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A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA

SOB DIFERENTES OLHARES

ELIANE MARIA FOLETO


Organizadora
Eliane Maria Foleto
(Organizadora)

A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA
SOB DIFERENTES OLHARES

Editora CRV
Curitiba – Brasil
2019
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Editora CRV
Revisão: Os Autores

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)


CATALOGAÇÃO NA FONTE

C743

A conservação da água sob diferentes olhares / Eliane Maria Foleto (organizadora) –


Curitiba : CRV, 2019.
314 p.

Bibliografia
ISBN 978-85-444-3268-6
DOI 10.24824/978854443268.6

1. Conservação da água 2. Educação ambiental 3. Restauração ecológica 4. Monitoramento


qualitativo da água 5. Unidade de conservação 6. Qualidade ambiental I. Foleto, Eliane
Maria. org. II. Título III. Série.

CDU 372.32 CDD 372.357


551.311.21 551.481

Índice para catálogo sistemático


1. Conservação da água 551.48

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2019
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004
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Três de Febrero – Argentina) Eduardo Pimentel Menezes (UERJ)
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Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) Fabio Eduardo Cressoni (UNILAB)
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Fernando Antônio Gonçalves Alcoforado (IPB) Jussara Fraga Portugal (UNEB)
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Gloria Fariñas León (Universidade Leandro Baller (UFGD)
de La Havana – Cuba) Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO)
Guillermo Arias Beatón (Universidade Luciana Rosar Fornazari Klanovicz (UNICENTRO)
de La Havana – Cuba) Luiz Guilherme de Oliveira (UnB)
Jailson Alves dos Santos (UFRJ) Marcel Mendes (Mackenzie)
João Adalberto Campato Junior (UNESP) Marcio Jose Ornat (UEPG)
Josania Portela (UFPI) Marcio Luiz Carreri (UENP)
Leonel Severo Rocha (UNISINOS) Maurilio Rompatto (UNESPAR)
Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO) Mauro Henrique de Barros Amoroso (FEBF/UERJ)
Lourdes Helena da Silva (UFV) Michel Kobelinski (UNESPAR)
Marcelo Paixão (UFRJ e UTexas – US) Rosangela Aparecida de Medeiros
Maria de Lourdes Pinto de Almeida (UNOESC) Hespanhol (UNESP)
Maria Lília Imbiriba Sousa Colares (UFOPA) Sergio Murilo Santos de Araújo (UFCG)
Maria Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar) Simone Rocha (UnC)
Paulo Romualdo Hernandes (UNIFAL-MG) Sylvio Fausto Gil filho (UFPR)
Renato Francisco dos Santos Paula (UFG) Valdemir Antoneli (UNICENTRO)
Rodrigo Pratte-Santos (UFES) Venilson Luciano Benigno Fonseca (IFMG)
Sérgio Nunes de Jesus (IFRO) Vera Lúcia Caixeta (UFT)
Simone Rodrigues Pinto (UNB)
Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA)
Sydione Santos (UEPG)
Tadeu Oliver Gonçalves (UFPA)
Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)

Este livro foi avaliado e aprovado por pareceristas ad hoc.


Com colaboração especial dos
Instituidores e Mantenedores da Fundação MO’Ã:
Eleonora Diefenbach Muller e Rainer Oscar Müller.
AGRADECIMENTOS

A produção deste material é fruto da construção conjunta de profis-


sionais de diferentes áreas, que militam na defesa do meio ambiente, par-
ceiros de longa data da Fundação Mo’ã, que não mediram esforços para
a execução dos Projetos: Implantação da RPPN Estadual Mo’ã (financia-
do pela SOS Mata Atlântica) e “Saúde da Água” (financiado da Petrobrás
Socioambiental), em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria
– UFSM, através do Termo de Cooperação Técnico-Científico, os quais
agradeço por terem aceitado o desafio de elaborar a coletânea de textos que
compõe o livro “A conservação da água sobre diferentes olhares”.
Agradeço, inicialmente, ao Conselho Administrativo da Fundação
MO’Ã, em especial, ao casal instituidor/mantenedor, Profª. Msc. Eleonora
Diefenbach Muller e Economista Rainer Oscar Müller, ambos aposentados
da UFSM, que, com a sua valorosa contribuição, na Direção Executiva, pro-
porcionaram espaços para a discussão e a construção que culminaram com
o sucesso dos Projetos ambientais. Agradeço a contribuição da Drª. Engª.
Florestal Michele Benetti Leite, colaboradora da Fundação, com papel fun-
damental na elaboração dos Projetos, e ainda por me incentivar a organizar
este material.
Aos colegas da UFSM – Universidade Federal de Santa Maria, que se
doaram na orientação/supervisão, qualificando as ações dos Projetos, dentre
eles: a Profª. Drª. Jussara Cabral Cruz, uma das instituidoras da Fundação
MO’Ã, coordenadora do Grupo de Gestão de Recursos Hídricos/GERHI/
UFSM/Centro de Tecnologia; o Prof. Dr. Adriano Severo Figueiró, coorde-
nador do Grupo PANGEA – Patrimônio Natural, Geoconservação e Gestão
da Água, do Deptº. Geociências/CCNE; a Profª. Drª. Ana Paula Moreira
Rovedder, coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação
de Áreas Degradadas/NEPRADE/Centro de Ciências Rurais; a Profª. Drª.
Suzane Bevilacqua Marcuzzo, coordenadora do Núcleo de Estudos de Áreas
Protegidas/NEAP/Colégio Politécnico; a Profª. Drª.Thais Scotti do Canto
Dorow, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências
e Matemática da Universidade Franciscana – UFN, e a Srª. Mara Kunsler,
sócia gerente da Agência ArtMeio Propaganda, profissionais que, sem medir
esforços, atuaram para além de projetos, ofereço-lhes a minha gratidão, por
terem possibilitado vivências e aprendizados para todos.
Meu agradecimento aos demais parceiros: Sociedade Vicente Pallotti;
Ademar Souza e Família Gehm; Sociedade de Caça e Pesca – SOCEPE;
Associação de Moradores do Parque Pinhal; Conselho Municipal de Meio
Ambiente de Itaara – CONDEMA; Secretaria de Educação; Empresa de
Assistência Técnica e Extensão Rural do Governo do RS – EMATER, que
nos apoiaram, possibilitando ações em defesa do meio ambiente no municí-
pio de Itaara.
Enfim, à Equipe contratada para a execução dos Projetos e a todos que,
direta ou indiretamente, contribuíram com a construção de uma nova pers-
pectiva ambiental, que terá continuidade na consolidação do CEPA – Centro
de Estudos e Pesquisas Ambientais da Reserva Particular do Patrimônio
Natural Estadual Mo’ã, minha gratidão. E, para o meu Projeto de Vida, agra-
deço minha filha, Letícia Foleto Soares, que me motiva a acreditar e lutar por
dias melhores, obrigada a todos pela oportunidade de aprender!!!

Profª. Drª. Eliane Maria Foleto


Departamento de Geociências –
Programa de Pós-Graduação em Geografia/CCNE/UFSM
Presidente do Conselho Administrativo da
Fundação Mo’ã (2012-2018) representante da UFSM
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO............................................................................................ 13

PREFÁCIO....................................................................................................... 17
Demetrios Christofidis

CAPÍTULO 1
SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS E A CONSERVAÇÃO AMBIENTAL.............. 23
Michele Benetti Leite

CAPÍTULO 2
A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO CONTEXTO DO
MUNICÍPIO DE ITAARA................................................................................... 47
Eliane Maria Foleto

CAPÍTULO 3
AS RESERVAS PARTICULARES DO PATRIMÔNIO NATURAL – RPPN....... 63
Suzane Bevilacqua Marcuzzo
Eliane Maria Foleto

CAPÍTULO 4
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NAS TRILHAS DA ÁGUA: interpretando o
patrimônio natural da RPPN Estadual MO’Ã em Itaara (RS)........................... 85
Letícia Ramires Corrêa
Adriano Severo Figueiró

CAPÍTULO 5
O GEOPATRIMÔNIO: as quedas d’água do Município de Itaara...................111
André Ademir Weber
Greice Kelly Perske da Silva
André Weissheimer de Borba

CAPÍTULO 6
A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A
CONSERVAÇÃO DA SAÚDE DA ÁGUA EM ITAARA (RS)........................... 127
Adriano Severo Figueiró

CAPÍTULO 7
RESTAURAÇÃO FLORESTAL EM PROPRIEDADES RURAIS:
nascentes e matas ciliares............................................................................. 153
Ana Paula Moreira Rovedder
Bruna Balestrin Piaia
Rafaela Badinelli Hummel
CAPÍTULO 8
INVENTÁRIO, DINÂMICA E CONSERVAÇÃO DAS
PLANTAS AQUÁTICAS.................................................................................. 173
Marina Deon Ferrarese
Renata Azevedo Xavier
Olímpio Rafael Cardoso
Thais Scotti do Canto-Dorow

CAPÍTULO 9
A FLORA VASCULAR DA RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO
NATURAL ESTADUAL MO’Ã: composição, importância e aspectos
de manejo....................................................................................................... 191
Marina Deon Ferrarese
Thais Scotti do Canto-Dorow

CAPÍTULO 10
ÓLEO PRIME: projeto piloto de descarte correto do resíduo óleo de
cozinha no município de Itaara-RS................................................................ 213
Graciela Schmidt Disconzi
Jussara Cabral Cruz

CAPÍTULO 11
PRÁTICAS DE GESTÃO INTEGRADA DE RESÍDUOS SÓLIDOS............... 243
André Ademir Weber
Greice Kelly Perske da Silva
Thaimon da Silva Socoloski

CAPÍTULO 12
MONITORAMENTO QUALI-QUANTITATIVO DA ÁGUA
DE NASCENTES........................................................................................... 261
Marciano Friedrich
Raul Todeschini
Jussara Cabral Cruz

CAPÍTULO 13
COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL: publicização do projeto
saúde da água................................................................................................ 289
Mara Matiuzzi Kunzler
Imaruí Mallmann de Oliveira de Lima
Giuliana Seerig

SOBRE OS AUTORES................................................................................... 309


APRESENTAÇÃO

A água, como um elemento dinâmico, adquire as características do


meio ambiente e a conservação demanda diferentes olhares. Neste contex-
to, de geomorfologia e de cobertura de Mata Atlântica, típicas do Rebordo
do Planalto, reconhecida internacionalmente como Reserva da Biosfera, o
Estado do Rio Grande do Sul, através do “Projeto RS Biodiversidade”, define
como área prioritária para a conservação, propondo o “Corredor Ecológico
da Quarta Colônia” para conectar fragmentos florestais ao das Unidades
de Conservação Estaduais da Reserva Particular do Patrimônio Natural
Estadual MO’Ã, do Parque Natural Municipal dos Morros, do Parque da
Quarta Colônia e da Reserva Biológica do Ibicuí-Mirim, considerando-se,
assim, ser ainda maior a responsabilidade dos municípios em articular os
mecanismos de gestão Ambiental aos dos Recursos Hídricos, incentivando a
efetivação das Áreas Protegidas, como provedoras de serviços ecossistêmi-
cos para a sociedade.
Este material, que se apresenta, resultado da parceria da Fundação
Mo’ã com a Universidade Federal de Santa Maria, através de um Termo de
Cooperação Técnico Científico, para execução dos projetos de “Implantação
da Reserva Particular do Patrimônio Natural Estadual Mo’ã” e do “Saúde
da Água”, executado pela Fundação Mo’ã, subsidiaram as discussões e as
ações apresentadas no livro. Inicialmente, apresenta-se uma reflexão sobre
Serviços Ecossistêmicos, dentre eles, a produção de água e a manutenção
da biodiversidade, como alguns dos benefícios que a natureza oferece para
a sociedade, destacando a necessidade de protegê-los através dos Espaços
Territoriais Especialmente Protegidos. Outro capítulo aborda a temática
da água como um elemento importante na estruturação da paisagem, de-
monstrando que os comitês de Bacia Hidrográficas, de forma descentrali-
zada e participativa, devem articular-se aos conselhos de gestão ambiental,
para garantir a conservação e os usos múltiplos de um bem de uso comum,
tão importante para a sociedade. No capítulo seguinte, apresentam-se as
Reservas Particulares do Patrimônio Natural, como instrumento de parti-
cipação da sociedade na conservação ambiental, destacando-se, em espe-
cífico, os desafios na gestão da RPPN Estadual MO’Ã. O capítulo quatro
apresenta uma proposta “Educação Ambiental nas Trilhas da Água” para
a comunicação e a divulgação da Unidade junto à Comunidade, buscando
ampliar para novas iniciativas de conservação no “Corredor Ecológico da
Quarta Colônia”, região de grande potencial turístico. Em capítulo poste-
rior, destacam-se as quedas d’água no município de Itaara como um atrativo
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turístico, pela diversidade e quantidade, embasando-se em um estudo inédito


da geologia da região, que possibilita entender a formação e, principalmente,
a necessidade de conservação desse geopatrimônio. Na sequência, são apre-
sentados alguns capítulos com os resultados do “Projeto Saúde da Água”,
da contribuição da educação ambiental com ações desenvolvidas junto às
escolas, envolvendo alunos, professores e a comunidade. As Oficinas foram
desenvolvidas juntos aos alunos de diferentes faixas etárias e formação con-
tinuada de professores, em que a “Mandala da Ecopedagogia” foi utilizada
como ferramenta para impulsionar a educação ambiental, por projetos, den-
tro das escolas, assim como o ciclo de cinema socioambiental, as atividades
artísticas e o uso dos “Jogos de Interpretação de Papéis” ou RPG para a
abordagem lúdica dos problemas socioambientais do município, com a ideia
central “Itaara em Ação”, para avaliar a postura dos alunos frente a questões
que demandam decisões quanto à conservação do Geopatrimônio Hídrico do
município. Outro capítulo apresenta os resultados da restauração ecológica
de nascentes e mata ciliar, com cinco técnicas diferentes de plantio, os resul-
tados do monitoramento apontam para a técnica mais adequada, configuran-
do-se em um trabalho inédito para a região, já que considera as condições
geográficas específicas do município de Itaara. Também se configuram como
trabalhos inéditos os apresentados nos dois capítulos seguintes: do inventá-
rio, dinâmica das plantas aquáticas de três lagos urbanos de Itaara, com a
identificação dos tipos de macrófitas que se destacam na paisagem dos lagos,
com o relato das oficinas realizadas para a apresentação dos resultados junto
à comunidade, e do capítulo do levantamento da Flora Vascular da RPPN
Estadual MO’Ã, onde são apresentados os diferentes ambientes encontra-
dos e as espécies associadas a eles, com registro de espécies exóticas, e da
flora considerado pela “Lista Estadual das Espécies da Flora Ameaçados de
Extinção”, trazendo quatro espécies vulneráveis a extinção, demonstrando
a importância dessa Unidade para a conservação e as futuras pesquisas. Na
sequência, são apresentados dois capítulos com os resultados obtidos pelo
subProjeto da Política de Resíduos Sólidos, considerando o óleo de cozinha
como um elemento poluidor do ambiente aquático, as ações centraram-se na
coleta, no aproveitamento e na destinação adequada, o diagnóstico realizado
em dois bairros de Itaara: Estação Pinhal e Parque Pinhal, a caracterização
sociodemográfica, o conhecimento ambiental e Produção foram usadas para
subsidiar a distribuição dos Pontos de Coleta de Óleo. Outro capítulo, em
continuidade, apresenta os resultados obtidos com a ampliação do Projeto de
Resíduos Sólidos e a dispersão de ideias de sustentabilidade, por meio das
parceiras, com a reconstrução do saber ambiental, por meio de oficinas de
sabão, aproximação e diálogo com os catadores e a realização de uma peça
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 15

teatral, buscando mobilizar a comunidade e divulgar o resultado das ações


nas escolas. Na sequência, destaca-se a importância do monitoramento com
dados qualitativos da água nas nascentes da sub-bacia do Arroio Manoel
Alves. E, por fim, o último capítulo apresenta a experiência da equipe da
ArtMeio com a construção dos produtos de divulgação e comunicação do
Projeto Saúde da Água. A publicação do livro não finaliza a parceria, que
continuará com o Projeto do “Centro de Educação e Pesquisas Ambientais”,
a ser construído na RPPN Estadual MO’Ã, como um espaço de interpretação
da paisagem, estratégia para formação de sujeitos conscientes e preparados
para compreender as demandas e propor ações para a conservação ambiental
e da água na região central do RS.
PREFÁCIO

Os panoramas que este livro proporciona com a diversidade de novos


olhares em sintonia e contemplação à natureza e as águas, criaram momen-
tos mágicos, nos quais meu sentimento fluiu para níveis de realidade inusita-
dos despertando avanços marcantes em minha consciência ambiental.
O alcance de níveis de realidade ampliados pelas descrições e relatos dos
autores, enalteceram meu “gostar de ler” e minha criatividade, estimulando
meu desejo de interagir com a visão sensível predominante que percebe os
ecossistemas como verdadeiros santuários e encantados “templos de vida”.
O impacto inicial da leitura do livro apresentou o poder de elevar-me a
perceber que os ecossistemas hídricos realizam seu viver, seu modo natural
de ser, suas dinâmicas, a doação de vida plena aos demais seres, por existi-
rem, por “serem como são” e, assim, as águas proporcionam aos outros seres
as possibilidades de realizarem suas vocações e de “realmente serem” em
suas plenas virtudes.
A partir da consciência advinda desse novo olhar despertei para uma reali-
dade na qual percebe o que sua Presença (com “P” maiúsculo) representa em sua
capacidade de realizar o que se constitui como sendo “essencial ao bem comum”.
Assim, percebi que: “cada pessoa, cada Ser, emite um foco de luz de
intenção que gera atitudes para que os ecossistemas e os outros seres vivam
em plenitude”. Lembrando Mahatma Gandhi: Cada um de nós deve ser a
mudança que deseja ver no mundo.
Essa nova dimensão, tende a gerar uma Ética de diálogo, um modo
‘conversar e um escutar a natureza’, seus reinos, a montanha, as árvores,
os animais, as águas, um modo de sentir o ‘outro’, por sua dimensão sagra-
da, por um olhar que contempla e uma visão complementar de realização,
de atuação, reunidas numa admiração, uma Com-Templa-Ação, pelo seu
modo de Ser Santuário, aliando às suas qualidades de Trans-Forma-Ação,
ampliando, além da forma no alcance da consciência reflexiva.
No cuidar das águas pela educação ambiental, os textos extrapolaram
expectativas ao presentear com um percurso potencializado por um caso
real dedicado a proteger os espaços denominados por ‘santuários hídricos’,
com uma vivência na qual houve a participação de estudantes com o sentido
de reaproximação ao ‘modo humano de Ser’, com a essência da vida, pelo
‘pensar e sentir a revelação da paisagem’, em um novo modo de olhar as
relações específicas que ofertam suporte à vida.
O modo de caminhar, interpretando e revelando os ‘segredos da
natureza’, com as ‘leituras de paisagem’ baseadas nos princípios de enten-
dimento, de interpretação e valorização dos ecossistemas pela combinação
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da diversidade de olhares, incluiram: a compreensão; a revelação baseada


na informação; a interpretação como arte; a provocação instigadora; a in-
terpretação do todo e do contexto; e o direcionamento às crianças (infantil).
Esse conjunto proporcionou uma real expansão em meu olhar sobre as águas
e ampliação da escala de minha consciência ambientalista.
Difícil expressar com palavras o alcance que os textos desse livro
proporcionaram. Transmutando meu sentir, minha percepção, o despertar do
ser fluido, do zelo das águas, por semearem a vida, levam a crer no acima e
além, de “um serviço ecossistêmico”. Agora sinto a água como: “um viver nas
dimensões de essência fluida que, por natureza, constitui-se em base da vida”.
A água em seu “modo Ser-vir” propicia aos “seres vivos” o modo de
“viver sendo” da biodiversidade. O fluir das águas, o serpentear, o murmurar
das águas, as quedas dos rios, suas curvas, corredeiras, os modos de seu fluxo
o-correr, de brincar, o seu ‘viver curioso’, o esconder e o reaparecer, posso
dizer, agora, ‘cantam e me encantam’, compondo com minha percepção atri-
butos que levaram a conceber a animação ‘Corpo hídrico-corpo humano’.
As ameaças sobre as águas em decorrência da insensibilidade humana,
levam ao discernimento e a mostrar que devemos abandonar os caminhos
associados às atitudes, comportamentos e valores utilitaristas, e nos abrir-
mos a novos percursos que mostrem como “considerar o ‘uno’, os ‘outros”,
compondo a harmonia do conjunto”, que seja: cooperativa, ética, participativa,
fraterna, valorizadora, solidária, admiradora, consciente, comprometida, que
promova ações de religação, de reconstrução, de reabilitação, de restaura-
ção, de reanimação, de revitalização...
O novo da “Pedagogia do Cuidado” me encanta, por possibilitar gerar
um “fio condutor” contemplando a diversidade de ações, lógicas, compreen-
síveis, incentivadoras, que reforçam, o Ser coletivo, o agir em cooperação
grupal, o transpessoal, a atenção aos “outros”.
As ligações potencializam o modo de ser “efetivo” (masculino) e
“afetivo” (feminino), ao “pensar global e agir local” e são de respeito às
singularidades e ao foco, por considerarem “a Unidade na Diversidade e a
Diversidade na Unidade”.
Identifiquei-me, como professor, como ente envolvido em mobilização
e conscientização de jovens, com a “Pedagogia do Cuidado” e sua “ligação
afetiva”, potencializadas pelas representações sensíveis da ética interespecí-
fica do sapo “Curi” tendo os estudantes como protagonistas das ações e os
professores, estimulando a consciência de Ser e de Estar no Mundo com os
“outros”. Estratégia que pode e deve ser disseminada pelo País.
A participação dos educadores no proporcionar o enraizamento de novos
paradigmas, chamou a minha atenção pelas diversas ações efetivas realiza-
das no “Projeto Saúde da Água”, em especial, a Oficina de sensibilização/
percepção, com seus variados temas destacando e revelando as interconexões.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 19

Deslumbrei-me, pela criação da “Mandala” que considero um instru-


mento de poder ímpar nas Oficinas de Formação Continuada em Saúde da
Água, pois atuo com a Geometria Sagrada, e compreendo o poder educativo
que a Mandala detém em sua capacidade de ampliar nosso modo de olhar.
Essa Mandala me surpreendeu pela sua perspectiva “glo-cal”, pelas suas
seis “dimensões”, nos seis “campos temáticos” e pelos seis principais “eixos
metodológicos”. Estratégia que espelha o padrão do hexágono do cristal de
água que apresenta seis vértices e um centro que constitui sua essência e por
associar às pesquisas de Massaro Emoto: “A Mensagem da Água”. Vejo a
Mandala como sendo a mensagem pedagógica ideal do ambiente hídrico.
Admirei, sobremaneira, os demais componentes da estratégia: a) O
Ciclo de Cinema Socioambiental; b) As Saídas de Campo com os “Guardiões
de Nascentes”; c) As Atividades Artísticas; d) A Abordagem Lúdica dos
Conflitos Sócio Ambientais, com os Jogos de Interpretação de Papéis, todos
com elevada capacidade hidro educativas, hidro mobilizadoras e hidro sen-
sibilizadoras, hidro conscientizadoras e condizentes aos atributos de hidro
ética que julgo merecedores de ampla disseminação e adoção.
Destaco o aprendizado e possibilidades de sensibilização pela rique-
za proporcionada pelo Inventário, Dinâmica e Conservação das Plantas
Aquáticas e pela Cartilha: “As Plantas Aquáticas e a Saúde da Água”.
O livro enfatiza a importância da diversidade com os variados am-
bientes e espécies vegetais nativas da Mata Atlântica e das Unidades de
Conservação, em especial, onde se situa a RRPN Estadual MO’Ã, com sua
importância e aspectos de manejo de vegetação, que representa ampliação
do Conhecer e Proteger.
Ao criar uma pioneira Estratégia de Ação, denominada de “Óleo Prime”,
pelo Projeto Piloto de Descarte Correto de Resíduo de Óleo de Cozinha na
região, criando condições de difusão de experiências, alertando para os im-
pactos que ocorrem no ambiente e nas águas, com ilustrações educativas e
conscientizadoras, orientando e definindo prioridades e metodologias e prá-
ticas, que são essenciais ao melhor modo de cuidar das águas.
Os levantamentos, informações e resultados contribuem na expansão
das experiências para novos pontos de coleta estratégicos para a ampliação
do envolvimento da população, bases sólidas para educação ambiental nas
escolas e Oficinas com atividades de sensibilização e conscientização das
comunidades. Realização que ampliou o horizonte de possibilidades de rea-
plicação da estratégia em todo o País.
O Projeto Saúde da Água, que complementa as ações de sensibiliza-
ção com as “Práticas de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos” mostra a
sensibilização ambiental por diversos meios alternativos, difusão de ideais
20

de sustentabilidade por meio de parcerias, por uma variedade de orienta-


ções, existência de cartazes de sensibilização e pela reconstrução do saber
ambiental por meio de oficinas de sabão e de diálogos.
As peças teatrais, e a variedade de opções me surpreenderam e me incen-
tivam a defender a multiplicação dessa forma consciente em programas afins
que estão sendo concebidos nos diversos estados e ecossistemas brasileiros.
Observa-se que hoje existe suficiente conhecimento. Temos que
alcançar sabedoria para atuar de modo sustentável com a natureza. O meio
ambiente e as águas sinalizam os possíveis efeitos de nossa negligência e as
consequências para o futuro.
O Capítulo sobre “Comunicação na Educação Ambiental” que trata da
publicização do projeto saúde da água, mostra modos de realizar as práticas
e políticas de forma ampla, no cotidiano e expandir o conhecimento a ser
incorporado e aplicado em benefício a saúde da água e saúde humana.
O processo adotado na Educação Ambiental que disseminou “valores
sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes, consciência, engajamento e
competências nas funções de conservação do meio ambiente, no cuidar dos
bens de uso comum, essenciais à saúde ambiental” me convenceu ter sido
efetivo por ter explanado os conceitos científicos em linguagem de práti-
cas de Comunicação Social, com técnicas de Publicidade e Propaganda,
gerando sintonia com o público da região, ampliando a sensibilidade com os
ecossistemas e cuidados com a saúde dos rios e mananciais.
A estratégia de oferecer robustez ao planejamento de comunicação, da
“Divulgação do Projeto Saúde da Água” com os componentes de: 1) Educação
Ambiental; 2) Política de Resíduos; 3) Restauração Florestal em Propriedades
Rurais; 4) Monitoramento dos Recursos Hídricos; e 5) Levantamento da
Fauna Silvestre, gerou um resultado de qualidade excepcional, desde as iden-
tidades visuais, os elementos gráficos cromáticos, os padrões de energia, que
transmitem harmonia, pureza, tranquilidade, paz e bem-estar na dedicação
para gerar atmosfera lúdica ao conjunto de seus componentes.
Julgo que foi fundamental a decisão do Projeto Saúde da Água ter,
como orientador, o componente “Educação Ambiental”, que levou a existi-
rem os “Clubes de Ecologia”, formando os “Guardiões das Nascentes” – por
estudantes que disseminam práticas de conservação do meio ambiente, essas
ações aliadas às “visitas às nascentes” fortalecendo com os desempenhos
da Peça Teatral “O Macaco Simão e a Saúde da Água”, valendo a pena ver
detalhes que resgataram minha esperança em sonhar na multiplicação dessa
experiência pelo país, por gerar o sentimento de pertencimento, por criar
união entre a criatividade, o conhecimento e a sabedoria “ao longo do fluir
natural do projeto.”
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 21

O elevado mérito do livro foi de expor tais atividades adotando um


modo expressar de singular efeito transformador da Educação Ambiental
do Projeto. O vídeo, relacionado com este componente, nos contempla com
mensagens extraordinárias: “Nós não podemos cuidar de todas as florestas,
mas podemos cuidar de nossas matas. Nós não podemos cuidar de todos
os rios. Mas podemos cuidar de nossas nascentes. Nós sabemos o quanto é
difícil mudar velhos hábitos. Mas nós podemos educar nossas crianças para
que não cometam os mesmos erros”.
Consertar o mundo não está ao nosso alcance, tampouco mudar aque-
les que se mantêm resistentes. No entanto, as crianças e adolescentes, mais
abertos a novos conceitos experiências, nos fazem crer que aquilo que pa-
rece impossível agora, possa ser fato dentro de poucos anos: por isso são
“nascentes”, origem de uma nova consciência, munidas de conhecimentos
científicos, de visão comunitária e de sabedoria.
Honrado e realizado com esse meu modo de olhar a Dimensão Água
do nosso mundo, acredito no Ser essencial viver uma escola, conforme a
apresentada: ‘o espaço de construção de um novo Ser Humano’.
Percebo um Ser Humano consciente, capaz de superar as marcas das
“pegadas ambientais” sobre o globo terrestre. Podemos adotar um modo
‘provocação motivadora’, que incentive e mobilize os participantes a
entrelaçarem a razão e a emoção e com consciência, e com as mãos, em
toques de sensível leveza, com a magia em seus dedos, possam transmutar as
“pegadas” para serem “digitais hídricas” dotadas de “intencionalidades
transformadoras”, pela qual, “cada Ser, cada pessoa, emite um foco energia
com padrões de intenção que gerem atitudes para a saúde dos ecossistemas
para que os outros seres vivam em plenitude”.
Numa ‘Super-Ação’ eficaz, de lucidez pura, coloco a intenção para
“gerar o padrão de proteção, prudência, precaução, preservação, conserva-
ção, melhorias e cuidados com as águas do Planeta Terra, em quantidade,
qualidade, regime, dinâmica e pulsação”.

Professor Demetrios Christofidis1

1 Formação: Doutor em Gestão do Ambiental / Gestão dos Recursos Hídricos pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável,
da Universidade de Brasília – Brasil.
Terapeuta Ambiental: Colégio Internacional dos Terapeutas – Paris.
Pós-Doutorado: Água, Ambiente e Saúde – Gestão das Águas em Sintonia com a Natureza – FIOCRUZ – ENSP / Rio de
Janeiro – Brasil (em curso).
Atuação: Professor da Universidade de Brasília – Departamento de Engenharia Civil e Ambiental.
Especialista – Recursos Hídricos, atuando na Secretaria Nacional de Segurança Hídrica do Ministério de
Desenvolvimento Regional.
CAPÍTULO 1
SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS E A
CONSERVAÇÃO AMBIENTAL
Michele Benetti Leite

A ocupação desordenada do espaço, buscando o máximo de lucro dos


sistemas de produção com o mínimo de custos, demonstra a ausência de
compromisso com a questão ambiental, o que gera a degradação do ambien-
te, a deterioração da paisagem e, consequentemente, da qualidade de vida da
população. Extrair dos ecossistemas e processos naturais mais de o que pode
ser reposto, põe em perigo nosso futuro (WWF, 2014).
A natureza sempre nos ofereceu benefícios com seus recursos naturais e
funções (ou os chamados Serviços Ecossistêmicos) de maneira abundante e
grátis. Porém, com o passar do tempo e com a exploração exagerada este for-
necimento poderia modificar-se, tanto em quantidade, como em qualidade.
Por ser oferecido de forma gratuita e abundante, ou ainda, por desconhecer
o funcionamento dos ciclos naturais, o ser humano nunca chegou a atribuir
o devido valor a esses “dons” da natureza, ainda que sejam vitais para nos-
sa sobrevivência.
Atualmente a natureza é entendida por muitos como um mero espaço
a ser usado, sem exercer nenhuma responsabilidade sobre ele, especialmen-
te quando esta responsabilidade pode implicar limitações ou o pagamento
dos gastos que originam sua conservação. Por exemplo, os moradores das
cidades desejam ter água com qualidade e quantidade em suas torneiras,
porém, em sua grande maioria, não estão preocupados, ou nem sequer se
questionam, de onde vem esta água e quem são os responsáveis por isso, ao
manterem suas nascentes e áreas de preservação permanentes conservadas.
Nesse sentido, muitas pessoas pensam: Por que me preocupar por algo
que eu recebo gratuitamente? Pois a resposta em muitos casos deveria ser
“Porque para nos beneficiarmos de algo gratuitamente implica que outro es-
teja suportando esta ‘carga’ de ter de manter suas áreas naturais conservadas
e provavelmente necessite de ajuda para mantê-las”. Por isso que a conser-
vação da natureza não pode consistir em um jogo puramente econômico
ou técnico. É também necessário um pensamento coletivo, uma atenção ao
outro, empatia e solidariedade.
24

Chuvieco e Martín (2015) foram muito felizes quando afirmaram que


a raiz dos problemas ambientais faz referência à nossa atitude e aos nossos
valores, ou melhor, à nossa falta de valores, não devendo fechar-se a uma
questão puramente técnica, e sim, melhor dito, constitui um dilema moral.
Para Hajek e Martínez de Anguita (2012), desde uma perspectiva eco-
nômica, pode-se afirmar que “a natureza se degrada onde a destruição gera
para seu dono mais benefício econômico que a sua conservação, mesmo
que a sociedade em seu conjunto saia perdendo”. Além do mais, não inter-
nalizamos no preço final dos produtos as externalidades negativas que fo-
ram causadas para sua produção: por exemplo, o quilo da carne de um gado
produzido na Amazônia não leva em consideração as perdas geradas pelo
desmatamento feito para a sua criação.
Para Sérgio Leitão (Câmara dos Deputados, 2009), o que nós temos no
Brasil é uma espécie de “PDA” (Programa de Destruição Ambiental), pois
o fomento à degradação, como a implementação de atividades econômicas
sem considerar seu impacto na natureza, é muito maior do que o apoio à con-
servação e o reconhecimento da importância dos serviços dos ecossistemas
(e seus mantenedores).
Acaba sendo um problema de custo de oportunidade (que é quanto o
dono da terra lucra ou deixa de ganhar de acordo com a opção de uso do solo
feita). A riqueza ecológica nem sempre é riqueza monetária, e a realidade
é que no Brasil as propriedades com mais florestas são mais baratas que as
com menos vegetação, pois como comentam Martínez de Anguita e Flores
Velasquez (2014) vale menos um hectare de floresta no Amazonas do que
nas serras espanholas próximas à Madri. Isso ocorre porque, apesar de sua
enorme riqueza natural e biodiversidade, as grandes extensões de floresta
Amazônica brasileira (apesar de permitem a subsistência de milhões de pes-
soas em comunidades indígenas e ribeirinhas) não geram ingressos financei-
ros como fazem as plantações agrícolas para os grandes mercados (como por
exemplo a soja).
Os “Serviços ecossistêmicos” são o resultado das condições e dos pro-
cessos ecológicos através dos quais os ecossistemas sustentam a vida. Estes
serviços são essenciais para a manutenção da vida humana no planeta, e por
isso é essencial garantir a sua continuidade. Estes serviços que nos são dis-
ponibilizados pela natureza possuem (muito) valor, ainda que não possuam
preço. Se estamos, como cada dia parece mais claro e como alertam sem
cessar os pesquisadores, excedendo a capacidade de suporte dos ecossis-
temas, a era dos serviços abundantes e gratuitos, está chegando ao seu fim
(HEAL, 2000; NETO, 2008).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 25

Até aqui falamos bastante da Amazônia (muito distante do sul do Brasil)


mas pensemos em nossa realidade: a água para abastecimento de nossas ci-
dades precisa de cada vez mais tratamento (o que o torna mais oneroso), com
mais elementos químicos, porque está chegando com uma qualidade cada
vez pior e mais contaminada.
Este complexo cenário, unido à situação de pobreza em que vivem
alguns moradores do meio rural brasileiro, convida-nos a pensar que é
preciso uma mudança de pensamento e que as políticas de conservação da
natureza não tenham que ter somente um caráter punitivo. É sabido que é preciso
limitar certas práticas, porém também existe um consenso sobre a necessida-
de de priorizar as políticas positivas de ajuda econômica que permitam que
os agricultores adotem voluntariamente práticas sustentáveis de produção.
Ainda assim, não existe um marco jurídico nacional de incentivo à ma-
nutenção dos Serviços Ecossistêmicos (apesar de que haver diversos proje-
tos de Lei no Senado sobre o tema) e como consequência nem programas,
metas e instrumentos específicos.
Este capítulo é fruto das pesquisas de minha tese de doutorado e o seu
propósito principal é o de contribuir com informações à crescente demanda
por parte do tema relacionado com os Serviços Ecossistêmicos (ou Serviços
Ambientais) e assim colaborar na construção de uma política nacional, esta-
dual e inclusive municipal, uma vez que poucas pessoas no estado conhecem
sobre este tema, além do Rio Grande do Sul estar bem atrasado com relação
a outros estados do Brasil.

1. Serviços Ecossistêmicos (SE)

Um serviço, em termos gerais, pode-se conceitualizar como uma fun-


ção que nos é útil. Em relação aos ecossistemas, existem diversas funções
(regulação, existência do ciclo natural da água, do clima, da biodiversidade,
entre outros) que são prestados pela natureza e para nós se convertem em
serviços vitais para nossa sobrevivência. De acordo com Daily (1997), um
serviço ecossistêmico é aquele que se refere às condições e aos processos
através dos quais os ecossistemas sustentam a vida. Para Armas et al. (2009)
os serviços dos ecossistemas são como frutos resultantes das funções e/ou
processos ecológicos dos ecossistemas, e geram benefícios econômicos, so-
ciais e ambientais para a sociedade.
A Avaliação Ecossistêmica do Milênio (MEA, 2005) define estes ser-
viços de uma maneira muito simples como “os benefícios que as pessoas
obtêm dos ecossistemas”. Em síntese, poder-se-ia afirmar que os serviços
ecossistêmicos são os processos naturais dos ecossistemas que se convertem
26

em benefícios e em fontes dos recursos naturais, essenciais para a nossa


sobrevivência e para o desenvolvimento do nosso país.
No quadro 1 criamos uma “pirâmide” onde listamos alguns exemplos
de serviços que nos são fornecidos pelos ecossistemas diariamente e que são
oferecidos de forma gratuita, mesmo sem percebermos.
Quadro 1 – Exemplos de serviços ecossistêmicos

EXEMPLOS DE SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS

Recreativo

Uso Medicinal

Espiritualidade

Purificação do ar

Controle da erosão

Ciclagem de nutrientes

Beleza cênica (paisagem)

Conservação da biodiversidade

Manutenção do patrimônio genético

Proteção contra os raios ultravioletas

Regulação de disturbios (inundações, secas)

Produção de oxigênio e sequestro de carbono

Mitigação das mudanças climáticas / Regulação climática

O controle de pestes e enfermidades (Controle Biológico)

Armazenamento e ciclagem de resíduos industriais e humanos

Fonte: Adaptado de Leite (2016).

Os projetos são normalmente classificados em quatro categorias:


carbono, recursos hídricos (ou hidrológicos), paisagem (ou beleza cênica)
e biodiversidade.

2. Um esclarecimento terminológico: serviços ambientais ou


serviços ecossistêmicos?

Inicialmente, o termo Serviços Ambientais é o que ficou mais conhe-


cido mundialmente (especialmente na América Latina). Entretanto, após
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 27

longo período de estudos fora do país e tendo contato com outros autores,
atualmente optamos pela terminologia de “Serviços Ecossistêmicos”: pri-
meiramente para deixar claro que estamos nos referindo às funções que nos
são prestadas pelos ecossistemas, para não confundir com os “serviços am-
bientais” prestados por empresas que trabalham na área ambiental (como
no tratamento de água ou coleta de resíduos). Este termo também foi ra-
tificado na tese desenvolvida por Espinal Gómez (2011) e na pesquisa de
Martínez de Anguita y Flores Velasquez (2011): “Em relação ao nome hoje
se aceita o adjetivo ecossistêmico no lugar de ambiental, para especificar
que os serviços considerados são aqueles que procedem exclusivamente
dos ecossistemas”.
Normalmente, quando tratamos da conservação ambiental focamos em
aspectos apenas técnicos e algumas vezes legais. Porém o tema relacionado
aos serviços ecossistêmicos é complexo e exige o conhecimento de aspectos
de várias áreas, como técnico, econômico, político e social. É o que quere-
mos trazer para esta discussão, ainda que de uma forma pontual e não apro-
fundada, pois não é o objetivo deste capítulo.

3. Princípios Básicos de Cidadania

Esta epígrafe serve para recordar-nos que, ainda que vivamos em co-
munidade, lamentavelmente há alguns princípios básicos de convivência (e
que também estão relacionados à preservação ambiental), que estão sendo
esquecidos ou nem sequer são conhecidos, apesar de sua enorme importân-
cia. O entendimento destes é primordial para uma mudança de postura frente
às questões ambientais e consequentemente para uma posterior implantação
de projetos de conservação ambiental.

3.1 Bem comum

Em um mundo onde o que se vê são grupos, movimentos e partidos que


defendem apenas seus interesses e os de seus coletivos, é primordial recor-
dar o princípio do bem comum e sua importância para melhorar a vida e a
convivência em sociedade. O bem comum, ou seja, aquilo que não pertence
a ninguém porém que é de todos, é um conjunto das condições ou circuns-
tâncias necessárias para que a pessoa humana alcance seu fim último, a dig-
nidade (DI LORENZO, 2010). Este termo também pode ser entendido como
o benefício coletivo de um grupo ou de uma população.
Larraz (1971) transcreveu as palavras de Domingo de Soto que dizia
que “toda lei para que fosse sólida e firme, deveria direcionar os cidadãos
28

ao bem comum”. Também o Papa Francisco, em sua encíclica Laudato Si


(2015), defende que a “ecologia integral é inseparável da noção de bem
comum, princípio este que desempenha um papel central e unificador na
ética social”.
Aplicando ao nosso âmbito ecológico, Chuvieco e Martín (2015) co-
mentam que são poucos os que pensam que a conservação da natureza forma
parte do bem comum. Porém, esta deve estar por cima dos interesses indivi-
duais, porque acaba nos beneficiando a todos.

3.2 Subsidiariedade

A origem da palavra subsidiariedade é o termo latino subsidium, tradu-


zido por assistência, ajuda ou socorro. A subsidiariedade dá liberdade para o
desenvolvimento das capacidades individuais e coletivas.
Aplicado à conservação da natureza, o princípio de subsidiariedade am-
biental afirmaria que nem o Estado nem nenhuma entidade externa deve
substituir a iniciativa e a responsabilidade (dos indivíduos e suas associa-
ções) geradas para alcançar a conservação dos serviços ecossistêmicos a ní-
vel local. Entretanto, se preciso for, estas entidades devem sim apoiar e aju-
dar a coordenar aquelas tarefas que não podem ser realizadas pelos grupos
menores (MARTÍNEZ DE ANGUITA; FLORES VELASQUEZ, 2014). É
uma maneira de não tirar o protagonismo e a responsabilidade daqueles que
estão mais próximos aos fatos, como é o caso dos moradores, dos Comitês
de Gerenciamento de Bacia, dos Conselhos de Defesa do Meio Ambiente,
entre outros.
Assim, os projetos de compensações pela manutenção dos serviços
ecossistêmicos poderiam ser considerados, em determinadas circunstân-
cias, como possíveis exemplos de desenvolvimento subsidiário de pessoas e
comunidades: por estarem mais próximas do local são as mais indicadas para
cuidá-lo, pois são as que mais o conhecem, e podem tirar seu sustento dali,
exercendo um papel protagonista e digno, contribuindo a conservar o global,
merecendo o reconhecimento social.
Em concreto, a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável
(2002) sugeriu estabelecer o princípio de subsidiariedade na Agenda 21
Brasileira, determinando como prioridade para as ações de interesse da so-
ciedade civil.
O Bem Comum e a Subsidiariedade são conceitos que estão profunda-
mente relacionados: a subsidiariedade deve coordenar e ordenar ações e ato-
res, com os demais componentes sociais; e o bem comum marca qual deve
ser o objetivo. A subsidiariedade foca, principalmente, a que cada pessoa e
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 29

grupo, e em um âmbito mais amplo, a que cada estado, contribua ao bem co-
mum mediante o exercício de sua função própria (GUITIÁN, 2014). E ambos
são fundamentais na construção das ações voltadas ao meio ambiente, para
um maior envolvimento da comunidade e buscando resultados mais globais.
Não é nossa intenção colocar preço na natureza ou em seus servi-
ços, entretanto, ao aprofundar no estudo deste tema vimos a importân-
cia de entender alguns dos princípios aqui expostos. Os bem comum e
a subsidiariedade podem marcar a ordem moral e o ordenamento jurídi-
co necessário para que a economia permita que a conservação tenha uma
dimensão superior à monetária, ou seja, que forme parte de nossos valores
humanos mais profundos. Para seguir nosso entendimento mais amplo da
conservação ambiental é preciso agora tratar de alguns dos princípios de
economia ambiental.

3.3 Princípios de Economía Ambiental

Apesar de que inicialmente a palavra economia nos remeta a conceitos


relacionados com a bolsa de valores, poupança, as moedas, juros e as taxas
de câmbios, em sua origem, e conforme a definição de Mankiw (2011), a
economia é o estudo de como a sociedade gerencia seus recursos escassos
(nos quais poderiam ser incluídos os recursos naturais). Por isso esta ciência
não deveria estar alheia à conservação ambiental.
Para Martínez de Anguita e Hajek (2012) na sociedade atual nossa rela-
ção com os ecossistemas costuma estar definida por um marco economicis-
ta, no qual a sua estrutura e produção não são valorizados necessariamente
por seu valor ecológico, e sim por sua utilidade econômica. Por exemplo,
Azqueta (2002), assume que a Economia Ambiental deve partir sempre da
base de que todas as pessoas têm o mesmo direito à aproveitar dos recursos
da biosfera, independentemente do tempo em que vivam nela.

3.3.1 Externalidade

Uma externalidade define-se como um impacto ou consequência aos


demais por uma ação, atividade, decisão individual ou coletiva. Está pre-
sente na produção ou consumo gerando um impacto na utilidade ou lucro de
outro, podendo ser de forma intencional ou não.
A externalidade pode ser negativa ou positiva. Por exemplo, você pos-
sui um sítio no município de Itaara-RS que é cortado por um riacho. Se
o seu vizinho de montante (mais acima) resolver barrar uma parte desse
arroio para construir uma piscina natural para ele e sua família, além de
30

ilegal, isso trará um prejuízo para você na quantidade de água (Externalidade


Negativa). Entretanto, se o vizinho onde está situada a nascente deste riacho
realizar o seu cercamento e recuperação, ou se for instituída uma Unidade de
Conservação como uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN),
você também será beneficiado com o aumento da quantidade e qualidade da
água (Externalidade Positiva), além de outros serviços ecossistêmicos.
Um dos problemas é que os prejuízos com as externalidades negativas
não são computados no valor final dos produtos. Vejamos o caso do qui-
lograma da carne ou da tonelada de soja produzidas em áreas desmatadas
da Amazônia: no seu preço de venda não foi levado em consideração as
perdas que se teve com a derrubada da floresta. Ou o aumento do gasto no
tratamento da água em virtude do assoreamento dos rios e da eutrofização
dos reservatórios.

3.3.2 Custo de Oportunidade

Segundo a ANA (2012) é o custo ou o lucro que um produtor (em nosso


caso quase sempre um agricultor) perde ou ganha ao renunciar a uma prática
(como por exemplo, a agrícola) para em troca destinar uma determinada área
a ser conservada e ocupada com vegetação natural. Normalmente este valor
é calculado tendo como base a lucratividade (por hectare) do tipo de cultura
que era ou será produzido nesta área (como arroz, soja, milho, gado etc.).
Por que é importante entender este termo? Porque quanto maior for a
lucratividade que se tenha com outros tipos de uso do solo (agrícola, pecu-
ária ou imobiliário), mais difícil de convencer ao proprietário a mantê-la
preservada com a vegetação natural. Além de uma questão de sensibilização
e conscientização, a conservação do meio ambiente tem sim muito que ver
com a economia. Inclusive, considera-se que quanto menor é o custo de
oportunidade ou, inclusive quando este é zero, maior é a probabilidade de
êxito de um programa de pagamento por serviços ecossistêmicos.
É a este custo a que muitos proprietários se justificam na hora de optar
pelo uso que farão de suas terras e para não limitar ou reduzir as atuações em
suas propriedades.

3.3.3 Pagamento por Serviços Ecossistêmicos (PSE)

É uma forma de incentivar aos proprietários de terras a manter nelas


áreas naturais (de acordo com o que exige a legislação (ou além), com re-
curso privado, recurso público ou público-privado), de modo que eles sejam
recompensados pela perda de lucratividade, ou em vez disso, pelo custo de
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 31

oportunidade que suporia para manter tais áreas para a produção e a compe-
titividade econômica.
A primeira vez que se aplicou este princípio foi no começo do século,
na cidade de Nova York. Suas autoridades avaliaram que restaurar a bacia
hidrográfica de Catskill, que abastece de água a cidade, era mais barato que
investir em uma planta de pré-tratamento para manter a água pura (TEEB,
2010). Assim, desenharam um pacote de ajudas aos fazendeiros das monta-
nhas. Estas medidas não consistiam somente em pagamentos, mas também
em ajudas, subsídios e obras (como a construção de pontes) que melhoras-
sem as condições de vida e o escoamento dos seus produtos.
Muitas comunidades proveem serviços ecossistêmicos gratuitamente em
áreas indígenas, parques, unidades de conservação (como a RPPN Estadual
MO’Ã), sem que, em a maior parte dos casos, recebam uma justa compensação
pelo custe de oportunidade ao que renunciam (LOUREIRO, 2002).
Nos famosos projetos de Pagamento por Serviços Ecossistêmicos (PSE)
ou Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) há a transferência, monetária
ou não, a partir de um ente pagador, que são dirigidas aos provedores de um
ou mais tipo de serviço ecossistêmico, conforme o esquema simplificado na
figura 1.

Figura 1 – Esquema básico da estrutura de um projeto de


Pagamento por Serviços Ecossistêmicos (PSE)

Pagadores

Provedores Beneficiários

O tripé representado na figura 1 é um esquema simplificado dos três


fatores básicos que formam a estrutura de um esquema de PSE e que são os
primeiros dados que devem ser identificados quando do intuito de imple-
mentar tal programa, e são:
– Provedores: são os “custódios” da natureza, responsáveis pela con-
servação das áreas naturais. Normalmente são os proprietários rurais,
32

ONGs (como a Fundação MO’Ã), comunidades tradicionais (como


tribos indígenas, quilombolas), unidades de conservação, entre outros.
– Beneficiários: são os que usufruem dos serviços (mesmo sem es-
tarem conscientes disso). Pode ser a população de uma cidade que é
abastecida com uma água de qualidade e quantidade (como é o caso de
Santa Maria que é abastecida em parte pelas águas do rio Ibicuí, vindas
de Itaara); os turistas ou praticantes de esportes radicais que visitam
um lugar por sua beleza paisagística (como em Itaara); os moradores
do entorno de uma área florestada (como na Mata Atlântica) que são
influenciados pelos seus efeitos no microclima, entre muitos outros.
– Pagadores: são também beneficiários (direto ou indireto), seja em
suas atividades econômicas ou representando um grupo de benefi-
ciários, que possuem poder aquisitivo para transferir algum tipo
de compensação aos provedores. Muitas vezes é o governo quem
faz o papel de pagador. Pode ser a companhia de abastecimento
de água, que receberá uma água de melhor qualidade e com isso
gastará menos em seu tratamento; uma usina hidrelétrica que terá
o nível de vazão de referência assegurado para a produção de ener-
gia elétrica, além de menos sedimento que chegará ao barramento,
aumento sua vida útil.

Em relação ao Brasil, o pagamento por serviços ecossistêmicos é um


conceito que está em crescimento, apesar de ainda estar a uma escala mais
local, por iniciativa de organizações não governamentais (ONG) e municí-
pios, segundo comenta Banks-Leite (2014). Em nosso entendimento, assim
como o de autores como Richards e VanWey (2015), é preciso dar um passo
a mais, superando os obstáculos burocráticos e legais, para que o governo
brasileiro implemente incentivos, tanto para os proprietários que mantêm
sua cobertura florestal, como alternativa para aqueles que pretendem desma-
tar suas terras por uma questão de sobrevivência.

4. Tipos de incentivos

Ainda que o conceito que ficou mais conhecido supõe que o incentivo
para os provedores seja através de um pagamento em efetivo, sempre gostamos
de destacar que este pode tomar diferentes formas como a Compensação por
Serviços Ecossistêmicos (CSE), os Incentivos por Serviços Ecossistêmicos
(ISE) ou inclusive a Gratificação pelos Serviços Ecossistêmicos (GSE).
Para Bennett e Gosnell (2015), a retribuição pode ser por compensa-
ções, ajudas e incentivos, com alguns nuances que os diferenciam, como
exemplificamos no quadro 2.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 33

Quadro 2 – Exemplos de incentivos que podem substituir o pagamento em


dinheiro propriamente dito (em um sistema de serviços ecossistêmicos)

TIPOS DE INCENTIVOS

Mão de obra Subvenções

Assistência técnica Insumos

Elaboração de projetos Formação

Incentivos fiscais Maquinário

Acesso a mercados diferenciados Isenções fiscais

Fonte: Leite (2016).

Também podem ser considerados como incentivos a infraestrutura, as


obras comunitárias ou simplesmente proporcionar os insumos necessários
para a melhoria da produção, tais como uma sede para a associação ou a
manutenção de uma ponte.
Os custódios podem ser beneficiados com a prestação de serviços es-
pecíficos que muitas vezes são inviáveis para os pequenos produtores, por
exemplo, na elaboração de projetos, no apoio à concessão de licenças, no
desenvolvimento de plano de gestão. Em troca destes incentivos, a comuni-
dade se compromete a conservar seus ecossistemas. Para Kamal et al. (2014)
quando o enfoque tradicional de uma política com ações de “cima para
baixo” combina-se com uma ou mais estratégias voluntárias de “baixo para
cima”, é quando foram alcançados os melhores resultados de conservação.
Também existem incentivos não materiais que conduzem as pessoas a
que modifiquem seu comportamento econômico, como: a melhoria da auto-
estima; o desejo de conservar um ambiente com valor histórico e pessoal;
sentir-se importante e parte de algum projeto maior (especialmente quando
recebem uma placa para ser colocada na frente de sua propriedade) ou dar
um bom exemplo aos demais. Esta lógica é muito diferente da que está em
vigor no nosso país que é baseada apenas na punição (comando e controle).
Tanto as políticas de incentivos como as de penalidades devem ser acom-
panhadas por uma sensibilização moral (através de informação e educação)
para criar consciência (MARTÍNEZ DE ANGUITA, 2012).
Outro aspecto importante no desenho de projetos de PSE é a criação
de uma comissão autônoma, transparente, formada por representantes de to-
dos os grupos envolvidos (provedores, beneficiários, governo, empresas),
com o objetivo de participar da gestão, escutando os interessados e trocando
ideias, além de administrar os recursos e estabelecer um sistema de controle
e monitoramento.
34

A CPDS (2002) comenta que, em linhas gerais, as comunidades tendem


a participar no processo de construção e implementação de cada programa
ou projeto de desenvolvimento sustentável de maneira diferente, dependen-
do do seu nível econômico, social e cultural, também seu grau de instrução
e organização são aspectos que influem bastante.
Também o desenvolvimento regional depende da ativação social da po-
pulação local, ou seja, que a própria região tenha a autonomia para criar um
conjunto de elementos políticos, institucionais e sociais, capazes de impulsar
o crescimento, que pode até ser provocado por forças exógenas, para alcan-
çar um desenvolvimento no sentido mais restrito da palavra (OLIVEIRA;
LIMA, 2003).
Nesse sentido listamos (Quadro 3) alguns instrumentos que podem ser
utilizados para ampliar as ações das políticas ambientais (de maneira geral),
e que podem ser requeridos pela sociedade civil organizada, não precisando
esperar apenas por decisões governamentais.
Para fomentar o interesse pelas atividades que garantem os serviços
fornecidos pela natureza, além das considerações anteriores, pode-se in-
cluir a licitação sustentável. Este tipo de licitação é um procedimento ad-
ministrativo que integra critérios sociais, ambientais e econômicos para a
aquisição de bens, a contratação de serviços e a execução de obras para
o setor público, porém leva em consideração a origem dos produtos. As
propriedades (e seus produtos) participantes de programas de incentivo aos
serviços ecossistêmicos poderiam ter preferência neste tipo de contratação
por parte do governo.

Quadro 3 – Exemplos de instrumentos econômicos, técnicos,


fiscais e legais para as políticas ambientais

Instrumentos Econômicos

Pagamento por Serviços Ecossistêmicos

Juros diferenciados

Imposto sobre Circulação de Mercadorías e Serviços (ICMS Ecológico)

Créditos de carbono

Certificação e selos ambientais

Fundos

Rede de mercados diferenciados para os participantes dos programas

Subsídios governamentais
continua...
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 35
continuação

Instrumentos Técnicos

Inventários florestais

Salvaguardas sociais e ambientais

Informação técnica

Formação/capacitação

Planos de gestão

Monitoramento

Instrumentos Fiscais

Deduções fiscais

Isenções tributárias

Crédito agrícola com taxas de juros mais baixas

Isenções fiscais para as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN)

Linhas de crédito e financiamento específicas

Certificado de origem para os produtos

Instrumentos Legais

Legislação específica

Marco legal

Regulamentação

Arranjo institucional

Fonte: Estado do Amazonas (2010), IDESAM (2012b),


Guedes e Seehusen (2011), WWF (2014b), Soares et al. (2014).

5. Políticas brasileiras
Existem inúmeras políticas governamentais brasileiras (monetária,
agrária, tributária) para fomentar a produção agrícola, como por exemplo, a
taxa de câmbio, o preço internacional das “commodities”1 ou a alta oferta de
crédito agrário, sem que este leve em consideração uma exigência de controle
ambiental, que podem estar dificultando a ampliação dos investimentos e da
priorização pelas atividades mais sustentáveis, de conservação e preservação
do meio ambiente.

1 Commodities são bens negociáveis no mercado de valores, com um baixo nível de diferenciação ou especialização.
36

Sobre o comentado anteriormente, Riva (2007) destaca as enormes


contradições dentro da estrutura governamental brasileira (não somente a atual,
mas já há muito tempo) que, por um lado, estimula a expansão da agricultura,
mineração, através dos ministérios vinculados a estas atividades econômi-
cas, enquanto isso lança algumas estratégias através do Ministério do Meio
Ambiente (MMA), para tentar corrigir a atual situação de degradação, porém
com ações meramente paliativas... O famoso “enxugar o gelo”!

6. O exemplo brasileiro

Entretanto, proteger este “bem comum” não é simples. Por isso, é urgente
a ação pública, privada e da sociedade civil organizada para a alteração deste
cenário que tem, entre outras muitas consequências, a degradação dos ciclos
naturais e da provisão de serviços vitais que a natureza nos brinda.
Atualmente existem numerosos programas, projetos e atividades rela-
cionadas aos serviços ecossistêmicos que se realizam em diferentes etapas e
escalas de maneira desconectada pelo país. Porém, a primeira ideia que nos
vem à cabeça quando falamos em preservação ambiental é a de que não temos
dinheiro para isso. Contudo, a análise realizada pelo grupo da pesquisadora
Banks-Leite (2014) concluiu algo diferente. Esta afirma que para preservar o
bioma Mata Atlântica seriam necessários $198 milhões (de dólares) por ano, o
que equivale a 6,5% dos gastos anuais em subsídios agrícolas ou aproximada-
mente 0,0092% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro (naquele período).
Segundo pesquisa desenvolvida em Leite (2016) listamos 101 fontes de
recursos que encontramos para o financiamento ambiental no Brasil. Além dis-
so, o correspondente aos estados, como o Fundo Estadual de Meio Ambiente e
o Fundo Estadual de Recursos Hídricos, há que se multiplicar pelo número de
estados brasileiros. A pesquisa de Informações Básicas Municipais revelou que,
até o ano de 2012, cerca de 2.070 dos municípios brasileiros possuíam Fundo
Municipal de Meio Ambiente e 2.674 possuíam Conselho Municipal de Meio
Ambiente ativo (IBGE, 2015). Ou seja, o número de possíveis fundos aumen-
taria ainda mais do que os listados anteriormente.
Muitos defendem que a “moeda de troca” da Lei de Proteção da Vegetação
Nativa nº 12.651/2012, também conhecida como o “Novo Código Florestal”
(que teve uma discussão muito polêmica), foi justamente seu Artigo 41 que tra-
ta do pagamento pelos serviços ambientais. Podemos dizer que a lei autorizou
ao poder executivo federal estabelecer um programa de apoio e o fomento da
conservação do meio ambiente, através dos PSA, como retribuição às ativida-
des que geram estes serviços. Porém, passados sete anos, até hoje não há um
decreto que regulamente e especifique como devem funcionar estes programas.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 37

No caso brasileiro, que ainda não possui uma legislação nacional especí-
fica e onde alguns estados estão muitos mais avançados que o governo federal
na definição de seus marcos legais de políticas relacionadas aos serviços dos
ecossistemas, uma política nacional pode fomentar a criação de leis em outros
estados e em outros níveis, como o municipal.
Tudo isso produz efeitos no desenvolvimento de uma região que, em
longo prazo, pode ser explicado como o resultado da interação de copiosas
forças como: a atribuição de recursos, um mecanismo político, uma política
econômica, a sensibilização por uma causa e a ativação social. Para Oliveira
e Lima (2003) estas forças mantêm uma relação de dependência mútua ou de
retroalimentação.
A experiência é que o Estado joga um papel chave em estruturar esque-
mas de Incentivo por Serviços Ecossistêmicos (ISE). Para Hajek (2012) isto se
aplica tanto aos casos que relacionam atores governamentais e privados (por
exemplo, o Fundo Nacional Florestal da Costa Rica – FONAFIFO) ou mesmo
entre atores privados (como o Fundo de Água de Quito, no Equador). A expe-
riência da Costa Rica mostra que a criação de entidades públicas ou público-
-privadas para, pelo menos, algumas das funções dos PSE, permite uma gestão
mais eficiente (ARMAS et al., 2009). Como constatamos em (LEITE, 2016),
além da Costa Rica, países como Peru e Guatemala, que possuem dimensões
menores e com muito menos recurso financeiros que o Brasil, já alcançaram um
esquema legal e financeiro para o fomento da proteção dos serviços ecossistê-
micos, muito antes que nós, com numerosos exemplos de programas e inclusive
de políticas nacionais.
Alguns exemplos de organizações que podem colaborar nestas deci-
sões e que possuem uma formação diversificada são: as Organizações Não
Governamentais (ONGs), fundações, instituições de proteção do meio ambien-
te, os Conselhos Municipais de Defesa do Meio Ambiente (CONDEMA), os
Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas, entre outros.
Como exemplo concreto já existente no país podemos destacar o Projeto
Produtor de Água, desenvolvido pela Agência Nacional de Água (ANA).
Tem como objetivo o estímulo à política de pagamento pelos serviços ecos-
sistêmicos dos recursos hídricos. Para isso apoia, orienta e certifica projetos
que orientem à redução da erosão e da sedimentação de mananciais no meio
rural, através de boas práticas de manejo do solo, propiciando uma melhoria
da qualidade, o aumento da quantidade e a regularização da oferta de água. É
um programa “guarda-chuva” que possui projetos em vários lugares do ter-
ritório brasileiro, sendo o mais conhecido o projeto Conservador das Águas,
no município de Extrema-MG.
38

Este programa conta com o apoio do poder público municipal (com a uti-
lização de recursos próprios do orçamento desde 2006), da Agência Nacional
de Águas (ANA), do Instituto Estadual de Florestas (IEF) de Minas Gerais, do
Comitê de Gerenciamento do PCJ (Bacias Hidrográficas do Rio Piracicaba,
Capivari e Jundiaí), das ONGs The Nature Conservancy (TNC) e SOS Mata
Atlântica, além da Iniciativa Verde e da IUCN (International Union for
Conservation of Nature).
Um dos êxitos do projeto foi o estabelecimento de uma Lei Municipal
(2.100/2005), pioneira no país, regulamentada pelo Decreto nº 1.703/2006, que
determina os requisitos prévios e as metas para que os proprietários recebam
apoio financeiro:

- Ter sua fazenda/sítio inserida na sub-bacia hidrográfica objeto


do projeto;
- Propriedade de área de igual ou mais de dois hectares;
- Desenvolver a agricultura como finalidade econômica (na fazenda);
- Ter o uso da água regularizado;
- Adotar práticas de conservação do uso do solo;
- Implementar um sistema de saneamento ambiental rural;
- Implementar e manter as Áreas de Preservação Permanente e a
Reserva Legal (PEREIRA et al., 2010).

O Decreto também determinou que o Conselho Municipal de


Desenvolvimento Ambiental (CODEMA) fosse responsável por analisar e
deliberar sobre os projetos técnicos a serem implantados nas propriedades
(PEREIRA et al., 2016).
Até o momento o único caso no estado do Rio Grande do Sul é o Protetor
das Águas. Em 2010 a Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) e a empresa
Universal Leaf Tabacos (ULT) acordaram a realização de um projeto piloto de
Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) no Arroio Andréas, no município
de Vera Cruz-RS, que foi lançado em 2011, com um planejamento inicial de
cinco anos.
Para execução do projeto foram estabelecidas parcerias com a Prefeitura
de Vera Cruz, o Comitê de Gerencimento da Bacia Hidrográfica do Rio Pardo,
a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra) e o Sindicato da Indústria de
Tabaco (Sinditabaco).
O diagnóstico inicial contou com visitadas às propriedades, com a apre-
sentação dos objetivos do projeto e da possibilidade de adesão voluntária, onde
receberiam os serviços e materiais necessários para a recuperação das nascentes
de da mata ciliar.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 39

Em 2015 o projeto passou a ser classificado como política pública de


Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) pela prefeitura de Vera Cruz e pela
Agência Nacional de Águas (ANA). A Prefeitura criou uma lei isentando da
tarifa de água os produtores integrados ao projeto. Essa ação ajuda a garantir a
perpetuidade da conservação das áreas mesmo se o projeto viesse a terminar.

7. A construção de uma política de SE para o Brasil

O planejamento de uma futura política nacional sobre serviços ecos-


sistêmicos afronta o grande desafio de criar um mecanismo flexível, efi-
ciente e não vulnerável à corrupção, alinhando diversos setores do governo.
Neste sentido, pensamos que o gasto corrente no combate ao desmatamento
e a degradação, à manutenção e melhoria das reservas florestais do Brasil
poderiam ser dedicados, em parte, a programas relacionados aos serviços
dos ecossistemas.
Dado que o Estado é responsável pela tutela dos recursos naturais, o
estabelecimento de uma política regulamentada por lei parece ser a única
garantia de que as promessas de um governo sejam cumpridas por outra ad-
ministração (especialmente se são de partidos distintos).
Para a construção de uma política bem representativa é fundamental o
envolvimento dos diversos setores da sociedade organizada, como as empre-
sas, prefeituras, os governos (municipal, estadual e federal) e organizações
não governamentais. É preciso também um esquema de entidades envol-
vidas e a definição de suas responsabilidades. Depois de analisar diversos
esquemas, de vários autores nacionais e internacionais, é possível verificar a
sua complexidade e às vezes, sua difícil compreensão.
É imprescindível o estabelecimento de uma política nacional de PSE no
Brasil, focada em todos os biomas do país (e não apenas a Amazônia, como
é o foco atual). A lei deve desenvolver-se de una forma ampla, pois se espe-
cificar muito dificulta. Ao mesmo tempo, não deve dar oportunidade para ser
usada de forma indevida. Esta política nacional deve ter certa flexibilidade
para moldar-se às diferenças regionais tão distintas do país, porém não deve
ser confundida com a ausência de método.
Sua construção deve levar em consideração aspectos econômicos, le-
gais, financeiros, ecológicos, sociais, de desenho e um esquema de entidades.

