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Áreas Protegidas e Inclusão Social em cenários de

mudanças

Artigos e Relatos de Experiência


Anais do IX Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social – SAPIS e IV Encontro
Latino Americano sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social – ELAPIS

Organização
Renata Priscila da Silva
Rita Paradeda Muhle
Wilma Barros da Paixão
Jenniffer Emannuelle dos Santos
Vanice Santiago Fagroso Selva
Edneida Rabelo Cavalcanti
Beatriz Mesquita Jardim Pedrosa

Recife, 2019
Foto da Capa:
Cleopatra Maria do Ó

Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças. Anais do IX SeminárioBrasileiros sobre Áreas
Protegidas e Inclusão Social e IV Encontro Latino Americano sobreÁreas Protegidas e Inclusão Social /
Organizadores: Selva, Vanice; Cavalcanti, Edneia; Silva, Renata Priscila; Recife: Universidade Federal de
Pernambuco, 2019.

https://sapiselapis.wixsite.com/ixsapisivelapis

ISSN:

1. Conservação da biodiversidade e inclusão social em tempos de mudanças climáticas. 2. Educação ambiental e


áreas protegidas como lugares educadores: potencialidades e limites. 3. Conflitos ambientais em áreas
protegidas. 4.Turismo e Lazer: contexto e expectativas frente aos novos cenários para o uso turístico de áreas
Protegidas. 5. Áreas protegidas e urbanização: cenários de mudanças e a dinâmica das cidades. 6. Políticas
públicas, governança ambiental e inclusão social em áreas protegidas. 7.Cultura, biodiversidade, conhecimentos
tradicionais e manejo comunitário do ambiente. 8.Áreas protegidas e a questão agrária.

AVISO: O conteúdo dos resumos expandidos é de responsabilidade dos autores.


APRESENTAÇÃO

O IX Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social (Sapis) e o IV Encontro


Latino-americano de Áreas Protegidas e Inclusão Social (Elapis) constituem relevantes eventos
acadêmicos que tratam da temática da proteção ambiental e a inclusão social no Brasil e na América
Latina. O objetivo é promover a discussão sobre os temas da inclusão social e da diversidade cultural
relacionadas às áreas protegidas e aos povos e territórios tradicionais, favorecendo a interface entre a
ciência, o conhecimento tradicional e a política pública.
O formato consolidado pelas edições anteriores promove a reunião de saberes acadêmicos e
tradicionais, através do encontro de pesquisadores, estudantes de graduação e pós-graduação,
profissionais da área ambiental e povos tradicionais e comunitários associados às áreas protegidas -
indígenas, quilombolas, pescadores, agricultores e outros. Os temas escolhidos, a submissão de
trabalhos científicos e relatos de experiências, discussões e reflexões presentes nas versões anteriores,
fazem com que o Sapis e Elapis sejam considerados espaços estratégicos e de referência, necessários
para o avanço das discussões sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social.
O IX Sapis e o IV Elapis, em suas primeiras edições no Nordeste, foram promovidos pelo
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (Prodema) da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE) e pela Fundação Joaquim Nabuco. Sendo sediado do Departamento de
Turismo e Hotelaria e no Centro de Ciências Sociais Aplicadas da UFPE.
O tema escolhido para 2019: “Áreas Protegidas e Inclusão Social em cenários de mudanças”
está ligado a dois eixos interconectados. O primeiro diz respeito a alta probabilidade de que as
mudanças do clima afetem o padrão de distribuição das espécies, trazendo a necessidade de um
planejamento dinâmico na criação, implantação e gestão de Áreas Protegidas. O segundo eixo diz
respeito às mudanças na geopolítica global, imposição de modelos de desenvolvimento com alto peso
na dimensão econômica, com impactos negativos nos arranjos de governança ambiental global, com
agravamento em países cuja opção tem sido a do ultraliberalismo como proposta de desenvolvimento.
Durante o evento foram apresentados 120 trabalhos, sendo 21 na modalidade pôster e 99 na
modalidade comunicação oral. Respeitando o caráter inclusivo dos eventos, neste material incluímos
todos os resumos expandidos que foram aprovados, um total de 150 trabalhos, que foram avaliados
temos reunidos 150 trabalhos inscritos nas modalidades comunicação oral e pôster, consistindo em
comunicação científica ou relato de experiência que foram avaliados e aprovados por uma comissão
científica composta por pesquisadores e docentes do ensino superior no Brasil e no exterior.
O volume está organizado de acordo com os Grupos de Trabalhos, a saber, Conservação da
biodiversidade e inclusão social em tempos de mudanças climáticas; Educação ambiental e áreas
protegidas como lugares educadores: potencialidades e limites; Conflitos ambientais em áreas
protegidas; Turismo e Lazer: contexto e expectativas frente aos novos cenários para o uso turístico de
áreas Protegidas; Áreas protegidas e urbanização: cenários de mudanças e a dinâmica das cidades;
Políticas públicas, governança ambiental e inclusão social em áreas protegidas;Cultura, biodiversidade,
conhecimentos tradicionais e manejo comunitário do ambiente;Áreas protegidas e a questão agrária.
Esperamos que a leitura seja proveitosa e ajude a vislumbrar perspectivas de futuro em
cenários de mudanças.
COMISSÃO CIENTÍFICA
Alba Simon (UNIRIO)
Alexandra Cerón Vivas (Universidad Pontificia Bolivariana)
Alexandre Caminha de Brito (ICMBio)
Altair Sancho (UFJF)
Aluisio Sales Ribero (UFPE)
Ana Maria Motta Ribeiro (UFF)
Anderson Portuguez (UFU)
Andrea Rabinovici (UNIFESP)
Annelise Caetano Fraga Fernandez (UFRRJ)
António Chambel (Universidade de Évora)
Beatriz Mesquita (FUNDAJ)
Breno Herrera (ICMBio)
Camila Rodrigues (UFRRJ)
Carla Rocha (UFSC)
Carlos Alberto Cioce Sampaio (UFPR)
Carlos Eduardo Menezes da Silva (IFPE)
Cecil Barros (ICMBio)
Claudio Jorge Moura de Castilho (UFPE)
Clemente Coelho Júnior (UPE)
Cristiano Ramalho (UFPE)
Cristina Araújo (UFPE)
Damaris Caravaca (Universidad Nacional de Costa Rica)
Deborah da Cunha Estima (Direção Regional da Ciência e Tecnologia dos Açores)
Edilaine Albertino de Moraes (UFJF)
Edneida Rabelo Cavalcanti (FUNDAJ)
Edson Vicente da Silva (UFC)
Edvania Torres Aguiar Gomes (UFPE)
Erica Paula Elias Vidal de Negreiros (UFPE)
Erika Fernandes Pinto (ICMBio)
Fábio Motta (UNIFESP)
Francisca de Paula (UFBA)
Giovanni Seabra (UFPB)
Gisela Livino Carvalho (ICMBio)
Grazielle Rodrigues (CEPEHC)
Helena Costa (UNB)
Henrique Callori Kefalas (Instituto Linha D’água)
Henrique Pereira (UFAM)
Iara Vasco (ICMBio)
Isabelle Meunier (UFRPE)
Itamar Dias e Cordeiro (UFPE)
Ivani Ferreira de Faria (UFAM)
Jaíra Maria Alcobaça Gomes (UFPI)
Janaina Tude Sevá (UFF)
Jonas Rodrigues (UFRPE)
José Martins da Silva Júnior (ICMBio)
José Severino Bento (IFPE)
Josicleda Galvíncio (UFPE)
Juvenita Albuquerque (FUNDAJ)
Karen Mustin (UFPEL)
Lia Vasconcelos (Universidade Nova de Lisboa)
Lucía Linsalata (Benemérita Universidad Autónoma de Puebla)
Lucio Ricardo Malizia (Universidade de Jujuy)
Luis Henrique Souza (UFPE)
Luz Stella Carmona (Universidad Pontificia Bolivariana)
Maria Geralda de Almeida (UFGO)
Marina de Sá Costa Lima (UFPE)
Maristela Andrade (UFPB)
Mauro José Cury (Unioeste)
Milton Mariani (UFMS)
Natália Azevedo (UFPR)
Odaleia Queiroz (USP)
Pedro Silveira (FUNDAJ)
Plinio Guimarães (IFPE)
Raquel Gutierrez (Benemérita Universidad Autónoma de Puebla)
Renata Priscila da Silva (GEPES/UFRPE)
Rita Paradeda Muhle (GEPES/UFRPE)
Serge Bahuchet (MNHN da França)
Sergio Leal (UFPE)
Solange Fernandes Soares Coutinho (FUNDAJ)
Sónia Silva (Universidade de Cabo Verde)
Sueli Furlan (USP)
Suzy Simonetti (UEA)
Sylvie Clarimont (Université de Pau et des Pays de l’Adour)
Taciana Kramer de Oliveira Pinto (UFAL)
Tarcisio Quinamo (FUNDAJ)
Teresa Cristina de Miranda Mendonça (UFRRJ)
Teresa de Jesús Rivas Pérez (Universidad Autónoma de Guerrero)
Tereza Mendonça (UFRRJ)
Thais Correia de Andrade (UFPE)
Thaise Guzzatti (UFSC)
Valéria Costa (UFPE)
Vanice Selva (UFPE)
Vladia Pinto (UFC)
Wilson Madeira Filho (UFF)
Xose Solla (Universidade de Santiago da Compostela)
Zysman Neiman (UFSCAR)
IX Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social – SAPIS e
IV Encontro Latino Americano sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social – ELAPIS
Universidade Federal de Pernambuco UFRPE | de 11 A 14 de dezembro de 2019

Coordenadoras:
Vanice Selva (UFPE)
Edneida Rabelo Cavalcanti (FUNDAJ)

Comissão Organizadora:

Beatriz Mesquita (FUNDAJ)


Claudia Conceição Cunha (ICMBio)
Daywinson Borges (Prodema/UFPE)
Erica Paula Elias Vidal de Negreiros (UFPE)
Gilberto Rodrigues (UFPE)
Gisela Livino Carvalho (ICMBio)
Josiane Maria Lins (Doutoranda Prodema/UFPE)
Juvenita Albuquerque (FUNDAJ)
Leandro Muniz (Prodema/UFPE)
Marina de Sá Costa Lima (UFPE)
Pedro Silveira (FUNDAJ)
Renata Priscila da Silva (GEPES/UFRPE)
Rita Paradeda Muhle (GEPES/UFRPE)
Rosalva Santos (UFPE)
Solange Fernandes Soares Coutinho (FUNDAJ)
Tarcisio Quinamo (FUNDAJ)
Thais Andrade (UFPE)
Valéria Costa (UFPE)

Equipe Plantur Jr

Luiz Gomes do Prado Filho (Presidente)


Dennys Vicente Rocha do Nascimento
Erick Matheus Dyonizio Mendonça
Everton Bruno Ribeiro Nunes
Ewerton Felipe dos Santos
Jenniffer Emannuelle dos Santos
João Gabriel Batista de Lima
Lucas Mateus P. Melo
Maria Carolina Silva Mariotto
Maria Gorett Bitu
Raíssa Araújo Ramos Barbosa
Rute Gabriela dos Santos Paes
Wilma Barros da Paixão
Realização:

Organização:

Patrocínio:

Apoio:
SUMÁRIO

GT 1. CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE E INCLUSÃO SOCIAL EM TEMPOS DE


MUDANÇAS CLIMÁTICAS
DINÂMICA ESPACIAL CIRCADIANA DA GARÇA-VAQUEIRA (Bulbucus ibis) NO ARQUIPÉLAGO DE
FERNANDO DE NORONHA ................................................................................................................. 22

MELIPONICULTURA: BASE TEÓRICA PARA UMA SENSIBILIZAÇÃO AMBIENTAL ................................ 27

A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO RIO MADEIRA VEM SENDO AFETADA


GRADATIVAMENTE PELAS SUBIDAS DAS ÁGUAS PRECIPITADAS ...................................................... 32

VULNERABILIDADE DAS POPULAÇÕES HUMANAS DA MATA ATLÂNTICA COSTEIRA FRENTE A


EVENTOS CLIMÁTICOS EXTREMOS: UM ESTUDO DE CASO EM PARANAGUÁ-PR ............................. 37

CONSERVAÇÃO E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL: RELEVÂNCIA DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO


PARA A PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE .......................................................................................... 42

IMPACTOS DA MUDANÇA DO CLIMA E ADAPTAÇÃO BASEADA EM ECOSSISTEMAS: UM ENFOQUE


EM GÊNERO........................................................................................................................................ 47

GT 2. EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ÁREAS PROTEGIDAS COMO LUGARES EDUCADORES:


POTENCIALIDADES E LIMITES
PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOBRE UNIDADES DE CONSERVAÇÂO MUNICIPAIS LOCALIZADAS NA
BAIXADA VERDE/RJ ............................................................................................................................ 54

PERCEPÇÕES E (RE)CONHECIMENTO DOS 30 ANOS DO PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DOS


GUIMARÃES: UMA HISTÓRIA QUE NÃO PASSARÁ EM BRANCO ....................................................... 59

ENTRE RODAS, REDES E MERGULHOS: DAS FORMAÇÕES AO ENVOLVIMENTO SOCIOAMBIENTAL


NO PARQUE NACIONAL MARINHO DOS ABROLHOS ......................................................................... 64

SONHOS DA JUVENTUDE - DRAGON DREAMING E EDUCAÇÃO PARA SUSTENTABILIDADE NA ÁREA


DE PROTEÇÃO PETRÓPOLIS/RJ .......................................................................................................... 69

CRIAÇÃO DO GRUPO DE MONITORAMENTO COMUNITARIO AMBIENTAL DO CARANGUEJO-UÇÁ NA


RESEX CHOCOARÉ MATO-GROSSO/PA, BRASIL ................................................................................. 74

PEQUENO GUARDA-PARQUE: INCENTIVOS À INTERPRETAÇÃO AMBIENTAL PARA A VISITAÇÃO DO


PÚBLICO INFANTO-JUVENILNO PARQUE NACIONAL MARINHO DE FERNANDO DE NORONHA ....... 79
CARTILHA COMO RECURSO EDUCATIVO PARA VALORIZAÇÃO DA FLORESTA E DAS UNIDADES DE
CONSERVAÇÃO NA AMAZÔNIA ......................................................................................................... 84

A RELAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO E ÁREAS PROTEGIDAS: ESTUDO REALIZADO NO PARQUE NACIONAL


DO CATIMBAU, ESTADO DE PERNAMBUCO, BRASIL ......................................................................... 90

CAMINHOS PARA UMA ESTRATÉGIA DE MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE PROCESSOS DE


EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS............................................. 95

MAPEAMENTO PARTICIPATIVO NA RESERVA EXTRATIVISTA ACAÚ-GOIANA ................................. 101

FEIRA AGROECOLÓGICA COMO INSTRUMENTO DE SENSIBILIZAÇÃO DA COMUNIDADE NO


ENTORNO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO ........................................................................... 106

EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM ÁREAS PROTEGIDAS: AÇÕES EDUCATIVAS NA MATA DE DOIS UNIDOS,


RECIFE-PE ......................................................................................................................................... 111

ÁREAS VERDES E INSTITUIÇÕES DE ENSINO NO RS: APROXIMAÇÕES E DESAFIOS ......................... 116

FORTALECENDO NOSSAS RAÍZES – PROTAGONISMO JOVEM NA RESEX MARINHA DE CAETÉ-


TAPERAÇU ........................................................................................................................................ 121

PRIMEIRA INFÂNCIA EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ................................................................. 126

DIMENSÕES HUMANAS E A EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS NA


CAATINGA: UMA CONTRIBUIÇÃO .................................................................................................... 130

UMA ANÁLISE QUANTITATIVA DA VISITAÇÃO VOLTADA À EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA RESERVA


BIOLÓGICA DO TINGUÁ ENTRE 2015 E 2018 ................................................................................... 137

O POTENCIAL EDUCADOR DE ÁREAS PROTEGIDAS TRILHADO NA COMPOSIÇÃO ENTRE AULA DE


CAMPO E VIVÊNCIA DE DANÇAS CIRCULARES ................................................................................. 143

EDUCOMUNICAÇÃO – DESAFIO PARA GESTÃO PARTICIPATIVA NA RESERVA EXTRATIVISTA ACAÚ-


GOIANA(RESEX ACAÚ-GOIANA) ....................................................................................................... 149

PROGRAMA DE VOLUNTARIADO DO ICMBIO COMO ESTRATÉGIA PARA CONSERVAÇÃO DOS


QUELÔNIOS DA AMAZÔNIA NO PARQUE NACIONAL DO JAÚ/AM.................................................. 154

ANÁLISE DO USO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA CIDADE DO RECIFE COMO ESPAÇO DE


EDUCAÇÃO NÃO FORMAL................................................................................................................ 159

EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A PRESERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE NA RESERVA BIOLÓGICA DE


PEDRA TALHADA ALAGOAS E PERNAMBUCO.................................................................................. 164
O QUE FAZER COM OS LIXOS GERADOS DENTRO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO? ................. 169

GEOEDUCAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS: DESAFIOS DA IMPLEMENTAÇÃO DE UMA UNIDADE DE


CONSERVAÇÃO CAVERNÍCOLA NO SERTÃO CENTRAL CEARENSE ................................................... 176

GT 4. CONFLITOS AMBIENTAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS

TERMOS DE COMPROMISSO: UM INSTRUMENTO DE PACTUAÇÃO OU DE CONTROLE DO USO E


MANEJO DOS RECURSOS NATURAIS EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL?181

“EPIDEMIA” DE RECATEGORIZAÇÃO, REDUÇÃO DE LIMITES E DESAFETAÇÃO DE UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO: PARCERIAS NECESSARIAS COM COMUNIDADES QUILOMBOLAS......................... 186

MAPEAMENTO PARTICIPATIVO DO USO DOS RECURSOS PESQUEIROS NA RESEX PIRAJUBAÉ:


DILEMAS ENTRE A TERRITORIALIDADE TRADICIONAL E OS LIMITES DA UC.................................... 191

RECONFIGURAÇÕES SOCIOESPACIAIS NO PARQUE NACIONAL DOS LENÇÓIS MARANHENSES:


CONFLITOS E DILEMAS RELACIONADOS ÀS COMUNIDADES TRADICIONAIS................................... 196

A RECATEGORIZAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E A RELAÇÃO COM OS CONFLITOS


SOCIOAMBIENTAIS........................................................................................................................... 202

ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO NUMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO: RELATO DE EXPERIÊNCIAS


SOBRE OS CONFLITOS AMBIENTAIS NO PARQUE ESTADUAL DOS TRÊS PICOS............................... 208

ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NOBRASIL E NA COLÔMBIA


CORRELACIONADO AOS IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS NA ZONA COSTEIRA ................................ 213

A MATA DE SANTA GENEBRA E SEU ENTORNO – UM ESTUDO DE CASO SOBRE A GESTÃO


TERRITORIAL E A INCLUSÃO SOCIAL ................................................................................................ 219

NÓS QUEREMOS A TERRA PARA VIVER: DESAFIOS PARA O RECONHECIMENTO LEGAL DE


TERRITORIOS CAIÇARAS AMBIENTALMENTE PROTEGIDOS............................................................. 230

OS CONFLITOS NA RESEX DA PRAINHA DO CANTO VERDE/CE E SUA RELAÇÃO COM O PARQUE


EÓLICO PRAIAS DE PARAJURU ......................................................................................................... 235

TRILHA TRANSCARIOCA: CONSERVACIONISMO E USO TRADICIONAL EM CONFLITO.................... 240

A DISPUTA DO BOTO COR DE ROSA E DO BOTO TUCUXI NA FESTA DO ÇAIRÉ 2019 ENQUANTO
ESTRATÉGIA DE PROTESTO E DE RESISTÊNCIA NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE ALTER DO
CHÃO ................................................................................................................................................ 245

CCDRU COMO CONCILIAÇÃO DE INTERESSE DE TERRAS QUILOMBOLAS E UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO................................................................................................................................. 249
QUEIMADAS NA FLORESTA AMAZÔNICA: HUMANOS E NÃO-HUMANOS INVISIBILIZADOS E A
NECROPOLÍTICA ESTATAL ................................................................................................................ 252

DESAFIOS PARA A GESTÃO PARTICIPATIVA DA ILHA DO MEL, PARANÁ ......................................... 255

ANÁLISE PRELIMINAR DO CONFLITO SOCIOAMBIENTAL DECORRENTE DA MINERAÇÃO DE AREIA


NA APA LAGO DO AMAPÁ, RIO BRANCO, ACRE............................................................................... 260

DILEMAS E AVANÇOS PARA A INCLUSÃO SOCIAL EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO


INTEGRAL: OS TERMOS DE COMPROMISSO FIRMADOS ENTRE O ICMBIO E OS QUILOMBOLAS
RESIDENTES NO INTERIOR E ENTORNO DARESERVA BIOLÓGICA DO RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ,
PARÁ, BRASIL.................................................................................................................................... 265

BREVE AVALIAÇÃO HISTÓRICA SOBRE A UTILIZAÇÃO DE TERMOS DE COMPROMISSO COM


COMUNIDADES TRADICIONAIS NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS .............................. 270

TERMO DE COMPROMISSO ENTRE O PARQUE NACIONAL DO DESCOBRIMENTO E ALDEIAS PATAXÓ


DA TERRA INDÍGENA COMEXATIBÁ: CONSTRUÇÃO E PERSPECTIVAS............................................. 275

SENSIBILIZAÇÃO DA POPULAÇÃO TRADICIONAL DA RESEX AUATÍ-PARANÁ, COM ENFOQUE NA


COMUNIDADE BOA VISTA DO CURIMATÁ ....................................................................................... 280

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO EM TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS:.................................................. 285

DOS CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS À CONSERVAÇÃO DA AGROBIODIVERSIDADE....................... 285

TERRA INDÍGENA EM DISPUTA: A RETERRITORIALIZAÇÃO DOS POTIGUARA NA TI POTIGUARA


MONTEMOR/PB ............................................................................................................................... 290

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E POBREZA – RECIFE E SEUS ESPAÇOS DE DESIGUALDADES .......... 295

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E PROCESSOS DE DESTERRITORIALIZAÇÃO DE COMUNIDADES


TRADICIONAIS: O CASO DA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL DA MATA DO PAU FERRO, MUNICÍPIO
DE AREIA-PB ..................................................................................................................................... 300

PROJETO MINAS-RIO NO ENTORNO DO MONUMENTO NATURAL SERRA DA FERRUGEM............. 305

A VIDA E SEUS MODOS –VISIBILIDADE INSTITUCIONAL DOS IMPACTOS DA USINA HIDROELÉTRICA


DE BELO MONTE SOBRE AS POPULAÇÕES EXTRATIVISTAS DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA
TERRA DO MEIO ............................................................................................................................... 308

O TRABALHO DAS MULHERES NA MANUTENÇÃO DA COMUNIDADE DA ENSEADA DA BALEIA,


LITORAL SUL DO ESTADO DE SÃO PAULO........................................................................................ 313
PRIORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO PRIVADAS
(RPPNS) PARA A CONECTIVIDADE DE FRAGMENTOS PROTEGIDOS NA UNIDADE BIOGEOGRÁFICA
“SERRA DO MAR” (MATA ATLÂNTICA BRASILEIRA) ......................................................................... 318

GT 5. TURISMO E LAZER: CONTEXTO E EXPECTATIVAS FRENTE AOS NOVOS CENÁRIOS


PARA O USO TURÍSTICO DE ÁREAS PROTEGIDAS

O PARAÍSO É PARA TODOS? ACESSIBILIDADE EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO PARA PESSOAS


COM DEFICIÊNCIA ............................................................................................................................ 325

QUESTÕES TERRITORIAIS ENTRE TURISTAS DE MONTANHA E CORREDORES DE AVENTURA NA APA


DA SERRA DA MANTIQUEIRA – SUDESTE DO BRASIL ...................................................................... 330

TURISMO E PROTEÇÃO DA NATUREZA:INTERPRETAÇÃO DOS CONFLITOS NO PARQUE ESTADUAL


DA COSTA DO SOL (RJ, BRASIL) ........................................................................................................ 336

INCLUSÃO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL E O PARQUE ESPAÇO SOLIDÁRIO NO


PROCESSO DE DINAMIZAÇÃO DA ECONOMIA DAS COMUNIDADES LOCAIS .................................. 341

DIA DO MORADOR: ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO COM A COMUNIDADE NO PARQUE NACIONAL


MARINHO DE FERNANDO DE NORONHA......................................................................................... 346

CONSOLIDANDO AS BASES PARA O TURISMO COMUNITÁRIO NA RESEX MARINHA DO PIRAJUBAÉ:


CRIANDO UMA REDE COLABORATIVA DE TBC LOCAL ..................................................................... 352

ESTUDO EXPLORATÓRIO SOBRE O USO TURÍSTICO E DE LAZER DO JARDIM BOTÂNICO DO RECIFE –


PE...................................................................................................................................................... 357

POTENCIAL DO TURISMO DE OBSERVAÇÃO DE MAMÍFEROS MARINHOS NO MUNICÍPIO DE JEQUIÁ


DA PRAIA (ALAGOAS) ....................................................................................................................... 362

VOLUNTARIADO NO PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DOS GUIMARÃES .................................... 367

OBSERVAÇÃO DE AVES EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO: PERSPECTIVAS NO REFÚGIO DE VIDA


SILVESTRE ESTADUAL DA LAGOA DA TURFEIRA .............................................................................. 372

O DESAFIO DA PROMOÇÃO DE GESTÃO INTEGRADA NO PARQUE NACIONAL DO PICO DA NEBLINA377

PARCERIAS PARA O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO EM ÁREAS PROTEGIDAS: UM DEBATE


SOBRE VALORES PÚBLICOS E OS DESAFIOS DA RESPONSABILIZAÇÃO............................................ 382

PERFIL DOS MERGULHADORES RECREATIVOS E IMPACTO ECONÔMICO DA VISITAÇÃO NO REFÚGIO


DE ALCATRAZES - SP: PONTOS DE PARTIDA PARA O FORTALECIMENTO DA EQUIDADE SOCIAL.... 387
TURISMO RESPONSÁVEL EM ÁREAS PROTEGIDAS: CAPACITAÇÃODE CONDUTORES DE VISITANTES
NA APA COSTA DOS CORAIS ............................................................................................................ 392

O TURISMO DE OBSERVAÇÃO DE FAUNA NO PARQUE NACIONAL MARINHO E NA ÁREA DE


PROTEÇÃO AMBIENTAL DE FERNANDO DE NORONHA ................................................................... 397

ENTRE AMAZÔNIAS : O ECOTURISMO NA FLORESTA NACIONAL DO TAPAJÓS E NO PARC


AMAZONIEN DE GUYANE A PARTIR DE UM OLHAR ANTROPOLÓGICO........................................... 402

MAPEAMENTO DOS ATRATIVOS EM TRILHAS DO PARQUE NACIONAL SERRA DA CAPIVARA E


PARQUE NACIONAL SERRA DAS CONFUSÕES – PI ........................................................................... 407

VISITAÇÃO EM TERRAS INDÍGENAS: EXPERIÊNCIAS DE ELABORAÇÃO DO PLANO DE VISITAÇÃO E


REFLEXÕES ACERCA DE SUAS IMPLICAÇÕES.................................................................................... 413

TURISMO E LAZER NO MOSAICO DE ÁREAS PROTEGIDAS DO BAIXO RIO NEGRO – AM ................ 418

NASCE UM DESTINO CHAMADO MILAGRES: ANÁLISE DOS EFEITOS DA INSERÇÃO DA ATIVIDADE


TURÍSTICA EM COMUNIDADES PESQUEIRAS DE PORTO DE PEDRAS E SÃO MIGUEL DOS MILAGRES,
ALAGOAS, BRASIL............................................................................................................................. 423

PESQUISA DE PERFIL DO VISITANTE DO PARQUE NACIONAL DO CATIMBAU, FEITA PELOS


INTEGRANTES DA ASSOCIAÇÃO DE CONDUTORES DE TURISMO DO CATIMBAU (ACONTURC) – 2018428

ALÉM DE PESCADORES ARTESANAIS, AGORA TAMBÉM CONDUTORES DE CAIAQUES OCEÂNICOS


NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE GUAPI-MIRIM (RJ, BRASIL).............................................. 434

DESCRIÇÃO DO PROCESSO DE CAPACITAÇÃO DE MORADORES LOCAIS VISANDO O


FORTALECIMENTO DO TURISMO DE BASE COMUNITÁRIA NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE
GUAPI-MIRIM (RJ, BRASIL) ............................................................................................................... 438

REVITALIZANDO O TURISMO COM CAVALOS-MARINHOS NO PARQUE NACIONAL DE


JERICOACOARA................................................................................................................................. 443

DIÁLOGOS PARA GESTÃO: DIAGNÓSTICO DA CADEIA DE OPERADORES DO TURISMO DE


MONTANHA DO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS....................................................... 448

TURISMO E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL: O CASO DO PARQUE ESTADUAL MATA DO PAU FERRO –


PB ..................................................................................................................................................... 454

PROPOSTA DE UM SISTEMA DE TRILHAS INTERPRETATIVAS PARA O PARQUE ESTADUAL SERRA DO


CONDURU (PESC), BAHIA ................................................................................................................. 459
GT 6. ÁREAS PROTEGIDAS E URBANIZAÇÃO: CENÁRIOS DE MUDANÇAS E A DINÂMICA
DAS CIDADES

ÁREAS PROTEGIDAS E URBANIZAÇÃO: O CASO DA APA DA ILHA DO COMBÚ, BELÉM (PA)........... 466

GRUPO DE TRABALHO AVALIA NECESSIDADES E AÇÕES PARA O ENFRENTAMENTO DO CONFLITO


ENTRE O LOTEAMENTO IRREGULAR ‘VARGEM GRANDE’ E A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E
CULTURAL NO MANANCIAL PAULISTA............................................................................................. 471

O PARQUE ESTADUAL CUNHAMBEBE E A RESERVA BIOLÓGICA TINGUÁ/RJ: UMA PROPOSTA DE


CORREDOR ECOLÓGICO A PARTIR DO GEOPROCESSAMENTO E CONSIDERANDO AS RESISTÊNCIAS DE
USO E COBERTURA DA TERRA............................................................................................................ 478

ANÁLISE ESPAÇO-TEMPORAL DO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DE ZONA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL


DO MUNICÍPIO DO JABOATÃO DOS GUARARAPES/PE .................................................................... 484

OCUPAÇOES EM ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTES(APPs) EM NÚCLEOS URBANOS


CONSOLIDADOS: A EXPERIÊNCIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO NA DEFESA DA
CONCILIAÇÃO ENTRE A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E O DIREITO DE MORADIA DE
ASSENTAMENTOS DE BAIXA RENDA ................................................................................................ 490

“GOVERNANÇA AMBIENTAL DE ÁREAS PROTEGIDAS EM CENÁRIOS DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS: O


CASO DO SISTEMA PRODUTOR DO ALTO TIETÊ, REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO”........ 495

PARQUES URBANOS DO RECIFE: PERCEPÇÃO E VALORAÇÃO DOS SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS ... 500

PERCEPÇÃO AMBIENTAL EM ÁREAS URBANIZADAS: UMA ANÁLISE DO PARQUE NATURAL


MUNICIPAL DE NOVA IGUAÇU E DO BAIRRO DA COREIA EM MESQUITA (RJ) ................................ 505

AVALIAÇÃO DE IMPACTO À SAÚDE NA IMPLEMENTAÇÃO DE UM MOSAICO DE UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO URBANO ................................................................................................................. 510

QUINTAIS QUILOMBOLAS E A SUA RELEVÂNCIA PARA A COMUNIDADE NO CONTEXTO DA


EXPANSÃO URBANA......................................................................................................................... 516

PROJETO “FAVELA-PARQUE”: PROCESSOS PARTICIPATIVOS PARA A INCLUSÃO SOCIAL NO PARQUE


NACIONAL DA TIJUCA....................................................................................................................... 522

AVALIAÇÃO DOS IMPACTOS AMBIENTAIS DA BR-163 EM ÁREAS PROTEGIDAS: ESTUDO DE CASO


DA FLONA DO TAPAJÓS.................................................................................................................... 528

MAPEAMENTO DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DA APA ESTUARINA DO RIO PARATIBE COMO


SUBSÍDIO À SUA DEMARCAÇÃO E CONSERVAÇÃO.......................................................................... 534
GT 7. POLÍTICAS PÚBLICAS, GOVERNANÇA AMBIENTAL E INCLUSÃO SOCIAL EM ÁREAS
PROTEGIDAS

POLÍTICAS PÚBLICAS Y ESPACIOS MARINOS PETROLIZADOS: CRÓNICA MEXICANA DE LA EXCLUSIÓN


PESQUERA ........................................................................................................................................ 540

INTERFACES TERRITORIAIS E PROCESSOS DE GESTÃO EM CURSO ENTRE UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO E TERRAS INDÍGENAS: COMPONENTES DO SISTEMA ESTADUAL DE ÁREAS
NATURAIS PROTEGIDAS DO ACRE.................................................................................................... 546

AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO BIOMA CAATINGA DE CLIMA SEMIÁRIDO: O CASO DO


ESTADO DE PERNAMBUCO .............................................................................................................. 558

OS DESAFIOS DO LICENCIAMENTO DE MANEJO FLORESTAL COMUNITÁRIO NAS UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO, SEGUNDO A LEGISLAÇÃO VIGENTE, NA AMAZÔNIA BRASILEIRA ......................... 565

INCREMENTANDO A INTEGRAÇÃO ENTRE A UNIVERSIDADE E A GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS570

MONITORAMENTO PARTICIPATIVO DA BIODIVERSIDADE: CAMINHOS PARA MOBILIZAÇÃO E


PROTAGONISMO DE ATORES LOCAIS NA GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS NA AMAZÔNIA .......... 575

AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO CONSELHO DELIBERATIVO DA RESEX


DO PIRAJUBAÉ.................................................................................................................................. 580

AGENTE VOLUNTÁRIO AMBIENTAL (AVA): PROTAGONISMO SOCIAL CONTRIBUINDO PARA A


GESTÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO ESTADUAIS DO CEARÁ............................................... 586

A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO AVENTUREIRO, ILHA GRANDE-RJ:


PERSPECTIVAS E DESAFIOS .............................................................................................................. 590

RESTRIÇÕES A PESCA ARTESANAL NO COMPLEXO ESTUARINO DE PARANAGUÁ .......................... 596

A QUALIDADE DA GOVERNANÇA NO ÂMBITO DO CONSELHO GESTOR DA RESEX CHICO MENDES,


ESTADO DO ACRE, BRASIL................................................................................................................ 601

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL: UMA REFLEXÃO SOBRE AS RESERVAS


EXTRATIVISTAS NO BRASIL............................................................................................................... 606

A PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA CONSTRUÇÃO DE ESTRATÉGIAS PARA CONSERVAÇÃO DE


ECOSSISTEMAS MARINHOS E COSTEIROS........................................................................................ 613

SOCIEDADE CIVIL (DES)ORGANIZADA: INCLUSÃO DA COMUNIDADE LOCAL NO CONSELHO GESTOR


DO PARQUE ESTADUAL DO TAINHAS – RS....................................................................................... 618
PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA DEFINIÇÃO DO USO DE IMÓVEIS PÚBLICOS: O CASO DO MIRANTE DO
BOLDRÓ NA APA DE FERNANDO DE NORONHA .............................................................................. 623

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA: A EXPERIÊNCIA DE ELABORAÇÃO DE PLANOS DE


MANEJO EM RECIFE (PE).................................................................................................................. 629

MEMÓRIAS DO RETIRO: O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO TERMO DE COMPROMISSO NO


PARQUE NACIONAL DA SERRA DO CIPÓ.......................................................................................... 635

GOVERNANÇA AMBIENTAL E INCLUSÃO SOCIAL EM ÁREAS PROTEGIDAS ..................................... 640

CONTRIBUIÇÕES DO PLANO DE MANEJO E DO CONSELHO GESTOR EM UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO................................................................................................................................. 645

ANÁLISES DOS PROCESSOS DE CAPACITAÇÃO REALIZADOS NO ÂMBITO DO PROJETO GEF MAR . 650

ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS CERTIFICADOS NO


ESTADO DE PERNAMBUCO .............................................................................................................. 655

INFORMAÇÃO AMBIENTAL SOBRE CONSELHOS GESTORES EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO


RIO GRANDE DO SUL........................................................................................................................ 661

CONHECENDO A PESCA ARTESANAL NA APA COSTA DOS CORAIS: MÉTODOS PARTICIPATIVOS ... 666

FORTALECIMENTO DE LIDERANÇAS E INTEGRAÇÃO REGIONAL: ESTRATÉGIAS PARA QUALIFICAR A


PARTICIPAÇÃO DE PESCADORES ARTESANAIS NA GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO SUL
DO BRASIL ........................................................................................................................................ 672

PEDAGOGIA SOCIAL E DESENVOLVIMENTO PESSOAL E ORGANIZACIONAL COM LIDERANÇAS


COMUNITÁRIAS LIGADAS AO PARNA ABROLHOS E ÀS RESEX CASSURUBÁ E CORUMBAU – ......... 677

A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA GERMINAR EM CARAVELAS, BA ................................................... 677

GESTÃO E PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM UMA RESEX MARINHA: EXPERIÊNCIAS NO DELTA DO


PARNAÍBA......................................................................................................................................... 682

PLANO DE GESTÃO LOCAL DA PESCA DO GUAIAMUM DA RESERVA EXTRATIVISTA DE CANAVIEIRAS,


BAHIA: CONTRADIÇÕES E POSSIBILIDADES ..................................................................................... 687

PARTICIPAÇÃO NO CONSELHO DE GESTÃO DA RESEX DE CANAVIEIRAS ........................................ 692

DESAFIOS DA IMPLEMENTAÇÃO DE MECANISMOS REED+ COMO FINANCIAMENTO PARA GESTÃO


DE ÁREAS PROTEGIDAS NA AMAZÔNIA........................................................................................... 698
GOVERNANÇA NO PARQUE NACIONAL DOS LENÇÓIS MARANHENSES: ANÁLISE DO VOUCHER
DIGITAL NA PERSPECTIVA DO TRADE .............................................................................................. 703

TECENDO REDES: DIAGNÓSTICO DA PESCA PARA ELABORAÇÃO DE TERMO DE COMPROMISSO


COM PESCADORES ARTESANAIS NO PARQUE NACIONAL DE JERICOACOARA................................ 708

INTEGRAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A SEGURANÇA ALIMENTAR PELA CONSERVAÇÃO DA


BIODIVERSIDADE: (RE)ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL DO EXTREMO SUL DO ESTADO DA BAHIA.... 713

DIÁLOGOS DESAFIADORES NA ELABORAÇÃO DO PLANO DE MANEJO DO PARQUE NACIONAL DO


PICO DA NEBLINA............................................................................................................................. 718

PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL COMO FERRAMENTA DE GESTÃO DE UC COM POPULAÇÕES


TRADICIONAIS .................................................................................................................................. 725

PLANOS DE MANEJO DAS ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL MARINHAS DO ESTADO DE SÃO


PAULO E PARTICIPAÇÃO SOCIAL ...................................................................................................... 730

DESAFIOS A GESTÃO PESQUEIRA COMPARTILHADA: CONFLITOS COM A PESCA DE EMALHE NA


APAS MARINHAS DE SÃO PAULO..................................................................................................... 734

ASPECTOS SOBRE A CRIAÇÃO DO CONSELHO DELIBERATIVO DA RESEX MARINHA MESTRE LUCINDO740

PROUCM EM AÇÃO: ESTRATÉGIAS DE INCENTIVO PARA A EFETIVIDADE DAS UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO MUNICIPAIS............................................................................................................ 745

AÇÕES DE ORGANIZAÇÃO E PROTAGONISMO DE MULHERES PESCADORAS NA REGIÃO SUL DO


BRASIL .............................................................................................................................................. 750

GT 8. CULTURA, BIODIVERSIDADE, CONHECIMENTOS TRADICIONAIS E MANEJO


COMUNITÁRIO DO AMBIENTE

QUEIMA EM MOSAICO: COMO O CONHECIMENTO TRADICIONAL ESTÁ CONTRIBUINDO PARA


REDUÇÃO DE INCÊNDIOS NO JALAPÃO, BRASIL .............................................................................. 756

CENTRO DE FORMAÇÃO OLGA BENÁRIO PRESTES – CECAPE: UM LUGAR TRANFORMADOR DE


CONHECIMENTO .............................................................................................................................. 761

AVALIAÇÃO PARTICIPANTE DO POTENCIAL DE PRODUTOS FLORESTAIS NÃO MADEIREIROS NA RDS


DO UATUMÃ, AMAZONAS ............................................................................................................... 766

O MANEJO COMUNITÁRIO DOS RECURSOS NATURAIS E A LUTA PELO TERRITÓRIO NA LOCALIDADE


DE AREAIS DA RIBANCEIRA EM IMBITUBA, SANTA CATARINA - BRASIL.......................................... 771
CONSTRUÇÃO COLETIVA DO PLANO DE USO DOS RECURSOS (CAMARÃO E PEIXES) DA RESEX
PIRAJUBAÉ........................................................................................................................................ 776

REEF CHECK NA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DO CORUMBAU: CIÊNCIA CIDADÃ EXERCIDA


POR PESCADORES LOCAIS ................................................................................................................ 782

PROTAGONISMO SOCIAL NA CONSERVAÇÃO DO PEIXE BOI MARINHO NA RESERVA EXTRATIVISTA


DA BAÍA DO TUBARÃO ..................................................................................................................... 787

CONSTRUÇÃO COLETIVA DE APRENDIZADOS E CONHECIMENTOS NO PROGRAMA NACIONAL DE


MONITORAMENTO DA BIODIVERSIDADE – PROGRAMA MONITORA ............................................. 794

RIQUEZA PERCEBIDA DE AVES E SUA CONSERVAÇÃO NO PARQUE NACIONAL DE SETE CIDADES,


PIAUÍ, BRASIL.................................................................................................................................... 799

ESTRATÉGIAS DE PESCA E PESCADOS EM UMA COMUNIDADE DE PESCADORES DO LITORAL


NORDESTINO.................................................................................................................................... 804

ETNOCONHECIMENTO E MANEJO NA PESCA ARTESANAL DE ARATU NA RESERVA EXTRATIVISTA


MARINHA ACAÚ-GOIANA ................................................................................................................ 808

MONITORAMENTO AMBIENTAL COMUNITÁRIO: PESQUISA-AÇÃO E GESTÃO DO BEM COMUM NA


RESERVA EXTRATIVISTA DE CASSURUBÁ ......................................................................................... 813

CULTIVANDO AS NOSSAS RAÍZES – CULTURA E CONSERVAÇÃO NA RESERVA EXTRATIVISTA


MARINHA DE SOURE ........................................................................................................................ 818

SE FAZENDO DO MAR: TERRITORIALIDADE E CONHECIMENTO TRADICIONAL DOS PESCADORES


ARTESANAIS DE SÃO JOSÉ DA COROA GRANDE, PERNAMBUCO .................................................... 822

CONHECIMENTO ETNOECOLÓGICO DAS COMUNIDADES PESQUEIRAS DE CRUSTÁCEOS NO


NORDESTE BRASILEIRO .................................................................................................................... 827

FLORÍSTICA E FITOSSOCIOLOGIA DA VEGETAÇÃO ARBUSTIVO ARBÓREA NA COMUNIDADE MONTE


ALEGRE, MONTE SANTO, BAHIA ...................................................................................................... 832

REDE DE MULHERES DE COMUNIDADES EXTRATIVISTAS DO SUL DA BAHIA - 10 ANOS DE LUTA.. 838

PROTETORES DA MATA: REPRESENTAÇÃO LOCAL DA CONSERVAÇÃO DE UMREFÚGIO DA MATA


ATLÂNTICA ....................................................................................................................................... 843

O PLANO DE MANEJO DA RESERVA EXTRATIVISTA DE CASSURUBÁ E SUAS ESTRATÉGIAS PARA O


USO SUSTENTÁVEL DO BUDIÃO-AZU E GUAIAMUM....................................................................... 848
CONSTRUÇÃO DE ACORDOS COMUNITÁRIOS COMO INCENTIVO À PRÁTICA DE GESTÃO
COMPARTILHADA NA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DE GURUPI-PIRIÁ ................................. 853

O LUGAR DOS CONHECIMENTOS TRADICIONAIS NO CURSO DE BIOLOGIA.................................... 859

MÉTODOS DE COLETA EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO UTILIZADOS POR PESCADORES DE


CRUSTÁCEOS NA RESERVA EXTRATIVISTA DE ACAÚ-GOIANA NO NORDESTE BRASILEIRO ............ 864

CARACTERIZAÇÃO DA VEGETAÇÃO ARBUSTIVO ARBÓREA NA COMUNIDADE MUQUÉM, MONTE


SANTO, BAHIA .................................................................................................................................. 870

FAUNA ASSOCIADA ÀS RAÍZES DO MANGUE DO RIO GOIANAE SEU USO NA PESCA...................... 876

A COLETA ARTESANAL DO SURURU: DIVERSIDADE DE HABITATS E DE ARTES DE PESCA ............... 881

GT 9. ÁREAS PROTEGIDAS E A QUESTÃO AGRÁRIA

AGROBIODIVERSIDADE DE QUINTAIS AGROFLORESTAIS: PARA ALEM DA PRODUÇÃO


DIVERSIFICADA................................................................................................................................. 885

PNATER E A AGROECOLOGIA: ANÁLISE DE ASSENTAMENTO RURAL EM ÁREA DE CONSERVAÇÃO


NO NORDESTE BRASILEIRO .............................................................................................................. 890

SITUAÇÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL DO ENTORNO DA TERRA INDÍGENA PACHECA, NO SUDESTE


DO RIO GRANDE DO SUL.................................................................................................................. 895
GT 1
Conservação da biodiversidade e
inclusão social em tempos de
mudanças climáticas
Visa discutir relações entre as delimitações das atuais Áreas Protegidas e as
Mudanças Climáticas, no sentido de se refletir sobre essas áreas, suas funções,
objetivos e resultados. Se há, ou não, necessidade de alterações nos seus limites,
uma vez que, por exemplo, espécies podem estar migrando ou virem a migrar
em consequência de mudanças nas condições climáticas globais e locais e, a
partir das alterações na distribuição biogeográfica, com consequências nos
demais elementos físicos e relações bióticas existentes. Ainda é importante
destacar aspectos relacionados à legislação e política ambientais e como estão
considerando o fato das mudanças climáticas afetarem a distribuição geográfica
das espécies, sua consequência nos serviços ecossistêmicos, na dinâmica
socioeconômica e em decorrência, nas populações humanas.

Coordenadores:
Itamar Cordeiro (UFPE)
Marta Irvying (UFRJ)
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DINÂMICA ESPACIAL CIRCADIANA DA GARÇA-VAQUEIRA


(Bulbucusibis)NO ARQUIPÉLAGO DE FERNANDO DE NORONHA
SPATIAL CIRCADIAN DINAMICS OF CATTLE EGRET (Bulbucus ibis) IN FERNANDO DE
NORONHA ARCHIPELAGO

Lucas Penna Soares Santos*, Ricardo Krul***, Patrícia Pereira Serafini**

*Projeto GEF Mar, Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (CEMAVE/ICMBio)/ ICMBio
Núcleo de Gestão Integrada de Fernando de Noronha, Brasil
***Instituto Brasileiro para Medicina da Conservação (Tríade), Brasil
**Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (CEMAVE/ICMBio), Brasil

1. INTRODUÇÃO
A garça-vaqueira (Bulbucus íbis Linnaeus, 1758) apresenta plumagem predominantemente
branca com regiões do tarso, bico e íris amarelados (SICK, 1997).É uma espécie originária do Velho
Mundo, com distribuição ampla na América do Sul, decorrente de processo de migração e ocupação em
todo o continente ao longo do tempo (CROSBY, 1972). Seus hábitos alimentares são, sobretudo,
insetívoros evários relatos reconhecem o caso da suaexplosão populacional, em função do uso
econômico territorial para exploração pecuária e áreas de pastagem (GASSET et al., 2000).
Um registro relevante sobre a história natural de B. íbis é o seu comportamento gregário para
forrageamento e repouso (VINCENT, 1974; SICK, 1997),inclusive Browder (1973) nota que locais
diferentes são utilizados para estes dois tipos de comportamentos em uma mesma população.No
entanto, apesar de informações existentes sobre a migração desta espécie no território Sul-americano, o
padrão de deslocamento da espécie ainda é pouco conhecido ealguns trabalhos indicam seu potencial
impacto negativo sobre espécies nativas em consequência da sua ocupação oportunista, em conjunto
com a degradação de ambientes naturais (BENNETS et al., 2000; RIBEIRO; MELO-JR., 2011).
O arquipélago de Fernando de Noronha é marcado historicamente por diversas alterações
humanas em todo o seu território, sendo a retirada da vegetação primária da ilha e a produção de gado
por antigos moradores fatores de mudanças antrópicas que refletem negativamente até os dias atuais
neste ambiente insular (SOUZA; VIEIRA FILHO, 2011). Em associação, a dispersão de B. ibispela
região Neotropicaltambém atingiu o arquipélago de Fernando de Noronha e, diante o processo de
antropização da ilha,a sua expansão populacional também é estimulada (SILVA, 2008).
Fernando de Noronha, territorialmente delimitado por duas Unidades de Conservação (Área de
Proteção Ambiental e Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha), é conhecida como a ilha
oceânica do Atlântico Sul com maior diversidade de aves, sendo registradas atualmente 17espécies
residentes e 58 migratórias (SILVA, 2008). A importância do local para regulação de sistemas naturais é
destacada, principalmente, pela grande quantidade de aves marinhas presentes no arquipélago e todo o

22
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

contexto ecológico que este grupo animal carrega em sua história natural (Important Bird Area BR234;
HARRINSON, 2000; BIRDLIFE INTERNATIONAL, 2009).
Dessa forma, através deste estudo sobre a dinâmica espacial circadiana da garça-vaqueira entre
diferentes ambientes do arquipélago de Fernando de Noronha, registramos um caso relevante sobre o
deslocamento desta espécie, levando em consideração, sobretudo, áreas geograficamente próximas com
contextos ambientais contrastantes e interligados.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O atual trabalho foi realizado no arquipélago de Fernando de Noronha, região equatorial
(3º51'13″S, 32º25'25″O), localizada a 540 km de Recife, pertencente ao estado de Pernambuco, Brasil.
No total, são 17 km² deárea terrestre da ilha principal, mais o conjunto de 21 ilhas secundárias,
enquadrados na fitofisionomia de Mata Atlântica Insular, clima Aw e temperatura média de 26.7°C.
Indivíduos de Bulbucusibis foram identificados por censo visual, com auxílio de binóculos
(Nikon Monarch® 10x42m), com umacoletapor semestre nos meses de outubro de 2018 e maio de
2019. Considerando os hábitos comportamentais de B. ibis, foram consideradas duas áreas e dois
horários distintos para registrode indivíduos: A) Zona Urbana da Área de Proteção Ambiental de
Fernando de Noronha (APAFN): subdividida em três pontos de amostragem: I) Aeroporto; II) Usina de
tratamento de lixo e; III) Rodovia BR-363 (sentido Sueste-Porto); Para os dois primeiros pontos, foi
utilizado o método de contagem de indivíduos e, para o terceiro, o método de contagem em transecto;
Horário de amostragem: 06h50m às 07h30m (busca ativa de recursos e forrageamento por B. ibisnas
regiões de maior grau de antropização da ilha principal);B) Parque Nacional Marinho de Fernando de
Noronha (PARNAFN); subdivido em duas regiões amostrais: i) Ponta do Air-France (ponto de
deslocamentode B. ibisem direção à Ilha secundária Sela Gineta) e; ii) Praia do Sueste (ponto de
deslocamento de B. ibisem direção à Ilha Cabeluda); Para ambos locais, foi utilizado o método de
contagem em dormitório; Horário de amostragem: 17h20min às 18h30min (retorno das aves para áreas
de repouso nas ilhas secundárias).
Todos os indivíduos de garças-vaqueiras avistados foram registrados durante as campanhas
realizadas e, adicionalmente, foirealizada uma saída embarcada em maio de 2019 para a contagem de
ninhos ativos desta espécie, possibilitando maior proximidade nas ilhas secundárias citadas neste estudo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Totalizando 21km e 12h46min de observação, foram registradas as médias totaisde 104
indivíduos de Bulbucus íbis para a região A(APAFN), e 350 espécimes em direção à Ilha Cabeluda e 42
à Ilha Sela Gineta, ambas localizadas na região B (PARNAFN) (Tabela 1). Estes foram caracterizados
como os principais pontos de agrupamentos desta espécie no arquipélago de Fernando de Noronha,
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

confirmando a utilizaçãodas localidades da Zona Urbana da APAFNpara as atividades de forrageio edas


ilhas secundárias do PARNAFN para o deslocamento circadiano das aves e a aglomeração de
indivíduos para pernoitar nestes sítios derepouso.

Tabela 1 –Número de indivíduos de garça-vaqueira registrado por localidade


Nº de Nº de
Data Localidade Data Localidade
indivíduos indivíduos

APAFN PARNAFN
13/10/18 Aeroporto 27 05/10/18 Praia do Sueste 358
14/10/18 Aeroporto 31 12/10/18 Praia do Sueste 365
15/10/18 Aeroporto 46 14/10/18 Praia do Sueste 329
13/10/18 Rodovia BR-363 19 02/10/18 Air France 42
14/10/18 Rodovia BR-363 16 05/10/18 Air France 47
15/10/18 Rodovia BR-363 12 12/10/18 Air France 37
13/10/18 Usina de Tratamento do Lixo 61 19/05/19 Praia do Sueste 248
14/10/18 Usina de Tratamento do Lixo 59 27/05/19 Praia do Sueste 264
15/10/18 Usina de Tratamento do Lixo 43 27/05/19 Air France 24
Fonte: dados da pesquisa.

Durante a saída embarcada para contagem de ninhos, foi verificado apenas um ninho ativo de B.
íbis em maio de 2019, relatado na Ilha Cabeluda. Interessante notar que, em conjunto da aglomeração de
garça-vaqueira, foram observados vários indivíduos de atobá-marrom (Sula leucogaster) e de fragata
(Fregatamagnifiscens), sem ninhos ativos nesta mesma localidade.
As ilhas secundárias do PARNAFN citadas neste trabalhosão áreas importantes para o abrigo de
grande quantidade de aves marinhas residentesdeste arquipélago, locais os quais também éobservadaalta
ocorrência de atividade reprodutiva com ninhos ativos de espécies, como o rabo-de-junco-de-bico-
amarelo (Phaethonlepturus) e o atobá-de-pé-vermelho (Sula sula) (obs. pess.; SILVA, 2008). Deste
modo, a competição interespecífica causada por B. ibispode ser um fator de diminuição destas espécies
residentes e pode agravar em impactos negativos nos seus limites de ocorrência e na sua ecologia
comportamental. Em especial, aves marinhas são grupos sensíveis às mudanças ambientais e podem
abandonar facilmente áreas de nidificação (YORIO et al., 1994).
No caso, a modificação histórico-espacial da ilha principal de Fernando de Noronha por áreas
abertas e de ocupação humana intensa é um fator que afeta suas proximidades, sobretudo quando
consideramosas delimitações das UCs locais e um zoneamento ambiental com limites bruscos entre
áreas antrópicas e de conservação da natureza. Naturalmente, espécies que possuem biogeografia ampla,
que se dispersam facilmente e que apresentam hábitos de alta adaptabilidade, como o exemplo da garça-
vaqueira, se beneficiamdiante as alterações humanas e, por outro lado, espécies de maior sensibilidade

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ambiental são fragilizadas em sua estrutura ecológica, incluindo as mudanças em seus hábitos, dos
locais que vivem e suas interações com outras espécies.

4. CONCLUSÃO
A dinâmica da garça-vaqueira entre áreas diferentes do arquipélago de Fernando de Noronha
mostra que os hábitos de rotina desta espécie são relacionados com a presença humana local. Sua
expansão populacional é afetada positivamente também por este fator, tendo em vista que inventários
antigos de B. ibis no arquipélago registraram poucos indivíduos na ilha, como exemplo de Antas et al.
(1990) que observaram apenas 12 indivíduos no ano de 1987, em comparação com o recente estudo que
relata a média total de 403 indivíduos nos sítios de repouso em 2018.
O território de Fernando de Noronha vem sendo modificado ao longo dos anos e especialmente
na Zona Urbana da APAFN atendência da exploração humana éaumentar. Tal localidade é um destino
turístico altamente visado e o número de visitantes já se encontra em uma quantidade extrapolada
conforme a infraestrutura presente na ilha principal (SOUZA; VIEIRA FILHO, 2011).
Avaliações que inter-relacionam o uso e ocupação do território com a dinâmica de espécies, a
exemplo da utilização espacial circadiana de B. ibis se tornam úteis para refletir nas mudanças que
ocorrem ao longo do tempo. Tais estudos se tornam essenciais para referenciar o status da qualidade
ambiental de áreas protegidas, que se encontram em cenários de grandes mudanças ambientais.

5. REFERÊNCIAS
ANTAS, P.T.Z; FILLIPINI, A.; AZEVEDO JUNIOR, S.M. Anilhamento de aves-oceânicas e/ou
migratória no arquipélago de Fernando de Noronha em 1987 e 1988. In: Anais do IV Encontro
Nacional de Anilhadores de Aves, Pernambuco, 1990.

BENNETS, R.E.; FASOLA, M.; HAFNER, H.; KAYSER, Y. The Influence of environmental and
density-dependent factors on reproductive parameters of Little Egrets in the Camargue, south France.
Auk, 117, 634-639, 2000.

BIRDLIFE INTERNATIONAL.Designing networks of marine protected areas: exploring the


linkages between Important Bird Areas and ecologically or biologically significant marine
areas. Cambridge, BirdLifeInternational, 2009.

BROWDER, J.A. Long distance movements of Cattle Egrets.Bird Banding 44 (3): 158-170, 1973.

CROSBY, G. T. Spread of the Cattle Egret in the western hemisphere. Birds-Banding43 (3), 205-
212, 1972.

GASSET, J.W.; FOLK, T.H.; ALEXY, K.J.; MILLER, K.V.; CHAPMAN, B.R.; BOYD, F.L.;
HALL, D.I. Food habits of Cattle Egrets on St. Crolx, U.s. Virgin Islands.Wilson Bulletin, 112 (2),
268-271, 2000.

HARRINSON, P. Seabirds, anidenficationguide. Christopher Helm, London, 2000.


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RIBEIRO, M.D; MELO JUNIOR, T.A. Dinâmica Populacional de Garças-Vaqueiras (Bubulcusibis;


Ciconiiformes: Ardeidae) no Nordeste do Estado de São Paulo. Revista de Biociêcias da
Universidade de Taubaté2 (7),2-2011.

SICK, H. Ornitologia Brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1997.

SILVA, R.S. Aves de Fernando de Noronha. Vinhedo: Avis Brasilis, 2008.

SOUZA, G.M.R.; VIEIRA FILHO, N.A.Q. Impactos socioculturais do turismo em comunidades


insulares: um estudo de caso no arquipélago de Fernando de Noronha-PE. Observatório de Inovação
do Turismo4 (5), 1-18, 2011.

VINCENT, J. Habits of Bulbucus ibis, the Cattle Egret, in Natal.Ibis, 89 (4), 489-491, 1947.

YORIO, P.; QUINTANA, F.; CAMPAGNA, C.; HARRIS, G. Diversidad, abundancia y


dinamicaespacio-temporal de lacoloniamixta de aves marinas enPunta Leon, Patagonia. Ornitologia
Neotropical, 6 (2), 69-77, 1994.

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MELIPONICULTURA: BASE TEÓRICA PARA UMA SENSIBILIZAÇÃO


AMBIENTAL
MELIPONICULTURE: TEORIC BASE FOR ENVIRONMENTAL AWARENESS

Tiago Grespan*, Patrícia Denkewicz**

Programa de Pós-Graduação em Ciências Florestais, Universidade Estadual do Centro-Oeste, Brasil. *


Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Universidade Federal do Paraná, Brasil. **

1. INTRODUÇÃO
Há 20 milhões de anos atrás, os meliponíneos, também conhecidos como abelhas indígenas
sem ferrão, já produziam e estocavam mel (MAGALHÃES, 2009). Em escala global, estes
pequenos insetos apresentam distribuição nas regiões tropicais e subtropicais, sendo o continente
americano um centro de diversificação das espécies (MICHENER, 2007). Atualmente são
conhecidas 417 espécies de meliponíneos no mundo (CAMARGO; PEDRO, 2013) e, dentre elas,
cerca de 300 espécies ocorrem no Brasil (SILVEIRA et al., 2002).
Em termos gerais, as abelhas sem ferrão são um grupo funcional relevante pelo seu papel
nos ecossistemas como polinizadores, principalmente de espécies nativas (KEARNS et al., 1998).
No entanto, diversos processos de transformação e degradação ambiental como a conversão do uso
do solo, utilização de pesticidas, introdução de espécies exóticas, entre outros, geram
desestabilizaçãonas populações de abelhas e, consequentemente, prejudicam os serviços ecológicos
que elas prestam (FREITAS et al., 2009; POTTS et al., 2010; TAKI et al., 2007). Diante disso, este
trabalho busca investigar o papel da meliponicultura como agente de mudança na sociedade, com
viés ambiental, social e econômico.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho possui uma abordagem qualitativa exploratória por meio de uma revisão
de literatura especializada como ferramenta de pesquisa, uma vez que esse estudo pretende
investigar a meliponicultura como ator de mudanças da sociedade nos diferentes níveis.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
A criação de abelhas nativas sem ferrão é uma prática tradicional, profundamente arraigada
principalmente em localidades rurais do Brasil (JAFFÉ, 2012). No entanto, devido à exploração
predatória das florestas, as populações de abelhas nativas sem ferrão têm sofrido grandes impactos
negativos, visto que elas se utilizam das árvores para nidificação (VENTURIERI, 2009). Além da
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

exploração predatória das florestas, a exploração predatória do mel das abelhas sem ferrão tornaas
possibilidades de sobrevivência das colmeias praticamente nulas, a partir do momento que as
estruturas internas das colmeias são destruídas e as famílias ficam à mercê de predadores como
formigas e forídeos (OLIVEIRA et al., 2013).
Segundo Pinto (2007), a meliponicultura pode ser considerada uma estratégia eficaz para o
preenchimento da lacuna existente no estabelecimento de um modelo para o uso racional dos
recursos naturais em áreas naturais protegidas. Entretanto, segundo o autor, percebe-se a
necessidade de políticas públicas que subsidiem esta atividade, como ocorre com a apicultura.
ParaKerret al. (1996), devido ao hábito alimentar, as abelhas desempenham uma importante
função na natureza denominada polinização, que garante a produção de frutos e sementes, fazendo
delas peça chave nos ecossistemas que habitam. Desempenhando a atividade de polinização, as
abelhas são responsáveis pela reprodução e fluxo gênico de inúmeras espécies vegetais, fazendo
valer os esforços para seu conhecimento e preservação (KRUG; ALVES DOS SANTOS, 2008).
Para Imperatriz- Fonseca et al. (2012), aproximadamente 250 espécies vegetais podem ser
adaptadas à polinização por abelhas nativas sem ferrão, como: o morango (Fragaria x ananassa), o
café (Coffeaarabica), o pepino (Cucumissativus), o guaraná (Paullinia cupana), a manga
(Mangifera indica), a melancia (Citrulluslanatus), o coco (Cocus nucifera), a carambola (Averrhoa
carambola), o sisal (Agave sisalana), o cupuaçu (Theobromagrandiflorum), entre outras espécies.
Além disso, mais de 30 mil espécies vegetais nativas do Brasil tem potencial para o suprimento de
néctar e pólen para as abelhas.
Além disso, de acordo com Nogueira et al. (2016), a meliponicultura se apresenta como
alternativa que propõe minimizar o processo de êxodo rural, mantendo o homem do campo no meio
rural, por meio da promoção da produção de bens de consumo e preservação ambiental. Ainda, a
meliponicultura possibilita à pequenos produtores rurais uma melhoria na qualidade de vida e
desenvolvimento sustentável da região.
Dentre outros benefícios sociais, o consumo de mel de abelhas nativas com fins medicinais é
uma prática secular que auxilia principalmente no combate a doenças pulmonares, infecção dos
olhos e falta de apetite (SOUZA et al., 2004). Rao et al. (2016) apresentaram diversos estudos que
comprovam as propriedades antiinflamatórias, antimicrobianas, antidiabéticas, anticancerígenas,
antioxidantes e cicatrizantes do mel de abelhas nativas.
Outro impacto positivo da meliponicultura é o desenvolvimento local, pois pode ser
considerada uma estratégia para agricultores familiares enfrentarem as dificuldades de produção
relacionadas à falta de recurso externo, uma vez que possibilita o uso múltiplo de recursos
provenientes do próprio agroecossitema (WOLF et al., 2009). Desta forma, Oliveira et al. (2013),
refere-se à meliponicultura com um grande potencial de geração de renda, devido à produção de
28
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

mel, cera e própolis, além de seus serviços ambientais, que são elementos chaves para conservação
ambiental, especialmente pelos serviços prestados na polinização de plantas nativas e cultivadas.
Para Santo et al. (2016), a meliponicultura desenvolvida em comunidades quilombolas no
sertão paraibano promovem a sustentabilidade local, por meio do estímulo da criação de abelhas
sem ferrão, garantindo a polinização de espécies nativas e de plantações, assim como ajudando a
reduzir o desmatamento e os danos ao meio ambiente. Pinto et al. (2013), verificaram uma intensa
rede de apoio social mantida pelas mulheres por meio da meliponicultura, onde a existência desta
rede permite às mulheres circulação em vários contextos, bem como a interação entre as pessoas de
outros microssistemas de modo adaptado e com equilíbrio nas relações de poder, proporcionando a
possibilidade de terem sucesso na execução da atividade.
Como atividade econômica, a meliponicultura pode ser desenvolvida de forma secundária
dentro da propriedade, visto que o manejo se faz periodicamente, ainda, os produtos oriundos da
meliponicultura apresentam elevado valor agregado e a produção não exige grandes investimentos
(NOGUEIRA et al., 2016).Além disso, a meliponicultura contribui para o aumento da produção de
alimentos e, consequentemente, aumento da renda dos agricultores por meio da comercialização de
mel e outros subprodutos. Em contrapartida, a maior diversidade de espécies cultivadas em
agroecossitemas contribui no aumento de alimentos e perpetuação dos meliponíneos (GEMIN;
SILVA, 2017; CARVALHO-ZILSE et al., 2007).
Ademias, embora as abelhas nativas produzam menos mel em comparação às Apisspp.
(abelhas com ferrão), o mel de abelhas nativas pode atingir em algumas regiões do país e
dependendo da espécie até sete vezes o valor do mel destas últimas, que em média custa R$ 30,00.
Entretanto, um dos grandes desafios da atividade é transpor a barreira da informalidade, a qual é
subexplorada, principalmente em função da escassez de conhecimento técnico e de práticas de
manejo padronizadas(GEMIN; SILVA, 2017). Neste sentido, a capacitação técnica, além de
auxiliar na resolução desse desafio, poderá promover a sensibilização ambiental, uma vez que
possibilitará a compreensão sobre a importância da biodiversidade o que consequentemente
incentivará a conservação de várias espécies nativas (MAIA, 2015).

4. CONCLUSÃO
Por meio dos trabalhos revisados neste estudo para avaliar o papel da meliponicultura como
agente de mudança na sociedade foi possível detectar que a meliponicultura se apresenta como uma
atividade que desempenha múltiplas funções, dentre elas: a ambiental, promovendo a conservação
de ambientes naturais, garantindo o fluxo gênico de espécies vegetaise, principalmente,
possibilitando a conservação das espécies de abelhas nativas; a social, agindo como minimizador do
processo de êxodo rural, a partir da promoção de bens de consumo, também, promovendo a
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

inclusão participativa da mulher nos diferentes níveis da atividade e, ainda, considerando as


propriedades medicinais que os meles podem contribuir para a saúde de quem o consome; e
econômico, por meio do aumento da produtividade em ambientes naturais e cultivares,
principalmente em agroecossistemas, viabilizando a diversificação de renda de pequenos produtores
rurais, a partir dos múltiplos produtos.

5. REFERÊNCIAS

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO RIO


MADEIRA VEM SENDO AFETADA GRADATIVAMENTE PELAS SUBIDAS
DAS ÁGUAS PRECIPITADAS
MADEIRA RIVER SUSTAINABLE DEVELOPMENT RESERVE HAS BEEN AFFECTED
GRAVELALLY BY THE RISE OF PRECIPITATED WATER

Michelle Andreza Pedroza da Silva *; Carlos Augusto da Silva**; Henrique dos Santos Pereira***

(*)Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia da


Universidade Federal do Amazonas, Brasil; (**) Doutor em Sociedade e Cultura na Amazônia pela Universidade de
Brasília da Universidade Federal do Amazonas, Brasil, Doutor em Ecologia pela Pennsylvania State University, (***),
Professor titular do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade da Universidade Federal
do Amazonas, Brasil.

I. INTRODUÇÃO
A propositura deste texto tem por parâmetro descrever por meio de etapa de campo como os
eventos climáticos extremos a partir da percepção da subida d´águas do Rio Madeira no munícipio
de Novo Aripuanã-Amazonas, vem contribuindo para mudar a comunidade de um lugar a outro e
além de prejudicar o sistema de cultivos queé a base da dieta alimentar dos moradoresda região do
médio Rio Madeira.
No final de 2013 e início de 2014os eventos hidrológicos extremos foram sentidos pelas
populações que se encontram ao longo das margens do rio Madeira com a subida das águas que
ocorreu nos meses de novembro a abril, onde atingiu a marca histórica de 28,88 metros, quando a
enchente terminou acarretou mudanças significativas nas casas, assoalhos e paredes onde foram
literalmente soterradas pelo processo de formação das camadas de solo em decorrência da cheia
histórica. Este evento hidrológico considerado extremo provocou danos socioeconômicos e
ambientais, o destaque vai para toneladas de sedimentos suspensos e depositados em forma de
dunas, vários moradores observaram que durante as enchentes daquele ano, alguns locais
adquiriram acúmulo exacerbado daquilo que eles denominam de aterro.
Assim, para avaliar os eventos foramobtidas informações por meio dos comunitários para
indicar os pontos que mais foram afetados. A metodologia foi abrir escavação em níveis
controlados com o objetivo de verificar o procedimento de sedimentação das casas e do ambiente.
Ao final, da escavação verificou-seque as fortes correntezas levaram camadas de areia muito
finapara estas localidades, observou-se a mudanças de temperatura e a ausência de água neste novo
solo depositado, as vegetações estão perdendo a cor verdade para cinza-claro, pode-se notar que as

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árvores estão morrendoem consequência das areias quentes da várzea, nessas mediações do
município.
2. MATERIAL E MÉTODO
O Rio Madeira, a partir da cachoeira de Teotônio até sua formação em que os rios Bene e
Mamoré ambos vêm do Bolívia. E na altura de Nova Mamoré em Rondônia e uma estação de base
militar da Bolívia, que forma o extenso e volumoso Rio Madeira. Nas duas margens (N-S) há uma
gigantesca paisagem com infinidades de árvores, dentre elas a castanheira (Bertholletia excelsa),
sumaúma (Ceiba pentandra), e as espécies típicas de várzea:: imbaúba (Cecropia pachystachya),
cajurana (Anacardium Nanum), capitari (Couralia Toxophora ), tarumã (Vitex megapotamica),
pupunharana (Duckeodendron cestroides). Essasárvores são importantes para a adieta alimentar dos
peixes, no período da cheia e de todos os pássaros que consomem as sementes e também são os
dispersores nas imensasáreas do Rio Madeira, outro dado importante é que essas árvores são como
um grande coração em que suas raízes funcionam como veias que se comunicam, por exemplo, as
volumosas raízes da sumaúma são abrigos de cacas de às vezes do homem, quando realizada a
coleta de frutos em área de várzeas. Conduto, as subidas bruscas d’águas na comunidade São
Sebastião da Boca do Taciuá em Novo Aripuanã – Amazonas perturbou sensivelmente as relações
dos comunitários, nos aspectos econômicos, sociais e culturais.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
A comunidade do Rio Madeira em Novo Aripuanã segue um ritmo que é pouco diferente de
área urbana. Ela se depara anualmente com as duas estações de subida e descida do rio isto, se deve
pelo fato da comunidade está a margem Norte do Rio Madeiraque é cortada paraná do Lago Taciuá,
este paraná no período da cheia faz a comunicação com as demais comunidades que ficam ao lago
homônimo e nos demais lagos outras comunidades. Wagley (1988) demonstra que uma das
características das comunidades na Amazônia, são os laços culturais e econômicos realizados de
formas circulares. De acordo com Fraxe (2010) as circularidades acontecem quando há eventos de
festejos nas quais as demais comunidades das áreas do em torno da comunidade do Taciuá se
relacionam. É nesse momento, que ocorrem as trocas de informações. Em 2013, durantes os festejos
do padroeiro da comunidade do Taciuá, que veio as primeiras observações que as cheias estavam
alterando o lugar Tuan (2013), as casas principalmente, o centro social, sua estrutura de madeira, e
entabuamento serem de ribas entrelaçadas por cerva de 15m de comprimento. E, o acesso ao
interior do centro, por meio de uma escada de madeira. E, durante a subida d´águas a correnteza
associado a pequenos fragmentos de madeira e mais o solo que foi sendo reunidos durantes os três
meses de pico da cheia, o assoalho cedeu, produzindo uma expeça camada de solo sobreas tábuas
do assolha. Mas, todavia, por meio de ajuri os comunitários do Taciuá, conseguiram reorganizar a

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estrutura do centro social e das casas que também ficaram com suas estruturas ameaçadas pela forte
correnteza.
Em 2014, a subida d´águas atingiram níveis até então, desconhecida pelos comunitários. As
fortes correntezas se efetivaram nas duas primeiras semanasdo mês de janeiro, a subida d´águas
foram tão acelerado quede costumes dos comunitários produzirem estruturas de madeiras para
acondicionarem os feixes de manivas, as mudas de bananeiras,os canteiros contendo a cebolinha, o
cheiro-verde, as pimentas, em fim tudo que havia em torno das casas em relação aos cultivos foram
levados pela forte correnteza. E, após os meses de maio, junho, julho e agosto a várzea voltou os
aspectos paisagístico, só que as fortes correntezas haviam soterrado as casas acerca de 1,50m.
A solução que os comunitários encontraram foram de realizar escavações para
desenterrarem todas as oito casas que seguiam uma arquitetura paralela à margem esquerda do Rio
Madeira. E, após as escavações por meio de intensos ajuris os comunitários elegeram outro lugar
para erguerem as casas, desta vez, algumas casas o madeiramento pouco foi aproveito, haja vista
que as correntezas destruíram algumas madeiras, principalmente os esteiros e os barrotes.
A nova comunidade São Sebastião da Boca do Taciuá foi reinstalada na margem direita do
paraná do Taciuá, todavia, mantendo o mesmo patrão anterior das casas que foram soterradas pelos
solos conduzidos pelas águas da cheia do Rio Madeira. E, esse novo lugar é estratégico, pois, os
demais comunitários daquela localidade se servem dele para acessarem suas comunidades. Este
local é importante pois, serve como centro de entrepostos de vendas de produtos orgânicos que vem
das demais comunidades existentes no lagodo Taciuá e adjacentes. No sentido de testar o processo
de soterramento da comunidade foi realizada uma escavação no local onde identificamos com a
“casa do biscoito”1. O caminhamento metodológico em que se adotou foi se descolocar até a
comunidade e realizar conversas informais aos comunitários. E, após as conversas foram solicitados
aos gêneros masculino e feminino, para que levasse os pesquisadores, até as antigas ruínas da
comunidade. E assim, foi contemplado, que uma a moradora faria o processo de condução até a
antiga comunidade, haja vista, que atualmente, os comunitários devido à ausência ou total carência
de plantar ou praticar a agricultura familiar acarretou que todos os comunitários do Taciuárealizem
a travessia pela manhã da cidade de Novo Aripuanã para a comunidade, ao cair da trade retornam à
cidade. Isto está literalmente, associado à falta de produtos que costumeiramente eram produzidos
nas baixadas d’águas do Rio Madeira.

1
A casa do biscoito era uma pequena construção de madeira, local aberto com chão batido, não possuía paredes, era envolvida sobre
esteios conhecido como barrote, com 2 m de altura, e 1 mde profundidade cavado no solo - padrão na construção da várzea, era
coberta com lona preta, o lugar servia como espaço destinado a confecção e produção de biscoito/bolo, as pessoas se reuniam não só
para fazer a produção como também para reforçar os laços de parentesco e de amizade ali existente.O forno a lenha apresentava um
formato arredondado, com uma pequena abertura na parte da frente, é construído com barro e madeira sobre um jirau suspenso do
assoalho, embaixo do forno era armazenada a lenha.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O caminhamento foi guiado pela moradoraque levou os pesquisadores nas instalações


soterradas. Após o caminho guiadofoi realizado uma escavação com as seguintes dimensões de
1mx50cm. A escavação foi em níveis artificiais ou regulares, pois se desceua cada 20 cm até ao
nível de 100 cm. Numa tentativa de recolher resíduos orgânicos que porventura tivessem sido
soterrados pelo processo de sedimentação da subida da água do Rio Madeira. Assim, a cada 20 cm,
era peneirado o solo numa peneira de 2 mm, porém, após o último nível de escavação, não foram
recolhidos nenhuma semente, todavia, só havia minúsculas raízes em estado de decomposição.
Essas características das raízes em estágios de decomposição podem estar associadas ao processo de
mudança na temperatura, pois, nos meses de julho a setembro o correm o período de seca do Rio
Madeira. E, a escavação demostrou que as camadas de soterramento da comunidade, atingiram
nível de 1,20cm na antiga casa do biscoito, em que apresentava uma ligeira depressão, no entanto,
na área que era mais elevada, o nível de soterramento foi de 1,60m.

Figura1.Escavações por níveis artificiais na antiga casa do biscoito.

Fonte: Pesquisa de campo, 2019.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A percepção via o processo de caminhamento guiado e mais o processo de abertura de
escavação nas antigas ruínas da comunidade São Sebastião da Boca do Taciuá em Novo Aripuanã –
Amazonas. Possibilitou-se que os eventos climáticos vêm contribuindo para que as espécies de
árvores que contempla o bioma da margem Norte do Rio Madeira e a Sul do paraná do Taciuá
estejammorrendo em decorrência as consequências dos eventos hidrológicos extremos. E, o
aterro,acarreta profundo prejuízos aos comunitários, pois, devido os pacotes de soterramento, e com
as mudanças climática vêm provocando total dependência dos comentários em relação aos produtos
industrializados (latas de conserva e de sardinha), pois, em plena seca do Rio Madeira, os
comunitários não têm um jerimum ou uma macaxeira para adicionar na dieta alimentar, a solução é
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

tentativa cultivar produtos orgânicos, porém, devido a areia escaldante, a estratégia é plantar a
maniva no sentido vertical, seja uma prática de cultivo, que talvez esteja ancorado na
ancestralidade,e está sendo invertida no sentido de se manter no lugar e produzir alimentos.
Por fim, os moradores que praticam a agricultura familiar possuem acesso limitado a
recursos financeiros, indiretamente, eventos hidrológicos extremos, associados a dificuldades
econômicaspodem levam ao deslocamento desses moradores para outras áreas como as grandes
cidades. De acordo com Pereira et al., (2017) se os moradores da várzea não forem capazes de
perceber que seus sistemas de produção tradicionais estão em risco por causa da intensificação de
eventos hidrológicos extremos e não anteciparem um cenário futuro de mudanças no clima, essas
comunidades não serão capazes de espontaneamente desenvolver novas respostas adaptativas que
tornem esses sistemas de produção mais resistentes ou resilientes.

5. AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Pós-graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia –


PPG-CASA e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, que
possibilitou o acesso a Unidade de Conservação para a realização da pesquisa.

6. REFERÊNCIAS
FRAXE, Terezinha de Jesus. Pinto. Cultura Cabocla-Ribeirinha: Mitos, lendas e
Transculturallidade.2.ª edição, São Paulo: Annablume, 2010.

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WAGLEY, Charles. Uma Comunidade Amazônica: estudo do homem nos trópicos. Tradução de
Clotilde da Silva Costa. 3ª ed. Belo Horizonte: Itatiaia: São Paulo, 1988.

PEREIRA, H. S.; SILVA, S. C. P.; GUIMARAES, D. F. S.; VASCONCELOS, M. A. Os impactos


dos eventos hidrológicos extremos e a governança ambiental: estudo sobre a assiduidade dos alunos
no distrito de terra nova, careiro da Várzea/AM. Revista Terceira Margem Amazônia, v. 2, p.
126-139, 2017.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

VULNERABILIDADE DAS POPULAÇÕES HUMANAS DA MATA


ATLÂNTICA COSTEIRA FRENTE A EVENTOS CLIMÁTICOS
EXTREMOS: UM ESTUDO DE CASO EM PARANAGUÁ-PR
VULNERABILITY OF HUMAN POPULATION OF THE COASTAL ATLANTIC FOREST IN
EXTREME CLIMATE EVENTS: A CASE STUDY IN PARANAGUÁ-PR

Fernanda de Souza Sezerino*, Liliani Marilia Tiepolo**

*Msc. em Desenvolvimento Territorial Sustentável, docente do Instituto Federal do Paraná - Campus Paranaguá,Brasil.
f.sezerino@gmail.com,
** Doutora em Ecologia, docente da Universidade Federal do Paraná - Setor Litoral, Brasil. litiep@yahoo.com

1. INTRODUÇÃO
As zonas costeiras brasileiras estão sendo afetadas pelas mudanças climáticas de maneira
significativa. As tendências para o litoral do Paraná são o aumento das temperaturas entre 2,1 a
3,1ºC, aumento dos dias secos, queda do volume de chuvas em torno dos 10% (CHANG; GARCIA,
2018), porém, com maior intensidade (GOURDAR; PAULA, 2016).
Apesar deste cenário, o Litoral do Paraná carece de estudos sobre os impactos das mudanças
climáticas na região e a vulnerabilidade humana frente aos eventos climáticos extremos. Ao mesmo
tempo, a região está sendo projetada e consolidada como um polo industrial do país, com diversos
empreendimentos portuários, industriais e de infraestrutura implantados ou em licenciamento
ambiental (SILVA et al. 2016). Paralelamente, o crescimento demográfico é significativo,
alcançando a soma de 12% em comparação ao último censo em 2010 (IBGE, 2019).
A região possui diversas Unidades de Conservação que protegem os ecossistemas locais e
seus serviços ecossistêmicos, contudo, a maior parte delas (em área) é de Uso Sustentável e não
possuem uma efetividade na gestão (PAULA et al. 2018). Além disso, o entorno têm sofrido
pressão da expansão urbana, com a formação de periferias em suas zonas de amortecimento, como é
o caso do município de Paranaguá, foco desta pesquisa. Diante deste cenário, este estudo teve como
objetivo avaliar a vulnerabilidade humana dos moradores do entorno das Unidades de Conservação
do município de Paranaguá-PR frente às mudanças climáticas, a partir do uso integrado de
indicadores socioambientais.

2. MATERIAL E MÉTODO

2.1. Área de estudo

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O município de Paranaguá está localizado no litoral do Estado do Paraná, possui uma área
territorial de 826 km² e população estimada em 154.936 mil habitantes (IBGE, 2019). Sua economia
é baseada, principalmente, nas atividades de exportação de commodities pelo porto Dom Pedro II,
reconhecido como o maior exportador graneleiro da América do Sul.
A ocupação e expansão urbana é limitada pelas barreiras naturais: Baía de Paranaguá e Serra
do Mar. Além disso, parte do território é protegido pelas Áreas de Preservação Permanente e
Reserva Legal, definidas pelo Código Florestal, pela Terra Indígena Ilha da Cotinga, e por sete
Unidades de Conservação: Parque Estadual e a Estação Ecológica da Ilha do Mel, Parque Estadual
do Palmito, Estação Ecológica do Guaraguaçu, Reserva Biológica de Bom Jesus, Parque Nacional
de Saint-Hilaire/Lange, APA de Guaraqueçaba e APA de Guaratuba e integra o Mosaico de
Unidades de Conservação do Lagamar. Estas áreas protegem os últimos remanescentes da Mata
Atlântica brasileira, sua rica sociobiodiversidade local e os serviços ecossistêmicos associados,
dentre eles a regulação do microclima, regulação do fluxo hídrico, controle da erosão, entre outros
(GUEDES; SEEHUSAN, 2014).
Este estudo teve como recorte a zona de amortecimento de duas Unidades de Conservação
de Proteção Integral: a Estação Ecológica de Guaraguaçu, criada em 1992, na zona rural do
município e o Parque Estadual do Palmito, criado em 1998 e inserido na zona urbana. Esta região é
considerada como prioritária para a conservação pelo Ministério do Meio Ambiente brasileiro e
definida pelo Zoneamento Ecológico Econômico do Litoral do Paraná, em 2017, como Zona de
expansão para Proteção Integral. Em 2018, ambas as UC foram ampliadas e atualmente somam,
4.736,41 e 1.782,44 hectares, respectivamente. Juntas eles protegem diferentes habitats da Floresta
Ombrófila Densa de Terras Baixas e as Formações Pioneiras de Influência Marinha (restinga) e
Flúvio-Marinhas (manguezais) do litoral do Paraná, ambientes de baixa declividade com solos
hidromórficos, sujeitas a altas temperaturas, umidade e pluviosidade (MAACK, 2002). Estas
características somadas ao regime hídrico dos rios da planície litorânea sujeitam a região à alta
suscetibilidade à inundação natural (GEOPLANEJAMENTO, 2011).
Estas áreas são limítrofes às zonas de expansão urbana previstas pelo Plano Diretor de
Paranaguá e alvo de inúmeras ocupações irregulares, devido ao baixo valor imobiliário, devido às
características físicas e naturais inóspitas aos seres humanos.

2.2. Metodologia
A avaliação da vulnerabilidade dos moradores do entorno das UC frente às mudanças
climáticas foi realizada a partir da seleção de 22 indicadores, que, posteriormente, foram divididos
em três grupos: demográficos e socioeconômicos, de infraestrutura, e ambientais e climáticos. Os
indicadores ambientais e climáticos são: a distância da rede de drenagem, percentagem de cobertura

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florestal e da identificação de eventos extremos, referentes à temperatura, umidade e precipitação.


Os dados da rede de drenagem foram obtidos do levantamento da empresa Geoplanejamento
(2011). A cobertura florestal foi obtida por meio da interpretação visual da imagem de satélite
disponibilizada pelo Google Earth para a região, de 17 de abril de 2014. Os indicadores climáticos
foram obtidos a partir dos dados da média mensal da temperatura, umidade e precipitação
fornecidos pelo Sistema Meteorológico do Paraná (SIMEPAR) da série histórica de 1998 a 2014
(17 anos = 204 meses). Para análise dos dados, foi utilizada a metodologia desenvolvida pelo
Ministério de Ciência e Tecnologia (BRASIL, 2005). Ela consiste em identificar os valores
extremos de cada variável com a criação de “boxplots” (diagramas de caixa) e comparar os dados
com outros municípios, a fim de identificar a situação de vulnerabilidade do município estudado.
Os indicadores ambientais e climáticos foram somados à análise dos indicadores de
infraestrutura local e as condições socioeconômicas da população em estudo, obtidos a partir dos
dados do Censo do IBGE (2010) por setor censitário.
Os valores para cada indicador foram calculados e classificados em uma escala de 1 a 6,
definida com base na literatura, sendo: baixíssima vulnerabilidade (Classe 1), baixa vulnerabilidade
(Classe 2), média a baixa vulnerabilidade (Classe 3), média a alta vulnerabilidade (Classe 4), alta
vulnerabilidade (Classe 5) e altíssima vulnerabilidade (Classe 6). A partir disso, foi calculada a
moda dos 22 indicadores para cada setor censitário para a identificação do seu grau de
vulnerabilidade.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
O grupo de indicadores ambientais e climáticos apresentou altíssima vulnerabilidade na
maior parte da área de estudo, atingindo 99.6% da população do entorno das UC. Os indicadores
climáticos tiveram peso significativo no grau de vulnerabilidade. Observa-se que dentre as variáveis
climáticas, a temperatura é a que apresenta as menores variações das médias mensais da série
histórica, dados compreendidos a partir das características climáticas da região que apresenta baixa
amplitude térmica devido ao fenômeno da proximidade com o oceano. Os indicadores de
precipitação e umidade, ao contrário, apresentaram situação de altíssima vulnerabilidade. Em
relação à precipitação, foram identificados 15 meses com valores extremos, equivalente a 7.35% do
total de meses, o maior percentual dentre os municípios do Estado do Paraná analisados. Já o
indicador de umidade obteve a maior percentagem de valores extremos, 9.8%, equivalente a 20
meses. Grande parte destes valores extremos altos coincide com anos de ocorrência do fenômeno El
Niño, que provoca o aquecimento das águas superficiais, afetando no regime das chuvas, além dos
efeitos das mudanças climáticas na região, tornando os eventos extremos mais frequentes.

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Em relação à distância da rede de drenagem, pudemos constatar que grande parte da área de
estudo encontra-se inserida a menos de 500m dos cursos d’água, principalmente na zona urbana.
Verificamos que alguns setores com alta vulnerabilidade referente à distância de drenagem, também
possuem alta ou altíssima vulnerabilidade referente à percentagem da cobertura florestal, o que
pode indicar a ausência das Áreas de Preservação Permanente. Além disso, podemos constatar que
as ocupações irregulares têm se expandido sobre estas áreas, principalmente na zona urbana,
agravando a situação de vulnerabilidade dos moradores destes setores. A proximidade dos setores
com os cursos d’água e a ausência de cobertura florestal em grande parte dos setores urbanos,
somadas à baixa declividade encontrada na área de estudo, em geral entre 2,5 e 5%
(GEOPLANEJAMENTO, 2011), são fatores agravantes no caso de eventos naturais como as
inundações e outros eventos climáticos extremos.
Os dados socioeconômicos e de infraestrutura revelam que quanto mais próximo das
Unidades de Conservação, maior a vulnerabilidade. A renda foi o indicador que apresentou os
resultados mais significativos para o grau de vulnerabilidade do grupo de indicadores
socioeconômicos e demográficos, visto que 83.13% dos domicílios possuem renda de até dois
salários mínimos. Somado à falta de infraestrutura e aos riscos naturais identificados na área de
estudo, a população da área de estudo apresentou situação de média a alta vulnerabilidade.
Pode-se observar que estas dinâmicas territoriais estão diretamente relacionadas com a
expansão portuária e industrial da cidade, que tem impulsionado a expansão da malha urbana para
os ecossistemas naturais ainda conservados do PE do Palmito e da EE de Guaraguaçu e que tem
minimizado os efeitos climáticos no município, embora ameaçados pelas ocupações irregulares e
pelo adensamento populacional.

4. CONCLUSÃO
A análise dos indicadores integrados revelou a interferência direta da pobreza-urbanização
sobre os remanescentes naturais da Mata Atlântica, processos que estão contribuindo para ampliar a
vulnerabilidade socioambiental dos moradores residentes no entorno imediato das áreas naturais
protegidas, e consequentemente, os impactos ambientais sobre estes ambientes naturais e seus
respectivos serviços ecossistêmicos associados, dentre eles, aqueles relacionados à minimização dos
efeitos das mudanças climáticas.
Mesmo com toda fragilidade dos ecossistemas desta região e da vulnerabilidade da
população detectados por meio deste estudo, o município carece de políticas públicas criadas e
implantadas, conjuntamente com a gestão das unidades de conservação e suas zonas de
amortecimento, garantindo que as áreas protegidas cumpram seus objetivos de criação, promovam

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os serviços ecossistêmicos, entre os quais, o apoio à adaptação às mudanças climáticas e o bem


estar da população local.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Análise da população brasileira aos impactos sanitários das mudanças climáticas.
Ministério de Ciência e Tecnologia. Brasília, 201p, 2005.

CHANG, M.; GARCIA, P. S. P. Relatório do projeto construção de indicadores de vulnerabilidade


da população como insumo para a elaboração das ações de adaptação à mudança do clima no Brasil:
Volume: Paraná (Relatório Técnico). Rio de Janeiro: Fiocruz, 130 p., 2018.

GEOPLANEJAMENTO. Pesquisa Mineral e Geologia Ambiental SS. Ltda. Mapeamento


Geológico-Geotécnico da Porção Leste da Serra do Mar do Estado do Paraná (Relatório Técnico) 4
volumes, 91p., 2011.

GUEDES, F. B.; SEEHUSEN, S. E. Payments for Environmental Services in the Atlantic


Forest: Lessons Learned and Challenges. Fátima Becker Guedes e Susan Edda Seehusen (Orgs).
Brasília: MMA, 276 p, 2014.

IBGE. Censo 2010. Disponível em:


<http://cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php?codmun=411820> Acesso: 26/01/2019. 2010.

IBGE. IBGE Cidades - Paranaguá. Disponível em: Erro! A referência de hiperlink não é válida.. 2019.

MAACK, R. Geografia física do Estado do Paraná. 3ª edição. Curitiba: Imprensa Oficial, 2002,
440p.

SILVA, A. S.; PAULA, E. V.; BORGES, C. R. S.; FISCHER, D.; SIPINSKI, E. A. B. Observatório
de Conservação Costeira do Paraná OC2: uma nova ferramenta de apoio ao desenvolvimento
regional. In: REIS, R. A.; et al. (Orgs.) Litoral do Paraná: Território e Perspectivas, v.1.
Curitba: Brazil Publishing, 2016, p. 249-273.

GOUDARD, G. PAULA, E. V. O clima do Litoral do Paranaense: variabilidades, mudanças


climáticas, tendências e desafios. In: BOLDRINI, E. B.; PAES, L. S. O. P.; PINHEIRO, F. (Org.).
Clima: boas práticas de adaptação. 1ª ed. Antonina: ADEMADAN, 2016, p. 13-27.

PAULA, E. V. de.; PIGOSSO, A. M. B.; WROBLEWSKI, C. A. Unidades de


Conservação no Litoral do Paraná: evolução territorial e grau de implementação. In:SULZBACH,
M. T.; ARCHANJO, D. R.; QUADROS, J. (Orgs.) Litoral do Paraná:
território e perspectivas, v. 3.1a ed. Rio de Janeiro: Autografia, 2018, p. 41-92.

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CONSERVAÇÃO E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL: RELEVÂNCIA DAS


UNIDADES DE CONSERVAÇÃO PARA A PROTEÇÃO DA
BIODIVERSIDADE
CONSERVATION AND ENVIRONMENTAL PRESERVATION: RELEVANCE OF
PROTECTED AREAS FOR THE BIODIVERSITY PROTECTION

Luana Cândido dos Santos*, Ana Márcia Moura da Costa*, Itamar José Dias e Cordeiro**.

Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Departamento de Ciências Geográficas, UFPE, Brasil*.


Professor Doutor adjunto do Departamento de Hotelaria e Turismo, UFPE, Brasil**.

1. INTRODUÇÃO
Com o advento da globalização e da lógica consumista que permeiam as sociedades
contemporâneas, a natureza e sua biodiversidade vêm sendo explorada de forma predatória e
desordenada. Tal fato corrobora com processo de extração predatória dos recursos naturais em prol
da satisfação de interesses capitalistas (LEEF, 2000). Tais interesses fazem-se cada vez mais
presentes, e perduram, desde a revolução industrial com o capitalismo industrial até os dias de hoje
com o capitalismo financeiro. Mediante tal constatação, a preocupação com a questão ambiental
tornou-se cada vez mais acentuada e discutida entre nações e estados desses países em todo o
mundo.
No que tange ao contexto brasileiro, a Convenção da Biodiversidade ocorrida em 1992 no
Rio de Janeiro, assinada por mais de 156 Estados durante a Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, estabeleceu em suas diretrizes a necessidade de desenvolver
estratégias, planos ou programas para a conservação e a utilização sustentável da diversidade
biológica, além de integrar, na medida do possível e conforme o caso, a conservação e a utilização
sustentável dos recursos naturais (DOUROJEANNI; PÁDUA, 2001). Dessa forma, para que tais
medidas fossem implementadas foram necessárias, primordialmente, identificar áreas prioritárias
destinadas à conservação e a preservação da biodiversidade.
Mediante esse contexto, a criação e institucionalização das Unidades de Conservação pelo
governo brasileiro em 2000 surgem como uma importante estratégia para a proteção da
biodiversidade e recursos naturais. As áreas protegidas, de forma geral, foram criadas no Brasil com
o intuito de preservar a biodiversidade brasileira e paisagens da ação predatória antrópica, além de
objetivar a consequente promoção do desenvolvimento sustentável (BRASIL, 2008). Com isso,
esses espaços vêm ganhando cada vez mais notoriedade em atividades voltadas ao ensino, à cultura
e, sobretudo, a práticas voltadas à educação. Por se tratar de espaços que possuem objetivos e

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diretrizes definidos pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), as Unidades de


Conservação (UCs) devem abranger quatro das principais preocupações evidenciadas e cobradas
por movimentos ambientalistas e demais setores da sociedade. Sendo estes: a conservação da
biodiversidade em seus três níveis fundamentais, ou seja, sua diversidade genética, de espécies e de
ecossistemas; o uso sustentável dos recursos naturais, além da participação da sociedade e
conseguinte distribuição equitativa dos benefícios auferidos por intermédio da criação,
implementação e gestão das UCs (PRIMACK, RODRIGUES, 2002).
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação representa uma ferramenta imprescindível
para que o país consiga cumprir os compromissos constitucionais internos e os diversos acordos
internacionais firmados em prol da proteção do meio ambiente em equilíbrio com o
desenvolvimento sustentável e menos impactante (BRITO, 2007). Com isso, poder-se-ia obter,
consequentemente, a preservação dos bens naturais, minimização dos problemas oriundos da “crise
ambiental”, e promoção da qualidade de vida da sociedade. Com base nesses pressupostos a
respectiva pesquisa tem como objetivo dissertar sobre a importância da criação das Unidades de
Conservação para a proteção e conservação da biodiversidade por intermédio de uma revisão de
literatura.

1.1 Unidades de Conservação no Brasil e proteção da biodiversidade


As Unidades de Conservação (UCs) do Brasil foram criadas a partir da década de 1930, com
o intuito de, sobretudo, promover a conservação da biodiversidade, dos ecossistemas e das
paisagens da ação predatória antrópica (BRASIL, 2000). Com o passar dos anos, as UCs
distribuídas no território brasileiro foram buscando atender a outros objetivos além dos
supracitados, e no ano de 2000 é criado um Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC), englobando antigas e novas áreas, as quais foram definidas em dois grupos principais:
Unidades de Proteção Integral e as Unidades de Uso Sustentável (BRASIL, 2000).
As Unidades de Proteção Integral foram criadas como intuito de assegurar a preservação da
natureza, restringindo, desse modo, o uso de seus recursos de forma direta, ou seja, o uso que não
envolve o consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais existentes. Já as Unidades de
Uso Sustentável possuem a finalidade de contribuir com a conservação da natureza com o uso
sustentável de parte dos recursos naturais existentes (BRASIL, 2000). O Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) foi instituído pela Lei Federal 9.985/2000 e trouxe
uma série de diretrizes e normas visando à modernização da gestão e do manejo das áreas
protegidas no Brasil.
Esta lei sugere que os estados e os municípios também criem os seus sistemas de unidades
de conservação e, assim, contribuam para o cumprimento das metas e objetivos relativos à proteção
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

da diversidade biológica em níveis nacional e internacional. Os benefícios aos seres humanos


advindos das chamadas áreas protegidas vão além daqueles oriundos da conservação da
biodiversidade.

1.2 Preservação e Conservação ambiental


Em uma análise inicial é importante destacar e diferenciar duas importantes palavras que são
muito importantes e comuns em discussões concernentes a questão ambiental e à natureza:
conservação e preservação. Segundo Araguaia (2011), a preservação (Preservacionismo) e a
conservação (Conservacionismo) são vertentes ideológicas que surgiram no fim do século XIX, nos
Estados Unidos (EUA). Com posicionamento contra o desenvolvimentismo - uma concepção na
qual defende o crescimento econômico a qualquer custo, desconsiderando os impactos ao ambiente
natural e o esgotamento de recursos naturais – estas duas se contrapõem no que se diz respeito à
relação entre o meio ambiente e a nossa espécie. Araguaia (2011) considera que:

O Preservacionismo aborda a proteção da natureza independentemente de seu valor


econômico e/ou utilitário, apontando o homem como o causador da quebra deste
“equilíbrio”. De caráter explicitamente protetor, propõe a criação de santuários, intocáveis,
sem sofrer interferências relativas aos avanços do progresso e sua consequente degradação.
Em outras palavras, “tocar”, “explorar”, “consumir” e, muitas vezes até “pesquisar”, torna-
se, então, uma atitude que fere tais princípios. Deposição considerada mais radical, este
movimento foi responsável pela criação de parques nacionais, como o Parque Nacional de
Yellowstone, em 1872, nos Estados Unidos (ARAGUAIA, p. 34, 2011).

Em outras palavras, o preservacionismo leva em consideração que, o que foi descoberto,


encontrado em determinada área ou território, não deve ser tocado e explorado. Ou seja, deve ser
preservado para que gerações futuras apreciem e usufruam da beleza e recursos naturais. Não
obstante, caso tal atitude anteriormente mencionada não seja adotada, corre-se o risco de que essas
gerações não venham a ter conhecimento do que teve a natureza a mostrar antes do nascimento
delas. Por isso, foram criados parques, reservas onde o homem não deve intervir. Ademais, ao
entrar e explorar a vertente conservacionista Araguaia (2011) diz que:

A vertente conservacionista, contempla o amor à natureza, mas aliado ao seu uso racional e
manejo criterioso pela nossa espécie, executando um papel de gestor e parte integrante do
processo. Podendo ser identificado como o meio-termo entre o preservacionismo e o
desenvolvimentismo, o pensamento conservacionista caracteriza a maioria dos movimentos
ambientalistas, e é alicerce de políticas de desenvolvimento sustentável, que são aquelas
que buscam um modelo de desenvolvimento que garanta a qualidade de vida hoje, mas que
não destrua os recursos necessários às gerações futuras.

Redução do uso de matérias-primas, uso de energias renováveis, redução do crescimento


populacional, combate à fome, mudanças nos padrões de consumo, equidade social, respeito à

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biodiversidade e inclusão de políticas ambientais no processo de tomada de decisões econômicas


são alguns de seus princípios.
2.METODOLOGIA
A metodologia utilizada para a elaboração da presente pesquisa partiu de consultas a artigos
científicos, teses, dissertações, consultas a diretrizes e leis nacionais brasileiras; bem como
levantamentos bibliográficos feitos na plataforma Google acadêmico e Scorpus. Os levantamentos
bibliográficos tinham por base autores que discutem sobre quais fatores levaram a gênese das UCs,
além de sua relevância para proteção e conservação da biodiversidade. Ademais, faz-se pertinente
salientar que a pesquisa bibliográfica, cuja pesquisa pode ser caracterizada como tal, é feita a partir
do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos,
como livros, artigos científicos, páginas de websites (FONSECA, 2002).

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todas as informações e discussões apresentadas ao decorrer da escrita do
respectivo trabalho, faz-se pertinente pontuar algumas considerações. Cabe destacar, inicialmente,
que a criação e institucionalização das Unidades de Conservação representam um grande marco
para a proteção e conservação da biodiversidade existente no território brasileiro. Apesar de muitos
desafios e adversidades enfrentados pelos órgãos gestores das Unidades de Conservação, como
conflitos entre povos e poder público, as diretrizes e legislações que asseguram sua regulação e
execução são de fundamental relevância para resguardar e fundamentar um olhar mais necessário e
atento frente às questões ambientais contemporâneas.
Dessa maneira, cabe salientar que além das Unidades de Conservação protegerem a
diversidade biológica e os recursos genéticos associados, elas exercem fundamental importância
para os seres humanos. Uma das muitas formas de contribuição está correlacionada especialmente à
regulação da quantidade e qualidade de água para consumo; à fertilidade dos solos e estabilidade
das encostas (relevo), que ficam aptos a cultivos e colheitas humanas, ao equilíbrio climático e
manutenção da qualidade do ar e serve de base para produção de medicamentos para doenças atuais
e futuras.
Mediante isso, infere-se que cada vez fica mais claro que a sociedade depende de recursos
naturais para sua subsistência e sobrevivência. Setores de destaque da sociedade também
necessitam de um meio ambiente equilibrado. A exemplo disso, tem-se o setor empresarial, por
exemplo, que necessita diretamente dos recursos naturais para o seu funcionamento e expansão,
com utilização de madeira, óleos vegetais, minérios, água, entre outros. Mediante essas
constatações, eis que emerge a necessidade do estabelecimentode diálogos sobre a importância de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

uma extração de recursos mais sustentável, por meio de práticas e conservação mais efetivas. Isso
perpassa e requer articulações entre o poder público, sociedade.
Por conseguinte, constata-se que as Unidades de Conservação são de suma importância para
a sociedade como um todo. Elas oferecem benefícios para além das suas fronteiras. Assim sendo, é
preciso que o poder público e a sociedade tenham clareza de que ecossistemas saudáveis são vitais
para a existência de pessoas sadias, empresas sustentáveis, economias sólidas e, consequentemente,
um desenvolvimento sustentável equitativo e equilibrado.

4. AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente(PRODEMA)
da Universidade Federal de Pernambuco e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES) pela concessão das bolsas de pesquisa.

5. REFERÊNCIAS
ARAGUAIA, Mariana. Preservacionismo e Conservacionismo: A busca da sustentabilidade. São
Paulo, 2011.

BRASIL. IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.
Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação- SNUC. no 9.985, de 18 de julho de 2000.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Portaria conjunta Ministério do Meio Ambiente e Instituto
Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis nº 259, de 7 de agosto de 2009.
Dispõe sobre a participação dos trabalhadores no processo de licenciamento ambiental e dá
outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 ago. 2008.

BRITO, Maria Cecília Wey de. Unidades de conservação: intenções e resultados. São Paulo:
Annablume; Fapesp, 2007.

DOUROJEANI , Marc J.; PÁDUA, Maria Tereza Jorge. Biodiversidade: a hora decisiva. Curitiba:
UFPR; Fund. O Boticário, 2001.

FONSECA, J. J. S. Metodologia da pesquisa científica. Fortaleza: UEC, 2002.

LEFF, E. Ecologia, capital e cultura: racionalidade ambiental, democracia participativa e


desenvolvimento sustentável. Blumenau: FURB, 2000.

MIRANDA, R. B. As relações sociedade/natureza sob a perspectiva da co-evolução.


Desenvolvimento e Meio Ambiente, 8, jul.-dez., Curitiba, Editora da UFPR, 2003.

PRIMACK, R. B. & RODRIGUES, E. Biologia da Conservação. Londrina, p. 328, 2002.

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IMPACTOS DA MUDANÇA DO CLIMA E ADAPTAÇÃO BASEADA EM


ECOSSISTEMAS: UM ENFOQUE EM GÊNERO

Jennifer Viezzer*, Letícia Sauer Guimarães**, Patrícia Betti***

*Engenheira florestal, mestre e doutoranda em eng. florestal (UFPR), analista ambiental MMA
(jennifer.viezzer@mma.gov.br)
**Relações internacionais (UnB), Projeto de Direitos Humanos (SFF) e
Grupo Temático de Gênero - GIZ Brasil (leticia.sauer@giz.de e lelesauer@gmail.com)
*** Turismo (UFPR), especialista em Gestão Pública e Sociedade (Unicamp/ UFT) e mestre em Desenvolvimento e
Meio Ambiente (UFPR) (patricia.betti@giz.de e patibetti@gmail.com)

INTRODUÇÃO
A mudança do clima já está afetando pessoas, ecossistemas e meios de subsistência
mundialmente. Seus impactos vêm diminuindo a provisão de recursos como água e alimentos,
alterando funções como a regulação do clima e o controle de enchentes, e provocando o aumento de
doenças como a dengue em decorrência do desequilíbrio ambiental. (IPCC, 2014). Esses efeitos
impactam desproporcionalmente pessoas mais pobres e vulneráveis, dentre as quais estão as
mulheres e meninas.
O enfrentamento à mudança do clima inclui a redução das emissões de gases de efeito estufa
e a adaptação aos seus impactos. Nesse sentido, a manutenção de áreas naturais protegidas tanto
contribui à mitigação – visto que o desaparecimento de áreas naturais é um dos fatores que mais
contribui para o aquecimento global (CARDOSO et. al, 2009) - quanto possibilita a adaptação ao
prover serviços ecossistêmicos como alimentos, regulação do microclima, controle de enchentes e
minimização dos impactos do aumento do nível do mar.
O papel dos ecossistemas na resposta aos desafios da mudança climática é crítico para
assegurar que as iniciativas de adaptação sejam eficazes e sustentáveis em longo prazo. A
Adaptação baseada em ecossistemas (AbE) é uma das abordagens que demonstrou ajudar a reduzir
a vulnerabilidade dos seres humanos e da natureza, e consequentemente o risco climático. É
definida como o uso da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos para ajudar as pessoas a se
adaptarem aos efeitos adversos da mudança do clima, como parte de uma estratégia mais ampla de
adaptação (CBD, 2009).
Diante de um clima em mudança aumentando as vulnerabilidades de mulheres e meninas, é
imprescindível compreender como o enfoque de gênero na AbE pode contribuir para minimizar os
impactos da mudança do clima nesses grupos mais vulneráveis. Para alcançar este objetivo foram
estipulados três objetivos específicos: i) compreender como a mudança do clima aumenta a
vulnerabilidade de mulheres e meninas; ii) identificar argumentos para o envolvimento de mulheres
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

na adaptação à mudança do clima; iii) por fim, identificar alternativas para um enfoque de gênero
na adaptação baseada em ecossistemas no planejamento e gestão de áreas naturais, com vistas a
diminuir os riscos da mudança do clima para toda a sociedade e em especial às mulheres e meninas.

MATERIAL E MÉTODO
Para alcançar os objetivos propostos realizou-se pesquisa bibliográfica e documental,
utilizando-se relatórios e outras publicações técnicas. Inicialmente identificaram-se as principais
vulnerabilidades das mulheres e meninas e como a mudança do clima pode agravá-las. Na
sequência, levantaram-se as razões apresentadas para que haja um esforço de inclusão de mulheres
e meninas no processo de adaptação à mudança do clima. A partir dessas informações e ainda com
base na pesquisa bibliográfica foram identificadas medidas para empoderamento com enfoque em
gênero e inclusão de mulheres e meninas em processos de planejamento e gestão.
Na sequência analisou-se como esses resultados preliminares poderiam ser incorporados na
metodologia de planejamento AbE apresentada pelo projeto Biodiversidade e Mudanças Climáticas
na Mata Atlântica (PROJETO MATA ATLÂNTICA, 2018). Dessa forma, foram identificadas
possíveis medidas com enfoque em gênero em cada passo do planejamento da AbE, sendo eles: i)
aplicação da lente climática; ii) análise de vulnerabilidade, impactos potenciais e risco; iii)
identificação de medidas de adaptação; iv) implementação das medidas de adaptação; v) avaliação e
monitoramento dos resultados.
Ressalta-se que o alcance desse trabalho é meramente teórico e expõe uma aproximação
inicial à integração de AbE com enfoque em gênero na referida metodologia de planejamento, a
qual poderá ser aplicada às áreas protegidas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os estudos indicam que uma calamidade climática não afeta igualmente todas as pessoas em
uma comunidade ou até na mesma família. Em muitos casos, as capacidades individuais de ação e
gerenciamento de crises são constrangidas pela existência de regras e normas culturais repressivas e
pela partilha injusta de direitos, recursos e poder. Embora homens pobres e marginalizados
enfrentem essa situação com frequência, ela ocorre principalmente junto às mulheres (CARE,
2010).
Em diversas comunidades rurais que enfrentam riscos ligados a fenômenos naturais, por
exemplo, existem desigualdades em termos de responsabilidade de ação e oportunidades de trabalho
devido às relações de gênero. Via de regra, são os homens que migram em busca de emprego, o que
pode resultar em benefícios para a família como um todo. Contudo, frequentemente, isso aumenta a

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carga de trabalho das mulheres, que precisam assumir mais atribuições na gestão da família, ficando
também mais expostas a vários tipos de riscos, como a violência baseada no gênero (CARE, 2010).
De todo modo, nesses casos, o planejamento e a responsabilidade para a adaptação à
mudança do clima recai principalmente sobre as mulheres. Porém, muitas vezes, os homens mantêm
o poder de tomada de decisões mesmo à distância e, ao retornar, negam às mulheres a autonomia
para serem agentes eficazes de adaptação à mudança do clima e de gestão de riscos (CARE, 2010).
Em nível mundial, elas são responsáveis por mais de 70% da gestão e das tarefas
relacionadas com a água e 70% das mulheres das regiões mais afetadas pelas mudanças climáticas
trabalham no setor agrícola. As estimativas das Nações Unidas indicam ainda que 70% das 1,3 mil
milhões de pessoas em situação de pobreza em todo o mundo são mulheres. Desse modo,
considerando que as pessoas em situação de pobreza vivem com maior frequência em zonas mais
remotas e suscetíveis a cheias, ao aumento do nível do mar e a tempestades, diante de catástrofes
naturais as mulheres e as crianças correm 14 vezes mais riscos de morrer do que os homens
(UNITED NATIONS, 2015).
De acordo com estimativas das Nações Unidas, 781 milhões de pessoas com idade igual ou
superior a 15 anos são analfabetas, sendo que dois terços destas pessoas são mulheres (UNITED
NATIONS, 2015). Isso implica em menos acesso à informação e menor independência, em especial
durante as catástrofes.
Assim, constatou-se que a desigualdade de gênero pode ser caracterizada como uma das
causas fundamentais da vulnerabilidade de mulheres e meninas à mudança do clima e que os efeitos
das mudanças climáticas acentuam essas desigualdades, nomeadamente em matéria de
discriminação, ameaças para a saúde, perda de meios de subsistência, deslocações, migrações
forçadas, pobreza, tráfico de seres humanos, violência, exploração sexual, insegurança alimentar e
acesso a infraestruturas e serviços essenciais.
Apesar de todo esse cenário, as mulheres e meninas raramente participam na concepção das
políticas em matéria de clima (UNITED NATIONS, 2015). Por outro lado, uma série de razões
justifica que sejam envolvidas na adaptação à mudança do clima.
As mulheres têm um papel estratégico a desempenhar no desenvolvimento de padrões de
consumo e de produção sustentáveis e razoáveis do ponto de vista ecológico; representam 70% da
mão-de-obra agrícola nos países atreitos a catástrofes; não só executam a maior parte das tarefas
domésticas e de prestação de cuidados não remuneradas, mas também tomam a maioria das
decisões quotidianas em matéria de consumo; a participação das mulheres no mercado de trabalho
nas zonas rurais inclui um vasto leque de trabalhos que vai para além da agricultura convencional,
e, as mulheres residentes nas zonas rurais podem ser agentes de mudança rumo a uma agricultura

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sustentável e ecologicamente saudável e desempenhar um papel importante na criação de empregos


«verdes» (UNITED NATIONS, 2015).
Adicionalmente, as mulheres e meninas representam as melhores fontes de conhecimento no
que diz respeito às circunstâncias de vida em que se encontram e às suas necessidades e se
manifestam mais preocupadas com as mudanças climáticas. Por fim, justifica-se a inclusão de
mulheres e meninas no processo de adaptação à mudança do clima considerando que, enquanto
inovadoras, líderes, organizadoras, educadoras e prestadoras de cuidados, as mulheres encontraram,
ao longo dos séculos, soluções para, em situações difíceis, satisfazer as necessidades das suas
famílias, tendo um enorme potencial para, no futuro, continuarem a ser inovadoras (UNITED
NATIONS, 2015).
Diante do exposto, consta-se que a inclusão de mulheres e meninas nos processos de
adaptação à mudança do clima pode contribuir para a minimização dos riscos da mudança do clima
não somente a elas, mas para toda a sociedade.
Nesse sentido foram identificadas medidas alternativas para um enfoque de gênero na
Adaptação baseada em Ecossistemas, apresentadas a seguir:

Planejamento de AbE com enfoque em gênero


Passos da AbE e seus objetivos Recomendações para enfoque em gênero
Adotar uma abordagem sensível ao gênero;
Incluir mulheres entre os técnicos;
Passo 1:aplicar uma lente climática
Promover capacitação sobre AbE e equidade de gênero a toda a
Estabelecer a base para a adaptação
equipe;
baseada em ecossistemas
Levantar as informações com indicadores separados por gênero para
melhor identificar as vulnerabilidades.
Passo 2:avaliar vulnerabilidade e Proporcionar a participação, a fala e a inclusão de mulheres e
riscos meninas em todas as etapas da avaliação de risco;
Entender onde e como a adaptação é Desenvolver análise de risco separada por gênero: identificar a
mais relevante sensibilidade, a exposição e a capacidade adaptativa por gênero.
Para cada vulnerabilidade, impacto e risco, identificar medidas de
adaptação com enfoque em gênero.
Passo 3:identificar medidas de
Informar mulheres e meninas sobre a mudança do clima e a
adaptação e de AbE
adaptação através de canais de comunicação adequados;
Identificar meios de rezuzir a
Aumentar sua participação na concepção das políticas em matéria de
vulnerabilidade, os impactos potenciais
clima;
e o risco climático
Estabelecer linhas de financiamentos, gerando oportunidades de
emprego, entre outros, especialmente durante catástrofes.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Passo 4:priorizar e selecionar medidas


Inlcuir a equidade de gênero entre os critérios de seleção de medidas;
de adaptação
Priorizar medidas mais relevantes para diminur a vulnerabilidade de
Identificar uma variedade de opções de
mulheres e meninas e que possam ter efeito multiplicador, por ex.
adaptação incluindo opções AbE para
aumentando a representação de mulheres em espaços de tomada de
melhorar ou ajustar o planejamento e a
decisão.
gestão
Integrar as medidas em outras estratégias de planejamento, políticas,
projetos;
Passo 5:implementar medidas eficazes
Esclarecer os papéis e responsabilidades na implmentação,
de medidas de adaptação
divindindo-os entre as mulheres também;
Minizar os riscos climáticos
Assegurar recursos financeiros e atenção às medidas que visem a
diminuição da vulnerabilidade das mulheres e meninas.
Assegurar que os indicadores sejam divididos por gênero para que se
Passo 6: monitorar e avaliar possa avaliar o desempenho das medidas de adaptação para
Determinar indicadores, metodos e minimizar a vulnerabilidade de mulheres e meninas;
responsáveis Proporcionar a participação de mulheres no processo de
monitoramento e avaliação.

CONCLUSÃO
A mudança do clima agrava a vulnerabilidade de mulheres e meninas porque estão expostas
a riscos e condicionalismos mais elevados, por motivos diversos que vão desde a desigualdade no
acesso aos recursos, à educação, a oportunidades de emprego e a direitos fundiários, a normas
sociais e culturais. Contraditoriamente, as mulheres e meninas podem contribuir para a minimização
dos riscos climáticos de toda a sociedade, pois estão mais sensibilizadas quanto à mudança do
clima, detêm maior conhecimento sobre as circunstâncias de vida de toda a família e um papel
estratégico para promoção de formas de consumo e produção mais sustentáveis.
Portanto, é fundamental o empoderamento das mulheres e meninas para que sejam não
apenas beneficiárias, mas agentes nos processos de adaptação baseada em ecossistemas. Para tanto,
devem participar, ser ouvidas e atendidas em suas necessidades específicas, liderar e integrar
processos de tomada de decisão e formulação de políticas e gestão não apenas em áreas naturais
protegidas, mas sim em todas as instâncias existentes.

REFERÊNCIAS
CARDOSO, D. N.; KARAM, G. Z.; CONEGLIAN, S. J. G.; HOFFMANN, P. M.; SANTOS, J. J.
S.; KRUGER, F. A. Programa Desmatamento Evitado (SPVS): um mecanismo complementar ao
SNUC para a conservação em áreas privadas. In: VI Congresso Brasileiro de Unidades de
Conservação, Anais em CD, v.1 Trabalhos Técnicos. Curitiba: Fundação O Boticário de Proteção
à Natureza/Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação, 2009.

CARE. Adaptation, gender and women’s empowerment. 2010. Disponível em:


<http://www.care.org/sites/default/files/documents/CC-2010-CARE_Gender_Brief.pdf>. Acesso
em 28 fev. 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CBD. Convention of Biological Diversity. Connecting Biodiversity and Climate Change


Mitigation and Adaptation: Report of the Second Ad Hoc Technical Expert Group on
Biodiversity and Climate Change. Montreal: CBD Technical Series No. 41, 2009. Disponível em:
<https://www.cbd.int/doc/publications/cbd-ts-41-en.pdf>. Acesso em 10 ago. 2019.

IPCC. Intergovernmental Panel on Climate Change. Climate Change 2014: Synthesis Report.
Contribution of Working Groups I, II and III to the Fifth Assessment Report of the
Intergovernmental Panel on Climate Change[Core Writing Team, R.K. Pachauri, L.A. Meyer
(eds.)]. Geneva: IPCC, 2014.

PROJETO MATA ATLÂNTICA. (Biodiversidade e Mudanças Climáticas na Mata Atlântica).


Adaptação baseada em Ecossistemas (AbE) frente à mudança do clima: apostila do curso.
Brasília: Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH/ Ministério do
Meio Ambiente, 2018.

UNITED NATIONS. The World's Women 2015 – Trends and Statistics. New York: United
Nations publication issued by the Department of Economic and Social Affairs (DESA), 2015.
Disponível em: <https://unstats.un.org/unsd/gender/downloads/worldswomen2015_report.pdf>.
Acesso em 10 ago. 2019.

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GT 2
Educação ambiental e áreas
protegidas como lugares educadores:
potencialidades e limites
Considerando a necessidade de compreensão dos ambientes naturais como
resultados das relações sistêmicas entre todos os seus componentes, sejam eles
naturais ou derivados das ações humanas, o GT visa promover discussões sobre
a função educadora, nos âmbitos formal e não formal, no contexto das diferentes
Áreas Protegidas, em alinhamento com os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável e, a Agenda 2030. O GT procura, também, discutir os limites e
possibilidades da Educação Ambiental relacionada às áreas protegidas na atual
conjuntura política no Brasil e América Latina.

Coordenadores:
Aluisio Sales (UFPE)
Edneida Cavalcanti (FUNDAJ)
Juvenita Albuquerque (FUNDAJ)
Rita Muhle (GEPES/UFRPE)
Solange Coutinho (FUNDAJ)
Tarcisio Quinamo (FUNDAJ)
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PERCEPÇÃO AMBIENTAL SOBRE UNIDADES DE CONSERVAÇÂO


MUNICIPAIS LOCALIZADAS NA BAIXADA VERDE/RJ
ENVIRONMENTAL PERCEPTION ABOUT MUNICIPAL PROTECTED AREAS LOCATED IN
BAIXADA VERDE/RJ

Felipe de Lima Almeida*, Everton de Oliveira da Silva*, Monika Richter** e Edileuza Queiroz **

Programa de Pós-graduação em Geografia, Mestrando, UFRRJ, Brasil.* (Autor)


Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Territorial e Políticas Públicas, Mestrando, UFRRJ, Brasil.* (Autor)
Departamento de Geografia e Políticas Públicas da UFF, Brasil.** (Professora Orientadora)
Departamento de Geografia da UFRRJ/IM, Brasil.** (Professora Orientadora)

1. INTRODUÇÃO
A Baixada Fluminense (BF), localizada na região metropolitana do Rio de Janeiro, abrange
13 municípios, com uma população total de 3,4 milhões de habitantes (IBGE, 2019) e cerca de
1.500 indústrias de pequeno a grande porte (MARQUES, 2017). Entretanto, ainda que com tal
configuração urbano-industrial, a BF possui importantes remanescentes de Mata Atlântica, em sua
maioria abrigados por Unidades de Conservação, nas suas diferentes categorias e administradas
pelas três esferas de gestão: Federal, Estadual e Municipal, compreendendo cerca de um terço das
áreas verdes da região (RICHTER et.al, 2019).
Historicamente marcada por registros de violência, abandono por parte do poder público no
que se refere a saneamento básico, mobilidade urbana e educação, bem como elevados índices de
pobreza afetando significativa parcela da população, a Baixada Fluminense vem sendo por décadas
estigmatizada como região pouco desenvolvida socioeconomicamente (ROCHA, 2014). Visando
desfazer tal imagem negativa da região, no ano de 2017, dez municípios uniram-se com a proposta
de trazer uma nova imagem que valorizasse suas potencialidades, são eles: Belford Roxo, Duque de
Caxias, Japeri, Magé, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Queimados, São João de Meriti e
Seropédica. Surge então o projeto Baixada Verde, oficializado como região turística do Estado pela
Secretaria de Turismo do Estado do Rio de Janeiro (SETUR/RJ).
Como o próprio nome Baixada Verde sugere, um dos potenciais para a oferta turística da
Região encontra-se nas áreas verdes e isto inclui diferentes categorias de Unidades de Conservação,
somando 92 UCsentre Unidades de Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável em todo o
contexto da BF (RICHTER et.al, 2019). Considerando essa expressiva área de recobrimento das
UCs presentes na BF, aproximadamente 3.875 km², acrescido do fato de que dentre as 92 Unidades
citadas, 66 correspondem a unidades de gestão municipal (RICHTER et al, 2019, p. 9), o presente
artigo tem como objeto de estudo analisar a percepção ambiental dos residentes no interior e no
entorno de algumas dessas UCs sob gestão municipal no recorte da Baixada Verde, buscando
54
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

identificar como se relacionam com esses espaços naturais protegidos, de modo a subsidiar ações no
sentido de fortalecer a gestão dessas áreas no contexto dessa nova Região Turística.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para a execução deste trabalho, a metodologia está baseada na pesquisa bibliográfica em sua
maioria disponível na Internet, busca de informações sobre o projeto Baixada Verde em sites
oficiais dos municípios, do Estado (SETUR) e do Ministério do Turismo e entrevista junto a
coordenação do Observatório de Turismo e Lazer da Região Turística da Baixada Verde. Utilizou-
se também a aplicação de um questionário, junto aos moradores residentes no entorno e interior de
UCs. Elaborado a partir dos seguintes temas: percepção ambiental sobre a UC; uso público;
expectativa em relação ao lugar e perfil do entrevistado ( adaptado de VARELA et al, 2013), o
questionário constitui-se de um conjunto de 25 perguntas abertas e fechadas, sendo utilizado o
aplicativo gratuito para android, Vicon Saga, que permite o georreferenciamento do local da
pesquisa, e a inserção das informações que constituem o banco de dados.
Foram aplicados 150 questionários em quatro dos dez municípios integrantes da Baixada
Verde (BV), contemplando três Parques e duas APAs municipais, sendo: Parque Natural Municipal
da Caixa D’água (Duque de Caxias), Parque Municipal de Nova Iguaçu e APA Tinguá (Nova
Iguaçu), APA Horto Luiz Gonzaga Macedo (Queimados) e Parque Natural Municipal Jardim
Jurema (São João de Meriti). Motivado pelo grande número de UCs da região, priorizou-se
trabalhar em ao menos uma Unidade de quatro municípios diferentes, sendo tais UCs municipais
foram selecionadas seguindo critérios de acessibilidade.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Foram identificadas 56 UCs municipais na Baixada Verde (Tabela 1) e diante deste cenário
depara-se com duas realidades: a primeira sobre o fato de quão significativa é a extensão verde de
toda a Região, mesmo estando no contexto da região metropolitana do Rio de Janeiro. A segunda é
a triste presença dos chamados “parques de papel” que em suma correspondem a determinadas
áreas verdes que são criadas sem serem efetivamente implementadas, ou seja, limitam-se a
polígonos em mapas oficiais, mas não têm implantação na realidade social na qual estão inseridos
(BRITO, 2000; DOUROJEANNI, 2002). A este respeito é possível citar por exemplo o caso do
município de Belford Roxo que contém doze APAs, porém em áreas bastante alteradas e
desconexas, bem como as UCs visitadas no âmbito desta pesquisa: Parque Natural Municipal
Jardim Jurema em São Joãedo Meriti e APA Tinguá em Nova Iguaçu.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Como mencionado, nem todos os municípios da Baixada compõem a região turística da BV.
A tabela a seguir (Tabela 1) evidencia os municípios participantes juntamente com as respectivas
informações demográficas do censo do ano corrente e o número de UCs encontradas nos mesmos.

Tabela 1 - Municípios participantes do Baixada Verde, suas características demográficas, extensão territorial
e o número de Unidades de Conservação de esferas municipais que existem nas mesmas.

População Densidade UCs -


Municípios da Estimada - Demográfica - Extensão Esfera Área em ha
Baixada Verde 2019 hab/km² Territorial - km² Municipal

Duque de Caxias 919.596 1.828,51 467,072 4 1.828,43

Japeri 104.768 1.166,37 81,697 10 3.937,22

Belford Roxo 510.906 6.031,38 78,985 12 413,85

Magé 245.071 585,13 390,775 4 19.215,36

Nilópolis 162.485 8.117,62 19,393 1 77,05

Nova Iguaçu 821.128 1.527,60 520,807 12 18.987,49

Queimados 150.319 1.822,60 75,701 7 387,34

São João de
472.406 13.024,56 35,216
Meriti 6 59,18

Total 3.224.194 4.262,972 1.650,253 56 44.905,92

Fonte: IBGE, 2019; INEA apud RICHTER, 2019.

Ter ciência do número da população estimada nos municípios faz-se interessante para este
trabalho pelo motivo de entender-se o papel fundamental do morador na boa gestão da UC, quando
a categoria permite. É o caso das APAs por exemplo, onde se permite a propriedade privada, sendo
uma das categorias mais permissivas em termos de uso do solo, desse modo entender sua percepção
sobre aquele ambiente é importante para o processo de gestão da Unidade. Entretanto, em pesquisa
de opinião desenvolvida pelo Observatório de Turismo da Baixada, coordenado pela Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ, boa parte da população desconhece seus atrativos
naturais, além de apresentar baixa estima relacionado ao lugar em que vivem, embora apresentem
todo esse potencial verde3.
Observa-se que apesar das expectativas em torno da Baixada Verde, existem alguns pontos
desafiadores a serem contornados no desenvolvimento dele. Além da presença dos citados “parques

2
Média por habitantes/km².
3
Ver nas referências o link do vídeo “Turismo na Baixada Verde - Daqui pra Frente Baixada Fluminense” onde as
coordenadoras do Observatório de Turismo da UFRRJ falam sobre a pesquisa de campo, juntamente com demais
coordenadores do projeto Baixada Verde.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de papel” menciona-se ainda a falta de infraestrutura presente em muitos atrativos e em seus


acessos, desde sinalização até nos elementos que deveriam ser encontrados dentro das UCs (placas,
banheiro públicos, lixeiras, por exemplo). Uma moradora da vila de Tinguá, inserida na APA de
mesmo nome destaca que “finais de semana, muitos são os frequentadores que além de jogarem o
lixo no chão, fazem xixi pela rua mesmo, já que não tem locais públicos para suas necessidades”.
Existe também a realidade da falta de segurança em alguns lugares, que de fato é um problema de
segurança pública a ser superado em todo o estado do Rio de Janeiro, mas que se destaca na fala de
muitos moradores, a exemplo da entrevista com uma comerciante de São João de Meriti, próxima
ao Parque Jardim Jurema: “semana passada a mercearia foi assaltada e traficantes locais vieram
oferecer segurança particular”.
Como mencionado, a Baixada possui uma herança não favorável em relação a
governabilidade, principalmente no que se refere a gestão dos ambientes naturais - preservação,
fiscalização, investimento, dentre outros. Essa realidade que infelizmente ainda está marcada na
memória de muitos moradores, como relatado por outro morador entrevistado de São João de Meriti
nas proximidades com o Parque Municipal Natural Jardim Jurema “já teve muito vereador dizendo
que iria trazer dinheiro para arrumar o Parque e até hoje quase nada foi feito e o lugar tá assim,
abandonado”, no mínimo configura certo desinteresse dos gestores em investir na região. Ou seja,
independente das possíveis justificativas que existam para os anos de não investimento na mesma,
certamente isso pode ter originado tal descrença da população junto a qualquer promessas de
iniciativas governamentais ou referentes ao valor e potencial que cada município em que estão
inseridos possui. Talvez com a nova proposta de desenvolvimento regional sustentável a partir da
região turística da Baixada Verde, esse quadro se modifique.

4. AGRADECIMENTOS
Agradecemos aos alunos da disciplina de Unidades de Conservação e Povos Tradicionais
(2019-2), coordenado pela Prof.ª Edileuza Queiroz, do curso de geografia do IM/UFRRJ, pelo
auxílio na aplicação dos questionários nas Unidades de Conservação visitadas, e às professoras
coordenadoras do Observatório de Turismo da UFRRJ, Isabela de Fátima Fogaça e Teresa
Mendonça, que auxiliaram com informações ainda não publicadas sobre o projeto Baixada Verde
do Observatório.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. MAPA DO TURISMO. Ministério do Turismo. Brasília,2019. Disponível em:
<http://www.mapa.turismo.gov.br/mapa/init.html#/home>. Acesso em: 01 de setembro de 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BRITO, M.C.W. Unidades de Conservação: intenções e resultados. São Paulo: Annablume;


FAPESP, 2000.

DOUROJEANNI, M.J. Vontade política para estabelecer e manejar parques. In: TERBORGH, J.;
VAN SCHAIK, C.; DAVENPORT, L.; RAO, M. (Org.). Tornando os parques eficientes:
estratégias para a conservação da natureza nos trópicos. Curitiba: UFPR; Fundação O Boticário de
Proteção à Natureza, 2002.

IBGE. Indicadores de Desenvolvimento Sustentável. Instituto Brasileiro de Geografia e


Estatísticas. Brasília, 2019. Disponível em:
<https://www.ibge.gov.br/busca.html?searchword=remanescente+mata+atlantica+na+baixada+flum
inense>. Acesso em: 07 de setembro de 2019.

IBGE. Panorama das cidades. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas. Brasília, 2019.
Disponível em:<https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rj/nova-iguacu/panorama>. Acesso em 07 de
setembro de 2019.

MARQUES, B. C. DESENVOLVIMENTO PARA QUEM? AS CONTRADIÇÕES


SOCIOAMBIENTAIS NA BAIXADA FLUMINENSE E A GERAÇÃO DE CONFLITOS.
2017. Dissertação de Mestrado, PPGGEO/UFRRJ. 113pg

TURISMO NA BAIXADA FLUMINENSE. Direção e Produção: Flávio Cardoso e Cris Roque.


Projeto Educativo: Daqui Para Frente Baixada Fluminense. 2019. 19:02 min.

UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO. ENTREVISTA:


OBSERVATÓRIO DA BAIXADA VERDE. Nova Iguaçu,2019. Disponível em:
<http://portal.ufrrj.br/entrevista-observatorio-da-baixada-verde/>. Acesso em: 03 de setembro de
2019.

RICHTER, M. et al. Situação atual das Unidades de Conservação da Baixada Fluminense.


Unidades de Conservação da Baixada Fluminense: Contribuições para a Consolidação da
Baixada Verde.In. RICHTER, M.; FARIAS, H. S.; SOUZA, E. M. F. R. (Org.). 1. ed. Curitiba,
Aprris, 2019. Cap.1, pág. 13-34.

ROCHA, A. S. As representações ideais de um território: Dinâmica econômica e política,


agentes e a produção de novos sentidos na apropriação territorial da Baixada Fluminense pós-
1990. Tese (Doutorado em Geografia) – Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2014.

VARELA, Maria Silvia; LOPES, Andreia; FERREIRA, Maria Conceição; RITCHER, Monika. A
Reserva Biológica de Tinguá (RJ) e a comunidade do entorno: Uma análise da relação a partir do
conceito de percepção ambiental. IN: Anais – Uso Público em Unidades de Conservação, n. 1, v.
1, 2013.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PERCEPÇÕES E (RE)CONHECIMENTO DOS 30 ANOS DO PARQUE


NACIONAL DA CHAPADA DOS GUIMARÃES: UMA HISTÓRIA QUE NÃO
PASSARÁ EM BRANCO
PERCEPTIONS AND (RE)COGNITION OF THE 30 YEARS OF THE CHAPADA DOS
GUIMARÃES NATIONAL PARK: A STORY THAT WILL NOT BE OVERLOOKED

Luiz Eduardo M. de Barros Cruz*, Priscilla C. de Moura Estevão**, Cintia M. Santos da Camara
Brazão***

1. INTRODUÇÃO
Em abril de 2019, o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães (PNCG) completou 30
anos de criação. Decretado em 12 de abril de 1989, com objetivo de proteger pouco mais de 32 mil
hectares do bioma Cerrado, situa-se nos municípios de Cuiabá e Chapada dos Guimarães, no Mato
Grosso. O PNCG é uma Unidade de Conservação (UC) federal administrada pelo Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia vinculada ao Ministério do Meio
Ambiente (BRASIL, 2000). O Plano de Manejodo PNCG considera ser importante celebrar o dia 12
de abril e elenca a data como prioritária para se desenvolverem ações que ampliem a relação com a
sociedade (ICMBio, 2009), sendo a experiência objeto deste relato a celebração do trigésimo
aniversário da UC. Para este fim, formou-se uma comissão em conjunto com a sociedade civil
organizada. Inspirada na atual logomarca, a Divisão de Comunicação Social/ICMBio criou o selo
comemorativo. Uma programação diversificada marcou a comemoração. Após a cerimônia oficial
de abertura, inaugurou-se a exposição ‘Memórias do Parque Nacional’ e duas rodas de conversa
foram realizadas na Câmara Municipal de Chapada dos Guimarães. A programação continuou com
atividades desenvolvidas no Parque durante o final de semana: visitas monitoradas, oficinas, teatro
infantil da Companhia Alegrís de Teatro de Bonecos, o Parque Espaço Solidário1 e o projeto de 4

extensão ZooAção da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). A partir das vivências
relatadas, o objetivo deste trabalho é provocar a reflexão sobre a importância do engajamento da
sociedade na gestão da UC.

2. MATERIAL E MÉTODO
Este trabalho relata a experiência das comemorações dos 30 anos do PNCG, vivenciada por
gestores, estudantes, visitantes, guias, conselheiros e voluntários, durante o período de 12 de abril a
11 de maio de 2019. Formou-se uma comissão com servidores do ICMBio e representantes da

1
O Parque Espaço Solidário é uma ação que acontece desde outubro de 2018 no PNCG e visa a integrar os produtores
das comunidades do entorno a um mercado diferenciado, ressaltando valores socioambientais.
59
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

sociedade civil, que se reuniu presencial e virtualmente (em grupo de WhatsApp) em diversas
oportunidades para tratar do planejamento, organização e execução das atividades. Um cartaz
comemorativo foi criado para divulgar a programação. No imóvel, conhecido como casarão dos
Neves, renomeado para o evento como ‘Casa do Parque’, ocorreu a exposição Memórias do Parque
Nacional, onde foram expostos documentos históricos. Móveis, quadros e utensílios antigos
consignados em parceria fizeram parte da decoração, procurando-se manter a atmosfera rústica no
casarão emprestado pela família Neves. Para a exposição, adotou-se procedimentos que permitiram
a ambientação nos cômodos do casarão, de acordo com a temática prevista em roteiro pré-definido,
visando à sensibilização dos visitantes e estudantes. As atividades foram construídas com base em
metodologias participativas, como rodas de conversa, discussão dirigida, exposição monitorada e
dinâmica com jogos de palavras. Além das informações obtidas nas duas rodas de conversa, foram
utilizados os dados provenientes de mais quatro visitas monitoradas. A coleta de dados foi uma
tarefa realizada de modo manual pelos analistas do ICMBio, que registraram palavras-chave
durante as conversas e utilizaram a técnica Metaplan (CORDIOLI, 2019). Como ferramenta de
visualização, elaboraram-se nuvens de palavras no gerador de ‘nuvem de palavras’ on-line e
gratuito no sítio Wordclouds (www.wordclouds.com).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Uma das primeiras ações relacionadas às comemorações foi a padronização da logomarca e
a criação de um selo comemorativo a ser usado durante o ano de 2019. Reuniões frequentes
aconteceram para programação das atividades do evento, definição das parcerias e dos participantes
da comissão organizadora, sendo que a premissa partiu da ideia central de não se deixar a data
passar em branco. Um pôster comemorativo foi elaborado pela sociedade civil. Ao longo do
planejamento, foram firmadas parcerias2 . Com o objetivo de se oferecer à população oportunidade
5

de conhecer o processo que resultou na criação da UC e refletir sobre sua importância, a exposição
Memórias do Parque Nacional foi guardada na Casa do Parque. Em linhas gerais, o espaço guardou
documentos históricos, como a proposta com os subsídios técnicos da Associação Mato-grossense
de Ecologia (AME) e o abaixo-assinado3 a favor da criação do Parque; acervos pessoais de
6

servidores e colaboradores; imagens cedidas por renomados fotógrafos e artigos jornalísticos, que
relatavam fatos relacionados à criação do PNCG. Mais de 520 pessoas assinaram o livro de
registros.

2
O evento contou com o apoio da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), das Prefeituras de Chapada dos
Guimarães e Cuiabá, da Câmara Municipal da Chapada dos Guimarães, do Conselho Municipal de Turismo de Chapada
dos Guimarães (COMTUR), da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), da Associação dos Guias e Condutores de
Ecoturismo (AGCE) e da empresa de consultoria ARCHAEO.
3
Abaixo-assinado com as assinaturas de Almir Sater, Thomaz Aquino Lisbôa, Tetê Espíndola, entre outros.
60
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Além de facilitar o conhecimento sobre as atribuições institucionais do ICMBio e do Parque,


o desafio maior foi a reflexão sobre o envolvimento da sociedade na tarefa de conservação da
diversidade natural, cultural e histórica do PNCG. Reconhece-se, entretanto, as limitações desta
proposta. A exposição Memórias do Parque Nacional deve ser compreendida como parte de uma
ação educativa, que contribui para o engajamento dos grupos sociais que convivem diretamente
com o PNCG, sejam vizinhos, moradores, usuários ou beneficiários e nesse sentido não se limita a
ser uma ação pontual (BRASIL, 2016), mas funciona como ponto de partida possível para o
desenvolvimento de novos projetos de Educação Ambiental (EA) na região.
Ressalta-se que as discussões foram dirigidas na primeira roda de ‘Contação de histórias do
Parque Nacional’ por moderadores partícipes da criação do PNCG. Interpreta-se que o
posicionamento político da juventude dos anos 80 era de compromisso com a conservação da
natureza, denominado na época de movimento ecologista, tendo em vista a postura radical diante
dos problemas ambientais. O PNCG foi criado, portanto, a partir da iniciativa de ecologistas,
acadêmicos, intelectuais, artistas e hippies, configurando-se um engajamento popular organizado. O
serviço voluntário foi percebido como uma oportunidade de se conhecer e cuidar do Parque.
Atualmente, os voluntários têm contribuído em diversas atividades de gestão da UC, o que
evidentemente fortalece cada dia mais o Programa de Voluntariado desenvolvido pelo ICMBio. A
segunda roda de conversa ‘O Parque do Amanhã’ iniciou-se com os participantes dispostos em
duplas, os quais responderam à questão norteadora sobre qual Parque desejam para o futuro, ou
seja, que Parque querem para o amanhã. Os registros das falas foram posteriormente sistematizados
e trabalhados em representação gráfica, com base na técnica de visualização nuvem de palavras
(Figura 1). Nessa técnica, as palavras sãoorganizadas “em várias cores e tamanhos, com base no
número de menções feitas no texto” (PRAIS; ROSA, 2017, p. 205). Esse resultado ficou disponível
durante todo o período da exposição. Após monitoria e vivência na Casa do Parque, os visitantes
deixaram suas impressões, respondendo à pergunta: “Que Parque queremos amanhã?”. A
comunidade escolar foi o maior público de visitantes da exposição. Em linhas gerais, os estudantes
demonstraram interesse na vivência. Entretanto, ainda que haja compreensão dos temas abordados,
parece faltar melhor contextualização das informações com relação à realidade em que estão
inseridos, o que motivou a se persistir no diálogo e na dinâmica ‘jogo de palavras’, para que os
jovens fossem capazes de relacionar a UC com sua própria experiência (RODRIGUES, 1996). Em
síntese, no encerramento, os alunos foram convidados para um bate-papo, a fim de que pudessem se
expressar e concluir a visita em uma única palavra sobre o Parque do Amanhã. Surgiram várias
contribuições, as quais foram posteriormente sintetizadas em quatro nuvens de palavras.

