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Ana Paula Wilvert

Camilla Volpato Broering


(organizadoras)

A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA:
reflexões e possibilidades de intervenção

Editora CRV
Curitiba – Brasil
2021
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Designers da Editora CRV
Imagem da Capa: Camilla Volpato Broering
Revisão: Analista de Escrita e Artes

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


CATALOGAÇÃO NA FONTE
Bibliotecária Responsável: Luzenira Alves dos Santos CRB9/1506

AT886

A Atuação da Psico-oncologia: reflexões e possibilidades de intervenção / Ana Paula Wilvert,


Camilla Volpato Broering (organizadoras) – Curitiba: CRV, 2021.
282 p.

Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-1082-0
ISBN Físico 978-65-251-1081-3
DOI 10.24824/978652511081.3

1. Psicologia 2. Psicologia da saúde 3. Psicologia hospitalar 4. Oncologia I. Wilvert, Ana


Paula, org. II. Broering, Camilla Volpato, org. III. Título IV. Série.

CDU 616-006 CDD 150


616.99
Índice para catálogo sistemático
1. Psicologia hospitalar - 150

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2021
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de La Havana – Cuba) Olga Ceciliato Mattioli (ASSIS/UNESP)
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Rodrigo Pratte-Santos (UFES)
Sérgio Nunes de Jesus (IFRO)
Simone Rodrigues Pinto (UNB)
Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA)
Sydione Santos (UEPG)
Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)
Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)

Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar aos pacientes que cruzaram o meu caminho
ao longo destes anos de jornada profissional, me ensinando a importância
da empatia, do cuidado e do amor. Agradeço também aos colegas de saúde
mental que toparam o convite em disseminar o seu conhecimento nesta obra,
primando pela responsabilidade ética e comprometimento com a nossa profis-
são. À Camilla Volpato Broering por abraçar a causa e juntas fazermos desta
obra um recurso utilitário aos demais colegas de profissão.

Ana Paula Wilvert

Quando se decide escrever um livro, sabe-se o quanto isso envolve


várias etapas, e pessoas sérias e competentes no que fazem. Tive a parceria de
pessoas incríveis que se dedicaram a escrever de forma única e responsável
sobre seus pacientes e suas formas de atuar.
Agradeço a todos aqueles que contribuíram com capítulos para esta obra,
pois além de confiarem na proposta, se empenharam no projeto. Agradeço a
Ana Paula Wilvert pelo convite em fazer parte deste desafio!
Também agradeço a todos os pacientes que num momento de dificuldade,
nos ensinam tanto, não só na nossa prática, como também, na nossa forma de
poder contribuir com o fazer do outro.
Dedico este livro a eles, que são nossa inspiração!

Camilla Volpato Broering


SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO...................................................................................................... 11

PREFÁCIO.................................................................................................................13
Tânia Rudnicki

PRÓLOGO.................................................................................................................17
Maria Balbina de Magalhães

PARTE I

CAPÍTULO 1
AVALIAÇÃO DA PERSONALIDADE DE PACIENTES ONCOLÓGICOS.............. 21
Sueli Terezinha Bobato
Kátia Baltoré Floriani

CAPÍTULO 2
GESTALT-TERAPIA E ADOECIMENTO: a abordagem desenvolvida pela Dra.
Adriana Schnake para trabalhar com pacientes oncológicos.....................................41
Ana Carolina Seara

CAPÍTULO 3
O MULTIFATORIAL DO CÂNCER:
intervenções e desafios no tratamento psicológico.....................................................53
Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida
Rodrigo Serrão de Farias

CAPÍTULO 4
AS REPERCUSSÕES EMOCIONAIS DO CÂNCER ASSOCIADAS À
GRAVIDEZ: uma revisão integrativa..........................................................................75
Igor Weyber da Silva Ramos
Isabel Regiane Cardoso do Nascimento
Keyssiane Maria de Alencar Lima

CAPÍTULO 5
CUIDADOS PALIATIVOS: compreensão dos profissionais......................................87
Marina Mesquita Geraldeli Carvalho Cavalcanti

CAPÍTULO 6
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS EM PACIENTES ONCOLÓGICOS............ 107
Cleonice Zatti
Stefania Teche
Lúcia Helena Machado Freitas

CAPÍTULO 7
O LUTO ANTECIPATÓRIO.....................................................................................121
Paula Abaurre Leverone
CAPÍTULO 8
A ESPIRITUALIDADE E O CÂNCER: uma luz na escuridão ................................131
Patrícia Pessatto da Silva
Maria Balbina de Magalhães

CAPÍTULO 9
MULHERES SOBREVIVENTES DE CÂNCER DE MAMA:
crescer a partir do sofrimento....................................................................................145
Tânia Rudnicki

CAPÍTULO 10
ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO (COPING) DE DOENÇA EM
SITUAÇÃO DE TRATAMENTO HOSPITALAR......................................................165
Grazielle Rocha França

CAPÍTULO 11
LUTO E PERDAS IMPLICADOS NO TRATAMENTO ONCOLÓGICO................183
Ana Paula Wilvert

CAPÍTULO 12
O FEMININO FRENTE AO CÂNCER DE MAMA..................................................191
Heloisa Canteri Langa

CAPÍTULO 13
RECURSOS LÚDICOS E O CÂNCER INFANTIL.................................................199
Camilla Volpato Broering

CAPÍTULO 14
PSICOLOGIA PEDIÁTRICA E ONCOLOGIA: intervenções
da terapia cognitiva..................................................................................................... 217
Marisa B. L. Marantes Sanchez
PARTE II

CAPÍTULO 15
O PACIENTE IDOSO ONCOLÓGICO E A COVID-19...........................................233
Camilla Volpato Broering
Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida
Vanessa Schmitz Bulcão

CAPÍTULO 16
CÂNCER NO CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19:
Repercussões Psicológicas e Implicações Práticas.................................................253
Daniela Barsotti Santos
Beatriz Schmidt
Débora da Silva Noal

ÍNDICE REMISSIVO...............................................................................................267

SOBRE OS AUTORES E ORGANIZADORES......................................................275


APRESENTAÇÃO
Esta obra é a junção da teoria com as experiências práticas de diversos
profissionais de saúde mental atuantes no contexto da Cancerologia. Com
olhares voltados para todas as fases do desenvolvimento humano: iniciando
pela infância, adolescência, fase adulta e idosa. Assim como para todas as
etapas do processo de tratamento oncológico, suas perdas e lutos implicados,
estando o paciente em condições clínicas curativas ou não.
Aborda também questões como a estrutura de personalidade do sujeito
e criação de modos de enfrentamento do câncer, as repercussões psicológicas
que este diagnóstico acarreta, podendo, inclusive, evoluir para um transtorno
psiquiátrico. Sendo assim, possibilidades de intervenção em diversas abor-
dagens do estudo da psicologia são mencionadas, assim como a eficácia da
terapia lúdica com as crianças em tratamento oncológico.
Por fim, o livro apresenta dois capítulos relacionados ao tratamento do
câncer em tempos de COVID-19, tema atual, que trouxe uma crise sanitária e
econômica sem precedentes no Brasil e no mundo, e exigiu dos profissionais
que trabalham na área da Oncologia adaptações constantes de seu fazer para
dar continuidade ao tratamento oncológico de seus pacientes. Portanto, trata-se
de um livro completo na medida em que abrange espiritualidade, cuidados
paliativos e luto, e temas atuais. Assim como aponta que os envolvidos neste
processo de doença vão além do paciente, implicando em questões emocionais
também em seus familiares e na equipe de saúde.
Portanto, trata-se de um livro completo na medida em que abrange espi-
ritualidade, cuidados paliativos e luto. Assim como aponta que os envolvidos
neste processo de doença vão além do paciente, implicando em questões
emocionais também em seus familiares e na equipe de saúde.
PREFÁCIO
Nos dias de hoje, muito se fala sobre os temas tratados nesta obra. Sua
publicação é uma ótima notícia, pois estamos ainda carentes de elementos
aqui trabalhados por profissionais da área da saúde. Desta forma, me sinto
honrada pelo convite de prefaciar este livro.
Na prática do psicólogo, é importante ter uma boa orientação ao longo do
caminho, tendo em vista que muitas variáveis estão em jogo na vida cotidiana
de todos: bem-estar, equilíbrio mental, qualidade de vida, relacionamentos e
comportamento frente a dificuldades. Tenho certeza de que as mãos experien-
tes dos autores poderão nos guiar nessa labuta. Os capítulos estão apoiados
na prática cotidiana dos autores e em estudos fidedignos. Desta forma, é com
grande entusiasmo que prefacio a publicação da primeira edição do livro “A
Atuação da Psico-oncologia: reflexões e possibilidades de intervenção”.
Os capítulos trazem contribuições de profissionais em diferentes práticas
e formas de abordar sua vivência, tecendo uma rede de cuidados que inclui
diversos espaços pelos quais os pacientes, família e equipe transitam. Desta
forma o Livro oferece caminhos através de pesquisas e reflexões.
A história da psicologia no que se refere ao trabalho com pacientes
oncológicos, no combate e adaptação ao tratamento do câncer percorreu um
longo caminho. O Livro foi construído enfatizando a psicologia baseada em
evidências, para que seus leitores tenham clareza de que cada opção de abor-
dagem é singular e de reconhecida importância, introduzindo o que é ímpar
a cada ator presente na situação de doença oncológica – o paciente, a família
e a equipe de saúde, visando cuidar e crescer em termos de conhecimento,
buscando melhorar o atendimento ao enfermo.
A presente obra traz temas diretamente relacionados à psicologia na
área da oncologia, desde atendimento infantil ao adulto, cooperação e escla-
recimentos sobre abordagens da psicologia e a prática profissional de cada
colaborador. O título sugere a vinculação entre esses temas – ‘Psicologia na
Oncologia’, caminhos, reflexões e comportamento humano.
O capítulo 1 fala do tema da ‘Avaliação da personalidade’, retratando a
situação atual do câncer, mostrando questões da personalidade e suas influên-
cias na vida dos enfermos. O capítulo 2 trata da abordagem da Gestalt terapia
no adoecimento, e sua prática junto à pacientes oncológicos.
O capítulo 3 aborda o aspecto ‘multifatorial do câncer: intervenções e
desafios no tratamento psicológico’. Abrange o câncer enquanto doença crô-
nica e o quanto afeta a vida do paciente em muitos aspectos, como na imagem
corporal e depressão. Dessa forma, os autores identificam, através de exce-
lente revisão bibliográfica, aspectos que devem ser estudados, apresentando
14

dados da eficácia da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) junto ao


paciente oncológico.
O capítulo seguinte (4) trata das ‘repercussões emocionais do câncer
associado à gravidez: uma revisão integrativa’ e mostra sensações ambíguas de
vida e morte, gerando conflitos emocionais e éticos para todos os envolvidos,
desafiando cada vez mais o alcance da integralidade do cuidado prestada pela
equipe médica e multiprofissional.
Logo em seguida, o capítulo 5, trata de tema atual e instigante, os ‘cui-
dados paliativos: compreensão dos profissionais’. A partir do avanço da medi-
cina, a luta contra doenças potencialmente fatais e a própria morte tem se
estendido, prolongando a vida e o próprio sofrimento daqueles que já não
apresentam possibilidade de cura. O capítulo aponta dois temas importantes
– o cuidado com o doente e família e a própria equipe. Os profissionais que
atuam atualmente com cuidado paliativo (CP) necessitam de um treinamento
diferenciado, conhecimento e reconhecimento sobre o real significado deste
cuidado. O capítulo refere conteúdo sobre a bioética e aborda conceitos
presentes no modelo do CP e no processo de morte.
O capítulo 6 trata dos ‘Transtornos psiquiátricos em pacientes oncológi-
cos’. O diagnóstico de um câncer possui um efeito devastador para o paciente,
trazendo ainda a ideia de morte, embora atualmente ocorram muitos casos de
cura. O câncer facilita um aumento na morbidade psiquiátrica, tornando-se
assim, fator de risco para o desenvolvimento de transtornos mentais em geral.
Sintomas de sofrimento psíquico e físico podem emergir ao longo do tratamento
oncológico, frequentemente combinado com os sintomas da própria doença.
O capítulo 7 trata sobre o ‘luto antecipatório’, mostrando que o fenômeno
do luto é um processo psíquico natural e indispensável para a elaboração da
perda e reajustamento ao mundo e à vida diante da ausência do que foi perdido.
O contexto histórico do tema foi trabalhado pelas autoras, dando significado ao
trabalho. O termo foi utilizado pela primeira vez por Lindemann, em 1944, a
partir da observação das esposas de soldados que iam para a guerra. Saber que
talvez eles não voltassem, acionava o gatilho do sentimento de perda e todas
as consequências emocionais que a situação evocava. De um lado, temos que
nos preparar para a morte que se avizinha e, de outro, precisamos dedicar toda
atenção e carinho ao paciente em fase terminal. Esse contraponto da vivência
mostra, no dizer de Arantes, que ‘a morte nos ensina a viver’.
O capítulo seguinte (8), traz um tema atual e de importância fundamental,
a espiritualidade. Até pouco tempo atrás, falar em espiritualidade se resumia
a considerar os temas pertinentes à religião. Atualmente, é temática que atra-
vessa o interesse de várias áreas do conhecimento. As autoras mostram que
é uma forma de enxergar e encarar a realidade, não se relacionando, neces-
sariamente, com religião. Trata dos sentimentos que nutrem a pessoa no seu
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 15

cotidiano, na forma como ela encara seus problemas. O próximo capítulo (9),
trata do ‘Crescimento Pós-Traumático, em mulheres sobreviventes de câncer
de mama’. Este conceito foi anunciado por Calhoun e Tedeschi, na década
de 1990 onde, para algumas pessoas, acontecimentos traumáticos passam a
ter oportunidades de crescimento pessoal e relacional. É apontada a vivência
do câncer de mama em mulheres sobreviventes, como evento estressor, uma
experiência traumática que pode servir como oportunidade para aprenderem
e, portanto, crescerem enquanto pessoas.
O capítulo 10 mostra a importância do coping, através de um relato
de experiência, junto ao paciente infantil hospitalizado e sua mãe. O câncer
durante a infância, se caracteriza como um elemento estressor para os pais,
pois é uma ameaça real e imprevisível, na mesma medida em que, receber notí-
cias de que seu filho tem uma doença que oferece risco de vida, é um evento
que pode se tornar traumático. A autora nos mostra como se torna fundamental
auxiliar os pais no enfrentamento da doença e alívio de seu sofrimento, pois
são fundamentais para apoio emocional a criança em tratamento oncológico.
O próximo capítulo (11), fala sobre ‘lutos e perdas no tratamento onco-
lógico’. Quando adoecemos ou quando acompanhamos uma pessoa em seu
processo de adoecimento, as perdas são partes marcantes do enfrentamento da
situação. Cada perda sofrida traz consequências e geram processos de luto para
pacientes, familiares, cuidadores, profissionais da saúde, entre outros. A autora
mostra que o luto, diante de qualquer uma destas perdas, é uma reação normal e
esperada em consequência à uma perda significativa. É parte natural da existência
humana, acompanha todo o ciclo vital e precisa ser vivido para ser superado.
O capítulo 12 trata do ‘feminino frente ao câncer de mama’, através de
um entendimento psicodinâmico. Trata da visão subjetiva da mulher, porta-
dora de câncer de mama, buscando compreender aspectos implicados no seu
adoecimento. Mostra da importância do atendimento multidisciplinar e do
papel do psicólogo no contexto.
Os capítulos 13 e 14 trazem os recursos lúdicos e o câncer infantil, mos-
trando que no tratamento oncológico infantil, atividades prazerosas e alegres
devem ser proporcionadas à criança como aliadas ao seu desenvolvimento e
reabilitação, e não como simples passatempo. O brincar é apresentado como
de ajuda à criança, frente as suas necessidades socioemocionais preservando,
na medida do possível, estas necessidades, pois quando brinca ela se comu-
nica, se expressa, se diverte e relaxa. A psicologia pediátrica é inserida através
de intervenções pela terapia cognitiva. A autora mostra que a abordagem
cognitiva, é aquela que melhor se aproxima da prática assistencial em saúde,
devido a sua agilidade.
O capítulo 15, trata do ‘paciente idoso oncológico e a Covid-19’. As
autoras apontam o envelhecimento humano como fenômeno universal, além
16

de apontarem para a mudança da pirâmide epidemiológica. Esta transição


demográfica e epidemiológica traz grandes desafios, sendo responsável pelo
surgimento de novas demandas de saúde, principalmente aquelas relacionadas
a doenças crônicas, como é o caso do câncer. O capítulo mostra que adaptar-
-se ao processo de envelhecimento, bem como às mudanças impostas pela
vivência do adoecimento por câncer, se constituiu em uma forma de cuidar
de si. Isso porque, a convivência do envelhecer com o câncer pode causar
efeitos diversos na vida do paciente se ele não souber utilizar estratégias de
enfrentamento adequadas.
Como última contribuição, o capítulo seguinte (16), apresenta tema atual
e instigante – ‘o câncer no contexto da pandemia de COVID-19’. As autoras
abordam as repercussões psicológicas e suas implicações práticas na assistên-
cia a pessoas com câncer e seus familiares nesta pandemia. Caracterizam, de
forma geral, a pandemia, com destaque aos impactos psicossociais, discutem
aspectos relacionados ao câncer, enfatizando as repercussões psicológicas que
podem ser experienciadas pelos pacientes oncológicos e seus familiares na
vigência da pandemia, finalizando com a apresentação dos desafios e poten-
cialidades das intervenções psicológicas diante do cenário atual.

Meu obrigada às organizadoras.


Que este Livro seja proveitoso a todos os leitores.
Tânia Rudnicki
PRÓLOGO
Pensar o homem a partir de intervenções dentro de uma abordagem holís-
tica, integral, já faz parte de qualquer protocolo do profissional que trabalha
com saúde. A Psicologia Hospitalar, apesar de todas as críticas que possa
receber, nesse aspecto, está à frente em relação a outras áreas de cuidado.
Tarefa desafiadora e nada fácil se for levado em conta a diversidade e as
condições socioeconômicas e políticas de nosso País, além da falta de inves-
timento em pesquisa na área de saúde. Esse contexto adverso, no entanto, não
impede os profissionais na busca de melhores estratégias para trabalhar com
seus pacientes, no sentido de minimizar os efeitos do adoecimento.
Quando falamos de câncer sabemos que os efeitos emocionais são ainda
mais devastadores. É uma doença que é atravessada por uma série de signi-
ficados e que o psicólogo precisa ter uma escuta qualificada para perceber
qual é realmente a demanda e de onde parte essa demanda. É do paciente?
Da família? Da Equipe? De onde vem realmente esse pedido?
O cenário quase sempre é o mesmo: a pessoa que se encontra, nesse
momento existencial, com uma doença chamada câncer, não é a protago-
nista da cena de seu tratamento. Quem ou o que ocupa esse lugar pode ser
muitas coisas, inclusive a própria doença. Daí a importância do profissional
psicólogo junto a pessoa em sofrimento, ajudando a trabalhar as situações
críticas que o câncer provoca. Desde os sentimentos que emergem quando
recebe o diagnóstico, todo o processo de negação do câncer, depois durante
o acompanhamento do tratamento, final do tratamento e pós-tratamento, que
nem sempre recebe atenção. Fase importante, porque em muitos casos as
pessoas conseguem lidar com o processo, até porque têm todo o apoio de
uma equipe de profissionais.
No entanto, quando retornam para seu cotidiano se deparam com seus
medos e outros sentimentos e não sabem o que fazer, além de se encontrarem
sozinhas. Nesse momento, há uma cobrança de que está na hora de voltar à
vida normal, de que está tudo bem. Porém, para elas não está. E pior, elas não
sabem dizer o que não está bem.
A necessidade de um profissional que possa fazer essa tradução é vital.
Sabemos que estas situações não são exclusivas dos tratamentos de câncer,
outros tipos de adoecimento também trazem grande sofrimento psíquico. A
diferença é que o câncer traz colado ainda a questão da morte. Ter o diagnós-
tico de câncer é se deparar com a questão de finitude. Além disso, emergem
diferentes sentimentos e percepções que necessitam ser compreendidos, tais
como ansiedade, raiva, angústia, culpa e depressão e, muitas vezes, tentativas
de suicídio como mecanismo de enfrentamento.
18

O relato do manejo destas e outras situações, que fazem parte do coti-


diano do psicólogo, nos diferentes contextos de saúde, é resultado da expe-
riência de cada profissional desta publicação. Todo conhecimento produzido e
divulgado sempre é muito bem-vindo, pois é uma forma de compartilhar o que
está sendo pesquisado ou vivido na prática. E, como professora universitária
isso é muito comemorado, porque estamos sempre buscando novos materiais
para levar para a formação dos alunos.
Minha alegria de participar deste livro não se limita a uma questão única.
Fiquei muito contente de ter sido convidada para fazer a apresentação deste
livro, pois há um carinho todo especial por esta publicação. Tudo começou
em Salvador, durante o XII Congresso da Sociedade Brasileira de Psicologia
Hospitalar, em 2019, quando começamos a pensar qual seria o nome deste
livro. Estávamos eu, Camilla Volpato Broering e Ana Carolina Seara no quarto
conversando e, depois de muitas sugestões e risadas, um nome saiu e foi con-
senso, quando alguém gritou: – Escreve, senão vamos esquecer! E foi escrito
num guardanapo. É bem verdade que ele passou por algumas alterações. Mas,
tudo começou lá na Bahia, abençoado pelos orixás.
Assim, você vai encontrar neste livro pesquisas e muitas informações,
mas todas permeadas por muitos afetos, mesmo que você não perceba à pri-
meira vista, porque, no fim, ele trata de vidas valiosas que são nossos pacien-
tes. Encantou-me de muitas formas ter participado desta publicação.

Maria Balbina de Magalhães


PARTE I
CAPÍTULO 1
AVALIAÇÃO DA PERSONALIDADE
DE PACIENTES ONCOLÓGICOS
Sueli Terezinha Bobato
Kátia Baltoré Floriani

O câncer agrupa um conjunto de mais de duzentas doenças com carac-


terísticas comuns relacionadas ao processo de divisão das células de forma
anormal e descontrolada, com invasões a outros tecidos, constituindo-se
como um problema de saúde pública mundial. Configura-se como a segunda
principal causa de morte no mundo, responsável por seis milhões de óbitos
anuais, e a estimativa é que sua incidência continue em ascensão, se não
forem tomadas medidas de prevenção ativa e mudança no estilo de vida
(INCA, 2017; Saito et al., 2015).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima, para o ano de 2030,
cerca de 27 milhões de novos casos de câncer, 17 milhões de mortes, e apro-
ximadamente 75 milhões de pessoas convivendo, anualmente, com algum tipo
de neoplasia (Modena et al., 2014). A situação é ainda mais preocupante nos
países em desenvolvimento, onde foram observados 60% dos novos casos
em 2012, e onde se concentrou 70% da taxa de mortalidade devido a doenças
oncológicas no mundo. Hoje, nos países em desenvolvimento, são estimados
aproximadamente 16 milhões de casos novos na década de 2016-2025, ou
seja, 80% da estimativa mundial (INCA, 2015). Guimarães et al. (2016),
ao analisarem alguns estudos atuais que consideram índices epidemiológi-
cos do câncer em diversos países, relacionando-os ao seu IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano), estabelecem uma relação direta entre o padrão
de morbimortalidade oncológico e o contexto socioeconômico dos países.
O desenvolvimento das neoplasias é de etiologia multifatorial, com
interação entre os fatores externos, como os hábitos ou costumes próprios
de um ambiente social e cultural; e os fatores internos ao organismo, geral-
mente pré-determinados geneticamente e ligados à nossa capacidade de
defesa. No entanto, estima-se que aproximadamente 80% das neoplasias
estejam associadas aos fatores ambientais como tabagismo, alcoolismo,
obesidade, medicalização, questões ocupacionais, contaminação por vírus
e exposição à radiação solar, os quais alteram a estrutura do DNA celular
(Saito et al., 2015; INCA, 2017).
22

Os fatores de risco para o desenvolvimento do câncer também podem


ser herdados geneticamente (INCA, 2017). No entanto, apesar de se reco-
nhecer que a hereditariedade exerce um papel importante na oncogênese, os
casos de doenças oncológicas desenvolvidas exclusivamente devido a fatores
genéticos são considerados raros (cerca de 10%). Em relação aos casos de
câncer de mama e de estômago, por exemplo, nos quais se observa haver um
forte elemento familiar operante, estuda-se a existência de uma exposição
comum a todos os membros da família a determinados fatores ambientais
de risco, que se converteriam na principal causa da doença (INCA, 2017).
Chammas (2010) apud Saito et al. (2015) salienta que o progressivo
aumento da longevidade humana contribuiu para investimentos em pesquisas
relacionadas às doenças crônico-degenerativas nos últimos 40 anos, inclu-
sive no Brasil, mais sistematicamente a partir da década de 80, trazendo
novos conhecimentos. No entanto, o desafio para o século XXI será o de
compreender e atuar nas escalas sistêmica e social, para além das escalas
molecular, celular, tecidual e orgânica.
Partindo dessa premissa, teorias e estudos sobre as questões da personali-
dade também têm sido conduzidos, a fim de se investigarem suas influências na
vida dos seres humanos. Dentre eles, destacamos a existência dos estudos que
se debruçam sobre a personalidade e a sua relação com a saúde (Bandeira, Bar-
bieri, 2007; Peres, Santos, 2009; Carvalho, 2010; Paiva, 2014; Pinto, 2016).
Nesse contexto, Patrão e Leal (2004) afirmam que a relação entre persona-
lidade e saúde pode estar na questão etiológica da doença, ao considerar-se
que determinados traços de personalidade tendem a produzir determinadas
alterações neuroendócrinas e imunológicas; na questão de mediação do stress,
como estilos de coping com os diversos problemas e conflitos da vida e; na
probabilidade de adotar comportamentos de risco ou não para a saúde.
Peres e Santos (2009) realizaram uma revisão sistemática da literatura
entre o período de 1995 a 2005, dedicada especificamente ao papel da perso-
nalidade na evolução da condição clínica e emocional de mulheres acometidas
por câncer de mama, e encontraram resultados que concluem que pacientes
que sofrem um comprometimento clinicamente significativo da condição
emocional quando da descoberta da enfermidade, tendem a apresentar níveis
reduzidos de linfócitos B e células T4 após a cirurgia e obtêm resultados
pouco efetivos com a quimioterapia. Os autores também encontraram estudos
que sustentam que mulheres que demonstram locus de controle intermediário,
referem satisfação com o suporte familiar e não experimentam perda subjetiva
de controle, sendo pouco propensas à recidiva precoce.
Paiva (2014) também afirma que diversos estudos têm sido conduzi-
dos por pesquisadores do mundo inteiro, com o intuito de compreender um
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 23

pouco melhor a relação entre traços de personalidade e o desenvolvimento


de patologias. Segundo a autora, muitos apontam para a existência de
influências psicológicas e de perfis de personalidade sobre o desenvolvi-
mento do câncer (Rubinow, 1990; Friedman, 1994; Nagano et al., 2001;
Nabi et al., 2008 apud Paiva, 2014).
De acordo com Paiva (2014), um estudo realizado em Paris, por Con-
soli, Cordier e Ducimetiére, em 1993, aponta para a ligação entre certos
traços de personalidade e o desenvolvimento de patologias, considerando
tanto o desencadeamento como sua evolução. Conforme este estudo, atitudes
como a de autopunição, por exemplo, detectadas em pessoas com câncer,
podem causar efeitos inibidores no sistema imunológico e, consequente-
mente, estimular a proliferação de tumores. Ainda, há indicativos de que a
ansiedade seja uma característica redutora da eficácia da quimioterapia para
o câncer. Assim, entende-se que o perfil psicológico seja ponto importante,
pois afeta a história clínica do paciente (Consoli, 1999, apud Paiva, 2014).
A autora assinala ainda que o perfil autopunitivo tem sido associado ao
câncer, assim como a característica do declínio progressivo na percepção do
prazer. Essa dificuldade em identificar o prazer, por sua vez, está relacionada
à queda ou à supressão de imunidade em pacientes oncológicos, devido a
linfopenia total ou redução de linfócitos (Rubinow, 1990; Jankovic, 1994;
Antoni, 2003 apud Paiva, 2014).
Em revisão da literatura brasileira que relacionam características de
personalidade com o câncer, foram encontrados os estudos de Bandeira e
Barbieri (2007), Peres e Santos (2009), Carvalho (2010), Paiva (2014) e
Pinto (2016). Para Honorato et al. (2017), há ainda poucos estudos científicos
que exploram a influência das características da personalidade dos sujeitos,
assim como da sua forma cognitiva e comportamental de agir e lidar com
situações de conflito, no processo de ajustamento individual psicológico.
Messina (2010, apud Paiva, 2014) e Pinto (2016) afirmam ser fundamental
compreender aspectos da personalidade dos pacientes oncológicos, buscando
a integração dos pontos de vista psíquico e emocional ao seu processo de
tratamento.
Conforme Pinto (2016), mesmo sabendo que o estado emocional do
paciente influencia o prognóstico da doença neoplásica, a investigação do
perfil psíquico geralmente não é incluída nos procedimentos clínicos dos
pacientes com câncer, ou fica limitada à avaliação da qualidade de vida do
paciente. No contexto hospitalar, a identificação de aspectos psicológicos e
da personalidade do paciente neoplásico pode contribuir para o entendimento
sobre a resposta ao tratamento, apontando uma direção útil para melhor
24

orientação no processo de adesão ao tratamento. Além disso, também pos-


sibilita capacitar a equipe de saúde para a compreensão do funcionamento
emocional do paciente, com vistas a auxiliá-lo efetivamente, bem como
amplia as possibilidades de intervenção do psicólogo.

As Dimensões da Personalidade a partir do modelo dos Cinco


Grandes Fatores

Atualmente, há alguns modelos teóricos que buscam mapear as dimen-


sões da personalidade, dentre eles o modelo dos Cinco Grandes Fatores (CGF).
De acordo com Bertamoni (2013), o Modelo dos Cinco Grande Fatores da
Personalidade (CGF) é o modelo que tem gerado mais consenso no meio aca-
dêmico nas últimas décadas, apesar de se encontrarem algumas divergências
quanto às nomenclaturas que ele apresenta para as dimensões da personali-
dade. Esse modelo relaciona cada perfil a determinada combinação de traços
de personalidade, os quais foram definidos a partir de observações e análises
linguísticas e comportamentais de indivíduos de diversas culturas do mundo.
Nunes, Hutz e Nunes (2013) afirmam haver grande evidência da uni-
versalidade e aplicabilidade deste modelo em diversos contextos, elaborado
principalmente a partir das teorias de traço de personalidade, bem como das
teorias fatoriais, que colaboraram para a elaboração dos aspectos instrumen-
tais e metodológicos, permitindo que seus resultados sejam mais fidedig-
nos e valiosos, o que justificaria o crescente interesse por esse modelo na
comunidade científica. Também possibilita que a personalidade seja descrita
de maneira mais simples, elegante e econômica em relação a outros mode-
los fatoriais da personalidade, que são maiores e mais complexos. Silva e
Nakano (2011) apontam a existência de suficientes evidências da validade
da utilização do modelo dos CGF na população brasileira e afirmam que,
a partir da continuidade e do avanço dos estudos, será possível aprimorar
e ampliar os processos de avaliação da personalidade no Brasil, além de
justificar sua importância.
Assim, conforme o Modelo dos Cinco Grandes Fatores, são cinco os
fatores que abrangem todo o conjunto dos traços de personalidade: Neuroti-
cismo, Extroversão, Amabilidade, Abertura à experiência e Conscienciosidade.
Entende-se que este modelo dê conta de avaliar o perfil do sujeito, analisar como
os eventos estressores afetam cada tipo de perfil e como cada pessoa lida com os
processos de enfrentamento. Já é possível, também, relacionar comportamentos
e tipos de personalidade mais ligados à saúde física e mental (Bertamoni, 2013).
Em todas as diferentes abordagens já desenvolvidas a partir do modelo
CGF, os traços de personalidade são considerados equivalentes, apesar de
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 25

haver alguma diferença em suas nomenclaturas. Ele tem sido apontado como
um modelo capaz de descrever a personalidade de maneira simples e econô-
mica, com boa aceitação por apresentar consideráveis indicadores de univer-
salidade e aplicabilidade em contextos diversos. Em contextos de diagnósticos
clínicos, geram informações úteis para a identificação de demandas de tra-
tamentos ou para a identificação de sintomas significativos dos transtornos
psicológicos ou de personalidade (Nunes; Hutz; Nunes, 2013).
A concepção de universalidade é atribuída ao CGF, pois, conforme
McGrae e Costa (1997 apud Nunes; Hutz; Nunes, 2013), o modelo parece
tratar-se de maneira eficiente de um agrupamento de traços comuns, cultural-
mente bastante gerais. Entende-se que os traços de personalidade apresentados
neste modelo dão conta de representar o conjunto de características biológicas
da nossa espécie, ou as consequências psicológicas das vivências humanas
compartilhadas socialmente. Segundo os autores, esta compreensão se apro-
ximaria das ideias de Allport (1961), as quais apontam para a possibilidade
de se representar aspectos comuns da personalidade da maior parte dos seres
humanos que compartilham de uma mesma cultura, através de traços comuns.
Segundo os respectivos autores, esse posicionamento decorre da hipó-
tese levantada por Goldberg em 1982, de que as características individuais
que fazem diferença significativa nas interações sociais cotidianas aparecem
codificadas na linguagem. Assim, se uma característica ou traço de persona-
lidade gera comportamentos relevantes para um determinado grupo social, as
pessoas falarão sobre esses traços e, consequentemente, criarão vocabulário
suficiente para citá-las e descrevê-las.
Dentre as cinco escalas que utilizam o modelo dos CGF para avaliação
da personalidade no Brasil, aprovadas no Sistema de Avaliação dos Testes
Psicológicos (SATEPSI), do Conselho Federal de Psicologia, destaca-se a
Bateria Fatorial de Personalidade (Silva; Nakano, 2011). Esta escala é utili-
zada em contextos como de pesquisa, avaliações clínicas e psicodiagnóstico,
avaliações de triagem em instituições de saúde, avaliação neuropsicológica,
entre outros fins (Nunes; Hutz; Nunes, 2013).
O Quadro 1 apresenta os cinco fatores avaliados pela Bateria Fatorial de
Personalidade, suas definições resumidas, e os subfatores a eles relacionados.
26

Quadro 1 – Fatores e subfatores avaliados pela Bateria Fatorial de Personalidade


Fator Definição Subfatores
N1 – Vulnerabilidade
Relacionado à vivência intensa do sofrimento psico-
N2 – Instabilidade
lógico, instabilidade emocional e vulnerabilidade, com
emocional
Neuroticismo pouca ênfase aos aspectos positivos dos fatos. Em
N3 – Passividade / Falta
alto nível, é associado à ocorrência de sintomas de
de energia
depressão e ansiedade.
N4 – Depressão
Tendência a um volume alto de fala e à busca de con-
E1 – Comunicação
tato com pessoas. Relacionado a um senso de intimi-
E2 – Altivez
dade maior que a média, com facilidade de comparti-
Extroversão E3 – Dinamismo
lhar informações particulares. Geralmente indica alto
E4 – Interações sociais
grau de atividade e de externalização de preferências
e crenças. Pode haver certa dominância e liderança.
Tendência a desenvolver confiança nas pessoas,
através da fácil percepção do seu lado positivo e de
uma rara suspeita de suas intenções, aspecto impor-
S1 – Amabilidade
tante que se associa à formação da identidade e à
S2 – Pró-sociabilidade
Socialização capacidade de estabelecer intimidade com os demais.
S3 – Confiança nas
Relaciona-se à lealdade e à franqueza, assim como
pessoas
a um alto nível de altruísmo, à submissão e ao aten-
dimento das necessidades de outros que lutam mais
ativamente por seus interesses.
Envolve motivação para o sucesso, perseverança,
R1 – Competência
capacidade de planejamento de ações em função de
R2 – Ponderação /
uma meta, bem como nível de organização e pon-
prudência
Realização tualidade. Tendência a buscar formas de alcançar
R3 – Empenho /
seus objetivos, mesmo envolvendo algum sacrifício
comprometimento
ou conflito com algum desejo imediato. Relacionado
à ambição, esforço e bastante dedicação ao trabalho.
Refere-se aos comportamentos exploratórios e de
reconhecimento da importância de ter novas expe-
riências. Relacionado à curiosidade, imaginação, cria- A1 – Abertura a ideias
Abertura tividade, diversão com novas ideias e com valores não A2 – Liberalismo
convencionais. Experienciação de uma gama ampla A3 – Busca por novidades
de emoções de maneira mais vívida do que pessoas
fechadas (baixas em Abertura).

Por ser desenvolvida no Brasil, a bateria levou em conta a fala brasi-


leira, nossa cultura, diversidades regionais e especificidades clínicas, o que
diferencia a BFP de outros instrumentos de avaliação da personalidade com
base nos CGF, desenvolvidos para aplicação em outros países.
Considerando a necessidade de investimentos nas investigações clínicas
que colaborem na condução do acompanhamento psicológico de pacientes
em instituições de saúde, este estudo tem como objetivo geral avaliar a per-
sonalidade de pacientes oncológicos adultos, a partir da Bateria Fatorial de
Personalidade. Os objetivos específicos consistem em verificar a dimensio-
nalidade dos fatores neuroticismo, extroversão, socialização, realização e
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 27

abertura, bem como suas facetas; e identificar a existência de traços comuns


de personalidade e suas facetas, nos participantes investigados.

Metodologia

Esta pesquisa caracterizou-se como um estudo exploratório-descritivo, de


corte transversal, com abordagem quantitativa. Para a composição da amostra,
foi utilizada a técnica de amostragem não-probabilística, por conveniência.
A amostra foi constituída por sete pacientes em tratamento em um ambulató-
rio oncológico de um hospital particular localizado no Vale do Itajaí-SC, no qual,
à época da pesquisa, 55 pacientes encontravam-se em tratamento ou acompanha-
mento oncológico. Dos sete pacientes (12,72% da referida população), quatro
apresentavam diagnóstico de câncer em algum órgão do aparelho digestivo, e
três o diagnóstico de câncer de mama, sendo cinco mulheres e dois homens.
Todos os participantes, à época da etapa de coleta de dados desta pes-
quisa (setembro e outubro/2017), estavam em tratamento quimioterápico no
referido Ambulatório, e atenderam aos seguintes critérios de inclusão, a saber:
a) ter recebido diagnóstico oncológico há, no mínimo, três meses; b) estar em
tratamento de infusão quimioterápica, ou em acompanhamento de evolução
da doença; c) ser maior de idade; d) demonstrar interesse em participar da
pesquisa; e) ter sido indicado pela psicóloga do setor oncológico. A indica-
ção da psicóloga foi pautada por seu entendimento de que a participação do
paciente nesta pesquisa não interferiria negativamente em seu tratamento.
Estabeleceu-se o tempo mínimo de três meses entre ter recebido o diagnós-
tico e o convite de participação nesta pesquisa, para que o impacto da notícia
não interferisse de maneira intensa nos resultados. Como critérios de exclusão,
foram estabelecidos os impedimentos de ordem física que impossibilitariam os
pacientes de preencherem o instrumento de maneira autônoma, como proble-
mas de visão, tremores, dores ou hipotonia em braços ou mãos. Ainda, visto que
o teste solicita recuperação e avaliação de informações de vida, foram excluídos
da pesquisa os pacientes diagnosticados com alguma doença que interferisse
em seu funcionamento cognitivo, sobretudo em sua memória ou capacidade
de análise, como Parkinson ou Alzheimer, ou que estivessem fazendo uso de
medicamentos que preveem diminuição ou alteração de memória.

Instrumentos de Coleta de Dados

Os instrumentos usados para a coleta de dados, para cada participante,


foram uma ficha de dados sociodemográficos e clínicos e um formulário
da Bateria Fatorial de Personalidade (BFP). A BFP é um instrumento
psicológico que avalia a personalidade por meio do modelo dos Cinco
28

Grandes Fatores (CGF), em que, através de uma escala likert de 1 a 7, o


participante avalia o quão bem o descreve cada uma das 126 frases apresen-
tadas, sendo que 1 refere-se a “descreve-me muito mal” e 7 a “descreve-me
muito bem”. Cada item avaliado gera uma determinada pontuação para
um dos subfatores, os quais posteriormente compõem a avaliação de cada
uma das dimensões de análise: Neuroticismo, Extroversão, Socialização,
Realização e Abertura (Nunes; Hutz; Nunes, 2013).

Procedimentos para a Coleta dos Dados e Aspectos Éticos

Todos os participantes, abordados e convidados pessoalmente, con-


cordaram em participar da pesquisa de maneira voluntária e assinaram o
“Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”, conforme o que estabele-
cem as Resoluções CNS nº 466/2012 (BRASIL, 2013) e CNS nº 510/2016
(BRASIL, 2016), a partir do qual foram explicados os objetivos e proce-
dimentos da pesquisa.
Os participantes preencheram a avaliação individualmente, e o local
de aplicação do instrumento variou conforme a situação em que se encon-
travam: no ambulatório, durante o tratamento quimioterápico (n=3), em um
consultório médico, após a consulta médica de acompanhamento (n=2),
no leito hospitalar, durante internação (n=2).
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade do
Vale do Itajaí, sob o Parecer Consubstanciado nº 2.164.415. A permissão
da Instituição para o desenvolvimento da pesquisa foi expressa e forma-
lizada mediante a assinatura do “Termo de Anuência da Instituição para
a Coleta de Dados”.

Procedimentos para a Análise dos Dados

Os dados foram analisados a partir do levantamento dos escores brutos de


cada fator e subfator da BFP, que se deu em conformidade com as instruções
do manual técnico do instrumento. Cada um dos escores brutos calculados
(fatores e subfatores) foram convertidos em escores percentílicos, mediante
o uso de tabelas de referência disponibilizadas no manual. Nesta pesquisa,
foram usadas as tabelas que comparam os resultados do indivíduo analisado
com os resultados de um grupo de pessoas do mesmo sexo. A partir disso,
cada escore percentílico foi classificado de acordo com as faixas de classifi-
cação dos percentis fornecida pelo manual, e que relacionam os escores dos
participantes com a frequência de respostas semelhantes nos grupos de refe-
rência. Assim, um valor percentílico de 75, por exemplo, indica que o escore
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 29

do participante é superior a 75% das pessoas do grupo de referência naquele


fator ou subfator, o que é classificado como um índice Alto.
A classificação dos percentis é definida pela seguinte escala: Muito Baixo
(MB) = até 14 pontos percentílicos; Baixo (B) = 15 a 29 pontos; Médio (M)
= 30 a 70 pontos; Alto (A) = 71 a 85 pontos; e Muito Alto (MA) = escore
maior que 85 pontos percentílicos.
Os dados advindos da ficha de dados sociodemográficos e clínicos, bem
como os dados da BFP foram sistematizados em tabelas, permitindo melhor
visualização e compreensão dos dados.

Resultados

Os resultados apresentam inicialmente os dados sociodemográficos da


amostra. Posteriormente são apresentados os dados relacionados à condição
de saúde dos participantes, como tipo de neoplasia, tempo de diagnóstico,
tratamento medicamentoso, percepção do estado de saúde, sentimento no
último mês, outros problemas de saúde relatados, demais condições psicos-
sociais e emocionais relatadas. Por fim, serão apresentados os dados relativos
aos aspectos da personalidade dos participantes.
A Tabela 1 apresenta os dados sociodemográficos, onde é possível
evidenciar que, dos 7 participantes que compuseram a amostra, houve
predomínio da idade acima de 50 anos (4) e do sexo feminino (5). Dos 7
participantes, 5 eram casados e a maioria possuia ensino médio (6), sendo
que 3 cursaram também o Ensino Superior. Todos os participantes residem
no Vale do Itajaí.

Tabela 1 – Caracterização dos participantes da pesquisa


Participante Idade Sexo Estado Civil Escolaridade Diagnóstico
de câncer
P1 81 anos Feminino Viúva Superior completo Intestino
P2 62 anos Masculino Casado Ensino Médio Cólon
completo
P3 41 anos Feminino Casada Ensino Médio Reto
incompleto
P4 38 anos Masculino Casado Ensino Médio Pâncreas
completo
P5 57 anos Feminino Casada Superior completo Mama
P6 72 anos Feminino Viúva Ensino Médio Mama
completo
P7 28 anos Feminino Casada Superior completo Mama
Fonte: Dados referentes à amostra coletada.
30

Dos sete participantes, quatro possuem diagnóstico de câncer do apa-


relho digestivo (pâncreas, intestino, reto, cólon) e três de câncer de mama.
A revelação diagnóstica ocorreu, na sua maioria, há menos de um ano (5).
Todos os participantes foram submetidos à cirurgia e à quimioterapia, e um
destes também estava em tratamento de radioterapia.
Em relação a outros problemas de saúde, dois participantes não relataram
outro problema, dois relataram diabetes e hipertensão e os demais referiram
artrite ou reumatismo, problemas de pele, hérnia de disco, problema crô-
nico de pé, sobrepeso, tromboembolia pulmonar, bronquite, problema renal,
problema cardíaco e asma. No que se refere às condições psicossociais e
emocionais, destacaram-se a ansiedade (6), sendo um caracterizado como
síndrome do pânico e dificuldades relacionadas ao sono (3). Também foram
relatados irritabilidade (2), lapsos de memória (2), estresse, hiperatividade,
humor deprimido, ideação suicida pregressa, problemas de relacionamento
com o cônjuge e problemas de relacionamento com familiares.
Apesar de seus contextos, a percepção sobre o próprio estado de saúde
é referida como muito boa por 5 participantes; nem ruim, nem boa para 1
participante; e ruim para o outro participante. Quando questionados acerca dos
sentimentos vivenciados no último mês, os positivos foram os mais referidos:
confiança (7), felicidade (6), satisfação (6), otimismo (5), disposição (5) e
força (4). Os sentimentos negativos foram mencionados na seguinte propor-
ção: ansiedade (6), preocupação (4), cansaço (4), inquietude (3), irritação (2),
impaciência (1) e revolta (1).
Em relação à avaliação da personalidade, os resultados da Bateria Fatorial
de Personalidade são apresentados na Tabela 2. Mais da metade dos partici-
pantes avaliados (n = 4) apresentou escores classificados como Alto ou Muito
Alto nos fatores Extroversão, Socialização e Realização. Em relação ao fator
Neuroticismo, a maioria apresentou escore médio (n = 4), e no fator Abertura,
evidenciou-se variação nos escores.
As facetas com maior escore no fator Socialização foram Pró-sociabili-
dade (S2) e Confiança nas pessoas (S3). O fator Socialização está relacionado à
confiança nas pessoas, lealdade, franqueza, alto nível de altruísmo, submissão
e atendimento às necessidades de outros. Os altos escores em Pró-sociabilidade
(S2) (> 71% para 6 participantes; > 85% para 4 participantes) indica uma
tendência a evitar situações de risco, transgressões a leis ou regras sociais,
e pode revelar uma postura respeitosa, não-opositora e de submissão aos
demais. Na faceta Confiança nas pessoas (S3), o escore foi maior que 71%
para 4 participantes, revelando uma propensão a acreditar que os outros são
honestos e bem-intencionados. Esta tendência pode estar relacionada a uma
postura ingênua perante os outros, bem como a colocar-se em situações nas
quais facilmente pode ser prejudicado.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 31

Tabela 2 – Classificação dos percentis obtidos a partir


dos escores da BFP, por participante
P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7
N1. Vulnerabilidade B M MB A MB M MA
N2. Instabilidade M M MB M MB B M
N3. Passividade MB A M M M M B
N4. Depressão M MB / B MB A A M M
Neuroticismo M M MB A B M M
E1. Nível de comunicação MB A M M MA M MB
E2. Altivez MB A A MA A MB M
E3. Dinamismo – assertividade MB / B A MA A MA M B
E4. Interações sociais MB A MA A MA M MB
Extroversão MB MA MA MA MA B MB
S1. Amabilidade MB MA MA M M MA M
S2. Pró-sociabilidade MA A MA A M M/A MA
S3. Confiança nas pessoas M MA A A M A B
Socialização M MA MA A M MA M
R1. Competência MB MA M M MA M A
R2. Ponderação M MA M M A M M
R3. Empenho B MA M MA A MB MA
Realização B MA M A MA B A
A1. Abertura a ideias MB M A MB M A MB
A2. Liberalismo B M M M MA MB M
A3. Busca por novidades M M MA M MA MA MB
Abertura MB A MA B MA M MB

O fator Realização (> 71%, para 4 participantes) refere-se à motivação


para o sucesso, perseverança, planejamento em função de uma meta, orga-
nização e pontualidade, ambição, esforço e alta dedicação ao trabalho. O
alto escore na faceta Empenho (R3 > 85% para 3 participantes) revela uma
tendência ao detalhismo, assim como a um alto nível de exigência pessoal na
qualidade do que realiza. Geralmente, pessoas com altos escores nesse subfator
são perfeccionistas, dedicam-se bastante às atividades a que se propõem e
buscam um reconhecimento de seu esforço.
No fator Neuroticismo, a maioria dos participantes (4) apresentou
escores médios (entre 30% e 70%), o que indica que estes não apresentam
tendência a vivenciar intensamente o sofrimento psicológico. Também apre-
sentam estabilidade emocional, dando maior ênfase aos aspectos positivos
dos fatos, com tendência a retornar rapidamente a seu estado normal após
uma elevação emocional.
32

Discussão

A maioria dos participantes desta pesquisa apresentou altos escores nos


fatores de personalidade Extroversão, Socialização e Realização; escores
médios no fator Neuroticismo; e no fator Abertura os escores foram variados.
A respeito dos fatores Extroversão e Neuroticismo, os resultados diver-
gem de pesquisas semelhantes em outros países, também baseadas na teoria
dos Cinco Grandes Fatores, os quais apontam para níveis altos no fator
Neuroticismo e baixos em Extroversão em pacientes oncológicos. Em pes-
quisa conduzida na Espanha, Cardenal et al. (2012) investigaram aspectos
da personalidade, emoções e estratégias de enfrentamento de 131 pacientes
oncológicos, e referem que, em relação à personalidade, o grupo de pacien-
tes com câncer apresentou níveis mais altos de Neuroticismo e mais baixos
em Extroversão, Agradabilidade e Conscienciosidade que o grupo controle.
Os pesquisadores também referem não terem sido encontradas diferenças
significativas em níveis de depressão. No Irã, Hamzeh, Beyrami e Hashemi
(2011), através de uma comparação dos traços de personalidade, experiencia-
ção de emoções negativas e estilos de enfrentamento de mulheres saudáveis
com os mesmos itens em mulheres com câncer, encontraram evidências de
uma maior experienciação de emoções negativas (neuroticismo), assim como
baixos escores de extroversão, no grupo de mulheres com câncer.
No Brasil, os estudos avaliados evidenciam uma tendência oposta,
indicando que estes podem estar relacionados às influências do contexto
cultural na personalidade. Peres e Santos (2009), em uma revisão sistemá-
tica da literatura acerca do papel da personalidade na evolução da condição
clínica e emocional de mulheres acometidas por câncer de mama, evidenciou
que parte das referências dedicadas ao estudo das relações entre a persona-
lidade e o curso da condição emocional de mulheres acometidas por câncer
de mama sustenta que o otimismo se afigura como uma espécie de prote-
ção contra o impacto psicológico da doença. Outra pesquisa realizada por
Leite, Nogueira e Terra (2015), que avaliou a autoestima de 156 pacientes
oncológicos submetidos à quimioterapia em um hospital de médio porte
no Brasil, evidenciou que 70,5% da amostra apresentou uma autoestima
alta. Salienta-se que a Escala de Autoestima de Rosenberg, utilizada no
respectivo estudo, apresentou correlações significativas com os escores da
BFP (Nunes; Hutz; Nunes, 2017).
No que se refere aos resultados do fator Socialização, os altos escores
nos subfatores Pró-sociabilidade (S2) e Confiança nas pessoas (S3) parecem
estar de acordo os estudos que apontam uma relação entre personalidade e
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 33

câncer. A faceta Pró-sociabilidade (S2) caracteriza uma tendência a com-


portamentos não-opositores, submissos, e observadores de regras sociais,
enquanto Confiança nas pessoas (S3) evidencia uma propensão a acreditar
na honestidade e boas intenções das pessoas, geralmente apresentando uma
postura ingênua perante os outros, colocando-se em situações nas quais
facilmente pode ser prejudicado. Patrão e Leal (2004) citam uma revisão de
estudos sobre fatores psicossociais e desenvolvimento de câncer de mama
na qual se aponta um estilo de personalidade centrada no evitamento do
conflito como fortemente associado a essa doença.
Conforme Paiva (2014), há algum tempo se tem buscado compreender
mais a respeito da natureza das relações entre traços de personalidade e
determinadas doenças. Em relação ao câncer, a autora aponta a referên-
cia, na literatura, a um perfil predisponente específico, chamado Tipo C,
característico de indivíduos cooperativos, conciliadores e pacientes, que
reprimem suas emoções consideradas negativas, particularmente a cólera,
com dificuldade de se afirmar, e tendência a submeterem-se a autorida-
des voluntariamente e a sacrificar suas necessidades em prol dos outros
(Temoshok, 1987, apud Paiva, 2014). Autores como Carvalho (2002), Patrão
e Leal (2004) e Sousa (2015), também fazem referência a personalidade
Tipo C, relacionando-a à doença oncológica.
Em relação ao questionário clínico aplicado, observou-se que os sen-
timentos vivenciados no último mês mais referidos pelos pacientes são,
predominantemente, sentimentos positivos (confiança, felicidade, satisfa-
ção, ansiedade, otimismo e disposição). Nesse contexto, observa-se ainda
que a maior parte dos participantes afirma perceber estar usufruindo de
boa (1) ou muito boa saúde (4), apesar de seu diagnóstico oncológico, dos
diversos outros problemas de saúde relatados (diabetes, hipertensão, artrite
ou reumatismo, problemas de pele, hérnia de disco, problema crônico de
pé, sobrepeso, tromboembolia pulmonar, bronquite, problema renal, pro-
blema cardíaco, asma), e das condições psicossociais e emocionais citadas
(ansiedade, síndrome do pânico, dificuldades relacionadas ao sono, irrita-
bilidade, lapsos de memória, estresse, hiperatividade, humor deprimido,
ideação suicida pregressa, problemas de relacionamento com o cônjuge,
problemas de relacionamento com familiares). Em conjunto, percebe-se
que os dados levantados nessa pesquisa apontam para uma postura predo-
minantemente satisfeita e otimista de enfrentamento da doença oncológica
no grupo analisado.
Diante disso, uma das hipóteses explicativas pode ser a do grupo ana-
lisado estar vivenciando, em alguma proporção, o fenômeno da tirania do
34

pensamento positivo, derivada de crenças populares sobre uma determinante


participação da tristeza na etiologia do câncer. Holland e Lewis (2000, apud
Peres; Santos, 2009, p. 617) descrevem esse fenômeno como algo que “faz
com que o paciente oncológico se sinta pressionado – tanto interna quanto
externamente – a experimentar apenas emoções consideradas positivas e,
assim, a reprimir sentimentos supostamente negativos, como se disso depen-
desse a sua sobrevivência”.
Os participantes apresentaram escores médios em Neuroticismo. Wat-
son; Hubbard apud Nunes, Hutz e Nunes (2017) concluíram que este fator
desempenha um papel importante no processo de coping. Isto nos remete a
uma segunda hipótese explicativa relacionadas aos resultados de autorrefe-
rência positiva: a capacidade de resiliência. Segundo Pinto et al. (2014), a
resiliência pode ser conceituada como a capacidade de a pessoa lidar com
situações adversas de forma positiva, não eliminando o problema, mas res-
significando-o. Os autores acreditam que as formas de pensar, agir e lidar
com a doença, fundamentais para a construção dos processos de resiliência,
estão permeadas pelos aspectos culturais.
O estabelecimento destas hipóteses traz importantes indicações de pes-
quisas subsequentes que averiguem esta variável, pois, neste contexto, tanto
a tirania do pensamento positivo, quanto os aspectos culturais, podem inten-
sificar as vivências de submissão e de repressão dos próprios sentimentos,
em um suposto perfil de personalidade oncológico. Uma maior clareza em
relação à existência ou não desses fenômenos, tanto no grupo analisado, como
nos demais pacientes oncológicos, contribuirá significativamente para uma
condução terapêutica mais sensível aos aspectos psicológicos do paciente.

Considerações Finais

Em relação aos objetivos deste estudo, através da avaliação dos fatores


de personalidade (Neuroticismo, Extroversão, Socialização, Realização e
Abertura) e de suas respectivas facetas, em pacientes oncológicos, a partir
da Bateria Fatorial de Personalidade, identificou-se, nos participantes desta
pesquisa, níveis predominantemente altos nos fatores Extroversão, Sociali-
zação e Realização, e médios nos fatores Neuroticismo. Os escores do fator
Abertura apresentaram variação.
Apesar deste estudo ter apontado semelhança de escores em alguns
fatores da personalidade entre os pacientes oncológicos participantes, não é
possível afirmar que a personalidade ou os referidos traços desempenhem um
papel significativo no desencadeamento ou no desenvolvimento do câncer,
devido, principalmente, ao número reduzido de participantes da pesquisa.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 35

Assim, pesquisas com maior amostragem são necessárias para que se possa
corroborar ou refutar com segurança as análises aqui iniciadas, oferecendo
contribuições para o avanço do conhecimento científico no âmbito da perso-
nalidade de pacientes oncológicos.
Como limitações deste estudo, apontamos principalmente a amostra
reduzida. Devido ao pequeno número de participantes desta pesquisa, os resul-
tados não são suficientemente representativos da personalidade da população
oncológica, contudo trata-se de um resultado interessante, que abre espaço
para novos estudos direcionados à formulação de algumas hipóteses expli-
cativas para a compreensão de algumas possíveis especificidades do grupo
analisado, como a da tirania do pensamento positivo.
Além disso, entendemos que a personalidade, constructo complexo e
multifacetado, exige um processo de investigação que contemple uma maior
variedade de instrumentos de avaliação para que, de maneira parcimoniosa e
reflexiva, se atinja uma compreensão mais aprofundada dos aspectos levantados.
No contexto da saúde, ao articular pesquisa e assistência, a avaliação
psicológica colabora tanto para a produção do conhecimento quanto para o
atendimento das necessidades das pessoas. Salienta-se que a Bateria Fatorial
de Personalidade se constituiu como um instrumento adequado para a avalia-
ção da personalidade de pacientes oncológicos, já que apresentou resultados
compatíveis com as informações autorreferidas em relação aos seus posiciona-
mentos perante a própria vida e a doença. Os resultados trouxeram informações
confiáveis que poderão ser úteis ao psicólogo, favorecendo uma abordagem
mais adequada e efetiva diante da adaptação do paciente oncológico à nova
realidade imposta pelo câncer e seu tratamento, assim como a possibilidade de
trabalhar na prevenção de complicadores psicológicos específicos.
36

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CAPÍTULO 2
GESTALT-TERAPIA E ADOECIMENTO:
a abordagem desenvolvida pela Dra.
Adriana Schnake para trabalhar
com pacientes oncológicos
Ana Carolina Seara

Ainda hoje, com todos os avanços tecnológicos da indústria farmacêutica,


das técnicas modernas de imagens e exames específicos para identificação
precoce e tratamento, a notícia do diagnóstico de câncer é devastadora. É como
se, neste momento, descobríssemos nossa mortalidade e tivesse sido iniciada
uma contagem regressiva. Não é de se estranhar que a maior parte das pessoas
tenha uma postura de evitação e fobia quando se trata de doenças com poten-
cial de ameaçar a vida, já que, em nossa cultura, principalmente a ocidental,
há uma extrema valorização do potencial da juventude e, em contrapartida,
um menosprezo pelas limitações e debilidades inerentes ao envelhecimento.
Esta postura é valorizada em sociedades que costumam perceber como
positivo apenas características relacionadas à força de trabalho, como produ-
tividade, alto-rendimento, proatividade, ambição, entre outras. A valorização
de tais características impulsiona as pessoas a trabalharem cada vez mais,
recorrerem a procedimentos estéticos para aparentar mais jovialidade e esti-
mulam uma postura competitiva em várias esferas da vida. Minha atenção
à descrição desses comportamentos e características da atualidade não tem
apenas o objetivo de citar elementos desencadeadores de estresse, conhecido
e temido vilão da modernidade, mas também serve para entender o que mais
a frente vamos tratar, a saber, as características do comportamento de uma
célula neoplásica.

Desafios do Trabalho Clínico com Adoecimento

Trabalhar com adoecimento na Gestalt-Terapia é uma tarefa desafiadora


e, ao mesmo tempo, encantadora, já que essa abordagem oferece recursos
terapêuticos incríveis que propiciam aberturas para ressignificações e verda-
deiras mudanças de (na) vida nas (das) pessoas. A Gestalt-Terapia é uma teoria
de base fenomenológica, que enfoca a descrição dos fenômenos e não está
42

preocupada com a interpretação, pois não está embasada em uma perspectiva


de causa-efeito. A Gestalt se baseia no aqui-agora do que acontece na sessão,
entendendo que, no presente, está contido nosso passado (como retenção das
vivências que experimentamos) e nossas perspectivas de futuro (como as
possibilidades que se abrem a cada nova vivência), mas de forma virtual. O
entendimento dessa abordagem sobre o conceito de saúde não acontece de
forma dissociada. Saúde e doença fazem parte do mesmo continuum, poderiam
ser descritas como polaridades da mesma questão.
Ao me referir ao meu estado físico, só posso dizer que estou saudável
porque identifico a ausência de doenças e o contrário também é verdadeiro,
o adoecimento é identificado pela ausência de saúde. No entanto, nossa per-
cepção poderia ser mais precisa se pudéssemos perceber que ora estamos
mais saudáveis (quando não estamos identificando sintomas físicos descon-
fortáveis), ora um pouco mais adoecidos (quando percebemos a ausência de
um bem estar); e que essas polaridades vão oscilar para mais ou menos ao
longo de nossa vida. Como a Gestalt-Terapia não faz separação entre mente e
corpo, já que a mente (entendida aqui como a área do corpo responsável pela
capacidade de refletir e raciocinar) faz parte do corpo, o desequilíbrio na pola-
ridade saúde-doença nos diz que algo está acontecendo com este ser humano,
que invariavelmente tem relação com a forma como lida com seu entorno, ou
seja, na repetição de hábitos ou na criação de novas formas para lidar com as
demandas. E é o comprometimento no seu desenvolvimento e crescimento
pessoal que pode indicar um desequilíbrio que resulte em sintomas.
O recorte que será desenvolvido neste capítulo diz respeito ao desenvol-
vimento teórico-prático de uma autora da Gestalt-Terapia que trabalha com
adoecimento, em específico, na questão central desta obra, com pacientes
oncológicos. A escolha por trazer esta autora e o trabalho que desenvolveu
ao longo de sua vida profissional se deu pelo fato de que ela não apenas dis-
cute um modelo teórico de trabalho, como mostra e desenvolve uma forma
específica de trabalho, ou seja, um recurso terapêutico para psicoterapeutas
aplicarem em seu cotidiano clínico. Com seis livros publicados (nenhum deles
traduzido para o português), a doutora Adriana Schnake é Médica Psiquiatra e
Gestalt-Terapeuta e natural do Chile. Em suas obras, relata o desenvolvimento
dos seus estudos em Gestalt-Terapia até a criação do “Enfoque Holístico da
Saúde e da Doença”, assim como traz relatos de inúmeros casos clínicos, das
experiências nos grupos terapêuticos e nos cursos de aprofundamento nesta
metodologia. Ao longo de sua carreira, esteve em vários centros de Gestalt-
-Terapia da América Latina, difundindo esta forma de trabalho e na década
de noventa se dedicou à criação de um centro de ensino e práticas clínicas
localizado no sul do Chile, na ilha de Chiloé, o Centro Anchimalén. Neste
centro, manteve-se à frente das aulas do diplomado (curso de especialização
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 43

com duração de 280 horas presenciais) e na coordenação dos grupos tera-


pêuticos até próximo aos seus 90 anos. Atualmente, reside em Santiago e
colabora com o centro de Gestalt de Santiago, centro que fundou em 1995 e
que é coordenado por uma de suas filhas, Psicóloga Marina Varas Schnake,
e seu genro, também Psicólogo, Alberto Martínez Ribes.
Adriana Schnake é presidente Honorária da Associación Gestaltica de
Buenos Aires y de Córdoba, membro honorário da Associación Española de
Terapia Gestática e é conhecida no mundo de língua espanhola como uma das
figuras mais relevantes da Psicoterapia Gestáltica. Seu enfoque da Saúde e da
Doença se revelou um aporte inovador e criativo tanto dentro da comunidade
gestáltica, quanto na contribuição para a medicina atual1. A proposta de trabalho
que desenvolveu é revolucionária por ter como meta devolver a cada indivíduo
seu poder de ação e de responsabilização pelo seu próprio corpo. Esse traba-
lho visa, antes de tudo, auxiliar no processo de restabelecimento da saúde por
meio do entendimento da mensagem contida na experiência de adoecimento
de cada pessoa.

Gestalt-Terapia e Autorregulação Organísmica

Em Gestalt-Terapia, quando se trabalha com a clínica da Neurose, em


que, na fronteira de contato, a função de ego está vulnerável, impedida de
atuar, vemos a repetição de hábitos que não permitem a assimilação da vivên-
cia, assim como impedem sua ampliação na direção de novas experiências de
contato, em consequência de um hábito inibitório que retornou do horizonte
de passado (a inibição reprimida). (MULLER-GRANZOTTO e MULLER-
-GRANZOTTO, 2007). A Neurose foi um ajustamento amplamente discutido
por Fritz Perls, como era mais conhecido, o então médico de origem alemã,
formado em Berlim. Frederick Solomon Perls (1893-1970) tinha formação
psicanalítica, foi dissidente de Freud (Psicanálise), e fundador e criador da
Gestalt-Terapia (1951), alguns anos após seu rompimento com Freud e com
a Psicanálise. Entre as formas de manejo clínico para os ajustamentos neu-
róticos, desenvolvidas pela Gestalt-Terapia, estão: a pontuação da forma,
frustração habilidosa e utilização de experimento clínico.
Para Perls (1977), o trabalho da Gestalt-Terapia é promover o processo
de crescimento e desenvolver o potencial humano que, segundo ele, é um
processo demorado. Um dos grandes entraves à fluidez é a ansiedade, que
seria “o vácuo entre o agora e o depois. Se você estiver no agora não pode
estar ansioso, porque a excitação flui imediatamente em atividade espontânea”
(p. 15). Outro conceito importante trazido pelo autor é o de “organismo”, que

1 Informações coletadas no site do Centro de Gestalt de Santiago em dezembro de 2019. www.gestalt.cl


44

seria descrito como qualquer ser vivo que possua órgãos, tenha organização e
se autorregule, lembrando que todo organismo precisa do ambiente para trocas
essenciais (respiração, nutrição, relações pessoais). É importante lembrar que o
organismo trabalha como um todo e não como um somatório de partes. Nesse
sentido, não somos um somatório de órgãos, somos um todo coordenado; não
temos um coração, fígado, pulmões, somos fígado, coração, pulmões. “Saúde
é um equilíbrio apropriado de tudo aquilo que somos” (p. 20)
A partir dessas definições, entra outro conceito fundamental na Gestalt-
-Terapia, a autorregulação organísmica. A auto-regulação precisa ser distin-
guida da regulação externa. A primeira pode deixar o organismo dirigir sem
interferência, confiando na sabedoria do organismo. “A tomada de consciência
em si - e de si mesmo - pode ter efeito de cura” (p. 34). Já a regulação externa
se refere à patologia da auto-manipulação, do controle ambiental que atrapalha
o sutil auto-controle organísmico; nossa auto-manipulação que costumamos
chamar de “consciência” (Perls, 1977).