Conclusões

Inicialmente há que buscar-se uma abertura de mentalidade e consci-


ência, com educação ambiental para a população em geral para que pos-
sa se perguntar: quem são os responsáveis pela manutenção dos serviços
40

ecossistêmicos que recebo diariamente? Também dos proprietários rurais,


para que percebam a importância da manutenção das áreas naturais de suas
propriedades, tanto para si como para os que vivem em seu entorno. A
sobrevivência da humanidade e a sua continuidade no planeta Terra depen-
dem da preservação e da conservação dos recursos que nos são fornecidos
pela natureza.
Os sistemas de PSE, além de proporcionar um incentivo endógeno
contínuo, devem articular-se como uma oportunidade para melhorar a qua-
lidade de vida dos habitantes de um território, de um modo permanen-
te, além do horizonte temporal do simples pagamento, pois este um dia
pode terminar.
Assim, uma lei (mas não simplesmente mais uma das tantas que te-
mos), mas específica e com a finalidade de estabelecer uma política e a
instituição de um fundo de compensações, é parte da estratégia pensada
para viabilizar a continuidade dos projetos. Que com o tempo os próprios
envolvidos tenham a autonomia para seguir com os esquemas de uma for-
ma subsidiaria e sustentável. Quiçá fazer uma política que seja simples
e que possa ser estabelecida junto aos Planos de Bacia Hidrográfica, por
exemplo. Há de se vencer a grande burocracia existente no Brasil e a difi-
culdade que normalmente existe para um acordo institucional, para que as
políticas nacionais cheguem até o local.
O Brasil possui um grande potencial para o fornecimento de serviços
ecossistêmicos (provavelmente o maior do mundo), proporcional ao seu
tamanho continental, entretanto ainda nos falta um longo caminho na cons-
trução de um entendimento sobre este assunto.
Os esquemas de serviços ecossistêmicos podem ser um aliado para
estreitar o vínculo de pertencimento entre os proprietários rurais com sua
terra, evitando o seu êxodo, além de levar em consideração também as
pessoas e sua dimensão comunitária e familiar.
Podemos ver, como sugere Armas (2012), que os incentivos para a
conservação sob a forma de PSE, podem ser uma grande contribuição para
distribuir melhor o peso econômico da conservação sobre os diferentes
atores envolvidos, ao mesmo tempo em que facilitam o trabalho da co-
munidade em seu território, ou sendo uma forma de como os pais podem
trabalhar com seus filhos pensando no futuro.
Um sistema de incentivos para a conservação pode, e deve, ser algo
a mais do que puramente uma dinâmica economicista baseada exclusiva-
mente nas leis de mercado: deve ser uma ferramenta de coesão e de soli-
dariedade, e por consequência também será de desenvolvimento. Isso não
quer dizer, em absoluto, que o PSE seja uma solução mágica para a crise
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 41

ambiental, apenas que é uma alternativa a mais na busca de manter os


ecossistemas, integrando as pessoas em pró de sua conservação de uma
forma sustentável.
Por isso, carece o empenho de todo o país na construção desta política,
pois se ela for concebida adequadamente, teremos mais uma ferramenta
para conciliar a conservação com a utilização dos recursos naturais, desde
uma forma sustentável, e sempre buscando o nosso bem comum e das fu-
turas gerações. Guiar nossas ações buscando o bem comum é um excelente
caminho a seguir para chegar a uma sociedade mais justa e com melhor
qualidade de vida.
Temos um duro e longo trabalho pela frente, porém maior é o desejo
de fazer bem as coisas e que elas frutifiquem...
42

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CAPÍTULO 2
A GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NO
CONTEXTO DO MUNICÍPIO DE ITAARA

Eliane Maria Foleto

O ciclo da água caracteriza-se por ser dinâmico com fluxo permanente


de matéria e energia ligado ao das rochas e da vida, onde desencadeiam-
-se processos de trocas diversificadas que compõe as diferentes paisagens,
muitas com características raras, de excepcional valor: científico, cultural,
cênico e ambiental, elevando-a à categoria de patrimônio natural, sendo que
os elementos abióticos compõe o geopatrimônio: geológico, geomorfológico
e hídrico; e os elementos bióticos, compõe a biodiversidade: da flora e fauna,
beneficiando a sociedade com os serviços ecossistêmicos.
Dentre os elementos da paisagem a água, abundante no Brasil, nem
sempre está disponível onde existe as maiores demandas, no estado do Rio
Grande do Sul, a rede de drenagem apresenta-se bem distribuída, no entanto,
o uso inadequado reduz sua quantidade e deteriora a qualidade, tornando-a
um recurso escasso para determinados usos. Diante disso, o gerenciamento
da água se torna imprescindível, para o uso racional e proteção qualiquanti-
tativa, para as atuais e futuras gerações.
Para efeito de gerenciamento o estado foi dividido em três regiões hi-
drográficas: do Uruguai, do Guaíba e do Litoral, dentre estas a do Guaíba é
a única de domínio totalmente estadual, onde o gerenciamento se restringe
ao estado do Rio Grande do Sul. A Região Hidrográfica do Guaíba drena os
principais rios do estado, densamente povoada e com características bem
distintas, por isso, dividida em nove sub-bacias hidrográficas, dentre elas a
do Vacacaí e Vacacaí-Mirim que drenam a região central do RS.
A abundante disponibilidade de água, exerce importante papel na estru-
tura, dinâmica e função da paisagem no município de Itaara, localizado na
região central do RS, onde a disponibilidade hídrica: possibilita o turismo,
com lagos para recreação e lazer; abastece o perímetro urbano dos municí-
pios de Santa Maria e de Itaara. Pela densidade de drenagem, quantidade
e qualidade dos Recursos Hídricos disponível, o município, é reconhecido
regionalmente como a “Cidade dos Balneários”.
48

A paisagem na região central do Rio Grande do Sul, compõe-se de uma


geobiodiversidade de beleza cênica ímpar, com o Rebordo do Planalto co-
berto de Mata Atlântica, da Reserva da Biosfera. Entretanto, a demanda pelo
uso e ocupação da terra, seja no espaço urbano ou rural, gera desmatamento,
alteração da topografia, modificando o ciclo das águas, principalmente a in-
filtração e o escoamento superficial, alterando a vazão e qualidade nos rios e
lagos. Os barramentos, transposições e captações para a irrigação, alteram o
fluxo a montante e a jusante destes locais de intervenção, consequentemente
da dinâmica fluvial dos rios, nascentes e lagos, comprometendo o aspecto
qualitativo e quantitativo dos recursos hídricos das sub-bacias hidrográficas.
Na perspectiva da melhoria qualiquantitativa, as ações de gestão dos re-
cursos hídricos devem intervir no sentido de aumentar o suprimento, através
de medidas estruturais e não estruturais, e reduzir a demanda do consumo da
água, na Bacia Hidrográfica, unidade recomendada pela Política Nacional e
Estadual de Recursos Hídricos, onde o gerenciamento dos Recursos Hídricos
estão sob a responsabilidade do Comitê de Bacia Hidrográfica. Para Lanna
(1997), a bacia hidrográfica, através da rede de drenagem fluvial, integra
grande parte das relações causa-efeito que devem ser tratadas na gestão dos
recursos hídricos. Para o autor, embora existam outras unidades político-
administrativas a serem consideradas, como os municípios, estados, regiões,
países, estas unidades não apresentam necessariamente o caráter integra-
dor da bacia hidrográfica, o que tornaria a gestão parcial e ineficiente caso
fossem adotadas.
Para Cristofoletti (1980), a bacia hidrográfica caracteriza-se por ser “a
área drenada por um determinado rio ou por um sistema fluvial, funcionando
como um sistema aberto”, em que cada um dos elementos, matérias e ener-
gias presentes no sistema apresentam função própria e estão estruturados
e intrinsecamente relacionados entre si. Desta forma, um rio é um sistema
aberto, com fluxo contínuo da nascente à foz, definindo a dinâmica fluvial
ao longo de milhares de anos, onde as alterações antrópicas, nas margens,
no perfil longitudinal ou na secção do leito desencadeiam reflexos sobre os
demais canais da rede hidrográfica.

1. A Política Nacional e Estadual de Recursos Hídricos

A preocupação com a gestão dos recursos hídricos permeia as agendas


políticas, tanto nacional como internacional. No Brasil com a Constituição
Federal de 1988, as águas passaram para o domínio público, dos Estados e da
União, acabando com o regime de águas particulares ou comuns, que eram
previstas no Código Civil e no Código de Águas de 1934.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 49

A Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH, da Lei 9.433 de


1997 define:

[...] a água é um bem de domínio público compartilhado entre a União


e os estados; é um recurso natural limitado, dotado de valor econômi-
co; em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos
é o consumo humano e a dessedentação de animais; a gestão dos re-
cursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;
a bacia hidrográfica é a unidade territorial; a gestão dos recursos hí-
dricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder
Público, dos usuários e das comunidades.

No Rio Grande do Sul, a Política Estadual de Recursos Hídricos –


PERH, regulamentada pela Lei 10.350 de 1994, portanto anterior a federal,
endossa o revisto pela PNRH ressaltando a importância do gerenciamento
para uso múltiplos, e definindo que o gerenciamento dos recursos hídricos é
de responsabilidade do poder público Estadual, através do Sistema Estadual
de Recursos Hídricos – SERH, onde os Comitês de Bacia são instâncias de
participação direta da comunidade nas decisões relativas aos recursos hídri-
cos. A descentralização da gestão, através dos Comitês, consolida o processo
de democratização das decisões, considerando a geografia de um país com
dimensões continentais e com diversidade de uso e ocupação, os Comitês de
Bacia com representantes dos órgãos públicos, da sociedade civil e de usu-
ários da água, desempenham um papel fundamental na descentralização das
decisões, e os municípios participando de sua composição, articulam, desta
forma, a gestão de seus territórios com a bacia hidrográfica.
Importante destacar, que segundo a PNRH, compete aos comitês, no
âmbito da Bacia hidrográfica:

[…] promover debates das questões relacionadas a recursos hídricos


e articular a atuação de entidades; – arbitrar, em primeira instância
administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos da ba-
cia; – aprovar o plano de recursos hídricos, proposto pela respectiva
Agência da bacia; – acompanhar a execução do plano de recursos hí-
dricos e sugerir as providências necessárias ao cumprimento das me-
tas; – propor ao conselho nacional e aos estaduais de recursos hídricos
as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca ex-
pressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direi-
tos de uso de recursos hídricos; – estabelecer mecanismos de cobrança
pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados,
e as isenções; – estabelecer critérios e promover o rateio de custo das
obras de uso múltiplo, de interesse comum ou coletivo.
50

A composição dos Comitês de Gerenciamento deve respeitar a parida-


de de representantes dos diferentes segmentos da sociedade: 40% de usuá-
rios da água; 40% da população da bacia; 20% de representantes de órgãos
da administração federal, estadual e municipal, com a função e estabele-
cer o ritmo das intervenções necessárias à implantação dos instrumentos de
gerenciamento.
Baseado nestes princípios de gestão, a descentralização das ações do
Estado será por regiões e bacias hidrográficas, e o estado do RS subdivide-
-se em três regiões hidrográficas (RH): do Guaíba, do Uruguai e das Bacias
Litorâneas. A região hidrográfica carateriza-se por abranger uma área mais
ampla, com algumas bacias hidrográficas contíguas. O território do Estado
esta dividido em 25 bacias hidrográficas, todas com Comitês de bacia insti-
tuídos. Cabe destacar, as duas maiores Regiões Hidrográficas do Rio Grande
do Sul, a do Guaíba e do Uruguai, são formadas por sub-bacias hidrográficas
dos Rio Vacacaí-Mirim e Ibicuí-Mirim, que possuem várias de suas nascen-
tes, na região central do estado, nos municípios de Itaara e Santa Maria.
A responsabilidade do Poder Público e da sociedade civil para con-
servar os recursos hídricos foi definida pela Lei nº 11.520/00 do Código
Estadual de Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul, quando prevê
que o Estado, os municípios, a coletividade e os cidadãos têm o dever de
defender meio ambiente a fim de preservá-lo e conservá-lo para as gerações
presentes e futuras.
Desta forma, delega responsabilidade à sociedade, através de espaços
formais de decisão local, como os Conselhos Municipais de Meio Ambiente
– CONDEMA e dos Comitês de Bacia. A divisão do Estado em Regiões
Hidrográficas, por Bacias Hidrográficas, tem nos comitês a responsabilidade
de um gerenciamento voltado às necessidades da população local, que se-
gundo a ANA (2007, p. 17)
O desafio está na adequação da gestão dos recursos hídricos às diver-
sidades físicas, bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais
das diferentes regiões, a integração da gestão de recursos hídricos à
gestão ambiental, a articulação do planejamento dos recursos hídricos
com o dos setores usuários e com os planejamentos regional, estadual
e nacional, a articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso
do solo e a integração da gestão das bacias hidrográficas.

Com a PERH a Bacia Hidrográfica passa a ser o recorte espacial regula-


mentado para a gestão dos recursos hídricos, constituindo-se em um territó-
rio, de delimitação física, para articulação e construção de parcerias que po-
derão intervir na gestão territorial e ambiental das quais os recursos hídricos
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 51

fazem parte. Constituindo um recorte espacial distinto e que se sobrepõem à


malha político-administrativa consolidada no País, de municípios e Estados,
criando, assim, uma estrutura mais complexa e que coloca ainda mais desa-
fios à capacidade de articulação dos diferentes órgãos em diversas escalas.

2. A Região Central do Rio Grande do Sul e os Territórios


de Conservação

Na Região Central do Rio Grande do Sul, o alto curso dos Rios Vacacaí-
Mirim e Ibicuí-Mirim, no município de Itaara e Santa Maria estão inseridos
na área da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, reconhecida pelo poder
público estadual através do Projeto “RS Biodiversidade”, como área prio-
ritária, número um, no Estado, para instituir unidades de conservação. Três
Unidades de Conservação Estadual sob responsabilidade da Secretaria do
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável/Departamento de Biodiversidade/
Divisão de Unidades de Conservação: Reserva Biológica do Ibicuí-Mirim,
Reserva Particular do Patrimônio Natural MO’Ã, Parque da Quarta Colônia
e o Parque Municipal Natural dos Morros, estão localizadas na Reserva da
Biosfera, e para “conectar” as Unidades foi instituído o “Corredor Ecológico
da Quarta Colônia”.
O Corredor Ecológico da Quarta Colônia, delimitado no território dos
municípios da Quarta Colônia de Colonização Italiana, Itaara e Santa Maria
constitui-se em uma paisagem diferenciada pela beleza cênica, composta por
uma geodiversidade, ímpar, se considerar a faixa de transição geomorfológi-
ca, do contato das rochas vulcânicas do Planalto com as rochas sedimenta-
res, especialmente, as da bacia do Paraná, que ocorre, de modo geral, através
de um relevo escarpado (ROBAINA; CRISTO; TRENTIN, 2011, p. 21).
Este relevo escarpado é conhecido como Rebordo do Planalto Meridional,
compondo a área de contato/transição entre as “terras altas” do Planalto gaú-
cho e as “terras baixas” da Depressão Central. A geodiversidade, associadas
ao clima, favorecem a Floresta Estacional Subtropical Decidual, que devido
à variação térmica por um período do ano (baixas temperaturas), apresenta
mais de 50% de perda foliar do estrato superior da floresta, isto, devido a
uma “seca fisiológica” (KILCA; LONGHI, 2011).
A disposição da rede de drenagem, influenciada pela geomorfologia,
com afloramento de água subterrânea, forma rios em vales encaixados, com
rupturas de declive escoando em cachoeiras, cascatas e acumulando em
lagos naturais, estruturando a paisagem na “cidade dos balneários” valori-
zando as atividades turísticas. Além dos lagos naturais, outros reservatórios
foram construídos para compor a paisagem dos balneários nos condomínios
fechados. O lago da sede campestre da SOCEPE (Sociedade Concórdia
52

Caça e Pesca) é o maior reservatório artificial do município, sendo usado


para lazer, e para o abastecimento público pela Companhia Riograndense de
Saneamento (CORSAN).
São as linhas de relevo, que oferecem resistência à erosão hídrica, que
vão condicionar o sistema hídrico, as vertentes, a profundidade do talvegue,
o tipo de canal, ou seja, o padrão da rede de drenagem, vinculada as ver-
tentes, dos divisores aos canais coletores das águas. Müller Filho (1970) a
respeito da hidrografia da região destacou que:
Desde o pós-cretáceo toda a região está sujeita à evolução de uma
rede de drenagem organizada e exorreica. Os altos-cursos dos prin-
cipais rios do Estado, tendo maior desnível por estarem no Planalto
e no Escudo, têm aumentado seu poder de desgaste e de transporte,
que diminui na grande zona de ruptura de declive que é a Depressão
Periférica. Assim, o intemperismo químico é o prefácio da erosão flu-
vial que, aos poucos, vai modelando a superfície das terras mais ele-
vadas, e lentamente faz regredirem seus rebordos. O encaixamento
dos rios e a erosão regressiva vem fazendo com que, de maneira muito
lenta, mas efetiva, a orla Planaltina tende a recuar. A partir desse nú-
cleo ainda extenso, os agentes do modelado dissecam o Planalto, es-
culpindo-o em regiões de topografia ondulada onde os cursos d’água
determinam a formação de vales, cuja amplitude depende do esquema
morfoestrutural do local e da capacidade de desgaste dos próprios rios
(MULLER FILHO, 1970).

A condição geológica e geomorfológica define o perfil longitudinal dos


rios, com rupturas e dinâmica hídrica típica de fluxo turbulento, com picos
de vazão muito rápido, quando das precipitações intensas, definindo uma
capacidade e competência de transporte muito grande, reforçando a necessi-
dade de conservação da área de captação: quanto maior a impermeabilização
da área de captação maior vai ser o fluxo de água superficial a ser canalizado
no rio, com vales encaixados, amplitudes altimetrias acentuadas a veloci-
dade do fluxo causa problemas de enchente e inundação em segmentos dos
rios, quando de episódios de precipitação intensa.
Nesta paisagem, a geobiodiveridade atribuem aos Recursos Hídricos,
a condição de Patrimônio Hídrico, a ser contemplado no Plano de Bacia,
sendo que os Planos Diretores dos municípios de Santa Maria e Itaara fazem
referência a uma política de manejo sustentável da área de influência da
Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA) e das nascentes das bacias
hidrográficas dos Rios Ibicuí (que deságua no rio Uruguai) e Vacacaí-Mirim
(que deságua no Guaíba), mas ainda há muito a ser feito, já que os recursos
hídricos encontram-se em processo de degradação.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 53

3. Os Comitês das Bacias dos Rios Vacacaí e Vacacaí-Mirim e do


Rio Ibicuí-Mirim

O município de Itaara, de acordo com Instituto IBGE (2010), possui


uma área de aproximadamente 172 km², sendo limitado pelos municípios de
Júlio de Castilhos a nordeste, Santa Maria ao sul e São Martinho da Serra a
noroeste. A cobertura da terra no município, em aproximadamente 30% do
território é florestal, concentrada em vertentes íngremes dos vales encaixa-
dos, e 70% ocupados, predominantemente, por pequenas propriedades de até
20 ha (RODRIGUES, 2005).
A população total do município, segundo IBGE (2010), é de 5.010 ha-
bitantes, sendo que, a população urbana é de 4.151 habitantes e a população
rural é de 1.314 habitantes, equivalente a 75,95% e 24,05%, respectivamen-
te. O perímetro urbano foi sendo ocupado ao longo da BR 158, disperso em
várias aglomerações, o que dificulta a implantação de uma rede de distribui-
ção de água e coleta de esgoto em sua totalidade.
O abastecimento público do município está sob a responsabilidade da
Companhia Rio Grandense de Saneamento (CORSAN) que capta água do
lago artificial da sede campestre da SOCEPE (Sociedade Concórdia Caça e
Pesca), maior reservatório artificial do município, no Arroio Manoel Alves
afluente do Arroio Grande, integrante da bacia do Rio Vacacaí-Mirim, da
região hidrográfica do Guaíba.
A ocupação e o uso inadequado da terra são apontados por Oliveira
(2012) como uma das causas da degradação da qualidade da água nas sub-ba-
cias do município, os resultados, de acordo com os parâmetros definidos pela
Resolução nº 357/05 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA),
são compatíveis com Classe II, demonstrando o comprometimento da qua-
lidade de água de vários córregos situados a jusante de ocupações urbanas.
Verifica-se que os valores de Oxigênio Dissolvido ficaram acima do preco-
nizado pela legislação, entre (8,8mg/L e 8,3mg/L), essa condição indica con-
taminação proveniente de ocupações antrópicas, tais como esgoto sanitário,
que contém bactérias do grupo coliforme (Escherichia coli), proveniente das
fezes humanas e de animais.
No território do município Itaara a BR 158, em quase todo segmen-
to, divide o fluxo do escamento superficial para bacias do rio Ibicuí-Mirim
e para o rio Vacacaí-Mirim, onde o gerenciamento dos recursos hídricos
está sob a responsabilidade de dois comitês de Bacias dos Rios Vacacaí e
Vacacaí-Mirim e o do Ibicui, mediante a implantação dos instrumentos: de
Planejamento, Plano de Bacia Hidrográfica e Enquadramento das águas;
54

e de Controle: outorga e cobrança. O sucesso na implantação dos instru-


mentos dependerá da articulação do Comitê junto ao Sistema Estadual de
Recursos Hídricos (SERH) e aos municípios, já que os planos municipais
deverão atender ao que for preconizado pelo Enquadramento dos recursos
hídricos.O contexto do gerenciamento dos recursos hídricos nas sub-bacias
hidrográficas no município de Itaara, analisado através da implantação
dos instrumentos, com base nos documentos disponibilizados pelo site da
SEMA – Secretaria do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Divisão
de Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos – DIPLA, do Diagnóstico
do Plano das Bacias Hidrográficas do Ibicuí, e de informações do Comitê das
bacias do Rios Vacacaí e Vacacaí-Mirim com Plano Manejo em elaboração,
demonstra a necessidade de ampla discussão junto à comunidade dos muni-
cípios de Itaara e Santa Maria para que possa avançar no gerenciamento com
a implantação dos instrumentos previsto na Política de Recursos Hídricos.
De acordo com a SEMA (2017), as bacias receberam um código de
identificação que remete a Região Hidrográfica, por exemplo, G 060 remate:
A Bacia Hidrográfica do Vacacaí e Vacacaí-Mirim está localizada na
porção centro-ocidental do Estado, entre as coordenadas geográficas
29°35’ a 30°45’ de latitude Sul e 53°04’ a 54°34’ de longitude Oeste.
Abrange as Províncias Geomorfológicas Depressão Central e Escudo
Sul Rio-Grandense. Possui área de 11.077,34 km². A população total
é de 407.533 habitantes, abrangendo municípios como Caçapava do
Sul, Júlio de Castilhos, Santa Maria e São Gabriel. Os principais cur-
sos de água são os arroios Igá, Acangupa e Arenal e os rios Vacacaí,
dos Corvos, São Sepé e Vacacaí-Mirim. Os principais usos de água
se destinam a irrigação, dessedentação de animais e abastecimen-
to público.

Ainda, de acordo com a divisão de bacias a do Ibicuí U050, refere-se a


Região Hidrográfica do Uruguai, na descrição geral apresenta:
A Bacia Hidrográfica do Ibicuí localiza-se a oeste do Estado do Rio
Grande do Sul, entre as coordenadas geográficas 28°53’ a 30°51’ de
latitude Sul e 53°39’ a 57°36’ de longitude Oeste. Abrange as pro-
víncias geomorfológicas Planalto Meridional e Depressão Central.
Possui área de 35.495,38 km² e população estimada em 394.030 ha-
bitantes, abrangendo municípios como Alegrete, Júlio de Castilhos,
Santana do Livramento, São Pedro do Sul e Uruguaiana. Os principais
corpos de água são os rios Ibicuí, Itu, Ibirapuitã, Jaguari e um trecho
do rio Uruguai. Dentro do território brasileiro, o principal afluente
do rio Uruguai é o Ibicuí. Sua formação dá-se na junção do Ibicuí-
Mirim com o rio Santa Maria e a desembocadura é no rio Uruguai. O
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 55

principal uso da água nesta bacia se destina a irrigação. Este uso pode
ocasionar insuficiência hídrica nos meses de verão, principalmente de-
vido à irrigação do arroz.

Pela caracterização geral que consta no site da SEMA, a área de


abrangência das duas bacias hidrográficas corresponde aproximadamente a
46.572,00 km², com população de 801.563 habitantes, com uma densida-
de populacional muito maior nas bacias dos Rios Vacacaí-Vacacaí Mirim.
A subdivisão das bacias em unidades de planejamento e gestão facilita as
ações, considerando a extensão territorial, mesmo assim, existem dificulda-
des para viabilizar a participação efetiva dos conselheiros nas reuniões dos
comitês, o distanciamento dificulta o conhecimento da realidade das diferen-
tes unidades, o que acaba por dificultar a tomada de decisão, desestimulando
a participação, gerando o esvaziamento das plenárias. O comitê das Bacias
dos Rios Vacacaí e Vacacaí-Mirim é responsável pelo gerenciamento das
duas bacias hidrográficas, estas ainda não possuam unidades de planejamen-
to e gestão definidas.
No caso da Bacia do Ibicuí a segmentação em unidades de Planejamento
e Gestão (UPG’s) ficou assim constituída:
“Ibirapuitã, Médio Ibicuí, Jaguari e Baixo Ibicuí. Já em relação à quan-
tidade de municípios, as UPG’s Ibicuí-Mirim, Toropí, Jaguari e Médio
Ibicuí se destacam das demais. O Rio Santa Maria, embora sendo o
principal formador do Rio Ibicuí, constitui unidade de planejamento
independente (na divisão hidrográfica do Estado) e é apresentado ape-
nas referencialmente no diagnóstico”. “O Rio Ibicuí-Mirim com área
de 2.286,24 Km², com 6,50% de participação na Bacia, englobando 7
municípios: Cacequi, S. Vicente do Sul, Dilermando Aguiar, S. Pedro
do Sul, S. Maria, Itaara, S. Martinho da Serra S. Vicente do Sul, S.
Maria, S. Pedro do Sul”.

Os comitês com a responsabilidade de gerenciar os recursos hídricos


dependem dos diagnósticos com a disponibilidade, demanda e qualidade,
para tomar ciência do desafio a ser enfrentado, para através dos instrumen-
tos de Planejamento e controle elaborar metas a serem atingidas através de
seus Plano de Ação. Dentre os instrumentos de gerenciamento previstos pela
PERH destaca-se: os planos, enquadramento, outorga e cobrança, sendo que
os planos devem prever, que seus programas e projetos, para a proteção,
conservação e uso racional das águas, estejam articulados as políticas de
conservação ambiental.
Para que o enquadramento se caracterize como instrumento participa-
tivo, demanda de efetiva participação de todos os segmentos da sociedade,
56

que definem o que querem para o rio, para a Política Nacional de Recursos
Hídricos (PNRH) o enquadramento visa “assegurar às águas com qualidade
compatível com os usos mais exigentes a que forem destinadas” e a “dimi-
nuir os custos de combate à poluição das águas, mediante ações preventivas
permanentes”. Este deve ser definido considerando as classes estabelecidas
pela Resolução 357/05 do CONAMA, que estabelece parâmetros para a qua-
lidade as águas doces, salobras e salinas para o território nacional.
O enquadramento representa um mecanismo de controle do uso e de
ocupação da terra, já que restringe a implantação de empreendimentos cujos
usos possam ser incompatíveis com a qualidade e quantidade de água dispo-
nível ou comprometa a qualidade do manancial enquadrado.
Como a água é um bem público, o seu uso pressupõe a outorga, que é
a autorização do poder público, para o controle da quantidade retirada dos
mananciais (seja superficial ou subterrâneo), com objetivo da distribuição
equitativa entre os usuários, e para reservar a vazão ecológica ao meio am-
biente (uma fração adequada para que se mantenha a vida dos ecossistemas
aquáticos). O Estado disponibiliza uma ferramenta on-line “SIOUT” no site
da SEMA para cadastrar usuários de água, para então, analisar a possibili-
dade de conceder outorga, de maneira segura, garantindo a vazão ecológica.
A cobrança pelo uso da água deve ser atribuída tanto para a captação de
águas superficiais, quanto subterrâneas, e se propõe a minimizar os desper-
dícios, buscando o seu uso racional, preservando e mantendo a qualidade.
De acordo com a PNRH, a cobrança pelo uso da água tem como objetivos
principais: “reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma
indicação de seu valor real; incentivar a racionalização do uso da água; ob-
ter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções
contemplados nos planos de recursos hídricos” (BRASIL, 1997, art. 19).
A cobrança pelo uso da água é um importante instrumento para o processo
de gerenciamento das águas, e demonstra a maturidade na implantação do
Sistema. Os recursos arrecadados, pela cobrança, devem subsidiar financei-
ramente o Plano de ações previsto nos planos de Bacia Hidrográfica (BH),
sendo que os valores só poderão ser aplicados na BH onde foram cobrados.
O site SEMA, seção Recursos Hídricos, disponibiliza informação do con-
texto dos instrumentos de gerenciamento, das bacias hidrográficas do estado,
da Bacia Rio Ibicuí-Mirim, através do: Relatório Técnico do Plano de Bacia:
diagnóstico e prognóstico; enquadramento; relatório final. Os estudos para a
elaboração do Plano das Bacias dos Rios Vacacaí e Vacacaí-Mirim estão em
andamento. Apesar da informação disponível, o SERH do Rio Grande do Sul,
como estado pioneiro na elaboração de uma política para os recursos hídricos,
ainda necessita de um esforço muito grande para atingir o objetivo previsto na
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 57

Política, os Comitês ainda não se consolidaram como o Parlamento da Água.


A implantação das agências de bacia, para prestar assessoria técnica, arrecadar
e destinar os recursos captados pela cobrança, tornam-se fundamental para a
consolidação do SERH e do gerenciamento através dos comitês.

4. A Gestão Ambiental e dos Recursos Hídricos no Território


de Itaara/RS

A gestão ambiental municipal deve ser articulada com o gerenciamento


dos recursos hídricos, já que a qualidade e quantidade de água na unidade
vai depender das condições ambientais da bacia hidrográfica, território que
se sobrepõe ao limite administrativo dos municípios.
Embora a bacia hidrográfica seja recomendada pela Política dos
Recursos Hídricos como ideal para o gerenciamento dos Recursos Hídricos,
os municípios desempenham papel importante na conservação da água. Por
exemplo, no caso dos municípios usuários da água, Santa Maria possui re-
servatório de abastecimento humano com área de captação no município de
Itaara, a manutenção da qualidade e quantidade de água depende da gestão
ambiental do município de Itaara, os municípios , deverão considerar o pre-
visto Código Estadual do Meio Ambiente Rio Grande do Sul, Lei nº 11.520,
de 03 de agosto de 2000:

Art. 16 – Os programas governamentais de âmbito estadual ou muni-


cipal destinados à recuperação econômica, incentivo à produção ou
exportação, desenvolvimento industrial, agropecuário ou mineral, ge-
ração de energia e outros que envolvam múltiplos empreendimentos e
intervenções no meio ambiente, em especial aqueles de grande abran-
gência temporal ou espacial, deverão obrigatoriamente incluir avalia-
ção prévia das repercussões ambientais, inclusive com a realização de
audiências públicas, em toda sua área de influência e a curto, médio
e longo prazos, indicando as medidas mitigadoras e compensatórias
respectivas e os responsáveis por sua implementação.

O grande desafio dos órgãos ambientais e dos comitês está em articu-


larem-se para o planejamento numa perspectiva sistêmica visando: prote-
ger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
promover a melhoria das condições ambientais; fiscalizar as concessões de
direitos de exploração de recursos hídricos; legislar concorrentemente sobre
defesa dos recursos naturais, proteção do meio ambiente, garantindo a efe-
tivação das APP – áreas de preservação permanente, das RL – reserva legal
58

e incentivando a implantação de UC – unidades de conservação, principal-


mente as RPPN – reserva particular do patrimônio natural
A necessidade da gestão articulada justifica-se na medida que a escas-
sez, a redução da vazão dos rios está diretamente ligada: ao uso, a alteração
das condições naturais das bacias, com o desmatamento para a ocupação, e a
impermeabilização do solo, que altera o processo de infiltração e acumulo da
água no solo, neste sentido os órgãos de licenciamento deverão estar atentos na
perspectiva de atender aos princípios da conservação dos mananciais hídricos.
O poder público municipal responsável pelo abastecimento humano, no
Estado do Rio Grande do Sul, concede a responsabilidade à CORSAN, que
usa a estratégia da construção de reservatórios para abastecimento, princi-
palmente para médios e grandes centros urbanos. A exemplo, pode-se des-
tacar o reservatório do (Departamento Nacional de Obras e Saneamento)
DNOS construído no alto curso do Rio Vacacai-Mirim e do Rodolfo Costa e
Silva no Ibicuí-Mirim, ambos mananciais são usados para abastecer a cidade
de Santa Maria, com população de aproximadamente 280.000 habitantes, a
maior cidade do centro do estado. O reservatório Rodolfo Costa e Silva lo-
calizado no alto curso do rio Ibicuí-Mirim onde a jusante deste encontra-se o
Reservatório Saturnino de Brito, que compõe o sistema de abastecimento de
mais de 60% da população urbana de Santa Maria, portanto este depende da
conservação ambiental do município de Itaara.
O abastecimento humano do município de Itaara, realizado pela
CORSAN, depende da vazão do Arroio Manoel Alves, afluente do Arroio
Grande, integrante da bacia do Vacacaí-Mirim da região hidrográfica do
Guaíba, além de ser fonte de água para os balneários de lazer e açudes nas
áreas rurais, também abastece o perímetro urbano de Itaara, com um reserva-
tório artificial, conhecido como lago SOCEPE (Sociedade Concórdia Caça e
Pesca) na propriedade privada da sede campestre.
Salienta-se a importância das sub-bacias hidrográficas, a área de capta-
ção dos mananciais que abastecem Santa Maria está no município de Itaara,
o reservatório do Rio Ibicuí-Mirim fornece água por transposição, método
muito contestado, pois o rio perde parte de sua vazão para outro sistema hí-
drico. As ações de gestão devem priorizar o aumento do suprimento de água
(medidas estruturais e não estruturais) e a redução do consumo, e do desper-
dício de água no sistema de distribuição para conserva água nos mananciais.
Em ambos os municípios os Planos Diretores salientam a necessida-
de da conservação da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica e suas áreas
núcleo, de Preservação Permanente (APPs) de margens de cursos d’água,
nascentes e declividades acentuadas, também previstas pela legislação am-
biental nos níveis federal e estadual. E ainda Lei de Uso e Ocupação do Solo
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 59

de Santa Maria (LUOS), define as Áreas Especiais Naturais de Conservação


e as de Preservação Permanente como: a do Morro Cechella, a do Morro do
Monumento ao Ferroviário e a da Barragem do Vacacaí-Mirim, com influên-
cia direta no aspecto qualiquantitativo da água. E Plano diretor de Itaara de-
fine a Política Municipal de Drenagem e Preservação dos Recursos Hídricos,
prevê a instituição de programas de incentivo à conservação e recuperação
da vegetação marginal dos cursos da água do município e a preservação e
recuperação dos recursos hídricos poluídos, mas, ambos os municípios não
apresentam nenhum plano de ação neste sentido.
Considerando que a água circula pela bacia hidrográfica, quando da
elaboração dos Planos de Bacia, deve-se priorizar a implantação do CAR
– Cadastro Ambiental Rural previsto no Código Florestal, para planejar as
propriedades, a fim de conservar as Áreas de Preservação Permanente: de
nascentes, margens e encostas e as reservas legal, que juntamente com prá-
ticas agrícolas que favoreçam a infiltração, diminuindo o escoamento super-
ficial e, consequentemente, reduzindo a carga de sedimentos transportados,
evita o assoreamento do leito dos rios, além de um adequado sistema de
saneamento ambiental nas propriedades rurais e cidades contribuem para a
conservação da água.
Os Planos de Bacia e os Planos Ambientais Municipais, na escala em
que estão sendo elaborados, e com o foco de abordagem muito técnico, estão
distantes da realidade da população, transformando-se em um banco de da-
dos para consulta técnica, trezentas ou quatrocentas páginas de diagnósticos,
os programas e Planos de ação são pouco propositivos, não apontam de for-
ma objetivas quais são as ações a serem executadas e em que escala.
Neste contexto de desenvolver mecanismos que fortaleçam a comuni-
cação com a comunidade a Fundação MO’Ã, gestora da RPPN – Reserva
Particular do Patrimônio Natural Estadual MO’Ã, vem trabalhando para
conscientizar e mobilizar a sociedade na participação dos fóruns formais de
decisão, como Condema e Comitês, exemplo das ações socioambientais do
Projeto Saúde da Água, algumas apresentadas neste livro.
Concluindo, o desafio após vinte anos da Política de Recursos Hídricos,
está em articular a gestão ambiental com a de recursos hídricos, com a efe-
tiva participação da sociedade, onde os municípios desempenham um papel
fundamental no ordenamento territorial através dos planos diretores e Planos
Ambientais, já previstas por lei para a conservação ambiental e consequente-
mente da água, melhorando a qualidade de vida da população.
60

REFERÊNCIAS

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SANTA MARIA. Lei complementar municipal n. 034 de 29 de dezem-
bro de 2005. Dispõe sobre a Política de Desenvolvimento Urbano e sobre
o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental do Município de
Santa Maria. Prefeitura Municipal de Santa Maria, Santa Maria, RS, 29 dez.
2005. Disponível em: <http://www.santamaria.rs.gov.br/_secretarias/pdf/
ArqSec44.pdf>. Acesso em: 20 dez. 2017.
SCHNEIDER, C. Recuperação de Áreas em Incompatibilidade Legal de
Uso da Terra: o caso da Bacia Hidrográfica do Arroio Manoel Alves, Itaara,
RS. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal de Santa
Maria, Santa Maria, 2010.
SECRETARIA Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do
Estado do Rio Grande do Sul. 2017. Disponível em: <http://www.sema.
rs.gov.br>. Acesso em: 28 dez. 2017.
SEMA. Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável,
2010. Bacias Hidrográficas do RS. Disponível em: <http://www.sema.
rs.gov.br/>. Acesso em: 27 dez. 2017.
______. Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável,
2012. Relatório Anual sobre a Situação dos Recursos Hidricos no Estado
do Rio Grande do Sul – Ano 2009/2010. Disponível em: <http://www.sema.
rs.gov.br/upload/Relatorio_2009_2010(4).pdf>. Acesso em: 27 dez. 2017.
CAPÍTULO 3
AS RESERVAS PARTICULARES DO
PATRIMÔNIO NATURAL – RPPN
Suzane Bevilacqua Marcuzzo
Eliane Maria Foleto

A participação da sociedade civil na conservação da natureza é uma


prática comum em muitos países. Diversas nações têm desenvolvido pro-
gramas de incentivo à criação de áreas particulares protegidas para a con-
servação da diversidade biológica, seja com a proteção de ecossistemas
ainda não protegidos, seja para a ampliação da área das UCs públicas já
existentes, ou para a criação de zonas-tampão em seu entorno, assegurando
sua proteção.
Ao contrário dos modelos europeu e estadunidense, fortemente base-
ados nos land trust e em grupos de conservação bem organizados e capita-
lizados, a América Latina vem experimentando um modelo de conservação
voluntária em terras privadas que pode ser considerado um modelo de res-
ponsabilidade socioambiental espontânea.
Em termos de visibilidade mundial, dois dos maiores atos da relevân-
cia das áreas protegidas privadas é a Resolução 1.65 do Congresso Mundial
de Conservação de 1997, incentivando os governos a “dar prioridade à
complementação dos sistemas de áreas protegidas públicas, através do
desenvolvimento de programas que apoiem a conservação em terras priva-
das”, e a edição especial da renomada revista Parks, da União Internacional
para a Conservação da Natureza (UICN), que em 2005 dedicou o número
dois do seu volume 15 exclusivamente ao tema.
No Brasil, ainda que houvesse previsão legal para restrições volun-
tárias visando à proteção da natureza em propriedades privadas desde
1965, somente em 1990 surgiu um marco legal apropriado para amparar
os interesses dos proprietários conservacionistas, com a publicação do
Decreto Federal 98.914, de 31 de janeiro de 1990, que criou a figura das
Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN). A Reserva Particular
do Patrimônio Natural (RPPN), criada para atender um grupo reduzido de
proprietários que queriam garantir a proibição de caça em suas fazendas,
em menos de uma década viria a se tornar a base legal sobre a qual tem
64

sido erguido um dos maiores, mais representativos e mais bem organizados


sistemas privados de conservação da natureza do mundo.
Foi somente em 2000 que as RPPN conquistaram o status de Unidades
de Conservação, com a aprovação da Lei Federal nº 9.985/2000, de
18 de julho de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC), fazendo do Brasil o único país da América Latina
à incluir as reservas privadas no seu sistema de áreas protegidas oficial.
Seis anos depois, em 2006, as RPPN se tornaram a primeira categoria de
unidade de conservação presente no SNUC a ser regulamentada, por meio
do Decreto Federal 5.746/2006, de 5 de abril de 2006.
Embora não tenha trazido grandes novidades com relação à regula-
mentação anterior, o mesmo serviu para redimir dúvidas com relação à
sobreposição entre as RPPN e as áreas de Reserva Legal e de Preservação
Permanente das propriedades, além de normatizar em mais detalhes os usos
e atividades permitidas e os potenciais benefícios.
Enquanto isso no Rio Grande do Sul o Decreto Estadual n° 46.519,
de 22/07/2009 regulamentava a RPPN estadual definida como “uma área
de domínio privado, a ser especialmente protegida por iniciativa de seu
proprietário, reconhecida e considerada pelo Poder Público como Unidade
Conservação de relevante importância, com o objetivo de proteção dos
recursos ambientais e de conservação da diversidade biológica, gravada
com perpetuidade, por intermédio de termo de compromisso averbado à
margem da matrícula do Cartório de Registro de Imóveis, sem implicar
em desapropriação”. Posteriormente, com a criação do Decreto 53037
de 2016, que institui e regulamento o Sistema Estadual de Unidades de
Conservação, SEUC, esta categoria recebe suporte legal que consta em seu
art. 15 que qualquer categoria de UC, independente de seu grupo, deverá
receber compensação por empreendimentos que ocorram em suas zonas de
amortecimento ou de impacto direto.
Ainda o Decreto do SEUC em seu § 2º cita que as Reservas Particulares
do Patrimônio Natural – RPPN poderão receber recursos para a elaboração, a
revisão e a implantação do Plano de Manejo e para realização de programas
de gestão, monitoramento e proteção, vedada a aquisição de bens permanen-
tes, consoante diretrizes da CECA.
A lei que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação a
categoria de ‘Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN’, que em-
bora seja estabelecida de maneira voluntária pelo dono da terra, recebe sta-
tus de unidade de conservação em caráter perpétuo e irrevogável (BRASIL,
2000). No caso das RPPN brasileiras, mais especificamente, SILVEIRA
(2010) apontou muito apropriadamente que a noção de patrimônio, que
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 65

inspira a concepção legal das RPPN, encerra a ambiguidade característica


dessas reservas: são áreas naturais, ao mesmo tempo de domínios particu-
lares e “bens comuns da humanidade”.
As Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) são áre-
as que integram o Sistema Nacional de Unidades de Conservação e são
criadas em caráter de perpetuidade por iniciativa de seus proprietários, e
reconhecidas pelo poder público por sua relevante diversidade biológica,
aspectos paisagísticos ou características ambientais que justifiquem ações
de recuperação. Desde o surgimento da figura da RPPN em 1990, foram
criadas mais de 1.503 reservas no Brasil, protegendo cerca de 774.845,28
ha, tendo uma representação no RS de 37 áreas em um total de 4348,74 ha
(CNRPPN, 2018).

1. Papel e Importância das RPPNS

Por sua vez, são os inúmeros fatores relevantes sobre o papel das
RPPNs para a conservação da biodiversidade, tais como serem aliadas na
proteção do entorno das UCs públicas.
As áreas protegidas na categoria de reservas privadas são essenciais
para a conservação da biodiversidade e atuam como a pedra angular das
estratégias de conservação, funcionando como refúgios para as espécies
e protegendo os diferentes processos ecológicos, onde ocorrem em geral
em fragmentos remanescentes em paisagens muito alteradas e são comple-
mentares aos esforços mais amplos de proteção dos ecossistemas, cobrindo
lacunas nas estratégias de conservação (DUDLEY, 2008).
Suas funções incluem a manutenção dos serviços ecossistêmicos e, em
muitos casos, é a última esperança para evitar a extinção de espécies amea-
çadas e endêmicas. De acordo com Pinto et al. (2012), a Mata Atlântica é o
domínio fitogeográfico com o maior número de RPPN, fato de importância
fundamental uma vez que 80% dos remanescentes naturais se encontram
em terras privadas. Esta importância é corroborada por dados de Oliveira et
al. (2010) que analisaram 127 RPPN do Bioma e encontraram pelo menos
3.000 espécies de plantas e animais, assim como uma fração significativa
das espécies da fauna e flora brasileira ameaçadas de extinção. Muitas es-
pécies endêmicas do bioma estão amplamente representadas nessas reser-
vas particulares, como no caso da bromélia Lymania spiculata e, algumas
espécies de plantas e animais da Mata Atlântica encontram em RPPNs o
seu último refúgio, considerando que só se tem registro delas em proprie-
dades particulares (Dyckia pernambucana e Vriesea limae consideradas
66

extintas na natureza) que são, efetivamente, reservas do nosso patrimô-


nio natural.
Além disso, as RPPNs constituem espaços para a realização de ativi-
dades de lazer, recreação e turismo ao ar livre, essenciais, sobretudo para
as populações urbanas. Neste contexto, são inúmeras propriedades que vin-
culam dois objetivos desta categoria, educação ambiental e lazer, uma vez
que os trabalham de forma conjunta, recebendo visitantes e oportunizando
vivências na natureza que atuam na percepção de valorização dos ambien-
tes naturais preservados.
No Brasil, as RPPN, ainda que pouco representativas em termos de
superfície protegida, estão consolidadas como uma das ferramentas mais
flexíveis e eficientes para a proteção de áreas naturais consideradas críticas
para a sobrevivência de algumas espécies e para a proteção de serviços
ecossistêmicos. Mesquita et al. (2012) e Holmes (2013) são bons exemplos
de estudos que lograram avaliar e quantificar a importância destas reser-
vas para os serviços essenciais para a sociedade, em especial proteção da
biodiversidade, provisão de água e manutenção de estoques de carbono.
Medeiros et al. (2011) estimaram que a criação e manutenção das unidades
de conservação no Brasil impediu a emissão de pelo menos 2,8 bilhões de
toneladas de carbono. Ainda de acordo com estes autores, o valor econô-
mico deste serviço foi estimado em R$ 96 bilhões.
Por sua vez, especialmente importante é a integração da proteção da
biodiversidade com as atividades produtivas no meio rural. No setor agrí-
cola podem ser trabalhados elementos chave que favoreçam a melhoria da
qualidade de vida e o bem-estar humano. Questões relacionadas à conser-
vação e fornecimento de água, provisão de alimentos, mudanças climáticas,
proteção de espécies, serviços ambientais, todas convergem no setor agrí-
cola. Tem crescido a importância de trabalhos integrados de implantação e
monitoramento da adequação agrícola e ambiental de propriedades rurais,
visando à conservação e à restauração da vegetação nativa associada ao
aumento da produção econômica da atividade agrícola. Mas permanece
um grande desafio fazer esta integração e conseguir mudanças em sistemas
produtivos tão arraigados e convencionais.
Cabe ressaltar que, embora pequenas em tamanho, as RPPN cada vez
mais desempenham um papel fundamental para ações de proteção ambien-
tal. E este papel torna-se ainda mais relevante em termos de escala de
paisagem, uma vez que estas reservas contribuem para aumentar a conecti-
vidade biológica na paisagem, sobretudo em regiões bastante fragmentadas
(como é o caso da Mata Atlântica) funcionando como “trampolins ecológi-
cos” (ou “stepping stones”; termo em inglês), abrigando espécies animais
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 67

que transitam em áreas antropizadas. Estas reservas também podem facili-


tar o intercâmbio de sementes e esporos entre hábitats, possibilitando um
fluxo de informações genéticas entre indivíduos e populações (CREPALDI
et al., 2008).
Seja como as únicas áreas protegidas efetivas em algumas regiões
sejam como reservas que complementam as funções ecológicas de unida-
des de conservação públicas – formando corredores, protegendo zonas de
amortecimento ou oferecendo uso público eficiente para a população local
e para turistas, para a proteção do hábitat de espécies ameaçadas, para
a adoção de práticas de adaptação a mudanças climáticas com base nos
ecossistemas naturais ou para assegurar a manutenção de serviços ecos-
sistêmicos essenciais para o bem-estar humano, áreas protegidas privadas
estão incluídas portfólio das iniciativas para proteção do capital natural
do planeta.

2. Benefícios ao proprietário

Esta categoria de área protegida particular traz alguns benefícios ao


proprietário, tais como: direito de propriedade preservado; isenção de im-
posto territorial rural (ITR) referente à área reconhecida como RPPN; prio-
ridade de análise dos projetos pelo Fundo Nacional de Meio Ambiente
– FNMA; preferência na análise de pedidos de crédito agrícola junto a
instituições de crédito em propriedades que contiverem RPPN em seus
perímetros; maiores possibilidades de apoio dos órgãos governamentais
para fiscalização e proteção da área, por ser uma Unidade de Conservação e
possibilidade de cooperação com entidades privadas e públicas na proteção,
gestão e manejo da RPPN.
Contudo é preciso criar incentivos mais significativos e propor meca-
nismos que sejam atrativos para proprietários, uma vez que as isenções de
ITR não constituem um incentivo de peso para os proprietários – provavel-
mente pelo valor baixo da alíquota deste imposto, pelo tamanho pequeno
das RPPN e pelo fato de ser possível obter descontos deste imposto por
outros meios – o que não significa que eles não aspirem a ser reconhecidos
com outros tipos de incentivos e recursos. E ainda devemos considerar o
fato de que praticamente não existem incentivos que fomentem a criação
ou apoiem a gestão destas áreas protegidas.
Por sua vez, como o Sistema de Unidades de Conservação prevê a
criação, além da esfera federal, de unidades de conservação de âmbito esta-
dual e municipal, estas esferas administrativas têm apresentado incentivos
para criação de RPPNs de forma a facilitar a gestão do proprietário. Neste
68

sentido, estados e municípios veem nas RPPN seu destaque nas estratégias
de conservação da biodiversidade e proteção dos serviços ecossistêmicos.
Em alguns estados, como Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro, as
RPPN recebem deferência especial nas políticas de promoção e reco-
nhecimento dos serviços ecossistêmicos. Em São Paulo, o governo do
estado tomou a iniciativa de implementar legislação de pagamento por
serviços ambientais a posicionar formalmente as RPPN como requisito
para o recebimento de repasses relacionados à serviços ambientais. Até o
presente momento, o RS não apresenta nenhuma política pública relacio-
nada a incentivos diretos à RPPNs e no que diz respeito à programa de
serviços ambientais, o mesmo é citado como instrumento da Política de
Conservação do Solo e da Água do Rio Grande do Sul, art. 4, inciso XV
do Decreto 52.751/2015.
Outro benefício que incentiva a criação de unidades de conservação
nos municípios, incluindo as reservas particulares, é o ICMs Ecológico.
Esta é uma arrecadação que faz parte da composição dos percentuais a que
os municípios, que abriguem unidades de conservação, ou seja, diretamen-
te influenciados por elas, ou aqueles com mananciais de abastecimento
público, têm direito a receber do ICMS arrecadado pelos estados. Os esta-
dos devem elaborar suas próprias leis sobre a distribuição e os percentuais
do ICMS Ecológico que será repassado aos municípios, que, mediante lei
municipal, podem celebrar convênios, acordos de mútua cooperação e inte-
resse recíproco com instituições para que estas apliquem aos proprietários
de RPPNs. É feita então, uma “Transferência Voluntária Municipal”, que
é a entrega de valores públicos a outro ente, que não decorre de determi-
nação constitucional legal. As instituições conveniadas com as prefeituras
para receberem o repasse do ICMS, devem ser de utilidade pública e sem
fins lucrativos.
Uma das maiores possibilidades que se abrem com o ICMS Ecológico
é a possibilidade de parceria entre os gestores municipais e os gestores pú-
blicos e privados de Unidades de Conservação localizados nos municípios,
com vista a incrementar a gestão dessas Unidades. Nesse sentido, associa-
ções de proprietários de reservas privadas, como a associação de RPPN
do estado do Paraná (RPPN Paraná), tomaram a iniciativa de trabalhar em
parceria com determinadas municipalidades no sentido da utilização de
parte dos recursos do ICMS Ecológico em prol de reservas particulares. O
estado do Paraná foi pioneiro em direcionar esses recursos às RPPN. As
negociações e os arranjos institucionais efetuados envolveram, à época,
a Secretaria de Meio Ambiente, o IAP – Instituto Ambiental do Paraná,
a RPPN Paraná – Associação Paranaense de Proprietários de Reservas
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 69

Particulares do Patrimônio Natural do Estado do Paraná, os poderes pú-


blicos municipais e contou ainda com o aval do MPE – Ministério Público
Estadual e do TCE – Tribunal de Contas do Estado, conferindo assim lisura
e idoneidade ao processo.
O Estado do Paraná também criou o Decreto Estadual 1.529, de 2 de
outubro de 2007, estabeleceu o Estatuto Estadual de Apoio à Conservação
da Biodiversidade em Terras Privadas. Com esta norma, o estado, que já
era o de maior número de RPPN reconhecidas de esfera estadual, passou a
ser também o que conta com o marco legal mais robusto e completo sobre
o tema, estabelecendo critérios e benefícios para incentivar a criação e
apoiar as reservas existentes.
Por sua vez é importante mencionar a atuação do Rio de Janeiro quanto
as RPPN. Ainda que tenha sido o penúltimo a adotar uma legislação pró-
pria, em 2007, graças a um bem estruturado programa de apoio à criação de
RPPN, que conta com equipe e infraestruturas próprias, além de uma diretriz
de política governamental que tem prestigiado as RPPN, este estado aparece
como o terceiro em número de RPPN reconhecidas, atrás apenas de Paraná e
Minas Gerais, dois dos precursores das regulamentações estaduais.
Desta forma o município do Rio de Janeiro instituiu por meio da
publicação da Lei Municipal nº 572/2010, de 28 de outubro de 2010, o
Sistema Municipal de Conservação da Biodiversidade e autorizou a prefei-
tura a firmar convênios com instituições sem fins lucrativos, para aplicar os
repasses adicionais do ICMS Ecológico, que amalgamou as diferentes ini-
ciativas. A partir desta legislação, as RPPN existentes no município podem
ser beneficiadas com recursos do ICMS repassados pela prefeitura, para
cobrir investimentos relacionados à sua proteção, planejamento, pesquisas
e ações de Educação Ambiental, com resultados diretos sobre o interesse
dos proprietários em criar suas reservas.
No RS, o estado repassa ICMS ecológico aos municípios que abrigam
área de proteção em unidades de conservação. Outra vantagem diz respeito
a medida compensatória recebida em RPPN atingidas por empreendimento
com EIA-RIMA, conforme SEUC, Decreto 53.037 de 2016 citado anterior-
mente no texto.
Desta forma, com estes incentivos, e também com o fortalecimento
das Associações de RPPNs, a nível federal, com a Confederação Nacional
de RPPN, como também a nível estadual, com as associações estaduais,
presentes na maioria dos estados. Além da existência dos programas de
incentivos de Organizações Conservacionistas para apoio a proprietá-
rios e criação de novas RPPNs, tais como, o “Programa de incentivos às
RPPNs da Mata Atlântica” (www.aliancamataatlantica.org.br), Programa
70

de Incentivos às RPPNs do Pantanal (www.repams.org.br), Programa de


Incentivo à Conservação em Terras Privadas na Caatinga, (www.acaatinga.
org.br), podemos antever que o futuro das reservas particulares é promissor
e assim estaria garantida grande parte das áreas florestadas de nosso país.
Ainda, no RS a Associação Charrua de RPPNs gaúchas, busca partici-
par de todos os fóruns de debates para fortalecer os proprietários, buscando
apoio para elaborar iniciativas ainda não implantadas.

3. Processo de criação e chancela oficial

Via de regra, para uma área se tornar uma RPPN deve apresentar rele-
vante importância pela sua biodiversidade, guardar ecossistemas naturais
e modificados que são essenciais na manutenção dos sistemas mantene-
dores da vida, conservar características biofísicas importantes para a re-
gulação dos ciclos hidrológicos e climáticos local e/ou regional, dispor de
oportunidades para educação e pesquisa científica, possuir relevante im-
portância por seu aspecto paisagístico, pelos atributos relacionados com
serviços ecossistêmicos ou ter características ambientais que justifiquem
sua recuperação.
As RPPNs podem ser criadas pelos órgãos integrantes do Sistema
Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA nos âmbitos federal, estadual
e municipal.
Contudo, a criação da RPPN é de iniciativa do proprietário do imóvel,
mas necessita da homologação da autoridade ambiental. O processo de
reconhecimento de uma propriedade ou de parte dela como RPPN envolve
basicamente as etapas de análise técnica, consulta pública, vistoria técni-
ca, análise jurídica, averbação do Termo de Compromisso e publicação de
instrumento legal de reconhecimento, conforme a regulamentação do Dec.
5.746, de 5 de abril de 2006.
Como a averbação de uma RPPN constitui um ato jurídico que cria
um direito real sobre os imóveis, independente dos seus titulares, esta aver-
bação precisa ser feita individualmente, sobre cada escritura ou título de
propriedade. É por esta razão também que não é possível instituir RPPN
sobre áreas de posse, pois seria precário, do ponto de vista legal, o estabe-
lecimento de obrigações reais sem um título ou uma escritura definitiva.
Considerando que a RPPN implica em restrição voluntária do direito
de propriedade, é necessário que o Oficial de Registro de Imóveis observe
se todos os titulares de direito real comparecem no termo de compromisso,
bem como se estão no pleno exercício de sua capacidade jurídica, sendo
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 71

que na hipótese de existência de menores é imprescindível a autorização


judicial. É comum a existência de um direito de usufruto na propriedade
imobiliária. Neste caso, o usufrutuário deverá também comparecer no ter-
mo do compromisso, juntamente com o proprietário, mesmo porque ele
também é detentor da posse da reserva a ser criada.
A RPPN é uma afetação de uma área com forte restrição ao direito
de propriedade e vinculado à preservação ambiental, não existindo trans-
missão da propriedade, que continua com particulares. O § 1º do art. 21 da
Lei 9.985/2000 em momento algum define que a descrição (perímetro) da
reserva será averbada na matrícula do Registro de Imóveis, mas somente o
gravame receberá publicidade registral. A reserva nasce com a aprovação e
aceitação do órgão ambiental competente.
No entanto, o gravame de perpetuidade somente recebe publicidade
e deve ser respeitado por todos após a averbação na matrícula no Cartório
de Registro de Imóveis respectivo. O próprio Dec. 5.746, de 5 de abril de
2006, no Parágrafo Único do art. 9º, dispõe que “a partir da averbação do
Termo de Compromisso no Cartório de Registro de Imóveis, ninguém mais
poderá alegar o desconhecimento da RPPN”.
Ainda conforme o artigo 3º, § 1º, inciso IX, é necessário a apresen-
tação para o órgão ambiental de “planta da área total do imóvel indicando
os limites; os confrontantes; a área a ser reconhecida, quando parcial; a
localização da propriedade no município ou região, e as coordenadas dos
vértices definidores dos limites do imóvel rural e da área proposta como
RPPN, georreferenciadas de acordo com o Sistema Geodésico Brasileiro,
indicando a base cartográfica utilizada e assinada por profissional habilita-
do, com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART”.
Outra menção que deve ser feita é ao papel da legislação estadual
no reposicionamento das RPPN como unidades de conservação de prote-
ção integral.
No que diz respeito a esfera municipal é imprescindível que a mes-
ma aplique os mesmos princípios e critérios para o reconhecimento das
reservas. Ainda que possam ser adotados procedimentos mais ágeis e sim-
plificados, é importante que os mesmos não comprometam os requisitos
essenciais para a segurança jurídica exigida para uma área protegida for-
malmente estabelecida, sendo o adequado georreferenciamento do perí-
metro um deles. Outra questão importante diz respeito aos objetivos de
conservação e gestão e aos usos permitidos nas reservas, os quais também
não devem se diferenciar de maneira fundamental dos regulamentos federal
72

e estaduais, mantendo as RPPN reconhecidas na esfera municipal com o


mesmo perfil de ‘proteção integral’ que possuem nas demais.
Importante também será acompanhar de que maneira os municípios
eventualmente beneficiados com estes recursos recompensam as RPPN
existentes em seu território.

4. Perfil e motivação de proprietários de RPPN

Estudos têm comprovado que a motivação maior de um proprietário


rural para a criação de uma área protegida privada é a conservação da
natureza (SILVEIRA, 2010). A análise dos dados sobre 118 reservas priva-
das de diferentes tipos e categorias, localizadas em 12 países da América
Latina, Brasil inclusive, demonstrou que os objetivos de caráter conserva-
cionista – tais como conservar a diversidade biológica, proteger espécies
ameaçadas, conservar amostras de ecossistemas e promover a Educação
Ambiental – representam os de maior peso na hora da criação de áreas
protegidas privadas (MESQUITA, 1999).
Da mesma forma, PELLIN (2010) apontam que a maior parte dos
responsáveis pelas áreas protegidas privadas existentes são pessoas com-
prometidas com a defesa da natureza, independente do tipo ou grau de
incentivo ou compensação que recebam ou possam vir a receber. Este perfil
médio do proprietário de reservas privadas é corroborado pelas pesquisas
realizadas por Marcuzzo et al. (2017) na região central do RS, onde foram
realizadas oficinas participativas em três municípios, São João do Polêsine,
Agudo e Itaara, incentivando a criação de RPPN em duas propriedades no
primeiro e uma em cada dos outros dois municípios.
Nas oficinas realizadas nas propriedades piloto após um processo de
avaliação de atributos ecológicos que validassem sua criação e com a par-
ticipação ativa dos proprietários, a comunidade do entorno foi convidada
a participar para se apropriar da possível unidade de conservação e seus
benefícios para região (Figura 1). Nesse momento foram repassadas in-
formações acerca da importância e gestão da RPPN e também o quanto a
mesma atuava como multiplicadora para ações de conservação.
Como resultado apenas um proprietário de um total de quatro, de-
cidiu levar até o final o processo de criação, em virtude de seu ativismo
conservacionista. Os outros três proprietários alegaram não dispor de pos-
sibilidade de envolvimento com a gestão, bem como arcar com custos de
manutenção para garantir a biodiversidade.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 73

Figura 1 – Oficinas participativas realizadas no processo


de criação de RPPN na região central do RS

Fonte: S. B. Marcuzzo, 2016.

5. Gestão das RPPN

Ao contrário do que supõem alguns proprietários – amantes da natureza,


mas leigos acerca dos princípios da ecologia e das ciências naturais – apenas
74

cercar e impedir a entrada de pessoas pode não ser o suficiente para garantir a
perpetuidade da proteção de uma dada área.
Ao contrário do poder público, que tem a obrigação de fazer o que a legis-
lação lhe atribui como responsabilidade, os cidadãos, as empresas e as organi-
zações da sociedade civil têm a liberdade de optar pelas atividades que melhor
lhes aprouver, obviamente respeitando os limites estabelecidos pelos atos legais,
regulatórios e normativos existentes. Sendo a RPPN uma área protegida criada
voluntariamente pelo proprietário, a mesma deve preservar a flexibilidade inerente
à livre iniciativa, no que tange ao seu modelo de planejamento, de gestão e de uso.
Entretanto, é recomendável, porém, que pelo menos algumas ações de
Educação Ambiental sejam desenvolvidas com os vizinhos e a comunidade do
entorno, até para se garantir a proteção da área e diminuir os problemas com
queimadas, caça e extrativismo, sobretudo de palmito, lenha e cipós.
É fundamental entender também que os objetivos de gestão de uma uni-
dade de conservação são limitados pelos atributos naturais da mesma, ou seja,
dependem diretamente das características naturais da área, incluindo seu ta-
manho, o tipo de ecossistema, o grau de conservação do mesmo, a presença
de espécies endêmicas e/ou ameaçadas, a existência de sítios históricos e/ou
arqueológicos, a ocorrência de áreas de interesse turístico e recreacional em
seu interior, a presença de pessoas, as atividades atualmente desenvolvidas na
mesma (compatíveis ou incompatíveis com a conservação dos recursos naturais
e da biodiversidade) e outras.
Além de ter sido a primeira categoria regulamentada após a criação do
SNUC, as RPPN foram também as primeiras a contar com um roteiro me-
todológico próprio, contendo diretrizes metodológicas e de procedimentos,
para orientar os proprietários e seus parceiros durante a elaboração dos planos
de manejo.
Neste sentido, podem surgir arranjos diferenciados de plano de manejo,
adequados a vocação de cada RPPN, possibilidade e interesse do proprietário
para implementar atividades de uso público e os que devem ser elaborados para
as reservas que não têm estas características. Para estas últimas, o plano de ma-
nejo a ser elaborado de forma a orientar o proprietário e/ou gestor apenas para
as atividades de preservação e conservação da biodiversidade.