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Figura 1 - Nuvens de palavras: “Contação de Histórias do Parque” e “O Parque do amanhã”

Fonte: Arquivo do PNCG/ICMBio (2019)

Os resultados permitiram o conhecimento, de maneira singela, acerca da visão que a


sociedade local tem do contexto em que se insere o PNCG e seu entorno. As nuvens de palavras
revelaram a importância da subjetividade, enquanto geradora de relações educativas, porque dão
ênfase ao conhecimento a partir do sujeito (GUTIÉRREZ; GADOTTI, 2001). Quanto ao ambiente
proporcionado na Casa do Parque e a atmosfera criada para se recordar o processo histórico, esses
demonstraram ser válidos enquanto capacidade de se educar, desde que os visitantes percebam e
deem significância ao Parque.
Para este trabalho, considera-se fundamental refletir-se sobre o pensamento de que

[...] educativamente, não são os resultados ou produtos finais do processo o que nos deve
interessar, e sim o apalpar, sentir, degustar e recriar, pois, é assim que estaremos
consolidando o processo de maneira permanente e intensa. Esse processo com suas relações
subjetivamente significadas, é o que educa e enriquece. (GUTIÉRREZ; GADOTTI, 2001,
p. 113).

4. CONCLUSÃO
A partir do objetivo do relato, verificou-se que é possível a inclusão da sociedade na
conservação da biodiversidade. A sensibilização proporcionada no ambiente da Casa do Parque
estimulou uma desejada tomada de consciência em relação ao PNCG, o qual precisa ser, antes de
tudo, conhecido. Nesse sentido, uma modesta exposição, que se desloca do espaço físico do Parque
até à pequena cidade que lhe empresta o nome, demonstra seu valor ao permitir que maior número
de pessoas não só conheça, mas reconheça a importância do PNCG em suas vidas, transformando-
as em cidadãos atuantes ao compartilhar com o Estado o dever de defender e preservar o meio
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ambiente para as presentes e futuras gerações, conforme a Constituição Federal brasileira.


Confirma-se a necessidade de se valorizar a gestão da memória do PNCG, pois, a partir do
conhecimento dessa história, pode-se projetar o Parque no futuro. Obter-se o engajamento
consistente, a partir da EA, da comunidade escolar na conservação da sociobiodiversidade é um
passo importante para o enfrentamento dos desafios frente às atuais ameaças ao meio ambiente. O
caminho para o engajamento da sociedade em uma nova postura com relação às UC é longo.
Contudo, destaca-se a percepção de que está em curso uma nova era e que os Parques Nacionais
fazem parte desse processo.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII
da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá
outras providências. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC. Brasília:
Diário Oficial da União, 2000.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente (MMA). Instituto Chico Mendes de Conservação da


Biodiversidade (ICMBio). Educação ambiental em unidades de conservação: 2016 ações
voltadas para comunidades escolares no contexto da gestão pública da biodiversidade. Brasília:
MMA, 2016.

CORDIOLI, Sérgio. Enfoque participativo – um processo de mudança. 2. ed. rev, e ampl, Porto
Alegre: [s.n.], 2019.

GUTIÉRREZ, Francisco; GADOTTI, Moacir. Educação comunitária e economia popular. São


Paulo: Cortez, 2001.

ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Plano de Manejo - Parque


Nacional da Chapada dos Guimarães. Chapada dos Guimarães/MT: ICMBio, 2009.

PRAIS, Jacqueline; ROSA, Vanderley. Nuvem de palavras e mapa conceitual: estratégias e recursos
tecnológicos na prática pedagógica. Nuances Estudos sobre Educação, Presidente Prudente - SP,
v. 28, n. 1, p. 201-219, jan./abr. 2017. Disponível em:
http://revista.fct.unesp.br/index.php/Nuances/article/view/4833. Acesso em: 13 ago. 2019.

RODRIGUES, Vera Regina (coord.). Muda o mundo, Raimundo!: educação ambiental no ensino
básico do Brasil. Brasília: WWF, 1996.

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ENTRE RODAS, REDES E MERGULHOS: DAS FORMAÇÕES AO


ENVOLVIMENTO SOCIOAMBIENTAL NO PARQUE NACIONAL
MARINHO DOS ABROLHOS

Luana Manzione Ribeiro*, Fernando Pedro Marinho Repinaldo Filho**, ***Maria Aparecida
Macário

*Parque Nacional Marinho dos Abrolhos - ICMBio – Brasil (luana.ribeiro.bolsista@icmbio.gov.br),


**Parque Nacional Marinho dos Abrolhos – ICMBio – Brasil(fernando.repinaldo.filho@icmbio.gov.br)
***Parque Nacional Marinho dos Abrolhos – ICMBio – Brasil (maria.aparecidaabrolhos@gmail.com)

1. INTRODUÇÃO
O relato de experiência a seguir, trata do Parque Nacional Marinho (PARNAM) dos
Abrolhose suas ações de Educação Ambiental (EA) e Inclusão social. O PARNAM foi a primeira
unidade de conservação (UC) dessa categoria no Brasil. A região em que está localizado é
reconhecida por abrigar o maior e mais complexo recifal do Atlântico Sul, abrigando a maior
biodiversidade do Brasil e importante berçário para inúmeras espécies. Sua implementação, em
1983, representou um marco para a proteção deste ecossistema, além de impulsionar o
desenvolvimento econômico regional por meio das operações turísticas, ampliando e diversificando
as formas de ocupação profissional, tais como: hospedagem, receptivo turístico, alimentos e
bebidas, meios de transporte, pesquisa, dentre outros. Localiza-se na principal região pesqueira do
Nordeste, sendo esta a principal atividade econômica nos municípios de seu entorno. Tal contexto
faz com que a pesca seja um dos fatores que ameaçam sua biodiversidade, logo a atuação da
implementação do Parque possui um histórico de conflitos com as comunidades locais, que têm
como principal atividade a pesca, mas ao longo dos anos busca práticas e propostas de diálogo e
partilha para mitigá-los.
Em busca desse diálogo e proteção da biodiversidade a região também recebeu a Área de
Proteção Ambiental (APA) da Ponta da Baleia, UC estadual, em 1993, como instrumento
complementar à conservação da biodiversidade local e desenvolvimento territorial
sustentável.Diante desse cenário e, como resposta à tentativa de implantação da atividade de
carcinicultura na região, em 2009, o território conquistou a demarcação da Reserva Extrativista de
Cassurubá – RESEX a qual contribuiu, com o Parque, para os processos de proteção de importante
porção do ambiente costeiro-marinho além da inclusão e envolvimento das comunidades
tradicionais ribeirinhas na compreensão da importância e proteção da biodiversidade marinha.
Frente a esse mosaico de UCs buscamos ações complementares que primem por caminhos e
possibilidades de parceria objetivando o envolvimentoda comunidade na conservação da
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biodiversidade,fortalecimento de vínculo interinstitucional (associações de moradores, pescadores e


marisqueiras; colônias de pescadores; ONGs e demais comunitários) e inclusão social. A partir de
nossos macro objetivos pautamos nossos objetivos específicos, sendo estes, respectivamente:
participação de diversos atores sociais no conselho do Parque; participação nos diversos eventos
sociais, educacionais e culturais de nosso território com a equipe de EA;formações participativas de
fortalecimento comunitário, formações técnicas para a geração de renda, acesso à comunidade a
programas de visitação ao Parque, programa de voluntariado, dentre outros.

2. MATERIAL E MÉTODO
O ato de envolver/incluir um indivíduo ou grupo nos processos de uma área protegida requer
escuta atenta, observação participante e empatia (MENDES, 1998). Esses pilares movem a equipe
do PARNAM dos Abrolhos nos processos de inclusão e participação social, bem como na criação
de novas propostas. Com base nessas técnicas consolidou-se junto à nossa equipe a gestão
participativa construída em sinergia com as demais UCs do território, Comunidades tradicionais,
Conselhos das UCs, Setor Público e Sociedade Civil, como ferramenta essencial para a idealização
de propostas, projetos e programas. Nossa gestão participativa foi sendo consolidada, inicialmente,
via conselho do Parque. O Conselho Gestor do PARNAM foi criado em 2002 e mantém
funcionamento desde então, tendo em 2017 seu último processo de revisão. Esse espaço de diálogo
tem sido de grande valia para o balizamento e conhecimento das demandas dos parceiros, pois é
diverso em sua composição, desde ONGs, Colônias de Pescadores, Órgãos Públicos e Sociedade
Civil. As demandas de nossos parceiros, conselheiros e comunidade em geral correspondem,
prioritariamente, com relação a aspectos de EA para as novas gerações e comunidade, formações
técnicas para a geração de renda alternativas à pesca e apoio com recursos humanos e materiais para
ações alinhadas aos objetivos das UCs do território.Com base nas demandas gerais levantadas no
Conselho e reuniões para demandas específicas, o Parque busca ações de integração e alinhamento
de nossos objetivos aos eixos dos Parques Nacionais estabelecidos pelo Sistema Nacional de
Unidades de Conservação, sendo estes, educacionais, recreacionais e científicos.
No âmbito da educação dentre as ações educacionais podemos citar o Programa
“Professores no Parque”; Ações educativas nas escolas públicas e privadas do Território; Projeto de
Educomunicação dos Abrolhos; Ações educativas em espaços e eventos públicos de caráter
educativo; Formação de condutores de visitantes e mergulhadores autônomos recreativos
profissionais (Divemaster) e Fortalecimento/formação da equipe de voluntários; Oficinas para a
elaboração do Plano Interpretativo do Parque; Formação de guias no Curso de Turismo de Base
Comunitária (TBC); Circuito Tela Verde (em parceria com a Secretaria do Meio Ambiente
Municipal de Caravelas). Com relação à dimensão recreacional podemos exaltar o Programa
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“Comunidade em Abrolhos”; a instalação de um mural artístico, realizado por artista local, em que
representa a biodiversidade marinha do Parque e fomenta experiência lúdica singular a partir da
observação. No âmbito científico salientamos os Programas de Pesquisa e Monitoramento: lixo,
aves marinhas, tartarugas, corais; Programa Abra os Olhos para a Ciência; Programa Ciência no
Parque, atividades que contam com o envolvimento de voluntários da comunidade, estudantes e
pesquisadores do território e demais estados brasileiros.
Nas três linhas de atuação temos como pressuposto o acolhimento e parceria da comunidade
do entorno e território. Essas parcerias vêm sendo cuidadosamente construídas a partir da
mobilização dos comunitários para participarem das atividades, vale ressaltar que, algumas ações
nasceram de demandas da própria comunidade e passaram por adaptações a partir das avaliações da
mesma ao longo de sua ocorrência.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Mensurar resultados quando tratamos de educação, formação e interpretação ambiental
(conhecer, acreditar, sentir e praticar) por vezes, pode se limitar a dados quantitativos. Entendemos
que nesse momento nosso grande desafio é estabelecer critérios e ferramentas para aferirmos nossos
resultados e alcance de forma qualitativa, pois ainda não dispomos de técnicas para tal.
Com relação aos dados quantitativos, temos adotado a prática de consolidar nossas ações por
meio de infográficos e tabelas como ferramenta para análise e contribuição no embasamento de
nossa reflexão, avaliação, continuidade e aprimoramento de nossas práticas. Podemos trazer
exemplos de alguns resultados quantitativos, tais como: 200 professores formados no Programa
“Professores no Parque”; 1000 visitantes do território no Programa “Comunidade em Abrolhos”; 6
profissionais de mergulho formados no Programa “Dive Master”; 2 jovens da comunidade
participantes do Projeto “Abra os olhos para a ciência” (parceria do Parque com a EE Polivalente e
CNPQ), dentro outros. A escolha do métodos dessas ações (participativas, de fortalecimento e
inclusivas) fomentaram uma relação de parceria, partilha e confiança que consolidou uma rede de
apoio ao engajamento na conservação da biodiversidade.
Contudo, ainda que nossa mensuração de resultados qualitativosseja incipiente, pois não
temos uma avaliação sistemática, por exemplo, de como os professores que participaram do
Programa introduziram no currículo escolar e/ou no Projeto Político Pedagógico de suas escolas as
discussões e conteúdos desenvolvidos. Nosso repertório qualitativo fica restrito a alguns
depoimentos informais.Entendemos que para avançarmos não nos basta os dados quantitativos,
primeiramente por estarmos tratando de educação; formação e relações de integração institucionais
e comunitárias, ou seja, são ações que devem ser uma constante em nossa prática e sempre que
possível avaliadas e alinhadas à nossas metodologias e novas abordagens e estratégias quando
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

diagnosticado. Nessa perspectiva, buscamos junto a nossa equipe e parceiros iniciar nossas
propostas e ações alinhados à discussão acerca do conceito de território educador e aos objetivos do
desenvolvimento sustentável (ODSs) pautados pela ONU, para além dos pilares e técnicas já
apresentadas.
Diante do cenário de nosso território, por conta de sua identidade e histórico de ações de
educação e práticas ambientais sustentáveis e a consolidação de uma rede (Parque e demais
instituições), propusemos neste segundo semestre o início da construção de um Projeto Político
Pedagógico de Educação Ambientalde forma a nos apoiar em nossas ações e avaliações.
Entendemos que um dos eixos da EA tem de ser a avaliação qualitativa, devendo ser construída
coletivamente.

4. CONCLUSÃO
Ao tratarmos de áreas protegidas, desenvolvimento sustentável, proteção e conservação da
biodiversidade é de extrema importância a integração territorial por meio de métodos e técnica
ativas e participativas. Nesse sentido o Parque tem caminhado e buscado promover relações
baseadas na construção coletiva, partilha e escuta das demandas e propostas de todos os atores
envolvidos na conservação da biodiversidade marinha do entorno do Parque. No entanto, fica
evidente a necessidade de melhor avaliar seus processos e ações dentro e fora do parque para
construir atividades mais eficazes e mais abrangentes no que tange à inclusão e participação das
populações tradicionais e locais. Espera-se, portanto, provocar discussões que avaliem todo o
esforço da unidade que, mesmo contando com pequeno efetivo, além dos voluntários e bolsistas,
tem realizado atividades importantes na região, mas que podem ser potencializadas por meio de
direcionamentos em busca de mais eficácia e de estabelecimento de uma rede.
Com um grande número de parceiros e crescente demanda por EA, urge estabelecermos
critérios e ferramentas de aferição dos resultados, pois as ações pontuais, ainda que importantes,
precisam ser mensuradas em sua eficácia e alcance para além das aferições quantitativas. Medir
qualitativamente é também verificar o grau de eficácia dos processos.Sendo assim, esse trabalho
propõe e provoca uma discussão interna da unidade em avaliar o rol de atividades realizadas e
coordenadas por ela no sentido de buscar além de fazer mais, fazer melhor.

5. AGRADECIMENTOS
Para que toda essa história fosse viabilizada foi necessário o apoio, acolhimento e confiança de
muitas pessoas e instituições. Inicialmente, gostaríamos de agradecer às equipes do PARNAM dos
Abrolhos, RESEX de Cassurubá, APA da Ponta da Baleia e Projeto GEF Mar/ FUNBIO que se
empenham diariamente em promover e viabilizar nossas ações. Contudo, todo esse esforço seria em
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vão se a comunidade de nosso território não partilhasse seus interesses, suas experiências e se
dispusesse a se envolver nas ações coletivas. Nosso muito obrigada às comunidades tradicionais
(afro-indígenas, pescadores, marisqueiras), moradores do entorno, voluntários do território e de
diversas partes do país, operadores de turismo - Abrolhos Adventure, Abrolhos Embarcações,
Apecatu Expedições, Horizonte Aberto e Sanuk - Mergulho Abrolhos, ONG´s com atuação
histórica na região, Conselheiros das UC´s, Setor Público dos municípios da Costa das Baleias
(Alcobaça, Caravelas, Itamaraju, Itanhém, Mucuri, Nova Viçosa, Prado e Teixeira de Freitas)
visitantes do PARNAM que nos provocam e estimulam nesse objetivo de consolidar espaços de
participação e inclusão social equitativos.

6. REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Josimar Ribeiro de (et al). Planejamento ambiental: caminhos para participação
popular e gestão ambiental para nosso futuro comum. Uma necessidade. Um desafio. 2ª edição.
Rio de Janeiro: Thex Editora, 1999.

CAVALCANTI, Clóvis. Desenvolvimento e natureza: Estudos para uma sociedade sustentável.


2ª edição. São Paulo: Cortez, 1998.

DIEGUES, Antonio Carlos. O mito moderno da natureza intocada. 3ª edição. São Paulo:
Hucitec, 2000.

INSTITUTO CHICO MENDES PARA A BIODIVERSIDADE – ICMBio. Parque Nacional


Marinho dos Abrolhos. Disponível em: http://www.icmbio.gov.br/parnaabrolhos/. Acesso em:
09/08/2019.

______. Plano de Manejo – Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. Brasília, 1991. Disponível
em: http://www.icmbio.gov.br/parnaabrolhos/images/stories/downloads/Plano_de_Manejo_-
_Parque_Nacional_Marinho_dos_Abrolhos.pdf. Acesso em: 16/08/2019.

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SONHOS DA JUVENTUDE - DRAGON DREAMING E EDUCAÇÃO PARA


SUSTENTABILIDADE NA ÁREA DE PROTEÇÃO PETRÓPOLIS/RJ
YOUTH DREAMS - DRAGON DREAMING AND EDUCATION FOR SUSTAINABILITY AT
THE PETRÓPOLIS PROTECTED AREA/RJ

Priscila Franco Steier*, Rodrigo Xavier D'almeida**, Fabiano Francisco de Azevedo***

APA Petrópolis/ICMBio,MSc. Environmental Governance, Universitat Freiburg - Alemanha*


(priscila.franco@icmbio.gov.br)
MSc. Práticas de Desenvolvimento Sustentável, UFRRJ - Brasil**
Centro de Defesa dos Direitos Humanos/Petrópolis, Biólogo, CEDERJ - Brasil ***

1. INTRODUÇÃO
A Área de Proteção Ambiental de Petrópolis – APA Petrópolis, criada em 1982, é uma
Unidade de Conservação (UC) federal situada na região Serrana do Estado do Rio de Janeiro e tem
como principais objetivos a manutenção da qualidade hídrica, dos remanescentes de mata atlântica e
da qualidade de vida humana. A UC é um mosaico de distintas formas de uso e ocupação do solo,
desde áreas urbanas entremeadas por patrimônio histórico, a extensas zonas rurais, remanescentes
de mata atlântica e afloramentos rochosos que abrigam espécies endêmicas.
Criado em 1997, o Conselho Gestor da APA Petrópolis passou por um processo de avaliação
em 2017 onde se identificou necessário fomentar uma atuação mais colaborativa e executiva. No
bojo da renovação do conselho, em 2018, a APA Petrópolis executou o projeto "Jovens
Protagonistas rumo ao conselho gestor da APA Petrópolis" envolvendo jovens de comunidades
rurais, comunidades urbanas vulneráveis e universitários.
O projeto foi inicialmente baseado na metodologia "Verde Perto - Jovens Protagonistas",
fundamentadano diálogo entre ciências, artes, conhecimento tradicional e linguagem jurídica para
valorização do protagonismo jovem e participação cidadã (ICMBio, 2013). Porém, para viabilizar
sua execução, a metodologia foi totalmente adaptada, mantendo como referencial teleológico o
florescimento da empatia entre os jovens de diferentes contextos sócio-culturais, visando seu
consequente engajamento em ações coletivas.
O projeto "Florescer", conduzido pelo Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH-
Petrópolis) desde 1997, tem como proposta a educação popular de jovens e organização
comunitária, Educação Ambiental e práticas agroecológicas, a partir das dimensões do lúdico,
afetivo, psíquico, corporal, teatral, estético e paradigmático. Por guardar estreita relação com os
objetivos e as escolhas pedagógicas do projeto Jovens Protagonistas e em razão da dificuldade de

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manter os jovens mobilizados para as atividades após o encerramento oficial do projeto, os jovens
do projeto "Florescer" passaram a ser o principal público alvo da experiência ora relatada.
Dentre as vivências e metodologias utilizadas no percurso, o Dragon Dreaming foi a que se
demonstrou mais potente e é o foco do presente relato. Dragon Dreaming é uma metodologia
colaborativa, desenvolvida por John Croft no contexto do ativismo socioambiental australiano e
inspirada por elementos da cosmologia aborígene, especialmente o karlupgur- o fogo da terra onde
as pessoas compartilham sonhos, contam histórias, tomam decisões, planejam atividades e celebram
ao final do dia. A filosofia do Dragon Dreaming é baseada em três objetivos: Servir a Terra,
Construir Comunidades e Crescimento Pessoal (BLANKE ET AL, 2013).
A prática do Dragon Dreaming ambiciona a criação de uma nova cultura, baseada na escuta
profunda da Terra,dos outros e de si. Uma cultura que confia na capacidade de plasmar jogos
ganha-ganha a partir da auto-vulnerabilização consciente e a abertura para o novo. O presente
trabalho apresenta, portanto, um relato de experiência de educação ambiental no contexto da
educação popular de jovens, a partir da metodologia Dragon Dreaming, na APA Petrópolis.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Durante a condução do projeto, a metodologia Dragon Dreaming foi incorporada em dois
momentos: uma oficina básica de "Gestão de Projetos Colaborativos" e uma oficina introdutória de
Dragon Dreaming. As atividades da oficina introdutória foram realizadas em seis encontros, com
carga horária total de 32 horas, nos meses de junho e julho de 2019, estruturados nos ciclos: Sonhar,
Planejar, Realizar e Celebrar. O total de recurso financeiro investido foi de R$ 2.800,00, com,
aproximadamente, 20 beneficiários diretos. Segue abaixo uma descrição de cada ciclo.
No ciclo Sonhar, cada participante foi convidado a expressar um sonho, enquanto os demais
participantes praticavam a escuta aberta, sem negar ou refutar o que foi dito. Posteriormente foram
criados círculos dos sonhos, para envolver o grupo em assumir o sonho individual enquanto um
sonho coletivo. Para tanto, os participantes são convidados a responder como deveria ser esse
projeto para que se sintam felizes em ter colaborado, isto é, quais as necessidades de cada um para o
real engajamento no projeto (BLANKEET AL, 2013). Foram definidos três grupos de trabalho
referentes as temáticas de saúde, inclusão social e meio ambiente para que fosse feita a releitura dos
sonhos enquanto projeto coletivo.
No ciclo Planejar, os participantes identificaram os objetivos e a declaração comum de suas
linhas de projetos. O trabalho iniciou da perspectiva do indivíduo, onde cada participante identifica
os objetivos que avalia estar associado aos sonhos manifestados. Os objetivos são agrupados em
categorias e cada pessoa tem a chance de reagrupar conforme sua avaliação, expressando seus
motivos. Nesta fase surge a oportunidade de nos deparamos com nossos Dragões e conflitos podem
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

aparecer. Os jovens foram, então, estimulados a trabalhar os conflitos por meio de ferramentas
como a comunicação não violenta e a escuta empática. A principal ferramenta do ciclo de
planejamento é o tabuleiro Karabirrdt, ou teia de aranha, pelo qual as tarefas são definidas e
distribuídas nas quatro etapas do projeto.
Na presente experiência, os ciclos Realizar e Celebrar ocorreram simultaneamente no último
encontro, a partir da execução do projeto de inclusão social “Celebrando os idosos # força vovó”.
Os jovens visitaram um lar de idosos na cidade, celebrando uma tarde de trocas, com música e
canto, contação de histórias, memórias entre jovens e idosos.
Encerrando o percurso, os participantes foram convidados a celebrar as habilidades
adquiridas por cada um, assim como os resultados transformadores envolvendo o grupo. Esse
processo possibilita que os participantes percebam com sabedoria onde estão os medos e bloqueios
de si e do coletivo, fortalecendo redes de resiliência, possibilitando multiplicar seus sonhos e cocriar
novas realidades a partir de processos regenerativos.

3. RESULTADOS
Como resultado direto da Oficina Introdutória de Dragon Dreaming, os jovens elaboraram
três projetos com impacto comunitário nas áreas de saúde, meio ambiente e inclusão social: (i)
Transformando vidas com boas ações de saúde; (ii) Celebrando os idosos # força vovó; e (iii)
Protege Lixeira – consciência ambiental em nossas comunidades.
Entre os benefícios dessa formaçãopara os participantes é possível citar: o fortalecimento
das relações; o engajamento das equipes; o despertar da inteligência coletiva para o
desenvolvimento de soluções criativas; e a integração da razão e da emoção para o desenvolvimento
de processos inovadores, ágeis e eficazes, obtendo resultados de forma mais leve, humana e
divertida.
Além dos resultados envolvendo os jovens participantes das oficinas, a experiência com a
ferramenta fez com que a APA Petrópolis mobilizasse o Comitê da Bacia Hidrográfica do Piabanha
e o Conselho Gestor da APA Petrópolis para realizarem treinamento em Dragon Dreaming com
objetivo de dar um salto em sua capacidade executiva articulada. Nota-se, portanto, que o objetivo
inicial do projeto de inspirar os jovens para ações coletivas de impacto, não só foi alcançado, como
despertou instancias robustas e consolidadas da gestão ambiental pública no território a querer
dançar com os dragões. É tempo de sonhar.

4. DISCUSSÃO
O Dragon Dreaming vem sendo aplicado em contextos de desenvolvimento pessoal a gestão
corporativa. No Brasil, apesar da rápida difusão em diferentes círculos e de sua origem no ativismo
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socioambiental, pouco se tem notícia da aplicação do Dragon Dreaming na Educação Ambiental ou


Educação para Sustentabilidade junto à juventude. O projeto "Escolas Resilientes" desenvolvido por
Rodrigo D'almeida é talvez um dos pioneiros na utilização da metodologia no contexto educacional
formal (D'ALMEIDA, 2017). Ainda assim, no que se refere à educação popular de jovens, a
presente experiência é inovadora.
O projeto ora relatado inova ainda frente à forma que o ICMBio historicamente conceitua e
opera a Educação Ambiental na gestão pública (LOUREIRO; CUNHA, 2008). A organização se
fundamenta na abordagem Educação Ambiental crítica, centrada no discurso da não neutralidade,
na ênfase das assimetrias de poder e dos tensionamentos classistas que engendram disputas no
campo político (LOUREIRO; CUNHA, 2008; QUINTAS, 2004).
Em face ao esgotamento afetivo-social causado pela crescente polarização política que vem
sendo vivenciada no Brasil nos anos recentes, o presente projeto, ao contrário, ousou partir da idéia
de colaboração, baseada no paradigma da regeneração que, por princípio, se posiciona de maneira
acolhedora na superação das dicotomias (WAHL, 2016).
Ao trazer para o centro do processo educativo a empatia com a diferença, o cuidado e a ação
coletiva com sentido, a experiência ora relatada dialoga com os princípios da Educação para
Sustentabilidade, ou ecopedagogia, uma "pedagogia biófila, que promove a vida: envolver-se,
comunicar-se, compartilhar, problematizar, relacionar-se, entusiasmar-se; o caminhar com sentido
na vida cotidiana; uma racionalidade intuitiva e comunicativa, afetiva, não instrumental; reeducar o
olhar, o coração, os sentidos; uma cultura da justipaz e da sustentabilidade” (GADOTTI, 2008,
p.32). O Dragon Dreaming transforma na prática o "projeto utópico" da ecopedagogia em sonho;
para então, coletivamente planejá-lo, executá-lo e celebrá-lo.
Não se trata, portanto, de negar a trilha percorrida da Educação Ambiental Crítica que
posicionou debates políticos fundamentais (GADOTTI, 2008; QUINTAS, 2004), mas de fazer uma
aposta de que a educação emancipatória pode ser também alcançada pela cultura da regeneração,
dando um salto da polaridade para a pluralidade e da participação para a colaboração. Uma cultura
que é crítica em um nível profundo ao questionar não somente modelos de desenvolvimento, masa
atualidade dos próprios modelos mentais e narrativas sobre quem somos; propondo a criação de
narrativas para um novo ser e um novo mundo (WAHL, 2016).

5. CONCLUSÃO
Em um momento de polarização feroz, as capacidades humanas de dar e receber afeto bem
como de escuta verdadeira estão duramente combalidas. Mais do que uma velha política a ser
combatida, precisamos soltar a velha história. O paradigma da cultura regenerativa propõe criarmos

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

uma nova história, uma nova narrativa (WAHL, 2016). Propõe enxergarmos e confiarmos na
humanidade de cada um e de todos.
Neste sentido, o Dragon Dreaming se apresenta como ferramenta sistemática para recriar
espaços de diálogos verdadeiramente acolhedores, múltiplos e divertidos. A partir da experiência
ora relatada e de experiências recentes no Comitê de Bacias de Ilha Grande (AGEVAP, 2019), a
gestão da APA Petrópolis aposta que a utilização do Dragon Dreaming no âmbito de conselhos
gestores de UCs e demais instancias participativas de gestão territorial será poderosa ferramenta
para alcançar o engajamento colaborativo da sociedade em sua pluralidade.
O presente trabalho, portanto, mais do que um relato de experiência, ambiciona ser como a
potência criadora karl - o fogo amarelo da infância do sol da manhã e convidar o interlocutor para
cocriar uma nova cultura na gestão ambiental pública - uma cultura de escuta profunda, que nos
torne capazes de dançar com os dragões, mesmo em tempos de polarização.

6. REFERÊNCIAS
AGEVAP. Oficina de Elaboração do Planejamento Estratégico Institucional do Comitê de
Bacia da Região Hidrográfica da Baía da Ilha Grande. 2019. Disponível em:
http://agevap.org.br/baiadailhagrande/6_est_proj/relatorio-final.pdf. Acesso em 13/09/2019.

BLANKE, C., CROFT, J., PRADO, M., KOGLIN, I. Dragon Dreaming - Desenho de Projetos.
2013. E-book. Disponível em: http://www.dragondreaming.org/about-us/the-international-e-book/
Acesso em 13/09/2019.

D'ALMEIDA, R. Escola Resiliente: Práticas Colaborativas para Redução de Riscos no


Ambiente Escolar / Rodrigo D'Almeida. 2017. Dissertação (Mestrado em Práticas de
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GADOTTI, M. Educar para a sustentabilidade: uma contribuição à década da educação para


o desenvolvimento sustentável. São Paulo: Instituto Paulo Freire. 2008.

ICMBio. Projeto Capacitação de Jovens - orientações projetos piloto. 2013.

LOUREIRO, C. F. B. & Cunha, C. C. Educação ambiental e gestão participativa de unidades de


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transformadora e emancipatória. In: LAYRARGUES, P. P. (Coord.). Identidades da educação
brasileira. Brasília: MMA. p. 113-140. 2004.

WAHL, D. C. Designing regenerative cultures. Axminster: Triarchy Press. 2016.

73
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CRIAÇÃO DO GRUPO DE MONITORAMENTO COMUNITARIO


AMBIENTAL DO CARANGUEJO-UÇÁ NA RESEX CHOCOARÉ MATO-
GROSSO/PA, BRASIL
CREATION OF THE COMMUNITY ENVIRONMENTAL MONITORING GROUP OF CRAB
ON THE RESEX CHOCOARÉ MATO-GROSS/PA, BRAZIL

Rubens Ramos Dias*, Camila Lima de Oliveira**, Maximiliano Niedfeld Rodriguez***

Biólogo, Voluntariado ICMBio, UFPA, Brasil.* Geografa, UNOPAR, Brasil; MSC Ecologia e Conservação**, Chefe
da Resex Chocoaré-Mato Grosso, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade***

INTRODUÇÃO
O caranguejo uçá (Ucides cordatus, linnaeus) constitui-se como um dos principais recursos
pesqueiros estuarinos, em virtude de sua grande abundância e da facilidade de captura, a qual não
exige métodos e técnicas sofisticadas, impedindo deste modo o controle efetivo da sua produção
total (CASTRO, 1986).No Brasil, a atividade de captura dessa espécie é uma das mais antigas
práticas de extrativismo nos manguezais e muitas comunidades tradicionais ainda sobrevivem dela
(GEOBRASIL, 2000).
Em todas as regiões de mangue existem pessoas que vivem da captura do caranguejo, para
vendê-lo a bares, restaurantes, cabanas de praia, feiras livres ou a atravessadores, que
comercializam o produto nos grandes centros, sendo estes últimos os que mais lucram com o
processo. Essa pressão, exercida através da sobrepesca (captura acima do nível de produção), ao
longo dos anos, pode interferir no tamanho máximo alcançado pela espécie na região, além da
diminuição no estoque natural, levando ao aumento do esforço de pesca, para manter a média de
produção.Entre os crustáceos de valor comercial, o caranguejo-uçá (Ucides cordatus) se destaca
pelo grande número de extratores que dependem de suas capturas (IVO & GESTEIRA, 1999).
Para Araújo et al (2013) a Educação Ambiental é um ato transformador, uma ferramenta
capaz de promover a mudanças de hábito, atitudes e comportamentos, imprescindíveis para o
equilíbrio do Planeta. Também há a necessidade de aplicação desse conhecimento em ações de
sustentabilidade no extrativismo do caranguejo, fornecendo subsídios para o ordenamento da pesca,
assegurando o potencial sustentável de captura e a manutenção dos estoques em níveis adequados
de exploração.
Esta pesquisa foi realizada na Reserva Extrativista Chocoaré-Mato Grosso, localizada no
município de Santarém Novo/PA e em suas especificidades e organização. Tem o objetivo de
mostrar a criação do grupo de Monitoramento Comunitário Ambiental do caranguejo-uçá na Resex

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Chocoaré Mato Grosso/PA (GCA) e suas ações que foram feitas na Resex antes e durante o período
de reprodução do caranguejo-uçá através da Educação Ambiental (EA). Este trabalho é resultado do
curso de Formação e Gestão Socioambiental através do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade realizado na ACADEBio nos anos de 2017/2018.

METODOLOGIA
A Resex possui uma área de 2.785,72 hectares e está localizada no Bioma Amazônico, em
sua Zona Marinho Costeira e encontra-se integralmente no município de Santarém Novo, estado do
Pará criada por meio de decreto presidencial de 13 de dezembro de 2002, com os objetivos de
assegurar o uso sustentável e a conservação dos recursos naturais renováveis, protegendo os meios
de vida e a cultura da população extrativista local. Atualmente, a Unidade de Conservação abrange
cinco Polos (Bacuriteua, Chocoaré, Pedrinhas, Peri-Meri e Sede), onde existem 17 comunidades.
Constam 672 famílias Beneficiários em levantamento realizado pelo ICMBio em 2014
A implementação do projeto se deu junto ao conselho deliberativoe com osbeneficiários da
UC. Assim,o trabalho que foi apresentado em 04 (quatro) etapas até sua elaboração final em forma
de relatório das ações que foram realizadas dentro da Resex.Ribeiro et al. (2005, p. 82) consideram
que algumas especificidades permitem identificar as populações tradicionais, pois esses grupos
ocupam territórios próprios com fronteiras definidas, criam normas internas para a coletividade,
estabelecem controle comunitário sobre os recursos naturais, conservam costumes específicos,
criam sanções e mecanismos locais de negociação dos conflitos.
Para o coordenador a construção de um projeto na UC é visto como um passo estratégico
para reverter danos, os mangues locais são utilizados pelos “oportunistas”pessoas que buscam
conflitos ocasionando transtorno para a gestão local na época do (soatá).Neste período, os
indivíduos saem das tocas para se reproduzirem, fenômeno conhecido pelos catadores como andada
ou carnaval do caranguejo (ALCÂNTARA-FILHO, 1978).
A pesquisa visa identificar os fatores que determinam ou contribuem para a ocorrência dos
acontecimentos. Caracteriza-se pela utilização do método experimental (nas ciências físicas ou
naturais) e observacional (nas ciências sociais). Geralmente, utiliza as formas de Pesquisa
Experimental e Ex-post-facto. Método adequado para pesquisas que procuram estudar a influência
de determinados fatores na determinação de ocorrência de fatos ou situações. (GIL, 1996;
DENCKER, 2000).

RESULTADOS

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Foram realizadas quatro reuniões, cada reunião tinha propostas diferenciadas e estratégicas
para definir cada etapa do projeto, como solicitar um espaço para mostrar o projeto durante a
reunião do CONDEL.

As mobilizações para as reuniões foram feitas através de oficio, convite pessoal e por meio
da rádio local para os membros do conselho deliberativo (Condel) e demais parceiros, as reuniões
aconteceram nos meses de Dezembro (22/12/17)como intuito de mostrar uma proposta de uma ação
pedagógica (projeto) de Educação Ambiental (EA), para quais as ideias seria a criação de um grupo
de Monitoramento Comunitário Ambiental do caranguejo-uçá na Resex Chocoaré Mato Grosso/PA
(GCA) no ano de 2018.Tendo alguns objetivos específicos para o projeto como:Entender porque a
comunidade captura o caranguejo-uçá na época da reprodução, Procurar dialogar sobre as possíveis
formas de proteção do espécime na época da sua reprodução, buscar ou envolver os comunitários na
proteção do caranguejo buscando sua sustentabilidade pesqueira e elaborar estratégias para evitar o
excesso de captura nessa época, buscar alternativas junto aos usuários para outros tipos de
subsistência. Sempre usando o meio da educação ambiental como formar de organização em equipe
e concientização.
A segunda reunião foi realizada emjaneiro (11/01/18)com o objetivo de definir as propostas
para um projeto de intervenção e buscar novos parceiros para a causa, além de identificar o nome do
projeto.A terceira reunião aconteceu após o Suatá em fevereiro (16/02/2018)tendo como objetivo
buscar estratégicas onde seriam levadas as palestras, reuniões, oficinas nas comunidades, e
divulgação do projeto. Além de verificar locais mais vulneráveis na época do defeso. A quarta
reunião foi realizada no mês de março (06/03/2018), a mesma foi realizada no dia da reunião do
conselho deliberativo, para apresentar o projeto para os conselheiros e demais usuários, neste
momento também ocorreu a definição de ação e onde seriam feitos os embates. Tendo como novos
parceiros o grupo de voluntariado da Resex Chocoaré Mato Grosso/PA, Policia Militar, Policia
Civil e prefeitura municipal fazendo uma ação de conscientização.
O grupo de monitores (GCA) entraram em ação fazendo os embates em diferentes locais da
cidade que foram feitas as diferentes estratégias junto com a gestão e parceiros do projeto, alguns
dos locais de embates mais frequentes foram os trapiches de algumas vilas e locais de acesso para
os manguezais.Assim, esta reunião veio mostrar a importância da criação do projeto para a resex,
devido ao fato das apreensões dos agentes do ICMBio na unidade, apreendendo milhares de
caranguejos, que são o foco do projeto nesse período, dando maior ênfase em ser criado um grupo
de monitoramento como proposto.
A participação da gestão nesse ato pedagógico é importante e estratégico, devido os
membros do conselho deliberativo atuarem diretamente na comunidade em que vivem, sendo seus

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

representantes na Resex, assim o projeto tem um maior sucesso, promovendo um maior diálogo
com os parceiros (Conselho) e usuários, além de serem os próprios usuários que vivem diretamente
da retirada do caranguejo-uçá para sustento de sua família.

Também ressalto que o módulo de planejamento de um ato ou ação pedagógica, plano de


intervenção, módulo de comunicação, palestras e facilitação gráfica, fora pontos importantes de
ensino aprendizagem na ACADEBio ajudaram a impulsionar o projeto pedagógico com uma maior
participação dos membros do conselho que foram os monitores do projeto, sendo peças
fundamentais nessa Educação Ambiental.

CONCLUSÃO
Percebeu-se que a cada encontro a equipe tornou-se mais unida sempre observando os
resultados das atividades que vinham sendo desenvolvidas na unidade, concluindo que uma
Unidade de Conservação é de extrema importância para o uso sustentável dos recursos naturais, e o
quão importante é o trabalho da gestão de uma Resex junto ao conselho deliberativo e demais
parceiros, trazendo benefícios para as unidades, de forma a contribuir com a vida dos povos
tradicionais.
Assim as ações dos atos avaliativos feitos foram processo progressivo auto reflexivo
buscando cada vez mais agregar as parcerias da sociedade para que os mesmo possam ser
sensibilizar com a ação do projeto, tornando futuros educadores e dando continuidade com um
segundo ato pedagógico juntos com a comunidade local. Tivemos como base os aspectos educativos
utilizados nas reuniões, as palestras, estudos de casos, entres eles, vídeos da Resex e suas funções e
o mais importante mostrando a realidade do problema que poderá afetar o espécime e o pescador.

AGRADECIMENTOS
Nossos agradecimentos vão em primeiro lugar a Deus, segundo a Srº Maximiliano Niedfeld
Rodriguez, atual gestor da Resex local que não mediu esforços para que o projeto tivesse transição
direta juntos aos usuários, ao conselho deliberativo e parceiros locais, também ressalto aqueles que
colaboraram de forma direta e indireta com a criação do projeto.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALCÂNTARA-FILHO, P. 1978 Contribuição ao estudo da biologia e ecologia do caranguejo – uça
Ucides cordatus cordatus (Linaeus, 1763) (Crustacea, Decapoda, Brachyura) no manguezal do Rio
Ceará (Brasil). Arquivos de Ciências do Mar, Fortaleza, 18 (1/2): 1-41.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ARAÚJO, L. M. S. da; et al. Educação para a sustentabilidade em comunidades pesqueiras. In:


MATOS, K. S. A. L. de (org.). Educação Ambiental e Sustentabilidade IV. Fortaleza: Edições UFC,
2013.

CASTRO, A.C.L. 1986. Aspectos bioecológicos do caranguejo-uçá Ucides cordatus (Linnaeus,


1763), no Estuário do Rio dos Cachorros e Estreito do Coqueiro, São Luiz, MA. Bol. Lab. Hidrob.,
7:7-26.

DELABIE, J.H.C.; PAIM, V.R.L.M.; NASCIMENTO, I.C.; CAMPIOLO, S.; MARIANO,


C.S.F. (2006) As formigas como indicadores biológicos do impacto humano em manguezais
da costa sudeste da Bahia. Neotropical Entomology, 35(5):602-615. DOI:10.1590/S1519-
566X2006000500006.

DENCKER, ADA DE FREITAS M. Métodos e técnicas de pesquisa em turismo. 4. ed.

GIL, ANTÔNIO C. Como elaborar projetos de pesquisa. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1996.

GEO BRASIL 2000. Perspectiva do Meio Ambiente. 1. ed.

FAUSTO-FILHO J. 1968. Crustáceos decápodos de valor comercial ou utilizados como alimento


no nordeste brasileiro. Biol Soc Cear Agron 9:27-28-

IVO, C. T. G.; DIAS, A. F.; BOTELHO, E. R. DE O.; MOTA, R. I.; VASCONCELOS, J. A. DE;
VASCONCELOS, E. M. S. DE. 2000. Caracterização das populações de caranguejo-uçá, Ucides
cordatus (Linnaeus, 1763), capturadas em estuários do Nordeste do Brasil. Boletin Técnico
Científico do CEPENE, 8 (1): 9-43.

IVO, C.T.C. E GESTEIRA, T.C.V. 1999 Sinopse das observações sobre bioecologia e pesca do
caranguejo-uçá Ucides cordatus (Linnaeus, 1763), capturado em estuários de sua área de ocorrência
no Brasil. Boletim Técnico Científico do CEPENE, Tamandaré, 7(1): 9-52.

PAIVA, M. P. 1997. Recursos pesqueiros estuarinos e marinhos do Brasil. UFC Edições,


Fortaleza, Brasil, 256pp.

Ribeiro, Eduardo Magalhães; GALIZONI, Flávia Maria; CALIXTO, Juliana Sena; ASSIS, Thiago
de Paula; AYRES, Eduardo Barbosa; SILVESTRE, Luiz Henrique. Gestão, Uso e Conservação de
Recursos Naturais em Comunidades Rurais do Alto Jequitinhonha. Revista Brasileira de Estudos
Urbanos e Regionais, v. 7, n. 2, p. 77-99, nov. 2005.

SCHAEFFER-NOVELLI & CINTRON, 1994, citado em Quiñones, 2000.

SCHAEFFER-NOVELLI, Y.; CINTRÓN-MOLERO, G. 1999. Brazilian mangroves: a historical


ecology. Ciência e Cultura, 51 (3/4): 271-286.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PEQUENO GUARDA-PARQUE: INCENTIVOS À INTERPRETAÇÃO


AMBIENTAL PARA A VISITAÇÃO DO PÚBLICO INFANTO-JUVENILNO
PARQUE NACIONAL MARINHO DE FERNANDO DE NORONHA
PEQUENO GUARDA-PARQUE: MOTIVATIONS TO INTERPRETING THE NATURAL
ELEMENTS BY YOUNG VISITANTS ONTHE NATIONAL MARINE PARK OF FERNANDO DE
NORONHA

Lauro Narciso*, Lucas Penna Soares Santos***, Carlos VenícioCantareli**

Biólogo, Editora Naturalistas, Brasil*


Projeto GEF Mar, Centro Nacional de Pesquisa para a Conservação das Aves Silvestres (CEMAVE)/ ICMBio Núcleo
de Gestão Integrada de Fernando de Noronha, Brasil***
MSc. Ecologia Humana, Grupo de Guarda-Parques de Fernando de Noronha, Brasil**

1. INTRODUÇÃO
Os Guarda-parques são profissionais de ambientes naturais que dedicam seus esforços para
proteger a natureza. São atividades como, apoio à fiscalização de Unidades de Conservação (UC),
prevenção de infrações ambientais, monitoramento da vida silvestre, manutenção de trilhas, educação
ambiental e orientação aos visitantes, que fazem parte da rotina destes guardiões (LEAL;
PIETRAFESA, 2008; GAJARDO, 2018). Sendo estes atores as principais referências no dia-a-dia das
regiões naturais, o Guarda-Parque se torna o elo principal entre os representantes públicos e as
comunidades no entorno das UCs (SILVA; SILVA, 2015).
A interpretação ambiental, área de conhecimento pertencente à educação ambiental, é
estimulada de diversas maneiras em ambientes naturais para compreender os elementos presentes e é
muito útil para visitantes destas regiões compreenderem e se sentirem mais próximos dos fenômenos da
natureza (TILDEN, 1957; ICMBio, 2017). A visitação em Unidades de Conservação vem sendo muito
estimulada nos últimos anos e a produção de materiais interpretativos para evidenciar o papel do ser
humano como parte do sistema natural se torna uma ferramenta útil e fundamental (ICMBio, 2018).
Com o foco entre a atuação de profissionais com grande conhecimento da natureza e a
necessidade depromovero conhecimento para visitantes de UCs, o programa "Pequeno Guarda-
Parque", divulga, principalmente, para o público infanto-juvenil e seus familiares, um material
didático informativo e com práticas lúdicas, para incentivar e destacar os elementos naturais presentes
nas áreas protegidas visitadas.

2. MATERIAL E MÉTODOS

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O programa “Pequeno Guarda-Parque”, efetivado pioneiramente no Parque Nacional Marinho


de Fernando de Noronha (PARNAFN), foi realizado de setembro de 2018 a agosto de 2019,através
daelaboração de um material didático preparado em formato de livreto (A5), intitulado como
“Caderneta de Campo”, com 12atividades lúdicas interpretativas aplicadas para o público alvo
(TABELA 1).Assim, realizamos cinco etapas para finalizar o processo de construção do programa:

Tabela 1 – Etapas da construção do programa e títulos das atividades práticas do programa “Pequeno
Guarda-Parque”.
Nº Etapas da construção do programa
1ª Levantamento fotográfico e dos elementos interpretativos dos locais de visitação
2ª Elaboração das atividades lúdicas a serem aplicadas
3ª Design e layout dos elementos gráficos e das atividades práticas de interpretação
4ª Palestra de divulgação aberta ao público sobre o programa e distribuição dos livretos
5ª Reunião pontual com os Guarda-Parques da Unidade para aplicação dos livretos durante o cotidiano

Nº Título da atividade lúdica presente no material didático


1 Mapa da ilha: assinale os locais visitados
2 Dinâmica da natureza: desenho o cenário que você está presente
3 A lua e as marés: qual é a fase da lua hoje? Qual são os horários das marés hoje?
4 Ligueos pontos: gerando o mapa de entorno da ilha de Fernando de Noronha
5 Diversidade: desenho quatro espécies que você avistou
6 Identifique a espécie: conhece as silhuetas destas aves marinhas?
7 Mapa dos sons: feche os olhos, concentre-se e depois desenhe o que escutou
8 Diversidade marinha: desenhe e colora a vida marinha
9 Caça-palavras: encontre as espécies da ilha
10 Fazendo relações: associe os números das espécies com suas características
11 Nós: conhecimento para o dia-a-dia
12 Check-list: quais lições você aprendeu?
Fonte: dados da pesquisa.

Não consideramos neste trabalho o direcionamento das atividades de interpretação ambiental


com base no perfil de turistas que visitam o PARNAFN, mas sim, o trabalho de educação ambiental
sobre a atuação dos Guarda-Parques e seu envolvimento com a natureza local,focado, sobretudo,para
o público infanto-juvenil de moradores da ilha e de turistas.Durante todo o anoe majoritariamente nos
meses de junho e julho, estas crianças e jovenschegam acompanhadas de suas famílias para a
visitação no PARNAFN.
Durante a rotina de trabalho dos Guarda-Parquesas cadernetas de campo foramdistribuídas para
o público alvo. Assim, com o acompanhamento de um profissional Guarda-Parque ou até mesmo de
forma autônoma, os participantes podiam realizar suas intepretações do ambiente, com a possibilidade
de ganhar um certificado de Pequeno Guarda-Parque, caso mostrassem sua curiosidade pelas ações
propostas. Especificamente para a Unidade do PARNAFN, constituem em 11 integrantes a equipe dos
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Guarda-Parques, que são vinculados à empresa concessionária desta UCcom cargo oficial de
“Monitores de Trilhas” e à Coordenação de Uso Público do Instituo Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio).Adicionalmente, o programa contou com a participação do grupo de
voluntários desta Instituição para realização do trabalho. Basicamente, o sistema de trabalho destes
consiste no monitoramento simultâneo de diversas áreas do PARNAFN em todos os dias do ano.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ao todo, foram produzidos 5.000 exemplarespara distribuição gratuita doslivretos “Pequeno
Guarda-Parque”. Durante o período de trabalho, foram distribuídos aproximadamente 2.000 livretos
para o público alvo do programa. Observamos um número relevante de crianças e jovens que
procuraram os Guarda-Parques para realização das atividades e para obtenção do certificado. Os
familiares que interagiram junto com o material também mostraram um retorno positivo e maior
proximidade pelas ações propostas pelo trabalho (FIGURA 1).

Figura 1 – Participação das crianças junto com os Guarda-Parquesnas áreas do PARNAFN.

Fonte: dados da pesquisa.

Dentre as atividades lúdicas presentes no material didático, as atividades “Diversidade


marinha” (nº8) e o “Caça-palavras” (nº9), apresentaram maior frequência de preenchimento pelos
participantes. A possibilidade de citar o juramento, acompanhado da assinatura e da entrega do
certificado, em conjunto com um profissional Guarda-Parque, foi a iniciativa que demonstrou maior

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mudança no comportamento das crianças e no cuidado de um ambiente natural, valorizando ainda


mais o papel do Guarda-Parque e a divulgação desta função, como profissional.
Tilden (1957) cita,entre os seis princípios da interpretação ambiental, que estas atividades
aplicadas para crianças devem ser feitas com um enfoque fundamentalmente diferente e não como
práticas interpretativas com conteúdo voltados para os adultos, porém com conteúdo superficial.
Outros trabalhos utilizam a educação ambiental como área temática fundamental para a construção de
conhecimento e reconhecem resultados positivos para a participação da sociedade para a conservação
de Unidades de Conservação (GOUVEIA; SAISSE, 2000; TOMAZELLO; FERREIRA, 2001).
É válido ressaltar que todo o contexto abordado pelo presente trabalho foi condizente com o
objetivo e a filosofia de uma Unidade de Conservação de proteção integral, em especial, os Parques
Nacionais, que tem a visitação como um de seus objetivos principais em sua fundamentação
(BRASIL, 2000). Adicionalmente, para que o papel deste ramo do uso público atinja o seu principal
objetivo, é necessário a construção de programas, capacitações e estruturas que trabalhem com
atributos tangíveis e intangíveis e que levem as experiências da interpretação ambiental como
elemento chave.

4. CONCLUSÃO
A partir das interações criadas pelo programa “Pequeno Guarda-Parque”entre as crianças e os
profissionais Guarda-Parques, surgiram mais oportunidades de ampliar o conhecimento e de
interpretar os elementos da natureza das regiões do PARNAFN. Tais elementos fazem parte de um
contexto ecológico importante e de alta sensibilidade ambiental, sobretudo para os biomas marinhos e
costeiros, tornando a divulgação e o respeito por esta temática uma ferramenta essencial para sua
conservação.
A metodologia construída e aplicada pelo presente programa pode ser facilmente aplicada para
outras Unidades de Conservação, sendo até mesmo adaptável para outros contextos ecológicos e
ambientes diferentes do que se é encontrado no PARNAFN. Assim, o enriquecimento de práticas e
estruturas de visitação em áreas naturaisprotegidas eleva a qualidade da experiência e gera maior
interação das pessoas com a região, principalmente levando em consideração ações conjuntas com
profissionais destas áreas que são referências do conhecimento local.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII
da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e
dá outras providências. Brasília: DOU de 19/07/2000.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

GAJARDO, O.A.B. Por quê e para que Guarda-Parques?In: PACHECO, W.L; RUSSO, C.R.M.
Olhares e diálogos para a gestão territorial: formação de guarda-parques comunitários para a
conservação em áreas protegidas. Brasília: ECAM, 2018.

GOUVEIA, M.T.J.; SAISSE, M.V. Educação Ambiental em áreas protegidas – Uma abordagem
crítica para educadores em formação. São Paulo: NUPAUB-USP, 2000.
ICMBio. Conceitos e diretrizes de interpretação ambiental. Brasília: ICMBio, 2017.

ICMBio. Estratégias de implementação da visitação em unidades de conservação federais:


prioridades de execução, Coordenação Geral de Uso Público e Negócios. 2018.

LEAL, P.C.S; PIETRAFESA, J.P. Poder de Polícia no Combate às Condutas e Atividades Lesivas ao
Meio Ambiente. Fragmentos de Cultura, 11/12 (18), 883-893, 2008.

SILVA, E.G; SILVA, D.V.R. O corpo de guarda-parques em unidades de proteção integral do estado
do rio de janeiro. Uso Público em Unidades de Conservação 5(2), 82-93, 2015.

TILDEN, F. Interpreting our heritage: principles and practices for visitors services in parks,
museums, and historical places. New York: Van Rees Press, 1957.

TOMAZELLO, M.G.C; FERREIRA, T.R.C. Educação Ambiental: Que critérios adotar para avaliar a
adequação pedagógica de seus projetos?Ciência & Educação2 (7), 199-207, 2001.

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CARTILHA COMO RECURSO EDUCATIVO PARA VALORIZAÇÃO DA


FLORESTA E DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NA AMAZÔNIA
EDUCATIONAL BOOKLETS AS EDUCATION RESOURCES FOR VALUING FOREST AND
CONSERVATION UNITS IN THE AMAZON

Genoveva Chagas de Azevedo*, Damaris Teixeira Paz **, Hellen Luyza Fernandes Cardoso***

Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental, INPA, Brasil *(Orientadora)


Doutoranda, Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental, INPA, Brasil**
Ex-bolsista, Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental, INPA, Brasil***

INTRODUÇÃO
Diferentes metodologias são utilizadas para melhorar a qualidade no processo de ensino-
aprendizagem. Temáticas envolvendo os elementos biofísicos (água, ar, terra e fogo) têm se
constituído no contexto educacional, em temas transversais que são importantes para a Educação
Ambiental e para investigação científica (ALVES, 2016; AZEVEDO, HIGUCHI, 2018; HIGUCHI,
AZEVEDO, 2014). Tornar tais temas transversais têm sido um desafio, e isso exige recursos
didáticos que facilitem a aprendizagem. O Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental -
LAPSEA/INPA produziu cartilhas com esse intuito, visando a problematização e o entendimento de
conteúdos considerados complexos e polissêmicos na relação pessoa-ambiente (KUHNEN;
HIGUCHI, 2017).
As Cartilhas foram criadas para serem utilizadas com os estudantes da educação básica em
sala de aula. São em formato HQ, com ilustrações coloridas, com linguagem acessível e de fácil
interação, e com atividades que podem ser realizadas com ou sem mediação didática, sem perda de
profundidade científica. A HQ ligada ao elemento terra: “Conhecer e proteger as florestas: missão
de todos”, aborda problemáticas ligadas aos usos e ocupação do solo, formas de proteção em
Unidades de Conservação e usos adequados dos serviços e produtos das florestas (AMÂNCIO et
al., 2017).
O uso de cartilhas pode ter um retorno significativo no processo escolar, com aulas
diferenciadas, retirando-se então do conceito estático e adentrando em um ambiente de trabalho
mais lúdico, utilizando-se de leitura e visualização de imagem, visto que representa um recurso
didático que fornece informações sobre determinado assunto e se apresenta de forma acessível aos
diferentes públicos (OLIVEIRA, 2016).
A cartilha Terra foi utilizada com fins de investigação no contexto da sala de aula como um
recurso mediador entre educador e alunos. O objetivo do trabalho foi identificar o potencial do uso

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

da cartilha no contexto escolar para o ensino de conceitos relacionados às florestas e a importância


das Unidades de Conservação.

MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório e de intervenção, com tempo médio de
aplicação da Cartilha de 3h em sala de aula. A aplicação orientou-se em Solé (1998) ocorrendo em
três momentos: 1. Antes, o leitor deve fazer suas predições iniciais sobre o texto; 2. Durante a
leitura, o leitor faz o levantamento de questões e controle da compreensão e; 3. Depois da leitura, o
leitor faz a construção da ideia principal.
Tal procedimento ocorreu na intervenção 1 onde a educadora atuava ativamente,
esclarecendo dúvidas e destaques, e promovendo a discussão e reflexão acerca dos conceitos
básicos em cada bloco de sequência da leitura; e na intervenção 2, onde a educadora apenas instruía
diretivamente os alunos para a sequência de leitura em cada bloco, não intervindo nos
esclarecimentos de dúvidas ou comentários. Em cada intervenção tinha no máximo 20 alunos da
turma selecionada, mantendo-se a equivalência proporcional.
Participaram 65 alunos, 32 do 9° e 33 do 7° ano do ensino fundamental, de duas escolas
públicas, sendo uma de Manaus/AM e uma de Presidente Figueiredo/AM. A escolha das escolas se
deu em função da acessibilidade e conveniência. Aproximadamente 15 dias após a intervenção
pedagógica os estudantes responderam a um questionário com 15 perguntas de conhecimento
(fechadas) e de avaliação da experiência com a cartilha (fechadas e abertas).
Todos os questionários foram incluídos numa base de dados no Excel. Foi realizada
estatística descritiva dos dados oriundos das perguntas fechadas. Os dados oriundos das perguntas
abertas foram submetidos à análise de conteúdos cujas categorias latentes foram organizadas em
percentuais (BARDIN, 2006). A pesquisa seguiu todos os critérios éticos e foi aprovada pelo
Comitê de Ética em Pesquisa sob o protocolo CAAE: 37940714.6.
Os dados foram analisados de acordo com quatro categorias: conhecimento (conceitual e
atitudinal); estética (formato HQ); reflexão do aluno em relação a possíveis ações de proteção e
cuidado com a floresta; e experiência com a cartilha em si (autoavaliação).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dentre os princípios da Educação Ambiental que Sato (2003) elenca, o uso da cartilha foi
capaz de atingir a sensibilização e a compreensão. Na Tabela 1, verificam-se os percentuais de
acertos a questões conceituais e atitudinais que envolvem o aprendizado de conceitos e avaliação
das consequências de certas ações, seja para indicar alteração para a degradação socioambiental
(AD) ou alteração para a conservação dos ecossistemas (AC).
85
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Tabela 1. Percentuais de acertos relativos ao entendimento conceitual e as implicações de ações de


proteção ou degradação das florestas.

Questões de Conhecimento Atitudinal Acertos Acertos


9º ano 7º ano

Os recursos biológicos são todos os produtos que a floresta nos dá para 91% 70%
nos alimentarmos, utilizarmos e transformarmos para nossas
necessidades de sobrevivência.

O desmatamento ilegal não respeita as leis ambientais e ainda causa 76% 60,5%
muitos danos para as comunidades nas Unidades de Conservação. AD

As Unidades de Conservação podem ser de Proteção Integral e de Uso 80,5% 84,5%


Sustentável.

O manejo florestal é uma técnica de uso da floresta para obter 75% 64%
benefícios econômicos, sociais e ambientais. AC

Fonte: Dados de campo, 2019.

Verifica-se que, os percentuais de acertos para todas as questões são aproximados. As


relacionadas ao conhecimento conceitual destaque os conceitos de recursos biológicos relacionados
à floresta (91% - 9º ano). Os índices acima de 80% para a classificação dos tipos de Unidade de
Conservação (UCs) indicam que esse conhecimento foi potencializado e internalizado por esses
estudantes, sendo um bom indicador do entendimento da importância das UC’s, como uma das
formas de proteção das florestas. Já para o item que enseja a avaliação de ações prejudiciais às
florestas e às UCs, quanto ao conceito de desmatamento ilegal os estudantes do 9º tiveram uma
avaliação melhor quanto aos danos, obtendo 76% de acertos; e para as ações que ensejam ações de
conservação, via manejo florestal, como sendo uma das formas de utilizar bem as florestas,
respeitando-se os ciclos naturais, e aproveitando melhor os recursos madeireiros e não madeireiros,
os do 9º ano também obtiveram o índice mais alto (75%) (HIGUCHI; HIGUCHI, 2012). Esses
dados sugerem que, a cartilha cumpre a função de tornar conceitos sobre a floresta, que não são de
uma única área disciplinar, compreensíveis numa perspectiva relacional e interdisciplinar. Para
além dos acertos ou erros, há que se problematizar a relevância dos sujeitos se sentirem implicados
na situação, de certa forma, posicionar-se responsavelmente em prol da sustentabilidade.
Quanto aos itens referentes à estética da cartilha, os alunos atribuíram notas para
(linguagem, ilustração, cores, função dos personagens, número de páginas, adequação do texto-
pouco ou muita informação). Tanto para os alunos do 7º ano como para os do 9º ano a estética da
cartilha foi bem avaliada, com todas as médias superiores a oito, com destaque para a

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

história/conteúdos, ilustrações e atividades em cores que chamaram atenção e agradaram os


estudantes. No geral a cartilha foi aprovada em 86,2% com notas nove e dez, indicando que HQs
podem se constituir em recursos que potencializam o olhar mais contextual e reflexivo para temas
interdisciplinares, como os são os de florestas e Unidades de Conservação (HIGUCHI, M. I. G;
FREITAS, C.; HIGUCHI, N; 2013; VERGUEIRO, 2010).
Na categoria reflexiva, verifica-se na Tabela 2 que, de modo geral, os estudantes das duas
séries conseguiram compreender a importância dos serviços oferecidos pela floresta e da cobertura
vegetal em locais alterados, com percentuais muito semelhantes (69% e 70%). Ainda assim, entre os
que não concordam e nem discordam, de ambas as séries,somam-se 30% (Q1) e 36% (Q3), o que
nos leva a inferir que tais conteúdos e reflexões associadas devem compor a agenda de debates nas
escolas, considerando a relevância de se proteger as encostas.

Tabela 2: Percentual de Concordância e Discordância para questões de compromisso com a


proteção das florestas
Ano Escolar

Questões Reflexivas 9º ANO 7º ANO

C D NCD C D NCD

Q1. Os serviços das florestas (madeira,


óleos, resinas, regulação do clima, estoque 19% 69% 12% 12% 70% 18%
de carbono) só servem para quem mora nas
Unidades de Conservação (UCs).

Q3. Plantar árvores em encostas, beiras de


rios e em área desmatadas deveria ser uma 90,5% 3%
ação de responsabilidade de todos. 6,5% 64% 18,5% 17,5%

Fonte: Dados de campo, 2019.

Questionados sobre as mensagens que os personagens transmitiram na história, a maior parte


dos alunos relacionou as mensagens com ideias de cuidado (94%). Seja cuidado com a floresta, com
o ambiente e com o planeta. Representados em frases como “A importância de cuidar de nossas
florestas, de construções, queimadas, por causa da sua riqueza” e “Que devemos preservar a
nossa fauna, floresta e rios, e ideias de como podemos fazer isso”.

CONCLUSÃO
Independentemente do tipo de mediação do uso da cartilha os resultados de conhecimento e
as avaliações dos estudantes são semelhantes. Apenas com a leitura ou com esclarecimento de
dúvidas, a cartilha mostrou ser um recurso muito importante para auxiliar em processos de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

educação ambiental que envolvam o uso da terra, a valorização das florestas tropicais e o
conhecimento acerca das Unidades de Conservação. O detalhamento das informações e o formato
lúdico do material foram muito importantes no processo de aprendizagem.

Conclui-se ainda que há evidências que a experiência do aluno com a Cartilha HQ Terra no
contexto da sala de aula potencializou a ampliação de conhecimentos e reflexões, se constituindo
em potencial para ser utilizada, seja com a mediação do professor, seja como um recurso que o
próprio aluno pode explorar. É preciso analisar em trabalhos futuros o impacto da cartilha em
processos de educação não formal.

REFERÊNCIAS
ALVES, I. R. S. Educação ambiental mediada por jogo de simulação: um estudo do “Ecoethos
da Amazônia” e sua contribuição para a construção da responsabilidade socioambiental
juvenil.Dissertação de Mestrado. Manaus: Universidade Federal do Amazonas, 2016.

AMÂNCIO, D. A. R; HIGUCHI, M. I.G; LIMA, A. J. N; HIGUCHI, N. Conhecer e proteger as


florestas: missão de todos. Manaus: Editora INPA, 2017.

AZEVEDO, G. C de; HIGUCHI, M. I. G. Recurso didático sobre a floresta amazônica e emissão de


gases de efeito estufa para uso em sala de aula. In: Meio Ambiente em Foco. Toledo, F. dos S.
(org.). v. 01, p. 39-49, Belo Horizonte: Poisson, 2018.

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. 3ª. Edição. Lisboa: Edições 70, 2006.

HIGUCHI, M. I. G; AZEVEDO, G. C de. Ecoethos da Amazônia: problemáticas


socioambientais para um pensar e agir. Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia, Manaus:
Editora do INPA, 2014.

HIGUCHI, M.I. G; FREOTAS, C. de; HIGUCHI, N (Orgs.). Morar e viver em Unidades de


Conservação no Amazonas. Considerações socioambientais para os Planos de Manejo. 1ª ed.,
Manaus/Am, 268p., 2013.

HIGUCHI, M.I. G; HIGUCHI, N. A floresta amazônica e suas múltiplas dimensões: Uma


proposta de educação ambiental; 2ª ed. S.n, 268p, Manaus: Editora do INPA, 2012.

KUHNEN, A; HIGUCHI, M.I. G. Percepção Ambiental. In: Temas básicos em Psicologia


Ambiental. S. Cavalcante e G. A. Elali (orgs). p. 250-266, 1ª reimpressão. Petrópolis: Editora
Vozes, 2017.

OLIVEIRA, J. R. Produção de cartilha “escorpião, que bicho é esse?”: um recurso para o ensino na
educação em saúde nas aulas de ciências. III Congresso Internacional das Licenciaturas - p. 1-5.
COINTER, IFPE, 2016.

SATO, M. Educação Ambiental. São Carlos: Rima, 2003.

SOLÉ, I. Estratégias de Leitura. 6ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

VERGUEIRO. W. Uso das HQs no ensino In: RAMA,A; VERGUEIRO, W (Org.). Como usar as
histórias em quadrinhos na sala de aula. São Paulo. p81-85, 2010.

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A RELAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO E ÁREAS PROTEGIDAS: ESTUDO


REALIZADO NO PARQUE NACIONAL DO CATIMBAU, ESTADO DE
PERNAMBUCO, BRASIL
THE RELATIONSHIP BETWEEN EDUCATION AND PROTECTED AREAS: A STUDY
CARRIED OUT IN THE CATIMBAU NATIONAL PARK, PERNAMBUCO STATE, BRAZIL

Solange Fernandes S Coutinho*, Juvenita Lucena de Albuquerque*, Bruno Luigi Bertuccelli*

Diretoria de Pesquisas Sociais, Fundação Joaquim Nabuco, Ministério da Educação, Brasil

1. INTRODUÇÃO
A existência de um Parque Nacional, com as especificidades que apresenta o do Catimbau,
vem sendo considerada como elemento de contextualização no ensino formal e não formal em nível
local? Esta foi a questão de partida que deu origem ao presente trabalho, e a ela, na discussão dos
seus autores, se somaram a forma como as visitas ao Parque estão sendo realizadas e as
consequências ecológicas e sociais delas derivadas.
A relação entre uma Unidade de Conservação (UC) e a Educação não é algo novo, e já está
presente desde a instituição da primeira UC no mundo. No Brasil, o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC) a explicita quando no inciso XII do Art. 4° cita como um dos seus
objetivos “favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a recreação em
contato com a natureza e o turismo ecológico” (BRASIL, 2000).
A utilização do termo Lugares Educadores ao se fazer referências às Unidades de
Conservação vem guiando os estudos da Fundaj na pesquisa supracitada, mas deriva-se do caminho
anteriormente percorrido pela equipe que a desenvolve no âmbito dos estudos ambientais realizados
pela instituição em questão que já tem 70 anos de existência.
Assim, um Lugar Educador é entendido como o que oferece elementos que ao se perceber é
possibilitada a ampliação do conhecimento. Eles estão visíveis na paisagem atual e nas marcas de
um passado próximo ou muito distante e são derivadas de ações da espécie humana ou não
(COUTINHO et al., 2018). Um lugar educador cumpre a sua função como tal, inclusive sem que
nele se esteja, mas para isto é preciso ser reconhecida a sua capacidade de continuamente ofertar
aprendizagem (BRASIL, 2016). Para Brandão (2005, p.86-87) “aprender é um processo
ininterrupto, em um mundo interativo de cultura, que transforma as pessoas através de múltiplos
momentos de socialização”.
Esses momentos ocorrem em lugares que estão na escola e fora dela e que podem ser
cuidados, preparados para cumprir relevante papel na educação contextualizada. Esse sentido de
lugar se aproxima do que propõe Tuan (1980) a partir da noção de topofilia, ou seja: avaliar e
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

questionar o modo como as pessoas se percebem, se situam, significam e idealizam o mundo que
habitam.
Destacar a vocação educadora das Áreas Protegidas, e aqui em especial do Parque Nacional
do Catimbau, foi o objetivo central deste recorte, aqui apresentado em forma de resumo, da
pesquisa desenvolvida pela Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) sobre Unidades de Conservação
como Lugares Educadores, tendo por base as respostas obtidas através de questionários semiabertos
aplicados aos participantes das oficinas realizadas durante a pesquisa da Fundaj, envolvendo
público que contou com representação de educadores e gestores educacionais, gestores ambientais e
da administração municipal, e lideranças locais.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Na primeira etapa da pesquisa foram definidas cinco Unidades de Conservação a serem
trabalhadas e em seguida feitas viagens de reconhecimento exploratório em todas elas para
finalmente selecionar duas a terem os estudos mais aprofundados. Uma no Litoral Norte de
Pernambuco e Sul da Paraíba (Resex Acaú-Goiana) e outra no Sertão Pernambucano (Parna do
Catimbau). Nesta comunicação a referência será o Parna do Catimbau e para ele, além das
pesquisas bibliográficas e de campo foi construído coletivamente uma representação cartográfica do
Parna e seu entorno, e realizadas oficinas de Educomunicação, de Elaboração de Programas e
Projetos de Educação Ambiental e de Fotografias e Vídeos, intitulada “Revelando a Qualidade
Ambiental através de Imagens”.
Durante as Oficinas de Educomunicação foram aplicados três roteiros de questionários semi-
estruturados com questões específicas para cada público alvo. O primeiro roteiro foi respondido por
gestores de cada UC e dos seus respectivos municípios, pessoal administrativo correspondente e
lideranças locais. O segundo roteiro teve como público alvo gestores educacionais, professores,
pessoal administrativo e membros de conselhos de educação das escolas. Em ambos buscou-se
subsídios para avaliar se a UC estava sendo considerada como Lugar Educador. Já o terceiro roteiro
foi aplicado a todos os participantes, pois tratou especificamente sobre Educomunicação como
ferramenta de Educação Ambiental em Unidades de Conservação.Para os três roteiros foram
elaborados quadros constando os percentuais relativos a cada questão respondida. Elas foram
analisadas de forma conjunta visando identificar diferenças e semelhanças entre os grupos de
respondentes e confrontá-los com as respostas subjetivas que complementavam as perguntas
objetivas, como: a existência, ou não, de relação entre a gestão da UC e a população local e se nas
escolas o Parna é inserido na construção do conhecimento.

91
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3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A proposta de criação da Unidade de Conservação de Proteção Integral do Catimbau, em
Pernambuco, teve sua origem no Workshop “Avaliação e identificação de ações prioritárias para
conservação, utilização sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade do bioma
Caatinga”, realizado em Petrolina-PE, em dezembro de 2000. A escolha dessa área se deu pela
importância biológica, geológica, geomorfológica e arqueológica que essa área representa para a
região (SNE, 2002).
O Parque Nacional do Catimbau foi criado pelo Decreto S/N de 13 de dezembro de 2002, em
conformidade com a Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000 (Lei do SNUC) que define as categorias
de Unidades de Conservação (BRASIL, 2000). Palco de um patrimônio cultural, arqueológico e
geológico de grande significado e biodiversidade elevada pertinente à Caatinga, bioma que só
ocorre no Brasil, apresenta espécies endêmicas, especialmente cactáceas e bromeliáceas, bem como
uma ampla fauna típica do ambiente semiárido brasileiro. Com uma área de 62.294,14 ha, o seu
território distribui-se entre os municípios pernambucanos de Buíque e Tupanatinga situados na
Microrregião do Vale do Ipanema e o de Ibimirim na Microrregião do Vale do Moxotó.
Apesar de sua criação ter se dado há 17 anos, o Parque apresenta ainda hoje conflitos de
natureza social com a comunidade de agricultores locais, e principalmente com a comunidade
indígena que vive dentro da área do Parque. Até o momento não possui sede administrativa, o que
dificulta a comunicação e interação da chefia do Parque com a comunidade. Fato também que
dificulta essa relação é a inexistência de um Conselho Gestor, o que impede a elaboração de Plano
de Manejo no qual se definem e orientam as atividades no domínio do Parque.
Com base nas respostas dos roteiros aludidos anteriormente, ao serem questionados sobre o
papel educador do Parna, obteve-se uma representatividade positiva de 90%. O que destoa das
respostas quando se questionou sobre o principal objetivo a ser atingido pela UC, porque
predominou ser a proteção ambiental, com 32%, enquanto educação e turismo, ambos apresentaram
22%. Quanto da necessidade de ampliar ou melhorar a relação da UC com as escolas, houve
equiparação das respostas afirmativas com as negativas, em 30%. E mais: 40% não souberam
responder, o que tem importante significado, pois indica, inclusive, desconhecerem a necessidade
de existência dessa relação.
Retomando à pergunta sobre o reconhecimento da Unidade de Conservação como Lugar
Educador, dentre as respostas afirmativas várias convergem para um mesmo significado genérico,
aqui se destacando a que foi dada por um dos respondestes: “Por se tratar de um ambiente de
conservação ambiental e cultural propício ao conhecimento”. E dentre as negativas, apesar de
representar uma minoria, uma das respostas merece reflexão: “Não há programas de Educação
Ambiental em andamento, falta de estrutura e o Parque tem pouca comunicação com a
92
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

comunidade”. Com base nos dados obtidos é possível afirmar-se que para este grupo, apesar de
admitirem o papel educador do Parna, é a proteção ambiental apontada como principal objetivo da
UC, sem ser percebido que esta tem forte dependência da compreensão que se tem de uma Área
Protegida específica.
Dentre as questões relativas à educação, a que se refere às ações de Educação Ambiental
desenvolvidas pelas escolas, 66% responderam que elas se dão de alguma forma, mas 28%
negaram, ou seja, a Educação Ambiental ainda não faz parte do planejamento escolar para um
número significativo de gestores. Ao se indagar sobre o papel do Parna como um Lugar Educador, a
afirmativa do seu reconhecimento foi de 85%, o que revelou a importância que é dada à UC neste
aspecto. Relativo a isto, 74% dos respondentes revelaram intenções de se iniciar ou intensificar
trabalhos educativos que envolvam o Parna do Catimbau. Ao se comparar os dois índices, pode-se
refletir sobre o fato de se considerar o Parque como Lugar Educador, mas não se fazer um uso mais
significativo dele como tal.
Quanto às questões direcionadas à Educomunicação como ferramenta de Educação
Ambiental em UCs, para o grupo representativo das escolas o uso de algum instrumento de
comunicação coletivo é significativo com percentual de 76%, sendo que 61% desses instrumentos
são utilizados para desenvolver atividades educativas gerais, mas deste, 70% alegaram que abordam
questões ambientais.
Quanto ao grupo de gestores da UC ou de representantes do poder público municipal,
liderança local e membros de conselhos, a avaliação da Educomunicação como ferramenta de EA
em UCs, apesar dos números absolutos serem menores do que o do grupo das instituições
educacionais, percentualmente foi representativa. Para a questão se a comunidade faz uso de algum
instrumento de comunicação coletiva, obteve-se o índice corresponde a 69%, onde 62% disseram
desenvolver atividades educativas, porém apenas 31% abordam questões ambientais. No entanto,
apenas 56% indicaram receber notícias sobre questões ambientais por algum desses meios de
comunicação. Dos instrumentos de comunicação mais utilizados em relação a todos os
respondentes, os mais citados foram WhatsApp e o Facebook, seguidos da televisão e, em menor
proporção, das rádios comunitárias.

4. CONCLUSÕES
A categoria de Parque Nacional, por suas especificidades, trata-se de uma Área Protegida
ímpar, porém não raro é objeto de conflitos de várias ordens. Todavia, geralmente a sua existência
em uma região é tida como positiva, fundamentalmente por destacar o lugar em nível estadual,
regional e nacional. O do Catimbau não é exceção tanto no que concerne aos conflitos lá existentes,
como na importância que possui em diferentes aspectos.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O potencial educativo das UCs, ou das Áreas Protegidas em geral, é inegável. Todavia, em
poucas ele é transformado em ações concretas e isto é facilmente percebido junto à população local.
É o que se verifica no Parna do Catimbau, uma vez que a UC que recebe visitantes de diferentes
locais do Brasil e do mundo ainda é relativamente pouco conhecida pelos habitantes dos três
municípios que têm área do Parque dentro dos seus limites.
As Unidades de Conservação por si só têm um caráter educador, porém esse se ofusca seja
por desconhecimento, seja por falta de interesse de diversos atores e setores. Daí julga-se ter a
Educação Ambiental um papel extraordinário no entendimento do que é uma Área Protegida e a sua
função educadora. Durante as oficinas realizadas no Parna do Catimbau ficou claro que os
participantes reconhecem a face educadora da UC, mesmo que apontem como seu principal objetivo
a proteção ambiental, sem reconhecer na educação o meio de alcançá-lo.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL, Presidência da República. Lei Nº 9.985, de 18 de julho de 2000 que institui o sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Brasília, DF: DOU, 2000.

______. Ministério do Meio Ambiente, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.


Educação ambiental em unidades de conservação. Brasília: ICMBio; WWF, 2016.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Comunidades aprendentes. In: FERRARO JÚNIOR, Luiz Antônio
(org.). Encontros e caminhos: formação de educadoras(es) ambientais e coletivos educadores.
Brasília: MMA, Diretoria de Educação Ambiental, 2005.

COUTINHO, S. F. S. et al. Unidades de Conservação como Lugares Educadores: a contribuição da


Educação Ambiental para o cumprimento da Agenda 2030. In: Anais 7º Encontro de Pesquisa
Educacional em Pernambuco (epePE), 2018, Recife, PE. p.1-21. Disponível em:
<http://epepe.info/arquivos/EPEPE_ANAIS.pdf>.

SNE, Sociedade Nordestina de Ecologia. Projeto técnico para a criação do Parque Nacional do
Catimbau/PE – versão final, em cumprimento ao Contrato n º 086-00/02, Subprojeto “Proposta
para Criação do Parque Nacional do Catimbau/PE”. Recife: SNE, 2002.

TUAN, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. São Paulo:
DIFEL, 1980.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CAMINHOS PARA UMA ESTRATÉGIA DE MONITORAMENTO E


AVALIAÇÃO DE PROCESSOS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS1

Karina Jorge Dino*, Mariele Borro Mucciatto Xavier**, Paulo Roberto Russo***

Mestre em Desenvolvimento Sustentável pelo CDS/UnB, Especialista em Políticas Públicas pelo NP3/CEAM/UnB,
Analista Ambiental do ICMBio.*
Mestranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela UFPR, Analista Ambiental do ICMBio.**
Mestre em Geografia pela UFRJ; Analista Ambiental e Coordenador Geral de Gestão Socioambiental do ICMBio***

1. INTRODUÇÃO
As instituições públicas vêm sendo cada vez mais demandadas pelos diversos setores da
sociedade a apresentarem indicadores de monitoramento e pesquisas de avaliação como uma forma
de demonstrar sua eficiência. Historicamente, o monitoramento e a avaliação de políticas públicas
no Brasil possuem abordagens quantitativas que nem sempre traduzem seu verdadeiro alcance. Em
relação à educação ambiental (EA), como mensurar o leque de oportunidades frente a tantas
dimensões subjetivas envolvidas? Além disso, é notório que processos de monitoramento e
avaliação são uma das principais lacunas no campo da Educação Ambiental.
Com isso, o principal desafio no âmbito do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade - ICMBio tem sido demonstrar de forma inteligível o quanto a Educação Ambiental
é um instrumento de gestão de mesmo grau de importância quanto os demais instrumentos previstos
na Política Nacional de Meio Ambiente - PNMA (Lei nº 6938/81) e no Sistema Nacional de
Unidades de Conservação - SNUC (Lei nº 9985/2000)2. Para demonstrar que a Educação Ambiental
é uma valiosa estratégia de conservação da biodiversidade é necessário apresentar certas respostas
sobre seus potenciais impactos.
Neste trabalho abordaremos sobre a EA nas unidades de conservação (UC) e no ICMBio,
com foco no processo de elaboração da estratégia de monitoramento e avaliação de projetos e ações
de EA.

1
A estratégia de monitoramento e avaliação de processos de educação ambiental em Unidades de Conservação Federais
foi construída a muitas mãos, dialogando e definindo os rumos da Educação Ambiental em unidades de conservação e
centros de pesquisa e conservação do ICMBio. Envolveu diferentes instituições e esferas do ICMBio, representando
uma rica experiência de articulação inter e intra-institucional que precisa ser fortalecida e continuada. Foi um processo
marcado pela sinergia de esforços entre movimentos sociais, organizações não governamentais, educadores ambientais
e gestores do ICMBio, IBAMA, MMA, Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que agradecemos profundamente seu
engajamento e parceria na construção de uma Educação Ambiental orientada à conservação da biodiversidade e à
justiça ambiental.
2
A EA aparece na PNMA enquanto princípio, no inciso X, do Art.2º (princípios) e no SNUC, como diretriz no inciso
IV, do Art. 5º (diretrizes).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

As UCs, assim como a educação ambiental e outros instrumentos de gestão ambiental,


surgiram como uma necessidade de dar resposta à crise ambiental, identificada e divulgada
fortemente em meados do século XX. No Brasil, mesmo que a preocupação ambiental já mostrasse
sinais desde a época do Império, foi após a década de 1960 que apareceram, de forma mais
significativa, normativas e criação de estruturas de governo para lidar com a crise iminente. Um
dos documentos mais importantes no processo de elaboração da política ambiental brasileira foi a
publicação, em 1981, da Política Nacional de Meio Ambiente. Essa nova lei trouxe os principais
instrumentos da gestão ambiental pública, dentre eles, a educação ambiental. A partir daí, surgiram
várias outras legislações relacionadas às questões ambientais, sendo a Política Nacional de
Educação Ambiental (PNEA - Lei nº 9795/1999) e o SNUC as mais importantes para essa
discussão. Desde 2007, o órgão responsável pela gestão das UCs federais é o ICMBio (Lei nº
11.516/2007), tendo entre suas competências atender o que estabelece o Art. 225 da Constituição
Federal, o artigo 2º da PNMA e os princípios e objetivos da PNEA, assim como, implementar a
Estratégia Nacional de Comunicação e Educação Ambiental – ENCEA.
Compreende-se que as Ucs estão ainda aquém em termos de estratégias viáveis de (des)
envolvimento regional, mas este é um processo que deve ser construído coletivamente e
gradualmente com outros setores da sociedade e não ser atribuição unicamente de um órgão. As
UCs devem ser percebidas como um projeto de sociedade, como parte de um todo e não a
fragmentação do território, enfim, como uma política pública. Assim, a EA surge como uma
estratégia para o envolvimento da sociedade na valorização das UCs e na tarefa de conservar a
diversidade socioambiental destes territórios, contribuindo para a construção de novos
conhecimentos e valores necessários à conservação da biodiversidade, à organização coletiva e ao
desenvolvimento socioambiental (ICMBio, 2016).
Como uma das finalidades do ICMBio é “fomentar e executar programas de pesquisa,
proteção, preservação e conservação da biodiversidade e de educação ambiental” (BRASIL, 2007),
foi necessário que a EA tivesse um espaço na estrutura regimental da instituição para que a
legislação fosse atendida. Neste contexto, tem como foco político-pedagógico o fortalecimento de
políticas públicas e ações institucionais que promovam os instrumentos de gestão e conservação da
biodiversidade; a participação efetiva na gestão das UCs dos grupos sociais em situação de
vulnerabilidade ambiental; os espaços democráticos de participação na gestão de UCs e da
biodiversidade (ICMBio, 2017). Para isso, promove e executa processos educativos com atores
sociais envolvidos na gestão da biodiversidade, apoiado em uma concepção de EA que é crítica e
emancipatória no processo de gestão ambiental, tendo como princípios o diálogo entre saberes e
fazeres, o reconhecimento de diferentes territorialidades e identidades, a valorização da cultura e da
organização social dos grupos sociais que são sujeitos das ações educativas.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

No período de 2015 a 2017 o ICMBio realizou um amplo debate interno para a construção
coletiva de diretrizes e orientações metodológicas para o planejamento e implementação da EA em
UCs federais e centros de pesquisa e conservação do instituto. Esse trabalho estabeleceu sua
concepção no contexto da gestão ambiental pública, seus objetivos, seus sujeitos prioritários (não
exclusivos, há que se ressaltar) e também as premissas que norteiam os processos educativos, que
estabeleceram as dimensões de monitoramento e avaliação. As referidas diretrizes e orientações
metodológicas estabeleceram as bases para o monitoramento e avaliação de processos de EA sob a
responsabilidade da instituição, resultando no documento “Estratégia de Monitoramento e
Avaliação de processos de Educação Ambiental em Unidades de Conservação Federais”. A
principal finalidade desta estratégia é dar maior visibilidade às contribuições da Educação
Ambiental, tanto para consolidação da participação na gestão pública da biodiversidade quanto nos
resultados da implementação dos processos e instrumentos de gestão, expressando assim sua
transversalidade na gestão das unidades de conservação.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Essa estratégia decorrente do diálogo entre as diversas áreas técnicas do Instituto considerou
como basilar propor a incorporação de conceitos estruturantes da EA na gestão pública da
biodiversidade, tais como: participação social qualificada; sustentabilidade; justiça ambiental;
territorialidades e identidades; e sujeitos em condições de vulnerabilidade. Foram elencados 25
indicadores de processos, resultados e impactos da EA, todos buscando um olhar integrado para as
áreas protegidas promovendo a reflexão sobre diferentes usos de recursos ambientais,
potencialidades, problemas e conflitos gerados em cada território e a diversidade de grupos
organizados envolvidos. Esses indicadores foram formulados visando mensurar a contribuição da
EA para: os debates regionais; a valorização de necessidades e características de cada território
abrangido pelas UCs ou trabalho desenvolvido pelos centros de pesquisa e conservação; e a
qualificação de processos decisórios da gestão pública da biodiversidade. Uma vez definida essa
estratégia, segue-se para a etapa imediatamente posterior, seu teste. Sua aplicação permitirá a
análise crítica do método e a inclusão de ajustes para seu uso em avaliações. Desta forma as ações
do ICMBio serão analisadas dentro de um contexto territorial mais amplo, sendo possível identificar
interfaces com outras políticas públicas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O desafio que se apresenta de forma mais preocupante neste debate é que a avaliação, como
parte essencial de um processo de aprimoramento das políticas públicas passa pelo reconhecimento
de seus problemas e pelo exercício de encontrar caminhos para a mitigação ou eliminação desses
97
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

problemas, o que reforça a necessidade de processos de monitoramento e avaliação que atendam


essa finalidade. É reafirmação da participação social no Brasil como um meio de garantir a efetiva
proteção social contra riscos e vulnerabilidades, assim como a vigência dos direitos fundamentais
assegurados na Constituição Federal.
O método desenvolvido pelo ICMBio busca dar credibilidade aos resultados dos esforços
avaliativos, mas sem um engajamento e reconhecimento dos sujeitos envolvidos nas diferentes
faces das políticas, muito provavelmente, não haverá transformação, uma das premissas da EA
adotada pelo Instituto. A decisão política é a primeira condição deflagradora ou não de uma política
pública, evidenciando o comprometimento dos tomadores de decisão. Portanto, sem o incentivo e
investimento em medidas concretas que viabilizam a análise e compreensão do que é proposto não
será possível a materialização do ideal de accountability, presente na concepção de um Estado que
almeja ser democrático.

4. CONCLUSÃO
A aplicação da estratégia de monitoramento e avaliação elaborada pelo ICMBio, contribui
para o seu aperfeiçoamento no campo da política pública de educação ambiental e estratégia de
promoção da participação social e da conservação da biodiversidade.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Estratégia Nacional de Comunicação e Educação Ambiental no âmbito do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação. Série Educação Ambiental e Comunicação em Unidades
de Conservação. Brasília, 2015 disponível na internet em
http://www.icmbio.gov.br/educacaoambiental/images/stories/biblioteca/educacao_ambiental/cadern
o1.pdf. Acesso em 10 de junho de 2019.

ICMBIO. Educação Ambiental em Unidades de Conservação: Ações voltadas para


Comunidades Escolares no contexto da Gestão Pública da Biodiversidade – Guia Informativo,
Orientador e Inspirador. Brasília, 2016. Disponível em
http://www.icmbio.gov.br/educacaoambiental/biblioteca/educacao-ambiental-em-uc.html. Acesso
em 10 de dez de 2018.
_______. Diretrizes e Orientações Metodológicas para planejamento e implementação de
processos de Educação Ambiental em Unidades de Conservação Federais e Centro de
Pesquisa e Conservação do ICMBio. Brasília: MMA, 2017. Disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/educacaoambiental/images/stories/biblioteca/Publica%C3%A7%C3%B5
es_da_COEDU/PRODUTO_1_-
_Diretrizes_e_Orienta%C3%A7%C3%B5es_Metodol%C3%B3gicas_de_EA_em_UCs_FINAL.pdf
. Acesso em 02 de set de 2019.

_______. Estratégia de Monitoramento e Avaliação de processos de Educação Ambiental em


Unidades de Conservação Federais. Brasília: MMA, 2017. Disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/educacaoambiental/images/stories/biblioteca/Publica%C3%A7%C3%B5

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

es_da_COEDU/PRODUTO_4_-_Estrategia_de_Monitoramento_e_Avaliac_o_FINAL.pdf . Acesso
em 20 de nov de 2018.

_____. Texto-base do projeto político-pedagógico do ICMBio, com as contribuições da consulta.


Termo de Cooperação Técnica ICMBIO/UFSCAR. Processo n.º 02154.000053/2011-63. Brasília,
2017a.

FONTANA, A. et al. O resgate da educação ambiental na gestão pública da biodiversidade – a


estruturação da educação ambiental no ICMBio. In: VII FÓRUM BRASILEIRO DE
EDUCAÇÃO AMBIENTAL , 2012, Salvador, BA.

99
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

MAPEAMENTO PARTICIPATIVO NA RESERVA EXTRATIVISTA ACAÚ-


GOIANA
PARTICIPATING MAPPING AT THE ACAÚ-GOIANA EXTRACTIVE RESERVE

Tarcísio dos Santos Quinamo*1

*Centro de Estudos de Dinâmicas Sociais e Territoriais – Cedist,


Diretoria de Pesquisas Sociais – Dipes, Fundação Joaquim Nabuco – Fundaj

1. INTRODUÇÃO
Este relato de experiência tem como foco as atividades de mapeamento participativo
desenvolvidas pela pesquisa Unidades de Conservação como Lugares Educadores2 – em fase de
conclusão pela Fundaj –, no âmbito da Reserva Extrativista (Resex) Acaú-Goiana, Unidade de
Conservação (UC) Federal, criada em 2007. A Resex abarca 6,68 mil hectares de área estuarina e
costeira nos municípios de Caaporã e Pitimbu, na Paraíba, e de Goiana, em Pernambuco. Tem como
beneficiárias as comunidades pesqueiras artesanais de Baldo do Rio, Tejucupapo, São Lourenço e
Carne de Vaca, em Goiana; de Acaú, em Pitimbu, e de Caaporã.
Iniciativas de mapeamento participativo, também conhecidas como mapeamentos
colaborativos ou cartografias sociais, dentre outras denominações, não constituem um todo
homogêneo, sendo orientadas por diferentes sistemas conceituais e metodológicos, e objetivos,
dentre e os quais, a gestão territorial, estudo de impactos e conflitos socioambientais, prospecção
manejo de recursos naturais, regularização fundiária, demarcação e proteção de territórios
tradicionais, prospecção e proteção ao conhecimento tradicional (LINHARES; SANTOS, 2017).
Têm em comum a participação de atores locais na abordagem dos temas e na identificação e
localização de questões ou alvos de interesse; e, observam Acselrad e Viégas (2013), envolvem o
acesso e utilização de técnicas cartográficas modernas pelos grupos cartografantes; e contribuem na
construção do conhecimento e na ação política desses atores, propiciando maior visibilidade aos
mesmos, aos seus territórios e a questões por eles apresentadas, relativas a conflitos e à defesa de
seus direitos.
As atividades de mapeamento participativo, abordadas neste relato de experiências,

1
O autor agradece à pesquisadora e professora Solange Fernandes Soares Coutinho, coordenadora da pesquisa
Unidades de Conservação como Lugares Educadores, que originou o presente relato de experiência, pelo apoio, críticas
e sugestões apresentadas.
2
A pesquisa abrange cinco Unidades de Conservação (UCs) de diferentes contextos da Região Nordeste do Brasil: a
Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, o Monumento Natural (MONA) do Rio São Francisco, a Reserva
de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Ponta do Tubarão, a Reserva Extrativista (Resex) Acaú-Goiana e o Parque
Nacional (Parna) do Catimbau. Essas duas últimas UCs foram alvos de estudos mais aprofundados, que incluíram
atividades de mapeamento participativo.
101
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

tiveram como referência os objetivos da pesquisa no sentido de “Avaliar Unidades de Conservação


como Lugares Educadores no âmbito das políticas públicas vinculadas à Educação e à
Sustentabilidade a partir da sua inserção na educação formal e não formal”, e de contribuir na
construção coletiva de conhecimento e de instrumentos que “facilitem a relação de
complementaridade entre Educação e Sustentabilidade”, considerando as culturas das populações
envolvidas e o contexto de expansão populacional e econômica relativo às UCs.

2. MATERIAL E MÉTODO
Definiu-se como área de abrangência da pesquisa os limites oficiais das UCs, acrescidos de
uma faixa de 10 km no entorno desses limites, e das sedes dos municípios que abrigam as Unidades.
O Banco de Dados foi modelado e elaborado com o QGis, um software livre e gratuito, apropriado
ao uso de informações georreferenciadas e que possibilita a inclusão de novos dados e novas
categorias de dados ao longo do processo.
As atividades de mapeamento participativo integraram transversalmente as três oficinas
temáticas realizadas3 pela pesquisa, que abordaram os temas Educomunicação, na Oficina 1;
Elaboração de Programas e Projetos de Educação Ambiental, na Oficina 2; e Revelando a
Qualidade Ambiental através de Imagens, na Oficina 3. Foram estruturadas a partir de dois grupos,
com cerca de trinta pessoas cada: um referente aos participantes dos municípios de Pitimbu e de
Caaporã; e outro aos participantes de Goiana. Os grupos foram compostos por representantes dos
segmentos de professores e gestores educacionais; do setor administrativo municipal; e das
comunidades pesqueiras artesanais beneficiárias.
Abordou-se questões relativas à diversidade de técnicas utilizadas em cartografia
colaborativa, ao sensoriamento remoto, georreferenciamento da informação, acesso e uso do GPS
via aparelho celular, uso de softwares livres e gratuitos na armazenagem e processamento de
informações geográficas. Para cada oficina temática, preparou-se uma base cartográfica específica,
que serviu como suporte para as atividades de mapeamento, cujos trabalhos partiram do mapa base
inicial (Figura 1), com as representações dos limites da área da UC, da faixa de entorno, hidrografia,
rodovias, áreas urbanas, florestas, assentamentos rurais, dentre outros elementos. As representações
cartográficas utilizadas como suporte nas oficinas subsequentes passaram a agregar novas
informações produzidas coletivamente em cada oficina, pelos dois grupos. Foram utilizadas
reproduções do mapa base inicial, impressas em tamanhos A4, A3 e ampliados, medindo 1,27m por
1,80m. Na Oficina 1, os mapas em tamanho A4 foram distribuídos aos participantes, os quais foram

3
Guardadas as especificidades de cada uma das duas Unidades de Conservação escolhidas para aprofundamento, os
procedimentos metodológicos acima descritos, no contexto da Resex Acaú-Goiana, foram basicamente os mesmos
adotados para as oficinas realizadas no contexto do Parna do Catibau.
102
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

estimulados a, individualmente, analisá-lo e anotar suas percepções. As reproduções em tamanho


A3 foram
utilizadas em trabalhos nos subgrupos, constituídos por cerca de seis pessoas, dos diversos
segmentos participantes. Nos subgrupos, as pessoas foram estimuladas a compartilhar suas
impressões iniciais sobre o mapa base e a apresentar, discutir e registrar que outros elementos
deveriam ser incluídos no mapa, o que deveria ser
retirado, quais questões ou aspectos positivos ou
negativos que a análise daquela representação
suscitava. Os mapas ampliados serviram de suporte
para as atividades coletivas, com todos os integrantes
do grupo (Figura 2). Ao redor dessa representação, os
participantes foram convidados a apresentar e
registrar, com canetas hidrocor, os principais aspectos
tratados nos subgrupos, e anotados nos mapas A3.
Também foram estimulados a escrever ou desenhar
no mapa ampliando outras informações que considerassem relevantes. Foram atribuídas cores
específicas para diferentes categorias de
registros, tais como aspectos positivos, aspectos negativos, inclusões e observações. Nas oficinas 2
e 3 foram utilizadas as representações cartográficas já
atualizadas a partir dos aportes realizados pelos dois
grupos na respectiva oficina precedente. A
sistematização e atualização dos mapas em meio
digital foram realizadas após cada rodada de oficina,
pela equipe da pesquisa, destacando-se o que foi
construído coletivamente, identificando por cores
distintas a origem dos novos registros, gerando
legendas, conforme o grupo – de Goiana ou de
Caaporã e Pitimbu – que os aportaram.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Como resultado, as atividades de mapeamento colaborativo possibilitaram aos participantes
e à equipe da Fundaj a construção conjunta de novos conhecimentos. Aportaram ao mapa novas
informações espacializadas (Figura 3), evidenciaram aspectos positivos e aspectos negativos,
configurando possibilidades e desafios para a gestão ambiental no âmbito da Resex Acaú-Goiana e

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

área de entorno, sintetizados no Quadro 1. Vale observar que a própria existência dessa Unidade de
Conservação, em si, é apresentada como aspecto positivo,
remetendo à compreensão
desenvolvida quanto ao papel que a
Resex Acaú-Goiana representa na
conservação de ecossistemas
fundamentais para vida marinha e a
para pesca artesanal e o modo de vida
das comunidades envolvidas, questões
amplamente debatidas no processo.
Quanto aos aspectos negativos,
convergindo com resultados
observados em estudos anteriores
(QUINAMO, 2017), destacaram-se
questões relativas à degradação ambiental associadas à poluição por resíduos industriais, agrícolas,
aquícolas e domésticos. Também chama a atenção

Fonte: Mapeamento participativo elaborado durante as oficinas da pesquisa

a referência à inexistência de área de amortecimento para a Resex; e à falta de conhecimento da


população sobre a existência e a importância dessa Unidade de Conservação. Observe-se que, antes
das oficinas, a maioria dosrepresentantes de professores e gestores educacionais não tinha
conhecimento da existência da Resex nem a grande importância da atividade pesqueira artesanal na
região. Essa constatação ganha relevância quando se considera que boa parte, ou mesmo a maioria,
dos estudantes das escolas participantes são pescadores ou de famílias de pescadores; e que essa
realidade não é levada em conta no tipo de ensino ou de atenção que o sistema de educacional
dispensa a esse público.
Nas oficinas, as atividades de mapeamento participativo acorreram de forma articulada e
sinérgica com as abordagens das temáticas desenvolvidas, contribuindo na sensibilização dos

104
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

participantes quanto à existência e importância da Resex Acaú-Goiana na conservação ambiental,


dos ecossistemas costeiros, da atividade pesqueira tradicional, que diz respeito ao modo de vida e à
sobrevivência de parcela significativa dos estudantes atendidos pelas escolas locais. E também para
se desenvolver ou fortalecer um olhar sobre a Resex como Lugar Educador, a ser privilegiado no
desenvolvimento de pesquisas e de atividades educativas. Essas reflexões convergem com as de
Bacci e Santos (2013, p.20), que destacam a contribuição do mapeamento socioambiental,
participativo, na compreensão e reflexão a cerca de problemas socioambientais e como “uma
proposta metodológica para o reconhecimento do lugar e como contribuição para a educação
ambiental e para a aprendizagem social”.

4. CONCLUSÃO
As atividades de mapeamento participativo, envolvendo professores, agentes da
administração pública e pescadores artesanais mostraram-se relevantes para os propósitos da
pesquisa. Contribuíram como instrumentos pedagógicos, estimulando práticas integrativas, fora das
oficinas, mas com uso de materiais nela produzidos, envolvendo pescadores e professores em ações
educativas com estudantes das comunidades. Como parte das oficinas temáticas e elemento
transversal às mesmas, o mapeamento participativo desempenhou a função de elo de ligação no
tempo e no espaço entre as três oficinas realizadas e entre os dois grupos participantes, de Caaporã-
Pitimbu e de Goiana, os quais, durantes os trabalhos, vivenciaram processos independentes, porém
interconectados pelo mapeamento. Contribuiu na construção do conhecimento, na troca e validação
de informações entre os grupos, incluindo representantes das comunidades de pescadores no
Conselho Gestor da Resex Acaú-Goiana, colaborando assim no processo formativo e de reflexão
desses conselheiros.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACSELRAD, H.; VIÉGAS, R. N. Cartografias sociais e território – um diálogo latino-americano.
In: ACSELRAD, HENRI (org.). Cartografia social, terra e território. Rio de Janeiro:
IPPUR/UFRJ, 2013. p.15-40.

BACCI, D. L. C.; SANTOS, V. M. N. Mapeamento socioambiental como contribuição


metodológica à formação de professores e aprendizagem social. in: Revista de Geologia - USP.
São Paulo: Geol. USP, Publ. espec., São Paulo, v. 6, p.19-28, Agosto 2013. Disponível em: <
www.igc.usp.br/geologiausp>. Acesso em: 09/09/2019

LINHARES, T. S; SANTOS, L. F. U. Mapeamento Participativo: subsídio à gestão participativa e


ao manejo sustentável de recursos naturais de comunidades tradicionais. Sociedade e Território.
Natal, RN. v.29, . n.1, p. 50 - 70.Jan./Jun. de 2017.

QUINAMO, T. S. População, Pesca Artesanal e Conflitos Socioambientais em Áreas Estuarinas no


Litoral Norte de Pernambuco e Litoral Sul da Paraíba. In: QUINAMO, T. S (Coordenador).
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Dinâmicas Sociais e Ecológicas em Ambientes Costeiros do Nordeste Brasileiro: interações e


intervenções. Recife: Fundaj, 2017. p.58-112. (Relatório de Pesquisa).
FEIRA AGROECOLÓGICA COMO INSTRUMENTO DE SENSIBILIZAÇÃO
DA COMUNIDADE NO ENTORNO DE UMA UNIDADE DE
CONSERVAÇÃO
AGROECOLOGICAL STREET MARKET AS AWARENESS INSTRUMENT TORESIDENTS
AROUND A PROTECTED AREA

Maria Carolina Medeiros Alves*, José Severino Bento**

* Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, UFPE, Brasil.


**Professor Doutordo curso de Tecnologia em Gestão Ambiental, IFPE-Campus Recife, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
As Unidades de Conservação (UC) são espaços que, independentemente de sua tipologia,
prestam serviços ecossistêmicos a sociedade. São serviços de informação, produção, habitat e
regulação que estão presentes em todas as unidades de conservação. Assim, essas áreas protegidas
tem um papel não apenas ecológico, mas também cultural e social. Em Pernambuco, as primeiras
UC estaduais foram criadas na década de 1980. Em 1987o estado criou, através da Lei nº 9.989/87,
40 Reservas Ecológicas na Região Metropolitana do Recife, estabelecendo assim critérios básicos
para conservação dessas áreas (PERNAMBUCO, 1987). Entre as reservas criadas estavam a de
Dois Irmãos (Recife), Engenho Uchoa (Recife), Mata de Gurjaú (Moreno, Cabo, Jaboatão) e Caetés
(Paulista).
Em 1998, com a sanção da lei nº 11.622, a Reserva Ecológica de Caetés é recategorizada
para Estação Ecológica de Caetés – ESEC (PERNAMBUCO, 1998), categoria que permanece até
hoje.A ESEC Caetés tem origens na década de 1980, quando a área que a ESEC ocupa atualmente
seria transformada em um aterro sanitário denominado Timbó II que atenderia a cidade do Recife,
dentre outras. Entretanto, diante da forte mobilização da comunidade de Caetés I, bairro onde a
ESEC fica localizada e de entidades ambientalistas e pesquisadores das UniversidadeFederal e
Federal Rural de Pernambuco, a obra foi embargada e transformada numa área natural protegida
(CPRH, 2019; NEGREIROS, 2008).
Atualmente, a unidade sofre muita pressão urbana, como invasões para construção de
moradias, ação de caçadores e descarte irregular de resíduos no seu entorno, obrigando a equipe
gestora da ESEC, em conjunto com o seu Conselho Gestor Consultivo a buscarem novas formas de
sensibilizar os moradores do entorno. E para sensibilizar, é importante saber o que mobiliza as
pessoas para a participaçãoe, a partir daí, elaborar estratégias adequadas aos mais variados públicos,

106
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

buscando sua continuidade e criatividade, bem como a ampliação das informações utilizando-se dos
diversos meios de comunicação(CASTRO, 2009).
Foi pensando em novas estratégias que surgiu a feira agroecológica na ESEC Caetés, onde
agricultores familiares da região levam seus produtos para vender e participam das oficinas e rodas
de conversa.A ideia e as ações para implementar a feira foi da gestão da ESEC em conjunto com o
Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA) e a Associação Pernambucana de Apicultores e
Meliponicultores (APIME), entidades que participam no Conselho Gestor da unidade.Este tipo de
atividade, inclusive, atende aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), um chamado
mundial que busca diminuir a desigualdade social, promover a inovação, alcançar o consumo
sustentável, mitigar as mudanças climáticas, entre outros(PNUD, 2019).
O objetivo dessa pesquisa foi mostrar o potencial da Feira Agroecológicapara sensibilizar e
integrar a população do entornocom a ESEC Caetés.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
2.1 Área de Estudo
A Estação Ecológica de Caetés possui 157 hectares e fica localizada no município de
Paulista, Região Metropolitana do Recife. A ESEC está delimitada ao norte pelos conjuntos
habitacionais de Caetés I e II (Abreu e Lima) e a PE-18; ao sul com o Rio Paratibe e o município do
Recife; a leste com o distrito industrial de Paulista e a oeste com fazenda Seringal Velho e a zona rural
dos municípios do Paulista e Abreu e Lima (CPRH, 2012).Segundo o Sistema Estadual de Unidades
de Conservação da Natureza (Lei nº 13.787/2009), a ESEC está no grupo de Proteção Integral, onde
é permitido apenas a visitação com objetivo educacional e a pesquisa científica (PERNAMBUCO,
2009).
A unidade de conservação é administrada pela Agência Estadual de Meio Ambiente –
CPRH, que possui estrutura física na UC e uma equipe gestora fixa com três pessoas.A média
mensal é de 400 visitantes, incluindo estudantes de escola públicas e privadas do ensino básico,
universitários e pesquisadores.

2.2 Coleta de dados


Para levantar informações sobre a feira agroecológica na ESEC Caetés, foram cumpridas
duas atividades. Na primeira parte, foi realizada uma pesquisa sistemática sobre a feira, diretamente
no site da Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH), utilizando as seguintes palavras-chave:
“ESEC Caetés” e “Feira agroecológica”. Depois, foram realizadas entrevistas não estruturadas e não
dirigidas (LAKATOS, 2010)com a gestora da unidade e um dos técnicos que trabalha na UC, de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

modo a validar as informações obtidas no site, comparando as respostas e os dados coletados da


pesquisa sistemática, e obter mais detalhes sobre a atividade.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A feira agroecológica na ESEC Caetés (Fig. 1) ocorria na última quarta-feira do mês, na área
administrativa da unidade, entre os anos de 2015 e 2016. Os comerciantes eram agricultores do
programa agricultura familiar das cidades de Paulista e Abreu e Lima. Em algumas edições da feira,
também participaram artesãos da região, pescadores da colônia de pescadores do Porto Jatobá
(Abreu e Lima) e agricultores e artesãos da aldeia Xucuru-Kariri (Alagoas)(CPRH, 2016).

Figura 1: Feira agroecológicana ESEC Caetés.

Fonte: CPRH, 2016.

Para garantir a participação dos agricultores, era solicitado transporte da prefeitura de Abreu
e Lima, e/ou do IPA. Segundo a gestão da ESEC, os produtores conseguiam vender entre 60-75%
dos produtos, que variavam desde hortaliças, verduras, e algumas frutas. Era sempre incentivado
que eles levassem produtos o mais variado possível e diferentes entre si. Além da venda de
produtos, ocorriam oficinas, rodas de conversa e palestras para os agricultores e demais
participantes. Esses momentos tinha como foco debater sobre a importância de alimentos sem
agrotóxicos, reaproveitamento de sobras de alimentos, alimentação saudável e importância dos
nutrientes. Antes desses encontros, havia uma conversa inicial sobre a ESEC Caetés, onde era
informado sobre o papel e a importância da UC para região.
Apesar da maioria dos visitantes da feira serem do Conselho Gestor da unidade,
pesquisadores da ESEC e visitantes, a feira conseguia atrair também a participação de moradores do
entorno. A feira agroecológica gerava impactos positivos, como:possibilitar que agricultores
vendam seus produtos diretamente ao consumidor, dispensando o atravessador e aumentando sua
renda; disponibilidade de produtos mais saudáveis, sem agrotóxicos para os
consumidores;possibilitar a troca de informações sobre o cultivo de plantas e seus diferentes usos
entre agricultores/produtores e consumidores; participar de oficinas e rodas de conversa sobre como
vender melhor, estimulando o gosto pelo comercio; melhorar a visibilidade da UC para os visitantes
e demais moradores da região e contribuíamna circulaçãoda economia local.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A feira agroecológica foi interrompida devido ao início das obras de recuperação e


ampliação estrutural da ESEC. Também foi considerado que a feira não deveria acontecer dentro da
unidade, mesmo que na área administrativa, pois não se adequa aos objetivos designados por lei
para essa tipologia e UC. Por isso, a gestão pretende voltar com a atividade, que agora acontecerá
na quadra de esportes da comunidade, localizada em frente a Unidade, com periodicidade de pelo
menos duas vezes por mês. Será estimulada a participação deoutros agricultores e artesãos para uma
ofertamaior de produtos. As oficinas e rodas de conversa continuarão em parceria com as
prefeituras e outras entidades públicas e privadas.

4. CONCLUSÃO
A feira agroecológica da ESEC Caetés é um instrumento que pode alcançar o público do
entorno e gerar impactos positivos na comunidade local. Este tipo de atividade podeampliar a
imagem da unidade, destacar sua importância e retornar para a sociedade um novo tipo de serviço, e
não somenteseus serviços ecossistêmicos (regulação do clima, habitat; produção e informação).
A feira agroecológica leva ao alcancedos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável a partir
do momento que ajuda a incrementar, na economia local, o espaço para produtores orgânicos da
região; melhorar as condições sociais, tanto nas interações quanto na alimentação dos moradores e
sensibilizar a populaçãoàconservação do meio ambiente, a partir do envolvimento da UC no
cuidado com a sociedade.É importante que a gestão e seu Conselho Gestor se utilizem desse
instrumento visando sensibilizar a população do entorno, além de retomar a importância histórica
desta unidade de conservação para a comunidade.

5. AGRADECIMENTOS
Agradeço a gestora da ESEC Caetés, Sandra Cavalcanti pela grande contribuição nesta
pesquisa; ao Eduardo Ribeiro, técnico de Meio Ambiente da ESEC; e ao meu orientador, José
Severino Bento, pelo incentivo e todo apoio sempre.

REFERÊNCIAS
AGÊNCIA ESTADUAL DE MEIO AMBIENTE (CPRH). Plano de manejo da Estação
Ecológica de Caetés e criação do Conselho Gestor Consultivo - Volume 2. Recife,2012.
Disponível em: <http://www.cprh.pe.gov.br/ARQUIVOS_ANEXO/Manejo_Caetes_2.pdf>.

______. Reaproveitamento de alimentos é tema de roda de diálogo na Esec Caetés. Disponível


em: <http://www.cprh.pe.gov.br/home/42401;42463;10;3014;11187.asp>. Acesso em: 2 set. 2019.

______. ESEC Caetés. Disponível em:


<http://www.cprh.pe.gov.br/unidades_conservacao/Protecao_Integral/Estacao_Ecologica_ESEC/ES
EC_Caetes/40039%3B36013%3B22370301%3B0%3B0.asp>. Acesso em: 2 ago. 2019.

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CASTRO, I. Série Cadernos ARPA 2: Conselhos Gestores de Unidades de


Conservação.Ministério do Meio Ambiente, Programa Áreas Protegidas da Amazônia e Cooperação
Técnica Alemã, Brasília, 2009.

LAKATOS, E. M. Fundamentos da metodologia científica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

NEGREIROS, E. DE B. Natureza Mínima - Política Ambiental e Unidades de Conservação em


Pernambuco: um estudo sobre a Estação Ecológica de Caetés e a Área de Proteção Ambiental do
Engenho Uchoa.2008. Tese (Doutorado em Sociologia) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2008.

PERNAMBUCO. Lei No 9.989, de 13 de janeiro de 1987. Define as reservas ecológicas da Região


Metropolitana do Recife.Recife, 1987.

PERNAMBUCO. Leino 11.622, de 29 de dezembro de 1998. Dispõe sobre a mudança de


categoria, de Manejo das Reservas Ecológicas de Caetés e Dois Irmãos e dá outras
providências.Recife, 1998.

PERNAMBUCO. Lei no 13.787, de 08 de junho de 2009. Institui o Sistema Estadual de Unidade


de Conservação da Natureza - SEUC, no âmbito do Estado de Pernambuco, e dá outras
providências.Recife, 2009.

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD). Objetivos do


Desenvolvimento Sustentável. 2019. Disponível em:
<http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/sustainable-development-goals.html>. Acesso em:
16 ago. 2019.

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM ÁREAS PROTEGIDAS: AÇÕES


EDUCATIVAS NA MATA DE DOIS UNIDOS, RECIFE-PE
ENVIRONMENTAL EDUCATION IN PROTECTED AREAS: EDUCATIONAL ACTIONS IN
THE MATA DE DOIS UNIDOS, RECIFE-PE

Aluisio Sales Ribeiro*, Pedro Henrique de Souza* e Rafael Urbano da Silva*

*Centro Social de Educação Ambiental, Brasil (cseambiental@gmail.com)

1. INTRODUÇÃO
Conforme referido na Constituição Federal Brasileira de 1988, é obrigatório à todas as
unidades da Federação o estabelecimento de espaços territoriais protegidos que tem como objetivo
garantir a conservação de áreas naturais e dos processos ecológicos como um mínimo de
interferência humana.
Estes espaços, internacionalmente denominados como “áreas protegidas”, no Brasil são
denominadas Unidades de Conservação –UC eassim conceituados na Lei que instituiu o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação-SNUC:“Unidade de Conservação é um espaço territorial e
seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes,
legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob
regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”.
As principais funções das Unidades de Conservação épreservar o patrimônio biológico
existente, garantir às populações tradicionais o uso sustentável dos recursos naturais de forma
racional e propiciar às comunidades do entorno o desenvolvimento de atividades econômicas
sustentáveis.É importante também ressaltar os serviços ambientais prestados pela biodiversidade
conservada nas UC, tais como qualidade e quantidade da água, beleza cênica, dispersão de
sementes, reprodução e dispersão de espécies da fauna e flora, regulação climática, entre outros.
Nesse contexto, as áreas protegidas ou unidadesde conservação são considerados espaços
privilegiados para o desenvolvimento de ações de educaçãoambiental (SAMMARCO, 2005), sendo
possível a realização de diversas práticas educativas, como trilhas interpretativas
(MENGHINI;MOYA-NETO; GUERRA, 2007), vivências na natureza (MENDONÇA,2007) e
atividades contemplativas (MARIN; OLIVEIRA; COMAR,2003).
A Constituição Federal de 1988 reconhece a EA como uma das condições para que todos
tenham: “[...] direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida [...] “Incumbindo ao poder público (Art. 225, §1°, Inciso VI) a

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tarefa de: “Promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública
para a preservação do meio ambiente”.
Sendo assim este trabalho tem como objetivo apresentar na forma de relato de experiência,
as ações educativas realizadas com jovens estudantes na Floresta Urbana Mata de Dois Unidos.

2. MATERIAL E MÉTODO
Em março de 2018, a partir de uma ação educativa idealizada por representantes de
instituições públicas, empresas privadas, escolas, coletivos e associação de moradores realizada na
Unidade de Conservação Floresta Urbana Mata de Dois Unidos na Zona Norte da cidade do Recife,
Estado de Pernambuco,foi criado o Centro Social de Educação Ambiental - CSEAM para incentivar
e promover ações de sensibilização e educação ambiental para crianças, jovens e adultos das
comunidades existentes no entorno da UC.
A partir da mobilização dos representantes e colaboradores doCSEAM foram realizadas
algumas ações educativas na UC Mata de Dois Unidos.As ações foram idealizadas e executadas em
conjunto com as diferentes representatividades e lideranças locais, utilizando mínimos recursos
disponíveis ou adquiridos e com foco no diálogo e integração entre as instituições parceiras, além
de contar com o apoio institucional de alguns setores públicos ligados à prefeitura da cidade do
Recife.

3. RESUTADO E DISCUSSÃO
A ação realizada na UC Mata de Dois Unidos que merece destaque, pois motivou a criação
do CSEAM, ocorreu em março de 2018 durante a Semana de Juventude do Recife e foi constituída
por uma trilha educativa chamada de “Passinho na Mata”. Essa ação foi idealizada pelo Coletivo
Jovem de Meio Ambiente do Recife (CJMAR) e pela Associação Comunitária de Dois Unidos
(ACDU) com apoio da Secretaria Executiva de Juventude da Prefeitura do Recife (SEJUV) e da
empresa Água Mineral Santa Clara S/A.
A ação educativa foi realizada na Sede da Água Mineral Santa Clara que fica localizada
dentro da Mata de Dois Unidos e teve como público alvo cerca de 100 alunos de turmas do 3°
terceiro ano da Escola de Referência de Ensino Médio de Beberibe – EREMB, sendo divididos em
dois grupos de 50 alunos por turno (manhã e tarde), totalizando uma carga horária de 08 horas de
atividades.
A atividade foi executada e acompanhada pelo integrantes do Coletivo Jovem de Meio
Ambiente do Recife (CJMAR) e da Associação Comunitária de Dois Unidos (ACDU) e também
contou com a participação do professor responsável pela disciplina de Biologia do EREMB que
aproveitou a oportunidade para discutir e repassar para os alunos temas importantes que constam na
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prova do ENEM. Dessa forma a atividade seguiu o seguinte roteiro:1°- Recepção dos alunos pelos
representantes das instituições envolvidas e bate-papo sobre a história da Fábrica Água Mineral
Santa Clara na Mata de Dois Unidos(Figura 1);2°-Realização de caminhada até a primeira nascente
ou fonte de água da fábrica e debate com os alunos sobre a importância da preservação da Mata
para a produção de água(Figura 2). 3°-Trilha no interior da mata onde foram abordados assuntos
como a diversidade de espécies da fauna e flora e avistadas algumas espécies de árvores nativas da
Mata Atlântica(Figura 2); 4°-Visita ao riacho existente na mata e apresentação de aspectos
ecológicos dos ecossistemas aquáticos e contato direto com a água do riacho; 5°-Apresentação da
morfologia das plantas aquáticas existentes no lago e discussão sobre a interação dessas plantas com
o controle da poluição da água;

Figura 1 – Recepção dos alunos na fábrica da Figura 2 – Discussão com os alunos sobre a
Água Mineral Santa Clara inserida na UC Floresta importância da preservação da UC Floresta
Urbana Mata de Dois Unidos. Urbana Mata de Dois Unidos.

Fonte: Foto de Aluisio Ribeiro (2018). Fonte: Foto de Aluisio Ribeiro (2018).
Figura 3 – Trilha no interior da floresta na UC Figura 4 – Apresentação musical dos alunos na
Floresta Urbana Mata de Dois Unidos. confraternização ao final da ação educativa.

Fonte: Foto de Aluisio Ribeiro (2018). Fonte: Foto de Aluisio Ribeiro (2018).

Outra ação importante realizada pelo CSEAM foi um uma ação de limpeza na Mata de Dois
Unidos em comemoração à Semana de Meio Ambiente em Junho de 2019, que contou com a

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participação de crianças e adolescentes das comunidades de entorno e teve como parceiros a Água
Mineral Santa Clara, a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Prefeitura do Recife e a
Associação Comunitária de Dois Unidos.
Durante a ação foi realizada uma caminhada ao longo da área da UC onde foram coletados
diversos tipos de resíduos sólidos como garrafas pets, garrafas de vidro, embalagens de plástico,
restos de tecidos, bitucas de cigarro, entre outros (Figura 5).No final da ação foi realizada uma
conversa sobre os impactos ambientais causados pela disposição inadequada do lixo na área da
floresta e em seguida os sacos de resíduos coletados foram depositados em lixeiras para coleta do
serviço público(Figura 6).

Figura 5 – Ação de limpeza na UC Floresta Figura 6 – Sacos de resíduos e lixo coletados


Urbana Mata de Dois Unidos. na ação de limpeza da Mata de Dois Unidos.

Fonte: Foto de Aluisio Ribeiro (2018). Fonte: Foto de Aluisio Ribeiro (2018).

4. CONCLUSÃO

A educação ambiental direcionada aos grupos sociais que convivem diretamente coma
realidade das unidades de conservação é uma estratégia essencial para oengajamento da sociedade
na tarefa de conservar as diversidades natural,cultural e histórica desses territórios.
A experiência da trilha educativa na UC Mata de Dois Unidos foi muito eficiente do ponto
de vista daconstrução de conhecimentospelos alunosda EREMB visto que os temas ambientaisque
são abordados pelos professores em sala de aula forammais bemintegralizadosem meio à Natureza,
segundo depoimento feito pelos próprios alunos.
A ação de limpeza da mata também foi considerada satisfatória principalmente pela
participação e envolvimento de crianças que puderam participar pela primeira vez de ações dessa
natureza e serão futuros agentes de sensibilização ambiental nas suas comunidades.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Portanto, as ações de educação ambiental nas UCs têm por objetivoa mudança de atitude dos
indivíduos em relação ao espaço protegido, contribuindopara a construção de novos conhecimentos
necessários à conservação dabiodiversidade e ao desenvolvimento socioambiental.
5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

MARIN, A. A.; OLIVEIRA, H. T.; COMAR, V. A educação ambiental num contexto


decomplexidade do campo teórico da percepção. Interciencia, Caracas, v. 28, n. 10, p. 616-
619, 2003.

MENDONÇA, R. Educação ambiental vivencial. In: FERRARO-JUNIOR, L.A.Encontros e


caminhos: formação de educadoras(es) ambientais e coletivos educadores.Brasília: MMA, 2007. v.
2. p. 117-130.

MENGHINI, F. B.; MOYA-NETO, J.; GUERRA, A. F. S. Interpretação ambiental. In:FERRARO-


JUNIOR, L. A. Encontros e caminhos: formação de educadoras(es) ambientais
e coletivos educadores. Brasília: MMA, 2007. v. 2. p. 209-218.

SAMMARCO, Y. M. Percepções socioambientais em unidades de conservação: o jardim de


Lilith?. Dissertação de Mestrado– Programa de pós-graduação em engenharia ambiental,
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2005.

SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA. Lei Federal Nº


9.985, de 18 de julho de 2000. Ministério do Meio Ambiente. Brasília.

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ÁREAS VERDES E INSTITUIÇÕES DE ENSINO NO RS: APROXIMAÇÕES


E DESAFIOS

Rita Paradeda Muhle*, Taís Cristine Ernst Frizzo**

*rpmbio@hotmail.com, **taisfrizzo@hotmail.com

INTRODUÇÃO
Este trabalho apresenta resultados de dois projetos de pesquisa realizado pelas autoras entre
2014 e 2019 no Rio Grande do Sul (RS). As duas investigações buscaram, de maneira geral,
observar as relações entre instituições de ensino e áreas verdes. A primeira teve como objetivo geral
compreender como a escola se relaciona com o lugar em que está inserida, considerando-se o
entorno de unidades de conservação, para observar os fatores que poderiam influenciar a
ambientalização do currículo. O objetivo da outra pesquisa foi pesquisa buscar compreender como
ocorrem os usos destes espaços educacionais não convencionais (áreas verdes) e como eles são
pensados e vistos pelas universidades em suas políticas ambientais e dentro de um contexto que
busca educar para a sustentabilidade e para uma cidadania socioambiental.
Consideramos áreas verdes os espaços pesquisados e esta denominação corresponde ao fato
que algumas das áreas abordadas nas pesquisas não são áreas naturais e também não fazem parte
das categorias das áreas protegidas. Todavia, áreas naturais também foram encontradas e ao usar
áreas verdes, a pesquisa entende estar contemplando todas estas categorias. As áreas estudadas
foram Jardins e Horto Botânicos, Reservas Legais, Áreas de Preservação Permanente, Reservas do
Patrimônio Natural, Refúgios de Vida Silvestre, Reserva Biológica e Parques Estadual e Municipal.
Esta multiplicidade configura a relação das instituições de ensino e áreas verdes que serão aqui
apresentadas.
A progressiva internalização das questões ambientais na formação dos sujeitos escolares e
universitários; no currículo e na gestão, chamaremos ambientalização. A estes fenômenos chamados
de processos de ambientalização, Carvalho e Toniol (2010), explicam este conceito como um, “[...]
processo de internalização nas práticas sociais e nas orientações individuais de valores éticos,
estéticos e morais em torno do cuidado com o meio ambiente”.
Com relação às escolas, e aqui também assumimos isso para as universidades, Frizzo (2018)
entende que a ambientalização compreende o conjunto de ações relacionadas à orientação ambiental
das instituições, as quais são influenciadas pelos fatores citados no parágrafo anterior, bem como
envolvendo aqueles observados ao longo da pesquisa, como a agência do lugar, a gestão escolar, o

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

espaço físico, as políticas públicas, as relações com a comunidade, a disponibilidade de recursos


públicos e privados, entre outros elementos que podem vir a motivar a tomada de decisões, dentro e
fora da sala de aula.
Nos tópicos que seguem serão descritos o percurso metodológico delineado para as
pesquisas e os resultados obtidos.

PERCURSO METODOLÓGICO
A abordagem qualitativa, de inspiração etnográfica, foi o método utilizado nos estudos.
Quanto aos procedimentos, privilegiamos o enfoque de uma pesquisa aberta, generosa e humilde
dando voz aos atores encontrados e valendo-nos de técnicas como observação-participante,
entrevista semi-estruturada e análise documental. Esta opção se alinhou com os pressupostos
teórico-metodológicos que fundamentaram as pesquisas, no sentido de não condicionar as respostas
dos participantes e apreender de um modo mais completo suas experiências. A pesquisa
bibliográfica foi um procedimento contínuo durante o desenvolvimento das teses de doutorado e
procurou fundamentar os estudos a partir dos referenciais da Antropologia, Filosofia, Psicologia
Ambiental e Sociologia, articulando-se com o campo da Educação e da Educação Ambiental.
Os locais estudados foram, na primeira e na segunda pesquisa, respectivamente, escolas
localizadas no entorno de unidades de conservação nos municípios de Viamão e de Porto Alegre,
RS, e oito universidades públicas e privadas do RS que possuem sob seu domínio e gestão áreas
verdes, localizadas em diversas regiões do estado.

AS ESCOLAS E AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO: APROXIMAÇÕES E DESAFIOS


Ao estudar as escolas localizadas próximo a unidades de conservação, observou-se que a
maioria tinha como preocupação ambiental questões globais, principalmente no que se refere aos
problemas associados aos resíduos sólidos. Apenas uma das escolas pesquisadas destacou-se pelo
foco na valorização do lugar e da unidade de conservação.
Fatores como os efeitos de políticas públicas; os documentos escolares; a presença de uma
unidade de conservação próxima à escola e as relações com o lugar; a agência de entidades não
humanas e as questões oriundas das ações e emoções humanas, tais como a violência, a valorização
da natureza e a preocupação com a questão ambiental, estavam relacionados com a ambientalização
do currículo.
Como resultado, foram observados elementos que facilitavam a aproximação entre escolas e
unidades de conservação e outros que, ao contrário, dificultavam ou impediam o acesso dos
estudantes e dos professores nessas áreas. Entre os fatores que contribuíram nessa relação estão a
proximidade física entre escolas e unidades de conservação; os investimentos dos gestores e
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

funcionários das unidades de conservação na promoção da educação ambiental nas escolas; a


presença de professores e de gestores engajados com as questões ambientais e os incentivos das
políticas públicas para a educação ambiental e para a sustentabilidade. Entre os desafios observados
estão o número reduzido de funcionários nas unidades de conservação e a pouca disponibilidade de
recursos financeiros.
As políticas públicas podem facilitar a relação entre escolas e unidades de conservação, mas
também podem dificultar esse processo. Exemplo disso são as normas e orientações sobre o
currículo escolar, que podem limitar a ampliação do currículo a fim de que a escola construa
momentos pedagógicos voltados para as questões ambientais. Além disso, as regras rígidas para
visitantes nas unidades de conservação, a cobrança de taxas para o ingresso e os conflitos históricos
relacionados à implantação das unidades de conservação no Brasil são questões que dificultam a
interação da comunidade e das escolas com essas áreas.

APROXIMAÇÕES E DESAFIOS DAS UNIVERSIDADES E SUAS ÁREAS VERDES:


Como resultados da pesquisa sobre universidades e áreas verdes pudemos identificar que
estas áreas correspondiam à Áreas de Preservação Permanente, Reservas Legais, Reservas
Particulares de Patrimônio Natural, Refúgio de Vida Silvestre, Horto Botânico e Jardins Botânicos.
Cada um destes lugares era detentor de características individuais e usos variados, e também se
relacionavam de formas específicas com suas gestoras na figura das universidades. Vimos como o
Horto Botânico e os Jardins Botânicos apresentados aqui foram, no momento das suas criações,
lugares gerados a partir de projetos grandiosos de pesquisa e expressão ecológica e como
atualmente este sentimento não tem se perpetuado nas altas administrações das universidades.
Situação similar à do Refúgio de Vida Silvestre que encontra suas atividades educacionais
suspensas pelas dificuldades que se apresentam em sua gestão. Ao mesmo tempo, vimos como áreas
protegidas por lei podem ser ressignificadas e transformadas em lugares de práticas educativas. O
fato é que todos estes lugares apresentam desafios: como se manterem interessantes para as
universidades; como lidar com a falta de recursos financeiros e técnico, como usá-los em potencial,
como sobreviver sem seus defensores, e como superar elementos negativos já instituídos e que não
dependem unicamente das universidades para sobreviver.
Todavia, também vimos exemplos que corroboram com o potencial de uso educativo destes
lugares, como as aulas práticas, nas Áreas de Preservação Permanente e as visitas escolares nos
Jardins Botânicos. Pessoas de dentro e de fora das universidades usam essas áreas verdes,
apropriam-se destes lugares das formas mais variadas. Estes espaços também correspondem a
pequenas ilhas de natureza que a população usufrui. Entretanto, existe valor intrínseco destas áreas
verdes e deveria também existir um sentido real nesta apropriação pelas universidades. As áreas
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

protegidas por lei e as Unidades de Conservação ganham novos significados através de seus usos
educativos, mas apesar de uma proteção firmada por leis nem por isso deixam de enfrentar desafios.
O mesmo vale para os Jardins Botânicos e o Horto Botânico: redescobrir seus valores dentro das
universidades onde estão inseridos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A tese sobre as relações entre universidades e suas áreas verdes se propôs a identificar a
situação atual das áreas verdes de oito universidades do Rio Grande do Sul e de que modo as
instituições estão usando estes espaços. A pesquisa buscou por áreas verdes que eram usadas com
algum intuito educacional e de gestão ambiental. É importante para essas instituições legitimar a
posse e a manutenção de suas áreas verdes frente aos seus compromissos ambientais e com a
sociedade. E esta legitimação não pode estar baseada em valores vazios e não efetivos. As
universidades precisam habitar esses espaços, transformando-os em lugares. A inserção da gestão
destes espaços nos processos de ambientalização poderia legitimar esta relação e dar um novo
sentido a ela. As universidades apresentadas aqui estão defrontando-se com as exigências de
políticas e gestão ambientais, entretanto, em algumas delas muito pouco foi encontrado na pesquisa
sobre a aproximação destes processos com as áreas verdes dentro de um contexto educacional.
Como vimos nesta tese, as relações entre as áreas verdes e as universidades são múltiplas, e variam
desde um esvaziamento deste sentido, até a ressignificação destes espaços (MUHLE, 2018).
Com os resultados da pesquisa pudemos observar as dificuldades das estruturas
universitárias de inserir em seus organogramas funcionais as áreas verdes que possuem, mesmo que
elas ainda sejam usadas para práticas de aula e visitação. Os rankings e indicadores de
sustentabilidade aparecem como os novos objetivos de comprometimento ambiental. Apesar de
estes compromissos aparecerem nos sites institucionais e nos Planos de Desenvolvimento
Institucional, nestes documentos a existência das áreas verdes é suprimida. As áreas verdes sofrem
com sua inadequação às estruturas duras e estreitas da burocracia das instituições universitárias. São
invisibilizadas e secundarizadas em sua importância, apesar do discurso ecológico parecer uma
unanimidade, em nível do macro discurso institucional. Esta relação tem mostrado esta
insustentabilidade porque de tempos em tempos as práticas e prioridades são substituídas (MUHLE,
2018).
Ao retomarmos o objetivo da pesquisa que acompanhou escolas no entorno de unidades de
conservação, observamos que o caminho trilhado permitiu desvendar pistas sobre fatores que
facilitam ou que dificultam a aproximação entre essas instituições. Entendemos que, apesar das
imposições e dificuldades que chegam às escolas, a criatividade das pessoas e a influência do lugar
permitem avançar no enfrentamento dos desafios relacionados à ambientalização do currículo.
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Esperamos que as pesquisas aqui apresentadas possam colaborar com a valorização dos
trabalhos realizados nas instituições de ensino pesquisadas, bem como sejam um alerta para aquelas
que ainda encontram muitos desafios para utilizar as áreas verdes disponíveis. Esses locais têm um
grande potencial de conservação, o que já é amplamente conhecido, mas também de sensibilização
para as questões ambientais, seja na forma da ambientalização do currículo das instituições,
atendendo seu público interno, seja na interação com visitantes da comunidade externa.

REFERÊNCIAS
CARVALHO, Isabel Cristina Moura; TONIOL, Rodrigo. Ambientalização, cultura e educação:
diálogos, traduções e inteligibilidades possíveis desde um estudo antropológico da educação
ambiental. Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, v. 1, p. 28-39, 2010.

FRIZZO, Taís Cristine Ernst. Educação e Natureza: os desafios da ambientalização em escolas


próximas a unidades de conservação. 2018. 281 f. Tese (Doutorado em Educação)-Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018. Disponível em:
<http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/8085>. Acesso em: 30 mai. 2018.

MUHLE, Rita Paradeda. Áreas verdes como espaços educacionais não convencionais dentro das
universidades: seus potenciais para a formação na perspectiva ambiental. 2018. 234 f. Tese
(Doutorado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Disponível
em: http://tede2.pucrs.br/tede2/bitstream/tede/8092. Acesso em: 28 abr. 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FORTALECENDO NOSSAS RAÍZES – PROTAGONISMO JOVEM NA


RESEX MARINHA DE CAETÉ-TAPERAÇU
STRENGHENING OUR ROOTS – PROTAGONISM OF THE YOUTH IN THE MARINE
PROTECTED AREA OF CAETÉ-TAPERAÇU

Sheyla da Silva Leão*, Bruna Maria Lima Martins, Marcelo Andrade **

Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil. *


Teatro e Dança, Universidade Federal do Pará. **

1. INTRODUÇÃO
Os jovens são, em um só tempo, parte da população atual que participa do desenvolvimento
e das diferentes ações produtivas do presente, e são parte dos futuros herdeiros das ações e decisões
coletivas tomadas no presente. Sendo assim, são parcela fundamental para toda e qualquer
discussão, ação, formação e decisão referente à sustentabilidade. Diante disso nos últmos anos tem-
se observado um apelo maior em incluir a juventude nos processos de participação e tomadas de
decisão, a Organização das Nações Unidas, por exemplo, no ano de 2017 a organização fez uma
convocatória aos Estados-membros da ONU para aumentar a representatividade e a garantir a
participação dos jovens em processos decisórios nos âmbitos local, nacional, regional e
internacional.
No Brasil, a partir da metade da década de 2000, até o início da década de 2020 a população
jovem e jovem adulta (idade entre 15 e 29 anos) apresenta uma forte onda de crescimento e passa a
ser alvo de políticas públicas, como a criação da Secretaria Nacional de Juventude em 2004 e a
promulgação do estatuto da juventude em 2013 (BRASIL, 2013). O governo brasileiro adota a faixa
etária entre 15 e 29 anos como sendo a da população jovem, seguindo as disposições estabelecidas
pelas agências das Nações Unidas.
Tendo em vista esse contexto, é importante mencionar de forma equivalente a prioridade
ao tema do fortalecimento da juvente junto as areas protegidas marinhas. O IMCBio por exemplo,
executou em duas Reservas Extrativistas Marinhas do estado do Pará, o Projeto Jovens
Protagonistas (ICMBIO, 2018) com estimulo ao protagonismo juvenil, por meio de ações
formativas vinculadas a arte-educação (RODRIGUES,2015). A partir dessa experiência, emerge a
necessidade de fomentar a formação e participação da juventude nas areas protegidas, em especial
as Reservas Extrativistas, como forma de apoiar as lideranças comunitárias e a gestão da unidade de
conservação.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para a experiencia na Resex Caeté-Taperaçú, são consideradas as formações “Jovens
Protagonistas na Sustentabilidade”, executada no anos de 2017 e 2018, pelo projeto Pesca
Sustentável na Costa Amazônica (UNESCO&Fundo Vale) e a experiencia “Comunica Jovem –
Jovens Extrativistas Bragantinos e comunicação social na RESEX Marinha de Caeté-Taperaçu”,
contemplada em edital interno do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade,
executado em 2018. O processo metodólogico no trato com a juventude buscou considerar o acima
de tudo o perfil do público alvo, bem como seu contexto de insersão no território. Desse modo, a
iniciativa de formação da juventude lança mão da arte-educação, comunicação social e atividades
técnicas como meio de instruir e sensibilizar os jovens que trazem em suas memórias afetivas a
relação com o rio, com o mangue e com o mar e suas influências na sociedade extrativista.
As atividades foram realizadas a partir de uma sequência de módulos temáticos realizados
em intervalo aproximados de três meses. Em cada módulo um tema é selecionado, para ser
trabalhado por meio de discussões teóricas baseadas em palestras, estudos de textos, filmes e
exercícios em grupo (Figura 1). Os momentos teóricos são conduzidos por pesquisadores,
pescadores, lideranças comunitárias, professores e quaisquer profissionais que dominem o tema do
módulo. As ações teóricas são intercaladas com outras linguagens, como teatro, fotografia, desenho,
corporalidade, música entre outros. Desse modo, além de tornar o encontro mais dinâmico, o
diálogo com o lúdico proporciona absorção do conteúdo abordado com habilidades diversas.