Diálogos com o Corpo

O Enfoque Holístico da Saúde e da Doença, desenvolvido pela Dra.


Adriana Schnake, a Nana, como é conhecida por seus pacientes, alunos e
pessoas mais próximas, pretende devolver um olhar integrado para a saúde,
tem caráter educativo, pois trabalha com informações sobre o funcionamento
do nosso próprio corpo como um organismo vivo, inteiro, integrado, sobre
o funcionamento e interrrelação entre tudo o que somos (órgãos, sistemas) e
não se baseia em divisões, diferenciando-se dos enfoques casualistas, duais,
baseados em causa e efeito (mente versus corpo; saúde versus doença etc.).
Não se trata de uma medicina “alternativa”, mas de um caminho com base na
descrição da nossa fisiologia e anatomia e nos conceitos gestálticos que tem
como tarefa norteadora tirar dos sintomas e doenças o caráter de “inimigos”.
Esta é a grande mudança que se pretende com este método de intervenção:
mostrar para aqueles que buscam os terapeutas no processo de um adoeci-
mento que, além dos sintomas não serem seus inimigos, estão presentes em
nosso organismo para nos dar uma mensagem, para nos conectarmos com
aspectos essenciais do que significa ser humano (Schnake, 2007).
Adriana Schnake (2007), em seu último livro sobre o EHSD (Enfoque
Holístico da Saúde e da Doença), “Enfemedad Síntoma e caracter: diálogos
gestálticos con el cuerpo”, elenca os postulados básicos com os quais o
Enfoque trabalha:
“(1) devolver à pessoa sua característica de ser humano, olhando-a em sua
totalidade; (2) entregar ao ser-humano os conhecimentos que vieram consigo
mesmo para que reconheça sua própria estrutura e capacidade de cura; (3)
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 45

entender a doença como um ato de DETENÇÃO total, que permite chegar a uma
realidade diferente; (4) entender que cuidar da saúde não é lutar contra nada, nem
contra as doenças, é conhecer o que somos e aceitar limites e possibilidades; (5)
por fim, colaborar na tarefa de deter o ser humano na escalada de onipotência
e autossuficiência em que se encontra empenhado” (Schnake, 2007, p. 22)2.
Segundo esta autora, quando uma pessoa busca ajuda em função de um
adoecimento localizado em um órgão específico e que já foi identificado e
diagnosticado como responsável pela suposta doença, está diante de uma divi-
são nítida: um é o paciente e o outro é o adoecimento que o “ataca”. Então, a
primeira tarefa do terapeuta é a restituição da integridade do olhar e vivência
desse organismo, desse corpo. Ou seja, que a pessoa possa se dar conta de
que esse órgão de que ela “se queixa” é uma parte inseparável de si mesma.
O trabalho desenvolvido no EHSD é bem específico e exige uma forma-
ção nesta metodologia de trabalho. Para isso, é necessário que o terapeuta não
o utilize apenas como uma técnica descolada de seu sentido mais global, pois
assim faria o que Perls, ao longo de sua vida, criticou nos Gestalt-Terapeutas
sem aprofundamento teórico e técnico (aqueles que assistiam um ou dois
workshops que ele promovia e depois saiam replicando seus experimentos,
sem entender o cerne do que estavam fazendo) que se constituía, no final
das contas, num trabalho de charlatão, e foi responsável pela má-fama que
a Gestalt recebeu durante certo tempo. Mas, para que se possa compreender
basicamente como é feito o trabalho neste Enfoque, farei uma breve descri-
ção. O primeiro passo é conhecer a demanda do adoecimento; em seguida,
explicar no que se baseia o trabalho que será desenvolvido e como ele vai
acontecer, fornecendo dados para que a pessoa possa compreender a dinâ-
mica do que vai ser proposto; depois, pede-se uma descrição pormenorizada
sobre o adoecimento e convidamos o paciente para o trabalho. Caso não haja
nenhuma resistência, inicia-se o experimento, que consiste em localizar no
espaço três lugares distintos: em um, fica o terapeuta, em outro, o paciente e,
no terceiro, o órgão (onde está localizado o adoecimento).
O trabalho do terapeuta é mediar esta conversa a partir do conhecimento
apurado sobre o órgão a ser trabalhado para que, no momento adequado, possa
intervir trazendo as características anatômicas e fisiológicas correspondentes
ao órgão. O terapeuta também está atento à forma como o paciente se mostra
na condução do diálogo (ou seja, a entonação da voz, movimentos corporais,
expressões faciais, silêncios etc.); e também é ele que faz a troca de lugares
durante o processo. É importante lembrar que não há uma interpretação do sen-
tido, mas sim um exercício no aqui e agora da sessão que pretende fazer com
que a pessoa possa se apropriar dos conflitos que tem com as características

2 Traduzido pela autora.


46

daquele órgão, das suas identificações com essas características e da percepção


(que muitas vezes ocorre) de características ou polaridades negadas ou difí-
ceis de reconhecer em si mesmo que faz com que esse órgão seja rechaçado e
visto como menos importante do que os demais. Há um conflito, e o diálogo
com o órgão tem por objetivo evidenciá-lo e promover uma compreensão
da mensagem que o órgão quer passar para o paciente. Muitas vezes, esse
processo não se finaliza em apenas uma sessão, é comum que continue por
mais sessões, ainda mais quando se trata de um adoecimento que ameaça a
vida, como, por exemplo, no câncer. Nesses casos, algumas vezes é necessário
dar continuidade ao trabalho em outros encontros para possibilitar diálogos
clínicos, envolvendo também outros sistemas relacionados ao adoecimento
em questão, como sistema imunológico, células neoplásicas etc.
Em vista disso, este trabalho parte de uma visão do adoecimento como
forma de entender algo que o corpo está revelando, sobre um conflito que nosso
organismo está tentando equacionar, a mensagem que o órgão traria seria o
modo de compreender o que precisa ser ajustado. Ou seja, que se permita que
o corpo possa fazer sua auto-regulação, sem que imponhamos nossa vontade
sobre ele, querendo que funcione deste ou daquele modo. Mas, para chegar
nisso, precisamos do auxílio de um profissional e, ainda mais importante, que
estejamos dispostos a entender nossos equívocos. É preciso uma postura de
abertura e confiança em relação ao que nosso corpo irá nos revelar, entendendo
o conceito, explanado por Perls, de que a confiança é diametralmente oposta ao
controle, e é nossa necessidade de controle que nos faz duvidar e não confiar.

EHSD e o Trabalho com Pacientes Oncológicos

Desde seu primeiro livro, Adriana Schnake se interessou pelo trabalho


com pacientes em tratamento oncológico, talvez pela demanda que chegava
aos grupos de trabalho clínico ou ao seu consultório. Talvez também, como
ela mesma sinalizou em alguns pontos das suas cinco obras que tratam do
Enfoque, porque, atualmente, no mundo ocidental, temos valorizado carac-
terísticas como: onipotência, autossuficiência, competitividade, rivalidade,
dentre outras que nos colocam em risco, pois, ao analisarmos as características
das células neoplásicas, identificamos que essas descrições também estão entre
as principais características dessas células.
No livro, Enfermedad síntoma e caracter, esta autora cria um formato de
“fichas anátomo-fisiológicas”, tendo como finalidade auxiliar os profissionais
no trabalho de descrição das características e funcionamento dos órgãos. Essas
fichas foram preparadas por uma junta profissional (psicólogos, muitos médi-
cos, e profissionais da saúde) a fim de desenvolver um estudo aprofundado
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 47

e fidedigno das características encontradas nos órgãos e sistemas que seriam


trabalhados no Enfoque. Como exemplo, podemos ver a descrição das carac-
terísticas da célula neoplásica:
Células neoplásicas são: invasivas, destrutivas, desobedientes ao seu ciclo
vital (diferente de outras células, não morrem, nem envelhecem); rebeldes, capri-
chosas; moldáveis e rápidas; astutas; controladoras (manejam o entorno conforme
sua conveniência), devastadoras (destrutivas); combativas; cínicas; onipotentes
(acreditam que podem tudo, não aceitam limites, são como adolescentes, se mul-
tiplicam e se mantêm jovens; são manipuladoras e vingativas). (Schnake, 2007)
Adriana Schnake (2008) acreditava existir uma relação entre câncer e
depressão e assinalava que ambos possuem uma característica marcante: a oni-
potência. Nos pacientes deprimidos, há uma alteração na percepção do tempo
vivido, um bloqueio relativo ao tempo futuro e possuem muita dificuldade de
perceber uma saída para seu estado. A relação com o entorno perde o signifi-
cado, é como se tudo fosse perdendo sentido, as coisas fossem se desfazendo
e tendendo ao caos. No paciente oncológico, uma parte do organismo se com-
porta desta mesma maneira, as células neoplásicas invadem e tomam o lugar
de células específicas, tendendo ao caos e à desorganização (Schnake, 2008) .
Segundo Schnake (1995), nesse experimento proposto pelo Enfoque,
quando se faz o encontro entre a pessoa e o suposto câncer, é muito comum
aparecerem diálogos tremendamente violentos e destrutivos. Muito similar
ao que acontece quando alguém que tem depressão grave se encontra com
seu lado “todo-poderoso” (em algum exercício clínico proposto pelo psicote-
rapeuta): esses diálogos costumam ser de uma agressividade e violência que
não se permitiria, nem com seu maior inimigo. E essa semelhança também
fica evidente ao perceber que câncer e depressão são duas doenças cada vez
mais graves e respeitáveis (e eu acrescentaria, cada vez mais comuns), já que
são formas de adoecimento que geram compaixão.
Um aspecto que Adriana Schnake trata e busca lembrar e relembrar
durante toda a sua obra é que não se deve lutar contra a doença, não se deveria
encará-la como um inimigo, afinal “quem escuta conselhos de um inimigo?” A
meu ver este é um aspecto central em suas obras, no que se refere ao trabalho
com pacientes oncológicos, já que a postura mais amplamente difundida por
grande parte dos profissionais da saúde é a de estimular um movimento de
resgate da força do sujeito para lutar contra a doença, na busca por vencer o
inimigo se apostam todas as “fichas”, inclusive com a necessidade de mutila-
ção e tratamentos extremamente agressivos. Não se trata aqui de contrariar as
recomendações médicas relativas ao encaminhamento do tratamento e reabi-
litação, mas de agregar algum sentido a esta experiência. No ensino formal,
como na vida, as lições realmente aprendidas não precisam ser repetidas e, ao
mudar o modo de enfrentamento da situação por parte daquele que adoece,
48

aquilo que está vivenciando ganha outra dimensão. Nesse sentido, também é
possível trabalhar com percepções equivocadas em que o paciente acha que
está “sendo punido” por algo que teria feito de errado; ou quando acredita que
é vítima e, nesse caso, não aciona sua energia vital para lidar com o conflito
que está vivendo. Afinal, se o adoecimento puder me ensinar algo sobre minha
forma de estar no mundo e fazer com que eu entenda o que se passa comigo,
uma vez que de forma habitual ou “inconsciente” não consigo perceber, por
que não experimentar?
São inúmeros os relatos de casos de pacientes oncológicos trazidos pela
autora. Trabalhos com órgãos adoecidos pelo câncer, já que é muito comum,
quando se identifica o primeiro órgão afetado, que exista um conflito claro
com as características e funções desse órgão. Outros trabalhos são realizados
com a célula neoplásica, visto que as características dessa célula evidenciam
uma forma de ser “anti-humana”, pois somos finitos, mortais, temos limites
claros, precisamos uns dos outros, somos seres dependentes desde que nas-
cemos, dentre outras características, que precisam ser evidenciadas, pois a
onipotência e demais características dessa célula ameaçam a organização
social da qual fazemos parte enquanto seres humanos. A célula oncológica,
se não for parada, cresce até acabar com sua possibilidade de sobrevivência,
pois extermina o seu “hospedeiro” (surpreende perceber que o comportamento
humano, muitas vezes, é muito semelhante).
Também são desenvolvidos trabalhos com o sistema imunológico, dado
que foi através de um descuido desse sistema que o câncer pôde se fixar e
desenvolver-se em um corpo-humano. Como se sabe, nosso sistema imu-
nológico está diariamente identificando células com potencial risco para o
organismo e as elimina sem problema algum, uma vez que essa tarefa faz parte
de uma de suas funções. Quando esse sistema falha, há uma mensagem que
precisa ser compreendida. Algumas vezes para auxiliar o paciente com câncer
a entender todas as mensagens implicadas no seu adoecimento é importante
realizar essas três possibilidades de trabalho clínico: (1) com o órgão afetado,
(2) com a célula neoplásica e (3) com o sistema imunológico.
Diferente de outras formas de trabalho psicológico e entendimento rela-
tivos ao adoecimento somático, o EHSD não pretende correlacionar um adoe-
cimento específico com uma característica de personalidade, já que se baseia
em uma postura fenomenológica e descritiva. Assim, seu formato permite que
o paciente possa perceber as identificações com determinada característica
relativas às funções que determinado órgão desempenha (o terapeuta, neste
caso, apenas conduz o processo).
Ilustrando esse processo, talvez nos surpreenderíamos ao perceber que
conhecemos muito pouco a respeito do nosso organismo, poderíamos exempli-
ficar com um órgão de vital importância para nossa saúde, o Intestino Grosso.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 49

A grande maioria de nós tem uma vaga ideia de onde ele se localiza e sente
seus efeitos já que ele é a parte final do intestino, antes do ânus. Geralmente
as pessoas sentem um pouco de asco ao se referir ao intestino, ignorando sua
extrema importância no processo digestivo para nosso bem estar geral. E por
esta razão é muito comum não conhecermos todo seu potencial de lidar com
os dejetos (restos não assimilados dos alimentos que ingerimos) e fazer sua
parte no trabalho de eliminação, sem questionar, apenas cumprindo sua fun-
ção. Podemos conhecê-lo um pouco mais em parte da descrição personalizada
desenvolvida na sistematização contida nas fichas de cada órgão: “Sou um
tubo flexível, grosso, tenho movimentos, um ritmo próprio e estou aqui para
receber todos os dejetos e tudo o que o intestino delgado (que é muito maior
do que eu) não absorveu. Eu não questiono o que me chega, recebo tudo e
começo a separar, já que minha principal função é absorver a grande quantidade
de líquidos que me chega. [...] Características de personalidade: eliminador,
limpador, desintoxicador, reclamão, forte, rítmico [...]” (Schnake, 2007, p. 89).
É, a partir dessas características, que se inicia o primeiro contato com
determinado órgão, mas de forma vivencial, pois nossa racionalidade talvez
atrapalhasse o processo de conexão com o órgão caso estivéssemos apenas
lendo a descrição das características. É na dinâmica do experimento clínico
que se pode viver com intensidade a experiência de contato e permitir dar-se
conta do que a experiência possibilita para se chegar ao entendimento da
mensagem do órgão, que é única para cada sujeito, assim como cada pessoa
possui uma história de vida particular e singular. Ou seja, é no trabalho
vivencial que o sujeito, ao conhecer as funções e características dos órgãos,
vai se identificando ou não com cada característica e pode perceber sua relação
com o órgão em questão.
Para Schnake, haveria aspectos nossos que poderiam favorecer a presença
de um tipo de doença que nos afeta. Ainda que não saibamos estatisticamente
o tamanho da influência de nos dar conta dessas características na melhora da
doença, é sabido que as mudanças de personalidade permitem uma maior har-
monia e um melhoramento da relação consigo mesmo e com seu entorno. Para
que essas mudanças aconteçam, é fundamental entender e conhecer a relação
que a pessoa tem com o órgão afetado. No trabalho com o EHSD, percebemos
que cada sistema ou órgão do nosso corpo tem suas características e muitas
vezes elas são violentamente rechaçadas, e este rechaço, a autora arrisca dizer
que, pela sua experiência, coincide com a “não defesa” ou o “deixar-se invadir
sem dar aviso”. Segundo Adriana Schnake (2001), as ideias que cada pessoa
possui sobre si mesmo geralmente correspondem a um “eu” idealizado e são,
muitas vezes, altamente perturbadoras e quase em oposição às características
dos órgãos que estão adoecendo. As exigências sociais vigentes, os padrões de
50

conduta que privilegiam determinadas características em detrimento de outras


são responsáveis pelas neuroses e a grave deformidade, não só do mundo em
que vivemos, mas como grandes males da humanidade.

O Legado que Transforma Sofrimento em Aprendizado

Meu contato com o Enfoque Holístico da Saúde e da Doença (EHSD)


aconteceu em 2011, quando eu e minha parceira de trabalho, Maria Balbina
de Magalhães, fomos ao Uruguai apresentar o trabalho Gestalt-Oncologia:
de um lugar além da doença à construção de um caminho, no XII Congresso
Internacional de Terapia Gestalt. Lá conhecemos o enfoque desenvolvido por
esta Médica e Gestalt-Terapeuta chilena até então pouco conhecida por nós.
Encantamo-nos com as possibilidades que esta forma de intervenção nos
revelava e decidimos fazer a formação (Diplomado) em Chiloé - Chile, no
Centro Anchimalén. E foi lá que vivencialmente pudemos então compreender
a dimensão e alcance desses ensinamentos.
O legado de Adriana Schnake, ao promover o encontro entre a abordagem
gestáltica, de base fenomenológica, com seus conhecimentos médicos psiquiá-
tricos, através do seu olhar clínico que partiu de sua extensa experiência como
terapeuta, promoveu um salto quântico no modo de compreensão dos fatores
humanos implicados no adoecimento e na sua possibilidade de restauração
rumo a uma maior integração do sujeito.
“Para mim, uma verdadeira cura implica uma transformação, e não neces-
sariamente no sentido místico, mas num sentido de verdadeiro crescimento;
de uma verdadeira expansão e ampliação do dar-se conta ou tomada de cons-
ciência. As perturbações podem oferecer uma transformação e as doenças
podem ser consideradas como perturbações, também os tratamentos, incluindo
a compreensão inicial da Mensagem da doença até a quimioterapia” (Sch-
nake, 2001).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 51

REFERÊNCIAS
Müller – Granzotto, M. J. & Müller – Granzotto, R. L. (2007). Fenomenologia
e Gestalt-Terapia. São Paulo: Summus.

Perls, F. (1977). Gestalt-Terapia Explicada. São Paulo: Summus.

Schnake, A. (2007). Enfermedad, sintoma y caráter: diálogos gestálticos con


el cuerpo. Buenos Aires: Del Nuevo Extremo: Cuatro Vientos.

Schnake, A. (2001). La Voz Del Síntoma. Santiago do Chile: Editorial Cua-


tro Vientos.

Schnake, A. (1995). A. Los diálogos del cuerpo. Santiago do Chile: Editorial


Cuatro Vientos.

Schnake, A. (2008). Sonia, te envio los cuadernos cafés. Santiago do Chile:


Editorial Cuatro Vientos.
CAPÍTULO 3
O MULTIFATORIAL DO CÂNCER:
intervenções e desafios no
tratamento psicológico
Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida
Rodrigo Serrão de Farias

O cenário das condições de vida e saúde no Brasil foi marcado por


mudanças epidemiológicas significativas nas últimas décadas, ao passo que
o atual panorama é caracterizado por um aumento da expectativa de vida
que acarreta no envelhecimento da população, no entanto, sem garantia na
qualidade de saúde. Isto se deve aos avanços tecnológicos e científicos que
estimulam o consumo da saúde com a crescente oferta de tratamento e cura
para as doenças, exigindo menos esforços, cuidado e responsabilidade de cada
indivíduo com sua saúde. Com isso, padrões de trabalho, lazer e alimentação
foram modificados e hábitos de vida menos saudáveis e inadequados passaram
a predominar e se reproduzirem nas famílias brasileiras. Estas transformações
inter-relacionadas refletiram diretamente no aumento das doenças crônicas
não transmissíveis (DCNT) (Monego & Jardim, 2006; Schmidt et al., 2011).
As DCNT representam um grupo de enfermidades cuja formação ocorre
progressivamente no organismo, com pequenas alterações, muitas vezes imper-
ceptíveis ao indivíduo, que se agravam e se manifestam, ao longo do tempo,
enquanto patologia crônica. Seus agravos são, em grande maioria, irreversíveis,
levando a complicações com graus variáveis de incapacidade, perda de qualidade
de vida e morte, sendo consideradas, na atualidade, as principais causas de mor-
bimortalidade no mundo. No Brasil, as DCNT também são instituídas como o
problema de saúde com maior magnitude, responsáveis por 72% das causas de
morte, com destaque para as doenças cardiovasculares (DCV) com 31,3% dos
óbitos, neoplasias com 16,3%, doenças respiratórias com 5,8% e diabetes mellitus
(DM) com 5,3% (Goulart, 2011; Brasil, 2012; Duncan, Chor, Aquino, Bensenor,
Mill, Schmidt, Lotufo, Vigo & Barreto, 2012; Mansur & Favarato, 2012).
Neste cenário uma pessoa que enfrenta o diagnóstico de câncer está
sujeita a mudanças em seu corpo, mas também no que diz respeito a sua visão
de si e de suas relações sociais e sobre o seu futuro. A partir desse momento,
o paciente pode refletir sobre seu passado e se adaptar ao presente, bem como
adaptar-se aos planos para o futuro. A autoimagem pré-existente, a qualidade
dos relacionamentos interpessoais e o sentimento de pertencimento são fatores
54

de proteção ou podem ser uma fonte de maior vulnerabilidade (Holland &


Rowland, 1989; Holland & Gooen-Piels, 2000; Watson & Kissane, 2011).
Kreitler (2019) refere que as doenças crônicas afetam a vida do paciente
em muitos aspectos. Neste sentido, o câncer acomete em maior grau, ou pelo
menos tem a reputação e a imagem para fazê-lo, em qualquer idade. Para alguns
indivíduos, as alterações na imagem corporal podem ser de importância crucial,
manifestadas na depressão e até na agressão, enquanto para outros, dificuldades
no trabalho podem ser a causa da depressão (Holland & Gooen-Piels, 2000).
O tratamento do sofrimento psíquico em pacientes acometidos pelo cân-
cer exige uma avaliação cuidadosa, a fim de determinar a intervenção mais
apropriada, que pode ser o tratamento de um fator biológico ou o fornecimento
de tratamentos psicológicos, psico-farmacêuticos ou combinados (Figura 1).
O câncer evoca um espectro diversificado de necessidades psicossociais, de
acordo com Holland, Wiesel, Nelson, Roth e Alici (2015) que pode dividir a
doença, para fins de tratamento, de acordo com: 1. o início, sintomas agudos
versus leves; 2. o curso clínico, progressivo (câncer metastático), estável (cân-
cer de mama em estágio inicial), recorrente (leucemia, mieloma); 3. resultado:
doenças que geralmente não influenciam a vida útil, por exemplo carcinoma
de base celular estão em alta em um extremo do continuum e no outro extremo
existem doenças terminais progressivas, como câncer metastático, entre outras
doenças imprevisíveis, que podem encurtar a vida e causar morte súbita; 4. cau-
sar invalidez, doenças significativamente versus insignificantes causam prejuízo
ao funcionamento. Aquelas doenças que se apresentam em grupos separados
implicam situações psicológicas distintas de pacientes e suas famílias.

Figura 1 – Modelo Integrativo de tratamento médico

Fonte: Os autores, baseado em Holland et al. (2015).


A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 55

Cordella e Poiani (2014) ressaltam que os distúrbios psiquiátricos ou


comprometimentos na saúde mental mais observados em pacientes com câncer
são os de ajuste e os afetivos (ansiedade e depressão), que na maioria dos
pacientes são causados ​​por estressores relacionados à ocorrência e ameaça
da doença, e vulnerabilidades psicológicas pré-existentes; no entanto, eles
também podem ser uma consequência direta de causas biológicas resultantes
de modificações corporais induzidas pelo câncer ou de efeitos colaterais do
tratamento (por exemplo, tratamento com interferon ou radioterapia, metás-
tases cerebrais, hipercalcemia, síndromes paraneoplásicas).
Observa-se que os tratamentos contra o câncer são reconhecidos como
extremamente desafiadores. O desenvolvimento e a intervenção psicológica
tornaram-se uma atividade detalhada, qualificada e organizada, guiada por
evidências. Apoiar os pacientes nesses desafios e dificuldades faz parte de uma
abordagem holística ao tratamento do câncer que os pacientes têm como foco
o tratamento e não o tumor. É importante que aqueles que lidam diariamente
com pacientes em sua prática clínica psicológica tenham habilidade sufi-
ciente para oferecer atendimento especializado. Quanto a equipe de saúde, o
treinamento nessas habilidades deve ser integrado as atividades rotineiras de
cada área profissional. À medida que os problemas e as emoções se tornam
mais difíceis e os pacientes se esforçam para lidar com isso, também o tipo
de atendimento psicológico oferecido se torna mais complexo, detalhado e
específico, e o nível de habilidade profissional necessário para prestar o aten-
dimento é aumentado (Hodges et al., 2011; Holland et al., 2015; Nice, 2004).
Dessa forma, compreendemos ser importante ressaltar esta seção para
contribuir em um livro que destina-se ao trabalho com essa população assistida
por equipe multiprofissional, a fim de promover a atenção e a qualidade de vida.

Psico-oncologia, um breve histórico

A psico-oncologia, tem acumulado evidências nas últimas três décadas,


confirmando o valor da intervenção psicológica. Isso contribuiu para uma
discussão específica sobre como as necessidades psicológicas e emocionais
dos pacientes com câncer, amigos, familiares e pessoas próximas a elas podem
ser melhor assistidas (Watson & Kissane, 2011). O termo psico-oncologia,
surgiu em 1961 na Argentina, através do médico José Schavèlson, mas foi
nos Estados Unidos, nos anos 70 que ganhou mais adeptos, através dos tra-
balhos de Jimmie Holland. Há três aspectos fundamentais para o nascimento
da psico-oncologia: (1) otimismo em relação ao diagnóstico e a possibili-
dade de sobrevivência, devido às constantes melhorias no tratamento; (2)
relatos de celebridades e personalidades públicas acerca de seus processos
de adoecimento e tratamento; e (3) movimentos sociais que defendiam os
56

direitos humanos, inclusive de pacientes oncológicos. Nessas condições a


população passou a ter mais informações sobre o câncer e isso contribuiu
para a diminuição do preconceito da doença, o que possibilitou o avanço de
pesquisas e com o conhecimento maior que os pacientes passaram a obter
de sua condição, essas respostas puderam ser melhor estudadas (Holland &
Rowland, 1989; Vilaça, 2018).
O livro de Holland, Handbook of Psychooncology (1989), apresentou
a sistematização sobre os cuidados emocionais dos pacientes oncológicos,
identificando os aspectos que deveriam ser estudados: 1. O impacto do câncer
na função psicológica do paciente, de sua família e da equipe; 2. O papel que
as variáveis psicológicas e comportamentais podem ter no risco de câncer e
na sobrevivência (Holland & Rowland, 1989).
A importância do paciente em participar do seu próprio processo saúde-
-doença, no seu tratamento e recuperação, de forma a melhorar sua qualidade
de vida e até ultrapassar a expectativa de sobrevida, é ressaltada por Vilaça
(2018). Potencializar essa participação do indivíduo, compreender suas for-
mas de lidar com a doença e reações emocionais é necessário na atuação da
área psico-oncológica.
Rudnick, Oliveria e Rosa (2018) e National Institute for Health and Clini-
cal Excellence (NICE, 2004) referem que todos os profissionais de saúde estão
envolvidos no controle da doença, dessa forma, precisam ter conhecimentos
suficientes sobre a patologia para que “possa informar, cuidar e encaminhar
cada paciente”. Informações sobre variáveis como idade do paciente, condi-
ção clínica, tamanho e localização do tumor, além de tratamentos fármacos,
deve perpassar a gama de conhecimentos que o profissional deve possuir para
melhor atendimento ao indivíduo.
Dentre as consequências psicológicas do câncer estão sintomas depressi-
vos, ansiosos e perturbações neuropsiquiátricas. Além de aspectos fisiológicos,
o tratamento visa fortalecer a autonomia do paciente, sua aceitação frente ao
quadro clínico, melhorar sua compreensão acerca de sua condição e aprender
a regular emoções e sentimentos associados ao câncer.

Intervenções psicológicas em pacientes oncológicos

O apoio social e psicológico dos pacientes e de seus familiares deve


ser considerado parte fundamental da assistência à saúde (Lassen, Gat-
tinger & Saxer, 2013). As intervenções psicológicas nessa área são as
ferramentas mais simples e mais complexas que desenvolvemos nesse
ambiente de saúde. Os terapeutas devem ter conhecimento sobre a doença
câncer como um distúrbio médico, ser habilidosos em avaliar e administrar
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 57

psicologicamente os pacientes e transmitir certa segurança c​ om a experiên-


cia subjetiva em face a situações médicas complexas e tensas. Além disso,
ter a capacidade de reconhecer as mudanças nas necessidades psicológicas
do paciente que requer o julgamento clínico e flexibilidade. O atendimento
psicossocial é cada vez mais reconhecido como um componente essencial
do atendimento integral ao indivíduo com câncer. Melhorar o acesso dos
pacientes aos cuidados psicossociais é importante; no entanto, garantir que
os cuidados disponibilizados tenham se mostrado eficazes é igualmente
fundamental no processo de tratamento (Holland et al., 2015).
A partir do momento do diagnóstico do câncer, o paciente modificará
sua percepção de si mesmo, seus relacionamentos interpessoais e seu
sentimento de pertencer aos outros (saudáveis ou não): ele pode refletir
sobre seu passado e se adaptar ao presente, e dessa forma adaptar-se aos
planos para o futuro. A autoimagem pré-existente, a qualidade dos rela-
cionamentos interpessoais e o sentimento de pertencimento são fatores de
proteção ou podem ser uma fonte de maior vulnerabilidade. A adaptação a
esse novo momento e à doença está associada a seis obstáculos distintos,
conforme definido por Faulkner e Maguire (1994): (1) gerenciamento da
incerteza sobre o futuro, (2) busca de significado para a vida, (3) trata-
mento de perda (exercer o controle), (4) com necessidade de abertura a
possibilidades e (5) apoio emocional, e (6) médico. Frente aos desafios,
deixar de lidar com esses obstáculos pode levar ao sofrimento psicossocial.
Para Souza e Araújo (2010), as intervenções psicológicas em pacien-
tes oncológicos são eficientes quando o paciente consegue manejar seus
sofrimentos, solucionar problemas específicos e obter algum controle
sobre consequências da doença, a partir disso, podem regular seu sofri-
mento emocional e continuar com atividades que julgam importantes.
Nesse sentido, para que os objetivos citados anteriormente sejam alcan-
çados, ressalta-se dentre eles, as que proporcionam o desenvolvimento de
“atitudes e crenças individuais quanto à capacidade de mudar aspectos
desfavoráveis; estratégias para lidar com as limitações funcionais; habili-
dades para estabelecer e manter uma rede de apoio; percepções positivas,
reestruturações de pensamentos negativos, objetivos realistas e planos
para o futuro” (Souza & Araújo, 2010, p. 188). Além disso, considerar
os aspectos sociais, psicológicos e econômicos do paciente em relação à
doença são de extrema relevância. A realização de uma avaliação e inter-
venções interdisciplinares facilitam o cuidado integral e humanizado a
esses indivíduos (Andrade & Azevedo, 2018).
Pacientes com câncer também são mais suscetíveis a transtornos
psicológicos, entre eles, o transtorno depressivo grave é quatro vezes
58

mais comum nesses indivíduos do que em pessoas saudáveis, acometendo


entre 10 a 20% dos pacientes durante a doença (Rudnick, Oliveira &
Rosa, 2018). Além do risco ao transtorno de ansiedade, transtornos sexuais
e suicídio (Lourenção, Junior & Luiz, 2010).
Analisando as necessidades do campo da oncologia, as intervenções
psicológicas devem focar na adaptação do paciente a sua nova condição,
promover adesão ao tratamento, auxiliar no manejo da dor e estresse,
intervenções psicoprofiláticas para realização de procedimentos cirúrgicos
ou invasivos dolorosos, promover melhoria na qualidade de vida e reabi-
litação; apoio aos familiares e atenção aos cuidados paliativos (Andrade
& Azevedo, 2018; Holland et al., 2015).
As intervenções psicológicas tornaram-se uma atividade detalhada,
qualificada e organizada, guiada por evidências científicas, são concebidas
para ajudar o paciente a lidar e se adaptar à doença e permitirão ter um
efeito positivo no sofrimento, na ansiedade, na depressão, e na angústia
(McLoone, Menzies, Meiser, Mann, Kasparian et al., 2013). De forma sus-
cinta, destaca-se uma definição mais específica da intervenção psicológica
formal, proposta aqui e inclui quatro características: 1. Uma intervenção
direta de um profissional especializado; 2. A intervenção segue um método
baseado em evidências científicas; 3. O método de intervenção e o resultado
da terapia são claramente descritos e definidos, possibilitando que outras
pessoas saibam como usar a intervenção e avaliar seus efeitos e eficácia;
4. O foco principal da intervenção é trabalhar com pessoas para aumentar
seus recursos pessoais ao lidar com aspectos do câncer que causam estresse
/ angústia indevidos e, a esse respeito, as metas de mudança serão compor-
tamentais, emocionais, cognitivas e relacionais / interpessoais.
A seguir, debruçaremos sobre as possibilidades de intervenções psi-
cológicas em TCC, discutiremos as duas versões apropriadas e benéficas
no atendimento ao adulto com câncer.

Psicoterapia cognitiva-comportamental (TCC)

A terapia cognitivo-comportamental é uma das versões da TCC, com


base na abordagem de Beck, J. (1995), tem sido amplamente utilizada em
pacientes com câncer para promover o ajuste psicológico. A TCC em doen-
ças físicas e fisiológicas consiste em modificar esses pensamentos e compor-
tamentos, que podem sustentar problemas mentais mesmo que seu cérebro
esteja lutando contra uma doença física. Essa terapia é estruturada e focada
no problema, onde o reconhecimento ou acesso consciente a pensamentos
e crenças são centrais. As sessões de TCC podem ser divididas em etapas
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 59

que iniciam com a coleta de informações importantes sobre o paciente (a


sua história de vida e doença) e terminam com um estágio final que auxilia
o paciente a integrar o que foi aprendido nas sessões de modo a fazê-lo
lidar com as preocupações, associadas à vida com o câncer (Daniels, 2015).
Quando à doença parece ser a principal tarefa de desenvolvimento para
um paciente e sua família, dar à experiência da doença um significado que
reforce sua competência e eficácia (Quadro 1). A TCC ajuda os pacientes
a controlar se a visão atual sobre uma determinada situação é adequada ou
útil, questionar suas opiniões, bem como apoiar a exploração de pensamen-
tos alternativos e na aplicação de habilidades de resolução de problemas
que promovem o enfrentamento (Beck, J., 1995; Knapp & Beck, A. 2008).

Figura 2

O terapeuta convida o paciente


para refletir sobre qual a
atitude ou solução que pode
adotar.

O terapeuta pergunta ou faz um resumo em que o paciente considere


a sua opinião uma conclusão construtiva ou não para aquela situação em
discussão (Figura 2).

Quadro 1 – Habilidades ensinadas ao paciente com câncer na TCC


• Obter uma compreensão completa dos fatores que mantêm o sofrimento emocional e a evitação
situacional.
• Identificar e modificar padrões negativos de pensamento.
• Desenvolver habilidades de resolução de problemas.
• Dominar técnicas, entre outras a de relaxamento e respiração profunda.
• Aprender a enfrentar gradualmente situações temidas, em vez de evitá-las.
• Desenvolvimento de habilidades organizacionais.
• Melhorar as interações sociais e parentais.
Fonte: Os autores.
60

As sessões têm uma forma estruturada, de acordo com o plano estabe-


lecido pelo terapeuta, que inicia geralmente, na identificação do problema,
e incluem as tarefas de casa, criação de novas e a verificação das anteriores,
cujo objetivo é testar crenças e novas maneiras de lidar entre as sessões
(continuum). As interações de pensamentos, comportamentos, emoções e
sensações físicas são enfatizadas nas suposições (Moorey & Watson, 2015). O
Quadro 2 traz algumas modificações que podem ser incluídas e adaptadas para
o tratamento com adultos e os idosos, de acordo com o contexto e o paciente.

Quadro 2 – Modificações da terapia TCC adaptadas para o tratamento do câncer


# As sessões são menos formais, mais flexíveis e mais favoráveis.
# As sessões podem ser mais breves e ajustadas às condições físicas, fisiológicas do paciente.
# As sessões podem ser realizadas em estabelecimentos de saúde ou nas casas dos pacientes.
# As técnicas são ajustadas às condições físicas, fisiológicas dos pacientes.
# A terapia inclui familiares e profissionais de saúde.
# Os objetivos da terapia são mais circunscritos.
# As sessões podem ser fornecidas pela Internet podem servir como um complemento às intervenções
presenciais existentes (Evert, van der Lee & Meezenbroek, 2015).
# O objetivo principal da terapia é promover a mudança máxima com a intervenção mínima.
Fonte: Adaptado de Holland et al. (2015).

O terapeuta ensina o paciente a identificar e modificar pensamentos,


crenças e comportamentos inúteis, além de reforçar o senso de autoeficácia.
O terapeuta e o paciente trabalham juntos para definir o objetivo da terapia e
criar uma conceitualização cognitiva compartilhada. Os objetivos terapêuti-
cos estão claramente definidos, desde o início do processo e revisto ao longo
das sessões. O terapeuta ajuda o paciente a tratar suas crenças negativas
como hipóteses sobre si mesmo, concomitantemente são testadas usando
técnicas cognitivas e comportamentais, através do empirismo baseada na
colaboração. Ensina o paciente a ser especialista em seus próprios problemas
e experiências. Propõe a busca conjunta de soluções para os problemas,
enquanto o paciente oferece dados brutos, como pensamentos e comporta-
mentos, e viabiliza a estrutura e as competências na resolução de problemas.
Continuamente, o progresso do paciente é monitorado e avaliado o tempo
todo, à medida que é solicitado a receber e dar feedback durante cada sessão
(Beck, A. et al., 1979; Beck, A. 1995; Daniels, 2015).
Durante as intervenções, podem surgir os pensamentos negativos, por
exemplo: “Sou vulnerável”, “Ninguém pode me ajudar”, “A situação ruim
mudará em breve para pior “, “Estou desamparado” e “ Não posso lidar com
isso”. O objetivo nas intervenções incide sobre o ajuste do paciente à nova
situação na relação com as suas respostas, de ansiedade, depressão, por exem-
plo. O treino com o paciente consiste em ele aprender a dar respostas úteis e
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 61

positivas às ideias pessimistas, nesse processo gradual (por exemplo, ideias


de prevenir ou tornar menos intensa a depressão e outras respostas do tipo
desamparo e desesperança). A atenção às questões emocionais e interpessoais
é particularmente importante nos pacientes que passam por um processo de
ajuste. O terapeuta precisa alcançar um equilíbrio entre apoiar o ajuste e pro-
mover a solução de problemas. O gerenciamento de interações desadaptativas
com os cuidadores e o apoio social são componentes significativos da terapia.
A eficácia da TCC nesses domínios foi comprovada em estudos controlados
em larga escala (Telch & Telch 1986; Lejouez, Hopko & Hopko, 2001; Hopko,
Funderburk, Shorey, McIndoo, Ryba, File & Vitulano, 2013).
A identificação de pensamentos automáticos e disfuncionais frente aos
sintomas é importante para descobrir quais são as crenças intermediárias
e centrais do paciente (por exemplo, cefaleia, insônia). A partir daí, em
conjunto com o terapeuta, pode realizar-se a reestruturação cognitiva, que
tem por objetivo ensinar aos pacientes que nem sempre seus pensamentos
condizem com a realidade, e mostrar que pode desenvolver estratégias para
diminuir a intensidade do episódio doloroso ou difícil de lidar, além de ter
mais controle sobre as crises. Nesse processo, o terapeuta auxilia na pre-
venção de recaídas (Daniels, 2015).
A coleta dessas informações ajuda o paciente a identificar qual abor-
dagem e técnica que mais o beneficiará. As técnicas cognitivas e comporta-
mentais geralmente proporcionam alívio rápido dos sintomas de angústia e
não exigem que o paciente seja excessivamente introspectivo. O foco aqui
é fornecer experiências de enfrentamento bem-sucedidas que reforçam a
autoeficácia e o controle (Wenzel, 2012).
O resultado pode ser um alívio do sofrimento e uma mudança do pensa-
mento negativo para uma visão mais positiva da capacidade do paciente em
lidar com o problema. Crenças negativas são transformadas em hipóteses,
isto é, se põe à prova esse pensamento e a emoção envolvida. Para pacientes
inseguros ou com sintomas de ansiedade, sem esperança, o agendamento de
atividades pode ajudar a superar a inatividade. Para pacientes deprimidos
ou mais doentes físicos, preferencialmente as tarefas precisam ser dividi-
das em pequenas etapas, de modo que possam ser graduadas. É necessária
alguma criatividade para encontrar atividades e adequá-las à situação. Os
familiares podem ser convidados a participarem e para fazer sugestões com
base em seus conhecimentos sobre o paciente (Kreitler, 2019). Para pacien-
tes ansiosos, experimentos comportamentais podem ser configurados para
testar situações temidas (Watson & Kissane, 2011). O Quadro 3 mostra
sucintamente alguns manejos com as técnicas cognitivas e comportamentais
a partir do questionamento dos pensamentos automáticos.
62

Quadro 3 – Técnicas cognitivas e comportamentais


no manejo nas sessões com adultos
Questionando pensamentos automáticos
*Qual é a evidência?
*Existe uma maneira alternativa de encarar a situação?
*Qual é o efeito de pensar dessa maneira?
*O que diria a um amigo se ele estivesse nessa situação?
*Existe uma maneira alternativa de encarar a situação?
*Qual o pior que poderia acontecer?
*Qual o melhor que poderia acontecer?
*O que acontecerá provavelmente?
*O que eu diria a um amigo se ele ou ela estivessem nessa situação?
*Como posso lidar com isso?

Fonte: Os autores, baseado em Wenzel (2012).

O paciente é confrontado com suas respostas cognitivas e comportamen-


tais inadequadas, sendo incentivado a explorar alternativas cognitivas ou em
ação, a fim de obter um melhor ajuste. Existem evidências empíricas sobre a
melhoria da qualidade de vida após a aplicação deste modelo (Daniels, 2015).
Dentre as técnicas mais utilizadas da TCC, algumas se fazem essenciais
junto ao paciente oncológico, como: Psicoeducação, mindfulness, estratégias
do manejo do estresse, habilidades sociais, regulação emocional (manejo da
raiva), reestruturação cognitiva, treino de assertividade, distração, dessensi-
bilização sistemática, manejo de contingência e modelação (Kreitler, 2019;
Rudinick, Oliveira & Rosa, 2018; Wenzel, 2012).
A psicoeducação é uma técnica eficaz no âmbito da saúde, sendo a psico-
-oncologia beneficiada pela sua utilidade e aplicabilidade, desde intervenções
com crianças e seus familiares, a cuidados paliativos de idosos e seus cuida-
dores (Lemos & Neto, 2017). As intervenções psicoeducacionais podem ser
feitas através de diversas maneiras, seja a partir da comunicação entre equipe
de saúde, paciente e familiares, vídeos educativos, palestras em salas de espera
etc. Quando nos referimos ao processo da TCC, um instrumento bastante uti-
lizado são os coping cards ou cartões de enfrentamento com registros sobre
conteúdos discutidos durante a psicoterapia (Santana, 2016). O paciente é
incentivado a guardar em lugares estratégicos (bolsos, gavetas, mochilas), e
sempre que se perceber em alguma situação-problema, ele acessa esses car-
tões com informações que podem lhe ajudar a enfrentar a situação que está
causando alguma perturbação emocional. Santana (2016) e Wenzel (2012)
sugerem que com a utilização do cartão-lembrete o paciente pode revisar seus
pensamentos disfuncionais, identificados com a ajuda do psicoterapeuta, e
avaliar qual forma mais adaptativa pode lidar com os sentimentos e pensa-
mentos que está experenciando, favorecendo uma reestruturação cognitiva.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 63

As intervenções psicoeducacionais também podem ser feitas com fami-


liares, cuidadores de pacientes infantis e na terapia em grupo. O impacto da
doença altera o modo como os pais se comportam e lidam com as contingên-
cias, como o estabelecimento de limites e uso de práticas coercitivas, o que
influencia a criança com câncer a ter ganhos secundários e desenvolver maior
dependência (Herman & Miyazaki, 2007; Kreitler, 2019). Desenvolver junto
aos pais práticas educativas positivas e participativas, favorecem o desenvol-
vimento da criança e também o tratamento da doença. Herman e Miyazaki
(2007) comentam sobre duas práticas positivas, a monitoria positiva com
“o uso adequado de privilégios, regras, distribuição de atenção e afeto” e o
comportamento moral, envolvendo o senso de justiça, generosidade e “certo e
errado”. As intervenções psicoeducacionais objetivam a promoção e fortaleci-
mento dessas práticas positivas. Em intervenções com crianças (Graner, Junior
& Rolim, 2010), adultos e idosos (Kreitler, 2019) ressaltam que a técnica
da imaginação dirigida é bastante frequente. É importante também associar
a utilização de desenhos, para proporcionar um alívio da dor e ansiedade,
distanciamento da realidade e aumento da consciência corporal. Outro ponto
a salientar é o reforçamento positivo, principalmente em pacientes infantis e
idosos com o objetivo de favorecer o comportamento de cooperação (Graner,
Junior & Rolim, 2010; Kreitler, Martin & Ben-Arush, 2012).
Souza e Araújo (2010) ressaltam a eficácia da psicoeducação no trata-
mento em grupo, com objetivos principais de desenvolver habilidades adapta-
tivas de enfrentamento, minimizar o estresse e melhorar a qualidade de vida.
Pacientes em início de tratamento quimioterápico podem ser submetidos à
intervenções em grupo, as quais visam “reduzir dificuldades relacionadas ao
diagnóstico e à quimioterapia, bem como seus efeitos (treino de soluções de
problemas), para auxiliar na adaptação à doença e tratamento (manejo do
estresse), ajudar no equilíbrio emocional (regulação emocional) e desenvolver
habilidades de comunicação (assertividade).
Em relação aos efeitos do tratamento, a técnica de relaxamento se mos-
tra eficaz para melhorar e aliviar os efeitos colaterais, além de minimizar a
ansiedade. O objetivo principal “é ensinar o paciente a entrar em um estado de
relaxamento”, focar em imagens agradáveis, ensinar a tensionar os músculos
e controlar a respiração, são algumas formas de se alcançar o relaxamento
(Kreitler, 2019; Rudinick, Oliveira & Rosa, 2018; Wenzel, 2012). Além disso,
proporciona uma redução considerável nos níveis de ansiedade, muito presente
em pacientes com câncer devido às expectativas dos resultados do tratamento
que envolvem estados de tensão, hiperatividade, apreensão, vigilância e alerta
(Andrade e Azevedo, 2018). Neste sentido, o relaxamento progressivo é bas-
tante utilizado no controle da dor, por exemplo, em que os pacientes aprendem
a tensionar e relaxar grupos de músculos separadamente com o objetivo, ao
64

longo do tempo, de aprender a controlar seus músculos simultaneamente


(Graner, Junior e Rolim, 2010). Tais estímulos podem exigir maior atenção
através de Biofeedback, o paciente pode perceber as respostas que seu orga-
nismo emite com a dor e com isso controlar e manejar essas respostas.
A prática da terapia cognitiva baseada em Mindfulness, ou atenção plena,
é um outro recurso, na qual o paciente concentra-se no “aqui e agora”, sem
julgamentos, o que favorece o gerenciamento do estresse, além de contribuir
para o doente lidar com a dor, fadiga, náusea e vômitos (Holland et al., 2015;
Rudinick, Oliveira e Rosa, 2018).
Moorey e Watson (2012) e Graner, Junior e Rolim (2018), destacam a
técnica comportamental da modelação utilizada tanto em adultos como em
crianças e adolescentes principalmente quando estão com medo ou não de
receberem informações suficientes acerca de algum procedimento médico
doloroso necessário. Em crianças, pode ser feita através da apresentação
de filmes onde se descrevem passos do procedimento que irá acontecer.
Já o ensaio comportamental tem como principal objetivo a promoção de
comportamentos de enfrentamento e dessensibilização de componentes
que provocam sofrimento ao doente, além de favorecer a participação
ativa da pessoa em seu tratamento.

Terapia de aceitação e compromisso (ACT)

É uma terceira versão recente da TCC cujo objetivo é alterar a função


de pensamentos problemáticos ou angustiantes para o indivíduo, em vez de
alterá-los, adaptá-los ou eliminá-los (Hayes & Lillis, 2012). O modelo de
psicopatologia da ACT é utilizado para conceitualizar casos e para delinear
intervenções. Assim, pensamentos ou expressões angustiantes são vistos
como normais no caso de uma situação desafiadora, e a terapia deve ajudar
o paciente a aceitá-los e a conviver com eles. O tratamento consiste em ensi-
nar os pacientes a reconhecer os pensamentos perturbadores e suas emoções
concomitantes, além de perceber que ter um pensamento não significa que
ele necessariamente se tornará realidade. Além disso, o paciente é ensinado
a continuar funcionando na vida, dar continuidade e a promover os objetivos
e valores, apesar das mudanças na situação devido ao câncer (Kreitler, 2019).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 65

Figura 3 – Modelo ACT de mudança de comportamento,


adaptado de Finlay, Peacock e Elander (2018)

O modelo de flexibilidade psicológica é, portanto, ao mesmo tempo,


um modelo de psicopatologia, de saúde mental e de intervenção psicoló-
gica. Os processos subjacentes à psicopatologia e ao sofrimento, conforme
a Teoria das Molduras Relacionais (TMR), emergem de características da
linguagem e cognição humanas. Os processos centrais estão relacionados
e são apresentados graficamente como um hexágono (Figura 3). Cada um
dos seis vértices desse hexágono corresponde a um processo associado à
inflexibilidade psicológica: esquiva de experiência ou esquiva experiencial;
fusão cognitiva; predominância do passado conceitual e do futuro temido;
apego ao eu conceitualizado; inércia, impulsividade e persistência na esquiva;
e falta de clareza de valores (Finlay, Peacock & Elander, 2018).
A avaliação deve abordar o contexto biopsicossocial dos adultos. É
essencial que o terapeuta colabore com o médico de cuidados primários do
paciente para entender melhor quaisquer comorbidades médicas ou defi-
ciências funcionais que possam influenciar o tratamento. Alem de conside-
rar várias características clínicas importantes ao conduzir a avaliação dos
processos principais relacionados ao ACT com adultos. É particularmente
importante avaliar os indícios de suicídio quando se trabalha com pessoas
mais velhas, sendo que o suicídio pode ser considerado a forma mais extrema
de evitação experiencial. Além disso, avaliar o uso ou abuso de substâncias
66

como uma estratégia de controle interno, pois esses problemas são geral-
mente diagnosticados ou não detectados nessa população (Loukissa, 2007).
A doença crônica e o comprometimento funcional são comumente
co-mórbidos em idosos deprimidos e ansiosos. É importante avaliar até que
ponto o cliente está se fundindo com um senso de si danificado que pode estar
surgindo de doenças crônicas e comprometimento funcional (isto é, definindo o
eu como indefeso ou enfermo). Semelhante às atitudes sobre o envelhecimento,
a fusão com um eu conceitual danificado decorrente de uma doença crônica
precisa ser abordada no tratamento e pode representar uma barreira à mudança
de comportamento (Hayes & Lillis, 2012; Finlay, Peacock & Elander, 2018).
A perda do contato com os valores da vida pode ocorrer após eventos
importantes nela experimentados, como aposentadoria ou novas deficiências
funcionais que surgem de uma doença crônica. Assim, se o paciente não con-
seguir fazer a transição para novos objetivos comportamentais consistentes
com esses valores após a aposentadoria, ele poderá experimentar descone-
xão com os valores essenciais. Além disso, novas deficiências funcionais
decorrentes de doenças crônicas podem tornar os objetivos atuais fisicamente
inatingíveis. Se esses objetivos inatingíveis não forem substituídos por obje-
tivos atingíveis que estejam de acordo com os valores, o paciente poderá
perder o contato com um valor de vida profundamente enraizado. Ressalta-se
que esclarecer sobre os valores tem os seguintes objetivos: ajudar o doente
a se reconectar com os valores que dão sentido e propósito à sua vida. Um
segundo objetivo é aumentar a conscientização sobre direções valiosas da
vida e maneiras pelas quais o comportamento atual não está de acordo com
esses valores anteriormente introjetados. Identificar esses valores, deve ser a
tarefa do terapeuta para trabalhar no sentido de criar estratégias alternativas
para chegar em direção a esses valores, obtendo assistência de outras pessoas
ou para identificar metas alternativas que ainda são atingíveis. O atendimento
psicoterápico mostra que a maioria dos pacientes não consegue, por exem-
plo, se desvencilhar de regras disfuncionais, aceitar aquilo que não pode
ser mudado, viver o momento presente e viver de acordo com seus valores.
As barreiras mais comuns encontradas no tratamento, por exemplo, são a
fadiga, experimentar emoções desconfortáveis ​​e a fusão com experiências
internas autoavaliativas (Finlay, Peacock & Elander, 2018).
A fusão cognitiva é outra área importante de avaliação em adultos mais
velhos. É importante avaliar até que ponto o indivíduo está fundido com um
eu conceitualizado como danificado. É importante avaliar com o paciente a
respeito das suas atitudes sobre o envelhecimento, e ter opiniões negativas
sobre o envelhecimento pode se transformar em um auto-estereótipo negativo
que tendem a ter piores resultados funcionais e de saúde mental na idade adulta
(Hayes & Lillis, 2012). A fusão cognitiva com esse eu envelhecido conceituado
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 67

e danificado pode criar uma barreira à mudança comportamental. Também é


importante avaliar a fusão cognitiva entre idosos com deficiência e doentes
crônicos. A doença crônica e o comprometimento funcional são comumente
co-mórbidos em idosos deprimidos e ansiosos. Sugere-se que uma das perguntas
que o terapeuta deve fazer, é como os desafios médicos influenciam seus com-
portamentos. Os pacientes que limitam suas atividades além do que é imposto
pela incapacidade física, embora atribuam essas limitações exclusivamente à
saúde, provavelmente estão se fundindo com esse eu conceitual danificado.
Schaie (2005) sugere que o tratamento deve ser limitado no tempo e,
dependendo do cliente e de seu comprometimento (físico, fisiológico, por
exemplo) pode consistir em 12 a 16 sessões de cinquenta minutos. As alte-
rações cognitivas, como velocidade de processamento reduzida, memória de
trabalho e atenção, ocorrem como parte do processo normal de envelhecimento,
portanto o processo terapêutico geralmente é mais lento com pacientes com
problemas cognitivos ou funcionais, por isso podem ser necessárias mais ses-
sões para dar maior atenção aos componentes importantes. Uma das formas
para auxiliar muitos adultos e idosos com dificuldade em perceber e identificar
experiências internas, é realizar um exercício de atenção plena, como respira-
ção consciente, no início de cada sessão, a fim de desenvolver e praticar essa
habilidade (Zettle, 2007). Em seguida, é interessante revisar os tarefas de casa
e aquilo que foi abordado na sessão anterior. O novo material para a sessão é
aceito (agenda) e a tarefa de casa é atribuída. Para essa clientela, normalmente,
os folhetos explicativos das tarefas de casa são fornecidos em papel colorido
diferente (com letras em negrito ou em fonte maior, para queles com deficiências
sensoriais, por exemplo), com objetivo de distinguir as tarefas e os pacientes
são solicitados a repetir o que conseguiram realizar ou não, com suas próprias
palavras para garantir que eles entendam o que devem fazer entre as sessões.

Psicoterapias específicas propostas para o cenário


de oncologia: os cuidados paliativos

Quando nos referimos ao câncer, a possibilidade de morte está presente


e perpassa por vários indivíduos, seja através do paciente, seus familiares
ou pela equipe de saúde. Essa possibilidade torna-se mais palpável e real
quando a pessoa se encontra no critério para cuidados paliativos, no qual o
tratamento volta-se ao controle da dor e outros sintomas, além de preservar
aspectos cognitivos, sociais e espirituais dos pacientes e sua família (Castro e
Barroso, 2012). Os cuidados paliativos são uma habilidade cujos os esforços
recentes nessa área demonstraram que a prestação de cuidados paliativos é
parte integrante da prestação de cuidados de câncer compassivos e de alta
68

qualidade, especificamente no que se refere aos resultados físicos e emocionais


dos pacientes e de seus cuidadores (Kaufmann & Kamal, 2017).
Dor e sofrimento são duas variáveis presentes no tratamento da pessoa
com câncer, comentam Castro e Barroso (2012), Kaufmann e Kamal (2017)
embora tenham conceitos diferentes. Enquanto a primeira refere-se a uma
experiência sensorial e emocional, geralmente uma lesão; a segunda está rela-
cionada à subjetividade do sujeito, podendo existir a ruptura do eu e refletir
a vulnerabilidade como pessoa; contém também o medo de ficar sozinho, de
perder quem se ama, e interromper os planos. O adoecimento e a eminência
da morte dentro da família desestabilizam o sistema e que deverá ser reorga-
nizado frente às demandas da condição imposta através da doença. Mas isso
não significa uma resolução, e sim uma “descoberta de maneiras de seguir
em frente com a vida” através de um compartilhamento da realidade que se
apresenta entre todos os membros.
Neste sentido, Castro e Barroso (2012) enfatizam o papel da dor e as
crenças que os pacientes possuem em relação a ela, além das estratégias de
enfrentamento que eles utilizam. Ao experenciar com mais controle sobre à
vida, o paciente pode perceber menos intensidade da dor e utiliza estratégias
mais adaptativas, ao contrário, quando se percebe indefeso, aumenta-se a
frequência e a intensidade das dores. Assim, educar pacientes, familiares e
cuidadores é essencial para o controle da dor. Além de possuir quadro clínico
específico em relação à doença, o paciente mostra-se vulnerável às influên-
cias externas, contribuindo para que os processos cognitivos favoreçam o
surgimento de comportamentos disfuncionais, resultando em uma percepção
equivocada de suas dores.
Em cuidados paliativos, como dito anteriormente, o controle da dor é
fundamental, e intervenções não medicamentosas, como “apoio emocional,
físicos, educacionais e cognitivo-comportamentais” também são importan-
tes (Castro e Barroso, 2012). Outras técnicas da TCC, podem ser também
aplicadas, como: Psicoeducação, Treino Assertivo e Habilidades Sociais,
Reestruturação Cognitiva e Técnicas de Aquisição de Estratégias para alívio
dos estados de tensão e ansiedade.
Cabe aos profissionais de saúde envolvidos no tratamento, orientar os
pacientes em relação aos sintomas, visando ao bem-estar e promovendo uma
forte aliança terapêutica. A equipe multiprofissional (quando trabalham em
conjunto) com os prestadores de cuidados longitudinais do paciente forne-
cem uma camada adicional de apoio. Acolher, melhorar a autoestima e o
autocuidado são fundamentais no processo de cuidado paliativo (Kaufmann
& Kamal, 2017) bem como, de intervenção ao paciente, familiares e cuida-
dores. Sendo assim, cabe ao psicólogo oportunizar a escuta e contribuir para
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 69

aceitação do quadro clínico por seu paciente, fortalecendo a união dos fami-
liares favorecendo uma oportunidade de validar sentimentos difíceis como
culpa, raiva e à possibilidade de morte.

Considerações finais

A relação terapêutica, que perpassa todo o processo da TCC, se mostra


uma habilidade profissional fundamental para a eficiência de qualquer inter-
venção psicoterápica. Essa habilidade, atuando diretamente com pacientes
oncológicos, vai além do estabelecimento da intimidade e confiança, torna-se
também uma responsabilidade mútua, por um lado, o terapeuta, conhecedor de
teorias e técnicas acolhe não só o paciente e familiares, mas todo o peso que
o câncer representa na história de vida daquele indivíduo. Compreender que
a condição da doença é algo além de aspectos físicos, influenciando na vida
afetiva, profissional, pessoal, emocional e espiritual, cumpre também o cuidado
biopsicossocial que perpassa o processo saúde/doença de todo indivíduo. Por
outro lado, com o ganho de autonomia que recebe da intervenção terapêutica, o
paciente se envolve com o próprio processo saúde/doença e contribui para seu
bem-estar, funcionando também como agente de mudanças de seus familiares,
o que pode favorecer e fortalecer o vínculo com a equipe de saúde.
70

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CAPÍTULO 4
AS REPERCUSSÕES EMOCIONAIS DO
CÂNCER ASSOCIADAS À GRAVIDEZ:
uma revisão integrativa
Igor Weyber da Silva Ramos
Isabel Regiane Cardoso do Nascimento
Keyssiane Maria de Alencar Lima

As mulheres têm progressivamente adquirido mais independência, con-


quistando mais autonomia tanto profissionalmente quanto em relação à família,
dentro do modelo socioeconômico vigente, seu espaço na sociedade vem se
consolidando cada vez mais. Para Cipriano e Oliveira (2016) isso justifica a
tendência atual das mulheres optarem pela gravidez para a terceira ou quarta
década de vida.
No entanto, devido a alguns fatores de risco como a idade e o maior
tempo de exposição das mulheres a condições ambientais e agentes cance-
rígenos exógenos, existe a possibilidade de o diagnóstico de câncer ocorrer
durante a gravidez ou no período de amamentação.
Em contraste, há também a contribuição da crescente incidência do câncer
de mama em pacientes jovens pelo avanço da história natural da doença, que
está se modificando pelas condições ambientais e também pela disseminação dos
programas de prevenção e conscientização relativos ao câncer, que elevaram o
número de mulheres cada vez mais jovens à procura de exames de rastreamento,
diagnosticando o câncer mais precocemente (Cipriano & Oliveira, 2016).
Costa et al. (2006) apontam que entre as mulheres os tipos de cânceres
mais prevalentes são o câncer no colo do útero, câncer de mama, melanoma,
câncer de ovário, câncer de tireóide, leucemia, linfoma e câncer colorretal.
Nesse sentido, o câncer associado à gestação pode ser definido como aquele
que ocorre durante a gravidez ou até um ano pós-parto, ou qualquer período
durante a amamentação (Carvalho et al., 2008).
Compreende-se que o diagnóstico de câncer traz consigo a representa-
ção sociocultural de morte e sofrimento acarretando inúmeras repercussões
emocionais negativas no indivíduo. No caso do câncer associado à gravi-
dez, Ferrari (2018) refere que este acometimento simultâneo potencializa os
sentimentos de medo, culpabilização, ansiedade e depressão. Além disso, é
compreensível que nessas mulheres coexistam sensações ambíguas de vida
e morte, gerando conflitos emocionais e éticos tanto para a paciente como
76

para seus familiares, desafiando cada vez mais o alcance da integralidade do


cuidado prestada pela equipe médica e multiprofissional.
Para Costa e Souza (2018) no contexto em que a doença oncológica
ocorre simultaneamente à gravidez, o processo de decisão sobre a terapêutica
e os cuidados a serem realizados é muito mais complexo, pois os protocolos a
serem usados no tratamento devem ponderar entre os riscos que podem existir
tanto para a mãe quanto para o feto.
Nessa conjuntura, as produções científicas em sua maioria são voltadas
para a intervenção biológica do câncer com enfoque no tratamento e reabilita-
ção do processo de adoecimento oncológico associado à gravidez. Capelozza,
Peçanha, Mattar e Sun (2014) afirmam que são escassos os estudos sobre os
sentimentos das pacientes, seus familiares, como também dos membros da
equipe de saúde frente à associação gravidez e câncer.
Visando contribuir com ampliação de discussões sobre temática, o pre-
sente trabalho objetiva debater através de revisão integrativa da literatura
sobre as principais repercussões emocionais que acometem mulheres e seus
familiares ao enfrentarem o adoecimento oncológico associado à gravidez.
Faz-se necessário contribuir para produção de estudos que explorem os
aspectos emocionais e psicológicos dos que sofrem com o câncer durante o
período que envolve a gestação, pois é refletindo sobre o paradoxo de vida
e morte coexistente nessas mulheres e suas famílias que os profissionais de
saúde poderão desenvolver competências e habilidades que norteiem atitudes
humanizadas dentro do processo de cuidado em saúde.

Metodologia

O presente trabalho é de natureza qualitativa e cunho exploratório, estru-


turado a partir dos fundamentos metodológicos da revisão integrativa, que
permite a combinação de dados teóricos e empíricos, conceitos, teorias e
problemas, para uma compreensão completa dos fenômenos analisados. A
partir da síntese dos conhecimentos adquiridos é possível a incorporação de
suas aplicações significativas na prática (Souza, Silva & Carvalho, 2010).
Para o levantamento de dados bibliográficos foram realizadas pesquisas
nas seguintes bases eletrônicas: US National Library of Medicine (PubMed),
Medical LiteratureAnalysisandRetrievalSistem on-line (Medline), ScientificE-
lectronic Library Online (Scielo) e Literatura Latino-Americana e do Caribe
em Ciências da Saúde (Lilacs). Foram utilizados como descritores de pesquisa
nas línguas portuguesa e inglesa: ‘Gestantes’, ‘Neoplasias’ e ‘Psicologia’.
Foram definidos como critérios de inclusão: artigos publicados na ínte-
gra nos idiomas Português e/ou Inglês e indexados nos últimos cinco anos
(2014-2019); pesquisas realizadas com seres humanos, e que delinearam como
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 77

escopo de estudo os fatores psicossociais que permeiam as neoplasias malig-


nas em mulheres, seus impactos frente à expectativa gestacional, durante a
gestação ou no período puerperal. Foram excluídos deste estudo os trabalhos
que tratam exclusivamente de métodos, técnicas, procedimentos e avaliações
medicamentosas e biomédicas. Artigos que não estavam disponíveis na íntegra
não foram incluídos nesta revisão.
A Tabela 1 apresenta os resultados quantitativos dos periódicos encon-
trados e selecionados a partir dos descritores definidos. Como resultados da
busca inicial, foram obtidos: PubMed = 17 artigos; Medline = 21 artigos;
Lilacs = 01 artigo; a base de dados Scielo não gerou resultados; somando um
total de 39 artigos. A seleção dos periódicos foi realizada de forma descritiva
a partir do título, do resumo e dos objetivos da pesquisa. Após análise dos
artigos quanto aos critérios de inclusão, estes foram apreciados em sua ínte-
gra, resultando em uma seleção quantitativa de 07 artigos da PubMed e 04
da Medline. Dentre os periódicos selecionados, 04 estavam disponíveis em
ambas bases de dados, resultando em uma seleção de 07 artigos.

