍTULO 8
REGIÃO NORDESTE, SUDENE E O
DESENVOLVIMENTO DESIGUAL
INTER-REGIONAL NO BRASIL
Jesana Germano da Silva

1. Introdução

Cotidianamente, nos deparamos com inúmeras contradições econômicas,


políticas, sociais e regionais que atestam a relevância e atualidade da proble-
mática do desenvolvimento regional e desigual do modo de produção capi-
talista. Olhamos para bairros “desenvolvidos” e contrastamos com o nosso.
Cidades e regiões “avançadas” são usadas como parâmetro para alimentar
nossa ideia de progresso e de desenvolvimento. E, no senso comum, são cor-
riqueiros os comentários que atestam a realidade social do Brasil como sendo
inferior, se comparada com a de outros países; ou alega-se a realidade social do
Nordeste como inferior frente à de outras regiões. Assim, especulamos sobre
a baixíssima qualidade do metrô e dos ônibus; interrogamos como crianças
famintas podem trabalhar diuturnamente nas ruas; questionamos a existência
de um contingente de pessoas com formação de nível superior desempregadas
ou relegadas à superexploração; perguntamos como casas em espaços urbanos
podem ser completamente alagadas em decorrência de fortes chuvas e nos
comovemos com a “tragédia” de um país comportar quase 500 mil mortos
em decorrência de uma pandemia.
Em nossa concepção, todos esses questionamentos e sentimentos, apa-
rentemente muito difusos e caóticos, se conectam através de uma unidade
analítica intimamente ligada às determinações mais profundas e contraditórias
das sociedades capitalistas que se interligam com as particularidades históricas
e regionais. Tal unidade analítica foi apresentada por Marx (1996, p. 40) em
sua crítica da economia política, ao tentar superar a “representação caótica do
todo” reconhecendo que as mais simples categorias econômicas não podem
existir de outro modo senão como uma “relação unilateral, abstrata de um
todo vivo e concreto já dado”. Assim, aos que se interessam em apreender
idealmente a “carnadura concreta” dos problemas que nos perseguem, pro-
pomos as seguintes perguntas: por que o processo de produção e reprodução
do capitalismo ocorre de forma desigual? Por que o Nordeste brasileiro se
182

tornou uma “região problema” para a qual se precisa constantemente acionar


soluções? E quais inciativas o Estado tomou historicamente para alcance das
prometidas soluções em face da região Nordeste?
Numa perspectiva histórica, a partir da década de 1960, período carac-
terizado por Fernandes (2020) como de irrupção do capitalismo monopo-
lista no Brasil, o Estado criou novas iniciativas para reconfigurar o papel
do Nordeste na dinâmica da reprodução do capital. Num contexto de gestão
nacional de Juscelino Kubitschek (1956-1961), foi criado o Plano de Metas,
que desaguou na criação, em 1959, da Superintendência do Desenvolvimento
do Nordeste (Sudene). Na concepção de Oliveira (1981, p. 24), a criação da
entidade representou a formulação de um padrão de planejamento que, ao fim
e ao cabo, representou a “racionalização da reprodução ampliada do capital”.
Oliveira (1983) compreende a questão regional por meio da categoria divisão
regional do trabalho, com a finalidade de apreender as determinações da
desigualdade inter-regional no país, e revela que, para não existir “limites de
transformação da forma da mais-valia” (p. 24), é necessário que exista um bom
nível de desenvolvimento das forças produtivas (força de trabalho, máquinas,
instrumentos e processos de produção). Ou seja, os conflitos gerados pelo
desenvolvimento e pela expansão do capitalismo no Brasil, as lutas de classes,
foram substanciais para a construção da Sudene e para a implementação de
políticas desenvolvimentistas no período.
Nosso objetivo, portanto, é apreender as condições de criação da Sudene
no processo do desenvolvimento desigual inter-regional. Tomamos como
hipótese que, com muitas contradições e mediações possíveis, a Sudene não
visou romper com a reprodução ampliada do capitalismo dependente brasi-
leiro. Para tanto, serão apresentadas algumas reflexões teóricas alinhadas à
perspectiva marxista sobre as categorias padrão de reprodução ampliada e
desenvolvimento desigual inter-regional; além disso, expomos alguns aspectos
teórico-conceituais e históricos que estão vinculados ao desenvolvimento do
capitalismo no Brasil e na região Nordeste, para, por fim, evidenciar algumas
das bases históricas e teóricas que constituem o Plano de Ação da Sudene no
início da década de 1960.