Figura 1 – Concepção metodológica da proposta de formação Jovens Protagonistas na Sustentabilidade.

Ao final de cada encontro, são planejadas missões intermodulares, chamadas “ações


protagonistas” para que os diferentes grupos de jovens realizem em suas comunidades. Essas
missões têm conexão com os temas trabalhados nos módulos, com mobilidade para se fortalecer um
determinado assunto debatido ou antecipar uma discussão do próximo encontro. Além disso, as

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ações reforçam o fortalecimento dos grupos nos intervalos entre um módulo temático e outro
(Figura 2).

Figura 2 – Esquema metodológico da formação Jovens Protagonistas na Sustentabilidade

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram realizados um total de cinco módulos de formação, as temáticas e detalhes das
oficinas estão descritas na Tabela 1.

Tabela 1 – Descrição dos módulos da formação de jovens na Resex Caeté-Taperaçu


Tema Público Oficina

Política, Juventude e 63 jovens. Teatro


Sustentabilidade

Politica, Cultura e Juventude 46 jovens. Teatro e Memoria –


Ministrante / Oficina de
Mídias Móveis
Politica, Juventude, Ciência, 48 jovens. Cartografia Social
Tecnologia e Sustentabilidade
Comunicação Social e 70 jovens Fotografia/Midias
Educomunicação Sociais/Audiovisual
Avaliação 48 jovens Cartografia Social

Os encontros realizados com os jovens da Resex foi uma oportunidade de aproxima-los do


conceito de areas protegidas, mais espeficicamente do território extrativista. Um dos pontos de
destaque, foi a visita técnica realizada no mangue. Esse encontro proporcionou um novo olhar dos
jovens a respeito dos manguezais e sobre a necessidade de protegê-lo, ele foi aliado a oficina de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

cartografia social. Foi possível observar que os jovens reconheceram a importancia da RESEX na
manutenção dos modos de vida de suas próprias famílias.
“Por conta da criação da reserva temos legislações que protegem o período de reprodução do
caranguejo. Isso ajuda para que sejam preservados os mangues e seja respeitado o defeso (Islen –
Comunidade de Eldorado, polo Treme – RESEX Caeté-Taperaçu)”.
A identificação da juventude com o território é essencial para incluí-lo na gestão da Resex, a
formação buscou também resgatar esse histórico junto a juventude.
“Meu pai conta que participou da movimentação dos extrativistas para a criação da reserva, por
isso é necessário que todos continuem a proteger nossa reserva, principalmente nós jovens”
(Lucielem – Treme, polo Treme – RESEX Caeté-Taperaçu).
Dentre as competências e habilidades desenvolvidas e aprimoradas durante a formação foi
observado uma vocação da juventude para aréas que envolvam o teatro e comunicação social. Isso
deve-se, pela facilidade de organizar suas ideias em plataformas de mídias simples e de fácil acesso,
e de expressar suas ideias por meio da teatralização. Além disso, os jovens da Resex apresentaram
facilidade no planejamento e execução de atividades que envolvam mobilização e animação
comunitária, e em alguns casos no levantamento e catálogo de dados das suas comunidades.

3. CONCLUSÃO
A partir da experiência de capacitação e formação de jovens nas comunidades pesqueiras,
por meio do Programa “Jovens Protagonistas na Sustentabilidade”, observa-se a importancia de
considerar as componentes políticas, sociais e ambientais aliada com a arte educação e a
comunicação social a fim de estimular o protagonismo e a participação juvenil. O destaque para
essas ferramentas deve-se a possibilidade de facilitar o engajamento juvenil. Nesse ponto, para além
da arte-educação, a comunicação social mostra-se também eficaz ao aprimorar a participação social
de jovens e aproxima-los da gestão da unidade. Com a iniciativa “Comunica Jovem”, viabilizado a
partir do edital interno do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio-, os
jovens receberam formação de social media, jornalismo, fotografia e video, costurado com a
identidade e participação social. Desse modo é importante considerar a característica inerente dessa
faixa etária: o instinto inovador de descobrir espaços de expressão, e alia-la a uma formação
educativa e libertadora com intuito de engajar mais um ator social, qualificado e motivado, para
atuar nas diferentes agendas sociais, políticas e laborais necessárias para a consolidação das
propostas de fortalecimento da gestão da RESEX.

4. AGRADECIMENTOS
124
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

As lideranças presentes e futuras que contribuem para o fortalecimento dos territórios extrativistas.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei Nº 12.852, de 5 de agosto de 2013 que Institui o Estatuto da Juventude e dispõe
sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o
Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE. Diário Oficial da União. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12852.htm. 201.

ICMBIO. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Jovens Protagonistas:


descrição da implementação em unidades de conservação com manguezal / Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade. Brasília: Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade, 2018.

RODRIGUES, L. S.; ANCIÃES, M. (orgs). Verde Perto Educação - Volume 1. Manaus: Editora
do INPA, 2015.

125
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PRIMEIRA INFÂNCIA EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO


EARLY CHILDHOOD IN PROTECTED AREAS

Cynthia Gerling de Oliveira¹* , Flávio José de Lima Silva¹-² , José Martins da Silva Júnior³

1 - Centro Golfinho Rotador, Fernando de Noronha, Brasil.


2 - Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil.
3 - ICMBio Noronha, Fernando de Noronha, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
A abordagem interdisciplinar e o envolvimento de múltiplos atores locais, regionais,
nacionais e internacionais têm sido uma das estratégias de sucesso do Projeto Golfinho Rotador,
que se tornou um projeto de referência sendo agraciado por prêmios nacionais e internacionais. Sua
atuação continuada desde 1990, fez com que se tornasse um dos maiores programas de Estudos de
Longa Duração (Sustainable Ecological Research) de golfinhos do mundo, tipo de trabalho
necessário para compreender as tendências e dinâmicas socioambientais, que passariam
despercebidas em estudos de curto prazo. Para atingir este objetivo, uma das ações desenvolvidas
pelo Projeto Golfinho Rotador no Arquipélago de Fernando de Noronha é a educação ambiental
para a primeira infância no Centro Integrado de Educação Infantil Bem-me-quer.
O objetivo deste trabalho é apresentar o programa de educação ambiental na primeira
infância desenvolvido pelo Projeto Golfinho Rotador, o qual visa preparar crianças da ilha desde os
primeiros anos de vida para uma vida pautada pela qualidade de vida e sustentabilidade nas
Unidades de Conservação de Fernando de Noronha.
A experiência direta com a natureza é uma forma eficaz das pessoas serem proativas na
preservação dos recursos naturais e em seu uso sustentável. A memória de se estar natureza na
primeira infância assegura a pessoa ser um futuro guardião do Planeta. Por outro lado, o
distanciamento da natureza por meio da urbanização enfraquece atitudes de preservação e
comportamento em prol do meio ambiente (ELANDS, 2018).
Atividades visando desenvolver senso de responsabilidade comunitária e ambiental em
jovens por meio de saídas de campo em áreas protegidas foram muito bem avaliadas pelos alunos,
sendo possível afirmar que as atividades de campo atingiram seu objetivo e que esses métodos são
vistos de forma positiva pelos alunos do ensino fundamental (MENABIT et al, 2018).
Um estudo feito pelo Instituto de Saúde Global de Barcelona mostrou que não estar em
espaço natural na infância pode ter consequências para a saúde mental ao longo da vida. Esse
estudo ressaltou a importância dos ambientes naturais, para uma atitude positiva em prol da
126
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

natureza, e também revelou que essa experiência vivida na infância resulta em um estado
psicológico saudável na vida adulta (PREUß et al, 2019).
O Arquipélago de Fernando de Noronha (PE) está distante 345 km do Cabo de São Roque
no Rio Grande do Norte, 361 km de Natal (RN), 545 km de Recife (PE). Por sua importância
ecológica, Fernando de Noronha recebeu da UNESCO o título de Patrimônio Natural da
Humanidade e abriga duas Unidades de Conservação Federais do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Parque Nacional Marinho de FN e a Área de Proteção
Ambiental de FN - Rocas - São Pedro e São Paulo (LINSKER, 2003). E, em 2017, conquistou o
título de Sítio Ramsar.
Embora a legislação de proteção às Unidades de Conservação minimize impactos
ambientais, o Arquipélago vem sofrendo com o incremento do turismo e demográfico que demanda
consumo cada vez maior consumo de água, energia e insumos e gera grande produção de resíduos
sólidos.
Como o impacto negativo do crescimento demográfico e do turismo é evidente, o
desenvolvimento sustentável em Fernando de Noronha deve ser almejado e praticado desde os
primeiros anos de vida para que os ilhéus aprendam a viver em Unidades de Conservação,
respeitando a capacidade de suporte de o ecossistema insular (SILVA-JR, 2010).

2. MATERIAL E MÉTODOS
Considerando a concepção de “Educação Ambiental crítica e emancipatória no processo de
gestão ambiental pública” (ICMBio, 2016), a metodologia usada para as ações educativas para a
primeira infância se desmembrou em várias abordagens, para atingir seu objetivo, conforme a
seguir: oficinas ambientais em sala de aula, oficinas ambientais com saídas de campo e intervenções
de arte educação.
As ações educativas foram realizadas de setembro de 2018 a agosto de 2019 com crianças de
2 a 5 anos de idade no Centro Integrado de Educação Infantil Bem-me-quer.
O conteúdo trabalhado, além de aspectos sobre golfinhos, aves marinhas, corais, unidades de
conservação, água, energia, resíduos sólidos, também abordou a singularidade e facilidade de
observação destes ecossistemas em Fernando de Noronha.
As oficinas ambientais teóricas e práticas, em sala de aula e em saídas de campo englobaram
também diversos itens da Carta da Terra, como “Adotar padrões de produção, consumo e
reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar
comunitário”. Ao longo do processo, os educadores facilitaram a aprendizagem por meio de
diversas ferramentas como vídeos, contação de histórias, mímica, desenho, pintura, teatro, fantoche
e trilhas ao ar livre.
127
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

As intervenções de arte-educação ocorreram com base no “Promover à contribuição das


artes e humanidades, assim como das ciências, na educação para sustentabilidade”. Foram
realizadas intervenções de caráter lúdico e artístico, como oficinas de Arte e Pintura em telas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
No período de setembro de 2018 a agosto de 2019, foram realizadas67 ações educativas,
entre saídas de campo para a área do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, oficinas
ambientais em sala de aula e intervenções de arte educação, incluindo arte e pintura em tela.
Como produtos artísticos, foram produzidas 4 telas de pintura com colagem de folhas e
carimbos feitos a partir de materiais orgânicos encontrados no jardim do Centro Integrado de
Educação Infantil, como talo da bananeira, galhos retorcidos e flores, onde as crianças puderam
perceber a beleza da natureza estampada nas telas. Foram apresentados vídeos sobre o
comportamento aéreo e subaquático dos golfinhos-rotadores de Noronha e a problemática do
plástico nos oceanos.
Nesse período houve a participação nas ações de 595 alunos. Destes, 329 eram crianças
diferentes.
A continuidade do trabalho no CIEI Bem-me-quer tem se mostrado eficaz na evolução do
conhecimento sobre a importância das Unidades de Conservação e das espécies que nelas habitam,
na percepção do ecossistema e no comportamento ambiental proativo dos alunos. A realização
dessa gama de opções de atividades na natureza e com elementos da natureza corroboram com o
que Elands (2018) e Menabit et al (2018) relatam em seus trabalhos, quando afirmam que ações
educativas em ambiente natural são avaliadas positivamente pelos alunos, lhes conferindo também
um senso de guardiões das Unidades de Conservação.

4. CONCLUSÃO
O presente estudo possibilitou evidenciar que a realização de ações educativas na primeira
infância em Unidades de Conservação aumentou o grau de consciência ambiental das crianças.
É senso comum que a vida de crianças, jovens e adultos longe da natureza os deixam menos
felizes e menos satisfeitos. A experiência direta com a natureza em Unidades de Conservação é uma
ferramenta poderosa para a sustentabilidade do Planeta, qualidade de vida e saúde mental das
pessoas e quanto mais cedo essa experiência começar, melhor será para todas as espécies que
habitam esse Planeta.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos a Petrobras, que por meio do Programa Petrobras Ambiental, patrocina nossas
ações de Educação Ambiental e Sustentabilidade em Fernando de Noronha. Agradecemos também
o Centro Integrado de Educação Infantil Bem-me-quer por ter confiado em nosso trabalho e nos
dado a oportunidade de executar nossas ações de Educação Ambiental com as crianças.
Agradecemos ao ICMBio Noronha por serem parceiros nas ações de Educação Ambiental.

5. REFERÊNCIAS
ELANDS, B. H. M. Responsibility for nature starts from childhood experiences in nature areas.
Abstract in scientific journal or proceedings. 2018.

INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE. Educação


ambiental em Unidades de Conservação: Ações voltadas para comunidades Escolares no
contexto da Gestão Pública da Biodiversidade. Brasília: ICMBio. 2016.

LINSKER, R. Arquipélago de Fernando de Noronha: O Paraíso do Vulcão. São Paulo: Terra


Virgem. 2003.

MENABIT, S., MUREȘAN, M., BEGUN, T., PAVEL, B., & SEGHEDI, A. “The School
Differently” Learning about Marine Protected Areas – A Proactive Educational Approach Towards
Implementation of Measures of Marine Habitats Conservation and Protection. Geo-Eco-
Marina, 23, 215-222, 2018.

PREUß, M., NIEUWENHUIJSEN, M., MARQUEZ, S., CIRACH, M., DADVAND, P.,
TRIGUERO-MAS, M., ... & Zijlema, W. Low childhood nature exposure is associated with worse
mental health in adulthood. International journal of environmental research and public health,
16(10), 1809, 2019.

SILVA JÚNIOR, J. M. Os golfinhos de Noronha. 1° Edição. São Paulo: Bambu, 2010.

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DIMENSÕES HUMANAS E A EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO EM


ÁREAS PROTEGIDAS NA CAATINGA: UMA CONTRIBUIÇÃO
HUMAN DIMENSIONS AND THE EDUCATION FOR CONSERVATION IN PROTECTED
AREAS IN CAATINGA: ONE CONTRIBUTION

Cláudia Sofia Guerreiro Martins*, Rogério Dell’António**, Camile Lugarini***

*Doutoranda em Ecologia Aplicada; Laboratório de Ecologia, Manejo e Conservação da Fauna Silvestre; Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, SP, Brasil (Autora correspondente) -
e-mail: csgmartins@gmail.com
** Geógrafo
*** Analista Ambiental, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio)/Centro Nacional de
Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (CEMAVE), Florianópolis, SC, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Entre os usos previstospara as unidades de conservação no Brasil(Lei 9.985/2000)
encontram-se atividades de pesquisa científica, educação ambiental, recreação e visitação,
principalmente nos Parques Nacionais (PN), Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN),
Refúgios de Vida Silvestre (RVS) e Monumentos Naturais (MN).
Espera-se que a educação ambiental executada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente (MMA),que tem
como missão proteger o patrimônio natural e promover o desenvolvimento socioambiental, (i)
institucionalize e implemente as diretrizes da política nacional (Lei 9.795/1999) e do MMA, (ii)
tenha caráter instrumental e de formulação de estratégias e metodologias, (iii) esteja presente e
contribuindo de forma transversal em todas as instâncias de gestão do ICMBio na tomada de
decisão (ICMBio, s.d.).Isso é padrão para todo o território nacional,com o objetivo principal da
conservação das espécies e seus habitats e uma busca permanentepor equilíbrio baseado na ética e
na pesquisa científica.
Esse equilíbrio se fundamenta nos sistemas éticosque contrapõem os preservacionistas aos
conservacionistas sociais, a partir dos conceitos usados no idioma anglo-saxônico de
“natureprotectionist” (NP) e “social protectionist” (SC) (MILLER; MINTEER; MALAN,2011). Os
NPs afirmam que a proteção da biodiversidade é motivada pelo reconhecimento do valor intrínseco
das espécies e seus ambientes, independentemente da contribuição destes para os valores ou
interesses da espécie humana (KATZ; OECHSLI, 1993; ROLSTON, 1994, 1998; OATES, 1999;
TERBORGH, 1999). Os SCs argumentam que a melhoria do bem-estar humano deve ser o foco da
conservação, e as áreas protegidas e a biodiversidade devem ser instrumentos para alcançar os
objetivos do desenvolvimento sustentável (PHILLIPS, 2003).

130
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A pesquisa científica tem revelado que áreas protegidas que excluem pessoas não asseguram
a sobrevivência de muitas espécies da fauna silvestre, uma vez que estas não conhecem fronteiras
estabelecidas em decretos e é no entorno das áreas protegidas que aumenta sua vulnerabilidade
(LOVERIDGE et al., 2010; WOODROFFE; GINSBERG, 1998), principalmente em lugares onde o
nível de desenvolvimento humano é baixo e o contexto socioeconômico, institucional e político
dificulta manter essas áreas de forma efetiva. O custo é elevado, assim como a demanda em
recursos humanos, e é inevitável o delicado trade-off de “ganhos econômicos imediatos advindos do
consumo dos recursos pelos locais versus os benefícios de longo prazo e difusos gerados pela
conservação da biodiversidade” (MILLER; MINTEER; MALAN, 2011: 949; tradução livre).
Dessa forma, a educação ambiental em unidades de conservação, uma educação para a
conservação, está assente em conceitos chave que a tornam transformadora antes mesmo de
transmissora ou geradora de conhecimentos. Essa educação para a conservação é interdisciplinar ao
procurar “as opiniões [sobre conservação] entre políticos, sociólogos rurais, agrônomos e
economistas” (IUCN, 1988, p. 33), e não apenas entre naturalistas. Essa educação entende que a
biodiversidade é, na verdade, sociobiodiversidade, porque “pertence tanto ao domínio do natural e
do cultural” (DIEGUES, 2005, p. 309). Essa educação reconhece as unidades de conservação como
“espaços educadores”, definidos como “aqueles capazes de demonstrar alternativas viáveis para a
sustentabilidade, estimulando as pessoas a desejarem realizar ações conjuntas em prol da
coletividade e reconhecerem a necessidade de se educarem” (MMA, 2005). Reconhece todos os
indivíduos e grupos que de alguma forma se relacionam com elas como “comunidades
aprendentes”, onde “pares, grupos, equipes, instituições” e suas múltiplas possibilidades de
interações propiciam situações pedagógicas (BRANDÃO, 2005).
Da aproximação que aconteceu, principalmente a partir dos anos de 1960, entre
pesquisadores e diversos setores populares e movimentos sociais, emergiu uma nova prática de
produzir conhecimento, além das universidades e centros de pesquisa. Nova em conteúdos, muito
mais próximos das questões do cotidiano e nova em métodos, foialém de descrever e sistematizar a
realidade social, mas interpretando-a e reconstruindo-a, em “um processo vivencial, que inclui
simultaneamente educação de adultos, pesquisa científica e ação social ou política, e no qual se
consideram como fontes de conhecimento: a análise crítica, o diagnóstico de situações e a prática
cotidiana” (BORDA, 1983).
Apesar de dialógico e inclusivo, pesquisadores e educadores questionando de forma
horizontal as formas convencionais de “produzir saber” e “educar” e tornando obsoletos termos que
categorizavam grupos (“comunidade, pobres, marginalizados, explorados”) (VIEZZER, 2005),
ainda não atingiu o ideal: “os grupos envolvidos [com educação ambiental] saírem do silêncio e do
espaço de opressão que a sociedade lhes impõe, para participar de um processo onde aprendem a
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

descobrir, compreender e analisar a realidade e a repassar adiante o conhecimento adquirido”


(VIEZZER, 2005, p. 283).
O pesquisador que se envolve com processos de educação ambiental em unidades de
conservação, principalmente aquelas com distribuição atual ou histórica de espécies-bandeira
(SIMBERLOFF, 1998) ou espécies carismáticas (MARCHINI, 2014), deseja produzir
conhecimento sobre os processos educativos dos quais participa. Esse pesquisador sabe que “a
conservação da biodiversidade é uma realização humana: iniciada por pessoas, nomeada por
pessoas, e intencionada para modificar comportamentos humanos…” (MASCIA et al., 2003;
tradução livre). “Conservação é não primeiramente sobre biologia, mas sobre pessoas e as escolhas
que estas fazem” (BALMFORD; COWLING, 2006), então, só acontecerá se comportamentos
humanos forem influenciados e modificados (SCHULTZ, 2011).
Existem exemplos notáveis de projetos em unidades de conservação, que têm respeitado as
diretrizes, os princípios, a ética, os objetivos e o conhecimento já produzido, envolvendo
comunidades na conservação e lidando com questões sociais, culturais e econômicas.É o caso do
trabalho de Bizerril, Soares e Santos (2011) no Parque Nacional da Serra da Canastra, MG, com
foco na conservação do lobo-guará (Chrysocyonbrachyurus) ou o trabalho da organização não-
governamental IPÊ, no Pontal do Paranapanema, voltado à conservação do mico-leão-preto
(Leontopithecuschrysopygus), onde foram envolvidos escolas, proprietários rurais e comunidades,
em projetos de recuperação de áreas degradadas, criação de corredores ecológicos e projetos de
geração de renda com bases sustentáveis (PÁDUA; SOUZA, 2007).
No entanto, três questões emergem, quando se atenta à educação para a conservação em
unidades de conservação, e essas são o foco desta comunicação:
i) Apesar da pesquisa em educação ambiental ser essencialmente qualitativa, variáveis
como motivações, aspirações, crenças, valores e atitudes (MINAYO, 2002) precisam ser medidas,
explicadas e comparadas. Sendo o objetivo a transformação da realidade, é relevante
perguntar:quanto as atividades de educação ambiental para a conservação usam diagnósticos
acurados? Equanto estes avaliam conhecimentos além da biologia e da ecologia, adentrando as
ciências sociais, a psicologia cognitiva e comportamental?
ii) Os pesquisadores em educação para a conservação em unidades de conservação e seu
entorno estão trabalhando em distintos níveis de abstração teórica, desde o planejamento,
observação e análise, facilitando os processos de efetiva apropriação do conhecimento da realidade
por todos os indivíduos e grupos envolvidos? Estão elaborando produtos diversificados, ou seja,
depois de coletados, os dados são sintetizados e analisados em diferentes níveis e formas para que
atendam as diferentes linguagens e expressões de todos? Estão intencional e declaradamente
eliminando as relações desiguais de produção do conhecimento? (VIEZZER, 2005).
132
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

iii) Que exemplos se encontram na Caatinga de ações de educação para a conservação


em unidades de conservação que levem em consideração a objetividade que a ciência das dimensões
humanas (VASKE, 2008) pode agregar à prática educativa?

2. MATERIAIS E MÉTODOS
A área onde decorreram as primeiras intervençõesem educação para a conservação que
correspondem ao estudo de caso exposto nesta comunicação inclui comunidades e escolas das
unidades de conservação e entorno: Refúgio de Vida Silvestre (REVIS) da Ararinha-Azul
(Cyanopsittaspixii), com 29.986 hectares, e na Área de Proteção Ambiental (APA) da Ararinha-
Azul, com 89.996 hectares, nos municípios de Curaçá e Juazeiro, Bahia4. Foi o primeiro passo após
a criação das unidades, de diagnóstico, dentro de uma estratégia de conservação proativa (BROOKS
et al., 2006), pelo subprojeto do ‘Projeto Ararinha na Natureza’, do ICMBio, executado entre
outubro de 2018 e março de 2019.
A ararinha-azul encontra-se classificada como criticamente ameaçadae possivelmente
extinta na natureza (MMA, 2014, havendo apenas 175 indivíduos em cativeiros em outros países e
22 no Brasil.Dois fatores principais foram identificados como responsáveis para o declínio das
populações da espécie: destruição em larga escala do ambiente específico de mata de galeria,
preferido pela espécie, e a captura para comércio ilegal (JUNIPER; YAMASHITA, 1990, 1991;
COLLAR et al., 1992; BAMPI; DA-RÉ, 1994) – denominador comum, o homem.
Planeja-se a reintrodução da ararinha-azul na região até2024 (Portaria ICMBio 353/2019).
Por isso, é importante saber quais as perspectivas dos locais em relação à espécie e não nos
basearmos unicamente nas percepções dos pesquisadores que trabalham na proteção da espécie ou
dos entes governamentais ou privados que financiam e gerem o Projeto e as unidades de
conservação da ararinha-azul. Diferentes indivíduos e grupos têm atitudes, percepções, valores,
crenças, comportamentos e normas sociais distintos, que precisam ser identificados e entendidos
pelo pesquisador em educação para a conservação, se há de influenciar mudanças de
comportamentos.
Pesquisas sobre as dimensões humanas das relações com avifauna silvestre que não sejam de
utilidade, nas quais aves não sejam recurso, ainda são muito escassas. Com isso em mente, foram
elaborados questionários semiestruturados,fundamentados nas teorias e métodos da ciência das
dimensões humanas das interações com a fauna silvestre (MANFREDO; VASKE; SIKOROWSKI,
1996), para professores e para estudantes de escolas municipais; e um roteiro para mapeamento
participativo nas comunidades.

4
Criadas por decreto nº 9.402, de 5 de junho de 2018
133
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O questionário disponibilizado para autoaplicação pelos professores tem 55 questões,


divididas nas seções “Dimensões humanas das relações com avifauna silvestre”, “Dimensões
humanas das relações com a ararinha-azul” e “Questões pessoais”. As variáveis de pesquisa em
dimensões humanas incluem “conhecimento” (biologia e ecologia das espécies), experiência com as
espécies”, “valores”, “atitude para com retirada de aves da natureza”, “norma social”, “crenças”,
“comportamentos favoráveis à conservação”, e, “instituições”.
O questionário aplicado aos estudantes tem 44 questões, divididas nas mesmas seções do
questionário usado com os professores, sendo comuns as variáveis de pesquisa, embora com
linguagem adequada à faixa etária. O protocolo foi transformado em um formulário de coleta de
dados primários no aplicativo GeoODK©, e aplicado face-a-face, nas mesmas escolas onde os
professores foram inquiridos.
Oroteiro para mapeamento participativovisou coletar informações sobre recursos naturais,
locais de interesse e percepções locais dentro de uma visão geográfica partilhada (PURI, 2011). O
conhecimento que deriva deste processo permite que o pesquisador (ou gestor) entenda como se usa
o ambiente natural e social, o que fornece subsídios para o planejamento de uso do solo e do
território, de grande importância quando se consideram áreas protegidas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Vinte e um professores, 64 estudantes e quatro comunidades foram envolvidas de forma
participativa e não “extrativa” nesta avaliação pioneira de dimensões humanas das relações dos
locais com uma espécie que vive apenas no imaginário da maioria dos habitantes da região.
Em processo de análise, os grupos aguardam produtos diversificados que possam ser
compartilhados com eles, para que a apropriação do conhecimento de sua realidade seja efetiva.
Entendem que o passo de diagnóstico e mapeamento, e os instrumentos objetivos de coletasãojá
produtos da pesquisa em educação, ao vivenciarem sua elaboração e proporem ajustes, sem o
constrangimento de uma hierarquia de grupos envolvidos no processo de pesquisa.

4. CONCLUSÕES
Apesar da importância dada ao monitoramento da biodiversidade em unidades de
conservação e à necessidade de identificar áreas, proprietários e conflitos por questões ambientais,
sociais ou fundiárias,dificilmente se encontram protocolos institucionais para diagnósticos
socioambientais e fundiários fora das regiões com terras indígenas, e inexistem protocolos
institucionais que permitam conhecer e entender quais relações as populações humanas têm
estabelecidas com as espécies com as quais coocorrem, exceto protocolos de diagnóstico de
conflito. Em um país de elevada sociobiodiversidade e em um bioma ainda fronteira para as
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ciências naturais e sociais como a Caatinga, é relevante ampliar os instrumentos que agregam
objetividade aos métodos tradicionais de pesquisa qualitativa em educação para a conservação. A
ciência das dimensões humanas dispõe de robustez teórica e metodológica para contribuir com os
projetos, programas e políticas em educação ambiental que as instituições executam.

5. AGRADECIMENTOS
Aos voluntários do ICMBio/Projeto Ararinha na natureza, Carleani Caxias, Damilys
Oliveira, Elpídio Júnior, Mércia Ataíde, Naíne Nascimento, Rafael Fernandes e Tatiane Alves, sem
os quais a coleta de dados teria sido inviável no tempo em que ocorreu.
Às escolas Colégio Estadual José Amâncio Filho e São Bento (Curaçá) e Santo António
(NH3, Juazeiro), ao Assentamento do Banguê e às comunidades Cacimba da Torre, Cabaceira e São
Bento, que aceitaram participar desta pesquisa inédita, generosamente contribuindo para a ciência e
conservação de uma espécie tão prejudicada por sua proximidade à nossa espécie.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BALMFORD, A.; R. COWLING. 2006. Fusion or failure? The future of conservation
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136
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

UMA ANÁLISE QUANTITATIVA DA VISITAÇÃO VOLTADA À


EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA RESERVA BIOLÓGICA DO TINGUÁ
ENTRE 2015 E 2018
A QUANTITATIVE ANALYSIS OF ENVIRONMENTAL EDUCATION IN TINGUÁ
BIOLOGICAL RESERVE BETWEEN 2015 AND 2018

Guilherme Preato Guimarães*, Gisele Silva de Medeiros**, Monika Richter***

* Departamento de Geografia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Brasil.


** REBIO do Tinguá, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil.
*** Departamento de Geografia, Universidade Federal Fluminense, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
A Reserva Biológica do Tinguá (Rebio do Tinguá) caracteriza-se como uma importante
Unidade de Conservação (UC) de proteção integral para a região metropolitana do Estado do Rio de
Janeiro. Essa importância é dada devido à UC possuir a maior extensão contínua de Mata Atlântica
do estado composta por floresta ombrófila densa baixo montana (até 500m), submontana (de 500 a
1000m) e montana (acima de 1000m) (MMA, 2000), preservando em seu interior diversas espécies
endêmicas e ameaçadas de extinção. Para além, a Rebio do Tinguá possui um manancial de águas
que hoje abastece cerca de 400 mil pessoas (CEDAE, 2019).
Devido à sua inserção na região metropolitana, a UC enfrenta diversos conflitos com as
comunidades circundantes. Dentre esses conflitos, destacam-se a caça da fauna silvestre; extração
de palmito; desordenado turismo predatório; atividade religiosa com abertura de trilhas e uso de
fogo; construções irregulares que fomentam o conflito fundiário, impedem a regeneração natural e
estimulam ações de desmatamento, além dos grandes empreendimentos instalados no território
protegido (GUIMARÃES, 2017). As ameaças à biodiversidade e a seus aspectos naturais não são de
exclusividade da Rebio do Tinguá. Em todo o Brasilmuitas UC vêm sofrendo forte pressão
antrópica. Além do avanço de construções irregulares em suas zonas de amortecimento, “observa-se
nessas UCs o agravamento dos processos erosivos, bem como movimentos de massa, sendo as
atividades turísticas, extrativistas e pecuária as responsáveis pelo agravamento de tal problema”
(GUERRA, 2016).
Muitos são os desafios que devem ser vencidos na gestão de uma UC, no caso da Rebio do
Tinguá a falta de infraestrutura logística, dificuldade de acesso à UC, assim como a ausência de
equipe especializada e com dedicação exclusiva ao tema são obstáculos a serem ultrapassados. Parte
desses desafios tem relação com as estratégias utilizadas, sendo uma delas a definição de parcerias
que podem ser iniciadas com os agentes envolvidos no Conselho Gestor da Unidade bem como com
entidades das comunidades do entorno como escolas e universidades.

137
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Os problemas ambientais enfrentados atualmente não são pontuais, mas sim sistêmicos, o
que exige uma mudança de paradigma e, para tal mudança, acredita-se que seja necessário um
trabalho efetivo de uma Educação Ambiental (EA) capaz de analisar, discernir e intervir sobre o
atual modelo de sociedade em que o mundo se encontra. Destaca-se que isoladamente a EA não é
solução para tais problemas, ela só passa a ter sentido quando inserida num contexto sócio-político-
econômico que diz respeito, não somente ao Brasil, mas a todo planeta (GUIA DO EDUCADOR,
2002).
Dessa maneira, vislumbra-se uma educação embasada na concepção da Pedagogia Crítica, a
qual busca a emancipação dos sujeitos nela envolvidos de modo a questionarem acerca de sua
realidade a fim de transformá-la (FREIRE, 1996). Esse processo de emancipação é dialético, de
modo que educando e educador estão em constante aprendizagem, renovando suas práticas à luz da
teoria, de maneira a alcançar a práxis educacional. Au (2011) elucida que se trata de uma ação
consciente, em que “os estudantes e professores tornam-se sujeitos que sabem ver a realidade,
refletir criticamente sobre a realidade e assumir uma ação transformadora para mudar essa
realidade”.
Neste sentido, a EA Crítica constitui-se como uma ferramenta metodológica a qual pode ser
associada às UC de todas as categorias na busca pela redução dos conflitos ambientais destacados
anteriormente. Em termos práticos, as UCs podem constituir excelentes “Espaços Educadores”.
Esses espaços são caracterizados como “lugares em que há um potencial educador e uma clara
intencionalidade educadora emancipatória, e que contenham em si o potencial de provocar
descobertas e reflexões, individuais e coletivas, simultaneamente” (MATAREZI, 2005).
Compreende-se que o processo educacional se constitui no dia a dia, no cotidiano, nas inter-
relações do ser com o ser e do ser com o meio - seja ele natural seja ele construído. Com isso,
podemos considerar que “todo espaço e/ou estrutura traz em si características educativas, mas não
necessariamente se constitui num espaço e/ou estrutura educadora, é preciso haver intencionalidade
educadora, ou seja, intenção a propiciar-se aprendizagem aos nossos interlocutores” (ibidem, pág.
164).
A partir da compreensão de que a efetivação da EA crítica em UC constitui-se como um
importante instrumento para amenizar os conflitos ambientais dessas unidades com seu entorno, o
presente texto busca como primeira etapa que venha a subsidiar ação no sentido de uma EA
transformadora, identificar as demandas de visitação para fins educacionais na Rebio do Tinguá.
Tendo como recorte temporal o intervalo entre os anos de 2015 e 2018, objetiva-se compreender
com que frequência essa ação vem sendo desenvolvida, e qual o perfil do público atendido de modo
a subsidiar novas medidas e ações no sentido de promover maior interação e envolvimento dos
moradores e outros na conservação desta Unidade.
138
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2. MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa efetiva-se a partir de uma investigação documental, sendo caracterizada como
pesquisa quantiqualitativa, por analisar o quantitativo de visitações bem como o perfil do público
visitante.Para tanto, foi feita uma solicitação à gestão da Rebio do Tinguádos registros das ações de
visitação realizadas in loco no período compreendido entre 2015 e 2018. O recorte temporal foi
estabelecido a partir da disponibilidade de dados sistematizados de maneira a permitir comparações
estatísticas.As planilhas com os registros são divididas de mês a mês e constam as visitas agendadas
e realizadas, com a data da atividade, quantitativo de visitantes identificado por categoria (aluno ou
pesquisador), total de visitas por mês e uma legenda contendo a instituição/grupo solicitante.
Com base no material fornecido, foi possível traçar o perfil bem como o quantitativo do
público visitante da Rebio entre 2015 e 2018, de modo que percebe-se um destaque das escolas no
que tange ao desenvolvimento de ações de EA na unidade em questão. A sistematização dos dados
e produção dos gráficos se deu através das ferramentas do Microsoft Word e Microsoft Excel.
A análise se deu a partir dos dados destacados nas planilhas, dividindo em três grandes
grupos de visitação: a) universidades – as quais em sua maioria são instituições públicas, parceiras
da Rebio através do conselho da unidade; b) escolas – dentre escolas públicas e privadas, percebeu-
se maior utilização por parte das escolas estabelecidas em Nova Iguaçu, município onde fica a sede
administrativa da UC; e c) outros – foram elencados nesse grupo ONGs, igrejas, grupos de
moradores, etc. por se tratarem de grupos que praticam atividades com menos frequência e por
constarem outras atividades que não necessariamente se identificaram, em primeira instância, como
sendo de EA, como oficinas de fotografia, por exemplo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Entre 2015 e 2018 foram 2.925 visitantes cadastrados, dentre alunos e pesquisadores, sendo
o ano de 2017 o mais expressivo com 28% do total (figura 01). Os dados apontam para um
aumento gradual de visitantes, embora uma pequena redução no ano de 2018, provavelmente
estimulado pelas parcerias que se instalaram com as gestões mais recentes; uma delas, oficinas de
fotografias, relacionadas às atividades de uma ONG local.
Em termos de perfil da visitação, os dados indicam que há um predomínio de demanda
voltada para visitação educativa, em sua maioria composto por um público escolar (figura 02), o
que já era de certa forma esperado devido à categoria da UC em questão permitir visitação apenas
para práticas de EA e pesquisas, conforme destacado inicialmente. No entanto, também se observa
que as unidades escolares em sua maioria são do município de Nova Iguaçu, muito provavelmente
pela facilidade de acesso àsede da Rebio que fica naquele município, apesar da relevância da UC no
contexto da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, conforme já salientado.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 01 - Total de Visitantes na Rebio Tinguá por Ano - 2015 a 2018

Outro dado que chama a atenção é a reduzida procura pelas Instituições de Ensino Superior,
considerando o período de análise, com uma média de apenas uma instituição/curso por ano (figura
02).Cabe igualmente destacar a visitação para fins de pesquisa, vinculadas em grande parte ao
Jardim Botânico do Rio de Janeiro e à Universidade Federal do Rio de Janeiro, por meio do Museu
Nacional, sendo ambas instituições membros do Conselho Consultivo da Rebio.

Figura 02 - Perfil do Visitante da Rebio Tinguá entre os anos de 2015 a 2018

As demais demandas de visitação, compreendendo desde grupos ecológicos a encontro de


professores de redes públicas de ensino, relacionam-se com atividades de educação ambiental,
indicando o grande potencial que a Unidade de Conservação apresenta, necessitando, no entanto, de
maior divulgação e parcerias quanto à esta previsão de uso público e de modo a atender um dos
objetivos de criação de uma Reserva Biológica.
Hoje, como nunca antes visto, a escola configura-se como o local, em vista de
suasfunçõessociais, mais propício para uma formação cidadã consciente e crítica, principalmente
nomeio em que se insere – a sociedade. Como nos aponta CAVALCANTI (2011)

(...) Outro ponto, assim, é a referência à necessária ligação do ensino (..) à formaçãopara a
vida coletiva, para a vida social, formação da cidadania – mas uma cidadaniaplanetária, um
processo de identificação dos indivíduos sempre dinâmico, aberto emúltiplo, levando em
conta o mundo da globalização, o contexto complexo domundo contemporâneo e a dialética
das relações locais/globais. (ibidem, 2011, p. 88)
140
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Acredita-se que a escola seja um importante agente, e talvez o principal lugar onde setem a
oportunidade de dar início à discussão acerca da Questão Ambiental e,consequentemente a
Educação Ambiental, uma vez que “a escola deve ser entendida comouma comunidade de
aprendizagem, em que devem ser predominantes as práticas educativas,com vistas à promoção do
desenvolvimento mental e da formação de personalidade dosalunos” (CAVALCANTI, 2011),
personalidade esta que há de se perpetuar e refletir nasociedade, como proposto por Guimarães ao
dizer que “educando e educador são agentessociais que atuam no processo de transformações
sociais”. (GUIMARÃES, 2012)

4. CONCLUSÃO
A resolução das problemáticas ambientais está para além da simples criação de uma UC em
determinado território. Percebe-se a necessidade do estabelecimento de parcerias com as
comunidades do entorno, e uma das formas para se alcançar essas parcerias é através da Educação
Ambiental in loco. Instituições de ensino como escolas e universidades destacam-se no que tange ao
estabelecimento dessas parcerias devido ao seu caráter de pesquisa, ensino e extensão, o que
propicia o findar dessas parcerias. Para além, nessas instituições encontram-se a maioria, se não
todas, as realidades sociais do território, configurando-se como potenciais espaços para o alcance
dessas comunidades através dos seus atores.
No caso da Rebio do Tinguá, observou-se que embora o quantitativo de visitantes voltados
para atividades de Educação Ambiental tenha gradualmente aumentado, ainda há considerável
lacuna nesta demanda, destacando-se a reduzida presença de Instituições de Ensino Superior,
estratégicas para atrair novos pesquisadores, assim como a ausência de escolas de outros municípios
que abrangem parte da Rebio e sua Zona de Amortecimento, indicando a relevância de uma
ampliação nos esforços para atrair novos visitantes escolares, favorecendo o conhecimento e o
respeito por este significativo remanescente de Mata Atlântica.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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GUERRA, A. J. T. Erosão dos Solos e Movimentos de Massa - Abordagens Geográficas.


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141
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

GUIMARÃES, G. P. A Educação Ambiental nas Escolas de Tinguá: Desafios E Potencialidades


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DeGeo, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Nova Iguaçu, 2017. CD-ROM.

GUIMARÃES, G. P.; de QUEIROZ, E. D. O Uso Da Reserva Biológica Do Tinguá Por Uma


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MMA - Ministério do Meio Ambiente. 2000. Avaliação e ações prioritárias para a conservação
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Brasil/Fundação SOS Mata Atlântica/Fundação Biodiversitas/Instituto de Pesquisas Ecológicas/
Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo SEMAD/Instituto Estadual de Florestas-MG,
Brasília, 45 p.

RESERVA BIOLÓGICA DO TINGUÁ. 2002. Guia do Educador. Livreto. IBAMA. REBIO do


Tinguá. 35 p.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O POTENCIAL EDUCADOR DE ÁREAS PROTEGIDAS TRILHADO NA


COMPOSIÇÃO ENTRE AULA DE CAMPO E VIVÊNCIA DE DANÇAS
CIRCULARES
THE POTENTIAL EDUCATOR OF PROTECTED AREAS WORKED IN THE COMPOSITION
BETWEEN FIELD CLASS AND THE EXPERIENCE OF CURCULAR DANCES

Edneida Rabêlo Cavalcanti*; Solange Fernandes Soares Coutinho*

Pesquisadoras Fundação Joaquim Nabuco, Brasil*

1. INTRODUÇÃO
A Comissão Mundial de Áreas Protegidas considera as mesmas como “um espaço
geográfico definido, reconhecido e destinado ao manejo, através de instrumento legal ou outro meio
efetivo, com o objetivo de promover a conservação da natureza em longo prazo, com seus
ecossistemas associados e valores culturais” (PELLIZZARO et al., 2015, p. 27). As Unidades de
Conservação (UCs) são uma categoria de Áreas Protegidas. O Brasil criou o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação (SNUC) no ano de 2000, através da Lei Federal Nº 9.985 de 18 de julho
que foi regulamentada pelo Decreto Nº 4.340 de 22 de agosto de 2002. Estados e municípios
brasileiros também podem criar os seus. Assim, Recife, capital do estado de Pernambuco,
estabeleceu o seu Sistema Municipal de Unidades Protegidas (SMUP) através da Lei Nº 18.014 de 9
de maio de 2014, no qual o Jardim Botânico do Recife (JBR) foi inserido como categoria única
junto com as Unidades de Conservação da Natureza (UCN), as Unidades de Conservação da
Paisagem (UCP) e Unidades de Equilíbrio Ambiental (UEA), esta última formada por Imóveis de
Proteção de Áreas Verdes (IPAV), Jardins Históricos, Área Verde de Convivência, Recreação,
Esporte e Lazer (AVCEL) e Árvores e Palmeiras Tombadas (RECIFE, 2014).
Um Jardim Botânico é uma a área protegida constituída, no seu todo ou em parte, por
coleções de plantas vivas cientificamente reconhecidas, organizadas, documentadas e identificadas,
com a finalidade de estudo, pesquisa e documentação do patrimônio florístico do país, acessível ao
público, no todo ou em parte, servindo à educação, à cultura, ao lazer e à conservação do meio
ambiente (BRASIL, 2000). Os Jardins Botânicos são espaços protegidos de grande importância para
a pesquisa científica, conservação da biodiversidade, educação ambiental e melhoria da qualidade
de vida da população local e de seus visitantes. São áreas verdes, geralmente urbanas, que também
contribuem com os aspectos ecológicos, paisagísticos e sociais em grandes cidades. O Jardim
Botânico do Recife (JBR), criado em 1979, é uma área verde importante na capital pernambucana

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

pois é um dos principais exemplos de fragmentos de Mata Atlântica remanescentes na planície


costeira do Recife. Em 2015 o JBR passou a figurar entre os cinco melhores do Brasil, após atender
exigências da Resolução N. 339 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), inclusive as
que dizem respeito a infraestrutura para recebimento de visitantes, corpo técnico qualificado e
programa de educação ambiental.
Uma das possibilidades de visitação em um Jardim Botânico pode ser com o planejamento
de aulas de campo, que são estratégias de ensino em que se substitui a sala de aula por outro espaço,
que pode ser natural ou não. E este espaço permite estudar as relações produzidas pelos seres vivos,
isto é, as relações sociais, econômicas, culturais e naturais (CHAVES; COUTINHO, 2017). A
atividade precisa ser trabalhada na perspectiva da atenção, da motivação para outros olhares, do
estímulo ao uso dos diversos sentidos e para transpor os muros da racionalidade. Pode ser um
convite a experiência, aquilo que “nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que se
passa, não o que acontece, ou o que toca. [...] Nunca se passaram tantas coisas, mas a experiência é
cada vez mais rara” (LARROSA, 2002, p. 21).
A experiência ocorre na inserção do corpo no espaço e no tempo, e na consciência projeta-se
em um mundo físico e vivido, permeado por cultura. Dessa forma, “o corpo é o modo próprio de
ser-no-mundo, tudo aquilo que sei do mundo, mesmo por ciência, eu sei a partir de uma visão
minha ou de uma experiência de mundo sem a qual os símbolos da ciência não poderiam dizer
nada” (MERLEAU-PONTY, 1999, p. 3). O corpo é então o lugar onde a experiência nos toca
(NEUENFELDT, MAZZARIANO, 2016), e é necessário ter essa compreensão no desenvolvimento
das aulas de campo, principalmente com temáticas ambientais e em Áreas Protegidas. As Danças
Circulares (WOSIEN, 2000) que, para além de sua antiguidade antropológica, é contemporânea do
movimento da contracultura e do surgimento de importantes movimentos sociais, e de inclusão da
dimensão ambiental nas discussões sobre desenvolvimento humano, pode ser um caminho para
abrir passagem para conteúdos negados historicamente, ativando outras funções da consciência,
além do pensamento, além da cognição, afinal “para encantar é preciso encantar-se” (OSTETTO,
2010, p. 41), o que requer ousadia, pausa, trabalhar com incertezas, sair do roteiro rígido, incentivar
percepções e sentidos.
O que caracteriza as Danças Circulares é o espírito comunitário que elas promovem. Podem
ser danças para celebração ou saudação, danças que expressam diversos sentimentos e que possuem
uma dinâmica simples: as pessoas são incentivadas a trabalhar o movimento do corpo através dos
passos, a praticarem no coletivo e na simbologia do círculo e depois aos poucos, ao dançarem
começam a liberar a mente, o coração, o corpo e o espírito. As Danças Circulares propiciam ligar o
que historicamente foi sendo separado pelas dualidades modernas. Mexe com esse lugar cristalizado

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

no qual a cultura e a ciência insistem em renegar a dimensão não racional, relacionada ao


sentimento, à sensibilidade, à imaginação (OSTETTO, 2010).
2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho de caráter qualitativo foi desenvolvido a partir da observação
participante e de textos narrativos de alunos do 6º período do Curso de Licenciatura em Geografia
de uma Universidade de Pernambuco, no âmbito da disciplina Fundamentos da Ecologia a partir de
uma aula de campo no JBR, em parceria com uma iniciativa coletiva de trabalho com Danças
Circulares cantadas, um projeto em atividade desde 2016 e que inclui JBR e parques da Cidade do
Recife.
A aula de campo contou com introdução feita por guia local e pela professora da disciplina,
seguida de experiência na trilha, com paradas para partilhar percepções e dialogar com os conteúdos
da disciplina, visitas às coleções ali presentes e a um Jardim Sensorial que objetiva a inclusão de
pessoas com algum tipo de necessidade visual e/ou auditiva e também visita ao Centro de Educação
Ambiental. O término da atividade se deu em área aberta, onde as Danças foram vivenciadas com a
participação de uma focalizadora, contando com um repertório previamente discutido, propiciando
outra forma de se aproximar de temas trabalhados durante os momentos anteriores.
Os textos narrativos foram trabalhados com base na ferramenta metodológica de Análise de
Conteúdo e dialogaram com referenciais teóricos e com as observações das pesquisadoras que
motivaram a vivência.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nos relatos colhidos dos estudantes ficaram evidenciados: o reconhecimento de que as
danças possibilitaram o contato mais próximo dos que estavam no círculo e permitiram desenvolver
a aproximação, o respeito e admiração por várias culturas; interação do grupo e uma reflexão sobre
a natureza e com o viver e o conviver; encantamento e paz; a aprendizagem de que o conhecimento
e a experiência de sentir envolve todo o ser, e os sentidos têm potências próprias e possibilitam
captar diferentes sensações. Muitos remeteram a um momento de conexão com o meio,
agradecimento por tudo que este pode proporcionar, relaxamento e purificação da alma através dos
cantos, movimentos e da finalização da construção de um novo olhar sobre coisas que geralmente
não se percebe no cotidiano. A referência a participação em uma dinâmica cultural partindo de
danças, músicas de diferentes tradições, estimulando os sentidos e conexão com o ambiente, na
tranquilidade que a natureza proporciona trouxe muitos e diferentes aprendizados.
O dançar no círculo possibilitou experimentar outras linguagens, na trilha da educação pela
sensibilidade e pela atenção. Junto com os outros sons presentes no Jardim Botânico, criou-se
acolhimento para o lúdico, a poesia em movimento, para novos passos que geram mobilidade do
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

corpo, mas também do pensamento. Multiplicidade, diversidade e beleza fazendo parte do processo
de ensino-aprendizagem. Nessa vivência, o corpo é percebido e trabalhado como o lugar onde a
transcendência do sujeito articula-se com o mundo (GONÇALVES, 2001). Ele é acolhido e por isso
há espaço para receber a experiência (GRÜN, 2008). Nesse sentido, o fechamento da roda remete a
relação do corpo com o mundo vivido e como lugar onde a Educação Ambiental pode alojar-se,
desenvolver-se e frutificar, ressignificando a relação do ser humano com ele mesmo, com o outro e
com o ambiente.

4. CONCLUSÃO
O trabalho com o corpo que as Danças Circulares proporcionam trazem para o repertório dos
conteúdos acadêmicos outra linguagem válida, que conecta o eu, o outro e o ambiente e estimula a
inteligência corporal cinestésica, onde movimentos físicos, percepção espacial e aprendizado pela
ação provocam a saída do lugar comum e a quebra paradigmas. A aula de campo pensada em
movimento, onde o caminhar na trilha, expandir percepções, experimentar sensações táteis, cheiros,
cores, conjugada com o canto e coreografia das Danças, gera deslocamentos, estranhezas que
contribuem para criar espaços para reelaborações.
A vivência também propiciou uma maior aproximação dos componentes do grupo que
tiveram a oportunidade de cantar juntos, dar-se as mãos, olhar nos olhos, agradecer de forma
coletiva e individual o momento e conectarem o que foi estudado com a presença ali, aguçando o
sentido de pertencimento ao lugar – um lugar educador –, o que só contribui para o preparo de terra
fértil para o conhecimento, novos conhecimentos.

5. REFERÊNCIAS
CHAVES, Clara Maria Mendes; COUTINHO, Solange Fernandes Soares. Aula de campo em
ensino da geografia. Os professores em formação estão sendo preparados para esta prática?
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OSTETTO. L. E. Para encantar é preciso encantar-se: danças circulares na formação de professores.


Caderno. Cedes, Campinas, v.30, n.80, p. 40-55, jan. /abr. 2010. Disponível em:
<http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 4 fev. 2017.

RECIFE. Lei Nº 18.014 de 9 de maio que institui o Sistema Municipal de Unidades Protegidas
(SMUP). Recife: DOM, 2014.

WOSIEN, B. Dança: um caminho para a totalidade. São Paulo: Triom, 2000.

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EDUCOMUNICAÇÃO – DESAFIO PARA GESTÃO PARTICIPATIVA NA


RESERVA EXTRATIVISTA ACAÚ-GOIANA(RESEX ACAÚ-GOIANA)
EDUCOMUNICATION - CHALLENGE FOR PARTICIPATIVE MANAGEMENT AT
EXTRACTIVE RESERVE ACAÚ-GOIANA (RESEX ACAÚ-GOIANA)

Larissa Fernandes Ferreira*; EdneidaRabêlo Cavalcanti**.

Graduanda de Jornalismo, Universidade Católica de Pernambuco, Brasil*.


Pesquisadora daCoordenação Geral do Centro de Estudos de Cultura, Identidade e Memória, Fundação Joaquim
Nabuco, Brasil**.

1. INTRODUÇÃO
A gestão participativa em Unidades de Conservação (UC), categoria de Área Protegida
consolidada no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc),representa umainovação
significativa e ao mesmo tempo um grande desafio para proteção da biodiversidade. Existem vazios
pedagógicos, culturais e políticos construídos historicamente na relação entre poder público e
sociedade quando o assunto é proteção de áreas, principalmente através da criação de UCs. A
criação de Conselhos Gestores responde a um conjunto de leis e políticas que foram sendo
instituídas no Brasil a partir do processo de redemocratização no final dos anos 1970 e início dos
anos 1980, contribuindo para o aprofundamento da relação Estado e Sociedade e permitindo que os
cidadãos e cidadãs se integrem à gestão administrativa e participem da formulação, planejamento e
controle das políticas públicas.Mas apenas a criação do Conselho Gestor não diz muito se não
houver esforços de inclusão, de percepção do contexto socioecológico e político no qual cada uma
das UCs está inserida, e definição de caminhos e pontes que permitam interação com essas
realidades, com as forças econômicas, sociais, políticas atuantes, sem perder de vista os
pressupostos de justiça ambiental.
A implementação da Estratégia Nacional de Comunicação e Educação Ambiental em
Unidades de Conservação (Encea), representa parte relevante de esforços, por meio da Educação
Ambiental (EA) e da comunicação social como estratégias de aprimoramento da gestão e de
fortalecimento da política.Trata-se de “(...) instrumentos indispensáveis para incentivar a
mobilização da população e garantir a participação das comunidades residentes e do entorno nos
processos de criação, implementação e gestão desses espaços” (BRASIL, s/d). Podem, dependendo
de como sejam trabalhadas no âmbito da UC, tornar essas áreas mais percebidas no território,
aclarando a complexidade das relações sociopolíticas existentes, somando forças favoráveis à
conservação. Para Soares (2011, p. 25-27), a Educomunicação inaugura um “novo campo, por sua
natureza relacional, estrutura-se de modo processual, midiático, transdisciplinar e interdiscursivo,
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sendo vivenciado na prática dos atores sociais, através de áreas concretas de intervenção social”.A
gestão de uma UC e de seu entorno depende da compreensão sobre meio ambiente que os sujeitos
envolvidos possuem, e a elaboração de um conhecimento comum – ou seja, de um diálogo – é parte
dos objetivos do processo de Educação Ambiental na gestão da UC (LOUREIRO;AZAZIEL;
FRANÇA,2006).
O presente trabalho1 teve como objeto de estudo a Reserva Extrativista Acaú-Goiana
(ResexAcaú-Goiana)localizada em áreas dos municípios de Goiana/PE, Pitimbú/PB e Caaporã/PB.
E o objetivo foi o de identificar e avaliar as estratégias de comunicação trabalhadas na Resex, assim
como perceber como professores e gestoreslidam com a articulação entre educação e comunicação
na relação com a UC.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Foi efetuada revisão de literatura sobre o tema da Educomunicação priorizando a relação
com Educação Ambiental e UCs. Também foi observado se existem meios de comunicação locais
que atuem nos municípios, que discutam ou possuam potencialidade para discutirem questões
ambientais.Foi aplicado questionário semiestruturado com participantes da Oficina de
Educomunicação, professores e gestores educacionais, gestores ambientais e comunidade
beneficiária (pescadores e pescadoras artesanais e marisqueiras). Ao todo foram 59 questionários. A
apuração dos mesmos se deu com análise quantitativa para as questões fechadas e para as perguntas
abertas se fez uso do procedimento de Análise de Conteúdo. Além disso, também foi possível
realizar observação direta nas reuniões do Conselho Gestor da Resexno período de agosto de 2017 a
junho de 2018.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A ResexAcaú Goiana é uma UC criada em 2 de setembro de 2007, localizada nos municípios
de Pitimbu e Caaporã, no estado da Paraíba, e Goiana, em Pernambuco. A área da Resex é
primordialmente utilizada por pescadores e pescadoras artesanais, como forma de garantir os seus
meios de vida. Na plataforma digital do ICMBio, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente e
integrado ao Sistema Nacional do Meio Ambiente, é notório, quando focado na Resex, a carência
ou inexistência de informações. Aparecem dados gerais e estanques sobre as UC, decreto de
criação, fone e e-mail para contato e praticamente nada mais.

1
Subprojeto “A Educomunicação como ferramenta de Educação Ambiental em Unidades de Conservação”,
desenvolvido com bolsa Pibic-Fundaj-CNPq no âmbito do projeto Unidades de Conservação como Lugares
Educadores.
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Mesmo possuindo Conselho Gestor, de caráter deliberativo, e com isso maior dinâmica na
gestão, isso não repercute em interfaces comunicativas para a sociedade. As atas das reuniões e
resoluções deveriam estar disponibilizadas, assim como atividades que ocorrem por parte da própria
equipe gestora. Iniciativas ligadas a ações de comunicação e educação são inexistentes nesse tipo de
mídia e em outros formatos digitais também. Numa perspectiva de fortalecimento de iniciativas de
construção de conhecimentos, também é precária a socialização mais ampla dos diversos estudos e
pesquisas desenvolvidas na área. Destaca-se também a falta de recursos financeiros e humanos para
empreender essas iniciativas comunicativas e educativas. Um projeto nesta área exige tempo
empregado e incentivos financeiros para funcionar.
Nos questionários aplicados a professores e gestores da ResexAcaú-Goiana 62,12%
afirmaram que a escola ou comunidade possui algum instrumento de Comunicação Coletiva,
31,82% responderam que não possuem e 3,03% não souberam informar. Os instrumentos vão desde
Internet, Facebook e Whatsapp até rádio comunitária e quadro de aviso.É possível observar que
alguns dos itens citados não se encaixam exatamente no conceito de instrumento de comunicação,
como a exemplo de ‘conselho gestor’, ‘reunião na colônia’, ‘secretaria da educação’, ‘caminhada’,
o que demonstra que o próprio entendimento da representação sobre os meios comunicativos
também requer ser trabalhado.Dos que podem ser relacionados diretamente a instrumento de
comunicação, os que aparecem com mais frequência nas respostas são: Internet, Facebook,
WhatsApp e mural de avisos.
Ainda dos que responderam sim a primeira pergunta, 39,39% disseram que utilizam
instrumentos de Comunicação Coletiva para desenvolver atividades educativas e que isso é feito por
meio de reuniões, divulgações de eventos e projetos, atividades interativas como produção de
curtas, publicações de fotos de eventos como aulas, reuniões e festivais, trabalhos, pesquisas, etc.,
que são realizados na colônia e nas escolas com o intuito de contribuir para uma boa prática
educacional, integrando os diversos segmentos da comunidade escolar e pela necessidade de expor
as atividades desenvolvidas e disseminar o conhecimento produzido.
Dos que são professores, 75% disseram que abordam questões ambientais nas disciplinas de
artes, ciências, química, geografia, matemática, religião, educação ambiental, história, português,
filosofia e sociologia. Dos que disseram que sim, quando perguntados sobre quais questões
ambientais, citaram: reutilização da água da chuva, assoreamento dos rios, sustentabilidade,
desmatamento, reciclagem, preservação, etc. Fica visível a ausência de correlação entre esses temas
e a existência de uma UC e sua comunidade beneficiária.Dos que disseram que não, justificam a
resposta com: falta de conhecimento, planejamento e incentivo da comunidade escolar, a
priorização de outras atividades, etc. Sugerem que para mudar essa situação seria necessário:
parcerias com rádios, criação de um jornal educativo, produção de eventos que envolvam as
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comunidades, aplicação de projetos de conscientização, acesso a instrumentos de divulgações e


visitas às comunidades com a inserção de palestras.
Quando perguntados se recebem notícias sobre questões ambientais por algum meio de
comunicação, 50% disseram que sim e 15,15% responderam que não. Dos que responderam sim,
apontam como os mais frequentes: televisão, jornais e revistas, sites, redes sociais, etc.Esses meios
de comunicação se fazem necessários nas atividades educativas, pois contribuem para a prática
educacional, tornando as aulas e outras dinâmicas escolares mais interessantes, desenvolve e
dissemina o conhecimento adquirido e informa a população, de uma maneira geral. A falta de
incentivo e investimento nas comunidades escolares, por conta da priorização de outros setores e
atividades, é algo questionado na região por parte da população e dos próprios gestores.

4. CONCLUSÃO
A inexistência de ações sistemáticas de comunicação e Educação Ambiental
naResexcontribui para fragmentação e enfraquecimento da capacidade de gestão das mesmas.
Equipes reduzidas e com carência de pessoal compatível e formação adequada para tocar as ações
de educação e comunicação, além de inexistência de recursos para as ações de caráter mais
permanente, são aspectos que também merecem destaque e que precisam ser revistos.
A participação efetiva da sociedade quando não há ações mediativas (educação e
comunicação) para tal fica comprometida, enfraquecendo instância de gestão compartilhada e o
próprio comprometimento dos órgãos e organizações que compõem espaços colegiados como o do
Conselho Gestor. Isso tanto é uma verdade nas ações de gestão para fora como as que deveriam ser
instituídas para dentro, a exemplo do processo de mobilização, acesso à informação que antecedem
e que sucedem as reuniões do Conselho, assim como a própria dinâmica de funcionamento das
reuniões.
As escolas sempre foram grandes parceiras e potenciais agentes de disseminação para uma
educação voltada à sustentabilidade e têm se tornado laboratórios vivos para a prática de ações
voltadas à conservação e exercício de cidadania, no entanto, inexistem ações permanentes de EA
por parte da gestão da UC. Contudo, precisa existir um processo de capacitação continuada e de
mecanismos de parcerias entre a gestão da UC e as escolas, para que a Educomunicação aconteça e
cumpra um papel transformador. Um caminho a ser buscando é o que busca a implementação da
Encea, com todo desafio que o contexto atual aponta no tocante ao desmonte das políticas ligadas a
áreas Protegidas.

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5.AGRADECIMENTOS
Agradeço à agência financiadora do projeto, CNPq/PIBIC, por me proporcionarem esta
oportunidade. Agradeço à Fundaje a equipe do projeto Unidades de Conservação como Lugares
Educadores.

6.REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Diretrizes para Estratégia Nacional de Comunicação e
Educação ambiental em Unidades de Conservação (Encea). Brasília: MMA, s/d.

GUTIÉRREZ, Francisco. Internet, comunicação e sociedade. Problemas, desafios e perspectivas. In


MELO, José Marques de et al (orgs). Educomídia. Alavanca da cidadania: o legado utópico de
Mário Kaplún. São Paulo. Cátedra UNESCO, Universidade Metodista de São Paulo, 2006.

PERUZZO, Cicilia Maria K. Comunicação Comunitária e Educação para a Cidadania São


Leopoldo: Editora da Unisinos, 2002.

LOUREIRO, C.F.B.; AZAZIEL, M.; FRANÇA, N. Educação ambiental em unidades de


conservação. Rio de Janeiro: IBASE, Instituto Terrazul, Parque Nacional da Tijuca, 2006.

SOARES, Ismar de Oliveira. Educomunicação: um campo de mediações. In: CITELLI, Adilson;


COSTA, Maria C. Castilho. Educomunicação, construindo uma nova área de
conhecimento. São Paulo: Paulinas, 2011, p. 13-29.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PROGRAMA DE VOLUNTARIADO DO ICMBIO COMO ESTRATÉGIA


PARA CONSERVAÇÃO DOS QUELÔNIOS DA AMAZÔNIA NO PARQUE
NACIONAL DO JAÚ/AM
ICMBIO VOLUNTEER PROGRAM AS A STRATEGY FOR THE CONSERVATION OF
AMAZONIAN CHELONIANS IN JAÚ NATIONAL PARK/AM

Geovanna Carvalho Mariosi da Silva*

Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil. *

1. INTRODUÇÃO
Atividades desenvolvidas por voluntários dentro de áreas protegidas podem ser realizadas
pelo Programa de Voluntariado do ICMBio, instituído pelo Instrução Normativa nº 03/2016
(BRASIL, 2016), que prevê a participação da população na gestão de Unidades de Conservação
(UCs), ao promover o engajamento da sociedade por meio das ações voluntárias e do
reconhecimento público dessas ações. Considerando-se que a extensão das UCs no Brasil é tão
grande quanto suas demandas, os voluntários assumem papel de agentes multiplicadores de
Conservação da Biodiversidade ao atuar de acordo com as demandas de cada UC, visto a realidade
e os desafios de cada área protegida.
No Parque Nacional do Jaú (PARNA Jaú), são mais de dois milhões de ha administrados
por quatro gestores; diante disso, o Programa de Voluntariado se mostra uma estratégia benéfica
para ampliar as ações no parque. O PARNA Jaú integra o Mosaico de Unidades de Conservação do
Baixo Rio Negro, composto por um conjunto de 13 UCs, que somam mais de sete milhões de ha na
Amazônia Central. Por sua grande extensão, um dos desafios é o monitoramento do Mosaico do
Baixo Rio Negro (MBRN), que se faz importante, pelo fato da bacia do Rio Negro ser considerada
um hotspot para conservação de quelônios, sendo área de desova e alimentação desses animais
(FERRARA; MORCATTY; FAGUNDES, 2017).
De acordo com Giovanelli et al. (In Press), uma das estratégias de observação de mudanças
na biodiversidade que contribui para o manejo dos recursos naturais é o projeto de monitoramento
em unidades de conservação, ao utilizar a participação social como veículo que promove a permuta
entre o conhecimento científico e o tradicional, ambos contribuindo para a conservação da
biodiversidade, como modo de auxiliar na garantia da sobrevivência de espécies ameaçadas pela
caça e tráfico de animais selvagens.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A utilização dos quelônios na alimentação é uma prática antiga no Brasil, especialmente na


região norte, apreciados tanto pela população local quanto pelos turistas. Nos rios da região
amazônica há caça ilegal desses animais, para que sejam comercializados, por serem consideradas
iguarias culinárias (RENCTAS, 2001).
Na área do Baixo Rio Negro, no Amazonas, acontece o manejo dos quelônios da amazônia,
em razão do tráfico de seus ovos e dos animais, pelo Programa de Monitoramento de Quelônios do
Mosaico do Baixo Rio Negro (PQMBRN). As atividades são desenvolvidas pelos órgão gestores e
parceiros, junto com comunitários e voluntários, havendo para ambos uma formação, com o fim de
diminuir ao máximo os impactos nos indivíduos manejados, e utiliza-se o protocolo de
monitoramento participativo de quelônios aquáticos em Unidades de Conservação da Amazônia,
descrito formalmente por Giovanelli et al. (In Press).
Durante as atividades desenvolvidas no Programa de Voluntariado do ICMBio, o maior
enfoque foi o apoio ao PQMBRN, do estágio de eclosão até a soltura dos quelônios, no MBRN.
Essas atividades são relevantes por inserir a sociedade em ações diretas de conservação e manejo
dos quelônios.
Partindo dessa premissa, o presente trabalho tem como objetivo relatar a experiência de
imersão no programa de voluntariado do ICMBio, com foco nas atividades de manejo dos quelônios
e práticas de Educação Ambiental em áreas protegidas, contribuindo assim para a Conservação da
Biodiversidade, com enfoque no PQMBRN.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A presente experiência se desenvolveu em janeiro de 2018, pelo Programa do Voluntariado
do ICMBio do PARNA Jaú. As atividades aconteceram no escritório sede do ICMBio (Novo
Airão), na Base Avançada (Rio Jaú) e comunidade Tapiira, localizada no PARNA JAÚ. Na Sede, o
trabalho se destinou à gestão das UCs Parque Nacional de Anavilhanas, RESEX Rio Unini e
PARNA Jaú, que possuem gestão integrada. As atividades desenvolvidas ao longo do ano variam de
acordo com a demanda de cada estação e estão inseridas nas linhas temáticas: Planejamento,
Administração e Logística; Pesquisa e Monitoramento; Uso Público e Negócios; Gestão
Participativa; Proteção.
O mês de janeiro corresponde ao inverno amazônico e a principal demanda do PARNA Jaú
nessa época é o monitoramento dos quelônios. De acordo com Ferrara, Morcatty e Fagundes
(2017), o monitoramento de sítios da desova devem seguir as etapas de seleção dos sítios de
nidificação; acompanhamento diário dos locais de desova e vigilância; coleta de dados e marcação
dos ninhos; transferência de ninhos; marcação dos filhotes e soltura, sendo que o programa do
voluntariado do presente estudo desenvolveu atividades somente na última etapa, com ações de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

manejo de três espécie de quelônios: tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa), tracajá


(Podocnemis unifilis) e iaçá (Podocnemis sextuberculata), ao acompanhar a eclosão dos filhotes
desovados entre outubro e dezembro de 2017, e auxiliar na organização do registros dos
nascimentos dos quelônios da Base Avançada, e soltura na comunidade Tapiira.
Como previsto no Plano de Monitoramento do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio
Negro (Giovanelli et al. In Press), foram desenvolvidas atividades de Educação Ambiental durante
a soltura, relacionadas à percepção do espaço e natureza, com a participação de crianças e jovens da
comunidade, onde buscou-se elementos que envolvessem a arte com a natureza nas redondezas de
suas casas. Após isso, foi realizada a produção de um grande cartaz para o momento da soltura, no
qual todos tiveram liberdade criativa para expressar pela arte todo o processo de cuidado dos
quelônios, no qual participaram ativamente.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Giovanelli et al. (In Press) afirma que a obtenção de informações de biodiversidade na
Amazônia é um desafio, principalmente por sua dimensão, portanto, os autores afirmam que a
presença das populações tradicionais e conhecimento que detém são fortes aliados para fortalecer a
geração de informação sobre essa biodiversidade. O PQMBRN, além da participação de
voluntários, tem como protagonistas os comunitários das UCs do MBRN, que são Monitores da
Biodiversidade e fomentam parte da pesquisa por meio do Monitoramento Participativo dos
Quelônios da Amazônia, contribuindo assim com o enriquecimento do conhecimento científico.
Nas atividades junto às comunidades, pode-se perceber que tanto adultos, quanto jovens e
crianças participam, desde o monitoramento das áreas de desova até a soltura. Nesse contexto, o
voluntário auxilia nas atividades de campo e na sistematização de dados, tendo acompanhamento
dos Monitores da Biodiversidade no processo de aprendizagem sobre ecologia e comportamento
dos quelônios, como identificação de ovos das espécies, profundidade dos ninhos de cada espécie,
riscos e cuidados na transferência dos ninhos, tempo de eclosão de cada espécie. À medida em que
o trabalho se desenvolve, os voluntários aumentam seu pertencimento com a UC e as atividades ali
desenvolvidas, passando assim a valorizar os povos brasileiros e suas atividades tradicionais por
partilhar diretamente dessa história.
Pelo fato do PQMBRN ser construído com base no conhecimento dos moradores das UCs e
na pesquisa científica, o diálogo de saberes e o reconhecimento dos comunitários torna-se essencial
para a efetividade do projeto e na formação dos voluntários, no processo formativo como estudantes
e cidadãos, além de ser fundamental para a conservação dos quelônios.

4. CONCLUSÃO
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O programa do Voluntariado do ICMBio proporciona contato direto dos voluntários com a


comunidade local, por meio das atividades do manejo dos quelônios e atividades de educação
ambiental. Em razão dessas atividades acontecerem nas próprias UCs, observa-se como o
intercâmbio do conhecimento dos nativos sobre a dinâmica de vida dos quelônios com a pesquisa
científica é benéfico à conservação dos quelônios, e isso é possível pela inserção dos comunitários
dentro do espaço natural, o que corrobora com a importância de sua permanência dentro de áreas
protegidas.
Com a atual crise socioambiental e o colapso ambiental global, é comum ver o ser humano
inserido na natureza como agente que destrói os recursos naturais; contudo, a partir de experiências
como o voluntariado relatado, entende-se que muitas das pessoas que residem em áreas protegidas
se dedicam em prol da conservação da biodiversidade, atuando como monitores, ao auxiliar e serem
protagonistas em projetos como o PQMBRN, e também por meio da participação em atividades de
educação ambiental, como a soltura dos quelônios, momento em que toda a comunidade se une em
função do cuidado com a vida desses animais, que desempenham papel tão importante nas relações
ecológicas.
O programa do voluntariado proporcionou o entendimento de que os saberes dos nativos são
essenciais para a manutenção da vida dentro de áreas protegidas, ainda mais em um contexto onde
legislações não são respeitadas, e há atividades ilegais como tráfico de animais silvestres. A
permanência dos povos da floresta em seu lugar de origem proporciona proteção a esse espaço, pelo
respeito que tem para com a natureza, e por partilharem seus saberes.

5. AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio),
proporcionar que as atividades do voluntariado sejam possíveis; ao Programa de Áreas Protegidas
da Amazônia (ARPA), Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) e Fundação Vitória Amazônica
(FVA), que também fazem com que esse projeto seja possível. Agradeço, principalmente, aos
ribeirinhos, que transmitem seu conhecimento sobre os bichos de casco, e às crianças, que
proporcionam que grande parte desse projeto tenha continuidade, pelo amor à natureza e desejo de
conservar.

6. REFERÊNCIAS
BRASIL. Instrução Normativa nº 3, de 10 de maio de 2016, sobre o Programa de
Voluntariado no âmbito do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Brasil,
15 maio 2015. Disponível em:
<http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/portarias/ICMBio_DCOM_IN_03_2016_voluntari
ado.pdf>. Acessado em setembro/2019. 2016.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FERRARA CR, MORCATTY T, FAGUNDES, CK. 2017. Plano de Monitoramento de Quelônios


de Água Doce do Mosaico do Baixo Rio Negro, Amazonas, Brasil. In: DIDIER K, ESTUPIÑÁN G
(editores). Plano de Monitoramento do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro
(MBRN), Amazonas, Brasil. Wildlife Conservation Society (WCS Brasil) e o Conselho do MBRN,
Manaus, Amazonas, Brasil.

GIOVANELLI JGR, SILVA FL, ACOSTA R.K, DE LEMOS PF, BERNARDES VCD, FERRARA
CR, FAGUNDES CF, JUNIOR MAS, ANDRADE PCM, BALESTRA RA. In Press. Protocolo de
monitoramento participativo de quelônios aquáticos em Unidades de Conservação da
Amazônia. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasília, Brasil.

RENCTAS, 2001. 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre. 108p.

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ANÁLISE DO USO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA CIDADE DO


RECIFE COMO ESPAÇO DE EDUCAÇÃO NÃO FORMAL
ANALYSIS OF THE USE OF RECIFE CITY CONSERVATION UNITS AS A FORM OF NON-
FORMAL EDUCATION

Natercia Corrêa de Araújo*, Paula Braga Gomes **

Departamento de Ciências Biológicas, Universidade Federal Rural de Pernambuco , Brasil *


Departamento de Ciências Biológicas, Universidade Federal Rural de Pernambuco , Brasil **

1. INTRODUÇÃO
A cada dia o professor enfrenta inúmeros desafios e em vários âmbitos profissão, Luckesi
(2009) relata alguns desses desafios vivenciados no cotidiano do professor, como: “[...] a
sobrevivência, os baixos salários, a violência urbana e rural, condições escolares inadequadas para o
ensino, currículos formais e excessivos, pressão do vestibular [...]”. Além desses desafios diários, há
outros de maior grandeza e complexidade, como o caso do “[...] fracasso escolar em larga escala, a
sociedade, os meios de comunicação, a globalização, os fenômenos das pós-modernidades”
(LUCKESI, 2009, p. 48).
Neste contexto, nem o educador nem o educando são “seres dados prontos”. Todos estando
em construção. Todos os dias, educador, está se constituindo como educador, como educando está
se constituindo como educando. São seres em processo (LUCKESI, 2009). De tal modo, os
professores de Ciências têm em suas mãos um leque de opções para atrair os alunos a interagir nas
aulas. Aulas práticas, jogos, experimentos, vídeos, modelos, espaços externos, muitas são as
possibilidades. Então é preciso sair do espaço escolar, tornar palpável o que é descrito nos livros
didáticos, sair do espaço formal da sala de aula, laboratório, escola, para descobrir os espaços não
formais disponíveis na cidade como áreas de propagação da educação, mostrando que o ensino-
aprendizagem pode-se dar em diversos locais e de formas variadas.
A educação enquanto forma de ensino-aprendizagem, é adquirida ao longo da vida dos
cidadãos e, segundo Vieira (2005), pode ser de três diferentes formas: educação formal, informal e
não formal. Dando destaque a educação não formal, Coombs (1975, p. 27) fala que a “educação não
formal é toda atividade organizada, sistemática, educativa realizada fora do marco da escola e do
sistema oficial, para facilitar determinados tipos de aprendizagem a subgrupos específicos da
população infantil ou adulto” (apud TRILLA, 2008, p.33). Então, a educação não formal é a
educação quando se dá fora do ambiente escolar, mas sendo complemento a ele, possibilitando ao

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

educador desenvolver atividades com objetivos bastante específicos, mas enfatizando as


experiências do dia-a-dia aproximando o conhecimento empírico do científico.
Deste modo, para o ensino de Ciências as áreas de Unidades de Conservação, podem ser
classificados como locais de aprendizagem e sensibilização, podendo contribuir na formação do
educando como espaço de aprendizado de diversos conteúdos do currículo formal ou como
incentivo à preservação e conservação do meio ambiente com a educação ambiental (LDB, 1996).
Na região de Recife há 25 Unidades de Conservação da Natureza (UCNs), instituídas pela
Lei Nº 18.014/2014, que institui o Sistema Municipal de Unidades Protegidas (SMUP). Então,
pensando no mundo como uma grande sala de aula, a proposta é analisar as possibilidades de uso
das UCs da cidade do Recife como espaços de educação não formal e montar planos de aulas
direcionados às UCs , onde os professores de Ciências, das redes públicas e privadas do Ensino
Fundamental Anos Finais de Recife, explorem as áreas tendo a intenção o estudo sobre a
preservação e conservação, assim como trabalhar os conteúdos formais de sala de aula de forma
concreta e lúdica.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa apresentou-se de caráter qualitativa, tendo o ambiente natural como fonte direta
de produção de dados e o pesquisador como instrumento fundamental, e sendo de natureza
descritiva (GODOY, 1995, apud SILVA, 2011). As informações coletadas e dados produzidos
foram a partir de processos metodológicos diversos.
Levantamentos bibliográficos, através de artigos e livros, permitindo a compreensão dos
conceitos que seriam abordados, nas temáticas de educação, espaços não formais e unidades de
conservação. Nas pesquisas documentais, foram consultados decretos de criação das unidades de
conservação, plano de ação da formação dos planos de manejo, Constituição Federal, Lei de Uso e
Ocupação do Solo, SMUC, BNCC e LDB.
Observação in loco, que foi realizada com visitas as áreas e o entorno das UCs, com
entrevista e conversas com visitantes e moradores das comunidades.Com dados que foram
organizados e analisados a partir dos registros e fotografias feitas das áreas, observando a
possibilidade de acesso ao local, segurança, infraestrutura e a disponibilidade de apoio didático.
Assim das 25 UCs, 18 foram visitadas e sete não, pois não dispunham de acesso ou segurança
adequados.
Os dados foram organizados e transcritos para uma planilha que serviu de alicerce para a
elaboração do ranking e escolha das UCs com maior potencial para uso, priorizando acesso,
segurança, infraestrutura e a apoio didático. Apresentaram-se 6 UCs com potencial de exploração,
que foram sugeridas planos de aula-campo, embasados na BNCC, possibilitando professores de
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Ciências do Ensino Fundamental a utilização dos espaços das UCs do Recife para desenvolver
atividades que complementem as propostas nos espaços de educação não formal.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Tendo como objetivo central a analise das possibilidades de utilização das áreas municipais
de Unidades de Conservação da cidade do Recife como espaço de educação não formal e conforme
os processos relatados no tópico Metodologia, partindo da análise documental, observou-se que das
25 UCs da cidade do Recife, apenas sete são categorizadas como Unidades de Uso Sustentável,
permitindo atividades didáticas em suas áreas, as demais ainda não estão enquadradas em nenhuma
categoria, não dispõem de plano gestor ou plano de manejo, que no momento estão em processo de
elaboração pela SDSMA, com perspectiva de finalização para 2019-2020.
A maior parte das unidades é de dimensões pequenas, com média de 280,74ha, sendo a
menor a UC Joana Bezerra com 3,51ha e a maior UC Beberibe com 3.674,20ha, e há ainda cinco
sobreposições com UCs estaduais (APA Aldeia-Beberibe, Parque Dois Irmãos, FURB Dois Unidos,
RVS Matas do Curado, RVS Mata São João da Várzea e RVS Engenho Uchôa), tornando mais
complicada a estruturação dos planos de manejo.
Durante a pesquisa de campo constatou-se que as UCs da cidade do Recife estão localizadas
dentro da região metropolitana, o que as faz sofrer com a especulação imobiliária. Assim como a
falta de fiscalização e de programas socioeducativos em algumas dessas áreas, faz com que se
encontrem num acelerado processo de crescimento da perturbação antrópica, aumentando a
degradação do meio ambiente e fragmentando os ecossistemas.
A dificuldade de acesso e a inexistência de segurança pública ou privada impossibilitou a
visitação em sete áreas, (UCN São Miguel, UCN Joana Bezerra, UCN Caxangá, UCN Sítio Grande,
UCN Beberibe, UCN Mata das Nascentes, ARIE Ilha do Zeca), que tiveram suas análises baseadas
em registros documentais.
Das 18 UCs que foram visitadas, em apenas três foi possível realizar entrevista com
responsáveis, em duas o contato não foi autorizado, e em 13 foi possível uma conversa informal
com os moradores e visitantes das áreas, já que essas não há um gestor, conselho gestor ou fiscal.
Com as informações e dados coletados foi estruturada a tabela com as atividades desenvolvidas nas
áreas, sendo elas direcionadas a educação ou apenas recreativas.
Deste modo, com base no acesso, segurança, infraestrutura e apoio didático, as Unidades de
Conservação de Dois Irmãos (abriga o Parque Estadual de Dois Irmãos), Matas do Curado (abriga
RVS São João da Várzea e parte da RVS Mata do Curado), Curado (abriga o Jardim Botânico do
Recife e parte do RVS Mata do Curado), Mata do Barro, APA Mata da Várzea e Lagoa do Araçá,
no ranking estabelecido, obtiveram as maiores pontuações, respectivamente. No entanto a UC Mata
do Barro foi substituída pela UC Orla Marítima, pois dentro da sua área localiza-se o 4º Batalhão de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Comunicação do Exército Brasileiro, que apesar de cumprir com os critérios estabelecidos, tem o
acesso restrito a militares e atividades propostas pela instituição (Profesp), proibindo atividades
ministradas por civis.
Com as seis Unidades de Conservação estabelecidas para a aplicação de planos de aula-
campo da disciplina de Ciências do Ensino fundamental Anos Finais, a UC de Dois Irmãos que
abriga o Parque Estadual de Dois Irmãos e UC do Curado que abriga o Jardim Botânico do Recife
foram excluídas, pois dispõem de projetos desenvolvidos no espaço, com apoio didático e
oferecendo atividades dentro de uma perspectiva educacional para as escolas, tal como a
possibilidade de adaptação a objetivos específicos solicitados pelas escolas visitantes dos espaços.
Deste modo os planos de aula-campo foram direcionados para a UC Matas do Curado, APA
Mata da Várzea, UC Orla Marítima e UC Lagoa do Araçá, voltados aos conteúdos de Ecologia e
Zoologia dos 6º e 7º anos do Ensino Fundamental, fundamentados nas habilidades promovida pela
BNCC Ensino Fundamental, fornecendo subsídios para mediar as aulas nos espaços das UCs e para
a produção de um produto final.

4. CONCLUSÃO
Espera-se que com esse trabalho as UCs, que apresentam uma evidente importância de
fornecimento de benefícios para a população, principalmente as que vivem no seu entorno, e
levando em consideração que as mesmas não foram criadas especificamente com finalidades
pedagógicas, possam ampliar as possibilidades de interação entre a educação, o educando e o meio
ambiente a partir do conhecimento. Conhecimento esse que permeia entre a educação formal, a não
formal e a informal, vislumbrando formar cidadãos conscientes da sua função na sociedade e
comprometidos com o bem maior. Assim como sendo responsável para pleitear junto ao poder
público um olhar diferenciado, pensado na necessidade de gestão desses espaços.
Desse modo, espera-se que as sugestões de atividades contribuam para o aumento da relação
entre as Unidades de conservação da cidade do Recife e os alunos do Ensino Fundamental,
fortalecendo como espaço não formal e gerando um maior alcance das possibilidades de
aprendizagem difundida pelo local contribuindo para a divulgação científica e humanística.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. LDB – Leis de Diretrizes e Bases.Lei nº 9.394/1996. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein Acesso em: 18 fev. 2019.

LUCKESI, C. C. O Educador: Qual o seu papel na contemporaneidade? In: D’ÁVILA, C. Ser


professor na contemporaneidade: Desafio, ludicidade e protagonismo. 1. Ed. Curitiba: Editora
CRV, 2009, cap. 2. p. 41-52.

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SILVA. L. H. A. da. Reflexões sobre a politica de conservação ambiental e a criação . unidades


de conservação na Cidade do Recife: o Parque Natural Municipal Josué de Castro / Luiz
Henrique Alves da Silva. - Recife: O autor, 2011, 157 f: il.

TRILLA, J. A educação não formal. In: ARANTES, V. A. (org.). Educação formal e não-formal:
pontos e contrapontos. São Paulo: Summus, 2008, p. 15-55.

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A PRESERVAÇÃO DA


BIODIVERSIDADE NA RESERVA BIOLÓGICA DE PEDRA TALHADA
ALAGOAS E PERNAMBUCO
ENVIRONMENTAL EDUCATION FOR THE PRESERVATION OF BIODIVERSITY IN THE
BIOLOGICAL RESERVE OF ALAGOAS AND PERNAMBUCO

Leandro Ferreira de Melo*, Valdilene Valdice de Santana**

*Graduando do curso de Licenciatura em Geografia, Instituto Federal de Pernambuco (IFPE/EAD), Campus Recife,
Brasil
**Professora Tutora do curso de Licenciatura em Geografia, Instituto Federal de Pernambuco (IFPE/EAD), Campus
Recife, Brasil

INTRODUÇÃO
As Unidades de Conservação, de forma geral, foram criadas com o objetivo de preservar a
biodiversidade da ação predatória humana e promover a sustentabilidade local.Atualmente , esses
espaços vêm ganhando cada vez mais importâncias em atividades voltadas ao ensino, à cultura e,
principalmente, a práticas voltadas à educação ambiental. O saber ambiental é uma epistemologia
política que busca dar sustentabilidade á vida. Através do conhecimento ambiental se produz novas
significações sociais, o mesmo constrói estratégias de reapropriação do mundo e da natureza. O
saber ambiental é construído de forma solidaria de uma política do ser, da diversidade e da
diferença. (LEFF, 2009).
As Unidades de Conservação (UCs) no Brasil foram criadas a partir da década de 1930,
com o intuito de, sobretudo, promover a conservação da biodiversidade, dos ecossistemas e das
paisagens da ação predatória antrópica (BRASIL, 2000). Com o passar dos anos, as UCs
distribuídas no território brasileiro foram buscando atender a outros objetivos além dos
supracitados, e no ano de 2000 foi criado um Sistema Nacional de Unidades de Conservação
(SNUC), englobando antigas e novas áreas, as quais foram definidas em dois grupos principais:
Unidades de Proteção Integral e as Unidades de Uso Sustentável (BRASIL, 2000).
A Reserva Biológica de Pedra Talhada, objeto de estudo da presente pesquisa, é uma
Unidade de Conservação Federal, tem uma área de aproximadamente 4.469 hectares, localizada
nos Estados de Pernambuco e Alagoas, mas especificamente nas cidades de Lagoa do Ouro /PE, e
Quebrangulo/AL. A criação desta área surgiu com o intuito de preservar a biodiversidade local e
conservar as inúmeras nascentes existentes no local. A Reserva é uma área de preservação integral
criada legalmente no dia 13 de dezembro de 1989, pelo decreto presidencial n°98.524.

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Tudo isso começou com pesquisadora Anita Studer, Bióloga Ornitóloga que veio da Suíça
quando estava fazendo seu mestrado em Londres ,sobre um pássaro chamado Anumará, o pássaro
estava encapado no museu e o seu professor falou que este só existia no inteiro do nordeste
brasileiro, em Alagoas mais preciso em Quebrangulo. Na década de 1980, começou a luta para
que aquele pedaço de mata se tornasse uma reserva , de início como parque estadual de Pedra
Talhada, mas não foi muito a frente ,depois de muitas batalhas foi criada em 1989 a Rebio e
também fundada a Associação Nordesta Reflorestamento e Educação. De 1989 até 2007 a Rebio,
foi gerida pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente, a partir de 2007, o Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade assumiu a responsabilidade pela Unidade de Conservação.
A Rebio de Pedra Talhada, sofre impactos com os dematamentos, caça ilegal e as
queimadas, que atualmente é o impacto mais agravante. Nos últimos 08 anos foram queimadas mais
de 800 hectares de mata que chega a quase 20 % do seu território. Sendo assim, se faz urgente a
conscientização e sensibilização de uma Educação Ambiental, voltada para a preservação da
Reserva Biológia de Pedra Talhada. Segundo Loureiro (2002), a Educação Ambiental é um
eficiente processo educativo capaz de fornecer os elementos instrumentais e racionais, necessários
para a conscientização de indivíduos e a concretização do ideal de uma sociedade sustentável em
múltiplas escalas.
Diante do exposto,a presente pesquisa tem como objetivo descrever a importância da
Educação Ambiental para a preservação da biodivesidade na Reserva Biológica de Pedra Talhada.

MATERIAL E MÉTODOS
A Reserva Biológica (Rebio) de Pedra Talhada,está localizada na divisa dos Estados de
Alagoas e Pernambuco, figura 01. O nome da unidade deve-se às formações rochosas talhadas pela
erosão hídrica e eólica.

Figura 01: localização da Rebio de Pedra Talhada.

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Fonte: google maps. Adaptado pelos autores, (2019).

A pesquisa teve uma abordagem qualitativa. Segundo Gil (2008), a pesquisa qualitativa
tem interesse na aplicação, utilização e consequências práticas do conhecimento gerado em uma
determinada realidade. Foram realizadas consultas a literatura especializada no tema da pesquisa,
consultas documentais in locu e em sites oficiais referentes a criação de Unidades de Conservação
e registros das ações realizadas pelo projeto de Educação Ambiental: “Corredores Florestais”.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Rebio de Pedra Talhada inclui em seu território áreas públicas e privadas que contém uma
abundante riqueza de fauna e flora, tendo também inúmeras nascentes que servem de abastecimento
para muitos moradores locais e até de outras regiões, foram 169 nascentes catalogadas na década de
1990, que atende quase 300 mil habitantes. Ao todo são 06 seis cidades distritos e povoados que
recebem água desta reserva; Lagoa do Ouro e Correntes em Pernambuco; Quebrangulo, Paulo
Jacinto, Estrela de Alagoas e principalmente a cidade de Palmeiras dos Índios em Alagoas com
mais de 80 mil habitantes.
Atualmente a Rebio de Pedra Talhada conta apenas com dois funcionários terceirizados: um
em Penambuco e outro em Alagoas. Em parceria com a ONG Nordesta Reflorestamento, um dos
funcionários realiza o projeto de Educação ambiental chamado, “Corredores Florestais”, com o
objetivo de conscientizar e sensibilizar a sociedade civil para a urgente necessidade da
preservação da biodiversidade na UC. Dentre as ações realizadas pelo projeto estão: palestras nas
escolas e comunidades circuvizinhas á Rebio figura 2A, caminhadas ecológicas, figura 2B e
passeatas nas cidades que ficam no entorno da UC., figura 2C. Realizam também um programa
semanal na rádio Victória FM, em Quebrangulo intitulado: “Nordeste e Nascentes”, levando
informações sobre a Rebio e propagando as ações do projeto.

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Figura 02: ações realizadas pelo projeto: “Os Corredores Florestais”

Fonte: autores, (2019).

CONCLUSÃO
A Rebio de Pedra Talhada é um marco histórico para a região. Desde as lutas para sua
criação até os dias atuais , a pesquisadora Anita Studer se faz presente, buscando formas de
protegera e dar sustentabilidade a UC. Os órgão ambientais de fiscalização ICMBio e CIPOMA não
são frequêntes na UC, geralmente aparecem duas ou três vezes por ano, facilitando impactos
ambientais como :caça ilegal criação de pássaros em gaiola e corte seletivo de madeira, queimadas,
dentre outros. A parceria com a Ong Nordesta Reflorestamento por meio das ações do projeto de
Educação Ambiental Corredores Florestais visa atende essa deficiência por meio da conscientização
e sensibilzação ambiental.

REFERÊNCIAS
BRASIL. IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.
Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação- SNUC. no 9.985, de 18 de julho de 2000.

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LEFF, E. Complexidade, racionalidade ambiental e diálogo de saberes. São Paulo: revista


Educação & realidade, v. 34, n. 3, 2009.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6ª Ed. São Paulo: Atlas, 2008.

LOUREIRO, C.F. B. Educação ambiental e movimentos sociais na construção da cidadania


ecológica e planetária. In: LOUREIRO, Carlos Frederico Bernardo.2002.

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O QUE FAZER COM OS LIXOS GERADOS DENTRO DAS UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO?
WHAT TO DO WITH WASTE GENERATED WITHINCONSERVATION UNITS?

Suzy Cristina Pedroza da Silva*; Michelle Andreza Pedroza da Silva **; Cloves Farias
Pereira ***

(*) Estudante de Graduação em Geografia, da Universidade Paulista/ UNIP; (**) Doutoranda do Programa de Pós-
Graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia/UFAM; (***) Dr. e Professor Orientador do
Programa de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia / UFAM.

1. INTRODUÇÃO
De acordo com Secretaria de Desenvolvimento Sustentável (AMAZONAS, 2014) a
civilização na qual estamos inevitavelmente inseridos lembra-nos que precisamos urgentemente
superar a perspectiva do Contrato Social, tal como elaborado por Rousseau (2013), por outra
perspectiva substantivamente nova, a de Serres (1994), tal como contida em o Contrato Natural. O
presente processo civilizatório exige, na verdade, que o contrato natural entre os homens e a
natureza estabeleça relações simbiônticas para que todos possam usufruir de modo justo dos frutos
da Terra. É parte essencial desse novo contrato natural exigido pelo nosso tempo, a criação de
Unidades de Conservação, dentro desta linha de pensamento.
A partir da criação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, SNUC / Lei Federal
nº. 9.985, de 18 de junho de 2000, o Brasil vem passando por um processo evolutivo significativo
no âmbito ambiental, tanto em relação aos marcos regulatórios, como na ampliação de unidades de
conservação (BRASIL, 2000). O estado do Amazonas, nesse contexto vem promovendo a
implantação e a gestão dessas áreas protegidas, por meio do Sistema Estadual de Unidades de
Conservação (SEUC), estabelecendo normas e critérios para sua administração.
Em 2003, foi estabelecida a criação de mais nove unidades de conservação estaduais no
Amazonas, totalizando 3.629.161,0 ha, como estratégia ambiental, a fim de conter o avanço do
desmatamento como medidas mitigativas pela abertura e recuperação dos trechos intrafegáveis da
BR-319. Assim em 2012, foi realizado pelo Governo do Amazonas por meio da Secretaria de
Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SDS), o chamamento público nº
01/2012-SDS que instituiu o Programa de Implementação das Unidades de Conservação (UCs)
Estaduais do Amazonas na Área de Influência da BR-319, a saber: oito UCs de uso sustentável:
Resex Canutama, Floresta Canutama, Floresta Tapauá, RDS Igapó-açu; RDS Rio Amapá, RDS

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Piagaçu-Purus, RDS do Rio Madeira, RDS do Matupiri e uma UC de proteção integral (Parque
Estadual do Matupiri).
Seis anos depois de sua implementação, as UCs mencionadas ainda necessitam de zelo por
parte dos gestores públicos. O recorte dado neste trabalho trata-se da destinação dos resíduos
sólidos e a consciência ambiental.
A destinação dos resíduos sólidos é sem dúvidas o problema mais complexo de ser
resolvido, pois com as novas políticas e diversos trabalhos acerca do assunto, ainda existem
principalmente nos lugares mais distantes dos centros urbanos, a incorreta forma de descarte desses
resíduos, onde muitas vezes são destinados a locais denominados de lixões, esses lixões recebem
resíduos das mais diversas categorias e que mesmo sendo oriundos de um sistema onde há o serviço
regular de coleta, mas sem nenhum controle ambiental, isso é mais preocupante pois as áreas rurais
mais longínquas dos centros urbanos.
O ambiente rural é um ambiente esparso e amplo, porém isso não quer dizer que o problema
com a ausência do serviço não faça falta, é notável que essas populações tenham acesso a produtos
industrializados e consequentemente essas embalagens geram lixo e é destinada diretamente no
ambiente em que vivem.
Resíduo Sólido é considerado um tema bastante pertinente no campo das questões
socioambientais. Vale ressaltar que antes de qualquer trabalho e/ou estudo nesta área, é importante
entender a diferença dos conceitos de lixo e resíduos sólidos.
Segundo Andrade (1989) o conceito de lixo é o resultado de toda e qualquer atividade
natural, humana ou animal, considerado geralmente como imprestável e/ou indesejável no
ambiente. Para o autor lixo é o que modernamente chamamos de resíduos sólido, explica que, até o
início da década de 90, os resíduos sólidos eram chamados simplesmente de lixo, porém,
atualmente eles são conhecidos ou recebem a denominação de resíduos urbanos ou resíduos sólidos
urbanos.
O objetivo deste trabalho é dar visibilidade a configuração de um cenário amazônico que
apresenta pontos importantes sobre a destinação dos resíduos sólidos e propor algumas medidas
para mitigar essa problemática nas comunidades rurais das UCs mencionadas.

2. MATERIAL E MÉTODO
O estudo foi realizado em nove UCs, a saber, RESEX Canutama, FLORESTA Canutama,
FLORESTA Tapauá, RDS do Matupiri (Entorno), PAREST do Matupiri (Entorno), RDS do Rio
Madeira e RDS Igapó-Açu, RDS do Rio Amapá e RDS Piagaçu-Purus (Quadro 1).
A pesquisa foi abordada a partir do método descritivo e qualitativo. A coleta de dados foi
realizada junto aos moradores das UCs, por meio de aplicação de formulários com perguntas
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

abertas e fechadas com uma equipe multidisciplinar e visitação in loco dos locais de destinação dos
resíduos sólidos nas comunidades rurais.
Quadro 1.Unidades de Conservação Estaduais do Amazonas na área de Influência da BR-319.

UCs CATEGORIA NÍVEL DE PROTEÇÃO

RESEX CANUTAMA Reserva Extrativista Uso sustentável

FLORESTA CANUTAMA Floresta Estadual Uso sustentável

FLORESTA TAPAUÁ Floresta Estadual Uso sustentável

RDS IGAPÓ-AÇU Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uso sustentável

RDS DO RIO AMAPÁ Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uso sustentável

RDS DO PIAGAÇÚ-PURUS Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uso sustentável

RDS DO RIO MADEIRA Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uso sustentável

RDS DO MATUPIRI Reserva de Desenvolvimento Sustentável Uso sustentável

PAREST DO MATUPIRI Parque Estadual Proteção integral

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A situação a respeito do lixo, nas UCs do estado do Amazonaspor estarem localizadas nas
zonas rurais, concentram-se entre as populações mais carentes, onde a densidade populacional é
baixa. De maneira geral os moradores estão mais adaptados as condições mais simples dos modos
de vida rural e de certa forma não percebem o perigo de contaminação de seus recursos naturais por
uma má destinação dos resíduos sólidos.
Os resíduos sólidos são, neste século, um dos principais problemas ambientais vividos pelo
homem. A sociedade extremamente consumista e individualista acredita que, ao colocar os resíduos
gerados na porta de casa para o “lixeiro” recolher, o problema estará resolvido.
Para uma melhor compreensão sobre os resíduos sólidos nas UCs foi realizada uma
descrição quanto a sua origem/classificação e disposição final.
A maioria do lixo identificado nas UC é residencial, que são os resíduos gerados nas
atividades diárias nas casas e demais edificações residenciais.
Há registro de lixo comercial, onde os resíduos são gerados em estabelecimentos comerciais,
cujas características dependem da atividade ali desenvolvida.
O lixo público também apresentou suas características, pois são os resíduos presentes nos
logradouros públicos, em geral resultantes da natureza, tais como folhas, galhadas, poeira, terra e
areia, e também aqueles descartados irregular e indevidamente pela população, como entulho, bens
considerados inservíveis, papéis, restos de embalagens e alimentos.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Esse último tipo de lixo foi percebido em vilas e/ou comunidades que apresentaram maior
infraestrutura.
1)RESEX Canutama - a quantidade de resíduos que são lançados no rio e a quantidade de
material queimado, pelos moradores da RESEX Canutama é bastante significativo, dentre estes,
estão as garrafas de vidros e latas. Já os incinerados são as embalagens plásticas, folhas secas e
pilhas. Os moradores da RESEX reaproveitam recipientes plásticos como garrafas pet para
armazenar sementes e água. Já os restos de alimentos são utilizados para complementar a
alimentação dos animais. Apesar de não ter sido realizada a caracterização dos resíduos sólidos, foi
possível observar por meio de entrevista a presença de plástico, das mais variadas embalagens (pet,
sacolas plásticas), vidro, metal, material orgânico e produtos não recicláveis.
2)Floresta Canutama - o problema referente à geração de resíduos vem sendo caracterizada
pela crescente produção de resíduos sólidos, gerados pelo consumo de produtos industrializados.
Muito dos resíduos descartados inadequadamente pelos moradores da UC Floresta Estadual de
Canutama, são embalagens que levam anos para se decompor.
3)RDS Igapó-Açu - o lixo geralmente é descartado no ambiente de forma incorreta
depositado em algum lugar no terreno, atrás da casa ou em áreas mais afastadas, enterrados, outro
destino dado ao lixo é a incineração, uma pequena parcela é reaproveitado (garrafa pet para
armazenar água) e por fim, a venda principalmente quando se trata de latas de alumínio e/ou ferro.
As comunidades rurais pertencentes à RDS Igapó-Açu necessitam de serviços de coleta de lixo.
4)Floresta Estadual de Tapauá - o rio é o destino de descarte de lixo de muitas famílias da
UC, sendo jogados nele os resíduos de difícil decomposição como plásticos, latas e pilhas. Como na
maioria das comunidades rurais, os lixos são queimados, sem separação ou mesmo definir uma área
especifica para isso.
5) PAREST e 6) RDS do Matupiri - a geração de resíduos inorgânicos nas comunidades
usuárias das Unidades de Conservação é alta. As embalagens são descartadas de forma inadequada
no meio ambiente como, sacos plásticos e metal que levam mais de 100 anos para se decompor.
Dentre os tipos de resíduos que são lançados no rio, buracos, incinerados ou vendidos pelos
usuários UC são respectivamente, pilhas, embalagens plásticas, folhas secas e latas. A falta de
informações sobre seleção e descarte das embalagens é evidente nos informantes, que na maioria
das vezes não sabem o que fazer com os resíduos sólidos e acabam dando o mesmo destino para
diferentes categorias de resíduos. Dentre as alternativas para tentar fornecer conhecimento sobre o
destino correto do lixo é implantar nas escolas pertencentes às comunidades do entorno das
Unidades de Conservação projetos de educação ambiental, visando realizar atividades de educação
ambiental com os envolvidos, afim de contribuir para a qualidade de vida das pessoas que vivem
nestas áreas.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

7)RDS do Rio Madeira - a população tem a prática de queimar, enterrar e acumular o lixo a
céu aberto nos quintais ou eliminá-lo diretamente nos cursos d’água. Segundo relatos de moradores,
é comum barcos recreios jogarem resíduos sólidos e líquidos nos cursos d’água da RDS. As
comunidades mencionaram diversos problemas causados pela má gestão dos resíduos sólidos, entre
os principais estão: poluição; acidentes com garrafas quebradas e latas de conserva, principalmente
envolvendo crianças; aparecimento de vetores de doenças: ratos, baratas, moscas e outros insetos;
contaminação de lençóis freáticos; doenças, como diarreia e verminose. A fim de atenuar essa
situação, os moradores utilizam-se da compreensão dos comunitários; diálogo e a conscientização
entre agente de saúde e comunidade. Os agentes de saúde junto com a comunidade fazem mutirão
de limpeza e gestores promovem mutirão de limpeza com os estudantes. As ações caminham em
passos muito curto, mas é um bom começo quando comparado com outras UC.
8) RSD Piagaçu-Purus - uma grande parte do lixo é constituída de materiais plásticos
(garrafas “pet”, embalagens), latas de conserva e garrafas de vidro. Os moradores se desfazem do
lixo queimando ou jogando no rio na maioria das vezes. No caso das garrafas de vidro, estas não
são consumidas pelo fogo e acabam sendo amontoadas em um canto ou jogadas no ambiente em
local mais afastado da casa e, além de poluir, pode causar acidentes. Na comunidade às margens do
lago Ayapuá (Pinheiros) as garrafas foram, por um tempo, acumuladas e vendidas a um comerciante
que visitava a área de barco. É um exemplo alternativo que poderia ser melhor articulado e que
poderia gerar algum retorno financeiro aos moradores.
9) RDS do Rio Amapá - não possui um local para o destino do lixo. O lixo produzido
dentro das comunidades tem gerado muitas polêmicas entre os moradores, que cada vez mais ficam
preocupados com esse tema. Dessa forma, os mesmos elencaram algumas regras para o lixo como
meio de evitar a contaminação do solo e água e a poluição das áreas comuns.
Em todas as UCs implementadas e acordadas dos seus referidos Planos de Gestão, as regras
quanto à destinação dos lixos são relacionadas por família, ou seja, cada família se responsabilize
por um “local” específico para armazenar o lixo; recomenda-se a reciclagem, reutilização do lixo e
fica proibido jogar qualquer tipo de óleo, lixo nos lagos, rios e igarapés e a queima dos resíduos.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há regras claras do que não é permitido fazer com os lixos gerados nas áreas mais
vulneráveis das UCs, como jogar nos rios, lagos e igarapés e queima dos resíduos.
No entanto, não há uma destinação adequada dos resíduos sólidos produzidos pelos
moradores dessas UCs, no estado do Amazonas. Tão pouco, existem instrumentos reguladores
desses sistemas. São acordados apenas recomendações que são alternativas para a reutilização de
algum recipiente, mas medidas de coleta efetiva, nessas localidades, são inexistentes.
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Mas afinal, seis anos após sua implementação e os problemas ambientais no que tange aos
resíduos sólidos continuam os mesmos nessas Unidades de Conservação. O que fazer?
É necessário propor em caráter de urgência soluções e alternativas para minimizar a
problemática dos resíduos nessas localidades. A comunicação ou informação sobre consciência
ambiental, mostrando os perigos de determinados materiais e seu descarte inadequado é um bom
início para realização desse trabalho. Palestras nas escolas e em reuniões de Conselhos Gestores.
Outra alternativa seria a coleta e venda de materiais seletivos, como vidro, alumínios e papelão,
organizados a partir de uma cooperativa ou associação, por exemplo. Criar mecanismos para
proporcionar a logística reversa de embalagens de agrotóxicos, que são utilizados em muitas
localidades rurais. Criar depósitos especiais de descarte de pilhas, baterias e outros materiais
perigosos, com destinação correta para seu descarte. Oferecer cursos de reaproveitamento de
material, por meio de oficinas de capacitação (artesanatos, vassouras de pet, eco construções,
fabricação de adubo orgânico, entre outras iniciativas), como outra forma de mitigar o despejo no
meio ambiente de alguns materiais prejudiciais. Todas essas iniciativas são interessantes, mas só
funcionaram com apresentação de um projeto base, por parte da gestão e administração dessas UCs
e a participação dos moradores locais com estímulos para que crianças e adolescentes garantam uma
continuidade permanente dessas ações nas comunidades rurais.

AGRADECIMENTOS
Ao governo do Estado do Amazonas, por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável, que possibilitou o acesso às UCs para a realização dos estudos
ambientais e ao Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (DNIT) que financiou o
chamamento público para a realização das pesquisas in loco.

REFERÊNCIAS
AMAZONAS, Governo do Estado. Plano de Gestão das Unidades de Conservação do Estado do
Amazonas / Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Manaus:
SDS, 2014.

ANDRADE, J. B. L. Avaliação do sistema de limpeza urbana na cidade de Campina Grande.


Universidade Federal da Paraíba, Engenharia Civil. 1989. 280p.

ROUSSEAU, J. O contrato social: e outros escritos. Tradução de Rolando Roque da Silva. 22. ed.
São Paulo: Cultrix, 2013.

AMAZONAS, Governo do Estado. Chamamento Público nº 01/2012. / Secretaria de Estado de


Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Manaus: SDS,. 2012.

SERRES, M. O contrato natural. Tradução de Serafim Ferreira. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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GEOEDUCAÇÃO EM ÁREAS PROTEGIDAS: DESAFIOS DA


IMPLEMENTAÇÃO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO
CAVERNÍCOLA NO SERTÃO CENTRAL CEARENSE
GEOEDUCATION IN PROTECTED AREAS: CHALLENGES OF IMPLEMENTION OF A
CAVERNIC PROTECTED AREAS IN THE CEARENSE CENTRAL WILDERNESS

Vitor Nairo Sousa Aguiar Lira *, Hermógenes Henrique Oliveira Nascimento *, Hívila Pâmella
Morais Silva *

Graduando em Engenharia Ambiental, Centro de Tecnologia, Universidade Federal do Ceará (UFC), Brasil. *
Célula de Conservação da Diversidade Biológica (CEDIB), Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Ceará, Brasil.*
Graduanda em Ciências Ambientais, Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR), Universidade Federal do Ceará
(UFC), Brasil. *

1. INTRODUÇÃO
As Unidades de Conservação (UC) compreendem áreas naturais protegidas por lei, que
possuem o objetivo de preservar a diversidade biológica e os diversos aspectos naturais presentes,
além de permitir gerenciar e ordenar o uso desses ambientes para que ocorra o menor impacto
possível. Por contar com características singulares, como fauna, flora e recursos hídricos, algumas
atividades são restritas ou até mesmo proibidas nessas áreas. No Ceará, cabe a Secretaria Estadual
do Meio Ambiente (SEMA) criar Unidades de Conversação no Estado e implementar a política de
Fauna e Flora no Ceará, dessa forma desempenhando papel fundamental de conservação das áreas
naturais no Estado. Além disso, a SEMA é responsável por avaliar, gerir e implementar o Sistema
Estadual de Unidades de Conservação (SEUC), conforme Lei Estadual 14.950, de 27/06/2011
(CEARÁ, 2011).
Conforme a Lei Federal N° 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC) e à Lei Estadual nº 14.950/2011 (SEUC) as UC estão divididas em dois
grupos: proteção integral e uso sustentável. A Proteção integral (PI) expõe como objetivo básico
preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção
dos casos previstos nesta Lei. Enquanto as unidades de Uso Sustentável (US) buscam
compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos
naturais. (BRASIL, 2000).
Nesse contexto, está inserida a proposta de criação de UC na Gruta da Casa de Pedra situada
nos municípios de Madalena e Itatira. A Gruta da Casa de Pedra expõe a difícil realidade
experienciado pelos patrimônios espeleológicos existentes no Estado do Ceará, apresentando
situação crítica de degradação. As pressões antropogênicas e consequente deterioração das
formações geológicas e patrimônio arqueológico (e.i. gravuras rupestres) no sistema de cavernas

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“Gruta Casa de Pedra”, coadjuvou para que a área recebesse o título de gruta mais degradada do
Estado. Diversas intervenções estão alterando e degradando essa formação, resultando em perda
significativa de feições geomorfológicas, beleza cênica e registros arqueológicos da gruta.
Por isso, este trabalho objetiva fazer o levantamento qualitativo dos estudos socioambientais
para a viabilidade da criação da Unidade de Conservação da Gruta Casa de Pedra.

2. MATERIAL E MÉTODO
A metodologia científica pode ser compreendida, de forma resumida, como a soma de
técnicas e processos empregados na realização de uma pesquisa, sendo que as técnicas
corresponderiam às atividades sistematizadas e racionais que permitem alcançar os objetivos,
delineando o caminho metodológico a ser seguido (MARCONI; LAKATOS, 2003).
Nesse sentido, foram duas técnicas empregadas nessa pesquisa:
1- Documentação indireta: refere-se ao levantamento de dados em fontes primárias e secundárias
através de:
- Pesquisa documental: realizada no acervo virtual do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação
de Cavernas (CECAV) e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), onde
foi possível ter acesso aos arquivos e dados estatísticos sobre o assunto.
- Pesquisa bibliográfica: baseou-se no levantamento, análise e interpretação de obras da Sociedade
Brasileira de Espeleologia pertinentes ao tema, a partir de quatro eixos principais:
I – Educação Ambiental, II – Unidades de Conservação, III – Geoconservação, IV - Espeleologia
2 – Documentação direta: correspondeu ao levantamento de dados produzidos nas oficinas de
capacitação de educação ambiental.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Nas vistorias realizadas pela SEMA foi evidenciado diversas pichações, depredação e
poluição do ambiente cavernícola com a presença de resíduos sólidos oriundos de visitantes
esporádicos. A contínua degradação da “Gruta Casa de Pedra” se reverbera por meio das inúmeras
pichações na entrada e no interior da caverna. Foram utilizados diversos materiais nas pichações,
desde corretivo escolar a tinta de sprey, condição na qual torna o cenário ainda mais complexo
dificultando o processo de remoção (Figura 1). Em relação aos resíduos sólidos foi encontrado
garrafas PET (refrigerante e água), papel, embalagens plásticas e entre outros resíduos, que
aparentam ser provenientes da utilização da gruta em sentidos diversos.

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Figura 1 - Pichações na entrada principal da cavidade

Fonte: CEDIB (2018)

A Gruta da Casa de Pedra apresenta importante patrimônio cultural, histórico,


geomorfológico, espeleológico, arqueológico e ambiental, configurando uma área de relevante
interesse para adoção medidas que promovam a preservação e fiscalização ambiental. No contexto
da preservação e reconhecimento da sua relevância ambiental, a área da gruta está localizada na
Reserva Legal (RL) do Projeto de Assentamento Umarizeiras criado e regulamentado pelo Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
O código florestal define que a RL é uma área localizada no interior de uma propriedade ou
posse rural, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais
do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a
conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa
(BRASIL, 2012). Além disso, a Gruta Casa de Pedra está registrada no Cadastro Nacional de
Informações Espeleológicas (CANIE) do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas
(CECAV), centro especializado do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio).
Nesse ínterim, estão envoltos as atividades desempenhadas a execução de visitas técnicas,
cursos de educação ambiental (e.g. curso de Formação de Multiplicadores em Educação Ambiental)
e estudos que consubstanciem a tomada de decisão para criação de uma Unidade de Conservação
Estadual visando a preservação do patrimônio espeleológico e arqueológico da gruta.
O Projeto “Proteção e Conservação da Gruta Casa de Pedra” conta com a participação de
diversas instituições e assentados que integram o Grupo de Trabalho de Espeleológia, conduzido
pelo MPE-CE – CAOMECE com apoio da SEMA, formado por instituições como SEMACE,
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IBAMA, IPHAN, DNPM, CPRM, BPMA, Departamento de Geologia da UFC, e SBE, que
possuem o interesse na conservação e proteção da Gruta da Casa de Pedra. A contribuinção do
Grupo de Trabalho (GT) foi fundamental para o desenvolvimento das ações de conservação da
gruta.

3. CONCLUSÃO
As cavernas possuem elementos únicos e que desempenham grande importância nos
registros históricos da sociedade e das mudanças climáticas e geomorfológicas da região. Apesar
das atividades do Projeto “Proteção e Conservação Gruta Casa de Pedra” surtirem efeitos positivos
na conscientização ambiental e preservação da caverna, é necessário o planejamento de novas ações
intensivas que culminem na aproximação com a comunidade e visitantes.
A exemplo, a realização de atividades de divulgação do patrimônio espeleológico e
arqueológico dos municípios e a elaboração de ações de fiscalização educativa visando prevenir a
degradação do ambiente cavernícula. Com a proposta de criação de uma UC da categoria
Monumento Natural (MONA), é fundante que ocorra, após sua efetivação, a elaboração do plano de
manejo de maneira a estabelecer o zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o
manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da
unidade.

4. AGRADECIMENTOS
Aos moradores de Itatira e Madalena que acolheram toda a equipe da SEMA com muito
carinho e compromisso. É louvável mencionar também a participação do Ministério Público
Estadual, por meio do CAOMACE que deu todo o suporte necessário para o arranjo do trabalho.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. CódigoFlorestalBrasileiro. Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2012/Lei/L12651.htm. Acesso: 28 set. 2019.

________. Lei Federal Nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I,
II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9985.htm>. Acesso em: outubro 2019.

CEARÁ. Lei nº 14.950 de 27 de junho de 2011. Institui o Sistema Estadual de Unidades de


Conservação - SEUC. Diário Oficial do Estado: série 3, Fortaleza, CE, ano III, n. 127, p. 4-5, 04
jul. 2011.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed. São


Paulo: Atlas, 2003.

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GT 4
Conflitos ambientais em áreas
protegidas
A criação, estabelecimento e gestão das áreas protegidas é invariavelmente
atravessada por inúmeros conflitos, negociações e pactos, que tendem a
envolver agentes governamentais, empreendedores privados, organizações
ambientalistas e diferentes representações das populações locais, tais como
comunidades tradicionais, povos indígenas, agricultores familiares, populações
urbanas vulneráveis, entre outros segmentos. Este grupo de trabalho tem o
objetivo de debater os dilemas e avanços para a inclusão social em áreas
protegidas, a partir destes conflitos, tendo em vista o recente cenário de
desregulação da legislação, do licenciamento e da gestão ambiental pública.

Coordenadores:
Alba Simon (UNIRIO)
Annelise Fernandez (UFRRJ)
Erica Vidal (UFPE)
Thaís Andrade (UFPE)
Wilson Madeira (UFF)
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TERMOS DE COMPROMISSO: UM INSTRUMENTO DE PACTUAÇÃO OU


DE CONTROLE DO USO E MANEJO DOS RECURSOS NATURAIS EM
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL?
COMMITMENT TERMS: AN APPLICATION OR CONTROL INSTRUMENT FOR THE USE
AND MANAGEMENT OF NATURAL RESOURCES IN NATURE RESERVES?

Ana Carolina Sena Barradas*,Marco Assis Borges, Máximo Menezes Costa


* Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
É recorrente, no mundo inteiro, o estabelecimento de áreas protegidas (AP) sobre territórios
tradicionalmente ocupados por comunidades locais. Conflitos socioambientais comumente se
estabelecem quando essas AP não permitem a presença das comunidades e/ou o uso direto dos
recursos naturais (DIEGUES, 2004).
No Brasil, a celebração de termos de compromisso (TC) entre órgão ambiental gestor e
comunidade tradicional é uma prerrogativa legal para gestão dos conflitos derivados desses casos de
sobreposição territorial (BRASIL, 2002). Trata-se de um instrumento temporárioque contém as
normas depermanência das comunidadesaté que aconteça a regularização fundiária.
A primeira unidade de conservação (UC) no país a abrir um processo para tratar da proposta
de elaboração de um TC foi a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins(ESEC Serra Geral do
Tocantins) (TALBOT, 2016), que iniciou um processo em 2003, logo depois da publicação do
Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), Lei 9.985/2000, e do seu decreto
regulamentador, nº 4.340/2002, os quais estabelecem o instrumento.
O longo e bem documentado histórico dos processos de construção e implementação de
TCna ESEC Serra Geral do Tocantins nos fornece subsídio para um estudo de caso voltado a
reflexões sobre o uso desse instrumento na gestão de conflitos, visando identificar e fortalecer
caminhos que levem ao seu aperfeiçoamento.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa essencialmente exploratória e descritiva, que considera também a
experiência pessoal dos autores, que atuam como gestores ambientais pelo Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) lotados na ESEC Serra Geral do Tocantins há quase
dez anos, inclinando o trabalho para um ensaio etnográfico dos processos de construção e
implementação de termos de compromisso nos quais se envolveram.

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Realizamos busca por documentos institucionais e publicações relacionados aostermos de


compromisso na ESEC Serra Geral do Tocantins, inclusivenos arquivos físicos e digitais
localizados no escritório da UC em Rio da Conceição/TO,entre julho de 2015 eagosto de 2018.
Este trabalho analisou agestão do conflito associado à sobreposição da ESEC Serra Geral do
Tocantins como territóriode quilombolas que ocupam as margens dos rios Novo, Preto e Riachão,
na porção tocantinense da UC, especialmente no que se refere às iniciativas de construção de termos
de compromisso com o órgão ambiental gestor, no sentido de ampliar compreensões sobre esse
instrumento a partir da sua aplicação prática.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Criada em 2001, a ESEC Serra Geral do Tocantins abrange os municípios Mateiros, Ponte
Alta, Almas e Rio da Conceição, no Tocantins, e Formosa do Rio Preto, na Bahia, com cerca de 716
mil hectares. A UC foi instituída1 sobre territórios ocupados há centenas de anos por povos e
comunidades tradicionais.
O fogo sempre foi o principal mote de gestão da ESEC Serra Geral do Tocantins
(BARRADAS, 2017). Os gerais do Jalapão têm predomínio de formações campestres e encontram-
se, de modo geral, em ótimo estado de conservação, apresentando grandes extensões de Cerrado
nativo. Dada a alta inflamabilidade da vegetação campestre, é comum no Jalapão a ocorrência de
fogo, que muitas vezes se transformam em grandes incêndios.
Amplamente utilizado pelas comunidades jalapoeiras, o fogo é considerado uma ferramenta
para manejo de pastagens, abertura de roças, extrativismo do capim-dourado, caça, limpeza de
áreas, proteção de casas e infraestruturas, dentre outros fins. Prontamente, o fogo constituiu o
principal eixo do conflito com as comunidades tradicionais locais desde a criação e implementação
da ESEC Serra Geral do Tocantins (muito embora o conflito também tenha fundo territorial, na
medida em que os territórios dessas comunidades foram englobados por uma UC de proteção
integral que não permitem a ocupação humana em seu interior).
A ESEC Serra Geral do Tocantins possui pelo menos três iniciativas formalizadas de
construção de termos de compromisso com as comunidadeslocais: uma de 2003, que culminou no
arquivamento do processo administrativo em 2005; outra de 2009, que culminou na assinatura do
TC nº14/2012 e outra de 2015, que culminou na celebração do TC nº 04/2018. Em todas iniciativas,
o uso do fogo foi o tema de pactuação(ou controle) mais emblemático nas discussões entre as

1
A criação da ESEC se deu sem consulta pública - Estações Ecológicas e Reservas Biológicas são as categorias de unidades de
conservação que, pelo SNUC (lei 8.865/2000), não têm a consulta pública como etapa obrigatória para sua criação. O passivo social
associado à forma de criação das UCs de proteção integral não é pequeno (Madeira et al., 2015) e a partir das críticas à inadequação
dessa forma de criação de UC atualmente o ICMBio realiza consultas públicas para todas as categorias de UC.
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partes.A Tabela 1 sinaliza as principais normas relativas ao uso do fogo previstas nas iniciativas de
TC na ESEC Serra Geral do Tocantins.

Tabela 1 – Principais normas associadas ao uso do fogo previstas nas iniciativas de termos de compromisso
na ESEC Serra Geral do Tocantins
TC/2003 TC/2012 TC/2018
Tolerauso do fogo para
Somente para fins fins produtivos e de
Finalidade Somente para fins produtivos
produtivos manejo de
combustível/ecológico
Podercidadão:
Exigeautorização do Exigeautorização do
Controle estímuloaomanejo do fogo
órgãoambiental órgãoambiental
de base comunitária
Autorizações de Toleraaouso do fogo no
queimapodemsersuspensaspeloó final da estaçãoseca,
Proíbe o uso do fogo
Sazonalidade rgãoambientalcasocondiçõesmet desdeque a
no fim da estaçãoseca
eorológicasestejamdesfavorávei áreaestejapreviamenteaceir
s adaporqueimasprecoces
Estipulaintervalosmíni
Fixahoráriosrigidos para Defende a promoção da
Temporalidade mo entre queimas de
realização de queimas pirodiversidade
trêsanos

Entendemos que a inciativa de construção do TC/2003, apesar de ousada – por ser a


primeira proposta de TC do país – teve uma participação social restrita o que levou à determinação
unilateral de normas nitidamente desconectadas das necessidades e anseios locais o que levaria ao
impedimento da manutenção de atividades de subsistência. Apesar das regras terem viés
conservacionista, o pioneirismo institucional limitou o avanço do processo de firmatura do TC/2003
que, ao desenrolar de quase três anos, não foi concluído sendo temporariamente suspenso em 2005.
Em 2009, a reabertura do processo de construção de TC na ESEC Serra Geral do Tocantins
foi precedida do questionamentodatradicionalidade da comunidade que habitava a região de
Mateiros, o que favoreceu o acirramento do conflito socioambiental, mas também instigou a
mobilização e organização comunitária, que no mesmo ano se autorreconheceu como quilombola e
criaram a Associação das Comunidades Quilombolas das margens dos rios Preto, Novo e Riachão
(Ascolombolas-Rios) e requereram interveniência do Ministério Público Federal (MPF) no
Tocantins para firmatura de um termo em apoio ao direito das comunidades.
O TC nº 14/2012 rompeu com enormes barreiras institucionais, tantono que diz respeito
àabertura institucional para gestão participativa na UC, o que permitiu uma elevação do nível de
participação social no processo de construção do TC(BARRADAS, 2017) como na previsão inédita
denormas que permitiam o uso do fogo em uma unidade de proteção integral. Ainda assim,
verificamos que o instrumento apresentou fortes traços de um sistema de comando-e-controle do
órgão estatal sobre a comunidade, reproduzindo, ao final, muito mais o poder do ICMBio do que os

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reais anseios e necessidades da comunidade (LINDOSO; PARENTE, 2014), o que é compreensível


num Estado cuja estrutura ainda é autoritária.
Apesar das dificuldades de implementação do TC/2012, o instrumento propicioumaior
aproximação entre o órgão ambiental gestor e a comunidade quilombola, de forma que as regras
foram expostas a críticas nos processos de monitoramento do TC, tornando nítida a necessidade de
revisão de normas que eram incompatíveis com o modo de vida geraizeiro.
Então, de2015 a 2017, foram realizadas ricas e densas discussões entre gestores e
quilombolas. Algumas das oficinas de revisão do TC contaram com apoio de um antropólogo,
contratado pelo Projeto Cerrado-Jalapão, que colaborou significativamente no processo de
repactuação do acordo de uso dos recursos naturais, potencializando a democratização dos espaços
de fala e uma integração mais equilibrada de expectativas e necessidades de conservação e proteção
de direitos humanos e culminando na celebração do TC nº 04/2018.
Passado um ano da celebração do termo, o monitoramento do instrumento, feito a partir de
encontros periódicos entre gestores ambientais e quilombolas, sugere haver uma organicidade na
co-gestão socioambiental do território em interface e, consequentemente, ganhos em conservação
da natureza. Até o momento, nenhuma cláusula do TC/2018 foi contestada ou descumprida pelas
partes e a relação gestores-quilombolas, outrora muito conflituosa, agora é mutuamente considerada
uma oportunidade de parceria respeitosa.

4. CONCLUSÃO
A celebração de termos de compromisso com povos e comunidades tradicionais tem grande
potencial depromover a conservação ambiental efetiva e socialmente justa em unidade de
conservação de proteção integral. Contudo, é importante considerar que o modelo clássico de gestão
ambiental, dirigido de forma unilateral, tecnocrático e desconectado das necessidades e
conhecimentos dos povos e comunidades tradicionais e das características ambientais, podem
comprometer a adequada utilização desse instrumento, especialmente quando limita a participação
social no que diz respeito à extensão do poder cidadão na determinação das normas.
O caso da ESEC Serra Geral do Tocantins mostra que a participação social na construção
dos termos de compromissofoi sendo elevada gradualmente, estimulada tanto pela organização e
articulação quilombola, que protagonizou a luta em defesa de seus direitos, como também pelo
monitoramento do TC por servidores que estão fixados na UC por quase uma década, o que
potencializou o aprendizado pela prática e a ampliação da compreensão da realidade local,
favorecendo a criação de ambientesdenegociação mais equilibrados e consequente definição de
normas mais contextualizadas com a realidade socioelogógicajalapoeira.

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O avanço na gestão de conflitos socioambientais por meio do estabelecimento de termos de


compromisso na ESEC Serra Geral do Tocantins constituiu uma base a partir da qual está sendo
possível aperfeiçoar uma abordagem de gestão multidisciplinar, holística e participativa,
especialmente no que se refere à gestão do fogo, por meio do seu manejo integrado.

5. AGRADECIMENTOS
Às comunidades quilombolas do Jalapão, pelos aprendizados diários e ao Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade.

6. REFERÊNCIAS
ARNSTEIN, S. R. 1969. A ladder of citizen participation. Journal of the American Institute
of planners 35(4), 216-224.

BARRADAS, Ana Carolina Sena. 2017. A Gestão do Fogo na Estação Ecológica Serra Geral
do Tocantins, Brasil. Dissertação apresentada ao Mestrado Profissional em Biodiversidade em
Unidades de Conservação, Escola Nacional de Botânica Tropical, Instituto de Pesquisas Jardim
Botânico do Rio de Janeiro.

BILBAO, B. A., LEAL, A. V., & MÉNDEZ, C. L. 2010. Indigenous use of fire and forest loss
in Canaima National Park, Venezuela. Assessment of and tools for alternative strategies of fire
management in Pemón indigenous lands. Human Ecology 38(5), 663-673.

DIEGUES, A. C. 2004. O mito Moderno da Natureza Intocada. 5. ed. São Paulo: Hucitec.

FAGUNDES, G. M. 2016. O cru e o combustível. Manipulações do fogo nos gerais do


Jalapão (TO). Projeto de Tese. Departamento de Antropologia. Universidade de Brasília.

LINDOSO, L. C. 2014. Recursos de Uso Comum nos Gerais do Jalapão: uma análise
institucionalista do Termo de Compromisso com populações tradicionais no interior de
Unidades de Conservação. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento Regional-UFT.

MADEIRA, J. A.; ABIRACHED, C. F. A.; FRANCIS, P. A.; CASTRO, D.; BARBANTI, O.;
CAVALLINI, M. M.& MELO, M. M. Interfaces e Sobreposições entre Unidades de
Conservação e Territórios de Povos e Comunidades Tradicionais: dimensionando o desafio.
2015. Anais do VII Seminário de Áreas Protegidas e Inclusão Social (SAPIS), UFSC,
Florianópolis-SC.

TALBOT, V. 2016. Termos de Compromisso: histórico e perspectivas como estratégia para


a gestão de conflitos em unidades de conservação federais. Dissertação de Mestrado. Escola
Nacional de Botânica do Rio de Janeiro / Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

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“EPIDEMIA” DE RECATEGORIZAÇÃO, REDUÇÃO DE LIMITES E


DESAFETAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO: PARCERIAS
NECESSARIAS COM COMUNIDADES QUILOMBOLAS
“EPIDEMIC” OF PROTECTED AREAS DOWNGRADING, DOWNSIZING AND DEGAZETTEMENT:
PARTENERSHIPS NEEDED WHITH QUILOMBOLAS COMUNITIES

Raquel Faria Scalco*, Bernardo Machado Gontijo**

* Doutora em Geografia pela UFMG. Professora Adjunta do curso de Turismo da Faculdade Interdisciplinar em
Humanidades da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Brasil.
** Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela UNB. Professor Associado do Instituto de Geociências da
Universidade Federal de Minas Gerais. Brasil.

1. INTRODUÇÃO
A criação de Unidades de Conservação (UCs) é uma importante estratégia para assegurar a
conservação dos recursos naturais e a proteção da biodiversidade. Porém, muitas vezes, a forma
como são criadas e/ou geridas causa conflitos entre comunidades e órgãos gestores. Este é o caso de
algumas UCs de proteção integral de Minas Gerais, criadas em áreas habitadas e/ou utilizadas por
comunidades quilombolas, que dependem dos recursos naturais para a reprodução de suas práticas
sociais. Com a criação das UCs, muitas atividades foram restringidas, cerceadas e/ou
criminalizadas, sem considerar que elas foram responsáveis pela conservação de tais áreas antes da
criação das UCs.
Estes conflitos têm suscitado propostas de recategorização, redução de limites e desafetação
de UCs de proteção integral em Minas Gerais, que podem favorecer agentes externos interessados
na implantação de projetos de desenvolvimento econômico, que já exercem pressão sobre os
territórios das comunidades quilombolas e das UCs.
Desta forma, a presente pesquisa partiu do questionamento da possibilidade de se conciliar
dois direitos fundamentais garantidos em leis: o direito ao meio ambiente equilibrado, que tem na
criação de UCs um de seus instrumentos mais importantes; e o direito cultural e territorial das
comunidades quilombolas.
Destaca-se queeste artigo é um recorte da tese de doutorado, na qual foi realizada um
levantamento dos casos de sobreposição entre territórios quilombolas e UCs de proteção integral em
Minas Gerais. Para este recorte, tem-se como objetivo entender se os conflitos gerados pela
sobreposição de UCs de proteção integral e territórios quilombolas geram propostas de desafetação,
redução de limites e recategorização de UCs. Além disso, pretende-se compreender como tais
propostas fragilizam as UCs e as comunidades quilombolas frente à pressão do capital; e ainda,

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reafirmar a necessidade de parcerias entre comunidades quilombolas e órgãos gestores de UCs,


frente ao cenário político atual.
Para tanto, foi realizado um levantamento destes casos de sobreposição em Minas Gerais,
sendo identificados sete casos em que esta situação acontece. A partir destes casos, identificou-se as
propostas de solução para os mesmos e as pressões exercidas por projetos de desenvolvimento
econômico sobre estes territórios. Assim, entende-seque, quando se tratam de povos e comunidades
tradicionais que vivem ou utilizam recursos de UCs de proteção integral, a melhor alternativa é a
flexibilizaçãoda gestão das mesmas, o estabelecimento de parcerias e o uso das áreas sobrepostas
mediante acordos baseados em instrumentos legais existentes para esta finalidade.Destaca-se que,
neste atual cenário político de desmantelamento das políticas ambientais e quilombolas em nosso
país, a união de forças entre estes dois lados mais fracos se faz ainda mais urgente.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Esta pesquisa possui caráter qualitativo, envolvendo coleta de dados primários e
secundários, sendo utilizados os procedimentos metodológicos abaixo descritos.
Primeiramente, foi realizada uma pesquisabibliográfica sobre temas relacionados àUCs,
direito das comunidades quilombolas, território e conflitos ambientais. Na sequência, foi feita
pesquisa de gabinete, com coleta de materiais, recorrendo-se aos seguintes órgãos: IEF, ICMBio,
INCRA, UFMG , UFVJM e UNIMONTES.
Posteriormente, foram realizados trabalhos de campo nas UCs e das comunidades
quilombolas com a realização de entrevistas semiestruturadascom lideres ou presidente de
associação comunitária, gestores de UCs, ONGs, órgãos públicos e pesquisadores envolvidos com a
questão. As entrevistas foram gravadas e transcritas, sendo utilizada a técnica de análise de
conteúdo, descrita por Bardin (1977). Assim, foramcriadas diversas categorias e subcategorias para
o agrupamento dos sintagmas (recortes do texto).
Destaca-se que para a realização da pesquisa o projeto obteve autorização do Comitê de
Ética em Pesquisa da UFMG, do Instituto Estadual de Florestas (IEF-MG) e do Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A criação de UCs tem sido uma prática recorrente no Brasil para assegurar a conservação
dos recursos naturais. Porém, a criação das mesmas, em geral, não leva em consideração a presença
de comunidades tradicionais, seu modo de vida e suas dinâmicas, causando uma série de conflitos
entre comunidades e órgãos gestores das UCs.

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Estes conflitos vem à tona, em geral, quando as UCs começam a ser implementadas, e estes
territórios passam a ser utilizado para a proteção ambiental, em detrimento de outros usos que as
comunidades quilombolas faziam do local.Destaca-se, então, que há a colisão de direitos
fundamentais e o choque de lógicas diferentes de uso e apropriação dos recursos naturais. De
acordo com o ICMBio:

Com base nas informações hoje disponíveis, identificou-se aproximadamente 100 unidades
de conservação federais com algum tipo de sobreposição territorial, desde terras indígenas
homologadas até territórios de uso de populações tradicionais não delimitados, passando
por territórios quilombolas em processo de reconhecimento(BRASIL. INSTITUTO CHICO
MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE, 2012, p.9).

A análise de Bensusan vai além expondo a situação para a América do Sul:

Estima-se que oitenta e seis por cento das áreas protegidas da América do Sul são habitadas
ou têm seus recursos utilizados pelas populações de seuentorno. Esse número permite
vislumbrar a perversidade embutida no modelo de áreas protegidas que exclui populações
humanas. Em outras palavras, as populações tradicionais preservam a biodiversidade de
suas terras e, justamente por suas áreas possuírem biomas preservados, acabam tendo que
se retirar delas (BENSUSAN, 2004, p.70).

Em todos os casos aqui analisados de sobreposição entre UCs e territórios quilombolas, as


soluções apontam para um rompimento das relações entre sociedade e natureza, baseando-se em
processos de recategorização, redução de limites de UCs, ou ainda realocação de parte da
comunidade, potencializando o que chamamos aqui de “epidemia”.
Estudos recentes realizados nacional e internacionalmente revelam dados impressionantes
sobreestes processos. Um levantamento do Ministério do Meio Ambienteidentificou mais de 400
projetos de lei em tramitação no Congresso que tentam redefinir os limites de UCs (ORTIZ, 2013).
Além disso, nos últimos anos, cerca de 5,2 milhões de hectares perderam o status de proteção
ambiental em função de desafetação ou redefinição de limites de UCs, segundo pesquisa publicada
na revista BiologicalConservation (MASCIA et.al., 2014). Segundo os autores, este fato não está
ocorrendo apenas no Brasil, tendo sido identificados 543 casos de recategorização, redefinição de
limites ou desafetação em 375 áreas protegidas, em 57 países dos continentes pesquisados. As
causas são diversas, mas estão centradas no acesso e uso dos recursos naturais em escala industrial
(como mineração, óleo e gás, agricultura e a construção de infraestruturas)(MASCIA et. al., 2014,
p. 357).
Este cenário fez surgira sigla PADDD2, para se referir a estes processos e a WWF e a
ConservationInternational criaram uma ferramenta online denominada PADD Tracker3 para

2
ProtectedAreaDowngrading, Downsizing andDegazettement(Recategorização, Redução de Limites e Desafetação de
Unidades de Conservação).
3
http://www.padddtracker.org/
188
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

mapear e monitorar este fenômeno em todo o mundo. No Brasil, foram identificados e mapeados
131 casos de PADDD nesta ferramenta online.
Estas análises desconstroem a noção amplamente divulgada de que as áreas protegidas estão
aumentando em número e área de abrangência e que, uma vez criadas, garantem permanentemente a
proteção da biodiversidade.Percebe-se atualmente que, quando há um grande interesse econômico
na área, o lobby ameaçando as UCs é intenso. Essa pressão sobre as UCs brasileiras se intensificou
durante os últimos anos e as ameaças sobre estas áreas é cada vez maior, com diversos projetos de
lei tentando, não apenas diminuir os limites e recategorizar UCs, mas também possibilitar o uso de
UCs de proteção integral para mineração; anular atos normativos que criaram UCs cuja
regularização fundiária não foi concluída; ou ainda Emendas Constitucionais que tentam retirar do
poder executivo a decisão de criar e extinguir UCs, Terras Indígenas e Territórios Quilombolas.
Com o novo presidente do Brasil o desmonte da área ambiental está sendo ainda maior,
sendo uma marca da nova estrutura administrativa a subordinação da agenda ambiental e de direitos
fundamentais de minorias à interesses econômicos. Assim, a perda de poder de alguns órgãos como
o Ministério do Meio Ambiente, ICMBio, INCRA, FUNAI dita a tônica do novo Governo em
retrocessos de políticas públicas construídas ao nas últimas décadas.
Esta estratégia aumenta a vulnerabilidade do meio ambiente e das comunidades tradicionais
aos ditames e pressões do capital. Destaca-se que todas as UCs e comunidades quilombolas aqui
analisadas sofrem ou já sofreram algum tipo de pressão para o avanço das fronteiras de projetos de
desenvolvimento econômico sobre estes territórios, seja relacionado à mineração, eucalipto,
agronegócio, especulação imobiliária ou uso dos recursos hídricos.
Neste sentido, as UCs de proteção integral são instrumentosimportantes que impedem ou
inibem este avanço. Claro que o fato de serem territórios quilombolas também barra alguns desses
processos. No entanto, estas comunidades são mais frágeis e vulneráveis em um eventual jogo de
forças contra o capital e o fato destes territórios ainda não estarem titulados, reduz sua proteção
legal efetiva.
Assim, entende-se que, quando se tratam de interesses decomunidades quilombolas ou
outras categorias de comunidades tradicionais no uso dos recursos naturais no interior das UCs, o
melhor caminho é a conciliação de interesses e a gestão participativa, podendo ser implementada a
dupla afetação.Desta forma,a área utilizada pelos quilombolas para sua reprodução social não
inviabiliza a presença das UCs, desde que haja o estabelecimento de acordos, critérios e normas
para a utilização dos recursos naturais.