6. O caso da Reserva Particular do Patrimônio Natural


Estadual MO’Ã

A Fundação MO’Ã, Organização Não Governamental, proprietária da


Reserva Particular do Patrimônio Natural Estadual, atua na defesa do meio
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 75

ambiente desde que foi instituída, no ano de 1996, idealizada por profissionais
com amplo conhecimento e militância na área ambiental, têm se dedicado a
atender o que é preconizado pelo termo MO’Ã, que significa em Tupi-guarani,
proteger, com sede administrativa no município de Santa Maria, no estado do
Rio Grande do Sul. Por seu histórico de atuação junto ao município de Itaara,
no ano de 2007, recebeu por doação do casal instituidor, Eleonora Diefenbach
Müller, cirurgiã dentista, Rainer Oscar Müller, economista, uma área de 24
hectares, localizada no Rincão dos Minellos, no município de Itaara, Região
Central do Rio Grande do Sul.
No RS os municípios da região central, dentre eles, Santa Maria e Itaara,
estão localizados na Reserva da Biosfera, definida pela Política Ambiental do
Estado, como área prioritária para a criação de unidades de conservação no
estado, os Planos Diretores Municipais dedicam artigos específicos a área de
abrangência da Mata Atlântica, reconhecem e salientam a necessidade de pro-
teção e conservação de remanescentes, e práticas que promovam o desenvolvi-
mento sustentável, mas pouco fazem neste sentido.
O reconhecimento da importância da conservação ambiental da Mata
Atlântica também motivou os instituidores e mantenedores da Fundação MO’Ã,
a doarem a área de 24 ha para a Fundação, trabalhando exaustivamente para que
fosse instituída, através da Portaria nº 80 da SEMA – Secretaria do Ambiente
e Desenvolvimento Sustentável do Estado do Rio Grande do Sul, publicada
no diário Oficial em 15 de junho de 2015, a Reserva Particular do Patrimônio
Natural Estadual MO’Ã/RPPN Estadual MO’Ã, com 22 ha na fração denomi-
nada Caminho das Pedras, no Rincão do Minellos, município de Itaara.
A RPPN destaca-se pela sua geobiodiversidade , com remanescentes de
vegetação do Bioma da Mata Atlântica, na área do Rebordo do Planalto Sul-
Rio-Grandense, com amplitude altimétrica de aproximadamente 200 metros,
de relevo escarpado, caracterizado pela inclinação de vertentes, com Área de
Preservação Permanente de encosta além de margens e nascentes no interior
da propriedade, caracterizando-se como zona núcleo da Reserva da Biosfera,
evidenciado a necessidade de conservação.
Outro aspecto relevante da área, é a biodiversidade de flora e fauna típicos
do bioma Mata Atlântica, poucos fragmentos na região possuem extensão e
qualidade ambiental como encontrados no interior da propriedade. Constata-se
que pela declividade, dinâmica fluvial do rio, composição dos remanescentes
florestais e espécies de fauna, apresenta significativa relevância, configurando
uma condição propícia à existência de Unidade de Conservação da tipologia
de RPPN, destinada a pesquisas e educação ambiental, atividades previstas nas
diretrizes do Plano de Manejo, aprovada pelo conselho Administrativo e em
processo de elaboração pela Fundação MO’Ã.
76

Reforça a importância desta Unidade o “Projeto RS Biodiversidade” que


define o Corredor Ecológico da Quarta Colônia como área prioritária para a
conservação, com o objetivo de promover a conservação e a recuperação da
biodiversidade, mediante o gerenciamento integrado dos ecossistemas e a
criação de oportunidades para o uso sustentável dos recursos naturais, com
vista ao desenvolvimento regional. O Corredor Ecológico da Quarta Colônia
define o território que conecta as Unidades de Conservação de domínio
Estadual, a Reserva Biológica do Ibicuí Mirim ao Parque da Quarta Colônia,
onde a RPPN Estadual MO’Ã possui papel estratégico, como fragmento in-
termediário a estas unidades, contribui para aumentar a conectividade, sobre-
tudo na região bastante fragmentada.
A presença do Arroio “Caminho das Pedras” que tangencia o limite oeste/
sul da propriedade, e as nascentes, contribuem para a vazão do Arroio Manoel
Alves. O leito do Arroio, pelo tamanho da área de captação da sub-bacia hidro-
gráfica, pela característica de vale encaixado, perfil longitudinal com rupturas
de declive, apresenta alteração rápida ocasionada pelas precipitações intensas,
pelo aumento de vazão e da velocidade da água. A dinâmica fluvial com fluxo
turbulento causa erosão de margem e mobilização de fragmentos de rocha, den-
tro do leito e nas margens, causando em alguns episódios de precipitação trans-
bordamento que atinge a margem esquerda na área da propriedade. Verificou-se
que nos últimos 10 anos, em dois episódios de precipitação intensa, houve
alteração de margem e leito do arroio na área da unidade, causando a destruição
da ponte de acesso à propriedade, que por vezes fica interditada até a construção
de uma nova ponte.
Com estas características naturais, o bom estado de conservação dos frag-
mentos remanescentes da Mata Atlântica e a proximidade com a Universidade
Federal de Santa Maria tem despertado interesse de pesquisadores e discen-
tes a realizarem Trabalhos de Campo, Estágios Curriculares e Pesquisas para:
Trabalho de Graduação e Dissertações de Mestrado, abordando: o Bioma Mata
Atlântica; aspectos quali-quantitativos da água; restauração florestal; tipo de
solo; elementos do clima e levantamento florístico, e a Fundação como Gestora
da RPPN têm se empenhado em apoiar estas iniciativas por entender serem
importantes para a efetivação da unidade de conservação.

7. O desafio da Fundação MO’Ã na implantação da RPPN

No Estado do Rio Grande do Sul, o Decreto Estadual nº 46.519, de


22 de julho de 2009, regulamenta artigos da Lei do SNUC, e dispõe so-
bre a Reserva Particular do Patrimônio Natural Estadual – RPPN Estadual
– como Unidade de Conservação da Natureza, estabelece procedimentos
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 77

para a criação, apoio para a implementação, e institui o Programa Estadual


de RPPN com objetivo ampliar o número destas Unidades no Estado, con-
siderando que existem apenas duas RPPN instituídas pelo Estado no RS:
A Reserva Particular do Patrimônio Natural Estadual Barba Negra, criada
pela Portaria SEMA nº 48 de 28/09/2010, localizada no município de Barra
do Ribeiro com área de 2.379,44 ha; e a Reserva Particular do Patrimônio
Natural Estadual MO’Ã, criada pela Portaria SEMA nº 80 de 15/06/2015,
localizada no município de Itaara com área de 22 ha.
A existência de apenas duas Unidades demonstra a necessidade de in-
centivos do poder público, para vencer os entraves pertinentes à implantação
destas unidades, Costa (2006, p. 12) menciona alguns fatores que dificultam
a ampliação do número das unidades de conservação,

“De maneira geral, na maior parte dos países, especialmente naque-


les em desenvolvimento, a implantação de Unidades de Conservação
(UCs) esbarra na escassez de recursos, na falta de vontade política e na
deficiência na divulgação e no entendimento do papel que essas áreas
exercem na melhoria da qualidade de vida das comunidades vizinhas.
Os altos custos necessários à ampliação de áreas protegidas reforçam
a importância das reservas privadas no cenário da conservação dos
recursos naturais em todo o mundo”.

As dificuldades de implantação também foram vivenciadas pela ONG


proprietária da RPPN Estadual MO’Ã, dentre elas: a elaboração do georre-
ferenciamento e do diagnóstico ambiental da propriedade; a falta de apoio
do poder público, o desconhecimento e desinteresse dos órgãos ambientais,
principalmente a nível municipal; a burocracia e demora nas tramitações
para cumprir as exigências legais da implantação, fatos que podem inviabi-
lizar as iniciativas de proprietários.
Uma das primeiras etapas para a implantação da Unidade foi o
Georreferenciamento da área. O primeiro entrave foi a definição da área da
propriedade, sendo que havia uma diferença, entre a área medida em campo
e a que constava no Registro do Imóvel, foi necessário uma visita, junta-
mente com os proprietários das sete áreas limítrofes da Unidade para averi-
guar os limites , quando da visita aos lindeiros da Unidade foi apresentada a
Reserva Particular, sua função, os benefícios a comunidade.
Outro entrave refere-se ao custo do georreferenciamento e dos estu-
dos para o diagnóstico da área, que deve ser bancado pelo proprietário, que
em contrapartida recebe a isenção do Imposto Territorial Rural, valor muito
aquém do custo do processo de implantação. Uma possibilidade para finan-
ciar os custos de implantação, submeter um Projeto, ao “Edital da SOS Mata
78

Atlântica”, demandando do proprietário conhecimento técnico para elaborar


e tramitar o projeto. O tempo da execução financeira do Edital, nem sempre
é compatível com o tempo da tramitação nos órgãos ambientais, ampliando
o leque de dificuldades para os proprietários que querem por livre iniciativa
conservar suas propriedades ou parte delas.
No caso da Fundação MO’Ã os custos do Processo de Implantação da
RPPN foram financiados, em parte, pelo Edital da SOS Mata Atlântica do
Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica, executado no período
de dezembro de 2012 a fevereiro de 2014. Dentre as ações financiadas desta-
ca-se: atualização do Georreferenciamento da área da propriedade; processo
de retificação da matrícula no Cartório de Registro de Imóveis; cercamento
da área da propriedade; levantamento da documentação necessária para a
criação da RPPN Estadual; custeio com deslocamento Porto Alegre, sede da
Divisão de Unidades de Conservação – DUC, para entrega da documenta-
ção. Após a implantação da Unidade a Fundação MO’Ã depara-se atualmen-
te com os desafios da Gestão, com a elaboração do Plano de Manejo.
De acordo com a nota técnica do (DUC/DEFAP/SEMA, 2009):

“A implantação efetiva de uma Unidade de Conservação requer um


elevado grau de comprometimento, que inclui a disposição para rea-
lizar investimento de recursos financeiros de modo permanente com
a finalidade de garantir: a proteção dos ambientes naturais abrangidos
pela RPPN; a realização de atividades relacionadas ao uso público
(educação ambiental, visitação com fins turísticos, pesquisa científi-
ca); a implantação de infraestrutura necessária para as diversas ati-
vidades, incluindo a proteção da RPPN; e a elaboração do Plano de
Manejo, documento técnico que embasa as ações para gestão das
Unidades de Conservação, entre outras ações. Além disso, o caráter
perpétuo das RPPNs gera a transferência da responsabilidade para
herdeiros ou futuros adquirentes da área, o que também deve conside-
rado pelo proprietário da área”.

Constata-se que estes desafios justificam em parte a existência de ape-


nas duas RPPN Estaduais sobre a gestão do DUC/DEFAP/SEMA no RS, a
Barba Negra e a da Fundação MO’Ã, sem dúvida que se o poder público
não assumir o ônus dos estudos necessários, e das tramitações burocráticas,
indispensável para a implantação de RPPNs, poucos serão os proprietários
que estarão dispostos a arcar com estes custos.
Os proprietários terão que ter outras motivações para implantar UCs,
para além de saber que estão contribuindo para: consolidar os Sistemas
Nacionais e Estaduais de Unidades de Conservação; promover a proteção,
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 79

as pesquisas e a educação ambiental e que estas produzem benefícios através


dos serviços ecossistêmicos; possibilitam a conectividade dos fragmentos da
paisagem natural, potencializando a conservação, como é o caso da RPPN
Estadual MO’Ã junto ao Corredor Ecológico da Quarta Colônia. Se não fo-
rem apresentados incentivos que superem o ônus da implantação, pouco se-
rão os avanços, considerando que após a criação da Unidade ainda terão que
arcar com o custo da elaboração e implantação do Plano de Manejo, princi-
pal instrumento para a gestão da propriedade, e de que nem todas as RPPNs
possuem a possibilidade de desenvolvimento do ecoturismo como fonte de
recursos financeiros para a manutenção da gestão.
Soma-se a isso que, após a implantação da Unidade, o Gestor deve
preocupar-se com a implantação de um Conselho Gestor para definir as di-
retrizes da elaboração do Plano de Manejo da RPPN, prevendo a zona de
amortecimento, para além dos limites da Unidade de Conservação, onde terá
que articular com os sujeitos locais, buscando parceiros, à gestão em defesa
do meio ambiente deste entorno, minimizando assim problemas decorrentes
do efeito de borda.

8. A Fundação MO’Ã na gestão compartilhada da RPPN

A participação da Fundação na Gestão Ambiental local se intensifica


com a demanda de instituir a RPPN, a Fundação se aproxima do Executivo e
Legislativo Municipal de Itaara, num primeiro momento para encaminhar o
processo de criação da RPPN, não obtendo o acolhimento da proposta, sendo
então encaminha a SEMA/DBIO, DUC.
Com o passar do tempo, como cogestora da Unidade, a aproximação com
a comunidade e as parcerias se fortalecem, principalmente com a execução
do Projeto “Saúde da Água” financiado pela PETROBRAS Socioambiental,
composto de subprojetos de: Educação Ambiental, Monitoramento quali-
-quantitativo da água, Política de Resíduos Sólidos, Restauração de Nascentes
e Divulgação ambiental, alguns resultados, serão apresentados nos capítulos
a seguir. O território de atuação do Projeto foi a Sub-Bacia do Arroio Manoel
Alves, a montante do Lago do SOCEPE – Sociedade Concórdia de Caça e
Pesca de Itaara, por configurar-se como zona de amortecimento da RPPN e
por ser o manancial de abastecimento de água do município de Itaara.
As ações do Projeto no eixo da Educação Ambiental, aproximou ain-
da mais a Fundação Mo’ã das escolas do município desde a pré-escola até
o ensino médio, as oficinas denominadas “Guardiões de Nascentes”, de-
senvolveram atividades de conscientização da importância do Patrimônio
Hídrico do Município, onde os participantes acompanharam as atividades de
80

recuperação de cinco nascentes do Arroio Manoel Alves a montante do lago


SOCEPE, com técnicas diferenciadas de recuperação. Cada nascente está
sendo monitorada, a jusante, por uma calha de medição de vazão e coleta
de amostras para a análise da qualidade da água. A comunidade tem partici-
pado das atividades de divulgação do resultado da restauração ecológica de
nascentes, também participaram da “Mostra de Cinema” onde foram traba-
lhados filmes, como o “lei da Água” com posterior debate de questões que
envolvem o gerenciamento da água.
Outra ação que envolveu a comunidade foi a execução do subprojeto
da Política de Resíduos Sólidos onde a comunidade mobilizada participan-
do do descarte de óleo de cozinha, em pontos de recolhimento previamente
divulgados para posterior reaproveitado, com o desenvolvimento de várias
oficinas, dentre elas a de fabricação de sabão.
Para a execução do Projeto a Fundação firmou parcerias com poder
público municipal/câmara de vereadores, Conselho Municipal de Meio
Ambiente – CONDEMA, Secretaria de Educação, Sociedade Concórdia de
Caça e Pesca – SOCEPE, Associação de Moradores do Parque Pinhal, além
de parcerias com proprietários Rurais do Município, Empresa de Assistência
Técnica e Extensão Rural do Governo do RS – EMATER, o que têm possi-
bilitado ações em defesa do meio ambiente no município de Itaara.
Destaca-se ainda a participação na gestão ambiental local como mem-
bro dos Conselhos Municipais de Meio Ambiente dos Municípios de Santa
Maria e Itaara, do Comitê de Bacias Hidrográficas dos Rios Vacacaí e
Vacacaí-Mirim, da Rede Municipal de Educação Ambiental de Santa Maria/
REMEA e do conselho Gestor do Parque Natural Municipal dos Morros.
A Fundação tem apoiado projetos de pesquisas na área da RPPN que
abordam: a interpretação da paisagem (apresentado neste livro), o estudo de
perfis de solo; a variação de elementos do Clima no Rebordo do Planalto;
Levantamento e Manejo de espécies exóticas; Definição florística. Além de
Estágios curriculares, trabalhos Acadêmicos de Graduação e Dissertações de
Mestrado de Programas do Pós-Graduação das Universidades Federais de
Santa Maria e do Pampa/ Campi São Gabriel.
Atualmente a Fundação trabalha na definição da zona de amortecimen-
to que terá como base o território da bacia hidrográfica do Arroio Manoel
Alves, que possui segmento de seu leito dentro da RPPN, outra ação será a
implantação do Conselho Gestor da RPPN Estadual MO’Ã, que dentre as
atribuições terá que: acompanhar a elaboração, implementação do Plano de
Manejo; buscar a integração com os gestores das unidades de conservação
e dos demais espaços territoriais especialmente protegidos no seu entorno,
neste caso, com a Reserva Biológica do Ibicuí-Mirim e o Parque Estadual da
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 81

Quarta Colônia, articulando-se ainda com o Corredor Ecológico da Quarta


Colônia; manifestar-se quando da consulta pública, sobre obra ou atividade
potencialmente causadora de impacto no Raio de Amortecimento; e propor
ações para compatibilizar, integrar e otimizar a relação com a população do
entorno da unidade. Destaca-se ainda a localização estratégica a Reserva
Particular do Patrimônio Natural Estadual MO’Ã / RPPN contribui na con-
solidação do Corredor Ecológico da Quarta Colônia.
Com objetivo de efetivar a RPPN e potencializar seus benefícios, o con-
selho Administrativo da Fundação MO’Ã aprovou, em parceria com a UFSM,
um Projeto para criar o Centro de Educação e Pesquisas Ambientais MO’Ã
– CEPA MO’Ã, com objetivo de desenvolver Estratégias de Comunicação e
Educação Ambiental, para que a sociedade perceba a necessidade e a oportu-
nidade das UCs enquanto espaços privilegiados para a conservação gerando
serviços ecossistêmicos como a produção de água, e manutenção da quali-
dade de vida.
Enfim, a Fundação tem se mobilizado na construção de parcerias com
sujeitos locais que militam na causa ambiental, principalmente os que resi-
dem na zona de amortecimento da Unidade, para que se tornem corresponsá-
veis pela manutenção da qualidade ambiental, beneficiando-se desta através
dos serviços ambientais.
82

REFERÊNCIAS

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225, §1º, inciso I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema
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CAPÍTULO 4
A EDUCAÇÃO AMBIENTAL
NAS TRILHAS DA ÁGUA:
interpretando o patrimônio natural da
RPPN Estadual MO’Ã em Itaara (RS)
Letícia Ramires Corrêa
Adriano Severo Figueiró

O grande desafio da humanidade nos dias de hoje é compreender sua in-


trínseca relação e interdependência com o meio natural. Assim como outras
civilizações romperam com os limites da resiliência dos sistemas naturais, com
gravíssimas consequências para o suporte da vida humana (DIAMOND, 2005),
de certa forma estamos hoje vivenciando uma crise socioambiental gerada pela
relação de exploração insustentável que estabelecemos com a natureza (LEFF,
2016). Ao distanciar-se da natureza por meio dos aparatos tecnológicos que
envolvem a civilização humana, a sociedade, em nome do desenvolvimento
econômico ilimitado, transgride o tênue equilíbrio dos sistemas biofísicos que
dão sustentação à civilização humana e nos encaminha de forma acelerada para
uma crise socioambiental sem precedentes (FIGUEIRÓ, 2016).
Por traz desta crise socioambiental está a crise de percepção, onde a hu-
manidade está se afastando da natureza e rompendo seus laços vitais com o
meio natural, o que implica a projeção de um desequilíbrio que parte da ecolo-
gia interna de cada indivíduo (CAPRA, 2002), passa pela ecologia social das
relações que se (des)constroem coletivamente (BOOKCHIN, 1979) e deságua
na extinção da vida e na perda de identidade e de serviços ambientais (WEIL,
1993). Isto desencadeia uma série de conflitos, o que nos leva a reconhecer que
fazemos parte do mesmo sistema que sustenta a vida, de tal maneira que, ao se
degradarem fisicamente as estruturas da natureza, compromete-se, também, a
estabilidade da sociedade. Assim, é preciso aceitar que os problemas atuais não
podem ser estudados e resolvidos de forma isolada, mas de forma sistêmica e
interdependente (CAPRA,1996). Nas palavras de Galeano (apud SÁNCHEZ;
SEGURA, 2017),

Creio que ainda não temos a consciência clara de algo que me parece
muito importante: é o fato de que os direitos da natureza e os direitos
humanos são dois nomes da mesma dignidade. Mais de cinco séculos
fomos oferecendo recursos naturais, concedendo em troca de nada,
86

recursos naturais que depois se vão. Se vão sem dizer adeus, sem dizer
sequer obrigado, deixando para trás imensas crateras, milhares de mor-
tos, nos sumidouros, nas plantações. Fantasmas, palácios vazios (p. 34).

Diante das transformações humanas nas paisagens naturais surge a ne-


cessidade da criação de medidas de gestão e planejamento que venham a
proteger e destacar as potencialidades paisagísticas que garantem as fun-
cionalidades ambientais sobre as quais edificamos a vida humana. Neste
sentido, a instituição de áreas protegidas visando à conservação das carac-
terísticas naturais é um dos principais instrumentos da Política Nacional
do Meio Ambiente e uma das estratégias do poder público para assegurar
a manutenção da qualidade ambiental e, consequentemente, da qualidade
de vida da população (KORMANN et al., 2010). Com isso se possibilita
uma reaproximação das comunidades com a natureza através da criação de
espaços protegidos (Unidades de Conservação) que permitam a (re)interpre-
tação ambiental, a fim de redescobrir o sentido da natureza na relação com o
humano, divulgando a conservação, preservando a vida e resgatando a ética
interespecífica antes perdida (DOUROJEANNI; PÁDUA, 2007).
Nesse sentido, a Reserva Particular do Patrimônio Natural Estadual
MO’Ã, localizada em Itaara/RS, contribui com uma área natural propícia
para uma interpretação ambiental dos processos envolvidos na estruturação
da Mata Atlântica brasileira, um dos patrimônios naturais mais ameaçados
atualmente no país e da dinâmica fluvial do arroio Manuel Alves. Nesta UC,
o visitante pode interagir e se apropriar do conhecimento sobre o patrimônio
natural que esta Reserva oferece.
Desta forma busca-se, através do presente texto, apresentar uma pro-
posta de trilha interpretativa desenvolvida para a educação ambiental na
RPPN Estadual MO’Ã, garantindo que seu patrimônio natural seja traduzido
a partir de uma linguagem adequada ao público que busca uma aproxima-
ção com a natureza e seus recursos, especialmente no caso das escolas do
município de Itaara, onde se localiza a UC. A interpretação aqui entendida,
representa a leitura e compreensão não apenas imediata da paisagem que
cerca o visitante, mas aquela capaz de despertar a curiosidade e emancipar o
indivíduo, a ponto de mudar suas atitudes perante o mundo.

1. A RPPN Estadual MO’Ã


Com uma área de 21 hectares, a RPPN Estadual MO’Ã possui biota, hidro-
grafia e variações topográficas relevantes, compondo, juntamente com outras
UCs, o Corredor Ecológico da Quarta Colônia, instituído em 2014 (figura 1).
A RPPN Estadual MO’Ã está localizada no município de Itaara/RS,
situada na encosta da Serra Geral, apresentando um relevo ondulado, com
vales íngremes devido ao entalhamento fluvial típico da Escarpa.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 87

Figura 1 – Localização da RPPN Estadual Mo’ã no contexto


do Corredor Ecológico da Quarta Colônia

Unidades de conservação presentes no Corredor Ecológico da Quarta Colônia

Legenda
Unidades de Conservação
PE Quarta Colônia
RB Ibicui Mirin
RPPN MO´Ã
Corredor Ecológico da 4º Colônia
Corredor
Zona de amortecimento
Zona de transição
Alvos de Conservação
Municípios abrangidos pelo Corredor
Fontes: SEMA, 2014
Fundação MO´Ã, 2013
Malha digital IBGE, 007
Org.: Weber, A. A. 2016

RPP
NE
stad
ual
MO
´Ã

Fonte: Adaptado de Instituto Curicaca (2016).

No Rio Grande do Sul, o Sistema Estadual de Unidades de Conservação


definiu a RPPN na categoria de Unidades de Proteção Integral; em função
disso, é permitido exclusivamente o uso para educação ambiental e pesqui-
sa, com objetivo de preservação a partir da construção de um conhecimento
sobre a natureza.
A área da RPPN Estadual MO’Ã é drenada pelo canal que compõe
a microbacia do Arroio Manuel Alves, que é um dos afluentes do Arroio
Grande, integrante da bacia hidrográfica do rio Vacacaí-Mirim, dentro da re-
gião hidrográfica do Guaíba. A dinâmica fluvial desta subbacia hidrográfica
é bem peculiar, por seus canais possuírem grande energia de transporte nas
porções de maior inclinação da vertente, o que facilita a ocorrência de rápi-
das enxurradas em períodos chuvosos (KORMANN et al., 2009), sendo que
“estas condições são verificadas nas porções de montante do canal fluvial,
88

onde as vertentes se apresentam mais encaixadas, situadas na parte norte da


área de estudo” (KORMANN et al., 2010, p. 28).
As proeminentes potencialidades da RPPN MO’Ã já vêm sendo explo-
radas do ponto de vista científico, abrindo espaço para pesquisas relaciona-
das à conservação do patrimônio natural da região central do Rio Grande do
Sul, especialmente a partir do Projeto Saúde da Água, desenvolvido entre
2014/2015 em Itaara. Este projeto da Fundação MO’Ã foi patrocinado pelo
programa Socioambiental da Petrobras, prevendo, dentre outras estratégias
de intervenção, a inserção na comunidade escolar do município, oferecendo
formações de professores, clubes de ecologia e despertando o interesse da
população em conservar os recursos naturais do município, nos capítulos a
seguir serão apresentados os resultados deste projeto.
A necessidade de um espaço natural protegido para a comunidade esco-
lar é outro elemento que justifica a importância da RPPN para o município
de Itaara, pois as quatro escolas que estão em funcionamento, sendo uma
de educação infantil (E.M.E.I. Gralha azul), duas de Ensino Fundamental
(E.M.E.F. Euclides Pinto Ribas e E.M.E.F. Alfredo Lenhadt) e uma de
Ensino Médio (E.E.E.M de Itaara), que totalizam 857 alunos (IBGE, 2015),
não possuem espaços naturais que propiciem contato dos alunos com a natu-
reza, ainda que haja uma grande demanda de projetos escolares envolvendo
a educação ambiental. Em função da dificuldade de acesso a áreas naturais
melhor preservadas, estes projetos acabam ficando carentes de um espaço
em que os alunos possam ter um contato direto com a natureza.
Diante disso, apresenta-se aqui uma sugestão de trilha interpretativa na
RPPN Estadual MO’Ã em Itaara/RS, com uma perspectiva didática e peda-
gógica, visando proporcionar aos estudantes uma experiência em primeira
mão relacionada à conservação da biodiversidade e às possibilidades de uso
sustentável da Mata Atlântica. No entender de Matarezi (2001),
Numa sociedade que supervaloriza a visão e é dominada pelas ima-
gens, deixamos em segundo plano os outros sentidos. Segundo
Kobayashi (1991), o elemento mais importante para a Educação
Ambiental é permitir às crianças “tocar” a real existência da nature-
za, pois as crianças raramente esquecem uma experiência direta. São
chamados “proto-experimentos” ou “experimentos de primeira mão”,
aqueles que propiciam vivências significativas a partir dos sentidos
básicos da percepção humana (visão, tato, paladar, olfato, audição e
reflexão) (p. 5).

Através desta proposta pretende-se contribuir para o uso sustentável


do Patrimônio Natural da Mata Atlântica e tornar a RPPN Estadual MO’Ã
num destino de referência de educação ambiental na região central do RS,
um espaço privilegiado para o desenvolvimento de ações de sensibilização,
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 89

além de oferecer suporte para desenvolvimento e execução de projetos de in-


vestigação científica, visando subsidiar o programa de uso público do Plano
de Manejo da RPPN.

2. Pensar e sentir a Paisagem

Na maioria das escolas o processo ensino-aprendizagem ainda conti-


nua sendo abordado de uma forma bastante tradicional, onde as disciplinas
são desenvolvidas de forma compartimentada, desvinculadas da realidade
e sem sentido prático, exigindo do aluno um excessivo esforço de memória
(AVILA et al., 2017). Porém, uma educação ambiental pensada nesses parâ-
metros, fragmentada e sem vínculo com a realidade, em nada acrescenta no
sentido da reaproximação do humano com a essência da vida. É somente a
partir da compreensão do todo, do contato com a realidade do mundo, que
poderemos discutir um novo projeto de sociedade e de futuro que, esse é o
papel que a educação ambiental deveria se propor a construir.
Este novo olhar sobre a vida e a ética das relações interespecíficas,
pressupõe ultrapassar as concepções mecanicistas e fragmentárias do conhe-
cimento, atingindo um grau qualitativamente superior na compreensão do
mundo, a partir da observação e compreensão de que todos os fenômenos
(incluindo aí a vida humana e seus valores culturais e tradições espirituais)
estão interconectados e são interdependentes.
Assim, da mesma forma que precisamos aprender o significado dos có-
digos da escrita para que possamos fazer a leitura e interpretação de um
texto, para decifrar a paisagem também é preciso, como salienta Razaboni
(2008), aprendizado que envolve o desenvolvimento de diversas habilidades
como a “observação atenta, indagação, comparação, descrição, identifica-
ção, análise e reflexão para se construir uma compreensão do mundo através
da paisagem” (p. 4).
Nesta perspectiva, a paisagem é mais que o visível, abrange o perceptí-
vel, o vivido, o abstrato. Há uma subjetividade nas relações da sociedade que
compõe as paisagens pelo mundo, pois, como afirma Spirn (1998) ao anali-
sar a “linguagem” da paisagem, “uma rosa raramente é apenas uma rosa; ela
carrega um significado acrescido através de séculos de poesia, pintura, arte
de jardins e rituais da vida cotidiana. E as rosas são ainda carregadas de no-
vos sentidos dados pela reformulação e combinação destes sentidos anterio-
res” (p. 216). Desta forma, a interpretação completa o estudo das paisagens
permitindo uma compreensão das relações sociais que o homem estabelece
com seu espaço físico.
90

Assim, as novas concepções de estudo do meio, nas quais se insere uma


educação ambiental crítica e transformadora, trouxeram não apenas mudan-
ças na forma de interpretar e valorar objetiva e subjetivamente a realidade
que nos cerca, como também o reconhecimento de que esta realidade com-
preende um todo integrado, “no qual a paisagem é uma dimensão concreta
espaço-temporal, envolvendo a integração estrutural e funcional da geosfera,
biosfera, tecnosfera e psicosfera, em um complexo sistema de interações
naturais e culturais” (GUIMARÃES, 2011, p. 142).

3. Unidades de Conservação: gestão da Paisagem no Brasil

Com o intuito de proteger espaços com Patrimônio Natural relevante,


buscaram-se medidas dentro da lei que assegurassem a preservação de to-
das as formas de vida e ambientes associados (THOMAS et al., 2011); para
isso foi criado o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC, Lei nº 9.985/2000) que busca estabelecer critérios e normas para a
criação, implantação e gestão das Unidades de Conservação (UCs) na esfera
nacional, estadual e municipal. As UCs são espaços territoriais que devido
suas características naturais relevantes visam à conservação do patrimônio
natural, sendo assim instituídas legalmente pelo Poder Público. Seu conceito
oficial está transcrito a seguir:
espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas ju-
risdicionais, com características naturais relevantes, legalmente ins-
tituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites
definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam
garantias adequadas de proteção (BRASIL, 2000).

O SNUC divide as UCs em duas categorias conforme seus objetivos


de proteção, as Unidades de Proteção Integral que são áreas que têm como
objetivo preservar a natureza admitindo-se apenas o uso indireto de seus
recursos naturais, estando protegidas de grandes interferências humanas; e
as Unidades de Uso Sustentável, que consistem em áreas que pretendem
conciliar a conservação da natureza com o uso sustentável de parte de seus
recursos naturais, permitindo-se a exploração destes de forma equilibrada
(THOMAS et al., 2010).
No caso do Rio Grande do Sul, tal como já se afirmou anteriormente, o
Sistema Estadual de Unidades de Conservação (SEUC) reconhece a catego-
ria de RPPN no grupo de proteção integral, com uso exclusivamente indireto
(SEUC, 1992). Com isso a RPPN Estadual MO’Ã sendo instituída em nível
estadual, enquadra-se no grupo de proteção integral, com uso indireto da sua
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 91

área, havendo apenas duas UCs nesta condição no estado do RS, a RPPN
MO’Ã e a Barba Negra (em Barra do Ribeiro). As atividades permitidas nas
RPPNs são a pesquisa científica e a visitação com objetivos turísticos, recre-
ativos e educacionais, conforme dispõe a legislação e seu Plano de Manejo.

4. Interpretação Ambiental: pensar, sentir e revelar

Há muitas definições sobre IA (Interpretação Ambiental) distribuídas


por diversas obras, porém, nos conceitos originais de Freeman Tilden, con-
siderado o primeiro grande pensador da IA, e que é citado sempre que este
tema entra em discussão, fica claro que a IA refere-se à tradução de forma
clara, precisa e de forma prazerosa da paisagem. Para isso, TILDEN (1957,
p. 3) esclarece que “O trabalho de revelar algo da beleza e do fascínio, da
inspiração e do significado espiritual que se escondem por trás do que o
visitante pode perceber com seus sentidos se chama interpretação”. Neste
mesmo sentido, Avanzi e Malagodi (2005, p. 96) salientam:
[...] interpretar seria procurar o sentido interno por detrás do que foi
expresso e, assim, projetar possíveis sentidos visando à compreensão.
No processo de interpretação está implicado também o traduzir em
algo compreensível um sentido estranho.

A IA representa um relevante componente de ligação entre a natureza e


o homem, favorecendo a construção de uma cultura de conservação do pa-
trimônio natural, que parte do sentimento de pertencimento, onde o visitante
percebe o quanto se é parte de um todo, deixando de lado uma visão há muito
tempo construída, de que a natureza está a serviço da humanidade, como
estoque de recursos naturais. Interpretação ambiental se constitui, desta ma-
neira, em um relacionamento de verdadeira imersão na natureza, nos quais
espera-se respostas sensoriais e afetivas intensas, a partir da observação da
paisagem sob diferentes formas pelos participantes das atividades ao ar livre,
trazendo um aprendizado sobre as relações do ser humano e a Terra, desper-
tando emoções e sentimentos (GUIMARÃES, 2010).
A paisagem aqui entendida como objeto da interpretação consiste em
um sistema composto de elementos interdependentes, naturais e culturais,
que fisicamente caracterizam uma área. Segundo Bertrand e Bertrand (2007,
p. 224), “a mais simples e a mais banal das paisagens é ao mesmo tempo
social e natural, subjetiva e objetiva, espacial e temporal, produção mate-
rial e cultural, real e simbólica”. Desta forma, traduzir a paisagem através
da Interpretação Ambiental, é considerar todas as suas dimensões, sociais,
econômicas e naturais. Parte-se do princípio de que em uma dada porção da
92

natureza a interpretação se dá a partir do contato direto com o recurso a ser


interpretado, com o intuito de proporcionar ao visitante novas experiências,
de conhecimento e sentidos a respeito do que está sendo interpretado, sendo
capaz de, no fim da interpretação, gerar opinião e ação a respeito daquela
paisagem (BROCHU; MERRIMAN, 2012). Ainda é Tilden que afirma: “o
principal interesse do visitante está naquilo que tocar sua personalidade, sua
experiência e seus ideais” (1957, p. 11).
Sendo assim a IA busca dar um sentido ao espaço experenciado pelo
visitante, como se fossem caminhos que o visitante percorre guiado por in-
terprete ou por algum meio interpretativo, que torne a atividade prazerosa,
significativa, organizada, provocante, diferenciada e temática (MORALES
MIRANDA, 2001). Para tanto, Tilden (1957) elenca seis princípios para
uma adequada interpretação da natureza:
I – Qualquer interpretação que não relacione, de alguma maneira, aquilo
que está sendo mostrado ou descrito com algo que faça parte da persona-
lidade ou da experiência do visitante será estéril. A compreensão sobre
aquilo que se experencia, parte do arcabouço de experiências e conhe-
cimentos que o visitante construiu na sua história de vida; portanto, não
pode ser algo estranho a sua própria compreensão de mundo.
II – Informação, como tal, não é interpretação. Interpretação é a revela-
ção baseada na informação. Mas elas são coisas inteiramente diferentes,
já que a interpretação pressupõe um espaço e um método de comunica-
ção daquilo que se sabe, o que exige um esforço de seleção, tradução
e expressão sensorial da informação. Ainda assim, toda a interpretação
inclui informação.
III – Interpretação é uma arte que combina várias outras artes, sejam os
materiais apresentados científicos, históricos ou arquiteturais. Qualquer
arte é ensinável em algum grau.
IV – O principal objetivo da interpretação não é a instrução, mas a provo-
cação, a capacidade de instigar o visitante para buscar mais, para retornar
àquele local novamente, para pesquisar sobre aquilo que o provocou.
V – A interpretação deve ter como objetivo apresentar um “todo” em lu-
gar de uma parte (o texto em seu contexto), e deve ser dirigida ao conjunto
das pessoas e não apenas a uma parte delas.
VI – Interpretação direcionada a crianças (até 12 anos) não deve ser uma
diluição da apresentação para os adultos, mas sim seguir uma abordagem
fundamentalmente diferente. Portanto, um programa interpretativo desti-
nado a crianças, deve ser construído do início e com linguagem própria, e
não ser um resumo mais simplificado da interpretação para adultos.

Tais características devem levar o indivíduo a perceber o mundo usan-


do os sentidos, buscando motivação para a observação do espaço, no qual
o homem está inserido e no enriquecimento das vivências pessoais, através
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 93

leitura da paisagem. O visitante deve sentir-se em um ambiente informal no


qual esteja voluntariamente participando e extrair toda a informação pos-
sível dos elementos da paisagem, podendo participar de cada momento da
interpretação, assim como transformar o momento de aprendizado em lazer,
para todas as idades (PROJETO DOCES MATAS, 2002).
Assim, a interpretação ambiental faz com que os visitantes em geral en-
tendam melhor a história da Terra para respeitar, valorizar e cuidar da natu-
reza e da cultura relacionada à paisagem; deve ser suficientemente sugestiva
para estimular o indivíduo a uma mudança de atitude ou a adoção de certa
posição ou conduta (SOUZA, 2014).
Em função disso é preferível transmitir as informações sem utilizar uma
linguagem muito técnica, a fim de construir um ambiente agradável ao vi-
sitante, sem interferir em momentos inoportunos, lembrando que a IA não
se limita a apenas transmitir informações e sim a traduzi-las ao visitante de
maneira agradável e instigante.
Portando a IA tem a intenção de caminhar para a proteção do ambiente,
contribuindo e estimulando para que o sujeito aja neste sentido. Partindo-se
do princípio de que não se pode criar uma consciência em alguém, e que
apenas o próprio indivíduo é capaz de construir a sua consciência a partir
de experiências vividas, a interpretação deve atuar no sentido de sensibilizar
o visitante, para a importância, a vulnerabilidade e as ameaças que pairam
sobre o patrimônio a ser conservado.
É então que a IA entra em ação através da conexão entre o visitante com
as ideias que estão sendo passadas a ele. Não há, por certo, resultados ime-
diatos, porém, há o despertar de sentimentos. Tal como afirma Silva (2012),
“[...] os intérpretes miram em resultados menos complexos, relacionados aos
sentimentos dos visitantes. Isto, porque o sentimento é um fator essencial
para o desenvolvimento do comportamento” (p. 19). É a partir destes sen-
timentos que irão surgir as atitudes, ou seja, busca-se através da IA que os
visitantes tenham o despertar do desejo de proteção à natureza, para que
futuramente ajam neste sentido.

5. Trilhas Interpretativas, como técnica para revelar os segredos


da natureza

Para além dos esportes de natureza, as trilhas tomam também um sen-


tido mais educacional e tornam-se aliadas da sustentabilidade por meio da
Interpretação Ambiental.
94

Para Hernandez (2004), “as trilhas interpretativas são uma ferramenta


educativa cuja principal finalidade é a de comunicar sobre o valor da conser-
vação do patrimônio cultural e da biodiversidade de nossas comunidades nas
diferentes regiões que recebem visitantes, permitindo um contato direto dos
visitantes com os valores sobre os quais se quer dar uma mensagem” (p. 2).
As experiências através das trilhas interpretativas e vivências na
natureza se constituem de relacionamentos de verdadeira imersão, ou seja,
buscam transportar o visitante a um espaço em que além de contemplar a
natureza possa aprender e respeitar o meio ambiente. Para tanto, a proposição
de uma trilha interpretativa requer um planejamento detalhado (figura 2),
a fim de que a qualidade da experiência do visitante possa estar à altura de
suas expectativas.
Figura 2 – Esquema metodológico para o planejamento,
desenho e operação das trilhas interpretativas

PROCESSOS FASES
Planejamento participativo

Diagnóstico do local
1. Planejamento participativo e
Delimitação da área da trilha diagnóstico da trilha

Inventário dos atrativos

Desenho e construção da trilha

Cálculo da Capacidade de Carga

Construção do plano interpretativo 2. Desenho da trilha


Sinalização

Mobiliário e sinalização especializada

Custo de investimento

Administração

Estratégias de comercialização 3. Operação da trilha

Monitoramento e manutenção

Fonte: Rueda García (2004).


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 95

É através destas trilhas que o visitante pode realizar a leitura da paisa-


gem, mas para isso requerem-se técnicas capazes de traduzir a linguagem
da natureza de forma que o público alvo consiga fazer uma leitura praze-
rosa e provocante da paisagem que o cerca, seja com a companhia de um
intérprete, seja com a mediação de instrumentos comunicativos (analógicos
ou digitais). Desta forma segundo Stransz et al. (2008), há três métodos de
Interpretação de Trilhas: autoguiada com painéis; guiada com a presença de
um interprete; autoguiada com roteiros ou folders.
No caso de trilhas interpretativas autoguiadas as informações podem
estar em folhetos (folder) ou em outros materiais, que permitem ao visitan-
te realizar sua interpretação. Dependendo do material do qual é feito, seu
custo pode ser baixo, havendo a possibilidade de o visitante levar o material
para casa.
Em vista disto, este trabalho apresenta uma proposta preliminar para
a delimitação de uma trilha interpretativa autoguiada utilizando-se de um
guia como técnica para interpretação do Patrimônio Natural da RPPN
Estadual MO’Ã.

6. O que quero revelar? O bioma Mata Atlântica na sua feição


de Mata Ciliar

O Bioma Mata Atlântica, já chegou a ocupar uma área com mais de


1 milhão de Km², correspondendo a 13,04% do território nacional, sendo
constituída principalmente por mata ao longo da costa litorânea que vai do
Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul. No entanto, esse bioma sofreu
uma supressão de mais de 75% de sua área natural (MMA, 2012). Conforme
dados do relatório de monitoramento do desmatamento nos biomas brasi-
leiros por satélite (MMA, 2012), este Bioma é Considerado um dos mais
importantes ecossistemas do mundo, pois a Mata Atlântica protege e regula
o fluxo dos mananciais hídricos que abastecem as principais metrópoles do
país e centenas de cidades; controla o clima local, garante a fertilidade do
solo e a extraordinária beleza de suas paisagens.
Hoje em dia, sua área original, antes grandiosa, encontra-se restrita a
alguns remanescentes já bastante fragmentados, vestígios do ecossistema
original que, embora aparentemente protegidos pela topografia acidentada
da serra do Mar, continuam sendo destruídos para reflorestamento de espé-
cies exóticas e extração de sua flora nativa. Uma das formações florestais
fundamentais da mata atlântica é a vegetação ciliar, caracterizada por estar
nas margens ou áreas adjacentes dos corpos d’água, sejam esses rios, lagos,
96

represas, córregos e várzeas; que apresenta em sua composição espécies típi-


cas, resistentes ou tolerantes ao encharcamento ou excesso de água no solo.
Essa vegetação recebe diversas denominações, como mata ciliar, floresta ou
mata de galeria, veredas, mata de várzea, floresta beiradeira, entre outras
(KAGEYAMA et al., 2002). De acordo com a Lei nº 12.651/2012, as matas
ciliares são definidas como Áreas de Preservação Permanente (APP’s), e
possuem grande importância para a preservação do meio ambiente.
Desempenham inúmeras funções ecológicas essenciais para a manuten-
ção da integridade ambiental, como a manutenção da qualidade e quantidade
da água, estabilização das margens dos rios contra processos erosivos, equi-
líbrio térmico das águas, conservação da biodiversidade, sequestro de car-
bono e também servem como corredores ecológicos (PIAIA; GIACOMINI;
ROVEDDER, 2015).

7. Leitura da Paisagem da RPPN Estadual MO’Ã na sua porção


de Mata Ciliar

A RPPN Estadual MO’Ã tem uma contribuição relevante para a con-


servação da natureza no município de Itaara, já que a presença de uma co-
bertura florestal contínua em bacias hidrográficas promove a regularização
do regime de rios e a melhora na qualidade da água produzida. Ainda assim,
as potencialidades desta UC ainda estão pouco exploradas na perspectiva
da Interpretação Ambiental, muito em função da recente instituição da área
como UC.
Assim, dada a localização estratégica da área, na média-baixa encosta
de transição entre a escarpa arenito-basáltica da Serra geral e a planície se-
dimentar da Depressão periférica sul-riograndense, onde as matas ciliares
desempenham um papel fundamental na regulação dos mecanismos hidroló-
gicos que controlam a evolução das vertentes, optou-se pela proposta de uma
trilha interpretativa com foco na apresentação da área da UC e na importân-
cia da mata ciliar na regulação dos processos naturais que ali ocorrem (fi-
gura 3). Esta proposta, assentada no âmbito de uma educação ambiental não
formal (definida pela Lei 9.795,04/1999) como “ações e práticas educativas
voltadas à sensibilização da coletividade sobre as questões ambientais e à
sua organização e participação na defesa da qualidade do meio ambiente”),
concorre, na linha do que propõe Pforr e Megerle (2006), para uma melhor
compreensão e aceitação das mudanças necessárias para um futuro sustentá-
vel de determinada região.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 97

Na parte de inventariação dos atrativos, foram elencados 6 pontos para


uma trilha autoguiada de 1,5 Km de extensão na porção da Mata Ciliar do
rio que faz divisa da RPPN Estadual MO’Ã com outra propriedade (qua-
dro 2). Em relação ao grau de dificuldade, a trilha proposta é considerada
Moderada, pois mesmo que o seu percurso seja inferior a 1.5 km, o des-
locamento exige um esforço físico moderado, apresentando pequenos obs-
táculos, como desníveis, pedras, troncos, riachos, embora não seja exigida
nenhuma técnica específica.
O meio interpretativo escolhido foi o folder (Figura 4), e o Guia práti-
co (Figura 5) pois a partir deles é possível descrever fatos ou informações,
utilizando técnicas que permitem, ao leitor não guiado, fazer a interpretação
do que se lhe apresenta. No entender de Moreira (2014), “os folders são
um meio de baixo custo e que podem conter os principais pontos onde seja
interessante realizar a interpretação ambiental. Podem também ser mais es-
pecíficos e abranger outros temas, além de conter mais informações do que
as disponíveis nos painéis interpretativos” (p. 105).
A trilha proposta tem a forma circular, possibilitando ao visitante voltar
ao ponto inicial sem cruzar pelo mesmo caminho.

Figura 3 – A Trilha do Arroio Manuel Alves localiza-se na porção sudoeste da


propriedade da RPPN Estadual MO’Ã, abarcando parte da Mata Ciliar do Arroio

6
5

Legenda:
1 O arroio Manuel Alves 4 A mata ciliar
RPPN Estadual MO´Ã Arroio Manuel Alves
2 Você está entrando em uma RPPN 5 Poço dos lambaris
Área de manejo Trilha Interpretativa
3 É nativa ou exótica? 6 Fungo do ar puro

Fonte: Corrêa (2016).


98

Quadro 1 – Descrição dos seis pontos inventariados para


promover a interpretação ambiental na trilha proposta

Ponto Coordenadas Interpretação Ambiental

Busque aguçar os seus sentidos, ouça o som do rio! Sinta o frescor da


Ponto 1: O água e a textura das rochas. Mas que rochas são essas? São basaltos!
(29°37’46.36”S /
Arroio Manuel Viste o tamanho das rochas? Chamamos de SEIXOS ROLADOS. Sabe
53°44’18.13”O)
Alves porque? A força do rio desloca rochas de tamanhos grandes e na corrente-
za são “lapidadas” pelo atrito com outras rochas e com água.

Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) é uma categoria de


unidade de conservação criada pela vontade do proprietário, sem desa-
propriação de terra. No momento que decide criar uma RPPN, o proprie-
tário assume compromisso com a conservação da natureza. Atividades
Ponto 2 recreativas, turísticas, de educação e pesquisa são permitidas na reserva,
Você está (29°37’46.44”S/ desde que sejam autorizadas pelo órgão ambiental responsável pelo seu
entrando em 53°44’17.95”O) reconhecimento (SNUC, 2000). A RPPN Estadual MO’Ã possui 21,02 ha
uma RPPN e foi instituída em 15 de junho de 2015, e tem por finalidade promover a
proteção dos recursos ambientais e a conservação da diversidade bioló-
gica. Esta área foi doada pelo casal Rainer e Eleonora à Fundação MO’Ã
Estudos e pesquisas para a Proteção e o Desenvolvimento Ambiental,
atual proprietária da área. A palavra MO’Ã significa proteger em tupi-guarani

Você já deve ter visto uma destas arvores. Porém sabe qual é nativa e
qual é exótica? Espécies nativas são aquelas naturais de uma determinada
região que, durante milhares de anos, vêm interagindo com o ambiente
Ponto 3
e, assim, passou por um rigoroso processo de seleção natural que gerou
Se a UVA é
(29°37’44.41”S/ espécies geneticamente resistentes e adaptadas ao local onde ocorrem. E
do-JAPÃO,
53°44’18.25”O) sobre as espécies exóticas que são aquelas introduzidas de outras regiões,
a Araucária
como de outro país, por exemplo, não sofreram esse processo de seleção
é da onde?
natural e, dessa forma, não servem de substituto ideal para a flora nativa,
uma vez que não desempenham as mesmas funções dentro do ecossiste-
ma (CAMPOS et al., 2006).

Chegamos no ponto principal da nossa trilha. Neste ponto vamos descobrir


“o que é” e qual a função da MATA CILIAR. Já imaginou nossos olhos
sem cílios? O que aconteceria? Todo e qualquer tipo de sujeira entraria em
Ponto 4 contato com nossos olhos, não é? O mesmo acontece com os rio, lagos,
Já imaginou (29°37’41.24”S/ córregos e lagoas, sem a MATA CILIAR.
nossos olhos 53°44’18.96”O) Em função disso neste ponto observa-se um arbusto característico de
sem cílios mata ciliar,o Sarandi (Colliguaja brasiliensisKlotzsch ex Baill.) encontrado
nas margens do recursos hídricos (FERRARESE, 2016).
Sarandi presente na RPPN MO’Ã. Possui importância por amenizar a
erosão. Indicado para o reflorestamento das margens de rios.

continua...
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 99
continuação

Ponto Coordenadas Interpretação Ambiental

O que veremos neste ponto vai além da beleza cênica! Sabe de onde
vem a água deste poço? Este poço é formado pelo extravasamento do rio.
Quando chove muito o rio extravasa seu leito, e inunda sua área de várzea,
que por sinal...
São elas que dissipam as forças erosivas do escoamento superficial de
Ponto 5
(29°37’40.39”S/ águas pluviais, funcionando como importantes controladores de enchentes
De olho no
53°44’19.84”O) e em época de chuva intensa forma pequenos córregos que deságuam no
poço!
Arroio Manuel Alves, caracterizando canais entrelaçados, típicos de zonas
montanhosas, com planície, formada a partir de depósitos coluvionares
sob constante retrabalhamento pela complexa rede de canais de menor
porte que são constantemente desativados/reativados de acordo com o
período chuvoso (KORMANN et al., 2009)

Última parada! Ar puro!


Neste ponto você terá a garantia de que esta Mata Ciliar é bem preservada.
Sabe porque? Pela presença destas e “manchas” rosas nos troncos das
arvores que são chamadas de liquens, que são seres vivos muito simples
que constituem uma simbiose de um organismo formado por um fungo e
uma alga; geralmente se proliferam nos substratos mais variados: sobre
rochas, solo, casca das árvores e madeira
Ponto 6 Assim como os Liquens as Bromélias são indicadores de qualidade do am-
(29°37’39.66”S/
Vai um ar biente. Esta é a Bromélia (Vriesea friburgensis) presente na RPPN MO’Ã.
53°44’22.07”O)
puro aí? Podem ser de diversos tipos como:
• Crostoso que é o caso deste ponto, onde o líquen fica preso no
substrato.
• folioso tomando uma forma de folha.
• fruticoso tendo a forma de um arbusto
O ar atmosférico puro é fator fundamental à sobrevivência dos liquens, assim
como bromélias, já que estes se alimentam da água presente do meio, fixan-
do elementos neles presentes (GONÇALVEZ, 2007 apud VICENTE, 2012)

Os seis pontos estabelecidos na RPPN para interpretação, foram dis-


postos no folder em formato de pétalas de uma flor que apresenta em um
dos lados a “provocação” interpretativa sobre o ponto e, no outro lado, a
explicação resumida daquilo que se propõe interpretar. O folder assim dis-
posto apresenta uma metáfora de que “a flor se abre para o conhecimento da
natureza” que envolve o visitante.
100

Figura 4 – O folder tem como objetivo ser um apoio para o visitante, guiá-lo
e oferecer mais autonomia ao visitante que fará sua própria interpretação

PARTE DE FORA DO FOLDER PARTE DE DENTRO DO


FOLDER

FOLDER FECHADO FRENTE FOLDER FECHADO VERSO

8 cm 8 cm
8c

8c
m

m
m

m
8c

8c
m

m
8c

8c
8c

8c
m

8 cm 8 cm

Fonte: Corrêa (2016).

Ao mesmo tempo, o guia de campo permite ao visitante mais curioso


complementar as informações que aparecem resumidas no folder, indicando
novos caminhos de investigação para as estruturas e processos observados
em campo.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 101

Figura 5 – O Guia Prático é um instrumento que busca através do seu conteúdo


traduzir a linguagem da natureza para o visitante, de maneira provocativa

Guia prático para a


Trilha do Arroio Manuel Alves

Trilha do Arroio Manuel Alves Ponto 1


Descubra os poderes
Esta Trilha oferece uma experiência deste rio!
fantástica de contato direto com a
natureza. Seu tema principal é a MATA Busque aguçar os
seus sentidos, ouça o
CILIAR, durante o percurso você som do rio! Sinta o
conhecerá elementos característicos frescor da água e a
desta mata, e suas deslumbrantes textura das rochas. Viste o tamanho das
paisagens. Mas que rochas são rochas? Chamamos de
essas? São basaltos! SEIXOS ROLADOS.
Você está pronto? Vamos lá!
Sabe por quê? A força
do rio desloca rochas
de tamanhos grandes e
na correnteza são
“lapidadas” pelo atrito
com outras rochas e
com água. Veja a figura:

Seixo Rolado presente na


RPPN Mo’Ã
102

Trilha do Arroio Manuel Alves

Legenda:
O Arroio Manuel Alves A Mata Ciliar
RPPN Estadual MO’Ã Arroio Manuel Alves
Você está entrando em uma RPPN Poço dos Lambaris
Área de Manejo Trilha Interpretativa
É nativa ou exótica? Fungo do Ar Puro

Ponto 2 A RPPN Estadual


MO’Ã possui 21,02 ha
Você está entrando em uma RPPN e foi instituída em 15
Reserva Particular do Patrimômio Natural de junho de 2015, e
(RPPN) é uma categoria de unidade de tem por finalidade
promover a proteção
conservação criada pela vontade do dos recursos
proprietário, sem desapropriação de terra. ambientais e a
No momento em que decide criar uma conservação da
RPPN, o proprietário assume compromis- diversidade biológica.
so com a conservação da natureza. Esta área foi doada
Atividades recreativas, turísticas, de pelo casal Rainer e
educação e pesquisa são permitidas na Eleonora à Fundação
reserva, desde que sejam autorizadas pelo MO’Ã – Estudos e
pesquisas para a
órgão ambiental responsável pelo seu Proteção e o
reconhecimento (SNUC, 2000). Desenvolvimento
Ambiental. A palavra
MO’Ã significa
“proteger” em
tupi-guarani.

Sabiá (Turdus rufiventris),


cafeeiro-do-mato (Psychotria
leiocarpa), Líquen.
Fonte: Acervo Fundação MO’Ã Fonte: Acervo Fundação MO’Ã
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 103

E sobre as espécies
Ponto 3 exóticas que são aquelas
Se a UVA é do JAPÃO, a Araucária é da onde? introduzidas de outras
regiões, como de outro
Você já deve ter visto uma país, por exemplo, não
destas árvores. Porém, sabe sofreram esse processo
qual é nativa e qual é exótica? de seleção natural e,
Espécies nativas são aquelas dessa forma, não servem
naturais de uma determinada A dispersão de H.
de substituto ideal para a dulcis ocorre por seus
região que, durante milhares flora nativa, uma vez frutos, carnosos ao
de anos, vêm interagindo com que não desempenham madurar, com sabor
o ambiente e, assim, passaram as mesmas funções doce e agradável. Em
função disso, as aves
por um rigoroso processo de dentro do ecossistema preferem seus frutos e
seleção natural que gerou (CAMPOS et al., 2006). não os das nativas.
espécies geneticamente
resistentes e adaptadas ao
local onde ocorrem.
A gimnosperma nativa Araucaria
angustifolia, conhecida como Araucária
é nativa do Rio Grande do Sul e
dominante nas partes elevadas do
Grande disseminação da Uva-do-Japão na RPPN MO’Ã
Planalto, podendo ocorrer na Serra do
Uva do Japão (Hovenia dulcis Thunb.), originária da China, Japão
Sudeste, e está presente na RPPN MO’Ã
e Coréias. Estes tipos de plantas produzem descendentes em
(FLORA DIGITAL, 2009). número muito elevado.

Ponto 4
Já imaginou nossos olhos sem cílios? Em função disso neste
ponto observa-se um
Chegamos no ponto principal da nossa trilha. arbusto característico de
Neste ponto vamos descobrir “o que é” e qual mata ciliar, o Sarandi
a função da MATA CILIAR. Já imaginou (Colliguaja brasiliensis
nossos olhos sem cílios? O que aconteceria? Klotzsch ex Baill.)
Todo e qualquer tidpo de sujeira entraria em encontrado nas margens
contato com nossos olhos, não é? O mesmo do recursos hídricos
acontece com os rios, lagos, córregos e (FERRARESE, 2016).
lagoas, se a MATA CILIAR.

Sarandi presente na
RPPN MO'Ã. Possui
importância por
amenizar a erosão.
Indicado para o
reflorestamento das
margens de rios.

Amparada pelo Código Florestal Federal como “área de


O nome “mata ciliar” vem do fato de serem tão importantes para preservação permanente” deve respeitar uma extensão
a proteção de rios e lagos como são os cílios para nossos olhos específica de acordo com a largura do rio, lago, represa ou
são como esponjas que absorvem a água da chuva e vão nascente (BRAGA et al., 2003). Como pode-se observar
liberando aos poucos para o rio. na figura.
104

Ponto 5 São elas que dissipam as forças erosivas do


De olho no poço! escoamento superficial de águas pluviais,
funcionando como importantes controlado-
O que veremos neste vai além da beleza res de enchentes e em época de chuva
intensa formam pequenos córregos que
cênica! Sabe de onde vem a água deste
deságuam no Arroio Manuel Alves, caracte-
poço? Este poço é formado pelo extrava- rizando canais entrelaçados, típicos de
samento do rio. Quando chove muito, o zonas montanhosas, com planície, formados
rio extravasa seu leito e inunda sua área a partir de depósitos coluvionares sob
de várzea, que por sinal... constante retrabalhamento pela complexa
rede de canais de menor porte que são
constantemente desativados/reativados de
acordo com o período chuvoso
(KORMANN et al., 2009).

(a) (b) (c)

Poço

(d) (e) (f)


(a) Escoamento restrito à calha principal do rio, poço com pouca
quantidade de água; (b) Início do extravasamento da calha; (c), (d), (e)
Extravasamento da calha inunda a planície; (f) Após a passagem da
cheia, acréscimo do volume de água no poço.

Ponto 6 Assim como os


Qual a fução do líquen? Líquens, as Bromélias
são indicadores de
Última parada! Ar puro!
qualidade do ambien-
Neste ponto você terá a
te. Esta é a Bromélia
garantia de que esta
(Vriesea friburgensis),
Mata Ciliar é bem
presente na RPPN
preservada. Sabe por
MO’Ã.
quê? Pela presença
destas “manchas” rosas Podem ser de diversos tipos, como:
nos troncos das árvores
que são chamadas de - Crostoso que é o caso deste ponto, onde o
líquens, que são seres líquen fica preso no substrato.
vivos muito simples que - Folioso tomando uma forma de folha.
constituem uma simbio- - Fruticoso tendo a forma de um arbusto.
se de um organismo O ar atmosférico puro é fator fundamental à
formado por um fungo e sobrevivência dos líquens, assim como
uma alga; geralmente se
bromélias, já que estes se alimentam da água
proliferam nos substra-
tos mais variados: sobre presente do meio, fixando elementos neles
rochas, solo, casca das presentes (GONÇALVEZ, 2007 apud
árvores e madeira. Árvore com presença de VICENTE, 2012).
líquen, na RPPN MO’Ã

A RRPN MO’Ã representa uma UC que conserva estruturas importan-


tes da Mata Atlântica capazes de regular os processos hidrológicos, edáficos
e de ciclagem de nutrientes na média encosta da escarpa da Serra Geral no
centro do estado do RS.
Desenvolver atividades de educação ambiental formal (com as escolas
do município de Itaara) e não formal (com a comunidade dos arredores)
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 105

representa uma oportunidade de divulgar o patrimônio paisagístico ali exis-


tente e estimular a sua conservação. Neste sentido, a proposição de uma
trilha interpretativa tendo como eixo central a bio-geodiversidade existente
na zona de mata ciliar do Arroio Manuel Alves, representa uma oportunidade
de interação pedagógica entre a sociedade e a natureza dentro da UC, afim de
divulgar a importância destas iniciativas.
Espera-se, com esta proposta, despertar e sensibilizar visitantes,
colaboradores, comunidade e professores quanto à importância da educação
ambiental como fonte de transformação do olhar sobre a natureza, evoluin-
do de um “baú de recursos” a espera de ser explorado, para um espaço de
complexidade da vida, a ser respeitado em nome de nossas necessidades co-
evolutivas. Para tanto, deve-se utilizar a educação ambiental como aliada na
orientação sobre a conservação e utilização racional dos patrimônios paisa-
gísticos a disposição dos visitantes. Assim, o repasse do conhecimento deve
ser facilitado, para que cumpra a sua função e possa alavancar processos
participativos que favoreçam a conservação da natureza e da vida (incluindo
a humana) dentro dela.
106

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CAPÍTULO 5
O GEOPATRIMÔNIO:
as quedas d’água do Município de Itaara

André Ademir Weber


Greice Kelly Perske da Silva
André Weissheimer de Borba

Impulsionada pelo Turismo de Balneários, Ecoturismo e Turismo de


Aventura, Itaara é conhecida como “Cidade dos Balneários”. Além da im-
portância recreativa, as águas presentes no território itaarense formam rios
que dessedentam grande parte da região central do estado.
A grande quantidade de rios somada a um relevo escarpado acabam
por formar castas de singular beleza. Em um levantamento preliminar rea-
lizado pelo Clube Trekking de Santa Maria (2008) foram encontradas mais
de 60 quedas d’água no município. Esse significativo número de cachoeiras
e cascatas aliado à proximidade de um considerável centro urbano como
Santa Maria torna o local atrativo para turistas que buscam a interação
com a natureza e a fuga da estressante rotina citadina. Afinal, observar a
água fluindo nos rios, ou apreciá-la nos lagos é uma atividade acessível e
agradável à população.
Essa busca da população por um contato mais próximo com a na-
tureza itaarense, principalmente no verão, acaba por gerar uma atividade
turística descontrolada, sazonal e onerosa às quedas d’água do município.
Considerando que os rios já estão ameaçados pela falta de saneamento
básicos no perímetro urbano e o uso desenfreado de agrotóxicos no campo
somada a atividade turística predatória, a conservação das quedas d’água
tem ainda mais importância pois elas propiciam um contato direto entre o
visitante e um valioso recurso natural: a água.
Dentro desse contexto, este capítulo busca apresentar as potenciali-
dades turísticas naturais de Itaara, traduzindo as características geológicas
e geomorfológicas responsáveis pela formação destes potenciais atrativos
turísticos hídricos e, finalizando com uma reflexão sobre geodiversidade,
geopatrimônio e geoconservação.
112

1. Potencialidades turísticas naturais de Itaara

Itaara se localiza em uma região de transição geomorfológica, entre o


Planalto Meridional Brasileiro e a Depressão Periférica Sul-rio-grandense, e se
destaca por uma riqueza natural passível de causar inveja a muitos municípios
cuja base da economia é o turismo. Apesar de Itaara ter sua base econômica
centrada na agricultura e na extração mineral de basalto (IENSEN, 2006), a
associação dessas paisagens em que predominam vegetação nativa, córregos e
cascatas naturais assegura áreas de lazer que possibilitam o desenvolvimento
de uma atividade turística efetiva (MARTINS, 1997).
Esses atributos garantem particularidades que acabam sendo atração para
visitantes e turistas, como, por exemplo, um clima mais ameno. A esse clima
mais serrano de Itaara, onde as temperaturas médias variam entre -3ºC e 10ºC
no inverno e 22ºC no verão, dá-se o nome de subtropical úmido (AYOADE,
2002), quer dizer, com chuva abundante em todos os meses do ano.
Uma pesquisa realizada por Baratto et al. (2015) aponta que em Itaara
chove mais se comparado com as áreas de menor altitude, como Santa Maria,
principalmente no inverno. Isso acontece, dentre outros motivos, em função
do relevo, pois as massas de ar polar encontram uma barreira natural (relevo),
causando chuvas orográficas no município.
Além do clima serrano, Itaara está inserida em uma área de transição
ecológica entre os Biomas Mata Atlântica e Pampa (FERRARESE, 2016).
O Bioma Mata Atlântica é definido pela vegetação florestal dominante e re-
levo diversificado, e ocupa toda a faixa continental leste brasileira e se es-
tende para o interior no sudeste e sul do país (IBGE, 2004), e seus remanes-
centes extremos geralmente são formados por zonas de transição ecológica
(ADEODATO, 2016).
As condições climáticas, aliadas a grandes remanescentes florestais, fa-
zem com que o município se torne um atrativo para turistas, e também para
moradores de cidades próximas que mantém em Itaara uma segunda residência,
tanto para veraneio quanto para o período de inverno (RECHIA, 2006).
A presença de uma grande quantidade de áreas com declividades supe-
riores a 45º fazem com que grande parte da área do município esteja em área
de preservação permanente de acordo com o Novo Código Florestal Brasileiro
(Lei nº 12.651/2012), pois os riscos de desastres ambientais e limitantes agríco-
las impostos pela alta declividade restringem o uso e a ocupação. Sendo assim,
Itaara contém extensas áreas de vegetação nativas preservadas em remanes-
centes florestais, além de abrigar duas unidades de conservação estaduais: a
Reserva Ecológica Ibicuí-Mirim e a Reserva Particular do Patrimônio Natural
(RPPN) MO’Ã (Figura 1).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 113

Figura 1 – Mapa de remanescentes florestais e Unidades


de Conservação presentes em Itaara

Mapa de Remanescentes Florestais e


Unidades de Conservação do município de Itaara - RS
Convenções Cartográficas

Legenda

Limite municipal
Reserva Biológica Ibicuí-Mirim
RPPN MO´Ã
Barragens e lagos
Área urbana
Remanescentes florestais

Escala: 1:150.000

Sistema de Coordenadas:
SIRGAS 2000 UTM ZONA 22S
Projeção: UTM
Datum: SIRGAS 2000

Meridiano Central: -51,000

Fonte: SOS Mata Atlântica, 2007

Organização: André Ademir Weber, 2017

Fonte: A. A. Weber, 2017.

Por conter remanescentes do Bioma Mata Atlântica e contribuir com a pro-


teção ambiental através de unidades de conservação, Itaara é uma área prioritária
para a conservação na região central do Estado, e juntamente com outras áreas
prioritárias para a conservação que apresentam remanescentes significativos de
Mata Atlântica integra o Corredor Ecológico da Quarta Colônia, reconhecido pela
Portaria nº43/2014 da Secretaria Estadual do Meio Ambiente.
As áreas de remanescentes florestais de Itaara estão aliadas a uma rica rede
de drenagem e, por sua posição de altitude, que varia entre 120 e 500 metros,
configura-se como uma espécie de “caixa d’água” da região central, pois as nas-
centes presentes em seu território acabam por formar rios que dessedentam grande
parte da região central do Estado.
O município é, portanto, um divisor de águas de importantes bacias hidro-
gráficas do Rio Grande do Sul: a do Ibicuí e a do Vacacaí-Mirim (Figura 2). A
nascente da bacia do rio Vacacaí-Mirim se encontra em terras itaarenses, enquan-
to a nascente da bacia do Rio Ibicuí se encontra na divisa de território com São
Martinho da Serra.
114

Figura 2 – Mapa hidrográfico de Itaara

Mapa Hidrográfico de Itaara - RS

Convenções Cartográficas
Legenda

Limite municipal
Ferrovia
BR-158
Barragens e lagos
Área urbana
Rede hidrográfica
Rios intermitentes
Rios perenes
Bacias hidrográficas
Ibicuí
Vacacaí - Vacacaí Mirim
Escala: 1:150.000
Sistema de Coordenadas:
SIRGAS 2000 UTM ZONA 22S
Projeção: UTM
Datum: SIRGAS 2000

Meridiano Central: - 51,000

Fonte: Base cartográfica digital - FEPAM, 2005

Organização: André Ademir Weber, 2017

Fonte: A. A. Weber, 2017.

Analisando a alta densidade de drenagem demonstrada na Figura 2,


pode-se considerar que Itaara possui cerca de 178 hectares de água em su-
perfície, incluindo vários açudes, tanto naturais quanto artificiais, rios, ar-
roios e barragens. Embora as barragens Saturnino de Brito e Val de Serra,
localizadas no rio Ibicuí, componham 1% da superfície de água sobre o total
da área municipal, nenhuma delas abastece Itaara, mas sim, abastecem Santa
Maria (MARTINS, 2005). Para o abastecimento de Itaara, a Companhia Rio-
Grandense de Saneamento (CORSAN) utiliza a água do Lago da Sociedade
Concórdia Caça e Pesca (SOCEPE).