2. Entre o padrão de reprodução do capital e


a divisão inter-regional do trabalho: a região
Nordeste e as bases para a criação da Sudene
A capacidade de reprodução e de sobrevivência que o capitalismo encon-
trou diante das inúmeras crises que eclodiram entre os séculos XIX e XX
está intimamente ligada à lei do desenvolvimento desigual e combinado120 do

120 Sobre o tema, ver Löwy (1995).


A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 183

sistema. O papel que as sociedades de economias não capitalistas ou semi-


capitalistas exerceram, seja durante o período de livre concorrência do capi-
talismo britânico, passando pela fase clássica do imperialismo até chegar no
período subsequente às duas grandes guerras, denominado por Mandel (1982)
como período do capitalismo tardio, comprova que o atraso e o moderno
constituem uma unidade dinâmica que, grosso modo, conjugam a formação
social de determinado país ao longo do desenvolvimento do modo de produ-
ção capitalista.
A respeito disso, Osório (2012), ao tratar do padrão de reprodução do
capital, compreende que na noção de sistema mundial capitalista121, em uni-
dade com a análise da formação econômico-social e da conjuntura, podemos
encontrar o espaço teórico para compreender a complexidade que envolve a
reprodução do capital em escala ampliada.

A noção de padrão de reprodução do capital surge para dar conta das


formas como o capital se reproduz em períodos históricos específicos e
em espaços geoterritoriais determinados, tanto no centro como na semi-
periferia e na periferia, ou em regiões no interior de cada um deles, consi-
derando as características de sua metamorfose na passagem pelas esferas
da produção e da circulação. (OSÓRIO, 2012, p. 43).

Ainda segundo Osório (2012, p. 45), “[...] a reprodução do capital assume


formas diversas em diferentes momentos históricos, devendo se readequar
às mudanças produzidas no sistema mundial e na divisão internacional do
trabalho”, o que permite historicizar a categoria reprodução do capital, além
de criar mediações entre o padrão de reprodução do capital e os “[...] níveis
mais gerais de análise (modo de produção capitalista e sistema mundial) e os
níveis menos abstratos ou histórico-concretos (formação econômico-social
e conjuntura)”.
Nesse sentido, sempre numa perspectiva histórica, encontramos no livro
A Revolução Burguesa no Brasil, de Florestan Fernandes (2020), algumas
explicações sobre o desenvolvimento do capitalismo brasileiro e o modo pelo
qual ocorreu a revolução burguesa no país, que podem servir de base teórica
para entendermos a inserção do Nordeste nesse processo.
Algo central apresentado por Fernandes (2020), que consideramos
relevante para nossa reflexão, é a revelação de que o capitalismo comporta,

121 “É a partir da aurora do desenvolvimento do capitalismo que a história se constitui em história universal e que
os mais diversos rincões do planeta se integram, com graus de intensidade variados, em um sistema mundial,
dando passagem ao sistema mundial capitalista. Nesse nível situam-se problemas como o mercado mundial,
a divisão internacional do trabalho, o imperialismo, a dependência, o intercâmbio desigual e os movimentos
cíclicos do capital, com suas ondas longas e suas fases de ascenso e descenso” (OSÓRIO, 2012, p. 43).
184

em sua natureza, diversos padrões de desenvolvimento. Segundo Fernan-


des (2020, p. 277) “[...] não é intrínseco ao capitalismo um único padrão
de desenvolvimento, de caráter universal e invariável”, assim como “[...]
não existe um único modelo básico democrático-burguês de transformação
capitalista.” (FERNANDES, 2020, p. 361). Nesse sentido, o autor observa que,
na história moderna da sociedade brasileira, o desenvolvimento do capitalismo
pode ser apreendido por meio de três fases: “[...] a) fase de eclosão de um
mercado capitalista especificamente moderno; b) fase de formação e expansão
do capitalismo competitivo; c) fase de irrupção do capitalismo monopolista”
(FERNANDES, 2020, p. 281). 122
A irradiação e a difusão do capitalismo nessas três fases, segundo Fer-
nandes (2020), além de não guardarem semelhança com o desenvolvimento
capitalista dos países centrais, também não impôs:

1) A ruptura com a associação dependente, em relação ao exterior (ou aos


centros hegemônicos da dominação imperialista); 2) a desagregação com-
pleta do antigo regime e de suas sequelas ou, falando-se alternativamente,
das formas pré-capitalistas de produção, troca e circulação; 3) a superação
de estados relativos de subdesenvolvimento, inerentes à satelização impe-
rialista da economia interna e à extrema concentração social e regional
resultante da riqueza (FERNANDES, 2020, p. 278).