4. CONCLUSÕES

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As comunidades quilombolas, além de serem corresponsáveis pela conservação das áreas


das UCs, possuem usos de recursos naturais, em tese, compatíveis com os objetivos do SNUC.
Assim, as comunidades quilombolas e os órgãos gestores de UCs poderiam se unir para lutar contra
atores que realmente vão contra os objetivos de conservação da natureza, como o avanço das
fronteiras agrícolas, as mineradoras, a especulação imobiliária e outros fenômenos característicos da
nossa sociedade urbano-industrial.Assim, ressalta-se o lado perverso desses conflitos, nos quais
dois lados que originalmente foram ou deveriam ser aliados (UCs e comunidades tradicionais) na
conservação dos recursos naturais, lutam e se enfraquecem mutuamente, enquanto os interesses do
grande capital sobre estas áreas só têm aumentado. Esta união é ainda mais necessária no atual
cenário de desmantelamento das políticas ambientais e daquelas relacionados aos direitos das
minorias (como os povos e comunidades tradicionais).
Destaca-se que a presença das comunidades quilombolas em UCs de proteção integral pode
contribuir com a conservação dos recursos naturais, desde que sejam estabelecidos acordos e
parcerias entre os agentes envolvidos e que sejam utilizados os instrumentos que normatizam o uso
dos recursos naturais no interior das UCs, como: Termos de Compromisso, Planos de Manejo,
Termo de Ajuste de Conduta, Termo de Autorização de Uso Sustentável ou a Autorização Direta.
Assim, a melhor alternativa é a flexibilização da gestão das UCs, para evitar perdas maiores
advindas da desafetação, redução de limites ou recategorização da área e/ou da pressão que o capital
já exerce sobre estes territórios.

5. REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Edições 70. Lisboa. Portugal. 1977.

BENSUSAN, N. Terras Indígenas: as primeiras unidades de conservação. In: RICARDO, F. (org.)


Terras Indígenas e Unidades de Conservação da Natureza: o desafio das sobreposições. São
Paulo: Instituto Socioambiental, 2004.

BRASIL. INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE. Povos


Indígenas, Quilombolas, Comunidades Tradicionais, Assentados da Reforma Agrária e
Unidades de Conservação Federais: diagnóstico e plano de ação para a gestão dos conflitos
territoriais. Brasília, 2012.

MASCIA; M. B.; PAILLER, S.; KRITHIVASAN, R.; ROSHCHANKA, V.; BURNS, D;


MLOTHA, M.J.; MURRAY, D.R.; PENG, N. Protected area downgrading, downsizing, and
degazettement (PADDD) in Africa, Asia, and Latin America and the Caribbean, 1900–2010.In.
BiologicalConservation. 2014, (355–361).

ORTIZ, F.. Mais de 400 Projetos Tramitam no Congresso para Redefinir Limites de UCs.
Disponível em<http://www.oeco.org.br/noticias/27875-mais-de-400-projetos-tramitam-no-
congresso-para-redefinir-limites-de-ucs/> Acesso em: 22/11/2016.

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MAPEAMENTO PARTICIPATIVO DO USO DOS RECURSOS


PESQUEIROS NA RESEX PIRAJUBAÉ: DILEMAS ENTRE A
TERRITORIALIDADE TRADICIONAL E OS LIMITES DA UC
PARTICIPATIVE MAPPING OF FISHERY RESOURCE USES IN THE RESEX PIRAJUBAÉ:
DILEMMA BETWEEN TRADITIONAL TERRITORIALITY AND THE MPA BOUNDARIES

Guilherme Tebet*

*Doutorando em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil. Membro do Observatório das Áreas
Protegidas (UFSC) e Diretor da ONG Coletivo UC da Ilha.

1. INTRODUÇÃO
A Reserva Extrativista (RESEX) de Pirajubaé foi a primeira reserva extrativista marinha criada
no Brasil, em 1992. Com área total aproximada de 1.440 ha, está localizada na baía sul da Ilha de
Santa Catarina, município de Florianópolis, capital do Estado. A Unidade de Conservação (UC)
abriga um dos maiores manguezais do município e área marinha adjacente composta principalmente
por um ‘baixio’ - área rasa de sedimentos areno/argilosos- (ICMBio, 2009). Este baixio é habitat de
um molusco bivalve conhecido localmente como berbigão (Anomalocardia Brasiliana). A
exploração comercial desde molusco foi o principal motivo para a criação da RESEX (TEBET,
2014).No entanto, a RESEX Pirajubaé está inserida dentro de um contexto urbano e fortemente
impactada pelo adensamento populacional e obras de infraestrutura urbana. Um exemplo
emblemático foi o aterro da baía sul. A obra concluída em 2002 gerou graves impactos
socioambientais e econômicos na RESEX e entorno. Com destaque para a destruição de parte do
próprio baixio devido a dragagem, o desaparecimento (diminuição drástica de estoque) do camarão
na localidade além de impactos sociais relacionado a perda do acesso a áreas marítimas e
desapropriação de ranchos de pesca (DEINFRA, 2011; PERREIRA, 2011). Esta dinâmica de
adensamento populacional e expansão urbana vem gerando: (I) perda de espaços de socialização
entre os beneficiários; (II) desorganização da comunidade; (III) tomada de decisão por interesses
individualistas; (IV) desinteresse na atividade pesqueira/extrativa (principalmente pelos mais
jovens) (TEBET, 2014; DEINFRA, 2011).
No verão de 2015 este contextode mudanças socioambientais ganha um novo capítulo com a
mortandade repentina e ainda sim explicação do berbigão. Estima-se que o estoque do recurso tinha
sido reduzido em mais de 80% (PEZZUTO, 2017). Este novo cenário trouxe maior visibilidade do
uso de outros recursos pesqueiros pela população tradicional. No entanto, também evidenciou que a
gestão da RESEX esteve fortemente vinculada a regulamentação do uso do berbigão,
negligenciando parte da população tradicional que não explorava este recurso. Aliás, historicamente
191
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a população tradicional nunca dependeu, em sua maioria, do berbigão(TEBET, 2014).


Oficialmente,inclusive, dos mais dos de 100 beneficiários cadastrados na RESEX apenas 25 tinham
permissão do ICMBio para exploração comercial do berbigão.
Partindo desta conjuntura de invisibilização de grande parte dos beneficiários da RESEX e
da mortandade do berbigão foi realizado um mapeamento e diagnóstico participativo das artes de
pesca utilizadas pela população tradicional não vinculada diretamente a exploração deste molusco.
Neste artigo os resultados deste mapeamento e diagnostico participativo são interpretados e
discutidos a partir da abordagem das territorialidades humanas (SACK 2014, HAESBAERT, 2006),
com o objetivo de identificar as incongruências entre os limites da UC e as áreas de pesca da
população tradicional bem como os problemas de gestão que decorrem desta incongruência.

2. MATERIAL E MÉTODO
O mapeamento e diagnóstico do uso dos recursos pesqueiros da RESEX surgiu a partir de
uma parceria entre o Centro de Pesquisa em Biodiversidade Marinha (CEPSUL/ICMBIo), a ONG
Coletivo UC da Ilha e a Fundação Municipal do Meio-ambiente de Florianópolis (FLORAM)no
âmbito da conclusão do curso de longa duração de Educação Ambiental na Gestão Pública da
Biodiversidade (ACADEBIO/ICMBIO).
Primeiramente, em parceria com a equipe gestora da UC, foram identificado dez
informantes-chaves (mestres de pesca). Desses, 6 foram entrevistados individualmente e, cada um
deles, a partir de uma foto área em tamanho grande utilizava adesivos de diferentes cores e
tamanhos para indicar áreas de uso e petrechos/técnicas utilizadas. Este primeiro momento foi
importante para que a equipe do projeto identifica-se as principais polêmicas e controvérsias além
de compreender previamente a dinâmica pesqueira na área. Depois de sistematizar os dados do
mapeamento individual foi organizada uma oficina com a participação dos dez informantes-chaves
previamente identificado (a oficina foi aberta a outros pescadores) onde a partir de uma maquete
construída participativamenteforam mapeadas as áreas de usos e os petrechos utilizados.

3. RESULTADOS
O diagnóstico realizado aponta que o camarão sempre foi o principal recurso utilizado pela
população tradicional e que após a diminuição do estoque deste recurso em decorrência da obra do
aterro houve um aumento no esforço da pesca do parati. Os pescadores destacam também que com
a mortandade do berbigão e consequentemente o abandono do uso do gancho (petrecho usado para
capturar o berbigão) no baixio foi possível notar um aumento considerável nos estoques de
camarão. Além disso, os resultados apontam que tanto a pescaria do camarão quanto do parati são

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

realizadas com maior intensidade nas áreas externas a RESEX, como evidenciado pela figura 1 e 2
abaixo.

Figura 1: Mapa da pesca do Camarão Legítimo com base na oficina participativa.

Figura 2: Mapa da pesca do parati com base na oficina participativa

4. DISCUSSÃO
No campo disciplinar da geografia humana o território é visto como um conceito que analisa
o espaço a partir das relações de poder estabelecidas. Compreende o poder como multidimensional,
não redutível apenas ao político mais também econômico e simbólico e (HAESBAERT, 2014;
SACK, 2013). Esta definição permite pensar as dinâmicas de territorialização e desterritorialização,
bem como nos abre a oportunidade de pensar em múltiplas territorialidades sobrepostas,
contraditórias e/ou complementares, que são resultado da ação, cooperação e conflito entre

193
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

indivíduos e grupos sociais que se apropriam do espaço nas mais diferentes escalas (COELHO, et
al., 2009).
Partindo desta abordagem a criação da reserva extrativista cria um território dual e
ambivalente. Isso porque a área passa a ser um espaço apropriado pelo Estado enquanto uma
política de conservação da biodiversidade e é, ao mesmo tempo, território de uso de uma população
tradicional. Ou seja trata-se de uma múltipla territorialidade, e esta dualidade é importante pois, por
mais que a RESEX tenha sido criada para garantir os modos de vida desta população tradicional,
não significa que as dinâmicas territoriais sejam uníssonas. Na criação da RESEXPirajubaé, por
exemplo, os limites definidos por lei priorizaram o espaço onde ocorria a extração do berbigão, no
entanto não levou em consideração os outros recursos naturais utilizados pela população tradicional,
ainda que a maior parte dela não dependesse diretamente da extração deste molusco. Portanto,
desde sua criação, o território da RESEX Pirajubaé não condizia com a territorialidade da
população tradicional local.
Além disso, a territorialidade da população tradicionais em decorrência do uso dos recursos
naturais é dinâmica e influenciado por diversos fatores socioambientais. A diminuição do estoque
do camarão em decorrência da obra do aterro, somado a falta de gestão voltada ao uso desde recurso
levou a uma mudança no padrão no uso dos recursos com aumento do esforço de pesca visando o
parati e em áreas externas a RESEX. Atualmente, com a mortandade do berbigão, o maior esforço
de pesca volta a direcionar-se ao camarão. No entanto, o território de uso destes recursos já não
condizem com os limites da UC dificultando que as ações de gestão sejam efetivas no sentido de
garantir um manejo sustentável dos mesmos.
Por fim, resta ressaltar que o aumento no estoque de camarão é apontado por grande parte da
comunidade como reflexo do fim do uso da gancho (instrumento de arrasto utilizado para capturar o
berbigão) no baixio, área considerado como berçário do camarão. Esta situação evidencia uma certa
disputa/conflito territorial interna a comunidade, uma vez que a apropriação do espaço (portanto
territorialização) dos extrativistas de berbigão afeta diretamente a disponibilidade de recursos e
consequentemente a áreas de atuação e apropriação (portanto territorialização) dos que tem na
captura do camarão sobre principal atividade pesqueira.

5. CONCLUSÃO
Pelo acima exposto concluímos que o território da RESEX não é congruente com a
territorialidade da população tradicional. Além disso, a territorialidade desta população é dinâmica e
heterogênea. O território criado pela UC é estático e não dá conta desta dinâmica inerente as
territorialidades tradicionais. No caso da RESEX Pirajubaé estas disparidades entre a
territorialidade tradicional e o território da UC resultaram em: (I) invisibilização histórica de grande
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

parte da população tradicional pela equipe gestora da unidade;(II) impossibilidade de criar normas
de manejo efetivas para os principais recursos pesqueiros utilizados pela população tradicional
atualmente por eles ocorrerem fora do limite da UC; (III) acirramento das disputas territoriais
internas á comunidade ao priorizar a extração do berbigão em detrimento a outros recursos.

6. AGRADECIMENTOS
Agradeço a ACADEBIO e ao curso de Educação Ambiental na Gestão Pública da Biodiversidade
que impulsionou a criação da parceria que tornou possível os resultados aqui apresentados.
Agradecimento também ao CEPSUL pelo apoio institucional e a equipe da RESEX Pirajubaé pelo
apoio logístico. Um agradecimento muito especial aos pescadores e extrativistas da RESEX
Pirajubaé

7. REFERÊNCIAS
COELHO, M.C.N; CUNHA, L.H; MONTEIRO, M.A. Unidades de Conservação: populações,
recursos e territórios. Abordagens da geografia e da ecologia política. In: Guerra, José Teixeira;
Coelho, Maria Cecília Nunes. Unidades de Conservação: abordagens e características geográficas.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil: 2009.

DEINFRA. Monitoramento Ambiental na Região de Abrangência da Via Expressa Sul:


Relatório Final 2010 – 2011. Itajaí: CTTmar – UNIVALI, 2011.

HAESBAERT, R.H.C.O Mito da Desterritorialização.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2014.

ICMBIO. Documento Consolidado da Caracterização da Reserva Extrativista Marinha do


Pirajubaé com Indicações de Estudos Prioritários e Subsídios para Construção do Plano de
Utilização e Programas de Sustentabilidade. Brasil: Ministério do Meio Ambiente, 2009.

PEREIRA, NEFERTITI BASTOS. O Impacto Ambiental do Aterro e da Via Expressa Sul no


Município de Florianópolis: Um estudo de caso junto aos pescadores da comunidade da
Costeira do Pirajubaé. Monografia de graduação – Curso de Geografia da UFSC. Florianópolis,
2011.

PEZZUTO, P.R. Biologia e pesca do berbigão na RESEX do Pirajubaé. Relatório Técnica de


pesquisa. UNIVALI: Itajai, 2017.

SACK, ROBERT DAVID.O Significado da Territorialidade. In: DIAS, LEILA CHRISTINA e


FERRARI, MARISTELA (Org.). Territorialidade Humanas e Redes Sociais. Florianópolis:
Insular, 2013.

TEBET, GUILHERME CANDIDO DE CAMPO. A Gestão dos Recursos de Uso Comum da


Reserva Extrativista Marinha de Pirajubaé. Monografia de graduação – Curso de Geografia da
UFSC. Florianópolis, 2014.

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RECONFIGURAÇÕES SOCIOESPACIAISNO PARQUE NACIONAL DOS


LENÇÓIS MARANHENSES: CONFLITOS E DILEMAS RELACIONADOS
ÀS COMUNIDADES TRADICIONAIS
SOCIO-SPACES RECONFIGURANTIONS IN LENÇÓIS MARANHENSES NATIONAL
PARK: CONFLICTS AND DILEMMAS RELATED TO TRADITIONAL COMMUNITIES

Thays Regina Rodrigues Pinho*

Departamento de Turismo e Hotelaria, UFMA, Brasil*

1. INTRODUÇÃO
Na atualidade, o crescimento do turismo é motivado, sobretudo,pela sua condição de
promotor da interação sociocultural entre os povos do mundo, associado à condição de indutor do
desenvolvimento local (UNWTO, 2018). A supervalorização do turismo, em tempos modernos, tem
suas raízes aí e associado, nas palavras de Hiernaux-Nicolas (2002), aos ideários que compõem o
imaginário turístico ocidental. São eles: a busca pela felicidade, o conhecimento do outro, o desejo
de evasão e o retorno à natureza.Ao analisar esses ideários, são perceptíveis as motivações
intrínsecas dos turistas ao buscar áreas naturais, a exemplo das unidades de conservação (UCs), para
suas práticas modernas de lazer.
Os espaços naturais protegidos e suas áreas de influência socioeconômicas se
transformaram, entretanto, em áreas de conflitos. É fato a problemática que os envolve, pela sua
utilização para diferentes usos, entre eles, o turístico, a conservação ambiental, a exploração
econômica dos recursos naturais (SILVA; RIBEIRO, 2018) e permanência de comunidades
tradicionais e suas práticas. Alcançar a coerência e o equilíbrio entre os diferentes usos é tarefa
ainda não concluída.
Uma das questões que se levanta trata da supervalorização do enfoque econômico e não
inclusão das comunidades locais nos processos de gestão dos espaços, mesmo sob uma perspectiva
de sustentabilidade turística, deixando de analisar o tema num aspecto mais amplo de articulação
entre sociedade e natureza, inerentes e complementares entre si.Distintos agentes entram num
processo de embate com vislumbre de interesses vistos como antagônicos: recreativos, econômicos
e de sustentabilidade ecológica (DIAS, 2017).
Diante desse cenário, o presente estudo objetiva apresentar os conflitos e dilemas
socioambientais associados a reconfigurações socioespaciais ligadas as questões fundiárias e
aoaproveitamento turístico em áreas do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (PNLM) e seu
entorno.
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2. MATERIAL E MÉTODOS
Ensejando uma breve descrição do objeto estudado, o PNLM está localizado no litoral
oriental do estado do Maranhão, no nordeste brasileiro, e abrange três municípios: Barreirinhas
(representando o principal acesso para esta UC e, por decorrência,local que sofre maior influência
dosfluxos turísticos), Santo Amaro e Primeira Cruz, ambos com fluxos turísticos ainda ínfimos. O
parque foi criado pelo Decreto Federal nº 86.060, de 02 de junho de 1981, com o objetivo de
preservar o ecossistema ímpar dos lençóis maranhenses, fomentar a educação ambiental e promover
a visitação pública.O ordenamento do uso da área é de responsabilidade do órgão ambiental gestor,
o ICMBio, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente.A grande extensão territorial do parque,
totalizando 155 mil hectares, constitui uma limitação à adequada gestão, pois dificulta as atividades,
sobretudo, de fiscalização e controle.
Os Lençóis Maranhenses, que compõem o ambiente característico do PNLM, são
constituídos por dunas de coloração branca, considerados uma raridade ecológica, cuja dinâmica
resulta da ação simultânea dos seguintes agentes: ventos, clima, deriva litorânea, regime de marés e
correntes marítimas (MMA; IBAMA, 2003).Entre as dunas de areias encerram-se inúmeras lagoas
perenes e temporárias que compõem o cenário de atratividade da demanda turística para a região.
No PNLM e arredores, o turismo teve início nos anos 1980, à época de sua criação, de forma
pontual e rudimentar e vinculado a eventos locais (vaquejada regional) e ações promocionais
realizadas pelo extinto órgão de turismo estadual, aEmpresa Maranhense de Turismo (Maratur).
Posteriormente, o fluxo foi incentivado com ainstitucionalização do polo turístico maranhense, o
Polo Parque dos Lençóis, no Plano Maior, e junto ao Ministério do Turismo e a construção da
rodovia MA-402, em 2002, que liga a capital São Luís a Barreirinhas.
Dentro das políticas públicas regionais de turismo, o PNLM configura-se como o mais
importante produto turístico do Maranhão e um dos atrativos principais da Rota das Emoções,
roteiro integrado que abrange 15 municípios dos estados do Maranhão, Piauí e Ceará.
Para a concretização deste estudo, estabeleceram-se práticas metodológicas descritivas e
analíticas, fundamentadas na abordagem qualitativa, com aplicação de pesquisas bibliográficas e/ou
documental, produção de dados primários e observações de campo. A coleta de dados primários,
realizada entre set./2018 a maio/2019, baseou-se em observações sistemáticas in loco, a partir de
categorias de observação previamente estabelecidas, e em entrevista semiestruturada com perguntas
abertas aplicada junto aogestor do PNLM. Para análise dos dados fez-se uso, primordialmente, da
análise de conteúdo, que possui um caráter social por ser uma técnica que objetiva produzir
inferências de um texto para seu contexto social de forma objetiva (BARDIN, 2004).

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3. RESULTADOS E DISCUSSÃOb
Nota-se que o PNLM incorporou, desde sua gênese, a vocação para a prática do turismo,
oficializada pelos órgãos ambientais competentes, que divulgam a sua alta potencialidade turística.
Hoje, seguindo a tendência mundial quanto ao uso público dos Parnas, essa vocação é replicada em
planos, programas e campanhas federais que fomentam o aumento da demanda turística com vistas
a alcançar a sustentabilidade financeira das UCs e promover a conscientização da sociedade sobre a
importância da proteção ambiental (MTUR; MMA, 2014). Dentre os mais recentes, citam-se:
“Turistando nos Parques” (2019) e “Visite os Parques” (2018).
A criação de um novo tipo de espaço, na localidade, o espaço protegido, e o consequente
zoneamento instituído pelo Plano de Manejo do PNLM, em 2003, definiram novas finalidades e
usos do espaço para as áreas do parque, que apenas passaram a ser efetivadas com a criação do
ICMBio, em 2007. Em decorrência disso, foram surgindo conflitos socioambientais ligados, em
especial, às regras de acesso aos parques e regularização fundiária.
Muito embora Dias (2017) relatou que os grupos residentes no interior do PNLM passaram a
sentir a aplicação das novas regras e intervenções dos gestores ambientais por meio de restrições,
proibições e sanções, na prática, os moradores continuaram exercendo suas atividades produtivas
cotidianas e construindo e reformando suas moradias. Existem, contudo, restrições quanto à
instalação de infraestruturas básicas urbanas que impedem melhorias nas condições de vida dessas
comunidades, como instalação de postos de saúde, escolas, vias de acesso asfaltadas etc. Para
alguns, essa condição representa um empecilho ao desenvolvimento local, para outros, no entanto,
simbolizaa geração de novas oportunidades e práticas econômicas, como o recente recebimento de
turistas nas residências rústicas das comunidades inseridas no interior e no entorno do PNLM, uma
gênese do turismo comunitário.
Em termos de uso público, admite-se a prática de atividades consideradas de uso indireto
com baixo impacto ambiental pela legislação ambiental brasileira nas UCs de proteção integral,
categoria em que se encontram os Parnas.O turismo de massas, neste contexto, é desaconselhado
pela forma como se desenvolve, com um número volumoso de pessoas em um determinado destino.
A gestão do PNLM é feita por uma equipe reduzida, o que compromete as atividades de
fiscalização e controle. Dentre as ações desenvolvidas pelo ICMBio, a que mais contribui para o
bem-estar e sustentabilidade local, é resguardar que as práticas turísticas sejam realizadas pela
própria comunidade local, melhor dizendo, que apenas a comunidade local tenha a competência
para conduzir os turistas pelos atrativos locais.
A questão fundiária é um dos temas mais controversos a ser gerenciado no PNLM, devido
aos inúmeros moradores que residem no parque e os conflitos resultantes, no tocante à permanência
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das comunidades tradicionais e as restrições de uso impostas por esta categoria de UC.Como relatou
Dias (2017), são aproximadamente 23 comunidades remanescentes no interior do parque, onde as
famílias realizam atividades, de modo combinado, como agricultura, pesca, extrativismo,
artesanato, criação de animais e outras. Com vistas a solucionar a questão, motivada por uma ação
civil pública,o ICMBiovem realizando o levantamento fundiário de todo o PNLM, materializado no
cadastramento de moradores, para posterior elaboração e assinatura de Termo de Compromisso
junto às famílias residentes.
De outro lado, futuras reconfigurações socioambientais podem ser operadas no PNLM, a
partir de um instrumento normativo em tramitação no Senado Federal. Trata-se do PL do Senado nº.
465/2018(BRASIL, 2018), de autoria do Senador Roberto Rocha (PSDB/MA) que se aprovado, irá
impactar diretamente na gestão do PNLM e nas comunidades inseridas em suas adjacências.
A proposição visa redefinir os limites do parque, a fim de promover ajustes na delimitação
realizada no seu processo de criação, mantendo a preservação dos ecossistemas que ensejaram a sua
criação e excluindo a maior parte das comunidades que estão, hoje, no interior da UC. Todavia, é
plausível afirmar que, por trás da proposta de revisão dos limites do parque, pode existir um viés
político-econômico exposto no documento, camuflado em um discurso social.

4. CONCLUSÃO

Dois pontos divergentes compõem os embates sobre as comunidades tradicionais inseridas


no PNLM: a visão idílica sobre suas práticas, usada como justificativa para sua permanência nas
áreas protegidas, e a visão preservacionista, que exige a expropriação das populações de seu lócus
habitual de moradia, por conceber a ação humana inapta ao equilíbrio ambiental. Modelos de gestão
de áreas naturais, com fins conservacionistas, podem incluir, de modo mais harmonioso, populações
tradicionais que aí residem e suas práticas produtivas.
Nesta perspectiva díspar, concorda-se com os autores, Silva Filho e Silva (2008), ao
afirmarem que se faz oportuno uma investigação, por meio de um tratamento individualizado, para
o maior detalhamento das práticas telúrico-culturais, a fim de coibir aquelas com maior impacto
lesivo ao meio ambiente e manter as que se mostraram menos agressivas e, portanto, mais
sustentáveis.
A promoção dos Parnas como atrativos potenciais para a prática do turismo, junto ao
imaginário turístico, evidencia o encadeamento da apropriação desses espaços naturais para o uso
turístico, processo denominado turistificação. Reconfigurações socioespaciais, ligadas à pressão
imobiliária, intensificação da urbanização, aumento de fluxos turísticos e mudanças nas práticas
produtivas, são percebidas, no parque e seu entorno, devido à prática do turismo.

199
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A nova configuração espacial propostaao parque,por sua vez, possui reentrâncias e recortes
territoriais que podem dificultar o controle de atividades impactantes. A redefinição de limites pode
criar outra problemática, em relação as comunidades envolvidas, pois, uma vez que estejam fora da
área do parque, não será tolerada a prática de atividades produtivas em seu interior, como vem
sendo feito com a pesca tradicional. A exclusão de áreas pode levar a ampliação da especulação
imobiliária já marcante no entorno do PNLM. Além disso, percebe-se uma maior valorização das
possibilidades de negócios do turismo do que propriamente uma preocupação ambiental e social. É
preciso, portanto, maior reflexão sobre o projeto e maior diálogo entre propositores, ministério e
gestores.

5. REFERÊNCIAS
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. 3. ed. Lisboa: Edições 70, 2004.

BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei do Senado nº. 465/2018. Altera os limites do Parque
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sustentabilidade: verso e reverso. Rio de Janeiro: Garamond, 2018.

SILVA FILHO, José Carlos Bastos; SILVA, David Leonardo Bouças da. Tratamento
individualizado: um caminho para solucionar a problemática da presença de populações residentes
em parques nacionais. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11339/tratamento-individualizado.
Acesso em: 20 maio 2019.

UNWTO. Tourism Highlights. Madri: UNWTO, 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A RECATEGORIZAÇÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E A


RELAÇÃO COM OS CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS
CONSERVATION UNITS DOWNGRADING AND RELATIONSHIP WITH SOCIAL AND
ENVIRONMENTAL CONFLICTS

Giully de Oliveira Batalha Silva*, Francisco Henrique de Oliveira**

Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental – PPGPlan, Mestra em


Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental, Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC,
Brasil.*
Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental – PPGPlan, Doutor em
Engenharia de Produção, Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC, Brasil.**

1.INTRODUÇÃO
O objetivo do presente trabalho consistiu em identificar como as recategorizações de
unidades de conservação (UC), podem estar relacionadas a algum conflito socioambiental. As UC
mundialmente conhecidas como áreas protegidas são vistas como uma ferramenta para conservação
da natureza, especialmente para proteger a diversidade biológica, não só cria-las, mas, manter uma
preocupação com a gestão destes espaços, deve ser visto como prioridade, em qualquer política
ambiental nacional (DUDLEY, 2008; GELDMANN et al., 2013).
No Brasil as UC estão dispostas em dois grupos, definidos no Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza (SNUC), o primeiro grupo é o de Proteção Integral, que tem como
principal objetivo proteger a natureza, permitindo apenas uso indireto dos recursos naturais, ou seja,
não é permitido a coleta, consumo ou qualquer atividade danosa ao recurso natural; visitação,
interpretação ambiental, atividades de pesquisas desde que com autorização são
permitidas1(BRASIL,2019).
O segundo grupo Uso Sustentável, visa conciliar a conservação da natureza com o uso dos
recursos naturais de forma sustentável. Neste grupo as atividades de coleta e consumo são
permitidas desde que, não implique no processo de regeneração natural dos recursos
renováveis2(idem).
O processo de recategorizarde uma UC, consiste em alterar a categoria na qual ela foi criada,
por exemplo, uma APA passar para a categoria de PARNA, esta possibilidade é prevista no
parágrafo 5º do art. 22 da Lei nº 9.985/2000 conhecida como SNUC, a lei dispõe sobre criação,
planejamento e gestão de UC.
1
Proteção integral, categorias: estação ecológica (ESEC), reserva biológica (REBIO), parque nacional (PARNA),
monumento natural (MONA) e refúgio de vida silvestre (RVS).
2
Uso sustentável, categorias: área de relevante interesse ecológico (ARIE), floresta nacional (FLONA), reserva de
fauna (REFAU), reserva de desenvolvimento sustentável (RDS), reserva extrativista (RESEX), área de proteção
ambiental (APA) e reserva particular do patrimônio natural (RPPN).
202
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Para Figueiredo (2014) a recategorização é a mudança da categoria de uma UC que foi


criada pelo poder público, ele considera que a recategorização pode levar em conta o aumento da
área ou supressão dela; e conclui “[...] entende-se a recategorização como uma alteração de
categoria intra ou entre grupos, seja para categorias mais restritivas ou mais permissivas, com
aumento ou redução total ou parcial de sua área” (idem).
O conceito de conflito socioambiental e abordado internacionalmente por Tuner (2005) e
Ruiz (2005) que desenvolvem uma discussão pensando o conflito socioambiental mais ligado a
escassez de recursos naturais, já nacionalmente os autores como Ribeiro (1995), Little (2001) e
Acselrad (2004) relacionam conflito socioambiental mais à questão das lutas dos grupos sociais
sobre como usar o recurso ou gerir os espaços de patrimônio natural. A diferença nas abordagens,
deve-se as realidades encontradas em cada território, observando que no Brasil, principalmente no
tocante as UC, os conflitos socioambientais já estão presentes desde o processo de criação da UC,
considerando que as primeiras UC foram criadas em situação de conflito, pois, algumas delas foram
estabelecidas em áreas previamente habitadas por comunidades tradicionais sem diálogo e
esclarecimento do que estava acontecendo.
Alguns trabalhos discutem a questão da recategorização de UC, Danielski (2012) aborda a
recategorização sob aspecto jurídico; Barbosa (2013) discutea recategorização dos Pontões
Capixabas, abordando a ideia de nova territorialidade e participação social no contexto do Parque
que passou a MONA.Farias (2017) acompanha e explica o processo de recategorização do território
Associação das Comunidades Caboclas do Ribeirão dos Camargo, de UC de Proteção Integral, para
RDS Cabocla do Ribeirão dos Camargo.
Outras pesquisas ampliando o leque de discussão incluindo ainda, os casos de alteração de
limites e desafetação de áreas protegidas ,como:Bernard et al. (2014), Pack et al. (2016), Kroner et
al. (2019) debatem sobre o futuro incerto das áreas protegidas, através do projeto identificado como
‘ProtectedAreaDowngrading, Downsizing, andDegazettement (PADDD), visando identificar os
processos de desafetação, recategorização e alteração de limites de áreas protegidas,relacionando
como esses processos implicam na perda área e efetividade da conservação da natureza.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
O recorteda presente pesquisasão os casos de recategorização, ou seja, aquelas UC que
tiveram suas categorias alteradas. No Brasil, as UC podem ser criadas nas diferentes esferas
administrativas: municipal, estadual e federal, a pesquisa considerou no levantamento de dados,
casos das três esferas.
Através da base de dados do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC) foi
realizado um levantamento quantitativo dos casos de recategorização existentes no Brasil até agosto
203
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de 2018,o banco de dados é mantido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) contando com a
colaboração dos órgãos ambientaisgestores de UC.Os dados disponíveis no CNUC, foram extraídos
no formato xls, o que possibilitou a organização dos dadosno programa MicrosoftExcel, com o
auxílio da ferramenta ‘tabela dinâmica’, prospectando uma primeira organização de informações de
ordem quantitativa.
Os dados foram organizados por esfera administrativa, posteriormente foi realizada a análise
documental (decreto ou lei de criação) e dados secundários (reportagens, artigos, trabalhos
científicos e afins), buscando identificar o motivo/conflito socioambiental que motivou a
recategorização das UC.
A disponibilidade de informações sobre as recategorizações em algumas esferas é bem
escassa, principalmente municipal, alguns casos não listados no banco de dados do CNUC foram
encontrados ao longo da análise de dados, essa ausência de informação limitou a
identificação/relação da recategorização com um conflito socioambiental, mesmo assim, resultados
foram obtidos e serão apresentados no próximo tópico.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na esfera federal, as UC geridas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio) criado em 2007, como uma autarquia especial vinculada ao MMA e
integrante o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), foram listados treze casos de
recategorização.
Quanto as motivações dos casos federais, oitocasos acontecerampara adequação a
legislação, pois, as categorias nas quais as UC foram criadas,não estavam dispostas no SNUC,
como Horto Florestal e Reserva Ecológica; um caso foi para promover a permanência de uma
população tradicional que já habitava a região antes da criação UC (o PARNA dos Pontões
Capixabas passou a MONA Pontões Capixabas para que a população pomerana pudesse
permanecer); um caso para proteção de recurso natural (água), considerando que as nascentes do
Rio Parnaíba estão no interior da UC (nesta situação parte da APA da Serra Tabatinga passou a ser
PARNA das Nascentes do Rio Parnaíba); um caso motivado pela atividade turística (ocorrido com
ESEC Anavilhanas que passou a ser PARNA Anavilhanas para permitir o recebimento de visitantes
para nadar com o boto vermelho); dois casosnão foram identificados.
Na esfera estadual e distrital (o país possui 26 estados e o Distrito Federal) as UC estaduais e
distritais são geridas por órgãos ambientais de cada estado e distrito possuem como base o SNUC,
para orientação na criação de suas UC. Alguns estados possuem Sistema Estadual de Unidades de
Conservação (SEUC), como por exemplo Rondônia, através da Lei nº 1.144 de 12 de dezembro de

204
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2002; e Tocantins, através da Lei n° 1.560, de 5 de abril 2005. Foram listados 73 casos de
recategorização na esfera estadual e distrital.
Quanto as motivações dos casos estaduais e distritais, 48 deles foram realizados buscando
adequar as categorias ao SNUC, pois, assim como as federais as UC estaduais possuíam categorias
anteriores ao SNUC, como Reserva Florestal, Parque Florestal, Reserva Estadual, Parque Botânico
entre outros. um caso foi realizado para que agricultores pudessem manter suas atividades (a
REBIO Estadual do Banhado do Maçarico que passou a RVS); um caso para garantir a proteção dos
ambientes naturais (a REBIO Mar de Espanha passou a ESEC Mar de Espanha); um caso para que
atividades turísticas pudessem ser desenvolvidas (a REBIO São Camilo passou a Parque Estadual
São Camilo);
Ainda sobre a motivação dos casos estaduais e distritais, três casos envolvendo a
permanência de populações (o Parque Estadual Nhamundá foi recategorizado para APA Guajuma
para que o população pudesse permanecer e a benfeitoria de energia elétrica pudesse passar no
interior UC; a ESECMamirauá passou para RDS Mamirauá para que a população tradicional
existente na área pudesse permanecer desenvolvendo suas atividades de subsistência, sendo este um
caso emblemático, pois, nesta altura o SNUC não tinha tal categoria prevista, e após o estado do
Amazonas aceitar a proposta de pesquisadores em recategorizar a UC para RDS, a mesma foi
incorporada no SNUC anos depois; o Parque Estadual Marinho Aventureiro que passou para RDS
Aventureiro para que os pescadores artesanais – caiçaras – pudessem permanecer ali);os
outrosdezenove casos não foram identificados.
As recategorizações na esfera municipal são mais difíceis de aferir, considerando que o país
possui 5.770 municípios. É na esfera municipal que existem muitas áreas com características de
UC, que poderiam receber a aplicação de uma categoria do SNUC, mas, recebem outras
nomenclaturas, possivelmente pelo período que foram criadas.
A motivação das recategorizações na esfera municipal, foram identificados apenas dois
casos, um foi pela permanência da comunidade de pescadores artesanais (Ilha Morro do Amaral, no
município de Joinville no estado de Santa Catarina, o Parque Municipal Ilha Morro do Amaral
passou para RDS Ilha Morro do Amaral); e um caso para proteção da biodiversidade também no
estado de Santa Catarina no município de Bombinhas (a ARIE da Costeira de Zimbros passou para
Parque Municipal visando proteger de forma mais efetiva a biodiversidade), e nove casos que não
foram identificados.
Totalizou-se 97 casos de recategorizações nas três esferas administrativas, sendo que doze
casos estão relacionados a algum conflito socioambiental, podendo ser eles por questões:
ambientais, econômicas ou sociais. No banco de dados do CNUC foi possível extrair informação

205
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

apenas dos casos concluídos, os processos de recategorização que estão em curso não aparecem
listados.

4. CONCLUSÕES
Preliminarmente, conclui-se que os conflitos socioambientais podem estar relacionados as
recategorizações de UC, embora, tenham sido identificados 97 casos, e desses, apenas 12
recategorizações foram motivadas por um conflito socioambiental. O que não inválida a
importância de preocupar-se com as recategorizações que acontecem de forma não estruturadas,
uma vez, queestas são usadas como meio de resolução dos conflitos socioambientais.
Os conflitos socioambientais em unidades de conservação podem estar presentes no
processo de criação, gestão e manejo destas áreas. Registra-se ainda, que o processo de criação de
unidades de conservação no Brasil viveu fases distintas, onde inicialmente seguiu o modelo norte-
americano de abordagem preservacionista; e mais à frente, com a especialização dos órgãos e
ocorrência de demandas por parte da sociedade, ocorreu a chegada do modelo conservacionista
proposto por Paulo Nogueira Neto após sua visita à Europa (BRITO,2008).
Caberia um processo de investigação mais extenso, afim de identificar mais elementos que
motivaram cada recategorização, por hora, é possível perceber que as motivações se repetem, talvez
coubesse um compartilhamento destas experiências, cabendo ainda a preocupação quanto a nova
categoria escolhida, quais os critérios utilizados?
É preciso acompanhamento destes processos, da mesma forma que existem estudos e etapas
a serem cumpridas quando se cria uma nova UC, a mesma acurácia deve ser dada aos processos que
implicam na alteração de uma categoria, mesmo que uma UC tenha nascido em meio de conflitos
socioambientais, trazer a recategorização como ‘remédio para todos os males’ tudo isso, precisa ser
melhor pensando, convidar para este dialogo todos os agentes envolvidos e interessados no
processo.

REFERÊNCIAS:
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Ambientais no Brasil, Rio de Janeiro: Fundação Heinrich Böll, 2004.

BARBOSA, C. S. Recategorização de Unidades de Conservação: o discurso de uma nova


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BERNARD, E., PENNA, L., ARAÚJO, E. Downgrading, downsizing, degazettement, and


reclassification of protected areas in Brazil. ConservationBiology. 28, 939, 2014.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Roteiro para criação de unidades de conservação


municipais, Secretaria de Biodiversidade, Departamento de Áreas protegidas - Brasília, DF: MMA,
2019.

BRITO, D. M. C. Conflitos em Unidades de Conservação. PRACS: Revista de Humanidades do


Curso de Ciências Sociais UNIFAP. N. 1 dez 2008.

DANIELSKI, W. R. A recategorização da Unidades de Conservação em face do princípio da


proibição do retrocesso social. Dissertação de Mestrado. Programa de pós-graduação Ciências
Jurídica, Universidade do Vale do Itajaí. Itajaí, 2012.

DUDLEY, N. Guidelines for Applying Protected Area Management Categories. Gland,


Switzerland: IUCN, 2008.

FARIAS, A.S. A. de. Dilemas da recategorização de unidades de conservação: reserva de


desenvolvimento sustentável da teoria à prática. estudo de caso comunidade Ribeirão dos
Camargo - Vale do Ribeira - São Paulo. Tese de Doutorado. PROCAM/USP. São Paulo, 2017.

FIGUEIREDO, M. F. A Proteção Constitucional dos Espaços Protegidos, a Recategorização de


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Brasileiro de Direito Ambiental (19.: 2014: São Paulo, SP) Saúde ambiental: política nacional de
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Direito por um Planeta Verde, 2014. 2v.

GELDMANN, J., BARNES, M., COAD, L., CRAIGIE, I. D., HOCKINGS, M; BURGESS, N. D.
Effectiveness of terrestrial protected areas in reducing habitat loss and population
declines.Biological Conservation, 161, 230-238. 2013.

KRONER,R. et al.The uncertain future of protected lands and waters. Science, 364, 881–886.
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LITTLE, P. E. Os Conflitos Socioambientais: um Campo de Estudo e de Ação Política. (Org.)


BURSZTYN, M. In: A Difícil Sustentabilidade: Política energética e conflitos ambientais. Rio
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RIBEIRO, R. F. Introdução à questão metodológica. In: DIEGUES, A. C. S. Conflitos sociais e


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TUNER, M. D. Political ecology and the moral dimensions of ‘‘resource conflicts’’: the case of
farmer–herder conflicts in the Sahel.PoliticalGeography, 23, p. 863–889, 2004.

207
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO NUMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO:


RELATO DE EXPERIÊNCIAS SOBRE OS CONFLITOS AMBIENTAIS NO
PARQUE ESTADUAL DOS TRÊS PICOS
POLICE ACTIVITY IN A CONSERVATION UNIT:REPORTEXPERIENCES ABOUT
ENVIRONMENTAL CONFLICT IN PARQUE ESTADUAL DOS TRÊS PICOS

Natalia Rodrigues Gomes *, Suzana Gabriela Matias do Nascimento**

Superintendência Regional Piabanha, Instituto Estadual do Ambiente, Brasil. *


Superintendência Regional Piabanha, Instituto Estadual do Ambiente, Brasil. **

1. INTRODUÇÃO
O presente resumo trata do relato das experiências obtidas durante as atividades de
fiscalização ambiental da Superintedência Regional do Piabanha, setor descentralizado do Instituto
Estadual do Ambiente – SUPPIB/INEA, realizadas no Parque Estadual dos Três Picos - PETP. A
avaliação tem como foco as vistorias realizadas no período de 2015 a 2019, no Municipio de
Teresópolis/Rio de Janeiro, na área do PETP, unidade de conservação do grupo de proteção
integral, prevista no Sistema Nacional de Unidades de Conservação, conforme Lei Federal nº.
9.985/2000.
O objetivo é a avaliação das atividades de fiscalização, seu caráter pedagógico e a
consequente alteração do comportamento da comunidade. O estudo se justifica pelos danos que
atividades como agricultura, criação de animais, implantação de loteamentos e condomínios
irregulares geram no ambiente, em razão da contaminação do solo, recursos hídricos e diminuição
da biodiversidade.
Por intermédio do levantamento do quantitativo das vistorias realizadas pelaSUPPIB/INEAe
PETP no período e das vivências dos fiscais nas diligências, foi possível verificar um maior
engajamento da população local e conscientização acerca da necessidade de conservação do
ambiente, em especial do PETP.

2. MATERIAL E MÉTODO
O PETP é uma área representativa do bioma da Mata Atlântica no Estado do Rio de Janeiro,
consideradahotspots de biodiversidade e reconhecida internacionalmente como Reserva da Biosfera,
com principal relevância para as práticas sustentáveis do seu entorno, educação ambiental e
conservação dos mananciais. O PETP abrange os Municípios de Cachoeiras de Macacu, Nova
Friburgo, Teresópolis, Guapimirim e Silva Jardim, com área total de 46.350 hectares, considerado a

208
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

maior unidade de conservação do Estado (INEA,2013).Em Teresópolis, a equipe que atua no PETP
conta com 10 guardas parque, 1 analista ambiental e 1 fiscal da SUPPIB/INEA.
A conservação da biodiversidade é essencial para a manutenção dos serviços ecossistêmicos
e para o bem estar humano. Estima-se que cerca de 10 a 20% das florestas atuais sejam convertidas
para outros usos até 2050, principalmente, em virtude da expansão agrícola (MEA, 2005). As áreas
protegidas representam 12% da cobertura terrestre. No entanto, a tendência é que os benefícios
sejam auferidos longe dessas áreas, enquanto os custos são locais e imediatos (ONU, 2010). Dessa
forma, sugere-se estabelecer sistemas de proteção “abrangentes, representativos, efetivos e
equitativos, de maneira a permitir a conservação da biodiversidade e a manter uma maior variedade
dos serviços ecossistêmicos” (ONU, 2010:33).
As parceriascom as comunidades locais e o incentivo às pesquisas sobre a percepção
ambiental da comunidade vem sendo aplicadas para conhecer e aperfeiçoar a relação do homem
com o ambiente e, por fim, conservar a biodiversidade. Afinal, a Unidade de Conservação contribui
para o desenvolvimento sustentável das economias locais e nacionais. (DA SILVA; FREIRE, 2010;
BEZERRA et al, 2018).A intervenção social encontra-se associada às formas de atuação
metodologicamente interativas e colaborativas, sob à ótica de gestão e responsabilidade partilhada,
uma vez que as conjunturas socioambientais são complexas e desiguais (GUERRA, 2002). A
simples divulgação não é suficiente a consolidar o conhecimento, se não houver interação das
vivências, culturas e hábitos na comunidade (FILHO et al, 2017). O que se almeja é alterar o
contexto social, desenvolvendo o partenariado (GUERRA, 2002).
Por intermédio de levantamento documental das vistorias realizadas no período de 2015 a
2019 e das vivências dos fiscais da SUPPIB/INEA, foi possível aferir a preocupação da população
na conservação da natureza. As vivências trazem conhecimento científico na resolução de
problemas práticos e pode ser enriquecida com a herança intelectual dos profissionais. Todos os
projetos que objetivam pôr termo a uma situação ambiental precária devem considerar as diferentes
ciências e saberes, relacionando-as, para que, no fim, se opte pela conjugação de uma ação
contextualizada (ALVEZ; ARAÚJO;AZEITEIRO, 2012).
Segundo o Plano de Manejo do PETP, quanto à proteção ambiental, os pontos fracos
residem na precariedade de recursos humanos, materiais, fiscalização e presença de caçadores e
extrativismo legal. As ameaças estão caracterizadas pelo uso intensivo e/ou descontrolado dos
recursos naturais, utilização de agrotóxico na zona de amortecimento, especulação imobiliária no
entorno, atividade pecuária e uso do fogo em pastagens (INEA,2013).

3. RESULTADO E DISCUSSÃO

209
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A Figura 1 demonstra o fluxo de vistorias realizadas na área do PETP e seu entorno, com
base em denúncias recebidas por diversos canais, ocorrências do Olho no Verde, notificações de
incêndio e requerimentos de licenciamento ambiental.
Figura 1- Quantitativo estimado anual de vistorias

Fonte: Autoras

Em meados de 2016, o PETP fixou uma nova sub-sede no Município de Teresópolis, situada
no bairro do Ermitage. Esse fator propiciou uma maior efetividade nas ações de controle ambiental
do PETP.Foram implementadas maiores ações preventivas de combate aos incêndios florestais, com
conscientização da comunidade do entorno para as questões ambientais, conservacionistas e
alertando os moradores para a existência do PETP. Em 2018, foi instalada uma base de apoio da
fiscalização da SUPPIB/INEA no PETP. Até o momento foram realizadas diversas vistorias, muitas
das vezes em conjunto com a equipe do PETP, objetivando coibir a supressão irregular de
vegetação, a extração ilegal de areia, construções irregulares em área de APP, ações preventivas de
combate a incêndios, entre outras. Tais ações conjuntas tiveram por objetivo otimizar os recursos
financeiros e os procedimentos fiscalizatórios. Por essa razão, o aumento das ações foi significativo
no ano de 2018.
Da vivência dos fiscais, pode-se aferir que os fatores de maior degradação nas ações
fiscalizatórias coincidem com intervenções de supressão de vegetação nativa, movimentação de
terra e intervenção em corpos hídricos para fins agrícolas. Frise-se que a região é um pólo
importante para o Estado no cultivo de hortaliças. Idênticas intervenções nas áreas mais urbanizadas
têm a finalidade de implantação de loteamentos irregulares. A prática conjunta de vistorias entre a
SUPPIB e o PETP contribuiu para uma intervenção social na área da unidade, refletida no aumento
das denúncias recebidas na região em 2018. A intensa atuação da fiscalização no PETP no ano de
210
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2018 refletiu na inibição dos danos ambientais no ano de 2019, na medida em que a presença do
órgão público nas comunidades como parceiro, atuando em ações prevencionistas, pode ter alterado
a consciência da comunidade para os danos ambientais.
Outro fator determinante para o aumento das demandas nos anos de 2017 e 2018 foi a
implementação do Sistema de monitoramento sistemático do uso da terra e cobertura vegetal em
todo o Estado do Rio de Janeiro – Olho no Verde, a partir de 2016. O Olho no Verde tenta coibir o
desmatamento ilegal utilizando imagens de satélites, principalmente em áreas de proteção
(INEA,s/d). As intensas ações de fiscalização no PETP no ano de 2018, além da conscientização,
podem ter sido determinantes para divulgação do Olho no Verde, de forma que a comunidade hoje
tem conhecimento do acompanhamento remoto realizado pelo INEA.
Do que pese a necessidade de realização de estudos mais aprofundados que analisem a
percepção social face à fiscalização ambiental, pode-se observar o caráter pedagógico da
fiscalização ambiental. As ações fiscalizatórias realizadas com viés educacional, de conscientização
e proximidade da população com a unidade de conservação são aptas a desenvolver o partenariado.
Busca-se a modificação do comportamento social, por intermédio da mudança de paradigma, para
que a conservação tome lugar da degradação ambiental.

4. CONCLUSÃO
As ações de fiscalização com caráter preventivo e educacional foram essenciais para
aproximar a comunidade do PETP. O desafio será buscar iniciativas inovadoras para diminuir a
pressão das atividades rurais e do crescimento urbano no PETP, face às limitações financeiras e de
recursos humanos. A implementação de políticas públicas que visem à alteração do conceito de
agricultura local para o manejo agroecológico, pode ser uma estratégia para evitar os danos
ambientais atualmente causados pela agricultura. Igualmente intensificar a presença dos guardas
parque na área urbana do entorno da Unidade, aumentar os programas de visitação e incentivar a
iniciação científica podem despertar o interesse da população para a conservação da Unidade.

5. AGRADECIMENTOS
A pesquisa realizada não seria possível sem o apoio e encorajamento do Chefe de
Fiscalização e do Superintendente da SUPPIB/INEA. A parceria entre SUPPIB e PETP, o incentivo
ao engajamento do PETP com a comunidade, na busca da diminuição dos conflitos ambientais é
fruto da idealização do Chefe do PETP. Igualmente à equipe do PETP - Teresópolis pelo excelente
trabalho de conservação realizado na região.

211
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6. REFERÊNCIAS
ALVES, F., ARAUJO, M. J., AZEITEIRO, U. Cidadania ambiental e participação: o diálogo e
articulação entre distintos saberes-poderes. Saúde em debate - Revista do Centro Brasileiro de
Estudo em Saúde, 36, 46-54. 2012
BEZERRA, G. S. C. L.; CARVALHO, R. M. C. M. O.; LYRA, M. R. C. C.; FRUTUOSO, M. N.
M. A.; BRANDÃO, S. S. F. Política Pública E O Desafio Da Participação Social Na Gestão De
Unidades De Conservação. HOLOS, [s. l.], v. 6, p. 117–129, 2018. Disponível em: < DOI:
10.15628/holos.2018.4486 > Acessado em: 4 set. 2019.

BRASIL. Lei Federal nº. 9.985 de 18 de julho de 2000.Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III
e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
e dá outras providências. Diário Oficial da União, 19 de jul. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm >. Acessado em setembro/2019. 2000.

DA SILVA, T. S.; FREIRE, E. M. X. Perception and use of fauna resources in communities


surrounding a conservation unit in northeast Brazil. Acta Scientiarum: Biological Sciences, [s. l.],
v. 32, n. 4, p. 365, 2010. Disponível em:
<https://doaj.org/article/51e879937b0a4210bdbe59f44d31735b >. Acessado em: 3 set. 2019.

FILHO, O.S., AGUIAR, A.C.M., SILVA, E.C.R., PEREIRA, T. C., FERREIRA, J. A., BORGES,
A. C. Projeto Estiva: uma iniciativa de gestão de resíduos sólidos urbanos em comunidades de baixa
renda. Elo, Vol 6, Iss 3, (3), 2017. Disponível em doi:10.21284/elo.v6i3.273, acessado em
Acessado em: 3 set. 2019.

GUERRA, I. Fundamentos e Processos de Uma Sociologia de Acção. - O planeamento em


Ciências Sociais. Cascais: Princípia. 2002

INEA - Instituto Estadual do Ambiente. Parque Estadual dos Três Picos: plano de manejo
/resumo executivo./ Instituto Estadual do Ambiente. Rio de Janeiro: INEA, 2013.

INEA -Instituto Estadual do Ambiente. Monitaramento do Uso e Cobertura. Rio de Janeiro.


Disponível em http://www.inea.rj.gov.br/biodiversidade-territorio/olho-no-verde/ acessado em
set/2019. S/D.

MEA - Millennium Ecosystem Assessment. Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity


Synthesis. World Resources Institute, Washington, DC. 2005.

ONU –Organização das Nações Unidas. TEEB.A economia dos Ecossistemas e da


Biodiversidade: Integrando a economia e a natureza. Uma síntese da abordagem, conclusões e
recomendações do TEEB.2010.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ESTUDO COMPARATIVO ENTRE A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL


NOBRASIL E NA COLÔMBIA CORRELACIONADO AOS IMPACTOS
SOCIOAMBIENTAIS NA ZONA COSTEIRA
COMPARATIVE STUDY BETWEEN ENVIRONMENTAL LEGISLATION IN BRAZIL AND
COLOMBIA RELATED TO SOCIAL AND ENVIRONMENTAL IMPACTS ON THE
COASTAL ZONE

Sofia Serrano Scheibler*; Carlyle Torres Bezerra de Menezes**; Samira Becker Volpato**

*Curso de Engenharia Ambiental, Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, Brasil, dinosofi@hotmail.com
** Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais, Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC, Brasil,
cbm@unesc.net; samiravolpato@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
O crescimento desordenado de aglomerações urbanas, bem como as deficiências dos
sistemas de planejamento e saneamento básico vêm gerando nos últimos anos severos impactos
sobre os ambientes costeiros. A dinâmica demográfica é resultado de processos históricos
socialmente construídos, característicos de um determinado tempo e espaço, o que explica as
grandes diferenciações existentes entre países, entre regiões dentro de um mesmo país, e entre
grupos sociais de uma mesma região (CARMO; MARQUES; AMARANTE, 2012).
As questões ambientais transpassam fronteiras e demandam um entendimento das normas
ambientais e suas interpretações nas diferentes culturas e países. Brasil e Colômbia compartilham
características que impactam sobre sua vulnerabilidade ambiental. Ambos países estão em vias de
desenvolvimento, grande parte de seu território pertence à zona costeira, os dois adotaram um
modelo histórico de crescimento econômico baseado na expansão da fronteira agrícola sobre as
áreas florestais e a extração de recursos minerais. Portanto, as políticas direcionadas para a
conservação e proteção ambiental destes países tropicais precisam de uma estrutura de normas que
considere suas especificidades sociais, ambientais, políticas, culturais e econômicas (SPADOTTO
et al., 2017).
A proposta deste trabalho surge a partir da necessidade de buscar compreender as
transformações decorrentes do crescimento demográfico desordenado e da constante ocupação de
espaços considerados com grande sensibilidade aos impactos socioambientais na zona costeira.
Neste sentido, esta pesquisa teve como objetivo geral a realização de um diagnóstico dos impactos
socioambientais de empreendimentos imobiliários na zona costeira, com o estudo de caso, por meio
da análise de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), suas possíveis fragilidades, e o
descumprimento da legislação ambiental. Este trabalho também realizou uma análise comparativa

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

entre a legislação brasileira e colombiana no que diz respeito a Avaliação de Impacto Ambiental e a
legislação incidente sobre o ambiente costeiro em ambos os países. Tal enfoque justifica-se tendo
em vista a existência de conflitos socioambientais similares e as pressões sobre os ambientes
marino-costeiros existentes nestes dois países, que possuem uma extensa linha de costa. A origem
colombiana de uma das autoras também motivou o interesse em um estudo acadêmico desta
natureza.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
O presente trabalho teve um caráter de pesquisa qualitativa. O levantamento de dados
contou também com uma análise documental. Junto com a investigação cientifica bibliográfica e
análise documental e estudo de caso.

2.1 DELIMITAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO


A área de estudo do presente trabalho, corresponde ao litoral centro Sul Catarinense sendo
possível enquadrar dentro do estudo a porção continental correspondente à costa a partir do norte da
Ilha de Santa Catarina, em Florianópolis até o munícipio de Balneário Rincão, onde encontra-se
situada uma importanteunidade de conservação regional, a Área de Proteção Ambiental - APA - da
Baleia Franca, localizada no Sul do Estado de Santa Catarina.

2.2 PROCEDIMENTOS DE OBTENÇÃO E ANÁLISE DE DADOS


Dentro desta fase, desenvolveu-se uma análise da legislação ambiental para a avaliação de
EIAs/RIMAs no Brasil, no que diz respeito à sua aplicação em ambientes costeiros, sendo realizado
também um estudo comparativo com a legislação da Colômbia. Para uma maior compreensão e
aplicação da temática investigada, foi analisado como aplicação e estudo de caso, o EIA/RIMA de
um empreendimento na zona costeira no Estado de Santa Catarina, o Projeto Porto Baleia.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
3.1 ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA E COLOMBIANA
Do ponto de vista da análise da legislação ambiental brasileira e colombiana aplicada à zona
costeira, no presente trabalho buscou-se identificar similitudes, diferenças e melhorias que uma
poderia contribuir para o seu aperfeiçoamento nos respectivos países.
No que diz respeito a legislação incidente no ambiente costeiro de ambos países, no Brasil a
Lei Nº 7.661 de 16 de maio de 1988 institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e na
Colômbia a Lei 1450 de 2011, expediu o decreto 1120 do 31 de maio de 2013, que regulamenta
as “Unidades Ambientales Costeras – UAC” e as “Comisiones Conjuntas”. No que se refere ao
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

planejamento costeiro, é possível identificar duas estratégias diferentes entre ambos países, em parte
devido possivelmente a diferença em termos de extensão territorial existente entre os dois países.
No caso da Colômbia, as UAC são determinadas conforme a legislação, considerando
principalmente as suas caraterísticas, existindo atualmente dez unidades no território nacional. A
partir da sua criação é implementado o plano de manejo da área, com a participação do órgão
ambiental ou de uma comissão conjunta criada especialmente para tal finalidade. A criação de
unidades especificas para a conservação se assemelha com os pressupostos previstos do Sistema
Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, seja unidades de conservação – UCs, de proteção
integral ou de uso sustentável.
Quanto aos requisitos existentes para o estudo de impacto ambiental nos dois países, no
Brasil a Resolução do CONAMA 01/1986 e na Colômbia a Metodología general para la
presentación de estúdios ambientales, apresentam o caminho a ser seguido para fins de
licenciamento ambiental. As diretrizes existentes em ambos os países para a elaboração de Estudos
de Impacto Ambiental apresentam algumas similitudes, ou princípios básicos, como o diagnóstico
prévio da área e os impactos positivos e negativos que possa vir a gerar o empreendimento nas suas
diferentes fases.
O principal diferencial situa-se no fato dos EIAs na Colômbia precisar de um levantamento
econômico a partir da quantificação dos impactos, no zoneamento das áreas a serem utilizadas e na
normativa que estima o investimento do 1% do valor total em obras de preservação da Bacia
hidrográfica. A normativa brasileira tem como principal diferencial a exigência da apresentação de
três alternativas tecnológicas e/ou locacionais do empreendimento confrontadas com a possibilidade
de não realizar o mesmo.
3.2 CONFLITOS DECORRENTES DE MEGAPROJETOS IMOBILIARIOS EM ÁREAS DE
PRESERVAÇÃO AMBIENTAL
Buscando identificar conflitos na zona costeira resultantes de impactos ambientais de
empreendimentos imobiliários, neste trabalho foi realizada a análise de um Estudo de Impacto
Ambiental de empreendimento imobiliário de grande porte, o Projeto Porto Baleia, proposto para
ser instalado na interface entre duas unidades de conservação marinho-costeira, a APA do Entorno
Costeiro e a APA da Baleia Franca, e do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro.
O Projeto Porto Baleia
Conforme os dados do EIA/RIMA do projeto Porto Baleia, este empreendimento tratava de
um projeto de parcelamento do solo com o intuito de constituir uma urbanização, configurando-se
como um projeto de grande porte e com fortes impactos ambientais na zona marinho-costeira, aí
incluída uma extensa área de restinga. A sua implementação compreendia diversas etapas de até a
sua finalização prevista para 20 anos depois de iniciada a construção, especificamente para o ano
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2035. O projeto apresentava quatro alternativas para implementar na área a ser ocupada, dentre elas
a denominada Hipótese Urbanística Sustentável com Aeródromo que teria como consequência o
adensamento limitado a 13 a 15 mil pessoas mais aeródromo.
Este fato representa um dos principais erros e deficiências identificados, e corrobora com as
fragilidades encontradas na avaliação de diversos EIAs/RIMAs, no qual o fato dos
empreendimentos em geral não apresentarem um estudo aprofundado de outros projetos possíveis e
alternativas locacionais, via de regra viabiliza-se como única opção apenas aquela que é do
interesse do empreendedor. E isto, muitas vezes apresentando dados muitas vezes inconsistentes ou
incompletos a fim de assegurar o descarte imediato daquelas alternativas que não sejam
interessantes por parte do empreendedor.
A partir da análise do EIA/RIMA deste empreendimento foi possível identificar várias
fragilidades quanto à coleta de informações, a qual foi feita de maneira superficial a fim de não
identificar ou apresentar situações que pudessem comprometer o andamento do empreendimento.
Ao longo das etapas de avaliação do projeto, tanto por parte do órgão ambiental estadual, e
corroborado por estudos independentes que analisaram o EIA/RIMA deste projeto, constatou-se
diversas lacunas e fragilidades, o que culminou com a revogação do processo de licenciamento
ambiental. Um aspecto bastante significativo que contribuiu para a não continuidade deste
megaempreendimento foi uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN, bem como uma ação
por parte do Ministério Público Estadual de Santa Catarina – MPSC, no que diz se refere a questão
da recategorização do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro ocorrida no ano de 2009.
Um outro aspecto identificado neste empreendimento Projeto Porto Baleia foi a
predominância de interesses privados, prevalecendo sobre o uso dos recursos comuns. No entanto,
neste caso a mobilização da sociedade, do Ministério Público e de pesquisadores e profissionais
independentes especialistas em estudos ambientais, que analisaram os estudos de impactos
ambientais, possibilitaram a reversão deste processo, com a suspensão do processo de licenciamento
ambiental.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ocupação do litoral brasileiro é fruto das formações socioeconômicas que se constituíram
por meio de uma trajetória caracterizada pela diversidade ambiental e cultural, e por desequilíbrios
sociais e econômicos, e apesar da tendência atual da desconcentração populacional e da formação
de novas territorialidades urbanas não metropolitanas no interior do país, ainda persiste o
movimento crescente no sentido da concentração populacional na zona costeira (MORAES, 2007).
Apesar do Brasil contar com um importante arcabouço normativo e legal, que tem por
objetivo a proteção ambiental e o ordenamento territorial, não é difícil encontrar exemplos de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

empreendimentos e projetos que apesar de contar com as licenças ambientais, descumprem vários
aspectos técnicos e legais e estão situados em áreas de grande relevância socioambiental. A análise
da legislação brasileira e colombiana no que diz respeito a conservação da biodiversidade
demonstram, primeiramente, que a tutela jurídica evoluiu nos últimos anos, e que caminha em
conformidade com a crescente preocupação desses países em se adequarem à convenção
internacional estabelecida. Dentro deste contexto, a CDB (Convenção da Diversidade Biológica) é
um marco importante em termos de proteção da diversidade biológica, e entre seus objetivos e
princípios determina que os países devem desenvolver estratégias, planos ou programas específicos
para a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica (BACHEGA et al., 2017)
No entanto, ainda é muita incipiente iniciativas de valorização dos conhecimentos de povos
e comunidade tradicionais e a participação da sociedade na criação e gestão de unidades de
conservação. Marroni e Asmus (2005) apontam que a participação pública nos processos de tomada
de decisão em sistemas de gestão integrada e participativa vem conseguindo avanços no país. Sendo
estes um dos desafios cruciais a ser levado em conta no que diz respeito à criação de alternativas no
esforço de sensibilização para as questões socioambientais dos tomadores de decisão na gestão
pública, e a participação das comunidades locais, de forma também articulada com o saber
produzido nas instituições acadêmicas, de maneira a integrar, o ensino, a pesquisa e a extensão.Os
conflitos socioecológicos ocorridos nos últimos anos nas zonas costeiras têm refletido a reprodução
das políticas hegemônicas capitalistas no ordenamento territorial.No entanto, as sementes de um
outro modelo de desenvolvimento podem ser identificadas.
Neste sentido, autores latinos americanos, tais como o colombiano Arturo Escobar (2005),
em uma de suas importantes contribuições teórico-conceituais, aponta de forma crítica que, quase
sempre suportados por interesses de governos e setores políticos e econômicos, a “ideologia do
desenvolvimento” surge como uma necessidade imposta enquanto alternativa para a melhoria das
condições de vida, de uma população ou região. No entanto, no entanto, o que constata-se é o
processo de “des-envolvimento”, ou seja, o tirar o envolvimento (a autonomia) que cada cultura e
cada povo mantêm com o seu espaço, com seu território; o subverter o modo como cada povo
mantém suas próprias relações de homens e mulheres entre si e destas com a natureza.

5. REFERÊNCIAS
BACHEGA, L.R.; ESPÍNDOLA, I. B.; NEVES, L. L.; MOSCHINI, L.E. A tutela jurídica da
biodiversidade no Brasil e na Colômbia pós-1992: considerações e perspectivas atuais.
Sustentabilidade em Debate - Brasília, v. 8, n.1, p. 141-151. 2017

CARMO, R.L.; MARQUES, C.; MIRANDA, Z.A.I. Dinâmica demográfica, economia e


ambiente na zona costeira de São Paulo. Campinas, SP: Núcleo de Estudos da População,
UNICAMP, 2012. 110 p
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ESCOBAR, Arturo. Lugar da natureza e a natureza do lugar: globalização ou pós-desenvolvimento?


In: LANDER, Edgardo (Org). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais –
perspectivas latino-americanas. Buenos Aires: CLACSO, 2005. p. 69- 86
MARRONI, E. V; ASMUS, M. L. Gerenciamento Costeiro: Uma proposta para o fortalecimento
comunitário na gestão ambiental. Pelotas: Editora da União Sul-América de Estudos da
Biodiversidade - USEB, 2005. 149p.

MORAES, A.C.R. Contribuição para a gestão da zona costeira do Brasil : elementos para uma
geografia do litoral brasileiro. São Paulo : Annablume, 2007.

SPADOTTO, A. J.; Barreiro, M. D. P. R.; Medeiros, G. A. Inferências sobre a lei brasileira de


crimes ambientais em comparação ao código penal colombiano. Veredas do Direito, Belo
Horizonte, v.14, n.28, p.221-249. 2017.

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A MATA DE SANTA GENEBRA E SEU ENTORNO – UM ESTUDO DE


CASO SOBRE A GESTÃO TERRITORIAL E A INCLUSÃO SOCIAL
MATA DE SANTA GENEBRA AND ITS SURROUNDINGS - A CASE STUDY ON
TERRITORIAL MANAGEMENT AND SOCIAL INCLUSION

Augusto de Oliveira Brunow Ventura, Camila de Sousa Medeiros Torres Watanabe, Lucas Cesar
Gouvea Barbosa1

Fundação José Pedro de Oliveira.

1. INTRODUÇÃO
O art. 2º da Lei Federal n. 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC) (BRASIL, 2000), define Zona de Amortecimento como sendo o entorno de
uma Unidade de Conservação (ZAUC) onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e
restrições específicas com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade.
O presente trabalho pretende demonstrar, por meio do relato de um casode ocupação
irregular na ZAUC da Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) Mata de Santa Genebra
(MSG), a existência de uma prática de Gestão Ambiental Pública (GAP) dependente de decisões
unidirecionais e tomadas em um contexto de conflito.

2. MATERIAL E MÉTODO
A ARIE MSG, Unidade de Conservação (UC) Federal, com área de 251,77 hectares e um
perímetro de 9 Km, protege o maior remanescente florestal da Região Metropolitana de Campinas
(SP), um refúgio para diversas espécies, algumas sob risco de extinção no país, como o gato-do-
mato (Leopardustigrinus), a onça-parda (Puma concolor), a palmeira-juçara (Euterpe edulis) e a
canela-sassafrás (Ocotea odorífera). Sua fitofisionomia principal é a Floresta Estacional
Semidecidual (BRASIL, 2010), um tipo de vegetação que no passado cobriu a maior parte do
Estado de São Paulo, mas hoje é uma das mais devastadas do país.
A gestão da UC é compartilhada entre o Instituto Chico Mendes para Conservação da
Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, e a Fundação José
Pedro de Oliveira (FJPO), ente da administração indireta da Prefeitura Municipal de Campinas.
A ZAUC foi delimitada no Plano de Manejo da UC considerando-se elementos de influência
na proteção dos recursos naturais (BRASIL, 2010) e revisada em 2012 pela Portaria Conjunta n.
01/2012 - PMC/PMP/FJPO, a qual dispõe sobre as diretrizes e normas para o uso e ocupação da
ZAUC, propondo uma nova delimitação incluindo áreas urbanas (CAMPINAS, 2012) (Fig. 01).
1
augusto.ventura@fjposantagenebra.sp.gov.br; camila.torres@fjposantagenebra.sp.gov.br; lucasc.barbosa@hotmail.com

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A área de ocupação irregular localmente conhecida como “Área do Pastor” estava localizada
além dos limites da UC até o ano de 2014, mas dentro da ZAUC (Figs. 01 e 02).

Figura 1 - Delimitação da ARIE MSG em verde. Atual delimitação da Zona de Amortecimento (ZAUC),
segundo a Portaria Conjunta n. 01/2012 - PMC/PMP/FJPO (CAMPINAS, 2012), em vermelho. Fonte da
imagem: Google Earth. Imagem obtida no ano de 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 2 - Detalhe da Área do Pastor - área delimitada em branco. Delimitação da ARIE MSG em verde.
Fonte da imagem: Google Earth. Imagem obtida no ano de 2012.

O presente relato baseia-se em informações retiradas do Inquérito Civil nº


1.34.004.001649/2012-16, que foi instaurado pelo Ministério Público Federal para apuração dos
fatos envolvendo as ocupações irregulares na ZAUC da ARIE MSG, em pareceres técnicos dos
setores responsáveis pelo acompanhamento do processo, e em comunicações orais com sujeitos
diretamente envolvidos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. A Área do Pastor
Em meados dos anos 2000 uma área de 30m² foi ocupada para a construção de uma
residência em uma gleba pública. Com o decorrer do tempo passou a ser composta por três

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moradias, uma igreja, e um amplo quintal em Áreas de Preservação Permanente (APP) da nascente
do Córrego do Guará, chegando a ocupar 2.100m² (Fig.2). A cerca que delimitava a UC foi
removida pelos ocupantes da área, permitindo livre circulação de pessoas e animais domésticos por
áreas internas à UC.
Em 2014, após comunicada pela FJPO a respeito dos impactos ambientais causados no local,
como redução da cobertura vegetal, contaminação de nascente por efluentes domésticos,
compactação do solo e descarte de resíduos sólidos em APP, a Secretaria Municipal de Habitação
(SEHAB) promoveu o cadastramento socioeconômico das famílias ocupantes e enquadramento
destas em programa habitacional e, posteriormente, demoliu as edificações ali instaladas. Não há
informações nos autos do processo a respeito do destino das famílias desapropriadas. Após a
desocupação, a área foi integrada à UC através de novo cercamento, iniciando-se trabalho de
restauração ecológica.
Apesar dos benefícios resultantes da integração da Área do Pastor à UC, o processo
demonstrou carência de articulação entre os órgãos do Poder Público responsáveis pela gestão
intersetorial no local. Não houve prévia comunicação por parte da SEHAB à FJPO quanto à data de
desocupação e posterior demolição das construções, embora integrantes da mesma esfera de
governo. Ainda se observou uma série de eventos e tomadas de decisões pautadas em uma visão
dicotômica do meio. A exemplo disto, as ações tomadas pela FJPO foram pontuais e unidirecionais
apontando apenas impactos negativos ambientais no local da ocupação.
O caso da Área do Pastor remete ao grave cenário de decisões unidirecionais e
compartimentalizadas, que tratam como opostas políticas públicas que, se integradas, poderiam
conduzir a resultados mais satisfatórios e socialmente sustentáveis. Além disso, os autos do
processo de desocupação demonstram não só a falta de diálogo entre órgãos do Poder Público, mas
também certa inércia ou incapacidade reiterada destes em melhorar a situação.2 Ademais, a
qualidade de acesso à informação tem sido um problema evidente em casos dessa natureza,
conforme demonstrado:

As informações não são precisas nem com relação aos projetos de intervenção em si,
ou seja, os rumos da cidade, nem mesmo com relação à forma de atendimento que
será dado às famílias, configurando além de violação da lei de acesso à informação,
violação à ordem urbanística pela ausência de condições para participação popular
no planejamento da cidade como nos projetos de intervenção urbana implementados
pelo Estado(SAULE JÚNIOR e DI SARNO, 2013:13).

2
BRASIL, 2015. Supremo Tribunal Federal - STF. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental: ADPF
347. Relator: Ministro Marco Aurélio. DJ: 09/09/2015. Disponível em:
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?doctp=tp&docid=10300665. Acesso em: 05 set. 2019.
222
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

3.2. Conflitos deflagrados no Córrego do Guará


A fragmentação e degradação florestal são fenômenos alarmantes na região próxima à ARIE
MSG e na ZAUC. Ações que visem a reversão deste cenário, como a restauração de áreas
degradadas e a implementação de corredores ecológicos entre fragmentos florestais locais e
regionais são instrumentos de gestão prioritários à conservação da biodiversidade da UC.
A Resolução conjunta FJPO/SVDS nº 01/2017 (CAMPINAS, 2017), em acordo com o
Plano Municipal do Verde, criado pelo Decreto Municipal nº 19.167/2016 (CAMPINAS, 2016),
confere alta prioridade para restauração ecológica ao trecho do córrego do Guará próximo à ARIE
MSG com o objetivo de criação de um corredor ecológico que conecte a UC a fragmentos florestais
próximos. Contudo, há dificuldades por parte do Poder Público em promover estas ações, assim
como em efetivar os propósitos da ZAUC.
Em outros dois casos semelhantes à Área do Pastor, os quais tiveram início da ocupação
aproximadamente no ano de 1993, em área de APP das margens do Córrego do Guará, e que estão
em processo de desapropriação, também se tem observado mínima articulação entre órgãos
públicos. Existem hoje nestes locais aproximadamente 100 famílias ocupando construções
clandestinas. Esta situação inviabiliza a implantação de rede de saneamento básico, causando danos
ao córrego devido ao despejo de efluentes domésticos diretamente em seu leito.
No ano de 2012, visando a solução do conflito, a Prefeitura firmou Termo de Ajustamento
de Conduta (TAC) com o Ministério Público Estadual, se comprometendo a reassentar as famílias,
através do programa do governo federal Minha Casa Minha Vida, no novo empreendimento
imobiliário denominado Residencial Takanos, o que se concretizou no final do ano de 2014.
Em entrevista concedida por uma antiga moradora do Jardim Novo Real Parque, bairro onde
estão localizadas as residências irregulares, e que foi reassentada junto à sua família, ficaram
evidentes alguns dos problemas enfrentados pelos moradores. A ocupação, que teve início em
meados dos anos 90, não foi alvo de políticas públicas relevantes e a população sofre com a falta de
saneamento básico. Segundo a ex-moradora a primeira ação efetiva do Poder Público foi o processo
de reassentamento.
Muitos moradores resistiram à ideia de deixar seus lares. Um dos aspectos que demonstra a
vulnerabilidade dos atingidos pelo processo de desocupação e reassentamento, e que torna este tipo
de processo especialmente delicado, é o vínculo que os moradores desenvolvem com o local onde
várias gerações nasceram e cresceram. Por quase três décadas os moradores estabeleceram estreitos
laços com o local e região próxima, desenvolvendo todos os aspectos de suas vidas. Ainda de
acordo com a ex-moradora, muitas famílias reassentadas continuam trabalhando, levando seus
filhos às escolas e visitando frequentemente amigos e familiares na região do Jardim Novo Real
Parque.
223
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Outro fator relevante à resistência dos moradores a saída do local foram os gastos que
teriam por morar em um local regular pois, ao invés de pagar somente a conta de água, como era no
Jardim Novo Real Parque, ao serem reassentados passariam a pagar também o financiamento do
apartamento, energia elétrica, condomínio, IPTU e demais despesas.
Merece destaque o fato de que os reassentados no Residencial Takanos sofrem com a falta
de acesso às políticas públicas, de serviços e equipamentos urbanos, de escolas, de postos de saúde
e de transporte público adequado, haja vista a importância desses elementos para que se configurem
moradias dignas (comunicação oral)3
Após a desocupação algumas casas foram parcialmente demolidas pela SEHAB, porém,
devido à dificuldade de acesso ao local e a ausência de coesão entre o esforço dos particulares e o
do Poder Público, estas construções estão em condições de escombros. O cenário observado
atualmente é de uma situação extremamente danosa ao meio ambiente e igualmente perigosa aos
moradores (Fig 3).

3
LÉLIS, Natália de Souza, 2019. Natália de Souza Lélis: entrevista [nov. 2019]. Entrevistadores: Augusto de Oliveira
Brunow Ventura e Lucas Cesar Gouvea Barbosa. Campinas: Fundação José Pedro de Oliveira, 2019. Áudio em mp3.
Entrevista de Natália de Souza Lélis concedida no âmbito da Fundação José Pedro de Oliveira - ARIE Mata de Santa
Genebra, Campinas, SP. Entrevista na íntegra disponível em:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:L%C3%89LIS,_Nat%C3%A1lia_de_Souza._Entrevista_-
_nov._2019.ogg#%7B%7Bint%3Afiledesc%7D%7D. Acesso em: 10 nov. 2019.
224
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 3 - Lélis, Natália de Souza. Imagem de ocupação demolida às margens do Córrego do Guará.. 2019.
Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1XZ1qJ-Sg3L8zRWiC87cyX-
Onp5emcnDi/view?usp=sharing. Acesso em: 09 nov. 2019.

Logo após à desocupação, no final de 2014, várias residências foram reocupadas, assim,
antigos moradores acreditam terem sido retirados de suas casas em vão, já que estas seguem
ocupadas e o descarte irregular de esgoto continua acontecendo. Por essa razão a municipalidade
ingressou, no início de 2015, com ação de reintegração de posse com pedido liminar, o qual foi
indeferido por falta de provas da reocupação. Por conseguinte, no mesmo ano, a Prefeitura agravou
a decisão e obteve resultado favorável no Tribunal de Justiça de São Paulo. Após um longo período
de recursos interpostos pelos moradores, o agravo chegou, no segundo semestre de 2019, ao
Supremo Tribunal Federal, o qual negou provimento, mantendo a decisão de segunda instância
favorável à reintegração de posse.

225
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Assim, salienta-se mais uma vez a latente falta de comunicação entre os órgãos do Poder
Público, visto que mais um processo de desocupação caminha para seu desfecho sem que a FJPO
seja sequer notificada das ações tomadas pelos órgãos do Poder Público municipal.
Os fatos descritos corroboram as premissas do presente documento, que versa a respeito da
atuação unidirecional e desarticulada do Poder Público. É premente que sejam adotados
procedimentos mais adequados à solução de conflitos fundiários (SAULE JÚNIOR e DI SARNO,
2013; CDESC, 2017), assim como à gestão territorial, a fim de evitar quaisquer violações de
direitos fundamentais das partes envolvidas.

3.3.A participação social como elemento fundamental nos processos de Gestão Ambiental
Pública (GAP) e na Conservação da Biodiversidade
A Constituição da República Federativa do Brasil traz em seu artigo 225:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso


comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público
e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.(Brasil, 1988).

Reciprocamente, os processos de uso, apropriação e transformação do meio são gerados


através das ações de múltiplos sujeitos sociais distintos e, portanto, estão condicionados à interesses
individuais e coletivos comumente antagônicos. Assim, a premissa do dever coletivo em gerenciar
problemas ambientais, por um lado, e a concepção da sociedade como o lugar dos conflitos, de
outro, demonstra que além de um conjunto de ferramentas técnicas de manejo e controle ambiental
a GAP é, essencialmente, um processo de mediação de conflitos de interesses (QUINTAS, 2006). A
mediação de tais conflitos depende do contínuo estímulo e criação de espaços de comunicação e
aprendizagem, a fim de se reduzir assimetrias empecivas à uma Gestão Ambiental Pública
efetivamente democrática, instrumento indispensável aos processos de promoção da Justiça
Ambiental.
A participação social tem sido cada vez mais valorizada no âmbito da gestão de Unidades de
Conservação Federais pelo ICMBio. Os mecanismos de participação e representação, tal como o
princípio da paridade entre Estado e Sociedade Civil, e a representação de grupos sociais
vulneráveis, são reforçados com a evolução das normativas federais.
O SNUC define, em seu artigo 5º, inciso III, que o mesmo será regido por diretrizes que
assegurem a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das
unidades de conservação, apontando, desta forma, o importante papel das comunidades do entorno
de uma UC na sua gestão e efetividade de seus objetivos (BRASIL, 2000).

226
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A Instrução Normativa ICMBio nº 9/2014, que rege sobre a formação, implementação e


modificação na composição de Conselhos Gestores de Unidades de Conservação Federais,
estabelece em seu artigo 9°, inciso V, que a formação dos Conselhos das Unidades de Conservação
federais deverá levar em conta a paridade, a representatividade, a equidade na participação e o
potencial em contribuir para o cumprimento dos objetivos da Unidade de Conservação e sua
inserção territorial (ICMBIO, 2014). Neste sentido o Conselho Gestor pode ser compreendido como
um pacto social no objetivo comum de realizar a gestão territorial, implicando em compromissos
entre o órgão gestor da UC e os setores4 sob influência desta.

4. CONCLUSÃO
Procurou-se demonstrar aqui a deflagração do conflito entre o direito à Moradia e o direito
ao Meio Ambiente saudável, situação recorrente no país, ocasionado pela carência de atuação
intersetorial e continuada do Poder Público.
Segundo QUINTAS (2006), o Poder Público tem papel central na mediação de conflitos,
pois detém poderes e obrigações estabelecidos na legislação que lhe permite disciplinar o uso de
recursos naturais e a ocupação do território. Por outro lado, observa-se que, no Brasil, os processos
de tomadas de decisão estão assimetricamente distribuídos, sob encargo de determinados atores
sociais detentores de poderes outorgados pela sociedade, que possuem capacidade variada de
influenciar na transformação do meio e, consequentemente, na qualidade de vida das populações ao
tomarem suas decisões. Estes atores nem sempre levam em conta os interesses e necessidades das
diferentes camadas sociais afetadas. O Estado, ao tomar determinada decisão no campo ambiental
está, portanto, definindo quem arca com os custos e quem recebe os benefícios advindos da ação
antrópica sobre o meio.
Os casos relatados revelam a prática de uma GAP pautada em decisões
compartimentalizadas e tomadas a partir de visões subjetivas e fragmentadas do meio, concorrendo
à grave dificuldade de efetivação de políticas públicas de gestão do território, de democratização de
seu uso e de ordenamento da ocupação humana sobre áreas ambientalmente protegidas. No intuito
do desenvolvimento de uma GAP eficiente, evidencia-se a importância da atuação integrada entre
órgãos do Poder Público e as populações diretamente afetadas, evitando-se, assim, a violação de
direitos fundamentais.
Conforme o bloco de constitucionalidade que orienta o ordenamento jurídico brasileiro
conclui-se que uma gestão territorial participativa, além de instrumento à coletividade em seu dever

4
De acordo com o artigo 2º, inciso VI, da IN nº 9/2014: Setor - esfera ou área temática do Poder Público ou de grupo de
interesse da sociedade civil que tem relação com os usos do território de influência da Unidade de Conservação, para
efeito da representação prevista no artigo 17º do Decreto 4.340/2002 (ICMBio, 2014).
227
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de atuar em defesa do meio ambiente, é também essencial para se avaliar custos e benefícios
socioambientais e intergeracionais de forma transparente e sustentada.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos à Fundação José Pedro de Oliveira, seus servidores e colaboradores.

6. REFERÊNCIAS
BRASIL, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Texto atualizado e consolidado
até a Emenda Constitucional nº 101, de 03 de julho de 2019. Disponível
em:https://www.imprensaoficial.com.br/downloads/pdf/Constituicoes_declaracao.pdf. Acesso em:
10 nov. 2019.

BRASIL, 2000. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).


Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9985.htm. Acesso em: 10 nov. 2019.

BRASIL, 2002. Ministério do Meio Ambiente. Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002.


Regulamenta artigos da Lei N°9.985, de 18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional
de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC, e dá outras providências. Disponível em:
https://www.imprensaoficial.com.br/downloads/pdf/Constituicoes_declaracao.pdf. Acesso em: 10
nov. 2019.

BRASIL, 2010. Ministério do Meio Ambiente. Plano de Manejo ARIE Mata de Santa Genebra.
Campinas, SP. Disponível em: http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/imgs-unidades-
coservacao/arie_mata_de_santa_genebra.pdf. Acesso em: 10 nov. 2019.

BRASIL, 2015. Supremo Tribunal Federal - STF. Arguição de Descumprimento de Preceito


Fundamental n. 347. Rel. Min. Marco Aurélio. Data de julgamento: 09/09/2015. Disponível em:
http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?doctp=tp&docid=10300665. Acesso em: 05 set.
2019.

CAMPINAS, 2012. Portaria conjunta nº 01, de 06 de dezembro de 2012, entre a Prefeitura


Municipal de Campinas, a Prefeitura Municipal de Paulínia e a Fundação José Pedro de
Oliveira. Dispõe sobre as diretrizes e normas para o uso e ocupação da Zona de Amortecimento da
Área de Relevante Interesse Ecológico Mata de Santa Genebra definida em seu Plano de Manejo.
Disponível em:
http://www.fjposantagenebra.sp.gov.br/assets/importacao/portaria_conjunta_01_de_06_12_2012.pd
f. Acesso em: 10 nov. 2019.

CAMPINAS, 2016. Decreto Municipal nº 19.167 de 06 de junho de 2016. Institui o Plano


Municipal do Verde e dá outras providências. Disponível em:
https://bibliotecajuridica.campinas.sp.gov.br/index/visualizaratualizada/id/129960. Acesso em: 10
nov. 2019.

CAMPINAS, 2017. Resolução conjunta FJPO/SVDS nº 01 de 26 de abril de 2017. Institui o


Plano Municipal do Verde e dá outras providências. Disponível em:
https://bibliotecajuridica.campinas.sp.gov.br/index/visualizaroriginal/id/131137. Acesso em: 10
nov. 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CDESC, 1997. Comité de Derechos Económicos, Sociales y Culturales. Observación General 07,
16º período de sesiones.Disponível em:
https://tbinternet.ohchr.org/_layouts/15/treatybodyexternal/Download.aspx?symbolno=INT%2fCES
CR%2fGEC%2f6430&Lang=en. Acesso em: 20 set. 2019.

ICMBIO (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), 2014. Instrução Normativa


nº 09, de 05 de dezembro de 2014. Disciplina as diretrizes, normas e procedimentos para
formação, implementação e modificação na composição de Conselhos Gestores de Unidades de
Conservação Federais. Diário Oficial da União, 12/12/2014. Disponível
em:http://www.icmbio.gov.br/cepsul/images/stories/legislacao/Instrucao_normativa/2014/in_icmbi
o_09_2014_diretrizes_modifica%C3%A7%C3%A3o_conselhos_gestores_und_conserva%C3%A7
%C3%A3o_federais.pdf. Acesso em: 10 nov. 2019.

LÉLIS, Natália de Souza, 2019. Natália de Souza Lélis: entrevista [nov. 2019]. Entrevistadores:
Augusto de Oliveira Brunow Ventura e Lucas Cesar Gouvea Barbosa. Campinas: Fundação José
Pedro de Oliveira, 2019. Áudio em mp4. Entrevista de Natália de Souza Lélis cedida no âmbito da
Fundação José Pedro de Oliveira - ARIE Mata de Santa Genebra, Campinas, SP. Entrevista na
íntegra disponível em: https://soundcloud.com/user-968371236/entrevista-natalia-de-souza-lelis-
cedida-para-augusto-ventura. Acesso em: 07 nov. 2019.

QUINTAS, JOSÉ SILVA, 2006. Introdução à Gestão Ambiental Pública. 2ª ed. revista. Coleção
Meio Ambiente. Série Educação Ambiental. Brasília: IBAMA, 2006. Disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/educacaoambiental/images/stories/biblioteca/educacao_ambiental/QUIN
TAS_Jos%C3%A9_Silva_-
_Introdu%C3%A7%C3%A3o_%C3%A0_Gest%C3%A3o_Ambiental_P%C3%BAblica.pdf.
Acesso em: 10 nov. 2019.

SAULE JÚNIOR, NELSON; DI SARNO, DANIELA CAMPOS LIBÓRIO (Coord.), 2013.


Manual de procedimentos: prevenção e soluções adequadas aos conflitos fundiários urbanos.
Diálogos sobre Justiça: Ministério da Justiça, Secretaria de Reforma do Judiciário. São Paulo;
Brasília, julho de 2013. Disponível em:
http://www.urbanismo.mppr.mp.br/arquivos/File/dialogosobrejustica.pdf. Acesso em: 6 set. 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

NÓS QUEREMOS A TERRA PARA VIVER:DESAFIOS PARA O


RECONHECIMENTO LEGAL DE TERRITORIOS CAIÇARAS
AMBIENTALMENTE PROTEGIDOS
WE WANT LAND TO LIVE: CHALLENGES FOR THE LEGAL RECOGNITION OF
ENVIRONMENTALLY PROTECTED CAIÇARAS TERRITORIES

Taina Mie Seto Soares **, Alba Simon *

*Professora visitante do Programa de Pós Graduação em Ecoturismo e Conservação da Universidade Federal do Estado
do Rio de Janeiro.albasimon7@gmail.com
**Mestranda do Programa de Pós Graduação em Ecoturismo e Conservação da Universidade Federal do Estado do Rio
de Janeiro.tainamie@gmail.com

INTRODUÇÃO
Atualmente, os territórios tradicionais no Brasil estão sujeitos à diferentes regimes jurídicos,
estruturas fundiárias e de ordenamento territorial. Muitos são reconhecidos como áreas protegidas,
sem que o motivo pelo qual foram definidas como tal, se dê pelo protagonismo da comunidade na
conservação da natureza. Em geral, estas continuam a ser vistas pelo senso comum que as cerca,
como grupos que estão à margem da sociedade nacional. Por sua forma de organização social se
basear na oralidade, tais comunidades são tratadas como subalternas, pelo fato do analfabetismo ser
uma das características desse sistema social, bem como a ausência de uma ideologia de acumulação
de capital e propriedade de bens de consumo, entre outros fatores.
Os territórios tradicionais sobrepostos a Unidades de Conservação, sobretudo a categoria
Parque Natural que tem entre os objetivos de conservação o desenvolvimento de atividades de uso
público com incentivo a visitação, são definidos sem que as comunidades, tenham optado
politicamente por esses usos, mesmo que sejam favoráveis às mesmas. Tal questão se dá pela
condição de que nas Unidades de Conservação de proteção integral, como nos parques, as áreas
inseridas em seus limites passam a ser de domínio público, necessitando para isso que haja a
regularização fundiária, ainda que nas categorias de uso sustentável, as comunidades locais
participem como um dos atores sociais nos processos decisórios.

MATERIAL E METODO
O presente artigo é parte da dissertação de mestrado em Ecoturismo e Conservação do
PPGEC/UNIRIO a ser defendida pela autora com coorientação da co autora, até dezembro de 2019.
A pesquuisa é desenvolvida em parceria com as lideranças da Coordenação Caiçara, e visa
desenvolver um modelo jurídico de território caiçara a partir do olhar desse grupo social. A

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

motivação para o desenvolvimento da pesqueisa se deu um função do convívio diário, por cerca de
15 anos, com as comunidades caiçaras da região de Paraty – RJ participando do Projeto Raízes e
Frutos da UFRJ. Ao acompanhar em suas andanças, o Mestre Altamiro dos Santos, liderança
caiçara da Praia Grande da Cajaíba, de Paraty, RJ, ouvi ele repetir muitas vezes: "nós queremos a
terra para viver, para nossos filhos e para os filhos dos nossos filhos, assim como nossos avós
passaram para nossos pais e para nós." Tal visão de mundo e de propriedade da terra me fizeram
refletir sobre o regime jurídico sob os quais são definidos os territórios tradicionais no Brasil e de
como o uso público nas áreas protegidas tem que ser problematizado perante a política de
conservação vigente no Brasil e a diversidade fundiária e sociocultural de territórios de
comunidades tradicionais hoje transformados em Unidades de Conservação.
Na fala do Mestre Altamiro, fica bem delimitado, que ele quer a "terra para os filhos e para
os filhos dos nossos filhos" sem incluir o povo brasileiro como um dos herdeiros bem como o uso
da nacionalidade através de atividades de recreação, pesquisa científica e interpretação ambiental.
Apesar dessa fala política não poder ser considerada um consenso na visão de todas as
comunidades, reflete uma idéia bem consolidada na voz de uma das principais lideranças nacionais
desse grupo tradicional e serve de reflexão sobre as estruturas fundiárias que são hoje a realidade
dessas áreas que se sobrepõem.
As áreas protegidas são espaços territorialmente demarcados cuja principal função é a
conservação e/ou a preservação de recursos, naturais e/ou culturais, a elas associados (MEDEIROS,
2003). No Brasil são reconhecidas através do decreto n. 5.758 de 13 de abril de 2006, que também
institui o PNAP - Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas. Apesar de diferentes
entendimentos sobre o que são áreas protegidas, o decreto que as regulamenta é fundamentado nos
compromissos assinados na CDB - Convenção sobre Diversidade Biológica na Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - CNUMAD, em 1992 durante a ECO-92.
No Brasil, o conceito legal de áreas protegidas abrange as unidades de conservação, os
corredores ecológicos, mosaicos florestais, florestas nacionais, as terras indígenas, os territórios
remanescentes de comunidades quilombolas, as APP - Áreas de Preservação Permanente e as RL -
Reservas Legais.
As comunidades tradicionais reconhecidas pelo decreto nº 6040 de 07 de fevereiro de 2007,
possuem cosmovisões, formas de organização social e de propriedade social, diversas ao
regulamentado pelo estado nacional. No caso das terras indígenas e dos territórios quilombolas, são
reconhecidos com regimes jurídicos próprios como áreas protegidas pelo mesmo decreto que
institui a PNAP. Apesar do avanço conquistado por esses grupos, outras comunidades tradicionais
como os ribeirinhos, caiçaras e caipiras não têm seus territórios considerados áreas protegidas por
sua ocupação e sim pelo fato de serem muitas vezes unidades de conservação.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

As comunidades extrativistas, que tiveram sua principal liderança, Chico Mendes,


assassinado, conquistaram as Reservas Extrativistas através do SNUC - Sistema Nacional de
Unidades de Conservação. Nesse sentido, também foram desenvolvidas as Reservas de
Desenvolvimento Sustentável que como as RESEX são categorias de uso sustentável e se propõem
à conciliar o uso das comunidades tradicionais e o desenvolvimento sustentável.

RESULTADO E DISCUSSÃO
Dessa forma se percebe que pelos diferentes processos de criação e estratégias
desenvolvidas pelos diferentes processos históricos e políticos que as criaram, as áreas protegidas se
distinguem dependendo da categoria que as define. As populações que possuem territórios que se
sobrepõem à essas áreas, dependendo do regime jurídico que as legitima, possuem diferentes
formas de ordenamento e uso de seu território. As terras indígenas e as unidades de conservação são
patrimônio da união, assim como os assentamentos de reforma agrária e as ilhas. Os territórios
quilombolas possuem título coletivo e pró-indiviso às comunidades, com obrigatória inserção de
cláusula de inalienabilidade, imprescritibilidade e de impenhorabilidade. (BRASIL, 2003).
Diferente de todas as outras comunidades tradicionais, os quilombolas possuem a concessão do
título de reconhecimento de domínio pelo INCRA à comunidade quilombola, em nome da
respectiva associação legalmente constituída, o registro cadastral do imóvel pelo INCRA e o
registro do título no Registro de Imóveis de acordo com a Lei Federal de Registros Públicos.
(CALDAS, GARCIA, 2007)
As outras comunidades tradicionais, incluindo as comunidades indígenas, não possuem a
segurança jurídica de terem suas terras registradas em nome de suas associações. No caso das
comunidades tradicionais que possuem territórios sobrepostos à unidades de conservação, seja de
uso integral ou sustentável, estão obrigadas à atender as regras e leis de ordenamento que na
maioria dos casos possuem forte herança do regime tutelar que o estado aplicou durante séculos em
relação à esses grupos sociais. No caso dos povos tradicionais do Brasil, uma grande semelhança
pode ser detectada nas distintas formas de propriedade social, que as afastam da razão instrumental
hegemônica com seu regime de propriedade baseado na dicotomia entre o privado e o público.
(LITTLE, 2003)
A tutela é a atribuição à um grupo ou indivíduo, do poder de falar e agir no lugar de outro,
instituindo entre ambos uma relação complexa de expectativas e trocas assimétricas. Tal poder pode
resultar da guerra e da conquista, de um mandato jurídico-político explícito, ou de uma visão
fortemente preconceituosa e discriminatória de um grupo em relação ao outro. Não consiste no uso
puro e simples de um poder econômico e social, não é algo estritamente pessoal, patrimonial, nem
deriva do parentesco. Embora tal condição de poder seja transmitida por processos institucionais, a
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

sua função e conteúdo real nunca estão enunciados nas atribuições burocráticas. Assim, embora os
programas governamentais muitas vezes definem metas a serem cumpridas e benefícios a serem
recebidos pelas populações tuteladas, na realidade, o que é fielmente executado são as ações
repressivas e de controle, em geral de interesse de terceiros, as demais raramente saindo do papel.
(OLIVEIRA, 2016)
O problema da influência da tutela na elaboração e implementação dos regimes jurídicos
que atuam na organização social das áreas protegidas, com exceção dos quilombolas, é que as
populações que habitam historicamente esses locais são vistas, não como proprietárias de seu
território, mas como moradoras de uma terra que juridicamente, é do patrimônio da união, regido
por ordenamentos e usos definidos não apenas pelas comunidades tradicionais e nem sempre de
acordo com seus interesses e visões de mundo. Ao participarem dos espaços que as inclui, como as
audiências públicas e os conselhos, o caráter oral de sua cultura as coloca em posição desfavorável
no domínio das ações e propostas desenvolvidas, salvo algumas exceções. A noção de terras
públicas, por outro lado, é associada diretamente ao controle da terra por parte do Estado. Nessa
concepção, a terra pertence, ao menos formalmente, a todos os cidadãos do país. Porém, é o
aparelho de estado que determina os usos dessas terras, supostamente em benefício da população
em seu conjunto. Na realidade, esses usos tendem a beneficiar alguns grupos de cidadãos e, ao
mesmo tempo, prejudicar outros. (LITTLE, 2003)
A tutela possui um sentido da proteção e de assistência que se confirma através do regime
fundiário que estão sujeitas as comunidades em áreas protegidas, pois não possuem autonomia no
uso e ordenamento dos territórios e estão em posição de desvantagem na instrumentalização das
regras que atuam sobre essas áreas.

CONCLUSÃO
Os territórios quilombolas são os únicos nas quais as comunidades possuem a propriedade
das terras que ocupam, como bens inalienáveis, mesmo sendo áreas protegidas pelo estado. Essa
forma de regime fundiário proporciona uma maior autonomia na organização social e ordenamento
territorial, pois ao contrário das outras comunidades tradicionais, possuem o domínio do território
que ocupam. Ao ocupar terras do patrimônio da união, as comunidades tradicionais se perpetuam
sob a égide da tutela do estado e suas formas de ordenamento e controle. É preciso que se aprimore
o sistema jurídico brasileiro referente aos territórios tradicionais e que se aprofunde o debate sobre
as propriedades sociais diversas ao regime atual, baseado na dicotomia público-privado. Os
territórios tradicionais sobrepostos à áreas protegidas precisam ser reconhecidos através de um
regime jurídico no qual as comunidades tradicionais tenham autonomia na organização social e no

233
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ordenamento territorial, para que se supere a herança da tutela nos regimes jurídicos e na estrutura
fundiária dessas áreas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÁREAS PROTEGIDAS. Ministério do Meio Ambiente. Disponível em:
http://www.planejamento.gov.br/assuntos/gestao/patrimonio-da-uniao/bens-da-uniao/outros-bens.
Acesso em: 18 ago. 2019.

LITTLE, Paul E. Territórios sociais e povos tradicionais no Brasil: por uma antropologia da
territorialidade. In: Anuário Antropológico 2002-2003. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro,
2004. p.251-290.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

OS CONFLITOS NA RESEX DAPRAINHA DO CANTO VERDE/CE E SUA


RELAÇÃO COM O PARQUE EÓLICO PRAIAS DE PARAJURU
THE CONFLICTS IN THE RESEX OFPRAINHA DO CANTO VERDE / CE AND ITS
RELATION TO THE WIND PARK BEACHES OF PARAJURU.

Paulo Torres Junior*, Maione Rocha de Castro Cardoso*, Gil Célio de Castro Cardoso**

*Programa de Pós Graduação em Avaliação de Políticas Públicas, Especialista, UFC, Brasil.


* Centro de Estudos Sociais Aplicados, Doutora, UECE, Brasil.
** Programa de Pós Graduação em Avaliação de Políticas Públicas, Doutor, UFC, Brasil.

1.INTRODUÇÃO
Nas três últimas décadas o cenário de alinhamento político brasileiro vem se moldando a
partir de uma lógica atenta aos interesses do capital, isto é, direcionada para a promoção de um
crescimento econômico centrado no mercado, afastando-se gradativamente das necessidades sociais
e sem preocupar-se com os eventuais impactos e perdas causadas à sociedade, causados pela
atuação estatal.
Neste contexto, o favorecimento estatal às demandas de grandes complexos industriais, em
prol de um desenvolvimento econômico entrelaçado com interesses políticos, acabou por motivar a
expansão de megaempreendimentos e conglomerados manufatureiros de maneira estratégica em
alguns setores da economia nacional, legitimados pelo argumento do incentivo à geração de renda e
emprego.
A partir deste cenário, algumas organizações acabaram por migrar das cidades e se instalar
em territórios ocupados por populações tradicionais constituídas, em sua grande maioria, através de
processos de resistênciaa invasões exógenas e que, em decorrência da intervenção do próprio
Estado, por meio de politicas públicas desenvolvimentistas, acabam sofrendo impactos em seus
hábitos e tradições, alterando suas dinâmicase organização.
No Nordeste do Brasil, discordâncias entre o objetivo dessas políticasdesenvolvimentistas e
sua repercussão junto a essas populações são comuns, ante a divergência do resultado esperado por
meio da relação tripartite política-estado-sociedade. Como exemplo, têm-se os conflitos
socioambientaishavidosem decorrência da instalação de parques eólicos em territórios ocupados por
populaçõestradicionais de pescadores.
Caso emblemático é o estado do Ceará. Nos últimos anos, vem se observando o aumento de
usinas de energia eólica próximas a comunidades tradicionais pesqueiras do litoral cearense, devido
ao seu elevado potencial energético local. Contudo, a vulnerabilidade dessas comunidades e as

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

externalidades que as afetam devido a instalação desses parques eólicos evidenciam dúvidas quanto
à eficácia desse tipo de projeto desenvolvimentista.
Apoiado nesse embateé possível indagar como a implementação de políticas públicas ditas
desenvolvimentistas, nos territórios ocupados por comunidades tradicionais, fomentam o
desenvolvimento econômico local?
Tomando como referência o incentivo à implantação de parques eólicos por meio do
Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica- PROINFA, evidenciam-se os
conflitos presentes na reserva extrativista marinha da Prainha do Canto Verde, um pequeno vilarejo,
localizado no Município de Beberibe/CE, onde está instalado um parque eólico que, embora tenha
como objetivo proporcionar incentivos para o desenvolvimento econômico local, divide a
comunidade sobre quais foram, de fato, os benefícios gerados.
Assim, o presente trabalho objetiva discutir como a intervenção do Estado, através
deefetivação de políticas públicas desenvolvimentistas em territórios ocupados por populações
tradicionais, pode gerar conflitos entre os propósitos da politica e os interesses das comunidades,
apresentando, como exemplo,os conflitos surgidos na RESEX Prainha do Canto Verde/CE, em
decorrência da instalação de torres eólicas próximas à vila de pescadores.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo busca investigar os efeitos da implantação de parques eólicos próximos a
comunidade de pescadores, em relação aos seus hábitos e tradições. Para tanto, tomou-se como
objeto de estudo a RESEX Prainha do Canto Verde, uma comunidade tradicional de pescadores
localizada em Beberibe/CE, onde se evidenciam conflitos decorrentes dos impactos causados por
esses equipamentos.
Logo, buscando evidenciar a compreensão dosindivíduos em seus próprios termos e
sistemas,destaca-se a abordagem interdisciplinar qualitativa dos dados da presente pesquisa, sem
que houvesse a preocupação de uma mensuração quantitativa de comportamentos, mas uma
tentativa de descrever a complexidade dos processos sociais (OLIVEIRA,1999; 2010).
Neste sentido, a pesquisa se mostra essencialmente bibliográfica e exploratória (GIL, 2010),
eis que busca o aprimoramento de ideias sobre a compreensão da realidade.
No que concerne à coleta de dados, primou-se pela coleta de dados primários e secundários,
através da observação direta, entrevistas e pesquisas bibliográficas, onde se incluem dissertações,
artigos, livros e reportagens relacionadas com o tema apresentado.Quanto à análise, realizou-se a
análise de conteúdo (BARDIN, 2011) para compreensão e categorização dos dados emergentes das
entrevistas e análise contextual, das demais fontes.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO.
As ações e registros do Estado brasileiro demonstram as diversas tentativas de se incorporar
às políticas públicas, enquanto marco de governança, diretrizes que passaram a consolidar-se em
ação social do Estado dentro de um conceito de Desenvolvimento atrelado a um crescimento
econômico inclusivo e ambientalmente equilibrado (SACHS, 2015).
Neste sentido, o Estado, enquanto policymaking, procura a consecução de objetivos e
instrumentos capazes de viabilizar a prosperidade econômica por meio de políticas públicas que se
firmam como fator imprescindível para o crescimento,ao unir o progresso social com o respeito ao
Meio Ambiente. Esse é, por exemplo, o sentido empregado para a legitimação da instalação de
parques eólicos, financiados pelo Programa de Fomento de Incentivo às Fontes Alternativas de
Energia Renovável no Brasil – PROINFA, cuja proposta se baseia na aliança entre o progresso
econômico e a eficiência energética.
Porém, enquanto concentradores de espaço ambiental (MARTINEZ-ALIER, 1999), tais
politicas – representadas por esses equipamentos - avançam por territórios, reconfigurando
paisagens, espaços e culturas. Aqui, o conceito de território não se perfaz apenas como o conjunto
dos sistemas naturais e de coisas superpostas, mas onde “ali, desembocam todas as ações todas as
paixões, todos os poderes, todas as fraquezas, isto é, onde a história do homem plenamente se
realiza a partir de manifestações da sua existência” (SANTOS, 2000, p. 12).
É nesse cenário que se revelam os ataques às comunidades tradicionais, onde o sentimento
de pertencimento com o território é algo que se traduz como identitário, e que se apresenta a partir
de uma relação sócioterritorial muito específica (LOPES, SMARRA, LOTUFO, 2014), onde se
guardam traços remanescentes de épocas passadas,cuja intervenção do Estado nesse processo de
valorização simbólica acaba por gerar conflitos (ACSERALD, 2004).
Exemplo dessa incongruência está na Reserva Extrativistada Prainha do Canto Verde,
comunidade tradicional de pescadores localizada no município de Beberibe, situado no litoral leste
do estado do Ceará onde próximo ao seu território está instalado um parque eólico. Tendo sua renda
basicamente oriunda da atividade pesqueira e de artesanato, a comunidade foi constituída como
Reserva Extrativista (RESEX) em 2009, com objetivo de proteger os meios de vida e a cultura da
população tradicional (art. 18 da lei nº 9.985/2002).
Com a instalação do parque eólico buscava-se, além da eficiência energética, a promoção do
desenvolvimento local a partir do incentivo ao turismo na localidade (LOURENÇO, 2009). Porém,
a partir desses incentivos, alguns conflitos surgiram na comunidade e outros se acentuaram,
segundo dados obtidos nas entrevistas colhidas na RESEX, como se denota na fala do entrevistado
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

1: “não podemos investir em nada na comunidade, por conta dessa RESEX. Essas torres não
influenciam em nada aqui”.
Segundo Costa(2016), há uma divisão na comunidade: os que se sentem prejudicados com os
limites impostos pela RESEX, e que não podem usufruir dos benefícios do parque eólico;e os que
se sentem protegidos, representados pelos moradores mais antigos, que consideram o parque eólico
como um equipamento prejudicial à comunidade.
Referido prejuízo, conforme o Presidente da Associação dos moradores da Prainha do Canto
Verde, Sr. Lindomar, diz respeito aos valores tradicionais da comunidade, que vem se perdendo
com o crescente interesse no local por investidores do ramo turístico, potencializado com a
instalação do parque eólico.
Não obstante a isso, ainda Segundo Costa (2016) a instalação do parque eólico e a visibilidade
dada à localidade fez crescer a violência local, redesenhando os hábitos e costumes locais e
evidenciando impactos negativos na comunidade.
Outro elemento revelado com a pesquisa é a privatização de áreas de uso comum, com a
instalação dos parques eólicos. Espaços antes livres e de acesso comum entre os moradores da
comunidade, como os lagos que se formam entre as dunas onde estão instaladas as usinas eólicas,
tornaram-se exclusivos e restritos ao acesso, ensejando um processo dedeculturamentoda
comunidade pesqueira que se beneficiava com a pesca nesses espaços.
É o queMoreno (2016) explicaquando esclarece que esse tipo de atuação Estatal se apresenta
distante do papel desenvolvimentista, mas como uma narrativa unificadora do capital, aliando
interesses econômicos e promovendograndes mudanças nas comunidades tradicionais tanto em seus
aspectos sociais, culturais, ambientais e ideológicos.

4. CONCLUSÃO
Procurou-se, com o presente artigo, abordar a temática dos efeitos da intervenção do Estado,
por meio de politicas públicas desenvolvimentistas, em comunidades tradicionais, tomando como
referência a RESEX Prainha do Canto Verde, localizada no Ceará.
Percebe-se que o discurso desenvolvimentista, que promete grandes melhorias nas
localidades onde serão instalados os empreendimentos, oculta, na maioria das vezes, os impactos
provocados pelos mesmos. A população local acaba tendo que se readaptar com a implementação
desses projetos, seja direta ou indiretamente.
Neste sentido, o processo de reconfiguração de seus territórios, pela lógica capitalista, acaba
por gerar conflitos que se acirram com a disparidade de poderes envolvidos na relação institucional.
Assim, ante a análise dos dados é possível constatar que ao contrário de uma promoçãodo
desenvolvimento local, por meio de politicas públicas, é pequeno e os reflexos desses aparelhos
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

(usinas eólicas) na economia local é quase inexistente, em decorrência das limitações próprias da
RESEX.
Com isso, oacirramento dos conflitos na localidade se evidencia como uma disputa entre os
moradores em usufruir eventuais benefícios de uma visibilidade dada à localidade, por meio do
parque eólico, e os malefícios que essa notoriedade propicia, como a violência urbana,
distanciando-se, pois, de um desenvolvimento pleno, seguro e inclusivo.

5.REFERÊNCIAS.

ACSELRAD, H. (org.) Conflitos Ambientais no Brasil. RelumeDumará, RJ, 2004.

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 1977

BURSZTIN, M; FONSECA, I.F. A banalização da sustentabilidade: reflexões sobre governança


ambiental em escala local. Sociedade e Estado, Brasília, v. 24, n. 1, p. 17-46, jan./abr. 2009.

COSTA, N. O. C. Cartografia Social: Instrumentos de luta e resistência no enfrentamento dos


problemas socioambientais na Reserva Extrativista Marinha e Continental da Prainha do
Canto Verde, Beberibe . Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Ceará, Centro de
Ciências, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Fortaleza, 2016.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. Ed. São Paulo, 2010.

LOPES, V. F. M, SMARRA, A. L. S, LOTUFO, C. A. Anais do I Congresso Brasileiro de


Geografia Política, Geopolítica e Gestão do Território, 2014. Rio de Janeiro. Porto Alegre:
Editora Letra1; Rio de Janeiro: REBRAGEO, 2014, p. 494-506.

LOURENÇO, J. Ceará abre parque eólico em Beberibe. Disponível em:


http://eco4planet.com/blog/ceara-abre-parque-eolico-em-beberibe/. Acesso em 10/10/19.

MARTINEZ-ALIER, J. Justiça Ambiental (local e global),Ii: CAVALCANTI, C. (Org). Meio


ambiente, desenvolvimento sustentável e políticas públicas. Cortez: São Paulo, 1999.

MORENO, M. Descolonizar o imaginário: debates sobre pós-extrativismo e alternativas ao


desenvolvimento / Gerhard Dilger, Miriam Lang, Jorge Pereira Filho (Orgs.); traduzido por Igor
Ojeda. - São Paulo : Fundação Rosa Luxemburgo, 2016.

OLIVEIRA, M. M. de. Como fazer pesquisa qualitativa. 3ª ed. Rev. Amp. Petropolis, RJ: Vozes,
2010.

SACHS, J. The age ofsustainabledevelopment. New York: Columbia University Press, 2015. p. 3.

SANTOS, M. et al. O Papel Ativo da Geografia: um manifesto. XII Encontro Nacional de


Geógrafos. Florianópolis, 2000.

SILVA, T. A. A. O. O mapa de injustiça ambiental e saúde no Brasil e as comunidades rurais


de Pernambuco. In: ALMEIDA, J.; GERHARDT, C.; 1216 Saúde Soc. São Paulo, v.24, n.4,
p.1208-1216, 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

TRILHA TRANSCARIOCA:CONSERVACIONISMO E USO


TRADICIONALEM CONFLITO
TRANSCARIOCA TRAIL: CONSERVATIONALISM AND TRADITIONAL USE IN
CONFLICT

Alba V. S. Simon**, Isabel Regina da Cruz Caetano da Silva*

** Professora do Programa de Pós Graduação em Ecoturismo e Conservação da Universidade Federal do Estado do Rio
de Janeiro – UNIRIO e orientadora da presente pesquisa/dissertação no Pós Doutorado em Sociologia e Direito –
PPGSD-UFF. albasimon7@gmail.com
*Mestre pelo Programa de Pós-Graduaçao em em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (PPGSD-
UFF). isabelcaetano.uff@gmail.com

INTRODUÇÃO
O presente artigotem como objetivo fazer uma reflexão sobre os aspectos constitutivos do
processo de criação e institucionalização de uma trilha de longo curso, situada na cidade do Rio de
Janeiro e denominada Trilha Transcarioca.Idealizada por conservacionistas com grande atuação nos
espaços decisórios da política ambiental no governo federal, no governo do Estado do Rio de
Janeiro e junto ao poder Legislativo do Município do Rio de Janeiro, a Trilha Transcarioca
“unificou” lugares com diferentes históricos de ocupação e realidades sociais,criando um território
imaginado, tido como “único” e“verde”, defendido com argumentos científicos e calcado em
concepções ecológicas positivistasde uso público, valor cênico, paisagem, cultura e natureza
evidenciando conflitos ao sobrepor60 km do traçado original aos caminhos usados pela
Comunidade Quilombola CafundáAstrogilda, habitantes históricos do Parque Estadual da Pedra
Branca (RJ) na vertente de Vargem Grande. As tensões entre uso público e o uso coletivo
considerado uso privado e entre as distintas formas de relacionamento com a natureza no processo
de produção e reprodução do espaço geográfico, traz para o debate os distintos conceitos de
natureza subjacentes e os respectivos modelos de conservação.
A Trilha Transcarioca é apresentada como uma trilha de longo curso, de 180 km, organizada
em 25 trechos que unem6 Unidades de Conservação (UC) – Parque Nacional da Tijuca, Parque
Natural Municipal de Grumari; Parque Natural Municipal da Cidade; Parque Natural Municipal da
Catacumba; Parque Natural Municipal José Guilherme Merquior, Parque Natural Municipal Fonte
da Saudade e Parque Estadual da Pedra Branca - nos limites da cidade do Rio de Janeiro. Segundo
seus idealizadores, tratar-se-ia de um “Movimento de cidadãos e instituições conectadas pelo sonho
de implantar uma trilha de longo curso no coração da paisagem natural, cultural urbana da cidade
do Rio de Janeiro” (Cfehttps://trilhatranscarioca.com.br/quem-somos).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

É um projeto que propõe, basicamente, a sinalização de trilhas interligando seis Unidades de


Conservação e formando um corredor ecológico que propicie o fluxo da fauna e flora, estimulando
ações voltadas à educação ambiental e induzindo o manejo integrado do Mosaico Carioca de Áreas
Protegidas.
O ponto de partida da Trilha Transcariocaé o Parque Nacional da Tijuca (PNT) - o primeiro
Parque criado no Brasil e, atualmente, o maior aglutinador das práticas ambientalistas do Município
do Rio de Janeiro - finalizando no também emblemático Parque Estadual da Pedra Branca (PEPB),
“berço” do sertão carioca, área rural com produção de pequenos agricultores e 3 comunidades
Quilombolas e, atualmente, palco de disputas territoriais e conflitos ambientais. Dos 180 km de
extensão total da Trilha Transcarioca, 60 km cruzam o PEPB.
Criado em 1974, o PEPB situa-se no centro geográfico do Município do Rio de Janeiro, nas
encostas do Maciço da Pedra Branca, localizadas acima da cota de 100m. Com área de 125 km² faz
limite com os bairros da Baixada de Jacarepaguá e da Zona Oeste do Município. Encravado na
região de maior crescimento urbano da cidade, o PEPB abriga em seu entorno conflitos associados à
pressão imobiliária, àimplantação de loteamentos clandestinos por milícias, áreas ocupadas pelo
tráfico de drogas, dentre outros problemas típicos de áreas “verdes e livres”imersas em regiões de
expansão urbana.(SIMON, MADEIRA FILHO, BIDEGAIN: 2017)
A delimitação do Parque, a partir da cota altimétrica de 100 metros, na região do maciço da
Pedra Branca, se sobrepôs a áreas agrícolas de pequenos agricultores da Zona Oestee a áreas
historicamente ocupadas por 3 comunidades locais, autodeclaradas como quilombolas. O traçado de
60 km.da Trilha Transcarioca, nos limites do PEPB, se sobrepôs aos caminhos usados pela
Comunidade Quilombola CafundáAstrogilda, habitantes históricos do maciço da Pedra Branca (RJ)
na vertente de Vargem Grande, criando tensões entre uso público e privado e evidenciando o
conflito entre as distintas formas de relacionamento com a natureza no processo de produção e
reprodução do espaço geográfico, trazendo para o debate os distintos conceitos de natureza
subjacentes e os respectivosmodelos de conservação.

MATERIAL E MÉTODO
O artigo faz parte da pesquisa desenvolvida pelas autoras no Programa de Pós-Graduação
em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense, no âmbito do Laboratório de Justiça
Ambiental e se tornou tema da dissertação de mestrado da coautora defendida em 2017 (SILVA,
2017). A metodologia, privilegiou a imersão no campo para uma escuta mais cuidadosa e
qualificada dos atores do processo. Além das entrevistas com atores estratégicos no conflito. A
participação em festas tradicionais, e a participação em reuniões e eventos estratégicos, tais como as
do Centro Excursionista Brasileiro (CEB), do Conselho do Mosaico Carioca de Áreas Protegidas
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

(MC), eventos técnicos científicos onde a Trilha Transcarioca era o tema principal, foram
significativos para compreender a natureza dos conflitos e as diferentes concepções de uso público
dos diversos atores e segmentos, assim como os interesses em jogo a partir da implementação da
Trilha Transcarioca e as formas de mobilização dos agentes sociais neste campo de tensões. Foram
quase dois anos de campo e participação em 37 reuniões/eventos/caminhadas.

RESULTADO E DISCUSSÃO
A implantação da Trilha Transcarioca institucionalizou os caminhos até então utilizados por
trilheiros e caminhantes de forma aleatória. Nesse sentido, o uso público para o lazer se sobrepôs
aos usos coletivos para o trabalho, para o transporte de produtos da agricultura, relações sociais, e
outros, criando tensão entre concepções de uso público e de uso privado. Vale dizer, o processo de
implantação do trecho de 60 km. da Trilha Transcarioca nos limites do PEPB não foi isento de
conflitos. A coexistência entre os habitantes tradicionais nos limites do PEPB com o órgão gestor da
UC sempre fora marcada por conflitos, uma vez que o processo de criação do PEPB reproduziu o
padrão arbitrário e tecnicista de criação de unidades de conservação no Brasil, vigente desde a
década de 1930, quando da criação dos primeiros parques brasileiros.
Segundo Cácere (2016), o uso dos caminhospela comunidade Cafudá - Astrogildanão é
apenas utilitário, está atrelado a um universo de relações de parentesco, tramas de significados e
vínculos de pertencimento e envolvimento afetivo que configuram uma singular prática espacial.Por
esses caminhos se escoa a produção agrícola através de burros ou cavalos, se levam filhos na escola,
se visitam parentes em outras comunidades locais. Estes se entrecruzam ligando as roças e
perpassando por reservatórios naturais manejados pelas comunidades para abastecimento de água,
dentre outros usos. Esses caminhos já vêmtambém sendo utilizados para o lazer por praticantes de
caminhadas, pedaladas, cavalgadas e motocross, atividades que têm como denominador comum o
desfrute do ócio e do tempo livre, perto da natureza, do qual usufruem segmentos da população
urbana do Rio de Janeiro, mas sem ainda uma “institucionalização”. .
No Brasil, o debate sobre os conflitos socioambientais inerentes ao processo de criação de
UCsde Proteção Integral (UCPI) sobre territórios de uso tradicional por populações locais não é
novo. Desde a instituição da Lei do Sistema nacional de Unidades de Conservação (SNUC - Lei
9.985/2000) que determinou as formas de criar, gerir e implementar UCs no Brasil,essa agenda vem
se tornando política pública acionada de forma positiva ou conflitiva de acordo com os perfis de
gestores públicos em situação de tomada de decisão.
Historicamente, a decisão pela transformação de um território com dinâmicas próprias de
uso e apropriação por comunidades locais em território da conservação, se pautou na ideia de uma
natureza única e universal, reificada por conceitos ecológicos estáticos e sem interdisciplinaridade
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

com as questões sociais, e vem se apoiandoem decisões técnicas, através de processos


administrativos conduzidos por setores burocráticos da gestão pública.
Na lógica do controle territorial ambientalpelo Estado, os residentes nos espaços de
conservação sofrem frequentemente constrangimentos por parte de agentes de fiscalização ou dos
próprios gestores das UCs, além do congelamento de suas atividadesde produção, obstaculizando os
usos tradicionais anteriores e criando dificuldades em acessarem políticas públicas básicas tendo em
vista sua situação, agora, irregular.
Para compreender a complexidade do processo de constituição da Trilha Transcarioca, cuja
identidade se manifesta no conflito entre uso público euso coletivo considerado contraditório ao
projeto conservacionista de implantação da trilha, fez-se necessário compreender o discurso
fundador do projeto e a construção de uma identidade transcarioqueira, como se auto intitulam os
adeptos da trilha. Discursos e práticas materializados em conceitos de conservação da natureza e
cultura que se confrontam e interagem com relações de poder, práticas econômicas e representações
sociais que produzem novas significações sobre o território, que é também espaço social de
comunidades com práticas diferenciadas, percepções e reivindicações distintas de acesso, posse e
uso e controle de recursos naturais.
Mais que uma trilha de longo curso, ou um corredor ecológico, interligando seis UCs nos
limites da cidade do Rio de Janeiro, a Trilha Transcarioca é um projeto conservacionistade
segregação de espaços naturais para fins de preservação da biodiversidade e de uso público, a partir
de um olhar urbano sobre o cênico, a paisagem e a natureza.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As articulações entre os processos que permitem e validam a criação da Trilha Transcarioca
são muito semelhantes aos processos relacionados à criação das primeirasáreas protegidas
noBrasil.A partir da concepção universalista de natureza, os ideólogos da Trilha Transcarioca
difundiram concepções e valores próprios do conservacionismo clássico, conseguindo
umconsiderável grau de consenso,articulando um discurso que se pretende altruísta.
Os ideólogos se constituem em um grupo de pressão, que se autointitula como movimento,
que busca transformar seus pressupostos em politicas publicas de conservação com o objetivo de
alcançar uma demanda supostamente existente na sociedade; qual seja, espaços verdes livres e
intocáveis para caminhadas, reconexão com a natureza e lazer.
A partir de concepções próprias de uso público, típicas do conservacionismo clássico, que
pressupõeacesso para todos (mobilidade) e não para alguns (os tradicionais, aqui vistos como
detentores do uso privado) o Movimento Trilha Transcarioca reproduz padrões ideológicos dos

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

primórdios do conservacionismo que se perpetuou ao longo dos anos,onde o uso público a partir da
beleza cênica e do valor da paisagem foi o carro chefe da defesa de uma politica de conservação.
Todavia, os conflitos evidenciados pelas diferentes concepções de espaço público e espaço
comunitário,foram fundamentais para pensar o campo de disputas. Concomitante ao processo de
institucionalização da Trilha Transcarioca, deu-se o processo de titularização quilombola,
constatando como a patrimonialização da comunidade, traduzida em valorização e respeito,
possibilitou equidade e peso político junto a umprojeto de grande alcance socialelegitimidade
política, que até então não teria “opositores”, visto que trabalhava com a ideia de uso público para
as atuais e futuras gerações.

REFERÊNCIAS
CÁCERES, Luz Stella Rodríguez. Território e identidade quilombola urbana contemporânea. In:
ANPUH – XIII ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E
PESQUISA EM PLANEJAMENTO URBANO E REGIONAL, 2011, São Paulo. Anais
Eletrônicos: XIII Encontro Nacional da Associação Nacional de História. Florianópolis, 2009.

SIMON, Alba. V. S.; MADEIRA FILHO, Wilson; PRIMO, Paulo Bidegain. Espaços Nulos e
Muros Simbólicos; uma reflexão sobre as áreas verdes urbanas e áreas livres em bairros periféricos
e topos de morro em comunidades de favela em Niterói RJ. In: XIII Congresso Nacional de
Excelencia em Gestão e III INOVARSE – Responsabilidade social aplicada, Rio de Janeiro, 29 e
30 de setembro de 2016.

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A DISPUTA DO BOTO COR DE ROSA E DO BOTO TUCUXI NA FESTA DO


ÇAIRÉ 2019ENQUANTO ESTRATÉGIA DE PROTESTO E DE RESISTÊNCIA NA
ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE ALTER DO CHÃO

Wilson Madeira Filho

Professor Titular da Faculdade de Direito e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade


Federal Fluminense
wilsonmadeirafilho@hotmail.com

INTRODUÇÃO
A celebração do Çairé em Alter do Chão, distrito do Município de Santarém, em especial
com a disputa entre os blocos do Boto Cor-de-Rosa e do Boto Tucuxi, tornou-se um dos eventos
mais populares e midiáticos da região amazônica. No ano de 2019, em face dos incêndios na
floresta, que atingiram proporções alarmantes, provocando reação internacional, e atingindo a Área
de Proteção Ambiental de Alter do Chão três dias antes do início da grande festa, o desfile dos
blocos ganhou forte tonalidade enquanto discurso estilizado de protesto e de resistência das
comunidades tradicionais e das populações locais diante do ecocídio.
O presente trabalho é uma etnografia, no âmbito de uma pesquisa-participativa- onde, além
de atuar com projetos de extensão em comunidades tradicionais locais, experenciei atuar como
jurado no festival mais antigo da Amazônia, o Çairé -, e tem como proposta detalhar a disputa dos
botos e a apresentação de seus enredos tendo como pano-de-fundo a desconstrução institucional da
política ambiental brasileira.

A FESTA DO ÇAIRÉ
A Festa do Çairé, também grafada como Sairé, implica no sincretismo entre duas danças, a
primeira de origem tapuia e a segunda enquanto resultado da evangelização jesuíta através de um
andor composto por três semicírculos de madeira coroados por uma cruz e carregado por mulheres
do local, ao som de música. São reivindicados quase 400 anos dessa história pelos próprios
narradores na disputa dos botos, afirmando tratar-se da festa mais antiga da região amazônica e do
próprio país.
De fato, todo enredo e coreografia da festa do Çairé é uma manifestação que mistura
elementos religiosos e profanos, começando com o hasteamento de dois mastros enfeitados com
frutas regionais, no qual homens e mulheres o disputam separadamente, seguido de ritual religioso e
danças folclóricas desempenhadas pelos moradores do balneário. No último dia, na segunda-feira,

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ocorrem a varrição da festa, a derrubada dos mastros e o almoço de confraternização, entre outros
eventos.
A Festa teria ocorrido emdiversas localidades na Amazônia e passado por diversas
reconfigurações no correr dos anos, até centrar-se em Alter do Chão, onde entre 1943 e 1973 teria
sido proibida pela Igreja católica em razão de seu apelo profano (CARVALHO: 2016). Novas
reconfigurações irão conservar muito pouco da sua originalidade, ganhando destaque a disputa
existente entre o Boto Tucuxi e seu rival, o Botocor-de-rosa.
O folclore dos botos Tucuxi e Cor-de-Rosa gira em torno da sedução, morte e ressurreição
destes personagens, entre lendas regionais, tribos indígenas, a Cabocla Borari, o Boto Encantador
que se transforma em Homem Sedutor, a Rainha do Lago Verde, a Rainha do Çairé, o Tuxaua, o
Curandeiro e os pescadores. O enredo ressalta a natureza, em especial o Lago Verde, palco da
trama. E quando o boto é morto por ordem do Tuxaua, pai da Cunhantã-iborari, que foi engravidada
pelo golfinho amazônico, recai sobre ele a fúria dos maus espíritos da região. Por isso, a pedido do
próprio Tuxaua, vem o Pajé e ressuscita o boto. É a apoteose do folclore durante o festival.
Para Barbosa (2017)é importante destacar a mudança de sentido de vida e das
transformações sofridas na comunidade com oconsumo cultural do Çairé e investigar a midiatização
da festa. No mesmo sentido Boyer (2018), a partir do mapeamento das categorias discursivas
mobilizadas pelos moradores de Alter do Chão para descrever a festa, destaca a oposição entre o
rito religioso e o boto profano e busca mostrar que esse antagonismo tem sido relativizado.

A APA ALTER DO CHÂO


O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), criado pela Lei 9.985/2000,
enformou a principal política conservacionista do país, estabelecendo grupos e categorias de
unidades de conservação. Essa patrimonialização estatal sobre a natureza implicou em traduzir de
forma complexa o modo de vida na região, transformando a tutela ambiental em dever de todos,
mas também cerceando usos e implicando em releituras identitárias a acionar tradicionalidades
emancipatórias em consonância com a ambientalização dos movimentos sociais.
Nesse sentido, Surgik (2006) já investigava a baixa aderência em Alter do Chão à instalação
da unidade de conservação da categoria Área de Proteção Ambiental (APA) em 2003 e a pouca
compreensão prática dos moradores locais sobre esse modelo de colonização territorial. A questão
ganha ainda mais em complexidade se considerarmos que grande parte da APA é sobreposta ao
AssentamentoAgroextrativista do Eixo Forte, que possui instrumentosde gestão que preveem
estratégias de conservação ambiental, e que parte da APAabrange também as áreas que estão sendo
reivindicadas pelo MovimentoIndígena Borari, que tem entre seus objetivos a conservação
ambiental do seuterritório.O Plano de Uso da APA foi construído entre agosto de 2011 e novembro
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de2012 e passou a estatuir em seu artigo 28 que “As atividades culturais devem ser incentivadas e
integradas àeducação ambiental, realizadas em espaços adequados, que não prejudiquema
conservação do meio ambiente, sob anuência do Conselho Gestor da APA”.

A DISPUTA DOS BOTOS EM 2019


Consagrada como a principal atração da festa do Çairé, que possui abertura em uma quinta-
feira e encerramento em uma segunda-feira, a apresentação dos blocos dos botos no Lago dos
Botos, mais conhecimento como Sairódromo, na passagem, do sábado para o domingo, teve início
em hotel próximo ao evento, onde a Secretaria de Cultura, às 18 horas, apresentou aos
representantes de ambos os blocos os quatro jurados da apresentação daquele ano, cujos nomes, até
então, haviam permanecido em sigilo. O presidente do júri, sem direito a voto, seria o responsável
pela regularidade do processo e pela apuração dos resultados na segunda-feira, enquanto os demais
três dos jurados seriam responsáveis por atribuir notas a dezesseis itens, conforme Art 6º do
Regulamento daquele XXI Festival Folclórico dos Botos de Alter do Chão, a saber: 1)
Apresentação (comunicação e oratória); 2) Cantador (timbre e afinação); 3) Rainha do Çairé
(evolução, indumentária, simpatia e cênica); 4) Cabocla Borari (evolução, indumentária, simpatia e
cênica); 5) Curandeiro (evolução, fantasia e cênica); 6) Rainha do Artesanato (evolução,
indumentária, simpatia e cênica); 7) Boto Homem Encantador (interpretação, dança e cênica); 8)
Boto Animal Evolução (evolução e originalidade); 9) Rainha do Lago Verde (evolução,
indumentária, simpatia e cênica); 10) Carimbó (coreografia e indumentária); 11) Organização do
conjunto folclórico (disposição e organização dos dançarinos no lago). 12) Alegorias (evolução,
estética e acabamento); 13) Letra e Música (harmonia, fidelidade ao tema); 14) Ritual (evolução e
cênica); 15) Torcida (animação e adereços); 16) Sedução (interpretação, dança e cênica).
Em seguida, um representante de cada bloco apresentou, em linhas gerais, o enredo daquele
ano, acompanhando de representantes da presidência do bloco e de seu corpo jurídico. O tema da
disputa eraFé que emociona, magia que encanta. A representante indígena do boto Cor-de-Rosa
apresentou o enredo Alter do Chão, berço da vida. Já o diretor de arte do Boto Tucuxi falou sobre a
Resistência Borari.

O Boto Cor-de-Rosa
O enredo do Boto Cor-de-Rosa centrou-se em Alter do Chão enquanto o maior aquífero de
agua-doce do mundo, o Aquífero Grande Amazônia, com 162.520 km2, ameaçado pela poluição,
pela ausência de inclusão social dos povos tradicionais (seringueiros, balateiros, caiçaras,
ribeirinhos, quilombolas, jangadeiros, pescadores, entre outros) e pela luta por sustentabilidade.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Nesse sentido, a simbologia da Mãe Natureza encontrava conexão na cunhatã grávida, a verter o
líquido amniótica que dá origem à vida.

O Boto Tucuxi
O enredo do Boto Tucuxi apresentou o drama indígena diante das queimadas das florestas e
à poluição mercurial no rio Tapajós, apresentando a própria festa do Çairé como a maior símbolo de
resistência do povo Borari. Outra resistência estaria no Carimbó, que une indígenas, quilombolas e
caboclos.

CONSIDERAÇÔES FINAIS
A presidência de Jair Bolsonaro e a política ambiental implementada no país vem se
caracterizando como uma política de desmonte da estrutura fiscalizatória, incentivando o avanço
das cadeias de commodities agrícola, o que tem levado à derrubada e à queima criminosa de
florestas.
Em momentos como esse, aressemantização simbólica de uma festa amazônida como o
Çairé ganha relevo por trazer à pauta cultural, midiática e popular, o grito de socorro de
comunidades, de povos e de não-humanos.

REFERÊNCIAS
BARBOSA, Erika Siqueira. Festa e fé: o afeto como propulsor da comunicação midiática no
espetacular Çairé de Alter do Chão. Belém: Programa de Pós-GraduaçãoComunicação, Cultura e
Amazônia, Mestrado em Ciências da Comunicação da Universidade Federal do Pará, 2017.

BOTO COR DE ROSA. Alter do chão: o berço da vida. Programa. Santarém: Associação
Folclórica Boto Cor-de-Rosa, 2019.

BOTO TUCUXI. Resistência Borari. Programa. Santarém: Grupo Sociocultural Boto Tucuxi,
2019

BOYER, Verónique. Sairé ‘religioso’ ou Çairé ‘profano’: uma patrimonialização em tensão.


Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/319243178

CARVALHO, Luciana Gonçalves de (coord.) Festa do Çairé de Alter do Chão. Fotos de Carlos
Matos Bandeira, Carlos Matos Bandeira Júnior e Claudia Seixas. Santarém: UFOPA, 2016.

CONSELHO GESTOR DA APA ALTER DO CHÃO. Área de Proteção Ambientalde Alter do


Chão: Plano de Uso da APA Alter do Chão. Santarém, novembro de 2012.

SURGIK, Ana Carolina Santos. Efeitos das leis conservacionistas sobre a biota, os recursos
hídricos e a população humana da área proposta para a APA de Alter do Chão, Santarém,
PA. Manaus: INPA/UFAM, 2006

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CCDRU COMO CONCILIAÇÃO DE INTERESSE DE TERRAS


QUILOMBOLAS E UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Marcelino Conti de Souza*, Lilian Regina Furtado Braga**, Wilson Madeira Filho***

*Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense -


contimarcelino@gmail.com
**Mestranda do PPGSD- UFF - lilian@mppa.mp.br
***Professor Titular da Faculdade de Direito e do PPGSD-UFF -wilsonmadeirafilho@hotmail.com

INTRODUÇÂO
O presente artigo relata o processo de titulação dos quilombos em Alto Trombetas 1 e Alto
Trombetas 2, territórios quilombolas sobrepostos por duas unidades de conservação, a Reserva
Biológica do Rio Trombetas(1979) e a Floresta Nacional Saracá-Taquera (1989).

O LONGO PROCESSO DE TITULAÇÃO


O processode titulação iniciado em 1989 se arrastou de forma lenta e a questão, passados
cerca de 30 anos, foi levada àCâmara de Conciliação e Arbitragem (CCAF) da AGU (Advocacia
Geral da União) onde o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) discutiram por mais 5 anos sem
apontar a solução para o impasse,tornando-se necessáriasua judicialização. Desse modo,uma Ação
Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal em 2013 obteve decisão, em fevereiro de
2015, determinando a obrigação de agir do INCRA, daFundação Palmares e do ICMBio, sendo que
a AGU recorreu mas a sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal.
O INCRA publicou os Relatórios Técnicos de Identificação e Delimitação (RTID) da
comunidade remanescente de quilombo em abril de 2017, abrindouma mesa de diálogos entre as
entidades governamentais e as associações dos Territórios quilombolas. As reuniões se deram em
Brasília, e ficou acordado que o ICMBio formalizaria os termos de uma proposta que permitisse
uma alternativa para conciliar os direitos dos quilombolas e a existência de duas Unidades de
Conservação.
Em dezembro de 2017, tempo aprazado entre todos envolvidos, foram realizadas duas
reuniões, uma em cada território, para repassar informações e dar início ao processo de consulta
livre, prévia e informada. Nesse momento, o ICMBIO deveria apresentar uma proposta formal, o
que não ocorreu, prejudicando o desenvolvimento do dialogo e retardando em pelo menos mais seis
meses a publicação das Portarias de Reconhecimento dos territórios quilombolas nas áreas
sobrepostas às duas UC’s, identificadas no RTID do INCRA.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A proposta apresentada pelo ICMBIO aos territórios distinguiu as UCs,atribuindo duas


soluções jurídicas: para a Reserva Biológica (REBIO) do Rio Trombetas, unidade de conservação
de Uso Integral, propôs um Termo de Compromisso de UsosMúltiplos; e para a Floresta Nacional
(FLONA) Saracá-Taquera, categoria do grupo de unidades de conservação de Uso Sustentável,
propôs apenasum Contrato de Direto Real de Uso (CCDRU), permanecendo ambas as áreas como
UC, e não modificando sua categorização no SNUC.

PROCEDIMENTALIZAÇAÕ VIA CCDRU


No CCDRU, a gestão de parte do território de uma unidade de conservação é repassada a
uma associação que representa os moradores. As cláusulas de uso do território são definidas em
comum acordo.
Pelo CCDRU, o ICMBio continua responsável pela administração da UC, dentro da qual
estão as terras cedidas, por meio de instrumentos de gestão (cadastramento de famílias, perfil da
família beneficiaria, conselho, plano de manejo, autorização de uso sustentável de recursos naturais
etc.), em estreita relação com a comunidade local e com a maioria do conselho, que é deliberativo.
A continuidade do processo de conciliação prevê uma extensa agenda de trabalho acordada
entre governo e associações quilombolas que incluiu, entre outras atividades, a arrecadação das
terras da FLONASaracá-Taquera e REBIO Rio Trombetas; a definição dos termos dos Contratos de
Concessão de Direito Real de Uso a serem firmados pelo ICMBio com as associações quilombolas
até que o título de propriedade possa ser emitido; a revisão do Plano de Manejo da FlonaSaracá-
Taquera e o acordo sobre a solução a ser adotada para a regularização da porção dos territórios
quilombolas incidente na REBIO Trombetas.
Descartada a desafetação, neste momento em queseria risco propor uma lei ao Congresso
Nacional, que poderia desfigurar a unidade de conservação, a dupla afetação é uma possível
solução a ser adotada, constatada a sobreposição entre a UC e o território quilombola. Referida tese
já foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e vem sendo aplicada como forma de
trazer uma proteção dupla a espaços sobrepostos.
Em 10 de setembro de 2019 foi aprovada pelos territórios quilombolas uma minuta de
CCDRU numa reunião no MPF, após varias reuniões de alinhamentos. Trata-se da Cessão sob o
regime de concessão de direito real de uso gratuito e resolúvel para o território da FLONA, com
base nos limites reconhecidos pelo INCRA,a título coletivo e pró-indiviso,por tempo
indeterminado, sendo inalienável, imprescritível e impenhorável.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Há ainda um caminho a ser percorrido mas que já afasta o risco de aplicação do art. 42 da lei
do SNUC, que determina a remoção das populações tradicionais residentes em unidades de
conservação nas quais sua permanência não seja permitida.

REFERÊNCIAS
ANDRADE, Lúcia M. M.Quilombolas em Oriximiná: desafios da propriedade coletiva In:
ANDRADE, Lúcia M. M.; GRUPIONI, Denise Fajardo (org.). Entre águas bravas e mansas,
índios & quilombolas em Oriximiná. São Paulo, Comissão Pró-Índio de São Paulo, Iepé, 2015.