2. Compreendendo a geologia de Itaara e sua influência na


Formação das Quedas d’água
No município de Itaara, de acordo com Nascimento (2010), encontram-se as
unidades morfoesculturais denominadas Porção Sul dos Planaltos e Chapadas da
Bacia do Paraná, Depressão Periférica Sul-rio-grandense e Rebordo do Planalto
da Bacia do Paraná. E a configuração desse relevo evoluiu a partir do terciário,
por processos erosivos associados aos climas úmidos, alternados por climas ári-
dos e semiáridos, processos que comandaram a esculturação da paisagem atual
(SARTORI, 2008).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 115

A partir da metodologia sugerida por Schirmer et al. (2013a, 2013b) foi


construído o mapa de compartimentação geomorfológica de Itaara (Figura 3),
apresentando quatro compartimentos: Associação de morros e morrotes, Colinas
Vulcânicas, Patamares entre escarpas e Rampa de depósito alúvio-colúvio de
arroios. É no compartimento Associação de Morros e Morrotes que se localiza a
maioria das cachoeiras do município. As altitudes variam entre 120 e 480 metros,
e há vertentes entalhadas que formam vales encaixados de encostas íngremes,
com um grande número de quedas d’água. As declividades superiores a 15%
restringem o uso e ocupação e, portanto, são áreas onde se tem a maior preserva-
ção da vegetação nativa. Destaca-se que estas áreas estão localizadas de sudeste
a sudoeste no município e são pouco utilizadas para as atividades econômicas
exercidas atualmente no município.
Figura 3 – Mapa de compartimentos geomorfológicos do
município de Itaara com imagens em detalhe
Mapa de compartimentos geomorfológicos
do município de Itaara - RS
53º49’30”W 53º46’0”W 53º42’30”W

Convenções Cartográficas

Legenda
Limite municipal

Compartimentosgeomorfológicos
29º30’30”S

I Associação de Morros e Morrotes


II Colinas Vulcânicas
III Patamares entre Escarpas
IV Rampa de depósito Alúvio-Colúvio de Arroio

Escala: 1:150.000
29º34’30”S

Sistema de Coordenadas:
SIRGAS 2000 UTM ZONA 22S
Projeção: UTM
Datum: SIRGAS 2000

Meridiano Central: - 51,000

Organização: André Ademir Weber, 2017


29º37’30”S

0 1 2 4 6 8
km

I II

III IV

Fonte: A. A. Weber, 2017.


116

Geologicamente, o território do município de Itaara está localizado na


Bacia Sedimentar do Paraná, constituída principalmente por rochas vulcânicas
(rochas que surgem a partir do resfriamento do magma expelido em forma
de lava por vulcões ou por fissuras na superfície terrestre) e arenitos (rochas
formadas por antigos depósitos de areia, que depois de compactados se tornam
rochas), e que se estendem por toda metade norte do Rio Grande do Sul.
O município está assentado quase em sua totalidade sobre duas forma-
ções relacionadas a Bacia Sedimentar do Paraná: Formação Serra Geral que
recobre Formação Botucatu.
A Formação Serra Geral é constituída por duas fácies: a Gramado for-
mada por basaltos que em afloramento ou expostas apresentam-se em cor
cinza escuro e estando frequentemente alteradas, quando assumem uma co-
loração marrom-avermelhada e a fácie Caxias que apresenta rochas vulcâni-
cas com cor cinza claro e cor de alteração branco ou castanho.
A Formação Botucatu constituída por arenito eólico de cor rosa aver-
melhada, granulometria media a fina e homogênea. Cabe salientar, ainda,
que existem pequenas áreas de afloramentos relativos à Formação Caturrita
no município (Figura 4).
A Formação Botucatu é resultado da grande desertificação do deserto
Botucatu, um dos mais extensos já registrados no planeta, e que existiu quan-
do o continente ainda era o Gondwana. Os extensos campos de dunas, deposi-
tados pela ação do vento, formaram os espessos pacotes de arenitos que hoje
constituem o sistema Aquífero Guarani, pois esse tipo de rocha apresenta uma
característica chamada porosidade, ou seja, existem muitos “espaços vazios”
entre os grãos de areia que compões a rocha e esses espaços com o tempo pas-
saram a ser preenchidos pela água e as rochas passaram a armazenar essa água.
O Aquífero funciona, então, como um alimentador das nascentes e dos rios
garantindo água aos mesmos durante todo o ano, o que torna Itaara conhecida
pela grande quantidade de nascentes, córregos, arroios e lagos.
A maior parte do município, porém, está localizada sobre a Formação
Serra Geral, originada por um enorme evento de vulcanismo ocorrido mui-
to depois do processo de sedimentação da Formação do deserto Botucatu,
há cerca de 120 milhões de anos. A Formação Serra Geral é composta
por uma série de derrames vulcânicos, intercalados com arenitos entre os
derrames vinculados à Formação Botucatu (CPRM, 2009), que vem a for-
mar o grande planalto meridional brasileiro e Itaara está localizada na bor-
da dessa formação, na chamada escarpa erosiva, onde a atuação dos rios
acabam formando vales entalhados entre morros, propícios a formação de
quedas d’água1.
1 Christofolleti (1981), conceitua as quedas d’água como locais onde a água do rio sofre uma queda subvertical, desco-
lando-se da rocha do leito, estando relacionadas a rupturas de declive decorrentes da oscilação do nível de base, e/ou
de processos litológicos ou tectônicos que alteram o perfil de equilíbrio. Classificam-se em cachoeira, salto, cascata ou
ainda catarata, conforme a quantidade de água e altura da queda.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 117

Figura 4 – Mapa geológico do município de Itaara com perfil


geológico-geomorfológico simplificado em detalhe

Mapa Geológico do Município de Itaara - RS

Formação
Litologia
geológica
Derrames de

Fácies Caxias
vitrófiro e

Formação Serra Geral


granófiro de
composição
riodácitica e
riolitica
Derrames de

Gramado
basalto e

Fácies
andesito,
soleiras de
diabásio

Formação Arenito médio


Botucatu a fino eólico

Arenito médio
a fino, com
Formação camadas de
Caturrita silitito argiloso
em direção ao
topo
Convenções Cartográficas
Legenda
Limite Municipal Corpos d´água
RFFSA Rios perenes
BR - 158
Escala: 1:150.000 Fonte: CPRM, 2009

Sistema de Coordenadas: GCS WGS 1984


Datum: WGS 1984

Organização: André Ademir Weber, 2017

Fonte: A. A. Weber, 2017.

Esses aspectos da geodiversidade não são exclusivos de Itaara, pois


ocorrem em boa parte do Rio Grande do Sul e do centro-sul do país. Esses
aspectos, porém, garantem uma grande beleza cênica e proporcionam o de-
senvolvimento de quedas d’água, principalmente nas escarpas relacionadas
ao derrame basáltico sobre os depósitos sedimentares da Formação Botucatu
118

(LUERCE, 2015), pois os mesmos apresentam potencial erosivo diferen-


cial, ou seja, uma rocha tende a erodir ou ser desgastada primeiro sob outra,
mas resistente e superior à primeira, como é o caso dos arenitos e basaltos
presentes em Itaara que vem ocasionar uma erosão remontante ideal para o
surgimento de quedas d’água.
As quedas d’águas podem se formar, ainda, por descontinuidades de
um mesmo maciço rochoso, como no caso da formação Serra Geral, como
falhamentos. Em Itaara os cursos d’água seguem uma orientação relacio-
nada a linhas de falhas ou fraturas de origem tectônica. Falhas ou fraturas
ocorrem em áreas onde as rochas são rígidas e resistentes às forças internas e
se “quebram” ao invés de “dobrar”, ou seja, formam rupturas ou fendas nas
extensões das rochas. Com isso, acontece o deslizamento entre as rochas,
formando um desnível no terreno (uma parte elevada e outra rebaixada),
responsáveis pelo surgimento de escarpas e vales.
A pesquisa de Rosa e Faccini (2005), que considerou a presença de
falhamentos na região, identificou fotolineamentos que foram reconhecidos
segundo sua extensão e orientação. As feições mais evidentes ocorrem no
planalto, sobre litologias vulcânicas da Formação Serra Geral. Em Itaara
ocorrem dois lineamentos tectônicos: o lineamento Ibicuí Mirim, ao lon-
go do rio Ibicuí-Mirim, e o lineamento Vacacaí-Mirim, ao longo do Arroio
Grande, desde a localidade de Três Barras, até sua confluência com o rio
Vacacaí-Mirim, e daí prolongando-se para sudeste. Essas estruturas tectô-
nicas acabam direcionando as águas fazendo com que coincidam com as
principais zonas de fraturas existentes nas rochas vulcânicas, propiciando o
aparecimento de quedas d’água.
Como resultado disso observa-se o aparecimento de quedas d’água no
município de Itaara. Ilustra-se algumas quedas existentes nas figuras 4 e 5, a
partir de uma imagem de satélite com a presença das quedas mais conheci-
das, as vias de acesso e a área urbana.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 119

Figura 5 – Mapa de localização das quedas d’água


do município de Itaara

Fonte: A. A. Weber, 2017.


120

Figura 6 – Principais quedas d’água do município de Itaara

Quedas d’água
1. Recanto da Vovó 1 2 3
2. 1ª Arroio Biriba
3. 2ª Arroio Biriba
4. Três Quedas
5. 1ª Arroio Taboão
4 5 6
6. 2ª Arroio Taboão
7. 3ª Arroio Taboão
8. 4ª Arroio Taboão
9. 5ª Arroio Taboão
10. Cascata Pozzobom 7 8
11. Cascata da Curva
12. Cascata do Banrisul
13. Cascata da Usina 10
14. 3ª Manuel Alves 9 11
15. 4ª Manuel Alves
16. 5ª Manuel Alves
17. 6ª Manuel Alves

12 14

13

15

16 17

Fonte: A. A. Weber, 2017.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 121

3. As Quedas d’água se constituem em patrimônio e merecem


ser protegidas?

No âmbito das geociências, o conceito de geodiversidade emergiu nas


décadas de 1990 e 2000, dentro de um movimento de aproximação entre a
geologia/geomorfologia e a conservação da natureza. Geodiversidade pode
ser definida como a “variedade natural de elementos geológicos (minerais,
rochas, fósseis), geomorfológicos (formas de relevo, processos ativos) e de
solo” (GRAY, 2004), ou seja, toda a fração abiótica da natureza. Nesse sen-
tido, constituindo-se de locais onde a água exerce processos – inorgânicos
e abióticos – de desgaste das rochas e de produção das formas de relevo, as
quedas d’água (cataratas, cascatas, cachoeiras, saltos, corredeiras) podem
ser consideradas, sem qualquer ressalva, elementos da geodiversidade.
Todos os elementos da geodiversidade apresentam uma série de valores
(GRAY, 2004; BRILHA, 2005), incluído aí o valor intrínseco, de existência,
que toda ocorrência da natureza (biótica ou abiótica) possui pelo simples
fato de existir. Os demais valores são ligados a alguma atividade humana ou
processo natural: (1) o valor estético, ligado à substancial beleza cênica das
quedas d’água, que sempre valem uma fotografia, e é primordial na cons-
trução de seu potencial turístico; (2) o valor cultural, principalmente para a
religiosidade das comunidades de matriz africana (BRAGA; MACHADO,
2013) ou, ainda, como símbolo local ou elemento formador da toponímia;
(3) o valor funcional humano, relacionado ao uso das quedas d’água para di-
ferentes esportes de aventura (cascading, canyoning, psicobloc etc.) ou sim-
plesmente como local de recreação e banho; (4) o valor funcional ecológico,
ligado ao desenvolvimento e manutenção de espécies vegetais ou animais,
sobretudo das florestas higrófilas, devido ao microclima úmido que se forma
em torno de uma queda d’água; (5) o valor científico, relacionado ao próprio
entendimento dos processos geomorfológicos que formam as cascatas e que
desenham as vertentes; e (6) o valor educativo, vinculado ao potencial das
quedas d’água como elemento na educação geopatrimonial e ambiental.
O somatório de todos esses valores permite, também, considerar as que-
das d’água como elementos dotados de status patrimonial, desde o âmbito
local até a escala mundial. Cataratas como Iguaçu (Brasil), Niágara (EUA-
Canadá), Vitória (Zâmbia-Zimbábue) ou o Salto Angel (Venezuela) podem
ser consideradas patrimônio da humanidade, inclusive com reconhecimento
oficial da UNESCO, e destinos turísticos com afluxo monumental de turis-
tas. No Rio Grande do Sul, boa parte dos parques nacionais e estaduais inclui
quedas d’água em seus limites, como no caso da Cascata do Caracol, em
122

Canela, ou do Salto do Yucumã, em Derrubadas. Também no âmbito local,


as quedas d’água merecem ser consideradas um elemento do geopatrimônio,
pela grande importância que a comunidade do entorno e, também, eventuais
visitantes/turistas, atribui a essas ocorrências da geodiversidade.
Da necessidade de proteção do patrimônio associado a geodiversidade
é que surge a Geoconservação. Segundo Brilha (2005), a Geoconservação
tem como objetivo a conservação e gestão do patrimônio geológico e dos
processos naturais a ele associados. Para o autor a geoconservação tem como
objetivo a utilização e gestão sustentável de toda a Geodiversidade, uma
vez que grande parte das ameaças à biodiversidade e à geodiversidade está
associada às atividades antrópicas, sendo importante ter um equilíbrio entre
o uso da geodiversidade e a sua conservação.
A Geoconservação surge, assim, das diversas ameaças a que está sujeita
a Geodiversidade (BRILHA, op. cit.): exploração de recursos geológicos,
desenvolvimento de obras e estruturas, má gestão de bacias hidrográficas,
florestação, desflorestação e agricultura, atividades recreativas e turísticas e
colheita de amostra geológicas para fins não científicos.
Dentre as ameaças ao patrimônio geológico listadas por Gray (2004)
as que estão diretamente ligadas aos rios e quedas d’água são o desenvol-
vimento e expansão urbana, contribuindo para a poluição dos mananciais
e alteração de sistemas de drenagem, as obras de engenharia para a gestão
hídrica que podem alterar processos fluviais importantes, o florestamento
e desmatamento, as atividades agropecuárias que utilizam agrotóxicos, a
pressão turística e recreativa e a ausência de conhecimento geocientífico e a
falta de informação sobre os valores da geodiversidade, em Itaara isto está
expresso no vandalismo na forma de pichação presente em algumas cascatas
mais visitadas.
Então as atividades que visam conservar/proteger as quedas d’água
podem ir muito além da conservação do geossítio utilizando a água como
elemento integrador pode-se ampliar o leque de possibilidades a serem tra-
balhadas. As quedas e os rios por serem ambientes dinâmicos, grande parte
das ameaças não estão, necessariamente, presentes no entorno dos geossítios
e estão diretamente ligadas ao modo de vida cotidiana dos visitantes em
relação a água.

Considerações finais

Embora Itaara tenha uma vocação natural e tenha investido no slogan


“cidade dos balneários” para o desenvolvimento do turismo, essa atividade
ainda não representa uma relevância econômica para o município. Porém,
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 123

esse investimento tem tido consequências positivas para a imagem de Itaara,


que já tem uma identidade própria e é regionalmente reconhecida por suas
potencialidades turísticas naturais. Por isso, Itaara precisa definir estratégias
que busquem aproveitar as potencialidades da diversidade turística do mu-
nicípio e apoiar programas e atividades relacionadas ao turismo sustentável.
É preciso ficar claro que a estratégia de turismo adotada em Itaara não
necessariamente seguirá os moldes das regiões turísticas tradicionais, como
Gramado e Canela, por exemplo, pois o município possui um produto turísti-
co diferenciado: o meio ambiente natural. Isso exige alternativas de turismo
que sejam adequadas as características da região, ou seja, que impactem
negativamente o mínimo possível as belezas naturais, que é o produto que
Itaara oferece aos turistas.
Quer dizer, Itaara precisa realizar esforços para a utilização recreativa
e educativa sustentável do patrimônio natural. É nesse contexto que entra a
geoconservação e o geoturismo, buscando promover a geodiversidade e o
patrimônio geológico do território, constituindo uma importante ferramenta
para a sua divulgação e conservação, e induz um desenvolvimento socioeco-
nómico local de matriz cultural e ambientalmente sustentável.
Enfim, é de fundamental importância o incremento imediato de estra-
tégias de desenvolvimento que compreendam o levantamento detalhado
dos recursos naturais existentes, afim de que possam ser explorados de for-
ma planejada, para que o uso excessivo não cause impactos negativos ao
meio ambiente.
124

REFERÊNCIAS

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Mata Atlântica, 2016.
AYOADE, J. O. Introdução à Climatologia para os Trópicos. Rio de
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Precipitação Pluviométrica no Período Veranil e Invernal de 2013/2014 na
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v. 37, n. 4, p. 577-593, set./dez. 2015.
BRAGA, Liliane Rodrigues de Oliveira; MACHADO, Maria Márcia
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como instrumento de valorização e conservação da geodiversidade cultu-
ral. In: II SIMPÓSIO BRASILEIRO DE PATRIMÔNIO GEOLÓGICO.
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com/Material%20didatico/Anais_completo_IISBPG.pdf>. Acesso em: 23
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A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 125

GRAY, M. Geodiversity: valuing and conserving abiotic nature.


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lógicas em municípios da Quarta Colônia do Rio Grande do Sul. Geografia
Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 17, n. 2, p. 199-212, maio/ago. 2013.
CAPÍTULO 6
A CONTRIBUIÇÃO DA EDUCAÇÃO
AMBIENTAL PARA A CONSERVAÇÃO
DA SAÚDE DA ÁGUA EM ITAARA (RS)1
Adriano Severo Figueiró

Dentre todos os recursos naturais que o imaginário da sociedade julga


dispor livremente neste planeta, a água é, de longe, o mais estratégico para
a sobrevivência da própria espécie humana. No entanto, após mais de cinco
mil anos de evolução da vida humana em sociedade neste planeta, ao mesmo
tempo em que testemunhamos os avanços mais inimagináveis no campo da
ciência e da tecnologia, cerca de 1 bilhão de pessoas ainda não têm acesso
à água potável, e pelo menos 2 bilhões não conseguem água adequada para
beber, lavar-se e comer.
Com a consolidação dos avanços do capitalismo industrial ao longo do
século XX, a “bomba populacional” da espécie humana multiplicou por qua-
tro o número de habitantes da Terra (de 1,5 bilhões de habitantes em 1900
para 6 bilhões no ano 2000), mas foi o crescimento acelerado da economia,
cujos resultados estiveram sempre monopolizados por um universo muito
restrito desta população, que fez com que o uso da água se multiplicasse por
nove (McNEILL, 2000), mesmo que a ideia de sustentabilidade nunca tenha
sido repetida de forma tão insistente como neste período e que o número de
“técnicos” ambientais não pare de crescer no mercado.
Vivemos um paradoxo civilizatório que nunca pareceu tão preocupante
e constrangedor para a sociedade contemporânea, ao menos desde os anos
iniciais da Revolução Industrial. Um mundo que desenvolve tecnologias
para extrair petróleo a mais de sete mil metros de profundidade da crosta
terrestre, ainda é incapaz de evitar que a cada 19 segundos uma mãe perca
o seu bebê por doença relacionada à água em algum lugar distante ou, até
mesmo, dentro dos grandes centros urbanos. Ao mesmo tempo, a restrição
no acesso à água está forte e negativamente relacionada à renda per capita,
1 Seria quase impossível falar de um projeto tão exitoso sem agradecer àqueles que, de fato, transformaram o Saúde da
Água de um projeto acadêmico em uma prática emancipadora que dialogou com a vida de um município inteiro. A vocês,
Luciane Belmonte Chami, Ivone da Silva Rodrigues, Olímpio Rafael Cardoso, Elis Helene de Andrade Deon, Marina
Deon Ferrarese, Renata Azevedo Xavier, Greice Perske da Silva, André Ademir Weber, Letícia Ramires Correa e Bruna
Camila Dotto, minha mais profunda admiração e agradecimento por toda a energia que vocês souberam e quiseram
colocar neste projeto.
128

pois, cerca de dois terços das pessoas que não dispõem de água para suas
necessidades básicas vivem com menos de US$ 2 por dia (SACHS, 2008).
Isso, em um cenário no qual, segundo relatório da Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), se estima que as
reservas hídricas globais possam encolher 40% até 2030 (UNESCO, 2015)
em função das transformações no uso da terra e das mudanças climáticas.
Uma redução de oferta de água que é fisicamente incompatível e assustadora
frente à estimativa de que a demanda aumente 55% até 2050, o que enca-
minha para um inevitável acirramento dos conflitos relacionados à água nas
próximas décadas (WELZER, 2016).
No entanto, frente aos 10 milhões de quilômetros cúbicos de água que
transitam entre a atmosfera e a terra, em ciclos de evaporação e precipitação,
estas estimativas apontam muito mais para uma crise global de governança
da água do que propriamente para uma crise de disponibilidade de recurso
hídrico; apenas nas últimas décadas o consumo de água cresceu duas vezes
mais do que a população mundial. Contaminação de aquíferos, impermeabi-
lização de áreas de recarga, falta de proteção de nascentes e matas-galeria,
expansão descontrolada de áreas agrícolas com produção de sedimentos e
assoreamento de canais, desperdício de água na irrigação e no abastecimento
urbano mal planejados, alteração de canais e de regimes hídricos e privatiza-
ção de mananciais são alguns dos elementos que definem um quadro bastan-
te complexo para as próximas décadas.
No Brasil, em que pese a abundância total dos recursos hídricos em ter-
ritório nacional, a sua distribuição irregular somada à criação de um rentável
e cada vez maior mercado da água e a uma cultura da má gestão (38,1% da
água tratada no Brasil é desperdiçada segundo o Ministério das Cidades –
BRASIL, 2018), acende todos os sinais de alerta. Este quadro, dentro de um
projeto de desenvolvimento em que mais de 70% da água doce utilizada é
controlada pelo agronegócio, cria uma produção social da escassez hídrica
no campo, atrelando a formação da cidadania à condição de uma seletiva
categoria econômica de produtividade (CHÁVEZ et al., 2017).
A mudança progressiva na concepção acerca dos mecanismos de acesso
aos recursos hídricos, do direito universal de uso de um patrimônio compar-
tilhado à uma mercadoria cuja circulação é mediada pelas relações de mer-
cado, define uma mudança substancial na proteção e conservação da água;
isto, em última instância, coloca em risco a sobrevivência da própria espécie
humana na Terra, na medida em que nos pautamos pelas características da
demanda sem levarmos em conta os limites da oferta.
É exatamente este o contexto que sustentou a entrada da Educação
Ambiental como um eixo transversal estratégico dentro do Projeto Saúde da
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 129

Água, financiado pela PETROBRAS Socioambiental (figura 1). A despeito


de todas as “engenharias verdes” que hoje concorrem para solucionar os
conflitos socioambientais envolvidos na crise da água, a construção deste
subprojeto partiu da ideia de que a superação desta forma de pensamento
destruidora (de natureza e de seres humanos), assentada na competição, no
economicismo, na acumulação de bens, na aceleração do tempo e na anu-
lação da diversidade, certamente não será resolvida a partir das soluções
tecnológicas, mas, antes de tudo, a partir do processo educativo; de uma
educação capaz de superar a prisão dos conteúdos disciplinares em busca
da transversalidade do conhecimento e da valorização da vida, das atitudes
cooperativas, do contato com a natureza, da preocupação com o outro, da
valorização dos espaços e decisões coletivas, do tempo da contemplação e
da reflexão.
Esta é a verdadeira transformação que poderá garantir uma alternativa
de futuro para todos: ao transformarmos o indivíduo, transformamos o mun-
do! Corroborando com esta perspectiva, Reigota (1997) afirma que “a edu-
cação, seja formal, informal, familiar ou ambiental, só é completa quando a
pessoa pode chegar nos principais momentos de sua vida a pensar por si pró-
prio, agir conforme os seus princípios, viver segundo seus critérios” (p. 45).
Tendo essa premissa básica como referência, este subprojeto buscou pen-
sar a Educação Ambiental como um processo de formação dinâmico, perma-
nente e participativo, no qual as pessoas envolvidas passassem a ser agentes
transformadores da sua própria realidade, participando ativamente da busca de
alternativas para a redução dos conflitos e para o controle social no uso da água
no município de Itaara, um território cujo patrimônio hídrico ainda representa
um dos elementos estruturadores da qualidade de vida que ali se observa.

1. A base da ação educativa: o papel das escolas no


desenvolvimento do projeto

A base de desenvolvimento de todo o projeto foram cinco escolas sele-


cionadas do município de Itaara: Escolas Municipais de Ensino Fundamental
Santos Dumont e Tiradentes, Escola Municipal de Ensino Infantil Gralha
Azul, Escola Vovô Orion e Escola Estadual de Ensino Médio. Quando nos
referimos à “base do projeto”, é por entendermos a escola como muito mais
do que um espaço de aprendizagem formal para os jovens. A escola é uma
referência no processo de organização da comunidade, pois permite que as
famílias se encontrem e participem no processo de discussão e transforma-
ção da realidade local.
130

Nesse sentido, um desafio para as escolas que assumam o seu verdadei-


ro papel de formação de cidadania é criar, disponibilizar e manter espaços
de diálogo, em que se produzam e articulem conhecimentos e saberes que
promovam o envolvimento da comunidade escolar na busca de formas pró-
prias de atuação diante dos desafios cotidianos. Espaços que possibilitem
conhecer melhor a escola e as pessoas com ela comprometidas, seus proble-
mas e necessidades, sonhos e desafios, tudo feito num clima de respeito e
valorização do potencial transformador existente em cada um.

Figura 1 – Fluxograma de organização dos subprojetos do Projeto


Saúde da Água, com destaque para o eixo de Educação Ambiental
como um tema transversal aos três outros subeixos do Projeto

SAÚDE DA ÁGUA
UM PROJETO DA FUNDAÇÃO MO’Ã

SUBPROJETOS

POLÍTICA DE
RESÍDUOS / DESCARTE
DE ÓLEO DE COZINHA

RESTAURAÇÃO FLORESTAL
EM PROPRIEDADES RURAIS
MATAS CILIARES E
NASCENTES

MONITORAMENTO QUALI-
QUANTITATIVO DOS RECURSOS
HÍDRICOS

EDUCAÇÃO
AMBIENTAL

Que futuro eu quero para o local onde eu vivo e para a minha


comunidade? Quais são as dificuldades para alcançarmos este futuro? É im-
portante dialogar sobre estas questões dentro da escola, falando e ouvindo
o que nossos interlocutores têm a dizer, planejando passo a passo todo o
processo a ser vivenciado. Esse diálogo fez emergir os desafios e evidenciou
os limites na capacidade de agir diante de obstáculos superiores aos que
conseguirmos mobilizar.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 131

Assim, buscou-se fazer com que a educação ambiental desenvolvida no


projeto representasse uma vivência prática dos indivíduos com o ambiente
que os cerca, descobrindo nosso impacto sobre a teia ecológica do planeta
e nosso potencial de restauração das relações (ecossistêmicas e humanas).
As experiências são sempre fundamentais para conseguir o encantamento
e o envolvimento dos estudantes com as questões da escola, com a Terra e
com toda a vida que nela existe. Diante disso, esperava-se que essa vivência
também ajudasse os estudantes a transformarem o seu ambiente social, bus-
cando a sustentabilidade não apenas na relação com as diversas estruturas
da natureza, mas na sua forma se relacionar no e com o mundo. Acima de
tudo, a equipe envolvida no projeto sempre teve como princípio de ação que
todas as relações (de degradação ou de conservação) que desenvolvemos com
a natureza são mediadas pelas relações que estabelecemos com os demais
seres humanos (figura 2).
Nestes termos, ao se transformar em um espaço educador sustentável,
a escola passa a estimular um processo de Ecoalfabetização, que envolve
a compreensão dos princípios básicos da sustentabilidade, sendo capaz de
refleti-los na vida diária das comunidades humanas.
A escola educadora sustentável é capaz de dar o testemunho cotidiano
de alternativas construtivas de atitudes ambientalmente mais racionais (re-
dução do consumo, economia de água e energia, reutilização de materiais
etc.). Porém, acima de tudo, ela é o espaço de diálogo e de partilha de co-
nhecimentos comprometidos com o fortalecimento da capacidade de cada
pessoa de realizar os seus sonhos e de enfrentar seus desafios, com cuidado e
respeito ao ambiente, na geração atual e nas futuras. Este é o desafio educati-
vo enfrentado pelo Projeto, já que, como afirma Novo (2003): “sempre acre-
ditei que educar, mais do que ensinar, é ajudar a repensar o mundo” (p. 19).
Assim, é imperativo que a educação ambiental nesta escola sustentável
coloque o conhecimento da biologia, da matemática, do português, da geo-
grafia, da história e das artes à serviço da compreensão dos problemas que
cercam os seus alunos em diferentes escalas de interferência da e na vida hu-
mana; e que o faça a partir da investigação prática, encorajando os estudantes
a estabelecerem um olhar crítico capaz de buscar as relações, os interesses
e as possibilidades de solução para os problemas que forem identificados.
Ainda que sejam nobres as intenções, não se pode desconhecer as enor-
mes dificuldades para implementar os princípios acima descritos no contexto
das escolas públicas de hoje, tanto no que se refere a infraestrutura, mate-
rial humano, currículo ou mesmo contexto social de origem dos estudantes.
Desenvolver um processo de educação ambiental emancipatória na escola de
hoje, capaz de desvelar e fazer frente as estratégias mais atuais do modelo
132

produtivo e cultural que hegemoniza a nossa sociedade, é uma das tarefas


mais difíceis e mais desafiadoras para a construção de um futuro em que os
seres humanos ainda possam estar ocupando este planeta com algum grau
de humanidade (FIGUEIRÓ, 2016). Efetivamente são os seres humanos que
nos preocupam, e não a natureza. Esta, enquanto categoria ontológica, existe
a mais de quatro bilhões de anos e continuará a existir pelo menos enquanto
durar a existência de nossa estrela solar.
Figura 2 – Esquema de representação da relação sociedade-natureza mediada
pelas relações que se estabelecem entre os seres humanos. Parte-se da ideia
de que não é possível se pensar em uma relação de harmonia com a natureza
enquanto não estivermos agindo na construção de um melhor equilíbrio social

Fonte: Adaptado de Santos e Sato (2001, p. 42).

Portanto, avançar no sentido da construção de um projeto educativo


que se proponha efetivamente a fazer alguma diferença na comunidade onde
ele é desenvolvido, significa se bater com pelo menos três desafios brutais a
serem superados: um desafio ético, um desafio teórico-metodológico e um
desafio político.
Do ponto de vista do desafio ético, há que se desdobrar um duplo en-
frentamento, o da ética social e o da ética ecológica. No que se refere à ética
social, precisamos compreender que nenhuma construção de futuro susten-
tável poderá ser feita a partir da fragmentação e da individualidade em que
a base cultural de nossa sociedade (e a escola dentro dela) foi lançada. Tal
como dizia Paulo Freire, “conhecer, que é sempre um processo, supõe uma
situação dialógica. Não há estritamente falando um ‘eu penso’, mas um ‘nós
pensamos’. Não é o ‘eu penso’ o que constitui o ‘nós pensamos’, mas, pelo
contrário, é o ‘nós pensamos’ que me faz possível pensar” (FREIRE, 1981,
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 133

p. 71). Assim, educar sobre o que é o homem e como ele se constitui coleti-
vamente, é a primeira das tarefas da educação ambiental.
É preciso, como afirma Novo (2003), criar uma “solidariedade
sincrônica” no tempo histórico, que permita que as pessoas reaprendam a
cooperar, a respeitar as diferenças e construir com elas. Afinal, “estamos na
era planetária; uma aventura comum conduz os seres humanos, onde quer
que se encontrem. Estes devem reconhecer-se em sua humanidade comum
e ao mesmo tempo reconhecer a diversidade cultural inerente a tudo que é
humano” (MORIN, 2000, p. 47).
Esta é uma capacidade que tem se reduzido de forma sistemática na
medida em que avançamos na modernidade reflexiva; o processo de tecni-
ficação da vida e “coisificação do mundo” (LEFF, 2001) tende à individua-
lidade e ao isolamento. O computador pessoal, o celular individual, o carro
particular, as várias televisões dentro de casa para que cada um possa assistir
o seu programa, a possibilidade de se comprar uma programação televisiva
individual, a redução dos espaços e rituais coletivos e a construída falta de
tempo e de paciência das pessoas para com estes rituais, são exemplos de
elementos que comprometem enormemente a capacidade de organização e
de intervenção dos seres humanos na construção do seu futuro. Logicamente
que este é um mecanismo que interessa diretamente ao modo de produção
dominante, já que desarticula o potencial coletivo de organização da socie-
dade e a torna refém das decisões dos gestores do sistema.
Então, a escola, enquanto espaço de construção de um “homem novo”,
precisa oportunizar esta experiência revolucionária e radical (porquanto incita
um retorno às raízes da própria humanidade e sua evolução) da socialização.
E nesse caso, não podemos deixar de lembrar a importância que a dimensão
emocional assume dentro deste processo, já que para Maturana (1998) é do
entrelaçamento entre o racional e o emocional que advém as coerências opera-
cionais de nosso sistema de argumentação a partir do qual construímos nossa
compreensão de mundo e nossa estratégia de intervenção nele.
No que se refere à ética ecológica, é preciso compreender que o desen-
volvimento da racionalidade humana não nos deu a primazia sobre todos
os outros seres. Precisamos recuperar a capacidade de vivermos no mundo
sem nos considerarmos donos dele, mas, pelo contrário, compreendendo que
devemos nossa existência à existência do outro.
Enquanto relação interespecífica, a ética ecológica pressupõe o aban-
dono de uma lógica utilitarista e antropocentrista, colocando a natureza (e
o homem como parte dela) no centro das relações, outorgando-lhe o papel
de sujeito de direito, tal como propõe Michel Serres: “[...] o antigo contrato
social deveria desdobrar-se num contrato natural: [...] não há outra saída
134

que não seja assiná-lo” (SERRES, 1991, p. 39-40). Emancipar a natureza do


domínio humano, significa resgatar a verdadeira dimensão da sustentabilida-
de, reconhecendo e respeitando os limites biofísicos do mundo e aprendendo
a organizar a vida humana dentro destes limites. Isso, enquanto realidade
escolar abre um leque de oportunidades para a construção educativa, desde
repensar o que comemos, até aquilo que efetivamente desejamos ou como
nos relacionamos com as demais espécies.
Todo este enfrentamento ético da educação ambiental acaba, por vezes,
esbarrando no desafio teórico-metodológico, já que não raras vezes a edu-
cação ambiental é compreendida como um conjunto de informações sobre
o ambiente, como se o simples acúmulo de conhecimentos fosse capaz de
transformar as atitudes dos indivíduos. Contra isso Paulo Freire afirmava:

[...] ler é reescrever e não memorizar os conteúdos da leitura. Devemos


superar a ingênua compreensão do ato de ler e de estudar como um
ato de “comer”. Do ponto de vista desta falsa concepção que, como
Sartre, poderemos chamar de “concepção nutricionista do conheci-
mento”, aqueles que lêem e estudam devem fazê-lo para tornar-se
“intelectualmente gordos”. Daí o uso de expressões como “fome de
conhecimento”, “sede de saber”, ter ou não “apetência pelo saber”
(FREIRE, 1981, p. 72).

Alguns professores chegam mesmo a justificar a ausência de tempo


para trabalhar a educação ambiental, como se de um conteúdo curricular
efetivamente se tratasse. Não percebem os professores, que a educação am-
biental corresponde tão somente ao exercício da ética inter e intraespecífica
de que nos referíamos no desafio anterior; ou seja, não há nenhum conhe-
cimento científico novo que a educação ambiental possa agregar ao que os
componentes curriculares já desenvolvem; o ambiental da educação está no
olhar, no conectar, no contextualizar, no sentir, e não na informação que se
possa acumular.
Assim, o desafio teórico-metodológico da educação ambiental consis-
te exatamente em não torná-la um laboratório de ciências aplicadas, e sim
um espaço de religação, reconstrução e contextualização dos conhecimentos
fragmentados que os indivíduos incorporam nos distintos espaços da vida
por onde transitam. Mais do que isso, reiteramos que é preciso compreender
que ninguém se educa exclusivamente pelo cognitivo, especialmente quan-
do se trata de uma educação que busca recriar as pontes de ligação com as
demais dimensões da vida. Então, o afeto e a percepção do mundo são mais
do que importantes no aprendizado da educação ambiental, eles são estrutu-
radores do ato educativo.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 135

Portanto, a educação ambiental não deveria ser “uma coisa a mais” den-
tro da escola; ela deveria ser, na verdade, uma forma da escola olhar para o
mundo em que está inserida e, ao mesmo tempo, uma orientação para balizar
o seu comportamento dentro desse mundo.
A transversalidade da educação ambiental não deveria implicar em pe-
ríodos adicionais de envolvimento extraclasse, como se isso fosse algo dife-
rente daquilo que devemos aprender; pelo contrário, deveria ser uma oportu-
nidade para que a matemática fosse aprendida no pátio da escola, as ciências
na horta, o português com as notícias do bairro, a geografia no supermercado
etc. Em relação a isso, comenta Morin (2003):

Vivemos numa realidade multidimensional, simultaneamente eco-


nômica, psicológica, mitológica, sociológica, mas estudamos estas
dimensões separadamente, e não umas em relação com as outras. O
princípio de separação torna-nos talvez mais lúcidos sobre uma pe-
quena parte separada do seu contexto mas nos torna cegos ou míopes
sobre a relação entre a parte e o seu contexto. Além disso, o méto-
do experimental, que permite tirar um “corpo” do seu meio natural
e colocá-la num meio artificial, é útil, mas tem os seus limites, pois
não podemos estar separados do nosso meio ambiente; o conhecimen-
to de nós próprios não é possível, se nos isolarmos do meio em que
vivemos (p. 15).

Por fim, o desafio político da educação ambiental consiste justamente


na sua capacidade em interferir nas relações do mundo em suas diferentes
escalas, para que a partir desta interferência, tenhamos condições de cons-
truir cenários alternativos de futuro. Se é verdade que precisamos trabalhar
no sentido de romper com a ética individualista e antropocêntrica e que
precisamos fazê-lo dentro de um contexto holístico de articulação dos co-
nhecimentos, também é verdade que tudo isso pode ser feito com ou sem
compromisso com a transformação das condições objetivas de vida em que
as pessoas estão inseridas.
A tentativa de darmos uma materialidade aos conceitos amplos que a
educação ambiental carrega, como ética, complexidade, holismo, alteridade
etc., por melhor que seja nossa intenção, se não estiver acompanhada de
uma verdadeira intencionalidade transformadora, corre o risco de produzir
um “discurso ingênuo que permite ver a educação como sinônimo de mundo
das ideias perfeitas e salvação das pessoas, que precisam, assim, apenas
alterarem suas atitudes mentais e adotarem comportamentos padronizados
como corretos para mudarem o conjunto das dimensões de nossas vidas”
(LOUREIRO, 2006, p. 149).
136

Por vezes nos preocupamos tanto com a mudança interior dos indivídu-
os, que esquecemos que quando esta mudança não se reflete igualmente em
mudanças exteriores, seja no plano individual, mas, principalmente, no pla-
no coletivo, enquanto identidade política de atuação do ser, estes indivíduos
tendem cada vez mais ao isolamento e à frustração diante de um mundo que
insiste em não se transformar para acompanhar a mudança interior que ele,
indivíduo, tem se esforçado para implementar.
O desafio político da educação ambiental consiste, antes de mais nada,
em compreendermos que os indivíduos são, ao mesmo tempo, produto e pro-
dutores da sua própria condição de existência. Esta compreensão lhe confere
o intransferível papel de sujeito do processo, capaz de fazer escolhas, de
enfrentar contradições, de organizar coletivamente um caminho, de reivin-
dicar. Tal como afirma Morin (1996), os indivíduos produzem a sociedade e
esta produz os indivíduos. Claro que isso não se dá em um plano metafísico
de retroalimentação harmoniosa; pelo contrário, isso se dá em um processo
dialético de enfrentamentos e superações, e este é o grande desafio sobre o
qual se buscou compreender e discutir sobre a saúde da água no município
de Itaara, já que “é a ação que cria a consciência das contradições para
rejeitá-las, e é a ação que busca uma forma de superá-las de maneira a não
reproduzi-las, mas de inaugurar o novo” (BOFF, 2012, p. 248).

2. (Inter)Ações do eixo de Educação Ambiental no Projeto


Saúde da Água
Ao longo dos dois anos de atividades, foram realizadas mais de quaren-
ta intervenções nas cinco escolas-piloto onde o Projeto foi desenvolvido, a
partir de três fases distintas (figura 3): sensibilização para a importância dos
recursos hídricos, diagnóstico da situação dos recursos hídricos no municí-
pio e ação no sentido de contribuir na solução dos problemas encontrados.
Ao todo, estiveram diretamente envolvidos nas ações do projeto mais de qui-
nhentos estudantes, mas estima-se que o alcance dos resultados foi bastante
superior a isso, tendo em vista que muitas das ações empreendidas transcen-
deram o limite das escolas e envolveram, também, a comunidade itaarense.
Importante ressaltar que todas as ações realizadas, independentemente do
tipo de intervenção, da faixa etária envolvida ou da escola, ligavam-se entre si
por meio de um “fio condutor” de todas ações que foi o desenvolvimento de
uma “pedagogia do cuidado” em relação ao que nos cerca, tal como propõe
Boff (2000), colocando a ética do “cuidado” como chave do comportamento
do ser humano para com as outras pessoas, como também para com o planeta
Terra, rompendo com a ideologia moderna do homem-máquina e do cérebro
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 137

como único caminho de interação dos indivíduos com a realidade do mundo.


Mais do que um conceito, o “cuidado” se transforma em uma categoria de
análise e de (inter)ação, já que o cuidado “possui uma dimensão ontológica
que entra na constituição do ser humano” (BOFF, 2000, p. 89), seja no sentido
da atenção ao outro (ligação afetiva), seja no sentido da inquietação que deve
produzir frente ao descuido em que a realidade se encontra.

Figura 3 – Esquema de organização das atividades do subprojeto


ao longo do tempo, demarcando o limite de abrangência
entre a intervenção na escola e na comunidade

ESCOLA COMUNIDADE
Oficina de Sensibilização
SENSIBILIZAÇÃO

Ciclo de cinema socioambiental : água em tela

Formação dos Grupos de


Guardiões das Nascentes
Const. Instalação
das das EM
Maqu. nas escolas
DIAGNÓSTICO

Trabalhos Construção
de do livro
campo Observatório da água “Histórias do
Manoel Alves”

Oficina de
Vídeo
Jogo
AÇÃO

“Pela Trilha
das Águas”

Conferência Infanto-Juvenil da água de Itaara

Tempo
Fonte: Organização do autor.

Assim, do ponto de vista da educação ambiental, a palavra ‘cuidado’


indica que cuidar é mais que um ato singular de precaução daquele que pro-
tagoniza a ação; é a indicação de um modo de ser/estar no mundo, a forma
como a pessoa se estrutura e se realiza no mundo com os outros e que, como
138

discutimos anteriormente, funda (porquanto estabelece as mediações) as re-


lações que se estabelecem com as pessoas e com a natureza.
No projeto Saúde da Água esta pedagogia do cuidado e a ligação afetiva
por ela estimulada foi simbolizada por um personagem criado especialmente
como uma representação sensível da ética interespecífica que se procurou
cultivar ao longo dos dois anos de atividade. O sapo “Curi” (figura 4) tinha
uma dupla representação no contexto do projeto: de um lado, do ponto de
vista ecológico, testemunha a presença de uma ampla diversidade de anfí-
bios da Ordem Anura que buscam as massas de água no interior da Mata
Atlântica (e que lhe serve como biondicador de qualidade em muitos dos
casos) como espaço de vida e interação.
Figura 4 – O mascote “Curi” simbolizou a pedagogia do cuidado que se
procurou imprimir como marca do Projeto, sendo utilizado nos materiais
produzidos, nas atividades nas escolas e na formação de professores

Fonte: Banco de imagens da Fundação Mo’ã.

De outro lado, do ponto de vista simbólico, o nome “Curi”, de origem


Tupi-Guarani, nos remete a uma das espécies mais representativas e mais
ameaçadas da Floresta Ombrófila Mista, o Pinheiro Brasileiro (Araucaria
angustifólia). Desta forma, o personagem Curi foi utilizado não apenas
como logomarca do projeto, mas também como um mediador de muitas das
ações realizadas, cujos resultados passaremos a descrever com a brevidade
que é permitida no espaço deste texto.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 139

2.1 Oficinas de Sensibilização

As oficinas, realizadas tanto com estudantes de diferentes faixas etá-


rias, quanto com professores e com a comunidade em geral, representaram
a “porta de entrada” do projeto em Itaara, no sentido de sensibilizar para os
objetivos principais do projeto e, ao mesmo tempo, estimular o exercício da
percepção dos problemas socioambientais enfrentados pelo município e do
debate acerca das suas possíveis soluções.
Neste sentido, mais de uma dezena de oficinas foram realizadas no perí-
odo de dois anos do projeto (figura 5), envolvendo a sensibilização acerca do
valor dos recursos hídricos (Oficina “Gotinha Feliz e Gotinha Triste”), o papel
do reaproveitamento de materiais descartáveis dentro da sociedade de con-
sumo (Oficina de construção de brinquedos com Materiais Reaproveitáveis
e Recicláveis, Oficina de fabricação de sabão caseiro e Oficina de recicla-
gem de papel) a importância da conservação da natureza para a manutenção
da qualidade de vida (Oficina “Tesouros da Natureza”, Oficina “Fauna de
Itaara”, Oficina “Clima e Tempo – Nuvens”, Oficina “Conhecendo as plantas
que vivem na água”).
Estas oficinas foram sendo planejadas e executadas numa perspectiva
absolutamente “rizomática”2 (DELEUSE; GUATTARI, 1997) em relação
ao tema central do projeto, de maneira que os diferentes temas envolvidos
retrataram a multiplicidade e a diversidade de “olhares” que concorrem
para a organização dos elementos da realidade, sem que houvesse uma
obrigatória hierarquização das questões a serem tratadas dentro do am-
biente a ser observado e refletido. Em outras palavras, a realização destas
oficinas de educação ambiental buscou desenvolver nos indivíduos uma
capacidade interpretativa mais ampla (e não apenas na verticalização eco-
lógica) da realidade que os cerca, colocando em relevo as interconexões
que compõe a multidimensionalidade do conceito de sustentabilidade
no mundo atual. Nas palavras de Santos (2005), “a educação ambiental
deveria buscar, além da legitimação do discurso (de sustentabilidade) –
que é o primeiro passo na direção da mudança – também a inscrição desse
discurso na vida prática dos agentes” (p. 44).

2 A discussão acerca de uma educação ambiental “rizomática” extrapola em muito os limites possíveis para este texto,
mas, de qualquer forma, podemos definir esta perspectiva de trabalho como uma teia de atividades cujo crescimento
polimorfo vai explorando as reentrâncias das oportunidades oferecidas a partir do diálogo, anseios e realidade de cada
comunidade. Não há, portanto, um “kit” de formação padronizada que possa ser desenvolvido de forma propedêutica
e genérica para qualquer público ou realidade. A característica central deste processo aponta para um processo de
planejamento participativo e horizontalizado sobre aquilo que se quer ou se precisa conhecer para enfrentar a realidade.
Um maior aprofundamento sobre a aplicação destes princípios em educação Ambiental pode ser encontrado em Santos
(2005) e Azevedo (2013).
140

Figura 5 – Oficinas de sensibilização realizadas nas escolas e na


comunidade, com a função de divulgar o projeto e estimular a percepção
dos problemas socioambientais enfrentados pelo município

Fonte: Banco de imagens da Fundação Mo’ã.

Ainda no que se refere a realização de oficinas, cumpre destacar o papel


das oficinas de formação continuada com os professores e funcionários das
escolas do município (figura 6), já que os mesmos apresentaram uma função
estratégica no sentido de dar capilaridade às ações do projeto dentro de todas
as escolas envolvidas, além de sentirem-se estimulados a criar e desenvolver
seus próprios projetos dentro das suas possibilidades de intervenção. Por isso
mesmo, ao longo das vinte horas de formação continuada, onde buscou-se
formar multiplicadores atuantes e críticos diante das situações socioambien-
tais, influenciando nas mudanças de atitudes com vistas a sustentabilidade e
qualidade ambiental da comunidade escolar e de seu entorno, a metodologia
de trabalho por projetos representou um eixo estruturador da intervenção
(FIGUEIRÓ, 2015).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 141

Figura 6 – Oficinas de Formação Continuada com professores e


funcionários das escolas do município, onde se procurou sensibilizar
e estimular a prática de uma educação ambiental por projetos

Fonte: Banco de imagens da Fundação Mo’ã.

Esperava-se que os professores compreendessem que ao planejar o jar-


dim, controlar os gastos de água e energia da escola, ao se responsabilizar
pelo descarte e tratamento dos resíduos, ao opinar sobre a merenda, ao or-
ganizar grupos para tarefas específicas, ao assumir a responsabilidade sobre
determinados espaços, ao discutir sobre os problemas da comunidade onde
vive, o aluno tem a possibilidade de ser protagonista do seu próprio processo
de desenvolvimento, construindo a autonomia necessária para, futuramente,
ser um cidadão atuante e comprometido com uma vida mais saudável para si
e para a comunidade na qual vive. Esse é o real sentido da educação ambien-
tal dentro da escola: construir as condições para formação de uma verdadeira
cidadania planetária!
Para estimular o desenvolvimento do trabalho por projetos, criou-se
especialmente para as Oficinas de Formação Continuada do Saúde da Água
uma “mandala da ecopedagogia” (FIGUEIRÓ; SILVA, 2017), proposta como
instrumento metodológico para a construção de práticas educativas transfor-
madoras a partir de uma perspectiva “glocal” (global-local). A mandala repre-
senta a materialização plástica e visual do retorno à unidade pela delimitação
de um espaço circular que representa a religação entre os seres humanos e o seu
entorno, não apenas por colocar em evidência a “ecologia das temporalidades”
142

(SANTOS apud NOVO, 2003) que sobrepõe o tempo circular ao linear, como
também porquê nos remete a uma perspectiva autocontida dentro de uma geo-
metria em que a compreensão dos limites e da finitude representa parte essen-
cial do entendimento do equilíbrio da sustentabilidade.
Tendo por base esta figura simbólica que afronta a ontologia do pen-
samento moderno, desafiando o indivíduo e a coletividade para o retorno a
uma “ética primitiva”, a mandala da ecopedagogia se propõe a oferecer uma
arquitetura de enfrentamento das questões e conflitos socioambientais a par-
tir de três dimensões complementares: os princípios, os campos temáticos e
os eixos de ação (figura 7).

Figura 7 – Mandala da Ecopedagogia, desenvolvida como uma ferramenta


para impulsionar a educação ambiental por projetos dentro das escolas

Fonte: Figueiró e Silva (2017, p. 131).

Para a primeira dimensão, representada pelo círculo que compõe o pla-


no exterior da mandala, apontaram-se seis princípios gerais de uma educa-
ção ambiental crítica, que podem ser escolhidos de forma alternada pelo
educador para a construção das suas ações. São eles: a complexidade/ inter-
disciplinaridade, o diálogo de saberes, o valor da vida (a ética), a responsabi-
lidade/auto-organização, a solidariedade/cooperação e o tempo cíclico. Cada
um destes princípios representa um suporte para a compreensão e o enfrenta-
mento das questões temáticas que compõe a segunda dimensão do processo.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 143

Na segunda dimensão, representada pelo hexágono intermediário da


mandala, são apontados seis campos temáticos gerais, que buscam abarcar
a maior parte das questões quotidianas com as quais se defronta a educa-
ção ambiental no seu processo de ação-reflexão-ação: saúde física e mental,
conflitos e justiça, produção de alimentos, água/energia, inclusão e, por fim,
consumo e felicidade. No processo de estruturação das ações ecopedagógi-
cas, os educadores podem rodar o hexágono dos campos temáticos sobre o
círculo dos princípios, a fim de refletir e testar diferentes possibilidades de
tratamento dos temas a partir dos diferentes princípios estabelecidos.
Por fim, a terceira dimensão da mandala, representada pela flor central
de seis pétalas, encerra os seis principais eixos metodológicos de ação a
partir dos quais os campos temáticos podem ser tratados tendo por base al-
gum dos princípios inicialmente escolhidos. São eles: a formação de redes,
a interação com a comunidade, a ecoalfabetização, a pesquisa-ação, jogos e
tecnologia e, por fim, o contato direto com a natureza. Evidentemente que
tais eixos não são excludentes e sim complementares; todavia, a sua indivi-
dualização oferece caminhos mais organizados de reflexão sobre as estraté-
gias de enfrentamento dos diferentes temas a partir dos diferentes princípios.

2.2 Ciclo de Cinema Socioambiental

Dentre os instrumentos de sensibilização para as questões socioambien-


tais utilizados no projeto, em paralelo às oficinas acima descritas, realizou-se
um ciclo de cinema nas escolas e na comunidade, tendo como eixo “Água
e Sociedade”. Para tanto, foram selecionadas um total de dezesseis obras
(figura 8) entre filmes infantis e documentários adaptados às diferentes
faixas etárias, que tinham a finalidade de despertar os estudantes e a comuni-
dade para um processo global de perda das condições naturais que sustentam
a vida no planeta, na medida em avança o modelo tecnológico-consumista
de crescimento da sociedade humana.
Por meio das obras cinematográficas os indivíduos são mais facilmente
sensibilizados pelos aspectos artísticos envolvidos na fotografia e na música,
estabelecendo-se ali uma mediação possível para comparar e refletir sobre os
problemas quotidianos vivenciados pela sua própria comunidade.

2.3 Saídas de Campo com os “Guardiões das Nascentes”

O subprojeto de Educação Ambiental não ficou restrito ao espaço es-


colar; pelo contrário, para que as ações dos demais eixos do projeto pudes-
sem ser articuladas com a perspectiva de sustentabilidade trabalhada pela
144

educação ambiental, foi necessário promover diversas saídas a campo, onde


os estudantes puderam não apenas ter contato com os conflitos socioambien-
tais que permeiam seu território de vida, como também atuar de uma forma
ativa nas diversas ações protagonizadas pelos demais subprojetos, como no
plantio de árvores para a recuperação de nascentes, coleta de material reci-
clável, identificação de aves e discussão acerca das alternativas de controle
para as macrófitas aquáticas (figura 9) .

Figura 8 – Obras selecionadas para o Ciclo de Cinema


Socioambiental desenvolvido nas escolas e na comunidade

Fonte: Banco de imagens da Fundação Mo’ã.

Considerando o grande número de estudantes alcançados pelas ações


ordinárias do projeto, e a dificuldade de aprofundamento do processo for-
mativo que disso decorre, foi necessário selecionar um grupo menor de
estudantes para a realização de determinadas ações de maior envolvimento
e intensidade, como no caso das saídas a campo. Para tanto, organizou-se,
em cada uma das escolas trabalhadas, um grupo de estudantes voluntá-
rios que foram denominados de “Guardiões das Nascentes”. Estes gru-
pos, que realizaram oficinas de sensibilização nos períodos inversos aos
da aula, passaram a ser os responsáveis pela manutenção das diferentes
ações envolvidas naqueles momentos em que a equipe do projeto não es-
tava na escola.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 145

Figura 9 – Imagens das saídas a campo com os “Guardiões das Nascentes”

Fonte: Banco de imagens da Fundação Mo’ã.

3. Atividades Artísticas
A Arte, como manifestação da cultura humana, favorece a formação da
identidade e a construção da cidadania. Assim, crianças e jovens vivenciam e
compreendem a realidade utilizando os problemas como desafios, opondo-se
ao conformismo, construindo relações entre o mundo interior e exterior por
meio das emoções e da sensibilidade, sendo, a partir disso, capaz de atuarem
eticamente no ambiente.
As atividades artísticas realizadas buscaram levar os estudantes a in-
vestigar, inventar e explorar a expressividade e a criatividade, tornando-os,
dessa forma, indivíduos mais sensíveis às belezas e aos problemas que os
cercam. Assim, buscando explorar as diferentes formas de expressão sensí-
vel potencializada pela arte, diversas atividades foram organizadas nas esco-
las (figura 10), envolvendo trabalhos de arte e natureza, máscaras de animais
e plantas, construção de instrumentos musicais com materiais recicláveis,
formatos da natureza em moldes de gelatina, exposições fotográficas etc.
Durante todas estas atividades, os estudantes vivenciaram, na prática,
diferentes conceitos da arte envolvendo a sensibilidade, a percepção, a cons-
ciência estética, a imaginação, a leitura de imagens, a emoção, a investigação
e a reflexão como ferramentas para construir uma concepção da realidade
capaz de transcender o conceito pronto que, via de regra, é o que se transmite
em uma educação “bancária” e conteudista.

4. Abordagem lúdica dos conflitos socioambientais

Um eixo de ação foi desenvolvido especificamente para envolver os es-


tudantes da Escola de Ensino Médio, onde se buscou criar um jogo de RPG
intitulado “Itaara em Ação: O Jogo”, com a finalidade de analisar e avaliar
146

os potenciais e os limites do jogo na mudança de atitudes frente às questões


referentes aos conflitos socioambientais contemporâneos, envolvendo espe-
cialmente ações de proteção e conservação dos mananciais hídricos de Itaara
(RS), numa perspectiva local-global.
Figura 10 – O desenvolvimento da expressão e sensibilidade artística
representou uma estratégia extremamente importante para a conexão
entre o mundo interior e exterior dos estudantes envolvidos, especialmente
no que se refere aos anos iniciais do Ensino Fundamental

Fonte: Banco de imagens da Fundação Mo’ã.

Os Jogos de Interpretação de Papéis, ou RPG, por seu caráter lúdico e


dinâmico, podem ser uma eficaz ferramenta para trabalhar com a Educação
Ambiental, já que, diferente das plataformas virtuais de jogos que apresen-
tam rotinas preestabelecidas, permite que sejam criados cenários com adap-
tação para a realidade de cada comunidade em que o jogo é aplicado, promo-
vendo a vivência dos vários aspectos envolvidos em uma situação- problema
do jogo, modulada conforme a interpretação dos jogadores.
Assim, o Jogos de Interpretação de Papéis se configuram como uma pos-
sibilidade para a negociação dos conflitos, na medida em que os papéis se
referem a pessoas envolvidas nos conflitos reais, representam indivíduos ou
grupos de pessoas com interesses distintos numa mesma situação a ser resol-
vida. A dinâmica desse tipo de jogo faz com que a interação entre os jogadores
seja direcionada primordialmente para a cooperação, ao invés de competição.
Na ideia central do jogo “Itaara em Ação” o geopatrimônio hídrico do
município foi interpretado como “tesouros” que os personagens precisariam
recolher para poder proteger este patrimônio, mas esta recolha dependia,
também, de uma ação coordenada e cooperativa de todos para vencerem os
obstáculos ao longo do jogo.
A construção do jogo partiu do conhecimento da realidade local que
os estudantes têm, traduzido pela elaboração de mapas mentais de porções
do município, com a identificação e localização de conflitos socioambien-
tais que são significativos para os estudantes. Ao total, foram produzidos
quarenta e nove mapas mentais (figura 11), os quais foram coletivamente
discutidos, sistematizando um processo de espacialização dos conflitos so-
cioambientais percebidos em Itaara.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 147

Figura 11 – A elaboração do jogo de RPG partiu dos Mapas


Mentais produzidos pelos estudantes, como este do centro da
área urbana de Itaara, representado segundo a percepção dos
problemas de um aluno do segundo ano do Ensino Médio

Fonte: Dotto (2016).

Posteriormente, a sistematização destes conflitos foi transferida para


uma imagem de satélite georeferenciada do município, construindo-se o ta-
buleiro do jogo a partir de vinte e cinco pontos distintos (figura 12) que pre-
cisavam ser protegidos da degradação pelos jogadores ou, caso chegassem a
ser degradados, precisariam, posteriormente, ser despoluídos. Uma das preo-
cupações foi em contemplar no tabuleiro as seis nascentes do Arroio Manoel
Alves monitoradas pela equipe do projeto “Saúde da Água”, pois essa seria
uma maneira de trabalhar a sensibilização dos educandos para o potencial
hídrico do município, além de identificar no mapa do tabuleiro a origem da
água consumida no município.
O jogo foi trabalhado em equipes de personagens que simulavam dife-
rentes perspectivas e intencionalidades no processo de garantir a qualidade
ambiental do município na medida em que corriam contra o tempo, evitando
o avanço do nível de poluição nas águas de Itaara. Por meio de uma sequên-
cia de ações, e fazendo uso de diferentes categorias de cartas3, os estudantes
iam enfrentando as situações-problemas que se apresentavam para conservar
o patrimônio hídrico do município e, a partir disso, conseguiam refletir sobre
o seu papel como morador, estudante e cidadão itaarense.
O jogo foi aplicado em três turmas da Escola de Ensino Médio de Itaara
(figura 13), sendo que depois da realização dos jogos, a validação do ins-
trumento didático envolveu a aplicação de questionários semiestruturados,
onde os estudantes puderam avaliar o jogo, sugerir mudanças nas regras e,
ao mesmo tempo, demonstrar a eficácia do instrumento no aprofundamento
da compreensão dos problemas socioambientais vivenciados.
3 Uma compreensão mais detalhada das regras do jogo pode ser encontrada em Dotto (2016).
Figura 12 – Tabuleiro do jogo de RPG, com destaque para os 25 sítios patrimoniais 148
a serem protegidos da degradação pelos jogadores
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 149

Figura 13 – Aplicação do jogo de RPG em três turmas de Ensino Médio de Itaara

Fonte: Dotto (2016).

Considerações finais

Já está por demais demonstrado que o ideal de progresso definido pelo


modelo produtivo hegemônico atualmente instalado, é um cenário que in-
teressa, em curto prazo, há um grupo muito pequeno de pessoas, e à longo
prazo, à ninguém. Mas, como dizia o economista John Maynard Keynes,
um dos maiores teóricos do modelo capitalista atual, “In the long run we
are all dead”. Cabe-nos, portanto, a revolucionária tarefa de permitir que a
educação ambiental altere este tipo de percepção e, alterando isso, que au-
xilie na construção de um outro tipo de futuro. Nós estaremos mortos, mas
a humanidade que ainda não nasceu, poderá não estar. A visão sistêmica nos
permite aprender com o passado para transformar o presente e construir um
futuro novo, menos imediatista, acelerado e material, e mais solidário, diver-
so, intuitivo e prazeroso.
Ao nos reencontramos como indivíduos coletivos, reencontramos a hu-
manidade; ao reencontramos a humanidade, recuperamos a capacidade de
partilharmos um caminho; ao recuperarmos a capacidade de partilhar o ca-
minho, reencontramos a responsabilidade sobre a definição do destino para
onde nos dirigimos pois, afinal, este destino agora não é mais apenas nosso.
Esse é o grande sentido de uma cidadania global!
O desenvolvimento das ações de educação ambiental dentro do Projeto
Saúde da Água deixou, por certo, marcas profundas na história daqueles que
viveram e acompanharam o projeto ao longo dos dois anos de execução.
Diversas mudanças de atitude testemunhadas ao longo desta caminhada, e
que a falta de espaço não nos permite registrar neste texto, foram tomadas
como indicadores da eficácia da proposta que se esteve construindo. No en-
tanto, em que pese o tamanho da equipe e o suficiente aporte material por
parte do financiador e dos parceiros, o conjunto do desafio enfrentado, em
termos de mobilizar o município para a defesa da qualidade ambiental que
começa a ser perdida, talvez estivesse para além das limitadas capacidades
150

deste projeto. Algumas ações planejadas acabaram não sendo executadas,


como foi o caso da construção do livro “Histórias do Manoel Alves”, pen-
sado para ser uma coletânea de histórias orais dos moradores mais antigos
do município, e que permitisse aos mesmos reconhecerem o seu papel na
construção e na defesa da identidade daquele lugar.
Da mesma forma, a Conferência Inafanto-Juvenil da Água de Itaara,
pensada como uma ação final, capaz de coroar todo o processo de sensi-
bilização e de tomada de consciência a partir do conjunto de intervenções
realizadas em diferentes escalas, acabou não ocorrendo, por um conjunto de
motivos tão próprios das dificuldades enfrentadas no gerenciamento de um
projeto tão amplo, complexo e ambicioso como foi o Saúde da Água. Ainda
assim, ao defendermos, quase que de uma forma visceral, que “o caminho se
faz caminhando”, temos a mais absoluta convicção que este projeto repre-
sentou uma herança inequívoca na defesa de um outro modelo de futuro para
este município ainda tão cheio de vida. Concordando com o imortal escritor
uruguaio Eduardo Galeano, podemos dizer que “mesmo que não possamos
adivinhar o tempo que virá, temos ao menos o direito de imaginar o que
queremos que seja”.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 151

REFERÊNCIAS

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fando devires e clinamens através de processos de criação e poéticas audiovi-
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CAPÍTULO 7
RESTAURAÇÃO FLORESTAL
EM PROPRIEDADES RURAIS:
nascentes e matas ciliares

Ana Paula Moreira Rovedder


Bruna Balestrin Piaia
Rafaela Badinelli Hummel

1. Introdução

A restauração ecológica de ecossistemas reúne práticas, conceitos e


ações que visam restaurar a estrutura e funcionalidade ecossistêmica de
áreas degradadas ou de ecossistemas que sofreram distúrbios. Seus pilares
teóricos encontram-se na ecologia profunda, cujas premissas contemplam
uma revisão do modelo antropocêntrico da relação sociedade-natureza, e
na ecologia da restauração, de onde vêm o conhecimento científico sobre
processos, redes de interações e fluxos de energia e matéria.
De essência multidisciplinar, a restauração ecológica abrange a ques-
tão socioeconômica, valoriza o conhecimento tradicional, a participação
comunitária e os usos múltiplos da biodiversidade. Na aplicação das es-
tratégias de restauração, os objetivos básicos são reintroduzir os processos
ecológicos e as espécies autóctones, incentivando o retorno dos serviços
ecossistêmicos locais e da paisagem.
O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação de Áreas Degradadas
(NEPRADE), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) atua no âm-
bito da pesquisa e extensão em restauração ecológica nos Biomas Pampa e
Mata Atlântica, com foco em aplicação de estratégias nucleadoras, capacita-
ção, usos múltiplos de espécies nativas, entre outras linhas temáticas.
Em 2012, foram iniciados os diálogos entre Fundação Mo’ã e
NEPRADE com intuito de se estabelecer parceria para ações de restaura-
ção ecológica em Itaara, município situado no Rebordo do Planalto do Rio
Grande do Sul. O município desempenha importante papel no cenário am-
biental da região: retrata a biodiversidade da Mata Atlântica, representada
154

pela cobertura vegetal nativa da Floresta Estacional e por elementos da


Floresta Ombrófila Mista e está inserido no Corredor Ecológico da Quarta
Colônia, importante instrumento de gestão territorial. Apresenta mananciais
hídricos estratégicos para abastecimento de água em diversas cidades, e é
local de nascente dos rios Ibicuí e Vacacaí-mirim, que percorrem extensa
região na metade sul do RS. Além disso, apresenta potencial turístico, o que
eleva a prioridade para conservação ambiental.
A parceria obteve sucesso e, em 2014, foram realizadas as primeiras
ações de restauração ecológica, com a implantação do projeto “Restauração
florestal em propriedades rurais: nascentes e matas ciliares”, componen-
te do projeto “Saúde da Água”, com patrocínio do Programa Petrobras
Socioambiental. O projeto teve como objetivo principal testar técnicas de
restauração ecológica em nascentes e mata ciliares. Entre as técnicas testa-
das estão a condução da regeneração natural, semeadura direta de espécies
florestais, plantio em núcleos e plantio em área total, que serão descritas
no decorrer do capítulo.
Nesse sentido, o presente capítulo aborda os principais aspectos da
metodologia adaptada para as condições do Bioma Mata Atlântica na re-
gião de transição entre o planalto médio e a Depressão Periférica do RS,
onde se desenvolveu a pesquisa. São apresentadas as etapas de seleção das
áreas, histórico e caracterização dos distúrbios, interpretação dos níveis
de resiliência local e de paisagem, definição e espacialização das técnicas
e implantação dessas. Além disso, são relatadas as ações de extensão e
popularização da ciência desenvolvidas. Por fim, faz-se uma análise dos
principais resultados e conclusões e das recomendações geradas a partir
da pesquisa.