Tais fases representaram, basicamente, a manutenção do caráter de depen-


dência econômica, política, social do país e, nos termos de Prado Jr. (1988),
um ajustamento a ordem imperialista e ao seu padrão de reprodução no sis-
tema mundial capitalista (OSÓRIO, 2012), que pode ser percebido até os dias
vigentes. Não obstante, é na fase de irrupção do capitalismo monopolista que
encontramos alguns elementos históricos que nos levam à problemática da
questão regional e de sua relação com a criação da Sudene.
A fase de irrupção do capitalismo monopolista no país se desenvolve a
partir do final da década de 1950, alastrando-se de forma estrutural após o
golpe de 1964, caracterizando-se “[...] pela reorganização do mercado e do
sistema de produção, através das operações comerciais, financeiras e indus-
triais da ‘grande corporação’ (predominantemente estrangeira, mas também
estatal ou mista)” (FERNANDES, 2020, p. 280).

122 “A fase de eclosão do mercado capitalista moderno é, na verdade, uma fase de transição neocolonial. Sua
delimitação pode ir, grosso modo, da Abertura dos Portos até aos meados ou à sexta década do século XIX
(tornando-se, como ponto de referência, as evidências históricas da crise estrutural irreversível do sistema
de produção escravista). A fase de formação e expansão do capitalismo competitivo se caracteriza pela
consolidação e disseminação desse mercado e por seu funcionamento como fator de diferenciação do
sistema econômico. Ela compreende, pois, tanto o período de consolidação da economia urbano-comercial
quanto a primeira transição industrial verdadeiramente importante; e vai, grosso modo, da sexta década ou
do último quartel do século XIX até a década de 1950, no século XX” (FERNANDES, 2020, p. 280).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 185

É nesse quadro mais amplo e geral de subordinação e integração do


padrão de reprodução da economia nacional ao sistema mundial capitalista,
no contexto de irrupção do capitalismo monopolista, que a relação entre
sociedade, economia e Estado na região Nordeste passa a ser mais integrada
à expansão do capitalismo monopolista, a qual, segundo Oliveira (1981) é
comandada pelo Centro-Sul do país.
Apesar da década de 1960 ser marcada por profundas mudanças no
padrão de acumulação do capital internacional e nacional, que reverberou nas
iniciativas do Estado na região Nordeste, Bernardes (2007) nos chama atenção
para o fato de que foi a partir de 1930 que o Nordeste se constituiu plenamente
como uma região com delimitação oficial, o que, na verdade, consagrava um
processo que se havia iniciado em períodos anteriores.123 Em nossa concepção,
a noção de região Nordeste como “região problema” se desenvolve durante
o século XX, integrada ao desenvolvimento do capitalismo no Brasil, e só
pode ser entendida dentro desse movimento mais amplo, por meio do conceito
econômico e político de região traçado por Oliveira (1981, p. 27), a partir
do qual a região Nordeste é apreendida através da “[...] especificidade da
reprodução do capital, nas formas que o processo de acumulação assume, na
estrutura de classes peculiar a essas formas e, portanto, também nas formas
da luta de classes e do conflito social em escala mais geral”.
O autor citado chama atenção para uma questão elementar: apesar de
existirem diferenciações entre as regiões, o sistema mundial capitalista possui
como tendência a homogeneização da reprodução do capital capaz de fazer
desaparecer a noção econômica e política de região acima mencionada. No
entanto, a tendência de homogeneização da reprodução não se realiza con-
cretamente, pois “[...] o processo de reprodução do capital é por definição

123 As bases de uma questão regional no Brasil podem ser encontradas antes de 1930. Bernardes (2007, p. 54)
afirma que no período do Império já se germinaram distinções entre o Norte e o Sul do país: “A internalização
do poder, com o Estado nacional soberano, criou condições inteiramente novas para a vida política, impos-
síveis de existir durante a vigência do Antigo Regime e do Antigo Sistema Colonial. A própria localização
da corte, no Rio de Janeiro, contribuiu para uma nova territorialidade ao, de alguma maneira, dividir o país
em duas grandes regiões: o Norte e o Sul. Ou seja, na primeira localizavam-se as províncias situadas ao
norte da corte, que compreendia da Bahia ao Amazonas, e ao sul, as que compreendiam de São Paulo
até o Rio Grande do Sul.” Além disso, diz Bernardes (2007, p. 62), “[...] foi durante a Primeira República
que se efetivou a primeira iniciativa institucional do governo central com o objetivo de enfrentar a questão
das secas, questão que tinha um claro recorte regional. Essa iniciativa foi a criação da Inspetoria de Obras
Contra as Secas (IOCS), em 1909, no governo Nilo Peçanha (1906-1910). Entre 1915 e 1919, com maior
intensidade no período 1917-1919, mais uma grande seca assolou o Nordeste. No Congresso Nacional, o
deputado cearense Ildefonso Albano pronunciou um discurso, fartamente documentado, intitulado O secular
problema do Nordeste. Esse discurso teve uma larga repercussão, provocando intensas discussões sobre
o enfrentamento das secas e sobre a ação do Estado na região. A eleição do paraibano Epitácio da Silva
Pessoa para a presidência da República (1918-1922) deu início ao mais vasto programa governamental
de intervenção na região, comparado com tudo o que fora antes proposto ou realizado, tendo por foco a
questão das secas, mas buscando ir além de ações pontuais”.
186