MMA/IBAMA. Revisão do Plano de Manejo da Reserva Biológica do Rio Trombetas. Brasília:


Edições IBAMA, 2004. Também disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/imgs-unidades-coservacao/rebio_trombetas.pdf

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

QUEIMADAS NA FLORESTA AMAZÔNICA: HUMANOS E NÃO-


HUMANOS INVISIBILIZADOS E A NECROPOLÍTICA ESTATAL

Luiza Alves Chaves*, Wilson Madeira Filho**

*Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense -


luizachavesjgd@gmail.com
**Professor Titular da Faculdade de Direito e do PPGSD-UFF - wilsonmadeirafilho@hotmail.com

1. OBJETO E OBJETIVO
Este trabalho examina o impacto dos discursos políticos desmentindo dados apresentados
pelo INPE (2019) referente ao aumento das queimadas e do desmatamento na Floresta Amazônica e
reforçando os projetos do agronegócio no Brasil para os indivíduos humanos e não-humanos que
residem na Floresta.
Objetiva-se estabelecer como a ascensão de políticas que ampliam a degradação ambiental
acabam reforçando a subjugação de indivíduos que são constantemente oprimidos e negligenciados
ao longo do processo de construção de políticas públicas ambientais.
O tema foi escolhido pela necessidade de se compreender o fenômeno das queimadas na
região amazônica, diante inclusive da repercussão internacional do episódio e da invisibilidade que
se dá a diversos sujeitos humanos e não-humanos diretamente envolvidos no processo, em
detrimento de um discurso internacional pautado em uma perspectiva de modelo de Natureza
conservacionista e antropocêntrico.
Nesse sentido, optou-se por fazer uma correlação entre a necessidade de se constituir uma
percepção diferente de risco, conforme apresenta Ulrick Beck (2018), onde seja possível entender
que alguns indivíduos acabam por suportar mais malefícios dos desgastes ambientais, entendendo
como isso se dá no caso específico das queimadas na Floresta Amazônica e avaliando se a
construção do discurso estatal que reforça essas práticas ilegais pode se constituir como prática de
necropolítica.

2. METODOLOGIA
A metodologia utilizada será o levantamento de dados acerca das queimadas que vem
ocorrendo no Brasil ao longo do ano de 2019, apresentando o cenário, os agentes envolvidos, seus
discursos e os números acerca das áreas afetadas, e das populações humanas e não-humanas
atingidas. Esses dados foram coletados através de análise de reportagens jornalísticas de veiculação

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

nacional e internacional sobre o tema, bem como de números levantados por organismos nacionais
e internacionais de pesquisa.
Trata-se de cotejar a situação mapeada pelo INPE e os discursos retóricos ideológicos do
governo federal. Nesse sentido, as previsões destacadas pelo produzido pelo Programa de
Monitoramento de Queimadas e Incêndios Florestais em julho de 2019, revelavam clima mais seco
que a média, com tendência esperada dos focos de queimadas no Brasil para o mês de agosto acima
da média em relação à climatologia (47 mil focos) e certamente superior aos focos detectados em
2018, que foi um ano relativamente úmido. Entrementes, a providência da presidência da República
diante desse fato concentrou-se na solicitação da exoneração do Diretor do INPE, Ricardo
Galvão.Desse modo, além do dano para o “índio”, para a “porra da árvore” e mesmo para o
“minério”, relatório da organização WWF estima que 180 espécies da fauna e 85 da flora brasileira
estão ameaçadas de extinção nos trechos atingidos por fogo
Procede-se também à análisedos conceitos de risco, trazido por Beck (2010, 2018), e de
necropolítca, na percepção de AchillieMbembe (2018), para compreender como determinados
grupos suportam maior impacto dos malefícios trazidos com as queimada. Trata-se de avaliar se e
como o caminho que vem seguindo os discursos das lideranças políticas brasileiras, no que tange à
perspectiva ambiental, podem constituir uma estrutura necropolitica.

3. CONCLUSÃO
Sem a pretensão de exaurir os caminhos que podem levar à reflexão da temática, o
desenvolvimento do trabalho busca apresentar o quadro das queimadas na Floresta amazônica
brasileira, no ano de 2019, para que se possa refletir sobre como os discursos de negação de
degradação ambiental, bem como de reforço da política de agronegóciocausa sofrimento, dor e
morte; sem deixar de avaliar que embora a perspectiva internacional de preservação dos espaços
naturais seja de extrema importância, a percepção vinculada diretamente a um modelo de natureza
em que humanos e não-humanos se colocam em fronteiras opostas reforça a opressão à
comunidades tradicionais que vem sendo diretamente afetadas pelas queimadas, bem como a não-
humanos (LATOUR: 2004) que são postos em espaço de vidas menos relevantes, tendo sua
preservação vinculada somente no limite da necessidade à conservação da vida humana.
O apagamento cultural, pessoal e simbólico das populações que vivem na Floresta é constante
e sistemática, a ponto de suas lutas e corpos serem apagados, mesmo em desastres onde suas vidas
são diretamente atingidas. Assim, dentro dessa perspectiva, é possível analisar se existe (ou não) o
desenvolvimento necropolítico, pelo Estado,na constituição de um sistema que é feito para calar.

4. REFERÊNCIAS
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BECK, Ulrich.A metamorfose do mundo:novos conceitos para uma nova realidade. Tradução
de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
BECK, Ulrick, Sociedade de risco: rumo a uma outra modernidade. Tradução: Sebastião
Nascimento. São Paulo: Ed. 34, 2010.

INPE. Coordenação Geral de Observação da Terra. Deter. Disponível


em:http://www.obt.inpe.br/OBT/assuntos/programas/amazonia/deter

LATOUR, Bruno. Políticas da natureza: como fazer ciência na democracia. Tradução de Carlos
Aurélio Mota de Souza. Bauru SP: EDUSC, 2004..

MBEMBE, Achille. Necropolítica. São Paulo: N-1 edições, 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

DESAFIOS PARA A GESTÃO PARTICIPATIVA DA ILHA DO MEL,


PARANÁ
CHALLENGES FOR PARTICIPATORY MANAGEMENT OF HONEY ISLAND, PARANÁ

Patrícia Denkewicz*, Tiago Grespan**, Cristina Teixeira Frutuoso ***

Programa de Pós-Graduação Meio Ambiente e Desenvolvimento, Universidade Federal do Paraná, Brasil.*


Departamento de Ciências Florestais, Universidade Estadual do Centro-Oeste, Brasil. **
Programa de Pós-Graduação Meio Ambiente e Desenvolvimento, Universidade Federal do Paraná, Brasil. ***
(ProfessorOrientador)

1. INTRODUÇÃO
A gestão participativa em Unidades de Conservação (UCs) não é um debate recente nem
livre de controvérsias (IRVING, 2014), é uma discussão que ao longo do tempo apresentou diversas
interpretações e objetivos. De acordo com Pymbert e Pretty (1997), até a década de 70, era
entendida como uma ferramenta que buscava a submissão voluntária das populações locais às
propostas das UCs. Na década de 80 passou a ser interpretada como interesse pela proteção dos
recursos naturais. É apenas nos anos 90, que a gestão participativa passa a ser compreendida como o
envolvimento das populações na criação e no manejo das UCs.
Atualmente, a gestão participativa, no campo das políticas ambientais está amparada
legalmente pela Constituição Federal (art. 225); pela Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA)
– Lei nº 6. 938/1981; pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) – Lei nº
9.985/2000; e pelo Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas (PNAP) – Decreto nº
5.758/2006 (PRETTO; MARIMON, 2017). A partir desse alicerce legal, a democratização da
gestão das áreas protegidas e o destaque social nos atos governamentais de proteção ambiental
transformaram-se em um compromisso central das políticas públicas ambientais, mesmo que,
inicialmente, somente no âmbito do discurso político (IRVING, 2014).
Especialmente sobre a gestão das UCs “coube à lei do SNUC introduzir a obrigatoriedade e
as diretrizes geraissobre o tema, assegurando a participação efetivadas populações locais e demais
atores na criação, implantação e gestão dessas áreas protegidas” (PRETTO; MARIMON, 2017, p.
330). Esta determinação da participação social tem-se apresentado em três processos distintos: na
instituição das unidades de conservação(através de consultas públicas), na elaboração ourevisão dos
planos de manejo das UCs, e na criaçãoe no funcionamento dos conselhos gestores (PRETTO;
MARIMON, 2017).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A gestão participativa será analisada por esse trabalho naIlha do Mel,


localidadeconstituída por duas Unidades de Conservação (UCs), a Estação Ecológica da Ilha do
Mel (ESEC) e o Parque Estadual da Ilha do Mel (PE) (IAP, 2012). Ambas as UCs, historicamente
por meio de suas normativas regulatórias, estabelecem conflitos socioambientais com as
comunidades locais (HARDER, 2014; GONZAGA; DENKEWICZ, 2013). Estas normativas
regulatórias são estabelecidas pelos planos de manejos das UCs e pelo Plano de Uso, o qual foi
instituído por uma exigência dos planos de manejos por meio da Lei Estadual 16.037/2009, que
regulamenta a área de ocupação da Ilha do Mel.
Atualmente, esse Plano de Uso está sendo atualizado e nessa conjuntura há a proposta de
criação da Unidade Administrativa da Ilha do Mel, a UNADIM, que se caracteriza como um novo
modelo de gestão que abarcará o Conselho Gestor. Entretanto, há contradições no processo de
implantação desse modelo, que dificultam a participação social. Desta maneira, esse trabalho
objetiva analisar se o processo de implantação da Unidade Administrativa da Ilha do Mel é
participativo.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho é uma pesquisa de caráter exploratório e descritivo (MARCONI &
LAKATOS, 2003) e foi estruturada sob a ótica de um estudo de caso (GIL, 1999). Como técnicas
de coleta de dados optou-se por entrevistas e análise documental. As entrevistas foram individuais
e realizadas com as comunidades locais e com o gestor ambiental. Foi aplicado um questionário
semiestruturado contendo questões relativas (i) à participação social nos espaços de decisão; e (ii)
ao modelo de gestão proposto. A pesquisa documental baseou-se na análise do Plano de Uso da Ilha
do Mel elaborado em 2004, que atualmente está sendo atualizado pelo IAP para implantação.
A área de estudo é a Ilha do Mel, localizada na entrada da baía de Paranaguá, município à
qual é pertencente como distrito. Está inserida no Complexo Estuarino-Lagunar de Iguapé –
Cananéia – Paranaguá. Situada na latitude 25º30’S e longitude 48º20’W, sendo separada pelo
Balneário de Pontal do Sul e pelo Canal da Galheta. Ao seu Norte, localiza-se a Ilha das Peças e o
Parque Nacional do Superagui. (SEMA/IAP, 1996). A Ilha do Mel é de propriedade da União
Federal, a qual cedeu ao Estado do Paraná, em 1982, o direito de exercer posse sobre o local, por
meio de um regime de aforamento (HARDER, 2014). É composta por cinco comunidades Brasília,
Farol, Encantadas, Fortaleza e Ponta Oeste e por duas UCs.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A UNADIM é o novo modelo de gestão proposto pelo IAP, o qual surge com a atualização
do Plano de Controle Ambiental e Uso do Solo da Ilha do Mel. Essa proposta objetiva organizar e
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

distribuir as funções administrativas entre os órgãos responsáveis (Governo Estadual e Municipal),


uma vez que a Ilha do Mel não apresenta uma equipe de gerenciamento, mas uma sobreposição de
atribuições entre os diversos órgãos e instâncias que atuam sobre o seu território (PARANÁ, 2004).
A composição da UNADIM ocorrerá por meio de três instâncias: a estadual representadas pelo IAP
e pelo COLIT; a municipal pela Prefeitura de Paranaguá; e a última instância, representada pelo
Conselho Gestor que garantirá a participação social das comunidades locais. A criação da
UNADIM vem sendo articulada desde 2004, porém, foi a partir de 2015, quando foi iniciada a
atualização dessa proposta, que ganhou visibilidade. Esse novo modelo está em fase de
implantação. Foi atualizado pelo IAP e, atualmente, encontra-se em processo de discussão para
possível aprovação.
A participação social proposta para a UNADIM não é incomum, uma vez que gestão
participativa nas UCs é garantida pelo SNUC por meio da obrigatoriedade da instituição do
Conselho Gestor, o que faz com que os modelos de gestão o comportem em sua. Segundo Gohn
(2007) os Conselhos Gestores são ferramentas importantes para a efetivação da gestão participativa
e também simboliza novas formas de interação entre o poder público e a sociedade.
Entretanto, de acordo com os dados levantados por meio das entrevistas com as
comunidades locais, o IAP não possibilitou o envolvimento dos moradores no processo de
planejamento da UNADIM, pois o Conselho Gestor proposto no Plano de Uso não foi instituído,
além de não ter sido promovida nenhuma forma de discussão entorno dessa proposta. Logo, tem-se
uma comunidade local que não consegue acessar e participar dos espaços de decisões.
Além do mais foi verificadoque háuma discordância na forma de participação da
comunidade, uma vez que os gestores ambientais sugerem a participação social, de caráter
consultivo, por meio do Conselho Gestor e a comunidade solicita um Conselho Gestor de caráter
deliberativo. Desta maneira, verifica-se que um contexto de centralização do planejamento e da
gestão, representado pela falta de diálogo e pela limitação do poder de decisão dos moradores,
intensificou os conflitos entre o órgão ambiental e as comunidades locais.
A exclusão social das comunidades locais nos processos decisórios de gestão das UCs não é
recente e muitos dos fracassos relacionados à gestão dessas áreas são derivados desses processos
exclusivos, porém esses fracassos também impulsionaram as discussões sobre a participação social
nos espaços decisórios das UCs (CARRILLO E CHARVET, 1994) e atualmente esse processo
participativo“constitui-se em um elemento-chave na produção de um novo conhecimento, na
determinação e no reconhecimento das necessidades essenciais da comunidade envolvida, na busca
de soluções e, sobretudo, na transformação da realidade” (IRVING, 2018, p. 62), e é a partir dessa
perspectiva que questiona-se o processo de implantação da UNADIM, pois implantar uma unidade

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

administrativa sem a participação social das comunidades, sabendo que essas detêm o
conhecimento das necessidades locais, é investir nos antigos fracassos.
De acordo com Irving (2018, p. 63) “os conhecimentos adquiridos em contato com a
realidade são absolutamente indispensáveis para a concepção e implementação de programas de
desenvolvimento ou gestão”. Além disso, a gestão participativa possibilita o encaixe das demandas
e costumes locais ao objetivo de desenvolver um sistema de uso sustentável do ambiente, que para a
partir dessa combinação entre a conservação ambiental e os interesses das comunidades locais,
consiga-se alcançar a melhoria na qualidade de vida (LIMA, 1997; IRVING, 2015). É preciso
refletir sobre a autonomia das próprias comunidades em decidirem que trajetórias pretendem seguir
e de que forma seria possível encontrar caminhos para assegurar os benefícios e a melhoria da
qualidade de vida condizente com seus valores, desejos e aspirações (IRVING, 2001).
É importante salientar que a Ilha do Mel possuí um histórico de gestão não participativa,
onde a população foi excluída de diversos processos, como por exemplo, a criação da ESEC e do
PE. Os resultados dessa centralização são os atuais conflitos socioambientais em torno do
zoneamento dessas áreas protegidas. Na Ponta Oeste por exemplo, desde a instituição da Lei
Estadual 16.037/2009 implantada por meio de uma exigência do plano de manejo da ESEC,
instaurou-se um conflito entre a comunidade local e o IAP, uma vez que por meio dessa diretriz
(16.037/2009), o território da comunidade tornou-se área de reversão e teve seus limites reduzidos
(HARDER, 2014; GONZAGA E DENKEWICZ, 2013). Isso acontece, também, com os moradores
da Praia Grande, que veem seu território tornar-se área de reversão, o que futuramente, implicará na
remoção da comunidade.
Portanto, os resultados das entrevistas (gestores ambientais e comunidades locais) e da
análise documental no Plano de Uso da Ilha do Mel apontaram que o processo de criação da
UNADIM, teoricamente, buscou seguir um modelo participativo, porém na prática caracterizou-se
como a repetição de um modelo de gestão centralizador, onde a população local permanece
excluída do processo.

4. CONCLUSÃO
O objetivo proposto por essa pesquisa foi analisar se o processo de implantação da
Unidade Administrativa da Ilha do Mel é participativo e concluiu-se que teoricamente a
estruturação da UNADIM demonstra-se participativa, porém, as ações desenvolvidas para sua
implantação não condizem com o proposto, demonstram apenas que seguem práticas
centralizadoras. Logo, conclui-se que a estratégia adotada pelo IAP para a implantação da
UNADIM não se caracteriza como participativa, uma vez que as comunidades locais não

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

demonstraram conhecimento sobre tal processo e o Conselho Gestor, espaço destinado para a
participação social, não foi instituído.
Entende-se que garantir, através do Conselho Gestor, a participação social nas decisões
relacionadas a gestão é uma prática comum e legítima nas UCs, entretanto, é considera-se
ilegítimo viabilizar a participação social por meio de um Conselho Gestor inexistente. Sendo
assim, conclui-se que a participação social sugerida pelo órgão ambiental gestor da Ilha do Mel
não é efetiva, caracterizando a implantação da UNADIM como uma iniciativa centralizadora.

5. REFERÊNCIAS
CARRILLO, G. O. & CHARVET, P. S. Áreas Silvestres protegidas y comunidades locales en
América Latina. Santiago, Chile: Oficina de la FAO para América Latina y el Caribe, 144p,
1994.

GONZAGA, C. A. M.; DENKEWICZ, P.; PRADO, K. C. P. Unidades de Conservação, ecoturismo


e conflitos socioambientais na Ilha do Mel, PR, Brasil. Revista ADMPG 7, 1, 61-67, 2014.

HARDER, E. A constitucionalização dos direitos culturais no brasil e os sentidos de uma


perspectiva patrimonial. Tese (Doutorado em Direito), 2014. Curitiba, Universidade Federal do
Paraná, 2014.

IRVING, M. A. O Ecoturismo no Brasil: Retrospectiva e Tendências. Boletim de Turismo e


Administração, 10, 2, 2001.

IRVING, M.; RODRIGUES, C. G. de O.; RABINOVICI, A. COSTA, H. A. Turismo, Áreas


Protegidas e Inclusão Social: diálogos entre saberes e fazeres. 1 Ed. – Rio de Janeiro: Folio
Digital: Letra e Imagem, 2015.

LIMA, D. Equidade, Desenvolvimento Sustentável e Preservação da Biodiversidade.In: Faces


do Trópico Úmido, Edna Castro e F. Pintos (eds.). Belém: Cejup, 1997.

PIMBERT, M.; PRETTY, J. P. Parks, People and Professionals: Putting “Participation” into
protected Areas Management. In: GHIMIRE, K. & PIMBERT, M. (eds). Social change and
conservation. London: Earthscan Publ, p.297-330, 1997.

SAMMARCO, Yanina Micaela. Educación ambiental y Paisajes para la gestión participativa


de las Áreas Protegidas en Brasil. Tese (Doutorado em Educação Ambiental) Universidad
Autonoma de Madrid, Madri – Espanha, 2013.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ANÁLISE PRELIMINAR DO CONFLITO SOCIOAMBIENTAL


DECORRENTE DA MINERAÇÃO DE AREIA NA APA LAGO DO AMAPÁ,
RIO BRANCO, ACRE
PRELIMINARY ANALYSIS OF SOCIAL AND ENVIRONMENTAL CONFLICT FROM SAND
MINING IN APA LAGO AMAPÁ, RIO BRANCO, ACRE

*Mirna Pinheiro Caniso; **Francisco Luiz Dietzel Faraco

*Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Acre (Sema), Brasil; **Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBIO), Brasil

INTRODUÇÃO
Em 2018, o setor de mineração representou 4% do Produto Interno Bruto (PIB), gerou 180
mil empregos diretos e foi responsável por 25% do saldo comercial do Brasil. (BRASIL, 2019)
A legislação ambiental brasileira (Constituição Federal de 1988, Resolução CONAMA Nº -
1/1986) considera a mineração como uma atividade modificadora do meio ambiente e, portanto,
passível de licenciamento ambiental.O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC), Lei Federal nº 9.985/2000, ao classificar as unidades de conservação, destacou que, a
mineração pode ser permitida nas UCs de uso sustentável, com exceção da Reserva
Extrativista (onde há expressa proibição em lei - artigo 18, §6°).
Dentre as atividades de mineração, a extração de areia em leitos de rios responde por 90%
da produção brasileira (DNPM, 2002), porém, conforme Nogueira (2016: p.13),a ocupação e uso
urbano do espaço estão entre os principais conflitos oriundos dessa atividade econômica,sobretudo
quando próximo dos mercados consumidores. Dela decorrem a degradação dos recursos naturais,
especialmente a supressão da vegetação local nativa, além de a instabilidade de ambientes
ribeirinhos, o aumento da turbidez da água, até mesmo,as modificações e desvios no leito do rio.
Na capital do Estado do Acre, a Área de Proteção Ambiental (APA) Lago do Amapá é um
dos principais locais de mineração de areia, atividade que antecedea data da sua criação, em 2005, e
em cujo perímetro estão instalados 13 empreendimentos licenciados.
As canchas, como são chamados os locais de armazenamento de areia,normalmente estão
próximos às margens do rio Acre, sempre vinculadas à localização das dragas flutuantes
posicionadas na calha principal do rio, ecompreendemuma área aproximada de 25,6 hectares - 0,5%
da área da UC. Elas estão em área de preservação permanente, conflitando com a legislação
ambiental. O fato de os pátios de armazenamento de areia não estarem normatizados no
Zoneamento da unidade, constitui outra fonte de conflito, para o ordenamento territorial da APA.A
mineração de areia, apesar de ser empreendimento licenciado, não cumpre com as medidas
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condicionantes, pois não são monitoradas pelo órgão ambiental licenciador, o que tem agravado a
condição e a qualidade de vida dos moradores da APA. Além das questões ambientais mencionadas,
existe um componente social e político envolvendo moradores e empresários do setor, que agrava e
intensifica os conflitos socioambientais: as relações assimétricas de poder e o acesso aos recursos
naturais, as quais serão analisadas preliminarmente, visando a criação de uma estratégia de gestão
de conflitos socioambiental.

MATERIAL E MÉTODO
A APA Lago do Amapá é uma unidade de conservação de uso sustentável, criada no ano de
2005 pelo Decreto Nº 13.531 de 26 de dezembro de 2005, e localizada a cerca de 8 km do centro do
município de Rio Branco-AC. Ela é gerida pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA),
está registrada no Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC) sob o código:
0000.12.0941, possui extensão de 5.224 hectares, e seus alvos de conservação são: o lago do
Amapá, o aquífero Rio Branco, a foz do Riozinho do Rôla, fragmentos florestais remanescentes no
cinturão verde da cidade, além de diversos igarapés, que abastecem o Rio Acre. No seu perímetro é
realizada a captação de água para abastecimento urbano, assim como atividades econômicas de
piscicultura, extração de areia do leito do rio, explotação de água subterrânea, pecuária, agricultura
familiar e concentra uma variedade de restaurantes de culinária regional.
Para a análise preliminar do conflito socioambiental e para a criação de uma estratégia de
gestão de conflitos, utilizamos o método proposto por Barbanti Jr (2010), que consiste em um
instrumento de gestão e inclui os seguintes passos:
1) Desenvolver a capacidade de análise: inicialmente é necessário contextualizar os padrões
e dimensões que inter-relacionam-se ao conflito, são eles macro – que referem-se a uma
interação do sistema internacional; padrões meso – padrões de políticas nacionais;
padrões micro – interações do ambiente local e padrões individuais – que diz respeito
aos padrões entre indivíduos.
2) Identificar as partes interessadas: tem como objetivo identificar interesses e posições de
cada ator social. são nove, os fatores geradores e influenciadores do conflito ou “drivers”
– objetividade/subjetividade; poder; instituições e políticas; procedimentos de gestão;
cultura/racionalidade; identidade; confiança; necessidades humanas básicas e
comunicação. Os drivers do conflito estão diretamente relacionados com os processos
macro, meso, micro e individual e sua interpretação possibilita compreender o momento
no qual o processo de conflito se encontra. Ferramentas como mapa falado, diagrama de
Venn, escalada de saturação do conflito (gatilho, escalada e polarização, ponto de
saturação, negociação/ desescalada, acordo/ imposição, dinâmica pós-conflito/ novo
261
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conflito, posteriormente um novo processo conflituoso surgirá); e matriz de interação


foram utilizadas para uma melhor compreensão do conflito, sua escala e atores
envolvidos.
3) Criar estratégias de interação: existem quatro alternativas de interação: não fazer nada,
ceder,cooperar e coagir.
4) Promover a negociação direta e/ou usar intervenção de terceiras partes : técnicas de
relacionamento, que consistem em procedimentos que ajudam a melhorar o
relacionamento entre as partes, como por exemplo, separar os conflitos dos problemas de
gestão, fazer uma distinção entre necessidades e os interesses, aumentar a
interdependência entre as partes, reforçar a discussão com base em dados técnicos,
verificar a legitimidade das partes e de seus representantes, enfrentar o problema e não a
pessoa, promover espaços de negociação, conseguir a intervenção de uma terceira parte
(externa), dentre outros.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Não existem dados científicos confiáveis que atestem a capacidade de suporte para a
quantidade de mineradoras instaladas no perímetro da APA, também não existem estudos
hidrossedimentológicosoficiais da bacia do rio Acre.
A percepção dos moradores é que a atividade de mineração de areia está alterando a
dinâmica de formação de praias no rio Acre.
O planejamento da intervenção para a gestão de conflitos na APA está na fase de
planejamento. Considerando os sete passos de Barbanti Jr. (2010), até o momento foram cumpridos,
na APA, quatro deles: i) reflexão sobre aspectos macro (estado), meso (município), micro (Apa) e
individual (moradores); ii) identificação e a importância dos “drivers” de conflito - fatores
geradores e influenciadores de processos conflituosos (objetividade/subjetividade, poder,
instituições e política, procedimentos de gestão, cultura/racionalidade, identidade, confiança,
necessidades humanas básicas e comunicação); iii) verificação de qual o momento do ciclo o
conflito está (gatilho, escalada e polarização, ponto de saturação, negociação/ desescalada, acordo/
imposição, dinâmica pós-conflito/ novo conflito, posteriormente um novo processo conflituoso
surgirá); e, iv) identificação das partes interessadas.
Identificamos cinco fatores geradores e influenciadores de processos conflituoso, os “drivers
do conflito”: i) poder - econômico e político, ligado diretamente à classe empresarial que tem
influência nas esferas de tomada de decisão e fácil acesso e voz na classe política local; ii)
instituições e políticas – as instituições reforçam a noção de que estes territórios protegidos
merecem atenção especial; iii) procedimentos de gestão - demanda/ cobrança do conselho gestor
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pela implementação do plano de gestão, retomada de atuação no território; iv) necessidades


humanas básicas – a questão do deslocamento dos moradores está associada a seu direito de ir e vir
e vi) comunicação – a gestão da unidade não conseguiu estabelecer espaços de comunicação
permanente sobre a atuação no território, bem como, estabelecer um canal direto de comunicação
com os moradores.
Considerando os momentos do ciclo do conflito, identificamos o gatilho e consideramos que
o processo está em franca etapa de escalada e polarização, ou seja, momento em que as partes estão
defendendo suas posições e interesses. Como gatilhos identificamos: o descumprimento das
condicionantes do licenciamento ambiental, acidente ambiental envolvendo vazamento de
combustível de veículo pesado,, deterioração do ramal em função do tráfego intenso de máquinas
pesadas (caminhões e trator) é determinante para a deterioração rápida do ramal, no período de
chuvas, há um agravamento na drenagem e a ocorrência de atoleiros é recorrente, dificultado o
acesso por parte dos moradores. Houve um episódio em que o ônibus escolar não conseguiu trafegar
pela via, o que ocasionou que o retorno dos alunos as suas casas ocorressem em horário noturno.
Em relação as partes interessadas, cabe ressaltar que no ano de 2014, houve atuação da
promotora de Justiça Especializada de Habitação e Urbanismo do Ministério Público do Estado do
Acre (MPE), que visitou os moradores do ramal do Rodo e estabeleceu medidas de controle
ambiental mais presentes no território.
Odiagrama de Venn possibilitou reconhecer seteatoresenvolvidos (SEMA, Associação
deMoradores da APA, Instituto de Meio Ambiente do Acre (IMAC), Ministério Público do Estado
do Acre, mineradores de areia, Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e Agência
Nacional de Águas (ANA).

CONCLUSÃO
Mesmo estando na metade do processo, percebemos que a aplicação do método facilita a
descrição, a compreensão, a análise e definição do processo de intervenção, e até o momento,
permite identificar os elementos fundamentais de análise, as partes interessadas, o reconhecimento
de quatro de nove drivers do conflito e a determinação do vetor da escalada no ciclo. As próximas
etapas da gestão envolverão (5) a negociação das condições de interação, (6) a criação das
estratégias de interação e (7) o uso de técnicas de relacionamento. São premissas para as próximas
etapas do cicloe agregação de parceiros.
Esta análise será submetida ao conselho gestor e replicada para outros conflitos da unidade,
entre eles, ocupação irregular de terras, atividade de piscicultura na área de preservação permanente
do rio Acre e instalação de empreendimentos empresariais em desacordo com o zoneamento. Esses

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e outros conflitos serão incluídos no plano de conflito socioambiental da APA, durante a revisão do
seu Plano de Manejo,prevista para ocorrer em 2020.
A instalação de um observatório da mineração na Apa, agregando todos os representantes
dos stakeholders envolvidos na gestão do conflito socioambiental, facilitaria a produção e o
acompanhamento de informações referentes ao volume de produção, quantitativo recolhido a
Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), referentes à atividade,
aproximaria órgãos para atuarem em sinergia.

AGRADECIMENTOS
Moradores da APA Lago do Amapá, Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Acre,
instrutores e colegas do III Ciclo de Formação em Gestão Socioambiental da Academia Nacional da
Biodiversidade (ACADEBIO) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBIO).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Acre. Governo do Estado do. Decreto nº 13.531 de 26 de dezembro de 2005.

B. Jr., O. 2010. Gestão de Conflitos em Cadeias de Valor da Sociobiodiversidade. MMA/GIZ.


Brasília.

P. R. C. 2017. Adeus Amazônia. Conflitos Agrários e Socioambientais por trás do


Desmatamento no Sudoeste do Pará. Editora Prismas. Curitiba.

N, G. R. F.A extração de areia em cursos d’água e seus impactos: proposição de uma matriz
de interação. Trabalho Final de Curso apresentado ao Curso de Engenharia Ambiental e Sanitária
da Universidade Federal de Juiz de Fora, 2016.

SEMA. Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Acre. 2010. Plano de Gestão da APA Lago do
Amapá. Rio Branco.

BRASIL. Ministério de Minas e Energia. Brasília, 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

DILEMAS E AVANÇOS PARA A INCLUSÃO SOCIAL EM UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL: OS TERMOS DE
COMPROMISSO FIRMADOS ENTRE O ICMBIO E OS QUILOMBOLAS
RESIDENTES NO INTERIOR E ENTORNO DARESERVA BIOLÓGICA DO
RIO TROMBETAS, ORIXIMINÁ, PARÁ, BRASIL

Carlos Adriano Siqueira Picanço*, Reinaldo Corrêa Costa**.

Departamento de Pesquisa, Inovação e Pós-graduação (Depesp), Campus Porto Velho Zona Norte, Instituto Federal de
Rondônia, Brasil.* (Autor Correspondente).
Laboratório de Estudos Sociais (Laes), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Ministério da Ciência,
Tecnologia, Inovações e Comunicações, Brasil.** (Professor Orientador).

1. INTRODUÇÃO
Este artigo refere-se aos dilemas e avanços relacionados aos Termos de Compromisso nº
119/2011, 120/2011 e 121/2011, firmados em 20 de dezembro de 2011, entre o Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio)e as associações representativas dos coletores
tradicionais de castanha-do-brasil(Bertholletia excelsa H. B. K) que residem no interior e entorno
da Reserva Biológica do Rio Trombetas. O objetivo desses Termos de Compromisso é estabelecer
regras para a coleta e a comercialização da castanha-do-brasil dentro dos limites da Reserva
Biológica do Rio Trombetas e das áreas a montante dessa unidade de conservação.
O Termo de Compromisso é um instrumento de gestão de unidades de conservação que
possui previsão legal no Decreto Federal nº 4.340, de 22 de agosto de 2002, que regulamenta o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Foi instituído pela Instrução Normativa nº
26, de 04 de julho de 2012, que estabelece as diretrizes e regulamenta os procedimentos para
elaboração, implementação e monitoramento de termos de compromisso entre o ICMBio e
populações tradicionais residentes em unidades de conservação onde a sua presença não seja
admitida ou esteja em desacordo com os instrumentos de gestão. Tal instrumento surgiu para
minimizar os conflitos pelo acesso e uso dos recursos naturais em unidade de conservação de
proteção integral, demandados por povos tradicionais residentes no interior e entorno dessas
áreas(TALBOT, 2016).
Os quilombolas que residem no interior e entorno da Reserva Biológica do Rio
Trombetassão oriundos de grupos negros que resistiram, por meio das fugas, ao regime escravocrata
das grandes fazendas de cultivo de cacau e de criação de gado instaladas, a partir de meados de
1780, na região de Santarém e de Óbidos (CASTRO; ACEVEDO, 1998). Na produção do novo
lugar os quilombolas do vale do rio Trombetas passaram a desenvolver diversas atividades

265
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

produtivas, dentre as quais, o extrativismo (vegetal e animal) e a agricultura familiar, ambas


utilizadas tanto para o próprio sustento (valor de uso da matéria prima) quanto para
comercialização(valor de troca do recurso natural) de parte da produção.
A partir das décadas de 1960 e 1970, o Governo Federal, por uma decisão política de integrar o
espaço amazônico ao restante do país, passou a agir com uma verdadeira política de intervenção
regional, com clara inspiração geopolítica do segmento militar, deslocando os seus interesses para o
subsolo, para as riquezas minerais da Amazônia, que se tornou alvo de grandes investimentos do
Governo Federal, como o Programa de Integração Nacional (PIN (GONÇALVES, 2012).
Nesse contexto, foi implantada, em Porto Trombetas, a Mineração Rio do Norte, um consórcio de
empresas multinacionais que extrai minério de bauxita no vale do rio Trombetas. Juntamente com a
MRN foram implantadas unidades de conservação no vale do rio Trombetas, dentre as quais, a
Reserva Biológica do Rio Trombetas, criada em 1979, com uma área de 385.000 hectares, no
entorno da área adquirida pela MRN (FUNES, 1995; CASTRO; ACEVEDO, 1998; FARIAS
JÚNIOR, 2016; SCARAMUZZI, 2016).
A Reserva Biológica do Rio Trombetas é uma categoria de unidade de conservação que
pertence ao grupo de unidades de conservação de proteção integral. As reservas biológicas, assim
como as demais categorias de unidades de conservação do grupo de proteção integral, não admitem
a permanência de pessoas residindo no seu interior e nem o uso direto dos recursos naturais
(BRASIL, 2000).Contudo, a Reserva Biológica do Rio Trombetas foi delimitada e instituída
sobreposta a territórios centenários de comunidades remanescentes de quilombo que ali haviam se
estabelecido desde meados do início do século XIX, sendo que atualmente há cinco comunidades
quilombolas no interior dessa unidade de conservação.
O objetivo foi analisar os termos de compromisso celebrados entre o ICMBio e as
associações representativas dos coletores tradicionais de castanha-do-brasil para a coleta e a
comercialização desse produto dentro dos limites da Reserva Biológica do rio Trombetas e das
áreas a montante dessa unidade de conservação, a partir da percepção dos quilombolas coletores
tradicionais de castanha-do-brasil.

2. MATERIAL E MÉTODO
A pesquisa foi realizada com os quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que
coletam esse produto na Reserva Biológica do Trombetas, localizada na microrregião Alto
Trombetas, na bacia do rio Trombetas, afluente da margem esquerda do rio Amazonas, no
município de Oriximiná.
A investigação foi realizada nos anos de 2018 e 2019, utilizando-se como método
procedimental para a coleta de dados o Estudo de Caso (YIN, 2005). Os dados primários foram
266
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coletados por meio de entrevistas semiestruturadas. As entrevistas semiestruturadas foram aplicadas


junto a 32 coletores tradicionais de castanha-do-brasil que residem no Território Quilombola Alto
Trombetas 1 e na comunidade Último Quilombo, ambos localizados na microrregião Alto
Trombetas. Após a coleta e tratamento dos dados, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo para
analisar os dados(BARDIN, 2011).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os Termos de Compromissosfirmados entre o ICMBio e os quilombolas coletores
tradicionais de castanha-do-brasil foi construído de forma participativa, conforme o §2º artigo, do
Artigo 42 da Lei do SNUC, o qual diz que:

“Até que seja possível efetuar o reassentamento de que trata este artigo, serão estabelecidas
normas e ações específicas destinadas a compatibilizar a presença das populações
tradicionais residentes com os objetivos da unidade, sem prejuízo dos modos de vida, das
fontes de subsistência e dos locais de moradia destas populações, assegurando-se a sua
participação na elaboração das referidas normas e ações.
§3º Na hipótese prevista no § 2º, as normas regulando o prazo de permanência e suas
condições serão estabelecidas em regulamento (Grifo nosso) (BRASIL, 2000).

Essa participação ocorreu por meio de reuniões, inicialmente, realizadas nas comunidades e,
posteriormente, com as principais lideranças das associações dos Territórios Quilombolas.
Quanto às regras dos Termos de Compromisso, há muitas reclamações por parte dos
quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil, conforme informado pelo Entrevistado 01:

“Olha, tem umas boas regras. Mas, agora tem até uns crachás que a gente... Não pode entrar
com arma, com cachorro. Não pode entrar com uma malhadeira pra pegar peixe. Aí, a gente
não pode entrar com essas coisas que eu tô dizendo. Aí, se a gente não levar, claro que os
bichos da gente vai morrer aqui. Porque se a gente ir pra lá e demorar... Aí, se a gente
chegar lá e não pegar um peixe, a gente não come porque não tem outra coisa pra matar.
Galinha não pode levar, nem pato. [...]. Foi uma dificuldade pra gente” (E1, 2018).

Quanto ao acompanhamento dos termos de compromisso, os quilombolas coletores


tradicionais de castanha-do-brasil acompanham por meio das reuniões realizadas com o ICMBio.
As regras contidas no Termo de Compromisso são flexíveis, conforme informado pelo Entrevistado
16:
“Olha, o termo de compromisso nós acompanhamos mais diretamente pelo ICMBio
mesmo. Nas reuniões agora, nesse mês, nós vamos ter três dias de reuniões pra fechar o
acordo de compromisso da castanha e outros acordos. Agora, dia 21, 22 e 23 (agosto). E a
gente vai acompanhando. O termo de compromisso, ele sofre mudanças, sofre melhorias a
cada ano. Isso é interessante, isso é bom. Isso mostra mesmo que não é um termo de
compromisso engessado, mas sim bem... ele é flexível pra mudanças. O termo de
compromisso, então, fala muito a nosso favor. A gente vai se organizando, vai melhorando,
adequando as coisas, pra que a gente possa ter mais resultados” (E16, 2018).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Quanto àsmelhorias proporcionadas pelos Termos de Compromisso em questão, os


quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil que coletam na Reserva Biológica do Rio
Trombetas afirmam que houve melhorias, pois, apesar das muitas regras, atualmente, não precisam
mais entrar às escondidas durante a noite para coletar, conforme informado pelo Entrevistado 05:

“O que melhorou, assim, depois deles liberarem pra entrar que antes quando iam... de
noventa e um pra baixo tiravam castanha, mas era tudo roubado. Iam pra lá escondido tirar
castanha. Entravam de noite e saiam de noite pra eles não verem porque se eles vissem eles
tomavam tudo. Aí já de 92 pra cá que já foi liberado, assim, pra tirar. Pelos acordos, eles
fizeram esses acordos pra... Tanto a Arqmo, assim, lutar, lutar e denunciava o que eles já
tinham feito, aí que já foi liberado. Aí já podia ir” (E5, 2018).

4. CONCLUSÃO
Os Termos de Compromisso implantados na Reserva Biológica do Rio
Trombetasconstituem avanços na gestão dessa unidade de conservação. Contudo, ainda há muitos
conflitos pelo uso dos recursos naturais nessa unidade de conservação, uma vez que o trabalho de
coleta da castanha-do-brasil é sazonal, ocorrendo apenas no período de fevereiro a maio. Assim, os
quilombolas também reivindicam o uso de outros produtos florestais não madeiros como copaíba
(Copaíferamultijuga), andiroba(CarapaguianensisAubl.), cipós, palhas, breu(Pinus palustres),os
quais também podem ser incluídos nos termos de compromisso para fins de coleta e
comercialização.
Assim, o desafio da gestão da Reserva Biológica do Rio Trombetas é garantir tanto a
conservação da biodiversidade, quanto os direitos básicos desses povos e comunidades tradicionais,
ambos garantidos constitucionalmente. Mas, isso perpassa em considerar os modos de vida desses
povos, que muitas vezes, são criminalizados por praticarem atividades basais de sustento e obtenção
de proteína animal, como por exemplo, a caça e a pesca para o próprio sustento.

5. AGRADECIMENTOS
Aos quilombolas coletores tradicionais de castanha-do-brasil da microrregião Alto
Trombetas e organizações dessa microrregião, que de forma gentil e paciente colaboraram na
obtenção dos dados dessa pesquisa. Da mesma forma, agradecemos ao Instituto Nacional de
Pesquisas da Amazônia, ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e ao Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia, que direta ou indiretamente apoiaram a
realização desse trabalho em suas diferentes etapas.

6. REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BRASIL. Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, §1º, incisos I, II, III
e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
e dá outras providências. Presidência da República, Casa Civil, Brasília, DF, 18 jul.
2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 15 fev.
2018.

CASTRO, E.; ACEVEDO, R. Negros do Trombetas: guardiões de matas e rios. 2ª ed. (revista e
ampliada). Belém: CEJUP/UFPA-NAEA, 1998.
FARIAS JÚNIOR, Emmanuel de Almeida. Megaprojetos inconcludentes e territórios
conquistados: diferentes processos sociais de territorialização da comunidade quilombola de
Cachoeira Porteira, Oriximiná, Pará. 2016. 445 f. Tese (Doutorado em Antropologia Social)–
Universidade Federal do Amazonas, Manaus, 2016.

FUNES, Eurípedes Antônio. Nasci nas matas nunca tive senhor: história e memória dos
mocambos do Baixo Amazonas. 1995. 441 f. Tese (Doutorado em História Social) – Programa de
Pós-graduação em História Social, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995.

GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. 3ª Ed. São Paulo: Contexto, 2012.

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Plano de Manejo da
Reserva Biológica do Rio Trombetas. STCP Engenharia de Projetos/IBAMA. Brasília, 2004.

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Instrução Normativa
n. 26, de 04 de julho de 2012. Estabelece diretrizes e regulamenta os procedimentos para a
elaboração, implementação e monitoramento de termos de compromisso entre o Instituto Chico
Mendes e populações tradicionais residentes em unidades de conservação onde a sua presença não
seja admitida ou esteja em desacordo com os instrumentos de gestão. Diário Oficial da União:
seção 1, Brasília, DF, p. 1, 23 dez. 2003. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil.
Brasília, 06 jul. 2012. Seção 1, p. 84-85.

SCARAMUZZI, Igor Alexandre Badolato. Extrativismo e as relações com a natureza em


comunidades quilombolas do rio Trombetas/Oriximiná/PA. 2016. 338 f. Tese (Doutorado) –
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016.

TALBOT, Virgínia. Termos de Compromisso: histórico e perspectivas como estratégia para a


gestão de conflitos em unidades de conservação federais. 2016. 208 f. Dissertação (Mestrado
Profissional em Biodiversidade em Unidades de Conservação) - Instituto de Pesquisas Jardim
Botânico do Rio de Janeiro, Escola Nacional de Botânica Tropical, Rio de Janeiro, 2016.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BREVE AVALIAÇÃO HISTÓRICA SOBRE A UTILIZAÇÃO DE TERMOS


DE COMPROMISSO COM COMUNIDADES TRADICIONAIS NAS
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAIS
BRIEF HISTORICAL EVALUATION ON THE USE OF TERMS OF COMPROMISE WITH
TRADITIONAL COMMUNITIES IN FEDERAL PROTECTED AREAS

Marcelo Meirelles Cavallini *, João Augusto Madeira *, Poliana de AlmeidaFrancis *

* Coordenação de Gestão de Conflitos em Interfaces Territoriais, ICMBio, Brasil

1. INTRODUÇÃO
O processo de gestão das unidades de conservação envolve, via de regra, divergências de
interesses e de necessidades relacionadas a grupos sociais que já habitavam e/ou utilizavam
recursos naturais nesses territórios que passaram a ser especialmente protegidos e destinados à
conservação da natureza pelo poder público. Essas divergências de interesses e necessidades
caracterizam os conflitos socioambientais relacionados ao que chamamos sobreposições ou
interfaces territoriais.
A avaliação qualificada das características e especificidades das interfaces territoriais
existentes em cada unidade de conservação possibilita construir estratégias de interação para o
estabelecimento de um diálogo adequado entre as partes interessadas, ampliando as possibilidades
de construção de soluções visando atendimento aos interesses comuns ede forma a minimizaro
impacto ou a pressão ambiental sobre os territórios protegidos, porém com garantias de justiça
social.
O Termo de Compromisso (TC) é o principal instrumento disponível para a gestão
socioambiental a ser utilizado em situações onde se constata interfaces territoriais entre unidades de
conservação (UC) de proteção integrale territórios de povos e comunidades tradicionais. O TC tem
previsão legal na Lei do SNUC (BRASIL, 2000)e nos artigos 35 a 39 do seu Decreto
regulamentador (BRASIL, 2002). Em 2012, o ICMBio editou a Instrução Normativa n. 26,
estabelecendo diretrizes e regulamentando os procedimentos para a elaboração, implementação e
monitoramento de TC.
Neste artigo fazemos uma análise do histórico de utilização de TC em UC federais, dos
resultados e aprendizados obtidos e das perspectivas para o futuro.

2. MATERIAL E MÉTODOS

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

As informações técnicas apresentadas no presente trabalho foram obtidas por meio de


consulta ao acervo de informações da Coordenação de Gestão de Conflitos em Interfaces
Territoriais do ICMBio (COGCOT/CGSAM/DISAT/ICMBio) considerando o período de 2006,
quando o instrumento TC foi utilizado pela primeira vez em uma UC federal, até o ano de 2018.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Entre 2006 e 2018 foram celebrados 21 TC, dos quais 81% ainda estão vigentes.Esses TC se
relacionam com UC federais de diferentes categorias, grupos sociais e objetos de abordagem
(Tabela 1).

Tabela 1: Unidades de conservação federais, grupos sociais envolvidos e objeto de abordagem dos Termos
de Compromisso firmados entre 2006 e 2018. Algumas UC contam com mais de um TC com o mesmo grupo
social.

Unidade de Conservação Grupo Social Principal abordagem do TC


EE da Terra do Meio Beiradeiros Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
EE de Tamoios Pescadores Uso e manejo do recurso pesqueiro.
EE Serra Geral do Quilombolas Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
Tocantins
PN Aparados da Serra- Quilombolas Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
Serra Geral
PN da Serra do Cipó Agricultores Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
Familiares
PN da Serra do Pardo Beiradeiros Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
PN do Cabo Orange Pescadores Uso e manejo do recurso pesqueiro.
PN do Descobrimento Indígenas Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
PN do Jaú Ribeirinhos Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
PN Ilha dos Currais Pescadores Uso e manejo (sazonal) do recurso pesqueiro.
PN Juruena Ribeirinhos Uso e manejo do recurso pesqueiro, extrativismo
vegetal e trânsito na UC.
PN Mapinguari Ribeirinhos Extrativismo da Castanha-do-brasil.
PN Restigas de Jurubatiba Pescadores Uso e manejo do recurso pesqueiro.
RB do Lago Piratuba Pescadores Uso e manejo do recurso pesqueiro.
RB do Lago Piratuba Agricultores Uso múltiplo do território e atividades agropecuárias.
familiares
RB do Rio Trombetas Quilombolas Extrativismo da Castanha-do-brasil.
RB Guaporé Quilombolas Uso múltiplo do território e dos recursos naturais.
RB Serra Negra Indígenas Realização de ritual sagrado.

Os dados da Figura 1 apresentam o número de TC firmados por ano em UC federais e pode-


se constatar uma tendência de incremento no uso dessa ferramenta de gestão ao longo dos anos,
ainda que tenha havidoalguma inconstância em sua utilização.

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Figura 1: Número de Termos de Compromisso firmados por ano em UC federais.


O bioma Amazônia abrange 10 dos TC celebrados, seguido pelos biomas Marinho e
Costeiro (4 TC), Mata Atlântica e Cerrado (3 TC cada). Já para a Caatinga, apenas um TC foi
outrora firmado, e nenhum nos biomas Pampa e Pantanal, até por que contêm menores quantidades
de UC federais. Outro aspecto digno de nota é que 40% dos TC firmados se relacionam a usuários
de recursos naturais do interior da UC, e não necessariamente comunidades residentes da unidade.
Essa situação é particularmente mais frequente com o grupo de pescadores artesanais, seja no
ambiente amazônico, seja no ambiente marinho.
Quanto ao teor do regramento abordado nos TC, nota-se que em 52% dos casos tratam de
usos múltiplos dos recursos naturais pela comunidadetradicional, 29% se relacionam
especificamente à atividade pesqueira e 14% tem foco no extrativismo da castanha-do-brasil no
interior da UC.Um único TC traz regramento para a realização de rituais sagrados, neste caso
envolvendo grupos indígenas na REBIO Serra Negra, localizada no sertão pernambucano.
Outro aspecto de interesse diz respeito ao período de vigência do TC quetem variado de 2 a
10 anos, sendo que quatro dos TC atualmente vigentes já foram renovados ao menos uma vez. Esse
aspecto remete a outro ponto importante e diz respeito à forma como a Lei do SNUC e seu Decreto
regulamentador tratam a questão da presença de comunidades tradicionais em UC onde essa
presença não é prevista. O SNUC deixa explícito que os direitos das populações tradicionais devem
ser respeitados, inclusive por meio da celebração de termos de compromisso, até que essas
populações sejam reassentadas. Esta determinação entra em conflito com o disposto no Artigo 16 da
Convenção 169 da OIT, à qual o Brasil aderiu por meio do Decreto 5.051/2004, e estabelece que o
reassentamento de povos e comunidades tradicionais é medida de caráter excepcional, dependendo
de seu livre consentimento e conhecimento.Neste contexto, os TC têm incorporado o desafio de
tratar os casos de colisão de direitos sem prever a obrigatoriedade do reassentamento de
comunidades tradicionais. Um dos principais intuitos do TC é reverter a situação de conflito

272
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relacionada à comunidade que se sente prejudicada pelas limitações de uso trazidas pela criação da
UC. A prática tem demonstrado que a segurança jurídica trazida pelos TC conduz a uma melhoria
na relação entre as partes envolvidas no conflito, reduzindo a tensão e viabilizando a busca de
possíveis soluções permanentes, a serem construídas durante a vigência do TC. Nessa perspectiva,
tem-se considerado que prazos de vigência mais amplos aos TC implicam, geralmente, em melhores
resultados de gestão na relação com as comunidades tradicionais envolvidas. Como conseqüência,
tem-se optado pelo incremento da vigência dos TC ao longo dos últimos anos (Figura 2).

Figura 2: Tendência de aumento do período de vigência dos Termos de Compromisso firmados entre 2010 e
2018 em unidades de conservação federais brasileiras.

Como dito anteriormente, o TC é um instrumento de gestão socioambiental, de caráter


transitório, que tem como principal objetivo compatibilizar os direitos de populações tradicionais,
respeitando-se seus modos de vida, fontes de subsistência e locais de moradia, com os objetivos de
criação da UC nos casos onde essa presença não esteja legalmente prevista. Tal aspecto remete à
necessidade de se avaliar, periodicamente, os resultados alcançados pelo termo. Não à toa, o
ICMBio tem definido que os TC celebrados estabeleçam que seja constituída uma “Comissão de
Acompanhamento do TC”, com a incumbência de acompanhar as ações necessárias ao
cumprimento do termo, avaliar os resultados obtidos e propor eventuais medidas para seu
aprimoramento. Criada no âmbito do Conselho Gestor da UC, sempre que possível, a comissão é
coordenada pelo órgão ambiental e conta com a indispensável representação das comunidades
tradicionais contempladas pelo termo, prevendo ainda a possibilidade de que representantes de
outras instituições possam ser convidadas para contribuir com a Comissão, participando de suas
reuniões. Vale citar que os resultados das avaliações dessas comissões são levados em consideração
para decidir sobre a necessidade e pertinência em se renovar os TC atualmente em vigência.
4. CONCLUSÕES
273
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O maior conhecimento da realidade socioambiental das unidades de conservação federais ao


longo dos últimos anos tem demonstrado que a existência de interfaces territoriais entre
comunidades tradicionais e UC de proteção integral está longe de se caracterizar como
situaçãoexcepcional (MADEIRA et al., 2015). As interfaces territoriais incorporam em si situações
extremamente complexas e uma solução de caráter permanente requer muita atenção, sob pena de
que um bem jurídico constitucionalmente protegido ganhe materialidade à custa de outro.Na
medida em que o órgão gestor propõeinstrumentos e estabelece ações que objetivam dar tratamento
conciliatório aos direitos e interesses envolvidos, sinaliza-se pelo fortalecimento da gestão territorial
das UC, com vistas à promoção do desenvolvimento socioambiental das comunidades tradicionais,
associado ao respeito e garantias de conservação da natureza.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000, que regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e
VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências.Diário Oficial da União, 19/07/2000. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm

BRASIL. Decreto 4.340 de 22 de agosto de 2002, que


regulamenta artigos da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC, e dá outras providências.Diário
Oficial da União, 23/08/2002. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4340.htm

MADEIRA, J. A.; ABIRACHED, C.F.A.; FRANCIS, P.A.; CASTRO, D. M. P.; BARBANTI, O.;
CAVALLINI, M.M.; MELO, M.M.Interfaces e sobreposições entre Unidades de Conservação e
territórios de povos e comunidades tradicionais:dimensionando o desafio. In: Anais do VII SAPIS
e II ELAPIS, Florianópolis, 2015.

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TERMO DE COMPROMISSO ENTRE O PARQUE NACIONAL DO


DESCOBRIMENTO E ALDEIAS PATAXÓ DA TERRA INDÍGENA
COMEXATIBÁ: CONSTRUÇÃO E PERSPECTIVAS
COMPROMISE TERM BETWEEN DESCOBRIMENTO NATIONAL PARK AND PATAXÓ
COMMUNITIES OF COMEXATIBÁ INDIGENOUS LAND: CONSTRUCTION AND PERSPECTIVES

João Augusto Madeira*

*Coordenação de Gestão de Conflitos em Interfaces Territoriais – COGCOT, Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade – ICMBio

1. INTRODUÇÃO
O Brasil atravessa um período politicamente conturbado, no qual há diversas políticas em
risco de descontinuidade. Dentre as mais ameaçadas estão as “áreas protegidas”, que incluem, no
Brasil, as unidades de conservação (termo exclusivamente brasileiro) e as terras indígenas,
conforme o PNAP (BRASIL, 2006). Em anos recentes houve um “debate interno” entre
ambientalistas das linhas preservacionista (que considera apenas as unidades de conservação como
áreas protegidas) e socioambientalista (que atribui este status também às terras indígenas e
territórios de comunidades tradicionais e quilombolas). Em meio a esta disputa, a presença Pataxó
na região de Prado (sul da Bahia), incluindo áreas do Parque Nacional do Descobrimento (PND) foi
tratada por vários anos pelos órgãos ambientais como um conflito a ser resolvido na Justiça, por
reintegração de posse. Em 2017 a abordagem alterou-se para uma linha de ação compatível com o
PNAP, que possibilitou uma parceria entre a gestão do PND e os Pataxó. Neste artigo trataremos
desta mudança, que esperamos que possibilite uma parceria duradoura, que sirva como exemplo
positivo a ser seguido em casos similares.

2. HISTÓRICO
O PND foi criado em 1999, em meio às comemorações dos 500 anos do descobrimento do Brasil,
em área remanescente de Mata Atlântica então sob o domínio da madeireira conhecida como
“Bralanda” (Sociedade Anônima Brasil Holanda Indústria). Havia um grande esforço de
organizações não governamentais ambientalistas e do Ministério do Meio Ambiente (MMA) no
sentido de proteger os últimos remanescentes do bioma no sul da Bahia (Figura 1), conhecido por
sua excepcional diversidade de espécies arbóreas (ARAÚJO ET AL. 1998). O território que coube
ao PND, ligeiramente ampliado em 2012, abriga um dos principais e preciosos remanescentes dessa
antes vasta floresta, de excepcional biodiversidade, rica também em espécies endêmicas (THOMAS
ET AL. 1998), ainda que já não fosse uma floresta “intocada”.

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1945 1960 1973 1990

Figura 1: Escalada do desmatamento no sul da Bahia entre 1945 e 1990, mostrando a localização do
polígono do Parque Nacional do Descobrimento criado em 1999 e ampliado em 2012. (modificado
de Holvorcem [2010], disponível em http://pt.slideshare.net/eltislides/pes-course-porto-seguro-carbono-
carava-project-southern-bahia-chris-holvorcem acessado em 23/09/2015

Enquanto isso, o povo Pataxó, que estivera disperso na região nas décadas que se seguiram
ao episódio conhecido como “Fogo de 51”1, iniciava um processo pelo qual buscava se reorganizar
e reassumir sua identidade étnica. A mesma data que inspirou a criação do PND, para os Pataxó
desencadeou um movimento que lembrava a “invasão europeia”. Este movimento conseguiu
fortalecer-se o suficiente para promover a ocupação de algumas áreas, nas chamadas “retomadas”.
As primeiras retomadas em áreas do PND se deram em 2003, quando o parque completava 4 anos.
De fato, no momento de sua criação, não havia ocupações indígenas no PND. No entanto, as
narrativas dos Pataxó identificam vários sinais de sua ancestralidade na região, o que foi
corroborado pelo Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) publicado pela
Funai (BRASIL, 2015). Ao delimitar a Terra Indígena (TI) Comexatibá, estabeleceu-se uma
sobreposição a cerca de 20% da área do PND. É importante lembrar que na hipótese de
sobreposição com Terra Indígena, o decreto de ampliação do PND (2012) prevê a dupla afetação.
A inexistência de ocupações indígenas na área definida como Parque Nacional em 1999 foi
o principal argumento usado pelos órgãos ambientais (inicialmente o Ibama e a partir de 2007 o
Instituto Chico Mendes – ICMBio) para considerar as retomadas como “invasões”. Há, de fato, um
princípio segundo o qual ocupações de povos e comunidades tradicionais pré-existentes quando da
criação de uma unidade de conservação devem ser tratados levando em consideração os direitos dos
ocupantes, enquanto ocupações posteriores à criação são tratadas como invasões. Essa interpretação

1
“Fogo de 51” é o nome dado pelos Pataxó a um episódio, noticiado nos jornais da época como “revolta dos caboclos”,
que teria sido causado por dois indivíduos, até hoje não identificados, que acompanhavam o Capitão Honório Borges,
um indígena que tentava ajudar na demarcação de uma Terra Indígena Pataxó. Conquistando a confiança de algumas
lideranças, esses dois indivíduos estimularam um grupo de índios a saquear a mercearia Theodomiro Rodrigues
localizada no povoado de Corumbau, investida que provocou o ferimento de Theodomiro. Esse fato desencadeou uma
violenta reação, tanto por parte dos regionais, como dos policiais de Prado e de Porto Seguro (Sampaio, 1996). A aldeia
foi incendiada e os índios passaram a ser perseguidos com grande violência, o que causou a sua dispersão e deu início a
um período em que a identidade indígena foi em grande parte escondida.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

jurídica levou às ações de reintegração de posse, que embora acolhidas pela Justiça, nunca se
fizeram cumprir, já que, afinal de contas, para onde iriam aquelas pessoas? Se os índios “não eram
dali”, de onde eram? Como executar tal reintegração de posse sem violência?Esse impasse se
manteve por quase 15 anos,com a tensão em altos níveis. A relação entre os servidores do ICMBio
na região e os Pataxó era muito ruim e a implementação do PNDera muito baixa, principalmente
seu uso público.E o Plano de Manejo do PND (BRASIL, 2014) tratou as aldeias Pataxó como “zona
de ocupação temporária”.
Mesmo com a publicação do RCID da TI Comexatibá, em 2015, a postura institucional do
ICMBiofoi, de início, mantida. Dentro do prazo regimental de contestação do RCID, o ICMBio
juntou-se às mais de 150 contestações apresentadas à Funai, usando como argumento principal a
tese do “marco temporal1” de 5 de outubro de 1988. Por esta tese, os índios expulsos de forma
“eficiente” antes de 1988 teriam perdido seus direitos territoriais.
Curiosamente, foram as reviravoltas políticas brasileiras, com o impeachment de Dilma
Rousseff, que alteraram a situação.Ao assumir o MMA no governo de Michel Temer, José Sarney
Filho comprometeu-se a respeitar os direitos indígenas em todas as situações de sobreposições entre
terras indígenas e unidades de conservação.

3. COMPATIBILIZANDO DIREITOS
No final de 2016 lideranças Pataxó perceberam a oportunidade e decidiram chamar atenção
para a situação, promovendo uma ocupação nas instalações do PND localizadas no seu flanco oeste,
fora da TI delimitada pelo RCID chancelado pela Funai. Em meio à ocupação, um grupo de
lideranças conseguiu uma audiência com o ministro, que prometeu avaliar a situação.
Em maio de 2017 foi assinado pelos presidentes do ICMBio e da Funai e por lideranças
Pataxó, um acordo que previa a desocupação das instalações do PND e a formação de um grupo de
trabalho para elaborar um Termo de Compromisso (TC) que garantisse a permanência dos Pataxó
nas aldeias sobrepostas ao PND e uma “Carteira de Projetos” que beneficiasse os Pataxó com
geração de renda e melhoria de qualidade de vida. Em junho de 2017 instituiu-se o Grupo de
Trabalho Interinstitucional (GTI), composto por representantes das seis aldeias, do ICMBio e da

1
Em meio ao julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da questão da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o plenário
daquele Tribunal propôs que era necessário, para a definição de “terras tradicionalmente ocupadas” por povos
indígenas, com vistas à definição dos limites de Terras Indígenas em atendimento ao Art. 231 da Constituição, foi
defendido que “a constituinte trabalhou com data certa”, que seria sua data de promulgação. Esta afirmação gerou
grande polêmica, já que em nenhum lugar do texto da Constituição há nada escrito que permita esta interpretação. Mas
os proprietários (legítimos ou não) de terras que se sentem ameaçados pela possibilidade de reconhecimento de uma
Terra Indígena em suas propriedades têm usado esta tese para defender seus supostos direitos... o que implicaria que
indígenas que tenham sido expulsos de seus territórios tradicionais antes de outubro de 1988 perderiam seus direitos, a
menos que fossem capazes de comprovar algo que se denominou “renitente esbulho”, o que incluiria comprovar disputa
judicial pelas terras antes de 1988, quando os indígenas eram considerados incapazes e sequer teriam autonomia para
ingressar com uma ação na Justiça.
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Funai,que começou a trabalhar na elaboração do TC, primeira etapa para que uma nova relação
entre as partes pudesse se estabelecer, com segurança jurídica.
A decisão de propor um TC com indígenas sobre o uso do território járeconhecido como
tradicional Pataxó merece uma explicação. O TC é um instrumento transitório, previsto na Lei
9.985/2000 (SNUC) para situações de uso ou ocupação de áreas e/ou recursos naturais em uma UC
que não o permita. Como terras indígenas não são “criadas”, como acontece com unidades de
conservação, mas “reconhecidas”, entende-se que sua existência representaa consecução de um
“direito originário”, que precede a todos os demais atos legais. Em uma TI, portanto, não haveria
necessidade de um TC para legitimar a ocupação e usos de seus sujeitos de direito. Ocorre que o
rito de reconhecimento da TI Comexatibáainda não se completou, faltando as etapas da
demarcação, homologação e regularização fundiária. A única etapa concluída foi a publicação do
RCID, que se encontra na fase das contestações. Assim, o TC traz segurança jurídica para as partes
e o RCID, ao caracterizar o território como tradicional do povo Pataxó, tira da ocupação o caráter
de invasão, ainda que posterior à criação da unidade de conservação.
As negociações entre as três partes envolvidas (ICMBio, Funai e Pataxós) levaram
praticamente um ano para chegar ao texto do TC, aprovado pelos membros do GTI em março de
2018 e assinado pelo presidente do ICMBio e pelos caciques das seis aldeias Pataxó no início de
abril de 2018. A partir da assinatura do TC consolidou-se o clima de parceria entre a equipe gestora
do PND e os moradores das seis aldeias Pataxó e passou-se a trabalhar na “carteira de projetos”, que
é um conjunto de propostas de projetos (sem viabilidade jurídica antes do TC) que devem
possibilitar oturismo de base comunitária, o ecoturismo, a recuperação de áreas degradadas e
melhorias das práticas agrícolas,melhorando a qualidade de vida e a renda dos indígenas. Já o PND
será beneficiado pela viabilidade do cumprimento adequado de uma de suas finalidades (a
visitação) e pela recuperação de áreas degradadas. Dentre as normas vigentes com o TC, uma que
surpreendeu a muitos foi a decisão, de comum acordo entre gestores e indígenas, de não permitir a
caça, mesmo na área de sobreposição entre o PND e a TI Comexatibá– um reconhecimento de que,
no atual estágio de isolamento deste remanescente de Mata Atlântica, cercado por todos os lados de
fazendas com pastos e monocultura de eucalipto e mamão, não há viabilidade em se praticar um
manejo sustentável da caça.
A grande preocupação das três partes envolvidas neste acordo histórico é que não se permita
que a crise econômica e política que vem precarizando o serviço público federal em geral impeça a
consolidação desta solução conciliatória, que através de diálogo maduro, onde todas as partes
cederam em alguns pontos antes tidos como inegociáveis, chegou-se a um arranjo no qual todos
ganham: os indígenas passam a ter tranquilidade para viver, para melhorar suas condições de vida,
incluindo a instalação de luz elétrica em breve para todas as aldeias (já autorizada), enquanto o
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ICMBio passa a poder dedicar-se a outros aspectos da gestão da UC, ao invés de lidar com um
conflito que ameaçava explodir a qualquer momento. A abertura de roteiros de visitação e de
turismo de base comunitária aumentam a atratividade do PND ao turismo e deverá ser um fator
fundamental de consolidação da situação, que esperamos que possa ser replicada em breve em
outros casos semelhantes de sobreposição entre UC e TI.

4. Referências Bibliográficas:
ARAÚJO, M; ALGER, K; ROCHA, R; MESQUITA, C.A.B. A Mata Atlântica no Sul da Bahia
– situação atual, ações e perspectivas. Série Cadernos da Reserva da Biosferada Mata Atlântica,
no. 8. Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, São Paulo, 1998.

BRASIL. FUNAI – FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO. Relatório Circunstanciado de


Identificação e Delimitação da Terra Indígena Comexatibá (Cahy/Pequi). Portaria No.
1.455/PRES, de 29 de novembro de 2006. Leila Silvia Burger Sotto-Maior e Sara Braga i Gaia
(responsáveis técnicas), Brasília, 2015.

BRASIL. ICMBIO – INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA


BIODIVERSIDADE. Plano de Manejo do Parque Nacional do Descobrimento. Disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/portal/biodiversidade/unidades-de-conservacao/biomas-brasileiros/mata-
o
atlantica/unidades-de-conservacao-mata-atlantica/2197-parna-do-descobrimento.html. Portaria ICMBio N
146, 2014.

BRASIL. MMA – Ministério do Meio Ambiente. Decreto 5.758 de 13 de abril de 2006 que
institui o Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas – PNAP, seus princípios, diretrizes,
objetivos e estratégias e dá outras providências. 2006.

SAMPAIO, J.A.L. Breve história da presença indígena no extremo sul baiano e a questão do
território Pataxó do Monte Pascoal. In: Espírito-Santo, M.A (org.) Política Indigenista: Leste e
Nordeste brasileiros. Brasília: FUNAI, 2000.

THOMAS, W.W., CARVALHO, A M.V., AMORIM, A.M.A., GARRISON, J. E ARBELÁEZ,


A.L. Plant endemism in two forests in southern Bahia, Brazil. Biodiversity and
Conservation.7:311-322, 1998.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

SENSIBILIZAÇÃO DA POPULAÇÃO TRADICIONAL DA RESEX AUATÍ-


PARANÁ, COM ENFOQUE NA COMUNIDADE BOA VISTA DO
CURIMATÁ
SENSITIZATION OF THE TRADITIONAL POPULATION OF RESEX AUATÍ-PARANÁ,
FOCUSING ON THE COMMUNITYBOA VISTA DO CURIMATÁ

Fernanda da Silva Xavier*

*Chefe de UC – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade / ICMBio


fernanda.xavier@icmbio.gov.br

INTRODUÇÃO
Em 07/08/2001, foi criada em a RESEX Auatí-Paraná, com suas 16 comunidades
(atualmente, 18) e quase 147 mil hectares, abrangendo os municípios de Fonte Boa, Japurá e Maraã
(Figura 1). A população tradicional residente na RESEX Auatí-Paraná descende, em sua maioria, de
indígenas imigrantes do Peru e de nordestinos que vieram para a Amazônia suprir a demanda de
força de trabalho nos seringais. Com o declínio da atividade seringueira, buscando consolidar sua
permanência na região, esses comunitários iniciaram um processo de mobilização social destes
comunitários, com o apoio do Movimento Educacional de Base (MEB). Esse processo de
fortalecimento da organização popular foi o que culminou na criação da Reserva Extrativista Auatí-
Paraná.
Neste contexto, o Estado passou a ter um papel mais atuante no território através do IBAMA
e, posteriormente, do ICMBio, que se inseriram com a missão de identificar e minimizar possíveis
conflitos decorrentes da disputa de território entre distintos atores, intermediando o diálogo entre as
partes, ao mesmo tempo em que buscavam a conservação ambiental dentro da unidade.
Embora se observe conflitos entre comunitários e atores externos, os conflitos mais
relevantes se desenvolvem internamente, entre comunidades e comunitários. A razão principal
costuma ser a disputa de áreas de uso da UC entre as comunidades.
Entre estes conflitos, se destaca o protagonizadopelas comunidades Boa Vista do Curimatá e
Castelo. Os comunitários de Castelo denunciam a entrada constante de comunitários de Boa Vista
do Curimatá em seu lago de manejo para uso inadequado do mesmo e das áreas marginais. Essa
ação causa prejuízo ao manejo do pirarucu da comunidade Castelo, pois o uso de motores espanta
os peixes do lago; além disso, também há denúncias de que alguns comunitários de Boa Vista do
Curimatá cometem ilícitos ambientais nessa área.

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A comunidade Boa Vista do Curimatá possui um histórico de distanciamento da gestão e


demais comunidades da RESEX, não comparecendo às reuniões do Conselho Deliberativo da
unidade, onde compartilha uma cadeira com a comunidade Curimatá de Cima.
Tendo em vista a necessidade de aproximar a população tradicional da RESEX da gestão da
UC e minimizar os conflitos internos da unidade, o presente trabalho visou a capacitar os
conselheiros e demais participantes do Conselho Deliberativo e sensibilizar as comunidades Castelo
e, em especial, Boa Vista do Curimatá quanto à importância de respeitar os espaços de uso do
território historicamente construídos por cada uma delas e fortalecer o espírito de cooperação entre
os comunitários, com utilização adequada dos recursos naturais.

Figura 1 - Malha Política. Limites da RESEX Auatí-Paraná em relação à divisão política municipal.

MATERIAL E MÉTODO
O trabalho foi realizado através de duas atividades principais:
1 - Capacitação do Conselho:
Após uma mobilização prévia realizada pela associação mãe da RESEX (AAPA) nas
comunidades da UC, foi realizada uma capacitação de conselheiros 1 dia antes da reunião de
Conselho da unidade.A capacitação, aberta ao público em geral, se organizou da seguinte forma:
- Apresentação de cada um dos conselheiros e demais participantes presentes;

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

-Apresentação breve sobre o papel e importância do Conselho como instância de maior


representatividade na gestão de uma unidade;
- Atividade em grupo sobre o perfil do conselheiro, onde cada um dos 3 grupos colocou no
papel as características que associavam a um mau conselheiro e as associavam a um bom
conselheiro - foram usados símbolos de chifres e auréola nos bonecos correspondentes para facilitar
a associação;
- Utilização da ferramenta Linha do Tempo com os comunitários para resgate da história do
território onde hoje se encontra a RESEX Auatí-Paraná;
- Avaliação do Conselho da RESEX Auatí-Paraná, tendo sido feitas sugestões para sua
melhoria.
2 - Reunião comunitária em Boa Vista do Curimatá:
Foi realizada reunião na comunidadeBoa Vista do Curimatácom todos os comunitários
presentes no local, organizada da seguinte forma:
- Apresentação de cada um dos participantes da reunião;
- Relato das expectativas com relação à RESEX antes de sua criação;
- Discussão sobre os pontos negativos da criação da RESEX;
- Discussão sobre a pergunta orientadora “E se a RESEX não tivesse sido criada?”;
- Provocação sobre o sentimento de pertencimento dos comunitários com relação à RESEX -
“Vocês se sentem parte da RESEX?”;
- Discussão de propostas de melhoria para a RESEX;
- Elaboração de um Mapa Falado sobre as áreas de uso da comunidade Boa Vista do
Curimatá no território da RESEX e entorno, sendo pontuado o uso compartilhado com outra(s)
comunidade(s);
- Feedback sobre a reunião e avaliação através da ferramenta “Termômetro”.

RESULTADO E DISCUSSÃO
Capacitação de conselheiros:ao final das atividades e discussões ocorridas na capacitação, a
maior parte dos participantes pareceu estar esclarecida quanto à importância do Conselho Gestor
como instância de decisão na gestão do território e determinada a fazer valer o seu papel nesse
processo. Em especial, o processo de construção coletiva de uma Linha do Tempo extremamente
rica em detalhes, com enorme resgate histórico e afetivo, demonstrou um alto grau de conexão dos
comunitários com o território ao qual pertencem.Isso se refletiu na reunião de Conselho
subsequente, com as discussões fluindo de modo mais ordenado e produtivo. Além disso, a sugestão
e aprovação pelo Conselho quanto ao local de realização da próxima reunião, a comunidade Boa

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Vista do Curimatá,deixou notório uma preocupação dos conselheiros em integrar comunitários mais
distantes da gestão da unidade.
Reunião de Boa Vista do Curimatá: os comunitários que participaram da reunião em Boa
Vista do Curimatá se mostraram receptivos aos assuntos abordados e, após a atividade, conscientes
de que seu direito ao território se relaciona diretamente aos seus deveres para com a conservação
ambiental do mesmo. A avaliação ao final da reunião mostrou que, de maneira geral, os
comunitários ficaram satisfeitos com a atividade, tendo os mesmos solicitado maior presença da
gestão da UC na comunidade. Nessa oportunidade, a comunidade também comunicou que aceitava
receber a próxima reunião do Conselho Deliberativo da unidade. Durante visita à comunidade
Castelo, o presidente da mesmainformou que a frequência de invasões de comunitários de Boa
Vista ao lago de manejo diminuiu significativamente. O planejamento é continuar monitorando a
dinâmica de uso no território e realizar mais reuniões em Boa Vista, buscando maior participação
dos comunitários e a presença do presidente da comunidade.

CONCLUSÃO
Os conselheiros capacitados se mostraram claramente interessados em melhorar seu papel de
atuação no Conselho, com alto grau de interação e discussão durante a atividade,o que demostrou a
importânciadas capacitações de Conselho e a necessidade das mesmas aumentarem sua
periodicidade e efetividade, com emprego de mais ferramentas participativas. Essa primeira
experiência se mostrou frutífera e servirá como base para as futuras, com os devidos ajustes
metodológicos.
Essa primeira aproximação com a comunidade Boa Vista do Curimatá se mostrou mais
positiva do que o esperado. A expectativa é de que a próxima reunião de Conselho, a ser realizada
na própria comunidade, aumente o nível de contribuição dos comunitários de Boa Vista no processo
participativo de tomada de decisão sobre o território.

AGRADECIMENTOS
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio
Associação Agroextrativista de Auatí-Paraná – AAPA

REFERÊNCIAS
ICMBio. Plano de Manejo da Reserva Extrativista Auatí-Paraná,
2011.Disponívelem:http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/licitacoes/2013/plano_de_manejo_da_
resex_do_auati-Parana.pdf

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO EM TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS:


DOS CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS À CONSERVAÇÃO DA
AGROBIODIVERSIDADE
CONSERVATION AREAS IN QUILOMBOLA TERRITORIES: FROM SOCIAL AND
ENVIRONMENTAL CONFLICTS TO CONSERVATION OF AGROBIODIVERSITY

Poliana de Almeida Francis*, DorisAleidaVillamizarSayago**

Mestre em Desenvolvimento Sustentável, Coordenação de Gestão de Conflitos em Interfaces Territoriais, Instituto


Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade-ICMBio, Brasil. polianatapajos@gmail.com*.
Prof.ª Dr.ª doCentro de Desenvolvimento Sustentável-CDS, Universidade de Brasília-UnB, Brasil.
doris.sayago.gmail.com**.

1. INTRODUÇÃO
O Brasil foi o país das Américas que mais importou seres humanos escravizados da África,
no âmbito do maior evento de transferência demográfica forçada já registrado na história da
humanidade.E foi também o último país americano a abolir oficialmente a escravidão. Tais aspectos
históricos ajudam a compreendera expressividade da dimensão quilombolado Brasil(ANJOS, 2014),
materializada nas mais de 6.000comunidadesremanescentes de quilombos espalhadas pelo território
nacional, conforme estimativa da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras
Rurais Quilombolas, a CONAQ.
Os territórios das comunidades quilombolas, via de regra, apresentam bom estado de
conservação ambiental,o que concorre para a transformação dessas áreas em unidades de
conservação da natureza (UC). A incidência dessa política ambiental em territórios tradicionalmente
ocupados por grupos sociais culturalmente diferenciadosconfigura o que denominamos
sobreposições territoriais. Nessas áreas, coincidem políticas públicas aparentemente divergentes, o
que, frequentemente, desencadeia conflitos socioambientais.
Por outro lado, as áreas de sobreposição entre territórios quilombolas (TQ) e UC abrigam
sistemas agrícolas tradicionais (SAT) complexos e biodiversos, intimamente relacionados
aosambientes em que se inserem; sendo, muitos desses, guardiões de atributos herdados da rica
cultura agrícola africana.Os SAT compreendem, além da produção agrícola em sí, os saberes,
crenças, histórias, formas de organização e dinâmicas sociais, técnicas, apetrechos, produtos,
manifestações culturais, recursos naturais, plantas cultivadas, formas de uso e transformação dos
produtos, bem como os sistemas alimentares que resultam dessa agricultura (EMPERAIRE, 2015).
Na base dos SATestá a agrobiodiversidade,que engloba diversos elementos que interagem
na produção agrícola, como as espécies animais e vegetais direta ou indiretamente manejadas, as
cultivadas e seus parentes silvestres, ervas daninhas, parasitas, pestes, polinizadores, predadores,
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

simbiontes, etc, e a diversidade genética a eles associada.A biodiversidade agrícola encontra-se em


acelerado processo de erosão genética, decorrente principalmente do avanço do modelo agrícola
industrial sobre territórios tradicionais(SANTILLI, 2009).
Isto posto, o trabalho em telaobjetiva lançar luz sobreo papel das áreas protegidasna
conservação da agrobiodiversidade, com ênfase nas áreas de sobreposição entre TQ e UC. Pretende-
se com essa comunicação científica divulgar parte dos resultados da pesquisa de mestrado da
primeira autora, concluída em dezembro de 2018.

2. MATERIAL E MÉTODO
Para elaboração desse trabalho, foram utilizados dados bibliográficos e empíricos, além de
textoslegais e dados quantitativos sobre unidades de conservação, territórios quilombolas e áreas de
sobreposição territorial entre essas áreas protegidas.
A partir de dados constantes em levantamento realizado pelo Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio) denominado Interfaces Territoriais entre Unidades de
Conservação Federais, Povos Indígenas, Quilombolas, Comunidades Tradicionais e Projetos de
Assentamento de Reforma Agrária, fez-se um recorte dos casos que envolvem territórios
quilombolas. A esses casos foram adicionados exemplos, do conhecimento da autora, que
envolvemsobreposição de TQ com Reservas Extrativistas (RESEX), chegando a um conjunto de
UCs federais que sobrepõem territórios de comunidades quilombolas.
Parte dos dados empíricos a serem apresentados são resultantes de estudo de caso
envolvendo a sobreposição entre a Reserva Biológica da Mata Escura e a Comunidade Quilombola
de Mumbuca, localizados em Jequitinhonha-MG. O estudo utilizou as técnicas grupo focal e
entrevistas semi-estruturadas.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Levantamentos realizados pelo Ministério do Meio Ambiente-MMA indicam que os 279
territórios quilombolas que possuíam limites oficialmente definidos até 2017 têm cerca de 87% de
suas áreas cobertos por remanescentes de vegetação nativa. Os levantamentos mostram também que
162 TQ localizam-se em 110 áreas consideradas prioritárias para a conservação, sendo que 50
dessas são classificadas como de importância extremamente alta para a conservação, uso
sustentável e repartição de benefícios (MMA, 2017). Esses dados dão a dimensão da importância
dos territórios quilombolas para a conservação das paisagens e bens naturais.
Para a manutenção dos quilombos, a agricultura sempre teve um papel de destaque. Na obra
O Quilombo dos Palmares, Carneiro (1966) afirma que a agricultura era uma das principais
atividades dos negros palmarinos. As roças eram abundantes e tinham importância estratégica para
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a sobrevivência do quilombo (CARNEIRO, 1966). Nascimento (1980) também registra que os


quilombos mantinham produção agrícola eficiente e organizada, reproduzindo a tradição africana do
comunitarismo agrícola (NASCIMENTO, 1980). Em grande parte dos quilombos contemporâneos a
agricultura permanece com importância central, figurando entre as principais atividades de
subsistência desses grupos sociais.
A esfera federal do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza-SNUC conta
hoje com 334 UC, das quais ao menos 19apresentam áreas sobrepostas a territórios de comunidades
quilombolas. O elenco de UC inclui 8 parques nacionais, 3 reservas biológicas, 2 estações
ecológicas, 1 floresta nacional e 5 reservas extrativistas. Não estão computadas nesse conjunto as
Áreas de Proteção Ambiental (APA).
A depender da categoria de manejo da UC que sobrepõe o TQ, os modos peculiares de cultivar a
terra e manejar os recursos naturais sofrem restrições que podem acarretar transformações e prejuízos ao
funcionamento do sistema agrícola tradicional ali inserido. Por outro lado, as práticas culturais quilombolas,
inclusas as práticas agrícolas, compõem o patrimônio cultural brasileiro, protegido pela Constituição Federal
de 1988 e legislação infraconstitucional.
Ademais, a Carta Magna estabelece,por meio do art. 225, a obrigação do poder público depreservar a
diversidade e a integridade do patrimônio genético do país. O Brasil também ésignatário do Tratado
Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e aAgricultura (TIRFAA), que orienta que
os países devem promover a conservação in situ dosparentes silvestres das plantas cultivadas e das plantas
silvestres para a produção de alimentos;inclusive em áreas protegidas, apoiando os esforços das comunidades
indígenas e locais, dentreoutros (BRASIL, 2008).
O estudo de caso realizado evidenciou a importância da REBIO Mata Escura para a proteção
das terras, matas e águas do quilombo Mumbuca, bens ambientais imprescindíveis à produção
agrícola. Embora tenha acarretado o impedimento de plantio às margens dos cursos d’água, nos
brejos e nas capoeiras em estágio avançado de regeneração, além de coibir práticas extrativistas; a
criação da UC freou o avanço do latifúndio, interrompendo o processo de expulsão dos quilombolas
de seu território. A criação da REBIO também impulsionou as políticas de reconhecimento
identitário e territorial, resultando em fortalecimento políticoda comunidade quilombola.
O Ministério Público Federal (MPF) entende que as sobreposições territoriais representam
uma colisão entre direitos constitucionais fundamentais a ser resolvida pela ponderação, em que a
conciliação dos dois direitos representará restrições necessárias para compatibilizar o direito das
comunidades quilombolas com os objetivos da unidade de conservação, descartando-se o
reassentamento involuntário desses grupos sociais. Diante disso, o MPF aponta que o caminho para
solução dessas questões é a figura jurídica da dupla afetação, sendo que a forma da conciliação
poderá constar nas condições do título de propriedade, no plano de manejo da unidade de
conservação, em um termo de ajustamento de conduta, ou outros acordos (BRASIL, 2018).
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
A confluência entre os bens naturais protegidos, tais como água, solo estável, florestas,
espécies silvestres,polinizadores, diversidade genética,etc; e os modos próprios de manejá-los para a
produçãode alimentos, confere às áreas de sobreposição entre unidades de conservação eterritórios
quilombolas importância singular no que concerne à proteção dos sistemas agrícolas tradicionais e à
conservação da agrobiodiversidade.
Diante do imperativo de conservaçãodo patrimôniogenético,natural e cultural brasileiro, faz-
se necessário reconhecer o papel estratégico dessas áreas e estabelecer diretrizes de gestão que
salvaguardem o valioso patrimônio agrícola construído e conservadopelas comunidades
remanescentes de quilombos, ao longo de séculos de práticas agroecológicas.
Nesse sentido, os planos de manejo, planos de proteção, planos de uso público, termos de
compromissoe demais instrumentosde gestão de UCs devem ser elaborados em consonância com as
práticas agrícolas tradicionais e as dinâmicas socioculturais a elas relacionadas. Dessa forma,
estaremos colaborando para a transformação de conflitos em concílios, e favorecendo a preservação
de um patrimônio biocultural de fundamental importância para a humanidade e o equilíbrio do
planeta.
Assim, a composição harmônica das políticas públicas socioambientais nas áreas
sobrepostaspoderá contribuirpara frear as perdas de biodiversidade e inspirar soluções frente aos
desafios de produção sustentável de alimentos saudáveis,do ponto de vista nutricional, ambiental,
social e cultural. A mudança de paradigmas para a gestão das áreas de sobreposição entre UC e TQ,
com vistas à conciliação dos direitos em jogo, pavimentará o caminho para a materialização do
regime de dupla afetação, bem como para a consolidação de uma coalizão de área protegidas, capaz
de conter o avanço da monocultura sobre os territórios da diversidade.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANJOS, R. S. A.ÁfricaBrasil: Atlas Geográfico. Brasília: Mapas Editora & Consultoria Ltda.,
2014.

BRASIL. Decreto nº 6.476/2008. Promulga o Tratado Internacional sobre


RecursosFitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6476.htm .

______.Reconhecimento de direitos territoriais de comunidades quilombolas, 6ª Câmara de


Coordenaçãoe Revisão; Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais; Brasília: MPF, 2018.
Disponível em http://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr6/documentos-e-publicacoes/manual-de-
atuacao/docs/02_18_manual_de_atuacao_quilombolas.pdf

CARNEIRO, E. O Quilombo dos Palmares. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira,1966.


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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

EMPERAIRE, L. La patrimonialización de un sistema agrícola en la Amazonia Brasileña.


Primer Encuentro Nacional de Patrimonio Vivo, Buenos Aires: Ministerio de la Cultura
BuenosAires, 2015.

MMA - MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Gestão Territorial e Ambiental


emTerritóriosQuilombolas. Ministério do Meio Ambiente, Secretaria de Extrativismo e
DesenvolvimentoRural Sustentável. Brasília: MMA, 2017.

NASCIMENTO, A. O Quilombismo. Petrópolis: Editora Vozes, 1980.

SANTILLI, J. Agrobiodiversidade e Direitos dos Agricultores. São Paulo: Petrópolis, 2009.

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TERRA INDÍGENA EM DISPUTA: A RETERRITORIALIZAÇÃO DOS


POTIGUARA NA TI POTIGUARA MONTEMOR/PB
INDIGENOUS LAND IN DISPUTE: RETERRITORIALIZATION POTIGUARA IN TI
POTIGUARA MONTEMOR/PB

Ivys Medeiros da Costa*, Maristela Oliveira de Andrade**, Alicia Ferreira Gonçalves**.

Centro Universitário de João Pessoa – UNIPE, Brasil. Ivysmedeiros10@gmail.com * Departamento de Ciências


Sociais, Universidade Federal da Paraíba – UFPB, Brasil. andrademaristela@hotmail.com e aliciafg1@gmail.com**

1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo consiste em analisaro processo de reintegração de posse envolvendo
um conflito fundiário entre os índios Potiguara no Litoral Norte da Paraíba, a família Lundgren, o
Governo Federal, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o Ministério Público Federal (MPF) e as
usinas de cana de açúcar, considerando ahistória recente da luta dos Potiguara para permanecer em
seu território original.
O processo de territorialização indígena intensificou-se na primeira década do séc. XX,
segundo Oliveira et al (2010), através do regime de tutela estatal. Contudo,no início do séc. XX, a
Família Lundgren instalou uma fábrica têxtil a Companhia de Tecido Rio Tinto, utilizando a
madeira das terras ocupadas pelos Potiguara para construir e manter a fábrica, provocando sua
desterritorialização. A falência da fábrica na década de 1970 coincide com a expansão da fronteira
agrícola com o Programa Nacional do Álcool (PROÁLCOOL) de modo que as terras foram
utilizadas para o plantio da cana de açúcar (PALITOT, 2005) no entorno e dentro da terra indígena.
Já a criação da Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) Manguezais da Foz do rio
Mamanguape, através do Decreto nº 91.890, em 1985 e da Área de Preservação Ambiental (APA)da
Barra do rio Mamanguape, com o Decreto nº 924,em 1993, em sobreposição as terras indígenas
provoca um conflito de caráter socioambiental.
Os Potiguara lutaram pela reterritorialização de suas terras, com o auxílio da FUNAI e do
MPF, conseguindo a demarcação da TI Potiguara Montemor em 17 de dezembro de 2007, pela
Portaria do Ministério da Justiça nº 2.135.
Otrabalhoserá analisado a partir das categorias de território, territorialização,
desterritorialização e reterritorialização, fundamentadas em autores e referenciais teóricos da
antropologia como Little (2002a e 2002b) e Oliveira (2004) e da geografia como Raffestin (1993) e
Haesbaert (2012).

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2. METODOLOGIA
A área pesquisada é a TI Potiguara Montemor que possui 05 (cinco) aldeias indígenas:
Montemor, Três Rios, Jaraguá, Lagoa Grande e Ybykoara, com 4.447 pessoas e uma área de 7.487
ha, segundo Cardoso e Guimarães (2012), sendo que o presente trabalho teve como área de estudo
as três primeiras aldeias da TI Potiguara de Montemor.
A metodologia utilizada foide mapeamento dos conflitos de Little (2002b), com a aplicação
de entrevistas com índios e não índios, uma pesquisa etnográfica e bibliográfica, e, por fim, a
análise de conteúdo das entrevistas.

3. RESULTADOSE DISCUSSÃO
A Aldeia Montemor contém 1.533 índios e mais de 3.000 não índios com uma extensão de
quase 3.000 hectares, conforme dados da Cacique da Aldeia, coletados durante a pesquisa. A Aldeia
Três Rios teve sua terra retomada em 2003, possuindo cerca de 700 índios, cujas atividades
econômicas são agricultura, cata de caranguejo, pesca de peixes e camarões nativos. A Aldeia
Jaraguá tem 285 famílias, conforme as lideranças locais e Censo da FUNAI, de difícil acesso, com
estradas de barro e muito irregular, porém conta com coleta de lixo, obtida após decisão judicial em
ação impetrada pelos índios. A Justiça Federal obrigou a Prefeitura do Município de Rio Tinto a
realizar a prestação de serviço de coleta de lixo.
A caracterização do cenário do conflito fundiário e a luta pela territorialidade indígena foi
feita conforme Little (2002b) com a identificação dos atores sociais entre os quais a família
Lundgren, as usinas de cana de açúcar, a FUNAI, o MPF e as lideranças indígenas, como a Cacique
de Montemor e o CIMI na busca pela demarcação da TI. Este cenário de disputa se amplia com o
conflito socioambiental com a entrada de novos atores sociais, como o Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBIO).
Analisando as entrevistas realizadas na pesquisa de campo com os Potiguara concernente a
territorialidade indígena, pode-se verificar que há expectativas com a homologação da TI Potiguara
Montemor, o planejamento de uma Gestão Ambiental e Territorial nas terras indígenas, como
também a recuperação ambiental da área pesquisada.
A demarcação da TI Potiguara Montemor ocorreu em 2007, conforme já
mencionado, contudo até o mês de setembro de 2019 a homologação dessa terra indígena ainda não
havia ocorrido. A partir da demarcação da TI Potiguara Montemor foi realizado um acordo através

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

do Ministério Público Federal para não mais ocorrer a cobrança de aluguéis nos imóveis que até
então eram considerados de propriedades da Companhia de Tecido Rio Tinto.
Outrossim, após a homologação da TI Potiguara de Montemor surge uma problemática
sobre a desintrusão, que é a retirada dos não índios da terra indígena, tal preocupação foi
mencionada pelos índios, como no caso da Cacique de Montemor e do Cacique Geral, haja vista a
necessidade de verba federal para indenizar as benfeitorias realizadas pelos não índios, como
também retirar a população não indígena da área, sejam eles residentes, empreendedores como os
herdeiros da Família Lundgren, donos da Companhia de Tecido Rio Tinto, já extinta, ou
latifundiários, como os usineiros. Com relação aos empreendimentos os índios desejam sua retirada,
contudo, com relação aos residentes, há a preocupação do conflito social que vai surge, como
também da questão habitacional, pelo fato destes não terem para onde ir.
A Cacique de Montemor informou o seguinte:

“Então acredito que com a homologação não é um processo que se resolva de um todo porque quando a
gente fala no processo de homologação a gente sempre fala na questão de desintrusão. A nossa maior
prioridade hoje é desintrusar a nossa área que é ocupada hoje pelos grandes latifundiários né ainda com
seus cantos de cana de açúcar e a Companhia de Tecido Rio Tinto que é a que construiu as casas que hoje
esta aqui no centro de nossa aldeia. Ai vem o grande conflito, a FUNAI entende que todo mundo que é
branco precisa sair. E ai a gente fica naquela balança do grande impacto social que isso causaria na nossa
comunidade. Ai nós diremos, ainda temos autonomia pra dizer quem fica e quem sai. Porque assim as
pessoas que cresceram junto conosco aqui não são empecilho. O grande empecilho pra nós, pra nosso
povo hoje é os latifundiários e não a população que alguns deles a gente precisa que são focos de algumas
coisas que nós não gostamos dentro da nossa área, que a gente precisa retirar, mas é muito pouco.”

Por conseguinte, o Cacique Geral dos Potiguara destacou também a homologação e a


consequente desintrusão na TI Potiguara Montemor, além de tratar sobre a existência de outra área
no Litoral Norte da Paraíba que esta sendo reinvindicada como terra indígena, a Aldeia de Taepe,
aumentando a quantidade de aldeias Potiguara de 32 para 33 aldeias.

“Agora a gente tá nesse processo da Terra Potiguara de Montenor que tamo aguardando só a
homologação e desintrusão. E também a gente tem outra terra que é a Potiguara de Taepe que a FUNAI tá
mandando um GT que foi 13.500 hectare que ficou fora dessas demarcação de Potiguara de São Miguel.
Na época o pessoal do exército vieram e deixaram essa parte fora. E a gente tá reivindicando ela agora,
tem uma aldeia lá que nunca deixou de ser aldeia, a Aldeia Taepe. E a gente conseguiu agora em Brasília
fazer um GT para que possa fazer esse. Trabalhando lá fica umas 04 fazenda, fica uma Usina de Cana de
Açúcar e a gente tá tentando, dento da lei, buscar de volta o que é nosso, a gente num tá tomando de
ninguém, a gente tá indo buscar porque o nosso povo precisa né. A gente, assim, na Paraíba, menos, é 1%
(um por cento) das terra da Paraíba a gente tamo situado, meno de 1%, pra você vê que é tão pequena a
quantidade de terra do nosso povo. E é onde tá crescendo, a gente tem, tamo querendo garantir isso pra
quê? Pra nós, pros nossos filhos e nossos netos. Novas gerações que tão vindo. E a gente tinha 56.000
(cinquenta e seis mil) hectare, hoje a gente só tá com trinta e poucas mil.”

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Os movimentos sociais indígenas realizam um trabalho nas áreas em conflito, trabalhando


de forma efetiva a questão da reterritorialização, através das associações indígenas, como também
com o apoio do CIMI e do Ministério Público Federal, com a finalidade de garantir a
territorialidade indígena contra os desmandos dos empreendimentos dos setores sucroalcooleiro e
têxteis.
A missionária do Conselho Indigenista Missionário – CIMI informou, na pesquisa de
campo, que a principal luta dos índios é com as terras, declarando também que o CIMI é um
parceiro em todo Brasil na luta indígena pela reterritorialização, “ajudando a acelerar as lutas da
retomada”. Informando também que participou, inclusive acampando junto com os índios, na
retomada da aldeia Três Rios, conquistada em 04 de agosto de 2003.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O conflito fundiário traz à tona a questão da territorialidade expropriada pelosportugueses
desde a colonização até os empreendimentos capitalistas no século XX, e mostra a fragilidade de
uma cultura que está sendo ameaçada por falta de apoio dos governantes. O Poder Público tem uma
parcela de responsabilidade nestes conflitos que envolvem não apenas a comunidade local e o setor
privado, mas também os órgãos de fiscalização e da própria justiça que não põe fim a esse litígio.
De fato, o processo demarcatório só é concluído com a homologação da demarcação,
conforme o Decreto nº 1.775/1996, fase essa ainda não alcançada pela TI Potiguara Montemor,
ocorrendo, com isso, conflitos judiciais com as usinas de cana de açúcar e os herdeiros da família
Lundgren, por causa da questão territorial na região (COSTA, 2014).
Por outro lado, o conflito socioambiental decorrente da sobreposição com as áreas
protegidas envolve problemas ligados a gestão ambiental e a atuação das agências ambientais que
não reconhecem os direitos indígenas de usufruto desses recursos. A resolução desse conflito requer
a implantação da gestão participativa da área de sobreposição conforme determina a Lei nº
9985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC).
A resolução dos conflitosna TI Potiguara Montemor requer que o Governo Federal conclua a
demarcação de suas terras, de modo a garantir o acesso a políticas indigenistas, dos governos
federal, estadual e/ou municipal, proporcionando a população indígena um melhor aproveitamento
de suas terras de forma sustentável, garantindo, com isso, o sustento das famílias indígenas.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto 7.747, 05 de junho de 2012. Institui a PNGAT – Política Nacional de Gestão
Territorial e Ambiental de Terras Indígenas. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/decreto/d7747.htm>. Acesso em
12/01/2014.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CARDOSO, Thiago Mota; GUIMARÃES, Gabriella Casimiro (Orgs.) Etnomapeamento dos


Potiguara da Paraíba. Brasília: FUNAI/CGMT/DGETNO/DGAM, Série Experiências Indígenas,
n. 2, 2012.
COSTA, Ivys Medeiros da. Terra indígena x terra de usina: legislação socioambiental e fundiária
e os conflitos na TI Potiguara Monte-Mor-PB. (Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento e
Meio Ambiente), PRODEMA/UFPB. João Pessoa, 2014.

HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à


multiterritorialidade. 7ª Edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Indicadores de desenvolvimento


sustentável Brasil 2010. Estudos e Pesquisas, Informação Geográfica. Número 07. Rio de Janeiro,
2010.

LITTLE, Paul E. Territórios Sociais e Povos Tradicionais no Brasil: por uma antropologia da
territorialidade. Brasília, Universidade de Brasília: 2002a. (Série Antropológica)

______ Ecologia Política como etnografia: um guia teórico emetodológico. Brasília, Universidade
de Brasília: 2002b. (Série Horizontes Antropológicos)

OLIVEIRA, João Pacheco de. A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no
Nordeste Indígena. Rio de Janeiro: LACED, 2004.

OLIVEIRA, JoãoP. de; REIS, Daniel A.; MATTOS, Hebe; MORAES, Luís E. de S.; RIDENTI,
Marcelo (Orgs.). Tradições e modernidades. Rio de Janeiro: FGV, 2010.

PALITOT, Estêvão Martins. Os Potiguara da Baía da Traição e Monte-Mór: história, etnicidade


e cultura. Dissertação de mestrado, PPGS/UFPB. 2005.

RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Editora Ática, 1993.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E POBREZA – RECIFE E SEUS ESPAÇOS


DE DESIGUALDADES
CONSERVATION UNITS AND POVETY – RECIFE AND ITS SPACES OF INEQUALITIES

Maria das Dores de Vasconcelos Cavalcanti Melo*


*Doutora, UFPE, Brasil

INTRODUÇÃO
A urbanização, a poluição das águas e do solo são algumas das ameaças a continuidade da
vida (MYERS, 1988; MITTERMEIER, 2011;MELO, 2017) sendo necessário portanto o
estabelecimento de prioridades e estratégias eficazes para reduzir o ritmo da destruição da
biodiversidade e a manutenção dos serviços ecossistêmicos. A estratégia adotada pela comunidade
científica e tomadores de decisão tem sido acriação de Áreas Protegidas, entendidas aqui também
como Unidades de Conservação da Natureza (UCN) (MELO, 2017).
O objetivo deste artigo é contribuir com a reflexão e a sensibilização acerca dos conflitos
socioambientais que envolvem a vida urbana no Recife, focalizando as UCNs Municipais e as
Comunidades de Interesse Social (CIS)1 que estão inseridas dentro das unidades. Informar, discutir
e promover o debate sobre Áreas Protegidas e Inclusão Social no espaço da cidade traz a luz a
desigualdade social instalada assim como a degradação do seu ambiente natural. A compreensão
desses aspectos possibilita a perspectiva de transformação de atitudes de planejamento e gestão que
venham a estabelecer uma convivência harmoniosa e justa da população pobre, para uma qualidade
de vida digna no meio em que elas vivem.
A cidade do Recife (PE) oferece um cenário propício para essa discussão, tendo em vista sua
longa história de evolução urbana, por se constituir como um dos primeiros polos de
desenvolvimento no país e ter um ambiente que exige um manejo permanente dos recursos naturais
para o desenvolvimento do seu tecido urbano e instalação da sua população. O diálogo das águas
com a Mata Atlântica delineou os caminhos da cidade e, sob aterros sucessivos, o bioma foi sendo
destruído, seja quando na primeira ocupação portuguesa no antigo istmo, (contíguo ao porto, hoje
ilha, bairro do Recife), seja na ocupação das áreas de manguezal e, por fim, a instalação de bairros
habitacionais nos morros antes cobertos com a floresta ombrófila densa. Hoje, manguezal e floresta
continuam em cena, provendo seus serviços ecossistêmicos, sendo protegidos por legislações

1
CIS – Comunidades de Interesse Social, mapeadas pela Prefeitura do Recife no Atlas das Infraestruturas Públicas do
Recife. (RECIFE, 2016)
295
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

federal, estadual e municipal, no entanto, sendo destruídos no dia a dia da produção da cidade, sem
uma intervenção apropriada da gestão governamental.
Desde a década de 1980, o Recife conta com UCNs, sendo as primeiras criadas no nível
estadual, em 1987 (seis no território do Recife), 21 criadas no nível municipal, 1996, eoutras quatro
Unidades criadas em anos posteriores.Hoje a cidade do Recife conta com 25 UCNs, que envolvem
os principais remanescentes de floresta e manguezal, ocupando cerca de 38% do seu território.Vale
destacar que, apenas 37% do território dessas UCNs municipais possuem cobertura de vegetação
significativa, sendo 33,97% de floresta densa1, e 3,51% de manguezal. O que significa que o
território da cidade do Recife conta com 14,5% de vegetação significativa de Mata Atlântica
protegida por unidades de conservação (SMAS, 2019).
Ao mesmo tempo, a cidade convive com 545 Comunidades de Interesse Social (CIS) que
ocupam cerca de 20% do seu território e abrigam 53% da sua população (RECIFE, 2014).Nesse
contexto de apropriação do espaço e manutenção dos serviços ecossistêmicos é que se travam as
reflexões e discussões no presente artigo.

MATERIAL E MÉTODO
Aqui trataremos dos conceitos fundamentais e pressupostos para a melhor compreensão do
assunto discutido no artigo, que são: Áreas Protegidas e UCNs; Mata Atlântica; Recife, sítio natural
e evolução urbana.O método adotado neste artigo é a revisão bibliográfica, levantamentos
disponíveis pela Prefeitura do Recife, em site oficial, e reconhecimento de campo das UCNs
Municipais e das CIS.
As áreas protegidas são reconhecidas internacionalmente por representar a biodiversidade de
cada região e conseguir separar essa biodiversidade dos processos que ameaçam a sua persistência
(MARGULES; PRESSEY, 2000; MELO, 2017). Neste artigo as áreas protegidas serão
reconhecidas como UCNs, por seu objetivo de conservação da biodiversidade, sua delimitação
explícita e a gestão especial e específica, de acordo com os conceitos de área protegida adotados
pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) e pela Convenção da Diversidade
Biológica (CDB) (MARETTI et al., 2012; MELO, 2017).
O Domínio da Mata Atlântica, bioma que cobria 15% do território nacional, inclui 17
estados2 e 3.429 municípios. Nesse domínio original vivem, atualmente, 70% da população
brasileira, localiza-se grande parte dos maiores polos industriais, agrícolas, químicos, petroleiros,

1
Floresta densa aqui compreendida como conjunto florestal com predominância de floresta ombrófila densa, contendo
também outras espécies arbóreas, mesmo que exóticas.
2
Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais,
Espírito Santo, Bahia, Alagoas, Sergipe, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí. Fonte: Ribeiro et
al., 2009
296
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

portuários e turísticos do Brasil, (MELO, 2017). No Brasil restam cerca de 12% da sua cobertura
original, considerando matas bem preservadas com mais de 3ha, ou cerca de 9%, considerando
matas bem preservadas com mais de 100ha (SOS Mata Atlântica, 2019).
Assentada em uma planície fluvio-marinha, circundada por outeiros, a ocupação urbana do
Recife, desde o século XVI,encontrou um sítio natural formado por águas fartas e ecossistemas da
Mata Atlântica, sendo a floresta ombrófila, manguezal e restinga. No século XIX,a cidade contava
com três áreas mais densas nos bairros do Recife, Santo Antônio e São José, com ocupações
esparsas ao longo dos principais eixos de escoamento da produção agrícola, no bairro da Boa Vista
(RECIFE, 2019).
No século XX, ocorrem intervenções estruturadorasno Recifee, por meio de aterros
sucessivos ao sítio natural no entorno do centro urbano, a cidade vai se expandindo, impulsionada
pela reforma do porto e a implantação da Avenida Guararapes, no bairro de Santo Antônio.A
estratégia adotada para a valorização dessa área central foi atransferênciadas famílias moradoras de
favelas da região central para habitacionais nas áreas periféricas da cidade, distantes das
oportunidades de trabalho e sem serviços de transporte. A intervenção agravou a segregação
espacial e a desigualdade social, gerando conflitos e influenciando a formulação de novos
programas de urbanização de favelas (RECIFE, 2019).
Nesse contexto, em 1920, o Recife contabilizava 43% das residências da cidade como
mocambos e, em 1950 esse percentual passou para 67% (RECIFE, 2019).É nesse período, que a
pressão sobre a ocupação do solo urbano se formaliza na ocupação dos morros da zona norte e nos
alagados do Capibaribe e da bacia do Pina, ao mesmo tempo em que o modelo de cidade se orienta
para a acomodação dos veículos individuais.Nas décadas seguintes, o Recife se desenvolve como
um lugar de contrastes onde as populações pobres ocupam as áreas de morro e margens de rios e
canais e se intensificam as construções multifamiliares verticais voltadas para a classe média.
Em 2014, o Atlas das Infraestruturas do Recife contabilizou 545 CIS, ocupando 20,4% do
território da cidade, com uma população estimada em 53% da população total do Recife.

RESULTADO E DISCUSSÃO
Refletir sobre a fronteira entre a conservação da biodiversidade e a pobreza urbana no Recife
expõe necessariamente a falta de visibilidade e a importância desses dois aspectos para a população
em geral, poder público e mídia.
A ocupação desordenada na cidade se dá principalmente sobre esses dois ecossistemas
remanescentes, floresta e manguezal, seja por estarem situados em áreas de domínio público, sem
uma gestão eficaz de controle e fiscalização, seja por estarem localizados próximos ao centro
urbano, oferecendo alternativas de trabalho e renda, além de facilidade de acesso por vias e
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transporte público. Nessa situação, encontram-se quase40% das UCNs municipais,nove das 11 que
possuem manguezal em seu perímetro, às margens dos rios Capibaribe e Tejipió. Cerca de 13%
dessas UCNs estão ocupadas por CIS e 23,2% delas possuem instalações de viveiros de camarão.
Durante o processo histórico de exclusão social, a população pobre ocupou as áreas alagadas
do Recife, construindo moradias de palhas, pau-a-pique ou palafitas, nutrindo-se do que era
ofertado pelo manguezal, como caranguejos, peixes e moluscos (CASTRO, 1968; LEITE, 1977;
ALVES, 2009). As atividades de aquicultura remontam do século XVII, com a construção de
viveiros de peixe, no bairro do Pina (BARLÉU, 2005).
A qualidade de vida dessas populações moradoras das margens indica a pior situação no
cenário urbano, considerando o fluxo das marés que invadem áreas residenciais em períodos de
chuvas, a qualidade das águas, a quantidade de resíduos sólidos dispostos nos corpos d´água e suas
margens, a proliferação de vetores e a insegurança dessas áreas, em algumas vezes tomadas pelo
tráfico de drogas.
Nas áreas de remanescentes florestais é frequente a pressão do mercado imobiliário em
busca de novos espaços para expansão, selecionando nessas áreas a paisagem expressiva, alto valor
do solo ea disponibilidade de infraestrutura em bairros como Ilha do Retiro,Várzea, Casa Forte e
Dois Irmãos.Dentre as 11 UCNs municipais que possuem ecossistema de floresta, apenas duas
(Nascentes e Capivara) não contam com ocupação de CIS em seu perímetro, nas demais as
ocupações variam entre 0,10% a 5%, com exceção da UCN Sítio dos Pintos, cuja ocupação com
CIS chega a quase 50% do território da UCN.

CONCLUSÃO
Considerando que as áreas protegidaspossuem como principal objetivo a conservação da
biodiversidade e o uso sustentável dos seus recursos naturais e que, a condição para a
implementação das unidades é a criação de seu conselho gestor e a elaboração do seu plano de
manejo, a gestão dasUCNs municipais deve focar esses condicionantes.
Considerando as informações e reflexões deste artigo, a presença e participação das
comunidades mais pobres nas decisões do planejamento das áreas protegidas municipais é
pressuposto para a efetividade de qualquer plano de manejo. Destacando que a compreensão das
necessidades e carências dessas populações exigem pesquisa aprofundada quanto aos aspectos
materiais e imateriais, objetivos e subjetivos que venham a contribuir com a construção de uma
cidade de fato justa e sustentável.
Considerando que há sobreposição de perímetros entre UCNs municipais e estaduais é
fundamental o planejamento e a gestão integrada dessas áreas, com a construção de instrumentos de
gestão claros, simples e compactuados com os atores envolvidos.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

AGRADECIMENTOS
Agradeço a toda a equipe técnica da Gerencia Geral de Unidades Protegidas da Secretaria de
Meio Ambiente e Sustentabilidade da Prefeitura da Cidade do Recife, pelo apoio nas reflexões.

REFERÊNCIAS
ALVES, P.R.M. Valores do Recife: o valor do solo na evolução da cidade. Recife: LuciArtes
Gráficas, 2009.

BARLÉU, G. O.Brasil holandês sob o Conde João Maurício de Nassau: história dos
feitosrecentemente praticados durante oito anos no Brasil... Tradução e notas de CláudioBrandão.
Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, v. 43, 2005.

CASTRO, J. Documentário do Nordeste. 4 ed. São Paulo: Brasiliense, 1968.

LEITE, A. L. P. Urbanização e conflitos urbanos: o caso do Recife.Caderno do CEAS,Salvador, n.


49, p. 9-30, mai./jun. 1977.

MARETTI, C.C.et al.Áreas Protegidas: definições, tipos e conjuntos – reflexões conceituais e


diretrizes para gestão. In: CASES, M.O. (org.) Gestão de Unidades de Conservação:
compartilhando uma experiência de capacitação. Brasília: WWF Brasil / IPÊ, 2012.

MARGULES, C.R.; PRESSEY, R.L. Systematic conservation planning. Nature, n. 405, p. 249-
253. 2000.

MELO, M.D.V.C. Lições da Mata Atlântica no Nordeste do Brasil: saberes e fazeres de uma
rede de gestores na implementação de um corredor de biodiversidade. 2017. Tese de
Doutorado – Universidade Federal de Pernambuco, Recife.

MYERS, N. Threatened biotas: “hotspots”. In:Tropical forests. Environmentalist, 1988.

MITTERMEIER, R.A., et al. Global biodiversity conservation: the critical role of hotspots. In:
Biodiversity hotspots. Springer Berlin Heidelberg, 2011.

RECIFE, PREFEITURA. Atlas das infraestruturas públicas das comunidades de Interesse Social do
Recife. Recife: Prefeitura do Recife, 2016.

RECIFE, PREFEITURA. RECIFE, 500 anos: uma visão da cidade. 2019. Disponível em:
https://docplayer.com.br/220425-Recife-500-anos-uma-visao-de-cidade-recife-500-anos-uma-visao-
de-cidade.html. Acesso em: 20 set 2019.

SOS MATA ATLÂNTICA; INPE; USP; ARCPLAN; MAPBIOMAS. Qual a área de cobertura
da mata atlântica. Disponível em: https://www.sosma.org.br/artigo/qual-e-area-de-cobertura-da-
mata-atlantica/. Acesso em: 19 set 2019.

SMAS – Secretaria do Meio Ambiente e Sustentabilidade – Prefeitura da Cidade do Recife.


Disponível em: https://esigportal.recife.pe.gov.br/arcgis/apps/webappviewer/index.html?id=bd
1dcc4f6db543ce8d978578a018da66. Acesso em: 20 set 2019.

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UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E PROCESSOS DE


DESTERRITORIALIZAÇÃO DE COMUNIDADES TRADICIONAIS: O
CASO DA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL DA MATA DO PAU
FERRO, MUNICÍPIO DE AREIA-PB
CONSERVATION UNITS AND DETERRITORIALIZATION PROCESS WITH TRADITIONAL
COMMUNITIES: THE CREATION OF STATE PARK MATA DO PAU FERRO, IN AREIA-PB

Joelma Abrantes Guedes Temoteo*, João Henrique Rosa**, Eduardo Rodrigues Viana de Lima***

*Departamento de Turismo e Hotelaria, Universidade Federal da Paraíba, Brasil.


**Rastro Arqueologia, Paraíba, Brasil.
***Departamento de Geografia, Universidade Federal da Paraíba, Brasil. *** (Professor Orientador)

1. INTRODUÇÃO
A questão ambiental vem sendo discutida com maior ênfase nas últimas décadas e envolve,
além de preocupações com a conservação da natureza e seus ecossistemas, uma gama de inter-
relações entre questões sociais, econômicas e culturais, tornando-a altamente complexa.
O conceito de Desenvolvimento Sustentável surgiu nos anos 1970 como uma proposta de
desenvolvimento que minimizasse impactos negativos resultantes das atividades humanas baseado
no tripé: atividade econômica, bem-estar da sociedade e meio ambiente. Nesse contexto do uso
sustentável de áreas naturais, já em meados do século passado, surgiu a ideia da criação de
Unidades de Conservação como mecanismos que assegurassem a conservação de áreas com
atributos ecológicos importantes. De acordo com Diegues (2001) a criação desses espaços foi
baseada em uma concepção da relação homem/natureza fundamentada na premissa de que “a única
forma de proteger a natureza era afastá-la do homem, por meio de ilhas onde este pudesse admirá-la
e reverenciá-la” (DIEGUES, 2001, p.13).
No Brasil, desde julho de 2000, as unidades de conservação são áreas protegidas pela Lei nº
9.985, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Segundo a WWF-
BRASIL (2006), a criação dessas Unidades de Conservação é a principal proposta para diminuir os
efeitos da destruição dos ecossistemas no Brasil. Elas atuam na manutenção da diversidade
biológica e dos recursos genéticos no país, protegendo as espécies ameaçadas de extinção,
preservando e restaurando a diversidade de ecossistemas naturais e promovendo a sustentabilidade
do uso dos recursos naturais.
Os Parques Nacionais se constituem na categoria mais popular entre as UC´s e estão
inseridos no grupo das de proteção integral. Segundo a legislação brasileira, os parques Nacionais
tem como objetivo principal “preservar ecossistemas de grande relevância ecológica e beleza
300
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas, realização de atividades educacionais e


de interpretação ambiental, recreação e turismo ecológico, por meio do contato com a natureza”. Os
parques estaduais, por sua vez, são a denominação atribuída aos parques nacionais quando criados
na esfera administrativa estadual.
Nesse contexto, no ano de 1992 foi criada a Reserva Ecológica da Mata do Pau Ferro,
compreendendo uma área de 600 ha do sítio "Vaca Brava", então pertencente ao Governo do
Estado. No ano de 2005 essa reserva foi recategorizada e transformada no Parque Estadual Mata do
Pau Ferro (PEMPF) através do decreto nº 26.098, de 4 de agosto de 2005. Em sua área encontra-se
remanescente de um tipo específico de Mata Atlântica conhecida como Brejo de Altitude, também
abrigando a barragem Vaca Brava.
A partir da criação dessa UC, as famílias que viviam dentro da área foram realocadas em
residências construídas fora do parque, às margens da rodovia PB-079, localidade conhecida como
Chã de Jardim. Esse processo de realocação representa o que Moreira, Dallabrida e Marchesan,
(2016, p. 92) definiram como um processo de desterritorialização, tendo em vista que o pequeno
agrupamento social que vivia na Barragem de Vaca Brava foi levado a abandonar seu território. A
esse respeito Santos e Silveira (2001) acrescentam que nem todas as formas de reterritorialização
são inclusivas pois muitas vezes as populações desterritorializadas são submetidasa formas de
territorialização precárias socioeconomicamente e ambientalmente, provocando formas de
desapropriação excludentes nos territórios ou regiões atingidas.
Dessa forma, o objetivo do estudo do qual resultou esse trabalho foi analisar os conflitos
gerados a partir do processo de desterritorialização das famílias que viviam na comunidade de Vaca
Brava para a criação do Parque Estadual da Mata do Pau Ferro, município de Areia-PB, visando
compreender como esse processo se deu e conhecer as condições a que essa comunidade foi
submetida.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Quanto à abordagem, este estudo foi realizado a partir de uma pesquisa qualitativa
procurando enfatizar os aspectos subjetivos, visando compreender e interpretar as experiências dos
indivíduos que foram realocados no processo de criação do PEMPF.
Quanto aos objetivos, esta pesquisa pode ser considerada como exploratória e em relação
aos procedimentos tratou-se de uma pesquisa de campo, tendo em vista que foram realizadas visitas
para observação in loco da situação atual dos indivíduos realocados e também para a coleta de
dados através de entrevistas semiestruturadas com indivíduos da comunidade que vivenciaram o
processo de realocação. Por se tratar de um estudo em uma comunidade específica, este estudo se
enquadra como estudo de caso.
301
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A seleção dos entrevistados foi a partir da utilização da técnica Snowball ou “Bola de


Neve”, que se constitui em uma forma de amostragem não probabilística utilizada em pesquisas
sociais em que “os participantes iniciais de um estudo indicam novos participantes que por sua vez
indicam novos participantes e assim sucessivamente, até que seja alcançado o objetivo proposto” ou
ponto de saturação (BALDIN; MUNHOZ, 2011, p. 332). Dessa forma, foram realizadas 3
entrevistas no dia 11 de setembro deste ano, cujos nomes foram mantidos em sigilo e tratados nesse
estudo como Entrevistados 01, 02 e 03 (Quadro 01).

Quadro 01: Resumo do Perfil dos Entrevistados

Entrevistado Idade Gênero Profissão Est. Civil Escolaridade

01 29 Masc. Guia turístico local Solteiro Superior (cursando)

02 58 Fem. Merendeira (aposent.) Casada Ens. Fund. Incompleto

03 68 Masc. Churrasqueiro Casado Não alfabetizado


Fonte: Dados da pesquisa (2019).

Para o georreferenciamento, na etapa de campo foi utilizado um aparelho de navegação por


satélite da marca Garmin, modelo 62s, e um smartphone Motorola, modelo Moto G4, rodando o
software livre OruxMaps versão 7.0.2, para coleta de pontos e registro de caminhos
percorridos.Para os cálculos geoespaciais e produção cartográfica em ambiente de Sistema de
Informação Geográfica, foi empregado o software livre QGIS. A partir dos dados de campo
carregados no QGIS, foi possível calcular com exatidão as distâncias entre as antigas e as atuais
moradias e sua relação com o Parque e cidades vizinhas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
No momento da criaçã do Parque Estadual Mata do Pau Ferro, as famílias que residiam na
antiga comunidade rural de Vaca Brava, próxima à barragem homônima e inaugurada no ano de
1934, foram visitadas por gestores do órgão ambiental estadual (SUDEMA) e convidadas a se
mudar para as novas casas construídas às margens da PB-079, a atualmente conhecida como “vila
de Chã”. Logo após a realização das mudanças, de acordo com o Entrevistado 01, suas casas eram
demolidas para evitar que voltassem a ocupá-las.
De acordo com o entrevistado 02, as famílias que viviam naquele território plantavam e
criavam animais para sua subsistência e, após se mudarem para a Vila de Chã, já não poderiam mais
dar continuidade a tais práticas. A partir da Figura 01 pode-se visualizar a localização das antigas
casas da comunidade Vaca Brava, a Vila de Chã, onde residem atualmente as famílias realocadas e
também a distância entre essas duas áreas. Percebe-se que a mudança foi bastante significativa.

302
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 1 - Localização do Parque Estadual Mata do Pau-Ferro.

Fonte: Elaboração própria (2019).

De acordo com o Entrevistado 01, o “pessoal da SUDEMA” chegou em sua casa e fez a
“proposta” a seu pai para que eles viessem para a Vila de Chã de Jardim. Na ocasião, prometeram
água encanada, energia e que poderiam trabalhar na futura fábrica de polpas, mel e castanha em
frente às casas que ocupariam. Segundo ele, a parte da castanha nunca chegou a funcionar. Já a
fábrica de polpas, de acordo com a líder comunitária Luciana Balbino, mal chegou a funcionar na
época, pois os moradores não foram devidamente capacitados para dar seguimento ao
funcionamento sozinhos.
Além de hoje não poderem mais plantar e criar animais na nova moradia, as famílias
realocadas atualmente sofrem bastante com relação ao abastecimento de água pois o poço artesiano
perfurado no início do projeto não apresentava água de boa qualidade e logo foi aterrado. Nas
palavras do entrevistado “sofremos dificuldade de água aqui, pior do que lá”. Atualmente, todos os
moradores da Vila precisam comprar água para consumo diário e isto pesa no orçamento das
famílias da comunidade.
Outra situação difícil relatada pela Entrevistada 02 foi quando seu filho mais novo lhe
perguntou quando eles poderiam voltar para a casa anterior, demonstrando sua insatisfação com a
nova moradia. O Entrevistado 03, por sua vez, enfatizou que a nova moradia na Vila de Chã
apresenta um aspecto positivo que é o acesso aos transportes para cidades vizinhas.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A partir dessas informações relatadas e considerando o que defende Raffestin (1993, p. 144)
sobre o significado do território para uma comunidade onde este corresponde ao “espaço onde se
projetou um trabalho, seja energia e informação, e que, por consequência, revela relações marcadas
pelo poder”, verificou-se que as famílias que viviam na região da Barragem de Vaca Brava de fato
sofreram um processo de desterritorialização pois perderam suas referências territoriais e tiveram
suas relações de trabalho alteradas.

4. CONCLUSÃO
Sabe-se que a criação de UC´s representa uma importante iniciativa no sentido de preservar
ecossistemas relevantes e contribuir para um desenvolvimento mais sustentável. Porém, a forma
como essas unidades são criadas precisa respeitar as comunidades que vivem e dependem dessas
áreas, incluindo-as nesse processo.
No caso da criação do Parque Estadual Mata do Pau Ferro verificou-se que as famílias que
viviam na comunidade Vaca Brava e que foram realocadas para a Vila de Chã tiveram suas formas
de sustento comprometidas e sua relação com o território alteradas. Dessa forma, verificou-se que
essas famílias sofreram um processo de desterritorialização, tendo em vista a quebra do elo com os
territórios onde viviam, enfrentando nos dias atuais graves problemas com relação ao abastecimento
de água.

6. REFERÊNCIAS
BALDIN, N.; MUNHOZ, E. M. B. "Snowball (bola de neve): uma técnica metodológica para
pesquisa em educação ambiental comunitária." In: Anais do X Congresso Nacional de Educação.
I Seminário Internacional de Representações Sociais, Subjetividade e Educação. 2011.

DIEGUES, Antônio Carlos Sant´Ana. O nosso lugar virou parque: estudo socioambiental do Saco
de Mamanguá – Parati, Rio de Janeiro. 3.ed. São Paulo: Núcleo de Apoio à pesquisas sobre
Populações Humanas e áreas Úmidas Brasileiras, USP, 2005.

MOREIRA, P., DALLABRIDA, V., & MARCHESAN, J. (2016). Processos de Territorialização,


Desterritorialização e Reterritorialização (TDR): um estudo sobre a realidade socioeconômica
no Planalto Norte Catarinense. DRd - Desenvolvimento Regional Em Debate, 6(2), 88-103.

RAFFESTIN, C. Por uma Geografia do Poder. São Paulo: Ática. 1993.

SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de
Janeiro: Record, 2001.

SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação; Lei 9.985 de 18 de julho de 2000;


Ministério do Meio Ambiente.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PROJETO MINAS-RIO NO ENTORNO DO MONUMENTO NATURAL


SERRA DA FERRUGEM

Thaís Henriques Dias*, Wilson Madeira Filho**

Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (PPGSD-


UFF)thaishdias5@gmail.com
Professor Titular da Faculdade de Direito e do PPGSD-UFFwilsonmadeirafilho@hotmail.com

INTRODUÇÃO
Com o objetivo de articular os temas mineração e conflitos ambientais, apresentaremoso
caso da Unidade de Conservação Municipal Monumento Natural Serra da Ferrugem, localizada em
Conceição do Mato Dentro, e os conflitos com os agentes governamentais e com a empresa
mineradora Anglo American de Ferro Brasil S/A, tendo em vista o recente cenário de desregulação
da legislação, do licenciamento e da gestão ambiental pública. Trata-se de uma unidade de
conservação da categoria de proteção integral e está localizada na Serra da Ferrugem, que contorna
Conceição do Mato Dentro. Com uma área de 867 hectares, foi transformada em monumento
natural em maio de 2007, preservando toda a paisagem da serra, além de ter seu conjunto
arquitetônico tombado como patrimônio histórico-cultural pelo município.
Trata-se também de pensar a categoria de racismo ambiental nos conflitos ambientais
(TAVEIRA e FAUSTINO, 2013) a partir da constatação de que as comunidades presentes na área
que seria diretamente afetada pelo projeto de mineração não foram incluídas nos estudos de impacto
ambiental dos processos de licenciamento de empreendimentos minerários, no município de
Conceição do Mato Dentro (PEREIRA, BECKER e WILDHAGEN, 2013).

MATERIAL E MÉTODOS
Esta pesquisa surge a partir de um trabalho de campo exploratório, em algumas cidades e
territórios afetados por mineração no estado de Minas Gerais, realizada em maio de 2019. O
objetivo foi acompanhar in loco os processos judiciais e as atuações sociais de enfrentamento e
resistências relativos aos desastres ambientais em Mariana e Brumadinho, além de outros processos
de conflito com a mineração no estado de Minas Gerais, tais como em Conceição do Mato Dentro,
Alvorada de Minas e Serro. As análises desenvolvidas neste trabalho foram feitas a partir do uso do
caderno de campo, com observações feitas na visita à área operacional da Anglo American em
Conceição de Mato Dentro, em conversas com comunidades afetadas por mineração, representantes
de movimentos sociais e de alguns órgãos de justiça. Os conflitos que envolvem a Unidade de
305
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ConservaçãoMunicipal Monumento Natural Serra da Ferrugem, implicam no levantamento das


ações judicializadas do conflito e no mapeamento de notícias e estudos sobre o tema, a fim de
cotejar os principais conceitos da literatura sobre Unidades de Conservação e conflitos ambientais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O conceito de racismo ambiental pode levantar algumas discussões interessantes pelo fato
de haver diferentes interpretações sobre o seu uso, limites e amplitude. Parece existir uma disputa
entre o uso do conceito de justiça ambiental e o de racismo ambiental, por haver divergências em
destacar o fundamento das desigualdades na divisão dos danos e riscos ambientais na sociedade
brasileira, se por questão de classe ou econômica ou se também por questões étnicas e raciais. Além
disso, a ampliação do conceito de racismo ambiental para grupos não-negros, mas também
vulneráveis aos grandes projetos de desenvolvimento, pode levantar a discussão sobre a banalização
do termo racismo a partir de seus usos análogos, o que pode gerar uma preocupação quanto ao rigor
desses usos frente à questão racial.
Algumas ações de “diálogo social” promovidas pela empresa mineradora Anglo American
podem ser interpretadas como uma estratégia de não-mercado na construção de uma imagem
pública frente aos danos causados ao município, sobretudo às comunidades rurais presentes no
entorno do empreendimento e à Serra do Espinhaço. Isso porque se tratam de estratégias não-
mercantis, isto é, todo tipo de relação que a empresa estabelece com terceiros, que não passa pela
compra e venda de mercadorias. Esses programas sociais ganham o caráter de técnicas de
manutenção da estabilidade política do entorno dos fluxos produtivos.
Por fim, embora estejam em operação as obras do empreendimento do Projeto Minas-Rio,
que começou a se desenhar em 2007 com a compra de ativos da mineradora MMX Mineração, do
empresário Eike Batista, estas ainda não estão totalmente concluídas (TAVEIRA, 2016).
Atualmente, está em curso a chamada etapa 3 do Minas-Rio, que diz respeito à extensão da Mina do
Sapo. Contudo, essas obras causariam danos ambientais e culturais na zona de amortecimento da
Unidade de Conservação, o que torna ainda mais complexo o processo de licenciamento ambiental,
já que é uma área que está sob gestão do município e o pedido de licenciamento foi formalizado
perante o Estado de Minas Gerais.

CONCLUSÃO
O caso trazido para discutir o conceito de racismo ambiental diz respeito a comunidades
negras que sofrem processos de expulsão de seus territórios e o desfazimento das relações baseadas
no uso coletivo da terra. Nesses casos, o conceito de racismo ambiental pode ser usado de forma
fundamentada na medida em que as comunidades diretamente afetadas pela mineração sofrem com
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

a contaminação da natureza da qual dependem para manter suas relações sociais, étnico-raciais e
econômicas historicamente construídas nesses territórios. A fim de discutir o conceito de racismo
ambiental mais profundamente e os debates que giram em torno dos seus usos e utilidade analítica,
faz-se necessária a revisão dos autores e pesquisas que trabalham esse tema e os seus diferentes
enfoques. Por fim, apontamos possíveis caminhos, que não a invisibilização desses grupos sociais,
ao trazer reflexões iniciais sobre identidade e a autocartografia como forma de visibilização das
comunidades no território.

REFERÊNCIAS
PACHECO, Tania; FAUSTINO, Cristiane. A Iniludível e Desumana Prevalência do Racismo
Ambiental nos Conflitos do Mapa. In: Injustiça ambiental e saúde no Brasil [livro eletrônico]: o
Mapa de Conflitos. Marcelo F.; PACHECO, Tania; LEROY, Jean P. (Orgs.). Rio de Janeiro:
Editora FIOCRUZ, 2013.
PEREIRA, D. C.; BECKER, L. C.; WILDHAGEN, R. O. Comunidades atingidas por mineração e
violação dos direitos humanos: cenários em Conceição do Mato Dentro. Revista Ética e Filosofia
Política, v. 16, n. 1, p. 124-150, 2013.
TAVEIRA, Bruno H. T. Direito minerário e conflitos socioambientais: a utilização da teoria dos
princípios para uma análise pós-positivista. Dissertação (Mestrado profissional em Justiça
Administrativa) - Faculdade de Direito, Universidade Federal Fluminense, 2016. 135f.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A VIDA E SEUS MODOS –VISIBILIDADE INSTITUCIONAL DOS


IMPACTOS DA USINA HIDROELÉTRICA DE BELO MONTE SOBRE AS
POPULAÇÕES EXTRATIVISTAS DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA
TERRA DO MEIO

Tiago Eli de Lima Passos *, Bruna De Vita Silva Santos**, Priscila Franco Steier***

Coordenação de Produção e Uso Sustentável - COPROD/CGPT/ICMBio, Doutor em Antropologia Social pela


Universidade de Brasília**
Coordenação-Geral de Populações Tradicionais – CGPT/ICMBio, Engenheira Agrônoma - Universidade Federal de
Viçosa**
APA Petrópolis/ICMBio,MSc. Environmental Governance, Universitat Freiburg - Alemanha***

1. INTRODUÇÃO
O advento da Usina Hidrelétrica de Belo Monte foi devastador para os ribeirinhos do Rio
Xingu (MAGALHÃES & CUNHA - orgs, 2016; MAGALHÃES & CUNHA - orgs, 2017). Lidando
com a destruição como parte de sua experiência imediata, desde 2015 as comunidades beneficiárias
de unidades de conservação federais da região da Terra do Meio - Reservas Extrativistas Riozinho
do Anfrísio, Rio Xingu e Rio Iriri, narram, por meio de cartas, resoluções, moções dos conselhos
deliberativos e manifestações das associações comunitárias, a tragédia que se abateu sobre suas
vidas. E, ao fazê-lo, reivindicam justiça.
Em dissonância com a velocidade com que os impactos repercutiram sobre a vida nestas
áreas protegidas, o reconhecimento por parte do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade - ICMBio e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis - IBAMA foi tardio. A reboque das reivindicações das comunidades locais, o IBAMA
assentou no âmbito da Licença de Operação n°1317/2015 a condicionante 2.24.c, contemplando
somente duas das três reservas extrativistas impactadas e com escopo insuficiente para a ampla
mitigação dos impactos identificados.
O ICMBio, por sua vez, mesmo provido de comprovações técnicas quanto aos impactos do
empreendimento sobre o modo de vida das comunidades beneficiárias das unidades de conservação
federais, absteve-se de intervir junto ao órgão licenciador a partir de sua área técnica e locus
institucional competentes - quais sejam: a Coordenação Geral de Avaliação de Impactos Ambientais
(CGIMP) e a Diretoria de Pesquisa, Avaliação e Monitoramento da Biodiversidade (DIBIO).
Restou à Diretoria de Ações Socioambientais e Consolidação Territorial em Unidades de
Conservação – DISAT, sob a liderança da Coordenação-Geral de Populações Tradicionais - CGPT,
encampar os pleitos das comunidades locais junto ao IBAMA, porém sem o mesmo lastro legal e

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

respaldo institucional que uma manifestação por meio de Autorização para Licenciamento
Ambiental (ALA) teria conferido.
A condicionante 2.24.c estabeleceu ao empreendedor uma obrigação genérica de, no
“âmbito do Projeto de Incentivo à Pesca Sustentável", desenvolver projeto de assistência técnica de
pesca destinado aos pescadores e ribeirinhos moradores das Reservas Extrativistas Riozinho do
Anfrísio e Iriri. No entanto, conforme o ICMBio veio a reconhecer posteriormente, há três grandes
impactos negativos associados: (i) aumento e intensificação de conflitos por recursos pesqueiros
com pescadores externos às reservas extrativistas; (ii) perda de renda das famílias ribeirinhas,
decorrente da diminuição de rendimento da pesca comercial e do aumento generalizado de preços
na região; e (iii) perda de soberania alimentar decorrente da diminuição do rendimento da pesca de
subsistência.
Assim, visando efetivamente mitigar estes impactos, seria necessário ao menos:(i) apoio ao
ordenamento, manejo e gestão da atividade pesqueira na área, com base no fortalecimento da
organização social comunitária para gestão territorial;(ii) ações para o aumento da eficiência da
atividade pesqueira de forma a possibilitar diminuição da pressão sobre os estoques, através da
agregação de valor ao produto e condições adequadas de comercialização, incluindo preço mais
justo; e (iii) apoio à diversificação de atividades produtivas para diminuir a dependência da
atividade pesqueira.
Frente ao hiato entre as medidas mitigadoras necessárias e a condicionante 2.24.c, a equipe
técnica da CGPT/ICMBio se viu em um dilema quanto à melhor estratégia para tratativas junto ao
IBAMA: marcar posição pela revisão formal da redação da condicionante, ou provocar sua
interpretação de maneira ampliada? O presente relato trata, portanto, das lições aprendidas pelo
corpo técnico da CGPT/ICMBio durante as tratativas institucionais para equacionar o dilema
apresentado. Mais ainda, trata-se de uma reflexão quanto à necessidade de ser conferida devida
atenção à categoria “Reserva Extrativista” no procedimento de avaliação de impactos ambientais,
para que se evite, então, a reedição de impactos de empreendimentos como a Usina Hidrelétrica de
Belo Monte sobre o modo de vida das populações extrativistas.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Toma-se aqui como referência os diversos processos administrativos do ICMBio relativos à
condicionante 2.24.c e a experiência profissional de interlocução com a rede que se estabeleceu,
composta de atores com posições convergentes ou divergentes frente as tratativas que se
desdobraram.
Assim, com um certo viés de memória etnográfica, e com inspiração na antropologia (de
dentro) do Estado, desenvolvida pelo antropólogo Luiz Eduardo Soares (SOARES, 2000), busca-se
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

uma reflexão situada da qual se pretende, de modo propositivo, extrair lições de relevância técnica e
institucional.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A avaliação quanto a posição frente ao órgão licenciador não se restringe a um entendimento
técnico, mas à apreciação do que é mais estratégico também do ponto de vista jurídico-político.
Neste sentido, a CGPT/DISAT/ICMBio optou por jogar nos dois flancos. A coordenação indicou à
DILIC/IBAMA a necessidade de aperfeiçoamento da redação da condicionante 2.24 c. Ao mesmo
tempo enquadrou uma interpretação ampliada da condicionante, com fundamentos no arcabouço
legal aplicável, especialmente a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho e a
Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. Assim, embora tenha sinalizado a
relevância de revisão do texto da condicionante, a CGPT/DISAT/ICMBio simultaneamente buscou
fazer com que fosse reconhecido que o mecanismo para mitigação previsto na condicionante em
vigor precisaria ser dimensionado com lastro nos interesses e necessidades das comunidades
envolvidas, desde a concepção até aimplementação, monitoramento e avaliação.
Após várias manifestações contundentes da CGPT/DISAT/ICMBio, a DILIC/IBAMA, que
já havia incluído a Reserva Extrativista Rio Xingu como uma das áreas que deveriam ser alvo de
medidas mitigadoras, reconheceu formalmente as evidencias dos impactos sobre a pesca nas
reservas extrativistas, não pesando dúvida quanto ao nexo causal com o empreendimento. O órgão
licenciador, então, estabeleceu caber à Norte Energia S.A (NESA) dar cumprimento às suas
obrigações e ao ICMBio conduzir as negociações e a se pronunciar quanto ao atendimento das
medidas de mitigação.
No bojo das interlocuções e tratativas, a NESA vem oscilando entre duas posições. De um
lado, sob uma fachada tecnocrática, opera uma lógica pragmática e oportunista de negociação,
regida por uma barganha pelo menor custo possível. De outro lado, em uma linha de investidas que
tem sido pautada pelo seu corpo jurídico, questiona os impactos e seu nexo com o empreendimento
de forma a protelar, ou mesmo evadir-se, do compromisso de atender a condicionante.
A estratégia de questionamento protagonizada pela área jurídica do empreendedor vem
avançando e, neste tocante, a NESA entrou com recurso administrativo contra a posição da DILIC,
requerendo que, até o julgamento do mérito pela Presidência do IBAMA, não lhe siga exigível a
obrigação imputada. A ofensiva da área jurídica tomou de surpresa as comunidades locais, que
vislumbravam a possibilidade de um acordo negocial, pela via administrativa. Foi, sem dúvidas,
uma severa frustração de expectativas e um golpe que, mais uma vez, faz propagar a insegurança
como a grande marca do empreendimento, em suas múltiplas faces.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O recuo da NESA, que deixou de negociar até a manifestação conclusiva do IBAMA,


atentou contra a boa-fé das comunidades envolvidas, que haviam mobilizado seus parcos recursos
para reuniões preparatórias e com o empreendedor. Esperava-se, não sem desconfiança, que com a
negativa da DILIC houvesse margem para a retomada das negociações. Mas tudo indica que não
será este o caso, e que tudo dependerá de uma resposta conclusiva da Presidência do IBAMA
quanto ao recurso interposto pelo empreendedor.
Apesar das investidas da NESA, a estratégia adotada pela CGPT/DISAT/ICMBio suscitou
sensíveis avanços junto ao órgão licenciador no sentido de qualificar a condicionante 2.24c. Por
outro lado, o posicionamento da CGIMP/DIBIO/ICMBio, de desconsiderar os impactos sobre o
modo de vida das população beneficiárias nas reservas extrativistas como efetivo impacto ambiental
sobre os atributos que justificam a criação das unidades de conservação, enfraquece a construção de
uma solução institucional mais robusta através de uma ALA. Alarmante notar que tal
posicionamento contraria o próprio instituto do SNUC (BRASIL, 2000), que, em seu art.18,
estabelece entre os objetivos básicos das reservas extrativistas "proteger o meio de vida e a cultura
das suas populações extrativistas tradicionais e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais
da unidade".