2. Região do estudo
O município de Itaara está localizado no topo da Serra Geral, na re-
gião central do Rio Grande do Sul e ocupa uma área de 172 km². Faz divisa
ao norte com o município de Júlio de Castilhos, ao sul e leste com Santa
Maria e a oeste com São Martinho da Serra (IBGE, 2018).
De acordo com a classificação climática de Köppen, o município se
enquadra no tipo Cfa, clima subtropical úmido, com verões quentes, sem
estação seca definida. A temperatura média do mês mais frio é de 12,2ºC e
a do mês mais quente é de 22,9ºC (ALVARES et al., 2013). A precipitação
média anual varia entre 1.500 e 1.750 mm, sendo bem distribuída durante
todo o ano.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 155

Em relação à economia, o setor de serviços caracteriza a principal


atividade do município, representado principalmente pelo turismo, devi-
do à existência de balneários e cachoeiras que são atrativas nos meses de
verão (KORMANN et al., 2010). Na porção sul do município, destaca-
-se o recente avanço do ecoturismo, em locais onde os recursos naturais
ainda se encontram preservados, tornando-se excelentes áreas de lazer
(FOLETO et al., 2011). A indústria também possui participação na econo-
mia do município, sendo a extração de pedras e britas a principal atividade
industrial. No setor agropecuário, os cultivos variam de monoculturas em
grandes propriedades a cultivos de subsistência em pequenas propriedades
(SCHNEIDER, 2010).
A região, reconhecida por sua riqueza hídrica, compreende três mi-
crobacias hidrográficas: Ibicuí-Mirim, Vacacaí-Mirim e Arroio Grande.
Os dois grandes reservatórios existentes, a barragem Saturnino de Brito
e a barragem de Val de Serra, atuam no abastecimento do município de
Santa Maria.
A maior parte da área florestal que representa a Floresta Estacional
se situa no Rebordo do Planalto Meridional, localizada na metade sul do
município. Ocorrem também, em pequenas proporções, áreas de Floresta
Ombrófila Mista, verificadas principalmente no topo do planalto, onde a
vegetação arbórea forma capões e matas de galeria (MARCHIORI, 2002).
As principais espécies arbóreas encontradas em levantamento realizado
por Piaia et al. (2015b) nas áreas de estudo foram Matayba elaeagnoi-
des Radlk (camboatá-branco), Symplocos uniflora (Pohl) Benth. (sete-san-
grias), Ocotea pulchella (Nees) Mez (canela-do-brejo), Dalbergia frutes-
cens (Vell.) Britton (rabo-de-bugio), Eugenia uniflora L. (pitangueira) e
Gymnanthes klotzschiana Müll.Arg (branquilho).

3. A restauração de nascentes e matas ciliares


A sub-bacia do Arroio Manoel Alves foi escolhida como área de abran-
gência do projeto Saúde da Água diante de sua importância estratégica para
abastecimento de água e manutenção dos serviços ambientais. Dessa forma,
as ações de restauração ecológica também seriam implantadas no âmbito da
sub-bacia.
As primeiras ações do projeto consistiram na definição das áreas degra-
dadas que receberiam as intervenções de restauração, o que necessitou de
uma etapa intensa de prospecção a campo, a partir da interpretação de ima-
gens orbitais e mapas disponíveis. Uma ampla busca por parceiros do proje-
to entre os proprietários rurais foi necessária, demandando diversas reuniões
156

com lideranças políticas e comunitárias, além de visitações às propriedades.


Concomitantemente, foi realizado mapeamento e georreferenciamento de
nascentes na sub-bacia do Arroio Manoel Alves.
Para a seleção das áreas de nascentes e matas ciliares para aplicação
das técnicas de restauração foi necessário percorrer toda rede de drenagem
da sub-bacia do Arroio Manoel Alves, tendo o apoio dos proprietários ru-
rais que se aliaram à equipe do projeto. Nesse levantamento foram georrefe-
renciadas 32 nascentes, classificadas em diferentes estados de conservação,
conforme metodologia proposta por Pinto et al. (2004). Para classificação
foram demarcados quatro raios de 50 m cada, medidos com trena, partindo
do olho d’água, à direita, esquerda, acima e abaixo da nascente, tendo como
referência o escoamento do curso de água. Desse modo, classificou-se as
nascentes em três categorias:

– Preservada: quando apresentavam pelo menos 50 metros de vegeta-


ção natural no seu entorno;
– Perturbada: quando não apresentavam 50 metros de vegetação natu-
ral, mas apresentavam bom aspecto, apesar de estarem ocupadas em
parte por pastagem e/ou agricultura;
– Degradada: quando se encontravam com alto grau de perturbação,
pouco vegetada, solo compactado, presença de gado, com erosões
e voçorocas.

Das 32 nascentes georreferenciadas, 17 foram classificadas como de-


gradadas, 13 como perturbadas e apenas duas como preservadas, o que de-
monstrou o histórico de degradação ao qual as nascentes do Manoel Alves
foram expostas, principalmente pela supressão da vegetação nativa e substi-
tuição por outros usos do solo (GIACOMINI et al., 2014).
As principais causas de degradação encontradas, em ordem de impor-
tância em termos de área de supressão da vegetação nativa foram: plantios
de eucalipto (30%), uso irregular da água (substituição por reservatórios,
desvios do fluxo para dessedentação animal e humana e irrigação) (20%),
pecuária bovina (16,67%), substituição por cultivos agrícolas (16,67%) e a
introdução de uma linha férrea (16,67%) (GIACOMINI et al., 2014). Tais
causas contribuíram para o baixo número de nascentes preservadas encon-
tradas e consequentemente para o aumento do nível de impacto ambiental
verificado na maioria das nascentes.
A partir da avaliação inicial das áreas a campo e da parceria estabele-
cida com os proprietários, foram escolhidas sete áreas, sendo seis Áreas de
Preservação Permanente em nascentes e uma em área de mata ciliar, para
implantação das estratégias de restauração (Tabela 1, Figura 1).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 157

Tabela 1 – Estado de conservação, fonte de impacto, características


do entorno e estratégia de restauração ecológica implantada em seis
nascentes da sub-bacia do arroio Manoel Alves em Itaara, RS

Estado de Estratégia de restau-


N Causa de degradação Características do entorno
conservação ração ecológica
Faixa de vegetação
Plantio de eucalipto Isolamento e
N1 Perturbada natural menor que 10 m
e pecuária bovina plantio em área total
e área de pastagem
Plantio de eucalipto Pastagem e plantio de Isolamento e
N2 Degradada
e pecuária bovina eucalipto na APP plantio em núcleos
Plantio de eucalipto Pastagem e plantio de
N3 Degradada Nenhuma intervenção
e pecuária bovina eucalipto na APP
N4 Preservada - Vegetação natural Isolamento
Vegetação natu-
N5 Perturbada Pecuária bovina Isolamento
ral e pastagem
Área isolada a oito anos
N6 Perturbada Pecuária bovina Isolamento a 8 anos
em sucessão inicial
Mata
Degradada Agricultura Lavoura na APP Semeadura
ciliar

Fonte: Adaptado de Piaia et al. (2015b).

Figura 1 – Localização das nascentes na sub bacia


do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS
53º51’0”W 53º48’0”W 53º45’0”W 53º42’0”W

29º30’0”S

29º33’0”S

29º36’0”S

0 2 4 8 29º39’0”S
km

Legenda
Sub-bacia Nascentes BR - 158 Sistema de Projeção Geográfica:
SIRGAS 2000
Arroio Manuel Alves Perímetro Urbano Lago SOCEPE

Itaara Elaboração:
André Ademir Weber, 2015

Fonte: Adaptado de Piaia et al. (2015b).


158

A Mata Ciliar (Tabela 1) não foi classificada dentro da metodologia


proposta por Pinto et al. (2004) devido à ausência de nascentes nos limites
da área. No entanto, trata-se de uma área de preservação permanente, com
histórico de supressão da vegetação original (mata ciliar) e substituição por
cultivo agrícola. Na etapa de definição das áreas, encontrava-se abandona-
da há aproximadamente 12 meses, apresentando cobertura vegetal escassa,
composta por espécies herbáceas. Considerando-se esse cenário, conside-
rou-se essa área como estruturalmente degradada.
Nas sete áreas foi realizada a interpretação dos níveis de resiliência
local e de paisagem e do histórico de distúrbios. A partir disso foram defi-
nidas as estratégias a serem aplicadas em cada uma das áreas e realizado o
isolamento para eliminação das fontes de distúrbio, principalmente quando
envolvia a entrada de rebanho bovino.
Após a definição das áreas, realizou-se um levantamento florístico pre-
liminar do estrato arbóreo. Nesse levantamento verificou-se baixa riqueza e
diversidade de espécies (Tabela 2), o que evidencia o impacto na comunida-
de arbórea. O principal fator de alteração na composição florística nas APPs
com nascentes (N1 a N6) foi o plantio de eucalipto (PIAIA et al., 2015b).

Tabela 2 – Abundância, riqueza, índice de diversidade de Shannon


(H’) e de equabilidade de Pielou (J) do estrato arbóreo das nascentes
na sub-bacia do Arroio Manoel Alves, em Itaara, RS

Nascente Abundância Riqueza (S) H’ J


N1 – Perturbada 62 14 2,12 0,80
N2 – Degradada 38 2 0,12 0,18
N3 – Degradada 95 3 0,12 0,11
N4 – Preservada 122 22 2,54 0,82
N5 – Perturbada 99 22 2,62 0,85
N6 – Perturbada 69 17 2,05 0,72

Fonte: Piaia et al. (2015b).

Além do levantamento florístico, foram realizadas análises químicas


(Tabela 3) e físicas (Tabela 4) do solo. Para isso, foram coletadas 364 amos-
tras de solo para análises nas sete áreas e encaminhadas para o Laboratório
de Análises do Solo da Universidade Federal de Santa Maria. Outros parâ-
metros foram obtidos diretamente no campo, como resistência à penetração
do solo, por meio de Penetrômetro de impacto, taxa de infiltração com o
Permeâmetro de Guelph e umidade, temperatura e condutividade elétrica
por sonda. A classe de solo predominante na região é o Neossolo Litólico,
originado de rochas ígneas extrusivas (STRECK et al., 2008).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 159

Tabela 3 – Variáveis químicas do solo na profundidade de 0 a 20 cm


nos locais de estudo, sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS

CTC CTC
P K Al Ca Mg V M MO Arg
ef ph7
Áreas pH
mg/L cmolc/L %

N1 4,83 5,38 67,50 1,69 4,01 0,99 6,88 13,84 37,31 29,74 2,75 24,25

N2 5,13 5,29 115,00 0,74 6,72 1,89 9,66 14,29 57,63 16,63 2,94 20,13

N3 4,75 3,93 92,00 2,39 1,64 0,79 5,04 8,93 30,93 49,35 1,69 24,25

N4 4,75 6,80 97,00 1,36 3,49 1,07 6,16 13,09 36,01 27,89 3,79 24,38

N5 4,56 10,50 66,50 1,73 2,57 0,69 5,16 13,24 25,10 47,23 3,75 16,00

N6 4,81 5,95 166,00 1,51 4,35 0,97 7,28 14,05 43,34 24,11 3,05 26,75

Mata ciliar 5,11 9,16 204,5 1,00 5,08 1,97 8,57 14,3 55,07 13,74 2,65 31,87

Em que: N1: nascente isolada + plantio em núcleos; N2: nascente isolada + plantio em área total; N3: nascente
testemunha degradada; N4: nascente isolada, servindo de testemunha preservada; N5: nascente isolada (cercamento);
N5: nascente isolada a 8 anos; mata ciliar: mata ciliar degradada onde se aplicou a semeadura direta. Ca: Cálcio; Mg:
Magnésio; K: potássio; Al: alumínio; m: saturação por alumínio (%); V: saturação por base (%); CTC. ef.: Capacidade
de troca de cátions efetiva; CTC pH 7: Capacidade de troca de catiônica potencial; MO: matéria orgânica; P: fósforo.
Fonte: Adaptado de Giacomini (2016).

Tabela 4 – Variáveis físicas do solo na profundidade de 0 a 20 cm de profundidade


nos locais do estudo, sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS

Ma- Mi-
CC PMP K Dp Ds Pt RP
cro cro
Áreas Classe textural
(cm 3
(cm 3
(mm (g (g (cm 3
(cm 3
(cm 3
(Mpa)
cm-3) cm-3) h-1) cm-3) cm-3) cm-3) cm-3) cm-3)

N1 0,445 0,18 84,66 2,46 1,225 0,055 0,46 0,51 2,31 Franco Argiloso

N2 0,445 0,19 219,90 2,415 1,21 0,055 0,465 0,51 3,71 Franco Siltoso

N3 0,415 0,195 1,915 2,47 1,275 0,06 0,425 0,48 4,55 Franco Siltoso

N4 0,415 0,165 171,90 2,445 1,01 0,145 0,43 0,57 1,56 Franco Siltoso

N5 0,475 0,165 74,04 2,425 1,03 0,075 0,49 0,57 1,56 Franco Siltoso

N6 0,415 0,16 117,42 2,555 1,15 0,11 0,43 0,54 1,68 Franco Siltoso

Mata ciliar 0,41 0,18 352, 42 2,53 1,27 0,08 0,42 0,50 2,05 Franco Argiloso

Em que: N1: nascente isolada + plantio em núcleos; N2: nascente isolada + plantio em área total; N3: testemunha
degradada; N4: nascente isolada, servindo de testemunha mais preservada; N5: nascente isolada (cercamento);
N6: nascente isolada a 8 anos; mata ciliar: mata ciliar degradada onde se aplicou a semeadura direta. CC:
Capacidade de campo (cm³/cm³); PMP: ponto de murcha permanente (cm³/cm³); k: condutividade hidráulica
(mm/h); Dp: densidade de partícula (g/ cm³); Ds: densidade do solo (g/ cm³); Macro: macroporisidade (cm³/
cm³); Micro: microporosidade (cm³/cm³); Pt: porosidade total (cm³/cm³); RP: resistência à penetração (Mpa).
Fonte: Adaptado de Giacomini (2016).
160

3.1 Implantação das estratégias e principais resultados


3.1.1 Condução da regeneração natural
A condução da regeneração natural consiste na retirada do fator de de-
gradação e isolamento da área para que a vegetação nativa volte a se es-
tabelecer por meio da regeneração natural (BRANCALION et al., 2015).
Essa técnica apresenta como principal vantagem o baixo custo e é utilizada
quando há bom nível de resiliência. Nesses casos, a área deve apresentar
indivíduos regenerantes e remanescentes florestais próximos, que possam
servir como fonte de propágulos.
Para avaliar o desenvolvimento da regeneração natural foram realizados
dois levantamentos. O primeiro antes da aplicação das estratégias de restau-
ração, em setembro de 2014, e o segundo após um ano, em outubro de 2015.
A regeneração natural é um indicador ecológico que representa a condição
do ambiente e a tendência de mudança ao longo do tempo (SUGANUMA;
DURIGAN, 2015), portanto foi avaliada nas seis nascentes em estudo.
Para o levantamento da regeneração natural foram avaliadas oito parcelas
de 2 x 2 m por nascente (Figuras 2). Nessas parcelas foram medidos e iden-
tificados todos os indivíduos regenerantes que apresentassem altura maior ou
igual a 30 cm e diâmetro à altura do peito (DAP) menor ou igual a 5 cm.
Figura 2 – Levantamento da regeneração natural na nascente 5 (N5)

Fonte: Fundação Mo’ã.

As espécies foram identificadas a campo e, quando isso não foi pos-


sível, coletou-se material botânico para posterior identificação, com auxí-
lio de especialistas do Herbário do Departamento de Ciências Florestais, da
Universidade Federal de Santa Maria. Obteve-se a abundância de indivídu-
os, riqueza de espécies e calculou-se o índice de diversidade de Shannon e
Equabilidade de Pielou para os dois levantamentos (Tabela 5).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 161

Tabela 5 – Abundância, riqueza, índice de diversidade de Shannon


e Equabilidade de Pielou da regeneração natural nas nascentes
na sub-bacia do Arroio Manoel Alves, em Itaara, RS

Abundância Riqueza (S) H’* J*


Nascente
2014 2015 2014 2015 2014 2015 2014 2015

N1 – Perturbada 70 108 19 24 2,49 2,79 0,83 0,87

N2 – Degradada 84 103 20 21 2,53 2,65 0,83 0,86

N3 – Degradada 4 33 3 11 1,04 1,73 0,94 0,72

N4 – Preservada 110 162 17 29 2,40 2,85 0,84 0,84

N5 – Preservada 66 91 21 33 2,76 2,81 0,90 0,87

N6 – Perturbada 86 128 21 29 2,76 2,93 0,90 0,87

Em que: H’ = Índice de diversidade de Shannon; J’ = Equabilidade de Pielou


Fonte: Adaptado de Giacomini (2016).

Observou-se um aumento na abundância de indivíduos, riqueza de es-


pécies e diversidade florística nas áreas de nascentes entre as avaliações,
o que indica que há potencial de restauração natural no entorno das nas-
centes. Ressalta-se o isolamento por meio do cercamento como fator fun-
damental para o acréscimo do número de indivíduos e riqueza de espécies
e, assim, desenvolvimento da vegetação, já que havia gado na maioria das
nascentes. A condução da regeneração natural pode contribuir para o retorno
da biodiversidade em áreas de passivo ambiental, desde que haja níveis de
resiliência adequados, auxiliando no aumento de conectividade em paisa-
gens culturais (ROVEDDER et al., 2018). Há que se ressaltar, o cuidado na
intepretação dos níveis de resiliência e de invasão biológica por espécies
exóticas. Na região do estudo, Hummel (2017) encontrou invasão por uva-
-do-japão (Hovenia dulcis), que correspondeu à quarta espécie com maior
valor de importância na regeneração natural, sendo possível observar ele-
vado adensamento e relação oposta com a ocorrência de espécies nativas.
Ainda no Rebordo do Planalto, a mesma autora encontrou invasão biológica
por Ligustrum lucidum em áreas florestais alteradas, onde a espécie utilizou-
-se do estágio sucessional inicial do fragmento para desempenhar seu caráter
invasor no estrato regenerante (HUMMEL et al., 2014).
162

3.1.2 Semeadura direta


Na semeadura direta, as espécies florestais nativas são semeadas direta-
mente na área a ser restaurada. Esta técnica permite maior recobrimento de
áreas degradadas e um menor custo. Exclui-se as despesas de viveiro, trans-
porte de mudas até a área e mão de obra para abertura de covas e plantio,
além disso pode ser aplicada facilmente em áreas de difícil acesso (PIAIA
et al., 2015a).
Contudo, a técnica tem muitas limitações como dificuldade para con-
seguir lotes de sementes viáveis, inexistência de informações sobre a épo-
ca adequada para a semeadura de muitas espécies, variabilidade no tempo
de germinação, impossibilidade de controlar características ambientais que
sejam adequadas para germinação, predação das sementes e plântulas, alta
competitividade em fases iniciais do desenvolvimento, principalmente com
gramíneas (CECCON, et al., 2016).
A semeadura direta foi realizada em uma Área de Preservação
Permanente da sub-bacia do Arroio Manoel Alves. Inicialmente, realizou-se
o isolamento da área por meio de cercamento para evitar a entrada de gado.
Foram selecionadas seis espécies florestais nativas regionais (Tabela 6), cuja
definição foi orientada pelo levantamento florístico realizado em remanes-
centes da mata ciliar do Arroio (PIAIA et al., 2015b), além da disponibilida-
de de sementes. Nenhuma das espécies selecionadas necessitava de quebra
de dormência.
A semeadura direta foi realizada em linhas com espaçamento de 2 m x
1 m, em uma área total de 0,13 ha. A distribuição das espécies nas linhas foi
aleatória, com 20 repetições por espécie. As sementes foram introduzidas
a 2 cm de profundidade. A avaliação da germinação e sobrevivência, as-
sim como do crescimento em altura das plântulas estabelecidas foi realizado
mensalmente, durante um período de 12 meses (Figura 3).
Após 12 meses, observou-se a germinação de Eugenia uniflora, Cupania
vernalis e Psidium catleianum. As demais espécies semeadas não germina-
ram (Tabela 6) (GIACOMINI, 2016), provavelmente devido à qualidade das
sementes. Em relação à sobrevivência, C. Vernalis apresentou percentual
inferior comparativamente a E. uniflora, o que pode ter ocorrido devido a
exposição elevada ao sol e queima das folhas pela geada.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 163

Tabela 6 – Taxa de germinação e sobrevivência e crescimento em altura das


espécies semeadas em Área de Preservação Permanente em Itaara, RS

Altura
Nome científico Família Nome popular TxG TxS
(cm)

Schinus terebentifolius Raddi Anacardiaceae aroeira-vermelha - - -

Psidium cattleianum Sabine Myrtaceae araça-vermelho 0,05 0,00 -

Eugenia uniflora L. Myrtaceae pitangueira 67,92 83,00 5,75

Cupania vernalis Cambess. Sapindaceae camboatá-vermelho 18,58 40,00 6,18

Prunus myrtifolia L. (Urb.) Rosaceae pessegueiro-do-mato - - -

Zanthoxylum rhoifolium Lam. Rutaceae mamica-de-cadela - - -

Em que: TxG: Taxa de germinação; TxS: Taxa de sobrevivência.


Fonte: Adaptado de Giacomini (2016).

Figura 3 – Desenvolvimento em altura da Eugenia uniflora (a) e Cupania


vernalis (b) após germinação via semeadura direta em área de preservação
permanente da sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS

Fonte: Giacomini (2016).


164

3.1.3 Plantio em núcleos


O plantio em núcleos consiste no plantio de mudas de espécies arbóreas
de forma agrupada entre si e com espaçamento entre núcleos dispersos na área
(REIS et al., 2014), opondo-se ao tradicional desenho do plantio em linhas.
Esta técnica se utiliza dos princípios da nucleação, em que um micro-habitat
formado, promove e facilita a chegada de propágulos e o desenvolvimento de
outras espécies (YARRANTON; MORRISON, 1974). Assim, os espécimes
plantados atraem agentes dispersores e polinizadores, ao mesmo tempo em
que criam condições para a regeneração natural se desenvolver. Tais condições
são, principalmente, variáveis microclimáticas, como amenização da ampli-
tude térmica, retenção de umidade, sombreamento etc., mas também há um
aumento de atratividade pela disponibilização de resíduos, formação de abrigo
e sítios apropriados ao acasalamento, disponibilidade de nutrientes etc.
As espécies a serem plantadas, geralmente, devem apresentar copa am-
pla, crescimento rápido, florescimento e frutificação precoce e atratividade
para a fauna polinizadora e dispersora de sementes (PIAIA et al., 2015a).
Tais características favorecem as interações interespecíficas e o fluxo bioló-
gico, essenciais para a regeneração natural.
Núcleos de alta e baixa diversidade foram introduzidos na Nascente
1 (N1) em outubro de 2014, após o isolamento da área. Como núcleos de
baixa diversidade foram implantados 20 arranjos com pitangueira e aroeira-
-vermelha. Foram plantados 20 núcleos de baixa diversidade. Para testar-se
a influência do porte de mudas no momento do plantio no estabelecimento e
desenvolvimento vegetal, 10 núcleos foram implantados com com mudas de
1 m de altura e outros 10 núcleos, com mudas menores que 30 cm de altura.
Os núcleos de alta diversidade foram plantados em dois arranjos:
Grupo 1: camboatá-vermelho (central), angico-vermelho, pitanga, araçá-
-vermelho e pessegueiro-do-mato; Grupo 2: cerejeira (central), guajuvira,
aroeira-vermelha, açoita-cavalo e chal-chal. As mudas dos núcleos de alta
diversidade tinham em média 1 m de altura no momento do plantio, com
exceção do camboatá-vermelho com altura média de 10 cm.
Foram avaliadas a taxa de sobrevivência e o crescimento em altura das
mudas plantadas por um período de 12 meses. Padrões fenológicos de flo-
ração e frutificação das espécies plantadas foram avaliados dos 12 aos 24
meses (LEAL DA SILVA, 2017).
As espécies plantadas apresentaram alta taxa de sobrevivência (Tabela
7). Apenas Camboatá-vermelho não atingiu percentual máximo no primeiro
ano e, aos 24 meses, o percentual de sobrevivência foi de 45% (LEAL da
SILVA, 2017). Isso pode ter ocorrido devido ao porte reduzido no momento
do plantio, portanto, podem não ter se adaptado e sofrido com eventos de
geada, por exemplo.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 165

Tabela 7 – Sobrevivência dos indivíduos plantados em núcleos na


Nascente 1 (N1) da sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS
Núcleos Nome popular Espécie Família N TxS (%)
cerejeira-do-mato Eugenia involucrata Mytaceae 20 100
aroeira-vermelha Schinus terebentifolius Anacardiaceae 20 100
Arranjo 1 -
chal-chal Allophylus edulis Sapindaceae 20 100
Alta diversidade
açoita-cavalo Luehea divaricata Malvaceae 20 100
guabiroba Campomanesia xanthocarpa Mytaceae 20 100
camboatá-vermelho Cupania vernalis Sapindaceae 20 90
pessegueiro-do-mato Prunus myrtifolia Rosaceae 20 100
Arranjo 2 – Alta
pitangueira Eugenia uniflora Mytaceae 20 100
diversidade
angico-vermelho Parapiptadenia rigida Fabaceae 20 100
araçá-vermelho Psidium cattleianum Mytaceae 20 100
Arranjo 3 – Bai- pitangueira Eugenia uniflora Mytaceae 50 100
xa diversidade aroeira-vermelha Schinus terebentifolius Anacardiaceae 50 100
Total 300
Em que: N: número de mudas plantadas; TxS (%): Percentual de sobrevivência das mudas.
Fonte: Adaptado de Leal da Silva (2017).

Em relação ao crescimento em altura, observa-se que as espécies


Parapiptadenia rigida, Schinus terebinthifolius, Prunus myrtifolia e Luehea
divaricata apresentaram os maiores valores (Figura 4). Observou-se maior
desenvolvimento nos primeiros meses, seguida de uma estabilização no
período de inverno e meses seguintes. As espécies Parapiptadenia rígida,
Luehea divaricata e Allophylus edulis são caducifólias, o que explica a di-
minuição da altura do sexto para o nono mês após o plantio.
Figura 4 – Crescimento em altura (cm) das espécies plantadas em núcleos
na nascente 1 (N1) Na sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS
180,0
160,0
140,0 L. divaricata
120,0 P. rigida
Altura (cm)

100,0 P. ca�leianum
S. tereben�folius
80,0
C. vernalis
60,0 E. involucrata
40,0 A. edulis
20,0 C. xanthocarpa
0,0 P. myr�folia
plantio 3 6 9 12 E. uniflora

Meses após o plantio

Fonte: Autoras.

Schinus terebinthifolius e Psidium cattleianum foram as únicas espécies


em que foi possível observar padrões fenológicos de floração e frutificação
166

(LEAL DA SILVA, 2017). Ambas têm síndrome de dispersão zoocórica e


apresentam floração e frutificação precoce, o que favorece os fluxos bioló-
gicos, processo importante para a nucleação e desenvolvimento da regene-
ração natural.

3.1.4 Plantio em área total

O plantio em área total consiste no arranjo das mudas dispostas em li-


nha, adensadas e em toda a área a ser restaurada. É a forma mais conhecida
de plantios silviculturais, tanto para fins comerciais quando para reposição
ambiental. Pesquisas têm demonstrado que esse formato não é adequado
para a recuperação de passivos ambientais, pois a artificialização do meio,
promovida pelo alinhamento do plantio, prejudica o restabelecimento da
biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos (ROVEDDER et al., 2018).
Além disso, o maior custo de implantação, condução e replantio necessários,
torna o método praticamente inexequível pois, frequentemente, a condução,
replantio e monitoramento são falhos ou não realizados.
O plantio em área total foi realizado na nascente 2 (N2), após o cerca-
mento da área. As mudas foram dispostas em linhas com espaçamento de 2
x 3 m e as espécies foram distribuídas aleatoriamente. As mudas tinham em
média 25 cm de altura no momento do plantio. Foram avaliadas a taxa de so-
brevivência e o crescimento em altura das mudas plantadas por um período
de 12 meses.
A taxa de sobrevivência para as mudas plantadas em área total na nas-
cente 2 (N2) foi superior a 90% para a maioria das espécies (Tabela 8). Isso
demonstra a adaptação das mudas à condição em que foram plantadas.

Tabela 8 – Sobrevivência dos indivíduos plantados em área total na


nascente 2 (N2) da sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS

Espécie Família Nome popular N TxS (%)


Allophylus edulis Sapindaceae chal-chal 18 100,0
Araucaria angustifolia Araucariaceae araucária 5 40,0
Blepharocalyx
Mytaceae murta 2 100,0
salicifolius
Campomanesia
Mytaceae guabiroba 3 100,0
xanthocarpa
Cupania vernalis Sapindaceae camboatá-vermelho 16 93,8
Eugenia involucrata Mytaceae cerejeira 16 93,8
Eugenia uniflora Mytaceae pitangueira 5 100,0

continua...
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 167
continuação
Espécie Família Nome popular N TxS (%)
Luehea divaricata Malvaceae açoita-cavalo 16 100,0
Parapiptadenia rigida Fabaceae angico-vermelho 29 100,0
Prunus myrtifolia Rosaceae pessegueiro-do-mato 16 80,0
Psidium cattleianum Mytaceae araçá-vermelho 16 100,0
Schinus
Anacardiaceae aroeira-vermelha 14 92,9
terebentifolius
Vitex megapotamica Lamiaceae tarumã 3 100,0

Fonte: Autoras.

Schinus terebinthifolius, Parapiptadenia rigida, Luehea divaricata e


Araucaria angustifolia apresentaram os maiores valores para crescimento
em altura (Figura 5). As três primeiras espécies também apresentaram maior
crescimento em relação as demais no plantio em núcleos. Observou-se maior
crescimento nos primeiros seis meses após o plantio, seguido por estabiliza-
ção no período de inverno, mesmo padrão observado para as mudas planta-
das em núcleos. O menor crescimento em altura, tanto no plantio em núcleos
como no plantio em linhas, foi observado para a C. vernalis, provavelmente
devido a qualidade da muda.

Figura 5 – Crescimento em altura das mudas plantadas em área total na


nascente 2 (N2), na sub-bacia do Arroio Manoel Alves, Itaara, RS

120,0

100,0 A. edulis
A. angus�folia
80,0 B. salicifolius
Altura (cm)

C. vernalis
60,0 E. involucrata
E. uniflora
40,0 L divaricata
P. rigida
20,0 P. myr�folia
P. ca�leianum
0,0 S. tereben�folius
plantio 3 6 9 12 V. megapotamica
Meses após o plantio

Fonte: Autoras.
168

3.2 Atividades de extensão

O Dia de Campo sobre Técnicas de Restauração Florestal para Proteção


de Nascentes (Figura 6a) e a Oficina de Capacitação em Restauração
Ecológica de Nascentes e Matas Ciliares (Figura 6b) foram dois eventos
realizados para divulgar a experiência do projeto. Os eventos tiveram como
objetivo promover a sensibilização sobre a importância da preservação das
nascentes e matas ciliares, qualificação e formação de pessoal para promo-
ção e implantação de técnicas de restauração florestal e divulgação dos re-
sultados obtidos em Itaara.
Figura 6 – Dia de campo sobre técnicas de restauração florestal
para proteção de nascentes (a) e Oficina de capacitação em
restauração ecológica de nascentes e matas ciliares (b)

Fonte: Fundação Mo’ã.

Houve elaboração de uma cartilha sobre Restauração Ecológica em


Nascentes e Matas Ciliares (PIAIA et al. 2015a). A cartilha abordou itens
relacionados à proteção e preservação dos recursos hídricos, como serviços
ambientais prestados pelas florestas, legislação aplicada, orientações e estra-
tégias para restauração florestal de áreas degradadas a partir da experiência
prática do projeto.

3.3 Continuidade da pesquisa


O projeto teve continuidade a partir de 2015, onde foram aprofundados
os estudos de restauração ecológica nas nascentes. A partir desse período foi
desenvolvida uma dissertação de mestrado que abordou a técnica de poleiros
artificiais e deu continuidade ao monitoramento do plantio em núcleos, agre-
gando variáveis fenológicas. Também foi desenvolvida uma tese de douto-
rado que avaliou os fatores determinantes da sucessão florestal, abrangendo
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 169

aspectos como o potencial de espécies ruderais na manutenção de visitantes


florais, o papel da diversidade funcional na estruturação de comunidades e a
influência dos plantios de Eucalyptus sp. existentes no entorno na sucessão
ecológica das nascentes.

4. Considerações finais

Ao analisar as técnicas de restauração ecológica implantadas, obser-


va-se que o cercamento das áreas, possibilitando a exclusão do gado, foi
determinante para o desenvolvimento da regeneração natural. Essa prática
deve ser sempre realizada em ações de restauração, principalmente quando
houver a entrada de animais.
As mudas plantadas em linha e em núcleos apresentaram bons resulta-
dos de sobrevivência e desenvolvimento, demonstrando adaptação às condi-
ções em que foram plantadas. Contudo, não se recomenda o plantio em área
total devido ao maior custo e à artificialização do meio. Deve-se priorizar o
plantio em núcleos para favorecer os fluxos biológicos e interação entre es-
pécies. As interações beneficiam a criação de uma comunidade mais diversa
e com menores custos em relação ao plantio em área total.
A semeadura direta apresentou resultados positivos apenas para duas de
seis espécies semeadas. Recomenda-se a ressemeadura das espécies que não
germinaram e a utilização de lotes com melhor vigor.

Agradecimentos

As autoras agradecem aos proprietários das áreas: Sociedade


Vicente Pallotti, Ademar Souza e Família Gehm, ao Programa Petrobrás
Socioambiental e à CAPES, pela disponibilização de bolsas de
Pós-Graduação.
170

REFERÊNCIAS

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CAPÍTULO 8
INVENTÁRIO, DINÂMICA
E CONSERVAÇÃO DAS
PLANTAS AQUÁTICAS
Marina Deon Ferrarese
Renata Azevedo Xavier
Olímpio Rafael Cardoso
Thais Scotti do Canto-Dorow

O município de Itaara localiza-se no rebordo da Serra Geral, na região


central do Rio Grande do Sul, e é reconhecido pelas belezas naturais e paisa-
gens cênicas integradas por cascatas e matas com alta diversidade de fauna e
flora. Em decorrência disso, cerca de 77% da área total do município confi-
guram Áreas de Preservação Permanente (APP), que são enquadradas nessa
categoria devido às faixas marginais das drenagens, riachos, rios e lagos
(POELKING et al., 2015). Em virtude de suas características geomorfológi-
cas, a região se evidencia como um divisor de águas, repleta de nascentes de
água que acabam por formar lagos urbanos/balneários. Perfazendo cerca de
seis lagos urbanos/balneários ao longo do município, os quais são desfruta-
dos por visitantes e turistas em todas as épocas do ano (DIETRICH, 2011).
Os lagos urbanos possuem grande importância socioeconômica e paisa-
gística, e podem ser utilizados para usos distintos como o abastecimento pú-
blico de água, recreação, pesca, lazer, além de constituírem um forte atrativo
turístico. Esses lagos, geralmente, estão inseridos em locais de adensamen-
tos populacionais, mas apesar disso, podem apresentar uma grande diversi-
dade de organismos (BRIGHENTI, 2009). Dentre esses organismos estão as
plantas macrófitas aquáticas, conhecidas popularmente como “aguapés ou
marrequinhas”, as quais ocorrem naturalmente em corpos hídricos (lagos,
lagoas, rios, reservatórios, banhados), fazendo parte da composição desse
ambiente, sendo fundamentais para a manutenção da vida e para o funciona-
mento regular do ecossistema (THOMAZ; BINI, 2003).
Macrófita aquática, para os autores Irgang e Gastal (1996), é toda plan-
ta cujas partes fotossinteticamente ativas estão submersas ou flutuantes por
alguns meses ou permanentemente, a cada ano, e que são visíveis a olho nu.
Deste modo, englobam também as plantas de margens que tem relação com
174

água em abundância. As macrófitas aquáticas servem de alimento, abrigo e


local para reprodução e nidificação de muitas espécies animais; realizam a
ciclagem de nutrientes e filtragem da água, podendo ser utilizadas no trata-
mento de efluentes e prevenção de contaminação de corpos d’água (POTT;
POTT, 2000).
Além disso, fornecem materiais de importância econômica para a so-
ciedade, podendo ser utilizadas como alimento para o homem e para o gado,
como fertilizante de solo, matéria prima para a fabricação de remédios, uten-
sílios domésticos, artesanatos e tijolos (BORTOLOTTO; GUARIM NETO,
2005; SAMPAIO; OLIVEIRA, 2005). Essas plantas possuem adaptações
morfológicas para ambientes alagados ou brejosos, integrando espécies es-
sencialmente aquáticas até anfíbias (Figura 1), cuja ocorrência vai depen-
der da condição de maior ou menor alagamento em profundidade e duração
(JUNK, 2013).

Figura 1 – Formas de vida das macrófitas aquáticas

Fonte: Cartilha As Plantas Aquáticas e a Saúde da Água (FERRARESE; XAVIER; CANTO-DOROW, 2015).

No entanto, os lagos urbanos, assim como outros corpos hídricos, so-


frem grande influência do uso da sua bacia de drenagem, através da im-
permeabilização do seu entorno (diminuindo a capacidade de infiltração
das águas), lançamento de dejetos industriais e domésticos, refletindo no
aumento do aporte de substâncias, seja através do escoamento superficial ou
através de fontes pontuais de poluição (BRIGHENTI, 2009). Dessa forma,
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 175

os lagos tendem a refletir os problemas ambientais que afetam o município,


coletando e acumulando grandes quantidades de nutrientes e poluentes o que
pode acarretar em alterações na qualidade das águas (NABOUT; SOUZA,
2011) e também podem induzir o aparecimento de condições favoráveis para
o desenvolvimento abundante das macrófitas aquáticas (ESTEVES, 2011),
uma realidade que assola alguns dos lagos urbanos do município de Itaara.
Os principais impactos relacionados a essas plantas estão associados ao
seu crescimento excessivo, que tem a potencialidade de atingir biomassa su-
ficiente para cobrir todo espelho d’água ou o fundo do lago, comprometendo
os usos atuais e futuros do sistema, com interferências nos serviços ecossis-
têmicos (POMPÊO, 2017). Além da morte natural das plantas, que favore-
cem o assoreamento dos lagos, elevam os teores de nutrientes durante sua
decomposição e podem provocar a aceleração do processo de eutrofização.
Esse aumento de nutrientes no corpo hídrico, geralmente, é provocado
por fatores antropogênicos, através do lançamento de efluentes domésticos
e industriais sem o devido tratamento, excrementos de grandes criações de
animais, como suínos e bovinos, e através do uso de fertilizantes e agrotóxi-
cos usados na agricultura (Figura 2).

Figura 2 – Fatores que contribuem para processo de


eutrofização dos recursos hídricos, como os lagos

Fonte: Cartilha As Plantas Aquáticas e a Saúde da Água (FERRARESE; XAVIER;


CANTO-DOROW, 2015). Banco de imagens da Fundação Mo’ã.
176

Como consequência da eutrofização, surgem alterações nas característi-


cas físico-químicas da água prejudicando a comunidade aquática, a navega-
ção e o impedimento de atividades recreacionais. A eutrofização favorece a
formação de hábitats propícios à reprodução de vetores de doenças de veicu-
lação hídrica, a diminuição da biodiversidade, o aumento de conflitos entre
os usuários do recurso hídrico, o aumento no custo da produção de água
potável, a queda no turismo e o aumento do estresse urbano (PEDRALLI,
2003; DINIZ et al., 2005; PINTO-COELHO; HAVENS, 2015). Contudo,
a importância ecológica das macrófitas aquáticas vai além desses obstácu-
los, pois podem ser utilizadas como bioindicadoras da qualidade da água
(POMPÊO, 2008), auxiliando no diagnóstico de impactos ambientais, na
determinação das condições de um ambiente frente a perturbações, e podem
avaliar a efetividade de ações mitigadoras que visam a recuperação do recur-
so hídrico (DALE; BEYELER, 2001).
O manejo de um ecossistema lacustre, deve assegurar a proteção das po-
pulações de todas as espécies, garantir a manutenção de suas funções e pres-
tação de serviços ecológicos, não sendo indicada a retirada total das plantas
aquáticas (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). É preciso empreender esforços
para compreender as causas da proliferação das macrófitas em excesso, além
de controlar as consequências, reduzindo os efeitos negativos decorrentes da
grande biomassa vegetal formada. Para tanto, é recomendado que sejam rea-
lizados estudos mais abrangentes e de longo prazo que permitam compreen-
der as razões desse substancial crescimento das plantas, e então direcionar os
esforços para cessar as causas e reduzir seus respectivos efeitos negativos ao
ambiente e aos usos que a sociedade faz do corpo de água (POMPÊO, 2017).
A maior parte da população do município de Itaara tem demonstrado
grande preocupação com a proliferação das macrófitas aquáticas, pois atri-
buem a presença das plantas ao mau cheiro e à proliferação de mosquitos da
Família Simuliidae, popularmente conhecidos como borrachudos, porém, é
preciso compreender a importância dessas plantas para o ecossistema aquáti-
co. Por meio dessa perspectiva, a equipe do Projeto Saúde da Água assumiu
como uma das prioridades em seu planejamento, contribuir para o esclareci-
mento da comunidade sobre ações de conservação, monitoramento e contro-
le de plantas aquáticas na região.
A primeira ação foi a de conhecer as espécies de macrófitas aquáticas
que habitam os lagos do município, sua distribuição e diversidade de formas
de vida, além de suas interações com o ambiente. A compreensão sobre as
diferentes espécies existentes é essencial para que o manejo e a conservação
do ecossistema dos lagos urbanos (por vezes, utilizados como balneários),
possam vir a tornar-se efetivos.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 177

1. Inventário e dinâmica das macrófitas aquáticas no município


de Itaara

O estudo realizado pela equipe do Projeto Saúde da Água em três


lagos urbanos do município de Itaara (Estação Pinhal, SOCEPE e Parque
Pinhal) (Figura 3), foi pioneiro na região com o objetivo de identificar a
diversidade de espécies de macrófitas aquáticas, suas características, for-
mas de vida, sua relação com a qualidade da água, importância ecológica
e, também, registrar a fauna associada a essas plantas. Essas ações foram
desenvolvidas tendo como foco o esclarecimento da população, no sentido
de desmistificar o fato de “as marrequinhas serem a causa dos problemas
dos lagos/balneários”.

Figura 3 – Localização dos lagos urbanos estudados no município


de Itaara – Rio Grande do Sul, Brasil. Lago da Estação Pinhal
(1); Lago da SOCEPE (2) e Lago do Parque Pinhal (3)
53º50’0”W 53º47’30”W 53º45’0”W 53º42’30”W
29º27’30”S

53º46’50”W 53º46’48”W 53º46’46”W 53º46’20”W 53º46’10”W 53º46’0”W


29º35’8”S

29º36’45”S
29º30’0”S

29º35’10”S

29º36’55”S
29º32’30”S

29º35’12”S

29º37’5”S
29º35’0”S

29º36’30”S
29º37’30”S

29º36’36”S
29º40’0”S

29º36’42”S

Legenda
Município de Itaara-RS Recurso Hídricos 53º45’40”W 53º45’30”W 53º45’20”W
Mancha Urbana Lagos Urbanos Estudados
Rodovia BR-158

Fonte: Autores, 2018.

O grande aporte de nutrientes nesses locais pode ser proveniente de


diferentes fontes, como a drenagem urbana, efluentes domésticos, fertilizan-
tes, erosão do solo, entre outros. Tais nutrientes tem propiciado a prolifera-
ção excessiva de algumas dessas espécies de plantas, que chegam a formar
178

“tapetes verdes” sobre a lâmina d’água, como observado, principalmente,


nos lagos da Estação Pinhal e do Parque Pinhal (Figura 4).
Essa proliferação excessiva ocasiona uma desestabilidade no ecossiste-
ma aquático, relacionada principalmente ao declínio da qualidade da água.
Esse aspecto afeta a comunidade aquática, favorecendo a proliferação de
insetos como mosquitos, além de interferir e prejudicar o uso desses corpos
d’água para pesca, recreação e lazer, constituindo-se em um aspecto negati-
vo para a população local, bem como para os turistas.
Figura 4 – Macrófitas aquáticas no lago Parque Pinhal (Itaara-
RS), cobrindo grande parcela da lâmina de água

Fonte: Autores, 2015.

Os lagos de Itaara, mesmo afetados por impactos de origem antrópica, como


o aporte de nutrientes, a ausência de mata ciliar e a presença de resíduos sólidos,
apresentam relevante riqueza de espécies de macrófitas aquáticas, com o registro
de cerca de 70 espécies (FERRARESE et al., 2015 dados não publicados).
As macrófitas aquáticas encontradas pelo Projeto Saúde da Água habi-
tam os ambientes lacustres de diferentes formas, ocupando, principalmente,
as margens dos lagos e regiões de menor profundidade, encontram-se enrai-
zadas no solo (Figura 5) e parcialmente cobertas por água, durante um certo
período de tempo ou de forma perene, destacam-se: o pinheirinho d’ água
(Myriophyllum aquaticum (Vell.) Verdc.), a estrela branca (Oldenlandia sal-
zmannii (DC.) Benth. & Hook.f.ex B.D. Jacks), a cruz-de-malta (Ludwigia
peploides (Kunth) P.H.Raven), as gramas boiadeiras (Luziola peruviana
Juss. ex J. F. Gmel; Leersia hexandra Sw.), as trapoerabas (Tripogandra
diuretica (Mart.) Handlos; Commelina diffusa Burm.f.), as ervas de bicho
(Polygonum spp.), e os eleocaris (Eleocharis spp.).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 179

Figura 5 – Macrófitas aquáticas que ocupam, principalmente, a região marginal


dos lagos estudados. 1- pinheirinho d’água; 2- estrela-branca; 3- cruz-de-malta;
4- grama-boiadeira (Luziola peruviana); 5- trapoeraba (Commelina diffusa)

Fonte: Autores, 2018.

Desenvolvem-se também espécies que se caracterizam por flutuar


livremente sobre a água (Figura 6), tais como: o aguapé (Eichhornia crassi-
pes (Mart.) Solms); a marrequinha (Salvinia sp.); a samambaia d’água (Azolla
sp.); a lentilha-d’água (Lemna sp). Essas plantas não fixam suas raízes no solo,
assim podem ser movidas pela ação do vento e da corrente de água, ocupando
180

diversas áreas dos lagos. As macrófitas são ainda representadas por plantas que
flutuam sobre a coluna d’água, mas possuem as raízes fixas no solo (Figura 6),
como a ninfeia (Nymphoides humboldtiana (Kunh) Kuntze).

Figura 6 – Macrófitas aquáticas flutuantes livres (1 a 4) e fixa (5). 1- aguapé;


2- marrequinha; 3- samambaia d’água; 4- lentilha-d’água; 5- ninfeia

Fonte: Autores, 2015.

Dentre os fatores que demonstram a importância dessas plantas,


ressalta-se a sua relevância por constituírem o ambiente de vida, a fon-
te de alimento e o abrigo para diversos animais, como anfíbios (rã-boia-
deira- Pseudis minutus Günther, 1858), répteis (tartaruga-tigre-d’água
– Trachemys dorbigni Duméril & Bibron, 1835), mamíferos (ratão-do-ba-
nhado – Myocastor coypus Molina, 1782) e aves (jaçanã – Jacana jacana
L.,1766; frango-d’água-comum – Gallinula galeata Lichtenteins, 1818;
biguá – Nannopterum brasilianus Gmelin, 1789), conforme constatado nos
ambientes estudados (Figura 7).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 181

Figura 7 – Representantes da fauna em ambiente com macrófitas


aquáticas em Itaara-RS. 1- ratões-do-banhado sobre as macrófitas
no Lago da Estação Pinhal; 2- frango-d ‘água-comum nadando
em meio às macrófitas no Lago da Estação Pinhal

Fonte: Autores, 2015.

Algumas espécies de plantas aquáticas se apresentaram de maneira


mais abundante do que outras, destacando-se na paisagem dos lagos estuda-
dos (Figura 8). Nos lagos do Balneário Pinhal e da Estação Pinhal foi notório
o estabelecimento de densa população de aguapé, flutuando livremente e co-
brindo a maior parte da lâmina d’água. Por outro lado, no lago da SOCEPE,
observou-se proeminência da flutuante fixa ninfeia, distribuindo-se desde a
margem até regiões um pouco mais profundas do lago, porém, de maneira
menos intensa que a ocupação dos outros lagos pelo aguapé.
182

Figura 8 – Macrófitas que se destacam na paisagem dos lagos


estudados: o aguapé no Lago do Balneário Pinhal (1) e no Lago
da Estação Pinhal (2); a ninfeia no lago da SOCEPE (3 e 4)

Fonte: Autores, 2015.

As macrófitas aquáticas presentes nos lagos de Itaara representam


grupos distintos de plantas, distribuídas desde o interior dos lagos até as
margens. São representadas por plantas do grupo das Samambaias, que não
apresentam flores (marrequinha e a samambaia d’água) e, também, por es-
pécies do grupo das Angiospermas, que se caracterizam por desenvolverem
flores, tais como: as gramíneas, os aguapés, as orquídeas, os juncos, a cruz-
-de-malta. Assim, essa vegetação que se desenvolve em várias regiões dos
lagos compõem uma exuberante paisagem por meio das diversas formas de
vida, das flores (com várias cores e formatos) e das folhas (com vários tons
de verde e por vezes vistosas) (Figura 9).
Além disso, esse conjunto de plantas presta consideráveis serviços
ecossistêmicos ao ambiente, para outros organismos e para o ser humano.
Foi constatado nos três lagos estudados a proliferação excessiva de algumas
das espécies de macrófitas, o que pode ser compreendido como alerta, ou
seja, essa excepcional quantia de biomassa de plantas é indicadora do grande
aporte de nutrientes que chega até esses corpos hídricos.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 183

Figura 9 – Macrófitas aquáticas em diferentes conjuntos de espécies e


regiões dos lagos (Itaara-RS) compondo o ambiente, com singular beleza

Fonte: Autores, 2015.

2. Conservação das macrófitas aquáticas no município de Itaara

A educação é um instrumento impulsionador da transformação so-


cial. Os investimentos em educação têm muitos outros aspectos relevan-
tes, além de incentivarem a mobilidade e o bem-estar social. É notório que
diversos indicadores associados à saúde pública, à paz, à justiça social e
à conservação do meio ambiente estejam relacionados ao grau de investi-
mentos que um determinado país aplica em educação (PINTO-COELHO;
HAVENS, 2015).
Conforme o Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata
Atlântica (LINO; DIAS, 2003), para o pleno exercício de uma política in-
tegrada de conservação e gestão de recursos hídricos e florestais, é consi-
derado como um de seus princípios básicos: “reconhecer a importância da
educação ambiental como processo explicitador das relações de interdepen-
dência entre florestas e águas, integrando informações e contribuindo para a
internalização de conceitos junto a todos os segmentos da sociedade”.
184

Diante da importância da educação ambiental para a conservação dos


ecossistemas e também para a mobilização social, a equipe do Projeto Saúde
da Água desenvolveu oficinas teórico-práticas com escolas e comunidade
em geral, além da elaboração de uma cartilha educativa.
As oficinas foram organizadas com o intuito de disseminar o conheci-
mento obtido através do estudo realizado sobre as macrófitas aquáticas de
Itaara (FERRARESE et al., dados não publicados), informar a população
sobre a importância das plantas aquáticas e desconstruir a ideia de que elas
são plantas daninhas e a causa dos problemas enfrentados pelos lagos do
município, sendo apenas uma consequência do grande aporte de nutrientes
nestes ambientes.
Foram realizadas duas oficinas junto às comunidades do entorno dos
lagos estudados – Estação Pinhal e com funcionários da SOCEPE, além
de mais duas oficinas realizadas com os Clubes de Ecologia Guardiões das
Nascentes da Escola Municipal de Ensino Fundamental Alfredo Lenhardt.
Durante as oficinas foram abordados temas como a importância das ma-
crófitas aquáticas para o ecossistema aquático, seus usos pelo homem, suas
adaptações ao ambiente aquático, e os possíveis motivos do grande cresci-
mento populacional em alguns ambientes. Também, foram discutidas formas
de manejo e controle da proliferação dessas plantas, bem como a utilização
de parâmetros físico-químicos da água para avaliar a qualidade da água.
Na parte prática da oficina, os participantes conheceram e observaram
as adaptações morfológicas das macrófitas ao meio aquático, seus hábitos e
formas de vida. Visualizaram algumas estruturas que facilitam a flutuação
dessas plantas e características peculiares das folhas (como os pelos proteto-
res – tricomas), bem como a dimensão de suas raízes. Essas características
vistas, inclusive, em maior detalhe, com auxílio de uma lupa (estereomicros-
cópio). Além disso, sentiram a textura (folhas, caule, raízes) das diferentes
espécies observadas.
Ainda, compondo as atividades práticas, foram medidos com os equi-
pamentos Oxímetro e pHmetro, alguns parâmetros físico-químicos da água
(oxigênio dissolvido, pH e temperatura da água), e associação dos parâme-
tros analisados às regiões com maior proliferação das macrófitas e fontes
pontuais de lançamento de efluentes em comparação a locais com uma pre-
sença reduzida das plantas.
A cartilha “As Plantas Aquáticas e a Saúde da Água” (FERRARESE;
XAVIER; CANTO-DOROW, 2015) foi elaborada com formato didático,
visando tornar o conhecimento científico acessível à comunidade, constituindo-
-se em um instrumento importante associado à educação ambiental.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 185

As cartilhas foram distribuídas para a comunidade escolar e comuni-


dade em geral. Buscou-se também, através das oficinas e da cartilha (Figura
10), que as pessoas compreendessem a realidade do lago do seu bairro e ins-
tigasse o papel (direitos e deveres) de cada um nesse contexto, o de buscar a
melhoria da qualidade ambiental associada à população local.

Figura 10 – Instrumentos de sensibilização ambiental: Oficina teórica e prática


“Conhecendo as Plantas que vivem na água” (1 a 3) e cartilha desenvolvida
durante o projeto “As Plantas Aquáticas e a Saúde da Água” (4)

Fonte: Autores, 2015.

Como a população de Itaara já demonstrava interesse e empenho em


“resolver o problema das macrófitas”, a comunidade já havia se mobiliza-
do para um manejo inicial, através da retirada mecânica da biomassa que
cobria quase que totalmente o espelho d’água, nos lagos Estação Pinhal e
Parque Pinhal.
Através da oportunidade de diálogo nas oficinas realizadas pelo Projeto
Saúde da Água, após a elucidação sobre a relevância dessas plantas para o
ambiente aquático e sua função no ecossistema, ressaltou-se a relevância em
se manter uma certa quantidade de bancos de macrófitas aquáticas para que
186

elas exerçam seu papel na manutenção e conservação dos serviços ecossistê-


micos (Figura 11). Além de reiterar a investigação a respeito das causas que
contribuem para a excessiva proliferação das plantas e colaboração entre
comunidade e poder público para a resolução desses distúrbios.

Figura 11 – Imagem do Lago da Estação Pinhal, com proliferação


excessiva de macrófitas aquáticas. 1) Lago da Estação Pinhal em janeiro
de 2015; 2) Lago da Estação Pinhal, depois das ações de manejo e controle,
iniciadas pela ação proativa da própria comunidade, em 2017

Fonte: Autores, 2015 e 2017.

Considerações finais
Ressalta-se aqui, a riqueza e beleza das macrófitas aquáticas encontra-
das nos ambientes lacustres estudados no município de Itaara, compostas
por samambaias, gramíneas, juncos, aguapé, lentilha-d’água, ninfeia, cruz-
-de-malta, orquídeas, dentre outras, com diversas formas, adaptações, cores
e flores singulares. Além da vasta diversidade de animais que as utilizam
como fonte de alimento, como substrato ou para refúgio. Cabe destacar a
importância deste estudo no sentido de “conhecer para preservar”, além
de “conhecer para manejar”, em que programas de gestão, monitoramento
e manejo específicos poderão ser desenvolvidos. No entanto, para obten-
ção de êxito, é necessária a cooperação entre pesquisadores, comunidade e
poder público.
Ao identificar e combater as fontes de contaminação dos lagos urbanos
e realizar o manejo adequado para controlar o crescimento excessivo das
populações de macrófitas aquáticas, será possível assegurar a conservação
da biodiversidade local, a boa qualidade da água, impactando diretamente na
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 187

saúde e no bem-estar da população, ganho paisagístico e também no retorno


econômico, uma vez que as atividades de lazer e turismo serão incentivadas.
Recomenda-se que junto às práticas de conservação da biodiversidade dos
lagos e seu entorno, sejam feitas ações de recuperação e restauração das
matas ciliares das áreas de APP e destinação adequada de resíduos sólidos.

Fonte: Cartilha As Plantas Aquáticas e a Saúde da Água (FERRARESE; XAVIER;


CANTO-DOROW, 2015). Banco de imagens da Fundação Mo’ã.
188

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v. 39, n. 2, p. 215-223, 2015.
POMPÊO, M. Monitoramento e manejo de macrófitas aquáticas. Oecologia
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______. Monitoramento e manejo de macrófitas aquáticas em re-
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POTT, V. J.; POTT, A. Plantas aquáticas do Pantanal. Brasília: Embrapa,
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PRIMACK, R. B.; RODRIGUES, E. Biologia da Conservação. 7. imp.
Londrina: Editora Planta, 2001. 328 p.
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THOMAZ, S. M.; BINI, L. M. (Ed.). Ecologia e manejo de macrófitas
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CAPÍTULO 9
A FLORA VASCULAR DA RESERVA
PARTICULAR DO PATRIMÔNIO
NATURAL ESTADUAL MO’Ã:
composição, importância e aspectos de manejo
Marina Deon Ferrarese
Thais Scotti do Canto-Dorow

1. Introdução

O Brasil é o país com a maior biodiversidade do mundo, assim é con-


templado por exuberante riqueza de espécies (cerca de 46.498 espécies)
conhecidas da flora (REFLORA, 2016), cuja conservação é de global impor-
tância (LEWINSOHN; PRADO, 2005; MARINI; GARCIA, 2005; MYERS
et al., 2000). Apesar dessa emblemática representação, somente cerca de
16% de seu território situa-se em Unidades de Conservação (UC), sendo a
maioria concentrada na região amazônica. Para o estado do Rio Grande do
Sul (RS), aproximadamente 2,6% do seu do território estão protegidos em
UC estabelecidas pelos poderes públicos Federal, Estadual, Municipal ou
pela iniciativa privada, sendo somente 0,8% de proteção integral (GERS,
2008). Salienta-se ainda que o RS está integrado pela Mata Atlântica e o
Pampa (IBGE, 2004), que estão entre os biomas brasileiros com menor
cobertura vegetal remanescente, apresentando-se com significativa degrada-
ção (MMA, 2018). Esse impacto pode ser evidenciado a partir do Decreto
nº 52.109, de dezembro de 2014, que declara as espécies da flora nativa
ameaçadas de extinção no estado do Rio Grande do Sul, sendo que 812,
dessas espécies, estão enquadradas em alguma categoria de ameaça (RIO
GRANDE DO SUL, 2014a).
A Fundação MO’Ã Estudos e Pesquisas para Proteção e Desenvolvimento
Ambiental, é uma organização não governamental criada em 1997, que atua
visando a sensibilização ambiental na defesa dos ecossistemas naturais e
da proteção ambiental (FERRARESE; XAVIER; CANTO-DOROW, 2015).
Em 2007 recebeu, de ambientalistas, a doação de uma área com cerca de 24
ha localizada no Rincão dos Minellos, zona rural de Itaara, região central
192

do Rio Grande do Sul. Assim, a MO’Ã iniciou a recuperação dos danos


ambientais observados nessa propriedade, ocasionados por desmatamento
e atividades como a pecuária e plantações desenvolvidas no passado. Em
2015, essa área foi instituída como Reserva Particular do Patrimônio Natural
(RPPN) Estadual MO’Ã (RIO GRANDE DO SUL, 2015), objetivando a
conservação da diversidade biológica e dos ecossistemas naturais. Em de-
corrência disso, para sua gestão, faz-se necessária a elaboração de um plano
de manejo, baseado na compreensão das características dessa área, sendo de
grande importância o conhecimento da flora local.
A RPPN Estadual MO’Ã situa-se no sudeste do município de Itaara,
região drenada pela Bacia Hidrográfica do Arroio Manoel Alves; é um dos
afluentes do Arroio Grande, integrante da bacia hidrográfica do rio Vacacaí-
Mirim, possui amplitude altimétrica de 200 metros, menor incidência de
luz solar e maior umidade, apresentando declividade acentuada, principal-
mente na porção norte da área, configurando um relevo típico do Rebordo
do Planalto Sul-Riograndense (KORMANN et al., 2010). Nesse município,
ocorrem remanescentes dos biomas Pampa e Mata Atlântica (IBGE, 2008),
essa representada pela Floresta Estacional Decidual, na qual encontra-se a
RPPN Estadual MO’Ã (Figura 1).
Figura 1 – Localização da RPPN Estadual MO’Ã e dos
remanescentes dos biomas no município de Itaara, RS, Brasil

Localização dos Remanescentes de Vegetação Nativa em Itaara-RS

29º30’0”S

29º33’0”S

29º36’0”S

Legenda 29º39’0”S

Itaara Remanescentes
53º51’0”W 53º48’0”W 53º45’0”W 53º42’0”W
RPPN MO’Ã Mata Atlântica Sistema de Projeção Geográfica:
SIRGAS 2000
Antropização Pampa Fonte: SOS Mata Atlântica
Elaboração:
Weber, A.A. 2016

Fonte: WEBER, 2016.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 193

2. Bioma Mata Atlântica e as Unidades de Conservação

Esse bioma encontra-se drasticamente reduzido, devido a histórica ex-


ploração dos seus recursos naturais, agricultura, urbanização e industriali-
zação (DEAN, 1996). Sua área apresenta-se extremante degradada e frag-
mentada, constituída por cerca de 11% dos seus remanescentes da vegetação
original, em maior parte fragmentos pequenos, menores que 50 ha (RIBEIRO
et al., 2009). Ainda é alvo de degradação, como demonstra a taxa anual bra-
sileira de desflorestamento dos remanescentes da Mata Atlântica, que em
período recente (2015 a 2016) foi de 29,075 ha sendo a mais alta entre os úl-
timos cinco anos (INPE, 2017). Contudo, somente 22 % (aproximadamente)
de seus remanescentes vegetacionais originais encontram-se em diferentes
estágios de regeneração (MMA, 2018), dos quais são preservados apenas
7,2% em unidades de conservação e, somente, 2,15% estão em Unidades de
Proteção Integral (CUNHA, 2010).
A fragmentação gera a perda e a dificuldade de deslocamento de al-
gumas espécies, influindo em processos ecológicos, mas, apesar disso, os
fragmentos ainda podem conter significativa biodiversidade e representar
uma possibilidade para conectar maiores fragmentos, evitando o isolamen-
to, mitigando os efeitos da devastação desse bioma (PARDINI et al., 2005;
UEZU; BEYER; METZGER, 2008).
O bioma Mata Atlântica, mesmo muito reduzido e fragmentado, ain-
da possui cerca de 5% de espécies da flora mundial (STEHMANN et al.,
2009), compreendendo aproximadamente 2% das espécies endêmicas
mundiais da flora, consiste em uma das regiões mais biodiversas do pla-
neta (MYERS et al., 2000). É qualificado como um hotspot mundial, por
apresentar alta concentração de espécies endêmicas (que só ocorrem nesse
bioma) e alto grau de ameaça devido à perda de hábitat, com destruição de
70% ou mais de sua vegetação original primária, sendo uma das áreas de
maior necessidade de esforços conservacionistas (MYERS et al., 2000).
Entre os meios que visam garantir a conservação da diversidade
biológica destaca-se a criação e implementação de Unidades de Conservação
da Natureza (UC) (MMA, 2000; BRASIL, 2000). Dentre essas UCs
encontra-se a Reserva Particular do Patrimônio Natural, na qual são
permitidas a pesquisa científica e a visitação com objetivos turísticos,
recreativos e educacionais, conforme a Lei Federal nº 9.985/2000 e o Decreto
Estadual nº 46.519/2009.
A criação de uma RPPN pode ser realizada em qualquer uma das três
esferas do governo (Federal, Estadual ou Municipal) e parte do interesse
espontâneo do proprietário, mediante reconhecimento do Poder Público,
194

por ser considerada de relevante importância pela sua biodiversidade, ou


pelo seu aspecto paisagístico, ou ainda por suas características ambien-
tais que justifiquem ações de recuperação (SOUZA et al., 2012; BRASIL,
2006; BRASIL, 1996).
No Brasil há escassez dos recursos públicos para a manutenção das
UC já implementadas e para a criação e gestão de novas áreas de conser-
vação, assim a RPPN desenvolve-se como uma importante alternativa para
ampliação e manutenção de áreas de proteção e conservação da biodiver-
sidade com a participação da iniciativa privada (SANTOS; COSTA, 2008;
SOUZA et al., 2012).
Nos últimos anos, houve um aumento na criação de RPPN em todos
os biomas brasileiros, porém, houve uma diminuição no tamanho médio
dessas UC (desde 2005), com isso, elas protegem apenas 0,1% do ambiente
terrestre do país. Ainda assim, continuam sendo relevantes tendo em vista
regiões que ainda não possuem áreas públicas protegidas, bem como, para
complementar a conservação da biodiversidade quando existem UC públi-
cas (PEGAS; CASTLEY, 2016).
Apesar da maioria das RPPN da Mata Atlântica ser localizada em
pequenas áreas, são fundamentais, quando geridas adequadamente, para
conservação local e em escalas regionais para a implementação de corre-
dores de biodiversidade e mosaicos dentro de uma biorregião, principal-
mente em biomas altamente fragmentados como a Mata Atlântica (PEGAS;
CASTLEY, 2016; LIMA; FRANCO, 2014).
Dentre os diversos fatores que ressaltam a importância das RPPN,
destacam-se sua contribuição para a conservação da flora (FIGUEIREDO;
SALINO, 2005; SANTOS; COSTA, 2008; SAKA; LOMBARDI, 2016),
por abrigar mais de 2.000 espécies vegetais e cerca de 20% das espécies
ameaçadas da Mata Atlântica (OLIVEIRA, 2010). Mesmo em pequenas
áreas, os fragmentos dessas UC podem apresentar grande riqueza de es-
pécies (SAKA; LOMBARDI, 2016), e constituírem áreas com potencial
para descoberta de espécies raras, endêmicas e de novas localidades de
ocorrência de representantes da vegetação (SANTOS; COSTA, 2007;
OLIVEIRA, 2010).
Apesar da relevância das RPPN na Mata Atlântica, ainda há falta de
informações, somente cerca de 20% dessas UC possuem pesquisa realiza-
das em sua extensão. A maioria não possui registros sobre dados biológicos
básicos, como por exemplo, as espécies que abriga (OLIVEIRA, 2010), o
que é de extrema importância para possibilitar a gestão efetiva da UC a fim
de assegurar a conservação da biodiversidade.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 195

3. A RPPN Estadual MO’Ã: diferentes ambientes e as espécies


vegetais nativas a eles associadas

A RPPN Estadual MO’Ã apresenta uma fisionomia composta por dis-


tintos ambientes (Figura 2), devido à ocupação passada dessa área e também,
em decorrência das suas condições de declividade, altimetria e orientação de
vertentes (KORMANN et al., 2010).
Na área, a vegetação em estágio mais antigo e preservado ocorre nas
regiões de elevada declividade, com acúmulo de serapilheira sobre rochas,
principalmente, as que integram regiões inferiores das encostas no interior da
floresta. A mata ciliar acompanha a maior parte da rede de drenagem, sobres-
saindo-se na paisagem. A porção campestre distribuída em regiões de terras
mais baixas, de menor declividade, se desenvolve em fragmentos oriundos
de antigo desmatamento, encontrando-se atualmente em regeneração. O
campo apresenta ainda algumas áreas úmidas próximas aos cursos d’água,
mas ocorrem também, em regiões de borda próximas da área florestal.

