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MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE
ERICO VERISSIMO
Editora CRV
Curitiba – Brasil
2021
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Designers da Editora CRV
Revisão: Analista de Escrita e Artes
SI581
Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-0327-3
ISBN Físico 978-65-251-0326-6
DOI 10.24824/978652510326.6
2021
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
Todos os direitos desta edição reservados pela: Editora CRV
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Gloria Fariñas León (Universidade Rafael Mario Iorio Filho (ESTÁCIO/RJ)
de La Havana – Cuba) Renata Fonseca Lima da Fonte (UNICAP)
Guillermo Arias Beatón (Universidade Sebastião Marques Cardoso (UERN)
de La Havana – Cuba) Simone Tiemi Hashiguti (UFU)
Helmuth Krüger (UCP) Valdecy de Oliveira Pontes (UFC)
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Sydione Santos (UEPG)
Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)
Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)
Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
A Graça, Nícolas e Letícia
AGRADECIMENTOS
A Deus, por tudo.
Ao meu pai João Daniel (in memorian) e a minha mãe Francisca
(in memorian) por terem sido os responsáveis pela minha existência.
A minha esposa Graça e aos meus filhos Nícolas Daniel e Natá-
lia Letícia pelo apoio incondicional em todos os momentos.
Aos meus irmãos Francisco, Luiz, Sebastião, Maria, Dasneves e
Lucinha pela força que me deram ao longo deste trabalho, extensivo
a todos/as familiares.
A Coordenação Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
(CAPES) pelo apoio financeiro durante os dois ANOS de curso.
A minha orientadora Doutora Ana Laudelina, por tudo e por
todos os momentos em que esteve ao meu lado, com a sua paciência,
sua sabedoria, sua preocupação, sua contribuição, sua lealdade, sua
orientação através da leitura atenta e crítica, uma eterna gratidão.
Ao professor/co-orientador Doutor Ozaías Antonio Batista, o
meu profundo agradecimento pela leitura atenta e sua contribuição
ao longo da produção deste livro.
Aos professores que compõem a banca examinadora, Doutora
Karlla C. Araújo Souza, Doutor Fagner Torres de França e Doutor
Rodrigo Viana de Sales pela participação e contribuição que deram
a este trabalho.
Ao Doutor Alexsandro Galeno e ao professor Doutor Orivaldo
Pimentel na condição de coordenador e vice-coordenador, respecti-
vamente, do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais (PPG-
CS-UFRN), o meu agradecimento.
Aos meus professores e professoras do Programa de Pós-gra-
duação em Ciências Sociais (PPGCS-UFRN) e em especial, aqueles
de quem fui aluno.
A todos os pesquisadores e pesquisadoras do Grupo de Pesquisa
Myhtos-Logos do PPGCS/UFRN, ao qual me integrei ao longo do
percurso do mestrado.
A professora e pesquisadora Maria da Glória Bordini (PUC-RS)
a quem recorri em busca de algumas informações precisas sobre
Erico Verissimo.
Aos funcionários da secretaria do PPGCS, Otânio, Nicolas e
Daniel, que sempre me atenderam bem naquilo que precisei.
Aos colegas da nossa turma de mestrado pela força nos momen-
tos de dificuldades.
A todos/as amigos/as que direta ou indiretamente contribuíram
para a realização deste trabalho.
As relações entre ciência e o poético provocaram uma
virada epistêmica que ultrapassa a dicotomia entre a visão
material e a visão imaginária, sendo no século XX, a obra
de Gastón Bachelard um dos marcos desses deslocamentos,
como sabemos, transformando a imagem da ciência e o
seu funcionamento, considerando que a imaginação do
cientista está eivada de elementos poéticos e até ficcionais.