desigual e combinado”, sobretudo entre países que se constituíram como


“[...] reservas e produtores de acumulação primitiva e que, posteriormente,
continuaram subjugados à divisão internacional do trabalho do capitalismo
imperialista” (OLIVEIRA, 1981, p. 27).
Oliveira (1981) observa que o desenvolvimento desigual e inter-regional
do trabalho no país é um processo que se desenvolve entre os séculos XIX e
XX, por meio da configuração de regiões, tanto no plano econômico quanto
no político. Nesse processo, a “região do café”, por exemplo,

[...] desdobrava-se na mesma medida em que avançava desde o Vale do


Paraíba até o Oeste paulista, homogeneizando-se internamente e diferen-
ciando-se da outra “região” – o Nordeste açucareiro – na mesma medida
em que esta era excluída dos novos circuitos de produção e apropriação
do valor gerado pela mercadoria café (OLIVEIRA, 1981, p. 35).

Além disso, verificamos que as desigualdades regionais não são obras da


natureza ou reflexos de meros “desequilíbrios regionais”, tampouco podem
ser resolvidas somente através do planejamento estatal. Tais desigualdades
correspondem aos traços mais gerais do processo de divisão inter-regional
do Brasil que estão na base da formação social do país e que se integram ao
desenvolvimento desigual do capitalismo. Essa interpretação, muito bem
elaborada por Oliveira (1981), apreende que a criação da Sudene, em 1959,
guarda bases no padrão de planejamento que o Estado começa a adotar e que
se distingue da forma “espontânea” que vigorava até então.
É importante salientar que, na fase de irrupção do capitalismo
monopolista, entre o final da década de 1950 e início da década de 1960, o
cenário econômico e político que está na base do processo que desencadeou o
golpe de 1964, pode ser visualizado através da consubstancialidade de perspec-
tivas distintas dentro de um movimento que constitui a forma e o conteúdo da
luta de classes no período, a saber: a força revolucionária das Ligas Campone-
sas124 no campo, a ascensão de movimentos urbanos e populares nas cidades,
a influência norte-americana no contexto de eclosão da Revolução Cubana,
o setor progressista da igreja católica tendo como figura mais conhecida o
arcebispo dom Helder Câmara, o reformismo progressista da figura política
de Miguel Arraes e a influência da perspectiva desenvolvimentista, que tem
como uma das principais representações a criação da Sudene (PAGE, 1972;
SILVEIRA JR.; ALMEIDA, 2019).

124 “Em 1955, mesmo ano de fundação das primeiras Ligas em Pernambuco, reuniu-se no Recife o Congresso
de Salvação do Nordeste, congregando as mais diversas forças políticas, sociais e econômicas, em uma
verdadeira frente ampla em defesa de uma nova política para a região. No ano seguinte, a Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil, realizou um encontro em Campina Grande no qual a questão regional esteve
na ordem do dia, indicando também em suas conclusões a necessidade de um outro tratamento para a
região” (BERNARDES, p. 70-71).
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 187

Nesse processo, segundo Bernardes (2012, p. 71), a eleição de Juscelino


Kubitschek (1956-1961) representou uma

[...] nova era na história brasileira, cuja palavra síntese era o desenvolvimen-
tismo. Um momento especial da história brasileira e da mundial, carregada
das tensões do pós-guerra, e, também, das esperanças do desenvolvimento
para combater as desigualdades entre as nações e as desigualdades regionais
em seu interior. Desenvolvimento com democracia e combate à miséria
pareciam ser a melhor forma de evitar o crescente fascínio da experiência
soviética sobre os trabalhadores e sobre os deserdados da terra.