4. CONCLUSÃO
Como a impressionante integridade dos territórios tradicionais nas reservas extrativistas da
Terra do Meio demonstra, as comunidades desempenhamum papel chave nas estratégias de
conservação da biodiversidade, como verdadeiras aliadas de um esforço conservacionista de
inequívoco interesse público. É justamente por reconhecer este papel que a criação de uma reserva
extrativista envolve afirmar a indissociabilidade entre a salvaguarda dos direitos e modos de vida
das comunidades extrativistas e o propósito de conservação da biodiversidade a partir do uso
sustentável.
Quando o poder público se subtrai ou se esquiva do reconhecimento de suas obrigações
frente às comunidades extrativistas, está se furtando a cumprir os compromissos que fundamentam
e justificam a criação da unidade de conservação, e minando ou vulnerando não só essas
coletividades potenciais parceiras, mas as próprias condições de sucesso que são requisito pra que a
área protegida possa atender aos seus objetivos de criação.
Em particular, no processo de avaliação de impactos ambientais de empreendimentos, dados
os objetivos de criação da categoria Reserva Extrativista, deve-se ter em conta que os impactos a
serem avaliados não se referem somente à integridade dos atributos ecológicos deste espaço
territorial, e sim aos efeitos negativos, reais ou potenciais, que passam a incidir sobre os modos de
vida das comunidades extrativistas. Afinal, o art. 18 do SNUC consigna claramente que a promoção
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

dos direitos de comunidades tradicionais não é só um meio, mas um fim em si, tão importante e
legítimo quando a conservação da biodiversidade.
É capital que esta compreensão esteja firmemente ancorada na praxe técnico-administrativa
das instituições que licenciam ou autorizam o licenciamento ambiental. Enquanto isso não se der,
estar-se-á atentando contra os direitos de comunidades extrativistas cujo papel já foi reconhecido
com fundamental na conservação de seu território, e marcharemos, em outros contextos, para a
rotinização do destino que a UHE do Belo Monte reservou às comunidades ribeirinhas do Rio
Xingu.

5. REFERÊNCIAS
MAGALHÃES, S. B. & CUNHA, M. C. (Orgs). Estudo sobre o deslocamento compulsório de
ribeirinhos do Rio Xingu provado pela construção de Belo Monte. Avaliação e propostas.
Altamira: Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, 2016.

MAGALHÃES, S. B. & CUNHA, M. C. A expulsão de ribeirinhos em Belo Monte: relatório da


SBPC : [livroeletrônico]. São Paulo: SBPC, 2017.

SOARES, LUIZ EDUARDO. Meu casaco de general. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

BRASIL. Lei Federal n° 9985 de 18 de julho de 2000, que regulamenta o art. 225, § 1o, incisos
I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza e dá outras providências. Diário Oficial da União, 19 de jul. 2000.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm. Acessado em
setembro/2019. 2000.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O TRABALHO DAS MULHERES NA MANUTENÇÃO DA COMUNIDADE


DA ENSEADA DA BALEIA, LITORAL SUL DO ESTADO DE SÃO PAULO
WOMEN'S WORK IN MAINTENANCE OF THE ENSEADA DA BALEIA COMMUNITY, SOUTH
COAST OF SÃO PAULO STATE

Tatiana Mendonça Cardoso*; Ingrid Cabral Machado*; Juliana Greco Yamaoka***


*
Pescadora/moradora da Enseada da Baleia; **Instituto de Pesca/APTA/SAA/SP, ingridcabralm@gmail.com; ***Rede
Cananéia, julianagreco@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
O Complexo Estuarino-lagunar de Cananéia, Iguape e Ilha Comprida e área costeira
adjacente localizam-se no litoral sul do Estado de São Paulo e forma um extenso mosaico de ilhas,
canais de maré, áreas de manguezal, praias e costões rochosos, onde as ilhas de grande porte
formam uma barreira natural de proteção às turbulências marítimas e à ação dos ventos (SALES &
MOREIRA, 1996). Nesta área há uma intensa atividade pesqueira, principalmente artesanal que
dependem dos recursos pesqueiros, ainda em bom estado de preservação. A pesca artesanal, embora
seja uma atividade secular, tem se tornado menos atrativa nos últimos anos em virtude das
dificuldades encontradas, como a diminuição dos estoques pesqueiros e a falta de investimento
racional nesta atividade. Mesmo com tantas temperes, muitas comunidades pesqueiras ainda
sobrevivem e mantendo suas tradições e cultura ao longo do litoral brasileiro. A presença da mulher
nesta manutenção muito é relatado em diversos trabalhos (BORGONHA e BORGONHA, 2008;
SOUZA et al, 2016; FONSECA et al, 2016), estando muitas vezes, desde a companheira de
pescaria até a condutora da atividade, passando por todas as atividades tanto da faina, quanto dos
desdobramentos da pesca que sustentam a família.
O presente trabalho visa relatar a experiência da Comunidade da Enseada da Baleia, na
busca de sua sobrevivência através da luta das mulheres pelo seu território.

2. METODOLOGIA
A Enseada da Baleia é uma comunidade localizada no Parque Estadual da Ilha do Cardoso
(PEIC), litoral sul do Estado de São Paulo, município de Cananéia. É instalada na península que
separa o canal estuarino do mar aberto, sendo caiçara em seu sentido mais estrito, que trabalha na
área marinha e estuarina. O trabalho foi desenvolvido com informações do histórico da comunidade
frente ao seu reconhecimento até a reconstrução da comunidade a partir de 2010, com informações
através de relatos dos moradores da própria comunidade em 2018 e 2019. O relato será dividido em

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

três partes: 1. Histórico da comunidade, com sua origem, tradição e meios de produção; 2. Pós-
ausência do patriarca, declínio e reconstrução; 3. Realocação da comunidade, enfrentamento,
trabalho e conquista.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Histórico da comunidade, com sua origem, tradição e meios de produção
A ocupação do território data de 1845, quando a primeira família se estabelece na área,
vivendo da pesca artesanal na margem paulista do estuário, e das roças tradicionais, no lado
paranaense. Dentre tantos que passaram por ali, um casal habitou o local com os filhos e dedicou-se
à pesca e à sua comercialização. Dos filhos que criaram, dois adotivos seriam patriarca e matriarca
do grupo que passou a se reconhecer como comunidade. Sr. Antônio Cardoso e Sra. Erci Malaquias
formaram, na década de 1940, a família que habita e luta pela permanência no local, mantendo-se
no território com a pesca, o processamento e a comercialização, abrindo, ainda, uma mercearia e um
salão que funcionava como restaurante.
A acidez do solo, o isolamento e o fato de estarem em uma unidade de conservação
restringiram as atividades possíveis para a subsistência dos moradores, de maneira que o pequeno
núcleo se mantém pesqueiro. A forte identidade comunitária forjou a inquebrantável coesão ao
longo dos anos, fazendo com que sejam reconhecidos como moradores tradicionais quando o lugar
foi transformado em Parque Estadual, em 1962.
A comunidade apresentava grande potencial para produção de peixe seco, sua mais antiga e
tradicional atividade, organizando a faina coletivamente, em diferentes papéis. A técnica de
produção de peixe seco, sem o recurso da luz elétrica, era a forma que a comunidade tinha para
aumentar a vida útil dos subprodutos, com secagem ao sol ou a defumação. O papel das mulheres
era de dedicação a apoiar e a cuidar, de parceiras no lar e no coletivo. O “limpar peixe”, expressão
que traduz esse rol genérico de “tarefas femininas”, inicia entre os sete e doze anos de idade e foi
essencial à produção pesqueira comunitária e à vida em família e em comunidade, mas foi ofuscado
pelo papel dominante masculino de ir ao mar e matar o peixe.
A produção de peixe seco ocupou Antônio e seus descendentes, sendo que as mulheres
trabalhavam em troca de itens para alimentação. Mais tarde, segue gerida por Antônio de forma
eminentemente centralizada, sendo o mentor e executor de todo o sistema, que perpetuou até seu
falecimento em 2010. A remuneração das mulheres participantes era feita por hora de trabalho, sem
que houvesse, por parte delas, a noção e a preocupação se estes benefícios eram efetivamente justos
ou sequer a disposição para questionar. Já nesta época, a comunidade sofria com a erosão da
margem voltada para o estuário, que ameaçava romper em uma nova barra que poderia causar a

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

extinção do lugar. A morte de Antônio, porém, foi para a comunidade uma primeira e severa crise,
onde a sua existência foi duramente ameaçada.
3.2. Pós-ausência do patriarca, declínio e reconstrução
A ausência de Antônio, por cerca de dois anos, a comunidade mergulhou no desolamento,
sendo que não sabiam trabalhar coletivamente, organizarem o processo produtivo, nem comunicar-
se com o mercado. Aliado a isto, os jovens começam a buscar trabalho na cidade e a comunidade
sofreu ameaça de dispersar-se, tão desgastada pela ausência da força agregadora do seu líder quanto
pela maré que não cessava de corroer a margem.
A força reativa que move a coletividade para a busca de caminhos alternativos vem, ao final,
da resiliência das mulheres do lugar, que começam a se reunir para discutir a situação. As raízes do
grupo, assentadas na força da identidade comunitária, germinam trabalhos com base na economia
solidária, frutos tanto da necessidade de subsistir enquanto comunidade, quanto do desejo de
perpetuar e aperfeiçoar a alegria da partilha. A partir de 2012, afastam-se da atividade pesqueira e
investem no artesanato como alternativa geradora de renda. Pelas habilidades e experiências locais
principiam um criar e realizar coletivo, com base no estarem juntas e se perceberem como iguais.
Com o auxílio de instituições parceiras, criam um empreendimento econômico solidário, as
Mulheres Artesãs da Enseada da Baleia (MAE) e começam a produção de ecobags, vestuário e
adornos. O artesanato desenvolvido pelas mulheres trazem as marcas do local e retratam a
paisagem, os animais e as artes de pesca da comunidade. Posteriormente, itens são confeccionados
usando-se fragmentos de redes de pesca abandonados, dando o caráter de sustentabilidade
ambiental, originalidade e identidade local.
Assim, emerge o turismo comunitário, embora na localidade já era praticado de forma
incipiente, o grupo de mulheres e mediante o apoio dos parceiros, fomentam atividades para a
recepção de grupos de estudo do meio, sendo autogeridas pelas mulheres e desenvolvidas através de
rotinas produtivas locais, do ambiente e modo de vida da comunidade. Passam a receber visitantes
de escolas da capital, entre outros, desenvolvendo modos de envolver a todos e, ainda, mostrar
quem efetivamente são, seus saberes, fazeres cotidianos e valores.
Neste tempo, a produção de peixe seco tinha sido suspensa devido ao registro na memória
das mulheres a posição subalterna que tradicionalmente desempenhavam e a ausência de poder de
decisão, duvidando da própria capacidade de gerenciar o negócio, bem como receavam a resistência
dos homens da comunidade em aceitar um comando feminino. Mas, em 2015, as mulheres
compraram em consignação toda a produção da safra da tainha (que ocorre no inverno) dos homens.
Foi um ato de ousadia de quem outrora fora meramente encarregada de “limpar peixe” e marcou
uma tomada de posição: a efetiva liderança da Enseada, a partir de então, seria feminina, seria
coletiva. Os contatos com os compradores foram restabelecidos e o processo de produção
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

comunitária foi realizado por elas. A composição da renda da comunidade a partir das três
atividades, trouxe um novo alento ao grupo, quando cada mulher envolvida nos processos auferia a
renda de um salário mínimo por mês, sonho compartilhado por elas.

3.3. 3. Realocação da comunidade, enfrentamento, trabalho e vitória.


Entretanto, no ano de 2015, um sério acidente demonstra que a situação do território era
mais grave do que se admitia. Uma embarcação turística, ao executar manobras sem orientação para
atracação na localidade, provoca o desmoronamento de cinco benfeitorias, incluindo a mercearia e o
salão de refeições, onde a matriarca então trabalhava. O choque de realidade é inevitável: o
território da comunidade está a ponto de desaparecer sob o mar.
Perder o território para a gente da Enseada significa mais do que perder a morada; é nada
menos que desaparecer. Instala-se, então, uma nova crise que impulsiona a comunidade em busca
de uma nova área para onde pudesse ser realocada o mais rápido possível. Vale ressaltar a
dificuldade em negociar a realocação na unidade de conservação de proteção integral. A luta foi
extremamente desigual, sendo necessário reunir entidades, angariar o apoio de órgãos públicos e
levar o assunto ao conhecimento da sociedade, para lograr uma interlocução efetiva com os órgãos
gestores do Parque. No meio das indefinições, a matriarca D. Erci Malaquias define o novo local da
Enseada da Baleia. Ela escolheu uma área conhecida por ela, com seus recursos – água potável e
árvores frutíferas e pontos de pesca. Em 2016, a comunidade se empenha em sua resistência e nos
preparativos para a realocação. Houveram eventos, matérias jornalísticas, campanhas em redes
sociais, além da ferrenha negociação com o Estado, que envolveu o Ministério Público, Defensoria
Pública, instâncias da Secretaria do Meio Ambiente, órgãos da USP, etc. Na área da antiga Enseada,
o tempo é de dormir “com um olho aberto e outro fechado”, em uma vigília permanente do desastre
e com toda a teimosia caiçara que fosse possível evocar, para não ceder ao medo e à pressão.
Mas finalmente a realocação é aprovada para a área escolhida pela matriarca e a construção
da Nova Enseada é todo um novo calvário, pois o Estado se recusa ajudar, apenas sede a área.
Assim, ainda faltaria o material para ser adquirido e transportado, além da construção em si,
eminentemente em regime de mutirão, bem com a captação de água a partir da área continental foi
um capítulo à parte.
A força feminina é demandada para manter a união e a liderança, mas, infelizmente a
mudança só se efetiva depois da morte da matriarca, com a saúde desgastada por sucessivos
desgostos. A morte de D. Erci é a consolidação de todas as perdas, ao mesmo tempo que a Nova
Enseada é o prenúncio de uma nova vida para a comunidade. Não havia mais sentido habitar na
antiga Enseada sem ela, e a comunidade vive o novo luto se despedindo de cada árvore plantada no
lugar, em celebração a cada novo nascimento, como era tradição na comunidade. A Nova Enseada
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ocupa o novo território a partir de junho/2017 e a força do mar abre a nova barra em agosto/2018,
engolindo em poucos meses boa parte dos testemunhos físicos de uma história que poderia ter ali o
seu capítulo final.
Na Nova Enseada foram construídas parte das residências, espaços comunitários e estruturas
produtivas da comunidade. Boa parte do território onde estava localizada a Enseada da Baleia, está
no fundo das águas, não sendo possível prever em que momento estas alterações se estabilizariam.
Em 2019 a proposta é avançar nas atividades de turismo comunitário e ainda, seguir na
defesa do território, para evitar a concessão da unidade de conservação à iniciativa privada,
proposta que vem se constituindo como política de estado, desde 2016, ameaçando o turismo
comunitário que ocorre em todas as comunidades caiçaras e ainda, ameaçando a permanência destas
na Ilha do Cardoso. A comunidade da Enseada que faz o enfrentamento, entretanto, não é a mesma
que instalou-se ali no passado e não é a mesma de 2010. É um grupo fortalecido pelo aprendizado
coletivo que emergiu das perdas, guiado pela força feminina recém conquistada pelas mulheres da
Enseada.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BORGONHA, M.C.; BORGONHA, M. Mulher-pescadora e mulher de pescador: A presença da
mulher na pesca artesanal na Ilha de São Francisco do Sul, Santa Catarina. Anais ... Fazendo
Gênero 8 - Corpo, Violência e Poder. Florianópolis, de 25 a 28 de agosto de 2008.

FONSECA, M.; ALVES, F.; MACEDO, M.C.; AZEITEIRO, U.M. O Papel das Mulheres na Pesca
Artesanal Marinha: Estudo de uma Comunidade Pesqueira no Município de Rio das Ostras, RJ,
Brasil. Journal of Integrated Coastal Zone Management/ Revista de Gestão Costeira
Integrada, 16(2):231-241 (2016).

SALES, R.R.; MOREIRA, A.C.C. Reservas Extrativistas no Complexo Estuarino-Lagunar de


Iguape e Cananéia - Domínio Mata Atlântica. Série Documentos e Relatórios de Pesquisa, Núcleo
de Apoio à Pesquisa sobre Populações Humanas e Áreas Úmidas Brasileiras (NUPAUB). São
Paulo, NUPAUB - USP. 77 p. 1996.

SOUZA, S.R.; MARTINEZ, S.A.; GANTOS, M.C. Mulheres pescadoras: uma análise das
produções bibliográficas acerca das relações de gênero no universo da pesca artesanal. Anais ...
Seminário Internacional Fazendo Gênero & 13th Women’s Worlds Congress. Florianópolis, 2017.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PRIORIZAÇÃO E AVALIAÇÃO DA IMPORTÂNCIA DAS UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO PRIVADAS (RPPNS) PARA A CONECTIVIDADE DE
FRAGMENTOS PROTEGIDOS NA UNIDADE BIOGEOGRÁFICA “SERRA
DO MAR” (MATA ATLÂNTICA BRASILEIRA)
PRIORITIZATION AND EVALUATION OF THE IMPORTANCE OF PRIVATE-
OWNEDPROTECTED AREASIN THE CONNECTIVITY BETWEEN FRAGMENTS OF THE
“SERRA DO MAR” BIOGEOGRAPHIC UNIT (BRAZILIAN ATLANTIC FOREST)

Viviane Sobral Domingos dos Santos*, Rafael Almeida Magris**

Universidade de Brasília (UnB), Brasil. vivisobral010@gmail.com*


COCUC, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Brasil. rafael.icmbio@gmail.com**

1. INTRODUÇÃO
À medida que a degradação ambiental torna as paisagens fragmentadas, esforços
deconservação se tornam cada vez mais necessários. O sistema de áreas protegidas representa uma
importante estratégia para minimizar os impactos decorrentes desta transformação. Como a
implementação de áreas protegidas públicas pode ser relativamente lenta (BUTCHART et al.,
2015)em relação a velocidade de transformação do uso do solo, o estabelecimento de unidades
privadas (i.e. Reservas Particulares do Patrimônio Natural -RPPNs) representa uma estratégia
complementar de grande potencial, com menor custo aos órgãos públicos e maior capacidade de
implementação imediata. Embora tenham áreas consideradas reduzidas do ponto de vista da
manutenção das espécies a longo prazo(MAYER et al., 2016), RPPNs podem ser fundamentais para
o estabelecimento de corredores ecológicos (MESQUITA, 2004), permitindo a movimentação das
espécies.
Diante deste cenário, o presente trabalho objetivou identificar os remanescentes de
vegetação com elevada prioridade para o estabelecimento de futuras RPPNs, a fim de serem alvos
de políticas de incentivo e estimulo à criação das mesmas.Objetivou-se ainda destacar quão
importante os remanescentes contendo RPPNsjá estabelecidas contribuem para a conservação da
conectividade em uma paisagem fragmentada.

2. MATERIAL E MÉTODOS

As análises foram realizadas para a Unidade Biogeográfica “Serra do Mar”(sensu RIBEIRO


et al., 2009), que compõe a Mata Atlântica Brasileira. Foram sistematizadas informações espaciais
sobre todasas RPPNs que sobrepõem o domínio, bem como todas as Unidades de Conservação
(UC’s) de Proteção Integralde nível Estadual e Federal.
318
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Fig. 1: Localização da área de estudo - Unidade Biogeográfica “Serra do Mar” - no Mapa dos Estados do Brasil, com
todos os limites das Unidades de Conservação Federais e Estaduais de Proteção Integral e ainda, todas as 130 Reservas
Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) que sobrepõem a sub-região. A representação das RPPNs está sem escala
para facilitar a visualização das mesmas.

Com o objetivo de agruparas 130 RPPNs com os fragmentos considerados


interconectados,os remanescentes sobrepondo com os limites de cada RPPN ou na sua vizinhança
imediata foram denominados “adjacências”, e foram alvos de análises destacadas dos demais
fragmentos. Para considerar os fragmentos conectados ou não, foram simulados dois cenários de
dispersão: 1 e 10km, a fim deavaliar a padrão de conectividade para espécies com baixa e alta
capacidade de dispersão, respectivamente.
A análise de priorização espacial levou em conta dois atributos: (i) percentagem de proteção
dos remanescentes por UC’s de Proteção Integral, uma vez que espera-se priorizar fragmentos com
baixo ou nenhum nível de proteção pré-existente; e (ii) importância para a conectividade em cada
cenário de conservação, uma vez que conectividade tem se tornado um importante critério para
manutenção das espécies a longo prazo. Para avaliar a percentagem de proteção, os remanescentes
foram sobrepostos espacialmente com os limites das UC’s de Proteção Integral. Para avaliar a
conectividade, foi utilizado o software ConeforSensinode 2.6 para o cálculo da métrica
“varIICconnector” que quantifica a importância de cada fragmento considerando o arranjo espacial
dos demais, e a capacidade de dispersão máxima das espécies em cada cenário. Ainda para o

319
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

cálculo desta métrica, a área dos remanescentes foi ponderada por uma medida de qualidade do
habitat, tendo como base dados dos focos de calorque ocorreram nos últimos dez anos.
Ambos atributos foram classificados em classes (categorias) com bases em medidas de
centralidade (i.e. mediana, quartis). Combinando-se as classes dos dois atributos, os remanescentes
foram classificados em oito categorias representando níveis de prioridade para a criação de RPPNs.

Tabela 1. Definição das classes de prioridade para a criação de novas RPPNs definidas com base na porcentagem de
proteção dos remanescentes por UCs de PI e importância para a conectividade.

Número Classe Nível de prioridade

1 Alta cobertura relativa por UCs de PI e muito baixa importância relativa para a conectividade
2 Alta cobertura relativa por UCs de PI e baixo nível de importância relativa para a conectividade
3 Baixa cobertura relativa por UCs de PI e muito baixo nível de importância relativa para a conectividade
4 Baixa cobertura relativa por UCs de PI e baixo nível de importância relativa para a conectividade
5 Alta cobertura relativa por UCs de PI e alto nível de importância relativa para a conectividade
6 Alta cobertura relativa por UCs de PI e muito alto nível de importância relativa para a conectividade
7 Baixa cobertura relativa por UCs de PI e alto nível de importância relativa para a conectividade
8 Baixa cobertura relativa por UCs de PI e muito alto nível de importância relativa para a conectividade

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quanto aos resultados da priorização espacial, os dados foram avaliados de forma distinta
para as adjacências e para os fragmentos. Os gráficos mostram o nível de prioridade das classes de
fragmentos e adjacências para a criação de novas RPPNs.

320
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Fig. 2: Porcentagem de adjacências (“A” e “B’) e fragmentos (“C” e “D”) encontrados em cada classe representativa
dos atributos obtidos através da priorização espacial. Os gráficos “A” e “C” representam o cenário de 1km e os gráficos
“B” e “D”, o cenário de 10km.

A combinação entre os dois atributos gerou um mapa com as áreas de maior prioridade para
a criação de novas RPPNs (classe 8 da Tabela 1) para cada um dos dois cenários de dispersão - 1 e
10km - onde a criação de novas RPPNs poderia ser incentivada.

Fig. 3: O mapa apresenta os fragmentos dos cenários de 1 e 10 quilômetros pertencentes à classe de prioridade máxima
para a conservação, sendo considerados prioritários para a criação de novas RPPNs (vermelho). Há um destaque (preto)
para as adjacências encontradas na área de maior priorização.

Para o cenário de 1km, apenas 10% das adjacências, contendo dezessete RPPNs ao todo,
estão enquadradas na classe de menor nível de prioridade. Já a classe de maior nível de prioridade
foi representada por pouco mais de 20% das adjacências, contendo trinta e nove RPPNs ao todo.
Em relação ao cenário de 10km, 14% das adjacências estão enquadradas na classe de menor
prioridade, contendo dez RPPNs ao todo, enquanto 7% estão enquadradas na classe de maior
prioridade, contendo oito RPPNs no total. Em relação aos fragmentos, a porcentagem dos mesmos

321
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

em áreas de maior prioridade foi de 24% e 18%, contra apenas 8% e 2% em áreas de menor
prioridade, para os cenários de 1 e 10km, respectivamente.
Os resultados relativos às RPPNs demonstraram que uma parte delas está localizada em
áreas estratégicas do ponto de vista da conectividade. A partir disso, é possível propor a
implementação das quarenta e seteRPPNsque ocorrem em áreas de máxima prioridade e ainda, que
novas RPPNs sejam criadas nestas adjacências onde já existe a prática de criação de unidades
privadas. Os resultados relativos aos fragmentos demonstraram que grande parte ocorre em áreas de
maior interesse para a criação de RPPNs. Tais fragmentos devem, portanto, ser priorizados em
estratégias de conservação.

4. CONCLUSÃO
Há uma necessidade crescente de incluir critérios associados à conectividade no
planejamento espacial de reservas, visto que são essenciais para a conservação a longo prazo em
ambientes fragmentados(ALAGADOR; CERDEIRA, 2018; ARROYO-RODRÍGUEZ et al., 2017;
JOLY et al., 2014). Assim, considera-se oportuno que os planos de manejo e implementação das
RPPNs já criadas bem como os de criação de novas unidades se baseiem em informações tais como
os critérios estabelecidos no presente estudo.

5. AGRADECIMENTOS
Agradeço às instituições fomentadoras do projeto: Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e
Universidade de Brasília (UnB), ao professor Ricardo Bomfim Machado pelo suporte dado ao
decorrer do projeto e ao meu orientador Rafael Almeida Magris.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALAGADOR, D; CERDEIRA, J. O. A quantitative analysis on the effects of critical factors
limiting the effectiveness of species conservation in future time. Ecology and evolution, 8, 3457-
3467, 2018.

ARROYO-RODRÍGUEZ V. et al. Multiple successional pathways in human-modified tropical

landscapes: new insights from forest succession, forest fragmentation and landscape ecology
research. Cambridge, UK: Biological Reviews92, 326-340, 2016.

BUTCHART et al. Shortfalls and solutions for meeting national and global conservation area
targets.Conservation Letters, 8, 329-337, 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

JOLY, C; METZGER, J. P; TABARELLI, M. Experiences from the Brazilian Atlantic Forest:


ecological findings and conservation initiatives. New Phytologist, 204, 459-473, 2014.

MARGULES, C; PRESSEY, R. Systematic conservation planning. Nature, 405, 243-253, 2000.


MESQUITA, C. A; VIEIRA, M. N. RPPN – Reservas Particulares do Patrimônio Natural da Mata
Atlântica. Conselho Nacional de Reserva da Biosfera da Mata Atlântica,Caderno nº 28, 2004.

MAYER A. L. et al.How landscape ecology informs global land-change science and policy.
Bioscience, 66, 458-469, 2016.

RIBEIRO, M. et al. The Brazilian Atlantic Forest: How much is left, and how is the remaining
forest distributed? Implications for conservation. Biological Conservation, 142, 1141-1153, 2009.

323
GT 5
Turismo e Lazer: contexto e
expectativas frente aos novos
cenários para o uso turístico de áreas
protegidas
Discutir as políticas públicas e práticas relacionadas ao turismo, em bases
sustentáveis e, o processo de dinamização da economia de comunidades locais
em áreas protegidas e entorno. Debater experiências criativas e que podem
motivar e a inserção das comunidades ou grupos locais no planejamento e na
gestão das áreas protegidas diante das mudanças climáticas. O tema da
governança ambiental em articulação ao turismo, diante da superposição de
territórios (turísticos, jurídicos, políticos), os conflitos decorrentes da pratica
turística, o movimento de busca de pactos em unidades de conservação, reservas
indígenas e comunidades quilombolas constituem também temas potenciais
desse GT. O debate sobre a pressão da expansão do turismo sobre áreas
protegidas e, a gestão voltada para a conservação dos atrativos naturais e
culturais representam temas complementares de debate. As políticas públicas
setoriais de turismo, no que tange aos compromissos de inclusão social,
proteção da natureza e valorização da cultura serão também discutidas,
criticamente, no âmbito desse GT.

Coordenadores:
Camila Rodrigues (UFRRJ)
Gisela Carvalho (ICMBIO)
José Martins (ICMBIO)
Suzy Simonetti (UEAM)
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O PARAÍSO É PARA TODOS? ACESSIBILIDADE EM UNIDADES DE


CONSERVAÇÃO PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
Ricardo Gonzalez Rocha Souza*, Katia Torres Ribeiro**

*Biólogo, Mestre em Biodiversidade em unidades de conservação (JBRJ). E-mail: ricsouza.81@gmail.com


**Dra. em ecologia, analista ambiental do ICMBio, docente do mestrado profissional Biodiversidade em Unidades de
conservação. E-mail: katia.ribeiro@icmbio.gov.br

Incluir e beneficiar as pessoas com deficiência e mobilidade reduzida, assim como outras
pessoas que demandem estruturas e métodos não usuais para desfrute de áreas naturais, pode ser
uma excelente estratégia para aliar a contribuição social que as unidades de conservação podem
oferecer e o incentivo ao turismo e à conservação dessas áreas. Áreas naturais protegidas, como os
parques, são comumente entendidas como refúgios na natureza, perante o desenfreado processo de
urbanização das sociedades contemporâneas. Além da função primordial de conservar a diversidade
biológica e a qualidade dos serviços ecossistêmicos, tais áreas desempenham outro papel de
extrema relevância: o de proporcionar uma significativa e autêntica conexão das pessoas com a
natureza, trazendo-lhes inúmeros benefícios de caráter social, cultural, espiritual e para sua saúde
física e mental.
O estudo pioneiro de Ulrich (1984), com demonstração de clara relação entre tempo de
recuperação em hospitais e contato, mesmo que indireto, com ambientes naturais, tornou-se uma
referência na pesquisa sobre os benefícios do estar na natureza para a saúde, e desde então estudos e
práticas sobre o tema têm se multiplicado. O Healthy Parks Healthy People1 – HPHP é um
destacado movimento global que tem como principal objetivo despertar a sociedade para o
potencial que a natureza e áreas protegidas possuem para a prevenção e restauração da saúde e bem-
estar humanos (Parks Victoria 2019).Concebido pelo Parks Victoria, órgão ambiental do estado de
Victoria, Austrália, esse movimento ganhou projeção mundial a partir de 2010, quando do primeiro
Congresso Internacional Healthy Parks Healthy People (NPS, 2014).
Se por um lado as áreas protegidas apresentam esses benefícios para as pessoas e para a
sociedade, por outro lado, existem estudos que apontam para a importância da frequência de
visitantes e do sentimento de conexão com a natureza (natureconnectedness) para a construção de
uma cultura conservacionista e o fortalecimento das áreas protegidas. Wright & Matthews (2015),
em uma revisão de literatura, mostram que a desconexão crescente de crianças, em especial, e de
adultos, em relação aos ambientes naturais,ocorre junto à grave deterioração das condições
ecológicas do planeta, de modo que o envolvimento das pessoas com a natureza é chave para

1
Em português, Parques Saudáveis Pessoas Saudáveis.
325
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

oapoio político às áreas protegidas e questões conservacionistas em geral. Sabe-se que as atividades
que produzem um significado emocional mais forte – experiências significativas da natureza –,
consideradas memoráveis, apresentam o maior potencial de intensificar esse sentimento de conexão
e, em consequência, podem gerar novas atitudes pró-ambientais, modificando positivamente o
comportamento das pessoas.
Em sua dissertação, Zimmermann (2006) identifica fatores principais que desestimulam a
visitação do grande público às unidades de conservação (UCs): carência de infraestrutura,
dificuldade de acesso, falta de informação e de sinalização, oportunidades recreativas reduzidas
(pouca diversificação de atividades), inadequação de trilhas e ausência de uma estrutura de apoio ao
turista no entorno.Outro fator que restringe o acesso a esses ambientes, destacado por Townsendet
al. (2015) e por outros estudos sobre o uso público em ambientes naturais, são as barreiras de
acessibilidade, que dificultam ou mesmo impedem a visita de uma parcela significativa da
sociedade. A acessibilidade para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida em UCs, objeto
deste trabalho, é uma área ainda especialmente carente em estudos, políticas públicas e atenção por
parte das autoridades competentes e dos gestores dos parques (Carvalho 2012; Oliveira et al. 2013;
Julião &Ikimoto 2007; Leite 2004; Luiz & Teixeira 2016; Nascimento & Paz 2015; Pinto 2017).
Este trabalho teve como objetivo avaliar oestado atual da acessibilidade para pessoas com
deficiência e mobilidade reduzida em unidades de conservação federais do Brasil (florestas e
parques nacionais) quanto à normatização vigente sobre o tema, iniciativas já implementadas e
resultados e benefícios já alcançados, além de propor estratégias de melhoria com base
nasinformações coletadase em experiências bem sucedidas.Para tanto foram realizadas visitas de
campo a algumas UCs, levantamento e análise da legislação e normatização vigentes a respeito do
tema em âmbito federal, aplicação de questionários à equipe gestora dasflorestas nacionais e
parques nacionaise também a frequentadores com deficiência ou mobilidade reduzidaque visitaram
as UCs em um período de um mês. Foram analisados casos de sucessodos EUA e do Chile, países
comcondições geográficas e de desenvolvimentodiversos e com reconhecida experiência na área.As
informações obtidas permitiram uma visão geral sobre o tema e identificação dos principais
desafios a serem enfrentados para se promover ambientes naturais livres de barreiras de acesso.
Das 70 UCs que responderam os questionários (de um universo de 140), há alguma
iniciativa de acessibilidade em cerca de 36%, e na maior parte das vezes por demanda local, sem
previsão no plano de uso público.A maioria das iniciativas existentes é voltada para pessoas com
deficiência física. Os representantes das UCs declararam que há infraestruturas e atividades de uso
público acessíveis para outros grupos de deficiência, porém percebe-se, em muitos casos, que não
estão devidamente preparados e em conformidade com as normas de acessibilidade vigentes. São
muito poucas ou inexistentes as medidas de inclusão (eliminação de barreiras comunicacionais,
326
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

metodológicas e instrumentais) para pessoas com deficiência visual, auditiva e intelectual. De uma
forma geral, as UCs com maior visitação, caracterizadas por uma maior atratividade turística,
recebem uma demanda maior também de visitantes com deficiência e estão melhor preparadas para
recebê-los, ainda que não necessariamente em conformidade com as normas de acessibilidade.
As iniciativas, em geral, são frutos de uma demanda local (sensibilização dos gestores,
demanda de usuário ou do conselho gestor). Nota-se que não há diretriz institucional e tampouco
uma mobilização organizacional sobre o tema. Outras características foram a baixa divulgação das
iniciativas para o público específico e a inexistência de capacitação de servidores e funcionários
para o atendimento ao mesmo.
Ainda que pareça um grande desafio transformar as unidades de conservação brasileiras em
ambientes totalmente inclusivos, haja vista o cenário de falta de recursos e da aparente
complexidade e da dificuldade de viabilizar tal empreendimento em áreas selvagens, iniciativas
criativas já existentes no Brasil e experiências bem-sucedidas de fora do país mostram que é
possível e que o horizonte pode ser bastante promissor. Ficou demonstrado na pesquisa que, apesar
de não existir regulamentação legal específica sobre acessibilidade em UCs e normatização sobre
espaços e serviços que lhes são próprios (trilhas, cachoeiras, mirantes, interpretação ambiental,
visita guiada etc.), está explícita na legislação a obrigatoriedade de que a oferta de lazer e recreação
em espaços públicos deve ser desenvolvida sob o prisma da acessibilidade e do desenho universal,
incluindo os ambientes preservados ou tombados, aos quais, em caso da impossibilidade efetiva da
promoção do acesso físico, deve ser garantido o acesso à informação em formato acessível para
todos.
Propomos, a partir deste estudo, alguns eixos de atuação para que esse desafio possa ser
enfrentado e venha a gerar bons frutos para toda a sociedade.
1) Desenvolver ações de sensibilização direcionadas aos servidores, agentes políticos e
comunidade que visem a uma mudança cultural em relação à questão da acessibilidade nas UCs,
envolvendo campanhas de comunicação, capacitação, realização de eventos.
2) Estabelecer um grupo de trabalho ou comissão de acessibilidade reunindo servidores do
ICMBio, especialistas da área e representantes de organizações representativas para discutir, propor
e acompanhar medidas de aprimoramento da acessibilidade nas UCs federais – ou alternativamente
no âmbito do MMA, já visando diretrizes para o SNUC como um todo.
3) Desenvolver plano de ação para promoção da acessibilidade e mudança de cultura no
âmbito das UCs federais ou do SNUC, com metas de curto, médio e longo prazos.
4) Concepção de diretrizes institucionais de acessibilidade para as UCs federais ou para o
SNUC, com vistas à eliminação dos diferentes tipos de barreiras de acessibilidade.
5) Incluir o tema de acessibilidade nos documentos normativos do órgão gestor.
327
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6) Eleger as UCs mais favoráveis para priorização de investimentos.


7) Estabelecer parcerias com organizações estrangeiras com expertise reconhecida no
assunto (HPHP, NPS/Park Rx) para troca de experiências, treinamentos e seminários.
9) Melhorar a divulgação das iniciativas já existentes e futuras.
10) Oferecer treinamentos voltados para o atendimento a pessoas com deficiência, Libras e
outros para servidores e profissionais da área que trabalham com UCs.

BIBLIOGRAFIA:
CARVALHO, S.M.S (2012) Acessibilidade do Turismo no Parque Nacional Serra da Capivara–PI.
Revista Turismo em Análise, v. 23, n. 2, Pp. 437-463. Disponível em:
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JULIÃO D.P.; IKIMOTO, S.M.(2007) O direito ao lazer do deficiente visual em áreas naturais
públicas e unidades de conservação. Anais do II Seminário de Áreas Protegidas e Inclusão
Social. UFRJ, Rio de Janeiro. Disponível em:
<https://www.researchgate.net/profile/Silvia_Ikemoto/publication/239549792_o_direito_ao_lazer_
do_deficiente_visual_em_areas_naturais_publicas_e_unidades_de_conservacao/links/57dd9af308ae
ea195938c9a9/o-direito-ao-lazer-do-deficiente-visual-em-areas-naturais-publicas-e-unidades-de-
conservacao.pdf> Acesso em: 20 de maio de 2019.

LEITE, CAG (2004) Ecoturismo, Terceira Idade e Tecnologia: Estudos de Acessibilidade em


Unidades de Conservação. Dissertação de Mestrado. Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado
de São Paulo, São Paulo. 97p. Disponível em:
<http://cassiopea.ipt.br/teses/2004_ta_carlos_alberto_goncalves_leite.pdf> Acesso em: 20 de maio
de 2019.

LUIZ, FI; TEIXEIRA, JC (2016) A Acessibilidade de Idosos e as Unidades de Conservação:


Reflexões Rumo à Democratização dos Espaços Públicos de Lazer. Turismo-Visão e Ação, v. 18,
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71512016000100164&lng=pt&nrm=iso> Acesso em: 20 de maio de 2019.

NASCIMENTO, JL; PAZ, RJ (2015) Avaliação da Floresta Nacional de Brasília para o


atendimento de pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida. Revista Brasileira de Gestão
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<https://www.ibeas.org.br/congresso/Trabalhos2013/VII-066.pdf> Acesso em: 20 de maio de 2019.

328
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Profissional. Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

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and Research Priorities on Connecting People to Nature in Parks. Parks, Vol 21.2. Disponível em:
<http://parksjournal.com/wp-content/uploads/2015/10/Wright-and-Matthews-PARKS-21.2-
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ZIMMERMANN A (2006) Visitação nos parques nacionais brasileiros: um estudo à luz das
experiências do Equador e da Argentina. Dissertação de Mestrado. Universidade de Brasília,
Brasília. Disponível em: <http://repositorio.unb.br/handle/10482/3599> Acesso em: 17 de fevereiro
de 2019.

329
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

QUESTÕES TERRITORIAIS ENTRE TURISTAS DE MONTANHA E


CORREDORES DE AVENTURA NA APA DA SERRA DA MANTIQUEIRA –
SUDESTE DO BRASIL
TERRITORIAL ISSUES BETWEEN MOUNTAIN TOURISTS AND ADVENTURE
RUNNERS IN THE APA DA SERRA DA MANTIQUEIRA - SOUTHEAST BRAZIL

Luiz Henrique de Oliveira Santos*, Vicente Paulo dos Santos Pinto**

Mestrando em Geografia pela UFJF. luiserrafina@hotmail.com*


Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF. vicente.pinto@ufjf.edu.br**

1. INTRODUÇÃO
O seguinte trabalho tem como objetivo analisar as diferenças entre os objetivos turísticos de
grupos que realizam práticas em áreas naturais. Apesar de frequentarem os mesmos lugares, grupos
como os montanhistas e corredores de aventura têm objetivos diferentes em suas práticas. A
diferença de objetivo pode criar divergências e até conflitos. O seguinte trabalho busca através da
percepção da categoria território dissertar sobre a questão para compreender melhor como
minimizar a divergência entre os grupos.
O ponto em questão a ser estudado é a uma estrutura de cristas serranas na Serra da
Mantiqueira chamada Serra Fina. Nesta estrutura geológica se encontra uma travessia turística
chamada “travessia Serra Fina” que é considerada por muitos como uma das mais difíceis do Brasil.
A travessia passa por alguns dos picos mais altos do Brasil, como a Pedra da Mina (4º pico mais
alto com 2.798 m) e o Pico dos Três Estados (10º pico mais alto com 2.665 m). A área e protegida
pela APA da Serra da Mantiqueira, que tem buscado conciliar conflito e aperfeiçoar a utilização dos
recursos de forma sustentável.
A região teve um crescimento turístico elevados nos últimos anos. O perfil dos turistas que
buscaram a região inicialmente são os chamados “montanhistas”, nome utilizado na região para os
praticantes de trekking. Porém, há alguns anos, um novo grupo começou a se configuras para a
utilização destra travessia – os corredores de aventura. Várias corridas têm acontecido nesta região
e proporcionado questionamentos. O seguinte trabalho busca avaliar se já há um conflito entre os
dois grupos e se esta abordagem pode ser analisada por uma ótica territorial.

2. MATERIAL E MÉTODO
Para alcançar o objetivo será realizado um levantamento bibliográfico sobre como o homem
se relaciona com a natureza pela ótica dos movimentos ambientalistas. Em um segundo momento,

330
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

será realizado uma revisão sobre as Unidades de Conservação com foco na categoria APA e serão
analisados alguns pontos no plano de manejo da APA da Mantiqueira. Em seguida, o conceito de
território será apresentado como categoria norteadora do trabalho. Por último, serão levantados
alguns questionamentos, através de entrevistas com montanhistas e corredores de aventura sobre a
conduta do seu grupo “concorrente”. As informações foram obtidas através de observações e de
uma pesquisa qualitativa com corredores, montanhistas, tanto turistas, quanto locais.

2.1 O interesse do homem pela natureza:


Os interesses pela natureza são difusos e complexos (BECKER; GOMES 1993). Em
primeiro momento é importante destacar que o homem não tem uma visão única sobre a
importância da natureza e consequentemente, a sua forma de agir, mesmo que buscando um meio
ambiente equilibrado, tem resultados diversos. Segundo Alier (2007), fazendo uma releitura do
movimento ambientalista. Há três grupos a se destacar no movimento ambientalista: O culto ao
silvestre, O evangelho da ecoeficiência, O ecologismo dos pobres.
Além dos trabalhos de Alier, os trabalhos de Becker e Gomes (1993) e Diegues (1996)
apresentam como a relação do homem com a natureza podem ter objetivos divergentes. Desta
forma, o turista, como um ser humano, também pode ter objetivos diversos sobre a sua relação com
a natureza (IGNARRA 2000). A questão é se os objetivos do montanhista e dos corredores de
aventura na Serra Fina são os mesmo ou são divergentes.

2.2 As Unidades de Conservação:


Segundo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC (2011), as Unidades de
Conservação podem ser definidas como:

Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com


características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com
objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração,
ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção;(Brasil, 2011 p. 5)

As Unidades de Conservação são divididas em dois grupos: as Unidades de Proteção


Integral e as Unidades de Uso Sustentável. Este último grupo, ao qual pertence à categoria APA,
tem como objetivo “compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos
seus recursos naturais. (Brasil 2011 p.9)”.
Segundo o SNUC, a categoria Área de Proteção Ambiental – APA pode ser definida da
Seguinte forma:

331
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um certo grau
de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais
especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações
humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica,
disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos
recursos naturais. (Regulamento) (Brasil, 2011 p. 11)”

As áreas de proteção ambiental podem ser compostas de terras privadas ou públicas, porém,
devem ser estabelecidas normas e restrições para a utilização das áreas. Segundo a legislação
vigente, as visitações nestas áreas estão sujeitas a condições impostas pelo proprietário observando
as exigências e restrições legais.
A APA da Serra da Mantiqueira foi criada pelo DECRETO Nº 91.304, DE 03 DE JUNHO
DE 1985. A área sofreu uma alteração pela LEI Nº 9.097, DE 19 DE SETEMBRO DE 1995, que
Incluiu o Município de São Bento do Sapucaí, Estado de São Paulo.
Segundo o Plano de Manejo da Área, o turismo ecológico se encontra em grande expansão
na região com um crescente numero de visitantes com destaque para a travessia da Serra Fina. Este
turismo pode trazer problemas para a localidade.

Figura 1: APA da Serra da Mantiqueira e a Travessia Serra Fina.

2.3 Território:
A reflexão sobre o território é profunda em Haesbaert (2004). Dentro da discussão, sobre a
polissemia no conceito de território surge uma reflexão sobre o território em uma perspectiva
materialista e o território sob uma perspectiva idealista. Na perspectiva materialista clássica o
território é materializado através da ocupação do solo e serve como palco para o estabelecimento
das estruturas humanas. Porém a visão pode incorporar uma dialética constituindo o território como
332
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

o resultado das relações entre o solo e as sociedades. Na concepção idealista, o território é


estabelecido por conotações subjetivas que transcende a materialidade. O que torna o território ideal
para determinada civilização são as estruturas culturais. O território se torna um tipo ideal com
valores semânticos inseridos não por uma ontologia, mas sim pelos signos que se estabelecem por
um devir.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO.
3.1. Descrição dos grupos que realizam a Travessia Serra Fina:
a) categorização do montanhista: busca realizar a travessia em 2 ou 4 dias. Carrega uma mochila
com os equipamentos necessários que pode variar de 45 a 90 litros. Os turistas realizam a atividade
por conta própria ou contratam agências de turismo. Estas agências geralmente são de fora da região
e contratam locais para realizar as operações. O maior fluxo acontece nos feriados, chegando a 200
pessoas. O que causa problemas devido às poucas áreas de camping e falta de consciência na hora
de descartar os dejetos.
b) categorização do corredor de montanha: busca realizar a atividade no menor tempo possível.
Realiza travessia em um dia ou apenas parte da travessia. Corre com uma mochila pequena de
aproximadamente 20 litros. Os maiores fluxos de corretores realizam a travessia nas crescentes
corridas de montanhas que estão sendo organizadas na região. Estas corridas acontecem duas ou
três vezes por ano com uma variação de 100 a 200 atletas.

3.2. Percepção dos grupos


a) Quais os problemas que os montanhistas alegam que os corredores causam: degradam a trilha
por estarem passando muito rápido. Deixam lixo por que quando passam correndo não observam o
entorno. A organização das corridas apenas foca no lucro e não dá retorno a localidade.
b) quais os problemas que os corredores alegam que os montanhistas causam: degradam a trilha
por estarem mais pesados. Deixam lixo e dejeto devido estarem mais tempo na montanha. As
agências focam apenas nos lucros e não dão retorno para as trilhas.

4. CONCLUSÃO:
A discussão de território cria uma conotação complexa neste caso. O território não é
disputado por detentores de posse da terra, mas sim devido as suas características subjetivas nas
atividades recreativas. No caso em questão o território abrange novos significados, conforme o que
foi debatido por Haesbaert (2004), o território não é apenas um agregado de amontoados históricos
de relação de poder político. Neste caso, a região apresenta importância territorial até mesmo para
pessoas que não residem na área e que consideram a localidade como parte da sua área de
333
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

recreação. Há por parte de corredores e montanhistas uma busca por uma produção idealista
territorial com o objetivo de recreação, trabalho ou mesmo uma busca por uma “espiritualidade”. Os
focos nas relações metabólicas da localidade aparentam ser uma condicionante a estes aspectos
subjetivos. Preservar a localidades não é apenas o foco de preservação da natureza, mas a forma de
garantir o território.
Após o diálogo com os praticantes da atividade, foi possível observar que a questão
territorial se estabelece de forma divergente até mesmo dentro destes dois grupos, ou seja, nem
sempre os montanhistas e corredores de aventura têm as mesmas percepções que os outros
integrantes de seu grupo. O que é possível observar é que as relações conflitosas são reflexo da
transformação da localidade em produto turístico a crescente demanda e os movimentos ligados ao
chamado turismo de aventura tem reinventado a forma dos locais utilizarem a sua localidade tanto
para recreação quanto como atividade econômica. Vários cidadãos da localidade trabalham com os
dois movimentos como forma de obtenção de recursos.
Os problemas que incomodam os grupos são os mesmos: manutenção da trilha, lixo, uso
sustentável da trilha e etc. Porém, quem realmente está agindo na preservação da área são
principalmente os locais que em alguns casos são ajudados pela APA da Mantiqueira.
Mesmo com o pouco poder investida a categoria APA, a Área de Proteção Ambiental da
Serra da Mantiqueira tem utilizado a influência para organizar mutirões de manutenção na trilha e
estão organizando os livros de cume para contabilizar a demanda turística na localidade.

5. REFERÊNCIAS:
ALIER, J. M. O ecologismo dos pobres: conflitos ambientais e linguagens de valoração. São
Paulo: Contexto, 2007. pp. 21-39

BECKER, B. e GOMES, P. C. DA COSTA. Meio Ambiente: Matriz do Pensamento Geográfico.


In: VIEIRA, P. F. e MAINON, D. (org.) As Ciências Sociais e a Questão Ambiental: Rumo à
Interdisciplinaridade. RJ/Belém: APED/ EUFP, 1993.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação


da Natureza: Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000; Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002;
Decreto nº 5.746, de 5 de abril de 2006. Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas: Decreto nº
5.758, de 13 de abril de 2006 / Ministério do Meio Ambiente. – Brasília: MMA/SBF, 2011.
Disponível em:
https://www.mma.gov.br/images/arquivos/areas_protegidas/snuc/Livro%20SNUC%20PNAP.pdf.
Acesso em: Setembro/2019.

_______ DECRETO Nº 91.304, DE 03 DE JUNHO DE 1985. Dispõe sobre implantação de área


de proteção ambiental nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, e dá outras
providências. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1980-1987/decreto-
91304-3-junho-1985-441986-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em: Setembro/2019.

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_______LEI Nº 9.097, DE 19 DE SETEMBRO DE 1995.Inclui o Município de São Bento do


Sapucaí, Estado de São Paulo, na Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9097.htm. Acesso em: Setembro/2019.

_______Plano de manejo e web Sig da APA da Serra da Mantiqueira produto. 6.2: Plano de
Manejo da APASM. Curitiba / PR abril / 2018.

DIEGUES, A. C. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo, Hucitec. 1996.

HAESBAERT, Rogério. O mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à


multiterritorialidade. – 4ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009.

IGNARRA, Luiz Renato. Fundamentos do turismo. São Paulo: Thomson Pioneira, 2002.

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TURISMO E PROTEÇÃO DA NATUREZA:INTERPRETAÇÃO DOS


CONFLITOS NO PARQUE ESTADUAL DA COSTA DO SOL (RJ, BRASIL)
TOURISM AND NATURE PROTECTION:INTERPRETATION OF CONFLICTS IN PARQUE
ESTADUAL DA COSTA DO SOL (RJ, BRAZIL)

Yasmin Xavier Guimarães Nasri*, Marta de Azevedo Irving**, Renata Amorim Almeida Fonseca***

Doutoranda do Programa EICOS/IP/UFRJ, Brasil. yasmin.nasri@hotmail.com *


Professora titular do Programa EICOS/IP/UFRJ e PPED/IE/UFRJ, Brasil. mirving@mandic.com.br **
Doutoranda do Programa EICOS/IP/UFRJ, Brasil. biol.renata@gmail.com ***

1. INTRODUÇÃO
Os desafios para a inclusão social no processo deconservação da biodiversidade envolveu
debates complexos, controversos e, por vezes, também conflitivos. E, essa reflexão tem
rebatimentos diretos em uma das principais estratégias para a proteção da natureza, a conservação
in situ(BRASIL, 2000), prevista no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB),
assinada em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, no Rio de Janeiro.
Nesse sentido, a criação, delimitação e gestão de territórios de elevada biodiversidade tem se
caracterizado, desde a origem do debate, pelo estabelecimento de fronteiras entre as atividades
humanas e a proteção da natureza, a partir da premissa equivocada de quenatureza e sociedade não
compõem um mesmo universo(GODOY 2006; IRVING, 2018). Desse modo, os conflitos no
processo de proteção da natureza tem origem na própria ideologia preservacionista centrada na
cisão entre natureza e sociedade. E, no caso brasileiro, esse entendimento e, as controvérsias dele
decorrentes, influenciaram a proposta deelaboração do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza (SNUC) (BRASIL, 2000; 2002), principal política pública vigente
dirigida ao tema (VALLEJO, 2013).
Sendo assim, o pressuposto de que o ser humano representa, em tese, uma ameaça à
dinâmica da natureza, fundamentou a prática de criação e delimitação de territórios com
extraordinária beleza cênica para fins de proteção, como tipificado no caso dos Parques Nacionais,
uma categoria de manejo de proteção integral que permite o uso público para fins de turismo e
lazer, educação e interpretação ambiental e pesquisa (BRASIL, 2000; 2002). Sobre os parques,
especificamente, é importante ainda considerar que o processo para a sua criação vem legitimando,
em políticas públicas de proteção da natureza, desde a origem, a disseminação de um imaginário de

336
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

natureza intocada a ser comercializada para um tipo de turismo contemplativo, seguindo a


perspectiva de “vitrines da natureza” (BROCKINGTON, 2003).
A partir desse breve contexto, a presente pesquisa buscou interpretar os conflitos que
envolvem o desenvolvimento turístico e as ações de conservação da natureza, no contexto do
Parque Estadual da Costa do Sol (PECS). O parque em foco foi escolhido para a pesquisa, por
representar uma área de proteção integral, criada em 2011,expressando desde a origem do processo,
um contexto conflitivo (CORRÊA; FONTENELLE, 2010), decorrente de ser a área focal de um dos
maiores fluxos turísticos do Estado do Rio de Janeiro, no tocante ao turismo de Sol e Praia,na
Região Turística da Costa do Sol (RIO DE JANEIRO, 2015), além de se sobrepora inúmeras outras
UCs de uso sustentável, com diferentes objetivos de proteção da biodiversidade, questões que se
refletem,diretamente,na dificuldade de gestão, conforme será detalhado, a seguir.

2. MATERIAL E MÉTODO
Tendo em vista os objetivos mencionados, os procedimentos metodológicos da pesquisa
envolveram levantamento bibliográfico sobre o tema dos conflitos em unidades de conservação e
inserção em campo, por meio da observação direta durante as reuniões da Câmara Temática de Uso
Público do PECS, principal ambiente institucional de discussão sobre o tema no âmbito da gestão
da unidade de conservação, realizadas entre junho de 2016 e janeiro de 2018, com registros em
caderno de campo.
Nesse sentido, é importante contextualizar que o Parque Estadual da Costa do Sol foi criado
em 18 de abril de 2011 pelo Decreto N° 42.929, sob responsabilidade administrativa do Instituto
Estadual do Ambiente (INEA), no Estado do Rio de Janeiro. O parque compreende,
aproximadamente, 10.000 haem áreas dos municípios de Araruama, Saquarema, São Pedro
d’Aldeia, Cabo Frio, Armação dos Búzios e Arraial do Cabo.
Os municípios mencionados estão localizados na Região Turística da Costa do Sol e têm
como principal característica o desenvolvimento do turismo balneário, com foco no fluxo massivo
de visitantes, concentrado em determinados atrativos naturais, com destaque para os feriados e
férias de verão no Estado do Rio de Janeiro (RIO DE JANEIRO, 2015). Tendo em vista essa
conjuntura, a Câmara Temática de Uso Público do PECS foi estabelecida no contexto da gestão,
com o objetivo de levantar e discutir os principais impasses que dificultam o ordenamento do
turismo local, no sentido de buscar possíveis alternativas para a mediação dosconflitos observados
entre o uso turístico e os próprios objetivos de criação da área protegida. Essa instância participativa
envolve representações da gestão pública municipal e estadual, das populações do entorno e dos
empresários dos setores imobiliário e turístico, estes últimos os principais investidores locais.

337
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

3.RESULTADO E DISCUSSÃO
Com o objetivo de analisar os conflitos decorrentes do turismo, os principais resultados da
pesquisa de campo foram sistematizados segundo oito principais temas, que refletem a complexa
dinâmica socioambiental regional, conforme apresentado no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1: Matriz-síntese sobre os conflitos na relação entre o turismo e as demandas de proteção da natureza no
PECS.
Origem dos conflitos Atores sociais envolvidos Contexto atual
Turismo de massa - proteção dos Gestão pública dos seis municípios que Os turistas que visitam as áreas do PECS
ecossistemas costeiros. integram o PECS, gestão do parque, desconhecem seus aspectos histórico-
turistas, populações tradicionais e culturais e, por isso, também não
moradores. reconhecem a relevância da diversidade
sociocultural da população do seu entorno,
composta, sobretudo, por pescadores
artesanais e quilombolas. Por isso, a
visitação local está dirigida, quase que
exclusivamente, aos atrativos naturais que
são, justamente, as áreas de maior
vulnerabilidade para a proteção da
biodiversidade.
Turismo de massa -direitos de populações Populações tradicionais e turistas. Tendo em vista que a região é
tradicionais. historicamente ocupada por populações
tradicionais de pescadores artesanais e
quilombolas, cujos modos de vida
dependem da qualidade ambiental e de uma
íntima relação com a natureza, é importante
considerar que o turismo modifica o
território e, consequentemente, interfere
diretamente em seus cotidianos.
Geração de renda-reconexão com a Gestão do PECS, empresários dos setores Visitantes que buscam o isolamento e a
natureza. turístico e imobiliário que investem na reconexão com a natureza no PECS tendem
região, turistas e moradores. à frustração, devido às grandes agências de
receptivo na região que conduzem a
dinâmica de uso público local, em geral,
sem compromisso com os pressupostos de
conservação da natureza.
Áreas dirigidas à proteção da natureza - Gestão do PECS e turistas. Há o desconhecimento sobre o zoneamento
áreas dirigidas à visitação. das áreas prioritárias para a proteção da
natureza e para a visitação. Assim, há a
dificuldade de implementar iniciativas com
sentido de ordenamento do uso público
local, devido à ausência de dados que
possam fundamentar as ações de gestão.
Construções ilegais em áreas do parque - Gestão do PECS, grupos invasores e São realizadas, recorrentemente, operações
proteção da natureza. turistas. em conjunto com a Polícia Militar, com o
objetivo de demolir casas irregulares em
áreas do PECS consideradas como
vulneráveis em termos socioambientais.
Megaempreendimentos hoteleiros em áreas Gestão pública dos seis municípios que São realizadas, regularmente, operações em
costeiras - proteção dos ecossistemas integram o PECS,gestão do PECS, conjunto com a Polícia Militar para
marinhos. empresários dos setores turístico e embargar construções que, em geral, não
imobiliário que investem na região e possuem licenças ambientais. Tais
turistas. construções são realizadas, com o objetivo
de ofertar a contemplação de belezas
cênicas e paisagísticas de frente ao mar,
mas há recorrentemente o descarte de
efluentes sanitários sem tratamento,
afetando o sistema lagunar.
Especulação imobiliária -proteção das Gestão pública dos seis municípios que Os seis municípios que integram o PECS
Áreas de Preservação Permanente (APP). integram o PECS,gestão do PECS e apresentam um dos maiores índices de
empresários dos setores turístico e crescimento demográfico do Estado do Rio
imobiliário que investem na região. de Janeiro,tendo como consequência a
urbanização das zonas de amortecimento
do parque. No entanto, há um movimento
perceptível de saída da população local e
chegada de moradores das grandes
metrópoles do Estado.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Pesca artesanal - atividades turísticas Gestão do PECS, agências de receptivo A gestão do PECS busca controlar a oferta
náuticas. regional, turistas e moradores. de turismo náutico, por meio da criação de
um cadastro das empresas que respeitam o
regulamento de utilização das áreas do
parque. No entanto, torna-se difícil realizar
o monitoramento constante, devido aos
reduzidos recursos humanos e financeiros
disponíveis para tal.
Fonte: Elaborado pelas autoras (2019).

A análise do Quadro 1 permite a identificação de algumas tensões características da


dinâmica regional, relacionadas aos diferentes atores sociais envolvidos no processo desde a fase
que antecedeuà criação do PECS e que se refletem, atualmente, nos desafios para a sua gestão e
ordenamento territorial. Nesse sentido, é importante considerar o impacto dos fluxos massivos de
visitantes à área protegida, a pressão do mercado imobiliário e, a oferta crescente de passeios
turísticos não regulamentados como fontes de conflitos recorrentes na área de inserção do parque.
Cabe destacar, em paralelo, as tensões existentes entre a gestão e o ordenamento territorial
do PECS e a presença de populações tradicionais de pescadores artesanais e quilombolas. Isso
porque, os objetivos de criação do parque e o regulamento de uso público local, baseados na
perspectiva de cisão entre sociedade e natureza, parecem desconsiderar os modos de vida desses
grupos sociais que utilizam tais áreas para a própria sobrevivência, de modo intergeracional.

4. CONCLUSÃO
Os dados obtidos por meio da presente pesquisa permitem afirmar que os conflitos
envolvendo o uso turístico e os compromissos de proteção da natureza na área de inserção do PECS
se expressam, principalmente, por meio de disputas materiais e simbólicas que decorrem de
distintos interesses em jogo, com relação ao uso e significado do território. Isso porque, a região se
caracteriza por um importante patrimônio naturalassociado a locais de belezacênica e paisagística,
envolvendo atrativos naturais e culturais quesão valorizados no plano de estratégias para a
conservação da biodiversidade e, simultaneamente, para a reprodução de práticas tradicionais, mas
representam também potenciais turísticos de interesse para investimentos do mercado turístico e
imobiliário.
Desse modo, a dinâmica turística regional se expressa em importantes desafios cotidianos da
gestão da área protegida, diante das pressões decorrentes do desenvolvimento e urbanização dos
municípios envolvidos no contexto do PECS. Nesse sentido, seria interessante que as iniciativas de
projetos socioambientais que vêm sendo implantadas desde 2011, como estratégia para salvaguardar
a diversidade biológica e cultural regional,incorporassem em seu escopoas demandas das
populações tradicionais no processo de gestão, tanto como forma de minimizar os conflitos
identificados, quanto para potencializar as ações de ordenamento das atividades turísticas, na
Região Turística da Costa do Sol.
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5. AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior (CAPES)- Brasil.

6.REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza. Brasília, 2000.

_______. Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002 que regulamenta os artigos da Lei nº 9.985, de
18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências. Brasília, 2002.

_______. MMA, Ministério do Meio Ambiente. Convenção sobre Diversidade Biológica. Série
Biodiversidade, nº 1. Brasília, 2000. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/estruturas/sbf_dpg/_arquivos/cdbport.pdf> Acesso em: 10 de set. de
2019.
BROCKINGTON, D. Injustice and conservation:is ‘local support’ necessary for sustainable
protected areas? Policy Matters, nº 12, September, 2003.p.7-41.

CORRÊA, W. B.; FONTENELLE, T. H. Processo de ocupação da zona costeira: Ecoresorts e


Gerenciamento Costeiro do Meso Compartimento Cabo Frio - Cabo Búzios, Litoral do Rio de
Janeiro. Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-
99907-02-3.

GODOY, A. O modelo de natureza e a natureza do modelo. São Paulo em Perspectiva. São Paulo,
v. 4., nº 14, p. 129-138, 2000. Disponível em:
<http://hidro.ufcg.edu.br/twiki/pub/CienciasdoAmbienteSelma/MATERIALDADISCIPLINA
/PRESERVAONATUREZA.pdf>. Acesso em: 10 de set. de 2019.

IRVING, M. A. Áreas protegidas, inclusão, pertencimento e políticas públicas: Construindo uma


nova ética para a conservação da biodiversidade no Brasil. In: PHILIPI JR., A.; SAMPAIO, C. A.
C.; FLORIT, L. Ética socioambiental. 2018. ISBN: 9788520451380.

RIO DE JANEIRO. Atlas das Unidades de Conservação do Estado do Rio de Janeiro.


Metalivros, 2015.

VALLEJO, L. R. Uso público em áreas protegidas: atores, impactos, diretrizes de planejamento e


gestão. Revista Eletrônica Anais Uso Público em Unidades de Conservação. Vol 1, nº 1, 2013.
p. 13-26. ISSN 2318-2148.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

INCLUSÃO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL E O PARQUE


ESPAÇO SOLIDÁRIO NO PROCESSO DE DINAMIZAÇÃO DA
ECONOMIA DAS COMUNIDADES LOCAIS
SOCIAL INCLUSION, TERRITORIAL DEVELOPMENT AND THE PARK SOLIDARITY
SPACE IN THE PROCESS OF BOOSTING THE ECONOMY OF LOCAL COMMUNITIES

Priscilla C. de Moura Estevão*1, Marcelo Lopes**2, Luiz Eduardo M. de Barros Cruz***3

INTRODUÇÃO
O presente artigo propõe relatar uma experiência de trabalho colaborativo envolvendo poder
público, conselho gestor, moradores locais e comunidades do entorno do Parque Nacional da
Chapada dos Guimarães (PNCG). O Parque Espaço Solidário é uma prática inovadora inspirada na
campanha #UmDiaNoParque1 . Fruto da ação coletiva, trata-se de uma iniciativa que, desde outubro
4

de 2018, uma vez por mês, envolve artesãs, produtoras e produtores da agricultura familiar na
agenda do PNCG. A construção conceitual do Parque Espaço Solidário esbarra no caráter pioneiro
da iniciativa. Busca-se a compreensão do conceito a partir da ideia de ‘alternativas de
desenvolvimento local’ (ICMBio, 2009), sendo atribuído ao Parque o valor de um espaço solidário
capaz de promover a inclusão social e produtiva, integrando as comunidades do entorno a um
mercado diferenciado e ressaltando significativos valores socioambientais (GARCIA et al., 2018).

MATERIAL E MÉTODO
A abrangência temporal deste relato de experiência vai de outubro de 2018 até julho de 2019,
último mês de referência, totalizando a realização de dez eventos. O grupo informal que participa da
prática é formado em sua maioria por mulheres, as artesãs do Núcleo de Estudos e Organização da
Mulher (NEOM) / Bordadeiras da Chapada, moradoras locais de Chapada dos Guimarães, produtoras
e produtores familiares do Distrito da Água Fria. As informações obtidas a partir de pesquisa
documental, relatórios, atas de reuniões e da aplicação de questionário fundamentaram a metodologia
embasada na sistematização de experiência. Os interesses coletivos e combinados são tratados nas
rodas de conversa realizadas ao final dos eventos, principal método participativo utilizado na
identificação dos problemas e necessidades do grupo para buscar transformar a realidade, além da
participação on-line (grupo de WhatsApp) no planejamento de ações e discussão dos problemas

* Analista Ambiental, ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, Brasil. E-mail: priscilla.estevao@icmbio.gov.br


1

** Analista Ambiental, ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, Brasil. E-mail: marcelo.lopes@icmbio.gov.br


*** Analista Ambiental, ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, Brasil. E-mail: luiz.cruz@icmbio.gov.br
3

1
4 Campanha idealizada e organizada pela Rede Coalizão Pró-Unidades de Conservação (UC), realizada no PNCG no dia
22 de julho de 2018.
341
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

cotidianos. Atualmente localizado no estacionamento2 do atrativo Véu de Noiva, o Parque Espaço


1

Solidário acontece aos segundos domingos de cada mês no Parque Nacional da Chapada dos
Guimarães.

RESULTADOS e DISCUSSÃO
Esta iniciativa é uma demanda do conselho gestor da Unidade de Conservação (UC). O final
do mês de agosto de 2018 representa um período importante de aproximação entre moradores,
comunidades do entorno e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Na reunião do Conselho Consultivo do PNCG, uma liderança feminina representante do Distrito da
Água Fria, cansada de esperar das ‘autoridades’ uma solução que não vem, reivindica um espaço de
comércio, como forma de beneficiar as comunidades residentes no entorno. Dessa forma, cria-se o
Grupo de Trabalho (GT) de Produção das comunidades associada ao turismo. As reuniões desse
grupo, composto por representantes da sociedade civil, instituições do poder público estadual e
federal e lideranças comunitárias, focalizaram nos objetivos principais de apoiar o turismo rural nas
comunidades do entorno e realizar a feira de produtos da agricultura familiar e artesanato no
Parque. Compreendendo que o foco era melhorar a relação da UC com as comunidades e moradores
locais, o esforço do ICMBio no GT esteve direcionado para iniciar a realização da feira no Parque.
Em resposta ao desafio lançado, a partir de novembro de 2018, definiu-se a feira como o Parque
Espaço Solidário, um espaço de vivências, trocas e comercialização dos produtos da
sociobiodiversidade e agricultura familiar, artesanatos e alimentos naturais. Um ponto crucial de
debate no GT e entre os participantes desde o início das atividades girou em torno da compreensão
de que o PNCG não estaria comercializando os produtos artesanais, tampouco auferiria lucro.
Em relação ao acesso direto do consumidor final aos produtos, a questão foi considerada
balizadora e, nesse sentido, logo se compreendeu a importância da comercialização direta, que tem
como característica o varejo imediato sem atravessadores, de modo a impulsionar práticas
relacionadas ao consumo consciente e ao comércio justo e solidário (BRASIL, 2017). Ofertam-se
polpa congelada de maracujá e gelados de frutíferas do Cerrado, como mangaba, buriti e jatobá. As
famílias comercializam certa produção de farinha de mandioca e diferentes produtos derivados,
como sequilhos, bolos e tapioca. Trazem ainda pães integrais e chás gelados. Há uma mesa de troca
de sementes nativas e plantas medicinais de uso tradicional. As mulheres do NEOM/ Bordadeiras
de Chapada participam assiduamente e apresentam histórias, receitas, poesia e música nos panos
bordados. O artesanato em tapeçaria, os licores, doces, bolos, geleias, sucos de frutas nativas e a
farofa de pilão geralmente vem de Água Fria. Destacam-se ainda os artesanatos de lideranças

2
1 Endereço: Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, Km 50, MT 251/Chapada dos Guimarães, MT.
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femininas Rikbaktsa e a participação de comunitárias do Rio dos Peixes. Entretanto, o desfrute do


espaço faz sentido a todos aqueles que buscam a cultura do bem viver; já houve eventos com prática
de hathayoga e teatro.O apoio aos eventos do Parque Espaço Solidário continua sendo uma das
principais ações do ICMBio, que garante o transporte e o espaço fixo de comercialização. Até o
momento, o PNCG garantiu a logística para buscar a produção. No espaço, vivenciam-se princípios
e valores da economia solidária. Ao assegurar um local para o comércio solidário dos produtos da
sociobiodiversidade e da agricultura familiar das comunidades do entorno do PNCG, o ICMBio
colabora para o enfrentamento da maior dificuldade encontrada por produtores artesanais: o gargalo
da comercialização. Dada a ação concreta junto aos participantes, o aprofundamento da discussão
sobre o problema principal da comercialização efetivamente possibilitou a definição de estratégias
em busca de soluções. A escolha do melhor local se configurou como uma dessas estratégias.
Durante os primeiros eventos que ocorreram na área coberta em frente ao auditório na sede
administrativa, a participação do público foi abaixo do esperado e os produtos ofertados tiveram
pouca procura.
Assim, alguns passos importantes na avaliação dos resultados alcançados foram dados e, a
partir daí, determinou-se uma próxima nova ação. Percebeu-se o estacionamento como um local
privilegiado. Localizado no principal atrativo turístico do Parque, que é a cachoeira Véu de Noiva, o
estacionamento é a área com o maior fluxo de visitantes. Quando, em janeiro de 2019, o Parque
Espaço Solidário passou a ser realizado no estacionamento, simbolicamente, tratou-se também da
ressignificação da entrada do Parque, um importante espaço de recepção dos visitantes. Discute-se a
conclusão ou não da obra da guarita, e o que será da concessão. No entanto, configurando-se o que
Dowbor (2000) denominou de “ponto nuclear de referência”, não há divergências na visão comum
do quanto é desorientador ver um parque sem referência no seu ponto inicial de contato com a
sociedade. A questão central é sobre como as comunidades do entorno ‘colorem’ o espaço com
novos referenciais, conforme observado na Figura 1. São referências próprias de um grupo informal
bastante heterogêneo, que segue se organizando para participar das atividades mensais. Os
envolvidos na iniciativa estão desde o primeiro momento aprendendo a ser um grupo solidário,
valorizando o trabalho coletivo e resgatando a dignidade. Ressalta-se que o Parque Espaço
Solidário é uma vivência que traz reflexões de questões socioambientais importantes, assim como
propõe incluir uma classe de excluídos da sociedade nos processos participativos da UC, com
cuidado, afeto e solidariedade. Quais são os benefícios esperados dessa prática inovadora em
relação à conservação da biodiversidade? O Parque Espaço Solidário pode contribuir na
implementação de um turismo solidário, agregando o potencial turístico local com inclusão social e
produtiva das comunidades do entorno do PNCG (UNISOL, 2015).

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Figura 1 - Exposição dos produtos artesanais nos eventos do Parque Espaço Solidário

Fonte: Arquivo doPNCG/ICMBio (2019)

O resultado de uma maior interação entre as comunidades e os turistas vem ao encontro do


Programa de Integração e Participação Social do PNCG (ICMBio, 2009). Com o objetivo específico
de se buscar, em conjunto com as comunidades, alternativas de desenvolvimento local, que
conciliem os objetivos do Parque e as necessidades da população do entorno, definiu-se a práxis
com novas ações a partir da experiência relatada, buscando-se contribuir para transformar a
realidade ao se estabelecer um ponto fixo de comércio solidário dos produtos da
sociobiodiversidade e da agricultura familiar no PNCG.

CONCLUSÃO
O Parque Espaço Solidário é uma experiência inovadora de gestão pública interessante por
apresentar resultados concretos, que vem dando certo. Dentre as principais conclusões, aponta-se
que a iniciativa permite aproximar produtores e consumidores e, assim, eliminar um elo do setor: o
atravessador. A experiência de se construir um projeto pioneiro de desenvolvimento local na
perspectiva das comunidades evidencia a potencialidade dessa ação estratégica para a melhoria da
relação entre o Parque e as comunidades do entorno, como uma iniciativa que articula poder
público, conselho gestor, comunidades locais e moradores do entorno do PNCG. Enfatiza-se a
valorização dos produtos artesanais da sociobiodiversidade, que acabam por promover a
conservação e o uso sustentável do Cerrado, buscando-se oportunidades de geração de emprego e
renda. A sistematização é uma necessidade para se poder construir coletivamente o conhecimento e
dessa forma favorecer maior integração possível entre os participantes. Contudo, deve-se estruturar
um processo metodologicamente distinto de avaliação e sistematização, e limitações devem ser
consideradas, com ênfase no pouco entendimento que os gestores públicos têm sobre a gestão da

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política de economia solidária, seus processos e princípios como ferramentas de desenvolvimento


local.
Com efeito, processos de educação comunitáriae de formação de gestores se apresentam
como possibilidades de um aprendizado de via de mão dupla, tanto para a gestão pública quanto
para a sociedade civil interessada nas especificidades da economia da solidariedade(GUTIÉRREZ;
GADOTTI, 2001).Conforme contextualizado no Plano Nacional de Economia Solidária (UNISOL,
2015, p. 6), “as iniciativas econômicas solidárias vêm sendo incentivadas como estratégias de
dinamização socioeconômica em processos de desenvolvimento local e territorial sustentável, na
perspectiva de promover a coesão social, a preservação da diversidade cultural e do meio
ambiente”. A experiência relatada é real e significativa, ainda que aconteça em um contexto local.
Germina-se um empreendimento solidário econômico que se fixou no espaço público denominado
Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. Acredita-se firmemente que o Parque Espaço
Solidário se enraíza na governança cotidiana e de fato faz brotar esperanças de onde serão colhidos
frutos desse esforço pioneiro de se criarem espaços solidários nos Parques Nacionais brasileiros.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei da Câmara nº 137, de 2017. Dispõe sobre a Política
Nacional de Economia Solidária e os empreendimentos econômicos solidários, cria o Sistema
Nacional de Economia Solidária e dá outras providências. Disponível em:
https://www25.senado.leg.br/web/atividade/345atérias/-/materia/131528. Acesso em: 5 set. 2019.
DOWBOR, Ladislau. A comunidade inteligente (visitando as experiências de gestão local). São
Paulo: Instituto Pólis, 2000.
GARCIA, J. P.; MENDONÇA, S. D.; DINIZ, J. D. A. S.; GUÉNEAU, S. Comercialização de
produtos da sociobiodiversidade: estratégias alternativas e de resistência de produtores
agroextrativistas do Cerrado. Cadernos de Agroecologia – Anais do VI CLAA, X CBA e V
SEMDF, Brasília, v. 13, n. 1, p. 1-6, jul. 2018.
ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Plano de Manejo – Parque
Nacional da Chapada dos Guimarães. Chapada dos Guimarães/MT: ICMBio, 2009.
GADOTTI, M.; GUTIERREZ F. (orgs.). Educação comunitária e economia popular. 3ª ed. São
Paulo: Cortez, 2001.
UNISOL – Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários. 1º Plano Nacional de
Economia Solidária, 2015-2019. Brasília: UNISOL, 2015.

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DIA DO MORADOR: ESTRATÉGIA DE INTEGRAÇÃO COM A


COMUNIDADE NO PARQUE NACIONAL MARINHO DE FERNANDO DE
NORONHA

Felipe Cruz Mendonça*,Ricardo Araújo**,Luciana Machado***

*analista ambientai do ICMBio/Sedefelipe.mendonca@icmbio.gov.br;


** analista ambiental ICMBio Noronharicardo.araujo@icmbio.gov.br
***analista ambiental ICMBio Noronhaluciana.machado@icmbio.gov.br

INTRODUÇÃO
Ainda que compreendamos a Gestão Ambiental Pública como um espaço de mediação de
conflitos socioambientais (Quintas, 2000), tendo as Unidades de Conservação como uma das
ferramentas de gestão destes conflitos (Mendonça, 2013), verifica-se que a criação das áreas
protegidas dificilmente se dá em ambientes de amplo consenso, em processos com uma frágil
participação social na sua construção.
Como exemplo disso, podemos citar Fernando de Noronha, único conjunto de ilhas
oceânicas brasileiras habitada, onde em seu território encontramos duas Unidades de Conservação
federais: Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PARNAMAR FN), unidade de
proteção integral criada em 1988 em cerca de 70% de sua área e a Área de Proteção Ambiental de
Fernando de Noronha – Rocas – São Pedro e São Paulo, criada em 1986.
A mobilização para a criação do PARNAMAR se deu principalmente pela luta de
ambientalistas brasileiros, em articulação com organismos e instituições internacionais, tendo pouca
participação da população residente. Entretanto, algumas especificidades do PARNAMAR FN
trouxeram características peculiares no início do processo de gestão, tais como o esforço do órgão
gestor1 em estabelecer regras de transição de uso dos recursos naturais que buscaram respeitar os
costumes locais, em especial, a atividade pesqueira que ocorria na área onde foi criada a unidade de
proteção integral. Regras estas recepcionadas e validadas no Plano de Manejo do Parque Nacional,
datado de 19902. Além disso, os primeiros gestores e a equipe da Unidade foram formados quase

1
Quando da criação o Parque ficou sob gestão do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF),
posteriormente passou para o IBAMA (1989-2007) e desde 2007 está sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade.
2
Não é o objetivo do presente artigo o detalhamento destas regras. Para maiores informações vero plano de manejo do
Parque
http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/biodiversidade/_PARNA_MARINHA_DE_FERNANDO_DE_NORO
NHA.pdf
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

que exclusivamente por ilhéus. Ainda que possa trazer suas dificuldades para a gestão, há de se
ressaltar o aspecto positivo da presença de pessoas da comunidade na gestão daquele “novo
território” que se formava no arquipélago.
Considerando que “os territórios são pensados a partir de interesses que nada ou pouco tem a
ver com a vida das populações que nele habitam, mas que definem e determinam os processos
econômicos locais e re-significam o território” (SVAMPA, 2012), e entendendo a criação de UCs
como um ato de gestão que está trazendo novas significações, e muitas vezes, criando “novos”
territórios, a articulação com as diversas políticas públicas do território e a comunidade do entorno é
um desafio que a gestão democrática desses espaços públicos deve buscar enfrentar. Desta forma, é
preciso compreender e administrar o ecossistema dentro do contexto socioeconômico no qual ele
está inserido (Araujo 2012).
Ainda que o PARNAMAR desempenhe um importante papel na conservação e na
salvaguarda do principal ativo econômico da ilha (belezas cênicas e rica biodiversidade), ele ainda é
visto por alguns como cerceador de direitos e um empecilho para o desenvolvimento, um lugar onde
“não posso ir como antes”, um lugar “só do turista”.

TURISMO NO ARQUIPÉLAGO
Se antes o turismo era incipiente na ilha, com a anexação político-administrativa do
arquipélago a Pernambuco e a criação do PARNAMAR (ambos os episódios em 1988), esta
atividade começou a crescer ano após ano. Trabalhadores do campo, pescadores e grande parte dos
serviços foram migrando paulatinamente para o turismo, fazendo com que o cenário hoje seja de
grande dominância desta atividade na economia da ilha. O PARNAMAR de Fernando de Noronha
está entre as 5 (cinco) Unidades que mais receberam visitantes em 2018 (ICMBio, 2019), e cumpre
grande parte de seus objetivos no que diz respeito a visitação pública, com estruturas e manejos dos
atrativos que buscam minimizar os impactos no arquipélago.
O perfil do turista que chega a Fernando de Noronha é formado por camadas da população
com alto poder aquisitivo e educacional. O território insular foi paulatinamente se especializando
como um território turístico, onde grande parte da economia e os serviços da ilha estão voltados
para esta atividade, contrastando com os problemas sociais que a ilha vivencia e com o
deterioramento da qualidade de vida da população residente (favelização, violência familiar,
saneamento deficitário, abastecimento de água insuficiente etc) .

VISITAÇÃO NAS PISCINAS NATURAIS E O DIA DO MORADOR


Para acessar o Parque Nacional é preciso obter um ingresso válido por 10 dias, com isenção
de pagamento para os moradores da ilha. Alguns dos atrativos bastante procurados pelos turistas são
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

as piscinas naturais (Abreu, Caieira, Atalaia e do Morro São José) que, seja pela fragilidade
ambiental ou pela experiência de visitação que se pretende oferecer, possui um limite diário de
visitas. Para acesso a estes atrativos, além do ingresso, é preciso agendamento prévio. Esta regra se
estende a visitantes e moradores, indistintamente. Com o aumento exponencial do número de
visitantes na ilha, as visitas estão cada vez mais disputadas e raras vezes moradores utilizam. Na
prática, este regramento ao longo dos anos afastou o morador da ilha desses atrativos do Parque,
gerando um sentimento de descontentamento do morador por ter que agendar para acessar uma área
da ilha, da qual tinha acesso livre anteriormente.
Buscando atender algumas reivindicações da comunidade e contribuir com a aproximação
da população local com o Parque e sua gestão, o Instituto Chico Mendes lançou, em março de 2017
o programa “Dia do Morador”. O programa consiste em disponibilizar, em todos os finais de
semana, o uso exclusivo pelos moradores em um dos atrativos que necessitam de agendamento. O
morador continua podendo ir quando quiser mas, nestes dias, ele não precisa agendar a sua ida.
Basta ir para o atrativo onde existirão monitores e voluntários orientando o uso das piscinas de
forma a não trazer problemas para sua condição ambiental. Nestes atrativos reservados aos
moradores, não é permitida a presença de turistas.
A divulgação dos dias e horários do dia do morador, é feita por via de mensagem eletrônica
nas redes sociais do Parque e da comunidade e em cartazes espalhados pelo comércio e prédios
públicos locais. Os dados do ICMBiolocal, mostram que o atrativo mais visitado é o Morro São
José, que não era um local tradicionalmente acessado pela comunidade. A maior parte dos
frequentadores são moradores temporários (vivem a menos de 10 anos na ilha) ou prestadores de
serviço que estão a trabalho.

AVALIAÇÃO DO MORADOR
Buscando ilustrar e demonstrar o impacto da proposta na comunidade residente, fizemos
uma breve consulta a pessoas da comunidade de diferentes formações e ocupações, questionando-as
sobre sua opinião com relação ao dia do morador (se é positivo ou não, o que precisa mudar) e
como ela enxerga a forma que a comunidade recebeu o programa. Foram consultados 18 moradores
permanentes na ilha, entre condutoras(es) de visitante, empresárias(os), jornalistas, professoras,
artesãos e funcionárias(os) públicos através de correio de mensagens eletrônicas. As mensagens
estão transcritas abaixo conforme fala do entrevistado.
Em geral, todas(os) os moradoras(es) consultadas(os) afirmaram que a recepção do
programa foi bastante positiva.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“Desde que foi criado o parque algumas áreas ficou com o acesso mais restrito. (com o
Dia do Morador) É a primeira vez que a comunidade teve uma oportunidade de
reaproximação com essas áreas. Principalmente as trilhas e os locais de
agendamento.”(Camila Barreto, condutora de visitante)
“O dia do morador realmente foi uma conquista da comunidade.”(Marcelina Correa da
Silva, empresária)
“Ele é superimportante porque resgata a vontade dos moradores para acessar vários
lugares que ele não estava tendo.”(Fernando Oliveira, condutor de visitante)

Os depoimentos nos dá pistas no sentido de perceber que o processo de especialização do


território insular para o desenvolvimento da atividade turística, vem se dando em detrimento aos
espaços/serviços voltados a comunidade local e evidencia o papel do Dia do Morador na construção
de uma nova dinâmica de uso do território

“(...) foi uma grande ideia para poder possibilitar ao morador da ilha visitar esses
atrativos que eles estavam sem chances de ir, em função de que com o crescimento do
turismo, a prioridade tem sido do visitante.” (Jornalista local)
“Eu sinto que é muito bem-vindo e deve continuar, porque a ilha está cada vez mais
movimentada e o morador com menos espaço.”(Tammy Casagrande, professora)
“A ilha está cada vez mais voltada para o turismo, para os visitantes. Acho que é então (o
dia do morador) um retorno para os moradores, um carinho uma coisa bem
bacana.”(Silvia Moreli, professora)

Nas avaliações é possível perceber até o reconhecimento com relação ao poder público nesse
esforço de garantir e prestigiar o morador na relação com o Parque Nacional.

“O projeto é fantástico e muito bem aceito na comunidade. A comunidade até valorizou


mais o ICMBio, porque se preocupou e pensou na comunidade.” (Sérgio Roberto de Lima,
artesão)
“(...)É muito gratificante, como moradora da ilha me sinto muito valorizada pelo Parque,
que proporciona esse momento de interação com a natureza e lazer.” (Silvia Morais,
condutora de visitante)
“(...)O dia do morador é uma forma do próprio Estado, a própria gestão pública,
reconhecer a importância do morador em Fernando de Noronha.”(Grazielle Rodrigues,
historiadora)

Ainda assim, em alguns depoimentos de moradores mais antigos, relatando a sua impressão
com relação a percepção da comunidade, ainda é possível observar falas de como era antes da
criação do Parque ou do manejo do atrativo, demonstrando um certo saudosismo e discordância de
como é manejado os atrativos hoje.

“Os mais antigos têm muita resistência porque acham que estão sendo tolidas no seu
direito. Eles acreditam que tinham facilidade de ir para esses locais por ser morador
permanente, a qualquer dia e hora.”(Jornalista local)
“(...) agora os mais antigos, os tradicionais, têm uma sensação que não haveria a
necessidade disso, pois todo dia é dia do morador. As pessoas ao invés de achar que isso é
um privilégio encara como uma restrição.”(Leonardo Veras, empresário)

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“(...) não deveria ter apenas um dia do morador, tinha que ter todos os dias, como a gente
fazia antigamente. Porém, sabemos que a ilha cresceu bastante, o movimento tem
aumentado, muita gente na ilha (...)”(João Paulo, condutor de visitante)
Com o crescimento do turismo no arquipélago nas últimas décadas, ainda que o manejo dos
atrativos tenham trazido limitações para o uso da comunidade, em geral ele é reconhecido como
necessário.

“A maioria das pessoas acha que o dia do morador tinha que ser todo dia, mas a gente
sabe do aumento do fluxo de turista na ilha então tem que ter um controle. Nós temos que
entender se a gente não controlar a gente vai perder muito.”(Ana Paula Silva, conselheira
distrital)
“Em Noronha todos os dias são maravilhosos. Bom seria se pudéssemos ir em qualquer um
dos pontos a qualquer hora. Mas infelizmente isso não é possível e que bom que não é
possível. Tem que agendar (pra proteger)” (Edleuza Maria dos Santos, chefe do cartório
eleitoral de FN )

Por fim, os depoimentos trazem oportunidades para melhorasdo programa. Em geral, as


sugestões dadas dizem respeito a melhorarar a comunicação com a comunidade, fiscalização e
oportunizar atividades educativas.

“Seria uma oportunidade de desenvolver uma boa atividade de educação ambiental com os
moradores, refletindo sobre o papel do Parque no arquipélago.” (Silvia Morais, condutora
de visitantes)
“(...) usar a rádio Golfinho para estimular a participação dos moradores permanentes.”
(Marcelina Correa da Silva, empresária)

CONCLUSÃO
Apesar do Dia do Morador ainda não ter sido totalmente incorporado ao uso da maior
parte da comunidade, somente a existência da possibilidade de acesso exclusivo ao local e de
valorização da comunidade, teve grandes ganhos na aproximação do Parque com a comunidade e
seu sentimento de pertencimento do local.
A construção de um território democrático, que oportunize o exercício pleno da
cidadania à toda sua população precisa ser o objetivo de toda cidade e distrito. Fernando de
Noronha vem passando nos últimos 30 anos por uma reconfiguração do seu território, influenciada
pela atividade turística, onde o turista tornou-se um dos protagonistas principaisdaquele território
em detrimento dos moradores, da comunidade local. O Dia do Morador, busca inverter essa lógica
dentro do Parque Nacional, trazendo o morador, a cada final de semana como protagonista de um
atrativo que tem limitação de visitação. Com isso, entendemos que estamos contribuindo com o
fortalecimento da gestão democrática do território insular.
Os depoimentos tiveram como objetivo trazer um breve levantamento do sentimento da
comunidade sobre o assunto, mas sem a pretensão de ter valor estatístico. Melhores estratégias de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

divulgação aliadas a ações educativas nos locais, podem potencializar ainda mais a experiência e a
integração entre Parque Nacional e a comunidade local.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAUJO, M. A. R. 2012. A Gestão das unidades de conservação à luz da abordagem
ecossistêmica, p.155-187. In: NEXUCS (org.). Unidades de conservação no Brasil: o caminho da
gestão para Resultados. RiMa Edito-ra. 536p.

FERNÁNDEZ, L.V. 2012. Territorialidades e integração: o Escudo Guianês no contexto da


iniciativa IIRSA. Textos & Debates, 21: 37-58.

MENDONÇA, F.C & TALBOT, V. 2014. Participação Social na Gestão de Unidades de


Conservação: uma Leitura sobre a Contribuição do Instituto Chico Mendes. Revista
Biodiversidade, 4 (1) p. 211-234.

QUINTAS, J. S. 2000. Por uma educação ambiental emancipatória: considerações sobre a formação
do educador para atuar no processo de gestão ambiental, p.11-19. In: Quintas, J. S. (org.).
Pensando e praticando a educação ambiental na gestão do meio ambiente. IBAMA.ICMBio,
2019. Painel Dinâmico de Informações.
http://qv.icmbio.gov.br/QvAJAXZfc/opendoc2.htm?document=painel_corporativo_6476.qvw&host
=Local&anonymous=true. Acessado em 10/09/2019.

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CONSOLIDANDO AS BASES PARA O TURISMO COMUNITÁRIO NA


RESEX MARINHA DO PIRAJUBAÉ: CRIANDO UMA REDE
COLABORATIVA DE TBC LOCAL
CONSOLIDATING THE FOUNDATIONS FOR COMMUNITY TOURISM IN THE RESEX
MARINHA DO PIRAJUBAÉ: CREATING A COLLABORATIVE NETWORK OF LOCAL TBC

Laci Santin*, Carolina Mattosinho de Carvalho Alvite, Flora Neves

laci.santin@icmbio.gov.br*, carolina.alvite@icmbio.gov.br**,guiaecoflora@yahoo.com.br***

RESUMO:

A Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé é uma unidade de conservação federal, gerida pelo ICMBio em
cogestão com seu Conselho Deliberativo. É uma unidade de conservação urbana localizada em Florianópolis
(SC), entre o centro da cidade e seu aeroporto internacional. É a primeira reserva extrativista marinha do
Brasil, criada em 1992 com a finalidade de garantir o acesso e uso desse território aos pescadores artesanais
locais, assim como, proteger o maior fragmento contínuo de manguezal da Ilha de Santa Catarina. Desde sua
criação, a Resex vem sofrendo intensa pressão do traiding turístico e imobiliário, com a crescente demanda
por infraestrutura viária e sanitária, comprometendo diretamente as condições para a manutenção do modo
de vida da população tradicional local, que é invisibilizada nesse processo, e seu território visto apenas como
depósito de resíduos. Para contrapor esta tendência à invisibilidade da pesca e da população local, por
iniciativa comunitária e com o apoio do ICMBio, desde 2015, se vem adotando a estratégia de promover o
turismo de base comunitária com o intuito de valorizar o território, suas belezas naturais e culturais, dar
visibilidade e melhorar a autoestima da população tradicional, assim como, ser um potencial de renda
complementar para os pescadores artesanais. Ampliar a participação dos extrativistas na cadeia produtiva do
turismo local é um desafio que requer, além de parcerias, um processo educativo com vistas a desenvolver
novas habilidades e atitudes nesse grupo social, ao mesmo tempo em que fortalece a resistência na defesa de
seu território e modo de vida tradicional.

Palavras chaves: turismo de base comunitária, educação ambiental em unidades de conservação, pescador
artesanal, desenvolvimento local, rede colaborativa local.

INTRODUÇÃO
A Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé, Resex Pirajubaé, foi a primeira reserva
extrativista marinha criada no Brasil, no ano de 1992. É uma unidade de conservação (UC) urbana,
localizada em uma área central e densamente povoada de Florianópolis, capital do estado de Santa
Catarina, cidade com muitas demandas de infraestrutura, o que torna o contexto da UC complexo e
desafiador. O fato histórico mais impactante foi a construção de um aterro hidráulico, no final dos
anos 1990 até 2005, para a construção de uma rodovia visando facilitar o deslocamento para o sul
da Ilha. Esta obra interveio diretamente na área da Resex e seu entorno, separando os pescadores e
as novas gerações do mar, provocando profundas transformações no território social, econômico e
cultural da população usuária desta UC. As crescentes e constantes pressões sobre seu território e

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bens naturais, aliada à fragilidade do ambiente e a incipiente capacidade organizativa da população,


exige que se reflita sobre o presente e o futuro, a nível local e regional, da Resex do Pirajubaé.

Ribas (2014), ao estudar a comunidade extrativista da Resex relata que o ecossistema local e
o extrativismo na Resex Pirajubaé aparentam estar ameaçados, tanto em virtude de as novas
gerações não optarem pela continuidade da atividade pesqueira, como pelo uso intensivo dos
recursos naturais locais, agravado pela intensificação das pressões urbanas sobre o território. Uma
das possibilidades para promover um maior envolvimento das novas gerações à Resex pode ser
alcançada com o estímulo à atividades que valorizem o território e seu modo de vida, ao mesmo
tempo que garantam a inserção da comunidade na conservação da biodiversidade e promovam o
desenvolvimento socioambiental. É neste contexto que o turismo de base comunitária (TBC) vem
apresentando-se como uma alternativa compatível com estes objetivos.
O resgate do etnoconhecimento e a preocupação com o agravamento dos impactos de ordem
antrópica na área, aliada com a beleza cênica do local, inspirou um projeto de utilização sustentável
dos recursos, baseado no ecoturismo e promovendo a divulgação, visitação e valorização da região
que abrange o manguezal e o território marinho protegido pela Resex. A iniciativa de TBC está
fundamentada num processo continuado de educação ambiental crítica e transformadora, que se
propõe estimular o pertencimento da população tradicional ao território protegido, sensibilizar e
criar um efeito multiplicador sobre extrativistas, visitantes e moradores de diversas comunidades,
incentivando a valorização da cultura e resgatando a autoestima da população local.
A iniciativa de TBC vem sendo implementada a partir do protagonismo de um beneficiário
da Resex, neto e filho de pescador artesanal, após sua participação no “Curso de Condutor
Ambiental Local da Ilha de Santa Catarina”, promovido pelo Instituto Federal de Santa Catarina –
IFSC, entidade membro do Conselho da UC. A partir do curso iniciou-se o Projeto Piloto de
Turismo de Experiência na Resex Marinha do Pirajubaé, com autorização do ICMBio e aprovação
do Conselho Gestor da UC, criando-se, neste fórum, um grupo de trabalho – GT Turismo, para
aprofundar os debates e orientações sobre o tema. O roteiro turístico implementado pelo Projeto
Piloto visa dar visibilidade aos atributos naturais e sua beleza cênica, assim como, aos aspectos
culturais e históricos associados ao território e ao modo de vida da comunidade de pescadores
artesanais. Procura aproximar o visitante ao dia a dia do pescador, sua vivência em rancho de canoa,
alimentação típica e o contato com instrumentos e artes de pesca, seus usos e costumes, valorizando
a cultura e o modo de vida associada à pesca artesanal e aos recursos ambientais da região. Além
do condutor ambiental local, o TBC é executado por pescadores artesanais e extrativistas
beneficiários da Resex, com vasto conhecimento sobre o território, navegação e artes de pesca local,
na condição de barqueiros e demonstradores da atividade pesqueira, assim como, esposa e nora
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

destes, como cozinheiras. Também é incentivada a participação de artesões locais que elaboram
artefatos e peças ornamentais que reproduzem aspectos da vida e realidade local.

Considerando que o turismo e a recepção de visitantes não fazem parte da atividade e modo
de vida da pesca artesanal, existe certa resistência dos pescadores locais e beneficiários da Resex
em se integrar na atividade. Esta resistência se deve à desconfiança no novo e incertezas em relação
à nova atividade vir a produzir benefícios econômicos que garantam a segurança alimentar e
reprodução social de sua unidade familiar (Chayanov, apud Gazolla e Schneider, 2007). De igual
maneira, desconhecem como se integrar na atividade, ignorando que o TBC possa ser compatível
com o trabalho na pesca, não se percebendo, ainda, como sujeitos desse processo.

A CRIAÇÃO DA REDE COLABORATIVA DE TBC NA RESEX PIRAJUBAÉ


Um dos desafios para que o TBC se consolide na Resex Marinha do Pirajubaé é integração
de um maior número de beneficiários da UC na atividade. Para dar conta deste desafio, e a partir do
lançamento do edital de chamada de Projeto da CGPT/DISAT/ICMBio1, Projeto PNUD
BRA/08/023, o GT Turismo do Conselho elaborou um projeto com a finalidade de promover a
consolidação do TBC na Resex mobilizando os beneficiários para se integrar no turismo
comunitário.
O projeto constou de três fases: i. levantamento da percepção e sensibilização dos
beneficiários sobre o turismo local; ii. mobilização da população tradicional para se integrar no
TBC e iii. formação básica nos elementos que compõem a cadeia produtiva do turismo local. O
planejamento e execução do Projeto se deu de maneira participativa, construído coletivamente pelos
membros do GT Turismo e outros parceiros que se integraram à proposta.
Inicialmente realizou-se uma pesquisa sobre a percepção dos beneficiários acerca do turismo
em Florianópolis e a visão destes sobre o potencial de turismo na Resex. Foram entrevistados 33%
dos extrativistas na UC (ICMBio, 2018), de um total de aproximadamente 180 beneficiários
cadastrados. Produto deste levantamento, pudemos saber que a maioria dos entrevistados tem uma
visão negativa do turismo de massa que se realiza em Florianópolis, em função do encarecimento
dos produtos e serviços locais durante a temporada, e pelos resíduos deixados pelos visitantes. No
entanto, 81% dos entrevistados manifestam que observam atrativos turísticos na área da Resex, e
73% destes se dispõem a se envolver com a atividade.

1
Edital “Chamada de Propostas para Fortalecimento de Iniciativas de Turismo de Base Comunitária” - Coordenação
Geral de População Tradicional – CGPT, da Diretoria de Ações Socioambientais e Consolidação Territorial – DISAT,
do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio.
354
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Na etapa de mobilização foram montadas duas feiras de divulgação, com exposição de fotos,
banners, artesanato, música e degustação de alimentos, divulgando as experiências e a rede
colaborativa que permite desenvolver o turismo localmente. Esta etapa culminou com a realização
do 1º Encontro de Turismo Comunitário na Resex Marinha do Pirajubaé, em dezembro de 2018.
Neste Encontro apresentou-se um vídeo educativo sobre a Rede Colaborativa local e se debateram
temas de interesse para os pescadores, junto com a Marinha do Brasil, relativo a dupla afetação das
embarcações de pesca para poderem ser adaptadas ao transporte de passageiros, viabilizando assim
o turismo embarcado. Como resultado, os participantes, reunidos por grupos de interesse
(gastronomia, piloto de embarcação, artesanato e condução ambiental), elaboraram diversos
encaminhamentos para dar seguimento ao processo de formação e organização da Rede. No
primeiro semestre de 2019, com o apoio da CGSAM/DISAT/ICMBio1, se viabilizou recurso
adicional do Projeto PNUD BRA/08/023, que permitiu a contratação de novos consultores, os quais
reativaram o processo de mobilização realizado em 2018, e realizaram oficinas e uma saída de
campo/aula prática com os grupos de cada seguimento, para a formação dos integrantes da Rede
Colaborativa de TBC na Resex.
Foram realizadas as seguintes capacitações: i) boas práticas sanitárias na preparação de
alimentos; ii) normas e requisitos para o transporte de passageiros e legalização de embarcações de
pesca para dupla afetação; iii) confecção de artesanatos que reproduzam aspectos da fauna, flora,
recursos e paisagens do território da Resex; iv) recepção de visitantes, gestão de riscos em uma
condução e interpretação ambiental.
O processo culminou com a realização de um 2º Encontro de Turismo Comunitário na Resex
Marinha do Pirajubaé, em julho/2019, no qual os participantes intercambiaram experiências com
outras práticas de TBC na região, assim como, discutiram a organização e estratégias para novos
roteiros turísticos a serem implantados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A formação e consolidação de uma Rede Colaborativa de Turismo de Base Comunitária na
Resex do Pirajubaé tem se apresentado como uma estratégia promissora para fortalecer a
organização e ampliar a iniciativa de turismo protagonizada pela comunidade. Prova disto é o
resultado deste projeto que ampliou em 100% o número de integrantes e potenciais novos membros
da Rede Colaborativa de TBC nesta UC. Grandes desafios ainda necessitam ser vencidos, no
entanto, a formação e consolidação de uma Rede Colaborativa de TBC tem se apresentado como

1
Coordenação Geral de Gestão Socioambiental – CGSAM, da Diretoria de Ações Socioambientais e Consolidação
Territorial – DISAT, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio.
355
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

uma estratégia promissora para fortalecer e ampliar a iniciativa de turismo protagonizada por
beneficiários da unidade de conservação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GAZOLLA, M., SCHENEIDER, S. - A Produção da Autonomia: os “papéis” do autoconsumo na
reprodução social dos agricultores familiares, Revista Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de
Janeiro, (UFRRJ), v. 15, p. 89-122, 2007

INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE - ICMBio,


Projeto PNUD BRA 08/023 - Relatório Técnico das Entrevistas com Beneficiários(as) no Âmbito
do Projeto: Consolidando as Bases para o Turismo de Base Comunitária na Resex Marinha do
Pirajubaé, 2018 (doc. interno do projeto).

RIBAS, L. C., A RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DO PIRAJUBAÉ: sujeitos, memórias


e saberes etnobiológicos, Organização: Liz Cristina Camargo Ribas Ano: 2014, IFSC.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ESTUDO EXPLORATÓRIO SOBRE O USO TURÍSTICO E DE LAZER DO


JARDIM BOTÂNICO DO RECIFE – PE
EXPLORATORY STUDY ON THE TOURISTIC AND LEISURE USE OF BOTANICAL
GARDEN IN RECIFE- PE

Guilherme de Siqueira Freitas Pontes*, Whithiney Julho Ribeiro Santos Coutinho*, Iraneide Pereira
da Silva**

* Estudante do Curso Superior Tecnológico em Gestão de Turismo, Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Pernambuco – IFPE/ Campus Recife, Brasil.
*Estudante do Curso Superior Tecnológico em Gestão de Turismo, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
de Pernambuco – IFPE/ Campus Recife, Brasil.
** Professora, Doutora do Curso Superior Tecnológico em Gestão de Turismo, Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia de Pernambuco – IFPE/ Campus Recife, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Segundo Cerati (2006), historicamente há registros da existência de jardins botânicos desde
as regiões da Mesopotâmia, Grécia, até a América Pré-Colombiana. O jardim botânico moderno é
datado de 1543, localizado em Pisa na Itália, com caráter médico e farmacêutico, o que impulsionou
pesquisas farmacêuticas na Europa. No Brasil, o primeiro Jardim botânico foi criado em 1798 em
Belém, inicialmente denominado Horto Botânico do Pará. Em seguida, em 1808, foi criado o
Jardim Botânico do Rio de Janeiro e em 1811, o Jardim Botânico de Olinda e em 1895 os jardins
botânicos de Ouro Preto – MG e o de São Paulo – SP.
Criado em 1979 por meio do Decreto no 11341/1979, o Jardim Botânico do Recife
apresenta-se como um espaço que busca oferecer lazer, ciência e educação ambiental para
moradores e visitantes da cidade do Recife (RECIFE, 1979). Trata-se de um espaço ambiental com
remanescente da Mata Atlântica na cidade, gerenciado pela Secretaria de Desenvolvimento
Sustentável e Meio Ambiente da Cidade do Recife. Considerando a Resolução no. 339/2003 que em
seu Art. 1º define como um dos objetivos de um jardim botânico o de promover o lazer e a
educação ambiental, além da pesquisa, conservação, e preservação, difundindo o valor multicultural
e a utilização de forma sustentável de suas plantas (BRASIL, 2003).
Atualmente o Jardim Botânico possui como principais atrativos a realização de trilhas
ecológicas, a visitação ao orquidário, ao jardim sensorial e de flores tropicais, além de visitação ao
jardim de plantas medicinais e de palmeiras, ao meliponário (coleção de colmeias de abelhas sem
ferrão), ao viveiro florestal. Ele ainda possui uma coleção de cactáceas, bromélias e um núcleo de
educação ambiental que também podem ser visitados (JARDIM BOTÂNICO, s/d).

357
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Estes atrativos reforçam o potencial do Jardim Botânico do Recife para o fomento do


segmento do Turismo de Jardins (gardenstourism), que embora ainda seja um nicho pouco
desenvolvido no Brasil, na Europa as experiências de Giverny e Versailles na França, de Keukenhof
na Holanda e de cerca de 400 jardins abertos na Grã Bretanha, além de Christchurch na Nova
Zelândia, dentre outros tem levado milhões de visitantes a estes atrativos, como lembram Gastal,
Rocha e Castrogiovanni (2018).
No sentido de compreender como se dá o uso turístico e de lazer deste equipamento, este
estudo exploratório trata como estes usos se apresentam no Jardim Botânico Recifense – JBR,
objetivando analisar a visão dos gestores sobre tal uso. No item que se segue expõem-se a
metodologia utilizada para realização da referida pesquisa.

2. MATERIAL E MÉTODO
A partir da realização de pesquisa qualitativajunto aos gestores do Jardim Botânico do
Recife – JBR,por meio de entrevista com representante da gestão, buscou-seanalisar a visão dos
mesmos sobre o uso turístico e de lazer desta área protegida da cidade do Recife. A análise do
corpus da pesquisa pautou-senaproposta de análise de conteúdo de Bardin (2016) para a análise
qualitativa da entrevista.
O instrumento de pesquisa, baseado na elaboração de um roteiro semi-estruturado de
entrevista, buscou levantar informações sobre o histórico do JBR, suas ações, aspectos da gestão,
assim como aspectos ligados às ações de turismo e lazer e das questões ambientais e sociais que
permeiam as atividades do JBR. Além disso, questionou-se sobre os desafios que a gestão percebe
sobre a questão do uso turístico e de lazer de áreas protegidas como o JBR.A partir da realização da
entrevista nas dependências do Jardim Botânico no último dia 19/09/19, junto ao representante da
gestão, são analisadas as falas e discutidas os aspectos levantados, conforme segue:

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Neste item são apresentados os resultados e discussões do corpus da pesquisa levantado por
meio da realização de entrevista junto a representante da gestão do Jardim Botânico do Recife. A
análise se baseia na proposta da análise de conteúdo das falas deBardin (2006). A partir da
transcrição da entrevista, foi realizada uma análise temática, cujos temas foram definidos a
posteriori, quais sejam: gestão, conhecimento, desafios e a relação turismo/lazer/meioambiente.
Considerando a temática gestão, percebe-se a preocupação do representante do JBR no
enfoque da função que um jardim botânico possui, ou seja, o cunho científico e gerador de
conhecimento da fauna e flora local, além de ser um espaço que salvaguarda elementos naturais,
notadamente os resquícios de mata atlântica que está no JBR. Segundo o gestor “Jardim não é um
358
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

parque. Jardim tem três elementos importantes: educação ambiental [...], a conservação de
diversidade e tem a parte de pesquisa. A conservação e a pesquisa são atreladas, mas isso também
tem que ser de domínio público”. Para dar domínio público às ações do JBR, a divulgação é feita de
forma descentralizada, por meio das ações doDepartamento de Divulgação da Prefeitura da Cidade
do Recife - PCR, por meio do setor de Comunicação da Secretaria de Meio Ambiente e
Sustentabilidademunicipal. Além disso, o JBR possui site oficial, além de disso ele possui um perfil
nas mídias sociais Facebook e Instagram.Outro aspecto apresentado pela gestão foi a questão da
acessibilidade. Ela se apresenta no JBR por meio da Trilha Acessível inaugurada em agosto de
2019e pelo jardim sensorial.
Considerando a função educativa do JBR, o gestor ressalta as atividades voltadas para a
educação ambiental feito por parte dos educadores e dos monitores do Jardim. Ele informou que o
perfil do público recebido no JBR seria de crianças e adolescentes de escolas públicas e privadas,
representando mais de 60% dos visitantes. Eles realizam pesquisa de satisfação com o público
envolvido nas ações de educação ambiental em que, segundo sua informação:

atualmente estamos realizando uma pesquisa com a ajuda de nossos monitores,


que serve como um termômetro para saber como anda nossa educação ambiental,
então as pessoas respondem um questionário quando entram e outro quando sai,
com o intuito de saber se as pessoas estão realmente absorvendo o que estamos
tentando passar.

Isto indica que a gestão está atenta à questão do acompanhamento das ações desenvolvidas
no Jardim. Acrescenta-se que a avaliação dos serviços prestados também é acompanhada por meio
de um link na página do JBR para reclamações, queixas e ideias.
A respeito de parcerias com outras secretarias e/ou instituições públicas, embora tenha sido
declarado que existem planos de estender ciclovias pela cidade até o Jardim Botânico, segundo ele
“para que o recifense realmente conheça este espaço, que muitos não conhecem”, quando
questionado sobre a existência de alguma atividade conjunta entre o JBR e a Secretaria de Turismo,
Esportes e Lazer – SETUREL da cidade do Recife, foi informado “que eu saiba não”.
Quanto ao tema conhecimento, o gestor informa que o Jardim Botânico busca conectar,
preservar e promover a sustentabilidade e educação ambiental por meio de ações de pesquisa na
Mata Atlântica, mas que tem um grande desafio que é expor o local ao público, mas ao mesmo
tempo garantir sua preservação. Neste sentido, segundo ele “a gente tem um núcleo de arte
educadores aqui no jardim né?!, fora as nossas monitorias que fazem os percursos com as
crianças, temos os artes educadores que trabalham muito com essa questão da sustentabilidade né,
tanto da questão da reutilização de materiais, como o plástico, bastante...” reforçando o caráter
educativo, de preservação e de promoção da sustentabilidade que o JBR possui.
359
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Já no tema sobre a relação turismo/lazer/meio ambiente,ressalta-se que ojardim por estar


dentro de remanescente de mata atlântica possui uma beleza paisagística capaz de gerar um fluxo
turístico, desta forma, para ele, seria uma oportunidade para “a gente ver fauna, flora.Temos muitas
arvores que chamam atenção como é o caso da sapucaia gigante que tem mais de 200 anos, temos
lagos artificiais com peixes, temos o orquidário, temos também a parte do refeitório em que as
pessoas interagem”. Esta fala é complementada pelavisão sobre a pressão da expansão do turismo
sobre áreas protegidas. Aparentemente ele não vê problema no desenvolvimento do turismo nestas
áreas, já que segundo seu depoimento “na verdade tentamos passar para o publico em geral a
importância de se ter a preservação das arvores e que se pode explorar a mata sem danificá-
la”.Assim, para ele, o turismoem áreas protegidas vai reforçar aimportância de se ter uma floresta
em pé, fazer o visitante perceber que “somos parte do meio, que estamos conectados”, indicando o
papel social que um jardim botânico tem de promover a reflexão sobre as ações do indivíduo sobre
o meio ambiente em que vive.
Por fim, o tema desafios se apresenta para gestão peladicotomia entre o jardim ser uma área
considerada intocada ou uma área a ser mostrada. Para o gestor, “tem que ser intocável, mas
mostrada, ela tem que ser conhecida, né?!, divulgada... é importante que as pessoas visitem as
áreas verdes e vejam sua importância tanto do ponto de vista ecológico, até como de serviços né?!,
sociais, na regulação de clima, proteção de fonte d’água, enfim...”.
Outro desafio exposto édecodificar a informação, poiscomo o jardim é um espaço de
produção de conhecimento, que se dá por meio da realização depesquisa, faz-se necessário traduzir
as informações para uma linguagem mais popular. Segundo ele, a principal forma de decodificação
é por meio de estratégias lúdicas, de brincadeiras com os visitantes, principalmente os estudantes
que visitam o Jardim.

4. CONCLUSÃO
O uso turístico e de lazer em áreas protegidas como os jardins botânicos tem sido
experienciado em vários lugares do mundo e também no Brasil, com destaque para o Jardim
Botânico do Rio de Janeiro e de Curitiba.
A partir da pesquisa realizada percebe-se que para os gestores o Jardim Botânico do Recife -
JBR, sem perder sua característica de ser um espaço de educação ambiental, de conservação da
diversidade e de produção de conhecimento por meio das pesquisas, o JBR é um espaço para o lazer
e o turismo, notadamente o turismo pedagógico, científico e de lazer. Assim, o uso turístico e de
lazer deste espaço se dá por meio de ações voltadas principalmente para crianças e adolescentes,
com enfoque para a educação ambiental.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Por fim, quanto à visão dos gestores sobre tal uso, percebe-se que a gestão preocupa-se em
fazer com que o recifense conheça mais e melhor este espaço, não só por meio de sua função
educativa, mas de sua função social e de geração de conhecimento por meio das pesquisas
realizadas.
Destaca-se como principal limitação deste estudo o direcionamento da visão sobre o uso
turístico e de lazer apenas da gestão, sendo necessária para complementar e verificar as
convergências e divergências, o levantamento da visão dos visitantes do JBR. Como contribuição,
ressalta-se que esta pesquisa pode basear estudos futuros sobre tal uso nos demais espaços públicos
de lazer que o Recife possui, tais como parques e praças da cidade.

5. REFERÊNCIAS
BARDIN, L.Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2016.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Resolução no 339, de 25 de Setembro de 2003. Brasília,


2003. Disponível
em:<http://jardimbotanico.recife.pe.gov.br/sites/default/files/midia/arquivos/pagina-
basica/resolucao_conama_339-2003.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2019.

CERATI, T. M.. Jardins botânicos e a biodiversidade. Instituto de Botânica/ Jardim Botânico de


São Paulo. São Paulo, 2006. Disponível
em:<http://www.biodiversidade.pgibt.ibot.sp.gov.br/Web/pdf/Jardins_botanicos_e_a_biodiversidad
e_Tania_Cerati.pdf>. Acesso em: 23 set.2019.

GASTAL, S.; ROCHA, V.; CASTROGIOVANNI, A. C. Jardins botânicos e turismo de jardins:


pesquisa de audiência em Porto Alegre e Caxias do Sul, RS. Caderno Virtual de Turismo. Rio de
Janeiro, v. 18, n. 1, p. 170-186, abr. 2018. Disponível em:<www.ivt.coppe.ufrj.br › caderno ›
index.php › caderno › article › download >. Acesso em: 23 set. 2019.

JARDIM BOTÂNICO DO RECIFE. Site oficial. Disponível


em:<http://jardimbotanico.recife.pe.gov.br/pt-br>. Acesso em: 20 ago. 2019.

RECIFE. Decreto no 11341, de 01 de agosto de 1979. Recife, 1979. Disponível


em:<http://jardimbotanico.recife.pe.gov.br/sites/default/files/midia/arquivos/pagina-
basica/decreto_de_criacao.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

POTENCIAL DO TURISMO DE OBSERVAÇÃO DE MAMÍFEROS


MARINHOS NO MUNICÍPIO DE JEQUIÁ DA PRAIA (ALAGOAS)
POTENTIAL OF MARINE MAMMALS WATCHING IN JEQUIÁ DA PRAIA (ALAGOAS)

Flávia Bonfietti Izidoro 1*, Kamila Pacheco Martins da Silva2, Renato de Mei Romero3
1
Campus Penedo, Brasil, Instituto Federal de Alagoas (IFAL)/ Discente no Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento e Meio Ambiente (UESC)* (Autora correspondente e orientadora)
2
Graduada em Gestão Ambiental, Campus Marechal Deodoro Instituto Federal de Alagoas (IFAL), Brasil
3
Programa de Pós-Graduação em Tecnologias Ambientais – PPGTEC, Campus Marechal Deodoro, Instituto Federal de
Alagoas (IFAL), Brasil

1. INTRODUÇÃO
A relação entre o homem e os cetáceos (baleias e golfinhos) é tão antiga quanto a própria
humanidade (SILVA; SHEPARD; CARMO, 2017). Sua exploração em épocas passadas destacou-
se pela caça comercial de baleias e pela alta mortalidade de golfinhos durante a atividade pesqueira
(LODI; BOROBIA, 2013).
No caso dos sirênios, muito antes da chegada dos europeus ao Brasil, a carne ea gordura dos
peixes-bois já eram consumidas pelos nativos e seu espesso e resistente couro usado como escudo e
armadura contra as flechas inimigas (SILVA; SHEPARD; CARMO, 2017). Registros históricos
retratam, porém, que a caça praticada pelos nativos habitantes da costa brasileira parece não ter
afetado tanto a população destes animais como aquela praticada depois da chegada dos
colonizadores europeus no século XVI (LIMA, 2008).
Atualmente, muitas espécies de pequenos cetáceos no Brasil não apresentam status de
conservação definido ou estão ameaçadas. Com relação ao peixe-boi marinho, sabe-se que é o
mamífero aquático mais ameaçado de extinção do Brasil (LUNA et al., 2008). O status de
conservação da espécie é classificado internacionalmente como vulnerável (SELF-SULLIVAN;
MIGNUCCI-GIANNONI, 2008) e nacionalmente como em perigo (ICMBio, 2018).
O sucesso da conservação dos mamíferos marinhos requer, além de condições ambientais
adequadas, uma interação positiva em áreas com influência antrópica. A educação envolvendo as
comunidades do entorno das áreas de ocorrência de mamíferos marinhos, em situação de risco, está
entre as medidas de alta prioridade para a conservação segundo os Planos de Ação Nacional para a
conservação de pequenos Cetáceos (BARRETO et al., 2010) e dos Sirênios (LUNA et al., 2011).
Uma das formas de mostrar para as comunidades, que convivem nas áreas de ocorrência de
mamíferos marinhos, a importância da conservação dessas espécies é através da alternativa de renda
que a presença desses animais pode gerar com o ecoturismo. Por serem animais bastante
362
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

carismáticos e relativamente fáceis de serem avistados em seu ambiente natural, os cetáceos têm
sido alvo de crescente demanda por interação (REEVES et al., 2003), e vem apresentando um
reconhecido valor socieconômico servindo como base para o desenvolvimento do ecoturismo em
várias partes do mundo (LODI; BOROBIA, 2013).
O turismo de observação de cetáceos, conhecido como whale whatching, já existe no Brasil,
com destaque para a observação de baleias jubartes na Bahia, baleias francas em Santa Catarina, e
observação de golfinhos-rotadores no arquipélago de Fernando de Noronha (LODI; BOROBIA,
2013). O turismo de observação de peixes-bois, entretanto, é uma atividade que vem tendo destaque
recente no Brasil, no modelo de Turismo de Base Comunitária - TBC (GONZAGA; IZIDORO,
2016). No TBCa gestão da visitação é protagonizada pela comunidade, gerando benefícios
coletivos, promovendo a vivência intercultural, a qualidade de vida, a valorização da história e da
cultura dessas populações, bem como, a utilização sustentável para fins recreativos e educativos,
dos recursos da unidade de conservação (ICMBio, 2017). As comunidades tradicionais residentes
em unidades de conservação estão encontrando no TBC alternativas de renda, oportunidades de
valorização da própria cultura e formas de integrar os jovens ao modo de vida local (ICMBio,
2017).
O município de Jequiá da Praia possui uma unidade de conservação de uso sustentável, a
Reserva Extrativista Marinha da Lagoa de Jequiá. A Reserva possui atributos biológicos favoráveis
para possíveis reintroduções de peixes-bois marinhos (comunicação pessoal). No caso, da
concretização dessas reintroduções, seria essencial a inclusão da comunidade nesse processo. A
ocorrência pacífica dos mamíferos marinhos, considerados da fauna carismática, com a comunidade
local pode representar também oportunidades de desenvolvimento econômico e regional através do
turismo de observação. O objetivo deste trabalho foifazer o levantamento do potencial turístico para
a observação de mamíferos marinhos no município de Jequiá da Praia (AL).

2. MATERIAL E MÉTODOS
O estudo ocorreu em Jequiá da Praia que dista 65 km de Maceió. O município é um dos
roteiros turísticos de sol e praia do estado de Alagoas, apresentando pousadas, restaurantes,
complexo de lazer em atrativos naturais com capacidade de permitir ao visitante a oportunidade de
observação de animais silvestres.
A pesquisa foi realizada por meio de entrevistas direcionadas a turistas que visitaram
atrativos do município, Dunas de Marapé e a praia de Duas Barras. As entrevistas foram aplicadas
por exaustão não-probabilística de acordo com a disponibilidade e o interesse em participar da
pesquisa. Um formulário semiestruturado, contendo questões fechadas e abertas, foi utilizado

363
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

permitindo flexibilidade no andamento da entrevista. Os formulários foram elaborados após


profunda pesquisa bibliográfica relacionada aos temas: atividades turísticas e ecoturismo.
Todas as entrevistas foram realizadas individualmente no intuito de evitar possíveis
interferências de outras pessoas nas respostas do entrevistado. As respostas que apresentaram
similaridade de conteúdo foram agrupadas em categorias, possibilitando a realização de análises
estatísticas descritivas e de porcentagens.
Esse estudo foi submetido e aprovado pelo comitê de avaliadores do Sistema de Autorização
e Informação em Biodiversidade – SISBio (nº60012-1).

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
No período de novembro de 2017 a março de 2018, 111 turistas foram entrevistados. Entre
os turistas 53% foram do gênero feminino e 47% do gênero masculino. A maior parte dos
entrevistados apresentaram escolaridade de nível superior, e renda familiar entre cinco a sete
salários mínimos.
Quando perguntados sobre quantas pessoas da família vieram ao passeio 30% deles
responderam que estavam sozinhos; 25% estavam em duas pessoas; 25% estavam em três pessoas;
enquanto 20% responderam estar com quatro ou mais pessoas da mesma família.
Verificamos que 79% dos turistas nunca fizeram passeios para observação de mamíferos
marinhos. Entre os entrevistados, 94% disseramque sentiriam felicidade caso vissem um desses
animais. A maior porcentagem dos turistas (92%) respondeu que voltaria à Jequiá da Praia para
fazer um passeio de observação de mamíferos marinhos, caso o município oferecesse esse tipo de
atrativo turístico.
Quando perguntados sobre o valor que estariam dispostos a pagar por um passeio desse
tipo,14% dos entrevistados afirmaram estar dispostos a pagar valores inferiores a R$50,00; 52%
declararam que pagariam até R$ 50,00 (justificando que é o valor médio de outros passeios na
região), enquanto 35% estariam dispostos a pagar valores superiores a R$50,00.
Setenta e quatro por cento dos turistas acreditam que esse tipo de passeio traria benefícios
para a comunidade, 11% acredita que não e 15% diz que depende da forma como isso seria feito. E
sobre acreditar que esse tipo de passeio traria benefícios ou prejuízos para os animais, 48% acredita
que traria benefícios, 24% respondeu que isso depende de como esse trabalho será feito e 28%
acredita que traz prejuízo aos animais.

4. CONCLUSÃO
Os resultados da pesquisa demostraram haver interesse por parte dos turistas peloturismo de
observação de mamíferos marinhos na RESEX Marinha de Jequiá da Praia. Na comunidade, 95%
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

dos barqueiros que trabalham com o turismo na região acham que a presença desses animais traria
benefícios; enquanto 50% dos pescadores e 50% dos comerciantes locais acreditavam que presença
desses animais seria benéfica para a comunidade (SILVA; ROMERO; IZIDORO, 2018). Para que
esse tipo de atrativotenha uma função social, é fundamental a capacitação da população local para
ocupar os postos de serviços deste setor (SILVA-JR, 2017). Consequentemente, assegura-se o
sentimento de pertencimento desses animais à região e sua proteção por parte da comunidade. Esse
tipo de turismo pode ser positivo e favorável para a tomada de conscientização ambiental dos
participantes; além de gerar ganhos econômicos para a população local.
Assim como Bentz et al. (2016), acreditamos que o turismo de vida selvagem marinha pode
beneficiar a conservação e a comunidade local, em Jequiá da Praia, desde que seja gerido de acordo
com os princípios de sustentabilidade.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao Instituto Federal de Alagoas pelo fornecimento da bolsa para a aluna
orientada através do edital Nº 03 PRPI/IFAL, de 2017 e pelos veículos disponibilizados para a
realização da pesquisa. Agradecemos também às analistas do ICMBio em Jequiá da Praia que
auxiliaram nas coletas de dados, no transporte e alimentação da bolsista.

6. REFERÊNCIAS
BARRETO, A. S.; CAMPOS, C. C. R.; ROSAS, F. W.; SILVA JÚNIOR, J. M.; ROSA, L. D.;
FLORES, P. A. C.; SILVA. V. M. F. Plano de ação nacional para a conservação dos mamíferos
aquáticos: pequenos cetáceos. Brasília: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio), Série Espécies Ameaçadas, 18, 2010. 132p.

BENTZ, J.; LOPES, F.; CALADO, H.; DEARDEN, P. Sustaining marine wildlife tourism through
linking Limits of Acceptable Change and zoning in the Wildlife Tourism Model. Marine Policy, v.
68, p. 100-107, 2016.

INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE - ICMBio. Livro


Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção: Volume II – Mamíferos / -1. ed. --
Brasília, DF: ICMBio/MMA, 2018.

INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE - ICMBio.


Turismo de Base Comunitária em Unidades de Conservação Federais: Princípios e Diretrizes.
Brasília: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), 2017.

LIMA, R. P. Distribuição espacial e temporal de peixes-bois (Trichechus manatus)


reintroduzidos no litoral nordestino e avaliação da primeira década (1994-2004) do programa
de reintrodução. 2008. 161 f. Tese (Doutorado em Oceanografia). Universidade Federal de
Pernambuco, Recife, 2008.

365
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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366
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

VOLUNTARIADO NO PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DOS


GUIMARÃES
VOLUNTEERING IN CHAPADA DOS GUIMARÃES NATIONAL PARK

Cintia Maria Santos da Camara Brazão*, Carolina Potter de Castro, Franciane dos Santos Silva

Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Parque Nacional da Chapada dos Guimarães*

1. INTRODUÇÃO
O Parque Nacional da Chapada dos Guimarães (PNCG) foi criado em 12 de abril de 1989
após grande movimento da sociedade civil datado do início dos anos 1980. Diversos eventos e
campanhas foram desenvolvidos por artistas, imprensa, intelectuais do estado de Mato Grosso, além
de organizações não governamentais, para que o parque nacional fosse criado (ICMBio, 2009).
Historicamente, a gestão do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, contou com apoio
de voluntários ligados a algumas das organizações não governamentais que estiveram a frente do
processo de criação da unidade de conservação, em especial a Associação para Recuperação e
Conservação Ambiental – ARCA e a Associação Matogrossense de Ecologia – AME MT.
As primeiras regulamentações de voluntariado envolvendo a gestão ambiental datam dos
anos 2000: em 2001 a Instrução Normativa do IBAMA que trata dos agentes ambientais
voluntários; em 2002 a regulamentação a partir do Decreto 4.519/2002 e, em 2005 a Portaria do
Ministério do Meio Ambiente que trata de voluntariado em unidade de conservações (ICMBio,
2017). Mais recentemente, 2009 e 2016, foram publicas as portarias do ICMBio sobre seu Programa
de Voluntariado (ICMBio, 2017).
O presente trabalho tratará do voluntariado no Parque Nacional da Chapada dos Guimarães a
partir da institucionalização do Programa de Voluntariado do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade – ICMBio.

2.MATERIAL E MÉTODOS
Localizado no bioma Cerrado, ao sul do estado de Mato Grosso, o Parque Nacional da
Chapada dos Guimarães (PNCG) possui uma área de 32.630 hectares, entre os munícipios de
Cuiabá (62% da área total) e Chapada dos Guimarães (38% da área total).
Com o objetivo legal de proteger e preservar amostra dos ecossistemas nele existente, o
PNCG assegura a preservação de recursos naturais e sítios arqueológicos, além de proporcionar
oportunidades controladas para uso pelo público, educação, pesquisa científica (Brasil, 1989).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Em 2013 o PNCG aderiu ao Programa de Voluntariado do ICMBio, na época regulamentado


pela Instrução normativa nº 03 de 02 de setembro de 2009 e vinculado a Coordenação-geral de
Proteção Ambiental. A adesão ao programa deu-se devido a necessidade de melhor orientar os
visitantes da unidade de conservação, sendo o uso público o principal eixo temático trabalhado
pelos voluntários.
Em 2016, quando o programa passou ser coordenado pela Coordenação Geral de Gestão
Socioambiental e regido pela Instrução Normativa 03 de 10 de maio de 2016, foi renovado o
interesse da unidade de conservação em permanecer no programa.
Neste trabalho serão apresentados os resultados do programa de voluntariado após a
publicação da Instrução Normativa 03 de maio de 2016.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Desde 2016, o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães tem voluntários em cinco eixos
temáticos do programa de voluntariado: (i) uso público - com trabalhos relacionados a orientação de
visitantes, manejo de trilhas e sinalização; (ii) proteção ambiental - trabalhando, principalmente,
com monitoramento de áreas de queima prescrita e apoio logístico durante combate a incêndios
florestais; (iii) pesquisa e monitoramento - programa que proporciona troca entre voluntários e
pesquisadores durante trabalhos de campo; (iv) gestão participativa e educação ambiental –
atividades de apoio a reuniões de conselho e acompanhamento de escolas em aula de campo; (v)
gestão da informação – auxílio em trabalhos de organização de arquivos, contagem de número de
visitantes.
O número de pessoas que procurou o parque para prestar serviço voluntário aumento desde
2016 até 2018, conforme Figura 01.

Figura 01: Número de voluntários no PNCG entre os anos de 2016 e 2018 (Fonte: ICMBio -Relatório Anual
do Programa do PNCG - 2016, 2017 e 2018).

O número de horas de trabalhadas de forma voluntária também aumentou, conforme Figura


02.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 02: Número de horas trabalhadas por voluntários no PNCG entre os anos de 2016 e 2018 (Fonte:
ICMBio -Relatório Anual do Programa do PNCG - 2016, 2017 e 2018).

O eixo temático com o maior número de horas trabalhadas é o de uso público, passando de
48,51% em 2016 para 73% do total de horas de serviço voluntário nos anos seguintes (Figura 03).

Figura 03: Percentual de horas trabalhadas de acordo com cada eixo temático no PNCG entre os anos de
2016 e 2018 (Fonte: ICMBio -Relatório Anual do Programa do PNCG - 2016, 2017 e 2018).

Dau e Oliveira (2015), apresentam que o número de vagas disponibilizadas anualmente para
o serviço de voluntariado por linha temática, em todo ICMBio, passou de zero em 2009 para o eixo
temático de uso público para 1047 em 2014, sendo o tema com maior número de vagas
disponibilizadas. Pellin et al. (2017), apontam que o uso público é uma das linhas temáticas que
mais se destacam com 35% do total de atividades desenvolvidas durante o voluntariado nas
unidades do ICMBio.
Os Parques Nacionais têm como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de
grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a recreação em contato com a natureza e
o turismo ecológico (Brasil, 2000), dentre outras atividades. O número de visitantes do PNCG
também aumentou no mesmo período, passando de 158.365 em 2016 para 179.709 em 2018,
aumentando a necessidade de recepção e orientação do visitante ao chegar a unidade de
conservação. Dau e Oliveira. (2015), destacam que a existência de um atrativo específico em uma
determinada unidade de conservação justifica a adesão ao programa de voluntariado.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Em pesquisa feita por Pellin et al. (2018), 47% dos entrevistados foram gestores de parques
nacionais, demonstrando que esta categoria de unidade de conservação tem maior adesão ao
programa do que outras unidades organizacionais, o que sugere um maior número de pessoas
atuando como voluntários.
Os voluntários do PNCG, além das atividades de uso público, também desenvolvem outras
atividades, como o monitoramento de queimas prescritas estabelecidas no planejamento de manejo
integrado do fogo, dentro da linha temática de proteção; acompanhamento de pesquisadores e
monitoramento de animais atropelados na MT 251, na linha temática de pesquisa e monitoramento;
participação de reuniões do conselho consultivo e ações com as escolas que visitam o parque, no
eixo temático de gestão participativa e educação ambiental; apoio a algumas atividades
administrativas, como é o caso da sistematização de dados, no que diz respeito ao eixo de gestão da
informação.
O trabalho voluntário tem sido uma grande ferramenta para aproximar a sociedade da gestão
das unidades de conservação, ampliando o conhecimento da sociedade sobre elas, além do
sentimento de pertencimento da comunidade local.

4. CONCLUSÃO
O PNCG aderiu ao programa de voluntariado do ICMBio em 2013, tendo, desde então, o
uso público como principal eixo temático desenvolvido pelos voluntários. Os voluntários, dando
informações qualificadas aos visitantes, fazem com que o visitante tenha uma melhor experiência
durante sua visita.
O aumento do número de voluntários neste eixo temático tem sido de grande importância
para a gestão da unidade de conservação, tendo em vista que a visitação do parque também aumento
nos últimos anos.
A participação social, por meio do voluntariado, vem crescendo ano após ano no PNCG,
demonstrando o interesse da sociedade em contribuir com a gestão da unidade de conservação e
dedicar seu tempo a causa voluntaria.
Ações nos demais eixos temáticos podem ser aprofundadas, fazendo com que mais pessoas
também queiram participar do programa de voluntariado no Parque Nacional da Chapada dos
Guimarães.

5. AGRADECIMENTOS
Aos voluntários do PNCG por sua dedicação a unidade de conservação. Aos servidores do
PNCG que contribuem com o desenvolvimento do programa de voluntariado na unidade.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6. REFERÊNCIAS
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Programa do PNCG. Chapada dos Guimarães/MT: ICMBio, 2016.

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Programa do PNCG. Chapada dos Guimarães/MT: ICMBio, 2017.

ICMBio - Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Relatório Anual do


Programa do PNCG. Chapada dos Guimarães/MT: ICMBio, 2018.

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Guia de Gestão. Brasília, 2017.

PELIN, A.; GOMES, B.N.; SILVA, C.H.; FIGUEIREDO, C.R.; BOAVENTURA, F.B.; CASTRO,
C.T.; PRADO, F.; CHIARAVALLOTI, R.M.; VALLADARES-PADUA. Avaliação da percepção
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conservação. Anais... In: IX Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, 2018.

PELIN, A.; GOMES, B.N.; SILVA, C.H.; FIGUEIREDO, C.R.; BOAVENTURA, F.B.; CASTRO,
C.T.; PRADO, F.; CHIARAVALLOTI, R.M.; VALLADARES-PADUA, C. Voluntariado em
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1182, 2017.

371
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

OBSERVAÇÃO DE AVES EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO:


PERSPECTIVAS NO REFÚGIO DE VIDA SILVESTRE ESTADUAL DA
LAGOA DA TURFEIRA
BIRDWATCHING IN CONSERVATION UNITS: PROSPECTS IN LIFE REFUGE SILVESTRE
LAGOA DA TURFEIRA

Graziele Noronha dos Santos (Autora)*, Rodrigo Machado Vilani (Professor orientador)*
Programa de Pós-Graduação em Ecoturismo e Conservação, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Brasil*

1. INTRODUÇÃO
O ecoturismo tem se inserido, cada vez mais, nas políticas nacionais de promoção do
desenvolvimento econômico e social, sobretudo nas áreas protegidas (ALBERNAZ, 2003), e uma
das modalidades que mais cresce no mundo é a observação de aves. Para que ela ocorra pressupõe-
se a necessidade de ambientes favoráveis à existência de avifauna e por isso a atividade é
considerada uma aliada da conservação (FIGUEIREDO, 2003).
A grande diversidade de ambientes encontrados no Brasil e a rica avifauna associada a eles
propicia a realização da atividade em todas as regiões, principalmente nas unidades de conservação
(UC) que se destacam como destinos preferenciais pelos praticantes da atividade, embora poucas
estejam efetivamente estruturadas para receber o público específico e incluam a observação de aves
como uma atividade turística (PINHEIRO, 2019).
Esse é o caso do Refúgio de Vida Silvestre Estadual da Lagoa da Turfeira (REVISTUR),
uma UC de proteção integral localizada no município de Resende (RJ) que tem como uma das
estratégias de ação elencada pelo seu plano de manejo, o incentivo ao turismo e à atratividade da
unidade para o município a partir de sua consolidação como um centro de referência na observação
de aves na região. Nesse sentido objetivo do estudo é analisar a observação de aves no Revistur e o
presente trabalho ocupa-se em apresentar os resultados parciais de uma pesquisa de mestrado que
ainda está em curso.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A metodologia consistiu em uma revisão da literatura sobre a observação de aves levando-se
em consideração sua relação com o ecoturismo e conservação, além de participação em seminários
sobre a temática, visitas em campo e principalmente conversas informais com a gestão do
REVISTUR para alinhamento dos objetivos da pesquisa com os objetivos e demandas reais da UC.
Assim, concordou-se que para o presente estudo o foco é o “Programa de Visitação” de seu plano

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de manejo, mais especificamente ao “objetivo estratégico 1” que consiste em “implantar o turismo


de observação de aves” para “ser reconhecido como importante ponto de observação de aves na
região”.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O ecoturismo é composto por atividades turísticas que, além de voltar-se para os atrativos
naturais e valores culturais dos destinos enquanto atrativos, comprometem-se também com os
aspectos de conservação, manejo e sustentabilidade das áreas naturais, incluindo a participação
ativa das comunidades locais e difundindo a consciência ecológica (PIRES, 1998).
Para Irving (2018) é necessário que se avance no enfoque de conservação da biodiversidade
em conjunto com o desenvolvimento de estratégias econômicas de baixo impacto ambiental – e o
ecoturismo constitui um dos caminhos nessa direção. Entre os muitos segmentos do ecoturismo, a
observação de aves se destaca por ser uma atividade de recreação ao ar livre, economicamente
viável, educacional e compatível com a conservação ambiental (FARIAS, 2006). Desta forma é
considerada uma das atividades de observação de fauna mais tradicionais praticada em todo o
mundo, sobretudo pela facilidade de avistamento (FARIAS e CASTILHO, 2006), inclusive em
áreas urbanas, salvo as espécies mais raras.
O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking de números de espécies registradas no mundo
totalizando 1.919 espécies catalogadas (CBRO, 2015), o que significa possuir 57% das espécies
encontrada na América do Sul, 10% são endêmicas no território nacional, 1.035 são encontradas na
Mata Atlântica e 784 estão no Estado do Rio de Janeiro (MARINS, 2019) - o que justifica o
aumento da participação das pessoas nos eventos de birdwatching. De acordo com Farias e Castilho
(2006), esse cenário faz do país um destino com grande potencial ecoturístico para a observação de
aves, no entanto, ainda é pouco representativo no Brasil, necessitando de pesquisas e investimentos
para orientar sua implantação de modo sustentável (PIVATTO e SABINO, 2007).
No Estado do Rio de Janeiro o Programa Vem Passarinhar – PVP/RJ que teve sua primeira
edição em 2015, é uma iniciativa do Instituto Estadual do Ambiente – INEA com o objetivo de
estimular a atividade de observação de aves nas unidades de conservação sob gestão do órgão. Entre
2015 e setembro de 2019, das 36 UCs geridas pelo INEA, 20 foram contempladas pelo PVP/RJ
com a participação de 1.136 pessoas que puderam observar 507 espécies de aves (56% das espécies
do Estado do RJ) (MARINS et al, 2018). No levantamento dos registros ao longo desses 4 anos,
todas as UCs que receberam sua edição tiveram novas espécies incluídas nas listagens oficiais e 12
novos registros para o Estado do RJ, mostrando que a ciência cidadã pode contribuir com a
produção de conhecimento e, nesse caso, com a conservação da natureza (MARINS et al, 2018).
Iniciativas como esta têm sido cada vez mais difundias no país e despertado a atenção dos órgãos
373
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

públicos para a possibilidade do fomento ao segmento como um produto turístico responsável,


promotor de ciência cidadã e aliado da conservação. Um exemplo desse olhar foi o Seminário de
Observação de Aves e Turismo promovido em conjunto no mês de agosto deste ano pela Secretaria
de Estado do Ambiente e Sustentabilidade, Secretaria Estadual de Turismo e o Instituto Estadual do
Ambiente no Rio de Janeiro.
O Refúgio de Vida Silvestre Estadual da Lagoa da Turfeira foi criado pelo Decreto n°
45.574 de 03 de dezembro de 2016 como exigência de um Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC) assinado entre o Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Estado do Rio de
Janeiro, Instituto Estadual do Ambiente, Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do
Rio de Janeiro e a Nissan do Brasil Automóveis Ltda. O TAC foi resultado de um dos conflitos
mais emblemáticos que marcou a história da área com o processo de instalação de uma fábrica da
Nissan que em 2012 chegou a iniciar suas obras de terraplanagem sobre parte das lagoas ao redor
do espelho d’água principal. Cabe ressaltar que a mobilização de biólogos e observadores de aves
locais empenhados em demonstrar a importância da conservação da lagoa da Turfeira através de
registros da avifauna foi fundamental para justificar a importância da criação de uma UC que
protegesse esse ecossistema (RIO DE JANEIRO, 2018). O TAC assegurou ainda a implementação
da UC, cabendo à Nissan o financiamento do plano de manejo e dos projetos de engenharia e
arquitetura da infraestrutura administrativa do REVISTUR, além de fornecer apoio financeiro no
valor de R$ 250 mil reais para implantação de infraestrutura básica necessária para o funcionamento
adequado de suas atividades (MPF, 2014).
De acordo com seu plano de manejo aprovado em 2018, a ocorrência de elevado número de
espécies na localidade (172 espécies de aves registradas das quais 8 estão ameaçadas de extinção e
3 estão são consideradas vulneráveis no Estado do RJ) demonstra a relevância ambiental do
fragmento que funciona como suporte, alimentação e reprodução de diversas aves durante seu ciclo
de vida, inclusive associadas a processos migratórios, além de espécies de peixes, répteis e
mamíferos. Ademais, a lagoa da Turfeira, que nomeia a UC, é um dos últimos remanescentes
naturais das áreas úmidas que antes se estendiam por toda várzea do Rio Paraíba do Sul e, ainda que
tenha sofrido com pressões antrópicas, é importante para a biodiversidade local, principalmente
para a avifauna aquática (RIO DE JANEIRO, 2018). Na edição do PVP/RJ, que ocorreu em
fevereiro de 2019 na UC, foram avistadas 55 espécies de aves, por 21 participantes que estiveram
presentes. O REVISTUR também contribuiu com um registro inédito para o Estado do RJ, em
setembro de 2018, com o avistamento do “Papa-moscas-canela” (Polystictus pectoralis), uma
espécie migratória na região (WIKIAVES, 2018).
O plano de manejo elenca como visão da UC, ser um centro de referência na observação de
aves, polo de educação e vivência ambiental. Seu Volume II versa sobre o planejamento e o
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

capítulo 6 apresenta os Planos Setoriais dos quais um deles é o Plano Setorial de Visitação que tem
como foco dos atrativos turísticos a observação de aves. Este plano traz três programas e o presente
estudo debruça-se sobre o Programa de Visitação, mais especificamente quanto ao “objetivo
estratégico 1” que é “implantar o turismo de observação de aves” para “ser reconhecido como
importante ponto de observação de aves na região".
A partir de visitas em campo foi possível observar que atualmente a UC ainda não conta
com sede própria, infraestrutura física e equipamentos no local. A infraestrutura disponível utilizada
é compartilhada pelo Refúgio de Vida Silvestre do Médio Paraíba (REVISMEP) no município de
Valença (RJ) que dista cerca de 110km do REVISTUR. Este cenário desfavorece tanto as atividades
básicas da UC, quanto ao alcance dos objetivos do Programa de Visitação de forma efetiva. No
entanto, além de receber anualmente uma edição do PVP/RJ, a equipe da unidade também tem
realizado atividades junto a escolas municipais próximas, para divulgar a importância das áreas
úmidas, da fauna local e da área protegida como um todo.