Ilza Matias de Sousa
SUMÁRIO
PREFÁCIO......................................................................................15
Ana Laudelina F. Gomes e Ozaías A. Batista
INTRODUÇÃO................................................................................19
REFERÊNCIAS.............................................................................127
ÍNDICE REMISSIVO....................................................................133
PREFÁCIO
LEMBRANÇAS-IMAGENS E
MEMÓRIAS-IMAGINAÇÕES
EM SOLO DE CLARINETA
O livro de Raimundo Paulino Silva faz uma leitura diferenciada
e criativa do Solo de Clarineta, autobiografia do escritor brasileiro
Erico Verissimo.
Na proposta teórica do pesquisador, mais do que ficcional, a
memória se apresenta como memória-imaginação, noção da filosofia
estética de Gaston Bachelard. Por conta desse entendimento, Raimundo
se atreve a buscar a poeticidade dessas memórias autobiográficas.
As lembranças verissimianas consteladas são, portanto, recortes
poéticos e bricolagens de Raimundo. São imagens que se mostram
como provocações à imaginação, imagens provenientes dos movi-
mentos de repercussões e ressonâncias que acontecem com o lei-
tor em processo de devaneio poético ou leitura imaginativa, todas
noções bachelardianas.
Raimundo se apoia também no pensamento de James Hillman,
segundo o qual a imaginação (criador-ativa) funda a memória, pois
a base da mente é poética. Por isso, Raimundo ousa pensar na pos-
sibilidade de uma poética memorial autobiográfica. Assim, o estudo
de Raimundo nos sugere que as memórias autobiográficas suscita-
das por Solo de Clarineta podem ser entendidas como imaginações
poéticas de Verissimo.
E tais memórias-imaginações puderam ser acessadas através
de lembranças-imagens de Verissimo que suscitaram devaneios de
leitura em Raimundo. Supondo-se aí uma comunicação transubje-
tiva entre escritor/leitor. Com isso, Verissimo e Solo de Clarineta
são re-imaginados por Raimundo. O que está totalmente dentro do
bachelardismo, para o qual o que importa é buscar o que as imagens
poéticas provocam e levam seus leitores a dizer, o que elas suscitam.
Raimundo pega na mão de seus ex-orientadores acadêmicos e
vai com eles na mesma direção: não há pretensão de objetividade
16
1 Entre eles podemos citar o livro de Karlla Christine Araújo Souza. (A vida num repente.
Memórias (e) Poéticas de João de Vital. Curitiba: Appris, 2021, no prelo), além de outros
estudos de pesquisadores do grupo, os quais, embora não de forma explícita, tem orientações
semelhantes, como a tese de doutorado de Michelle Ferret Abadiali e a de Rodrigo Viana
Salles, dentre os mais recentes.
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 17
1 Nota explicativa: Optei por adotar, neste texto, o nome de Erico Verissimo sem acento gráfico,
no “E” de Erico e no primeiro “i” de Verissimo. Segundo a professora Maria da Glória Bordini,
em e-mail recebido dia 19 abr. 2019, “Erico não usava os dois acentos. Embora a ortografia
oficial diga que se pode corrigir o que foge a ela nos nomes, eu sempre respeito à vontade
do escritor.
20
afetivos do ser humano, que vive suas paixões, seus amores, seus
ódios, seus envolvimentos, seus delírios, suas infelicidades [...]”
(MORIN, 2006, p. 43). Ambos, romance e cinema, “põem à mos-
tra as relações do ser humano com o outro, com a sociedade, com
o mundo” (MORIN, 2006, p. 43.). Enfim, “trata-se de demonstrar
que, em toda grande obra, de literatura, de cinema, de poesia, de
música, de pintura, de escultura, há um pensamento profundo sobre
a condição humana” (MORIN, 2006, p. 45).
Posso dizer que com essa proposta teórico-metodológica de
religação das duas culturas (científica e das humanidades) e de
outros saberes, “as ciências contemporâneas se abririam a uma
reorganização da racionalidade científica incluindo modos de pen-
samento e lógicas antes considerados não científicos” (WUNEN-
BURGER, 2003, p. 203).