Ou seja, no contexto de efervescência das lutas de classes no país, e mais


especialmente na região Nordeste, o Estado precisava criar estratégias que lidas-
sem com as problemáticas derivadas dessas contradições, e uma das estratégias
criadas foi atrelada ao desenvolvimentismo que, por sua vez, estava alinhado ao
Plano de Metas de Kubitschek. Bernardes (2012, p. 71) lembra que “[...] foi esse
o momento histórico especial que propiciou a criação do Grupo de Trabalho para
o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), do qual resultou a criação da Sudene”.
Segundo Oliveira (1981), a criação da Sudene guarda bases no padrão
de planejamento que o Estado começa a adotar e que se distingue da forma
“espontânea” que vigorava até então. Nesse sentido, o GTDN criou um
documento intitulado Uma Política de Desenvolvimento Econômico para o
Nordeste, que apresentava os fundamentos da perspectiva da Sudene sobre
o desenvolvimento da região Nordeste. As perspectivas que aparecem neste
documento são apresentadas por Oliveira (1981, p. 25):

O enfoque tradicional, inclusive aceito pelos diagnósticos que fundamen-


taram a criação da Sudene e que continuam a informar as políticas de
desenvolvimento regional no Brasil e alhures, é não somente um enfoque
que parte de uma base estática, tomando como dados uma certa situa-
ção da divisão regional do trabalho para então desdobrar-se na medição
de “desvios”, como é sobretudo uma abordagem que se centra sobre os
resultados dos desenvolvimentos diferenciais inter-regionais, e não sobre
o processo de constituição desses diferenciais. A sua base teórica, ainda
quando permeada pela tradição estruturalista do pensamento econômico
latino-americano, é de inegável extração neoclássica: constitui a ótica
da alocação ótima de fatores, dos desequilíbrios na função de produção
regional, de que os diagnósticos do desemprego e da inadequação da eco-
nomia da zona semiárida do Nordeste são os exemplos mais conspícuos.125

125 Anos depois Francisco de Oliveira (apud BERNARDES, 2007, p. 73) descreveu o documento da seguinte
forma: “Este texto é um clássico. Com a datação do seu tempo, ele é a certidão de nascimento de um tempo
inovador, verdadeira caixa de Pandora de um turbulento processo cujos tremores repercutem até hoje. Cuja
decifração não lhe cabe, mas compete aos homens saídos desse caldeirão do qual foi apenas anúncio.”
188

Ou seja, estamos em concordância com Oliveira (1981), que percebe


a constituição da Sudene, a priori, através de uma perspectiva que encara a
desigualdade regional por meio do enfoque do “desequilíbrio regional”. Tal
documento apresenta quatro diretrizes para a efetivação de um Plano de Ação:

a) intensificação dos investimentos industriais, visando criar no Nordeste


um centro autônomo de expansão manufatureira;
b) transformação da economia agrícola da faixa úmida, com vistas a pro-
porcionar uma oferta adequada de alimentos nos centros urbanos, cuja
industrialização deverá ser intensificada;
c) transformação progressiva da economia das zonas semiáridas no sentido
de elevar sua produtividade e torná-la mais resistente ao impacto das secas;
d) deslocamento da fronteira agrícola do Nordeste, visando incorporar
à economia da região as terras úmidas do hinterland maranhense, que
estão em condições de receber os excedentes populacionais criados pela
reorganização da economia da faixa semiárida (BERNADES, 2007, p. 73).

Em suma, no contexto de irrupção do capitalismo monopolista, as ações


do Estado brasileiro diante da questão regional têm como fundamento a divi-
são desigual inter-regional que se constituiu na formação social do Brasil e
no desenvolvimento do capitalismo no país. A Sudene emerge como uma
das estratégias de um “Estado capturado” (OLIVEIRA, 1981) pela região do
Centro-Sul que se estabelece funcional ao capital estrangeiro e imperialista. O
Plano de Ação da Sudene expressa uma política econômica estruturalista que
via a desigualdade regional como uma questão de “desequilíbrio regional”;
e onde as lutas de classes deveriam ser encaradas como uma questão a ser
resolvida através do planejamento e da homogeneização do espaço econô-
mico. Ao fim e ao cabo, tal política econômica visou consolidar um padrão
de acumulação capitalista que ultrapassava os limites do regional ou nacional,
mas que pretendia integrar o Nordeste e, mais extensivamente o Brasil, no
sistema mundial capitalista.

3. Conclusão

Neste trabalho, buscamos apresentar alguns aspectos que estão na base


da construção da Sudene. Percebemos que a questão regional é uma questão
que se constituiu historicamente e que está intimamente ligada ao desenvol-
vimento do capitalismo no Brasil. No entanto, somente a partir da irrupção
do capitalismo monopolista encontramos uma política econômica nacional
que objetiva homogeneizar e integrar a região à economia capitalista nacional
e ao sistema mundial capitalista. Percebemos que sua criação foi realizada
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 189