4. CONCLUSÃO
Pelo que foi exposto anteriormente, a revisão da literatura apontou que o ecoturismo como
estratégia de conservação vem ganhando notoriedade nas três esferas da agenda pública e a
observação de aves tem se mostrado uma possibilidade dessa atividade. Assim, ela assume grande
importância no que tange à contribuição com o alcance dos objetivos das unidades de conservação
e, a partir da ciência cidadã, tem estimulado o poder público a olhar para a atividade como um elo
entre turismo, meio ambiente e educação.
Embora o REVISTUR ainda não tenha infraestrutura própria e bases de apoio para que as
atividades de observação de aves sejam efetivamente implementadas na UC, o aumento de
iniciativas que estimulam o segmento principalmente com o apoio do poder público, aliado a
relevância ambiental da área, contribui para que a área protegida em questão alcance seu objetivo de
ser uma referência regional em birdwatching.

5. REFERÊNCIAS
ALBERNAZ, P. C. Ecoturismo como Instrumento de Conservação Ambiental e Viabilidade
Econômica para RPPNs: um estudo de caso na VSV Vagafogo. Monografia (Especialização).
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FARIAS, G. B. A observação de aves como possibilidade ecoturística. Revista Brasileira de


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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FARIAS, G. B.; CASTILHO, C. J. M. Observação de aves e o ecoturismo em Itamaracá (PE):


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376
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O DESAFIO DA PROMOÇÃO DE GESTÃO INTEGRADA NO PARQUE


NACIONAL DO PICO DA NEBLINA
THE CHALLENGE OF INTEGRATED MANAGEMENT PROMOTION IN THE PICO DA
NEBLINA NATIONAL PARK

Luciana Yukari Uehara *

Parque Nacional do Pico da Neblina, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, Brasil *

RELATO DE EXPERIÊNCIA
Localizado no noroeste amazônico, o Parque Nacional do Pico da Neblina foi criado em 05
de junho de 1979, com área de 2.252.616,84 hectares, é entremeado e sobreposto a um complexo
mosaico de áreas protegidas. Abrange dois municípios: São Gabriel da Cachoeira e Santa Isabel do
Rio Negro, no estado do Amazonas.
O PARNA foi criado dentro de uma estratégia de ocupação da fronteira norte,
desconsiderando a existência de grupos indígenas em seu interior, gerando conflitos relacionados
ao uso de recursos naturais e do território. O Pico da Neblina localiza-se na área de sobreposição
entre a Terra Indígena Yanomami (TIY) e o Parque Nacional. Os Yanomami batizaram o local de
Yaripo, que significa Serra dos Ventos. As tensões se acirraram quando o IBAMA, na década de
1990, decidiu estimular o turismo na unidade sem promover o envolvimento dos grupos indígenas
até que, em 2003, denúncias sobre conflitos entre turistas e o povo Yanomami, feitas ao Ministério
Público Federal (MPF), culminaram na suspensão da visitação ao Parque enquanto a unidade não
contasse com um plano de manejo, recomendação acatada pelo IBAMA à época com o
fechamento oficial da UC, até o presente não suspenso.
Complementarmente, o movimento indígena conseguiu a demarcação de quatro terras em
regime de sobreposição ao PARNA: Balaio, Cué-Cué Marabitanas, Médio Rio Negro II e
Yanomami. O Parque apresenta 71,6% de sua área total sobreposta a quatro Terras Indígenas. São
aproximadamente 5 mil moradores, em 46 comunidades situadas nessas terras indígenas que
abrigam elevada sociodiversidade. As etnias presentes nessas comunidades são: Yanomami,
Tukano, Tuyuka, Dessano, Baniwa, Koripaco, Carapanã, Baré, Tariano, Piratapuya, Yepamasã,
Kobewa e Werekena.
Após a criação do ICMBio, em 2007, paulatinamente procurou-se adotar uma estratégia de
gestão para esta UC que interiorizasse a questão da ocupação indígena local, tendo como
pressuposto o caráter participativo nesse processo. O apaziguamento de conflitos foi iniciado a

377
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

partir de diálogos dos gestores com o povo Yanomami, com destaque para: formação do Conselho
Consultivo em 2012 (BOCARDE; RAMOS; UEHARA, 2015); capacitação na Política Nacional de
Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas – PNGATI e PA para conselheiros indígenas
(RAMOS; BOCARDE; UEHARA, 2015); o ordenamento do ecoturismo ao Pico da Neblina a partir
de 2013 e a criação da Câmara Temática do Ecoturismo em 2014, vinculada ao Conselho.
A Câmara Temática possibilitou a realização de esclarecimentos sobre o ecoturismo, com
debates, capacitações e aprendizados para todos (participantes Yanomami e representantes das
instituições ICMBio, FUNAI, ISA e colaboradores). Deu arcabouço teórico e prático para a
elaboração do Plano de Visitação Yaripo, finalizado em 2017. Em 2018 é publicada a Portaria nº
458, através do qual o ICMBio aprova o Plano de Visitação Yaripo (disponível para acesso em:
http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/biodiversidade/plano_de_visitacao_parna_pico_da_
neblina.pdf). A atividade ainda não está liberada devido à necessidade de emissão de carta de
anuência pela FUNAI.
Concomitantemente, há a elaboração do Plano de Manejo do Parque Nacional do Pico da
Neblina, iniciado em 2015, com a construção do Desenho de Planejamento de Projeto – DPP.
Considerando a sobreposição territorial, a premissa do Plano de Manejo é a conciliação com os
Planos de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas - PGTA’s, iniciativa inovadora na
instituição, visando a gestão integrada de áreas protegidas. A elaboração dos PGTA's na região do
Rio Negro iniciou-se com a realização de oficinas nas comunidades no final de 2015, com previsão
de conclusão dos documentos em 2019. Os PGTA’s são ferramentas de implementação da Política
Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas – PNGATI, prevista pelo Decreto
7747/2012.
Como o Parque Nacional do Pico da Neblina apresenta 25% da área total de sobreposição
territorial no Brasil, faz-se necessária a elaboração de planos conjuntos, não ignorando e ressaltando
a necessidade do Plano de Manejo. Em 2018, foram realizadas reuniões nas 4 Terras Indígenas com
interface territorial ao Parque: Balaio, Cué-Cué Marabitanas, Médio Rio Negro II e Yanomami.
Também foi realizada a Oficina de Elaboração do Plano de Manejo com participação de
representantes indicados das TI's e instituições para construção do PM, sendo a maioria constituída
por representantes do Conselho Consultivo. Em maio/2019, foi feita a Oficina de Devolutiva do
Plano de Manejo, para apresentar o documento elaborado aos representantes a partir dos subsídios
obtidos na primeira oficina e realizar complementações.
Outro fator motivador é relacionado a uma potencialidade do PARNA, o uso público. Este,
quando bem planejado e ordenado, contribui para o cumprimento dos objetivos que fundamentam a
criação de muitas das unidades de conservação. Como essa atividade é também uma demanda da
Terra Indígena, o tema apresenta-se como possibilidade de construção de agenda positiva e de
378
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

superação dos conflitos históricos. Atendendo a anseios da população Yanomami, o Parque


Nacional do Pico da Neblina, através da criação da Câmara Temática do Ecoturismo, vinculada ao
Conselho Consultivo da UC, está realizando atividades de ordenamento da visitação e planejamento
do ecoturismo, almejando a capacitação das comunidades para gestão da atividade, quando esta for
liberada. Trata-se de uma iniciativa para evitar conflitos e propor alternativa ao garimpo, à caça e à
pesca ilegais na região, inserindo toda a comunidade, visto que abrange toda a cadeia de atividades
relacionada ao ecoturismo. Em estudo há a proposta para a realização de monitoramento da
biodiversidade e impactos da visitação, considerando a relevância da região em termos de endemia
de espécies da fauna e da flora e a minimização dos impactos das atividades de uso público.
Foram 87 atividades (cursos, conferências, assembleias, oficinas e reuniões) realizadas
desde janeiro de 2015 relacionadas à construção conjunta e participativa dos instrumentos de gestão
das áreas protegidas (PGTA’s, Planos de Visitação e Plano de Manejo). Há planejamento para mais
atividades, sendo este número contabilizado em setembro/2019.
Há enorme débito do Estado brasileiro com os povos indígenas, historicamente explorados,
dizimados por genocídios; ainda hoje enfrentam inúmeras ameaças ao território e aos direitos
arduamente conquistados, apartados de políticas públicas eficazes, negligenciados pelas diversas
esferas de governo. O processo de construção participativa do Plano de Manejo, apesar das
limitações metodológicas, possibilita aos representantes indígenas reescrever sua história e a do
Parque Nacional do Pico da Neblina. A premissa do Plano de Manejo de compatibilizar os
instrumentos de gestão é baseada na lida empírica de um “parque indígena”. As iniciativas do
Parque Nacional do Pico da Neblina buscam a harmonização interpretativa da legislação brasileira
pertinente à temática da sobreposição territorial.
Verificou-se que ferramentas de gestão - Plano de Visitação, Plano de Manejo e PGTA’s, ao
serem empregadas no conjunto de áreas protegidas, tem a ação de contribuir para o diálogo entre os
gestores de unidades de conservação (ICMBio) e de Terras Indígenas (FUNAI) e a sociedade civil,
as comunidades indígenas, FOIRN, ISA, ONGs, mediando e minimizando os conflitos.
Houve fortalecimento do Conselhos Consultivo da UC com a criação da Câmara Temática
do Ecoturismo, pela participação da sociedade civil nesses espaços públicos de diálogo, com
levantamento das atuais demandas das comunidades e instituições, ao promover reflexões e ações
relativas ao meio ambiente e suas diversas formas de uso, a sobreposição territorial, a geração de
renda sustentável, o empoderamento das comunidades indígenas. É um meio para promover o
desenvolvimento de atividades econômicas e produtivas, que além de garantir a subsistência dos
envolvidos nessas atividades, apresenta como potencial colaborar com a conservação do meio
ambiente e cultural por meio da participação social.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A principal dificuldade é ser o parque um “NGII - Núcleo de Gestão Individual e Isolada”,


sem recursos próprios da UC, em localidade remota e com gestão de alta complexidade. Enfrentam-
se muitos entraves: ausência e/ou insuficiência de apoio institucional; dificuldades quanto à gestão,
administração, regulação fundiária, proteção; recursos financeiro e humano exíguos; inadequação
de metodologias e instrumentos de monitoramento e manejo ao contexto local.
O desafio reside em como administrar as áreas protegidas e sobrepostas, com diferentes
níveis de impasses entre os atores envolvidos. Soma-se a necessidade de criar, manter e fortalecer
relações internas e entre instituições, nos âmbitos local e nacional.
O objetivo da promoção da gestão integrada e participativa na área de sobreposição
territorial é “ampliar” os limites da UC e das TI’s, compatibilizando a conservação ambiental com a
valorização da sociobiodiversidade, empregando o desenvolvimento sustentável no contexto
regional. Com isso, as áreas protegidas podem ser geridas de forma mais integrada, visando ampliar
a escala de planejamento territorial, realçando a importância da conservação da biodiversidade,
incentivando práticas de manejo mais apropriadas, e reduzindo os impactos negativos das atividades
antrópicas.
Existem ainda muitos desafios de gestão, conflitos persistem, recursos são exíguos para
realização do planejamento e execução de atividades do Parque Nacional do Parque Nacional do
Pico da Neblina. Todavia, mantem-se a perseverança nas ações almejando a superação dos
obstáculos, buscando melhorias na gestão e na relação institucional, com as parcerias e as
populações indígenas. A conciliação aumenta as chances das áreas protegidas persistirem às
ameaças de interesses econômicos não sustentáveis. Não são desconsideradas as dificuldades
relacionadas ao uso racional dos recursos naturais, porém a introdução e o fortalecimento de
instrumentos de educação ambiental e de participação social fornecem novas perspectivas. Sendo
assim, a gestão do Parque Nacional do Pico da Neblina continua empenhada na estratégia de
implementação da gestão integrada e no desafio de tornar a situação de “dupla afetação” em “dupla
proteção territorial e ambiental”.
Parte deste trabalho foi desenvolvido durante participação da gestora nos II e III CGSA –
Ciclo de Formação em Gestão Socioambiental, programa de capacitação profissional inserido no
Plano Anual de Capacitação – PAC, principal instrumento da Política de Desenvolvimento de
Pessoas do ICMBio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOCARDE, F.; RAMOS, S.M.; UEHARA, L. Y. Governança indígena em áreas de sobreposição
territorial e formação do Conselho Gestor do Parque Nacional do Pico da Neblina. In: Anais do
Seminário de Áreas Protegidas e Inclusão Social – SAPIS. 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BRASIL. Decreto n.º 7747, de 5 de junho de 2012, institui a Política Nacional de Gestão
Territorial e Ambiental de Terras Indígenas - PNGATI. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/decreto/d7747.htm. Acessado em
Setembro/2019.

BRASIL. Portaria ICMBio nº 458, de 9 de maio de 2018, aprova o Plano de Visitação Yaripo no
Parque Nacional do Pico da Neblina. Disponível em
:http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/portarias/portaria_458_de_9_de_maio_de_2018.pd
f. Acessado em Setembro/2019.

RAMOS, S.M.; BOCARDE, F.; UEHARA, L.Y. Comunidades de Ariabu e Maturacá Terra
Indígena Yanomami – AM. Em: Cadernos de Gestão Territorial e Ambiental no Noroeste
Amazônico – Diálogos com a PNGATI. FOIRN – Federação das Organizações Indígenas do Rio
Negro. pp. 75-85. 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PARCERIAS PARA O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO EM ÁREAS


PROTEGIDAS: UM DEBATE SOBRE VALORES PÚBLICOS E OS
DESAFIOS DA RESPONSABILIZAÇÃO
PARTNERSHIPS FOR DEVELOPING TOURISM IN PROTECTED AREAS: A DEBATE ON
PUBLIC VALUES AND THE CHALLENGES OF ACCOUNTABILITY

Camila Gonçalves de Oliveira Rodrigues∗, Fernando Luiz Abrucio ∗∗

∗ Departamento de Administração e Turismo; Programa de Pós-Graduação em Práticas em Desenvolvimento


Sustentável; Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Brasil.
∗∗ Programa de Mestrado e Doutorado em Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas
(EAESP/FGV), Brasil.

1. INTRODUÇÃO
A participação privada, com e sem fins lucrativos, no apoio à gestão da visitação em áreas
protegidas tem sido incentivada e priorizada no contexto das políticas públicas de turismo e
conservação da natureza no Brasil e em diversos países (WYMAN et al., 2011; THOMPSON,
MASSYN & PASTORELLO, 2014; BRAGA, 2013; RODRIGUES & ABRUCIO, 2019).
O termo “parceria” expressa um conjunto de arranjos institucionais para viabilizar a
participação de empresas e organizações da sociedade civil no apoio à gestão do turismo em áreas
protegidas.
Os modelos como concessão, permissão e autorização são utilizados para formalizar a
parceria com entidades privadas com fins lucrativos e são caracterizadas como um negócio para o
setor privado, caracterizando a exploração comercial de parques e demais áreas protegidas
(RODRIGUES & GODOY, 2013).
As parcerias com organizações da sociedade civil, entidades privadas sem fins lucrativos,
visam qualificar os serviços e atividades de apoio à visitação considerando aspectos como a
liderança das iniciativas locais, a educação ambiental e a mobilização social.
Este trabalho tem como objetivo apresentar um panorama da prestação de serviços de apoio
ao turismo em parques nacionais e estaduais (Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro),
considerando o tema da responsabilização (CLAD, 2006) como elemento central para orientar o
planejamento e a implementação de parcerias e concessões. O instrumento de concessão será
destacado ao longo do trabalho em virtude de um maior número de processos que utilizam esse
modelo em âmbito federal e estadual.
A responsabilização é analisada a partir de uma compreensão multidimensional, expressa
em iniciativas, ações e decisões por parte do órgão público na sua relação com a sociedade (CLAD,

382
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2006). Neste sentido, a responsabilização é entendida como um valor público fundamental que,
juntamente com valores como transparência, qualidade, capacidade de resposta, devem orientar as
parcerias no sentido de salvaguardar o interesse público (REYNAERS, 2013).
O trabalho destaca também a recreação em contato com a natureza como um valor público
fundamental que dever ser compreendido e promovido no contexto dos serviços ecossistêmicos
culturais e da conservação do patrimônio natural e cultural em áreas protegidas (MANNING, 2002;
BPES, 2019).

2. MATERIAL E MÉTODO
Para investigar o entendimento dos gestores sobre os mecanismos de responsabilização e
mapear os avanços e desafios da agenda de parcerias e concessões na esfera federal e nos estados do
Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, foram entrevistados dezesseis profissionais que atuam
nas instituições responsáveis pela administração das áreas protegidas no âmbito federal (8 -
ICMBio) e nos estados de São Paulo (3 - governo do estado e da Fundação Florestal), Rio de
Janeiro (3 - Instituo Estadual do Ambiente) e Minas Gerais (2 - governo do estado e Instituto
Estadual de Florestas). A escolha desses estados se deve ao fato de apresentarem iniciativas de
parcerias e concessões nos últimos cinco anos (2014-2018), inspiradas em processos similares.
O recorte da pesquisa considerou apenas os gestores que atuam nos escritórios centrais das
instituições responsáveis pelas áreas protegidas. O trabalho apresenta uma discussão a partir do
ponto de vista de parte dos gestores que atuam nas parcerias e concessões, mas para uma análise
mais aprofundada, outras pesquisas devem abordar os gestores que atuam nos parques que possuem
contratos de concessão vigentes ou em fase inicial de operação.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Inicialmente, foi realizado um levantamento sobre a situação atual das concessões e
parcerias nos parques nacionais e, posteriormente, nos parques estaduais.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) é responsável pela
gestão de 324 unidades de conservação, sendo que 74 parques nacionais, dos quais 4 apresentam
contratos de concessão em estágio avançado, são eles: Parque Nacional do Iguaçu (PR), Parque
Nacional da Tijuca (RJ), Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PE) e Parque
Nacional da Serra dos Órgãos (RJ). Entre o final de 2018 e início de 2019 foram assinados três
contratos de concessão nos Parques Nacionais do Pau Brasil (BA), da Chapada dos Veadeiros (GO)
e do Itatiaia (RJ/MG).
Em Minas Gerais, o Instituto Estadual de Florestas (IEF) é responsável pela gestão de 91
unidades de conservação, sendo que 39 parques estaduais. Em abril de 2019 o governo do estado de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Minas Gerais lançou o “Programa de Concessão de Parques Estaduais 2019-2022”, que inclui o
planejamento para a implementação de serviços de apoio ao turismo, por meio de concessão, em 17
parques estaduais, 2 monumentos naturais e 1 floresta estadual.
O INEA é responsável pela gestão de 35 unidades de conservação, sendo que 11 parques
estaduais. Até setembro de 2019 nenhum parque apresentava contrato de concessão. Contudo, de
acordo com informações fornecidas pelo órgão, estão em andamento os processos de concessão de
serviços para lanchonete e loja de souvenires nos parques estaduais da Pedra Branca e de
Cunhambebe.
No estado de São Paulo, a Fundação Florestal (FF) é responsável por 121 unidades de
conservação, sendo que 36 parques estaduais. Em 2016, o governo do estado de São Paulo editou a
Lei Estadual 16.260, de 29 de junho de 2016, que autoriza a concessão para exploração de serviços
ou uso para o desenvolvimento de atividades inerentes ao ecoturismo e à exploração comercial de
madeira ou subprodutos florestais. Com base nessa lei, a FF está coordenando o processo de
concessão de serviços em alguns parques, como o de Campos de Jordão e da Cantareira.
A participação privada no desenvolvimento do turismo em áreas protegidas tem sido
incentivada no contexto da gestão pública como um alternativa para apoiar a gestão das áreas
protegidas, considerando a conservação da natureza, a melhoria da oferta e da qualidade de serviços
de apoio ao turismo, a geração de receitas para o manejo da visitação e a inserção socioeconômica
das comunidades locais. Mas, em que medida esses propósitos estão sendo alcançados e qual é a
repercussão das parcerias para a sociedade e para o alcance dos objetivos das áreas protegidas?
A partir dos resultados do levantamento junto aos gestores de áreas protegidas, tal
questionamento foi abordado à luz da responsabilização (accountability) no âmbito das parcerias.

4.CONCLUSÃO
Ao longo das entrevistas foi possível identificar duas vertentes da responsabilização. A
primeira diz respeito à responsabilização pela lógica dos resultados, que busca, por meio de
instrumentos como a bonificação vinculada ao desempenho, valorizar indicadores socioeconômicos
e ambientais na prestação de um determinado serviço (RODRIGUES & ABRUCIO, 2019).
A segunda dimensão trata da responsabilização pelo controle social, que visa problematizar
a comunicação (canais de participação, informação, construção, esclarecimento) entre os diversos
setores envolvidos e afetados pelas concessões e demais parcerias.
Aspectos como a prestação de contas para a sociedade e a forma como o Estado monitora e
divulga os resultados das parcerias foram abordados pelos gestores como formas de
responsabilização. Neste sentido, reforçaram o papel dos conselhos gestores das unidades de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

conservação como o local preponderante para o debate crítico e a construção compartilhada de


conhecimento sobre o tema das concessões e parcerias.
Os conselhos devem funcionar como canais de geração de conhecimento e divulgação de
informações e, ao mesmo tempo, instância de tomada de decisão e definição de responsabilidades.
É neste sentido que a responsabilização via controle social tende a gerar uma maior democratização
no processo de implementação de uma política pública (CLAD, 2006).
Por fim, destaca-se que a administração pública está vivenciando uma transição de modelos
de gestão, que tende a gerar uma maior complexidade, sobretudo no que diz respeito ao desafio de
aumentar as capacidades institucionais do Estado para monitorar e ampliar os resultados das
parcerias.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecimento à Fundação Getúlio Vargas / Escola de Administração de Empresas de São Paulo
(FGV/EAESP).

6. REFERÊNCIAS
BPBES. Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos. 1° Diagnóstico
Brasileiro da Biodiversidade & Serviços Ecossistêmicos. Vários autores. Vários colaboradores.
Livro eletrônico. São Carlos/ SP: Editora Cudo, 2019. Disponível em:
https://www.bpbes.net.br/wp-content/uploads/2019/09/BPBES_Completo_VF-1.pdf. Acesso em
setembro de 2019.

BRAGA, A. S. (2013). Parques nacionais: participação privada na viabilização do uso público.


Curitiba: Edições CRV.

CLAD. Conselho Latinoamericano de Administração Pública. In: BRESSER-PEREIRA, L. C.;


GRAU, C. N. Responsabilização na administração pública.São Paulo: CLAD/Fundap. 2016.

MANNING, R. & MORE, T. (2002). Recreational Values of Public Parks. The George Wright
Forum, 19 (2), 21-30.

REYNAERS, A. M. (2013). Public Values in Public-Private Partnerships.Public Administration


Review, 74(1), p. 41–50. The American Society for Public Administration. DOI:
http://dx.doi.org/10.1111/puar.12137.

RODRIGUES, C. G. O.; GODOY, L. R. C. (2013). Atuação pública e privada na gestão de


unidades de conservação: aspectos socioeconômicos da prestação de serviços de apoio à visitação
em parques nacionais. Desenvolvimento e Meio Ambiente, v.28, 75-88.

RODRIGUES, C. G. O; ABRUCIO, F. L. Parcerias e concessões para o desenvolvimento do


turismo nos parques brasileiros: possibilidades e limitações de um novo modelo de governança.
Revista Brasileira de Pesquisa em Turismo, v. 13, p. 105-120, 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

THOMPSON, A; MASSYN, P.J; PASTORELLI, J. (2014). Tourism concessions in protected


natural areas: guidelines for managers. United Nations Development Programme.
WYMAN, M; BARBORAK, J.R.; INAMDAR, N.; STEIN, T. 2011. Best Practices for Tourism
Concessions in Protected Areas: A Review of the Field. Forests. 2, 913-928. doi:
http://dx.doi.org/10.3390/f2040913.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PERFIL DOS MERGULHADORES RECREATIVOSE IMPACTO


ECONÔMICO DA VISITAÇÃONO REFÚGIO DE ALCATRAZES - SP:
PONTOS DE PARTIDA PARA O FORTALECIMENTO DA EQUIDADE
SOCIAL
RECREATIONAL DIVERS’S PROFILE ANDECONOMIC IMPACT OF VISITATIONIN THE
ALCATRAZES WILDLIFE REFUGE: BASELINE FOR STRENGTHENING SOCIAL EQUITY

Marina Marconi dos Santos*, Vinicius José Giglio, Fábio dos Santos Motta**

Laboratório de Ecologia e Conservação Marinha (LABECMar) e Programa de Pós-graduação em Biodiversidade e


Ecologia Marinha e Costeira (PPGBEMC), Instituto do Mar, Universidade Federal de São Paulo, Campus Baixada
Santista,Brasil.* E-mail: marina@atuair.com.br
Laboratório de Ecologia e Conservação Marinha (LABECMar), Instituto do Mar, Universidade Federal de São Paulo,
Campus Baixada Santista,Brasil.**

1. INTRODUÇÃO
Omergulho recreativo é uma atividade em ampla expansão, movimentando uma
indústriamultibilionária que atrai milhares de novos praticantes todos os anos(GARROD;
GÖSSLING, 2008).Por ser uma atividade que depende da qualidade ambiental dos locais onde o
mergulho é praticado, as Unidades de Conservação (UC) são os destinos preferidos dos
mergulhadores.O mergulho recreativo tem grande potencial de contribuir para sensibilizar o público
sobre a necessidade de proteção dos ecossistemas marinhos,bem como gerar receitas para a
manutenção das UCs efomentar odesenvolvimento regional(DAVIS; TISDELL, 1995). No entanto,
pouco se sabe sobre o papel que as UCs marinhas desempenham como indutoras de atividade
econômica e como seus valores naturais, sociais e culturais são compartilhados com as
comunidades do entorno. Neste sentido, fortalecer a equidade social das UCsé crucial para o
sucesso das ações de conservação e mitigação dos conflitos (GURNEY et al., 2015;
SCHRECKENBERG et al., 2016).
Localizado no litoral norte do Estado de São Paulo, o Refúgio de Vida Silvestre do
Arquipélago de Alcatrazesfoi estabelecido em 2016 eabrange uma área de 674,09 km2. No final de
2018 a unidade foi aberta à visitação pública para a prática do mergulho recreativo. No início da
visitação, a UC já contava com conselho gestor, plano de manejo, plano de uso público e portaria
para ordenamento da visitação. Além dos instrumentos de gestão, um amplo esforço de diálogo com
os operadores de turismo foi realizado com vistas ao credenciamento, construção de normas e
capacitação dos condutores subaquáticos.
No âmbito de um programa de monitoramento da experiência dos visitantes, o presente
estudo traçou o perfil socioeconômico dos mergulhadores e estimou o impacto econômico do
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

mergulho recreativo no Refúgio de Alcatrazes. Com base nesses dados, também apresentamos
algumas recomendações visando o fortalecimento da equidade social desta área protegida.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi realizado por meio da aplicação de questionários semiestruturados junto aos
mergulhadores recreativos do Refúgio de Alcatrazes entre dezembro de 2018 a maio de 2019. O
questionário consistiu em questões relacionadas ao perfil socioeconômico dos visitantes, aos custos
médios da viagem, à especialização e experiência dos mergulhadores.A coleta foi iniciada com a
abertura do uso público na área e o contato com os visitantes ocorreu durante a operação de
mergulho ou via e-mail obtido pela equipe de gestão junto aos relatórios de viagem entregues pelas
operadoras de mergulho.Para ampliar a adesão dos visitantes à pesquisa,outras frentes de
divulgação foram implementadas.Desde a participação em reuniões do conselho consultivo até
reuniões específicas com operadores e condutores de mergulho. Nessas ocasiões, os atores foram
convidados a colaborar incentivando a participação dos mergulhadores. Além disso, adesivos com
uma breve descrição do projeto e um QR Code para acesso ao questionário on-line também foram
fixados nas embarcações e marinas.
O impacto econômico (IE) do mergulho recreativo na região foi estimado com base no
modelo de geração de renda (Money Generation Model) de Stynes et al. (2000), empregando a
seguinte equação: IE = Número de Visitantes X Gasto Médio por Visitante X Multiplicador. Dois
valores de multiplicadores foram utilizados, refletindo um cenário otimista e um cenário
conservador de acordo com Medeiros et al. (2011).

3. RESULTADOS
Durante o período do estudo, um total de 827 mergulhadores visitaram o Refúgio de
Alcatrazes. Destes, 214 (26%) responderam os questionários (Tabela 1). A predominância foi de
mergulhadores do sexo masculino (71%) com idades entre 36 e 45 anos (40,5%), seguido por 46-55
anos (19,8%). Dentre as certificações de mergulho, a maior parte dos respondentes possui curso
avançado (44%) e renda maior ou igual a seis salários mínimos (69,5%). Além disso, a maior parte
dos mergulhadores que visitou o Refúgio de Alcatrazes é proveniente do Estado de São Paulo
(94%), sendo que 49% moram no interior, 35% na capital e apenas 15% eram do litoral.Com
relação à disposição para contribuir financeiramente em ações de conservação, 28% dos
mergulhadores responderam estarem dispostos a contribuir.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Tabela 1: Perfil socioeconômico e especialização dos mergulhadores recreativos amostrados. M =


Masculino e F = Feminino; *Valores expressos em média e desvio padrão.
Formação - %
Ensino Superior 37,3
Pós-Graduação 51
Renda familiar (salários mínimos) - %
Até 1 0,4
1a5 16,4
6 a 10 34,5
mais de 10 35
Certificação - % 25 Básico
44 Avançado
N° médio de mergulhos * 303 ± 810

N° médio de mergulhos (últimos 2 anos) * 42 ± 67

Média de gasto com a viagem (R$) * 1406 ± 910

Disposição a contribuir financeiramente com


ações em prol da conservação - %
Sim 28
Não 19
Talvez 53

Considerando os gastos com a atividade de mergulho, o transporte até o destino e a


hospedagem, a média de gastos por mergulhador foi de R$1.406,00 (DP ± 910). O impacto
econômico do mergulho recreativodurante o período avaliado, em um cenário otimista, foi de cerca
de R$1.860.419,00 e, em um cenário mais conservador, foi de R$1.627.867,00. Ademais, utilizando
esses valores foram calculadas projeções para o impacto econômico anual, representando em um
cenário otimista R$4.465.006,08/ano e em um cenário conservador R$3.906.880,32/ano.No
momento, apenas três empresas operam o mergulho recreativo no Refúgio de Alcatrazes, mas estão
previstas ao menos mais duas operadoras no verão de 2020. É importante destacar que dos 44
condutores empregados para acompanhar os visitantes, 33 são do litoral norte de São Paulo.

4. DISCUSSÃO
Estratégias efetivas para a gestão do turismo em ambientes naturais têm se pautado em
abordagens adaptativas (DIMMOCK; MUSA, 2015). Neste contexto, concomitante com a visitação,
ocorremos monitoramentos ecológico e socioeconômico e os dados produzidos são utilizados para
subsidiar as ações de gestão que são discutidas entre gestores, pesquisadores e atores locais.
Apesardos benefícios econômicos gerados pelo turismo no Refúgio de Alcatrazes permanecerem na
região, principalmente por meio da rendados operadores e condutores, os benefícios naturais e
389
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

culturais ainda estão concentrados em uma população de alta renda que não pertence à comunidade
local.
É justificável que o perfil socioeconômico dos mergulhadores do Refúgio de Alcatrazes seja
composto principalmente pela classe média-alta, pois é uma atividade recreativa cujos custos são
relativamente altos devido aos equipamentos, treinamentose logística das viagens (DIMMOCK;
MUSA, 2015). Além disso, a alta formação acadêmica provavelmente está relacionada à estreita
correlação entre educação e renda (DIMMOCK; MUSA, 2015).
Diante do exposto, écrucial que a gestão, em parceria com os operadores,dedique esforços
visando o fortalecimento da equidade social do Refúgio de Alcatrazes. Neste sentido, experiências
exitosas já realizadas em UCs marinhas do Brasil poderiam ser replicadas em Alcatrazes, como, por
exemplo, o projeto “Professores no Parque” (RANIERI; ROSAMÍGLIA, 2007) executado no
Parque Nacional Marinho de Abrolhos. A iniciativa promoviade forma gratuita visitas guiadas ao
parque com professores das comunidades locais. Atividades similares envolvendo estudantes de
escolas públicas também podem ser realizadas como premiação para concursos de redação ou
gincanas científicas.Outro exemplo de projeto que pode ser replicado é o “Comunidade em
Abrolhos”, no qual há uma contrapartida dos operadores por meio da alocação de um percentual das
vagas nas embarcações para o público de baixa renda visitar o local gratuitamente. Além disso,
gestores e organizações não governamentais poderiam arrecadar recursos com os mergulhadores
recreativos para ações que envolveriam a comunidade local na conservação da biodiversidade do
Refúgio de Alcatrazes, já que cerca de um terço (28%) dos mergulhadores estavadisposto a
contribuir financeiramente para este objetivo. Por fim, entendemos ser fundamental o planejamento
de ações diversas com vistas a potencializar o compartilhamento dos valores naturais, sociais e
culturais do Refúgio de Alcatrazes.

5. CONCLUSÃO
Apesar dos efeitos positivos gerados pelas UCs marinhas, os monitoramentos periódicos de
indicadoresecológicos, socioeconômicos e de governança são críticos não apenas para a gestão
adaptativa, mas também para o planejamento de intervenções visando potencializar o acesso
igualitário aos serviços ecossistêmicos e a redução dos conflitos.

6. AGRADECIMENTOS
À toda equipe do Núcleo de Gestão Integrada ICMBio Alcatrazes, aos operadores e
condutores subaquáticos e a Fundação SOS Mata Atlântica. VJ Gigliorecebeu uma bolsa de pós-
doutorado da FAPESP, processo #2017/22273-0.

390
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7. REFERÊNCIAS
DAVIS, D.; TISDELL, C. Recreational scuba-diving and carrying capacity in marine protected
areas. Coastal Management, 26, 19 – 40, 1995.

DIMMOCK, K. AND MUSA, G. Scuba Diving Tourism System: A framework for collaborative
management and sustainability. Marine Policy, 54, 52 – 58, 2015.

GARROD, B.; GÖOSSLING, S. Introduction. In B. Garrod; S. Göosling (Eds.), New frontiers in


marine tourism: Diving experiences, sustainability, management, Oxford: Elsevier, 93 – 113,
2008.

GURNEY, G.G.; PRESSEY, R.L.; CINNER, J.E.; POLLNAC, R.; CAMPBELL, S.J. Integrated
conservation and development: evaluating a community-based marine protected area project for
equality of socioeconomic impacts. Philosophical Transactions of the Royal Society B:
Biological Sciences, 370(1681), 20140277, 2015.

MEDEIROS, R.; YOUNG, C.E.F.; PAVESE, H.B.; ARAÚJO, F.F.S. Contribuição das unidades
de conservação brasileiras para a economia nacional: Sumário Executivo. UNEP WCMC,
Brasília, 120, 2011.

RANIERI, C.L.; ROSAMÍGLIA, P.R.F. Experiências em organizações públicas, empresas e


parcerias. Cap.6 - parque Nacional Marinho dos Abrolhos - Núcleo de Educação Ambiental. In:
Viviane Junqueira, Zysman Neiman. (Org.). Educação Ambiental e Conservação da
Biodiversidade - reflexões e experiências brasileiras.São Paulo: Manole, 1ª Ed., 67 – 71, 2007.

SCHRECKENBERG, K.; FRANKS, P.; MARTIN, A.; LANG, B.Unpacking Equity for Protected
Area Conservation. Parks, 22(2), 11 – 26, 2016.

STYNES, D.J.; PROPST, D.B.; CHANG, W.; SUN, Y.Estimating national park visitor spending
and economic impacts: the MGM2 model. May, 2000. Final report to National Park Service.
Department of Park, Recreation and Tourism Resources, 2000.

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TURISMO RESPONSÁVEL EM ÁREAS PROTEGIDAS: CAPACITAÇÃODE


CONDUTORES DE VISITANTES NA APA COSTA DOS CORAIS
RESPONSIBLE TOURISM IN PROTECTED AREAS: CAPACITY-BUILDING FOR VISITORS
GUIDES ON THE COSTA DOS CORAIS MPA

Carolina Neves Souza*;Rafael Lustosa Siqueira; Diego da Silva Santos

Instituto Yandê: Educação, Cultura e Meio Ambiente, Brasil* (carolina_cns@hotmail.com).

1. A APA COSTA DOS CORAIS E O TURISMO


Inspiradas no modelo dos Parques Naturais Regionais Europeus, as Áreas de Proteção
Ambiental (APA) foram criadas com o objetivo de preencher as lacunas do antigo modelo
preservacionista de criação de áreas protegidas e permitirem um maior envolvimento das
comunidades locais (MEDEIROS, 2006) e visam estabelecer um modelo de proteção que resguarde
áreas com certo nível de ocupação, sobretudo áreas urbanas. No entanto, o forte apelo turístico ao
qual geralmente está associado à criação destas áreas vem solidificando a ideia de que essa
categoria de UC estimula o processo de ocupação turística (ARTAZA-BARRIOS, 2007).
O turismo como atividade econômica do mundo moderno vem se expandindo e cada vez
mais a motivação pelo“contato com a natureza”, que se tornou uma mercadoria, tem feito a
atividade turística ser praticada em áreas protegidas. Na Área de Proteção Ambiental Costa dos
Corais (APACC), as áreas turísticas foram submetidas a atividades subvertidas pela ação do turismo
onde a gestão ambiental pública necessita dar conta do seu ordenamento (SELVA, et. al. 2015).
Dentre os objetivos de criação da APACC está o ordenamento do turismo. Assim, visando
este ordenamento e com foco na experiência de visitação em ambientes naturais, seu Plano de
Manejodeterminaque os operadores de turismo náutico passem por uma formação em conduta
consciente em ambientes recifais. Estes cursos são de responsabilidade da gestão da UC(ICMBio,
2013). No entanto, desafios como: (i) o elevado número de operadores de turismo náutico; (ii)a
implementação de novas zonas de visitação e (iii) o número reduzido de gestores da UC, geraram a
necessidade de formar mais profissionais aptos a ministrarem estes cursos, em parceria com
instituições locais. Este relato de experiência apresenta os resultados do Projeto Conduta
Responsável na APA Costa dos Corais que teve como objetivo formar e habilitar instrutores para
ministrar os cursos de conduta consciente e aplicar os cursos para os agentes de turismo.

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2. CAPACITANDO AGENTES TURÍSTICOS NA APACC


2.1 Área de estudo
A APA Costa dos Corais, criada 1997, é a maior unidade de conservação federal costeiro-
marinha do Brasil, com mais de 400 mil ha de área, cerca de 120 km de praia e mangues e uma das
maiores faixas de recifes de coral do mundo, distribuídos em 12 municípios dos estados de Alagoas
e Pernambuco. No interior e entorno da UC vivem aproximadamente 200 mil pessoas (ICMBIO,
2016), que em sua maioria dependem diretamente do uso dos recursos naturais da unidade e os
utilizam por meio do turismo e da pesca artesanal.
Visando a consolidação dos objetivos da UC e seguindo as recomendações da lei do SNUC,
a gestão da unidade dedicou-se, em conjunto com outras instituições, para definição de seu
zoneamento, estabelecendo áreas com fins de preservação, conservação e visitação. Essencialmente
marinha e estuarina, um dos principais conflitos relacionado ao turismo na APA Costa dos Coraisé
causado pela intensificação de atividades turísticas que ocorrem nas praias e piscinas naturais
(FRAGA, 2013).
Atualmente, os gestores do ICMBio Costa dos Corais estimam a existência de 780
operadores de turismo náutico. Após publicação da revisão do Plano de Manejo, que passou por um
amplo processo participativo, ocorrerá o ordenamento das piscinas naturais dos municípiosainda
não contemplados e, consequentemente, é esperado um aumento na demanda nas solicitações dos
cursos de conduta consciente.

2.2 O curso de conduta responsável na APACC


Com o objetivo de capacitar e certificar estes operadores, o Instituto Yandê executou,em
parceria com o ICMBio,o Projeto Conduta Responsável na APA Costa dos Corais. A estratégia do
projeto foi formar instrutores como forma de ganhar escala e possibilitar a formação de um número
maior de agentes de turismo náutico, além de inserir profissionais locais neste processo formativo.
Para isso foram previstos: (i) a elaboração do plano pedagógico do curso de Formação de
Instrutores em Conduta Responsável em Ambientes Marinhos Costeiros; (ii) a formação de 15
instrutores residentes nos municípios integrantes da APA Costa dos Corais; (iii) a elaboraçãodo
plano pedagógico do curso de Conduta Responsável para agentes de turismo náutico; (iv) E a
realização de cursos teóricos/práticos de conduta responsável para agentes de turismo náutico.
Entre os temas trabalhados em forma de seminários, minicursos e oficinas, destaca-se a
disseminação de conhecimentos em ecossistemas costeiros (recifes de coral, estuários, manguezais,
praia e mata atlântica) e de conduta consciente. Foram trabalhados ainda temas relacionados ao
aumento do sentimento de pertencimento e o empoderamento dos comunitários. As metodologias
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

utilizadas nas ações pedagógicas tiveram por princípio a associação entre teoria-práxis, o
dialogismo entre os saberes científico e tradicional do conhecimento, metodologias vinculadas à
pedagogia sociointeracionista de Vygotsky e humanista emancipatória. Enquanto concepção, o
projeto se vinculou à Educação Ambiental Crítica,que visa a autonomia dos grupos sociais na
defesa de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e a garantia da sadia qualidade de vida da
população (preceito do art. 225 da CF-1998) e principalmente os mais vulneráveis, visto que nossa
sociedade é assimétrica e geradora de injustiças ambientais (ACSELRAD, 2010).

3. FORMANDO MULTIPLICADORES
Entre 2018 e 2019 foram realizados um curso de Formação de Instrutores para Condutores
de Visitantes esete cursos deConduta Responsávelpara Condutores de Visitantes da APA Costa dos
Corais. Ao todo foram formados 21 instrutores em todo o território da APACC e capacitados 186
agentes turísticos em cinco municípios da UC (São José da Coroa Grande-PE, Porto de Pedras, São
Miguel dos Milagres, Passo de Camaragibe e Paripueira-AL).

3.1Identificação de problemas e conflitos pelos condutores


Diversos problemas e conflitos foram identificados pelos condutores relacionados à gestão
da unidade de conservação e gestão pública municipal; especulação imobiliária atrelada ao turismo;
disputas por clientes entre condutores, receptivos e guias de turismo não credenciados; organização
dos próprios condutores na execução dos passeios; o quantitativo de instrutores e condutores
formados e a distribuição dos mesmos no território da unidade.
Os resultados foram sistematizados em cinco categorias de conflitos: (i) conflitos com a
gestão da unidade de conservação e a gestão pública municipal; (ii) conflitos relacionados a
especulação imobiliária atrelada ao turismo; (iii) conflitos relacionados a comercialização de
passeios entre condutores, receptivos e guias de turismo não credenciados; (iv) conflitos
relacionados organização operacional dos passeios; e, (v) conflitos com condutores associados e
não associados.

3.2 Avaliação dos condutores referente aos cursos


Os gráficos apresentam análises quantitativas e qualitativas das avaliações realizadas
individualmente pelos 186 condutores capacitados, através da classificação em BOM, REGULAR
ou RUIM, sobre itens relacionados aos cursos, conforme figura 1.

394
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Figura1: Resultado das avaliações dos condutores sobre o curso de conduta responsável

Fonte:Relatórios do projeto, (2018-2019)

3.3 Avaliação dos instrutores e equipe organizadora, referente à execução do projeto


As dificuldades encontradas ao longo da execução do projeto foram: (i) falta de interesse as
gestões públicas municipais em apoiar ações que contribuem para o ordenamento do uso público da
UC, apesar de muitos municípios terem o turismo como um importante motriz econômico; (ii) O
baixo nível de escolaridade da maioria dos condutores e alguns conteúdos de cunho técnico, exigiu
habilidades especificas acerca da didática e metodologia de ensino e (iii) falta de documentação da
embarcação e habilitação náutica por grande parte dos condutores, devido a oferta restrita de cursos
da Capitania dos Portos-Marinha do Brasil nos municípios.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A APA Costa dos Corais possui uma diversidade de belezas cênicas e seus atrativos naturais
têm destaque no cenário nacional e internacional.A existência de um número expressivo de
operadores e prestadores de serviços ligados ao turismo náutico, a crescente demanda dessa
atividade econômica na região da APA Costa dos Corais e a implementação de novas zonas de
visitação geram a necessidade de capacitação destes profissionais.
A formação de instrutores, distribuídos estrategicamente,ampliou a oferta de novos cursos e o
número de beneficiários, contribuindo de maneira significativa na promoção do turismo ecológico e
responsável na APA Costa dos Corais.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao apoio da Fundação Toyota do Brasil e da Fundação SOS Mata Atlântica e aos
parceiros Instituto BiomaBrasil, Projeto Conservação Recifal e Rede TerraMar.
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6. REFERÊNCIAS
MEDEIROS, R. Evolução das tipologias e categorias de áreas protegidas no Brasil. Ambiente &
Sociedade. Vol.IX, nº1, 2006.

ARTAZA-BARRIOS, O. H.; SCHIAVETTI, A. Análise da Efetividade do Manejo de duas Áreas


de Proteção Ambiental do Litoral Sul da Bahia. Revista da Gestão Costeira Integrada. 7(2): p.
117-128. 2007.

ACSELRAD. H.Ambientalização das lutas sociais. Revista Estudos Avançados, São Paulo, v. 24,
n. 68, p. 103-119, 2010.

ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.Plano de Manejo da APA


Costa dos Corais. 2013.Disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/portal/component/content/article?id=2238:apa-da-costa-dos-
corais.Acesso em 28 de setembro de 2019.

SELVA, V. S. F.; SOUZA, C. N.; GOUVEIA, R. L.; SANTOS, E. C. S. Práticas turísticas em áreas
protegidas: um olhar sobre aÁrea De Proteção Ambiental - APA Costa Dos Corais, Brasil. In:
Terra - paisagens, solos, biodiversidade e os desafios para um bom viver.1 ed.Ituiutaba:
Barlavento, 2016, v.1, p. 1024-1034.

FRAGA, F. F. A expansão do turismo em São Miguel dos Milagres - AL: contribuições e


obstáculos ao desenvolvimento local. 2013.101p. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e
Meio Ambiente) – Universidade Federal da Paraíba. 2013.

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O TURISMO DE OBSERVAÇÃO DE FAUNA NO PARQUE NACIONAL


MARINHO E NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE FERNANDO DE
NORONHA
THE TOURISM OF WILDLIFE OBSERVATION IN THE MARINE NATIONAL PARK AND
IN THE ENVIRONMENTAL PROTECTION AREA OF FERNANDO DE NORONHA

José Martins da Silva Júnior 1* , Cynthia Gerling de Oliveira 2 , Flávio José de Lima Silva 2,3

1 - ICMBio Noronha, Fernando de Noronha, Brasil.


2 - Centro Golfinho Rotador, Fernando de Noronha, Brasil.
3 - Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
O objetivo deste trabalho é descrever o turismo de observação de fauna nas Unidades de
Conservação de Fernando de Noronha, bem como destacar a importância desta modalidade de
turismo como ferramenta de gestão em prol da conservação da biodiversidade e fonte de renda para
a população local.
O turismo baseado na natureza pode fornecer oportunidades para se criar incentivos para
apoiar a conservação de espécies e habitat local, pois geralmente estão focados em animais que têm
mais empatia aos humanos, as espécies bandeiras (SCHWOERER; KNOWLER; GARCÍA-
MARTÍNEZ, 2016). Estas espécies bandeiras também podem ser utilizadas para garantir
sobrevivência e conservação de todo o seu ambiente, com benefícios sociais, culturais e econômicos
(BOAS; DIAS, 2010).
Newsome e Hughes (2016) afirmam que filmes como "Jurassic World" fornece "insights"
sobre atuais e potenciais futuras atividades turísticas em parques naturais e as expectativas do
visitante associado. Destacam-se temas como: necessidade de grande infraestrutura de apoio e
acesso turístico; desejo humano para interagir com animais selvagens por meio de alimentação;
observação de animais raros, grandes e perigosos como experiências emocionantes. Nota-se que o
desejo de emoção e excitação pode incentivar desconsideração pelo bem-estar dos animais
selvagens e pelo ambiente natural.
No entanto, Higham et al. (2016), usando estudos de impacto específico, concluíram que
uma mudança de paradigma de sustentabilidade é necessária para o turismo de observação de
cetáceos, assim como para outras formas de turismo de vida selvagem. Estas atividades são
reconhecidas como uma forma de exploração consumista não-letal, com produção de estresse
antropogênico sub-letais e impactos energéticos nos animais alvo do turismo, com externalidades
negativas.
397
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Segundo Silva-Jr (2003), o Arquipélago de Fernando de Noronha é constituído por duas


Unidades de Conservação Federais do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio): Área de Proteção Ambiental de Fernando de Noronha (APA-FN) e Parque Nacional
Marinho de Fernando de Noronha (Parnamar-FN). O Parnamar-FN compreende aproximadamente
58% da área da Ilha Fernando de Noronha, todas as demais 17 ilhas secundárias do Arquipélago e a
maior parte das águas adjacentes até a profundidade de 50 metros, totalizando uma área de 112,7
km². Na APA-FN está localizada toda a ocupação permanente de moradia, agropecuária, indústria
hoteleira, prestação de serviço e instalações de infra-estrutura. Fernando de Noronha também tem
os títulos da UNESCO de Patrimônio Natural da Humanidade (SCIFONI, 200619) e de Sítio
Ramsar (MMA, 2019).
Algumas características abióticas e biológicas de Fernando de Noronha propiciam
excelentes condições à prática do turismo de observação de fauna, como: paisagem de grande
beleza cênica; transparência das águas circundantes; localização sobre a Corrente Sul Equatorial;
singularidade de ser o único arquipélago oceânico tropical com mais de 10 km2 no Atlântico Sul
(SILVA-JR; SILVA; PEREIRA, 1997a). Essa singularidade é complementada por espécies
endêmicas e pela biodiversidade de fauna e flora marinha e terrestre (SILVA-JR; SILVA;
PEREIRA, 1997b), sendo que a avifauna local é rara no Brasil (SILVA-JR, 1998).
Segundo dados da Autarquia Territorial de Fernando de Noronha, o turismo é a principal
atividade econômica em Fernando de Noronha e a fauna é uma das atrações turísticas mais
importantes. Entre os motivos da viagem para Fernando de Noronha, 59% dos turistas indicaram a
observação de golfinhos e 20% o mergulho.
Os principais atrativos turísticos do Arquipélago estão dentro do Parnamar-FN, onde os
visitantes ingressaram de três formas: caminhadas, carro e barco. Os turistas que vieram a Ilha
entraram em média na área do Parnamar-FN uma vez por dia (SILVA-JR, 2003).
Este trabalho objetivou descrever o turismo de observação de golfinhos e de ecossistemas
recifais em FN.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho teve duas etapas metodológicas distintas e complementares. A primeira foi a
copilação e análise de dados e metadados sobre a visitação turística da ATDEFN, do ICMBio
Noronha e do Projeto Golfinho Rotador.
A segunda etapa foi é a experiência dos autores em 30 anos de pesquisa sobre o turismo de
observação de mamíferos aquáticos, acumulando mais de 500 saídas para observar cetáceos em
barcos; mais de 1.000 mergulhos com golfinhos; mais de 3.000 dias de monitoramento do turismo
de observação de cetáceos de cima de um ponto alto; condução em mergulho turístico de mais de
398
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2.000 pessoas; análise de dados sobre interação de mais de 20 mil encontros de barcos com
golfinhos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
As características abióticas e biológicas de Fernando de Noronha propiciam a prática do
turismo de observação de fauna para ecossistemas recifais, golfinhos e aves.
A principal atração de Fernando de Noronha é o ecossistema recifal, que pode ser por
observação por meio do mergulho. Em Fernando de Noronha ocorrem basicamente três tipos de
mergulho: livre, rebocado e autônomo.
O mergulho livre é praticado por mais de 75% dos visitantes. No Mar de Dentro, onde há
melhores condições de mergulho livre de julho a dezembro, os melhores pontos são: naufrágio do
Porto, lado direito da Praia da Conceição, Laje do Boldró e lado direito da Baía do Sancho. No Mar
de Fora, o melhor ponto de mergulho livre é a Baía do Sueste.
O mergulho rebocado consiste em o mergulhador ser rebocado com equipamento de
mergulho livre por um barco, segurando uma prancha em formato de asa delta que possibilita o
controle de deslocamento da superfície ao fundo.
O mergulho autônomo consiste na submersão completa do mergulhador que, com auxílio do
equipamento para respiração subaquática “scuba”, respira ar embaixo da água. Cerca de 30% dos
turistas que visitam Noronha, realizam mergulhos autônomos em uma das operadoras locais, que
oferecem serviços de batismo, mergulho para credenciado, mergulho técnico e cursos. Os 75.634
turistas que pagaram ingresso para acessar o Parnamar-FN, entre janeiro e agosto de 2019,
realizaram 16.121 saídas para mergulho dentro do Parque.
Os mergulhos autônomos ocorrem a partir da praia do Porto ou de barcos. Os mergulhos de
barco normalmente ocorrem em pontos escolhidos em função das condições do mar no dia da
operação. Os melhores pontos de mergulho autônomo estão no Mar de Fora: Pedras Secas, Iúias e
Cabeço do Submarino, onde as condições de mar são melhores de março a maio. No Mar de Dentro
as condições são melhores de julho a dezembro e os melhores locais são a Caverna e o Cabeço da
Sapata e o Pontal do Norte. As encostas das Ilhas do Meio e Rata são mais utilizadas para o
batismo. O naufrágio da Corveta Ipiranga propicia um dos melhores mergulhos de naufrágio do
mundo, mas requer experiência, equipamentos e operação especial, pois a Corveta repousa a 63
metros de profundidade.
No período de cópula da tartaruga-verde (Chelonia mydas), de janeiro a março, é freqüente
o barco encontrar no trajeto entre o Boldró e a Ponta da Sapata grupos reprodutivos deste quelônio
formados por uma fêmea e até três machos. A tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata) é
facilmente encontrada se alimentando no lado direiro da Baía do Sueste. De novembro a abril, nos
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

mergulhos em locais como Baía de Santo Antônio, Praia da Conceição, Baía do Sancho, Praia do
Leão e Baía do Sueste é grande probabilidade de se avistar um tubarão-limão (Negaprion
brevirostris).
O turismo de observação de golfinhos acontece por meio de dois passeios: mar e terra. A
observação feita por passeios de barco envolve três vezes mais turistas que a observação a partir de
terra. Porém esta última proporciona maior componente informativo e educacional. Em cerca de
70% dos passeios de barco, os turistas avistam os golfinhos-rotadores (Stenella longirostris),
momento em que os rotadores de guarda vêm nadar na proa da embarcação, para desviar a atenção
dos barcos. Entre 16/01/2018 e 15/01/2019, foram registradas 2.747 passagens de barcos de
turismo defronte a Baía dos Golfinhos, sendo, em média, 13 passagens (DP=±4) por dia. Houve
acompanhamento dos golfinhos à embarcação somente em 48 das passagens, ou seja, em apenas
1,75% das passagens de passagens de barcos foi observado acompanhamento por golfinhos. Neste
período, na Baía de SantoAntônio e Entre Ilhas foram observados 642 agrupamentos de rotadores e
4.319 interações de embarcações de turismo com estes agrupamentos. O tempo médio de interação
foi de 4min (DP=±3,5min) e acompanhamento por golfinhos foi observado em 78,8% das
interações.
Por terra, o principal ponto de observação de golfinhos é o Mirante dos Golfinhos, mas o
Forte dos Remédios vem recebendo cada vez mais turistas para esta finalidade. De 1990 a 2018, o
Projeto Golfinho Rotador orientou a observação de golfinhos de 268.027 turista, sendo que 34%
visitaram o Mirante dos Golfinhos entre 5h30min e 8 horas, 48% entre 8 e 12 horas e 17% dos
turistas visitaram o Mirante entre 12 e 18 horas.
A trilha Mirante dos Golfinhos ao Mirante dos Porcos possibilita a avistagem de inúmeros
ninhais de mumbebo-de-pé-vermelho (Sula sula), viuvinha-preta (Anous minutus) e noivinha (Gygis
alba), onde os visitantes observam os comportamentos peculiares destas aves durante o período
reprodutivo.
No passeio de barco nas ilhas secundárias, pode se observar ninhais de várias espécies de
aves marinhas. De trinta-réis (Sterna fuscata) na Ilha do Cuscuz, de fragata (Fregata magnificens)
na Ilha Sela Gineta, de mumbebo-real (Sula dactylatra) na Ilha Rata e de mumbebo-preto (Sula
leucogaster), mumbebo-de-pé-vermelho (Sula sula) e viuvinha-preta (Anous minutus) na Ilha do
Meio.No final do passeio de barco da tarde, é comum encontrar mumbebos-pretos e as fragatas
sobrevoando os barcos de pesca, quando observa-se as fragatas roubando peixes dos mumbebos.

4. CONCLUSÃO
O que faz com que Fernando de Noronha seja um dos melhores locais do mundo para observar
golfinhos, aves marinhas e ecossistemas marinhos em mergulho é a comodidade e facilidade de se
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encontrar a fauna marinha em trilhas ou saídas de barco de 1 hora ou em mergulhos de 1 a 60


metros de profundidade.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos a Petrobras, patrocinadora oficial do Projeto Golfinho Rotador por meio do
Programa Petrobras Socioambiental, e ao ICMBio Noronha.

6. REFERÊNCIAS
BOAS, M.H.A. V.; DIAS, R. Biodiversidade e turismo: o significado e importância das espécies-
bandeira. Turismo e Sociedade, v. 3, n. 1, 2010.

HIGHAM, J.E.; BEJDER, L.; ALLEN, S.J.; CORKERON, P.J.; LUSSEAU, D. Managing whale-
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Ilhéus/BA, p. 353-354, 1997b.

401
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ENTRE AMAZÔNIAS : O ECOTURISMO NA FLORESTA NACIONAL DO


TAPAJÓS E NO PARC AMAZONIEN DE GUYANE A PARTIR DE UM
OLHAR ANTROPOLÓGICO
BETWEEN AMAZONS: THE ECOTURISM IN THE NATIONAL FOREST OF TAPAJÓS AND IN THE
AMAZONIAN PARK OF FRENCH GUIANA FROM AN ANTROPOLOGICAL PERSPECTIVE

Rudiney Ivo Lima dos Santos*; Yazmin Bheringcer dos Reis e Safatle**

*Mestrando, Departamento de Antropologia, Instituto de Ciências Sociais,Universidade de Brasília,


ivolimadsaints@gmail.com
**Mestranda, Departamento de Antropologia, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília,
yazmin.safatle@hotmail.com

1. INTRODUÇÃO
A partir da proposta de Sautchuk (2017) de realizar uma leitura das práticas de conservação
a partir da dimensão técnica, propomos um sobrevoo às realidades de duas áreas protegidas, a saber,
a Floresta Nacional do Tapajós (FLONA) e o Parc Amazonien de Guyane (PAG), onde vivem
populações indígenas, ribeirinhas e marrons1, sendo focalizadas, neste resumo, as duas últimas. Em
uma perspectiva comparada – no caso, entre uma experiência brasileira e outra francesa,
respectivamente -, buscamos interpelar a literatura mobilizada, no que concerne ao
desenvolvimento do ecoturismo 2dentro dessas duas áreas protegidas e das vicissitudes que levaram
à conformação e operacionalização dessa atividade. Orientados pela concepção de Sigaut (1994:
444), de que o ambiente de um grupo só pode ser compreendido a partir de suas técnicas,
pavimentamos uma comparação que põe em diálogo a governança ambiental de cada caso
explorado e as práticas atuais das populações residentes (BARRETO FILHO, 2006) da FLONA e
do PAG voltadas ao ecoturismo.
As elaborações de Barreto Filho (2001) e Sautchuk (2017) nos permitem pensar as
iniciativas de ecoturismos enquanto formas de apropriação específica por parte de comunidades
concebidas como tradicionais em espaços delimitados, que são eles mesmos produtos de
intervenção e apropriações diversas por parte do poder público. Nossa abordagem comparativa visa
confrontar as duas experiências de ecoturismo, na intenção de compreender como se constituem os
incentivos a essa atividade e que concepções norteiam as políticas progenitoras desse fomento.

1
Marrons são grupos étnicos formados por descendentes de populações de fugitivos escravizados e pessoas ex-
escravizadas libertas nas antigas colônias americanas.
2
De acordo com a EMBRATUR (1994) o ecoturismo é um tipo de atividade turística que deve fomentar uma
consciência ambientalista e a conservação do meio ambiente através do seu uso de forma sustentável, promovendo o
bem estar de populações locais.
402
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O objetivo é, com essa proposta, sondar possíveis ruídos entre os entendimentos da


conservação mobilizados pelo(s) Estado(s) e aqueles perpetrados pelos povos que habitam as duas
áreas protegidas - ribeirinhos (FLONA) e marrons (PAG) -, bem como rastrear pontos de contato
entre as duas experiências ecoturísticas, à luz de um conhecido contexto de assimetria entre as
compreensões supracitadas. Analisamos também os distintos dispositivos legais acionados pelas
comunidades na FLONA do Tapajós e no PAG no que diz respeito a direitos sobre os territórios e
uso dos recursos naturais. Abaixo, apresentamos algumas informações gerais sobre as duas áreas
protegidas, para melhor enquadrá-las em nosso esforço de análise.
A FLONA do Tapajós é uma Unidade de Conservação de Uso Sustentável, de acordo com a
classificação estipulada pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Criada no
ano de 1974, a Unidade permitiu o acesso e a promoção do uso sustentável dos recursos naturais
por seus/suas moradores/as, que incluem ribeirinhos agroextrativistas e indígenas. A FLONA do
Tapajós possui uma área de 527.319 hectares, abrangendo os municípios de Aveiro, Belterra, Placas
e Rurópolis, no Oeste do Pará. Residem nela 1.050 famílias e cerca de 4 mil moradores, distribuídos
em 23 comunidades ribeirinhas e três aldeias indígenas da etnia Munduruku. O PAG, de acordo
com sua página oficial, foi criado em 2007 após 15 anos de construção (SARASIN et. al, 2016) e é
o maior Parque Nacional da França e da União Europeia. No total ele abrange 34 000 km2.

2. METODOLOGIA
A nossa metodologia inclui a análise de documentos oficiais e regulamentos das unidades
de conservação, relatos e relatórios emitidos por parte de diferentes agentes. Realizamos também
uma interpretação da presença midiática e das redes sociais virtuais das áreas protegidas. Com base
neste material, dialogamos com a literatura vigente nas searas antropológicas do turismo, da técnica
e da ciência. Além dos autores já mencionados, Carlos Sautchuk (2017) e Henyo Trindade Barretto
Filho (2001), os/as principais autores/as com os quais dialogamos são Bruno Sarrasin (2016),
Jonathan Tardif (2014), Marie Fleury (2006), Letícia Cesarino (2017), Amanda Stronza (2001) ,
Nelson Graburn (2009) e Sandra Maria Sousa da Silva (2015). Uma pesquisa empírica a partir de
uma abordagem etnográfica (SCHENSUL et al, 1999; 2013. PEIRANO, 1995) ainda será efetuada
na FLONA do Tapajós com duas comunidades específicas - Maguari e Jamaraquá - e no PAG,
junto à comunidade marron Boni/Aluku, nos meses de janeiro a março de 2020, cujos dados serão
incluídos em uma versão posterior do artigo.

3. DISCUSSÃO E RESULTADO
Amanda Stronza (2001) nos informa que o turismo pode servir, à Antropologia, como uma
lente através da qual podemos explorar temas como economia política, desenvolvimento e mudança
403
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

social, manejo de recursos naturais e identidade cultural. Se focalizarmos a visão local sobre a
atividade ecoturística devemos pensar, como nos orienta Cesarino (2017: 76), que múltiplas escalas
e contextos são acionados cotidianamente pelos/as atores/atrizes locais envolvidos/as no
ecoturismo, com repercussões relevantes no âmbito da microprática, essa que inclui as técnicas e as
escolhas técnicas que sedimentam, não somente o turismo em questão, mas a conservação do
espaço, já que ambos se imbricam na proposta ecoturística. Nelson Graburn (2009), ao falar de
“turismos alternativos” informa como os pesquisadores, antropólogos incluídos, pensaram a
proliferação de formas alternativas de turismo, a qual forneceria, por meio do ecoturismo e do
turismo étnico, proteção à “natureza” e aos menos favorecidos, respectivamente. O ecoturismo
acabou por englobar o turismo étnico, amálgama esse que resultou em uma modificação do
entendimento dos grupos locais nos ambientes-alvo dos (eco)turistas. Assim, o ecoturismo passou a
incluir as pessoas como parte do ambiente, porque o envolvimento dessas com o ecoturismo, nas
posições de guias e protetoras, realçaria novos valores turísticos de preservação da natureza pelo
seu valor intrínseco e inestimável (SMITH E EADINGTON, 1992 apud GRABURN, 2009: 37).
Esses novos valores se encontram no bojo da proposta ecoturística presente na FLONA do
Tapajós, a exemplo de duas comunidades ribeirinhas – Maguari e Jamaraquá -, que já desenvolvem
essa atividade comercial a partir do mote da sustentabilidade. Para introduzir a importância da
utilização do ecoturismo em unidades de conservação como a FLONA (e, certamente, o PAG),
Silva nos informa sobre a importância de a atividade ecoturística levar em consideração as
características particulares das comunidades locais (COSTA & COSTA, 2000 apud Silva, 2015).
Além disso, acrescenta que a participação da comunidade local necessita de uma articulação que a
faça assumir a responsabilidade sobre o desenvolvimento do ecoturismo em sua localidade
(IRVING et al., 2000 apud SILVA, 2015). Sobre os percalços decorrentes da implantação de um
modelo ecoturístico, Graburn (2009) indica que, ao mesmo tempo em que essa atividade aumenta a
renda e a oferta de emprego nos contextos em que ela é desenvolvida, pode também adensar as
desigualdades econômicas e políticas (SCHEYVENS, 2002; HALL, 2007 apud GRABURN, 2009:
38).
Nos documentos oficiais emitidos pelo PAG a ideia de desenvolvimento está muito
presente. Esta figura também entre os objetivos principais da criação do parque, que seriam a
proteção da flora e fauna, vinculada ao desenvolvimento humano e econômico. (Site oficial do
PAG). O ecoturismo, nesse contexto, é apresentado como uma “ferramenta de desenvolvimento a
serviço dos territórios” (PAG, 2012:84). Na interpretação de Sarrasin et al (2006) , o ecoturismo é
associado à proteção de áreas e recursos naturais ao mesmo tempo em que promove o bem-estar da
população local, concepção convergente com aquela presente na Política Nacional de Ecoturismo,
inerente ao contexto brasileiro. A especificidade do ecoturismo no PAG está na ideia do “turismo
404
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de descoberta da Floresta Amazônica”, oferecendo trilhas e arvorismo, mas também uma grande
feira de artesanatos protagonizado pelas comunidades residentes no parque, “la marché artisanal du
Maroni”. Os objetivos explícitos desse tipo de turismo envolvem a valorização da flora e fauna
local na medida em que se incentiva uma circulação dos saberes e valores tradicionais de
comunidades ribeirinhas, indígenas e marrons. O ecoturismo deve ser assim associado a uma
transmissão de conhecimentos, patrimônio cultural e valorização de identidades locais. (SARASIN
et al, 2016).

4. CONCLUSÃO
A antropologia da técnica possibilita que rompemos com categorias estáticas como
“tradicional” e “moderno” para questionarmos essas mesmas categorias e pensarmos processos de
transformação. Sob essa perspectiva, podemos analisar o ecoturismo como um processo de
territorialização que envolve múltiplos atores novos, fluxos próprios e pode ocasionar
reconfigurações territoriais e identitárias dentro de áreas protegidas. Nesse sentido, Tardif e Sarrasin
(2014) falam em distintos processos de territorialização sobrepostos, que ocorrem a partir do projeto
do ecoturismo. Enquanto no caso da PAG há uma atribuição do ecoturismo sob uma visão muito
impregnada pelo desenvolvimento econômico e social, no caso da FLONA tem-se uma experiência
aparentemente estável e consolidada no que diz respeito à aplicação da atividade ecoturística. A
FLONA pode ter muito a iluminar as questões latentes no caso do PAG, mas uma atenção científica
e institucional ainda precisa ser direcionada à sua realidade pelos problemas abordados
anteriormente, além de a comparação entre as duas experiências conservacionistas demandar de nós
um extremo cuidado, no que concerne à consideração das particularidades epistemológicas, sociais
e políticas tangenciadas no presente resumo.

5. AGRADECIMENTOS
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de
pesquisa concedida.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARRETO FILHO, Henyo Trindade. Da nação ao planeta através da natureza: uma
abordagem antropológica das unidades de conservação de proteção integral na Amazônia
brasileira, USP (Tese de Doutorado), 2001

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405
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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SCHENSUL, Stephen L.; Schensul, Jean J.; LeCompte, Margaret D. “Guiding Principles”. In op.
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interviews, drawings, visual documentation, and survey data”. In. op. cit. pp. 47-82, 2013

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406
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

MAPEAMENTO DOS ATRATIVOS EM TRILHAS DO PARQUE


NACIONAL SERRA DA CAPIVARA E PARQUE NACIONALSERRA DAS
CONFUSÕES – PI
Camila Christiane Fonseca de Jesus*, CrisleideAliete Ribeiro Mendes**, Maria Eugênia Bruck de
Moraes***
Mestranda em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente, Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil*
Mestranda em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente, Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil**
Professora do DCAA, Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil. ** *

INTRODUÇÃO
O Parque Nacional Serra da Capivara (PNSCa) foi criado no ano de 1979 pelo Decreto nº
83.548, compreendendo área de 100.000 hectares com o intuito de proteger aos mais de 900 sítios
arqueológicos situados na região (Pessis&Guidon, 2007). O Parque Nacional Serra das Confusões
(PNSC)abrange área de 823.854,54 hectares e foi criado pelo Decreto de 2 de outubro de 1998 e
ampliado em dezembro de 2010.
Situados na Caatinga, bioma único atribuído ao seu isolamento geográfico, os Parques
contam com espécies vegetais endêmicas resultando em um cenário composto de árvores, arbustos
de galhos retorcidos, flores, cactosespalhados pela paisagem de terra seca(SARMIENTO, 1975).
As características únicas desses locais são o que mais chamam a atenção dos turistas em busca de
visitação.
Os PARNAS Serra da Capivara e das Confusões encontram-se neste contexto, assim o
presente trabalho buscou realizar mapeamento das trilhas, uma caracterização geral dos Parques,
bem como identificar os principais atrativos relacionados às suas trilhas e uma comparação entre os
Parques, de forma a contribuir para o planejamento do uso público da unidade.

MATERIAS E MÉTODOS
Foram realizadas revisões bibliográfica, documental e consultados materiais
disponibilizados pelos sites:Unidades de Conservação no Brasil/Instituto Socioambiental, ICMBio e
FUNDHAM. Este levantamento foi complementado com a realização de observações diretas nos
parques e seus arredores.
A obtenção dos dados foi realizada durante trabalhos de campo nas trilhas do Parque
Nacional Serra da Capivara e Parque Nacional Serra das Confusões entre os dias 28 a
30/05/2019.Durante o percurso foram observados os pontos de parada, a infraestrutura dos Parques
e meio físico. Os aspectos de interesse para o estudo foram registrados por meio de coordenadas
407
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

geográficas, fotografias, anotações e entrevistas não estruturadas junto aos funcionários do Parque.
Os pontos foram marcados utilizando GPS Garmin, sendo também medido o comprimento através
do odômetro do GPS.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
TRILHA GRUTA RIACHO DOS BOIS - SERRA DAS CONFUSÕES
O parque dispõe de 3 trilhas: Cores da Caatinga, Gruta Riacho dos Bois e das Pinturas
Rupestres. A trilha escolhida para o estudo foi da Gruta Riacho dos Bois (figura 1), seu percurso
necessita passar por 12 km de estrada de chão para chegar ao centro de visitantes. O centro de
visitantes é o primeiro ponto de parada onde contém infraestrutura como bancos, mesas, banheiro,
cantina, sala com informações acerca do Parque e sua fauna e flora.

Figura 1- Mapeamento das trilhas e pontos de parada do PARNA Serra das Confusões

Fonte: Elaborado pela autora, 2019

A lista completa dos pontos de parada realizados na trilha incluindo seus respectivos nomes
e coordenadas geográficas pode ser consultada na Tabela 3.

Tabela 3 – Lista dos pontos de parada da trilha


Nº Pontos de Parada Coordenadas Geográficas
1 Centro de Visitantes S9° 13.574' W43° 27.803'
2 Mirante S9° 13.251' W43° 29.110'
3 Olho D’água da Santa S9° 13.151' W43° 29.415'
4 Gruta Riacho dos Bois S9° 13.237' W43° 29.445'
5 Casa de Farinha S9° 13.604' W43° 27.611'
Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

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O Mirante é o segundo ponto após o Centro de Visitantes. Com vista para a belíssima
transição entre caatinga e cerrado que é uma particularidade da vegetação da região sul do estado.
Essas áreas são apontadas como ecótono, por existir uma combinação de dois ou mais tipos
ecológicos diferentes (CEPRO, 1996). A vista se aperfeiçoa com os lindos paredões que mudam de
cor no decorrer da mudança da luz solar trazendo tons alaranjados e acinzentados.
O terceiro ponto de parada é o Olho D’água da Santa do qual recebeu esse nome pelos
moradores antigos que habitavam a área do Parque. Utilizavam essa água para realizar rituais
religiosos, principalmente com pessoas adoentadas. Após a indenização do Parque, os ex-moradores
deixaram o local e retiraram a santa, porém o nome permaneceu.
A partir do Olho D’água segue-se a pé até a Gruta Riacho dos Bois. Ela é considerada uma
das maiores atrações do Parque com uma caminhada entre seus paredões rochosos areníticos. Essa
área apresenta uma temperatura agradável devido a umidade e sombra que o local oferece. Esses
fatores ajudam no crescimento de espécies ciófitas, epífitas ocasionais ou facultativas que obtêm
umidade e nutrição provenientes de uma camada rasa de húmus (JOANITTI, 2013).
A casa de Farinha é a última parada deste percurso em que famílias realizam o processo de
transformar a mandioca em farinha e tapioca no período de 8 a 12 meses. O visitante pode observar
todos os procedimentos caseiros para fabricação da farinha.

TRILHA CIRCUITO SÍTIO DO MEIO E BAIXÃO DA PEDRA FURADA – PARQUE


NACIONAL SERRA DA CAPIVARA
A sede do Parque situa-se no município de Coronel José Dias (516 quilômetros de Teresina)
onde também se encontra o Museu da Natureza. O Parque se encontra bem estruturado e conta com
mais de dez circuitos formados por várias trilhas para conhecer as paisagens, vegetação, geologia do
local e os sítios arqueológicos.
O ICMBio, órgão gestor do Parque incumbido principalmente da preservação natural e
patrimonial dispõe até o presente momento de três funcionários e uma equipe de guias. Com uma
boa infraestrutura em seu todo, o Parque se atenta em relação a manutenção como retirada de
cupinzeiro, instalação de calhas para a chuva não afetar as pinturas rupestres e alguns pontos é
despejado água em períodos de bastante seca, no intuito de manter os animais dentro da área do
Parque.
Os circuitos escolhidos foram do Sítio do Meio e Baixão da Pedra Furada (figura 4) que
dentre suas maiores atrações se encontra o sítio do meio, boqueirão e a Pedra Furada. Tem duração
de aproximadamente 6 horas e 13 quilômetros de extensão. A primeira parada é na guarita de
entrada que dispõe de banheiros, telefone e loja de artesanato.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 4 – Mapeamento e pontos de parada da trilha Circuito Sítio do Meio e Baixão da Pedra
Furada

Fonte: Elaborado pela autora, 2019.

Lista dos 22 pontos realizados no Circuito com seus respectivos nomes e coordenadas
geográficas (tabela 2).
Tabela 2 – Lista dos pontos de parada da trilha
Nº Pontos de Parada Coordenadas Geográficas

Ponto 1 Entrada S8° 50.283' W42° 32.868'

Ponto 2 Guarita S8° 50.259' W42° 32.868'

Ponto 3 Caatinga arbustiva S8° 50.111' W42° 32.844'

Ponto 4 Entrada do Circuito Sítio do Meio S8° 49.850' W42° 32.649'

Ponto 5 Mandacaru - Cereus jamacaru S8° 49.796' W42° 32.666'

Ponto 6 “Fenda na rocha” S8° 49.721' W42° 32.678'

Ponto 7 Toca do Sítio do Meio S8° 49.707' W42° 32.688'

Ponto 8 Mirante Vista da ponta da serra S8° 50.038' W42° 32.978'

Ponto 9 Vista Panorâmica S8° 49.914' W42° 32.963'

Ponto 10 Reservatório 1 S8° 49.891' W42° 33.033'

Ponto 11 Sítio Arqueológico 1* S8° 49.907' W42° 33.042'

Ponto 12 Reservatório 2 S8° 49.914' W42° 33.052'

Ponto 13 Gameleira - Ficusadhatodifolia S8° 49.925' W42° 33.085'

Ponto 14 Sítio arqueológico - UNIVASF S8° 49.933' W42° 33.100'

Ponto 15 Ponto de descanso S8° 50.249' W42° 33.235'

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Ponto 16 Sítio arqueológico a céu aberto* S8° 50.180' W42° 33.335'

Ponto 17 Toca Boqueirão da Pedra Furada S8° 50.148' W42° 33.367'

Ponto 18 Panorâmica do Boqueirão S8° 50.143' W42° 33.288'

Ponto 19 Toca do Arame do Sansão S8° 49.623' W42° 33.362'

Ponto 20 Vista panorâmica das mangueiras S8° 49.802' W42° 33.201'

Ponto 21 Pedra Furada S8° 50.033' W42° 33.222'

Ponto 22 Centro de visitantes S8° 50.190' W42° 33.318'

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

O terceiro e quinto ponto de parada retratam a vegetação, sendo a caatinga arbustiva que
contém espécies que variam entre 2 e 5 metros de altura e o mandacaru -Cereus jamacaru espécie
típica da Caatinga. A área onde se encontra o Parque era utilizada para plantação de milho,
mandioca dentre outros, sendo uma vegetação secundária em recuperação que se encontra
atualmente no local.
A partir do quarto ponto inclui-se no circuito sítio do meio, formado por caminhadas e
subidas aos mirantes (pontos 8 e 9) e sítios arqueológicos (pontos 7,11,14 e 16) de suma
importância. No ponto 13 observa-se a árvore gameleira - Ficusadhatodifoli, que se desenvolveu
sobre outra árvore e conseguiu estabilidade por estar próxima ao paredão rochoso.
Após a passagem pelo circuito do meio, um dos locais mais importantes do Parque é a Toca
do Boqueirão, pela diversidade e quantidade de pinturas rupestres em seus paredões rochosos
realizados por idades e provavelmente povos diferentes. Com agendamento prévio também é
possível visitar esse local à noite podendo observar os paredões com a iluminação noturna. O último
ponto de parada é a Pedra Furada, cartão postal do Parque e grande monumento geológico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este levantamento visou à caracterização geral das trilhas, incluindo atrativos e as principais
diferenças entre os dois Parques no contexto de uso público. No que diz respeito a visitação pública
foi possível verificar que o PARNA Serra das Confusões obtém quantidade de visitação inferior ao
PARNA Serra da Capivara, assim como a qualidade de infraestrutura. A localização geográfica que
os Parques encontram-se torna a questão extremamente complexa, requerendo esforços como
viagens longas e maiores gastos para os turistas, agravando ainda mais a situação com a dificuldade
de acesso aos locais pelas estradas sem pavimentação.
As duas trilhas trabalhadas contém grandes atrativos o que pode atrair visitantes e
educadores ambientais com grupos de estudantes que prezem pelo contato com a natureza

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

utilizando os Parques como laboratório ao ar livre.No entanto, diversos impactos foram


identificados e parecem estar relacionados à falta de estrutura e da fiscalização atual. Contudo, o
diálogo com o entorno, a melhoria de infraestrutura podem contribuir para o aumento de visitação.
Um projeto de uso público bem estruturado pode ser etapa importante para o desenvolvimento da
área protegida e interação com os visitantes.

AGRADECIMENTOS
Sou grata à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo
auxílio financeiro. Agradeço ao Laboratório de Análise e Planejamento Ambiental (LAPA) e sua
equipe.

REFERENCIAS
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412
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

VISITAÇÃO EM TERRAS INDÍGENAS: EXPERIÊNCIAS DE


ELABORAÇÃO DO PLANO DE VISITAÇÃO E REFLEXÕES ACERCA DE
SUAS IMPLICAÇÕES
VISITING INDIGENOUS TERRITORIES: EXPERIENCES OF ELABORATION OF THE
VISITING PLAN AND REFLECTIONSABOUT ITS IMPLICATIONS

Manuela Muzzi de Abreu*

* Pesquisadora integrante do Grupo de Pesquisa GAPIS - Governança, Ambiente, Políticas Públicas, Inclusão e
Sustentabilidade (Lattes/ CNPq), Mestre em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social, Instituto de
Psicologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro/ Brasil.

1. INTRODUÇÃO
As contribuições das Terras Indígenas (TIs) no impedimento do avanço do desmatamento na
Amazônia e na conservação da sociobiodiversidade vem sendo cada vez mais reconhecidas pela
sociedade. Contudo, as TIs sofrem grandes ameaças à sua integridade territorial devido às invasões
e diversas pressões em seu entorno, relacionadas ao garimpo ilegal,mineradoras, madeireiras,
grileiros e fazendeiros, interessados na extração e/ouexploração dos recursos naturais que estas
protegem, e que são essenciais para a vida dos povos originários que as habitam. Alternativas às
atividades predatórias vem sendo planejadas e desenvolvidas em algumas TIs, com apoio da
Fundação Nacional do Índio (Funai) e organizações parceiras, com foco na melhoria da qualidade
de vida de seus povos, atendimento as suas necessidades básicas, valorização dos conhecimentos
tradicionais e incentivo a geração de renda de forma sustentável. Entre estas atividades,são
incentivadasa agroecologia, a certificação participativa de produção orgânica e o selo de
identificação de origem étnica e territorial, além da visitação em TIs para fins turísticos1.
O caso da visitação nas TIs é objeto de análise desta pesquisa, que foi estruturada a partir de
uma revisão da literatura e de relatos de experiências sobre a construção de planos de visitação de
TIs, a partir da publicação da Instrução Normativa da Funai, Nº 03/2015, que visa ordenar a
atividade orientando a elaboração de um Plano de Visitação.Atualmente, já existem cinco planos de
visitação aprovados pela Funai, sendo quatro no bioma da Amazônia e um na Mata Atlântica. Estes
são os projetos de turismo nas TI Pequizal do Naruvotu (Parque do Xingu - aldeias Morená, Arayó
e Ilha Grande) - MT; TI Mekragnoti (aldeia Kendjam) – PA;TI Kayabi (sete aldeias) –MT;TI
Médio Rio Negro II (rio Marié) - AM. O quinto projeto é do povo Guarani, da TI Tenondé Porã -
SP, na região de Parelheiros, Sul do município de São Paulo.

1
Fonte: http://www.funai.gov.br/index.php/nossas-acoes/2013-11-18-18-38-38 acesso em 02/09/2019.
413
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A pesquisa desenvolvida analisou os planos de visitação já aprovados e/ouem vias de


aprovação, disponíveis por consulta em sítios eletrônicos da internet, e as matérias e entrevistas
publicadas sobre experiências que vêm sendo desenvolvidas por povos indígenas e associações
parceiras no processo de elaboração de planos de visitação. Buscou mapear quais são os planos já
elaborados, em andamento e em fase inicial no país, observar quais são os argumentos que
embasam a elaboração dos planos e que justificam o interesse em desenvolver a visitação nas TIs,
avaliando a governança territorial envolvida, e por fim, identificar quais são as formas previstas
para monitorar e controlar os impactos da visitação sobre as TIs.

2. MATERIALEMÉTODOS
Este estudo foi baseado em uma revisão bibliográfica e documental, principalmente a partir
de documentos e matérias jornalísticas, além de participação em palestras e debates públicos sobre a
temática investigada. As principais matérias e artigos jornalísticos consultados foram dos sítios
eletrônicos da Funai, Instituto Socioambiental (ISA), Conselho Indigenista Missionário (Cimi),
Centro de Trabalho Indigenista (CTI), ONG Garupa, entre outros, no período de junho a setembro
de 2019.
Devido às discussões sobre o tema estarem se ampliandorecentemente, a partir da
publicação da IN 03/ 2015 da Funai e da elaboração dos primeiros planos de visitação, o debate
sobre a implementação dos planos e os resultados do ordenamento do turismo em TIs ainda não foi
refletido na produção acadêmica. Isto reforça ainda mais a importância de se voltar o olhar para o
tema, a partir de diferentes perspectivas.
Ao longo dos anos de 2018 e 2019 foram pesquisadas referências sobre a visitação em TIs e
a implementação dos planos, incluindo a participação em fóruns de discussão, sendo o que mais se
destacou foi o evento intitulado “Turismo Indígena”, realizado em julho de 2019 na cidade de São
Paulo. Neste, cinco lideranças das etnias Yawanawa, Yanomami, Baré e Guarani estiveram
presentes, prestandoseus depoimentos sobre a atividade de visitação em suas terras. Trouxeram
exemplos de projetos de visitação que estão em diferentes estágios de desenvolvimento, sendo
essesno Pico da Neblina – Yaripo (Yanomami), Tenondé-Porã (Guarani), turismo de pesca no rio
Marié (Baré), Serras Guerreiras de Tapuruquara (Baré) e turismo xamâmico (Yawanawá). A partir
destes exemplos, foram pesquisados os planos de visitação disponíveis para consulta e analisados
em relação às formas previstas de monitoramento dos impactos relacionados às atividades turísticas,
expectativas dos justificativas das comunidades indígenas relacionadas ao ordenamento da visitação
nas TIs.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A importância das áreas protegidase em especial das Terras Indígenas para conservação da
sociobiodiversidade, é um tema que tem se mostrado de extrema importância no período atual,
especialmente no ano de 2019, em que a floresta amazônica tem sofrido graves incêndios
criminosos que repercutiram na mídia mundial.As TIs, cujo reconhecimento é previsto pela
Constituição Federal de 1988, são atualmente consideradas as principais barreiras ao desmatamento,
e sua conservação é vital para a proteção da biodiversidade e reprodução cultural e física dos povos
que a habitam.
A responsabilidade de proteger e promover os direitos dos povos indígenas no país cabe à
Fundação Nacional do Índio (Funai)e, entre suas atribuições, está a de incentivar atividades
sustentáveis e relacionadas à geração de renda para as comunidades.Nesse sentido, conforme
previsto pela Política Nacional de Gestão Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), a visitação em
TIs é mencionada como uma possibilidade de atividade a ser desenvolvida de forma sustentável
com geração de renda, desde que seja estabelecida com base comunitária e de acordo com os
interesses e limites colocados pelos povos indígenas. Para regularizar a visitação, a Funai
estabeleceu a Instrução Normativa Nº 03/2015, que aponta as diretrizes para se realizar a visitação
em TIs,além de sugerir modelos de termos de responsabilidade de visitantes, parceiros, e de
autorização de ingresso nas TIs. Isto se dá a partir da elaboração de um plano de visitação, a ser
elaborado conforme as orientações da IN, e então submetido à aprovação da Funai.
Com isso, no âmbito desta pesquisa, foram investigadas quais TIs estão elaborando plano de
visitação e quais já possuem planos aprovados. A partir da consulta em fontes bibliográficas e
documentais realizada, foram encontrados como resultado 5 planos de visitação aprovados, e
aproximadamente 16 planos em fase de elaboração e 3 em fase inicial de estudo. As experiências de
construção de alguns destes planos de visitação, embora ainda em andamento, foram relatadas e
mostram queesse é um processo longo, feito de forma coletiva, e que necessariamente deve ter o
protagonismo indígena e de suas organizações comunitárias.
Foram analisados dois planos de visitação, que são o Yaripo (Yanomami) e da TI Tenondé-
Porã (Guarani), por estarem disponíveis na internet. A análise dos planos corrobora com a fala de
seus representantes nos debates públicos presenciados, que pontuaram que o objetivo das
comunidades não é viver do turismo. Associam a visitação com uma estratégia de proteção
territorial e de diversificação de formas de geração de renda dentro das TIs, sendo que estas podem
ser estabelecidas em oposição a atividades ilegais como garimpo e extração de madeira, além de
impedir que empresas não autorizadas ingressem em suas terras levando turistas de forma
predatória. Além disso, foi ressaltado que a experiência de abertura das TIs à visitação pode ter um
caráter educativo importante, para sensibilizar os não-indígenas sobre as formas de vida nas aldeias,
contribuindo para o respeito aos povos, sua culturae seus direitos.
415
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
O artigo buscou trazer um panorama dos processos de implementação dos planos de
visitação em TIs, a partir da IN 03/2015 da Funai. A pesquisa foi realizada com base principalmente
em dados secundários, além da análise de relatos de experiências apresentados em debates públicos,
em que representantes indígenas e seus parceiros compartilharam processos de organização do
turismo e de construção dos planos de visitação.Verificou-se que há ainda pouco material
acadêmico produzido sobre o tema, o que indica a necessidade de se aprofundar no debate sobre o
ordenamento da visitação em terras indígenas.
O argumento de se estabelecer uma visitação como estratégia de proteção territorial e
educação sobre a vida nas aldeias, foi utilizado como justificativa para embasar os planos de
visitação analisados, assim como a diversificação de formas de geração de renda dentro das TIs
conservando a floresta em pé. As experiências de construção dos planos de visitação abordadas
mostram a importância de que o foco dos projetos seja a autonomia, o protagonismo, o respeito e
qualidade de vida dos povos indígenas, além reforçar a garantia do direito ao território e a proteção
das TIs.
A conclusão apontou para a importância de se estabelecer instâncias de governança de base
indígena, apoiadas por suas organizações parceiras, com envolvimento do setor público e do
terceiro setor, para a elaboração do plano e acompanhamento da atividade de visitação. Além disso,
ficou clara a importância de se estabelecer formas de monitoramento participativo da atividade,
tanto para reforçar as estratégias de proteção territorial quanto para acompanhar e atuar sobre as
implicações culturais, socioeconômicas e ambientaisda visitação para os povos e seu território.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecimentos à Paula Arantes, turismóloga da ONG Garupa e Camila Barra, antropóloga
e ex-funcionária do ISA, que forneceram informações e documentos publicados sobre os projetos
dos planos de visitação desenvolvidos.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CORBARI S.D., BAHL M. & SOUZA S.R.Legislação Indigenista e Perspectivas para o Turismo
em Terras Indígenas no Brasil. Revista Turismo em Análise - RTA, ISSN: 1984-4867, DOI:
http://dx.doi.org/10.11606/issn.1984-4867.v28i1p53-70. ECA-USP, v. 28, n. 1, p. 53-70, jan./abr.,
2017.

416
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FUNAI, Fundação Nacional do Índio. FUNAI normatiza Etno e Ecoturismo em Terras


Indígenas. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/3334-funai-
normatiza-etno-e-ecoturismo-em-terras-indigenas>. Acesso em: 10 ago. 2019.

______. Instrução Normativa Nº 3, de 11 de junho de 2015. Estabelece normas e diretrizes relativas


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http://www.funai.gov.br/arquivos/conteudo/ascom/2015/doc/jun-06/IN%2003%202015.pdf. Acesso
em: 05 jul. 2019.

FUNAI – Fundação Nacional do Índio, Brasília, maio. Disponível em:


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no-coracao-da-amazonia.html, acesso em 12/08/19.

https://noticias.band.uol.com.br/jornaldaband/videos/ultimos-videos/16399664/amazonia-povos-
indigenas-recuperam-sua-arte-e-cultura.html, acesso em 12/08/19.

https://noticias.band.uol.com.br/jornaldaband/videos/ultimos-videos/16400312/amazonia-natureza-
exuberante-e-tesouro-natural.html, acesso em 12/08/19.

417
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

TURISMO E LAZER NO MOSAICO DE ÁREAS PROTEGIDAS DO BAIXO


RIO NEGRO – AM
TOURISM AND LEISURE IN THE MOSAIC OF PROTECTED AREAS OF BAIXO RIO
NEGRO - AM

Susy Rodrigues Simonetti* Nailza Pereira Porto** Caroline Yoshida Kawakami***

Professora do Curso de Bacharelado em Turismo e do Mestrado Interdisciplinar em Ciências Humanas da Universidade


do Estado do Amazonas – UEA; Professora do Mestrado Profissional em Gestão de Áreas Protegidas/INPA; Doutora
em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia (UFAM), Brasil*
Pesquisadora Associada do Instituto de Pesquisas Ecológicas – IPÊ; Mestre em Gestão de Áreas Protegidas
(MPGAP/INPA), Brasil **
Assessora Técnica da Secretaria de Estado do Meio Ambiente/AM; Mestre em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade
na Amazônia, Brasil ***

1. INTRODUÇÃO
O turismo e o lazer ganharam espaço nas discussões acadêmicas e nas políticas públicas,
especialmente nos últimos anos nas Unidades de Conservação (UCs) do Baixo Rio Negro, no
Amazonas. Nessa região, há o Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro – MBRN, onde
estão localizadas algumas das melhores experiências de turismo em comunidades ribeirinhas e
indígenas. Cada uma das diferentes UCs que compõem o MBRN possui potencial para o
desenvolvimento do turismo em seus vários segmentos: ecoturismo, turismo de aventura, turismo
étnico, cultural e outros, sendo que grande parte dos esforços está sob a gestão comunitária.
Alguns estudos realizados na região do Baixo Rio Negro contribuíram para se conhecer
melhor as experiências de turismo e lazer que ocorrem nas comunidades, dentre eles destaca-se o
de Porto e Lima (2014), apresentando o fomento ao turismo nas comunidades do entorno sul do
Parque Nacional de Anavilhanas, abrangendo os municípios de Manaus, Novo Airão e Iranduba,
por meio do trabalho Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ). Nesse estudo, foram identificadas 15
iniciativas comunitárias (Figura 1).

Figura 1: Mapa das 15 iniciativas de TBC identificadas pelo IPÊ.

418
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Fonte: Acervo IPÊ, 2010.


O acompanhamento, inicial, da equipe do IPÊ junto a essas iniciativas comunitárias, tinha
como objetivo promover diálogos sistemáticos com os diferentes atores sociais (comunidades, guias
de turismo, donos de embarcações, operadores, organizações governamentais e não governamentais,
universidades), a respeito do ordenamento do turismo, com o intuito de minimizar os danos
ambientais e valorizar as iniciativas comunitárias. Mesmo diante desse apoio externo, as
comunidades dessa região seguem recebendo visitantes e se organizando há mais de três décadas a
partir de suas redes de colaboração, visando proporcionar uma experiência singular àqueles que
chegam ao seu território.
A pesquisa-ação, o levantamento de informações secundárias, o acompanhamento das ações
de turismo nos últimos 10 anos, tanto por meio do Fórum de Turismo de Base Comunitária do Rio
Negro, quanto pela avaliação do projeto contemplado pelo Edital do Ministério do Turismo no ano
de 2009 intitulado “Proposta de ações estratégicas para o desenvolvimento sustentável do turismo
de base comunitária no entorno sul do Parque Nacional de Anavilhanas”, constituíram o arcabouço
teórico-metodológico desse processo dialético que é o turismo nas comunidades tradicionais do
Amazonas.
Outros estudos acadêmicos também se destacam nessa parte do Mosaico, como o de Costa
Novo (2011), ao buscar conhecer o turismo comunitário da região; o estudo socioeconômico
realizado por Porto (2014), em uma comunidade pertencente ao MBRN; a tese de doutorado
realizado em três comunidades de áreas protegidas na região do Baixo Rio Negro, margem direita,
realizado por Simonetti (2015), com foco na investigação sobre as representações sociais de turismo
e lazer dos moradores; e a tese de Silva (2016), envolvendo o turismo em comunidades tradicionais
na mesma região.
As pressões sobre as UCs do MBRN são as mais diversas possíveis – desde a especulação
imobiliária até a extração ilegal de madeira -, mas o turismo e o lazer ocorrem há décadas nesta
região do rio Negro, como uma forma de resistência diante das evidentes condições desfavoráveis.
Nesse sentido, o presente artigo tem como objetivo analisar as mudanças, ao longo da última
década, no cenário de 15 iniciativas de turismo nas comunidades da região do Mosaico de Áreas
Protegidas do Baixo Rio Negro, no estado do Amazonas.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo, ao analisar as mudanças ao longo da última década no cenário de 15 iniciativas
de turismo nas comunidades da região do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro, foi
composto por três etapas distintas: a primeira etapa, preparatória, consistiu em uma seleção

419
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

criteriosa de autores e estudos relacionados aos temas turismo e áreas protegidas, envolvendo
pesquisa bibliográfica e documental. Houve ainda o regate de todo trabalho (entrevistas,
capacitações, conversas informais e entrevistas em atas e relatórios) junto aos arquivos do Fórum e
IPÊ.
A segunda etapa, essencialmente qualitativa, envolveu conversas informais e entrevistas
junto aos sujeitos representantes dos grupos familiares que conduzem as atividades de turismo e
lazer na região definida, e junto aos representantes das instituições (07) que apoiam o turismo na
região. Em cada uma das 15 iniciativas comunitárias pelo menos dez (10) sujeitos estiveram
envolvidos com este trabalho. A aproximação com as iniciativas ocorreu por meio das visitas in
loco entre os anos de 2009 e 2019 nas comunidades sinalizadas na Figura 1, configurando-se em
uma pesquisa-ação, e por meio de reuniões e discussões no âmbito do Fórum de Turismo
Comunitário, ou seja, o estudo envolve um recorte de uma década de trabalho na região.
O Fórum é um espaço de discussão (as reuniões ocorrem a cada dois meses) formado por
representantes de instituições governamentais, não governamentais, trade turístico, academia e
lideranças comunitárias, que surgiu a partir de um grupo de trabalho responsável por incentivar e
apoiar diretamente a implantação de um Plano de Ação para o turismo sustentável na região do sul
do Parque Nacional de Anavilhanas, viabilizando o diálogo entre os diferentes grupos de interesse.
A terceira e última etapa consistiu na organização e sistematização das informações
coletadas, baseadas nos relatos, entrevistas, relatórios e de acordo com os objetivos do estudo, a
partir de uma visão dialética desta realidade, confrontando o resultado dos trabalhos, as opiniões e
oposições encontradas ao longo do trabalho.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO: O TURISMO NAS COMUNIDADES DO MOSAICO DO


BAIXO RIO NEGRO
De acordo com Sampaio et al (2011, p. 27), o grande desafio do turismo comunitário é
“promover modos de vida tradicionais (tidos, sob a lógica desenvolvimentista, como modos de vida
obsoletos), inseridos em economias comunitárias, que se apresentam ambientalmente mais
sustentáveis [...]”, ou seja, é necessário valorizar e olhar sob um outra perspectiva essa forma de
gestão.
Simonetti, Nascimento e Chaves (2018) garantem que o turismo comunitário pode ser
compreendido como um modelo de turismo endógeno, cujo protagonismo deve ser atribuído à
comunidade, ainda que, na concepção de Fabrino (2018), tal discussão esteja situada em bases
ideológicas, pois na prática o protagonismo se distancia da realidade.
O projeto “Proposta de ações estratégicas para o desenvolvimento sustentável do turismo de
base comunitária no entorno sul do Parque Nacional de Anavilhanas”, resultou em um importante
420
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

diagnóstico das iniciativas de turismo em comunidades na região, uma vez que foram identificadas
várias situações que levavam a um turismo insustentável no Mosaico.
O diagnóstico, fruto desse convênio, elaborado em 2011 (Relatório IPÊ), apontava para um
turismo pouco estruturado, mas diversificado em termos de atrativos: trilhas, rios, cachoeiras,
artesanato, gastronomia regional, apresentações culturais indígenas e bens histórico-culturais, com o
envolvimento de grupos familiares das 15 comunidades em atividades de turismo e lazer (Figura
01). As discussões realizadas no âmbito do Fórum de Turismo Comunitário, indicavam para uma
atividade complexa, repleta de desafios, tendo comunidades e apoiadores dispostos a
desenvolverem um turismo sustentável sob a gestão comunitária. As análises dos dados são claras
ao indicar que, inicialmente, das 15 iniciativas nas comunidades, cerca de 10 despontavam no
turismo com algum apoio externo, enquanto 05 delas ainda estavam com trabalhos incipientes.
A partir da análise de uma década de trabalho na região, percebeu-se uma diversificação das
atividades e iniciativas comunitárias no rio Negro: o surgimento de restaurantes e pousadas
comunitárias, de atividades de observação e interação com botos, de espaços para apresentação
cultural indígena, visitação na biblioteca indígena, circuito de canoagem, trilhas sinalizadas com
informações que contribuem para a interpretação ambiental, oficinas de artesanato, novos espaços
com gastronomia local, espaços para venda de produtos da sociobiodiversidade (bombons, biscoitos
e geleias de frutas regionais), locais de visitação em experiências agroflorestais, participação do
visitante no preparo da farinha, soltura de quelônios, exposição e venda de artesanato local, e muitas
outras atividades.

4 CONCLUSÃO
O mapeamento das iniciativas comunitárias na região sul do Parque Nacional de
Anavilhanas foi considerado o passo inicial rumo a integração de várias ações no Mosaico. A
aproximação entre os vários sujeitos e instituições possibilitou uma melhor articulação entre aqueles
envolvidos na atividade turística local, bem como a formação de uma rede, com interesses comuns,
promovendo mais qualidade no desenvolvimento das experiências de visitação na região. No
entanto, mesmo diante de tantas conquistas ao longo de uma década, há um longo caminho a ser
percorrido na percepção dos sujeitos envolvidos com o turismo e o lazer nas comunidades. A
análise das atas das reuniões, relatórios e trabalhos produzidos pelo Fórum, ao longo dos anos,
mostra a iniciativa como um diferencial na região, ao reunir os sujeitos, divulgar o turismo nas
comunidades, promover intercâmbios, além de outras ações.

5 REFERÊNCIAS
COSTA NOVO, C B. M. Turismo de base comunitária na região metropolitana de Manaus:
421
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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422
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

NASCE UM DESTINO CHAMADO MILAGRES: ANÁLISE DOS EFEITOS


DA INSERÇÃO DA ATIVIDADE TURÍSTICA EM COMUNIDADES
PESQUEIRAS DE PORTO DE PEDRAS E SÃO MIGUEL DOS MILAGRES,
ALAGOAS, BRASIL
A DESTINY NAMED MIRACLES: ANALYSIS OF THE EFFECTS OF THE INSERTION OF
TOURISM ACTIVITY ON FISHING COMMUNITIES OF PORTO DE PEDRAS AND SÃO
MIGUEL DOS MILAGRES, ALAGOAS, BRAZIL

Manuela Grace de Almeida Rocha Kaspary* Lindemberg Medeiros de Araujo**


*Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU/FAU), Universidade Federal de
Alagoas, Brasil; Docente do departamento de Hospedagem doInstituto Federal de Alagoas, campus Maragogi, Brasil;
**Professor Doutor do Departamento de Geografia e Meio Ambiente da Universidade Federal de Alagoas (IGDEMA),
Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Esta investigaçãobuscou analisar os efeitos do desenvolvimento turístico nos municípios de
São Miguel dos Milagres e Porto de Pedras, inseridos na denominada Rota Ecológica dos Milagres,
litoral norte de Alagoas. Esses municípios, antes isolados geograficamente, exibem um apanágio
cênico e características físicas e ambientais pouco modificadas, esses aspectos associados à escolha
desse ambiente para reintrodução do peixe-boi, à incorporação do lugar no circuito de pousadas do
charme e, sobretudo, à realização de uma festa de réveillon nas proximidades, os colocou em uma
posição de destino turístico da moda. As circunstâncias citadas acima contribuíram com a inserção
de novos atores e instituições vinculados a ações de conservação da vida marinha, preservação
ambiental e inclusão social; como também novos empreendimentos turísticos, comerciais,
imobiliários e de serviços motivados pelas condições oportunas para as suas respectivas atividades.
Contudo, como consequência, principalmente desses últimos, povoados que outrora eram lugar de
práticas voltadas a pesca artesanal, a cultura do coco e para agricultura de subsistência, agora se
convertem em territórios turísticos e imobiliários direcionados para segunda residência. Com efeito,
essa nova configuração socioespacial tem desencadeado novas dinâmicas e práticas que, de alguma
maneira, tem interagido com antigas práticas, as vezes dialogando, as vezes estabelecendo relações
conflitivas. Desse modo, o objetivo deste trabalho é identificar as transformações socioespaciais nos
povoados litorâneos que compõem esses municípios em decorrência da inserção do fenômeno
turístico e imobiliário. Busca-se também saber se, e de que maneira, a interação com novos atores e
agentes que integram esseslugares têm interferido em respostas da sociedade local ao fenômeno.

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2. MATERIAL E MÉTODO
Conhecer antigos e novos atores, suas relações, suas percepções e ações no território
turístico foram propósitos colocados neste estudo. E como mecanismo de apreensão da realidade
optou-se pela adoção do método de investigativo de caráter histórico-etnográfico. O trabalho de
campo iniciou em 2014, em uma parceria em um projeto do IFAL (Campus Maragogi) e o Instituto
Chico Mendes de Meio Ambiente (ICMBio), da base de Porto de Pedras, e organizações que
atuavam no recorte territorial denominado de Rota Ecológica, Instituto Yandê, Colônias de
Pescadores Z-25 e Z-11. Esse contexto possibilitou conhecer e dialogar com outras entidades e
atores. Em momentos específicos foi possível conhecer conflitos e tensões existentes, não só dos
municípios da Rota Ecológica como também do restante dos povoados pesqueiros que fazem parte
da APACC. Este trabalho se tornou mais intenso no segundo semestre de 2016, quando foi cedido o
uso do alojamento da ICMBio, na base de Porto de Pedras. A partir daí, as visitas se tornaram
assíduas e continuadas até final de fevereiro de 2017.
Durante o percurso investigativo no Brasil consultou-se documentos institucionais (Plano
diretor de São Miguel dos Milagres, Portaria de criação da APACC, Plano de Manejo da APACC e
sua proposta de revisão, outros documentos de organismos ambientais como o ICMBio, Plano de
Desenvolvimento Turístico Costa dos Corais, Atas da reuniões do CONAPACC, Atas de encontros
com pescadores, propostas de projetos socioambientais, entre outros) e acadêmicos.
Bibliograficamente falando, elencou-se o livro do Historiador Dirceu Lindoso denominado
‘Formação da Alagoas Boreal’, o livro de Manuel Diegues Junior, nomeado ‘O bangüê nas
Alagoas: traços da influência do sistema econômico do engenho de açúcar na vida e na cultura
regional’, e o livro fruto da tese Maria Eduarda Rocha, titulado de ‘Pobreza e cultura de consumo
em São Miguel dos Milagres’. Esses três livros foram chaves para conhecer os processos históricos
ocorridos na região. Apesar dos dois primeiros apontassem o desenvolvimento de toda região, o da
Maria Eduarda Rocha se restringiu ao recorte territorial de estudo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Porto de Pedras e São Miguel dos Milagres são municípios costeiros do litoral norte do
Estado de Alagoas. Ambas municipalidades estão inseridas na Área de Proteção Ambiental Costa
dos Corais (APACC). Esta área de conservação é caracteristicamente marinha e estuarina, em uma
abrangência que se limita, no continente, às linhas preamar e aos estuários dos rios que abarca; o
restante fica em ambiente marinho. Na costa, limita-se ao norte com o sul do Estado de
Pernambuco e ao sul com o norte de Alagoas.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A inserção desse recorte como área ambiental e os primeiros casos de reintrodução do peixe-
boi, o crescimento do número de pousadas e por fim com a realização da festa de réveillon, a partir
do ano 2011, confluem para que essa região se tornasse um destino turístico da moda. Matérias
jornalísticas e materiais publicitários contribuíram com essa circunstância. O interesse pelo lugar se
amplia e faz despertar a atenção de grupos sociais privilegiados, como empresários, donos de
propriedades, políticos e outros que convivem ou transitam pelo território.
É nesse estágio que cercas passam a ser levantadas e terrenos e sítios passam a ser
cortejados. Nesse lapso de tempo a demanda acompanha o aumento do valor do solo e da moradia.
Também é nesse estágio que o termo ‘ecológico’ se faz coadjuvante para que ‘Milagres’ se
destaque, seguindo uma característica da segunda fase do fenômeno de gentrificação apontada por
Clay (1979). Essa nova fase põe em xeque antigas práticas. Os espaços necessários do labor, como
caminhos e locais de estacionamento, embarque e desembarque, que a cada dia são reduzidos. A
obstrução do espaço de passagem e a limitação dos espaços de práticas voltadas a pesca tem sido o
que tem dificultado a continuidade da prática pesqueira. Outros elementos a considerar são as
perdas de terrenos para práticas agrícolas de subsistência. Terrenos e mais terrenos têm sido
cercados, loteados, vendidos, ou postos a vendas, para que sirvam objeto de valorização imobiliária
voltada para o turismo e para o veraneio. Essas obstruções as práticas laborais junto ao mar e ao
mangue já foram apontadas por Cañada (2018) em outros lugares da costa latino-americana, fato,
que segundo ele, vem a corroer as fontes necessárias para a sobrevivência dos mais pobres.
Contudo, em um movimento ainda descompassado, novas atividades econômicas passam a ser
exercidas por seus habitantes, dentre elas o artesanato, o passeio de jangada, o passeio de bugre,
trabalhos em pousadas e restaurantes.
Assim como têm ampliado de maneira, pode-se dizer, vertiginosa, nos últimos cinco anos, o
comércio e o setor de serviços, quando se refere a São Miguel dos Milagres. A falta de imóveis para
aluguel, em recortes territoriais que eram comuns de existir, já ocorre. Além disso, o que se
observa é que atividade turística e imobiliária, mesmo que queira, não parece ter condições
suficiente para absorver a crescente população jovem de São Miguel de Milagres e Porto de Pedras.
A disponibilidade de trabalho ofertadas e de ofícios que surgem não demonstram que possam ter
capacidade de substituir por definitivo antigas práticas laborais.
A presença da atividade turística e da segunda residência nos casos de estudo influenciou em
novas práticas e novas relações de trabalho. Essas relações envolvem menos trocas e maior o
ingresso do valor monetário, como também tem influenciado nas relações de animosidades entre
antigos pares. A atividade de jangadeiro e bugre, por exemplo, tem desencadeado disputas entre
colegas de ofício. O exercício da atividade de caseiro tem influenciado na discussão entre antigos
vizinhos. Vizinhas que exerciam coletivamente a coleta do marisco, pouco a pouco, deixam de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

desfrutar da companhia de outras que faziam parte. Crianças e adolescentes do povoado, que antes
acompanhavam seus pais e mães para o exercício de antigas práticas, agora experimentam a
liberdade de não ir. São poucos os que insistem. E esse não ir, nem ao menos por diversão, também
influencia na perda de antigos saberes.
A oferta de produtos e serviços para uma classe social mais elevada por parte de vários
estabelecimentos, de certa forma, não interfere naqueles estabelecimentos que ofertam produtos
básicos voltados ao consumo doméstico de pessoas simples. Parece haver, no momento, espaço para
ambos estabelecimentos. Contudo algo deve ser colocado, o potencial econômico proveniente da
prestação de serviços para atividade turística está concentrado nas mãos daqueles que tem capital
para investir. Os maiores ganhos ainda são daqueles que dispõem de embarcações, bugres e espaços
de receptivo, coincidentemente poucos não exclusivamente local, pelo contrário a maioria
proveniente de outros lugares, portanto seguindo uma realidade já vislumbrada por Gotham (2005)
e Cocola-Gant (2018), quando se refere a espaços alvos da gentrificação turística.

4. CONCLUSÃO
Dentre os resultados foi identificado que o processo não ocorre de maneira homogênea em
todo território, pelo contrário, as peculiaridades físico culturais de cada povoado, assim como
atuação de certos segmentos sociais, tem influenciado em diferentes configurações socioespaciais
em cada um dos dez povoados litorâneos que integram este estudo. As especificidades de cada
povoado e a rede de relações que os envolve têm influenciado em antagônicos contextos: enquanto,
em alguns dos povoados, práticas e modos de vida, pretéritos a inserção da atividade turística, estão
sendo de certa forma preservados; noutros, os modos tradicionais de subsistência e aspectos da
cultura local estão sendo paulatinamente perdidos, numa circunstância que tende a se adaptar a
novas formas e práticas voltadas a atividade turística e imobiliária.

5. REFERÊNCIAS
APACC – Área de Proteção Costa dos Corais. Disponível em
http://www.icmbio.gov.br/apacostadoscorais/quem-somos/historico.html Acesso em 15 de setembro
de 2016.

CAÑADA, E. - Dispossession, DisplacementandSubordination in theConstructionofTouristAreas:


Central America as a ConlictScenario. In: Revueenligne, 2018. Acesso em: http://norois.revues.org

CLAY, P. NeighborhoodRenewal: Middle-ClassResettlementandIncumbentUpgrading in


American Neighborhoods. Lexington: Lexington Books, 1979.

COCOLA-GANT, A Tourismandcommercialgentrification. In: The ideal city. Betweenmythand


reality. RC21 Conference, Urbino: ISA, pp. 1–25, 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

COCOLA-GANT, A Tourismgentrification. In Lees, L and Phillips, M (Eds) Handbook


ofGentrificationStudies.Cheltenhamand Northampton: Edward ElgarPublishing, 2018.
DIEGUES JUNIOR, M. O bangüê nas Alagoas: traços da influência do sistema econômico do
engenho de açúcar na vida e na cultura regional. Maceió: Edufal, 2006.

GOTHAM, K. F. TourismGentrification: the case of New Orleans VieuxCarre (frenchquarter). In


UrbanStudies, Vol. 42, nº 7, 1099 –1121, Jun 2005.

LINDOSO, D. Formação de Alagoas Boreal. Maceió: Cataventos, 2000.

ROCHA, M. E. M. Pobreza e cultura de consumo em São Miguel dos Milagres. Maceió: Edufal,
2002.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PESQUISA DE PERFIL DO VISITANTE DO PARQUE NACIONAL DO


CATIMBAU, FEITA PELOS INTEGRANTES DA ASSOCIAÇÃO DE
CONDUTORES DE TURISMO DO CATIMBAU (ACONTURC) – 2018
Gisela Livino de Carvalho* ; Luís Cavalcanti Ramos** ; Macilio Bezerra Cavalcanti** ; José Pereira
de Almeida**; Luciano Bezerra Cavalcanti2**
*
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO)/ Parque Nacional do Catimbau
E-mail: gisela.carvalho@icmbio.gov.br
**
Associação de Condutores de Turismo do Catimbau (ACONTURC)
E-mail: turismocatimbau@gmail.com

Introdução
O Parque Nacional do Catimbau (PNC) foi criado por Decreto Federal s/n, em 13/12/2002,
abrangendo os municípios de Buíque, Tupanatinga e Ibimirim, em Pernambuco. Abrange 62.300
hectares e possui importante patrimônio natural, conservando uma estrutura geomorfológica rica em
belas e incomuns formações rochosas, decorrentes da erosão sobre rochas de diferentes graus de
dureza. É constituído pela fitofisionomia de caatinga, com vegetação de porte diversificado, que
abriga espécies endêmicas da região e do domínio das Caatingas. Contém fauna rica em espécies
típicas deste bioma, assim como alguns endemismos notáveis e espécies ameaçadas de extinção.
Além de sua riqueza natural, contém notável patrimônio histórico-cultural, abrigando os mais
importantes conjuntos de pintura rupestre de Pernambuco. O PNC só perde em número de registros
de sítios arqueológicos pelo IPHAN para o Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí. Vale
salientar que o parque conta com uma demanda crescente de visitação, sendo uma região de
significante interesse turístico no estado de Pernambuco.
A Associação de Condutores de Turismo do Catimbau (ACONTURC) foi formada em 2001,
pouco antes de ser publicado o decretode criação do PNC. À época, 15 comunitários da região, em
Buíque, que já atuavam como condutores locais na região do Vale do Catimbau, foram capacitados
por servidores do Ibama, em conjunto com professores do curso de Turismo da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), em temas como associativismo, biodiversidade e objetivos do
parque, condução de visitantes, manejo de trilhas, entre outros afins. Atualmente, conta com 10
associados, que são parceiros dos servidores do ICMBIO, recebendo e orientando os turistas, assim
como promovendo a manutenção das trilhas e monitorando a conservação destas e dos sítios
arqueológicos, informando aos gestores quando há alguma anormalidade. Também fazem o registro
dos visitantes que os procuram. No último mês de junho, por exemplo, 466 pessoas assinaram o
livro de registro na sede da ACONTURC, fora o número que não conseguimos estimar, pois são
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

pessoas que acessam o parque sem condutores ou com guias não credenciados, ou que deixam de
assinar o livro.
Como forma de traçar um perfil médio dos visitantes do PNC e aproximar os condutores
associados dos gestores do parque, no processo de colher e analisar dados de uso público, foi
proposto este trabalho, que consistiu na elaboração,pela chefe da unidade, de um questionário a ser
aplicado às pessoas que contratavam um guia na ACONTURC e se propunham a colaborar com as
informações solicitadas. O questionário usado foi baseado em um modelo enviado pela equipe do
Parque Nacional do Jaú, o qual foi adaptadodo Serviço de Parques dos Estados Unidos, que tem
convênio com o ICMBio. Os resultados a seguir foram compilados dos questionários respondidos e
entregues à gestora por quatro condutores.

Resultados: Total de respostas -47

Período das entrevistas:


Entre os dias 20/06 e 24/07/2018.

Entrevistadores:
LuizCavalcanti Ramos – 22; Macilio Bezerra Cavalcanti – 12; José Pereira de Almeida – 6
Luciano Bezerra Cavalcanti – 1; Não respondeu (NR) – 6

País de origem do visitante:


46– Brasil; 1 - França

Cidade:
Recife (e Região Metropolitana)/PE – 29; Buíque/PE – 5; Caruaru/PE – 4; Garanhuns/PE – 2;
Barreiros/PE – 1; Barueri/SP – 1; Carapicuíba/SP – 1; São Paulo/SP – 1; NR –3

Idade:
17 a 26 anos- 19; 27 a 36 anos – 16; 37 a 46 anos: 4; 47 a 57 anos: 7; NR–1

Gênero:
Masculino – 20; Feminino –25; NR –2

Escolaridade:
Fundamental – 0; Médio – 2; Superior incompleto – 19; Superior completo – 8; Pós-graduação – 18

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Tempo de planejamento da viagem:


1 dia – 2; 2 a 3 dias –10; 4 a 7 dias–2; 8 a 14 dias – 3; 15 dias a 1 mês –14; 1 a 3 meses –14
+ de 3 meses– 1; NR – 1
Primeira visita ao PN Catimbau:
Sim – 43; Não –4 (1 respondeu que visita 1 vez por ano)

Pernoite na região:
Sim – 35
• 1 dia – 4
• 2 dias– 27
• 3 dias –3
• 5 dias – 1
Não – 12
• Tempo da visita:
o Até 3h - 4
o Um período do dia - 6
o Dia todo – 1
o NR – 1

Meio de transporte:
Carro privado – 18; Ônibus particular (excursão) – 16; “Pau de arara” – 4; Carro alugado – 2;
Ônibus de linha – 2; Lotação – 1; NR –4

Composição do grupo:
Educacional – 16; Casal – 10; Família – 7; Amigos – 6; Excursão comercial – 5; Sozinho – 1; NR –
2
* Menores de 16 anos -> 1 grupo escolar de Garanhuns com 38 pessoas e 1 família com 2 menores.

Atividades realizadas:
Caminhada/trilha – 43; Visita a sítios arqueológicos/pinturas rupestres – 43; Compra de artesanato –
5; Visita a comunidades – 4; Almoço – 4; Observação de animais – 3; Visita a caverna – 3; Banho –
1; Festa de São João – 1

Motivação principal:
Sítios arqueológicos – 26; Trilhas –16; Pesquisa educacional – 3; Paisagens – 2; Parque como um
todo – 2; Natureza – 1; História – 1; Trilha em veículo 4X4 –1; NR – 4

Você sabia que esta área é um parque nacional antes de chegar?


Sim – 41
Não –5
• Como ficou sabendo?
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

o Na ACONTURC / Condutor informou – 2


o Família – 1
o Durante a entrevista –1
o NR – 3

Avaliação da visita:
Perfeita – 23; Excelente – 15; Muito boa – 7; Boa – 1; NR – 1

Classificação:
Ruim Razoável Boa Muito Excelente Não Não
Aspectos
boa aplicável respondeu
Limpeza da área - 2 - 11 32 NA 2
Proteção e segurança - 1 3 17 24 NA 2
Condição da trilha - 2 3 15 24 NA 3
Instalações - 2 6 13 18 5 3
Vias de acesso 1 4 7 13 18 NA 4
Interpretação ambiental (condução
- - 2 2 40 NA 3
interpretativa pelos condutores)

Como o número de pessoas que você viu hoje afetou o nível de satisfação de sua visita?

-4 -3 -2 -1 0 (15) 1 2 3 (9) 4 (20)


Reduziu minha satisfação Sem efeito Aumentou minha
satisfação

NR: 3

Visitaria novamente o PN Catimbau?


Sim – 46; Não – 0; NR – 1

Recomendaria o PN Catimbau?
Sim – 46; Não – 0; NR – 1

O que você mais gostou?


Sítios arqueológicos e arte rupestre – 10; Tudo – 6; Guia, pinturas e paisagem – 5; Trilhas – 4;
Paisagens – 4; Pedra do Cachorro – 3; Trilhas e sítios – 2; Sentimento de identidade – 2; Chapadão
– 1; Organização – 1; Guia e pessoas/comunidade – 1; Contato com a natureza e pinturas rupestres
– 1; Caminhada, vistas e guia – 1; Natureza preservada – 1; Contato com a natureza – 1;
Hospitalidade e natureza – 1; História – 1; A energia e a natureza do vale – 1; NR – 1
• Respostas pessoais.

O que não gostou?

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Nada – 20; Dano/vandalismo na Pedra da Concha – 8; Acesso/ mobilidade/ estradas – 6; Falta de


estrutura e de incentivo do poder público – 4; Falta de buscar a recuperação do patrimônio (?)– 2;
Estradas dentro das trilhas (?)– 1; Clima – 1; Dificuldades trilha – 1; Preço (condutor) – 1; NR –3
• Respostas pessoais

Para você, qual o principal motivo de se ter criado um parque nacional neste local:
Para proteger os sítios arqueológicos - 35;Para proteger a biodiversidade - 27;Para desenvolver o
turismo da região- 20;Para proteger as formações geológicas- 18;Para fazer pesquisa- 17;Outros (3)
- “Porque tem que ter esse no mundo”; Cultura; Melhoria da comunidade local.
NR – 1
* Podia marcar mais de uma opção.

Considera que o parque nacional é importante para o desenvolvimento local:


Sim – 47; Não – 0; NR - 1
Por que/como ele poderia contribuir?
• Turismo (22):
o Turismo e conservação (3)
o Turismo e pesquisas (3)
o Turismo e desenvolvimento do conhecimento (2)
o Turismo ambiental e sustentável gerando renda (2)
o Turismo cultural (1)
o Turismo de base comunitária (1)
o Turismo e consciência social (1)
o Turismo, história, desenvolvimento da comunidade, proteção ambiental (1)
• Desenvolvimento econômico regional (5)
• Valorização da riqueza cultural e ambiental (2)
• Conhecimento (1)
• Fixação de pessoas na terra (1)
• Percepção da cultura existente (1)
• Pesquisas (1)

Sugestões:
- Recuperação/restauração do Sítio da Concha (!) (8); - Mais divulgação (2); - Maior conservação
dos sítios;- Trilha com cavalo;- Marketing e divulgação/placas indicativas para trilhas autoguiadas;-
Incentivo ao cuidado com patrimônio por parte também dos governos municipal e estadual;- Melhor
estrutura pra chegar nas trilhas;- Placas indicativas dos acessos e da vegetação;- Melhorar limpeza e
estradas.
* Respostas pessoais.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONCLUSÕES
Apesar da amostra pequena em relação ao total de pessoas que o PNC recebe atualmente, as
respostas demonstraram alguns aspectos interessantes: 1 – O visitante do parque é, em maioria,
adulto, com bom nível socio-educacional e, para nossa grata surpresa, tem consciência de que está
em um parque nacional, seus objetivos e importância. Esta resposta não é comum em inúmeras
unidades de conservação brasileiras. 2 – O turismo de excursão educacional também é frequente. 3
– O principal atrativo do Catimbau é o patrimônio arqueológico e a arte rupestre, mas, quase que
tão importantes quanto este, estão listadas suas trilhas e paisagens. 4 – Os turistas saíram muito
satisfeitos com a experiência, no entanto, a crítica mais frequente foi a condição das estradas de
acesso. 5 – A interpretação ambiental repassada pelos condutores da ACONTURC foi totalmente
aprovada pelos visitantes, demonstrando que os associados estão fazendo um importante trabalho,
que justifica a contratação da visita guiada.
Observação: Devido ao pouco espaço do resumo, deixaremos para conversar mais sobre os
resultados no momento da apresentação oral.

REFERÊNCIAS:
INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE(ICMBio) -
Unidades Abertas A Visitação > Parque Nacional Do Catimbau.Disponível em
<http://www.icmbio.gov.br/portal/visitacao1/unidades-abertas-a-visitacao/732-parque-nacional-do-
catimbau> acesso em 26 de setembro de 2019.

INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN) -


Patrimônio Arqueológico – PE. Disponível em <http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/560/>
acesso em 26 de setembro de 2019.

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ALÉM DE PESCADORES ARTESANAIS, AGORA TAMBÉM


CONDUTORES DE CAIAQUES OCEÂNICOS NA ÁREA DE PROTEÇÃO
AMBIENTAL DE GUAPI-MIRIM (RJ, BRASIL)
BEYOND ARTISANAL FISHERS, NOW ALSO OCEANIC KAYAK GUIDES IN THE
ENVIRONMENTAL PROTECTION AREA OF GUAPI-MIRIM (RJ, BRAZIL)

Juliana Cristina Fukuda*, Rafael Abrantes Machado**, Flavia Fassi**, Rodrigo Magalhães**,
Olivar José Salles Bendelak*
Área de Proteção Ambiental de Guapi-Mirim / Estação Ecológica da Guanabara, Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Brasil*
Clube Carioca de Canoagem (CCC), Brasil**

INTRODUÇÃO
A Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapi-Mirim foi criada em 1984 como a primeira
unidade de conservação (UC) brasileira a ter como objetivo explícito a proteção e conservação de
manguezais. É também objetivo dessa área protegida assegurar as condições de vida da população
humana que mantém contato direto com esse ambiente e vive dos seus recursos naturais. A APA de
Guapi-Mirim possui uma extensão de 14 mil hectares (ha) e abrange os municípios de Magé,
Guapimirim, Itaboraí e São Gonçalo (MMA, 2004).
Visando um reforço para a proteção de ecossistemas, foi criada em 2006 a Estação
Ecológica (ESEC) da Guanabara, localizada na área central da APA de Guapi-Mirim, com cerca de
2 mil ha (ICMBIO, 2012). Essas duas áreas protegidas são administradas de forma integrada pelo
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia federal ligada ao
Ministério do Meio Ambiente.
O recôncavo da Baía de Guanabara, que já foi muito utilizado para lazer da população local,
perdeu parte do seu encanto após o derramamento de milhares de litros de óleo em Duque de Caxias
no ano 2000. A pesca artesanal foi outra atividade muito afetada por esse evento (BOTELHO,
2003).
Desde 2007 vêm sendo realizados projetos a fim de incentivar o ecoturismo de base
comunitária na região. Até o momento, as atividades em andamento envolvem somente
embarcações motorizadas, o que possibilita a visitação para apenas parte da população. Estão sendo
estruturadas trilha terrestre e suspensa sobre o manguezal e mobilização local para promover
estruturadas de hospedagem e alimentação.
Em 2016, como parte das comemorações de 10 anos da ESEC da Guanabara, foi promovida
o primeiro evento de percorrer os manguezais da região a remo. Apesar de ter contado com apenas
dois caiaques (um deles de associada do Clube Carioca de Canoagem – CCC), ficou clara a

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

possibilidade e potencial de desenvolver a atividade na região. Em 2017, a segunda edição do


evento fez parte do evento comemorativo dos 33 anos da APA de Guapi-Mirim, já contando com
treze caiaques, duas canoas havaianas e dois stand-up paddles.
No final de 2017, a partir de dois editais internos do ICMBio – um para projetos de
educação ambiental e outro voltado ao turismo de base comunitária – vislumbrou-se a possibilidade
de unir esforços entre o ICMBio e o CCC para capacitar moradores locais a serem condutores de
caiaques oceânicos e futuros dinamizadores dessa prática esportiva e de lazer no recôncavo da baía
de Guanabara.
O Clube Carioca de Canoagem é uma associação desportiva sem fins lucrativos, fundada em
2006 com modelo de gestão participativo, dedicada ao esporte participativo e de lazer. Foi criado
com o objetivo de fomentar a prática e o desenvolvimento da canoagem oceânica
recreativa,favorecer a descoberta e a proteção dos ambientes marinhos e costeiros e contribuir na
difusão da cultura náutica. É um clube filiado à Confederação Brasileira de Canoagem - CBCa e a
Federação de Canoagem do Estado do Rio de Janeiro – FECAERJ. O clube oferece um calendário
permanente de cursos de introdução à canoagem, navegação marítima, confecção de remos, reparos
de embarcações, entre outros. Além disso, possui turmas para treinos regulares e aperfeiçoamento
como também promove expedições e projetos sociais com jovens de famílias de baixa renda.
O presente trabalho visa apresentar o projeto de capacitação realizado para seis moradores
da região da APA de Guapi-Mirim, sendo três deles pescadores artesanais. As ações foram
realizadas entre 2018 e 2019, baseadas na educação ambiental e melhoria da qualidade de vida da
população local.

MATERIAL E MÉTODO
Inicialmente, de 78 interessados em participar do projeto mais amplo de fortalecimento de
turismo de base comunitária, seis foram selecionados para participar da capacitação em condução
de caiaque oceânico. A seleção foi realizada com base nos seguintes critérios: saber nadar, não ter
medo de mar, disponibilidade para encontros semanais, e vontade de remar.
Com início das atividades com a comunidade em julho de 2018, o Clube Carioca de
Canoagem foi a principio contratado para essa capacitação – o valor seria suficiente apenas para
cobrir o combustível e alimentação dos instrutores e monitores do clube. Os equipamentos –
caiaques, remos, coletes salva-vidas e demais acessórios – foram emprestados pelo CCC para a
capacitação.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dos seis participantes da capacitação, três eram mulheres e três eram homens, promovendo
um equilíbrio dentro do time que a cada treino de se formava. Apenas um deles já havia remado um
caiaque anteriormente.
No total, foram 300 horas de treinos, alguns teóricos (como leitura de carta náutica e
meteorologia) mas a maioria práticos. Nos treinos práticos, além das próprias técnicas de canoagem,
houve muita troca de informações e discussões acerca da baía de Guanabara, seus problemas e
potencialidades.
Paralelamente, ocorreram treinamentos em primeiros socorros e observação de aves,
promovidos em parceria, respectivamente, com o Corpo de Bombeiros de Magé e os irmãos Gabriel
e Daniel Mello.
A cada treino, novos desafios individuais e coletivos eram colocados à prova. Depois de
aproximadamente dois terços do programa, os participantes foram autorizados a remarem sem a
presença dos instrutores.
Para complementar a formação, os novos remadores foram treinar da região da praia da Urca
por três vezes a fim de experimentarem o mar aberto, com ondas e correntezas mais fortes.
Ao final, o Clube Carioca de Canoagem decidiu ceder o uso dos caiaques e demais
equipamentos que vinham sendo utilizados para os treinos, e ainda o valor que tinha recebido da
contratação, ao coletivo de remadores, enquanto ele existir como tal.

CONCLUSÕES
Os novos roteiros de visitação pelos manguezais da Baía de Guanabara estão sendo
construídos, e são muito diferentes daqueles realizados pelos barcos motorizados, tanto em rota
como em possibilidades de imersão no ecossistema.
Porém, os resultados do projeto não são apenas os mensuráveis e atingidos objetivamente,
como aprender a remar e conduzir visitantes. Houve um grande aprendizado de instrutores e
aprendizes, que também eram instrutores dos seus saberes-fazeres. Mais além, criou-se uma relação
de confiança e crescimento mútuo, com empoderamento sobre o papel social de cada um no grupo.

REFERÊNCIAS
BOTELHO, André Luiz Magalhães. Análise de contaminação por óleo na APA de Guapimirim
– RJ: Aspectos Geoquímicos e Socioambientais (Dissertação de Mestrado). 2003. Niterói,
Universidade Federal Fluminense.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ICMBIO (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Plano de Manejo da


Estação Ecológica da Guanabara. 2012.

MMA (Ministério do Meio Ambiente). Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de


Guapi-Mirim. 2004.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

DESCRIÇÃO DO PROCESSO DE CAPACITAÇÃO DE MORADORES


LOCAIS VISANDO O FORTALECIMENTO DO TURISMO DE BASE
COMUNITÁRIA NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE GUAPI-
MIRIM (RJ, BRASIL)
DESCRIPTION OF THE PROCESS OF TRAINING LOCAL RESIDENTS TO STRENGTHEN
COMMUNITY BASED TOURISM IN THE ENVIRONMENTAL PROTECTION AREA OF
GUAPI-MIRIM (RJ, BRAZIL)

Olivar José Salles Bendelak*, Juliana Cristina Fukuda*, Eloise Silveira Botelho**, Camila
Gonçalves de Oliveira Rodrigues***, Vittoria Speranza Campos*

Área de Proteção Ambiental de Guapi-Mirim / Estação Ecológica da Guanabara, Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Brasil*
Departamento de Turismo e Patrimônio, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), Brasil**
Departamento de Administração e Turismo, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Brasil***

INTRODUÇÃO
O maior remanescente de manguezais conservados da baía de Guanabara (RJ) e do estado
do Rio de Janeiro é atualmente protegido pela Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapi-Mirim
(criada em 1984) e pela Estação Ecológica (ESEC) da Guanabara (criada em 2006). Essas duas
unidades de conservação (UC) federais possuem gestão integrada e são administradas pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Seus bosques de mangue ocupam a
faixa costeira de quatro municípios: São Gonçalo, Itaboraí, Guapimirim e Magé, parte do que é
conhecido como Baixada Fluminense (MMA, 2004).
A região da APA de Guapi-Mirim vem sofrendo pressões antrópicas nos últimos 80 anos
que vão desde obras para a construção de diques, drenos, retificação e transposição de rios a
lançamento de resíduos diversos e esgotamento sanitário. Atualmente, há pressões provocadas pela
instalação do COMPERJ – Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – e de diversos
empreendimentos industriais e imobiliários associados (COELHO, 2017).
Considerando que a região é povoada por algumas comunidades tradicionais que têm como
base de sobrevivência as atividades extrativistas, especialmente a cata de caranguejos e pesca, esses
grupos encontram-se em condições de vulnerabilidade social devido à escassez crescente dos
recursos explorados. Essas comunidades em geral são compostas por grupos familiares com baixa
escolaridade, com poucas perspectivas quanto a alternativas para a geração de renda a partir de
outras atividades, aumentando assim ainda mais a pressão sobre os recursos explorados, em um
ciclo vicioso que compromete a estabilidade do ecossistema e sua própria subsistência (PANDEFF,
2009).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A administração dessas UC, em conjunto com seu conselho consultivo, tem buscado formas
de apoiar as comunidades tradicionais da região (HERRERA, FERREIRA E RODRIGUES, 2009;
ICMBIO/IPE, 2016; ICMBIO, 2018(b)).
O turismo de base comunitária (TBC) foi sendo cada vez mais percebido como uma forma
de complementar a renda dos moradores locais, ao mesmo tempo em que sensibiliza a população
sobre a importância dessas áreas protegidas. Todos os esforços até então empreendidos nesse
sentido contemplam a educação ambiental crítica, de forma que os moradores locais compreendam
amplamente o contexto no qual estão inseridos, e possam ser parceiros na luta de proteção das
unidades de conservação. No momento, essas ações são ainda mais urgentes frente à expansão do
tráfico de drogas na região, que é socialmente e ambientalmente devastador.
No primeiro trimestre de 2018 teve início um projeto de educação ambiental e turismo de
base comunitária a partir de duas propostas apresentadas pela APA de Guapi-Mirim / ESEC da
Guanabara e selecionadas em editais internos do ICMBio, com a colaboração de diversos parceiros
institucionais.
Este trabalho visa apresentar os aprendizados e resultados do processo de capacitação de
moradores locais para o fortalecimento do TBC na APA de Guapi-Mirim.

MATERIAL E MÉTODO
As diretrizes para o turismo de base comunitária adotadas pelo ICMBio foram premissas
básicas do projeto, entre elas: processo educativo para todos os envolvidos, avaliação do nível de
organização social da comunidade, gestão comunitária do processo, integração das ações propostas
para o TBC com as demais atividades econômicas, modos de vida, saberes e cultura dos povos e
comunidades envolvidos e com a realidade socioeconômica do entorno (ICMBIO, 2018(a)).
As comunidades tradicionais da região, moradores na APA de Guapi-Mirim ou próximos a
essa UC, em geral usuários da área, foram o público prioritário do projeto.
As ações realizadas sempre tiveram como diretriz a educação ambiental crítica,
transformadora e emancipatória, aliada às alternativas de geração de renda. Buscou-se utilizar
metodologias participativas, baseadas em conhecimento técnico especializado e trocas de saberes,
tanto locais como com povos e comunidades tradicionais de outras regiões.