Jean-Jacques Wunenburger, baseado principalmente em estudos
de Gilbert Durand, criador da Teoria do Imaginário, explica que a
história da ciência moderna tendeu a exaltar os poderes da razão
vendo-os ilustrados nas produções científicas, marginalizando a
imaginação e colocando o imaginário num papel negativo de obs-
táculo, acabando por antagonizar imaginário e racionalidade. Mas,
de fato, diz o pensador, essas esferas não são antagônicas pois “a
inteligentibilidade do mundo não é sem dúvida redutível a uma
pura atividade de conceptualização abstrata [...] e as representações
científicas] não rompem fundamentalmente com as estruturas inte-
lectuais profundas, cujas imagens são as primeiras manifestações”
(WUNENBURGER, 2003, p. 265).
Ana Laudelina F. Gomes (2016a) relaciona a proposta de reli-
gação dos saberes de Edgar Morin para a reforma do pensamento
a concepções de imaginário e imaginação simbólica presentes da
filosofia estética de Gaston Bachelard, principalmente nas sinali-
zadas por Jean-Jacques Wunenburger, um dos mais importantes
estudiosos e difusores das obras bachelardiana e de Gilbert Durand
na atualidade. Segundo a pesquisadora, Gaston Bachelard fala-nos
da complexidade do homem contemporâneo cindido em duas esfe-
ras de representação opostas, o conceito e a imagem, a razão e a
imaginação (GOMES, 2016a) e os estudos da complexidade viriam
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 25
O escritor e o espelho
• Clarissa (1933)
• Caminhos cruzados (1935)
• Música ao longe (1936)
• Um lugar ao sol (1936)
• Olhai os lírios do campo (1938)
• Saga (1940)
Romance • O resto é silêncio (1943)
• O Continente, 2 volumes (1949)
• O Retrato, 2 volumes (1951)
• O Arquipélago 3 volumes: (vol. I e II, 1961 – vol. III, 1962)
• O Senhor Embaixador (1965)
• O Prisioneiro (1967)
• Incidentes em Antares (1971)
continua...
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 35
continuação
Gênero literário Título/ano da 1ª edição
• Das Bildnis des Rodrigo Cambará [Um certo capitão Rodrigo] (1955)
• Die Zeitund der Wind [O tempo e o vento] (1956)
• Nacht [Noite] (1956)
Alemão
• Mexiko (1958)
• SeineExzellenz der Botschafter [O senhor embaixador] (1967)
• Die LilienaufdemFelde [Olhai os lírios do campo] (1974)
continua...
3 Único livro escrito por Verissimo em língua estrangeira. Com tradução de Maria da Gló-
ria Bordini, foi publicado pela Editora Globo, intitulado Breve história da literatura brasileira
(VERISSIMO, 1995).
4 Para listar as obras, além de Solo de Clarineta, levei em conta duas fontes: “O contador de
história”, livro organizado por Flávio Loureiro Chaves (1972), com a participação de vários
colaboradores, publicado em 1972 e Cadernos de Literatura Brasileira, publicação organizada
pelo Instituto Moreira Sales (2003).
36
continuação
Língua Títulos
continua...
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 37
continuação
Língua Títulos
mescla narrativas memoriais com ficção, ou seja, narra fatos de sua vida
real (memórias de infância) com a poética romanesca autobiográfica.
E se memória para Bachelard (2000) está intimamente relacionada
com sua noção de espacialidade onírica, como trabalhar com as imagens
do espaço onírico nessa abordagem? Como nos ensina Gomes (2013),
no bachelardianismo não devemos encarar a imagem literária como um
objeto, tampouco como um substituto de um objeto, mas buscar dialo-
gar com sua realidade específica, pois ela é um produto da consciência
criadora do escritor em articulação ao devaneio poético do leitor.
Em face disso, Bachelard (2000) nos apresenta seu método de
leitura de imagens pelas imagens, podendo ser entendido também
como leitura imaginativa de imagens (GOMES, 2013). Método por
ele designado por fenomenológico, mas num sentido muito próprio,
que pretende superar a descrição aderindo à função do habitar o
espaço onírico do devaneio poético (GOMES, 2016a), procurando
responder como o escritor habita seu espaço onírico vital, através
das imagens literárias que cria.