Tabela 1 – Resultados quantitativos dos periódicos encontrados e selecionados


PubMed Medline Lilacs Scielo Total
Resultados da busca 17 21 1 0 39
Periódicos selecionados 7 4 0 0 11*
*Os periódicos semelhantes encontrados em diferentes bases de dados foram levados em
conta na análise quantitativa, e estão apontados na coluna “Base de dados” do Quadro 1.

Resultados

O Quadro 1 descreve os artigos selecionados a partir das buscas rea-


lizadas nas bases de dados e da avaliação de adequação aos critérios. São
descritos o título do artigo, as respectivas bases de dados, os autores, ano de
publicação e objetivos do trabalho.

Quadro 1 – Descrição dos periódicos selecionados


Base de
Nº Título Autores/Ano Objetivos
dados
Explorar os
Gerstl B, Sullivan E, resultados reprodutivos, con-
PregnancyOutcomesAfter a Breast-
Ives A, Saunders C, siderando a gravidez, aborto,
01 CancerDiagnosis: A Systematic Re- PUBMED
Wand H, Anazodo interrupção da gravidez e nas-
view and Meta-analysis.
A, 2018 cidos vivos, após o tratamento
de câncer de mama.
continua...
78

continuação
Base de
Nº Título Autores/Ano Objetivos
dados
Compreender os aspectos de
Hsieh P. L, Huang S.
risco-benefício na escolha pela
Risk-benefitperceptionofpregnan- PUBMED/ M, Chien L. Y, Lee
02 concepção ou contracepção
cyamongbreastcancersurvivors. MEDLINE C. F, Hsiung Y, Tai
após o tratamento de câncer
C. J, 2017
em Taiwan.
Relatar as queixas de aleita-
mento materno de mulheres
AfterChemotherapyTreatment for Stopenski S, Aslam diagnosticadas com câncer
03 Maternal CancerDuringPregnancy, PUBMED A, Zhang X, Car- durante a gravidez, correlacio-
IsBreastfeedingPossible? donick E, 2017 nando positividade no prognós-
tico com as características de
seu tratamento.
Identificar risco de altos índices
de sofrimento em mulheres
Psychologicaldistressandcogniti-
Vandenbroucke T, et diagnosticadas com câncer
04 vecoping in pregnantwomendiag- PUBMED
al. 2017 durante a gravidez e seus par-
nosedwithcancerandtheirpartners.
ceiros, com base em seu perfil
de enfrentamento.
Identificar as necessidades
não atendidas de serviços de
Unintendedpregnancy: a system- planejamento familiar entre
atic review ofcontraception use PUBMED/ mulheres com câncer, descre-
05 Britton L, 2017
andcounseling in womenwithcan- MEDLINE vendo a prevalência de aconse-
cer.(Report) lhamento sobre contracepção,
uso de contraceptivos, gravidez
indesejada e aborto.
Karunaratne K, Descrever a importância da prá-
Counsellingpregnantwomenwith- PUBMED/ Premaratne S, tica do Aconselhamento por parte
06
cancer. MEDLINE Hapuachchige C, da equipe multidisciplinar junto a
Ihalagama H, 2016 mulheres grávidas com câncer.
Güth U, Huang D. Avaliar a interação de
Family ties: youngbreastcancerpa- PUBMED/
07 J, Alder J, Moffat R, laços familiares em pacientes
tientsandtheirchildren. MEDLINE
2015 jovens com câncer de mama.

Caracterização dos Dados

Os artigos selecionados foram produzidos com diferentes objetivos e


abordagens metodológicas, fornecendo subsídios para aquisição de conhe-
cimentos variados e uma melhor compreensão do fenômeno estudado, das
produções existentes sobre a temática, e as interfaces psicossociais existentes
entre o contexto estudado.
Conforme representado no Quadro 1, percebe-se uma maior frequência
de publicações no ano de 2017 (2, 3, 4, 5). Apenas uma publicação no ano
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 79

de 2018 (1),uma em 2016 (6) e uma em 2015 (7). Todos os artigos são pro-
duções internacionais (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7), dentre os quais foram publicados
respectivamente: 1 – Clinical Breast Cancer; 2 – European Journal of Cancer
Care; 3 – Breastfeeding Medicine; 4 – Psycho‐Oncology; 5 – Clinical Journal
of Oncology Nursing; 6 – Best Practice & Research Clinical Obstetrics and
Gynaecology; e 7 – Swiss Medical Weekly. As características metodológicas
dos trabalhos selecionados são: dois artigos de abordagem qualitativa (2, 4),
com a realização de entrevistas em profundidade e aplicação de questionários;
três estudos de caráter quantitativo, uma metanálise (1), com predomínio em
estudos de coorte prospectivo (3, 7); uma revisão sistemática (5); e outra de
caráter descritivo (6).

Discussão

A vivência do sofrimento psíquico decorrente do risco de infertilidade,


recidiva da doença relacionada à gravidez, e efeitos tardios da doença após
tratamento de câncer foram apontados nos estudos como fatores ansiogênicos
e que causam medo nas mulheres, o que leva ao retardo do planejamento
familiar ou colabora para a interrupção da gestação, podendo esta decisão
está associada a preocupações psicossociais e também relacionada à saúde
do feto, tendo em vista a incerteza de uma gestação segura.
Os estudos de Gerstl et al. (2018) exploraram os resultados reprodutivos,
considerando a gravidez, aborto, interrupção da gravidez e nascidos vivos,
após o tratamento de câncer de mama, de mulheres com idade reprodutiva
e sobreviventes da doença e tratamento do câncer de mama, que optaram
pela tentativa de gestação. A pesquisa englobou 54 estudos, distribuídos em
estudos populacionais, estudos de coorte, estudo de controle de caso, ensaio
controlado randomizado, estudo retrospectivo em corte transversal e revisões
retrospectivas, nos quais analisaram 2.523 mulheres que engravidaram após
tratamento de câncer de mama, num período que variou de 11-63 meses, tendo
como intervalo médio 29 meses.
O estudo ressalta a importância da informação às mulheres que vivenciam
o adoecimento e tratamento de câncer de mama e que passam por diferen-
tes formas de tratamento, a exemplo, cirurgia, quimioterapia, radioterapia e
hormonioterapia, sobre os efeitos de curto e longo prazo no funcionamento
geral do corpo, incluindo fertilidade e qualidade de vida (Gerstl et al., 2018).
Mulheres com diagnóstico de câncer de mama RER positivo são apontadas
nos estudos como aquelas que apresentam maior impossibilidade de gestar
quando comparadas as com RER negativo. A taxa de aborto esteve em torno
de 12% nos casos de tratamentos combinados.
80

As contribuições de Hsieh et al. (2017) compreendem os aspectos de


risco-benefício na escolha pela concepção ou contracepção após o tratamento
de câncer em Taiwan. Participaram 16 mulheres, destas 9 estavam tentando
engravidar e 7 usavam métodos contraceptivos, a média de anos após trata-
mento foi em torno de 6,8. Frente à possibilidade de gravidez após quimio-
terapia, as participantes demonstraram a ponderação com base na análise
do risco-benefício entre concepção e contracepção baseando-se na situação
pessoal e estado clínico.
As dimensões apontadas sobre o risco-benefício da gestação após tra-
tamento para câncer de mama: o estado de saúde (relacionada ao bem-estar
da paciente); a segurança (envolve o medo de que o tratamento para o câncer
possa afetar a saúde do bebê); o prejuízo (riscos de danos potenciais para
a saúde da gestante); ganho esperado (refere-se aos benefícios de gestar e
criar um filho); carregando (percepção do risco de desgaste físico durante a
gravidez); apoio e suporte (implicado a percepção do nível de assistência de
familiares, amigos e profissionais de saúde); tempo (limitação pelo risco de
uma idade reprodutiva) (Hsieh et al., 2017).
As pesquisas incluídas nesta revisão, também mostraram que pacientes
cuja fertilidade foi afetada pelo tratamento do câncer estiveram propensas
a experimentar reações emocionais negativas. A angústia psicossocial rela-
cionada à gravidez interrompida é considerada intensa e persistente, prin-
cipalmente entre mulheres em nuliparidade. As preocupações com a vida
reprodutiva e o desejo de gestar também estiveram relacionados aos sintomas
depressivos (Hsieh et al., 2017).
Os estudos de Stopenski et al. (2017) relataram as queixas de aleita-
mento materno de mulheres diagnosticadas com câncer durante a gravidez,
correlacionando positividade no prognóstico com as características de seu
tratamento. Foram incluídas no estudo mulheres que engravidaram e tentaram
amamentar após vivenciar o diagnóstico e tratamento por diferentes tipos
de câncer, sendo os mais recorrentes no estudo os casos de mama, linfoma
Hodgkin e não- Hodgkin, ovário, colorretal e tireóide, incluídas no registro
do Hospital Universitário de Cooper, totalizando 96 mulheres. Destas, 45
produziram leite e conseguiram amamentar, 32 não conseguiram produzir
leite e 19 produziram pouco leite, não sendo suficiente para amamentar. A
diferença entre as participantes esteve relacionada ao período da gestação
em que foi administrada a quimioterapia e aquelas que não foram tratadas
por quimioterapia.
Quando submetidas à quimioterapia durante a gravidez as participan-
tes apresentaram uma produção de leite reduzida, no entanto, ao realizar
o tratamento em torno de 3 semanas antes do parto, não foram percebi-
dos efeitos adversos sobre as crianças amamentadas. Fatores como tipo de
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 81

câncer, o estágio, a idade materna, depressão, idade gestacional ao término


da quimioterapia, não estiveram relacionadas ao sucesso da amamentação.
Considerando o possível impacto da quimioterapia sobre a amamentação,
conclui que é necessário orientar as pacientes sobre a probabilidade de ocor-
rência de diminuição ou nenhuma produção de leite materno, evitando ou
minimizando efeitos de um sofrimento adicional, visto que a amamentação
beneficia a criança e também a mãe ao proporcionar dentre outros ganhos a
experiência do vínculo materno (Stopenski et al., 2017).
A identificação do risco de altos índices de sofrimento em mulheres
diagnosticadas com câncer durante a gravidez e seus parceiros, com base em
seu perfil de enfrentamento, foi o objetivo da produção de Vandenbroucke et
al. (2017), que dada à raridade da gestação concomitante ao diagnóstico de
câncer, recrutou mulheres e seus parceiros oriundos da Bélgica e da Holanda,
retrospectivamente após o parto e prospectivamente antes do parto, no registro
da Rede Internacional sobre o Câncer, Infertilidade e Gravidez, totalizando 122
participantes. Mulheres grávidas diagnosticadas com câncer apresentaram
níveis significativos de angústia, quando comparadas a mulheres grávidas
saudáveis. O estudo apontou o uso de estratégias de enfrentamento usadas
para melhor lidar com o fator estressor, a saber, autoculpa, catastrofização,
aceitação e focar no planejamento.
A aceitação e focar no planejamento foram estratégias consideradas como
facilitadoras do processo emocional vivenciado, estando, portanto, associados
com menos sintomas depressivos e de ansiedade. Ainda foi relatada a escassez
de conhecimento sobre as preocupações experienciadas por mulheres grávidas
diagnosticadas com câncer e seus parceiros (Vandenbroucke et al., 2017).
Vandenbroucke et al. (2017) evidenciam que as repercussões emocio-
nais vivenciadas pelas mulheres grávidas diagnosticadas com câncer e por
seus parceiros foram semelhantes em relação a preocupação com a saúde da
criança, sobre a doença e tratamento, a gravidez e o parto, diferenciando-se no
que concerne a manutenção da gravidez, cujas mulheres se mostraram mais
favoráveis quando comparadas aos parceiros. Mulheres e parceiros que utili-
zaram estratégias de enfrentamento positivas apresentaram nível de estresse
reduzido. Com base nos resultados encontrados, os autores ressaltam sobre a
importância da avaliação dos níveis de angústia e preocupação por mulheres
e seus parceiros para que seja verificada a necessidade de apoio psicossocial.
As pesquisas apontam que há possibilidade de gravidez ao longo de todo
o processo de tratamento contra o câncer, porém, é um fenômeno dotado de
incertezas, tendo em vista a existência de poucos estudos que abordam essa
temática e a limitação para tais evidências. Embora a gravidez nem sempre
afete diretamente o prognóstico da doença, as opções de tratamento para
o câncer aumentam os riscos de parto prematuro e de abortamento. Nesse
82

sentido, são muito importantes as ações de aconselhamento por parte da


equipe multidisciplinar e com profissional especialista sobre as temáticas de
contracepção e fertilidade durante e após o tratamento para as mulheres com
câncer, favorecendo assim o planejamento familiar e desmistificando concei-
tos previamente concebidos, evitando risco de gravidez indesejada durante
o manejo clínico do tratamento contra o câncer (Britton, 2017; Karunaratne,
Premaratne, Hapuachchige & Ihalagama, 2016).
O trabalho de revisão sistemática realizado por Britton (2017) demonstra
que há ocorrência de casos de gravidez indesejada e aborto em todo o período
dos cuidados oncológicos, que corresponde o diagnóstico, o tratamento e o
prognóstico. Estudos apontam que no período do tratamento as mulheres
continuavam sexualmente ativas, sem desejar conceber gravidez e sem fazer
ou parando o uso de contraceptivos, tendo por base a crença de infertilidade,
o que aumentaria a ocorrência de gravidez indesejada durante o tratamento
ou depois de finalizado. A fertilidade, nesse sentido, é aspecto de frustração e
incertezas, somando-se a sobrecarga adquirida com o diagnóstico e as reper-
cussões do tratamento.
Os estudos apresentam produções científicas que evidenciam a neces-
sidade de aconselhamento por parte da equipe multiprofissional sobre con-
tracepção, aborto e gravidez não planejada, para mulheres acometidas pelo
câncer e suas famílias, tendo em vista a necessidade de planejamento familiar
nessas circunstâncias. Nesse sentido, o autor pontua como de fundamental
importância a identificação das preferências da paciente, a investigação de
suas experiências e suas perspectivas com relação à gravidez durante o diag-
nóstico, o tratamento e o prognóstico (Britton, 2017).
Receber um diagnóstico de câncer durante a gravidez é um acontecimento
inesperado e traumático, tanto para a paciente, quanto para seu companheiro e
família. Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige e Ihalagama (2016) ressaltam
que os profissionais da equipe multidisciplinar, devidamente treinados em
habilidades comunicativas, podem minimizar o sofrimento da paciente e de
seus familiares. O método do Aconselhamento, centrado fundamentalmente
na paciente, aborda efetivamente os aspectos emocionais e comportamentais,
levando em consideração suas preocupações, ideais e desejos.
Há existência de medos por parte das mulheres grávidas relacionados ao
tratamento e a evolução da gravidez, bem como, também após o tratamento
existe receio de engravidar e haver recorrência da doença, nesse sentido, é
experienciado uma eclosão de emoções conflitantes de felicidade pela gravidez
e o risco de sua vida pelo diagnóstico de câncer (Karunaratne, Premaratne,
Hapuachchige & Ihalagama, 2016).
Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige e Ihalagama (2016) apontam
que durante o processo de Aconselhamento de mulheres grávidas com câncer,
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 83

devem ser levados em consideração os seguintes fatores que envolvem o


bem-estar materno e fetal por parte da equipe oncológica e obstétrica: a possi-
bilidade da história natural do câncer ser afetada pela gravidez; a possibilidade
do feto ser afetado pelo câncer; as vantagens terapêuticas da interrupção da
gravidez; a possibilidade do feto ser prejudicado pelo tratamento; a necessi-
dade de acompanhamento no período pré-natal e pós-natal; e a possibilidade
de futuras gestações.
As informações prestadas à paciente e aos familiares devem sempre ser
embasadas em evidências científicas, prestadas de forma clara, imparcial, e
que levem em consideração os valores, crenças, interesses, prioridades e preo-
cupações da paciente, a fim de que facilite uma tomada de decisão importante
como a interrupção da gravidez ou a continuação do tratamento. A família e o
parceiro, quando em um papel ativo, podem ser um importante recurso cola-
borativo, fortalecendo a paciente emocionalmente fragilizada. Porém, quando
compartilham dos mesmos sentimentos ou com maiores intensidades que a
paciente, podem reduzir a eficácia do seu apoio ou intervir negativamente
(Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige & Ihalagama, 2016).
Já é conhecido que o estresse durante a gestação tem resultados adversos,
tais como, parto prematuro, baixo peso ao nascer e deficiências no desen-
volvimento neurológico. A angústia vivenciada afeta diretamente a relação
materno-infantil, impactando o desenvolvimento e a identidade materna. Nesse
sentido, Karunaratne, Premaratne, Hapuachchige e Ihalagama (2016) apontam a
eficácia das técnicas de relaxamento e meditação como formas de minimizar o
estresse e a ansiedade vivenciada durante a gravidez durante o acometimento do
câncer, reduzindo também os possíveis riscos de depressão pós-parto e outros
transtornos desadaptativos, tendo em vista que suas emoções circundam sobre
o status da doença, o bem-estar do bebê e a preparação para a maternidade.
Güth, Huang, Alder e Moffat (2015) ao avaliarem a interação de laços
familiares em pacientes jovens com câncer de mama, ressaltam como é
importante a disponibilização de apoio psico-oncológico para a família e
crianças. Seus estudos apontam repercussões sintomatológicas emocionais
e comportamentais relevantes. As mulheres sentem mais intensamente a
sensação de responsabilidade quando acometidas pelo câncer e sendo mãe
de crianças, e também preferem interromper precocemente as terapias de
tratamento do câncer do que correr o risco de não poder ser mãe, dando pre-
ferências claras do desejo de manter a fertilidade a receber recomendações
de terapia oncológica.
Güth, Huang, Alder e Moffat (2015) ainda apontam que a interrupção
precoce do tratamento pode ser associada à falta de informação ou prestadas
de forma incompreensível sobre as terapias oncológicas, os efeitos colaterais
e apoio social insuficiente.
84

É importante que as mulheres em idade reprodutiva com diagnóstico de


câncer sejam orientadas sobre o efeito do tratamento sob a fertilidade, sendo
recomendado que estas adiem a gravidez para dois anos após o final do trata-
mento, e sejam dadas orientações, no momento do diagnóstico, relacionadas
à preservação da fertilidade e tratamentos para concepção e gravidez segura
após tratamento.

Considerações Finais

Os resultados dos estudos desta revisão refletiram sobre diferentes pers-


pectivas, o modo como o diagnóstico e o tratamento de câncer repercutem na
gestação, apontando como mulheres grávidas lidam com a ambivalência entre
o adoecer e o gestar, considerando os riscos relacionados à sua própria vida
e do bebê. Verifica-se que os avanços com relação ao tratamento e diagnós-
tico precoce convergem para um maior aumento de sobrevida das pacientes.
Entretanto, apesar de observarmos um crescente aumento de pesquisas sobre
o câncer, ainda é considerada pequena a produção de estudos publicados sobre
o tema associado à gestação, principalmente no que tangem aos apontamentos
de pesquisas sobre os aspectos emocionais desse processo.
Em geral, percebe-se que o diagnóstico de câncer atinge toda a família
que passa por momentos de grande sofrimento. As emoções repercutem de
modo singular a partir do diagnóstico de câncer. Diante da gestação associada
ao câncer, percebe- se vivências ambíguas sobre vida e doença, desejo e medo,
alegria e angústia, no enlace entre gestação e câncer.
Ficou evidente a necessidade de que os profissionais de saúde consigam
estabelecer uma comunicação assertiva, criando vinculação terapêutica com
a paciente, orientando-a sobre fertilidade, amamentação, e possíveis riscos
do tratamento sobre a gestação e a criança. Também deve ser parte da assis-
tência prestada pela equipe de saúde oferecer escuta compreensiva e acolhe-
dora, além do apoio contínuo, visto que essas intervenções poderão auxiliar
a paciente e o companheiro na tomada de decisão e no enfrentamento das
questões decorrentes do diagnóstico do câncer antes, durante e após a gesta-
ção, minimizando possíveis repercussões emocionais e sofrimento psíquico
na paciente e seus familiares.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 85

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pon.4301
CAPÍTULO 5
CUIDADOS PALIATIVOS:
compreensão dos profissionais
Marina Mesquita Geraldeli Carvalho Cavalcanti

Neste capítulo será falado sobre um tema atual e extremamente impor-


tante para os profissionais que trabalham na área da saúde, os Cuidados
Paliativos. Este assunto tem sido alvo de muitas dúvidas por estar cres-
cendo em significado a cada dia, e também pela sua disseminação nas
instituições de saúde. Sabe-se que este tema ainda é desconhecido entre
muitas pessoas, mas quem conhece seu verdadeiro significado se encanta
com sua filosofia.
Em 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu pela primeira
vez os Cuidados Paliativos como um “cuidado ativo e total para pacientes
cuja doença não é responsiva a tratamento de cura” (ANCP, 2009, p. 15).
Mais tarde, em 2002 o conceito de Cuidados Paliativos foi reformulado e
ampliado, sendo definido pela OMS como uma “abordagem que promove a
melhora da qualidade de vida de pacientes e seus familiares diante de doenças
que ameaçam a continuidade da vida, através da prevenção e alívio do sofri-
mento. Requer identificação precoce, avaliação e tratamento impecável não
somente da dor, mas de todos os sintomas de natureza física, social, emocional
e espiritual” (ANCP, 2009, p. 16).
Observa-se que a primeira definição restringia os Cuidados Paliativos
ao cuidado dispensado somente quando não existia a possibilidade de cura
da doença. Após a reformulação do seu conceito, os Cuidados Paliativos
começaram a ser vistos como um cuidado presente não só neste momento,
mas presente também desde a descoberta do diagnóstico de uma doença que
ameaça a vida, em conjunto com o tratamento curativo, e até o momento de
progressão da doença e incurabilidade; momento em que os Cuidados Palia-
tivos ganham total força e se torna exclusivo.
Os Cuidados Paliativos surgiram para inovar e ampliar a assistência ao
paciente doente. Seu valor se dá pelo foco na assistência à saúde, através do
cuidado integral em consideração com os sintomas dos pacientes ampliando o
cuidado para sua família e cuidadores, que o acompanham e também sofrem
com sua doença (Matsumoto, 2012). A descoberta de uma doença crônica e
incurável pode acarretar tanto no paciente quanto em sua família um impacto
88

emocional, desencadeando os sentimentos de tristeza, sofrimento e medo


da morte.
A doença surge como uma ameaça à vida das pessoas, podendo adiar
planos e sonhos, e também pode trazer alterações no funcionamento familiar.
Após o diagnóstico de doenças graves e incuráveis, a pessoa adoecida poderá
vivenciar o sentimento de angústia e quando este diagnóstico e o tratamento
são acompanhados da notícia de que os Cuidados Paliativos são o único
cuidado a ser recebido, podem surgir diversos questionamentos sobre esta
conduta. Apesar do movimento dos Cuidados Paliativos ter chegado ao Bra-
sil há mais de vinte anos, ele ainda é mal compreendido por muitas pessoas,
inclusive por alguns profissionais.
O movimento dos Cuidados Paliativos teve seu início em 1960 no
Reino Unido, tendo como precursora a médica Cicely Saunders. Na década
de 70 a psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross, influenciada pelos tra-
balhos de Cicely, levou este movimento para a América. A partir deste
momento o movimento dos Cuidados Paliativos foi disseminado para
diversos países (Matsumoto, 2012). No Brasil este movimento teve início
em 1990 e neste mesmo ano o conceito de Cuidados Paliativos foi definido
pela primeira vez pela Organização Mundial de Saúde, como já citado
anteriormente, e sua definição foi disseminada para 90 países e em 15
idiomas (Gomes & Othero, 2016).
Segundo a OMS, inicialmente os Cuidados Paliativos eram direcionados aos
pacientes oncológicos, e seu objetivo era promover assistência integral a estes
pacientes, com um olhar para os cuidados no fim da vida, tornando-se um dos
pilares básicos do tratamento ao paciente com câncer (Gomes & Othero, 2016).
Atualmente sabe-se que os Cuidados Paliativos não estão presentes somente
na doença oncológica, mas em todas as doenças que ameaçam a vida, como
doenças cardiovasculares, degenerativas, autoimunes, entre outras e ele visa a
minimização do sofrimento físico e emocional, o alívio de sintomas desagradá-
veis, o respeito aos desejos e a manutenção da autonomia da pessoa que adoece.
Ao falar sobre Cuidados Paliativos, não podemos esquecer de falar sobre
a espiritualidade e a religião, que se apresentam como mecanismos de enfren-
tamento. A espiritualidade destaca-se pela busca pessoal pelo significado do
final da vida, e a religião corresponde a um sistema de crenças que facilitam
o contato com o sagrado (Evangelista et al., 2016). Sendo assim, observa-se
que a espiritualidade e religião se complementam e podem estar presentes
em um mesmo momento frente às situações enfrentadas. A literatura destaca
a importância de falar sobre a espiritualidade na vida das pessoas adoecidas,
pois esta os auxilia a enfrentar este momento.
Segundo Evangelista et al. (2016) foi realizada uma pesquisa com pacien-
tes internados em uma unidade de Cuidados Paliativos, e foi observado que
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 89

a espiritualidade apresenta uma repercussão positiva em relação ao enfrenta-


mento do adoecimento e possibilidade de morte. Em se tratando de pacientes
oncológicos é possível observar a utilização destes recursos de enfrentamento,
principalmente no momento em que a limitação terapêutica é definida pelos
profissionais, momento em que o paciente pode se fragilizar emocionalmente
e necessitar de um fortalecimento, que muitas vezes acontece através da fé.
No momento em que a finitude se apresenta próxima, os pacientes podem
se apegar mais ainda à espiritualidade e religião. Sabe-se que a morte é vista
de diferente forma por diferentes religiões, e a crença de cada pessoa pode
facilitar a elaboração do paciente e de sua família frente ao fim da vida. Sendo
assim, cabe salientar a importância do profissional que trabalha com Cuidados
Paliativos e com Oncologia estar preparado para lidar com estas situações,
pois a morte estará muito presente em seu dia a dia. É importante também que
este profissional saiba respeitar a crença de cada paciente e de cada família.
Como já foi dito, os Cuidados Paliativos são um modelo de cuidado muito
presente na doença oncológica. Sabe-se que atualmente existem diversos tra-
tamentos para o câncer, e entre eles destacam-se as cirurgias convencionais,
cirurgias robóticas, quimioterapia, radioterapia, imunoterapia, entre outros. Há
também formas de se prevenir o câncer, que atualmente são proporcionadas pela
oncogenética; área que estuda e avalia a predisposição genética do paciente e de
sua família virem a desenvolver esta doença. Apesar de todos os avanços na medi-
cina, sabe-se que hoje em dia muitas pessoas ainda morrem vítimas do câncer.
Ao receber o diagnóstico de câncer, o paciente e seus familiares neces-
sitarão de um tempo de reorganização psíquica, pois neste momento pode-
rão surgir muitos conflitos e dúvidas sobre o diagnóstico e tratamento a ser
realizado. É neste momento que o paciente – acompanhado de sua família
– irá buscar respostas para suas dúvidas. Ao receber as orientações sobre o
tratamento, o paciente poderá sentir-se confuso neste primeiro momento, e é
importante que o profissional de saúde o auxilie durante todo o processo; o
que pode facilitar sua elaboração frente ao processo de adoecimento.
Quando o tratamento curativo não é possível; chega então o momento
do profissional de saúde (na maioria das vezes o médico) dar a notícia sobre
a incurabilidade da doença. Este momento é vivenciado por algumas pessoas
como uma “sentença de morte”; e isto acontece devido ao estigma social que
o câncer carrega, e por esta doença provocar tanto medo nas pessoas. Após a
notícia de incurabilidade da doença, chega o momento do profissional falar
mais enfaticamente sobre os Cuidados Paliativos, que neste momento pode
se intensificar e se tornar um tratamento exclusivo.
Os Cuidados Paliativos passam a ser exclusivos e ganham mais força no
momento em que a equipe de saúde detecta a irreversibilidade da doença e a
possibilidade do desfecho para a morte, através de uma avaliação criteriosa
90

baseada em estudos, reuniões e protocolos. Moritz et al. (2011) ressaltam


alguns aspectos a serem considerados na conduta com o paciente em CP,
como não realizar condutas desnecessárias e fúteis, priorizar a comunicação
entre membros da equipe, paciente e família, oferecer um cuidado individua-
lizado, verificar a existência de diretivas antecipadas, investigar a compreen-
são dos pacientes e familiares a respeito das informações recebidas sobre o
paciente em Cuidados Paliativos.
No momento em que os Cuidados Paliativos tornam-se exclusivos podem
surgir questionamentos sobre a possibilidade de morte do paciente, que pode
acarretar o sentimento de medo. A morte pode então se apresentar como uma
realidade iminente. Sabe-se que quando os Cuidados Paliativos são realiza-
dos em conjunto com as medidas de cura ainda existe o pensamento de que
algo ainda pode ser feito e há esperança, mas, a partir do momento em que as
medidas curativas deixam de ser realizadas e os Cuidados Paliativos tornam-se
exclusivos, esta esperança pode desaparecer, causando sentimentos de angústia,
impotência, tristeza e revolta, ao pensar que não há nada a se fazer.
A concepção de que não há nada a fazer pelo paciente também pode ser
vista pelos profissionais de saúde, e caso isto aconteça, podemos pensar que
essa falta de conhecimento sobre o assunto pode se apresentar como uma
barreira frente à disseminação deste modelo de cuidado dentro das instituições
hospitalares. Outra barreira encontrada pelos profissionais na disseminação
dos Cuidados Paliativos é o confronto da equipe com a morte, uma morte
incerta, que pode acontecer em horas, dias e até meses e que propiciará para os
profissionais o confronto com a sua própria morte. A morte é vista por muitos
profissionais da saúde como uma inimiga, o que desencadeia o pensamento de
combatê-la a qualquer custo. Isto pode levar estes profissionais à obstinação
terapêutica e ao desejo incessante de salvar o paciente. Como consequência o
paciente poderá sofrer com o prolongamento de sua vida, sem prognóstico de
cura, e os profissionais manifestarem o sentimento de frustração e sofrimento
quando a morte acontecer. Frente a isto acredita-se na importância de cuidar
da saúde mental dos profissionais que trabalham com paciente em Cuidados
Paliativos e que vivenciam a morte frequentemente.
Antigamente a morte era vista como natural e os rituais a ela relacionados
eram vividos naturalmente. As pessoas decidiam morrer em suas casas quando
chegasse o momento, os velórios eram realizados nas suas residências, as
crianças participavam dos velórios e enterros. Hoje em dia observa-se uma
resistência das pessoas ao falar sobre a morte, que muitas vezes tem se tornado
institucionalizada, artificial, e vista pelas pessoas como algo fora do normal, o
que vai contra a filosofia do CP, que enxerga a morte como um processo natural.
No momento em que surge a possibilidade de morte do paciente, os Cui-
dados Paliativos sintetizam a busca do conforto para ele, através do alívio das
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 91

dores e dos sintomas desagradáveis da doença, oferecendo apoio e respeito à


sua autonomia, até o momento de sua morte. Os Cuidados Paliativos preco-
nizam também o cuidado com a família do paciente, durante todo o processo
e após a morte de seu ente querido. Sendo assim, acredita-se que os Cuidados
Paliativos propiciam a humanização no processo de adoecimento e de morte,
e quem será responsável pela disseminação deste cuidado humanizado nas
instituições será a equipe multiprofissional.
A equipe multiprofissional pode ser composta por diversos profissionais,
entre eles: médico, enfermeiros, técnicos de enfermagem, psicólogos, farma-
cêuticos, fisioterapeutas, entre outros. A equipe também será responsável pela
condução do caso clínico do paciente. Frente a isto, salienta-se novamente a
importância de que esta equipe tenha conhecimento e compreensão sobre o
significado dos Cuidados Paliativos nos dias de hoje, bem como seu conceito
e princípios, pois a falta de conhecimento sobre o assunto pode refletir em
suas condutas e disseminação.
Os profissionais que atuam atualmente com Cuidados Paliativos necessi-
tam de um treinamento diferenciado, já que é um modelo de cuidado que sofreu
mudanças de conceituação ao longo do tempo e é permeado por significados
baseados no senso comum e estigmas. A falta de conhecimento e de interpreta-
ção sobre o real significado de Cuidados Paliativos pode ter como consequência,
dentro do ambiente hospitalar, os conflitos éticos. Surge, portanto, a necessidade
de falar sobre a bioética, que aborda os conceitos presentes no modelo do CP
e no processo de morte, como a eutanásia, distanásia e ortotanásia.
Estes dilemas éticos podem se apresentar como barreira frente à dis-
seminação deste modelo de cuidado no ambiente hospitalar, pois a falta de
compreensão do real significado dos Cuidados Paliativos pode acarretar uma
visão distorcida da realidade, como a crença de que não há nada a se fazer
para o paciente em Cuidados Paliativos. Esta concepção pode ser confundida
por muitas pessoas com a eutanásia, que é vista pelo senso comum como
“o deixar morrer”. Segundo Marta, Hanna e Da Silva (2010) a eutanásia é
definida como a prática que busca abreviar, sem dor e sofrimento, a vida de
um doente com uma doença incurável.
Isto demonstra o equívoco frente aos dois conceitos, já que o paciente em
Cuidados Paliativos não tem a vida abreviada – como na eutanásia – e sim,
deixa de receber medidas invasivas que não vão curar e prolongar a vida, mas
causar sofrimento. Segundo Marta, Hanna e Silva (2010) outros dois concei-
tos importantes de serem compreendidos pelo profissional que trabalha com
Cuidados Paliativos também devem ser ressaltados: a ortotanásia, também
conhecida como a “boa morte”, e definida como o processo de morte natural,
que visa o respeito pelo bem-estar do paciente e a garantia de dignidade no
tempo de vida que ainda lhe resta; e a distanásia, conhecida como obstinação
92

terapêutica e definida como a manutenção da vida por meio de procedimentos


desproporcionais, ocasionando uma morte com sofrimento.
Sendo assim, ressalta-se a importância do conhecimento destas questões
éticas, pois atualmente elas estão muito presentes no trabalho dos profissionais
dentro das instituições de saúde. Isto é importante para garantir o bem-estar
do paciente, de sua família, e dos profissionais que ali se encontram, pois
todos fazem parte da unidade de cuidado. É muito importante lembrar que o
trabalho interdisciplinar é essencial no tratamento do paciente em Cuidados
Paliativos, e que cada profissional irá contribuir com seu conhecimento nas
condutas do caso clínico.
Frente a isto, observa-se a criação de leis que buscam o respaldo legal para
os profissionais e para os pacientes em Cuidados Paliativos. Em se tratando dos
profissionais, sabemos que mesmo que toda a equipe participe das decisões,
é o médico que é responsável pelas condutas a respeito do quadro clínico do
paciente, pois é ele quem possui o estudo e o conhecimento específico para
tal tarefa. Em alguns casos este profissional e toda a sua equipe são expostos
e mal compreendidos por familiares dos pacientes. Por este motivo o conselho
federal de medicina criou resoluções para proteger estes profissionais. Estas
resoluções também visam o cuidado com os pacientes e sua família, pois estes
podem se informar e ter uma melhor compreensão frente às condutas dos pro-
fissionais, acarretando menos prejuízo emocional para todos os envolvidos.
O Conselho federal de medicina (CFM) publicou em 2006 a resolução
de Nº 1.805, que permite ao médico “limitar ou suspender procedimentos e
tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados
necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspec-
tiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu
representante legal” (Publicada no D.O.U., 28 nov. 2006, Seção I, pg. 169).
Esta resolução foi criada para orientar os profissionais, pacientes e fami-
liares no momento da tomada de decisão, resultante da avaliação do médico,
principalmente quando a conduta realizada é a não indicação de medidas
invasivas. Neste momento a conduta pode ser questionada pelas famílias, que
estão envolvidas emocionalmente com a pessoa adoecida e poderão apresentar
falta de compreensão sobre o caso clínico e sobre as condutas. É importante
salientar que o médico irá definir a melhor conduta a ser realizada com o
paciente, tendo em vista seu conhecimento médico e científico e seguindo
protocolos criados pela equipe.
Quando se trata dos Cuidados Paliativos, destaco a importância da comu-
nicação e do compartilhamento das informações com as famílias, propiciando
sua participação nas decisões, podendo chegar a um consenso. Cabe ao profis-
sional médico e sua equipe receber a família do paciente, ouvir suas dúvidas
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 93

e esclarecê-las através de conferências familiares (reuniões planejadas com


a família), visando uma melhor compreensão sobre as informações afinal,
na impossibilidade de decisão do paciente, cabe à sua família, junto com a
equipe, tomar as decisões sobre qual caminho seguir.
Outra resolução publicada pelo Ministério da Saúde em 23 de novembro
de 2018 reforça o que foi dito acima, que o paliativismo deve ser realizado
por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar; ressaltando o quanto é
importante que os profissionais tenham uma comunicação sensível e empá-
tica com o paciente e sua família. Esta resolução destaca ainda que os Cui-
dados Paliativos deveriam estar disponíveis em todos os pontos da rede,
atenção básica, domiciliar, ambulatorial, hospitalar e urgência e emergência,
e que este cuidado deve ser incluído como parte dos cuidados continuados
integrados no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS (Valadares, 2018).
Frente a isto observa-se a importância em oferecer os Cuidados Palia-
tivos em todas as instituições hospitalares e unidades de atendimento. Os
Cuidados Paliativos também podem estar presente dentro das Unidades de
Terapia Intensiva (UTI) e pode acontecer por dois motivos. No primeiro caso
o paciente pode ter sido encaminhado à UTI já com o diagnóstico de uma
doença que ameaça a vida e em Cuidados Paliativos ou Cuidados Paliativos
exclusivo. No segundo caso ele pode ter sido internado sem diagnóstico e
receber nesta unidade o diagnóstico de uma doença que ameaça a vida, que
receberá Cuidados Paliativos e que este cuidado pode se tornar exclusivo.
A primeira situação pode acontecer devido à dificuldade no consenso
entre os profissionais que assistem o paciente e também por solicitação da
família, que pode apresentar dificuldade na aceitação da conduta indicada;
já a segunda situação pode ocorrer devido à uma internação repentina por
um quadro agudo sem diagnóstico prévio. Em ambos os casos, destaca-se a
importância da postura dos profissionais, inclusive os que trabalham nas UTI’s
frente aos cuidados com o paciente e sua família, já que ele estará à frente da
situação, com suas orientações, condutas e decisões.
Os autores Santana, Rigueira e Dutra (2010) falam sobre a importância
da comunicação entre paciente, família e equipe durante todo o processo de
adoecimento e tomada de decisões para que todos tenham uma boa compreen-
são do quadro clínico real do paciente e compreendam as condutas e decisões
realizadas pelos profissionais. Acredita-se que a comunicação é um facilitador
durante este processo, e quando ela é realizada de forma correta, pode auxiliar
muito os profissionais frente ao seu papel com o paciente e sua família.
Vargas (2013) destaca algumas ações paliativas que devem ser realizadas:
habilidade de comunicação da equipe com o paciente e unidade de cuidado,
diferenciação de informação médica de conferência familiar (momento no qual
o profissional irá esclarecer as dúvidas do familiares, afinal as conferências
94

são realizadas com maior disponibilidade de tempo para perguntas), a com-


preensão do desejo dos familiares envolvidos nas decisões; desenvolvimento
de protocolos visando as condutas dos profissionais e a resolução de conflitos,
e a aderência de todos os envolvidos às ações paliativas. Sendo assim, obser-
va-se a importância da formação dos profissionais de saúde que trabalhem
com este modelo de cuidado.
É importante que estes profissionais consigam desenvolver habilidade
de comunicação para poder transferir suas posições aos envolvidos e possam
realizar suas condutas baseadas em seu conhecimento e compreensão sobre
o assunto. A sensibilidade para lidar com situações delicadas que envolvam a
morte e o manejo de acolhimento com paciente e sua família também são ações
importantes durante todo o processo, pois a decisão deles poderá influenciar no
desfecho do caso. O atendimento e cuidado dos profissionais com os pacientes
também devem se estender após a morte do paciente e processo de luto.
Observa-se atualmente um grande avanço na tecnologia, e como resul-
tado há um aumento na procura pela formação profissional. Os cursos na
área da saúde estão sendo procurados cada vez mais, e o conhecimento tem
sido dividido em especialidades e subespecialidades. Frente a isto, há uma
preocupação com a formação destes profissionais e com sua postura frente à
humanização do cuidado com o paciente, e que com o excesso de conheci-
mento, o profissional deixe de lado sua humanidade.
Tendo em vista o aumento da procura por cursos na área da saúde,
acredita-se também na importância da preparação destes profissionais para
aprenderem a lidar com assuntos que tratam sobre conflito ético e situações
que envolvam a morte, como a bioética e a tanatologia (assunto que trata da
morte), temas que devem ser discutidos e disseminados entre os profissionais,
por se tratar de uma realidade muito presente em suas vidas. Os profissionais
que trabalham com pacientes em CP estão em um contato maior com a morte
pois o paciente em CP, pode evoluir rapidamente para este fim.
Por este motivo salienta-se a importância de oferecer apoio psicológico,
treinamento, rodas de conversa a estes profissionais. Braz e Franco (2017)
relatam que os estudos sobre educação para a morte são escassos e Kóvacs
(2003) salienta a importância de uma equipe ser preparada para o processo
de morte do paciente, já que ela está próxima do paciente, e pode auxiliar
a sua família a lidar com o luto. Ambos demonstram a preocupação com o
assunto. Hoje em dia os autores falam sobre a morte moderna, vista como um
processo de despersonalização dos pacientes hospitalizados no qual ocorre
uma desumanização.
Segundo Menezes (2003) com o surgimento de recursos para a manuten-
ção da vida, como respiradores, monitores de funções corporais, desfibrilado-
res, entre outros equipamentos utilizados em hospitais – principalmente em
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 95

UTI, o homem vive como se nunca fosse morrer; o que acarreta a distanásia
(prolongamento da morte) e a obstinação terapêutica dentro do hospital. Os
autores também falam sobre o conceito de “boa morte”, que consiste em uma
morte humanizada e tem como objetivo oferecer cuidado integral ao paciente
até o fim de sua vida – sem a presença de desconforto e sofrimento provocado
pela doença – incluindo suporte emocional e espiritual. Na “boa morte” evi-
ta-se tratamentos invasivos quando não há chance de cura e quando não irá
acrescentar benefícios à sobrevida do paciente, mas vão apenas causar dor e
sofrimento (Menezes, 2003).
Conclui-se então que a “boa morte” é a morte idealizada pelos Cuidados
Paliativos, ou seja, digna e humanizada. Serão descritos dois casos clínicos
de pacientes que foram atendidos pela autora, que atua como psicóloga e
que receberam Cuidados Paliativos. Estes casos ilustram condutas da equipe
multiprofissional ao lidar com pacientes em Cuidados Paliativos. Salienta-
-se que para que o trabalho fosse realizado com sucesso, contou-se com a
ajuda de todos (médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, nutricionistas,
fisioterapeutas).

Relatos de Caso

Caso 1

O primeiro caso trata-se de um paciente do sexo masculino, 60 anos,


casado, com filhos, etilista. Chega à instituição hospitalar para realizar tria-
gem e recebe o diagnóstico de câncer no estômago. Realizou os tratamentos
de quimioterapia neoadjuvante e cirurgia. Ficou internado alguns dias na UTI
e depois foi para o quarto. O primeiro atendimento psicológico foi solicitado
pela enfermagem e foi realizado durante sua internação, após uma cirurgia.
No momento do atendimento o paciente apresentava humor deprimido e
fragilidade emocional, relatando tristeza pela perda da autonomia reativo
à doença e internação.
O atendimento foi realizado com o paciente e sua esposa, auxiliando-os
frente ao enfrentamento do processo de adoecimento. O paciente reclamava
de ter que usar fralda e tomar banho de leito. Apresentava comportamento
agressivo com os profissionais. Foi conversado com a equipe, pois o paciente
apresentava um quadro de delirium hiperativo, reativo ao longo tempo de
internação, e este quadro intensificava seus sentimentos, resultando em
comportamento agressivo.
Realizou-se o atendimento com o paciente através do acolhimento e
foram trabalhadas questões relacionadas à perda de autonomia. O quadro
de delirium em que o paciente se encontrava foi avaliado e manejado pelos
96

médicos da equipe. Após o manejo do quadro clínico, os médicos conversa-


ram com a sua família sobre como utilizar medidas preventivas de delirium
através de orientação têmporo-espacial, conversas com o paciente, presença
da família, entre outras. No dia seguinte o paciente ainda demonstrava humor
entristecido, mas demonstrava mais tranquilidade. Neste mesmo dia o paciente
recebeu alta e foi para sua casa.
Após 9 meses o paciente retornou ao hospital para realizar alguns
exames, e recebeu a notícia de progressão da sua doença (metástase hepá-
tica), sendo encaminhado ao serviço de Cuidados Paliativos para Cuidados
Paliativos exclusivos. Após ouvir esta notícia o paciente procurou atendi-
mento psicológico, apresentando humor deprimido e dificuldade de aceitação
frente ao seu prognóstico. Neste momento foi realizado acolhimento com
o paciente e sua esposa, ouvindo suas questões diante do sofrimento, inse-
gurança e medo da morte. Avaliei também qual a compreensão deles frente
à doença e informações recebidas sobre prognóstico do paciente e sobre o
encaminhamento ao serviço de Cuidados Paliativos.
No momento do atendimento o paciente demonstrava pouca compreen-
são sobre Cuidados Paliativos e um pouco de resistência frente à consulta
com os médicos paliativistas. Referia que não havia mais nada a ser feito,
“apenas esperar a sua morte”. Foi conversado com o paciente sobre a filoso-
fia dos Cuidados Paliativos e sobre os cuidados que ele iria receber naquele
setor, que tinham como objetivo oferecer qualidade de vida, neste momento
de incurabilidade da doença. Foi conversado sobre tudo que poderia ser
realizado, visando o seu conforto, alívio da dor, respeito aos seus desejos
e autonomia, cuidado com sua família, e muitas outras ações que visavam
o cuidado integral.
O discurso do paciente demonstrou como a falta de compreensão sobre
o real significado de Cuidados Paliativos (visto como o não fazer nada” e “ser
deixado para morrer”) pode causar angústia, medo e dificultar o processo de
aceitação e elaboração do prognóstico e das novas ações a serem realizadas.
Precisei conhecer a compreensão de todos sobre os Cuidados Paliativos para
trabalhar as questões emocionais que estavam surgindo tanto com o paciente,
quanto com sua família. Frente a isto, salienta-se a necessidade de ações que
auxiliem as pessoas na compreensão deste modelo de cuidado, afinal, as dire-
trizes dos Cuidados Paliativos ressaltam que neste momento ainda há muito
a se fazer, inclusive quando este cuidado se torna exclusivo.
Freitas (2012) realizou um trabalho sobre a concepção terapêutica ativa,
e salienta o que já foi citado acima, que mesmo com o esgotamento das pos-
sibilidades terapêuticas de cura, ainda existem condutas a serem realizadas
como a oferta de cuidados globais, que são os cuidados que visam o bem-
-estar físico, emocional e espiritual do paciente, e destaca que estas ações
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 97

devem ser prestadas de forma única e contínua. Sendo assim, acredita-se


que os profissionais da saúde que trabalham com estes pacientes, podem
e devem promover uma reflexão sobre o assunto, visando a mudança na
compreensão das pessoas acerca dos Cuidados Paliativos.
Para que os Cuidados Paliativos sejam disseminados, é importante que
os profissionais de saúde também tenham compreensão sobre o assunto,
e sua formação profissional irá influenciar no manejo de suas condutas
realizadas em seus locais de trabalho. Acredito que a instituição também
pode auxiliar os profissionais através de treinamentos, rodas de conversas,
palestras, entre outras ações que visem à compreensão e disseminação dos
Cuidados Paliativos. Após o atendimento com o paciente, atendi sua esposa
que também estava abalada emocionalmente com a notícia recebida.
Realizei acolhimento, atendimento e a acompanhei até o serviço de Cui-
dados Paliativos da instituição, para resolução das questões práticas, como
o agendamento da próxima consulta. É importante acompanhar a família
do paciente na resolução de questões burocráticas, pois neste momento,
os familiares podem ficar confusos diante de muitas informações. Sales e
D’artibale (2011) também consideram importante ter um olhar voltado aos
familiares do paciente em Cuidados Paliativos exclusivo, visando a huma-
nizar o tratamento e garantir suporte à saúde mental de todos.
Após 20 dias deste atendimento, o paciente foi internado apresentando
piora de seu quadro clínico, e sua família procurou o serviço de psicologia
solicitando atendimento. Eles haviam conversado com a equipe e nesta
conversa lhes foi dito que o quadro do paciente era grave, e que havia pos-
sibilidade de evolução para a morte. Também foi conversado sobre a não
indicação de medidas invasivas e não indicação de transferência do paciente
para a UTI, devido à evolução de sua doença. Os familiares do paciente
demonstraram sofrimento frente às informações recebidas, e acreditavam
que o etilismo era a causa de sua doença. Este pensamento os conduziu ao
processo de luto antecipatório.
Segundo Flach et al. (2002) o luto antecipatório é a vivência do luto
antes mesmo da perda real acontecer e possui as mesmas características
do luto normal, como choque, negação, revolta, barganha, depressão e
aceitação. O luto antecipatório pode ser visto como um mecanismo de
enfrentamento frente a perda, agindo como facilitador na preparação para
a morte do seu familiar doente. Durante o processo de luto antecipató-
rio, os familiares deste paciente demonstraram utilizar este mecanismo de
enfrentamento.
Realizei os atendimentos com esta família através do acolhimento e
escuta, com o objetivo de auxiliá-los a lidar com os sentimentos desenca-
deados frente ao luto antecipatório e possibilidade de morte do seu familiar
98

e fortalecer seus mecanismos de enfrentamento. Criei uma relação de con-


fiança com o paciente e com sua família, e a partir deste momento me tornei
a profissional de confiança da família, quem eles procuravam quando preci-
savam resolver algo, ou para estar presente nas conversas com a equipe. Esta
relação também foi um facilitador frente ao processo de luto antecipatório
vivenciado pela família do paciente.
Hermes e Lamarca (2013) ressaltam que a escuta, o acolhimento e
a boa comunicação interpessoal são imprescindíveis para o trabalho do
psicólogo, visando o conhecimento das suas questões, com o objetivo de
criar uma relação de confiança com o paciente. Neste momento a relação de
confiança foi reforçada. Durante os atendimentos, sua esposa e seus filhos
relembraram dos momentos felizes vivenciados ao lado do paciente. Em
seus discursos, falavam do paciente como se ele já tivesse morrido, o que
demonstra a vivência do luto antecipatório.
O paciente apresentava sentimentos de raiva e revolta frente à sua
situação. Falava sobre seus medos e sobre sua vida antes da doença.
Demonstrava esforços para manter sua autonomia e falava sobre seus dese-
jos mesmo nos momentos em que apresentava confusão mental, desenca-
deado pelo quadro em que se encontrava. A equipe proporcionou momentos
de escuta a este paciente, teve empatia e permitiu que ele tivesse seus
desejos, vontade e autonomia respeitados. O paciente apresentou rebai-
xamento do nível de consciência e faleceu um mês após sua internação.
O trabalho foi realizado com este paciente e sua família utilizando meu
conhecimento sobre Cuidados Paliativos. Possibilitei um espaço de escuta
para que eles pudessem falar sobre seus sentimentos e sobre a dor frente
ao adoecimento, fase final de vida e morte. Também foi auxiliei a equipe
no contato com o paciente e com sua família, já que havia um vínculo de
confiança com todos.
Segundo Hermes e Lamarca (2013) o papel do psicólogo frente ao fim
da vida é através da busca pela manutenção da qualidade de vida do paciente,
e com isto favorecer a minimização dos sintomas desagradáveis e do sofri-
mento, mesmo diante da morte. O trabalho do psicólogo deve ser realizado
durante todo o processo do tratamento, visando também auxiliar o paciente e
sua família a falar sobre seus sentimentos, o que poderá facilitar a elaboração
acerca do adoecimento e morte (Nunes, 2009).
Acredito que o meu conhecimento sobre os Cuidados Paliativos e a
postura da equipe multiprofissional foram facilitadores no processo de ela-
boração e enfrentamento desta família. O discurso médico era claro, e todos
foram empáticos e atenciosos, o que facilitou a compreensão das informações
recebidas. Realizávamos reuniões de equipe semanalmente para discussão dos
casos, o que proporcionou o contato de todos os membros da equipe com este
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 99

paciente e sua família e o conhecimento de seus sentimentos, proporcionando


confiança e segurança em todos os envolvidos.
Furtado e Leite (2017) salientam a importância do cuidado com a famí-
lia do paciente em Cuidados Paliativos informando-os de maneira clara e
empática, pois a falta de informação e um lugar onde os indivíduos possam
expressar seus sentimentos de forma adequada, pode dificultar o processo de
elaboração. Foi disponibilizado atendimento psicológico à família do paciente
após sua morte, tendo em vista a importância do cuidado com a família do
paciente em Cuidados Paliativos mesmo após sua morte. Não retornaram ao
hospital, mas sua esposa entrou em contato para agradecer minha ajuda em
todos os momentos.

Caso 2

O segundo caso trata-se de uma paciente do sexo feminino, 65 anos,


divorciada, reside com o filho e a nora, com diagnóstico de tumor de reto
e recidiva local extensa. Foi submetida aos tratamentos de cirurgia, qui-
mioterapia e radioterapia. Durante a cirurgia foi necessário realizar o pro-
cedimento de colostomia. A paciente retornou dias após a cirurgia para a
consulta com o médico, e este a encaminhou ao serviço de psicologia, por
apresentar humor deprimido.
Chegou ao ambulatório de psicologia para o primeiro atendimento acom-
panhada pela nora. No momento do atendimento psicológico a paciente apre-
sentou humor deprimido e fragilidade emocional, com episódios de choro.
Pelo relato da paciente, seu estado emocional era reativo ao adoecimento e às
dificuldades enfrentadas na adaptação ao uso da bolsa de colostomia. Referia
perda da autonomia após adoecimento e uso da bolsa, pois precisava da ajuda
do filho e da nora com o tratamento e com os cuidados diários. Relatou tam-
bém isolamento de pessoas e de locais onde costumava ir, inclusive da igreja
que frequentava, o que causava tristeza.
Durante o processo de adoecimento, a paciente começou a se queixar
de dor com muita frequência, motivo pelo qual a equipe assistente solicitou
avaliação e acompanhamento do serviço de dor e Cuidados Paliativos para
avaliação e controle de dor. A paciente começou a ser acompanhada também
por esta equipe, em conjunto com a equipe de Oncologia e cirurgia. Após
realizar todos os tratamentos curativos, sem resposta de cura, a paciente apre-
sentou recidiva da doença e piora do quadro clínico, e através da avaliação
da equipe médica foi verificado a incurabilidade da doença.
A partir deste momento os Cuidados Paliativos, que já eram realizados
em conjunto com as outras equipes, se tornou exclusivo. Isto demonstra que
os Cuidados Paliativos foram realizados de acordo com o que é estabelecido
100

atualmente pela OMS, e que a compreensão dos profissionais sobre como


realizar este cuidado está se transformando e se disseminando. A paciente
demonstrava pouca compreensão sobre o que eram Cuidados Paliativos e o
motivo de seu encaminhamento. Apesar da pouca compreensão sobre estes
dois conceitos a paciente demonstrava percepção de sua piora, e manifes-
tava os sentimentos de tristeza e revolta, verbalizando medo da morte. Pude
observar que a paciente utilizava a negação como mecanismo de defesa e
enfrentamento; sabemos que este mecanismo pode estar presente ao enfrentar
doenças incuráveis.
Com a piora de seu quadro clínico e a intensificação das dores, a paciente
demonstrou exacerbação dos sintomas depressivos. Dizia que o que mais
lhe causava sofrimento era a dor física, causada pelo tumor e complicações
da doença. Através dos atendimentos pude constatar que ela também estava
sofrendo de mais de três tipos de dor: a dor emocional, reativa às implicações
do adoecimento em sua vida e prognóstico reservado; a dor social reativa à
perda do controle de sua vida e isolamento; e a dor espiritual, causada pela
perda da esperança. Frente a esta avaliação pude avaliar em conjunto com a
equipe multiprofissional que a dor da paciente não era só a dor física, mas
também se tratava da ‘dor total’.
A “dor total” foi definida por Cicely Saunders (precursora dos Cuidados
Paliativos) como uma dor multidimensional, na qual o componente físico da
dor pode ser influenciado pelos componentes emocionais, sociais e espirituais.
Sabe-se que a dor física pode ser a maior causa de sofrimento, mas a dor emo-
cional também pode causar sofrimento, podendo ter como consequência alte-
ração do humor e sentimentos de desesperança. Também podem ser incluídas
neste conceito de ‘dor total’, a dor social, resultante da perda do papel social
exercido junto à família, amigos e a dor espiritual, reativa à perda do sentido
da vida e da esperança) (Hennemann-Krause, 2012). Este conceito de dor
total se encaixa no caso desta paciente e na filosofia dos Cuidados Paliativos.
Acolhi a paciente e trabalhei com ela questões relacionadas à dor total
através da escuta, apoio, interpretações e ressignificações. O trabalho realizado
através da escuta, apoio, interpretações e ressignificações. Auxiliei a paciente
na elaboração do momento vivido, na resolução de questões burocráticas do
tratamento, fortalecimento de sua autonomia frente à sua vida, criação e poten-
cialização de mecanismos de enfrentamento e das suas redes de suporte. O
vínculo com a paciente foi extremamente importante na condução deste caso.
Este vínculo se estendeu também aos seus familiares, que também foram acom-
panhados durante todo o processo de adoecimento, tratamento e morte.
Sendo assim, o trabalho foi realizado com a paciente e sua família
seguindo a filosofia dos Cuidados Paliativos, e isto só foi possível devido ao
meu conhecimento sobre o assunto, o que me guiou e auxiliou nas intervenções
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 101

a serem realizadas. Segundo Reigada et al. (2014) os Cuidados Paliativos tem


como um de seus objetivos oferecer apoio a família do paciente, frente à sua
função de cuidar, para que este momento seja vivenciado por eles de uma
forma saudável, apesar de todas as dificuldades enfrentadas. O conhecimento
da história de vida do paciente e de sua família, e a compreensão frente aos
sentimentos desencadeados e comportamentos manifestados são facilitado-
res no enfrentamento do processo de doença avançada, e é importante que
o apoio seja prestado a todos de forma singular, pois cada paciente e cada
família é única.
O meu conhecimento sobre a história de vida destas pessoas, que foi
possível através do vínculo e da minha escuta, foi extremamente importante
na condução deste caso. Os familiares da paciente demonstravam compreen-
são do que era Cuidados Paliativos exclusivos, mas continuavam buscando
respostas e continuavam mantendo a esperança de cura como mecanismo
de enfrentamento. A esperança destes familiares só se transformou em
desesperança no momento em que foi conversado com os médicos na visita
domiciliar, sobre a possibilidade de morte em um curto período. Foi aí que
surgiram os sentimentos de medo, angústia, impotência e tristeza.
Segundo Hudson (2006) tanto o paciente quanto sua família podem
vivenciar na fase final de vida diferentes sentimentos e comportamentos.
Frente a isto é importante que a equipe estabeleça uma relação de confiança
com todos, para que eles sintam que não estão sozinhos. Também é importante
auxiliar estas pessoas a reforçar suas capacidades e potencialidades, visando
a tomada de consciência de cada um frente às situações difíceis e utilização
de mecanismos de enfrentamento frente ao processo de morte.
Durante a visita domiciliar também foi ofertada uma escuta empática
aos familiares da paciente, enquanto a médica e enfermeira a atendiam. Eles
demonstravam estar tristes e em sofrimento, mas estavam conscientes da
real situação. Falavam sobre tudo que fizeram para ajudá-la, relembrando
todos os momentos. Eles demonstravam a vivência do luto antecipatório,
o preparo para a morte da paciente e aceitação da realidade como se apre-
sentava. Referiam que estavam fazendo tudo que a paciente gostaria que
fosse feito neste momento, e que seu desejo era estar em sua casa e morrer
perto da família e dos amigos. A visita de amigos e de familiares, a pre-
sença de sua cachorrinha de estimação e o carinho de todos a amparavam
naquele momento.
Isto demonstra mais uma vez que os Cuidados Paliativos estavam sendo
realizados de acordo com seus princípios, inclusive pela família da paciente,
que buscava proporcionar a ela conforto, controle da dor, respeito à sua dig-
nidade e carinho para que ela tivesse uma ‘boa morte’ em sua casa. A boa
morte, que também recebe o nome de ortotanásia é a morte idealizada na
102

filosofia dos Cuidados Paliativos. Segundo Santoro (2003) este tipo de morte
é a morte digna e sem sofrimento, que acontece através da conduta correta
sem antecipar ou retardar o processo.
Sua família já havia conversado com ela, e ambos haviam decidido não
prolongar a vida da paciente, como não havia possibilidade de cura. Inclusive,
na última internação da paciente, foi decidido por ela e por sua família sua ida
para casa, pois o desejo de todos eles era que a paciente morresse em casa,
próximo de sua família.
Durante a visita domiciliar, também conversei com a paciente, e mesmo
com dificuldade de se comunicar, pronunciou algumas palavras. Segurei
em sua mão naquele momento e a escutei. Neste momento foi possível
sentir a importância do vínculo estabelecido por nós. Ela falou sobre sua
casa, sobre a visita da equipe e continuou pensativa e quieta. Demonstrava
naquele momento estar sem dor, confortável, bem cuidada, esperando o
momento de sua morte ao lado de sua família. Tanto a paciente, quanto sua
família demonstravam aceitação do momento que estavam vivendo, com a
proximidade de morte.
A paciente demonstrava também o sentimento de gratidão pelos cuidados
oferecidos por mim, pela equipe e por sua família. A paciente faleceu alguns
dias após a visita, e fomos informados por sua família, que me procurou
solicitando atendimento psicológico durante o processo de luto. Os familiares
foram encaminhados ao grupo de luto da instituição. Continuei realizando os
atendimentos com eles por alguns meses. Mais uma vez o CP se fez presente,
pois tem como um de seus princípios oferecer assistência aos familiares do
paciente, mesmo após a morte do paciente.
Este caso ilustra como a filosofia dos Cuidados Paliativos é um modelo
de cuidado humanizado, e o quanto é importante conhecê-lo e compreendê-lo
para que ele seja utilizado e disseminado em todas as instituições de saúde. Os
Cuidados Paliativos preconizam acima de tudo o respeito com o paciente, com
o objetivo de promover seu bem-estar físico, psicológico, social e espiritual,
tendo em vista seus sentimentos, desejos e escolhas. Este cuidado também
tem como objetivo o cuidar da família do paciente em todos os momentos.
O vínculo com o paciente e sua família foi um facilitador do meu trabalho,
pois trabalhei como um ego auxiliar, um elo entre eles e a equipe multipro-
fissional, auxiliando-os em todos os momentos. É importante pensarmos que
os Cuidados Paliativos é um direito humano, e deve ser ofertado a todos, pois
ele propicia uma vida digna e uma morte humanizada.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 103

Considerações Finais

A experiência da autora com Cuidados Paliativos se deu através do traba-


lho com pacientes oncológicos, e sua filosofia me encantou desde o primeiro
atendimento realizado com estes pacientes. Aprofundei-me neste assunto atra-
vés de uma pesquisa realizada para avaliar qual a compreensão dos profissionais
de uma UTI oncológica sobre os Cuidados Paliativos. O conceito dos Cuidados
Paliativos sofreu reformulações ao longo dos anos, o que se apresenta como
um ponto positivo, afinal o conceito foi ampliado. Inicialmente os Cuidados
Paliativos eram restritos à fase final de vida, mas hoje sabemos que este cuidado
está presente inclusive em conjunto com o tratamento curativo.
Mesmo após essas reformulações, através de minha pesquisa constatei
que os Cuidados Paliativos ainda são vistos por alguns profissionais como
um cuidado dispensado somente no fim da vida. Frente a isto acredito que
os profissionais necessitam ter um aprofundamento teórico sobre este tema
através de sua formação profissional, visando uma maior compreensão sobre
o assunto. Os princípios dos Cuidados Paliativos ressaltam a importância em
oferecer cuidado à família dos pacientes, que são sua rede de apoio. Ressaltam
também a importância em oferecer um cuidado integral, realizado através de
uma equipe multiprofissional.
Entre os objetivos dos Cuidados Paliativos se destacam o respeito à
autonomia do paciente e independência, e a promoção de ações que visem
o seu conforto, e uma avaliação criteriosa dos sintomas e da dor, cuidados
com alimentação e higiene. A bioética contribui de forma direta com a com-
preensão, disseminação e realização das ações dos Cuidados Paliativos nas
instituições de saúde, através de explicações dos conceitos de eutanásia, dis-
tanásia e ortotanásia, entre outros assuntos evitando a ocorrência de dilemas
éticos frente a um assunto tão delicado como é a morte.
Sendo assim, acredita-se que seja importante criar um espaço de dis-
cussão sobre os Cuidados Paliativos e assuntos como a bioética dentro das
instituições de saúde e universidades, visando um maior conhecimento e
compreensão sobre o tema, o que poderá influenciar positivamente nas ações
destes profissionais que atuam com Cuidados Paliativos. Acredita-se também
na importância de incluir disciplinas sobre este assunto nos cursos de gradua-
ção dos profissionais de saúde, já que a maioria dos participantes de minha
pesquisa não tiveram conteúdos relacionados ao assunto em sua formação.
Concluiu-se então que o CP visa a qualidade de vida do paciente, inclu-
sive no momento final de sua vida. Sua assistência é humanizada e a morte é
encarada como um estágio final da vida. O CP tem como ideal a ‘boa morte’,
que é a morte com o mínimo de sofrimento tanto para o paciente, quanto
104

para sua família. Enfim, espero que as instituições de saúde possam levar aos
seus profissionais o conhecimento sobre o CP, com o objetivo de oferecer um
cuidado humanizado ao paciente e sua família, tendo em vista que o cuidado
paliativo não é uma opção de tratamento, e sim uma complementação do
acompanhamento do paciente.
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CAPÍTULO 6
TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS
EM PACIENTES ONCOLÓGICOS
Cleonice Zatti
Stefania Teche
Lúcia Helena Machado Freitas

Os anos 1950 marcaram a inserção da Psiquiatria no Hospital Geral no


Brasil (Sampaio, 1956). Desde então, o médico psiquiatra trabalha em con-
junto com redes de cuidado, buscando compreender cada paciente dentro do
contexto de mudanças provocadas pelo câncer.
Quando um indivíduo recebe diagnóstico de câncer, ocorrem mobiliza-
ções de ordem emocional, que trazem questões de finitude, colocam-no diante
da impossibilidade de se controlar os eventos da vida, o que leva a perturba-
ções emocionais. Sendo assim, o atendimento em saúde mental é fundamental
para que haja uma melhor aderência ao tratamento e contribui positivamente
para que o paciente enfrente a situação inesperada de adoecimento.
A incidência de novos casos de câncer no Brasil, em 2018, em homens,
foi de 300.140 para todas as neoplasias e, em mulheres foi de 282.450, sendo
os tipos mais prevalentes de próstata, pulmão e cólon nos homens e mama,
cólon e útero nas mulheres, conforme consulta realizada na base de dados
on-line do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA).
Os quadros psiquiátricos se encontram presentes em mais de 50% dos
pacientes diagnosticados com câncer, sendo necessária uma ação conjunta
entre psiquiatras e oncologistas para definir abordagens de tratamento
(Capristano, 2018).
O paciente, ao receber o diagnóstico de câncer, passa a lidar com diver-
sos sentimentos em relação a esse evento estressante, o que pode causar
angústia e medo da morte (Massie, 2004). A notícia da doença pode trazer
um efeito devastador em função de vir acompanhada da ideia de morte,
embora se saiba que a maioria dos casos são tratáveis e têm cura quando
diagnosticados precocemente.
O tratamento da doença vem acompanhado de radioterapia, quimiotera-
pia e muitas vezes de procedimentos cirúrgicos, o que pode levar o paciente
a ter medo da mutilação, inclusive trazendo uma incapacidade para realizar
tarefas no dia a dia devido a sintomas gerais que afetam sua saúde mental
108

(Meijer et al., 2011), como cansaço, preocupações, tristeza, dor, sonolência


diurna, insônia e perda do apetite.
O impacto psicológico na pessoa ao ser diagnosticada com câncer traz
uma quebra na rotina diária e na sensação de segurança; e ainda, os pacientes
entram em um luto pela ruptura da vida saudável e passam a enfrentar os pro-
cedimentos terapêuticos. As reações emocionais pós-diagnóstico podem ser
entendidas como expressões do luto antecipatório (Cardoso & Santos, 2013).
Os quadros psiquiátricos nos pacientes diagnosticados com câncer,
demonstram a magnitude e importância da ação conjunta entre psiquiatras e
oncologistas. Os principais transtornos se referem a depressão ou problemas
de ajustamento (Capristano, 2018).
Portanto, os princípios de tratamento para os pacientes com câncer
incluem uma boa avaliação da situação clínica da doença, o estágio de
desenvolvimento do câncer e as condições de tratamento. Há ainda uma
investigação da história psiquiátrica atual e passada, incluindo as questões
psicológicas sobre o entendimento e o significado da doença, além da ava-
liação da situação atual com a família, com a equipe de tratamento, com os
suportes sociais e com as questões econômicas para o tratamento.
Na clínica psiquiátrica é bastante comum atendimento a pacientes diagnos-
ticados com a doença, além das repercussões emocionais naturais pós-diagnós-
tico. No momento da primeira internação em hospital geral para o tratamento
do câncer, a Síndrome de Delirium, o Transtorno de Ajustamento e Transtorno
de Estresse Agudo são manifestações psiquiátricas prevalentes. Este último
podendo evoluir, em alguns casos, para Transtorno de Estresse Pós-Traumático.
Ao longo do tratamento ambulatorial, algumas comorbidades psiquiátricas
podem se desenvolver, como Transtorno de Ansiedade, Transtorno Somatoforme
e dor crônica e Transtorno Depressivo. A seguir, são descritos os principais
transtornos psiquiátricos e seu manejo adequado em pacientes com câncer.