Figura 2 – Diferentes ambientes da RPPN Estadual MO’Ã, Itaara, RS,


Brasil. 1) visão lateral da área, evidenciando amplitude altimétrica; 2)
encosta íngreme; 3) porção campestre; 4) interior da mata ciliar

Fonte: FERRARESE, 2016.


196

Esses diferentes ambientes permitem o desenvolvimento de consi-


derável riqueza de espécies da flora, mesmo que, em um remanescente
de Mata Atlântica relativamente pequeno, como evidenciado pelo levan-
tamento florístico das espécies vasculares (Samambaias, Angiospermas e
Gimnospermas) que registrou 277 táxons (nativos do Brasil) pertencentes
a 72 famílias (FERRARESE, 2016).
Na RPPN Estadual MO’Ã, as Samambaias apresentam-se como herbá-
ceas que se desenvolvem no solo, como por exemplo, a avenca (Adiantum
pseudotinctum Hieron.), mas também, há as que vivem sobre outras plantas
(rabo-de-arara – Niphidium rufosquamatum Lellinger) e sobre as rochas
(Campyloneurum). Elas são representadas por uma única espécie consi-
derada arborescente, o samambaiaçu (Alsophila setosa Kaulf), presente
geralmente em grupos e em áreas de alta declividade e altitude.
Nas áreas mais baixas do relevo, configurando a paisagem campestre,
ocorrem essencialmente espécies herbáceas, juntamente com alguns arbus-
tos. Destacam-se para esses locais, principalmente, gramíneas (Poaceae
– gêneros Paspalum e Setaria), compostas como carquejas, margari-
das do campo (Asteraceae – gêneros Baccharis, Senecio, Adenostemma,
Vernonanthura), espécies de trevo (Oxalidaceae – Oxalis), tiriricas
(Cyperaceae – Cyperus), solanáceas (Solanaceae – Solanum), entre outras.
Na porção mais úmida do campo, próxima ao rio, desenvolvem-
-se plantas características de ambientes úmidos, como a cruz-de-malta
(Ludwigia), as trapoerabas, (Commelina, Tripogandra) e a erva-de-bicho
(Polygonum). Na mata ciliar, em clareiras próximas às margens do recur-
so hídrico, destaca-se o capim-palmeira (Setaria sulcata Raddi), chamado
assim devido ao seu grande porte (cerca de 1,50 m de altura) e folhas que
lembram as frondes de uma palmeira. Nesse ambiente, também se encon-
tram os representantes mais delicados da vegetação como o quebra-pedra
(Phyllanthus niruri L.) e o trevo amarelo (Oxalis subvillosa Norlind).
Salienta-se que essa última espécie faz parte da segunda população re-
gistrada no RS, encontrada através de levantamento florístico, na RPPN
Estadual MO’Ã (FERRARESE, 2016).
Salienta-se, também, as espécies herbáceas que prevalecem na por-
ção florestal ocupando, preferencialmente, locais sombreados e úmidos:
as orquídeas, (Sarcoglottis ventricosa (Vell.) Hoehne, Aspidogyne ku-
czynskii (Porsch) Garay, Malaxis parthonii C. Morren, dentre outras), as
pimentinhas do mato (Peperomia hispidula (Sw.) A. Dietr., Peperomia ly-
man-smithii Yunck.) e as gramíneas florestais (Pharus lappulaceus Aubl.).
Na área da RPPN Estadual MO’Ã, também foram observados indiví-
duos arbustivos. Na área campestre, o fumo-bravo (Solanum mauritianum
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 197

Scop.) e o esporão de galo (Vassobia breviflora (Sendtn.) Hunz). Na por-


ção florestal, destacam-se pela visível representatividade, o cafeeiro-do-
-mato (Psychotria leiocarpa Cham. & Schltdl.) e o urtigão-bravo (Urera
baccifera (L.) Gaudich. ex Wedd.). Na mata ciliar, salientam-se o topete-
-de-cardeal (Calliandra brevipes Benth.) e o sarandi (Colliguaja brasilien-
sis Klotzsch ex Baill.).
As trepadeiras nativas também estão presentes na área da RPPN
Estadual MO’Ã. Na borda da floresta elas são representadas pela enreda-
deira (Ipomoea indivisa (Vell.) Hallier f.) e mofungo-gigante (Chamissoa
altissima (Jacq.) Kunth), dentre outras. Já no interior florestal, encontra-se
a unha de gato (Senegalia tucumanensis (Griseb.) Seigler & Ebinger) e
escada-de-macaco (Schnella microstachya Raddi).
As espécies arbóreas que se desenvolvem na área florestal são: ta-
rumã (Vitex megapotamica (Spreng.) Moldenke), laranjeira-do-mato
(Actinostemon concolor (Spreng.) Müll.Arg.), limoeiro-do-mato (Randia
ferox (Cham. & Schltdl.) DC.), tajuva (Maclura tinctoria (L.) D.Don ex
Steud.), cedro (Cedrela fissilis Vell.), ocupando, predominantemente, áreas
elevadas e de fisionomia aparentemente mais antiga, devido à ocorrência
de árvores de maior porte no conjunto da vegetação. Destacam-se, também,
o umbu (Phytolacca dioica L.) e a corticeira-da-serra (Erythrina falcata
Benth.), principalmente em áreas contíguas aos cursos d´água, juntamente
com o vacum (Allophylus guaraniticus (A. St.-Hil.) Radlk.), o camboatá-
-vermelho (Cupania vernalis Cambess.), o camboatá-branco (Matayba ela-
eagnoides Radlk.), o leiteiro (Sebastiania brasiliensis Spreng.) e o chal-
-chal (Allophylus edulis (A.St.-Hil. et al.) Hieron. ex Niederl.).
Na composição da flora epífita destacam-se as orquídeas, peperômias,
cactos e bromélias. Essas últimas encontram-se sobre árvores localizadas
preferencialmente na área florestal (Billbergia e Vriesea) e algumas es-
pécies, conhecidas popularmente como cravo-do-mato (Tillandsia), con-
seguem se desenvolver sobre arbustos e eventuais árvores existentes no
campo. As peperômias (Peperomia) crescem na região florestal em áreas
sombreadas e nas áreas mais iluminadas desse ambiente, como bordas da
floresta com o campo e nas proximidades do rio. Locais de significativa
ocorrência, também, para os cactos comumente denominados como rabo-
-de-rato (Lepismium e Rhipsalis).
Além dos grupos vasculares já comentados, as Samambaias e
Angiospermas, ressalta-se ainda as Gimnospermas, que compreendem
apenas duas espécies: a araucária ou pinheiro-do-paraná (Araucaria
angustifolia (Bertol.) Kuntze) e o podocarpos (Podocarpus lambertii
Klotzsch ex Endl.).
198

A flora na área da RPPN Estadual MO’Ã apresenta expressiva rique-


za (FERRARESE, 2016), representada por diferentes formas de vida que
se desenvolvem nos distintos ambientes e substratos (Figuras 3 a 9), que
somados, culminam na singularidade da área, bem como de suas diferen-
tes paisagens.

Figura 3 – Espécies de Samambaias e Gimnosperma nativas registradas


na RPPN Estadual MO’Ã. 1) Pecluma sicca (Lindm.) M.G.Price; 2)
Doryopteris nobilis (T.Moore) C.Chr.; 3) Ctenitis submarginalis (Langsd. &
Fisch.) Ching; 4) rabo-de-arara (Niphidium rufosquamatum Lellinger); 5)
samambaiaçu (Alsophila setosa); 6) araucária (Araucaria angustifolia)

Fonte: Autor, 2018.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 199

Figura 4 – Herbáceas nativas observadas na região campestre da RPPN


Estadual MO’Ã. 1) batata-silvestre (Solanum commersonii Dunal);
2) Adenostemma brasilianum (Pers.) Cass.; 3) Vernonanthura tweediana (Baker)
H.Rob.; 4) trapoereba (Tripogandra diuretica (Mart.) Handlos); 5) trevo
rosa (Oxalis floribunda Lehm.); 6) carrapicho-do-brejo (Alternanthera
philoxeroides (Mart.) Griseb.); 7) bibi (Herbertia sp.); 8) capim-palmeirinha
(Setaria sulcata Raddi); 9) e 10) quebra-pedra (Phyllanthus niruri L.);
11) carqueja (Baccharis trimera (Less.) DC.); 12) anêmone (Anemone
decapetala Ard.); 13) trevo amarelo (Oxalis subvilosa Norlind)
1 2

3 4

6 7

10

9 11

8 12 13

Fonte: Autor, 2018.


200

Figura 5 – Herbáceas nativas observadas na região florestal da RPPN


Estadual MO’Ã. 1) capim-bambu (Pharus lappulaceus Aubl.); 2) orquídea
(Sarcoglottis ventricosa (Vell.) Hoehne); 3) Peperomia lyman-smithii Yunck.;
4) Peperomia hispidula (Sw.) A. Dietr.; 5) Salvia regnelliana Briq.; 6)
tiririca-do-mato (Carex sellowiana Schltd.l); 7) orquídea Malaxis parthonii
C.Morren; 8) erva-capitão (Hydrocotyle leucocephala Cham. & Schltdl);
9) orquídea Aspidogyne kuczynskii (Porsch) Garay; 10) arbustinho-do-
mato (Galianthe brasiliensis (Spreng.) E.L.Cabral & Bacigalupo)

1 2 3

5 6 7

8 9
4

Fonte: FERRARESE, 2016


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 201

Figura 6 – Espécies arbustivas nativas observadas na área da RPPN Estadual


MO’Ã. 1) fumo-bravo (Solanum mauritianum Scop.); 2) esporão-de-galo
(Vassobia breviflora (Sendtn.) Hunz.); 3) flor-de-fogo (Ruellia cf. angustiflora
(Nees) Lindau ex Rambo); 4) cafeeiro-do-mato (Psychotria leiocarpa Cham.
& Schltdl); 5) farroupilha (Justicia floribunda (C.Koch) Wassh.); 6) urtigão-
bravo (Urera baccifera (L.) Gaudich. ex Wedd.); 7) sapatinho (Pombalia
bigibbosa (A.St.Hil.) Paula-Souza); 8) Sarandi (Colliguaja brasillensis
Klotzsch ex Baill.); 9) topete-de-cardeal (Calliandra brevipes Benth)

Fonte: FERRARESE, 2016.


202

Figura 7 – Espécies de trepadeiras nativas observadas na RPPN Estadual


MO’Ã. 1) Mikania ternata (Vell.) B.L.Rob.; 2) joá-cipó (Solanum laxum
Spreng.); 3) enredadeira (Ipomoea indivisa (Vell.) Hallier f.); 4) trepadeira-
pintora (Fischeria stellata (Vell.) E.Fourn.); 5) mofungo-gigante (Chamissoa
altissima (Jacq.) Kunth); 6) escada-de-macaco (Schnella microstachya Raddi-
folha); 7) escada-de-macaco (Schnella microstachya-caule)

Fonte: FERRARESE, 2016.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 203

Figura 8 – Espécies arbóreas nativas observadas na área da RPPN Estadual


MO’Ã. 1) tarumã (Vitex megapotamica (Spreng.) Moldenke); 2) limoeiro-
do-mato (Randia ferox (Cham. & Schltdl.) DC.); 3) vacum (Allophylus
guaraniticus (A. St.-Hil.) Radlk.); 4) cedro (Cedrela fissilis Vell); 5) leiteiro
(Sebastiania brasiliensis Spreng.); 6) chal-chal (Cupania vernalis Cambess.);
7) Ingá (Inga virescens Benth.); 8) tajuva (Maclura tinctoria (L.) D.Don ex
Steud.); 9) chal-chal (Allophylus edulis (A.St.-Hil. et al.) Hieron. ex Niederl)

1 2

4 5
4

8 9

Fonte: FERRARESE, 2016.


204

Figura 9 – Espécies epifíticas nativas observadas na RPPN Estadual MO’Ã.


1) orquídea (Gomesa riograndensis (Cogn.) M.W.Chase & N.H.Williams); 2)
cravo-do-mato (Tillandsia stricta Sol.); 3) Peperomia tetraphylla (G.Forst.)
Hook. & Arn.; 4) Peperomia catharinae Miq.; 5) Peperomia psilostachya
C.DC.; 6) cravo-do-mato (Tillandsia geminiflora Brongn.); 7) Lepismium
houlletianum (Lem.) Barthlott; 8) bromélia (Vriesea friburgensis var.
tucumanensis (Mez) L.B.Sm.); 9) cactos (Lepismium cruciforme (Vell.)
Miq.); 10) bromélia (Billbergia nutans H.H.Wendl. ex Regel)
1 2

4 5

3
6

10
7

8 8

Fonte: FERRARESE, 2016.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 205

4. RPPN Estadual MO’Ã: relevância e manejo

4.1 Importância no contexto da conservação da flora


A vegetação da RRPN Estadual MO’Ã merece destaque por constituir-
-se em fragmento de Mata Atlântica, com Floresta Estacional Decidual, que
apresenta áreas de encostas íngremes menos afetadas pelos impactos decor-
rentes de atividades, como a agricultura e a pecuária. Assim apresentam uma
flora mais preservada, o que demonstra a importância e o potencial para a
conservação desse remanescente.
É importante ressaltar que a propriedade se localiza em área prioritária
para conservação, na região central do estado, que compõem o Corredor
Ecológico da Quarta Colônia, reconhecido pela portaria da Secretaria Estadual
do Meio Ambiente nº 143 de 2014 (RIO GRANDE DO SUL, 2014b). Com
essa estratégia de gestão territorial, a RPPN Estadual MO’Ã possui potencial
para possibilitar o fluxo genético e de organismos; abrigar populações de
espécies da flora que necessitem de maior área para sobrevivência; preservar
os ecossistemas naturais e a biodiversidade a eles associada.
Enfatiza-se ainda a relevância ecológica da região na qual a UC
está inserida, tombada como Reserva da Biosfera da Mata Atlântica pela
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura em
1993, sendo a região da Quarta Colônia uma das áreas para sua implantação
(MARCUZZO; PAGEL; CHIAPPETTI, 1998, BRASIL 2002).
Além disso, salienta-se que na área dessa RPPN há registro de espé-
cies da flora de interesse elevado para conservação, ou seja, que são enqua-
dradas em alguma das categorias de ameaça (FERRARESE, 2016, IUCN,
2016a). Considerando a Lista Estadual das Espécies da Flora Ameaçadas
de Extinção (RIO GRANDE DO SUL, 2014a), essa UC apresenta quatro
espécies classificadas como vulneráveis (VU), enfrentando um risco de ex-
tinção elevado na natureza (IUCN, 2016b), sendo elas: mofungo-gigante
(Chamissoa altíssima), trepadeira-pintora (Fischeria stellata), a paineira
(Ceiba speciosa (A.St.-Hil.) Ravenna) e a cabreúva (Myrocarpus frondosus
Allemão). Também há duas espécies inseridas na categoria criticamente em
perigo (CR), a araucária (Araucaria angustifolia) e o trevo amarelo (Oxalis
subvillosa), indicando que estão enfrentando um risco extremamente eleva-
do de extinção na natureza (IUCN, 2016b).

4.2 Aspectos sobre o manejo da vegetação

Nessa UC, as áreas antigamente cultivadas e desmatadas encontram-se


em progresso de regeneração natural espontânea, com estabelecimento de
206

arbustos e arvoretas que se dispõe de modo gradualmente mais consistente


(observações in loco 2014-2018), representando até o momento, indícios do
sucesso na recuperação dessas áreas. Diante disso, recomenda-se o manejo
dessa vegetação apenas em locais que podem vir a ser utilizadas como trilhas.
Sugere-se que sejam tomadas medidas para iniciar o controle (e a longo
prazo visar a erradicação) de espécies exóticas invasoras, principalmente,
para a uva-do-japão (Hovenia dulcis Thumb.), na área da RRPN Estadual
MO’Ã, bem como em seus arredores (Zona de Amortecimento). Recomenda-
se, também, manutenção periódica da cerca nos limites da propriedade, a fim
de evitar a possível entrada do gado e seus impactos na regeneração, bem
como, na flora em geral.
O conhecimento e a conservação da vegetação possui diversos aspectos
que podem ser abrangidos pela Educação Ambiental, tais como: o proces-
so ecológico de regeneração, que pode ser observado nessa UC, na região
campestre e contrastado com a porção florestal, bem como as diferentes co-
munidades de espécies vegetais desses ambientes; motivos da existência de
espécies vegetais classificadas em alguma categoria de ameaça e a impor-
tância de sua preservação; diagnóstico das espécies exóticas invasoras da
flora e as consequências que geram no ambiente em que se desenvolvem,
dentre outros.
Aponta-se que as espécies da flora ameaçada, existentes na área des-
sa UC, podem servir como meio de divulgação com intuito de alertar para
a importância dessa RRPN como componente colaborador na preservação
da vegetação.

Considerações finais

Apesar da Mata Atlântica se encontrar altamente degradada e fragmen-


tada, ainda é uma das regiões com maior biodiversidade do planeta e neces-
sita da proteção efetiva dos seus remanescentes. Diante disso, enfatiza-se
a importância da RRPN Estadual MO’Ã que apresenta riqueza expressiva
de espécies vegetais nativas e situa-se em área potencial para a integração
com outros fragmentos desse bioma. Assim, possibilita preservar a flora
local e provavelmente contribuir para a conservação da diversidade
biológica regional.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 207

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CAPÍTULO 10
ÓLEO PRIME:
projeto piloto de descarte correto do resíduo
óleo de cozinha no município de Itaara-RS
Graciela Schmidt Disconzi
Jussara Cabral Cruz

A problemática geração de resíduos pelas atividades humanas é com-


plexa e permanece desafiando a sociedade em geral, especialmente no con-
texto urbano. Para Strauch e Albuquerque (2008), o problema dos resíduos
surge em paralelo com o desenvolvimento econômico, tendo suas raízes nos
atuais padrões sociais de consumo e produção. Para enfrentar esses desa-
fios, considerando o objetivo de construção de uma sociedade sustentável do
ponto de vista social e ambiental, um dos caminhos é a concepção de uma
política de recolhimento e de destinação correta dos resíduos, por meio da
indução à redução dos resíduos produzidos e à reutilização e reciclagem de
materiais como alternativa de renda.
Um exemplo de resíduo altamente poluidor causador de grandes im-
pactos ambientais, quando descartado inadequadamente, o óleo de cozinha
usado é considerado um dos grandes causadores de impacto ambiental. Nos
corpos hídricos, em função de imiscibilidade do óleo com a água e sua infe-
rior densidade, há tendência à formação de películas oleosas na superfície,
o que dificulta a troca de gases da água com a atmosfera, ocasionando di-
minuição gradual das concentrações de oxigênio, resultando em morte de
peixes e outras espécies dependentes de tal elemento (PITTA JÚNIOR et al.,
2009). E qual seria o grau de conhecimento e envolvimento da população
com relação às questões ligadas ao descarte do resíduo óleo de cozinha no
meio ambiente?
Uma das alternativas para minimizar os impactos ambientais do lan-
çamento do óleo de cozinha no meio ambiente é a coleta, reciclagem e a
utilização deste resíduo como matéria-prima para produção de novos pro-
dutos. A iniciativa de implantação de programas de coleta seletiva e reci-
clagem de resíduos já vêm sendo implementada por alguns municípios e
estados, em parceria com cooperativas e associações, e é apontada como
214

uma importante prática de sensibilizar a população local para minimizar a


produção de resíduos.
A relação entre meio ambiente e educação para a cidadania assume um
papel cada vez mais desafiador, demandando a emergência de novos saberes
para apreender processos sociais que se complexificam e riscos ambientais
que se intensificam (CANES et. al., 2013). Na medida em que acontecer a
participação consciente da população, ações concretas de transformação so-
cial também ocorrerão, o que influenciará direta ou indiretamente, na trans-
formação da realidade.
Considerando-se essa possibilidade, pode-se dizer que integrar progra-
mas de coleta seletiva com a Educação Ambiental possibilita a aproximação
do ambiente natural ao indivíduo e faz com que este perceba que faz parte do
ambiente e de como ele é importante em sua vida. Além disso, a Educação
Ambiental tem por princípio que cada um tem importante papel a cumprir
na proteção do meio em que vive. Conforme Jacobi (2003), a Educação
Ambiental assume cada vez mais uma função transformadora despertando
nos indivíduos a corresponsabilidade que vai influenciar diretamente nos há-
bitos e costumes dos cidadãos.
Então, dado que na execução de um programa de coleta seletiva, a com-
preensão e a colaboração da população são fundamentais, quais estratégias
que devem ser utilizadas para atingir a mobilização social?
Posta a questão, e considerando o desafio que representa dar solução ao
descarte ambientalmente adequado ao óleo de cozinha doméstico, a equipe
do projeto Saúde da Água, no âmbito do subprojeto Política de Resíduos
Sólidos: ÓLEO PRIME, desenvolveu ações socioambientais em dois bairros
de Itaara, com o objetivo de diagnosticar e entender como uma comunidade
com diferentes níveis sociais, em um pequeno município do Rio Grande do
Sul, se posiciona com relação ao descarte do óleo de cozinha usado.
A estratégia da ação do projeto foi estabelecida em duas etapas: a) ca-
racterização e comparação do perfil sócio econômico das comunidades dos
dois bairros selecionados para a aplicação do projeto piloto, bem como da
comunidade de catadores atuantes na região; b) com base nos resultados da
primeira etapa, elaborou-se um programa experimental (piloto) de coleta de
óleo de cozinha, com o objetivo de levantar informações do potencial uso
e destinação do óleo de cozinha usado nos domicílios urbanos destes dois
bairros do município de Itaara-RS, com visitas in loco.
Assim, neste capítulo, objetiva-se apresentar os resultados do desenvol-
vimento das ações da equipe do Projeto Saúde da Água relacionados com a
questão do descarte e destino do óleo de cozinha.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 215

1. Criando condições para replicação das experiências

As ações de coleta e quantificação do óleo de cozinha nos dois bairros


da amostra e sua relação com as respectivas características socioeconômicas
da população e seus hábitos de descarte do óleo de cozinha, tiveram por ob-
jetivo diagnosticar a realidade para contribuir posteriormente com a amplia-
ção do projeto. Essa possiblidade, de estabelecer condições para replicação
de um programa de coleta seletiva do óleo usado, além de reduzir o impac-
to ambiental, deve proporcionar uma maior conscientização da sociedade,
cujos indivíduos poderão atuar como multiplicadores da ação, implantando
esse sistema de coleta em suas próprias residências e futuramente em seu
local de trabalho, como empresas, escolas e universidades.
Somando-se a essas vantagens, tinha-se também como objetivo, que
essa experiência desenvolvida pudesse ser levada para gestores e técnicos
responsáveis pelos Resíduos Sólidos Urbanos municipais. A divulgação des-
sas ações representa uma forma de mostrar aos gestores a viabilidade da im-
plantação de ações semelhantes e com isso potencializar benefícios sociais
para seus municípios e respectivas populações.

2. O óleo de cozinha e seus impactos ao meio ambiente

Sobre os óleos e gorduras saturados, existem poucos conceitos e defi-


nições e praticamente todos se reportam ao mesmo entendimento: represen-
tam uma categoria de subprodutos provenientes de diferentes atividades e, em
sua maior parte, derivados da atividade de fritura de alimentos. Conhecidos
também como óleos alimentares usados (ou simplesmente óleos já utilizados)
derivam essencialmente do uso de óleos de origem vegetal tais como, azeite,
óleo de girassol, óleo de soja, óleo de canola, entre outros (RIZZO et al., 2013).
Quando descartado inadequadamente, o óleo de cozinha usado é conside-
rado um dos grandes causadores de impacto ambiental. Uma prática incorreta
está associada à descarga dos mesmos nas redes públicas de esgoto e coletores
municipais, podendo provocar grandes problemas de entupimento e obstrução.
O seu encaminhamento para as estações de tratamento, contribui significativa-
mente para o aumento dos níveis de CBO (Carência Bioquímica de Oxigênio),
de CQO (Carência Química de Oxigênio) e SST (Sólidos Suspensos Totais) nas
águas residuais, dificultando o desempenho e funcionamento eficiente das esta-
ções, o aumento da concentração destes parâmetros conduzir em um considerá-
vel aumento de energia, implicar em manutenções e limpezas mais frequentes
nos equipamentos de separação de óleos e gorduras associadas a aumento de
tempo (MIGUEL, 2010).
216

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, 2004),


apenas um litro de óleo é capaz de esgotar o oxigênio de até 20 mil litros de
água, seu impacto ambiental é muito grande, representando o equivalente
da carga poluidora de 40.000 habitantes por tonelada de óleo despejado em
corpos d’água.

3. As nascentes de Itaara e o descarte do óleo de cozinha

O município de Itaara-RS se configura como um divisor de águas de


importantes bacias hidrográficas do estado gaúcho. Suas terras são forma-
doras de afluentes de rios importantes da região como o rio Ibicuí e o rio
Vacacaí-Mirim (MARION, 2007), e apresenta áreas de nascentes de grande
fragilidade ambiental e com grande diversidade de espécies nativas. As nas-
centes, partes integrantes do sistema ambiental, utilizadas como fonte para
o abastecimento humano e também animal, em alguns locais, além de ter
a função do abastecimento, ainda possuem importância fundamental para
manter os cursos d’água e, consequentemente, para a rede de drenagem, já
que é a partir delas que os cursos d’águas se formam, estão em sua maioria
descaracterizadas em função da expansão da mancha urbana e da densidade
populacional (CAVALCANTI, 2013). A proteção de nascentes e margens,
assim, como determina a Lei Federal 12.651/2012, é fundamental para me-
lhoria da qualidade, ampliação e regularização da oferta de água.
No bairro Estação Pinhal, área de estudo deste trabalho, a urbanização
ao redor da nascente da microbacia hidrográfica do Arroio Manoel Alves
importante arroio que abastece o lago SOCEPE responsável pelo abasteci-
mento domiciliar do município, ocasiona modificações pelas ações huma-
nas, reduzindo a qualidade da água, como mostra a figura 01.

Figura 01 – Urbanização ao redor da nascente e poluição dos recursos hídricos

Fonte: Acervo Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2013).


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 217

No que concerne ao saneamento básico, principalmente o esgoto sani-


tário, a maioria das residências faz uso da fossa séptica.
Considerando a localização estratégica de Itaara em região de nascen-
tes, com sistema precário de saneamento básico, considerou-se de significa-
tiva relevância a implantação de um sistema de coleta seletiva apropriado,
com a retirada preventiva do óleo de cozinha usado nas residências, de modo
a evitar que o mesmo seja descartado de forma a causar prejuízos às águas,
ao ambiente e ao abastecimento.
Por essa razão, diante da necessidade de diagnosticar o conhecimento
que a população tem em relação ao descarte do resíduo óleo de cozinha
no meio ambiente e quanto produzem para ser descartado, a destinação e o
potencial de adesão da população a um programa de coleta seletiva do óleo
usado com vistas a seu reaproveitamento, foram projetadas e desenvolvidas
as ações do Subprojeto Saúde da Água.

4. Estratégia de ação

A estratégia adotada (Figura 02) para o desenvolvimento das ações do


projeto foi baseada na abordagem qualitativa, de caráter analítico-descritivo
e exploratório (VERGARA, 2009) e aplicada à área de estudo, em duas eta-
pas, para conhecer a realidade do local e compreender a cultura local, espe-
cialmente no que diz respeito ao consumo e descarte, buscando identificar
pontos de problemas e potencialidades, evitando o descarte inadequado de
um resíduo altamente poluidor, o óleo de cozinha usado.
Na primeira etapa, com o objetivo de delimitar a amostra mantendo
sua representatividade em relação ao âmbito ao qual pertence, foram sele-
cionados o bairro Estação Pinhal pelo fato de nele está localizado um im-
portante reservatório de água, o Lago Santo Expedito. No lago está inserido
a nascente da microbacia hidrográfica do Arroio Manoel Alves, importante
arroio que abastece o lago SOCEPE responsável pelo abastecimento domi-
ciliar da população local e flutuante de Itaara, e seus canais drenam a área
da Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN), da Fundação MO’Ã,
apoiadora deste estudo e que desenvolve atividades de restauração ecológica
de nascentes e matas ciliares, de avaliação do regime hidrológico e da qua-
lidade das águas. Já a decisão de estudo pelo bairro Parque Pinhal é devida,
ao balneário, estar inserido, na área central do município. Como o município
não possui sistema de drenagem urbana adequado, as residências localizadas
próximas ao lago fazem uso de fossa séptica.
218

Após a definição dos bairros foi aplicado um instrumento de pesquisa


(questionário) nas residências escolhidas aleatoriamente no bairro Estação
Pinhal e no bairro Parque Pinhal (Figura 03). Entretanto, ainda que aleatoria-
mente distribuída, a pesquisa buscou um direcionamento específico voltado
para o grupo de responsáveis pela cozinha nas residências, a partir do enten-
dimento de que suas respostas aos temas focalizados seriam uma versão real
das práticas utilizadas nesse âmbito. A escolha de entrevistar os domicílios
particulares e não os comerciais deve-se ao fato de que o óleo usado nos
domicílios corresponde a um menor volume individual e por isso demandam
uma logística de recolhimento mais complexa se comparada à coleta do óleo
usado nos estabelecimentos comerciais.
Após levantamento, a partir de vinte e cinco entrevistas in loco em cada
bairro, foram realizadas as instalações dos Pontos de Entrega Voluntária
(PEVs), em locais de fácil acesso para a população e ações de parcerias
em conjunto das empresas, de associações e governo para que todos en-
tendam e exerçam seu papel para assegurar a destinação adequada do re-
síduo óleo de cozinha usado e, dessa forma, colocar em prática a Política
Nacional de Resíduos Sólidos assentada sobre o conceito da responsabilida-
de compartilhada.
Ações de educação ambiental com alunos da rede pública do municí-
pio na Escola Municipal Alfredo Lenhart e na EMEF Euclides Pinto Ribas,
disseminando a importância da conservação e preservação do meio ambiente
e recursos hídricos para o futuro do planeta e conquistando os alunos como
aliados na disseminação de atitudes ambientalmente corretas que devem
começar dentro de casa.
A sensibilização e conscientização da comunidade local com o de-
senvolvimento de oficinas de reciclagem de resíduos e a busca da inclusão
dos catadores na resolução dos problemas ligados aos resíduos sólidos no
município, iniciativas com função principal, do esclarecimento e a orienta-
ção à sociedade, buscando sua adesão e participação ativa na coleta seletiva
do óleo residual doméstico.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 219

Figura 02 – Percurso metodológico adotado

Pela combinação de metodologias, a abordagem pode ser classificada


como: i) Qualitativa de caráter analítico-descritivo e exploratório e ii)
Quantitativa de caráter exploratório.
ABORDAGEM

Consistiu em diagnosticar e entender o comportamento da população,


relativo ao descarte óleo de cozinho usado, com diferentes níveis sociais
e sua disponibilidade em aderir a práticas mais sustentáveis dos respecti-
OBJETIVO vo descarte.

OBJETIVOS
QUESTÕES METODOLOGIAS
ESPECÍFICOS
NORTEADORAS

Definição dos bairros pilotos: pesquisa na fonte de


dados dos setores censitários do Censo Demográfico de
2010 do IBGE; delimitando os setores 2, pelo fato de nele
- Caracterizar o perfil está inserido a nascente da microbacia hidrográfica do
socioeconômico e socioambien- Arroio Manoel Alves e o setor 4 é devida, ao balneário,
Hipótese 1: A tal dos ocupantes das residências estar inserido, na área central do município.
disponibilidade de particulares nos dos (02) bairros Aplicação de questionário: a pesquisa de campo
doação do óelo de pilotos; permitiu levantar, a partir de esntrevistas in loco, dados
cozinha usado nos primários da realidade socioeconômica, a percepção
domicilios urbanos do ambiental e o conhecimento da realidade do consumo e
Município de Itaara descarte de óleo.
está diretamente
Verificação da existência de correlação estatística
associada à renda e à
- Comparar as ações e a entre as variáveis: calculando a Matriz de Correlação de
escolaridade do
percepção ambiental dos Pearson e Análise de Cluster e Análise fatorial - Método
segmento da
responsáveis pela cozinha, sobre de Componentes Principais, extração de fatores de modo
população
o descarte e o destino do óleo de a encontrar a explicação para o máximo de variância no
em questão.
cozinha usado, nos dois núcleos conjunto de dados.
estudados, com a finalidade de Pelo fato deste estudo envolver o registro e a observação
levantar subsídios para uma de inúmeras variáveis para cada elemento da amostra e/ou
coleta seletiva desse material. população de indivíduos, é de interesse máximo examinar
as inter-relações entre tais variáveis.

Quantificação do volume de óleo de cozinha usado


descartado: No final da aplicação do questionário, com a
Hipótese 2: As divulgalgação do folder informando as metas e objetivos
atitudes do - Avaliar a demanda por descarte do projeto, o participante recebeu do entrevistador um
responsável pela do resíduo óleo de cozinha usado recipiente de vidro devidamente lavado e etiquetado com
cozinha em relação ao gerado nos domicílios o símbolo do projeto, que foi utilizado para acondicionar
resíduo óleo de particulares; o resíduo até o momento da entrega, em um dos quinze
cozinha usado que é Pontos de Entrega Voluntária (PEV’s) distribuidos no
gerado no domicílio, município de Itaara.
revelam o grau de
conscientização e - Avaliar a efetividade da Realização de atividades Monitoramento do projeto:
sensibilização sobre o estratégia de mobilização do visita aos Estabelecimentos e Instituições de Ensino, onde
seu papel na questão público alvo, visando informar, foram instalados os PEV’s, para orientações sobre a
descarte do óleo de conscientizar e sensibilizar este pesquisa e o manuseio com as bombonas, visita
cozinha e o meio público para as questões periódicas as Escolas e Comunidades para a realização de
ambiente. relativas ao descarte correto do atividades de educação ambiental e monitoramento da
resíduo óleo de cozinha usado. qualidade da pesquisa.

Fonte: G. S. Disconzi (2014).

Na segunda etapa, a pesquisa de campo permitiu a quantificação, no pe-


ríodo de agosto de 2013 a março de 2014, do volume de óleo de cozinha usado
descartado nos domicílios entrevistados da área estudo. Foi possível estimar
a quantidade real de óleo descartado pela população. A amostra restringiu-se
ao resíduo óleo de cozinha usado produzido pelos participantes que aceitaram
participar do projeto.
220

Figura 03 – Área estudo 1: bairro Estação Pinhal


e Área estudo 2: bairro Parque Pinhal

Recorte Estação Pinhal

Recorte Parque Pinhal

Legenda

Nascentes Itaara Corpos Hídricos


Hidrografia Área Urbana
Itaara
Fonte:
Municípios; IBGE (2007)
Hidrografia: ANA (2010)

Fonte: G. S. Disconzi (2014).

5. Dialogando com os resultados


Conforme a estratégia definida no projeto, foi realizada a aplicação do
questionário socioambiental (APÊNDICE) a 25 pessoas do bairro Estação
Pinhal e 25 pessoas no bairro Parque Pinhal, no município de Itaara-RS.
Sob o título de Caracterização Sociodemográfica, na primeira parte do
questionário, foi verificado o perfil socioeconômico da amostra. No âmbito
dessa primeira parte, foram coletadas informações de identificação dos en-
trevistados vinculadas à respectiva condição demográfica.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 221

Das 50 entrevistas realizadas em campo, 43 dos entrevistados eram do


sexo feminino, totalizando 86% e 07 do sexo masculino, totalizando 14%
(Figura 04).

Figura 04 – Percentual dos entrevistados quanto a sexo e idade

Bairro Estação Pinhal Bairro Parque Pinhal

0.16 0.14
0.14 0.12
0.12 0.1
0.1
0.08
0.08
0.06
0.06
0.04
0.04
0.02 0.02
0 0
21 - 30 31 - 40 41 - 50 51 - 60 acima de 21 - 30 31 - 40 41 - 50 51 - 60 acima de
0 - 20 anos 0 - 20 anos
anos anos anos anos 61 anos anos anos anos anos 61 anos
FEM - Estação Pinhal 8% 8% 10% 14% 4% FEM - Parque Pinhal 2% 2% 14% 2% 10% 10%
MASC - Estação Pinhal 2% 2% 2% MASC - Parque Pinhal 2% 4% 4%

Observa-se que entre os entrevistados predominavam indivíduos do


sexo feminino, conforme informado no capítulo relativo à metodologia, os
participantes da pesquisa foram selecionados por desempenharem o papel de
responsáveis pelos domicílios, com o intuito de se obter respostar mais re-
alistas sobre o consumo de óleo domiciliar e consequentemente sobre o seu
descarte. O tema pesquisado “óleo de cozinha” é mais afeto aos responsáveis
pelos serviços domésticos, que na maioria dos casos, são mulheres. Também
se destaca que 20% dos entrevistados têm idade de até 30 anos, 64% com
idade na faixa entre 31 a 60 anos e 16% estão na faixa acima de 61 anos.
Quanto a Influência da escolaridade na coleta seletiva do óleo de cozi-
nha usado, na figura 05, evidenciou-se que 36% dos entrevistados detento-
res de menor grau de escolaridade, ensino fundamental completo (EFC) e
incompleto (EFI), informaram não haver a necessidade de implantação da
coleta seletiva do óleo residual no município.

Figura 05 – Escolaridade e Implantação da coleta


seletiva do óleo residual doméstico

28% 44%
30% 45%
40%
25% 32%
20% 35%
20% 16% 16% 30%
25%
15%
20%
Ensino Fundamental Completo 8% 8% 12%12%
10% 15%
Ensino Fundamental Incompleto 4% 10%
Ensino Médio Completo 5%
5%
Ensino Médio Incompleto
0% 0%
Ensino Superior Completo
SIM NÃO SIM NÃO
Ensino Superior Incompleto
Outros Estação Pinhal Parque Pinhal

Fonte: G. S. Disconzi (2014).


222

A falta de disseminação do conhecimento e o baixo nível de escola-


ridade da população brasileira em geral, se tornam responsáveis por ações
ambientais incorretas, não só ao que concerne o óleo de cozinha usado,
mas sim a diversas práticas como o desperdício de água, a disposição de
resíduos sólidos no meio ambiente, entre outros.
Quando perguntado sobre quantos integrantes havia na residência, na
figura 06, no Bairro Parque Pinhal 48%, ou seja, 12 famílias, possuem 2 a 3
integrantes, e 2 famílias, residência com 6 integrantes. Já no Bairro Estação
Pinhal 72%, ou seja, 18 famílias, possuem 3 a 5 integrantes, e 16%, respec-
tivamente, 4 famílias, possuem 6 a 8 integrantes.

Figura 06 – Composição familiar participantes questionário

Composição Familiar
0,35 32%
0,3 28%
24% 24% 2 integrantes
0,25 3 integrantes
20% 20%
0,2 4 integrantes
16% 5 integrantes
0,15 12% 6 integrantes
0,1 8% 8% 7 integrantes
4% 4% 8 integrantes
0,05
0
Parque Pinhal Estação Pinhal

Se observarmos o número grande de integrantes nas residências e su-


ponha que possivelmente estão descartando erroneamente o óleo de fritura
através dos encanamentos e consomem mais litros de óleo em frituras por
semana, a implantação da coleta seletiva do resíduo óleo de cozinha usado
é de grande valia para a proteção dos recursos hídricos e meio ambiente.
Na segunda parte do questionário, sob o título de Conhecimento
Ambiental, foi identificado como os entrevistados formulam suas ideias
sobre o meio ambiente, abrangendo questões sobre as ameaças relativas à
poluição ambiental e o entendimento dos entrevistados sobre o resíduo em
suas residências. Um total de 50% da amostra acha que a parte do meio
ambiente que se encontra mais ameaçada pela poluição, é a água, conforme
pode ser visualizado na figura 07. A preservação dos recursos hídricos é
uma preocupação manifestada pelo universo amostrado na presente pes-
quisa, seguida do ar, com 22%, enquanto 10% consideram que o solo e as
florestas estão mais ameaçados.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 223

Figura 07 – Visão dos entrevistados sobre parte do


meio ambiente mais ameaçada com poluição

50%
50%
45%
40%
35% Água
30% Solo
22%
25% Atmosfera
20% Floresta
15% 10% 10%
8% Outro
10%
5%
0%
Meio ambiente ameaçado por poluição resíduo
óleo de cozinha

Com relação ao lixo como agente poluidor do meio ambiente, no Bairro


Parque Pinhal, 21 entrevistados acreditam que o lixo gerado em sua resi-
dência polui o meio ambiente, enquanto 04 acham que o seu lixo não polui
o meio ambiente. Já no Bairro Estação Pinhal, 13 acreditam que o seu lixo
doméstico polui o meio ambiente, enquanto 12 acham que o seu lixo não
polui o meio ambiente, conforme figura 08.

Figura 08 – Percepção dos entrevistados quanto ao


poder de poluição do lixo doméstico

Lixo gerado nas residências polui o ambiente Percepção sobre o tipo de


resíduo poluente

25 1% Plásticos
24% Óleo
20 45%
1% Lixo eletrônico
10% Lixo orgânico
15
9% Lixo tóxico
10
Metais
5 Vidros
4% 2% 4%
0
Parque Pinhal Estação Pinhal

SIM NÃO

Dessa forma, 34 entrevistados estão cientes de sua contribuição como


poluidores. A percepção dos entrevistados com relação ao lixo gerado no seu
ambiente doméstico, sendo que 45 % dos resíduos considerados mais poluen-
tes ao meio ambiente são os plásticos, especificadamente as sacolas plásti-
cas. Seguido pelos papeis (24%), metais (10%) e lixo tóxico (9%), os outros
resíduos citados seguem de longe a indicação de poluentes. Especificamente
sobre o óleo residual, apenas 4 % dos entrevistados identificou esse resíduo
como causador do impacto ambiental quando descartado inadequadamente.
224

Quanto à questão desse potencial poluidor, um dos fatores considerados


pelos entrevistados foi o tempo de decomposição das sacolas plásticas, o que
é visto como um dos causadores da obstrução de bueiros, contribuindo para
o alagamento das cidades no período de chuvas intensas. Esta concepção é
um indicativo de funcionalidade das campanhas educativas e de boas práti-
cas, dos debates realizados através dos veículos de comunicação que, uma
vez disseminadas, têm impacto positivo na conscientização da população.
Sob o título de Produção, Descarte e Reaproveitamento Sustentável do
óleo de Cozinha Usado, na terceira parte do questionário, a disposição para
doar o óleo de cozinha usado, conhecimento sobre reciclagem e o conheci-
mento sobre a parte do meio ambiente mais impactada pelo descarte inade-
quado deste resíduo.
No que se refere ao conhecimento de que o óleo de fritura usado pode
ser reciclado, 90% dos entrevistados afirmaram saber que o óleo de cozinha
pode ser reciclado depois de usado e apenas 10% disseram não saber. A
figura 09 identifica essa distribuição.
Figura 09 – Conhecimento sobre a reciclagem do óleo de cozinha usado
Conhecimento sobre a reciclagem do óleo de cozinha
usado
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Estação Pinhal Parque Pinhal
SIM 40% 50%
NÃO 10% 0%

Diante da figura 09, é percebido que 10% dos entrevistados não sabem
que o óleo pode ser reciclado. Dessa forma, fica a sugestão à inclusão e a
orientação no intuito de fazê-los entender a necessidade da participação de-
les como agentes de mudanças na solução de problemas ambientais.
Na figura 10 a indicação é de que 66% dos 50 entrevistados afirmam sa-
ber o local de descarte do resíduo óleo de cozinha pela população. E citaram
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 225

que o descarte principal é na pia, seguido do solo como destino do óleo e


junto aos lixos recolhidos pela coleta normal.
Figura 10 – Conhecimento acerca do local onde o óleo residual é descartado
Onde é feito o descarte do resíduo óleo de
cozinha
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Estação Pinhal Parque Pinhal
NÃO 18% 16%
SIM 32% 34%

Já quanto à forma ideal de descartar o resíduo óleo de cozinha, na figura


11, é apresentada a distribuição do conhecimento dos entrevistados. Nota-se
que no Bairro Parque Pinhal, 72% dos entrevistados afirmam que conhe-
cem, destinando o resíduo para o reaproveitamento na fabricação de outros
produtos; guardando em recipientes antes de jogar no lixo ou doando para
associações e escolas; enquanto 28% dos entrevistados disseram não saber
a forma ideal, afirmando que descartam na pia, por não haver um descarte
correto, apesar da consciência ambiental. Já no bairro Estação Pinhal, 56%
dos entrevistados afirmam que conhecem, enquanto 44% afirmam não saber
a forma ideal de descarte para evitar a poluição.
Figura 11 – Conhecimento sobre a forma ideal de
descarte do óleo de cozinha usado

Ressalta-se que o conhecimento do reaproveitamento de sabão é ma-


nifestado principalmente pelo grupo de baixa renda, que já possui o co-
nhecimento e o hábito de recolher o óleo para fabricar sabão, utilizar na
alimentação de animais.
226

Uma vez tendo o conhecimento de que o óleo de cozinha pode ser


reciclado, seria importante verificar quais as possibilidades de reciclagem
que os entrevistados conheciam. O sabão mereceu destaque dentre os pro-
dutos passíveis de serem produzidos a partir do óleo de cozinha, com espe-
cial destaque para a população de menor renda, que fabrica o seu próprio
sabão. Foi citado também para a produção de detergentes, produção bio-
diesel e alguns não souberam responder.
Associado a utilização do óleo de cozinha perguntou-se quanto à sobra
desse resíduo por mês em cada residência (Figura 12).
Figura 12 – Sobra mensal de óleo de cozinha usado

Sobra do resíduo óleo de cozinha

25% 22% 25% 22%

20% 20%
16%

15% 15% 12%

10% 10%
6% 6% 6% 6%
4%
5% 5%
0% 0% 0%
0% 0%
Estação Pinhal Estação Pinhal

Menos de 1 litro 1 a 2 litros mais de 4 litros


Igual ou similar a 1 litro 2 a 4 litros Não sei

Do total no Bairro Estação Pinhal, 44% dos entrevistados responde-


ram sobrar mais de 4 litros mensalmente em suas residências, devido ao
grande volume de óleo de cozinha que é utilizado na alimentação. Já no
Bairro Parque Pinhal, sobraria 44%, menos de 1 litro para ser descartado,
o volume é menor.
Perguntou-se ainda se o entrevistado confiaria em utilizar qualquer
destes produtos se eles fossem oferecidos sem custo algum. A maioria dos
entrevistados respondeu que confiariam em usar os produtos oferecidos de
graça. A razão pela qual os entrevistados confiariam em utilizar esses pro-
dutos reciclados do óleo de cozinha está relacionada à percepção ambiental.
Finalmente, na quarta parte do instrumento, sob o título de Informações
sobre Coleta de óleo de Cozinha Usado, foi definido o conhecimento da
população sobre o funcionamento da coleta seletiva, importância da coleta
de óleo de cozinha usado para o Município de Itaara, a quem caberia essa
atividade de coleta, a logística, a periodicidade da coleta, o armazenamento
e as dificuldades.
Na execução de programas de coleta seletiva, a compreensão e a co-
laboração da população são fundamentais, pois o sucesso dos programas
dependerá do grau de sensibilização e conscientização das pessoas (SILVA,
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 227

2008). A figura 13 apresenta a adesão dos entrevistados acerca da implan-


tação da coleta seletiva do óleo de cozinha usado no município.
Figura 13 – Adesão acerca da implantação da coleta de
óleo de cozinha usado no Município de Itaara
Adesão à coleta seletiva do óleo de cozinha usado
Estação Pinhal Parque Pinhal Implantação de
uma Coleta
4% 8% sele�va do óleo em
Itaara
32%
Não implantação
46% 50% de uma Coleta
42% sele�va
18%

Deslocamento até
um PEV

Com referência a implantação da coleta seletiva de óleo de cozinha


usado em Itaara, um universo de 50% dos entrevistados do Bairro Parque
Pinhal concorda que deveria haver essa coleta. Já no bairro Estação Pinhal,
32% dos entrevistados concordam que deveria haver a coleta do resíduo
óleo de cozinha usado, e 18% responderam negativamente. A razão princi-
pal, segundo entrevistados, para a implantação da coleta seletiva do óleo é a
diminuição do impacto ambiental deste poluente.
De acordo com o resultado desta pesquisa, verifica-se que os entrevis-
tados demonstram interesse nos aspectos ambientais com relação à coleta do
óleo de cozinha usado, sendo destacada a preocupação em preservar o meio
ambiente. Na medida em que ocorre a participação consciente das pessoas,
as ações concretas de transformação social também ocorrerão, o que influen-
ciará direta ou indiretamente na transformação da realidade.
Para aqueles entrevistados (18%) que responderam negativamente a
implantação da coleta seletiva, questionou-se sobre o motivo da não partici-
pação, onde foram obtidas respostas de forma expressiva, que já reaprovei-
tavam o resíduo na fabricação de sabão e alimentos para animais ou doavam
para a escola dos filhos.
A principal dificuldade para fazer a coleta do óleo de cozinha usado nas
residências, na opinião dos entrevistados é a falta de informação e hábito,
os entrevistados reforçam que deveria haver mais divulgação de campanhas
para sensibilizar a população a refletir sobre o descarte inadequado no meio
ambiente. Também não basta apenas mostrar os danos que esse resíduo cau-
sa, precisa haver alternativas, ou seja, locais específicos, para seu descarte.
Para realização de uma coleta seletiva são necessários critérios e cons-
cientização da população. Adquirir práticas de responsabilidade com o meio
ambiente, evitando o descarte inadequado do óleo de cozinha usado. E um
228

importante instrumento seria a sensibilização da população por meio de


campanhas, palestras e outras ações que possibilitem o acesso à informação.
Quanto ao ator que deveria ser responsável pela coleta do óleo de co-
zinha usado, no Bairro Estação Pinhal 52 % julgam que a coleta deve ser
realizada pelas Cooperativas, 36% pelas Prefeituras, 8 % Companhias de
Saneamento e 4 % por ONGs. Para os entrevistados do Bairro Parque Pinhal,
68 % julgam que a coleta deve ser realizada pelas Prefeituras, 16% pelas
Cooperativas, 12 % Companhias de Saneamento e 4 % por outros, que nesse
caso, foi citado as Escolas (Figura 14).
Figura 14 – Opinião acerca do responsável pela coleta
de óleo de cozinha usado no Município Itaara

A responsabilidade da Coleta Seletiva do resíduo óleo de cozinha


na opinião dos entrevistados

70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Cooperativas ONGs Prefeituras Cia de Outros
Saneamento
Estação Pinhal 52% 4% 36% 8%
Parque Pinhal 16% 68% 12% 4%

Os entrevistados com percentual de escolaridade maior, responderam


que a responsabilidade da implantação da coleta seletiva seria da adminis-
tração pública. A Lei 12.305/2010 determina que todas as administrações
públicas municipais, indistintamente do seu porte e localização, devem de-
senvolver um plano de gestão integrada de resíduos, terão de implantar um
sistema de coleta seletiva.
Quanto à indicação para a frequência ideal desta coleta também foi ob-
tida junto aos entrevistados e é apresentada na figura 15. No Bairro/Núcleo
Parque Pinhal nota-se uma alta similaridade na frequência mensal, devido
à pouca utilização do óleo de cozinha nas residências. Já no Bairro/Núcleo
Estação Pinhal, há uma preocupação dos entrevistados quanto à frequência
do recolhimento do óleo residual, pelo fato de haver um limite para arma-
zenamento tolerável nas residências. Nota-se uma alta similaridade entre as
frequências semanal e quinzenal, devido ao maior volume de óleo de cozi-
nha utilizado nas residências. Uma parcela pequena dos entrevistados apon-
tou a frequência bimestral como a mais adequada.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 229

Figura 15 – Opinião relativa à periodicidade da


coleta seletiva do óleo de cozinha usado

Periodicidades da coleta seletiva para o resíduo óleo de


cozinha – segundo entrevistados
90%
80%
70%
60%
50% 32% 52%
12% Parque Pinhal
40%
30%
Estação Pinhal
20% 36% 36%
10%
28%
4%
0%
Semanal Quinzenal Bimestral Mensal

A principal dificuldade para fazer a coleta do óleo de cozinha usado


nas residências, na opinião dos entrevistados é a falta de informação e
hábito, os entrevistados reforçam que deveria haver mais divulgação de
campanhas para sensibilizar a população a refletir sobre o descarte inade-
quado no meio ambiente. Também não basta apenas mostrar os danos que
esse resíduo causa, precisa haver alternativas, ou seja, locais específicos,
para seu descarte.
Para realização de uma coleta seletiva são necessários critérios e
conscientização da população. Adquirir práticas de responsabilidade com
o meio ambiente, evitando o descarte inadequado do óleo de cozinha usa-
do. E um importante instrumento seria a sensibilização da população por
meio de campanhas, palestras e outras ações que possibilitem o acesso
à informação.

6. Caracterização do resíduo óleo de cozinha usado baseado nos


dados da pesquisa

A quantificação do resíduo óleo de cozinha foi realizada no período


de agosto de 2013 a março de 2014, nas diferentes estações. No final da
aplicação da entrevista, com a divulgação do folder informando as metas e
objetivos do projeto, o participante recebeu do entrevistador um recipiente
de vidro devidamente lavado e etiquetado com o símbolo do projeto, que foi
utilizado para acondicionar o resíduo até o momento da entrega, em um dos
quinze Pontos de Entrega Voluntária (PEV’s) distribuídos no município de
Itaara (Figura 16).
230

Figura 16 – Estruturas instaladas nos PEV’s

DESCARTE DO ÓLEO DE COZINHA


Pontos de Entrega Voluntária – PEVs
01. Escola Santos Dumont
BR 158, km 313, Subúrbios (Rincão dos Minelos)
02. Escola Municipal Alfredo Lenhardt
Av. Guilherme Kurtz, nº 12
03. Escola Municipal Pinto Ribas
Rua Marcelino de Almeida
04. Escola de Ensino Médio de Itaara
Av. Guilherme Kurtz, s/nº
05. Escola Vô Orion
Rua Evandro Behr, s/nº (Estação Pinhal)
06. Escola Municipal Tiradentes
Rua das Lidias, s/nº, km 23
07. Posto Santa Lúcia III
BR 158, km 313, s/nº
08. Restaurante Timbaúva
Rua Timbaúva, BR 158
09. Supermercado Colina
BR 158, km 315, Novo Pinhal (Cidade Oásis)
10. SOCEPE – Entrada
BR 158, km 312
11. FEIRITA
BR 158, Dr. Agostinho Almeida
12. Expedito Lanches
Jardim da Serra, nº 20 (Parque Serrano I)
13. Elizete’s Gourmet
Av. Guilherme Kurtz, nº 09 (Parque Serrano II)
14. Negão Lanches
Av. Guilherme Kurtz, Praça Matriz (Centro)
15. Restaurante do Parque Pinhal
Balneário Parque Pinhal

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

O participante se responsabilizou em anotar na tabela de quantificação


entregue a estimativa de óleo de cozinha usado que seria descartado inade-
quadamente no meio ambiente, durante o período da pesquisa. Decorrido o
período da coleta foi realizado a coleta desse material para a quantificação
do mesmo. A partir levantou-se um percentual por faixas de consumo, por
bairro, de quantos litros por mês, em média, são utilizados. Para o cálculo da
estimativa de Consumo do município, adotou-se o percentual de cada faixa
de consumo amostrada como ponderador e extrapolação para o número de
domicílios do município de Itaara – RS.
Ao final da triagem da amostra, o resíduo óleo de cozinha usado foi en-
caminhado, um percentual para as escolas utilizarem na fabricação de sabão
e o restante repassado para a Empresa RECÓLEO NATURAL, que dará o
destino correto.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 231

7. Quantidade de litros de óleo de cozinha que sobram nas


residências por mês
Figura 17 – Estimativa de sobra de óleo de cozinha
usado no Município de Itaara-RS
Estimativa da Sobra de Óleo de Cozinha
ESTIMATIVA DA SOBRA DE ÓLEO DE COZINHA ESTIMATIVA DA SOBRA DE ÓLEO DE COZINHA
ESTAÇÃO PINHAL PARQUE PINHAL
FAIXA DE PERCENTUAL QUANTIDADE FAIXA DE PERCENTUAL QUANTIDADE
CONSUMO % DOMICÍLIOS CONSUMO % DOMICÍLIOS
menos de 1 litro 0% 0 menos de 1 litro 8% 2
igual ou similar a 1 litro 4% 1 igual ou similar a 1 litro 16% 4
1 a 2 litros 8% 2 1 a 2 litros 36% 9
2 a 4 litros 32% 8 2 a 4 litros 12% 3
mais de 4 litros 56% 14 mais de 4 litros 28% 7
TOTAL 100% 25 TOTAL 100% 25

Estimativa da sobra de óleo de cozinha segundo


o universo da amostra e a população de Itaara, RS
ESTIMATIVA DA SOBRA DE ÓLEO DE COZINHA ESTIMATIVA DA SOBRA DE ÓLEO DE COZINHA
ESTAÇÃO PINHAL PARQUE PINHAL
FAIXA DE LITROS % FATOR FAIXA DE LITROS % FATOR
CONSUMO PONDERAÇÃO CONSUMO PONDERAÇÃO
menos de 1 litro 0 0% 0 menos de 1 litro 0.75 8% 0.06
igual ou similar a 1 1.00 4% 0.04 igual ou similar a 1 1.16 16% 0.19
1 a 2 litros 1.94 8% 0.16 1 a 2 litros 1.88 36% 0.68
2 a 4 litros 3.33 32% 1.07 2 a 4 litros 4.04 12% 0.48
mais de 4 litros 5.56 56% 3.11 mais de 4 litros 5.92 28% 1.66
TOTAL 100% 4.37 TOTAL 100% 3.06

Estimativa da sobra de óleo de cozinha segundo


o universo da amostra e a população de Itaara, RS
SOBRA DE ÓLEO DE COZINHA
UNIVERSO DA CONSUMO POPULAÇÃO
AMOSTRA ITAARA (domicílios IBGE)
7.44 X 25 domicílios 7.44 X 2.708 domicílios
185 litros 20.150 litros

Fonte: G. S. Disconzi (2014).

Com isto, a estimativa da quantidade total de óleo disponível para co-


leta nas residências do município seria de 20.150 litros de óleo usado por
mês, ou seja, a estimativa do volume disponível para a reciclagem. O que se
pode inferir é que, se a população estiver descartando inadequadamente este
resíduo, isso se caracteriza em um impacto ambiental para o município que
precisa ser evitado. Os resultados apresentados a partir dos dados coletados
na pesquisa mostram que quase a totalidade dos entrevistados participaria
efetivamente da doação gratuita do óleo de cozinha usado. No entanto, existe
um grande abismo entre a teoria e a prática, sendo que para maximizar esta
ação é necessário se realizar algumas ações, tanto no sentido educacional,
quanto a incentivos proporcionados para a doação deste resíduo.
Dessa forma, os resultados obtidos permitem inferir que em algumas
residências o óleo de cozinha usado está sendo disposto de forma errada no
232

meio ambiente. Neste sentido, são necessários esforços e ações para que a
informação se dissemine entre toda a população e, com isso, este resíduo
tenha um destino mais adequado que o atual.

8. Relato sobre a experiência – Subprojeto Política de Resíduos


Sólidos: Óleo Prime
8.1 Aplicação da Entrevista Socioambiental
A primeira fase, conforme descrito anteriormente, consistiu, portanto,
da orientação da comunidade nos bairros Parque Pinhal e Estação Pinhal
em Itaara-RS em relação à prática adequada de descarte de resíduos sólidos
e óleo de cozinha usado, bem como da pesquisa de sua percepção sobre a
importância do tema.
Em agosto de 2013, a Fundação MO’Ã iniciou no município, com o
apoio da Ferragem Central Serrano, SOCEPE e Associação dos Amigos do
Parque Pinhal (AAPP), a primeira fase da implantação do projeto (Figura
18) realizando a aplicação da entrevista socioambiental para identificar os
diferentes pontos de vista sobre as várias questões que envolvem o tema
“óleo de cozinha usado” relativamente ao consumo e descarte, possibilitan-
do o conhecimento da realidade do universo pesquisado.
Figura 18 – (a)Voluntários na aplicação do instrumento da entrevista
socioambiental, (b) Registro do material utilizado na aplicação da
entrevista, (c) Entrevistada moradora do bairro Estação Pinhal

Fonte: Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2014).


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 233

8.2 Instalação dos Pontos de Entrega Voluntária (PEVs)

Em dezembro de 2013, o Projeto Saúde da Água foi contemplado com


o patrocínio Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental.
Para enfrentar o problema de disposição inadequada do resíduo óleo de co-
zinha usado no município, foram implantados Pontos de Entrega Voluntária
– PEV’s nas empresas e associações apoiadoras do projeto, com o objetivo
de ofertar à população a infraestrutura adequada para recepção do resíduo
(Figuras 19 e 20), e posteriormente viabilizar o conhecimento da quantifi-
cação da produção de óleo em função das características socioeconômicas
da população.

Figura 19 – (a)PEV FEIRIT, (b) PEV Restaurante


Timbaúva e (c) Posto Santa Lúcia III

Fonte: Fundação MO’Ã, 2014.


234

Figura 20 – (a) PEV Expedito Lanches, (b) Restaurante Elizete’s Gourmet, (c)
Lancheria X do Negão, (d) SOCEPE, (e) Supermercado Colina- Grupo Rede Fort

Fonte: Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2014).

8.3 Educação Ambiental nas Escolas


O desenvolvimento do projeto contou, além da instalação da infraestru-
tura necessária ao gerenciamento ambientalmente adequado deste resíduo,
com as ações da principal vertente do Projeto Saúde da Água: a prática de
educação ambiental. Essa ação, integradora de todas as vertentes do Projeto,
teve por objetivo a conservação e preservação do meio ambiente e recursos
hídricos por meio de ações de conscientização sobre consumo consciente e
sustentável, formando agentes multiplicadores. A educação ambiental para a
sustentabilidade é um processo de aprendizagem contínua, baseada no res-
peito à vida em todas as suas formas. Neste sentido, o trabalho social pro-
moveu ações de conscientização da população, mas indo além dos métodos
informativos, criando mecanismos de sensibilização que incluíssem o conhe-
cimento dos processos e gerasse a necessidade de mudança comportamental.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 235

Assim, ações de educação ambiental foram desenvolvidas com alunos e


professores da rede pública do município e a comunidade local, na intenção
de possibilitar, aos geradores, a percepção e conscientização da importância
do não descarte do óleo usado em locais inadequados, e esclarecer sobre
os impactos ambientais negativos nas redes de esgoto, rios, lagos e mares
(Figura 21 e 22).
Como uma das estratégias para cativar mais os envolvidos, o Projeto
Saúde da Água também contou com o mascote CURI (Figura 23) que au-
xiliou nas ações de educação ambiental nas escolas e eventos organizados
pelo projeto.

Figura 21 – Ações do recolhimento óleo de cozinhas nas Escolas

Fonte: Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2014).

Figura 22 – Educação ambiental nas escolas

Fonte: Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2014).


236

Figura 23 – Registro de participação de aluno no descarte ambientalmente


correto do resíduo óleo de cozinha usado, juntamente com o mascote CURI

Fonte: Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2014).

Voltado a professores e funcionários do município, o projeto Saúde da


Água também ofereceu o Curso de formação em Educação Ambiental com
tema central a “Sustentabilidade e a proposta de como abordar a temática
através de práticas pedagógicas”. Na ocasião, foi debatida a situação atual
da educação ambiental nas escolas, e as metodologias e formas de construir
soluções para viabilizar a implantação da educação ambiental sem abrir mão
dos conteúdos disciplinares e das tarefas pedagógicas para a formação dos
estudantes. Para auxiliar os docentes, o professor Dr. Adriano Figueiró – res-
ponsável pelo curso, elaborou a cartilha “Educação Ambiental base para a
elaboração de projetos ambientais nas escolas”.

8.4 Atividades de sensibilização e conscientização


na Comunidade
Complementarmente ao curso de formação em educação ambiental,
foram realizadas atividades de sensibilização (Figura 24) e oficinas de re-
ciclagem do óleo de cozinha usado junto à comunidade. Em todas as ativi-
dades, procurou-se divulgar a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei
nº 12.305/2010), destacando a importância do Plano Municipal de Gestão
Integrada de Resíduos Sólidos, o qual deve ser discutido no Conselho
Municipal de Defesa do Meio Ambiente (CONDEMA).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 237

Figura 24 – Campanhas de sensibilização junto à comunidade de Itaara-RS

Fonte: Fundação MO’Ã/Graciela S. Disconzi (2014).

8.5 Desenvolvimento de Oficinas de reciclagem de resíduos –


Óleo de cozinha usado
O desenvolvimento das oficinas de reciclagem teve como objetivo tra-
balhar as possiblidades de destinação final ambientalmente adequada deste
resíduo, de modo a minimizar os impactos ambientais adversos. Foram reali-
zadas oficinas de fabricação sabão com comunidade em associações e salões
comunitários e escolas. As oficinas foram estruturadas com o intuito de res-
gatar capacidades nas pessoas comuns da comunidade de ministrar as ofici-
nas, fazendo com que se sintam parte do Projeto Saúde da Água (Figura 25).

Figura 25 – Preparação para oficinas de reciclagem


de óleo com confecção de sabão

Fonte: Fundação MO’Ã, 2014.