A princípio, com base nesses referenciais e nas leituras que
fiz de Solo de Clarineta, já tenho condições de dizer que muitas de
suas imagens literárias remetem à casa onírica e à infância onírica,
noções bachelardianas que serão dois focos narrativos importantes em
minhas leituras imaginativas da poética memorial de Erico Verissimo
nessa obra. No entanto, tenho clareza que outros centros de imagens
aparecerão trazendo a necessidade de voltar a novas leituras, tanto
da obra bachelardiana quanto da Narrativa verissimiana em foco.
Fiz com que ambas se nutram mutuamente ao longo da pesquisa.
No caso específico deste estudo, busco ler a imaginação que
brota das lembranças do escritor Erico Verissimo em Solo de Cla-
rineta, discutindo como essas lembranças podem ser lidas como
imagens poéticas, tornando possível distinguir tanto os aspectos
factuais como os oníricos (de sonho). A esse sonho do escritor,
nessa obra de memórias, estou denominando de poética memorial
autobiográfica, justamente por se tratar de memórias que são estu-
dadas especialmente em sua dimensão de sonho, de onirismo, de
imaginação, de inventividade, qualidades não exclusivas da escrita
literária, mas também da escrita autobiográfica, principalmente em
se tratando de memórias de um escritor de ficção.
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A relação tempo-espaço
Tempo/infância
Articulando lembranças dos tempos de criança, Verissimo conta
momentos de sua infância vividos e lembrados nos tempos em que
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 51
Recordações familiares
Cruz Alta foi o ponto de encontro dos dois troncos cujos ramos
se uniram e, numa sucessão de enxertos e cruzas, tornaram
possível o desabrochar desse espécime humano que agora me
contempla, irreverente, do fundo do espelho. O miserável não
está levando a sério estas memórias. Descobri na idade adulta
que vivem dentro de mim, como irmãos xifópagos, dois sujeitos:
um deles sisudo, responsável e até moralista; o outro um pícaro
que não leva nada a sério (VERISSIMO, 1973, p. 1).
MEMÓRIA IMAGINATIVA
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Os avós paternos
Os avós maternos
Sua mãe
Seu pai
Ao assinar seu nome, meu pai costumava, por assim dizer, pôr
um “rabo” na última letra do nome Verissimo, transformando-a
quase num q. Dizem os peritos em grafologia que esse traço
puxado para baixo revela uma tendência para a autodestruição
(VERISSIMO, 1973, p. 24).
Outro momento que Verissimo alude a seus pais tem a ver com
a sua aversão à ingestão de bebida alcoólica. Em conversa com o
escritor Augusto Meyer (1902-1970)6, que bebia, ficava impaciente
O único irmão
Era uma menina de nove anos e olhos azuis, cabelos dum cas-
tanho alourado, filha duma chapeleira das vizinhanças que por
ela mandava à minha mãe um figurino. Ouvindo as batidas, meu
pai gritou: “Vá embora! Não tem ninguém em casa!”. Assustada
por aquela voz rouca e irada, a menininha se foi quase a correr.
Chamava-se Mafalda, e graças aos enredos e à imaginação do
Autor deste novelão que é a vida, nove anos mais tarde nós nos
casaríamos e ela viria a tornar-se minha companheira pelo resto
da vida (VERISSIMO, 1973, p. 158).
“Um lugar ao sol”, ele procura contar sua história por meio de
pessoas imaginadas.
A Nespereira do Japão
Tive no começo da vida uma árvore que até hoje continua dentro
de mim como um marco do tempo da infância e uma entidade
importante de minha mitologia particular. Era a única existente
em nosso pátio interno (VERISSIMO, 1973, p. 55).