num contexto de efervescência da luta de classes, tendo como base a força


revolucionária das Ligas Camponesas no campo, a ascensão de movimentos
urbanos e populares nas cidades, a influência norte americana no contexto de
eclosão da Revolução Cubana, o setor progressista da igreja católica, tendo
como figura mais conhecida o arcebispo dom Helder Câmara, o reformismo
progressista da figura política de Miguel Arraes.
Além disso, a construção da Sudene se deu atrelada ao Plano de Metas
de Juscelino Kubitschek, que tem como base o padrão de planejamento que
o “Estado capturado” pela região Centro-Sul começa a adotar e que se dis-
tingue da forma “espontânea” que vigorava até então. O Plano de Ação do
GTDN, por exemplo, apesar de apresentar perspectivas de mudanças na esfera
da produção, tais mudanças não são capazes de romper com a dinâmica da
desigualdade inter-regional. Tais aspectos permitiram, em nossa concepção,
que se desenvolvesse um padrão de reprodução capitalista mais integrado
ao sistema mundial capitalista, mas sem romper com o padrão desigual da
divisão inter-regional e nacional do trabalho.
190

REFERÊNCIAS
BERNARDES, Denis de Mendonça. Notas sobre a formação social do Nor-
deste. Lua Nova: Revista de Cultura e Política, n. 71, p. 41-79, 2007.

FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de inter-


pretação sociológica. Curitiba: Kotter Editorial; São Paulo: Editora Contra-
corrente, 2020.

LÖWY, Michael. A teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Revista


outubro, v. 1, n. 1, p. 70-80, 1995.

MANDEL, Ernest. O Capitalismo Tardio. Tradução de Carlos Eduardo Sil-


veira Matos, Regis de Castro Andrade e Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo:
Abril Cultural, 1982.

MARX, Karl. Para a Crítica da Economia Política. Tradução Edgard Mala-


godi. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1996.

OLIVEIRA, Francisco. de. Elegia para uma re(li)gião: SUDENE, Nordeste.


Planejamento e conflito de classes. 3. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981.

OSÓRIO, Jaime. PADRÃO DE REPRODUÇÃO DO CAPITAL: UMA PRO-


POSTA TEÓRICA. In: FERREIRA, Carla et al. (org.) Padrão de reprodu-
ção do capital: contribuições da teoria marxista da dependência. São Paulo:
Boitempo, 2012.

PAGE, Joseph A. A revolução que nunca houve: o nordeste do Brasil 1955-


1964. Trad. Ariano Suassuna. Rio de Janeiro: Editora Record, 1972.

SILVEIRA JR., Adilson Aquino; ALMEIDA, Lenita. O “desenvolvimento


de comunidade” no Serviço Social em Pernambuco. Anais do Encontro
Internacional e Nacional de Política Social, v. 1, n. 1, 2019.
ÍNDICE REMISSIVO

A
Ação Católica 23, 24, 27, 48, 51, 52, 56, 57, 58, 88, 137, 147, 148
Ação Popular 35, 37, 137, 138, 147, 155
Assistente social 30, 39, 60, 68, 69, 72, 75, 77, 78, 79, 80, 86, 91, 96, 103,
108, 113, 117, 118, 119, 122, 123, 128, 129, 131, 132, 133, 141, 146, 157, 196
Atuação profissional 9, 36, 46, 76, 77, 106, 111, 125, 128, 158, 177

B
Burguesia 49, 50, 52, 57, 109, 162, 163, 166

C
Capitalismo 15, 33, 35, 44, 47, 48, 82, 83, 84, 103, 104, 106, 107, 127, 138,
145, 181, 182, 183, 184, 185, 186, 188, 190
Classe operária 8, 11, 50, 99, 161, 162, 163, 164, 166, 168, 174, 176, 177
Conselho Regional de Serviço Social 69, 107, 115

D
Desenvolvimentismo 36, 83, 84, 87, 103, 143, 144, 145, 187
Desenvolvimento de comunidade 26, 27, 28, 31, 32, 36, 38, 70, 84, 87, 98,
99, 100, 102, 103, 114, 115, 117, 143, 176, 190
Desenvolvimento desigual 11, 15, 181, 182, 186, 190
Diretório Acadêmico de Serviço Social 136
Ditadura 13, 39, 44, 83, 106, 111, 117, 124, 127, 128, 138, 139, 146, 147,
149, 152, 155, 156, 168

E
Educação de base 27, 37, 90, 93, 99, 100, 143
Educação popular 7, 11, 27, 37, 38, 81, 85, 95, 99, 100, 101, 103, 105,
145, 148
Escola de Serviço Social 7, 11, 16, 18, 19, 23, 27, 28, 29, 30, 32, 33, 35, 37,
38, 39, 40, 41, 45, 47, 48, 49, 51, 52, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 65,
81, 85, 86, 87, 89, 93, 105, 106, 112, 132, 136, 137, 140, 156, 161, 169, 178,
179, 180, 195
Espaços ocupacionais 10, 15, 32, 109, 164, 168
Estado 9, 11, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 23, 25, 26, 28, 33, 34, 35, 37, 39, 41,
43, 44, 46, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 59, 60, 61, 62, 63, 65, 67,
192