Delirium

Esta é uma condição psiquiátrica encontrada frequentemente quando se


trata de pacientes com câncer, seja no diagnóstico inicial ou estágios avançados
da doença; contudo, muitas vezes é esquecida na avaliação clínica geral. O
Delirium é uma síndrome de etiologia orgânica multifatorial que se manifesta
de forma súbita, está associado a uma perturbação na atenção e consciência,
podendo ser acompanhado por perturbação no comportamento psicomotor.
Existem três subtipos de Delirium, baseados nos níveis de vigília e no compor-
tamento psicomotor: o subtipo hiperativo (agitação), o subtipo hipoativo (letar-
gia) e o subtipo misto (flutua entre os dois anteriores) (Prayce et al., 2018).
Em pacientes oncológicos a incidência de Delirium é elevada, podendo chegar
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 109

a 80% em fases mais avançadas da doença. Segundo pesquisas, os opioides,


tratamento para a dor, são responsáveis por aproximadamente 60% desses epi-
sódios e outras drogas, como corticosteroides, anticolinérgicos, antieméticos
e benzodiazepínicos, também podem estar relacionadas com eles (Centeno et
al., 2004; Santos, 2010). Para Cosetino et al. (2012), as avaliações rotineiras
por meio de ferramentas validadas para diagnóstico precoce de Delirium
devem ser incluídas na prática dos profissionais de saúde.
Em pacientes internados que se encontram em cuidados paliativos, o
Delirium tem uma prevalência de 13-42% na admissão e de 88% nas últimas
semanas ou horas de vida. O Delirium causa em pacientes e familiares um
significativo sofrimento psíquico, e está associado com aumento da mortali-
dade (Bush et al., 2017).
Dentro do quadro de Delirium os pacientes oncológicos também podem
apresentar outros sintomas para além dos manuais psiquiátricos, sintomas
como ansiedade, medo, depressão, irritabilidade, raiva, euforia, apatia, dis-
túrbio do ciclo sono-vigília, delírios, disgrafia e labilidade emocional.
Um quadro grave de Delirium pode ser um evento pré-terminal ou um
sinal de distúrbio fisiológico, geralmente envolvendo múltiplas etiologias,
como infecção, disfunção de múltiplos órgãos, distúrbios hidroeletrolíticos,
deficiências nutricionais ou até mesmo efeitos colaterais do próprio tratamento
quimioterápico. Estima-se que dos casos de Delirium em pacientes com cân-
cer avançado, em torno de 50% seriam reversíveis (Cosetino et al., 2012). O
Delirium pode incidir em uma outra etapa da evolução da doença, como nas
situações de metástase cerebral, síndrome paraneoplásica ou encefalopatia por
insuficiência de múltiplos órgãos, merecendo atenção especial e tratamento.
O tratamento para o Delirium é remover a causa disfuncional que está
causando a condição. É acompanhado de medidas comportamentais não far-
macológicas, como um ambiente silencioso, com iluminação natural, a pre-
sença de familiares e conhecidos que auxiliem na orientação espaçotemporal
e tentem manter preservado o ciclo sono-vigília de acordo com os horários
de dia e noite. Caso seja necessária alguma medicação, esta deve ser pres-
crita de acordo com a causa do Delirium, mais frequentemente são usados os
antipsicóticos em baixas doses por um período específico.

Transtorno de Adaptação

Embora o distúrbio de adaptação seja comum, existe uma escassez


de pesquisas sobre suas consequências para a saúde física. Em estudos
anteriores que investigaram mecanismos biológicos e comportamentos
relacionados ao estresse, sugere-se que o câncer pode ser um desenca-
deante do Transtorno de Adaptação.
110

Embora ocorra em circunstâncias clínicas frequentes após importantes


eventos da vida, como o diagnóstico de câncer, o distúrbio de adaptação muitas
vezes não é considerado para a definição do diagnóstico principal. Uma vez
que prevalecem sintomas semelhantes de tristeza e preocupações, é nomeado
como depressão maior e transtorno de ansiedade por serem mais conhecidos.
No DSM-5 (APA, 2013), o Transtorno de Ajustamento (TA) é apresen-
tado como um dos transtornos psiquiátricos que compõem um conjunto hete-
rogêneo de sintomas em resposta ao estresse, desencadeados posteriormente
à ocorrência de um evento estressante, podendo ser traumático ou não.
A condição psiquiátrica do TA pode ser diagnosticada logo após a vivên-
cia de uma experiência estressante, e, conforme descrito no DSM-5, o estressor
não precisa ser necessariamente traumático. Alguns sintomas emocionais
perante um estressor podem ser entendidos como uma reação humana normal,
ao invés de um estado psicopatológico, e, portanto, com menos estigma.
O DSM-5 definiu o Transtorno de Adaptação como um conjunto de
diferentes sintomas emocionais e mudança de comportamento em resposta
a um estressor recente (3 meses do início do estressor) e identificável, como
no caso de um diagnóstico de câncer ou doença grave que ameace a vida.
Essas alterações causam sofrimento desproporcional à gravidade do estres-
sor, prejuízo significativo e não são adequadamente representadas por uma
exacerbação de um transtorno mental prévio.
O TA apresenta uma prevalência de 5 a 20%, podendo chegar a 50% em
ambiente de consultoria psiquiátrica hospitalar. O número de diagnóstico de
TA em mulheres é duas vezes maior do que em homens, porém entre crianças
e adolescentes não há diferença de gênero, destacando-se que esse último
grupo tem um risco maior para evolução de outro transtorno psiquiátrico em
comparação aos adultos (Strain & Friedman, 2013).
Um estudo alemão indicou que as mulheres com histórico clínico com
suspeita de diagnóstico de câncer de mama ou em órgãos genitais exibiram
um risco aumentado de ter diagnóstico de transtorno de ansiedade, depressão
ou distúrbios de ajustamento. De acordo com a pesquisa, esse risco foi supe-
rior a metade do risco de mulheres com diagnóstico confirmado de câncer
de mama ou em órgãos genitais. Kostev et al. (2017) e Hayes Balmadrid et
al. (2015) indicam que o diagnóstico suspeito de câncer é um fator de risco
para o desenvolvimento de condições psiquiátricas (Kostev et al., 2017; Hayes
Balmadrid et al., 2015).
Normalmente, o desenvolvimento é agudo após um estressor e tende a
resolver-se dentro de 6 meses após a resolução do estressor. As consequências
funcionais do Transtorno se dão no desempenho profissional ou acadêmico
e nas relações interpessoais. Além do mais, a consequência mais grave que
pode se desenvolver neste transtorno é a ideação suicida.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 111

O tratamento para o transtorno de Adaptação são intervenções não


farmacológicas psicoterápicas juntamente com a melhora e o desenvolvi-
mento do apoio social para a resolução e o enfrentamento dos estressores
(Appart et al., 2017).
A área clínica reconhece a utilidade de se usar o especificador “des-
moralização” para descrever a natureza de um Transtorno de Ajustamento
quando um paciente é desafiado a lidar com um grave estressor, como o câncer
avançado. Um estudo australiano investigou vinhetas que foram avaliadas
por 280 clínicos, e exibiu o especificador de “Desmoralização” (presença de
baixa moral, otimismo reduzido, sentimento de bloqueio, indefeso, sensação
de baixo enfrentamento, sentimento de baixo valor na vida) no campo clínico
este termo parece ser bem compreendido no cuidado de pacientes com câncer.
O Transtorno de Ajustamento com desmoralização obteve 77% em compara-
ção com 33% Transtorno de Ajustamento com ansiedade (teste de McNemar,
p < 0,001). O estudo afirma que a categoria pode ser menos estigmatizada, e
mais reconhecida por pacientes, portanto havendo uma maior utilidade para
o atendimento, especialmente para um diagnóstico que pode vir em comor-
bidade com Transtorno de Estresse Pós-Traumático (Kissane et al., 2017).

Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)


O fato de uma pessoa ser diagnosticada com câncer já vimos que pode
desencadear sintomas de ansiedade e estresse, mas também pode ser potencial-
mente traumático. O evento da descoberta da doença pode ser entendido como
uma situação ameaçadora à vida. Algumas pessoas inicialmente se esquivam
em relação ao meio social, frequentemente revivem em pensamentos aspectos
sobre a doença, raiva e dificuldade de adaptação, o que causa um prejuízo
funcional. Porém, a aplicação do diagnóstico de TEPT relacionado ao câncer
não é isenta de controvérsias, pois evidências já sugeriram que o câncer pode
ser experienciado como traumático por algumas pessoas, embora não por todas
as pessoas que recebam esse diagnóstico (Mulligan et al., 2014). O texto de
apoio sobre recursos de diagnóstico no DSM-5 afirma especificamente sobre o
transtorno e a condição médica: “Uma doença com risco de vida ou condição
médica debilitante não é necessariamente considerada um evento traumático”
(Cordova et al., 2017). Nota-se que a literatura sobre a relação entre câncer
e TEPT permanece ainda controversa.
A aplicação de critérios nosológicos a pacientes com câncer requer aten-
ção aos detalhes e fenomenologia, com distinção entre respostas psicopa-
tológicas e normativas ao diagnóstico e tratamento do câncer. Neste caso,
exemplifica-se que medos de recorrência futura, progressão da doença e morte
são comuns entre pacientes com câncer e diferem de sintomas de TEPT,
como memórias intrusivas ou reexperimentação de estressores relacionados
112

ao câncer que já ocorreram. Ou seja, as lembranças traumáticas de eventos


relacionados ao câncer no passado devem ser referentes a algo já vivenciado,
em vez de eventos futuros temidos (Cordova et al., 2017).
O fato de a doença representar uma ameaça existencial não é uma questão
irrealista ou distorcida, pois as pessoas que enfrentam o câncer se preocupam
com a possibilidade de encurtamento da vida. Embora essa ameaça existencial
possa levar a um sofrimento intenso, ela também pode provocar mudanças
nas prioridades e valores, visões de si e dos outros e senso de significado e
espiritualidade (Cordova et al., 2017).
A avaliação de TEPT na oncopsiquiatria deve levar em consideração o
histórico psiquiátrico prévio e de trauma dos pacientes. Dado o poder preditivo
da história prévia de trauma para o desenvolvimento de sintomas de TEPT
em resposta ao câncer, o contexto no qual a experiência da doença está se
desenvolvendo precisa ser compreendido (Stanton et al., 2015; Cordova et
al., 2017). É cabível a cautela quanto à patologização nos primeiros sintomas
de estresse em relação à doença, bem como é aconselhável a aplicação de
diretrizes gerais para a avaliação e o tratamento de TEPT em pacientes com
câncer. Pesquisadores descobriram que os β bloqueadores pareciam reduzir a
memória intrusiva em 32% em pacientes recém-diagnosticados com câncer (p
< 0,05) (Lindgren et al., 2013), porém este achado não pode ser replicado na
clínica e, portanto, ainda não se encontra como uma recomendação preventiva.
Em 2015, houve uma estimativa de que um terço dos pacientes com
câncer poderiam desenvolver sintomas de TEPT em algum momento do
tratamento (NCI, 2015).
Os sintomas de pacientes oncológicos relacionados ao TEPT são: insônia,
memórias intrusivas e dolorosas de acontecimentos passados em relação ao
câncer, hipervigilância com tempo de vida encurtado e evitações de situações
e memórias que lembrem esses gatilhos dolorosos. Para prevenir os sintomas
de TEPT, os pacientes em tratamento oncológico devem ser rotineiramente
acompanhados por psiquiatras e psicólogos, para que haja um enfrentamento
adequado dos sintomas psíquicos (Lin et al., 2017). O tratamento do TEPT
é realizado com intervenções psicoterápicas que visam ao enfrentamento de
estressores e manejo do estresse e crenças disfuncionais, além da modificação
do comportamento para a melhoria das relações interpessoais. Em alguns
casos, o uso de psicofármacos pode ser necessário, sendo os fármacos de
escolha os antidepressivos inibidores da receptação da serotonina, como a
Sertralina, o Escitalopram e a Fluoxetina, podendo com indicação adequada
incluir outras possibilidades.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 113

Transtorno de Ansiedade
Os sintomas ansiosos podem estar presentes em todas as etapas de evo-
lução da doença e tratamento. Pessoas com este transtorno possuem grande
dificuldade em compreensão da patologia e indicações de tratamentos for-
necidos pela equipe hospitalar devido a sintomas de medo e preocupações
excessivas com relação à realidade, ocasionando assim uma baixa adesão ao
tratamento recomendado.
Na Espanha um estudo revelou que, em uma amostra de 600 pacien-
tes oncológicos, metade deles apresentava sintomas ansiosos. As mulheres
apresentaram mais ansiedade em relação aos homens, pessoas empregadas
sofreram mais ansiedade em comparação aos aposentados. Através de uma
regressão logística, as pessoas com otimismo, esperança e apoio social, do
sexo masculino foram significativamente associadas ao menor risco de apre-
sentar os sintomas de Transtorno de Ansiedade (Jimenez-Fonseca et al., 2018).
Nos pacientes oncológicos, os sintomas ansiosos podem estar relacio-
nados ao tratamento, negatividade em relação à doença, dúvidas existenciais,
falta de apoio social, desesperança, incluindo a questão da morte. Há casos em
que, mesmo após a cura, ainda persiste a ansiedade em relação à possibilidade
de retorno da doença.
Pesquisas mostram que 40% dos sobreviventes de câncer obtiveram
escores de ansiedade moderada a alta na faixa de pacientes em idade ativa
de trabalho, comparados com a população em geral (Inhestern et al., 2017).
A equipe multidisciplinar envolvida no atendimento do paciente onco-
lógico deve estar sempre atenta aos sintomas ansiosos apresentados, pois
muitas vezes o paciente está impactado com a doença, não tendo condições
de detectar sinais de alerta e pedir ajuda emocional. Os sintomas de sono
perturbado, boca seca e dormência ou formigamento, bem como preocupação
ansiosa e evitação, foram significativamente correlacionados com Transtorno
de Ansiedade em pacientes com câncer (Shim et al., 2017).
Recomenda-se que a avaliação e os cuidados dos sintomas ansiosos e
depressivos sejam integrados como parte regular dos cuidados oncológicos
durante todo o tratamento do câncer.
O suporte social e familiar também deve estar em Alerta. Ao perceber
qualquer demanda, um psicólogo ou psiquiatra deverá ser agendado para que
sejam tomados os devidos cuidados com o paciente.
Ao discutirmos sobre o suporte familiar, voltamos a atenção aos cuida-
dores do paciente oncológico. Um estudo realizado na Índia mostrou que o
familiar, ao prestar os cuidados a um paciente que está enfrentando problemas
devido ao câncer, pode apresentar problemas psiquiátricos tanto quanto o pró-
prio paciente diagnosticado com a doença. Assim, faz-se necessária a atenção
114

aos problemas emocionais dos cuidadores, para que sejam planejadas inter-
venções de suporte apropriadas. Se o bem-estar dos cuidadores for reforçado,
eles contribuem ainda mais para o bem-estar dos pacientes em tratamento
oncológico (Padmaja et al., 2016). A oncopsiquiatria, assim chamada a assis-
tência psiquiátrica aos pacientes oncológicos, faz intervenções direcionadas
aos pacientes e cuidadores separadamente, bem como intervenções combina-
das para ambos, caso necessário. O tratamento dos transtornos de ansiedade
em pacientes com câncer inclui fármacos da classe dos antidepressivos e dos
benzodiazepínicos, que devem ser avaliados pela interação medicamentosa
com os fármacos dos tratamentos oncológicos. Intervenções psicoterápicas
são efetivas e recomendadas.

Transtorno Depressivo e Risco de Suicídio


Na perspectiva psiquiátrica, o desejo de morte em pacientes com câncer
vem sendo debatido e estudado, muitas vezes o paciente busca um cenário
que envolve uma válvula de escape, no qual as emoções ficam desintegradas
(Corn, 2009; Madeira et al., 2011).
Uma pesquisa realizada com 130 pacientes oncológicos em um Ser-
viço de Psiquiatria em Portugal identificou que a ideação de morte ocorreu
em 34,6% dos casos. Este estudo apesar de constatar que os pensamentos
suicidas estavam presentes em pacientes oncológicos em diferentes estágios
da doença, destaca que a maioria desses pensamentos é considerada transitó-
ria. No grupo estudado, o sexo feminino teve maior prevalência no risco de
suicídio em relação ao masculino (Madeira et al., 2011).
Um grupo de pesquisadores avaliou nos Estados Unidos 4.671.989
pacientes com câncer durante 14 anos, e descobriu que 1.585 cometeram
suicídio no período de um ano após o diagnóstico. Os pacientes divorciados
mostraram um aumento maior nas taxas de suicídio do que casados, solteiros,
viúvos ou separados (Saad et al., 2018).
Em Taiwan, pesquisadores compararam as chances de risco de suicídio
em diferentes momentos durante um ano após o diagnóstico de câncer. Foram
estudados 2.907 casos de suicídio, os resultados apontaram que o primeiro
mês de diagnóstico de câncer foi associado com o maior risco de suicídio em
comparação com o 13º mês. O grupo de câncer de cavidade oral e faringe foi
o que mais apresentou risco nesta amostra (Wang et al., 2018).
Aproximadamente 60% dos homens com câncer de próstata sofrem de
problemas de saúde mental, sendo que de 10% a 40% possuem Transtorno
Depressivo clinicamente significativo. Estudos longitudinais de pacientes com
câncer de próstata sugerem que a disfunção erétil após o tratamento curativo
pode ter um efeito psicológico significativo e levar à depressão e risco de
suicídio em homens (Klaassen et al., 2018).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 115

Na Coreia do Sul um estudo de caso-controle, pareados 1:2, comparou


uma amostra de pacientes oncológicos internados em um hospital geral. Nesta
pesquisa 40% dos casos cometeram suicídio durante o primeiro ano de desco-
berta do diagnóstico da doença, e quanto mais o estágio avançado da doença
prevaleceu, mais foi associado com um aumento no risco de suicídio nesse
período de um ano pós-diagnóstico (Ahn et al., 2015).
Pacientes com câncer que estão em risco de comportamento suicida
devem estar inscritos em programas de prevenção de suicídio (Lin et al., 2017).
Os sintomas de alerta para essa condição incluem: tristeza, desesperança,
dor não controlada, cansaço extremo, ansiedade, uso abusivo de substâncias,
sensação de desamparo e baixo suporte social.
Um estudo brasileiro em um hospital geral universitário avaliou 5.357
pacientes, sendo que destes 675 eram pacientes oncológicos. A prevalência
de Transtorno Depressivo foi de 18,3% e risco de suicídio de 4,7%. Esse
último resultado coincide com dados de um estudo anterior realizado pelos
pesquisadores, que utilizou o Mini International Neuropsychiatric Interview
(MINI) em amostra aleatória de 253 indivíduos internados, sucedendo assim
aos profissionais uma maior atenção na detecção e no tratamento do Trans-
torno Depressivo, haja vista que a depressão afeta a adesão ao tratamento,
bem como influencia a evolução do câncer e a qualidade de vida dos pacien-
tes (Fanger et al., 2010). Estudo multicêntrico recente confirma as taxas de
prevalência para transtornos depressivos em 16% e informa que idade mais
jovem, queixas de sintomas físicos, bem como de desamparo e desesperança,
foram significativamente relacionados ao diagnóstico de transtorno depressivo
maior, necessitando tratamento farmacológico (Shim et al., 2017).
O tratamento para o Transtorno Depressivo e ideação suicida inclui
medidas não farmacológicas, como intervenções psicoterápicas, e fármacos
antidepressivos a serem avaliados em suas diferentes classes e opções.

Síndrome Psicótica

Os transtornos psiquiátricos se manifestam com uma diversificada gama


de sintomas na clínica de pacientes oncológicos. A síndrome psicótica é um
sintoma significativo que se apresenta principalmente em pacientes com tumo-
res malignos graves. Nesse caso, independentemente da parte do corpo em
que se localiza o tumor, os sintomas psicóticos serão temporários. As pertur-
bações transitórias geralmente se estinguem em até 2 semanas. Na síndrome
psicótica, há uma perda de conexão com a realidade, delírios e alucinações.
Os efeitos iatrogênicos dos esteroides são bem definidos e incluem efeitos
sistêmicos como ganho de peso, insuficiência adrenal, osteoporose, formação
de catarata, psicose, miopatia e hiperglicemia (Sengupta, Lee & Wen, 2012).
116

Foram encontrados poucos estudos sobre este sintoma em pacientes


oncológicos devido ao fato de sua baixa prevalência. O tratamento para esta
condição inclui o uso de fármacos antipsicóticos típicos e atípicos a serem
avaliados pelo psiquiatra.

Cuidados Paliativos
Chama-se uma condição de cuidado paliativo a situação na qual o câncer
não apresenta chance de cura, porém é possível realizar tratamento para o
manejo dos sintomas disfuncionais. Neste cenário, foi realizado um estudo mul-
ticêntrico em sete países, em contextos de cuidados paliativos, incluindo 4.007
indivíduos. A prevalência de depressão maior nesse grupo foi de 16,5%. A
prevalência do distúrbio de adaptação isoladamente foi de 15,4% e dos trans-
tornos de ansiedade 9,8% (Mitchell et al., 2011). O tratamento dessas condições
e comorbidades melhora a qualidade de vida no estágio terminal da doença.

Conclusão
Neste capítulo, descrevemos os transtornos separadamente, porém na
prática clínica eles podem aparecer concomitantes, a separação serviu para
apresentá-los de forma didática. Conclui-se que, ao receberem a notícia de uma
doença grave, que aparece de forma inesperada, é natural os pacientes apresen-
tarem sintomas como ansiedade, tristeza, desesperança e ideias sobre a morte.
O câncer em estágio avançado, ou predisposição à doença psiquiátrica, pode
levar o paciente a manifestar esses sintomas de forma mais acentuada, portanto
é de grande importância a avaliação psíquica e distinção do que é um senti-
mento e reação esperada de sintomas que podem desenvolver psicopatologia.
Algumas condições influenciam significativamente o risco de desenvolver
uma psicopatologia, porém, se tratadas precocemente, pode-se modificar o
desfecho negativo. Essas condições são medidas gerais de saúde em relação
ao manejo adequado da dor, a manutenção da higiene do sono e do ciclo sono-
-vigília e medidas que atentem para o apetite e uma boa alimentação, assim
como a atenção ao comportamento sexual, medidas de lazer e de interação
com pessoas queridas.
A avaliação completa trará possibilidades para uma intervenção ade-
quada, considerando os princípios gerais do tratamento. As principais indica-
ções de tratamento para o paciente com câncer são intervenções cirúrgicas ou
farmacológicas no sítio do tumor. Além disso, o que contribuirá para amenizar
o sofrimento psíquico será a ajuda do serviço social, o tratamento psiquiátrico,
se necessário, a psicoterapia individual e grupos de apoio na comunidade. O
tratamento integrado para as necessidades do paciente dá um suporte adicional
e aumenta consideravelmente o desfecho positivo de cura e de bem-estar.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 117

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CAPÍTULO 7
O LUTO ANTECIPATÓRIO
Paula Abaurre Leverone

Nem todas as partidas, dentre as tantas que a vida nos reserva, comportam
uma despedida como a morte anunciada é capaz de fazer.
O tempo passa a ter um valor diferente quando a realidade da morte se
aproxima, a vida se torna urgente por um lado e demoradamente intensa por
outro. O choque da má notícia denuncia o que ficou por fazer e reivindica o
que ainda pode ser feito.
É nesse período entre o diagnóstico e a morte que se dá o luto anteci-
patório, um processo que possibilita ir aos poucos entrando em contato com
o sentimento de perda e organizando a partida, tanto por parte do paciente
doente, ao vivenciar o final da vida, quanto por parte das pessoas a ele vin-
culadas, pela perda do ente querido.
O anúncio de uma doença fora de possibilidades curativas afeta significa-
tivamente o sistema familiar e social no qual o paciente está inserido, exigindo
dos envolvidos uma reorganização de funções e tarefas e uma revisão de
olhares que tendem a ser de grande impacto emocional e relacional. A ameaça
de rompimento de vínculo abala o funcionamento normal do sistema, altera
a rotina familiar e faz com que recursos internos e externos sejam acionados
para enfrentar todas as mudanças no caminho.
Um diagnóstico de doença crônica por si só, por todas as perdas que
comporta e a proximidade com a morte ali implícita, pode levar a esse processo
de enlutamento, que chamamos de luto antecipatório. Tal nome é atribuído
ao fato de que o enlutado antecipa o contato com a morte iminente e inicia a
vivência e a elaboração de seu luto desde então.
O fenômeno do luto é um processo psíquico natural que se dá a partir
de uma perda significativa para o sujeito (Parkes, 1998), é algo indispensável
para a elaboração dessa perda, para o reajustamento ao mundo e da vida diante
da falta e da ausência daquele ou daquilo que foi perdido.
As perdas vão sendo sentidas em uma série de tarefas e atividades que
eram antes executadas rotineiramente e se veem inviabilizadas pelo avançar da
doença. A pessoa ainda não morreu, mas as perdas já precisam ser elaboradas
(Kovács, 1992 apud Flach, 2012).
Para o paciente, o luto vem relacionado às diversas perdas impostas
pela doença como: a perda da sua condição de saúde e debilidades físicas; a
mudança na imagem corporal; a perda da autonomia que a doença impõe; a
122

intimidade que fica nas mãos e aos cuidados dos outros; a autoestima conse-
quentemente abalada; as mudanças no cotidiano; as funções desempenhadas
em cada papel de sua vida, que estão impossibilitadas de serem exercidas; a
identidade do sujeito que passa por uma crise e precisa ser revista; as pessoas
e coisas que deixará quando partir; e claro, a perda da própria vida.
Por parte dos amigos e familiares do paciente doente também são vividas
múltiplas perdas e, consequentemente, seus lutos: pelo estado físico e psí-
quico do ente querido doente; pelo papel e significados contidos na relação
com aquela pessoa; pelas alterações na rotina que uma doença exige; pela
antecipação do enfrentamento de um mundo sem a presença física daquele
ente e pela quebra com tudo que é conhecido, provocada pela doença e pela
aproximação da morte.
Fonseca (2012) explica que paciente e familiares podem experimentar
seus lutos a partir do momento em que entendem e assumem que o diagnóstico
da doença é terminal e com isso se veem diante da necessidade de reorganizar
seus recursos para enfrentar a perda iminente. Essas perdas (concretas e sim-
bólicas), segundo o autor, desencadeiam o luto antecipatório que possibilita
uma elaboração do luto, a partir do processo de adoecimento (Fonseca, 2004).
Sendo assim, o luto antecipatório pode ter a importante função de auxiliar
os pacientes e familiares na preparação para o convívio com uma enfermidade
crônica ou para uma morte iminente (Cardoso & Santos, 2013).

Origem e Definições do Conceito de Luto Antecipatório

O termo ‘luto antecipatório surgiu a partir das observações de Lindemann


(1944) apud Fonseca (2012) de esposas de soldados que apresentavam reações
de luto diante da partida dos maridos para guerra. A possibilidade da morte
antecipava um processo de desligamento afetivo, como forma de proteção e
defesa diante das circunstâncias, o que foi considerado por Lidemann como
um fenômeno adaptativo e a partir daí, esse fenômeno passou a ser estudado
também em casos de pessoas que enfrentam doenças fora de possibilidades
curativas e seus familiares. Flach et al. (2012) reuniram em sua pesquisa
algumas definições do termo ‘luto antecipatório’ de diferentes autores área
da saúde transcritas a seguir: Lebow (1976) entende esse processo como um
conjunto de reações cognitivas, afetivas, culturais e sociais, experienciadas
pelo paciente e por sua família quando a morte é iminente. Pine (1986) diz
que o luto antecipatório é parte de um processo global de enlutamento, quando
se tem uma percepção consciente da realidade da perda, antecipando o luto
e com ele o eliciamento de todas as suas reações. Para Rando (1986) o luto
antecipatório é um conjunto de processos deflagrados pelo paciente e pela
família quando há uma ameaça progressiva de perda, sendo este um processo
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 123

psicossocial de enlutamento, vivido pelo paciente e pela família, na fase


compreendida entre o diagnóstico e a morte propriamente dita. Finalmente,
Worden (1998), define como o tipo de luto, que ocorre antes da perda, de fato
tem as mesmas características e sintomatologia do luto normal.
Este último autor, Worden (1998) apud Fonseca (2012), complementa
que o luto antecipatório permite iniciar, a partir do momento em que recebe o
aviso prévio de morte, a realização das tarefas do luto, listadas por ele próprio.
São elas: aceitar a realidade da perda; elaborar as dores físicas, emocionais
e comportamentais associadas à perda; ajustar-se ao ambiente e a perda de
papéis e funções próprias do relacionamento com essa pessoa; e reposicio-
nar-se em termos emocionais à pessoa e continuar a vida, ou seja encontrar
um lugar apropriado em sua vida emocional para colocar o ente querido de
forma que seja possível continuar a conviver com a ausência dele.
Outro importante trabalho que permite compreender o processo de luto
antecipatório foi desenvolvido por Elisabeth Kübler-Ross (2008). O convívio
e o trabalho com pessoas no final de suas vidas permitiu que a pesquisadora
identificasse semelhanças nos processos vividos por eles que deram origem
à teoria dos cinco estágios do luto, enfrentados pelo paciente e pelos seus
familiares diante da morte iminente.
O primeiro estágio chamado pela autora de ‘negação e isolamento’ é
uma defesa temporária que faz com que os envolvidos não precisem entrar
em contato com a realidade do fato negando-o; o segundo estágio, a ‘raiva’ é
quando não é mais possível sustentar a negação e dá-se lugar então à revolta,
à indignação com a vida, com o mundo, com Deus e com as pessoas; o ter-
ceiro estágio é chamado de ‘barganha’, onde paciente e familiares tentam
negociar com àqueles contra os quais se revoltou anteriormente sem obter
sucesso e nesse momento tentam trocas, pedidos, clemências para que aquela
realidade venha a ser modificada; em um quarto estágio a perda passa a ser
indiscutível dando lugar à ‘depressão’, uma grande tristeza e um pesar por
todas as perdas que vão sendo constatadas; por fim o quinto e último estágio
recebeu o nome de ‘aceitação’, entendido como uma assimilação da realidade
de perda, quando se torna possível conviver com ela e viver apesar dela, ou
seja uma adaptação à nova realidade.
Bowlby (1979, 1980) e Parkes (1998) apud Marrone (2009) também des-
creveram o luto através de fases ressaltando os limites difusos e a possibilidade
de sobreposição entre elas. Para esses autores o luto atravessa quatro fases:
‘entorpecimento’, ‘anseio e protesto’, ‘desespero’ e ‘recuperação e restituição’,
que podem ser identificadas, igualmente, no processo de luto antecipatório.
De acordo com esses autores a fase de entorpecimento é a reação ime-
diata à perda e representa uma rejeição a novidade, como uma anestesia
124

para amortecer o momento numa tentativa de enfrentar as emoções que a


perda desencadeia. A fase de anseio e protesto é quando o enlutado começa
a perceber a realidade da perda, busca pelo objeto perdido e experimenta
a raiva e a tristeza diante dessa realidade. A fase de desespero é reconhe-
cida por uma depressão e apatia ao constatar que a perda é irreversível. A
quarta e última fase de recuperação e restituição é onde se aceita a realidade
de perda e que à vida deve ter uma nova forma frente às ausências e às
mudanças (Marrone, 2009).
Cada teoria mencionada propõe uma visão didática do luto em geral
e não invalida a singularidade e o dinamismo da vida de cada indivíduo,
suas experiências, sua história e tudo aquilo que poderá exercer influência na
vivência do seu processo de luto.

A Morte e o Luto Antecipatório

Todos carregam convicções, crenças e significados que atribuem a vida,


às coisas, ao mundo e à morte. Diante de situações extremas, como ameaças à
vida ou o enfretamento concreto da morte, o mundo presumido se desconstrói.
Mundo presumido é o mundo que o ser humano efetivamente conhece, que
inclui tudo o que sabe ou pensa saber, desde sua interpretação do passado, as
expectativas do futuro, planos e preconceitos (Parkes, 1971 apud Franco, 2012).
Desta forma, tudo o que conhecemos, entendemos e como significamos o
mundo precisa ser revisado e reorganizado, já que muitas das visões anterio-
res parecem não fazer mais sentido depois do impacto de uma perda. Esse é o
momento que chamamos de crise e que pode ser ocasionado por qualquer tipo
de perda, ameaça ou mudança significativa na vida de um sujeito.
Diante da crise, faz-se necessária então a reconstrução dos pressupostos
acerca de si mesmo e do mundo que foram destruídos (Worden, 2009). Essas
circunstâncias também obrigam os envolvidos a lidarem com as várias ques-
tões contidas na tão evitada finitude humana, com a qual não costumamos
dialogar no dia a dia. Keleman (1997) apud Flach et al. (2012) explica que
a morte de alguém que amamos faz uma aproximação com a nossa própria
morte, uma espécie de ensaio ou ameaça à própria vida. Tomamos consciência
e entramos em contato com a nossa morte (que um dia virá), através da morte
do outro e tudo isso traz à tona um misto de sentimentos característicos do
luto, que vai desde o choque e a negação até a impotência diante da realidade
imposta; passa pela tristeza e a dor da perda; pela raiva do mundo, dos outros
e até de Deus; pelo medo de um mundo que parece se tornar mais inseguro
naquele momento; a culpa pelo que poderia ter feito diferente ou pelos senti-
mentos e pensamentos experimentados; e muitas vezes até o alívio, em casos,
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 125

por exemplo, de doenças que se prolongam e exigem demais de todos os


envolvidos, ou em casos de relacionamentos muito abusivos e complicados.
A degeneração física e/ou psíquica causada pela doença pode provocar
uma ambivalência entre o desejo que o familiar morra para aliviar o sofrimento
de todos e a culpa sentida por experimentar esse desejo. Presenciar a dor e o
sofrimento de alguém que amamos traz uma grande sensação de impotência
e sofrimento. Entretanto, em alguns casos, após a morte do ente querido, o
enlutado que era responsável pelos cuidados e acompanhamento do familiar
doente pode experimentar também uma sensação de vazio depois de tanto
tempo de dedicação, com uma rotina que era tão voltada para esses cuidados
e se vê de repente sem saber lidar com o tempo livre e isento das tarefas de
cuidador que exercia antes (Kovács, 1992 apud Flach, 2012).
Os sentimentos se apresentam ao enlutado de forma desorganizada
e costumam ser descritos por muitos como uma “montanha russa” com
grandes oscilações.
São justamente essas “ondas” que traçam o percurso da elaboração do
luto oscilando entre momentos voltados para a perda e momentos voltados
para a restauração da vida é que é possível assimilar e ressignificar a expe-
riência de perda (Stroebe & Schut, 1999).
No luto antecipatório, a vivência e intensidade desse processo estão rela-
cionadas com a evolução da doença, com o grau de certeza do prognóstico e
com a perspectiva de tempo, porém mesmo diante de doenças incuráveis existe
sempre uma esperança, um constante conflito entre a perda e o surgimento de
alguma possibilidade curativa, um milagre ou uma nova descoberta que venha
salvar o paciente, essas expectativas positivas são estratégias de controle que
fazem parte do ajustamento emocional. As esperanças não devem ser tolhidas,
porém tampouco alimentadas de forma irreal. Devem ser mantidas de maneira
realista, dentro da perspectiva dos cuidados que podem ser oferecidos, das
possibilidades de alívio da dor física que existem, do acompanhamento e
atenção que será oferecido e etc. Já as falsas esperanças, quando alimentadas,
costumam ser prejudiciais para os envolvidos (Tizón, 2013).
Muitas outras manifestações e sensações são observadas no processo de
luto e podem trazer impacto em todas as áreas da vida do enlutado: social,
físico, espiritual, emocional, cognitivo e comportamental.
Todas essas sensações e características do luto antecipatório, também
são experimentadas no luto pós morte, a diferença é que no luto antecipatório
elas ocorrem antes mesmo da perda se concretizar. Isso não vem subtrair a
dor ou amenizar a saudade após a morte efetiva, mas antecipa o processo de
forma que torna possível entrar em contato, ensaiar a perda, criar cenas de dor
e de enfrentamento, além de possibilitar a resolução de questões importantes
quando a pessoa ainda está viva. A realidade da perda vai sendo absorvida
126

gradualmente, ao longo do tempo, como pontua Rando (1997), e os envol-


vidos se veem diante da possibilidade de resolver questões pendentes com a
pessoa doente (expressar sentimentos, perdoar e ser perdoado), além de ini-
ciar mudanças de concepção sobre vida e identidade e inclusive fazer planos
para o futuro de maneira que não sejam sentidos como traição ao doente, o
que poderia ser mais custoso após a perda, já que a pessoa morta não está
mais ali para dialogar e dividir as questões que se apresentam no luto. Tudo
isso, porém, supõe que exista um espaço e uma abertura para esse diálogo,
ou seja, uma atenção e um cuidado para as questões emocionais, relacionais
e espirituais de todos esses envolvidos, o que nem sempre é oportunizado,
apesar de ser tão útil para a elaboração do luto.

Facilitadores e Dificultadores do Luto Antecipatório

No individualismo da nossa sociedade atual, o enfrentamento do luto e


o sofrimento causado pela morte, ou pela iminência da mesma, são encarados
por muitos como uma inadequação social, um ‘problema a ser resolvido’ por
aquele que está passando pela perda, sem dizer respeito aos demais. O luto
é vivenciado de forma, muitas vezes, solitária. Escutar e entrar em contato
com a dor do outro leva a um envolvimento incômodo e a saída passa a ser o
afastamento e o isolamento do enlutado. Sem ter quem escute e compreenda, o
enlutado mergulha em uma vivência solitária de angústia e de dor (Freire, 2006
apud Flach, 2012).
A falta ou ineficiência de uma rede de apoio, ou seja, não ter com quem
contar, não se sentir validado, respeitado e apoiado na sua dor pode ser um
importante complicador para o processo de luto.
Além disso, o relacionamento e a dinâmica familiar, a comunicação
entre os familiares e também a comunicação com os profissionais de saúde
têm grande influência na qualidade do luto antecipatório. Poder falar do que
sente, o que espera, o que gostaria e o que não gostaria, tratar abertamente de
temas relacionados à doença e questões a serem resolvidas, pode ser muito
organizador e positivo para o processo de luto de todos os envolvidos.
O espaço para o diálogo, quando não promovido pelo próprio sistema
familiar, pode e deve ser facilitado por profissionais de saúde e outras pes-
soas capacitadas ao redor de pacientes fora de possibilidades curativas e
suas famílias. Essa intervenção e apoio devem ser feitos sempre de forma
empática, ética e respeitosa, ajudando a pessoa a expressar preocupações e
desejos, possibilitando a despedida, priorizando o bem-estar dos envolvidos
e prevenindo a complicação nos processos de luto antes e depois da perda.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 127

O Luto complicado

Franco (2014) afirma que em alguns casos o luto antecipatório pode


possibilitar que questões pendentes sejam abordadas e resolvidas ao longo
do período que antecede a morte, representando um fator de prevenção
para o luto complicado, mas em outros casos pode também intensificar o
vínculo e os cuidados, de forma a tornar-se um fator de risco para o luto
complicado (Franco, 2014).
O que observa Worden (2009) é que ter um anúncio prévio de morte e a
possibilidade de realizar um luto antecipatório é apenas um dos determinantes
que influenciam no processo de luto são muitas as variáveis, os fatores de
risco e de proteção a serem analisados e seria simplificar demais levar em
conta apenas a variável de ser uma “morte anunciada” ou não.
Parkes (1998) complementa que em qualquer processo de luto o que
interfere no trabalho de elaboração do luto são graus elevados de dor, podendo
levar a um luto crônico, ou os casos em que são expressos poucos ou nenhum
sinal de luto, no qual o luto pode estar sendo inibido ou adiado. Sendo assim,
um processo de luto, para ser entendido como um luto complicado, é aquele
em que o enlutado não apresenta alternâncias entre os movimentos voltados
para a perda, dor, sofrimento e os movimentos voltados para a restauração,
reorganização da vida e reconstrução, ao contrário, ele permanece numa
constante de sofrimento intenso ou de completa negação do luto que podem
comprometer seu processo de elaboração da perda.
Em algum momento, que não é possível precisar em dias, meses ou
anos, o enlutado vai encontrando um novo lugar dentro dele para aquele ente
querido que morreu, a ausência vai sendo assimilada e a perda passa a ter
um significado, um novo sentido para essa pessoa. Esse é o que chamamos
de luto elaborado, o que não quer dizer que nunca mais será experimentada
a dor ou falta, mas que agora isso não controla mais a pessoa. Quando o luto
se estende em tempo e intensidades extremas, sem serem sentidas como uma
oscilação, mas sim como uma constante, isso pode sinalizar a necessidade de
uma atenção especial e de um apoio especializado para esse enlutado.
Alguns aspectos são de grande ajuda nesse processo, como por exemplo,
a presença de uma rede de apoio (amigos, familiares, equipe multiprofissio-
nal); a existência de uma crença, fé ou religião; o preparo, o acolhimento, a
ética e o respeito a questões religiosas, culturais e pessoais dos pacientes por
parte da equipe multiprofissional.
Assim como uma crise pode representar uma oportunidade de mudanças
e crescimentos, o luto pode resultar em um importante processo de aprendi-
zagem, que permite uma nova concepção de mundo e um reposicionamento
128

em relação à vida, quando predomina uma avaliação positiva das experiências


adversas (Cardoso & Santos, 2013), as boas lembranças e toda a bagagem
deixada pela relação com o ente querido que morreu.

Considerações Finais

O luto antecipatório possibilita organizar questões, revisar a dinâmica


relacional da família, fazer planejamentos importantes e iniciar o processo de
elaboração da perda diante de uma doença potencialmente fatal.
É um processo anterior à perda, que não elimina a vivência de um luto
posterior, mas que pode atenuar diversos aspectos por possibilitar o contato
e o ensaio de situações relativas à perda, antes mesmo dela se concretizar.
Quando se dá em um contexto de qualidade, com o devido apoio e cui-
dado pode representar um fator de proteção para o enlutado e deve, portanto,
ser conhecido e compreendido pelos profissionais de saúde que lidam com
perdas e morte em suas rotinas de trabalho, para que possam identificar, validar
e oferecer o apoio necessário nesse processo, para pacientes e seus familiares.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 129

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CAPÍTULO 8
A ESPIRITUALIDADE E O CÂNCER:
uma luz na escuridão
Patrícia Pessatto da Silva
Maria Balbina de Magalhães

No dia a dia, raras vezes toma-se consciência de que a morte é um evento


certo para todas as pessoas, mesmo o homem sabendo disso, desde que se
percebe como ser humano. Postergar a ideia da finitude da vida, jogando este
pensamento para o futuro, é um fato que sempre acontece quando a iminência
da morte é uma possibilidade, como, por exemplo, diante de um diagnóstico
de uma doença grave, como um câncer.
Uma reação normal, diante da gravidade da doença, já que segundo estu-
dos estatísticos da Organização Mundial da Saúde (OMS) o câncer está no
ranking das dez doenças que mais causam mortes no mundo (OMS, 2020).
O câncer de mama, por sua vez, é a neoplasia maligna que mais acomete as
mulheres, não só no Brasil, mas também no mundo (Instituto Nacional de Cân-
cer, 2020); sendo considerada a maior causa de mortes por esse tipo de doença.
O diagnóstico de câncer remete à perda da esperança na vida futura. É
ver sonhos, projetos e anseios relegados a um segundo plano, pois o foco
agora é manter-se vivo. Quem tem câncer é acometido de muitos sentimen-
tos, dentre eles a desesperança; logo, acreditar em algo é ter sua esperança
renovada. Todos os esforços são empreendidos em busca da melhora ou cura
da doença. Neste sentido, a busca por outros tratamentos, além do ministrado
por médicos especialistas na área (oncologistas) é a realidade vivida por
quem se defronta com uma doença. Diante da desesperança e do sofrimento
causado pela descoberta, doentes e familiares buscam na espiritualidade dar
um sentido positivo às experiências pelas quais estão passando.
Até pouco tempo atrás, falar em espiritualidade se resumia a considerar os
temas pertinentes à religião. Hoje, no entanto, é uma temática que atravessa o
interesse de várias outras áreas do conhecimento. A fé e a razão desde sempre
se estranharam. A convivência foi necessária e aconteceu aos poucos, permi-
tindo assim o conhecimento mútuo, possibilitando o surgimento de respostas
e explicações sobre a crença de que o homem precisa acreditar em algo fora
do sistema usual, do convencional da ciência (Estefan, 2014; Lopes, 2007).
Essa necessidade, entretanto, surge quando o homem começa a se dar conta
de que ele não é só matéria e que deve ter algo mais, não importando o nome
132

que se dê , já que não se sabe explicar o surgimento do homem, de onde veio


e para onde vai (Estefan, 2014).
Diante do sofrimento e da morte, estados inevitáveis na existência
humana, surgem inúmeros sentimentos que tendem a afastar o ser humano
do que ele poderia aprender com os reveses da vida. Para Frankl (1982),
a necessidade de aprender a tirar do sofrimento inevitável e da finitude
da vida um sentido, encarando-os de frente, é assumir a responsabilidade
pela própria vida, aproveitando o tempo disponível que se tem para não
deixar passar as ocasiões que aparecem e que não irão mais se repetir,
porque cada dia é único.
Documentários, pesquisas e entrevistas divulgadas nas mídias sociais,
a todo o momento, mostram os impactos causados pela adoção de uma vida
espiritualizada nos tratamentos. Um exemplo é o Psiquiatra Harold Koe-
ning, professor da Universidade de Carolina do Norte e que há 28 anos se
dedica a estudos da relação entre fé e saúde. Sua tese é de que a fé religiosa
ajuda as pessoas em diversos aspectos da vida cotidiana, reduzindo o estresse,
fazendo-as adquirir hábitos saudáveis e dando-lhes o conforto nos momentos
difíceis, entre outros benefícios. O autor tem 40 livros e mais de 300 artigos
publicados. Para Koening (2005), a religião é usada por muitas pessoas como
estratégia de enfrentamento (coping) em relação às doenças, trazendo conforto
e reduzindo o estresse emocional causado pelas mudanças decorrentes dos
processos patológicos.
Confirmando a importância dessa dimensão, a OMS incluiu em seu
Manual de prevenção ao suicídio, as crenças religiosas, culturais e étnicas
como fator de proteção (Organização Mundial de Saúde, 2006). O Instituto
Pazanesse, por sua vez, reuniu quase 250 artigos de todo o mundo, para com-
provar a tese da importância das crenças religioso-espirituais e concluiu que a
prática regular de atividades religiosas (sejam elas quais forem) pode reduzir
o risco de morte em 30% (Universidade Federal do Espírito Santo, 2019).
Considerar a espiritualidade hoje como condição de saúde é ir ao encontro
da concepção holística do termo saúde, pois a dimensão espiritual foi incluída
no conceito multidimensional de saúde pela OMS, junto com as dimensões
corporal, psíquica e social, mostrando a importância da discussão do tema
espiritualidade dentro da Academia. Nesse sentido, é fundamental que tam-
bém os profissionais da área da saúde possam se questionar sobre o tema e
entender como acontece esse processo, considerando que a espiritualidade
contribui para um melhor bem-estar do paciente e sua família.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 133

Breve Histórico do Câncer

Câncer3 é uma doença que está envolta, geralmente, em pensamentos


relacionados ao sofrimento e à morte quando se ouve o seu pronunciamento:
“Quando a doença é diagnosticada como oncológica, a percepção da finitude da
vida torna-se presente” (Farinhas, Wendling, & Dellazzana-Zanon, 2013, p. 4)

Apesar do avanço tecnológico da medicina, o seu diagnóstico ainda é


encarado, muitas vezes, como sentença de morte. Desse modo, embora
seja comprovado que 50% dos casos são passíveis de cura ou controle, esta
imagem persiste, principalmente pelo rótulo “terminal” (Silva, Aquino,
& Santos, 2008, p. 6).

Dessa forma, câncer e morte tornam-se sinônimos: “Em nossa socie-


dade, o câncer está relacionado à crença de que seu portador está condenado
a morrer”. (Caetano, Gradim, & Santos, 2009, p. 258). O estigma surge das
poucas chances de sobrevivência de um paciente oncológico, no passado,
onde os recursos ainda eram escassos e a medicina não tão avançada (Caetano,
Gradim, & Santos, 2009).
A origem do nome vem do grego karkinos, que significa caranguejo,
denominação dada pela semelhança da forma do tumor (veias ao redor) e
as pernas do crustáceo (Silva, Aquino, & Santos, 2008). Esta denominação
foi utilizada pela primeira vez por Hipócrates, o pai da Medicina, aproxima-
damente em 400 A.C., tendo sido detectado em múmias egípcias, fato que
comprova sua existência há milhares de anos A.C. Existe há milhares de anos

3 De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), câncer é o nome dado a um grupo de doenças
que tem em comum o crescimento desordenado de células. Este tumor maligno (câncer) tem a capaci-
dade de espalhar-se para outras regiões do corpo, multiplicando-se rapidamente, e sua cura está muito
relacionada com sua descoberta precoce. É fator relevante a mulher estar informada para poder perceber
em seu corpo alterações que podem surgir na mama, acompanhadas ou não de dor mamária, como por
exemplo, mudança de tamanho ou formato (acompanhadas ou não de dor mamária); nódulo ou aumento de
espessura em determinada região, observando no mamilo nódulo ou aumento da espessura, retraimento,
saída de sangue. Nos braços: é preciso estar atento ao aparecimento de inchaço ou nódulo na axila, sendo
esses nódulos palpáveis ou não, podendo o câncer de mama ser também detectado precocemente através
de diferentes estratégias, tais como: autoexame das mamas, realizado mensalmente pela própria mulher,
exame clínico anual com ginecologista e solicitação para encaminhamento ao mastologista, sendo este é
o profissional mais indicado para realizar a palpação e exame minucioso da mama, abordando histórico
familiar de doenças, e caso o mastologista perceber a presença qualquer anormalidade poderá solicitar
alguns exames, como: mamografia, em que a mama é comprimida no mamógrafo, de forma a fornecer
melhor capacidade de diagnóstico e mostrar lesões em fase inicial, sendo este exame muito utilizado em
mulheres com mais de 35 anos; ultrassonografia (USG), que consiste em um exame de avaliação por
imagem, utilizado frequentemente em mulheres com menos de 35 anos, e em mulheres com mais de 35
anos como complementação à mamografia. A USG é usada para detectar um nódulo sólido ou com fluido
(um cisto) e também é capaz de identificar lesões no interior de cistos.
134

e persiste frente a tantos avanços na medicina e na tecnologia, conferindo um


status de invencibilidade, associando uma imagem de forte poder, tornando
natural o temor que as pessoas demonstram frente ao seu diagnóstico.
O Instituto Nacional de Câncer (2020) estima que no Brasil, para cada
ano do triênio 2020-2022, que ocorrerão 625 mil casos novos de câncer,
enquanto em nível mundial, as estatísticas de 2018 apontaram a ocorrência
de 18 milhões de casos novos. O câncer de pulmão é o mais incidente no
mundo (2,1 milhões), seguido pelo câncer de mama (2,1 milhões), cólon e reto
(1,8 milhão) e próstata (1,3 milhão). Para o Brasil, a previsão de incidência
aponta o câncer de mama (66 mil) em primeiro lugar, junto com o câncer
de próstata (66 mil), seguido pelo câncer de cólon e reto (41 mil), traqueia,
brônquio e pulmão (30 mil) e estômago (21 mil). A estimativa de 66 mil casos
novos de câncer de mama, para cada ano do triênio 2020-2022, corresponde
a um risco estimado de 61,61 casos novos a cada 100 mil mulheres.

A Espiritualidade e a Vivência do Adoecimento

As pessoas buscam na religião, na psicologia e em outros tipos de terapias


algo além da medicalização que a medicina propicia que é a crença em algo
superior, que faz ter esperanças de uma vida futura melhor. Os pacientes e os
familiares, diante da desesperança e do sofrimento causados pela descoberta
da doença, buscam na espiritualidade um sentido positivo a essas experiências
(Guerrero, Zago, Sawada, & Pinto, 2011). Essa crença é corroborada pela
teoria existencialista de Viktor Frankl, criador da Logoterapia4, que acredita
que a motivação primeira do ser humano é a busca por um sentido na vida,
seja para criar, fazer ou sofrer. O mesmo autor diz ainda que o trágico não
deve ser evitado, uma vez que essa experiência pode ser usada como forma
de desenvolver a capacidade para enfrentar o sofrimento.
Nesse processo de cura e/ou alívio no tratamento de câncer, missão de
muitos grupos que atuam em hospitais e instituições de saúde, como por
exemplo, a Capelania5, apresenta aos pacientes uma oportunidade de vivência

4 Criada por Viktor Emil Frankl, e desenvolvida enquanto o seu criador esteve preso em Campos de Concen-
tração, durante a Segunda Guerra Mundial, a Logoterapia, percebe o ser humano como um ser que tem a
livre escolha perante as pressões internas e externas a ele. Esta escolha está direcionada para a que tiver
maior sentido na vida de quem escolhe, dessa forma, acredita que os humanos se autoconstroem, ou seja,
são livres e responsáveis pelas próprias escolhas.
5 Capelania é uma Assistência Religiosa e Social prestada aos serviços Civis e Militares, prevista e garantida
pela Constituição Federal de 1988, sob a Lei n. 6.923 art. 5 e inciso VII. A Capelania ganhou muita força
nestes últimos anos, principalmente no Brasil pelas Lideranças Evangélicas, já que os hospitais, presídios,
escolas, universidades e outras instituições vem se preocupando com a qualidade no atendimento das
pessoas com carências espirituais, afetivas e emocionais, necessitando de uma pessoa de estímulo e
entusiasmo. (BRASIL, 1981).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 135

de espiritualidade, por meio de palavras de conforto, orações e um espaço


para que possam falar de suas angústias, medos e sofrimento causados pelo
contexto de adoecimento em que se encontram.
A espiritualidade de que estamos falando diz respeito àquilo que difere
do material palpável, objetivo e concreto, e, portanto, contrário à ciência
positivista. Assim, compreendida em uma dimensão mais abrangente, dife-
renciando-se do termo religiosidade, a espiritualidade expressa a prática do
crente, que pode estar relacionada com alguma instituição religiosa, diferindo
também de religião, que determina regras e ritos. Dessa forma, a espiritua-
lidade pode ser pensada como um sistema de crenças que enfoca elementos
intangíveis, que transmite vitalidade e significado a eventos da vida. Tais
crenças podem mobilizar energias e iniciativas extremamente positivas, com
potencial ilimitado para melhorar a qualidade de vida das pessoas (Saad,
Masiero, & Battistella, 2001).
A espiritualidade é, portanto, uma forma de enxergar e encarar a realidade
e não se relaciona necessariamente a religiões. Trata-se dos sentimentos que a
pessoa nutre no dia a dia e na forma como encara seus problemas. A religião
pode servir como um recurso para a pessoa experimentar a espiritualidade,
porém não é sempre que esta relação ocorre. Assim, existirão pessoas reli-
giosas que não experimentam bem-estar espiritual, enquanto existem pessoas
espiritualizadas sem seguir nenhuma religião.
Os estudos sobre o tema apontam, de maneira geral, uma forte relação
entre bem-estar espiritual e maior qualidade de vida, saúde mental e física e
menos necessidades de serviços de saúde, além da recuperação mais rápida de
doenças (Teixeira, Müller & Silva, 2004; Koening, 2012). “Estudos mostram
que a religiosidade pode ser fator positivo na saúde das pessoas” (Camboim
& Rique, 2010, p. 252).

A influência dos fatores psicológicos sobre os aspectos biológicos é


demonstrada através de estudos com um tipo de célula produzida pelo
sistema imunológico, a célula natural killer (NK). Eles mostram uma
associação entre algumas variáveis psicossociais e o funcionamento dessas
células. Os mesmos trazem evidências de que um baixo nível de ajusta-
mento ao câncer, falha no apoio social, alto nível de estresse e presença de
sintomas depressivos diminuem a produção e atividade da NK. Sendo essa
célula responsável pela vigilância imunológica sobre o câncer, controlando
a difusão das células malignas, a paciente tenderá a ter um pior prognós-
tico. De acordo com esses dados, conclui-se que o sistema imunológico
é fortemente afetado por fatores emocionais e que determinadas atitudes
psicológicas podem influenciar positivamente no sistema de defesa, favo-
recendo uma maior e melhor sobrevida (Venâncio, 2014, p. 61).
136

Assim sendo, entende-se que o homem amparado socialmente, com apoio


psicológico e com sua fé fortalecida, encontra-se espiritualizado e, portanto,
em maior capacidade de enfrentar a vida e suas mazelas, ou seja, “Mais
essencial do que iluminar as profundezas escuras da alma é a descoberta das
alturas iluminadas” (Frankl, 2009, p. 10).
De base existencial fenomenológica, é a isso que se propõe a Logoterapia:
a crença de que o homem tem em si um inegável impulso que é o de superar a
si mesmo, devotando à sua vida a um sentido maior (Frankl, 2009)6. Segundo
Frankl (1982), cada pessoa tem uma instância que nenhuma doença jamais
conseguirá atingir, que é a dimensão noética, a espiritualidade imaculada, o
Deus vivo na intimidade da pessoa humana.
As pessoas que, de alguma forma, tem presente em sua vida a espiri-
tualidade, vão experimentando, ao longo do tempo, uma ampliação da cons-
ciência e sentem-se pessoas empoderadas, capazes e mais capacitadas para
lidar com as situações que lhe incomodam de forma mais funcional. Esta
vivência propicia uma atitude mais empática nas pessoas, convidando-as a
sair do próprio eu, e a olhar para o sofrimento do outro. Frankl (1982) propõe
que no tratamento com pessoas com diagnóstico de depressão, se trabalhe a
estratégia de um olhar ao outro, ao sofrimento do outro, pois segundo ele,
as pessoas nesse estado olham muito para si mesmas, e assim, ao sair de si
e voltar seu foco ao outro, acabam encontrando respostas para o seu próprio
sofrimento. Essa alegria em “servir”, em ajudar ao outro, pode possibilitar
que a pessoa encontre um sentido para ela mesma que a preenche, ou seja,
“[...] a existência humana no fundo significa existência responsável e que o
homem, em última análise, é um ser que luta espiritualmente pelo sentido
concreto de sua existência pessoal” (Frankl, 1982, p. 11).
Gomes (1992), por sua vez, lembra que o foco em si mesmo leva as
pessoas a olharem só para seu mundo, perdendo o sentido da vida e entrando
num grande vazio existencial. Em contrapartida, pessoas mesmos doentes
fisicamente, mas altruístas, interessadas não só em seu bem, mas no bem
comum, “são indivíduos extremamente saudáveis” do ponto de vista emo-
cional. (Lopes, 2007, p. 57). A Logoterapia tem como meta que cada pessoa
possa encontrar o seu “para que” viver, isto é, um sentido individual para sua
vida. Essa perspectiva de buscar formas saudáveis de ser/estar no mundo é
alimento mental para o indivíduo, que também pode expandir a consciência

6 “Frankl não conheceu o valor deste sentido da vida nos momentos confortáveis e cômodos da sua vida, mas
nos mais escuros e difíceis: no campo de concentração, quando soube da morte da sua família, nas horas
de mais profunda humilhação e esgotamento físico. Ele o transmite agora aos seus pacientes, e provoca
verdadeiro milagre, tanto em terapia individual, como através da influência coletiva de seus milhões de
livros editados. É como se a indescritível ingenuidade de sua tese ‘a vida tem um sentido’ tivesse um efeito
semelhante ao da não menos ingênua ordem bíblica: ‘levanta-te e anda’”. (Frankl, 2009, p. 10).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 137

de vida e bem-estar a outras pessoas dentro de seu convívio. Lopes (2007, p.


44) argumenta que “trabalhar-se interiormente para ser reconhecido com o
que possui em sua vida é uma qualidade imprescindível para a saúde mental
de qualquer pessoa”. Esse altruísmo é parte das pessoas espiritualizadas e sua
influência é notória para os que as cercam. Assim, percebe-se que as pessoas
que buscam essa vivência maior, fortalecendo sua espiritualidade também
reagem melhor frente a desafios, sejam de ordem econômica, social ou de
saúde. O confronto com o tema morte e como se lidará com ele depende da
história de vida e da personalidade de cada pessoa. Rodrigues (2011) lembra
que a qualidade da saúde mental está diretamente ligada à forma como a
pessoa se responsabiliza ela própria vida, assim como com a própria morte.