Eu sentia uma grande atração por todos os tipos de lápis de cor, cai-
xas com pincéis e pastilhas de aquarela, e o curioso é que até hoje,
já na reta final para os setenta anos, conservo essa afeição infantil e
o hábito de rabiscar caricaturas onde quer que me caia na mão uma
caneta ou um lápis e eu veja um pedaço de papel em branco. [...]
Na minha casa a peça que mais me atraía e divertia era o escritório
de meu pai – que ele pouco usava (VERISSIMO, 1973, p. 68).
As amizades
Dois vizinhos
As raparigas de Nazaré
Lembranças do Titanic
Casa-Sonho
8 Esta palavra, imagino eu, Verissimo deve estar se referindo ao “Continente”, o primeiro
volume de “O tempo e o vento”.
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[...] creio que a história da minha vida seguiu uma trajetória clara e
coerente e até certo ponto coerente, e que se tem mantido ininter-
rupta desde meus dezoito anos [...] (VERISSIMO, 1976, p. 319).
Não me parece isso ser verdade, visto que pela leitura que fiz
de Solo, Verissimo entra em algumas contradições tais como essa,
quando diz ter sido coerente em termos de trajetória de vida.
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 85
Conflitos da imaginação
Assim, fica evidente nessa última fala, que a primeira vez que
viu o mar foi na cidade gaúcha citada, embora só tenha pisado na
areia da praia na capital fluminense9.
Bachelard (1998), em “A água e os sonhos”, ao tratar dos quatro
elementos materiais (o fogo, o ar, a água e a terra), nos diz que muito
mais que os pensamentos claros e as imagens conscientes, os sonhos
estão sob a influência desses quatro elementos. Nesse sentido, o ele-
mento material água, descrito por Bachelard, é sonhado por Verissimo.
Senti um arrepio pelo corpo todo, produzido não pela dor das
repetidas picadas, mas pela impressão visual delas. Resolvi
então, num mecanismo de defesa, ausentar-me em espírito
daquele quarto, fechei os olhos e busquei na memória momen-
tos agradáveis de meu passado. Deixando o corpo na cama,
transportei-me para um certo anoitecer de fevereiro de 1959, em
Portugal. Tinha acabado de descer do automóvel de meu editor
português em Conímbriga, nas proximidades de Coimbra. Íamos
88
Leio essa lembrança através de uma imagem, não por ser com-
preendida por aquilo que ela me mostra, pois preciso ir além e
perceber a “imaginação” que essa imagem desperta, tal como nos
diz Hilmann (1995).
90
Os viajantes imaginários
10 Escritor português (1911-1969). Obras principais: Avieiros (1942), Horizonte Cerrado (1949),
Uma Fenda na Muralha (1959), Cavalo Espantado (1960) e Barranco de Cegos (1962), con-
siderada a sua obra prima. Escreveu as peças de teatro Maria Emília (1946), Forja (1948).
11 A Polícia Internacional e de Defesa do Estado foi a polícia política portuguesa entre 1945 e
1969, responsável pela repressão de todas as formas de oposição ao regime político vigente.
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NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 93
12 Cidade imaginada por Verissimo como palco do romance “Incidente em Antares”, em 1971.
96
As estações do ano
Essa estação, para Verissimo, não era diferente para ele quando
estava em Porto Alegre. Tanto numa cidade como noutra, as tem-
peraturas, nessa altura do ano são muito baixas, chegando a nevar.
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 99
Nessa última parte, fica claro o que desejava para si, cujo sonho
era viver uma vida diferente daquela de seus pais.
Em seu trabalho na Livraria do Globo, Verissimo conta que era
um polivalente, exercia várias funções, tais como tradutor de livros,
paginador, redator, ilustrador e às vezes fazia função de diretor.
Assim, não sobrava tempo para escrever sua ficção.
Um escritor erótico/pornográfico?