238

Considerações finais

Em primeiro lugar, ressalte-se o pioneirismo da iniciativa do Programa


Saúde da Água, de uma organização não governamental, ao empreender
ações para viabilizar o gerenciamento do descarte adequado do óleo de co-
zinha usado, servindo o projeto “Piloto” como um meio eficaz para a sen-
sibilização da sociedade e do Poder Público Municipal de Itaara-RS sobre
a viabilidade da Gestão de Resíduos Sólidos com a destinação adequada de
óleos e gorduras saturados.
É importante também destacar a interação, a dedicação e o comprometi-
mento das Escolas, Professores e Alunos, e moradores do município. Projetos
como este são de fundamental importância para propiciar a todos os envol-
vidos a chance de dar um novo caminhar à sociedade e ao Meio Ambiente.
Como resultado do projeto constituiu-se um banco de informações so-
cioeconômicas e educativas relevantes que poderão servir de base para a
proposição de políticas públicas e implantação de projetos, programas ou
mesmo de campanhas de educação voltadas para o tema.
As ações desenvolvidas poderão culminar em minimização dos impac-
tos socioambientais gerados pelos resíduos sólidos, além de promoção de
uma nova consciência no que se refere ao consumo e ao descarte final. Para
tanto, esta mudança de cultura depende da continuidade da educação am-
biental, da sensibilização e da mobilização permanente, tornando-os atores
sociais comprometidos e responsáveis pelo sucesso do programa.
Como sugestões para trabalhos futuros, que seja feita uma pesquisa se-
melhante nos outros bairros da cidade e até mesmo na região do município
vizinho Santa Maria, já que muitos procuram o município nos meses de fé-
rias, para talvez, no futuro, transformar a cidade, com o auxílio da prefeitura
local em um grande produtor de biodiesel, gerando empregos, mitigando
impactos ambientais e proporcionando um lucro real ao município. Saber e
conhecer os diversos seguimentos que existem a este resíduo, que pode ser
reaproveitado como subproduto na produção industrial se destinado a um
local adequado, incentiva a população a fazer um descarte ideal. A partir
do momento que a população descobrir a finalidade do resíduo do óleo de
cozinha, passará a existir o maior comprometimento com a natureza e os
recursos naturais.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 239

REFERÊNCIAS

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de 5 de outubro de 2004. Assunto: óleos e gorduras utilizados em frituras.
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em: <http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/revistadireito/arti-
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de nascente. Revista Didática Sistêmica, v. 15, n. 1, p. 56-68, 2013. FURG.
Instituto de Educação. Disponível em: <http://www.seer.furg.br/redsis/arti-
cle/view/3524/2244>. Acesso em: 2014.
HAIR, J. et al. Análise multivariada de dados. Trad. Adonai Schulup
Sant’Anna e Anselmo Chaves Neto. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2010. Disponível em:
<www.ibge.gov.br>; <www.ibge.gov.br/cidades>; <http://www.ibge.gov.br/
home/geociencias/default_prod.shtm#TERRIT>. Acesso em: 2013.
JACOBI, P. Educação Ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos
de Pesquisa, São Paulo, n. 118, 2003.
MARION, F. A. Levantamento da situação atual dos Recursos Hídricos
Subterrâneos em Itaara-RS e sua vulnerabilidade natural. Trabalho de
Graduação (Curso de Geografia – Bacharelado) – Universidade Federal de
Santa Maria, 2007.
MIGUEL, C. R. Coleta Seletiva para Reciclagem de Óleo Vegetal em
Estabelecimentos Localizados no Município de Florianópolis – ACIF.
Estudo de Caso: Programa de reciclagem de Óleo de Cozinha – REÓLEO.
2010. Disponível em: <http://www.bib.unesc.net/biblioteca/sumario/00004
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PITTA JÚNIOR, O. S. R. et al. Reciclagem do óleo de cozinha usado: uma
contribuição para aumentar a produtividade do processo. 2nd International
Workshop. Advances in Cleaner Production São Paulo: 20 a 22 maio 2009.
240

Disponível em: <http://www.advancesincleanerproduction.net/second/fi-


les/sessoes/4b/2/M.%20S.%20Nogueira%20-%20Resumo%20Exp.pdf>.
Acesso em: 2013.
RIZZO, M. R.; GASPARINI, S. T.; da SILVA, N. F. Óleos Saturados: um es-
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Científica ANAP Brasil, v. 6, n. 7, p. 85-104, jul. 2013. Disponível em:
<http://www.amigosdanatureza.org.br/publicacoes/index.php/anap_brasil/
article/view/424/451>. Acesso em: 2014.
SANTOS, D. V. Disponibilidade e Potencial de Recolhimento de Óleo
de Cozinha Usado Domiciliar no Distrito Federal: uma avaliação da
situação atual e perspectivas para um aproveitamento socioambiental e sus-
tentável. Dissertação (Mestrado em Planejamento e Gestão Ambiental) –
Universidade Católica de Brasília, 2012.
SILVA, M. S. F. Educação Ambiental: a participação da comunidade na
coleta seletiva de resíduos sólidos. Revista Eletrônica da Associação dos
Geógrafos Brasileiros. Seção Três Lagoas, MS, n. 7, ano 5, maio 2008.
Disponível em: <http://www.cptl.ufms.br/geo/revista-geo/Revista/Revista_
ano5_numero7/Art607_M.doSocorro_P.Joia.pdf>. Acesso em: 2013.
STRAUCH, Manuel; ALBUQUERQUE, Paulo Peixoto. Resíduos: como
lidar com recursos naturais. São Leopoldo, RS: Oikos, 2008.
VERGARA, S. C. Projetos e relatórios de pesquisa em administração.
11. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 241

ANEXO

ANEXO A Você
( )N
ENTREVISTA SOCIOAMBIENTAL SOBRE O DESCARTE DE ÓLEO DE COZINHA
USADO NO MUNICÍPIO DE ITAARA-RS Quan
( )m
NÚCLEO/BAIRRO: ( )2
ENDEREÇO: N° CASA:
Quan
CARACTERIZAÇÃO SÓCIO-DEMOGRÁFICA ( )m
( )2
ENTREVISTA DOMICILIAR: Você
( )N
Idade:______ Sexo: ( ) Feminino ( )Masculino
O óle
Escolaridade: destes
( ) Fundamental completo ( ) Fundamental incompleto
( ) Ensino médio completo ( ) Ensino médio incompleto Se os
( ) Superior completo ( ) Superior incompleto ( )N
( ) Outros
Estari
Composição Familiar:______________ Profissão: _____________________ ( )N

Renda familiar (salário mínimo): Possui acesso à internet: ( ) SIM ( ) NÃO Você
____________________________________ cozin
( ) 0 – 5 salários
( ) 5 – 10 salários
( ) 10 – 15 salários
( ) 15 – 20 salários
Você
( ) acima de 20 salários

CONHECIMENTO AMBIENTAL Você


( )N
Em sua opinião, qual a parte do Meio Ambiente está mais ameaçada por poluição hoje em dia? Quem
__________________________________________________________________________________ ( )C
Você acha que o lixo gerado em sua casa polui, o ambiente? ( ) NÃO ( ) SIM. Na su
( )S
Que lixo gerado na sua casa pode ser um poluente? Por favor, dê 3 (três) ( )Q
exemplos:__________________________________________________________________________
Como
PRODUÇÃO, DESCARTE E REAPROVEITAMENTO SUSTENTÁVEL ( ) re
DO ÓLEO DE COZINHA USADO
Você
Você sabe onde as pessoas em geral jogam (descartam) óleo de cozinha usado? ( ) NÃ
( ) NÃO ( ) SIM. Onde? ___________________________________________________________
Em s
Onde você joga (descarta) o óleo de cozinha usado da sua casa?________________________
residê
242

Você sabe qual seria a forma ideal de se desfazer desse resíduo?


( ) NÃO ( ) SIM. Como? _________________________________________________
ZINHA
Quantos litros de óleo de cozinha são utilizados na sua residência por mês?
( ) menos de 1 litro ( ) ≈ 1 litro ( ) 1 a 2 litros
( ) 2 a 4 litros ( ) mais de 4 litros ( ) Não sei

Quanto litros de óleo de cozinha usado você acha que sobra por mês em sua casa para ser descartado?
( ) menos de 1 litro ( ) ≈ 1 litro ( ) 1 a 2 litros
( ) 2 a 4 litros ( ) mais de 4 litros ( ) Não sei

Você sabia que o óleo de cozinha depois de usado pode ser reciclado?
( ) NÃO ( ) SIM. Em que?________________________________________________

O óleo de cozinha usado pode ser transformado em biodiesel, sabão e detergente. Você compraria algum
destes produtos? ( ) NÃO. Por quê?___________( ) SIM. Qual?_____________

Se os produtos fossem oferecidos de graça, você confiaria em usá-los?


( ) NÃO ( ) SIM. Por quê? _______________________________________________

Estaria disposto(a) a doar o óleo usado de sua residência para ser reciclado?
( ) NÃO ( ) SIM. Por quê?________________________________________________

NÃO Você sabe que parte do meio ambiente pode ser poluído se houver descarte inadequado do óleo de
____ cozinha? ( ) NÃO ( ) SIM. Qual(ais)?_________________________________________

INFORMAÇÃO SOBRE COLETA DE ÓLEO DE COZINHA USADO

Você sabe o que é coleta seletiva? ( ) NÃO ( ) SIM Como funciona?_______________

Você acha que deveria haver uma coleta de óleo de cozinha usado em Itaara?
( ) NÃO ( ) SIM Por que?__________________
a? Quem você acha que deveria fazer as coletas desse resíduo?
________ ( ) Cooperativa ( ) Prefeitura ( ) ONGs ( ) CORSAN ( ) Outros:___________

Na sua opinião qual seria a periodicidade da coleta do óleo residual doméstico?


( ) Semanal ( ) Bimestral
3 (três) ( ) Quinzenal ( ) Mensal
_________
Como você guardaria o óleo de cozinha até a coleta?
( ) recipiente de vidro ( ) garrafas PET ( ) Outros:________________

Você levaria o óleo de cozinha até um Ponto de Entrega Voluntária (PEV)?


( ) NÃO ( ) SIM. Que distância você levaria?_____________________________________________
________
Em sua opinião, qual seria a principal dificuldade para se fazer coleta de óleo de cozinha usado nas
_
residências?_________________________________________________________________________
CAPÍTULO 11
PRÁTICAS DE GESTÃO INTEGRADA
DE RESÍDUOS SÓLIDOS
André Ademir Weber
Greice Kelly Perske da Silva
Thaimon da Silva Socoloski

O conceito de gestão integrada compreende ações voltadas para a bus-


ca de soluções para os resíduos sólidos, considerando as dimensões polí-
tica, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a
premissa do desenvolvimento sustentável (BRASIL, 2010). Sair da teoria
e aplicar esse conceito na prática é um dos maiores desafios enfrentados
pelos municípios hoje, pois a destinação inadequada de resíduos gera di-
versos impactos negativos, como a contaminação da água e do solo, além
da perda de oportunidade de geração de trabalho e renda e o retorno da
matéria-prima à cadeia produtiva que a reciclagem proporciona.
Embora o aterro sanitário seja o local adequado para dispor os rejei-
tos (resíduos não recicláveis) gerados pela nossa atividade em sociedade,
é comum que se direcione todos os resíduos para os aterros, contribuindo
com a diminuição da sua finita vida útil e com o aumento dos custos
de manutenção, sejam econômicos, sociais ou ambientais. Um exemplo
disso é o aterro sanitário de Santa Maria, que recebe resíduos de mais
31 municípios da região, incluindo Itaara, totalizando 300 toneladas por
dia, de acordo com dados apresentados pela Companhia Riograndense
de Valorização de Resíduos (CRVR) em 2014 (MARTINS, 2014).
Porém, nem todo esse resíduo deveria ir para a Central de Tratamento de
Resíduos de Santa Maria, pois, segundo a Política Nacional de Resíduos
Sólidos (PNRS) (Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010), um aterro sani-
tário deveria receber apenas rejeito, e não resíduos recicláveis (incluindo
orgânicos), como acontece atualmente.
Por isso, tanto os municípios que geram grandes quantidades como as
comunidades pequenas e médias precisam encontrar soluções que incenti-
vem a reciclagem e preservem o meio ambiente, especialmente, as fontes
de água. Hoje, com água potável brotando das torneiras ininterruptamen-
te, há uma despreocupação com o desperdício e poluição da água. Esta
244

despreocupação pode ser percebida quando se fala em óleo de cozinha


usado, que comumente é jogado pelo ralo da pia. Apesar de parecer um ato
simples, pode entupir tubulações nas redes de esgoto, além de provocar
um aumento de até 45% nos custos de tratamento, pois um litro de óleo de
cozinha que vai para os corpos hídricos contamina cerca de um milhão de
litros de água (RABELO; FERREIRA, 2008).
A busca pela compreensão dos impactos negativos causados pelo
descarte inadequado do óleo de cozinha usado em Itaara iniciou com a
pesquisa de mestrado de Graciela Schmidt Disconzi. Essa pesquisa foi o
pontapé inicial do Projeto Saúde da Água, idealizado pela Fundação MO’Ã
Estudos e Pesquisas para a Proteção e Conservação Ambiental. No mo-
mento em que o projeto foi readaptado e ampliado para além do âmbi-
to acadêmico por meio do patrocínio da Petrobras através do Programa
Petrobras Socioambiental, a Fundação MO’Ã, amparada por sua filosofia
ambientalista, buscou não só orientar a comunidade em relação à prática
adequada de descarte de óleo de cozinha usado, mas também incluir os
demais resíduos sólidos incentivando a lógica da reciclagem.
Nesse capítulo, serão apresentados os objetivos e as respectivas ações
do Projeto Saúde da Água entre 2014 e 2015 no contexto dos resíduos
sólidos. Todas as figuras foram produzidas durante o Projeto e são de pro-
priedade da Fundação MO’Ã.

1. Sensibilização ambiental por meio de pontos de


entrega voluntária
O óleo de cozinha usado é considerado um resíduo sólido porque suas
particularidades tornam inviável o seu lançamento na rede pública de es-
gotos ou em corpos d’água (BRASIL, 2010). Assim, quando descartado
incorretamente, esse resíduo contamina o solo e a água; entope tubulações,
tornando mais cara a operação e manutenção das redes de esgoto; e quando
chega aos rios, lagos e mares, pode causar a morte de seres aquáticos, pois
a presença de óleos na água cria uma barreira que dificulta a entrada de luz
e a oxigenação da água.
No seu retorno à produção, como matéria-prima para sabão, deter-
gente e combustível, por exemplo, o óleo de cozinha usado pode agregar
valor à cadeia produtiva, diminuindo o custo do produto derivado final
e preservando o meio ambiente. Mas nem sempre é possível realizar um
sistema de coleta porta a porta e, nesses casos, pontos de entrega voluntá-
ria (PEV’s) podem fazer toda a diferença para que determinados resíduos
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 245

sejam corretamente encaminhados para a reciclagem. Especialmente nesse


tipo de coleta, onde voluntariamente o gerador se desloca para destinar
adequadamente o resíduo que gerou, é preciso realizar permanentemente
ações de sensibilização e educação ambiental para a obtenção de apoio e
envolvimento de todos os geradores.
Para que o retorno como matéria-prima fosse possível em Itaara, o
Projeto Saúde da Água subsidiou a realização de ações educativas de sen-
sibilização que envolveram a produção e distribuição de materiais infor-
mativos (fôlderes) sobre o descarte ambientalmente adequado dos resíduos
sólidos (Figuras 1, 2, 3 e 4), e o acondicionamento de óleo cozinha usado
através da instalação de pontos de entrega voluntária (PEV’s) em escolas,
estabelecimentos comerciais e associações comunitárias (Figura 5). Esses
fôlderes foram elaborados com o objetivo de orientar a população para
a separação dos resíduos domésticos, seguindo as orientações da PNRS,
e divulgar os PEV’s de óleo de cozinha usado. Por isso, esses materiais
foram distribuídos principalmente nas escolas de Itaara, para que essas
informações chegassem até as residências.

Figura 1 – Parte externa do primeiro folder sobre resíduos sólidos

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.


246

Figura 2 – Parte interna do primeiro folder sobre resíduos sólidos

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

Figura 3 – Parte externa do segundo folder sobre resíduos sólidos

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 247

Figura 4 – Parte interna do segundo folder sobre resíduos sólidos

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

Figura 5 – Localização dos PEV’s de óleo de cozinha usado em Itaara

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.


248

Em dois anos foram coletados mais de 500 quilos de óleo de cozinha


usado. Parte desse resíduo foi utilizado como matéria-prima em oficinas de
produção caseira de sabão e o excedente foi e continua sendo destinado à
empresa santamariense Recóleo Natural Ltda. que direciona óleo saturado
para a fabricação de biodiesel.

2. Ampliação do projeto e dispersão dos ideais de sustentabilidade


por meio das parcerias
Instituições e entidades parceiras são imprescindíveis para o êxito de
um projeto socioambiental. Além de contribuir com investimentos, as parce-
rias podem vir a ser disseminadoras das ideias de sustentabilidade fazendo
com que os objetivos atingidos sejam duradouros, pois tendem a zelar pelo
valor que o apoio a um projeto socioambiental agrega a sua marca.
O êxito do Projeto Saúde da Água no âmbito da coleta de óleo de
cozinha usado em Itaara contribuiu com o estreitamento do diálogo com
a Comissão de Planejamento Ambiental da Universidade Federal de Santa
Maria (COMPLANA). Através de uma parceria, foram instalados PEV’s de
óleo de cozinha usado nos restaurantes universitários, reitoria, centros de
ensino e hospital universitário; além de terem sido produzidos e distribuídos
materiais informativos do tipo fôlderes (Figuras 1 e 21) e cartazes (Figura 6).
Figura 6 – Cartaz fixado junto aos PEV’s da UFSM



 

   




  


 


    

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

1 Na Figura 1, a lista dos PEV’s foi substituída pelos pontos localizados na UFSM.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 249

Outra importante parceria firmada no Projeto Saúde da Água foi com a


Sociedade Concórdia Caça e Pesca (SOCEPE), cuja sede campestre se loca-
liza em Itaara. O lago da SOCEPE faz parte da sub-bacia do Arroio Manoel
Alves (bacia hidrográfica do Vacacaí-Mirim) e tem fundamental importância
hídrica não só para fins de recreação, mas também para o abastecimento
do município.
A SOCEPE é um atrativo ao turismo regional e contribui com o au-
mento do fluxo de pessoas, de consumo e, consequentemente, com o au-
mento da geração de resíduos. A destinação inadequada desses resíduos
pode comprometer a qualidade da água do lago e, portanto, o próprio abas-
tecimento de água potável no município. Diante disso, embasado na PNRS
(BRASIL, 2010), o Projeto Saúde da Água subsidiou a elaboração do Plano
de Gerenciamento de Resíduos Sólidos da SOCEPE, que incluiu o objetivo
de sensibilizar os turistas tanto para a separação dos resíduos através de car-
tazes informativos (Figura 7) fixados junto às lixeiras seletivas quanto para
a importância da qualidade da água do lago.

Figura 7 – Cartaz fixado junto às lixeiras seletivas





     
  

 
  
  
     

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.


250

3. Reconstrução do saber ambiental por meio de oficinas


de sabão
A crise ambiental é um problema do conhecimento, ou seja:
“das formas de conhecimento com as quais construímos a civilização
moderna em transição para uma certa pós-modernidade e das formas
como destruímos a natureza, degradamos os ecossistemas e contamina-
mos o ambiente, ao mesmo tempo que subjugamos os saberes que foram
sendo construídos no processo de coevolução das culturas com suas na-
turezas, com seus territórios e seus mundos de vida” (LEFF, 2010, p. 97).

A exemplo disso, é possível fazer uma análise sobre a produção caseira


de sabão. Esse saber ambiental está sendo esquecido, pois trocar receitas
é uma arte que está em baixa, especialmente entre os mais jovens, pois na
sociedade atual, em geral, tem pouca importância ouvir e trocar informações
com os mais velhos, fazendo com que essas informações deixem de ser co-
municáveis. Assim, enquanto nossas avós costumavam utilizar o óleo de co-
zinha usado para produzir inúmeras receitas de sabão, nós compramos sabões
feitos a partir de uma longa lista de materiais agressivos ao meio ambiente,
embalados em plásticos que facilmente viram resíduo, e descartamos essa
matéria-prima (óleos e gorduras) e, consequentemente, esse conhecimento.
O saber ambiental não é o conhecimento da biologia e da ecologia; não
trata apenas do saber a respeito do ambiente, mas da construção de sentidos
coletivos e identidades compartilhadas na busca de um futuro sustentável
(LEFF, 2009). Nesse sentido, buscando promover o encontro entre as pes-
soas da comunidade e compartilhar um processo de reconstrução do saber
ambiental, o Projeto Saúde da Água promoveu oficinas educativas de produ-
ção caseira de sabão a partir do óleo de cozinha usado coletado nos PEV’s
de Itaara.
As oficinas foram muito além da reciclagem de óleo de cozinha usa-
do para a produção de sabão, buscando promover uma maior consciência
acerca dos problemas socioambientais ligados aos resíduos sólidos, além
de resgatar a memória e fortalecer o protagonismo local, pois as oficineiras
responsáveis por ensinar as receitas eram sujeitos da própria comunidade.
Assim, além de incentivar a lógica da reciclagem de um resíduo que pode
contaminar o solo e a água, entupir tubulações e causar a morte de seres
aquáticos, as oficinas oportunizaram que as pessoas se percebessem como
parte do projeto e da solução dos problemas ambientais.
Em março de 2015 foi oferecida uma oficina para as 7 merendeiras da
rede de ensino de Itaara, a fim de capacitá-las para reutilizar o óleo de cozinha
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 251

residual produzido e coletado nas próprias escolas, e utilizar o sabão na limpeza


do espaço escolar. Sendo a escola um lugar de encontro de pessoas e práticas,
outra oficina foi realizada em julho com a comunidade da Estação do Pinhal
(Santo Expedito) na Escola de Educação Infantil Vovô Orion.
Sabendo da importância de parcerias para a continuidade do projeto, or-
ganizou-se também um ciclo de 5 oficinas junto com a Empresa de Assistência
Técnica e Extensão Rural (EMATER) de Itaara e o grupo de mulheres da
Associação de Produtores, Feirantes e Artesãos de Itaara (FEIRITA). Nesses
espaços, buscou-se recuperar antigos saberes de produção de sabão e testar
de novas receitas com óleo de cozinha usado, a fim de agregar técnicas para
a posterior confecção e comercialização de sabão caseiro pela FEIRITA.
Para disseminar o saber ambiental da produção caseira de sabão foram
produzidos e distribuídos fôlderes contendo além de informações sobre o
descarte ambientalmente adequado do óleo de cozinha usado, receitas de
sabão fáceis de serem replicadas e a agenda das próximas oficinas (Figuras 8
e 9). E para agregar valor ao sabão e promover a ideia, foi produzido um ró-
tulo informando não só os ingredientes utilizados na produção, mas também
a pessoa que produziu, fortalecendo ainda mais o protagonismo dos sujeitos
locais no processo (Figura 10).

Figura 8 – Parte externa do folder sobre sabão caseiro

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.


252

Figura 9 – Parte interna do folder sobre sabão caseiro

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

Figura 10 – Rótulo anexado junto aos sabões produzidos nas oficinas.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 253

4. Aproximação e diálogo com catadores de materiais recicláveis

O catador é o sujeito mais importante no ciclo da cadeia produtiva de


reciclagem. É quem está na ponta do processo produtivo, fazendo cerca de
90% de todo o trabalho. Contudo, o catador é quem menos ganha, mesmo
sendo responsável por cerca de 60% de todos os resíduos que são reciclados
hoje no Brasil (BRASIL, 2002).
Embora tenham a profissão reconhecida pela Classificação Brasileira
de Ocupações (CBO), registrados pelo número 5192-05, muitos catadores
ainda desempenham suas atividades em condições precárias e possuem bai-
xo reconhecimento do papel que representam na economia e no meio am-
biente (ALVES; MEIRELES, 2013). Medeiros e Macedo (2006) entendem
que o catador de materiais recicláveis é incluído ao ter um trabalho, mas
excluído por realizar um trabalho precário, em condições inadequadas, com
alto grau de periculosidade e insalubridade, sem reconhecimento social, com
riscos muitas vezes irreversíveis à saúde, com a ausência total de garantias
trabalhistas, sem acesso à educação e ao aprimoramento técnico.
Apesar disso, é com o trabalho dos catadores que tem início todo um
processo de reciclagem de resíduos domiciliares no Brasil.

“O Unicef estima que eles sejam responsáveis por mais de 60% do


papel e papelão reciclado no país, bem como por 90% do material
que alimenta as indústrias de reciclagem, fazendo do Brasil um dos
maiores recicladores de alumínio do mundo, por exemplo. Os catado-
res encaminham para a reciclagem mais de 20% dos resíduos sólidos
urbanos” (PINHEL, 2013, p. 32).

A importância dos catadores de recicláveis fica ainda mais evidente


quando as despesas da prefeitura com o recolhimento do lixo e a quanti-
dade que chega aos aterros sanitários passa a diminuir. Portanto, diante da
crescente geração de resíduos, a atuação do catador junto ao poder públi-
co é fundamental para um gerenciamento sustentável dos resíduos sólidos
(PINHEL, op. cit.).
Nesse sentido foi criada a Política Nacional de Resíduos Sólidos
(PNRS), Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. Essa lei propõe a eliminação
e recuperação dos lixões, incentivando a indústria da reciclagem e a criação
e o desenvolvimento de associações, cooperativas ou outras formas de orga-
nização dos catadores.
Diante disso, buscando contribuir com a inclusão social e com o de-
senvolvimento de uma forma coletiva de organização do trabalho, o Projeto
254

Saúde da Água promoveu duas oficinas de formação com os catadores in-


formais de Itaara, a primeira intitulada “Espaço de Diálogo sobre Resíduos
Sólidos” (Figura 11) e a segunda, “Troca de Saberes em Coleta Seletiva”.
Figura 11 – Convite da oficina “Espaço de Diálogo sobre Resíduos Sólidos”

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

O “Espaço de Diálogo sobre Resíduos Sólidos” ocorrido na câmara


Municipal de Vereadores de Itaara mediou o diálogo entre os catadores infor-
mais do município, o poder público municipal, o Conselho de Defesa do Meio
Ambiente de Itaara (CONDEMA), o Movimento Nacional de Catadores de
Materiais Recicláveis (MNCR), a Cooperativa de Catadores e Recicladores
de Santa Cruz do Sul (COOMCAT) e a Associação de Selecionadores de
Materiais Recicláveis de Santa Maria (ASMAR). Nesse espaço, foi discuti-
da a PNRS, problemas e potencialidade de Itaara com relação aos resíduos
sólidos e levantadas algumas metas para auxiliar na formação e organização
dos catadores.
Do primeiro encontro, surgiu a segunda oficina, a “Troca de Saberes
em Coleta Seletiva”, que possibilitou que os catadores de Itaara (que ainda
trabalham de forma isolada, sem equipamentos adequados e sem a garan-
tia de direitos) conhecessem na prática a forma de organização do trabalho
da ASMAR.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 255

As oficinas foram a pontapé inicial para a criação do Grupo de Trabalho


(GT) sobre Resíduos Sólidos no CONDEMA de Itaara. O GT tem como foco
a elaboração de uma campanha permanente sobre resíduos sólidos para a
organização de uma coleta seletiva para o município, além da continuação
da formação política dos catadores.
Para contribuir com essa proposta do GT e dar suporte para a conti-
nuidade das ações iniciadas pelo Projeto Saúde da Água, elaborou-se uma
Cartilha de Gerenciamento Doméstico de Resíduos Sólidos (WEBER;
SILVA, 2015) (Figura 12). Com uma linguagem acessível, a cartilha, que
foi distribuída nos PEV’s e em todas as escolas de Itaara, apresenta a PNRS
e mostra como é possível separar os resíduos dentro de casa, incentivando a
lógica da reciclagem. Além disso, contém receitas de sabão caseiro que uti-
lizam óleo de cozinha usado e ressalta a importância do papel dos catadores
no ciclo produtivo da cadeia da reciclagem.

Figura 12 – Sumário e amostra do miolo da Cartilha de


Gerenciamento Doméstico de Resíduos Sólidos

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

5. Discutindo resíduos sólidos por meio de uma peça teatral

A aprendizagem através do lúdico é muito mais simples e prazerosa, in-


dependentemente da idade ou do ano de ensino. São lúdicas todas e quaisquer
atividades que são capazes de propiciar a vivência plena naquele momento,
256

integrando, assim, a ação, o pensamento e o sentimento, possibilitando uma


dinâmica de integração. A linguagem teatral é lúdica, e é uma poderosa alia-
da no processo ensino-aprendizagem, pois tem o poder de cativar o público
para situações-problema que podem estar diretamente relacionadas com o
cotidiano das pessoas. O teatro, por sua forma de “fazer coletivo”, permi-
te ampliar, entre outras coisas, o senso crítico e o exercício da cidadania
(MONTENEGRO et al., 2005).
Dentro desse contexto, em parceria com a Secretaria de Educação e
Desporto de Itaara, o Projeto Saúde da Água subsidiou duas sessões da peça
teatral de fantoches “O Macaco Simão e a Saúde da Água” (Figura 13) à
quase 500 crianças da educação infantil (creche e pré-escola) e ensino fun-
damental (anos iniciais) de Itaara.
Figura 13 – Cartaz da peça teatral “O Macaco Simão e a Saúde da Água”

Fonte: Banco de Imagens Fundação Mo’ã.

A peça discutiu a temática dos resíduos sólidos com o público infantil


através da história do Macaco Simão que precisou resolver o problema da
poluição do rio e da floresta junto com o Curi2 e as demais personagens. Essa
atividade lúdica buscou estimular o desenvolvimento da criatividade, senso
crítico, percepção e sensibilidade, a fim de contribuir com a lógica da con-
servação do meio ambiente. Além disso, a peça possibilitou a inclusão de um
artista local, Rogério Rocha Lobato, que compôs o jingle da peça:
2 Curi, do tupi-guarani, significa “pinhão”. A mascote do Projeto Saúde da Água, que é uma rã, foi batizada com esse nome
pelo contexto florístico de Itaara, onde havia muitas araucárias (pinheirais).
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 257

“A latinha você usa e limpa,


limpa o vidro e o plástico também.
O papel você junta no canto e espera
que o catador já vem.
As cascas e o restinho de comida
vão dar adubo de montão!
E quem leva o que não serve pra nada
você sabe, como sempre, é o caminhão. É o caminhão!
Pra fazer isso a gente sabe,
não demora mais que um segundo.
E a vida então vai melhorar
pra mim, pra você, pra todo mundo!”

Considerações finais

O Projeto Saúde da Água incluiu ações que buscaram sensibilizar a


população de Itaara com relação ao descarte ambientalmente adequado dos
resíduos sólidos e o aproveitamento de óleo de cozinha usado. É impor-
tante destacar que, embora o projeto patrocinado pela Petrobras tenha sido
concluído, a Fundação MO’Ã tem dado continuidade a ações de educação
ambiental em Itaara.
As oficinas de fabricação de sabão caseiro buscaram arranjar um
(re)encontro entre a comunidade, priorizando a trocas de experiências, e
despertando um sentimento de pertencimento a determinado lugar e tempo.
É esse sentimento que faz com que essas pessoas compreendam a essência
dos problemas ambientais, e sob essa essência é que se deve construir uma
educação ambiental emancipatória.
O Saúde da Água também possibilitou levar o assunto da PNRS ao
CONDEMA de Itaara e à Prefeitura Municipal de Itaara, fazendo com que
tanto a comunidade quanto o poder público se apropriem dos seus direitos e
deveres e se responsabilizem pelos resíduos sólidos gerados no município.
A gestão dos resíduos domésticos é fundamental para o bom funciona-
mento da coleta seletiva que está em discussão no município. Por isso, com a
distribuição da Cartilha de Gerenciamento Doméstico de Resíduos Sólidos,
buscou-se contribuir com a disseminação de informações que despertem a
responsabilidade que todos devem ter em relação aos resíduos sólidos, con-
tribuindo com destinação final ambientalmente adequada dos resíduos que
são gerados dentro de casa.
O Grupo de Trabalho sobre Resíduos Sólidos do CONDEMA de Itaara
elaborou um projeto de campanha permanente sobre resíduos sólidos e coleta
258

seletiva, visando contribuir com a concretização so plano de coleta seletiva


municipal que aproximará poderes legislativo e executivo e a comunidade
em prol da questão dos resíduos sólidos. O GT se comprometeu em bus-
car apoio para dar continuidade a algumas atividades iniciadas pelo Projeto
Saúde da Água, como o acompanhamento dos catadores do município e im-
plantação de uma coleta seletiva solidária no município.
Diante do amplo trabalho realizado pela Fundação MO’Ã desde 1997,
cabe ressaltar que o presente capítulo é apenas uma pequena parte de um
projeto muito maior, e o trabalho iniciado com o Projeto Saúde da Água
não foi concluído com o término do patrocínio da Petrobras. Agudo, o mais
populoso município dos 9 da Quarta Colônia com população estimada de
17.085 habitantes, por exemplo, tem se espelhado na experiência trazida
pelo Projeto Saúde da Água no processo de implantação da coleta seleti-
va no município associada à inclusão social e à emancipação econômica
de catadores.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 259

REFERÊNCIAS

ALVES, J. C. M.; MEIRELES, M. E. F. Gestão de Resíduos: as possibilidades


de construção de uma rede solidária entre associações de catadores de ma-
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BRASIL. Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). Ministério do


Trabalho e Emprego. Brasília. 2002.

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da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 2 de
agosto de 2010.

LEFF, E. Discursos Sustentáveis. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

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MARTINS, M. Ampliação do aterro de lixo em Santa Maria estará


em discussão. Reportagens disponibilizada em 3 de novembro de 2014,
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cia/2014/11/ampliacao-do-aterro-de-lixo-em-santa-maria-estara-em-discus-
sao-cj5vrjkbo0r7pxbj0h00ek77b.html>. Reportagem extraída da Gaúcha
ZH. Acesso em: 20 jan. 2018.

MEDEIROS, L. F. R.; MACEDO, K. B. Catador de material reciclável:


uma profissão para além da sobrevivência? Psicologia & Sociedade, Belo
Horizonte, v. 2, n. 18, p. 62-71, maio/ago. 2006.

MONTENEGRO, B.; FREITAS, A. L. P.; MAGALHÃES, P. J. C.; SANTOS,


A. A.; VALE, M. R. O papel do teatro na divulgação científica: a experiên-
cia da seara da ciência. Ciência e Cultura, São Paulo, v. 57, n. 4, p. 31-32,
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PINHEL, J. R. Do lixo à cidadania: guia para a formação de cooperativas


de catadores de materiais recicláveis. São Paulo: Peirópolis, 2013.

RABELO, R. A.; FERREIRA, O. M. Coleta seletiva de óleo residual-


de fritura para aproveitamento industrial. Disponível em: <http://
260

www.pucgoias.edu.br/ucg/prope/cpgss/ArquivosUpload/36/file/Continua/
COLETA%20SELETIVA%20DE%20%C3%93LEO%20RESIDUAL%20
DE%20FRITURA%20PARA%20AP%E2%80%A6.pdf>. Acesso em: 22
jan. 2018.

WEBER, A. A.; SILVA, G. K. P. Gerenciamento doméstico de resíduos


sólidos. Itaara: Fundação MO’Ã, 2015.
CAPÍTULO 12
MONITORAMENTO
QUALI-QUANTITATIVO DA
ÁGUA DE NASCENTES
Marciano Friedrich
Raul Todeschini
Jussara Cabral Cruz

1. Introdução
Nas últimas décadas as discussões sobre a preservação do meio am-
biente, tem sido pauta crescente e recorrente entre as contendas acerca desse
tema. No que concerne a esse contexto, debates relacionados aos recursos
hídricos é notadamente um dos mais evidenciados. Isso porque a água é um
recurso indispensável para todos os seres vivos e, não obstante, o acesso a
água potável tem se tornado cada vez mais escasso em muitas regiões do
planeta, o que de maneira semelhante ocorre no Brasil. E, embora, existam
novas tecnologias associadas a produção de conhecimento para melhoria da
gestão das águas, o aprimoramento necessário para alcançar a conservação
e a manutenção da qualidade e, consequentemente, o acesso aos recursos hí-
dricos qualitativamente e quantitativamente satisfatórios, ainda requer gran-
des avanços, sobretudo no que tange a gestão desse recurso.
No Brasil, um dos maiores problemas relacionado à poluição dos re-
cursos hídricos está associado à carência de saneamento, principalmente em
função do lançamento de efluentes sem tratamento, destacando-se os de ori-
gem doméstica (ARAÚJO, 2013). Somam-se ao lançamento de efluentes, as
atividades agrícolas e pecuárias, bem como a eliminação das matas ciliares.
Em se tratando de áreas rurais, a deficiência na coleta e tratamento de
esgoto sanitário é ainda maior, onde grande parcela das residências faz o uso
de tanques sépticos (COSTA; GUILHOTO, 2014), podendo ser fontes de
contaminação dos lençóis freáticos e, consequentemente, dos cursos hídricos
localizados em áreas de nascentes. Soma-se a isso, a crescente degradação
e a retirada da vegetação circundante às nascentes resultando, não raramen-
te, em locais extremamente vulneráveis a poluição ambiental. Ressalta-se,
ainda, o fato de que as comunidades rurais têm o seu abastecimento hídrico,
geralmente, proveniente de águas de nascentes ou de poços subterrâneos,
uma maior parcela desses, são poços rasos.
262

Em relação as nascentes, essas são responsáveis pela produção das águas


que darão origem aos cursos d’água e atenderão as demandas da sociedade e do
meio ambiente como um todo. Nesse conjunto, torna-se de grande relevância
estudos que contribuam como forma de referência e apoio, no sentido de propor
metodologias que permitam compreender os fatores e processos que influen-
ciam na qualidade da água de cursos hídricos localizados em áreas de nascentes.
Além disso, tais estudos podem auxiliar na elaboração de um banco de
dados que forneça informações adequadas para análise e tomada de decisões,
planejamento de ações mitigadoras e de recuperação ambiental dessas áreas.

1.1 A bacia hidrográfica como unidade de planejamento e


gestão ambiental
A bacia hidrográfica, em âmbito terrestre, é considerada o elemento fun-
damental de análise do ciclo hidrológico, englobando os processos de infil-
tração e escoamento superficial. Pode ser compreendida como uma área de
captação natural dos fluxos de água provenientes da precipitação, direcionando
o escoamento para um único ponto de saída, o exutório, ou, infiltrando no solo,
dessa forma, reabastecendo os lençóis freáticos, dando origem às nascentes
(TUCCI, 2009; BARRELLA et al., 2001). Considerada, também, um sistema
geomorfológico aberto, o qual recebe energia e matéria decorrentes de agentes
climáticos, que serão perdidos, em parte, pelo deflúvio (HORN, 2012).
De acordo com Pires et al. (2002), as características de um corpo
hídrico refletem as de sua bacia de drenagem, onde qualquer alteração
que ocorrer sobre ela, resultará na qualidade final da água desse sistema
(WALLING, 1980). Nesse sentido, fazem-se necessárias medidas relacio-
nadas ao gerenciamento dessas áreas.
No Brasil, conforme a Lei 9.433 de 8 de janeiro de 1997, a qual institui a
Política Nacional de Recursos Hídricos, define a bacia hidrográfica como uni-
dade territorial para fins de planejamento e gestão (BRASIL, 1997). A referida
lei, fundamenta-se no fato de que a água, embora reconhecida como um recur-
so natural renovável, ela seja, também, um recurso de domínio público, tendo
o objetivo de assegurar à atual e às futuras gerações a sua disponibilidade em
padrões adequados aos respectivos usos, além da prevenção e da defesa contra
eventos decorrentes de seu uso inadequado (BRASIL, 1997).

1.2 Enquadramento dos corpos d’água


Um dos instrumentos utilizados para tal, o enquadramento, segundo a
Resolução 357/2005 do CONAMA, estabelece os padrões de qualidade da
água de acordo com os seus determinados usos, dispondo as suas classifica-
ções e diretrizes ambientais (BRASIL, 2005). Dessa forma, os corpos d’água
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 263

são classificados em: doces (salinidade ≤ 0,05%o), salobras (salinidade en-


tre 0,05 e 30%o) e salinas (salinidade ≥ 30%o). As classificações são, tam-
bém, dividas em 13 classes de qualidade conforme seus usos preponderantes
(Tabela 1), sendo elas: classe especial e classes 1 a 4, para as águas doces;
classe especial e 1 a 3, para as águas salobras; e classe especial e 1 a 3, para
as águas salinas. Para as classes 1, 2 e 3 das águas doces, recomenda-se tra-
tamentos do tipo simplificado, convencional e convencional ou avançado,
respectivamente, para o abastecimento e consumo humano. A classe especial
exige tratamento de desinfecção, o qual consiste na remoção ou inativação
de organismos potencialmente patogênicos.
Tabela 1 – Águas brasileiras: Classificação das águas de acordo com os usos
TIPO DE ÁGUA
DOCE SALINA SALOBRA
TIPO DE CONSUMO
CLASSE
Especial 1 2 3 4 Especial 1 2 3 Especial 1 2 3
Abastecimento para consumo humano TD TS TC TC ou TAV TC ou TAV
Aquicultura e atividade de pesca. X X X
Dessedentação de animais. X
Harmonia paisagística X X X
Irrigação de culturas arbóreas,
X
cerealíferas e forrageiras;
Irrigação de hortaliças/frutas
que são consumidas cruas/ X X
sem remoção de película;
Irrigação de parques, jardins, campos
de esporte e lazer, com os quais o X X
público possa vir a ter contato direto.
Navegação X X X
Pesca amadora X X X
Preservação do equilíbrio natural
X X X
das comunidades aquáticas
Preservação dos ambientes
aquáticos em unidades de con- X X X
servação de proteção integral
Proteção das comunidades aquáticas X* X X X
Recreação de contato primário,
tais como natação, esqui aquático
X X X X
e mergulho, conforme Resolução
CONAMA nº. 274, de 2000;
Recreação de contato secundário. X X X
Tipos de Tratamento para a água de consumo humano: - Desinfecção: TD; Simplificado:
TS; Convencional: TC; Avançado: TAV X* – em Terras Indígenas.
Fonte: Cruz e Silveira (2007).
264

Na Tabela 2 são mostrados os padrões de qualidade para águas doces de


alguns parâmetros de qualidade da água.
Tabela 2 – Padrões de qualidade para águas doces,
conforme Resolução CONAMA 357/2005

Padrões de qualidade
Parâmetros Unidade
Classe
Classe 1 Classe 2 Classe 3 Classe 4
Especial

Turbidez UNT - ≤40 ≤100 ≤100 -

pH - - 6–9 6–9 6–9 6–9

Oxigênio Dissolvido mg.L-1 - ≥6 ≥5 ≥4 ≥2

Sólidos Dissol-
mg.L-1 - ≤500 ≤500 ≤500 -
vidos Totais

DBO mg.L-1 - ≤3 ≤5 ≤10 -

Nitrato mg.L-1 - ≤10 ≤10 ≤10 -

Nitrito mg.L-1 - ≤1 ≤1 ≤1 -

Cloreto mg.L-1 - ≤250 ≤250 ≤250 -

Sulfato mg.L-1 - ≤250 ≤250 ≤250 -

Fósforo Total (Am-


mg.L-1 - ≤0,02 ≤0,03 ≤0,03 -
biente lêntico)

Fósforo Total (Am-


mg.L-1 - ≤0,10 ≤0,10 ≤0,15 -
biente lótico)

Escherichia coli NMP/100 mL - ≤200 ≤1000 ≤4000 -

Fonte: Brasil (2005).


Nota: (-) limite não citado pela Resolução.

A Resolução 357/2005 do CONAMA, afirma, também, no artigo 42º,


que enquanto não aprovados os respectivos enquadramentos, as águas doces
serão consideradas classe 2, as salinas e salobras, classe 1. Exceção ocorre
quando as condições de qualidade atuais forem melhores, o que determinará
a aplicação da classe mais rigorosa correspondente (BRASIL, 2005).
Entende-se que a contaminação dos recursos hídricos é provenien-
te de fontes denominadas “difusas” e “pontuais”. A fonte difusa refere-se
ao processo de carreamento, de forma esparsa, de todo material orgânico
e/ou inorgânico encontrado na superfície do solo, os quais alcançam os
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 265

mananciais em diversos pontos ao longo de sua extensão, como por exem-


plo em função do escoamento superficial em áreas urbanas e do uso de
fertilizantes em áreas agrícolas (VON SPERLING, 2005). No caso das
fontes pontuais, os poluentes atingem os sistemas hídricos de maneira con-
centrada no espaço, e tem sua descarga contínua e conhecida, como nas
situações de despejos de efluentes industriais e de esgoto doméstico (VON
SPERLING, 2005; TOMAZ, 2006).
Nessa ótica, quantificar o escoamento de um corpo hídrico é essencial
na avaliação da sua qualidade, uma vez que possibilita a verificação da ca-
pacidade de diluição de potenciais cargas de poluição difusas ou pontuais
(SILVEIRA, 1997; CRUZ; TUCCI, 2008; LIBÂNIO, 2010). A indissocia-
bilidade dos aspectos quali-quantitativos é fundamental para compreensão
de possíveis impactos ambientais em uma bacia hidrográfica, em que uma
mesma carga poluidora pode ser diluída em função da amplitude da varia-
ção das vazões (SILVEIRA et al., 2003).
Perry e Maghembe (1989) relatam também que as bacias hidrográfi-
cas, dependendo do estado de conservação, apresentam certa vulnerabilida-
de em relação às perturbações naturais, cujas alterações manifestam-se na
qualidade da água, fato que indica a integração das propriedades inerentes
de cada bacia. Entretanto, quando em boas condições de proteção vegetal,
o funcionamento hidrológico, que é relativamente estável e altamente com-
plexo, suporta tais perturbações.
Conforme Arcova (1996), as alterações no regime hidrológico das ba-
cias hidrográficas só podem ser avaliadas se precedidas de um registro das
informações hidrológicas de um período suficientemente longo das mes-
mas, para que, dessa maneira, se quantifique a magnitude dessas mudanças.
Nesse sentido, o levantamento de informações, a partir do monito-
ramento ambiental, permite a quantificação das alterações hidrológicas,
proporcionando, também, a avaliação das consequências das atividades
humanas, como as alterações de uso e cobertura do solo exercidas sobre os
ecossistemas das bacias hidrográficas (QUEIROZ et al., 2010). Dessa for-
ma, as áreas de captação natural de água (bacias hidrográficas) apresentam-
-se como um território ideal para se determinar os possíveis impactos nos
recursos hídricos.
Cruz (2001) lembra que o monitoramento de bacias hidrográficas
envolve características quantitativas e qualitativas dos recursos hídricos.
Ainda, o comportamento hidrológico desses sistemas recebe interferência
de diversos fatores, como a geomorfologia, o tipo e uso do solo, a distri-
buição temporal e intensidade das chuvas, a forma do canal, dentre outros.
266

2. Monitoramento dos recursos hídricos


Em um contexto em geral, quando se fala em monitora-
mento dos recursos hídricos, é importante ressaltar que existe
uma relação direta entre a qualidade e a quantidade da água.
A quantidade de água é função do ciclo hidrológico, ciclo das
águas na natureza, em especial as precipitações pluviométricas
e as vazões dos cursos d’água. Já a qualidade da água é medida por indicadores
e parâmetros, cujas concentrações são menores quanto maior é a quantidade de
água e vice-versa. Portanto, quando se pensa em monitoramento dos recursos
hídricos é necessário pensar em monitoramento tanto dos aspectos de quantida-
de como de qualidade simultaneamente.

2.1 Mas afinal, o que é o monitoramento dos recursos hídricos?


Monitoramento, em suma, consiste na coleta de dados, estudos e acompanha-
mento de parâmetros de quantidade e qualidade dos recursos hídricos. Conforme
o artigo 2º, inciso XXV, da Resolução CONAMA 357/2005, monitoramento é
definido como a medição ou verificação de parâmetros de qualidade e quantidade
da água, que pode ser contínuo ou periódico, utilizado para o acompanhamento da
condição e controle de qualidade do corpo de água (BRASIL, 2005).
Segundo Câmara (2004), um plano de monitoramento da qualidade
da água viabiliza ações e práticas apropriadas para o seu controle e mane-
jo. Todavia, usualmente, essas práticas são concebidas a partir de resultados
experimentais, em circunstâncias que proporcionem quantificar e analisar as
consequências das medidas mitigadoras a serem adotadas. Essas afirmações
são consoantes com o que Lemos et al. (2010) cita, pois para este o monitora-
mento da qualidade da água é um dos principais instrumentos para o planeja-
mento e a gestão dos recursos hídricos. Este autor justifica que tal instrumento
permite o acompanhamento dos processos de usos dos cursos hídricos, assim,
sendo possível identificar os efeitos sobre as características qualitativas das
águas, de maneira que contribua para ações de controle ambiental. Além disso,
o monitoramento pode auxiliar em termos de saúde pública, principalmente no
sentido de evitar agravantes em relação às águas utilizadas no abastecimento e
consumo público (BARRETO et al., 2014).
Portanto, o monitoramento quali-quantitativo dos recursos hídricos de-
monstra-se de grande relevância no fornecimento de subsídios para planos
e projetos de recuperação das perturbações resultantes de atividades antrópi-
cas e/ou de processos naturais. Adicionalmente, essa intervenção demanda o
conhecimento e entendimento dos processos ambientais, para que, então, se
possam adquirir informações confiáveis pertencentes ao ambiente em questão
(VALENTE, 2013). Vale ressaltar, contudo, que os dados oriundos do monito-
ramento devem ser trabalhados de modo a gerar informações que possam ser
entendidas e aplicadas na prática pela população em geral.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 267

2.2 Qual a finalidade do monitoramento?


Para verificar a quantidade e a qualidade dos recursos hídricos. Além dis-
so, serve para subsidiar a gestão integrada das águas segundo a Lei da Águas
(Lei Federal 9433/1997). Essa Lei prevê também que a gestão dos recursos
hídricos deve proporcionar os usos múltiplos das águas, de forma descentrali-
zada e participativa, contando com a participação do Poder Público, dos usu-
ários e das comunidades. Em situações de escassez o uso prioritário da água é
para o consumo humano e para a dessedentação de animais. As informações
do monitoramento são fundamentais para tomada de decisões. Isso é de suma
importância quando se trata de recursos hídricos, pois se não houver um en-
tendimento e a sensibilização da população em adotar práticas, na maioria das
vezes simples, que podem ser replicadas por meio da educação ambiental inte-
grando as faces de conhecimento em prol de um objetivo comum, os números
advindos do monitoramento por si só não são capazes de modificar o atual
panorama em relação aos recursos hídricos.
Vale destacar que de um modo geral, o monitoramento em termos quan-
titativos é consideravelmente maior se comparado ao qualitativo. A prova
disso, são os metadados divulgados pela Agência Nacional e Águas (ANA)
onde, segundo ela, em 2018, a agência é responsável pela operação e pelo
monitoramento de aproximadamente 4543 estações, sendo que em no ano
de 2016, em cerca de 1600 estações havia a medição de 4 parâmetros de
qualidade da água.

2.3 Qualidade da água


A qualidade da água dos cursos hídricos em áreas naturais é resultado
de diversos fatores, como o clima, geologia, solos e vegetação (ARCOVA
e CICCO, 1999). Áreas alteradas por atividades antrópicas em decorrência
da expansão da agricultura, urbanização, silvicultura, associadas às práticas
inadequadas de uso do solo, contribuem essencialmente nas variações das
características físicas, químicas e biológicas dessas águas (DONADIO et al.,
2005; PINTO et al., 2012).
Assegurar a qualidade da água de forma satisfatória é de fundamental
importância para o desenvolvimento econômico, social e sustentável dos ci-
clos do planeta (TUNDISI, 2003). No entanto, a ausência de gerenciamento
e a crescente demanda por recursos hídricos, principalmente em função do
crescimento populacional, das atividades agrícolas, pecuárias e industriais,
tem ocasionado a degradação em termos qualitativos e quantitativos desses
recursos (QEUIROZ et al., 2010).
O Brasil detém 13% de toda água doce disponível no planeta (ANA,
2013). Contudo, embora dotado de significativa disponibilidade hídrica
268

comparada à maioria dos países, o Brasil apresenta expressiva desigual-


dade em relação à distribuição desse recurso natural. A região norte, com
apenas 5% da população, dispõe de 80% de água, concentrada na região
Hidrográfica Amazônica, enquanto que as demais regiões, as quais contam
com 95% do contingente populacional do país, são contempladas com 20%
da disponibilidade hídrica (RIGHES, 2009; ANA, 2013).
Considerada um solvente universal, a água disponível na natureza geral-
mente não se encontra em seu estado de absoluta pureza (VON SPERLING,
2005). Sua qualidade, seja superficial ou subterrânea, é resultado de fatores
naturais e antrópicos, em razão do uso e ocupação do solo desenvolvidos
nas bacias hidrográficas, onde a determinação da qualidade se dá por meio
das características físicas, químicas e biológicas (TUCCI, 2009; BINOTTO,
2012). A variação dessas características estabelece suas múltiplas deman-
das, como o uso doméstico, agrícola, industrial, recreativo (MERTEN;
MINELLA, 2002), além de servir de subsídio como forma de informação
para o controle e conservação dos ecossistemas.
Além das alterações qualitativas dos recursos hídricos, as mudanças no
uso do solo têm consequências em termos quantitativos. Pinto et al. (2004)
destacam que o uso do solo pode influenciar no armazenamento de água
subterrânea, no regime das nascentes e, também, dos cursos d’água. Ferreira
et al. (2013) menciona que a água tem maior facilidade para escoar super-
ficialmente em áreas onde o solo se encontra desprotegido, o que diminui a
capacidade de retenção dessa água. Ademais, como consequência, a infiltra-
ção deixa de abastecer o lençol freático, podendo reduzir a vazão dos rios
em época de estiagem. Outro resultado é o favorecimento ao assoreamento
desses corpos d’água, processo que restringe a disponibilidade hídrica.
Conforme Donadio et al. (2005), os recursos hídricos estão mais pro-
tegidos quando encontrados em meio a florestas não perturbadas. Esses
sistemas, quando comparados às áreas de uso agrícola, auxiliam no sentido
de minimizar as perdas de solo e, consequentemente, o aporte de sedimentos
e nutrientes aos cursos d’água, o que pode prejudicar os processos hidrológi-
cos e gerar impactos à jusante (ARCOVA; CICCO, 1999; FERREIRA et al.,
2013; VALENTE, 2013).
Nesse contexto, as matas ciliares, como as Áreas de Preservação
Permanente (APP’s), exercem funções fundamentais de proteção aos solos
e aos recursos hídricos, sendo importantes na manutenção da qualidade da
água, na regularização dos cursos d’água e na conservação da biodiversidade
(RODRIGUES, 2004).
A legislação 12.651/2012 (BRASIL, 2012), a qual define o Novo Código
Florestal Brasileiro, no artigo 3º, inciso II, estabelece as APP’s como uma
área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental
de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 269

biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e


assegurar o bem-estar das populações humanas.
Segundo Neary et al. (2009), a melhor qualidade das fontes de água
doce ocorre em ecossistemas florestais. Os sistemas radiculares sob florestas
são mais extensos e relativamente profundos em relação às terras agrícolas,
fazendo com que aumente a macroporosidade, e em consequência, a con-
dutividade hidráulica e as taxas de infiltração (ALVARENGA et al., 2012).
Além das funções ambientais mencionadas, funcionam como filtros, retendo
agrotóxicos, poluentes e sedimentos que seriam transportados para os cur-
sos d’água, os quais são prejudiciais em termos de quantidade e qualidade,
e, consequentemente, em relação à fauna aquática e a população humana
(SILVA et al., 2012).
Nesse sentido, avaliação da qualidade da água proporciona o diagnóstico
do estado de preservação dos sistemas ambientais (BINOTTO, 2012). Parron
et al. (2011), destaca que a partir do conhecimento do comportamento e das
condições dos aspectos quali-quantitativos dos recursos hídricos é possível
compreender os processos ambientais ocorrentes nas bacias hidrográficas,
constituindo-se, assim, em uma ferramenta essencial para o planejamento
e gerenciamento dessas áreas em função das necessidades correspondentes.
Diante do exposto, algumas metodologias podem auxiliar nesses pro-
cessos, como o monitoramento ambiental, incluindo levantamentos de cam-
po, amostragens, análises laboratoriais, medição de vazões. A verificação da
diluição de possíveis cargas poluidoras ao longo do tempo e das séries de
vazões, por meio da utilização das curvas de permanência de vazões e de
qualidade das águas, além dos índices de qualidade das águas (IQA’s), que
possibilitam a avaliação das alterações qualitativas das águas.

3. Qualidade da água em nascentes

O Novo Código Florestal em seu artigo 3º, inciso XVII (Lei nº


12.651/2012) (BRASIL, 2012), define nascente como: afloramento natural
do lençol freático que apresenta perenidade e dá início a um curso d’água.
São encontradas nas encostas ou depressões dos terrenos, e, também, no
nível de base, representado pelo curso d’água local. Podem ser perenes (de
fluxo contínuo), temporárias (de fluxo apenas na estação chuvosa) e efê-
meras (surgem durante as chuvas, permanecendo por apenas alguns dias ou
horas) (CALHEIROS et al., 2009).
Diversos fatores podem alterar as características dessas águas em uma
bacia hidrográfica, como por exemplo, a declividade, o tipo e o uso do solo,
bem como os processos naturais de precipitação, infiltração, escoamen-
to superficial, entre outros (VON SPERLING, 2005; CALHEIROS et al.,
270

2009). Destacam-se, também, algumas práticas antrópicas responsáveis por


essas alterações, dentre elas: a ocupação de áreas de recarga com manejo
agropecuário inapropriado; a eliminação da vegetação nativa nas APP’s em
decorrência da agricultura, pastagens ou construção de domicílios; o des-
pejo de efluentes domésticos, bem como a disposição de resíduos sólidos
nas adjacências ou diretamente nos cursos d’água (PINTO et al., 2012).
Em áreas rurais, o abastecimento das comunidades, geralmente, é
feito de águas provenientes de nascentes ou de poços rasos. Esses siste-
mas podem ser susceptíveis à contaminação por diversas formas, como
citado anteriormente. De fato, a adoção de medidas de preservação ou de
tratamento das águas é fundamental para a mitigação dos riscos à saúde
das pessoas que fazem o seu uso, assim como a manutenção do bem-estar
(AMARAL et al., 2003).
No que se refere às práticas de recuperação e preservação da qualidade
e quantidade da água em nascentes deve-se considerar toda a área da bacia
hidrográfica em questão. O combate à erosão do solo por meio de estrutu-
ras físicas e barreiras vegetais de contenção, a minimização de contamina-
ção química e biológica, a mitigação das perdas de água por evaporação e
consumo das plantas, além da melhoria das características físicas do solo
relacionadas à capacidade de infiltração da água da chuva, determinarão a
maior disponibilidade hídrica nas nascentes ao longo dos anos, incluindo
os períodos de estiagem (CALHEIROS et al., 2009).
Nesse contexto, para a recuperação e conservação das nascentes, a
presença de árvores nas adjacências das mesmas, pode ser de grande im-
portância. Essa prática, regulamentada pela alteração do Novo Código
Florestal (Lei nº 12.727/2012), no artigo 4º, inciso IV, estabelece um raio
mínimo de 50 metros de Áreas de Preservação Permanente (APP’s) em seu
entorno, qualquer que seja sua situação topográfica, tanto em zonas rurais,
como em zonas urbanas.
Ainda, segundo Ferreira et al. (2013), alguns cuidados essenciais de-
vem ser tomados em relação ao condicionamento das áreas próximas às
nascentes, principalmente em propriedades rurais, esses, ilustrados con-
forme o exemplo da situação apresentada na Figura 2. De acordo com a
situação inicial, na distribuição das áreas de cultivo, o proprietário de um
sítio que cultiva o algodão, milho e pastagem, permite que os animais te-
nham o livre acesso à água, além de estabelecer a presença de chiqueiros,
fossas e estábulos próximos à nascente. Essa distribuição, possivelmente,
acarretará na contaminação da água, prejudicando os meios biótico, físico
e antrópico ali dispostos.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 271

Figura 1 – Exemplo distribuição espacial das culturas e estruturas rurais


nas situações inadequadas (A) e adequada (B) em função da nascente
A B

Fonte: Ferreira et al. (2013).

Dessa forma, salientam-se os seguintes cuidados e modificações na área


para que se recupere e mantenha a boa condição da nascente: isolamento da
área de captação (presença de APP’s adjacente à nascente e cercamento, a
fim de evitar o acesso de animais, pessoas, veículos, etc), distribuição ade-
quada dos diferentes usos do solo, eliminação das instalações rurais e redis-
tribuição das estradas (FERREIRA et al., 2013) (Figura 2B).
Considerando as questões de recuperação e proteção ambiental, alguns
programas vêm sendo desenvolvidos no Brasil, esses, por sua vez, baseados
nos sistemas de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA). Tal sistema
tem princípio no modelo “provedor-recebedor”, onde aqueles que se bene-
ficiam de algum serviço ambiental produzido em uma determinada área de-
vem realizar pagamentos para o fornecedor desses serviços. Os pagamentos
podem ser vistos como uma fonte adicional de renda pelos benefícios am-
bientais gerados (ANA, 2012).
A Agência Nacional de Águas – ANA propôs o Programa do Produtor
de Água visando o estímulo às PSA’s. O Programa objetiva a redução da
erosão e assoreamento dos mananciais localizados em áreas rurais, possibi-
litando o apoio técnico e financeiro à execução de ações de conservação da
água e do solo. Exemplo dessas ações são a recuperação e proteção de nas-
centes, o reflorestamento de APP’s e reserva legal, o saneamento ambiental,
a readequação de estradas vicinais etc. (ANA, 2012).

4. Avaliação da qualidade das águas


A qualidade da água pode ser representada por diversos parâmetros
que traduzem as suas principais características físicas, químicas e biológi-
cas. A determinação desses parâmetros, por meio de processos analíticos
em laboratório, permite avaliar as condições da água quanto à sua utiliza-
ção para consumo humano, lazer, pesca, agricultura e produção de energia
(MORTARI; SILVA, 2009).
272

Nesse contexto, na Tabela 3, estão descritos e apresentados alguns exem-


plos de parâmetros com suas definições e características correspondentes.

Tabela 3 – Parâmetros de qualidade da água e características correspondentes

Parâmetro Características
Atua como um catalisador de reações químicas, interfere na solubilidade das substâncias e no
metabolismo dos organismos aquáticos. Sua variação depende, de maneira geral, da radiação
Temperatura
solar, pela influência do clima e, quando de origem antrópica, do lançamento de efluentes in-
dustriais. Responsáveis pela alteração da solubilidade de oxigênio dissolvido no meio aquático.
Diretamente relacionada a quantidade de sólidos presentes na água, o que, por sua vez, in-
terfere na passagem de luz solar no maciço aquático e, consequentemente, pode ocasionar
Turbidez
a redução da fotossíntese das vegetações submersas e das algas, resultando na limitação da
produção de oxigênio.
Influi no grau de solubilidade e no potencial de toxicidade de diversas substâncias. As alte-
Potencial hidro- rações de pH nos cursos d’água podem ser decorrentes de atividade algal (fotossíntese ou
geniônico (pH) respiração dos organismos), da dissolução de rochas e do lançamento de efluentes domésticos
e industriais.
A condutividade elétrica constitui na capacidade de a água transmitir corrente elétrica em de-
Condutividade corrência da presença de sais dissolvidos. Representa uma medida indireta da concentração de
Elétrica (CE) poluentes, relacionando-se com a concentração de sólidos dissolvidos, uma vez que, à medida
que mais sólidos dissolvidos são adicionados, a condutividade elétrica tende a aumentar.
Considerado um dos principais indicadores de qualidade da água, o oxigênio dissolvido é funda-
mental para a manutenção dos organismos nos ambientes aquáticos. Águas encontradas sob
Oxigênio
maior pressão atmosférica terão maior concentração de OD. Quanto maior a temperatura, menor
Dissolvido (OD)
a concentração de gás dissolvido na água. Em relação à salinidade, à medida que a concentra-
ção aumenta, podendo ser decorrente de atividades poluidoras, a solubilidade de OD diminui.
A Demanda Bioquímica de Oxigênio corresponde à quantidade de oxigênio necessário aos
Demanda
microrganismos para oxidar a matéria orgânica biodegradável presente no ambiente aquático.
Bioquímica de
Elevados teores de DBO indicam a presença de matéria orgânica na água, normalmente prove-
Oxigênio (DBO)
niente do despejo de efluentes.
A determinação da potencialidade de uma água transmitir doenças pode ser feita de forma indi-
reta, por meio dos organismos indicadores de contaminação fecal, pertencentes, principalmente,
ao grupo dos coliformes. Os coliformes totais englobam um amplo grupo de bactérias de origem
Coliformes Totais exclusivamente fecal, podendo ser encontrados naturalmente em amostras de plantas, águas
e Escherichia coli e solos poluídos e não poluídos, bem como de fezes de seres humanos e animais de sangue
quente. O grupo de coliformes termotolerantes, representados predominantemente pelos gru-
pos Escherichia coli, são encontrados em fezes humanas e de animais, bem como nos solos,
plantas ou qualquer efluente que contenha matéria orgânica.
Em se tratando de sólidos nas águas, admite-se que, esses, correspondem a toda matéria
que permanece como resíduo após processos de evaporação, secagem ou calcinação de uma
amostra. A soma dos sólidos dissolvidos e dos sólidos em suspensão definem a concentração
Sólidos Totais,
dos sólidos totais. O aumento da concentração de sólidos nos cursos d’água, em muitos casos,
em Suspensão
pelos processos erosivos decorrentes dos períodos chuvosos. A ausência de mata ciliar, somada
e Dissolvidos
às atividades agrícolas, seguidas de técnicas inadequadas de preparo e conservação de solo,
faz com que grande quantidade de solo seja levada para dentro dos rios, contribuindo com esse
aumento.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 273

4.1 Índice de Qualidade das Águas – IQAs

Índices de Qualidade das Águas (IQA’s) são geralmente utilizados com


a finalidade de verificar e avaliar as alterações na qualidade das águas, bem
como de facilitar a compreensão das possíveis interferências antrópicas e das
causas naturais dessas alterações (FRANCO et al., 2014). Conforme Toledo
e Nicolella (2002), a utilização dos IQA’s possibilita o acompanhamento
sazonal da degradação potencial ou efetiva dos recursos hídricos ao longo
de uma bacia hidrográfica, constituindo-se em uma ferramenta de apoio ao
monitoramento qualitativo dos sistemas hídricos superficiais.
Nesse contexto, o IQA permite, por meio de determinações matemáti-
cas e de informações resumidas, realizar a caracterização da água e transfor-
má-la num valor simples e de fácil interpretação, sendo usados no controle
e gerenciamento dos recursos hídricos por planejadores, pesquisadores e o
público em geral (CARVALHO et al., 2009). Consoante com Pinto et al.
(2012), o IQA consiste em um dispositivo imprescindível para os órgãos
públicos em termos de gestão ambiental, em razão dos baixos custos, bem
como pela importância na tomada de decisão em áreas pouco estudados, po-
rém se faz necessária uma investigação mais detalhada que aponte o melhor
indicador ambiental.
Desenvolvido pela National Sanitation Foudantion (NSF), dos Estados
Unidos, no ano de 1970, o IQA baseia-se na utilização de nove principais
parâmetros físicos, químicos e biológicos de qualidade da água, onde à cada
variável é atribuído um peso de acordo com a sua importância na estrutura
global de qualidade, sendo essa técnica adotada por diversos países (VON
SPERLING, 2005; ANA, 2016).
No Brasil o IQANSF foi adaptado pela Companhia Ambiental do Estado
de São Paulo – CETESB, tendo como objetivo principal o abastecimento pú-
blico. Assim como no IQANSF, utiliza nove parâmetros de qualidade, dentre
eles: o oxigênio dissolvido, coliformes termotolerantes (Escherichia coli),
pH, demanda bioquímica de oxigênio, nitrogênio total, fósforo total, tem-
peratura da água, turbidez e sólidos totais. Após a atribuição dos pesos para
cada variável, realiza-se o cálculo da determinação do IQA por meio do pro-
dutório ponderado dos resultados desses parâmetros (CETESB, 2004).