Sentimentos e Dificuldades Encontrados Frente ao Câncer de Mama

Quando se adoece, o percurso natural vivido no cotidiano, que é nor-


malmente uma vida com afazeres, com desafios é alterado. Ou seja, a rotina
conduzida diariamente quando se está saudável é interrompida por outras
obrigações: consultas, exames etc., que buscam novamente o equilíbrio da
saúde comprometida. A mudança brusca no dia a dia durante o tratamento
produz uma ruptura na rotina diária, descaracterizando hábitos, capacidade
de autorregulação, cuidado pessoal, atingindo também a família (Rodrigues
& Polidori, 2012). O tratamento do câncer, além de obrigar pacientes e seus
familiares a assumir atribuições impostas pelo adoecimento, impõe outros
ônus, como abandonar sonhos, planos e perspectivas futuras.
Além da mudança na rotina, existem as reações ao tratamento medica-
mentoso. São diversos os efeitos colaterais, e as mulheres com câncer de mama
relatam essa questão como uma das fases mais difíceis durante o tratamento.
Os efeitos colaterais mais comuns são náuseas, vômitos, fadiga, alopecia
(perda de cabelo), menopausa precoce, fadiga, infecções, ferida na boca e
garganta, ganho de peso, fraqueza nas unhas e perda de memória. No entanto,
a lista é bem mais longa e não está restrita apenas a esses efeitos mais comuns.
A quimioterapia é um tratamento sistêmico, que afeta todo o corpo, podendo
provocar inúmeros efeitos colaterais, tais como: diminuição da libido, infec-
ções vaginais fúngicas, déficit cognitivo, alterações no paladar, problemas
nas unhas que podem até cair e refluxo (Prado, 2019). Os diversos efeitos
colaterais da quimioterapia e radioterapia interferem na vida, trazendo efeitos
que potencializam o mal-estar sentido ao receberem o diagnóstico inicial.
Conviver com o câncer traz para as mulheres outros agravantes, poten-
cializando o sofrimento vivido. Além dos efeitos da medicação e da perda do
cabelo, a perda da mama, símbolo da feminidade, é um golpe forte, abrindo
138

brechas com marcas profundas no autoconceito da mulher. As mamas, desde


sempre, são a representação da sexualidade e a maternidade, sendo um órgão de
contato, de atração sexual, assim como símbolo da identidade corporal feminina,
representando os sentimentos de autoestima e valor-próprio (Soares, 2006). A
presença do companheiro no tratamento é fundamental, uma vez que frente a
mastectomia muitas mulheres evitam o relacionamento sexual, acarretando
grandes dificuldades para o relacionamento afetivo/amoroso do casal.
No adoecimento, a rotina familiar passa por várias mudanças e transtor-
nos, que vão desde as questões de ordem prática do cotidiano até situações
mais pontuais da própria dinâmica do tratamento, gerando sentimentos de
temor e desespero. Em função de seu estigma social e de sua associação com
a morte, o câncer é a doença que mais provoca medo nas pessoas. (Farinhas,
Wendling & Dellazzana-Zanon, 2013; Rodrigues, 2011.) As pesquisas com
mulheres com câncer de mama apontam o desespero e a perplexidade como
sentimentos mais vividos frente ao diagnóstico da doença. Rodrigues (2011)
explica que os sentimentos experienciados não são provocados somente pela
constatação da finitude da vida, mas que o medo e a ansiedade advêm tam-
bém do sofrimento gerado pelo próprio processo da enfermidade em si. Ou
seja, quando a paciente toma conhecimento de algo importante e grave que
se passa com seu corpo do dia para a noite, isto pode causar certa alienação,
para além do choque inicial causado pelo diagnóstico. No momento de rece-
bimento da notícia, é comum notar-se um estado de estranhamento em relação
a si, demonstrando a dificuldade de aceitação de estar doente (Soares, 2014).
A todo esse emaranhado de sentimentos, somam-se ainda outras questões
emocionais, a preocupação com os filhos ou outros parentes dependentes.
Para enfrentar este contexto de sofrimento psíquico, as pessoas acometi-
das pelo câncer e seus familiares procuram no tratamento espiritual, além do
medicamentoso, condições de enfrentamento ao sofrimento e a possibilidade
de morte. A fé em algo que transcende o mundo material atua no paciente,
portanto, como o combustível que fará com que ele tenha força, motivação e
esperança para encarar essa difícil etapa da vida. Agora contam com a espe-
rança da cura capitalizada em um Deus e na medicina (Caetano, Gradim &
Santos, 2009). Rodrigues (2011) explica que a espiritualidade é um fator que
funciona como um facilitador, ajudando as pessoas a compreender e decidir
sobre quais comportamentos assumir frente aos efeitos das vivências sociais
e psíquicas do adoecimento, assim como habilita a capacidade da pessoa
para dar significado exato às experiências do adoecer. A essas capacidades
o autor dá o nome de autodistanciamento e autotranscedência, as quais são
desenvolvidas a partir da vivência da espiritualidade, como uma condição
humana que o diferencia dos demais seres vivos.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 139

Para alguns pesquisadores, no entanto, a vivência religiosa atua como um


placebo, inspirando pensamentos de otimismo e esperança, bem como expec-
tativas positivas, com resultados observados não somente nos mecanismos
psicológicos, como também nos efeitos fisiológicos provocados no organismo.
Ou seja, crenças subjetivas profundas geram alterações bioquímicas, hormo-
nais e fisiológicas (Santos & Guimarães, 2011). Os estudos nessa área apontam
que as mulheres que apresentam determinação para enfrentar a doença têm
maior sobrevida, ou seja, há uma expressiva ligação entre o prognóstico e
comportamentos de desesperança e desamparo (Venâncio, 2004). O bem-estar
promovido por essa nova disposição interior diminuirá a ansiedade/estresse e
fará com que haja um reforço na imunidade. Ao imaginar o contrário, a ausên-
cia de espiritualidade, considerando apenas o aspecto materialista e científico,
o paciente poderá se tornar apenas o espectador da própria narrativa com final
pré-estabelecido, como nos casos em que ocorre a metástase, por exemplo.
A capacidade de optar intelectualmente por encontrar sentido no enfren-
tamento a uma doença é possível, desde que o paciente consiga fazer uma
retrospectiva, analisando os fatos que viveu, recordando as experiências posi-
tivas e assim retirar a carga social e psicológica do adoecimento. De acordo
com Rodrigues (2011, p. 8), “[...] o sentido para a vida pode ser encontrado
em qualquer situação, mesmo diante do sofrimento que traz a possibilidade
de mudar a si mesmo, [...] e da morte que motiva o indivíduo a fazer o melhor
possível frente à finitude da existência”. Assim, pode-se dizer que o homem
espiritualizado se encontra mais capacitado para enfrentar a vida e suas angús-
tias, pois torna-se mais potente para lidar com estas questões. Lopes (2007)
acrescenta que há uma distinção entre as pessoas que desenvolvem a espiri-
tualidade e as que não valorizam. Segundo o autor, as pessoas que se nutrem
da fé, da oração e outros recursos transpessoais, suas células funcionam em
padrões mais saudáveis. Ainda de maneira tímida, na área médica as pesqui-
sas já levam em consideração e valorizam a influência da espiritualidade no
enfrentamento de doenças e na esperança de cura. Outros tratamentos com-
plementares utilizados como ferramentas terapêuticas no enfrentamento do
câncer são o Reiki e o passe espírita, além da meditação.
Por mais doloroso e traumático que possa ter sido receber o diagnóstico
de um câncer, o ser humano pode encontrar sentido na vida mesmo ante a
finita existência humana, porque é ele quem constrói a própria realidade por
meio das oportunidades de criar, de experienciar e, portanto, de recriar novas
realidades, ou seja, a percepção do seu sofrimento é alterada, pois este sofrer
alcança outro significado.
Uma discussão importante que está acontecendo é o questionamento da
validade do paradigma ‘ciência versus espiritualidade’, que seria substituído
140

por ‘ciência e espiritualidade’, isto é, a relação entre esses dois conhecimentos


seria de complementariedade e não de confronto. A ciência ajuda a qualificar
e conscientizar o tema espiritualidade, enquanto a espiritualidade torna o
desafio da ciência algo transcendental, acima da razão. Isto evitaria a falta de
argumentos que a ciência, por vezes, se encontra como, por exemplo, quando
precisa explicar a cura de um paciente desenganado.
A crença em Deus, na espiritualidade, na vida, modifica a forma de encarar
a adversidade e o sofrimento, favorecendo harmonia e capacidade para enfrentar
desafios extremos como as doenças terminais. A forma como a pessoa se posi-
ciona frente ao adoecimento, poderá piorar ou melhorar o tratamento.
Sabe-se que o estado emocional poderá alterar a imunidade do corpo,
consequentemente, das defesas do organismo, criando predisposição para a
ação de células cancerígenas ou de doenças semelhantes. Da mesma forma,
uma mente que se harmoniza com o aspecto religioso e/ou espiritual poderá
proporcionar uma ação na produção de anticorpos para o combate da doença.
Mas, é quando tudo foge ao habitual e o que se tem é apenas um emaranhado
de diferentes emoções que as pessoas recorrem à espiritualidade como uma
alternativa para se adaptar e fortalecer frente ao que ameaça sua vida. Não
que as dificuldades (doenças) não acometam as pessoas que tem fé. Mas ter
fé acalenta, conforta e fortalece, dá o encorajamento diante do conflito, da
dúvida e da dor. Embora a fé seja incompreensível à luz do conhecimento
científico, ela permite a compreensão dos ciclos, da complexidade do processo
do adoecimento e até mesmo da finitude humana. Ter fé alimenta o humano
de esperança e coragem para viver a vida e também pensar na morte.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 141

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CAPÍTULO 9
MULHERES SOBREVIVENTES
DE CÂNCER DE MAMA:
crescer a partir do sofrimento
Tânia Rudnicki

O modo de vida em sociedade vem sofrendo contínuas mudanças,


levando, em geral, a alterações no estilo de vida das pessoas. O aumento da
ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) tem sido impul-
sionado por vários fatores de risco, oriundos do uso do cigarro e do álcool, a
falta de exercício físico, dietas pouco saudáveis e a poluição do ar, entre outras
causas (Souza, 2018). As enfermidades classificadas desta forma resultam
em perda de qualidade de vida, limitações e incapacidades (Brasil, 2013).
A vivência de uma doença crônica afeta o indivíduo em todo seu contexto,
acarretando diversas alterações no seu dia a dia.
O câncer é provavelmente uma das experiências mais difíceis que alguém
poderia viver, devido à multiplicidade de fatores envolvidos e pela mesma
razão, não há maneira específica de lidar com isso. Abruptamente, ele muda
muitos aspectos da vida e da rotina diária, tanto do paciente quanto da família
e de seu ambiente próximo. As reações que podem ser observadas; como o
choque de primeiro momento, onde o enfermo não consegue entender a situa-
ção que está enfrentando, congelando, sentindo-se perturbado, incrédulo, sem
esperança entre muitos outros pensamentos e sentimentos que são comuns e
considerados como parte de um processo normal de adaptação.
Considerado como doença crônica, o câncer é a principal causa de morte
imposta por enfermidades não transmissíveis no mundo, portanto, é um pro-
blema de saúde pública importante, tanto em países desenvolvidos como
em países a caminho do desenvolvimento (Prolla, Silva, Netto, Goldim, &
Ashton-Prolla, 2015). Conforme dados do Instituto Nacional de Câncer José
Alencar Gomes da Silva – INCA (2019ª), a carga global de câncer em todo o
mundo, foi estimada no ano de 2018, em 18,1 milhões de novos casos e 9,6
milhões de mortes por câncer.
O câncer tornou-se uma doença crônica relacionada cultural e histori-
camente à dor e à morte. Devido a isso, e à complexidade da doença e seu
tratamento, o momento do diagnóstico resulta em um forte impacto emocional
para o paciente e sua família; portanto, geralmente leva tempo para a pessoa
146

assimilar e aceitar a situação que é viver e se submeter ao tratamento sugerido


(Robert, Álvares, & Valdivieso, 2013). Entre as mulheres (INCA, 2019b), o
câncer de mama é o mais comumente diagnosticado e a principal causa de
morte por câncer. De acordo com estatísticas mundiais do Globocan-2018
(Bray et al., 2018), a estimativa gira em torno de 2,1 milhões de casos novos
de câncer e 627 mil óbitos pela doença.
O câncer de mama é a neoplasia maligna mais incidente em mulheres na
maior parte do mundo, sendo uma doença que carrega consigo a possibilidade
de morte e de tratamentos mutilantes, provocando intenso sofrimento. No Bra-
sil, é o tipo de câncer que mais acomete as mulheres excetuando-se os tumores
de pele não melanoma, além de ser o que mais leva a óbito (INCA, 2019b).
Devido ao aumento de sua prevalência dentro das doenças não trans-
missíveis, o câncer de mama tornou-se um problema de saúde pública para o
sistema de saúde brasileiro, exigindo intervenções vinculadas a tecnologias
leves, leve-duras e duras, concomitante a mudanças de estilo de vida inseridas
em um projeto terapêutico de cuidado contínuo (Silva et al., 2014).
O expressivo aumento da incidência deste tipo de câncer ocorreu, nos paí-
ses ocidentais, no final dos anos de 1980 e nos anos 1990. Pode-se entender tal
fato como um reflexo de mudanças no padrão reprodutivo e no estilo de vida,
impostos pelo mundo industrializado (Silva, 2012). Com esse ritmo agitado,
ocorre aumento da taxa de sedentarismo, a alimentação torna-se inadequada
e as pessoas ficam mais expostas ao estresse. O ritmo de vida é acelerado,
sendo esperado que se trabalhe de forma intensa (Pereira et al., 2017).
A incidência do câncer de mama tende a crescer progressivamente a partir
dos 40 anos, assim como a mortalidade por essa neoplasia. Para o seu controle,
estudos epidemiológicos têm apontado a relevância da determinação dos fatores
de risco no intuito de identificar mulheres com risco aumentado para a promoção
do diagnóstico precoce e tratamento adequado, buscando prevenir intercorrên-
cias. Para o Brasil, foram estimados quase 60 mil novos casos em 2019, com
risco estimado de 56 casos a cada 100 mil mulheres (INCA, 2019b).
Atualmente, o diagnóstico, o tratamento local e o tratamento sistêmico
para o câncer de mama estão sendo aprimorados de forma rápida, em razão
de um melhor conhecimento da história natural da doença e das característi-
cas moleculares dos tumores. Nesse cenário, o planejamento de estratégias
de controle do câncer de mama por meio da detecção precoce é fundamental
(Silva, 2012; Pereira et al., 2017; INCA, 2019b).
Quanto mais cedo um tumor invasivo é detectado e seu tratamento iniciado,
maior a probabilidade de cura. Entretanto, em razão da individualização orgânica
e da grande heterogeneidade tumoral associada à presença de fatores de risco
conhecidos e não conhecidos, este tipo de câncer é considerado uma doença de
comportamento dinâmico, em constante transformação (INCA, 2019b).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 147

O tratamento classificado como sistêmico, é aquele onde é utilizada


quimioterapia, hormonioterapia e/ou terapia-alvo molecular e local; cirúrgico,
radical ou conservador, além de radioterápico. Quando realizado antes da
cirurgia curativa, o tratamento sistêmico é chamado de neoadjuvante e tem
por objetivo eliminar possíveis micrometástases, que são aquelas células que
disparam da mama, para outros órgãos do corpo (NCCN, 2018; Rudnicki,
Oliveira, & Rosa, 2018).
Além dos aspectos físicos e biológicos, envolve a dimensão existen-
cial da mulher, no que concerne à sexualidade, maternidade, autoimagem e
estética (Prolla, Silva, Netto, Goldim, & Ashton-Prolla, 2015). Ao receber
esse diagnóstico ela se sente ameaçada de diferentes formas, podendo trazer
consequências diversas, que podem se manifestar como desconforto físico e
psicológico, ansiedade, estado depressivo, mudanças na autoimagem, baixa
na autoestima, alterações nos hábitos e estilo de vida, medo quanto ao trata-
mento e pela possibilidade de recorrência da doença, além do temor da morte
(Rudnicki, Oliveira, & Rosa, 2018).
Ela terá de enfrentar, em seu cotidiano, dificuldades as mais diversas,
como a condição de viver com uma doença que, em nossa sociedade, ainda é
intensamente ligada a estigmas. O diagnóstico deste tipo de câncer é sempre
conflituoso, fazendo com que a mulher experiencie um trauma emocional,
que a fará sentir-se sem esperança, deprimida, revoltada, retraída e na maioria
das vezes, solitária (Rudnicki, Oliveira, & Rosa, 2018).
A essa condição se aliam sofrimento, dor e agravamento da situação,
que pode ter como consequência a morte, além de produzir conflitos emocio-
nais associados ao sofrimento e ao medo do futuro. Ao se descobrir doente,
a mulher vai trilhar as etapas do diagnóstico, do tratamento agressivo e da
mudança corporal. Poderá experienciar sentimentos como negação, raiva e
frustração pela doença. Seu estado emocional pode ser afetado por vários
fatores, como a incerteza do diagnóstico ou a confirmação deste, o ato cirúr-
gico ou seu resultado, mudanças na imagem corporal e em sua rotina diária
(Dolina, Bellato, & Araujo, 2013).
É uma doença que carrega a possibilidade concreta de morte, gerando
medo, e angustia, expondo a mulher à fragilidade e finitude. Somando-se
a isso, a necessidade de se afastar das atividades rotineiras, dos papéis que
desempenham como mães, filhas, esposas, as possíveis utilizações no corpo,
principalmente no órgão feminino e a dor dos tratamentos, como o cirúrgico
e a quimioterapia (Dolina, Bellato, & Araujo, 2013). Crenças e esperança
possuem a capacidade de influenciar o bem-estar físico, emocional e espiritual
da mulher e familiares.
148

Sentimentos Vivenciados pela Mulher com


Diagnóstico de Câncer de Mama

O luto pelo câncer é um processo normal, adaptável e necessário, caracte-


rizado por um primeiro período em que um sentimento ou estado de perturba-
ção (atordoamento) e negação podem aparecer. É comum ouvir das pacientes:
“isso não pode estar acontecendo comigo, devem ter errado”. Muitos desejam
que seja apenas “um pesadelo ruim, é terrível”.
Neste processo, há momentos que são vividos com maior intensidade,
como nos momentos de início do tratamento, caracterizado por muito medo
e incerteza, sendo em alguns casos vivido como verdadeiro terror, às vezes
chegando até ser paralisante. O medo, como mencionado, é uma das emoções
que geralmente acompanham todo o tratamento e mesmo além deste. Medo de
efeitos colaterais, reações familiares, sociais e de trabalho, mudanças na vida
sexual, quando enfrentam seus próprios receios de perda ou mudança na identi-
dade pessoal e corporal, sendo comum não saber com certeza o que vai acontecer
com sua própria existência e até mesmo com a possibilidade de recidiva após o
término do tratamento. É incomum que a paciente seja mais emocionalmente
instável, o que se traduz em tristeza, tristeza e mudanças no nível emocional.
Podendo ser acompanhado por ansiedade, angústia, sentimento de desamparo
e desesperança, que muitas vezes é confundida com depressão clínica.
Muitas vezes o paciente com câncer pode sentir muita raiva, além da
sensação de solidão. Podem apresentar uma certa tendência ao isolamento, por
incerteza e insegurança. E não é estranho ouvir da família do paciente, que ele
é muito irritado. Estes últimos são manifestações de a raiva e frustração que
vem de estar sob pressão ter uma doença crônica tão complexa quanto o câncer.
A presença de sofrimento aumentado na paciente com câncer está associada
a um grande número de pontos negativos, incluindo baixa adesão ao tratamento
médico, pouca satisfação com os cuidados de saúde e baixa qualidade de vida.
Além disso, é difícil diagnosticar angústia em tempo de levar a um tratamento
psicológico e/ou farmacológico adequados, podendo assim, proporcionar melho-
rias importantes no bem-estar da paciente (Burgess et al., 2005).
O sofrimento excessivo ou sua má gestão pode trazer distúrbios psiquiá-
tricos importantes que interferem na qualidade de vida da paciente e impactar
visivelmente o processo de tratamento e adaptação a novos desafios vitais
impostos pela experiência do câncer. A população de câncer é significati-
vamente mais prevalente nos Transtornos Depressivos em contraste com a
população normal, havendo algumas diferenças relevantes de acordo com a
idade, sexo e tipo de câncer (Robert, Álvares, & Valdivieso, 2013).
A partir do diagnóstico confirmado, a doença pode causar impactos de
diferentes formas à paciente em relação à forma de encarar a doença. Grande
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 149

parte dos casos diagnosticados gera sentimentos de medo e de vergonha e faz


com que a mulher tente ocultar a doença do ambiente social, muitas vezes,
escondendo o diagnóstico ou adiando a revelação pública de sua condição
(Scorsolini-Comin, Santos, & Souza, 2009).
No curso da doença oncológica, a paciente vive um inevitável processo
de luto, entendendo o luto como o processo de adaptação a uma série de per-
das, não apenas relacionadas à saúde, mas também, relacionado à perda de
estabilidade e segurança, perda da rotina e da vida cotidiana, perda do papel
que costumava ter dentro da família, do mundo do trabalho ou social, perda
de controle, entre outros. Desta forma, portanto, é importante destacar que a
perda de controle, pode se tornar uma das perdas mais desestabilizadoras e
desestruturais no ser humano (Robert, Álvares, & Valdivieso, 2013).
Pontuado como a doença que incide sobre um dos símbolos do corpo,
relacionado à sexualidade, sensualidade e maternidade, compromete, além da
condição física, a saúde mental (Pelegrini, Cerqueira, & Peres, 2008). O diag-
nóstico de câncer de mama interfere no desenvolvimento emocional, social
e profissional da mulher (Ferlay et al., 2015; Ramos & Patrão, 2015). Assim,
ele vem acompanhado de fatores estressores que transformam a patologia em
uma vivência traumática, podendo desencadear sintomatologias de ansiedade
e depressão (Hansen, Silva, & Rudnicki, 2015). Em estudo de Cordova et al.
(2001), composto por uma amostra de 70 mulheres com câncer de mama, 61%
referiu perceber o diagnóstico como um evento estressor traumático. Em seu
estudo, a partir de uma amostra de 746 mulheres, Lo-Fo-Wong et al. (2016)
encontraram que 41% das participantes referiu experimentar sentimentos de
aflição, seis meses após o diagnóstico e 32%, após 15 meses.
As intervenções propostas pela Psicologia, desde seu início, através da
clínica, estiveram sempre focadas nos aspectos negativos e patológicos do
diagnóstico. Entretanto, cada vez mais, a literatura vem explorando as inter-
venções interligadas aos aspectos positivos. Estudos na linha da Psicologia
Positiva têm direcionado seu foco de atenção a diferentes populações e con-
textos, mas é, em especial, no campo da reabilitação de doenças que têm
encontrado resultados mais efetivos (Sheldon & King, 2001).
Traumas são inesperados e estão fora do controle. Muitos sobreviven-
tes são assombrados pelas cenas do ocorrido pelo resto de suas vidas. O
entendimento de crescimento pós-traumático não nega esse fato. Porém, ele
reconhece que há um outro lado na moeda, a dor também pode representar
novas perspectivas (Ramos & Patrão, 2015; Rudnicki, 2020).
A maioria dos estudos mostra dados e exemplos de um viés negativo que
permeia grande parte da psicologia teórica. É importante que os psicólogos
tentem cultivar esta perspectiva mais apreciativa da natureza humana. Tal fato
limita a compreensão sobre o funcionamento humano típico e bem-sucedido
150

(Sheldon & King, 2001). A abordagem da Psicologia Positiva busca estudar o


desenvolvimento da força pessoal, o incentivo de sentimentos positivos, bem-
-estar, satisfação com a vida e crescimento pessoal. As abordagens que buscam
desenvolver crescimento pós-traumático (CPT) se encontram neste grupo.
Acontecimentos adversos, incontroláveis e imprevisíveis, as crises, trau-
mas ou eventos estressores, estão presentes na vida de todo ser humano. Carac-
teriza-se um trauma quando a resposta é dada por um medo intenso ou uma
sensação de impotência (Martins-Monteverde, Padovan, & Juruena, 2017).
A forma como cada pessoa encara a vivência de um evento traumático
é pessoal, subjetiva (Madeira, 2013). Mudanças positivas, após uma adver-
sidade, já há algum tempo são reconhecidas em diversas áreas, como em
casos de câncer, violência física e sexual, em acidentes de aviação, catástrofes
naturais, nas doenças crônicas, entre outros. Estas mudanças partilham o fator
comum de luta contra a adversidade.
É através deste processo de luta que as mudanças podem ocorrer e levar
o indivíduo a um nível mais elevado de funcionamento do que aquele exis-
tente antes do acontecimento (Joseph & Linley, 2012). Desta forma, carac-
teriza-se o CPT, trazendo oportunidades para crescer através da dor e abrir
novos horizontes, assumindo uma nova perspectiva na vida e desenvolvendo
a perseverança através das dificuldades (Rudnicki, 2020).
O CPT é um dos vários conceitos que estuda as mudanças positivas e
aprendizagens realizadas a partir das experiências consideradas negativas. É
uma mudança positiva resultante da vivência de uma situação percebida como
difícil ou traumática, que desestrutura intensamente os esquemas mentais
fundamentais (Tedeschi & Calhoun, 2004).
O processo cognitivo inicia com a vivência de algum evento que abala
o sistema de crenças centrais da pessoa. Desta forma, o indivíduo irá dispor
de aspectos próprios que interferem na possibilidade de desenvolvimento de
CPT como, por exemplo, espiritualidade e traços como otimismo. A partir
destes, a pessoa irá usar diferentes processos para lidar com a situação, como
o apoio social e as estratégias de coping, para assim, manejar com o estresse
e rever suas crenças (Danhauer et al., 2013).
No que se refere a vivência de um evento traumático, Cann, Calhoun e
Tedeschi (2010) constataram que ela pode levar o indivíduo a reexaminar os
elementos principais das suas crenças de visão de mundo. Quanto maior a
necessidade de reexaminar as crenças, maior a probabilidade de experienciar
crescimento após o trauma (Triplett, Tedeschi, Cann, Calhoun, & Reeve, 2012;
Medeiros, Fonseca, Brito, Castro, & Serra, 2016).
Estudo de Wortman e Silver (1989) mostra que um grande número de
pessoas que sofre uma perda irreparável não se deprime e que as reações
intensas de luta e sofrimento não são inevitáveis e a sua ausência não significa
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 151

necessariamente que exista ou vá existir alguma perturbação. Assim, elimina


a ideia tradicional de que uma experiência traumática seria inevitavelmente
desestabilizadora para a pessoa, passando-se a admitir que não se deve esperar
que todas as pessoas, frente a situações extremas tenham reações iguais. Frente
à experiência traumática as reações das pessoas podem variar num contínuo
e adotar diferentes formas (Vázquez, Castilla, & Hervás, 2008).

Crescimento Pós-Traumático

Como um acontecimento traumático, o diagnóstico de um câncer se


constitui em experiência de choque emocional, para o qual a pessoa pode não
ter obtido preparação psicológica prévia e, consequentemente, não percebe os
recursos necessários para lhe fazer frente. Desta forma, compreende-se que o
confronto com um acontecimento traumático como este, pode gerar intenso
estresse e eclodir em respostas emocionais negativas, como ansiedade, humor
deprimido, entre outros (Silva, Moreira, Pinto, Souza, & Canavarro, 2009).
Alterações positivas foram caracterizadas na literatura, por meio de vários
conceitos, entre eles, o crescimento pós-traumático, crescimento relacionado
ao estresse, os benefícios percebidos, mudanças psicológicas positivas, flo-
rescimento, ajuste positivo, adaptação positiva, entre outros (Joseph & Lin-
ley, 2004; Tedeschi & Calhoun, 2004).
Ainda que a experiência de um câncer possa ter impactos físicos e psico-
lógicos negativos substanciais, existem algumas pessoas que veem aspectos
desta experiência como positivo ou benéfico. A literatura tem mostrado que
a exposição a um acontecimento traumático não precipita necessariamente
uma constelação significativa de sintomas negativos, a ponto de se constituir
como uma perturbação psiquiátrica (Silva et al., 2009; Rudnicki, 2020).
Muitos pacientes relatam melhores recursos pessoais, mais prudên-
cia, relações mais próximas com outros e mudanças nas prioridades de vida
após a experiência do câncer (Cordova, Cunningham, Carlson, & Andryko-
wski, 2001). As mudanças positivas percebidas no confronto com o aconteci-
mento traumático, como a doença oncológica, o Crescimento Pós-Traumático
(CPT) (Tedeschi & Calhoun, 1996; 2004), é definido como a percepção de
mudanças positivas, resultante dos esforços individuais das formas de lidar/
enfrentar (coping) uma situação de crise.
O CPT​ é a construção mais usada para descrever as mudanças positi-
vas experimentadas como resultado de esforços psicológicos e cognitivos
realizados, cuja finalidade é lidar com circunstâncias difíceis (Calhoun &
Tedeschi, 2006). Conforme descrito pelos mesmos autores (2004), é a luta
do indivíduo com sua nova realidade, com o saldo do trauma, sendo decisivo
para determinar a extensão em que ocorre o CPT.
152

O estresse do acontecimento não produz necessariamente CPT, mas é


necessário que o sujeito entenda o acontecimento como estressante ou como
uma ameaça ao seu bem-estar biopsicossocial para que, como sobrevivente,
se envolva em estratégias de coping eficazes para lidar com o acontecimento e
para reestabelecer o equilíbrio, que foi afetado pelo choque do acontecimento
(Cann et al., 2011; Calhoun & Tedeschi, 2006).
A existência de CPT não é o regresso ao ponto inicial. É diferenciado
de resiliência, é uma experiência de melhoria do funcionamento psicoló-
gico, principalmente por proporcionar alterações intensas de vida e relevantes
expressões comportamentais (Silva et al., 2009; Tedeschi & Calhoun, 2004).
A experiência de CPT é um processo e um resultado, que ocorrem simulta-
neamente (Tedeschi & Calhoun, 2004).
Ele corre concomitantemente às tentativas ou esforços de adaptação às
situações de vida indutoras de elevados níveis de estresse e não como con-
sequência dos acontecimentos por si só. É um fenômeno que, mais do que a
exclusiva integração de novos dados nos esquemas preexistentes (assimilação),
requer um processo de transformação das estruturas cognitivas anteriores, de
forma a incorporar a nova informação relacionada com a situação traumática
(acomodação). Este processo acontece à medida que a pessoa se envolve
em estratégias (coping) para lidar com suas emoções negativas associadas
ao acontecimento e inicia a processar cognitivamente a situação traumática
(Silva et al., 2009). Para além das estratégias de coping, no processo cognitivo
da experiência traumática existem Dois fatores fundamentais e centrais no
desenvolvimento de CPT: a) reconstrução de crenças centrais; b) ruminação
(Cann et al., 2010; 2011).
Após a percepção de estresse subsequente ao confronto com o aconteci-
mento traumático é que vai ocorrer o rompimento de crenças centrais. Estas
são definidas como um conjunto de pressupostos-base sobre si mesmo, os
outros e o mundo, utilizados pelo sujeito para definir a priori os seus com-
portamentos e o seu lugar no mundo (Janoff-Bulman, 2006). São as crenças
centrais que permitem conferir alguma previsibilidade e certeza ao dia a dia
da pessoa. Após o trauma, tudo o que é previamente estabelecido é rompido e
questionado. Desenvolve-se, então, a necessidade de reestruturar e reconstruir
cognitivamente suas crenças centrais de modo a reestabelecer o equilíbrio
biopsicossocial (Cann et al., 2010). Assim, a pessoa se envolve no processo
de ruminação cognitiva sobre o acontecimento.
A ruminação é definida como um conjunto de pensamentos repetitivos
relacionados com determinada experiência estressante ou preocupante (Cann
et al., 2011), podendo ser intrusiva ou deliberada. A primeira define-se como
um conjunto de pensamentos de natureza estressante e negativa, que surge
de modo automático, sem a permissão do sujeito. Tendencialmente ocorre no
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 153

período mais próximo do acontecimento traumático, uma vez que se relaciona


com os esforços individuais em lidar com o impacto emocional da experiência
traumática (Cann et al., 2011).
De outra forma, a ruminação deliberada é definida como um conjunto de
pensamentos de natureza positiva e construtiva, sendo que, o sujeito envolve-
-se deliberadamente em tentativas de encontrar propósito e significado para
o acontecimento traumático (Cann et al., 2011). Este estilo de ruminação é
posterior aos pensamentos intrusivos; ocorre tendencialmente mais tarde no
tempo e à medida que aumenta a adaptação ao trauma.
Assim sendo, pode-se entender ruminação como um tipo característico
de pensamento relacionado à estado depressivo e/ou ansioso, frequentemente
manifestados nos pacientes oncológicos (Zanon & Teixeira, 2006). Pode ser
entendida como uma estratégia de regulação emocional, apresentando-se
como preditora significativa do CPT.
É no âmbito do processo cognitivo, restaurando as crenças centrais e
atribuindo significado à experiência, que o sujeito começa a compreender que
esse experimento traumático pode traduzir-se, também, em benefício para
diversas áreas da vida (Calhoun & Tedeschi, 2004). Desta forma, a mudança
de crenças centrais e a ruminação deliberada são reconhecidos como fortes
preditores de CPT, de acordo com o modelo sócio-cognitivo (Calhoun &
Tedeschi, 2006; 2013).
Assim sendo, os benefícios percebidos após o trauma estão diretamente
associados à busca de significado em meio à incerteza e à percepção de vulne-
rabilidade (Calhoun et al., 2000). Um processo reparador, uma reestruturação
em nível cognitivo que auxilia a encontrar explicações para o ocorrido.
Costa e Gil (2008) referem que tanto o processamento cognitivo como o
estilo de enfrentamento contribuem para a ocorrência de crescimento, asso-
ciado às experiências estressantes, embora os recursos de personalidade e/ou
aspectos socioculturais também devem ser considerados importantes contri-
buições. Tanto aspectos cognitivos como emocionais contribuem para o CPT
após um diagnóstico de câncer.
Em nível cognitivo, a busca por significados para a doença possibilita a
realização de uma avaliação das causas que podem ter levado ao seu desen-
volvimento. Por este ângulo, facilitar a expressão emocional fomenta o CPT;
porém, o objetivo sempre será oferecer ao paciente um espaço e um tempo para
depositar suas preocupações frente ao seu diagnóstico e não de racionalizar
seu mal-estar (Ramos & Patrão, 2015).
O CPT é um processo dinâmico e complexo que envolve vários fatores
em seu desenvolvimento (Taku, Cann, Tedeschi, & Calhoun, 2015). Fatores
sociodemográficos, como, idade, gênero, escolaridade; os clínicos ou relacio-
nados com o acontecimento, como o tempo desde o diagnóstico, a severidade
154

da doença, o estresse percebido; as características de personalidade, como


extroversão e otimismo; os fatores cognitivos, tais como, a ruminação e o
processo cognitivo, e os fatores sociais, como o suporte social e a expressão
emocional (Taku et al., 2015).
Os preditores de CPT têm sido estudados em diversos tipos de cân-
cer, sendo o de mama, aquele com um maior número de estudos (Shand,
Cowlishaw, Brooker, Burney, & Ricciardelli, 2015). A metanálise de Shand
et al. (2015) mostrou que, em doentes com câncer, o CPT associa-se positiva-
mente ao suporte social percebido, otimismo, espiritualidade, coping religioso
e tempo desde o diagnóstico. Esta última variável mantém algumas inconsis-
tências quanto à relação que estabelece com o CPT Contrariamente, outras
variáveis estabelecem uma associação significativa negativa com o CPT, como
a depressão, ansiedade e o estresse percebido. Apresenta-se, também, negati-
vamente correlacionado com idade e o gênero, ou seja, mulheres e indivíduos
com menor idade apresentam níveis mais elevados de CPT.

Crescimento Pós-Traumático, Instrumentos


de Medida e Verbalizações

Existe uma variedade de instrumentos que se propõem a avaliar o cresci-


mento decorrente do enfrentamento de situações adversas, entre eles: Changes
in Outlook Questionnaire (Joseph, Williams, & Yule, 1993); Stress Related
Growth Scale (Park, Cohen, & Murch, 1996); Perceived Benefit Scale (McMil-
len & Fisher, 1998), além do Posttraumatic Growth Inventory (Tedeschi &
Calhoun, 1996). Este último tem sido o mais comumente utilizado para mensu-
rar o crescimento proveniente do enfrentamento de situações adversas (Hanley,
Peterson, Canto, & Garland, 2015; Wu, Leung, Cho, & Law, 2016), sendo
considerado, atualmente, o instrumento padrão para medir esse tipo de fenô-
meno (Steffens & Michael, 2015). Além de sua presença em estudos america-
nos, o instrumento tem sido utilizado em diversos países ao redor do mundo,
como Inglaterra (Linley & Andrews, 2007), Turquia (Dirik & Karanci, 2008),
China (Ho, Chan, & Ho, 2004), Holanda (Jaarsma, Pool, Sanderman, & Ran-
chor, 2006), Bósnia (Powell, Rosner, Butollo, Tedeschi, & Calhoun, 2003),
Austrália (Morris, Shakespeare-Finch, Rieck, & Newbery, 2005), Hungria
(Konkolÿ Thege, Kovács, & Balog, 2014), Itália (Prati & Pietrantoni, 2014),
Portugal (Resende, Sendas, & Maia, 2008), Espanha (Weiss, 2006) e França
(Cadell, Suarez, & Hemsworth, 2015).
Na versão original (Tedeschi & Calhoun, 1996), o Inventário é composto
por cinco dimensões: 1) relacionamento com outros; 2) novas possibilidades;
3) força pessoal; 4) mudança espiritual e 5) apreciação da vida (Calhoun &
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 155

Tedeschi, 2006; Tedeschi & Calhoun, 2004). Conforme os autores, a dimensão


relacionamento com os outros refere-se à valorização dos relacionamentos
interpessoais, à percepção de quem realmente importa na vida, à busca por um
grau maior de intimidade e profundidade nos relacionamentos ou mesmo ao
desenvolvimento de um nível de compaixão maior pelo sofrimento de outras
pessoas. Quanto a dimensão, novas possibilidades, esta refere-se à identifica-
ção de novos caminhos de vida, onde o indivíduo pode decidir lutar por algo
ou se engajar em uma determinada causa que passou a fazer sentido para ele.
Força pessoal refere-se a um aumento na percepção das próprias potenciali-
dades do indivíduo, que pode sentir-se mais preparado para enfrentar outros
desafios ou perceber-se tendo características positivas que desconhecia possuir.
Mudança espiritual refere-se ao desenvolvimento do interesse e engajamento
em questões existenciais, espirituais ou religiosas. Apreciação pela vida, em
geral, refere-se à valorização das pequenas alegrias cotidianas e à alteração
das prioridades em relação ao que realmente importa na vida.
O crescimento pós-traumático é um campo de estudo relativamente novo,
mas as descobertas já existentes são certamente instigantes. Especialistas da
área mostram que as pessoas podem crescer por meio da dor (Tedeschi &
Calhoun, 2004). Este crescimento pode acontecer na sequência de qualquer
acontecimento traumático.
Após o diagnóstico de um câncer de mama, por exemplo, compreendido
como aquilo que mudou a vida, a mulher pode perceber uma mudança nas suas
crenças e princípios norteadores de vida. Todos os dias acordamos pensando
que o amanhã vai ser igual e que nosso dia-a-dia vai seguir de acordo com
os princípios de segurança, estabilidade e conforto, mas quando ocorre um
acontecimento traumático, como o diagnóstico de um câncer, esses princípios
passam a ser desafiados (Rudnicki, 2020).
S. I., 45 anos, diz: “Não tive medo, disse que ia enfrentar a doença e tô
aqui até hoje.” L., 36 anos conta: “Tenho três filhos pra criar, então eu tive
que ser forte e enfrentar o câncer pra poder criar os meus filhos, não podia
deixar eles sozinhos no mundo.” Enquanto C., 44 anos verbaliza: “... eu me
levantei, tive coragem pra tratar a doença ... assim eu fiz. Eu já tô doente
mesmo, então agora tenho que me cuidar pra viver mais.”
Pode-se observar que a vida passa a ser olhada de forma diferente, pas-
sando a perceber que amanhã pode ser diferente; que de um dia para o outro,
tudo pode mudar, que a vida é imprevisível e que sou vulnerável a essa
imprevisibilidade e é através desta cognição que pode ocorrer o CPT. Ou seja,
depois que a mulher com câncer de mama percebe esta desestabilização da
vida, todo o processo (cognitivo, individual e social) subsequente – o pensar
156

sobre a doença, os pensamentos negativos e positivos, as relações que esta-


belece com os outros – pode levar a que experimente este CPT.
O acontecimento do câncer de mama enquanto evento marcante na
vida das mulheres é definido por sua intensidade e permanência, desde
experiências de vida, sentimentos negativos ou positivos (Grzybowshi,
Schmidt, & Borges, 2008).
A paciente I. (36 anos) mostrou o que aprendeu com sua doença: “Sofri!
Mas não morri, e acabou que esse mesmo sofrimento até me fez crescer.
Como eu trabalho na área da saúde, eu acredito que aprendi com a minha
doença a ajudar outras pessoas que, como eu, tinham câncer... ajudava essas
pessoas a não se desesperarem muito, mas aprenderem a viver com o que
tinham, falando com elas sobre o câncer e sobre o apoio todo que tinham.”
Pode-se entender que desse modo, a ameaça de desordem e instabilidade que
o câncer pode provocar perpassa por experiências compartilhados com outros
com os quais se vive, dialogando, negociando e debatendo para produzir
definições e modos de se manejo da doença (Ramos et al., 2012).
Outrossim, o CPT pode manifestar-se ou não, podendo aparecer num
aspeto ou em vários. O aspecto mais frequentemente relatado na literatura
é a clarificação das relações, torna-se claro para as mulheres as relações
investidas de ambas as partes, sejam com os amigos, com a família ou
com o parceiro, e as que não são.
“Tive muito apoio da minha família, eles não me deixavam ficar triste.
A minha família também me ajudou muito. Eu sou a menor dos irmãos,
eles me tratam como pequena ainda, cuidam muito bem de mim, graças
a Deus.” (D., 51 anos).
“Agora, depois do câncer eu levo uma vida de rainha! Não trabalho
mais, meu marido, meus filhos e noras estão sempre por perto, não me
deixam fazer nada. Se não fosse por eles, acho que eu não teria sido tão
forte.” (J., 55 anos)
“Eu não tenho mais força no braço pra trabalhar, mas eu não me
sinto uma inútil, faço o que eu posso e respeito isso, e minha família tá
sempre comigo, isso tá sendo muito importante.” (V., 69 anos).
Outro aspecto está relacionado a uma maior valorização da vida,
apreciar melhor cada dia e perceber o que é realmente importante para
si. E ainda a percepção do seu valor pessoal, onde passa a crer que, “se
fui capaz de lutar contra esta doença, sou capaz de muito mais ... só meu
cabelo que caiu, aí raspei logo tudo, cabelo cresce de novo, isso não seria
um problema.” (Paciente D., 55 anos).
“... depois que comecei a quimioterapia, que por sinal é muito ruim,
fico com muito mal-estar [...] meu cabelo caiu todinho, fiquei triste porque
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 157

eu tinha o cabelo bonito, era bem comprido, mas fazer o que, não é?
Quando acabou ele cresceu de novo” (P., 38 anos).
Importante pontuar que nem toda pessoa que passa por um aconteci-
mento traumático, como o câncer de mama, experiencia o crescimento. Esta
experiência é uma transformação pessoal, não se trata apenas de resiliência
para conseguir enfrentar o trauma, mas trata de conseguir transformar-se
a partir deste.

Considerações Finais

Uma visão abrangente do paciente com câncer significa aumento da cer-


teza de incluir o fator psicológico como um aspecto relevante no fenômeno da
doença. O câncer transcende a aparência somática se tornando fundamental
na experiência de vida e morte os aspectos emocionais associados.
Estudos que retratam os significados do câncer de mama podem repre-
sentar novas possibilidades de entendimento e compreensão de comportamen-
tos, sentimentos e comportamentos vinculados a esta experiência vivida. É
evidente também que os significados do câncer e seu tratamento são bastante
complexos, estando esta realidade sempre em movimento.
À medida que a pessoa começa a se sentir mais segura e tranquila, vai
reconhecendo os processos envolvidos no tratamento, as reações de seu corpo
frente as drogas, ao mesmo tempo, vai derrubando muitos dos mitos em torno
do diagnóstico do câncer, encontrando então, mais possibilidades para se
adaptar ao tratamento e à doença.
Para finalizar, aponta-se a necessidade de um olhar sensível na direção
dessas mulheres, bem como a implementação de estratégias de manejo capazes
de romper com a fragmentação dos processos de trabalho que subdividem o
cuidado em saúde. Percebe-se a importância da atividade de uma psicologia
comprometida com a saúde e o cuidar de pessoas, nas diversas etapas de sua
vida. Espera-se que esse capítulo possa contribuir efetivamente para mudanças
de práticas em saúde.
158

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CAPÍTULO 10
ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO
(COPING) DE DOENÇA EM SITUAÇÃO
DE TRATAMENTO HOSPITALAR
Grazielle Rocha França

Este capítulo é uma adaptação de um trabalho de conclusão de curso inti-


tulado – o Processo de Interação Entre Mãe e Filho com Câncer em Situação
de Tratamento Hospitalar.
A pesquisa realizada visou compreender como acontece o processo de
interação e integração entre mãe e filho com câncer em situação de tratamento
hospitalar através da análise de estratégias de enfrentamento da mãe frente à
doença da criança. Ainda, identificar as mudanças da vida cotidiana materna
decorrentes de sua permanência no hospital para acompanhar seu filho.
Participou deste estudo a mãe de um menino com câncer (Tumor de
Wilms), 35 anos, solteira, faxineira, nível de escolaridade ensino fundamental
completo, selecionada entre as mães do setor de Oncologia, em um hospital
especializado no atendimento de crianças e adolescentes. A seleção da parti-
cipante ficou sob a responsabilidade da psicóloga do setor de Oncologia da
instituição. Gostaríamos que fosse alguém em acompanhamento psicológico.
Em comum acordo com a mãe iniciei a coleta de dados em duas fases
distintas: A Fase I, coleta de dados inicial, realizada no terceiro dia da quimio-
terapia da criança. Nesta fase, mãe e filho encontravam-se no ambulatório do
setor de Oncologia. A Fase II realizada 19 dias após a Fase I, com a mesma
mãe, no oitavo dia de internação da criança, devido a leucopenia (redução
do número de leucócitos na concentração sanguínea). Nesta fase, mãe e filho
encontravam-se no setor de isolamento.
As fases da coleta de dados descritas acima ocorreram de acordo com a
estruturação do tratamento da criança (quimioterapia realizada de 21 em 21
dias). Além disso, levou-se em conta a dinâmica da entrevista estruturada,
composta de quatro etapas relacionadas à vida da criança, à dinâmica familiar,
aos aspectos de interação existentes entre mãe e filho na época da gestação,
nascimento e desenvolvimento, e aos aspectos de interação entre eles após o
diagnóstico de câncer.
A revelação de um câncer na criança explode no seio familiar. Desde o
momento em que o diagnóstico é comunicado à família, profundas alterações
166

ocorrem nela, afetando não só a unidade familiar, como também, o relaciona-


mento de seus membros com as outras pessoas (Valle, 1997).
A época do diagnóstico é o período em que aparecem incertezas e sen-
timentos de angústia diante da possibilidade de morte. Geralmente, os pais
não acreditam no diagnóstico, questionam-no, procuram outros médicos e
realizam em suas crianças novos exames, na busca de confirmação da doença
e na esperança de reversão da realidade.
Uma grande dificuldade dos pais na aceitação do diagnóstico de câncer
em seus filhos, através da percepção a respeito da gravidade da doença, das
manifestações de tristeza, das dificuldades em compreender a doença e o
tratamento, e do sofrimento demonstrado pela criança (Valle, 1997).
Há muitas famílias que permanecem intactas enquanto as crianças estão
se desenvolvendo bem, mas que são incapazes de suportar a presença de uma
criança doente (Winnicott, 1993).
Uma das atitudes mais comuns da família é superproteger a criança. Por
medo de perdê-la a família passa a tratá-la de forma diferente da qual vinha
sendo tratada até então. Há pais que não conseguem controlar a sua angústia
diante da possibilidade de recaída e a todo instante têm a necessidade de tocar
a criança, observá-la, mesmo enquanto ela dorme (Valle, 1997).
Por causa das atitudes dos pais, muitas vezes as crianças se transfor-
mam em pequenas tiranas, cheias de manias e vontades, egoístas e ciumentas
(Valle, 1997). Esses tipos de atitudes podem afetar a relação entre os membros
da família, principalmente quando há irmãos envolvidos (Valle, 1997). Nesta
situação, quase sempre, os irmãos se tornam agressivos com os pais, sentem
raiva, ciúmes, revoltando-se com a proteção despendida ao filho doente.
As atitudes dos membros das famílias dependem muitas vezes do modo
como eles percebem o câncer, encaram-no, e reagem à doença. Em outras
palavras, dependem das estratégias de enfrentamento que cada membro fami-
liar dispõe para lidar com o câncer.
O coping é entendido como um conjunto de estratégias de enfrentamento
que as pessoas utilizam para a adaptação em situações adversas (Antonia-
zzi, 1998). É dividido em duas categorias funcionais: coping focalizado no
problema e coping focalizado na emoção (Folkman & Lazarus, 1980).
O coping focalizado na emoção é definido como um esforço para regular
o estado emocional que é associado ao estresse. A função desta estratégia é de
reduzir a sensação física desagradável que um estado de estresse proporciona
(Folkman & Lazarus, 1980). O coping relacionado ao problema consiste no
esforço para atuar na situação que deu origem ao estresse, tentando mudá-la
(Folkman & Lazarus, 1980).
Na perspectiva dos autores, coping é definido como um conjunto de esfor-
ços, cognitivos e comportamentais, utilizados pelos indivíduos com o objetivo de
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 167

lidar com as demandas específicas, internas ou externas, que surgem em situação


de stress e são avaliadas como sobrecarregando ou excedendo seus recursos
pessoais (Folkman & Lazarus, 1980). Tal definição implica que as estratégias de
coping são ações deliberadas que podem ser aprendidas, usadas e descartadas.
Os quatro conceitos que englobam o coping são (Folkman & Laza-
rus, 1980):
(a) coping é um processo ou uma interação que se dá entre o indivíduo
e o meio; (b) sua função é administrar a situação estressora, ao invés de con-
trolá-la e dominá-la; (c) os processos de coping pressupõem a noção de ava-
liação, ou seja, como o fenômeno é percebido, interpretado e cognitivamente
representado na mente do indivíduo; (d) o processo de coping se constitui em
uma mobilização de esforço, através do qual os indivíduos irão empreender
esforços cognitivos e comportamentais para administrar as demandas internas
ou externas que surgem da sua interação com o ambiente.
A disponibilidade de recursos afeta a avaliação do evento ou situação
estressante, e determina que estratégias de enfrentamento a pessoa vai usar
(Antoniazzi, 1998). Segundo o autor, as pessoas utilizam recursos pessoais e
sócio ecológicos para lidar com o evento estressor.
Os recursos pessoais de coping são constituídos por variáveis físicas e
psicológicas que incluem a saúde física, moral, crenças ideológicas, expe-
riências previas de coping e inteligência, e outras características pessoais
(Antoniazzi, 1998).
Quanto aos recursos sócio ecológicos, estes são encontrados no ambiente
do indivíduo ou em seu contexto social, incluem relacionamento conjugal,
características familiares, redes sociais, recursos funcionais ou práticos e
circunstâncias econômicas (Antoniazzi, 1998).
Recentemente, foi apresentada uma terceira estratégia de coping focali-
zada nas relações interpessoais, na qual o sujeito busca apoio nas pessoas do
seu círculo social para a resolução da situação estressante (Antoniazzi, 1998).
No caso específico da presente pesquisa, toda a gama de situações enfren-
tadas pela família, e a mãe, da criança com câncer implica necessariamente
em novas adaptações por parte de todos os membros. Este processo adap-
tativo gera uma grande quantidade de estresse e por consequência implica
em estratégias de enfrentamento que podem repercutir de modo positivo ou
negativo sobre o tratamento da criança. Uma vez que a mãe, geralmente, é a
principal cuidadora e acompanhante da criança em situação de tratamento e/
ou internação hospitalar suas estratégias de enfrentamento (coping) podem
influenciar significativamente neste processo.
A internação de uma criança em um hospital normalmente traz con-
sigo um de seus pais, que altera sua rotina diária para acompanhar o filho
(Quaglia & Beier, 1997). Segundo as autoras, como consequência, além de
168

todos os sentimentos pertinentes ao momento, insegurança, medo da morte,


desconfiança, surgem problemas de ordem familiar estrutural (Quaglia &
Beier, 1997). Os demais filhos são deixados aos cuidados de terceiros, quando
não deixados a sós; é a empresa empregadora que não aceita o atestado do
filho doente como justificativa para as faltas ao trabalho; há a falta de recursos
financeiros para a alimentação ou transporte; é o hospital que impõe regras e
rotinas que divergem do cotidiano familiar, utilizando termos e procedimen-
tos desconhecidos.
A reação da criança frente à doença depende muito da forma de reação
de seus pais, por isso, cabe ressaltar a importância da participação deles
na hospitalização (Ortiz, 1997). Os vínculos amorosos e a valorização mais
efetiva dos pais junto aos seus filhos facilitam a permanência da criança no
hospital (Ortiz, 1997).
A permanência dos pais ou responsáveis no hospital não deixa que a
criança ou adolescente sintam a perda do ambiente amoroso e dos objetos
mais queridos, como também tendem a minimizar eventuais experiências
incômodas e dolorosas da hospitalização (Carvalho & Ceccin).

Parte 2

O presente subcapítulo tem por objetivo apresentar os dados coletados,


analisá-los e discuti-los simultaneamente levando em conta o processo de
interação entre mãe e filho com câncer em situação de tratamento hospitalar.
Nesta sessão de discussão dos resultados, busquei analisar as estratégias de
enfrentamento da mãe da criança com câncer frente às alterações da vida
cotidiana; bem como, identificar as questões da vida materna cotidiana que
se alteraram com a sua permanência no hospital para o acompanhamento do
seu filho doente.
Após a coleta de dados, os mesmos foram analisados conforme a metodo-
logia qualitativa de pesquisa, por meio do processo de categorização baseado
na análise do discurso. Os dados foram divididos em três categorias compostas
de subcategorias apresentadas a seguir:
A. Categoria: Relação mãe-filho
A. 1 Subcategoria: Diagnóstico e tratamento médicos;
A. 2 Subcategoria: Atitudes da mãe em relação à vida cotidiana da
criança.
B. Categoria: Estratégias de coping
B. 1 Subcategoria: Não responsabilização pela doença;
B. 2 Subcategoria: Esquiva;
B. 3 Subcategoria: Variáveis da personalidade;
B. 4 Subcategoria: Religiosidade;
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 169

B. 5 Subcategoria: Afastamento psicológico.


C Categoria: Mudanças nas questões cotidianas
De acordo com a Resolução número 196/96 sobre pesquisa envolvendo
seres humanos, os participantes das mesmas têm a garantia de sigilo que lhes
assegura a privacidade quanto aos dados confidenciais envolvidos. Para tanto,
para salvaguardar as identidades da participante e de seu filho foram criados
os pseudônimos Juliana e Leonardo.
Conforme o discurso de Juliana, sua gravidez foi normal. Do mesmo
modo, o desenvolvimento de Leonardo ocorreu normalmente, sem episó-
dios merecedores de maiores esclarecimentos. Fora o diagnóstico de câncer
ocorrido quando Leonardo tinha dois anos e dez meses de idade, nenhum
comprometimento físico foi evidenciado.
Juliana tinha 35 anos, solteira, mãe de cinco filhos, residente em Brusque,
casa própria conseguida com a ajuda de familiares, possuía o Ensino Fun-
damental completo, frequentava as igrejas católica e evangélica, e prestava
serviços de doméstica. Foi casada com o pai biológico de Leonardo por seis
anos. A separação entre eles ocorreu porque o marido era toxicômano e alcoo-
lista. Atualmente mantém um outro relacionamento, sendo que seu namorado
cumpre o papel de pai do menino. Em relação a seus familiares, não evidencia
os motivos, mas deixa claro que não se relaciona com eles.

A. Categoria: Relação mãe-filho


A.1 Subcategoria: Diagnóstico e tratamento médicos
Juliana estava ausente quando seu filho passou a apresentar os primeiros
sintomas da doença:
“O pai biológico do Leonardo que percebeu. Eu estava viajando, em São
Paulo, e o Leonardo estava com ele. O Leonardo ficou Dois dias sem fazer
xixi, um dia sem fazer coco. A barriga dele ficou enorme, bem grande. Ele
tinha 39o, 40o graus de febre. Ele começou a puxar a perna, daí, não andou
mais” (Juliana).
Ao saber do diagnóstico de uma doença grave a família passa pelos
mesmos estágios que o paciente, e a forma de enfrentamento vai depender da
estrutura de cada um e da relação entre eles. É frequente surgir perda em vida,
luto antecipado, ambivalência de sentimentos, impotência, culpa e tentativa
de reparação (Amaral, 1994).
A mãe esperou três dias para ver se a febre passava. Durante este tempo,
cuidou dele, sem saber do que se tratava. Após um encaminhamento do pedia-
tra, ela percebeu o que era.
“[...] dei remédio para a febre, fiz chá para ver se o xixi descia. Não des-
ceu. Então, eu esperei até o dia três de janeiro, procurei o hospital. O pediatra
fez Raios-X e ultrassom. Com o ultrassom apareceu uma massa tumoral. O
170

médico disse que era um tumor, só que ele não sabia de que tipo. Daí me
mandaram para cá. Depois me chamaram para ver o resultado e deu que era
Tumor de Wilms” (Juliana).
Desde o diagnóstico os pais, de modo geral, buscam informações sobre
o câncer e o seu tratamento, como se a posse de tais conhecimentos pudesse
ajudá-los a partilhar o mundo da doença com o filho, de adentrar esse mundo,
no sentido de que este se torne familiar para eles, ajudando-os assim, a superar
suas inquietações e conviver melhor com a criança (Valle, 1997). Desejam,
também que essas informações lhe tragam alguma esperança que possa aliviar
sua dor (Valle, 1997).
Dentre as neoplasias malignas localizadas primariamente no rim de crian-
ças, o tumor de Wilms destaca-se como o mais frequente e praticamente o
único crescimento tumoral maligno do rim na infância (Chaves, 1978). Tal
tumor afeta ambos os sexos e rins, entretanto, em apenas 5% dos casos existe
tumor bilateral (Chaves, 1978).
O tumor de Wilms, conhecido como nefroblastoma, pode estar associado
a certas anomalias congênitas, especificamente hemi-hipertrofia congênita
(membros de um lado do corpo maiores que do outro), aniridia congênita
(ausência congênita de íris), síndrome de Beckwiht, anomalias do trato geni-
to-urinário (Chaves, 1978). Conforme o autor, inicialmente, o tumor se apre-
senta como uma massa abdominal assintomática, frequentemente presente por
algum tempo e primeiramente detectada pelos próprios pais (Chaves, 1978).
Os diferentes procedimentos e tratamentos utilizados foram descritos
minuciosamente pela mãe:
“Dia 12 de fevereiro de 2001, eles começaram com a quimio pequena.
Era uma injeção de Oncovin, uma vez por semana, de 15 em 15 dias, por Dois
meses. Daí, O Leonardo fez os exames tudo de novo, e deu que o tumor havia
aumentado. Era de 8,5cm X 5cm. Ficou 13cm X 7cm. O rim dele era de 9 cm.
Eles mudaram a quimio. Era a quimio pesada. Eles chamam de círculo: quatro
vezes de cinco dias. Novamente, ele fez todos os exames, e deu que a quimio
diminuiu 30% do tumor. Eu já tinha visto que não tinha diminuído nada. Daí,
eles resolveram operar. Operou e agora, um ano de quimio”[...] (Juliana).
O tumor de Wilms é uma neoplasia que apresenta uma grande proclivi-
dade para o crescimento e para metastatizar em curto prazo (Chaves, 1978).
Tais tumores podem ser classificados em: T (tumor primário - intra-renal),
T1 (tumor unilateral - < = 80 cm2 do rim – além da cápsula), T2 (tumor uni-
lateral - > 80 cm2 do rim – além da cápsula), T3 (tumor unilateral roto), e T4
(tumores bilaterais) (Chaves, 1978).
O tratamento quimioterápico pode ser empregado antes dos procedimen-
tos cirúrgicos ou radioterápicos. Após as cirurgias, o tratamento é utilizado
para prevenir recidiva ou metástases (Chaves, 1978). Este tratamento pode
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 171

levar a cura nos linfomas, leucemias, tumores de ovários e testículos, entre


outros. Naqueles casos em que a cura é impossível, a quimioterapia é utilizada
como paliativo (Chaves, 1978).
Para o tumor de Wilms, como tratamento, a quimioterapia é realizada
geralmente antes da cirurgia (Voute, 1991.) Após um período de quatro a oito
semanas, o tumor é ressecado e o estádio da doença é determinado. Decisões
sobre o uso de terapia adicional (quimioterapia ou radioterapia) dependem
do estádio (estádios três e quatro com linfonodos positivos precisam de
radioterapia) (Voute, 1991). A radioterapia é necessária quando há doença
residual (Voute, 1991).
No tumor de Wilms, a quimioterapia consiste, para todos os pacientes, em
uma combinação de vincristina e actinomicina D. O tratamento quimioterápico
pode ser de três meses para estádio um e um ano para a doença avançada.
Quando as drogas são administradas antes da cirurgia pode ocorrer a diminui-
ção do tumor, facilitando-a, reduzindo também a morbidade (Voute, 1991).
85% dos pacientes com tumor de Wilms podem ser curados. A ênfase do
tratamento é centrada na possibilidade de cura e na redução da morbidade.
O estadiamento da doença e a análise histológica são essenciais para reduzir
a necessidade de radioterapia e a duração da quimioterapia (Voute, 1991).
No começo do tratamento quimioterápico Juliana permanecia com Leo-
nardo no colo, por causa de seu choro excessivo.
“No começo, o Leonardo incomodava bastante. Gritava, chorava, ber-
rava, queria colo. Agora não. Agora ele não me incomoda mais, fica quietinho.
Já se acostumou. Antes eu andava direto com ele no colo, ele não me deixava
sossegada. Hoje em dia é fácil de lidar com ele. Quem não viu como ele era
antes, acha que agora não é fácil de lidar com ele” (Juliana).
Pelo que foi exposto por Juliana sua dedicação no tratamento de seu filho
foi condizente com as necessidades da criança, não havendo por sua parte um
comprometimento extremo.

A. 2 Subcategoria: Atitudes da mãe em relação à vida cotidiana da criança


Leonardo não sofreu grandes alterações em sua vida depois do diagnós-
tico da doença. Percebo tal fato diante do relato de sua mãe:
“Antes e depois do câncer. A vida dele não modificou. Ele é a mesma pes-
soa. Ele come bem, brinca, pula, mexe em tudo. Ele sempre foi muito sapeca,
corre o dia inteiro. Aqui, todo mundo se admira. Eles dizem que eles nunca
viram uma criança tão forte. Desde que ele começou com a quimio, ele tem
ido para a escola normalmente. Ele nunca faltou porque deu alguma coisa. Ele
só falta, quando está aqui. Aí, as professoras já sabem porque ele está faltando.
Ele só ficou bem mal por uma semana. Ele não comeu nada” (Juliana).
Ainda, sobre o cotidiano do garoto, a mãe dele acrescentou:
172

“A rotina dele não se modificou com a doença. Ele acorda, toma banho e
vai para a aula. Eu vou buscar o Leonardo na hora do almoço. Ele chega em casa
e abre a geladeira, liga a TV. Ultimamente ele só assiste TV. É que faz pouco
tempo que a gente tem TV em casa. Ele sabe tudo sobre as novelas, assiste
Malhação, Coração de Estudante, Desejos de Mulher, até a Jade. Eu digo que
ele está por dentro de tudo. Ele não dorme mais à tarde. Ele vai para o serviço
comigo. Lá ele fica enchendo o saco dos padeiros, ele quer saber tudo” (Juliana).
Salienta-se que Leonardo leva uma vida adequada a sua idade. Além
disso, percebo também que Juliana o deixa levar a mesma vida que ele levava
antes de ter sido diagnosticado com câncer, o que não é muito comum aconte-
cer com crianças doentes, já que seus pais tentam protegê-las demasiadamente.
Uma das atitudes mais comuns por parte da família é a superproteção à
criança. Por medos de diversas ordens, sendo o maior deles o medo da morte,
a família passa a tratar a criança doente de forma diferente da qual vinha sendo
até então: não permite brincadeiras que envolvam maior atividade física, não
a deixa sair sozinha, ir brincar com outros amiguinhos, ir à escola, mesmo
estando em condições (Valle, 1997).
Percebo-se que o relacionamento de Leonardo e Juliana é baseado numa
relação afetuosa. Juliana demonstra-se rígida com ele, apesar da doença. Na
idade que ele se encontra, o controle e as regras são necessários porque tende
a passar rapidamente dos limites. O diagnóstico de câncer não colaborou para
que Juliana o superprotegesse, nem o deixasse livre demasiadamente.
“[...] Hoje ele ainda corre e grita: – Oh! Mãe. Oh! Mãe. É bom saber
que ele gosta da gente, que ele sente falta da gente [...] Eu te falei que ele é
bastante beijoqueiro, vive me beijando e me agarrando” (Juliana).
“[...] Quando eu brigo com ele, quando a coisa está feia para o lado
dele, ele me enche de beijos. Ele fala: – Oh! Mãezinha, mãezinha. Eu sempre
tenho que falar com a voz alta. Tem que falar brava com ele senão eu não
dou conta” (Juliana).
Leonardo é uma criança que quando contrariada, manifesta-se com pro-
vocações físicas e verbais:
“[...] Ele quer me bater. Ele me diz: – Eu não falo mais contigo. Eu não
gosto mais de ti” (Juliana).
As crianças consideradas agressivas evidenciam os seguintes tipos de
comportamento agressivo: elas são más para com os outros, atacam fisica-
mente as pessoas, envolvem-se em brigas, destroem seus pertences, destroem
pertences alheios e ameaçam machucar as pessoas. Esses tipos de comporta-
mentos agressivos são semelhantes aqueles manifestados por Leonardo, de
acordo com o relato de sua mãe (Bee, 1997).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 173

B. Categoria: Estratégias de coping


B. 1 Subcategoria: Não responsabilização pela doença
Nas famílias as acusações mútuas entre os pais pela responsabilidade
da doença, a busca de explicação para essa realidade, tentando atribuir uma
causa ao câncer, procurando nas suas reminiscências que remontam à vida
uterina dos filhos algo que leve à compreensão do aparecimento do mesmo,
são bastante comuns (Valle, 1997). Contudo, percebo que a mãe de Leonardo
também recorreu a vida uterina, porém, ela se exime da culpa do câncer por
ter feito os exames pré-natais necessários para acompanhar o desenvolvimento
do feto, além de ter amamentado Leonardo por um ano e Dois meses. Noto
que Juliana aponta o acompanhamento pré-natal, o exame de ultrassom e a
amamentação como fortes indicativos de suas ações voltadas para uma gra-
videz saudável, e, portanto, para um bebê saudável também.
“Eu sempre me cuidei na gravidez, fiz pré-natal, fiz ultrassom. Ama-
mentei até um ano e Dois meses. Tem gente que diz que é emocional. Tudo é
possível. Eles acham que o Leonardo não nasceu com o tumor, eles não têm
certeza de nada” (Juliana).
A estratégia de enfrentamento – não responsabilização pela doença –
aponta uma das formas que Juliana utiliza para lidar com o câncer de Leonardo.
O processo de enfrentamento é dinâmico e particular a cada etapa
da doença.
O enfrentamento é um conjunto de estratégias para lidar com uma ameaça
iminente (Folkman & Lazarus, 1980). Outra concepção de enfrentamento se
refere como um comportamento instrumental que demonstra a capacidade da
pessoa para resolver problemas decorrentes da exigência e dos objetivos de sua
vida, envolvendo, portanto, o uso de habilidades diversas, técnicas e conheci-
mentos que a pessoa vem adquirindo ao longo de sua vida (Gimenez, 1997).