Uma das muitas provas por que tem de passar o romancista para
convencer-se a si mesmo e aos leitores de que não é apenas um
memorialista nem um fotógrafo ambulante, é a de criar com
verossimilhança uma personagem que seja diferente dele em
matéria de gosto, temperamento, caráter. Dizer – como suge-
riu um amigo – que deleguei a Rodrigo procuração para fazer
por mim tudo quanto desejei ter feito na vida, mas não fiz por
timidez ou falta de coragem moral ou física, é uma explica-
ção não apenas simplista mais simplória (VERISSIMO, 1973,
p. 297, grifo do autor).
Sobre escritores/literatos
Ao longo de toda obra autobiográfica, Verissimo faz referência a
muitos escritores, sejam amigos ou não. De quando esteve em Portugal
pela primeira vez, recorda-se de ter encontrado um ficcionista português,
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 109
Confesso que sinto uma sadia, cordial inveja dos escritores que
têm uma real, autêntica intimidade com a terra, as árvores, os
ventos, os bichos e principalmente com as criaturas humanas
que também estão perto das raízes profundas da vida, às vezes
chego a pensar – por mais ridícula que a imagem possa pare-
cer – que sou uma planta do asfalto, mas planta de papel [...]
(VERISSIMO, 1976, p. 309).
Desse professor, Verissimo não diz muita coisa sobre ele, mas
certamente, se foi citado, de entre tantos que teve como docente,
deve ter tido alguma importância. Percebo também aqui outra con-
tradição de Verissimo, visto que, de fato, o que fala efetivamente
sobre esse professor, é uma tentativa de assédio sexual. Certo dia,
convidou Verissimo a sentar numa cadeira junto a dele, numa sala
com a porta trancada. Usou como pretexto para essa conversa, o
incentivo para Verissimo fazer o preparatório do francês para a banca
do Colégio Estadual Júlio de Castilhos:
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 113
Algumas despedidas
Um dos momentos que mais marca as lembranças de Verissimo
é quando se despede da sua filha, após seu casamento com o físico
norte-americano:
Essa reflexão que faz sobre seu pai demonstra o quanto tinha
sentimentos pela sua figura, apesar dos defeitos que habitavam nele.
Depois dessa partida, disse: “Nunca mais tornei a ver meu pai”
(VERISSIMO, 1973, p. 233). Esse tom de nostalgia, associada com
sentimento de culpa, efetivamente por não ter feito algo que pudesse
tirar seu pai da situação em que se encontrava, de miséria, chega
o dia de sua morte, o fim da vida daquele homem que tanto amou.
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 115
A despedida da mãe
A
Autor 18, 19, 24, 30, 31, 33, 35, 45, 46, 50, 55, 56, 57, 59, 61, 63,
65, 66, 68, 69, 70, 73, 74, 76, 77, 83, 84, 87, 88, 94, 96, 99, 100,
102, 103, 104, 106, 107, 108, 109, 111, 112, 113, 115
B
Bachelard 11, 22, 23, 24, 25, 26, 45, 46, 47, 50, 51, 52, 53, 54, 55,
66, 68, 70, 71, 78, 79, 80, 81, 85, 86, 88, 89, 93, 96, 97, 101, 109,
114, 117, 119, 120, 123, 124, 127
C