4.2 Curvas de permanência de vazões e de qualidade

As curvas de permanência, ou de duração de vazões, são definidas


como a probabilidade de que a vazão média diária de um corpo hídrico seja
excedida ou igualada ao longo do tempo, dentro do seu período amostral.
274

Sua obtenção ocorre por meio da relação entre as vazões e as porcentagens


do tempo usado no estudo. É considerado um instrumento fundamental na
orientação de processos de gestão de recursos hídricos relativos ao enqua-
dramento, à outorga e à cobrança pelo uso da água (CRUZ; TUCCI, 2008).
Na legislação brasileira o instrumento de enquadramento de corpos hí-
dricos em classes segundo seu uso preponderante atende a necessidade de
que a gestão de recursos hídricos considere a quantidade hídrica para avaliar
a qualidade do corpo hídrico. Isso se torna possível, via estabelecimento
de parâmetros de qualidade hídrica com base em uma vazão de referência
(CRUZ; SILVEIRA, 2007; FORMIGONI et al., 2011). Nesse aspecto, a
relação entre as curvas de permanência de vazões com parâmetros da quali-
dade da água pode ser bastante útil.
Essa relação, curvas de permanência de vazões e qualidade da água,
por meio de dados de monitoramento, permite observar o comportamento de
determinada variável indicativa de qualidade ao longo do tempo (SILVEIRA
et al., 2003). A partir destes dados e com outras informações sobre a bacia,
pode-se ter ideia de como a qualidade da água responde a diferentes vazões
e, assim, planejar ações de controle de carga poluente em função do risco
de atendimento aos padrões de qualidade compatíveis com os usos da água
(FORMIGONI et al., 2011).
Trata-se de uma distribuição de frequência acumulada para determina-
dos parâmetros, onde é possível a avaliação da permanência das variáveis de
qualidade da água em diferentes concentrações. Essa técnica permite, ain-
da, que a partir do tempo de permanência dos parâmetros, se identifique o
grau de atendimento do enquadramento estabelecido para um curso hídrico
(CRUZ; TUCCI, 2008; BURIN, 2011).

5. Estudos relacionados à qualidade da água em nascentes

Sobre a qualidade da água em nascentes, alguns estudos têm indicado


que a qualidade está relacionada com diferentes usos do solo. Pinto et al.
(2012) analisaram os impactos de diferentes usos e ocupações do solo na
qualidade da água de cinco nascentes do município de Inconfidentes, MG,
bacia hidrográfica do rio Mogi Guaçu. Observaram que, ao longo do perí-
odo de amostragem, a nascente com presença de vegetação ciliar auxiliou
na proteção quali-quantitativa de seus recursos hídricos, em comparação às
demais nascentes, sendo as características cor, turbidez, coliformes totais e
termotolerantes, DBO5,20, fosfato total, nitrato e oxigênio dissolvido as que
mais evidenciaram essas diferenças.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 275

Donadio et al. (2005) avaliaram a qualidade da água de quatro nascen-


tes em áreas de agricultura e de vegetação natural, durante período seco e
chuvoso, na bacia hidrográfica do Córrego Rico, região Nordeste do Estado
de São Paulo. De modo geral, as médias dos parâmetros obtidas para o pe-
ríodo seco foram inferiores às obtidas para o chuvoso, fato revelado pelas
variáveis cor, fósforo, nitrogênio e DBO. A presença de remanescentes de
vegetação ciliar auxiliou na proteção das nascentes, onde a qualidade da
água mostrou-se melhor que nas nascentes com uso agrícola, sendo as va-
riáveis cor, turbidez, alcalinidade e nitrogênio total as que mais explicaram
essas diferenças.
O estudo de Jardim (2010) avaliou a qualidade da água em dez nascen-
tes, distribuídas em cinco microbacias, com diferentes usos e cobertura do
solo, em período chuvoso e seco, localizadas no município de Ouro Branco,
MG. Foi observado que, de forma geral, as nascentes com maior gradiente
de mata nativa apresentaram melhores resultados de qualidade da água para
os parâmetros pH, turbidez, sólidos totais e oxigênio dissolvido. Além dos
melhores resultados referentes aos parâmetros qualitativos, o fato da exis-
tência de floresta ou mata nativa, influenciou na disponibilidade hídrica nas
nascentes no período seco, isso em decorrência do abastecimento do lençol
freático na época das chuvas. Nas adjacências das nascentes em que há a
presença de erosão, bem como solo solto, notou-se aumento nos valores das
variáveis turbidez e sólidos totais. Nesse contexto, o autor sugere um manejo
adequado nessas áreas, voltado para a sustentabilidade e conservação dos
recursos naturais.
Agrizzi (2012) analisou a qualidade da água em oito nascentes com
variadas coberturas e ocupações do solo, na área da sub-bacia do córrego
Paraíso, interior do município de Alegre, ES. Na área de estudo ocorre a pre-
sença de gado, devido à pecuária leiteira ser a principal atividade econômica
na região. Nesse contexto, foi desenvolvida a recuperação dessas nascentes
a partir de APP’s, com diferentes tratamentos. Entre os resultados qualitati-
vos, seis nascentes que possuíam cercamento evitando o acesso de animais,
apresentaram melhores resultados. Já as nascentes que apresentavam livre
acesso do gado obtiveram os piores resultados na maioria dos parâmetros
analisados, em consequência da carga orgânica expelida por esses animais.
Porém, de modo geral, após desinfecção prévia, todas as nascentes foram
consideradas aptas para o consumo humano.
Marmontel e Rodrigues (2015) avaliaram e comparam a qualidade da
água de quatro nascentes pertencentes ao Córrego Pimenta, afluente do Rio
Paraíso, município de São Manuel, SP. As nascentes analisadas encontram-se
sobre diferentes coberturas do solo (vegetação nativa, pastagem, bambuzal e
276

povoamento de Eucalyptus sp) e conservação da vegetação ciliar (preserva-


da, perturbada ou degradada). Segundo os autores, a cobertura do solo com
mata ciliar nos estados preservada e perturbada contribuiu para a melhor
qualidade da água nos parâmetros de temperatura, turbidez, cor, pH, nitrato,
nitrito e ferro, demonstrando que a mata ciliar auxilia na proteção qualitativa
da água.
Em se tratando das modificações no uso e cobertura do solo, essas, po-
dem contribuir significativamente para as alterações dos processos biológi-
cos, físicos e químicos dos sistemas naturais, especialmente em função da
perda da cobertura florestal, resultando em prejuízos aos recursos hídricos e
à biodiversidade (FERNANDES et al., 2012). Segundo Santos et al. (2011),
áreas de mata nativa contribuem na manutenção das baixas vazões de uma
bacia hidrográfica, aumentando a infiltração de água no solo, e, consequen-
temente, reduzindo o escoamento superficial e os processos erosivos. Nesse
sentido, as Áreas de Preservação Permanente (APP’s), exercem papel funda-
mental dentro de uma bacia hidrográfica, sendo responsáveis pela manuten-
ção, preservação e conservação dos ecossistemas ali existentes.

6. Projeto Saúde da Água – Um Estudo de Caso

O projeto Saúde da Água, o qual foi executado pela Fundação MO’Ã,


com patrocínio da PETROBRÁS, teve como objetivo desenvolver estudos,
pesquisas e práticas conservacionistas dos recursos hídricos em Itaara, RS,
por meio da recuperação de matas ciliares em áreas de nascentes, análises
ambientais quali-quantitativas dos recursos hídricos, ações de prevenção da
poluição e da educação ambiental.
A partir dessas práticas, espera-se uma melhoria na qualidade e quanti-
dade da água disponível para o abastecimento e demais usos do município.
O conhecimento sobre a qualidade das águas nas nascentes e o conhecimen-
to dos fatores que interferem nessa qualidade deve promover aumento de
conscientização e sensibilização da população em geral e em especial às co-
munidades da região, quanto à importância e as consequências de forma de
uso da água e do solo na qualidade e dessa forma, induzir a uma mudança de
atitudes. Indiretamente, um dos impactos positivos acreditados é o aumento
da área florestada refletindo no uso racional dos recursos hídricos e da pre-
servação ambiental. Vale ressaltar que a região em que o município de Itaara
está inserido é relativamente rica em número de nascentes, o que justifica
e evidencia a importância de estudos piloto para entender as nascentes nos
aspectos de quantidade e qualidade da água e a partir desse conhecimento
propor ações para sua recuperação, conservação e/ou preservação.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 277

6.1 As nascentes de Itaara: estudo piloto

O estudo piloto foi realizado em seis nascentes contribuintes de uma


sub-bacia de aproximadamente 7,82 km², localizada na porção superior
da microbacia do Arroio Manoel Alves, bem como no seu exutório (Calha
Champagnat) correspondente (Figura 2). A microbacia hidrográfica do
Arroio Manoel Alves situa-se no município de Itaara, e é parte integrante
da bacia hidrográfica do Rio Vacacaí-Mirim. Abrange áreas de mata nativa,
representadas pelo bioma Mata Atlântica, onde há evidências da existência
de um grande número de nascentes, as quais compõem os principais manan-
ciais da região, além de contribuir significativamente para a formação do Rio
Vacacaí-Mirim.
Em relação às atividades econômicas, o município baseia-se na utili-
zação de seus recursos naturais para o desenvolvimento da agricultura e da
pecuária, relacionados com o tamanho da propriedade (DISCONZI, 2014).
Ela também observa que sobre às questões sanitárias, especialmente à co-
leta e o tratamento de esgoto, o município apresenta relativa precariedade,
uma vez que grande parcela das residências faz o uso de tanques sépticos, o
qual consiste em um sistema insuficiente para o tratamento de efluentes, não
removendo toda a carga orgânica e microbiológica produzida, podendo ser
fontes de contaminação dos lençóis freáticos.
Especificamente, as nascentes investigadas apresentam, no seu entor-
no, diferentes estágios de perturbação, conservação e usos do solo, confor-
me apresentado na Figura 2 onde foram identificadas as seguintes classes
temáticas: Área Agrícola, Edificações, Eucalipto, Gramínea, Mata Nativa,
Recurso Hídrico e Vias de Acesso, além das áreas de captação de cada nas-
cente estudada.

Figura 2 – Localização das nascentes e da área de estudo (A) e Mapa


temático de uso e cobertura do solo da microbacia de estudo (B)

A B
278

Visando quantificar os diferentes usos e ocupação do solo na bacia


envolvida no projeto foram determinados os valores das classes temáticas
identificadas em cada área investigada, em função das respectivas áreas, em
hectares, assim como a denominação abreviada de cada uma das nascentes e
seu exutório (Tabela 4). Já na Tabela 5, apresenta-se a descrição das áreas de
estudo em função das características de uso e cobertura do solo.

Tabela 4 – Distribuição das classes temáticas de uso e cobertura do solo


identificadas nas áreas de captação investigadas e as respectivas áreas (ha)

Classe Temática – Áreas (ha) N1 N2 N3 N4 N5 N6 CC

Área Agrícola - - 2,38 - - 0,81 185,98

Edificações - - - - - 0,04 7,48

Eucalipto 1,12 1,87 0,43 3,54 12,21 1,26 222,08

Gramínea 0,17 - 0,37 0,00 0,22 0,25 98,65

Mata Nativa 0,72 0,02 3,21 0,54 0,80 1,03 236,45

Recurso Hídrico - - 0,27 - - - 14,28

Vias de Acesso 0,14 0,06 0,08 - 0,30 0,13 16,86

Área Total 2,15 1,95 6,75 4,08 13,52 3,53 781,42

Tabela 5 – Caracterização dos usos e coberturas do solo das áreas investigadas

Nascente Caracterização
Nascente cercada, em meio à mata nativa. Ocorre a presença de gramíneas, uma pequena estrada de
N1
chão e floresta de eucalipto à montante.
N2 Nascente cercada, em meio à mata nativa e floresta de eucalipto.
Nascente considerada degradada devido à perda da sua cobertura florestal original. Situada em meio
N3 à floresta de eucalipto, tendo livre acesso de animais, especialmente o gado. Possui mata nativa, área
agrícola, gramíneas, estrada de chão, além de um pequeno reservatório à montante.
Nascente com cercamento, situada em meio à mata nativa, com grande concentração de araucárias. À
N4
montante, ocorre a presença de floresta de eucalipto e fragmentos de mata nativa.
Nascente preservada, ou seja, aquela que possui suas características nativas conservadas. Estabe-
lecida em meio à floresta de eucalipto e mata nativa, tendo livre acesso de animais, principalmente o
N5 gado. À montante, estão dispostas áreas de cultivo de eucalipto, além de perfazer pequenas estradas
de chão e áreas de gramíneas. Ponto de coleta localizado 100 m à jusante da origem da nascente, em
razão da topografia.
Nascente cercada, em meio à vegetação densa em estágio sucessional avançado. Presença de resi-
N6 dências, gramíneas, área agrícola, estrada de chão, cultivo de eucalipto e fragmentos de mata nativa
à montante.
Exutório da microbacia em estudo. Recebe contribuição das nascentes, bem como dos demais cursos
CC
hídricos. À montante estão distribuídas todas as classes de solo identificadas.

Nota: Cercamento constitui no isolamento das nascentes, com a finalidade de evitar o acesso de animais.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 279

6.2 Instrumentalização das áreas


Em termos de metodologia adotada, resumidamente esta pode ser visu-
alizada na Figura 3, onde é apresentado de forma esquematizada as etapas
desenvolvidas em relação ao monitoramento quali-quantitativo.
Figura 3 – Fluxograma representativo das atividades
desenvolvidas no projeto Saúde da Água e desta pesquisa
Projeto Saúde
da Água

Arroio Manoel
Alves

Projeto Projeto de Projeto


Restauração
Resíduos Educação Faunístico
Florestal
Sólidos Ambiental

Monitoramento
Quali-quantitativo

Seleção das áreas de


nascentes

Pluviometria Fluviometria Monitoramento Uso e Cobertura do


Qualidade da Água Solo

Análise dos parâmetros Avaliação da


de qualidade da água com influência do uso e
os valores da Resolução cobertura do solo na
CONAMA 357/2005 qualidade das águas

Análise da
qualidade da água
ao longo do tempo

Para a obtenção dos dados de vazão, foram instaladas em cada nascente,


Calhas Parshall de 1” (N1, N2, N3, N4 e N6) e 2” (N5) com sensores automáti-
cos de medição de nível d’água programados em frequência de medição horária
(Levelogger e Barologger). O exutório (CC) também recebeu a medição por
meio do sensor de nível, entretanto, tal curso hídrico já apresentava uma estrutu-
ra para medição de vazão (Calha Parshall). Adjacentes às nascentes e às calhas
medidoras de vazão foram dispostos dois pluviômetros para a quantificação da
entrada de água por precipitação pluviométrica na microbacia em estudo. Na
Figura 4 estão apresentadas imagens referentes aos equipamentos usados para o
monitoramento das vazões e precipitações mencionados anteriormente.
280

Figura 4 – Equipamentos utilizados para monitorar as precipitações e as vazões

Fluxo
d’água

Conexão para sensor

6.3 Procedimento amostral

As campanhas de coleta de água das áreas monitoradas e as análises


laboratoriais desenvolveram-se em intervalo de tempo quinzenal, entre os
meses de janeiro de 2015 a janeiro de 2016 com um total vinte coletas das
amostras de água. Utilizaram-se recipientes âmbares de 1,0 L para arma-
zenamento das amostras, sendo coletadas uma amostra para cada uma das
seis nascentes junto às respectivas calhas Parshall, bem como do exutório
(Quadro 2). As coletas das amostras foram realizadas durante o turno da ma-
nhã e após, encaminhadas ao Laboratório de Engenharia do Meio Ambiente
(LEMA) do Centro de Tecnologia da UFSM para a análise dos parâmetros:
Temperatura, Turbidez (Turb.), pH, Condutividade Elétrica, Sólidos Totais,
Sólidos em Suspensão, Sólidos Dissolvidos, Demanda Bioquímica de
Oxigênio (DBO5,20), Coliformes Totais, Escherichia coli e Nutrientes.

6.4 Resultados obtidos no estudo de caso

Dentre os vários parâmetros analisados, aqueles considerados relati-


vamente os mais representativos e além disso utilizados como balizadores
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 281

para indicar a qualidade das águas, são apresentados, sendo eles: a Turbidez
(Turb.), Sólidos Dissolvidos Totais, Demanda Bioquímica de Oxigênio
(DBO5,20) e Escherichia coli (Figura 5). Nesta, apresenta-se a diluição das
cargas médias dos parâmetros apresentados nas curvas de permanência para
as áreas de estudo, assim como os limites das classes de enquadramento pro-
postos pela Resolução 357/2005 do CONAMA. Uma síntese desses resulta-
dos pode ser observada na Tabela 6. Verifica-se que, segundo as classes da
Resolução 357/2005 do CONAMA, que em aproximadamente 3% do tempo
de permanência, a N6 esteve dentro dos limites para classe 1, 4% para classe
2, cerca de 7% para classe 3 e 86% do tempo na classe 4. A N5 demonstrou-
-se compatível com os limites de qualidade da classe 1 em 19% do tempo,
classe 2 em 23% do tempo, 26% na classe 3 e 32% na classe 4. As nascentes
N1, N2, N3 e N4 estiveram em consonância com a classe 1 em 71%, 80%,
62% e 40% do tempo de permanência, respectivamente. Percebe-se, ainda,
que essas, permaneceram dentro dos limites para classe 2 em 14%, 9%, 17%
e 22% do tempo monitorado, além dos 11%, 6%, 13% e 21% para classe 3.
Na classe 4, essas nascentes se mantiveram em 4%, 5%, 8% e 17% do tempo
de permanência.
O manancial localizado na Calha Champagnat permaneceu em acordo
com os limites da classe 1 em 6% do tempo monitorado, 23% do tempo em
classe 2, 30% em classe 3 e 41% em classe 4.

Figura 5 – Curva de permanência das concentrações de turbidez (UNT),


(DBO5,20), Sólidos Dissolvidos Totais e Escherichia coli.para as áreas de
estudo e limites de concentração conforme as classes de enquadramento
dos corpos hídricos, segundo Resolução 357/2005 do CONAMA
282

Tabela 6 – Síntese das cargas médias dos parâmetros apresentados nas


curvas de permanência para as áreas de estudo, assim como os limites das
classes de enquadramento, segundo a Resolução 357/2005 do CONAMA

Turb (NTU) DBO5,20 (mg.L-1) E. coli (NMP.100mL-1) SDT (mg.L-1)

C1, C2
Áreas C1 C2 e C3 C4 C1 C2 C3 C4 C1 C2 C3 C4 C4
e C3
N1 99% 1% - 71% 14% 11% 4% 98% 2% - - 100% -
N2 100% - - 80% 9% 6% 5% 100% - - - 100% -
N3 98% 2% - 62% 17% 13% 8% 100% - - - 100% -
N4 100% - - 40% 22% 21% 17% 100% - - - 100% -
N5 89% 10% 1% 19% 23% 26% 32% 80% 20% - - 99% 1%
N6 100% - - 3% 4% 7% 86% - 7% 44% 49% 100% -
CC 72% 24% 6% 6% 23% 30% 41% 13% 67% 18% 2% 95% 5%

Em relação ao IQA, nota-se na Tabela 7 que os resultados médios obti-


dos para o IQA variaram entre as classificações consideradas médias e boas.
Possivelmente essa situação está associada à sensibilidade das respectivas
áreas, em relação à variação das concentrações dos parâmetros utilizados
no monitoramento.
Tabela 7 – Índices da Qualidade das Águas médio e as
respectivas classificações das áreas monitoradas

Áreas IQA Médio Classificação IQA


N1 74,35 Bom
N2 73,53 Bom
N3 68,25 Médio
N4 59,07 Médio
N5 74,41 Bom
N6 69,13 Médio
CC 75,26 Bom

Uns dos parâmetros que apresentam maiores pesos e consequentemente


a maior variação destes acarreta maiores reflexos nos valores do IQA é o do
OD e o pH. Nas nascentes onde os valores numéricos foram os menores esse
fato é provavelmente a consequência das menores concentrações de OD e
pH. Esse fato está em consonância com os resultados apresentados no traba-
lho realizado por Agrizzi (2012). Já nas nascentes que apresentaram o IQA
variando entre os índices médio, ruim e bom, pode ter relação com a matéria
orgânica presente no curso d’água, uma vez que os animais, especialmen-
te o gado, tem livre acesso à área e, possivelmente, os dejetos produzidos
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 283

contaminam a nascente fazendo com que as concentrações de OD diminu-


am, além de aumentar as cargas de E. coli. A Turbidez demonstrou-se ele-
vada em algumas áreas, possivelmente em função dos processos erosivos
e do pisoteio do gado no curso d’água, influenciando no cálculo do IQA.
Percebe-se, também, os menores índices de qualidade de água nos meses de
fevereiro e março de 2015, especialmente na nascente N3. Possivelmente
essa condição está associada às baixas precipitações e, consequente vazões,
registradas nesse período, o que pode ter ocasionado menores concentrações
de OD devido a menor aeração dos cursos d’água monitorados (CETESB,
2009). Outro fator pode estar nas concentrações mais elevadas de E. coli, as
quais influenciam fortemente no cálculo do IQA. Nota-se, ainda, que após
esse período o índice demonstrou certa regularidade em todas as áreas, vol-
tando a decair em janeiro de 2016. Essa situação pode ter relação com a
diluição dos parâmetros qualitativos, como referido por Cruz (2001).
Os índices médios, de modo geral, foram superiores aos observados na
pesquisa de Pontes et al. (2012) em nove pontos distribuídos ao longo do
córrego Banguelo, sub-bacia do Ribeirão do Onça, MG, sob diferentes usos
e ocupações dos solos. Os autores obtiveram IQA’s médios variando entre as
classificações ruins e médio, com valores entre 28,4 e 63,7. Possível conse-
quência do lançamento de efluentes aos cursos hídricos devido à expansão
urbana sem planejamento, das atividades agrícolas e pecuárias, processos
erosivos e do desmatamento.
Pinto et al. (2012) avaliaram o IQA em cinco nascentes sob diferentes
usos e ocupações do solo e verificaram que a nascente considerada perturba-
da foi a que apresentou melhor índice médio de qualidade da água (90,64),
correspondendo a uma qualidade ótima, diferentemente dos resultados al-
cançados nesta pesquisa, especialmente em algumas das nascentes.
Quanto à nascente N4, a qual está estabelecida em meio à mata nativa
e possui cercamento, caracterizou-se pelas baixas concentrações dos parâ-
metros pH e oxigênio dissolvido, porém apresentou resultados positivos nas
variáveis turbidez, condutividade elétrica, DBO5,20, coliformes totais, E. coli
e a série de sólidos quando comparadas às demais áreas.
De modo geral, as nascentes N1 e N2 foram as que melhor se desta-
caram em termos de qualidade da água, demonstrando concentrações sa-
tisfatórias na maioria dos parâmetros analisados em relação às outras áreas
monitoradas. Tais nascentes encontram-se em proximidade uma da outra,
são cercadas e localizadas em meio à mata nativa e floresta de eucalipto,
podendo ser um indicativo da proteção florestal na qualidade das águas.
A N5 caracterizou-se por apresentar as maiores cargas específicas médias
na maior parte dos parâmetros analisados. Possivelmente essa circunstância
284

tem relação com as maiores vazões registradas nesse ponto, o que pode indi-
car a influência do arreste do material superficial ao curso d’água.
O exutório (Calha Champagnat), área que recebe contribuição de to-
dos os afluentes da microbacia, caracterizou-se pelas maiores concentrações
médias de DBO5,20, entretanto, apresentou melhora em boa parte dos demais
parâmetros de qualidade da água.
No intento de relacionar a qualidade da água das nascentes investiga-
das, bem como do exutório, com as causas possíveis relacionadas à quali-
dade apresenta-se, na Tabela 8, uma síntese dos fatores que classificaram os
principais componentes por meio de testes estatísticos.
Tabela 8 – Síntese da caracterização da qualidade da água para
as áreas monitoradas em função da análise fatorial

Nascentes Componente 1 Componente 2 Componente 3


N1 Fator clima Fator intemperismo Fator poluição difusa
N2 Fator intemperismo Fator clima Fator poluição difusa
N3 Fator superficial Fator ambiente Fator microbiológico
N4 Fator lixiviação Fator poluição difusa Fator decomposição
N5 Fator decomposição Fator intemperismo Fator microbiológico
N6 Fator superficial Fator ambiente Fator microbiológico
CC Fator poluição difusa Fator intemperismo Fator clima

Nota-se que os componentes formados para as nascentes N1 e N2 obti-


veram as mesmas influências na caracterização da qualidade das águas, porém
apresentaram ordem inversa dos fatores. Possivelmente em razão da proximida-
de entre as duas áreas de drenagem, as quais podem apresentar geomorfologia
similar, bem como pela mesma cobertura florestal, entre elas a mata nativa e o
eucalipto. As nascentes N3 e N6 apresentaram as mesmas caracterizações para
os componentes, porém as justificativas para esses são diferentes. Tratam-se de
áreas distintas, onde a N3 recebe livre acesso do gado e processos erosivos e a
N6 ocorre o acúmulo de vegetação e recebe efluentes das residências localiza-
das à montante da nascente. As demais áreas demonstram características pró-
prias para cada componente, provavelmente em consequência das propriedades
e particularidades de cada área de drenagem.
Pode se observar que em algumas das nascentes a interferência da ativi-
dade pecuária, demonstrou-se sensível em se tratando das baixas concentra-
ções de OD e de uma possível contaminação orgânica originada do arraste de
material superficial ao curso d’água. Tal relação foi verificada pela classifica-
ção média no IQA, bem como pelas curvas de permanência e das classes de
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 285

enquadramento para a variável DBO5,20. Já em pelo menos uma delas, pode-


-se concluir que a qualidade insatisfatória da água esteve relacionada com a
ausência de tratamento adequado dos efluentes produzidos pelas residências
rurais, representadas, especialmente, pelas variáveis coliformes totais e a E.
coli. As curvas de permanência de qualidade das águas para tal área, revelaram
a contaminação microbiológica e orgânica, reforçando a ideia da contaminação
por consequência dos efluentes. Além disso, o IQA classificou as águas com
qualidade média.
Ainda, verificou-se pela relação dos fatores que em uma das nascentes
estudadas, a N4, apesar desta estar situada em meio à mata nativa, caracterizou-
-se pelas baixas concentrações dos parâmetros pH e OD, fato esse comprovado
pelo IQA, classificado com qualidade média. A principal hipótese neste caso
e apontado estatisticamente foi o destaque para uma possível influência dos
fatores lixiviação, poluição difusa e decomposição na qualidade dessas águas,
fazendo-se necessária uma investigação mais aprofundada para verificar as cau-
sas das baixas concentrações das variáveis mencionadas.
O ponto positivo fica em relação a duas das seis nascentes que foram mo-
nitoradas no período de vigência do projeto, ou seja, as nascentes N1 e N2 des-
tacaram-se em termos de qualidade da água, comprovadas pelos IQA’s, classi-
ficando-se com qualidade boa. Um contraponto, se comparado com o exutório,
cuja qualidade da água culminou no se enquadramento como sendo da classe 4
nas curvas de permanência para as variáveis turbidez, DBO5,20, E. coli, sólidos
dissolvidos e nitrato, indicando influência das maiores vazões, bem como da
contribuição dos afluentes e dos usos e coberturas do solo da microbacia.

Considerações finais

Os melhores índices de qualidade da água obtidos para as nascentes es-


tão relacionados àquelas que estão cercadas e localizadas em meio à APP’s.
Ou seja, para aquelas em que não há a interferências antrópicas e/ ou dos
animais, sobretudo, a do gado bovino. Além disso, as nascentes com áreas
próximas protegidas pela vegetação mostraram maior relação com à manu-
tenção e à conservação da água tanto da quantidade, quanto da sua qualida-
de. Esses resultados são coerentes com os obtidos por Zanini et al. (2010)
ao analisar a qualidade da água de nascente situada no município de Monte
Alto, SP, pertencente do Córrego Rico, os quais observaram qualidade clas-
sificada como boa, segundo o IQA, associadas a nascentes cujo local tem a
situação do entorno preservada. Esses fatos evidenciam a importância dos
dispositivos previstos na Lei 12.651/2012, Código Florestal Brasileiro.
286

Os resultados obtidos nos trabalhos referentes à qualidade da água nas


nascentes, no âmbito do Projeto Saúde da Água, apontaram para uma menor
qualidade da água em locais desprotegidos, ou seja, com maior grau de de-
gradação do entorno e onde não foram aplicados tratamentos de restauração
florestal e os animais tem livre acesso às águas, principalmente o gado, refle-
tindo em parâmetros de qualidade com elevadas concentrações das variáveis
turbidez, condutividade elétrica, coliformes totais, E. coli, sólidos totais, só-
lidos em suspensão e sólidos dissolvidos, além de baixas concentrações para
o oxigênio dissolvido. Observou-se ainda, que mesmo em áreas onde o en-
torno é relativamente protegido com densa vegetação nativa, porém, ocorre
presença de residências, área agrícolas próximas, evidenciou concentrações
mais elevadas especialmente nas variáveis E. coli e Coliformes Totais, des-
tacando-se, também, os parâmetros condutividade elétrica, DBO5,20, sólidos
totais, sólidos em suspensão. Esse fato é um indício de que a infiltração da
água contendo possíveis maiores níveis de contaminantes pode implicar e
qualidade da água diminuta já nas próprias nascentes.
Diante disso, pode-se inferir que, como constatado por Gardiman Junior
(2012) e Valente (2013), as características físicas, químicas e biológicas das
águas são consequência das peculiaridades do meio físico de cada área de
drenagem, assim como das variações das vazões, uma vez que essa situação
altera o poder de diluição das concentrações dos parâmetros qualitativos da
água (CRUZ, 2001). Além da redução da diluição, a variação das vazões,
pode contribuir para aporte do material orgânico proveniente da vegetação
ciliar, bem como para aumento dos sedimentos oriundos do solo.
De maneira geral, é imprescindível realizar o monitoramento quali-
-quantitativo em bacias hidrográficas, sobretudo, em bacias de menores es-
calas de áreas, como as microbacias hidrográfica estudadas no Projeto Saúde
da Água, pois somente dessa forma poderão ser observadas em maior espa-
ço temporal, as influências das alterações do uso e cobertura do solo, bem
como do desenvolvimento dos tratamentos de restauração florestal aplicados
a partir das APP’s e seus impactos nas características quali-quantitativas dos
recursos hídricos correspondentes.
Aplicar a metodologia de restauração florestal de nascentes, assim
como do monitoramento quali-quantitativo, porém com áreas de nascentes
em estado de maior perturbação do uso do solo e, consequente menor con-
servação e cobertura florestal das mesmas é de suma importância para buscar
as soluções mais adequadas para cada situação.
Finalizando, a metodologia utilizada no estudo das nascentes de Itaara,
no âmbito do Projeto Saúde da Água, pode ser facilmente replicada em ou-
tras regiões de nascentes, visando a conhecer as principais causas da degra-
dação das mesmas e auxiliar nos processos de tomada de decisão e adoção de
critérios a serem adotados no planejamento de recuperação e gerenciamento
de áreas de nascentes.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 287

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CAPÍTULO 13
COMUNICAÇÃO NA
EDUCAÇÃO AMBIENTAL:
publicização do projeto saúde da água
Mara Matiuzzi Kunzler
Imaruí Mallmann de Oliveira de Lima
Giuliana Seerig

Seja no aspecto global ou local, é sabido que a espécie humana preci-


sa mudar sua relação com a natureza. Temos hoje conhecimento o bastante
para compreender o quanto nossas ações podem modificar o meio ambiente
e contribuir para a sobrevivência de diversas espécies, inclusive a nossa.
Estudiosos de diversas áreas alertam, há décadas, acerca dos perigos da ne-
gligência com os cuidados com o ambiente natural e suas consequências
para o futuro. No entanto, é notório que, apesar desse conhecimento existir,
não se traduz em práticas e políticas de forma ampla no nosso cotidiano –
não seria preciso caminhar muito longe, na nossa cidade ou nosso bairro,
para chegar a essa constatação. Como fazer, então, para que o conhecimento,
advindo de diversos campos da ciência, seja conhecido e incorporado pe-
las pessoas? Como obter a circulação desses valores na nossa sociedade, na
nossa região? Como podemos aproximar a população daquilo que pode ser
benéfico para a natureza e gerar mobilização em prol desses valores?
Uma parte da resposta para essas perguntas tão amplas passa, inevitavel-
mente, pela Educação Ambiental, processo educativo que busca formar cida-
dãos munidos de saberes e práticas que contribuem para disseminar “valores
sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a
conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sa-
dia qualidade de vida e sua sustentabilidade”1. A Comunicação Social, como
o estudo da circulação de informações entre fontes e seus públicos, traz em
si também a missão de propagar valores e gerar novas atitudes nas pessoas.
Comunicar significa ir ao encontro do outro, buscar a interface, atuar na zona
de interação2, colocar em sintonia diferentes campos da sociedade e obter, as-
sim, novas relações e cenários. Comunicar é também, em certo sentido, educar.
1 Política Nacional de Educação Ambiental – Lei nº 9795/1999, Art 1º.
2 DA SILVA, Juremir Machado. Interfaces: Michel Maffesoli, teórico da comunicação. Revista Famecos, v. 11, n. 25,
p. 43-48, 2004.
290

Ainda que em contextos diferentes, a comunicação pode ser uma aliada signi-
ficativa para que se atinja a visibilidade esperada das práticas de preservação.
Uma agência de publicidade, mais especificamente, tem como função
mediar a relação entre aquele que oferece algo e seus públicos, buscando
realizá-lo de forma eficaz e criativa, com ética e competência.
A Art/Meio Propaganda atua há 37 anos no mercado local e regional,
trabalhando múltiplas ferramentas: propaganda, design, promoção, eventos,
trade, PDV (ponto de venda) e marketing digital. Para proporcionar a seus
clientes orientação para o planejamento e gerenciamento das marcas, con-
ta com uma equipe qualificada que mescla profissionais experientes e jo-
vens distribuída, nas áreas de direção de arte, redação, atendimento, mídias
digitais, planejamento e mídia. Com isso, a empresa busca compreender o
universo do cliente, do mercado, das tendências, dos concorrentes e dos con-
sumidores, criando processos para consolidar ações e apontar soluções em
comunicação, demonstrando a agilidade necessária ao dia a dia, tanto nas
suas ações institucionais quanto de varejo.
Além disso, desde sua fundação a Art/Meio busca marcar sua presença
também com uma forte atuação em campanhas de cunho social e cultural.
Cumprindo seu papel na sociedade, a agência entende que deve contribuir de
forma voluntária para a promoção e divulgação de ideias que possam trazer
benefícios às pessoas, promovendo o bem-estar de todos.
Assim, em meados de 2013, a Art/Meio recebeu a visita da Engenheira
Florestal Michele Benetti Leite, que estava a cargo da organização do Projeto
Saúde da Água para a Fundação MOÃ e buscava parcerias para o planejamento,
visando cumprir exigências do edital do “Programa Petrobras Socioambiental”.
embora o Projeto Saúde da Água já existisse desde 2012 com ações desenvol-
vidas em Itaara e região, a decisão de inscrevê-lo neste programa específico
e submetê-lo à aprovação exigia o trabalho de vários profissionais, entre eles
uma empresa que Pudesse atender às demandas relacionadas à comunicação do
Projeto Saúde da Água, um trabalho de grande importância para que os objetivos
do projeto pudessem ser alcançados. O edital previa também o cumprimento de
todas as contrapartidas do patrocinador, no caso, a Petrobras.
Ainda que a Art/Meio já tivesse trabalhado com temas sociais e cul-
turais, o envolvimento direto com questões relacionadas ao meio ambien-
te ainda era algo inédito para a agência, por isso essa parceria se mostrou
uma oportunidade única. Nela, a missão não era propriamente publicizar
um serviço, um produto ou um evento, mas buscar sensibilizar as pessoas
para as questões essenciais sobre o meio ambiente e tentar obter a sintonia
comunicativa para que o projeto Saúde da Água alcançasse o público mais
amplo possível.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 291

Tratava-se, em outras palavras, de buscar os conceitos científicos e


traduzi-los para as práticas e possibilidades da Comunicação Social, mais
especificamente da Publicidade e Propaganda. Criar, portanto, o ponto de
contato possível, uma sintonia que fosse fértil e produtiva, lançando mão
de ferramentas simples e que tivessem relação com o público da região de
Santa Maria/Itaara. Isso significava tentar “vender” – em seu sentido menos
comercial e mais comunicativo – a preservação, a importância de deter a
degradação e a atenção às questões locais sobre a saúde de rios e mananciais.
Para isso, o trabalho iniciou pelo planejamento de comunicação, que
procurou atender às demandas dos cinco subprojetos: Educação Ambiental,
Política de Resíduos, Restauração Florestal em Propriedades Rurais,
Monitoramento dos Recurros Hídricos e Levantamento da Fauna Silvestre.
Para cada projeto o planejamento de comunicação atendeu às premissas:
objetivos, público, estratégia, peças, criação e previsão orçamentária.
No mesmo ano, a Petrobras, por reconhecer o mérito do Projeto Saúde
da Água, enquadrou-o na categoria Patrocínio Convidado no Programa
Petrobras Socioambiental. Assim, após algumas adequações, o projeto re-
cebeu aprovação final em dezembro de 2013. Destaque para o trabalho do
publicitário Rodrigo Fontana, que foi responsável pela elaboração do plane-
jamento. Sobre o trabalho, ele diz: “‘Meu Senhor, e agora?!’ Foi o meu pen-
samento quando me deparei com um projeto dessa magnitude, que nos faz
pensar sobre um assunto tão importante e valioso em nossas vidas. Recém-
saído da academia, sem saber muito bem como era o mercado profissional,
recebi o desafio de fazer um planejamento de comunicação para um cliente
real, com verbas reais e objetivos bem definidos, um exercício que a acade-
mia não te proporciona. Participar da etapa de planejamento desse projeto da
Fundação MO’Ã me permitiu, recém-formado, perceber que o meu trabalho
poderia sim impactar no futuro do planeta através de estratégias que divul-
gassem a causa para aqueles que poderiam contribuir para um mundo me-
lhor. Certamente o Projeto Saúde da Água foi uma excelente oportunidade
para tornar o meu trabalho muito mais humano e recompensador”.
Para uma agência de propaganda, acostumada ao dia a dia do varejo,
que exige rapidez na solução sem perder a criatividade e o foco, o Projeto
Saúde da Água foi um grande desafio. Como dito anteriormente, o objetivo
não era vender um produto ou serviço, mas sim sensibilizar pessoas, mobi-
lizar instituições e promover um novo olhar sobre aspectos importantes da
preservação do meio ambiente. Cabe aqui destacar um importante aspecto
que, segundo nos orienta Pedro Jacobi3, é determinante para o sucesso: “um
3 JACOBI, Pedro et al. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de pesquisa, v. 118, n. 3,
p. 189-205, 2003.
292

novo despertar da consciência ambiental será feito através de um pensamen-


to complexo e, sobretudo, de forma interdisciplinar”. Em outras palavras,
uma perspectiva de fato ecológica. A fertilização de novas iniciativas e cam-
panhas será feita pela associação de saberes e competências, em um espaço
em que natureza, técnica e cultura estejam articuladas e em harmonia.
Em vista disso, foi esse o pensamento que norteou todo o trabalho da
agência durante dois anos, de 2014 a 2016, em que toda a equipe foi desafia-
da a criar e produzir peças voltadas ao tema ambiental, reforçando a imagem
da Fundação MO’Ã através dos seus conceitos de preservação, ética e res-
peito ao meio ambiente.

1. Divulgação do Projeto Saúde da Água

O Projeto Saúde da Água busca promover pesquisas e práticas con-


servacionistas dos recursos hídricos na sub-bacia do rio Vacacaí-Mirim,
no município de Itaara (RS). Sua atuação se centra em diversos objetivos,
como despertar a sensibilização ambiental na defesa do equilíbrio do meio
ambiente, congregar pessoas físicas e jurídicas para a preservação do meio
ambiente e para combater a degradação ambiental, além de estimular a inte-
gração entre saúde e meio ambiente.
A divulgação e promoção desses valores se deram através da aplicação
da Identidade Visual do Projeto que consiste no “conjunto de elementos grá-
ficos que irão formalizar a personalidade visual de um nome, ideia, produto
ou serviço”. Esses elementos contribuem no processo de percepção e fixação
da mente de seus consumidores e são a primeira impressão frente ao seu
público, podendo influenciar diretamente no conceito que este público irá
formular a respeito da organização.
“As identidades visuais são um instrumento fundamental nas políticas
de marketing das empresas. São a expressão de sua individualidade e a
garantia de responsabilidade perante a sociedade. Cuidadosamente cria-
das e implantadas, traduzem exatamente a forma pela qual as empresas
gostariam de ser vistas por seus públicos externo, seus clientes e forne-
cedores, e interno, os que nela trabalham” (STRUNCK, 1989, p. 44).

Com base nos elementos básicos da identidade visual (o logotipo, o


símbolo, a marca, as cores institucionais e o alfabeto institucional, além de
outros eventuais elementos acessórios4) todas as aplicações (material de pa-
pelaria, uniformes, produtos promocionais, folders, cartazes, banners etc.)
foram padronizadas para que se comuniquem uns com os outros, de forma a
4 PEÓN, Maria Luísa. Sistemas de Identidade Visual. 3. ed. Rio de Janeiro: 2AB, 2003. p. 13.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 293

valorizar a imagem do projeto e garantir consistência e continuidade no uso


da marca. De acordo com Pinho (1996, p. 40), as cores, devidamente pa-
dronizadas, contribuem para identificação da empresa e a tipologia assegu-
ra legibilidade, garante coerência e uniformidade das mensagens visuais da
empresa. A seguir será exposto o resultado da aplicação da Identidade Visual
em alguns produtos que foram produzidos para o lançamento do projeto.

Quadro 1.1 – Identidade Visual: Produtos Institucionais


Padronização de produtos que materializam a personalidade do projeto, através da
Identidade unificação do conjunto de imagens, cores, símbolos, fontes e padrões visuais que irão
Visual representar graficamente os princípios e valores da organização.

Camiseta Institucional

Squeeze Boné
294

Folder Institucional Cartaz, Lago do Socepe.

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

Todo material desenvolvido apresenta os mesmos elementos gráficos,


padrão tipográfico, cromático e aspecto visual como um todo, que transmi-
tem paz, pureza, limpeza, tranquilidade e bem-estar. Além disso, foi explo-
rado o uso de fotografias das áreas estudadas para resumir visualmente os
atributos que fazem o projeto ser único.
Outros elementos acessórios como grafismos, ilustrações e mascote fo-
ram criados no decorrer do projeto, “cuja função é enfatizar algum conceito
ou servir como apoio de organização visual de layouts, aliando a um compo-
nente estético a função de veicular a identidade visual da instituição”5. Esses
elementos acessórios nortearam a criação de outros materiais de divulgação
e acrescentaram uma atmosfera lúdica ao universo do projeto. A seguir mos-
traremos alguns desses elementos, como a mascote, e produtos de destaque
para divulgação da instituição. Vale ressaltar que todas as mídias impressas
foram feitam em papel reciclado com intuito de diminuir os problemas am-
bientais causados pelo processo industrial de fabricação do papel, além de
reduzir os resíduos depositados em aterros.

5 PEÓN, Maria Luísa. Sistemas de Identidade Visual. 3. ed. Rio de Janeiro: 2AB, 2003. p. 45.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 295

Quadro 1.2 – Identidade Visual: A Mascote6


As mascotes são personagens criados em algum momento, para alguma campanha publicitária ou
promoção, com a intenção de atingir uma determinada parcela do público, na maioria, jovens e
Mascote crianças. “Eles buscam enaltecer uma dada propriedade positiva que cause identificação entre este
púbico e a imagem corporativa, de forma a agregar este valor à instituição”.

Assinatura Visual Curi, Guardião das Nascentes.

Curi, “Pinhão” em Tupi-guarani.

Curi, Expressões (emoções).

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

Quadro 1.3 – Identidade Visual: Produtos de divulgação


Caderno Personalizado, Capa. Miolo, Dados Pessoais e Calendário Ecológico.

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

6 PEÓN, Maria Luísa. Sistemas de Identidade Visual. 3. ed. Rio de Janeiro: 2AB, 2003. p. 46.
296

Vídeo Institucional, Case para DVD.

Fonte: Art/Meio Propaganda, 2015.

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

No decorrer do projeto, percebeu-se a necessidade de criar produtos


em materiais diferenciados, uma mídia alternativa para o papel reciclado, já
empregado em outros materiais. Foi necessário encontrar outro produto feito
a partir de processos mais éticos e sustentáveis. Surgiu então a ideia de um
Calendário Ecológico em tecido reciclado. Este tecido é uma combinação de
poliéster reciclado (PET)7 com algodão, resultando em uma malha ecológica
de grande qualidade.
O Calendário Ecológico foi um produto desenvolvido para demonstrar
o engajamento do projeto em gerar diferentes alternativas de produção com
responsabilidade social e preocupação ambiental.

7 PET – Politereftalato de Etileno. Polímero utilizado na indústria têxtil e na indústria de embalagens.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 297

Figura 1.1 – Layout para Calendário Ecológico em tecido, 2014

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

Além da comunicação institucional (divulgação dos valores e objetivos


do projeto) foi realizada a subdivisão do projeto de acordo com áreas de estudo
(eixos) para auxiliar a organização de práticas e facilitar o processo de apren-
dizagem por parte do público. O Projeto Saúde da Água trabalha em cinco
subprojetos sendo eles: Educação Ambiental; Política de Resíduos Sólidos e
Descarte do Óleo de Cozinha; Restauração Florestal em Propriedades Rurais;
Monitoramento Quali-Quantitativo dos Recursos Hídricos; Levantamento
da Fauna Silvestre: Avifauna, Mastofauna e Ictiofauna.
298

1.1 Educação Ambiental

A Educação Ambiental serviu como subprojeto norteador do Projeto


Saúde da Água. Durante dois anos, equipes trabalharam em todas as es-
colas de Itaara. Nelas foram criados os Clubes de Ecologia denominados
Guardiões das Nascentes – formados por alunos que respeitam e dissemi-
nam práticas de conservação do meio ambiente. Também foram realizadas
atividades como: Curso de Formação em Educação Ambiental, visitas às
nascentes e a Peça Teatral “O Macaco Simão e a Saúde da Água”, iniciativas
que uniram criatividade e o conhecimento adquirido no projeto. Todas as
práticas buscaram ressaltar a importância da conservação e restauração das
nascentes para a melhoria da qualidade da água e do consumo sustentável.

Folder, Guardiões das Nascentes. Camiseta, Clube de Ecologia Guardiões das Nascentes.

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

1.1.1 Política de Resíduos e Descarte de Óleo de Cozinha

Neste subprojeto buscou-se promover a sustentabilidade do meio am-


biente por meio de estratégias de conscientização ambiental. Seu planejamen-
to foi desenvolvido para formar uma consciência social de zelo, orientando
a comunidade em relação à prática adequada de descarte de resíduos sólidos
e óleo de cozinha usado. Palestras e oficinas serviram para a disseminação
do conhecimento, contribuindo para aumentar o número de colaborados e
colaboradores no processo. Para esse fim foram desenvolvidos materiais que
facilitam o processo de aprendizagem pelo público, como folders e cartilha.
Além de trabalhar com a compreensão sobre o descarte e reutiliza-
ção dos resíduos sólidos, também se criou um eixo de ação sobre a prática
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 299

adequada de descarte de óleo de cozinha usado. Esse eixo foi de extrema im-
portância para conscientizar a população sobre o aproveitamento desse resí-
duo através de materiais didáticos e atividades como a Oficina de Fabricação
de Sabão Caseiro. Esse subprojeto teve como colaboradores: Instituições
de Ensino, Prefeituras, Associações Comunitárias, Clubes e Empresas. A
Universidade Federal de Santa Maria, por exemplo, recebeu 16 coletores de
óleo no campus da instituição.
Figura 1.2 – Política Nacional de Resíduos Sólidos

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

1.1.2 Restauração Florestal: Matas Ciliares e Nascentes

O trabalho desenvolvido por este subprojeto procurou demonstrar


técnicas para a recuperação de nascentes e matas ciliares, bem como cons-
cientizar sobre a importância de preservação destas áreas, como o “Dia de
Campo”. Esse evento foi realizado para moradores locais, produtores rurais,
estudantes de cursos técnicos superiores voltados às ciências agrárias e am-
bientais, bem como professores e funcionários das instituições agraciadas
com o projeto. Divulgação e disseminação deste subprojeto foram feitas
através de materiais didáticos que promovem a conscientização sobre a pre-
servação de nascentes e do meio ambiente como um todo.
300

Quadro 1.4 – Restauração Florestal: Matas Ciliares e Nascentes


Folder Cartaz

Cartilha
Cartilha

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

1.1.3 Levantamento da Fauna Silvestre: Avifana, Mastofauna


e Ictiofauna
Este subprojeto realizou o levantamento fotográfico da fauna silvestre
de Itaara, incluindo aves, mamíferos e peixes, dando atenção especial às es-
pécies ameaçadas de extinção. Foram encontradas 122 espécies de aves, 18
de mamíferos e 14 de peixes.
A exposição do estudo se deu por meio de um recurso de comunica-
ção clássico dado por materiais impressos, tornando possível transformar o
trabalho de investigação do subprojeto em um manual de campo intitulado
“Aves do Município Itaara/RS” e em outras ferramentas de comunição como
mostra o quadro a seguir.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 301

Quadro 1.5 – Levantamento da Fauna Silvestre: Avifana, Mastofauna e Ictiofauna


Mídias como cartaz e banner permitem um trabalho visual mais apelativo, tentando uma
comunicação rápida e de forte impacto. Elas podem ser fixadas em entradas de salões, seminários,
Mídia oficinas, apresentações, palestras ou onde for necessária uma imagem de grande formato como pano
de fundo, ambientação e até mesmo como cenário.

Cartaz Macuco Cartaz Quati,

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.


302

Figura 1.3 – Manual de Campo: As Aves do Município de Itaara-RS, 2015

Fonte: Manual de Campo – As Aves do Município de Itaara-RS, 2015.

1.1.4 Monitoramento Quali-Quantitativo dos Recursos Hídricos


Neste projeto buscou-se quantificar o volume de chuva na bacia do
Rio Vacacaí-Mirim através de equipamentos para registro da precipitação
pluviométrica na área, assim como monitorar a qualidade da água em seis
pontos do Rio Vacacaí-Mirim. Esse acompanhamento foi feito por meio de
análises laboratoriais de parâmetros físico-químicos e microbiológicos das
amostras colhidas nos pontos.
O acompanhamento do regime hidrológico, volume e qualidade das
águas na sub- bacia do Arroio Manoel Alves foram monitorados nas nascen-
tes onde foram aplicadas técnicas de restauração florestal. Para este subpro-
jeto foram criados alguns banners para seminários e palestras além de um
folder com o resultado das atividades desenvolvidas.

Quadro 1.6 – Monitoramento Quali-Quantitativo dos Recursos Hídricos


Folder, Qual a importância do Monitoramento Quali-Quantitativo da Água?

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.


A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 303

1.2 Mostra de Práticas Sustentáveis

A “Mostra de Práticas Sustentáveis – O que se faz AQUI para cuidar


do PLANETA?” foi o evento de fechamento desses dois anos de trabalho
com o Projeto Saúdeda Água. Este evento deu visibilidade à comunidade
das ações do projeto e pode trazer na prática o que empresas, instituições e
pessoas físicas estão fazendo para melhorar o meio ambiente. Foi implemen-
tado em parceria com a Associação de Professores da Universidade Federal
de Santa Maria – APUSM e Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, e
buscou demonstrar práticas sustentáveis como fontes de energia, tratamento
das águas, compostagem, separação e reciclagem de resíduos, telhado verde,
paisagismo funcional e alimentício, dentre outras.
Sua divulgação se deu por meio de várias mídias, entre elas: convite,
cartaz, busdoor, banners entre outros. A seguir algumas imagens ilustram os
materias de divulgação do evento.

Figura 1.4 – Cartaz Mostra de Práticas Sustentáveis, 2015

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.


304

Figura 1.5 – Banner A cheia do Rio Vacacaí, 2015

Fonte: Banco de Imagens Fundação MO’Ã.

Considerações finais
Como vimos nos relatos acima, foram inúmeras as atividades realiza-
das, envolvendo a integração de comunidade, entidades, associações, cor-
po técnico e diretores da Fundação MO’Ã. Promovemos a distribuição de
materiais educativos como cartilhas e folders, palestras e espaços de diá-
logo, oficinas e muitos outros encontros, sempre mirando o mesmo objeti-
vo: disseminar conceitos de cuidados com o meio ambiente. Como exemplo
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 305

da continuidade dessas iniciativas, temos os “Pontos de Entrega Voluntária


(PEVs)” de óleo de cozinha que se mantém em funcionamento na cidade de
Itaara. A comunidade segue realizando o descarte correto de óleo desde a im-
plementação inicial do projeto e espera-se que essa postura seja incorporada
de forma definitiva na cultura local.
Dentre todas as iniciativas, certamente o maior legado do projeto é o
trabalho de introdução aos conceitos de Educação Ambiental realizado junto
às escolas do município de Itaara – atividades que abrangiam da Educação
Infantil ao Ensino Médio. Uma educação que fez professores e alunos
(crianças e adolescentes) olharem ao seu redor, perceberem a realidade de
uma forma mais sensibilizada e de fato sentirem a necessidade de mudanças.
As atividades desenvolvidas em sala de aula, bem como plantios, visitas,
oficinas de reciclagem, observação dos lagos, ficarão inscritas nas memó-
rias daqueles estudantes como uma fonte para qual retornar sempre que o
tema meio ambiente vier à tona. Contarão com orgulho que são sócios do
“Guardiões da Natureza”, clube formado para defender e preservar o meio
ambiente; lembrarão de terem plantado mudas com suas próprias mãos, de
terem estado junto às nascentes dos rios da cidade em que vivem, percebido
pessoalmente a degradação dos lagos. Aquilo que é vivenciado e não somen-
te teorizado deixa sua marca e, certamente, as crianças e adolescentes serão
os multiplicadores destes ensinamentos.
No vídeo de encerramento do projeto, um trecho expressa de forma
clara a importância da Educação Ambiental como agente transformador:
“Nós não podemos cuidar de todas as florestas, mas podemos cuidar de nos-
sas matas. Nós não podemos cuidar de todos os rios. Mas podemos cuidar
de nossas nascentes. Nós sabemos o quanto é difícil mudar velhos hábitos.
Mas nós podemos educar nossas crianças para que não cometam os mes-
mos erros”. Consertar o mundo não está ao nosso alcance, tampouco mudar
aqueles que se mantêm resistentes. No entanto, as crianças e adolescentes,
mais abertos a novos conceitos experiências, nos fazem crer que aquilo que
parece impossível agora possa ser fato dentro de poucos anos: por isso são
“nascentes”, origem de uma nova consciência, munidas de conhecimentos
científicos e visão comunitária. Investir em um projeto sério e perene, vol-
tado para o futuro, é algo que tivemos o orgulho de participar em conjunto
com a Fundação MO’Ã.
306

REFERÊNCIAS

DA SILVA, Juremir Machado. Interfaces: Michel Maffesoli, teórico da


comunicação. Revista Famecos, v. 11, n. 25, 2004.
JACOBI, Pedro, et al. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade.
Cadernos de Pesquisa, v. 118, n. 3, 2003.
PEÓN, Maria Luísa. Sistemas de Identidade Visual. 3. ed. Rio de
Janeiro: 2AB, 2003.
PINHO, José Benedito. O Poder das Marcas. São Paulo: Summus, 1996.
STRUNCK, Gilberto Luiz. Identidade Visual: a direção do olhar. Rio de
Janeiro: Europa Emp. Graf. Ed., 1989.
Imagens
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CALENDÁRIO ECOLÓGICO. CAPA. Layout da página. Art/Meio
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CAMISETA CLUBE DE ECOLOGIA GUARDIÕES DAS NASCENTES.
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CAMISETA INSTITUCIONAL. Simulação Digital. Art/Meio Propaganda
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CARTAZ CURSO DE FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL.
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MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2015.
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CARTAZ PEÇA TEATRAL O MACACO SIMÃO E A SAÚDE DA ÁGUA.
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MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2015.
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MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2015.
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FOLDER, CURSO DE FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL.


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Simulação Digital. Art/Meio Propaganda e Fundação MO’Ã, Santa Maria/
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FOLDER INSTITUCIONAL. Simulação Digital. Art/Meio Propaganda e
Fundação MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2014.
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Simulação Digital. Art/Meio Propaganda e Fundação MO’Ã, Santa Maria/
Itaara, RS, 2015.
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QUANTITATIVO DA ÁGUA?”. Simulação Digital. Art/Meio Propaganda
e Fundação MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2015.
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NASCENTES. Simulação Digital. Art/Meio Propaganda e Fundação
MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2015.
LAYOUT PARA CALENDÁRIO ECOLÓGICO EM TECIDO. Desenho.
Art/Meio Propaganda e Fundação MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2014.
MANUAL DE CAMPO: AS AVES DO MUNICÍPIO DE ITAARA-RS.
Simulação Digital. Art/Meio Propaganda e Fundação MO’Ã, Santa Maria/
Itaara, RS, 2015.
SQUEEZE. Simulação Digital. Art/Meio Propaganda e Fundação MO’Ã,
Santa Maria/Itaara, RS, 2014.
VÍDEO INSTITUCIONAL, CASE PARA DVD. Simulação Digital. Art/
Meio Propaganda e Fundação MO’Ã, Santa Maria/Itaara, RS, 2015.
SOBRE OS AUTORES

Adriano Severo Figueiró


Graduado em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria,
Mestrado em Geografia (Utilização e Conservação de Recursos Naturais)
pela Universidade Federal de Santa Catarina, doutorado em Geografia
(Planejamento Ambiental) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
e Pós-Doutorado em Geoconservação pela Universidade do Minho-
Portugal. Professor Associado da Universidade Federal de Santa Maria.
Tem experiência na área de Geografia Física, com ênfase em Geoecologia,
Geoconservação e Educação ambiental. Pesquisador do Grupo de Pesquisa
em Patrimônio Natural, Geoconservação e Gestão de Águas (PANGEA)
e coordenador do Laboratório de Geoecologia e Educação Ambiental
(LAGED) do Departamento de Geociências da UFSM, desenvolvendo
pesquisas e orientando alunos de graduação e Pós-Graduação nas áreas de
ecologia da paisagem, geoconservação, planejamento ambiental, geoturismo
e educação ambiental.

Ana Paula Moreira Rovedder


Engenheira Florestal. Doutora em Ciência do Solo, Professora Associada
do Departamento de Ciências Florestais da Universidade Federal de Santa
Maria, Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação
de Áreas Degradadas – NEPRADE/UFSM. Orientadora de mestrado e
Doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia Florestal e
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Agrícola, ambos da UFSM.
Desenvolve pesquisa e extensão em restauração ecológica de ecossistemas
degradados e Relação solo-floresta. É membro do Conselho Superior da
Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica, representando a Região Sul.

André Ademir Weber


Bacharel em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria e Mestre
em Geografia pela mesma Universidade, pesquisa e trabalha nas áreas de
Climatologia Geográfica, Geoturismo, Educação Ambiental e Permacultura.

André Weissheimer de Borba


Professor do Departamento de Geociências da Universidade Federal
de Santa Maria. Atua nos Cursos de Graduação em Geologia e Pós-
Graduação em Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS) Porto Alegre. Pesquisa na área de Geodiversidade, Patrimônio
Geológico e Geoconservação.
310

Bruna Balestrin Piaia


Engenheira Florestal, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em
Engenheira Florestal da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM.
Mestrado em Engenharia florestal pela UFSM. Pesquisadora do Núcleo de
Estudos e Pesquisas em Recuperação de Áreas Degradadas – NEPRADE/
UFSM. Possui experiência em restauração ecológica, com ênfase em nuclea-
ção, transposição de banco de sementes e indicadores da restauração ecológica.

Eliane Maria Foleto


Professora do Departamento de Geociências e do Programa de Pós-Graduação
em Geografia, da Universidade Federal de Santa Maria/RS/Brasil. Coordena o
laboratório de Hidrogeografia – HIDROGEO. Participa do Grupo de Pesquisa:
Patrimônio Natural, Geoconservação e Gestão da Água – PANGEA.

Giuliana Seerig
Escritora, bacharel em Comunicação Social pela Universidade Federal de
Santa Maria e acadêmica de Letras (Português e Espanhol) da Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.
E-mail: giuliana.seerig@usp.br

Graciela Schmidt Disconzi


Graduada em Administração – ULBRA e Formação de Professores para
Educação Profissional pela Universidade Federal de Santa Maria – PEG/
UFSM. Doutoranda em Enga. Civil – Área Recursos Hídricos pela
Universidade Federal de Santa Maria-UFSM. Mestre em Enga. Ambiental –
UFSM. Atualmente Professora no Ensino à Distância do Curso Administração
e Gestão Ambiental da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA. Analista
Administrativa da Associação Brasileira de Recursos Hídricos – ABRH.
Pesquisadora no Grupo de Pesquisa em Gestão de Recursos Hídricos
(GERHI) do Centro de Tecnologia da UFSM e no Grupo de pesquisa
Gerenciamento Ambiental e Manejo de Recursos Hídricos (GAMRH).

Greice Kelly Perske da Silva


Licenciada e mestre em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria,
trabalha com Educação Ambiental, Permacultura, resíduos sólidos e planeja-
mento ambiental. Atualmente é doutoranda do Programa de Pós-Graduação
em Geografia da UFSM, membro da entidade ambientalista Mãos Verdes,
do Conselho de Meio Ambiente e Saneamento de Agudo, da Comissão
Municipal de Resíduos Sólidos de Agudo, e do Conselho Consultivo do
Parque Estadual da Quarta Colônia.
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 311

Imaruí Mallmann de Oliveira de Lima


Bacharel em Desenho Industrial – Programação Visual, Design Gráfico, pela
Universidade Federal de Santa Maria. Trabalhou como diretora de arte na
agência ArtMeio Propaganda por dois anos e atualmente é freelancer na área.

Jussara Cabral Cruz


Professora da UFSM, Orienta Doutorado, Mestrado nas áreas de Engenharia
Civil, Engenharia Sanitária, Eng. Florestal, Planejamento Urbano e Regional
e Geociências. Participa em vários projetos de pesquisa para CNPq, FINEP,
SEMA/RS, FAPERGS, entre outros. Atua na área de Recursos Hídricos com
ênfase nos processos e métodos para implementação dos instrumentos de
gestão, monitoramento hidrológico, modelagem hidrológica, disponibilida-
de hídrica, fragilidades ambientais para licenciamento ambiental outorga,
meio ambiente.

Letícia Ramires Corrêa


Licenciada e Mestranda em Geografia Tem experiência na área de
Geografia, com ênfase em Educação Ambiental, atuando principalmen-
te nos seguintes temas: Percepção ambiental. Mapas Mentais. Ciclo de
Cinema Socioambiental. Conservação do patrimônio hídrico. Interpretação
Ambiental. Trilhas Interpretativas.

Mara Matiuzzi Kunzler


Publicitária, Especialista em Marketing e Recursos Humanos. Diretora
de Atendimento da ArtMeio Propaganda. No Projeto Saúde da Água, foi
responsável pelo planejamento e execução do Plano de Comunicação.

Marciano Friedrich
Engenheiro Sanitarista e Ambiental. Doutorando em Engenharia Civil
– PPGEC/UFSM, Área de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental.
Professor Substituto na Universidade Federal de Santa Maria, Departamento
de Engenharia Florestal, Campus de Frederico Westphalen. Atua em
pesquisas na área de Recursos Hídricos e Sensoriamento Remoto.
Possui experiência profissional na área de Hidrologia, Monitoramento
Ambiental e Geoprocessamento.

Marina Deon Ferrarese


Bióloga pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Mestre em
Agrobiologia (UFSM), estudante do Curso Técnico em Meio Ambiente
(UFSM). Desenvolvo trabalhos e pesquisas com Botânica, Taxonomia
312

Vegetal, Unidades de Conservação, intervenções envolvendo Educação


Ambiental atrelada aos esportes de aventura, com ênfase em trilhas em
ambiente natural. Apoio Técnico-Bióloga, Grupo Bandeirantes da Serra;
Pesquisadora Colaboradora do Projeto Flora de Santa Maria Revisitada.

Michele Benetti Leite


Engenheira Florestal (UFSM), Mestra em Recursos Hídricos e Saneamento
Ambiental (UFSM), Doutora em Engenharia Química e Ambiental pela
Universidad Rey Juan Carlos (URJC/Madri-Espanha). Atua na área de
Projetos Ambientais, Serviços Ecossistêmicos, Unidades de Conservação,
Gestão de Recursos Hídricos, Conservação de Recursos Naturais e Políticas
Públicas Ambientais. Coordenadora do Aplicativo LandsCare no Brasil.

Olímpio Rafael Cardoso


Bacharel em Ciências Biológicas – Ênfase Marinha e Costeira pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS, 2011), mestre em
Engenharia Ambiental – Recursos Hídricos através do Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Ambiental da Universidade Federal de Santa
Maria (UFSM, 2015). Atualmente é doutorando acadêmico em Zoologia na
Universidade Federal do Paraná – UFPR, trabalhando como colaborador no
Laboratório de Ecologia de Peixes do Centro de Estudos do Mar (CEM/
UFPR), onde realiza trabalhos com ictiologia marinha e estuarina, tendo
como enfoque, abordagens ecológicas modernas no âmbito da Zoologia e da
Oceanografia Biológica.

Rafaela Badinelli Hummel


Engenheira Florestal, Doutoranda em Engenharia Agrícola pelo Programa de
Pós-Graduação em Engenharia Agrícola – UFSM. Mestrado em Engenharia
Florestal pela UFSM. Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em
Recuperação de Áreas Degradadas – NEPRADE/UFSM. Possui experiência
em invasão biológica e restauração ecológica, com ênfase na condução da
regeneração natural e relação planta-visitantes florais.

Renata Azevedo Xavier


Bacharel em Ciências Biológicas – Ênfase Marinha e Costeira pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS, 2011), mestre em
Engenharia Ambiental – Recursos Hídricos através do Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Ambiental da Universidade Federal de Santa
Maria (UFSM, 2015) e licenciada em Ciências Biológicas (UNOPAR,
2018). Tem experiência nas áreas de reabilitação de fauna, conservação
A CONSERVAÇÃO DA ÁGUA SOB DIFERENTES OLHARES 313

da biodiversidade, gestão ambiental, ecohidrologia e educação ambiental.


Atualmente exerce a função de professora de Ciências Naturais e Biologia
do Colégio Militar de Curitiba (CMC).

Raul Todeschini
Graduado em EngenhariaAmbiental e Sanitária pela Universidade Franciscana
– UFN. Mestrado em Engenharia Civil, área de concentração em Recursos
Hídricos e Saneamento Ambiental da Universidade Federal de Santa Maria
– UFSM. Possui experiência nas áreas hidrologia, geoprocessamento,
gestão de recursos hídricos, gestão de resíduos sólidos. Atua profissional-
mente no desenvolvimento de projetos, relatórios e estudos técnicos voltados
aos processos de licenciamento ambiental, recuperação de áreas degradadas,
gerenciamento de resíduos sólidos, assessoria ambiental, monitoramento
de ETEs, entre outros, etc. Professor do curso de engenharia ambiental da
Faculdade Horizontina – FAHOR.

Suzane Bevilacqua Marcuzzo


Professora na Universidade Federal de Santa Maria, no curso superior de
Gestão Ambiental, Tem experiência na área de Ecologia e Conservação da
Natureza, com ênfase em Áreas Protegidas e Unidades de Conservação, atu-
ando nos temas: planejamento e gestão de unidades de conservação, uso pú-
blico em áreas protegidas, manejo de exóticas invasoras em áreas protegidas
e restauração de ecossistemas degradados.

Thaimon da Silva Socoloski


Bacharel e mestre em Geografia pela Universidade Federal de Santa Maria, e
membro do grupo de pesquisa Geografia, Trabalho e Ambiente. Atualmente
é licenciando em geografia pela UFSM e participante do Programa
Residência Pedagógica.

Thais Scotti do Canto-Dorow


Licenciada em Ciências Biológicas na Universidade Federal de Santa Maria
(UFSM), Mestrado e Doutorado em Ciências, com ênfase em Botânica,
na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora do ensino
superior aposentada na Universidade Federal de Santa Maria, função que ainda
cumpre, na Universidade Franciscana (UFN). Atua na pesquisa na área
do Ensino em Ciências/Biologia (Formação de professores e Ensino-
Aprendizagem) e na área da Botânica (Taxonomia de Angiospermas).
SOBRE O LIVRO
Tiragem não comercializada
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5/12/16/18
Arial 7,5/8/9
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)

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