B. 2 Subcategoria: Esquiva
Em relação ao diagnóstico de câncer, Juliana evidencia sua posição:
“A gente custa a acreditar. Fiquei estranha. Não pensei que era uma coisa
tão grave. Só depois que vim para cá com ele, fazer quimioterapia, que eu vi
que era tão grave” (Juliana).
“Não tinha muita visão. A gente acha que não vai acontecer com a gente,
nem com a família da gente. Nunca procurei saber nada” (Juliana).
Ressalto que Juliana utilizou a negação frente ao impacto causado pelo
diagnóstico de câncer de seu filho como estratégia de enfrentamento.
O impacto do diagnóstico é amenizado pelas chances de cura que lhe são
oferecidas no início do tratamento, levando-a a participar efetivamente de sua
recuperação. Sabe da gravidade da doença e fala de seu medo, da culpa e dor
de não viver mais naturalmente sua vida, uma vez que a doença, no contexto
174

sociocultural em que vivemos, é considerada não como parte integrante da


vida, mas como um estorvo. Algo que não deveria nunca nos acontecer, imor-
tais que somos em nossas fantasias (Perina, 1994).
Conforme a interpretação de Juliana, Leonardo é curioso. Contudo, não
sabe sobre o câncer:
“Ele sabe que tem alguma doença, não sabe que é câncer. Ele sabe que
tem alguma coisa. Quando perguntam o que ele tem, ele mostra a cirurgia.
Quando perguntam o que aconteceu com o cabelo dele, ele fala que foi a
quimioterapia” (Juliana).
Ressalto que contar o diagnóstico à criança, para algumas mães pode ser
difícil. Muitas famílias acreditam que a criança não tem maturidade suficiente
para compreender o que lhe acontece. Em algumas famílias, o diagnóstico
não é contado à criança para protegê-la.
O comportamento de Juliana em relação ao não informar seu filho sobre
o câncer que ele tem, revela uma estratégia de enfrentamento denominada –
esquiva. A esquiva é evidenciada visto que Juliana se relaciona com seu filho,
como se ele não estivesse doente. Além disso, Juliana evita falar do câncer
na frente da criança, falando somente da “doença”. Percebo que a esquiva
de Juliana é utilizada com o intuito de não se deparar com situações que a
obriguem a falar a verdade para a criança.
A criança com câncer, mesmo a de tenra idade, sente necessidade de saber
o que é que está acontecendo consigo (Valle, 1997). Ela percebe que seus
pais estão angustiados e que algo de grave está acontecendo com seu corpo.
Por desconfiar, contar ou não contar é uma falsa questão: a criança sempre
acaba sabendo o que tem, mesmo quando os pais se esforçam, no sentido de
protegê-la, para esconder-lhe o diagnóstico (Valle, 1997).
O fato de um paciente ser informado de que tem câncer já o conscientiza
de sua possível morte. Segundo a autora, as pessoas costumam relacionar o
tumor maligno com a doença fatal, mesmo havendo um número crescente de
curas reais ou remissões significativas (Moraes, 1994).
No caso de Leonardo, percebo que ele tem conhecimento sobre o que lhe
acontece em termos gerais. Porém, para o menino, a quimioterapia é realizada
porque ele fez uma cirurgia, já que Juliana não lhe contou sobre o câncer. Para as
crianças pequenas, não interessa o nome científico da enfermidade, mas explica-
ções práticas sobre sua permanência no hospital, eventual cirurgia e procedimen-
tos terapêuticos que vão sofrer, numa linguagem simples e acessível (Valle, 1997).
Quando pode participar de sua doença a criança fica menos passiva,
deprimida, assustada e até menos rebelde, canalizando energia para cura
(Amaral, 1994).
Em um estudo com desenhos observaram que o nível de ansiedade de
crianças em tratamento de câncer dependia da forma de comunicação e das
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 175

mensagens familiares sobre a doença (Valle, 1997). As mães que mantinham


um relacionamento aberto e honesto com seus filhos sobre a doença e tra-
tamento favoreciam a criança uma posição menos defensiva, um conceito
melhor de si e, em seus desenhos, colocavam as figuras parentais mais pró-
ximas a ela (Valle, 1997).
A entrevistada em questão teme a morte e revela preocupações em relação
ao futuro de seu filho:
“Tenho medo que eu pare, e pense que ele vai morrer. Vai acabar em
julho, mas tem cinco anos pela frente para cuidar. Ele tem quatro anos, estará
com nove. A gente vê cada caso por aí, de gente que fez quimio por um ano,
e a doença voltou. Depende de cada um. Eu já vi gente com o tumor do Leo-
nardo que já faleceu [...]” (Juliana).
“Na semana passada morreu uma menina, lá na onco, de leucemia. Já
era paciente terminal, mas resistiu por um mês. Tinha fotos dela lá na onco.
Eu acho que já tiraram de lá. Quando morre, eles tiram as fotos. Todo mundo
ficou falando da menina. Ela tinha sete anos” (Juliana).
Denoto que o medo de pensar na morte é uma estratégia de coping uti-
lizada por Juliana referente também a esquiva. Esta estratégia revela Dois
pontos significativos: o primeiro, refere-se ao medo de parar com o ‘faz-de-
-conta’ que Leonardo não está doente, e o segundo, refere-se a atitude de tomar
consciência que o menino está doente e que ele pode morrer. Percebo também
que o medo que Juliana tem sobre a possibilidade da morte de Leonardo pode
ser decorrente de seus conhecimentos relacionados aos contatos que a mesma
teve com crianças com o tumor de Wilms e outros cânceres.
Os pacientes e os familiares tendem a se pautar por casos de conheci-
dos que podem ser absolutamente diferentes na apresentação e evolução, e
como o câncer traz consigo o estigma da época em que não havia tratamento
disponível, o diagnóstico costuma ser interpretado como trazendo consigo a
possibilidade de morte eminente (Yamaguchi, 1994).
Quanto ao futuro, a capacidade de se projetar para além do aqui e agora
é considerada como variável preditora da qualidade de sobrevivência, e o que
se tem evidenciado é uma dificuldade em planejar e buscar o futuro entre os
sobreviventes [...] (Arraes & Araújo, 1998).
Percebo que Juliana tem dificuldade de se projetar ao futuro visto que
na sua concepção, a cura demora cinco anos para ser alcançada. Ainda, a mãe
apresenta dúvidas em relação ao tratamento quimioterápico já que se baseia
em casos onde o tratamento fracassou e houve recidivas.
Quando mãe e filho estão em casa, ela esquece do tratamento hospitalar.
“Tenho vontade de ir embora. Acabar com a quimio para ir embora. Cada
vez que a gente vai embora é uma etapa vencida. Dessa vez a etapa demorou.
Quero ir embora. Já não dá mais. Estou sem dinheiro, não tenho uma roupa
limpa. Tem meus filhos” (Juliana).
176

“Eu não penso nisso. Esqueço desse lugar. Só lembro no sábado, quando
eu sei que tem que vir para cá na segunda-feira” (Juliana).
Juliana esquece do hospital e do tratamento hospitalar quando está em
casa. Por consequência do esquecimento de Juliana, provavelmente, ela tam-
bém não se recorda da doença de Leonardo quando está longe do hospital.

B. 3 Subcategoria: Variáveis da personalidade


Para Juliana, sua personalidade a ajuda lidar com a doença de Leonardo.
“Eu sou como o Leonardo. Sou de berrar também. Solto os cachorros
em cima de quem nada tem a ver com o peixe [...]” (Juliana).
“Tem gente que diz por aí que eu levo muito na esportiva. É o meu jeito
de ser. É difícil dizer como eu enfrento a doença. Eu não sei ser diferente.
Eu vivo rindo. Faço palhaçadas. Eu tenho cinco minutos de recaída, daí, eu
choro e passa. Eu não choro, mas quando eu choro, eu choro. É o meu jeito
de ser, eu sou assim. O meu jeito é... Eu falo alto, sou explosiva, não pega no
meu pé. Sai de baixo, posso até apanhar, mas bato também. Sou muito boa,
não tem melhor, mas não mexe comigo” (Juliana).
As características pessoais de Juliana conforme relata quando fala de si
mesma parece consentir que ela encare a doença de Leonardo de um modo
que lhe permite um certo controle sobre a situação.

B. 4 Subcategoria: Religiosidade
“Às vezes, eu penso que Deus nunca me deixou na mão. Disso ai, eu não
posso reclamar. Ele sempre me ajudou” (Juliana).
Outra estratégia de enfrentamento elencada é condizente a – religiosi-
dade. O apoio de Deus é referenciado por Juliana. Percebo que pelo relato dela
Deus foi o único a lhe ajudar, já que ela “sempre se virou sozinha” (Juliana).
Os recursos pessoais de coping são constituídos por variáveis físicas
e psicológicas que incluem saúde física, moral, crenças religiosas, expe-
riências prévias de coping, inteligência e outras características pessoais
(Antoniazzi, 1998).
A disponibilidade de recursos afeta a avaliação do evento ou situa-
ção e determina que estratégias de coping o indivíduo pode usar (Antonia-
zzi, 1998). No caso de Juliana, aponta-se que a mesma não recebeu apoio
familiar (recurso sócio ecológico), mas na sua concepção recebeu apoio de
Deus, o que demandou a elaboração de estratégias de enfrentamento baseadas
em seus recursos pessoais.

B. 5 Subcategoria: Afastamento psicológico


O tempo para Juliana trabalhar torna-se restrito nos momentos em que
Leonardo está em tratamento quimioterápico e internação. Essa situação acar-
reta acúmulo de tarefas para realizar no trabalho:
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 177

“Eu penso: você vai se atrapalhar toda no sábado. Chego lá sábado, cedo,
e nem sei onde eu começo. Não sei se começo pela roupa ou pela padaria, de
tanta coisa” (Juliana).
O tempo restrito obriga Juliana a focalizar no trabalho e a desenvolver
uma estratégia de coping denominada – afastamento psicológico – para que
ela possa enfrentar o trabalho acumulado e lidar com a doença de Leonardo.
Tal estratégia lhe possibilita arcar com o excesso de tarefas a fim de realizá-
-las, além de desligá-la da situação em que seu filho e ela se encontram, como
parece transparecer ao longo do seu discurso, porém não em frases específicas.
C. Categoria: Mudanças nas questões cotidianas
A vida de Juliana está uma “bagunça”, tanto pela questão da quimiotera-
pia, quanto pela internação de seu filho. As pessoas importantes de sua vida
estão deixadas de lado devido ao tratamento hospitalar de Leonardo. Tais
pontos foram indicados no seu relato:
“Minha vida está uma baderna, uma bagunça. Nem sei o que fazer [...]”
(Juliana).
“Tudo mudou. Mudou tudo. Minha vida está uma bagunça. Não tenho
tempo para olhar para os filhos, não tenho tempo para dar conselho, não tenho
tempo para mim [...]” (Juliana).
Ao lado do desgaste emocional, da incompreensão de ser atingida por tal
golpe, da ameaça de morte que paira sobre seu filho, a família precisa resolver
problemas de ordem prática, tais como os de ordem doméstica (manter a casa
funcionando, com quem deixar os outros filhos), os de ordem financeira (como
conseguir transporte, comprar medicamentos caros) e os de ordem profissional
(ausências frequentes no emprego, não ter cabeça para trabalhar) (Valle, 1997).
Juliana é faxineira, quando pode trabalha três vezes por semana na casa
da madrinha de Leonardo. Após o diagnóstico de câncer, Juliana passou a levar
o menino consigo para o trabalho. Antes do diagnóstico, o menino ficava sob
os cuidados de outra pessoa.
“Trabalho numa casa só. Na verdade é assim, eu trabalho numa casa e
numa padaria. A casa fica em cima e a padaria em baixo” (Juliana).
“Ela é madrinha do Leonardo. Ela é um amor [...] Ela sabe o que o Leo-
nardo tem. Ela fala: só não falta no sábado [...]” (Juliana).
“[...] Ele vai comigo trabalhar. Lá, ele come e enche o saco dos padeiros,
quer aprender tudo, quer saber tudo. Os padeiros têm bastante amizade com
ele” (Juliana).
“Tinha que deixar com uma mulher. Eu ia trabalhar com preocupação.
Não era fácil e nem é” (Juliana).
Juliana no seu relato, implicitamente revela que recebe apoio social da
madrinha de Leonardo, que faz parte de sua rede de amigos. Saliento que a
mãe, talvez nem perceba que sua comadre está lhe ajudando. Acredito que se
178

fosse um outro tipo de emprego, e que se houvesse um outro tipo de relacio-


namento empregada-patroa, a percepção de Juliana sobre o apoio social que
recebe seria diferente, pois tratar-se-ia de um relacionamento mais formal do
que o que ela mantém com sua atual patroa. Deste modo, percebo que Juliana
recebe um certo apoio social, apesar de não se sentir satisfeita em seu atual
local de trabalho.
Juliana aponta que o tempo para trabalhar está restrito:
“Às vezes, eu falto na terça e na quinta-feira. Às vezes, eu consigo tra-
balhar três dias por semana depois que ele ficou doente [...]” (Juliana).
“[...] Semana passada eu nem trabalhei. Nesta semana, nem sei se vou
trabalhar. Eu acho que não. Está difícil. Estou sem dinheiro. A coisa está feia
para o meu lado [...]” (Juliana).
Devido à dinâmica do tratamento, e a disponibilidade de tempo exigida de
Juliana para acompanhar seu filho, no hospital, não há possibilidade de arrumar
um emprego com carteira assinada, desejo este revelado em uma de suas falas:
“[...] Vindo para cá desse jeito, como eu vou trabalhar em outro
lugar?” (Juliana).
“[...] Eu gostaria de arrumar um emprego com carteira assinada” (Juliana).
Percebo que Juliana gostaria de retomar sua vida normal, apesar de
fazer-de-conta que as coisas não estão acontecendo com seu filho.

Considerações Finais

O processo de interação mãe e filho com câncer em situação de tratamento


hospitalar é decorrente do tipo de relação existente entre ambos antes do diag-
nóstico da doença. Em alguns casos o filho é visto como morto quando há o
estranhamento da criança por parte dos pais, pois estes não conseguem mais iden-
tificar o filho lhes parecendo um outro (Santos, 2002). Ainda, para outras família
o filho pode ser visto como morto por já ter nascido morto ou talvez por nunca
ter nascido, sendo um filho inexistente no desejo de seus pais (Santos, 2002).
As pessoas reagem de diferentes maneiras frente ao conhecimento da doença.
O impacto do diagnóstico de câncer na criança é um momento desorga-
nizador na vida dos pais, e requer uma atenção cuidadosa dos profissionais
que trabalham nesta área. As reações e manifestações psíquicas ao diagnóstico
podem ser extremamente desastrosas na vida das crianças e de suas famílias,
podendo levá-las a desequilíbrios emocionais, insegurança, negação, sintomas
depressivos e culpabilidade (Santos, 2002).
A dificuldade dos pais em se relacionar com a doença e com a criança
doente inicia antes do conhecimento dos mesmos sobre o diagnóstico, se
estendendo aos períodos de exames, tratamentos, acompanhamentos pós-tra-
tamentos e cuidados paliativos.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 179

Na presente pesquisa evidenciei a interação existente entre Juliana e seu


filho Leonardo nos períodos de diagnóstico, exames, tratamentos quimiote-
rápicos e internação hospitalar conforme o discurso da mãe da criança. Além
disso, abordei as questões da vida cotidiana materna que se alteraram com a
internação da criança e as estratégias de enfrentamento despendidas por Juliana
para lidar com o tratamento hospitalar, situação esta, considerada estressante.
As questões cotidianas alteradas com o tratamento hospitalar de Leonardo
na vida de Juliana foram elencadas como a falta de tempo para cuidar dos
demais filhos e de si mesma, e para ter um trabalho estável. As estratégias de
enfrentamento utilizadas por ela foram a não responsabilização pela doença,
esquiva, religiosidade, variáveis de personalidade, e afastamento psicológico.
Constantemente, Juliana apontou sua facilidade em lidar com o câncer
de Leonardo como se tratasse de uma doença como as demais. Contudo, pelas
estratégias de enfrentamento elencadas percebo que a maioria de seus compor-
tamentos foi de esquiva, ou seja, de evitação frente ao quadro em que o menino
se encontrava. Desta forma, três pontos contraditórios foram encontrados no
discurso dela: Juliana se esquiva de situações e pensamentos que a confrontem
com o câncer; afirma que lida normalmente com seu filho independente da
doença; e demonstra cuidados diferenciados com o menino daquele empre-
gado aos demais filhos apesar de não admitir claramente esta diferenciação.
O viés no discurso de Juliana aponta uma falta de conhecimento sobre
si mesma e sobre seus sentimentos, bem como, dificuldades em lidar com o
câncer de Leonardo, apesar da mesma agir como se o problema não existisse.
O apoio psicológico à família da criança doente é fundamental para
que os familiares possam encarar a doença, o tratamento, os procedimentos
clínicos e cirúrgicos, com maior segurança e menos preocupação. O acom-
panhamento psicológico à mãe, principal cuidadora da criança, nos períodos
de hospitalização e internação também é importante. Com a parceria de um
profissional da Psicologia, a mãe pode conversar sobre a doença e a criança,
bem como, pode desabafar, trabalhar e elaborar algumas angústias e senti-
mentos ambíguos que surgem no contexto em que ela se encontra.
Além da psicoterapia emergencial, é essencial também que a Psicologia e
a equipe de profissionais possam amparar a família, principalmente em relação
à questão de dar a informação à criança sobre seu diagnóstico e demais procedi-
mentos médicos. Para tanto, é preciso conduzir a equipe que assiste aos familiares
ao estudo das consequências que a não emissão do diagnóstico acarreta. Torna-se
preciso fazer valer o direito da criança em saber o que acontece consigo mesma,
respeitando a Constituição Nacional e o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA) que ressaltam o direito de ter conhecimento adequado de sua enfermidade,
dos cuidados terapêuticos e diagnósticos a serem utilizados e do prognóstico,
respeitando sua fase cognitiva, além de receber amparo psicológico quando se
fizer necessário (Carvalho & Ceccim, 1997).
180

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CAPÍTULO 11
LUTO E PERDAS IMPLICADOS NO
TRATAMENTO ONCOLÓGICO
Ana Paula Wilvert

Luto é o processo psíquico de elaboração de uma perda, é o rompimento


de um vínculo significativo, sendo uma manifestação natural e esperada diante
do ocorrido. No entanto, quando falamos de luto, não nos referimos apenas à
perda de alguém. Ele também pode estar atrelado a diversos contextos de perdas.
Essas perdas podem estar vinculadas à mudança de lar, cidade ou até
mesmo de país. Perdas de bens materiais, status social e de projetos e expec-
tativas também podem acarretar um processo de luto. Além disso, o processo
de saúde e doença também está incluso neste contexto de perdas. Ou seja,
“as perdas expressam muito mais do que a falta de algo ou alguém, mas a
relação entre eles, o simbolismo dado e o sentimento associado” (Vera &
Moreira, 2012; Yunta, 2016 apud Ramos et al., 2019, p. 94).
Por diversas vezes o diagnóstico de uma doença, principalmente de uma
doença crônica, acaba por despertar a consciência da morte, causando temor
no sujeito. É necessário então que seja acolhido o seu sofrimento, para que
ele consiga ressignificar e enfrentar essa vivência (Rezende et al., 2009).
É de suma importância validar esse temor da morte, independentemente
da patologia que acarreta o sujeito. No entanto, as perdas implicadas num pro-
cesso de doença estão presentes mesmo que o prognóstico não seja reservado e o
paciente encontre-se fora de possibilidades curativas. A perda está implicada em
qualquer circunstância de doença, independentemente de a morte estar próxima.
Assim, adoecer é situação crítica, exigindo que o sujeito encontre recursos para o
enfrentamento do momento, pois a doença, além de atingir a saúde física, atinge
também a saúde mental, afetando toda a integridade do ser humano (Cantu, 2010).
A palavra câncer é originária do grego karkinos (caranguejo). Essa
palavra faz referência a um conjunto de mais de cem tipos de doenças, des-
tacando-se pela formação de um tecido constituído por células autônomas
com habilidades e capacidades bem diferentes das que o antecederam. A
possibilidade de invasão tecidual e a metastatização dessas células são marcas
reconhecidas das neoplasias malignas (Fernandes Júnior, 2010).
Dividindo-se rapidamente, essas células tendem a ser bastante agressivas
e incontroláveis, determinando a formação de tumores, que podem alastrar-se
para outras regiões do corpo. Os diversos tipos de câncer correspondem aos
184

vários tipos de células do corpo. Quando começam em tecidos epiteliais,


como a pele ou as mucosas, são denominados de carcinomas. Se o ponto de
partida são os tecidos conjuntivos, como osso, músculo ou cartilagem, são
chamados de sarcomas.
O câncer não é uma doença nova, de modo que as mais remotas evidên-
cias de tumores ósseos foram encontradas em múmias egípcias, e a primeira
descrição da doença, embora o termo ainda não fosse utilizado, data de 1600
a.C., quando Edwin Smith descreveu em seu papiro oito casos de tumores ou
ulcerações da mama tratados com cauterização. A origem do termo câncer
é creditada a Hipócrates (460-370 a.C.), utilizando-se da palavra carcinos
para descrever um grupo de doenças que se apresentavam como tumores e
ulcerações (Caponeto & Lage, 2008).
No Brasil as iniciativas para o diagnóstico e o tratamento do câncer ini-
ciaram-se nos primeiros anos do século XX. As iniciativas eram ligadas ao
diagnóstico e tratamento, tendo em vista que pouco ou nada era conhecido a
respeito da prevenção primária. Em 1937 foi criado no Rio de Janeiro o Centro
de Cancerologia do Serviço de Assistência Hospitalar do Distrito Federal,
atualmente denominado de Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes
da Silva (INCA) (Fernandes Júnior, 2010).
Levando em consideração que o processo de luto implica diversas perdas,
sendo elas também a perda da saúde, pode-se concluir que o próprio tratamento
oncológico acarreta diversas perdas para o sujeito.
A quimioterapia passou a ser utilizada para o tratamento de neoplasias
disseminadas ou avançadas demais para que pudessem ser tratadas também
por cirurgia ou radioterapia. Nos pacientes em que a cirurgia seria impossível,
difícil ou mutiladora, o uso da quimioterapia pode reduzir o volume tumoral,
permitindo a realização da cirurgia ou menor radicalidade cirúrgica. Essa
função é denominada como tratamento neoadjuvante. O tratamento adju-
vante diz respeito ao tratamento quimioterápico após a intervenção cirúrgica
(Caponero & Lage, 2008).
As consequências do tratamento quimioterápico, como, por exemplo,
a queda de cabelo e o emagrecimento, interferem diretamente na imagem
corporal do sujeito. Desse modo, considera-se como uma perda implicada
pelo tratamento.
É evidente que nem todas as perdas explanadas neste capítulo implicarão
prejuízos psíquicos a todos os pacientes. Vale reforçar que dependerá da sua
estrutura psíquica e também do modo como o paciente percebe e enfrenta esse
processo, conforme reforça Rezende (et al., 2009, p. 90): “[...] é importante
enfatizar que as manifestações somáticas e psíquicas da doença são singulares
ao sujeito podendo também variar em diferentes momentos e contextos”.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 185

Mas voltando a questão do tratamento quimioterápico, sabe-se que em


alguns casos ele pode proporcionar a queda de cabelo e perda de peso. O que
invariavelmente repercutirá na imagem do paciente, de modo que, ao olhar-se
no espelho, não se reconhece mais como antes. Isso pode desencadear uma
série de questionamentos e repercussões psíquicas, que envolvem o âmbito da
sua identidade. Quem eu sou agora? Quem eu era? Quem serei? Dando lugar
da sua subjetividade ao câncer. Agora ele é o câncer. É como se de agora em
diante o câncer o determinasse, esquecendo-se de toda a sua história prévia,
suas experiências e sua essência.
Os sintomas decorrentes da quimioterapia, como as náuseas e mal-estar,
também suscitarão perdas que reverberarão no seu bem-estar físico, psíquico
e social, impedindo que o paciente esteja em condições de passear, exercer
alguma atividade de lazer ou até realizar funções simples como tomar banho
e assistir à televisão.
Pacientes oncológicos, em virtude da sua imunidade baixa, são orientados
a evitar lugares públicos e aglomerações de pessoas, o que implica a rees-
truturação dos seus momentos de prazer e de lazer. Se um paciente tinha por
hobby pedalar, sua condição física comprometida impedirá que isso ocorra.
Sem contar no trabalho ou então escola e/ou faculdade.
A cirurgia, a mais antiga modalidade de tratamento do câncer, ainda é
considerada uma das principais armas de combate contra essa doença, além
de tratar-se de uma ferramenta essencial para um bom prognóstico clínico.
Ela pode ser realizada para diversas modalidades.
A cirurgia de caráter diagnóstico é uma biópsia cirúrgica como ponto de
partida para o estabelecimento do diagnóstico diante uma suspeita tumoral
e seu futuro tratamento. A cirurgia curativa diz respeito às ressecções dos
tumores primários com ampla margem de segurança, enquanto a cirurgia
paliativa contribui para a melhora da qualidade de vida ou de sobrevida de
um paciente, mesmo que não seja retirado totalmente o tumor.
Além disso, há também a cirurgia citorredutora, que tem por base o con-
ceito de que a redução volumétrica primária do tumor melhora a eficiência da
quimioterapia ou da radioterapia. A cirurgia preventiva é indicada para lesões
consideradas pré-malignas de alto risco em várias regiões, e, por fim, a cirurgia
reconstrutora passou a ter grande êxito com base no avanço da cirurgia plástica
reconstrutora, abrindo novas perspectivas para a reabilitação de pacientes antes
condenados a conviver com as suas mutilações e deformidades cosméticas e
funcionais (Perdicaris, 2008).
Assim, o procedimento cirúrgico também implica perdas, na medida
em que sua preparação ou então sua recuperação impõem restrições físicas,
como o jejum para a anestesia ou a imobilização de algum membro para
melhor recuperação.
186

Mas a perda também pode estar vinculada a uma mutilação. Alguns


cânceres, como o osteossarcoma, ao não corresponderem ao tratamento pre-
viamente proposto, apontam para a necessidade de amputação do membro.
Identificando, neste caso, mais uma perda. Esta pode estar implicada em ques-
tões que vão além da condição física, envolvendo a representação psíquica e
simbólica daquele membro para o sujeito.
Essa questão também faz ponte com o que já foi abordado sobre a imagem
corporal. Pacientes com mudanças na imagem corporal podem sentir-se menos
atraentes, o que acaba interferindo em seus relacionamentos interpessoais.
No entanto, as mudanças nos relacionamentos interpessoais podem
ocorrer não somente em virtude da alteração na imagem corporal, mas tam-
bém vinculadas à reorganização familiar em função do próprio processo de
doença. Essas mudanças podem repercutir em desentendimentos, estresse e
distanciamentos, havendo a perda do equilíbrio da necessária rede de apoio
suportiva deste momento.
A radioterapia consiste no uso de radiação ionizante que é produzida por
aparelhos ou também emitida por radioisótopos, que podem ser naturais ou
artificiais, com intuito terapêutico em diversas patologias. Ou seja, ela tem
por objetivo entregar uma dose precisa de radiação em um volume, a fim de
promover o controle ou a erradicação da doença em questão, de modo que
ela pode ser de finalidade curativa ou paliativa. Pode ser empregada de modo
exclusivo, combinada a quimioterapia, pré-operatório ou neoadjuvante, sendo
que a sua indicação deve ser baseada em dados da literatura que justifiquem o
benefício de sua utilização baseados no tipo histológico da doença, do estadia-
mento e das condições clínicas do paciente. Os profissionais envolvidos são
médicos, físicos, técnicos, enfermeiros e dosimetristas (Dias & Segreto, 2013).
Dentre os efeitos colaterais do tratamento radioterápico estão o cansaço
e a fadiga, a perda do apetite, dificuldades para alimentar-se e as reações na
pele. Deep et al. (2014, p. 294) nomeiam essa fadiga como “fadiga oncoló-
gica”: “É a fadiga oncológica, quando a sintomatologia tende a aumentar
durante os tratamentos como a radioterapia: quando se espera o tratamento,
quando neste há uma alteração, quando falha ou no seu final”. Ela interfere
na rotina do paciente, na falta de energia, sonolência, fraqueza, perturbação
do humor e diminuição do desempenho cognitivo (Schneider & Lopes, 2004
apud Deep et al., 2014).
O transplante de células-tronco hematopoiéticas consiste na infusão intra-
venosa dessas células, designada a restabelecer a função medular e imune
em pacientes com doenças malignas e não malignas, herdadas ou adquiridas.
Quanto ao tipo de doador, o transplante pode ser autólogo, cuja célula-tronco
é coletada do próprio paciente; alogênico, quando a célula-tronco é obtida
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 187

de outra pessoa; aparentado ou consanguíneo, quando o doador é familiar


(Setúbal & Dóro, 2008).
Optar ou não por realizar o transplante de medula óssea desencadeia uma
série de repercussões psíquicas no paciente, tendo em vista os riscos pessoais
e de integridade física aos quais o sujeito é submetido. Ao optar por realizar o
procedimento, o momento é permeado de ansiedade, tendo em vista a espera por
um doador compatível (em caso de o procedimento não ser autólogo ou o doador
não ser um familiar), somada às fantasias inerentes a esse momento, como, por
exemplo, a de que poderá receber as características do possível doador.
O isolamento protetor e a deficiência imunológica também elevam o nível
de ansiedade, além de precipitar o surgimento da dependência de ajuda e o
iminente medo de morte. A solidão no isolamento pode favorecer sentimentos
negativos em relação às perdas implicadas neste processo.
Todos esses tratamentos podem interferir no sujeito, para além do fato do
próprio diagnóstico oncológico. O processo de luto dessas perdas repercutirá
nos âmbitos físico, psíquico, social, cognitivo, comportamental e espiritual,
pois a doença (e também o tratamento) impede que o indivíduo trabalhe e
se divirta, isolando-o ao tirá-lo do seu convívio familiar e dos amigos. Por
mais que as pessoas se esforcem para compreendê-lo, ninguém sentirá o que
somente ele sente. Sendo assim, a experiência de estar doente é sentida de
uma forma única pelo paciente.
Sentimentos como medo, dor, insegurança e isolamento são comuns de
serem manifestados nos pacientes em situações de doença ou hospitalização.
No entanto, o modo como o paciente enfrentará esse momento sempre será sin-
gular, ou seja, cada sujeito reagirá de uma maneira diferente dos demais, bem
como enfrentará de modo peculiar o seu processo de doença e ou tratamento.
Desse modo, o processo de luto também dependerá de vários fatores
peculiares ao paciente, como, por exemplo, a sua estrutura psíquica, as suas
vivências anteriores (sendo elas traumáticas, de perdas ou não), como ele
ressignificou e continuou a sua vida, como também da rede de apoio que
possui no momento da doença.
Sabe-se que uma rede de apoio, seja ela familiar ou composta por amigos,
é imprescindível para um enfrentamento mais leve, de modo que o paciente
sente-se amparado e seguro. Ou seja, em caso de o paciente não possuir uma
rede de apoio consolidada ou então essa rede ser desestruturada, haverá difi-
culdades no processo de enfrentamento, sendo que muitas vezes essa questão
pode até mesmo prejudicar o paciente.
O repertório psíquico e o quanto o paciente deu conta de escutar tam-
bém serão de suma importância para a estruturação do seu mecanismo de
enfrentamento. Além do significado da doença para ele e a sua percepção em
188

relação ao ciclo natural da vida e a morte, a gravidade da doença e o tratamento


proposto também serão preditivos neste cenário.
Vale ressaltar que “o câncer e o processo de tratamento trazem consigo
também a particularidade da dor, de uma dor total – física, psíquica, social e
espiritual. Deve ser entendida no contexto do sofrimento do paciente, valori-
zando o olhar, a reflexão e a significação da experiência a partir do discurso
do mesmo” (Costa & Chaves, 2012; Siqueira et al., 2015 apud Ramos et
al., 2019, p. 93).
Assim, é possível abrir espaço para que o paciente fale da sua condição,
com o intuito de ampliar suas oportunidades de vivenciar sua autonomia sobre
a sua vida, possibilitando também a condução de uma intervenção psicológica
eficaz (Ribeiro & Morais, 2017).
“Diante do que foi exposto, compreende-se que o paciente oncológico
tem perdas diárias de distintas significações, podendo ser concretas, abstratas
ou conectadas à própria essência. Perdas não restritas à morte na esfera orgâ-
nica, mas permeia sobre a autonomia, a subjetividade e o plano emocional do
paciente em si. Faz-se necessário dar voz ao paciente oncológico, resgatando
sua subjetividade no adoecer, em suas perdas, morte e luto, para que assim
possa-se oferecer qualidade de vida e de morte, em verdadeira integralidade,
ao paciente oncológico” (Ramos et al., 2019, p. 95).
Cantu (2010) reitera que, em razão de maior detecção precoce do câncer,
a eficácia dos tratamentos tem sido maior e consequentemente tem aumentado
o número de sobreviventes e possibilitado uma melhor qualidade de vida.
Assim, “[...] as pessoas com câncer querem sentir que a sua sobrevida significa
mais “que um escape à morte (Cantu, 2010, p. 7)”. Em virtude disso, julga-se
a importância do acompanhamento psicológico ao longo do tratamento onco-
lógico com o intuito de acolher e trabalhar todas as perdas implicadas nesse
processo, possibilitando um processo de luto mais humano, ético e saudável.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 189

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CAPÍTULO 12
O FEMININO FRENTE AO
CÂNCER DE MAMA
Heloisa Canteri Langa

O Diagnóstico de Câncer de Mama

Receber um diagnóstico de câncer causa inúmeras repercussões na vida


de um indivíduo. O imaginário da doença pode gerar o medo de procedi-
mentos invasivos, efeitos colaterais da quimioterapia ou da radioterapia e até
mesmo o medo da morte. Tais situações podem causar importante impacto
emocional no paciente, sendo o acompanhamento psicológico um aliado no
enfrentamento do tratamento.
Estima-se que entre os anos de 2018 e 2029 haverá uma ocorrência
de 600 mil casos novos de câncer, sendo os cânceres de próstata e mama os
mais frequentes (INCA, 2014).
De acordo com o INCA (Instituto Nacional de Câncer), o câncer de
mama é o tipo de câncer que mais acomete as mulheres em todo o mundo.
“O câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm
em comum o crescimento desordenado (maligno) de células que invadem
os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se (metástase) para outras regiões do
corpo”. O câncer de mama acomete uma ou as duas mamas e, por vezes,
as axilas, manifestando-se no início como um nódulo. Esse tipo de câncer
é mais comum em mulheres acima de 35 anos e, embora possua um bom
prognóstico quando identificado no início, é considerado um problema de
saúde pública (INCA, 2014).
As cirurgias podem ser de Dois tipos: conservadora (realizada para
retirada de tumores pequenos, preservando a mama) ou radical (mastectomia,
indicada quando o tumor se encontra em estágio avançado). Mesmo quando
só se retira o tumor e se conserva a mama, percebe-se a angústia e o medo
ocasionado pela doença, que afeta mais que um órgão: o seio é tido pela
mulher como representante da sua feminilidade (Bland & Copeland, 1994,
apud Rocha, Almeida & Ribeiro, 2013).
O diagnóstico de câncer de mama na vida da mulher pode acarretar
efeitos negativos que extrapolam a doença em si, envolvendo, muitas vezes,
a perda de um órgão investido de representações, além do medo da morte,
192

da dor e do sofrimento. Receber o diagnóstico de uma doença sem causa


definida traz ainda mais angústia e culpa (Venâncio, 2014).
Em relação ao trabalho do psicólogo oncológico, é importante ressal-
tar que as transformações no conceito de saúde, ocorridas entre os anos 70
e 90, foram um marco na criação de um espaço para esse profissional nos
Serviços de Saúde, visto que a partir de desse momento a saúde passa a ser
compreendida como um fenômeno biopsicossocial (Venâncio, 2014).
Além disso, ao final da década de 70, surgiram novos métodos de detec-
ção precoce e tratamentos mais eficazes contra o câncer, aumentando assim
a expectativa de vida do paciente. Surge aí uma maior preocupação com a
qualidade de vida, o que contribuiu para o desenvolvimento do campo de
estudo e prática da Psicologia Oncológica (Venâncio, 2014).
No Brasil dos anos 1980, já se encontravam trabalhos isolados de pes-
quisa sobre assistência psicossocial a grupos de pacientes e de atendimento
psicoterápico a pacientes em hospitais e consultórios, além da formação de
grupos de autoajuda por pacientes, ampliando consequentemente o número
de pesquisas desenvolvidas na área (Venâncio, 2014).
Dentro do contexto da Oncologia, o psicólogo auxilia na identificação dos
fatores emocionais que intervêm na saúde do paciente, trabalha na prevenção
e redução de sintomas emocionais causados pelo câncer e seus tratamentos,
além de avaliar possíveis comorbidades psicopatológicos, como depressão e
ansiedade graves. O trabalho da psicologia se estende também ao familiar do
paciente, considerando que na medida em que tenha suporte, a família pode
se tornar aliada do paciente e da equipe de saúde (Venâncio, 2014).

Aspectos Históricos

Segundo Gomes, Skaba e Vieira (2002), a primeira cirurgia de mama foi


realizada no século I d.C. por um médico grego. Porém, a primeira esperança do
tratamento do câncer de mama só aconteceu no século II, com Galeno, que acre-
ditava na possibilidade de cura do câncer por meio da cirurgia, desde que o tumor
fosse superficial e todas as suas raízes extirpadas. No século XVIII, novas técnicas,
como ligadura de vasos e a criação de instrumental específico para a cirurgia de
mama foram desenvolvidas. Já no Renascimento, Lorenj Heister defendia o uso
de uma guilhotina para tornar a mastectomia um procedimento mais rápido e
menos doloroso. Com a descoberta da antissepsia e da anestesia, em 1846, a dor
e a infecção foram minimizadas. Houve também avanço na anatomia patológica,
possibilitando que o tumor de mama fosse visualizado pelo microscópio.
Um cirurgião americano descreve, no ano de 1889, sua técnica de mas-
tectomia radical, que permanece como padrão de tratamento de câncer de
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 193

mama por mais de setenta anos. Em 1895 é realizada a primeira biópsia de


congelação e a primeira reconstrução mamária. A técnica de quadrantectomia
teve início com grandes ressecções de quadrantes mamários, passando, em
seguida, para intervenções mais moderadas. Em casos como tumores multi-
cêntricos, tumores centrais (de localização retroareolares) e com desproporção
entre o tamanho do tumor e o tamanho da mama, a mastectomia continua
sendo utilizada (Gomes, Skaba & Vieira, 2002).

Imaginário Popular do Câncer

Historicamente o câncer vem sendo associado a más experiências e


servindo como metáforas para diversas ordens de infortúnios físicos, mentais
e sociais. Sontag (1984 apud Gomes et al., 2002) afirma que o câncer ainda
é interpretado como uma doença cruel, intratável e misteriosa.
Por ser algo que ataca e invade o corpo, o seu tratamento tem sido
pensado como um contra-ataque, fazendo com que muitas vezes seja visto
como algo pior do que a própria doença. Nesse tratamento, costuma-se usar
metáforas tiradas da linguagem militar.
Com base em Sontag e Schulze (1993, apud Gomes et al., 2002) observa
que, na discussão acerca do câncer, deve-se levar em conta a questão do
estigma social, que faz com que pacientes com câncer sejam vistos como
pessoas que vão morrer por conta de sua doença.
Em face desse imaginário social, a abordagem do câncer envolve sen-
timentos que são difíceis de serem administrados, tanto por parte dos pro-
fissionais, como por parte das pessoas em geral. Medo da dor, resignação
diante da percepção de que sua doença terá um desfecho fatal e a negação
de que a própria doença existe são alguns dos aspectos emocionais que
envolvem toda a trajetória de ser portador de câncer (Gomes et al., 2002).
Assim, por conta de toda a problemática que envolve o tema, a dis-
cussão não pode ser restrita a aspectos da clínica médica. Nela deve ser
contemplada a necessidade de se considerarem os desdobramentos sociais
que seguem à descoberta do câncer, demandando ações de saúde pública
voltadas para essa doença (Gomes et al., 2002).
O câncer de mama feminina está entre as doenças que mais afetam a
mulher, fazendo com que suas portadoras vivenciem um processo de fragi-
lização. Para que os profissionais de saúde possam lidar com essa proble-
mática, é preciso que haja, além do entendimento da dimensão psicológica,
uma compreensão sócio-antropológica do contexto e da situação social em
que se encontra o sujeito da doença (Gomes et al., 2002).
Quando tratamos do câncer de mama feminina, acrescentamos aos fato-
res relacionados ao câncer em geral os aspectos relacionados à função social
194

do corpo da mulher. Nesse sentido, no universo simbólico, a mama é um


elemento fundamental capaz de concentrar papéis da identidade feminina,
como a sexualidade – incluída aí a sensualidade –, sendo os seios objeto
de prazer e desejo, e a feminilidade diante da possibilidade exclusivamente
concedida à mulher do ato da amamentação (Gomes et al., 2002).
A possibilidade de desenvolver uma doença na mama compromete
toda essa construção fundamental da existência feminina. Compreender
esses significados colabora no entendimento da totalidade dos aspectos que
compõem o adoecimento por câncer, incorporando ao tratamento do tumor
o sujeito fragilizado em suas funções de mulher e mãe (Gomes et al., 2002).
Faz-se importante refletir sobre as repercussões que as representa-
ções sociais sobre essa patologia trazem para as mulheres, no sentido de
se criarem condições, objetivas e subjetivas, para que haja mobilização
em busca de um caminho que favoreça o tratamento e o enfrentamento do
câncer (Gomes et al., 2002).
Frequentemente ao se perceber como possível portadora de uma pato-
logia representada socialmente como aliada à dor ao sofrimento e com
desfecho fatal, a mulher sofre reflexos dessas construções historicamente
determinadas, que podem muitas vezes levá-la à negação desse processo,
traduzindo-se em um elemento dificultador para a detecção precoce do
câncer e, conseqüentemente, para a obtenção de melhores prognósticos
(Gomes et al., 2002).
A compreensão dessa teia de significados pode sinalizar para uma
promoção em saúde que invista na desconstrução dessas representações,
passando pela busca de possibilidades de se lidar com a doença como algo
passível de controle, assegurando melhor qualidade de vida a essas pacientes
(Gomes et al., 2002).

Câncer de Mama e o Corpo da Mulher

O câncer de mama, seus sintomas e tratamento podem causar inúmeros


efeitos na vida prática e emocional da mulher. Um dos fatores que podem
gerar angústia é a cirurgia mamária, que pode inclusive ser vivenciada de
maneira traumática pela mulher.
O ser humano sempre relacionou-se com o mundo através de seu corpo.
Sendo assim, o corpo pode ser considerado uma construção social e cultural.
Segundo Le Breton (2003 apud Nascimento, Próchno & Silva, 2012) o corpo
pode ser entendido como um ‘alter ego do homem’, se tornando sujeito para si
próprio. Novaes (2006 apud Nascimento et al., 2012) afirma que o corpo, no
registro imaginário, pode ser uma demarcação do dentro e fora, e se torna o
local de signos culturais e uma exteriorização do interior psíquico do sujeito.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 195

Ao abordar a questão do corpo da mulher dentro do viés psicanalítico


é impossível não abordar a questão da histeria. Quando desenvolveu seus
estudos a respeito da histeria, Freud fez a primeira formulação não médica
sobre o corpo. A histérica é chamada pela Psicanálise a produzir conhecimento
sobre esse corpo (Nascimento et al., 2012).
No século XX houve um forte crescimento das indústrias de cosméticos,
voltado principalmente às mulheres, que aumentaram os cuidados com o
corpo. Com isso, podemos pensar que houve uma transformação do corpo da
mulher em diversas instâncias sociais. No século XIX houve uma transforma-
ção na relação entre as mulheres e a mídia a partir da influência da educação
e da leitura, que se tornam mais acessíveis a elas. Assim, foram induzidas a
consumir e a viver de acordo com o que é transmitido como desejável para
elas pela mídia. Desse modo, a publicidade expõe as verdades criadas na
contemporaneidade sobre o corpo feminino e sobre o lugar cultural da mulher
na sociedade de consumo (Nascimento et al., 2012).
O seio, na obra freudiana, está relacionado à amamentação e ao modelo
de experiência de prazer que ele proporciona ao longo da vida. É visto como
símbolo da feminilidade, manifestando deslumbramento e erotismo. Dessa
forma, o seio é um representante das experiências do ser humano, principal-
mente da mulher, porque é esta quem vê o próprio seio se desenvolvendo,
junto com seus afetos (Nascimento et al., 2012).
A feminilidade compõe o corpo da mulher, seus anseios sexuais, seu sofri-
mento psíquico. A dimensão simbólica no feminino reflete sobre os caminhos
subjetivos a partir da castração, na qual a menina entra em contato com a sua
feminilidade. Dessa forma, a feminilidade nos leva a compreender o sujeito,
diante da sua angústia originária, marcada pela incompletude. A feminilidade
acontece a partir do momento em que a castração é significada. Há uma imagem
corporal sendo modificada, há um real de corpo que remete à castração feminina,
tentando se equilibrar nas faltas simbólicas. A dimensão simbólica no feminino
reflete sobre os caminhos subjetivos a partir da castração, na qual a menina
entra em contato com a sua feminilidade (Rocha, Almeida & Ribeiro, 2013).
Algumas partes específicas do corpo feminino são privilegiadas pela
sociedade, como: os seios, o cabelo, a boca e a pele. Tomando os seios como
expressão corporal da feminilidade, como discutido acima, é possível com-
preender, por um lado, sua valorização em termos de autoimagem e, por
outro, a tragédia em termos da possibilidade ou concretização de sua perda.
O câncer é umas das doenças que mais alteram a imagem corporal. O câncer
de mama significa uma mutilação para as mulheres, visto que o seio é um dos
principais representantes da feminilidade (Rocha et al., 2013).
O medo da morte (concomitante ao sofrimento da perda de um órgão
que representa sua feminilidade) e o receio de perder o parceiro (devido
196

ao comprometimento da sua sexualidade durante o tratamento) são alguns


fatores que acometem a vida dessas mulheres que necessitam de apoio
(Rocha et al., 2013).
Atualmente, existem vários recursos de cirurgia plástica que tentam
minimizar as alterações físicas deixadas pela mastectomia. A reconstrução
da mama tenta devolver a essas mulheres seus desejos e satisfações. Por isso,
é importante que a demanda seja da própria mulher, para que sua implicação
seja efetiva. Afinal, o que está em questão são os anseios e frustrações dessa
nova mulher, que vem tentando outras significações para se reconstituir como
mulher (Rocha et al., 2013).
Brant (2001, apud Rocha et al., 2013) aponta para o enfoque psicanalí-
tico voltado para as condições subjetivas da paciente, da sua família e do seu
contexto social, na organização psíquica e na experiência da doença, ou seja,
no processo do adoecer.
Peres e Martins (2000, apud Rocha et al., 2013) sugerem que o trabalho
do psicólogo com pacientes com câncer seja multidisciplinar, voltado para
o paciente e os membros de sua família, objetivando oferecer uma escuta à
família para que possam falar de seus sentimentos em relação à doença. É
importante mencionar que o psicólogo oncológico deve reforçar os laços
familiares desse paciente, para que se sinta emocionalmente mais fortalecido.
No trabalho com a equipe de saúde, é imprescindível a interação entre todos
os profissionais da equipe envolvidos no tratamento do câncer de mama para
que se possa obter um bom resultado, compreendendo todos os aspectos
implicados no adoecimento.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 197

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CAPÍTULO 13
RECURSOS LÚDICOS E O
CÂNCER INFANTIL
Camilla Volpato Broering

Quando uma criança recebe o diagnóstico de câncer, ela passa por pro-
fundas modificações em sua vida cotidiana. “Se para o adulto a experiência
de conviver com o câncer é desestruturante, as crianças costumam reagir com
maior desorientação” (Campos, 1997, p. 19). Contudo, tais modificações não
se limitam à vida da criança, se expandem, atingindo seus familiares e aqueles
que a cercam, pois “a descoberta tem impacto em toda a rede de relações de
que a criança faz parte” (Campos, 1997, p. 19). As principais pessoas envolvi-
das nesta nova vida com câncer são o pai e a mãe, que ficam emocionalmente
abalados e têm suas vidas modificadas na eminência do tratamento.
Valle (1994) assinala que a revelação de um câncer na criança explode no
seio familiar. Desde o momento em que o diagnóstico é comunicado à família,
profundas alterações ocorrem nela, afetando não só a unidade familiar, como
também, o relacionamento de seus membros com as outras pessoas.
A época do diagnóstico é o período em que aparecem incertezas e senti-
mentos de angústia diante da possibilidade de morte. Geralmente, os pais não
acreditam no diagnóstico, negam, questionam, procuram outros médicos e
realizam em suas crianças novos exames, na busca de confirmação da doença
e na esperança de reversão da realidade.
Por medo de perder a criança, a família passa a tratá-la de forma dife-
rente da qual vinha sendo tratada até então, num processo de superproteção.
Segundo Valle (1994), há pais que não conseguem controlar a sua angústia
diante da possibilidade de recaída e a todo instante têm a necessidade de tocar
a criança, observá-la, mesmo enquanto ela dorme.
O câncer é uma doença que se desenvolve nos genes das células, com
uma capacidade de proliferação para originar tumores em áreas específicas
do corpo humano (Yamaguchi, 1994). De acordo com Borges et al. (2006),
câncer é uma denominação genérica, abrangendo um conjunto de doenças
com múltiplas causas e alternativas de tratamento e prognóstico. As causas
podem ser consideradas numa perspectiva multifatorial, englobando fatores
genéticos e mudanças nos hábitos de vida dos indivíduos.
Conforme dados do INCA, no Brasil, para o ano 2020, estimou-se 8.460
novos casos de câncer infantil, e 2.704 mortes. Em todo o mundo, segundo
200

a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer estima-se que, todos os


anos, 215.000 casos são diagnosticados em crianças menores de 15 anos, e
cerca de 85.000 em adolescentes entre 15 e 19 anos. Assim como nos países
desenvolvidos, no Brasil, o câncer já representa a primeira causa de morte
(8% do total) por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos.
O câncer infanto-juvenil corresponde a um grupo de várias doenças que
têm em comum a proliferação descontrolada de células anormais e que pode
ocorrer em qualquer local do organismo. Diferentemente do câncer do adulto,
o câncer infanto-juvenil geralmente afeta as células do sistema sanguíneo e
os tecidos de sustentação. Por serem predominantemente de natureza embrio-
nária, tumores na criança e no adolescente são constituídos de células indife-
renciadas, o que, geralmente, proporciona melhor resposta aos tratamentos
atuais (INCA, 2020).
Os tumores mais frequentes na infância e na adolescência são as leu-
cemias (que afetam os glóbulos brancos), os que atingem o sistema nervoso
central e os linfomas (sistema linfático). Também acometem crianças e ado-
lescentes o neuroblastoma (tumor de células do sistema nervoso periférico,
frequentemente de localização abdominal), tumor de Wilms (tipo de tumor
renal), retinoblastoma (afeta a retina, fundo do olho), tumor germinativo (das
células que originam os ovários e os testículos), osteossarcoma (tumor ósseo)
e sarcomas (tumores de partes moles) (INCA, 2020).
Nas últimas quatro décadas, o progresso no tratamento do câncer na
infância e na adolescência foi extremamente significativo. Hoje, em torno
de 80% das crianças e adolescentes acometidos da doença podem ser cura-
dos, se diagnosticados precocemente e tratados em centros especializados. A
maioria deles terá boa qualidade de vida após o tratamento adequado.
Muito embora as estimativas apontem o valor acima, sabe-se que as
crianças acometidas pelo câncer infantil precisarão ficar hospitalizadas por um
período de tempo. A realidade hospitalar é vista como negativa e marca a história
de vida da pessoa, conforme o momento em que acontece. Nesta perspectiva, o
enfoque dos estudos iniciais neste contexto (processo de adoecimento - crianças
- hospital) tenderam a enfatizar os aspectos negativos da situação de hospita-
lização e os efeitos potencialmente maléficos desta sobre o comportamento, a
vida e o desenvolvimento das crianças e famílias. Numa perspectiva mais atual,
tem-se enfatizado a dimensão educativa e potencializadora do desenvolvimento
humano nas situações de crise, apontando possibilidades de aprendizados sig-
nificativos relacionados a situação de hospitalização (Oliveira et al., 2009).
Para Barros (2003), a hospitalização pode ser uma situação positiva
em que a criança se beneficia de um momento mais próximo com o familiar
acompanhante, aprende que é capaz de lidar com a dor, de enfrentá-la, e se
perceber forte e eficaz. Saberá pedir ajuda e perceberá que existem pessoas
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 201

que podem curá-la ou minimizar sua dor. Além disso, essa experiência irá
prepará-la para situações futuras de sofrimento.
Assim, difere-se a situação de internação nas diferentes fases do ciclo
vital, seja infância, adolescência, vida adulta e velhice. A internação é uma
ruptura da história de vida do indivíduo, pois ele percebe que não é mais o
mesmo. Há um sofrimento diante da imagem de si mesmo. Segundo Souza et
al. (1988), ele é separado de sua família, e de seus referenciais identificatórios.
Todo o impacto que a hospitalização ocasiona nas crianças tende a alterar
o comportamento, visto que o hospital apresenta-se como um ambiente pouco
reforçador e com estímulos aversivos em demasia. A hospitalização pode
trazer à criança alguns efeitos psicológicos negativos, tais como a depres-
são, ansiedade, regressão, solidão, negação da doença, autoestima negativa
e distúrbios neuróticos (Sousa, Araújo, Santos, & Carvalho, 2010; Sobrinho,
Barbosa, & Dupas, 2011). Muitas das reações encontradas em crianças se
davam há algum tempo atrás, pela hospitalização em si e pela interrupção
da relação mãe-filho, necessária para o desenvolvimento neuropsicomotor
normal (Altamirano & Jereissati, 2002).
A partir do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de julho de 1990,
a implantação do Programa Mãe Participante em várias instituições trouxe
para a literatura brasileira especializada, a importância da participação dos pais
no cuidado de seus filhos durante o processo de hospitalização, apontando os
benefícios e os obstáculos nas relações entre equipe multiprofissional, família
e instituição (Imori & Rocha, 1997). Durante o processo de hospitalização
da criança, a presença dos pais, além de ser uma necessidade para minimizar
os efeitos da separação entre pais e filhos, atualmente, é legislada pelo ECA,
no Capítulo I, Art. 12, que garante a permanência em tempo integral de um
dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente.
Em contextos de atenção à saúde pediátrica, o atendimento é necessaria-
mente caracterizado pela presença, no mínimo, de um profissional de saúde,
do paciente e de um cuidador, na maioria das vezes a mãe da criança, que
geralmente é designada como a principal responsável pelos cuidados em saúde
e práticas educativas parentais (Kohlsdorf & Seidl, 2012).
Outro fator importante a ser considerado em situação de hospitalização, e
mais em específico, de crianças com câncer é a utilização do brincar. Conforme
Azevêdo (2011) acredita-se que o enfrentamento das repercussões psicológi-
cas da doença é favorecido com a utilização do lúdico, principalmente com
a abordagem em grupo, integrando as crianças e seus familiares para propor-
cionar momentos de satisfação e de reorganização das experiências. A criança
hospitalizada com câncer necessita de uma equipe multiprofissional e de um
espaço para expressar suas emoções, visando compreender a sua vivência
por meio das atividades lúdicas que auxiliem a promoção da saúde integral.
202

De acordo com Ribeiro e Angelo (2005) a hospitalização e a doença


interagem na vivência da criança, sendo relevante desenvolver intervenções
preventivas para minimizar as consequências provenientes da doença orgânica,
as quais dificultam o tratamento e a adesão aos procedimentos necessários
para sua recuperação. Assim o brincar, ajuda na condição física, na adesão
ao tratamento, bem como, nas necessidades básicas da infância que precisam
ter livre acesso ao brincar para se desenvolverem.
Mesmo considerando as possíveis dificuldades e variáveis que contro-
lam o comportamento da criança com câncer no hospital, pode-se afirmar a
contribuição para a superação das dificuldades encontradas no atendimento
pediátrico, fornecendo um modelo de atendimento direcionado à preparação
da criança para procedimentos médicos e para superação de dificuldades rela-
cionadas a esse contexto.