Casa 13, 17, 26, 30, 36, 43, 45, 47, 53, 56, 57, 58, 61, 64, 65, 69,
71, 72, 73, 78, 79, 80, 86, 90, 92, 93, 99, 100, 101, 102, 103, 113,
120, 121, 122, 123, 125
Clarineta 13, 17, 18, 19, 20, 23, 24, 26, 27, 28, 29, 30, 33, 35, 38,
39, 43, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 71, 81, 88, 101, 119, 125, 128,
130
E
Erico verissimo 3, 4, 9, 13, 17, 18, 23, 26, 27, 32, 34, 36, 37, 45,
46, 47, 48, 128
Escritor 13, 17, 18, 19, 20, 21, 24, 25, 26, 27, 28, 30, 31, 32, 33,
35, 47, 48, 49, 61, 70, 72, 76, 78, 81, 82, 83, 86, 88, 92, 104, 105,
106, 108, 116, 118, 120, 121, 122, 124, 130
H
Homem 21, 22, 29, 53, 55, 59, 60, 61, 62, 63, 68, 73, 75, 77, 78,
82, 85, 87, 91, 92, 93, 96, 101, 102, 105, 107, 109, 110, 111, 113,
114, 115, 116, 120, 121
134
I
Imagens 22, 23, 24, 26, 38, 39, 40, 41, 42, 45, 46, 47, 48, 50, 51,
52, 53, 64, 66, 71, 78, 79, 81, 82, 85, 86, 88, 92, 93, 97, 100, 101,
112, 114, 117, 119, 124, 125, 129, 130
Imaginação 4, 11, 22, 23, 25, 26, 45, 46, 47, 48, 50, 52, 53, 54, 55,
56, 65, 68, 70, 76, 78, 79, 81, 85, 88, 89, 100, 101, 104, 107, 109,
118, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 127, 128
Imaginário 22, 23, 24, 25, 45, 46, 81, 103, 110, 118, 120, 122, 128,
129, 131
Infância 13, 19, 26, 30, 43, 45, 46, 47, 50, 51, 53, 55, 59, 66, 68,
69, 70, 71, 72, 73, 78, 79, 80, 90, 113, 114, 119, 121, 122, 123
L
Lembranças 3, 4, 17, 19, 23, 26, 29, 32, 33, 35, 43, 45, 46, 47, 48,
50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 58, 63, 70, 71, 73, 74, 75, 77, 78, 79, 80,
81, 83, 86, 89, 91, 92, 93, 97, 107, 112, 113, 114, 118, 119
Literatura 17, 18, 21, 22, 25, 32, 33, 35, 36, 37, 51, 69, 70, 71, 73,
84, 87, 94, 99, 106, 108, 109, 124, 128, 129, 130, 131
M
Memórias 18, 19, 20, 23, 26, 27, 28, 29, 45, 46, 47, 48, 50, 52, 53,
54, 62, 68, 78, 81, 88, 90, 100, 101, 120, 121, 122, 125, 127, 128,
130
O
Obra 4, 11, 13, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31,
33, 35, 36, 46, 47, 48, 49, 50, 70, 81, 82, 92, 96, 101, 103, 107, 108
S
Solo de clarineta 13, 17, 18, 19, 20, 23, 24, 26, 27, 28, 29, 30, 33,
35, 38, 39, 43, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 71, 81, 88, 101, 119, 125,
128, 130
Sua vida 20, 24, 27, 30, 36, 46, 50, 63, 64, 68, 74, 85, 86, 87, 90,
91, 94, 95, 96, 110, 114, 118, 121, 122, 124
MEMÓRIA IMAGINATIVA
NAS LEMBRANÇAS DE ERICO VERISSIMO 135
T
Tempo 13, 17, 18, 19, 20, 23, 24, 26, 27, 29, 30, 31, 34, 43, 45, 48,
49, 50, 51, 52, 57, 58, 59, 63, 64, 65, 66, 68, 75, 78, 81, 84, 87, 88,
89, 90, 93, 94, 95, 97, 98, 99, 100, 103, 104, 107, 113, 115, 119,
121, 124
V
Vida 13, 19, 20, 23, 24, 27, 28, 30, 32, 36, 45, 46, 48, 49, 50, 51,
52, 53, 59, 61, 62, 63, 64, 65, 67, 68, 70, 72, 74, 80, 82, 84, 85, 86,
87, 88, 89, 90, 91, 94, 95, 96, 99, 105, 106, 110, 114, 115, 116, 117,
118, 119, 121, 122, 124, 125, 127, 128, 129
SOBRE O LIVRO
Tiragem: 1000
Formato: 14 x 21 cm
Mancha: 10 X 17 cm
Tipologia: Times New Roman 11,5/12/16/18
Arial 7,5/8/9
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)