68, 69, 70, 72, 73, 75, 76, 78, 81, 82, 83, 84, 85, 99, 109, 110, 111, 113, 114,
118, 120, 121, 124, 125, 126, 133, 136, 139, 141, 145, 146, 154, 156, 157,
158, 164, 165, 166, 168, 176, 182, 185, 186, 187, 188, 189, 195, 196

I
Igreja Católica 33, 43, 49, 50, 51, 64, 137, 145, 147, 148, 169, 186, 189
Industrialização 17, 18, 21, 22, 24, 25, 34, 47, 52, 82, 83, 84, 102, 145, 165,
169, 188
Intenção de ruptura 37, 40, 104, 120

L
Ligas Camponesas 25, 26, 27, 30, 83, 104, 115, 116, 145, 186, 189
Lutas de classes 84, 103, 109, 115, 121, 125, 182, 187, 188

M
Marxismo 33, 35, 44, 147, 153
Movimento estudantil 7, 11, 35, 83, 128, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 143,
146, 148, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 195

N
Nacional-desenvolvimentismo 103, 143, 145
Nordeste 3, 4, 7, 8, 9, 10, 11, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 24, 25, 26, 27, 28,
29, 30, 31, 32, 35, 36, 37, 39, 42, 45, 46, 67, 84, 103, 107, 112, 115, 117,
123, 128, 136, 139, 145, 149, 158, 163, 171, 179, 181, 182, 183, 185, 186,
187, 188, 190

O
Organização profissional 7, 11, 107, 108, 110, 111, 121, 124, 126

P
Paulo Freire 7, 11, 27, 28, 32, 33, 34, 35, 37, 45, 81, 85, 86, 87, 89, 90, 91,
92, 93, 94, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 145, 147, 148
Proletariado 20, 21, 22, 50, 104, 108, 122, 162, 165, 169

Q
Questão social 15, 20, 31, 39, 43, 47, 48, 49, 50, 51, 55, 56, 57, 59, 63, 66,
77, 78, 80, 84, 103, 104, 163, 164, 165, 170, 173, 196

R
Reconceituação 13, 40, 61, 74, 104, 117, 139
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 193

Reforma universitária 29, 142, 145, 151, 153, 154


Renovação do Serviço Social 44, 114, 135, 136

S
Serviço Social 3, 4, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 15, 16, 18, 19, 23, 24, 25, 26, 27,
28, 29, 30, 31, 32, 33, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48,
49, 50, 51, 52, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70,
71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 78, 80, 81, 83, 84, 85, 86, 87, 89, 93, 98, 99, 100,
103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 117,
118, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 129, 130, 131, 132,
133, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 143, 144, 145, 146, 148, 153, 154,
155, 156, 157, 158, 161, 162, 163, 164, 165, 166, 167, 168, 169, 170, 171,
172, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 180, 190, 195, 196, 197
Serviço Social de Grupos 31
Sindicato 75, 111, 121, 122, 124, 125
SUDENE 8, 11, 17, 18, 25, 30, 31, 36, 45, 128, 143, 181, 182, 184, 186,
187, 188, 189, 190
SOBRE AS AUTORAS E OS AUTORES
Adilson Aquino Silveira Júnior
Professor Adjunto do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE). Doutor e Mestre em Serviço Social da Universidade
Federal de Pernambuco. Coordena o projeto de extensão História e Memó-
ria do Serviço Social em Pernambuco (MEHSSPE). Desenvolve pesquisas
e publicações com os temas Teoria Social, Política Social, Fundamentos e
História do Serviço Social. E-mail: j_r1987@hotmail.com

Alessandra Carvalho da Cruz


Historiadora formada pela Universidade Católica do Salvador (UCSAL).
Especialista em História da Bahia pela Universidade Estadual de Feira de
Santana, (UEFS). Mestre em História Social pela Universidade Federal da
Bahia (UFBA). Professora Assistente da Universidade Católica do Salva-
dor lecionando na Licenciatura em História e na Especialização em Histó-
ria Pública e Ensino. Coordenadora do Pibid História e Geografia UCSAL.
Integrante do Grupo de Pesquisa em Serviço Social, Educação e Direitos da
Criança (GESSED). Pesquisas os temas Cultura popular, História do Samba,
História Social, Oralidades e Memórias são de interesse da estudiosa. E-mail:
alessandra.cruz@pro.ucsal.br; alecarvalhocruz.1974@gmail.com