O Brincar e o Câncer

O brincar é reconhecido pela Convenção Internacional dos Direitos da


Criança, em seu artigo 31, e pelo artigo 227 da Constituição Federal. Já a
regulamentação da Lei número 11.104/2005, em 2015, tornou obrigatória a
instalação de brinquedotecas em unidades de saúde que ofereçam atendimento
pediátrico em regime de internação. De acordo com a Associação Brasileira de
Brinquedotecas (ABBri), essa lei, além de ser um avanço para as crianças que
se encontram internadas em hospitais, representa também um reconhecimento
à importância do profissional brinquedista (INCA, 2020).
Um dos mais importantes pensadores do século XX, o biólogo suíço Jean
Piaget, já classificou o brincar como uma forma de a criança se adaptar ao
mundo dos adultos. Assim, em momento de fragilidade, quando é necessário
enfrentar o tratamento oncológico, o brinquedo não é apenas um recurso
lúdico, que permite às crianças se ausentarem da realidade, mas também um
apoio psicológico. Por meio do brincar, eles também podem retomar a sua
rotina e desfrutar de novo do convívio social (INCA, 2020).
Vygotsky (2007), semiólogo russo, outra referência em desenvolvimento
infantil, também postula que o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento
proximal na criança, ou seja, uma zona passível de transformação através da
aprendizagem. O papel do adulto na promoção do desenvolvimento infantil,
por meio da zona de desenvolvimento proximal, é o de agir criando condições
para que as crianças brinquem, incentivando e propondo que a brincadeira
esteja presente na vida da criança.
O espaço do brincar também favorece que a criança manifeste suas poten-
cialidades e necessidades lúdicas, por meio de jogos variados e materiais que
estimulam a criatividade. Alguns recursos utilizados durante as brincadeiras
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 203

facilitam a aceitação dos procedimentos. Usar uma boneca para que a criança
conheça o local de sua doença torna mais fácil a hora de colocar o acesso
venoso para injetar a medicação, num processo de dessensibilização. Com
base no que foi anteriormente pontuado, os estudos descritos a seguir, foram
realizados na tentativa de comprovar a efetividade de tais técnicas.
Motta e Enumo (2004) também salientam que o brincar é uma das estra-
tégias utilizadas no hospital tanto com crianças, como com os profissionais
para lidarem com as adversidades da hospitalização. Um estudo realizado por
Paladino et al. (2014) com 30 crianças submetidas a cirurgias ortopédicas, de
adenoidectomia e postectomia, destaca a preparação para cirurgia por meio
do brincar terapêutico, como sendo eficaz, visto que os comportamentos apre-
sentados pelas crianças antes da cirurgia, demonstraram grande interesse pela
brincadeira, participando ativamente ao fazer perguntas e repetir a brincadeira,
manuseando os brinquedos hospitalares com desenvoltura.
O uso da fantasia favorece a expressão de sentimentos como a utiliza-
ção do Jogo de Areia constituída de um espaço para favorecer a expressão e
elaboração destes sentimentos por meio de imagens na caixa-de-areia, pro-
porcionando-lhes um espaço também de expressão não-verbal, facilitando,
assim, um contato entre seus aspectos conscientes e inconscientes.
Num estudo realizado por Silva et al. (2002), os autores obtiveram dados
que confirmaram a eficácia da utilização do referido instrumento, inclusive,
em enfermaria cirúrgica. Conforme as autoras, inserir o Jogo de Areia num
contexto de instituição hospitalar, especificamente de enfermaria cirúrgica,
permite uma reflexão sobre possibilidades ampliadas e criativas de expres-
são e relação psicoterapêutica num ambiente, no qual não é apenas o corpo
concreto que pede atenção.
Moix (1996) elenca o uso do jogo médico, ou dessensibilização sistemá-
tica de acordo com os psicoterapeutas comportamentais. Para Turner (1999)
a dessensibilização é uma intervenção terapêutica desenvolvida para eliminar
o comportamento de medo e síndromes de evitação, na qual uma resposta
de ansiedade ante um estímulo provocador de medo pode ser eliminada ou
debilitada, gerando uma resposta contrária à ansiedade. Nesta técnica, utili-
za-se material do próprio hospital, tais como máscaras, seringas, e bonecos
anatômicos. Neste jogo, a criança manuseia o boneco a ser operado, e assim,
ela vai sendo orientada sobre os procedimentos que serão realizados com ela,
e desmistifica as ideias errôneas que porventura, ela possa ter.
Segundo Twardosz, Weddle, Borden e Stevens (1986) a utilização dos
materiais do próprio hospital ajuda a criança a viver aquela situação como a
mais parecida possível com o momento pelo qual irá passar, pois em estudo
realizado com 6 crianças, verificaram que esta atividade é mais eficaz para a
redução de ansiedade do que as informações transmitidas pelas enfermeiras.
204

Costa Jr., Coutinho e Ferreira (2006) afirmam que, em todas as faixas


etárias, a participação em atividades de recreação que incluíam o recebimento
de informações sobre temas médicos aumentou a probabilidade de que o
paciente adquira um repertório de comportamentos mais ativo em relação ao
ambiente hospitalar. Também permite que a experiência de hospitalização e
tratamento médico possa ser utilizada como oportunidade de ampliação do
repertório de comportamentos do paciente, condicionada à disposição do
ambiente de cuidados dispensados à criança. Andraus, Minamisava e Munari
(2004) salientam que as pessoas que detêm informação sobre situações ou
práticas ansiogênicas experimentam um maior sentido de controle cognitivo
e mantêm a perturbação emocional em níveis mais baixos.
Azevedo, Santos, Justino, Miranda e Simpson (2008) pontuam que a
necessidade de brincar não deve ser eliminada quando as crianças adoecem
ou são hospitalizadas, uma vez que a brincadeira desempenha papéis impor-
tantes, como a capacidade de sentir-se mais segura em um ambiente estranho
com pessoas desconhecidas.
Outro estudo que referencia a importância do lúdico, especificamente
para o preparo pré-cirúrgico é o de Magalhães et al. (2010), o qual avalia três
crianças com idade entre 9 e 14 anos. A avaliação com aplicação de escalas
foi realizada em dois momentos que antecediam a realização da cirurgia,
pré e pós-preparo psicológico. Os resultados do pré-preparo evidenciaram
ocorrência de medo, ansiedade e preocupações. No preparo psicológico os
sujeitos puderam experienciar de forma lúdica o procedimento cirúrgico,
além de tirarem dúvidas, fazerem questionamentos e desmistificarem crenças
relacionadas ao procedimento médico invasivo. Na reavaliação pós-preparo
houve diminuição dos sintomas anteriormente apresentados. Fala-se aqui em
cirurgias, visto que muitas crianças terão a necessidade de se submeter a um
procedimento cirúrgico, e o preparo tanto para a cirurgia quanto para algum
procedimento médico invasivo se beneficiam do lúdico, pois além de apro-
ximarem a criança desta fase tão importante do ciclo vital, também ajudam
no manejo e na adesão ao tratamento.
Em pesquisa de Azevêdo (2011), o qual utilizou 16 produções científicas
sobre o assunto do brincar e o câncer infantil, identificou-se a receptividade das
crianças para o brincar, assim como o interesse para desenvolver a espontanei-
dade e a interação social. Os efeitos positivos dos projetos lúdicos no hospital
permitem evidenciar as contribuições para a qualidade de vida da criança e
sua família. Kohlsdorf e Costa-Júnior (2008) destacaram a importância da
participação do psicólogo e outros profissionais de saúde no desenvolvimento
de atividades lúdicas para a criança com câncer, visando fortalecer o apoio
para o enfrentamento do período de hospitalização. O brincar no hospital pro-
move o resgate da concepção de vida, o estabelecimento de relações sociais e
a integração da equipe de saúde na assistência à criança e ao acompanhante.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 205

Já na pesquisa de Silva e Cabral (2015) observa-se que uma das inúmeras


formas de humanizar a assistência, promover e propiciar o que toda criança
gosta e necessita fazer, é o brincar. Na brinquedoteca, elas aprendem novas brin-
cadeiras que são compatíveis com seu processo de adoecimento e tratamento.
Nessa perspectiva, o brincar no hospital passa a ser visto como um espaço
terapêutico capaz de promover a continuidade do desenvolvimento infantil.
Além disso, brincar no hospital contribuiu para melhorar a qualidade de vida
da criança, amenizando as repercussões do adoecimento na esfera psíquica e na
física. Percebe-se pelo discurso dos familiares que, neste espaço, por meio da
interação com outras crianças na mesma condição de adoecimento, a criança
em tratamento oncológico redescobre o prazer de viver. Esses dados são confir-
mados quando os autores apontam os benefícios da incorporação de atividade
lúdica para ajudar as crianças a aliviarem o fardo do tratamento (Gibson, 2010).
Conforme o mesmo autor, entre as novas brincadeiras aprendidas a partir
do adoecimento e contato com o ambiente hospitalar, estão os jogos eletrônicos
como vídeo games, jogos no computador e até mesmo jogos com dispositivo de
telefonia móvel, celular. Com relação aos jogos virtuais, em espaços interativos, as
crianças podem escolher aqueles adequados as suas habilidades físicas e mentais,
tipo de doença, e os objetivos terapêuticos. Além disso, tem possibilidade de exe-
cutar atividades de lazer que, na vida real podem estar impossibilitadas de realizar
em decorrência da complexidade da doença e tratamento e seus efeitos adversos.
Um achado importante da pesquisa de Silva e Cabral (2015) foi o fato
de que, apesar de as crianças estarem em tratamento ambulatorial, ou seja,
não estarem hospitalizadas, o hospital se manteve como principal local de
brincadeira. Isso mostra que a instituição deve estimular o desenvolvimento
infantil e cuidado no sentido ampliado, integral e não apenas curativo. O pro-
fissional de saúde, especialmente o enfermeiro que atua no cenário hospitalar,
precisa desenvolver habilidades para ser facilitador e promotor da brincadeira
no ambiente hospitalar, a fim de proporcionar cuidado mais individualizado
e completo a criança, pois tal atividade é essencial para o desenvolvimento
infantil. Por outro lado, na pesquisa de Borges, Nascimento e Silva (2008)
observou-se um expressivo predomínio do lúdico realizado nas residências
em comparação com o efetuado no hospital.
O brincar passa a ser visto como espaço de reabilitação capaz de promo-
ver não só a continuidade do desenvolvimento infantil, mas também permite
que a criança hospitalizada elabore melhor este momento específico em que
vive (Mitre, 2000). Para Soares (2003), as brincadeiras e jogos variados que
promovem risadas podem melhorar a oxigenação, induzem ao relaxamento
e melhoram a autoestima.
Borges, Nascimento e Silva (2008) afirmaram que através do brincar,
as crianças experimentam sensações de prazer e de felicidade; adquirem
conhecimento sobre o mundo; aprendem espontaneamente; desenvolvem
206

a sociabilidade. O brincar pode representar uma fuga da realidade, ou seja,


esquecer temporariamente a doença. Todos esses benefícios contribuem para
que as crianças aumentem as defesas imunológicas; minimizem os prejuízos
da hospitalização, sobretudo a apatia e a irritabilidade; recuperem-se mais
rapidamente e resgatem a alegria inerente à infância, mesmo em situação de
doença grave. Além desses aspectos, Soares (2003) destaca o que já foi citado
anteriormente, que quando as brincadeiras e os jogos são alegres, podem
melhorar a oxigenação, induzir ao relaxamento e também a autoestima. Assim,
se uma criança se sente alegre e descontraída, sua permanência no hospital
poderá ser mais fácil, tendo seu desenvolvimento e cura favorecidos.
Além desses benefícios apontados pelas mães entrevistadas, existiram
outros menos citados como: ajuda a criança a sentir-se melhor; promoção
ao crescimento e desenvolvimento infantil; favorecimento da criatividade;
redução da agressividade; aumento do interesse em brincar; diminuição da
depressão e ajuda para esquecer a doença.
Ao se pensar em quais atividades podem ser feitas com as crianças no
hospital, tem-se as mais diversas brincadeiras, que vão desde a mais simples
as mais elaboradas. E o fácil é que são brincadeiras utilizadas rotineiramente
na vida de todas elas. Compreendem jogos de tabuleiros, de montagem, bone-
cas, bolas, brinquedos artesanais e educativos, fabricados através de sucatas
pelas próprias crianças, brinquedos especiais ou adaptados para crianças com
movimentos limitados em decorrência de enfermidades, limitação visual ou
de fala e escuta, e até para crianças em isolamento hospitalar.
A criança com câncer, de modo geral, passa longo tempo internada e
ainda é submetida a várias reinternações e tratamentos estressantes. Portanto,
é fundamental que no plano de cuidados sejam inseridas brincadeiras e leitu-
ras como estratégias de lazer com um direcionamento adequado de modo a
considerar a faixa etária da criança e qual a sua condição clínica.
Atividades como pintura, desenhos, contação de histórias, mágicas, fanto-
ches, bolas, bonecas, brinquedos artesanais, quebra-cabeças, dominó, varetas,
estão muito próximas do que já faz parte da vida da criança, e no hospital
não deveria ser diferente, obviamente tendo os devidos cuidados, e sempre
na tentativa de contextualizar a brincadeira em relação ao momento vivido.
Crianças um pouco mais velhas podem se beneficiar de jogos tais como
quebra-cabeças, dominós, filmes, jogos eletrônicos, baralho, um interesse
maior pela leitura. A música também pode ser utilizada. Vale ressaltar a exis-
tência de uma variedade imensa de sons, e cada um deles pode sensibilizar uma
criança. Para Moura, Resck e Dazio (2012), a musicoterapia é uma estratégia
lúdica que consiste em utilizar o som para alívio físico, emocional e com-
portamental, contribuindo para aliviar também a dor, pois provoca relevantes
efeitos nos pacientes infantis oncológicos por aumentar a autoestima, alegrar
o ambiente, proporcionando momentos de relaxamento.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 207

Atividades prazerosas para as crianças são a participação de palhaços


ou médicos que alegram e atuam com o intuito de fazer rir e trazer diversão,
por muitos chamados de ‘Doutores da Alegria’.
Outra estratégia que tem sido utilizada é a tecnologia com suas diversas
possibilidades, sejam jogos, e-books, aplicativos, equipamentos eletrônicos
diversos, com luzes e sons, que facilitam em especial o acesso a crianças que
não podem ter contato com outras crianças.
Para as que podem ter contato, jogos como damas, trilhas, Banco Imobi-
liário, livros e contos infantis os mais diversos, tais como ‘Pinóquio’, ‘Branca
de Neve’, ‘Chapeuzinho Vermelho’ auxiliam a criança a entrar no mundo da
fantasia e servem como distração para o momento que estão vivenciando.
A distração é uma técnica muito utilizada, visto que, não podemos prestar
atenção a dois estímulos diferentes ao mesmo tempo. Em que se considere
esta evidência, quando há dor, a atenção deve ser dirigida a outra informação
diferente, para que a experiência consciente da dor diminua. Deste modo,
utilizam-se livros de histórias, contos infantis, atividades verbais, e exercícios
de respiração que contribuam para que a criança se atenha a outras atividades
diferentes daquelas que lhe são impostas. O relaxamento pode potencializar
a distração, e também, pode ser utilizado com técnica por si só (Moix, 1996).
Todas as tentativas de lúdico, estruturadas ou não, voltadas para o pro-
cesso de doença e hospitalização ou não, alegram a criança, e além disso, pro-
porcionam descontração, desenvolvimento e socialização. O riso promovido
pela ludicidade tem efeito terapêutico, colaborando no método analgésico,
pois sua prática favorece o humor e intensifica a imunidade, reduz a tensão
muscular e diminui a exaustão, a ansiedade, através da liberação de neurotrans-
missores que proporcionam o bem-estar (serotonina e endorfina) pelo sistema
límbico. Momentos de alegria suscitam alterações psiconeuroendócrinas que
atuam no sistema imunológico, de ansiedade e depressão. A gargalhada tam-
bém favorece o exercício respiratório, pois age como miorrelaxante, essencial
para a contenção da tensão, especialmente nos momentos de dor. O riso por
dez minutos contribui para sensação de felicidade e pode suavizar a dor por
horas, facilitando o repouso (Sousa, Schueroff, Pessoa, & Sobrinho, 2013).
No tratamento oncológico infantil, atividades prazerosas e alegres devem
ser proporcionadas à criança como aliadas ao seu desenvolvimento e reabi-
litação, e não como simples passatempo. Assim, é preciso que todos aqueles
que cuidam dela no tratamento oncológico tenham clareza dos benefícios
das atividades lúdicas na melhoria da sua qualidade de vida por favorecer
momentos alegres, saudáveis e promotores do desenvolvimento infantil e de
sua reabilitação. Pode diminuir efeitos negativos da rotina no ambiente hospi-
talar quando para a criança, a participação da própria criança no planejamento
dos seus cuidados, a escolha de alimentos e das roupas preferidas. Aspecto
importante é promover a continuidade das atividades escolares, chamar a
208

criança pelo nome, assim como oferecer explicações, apoio e auxílio para a
sua inserção nos espaços para recreação. Não apenas interesse, mas aprimo-
ramentos constantes no cuidado à criança com câncer devem nortear as ações
dos profissionais (Paixão, Damasceno, & Silva, 2016).
Em estudo realizado por Lima e Silva (2015) os achados mostram que as
atividades lúdicas descritas pelas crianças com câncer internadas envolvem o
assistir televisão, o uso de computadores, os jogos e os brinquedos, a realiza-
ção de desenhos, a brinquedoteca e o palhaço. Essas atividades, segundo as
crianças, proporcionam diversão, sentimentos de alegria, distração e interação
com outras pessoas, elementos essenciais no processo de cuidar que favorecem
seu bem-estar e reduzem os desconfortos provenientes da hospitalização.
Do mesmo modo que se utiliza recursos os mais diversos, também exis-
tem recursos especialmente desenvolvidos para a situação de hospitalização.
Um material lúdico desenvolvido por Broering e Kruger (2018), intitu-
lado ‘Baralho da Hospitalização Infantil’, publicado pela Editora Sinopsys,
é uma ferramenta lúdica facilitadora no acesso a pensamentos e comporta-
mentos de crianças inseridas no contexto hospitalar. O Baralho é composto
de 49 cartas com características gráficas para ambos os gêneros, direcionadas
a faixa-etária entre 6 e 13 anos, podendo ser expandida para outras faixas
etárias de acordo com a habilidade do terapeuta em apresentar as cartas e
explicar a forma de manuseio. O instrumento é dividido em quatro módulos
que contextualizam a situação de hospitalização pediátrica, são eles: a) even-
tos; b) pensamentos; c) sentimentos e d) comportamentos. A partir da situação
proposta, a criança seleciona com a mediação do profissional as demais cartas
correspondentes aos seus pensamentos, sentimentos e comportamentos que
teria diante de tal situação. Isso permite ao terapeuta identificar as crenças,
pensamentos e comportamentos disfuncionais, o que possibilita intervenções
de psicoeducação e reestruturação cognitiva, para que a criança desenvolva
estratégias de enfrentamento diante do processo de hospitalização. Este mate-
rial visa mostrar como o lúdico pode proporcionar reflexões e uma melhor
adesão aos tratamentos e tempo de internação.
O Baralho é um recurso importante para se trabalhar emoções e sen-
timentos referentes à situação da hospitalização, doenças e procedimentos.
Realiza-se com frequência no hospital, Oficinas com outras crianças para se
trabalhar emoções, visto que a criança que é ouvida em suas necessidades,
sente-se melhor compreendida, além de receber algum tipo de intervenção
associada ao momento. Um exemplo é a criança, que na carta de eventos,
selecionou Injeção e Remédios (Broering & Kruger, 2018).
Ela escolheu a carta Injeção e Remédios. Foi realizado a psicoeduca-
ção sobre as emoções e a partir disso foi solicitado que ela escolhesse a emo-
ção que mais sentia naquele momento no hospital. É importante explicar para
a criança nesse momento que sentimentos tidos como bons e ruins existem
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 209

e podem ser sentidos, porém, tem-se que saber lidar com eles, e para isso,
torna-se fulcral identificar quais eventos causam determinados pensamentos
e sentimentos e o que pode-se fazer diante disso.
De todas essas emoções que estão nas cartas, você consegue escolher
uma, que você mais identifica quando vai receber a injeção?
A criança escolheu a carta Medo. Após isso, foi solicitado que medisse
no termômetro o quanto ele sentia de medo. Este aqui é nosso termômetro.
Você sabe o que é isso e para que ele serve?. Agora você vai marcar neste
termômetro o quanto você sente de medo.
Ela marcou que o medo que sente é forte. Foi então questionada sobre os
pensamentos que a levam a sentir medo. Quando a enfermeira vem te dar a
injeção, o que você pensa que faz com que esse medo apareça e seja tão forte?
Falou que sente medo porque a injeção dói e a machuca, por este
motivo escolheu a carta Penso que vai doer da categoria ‘Pensamentos’.
Com o objetivo de compreender como a criança reage a partir desta situa-
ção, é solicitado logo em seguida que ela escolha a categoria de carta ‘Com-
portamentos’. Neste caso foi escolhido pela criança as cartas Choro e Grito.
A partir dessa escolha, o terapeuta faz uma relação sobre a emoção e os
pensamentos que fazem com que este medo se torne maior. Questionou-se se
a criança sabia a importância de necessitar fazer uso da injeção. Muitas vezes
a criança não é informada sobre a importância dos procedimentos aos quais é
submetida no hospital, e assim, pode-se afirmar que a informação é fundamental
para a sua conscientização sobre a importância do procedimento ou medica-
mento para sua melhora. A injeção é um procedimento que dói, e é comum
sentirmos medo da dor. Mas você sabe o porquê você está tomando a injeção?
Após a conversa com a criança sobre a importância deste procedimento,
foi proposta a reflexão sobre a relação de seu pensamento com a intensidade
da emoção que sentia:
Não é errado sentir medo, crianças e adultos de qualquer idade sentem
medo da dor. Mas como você já sabe, a injeção não vai te machucar e é
importante para que você possa melhorar. Muitas vezes a injeção é para ser
algo rápido e quando ela acaba a dor acaba também. Mas se a gente grita
e chora mais tempo demora, e o que era para ser rápido demora muito para
passar. Então, vamos chamar este pensamento de pensamento que não ajuda,
você consegue me falar porque que não te ajuda?
É importante que a criança consiga associar o pensamento com a inten-
sidade do medo e os comportamentos apresentados. Caso ela não consiga,
é importante o terapeuta auxiliá-la nesta associação fundamental para que a
reestruturação cognitiva seja efetiva. Uma opção é iniciar um questionário
socrático para que a criança visualize esta relação com mais facilidade.
E com a maneira exemplificada anteriormente pode-se ter uma noção de
como os sentimentos serão trabalhados em relação àquilo que está passando
210

ou sentindo. Existem cartas coringas também em que a criança pode escolher


sobre aquilo que a incomoda. Um exemplo é de uma criança que usou a carta
coringa para o Evento. Nesta carta ele escolheu falar sobre a camisola utilizada
no hospital, pois trouxe que o sentimento era de vergonha, o pensamento foi
“Que chato”, mas aceitou que nada tinha a fazer, que foi o comportamento
decorrente do pensamento.
Outro material desenvolvido por Broering (2018), chama-se ‘Conver-
sinha no Hospital’ e tem por objetivo proporcionar à criança a possibilidade
de falar sobre coisas que a incomodam, bem como, falar sobre assuntos que a
distraiam em relação às situações que acontecem no hospital. Além de que as
cartas com ilustrações lúdicas ajudam a criança a se interessar pelo material e
colaborar com o profissional. Conversinha é um material lúdico para ser usado
no primeiro contato do psicólogo com a criança em situação de hospitalização
também mostra como o lúdico favorece a interação no ambiente hospitalar.
O ‘De Avental no Hospital’ (Broering, Leite, & Souza, 2015) é um jogo
para auxiliar no preparo de crianças para o procedimento cirúrgico. Consta
de um jogo de tabuleiro, com várias casas em que a criança percorre o passo
a passo desde o momento em que sabe sobre a necessidade de cirurgia, os
cuidados e exames pré-operatórios, até o pós-cirúrgico e possível alta.
Existem livros voltados a situação de hospitalização, incluindo diversos
motivos, tais como: ‘Operar, eu?’, de Broering (2018); ‘Enquanto estou no
hospital’, de Simone Lopes de Mattos e Vivian Lopes de Mattos; ‘A criança,
o hospital e o lúdico’, de Rita Oliveira; ‘O que tem no hospital’, de Marina
Menezes; ‘Quando você está doente ou internado’, de Tom McGrath, dentre
outros, que se utilizam de informação para tranquilizar a criança sobre o que
irá acontecer no hospital.
O objetivo da informação é promover a possibilidade de manejar os even-
tos antecipando-os e compreendendo os objetivos, o significado e propósito
deles, além de corrigir o que não ficou claro. A informação deve ser simples,
segundo as condições de cada criança e família. A criança informada lidar
melhor com a situação, pois a informação aumenta a percepção do paciente em
relação a sua capacidade de exercer algum controle sobre a situação vivenciada.
Vale ressaltar que as diversas formas de brincar no hospital com crianças
acometidas por diversos tipos de doenças deve levar em conta alguns aspec-
tos, tais como as particularidades de cada criança, sua condição de saúde,
experiência, inserção familiar e sociocultural, além de sua familiaridade com
o ambiente, pessoal e procedimentos hospitalares, tendo em vista que cada
criança é singular e pode fazer uso de suas estratégias de enfrentamento frente
à situação que lhe é imposta (Broering, 2019).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 211

Considerações Finais
É inegável que o adoecimento pelo câncer infantil implica mudanças
dos espaços e das pessoas que interagem com as crianças nas brincadeiras.
O estresse envolve a todos da família, a qual passa por um período de medo,
insegurança e sensação de que perderá o controle. Assim, percebe-se a real
necessidade de um profissional que esteja apto a lidar com tais situações,
trabalhar com o paciente, familiares e equipe de saúde, abarcando assim toda
a gama de pessoas que circundam a criança em seu processo de internação.
Diante dos comportamentos apresentados pela criança no ambiente hospi-
talar, percebe-se a necessidade da equipe de saúde em dar atenção não somente
para a saúde física, mas também atenção para os cuidados com as necessida-
des emocionais e sociais que a criança apresenta. Reside aí a importância da
intervenção psicológica para a melhora do comportamento e da situação na
qual a criança está inserida, favorecendo ao paciente uma melhor adaptação
e qualidade de vida no ambiente hospitalar
Kazak, Segal-Andrews e Johnson (1995) já referiam-se à instituição
hospitalar também como um contexto de promoção de saúde para a criança
e sua família. Para tanto, é necessário que sejam reconhecidas as influências
da família, da sociedade, e do sistema médico no processo de adoecimento da
criança. O hospital deve ser incluído como parte integrante do contexto social
da criança doente, pois este influencia a trajetória do seu desenvolvimento e
nas suas relações psicossociais com o meio, e aqui pode-se incluir o brincar.
O profissional da saúde, normalmente é quem fará as atividades lúdicas
com a criança, por estar sempre no hospital e conhecer de fato, sobre o paciente
e a doença, por isso deve voltar-se aos aspectos afetivos, deve ouvir o outro
lado das queixas do paciente e seus posicionamentos sem estar voltado apenas
ao tratamento clínico médico. Utilizando-se de metodologias de trabalho que
visem proteger o desenvolvimento da criança, evitando sequelas emocionais
futuras, ainda que a permanência da criança no hospital seja variada, o brincar
no hospital tende a minimizar os sentimentos negativos e a criança se sente
protegida, acionando mecanismos de proteção para seu desenvolvimento.
Em tempo, percebe-se que os recursos lúdicos que podem ser utilizados em
hospital são pouco onerosos, mas podem ajudar a criança a sofrer menos com
ansiedade, apresentar menos condutas negativas, se comportar de forma mais
colaboradora, apresentar menos transtornos psicológicos após receberem a alta, e
terem memórias mais saudáveis sobre o momento vivenciado (Broering, 2011).
Pelos estudos abordados neste capítulo, pode-se notar que o brincar ajuda
a criança a ter suas necessidades socioemocionais preservadas na medida do
possível, pois quando brinca ela se comunica, se expressa, se diverte, relaxa e
talvez, até esqueça dos tantos procedimentos invasivos e doloridos aos quais
seja submetida.
212

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CAPÍTULO 14
PSICOLOGIA PEDIÁTRICA
E ONCOLOGIA:
intervenções da terapia cognitiva
Marisa B. L. Marantes Sanchez

A doença na infância desencadeia estresse, que poderá deixar marcas na


memória emocional da criança. Quando a questão é o câncer, ainda que ele
perdeu o estigma de doença incurável e fatal, segue sendo percebido como
assustador devido aos procedimentos médicos invasivos e efeitos colaterais
(Hostert, Motta, & Enumo, 2019).
A consequente hospitalização se torna fundamental para a realização
do tratamento e cuidados específicos. O afastamento temporário de casa,
o ambiente hostil com cheiros diferentes, comidas com as quais não estão
familiarizados, picadas de agulha, sono interrompido para o recebimento de
medicamentos, geram ansiedade pela nova e desconhecida rotina. A prescri-
ção de tratamentos terapêuticos complexos demanda explicações detalhadas
ao paciente. A revelação do diagnóstico é uma tarefa que requer habilidade,
a fim de não serem ativados os esquemas de vulnerabilidade e se instalar a
insegurança na criança ou adolescente (Bisch & Sanchez, 2014).
A internação em enfermarias provoca instabilidade emocional no paciente
e nos pais. A preocupação dos progenitores expressa em seus semblantes é
percebida pelo paciente, o qual demonstra tristeza e ansiedade. Desse modo,
as alterações físicas e emocionais provocadas pela hospitalização, podem
modificar o seu comportamento. O acompanhamento psicológico se insere
como fator protetivo para auxiliar no enfrentamento das adversidades viven-
ciadas durante todo o período do tratamento (Bisch & Sanchez, 2014; Armelin
& Heringer, 2017).
A psicologia pediátrica é a especialidade dentro psicologia da saúde
exclusiva ao cuidado e bem-estar de crianças, adolescentes e suas famílias.
O trabalho realizado ocorre em equipe multidisciplinar, de modo a atender
integralmente ao doente (Castro, 2007).
As intervenções requerem que o psicólogo tenha conhecimento sobre
o desenvolvimento humano e psicopatologias, além de conhecer conceitos
médicos voltados ao processo de tratamento clínico. Este capítulo pretende
trazer contribuições sobre a prática da psicologia pediátrica, com ênfase no
218

câncer em crianças e adolescentes, a partir da experiência prévia e das evi-


dências científicas. Do mesmo modo, a aplicabilidade da técnica da terapia
cognitivo-comportamental no contexto da saúde.

O Câncer Infanto-Juvenil

O câncer está entre as quatro principais causas de morte prematura na


maioria dos países e, portanto, considerado o principal problema de saúde
pública do mundo. Em 2018, a estimativa mundial aponta que ocorreram 18
milhões de novos casos de câncer no planeta e 9,6 milhões de óbitos, sendo o
câncer de pulmão o mais emergente em adultos (Organização Pan Americana
de Saúde [OPAS], Organização Mundial da Saúde [OMS], 2018).
A atenção global a novos casos inicia no acesso à prevenção, diagnóstico,
tratamento, reabilitação até a sua reinserção social contemplando o atendi-
mento à criança e ao adolescente com câncer. O Ministério da Saúde, no ano
de 2005, fundou a Política Nacional de Atenção Oncológica contemplando
ações de Promoção, Prevenção, Diagnóstico, Tratamento, Reabilitação e Cui-
dados Paliativos, a ser implantada em todas as unidades federadas. A proposta
estabelece que a Política Nacional de Atenção Oncológica deva ser organizada
de forma articulada com o Ministério da Saúde e com as Secretarias de Saúde
dos estados e municípios (Brasil, 2005).
O câncer na criança e no adolescente (entre 0 e 19 anos), chamado de
infanto-juvenil ou pediátrico, tem a incidência universal aumentando, com a
perspectiva de 300 mil novos casos até 2030. O Instituto Nacional de Cân-
cer José Alencar Gomes da Silva (INCA) estima que, no Brasil, para cada
ano do triênio 2020-2022, será de 4.310 casos novos no sexo masculino
e de 4.150 para o sexo feminino. Estes valores correspondem a um risco
estimado de 137,87 casos novos por milhão no sexo masculino e de 139,04
por milhão para o sexo feminino (Instituto Nacional de Câncer José Alencar
Gomes da Silva [INCA], 2019, p. 52).
Distinto ao câncer do adulto, o câncer na infância apresenta natureza
embrionária, a qual acaba afetando as células do sistema sanguíneo e os
tecidos de sustentação. Também, diferente aos fatores de risco encontrado
em adultos, o estilo de vida nessa faixa etária demonstra não ter influência
no diagnóstico (Brasil, 2017).
Os tipos predominantes de cânceres pediátricos são leucemia (28%),
sistema nervoso central (26%) e linfomas (8%). Atualmente, 80% das crianças
e adolescentes acometidos da doença podem ser curados, se diagnosticados
precocemente e tratados em centros especializados. A maioria deles terá boa
qualidade de vida após o tratamento adequado (INCA, 2019).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 219

O processo terapêutico nessa faixa etária é semelhante ao realizado


com adultos. Os procedimentos médicos se realizam conforme o tipo e o
estadiamento da doença. Entre os tratamentos utilizados estão a Cirurgia, a
quimioterapia, a radioterapia e o transplante de medula óssea. Em determina-
dos tipos de cânceres, novos medicamentos alvos podem ser usados em vez
dos quimioterápicos padrões. A terapia alvo é direcionada às células que se
dividem rapidamente, por isso são eficazes contra estas. Os medicamentos
às vezes funcionam, quando os quimioterápicos padrões não respondem ao
tratamento. Para, além disto, têm diferentes efeitos colaterais que muitas vezes
são menos severos (França, 2018).
As reconhecidas limitações nos avanços terapêuticos são encontradas
quando comparados os esforços da Oncologia Pediátrica no Brasil em relação
a países desenvolvidos. Esta doença representa a segunda causa de morte na
população pediátrica, e estudos não têm evidenciado declínio desses dados
(Mutti et al., 2018). Deste modo, durante o XIV Congresso da Sociedade
Brasileira de Oncologia Pediátrica (SOBOPE), representantes de órgãos da
saúde brasileira criaram o documento oficial intitulado “Carta de Brasília –
Oncologia Pediátrica 2014”. Esta carta expressa às sugestões da comunidade
cientifica à rede de saúde para ampliar e integrar a assistência às evidências
(Magalhães et al., 2016).
Como o câncer em crianças e adolescentes apresenta características pró-
prias, a troca de informações, registro de dados em cada estado brasileiro, favo-
receu o alinhamento das intervenções terapêuticas. Na infância, o câncer não é
uma doença previsível, porém já é reconhecida a sua ligação a fatores genéticos
com um curto período de latência para sua manifestação. Logo, a prevenção
do câncer infantil ainda é um desafio para o futuro e a ênfase deve ser dada
ao seu diagnóstico precoce e imediato encaminhamento para um tratamento
oportuno e de qualidade, que possibilite maiores taxas de cura (Brasil, 2017).
Diante do diagnóstico, tanto o paciente quanto a família são pegos de
surpresa. O acompanhamento psicológico especializado se mostra fundamental
auxiliar nesse processo.

Psicologia Pediátrica

A psicologia pediátrica é uma área especifica da psicologia da saúde,


aplicada à criança e ao adolescente, a qual distinta da psicologia clínica infantil
preocupada com a doença mental, utiliza seu conhecimento para tratar o mal
estar emocional devido ao adoecimento orgânico.
A psicologia da saúde compreende o estudo dos processos psicológicos
e comportamentais, na saúde, enfermidade e cuidados com a saúde (Cas-
tro, 2007). Tem como foco os problemas físicos e doença. Desta forma, os
220

modelos tradicionais empregados em saúde mental nem sempre são os mais


indicados. A área se distingue da psicologia clínica por compreender o com-
portamento no contexto da saúde e doença (Almeida & Malagris, 2011).
Entre as atividades realizadas pelos psicólogos da especialidade, além
da investigação, pesquisa e ensino, realizam a intervenção em serviços clí-
nicos e hospitalares. A prática se volta para os elementos psicológicos que
reforçam os aspectos da saúde, reduzem o adoecer e auxiliam ao paciente no
enfrentamento do adoecimento (Almeida & Malagris, 2011; Rudnicki, 2020).
A ênfase na pediatria começou a se desenvolver, como área da psico-
logia, no final dos anos 70, nos EUA. Ela surge a partir da necessidade dos
médicos que passaram a se deparar com problemas do desenvolvimento,
comportamento e aprendizagem infanto-juvenis associadas a causas médicas
(Pires, 1998). Verificaram que os aspectos emocionais tinham grande influên-
cia na saúde e que nem sempre os problemas apresentados eram unicamente
físicos (Roberts, 1982). A partir dessa demanda, os profissionais da psicologia
iniciam os atendimentos, porém, ao executar a assistência a esses pacientes,
perceberam que havia limitações na práxis (Menezes, Moré, & Barros, 2008).
O uso do conhecimento utilizado no exercício da clínica, não era sufi-
ciente para auxiliar aos pacientes com diagnóstico de doenças orgânicas, bem
como às suas famílias. Portanto, o psicólogo começa a contemplar diferentes
campos do conhecimento como a psicologia do desenvolvimento, psicopa-
tologia, avaliação diagnóstica, a influência dos fatores sociais que afetam
o paciente e a família, fatores de risco e proteção, o processo da doença e
tratamento médico (Pires, 1998; Menezes, Moré, & Barros, 2008).
Assim, a psicologia pediátrica, ainda que se mostre uma área nova, define
as características da sua atuação. A prática ocorre no âmbito dos serviços médi-
cos para a saúde da criança e do adolescente, e a ênfase recai na intervenção da
saúde primária e secundária. O campo se mostra definido onde as ações acon-
tecem em equipes interdisciplinares para o acompanhamento infanto-juvenil
no processo saúde e doença. Realiza avaliação psicológica, acompanhamento
pré e pós-cirúrgico, diagnóstico precoce de alterações no desenvolvimento,
sensibilização da equipe para as necessidades da criança e família, interven-
ção em situações agudas e crônicas que favoreçam o uso de estratégias de
enfrentamento para controle do estresse (Venegas & Moral, 2011).
A assistência prestada se desenrola nas diferentes formas de manifestação
de alterações na saúde. A saber: modificações no desenvolvimento (transtornos
alimentares ou do sono), problemas neonatais (prematuridade, má formação,
morte precoce), doenças crônicas (câncer, diabetes, fibrose cística), situa-
ções traumáticas (traumatismos e queimaduras), campanhas de prevenção
(uso de substâncias, gestação precoce e doenças sexualmente transmissí-
veis) (Pires, 1998).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 221

A criança e o adolescente, culturalmente, não possuem idade para o


adoecimento. Logo, frente à manifestação de sintomas e confirmação diag-
nóstica da doença, surgem inseguranças, revoltas, medos e ansiedade, tanto no
paciente, quanto em seus familiares, bem como na equipe. Estes, preparados
para a cura, se deparam com situações de sofrimento e dor, e por vezes com
a luta entre a vida e morte (Rudnicki, 2020).
Por consequência, a psicologia pediátrica começa a expandir-se na área
de subespecialidades emergindo a Psico-Oncologia pediátrica. Esta passa a
dedicar o conhecimento à influência de fatores psicológicos sobre o desen-
volvimento e manifestação do câncer infantil. O trabalho tem como ênfase
o estudo e a intervenção aplicada aos cuidados com o paciente portador de
câncer, sua família e os profissionais envolvidos no seu tratamento (Nasci-
mento & Leão-Machado, 2017).
Ainda que alguns cursos de graduação em psicologia no Brasil já tenham
em sua grade curricular a disciplina de psicologia da saúde, o destaque em
psicologia pediátrica e suas subáreas segue sendo escasso. A mesma se mostra
ampliada nos cursos de especialização na área da saúde e hospitalar. Assim,
os psicólogos pediátricos, através de evidências começam a comprovar a
eficácia das intervenções para auxiliar o paciente no processo de adaptação
ao tratamento médico.

Intervenções da Terapia Cognitiva

A terapia cognitiva criada por Aaron Beck, na década de 60, como uma
psicoterapia breve, estruturada, orientada para o presente e direcionada para
os problemas atuais (Beck, 2013). Parte da premissa que a inter-relação entre
cognição, emoção e comportamento está implicada no funcionamento normal
do ser humano e, em especial na psicopatologia (Knapp, 2004).
O paciente através da colaboração e participação ativa durante o pro-
cesso terapêutico, aprende a identificar e modificar sua forma distorcida de
pensar. As emoções que tais pensamentos provocam e os comportamentos
que ocorrem em decorrência dos mesmos, criam habilidades necessárias ao
enfrentamento e, por fim, a aquisição de estratégias funcionais para prevenir
a recaída (Beck, 2013; Knapp, 2015).
Atualmente, a Terapia Cognitiva está sendo aplicada por um número
cada vez maior de psicólogos diante do sofrimento emocional do paciente em
diferentes contextos (Petersen & Wainer, 2011). Com crianças e adolescentes,
a abordagem segue os mesmos princípios teóricos utilizados com adultos. As
intervenções buscam analisar, identificar e modificar cognições, mas tam-
bém reforçam comportamentos que sejam funcionais e que tenham uma alta
222

probabilidade de serem reforçados, tanto pelo ambiente social, quanto pelo


processo de ressignificação cognitiva do paciente (Friedberg & McClure, 2019).
Diante do diagnóstico do câncer, as consequências psicológicas da doença
e do tratamento podem ser várias, a curto e em longo prazo, para a criança, o
adolescente e a família. As possíveis reações envolvem passividade ou agres-
sividade, e sentimentos básicos como o medo, a tristeza e a raiva são ativa-
dos. A manifestação das emoções estará diretamente relacionada ao processo
adaptativo da pessoa ao contexto social. Estas emoções irão gerar sentimentos
expressivos do seu estado interno, ou seja, como a pessoa está percebendo e
interpretando a situação de enfermidade e não a doença em si (Castro, 2007;
Sanchez, Barbosa, & Rudnicki, 2019).
Assim, o foco na resolução de problemas para enfrentar a enfermidade
faz com que a TCC seja um instrumental valioso e adequado ao contexto
da doença física e ao setting hospitalar. O setting terapêutico no ambiente
hospitalar apresenta características próprias. O espaço físico não é privativo
do psicólogo com o paciente, assim como na prática clínica. Este pode ser
interrompido a todo o momento por outros profissionais da equipe de saúde
(médicos, enfermeiras, fisioterapeutas etc.), que estão executando suas funções
e cuidados com o paciente. A vista disso, o hospital é um local que necessita
de intervenções mais breve, diretivas e focadas em problemas, tal como a
Terapia Cognitiva (Sanchez, Barbosa, & Rudnicki, 2019).
O câncer, por ser uma doença agressiva, requer ciclos de hospitalização
para consumar o tratamento médico. As internações geralmente são longas.
Além de causar rupturas na rotina de vida normal da criança ou adolescente,
os tornam expectadores de procedimentos terapêuticos, invasivos e doloro-
sos. Para o enfrentamento de tais períodos, é necessário que haja técnicas de
intervenções psicológicas para uma melhor adesão e enfrentamento da doença
(Ismael, 2015; Ribeiro & Morais, 2017).
O psicólogo pediátrico, no uso da abordagem cognitiva, deverá adotar
uma série de posturas ante ao paciente, à família e à equipe de saúde, como
utilizar linguagem clara e objetiva, além de adotar postura acolhedora, empá-
tica e autêntica para criar uma relação de confiança. Também deverá auxiliar
ao paciente no estabelecimento de metas realistas e ajudá-lo a examinar e
responder às suas cognições disfuncionais (Peron & Sartes, 2015).
A psicoeducação, ainda que não caracterize especificamente uma inter-
venção, abarca as informações ao paciente, sobre sua doença e condição de
saúde. As orientações fornecidas podem interferir positivamente no sucesso
do tratamento, aumentar a confiança e ampliar sua motivação para realizar o
tratamento. A obtenção do conhecimento pode auxiliar na mudança cognitiva e
no aprendizado de estratégias para lidar com as adversidades do adoecimento
(Carvalho, Malagris, & Rangé, 2019).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 223

Ao realizar a psicoeducação sobre o tratamento do câncer e do modelo cog-


nitivo, torna-se recomendável que o psicólogo possa flexibilizar as informações.
Tendo em mente a importância e a necessidade de favorecer a compreensão da
criança ou adolescente, deverá considerar as características cognitivas, culturais
e sociais do paciente. É fundamental evitar o aparecimento da ansiedade exa-
cerbada pela incompreensão do processo, pois isso poderá dificultar a aliança
terapêutica e a motivação para o tratamento (Sanchez, 2020).
Atualmente, existe uma série de materiais psicoeducativos para crianças
e adolescentes, tais como livros específicos sobre o câncer em crianças – No
país dos carequinhas; baralho infantil da hospitalização; e jogos eletrônicos
– alpha beat câncer – o qual atrai as crianças maiores e os adolescentes.
Os sintomas de ansiedade e depressão são comuns em crianças com
doenças crônicas e hospitalizadas. Portanto, algumas estratégias terapêuticas,
especificas, devem ser adotadas. Atividades prazerosas, reestruturação cogni-
tiva, treino de resolução de problemas, treino de relaxamento, incremento de
habilidades de autocontrole e treinamento de pais (Petersen & Wainer, 2011).
O brinquedo estruturado e diretivo e os jogos, na maioria das vezes, têm
conotação prazerosa ao paciente. O brincar favorece a manifestação dos pen-
samentos automáticos, emoções e distorções cognitivas. Brinquedos represen-
tativos tais como: bonecos caracterizados de médicos e enfermeiras, bonecos
caracterizados de pacientes e familiares, bonecos com cabelos removíveis,
seringas, suporte para quimioterapia, auxiliam para que a criança expresse seus
sentimentos. A modelação pela brincadeira permite que o psicólogo reforce os
comportamentos positivos frente à hospitalização e procedimentos de saúde.
Também possibilita diminuir ou modificar comportamentos que indiquem
ansiedade e temor frente ao tratamento (Sanchez, 2020).
A reestruturação cognitiva ocorre na medida em que o paciente começar
a identificar e questionar seus pensamentos desadaptativos. Propor ao pequeno
paciente ansioso que represente um detetive em busca de “pegadas cerebrais”,
assim será possível trabalhar com o erro de pensamento e o catastrofismo. O
detetive deverá expressar marcas de “pegadas”, que indiquem o seu pensa-
mento “e se” (Ex: Quando penso “e se” cair meu cabelo, poderei ficar sem
amigos?). Após a expressão catastrófica, pedir que aponte no “termômetro
do medo”, o quanto acredita em seu pensamento. E, a seguir que responda:
se seus amigos gostam de você, porque deixariam de gostar agora? Por fim,
solicitar à criança que revise suas “pegadas” e responda se elas estavam indo
pela estrada correta ou não.
Através da resolução de problemas, a criança ou o adolescente, aprende
a lidar com uma situação que gere ansiedade. Identificar os obstáculos e desa-
fiar as crenças disfuncionais facilitam a resolução do problema. Pacientes,
muito ansiosos ou muito deprimidos, se beneficiam quando se distanciam da
224

situação e um personagem assume esse lugar. A vinheta de Henrique, 6 anos,


com neuroblastoma, ilustra a técnica:

Psi – Estou vendo que você gosta bastante do boneco do homem aranha.
Henrique - Ele é legal! Esperto e corajoso!
Psi – E se ele estivesse muito chateado, porque terá que fazer quimiote-
rapia, como ele poderia resolver esse problema?
Henrique – Ele não quer ficar careca, então ele pode usar um boné
do aranha!
Psi – Isso é uma ótima ideia! Essa pode ser uma solução para o teu pro-
blema também?
Henrique – Pode, eu já tenho até esse boné...

As técnicas de relaxamento têm sido vitais no auxílio do controle da


ansiedade e estresse. Para isso, o terapeuta deverá ter um bom domínio da
técnica, para de fato auxiliar a pessoa a aprender a identificar a tensão de
seu corpo e aprender a relaxar seus músculos. Solicitar que a criança respire
lentamente, sentindo o ar frio entrar no seu nariz e o ar quente sair é o início
do exercício. Após, pedir que descreva como é um robe e como é um boneco
de pano. No momento seguinte, então, que os represente.
O Mindfulness – ou atenção plena – também subsidia a criança a ser
menos reativa e a lidar com a vivência do adoecimento. Trata-se da concen-
tração no momento atual. Com a atenção plena deverá ‘viver’ o presente, o
que é diferente de ‘pensar’ o presente. O objetivo é o aprimoramento para
gerenciar a atenção e a emoção, diminuindo a ruminação ansiosa (Dinelli &
Assumpção, 2018).
Os exercícios devem ser variados e ampliados a cada sessão para a aquisi-
ção da plena atenção do seu corpo. A respiração, a vigilância sobre seu estado
corporal e movimentos motores e sensações físicas fazem parte do crescente
aprendizado. Dessa forma, passam a obter melhor autoconhecimento e a
desenvolver a auto regulação emocional (Leahy, Tirch, & Napolitano, 2013).
As habilidades sociais podem ser desenvolvidas através do auxílio do
auto- registro das ações executadas, incluindo tanto as que favorecem quanto
as que interferem na qualidade dos relacionamentos, O incremento do auto-
controle pode advir por meio do desenvolvimento de estratégias de enfren-
tamento eficazes.
A distração através da música, do uso de celulares e demais eletrôni-
cos tem apresentado resultados positivos em especial com adolescentes. A
música funciona como um canal de comunicação e expressão dos sentimentos
diminuindo o estresse. Enquanto, o uso de celulares e eletrônicos favorece o
contato com sua rede social (Iamin & Zagonel, 2011).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 225

Considerações Finais

O câncer em crianças e adolescentes apresenta um crescente con-


tingente de diagnósticos precoces, diminuindo o percentual de mortes e
tornando a doença crônica.
Entretanto, os procedimentos médicos e a necessidade de internação
hospitalar, causam medo e ansiedade nos pacientes. O tratamento, ainda
que tenha evoluído, segue com alguns métodos invasivos necessários,
como a quimioterapia.
A psicologia pediátrica, ao utilizar a abordagem cognitiva, melhor
se aproxima da prática assistencial em saúde, devido a sua agilidade.
O paciente estabelece uma boa aliança terapêutica ao perceber que está
desenvolvendo estratégias que o auxiliam no enfrentamento do adoeci-
mento. Tornam-se, desta forma, mais motivados e apresentam uma maior
adesão ao tratamento. As repercussões emocionais são melhores contro-
ladas diminuindo os pensamentos de vulnerabilidade.
A área da psicologia da saúde vem ampliando sua prática nas diferentes
especialidades médicas. Psicólogos da pediatria necessitam seguir aprimo-
rando seu conhecimento, para melhor auxiliar aos pacientes no processo de
ressignificação cognitiva sobre a vivência entre a saúde e a doença.
226

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PARTE II
CAPÍTULO 15
O PACIENTE IDOSO
ONCOLÓGICO E A COVID-19
Camilla Volpato Broering
Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida
Vanessa Schmitz Bulcão

Atualmente, pode-se dizer que, com o aumento da expectativa de vida, a


idade do ser humano tende a aumentar. A afirmativa permite arriscar a tentativa
de redesenhar o ciclo vital, a partir da vida adulta: adulto jovem – de 23 a 40
anos; adulto médio – de 40 a 65 anos; adulto tardio – de 65-75 anos a (prati-
camente como apontam as previsões para os próximos anos) 100-120 anos.
Bastam alguns minutos em pesquisas de ordem científica ou matérias em
jornais e revistas para constatar que na década de 1960 o brasileiro vivia uma
média de 54 anos, hoje chega-se aos 76 – um acréscimo de 22 anos, em tempo
recorde. Nunca se viveu tanto, e isso, por si só, já é motivo de comemoração.
Em 2018, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divul-
gou que a expectativa de vida do brasileiro chegou a 76 anos, um aumento
de 10,4 anos desde 1990. Segundo o Programa das Nações Unidas pelo Desen-
volvimento (PNUD), a expectativa no país é que as mulheres vivam até 79,3
anos, e os homens, 72,1.

Envelhecer é extremamente recente no Brasil

O envelhecimento humano é um fenômeno universal. No Brasil, a


pirâmide epidemiológica vem mudando de maneira rápida e significativa
(Miranda, Mendes, & Silva, 2016). Segundo o IBGE, a população brasileira
manteve a tendência de envelhecimento dos últimos anos e ganhou 4,8 milhões
de idosos desde 2012, superando a marca dos 30,2 milhões em 2017. Os 4,8
milhões de novos idosos em cinco anos correspondem a um crescimento
de 18% desse grupo etário e vem se tornado cada vez mais representativo
no nosso país. As mulheres são maioria expressiva nesse grupo, com 16,9
milhões (56% dos idosos), enquanto os homens idosos são 13,3 milhões, ou
seja, 44% do grupo.
Embora o envelhecimento da população tenha começado em países de
alta renda (por exemplo, 30% da população do Japão agora tem mais de 60
anos), as maiores mudanças estão sendo observadas nos países de baixa e
234

média renda (Muramatsu & Akiyama, 2011). Todos os países enfrentam gran-
des desafios e devem garantir que seus sistemas sociais e de saúde estejam
preparados para lidar com as possíveis consequências dessa mudança demo-
gráfica (Bai, Bian, Zhang, & Cao, 2020).
Pode-se perceber a realidade do envelhecimento populacional como
problema ou oportunidade. Se todos querem viver mais e melhor, olhar pelo
prisma da segunda opção é certamente mais aconselhável. Ademais, o enve-
lhecimento pode ser visto como um fenômeno indesejável ou ser concebido
como uma fase admirável da vida.
Como produto de uma sociedade orientada para a juventude, muitos
aprenderam atitudes negativas sobre o ‘velho’; portanto, os idosos podem
encontrar muitos estereótipos e mitos (Oliveira et al., 2016). De fato, diferentes
sociedades e grupos sociais produzem visões diferentes dos ciclos da vida. O
termo ageism ou agism (ageísmo, em português) designa os estereótipos com
os indivíduos ou grupos com base na idade (Pereira, Ponte, & Costa, 2018).
Funciona como o sexismo e o racismo e interconecta três elementos: atitu-
des preconceituosas em relação às pessoas idosas e ao processo de enve-
lhecimento; práticas discriminatórias contra as pessoas idosas; e práticas e
políticas institucionais perpetuadoras dos estereótipos sobre idosos. Afetam a
autoestima, o bem-estar emocional e o comportamento cotidiano não só dos
mais velhos, mas de todos os que direta ou indiretamente convivem com eles.
Tais atitudes e práticas estereotipadas existem ativas, em diversas sociedades
contemporâneas, em maior ou menor grau (Castro, 2015).
O processo do envelhecimento humano se dá em três níveis diferentes:
biológico, psicológico e social (Fechine & Trompieri, 2015). Envelhecer é
um processo dinâmico, habitualmente lento e progressivo, mas individual e
variável, justificando a tendência para reconhecer os idosos como um grupo
heterogêneo. O declínio das diversas funções não é uniforme, nem o mesmo
no indivíduo, nem de indivíduo para indivíduo (Dardengo & Mafra, 2018).
Os idosos brasileiros envelhecem em condições heterogêneas de fun-
cionalidade, controle de doenças e agravos, acessibilidade aos serviços de
saúde, características da rede de apoio, estilo de vida e contexto psicossocial
(Miranda, Mendes & Silva, 2016). Apesar da idade cronológica não ser o único
determinante do envelhecimento, para Silva (2016) é importante a compreen-
são de que quanto mais avançada a idade, maior a tendência de ocorrerem
alterações e problemas decorrentes do processo de envelhecimento.
Por outro lado, a longevidade não pode ser considerada apenas do ponto
de vista da diminuição da mortalidade, é imperativo que seja acompanhada por
uma perspectiva compreensiva de morbidade e incapacidade, o que impacta na
qualidade de vida do idoso. Sob este prisma, pode-se observar que viver mais
tempo, muitas vezes, vem acompanhado de importantes dificuldades por se
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 235

viver longos períodos da vida acamado ou com outro tipo de padecimento, o


que acarreta grande carga de sofrimento tanto para o idoso como para aqueles
que o cercam, como por exemplo a família e a sociedade (Borges, 2017).
Devido à natureza dinâmica e heterogênea desta etapa do ciclo vital, o
crescimento da população idosa pode significar aumento direto de doenças
relacionadas à idade, tais como demência, transtornos mentais, como depres-
são, ansiedade, suicídio e sérias restrições à qualidade de vida (Leandro-França
& Murta, 2014). Observa-se que o envelhecimento biológico caracteriza-se
por mudanças progressivas, inseridas em um processo natural e irreversível
que pode funcionar como um envelhecimento ativo, típico ou patológico
(Ferreira et al., 2012).
A Organização Mundial da Saúde preconiza, desde a década de 1990,
o conceito de envelhecimento ativo: o processo de otimização das opor-
tunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar
a qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem. Nesse sentido,
ser ativo não se esgota na questão de estar fisicamente e profissionalmente
ativo (Sousa et al., 2018).
Além das transformações biológicas, esta etapa da vida tem implicações
sociais. A diminuição da rede de suporte em decorrência da aposentadoria, o
aumento de gastos e a redução da renda, bem como a morte do cônjuge, de
familiares e de amigos, trazem impactos psicológicos negativos na qualidade
de vida dos idosos (Tavares et al., 2016). O apoio social é um mediador da
qualidade de vida e pode melhorar a saúde dos idosos (Areosa, Benitez, &
Wichmann, 2012).
Outros estudos possuem conclusões semelhantes, demonstrando que o
apoio social está positivamente correlacionado com a saúde entre os idosos
nos países em desenvolvimento (Rocha, Oliveira & Mota, 2017). Os idosos
que se comunicam mais com suas famílias têm melhor saúde mental do que
aqueles que não têm estabelecido este contato.
O envelhecimento, ou senescência, é um processo universal, determinado
geneticamente para os indivíduos da espécie, motivo pelo qual é também cha-
mado de envelhecimento normal. Podem apresentar as mudanças normativas,
mas com pequenas perdas funcionais, poucas e controladas doenças crônicas
e manutenção da participação social (Neri, 2013).
A senescência está associada a mudanças nos processos biológicos, fisio-
lógicos, ambientais, psicológicos, comportamentais e sociais. Entende-se
por senescência envelhecer em sua plenitude, com manutenção (ou perda
mínima) de independência. Estão incluídos aqui sinais como rugas na pele,
perda de músculo sem impacto em performance física e embranquecimento
dos cabelos, por exemplo (Moraes, Moraes & Lima, 2010).
236

Outras mudanças resultam em declínio da cognição, das atividades da


vida diária (AVD’s), aumento da suscetibilidade e frequência de doenças,
fragilidades ou incapacidades. Este envelhecimento acompanhado de perda
de autonomia e independência, devido ao controle inadequado das doenças
crônicas é denominado senilidade, e inclui condições como, diabetes e hiper-
tensão, osteoartrose, síndrome da fragilidade, sarcopenia e outras (Ferreira et
al., 2012). De fato, o avanço da idade é o principal fator de risco para várias
doenças crônicas em humanos (Barreto, Carreira, & Marcon, 2015).
O desempenho das AVD´S é utilizado como parâmetro para determinar
o estado funcional do indivíduo e são fundamentais para a autopreservação
e sobrevivência do indivíduo. Categoricamente essas atividades são dividi-
das em atividades básicas de vida diária – ABVD (vestir-se, fazer a higiene,
alimentar-se etc); atividades instrumentais de vida diária – AIVD (usar o
telefone, fazer compras, usar meios de transporte, tomar medicações etc.) e
atividades avançadas de vida diária – AAVD (atividades recreativas, produ-
tivas e sociais) (Dias et al., 2011).
A rápida transição demográfica e epidemiológica traz grandes desa-
fios, pois é responsável pelo surgimento de novas demandas de saúde, espe-
cialmente a “epidemia de doenças crônicas e de incapacidades funcionais”,
resultando em maior e mais prolongado uso de serviços de saúde (Barreto,
Carreira, & Marcon, 2015).

O câncer no idoso

No Brasil e no mundo, na medida em que a população envelhece, são


identificados problemas decorrentes do envelhecimento, entre eles o avanço
das doenças crônicas. Em estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS),
havia estimativas de que no ano de 2020, 80% da carga de doenças nos paí-
ses em desenvolvimento seriam decorrentes de problemas de saúde crônicos
(OMS, 2003). Ainda, tem-se que o câncer constitui um problema de saúde
pública mundial: de cada sete mortes no mundo, uma deve-se ao câncer,
sendo mais que HIV/AIDS, tuberculose e malária juntos (ACS, 2017). A OMS
(2003) estima que, em 2020, existam 15 milhões de novos casos no mundo
(WHO, 2015) enquanto no Brasil (INCA, 2017) estimou-se casuística de 420
mil novos casos de câncer para o biênio 2016-2017, excetuando-se os de pele
não melanoma (cerca de 180 mil).
Ao longo da história, o câncer é concebido como uma doença fatal.
Mesmo com os avanços tecnológicos e médicos na área da cirurgia, da far-
macologia e da radioterapia direcionados a seu tratamento, essa doença ainda
pressupõe a ideia de morte. Assim, o diagnóstico desta enfermidade traz em
si a consciência da possibilidade de morte para o paciente. Essa experiência,
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 237

geralmente, é acompanhada de angústia, desesperança, isolamento e temores


que perpassam o desenrolar do tratamento para paciente e seus familiares
(Borges et al., 2006).
O câncer por si só é uma doença amedrontadora, e a velhice também
o é. Deste modo, lidar com o câncer durante a velhice torna-se uma ques-
tão complexa. Assim, a equipe de saúde torna-se fundamental no tratamento
oncológico, acompanhado da condição física, psicológica e social dos idosos
durante o processo de desenvolvimento.
Em nossa cultura, há uma imagem estereotipada do idoso, embora dados
do IBGE apontem que a expectativa é que em 2025, o Brasil chegue a 31
milhões de pessoas com mais de 65 anos de idade. São diversas as questões
envolvidas, quando se trata do idoso: o sentimento de que a vida não tem mais
objetivo, os prazos para renovação de carteira de motoristas são mais curtos,
se cometem alguma infração no trânsito são julgados pela idade, fora o fato
de que com a idade, doenças e condições de saúde acabam por deixar o idoso
mais vulnerável e dependente de cuidados, muitas escolhas já não são por ele
tomadas, há um luto pelo corpo jovem, redução das capacidades, diminuição
das responsabilidades, dos amigos, muitas vezes do cônjuge e até mesmo de
um bom padrão de vida. Isso é algo esperado pelo ciclo de desenvolvimento
em que se encontram.
Por outro lado, existem fatores que não são esperados e que se acon-
tecem, aliados a todos os itens pontuados anteriormente podem causar uma
situação de grande completude. No que tange aos impactos causados pelo tra-
tamento, a terapêutica ambulatorial tem se mostrado uma excelente estratégia
para amenizar o sofrimento dos pacientes, possibilitando maior autonomia
quando comparado à internação hospitalar. A autonomia é compreendida
como a capacidade de agir por si, de poder escolher e expor ideias, agir com
responsabilidade. Refere-se ao direito do indivíduo de autogovernar-se, fazer
suas escolhas, exercer a função de protagonista em seu processo de saúde e
doença (Freire, 2011; Santin & Bettinelli, 2010).
Adaptar-se ao processo de envelhecimento, bem como às mudanças
impostas pela vivência do adoecimento por câncer, também se constituiu
em uma forma de cuidar de si, do ponto de vista dos idosos. Isso porque, a
convivência com o envelhecer e com o câncer podem causar efeitos diversos
na vida do indivíduo se não souber utilizar adequadamente estratégias de
enfrentamento. A adaptação, ou não, à situação vivida depende de aspectos
culturais, emocionais, vivências anteriores e das características pessoais do
idoso em questão (Braz et al., 2018).
Outra preocupação é o fato de que a idade também é um fator preponde-
rante na mortalidade por câncer, uma vez que as maiores taxas correspondem
às idades mais avançadas. Este fato é preocupante, pois em detrimento do
238

fenômeno do envelhecimento populacional os níveis da morbimortalidade de


idosos pelos principais tipos de câncer tendem a aumentar. Para se ter ideia
da dimensão, o aumento da mortalidade proporcional por câncer desse grupo
etário passou de 53,5%, em 1979 para 68,4%, em 2015 (WHO, 2015).
No imaginário social, o envelhecimento está associado ao fim de uma
etapa, como sinônimo de sofrimento, solidão, doença e morte. Dificilmente
está ligado a algum prazer de viver essa fase da vida. É no âmbito dessa refle-
xão que os idosos que convivem com câncer enfrentam o processo de envelhe-
cimento. As reações à experiência do adoecimento por câncer na maturidade
contemplaram tanto a negação como a resistência e a aceitação do processo.
O medo da morte está associado ao sofrimento pessoal, isto é, à possibilidade
de sofrerem dor física (Rocha et al., 2014).
Conforme um estudo realizado por Carvalho e Paes (2019) com pacientes
idosos oncológicos do Norte e Nordeste do Brasil, os resultados mostraram
que o conhecimento sobre a quantidade de óbitos registrados para os principais
tipos de câncer facilita as ações de planejamento na saúde pública e epide-
miológica, visto que muitas vezes são subnotificados, e os números corretos
auxiliariam nas ações específicas.
Esse desconhecimento prejudica a aceitação e manejo da doença por
parte do paciente, família e profissionais da saúde. Se o paciente tem conhe-
cimento da doença e das práticas adotadas para tal, potencializa-se a sua par-
ticipação em formas de lidar com a doença e suas reações. Pode-se salientar a
importância do paciente em participar do seu próprio processo saúde-doença,
no seu tratamento e recuperação, de forma a melhorar sua qualidade de vida
e até ultrapassar a expectativa de sobrevida, é ressaltada por Vilaça (2018).
Assim, a percepção do câncer como certeza de morte pode trazer prejuízos
no diagnóstico precoce, exames e tratamentos.
Este fato deve ser destacado, pois como falado anteriormente a doença
aumenta de forma considerável com a idade, já que, com o avançar dos anos,
acumulam-se fatores de risco de tipos específicos de câncer. Podem-se citar expo-
sição cumulativa ao sol e a radiações ionizantes (ACS, 2017); contato com álcool,
tabaco e poluição ambiental; alimentação inadequada e exposição a infecções
como fatores de risco para uma variedade de neoplasias malignas. Tais lesões
incluem os cânceres mais prevalentes no mundo, que são o de pele, pulmão,
colorretal, próstata (Danaei, 2005) e câncer de mama (Miranda et al., 2008).
Além do acúmulo desses fatores de risco, sabe-se que o sistema imune também
se torna comprometido com a idade, sendo menos eficaz no combate a neoplasias.
Partindo do pontuado acima, sugere-se que informações simples e curtas
sobre os procedimentos e a doença possam contribuir para a redução da ansie-
dade, medo e problemas suscitados pelo desconhecimento da situação, pois
durante o período de internação, os pacientes passam, frequentemente, por
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 239

uma situação de grande fragilidade física e emocional, devido às repercussões


da doença e à própria rotina de internação (Angerami-Camon et al., 1996).
Cada pessoa sentirá tudo isso de uma maneira particular e reagirá de acordo
com sua própria percepção e interpretação da situação (Romano, 1999).
Alguns pacientes apresentam resistência para o trabalho psicológico nes-
sas condições de hospitalização, o que se deve, muitas vezes, a uma dificuldade
em verbalizar seus sentimentos, angústias e fantasias que lhes são conflitantes.
Em estudo de Braz et al. (2018) constatou-se que os idosos formam o grupo
com maior risco de desenvolver câncer e para tanto, essa população precisa ter
informações confiáveis e acuradas para prevenir sua ocorrência. Desse modo,
torna-se imperativo conhecer como os idosos percebem o câncer para prever
comportamentos relacionados à saúde, possibilitando a criação de estratégias
para educação em saúde e melhoria da prevenção.
O estudo acima concluiu que, ao ser diagnosticado com câncer, o idoso,
inserido nos serviços de saúde, deve se deparar com experiências positivas e nega-
tivas de outros pacientes. Devido ao processamento dual, as vivências negativas
são mais marcantes, ficando mais vívidas em sua memória, o que contribui para
a percepção de serem os acontecimentos mais frequentes e, consequentemente,
para a concepção de que o câncer possui uma baixa sobrevida para a maioria dos
pacientes. Além disso, todos os entrevistados com diagnóstico prévio de câncer
concordaram que o câncer detectado cedo pode ser curado, o que provavelmente
está de acordo com a ampla divulgação da importância do diagnóstico precoce
em campanhas preventivas. As concepções observadas na amostra estudada se
configuram como alvos em potencial para abordagens educativas e comunicativas
que visem a uma maior eficácia na prevenção contra o câncer.
As questões que envolvem o conhecimento ético junto ao ser idoso
configuram-se complexas e, consequentemente, envolvem discussões, já
mencionadas, de uma equipe multiprofissional. Este idoso é portador de uma
doença como o câncer que traz um estigma representado por importantes
questões éticas. A tomada da decisão adequada certamente levará em conta a
condição bio-psico-social-espiritual, do indivíduo, seus valores e princípios,
evitando-se que o idoso seja desconsiderado nas suas opções. A tomada de
decisão está determinada pela autonomia e orientada pela individualidade do
idoso, considerando o processo de envelhecimento e sua doença. O paciente
idoso oncológico não pode ser descaracterizado, deixando de ser informado
sobre seu diagnóstico, tratamentos propostos e os cuidados necessários nesta
etapa de sua vida. Entende-se que contar a verdade ao paciente idoso pode
fortalecer o elo entre ele e o profissional, dignifica o ser humano no reconhe-
cimento de sua autonomia e da tomada de decisão sobre si próprio (Visentin,
Labronici, & Lenardt, 2007).
240

Por se falar em respeito ao idoso, conhecimento sobre seu processo de


adoecer e diagnóstico para que ele se sinta validado, chega-se numa situação
que fugiu um pouco do controle, e mostra o quão delicado é lidar com os
idosos em tempos de um desconhecido, em que muitas vezes se torna inviável
e difícil os esclarecimentos e o suporte.

O Idoso no Século XXI

O terror contemporâneo tem um nome: COVID-19

Em dezembro de 2019, uma nova doença de coronavírus (COVID-


19) surgiu em Wuhan, uma cidade em Hubei, província da China. Ela se
espalhou rapidamente de forma epidêmica por toda a China, seguido por
um número crescente de casos em muitos países do mundo, incluindo o
Brasil (Costa, 2020). A OMS, no dia 11 de março, declarou a COVID-19
uma pandemia, uma emergência de saúde pública de interesse internacional
(WHO, 2020)
Como consequência do nosso mundo em rápida mudança e massivamente
globalizado, a dinâmica e a extensão dos surtos também mudam. Embora a
humanidade já tenha enfrentado uma série de pandemias no século XX, o
vírus SARS-CoV-2 (causando COVID-19) representa um dos maiores desa-
fios já enfrentados na contemporaneidade. A vulnerabilidade entre indivíduos
com condições médicas subjacentes e grupos sociais específicos é agora evi-
dente, pois existem em número expressivo de idosos fortemente afetados pela
COVID-19 (Davidson & Szanton, 2020).
O impacto global da pandemia de síndrome respiratória aguda grave -
coronavírus 2 (SARS-CoV-2), é significativo em termos de efeitos na saúde
pública e suas implicações socioeconômicas a longo prazo. Entre todos os
grupos sociais, o idoso é de longe a faixa etária mais afetada em relação à
morbidade e mortalidade (Kemenesi et al., 2020).
No entanto, todas as faixas etárias correm o risco de contrair COVID-
19, e os idosos enfrentam um risco significativo no desenvolvimento de uma
doença grave se a contraírem, devido a alterações fisiológicas que acom-
panham o envelhecimento e, mais frequentemente, as condições de saúde
subjacentes nessa faixa etária específica (Bao, 2020).
Os idosos são mais vulneráveis ​​do que outros aos efeitos psicossociais
das pandemias (Dubey et al., 2020). Surtos generalizados de doenças infeccio-
sas, como a COVID-19, estão associados a sofrimento psicológico e sintomas
de doença mental (Pfefferbaum & North, 2020). Nessa conjuntura, o estigma
social e os comportamentos discriminatórios contra os idosos aumentaram
exponencialmente (Xiang et al., 2020).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 241

Dados epidemiológicos de Wuhan mostraram um risco 5,1 vezes maior


de morrer em pacientes idosos sintomáticos com 60 anos ou mais e, em geral,
mais de 95% dessas mortes ocorreram naqueles com mais de 60 anos como
dados recentes da OMS (Wu et al., 2020). Do mesmo modo, a experiência
da Itália mostra uma idade mediana na morte de 79 anos para homens e 82
para mulheres (Kunz & Minder, 2020).
Ressalta-se que os pacientes com câncer são mais suscetíveis à infecção
do que a população em geral devido ao seu estado imunossupressor sistêmico
causado pelos tratamentos oncológicos. Assim, no cenário epidemiológico da
pandemia na Itália, os idosos em tratamento de câncer correram um risco particu-
larmente alto de serem gravemente afetados por COVID-19 (Fratino et al., 2020).
Vários estudos relataram complicações psicológicas negativas, incluindo
sintomas de TEPT (transtorno do estresse pós-traumático), confusão e raiva
nos casos envolvidos em situações estressantes. O longo período de quaren-
tena, medo de infecção, desespero, tédio, escassez de alimentos, informações
inadequadas, perda financeira e estigma ficaram conhecidos como estressores
na epidemia do COVID-19 (Brooks et al., 2020).
Muitos idosos enfrentam dificuldade ao ficarem sozinhos e longe da
família. Os indivíduos com problemas psicopatológicos existentes pioraram
seu quadro emocional. (Yang et al., 2020). A saúde física e mental destes
precisa ser abordada, bem como, muitos dos problemas relacionados à morte,
a pandemia e a recuperação trouxeram sofrimento significativo e em muitas
partes do mundo a prática foi por meio de aconselhamento on-line. No entanto,
a falta de uso de meios digitais por idosos dificulta o acesso a estes cuidados
(Johnson, Ling & McBee, 2015).

Como o mundo se preparou para o atendimento dos idosos em


tempos de pandemia

As práticas e as propostas incluíram o desenvolvimento de equipes de


especialistas qualificados para lidar com o estresse emocional (Wang, Horby,
Hayden, & Gao, 2020); o treinamento do pessoal de saúde da comunidade em
aspectos básicos dos cuidados de saúde mental; o uso de pesquisas on-line para
avaliar o risco de transtornos mentais (Duan & Zhu , 2020); vários materiais
on-line para educação em saúde mental; a prestação de serviços de aconse-
lhamento em telepsicologia, telemedicina e afins (Liu et al., 2020); desen-
volvimento de estratégias de consulta assíncrona em telepsiquiatria (Zhou et
al., 2020); e de serviços síncronos de telemedicina (Xiao, 2020); e a neces-
sidade de tornar os serviços de saúde mental on-line acessíveis a indivíduos
em vulnerabilidade (Yao, Chen, & Xu, 2020).
242

Todo este esforço, de diferentes categorias da saúde, confirma a importân-


cia de intervenções psicossociais alicerçadas nas emergentes necessidades que
surgiram diante deste inédito cenário de pandemia (Liu et al., 2020). Ademais,
estudos postulando práticas exitosas foram apresentados em diversas platafor-
mas científicas, especial atenção às publicações na Ásia (Xiao, 2020; Zhou et
al., 2020) e as recomendações para cuidados em saúde mental (WHO, 2020).
Ainda que tenham acesso à tecnologia, algumas pessoas podem apre-
sentar dificuldades para utilizar de dispositivos digitais. A população que
mais sofre esta dificuldade, é exatamente a mais vulnerável a pandemia: os
idosos (Ornell et al., 2020). Portanto, nesses casos, sugere-se a realização
de alternativas viáveis, por exemplo o acolhimento psicossocial via telefone
(Shojaei & Masoumi, 2020).
O isolamento social entre os idosos é uma séria preocupação de saúde
pública devido ao seu risco aumentado de problemas cardiovasculares,
autoimunes, neurocognitivos e de saúde mental. A desconexão social coloca
os idosos em maior risco de depressão e ansiedade (Santini et al.,2020). As
tecnologias on-line podem ser aproveitadas para fornecer redes de suporte
social e um sentimento de pertença (Armitage & Nellums, 2020).
Os mesmos autores acima, afirmam que embora possa haver disparidades
no acesso ou na alfabetização de recursos digitais, as intervenções poderiam
simplesmente envolver contato telefônico mais frequente com outras pessoas
importantes, familiares e amigos próximos, organizações voluntárias ou pro-
fissionais de saúde ou projetos de extensão comunitária, fornecendo apoio de
colegas durante todo o isolamento imposto.
Também é necessário entender as possíveis barreiras para os idosos que
usam tecnologias digitais para apoiar a saúde mental. Por exemplo, muitos
idosos percebem que a tecnologia é cara (Greenhalgh et al., 2013) e geralmente
preferem as formas “antiquadas” de fazer as coisas (Chen & Chan, 2013). Pes-
quisas anteriores também destacaram que os idosos podem ter problemas para
se lembrar de como usar as novas tecnologias. No entanto, pouco se sabe sobre
as atitudes dos idosos em relação ao uso de tecnologias digitais especificamente
para apoiar a saúde mental (Peek et al., 2018).
Em tempo de pandemia, muitas iniciativas foram apresentadas e concebidas
aos idosos. Além das descritas acimas nos estudos e pesquisas, outras podem
ser vistas na tabela referenciada abaixo.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 243

Figura 1 – Algumas práticas ao redor do mundo de apoio psicossocial aos idosos


País Iniciativa Situação Como?
Itália “O direito de dizer Devido ao isolamento, Por iniciativa de um vereador do
adeus” muitos dos idosos que partido democrático Italiano, foram
morreram na Itália não adquiridos cerca de 20 tablets que
conseguiram se despedir mais tarde foram distribuídos no
de seus entes queridos Hospital San Carlo e que permitem
a realização de videochamadas para
realizar a despedida.
Argentina Atendimento Número expressivo de A Argentina tem longa tradição na
telefônico de idosos sozinhos em área de psicanálise e no âmbito pri-
abordagem quarentena vado, os psicólogos e psicanalistas
psicológica da Associação Psicanalítica Argen-
tina (APA) ofereceram para atender,
gratuitamente, através de uma linha
telefônica da entidade idosos em
isolamento.

Portugal “O calor é um Objetivo é diminuir a Disponibilizado a cada voluntário um


Autarquia de abraço à distância” solidão pelo isolamento aparelho celular com pacote de mi-
Gondomar social dos idosos que nutos e dados móveis para proceder
procuram o serviço o acompanhamento de cada idoso.
Portugal Canal exclusivo Acolhimento de Ao entrarem em contato, os idosos
Todo país “Disque 100” idosos em situação recebem informações gerais sobre
de isolamento social a pandemia e contam com acolhi-
decorrente da pandemia mento social.
Brasil www. Promover o encontro Voluntário compram e entregam na
( Porto Alegre) ajudacoronavirus. entre pessoas que casa de idosos remédios, alimentos
com.br/ precisam de ajuda e básicos e produtos de higiene/limpeza.
voluntários durante
a pandemia de
coronavírus.
Brasil Equipamentos Monitoramento de Idosos acima de 65 anos solicitam o
(Santos) baseados em idosos durante a equipamento que inclui um botão de
Internet das Coisas pandemia como forma de alerta, que se assemelha a um tele-
(IoT) e dispositivos telemedicina fone sem fio, uma pulseira conectada e
vestíveis (wearable) um oxímetro de dedo que mede a den-
sidade respiratória possibilitando a di-
ferenciação de sintomas de ansiedade
e pânico aos problemas respiratórios.
Fonte: as autoras.

Considerações finais

Com o aumento da esperança média de vida, se estabelece um novo


desafio em criar uma melhor qualidade de vida. Quando se vive mais tempo,
a vulnerabilidade aumenta, assim como também a atenção à saúde física,
244

psicológica e social, levando a pessoa idosa, na maioria das vezes, a se hos-


pitalizar devido às doenças crônicas ou degenerativas, dependência funcional,
saúde mental e distúrbios cognitivos.
Adultos mais velhos e pessoas que têm condições médicas subjacen-
tes graves, como por exemplo o câncer, parecem estar em maior risco de
desenvolver complicações mais graves da doença de COVID-19. Seus impac-
tos podem ser particularmente difíceis para essas pessoas que podem estar
sofrendo declínio cognitivo ou demência. E algumas pessoas mais velhas
podem já estar socialmente isoladas e experimentar a solidão, o que pode
piorar a saúde mental.
Na perspectiva dos indicadores econômicos, durante tempos tênues e
incertos, entidades públicas e governamentais, assim como os profissionais
devem considerar a saúde psicossocial e mental de seus pacientes idosos e
voltar ao que nos torna tão confiáveis entre pacientes, familiares e cuidado-
res: comunicação terapêutica, considerações psicossociais abrangentes e a
valorização do bem-estar desses cidadãos.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 245

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CAPÍTULO 16
CÂNCER NO CONTEXTO
DA PANDEMIA DE COVID-19:
Repercussões Psicológicas e
Implicações Práticas
Daniela Barsotti Santos
Beatriz Schmidt
Débora da Silva Noal

O SARS-CoV-2, registrado como um novo coronavírus, foi notificado


pela primeira vez na cidade de Wuhan, província de Hubei, na China, em
dezembro de 2019 (Candido et al., 2020). Menos de três meses após a pri-
meira notificação, a doença causada pelo novo coronavírus (COVID-19) foi
considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como pandemia,
em março de 2020 (World Health Organization [WHO], 2020a). No Brasil,
o primeiro caso foi registrado em fevereiro desse mesmo ano. Quase um
mês após sua confirmação, o Ministério da Saúde reconheceu a transmissão
comunitária do novo coronavírus em todo o território nacional (Candido et
al., 2020). Em cinco de junho de 2020, data em que a redação do presente
capítulo foi concluída, o Brasil era considerado o segundo país do mundo em
número de casos confirmados (aproximadamente 585 mil) e o terceiro em
número de óbitos por COVID-19 (aproximadamente 33 mil) (WHO, 2020b).
A pandemia gerou uma crise sem precedentes no Brasil e em diferentes
países, cujos sistemas de saúde não estavam inteiramente preparados para
enfrentá-la. Além de prejudicar respostas apropriadas para conter a rápida
disseminação do novo coronavírus e o tratamento das pessoas acometidas
pela COVID-19, a sobrecarga dos sistemas de saúde também se associa a
dificuldades na assistência a outras doenças (Tsamakis et al., 2020). Nesse
contexto, pacientes oncológicos têm sido particularmente afetados, por cons-
tituírem um grupo altamente vulnerável à infecção pelo SARS-CoV-2, dado
o comprometimento imunológico causado pelo câncer e pelos tratamentos
oncológicos (Ferreira, Lima, Oliveira, Cancela, & Santos, 2020). Estudos rea-
lizados na China e na Itália revelaram que a taxa de fatalidade por COVID-19
é significativamente maior em pessoas com câncer em comparação àquelas
que não têm a doença (Tsamakis et al., 2020). Ademais, embora os benefícios
da manutenção do tratamento oncológico durante a pandemia continuem os
254

mesmos, os riscos aumentam substancialmente, o que tem gerado a recon-


sideração de algumas práticas clínicas (Chagnon, 2020; Hanna, Evans, &
Booth, 2020; Romeo, Castelli, & Franco, 2020; Tsamakis et al., 2020).
O atual cenário tende a amplificar as inquietações e o sofrimento psí-
quico de pessoas com câncer e seus familiares (Chagnon, 2020; Jones et al.
2020). Isso se deve sobretudo a dois principais aspectos: (a) preocupações pelo
cancelamento de procedimentos referentes ao diagnóstico e aos tratamentos
oncológicos, face à reorganização dos dispositivos de assistência à saúde
durante a pandemia (Jones et al., 2020); e, (b) fragilização das redes de apoio
social e institucional, em função das medidas adotadas para conter a escalada
da COVID-19, tais como o distanciamento social, que implica na redução de
interações face a face (Chagnon, 2020). Nesse contexto, o acompanhamento
psicológico aos pacientes oncológicos e às suas famílias se mostra especial-
mente relevante e também pode sofrer modificações, o que se configura em
um desafio adicional a ser enfrentado (Tsamakis et al., 2020).
Diante do exposto, o objetivo do presente capítulo é abordar as repercus-
sões psicológicas e as implicações práticas para a assistência a pessoas com
câncer e seus familiares na pandemia de COVID-19. Nesse sentido, inicial-
mente se apresenta uma caracterização geral da pandemia, com destaque aos
impactos psicossociais, os quais são frequentemente relacionados às medidas
adotadas para conter a escalada da COVID-19. Em um segundo momento,
discutem-se aspectos relacionados ao câncer, com especial ênfase às repercus-
sões psicológicas que podem ser experienciadas por pacientes oncológicos e
seus familiares na vigência da pandemia. Por fim, são referidos os desafios e
as potencialidades para intervenções psicológicas diante desse cenário.

Impactos Psicossociais da Pandemia de COVID-19

A pandemia de COVID-19, como processo global amplo de contágio,


restrição de deslocamentos e distanciamento social em larga escala (Baner-
jee, 2020; Wang et al., 2020), consiste em um acontecimento cuja realidade
e os impactos psicossociais ainda não possuem parâmetros de comparação.
Essa grave crise de saúde pública expôs globalmente a humanidade, eviden-
ciando a necessidade de reconfiguração de interações sociais, relacionamentos
afetivos, processos de trabalho e mobilidade entre diferentes localidades,
promovendo reações como medo, irritabilidade, angústia, tristeza, impotência
perante os acontecimentos, alterações ou distúrbios do sono e do apetite, bem
como conflitos interpessoais (Fundação Oswaldo Cruz [FIOCRUZ], 2020a).
Em situações como epidemias ou pandemias, estima-se que entre um
terço e metade da população exposta venha a experienciar manifestações
de sofrimento agudo e possíveis sintomas psicopatológicos, caso não haja
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 255

cuidados específicos voltados às reações apresentadas (Organização Pan-A-


mericana da Saúde, 2006). Os fatores que influenciam o impacto psicossocial
estão relacionados à magnitude do surto infeccioso e ao grau de vulnerabi-
lidade em que a pessoa se encontra no momento. Ademais, as repercussões
psicológicas decorrentes do risco sanitário iminente são potencializadas pelas
perdas sociais, econômicas, afetivas, dentre outras. Entretanto, destaca-se
que nem todos os problemas psicológicos apresentados serão qualificados
como adoecimentos ou transtornos. A maioria será classificada como rea-
ção adaptativa diante de uma situação anormal. Ainda assim, recomenda-se
que toda a população afetada por uma pandemia receba diferentes níveis de
apoio psicossocial (FIOCRUZ, 2020a; 2020b). Nesse contexto, especial aten-
ção deve ser oferecida às populações que já experienciavam vulnerabilidade
psicossocial, tendo em vista que elas podem ter sua situação agudamente
agravada (Banerjee, 2020; Inter-Agency Standing Committee [IASC], 2020;
Polizzi et al., 2020; Wang et al., 2020).
Os impactos psicossociais da COVID-19 também se associam às medi-
das adotadas para conter a rápida escalada da doença (Schmidt, Crepaldi,
Bolze, Neiva-Silva, & Demenech, 2020). Assim, destaca-se o distanciamento
social, o qual se ancora em evidências científicas e dados epidemiológicos,
e potencialmente será mantido como estratégia de controle da pandemia,
até o desenvolvimento de intervenções farmacológicas eficazes. Contudo,
mesmo com o distanciamento social, o SARS-CoV-2 continuará a circular,
resultando no risco de aumento do número de casos e óbitos por COVID-
19. Portanto, até que ocorra a imunidade coletiva, seja por infecção ou por
vacina, estima-se que períodos de distanciamento social intermitentes sejam
necessários, o que pode perdurar de dois a quatro anos, a depender do cenário
(FIOCRUZ, 2020c). Isso traz implicações para toda a população, mas pode
ser especialmente preocupante para pessoas com doenças crônicas, como o
câncer, por exemplo, tendo em vista que não há uma previsão clara sobre o
tempo de duração do distanciamento social. Tal aspecto tende a dificultar o
acesso desses pacientes aos serviços de saúde e, por conseguinte, implicar no
agravamento da doença, trazendo também repercussões psicológicas a eles e
aos seus familiares, como será apresentado a seguir.

Câncer e Tratamento Oncológico no Pandemia


de COVID-19: Repercussões Psicológicas

Nas últimas décadas, observa-se um enorme progresso na luta contra o cân-


cer, graças aos avanços tecnológicos e científicos em prevenção, detecção pre-
coce, melhorias nos tratamentos e apoio àqueles que enfrentam a doença. Mesmo
com avanços extraordinários, nem todos têm se beneficiado desse progresso
256

de forma equitativa. Nesse sentido, o câncer é um problema crescente entre as


pessoas que vivem em países em desenvolvimento, como o Brasil, uma vez que
elas podem não ter acesso a informações ou intervenções que potencialmente
lhes garantiriam sobrevida (Jemal, Torre, Soerjomataram, & Bray, 2019).
‘Câncer’ é o termo usado para designar um conjunto de doenças que
podem ter etiologia em qualquer órgão ou tecido quando células anormais
crescem descontroladamente, ultrapassando seus limites usuais e invadindo
partes adjacentes do corpo e/ou espalhando para outros órgãos. O processo
posterior é chamado ‘metástase’ e consiste na principal causa de morte por
câncer. Esse conjunto de doenças está associado à alta morbidade, debilidade
e mortalidade, que geram repercussões sociais e econômicas a indivíduos,
comunidades e sociedades. O impacto global do câncer é crescente, devido
às transições demográficas que evidenciam o envelhecimento populacional
e, também, pela exposição a fatores de risco relacionados a hábitos de vida e
ocupacionais resultantes da globalização (WHO, 2020c).
No Brasil, é estimado que ocorram 625 mil casos novos de câncer a cada
ano do triênio 2020-2022. Nessa estimativa, serão mais frequentes o câncer
de pele não melanoma (177 mil), seguido pelos cânceres de mama e próstata
(66 mil cada), cólon e reto (41 mil), pulmão (30 mil) e estômago (21 mil)
(Instituto Nacional de Câncer, 2019). Ademais, nos países em desenvolvi-
mento, como o Brasil, é comum que o diagnóstico aconteça tardiamente e que
se tenha menor acesso aos tratamentos. Em 2017, apenas 26% dos países de
baixa renda reportaram possuir serviços de patologia, geralmente disponíveis
no setor público. Por outo lado, mais de 90% dos países com maior renda
relataram dispor de serviços para tratamentos oncológicos, em comparação
a 30% dos países de baixa renda (Jemal et al., 2019; WHO, 2020c).
A mortalidade por câncer pode ser reduzida se os casos forem detecta-
dos e tratados precocemente. Além disso, o diagnóstico precoce evidencia
uma resposta mais efetiva ao tratamento, o que se associa à maior chance de
sobrevida, menor morbidade e tratamentos menos custosos. O diagnóstico
adequado do câncer é importante para a efetividade do tratamento. Isso porque
cada tipo de câncer requer um protocolo, o qual pode envolver um tratamento
específico ou a combinação de modalidades terapêuticas, incluindo a combi-
nação de cirurgia, radioterapia e quimioterapia (WHO, 2020c).
A partir do diagnóstico, é possível determinar as metas de tratamento e
iniciar os cuidados paliativos. O cuidado ao paciente oncológico deve ser rea-
lizado em modo integrado e centrado nas necessidades dele. Entende-se que a
primeira meta é, em geral, a cura do câncer ou o prolongamento da vida. Con-
tudo, a qualidade de vida do paciente também é uma meta importante. Ela pode
ser alcançada pelos cuidados paliativos e apoio psicossocial (WHO, 2020c).
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 257

Vivenciar um diagnóstico de câncer é um evento crítico que suscita


perplexidade, temor da morte, bem como incertezas quanto à recuperação e à
continuidade da vida após os tratamentos. Este pode ser o início de um período
de revisão sobre como se vinha levando a vida até então, com a reavaliação de
crenças e valores. A literatura também evidencia preocupações relacionadas à
imagem corporal, já que o câncer e os tratamentos podem afetar a aparência
e a experiência com a corporeidade (Santos & Vieira, 2011).
Atualmente, é reconhecida a necessidade de pesquisar e intervir sobre
as mudanças dos aspectos psicossociais advindas do câncer e seus tratamen-
tos, sobretudo aquelas que incidem no bem-estar e na qualidade de vida do
paciente oncológico. Tais impactos podem ser duradouros, mesmo após um
tratamento bem-sucedido, pois muitas vezes acontecem severos danos físicos
e emocionais, decorrentes dos efeitos colaterais e da elevada toxicidade do
tratamento (Santos, Santos, Cesnik-Geest, & Vieira, 2016).
Se o diagnóstico de um câncer mobiliza emocionalmente as pessoas
devido às incertezas quanto ao prognóstico, o acesso aos tratamentos e a
continuidade da vida, a pandemia do COVID-19 amplia suas inquietações.
Pacientes oncológicos e suas famílias podem experienciar cotidianamente uma
série de preocupações, que incluem desde o não recebimento do tratamento
adequado, até a vivência de dificuldades em suprir suas necessidades físicas,
psicológicas, sociais e espirituais neste período (Chagnon, 2020).
Estes temores encontram fundamento diante das poucas evidências dispo-
níveis sobre os riscos em relação à COVID-19, bem como à grande reorgani-
zação que a maioria dos serviços de saúde passa atualmente. Entre cientistas,
gestores e profissionais de saúde, a pandemia levanta duas questões principais
sobre a segurança dos pacientes oncológicos. Em primeiro lugar, questiona-
-se se as pessoas com câncer deveriam deixar suas casas para se dirigir aos
serviços de saúde, com a possibilidade de exposição à infecção. A segunda
questão colocada é sobre a continuidade dos tratamentos oncológicos nesse
período, os quais tendem a predispor os pacientes aos efeitos mais danosos
da COVID-19 (Hanna et al., 2020).
Nesse sentido, a International Agency for Research on Cancer (IARC)
passou a realizar monitoramentos e estudos para compreender os impactos
da COVID-19 no câncer, buscando preveni-los (IARC, 2020). Guias para
o acompanhamento dos pacientes oncológicos conforme o tipo de câncer e
a necessidade do tratamento, com a ponderação dos riscos acerca da conti-
nuidade ou da interrupção, vêm sendo formulados. Ademais, aspectos éticos
relacionados às decisões terapêuticas também têm sido estudados (Hanna et
al., 2020; IARC, 2020).
As evidências sugerem que os sintomas da COVID-19 são provavelmente
mais severos em pacientes oncológicos do que em pessoas que não tem câncer,
258

sobretudo quando se considera o câncer uma doença relacionada ao envelhe-


cimento. Isso porque existem evidências claras de que a idade avançada e os
maiores índices de comorbidades estão associados aos sintomas mais graves
da COVID-19 (Ferreira et al., 2020; Hanna et al., 2020). Medidas de barreira
e confinamento, cuidados de apoio e ajustes nos cronogramas dos tratamen-
tos, como o aumento dos intervalos entre as sessões, a redução de doses e a
fração alternativa de radioterapia, têm sido amplamente recomendados para
pacientes idosos com câncer. Quando apropriadas, essas medidas também têm
sido recomendadas para pacientes jovens (Mourey et al., 2020).
Experienciar sintomas comuns relacionados ao câncer e seus tratamen-
tos pode fazer com que a pessoa tema ter contraído a COVID-19. A exem-
plo disso, alguns dos sintomas de doenças hematológicas, como leucemias
e linfomas, tendem a aumentar o risco de infecções (Hamerschlack, 2008).
Também se observa que alguns dos medicamentos utilizados nos tratamentos
oncológicos, como a quimioterapia, podem induzir a imunossupressão, o que
aumenta o receio da pessoa que vivencia um câncer em adoecer por COVID-
19 (Chagnon, 2020).
Na atenção primária, a reorganização dos serviços pode causar atrasos
no diagnóstico do câncer, pois exames regulares deixam de ser realizados no
período. Esses atrasos, além de prejudiciais à recuperação do câncer, podem
aumentar o estresse e a angústia em pacientes, familiares e profissionais de
saúde, sobretudo quando se percebe sinais sugestivos de adoecimento, como
um nódulo no seio ou sangue nas fezes (Jones et al., 2020).
Os serviços de saúde, como o hospital, podem ser percebidos como
locais que oferecem risco potencial à saúde. Tal percepção pode fazer com
que algumas pessoas deixem de realizar exames diagnósticos ou abandonem
tratamentos oncológicos. No caso da continuidade dos tratamentos, essas
pessoas podem não ter a presença de um acompanhante durante tratamentos e
procedimentos cirúrgicos. Pacientes hospitalizados podem não receber visitas,
e aqueles que estão em situação de fim de vida podem não ter a presença de
familiares e amigos (Chagnon, 2020).
Aos profissionais da saúde, destaca-se a necessidade de flexibilizar os
serviços diante das complexas necessidades dos pacientes, desde a identifi-
cação de sintomas até os cuidados no fim da vida e o luto. Muitos desafios
surgem diante desses cenários em transformação, que incluem a elaboração
de estratégias terapêuticas como a telemedicina, atendimento psicológico
por videoconferências, bem como novos modos de identificar sofrimentos de
ordem psíquica, como o estresse e a depressão (Chagnon, 2020).
Nota-se que níveis de estresses têm sido pouco diagnosticados em pacien-
tes oncológicos, ainda que se saiba que a maneira como uma pessoa reage aos
eventos estressores passa por mudanças com o processo de envelhecimento.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 259

A depressão também consiste em um aspecto importante a ser avaliado no


adoecimento, pois pode repercutir na adaptação aos tratamentos, bem como na
aceitação do adoecimento (Silva et al., 2019). Assim, reconhece-se a dificul-
dade que profissionais de saúde têm no diagnóstico de depressão em pacientes
oncológicos, pois frequentemente os sintomas depressivos são confundidos
com os efeitos colaterais dos tratamentos, como fadiga, perda do apetite e
alterações do sono (Santos, 2017).
A depressão em pacientes oncológicos pode afetar a adesão aos tratamen-
tos, o que tende a comprometer o prognóstico e a qualidade de vida. Ademais,
destaca-se a correlação negativa entre sintomas depressivos e níveis de espe-
rança, bem como entre níveis de estresse e níveis de esperança, em particular
entre idosos com câncer, conforme identificado por Silva et al. (2019). Nesse
estudo, a esperança foi reconhecida como um importante recurso para idosos
com câncer na elaboração da aceitação e do enfrentamento do tratamento
oncológico. Assim, recomenda-se que os profissionais de saúde se atentem aos
processos formativos para a realização de uma ampla avaliação dos recursos
dos idosos, com a consideração da totalidade de seus aspectos biopsicossociais
que podem ser afetados pelo adoecimento, reconhecimento de suas potenciali-
dades, bem como suas limitações resultantes do processo de envelhecimento.
Alguns pacientes oncológicos ainda podem se sentir abandonados por não
se beneficiar dos cuidados que estavam sendo oferecidos rotineiramente. Por
outro lado, outras pessoas com câncer podem passar a vivenciar um sentido de
normalidade ao permanecer em casa, quando todos estão distanciados social-
mente. Antes, o adoecimento pelo câncer trazia a necessidade de recolhimento,
sendo percebido como uma vivência estigmatizada, alheia e à margem da vida
social. No atual cenário, ficar em casa ganha um sentido de nova normalidade,
produzindo um efeito redutor de estigma, o que contribui para a aceitação do
adoecimento e o seguimento dos tratamentos (Chagnon, 2020).

Implicações para a Prática Psicológica na Atenção a Pacientes


Oncológicos e seus Familiares no Contexto da Pandemia

Como visto, a pandemia de COVID-19 se associa a repercussões psico-


lógicas para pacientes oncológicos e seus familiares. Nesse sentido, destaca-
-se a relevância das intervenções psicológicas, que durante essa grave crise
de saúde pública podem ser voltadas a promover o bem-estar de pacientes
e familiares, incentivando-os a explorar formas criativas para lidar com o
estresse, incluindo cuidados com o sono e a alimentação, prática de atividades
físicas, manutenção de contatos com a rede socioafetiva (ainda que as inte-
rações não ocorram face a face), além de estratégias para evitar o excesso de
260

informações, o que tende a aumentar sintomas de ansiedade no atual cenário


(Tsamakis et al., 2020).
Para minimizar o risco de infecção pelo novo coronavírus, recomenda-se
que as intervenções psicológicas sejam realizadas por meios de tecnologia da
informação e da comunicação (Schmidt et al., 2020; Torous, Myrick, Rauseo-
-Ricupero, & Firth, 2020). Em função da COVID-19, o Conselho Federal de
Psicologia (CFP) passou a permitir a prestação de serviços psicológicos por
esses meios, inclusive em situações de urgência, emergência e desastre, o que
não era autorizado até então (Resolução CFP nº 4/2020). Portanto, pacien-
tes oncológicos e seus familiares podem receber assistência psicológica por
internet ou telefone, de forma síncrona (ex., videoconferência ou teleconfe-
rência) ou assíncrona (ex., troca de e-mails e mensagens de texto), buscando
minimizar repercussões psicológicas negativas durante a pandemia (Torous et
al., 2020). Outro recurso interessante para promover saúde mental e fortalecer
redes de apoio de pacientes oncológicos e seus familiares são webinars com
profissionais da saúde, para esclarecimento de dúvidas ou oferta de suporte
(ex., pelo Skype), bem como interações em comunidades virtuais (ex., grupos
no Facebook) (Tsamakis et al., 2020).
No Brasil, algumas instituições, como a Fiocruz, têm oferecido treina-
mentos gratuitos voltados à saúde mental e à atenção psicossocial no atual
cenário, abordando, dentre outros aspectos, intervenções por meios de tecno-
logia da informação e da comunicação. Contudo, embora muitos profissionais
estejam sendo ou já tenham sido suficientemente capacitados para a prestação
desses serviços, é importante salientar que alguns pacientes oncológicos não
têm acesso à internet, computadores ou smartphones, ou ainda apresentam
dificuldades para utilizá-los. Essa brecha digital evidencia inequidades sociais,
podendo trazer repercussões negativas à saúde mental (Chagnon, 2020). A
falta de acesso à internet ou de conhecimentos suficientes para manejar as
tecnologias digitais costuma ocorrer sobretudo entre idosos no Brasil (Sch-
midt et al., 2020). Isso gera um desafio duplo, tendo em vista que o câncer é
considerado uma doença relacionada ao envelhecimento e é no estágio tardio
do ciclo de vida que se observa o maior número de complicações em decor-
rência da COVID-19 (Ferreira et al., 2020; Hanna et al., 2020). Nesses casos,
recomenda-se que as intervenções psicológicas sejam realizadas notadamente
por ligações telefônicas (Schmidt et al., 2020).
Afora pacientes oncológicos e seus familiares, destaca-se a relevância
de intervenções psicológicas também junto a profissionais da saúde nesse
contexto (Romeo et al., 2020). Os médicos, em particular, podem experien-
ciar pressão intensa e se deparar com dilemas éticos, referentes à tomada
de decisões sobre a manutenção ou a suspensão temporária de procedimen-
tos e tratamentos oncológicos (Tsamakis et al., 2020). Nesse sentido, escuta
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 261

ativa, oferta de apoio e psicoeducação sobre estratégias de enfrentamento


(ex., gerenciamento de estresse) podem favorecer o bem-estar psicológico e
prevenir as repercussões negativas à saúde mental dos profissionais da saúde.
Além disso, para preservar os pacientes, muitos profissionais da saúde têm
se mantido fisicamente distantes de pessoas da sua rede socioafetiva, o que
pode acarretar sentimento de isolamento (Schmidt et al., 2020). Assim, nas
intervenções psicológicas voltadas a esse público, recomenda-se incentivar
a manutenção de contatos frequentes com familiares e amigos, por meio
de mensagens de áudio, texto e vídeo, bem como de telefonemas (Chen et
al., 2020). Essas intervenções psicológicas podem ser realizadas via internet,
telefone ou face a face, bem como por meio de materiais informativos (ex.,
cartilhas), abordando desafios comumente experienciados por profissionais
da saúde que acompanham pacientes oncológicos e estratégias de manejo de
situações desafiadoras no contexto da pandemia. Ressalta-se ainda o TelePSI,
que consiste em uma central de prestação de apoio psicológico, por meio de
teleconsulta, aos profissionais do SUS que atuam na linha de frente do com-
bate à COVID-19, buscando auxiliá-los a gerenciar especialmente sintomas
de estresse, ansiedade e depressão (Ministério da Saúde, 2020). Esse projeto
foi lançado em maio e deve ocorrer até setembro de 2020.

Considerações Finais

Como visto, a COVID-19 gera desafios adicionais para pessoas com cân-
cer, seus familiares e profissionais de saúde. Entretanto, a pandemia também
traz a oportunidade de pensar sobre formas alternativas para manutenção de
procedimentos e tratamentos oncológicos, incluindo as intervenções psico-
lógicas nesse contexto. Tem-se a expectativa de que essa crise se associe à
qualificação da assistência, na perspectiva da integralidade, ao considerar
globalmente as necessidades e os direitos dos usuários dos serviços de saúde.
Além disso, em alguns casos, ela também pode favorecer o crescimento pós-
-traumático, sobretudo em médio e longo prazo, dado que circunstâncias
desafiadoras não excluem a ocorrência de mudanças psicológicas positivas
às pessoas que as experienciam (Romeo et al., 2020). Assim, destaca-se a
relevância do apoio social e institucional, o que tende a contribuir para a
elaboração de narrativas mais adaptativas sobre eventos estressantes e poten-
cialmente traumáticos, como a pandemia de COVID-19.
A implementação e o aprimoramento das intervenções realizadas de
forma remota é uma demanda premente, dado que medidas de distancia-
mento social intermitente devem permanecer por meses ou anos, até que
seja desenvolvida a imunidade coletiva da população (FIOCRUZ, 2020c).
Portanto, destaca-se a necessidade de garantir a constância no funcionamento
262

dos serviços e a qualidade da assistência, mantendo a articulação da rede, visto


que pacientes crônicos ou em tratamento são particularmente vulneráveis,
podendo ter seu quadro agravado pela suspensão ou pelo atraso na oferta de
cuidados e ações de saúde (IASC, 2020; WHO, 2020). Ademais, conforme
abordado no presente capítulo, os familiares dos pacientes oncológicos tam-
bém devem ser incluídos nessas propostas, pois seu bem-estar psicológico
tende a ser afetado no atual cenário.
É importante destacar que o aprimoramento das intervenções oferecidas
de forma remota depende de pesquisas, para investigar sua efetividade e
eficácia no acompanhamento a pessoas com câncer e seus familiares. Isso
exigirá o desenvolvimento de estudos robustos, os quais necessitam de
financiamento, bem como mudanças de políticas, treinamento profissional e
equidade no acesso aos meios de tecnologia da informação e da comunicação
por usuários dos serviços de saúde (Touros et al., 2020). Assim, investimentos
são necessários para que se tenha o retorno desejado, por meio de intervenções
baseadas em evidências científicas.
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 263

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ÍNDICE REMISSIVO

A
Adoecimento 9, 13, 15, 16, 17, 37, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 50, 55, 68,
76, 79, 89, 91, 93, 95, 98, 99, 100, 107, 122, 134, 135, 137, 138, 139, 140,
194, 197, 200, 205, 211, 219, 220, 221, 222, 224, 225, 237, 238, 258, 259,
267, 271
Ansiedade 17, 23, 26, 30, 33, 43, 55, 58, 60, 61, 63, 68, 75, 81, 83, 85, 108,
109, 110, 111, 113, 114, 115, 116, 138, 139, 147, 148, 149, 151, 154, 162,
174, 187, 192, 201, 203, 204, 207, 211, 217, 221, 223, 224, 225, 227, 229,
235, 238, 242, 243, 260, 261

B
Bem estar 42, 49

C
Câncer 9, 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 21, 22, 23, 27, 29, 30, 32, 33, 34, 35,
36, 37, 38, 39, 41, 46, 47, 48, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 63, 65, 67, 68,
69, 70, 71, 72, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 88, 89, 95, 107,
108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 116, 118, 120, 131, 133, 134, 135,
137, 138, 139, 141, 142, 143, 145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 153, 154,
155, 156, 157, 159, 160, 162, 163, 165, 166, 167, 168, 169, 170, 171, 172,
173, 174, 175, 177, 178, 179, 180, 181, 183, 184, 185, 188, 189, 190, 191,
192, 193, 194, 195, 196, 197, 199, 200, 201, 202, 204, 206, 208, 211, 212,
213, 215, 216, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223, 225, 227, 228, 229, 236,
237, 238, 239, 241, 244, 245, 246, 247, 249, 250, 253, 254, 255, 256, 257,
258, 259, 260, 261, 262, 263, 264, 265, 270
Câncer de mama 10, 15, 22, 27, 30, 32, 33, 36, 38, 54, 75, 77, 78, 79, 80,
83, 85, 110, 131, 133, 134, 137, 138, 141, 143, 145, 146, 148, 149, 155, 156,
157, 159, 160, 162, 163, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 197, 238, 265
COVID-19 10, 11, 15, 16, 233, 240, 241, 244, 245, 247, 248, 249, 250, 251,
252, 253, 254, 255, 257, 258, 259, 260, 261, 263, 264, 265, 266
Criança 15, 63, 71, 81, 84, 165, 166, 167, 168, 170, 171, 172, 174, 175, 178,
179, 180, 181, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 210,
211, 212, 213, 214, 215, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223, 224, 227
Crianças 11, 62, 63, 64, 80, 83, 90, 110, 165, 166, 170, 172, 174, 175, 178,
268

189, 190, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 210, 211,
212, 213, 215, 217, 218, 219, 221, 223, 225, 226, 227, 228, 229, 268, 269
Cuidados 9, 11, 13, 14, 56, 57, 58, 62, 65, 67, 68, 70, 76, 82, 87, 88, 89, 90,
91, 92, 93, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 109,
113, 116, 120, 122, 125, 127, 129, 148, 168, 177, 179, 195, 201, 204, 206,
207, 210, 211, 217, 218, 219, 221, 222, 226, 237, 239, 241, 242, 249, 255,
256, 258, 259, 262, 267, 270
Cuidados Paliativos 9, 11, 14, 58, 62, 67, 68, 70, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93,
95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 109, 116, 120, 129,
179, 218, 226, 256, 267, 270

D
Desenvolvimento 11, 14, 15, 21, 22, 23, 28, 33, 34, 37, 38, 42, 55, 57, 59,
63, 83, 94, 108, 110, 111, 112, 145, 149, 150, 152, 153, 155, 163, 165, 169,
173, 181, 192, 200, 201, 202, 204, 205, 206, 207, 211, 214, 216, 217, 220,
221, 224, 233, 235, 236, 237, 240, 241, 245, 255, 256, 262, 268, 269, 272
Diagnóstico 11, 14, 17, 27, 29, 30, 33, 41, 53, 55, 57, 63, 70, 75, 79, 80, 81,
82, 84, 87, 88, 89, 93, 95, 99, 105, 107, 108, 109, 110, 111, 114, 115, 121,
122, 123, 131, 133, 134, 136, 137, 138, 139, 141, 143, 145, 146, 147, 148,
149, 151, 153, 154, 155, 157, 160, 163, 165, 166, 168, 169, 170, 171, 172,
173, 174, 175, 177, 178, 179, 183, 184, 185, 187, 191, 192, 199, 217, 218,
219, 220, 222, 226, 236, 238, 239, 240, 250, 254, 256, 257, 258, 259
Diagnóstico de câncer 17, 27, 29, 30, 41, 53, 75, 79, 81, 82, 84, 89, 95, 107,
110, 114, 131, 141, 148, 149, 153, 165, 166, 169, 172, 173, 177, 178, 191,
199, 257
Doença 10, 11, 13, 14, 15, 17, 22, 23, 27, 32, 33, 34, 35, 37, 42, 43, 44, 45,
47, 49, 50, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 63, 66, 67, 68, 69, 75, 76, 79, 81, 82, 83,
84, 87, 88, 89, 91, 93, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 107, 108, 109, 110, 111,
112, 113, 114, 115, 116, 121, 122, 125, 126, 128, 131, 133, 134, 136, 138,
139, 140, 145, 146, 147, 148, 149, 151, 153, 154, 155, 156, 157, 160, 162,
165, 166, 168, 169, 170, 171, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 183,
184, 185, 186, 187, 188, 191, 192, 193, 194, 196, 199, 200, 201, 202, 203,
205, 206, 207, 211, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 225, 226, 236, 237, 238,
239, 240, 244, 253, 255, 258, 260, 267, 271
Dor 58, 63, 64, 67, 68, 71, 87, 91, 95, 96, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104,
108, 109, 115, 116, 124, 125, 126, 127, 133, 140, 145, 147, 149, 150, 155,
170, 173, 187, 188, 192, 193, 194, 200, 201, 206, 207, 209, 221, 238
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 269

E
Emocional 15, 22, 23, 24, 26, 31, 32, 57, 59, 62, 63, 68, 69, 81, 85, 87, 88,
92, 95, 96, 99, 100, 107, 109, 113, 121, 123, 125, 132, 136, 140, 145, 147,
148, 149, 151, 153, 154, 159, 166, 173, 177, 188, 191, 194, 204, 206, 217,
219, 221, 224, 228, 234, 239, 241
Emoções 26, 32, 33, 34, 55, 56, 60, 64, 66, 82, 83, 84, 114, 124, 140, 142,
148, 152, 201, 208, 209, 221, 222, 223
Enfrentamento 10, 11, 15, 16, 17, 24, 32, 33, 47, 59, 61, 62, 63, 64, 68, 70,
78, 81, 84, 88, 89, 95, 97, 98, 100, 101, 111, 112, 122, 125, 126, 132, 138,
139, 141, 142, 153, 154, 163, 165, 166, 167, 168, 169, 173, 174, 176, 179,
183, 187, 190, 191, 194, 201, 204, 208, 210, 214, 217, 220, 221, 222, 224,
225, 227, 229, 237, 259, 261

F
Família 13, 14, 17, 22, 56, 59, 67, 68, 75, 82, 83, 84, 87, 88, 89, 90, 91, 92,
93, 94, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 106, 108, 122, 123, 128, 129, 133,
136, 137, 141, 145, 148, 149, 156, 166, 167, 169, 172, 173, 177, 178, 179,
180, 181, 192, 196, 199, 201, 204, 210, 211, 219, 220, 221, 222, 235, 238,
241, 268, 269

G
Gestalt-terapia 9, 41, 42, 43, 44, 51, 269, 270
Gravidez 9, 14, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 169, 173

H
Hospital 27, 32, 70, 80, 95, 96, 99, 104, 107, 108, 115, 120, 162, 165, 167,
168, 169, 174, 176, 178, 180, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 208, 209,
210, 211, 212, 213, 214, 215, 222, 226, 227, 229, 243, 245, 258, 267, 268,
269, 270, 271, 272

I
Idosos 60, 62, 63, 66, 67, 233, 234, 235, 237, 238, 239, 240, 241, 242, 243,
244, 245, 246, 249, 250, 258, 259, 260, 265, 266

L
Luto antecipatório 9, 14, 97, 98, 101, 104, 108, 117, 121, 122, 123, 124,
125, 126, 127, 128, 129
270

M
Ministério da saúde 36, 70, 71, 93, 106, 158, 160, 189, 218, 226, 247, 253,
261, 265
Momento 7, 17, 41, 45, 53, 57, 66, 84, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 95, 96, 97,
98, 99, 100, 101, 102, 103, 108, 112, 122, 123, 124, 127, 132, 138, 145, 165,
167, 178, 183, 186, 187, 192, 195, 199, 200, 202, 203, 205, 206, 207, 208,
210, 211, 222, 224, 254, 255
Morte 14, 17, 21, 53, 54, 67, 68, 69, 75, 76, 88, 89, 90, 91, 92, 94, 95, 96, 97,
98, 99, 100, 101, 102, 103, 105, 106, 107, 111, 113, 114, 116, 121, 122, 123,
124, 125, 126, 127, 128, 129, 131, 132, 133, 136, 137, 138, 139, 141, 142,
145, 146, 147, 157, 166, 168, 172, 174, 175, 177, 183, 187, 188, 191, 192,
195, 199, 200, 218, 219, 220, 221, 235, 236, 237, 238, 241, 245, 256, 257
Mulheres 10, 15, 22, 27, 32, 38, 39, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85,
107, 110, 113, 131, 133, 134, 137, 138, 139, 143, 145, 146, 149, 154, 156,
157, 160, 162, 163, 191, 194, 195, 196, 197, 233, 241, 265

P
Paciente 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 23, 24, 27, 34, 35, 45, 46, 47, 48, 53, 54,
56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 73, 76, 80, 82, 83, 84,
85, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104,
107, 111, 113, 114, 116, 121, 122, 123, 125, 133, 135, 138, 139, 140, 141,
142, 145, 148, 149, 153, 156, 157, 169, 174, 175, 180, 183, 184, 185, 186,
187, 188, 189, 190, 191, 192, 196, 201, 204, 210, 211, 213, 217, 219, 220,
221, 222, 223, 225, 233, 237, 238, 239, 245, 250, 256, 257
Paciente oncológico 14, 34, 35, 47, 62, 113, 133, 180, 188, 189, 245, 256, 257
Pacientes com câncer 23, 32, 38, 55, 57, 58, 63, 108, 109, 111, 112, 113,
114, 115, 159, 193, 196, 241
Pandemia 10, 16, 240, 241, 242, 243, 253, 254, 255, 257, 259, 260, 261,
263, 264, 265
Personalidade 9, 11, 13, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 29, 30, 32, 33, 34, 35, 36,
37, 38, 39, 48, 49, 137, 153, 154, 168, 176, 179
Processo 11, 14, 15, 16, 17, 21, 23, 24, 34, 35, 43, 44, 45, 46, 48, 49, 56,
57, 60, 61, 62, 65, 67, 68, 69, 76, 81, 82, 84, 89, 90, 91, 93, 94, 95, 96, 97,
98, 99, 100, 101, 102, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 132, 134, 138,
140, 145, 148, 149, 150, 152, 153, 154, 155, 165, 167, 168, 173, 178, 183,
184, 186, 187, 188, 193, 194, 196, 199, 200, 201, 203, 205, 207, 208, 211,
212, 217, 219, 220, 221, 222, 223, 225, 229, 234, 235, 237, 238, 239, 240,
247, 254, 256, 259, 270
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 271

Profissionais 9, 11, 13, 14, 15, 17, 46, 47, 56, 60, 68, 76, 80, 82, 84, 87, 88,
89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 97, 100, 103, 104, 105, 109, 115, 126, 128, 130,
132, 178, 179, 186, 193, 196, 203, 204, 208, 220, 221, 222, 238, 242, 244,
257, 258, 259, 260, 261, 267
Profissionais de saúde 11, 56, 60, 68, 76, 80, 84, 90, 94, 97, 103, 105, 109,
126, 128, 130, 193, 204, 242, 257, 258, 259, 261
Psicologia 4, 10, 11, 13, 15, 17, 18, 25, 36, 37, 38, 39, 70, 71, 72, 73, 76, 85,
97, 99, 104, 134, 149, 150, 157, 159, 161, 162, 163, 164, 179, 180, 190, 192,
197, 212, 213, 214, 215, 217, 218, 219, 220, 221, 225, 226, 227, 228, 229,
245, 248, 249, 260, 263, 265, 266, 267, 268, 269, 270, 271, 272, 273
Psicologia Pediátrica 10, 15, 212, 217, 218, 219, 220, 221, 225, 227, 228, 229
Psico-oncologia 3, 4, 36, 37, 38, 39, 55, 62, 73, 85, 189, 191, 221, 228,
250, 264
Psiquiatria 72, 107, 114, 228, 249, 268, 270, 271, 272

Q
Qualidade de vida 13, 23, 39, 53, 55, 56, 58, 62, 63, 79, 87, 96, 98, 103, 115,
116, 135, 143, 145, 148, 162, 185, 188, 192, 194, 200, 204, 205, 207, 211,
215, 218, 234, 235, 238, 243, 250, 256, 257, 259

R
Recursos Lúdicos 10, 15, 199, 211

S
Saúde 4, 7, 11, 13, 15, 16, 17, 18, 21, 22, 24, 25, 26, 29, 30, 33, 35, 36, 37,
38, 39, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 49, 50, 53, 55, 56, 60, 62, 65, 66, 67, 68, 69,
70, 71, 72, 76, 79, 80, 81, 84, 85, 87, 88, 89, 90, 92, 93, 94, 97, 102, 103,
104, 105, 106, 107, 108, 109, 114, 116, 117, 121, 122, 126, 128, 129, 130,
131, 132, 133, 134, 135, 137, 141, 142, 145, 146, 148, 149, 156, 157, 158,
159, 160, 161, 162, 163, 164, 167, 176, 183, 184, 189, 190, 191, 192, 193,
194, 196, 197, 201, 202, 204, 205, 210, 211, 217, 218, 219, 220, 221, 222,
223, 225, 226, 227, 228, 229, 234, 235, 236, 237, 238, 239, 240, 241, 242,
244, 245, 246, 247, 248, 249, 250, 251, 253, 254, 255, 257, 258, 259, 260,
261, 262, 263, 265, 267, 268, 269, 270, 271, 272
Saúde Mental 7, 11, 55, 65, 66, 90, 97, 107, 108, 114, 130, 135, 137, 142,
149, 183, 220, 235, 241, 242, 244, 248, 260, 261, 263, 265, 269, 270, 271
Sintomas 14, 25, 26, 42, 44, 54, 56, 61, 67, 68, 80, 81, 87, 88, 91, 92, 98,
100, 103, 107, 109, 110, 111, 112, 113, 115, 116, 120, 135, 151, 162, 169,
272

178, 185, 192, 194, 204, 221, 223, 227, 240, 241, 243, 255, 257, 258, 259,
260, 261, 266
Social 21, 22, 25, 48, 56, 61, 70, 84, 87, 89, 100, 102, 111, 113, 115, 116,
121, 125, 126, 132, 134, 135, 137, 138, 139, 149, 150, 154, 156, 161, 167,
177, 178, 180, 181, 183, 185, 187, 188, 193, 194, 196, 202, 204, 211, 213,
216, 218, 222, 225, 234, 235, 237, 238, 239, 240, 242, 243, 244, 245, 247,
250, 254, 255, 259, 261, 264, 269, 271, 272
Sofrimento 10, 14, 15, 17, 26, 31, 50, 54, 57, 58, 59, 61, 64, 65, 68, 75, 78,
79, 81, 82, 84, 87, 88, 90, 91, 92, 95, 96, 97, 98, 100, 101, 102, 103, 109, 110,
112, 116, 125, 126, 127, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 140,
142, 145, 146, 147, 148, 150, 155, 156, 166, 183, 188, 192, 194, 195, 201,
215, 221, 235, 237, 238, 240, 241, 254

T
Terapia 9, 10, 11, 13, 14, 15, 41, 42, 43, 44, 50, 51, 58, 60, 61, 63, 64, 70,
72, 73, 83, 93, 104, 105, 106, 129, 130, 136, 143, 147, 162, 163, 171, 212,
213, 214, 215, 217, 218, 219, 221, 222, 226, 227, 228, 229, 246, 250, 267,
268, 269, 270, 271, 272, 273
Trabalho 13, 14, 26, 31, 41, 42, 43, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 53, 54, 55, 67,
76, 77, 82, 92, 95, 96, 97, 98, 100, 102, 113, 123, 127, 128, 142, 148, 149,
156, 157, 164, 165, 168, 177, 178, 179, 185, 192, 196, 211, 217, 221, 239,
254, 267, 269
Transtornos psiquiátricos 9, 14, 107, 108, 110, 115
Tratamento 9, 10, 11, 13, 14, 15, 17, 23, 24, 27, 28, 29, 30, 35, 37, 39, 41,
46, 47, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 60, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 71, 76, 77, 78, 79,
80, 81, 82, 83, 84, 87, 88, 89, 92, 97, 98, 99, 100, 103, 105, 107, 108, 109,
111, 112, 113, 114, 115, 116, 134, 136, 137, 138, 140, 142, 143, 145, 146,
147, 148, 157, 162, 165, 166, 167, 168, 169, 170, 171, 173, 174, 175, 176,
177, 178, 179, 183, 184, 185, 186, 187, 188, 191, 192, 193, 194, 196, 197,
199, 200, 202, 204, 205, 207, 211, 215, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223,
225, 226, 236, 237, 238, 241, 249, 253, 255, 256, 257, 259, 262, 266, 267

U
Unidade de Terapia Intensiva 104, 105, 106, 129

V
Vida 13, 14, 15, 16, 17, 21, 22, 23, 27, 35, 37, 38, 39, 41, 42, 45, 46, 47, 49,
53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 62, 63, 64, 66, 68, 69, 75, 76, 79, 80, 82, 84, 87,
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 273

88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 98, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107,
108, 109, 110, 111, 112, 115, 116, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128,
129, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 143, 145, 146,
147, 148, 149, 150, 151, 152, 153, 155, 156, 157, 158, 160, 162, 165, 168,
169, 171, 172, 173, 174, 177, 178, 179, 181, 185, 187, 188, 191, 192, 194,
195, 196, 197, 199, 200, 201, 202, 204, 205, 206, 207, 211, 215, 218, 221,
222, 229, 233, 234, 235, 236, 237, 238, 239, 243, 246, 250, 256, 257, 258,
259, 260, 265
SOBRE OS AUTORES E
ORGANIZADORES
Ana Carolina Seara - Graduada (2002) e Mestre (2006) em Psicologia pela
Universidade Federal de Santa Catarina; Gestalt-Terapeuta e Especialista em
Psicologia Clínica, com formação no Enfoque Holístico da Saúde e Doença
(com Adriana Schnake, Chile) e em Coordenação de Grupos em Fenomeno-
logia (Feno&Grupos-SP). Ao longo da sua formação, fez aprofundamentos
didáticos-vivenciais com os Psicoterapeutas: Jean-Marie Delacroix (França);
Jean-Marie Robine (França) e Paolo Quatrini (Itália). Desde 2011, dedica-se
ao estudo da relação entre Psicologia e adoecimento, apresentando trabalhos
em congressos nacionais e internacionais. Foi professora e supervisora Clínica
e da Saúde no Curso de Psicologia da UNIDAVI (Rio do Sul-SC); profes-
sora na Escola Técnica Geração (Florianópolis-SC) e, também, no curso de
Psicologia da UNIASSELVI (Blumenau-SC). Desde 2012, é coordenadora
e professora no curso Psicologia do Adoecimento (curso de pós-formação,
em Florianópolis-SC). Como psicoterapeuta, trabalhou junto a profissionais
da área da Educação com foco no atendimento infanto-juvenil e de pessoas
com deficiência no Centro Interdisciplinar (Florianópolis-SC); participou do
corpo clínico do Instituto Gestalten e da Clínica Alcance (especializada em
reabilitação física). Fez parte do Instituto Müller-Granzotto, como supervi-
sora e professora no Curso de Especialização em Psicologia Clínica; além
de trabalhar nesta instituição com atendimento individual (jovens e adultos),
com grupos e com pacientes em tratamento oncológico e outras doenças.
Atualmente, trabalha como psicoterapeuta na UNO Clínica Integrativa (tra-
balho interdisciplinar e multiprofissional) e em seu consultório particular,
atendendo jovens, adultos e pacientes com relato de adoecimento orgânico.
E-mail: ana_seara@hotmail.com

Ana Paula Wilvert (org.) - Psicóloga Graduada pela Universidade Regional


de Blumenau – Blumenau/SC; Aprimoramento em Luto e Emergência pelo
Instituto 4 Estações – São Paulo/SP; Residência em Psicologia Hospitalar com
ênfase em Emergência e Trauma pelo Hospital de Pronto Socorro de Porto
Alegre – Porto Alegre/RS; Especialista em Psicologia da Saúde e Hospitalar
pelas Faculdades Pequeno Príncipe – Curitiba/PR; Especialista em Cancero-
logia pelo Hospital Erasto Gaertner – Curitiba/PR. Psicóloga Clínica, Supervi-
sora em Estágio Clínico em Terapia Cognitivo-Comportamental, Supervisora
da prática em Psicologia Hospitalar, realiza cursos e palestras nas áreas de
Oncologia, Cuidados Paliativos, Emergência, Perdas e Luto. Autora do livro
‘Psicologia Hospitalar: pesquisa e formas de atuação’ (2019, Juruá Editora).
E-mail: apwilvert@gmail.com
276

Beatriz Schmidt - Professora no Curso de Psicologia e no Programa de Pós-


-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande (FURG).
Professora no Programa de Residência Integrada Multiprofissional Hospitalar,
no Hospital Universitário da FURG. Pós-Doutorado no Núcleo de Infância e
Família (NUDIF) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFRGS. Dou-
torado sanduíche no Human Development & Family Science Program da
Ohio State University (OSU), nos Estados Unidos. Psicóloga, Especialista
em Saúde da Família e Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC). É pesquisadora colaboradora externa no Laborató-
rio de Psicologia da Saúde, Família e Comunidade da UFSC. Integrante do
GT Parentalidade e Desenvolvimento Infantil em Diferentes Contextos, da
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (ANPEPP)
e do Latino Caucus, da Society for Research in Child Development (SRCD).
E-mail: psi.beatriz@gmail.com

Camilla Volpato Broering (org.) - É psicóloga formada pela Universidade


do Vale do Itajaí - UNIVALI (2002), Mestre e Doutora em Psicologia da
Saúde, Processos Psicossociais e Desenvolvimento Psicológico pela Uni-
versidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Atualmente é professora do
Curso de Graduação em Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí (UNI-
VALI) professora de cursos de Pós-Graduação em Psicoterapia Cognitivo
Comportamental e atua como psicóloga clínica. Tem experiência na área de
intervenções cognitivo-comportamentais com crianças, adolescentes e adul-
tos. Supervisora da prática clínica em Terapia Cognitivo-Comportamental.
Autora de livros infantis tais como: ‘Meu Primeiro Dia na Psicóloga’, ‘O Sol
brilha para todos’, ‘Operar, eu?’, ‘O garoto autista em seu primeiro dia de
aula: aprendendo sobre o autismo’ (Juruá Editora), e organizadora do livro
‘Psicologia Hospitalar: pesquisa e formas de atuação’ (Juruá Editora). Autora
do ‘Baralho Infantil da Hospitalização’ (Sinopsys Editora).
E-mail: millavolbro@hotmail.com

Cleonice Zatti - Psicóloga; Pedagoga; Mestre em Psiquiatria e Ciências do


Comportamento pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Fez resi-
dência em Psicologia Hospitalar no Hospital de Pronto Socorro de Porto
Alegre, RS. Doutoranda em Psiquiatria e Ciências do Comportamento pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
E-mail: cleonice.zatti@outlook.com

Daniela Barsotti Santos - Psicóloga, docente da Graduação e Mestrado


em Psicologia, e das Residências Multiprofissionais em Saúde, Instituto de
Ciências Humanas e da Informação da Universidade Federal do Rio Grande
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 277

(ICHI-FURG). Possui graduação em Psicologia pela Universidade Estadual


Paulista (UNESP-Assis), mestrado em Psicologia pela Faculdade de Filosofia
Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FFCLRP-
-USP), doutorado em Enfermagem pela Escola de Enfermagem de Ribeirão
Preto (EERP-USP), com estágio de doutorado-sanduíche no Institut National
de la Santé et de la Recherche Médicale (INSERM), França. Realizou pós-
-doutorado em Saúde Coletiva na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto
(FMRP-USP). Coordenadora do Laboratório VIVAZ - Interfaces em Psico-
logia e Saúde da FURG e integrante do Laboratório de Ensino e Pesquisa em
Psicologia da Saúde (LEPPS) da FFCLRP-USP.
E-mail: daniela.santos@furg.br

Débora da Silva Noal - Psicóloga, Pesquisadora e Pós-Doutoranda em Saúde


Mental e Desastres (FIOCRUZ, 2019-2021), Doutora (UnB, 2018) e Mestre
em Processos do Desenvolvimento Humano e Saúde (UnB, 2014), com Dou-
torado Sanduíche na Division of Social and Transcultural Psychiatry (McGill
University, Canadá). Desde 2008 desenvolve junto a Médicos Sem Fronteiras
trabalhos relativos ao cuidado em saúde a populações e trabalhadores que
vivenciam desastres e epidemias nos continentes Americano, Africano e Asiá-
tico em países como: Haiti, República Dominicana, Brasil, Guiné, República
Democrática do Congo, Sudão do Sul, Líbia, Tunísia e Quirguistão. Membro
da “Equipo Regional de Respuesta en Salud” da Organização Panamericana
da Saúde (2015/Atual).
E-mail: noaldebora@gmail.com

Grazielle Rocha França - Psicóloga Clínica, Mestre em Saúde e Gestão do


Trabalho, especialista em Psicologia Clínica de crianças e de adolescentes na
perspectiva da Gestalt-Terapia, especialista em Saúde da Família, pós-graduada
em Psicopedagogia, atuante na atenção básica e na atenção de média complexi-
dade do Sistema Único de Saúde (SUS), com crianças, adolescentes e família.
E-mail: grazirf@yahoo.com.br

Heloisa Canteri Langa - Psicóloga Graduada pela Pontifícia Universidade


Católica do Paraná, Residência em Atenção Hospitalar pelo Hospital de Clí-
nicas da Universidade Federal do Paraná, Residência em Cancerologia pelo
Hospital Erasto Gaertner – Curitiba/PR.
E-mail: heloisacanteri@gmail.com

Igor Weyber da Silva Ramos - Psicólogo Graduado pela Universidade de


Fortaleza – Fortaleza/CE.
E-mail: igorweyber10@gmail.com
278

Isabel Regiane Cardoso do Nascimento - Coordenadora da Residência Inte-


grada em Saúde - Ênfase Pediatria- Hospital Infantil Albert Sabin/Escola de
Saúde Pública do Ceará - HIAS/ESP-CE; Psicóloga do Serviço de Cuidados
Paliativos Pediátricos - Hospital Infantil Albert Sabin - HIAS; Docente do
curso de Gestão Hospitalar da Faculdade Rodolfo Teófilo - FRT; Docente
do curso de Psicologia da Faculdade Ari de Sá - FAS; Mestre em Gestão em
Saúde pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva/Universidade
Estadual do Ceará - PPSAC/UECE; Especialista em Cancerologia na moda-
lidade de Residência Integrada em Saúde - Instituto do Câncer do Ceará/
Escola de Saúde Pública do Ceará - ICC/ESP-CE; Especialista em Saúde
Mental - Faculdade Stella Maris; Especialista em Gestão em Saúde - UECE;
Especialista em Psicologia da Saúde - Conselho Regional de Psicologia da 11ª
Região, CRP 11/08682; Graduada em Psicologia - Unicatólica de Quixadá-CE.
E-mail: isabelregiane90@gmail.com

Kátia Baltoré Floriani - Graduada em Letras pela FURB (2003), mestre em


Liguística Aplicada pela Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (2004),
graduada em Psicologia pela UNIVALI (2018). Atualmente é pós-graduada
em Psicologia Hospitalar e da Saúde, pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do
Hospital Santa Catarina (Blumenau-SC), em processo de Formação Plena em
Gestalt-Terapia pelo Instituo Granzotto (Florinanópolis, SC).
E-mail: katiabfloriani@gmail.com

Keyssiane Maria de Alencar Lima - Psicóloga Graduada pelo Centro Uni-


versitário Católica de Quixadá – Quixadá/CE, Especialista em Oncologia
pelo Instituto do Câncer do Ceará, na modalidade de Residência Multipro-
fissional, Especialista em Gestão em Saúde pela Universidade Estadual do
Ceará, Fortaleza/CE.
E-mail: keyssipsi@gmail.com

Lúcia Helena Machado Freitas - Médica, Psiquiatra, Phd, Professora Asso-


ciada do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal e do Serviço de
Psiquiatria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – Universidade Federal
do Rio Grande Do Sul.
E-mail: luciahelena.frei@gmail.com.br

Maria Balbina de Magalhães - Mestre em Educação pela Universidade Inter-


nacional (Lisboa - Portugal) e mestranda em Saúde Mental pela Universidade
Federal de Santa Catarina (Florianópolis-SC), Especialista em Ensino à Dis-
tância: Docência e Tutoria pela Faculdade Avantis (Balneário Camboriú-SC),
Gerontologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (Florianópolis-SC)
e Psicologia Clínica pelo Conselho Federal de Psicologia. Possui formação
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 279

no Enfoque Holístico da Saúde e Doença (Chile), em Saúde Mental pelo


Hospital Espírita de Psiquiatria Bom Retiro (Curitiba-PR) e em Coordenação
de Grupos em Fenomenologia – Feno&Grupos-SP. Graduada em Psicologia
pela Universidade Tuiuti do Paraná - UTP (Curitiba-PR) e Jornalismo pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Porto Alegre-RS).
Atualmente, é coordenadora do curso de formação “Psicologia do Adoeci-
mento” (Florianópolis-SC), docente no curso de Psicologia do Centro Univer-
sitário UNIAVAN (Balneário Camboriú-SC), e professora da Pós-Graduação
da Universidade Positivo (Curitiba-PR). Psicoterapeuta de adultos e grupos.
E-mail: ninagap@gmail.com

Marina Mesquita Geraldeli Carvalho Cavalcanti - Psicologia - Universi-


dade José do Rosário Vellano – Varginha/MG, Residência Multiprofissional
em Cancerologia – Hospital Erasto Gaertner – Curitiba/PR, Pós-graduação em
Psicologia da saúde- Hospitalar – Faculdades Pequeno Príncipe - Curitiba-PR.
E-mail: marinageraldeli@hotmail.com

Marisa B. L. Marantes Sanchez – Psicóloga, Especialista em Terapia Cogni-


tivo-Comportamental e Formação em Terapia do Esquema (IST-New Jersey),
Tutora Regional da Atenção ao Recém-nascido (SES/RS; MS/BR), Diretora
do Instituto de Terapia Cognitiva em Psicologia da Saúde – ITEPSA.
E-mail: sanchez.marisam@gmail.com

Nazaré Maria de Albuquerque Hayasida – Psicóloga, Pós-Doutoranda em


Psicologia (PUCRS/RS), Docente da Graduação e do Programa de Pós-gra-
duação em Psicologia da Universidade Federal do Amazonas, Líder do Labo-
ratório de Investigação em Ciências Cognitivas – LABICC/UFAM. Fundadora
e Coordenadora do Centro de Serviço de Psicologia Atendimento – CSPA
(Gestão 1993-1998). Terapeuta Certificada pela Federação Brasileira de Tera-
pias Cognitivas. Membro da Diretoria da Sociedade Brasileira de Psicologia
Hospitalar (Gestão 2017-2019 e 2019-2021). Membro do GT Processos, Saúde
e Investigação em uma perspectiva Cognitivo-Comportamental - ANPEPPE.
E-mail: hayasidanazare@hotmail.com

Patrícia Pessatto da Silva - Psicóloga formada pelo Centro Universitário Leo-


nardo da Vinci – UNIASSELVI (2018), Assistente Social pela Universidade
Católica de Pelotas - UCPel/RS (2008) e Especialista em Educação, Pobreza
e Desigualdade pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC (2016).
Atualmente, faz especialização em Neuropsicologia no Centro Universitário
Leonardo da Vinci - UNIASSELVI e atua na prefeitura Municipal de Doutor
Pedrinho, desde 2011.
E-mail: patriciapessato@hotmail.com
280

Paula Abaurre Leverone - Psicóloga com formação em Psicologia Familiar


e Individual Sistêmica pelo Intercef (Curitiba), Aprimoramento em Luto e
Emergência pelo Instituto 4 Estações (São Paulo), Mestre em “Migrações
Internacionais, Saúde e Bem-Estar” com ênfase em Luto Migratório pela
Faculdade Psicologia da Universidade de Sevilla (Espanha).
E-mail: paulaleverone@hotmail.com

Rodrigo Serrão de Farias - Psicólogo, graduado pela Universidade Federal


do Amazonas – UFAM. Mestrando em Psicologia pelo Programa de Pós-
-graduação em Psicologia da UFAM. Residência Multiprofissional em Saúde
com ênfase em Terapia Intensiva pela Fundação de Medicina Tropical do
Amazonas – FMT-HVD.
E-mail: rsf.serrao@gmail.com

Stefania Teche - Médica Psiquiatra, MsC, contratada do Serviço de Psiquia-


tria do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, doutoranda no programa de
Pós-Graduação em Ciências do Comportamento Psiquiatria na Universidade
Federal do Rio Grande Do Sul.
E-mail: steche@hcpa.edu.br

Sueli Terezinha Bobato - Possui graduação em Psicologia pela Universidade


do Vale do Itajaí - UNIVALI. Mestrado em Psicologia pela Universidade Fede-
ral de Santa Catarina - UFSC. Doutoranda em Ciências - Área de Oncologia
sob o Termo de Cooperação Técnica e Científica celebrado entre a UNIVALI
e a Fundação Antônio Prudente. Psicóloga do Ambulatório Interdisciplinar
de Doenças Inflamatórias Intestinais da Univali. Docente das disciplinas de
avaliação psicológica, psicologia analítica junguiana e psicologia da sexua-
lidade no Curso de Psicologia da Univali e em Cursos de Pós-Graduação
Lato Sensu em Psicologia. Membro do Grupo de Pesquisa Processos Psico-
lógicos, Desenvolvimento Humano e Saúde (CNPq) do Curso de Psicologia
da Univali. Atua como psicóloga clínica na perspectiva analítica junguiana e
realiza supervisão de casos clínicos na Clínica ConSCiência. Autora do livro
infantil “Como você está se sentindo hoje?” obra em formato híbrido com
um caderno de atividades (Editora Imagine Publicações).
E-mail: suelibobato@univali.br

Vanessa Schmitz Bulcão – Psicóloga (Uniritter/RS), especialista em Neu-


ropsicologia, com aperfeiçoamento em Terapia Cognitivo-Comportamental
(WAINER/RS). Possui formação em Comunicação Social (PUC/RS) e MBA
em Marketing (ISTE/Portugal).
E-mail: vabulcao@gmail.com
A ATUAÇÃO DA PSICO-ONCOLOGIA: reflexões e possibilidades de intervenção 281

Tânia Rudnicki – Psicóloga. PhD - Pós-Doutorado pela Capes Foundation


Ministry of Education Of Brazil-Brasília/DF – Brazil no WJCR - William James
Center for Research ISPA/Portugal, Terapeuta Certificado pela FBTC. Diretora
do ITEPSA - Instituto de Terapia Cognitiva em Psicologia da Saúde/RS.
E-mail: tania.rudnicki@gmail.com
SOBRE O LIVRO
Tiragem: 1000
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 X 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 11,5/12/16/18
Arial 7,5/8/9
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)

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