Camila Sobral Leite Lyra Montalvão


Graduanda do curso Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE). Participa do projeto de extensão História e Memória do Serviço
Social em Pernambuco entre as décadas de 1940 e 1970 (MEHSSPE) e da
pesquisa de iniciação científica O Movimento Estudantil do Serviço Social
e Renovação Profissional em Pernambuco nos Anos 1950-1970. Membro
do grupo Conexões Gestão Política-pedagógica do Programa de Educação
Tutorial (PET). E-mail: camila.montalvao@ufpe.br

Gilca Oliveira Carrera


Professora do Programa de Pós-Graduação em Família na Sociedade Contem-
porânea da Universidade Católica do Salvador, concentrando os seus estudos
no Sistema de Proteção Social, Direito da Criança e do Adolescente, nas
relações familiares, política social e Estado. Doutora (2014) e Mestre (2005)
em Educação pela UFBA, graduada em Serviço Social pela UCSAL (2001)
tendo, ao longo da sua trajetória, atuado nas áreas de Família do Adolescente
em situação de risco social e em conflito com a lei. É Professora da Escola de
Serviço Social da Universidade Católica do Salvador (UCSAL), onde mantém
196

Grupo de Pesquisa em Educação, Serviço Social e Direito da Criança e do


Adolescente. É Assistente Social estatutária da Secretaria Municipal de Saúde
de Salvador. Na sua trajetória interdisciplinar, tem experiência de gestão,
implementação e consultoria de políticas sociais em órgãos do âmbito fede-
ral, estadual e municipal, com ênfase em Família na área de Serviço Social,
além de políticas de infância e juventude nas áreas de proteção e medidas
socioeducativas. E-mail: gilcarrera@gmail.com

Ivone Pires Ferreira de Oliveira


Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Católica do Salvador
e mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
PUC/Campinas. Atualmente é professora – Ciodonto/FAISA – Clínica Inte-
grada de Odontologia, do Centro Baiano de estudos odontológicos – CEBEO
e da Universidade Católica do Salvador – UCSal; Pesquisadora/ membro
do grupo de estudos e pesquisa, direitos da criança e adolescente – GSSED;
pesquisadora e vice-líder – Grupo questão social estado e sociedade civil –
GQUESCI. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Saúde
Coletiva, atuando principalmente nos seguintes temas: serviço social, trabalho,
sus, violência e avaliação. E-mail: ivone.oliveira@pro.ucsal.br

Jesana Germano da Silva


Assistente social, mestranda em Serviço Social no PPGSS/UFPE. Integrante
do projeto de extensão Memória e História do Serviço Social em Pernambuco
(MEHSSPE). Pesquisa os temas Serviço Social em Pernambuco e renovação
profissional do Serviço Social. E-mail: jesanagerman@gmail.com

Larissa Ranielly Lima Dias


Graduanda no curso de Serviço Social da Universidade Federal de Pernam-
buco (UFPE). Participa da pesquisa de iniciação cientifica O pensamento
de Antônio Gramsci no Serviço Social nos anos 1970-1980. Participa do
projeto de extensão Memória e História do Serviço Social em Pernambuco
(MEHSSPE). E-mail: larissa.limadias18@gmail.com

Lenita Maria Maciel de Almeida


Graduanda do curso Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE). Participa do projeto de extensão História e Memória do Serviço Social
em Pernambuco (MEHSSPE) e do programa de extensão UFPE no meu quintal.
Participa da pesquisa de iniciação científica O Serviço Social no meio operário
em Pernambuco nos anos 1950-1960. E-mail: lenita.mma@gmail.com
A RECONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SERVIÇO SOCIAL NO NORDESTE 197

Luanna Barbara Cavalcanti Soares


Graduanda em Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE). Participa do projeto de extensão Memória e História do Serviço
Social (MEHSSPE). E-mail: luannabcavalcantisoares@gmail.com

Maria D’Alva Macedo Ferreira


Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Piauí. Mestrado
e Doutorado em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo. Professora titular do Departamento de Serviço Social e do Programa
de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Piaui.
E-mail: mrosariofat@gmail.com

Maria do Rosário de Fátima e Silva


Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Piauí. Mestrado,
Doutorado e Pós-Doutorado em Serviço Social pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Professora titular aposentada do Departamento de
Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da
Universidade Federal do Piaui. E-mail: mrosariofat@gmail.com

Simone de Jesus Guimarães


Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal do Maranhão. Mes-
trado, Doutorado e Pós-Doutorado em Serviço Social pela Pontifícia Univer-
sidade Católica de São Paulo. Professora titular aposentada do Departamento
de Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da
Universidade Federal do Piaui. E-mail: simone.guimaraes@uol.com.br
SOBRE O LIVRO
E-book não comercializado
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 11,5 | 12 | 16 | 18
Arial 7,5 | 8 | 9
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)

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