RESULTADO E DISCUSSÃO
Inicialmente foram realizadas 13 reuniões comunitárias, tanto nos bairros quanto na sede das
UC. O objetivo era apresentar o projeto e sensibilizar os moradores para participar da iniciativa.
Participaram desses encontros aproximadamente 150 pessoas no total, das quais 78 preencheram a
ficha de pré-inscrição no projeto. Posteriormente, quando definido que as atividades ocorreriam em
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

dias da semana – devido à disponibilidade dos dinamizadores/instrutores e maioria dos moradores


interessados – 50 pessoas começaram a participar da agenda de capacitação.
A capacitação foi dividida em módulos básicos - obrigatórios para todos os participantes - e
módulos específicos - dos quais cada pessoa poderia escolher duas linhas de capacitação.
Os módulos básicos foram os seguintes: educação ambiental (14 horas), turismo de base
comunitária (7 horas), administração de microempreendimentos locais (14 horas) e comercialização
de empreendimentos turísticos (7 horas). Para esses módulos, os participantes foram divididos em
dois grupos, de acordo com a localidade de residência.
Os módulos específicos foram: gastronomia local (14 horas), hospedagem local (21 horas),
condução local de visitantes (28 horas), confecção de lembranças turísticas (63 horas) e condução
de caiaques oceânicos (300 horas).
Durante o processo de capacitação, cada participante teve oportunidade de realizar uma
visita técnica a uma região do estado do Rio de Janeiro onde já há iniciativas de TBC:
• Niteroi: Reserva Extrativista Marinha de Itaipu, Museu de Arqueologia de Itaipu, loja de
artesanato Martinica, Quilombo do Grotão e mirante da fortaleza de Santa Cruz (duração de um dia)
• Paraty: bairro de Trindade (APA Cairuçu), praia do Cachadaço (Parque Nacional da Serra da
Bocaina), Quilombo do Campinho, sede da Estação Ecológica de Tamoios (duração de três dias)
• Angra dos Reis e Paraty: praia e sertão de São Gonçalo (APA Cairuçu), Ilha do Pelado (APA
Cairuçu), Quilombo do Bracuí (duração de três dias).
Após o retorno, foi organizado um dia de encontro para que os participantes de cada uma
das visitas técnicas compartilhassem as experiências, com apoio de material audiovisual,
destacando os aspectos positivos e negativos mais marcantes.
A etapa seguinte consistiu na visita aos próprios participantes que abriram suas casas para
que os demais colegas as conhecessem e para que os instrutores realizassem uma primeira avaliação
das condições para a recepção de visitantes. Também participaram dessa etapa as empresas de
comunicação que produziram posteriormente os materiais de divulgação.
O primeiro dia dessas visitas também teve os objetivos de: a) capacitação sobre os
ecossistemas da região e b) apresentação aos participantes de um dos roteiros em embarcações
motorizadas, que já são percorridos pelos aquaviários credenciados pela APA de Guapi-Mirim. O
trajeto envolveu rios, manguezal, baía de Guanabara e a ilha de Paquetá. Nesta, foi realizada a visita
a uma das participantes do projeto e também a alguns pontos turísticos locais.
Em outro dia foram visitados treze participantes, que já oferecem ou estão prestes a oferecer
serviços relacionados ao TBC, em diversas localidades na região da APA de Guapi-Mirim. O trajeto
foi percorrido em ônibus.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Um video com outras informações sobre o processo acima descrito está disponível em
https://youtu.be/nXVccAyxHu4 .

CONCLUSÃO
O processo de capacitação, através de encontros constantes e uso de grupos virtuais, aos
poucos foi gerando identidade, segurança e auto-estima ao grupo. Uma rede de colaboração e até de
novas amizades foi se formando. Conflitos também surgiram, como esperado, e foram sendo
resolvidos a partir da perspectiva de objetivos comuns do grupo.
Por outro lado, a articulação de várias parcerias, de diversas naturezas, e com profissionais
comprometidos e afinados com a temática, foi fundamental para termos conseguido realizar tantas
atividades com recursos financeiros relativamente baixos.
Como resultado desse processo de capacitação os participantes concluíram pela necessidade
de se organizarem como cooperativa, de forma a terem autonomia jurídica e econômica, com
melhoria de renda através de suas práticas tradicionais.

AGRADECIMENTOS
• Aos chefes da APA de Guapi-Mirim, Maurício Barbosa Muniz, e da ESEC da Guanabara, Klinton

Vieira Senra, pelo apoio ao projeto.


• À equipe de funcionários da APA de Guapi-Mirim e da ESEC da Guanabara pelo apoio logístico -

Rinaldo Sabino dos Santos, Sergio Serra, Edson Cosso, Marcos Diniz, Edson Cosso, Gilsemar de
Paula Silva, João Lourenço, Ludmila Tomé.
• Aos parceiros institucionais: Comissão Nacional pelo Fortalecimento das Resex Costeiras e

Marinhas e dos Povos Extrativistas Costeiros e Marinhos (CONFREM), Guardiões do Mar,


Fundação SOS Mata Atlântica, Clube Carioca de Canoagem, Cooperativa Manguezal Fluminense,
secretarias de meio ambiente e de turismo das prefeituras municipais de Magé, Guapimirim,
Itaboraí e São Gonçalo, Dept. de Gastronomia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
Parque Nacional da Serra dos Órgãos, agência GuapimirimTur.
• Aos participantes do projeto, que abriram mão de afazeres para se capacitarem e expandirem

horizontes, de forma dedicada.

REFERÊNCIAS
COELHO, B.H. da S. Potencialidades e limites de conselhos de unidades de conservação:
Considerações sobre a implantação do COMPERJ na região do Mosaico Central Fluminense
(Tese de doutorado), 2017. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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HERRERA, B; FERREIRA, F.P de M e RODRIGUES, L. Experiência da Cooperativa Manguezal


Fluminense na APA Guapimirim. Anais: IV Seminário Brasileiro sobre Áreas Protegidas e Inclusão
Social (SAPIS). Belém (PA), 2009.

ICMBIO (a) (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Turismo de Base


Comunitária em Unidades de Conservação Federais: princípios e diretrizes. 2018.

ICMBIO (b) (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Boas práticas na gestão
de unidades de conservação. 2018. “Condicionantes e ajustamentos. Mais de 100 hectares de
manguezais recuperados em menos de 10 anos” (p.198-200).

ICMBIO (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) / IPE (Instituto de pesquisas


Ecológicas). Boas práticas na gestão de unidades de conservação. 2016. “Permacultura, parcerias
e participação social são diferenciais na conservação da APA Guapimirim e ESEC da Guanabara”
(p.17-21).

MMA (Ministério do Meio Ambiente). Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de


Guapi-Mirim. 2004.

PANDEFF, P.A. Gestão ambiental em unidades de conservação: reflexões a partir do Projeto


Defeso na APA Guapimirim (RJ) (Dissertação de mestrado), 2009. Niteroi, Universidade Federal
Fluminense.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

REVITALIZANDO O TURISMO COM CAVALOS-MARINHOS NO


PARQUE NACIONAL DE JERICOACOARA
REVITALIZING SEA-HORSE TOURISM IN JERICOACOARA NATIONAL PARK

Jerônimo Martins1*, Alessandra Fontana1, Regina Kátia Carneiro1, Marcelo Vidal2


1
Parque Nacional de Jericoacoara, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Jijoca de Jericoacoara –
CE, Brasil. *jeronimo.martins@icmbio.gov.br,alessandra.fontana@icmbio.gov.br, katia.carneiro@icmbio.gov.br
2
Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais,
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, São Luís - MA, Brasil. marcelo.vidal@icmbio.gov.br

1. INTRODUÇÃO
No Brasil são reconhecidas três espécies de cavalos-marinhos: Hippocampus reidi, H.
patagonicuse H. erectus(Silveira et al. 2014). As três espécies constam na Lista Brasileira de Fauna
Ameaçada de Extinção (MMA, 2014), na categoria Vulnerável.
A presença desses animais em redes de arrasto é frequente e eles são secos ao sol e vendidos
para turistas ou usados como remédios(Rosa et al., 2005). Além disso, existe um comércio intenso
de cavalos-marinhos vivos para fins ornamentais, que é amplamente baseado em exemplares de H.
reidi capturadosnas regiões Norte e Nordeste (IBAMA, 2011).
Na contramão destas atividades depredadoras, o turismo de interação com os cavalos-
marinhos pode ser uma alternativa menos impactante. Sendo adequadamente planejado, o turismo
com fauna pode ser positivo, uma vez que o contato com os animais amplia a curiosidade das
pessoas e, desta forma, o seu conhecimento, sendo assim uma importante ferramenta para
sensibilização(Vidal, 2011). A interação turística com a fauna silvestre pode ser ainda uma
oportunidade para promover comportamentos apropriados, tornando as pessoas mais
ambientalmente responsáveis, já que a educação e a interpretação ambiental são normalmente parte
do turismo voltado para a interação com estes animais (Newsome et al., 2005; Vidal et al., 2019).
No Parque Nacional de Jericoacoara, situado no litoral cearense, desenvolve-se o turismo
interativo com cavalos-marinhos, sendo H. reidi a espécie foco. A atividade é baseada na procura
do animal nas áreas mais rasas do manguezal e, ao ser encontrado, sua contenção temporária em
recipiente de vidro com água, que é então repassado aos visitantes presentes nas canoas utilizadas
para deslocamento.
Jericoacoara é atualmente o terceiro Parque Nacional mais visitado do Brasil (ICMBio,
2019), sendo utilizado por uma extensa rede de instituições que promovem também outras
atividades de uso público, como turismo de praia, banhos em lagoas e no mar, esportes náuticos,
corrida, ciclismo, natação, trekking e contemplação da natureza.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Em cumprimento à diretriz do Plano de Manejo (ICMBio, 2011) do Parque, que prevê a


regulamentação e o ordenamento do uso público por meio da elaboração de portarias institucionais,
a equipe gestora daárea realizou, nos últimos anos, processos participativos de construção dessas
portarias. Uma delas (Portaria nº 579, de 2017) estabelece normas e procedimentos para o
cadastramento e autorização para o exercício de condução de visitantes para interagir com os
cavalos-marinhos na área protegida. A referida portaria define que, para a autorização de condução
de visitantes no turismo interativo com cavalos-marinhos, é necessário que os atores interessados
participem de capacitações nas temáticas de Primeiros Socorros, Condutor de Turismo, e Ambientes
e Normas do Parque Nacional de Jericoacoara.
Considerando a exitosa experiência de pesquisa e ordenamento do turismo interativo com
botos (Inia geoffrensis) desenvolvida no Parque Nacional de Anavilhanas - Amazonas (Vidal et al.,
2017) e buscando auxiliar os condutores de turismo que já atuam nas interações com cavalos-
marinhos a se adequarem ao cumprimento da Portaria, o Parque Nacional de Jericoacoara iniciou
em 2018 uma parceria com o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade
Associada a Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT/ICMBIO) para caracterização e manejo do
turismo com cavalos-marinhos. Neste trabalho apresentamos alguns dos resultados alcançados
nesse processo que, além de preparar os condutores para melhor atender os visitantes e preservar o
cavalo-marinho e outras espécies do manguezal, visa o credenciamento destes atores junto ao
Parque Nacional de Jericoacoara.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O Parque Nacional de Jericoacoara está localizado na porção oeste do Estado do Ceará,
abrange 8.585,40 hectares e está situado a aproximadamente 280 km de Fortaleza, a capital do
Estado. Criada em 1984 como Área de Proteção Ambiental e recategorizada em 2002 para Parque
Nacional, Jericoacoara é uma Unidade de Conservação gerenciada pelo Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Em seus limites, o Parque abriga e protege importantes
feições de ecossistemas, como manguezais e restingas. Ademais, a combinação de ambientes
naturais de dunas móveis e fixas, costões rochosos, lagoas interdunares sazonais, praias e estuário
compõe uma paisagem local de rara beleza cênica que torna a área protegida um polo turístico que
atrai visitantes de todo o mundo.
Tal como descrito por Vidal et al. (2017), as estratégias de revitalização e qualificação do
turismo interativo com cavalos-marinhos basearam-se em atividades que utilizaram ferramentas de
diagnóstico, planejamento e gestão participativa, que foram implementadas por meio (i) reuniões
envolvendo servidores do ICMBio e condutores de turismo para apresentação do projeto e
compartilhamento de informações sobre quando, como e onde foi iniciado o turismo com cavalos-
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

marinhos na Unidade de Conservação, (ii) visita técnica a um dos locais onde a atividade turística
acontece, onde foram realizadas observações sobre acesso, estrutura do passeio e interação dos
visitantes com os cavalos-marinhos, e (iii) capacitações consideradas pré-requisito para o
cadastramento e autorização para o exercício das atividades comerciais de condução de visitantes
no turismo interativo com cavalos-marinhos na Unidade de Conservação.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Segundo os condutores de turismo, as interações turísticas com os cavalos-marinhos
iniciaram em meados de 2005 e hoje são realizadas em três trechos de manguezal que se estende da
comunidade de Mangue Seco, situada no entorno do Parque, à foz do rio Guriú.
Para se chegar até a área de manguezal onde o passeio se desenvolve faz-se necessário
contratar o serviço de um veículo adaptado para deslocamento nas dunas e beira-mar (buggy,
quadriciclo) ou fazer parte de um grupo de visitantes que esteja participando do denominado
“roteiro oeste” de visitação, que finaliza na lagoa de Tatajuba. Já na área de manguezal, paga-se
separadamente R$ 15,00 para participar do passeio do cavalo-marinho. Considerando o horário da
maré, que deve estar baixa, os visitantes deslocam-se com os condutores em canoas com diferentes
capacidades (variando de 10 a 15 lugares). Pouco metros depois da partida, os condutores já iniciam
a busca visual pelos cavalos-marinhos. Assim que encontram um animal o capturam em um
recipiente de vidro e o passam para que os visitantes observem e tirem fotos/filmem. Enquanto isso,
os condutores repassam algumas informações sobre a biologia do animal e regras de interação. De
modo geral, o passeio não dura mais que 25 minutos e é focado apenas na interação com os cavalos-
marinhos.
Dentre os aspectos positivos durante o passeio destacam-se: (a) os condutores repassam aos
visitantes informações sobre a biologia dos cavalos-marinhos e sobre as normas de interação; (b) de
maneira geral, os visitantes comportam-se de maneira adequada, respeitando as normas recebidas; e
(c) as interações com os cavalos-marinhos instigam diversas perguntas feitas pelos visitantes que,
sendo bem respondidas pelo condutor e associadas a um processo de interpretação ambiental,
podem contribuir para a conservação da espécie e do ambiente manguezal.
Por outro lado, destacam-se como aspectos negativos: (a) os recipientes de vidro onde são
colocados os cavalos-marinhos são pequenos e, aparentemente, inadequados para a contenção dos
animais durante as atividades de interação com os visitantes; (b) alguns condutores não devolvem
os cavalos-marinhos para a água logo após as interações com os visitantes, permanecendo muitas
vezes os animais em um tempo desnecessário e potencialmente estressante; (c) devido à
aglomeração de embarcações em uma pequena área de manguezal, possivelmente um mesmo

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

cavalo-marinho é capturado por mais de um condutor; (d) outros atrativos do manguezal (aves,
crustáceos, árvores...) são pouco explorados durante o passeio de canoa.
As três capacitações realizadas beneficiaram 25 condutores de turismo interativo com
cavalos-marinhos. A capacitação sobre Ambientes e Normas do Parque Nacional de Jericoacoara
abordou tópicos do Plano de Manejo da área protegida e os ambientes existentes em seu interior,
com ênfase no ambiente manguezal, por ser aquele onde é realizado o turismo interativo com
cavalos-marinhos. Nessa etapa também foram abordadas as normas que regulamentam a atividade.
A capacitação que tratou do tema Condutor de Turismo abordou experiências e desafios no turismo
com fauna, técnicas de condução no turismo, interpretação ambiental, monitoramento de impactos,
ética, apresentação pessoal e relações interpessoais. A terceira capacitação teve como tema
Primeiros Socorros, no intuito de preparar os condutores para procedimentos iniciais de socorro aos
visitantes em eventuais emergências.
A apresentação dos conteúdos das capacitações foi de forma dinâmica, criativa e dialógica,
partindo da realidade concreta dos participantes (saber empírico), mas explicitando o conhecimento
acadêmico (saber científico) em cada tema trabalhado. O processo educativo proposto teve como
meta a formação e envolvimento de sujeitos ecológicos, que contribuam com a conservação dos
cavalos-marinhos. Com a realização dessas capacitações os condutores atuantes no turismo
interativo com cavalos-marinhos tornaram-se aptos a receber o credenciamento para atuar
legalmente no Parque Nacional de Jericoacoara, além de, segundo os próprios condutores, já
estarem possibilitando melhorias na prestação do serviço.

4. CONCLUSÃO
As abordagens participativas adotadas foram bastante produtivas e propiciaram uma maior
aproximação entre os condutores de turismo com cavalos-marinhos e a equipe do ICMBio. Ao
estreitar relações e estimular uma percepção de formação de grupo fomentou-se um vínculo de
confiança que permitiu abordar situações do dia a dia de trabalho no manguezal até então não
consideradas ou aprofundadas pelos participantes. As capacitações já ofertadas vêm permitindo
melhor qualificar as interações turísticas, contribuindo assim para a satisfação do visitante e para a
conservação de H. reidi no Parque Nacional de Jericoacoara.

5. AGRADECIMENTOS
Os autores deste trabalho expressam seus agradecimentos aos condutores de turismo com
cavalos-marinhos no Parque Nacional de Jericoacoara.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6. REFERÊNCIAS
IBAMA. Proposta de Plano Nacional de Gestão para o uso sustentável de Cavalos-Marinhos
do Brasil. Brasília: IBAMA, 2011.

ICMBio. Plano de Manejo do Parque Nacional de Jericoacoara. Encarte 4 – Planejamento.


Disponível em <http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/imgs-unidades-
coservacao/Planejamento.pdf> Acesso em: 07/09/2019. 2011.

ICMBio.Visitação em Parques Nacionais bate novo recorde em 2018.Disponível em:


<http://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/20-geral/10216-visitacao-em-parques-nacionais-
bate-novo-recorde-em-2018>. Acesso em: 07/09/2019. 2019.

MMA. Portaria nº 444, Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção.
Diário Oficial da União 245: 121-126, 2014.

NEWSOME, D.; DOWLING, R. & MOORE, S. Wildlife Tourism. Clevedon: Channel View
Publications, 2005.

ROSA, I.L.; BARROS, A.T.; XAVIER, J.H.A. & CORTEZ, C.S. Dados populacionais de cavalos-
marinhos Hippocampus reidi Ginsburg, 1933 (Teleostei: Syngnathidae) capturados para fins de
aquarismo no Nordeste do Brasil. Boletim Técnico Científico do CEPENE 13(1): 25-38, 2005.

SILVEIRA, R. B.; SICCHA-RAMIREZ, R.; SILVA, J. R. S.; OLIVEIRA, C. Morphological and


molecular evidence for the occurrence of three Hippocampus species (Teleostei: Syngnathidae) in
Brazil. Zootaxa 3861(4): 317-332, 2014.

VIDAL, M. D. Botos e turistas em risco. Ciência Hoje 47(281): 73-75, 2011.

VIDAL, M.D; SANTOS, P.M.C.; JESUS, J.S.; ALVES, L.C.P.S.; CHAVES, M.P.S.R.
Ordenamento participativo do turismo com botos no Parque Nacional de Anavilhanas, Amazonas,
Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi Ciências Naturais 12(1): 23-36, 2017.

VIDAL, M. D.; SILVA JÚNIOR, U. L.; SANTOS, P. M. C.; SIMONETTI, S. R. & CHAVES, M.
P. S. R. Percepción de habitantes locales sobre los impactos socioeconómicos y conservacionistas
del turismo con botos en el Parque Nacional de Anavilhanas, Brasil. Estudios y Perspectivas en
Turismo 28: 802-817, 2019.

447
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

DIÁLOGOS PARA GESTÃO: DIAGNÓSTICO DA CADEIA DE


OPERADORES DO TURISMO DE MONTANHA DO PARQUE NACIONAL
DA SERRA DOS ÓRGÃOS
MANAGING DIALOGUES: IDENTIFYING ANS UNDERSTANDING MOUNTAIN TOUR
OPERATORS OF SERRA DOS ÓRGÃOS NATIONAL PARK

William Gregory Mendes Silva*, Clara Carvalho de Lemos**; Leonardo Martins Gomes**
*Graduando de Turismo do Departamento de Turismo/IGEOG/UERJ/Brasil (williamgrery@hotmail.com)
**Profª Adjunta do Departamento de Turismo/IGEOG/UERJ/Brasil (clara.lemos@uerj.br)
**Analista Ambiental/Coordenador de Uso Público/ICMBio/Brasil (leonardo.gomes@icmbio.gov.br)

INTRODUÇÃO
Por se apropriar de maneira indireta dos recursos e ambientes naturais, o turismo é
frequentemente visto como valioso aliado das áreas naturais protegidas. Não obstante, a visitação
em Unidades de Conservação (UC) federais, de acordo com os estudos realizados por Souza e
Simões (2018), atingiu a marca de 10,7 milhões de visitantes no ano de 2017, aumento de
aproximadamente 29% referente ao ano anterior.
No entanto, o crescente interesse do público pelos atrativos nas UCs também traz inúmeros
desafios. Aliar o uso público das atividades turísticas à conservação da biodiversidade se mostrou
uma tarefa complexa. Desta maneira, se não bem planejado e gerido, o turismo pode se tornar um
grande risco às áreas naturais, colocando em risco, inclusive, os objetivos de proteção e
conservação.
Neste sentindo, a participação social apresenta-se como fundamental à gestão. Conseguir
atrair a vontade e a colaboração de novos parceiros para intervir em dificuldades existentes poderia
ser capaz de reverter situações de confronto e sanar problemas existentes nas UCs. Notando que, ao
inserir variados atores nessecontexto, acrescenta a possibilidade de evitar ou diminuirentraves, já
que o campo da consulta e do diálogo é aberto e permite a inclusão daqueles que são afetados pelos
processos decisórios.
Assim, essa pesquisa se debruça sobre os desafios do uso público do Parque Nacional da
Serra dos Órgãos – PARNASO. Mais especificamente, busca entender como os operadores de
turismo que comercializam roteiros dentro do parque percebem sua relação e comunicação com os
gestores da área. Dessa forma, pretende-se também identificar quais subsídios esses atores podem
oferecer para melhorar o processo de gestão e tomada de decisão das questões operacionais do uso
público.

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MATERIAL E MÉTODO
A metodologia utilizada para o presente trabalho partiu de pesquisa bibliográfica e
documental e, paralelamente, da busca em identificar o universo dos operadores de turismo que
comercializam roteiros dentro do Parnaso. Uma vez identificado o universo da pesquisa, serão
realizadas entrevistas semiestruturadas com esses operadores. Após análise e interpretação dos
dados, pretende-se também promover um encontro dos gestores com esses operadores de turismo na
sede do PARNASO, com o intuito de discutir os resultados da pesquisa e identificar melhores
práticas de gestão, comunicação e relacionamento entre as partes.

RESULTADO E DISCUSSÃO
A problemática da demanda por ações no controle e organização do turismo em áreas
protegidas é só mais um desafio dentro do quadro enfrentado pelos gestores de UCs. Como bem
recordam Passold eKinker (2010) ao recorrerem a Janér (2003), a realidade dos gestores é de um
local onde o urgente tem prioridade sobre o importante e há falta de pessoal, o que dificulta grandes
esforços voltados ao efetivo planejamento.
É preciso pensar em formas de tornar os processos decisórios mais inclusivos e
participativos, antecipar problemas e conflitos e tornar as ações mais assertivas. Isso posto, alargar
os meios de participação da sociedade em espaços institucionais públicos pode ser um mecanismo
que possibilite uma visão melhorada a respeito de diferentes conflitos e forneça elementos
essenciais para solucionar problemas cotidianos e mais complexos.
Nesse sentido, Frey (2007)apud Cozzolino, Irving e Soares (2015) lembra que o espaço
público compreende não apenas atores governamentais, mastambém o protagonismo de
representações da sociedade civil e dos setores produtivos. Caminhos nessa direção já são
assegurados pela Lei do SNUC (2000). Dada oficialmente por meio dos conselhos gestores, essa
participação é marcada como importante avanço na democratização de espaços públicos e na
emancipação social e política (COZZOLINO; IRVING; SOARES, 2015).
Tal conquista representa o real acesso da sociedade civil nos diálogos e embates a respeitos
de problemas e conflitos socioambientais nas UCs. Contudo, por mais que os conselhos tenham
sido consagrados como principal meio de relação entre sociedade e Estado, Loureiro e Cunha
(2008) acreditam que é necessário investir em formas de capilarização da participação para além
dos representantes presentes nos conselhos das UCs.
Deste modo, se faz necessária a criação de novas formas de experiências que se qualifiquem
como ampliadas e participativas, ou ainda interativas (FREY, 2007, apud COZZOLINO; IRVING;
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

SOARES, 2015), embora se compreenda que tais espaços são, por definição, arenas de interesses
em disputa e situações de conflitos (LOUREIRO; CUNHA, 2008). Ainda assim, entende-se
também que nos campos dos debates, discussões, negociações e tomadas de decisão, o poder
provém da composição de uma vontade comum a partir do diálogo na ação comunicativa
(HABERMAS, 1980, apud COZZOLINO; IRVING; SOARES, 2015, p. 141).
Desta maneira, Cozzolino, Costa eEgrejas, (2016, p. 126) esclarecem o entendimento de
diálogo como:
“um processo de escuta e expressão dos sujeitos em torno de um bem comum. Não se refere
a um “monólogo alternado” que visa apenas convencer o outro, mas, sobretudo, uma
construção coletiva, em que cada parte escuta a si e ao outro, transformando-se ou
reafirmando-se (COSTA, 2015).”

Com isso, entende-seque a gestão participativa deve ser discutida de maneira crítica,de modo que
seja realmente capaz depromover a participação direta e inclusiva. Esperando viabilizar a ampliação
do universo de atores e de espaços de participação social nos processos de tomadas de decisão e,
por conseguinte, diminuir conflitos e adversidades na esfera da UC, esforços foram empreendidos
para fomentar modelos de democracia participativa eficientes.
Nesta perspectiva, a partir do levantamento e revisão bibliográfica, foram identificados
princípios de melhores práticas de boa governança e gestão participativa. Onde, dentro de seu
horizonte de contribuições, podem ser utilizadas para construção de um diálogo entre gestores e
representantes da cadeia produtiva turística atuantes em áreas protegidas, assim, embasando o
entendimento, o contato e a formulação dos questionamentos e roteiros de conversa para com os
diversos atores que propagam e prestam os serviços turísticos no Parque Nacional.
Segundo Kaltenborn, Qvenild e Nellemann (2011), Teles e Lima (2011) e Cozzolino, Irving
e Soares (2015), esses princípios são: (1) Legitimidade e Voz; (2) Direcionamento; (3)
Desempenho; (4) Prestação de Contas (Accountability); (5) Equidade (Fairness).
Nesta linha, governança é definida como:

“a interação entre estruturas, processos e tradições, que determina como o poder e as


responsabilidades são exercidos, como decisões são tomadas e como os cidadãos e outros
parceiros envolvidos (stakeholders) são ouvidos” (GRAHAM et al., 2003, p.3, apud
COZZOLINO; IRVING; SOARES, 2015, p. 146).

Teles e Lima (2011) ressaltam que no contexto ambiental, a governança está intrinsecamente
relacionada com a materialização dos objetivos das áreas protegidas.Afirmam, ainda, ser esta a
chave para prevenir ou resolver conflitos sociais.
No âmbito desta pesquisa foram conduzidas conversas com os gestores do PARNASO para
o reconhecimento dos desafios, gargalos e principais demandas enfrentadas em relação ao uso

450
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

público. Assim, foi possível perceber a necessidade e o interesse por parte da gestão do parque em
estreitar o contato com os operadores de turismo.
Posteriormente foi feito o levantamento da amostra dos possíveis operadores de turismo que
comercializam roteiros dentro da UC. Através da pesquisa e contato com os visitantes, condutores
cadastrados, Associação Brasileira de Escalada e Turismo de Aventura – ABETA, Associação
Carioca de Turismo de Aventura – ACTA, e triagem em canais na web como TripAdvisor,
Facebook e Instagram para identificação e composição do universo da pesquisa, desse modo, foram
identificadas 97 potenciais empresas.Cada uma delas será contatada para realização da fase de
entrevistas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando a complexidade da relação do turismo com os ambientes naturais, o constante
planejamento, gestão e a participação da sociedade são necessárias se pretende-se promover
experiências inclusivas e de mínimo impacto. Para alcançar este objetivo, estudos e levantamentos
de dados precisam ser realizados rotineiramente para o manejo do uso público, visto que o cuidado
com os impactos gerados pela visitação representa um dos seus maiores desafios da atualidade.
Atentando-se à complexidade da questão, Loureiro e Cunha (2008) chamam a atenção à
importância do compartilhamento de responsabilidades na proteção das UCs. Pensando nisso,
Passold eKinker (2010) apontam no fortalecimento de parcerias com a iniciativa privada e
associações de classe como alternativa para melhorar à capacidade administrativa dos gestores.
Porém, os prestadores de serviços do turismo devem estar alinhados com os mesmos
objetivos do parque para que essa parceria possibilite a coordenação e formação de trabalhos em
redes (SANTOS et al., 2011). Para isso, a abertura de canais de diálogos com os operadoresdo
turismo mostra-se bastante pertinente, inclusive para que seja possível entender os modelos de
turismo que estão se desenvolvendo, os beneficiários dessas atividades e os impactos, positivos e
negativos, que causam dentro e fora das UCs.
Tais movimentos na edificação de ambientes para debates poderiam possibilitar trocas de
saberes que sejam pertinentes a todas as partes interessadas, como exemplo, convertendo em dados
para o planejamento do parque. Para tanto, a aproximação e o estabelecimento de canais de
comunicação com empreendedores que executam atividades de turismo dentro da UC é o primeiro
passo para a conjugação dos interesses em uma mesma perspectiva de benefício mutuo e
minimização dos impactos.
Ampliando os espaços institucionais formais, acredita-se que seja dilatado a gama de atores
que possam contribuir com orientações, decisões e uma gestão mais justa, transparente e eficaz,
tendo em vista o empenho e incentivo ao diálogo com a sociedade. Dessa maneira, torna-se mais
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

possível o estabelecimento das vantagens na mobilização de conhecimentos e potencialidade da


sociedade, voltados a melhoria do desempenho da administração pública (COZZOLINO; COSTA;
EGREJAS, 2016).
Têm-se como perspectivas para próxima fase, após a realização das entrevistas, entender
melhor a realidade das empresas que atuam no parque, fazendo o reconhecimento de suas opiniões,
dificuldades, expectativas, interesses e necessidades, e coletar elementos que consigam dar
subsídios nos processos de tomada de decisão dos gestores do parque. Além disso, será possível
caracterizar e compreender melhor como se dá o processo de intermediação desses serviços
turísticos prestados e, possivelmente, identificar subsídios para gestão e planejamento do turismo
fora da UC.
Com isso, acredita-se que essa pesquisa vai ao encontro dos objetivos do parque.Portanto, os
subsídios a serem gerados podem proporcionar processos gerenciais mais eficientes e os resultados
mais eficazes, além de, contribuir para uma gestão mais participativa e efetiva.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a FAPERJ e o programa PIBIC/ICMBio pelo imprescindível incentivo e apoio


destinado à realização do projeto.

REFERÊNCIAS:
BRASIL.Lei n° 9.985, de 18 de julho de 2000 que regulamenta o art. 225, § 1°, incisos I, II, III
e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências. Diário Oficial da União. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm>. Acessado em agosto/2019. 2000

COSTA, G. B. Participation et dialogue danslagestionenvironnementaleauBrésil:


lecasdumonumentnatureldesMontsduPain de Sucre et d’Urca à Rio de Janeiro. Tese de
Doutorado, 2015. Caen, Université de Caen Normandie, 2015.

COZZOLINO, L. F.; IRVING, M.; SOARES, D. Gestão de áreas protegidas: análise dos marcos
legais à luz dos princípios de governança democrática. Sociedade e Território, v. 27, n. 1, 138-
156, 2015.

COZZOLINO L. F. F.; DA COSTA, G. B.; EGREJAS, M. Diálogo na gestão de políticas públicas e


o estabelecimento de governança democrática. IN: Marta de Azevedo Irving (Org.). Turismo,
Natureza E Cultura: Interdisciplinaridade e políticas públicas. Rio de Janeiro: Fundação Casa
de Rui Barbosa, 165 p., 2016.

FREY, K. Governança Urbana e Participação Pública. RAC-Eletrônica, v.1, n.1, p. 136-150. 2007.

GRAHAM, J.; AMOS, B.; PLUMPTRE, T.GovernancePrinciples for ProtectedAreas in the 21st
Century. Durban, UICN. 2003.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

HABERMAS, J. O conceito de poder de Hannah Arendt (1976). In: Freitag, B. e Rouanet, S. P.


(org.). Habermas.São Paulo: Ática. 1980.
JANÉR, A. Turismo e parques nacionais. Estudo de caso. Ecobrasil/FunbioProgramaMPE, p. 28,
2003.

KALTENBORN, B. P.; QVENILD, M.; NELLEMANN, C. Local governance of national parks:


The perception of tourism operators in Dovre-Sunndalsfjella National Park, Norway. In:
NorskGeografiskTidsskrift - NorwegianJournalofGeography, 65:2, 83-92. 2011.

LOUREIRO, C. F. B.; CUNHA, C. C. Educação ambiental e gestão participativa de unidades de


conservação: elementos para se pensar a sustentabilidade democrática. Ambiente & Sociedade. v.
XI, n. 2, 237-253, 2008.

PASSOLD, A.J.; KINKER,S.M.S. Visitação Sustentável em Unidades de Conservação. (2010).


In:Philippi Jr., A. &Ruschmann, D. V. M. (Org.).Gestão ambiental e sustentabilidade no
turismo.v.9. Barueri, SP: Manole, 2010.

SANTOS, A.A.; et al. Cadeia de serviços turísticos: possibilidade de inclusão social nos parques
nacionais brasileiros. Revista Brasileira de Ecoturismo, v.4, n.1, 208-227, 2011.

SOUZA, T. V. S. B.; SIMÕES, H. B. Contribuições do Turismo em Unidades de Conservação


Federais para a Economia Brasileira - Efeitos dos Gastos dos Visitantes em 2017: Sumário
Executivo. ICMBio. Brasília, 2018.

TELES, R. M. de S.; LIMA, T. Gestão participativa em unidades de conservação: desenvolvimento


de um método de avaliação de conselhos gestores. In: TELES, R. M. de S. (Org.). Turismo e Meio
Ambiente. Rio de Janeiro: Elsevier,133-144,2011.

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TURISMO E CONSERVAÇÃO AMBIENTAL: O CASO DO PARQUE


ESTADUAL MATA DO PAU FERRO – PB
TOURISM AND ENVIRONMENTAL CONSERVATION: THE CASE OF MATA OF PAU
FERRO STATE PARK – PB

Airton Vieira Alves*, Vivian Maitê de Castro**

*Bacharel em Turismo, Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Brasil.


**Professora Substituta do Departamento de Turismo e Hotelaria. Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Brasil.
(Professora orientadora)

INTRODUÇÃO
O turismo, enquanto fenômeno social, desencadeia uma série de processos econômicos,
ambientais e socioculturais que transformam pessoas, lugares e dinâmicas sociais, pela relação
estabelecida entre turista e comunidade receptora. Essas transformações podem trazer impactos
positivos, como oportunidade de emprego e renda, adequação e melhoria de infraestrutura,
fortalecimento da cultura local, entre outros; bem como impactos negativos, como a degradação de
espaços naturais, perda da autenticidade, descaracterização da cultura regional, dependência de
capital externo, entre outros. Visando a minimização dos impactos negativos, surge um novo
modelo denominado turismo sustentável.
O turismo sustentável é uma maneira de conduzir o desenvolvimento da atividade sem
atitudes ofensivas ao meio natural, que pretende acolher as necessidades dos turistas e dos locais de
maneira simultânea, propondo medidas para atender a economia, a sociedade e o ambiente sem
depreciar a cultura regional, a biodiversidade e os sistemas ecológicos que coordenam a vida
(MEDEIROS, 2013). A prática ainda “pretende refletir uma política e estratégia de
desenvolvimento econômico e social contínuo, sem prejuízo do ambiente e dos recursos naturais”
(BENI, 2003, p. 07).
Em um panorama nacional, destacam-se a institucionalização de políticas públicas de base
conservacionista e proteção dos espaços naturais, como a Política Nacional de Meio Ambiente
(PNMA) e o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), que institui e
normatiza as atividades nesses espaços, inclusive o turismo, que são a “delimitação de parcelas do
território nacional para a preservação e/ou conservação da natureza” (IRVING, 2002, p.16).
Atividades turísticas em unidades de conservação (UC) são comuns para pesquisadores,
profissionais do turismo e do meio ambiente, além de comunidades tradicionais inseridas nestas ou
em seu entorno.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Nesse contexto, este trabalho objetiva identificar e analisar o turismo realizado pela
comunidade rural Chã de Jardim, localizada no entorno do Parque Estadual Mata do Pau Ferro,
município de Areia/PB, analisando-o quanto a sua concepção, desenvolvimento e sustentabilidade,
a partir da promoção, interação, educação e conservação da natureza, além da geração de emprego e
renda aos comunitários.

MATERIAL E MÉTODOS
Este trabalho surgiu da percepção de transformação na dinâmica socioespacial da região,
advinda da relação turismo e área protegida (Parque Estadual Mata do Pau Ferro), considerando que
a comunidade rural residia dentro da área antes de sua criação, tendo sido realocada as margens da
UC e da rodovia estadual após sua institucionalização.
Inicialmente, realizou-se um levantamento bibliográfico referente as temáticas de turismo,
áreas protegidas, conservação ambiental, desenvolvimento e turismo sustentável, políticas públicas,
participação e inclusão social. Posteriormente, a aplicação da pesquisa in loco se deu por meio da
experiência vivenciada com a metodologia da observação sistemática, onde o pesquisador se
mantém captador das experiências no local. Também realizou-se a aplicação de entrevistas e
questionários aos turistas; e, com os comunitários envolvidos na execução das atividades turísticas
(condutores, artesãos, educadores ambientais).
Trata-se de uma pesquisa de caráter qualitativo, na qual analisamos as relações ocasionadas
pelo fenômeno turístico na comunidade. Ramos et al (2005), define a pesquisa qualitativa
relacionando a realidade com o objeto de estudo, obtendo diferentes interpretações através de uma
análise indutiva, orquestrada pelo autor da pesquisa. Dessa forma, as atividades de turismo
realizadas pela comunidade ganharam papel de população nesse trabalho, e a amostra tornou-se o
visitante em atividade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O turismo realizado pela comunidade Chã de Jardim relaciona-se com o uso direto do
Parque Estadual, por meio de práticas socioambientais que dinamizam a economia local e
contribuem para o desenvolvimento do turismo na região. Pela iniciativa comunitária de gestão
social, as ações de turismo buscam promover o bem-estar e melhoria na qualidade de vida dos
moradores da comunidade. O desenvolvimento das atividades na comunidade inicia-se com a
ativação da fábrica de polpas de frutas Doce Jardim, em 2006. Esta era a promessa do poder público
para geração de emprego e renda, quando da realocação da comunidade. Entretanto, a mesma
permaneceu desativada por falta de mão de obra qualificada por dez anos, tendo o turismo motivado

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

a sua abertura e funcionamento. A fábrica torna-se assim, a primeira ação empreendedora da Chã de
Jardim.
Pela relação com a Mata do Pau Ferro antes mesmo da criação da UC, e por ainda residirem
nos limites da mesma, a comunidade percebeu que além de visitantes com fins acadêmicos, haviam
grupos de turistas e amantes da natureza que apareciam para visitar o Parque. Este, até hoje sem
plano de manejo, tampouco uma gestão efetiva, era uma possibilidade de trabalho e renda, e os
moradores conheciam bem a área e seu entorno. Assim, iniciaram a organização das trilhas
ecológicas para caminhantes, ainda com bicicletas ou cavalos, adequando o produto de acordo com
as condições e intenções do visitante. Também há o fornecimento de alimentação, com produtos
característicos da região, como bolos, tapioca, sucos naturais, preparados no Restaurante Rural Vó
Maria, também da comunidade, e situado do outro lado da rodovia. A conduta ambiental consciente,
com momentos de educação e interpretação ambiental, está implícitano desenvolvimento da
atividade, proporcionando o lazer e contemplação da paisagem.
Ampliando a oferta turística, em 2013, foi criado o Restaurante Rural Vó Maria,
empreendimento gastronômico sob administração dos comunitários, onde os visitantes podem
apreciar a culinária tradicional da região. Com a oferta de pratos regionais preparados com produtos
livres de agrotóxicos, produzidos na comunidade, o empreendimento já recebeu prêmios pela boa
comida. Orientados pela ótica de práticas conservacionistas, os turistastambém podem optar pela
participação em oficinas e atividades de cunho ambiental, como a compostagem e viveirismo; e
cultural, como a oficina de artesanato na palha de bananeira. Trata-se de uma ocasião de
sensibilização ambiental acerca da destinação e tratamento aos resíduos sólidos orgânicos,
promovendo a sustentabilidade com a redução do desperdício de recursos, redução dos índices de
poluição do solo, água e ar, entre outros (MONTEIRO, 2016).
A comunidade também desenvolve, junto com um grupo de artesãs locais que integram o
Projeto Arte na Mão, uma oficina de artesanato com a utilização da palha seca de bananeira,
produto abundante na região, e os visitantes confeccionam as peças e as levam de lembrança. Por
fim, ainda criou-se mais uma opção turística com os talentos locais, o Pôr do sol de Maria, que une
entretenimento, música popular brasileira, contemplação da paisagem e vivência cultural, com uma
cantora da comunidade. Assim, elenca-se um compilado de elementos, que de forma integrada
compõem o produto turístico local, agregando elementos físicos, naturais, humanos, sociais e
econômicos, descritos na tabela a seguir.

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Tabela 1 – Elementos do Produto Turístico


Elementos Características

Produção agrícola com o uso de grãos/sementes/raízes;


manejo e uso da terra para o plantio; casa para produção de
farinha e derivados; uso de resíduos (folhas/restos de
alimentos e frutas) para compostagem;
Produção agropecuária com a criação e uso de animais
Físicos domésticos (galinha/porco/bode/outros);
Extração da folha de bananeira para a criação de peças
artesanais (esteiras/pastas/bolsas/outros);
Fabricação da polpa de fruta com as instalações/maquinários;
local para armazenamento (câmara fria).

Recursos florestais para uso no desenvolvimento de trilhas;


práticas de conservação; mudas/ervas medicinais;
Área florestada, que possibilita o desenvolvimento de práticas
e atividades (turismo/educação ambiental/lazer, outros);
Naturais
Ambiente natural, que fortalece práticas tradicionais da
comunidade;
Representação do patrimônio natural, material e imaterial.

Conhecimento das práticas produtivas e da área florestada;


Presença de famílias tradicionais;
Representatividade feminina no desenvolvimento das
Humanos atividades;
Cooperação e trabalho em parceria;
Hospitalidade comunitária.
Associação formal para gestão e uso dos recursos naturais;
Redes de parentesco e associados no desenvolvimento das
Sociais
atividades;
Relações simbólicas ede pertencimento presentes no território.

Descentralização do capital financeiro;


Rendas secundárias de trabalho associadas às atividades
Econômicos
tradicionais (convênio com poder público);
Benefícios socioeconômicos associados ao modelo de
produção.
Fonte: Elaboração própria (2019)

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Por meio de uma gestão descentralizada e colaborativa, a comunidade desenvolve o turismo


de forma a conservar o patrimônio natural local, estimular a dinâmica econômica, com a geração de
renda e empregos diretos e indiretos, fortalecimento e valorização da cultura, práticas sociais e do
sentimento de pertencimento. De acordo com Entrevistada 04 (2019), “o parque colabora pro bem
estar da comunidade e contribui como gerador de renda para algumas pessoas que trabalham
diretamente com as trilhas, e tudo que venha surgir em questão da criação de novas atividades,
depende do parque e sua conservação”.

CONCLUSÃO
As atividades turísticas desenvolvidas na comunidade propiciam o estímulo a conservação
da natureza e à produção científica, a valorização do patrimônio natural, social, cultural e
econômico local, a perpetuação de novos espaços de aprendizagem e o estabelecimento de relações
de parceria entre as instituições públicas e privadas. Além disso, o turismo contribui com a
sensibilização e educação ambiental, bem como possibilita a inserção social dos comunitários, que
passam a ter alternativas viáveis e possíveis para permanecer residindo neste local.
Por fim, podemos alinhar o uso de áreas naturais protegidas com o turismo como um fator
benéfico à conservação ambiental e a inclusão social, neste caso o Parque Estadual Mata do Pau
Ferro e a comunidade rural Chã de Jardim. Além de benefícios ambientais, destacam-se o
desenvolvimento econômico, a disseminação da cultura local, configurações espaciais que
aproximam o meio urbano e o rural, e a difusão de práticas sociais locais associadas, que passaram
a inspirar empreendimentos comunitários na Paraíba, no Nordeste, e até em outros estados do
Brasil.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BENI, M. C. Como certificar o turismo sustentável? Revista Turismo em Análise, v. 14, n. 2, p.
5-16, 2003.

IRVING, M. A.; AZEVEDO, J. Turismo: o desafio da sustentabilidade. São Paulo:Futura, 2002.

MEDEIROS, L. C. Turismo e sustentabilidade ambiental: referências para o desenvolvimento


de um turismo sustentável. Revista Meio Ambiente e Sustentabilidade, v. 3, n. 2, p. 197-234,
2013.

MONTEIRO, J. A. V. Benefícios da compostagem doméstica de resíduos orgânicos. Revista


Educação Ambiental em Ação, n. 56, 2016.

RAMOS, P.; RAMOS, M. M.; BUSNELLO, S. J. Manual prático de metodologia da pesquisa:


artigo, resenha, projeto, TCC, monografia, dissertação e tese. Acadêmica: Blumenau, 2005.

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PROPOSTA DE UM SISTEMA DE TRILHAS INTERPRETATIVAS PARA O


PARQUE ESTADUAL SERRA DO CONDURU (PESC), BAHIA
Monalisa Peixoto Ribeiro*, Camila Christiane Fonseca de Jesus**, Maria EugêniaBruck de
Moraes***

Graduanda em Geografia, Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil*


Mestranda em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente,Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil**
Professora do DCAA, Universidade Estadual de Santa Cruz, Brasil. ***

INTRODUÇÃO
A unidade está inserida dentro do bioma Mata Atlântica e a preservação do Parque está
diretamente relacionada com a elevada diversidade biológica da região. Abriga o mini corredor
PESC- Boa Esperança que integra uma das áreas prioritárias para conservação do Corredor Central
da Mata Atlântica. Devido a essa aptidão, o Parque Estadual Serra do Conduru (PESC) é de suma
importância para a região sul da Bahia.
Visando colaborar com a gestão do Parque, o presente projeto contemplará o mapeamento
das duas trilhas localizadas no PESC e seus pontos interpretativos, com o objetivo de propor um
sistema de trilhas interpretativas, tendo em vista sua importância como patrimônio natural, sua
capacidade turística, educacional e científica.

MATERIAL E MÉTODOS
O Parque está inserido no Sul da Bahia e abrange área dos municípios de Uruçuca, Itacaré e
Ilhéus. Foi criado em 21 de fevereiro de 1997, pelo Governo do Estado da Bahia, a partir do
Decreto Estadual 6227, totalizando uma área de 7 mil hectares e ampliado para 9.725 hectares em
04 de novembro de 2003, pelo decreto 8.702.
A metodologia se desenvolveu em três etapas principais:
Figura 1 – Esquema Metodológico

Fonte: Elaborado pela autora.

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A primeira fase compreendeu o levantamento bibliográfico baseado na revisão de


publicações científicas acerca da educação ambiental em parques, com foco nas experiências em
trilhas interpretativas, em Unidades de Conservação e o seu uso público.
A segunda fase consistiu na coleta dos dados vetoriais de origem secundária como rodovias,
limites municipais e hidrografia disponibilizadas pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística). Houve também a coleta dos dados vetoriais disponibilizados pelo GPS como traçado e
pontos de parada, além da duração do percurso, velocidade e altitude. Os dados vetoriais são
representações de vértices definidos por um par de coordenadas, podem ser georreferenciados e
expressos através de pontos, linhas e polígonos.
A terceira fase correspondeu à elaboração dos mapas das trilhas interpretativas do Parque, a
partir da exportação dos dados vetoriais do GPS para o software BaseCamp Garmin. Esses dados
foram salvos em formato KML, que se trata de um formato de arquivo usado para exibir dados
geográficos. Os dados espaciais foram inseridos no Software ArcGIS 10.2.2 e convertidos para
shapefile, formato de arquivo de dados geoespaciais em forma de vetor.
Para a elaboração do traçado das trilhas, foram definidos e marcados com GPS Portátil
modelo Garmin (GPSMAP 73) os pontos de maior interesse. Posteriormente, foi adotado um
critério de escolha dos pontos potenciais de interpretação, como ilustra na Figura 2:

Figura 2- Critérios de escolha dos pontos interpretativos

Fonte: Dados da pesquisa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
TRILHA DO MIRANTE
A Trilha do Mirante possui seis pontos de interpretação, como sugeridos na Tabela 1 e
Figura 3.

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Tabela 1- Pontos de interpretação Trilha do Mirante


Nº Nome popular/ científico Critério de inclusão Coordenadas

1 Matataúba/ Scheflera morototoni Espécie endêmica S14° 29.683' W39°


08.139'

2 Área alagada APP S14° 29.710' W39°


08.133'

3 Imbiruçu Roxo/ Eriotheca sp Beleza cênica S14° 29.722' W39°


08.116'

4 Mundururu Ferro/ Henriettea succosa Beleza cênica S14° 29.811' W39°


08.050'
Ponto para descanso

5 Formigueiro Beleza cênica S14° 29.865' W39°


08.057'

6 Mirante Beleza cênica S14° 30.048' W39°


07.958'

Fonte: Dados da pesquisa.

A trilha possui 2 quilômetros (km) no seu percurso e é considerada de tipologia linear pois é
caracterizada por um sentido único. O primeiro ponto de interpretação da trilha é a Matataúba uma
espécie endêmica da flora da região (Sambuichi; et al., 2009). O segundo ponto contém área
alagada que é considerada uma APP (Área de Preservação Permanente). Segundo Schäffer, et al.
(2011), as APPs tem função de assegurar um ambiente ecologicamente equilibrado.

Espécies como Imbiruçu Roxo e Mundururu Ferro se destacam pelo seu tamanho em relação
às demais. O último ponto de interpretação é o que deu nome à trilha, um mirante com vista
panorâmica para cidade de Ilhéus.

461
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 3- Mapa Trilha do Mirante

Fonte: Dados da Pesquisa.

TRILHA DA CACHOEIRA SÃO JOSÉ


O seu percurso possui 18 km em seu total e classificada como tipologia linear. Durante o
percurso é possível conhecer o sistema de cacauicultura tradicional, chamado método da cabruca.
De acordo com LOBÃO, et al. (2011), consiste na substituição do sub- bosque da floresta primária
de Mata Atlântica pelo cacaueiro e raleamento das árvores do dossel para utilização do seu
sombreamento no cacau (Theobroma cacao).
A Trilha da Cachoeira São José possui quatorze pontos de interpretação, como sugeridos na
Tabela 2 e Figura 4.

Tabela 2 - Pontos de interpretação Trilha da Cachoeira São José


Nº Nome popular/ científico Critério de inclusão Coordenadas

S14° 30.027' W39°


1 Palmeira Catulé/ Attalea oleifera Beleza cênica
08.226'

S14° 30.277' W39°


2 Curso d’água APP
08.255'

S14° 30.400' W39°


3 Curso d’água APP
08.153'

Plantio de Cacau Cabruca/ S14° 30.441' W39°


4 Plantio regional
Theobroma cacao 08.140'

S14° 30.598' W39°


5 Curso d’água APP
08.137'

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S14° 30.695' W39°


6 Curso d’água APP
08.178'

S14° 30.731' W39°


7 Cedro Verdadeiro/ Cedrela fissilis Espécie nobre
08.164'

S14° 30.754' W39°


8 Curso d’água APP
08.167'

S14° 31.426' W39°


9 Curso d’água APP
08.188'

S14° 31.582' W39°


10 Massaranduba - Manilkara salmanii Espécie nobre
08.134'

Cipó Escada de Macaco/ Bauhienia S14° 31.603' W39°


11 Beleza cênica
sp. 08.141'

S14° 31.603' W39°


12 Gingiba/ Sloanea obtusifolia Beleza cênica
08.141'

S14° 32.565' W39°


13 Conduru/ Brosimum rubescens Espécie endêmica
08.024'

S14° 33.237' W39°


14 Cachoeira São José Beleza cênica
08.217'

Fonte: Dados da pesquisa.


Gindiba e Palmeira Catulé, são importantes atrativos para fauna. Foram espécies sugeridas
devido a sua beleza cênica. Espécies nobres com madeira de lei como Cedro e Massaranduba, são
muito conhecidas pelo seu uso em movelaria e construção civil. E por último o maior atrativo da
trilha, a Cachoeira São José.
Figura 4 - Mapa Trilha da Cachoeira São José

Fonte: Dados da pesquisa.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONCLUSÃO
O Parque Estadual Serra do Conduru apresenta grande potencial para implantação de trilhas
interpretativas, utilizando roteiros que podem alcançar diferentes públicos. As trilhas interpretativas
atuam como estratégias para educação, além de atrair visibilidade para o Parque. Porém o PESC
ainda é pouco conhecido, tornando-se preciso o estimulo à visitação do Parque não somente pelo
turista, mas também pela comunidade do seu entorno, estudantes do ensino infantil, fundamental,
médio e superior.
Além da sensibilização da comunidade sobre a importância da biodiversidade existente no
parque, busca-se o seu envolvimento e participação para a preservação e valorização, através de
desenvolvimento socioambiental sustentável que contribuam para a melhoria na qualidade de vida
das comunidades do PESC.Os vigilantes que trabalham no Parque são antigos caçadores da região e
hoje auxiliam na condução em trilhas, fiscalização da área, auxiliando no combate a caça e
desmatamento.

AGRADECIMENTOS
Sou grata à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) pelo auxílio
financeiro com uma bolsa de Iniciação Científica, ao Instituto do Meio Ambiente e Recursos
Hídricos (INEMA), equipe e gestores do PESC por todo apoio prestado para realização dos campos
dessa pesquisa. Agradeço ao Laboratório de Análise e Planejamento Ambiental (LAPA) e sua
equipe.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAHIA. Decreto 6227/97, de 21 de fevereiro de 1997. Poligonal do Parque Estadual da Serra do
Conduru. Disponível em: <https://governo-ba.jusbrasil.com.br/legislacao/79038/decreto-6227- 97>.
Acesso em: 6 nov. 2018.
LOBÃO, D. E.; et al. Sistema Cacau Cabruca e a Mata Atlântica: Diversidade Arbórea,
conservação e potencial de produção. Agrotrópica 23(2,3): 115 – 124. CEPLAC, 2011. Ilhéus,
BA.
SAMBUICHI, R.H.R.; et al. Lista de árvores nativas do sul da Bahia. In: SAMBUICHI, R.H.R.;
MIELKE, M.S.; PEREIRA, C.E., org. Nossas árvores: conservação, uso e manejo de árvores
nativas no sul da Bahia. Ilhéus, BA: Editus, 2009, pp. 171-157. Disponível em:
<http://books.scielo.org/id/pkb78/epub/sambuichi-9788574555157.epub>. Acesso em 28 ago. 2019.

464
GT 6
Áreas protegidas e urbanização:
cenários de mudanças e a dinâmica
das cidades
Em geral é ainda incipiente no debate sobre áreas protegidas, a discussão da
dinâmica de proteção da natureza em espaços urbanos. Nas cidades brasileiras,
em especial nas grandes metrópoles, muitas são as áreas urbanas protegidas, em
nível federal, estadual ou municipal. Poucas pesquisas são específicas sobre esse
contexto, apesar da forte tendência de urbanização no caso brasileiro. Há ainda
uma diversidade de áreas de interesse para a conservação da biodiversidade a
serem inseridas no debate, como as APPs, praças e parques urbanos, em áreas
privadas e em fragmentos de vegetação sem proteção especial pela legislação
vigente. Estão também em curso no caso brasileiro, iniciativas de parques
lineares, agricultura urbana ou periurbana, além da proteção e uso da
biodiversidade aquática em águas urbanas que precisam ser melhor discutidas
como alternativas para a gestão. As áreas protegidas nas cidades se conectam
com questões de direito à moradia e à especulação imobiliária, questões de uso
público e lazer, temas vinculados à poluição urbana, saúde, alimentação e
violência urbana, entre outros. O grupo de trabalho tem o objetivo de discutir e
debater as pesquisas e ações em curso e promover o dialogo sobre tais conexões.

Coordenadores:
Andrea Rabinovici (UFSCAR)
Carlos Eduardo Menezes (IFPE)
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ÁREAS PROTEGIDAS E URBANIZAÇÃO: O CASO DA APA DA ILHA DO


COMBÚ, BELÉM (PA)
PROTECTED AREAS AND URBANIZATION: THE CASE OF COMBÚ ISLAND, BELÉM
(PA)

Pekka Virtanen*

Departamento de Ciências Sociais e Filosofia, PhD, Professor Adjunto, Universidade de Jyväskylä, Finlândia*

1. INTRODUÇÃO
O município de Belém tem 65% da sua área municipal composta por 39 ilhas, incluindo a ilha
do Combú, que é a quarta maior ilha do município (IDEFLOR-BIO, 2018). Esta está situada a 1,5
km ao sul de Belém, as margens do rio Guamá (Figura 1). Sua área de aproximadamente 16
km2 apresenta ecossistema típico de várzea, com paisagem formada por um mosaico peculiar de
espécies florestais e cursos d’água. Sua população é estimada em 1.500 habitantes que vive
principalmente do extrativismo dos recursos da floresta, sobretudo o açaí, da pesca, e mais e mais
do turismo (IDEFLOR-BIO, 2018).
Através da Lei Estadual nº 6.083 de 13/11/1997, a APA da Ilha do Combú foi criada

“com o objetivo de proteger e restaurar a diversidade biológica, os recursos genéticos, as


espécies ameaçadas de extinção, bem como a promover o desenvolvimento sustentável,
através do ordenamento dos recursos naturais e da melhoria da qualidade de vida da
comunidade local” (IDEFLOR-BIO, 2018).

A APA da Ilha do Combú faz parte da Região Administrativa de Belém, um conjunto de mais
de 16.000 ha de unidades de conservação, incluindo - além do Combú – três outros. O mosaico de
áreas protegidas também inclui o Quilombo Abacatal (Figura 1).
Semelhante a outras comunidades ribeirinhas da Amazônia, os moradores da Ilha do Combú
passaram por uma série de ciclos econômicos com ligações mais ou menos intensivas a economia
urbana de Belém, mas também aos mercados globais. No entanto, penetração significativa da
Amazônia para fins econômicos veio com a indústria de borracha, cujo auge durou até início do
século XX. Na Ilha do Combú a borracha tornou-se novamente importante na década de 1950,
devido à demanda da empresa Pirelli estabelecida em Belém. Por falta de transporte motorizado, a
agricultura de subsistência permaneceu essencial até a década de 1960. Com transporte
gradualmente melhorado, novos mercados se abriram para produtos extrativistas, especialmente
açaí, que se tornou o principal produto na década de 1990. Durante as últimas décadas, os principais
desenvolvimentos foram a criação do mosaico de áreas protegidas e o rápido crescimento do
turismo. A pergunta de pesquisa é: qual é o impacto da localização geográfica do Combú na
466
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

área metropolitana de Belém e seu status como APA sobre biodiversidade e desenvolvimento
socioeconômico?

Figura 1 - Mosaico de áreas protegidas da RegiãoMetropolitana de


Belém.

Fonte: Governo do Estado do Pará (2009)

2. MATERIAL E MÉTODO
Esta submissão é baseada em entrevistas semi-estruturadas e observações feitas pelo autor e
pelo Sr. Reginaldo da Conceição Teixeira durante o trabalho de campo na Ilha do Combú e em
Belém, no período de 8-19 de outubro de 2018. Entrevistamos ao todo 20 homens e 14 mulheres de
31 domicílios da ilha, além de 3 representantes do Ideflor-Bio e 1 representante de ONG e 1 do
setor privado em Belém. Entre os entrevistados na ilha foram incluídos 3 atuais e 3 ex-membros do
Conselho da APA da Ilha do Combú. A fim de preparar o trabalho de campo, uma visita
introdutória à área de pesquisa foi realizada pelo autor em junho de 2017. Além disso, documentos
legais e administrativos, bem como relatórios de pesquisas anteriores na área e outras publicações
de pesquisa relevantes são usados.
Os dados são analisados usando métodos qualitativos. A análise é baseada em Critical
Discourse Studies (CDS), em particular aabordagem histórico-discursiva.

467
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“CDS é uma abordagem interdisciplinar da linguagem em uso, que visa avançar nossa compreensão de como o discurso
se encaixa nos processos sociais, nas estruturas sociais e na mudança social” (FLOWERDEW; RICHARDSON,

2018, 1, tradução pelo autor).


A ênfase da abordagem histórico-discursiva está na qualidade prática dos discursos relacionados,
sua dependência de contexto e seu caráter construído e construtivo. O foco está em dados primários
relacionados a problemas, em particular assuntos históricos e sua ancoragem histórica (REISIGL,
2018).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Enquanto a população da Ilha do Combú é considerada "tradicional", na verdade, sua base
econômica sofreu várias mudanças durante os últimos 50 anos. Segundo os entrevistados, em
meados do século XX, as principais fontes de renda foram cacau e borracha. Outros produtos
incluíam frutas nativas, madeira, peixe e camarão. Com exceção da borracha, os mesmos produtos
foram utilizados para consumo próprio, enquanto os frutos de açaí constituíram a base da dieta
local. Com a queda drástica do preço da borracha na década de 1980, a produção de palmito para o
centro-sul (onde a colheita excessiva dizimou a palmeira juçara nos anos 70) tornou-se a palmeira
açaí o principal recurso comercial (JARDIM, 2002). Alarmados com o dano ambiental causado no
sul, as autoridades tentaram regular de forma mais rigorosa a produção no Pará (RIBEIRO, 2010).
Contudo, depois de um pico nos anos 80, a produção do palmito caiu drasticamente (MOURÃO,
2004). Por outro lado, a demanda por frutas de açaí em Belém cresceu rapidamente. Devido à
proximidade dos mercados em Belém e ao fato de a maioria das famílias ter acesso a recursos
florestais (JARDIM, 2002), o modo caboclo de extrativismo, ou seja, a produção familiar, ainda é
dominante no Combú ao invés da aviação (cf. FILHO, 1979), ao contrário de algumas outras ilhas
do delta (NASCIMENTO, 2004).
Apesar de sua proximidade de Belém, o Combú permaneceu relativamente isolado até a
década de 1990. Transporte dependia de canoas não motorizadas, que poderiam ser usadas com
segurança para atravessar o rio Guamá apenas em condições favoráveis. Isso reduziu a
comercialização de alguns produtos perecíveis (como açaí) e incentivou a agricultura para consumo
próprio. Essa situação mudou gradualmente à medida que os motores de popa se tornaram mais
acessíveis. Ao mesmo tempo, a população também dobrou, enquanto que as viagens regulares para
Belém para negócios ou trabalho se tornaram mais comuns. O rápido crescimento do turismo
durante a última década é também devido à melhoria dos transportes. É, no entanto, mais turismo de
lazer dirigido aos restaurantes do que ecoturismo.
Na década de 1990, várias novas áreas protegidas foram estabelecidas na região
metropolitana. A participação é um princípio operacional das APAs, mas em vez de uma iniciativa
468
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

local, Combú foi incluído por iniciativa dos pesquisadores do Museu Goeldi, sendo uma das
justificativas o controle da produção de palmito (RIBEIRO, 2010). O conceito de APA visa também
promover o bem-estar das populações-alvo, mas no caso do Combú objetivos como água e
saneamento melhorado (LINO; MORAES, 2005) não foram cumpridos. Ao mesmo tempo, erosão
da costa devido ao aumento do tráfego motorizado e a poluição aumentaram rapidamente.
A maioria dos entrevistados sentiu que eles têm pouco ou nenhum papel na gestão, e alguns
nem sequer sabiam do status de proteção da ilha. O conselho deliberativo foi criticado por não
tomar medidas sobre questões importantes, e Combú ainda não tem plano de manejo.
Concomitantemente, membros do conselho e autoridades se queixaram da fraca participação e falta
de iniciativa da população. No entanto, como observado pelos membros do Ideflor-Bio, a FEMA
tem poucos recursos, mas o status facilitou acesso a outras fontes, como fundos federais que
permitiram a eletrificação da ilha, melhoria na habitação, melhoria dos serviços de educação e
saúde, e organização de atividades de treinamento.
Vários entrevistados observaram que os moradores já cortaram cacaueiros e as árvores
frutíferas para dar lugar ao açaí, e um apicultor mencionou redução na prevalência de abelhas. O
dano potencial à biodiversidade (FREITAS et al., 2015) e a reprodução do açaí devido à redução
dos serviços de polinização (CAMPBELL et al., 2018) são confirmados pelos pesquisadores.
Portanto, o valor da APA para a conservação da biodiversidade pode ser questionado.

4. CONCLUSÃO
Semelhante a outras áreas ribeirinhas da Amazônia, o Combú tem uma longa história de
envolvimento no comércio de produtos extrativos. No entanto, sua proximidade geográfica com
Belém e consequente acesso a mercados tornou os produtores menos dependentes de
intermediários, enquanto a posse de recursos se baseou em unidades familiares independentes.
Portanto, o modo dominante de extrativismo caboclo, juntamente com o acesso limitado ao
transporte motorizado para chegar a Belém até a década de 1990, garantiu um nível relativamente
alto de conservação ambiental. A declaração da APA em 1997 serviu ao objetivo de manter essa
situação contra o aumento da pressão da urbanização.
O impacto do status de APA introduzido externamente tem sido um tanto contraditório.
Embora tenha facilitado o acesso a algumas instalações modernas, como a eletricidade, a ilha ainda
sofre com a falta de serviços importantes, como água potável e tratamento de lixo. Embora a APA
tenha tido um efeito limitado na conservação da biodiversidade, a alta demanda por açaí permitiu a
continuidade da produção extrativista relativamente sustentável, embora com tendência para a
monocultura. As principais ameaças vêm do turismo de lazer descontrolado e do rápido aumento do
tráfego motorizado - ambos devido à proximidade de Belém.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

5. AGRADECIMENTOS
Agradeço ao povo do Combú pelas entrevistas concedidas.

6. REFERÊNCIAS
CAMPBELL, A.J.; CARVALHEIRO, L.G.; MAUÉS, M.M.; JAFFÉ, R.; GIANNINI, T.C.;
FREITAS, M.A.B.; COELHO, B.W.T; MENEZES, C. Anthropogenic disturbance of tropical
forests threatens pollination services to acai palm in the Amazon river delta. Journal of Applied
Ecology 55, 1725-1736, 2018.

FILHO, J.P. O caboclo e o brabo: Notas sobre duas modalidades de força-de-trabalho na expansão
da fronteira Amazônica no século XIX. In: Encontros com civilização Brasileira, Silveira, É. &
Moacyr, F. (Org.), Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979, p. 101-140.

FLOWERDEW, J; RICHARDSON, J.E. Introduction. In: The Routledge handbook of critical


discourse studies, Flowerdew, J. & Richardson, J.E. (Org.), New York: Routledge, 2018, p. 1-12.

FREITAS, M.A.D.; VIEIRA, I.C.G.; ALBERNAZ, A.L.K.; MAGALHÃES, J.L.L.; LEES, A.C.
Floristic impoverishment of Amazonian floodplain forests managed for açaí fruit production.
Forest Ecology and Management 351, 20-27, 2015.

Governo do Estado do Pará,Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Consulta publica: Refúgio de


Vida Silvestre.Marituba, Pará,05 de Novembro de 2009 (Powerpoint).2009.

Ideflor-bio. Área de Proteção Ambiental da Ilha do Combu. Belém – PA. Disponível


em:https://ideflorbio.pa.gov.br/unidades-de-conservacao/regiao-administrativa-de-belem/area-de-
protecao-ambiental-da-ilha-do-combu/. Acesso em: 28/07/2019. 2018a.

JARDIM, M. A cadeia produtiva do acaizeiro para frutos e palmito: Implicacões ecológicas e


sócioeconômicas no estado do Pará. Boletim do MPEG, Série Antropologia 18, 287-305, 2002.

LINO, C.F.; MORAES, M.B. Protecting landscapes and seascapes: Experience from coastal regions
of Brazil. In: The protected landscape approach: Linking nature, culture and community,
Brown, J.; Mitchell, N.; Beresford, M. (Org.), Gland: IUCN, 163-176, 2005.

MOURÃO, L. Açaizeiro: Açaí e palmito no estuário Amazônico. In: Açaí. Possibilidades e limites
para o desenvolvimento sustentável no estuário Amazônico, JARDIM, M.A.G.; MOURÃO, L.;
GROSSMAN, M. (Org.), Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 181-204, 2004.

NASCIMENTO, J.M. Açaí, a fotossíntese do lucro. In: Açaí. Possibilidades e limites para o
desenvolvimento sustentável no estuário Amazônico, JARDIM, M.A.G.; MOURÃO, L.;
GROSSMAN, M. (Org.), Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 135-154, 2004.

REISIGL, M. The discourse-historical approach. In: The Routledge handbook of critical


discourse studies, Flowerdew, J. & Richardson, J.E. (Org.), New York: Routledge, 2018, p. 44-59.

RIBEIRO, J. Área de Proteção Ambiental da Ilha do Combu, Belém/PA: Desafios de


implantação e de gestão de uma unidade de conservação. Dissertação (Mestrado em Gestão de
Recursos Naturais e Desenvolvimento, Núcleo de Meio Ambiente). Belém, Universidade Federal
do Pará.

470
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

GRUPO DE TRABALHO AVALIA NECESSIDADES E AÇÕES PARA O


ENFRENTAMENTO DO CONFLITO ENTRE O LOTEAMENTO
IRREGULAR ‘VARGEM GRANDE’ E A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E
CULTURAL NO MANANCIAL PAULISTA
WORKING GROUP ASSESSES NEEDS AND ACTIONS FOR FACING THE CONFLICT
BETWEEN THE IRREGULARSETTLEMENT ‘VARGEM GRANDE’ AND
ENVIRONMENTAL AND CULTURAL PRESERVATION IN SAO PAULO DAM AREA

Alexandra Aguiar Pedro*, Rosângela Toso Bringel**

*Coordenadoria de Projetos e Obras, Secretaria Municipal da Habitação, PMSP, Brasil.


**Coordenadoria de Regularização Fundiária, Secretaria Municipal da Habitação, PMSP, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Conflitos em áreas de proteção ambiental são recorrentes, notadamente em relação a usos
que demandam remoção da cobertura vegetal. A ocupação irregular desordenada é comum nas
cidades brasileiras. Por um lado, a legislação e as normas de uso e ocupação do solo;(SAO PAULO
(ESTADO), 1976;SAO PAULO, 2001;SAO PAULO, 2006;SAO PAULO, 2009), visam garantir a
preservação ambiental, por outro, o direito à inclusão social, geralmente de famílias com pouco ou
nenhum acesso aos locais apropriados à moradia na cidade, são igualmente legítimos e
reconhecidos por legislações que visam garantir o acesso àterra(SAO PAULO (MUNICÍPIO),
2002; BRASIL, 2011; BRASIL, 2017).
No município de São Paulo, o conflito entre a ocupação irregular e a preservação ambiental
mostra-se evidente na área de proteção aos mananciais na zona sul do município, onde o uso do solo
é restrito(SAO PAULO, 2006; SAO PAULO, 2009). Esta zona da cidade concentra a maior parte
da área verde municipal(vegetação natural e floresta de Mata Atlântica), notadamente na região
administrativa da Subprefeitura Parelheiros, o que levou à criação da Área de Proteção Ambiental
Capivari-Monos (SAO PAULO (MUNICÍPIO), 2001). Por outro lado, nas décadas de 70 e
80,assentamentos irregulares tiveram sua implantação iniciada nesta região, como é o caso do
loteamento irregular Vargem Grande, comuma área aproximada de 3 milhões m², onde vivem
atualmente cerca de 7.000 famílias, segundo estimativa da Secretaria Municipal da Habitação -
SEHAB.Talloteamento localiza-seainda, na face norte da Cratera de Colônia, uma depressão
circular de 4,4 km de diâmetro e cerca de 400 m de profundidade(CONPRESP, 2018), fruto do
impacto de um corpo celeste, há alguns milhares de anos.
Garantir os direitos da população e a preservação ambiental de forma perene, sem incentivar
novas invasões, mas permitindo o desenvolvimento sustentável do local é um desafio.O

471
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

trabalhodesenvolvido descreve os resultados do grupo de trabalho, intitulado ‘GT Vargem Grande’,


estabelecido a partir da solicitação do Ministério Público - MPSP, para analisar o conflito entre o
loteamento irregular e sua área de implantação, que possui importância ambiental, cultural e de
pesquisa.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Parte das ações de um inquérito civil do MPSP, o GT Vargem Grande foi coordenado pela
SEHABno primeiro semestre de 2019. Este trabalho relata os resultados deste GT, por meio de
pesquisa descritiva. Técnicos da gestão municipal das áreas de habitação, meio ambiente,
desenvolvimento urbano, patrimônio histórico, subprefeitura e guarda ambiental e, da gestão
estadual nas áreas de patrimônio histórico, infraestrutura, meio ambiente e polícia militar ambiental
participaram do GT e apresentaram as normas, conflitos e dificuldades que suas áreas têm no
território do Vargem Grande. Os dados apesentados foram registrados e resumidos em conjunto, a
fim de definir o problema e suas contradições. Uma análise conjunta levou à proposição de
diretrizes, apresentadas ao MPSP, o que deve resultar emplano de ação ematriz de
responsabilidades, capazes de atingir o objetivo de promover a regularização fundiária do
loteamento e ao mesmo tempo garantir a preservação da área.Estudos científicos e urbanísticos, o
conteúdo do processo administrativo além de projetos existentes para o local foram também
analisados pelo GT e admitidos como ponto de partida. Todo material analisado no GT, bem como
os registros em ata, resumos, apresentações e normas foram utilizados para executar este trabalho.

3. RESULTADOS
Os representantes dos órgãos responsáveis pelo patrimônio histórico CONPRESP
(municipal) e CONDEPHAAT (estadual) esclareceram que em 2003, aCratera de Colônia foi
tombadapelo Estado (CONDEPHAAT, 2003). Em 2005, foi reconhecida como Sítio Geológico pela
Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleontológicos – SIGEP (SCHOBBENHAUS;
WINGE, 2012)e, em 2018 foi tombada pelo município de São Paulo(CONPRESP, 2018). Tais
instrumentos reconhecem a Cratera como Monumento Geológico, sua importância ambiental,
paisagística e de pesquisa, bem como a necessidade de proteção legal e física. VELÁZQUEZ et
al.(2014), destaca a diversidade geológica e biológica da Cratera de Colônia e a necessidade de sua
preservação, tendo em vista a continuidade das pesquisas no local, bem como seu desenvolvimento
ecoturístico.
A Resolução do CONPRESP reconhece o loteamento Vargem Grande como setor
específico, para o qualdeve-se proibira expansão irregular e promover a regularização fundiária
associada à recuperação e valorização ambiental.
472
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Os técnicos da Secretaria do Meio Ambiente municipal explicaram que a Área de Proteção


Ambiental Capivari Monos foi criada em 2001 a fim de promover o uso sustentável, proteger a
biodiversidade, os recursos hídricos, os remanescentes da Mata Atlântica e o patrimônio
arqueológico e cultural, promovendo a melhoria da qualidade de vida, mantendo as áreas rurais e
contendo a expansão da ocupação urbana.Sua gestão ocorre por meio de Conselho Gestor,
representado pelo Poder Público e sociedade civil de forma paritária. Na área da Cratera de Colônia,
os parcelamentos implantados até adata da promulgação da lei, como é o caso do Vargem Grande,
devem ser objeto de um plano de recuperação, atendendo aos requisitos de saneamento
ambiental(SAO PAULO (MUNICÍPIO), 2001).
Os representantes da Secretaria do Meio Ambiente municipal discorreram ainda sobre
oPlano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA)de2017. Conforme as
orientações do Plano Diretorda Cidade – PDE(SÃO PAULO (MUNICÍPIO), 2014), seu intuito foi
identificar ações prioritárias de conservação e recuperação da Mata Atlântica e definir corredores
ecológicos, baseando-se no mapeamento das áreas remanescentes. No interior da Cratera predomina
‘Mata de Várzea’, seguida por ‘Campo de Várzea e VegetaçãoAquática’, enquanto na região dos
morros, tem-se ‘Mata Ombrófila Densa’. O Plano recomenda a implantação de corredores
ecológicos na Cratera(PMSP, 2017).
O técnico do órgão licenciador estadual explicou que o Vargem Grande encontra-se na Área
de Proteção e Recuperação de Mananciais da Bacia Hidrográfica do Reservatório Billings - APRM-
B, que compõe os mananciais de interesse do Estado de São Paulo(SAO PAULO (ESTADO),
2009), cuja legislação permite a regularização de interesse social, com o objetivo principal de
recuperar a qualidade da água. O Vargem Grande encontra-se enquadrado como Área de
Recuperação Ambiental, devendo ser objeto de licenciamento e atender aos quesitos das legislações
pertinentes.
Os representantes da Secretaria da Habitação municipal explicaram que aregularização de
loteamentos demanda projetos e obras para implantação de redes de infraestrutura, saneamento
ambiental, remoções de moradiase reassentamentos decorrentes de risco ou necessidades de
obra,além de ações de recuperação ambiental, como implantação de parques lineares e
recomposição da vegetação.
Segundo o processo de regularização, a implantação do Vargem Grandeocorreu em 1986, de
maneira irregular, em desconformidade à legislação vigente de proteção ambiental.O parcelamento
de terras na zona rural do município era proibido.Hoje, o loteamento tem amparo legal para
regularização (SAO PAULO (MUNICÍPIO), 2002)e está mapeado como Zona Especial de Interesse
Social (ZEIS-1), pelo Plano Diretor (SÃO PAULO (MUNICÍPIO), 2014), bem como pela lei de
Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (SAO PAULO (MUNICÍPIO), 2016).
473
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Entre 2009 e 2012, a SEHAB concluiu as obras de infraestrutura no trecho norte do


loteamento (região de morros), onde é possível finalizar a obtenção das licenças ambientais e iniciar
aregularização fundiária. O restante do loteamento (na região de várzea), onde se concentram as
complicações ambientais ainda carece de estudos e obras. Os sedimentos da Cratera estão em
processo de consolidação e compactação, com a água extremamente próxima à superfície,
funcionando como um aquífero não confinado (VELÁZQUEZ et al., 2015). Para aexecução das
obras remanescentesfaz-se necessário um laudo conclusivo sobre a permanência de cerca de 1.500
famílias, que residem onde o solo temse mostrado impróprio à ocupação.
Os técnicos dos órgãos fiscalizadores municipais (subprefeitura, secretaria do meio ambiente
e guarda ambiental) e estaduais (polícia ambiental e secretaria do meio ambiente)elucidaram as
dificuldades de garantir o congelamento da área, ou seja, da expansão da ocupação. Oentorno do
loteamento, especialmente ao sul, onde o solo se mostraimpróprio, vem sendo objeto de ocupações
recorrentes. Dificuldades como poucos veículos e funcionários para o volume das ações
demandadas; longos prazos para adequação de algumas legislações; a não punição dos crimes
ambientais; a falta de articulação entre os agentes; e a rápida dinâmica da expansão informal foram
relatadas. Importante destacar a presença do crime organizado nesta região, que tem vendido lotes
irregulares para a população de baixa renda(JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO, 2019).
Há ainda uma clara divisão da população em dois grupos. Há moradores antigos que
defendem a retomada das ações para regularização nas áreas consolidadas, onde as soluções de obra
e de regularização fundiária são viáveis e há moradores mais recentes, que ocupam a parte sul do
loteamento, quenão admitemque obras nas áreas consolidadas sejam iniciadas sem garantir ações de
permanência para todos os ocupantes.
O produto do GTfoi apresentado ao MPSP, com a presença de representantes da população.
Devolutivas parciais foram dadas à população a cada mês no Conselho Gestor da APA Capivari-
Monos.
As conclusões do GT dividiram-se em diretrizes de planejamento e de fiscalização.
São diretrizes de planejamento: 1) utilizar o potencial eco turístico do local para um plano de
desenvolvimento, capaz de gerar renda para a população residente e garantir a preservação
ambiental; 2) priorizar a implantação dos parques e corredores ecológicos previstos no PDE e no
PMMA; 3) rever o projeto do Vargem Grande e ampliá-lo para toda extensão da Cratera, prevendo
mirantes, ciclovias e trilhas ambientais; 4) utilizar instrumentos previstos no PDE para viabilizar as
propostas; 5) estabelecer um processo participativo adequado; 6) integrar as ações e orçamentos
inter-governamentais; 7) estabelecer acordo com os responsáveis pelas secretarias municipais e
estaduais, com ações e responsabilidades definidas, sob o controle do MPSP.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Entre as diretrizes para fiscalização temos: 1) fortalecer e implantar o convênio entre estado
e município para ações de fiscalização nos mananciais de forma permanente; 2) revisar os prazos
das legislações municipais para desfazimento de ocupações irregulares em áreas de mananciais; 3)
revisar a legislação de crimes ambientais, bem como garantir a investigação destes; 4) fortalecer as
ações educativas junto à população, principalmente sobre o comércio ilegal de lotes; 5) garantir
ações integradas das obras públicas, evitando intervalos que permitam a ocupação irregular; 6)
integrar os bancos de dados municipal e estadual.

4. CONCLUSÃO
O território onde o loteamento irregular Vargem Grande se localiza, possui importâncias
diversas, de preservação ambiental, hídrica, cultural e de direito social. Este trabalho descreveu
oresultado do GT Vargem Grande, composto por técnicos municipais e estaduais, por
recomendação do Ministério Públicopara analisaro conflito entre a ocupação irregular do
loteamento e as demandas de preservação ambiental (território da APA Capivari Monos e de
proteção aos mananciais, com relevância para o Plano Municipal da Mata Atlântica) e cultural
(implantado na área da Cratera de Colônia), estabelecendo diretrizes para sua solução.
Ações de planejamento urbano e de fiscalização de ocupação irregular são destacadas nas
diretrizes, como aproveitar o potencial eco turístico local para geração de renda para população do
loteamento, integrar orçamentos intergovernamentais e firmar responsabilidades entre os
envolvidos, bem como garantir permanência e fortalecer a parceria estado-município para ações de
fiscalização no local. São desafios para isto, as mudanças de gestão dos governos municipais e
estaduais, que nem sempre são aliados políticos e cooperam para o encaminhamento das ações; a
urgência em se conter a expansão irregular, de forma a impedir maiores danos ambientais e o
agravamento das situações de risco da população em contraponto à falta de prioridade política para
as ações fiscalizatórias; o crescente déficit habitacional, que faz com as pessoas comprem lotes
irregulares, já que não possuem opções viáveis de acesso à moradia; a dificuldade em garantir
orçamento para urbanização de favelas, notadamente após a revogação das verbas do PAC; e a
expansão do crime organizado que encontrou no comércio irregular uma fonte rentável de recursos.
A iniciativa do MPSP em promover um diálogotécnico, a fim de compreender o conflito
antes de estabelecer um acordo em termos políticos e de prioridade de gestão,foi fundamental para
uma efetiva priorização de ações e responsabilidades dos órgãos envolvidos. Vale ressaltar que o
processo ainda encontra-se em andamento e as ações passarão por mais de uma gestão municipal e
estadual. A articulação social e a atuação doMPSPsão fundamentais para assegurar a continuidade
dos encaminhamentos. De qualquer forma, tal experiência pode ser considerada como um modelo
de articulação do ponto de vista técnico e político, a ser replicada em outros locais.
475
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Destaca-se ainda a importância das legislações no reconhecimento do conflito. Sem elas, tal
iniciativa estaria estagnada pelas restrições legais, impedindo o avanço da discussão que já se
mostra complexa.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos a todos os técnicos que contribuíram com o GT Vargem Grande, ao MPSPe
ao suporte da população residente nas discussões.

6. REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei no 10.257, de 10 de julho de 2011 : Estatuto da cidade, que regulamenta os arts. 182
e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras
providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm
Acessado em setembro de 2019.

BRASIL. Lei no 13.465, de 11 de julho de 2017, que dispõe sobre a regularização fundiária rural e
urbana, sobre a liquidação de créditos concedidos aos assentados da reforma agrária e sobre a
regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal. Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13465.htm. Acessado em
setembro de 2019.

CONDEPHAAT. Resolução SC 60/03, de 20/08/2003. Disponível em


https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/upload/d4105_RES.%20SC%20N%2060%20-
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CONPRESP. Resolução no 27 / CONPRESP / 2018. Disponível em


https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/upload/re2718tombamentocrateracoloniapdf_1529940831.
pdf. Acessado em setembro de 2019.

JORNAL O ESTADO DE SÃO PAULO. Crime organizado coordena invasões em áreas de


mananciais de São Paulo, 24 de junho de 2019.. Disponível em
https://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,crime-organizado-coordena-invasoes-em-
areas-de-mananciais-de-sao-paulo,70002884543. Acessado em setembro de 2019.

PMSP. Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica do Município de


São Paulo - PMMA. Disponível em
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/PMMA_final_8_jan%20ok.pdf.
Acessado em setembro de 2019., 2017.

SAO PAULO (ESTADO). Lei n° 1.172 de 17 de novembro de 1976, que delimita as áreas de
proteção relativas aos mananciais, cursos e reservatórios de água, a que se refere o artigo 2° da Lei
n° 898 de 1975, estabelece normas de restrição de uso do solo em tais áreas e dá providências.
Disponível em http://www.daee.sp.gov.br/legislacao/arquivos/760/LEI1172_17111976.pdf.
Acessado em setembro de 2019.

SAO PAULO (ESTADO). Lei no 12.233, de 16 de janeiro de 2006, que define a Área de Proteção
e Recuperação dos Mananciais da Bacia Hidrográfica do Guarapiranga, e dá outras providências

476
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

correlatas. Disponível em https://ceapg.fgv.br/sites/ceapg.fgv.br/files/u60/represa_gurapiranga.pdf.


Acessado em setembro de 2019.

SAO PAULO (ESTADO). Lei no 13.579, de 13 de julho de 2009, que define a Área de Proteção e
Recuperação dos Mananciais da Bacia Hidrográfica do Reservatório Billings - APRM-B.
Disponível em https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2009/lei-13579-13.07.2009.html .
Acessado em setembro de 2019.

SAO PAULO (MUNICÍPIO). Lei no 13.136, 09 de junho de 2001, que cria a Área de Proteção
Ambiental Municipal do Capivari-Monos - APA Capivari-Monos, e dá outras providências.
Disponível em https://cm-sao-paulo.jusbrasil.com.br/legislacao/814931/lei-13136-01. Acessado em
setembro de 2019.

SAO PAULO (MUNICÍPIO). Lei no 13.428, de 10 de setembro de 2002, que dispõe sobre a
regularização de parcelamentos do solo para fins urbanos. Disponível em
https://leismunicipais.com.br/a/sp/s/sao-paulo/lei-ordinaria/2002/1342/13428/lei-ordinaria-n-13428-
2002-altera-a-lei-n-11775-95-de-29-de-maio-de-1995-que-dispoe-sobre-a-regularizacao-de-
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SAO PAULO (MUNICÍPIO). Lei no 16.402, de 22 de março de 2016, que disciplina o


parcelamento, o uso e a ocupação do solo no Município de São Paulo. Disponível em
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SÃO PAULO (MUNICÍPIO). Lei municipal n° 16.050, de 31 de julho de 2014: Plano Diretor
Estratégico do Município de São Paulo, que aprova a política de desenvolvimento urbano e o plano
diretor estratégico do Município de São Paulo e revoga a lei nº 13.430/2002. Disponível em
https://leismunicipais.com.br/a/sp/s/sao-paulo/lei-ordinaria/2014/1605/16050/lei-ordinaria-n-16050-
2014-aprova-a-politica-de-desenvolvimento-urbano-e-o-plano-diretor-estrategico-do-municipio-de-
sao-paulo-e-revoga-a-lei-n-13430-2002. Acessado em setembro de 2019.

SCHOBBENHAUS, C.; WINGE, M. Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos


- SIGEP. Disponível em http://sigep.cprm.gov.br/SIGEP_Schob_Winge_ago2012.pdf. Acessado
em setembro de 2019.

VELÁZQUEZ, V. F. et al. The Colônia Impact Crater : Geological Heritage and Natural
Patrimony in the Southern Metropolitan Region of São Paulo , Brazil. Geoheritage (2014), n.
November, p. 283–290, 2014.

VELÁZQUEZ, V. F. et al. The current situation of protection and conservation of the colônia
impact crater, São Paulo , Brazil. GeojournalofTourismandGeosites, v. 17, n. 1, p. 7–20, 2015.

477
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O PARQUEESTADUALCUNHAMBEBEEARESERVA BIOLÓGICA
TINGUÁ/RJ: UMA PROPOSTA DE CORREDOR ECOLÓGICOA
PARTIR DO GEOPROCESSAMENTO E CONSIDERANDOAS
RESISTÊNCIAS DE USO E COBERTURA DA TERRA
THE CUNHAMBEBE STATE PARK AND THE TINGUÁ BIOLOGICAL RESERVE / RJ: A
PROPOSAL OF ECOLOGICAL CORRIDOR FROM GEOPROCESSING CONSIDERING THE
RESISTANCES OF LAND USE

Caio Alves da Costa Silva*; Bárbara Costa Lima*; & Monika Richter**
*
Discente Mestrado Profissional - Inst. Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (ENBT/JBRJ)
**
Docente DGP/IEAR/UFFeMestrado Profissional do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (orientadora)

1. INTRODUÇÃO
Corredores ecológicos são faixas de vegetação ou habitat nativo com utilidade para
conectar remanescentes isolados, formando um mosaico com diferentes paisagens e usos da
terra (AYRES et al., 2005; FONSECA et al., 2003).
Galinkin et al. (2004) ressalta a importância destes por serem úteis na redução das taxas
de extinção, uma vez que possibilitam a recolonização de fragmentos, nos quais habitam
populações de tamanho diminuído, culminando no aumento das chances de sobrevivência de
várias espécies.
A conectividade entre fragmentos florestais, por meio de corredores ecológicos, temsido
uma importante estratégia interligando Unidades de Conservação(UC) isoladas (SEOANE et
al., 2010; UMEDA et al., 2015). Geralmente, estudos ligadosa esta temática tendem a focar na
ecologia de paisagem, utilizando-se métricas queanalisam a situação dos fragmentos, no
entanto muitas vezes desconsiderando asresistências de uso, o que pode inviabilizar qualquer
processo de restauração.
Diante disso, faz-se necessário analisar a distribuição dos fragmentos florestais na área
objeto de estudo, utilizando-se recursos apropriados para identificar os padrões que considere
os demais usos. Dentre as tecnologias disponíveis, o geoprocessamento apresenta-se como
chave para o planejamento de corredores ecológicos (ROCHA et al., 2007).
Este trabalho tem o objetivo de gerar, em ambiente de sistema de informaçãogeográfica
(SIG), rotas possíveis para a implementação de corredores ecológicos quepropiciem a
interligação dos fragmentos florestais remanescentes no trecho entre o ParqueEstadual
Cunhambebe e a Reserva Biológica do Tinguá, identificando as áreas com menorresistência à
restauração, subsidiando a tomada de decisão.

478
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2. MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo contempla parte do centro-sul do Estado do Rio de Janeiro, enquadrando
parte das regiões da Costa Verde e Metropolitana do Rio de Janeiro,inserida no bioma Mata
Atlântica. Seu histórico conta com intensa exploração florestal, desde o período de colonização,
principalmente devido a extração de madeira, atividades agropastoris e mais recentemente a
ocupação pelo setor industrial e à expansão da malha urbana. Tal cenário de desmatamento gerou
intensa
fragmentaçãodasflorestasnaregião,afetandodiretamenteadinâmicadafaunaeflora,alémdepôr em
risco a perpetuação dos serviços ambientais prestados, tais como contenção de processos
erosivos e produção de água.
De acordo com Veloso et al. (1991), a região de estudo está inserida no domínio da Floresta
Atlântica com predominância fitofisionômica de floresta estacional semidecidual e ombrófila densa.
Abrange os municípios de: Engenheiro Paulo de Frontin, Miguel Pereira, Nova Iguaçu,
Paracambi,Piraí e Rio Claro.
Para o processamento dos dados foram utilizados o mapa de uso e cobertura do solo para o
Estado do Rio de Janeirodisponível online pelo INEA de 2015, na escala de 1:25.000, bem como a
distribuição das Unidades de Conservação alvos do estudo, Parque Estadual Cunhambebe e REBIO
Tinguá, no domínio especializado em UC do mundo todo (www.protectedplanet.net), e as demais
que abrangem a região. Esses dados foram convertidos para o formato raster em pixels de 1m
utilizando a Projeção Transversa Mercator, fuso 23S.
Uma metodologia aplicável à identificação de corredores usando o nível de “naturalidade”
da paisagem como foco (KROSBY et al., 2015) é o uso da ferramenta Linkage Mapper adaptada ao
ArcToolbox utilizando o software ArcGIS® 10.2 (ESRI, 2013). Posteriormente à análise de
conectividade entre as Unidades em questão, incluiu-se as demais UCs encontradas, visto já se
constituírem em áreas com regime especial de uso.

3. RESULTADOS EDISCUSSÃO
Louzada et al. (2010) definiu classes de resistência de uso e cobertura do solopara
formação de um corredor ecológico. A partir de uma adaptação, gerou-se o mapa classificando
as unidades de mapeamento eposteriormente, incluídas as UC existentes na região,
possibilitando a identificação das estratégicas para a implementação do corredor proposto.
Os graus de resistência definidos, bem como as devidas justificativas encontram-se na
Tabela 1, a seguir:

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Tabela 1 – Classes de uso do solo e suas respectivas resistências justificadas (Adaptado de Louzada et al., 2010).

Classificação Resistência Justificativa


Áreasadequadasparaintegrarcorredoresecológicos.
Água/Comunidaderelíquia/Florest Dessedentação da fauna, além de constituir em seu entorno
1
a/Pastagem em várzea áreas de preservação. Não são consideradas como barreira,
pois a largura é estreita.
Ideal para formação de corredores ecológicos pois são Áreas
Mangue/Restinga 1
de Preservação Permanentes instituídas por lei.
Considerada como barreiras para propagação de espécies
Afloramento rochoso 10
arbóreas, mas pode servir de passagem para a fauna.
Vegetação secundária em estágio Área propensa à recuperação, porém, ainda vulnerável a
20
inicial ocupação urbana ou agrícola.
Áreas que podem integrar um corredor ecológico, mas que
Áreasúmidas/Cordõesarenosos 40
dificultam o fluxo de fauna e flora.
Áreas que podem ser utilizadas para fim de agropecuária e
Pastagem 60
seria necessário recuperá-la com plantio de espécies nativas.
Áreas plantadas, em sua maioria com objetivo econômico,
Reflorestamento 65 sendo suprimida após alguns anos, ficando a área
desflorestada.
Agricultura 80 Consideradas como barreiras para passagem dos corredores
Ocupação urbana debaixa, 95, 97 e ecológicos, recebendo o custo extremo. O esforço para
média e altadensidade 100 implementação é excessivamente complexo.
Estão em regiões bem próximas às edificações e à
Soloexposto 100 agricultura, não sendo adequadas para corredores
ecológicos.

A partir da rota indicada em função dos pesos atribuídos de resistência, foi obtido um
corredor com largura de 200m, seguindo os critérios da resolução CONAMA 09/96 (BRASIL,
1996), 59Km de extensão e área total de 1.175 ha.Essa área abrange em parte a Área de Proteção
Ambiental do Rio Guandu e o Parque Natural Municipal do Curió, atravessando os municípios de
Engenheiro Paulo de Frontin, Miguel Pereira, Nova Iguaçu, Piraí, Paracambi e RioClaro (Figura 1).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 1 – Corredor ligando PEC,REBioTinguá e outras UC com classes de resistência.

Os resultadosencontradosnãosomenteindicama interligação de UC,


conformesugeremSeoaneet al. (2010) eUmedaet al.(2015), como as deobjetodesteestudo, mas
tambémaponta a melhorrota, considerando as classes de resistêncas e a presença de outras UC,
viabilizando a definição de estratégias de açãovoltadasnagestãodessasáreasprotegidas.
Além da definição da melhor rota para o corredor, foi processada a análise de área dentre os
municípios abrangidos pelo corredor proposto, a qual indicou Paracambi como o mais importante
para sua implementação, seguido do município de Piraí, como pode ser conferido na Figura 2, a
seguir:

Figura 2 –Área total em todos os municípios abrangidos pela proposta do corredor.

A análise dos dados gerados pelo processamento confirmou que a maior parte do corredor
ecológico proposto faz uso dos fragmentos florestais e contempla duas UC, tornando mais viável o
mesmo. A pastagem foi a segunda cobertura mais utilizada pela proposição.

481
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Da área total contemplada pelo corredor proposto, 50% está inserida em cobertura de
floresta ou vegetação secundária dentro de UC e 31,5% correspondem à área fora de UC. Apenas
12% do total, o que equivale a 139 ha, possui cobertura de pastagem, e é representado por cerca de
77 ha dentro de UC.

4. CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS


Os resultados apontam a importância em considerar as resistências para uso da terra na
paisagem de modo a orientar as ações de restauração, a partir dos esforços para implementação
de corredores ecológicos.
No presente estudo, observou-se que a porção degradada constitui-se prioritariamente
de pastagens, apresentando média resistência de uso, porém em sua maioria localizada no
interior da APA Guandu, o que poderia servir como informação de orientação para a definição
de áreas prioritárias para restauração nesta UC. Neste cenário destaca-se o município de
Paracambi, que pode buscar recursos de compensação ambiental para a definição de ações e
propostas voltadas a permitir maior permeabilidade na paisagem por meio da implementação
de sistemas agroflorestais, por exemplo.
É necessário proceder estudos complementares, especialmente quanto ao detalhamento
da informação, identificar as peculiaridades socioambientais do trecho proposto, os projetos de
restauração em andamento ou concluídos, e ainda o dimensionamento do esforço necessário
em restauraçãoflorestalinerenteacadamunicípio.

5. REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS
AYRES, J.M. Os corredores ecológicos das florestas tropicais do Brasil. Belém: Sociedade Civil
Mamirauá, 2005.

BRASIL.Ministério do MeioAmbiente, ConselhoNacional de MeioAmbiente, CONAMA.


Resolução CONAMA nº 9, de 24 de outubro de 1996

ESRI. UsingArcGIS. Redlands: ESRIPress, 2013.

FONSECA, G.A.B. et al. Corredores de Biodiversidade: o corredor Central da Mata Atlântica. In:
ARRUDA, M.B.; SÁ, L.F.S.N. (Orgs.) Corredores ecológicos: uma abordagem integradora de
ecossistemas no Brasil. Brasília; IBAMA, 2004. p.47-66.

GALINKIN, M. et al. Projeto corredor ecológico Araguaia – Bananal. In: ARRUDA, M.B.; SÁ,
L.F.S.N. (Orgs.) corredores ecológicos: Uma abordagem integradora de ecossistemas no Brasil.
Brasília: IBAMA. 2004. p. 81-132.

KROSBY, M., BRECKHEIMER, I., COSENTINO, B., GAINES, B., HALL, S., HALUPKA, K.,
LONG, R., MCRAE, B., PIERCE, J., SCHUETT-HAMES, J., AND P. SINGLETON. Focal

482
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

species and landscape “naturalness” corridor models offer complementary approaches for
connectivity conservation planning. Landscape Ecology30:2121–2132, 2015.

LOUZADA, F. L. R. O.; SANTOS, A. R.; SILVA, A. G. (org). Delimitação de corredores


ecológicos do ArcGIS 9.3. Alegre: CAUFES, 2010. 50 p.

ROCHA, C. C.; SILVA, A. B.; NOLASCO, M. C. e W. F. ROCHA. Modelagem decorredores


ecológicos em ecossistemas fragmentados utilizando processamento digital deimagens e sistemas de
informações georreferenciadas. Anais XIII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto.
Florianópolis, Santa Catarina (SC), Brasil,2007.

SEOANE, C. E. S.; DIAZ, V. S.; SANTOS, T. L.; FROUFE, L. C. M. Corredores ecológicos como
ferramenta para a desfragmentação de florestas tropicais. Pesquisa Florestal Brasileira, v. 30, n.
63, p. 207-216, 2010.

UMEDA, C. Y. L.; SANTOS, T. H. L. D.; LASTORIA, G.; OLIVEIRA, A. P. G.; COUTINHO, H.


L.D. C.; PARANHOS FILHO, A. C. Uso de sensoriamento remoto na identificação de corredores
ecológicos: estudo de caso da Bacia Hidrográfica do Rio Formoso, Bonito - MS. Engenharia
Sanitária e Ambiental, v. 20, n. 4, p. 551-557, 2015.

VELOSO, H. P.; RANGEL FILHO, A. L. R. & LIMA, J. C. A. Classificação da vegetação


brasileira, adaptada a um sistema universal. IBGE, Rio de Janeiro, 1991. 123p.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ANÁLISE ESPAÇO-TEMPORAL DO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DE


ZONA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO MUNICÍPIO DO JABOATÃO DOS
GUARARAPES/PE
SPACE-TIME ANALYSIS OF THE USE AND OCCUPATION OF THE SOIL OF THE
ENVIRONMENTAL PROTECTION ZONE OF THE MUNICIPALITY OF JABOATÃO DOS
GUARARAPES/PE

Amaury Gouveia Pessoa Neto*

*Secretaria Executiva de Meio Ambiente e Gestão Urbana, Prefeitura Municipal do Jaboatão dos Guararapes, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
As matas ciliares são todo o tipo de vegetação que se desenvolvem ao longo das margens
dos cursos d’água e no entorno de nascentes e reservatórios de água (PINHEIRO, 2016;
ALEXANDRE et al, 2017). Conforme Benício et al (2017), esse tipo de formação florestal exerce
importante função na estabilidade dos solos das áreas marginais, na regularização do regime hídrico
e na manutenção qualitativa de água.
No entanto, apesar dessa representatividade e da relevância para vivência dos seres vivos e
dos sistemas ecológicos, esse tipo vegetação é fortemente impactado por intervenções antrópicas.
Uma das formas de agressão éa ocupação inadequada do entorno desses corpos hídricos que
acarreta diversos problemas ambientais, tais como: desmatamentos, erosões, escorregamentos e
assoreamento que acontecem em um ritmo mais acelerado do que a capacidade de reposição dos
recursos naturais (ZANATA et al, 2012; VEN, 2017).
Para uma gestão adequada dos recursos naturais e do meio ambiente em que os envolvem,
seja um corpo hídrico ou a mata ciliar envolvente, é preciso o monitoramento e análise do uso e
ocupação solo, para a possível detecção e entendimento do processo de degradação (FONSECA;
TAVARES JR; FARIAS, 2018). Uma ferramenta de fundamental importância, neste tipo de
pesquisas, é o geoprocessamento, que se destaca na obtenção de dados espaciais referente ao uso e
ocupação do solo (CASTRO et al, 2019).
O objetivo do presente estudo foi analisar, buscando evidenciar a importância da utilização
da tecnologia do geoprocessamento, a dinâmica da ocupação urbana ocorrida na Zona de Proteção
Ambiental (ZPA) Curcurana, bairro de Barra de Jangada, Jaboatão dos Guararapes/PE, nos períodos
de 1997 e 2016, através de análise comparativa e fotointerpretação supervisionada de produtos
fotogramétricos disponíveis.
A ZPA Curcurana abrange o remanescente da mata ciliar que envolve o canal Olho D’Água,
que se configura como um dos principais canais alimentadores da lagoa Olho D’Água conectando-a
484
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ao estuário formado pela foz dos rios Jaboatão e Pirapama. A escolha dessa região se deu por se
tratar de um espaço cuja fragilidade ambiental é intensa, devido à presença de áreas estuarinas e
matas ciliares, as quais têm importância fundamental na manutenção dos mananciais hídricos e no
tênue equilíbrio das já bastante reduzidas áreas de manguezais, invadidas irregularmente (SILVA,
2010).

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para o desenvolvimento deste trabalho foram adquiridos elementos da cartografia básica
municipal, tais como: delimitação dos bairros e zoneamento, no formato vetorial shapefile,
disponibilizados pela Prefeitura do Município do Jaboatão dos Guararapes (PMJG). Também foram
adquiridos produtos fotogramétricos datados de 1997 e 2016 com o objetivo de ser efetuada uma
análise comparativa e fotointerpretativa da área de estudo. Para isso foram utilizadas imagens aéreas
datadas de 1997, na extensão TIFF, cedidas pela Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de
Pernambuco (CONDEPE/FIDEM) e um mosaico de imagens, datado de 2016, advindas de um
recobrimento aerofotogramétrico que foi contratado e supervisionado pela PMJG. Todos esses
materiais foram manipulados no software livre QGis (Versão 2.18.22) em coordenadas UTM no
Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas (SIRGAS).
As análises comparativas e fotointerpretativas foram fundamentadas na observação da
ocorrência e evolução das ações antrópicas na região de estudo, que são áreas destinadas à proteção,
recuperação e conservação natural, tomando como base o Artigo 10 do Plano Diretor municipal
(Lei Nº 002/2008) que proíbe qualquer tipo de construção em áreas verdes e/ou em margem e leitos
de rios e lagoas.
Para delimitação da região de estudo foi realizada uma superposição da camada vetorial,
referente a ZPA Curcurana, nas imagens aéreas. Em seguida, para confecção dos mapas temáticos
de cobertura do solo dos períodos estudados, foi criado no QGis uma camada, no formato vetorial
shapefile, do tipo polígono para cada categoria em alvo do estudo a partir de análise supervisionada,
ou seja, definidas através de restituição estereofotagramétrica que foi disponibilizada pela PMJG.
Por fim foi possível calcular as áreas identificadas na cobertura do solo e quantificar as dinâmicas
ocorridas na região estudada. Esses dados foram inseridos numa tabela no software Microsoft Excel
(Versão 14.0). Dentre essas categorias eleitas, foram contabilizadas: a quantidade de ocupação
urbana,vias de acesso, corpo hídrico e remanescente de vegetação.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Através do emprego da tecnologia do geoprocessamento e das técnicas de fotointerpretação
foi possível gerar as classes de uso e cobertura da região estudada, o que possibilitou não apenas a
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quantificação das classes mapeadas, mas também a identificação das agressões antrópicas ao
ambiente. O mapa de cobertura do solo da região de estudo, para os períodos de 1997 e 2016, pode
ser verificado na Figura 1, onde estão contidas todas as classes de interesse ao estudo: corpo hídrico
(Canal Olho D’Água), vias de acesso e ocupações advindas da expansão urbana.

Figura 1 – Cobertura do solo da região de estudo nos períodos de 1997 e 2016

Fonte: O autor (2019)

Através do mapa de cobertura do solo e dos dados presentes na Tabela 01 pode-se perceber
que,em ambos os períodos, a região estudada prevalece ocupada por cobertura vegetal, representada
pela classe de áreas remanescentes de mata ciliar e vegetação rasteira, apresentando uma área de
32,09ha em 1997 e 29,74ha em 2016, representando 92,25% e 85,49% de ocupação,
respectivamente. A região de corpo hídrico, representada pelo canal Olho D’Água, representa, em
1997,5,03% da área estudada, correspondendo a uma área de 1,75ha. No período de 2016, essa
mesma classe apresenta uma área de 2,46ha, equivalendo a 7,07% da região de estudo.
Acerca das categorias que compõem as agressões antrópicas, obteve-se os seguintes
resultados:

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- Ocupações urbanas: em ambos os períodos ocasionadas pela desorganizada e intensa expansão


urbana, indicando uma área de 0,22ha e 0,63% de ocupação em 1997 e 1,56ha e 4,48% em 2016,
indicando um acréscimo de 609,10%;
- Vias de acesso: originado por aterros, desmatamento e pela definição de ruas e acessos às
residências, ocupando uma área de 0,73ha (2,09%) no período de 1997 e 1,03ha (2,96%) em 2016,
ocasionando um aumento de 41,10% desse tipo de manifestação;
Somadas, essas categorias provenientes de antropização representam, aproximadamente,
2,72% de toda a região estudada para o período de 1997 e 7,44% para 2016. Através desses
resultados, foi verificado um aumento de 172,63% referentes as agressões antrópicas.
Sabe-se que, pelo fato dessa região ser de conservação ambiental, não deveria apresentar
nenhum valor desse tipo de manifestação.

Tabela 1 -Classificação da cobertura do solo da região de estudo


1997 2016 Variação
Uso Área Taxa Área Taxa Redução Aumento
(ha) (%) (ha) (%) (%) (%)
Vias de acesso 0,73 2,09 1,03 2,96 - 41,10
Ocupação urbana 0,22 0,63 1,56 4,48 - 609,10
Área destinada a
proteção ambiental 1,75 5,03 2,46 7,07 - 40,57
(canal)
Área destinada a
proteção ambiental 32,09 92,25 29,74 85,49 7,32 -
(vegetação)
Total 34,79 100,00 34,79 100,00 - -
Fonte: O autor (2019)

Essa dinâmica de ocupação, conforme o estudo realizado por Nogueira (2015), é


fundamentadana abertura da rua Barras,no ano de 1976, que se constitui como uma importante via
do município que se limita ao sul da região de estudo. O referido autor salienta que a partir desse
evento, a localidade sofreu um intenso processo de ocupação que não veio acompanhado da
infraestrutura básica.
Em complementação a essa constatação, Silva (2010)demonstrou que o regime de ocupação
apresentadonessa região foi incentivado, principalmente, pelos grandes empreendimentos ligados ao

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Porto de Suape, no município do Cabo de Santo Agostinho/PE devido, sobretudo, a grande


proximidade entre os mesmos.

4. CONCLUSÃO
Através do geoprocessamento foi possível obter dados de uso e ocupação do solo da região
estudada para os períodos avaliados (1997 e 2016) de maneira satisfatória, mostrando-se uma
ferramenta eficiente, tanto em termos de economia de tempo quanto de recursos. Por meio dos
resultados apresentados nesse estudo, foi possível identificar como a dinâmica da ocupação urbana
seguiu na região, o que indicouum acréscimo de 172,63% em relação às interferências provocadas
pelo processo de antropização.
Os dados apresentados contribuíram no despertar para os desafios atuais impostos à
sustentabilidade ambiental. Os mesmos tornam-se efetivos para atuação da gestão municipal,
considerando-se que através deles é possível promover um planejamento ambiental destinado a
recuperação e conservação da mata ciliar presente na região estudada, contribuindocom a melhoria
da qualidade ambiental, reduzindo e fiscalizando impactos que podem ser causados pelo uso e
ocupação desordenados em áreas prioritárias para preservação.

5. AGRADECIMENTOS
À Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco (CONDEPE/FIDEM) e à
Prefeitura do Município do Jaboatão dos Guararapes (PMJG), pela colaboração no sentido de ceder
os dados aqui apresentados.

6. REFERÊNCIAS
ALEXANDRE, J. I. da S.; CARDOSO, M. F. M.; SILVA, J. P. F.; REIS, A. W. V. Recuperação da
mata ciliar do rio Ipojuca no perímetro urbano da cidade de Caruaru/PE. Anais... In: SIMPÓSIO
BRASILEIRO DE RECURSOS NATURAIS DO SEMIÁRIDO, 3.,Fortaleza,p. 01-07, 2017.

BENICÍO, L. P. B.; SOUZA, P. A.; BENDITO, B. P. C.; SANTOS, A. F. dos; SOUZA, P. B. de.
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Gurupi-TO. Enciclopédia Biosfera, v. 14, n. 26, p. 53-63, 2017.

CASTRO, T. C. S. de; RODRIGUES, J. D.; COSTA, D. S.; DINIZ, A. M. C.; CAVALCANTI, E.


R. A. Degradação da cobertura vegetal na área da bacia hidrográfica do rio Pimenta, São Luís,
Maranhão, Brasil. In: SELVA, V. S. F. et al (org.). Tecnologias no contexto das vulnerabilidades
ambientais. Ananindeua: Itacaiúnas, 2019. p. 129-135.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FONSECA, R. C.; TAVARES JR., J. R.; FARIAS, J. A. Análises do NDVI e GRVI no estudo da
bacia hidrográfica do rio Ipanema - Pernambuco. Anais... In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE
CIÊNCIAS GEODÉSICAS E TECNOLOGIAS DA GEOINFORMAÇÃO, 7., Recife, p. 842-849,
2018.

JABOATAO DOS GUARARAPES. Lei Municipal Nº 002, de 11 de janeiro de 2008 queinstitui


o Plano Diretor do município do Jaboatão dos Guararapes e estabelece asdiretrizes para a sua
implantação. Jaboatão dos Guararapes, 2008.

NOGUEIRA, N. L. de M. Exercício de compreensão das transformações socioambientais em


áreas costeiras urbanas a luz da análise multitemporal em diferentes escalas: bairro Barra de
Jangada, Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e
Meio Ambiente), 2015. Recife, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de
Pernambuco, 2015.

PINHEIRO, C. U. B. Matas ciliares e conservação das nascentes dos rios Anil, Bacanga e Tibiri, na
Ilha de São Luís, Maranhão. Revista Brasileira de Geografia Física, Recife, v. 09, n. 4, p. 1212-
1222, 2016.

SILVA, L. G. da. Tipologia das Dinâmicas de Urbanização na Franja Rural-urbana em


Jaboatão dos Guararapes – Região Metropolitana do Recife. Dissertação (Mestrado em
Geografia), 2010. Recife, Departamento de Ciências Geográficas, Universidade Federal de
Pernambuco, 2010.

VEN, V. L. V. D. Utilização de Sistemas de Informação Geográfica para a gestão de Unidades de


Conservação. Diversidade e Gestão, v. 01, n. 01, p.88-102, 2017.

ZANATA, J. M.; PIROLI, E. L.; DELATORRE, C. C. M.; GIMENES, G. R. Análise do uso e


ocupação do solo nas Áreas de Preservação Permanente da microbacia Ribeirão Bonito, apoiada em
técnicas de geoprocessamento. Revista Geonorte, v. 02, n. 04, p. 1262-1272, 2012.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

OCUPAÇOES EM ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTES(APPs) EM


NÚCLEOS URBANOS CONSOLIDADOS: A EXPERIÊNCIA DA
DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO NA DEFESA DA CONCILIAÇÃO
ENTRE A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E O DIREITO DE MORADIA DE
ASSENTAMENTOS DE BAIXA RENDA
OCCUPATIONS OF PERMANENT PRESERVATION AREAS (APP) IN CONSOLIDATED URBAN
AREAS: THE EXPERIENCE OF THE PUBLIC DEFENDER'S OFFICE OF SÃO PAULO IN THE
PROMOTION OF CONCILIATION BETWEEN ENVIRONMENTAL PRESERVATION AND THE
RIGHT OF HOUSING OF LOW INCOME SETTLEMENTS

Tatiana Zamoner Geraldo

Arquiteta Urbanista da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Mestre pela FAU/USP,
tgeraldo@defensoria.sp.gov.br

1. INTRODUÇÃO
O histórico de abordagens do Judiciário Paulista em relação à núcleos de baixa renda situados
emAPPs urbanas demonstra a evolução do conhecimento e do aparato legal construído em torno do
da conciliação entre meio ambiente e direito de moradia, em especial em relação à possibilidade de
regularização fundiária destes núcleos. A favela Mississipi, situada no município de Jacareí, é um
exemplo emblemático da evolução da experiência adquirida com o tema ao longo dos anos.
A partir de uma Ação Civil Pública (ACP) proposta pelo Ministério Público de São Paulo
para remoção total da favela, utilizando como argumentos o impacto ambiental decorrente da
ocupação e o risco associado a alagamentos, o objetivo dos técnicos da Defensoria Pública do Estado
foi ponderar os reais impactos envolvidos na remoção ou permanência destes moradores. O
artigo apresenta a evolução do entendimento sobre as possibilidades de permanência da favela ao
longo do tempo (2013 a 2019), debatendo argumentos comumente utilizados para remoção de favelas
e discutindo o projeto de regularização fundiária em curso.

1.1 Contexto físico e ambiental


Podemos considerar o baixo índice de tratamento de esgoto como principal problema em
relação à gestão dos recursos hídricos no município de Jacareí.A Concessionária responsável pelo
saneamento básico da cidadepossui projetos em andamento desde 2013 para elevar o índice de
tratamento de esgotos no município. Em relação à drenagem urbana, as questões se assemelham à
realidade de grande parte dos municípios da bacia do rio Paraíba do Sul, pela dificuldade de controle
do uso e ocupação do solo e ocupações de áreas ambientalmente protegidas. As soluções passam por

490
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

intervenções estruturais na bacia, de difícil implementação, e soluções locais, com o incremento das
ações não estruturais, pelas administrações públicas.
1.2 O Processo de Regularização Fundiária
A Política Nacional de Recursos Hídricos – Lei 9.433/97, institui a Bacia Hidrográfica como
unidade de Gerenciamento. Tal marco legal induz o reconhecimento das escalas necessárias de
análise em relação aos problemas pontuais colocados. Dessa forma, não mais se justificam as ações
pontuais e fragmentadas em relação ao impacto ambiental, que deve ser estudado, remediado e
mitigado a partir de métodos abrangentes de análise.
O Código Florestal, Lei 4.771 de 1965, passou por revisões em 1986e 1989, ampliando faixas
de preservação e estabelecendo sua aplicação às cidades, acirrando os conflitos existentes entre
ocupação do solo e preservação ambiental, em um contexto em que grande parte das APPs urbanas já
se encontravam legalmente ocupadas, como no caso da favela Mississipi, e as que restaram
preservadas até a década de 1980 foram, em grande parte, tomadas por populações de baixa renda,
sem alternativa de moradia. O tratamento desigual dado às ocupações, de acordo com o perfil social
dos moradores também se acirra. Enquanto as leis se tornavam mais restritivas em relação à
ocupação do território, como no caso da aplicação do Código Florestal, a cidade real continuou
crescendo à margem de qualquer regulação. Enquanto a baixa renda é removida de seus locais de
moradia por motivação ambiental, as opções do poder público pela canalização de córregos, pela
impermeabilização em áreas consolidadas e valorizadas do ponto de vista imobiliário e pela
construção de avenidas de fundo de vale em APPs não são devidamente enfrentadas.
Reconhecendo a escala da informalidade urbana e a necessidade de se pensar em formas de
compatibilização entre meio ambiente e a realidade social das ocupações de baixa renda, a Lei 11.977
de 2009, trouxe a possibilidade de regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas
urbanas, destacando-se a previsão da regularização de assentamentos em APPs, que permite o
amparo da lei para projetos de urbanização e melhorias ambientais em APPs ocupadas por população
de baixa renda.A atual Lei de Regularização Fundiária (Lei 13.465de 2017) mantém os
procedimentos necessários para a chamada REURB-S em áreas ambientalmente protegidas,
ampliando as possibilidades de instrumentos jurídicos para a viabilização do processo.
A intervenção da Defensoria Pública no caso busca uma abordagem conciliatória entre as
moradias e a preservação ambiental. Como alternativa à remoção total de um núcleo urbano
consolidado ao longo dos anos em APP, um estudo detalhado pode considerar as reais condições
desses locais, indicando as remoções necessárias e os trechos de córregos que precisariam ser
recuperados, principalmente nas áreas mais precárias. A principal estratégia ambiental embutida
nesse tipo de proposta estaria no envolvimento direto da população local nas questões ambientais e

491
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

sociais que lhes dizem respeito. A intervenção em assentamentos de baixa renda deve contar com a
parceria dos próprios moradores, com as dimensões discursivas que envolvem suas práticas.
Apesar das recomendações da Defensoria Pública ao longo da ACP em curso, o Município de
Jacareí, por meio de contrato com empresa especializada nos levantamentos técnicos necessários para
o processo de regularização fundiária, vem considerando a favela isoladamente, com propostas de
remoção que, antes de responder a questões técnicas inseridas no contexto urbano, atendem a
questões meramente operacionais, de como tornar o processo mais célere ao município. A proposta,
basicamente, pretende remover a faixa de terras da União (15 metros), apresentando uma justificativa
de risco de alagamentos que coincide com a faixa de titularidade da União.
No momento, a Defensoria pede uma revisão do Estudo Técnico Ambiental produzido, com a
realização de estudos hidrológicos que comprovem a necessidade das remoções pontuais
recomendadas, além da efetiva participação dos moradores no processo de realização do Projeto de
Regularização Fundiária.

2. DISCUSSÕES E RESULTADOS: A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE RISCO


Os trabalhos acadêmicos produzidos a respeito da utilização do conceito de risco, em suas
diversas categorias, para justificar remoções de moradias com baixo padrão construtivo foram
utilizados para analisar o contexto da favela Mississipi e propor alternativas para manutenção das
famílias residentes e relativizar a situação apontada na ACP em relação ao contexto de toda área
urbana de Jacareí, formal e informal.1Ao longo dos casos estudados pela Defensoria Pública,
constatamos que o processo de remoção de populações de baixa renda segundo o critério do risco
confirma a produção acadêmica que trata da questão da “justiça ambiental”, na medida em que que as
ações do Estado sobre as áreas de riscos são desiguais, penalizando a população de baixa renda e
adotando estratégias conciliatórias e ações de contenção ou mitigação em relação à cidade formal. A
noção arbitrária e generalizada do risco acaba por cegar a análise dos fatores objetivos, contribuindo
assim para a consolidação de representações sociais negativas de determinadas áreas da cidade e de
seus habitantes. A precariedade das construções, associada à ausência de infraestrutura, reforça uma
representação socialmente dominante, que associa diretamente as favelas à situação de risco. De fato,
o risco mais presente na vida dos moradores das favelas diz respeito à ausência da segurança de suas
posses, à precariedade das redes de infraestrutura e a precariedade material de suas moradias, fatos
associados ao que podemos chamar de risco social.

1
Na pesquisa desenvolvida na Universidade Federal de Viçosa, intitulada Impactos Pluviais: Um estudo de caso de Jacareí- SP, a
pesquisadora Julia de Resende Barreto compara,através da análise histórica de precipitação no município de Jacareí entre os anos de 1942 a 2011, os
impactos pluviométricos à ação antrópica sobre a cidade.

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Os resultados parciais alcançados foram: o entendimento do judiciário de que a remoção


generalizada de núcleos de baixa renda não representa a melhor solução para o enfrentamento da
questão ambiental; e a abertura de um processo de discussões sobre o necessário processo de
regularização fundiária da área.

3. MATERIAL E MÉTODOS
O acompanhamento do caso da Favela Mississipi entre 2013 e 2019, envolveu os seguintes
procedimentos: Reunião com representantes e técnicos do município de Jacareí e estudo dos planos e
projetos existentes; Visitas técnicas ao Núcleo Mississipi;Análise dos dados coletados, de relatos dos
moradores e das políticas públicas existentes no município de Jacareí e na Região do Vale do
Paraíba;Consulta de bibliografia especializada.

4. CONCLUSÕES PARCIAIS
O contexto urbano analisado, onde uma população de baixa renda se estabeleceu nas margens
do curso d’água e se destaca da cidade formal pela forma de ocupação característica de uma favela,
expõe mais um exemplo da tônica atribuída ao aparente conflito entre ocupação humana e meio
ambiente. Como na maioria dos casos similares existentes, o conflito anunciado não se relaciona à
cidade formal, mas à população de baixa renda, fragilizada em relação a múltiplos aspectos, que vão
da carência econômica à precariedade física. Não bastasse as desvantagens históricas e estruturais
enfrentadas por tais parcelas da população nas grandes cidades, o paradigma político e científico
vigente, fortemente influenciado pelo ideário do Desenvolvimento Sustentável, acaba dando novos
subsídios para o processo de “limpeza social” dos centros urbanos e deslocamento das populações
pobres para áreas cada vez mais distantes.
A preservação dos recursos naturais e o processo de ocupação humana disputam espaço físico
e valores, e tais processos não devem ser considerados isoladamente, tampouco devem ser
fragmentados em relação à um contexto urbano e social que lhe dão suporte.
A preservação dos cursos d’água está relacionada ao sistema de preservação do ciclo
hidrológico, cuja unidade de gerenciamento é a microbacia hidrográfica. Dessa forma, toda a análise
deve se pautar em escalas abrangentes de interpretação, com a identificação de todos as ações que
causam impactos, direta e indiretamente, na microbacia, e não no acirramento do processo de
segregação sócio espacial.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACSELRAD et al. O que é Justiça Ambiental? Rio de Janeiro, Editora Garamond, 2009.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ACSERALD, H. Justiça ambiental e construção social do risco. Trabalho apresentado no XIII


Encontro da Associação Brasileira de Estudos Populacionais, realizado em Ouro Preto, entre 4 a 8
de novembro de 2002.
BARRETO, J.R. Impactos Pluviais: Um estudo de caso de Jacareí- SP. Departamento de
Geografia, Universidade Federal de Viçosa, outubro 2012.

BRANDÃO, A. M. de P. M. Clima Urbano e Enchentes na cidade do Rio de Janeiro. in: GUERRA,


Antônio José Teixeira e CUNHA, Sandra Baptista (orgs.).: Impactos Ambientais Urbanos no
Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010. 416p. p. 47–109.

BUENO, L.M.M; MARTINS, M. L. R (org.). Seminário Nacional Sobre o Tratamento de Áreas de


Preservação Permanente em Meio Urbano e Restrições Ambientais ao Parcelamento do Solo. São
Paulo: FAUUSP, 2007.

CARVALHO, S. N.; ZAMONER, T. Direito à moradia e áreas ambientalmente protegidas: a


abordagem conciliatória como estratégia de ação no enfrentamento do conflito. In: RÉ,
AluisioIunesMontiRuggeri. (Org.). Temas aprofundados: Defensoria Pública. 2 ed. Salvador:
Juspodivm, 2014, v. 02, p. 431-448.

GERALDO, T.Z.; ALBERINI, M. Às margens da inclusão: construção do risco ambiental e


desigualdade social a partir do estudo de caso da favela Mississipi em Jacareí. Anais do Seminário
Nacional Sobre o Tratamento de Áreas de Preservação Permanente em Meio Urbano e Restrições
Ambientais ao Parcelamento do Solo. UFPA:Belém, 2014.

PLANSAN. “Planos Integrados Regionais de Saneamento Básico para as Unidades de


Gerenciamento de Recursos Hídricos de Serra da Mantiqueira, Paraíba do Sul e Litoral Norte–
UGRHI’s 1, 2 e 3. Estudo de Demandas, Diagnóstico Completo, Formulação e Seleção de
Alternativa – Município de Jacareí” - PRODUTO 3. Consórcio PLANSAN 123:São Paulo – SP,
Março/2011.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“GOVERNANÇA AMBIENTAL DE ÁREAS PROTEGIDAS EM CENÁRIOS


DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS: O CASO DO SISTEMA PRODUTOR DO
ALTO TIETÊ, REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO”
“ENVIRONMENTAL GOVERNANCE OF PROTECTED AREAS IN CLIMATE CHANGE
SCENARIOS: THE CASE OF THE HIGH TIETÊ, PRODUCTION SYSTEM, METROPOLITAN
REGION OF SAO PAULO”

Me. Solange Alves Duarte dos Santos*, Dra. Sandra Irene Momm Schult**, Dra. Luciana Fagnoni
Rodrigues Costa Travassos**
*Centro de Eng., Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas da Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão
do Território - Universidade Federal do ABC. SP, Brasil. duartelange@gmail.com (doutoranda).
**Centro de Eng., Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas da Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão
do Território - Universidade Federal do ABC.SP, Brasil.sandramomm@gmail.com (orientadora) e
ltravassos@gmail.com (co-orientadora).

1. INTRODUÇÃO
O trabalho aqui apresentado é uma breve análise de uma porção do território em estudo em
nossa pesquisa de doutorado, onde se pretende explorar o papel das áreas protegidas da sub-região
Alto Tietê-Cabeceiras, Região Metropolitana de São Paulo, enquanto instrumento de planejamento
territorial e governança ambiental em cenário de mudanças climáticas, compreendendo de que
forma as áreas protegidas dialogam com outros instrumentos de proteção ambiental e se inserem no
planejamento territorial em suas várias escalas e nas demais políticas setoriais. Dentre as estratégias
mais eficientes para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas é possível destacar a
implantação de áreas protegidas, não só pelo fato de abrigarem e protegerem florestas, mas por
terem a função de conter o desmatamento e proverem serviços ecossistêmicos. Assim, com as
discussões relacionadas às mudanças climáticas, a implantação e gestão das áreas protegidas
ganham força. Destacam-se, nesse contexto, as Unidades de Conservação (UCs), tipologia de áreas
protegidas estabelecidas pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)1 que são
territórios de planejamento, participação e governança ambiental complexos, multinível e em
múltiplas escalas.
Graham, J. Amos B. e Plumptre, T. (2003) trazem um conceito para governança como
sendo “as interações entre estruturas, processos e tradições que determinam como o poder e as
responsabilidades são exercidos, como as decisões são tomadas; trata de poder e de como os
tomadores de decisão são responsabilizados”, sugerindo ainda cinco princípios fundamentais de
boa governança para Áreas Protegidas, com base na lista do Programa das Nações Unidas para o

1
Lei Federal n 9.9985/2000.
495
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Desenvolvimento, a saber: Legitimacyand Voice, Direction,Performance, Accountability e


Fairness.
Quanto ao conceito de governança ambiental, é possível entender, que se trata da relação de
múltiplos atores, instituições, inter-relações e temas, cada um dos quais suscetível a expressar
arranjos específicos entre interesses em jogo e possibilidades de negociação, com ênfase na
prevalência do bem comum, relacionada com a implementação socialmente aceitável de políticas
públicas (Jacobi, 2012). Nas áreas protegidas, a governança tem sido questão chave para a
compreensão dos arranjos institucionais que se formam para uma maior eficácia.
A região de estudo deste trabalho abrange o Sistema Produtor Alto Tietê (SPAT)1 e a Área
de Proteção e Recuperação dos Mananciais do Alto Tietê Cabeceiras (APRM-ATC)2. Os
municípios da região, desde 1975, foram total ou parcialmente delimitados como mananciais de
interesse público pela Lei de Proteção aos Mananciais3, que estabeleceu Áreas de Proteção de
Mananciais (APM), nas bacias de 4 reservatórios destinados à produção de água e redução de
vazões a jusante, e possibilitou a preservação de alguns atributos naturais na região. Também se
encontra na região do SPAT, a Área de Proteção Ambiental (APA) da Várzea do Rio Tietê, criada
entre outros, com objetivo de proteção e recuperação do Rio Tietê e do seu entorno e preservação e
recuperação dos remanescentes da biota local. Quanto às áreas protegidas municipais, Mogi das
Cruzes destaca-se com 04 (quatro) unidades de conservação.
O SPAT encontra-se numa região de grande desenvolvimento econômico, que possui função
estratégica do ponto de vista ambiental, pois para além de estar em APM, faz parte da Reserva da
Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo (UNESCO), abrigando várias áreas protegidas
e grandes remanescentes de Mata Atlântica. É um território com significados culturais e simbólicos,
no qual as relações e conflitos por acesso a recursos e a disputa pelo controle dos mesmos são
marcantes.
A governança ambiental no contexto desta região se articula com a governança da água, da
biodiversidade, bem como com a governança urbana/metropolitana, o que torna importante a
aproximação entre diversas políticas multinível, sendo essencial o estabelecimento de estratégias de
gestão integrada entre as diversas esferas para a construção de agendas comuns, consideradas
práticas multiescalares. Assim, compreender como se dá a articulação espacial e institucional entre
as políticas setoriais e o debate ambiental tem sido um grande desafio.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

1
O SPAT é um conjunto de bacias de reservatórios protegidos para abastecimento público que envolve: Mogi das
Cruzes, Suzano, Biritiba-Mirim e Salesópolis, municípios da Sub-região do Alto Tietê-Cabeceiras.
2
Estabelecida através da Lei Estadual n 15.913, de 02 de outubro de 2015.
3
Leis Estaduais n° 895/75 e 1.172/76.
496
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A pesquisa que dá origem a este trabalho busca aprofundar o campo teórico no que se refere
à interface entre planejamento territorial, áreas protegidas, mananciais, cidade/metrópole e
processos de urbanização, por meio de pesquisa bibliográfica e documental. A pesquisa
bibliográfica trata do conhecimento disponível em livros, artigos técnicos e científicos, teses,
dissertações entre outros. A pesquisa documental baseou-se na coleta de dados qualitativos, nos
registros pessoais de trabalho (planejamentos, relatórios, atas de reuniões entre outros) e na leitura
de documentos públicos, bem como a participações em debates, oficinas de trabalho durante a
construção dos documentos analisados. Trata-se de um estudo de caso sobre a aplicação dos
instrumentos de planejamento territorial e governança ambiental, em especial as áreas protegidas,
analisando os impactos e transformações presentes nos processos de produção do espaço e a
eficácia da legislação ambiental estabelecida para cada unidade de conservação.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
No Brasil o estabelecimento de áreas protegidas baseou-se em diferentes modelos e
convenções internacionais, tendo assim, sido instituído pelo SNUC, que fornece muitas
informações, tais como: objetivos, diretrizes e o que é permitido em cada categoria estabelecida.
Um ponto importante a destacar é o crescimento das UCs Municipais após o SNUC, sendo uma
importante estratégia para se assumir o compromisso de conservação da biodiversidade na esfera
local, considerando as condicionantes socioeconômicas e as tendências atuais de ocupação humana
no território e propondo ações estratégicas que considerem a importância da conservação dos
recursos naturais.
Na composição e articulação destes territórios, os governos locais têm papel legítimo na
gestão das áreas protegidas, bem como na proposição e gestão de outras medidas de conservação.
Porém com grande frequência, o debate sobre as áreas protegidas fica à margem dos planejamentos
e estratégias de desenvolvimento territorial nesses entes federativos. Muitas vezes são inexistentes
as informações sobre a importância das áreas protegidas e o papel que estas cumprem na prestação
de serviços ambientais e como podem direcionar o planejamento territorial numa dada região para
que se garanta qualidade de vida. Inclui-se também nestes casos as Áreas de Proteção de
Mananciais (APM) que são importantes enquanto elementos integradores da biodiversidade e dos
recursos naturais, em especial dos recursos hídricos, não só no contexto local, mas também no
regional, já que mantém elo com os ecossistemas de seu entorno. Também desempenha papel
importante de zona de amortecimento, já que muitas vezes se localiza nos limites de muitas das
unidades de conservação, sendo também importante na minimização dos impactos causados às
mesmas.

497
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Ainda que as APMs tenham caráter conservacionista, estas não são classificadas como
unidades de conservação, entretanto, são áreas legalmente protegidas visando a proteção dos
recursos hídricos, o que não modifica a condição de estar vulnerável a impactos ambientais por
ocupação clandestina e desordenada, desmatamento etc. Por similaridade podem ser entendidas
como APA – Área de Proteção Ambiental, categoria prevista no SNUC que tem como objetivo
compatibilizar a proteção da diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a
sustentabilidade do uso dos recursos naturais. No entanto as APMs acabam sendo espaços
contraditórios já que são extremamente restritivos no que se refere a ocupação territorial ao mesmo
tempo em que não tem no escopo de sua base legal a previsão de desapropriação de terras para que
seja garantida a proteção total. A APRM do Alto Tietê-Cabeceiras, criada através da Lei Estadual
n 15.913/2015 traz, dentre seus objetivos, o de assegurar e potencializar a função do SPAT como
provedor de água prioritariamente para abastecimento público garantindo qualidade e quantidade,
onde a compensação financeira aos municípios também poderá ser viabilizada.
A partir de alguns estudos mais recentes sobre a região que tem seu foco na proteção
ambiental, tais como Plano de Desenvolvimento e Proteção Ambiental (PDPA) dos Mananciais do
Subcomitê da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê Cabeceiras e Plano Manejo da Área de Proteção
Ambiental da Várzea do Rio Tietê (Etapa Diagnóstico) foi possível identificar alguns conflitos nos
municípios do SPAT que vem transformando este espaço protegido. Dentre os conflitos existentes é
possível citar: expansão urbana sobre áreas de mananciais, impactos de grandes empreendimentos,
tais como o rodoanel, alteração no uso do solo, conflitos sociais, desmatamentos, além do uso de
agrotóxicos e defensivos agrícolas comprometendo recursos hídricos, lembrando que produção
agrícola de hortifrutigranjeiros é maior atividade produtiva da região, que é conhecida como
Cinturão Verde.

4. CONCLUSÃO
O comprometimento da disponibilidade hídrica dos mananciais do Alto Tietê-Cabeceiras,
agravada pela crise hídrica, relaciona-se diretamente à forma como o espaço vem sendo produzido.
A partir de alguns estudos mais recentes sobre a região que tem seu foco na proteção ambiental, foi
possível identificar alguns conflitos nos municípios do SPAT que vem transformando este espaço
protegido. É possível afirmar que tanto as APMs, APRMs quanto as UCs são instrumentos que
interferem na gestão do território e que estas objetivam a proteção dos recursos naturais, tanto para
conservação quanto para uso.
Para refletir as especificidades da política escalar na governança ambiental e no
planejamento territorial na região é importante conhecer as instituições, atores e colegiados que
atuam no território, quais as principais questões, conflitos, as relações e interesses que mantém com
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as áreas protegidas, seus discursos e os papéis que ocupam, as relações de poder que são
estabelecidas no planejamento e governança do território.

5. AGRADECIMENTOS
As autoras agradecem o apoio recebido do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico - CNPq-Brasil. Edital Universal. Processo: 409061/2016.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GRAHAM, J., AMOS, B., e PLUMPTRE, T. (2003). Governanceprinciples for protectedareas
in the 21st century. Ottawa, ON: InstituteonGovernance.

JACOBI, P. R. e SINISGALLI, P. A. A. (2012). Governança Ambiental e Economia Verde.


Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n 6, pp. 1469-1478, jun. 2012.

SÃO PAULO (Estado). Projeto PDPAs RMSP: Plano de Desenvolvimento Regional dos
Mananciais do Subcomitê Alto Tietê Cabeceiras: Plano de Desenvolvimento deProteção
Ambiental (PDPA) e assessoria para elaboração das respectivas Leis Específicas (Relatório
Técnico). COBRAPE e IPT. Volume 2 e 3. http://pdpa.cobrape.com.br/Arquivos/Pdpas/PDPA-
Alto-Tiete-Cabeceiras.pdf. Acessado em: 17 de março de 2019.

SÃO PAULO (Estado). Plano de Manejo da APA da Várzea do Rio Tietê (Diagnóstico) –
Fundação Florestal e Universidade de São Paulo, Volume Principal. São Paulo, SP, 2013.

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PARQUES URBANOS DO RECIFE: PERCEPÇÃO E VALORAÇÃO DOS


SERVIÇOS ECOSSISTÊMICOS
Carlos Eduardo Menezes da Silva1, Anselmo César Vasconcelos Bezerra2, Claudiano Carneiro da
Cruz Neto3
1
Departamento de Ambiente Saúde e Segurança, Instituto Federal de Pernambuco, Brasil.*
2
Departamento de Ambiente Saúde e Segurança, Instituto Federal de Pernambuco, Brasil.
3
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Os padrões de exposição humana à natureza mudaram acentuadamente nas últimas décadas,
devido principalmente à rápida urbanização (LAI et al., 2019). Projeções mostram que até 2050
cerca de dois terços das pessoas viverão em áreas urbanas (UN, 2019). Isso tem levado a uma
competição pelo espaço urbano que resulta na falta de exposição a áreas verdes por parte da
população, o que em consequência pode levar a importantes implicações negativas para o bem-estar
humano (LAI et al., 2019).
Esses benefícios providos pelas áreas verdes urbanas se tornam ainda importantes no
momento em que as cidades buscam oferecer uma variedade de serviços que contribuam para o
aumento da qualidade de vida dos seus habitantes. Esse movimento global é fortalecido a partir do
momento que as Nações Unidas - ONU coloca entre seus Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável - ODS a necessidade de criar estratégias para tornar as cidades mais sustentáveis e
saudáveis. Isso instiga pesquisadores a responderem como as cidades podem se desenvolver nesta
direção? Quais as políticas que podem ser desenvolvidas para alcançar esses objetivos? Quais os
impactos do que já está sendo feito?
Pesquisas realizadas em países desenvolvidos mostram o potencial desses espaços para o
desenvolvimento de atividades físicas, por exemplo, para ser um aliado na prevenção de doenças
cardiovasculares (TAMOSIUNAS, 2014); de obesidade (NOCON et al., 2008) e de distúrbios
mentais (MACKAY E NEILL, 2010). Além dos benefícios diretos à saúde resultantes da prática de
atividades físicas nesses espaços, a literatura aponta que os usuários das áreas verdes tendem a
desenvolver e manter laços de vizinhança e uma maior integração social, inclusive entre diferentes
classes sociais (MAAS et al., 2009).
Ao contrário dos países desenvolvidos, no Brasil e na América Latina, a literatura acerca
dessa questão ainda é escassa. São poucos os estudos que exploram a associação entre áreas verdes,
saúde e bem-estar nas áreas urbanas no Brasil (LONDE E MENDES, 2014; AMATO-LOURENÇO
et al., 2016; SILVEIRA E JUNGER, 2018; CAMARGO et. al., 2018). sendo essas concentradas na
500
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

região sul do país. Essa escassez torna difícil a compreensão do potencial benefício que os espaços
verdes urbanos podem trazer à população brasileira(ARANA; XAVIER, 2017).
Diante desse arcabouço teórico-empírico algumas questões já estão elucidadas e outras são
controversas ou ainda não foram investigadas. Por exemplo, será que os usuários de parques
urbanos em países em desenvolvimento, como o Brasil, percebem os benefícios gerados por essas
áreas? Será que os usuários vêem e usam os parques como um espaço de exceção na promoção de
saúde em detrimento das condições de vida desfavoráveis geradas por outras infra-estruturas
urbanas? Num contexto de desigualdades sociais extremas, são os parques urbanos um local de
integração social? Quais os reais benefícios em termos de serviços ecossistêmicos gerados por essas
áreas? Como fatores físicos (área, vegetação, solo) afetam a provisão desses serviços? Qual a valor
desses serviços para a sociedade? Quais são os custos e benefícios para o poder público manter
essas áreas?
Segundo a Avaliação Ecossistêmica do Milênio (2005), os serviços dos ecossistemas são os
benefícios que o homem obtém desses ecossistemas. Os ecossistemas são considerados um
complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais, microorganismos, e seu respectivo meio,
que interagem como uma unidade funcional. Os serviços ecossistêmicos são classificados em quatro
grandes categorias: Serviços de provisão – como alimentos, água, madeira e fibras; Serviços
reguladores – responsáveis pela regulagem do clima, de inundações, de doenças, dos resíduos e da
qualidade da água; Serviços culturais – são aqueles que oferecem benefícios de recreação, de
estética e os espirituais; Serviços de suporte – tais como formação do solo, fotossíntese e ciclo de
nutrientes.
Esses serviços ecossistêmicos são importantes para a manutenção da vida humana. A partir
disso, pode tentar capturar o valor que uma parcela da sociedade atribui a esses serviços
ecossistêmicos. E como capturar o valor desses bens e serviços? Um caminho que vem sendo
tomado por economistas é a idéia de valorar através das preferências individuais – no qual espera-se
que os indivíduos possam manifestar as suas preferências por atributos do ecossistema, e isto
poderia estar diretamente ligado à ao seu grau de conhecimento sobre as funções e processos
ecológicos. O que pode comprometer a sua capacidade de atribuir valores aos atributos
ecossistêmicos (BINGHAM et al., 1995).
A partir dessas questões, pretende-se investigar as relações entre as áreas verdes urbanas e o
bem-estar das populações de seu entorno. De forma que os resultados gerados possam contribuir
para subsidiar o aprimoramento de ações no âmbito das políticas públicas locais.

501
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2. METODOLOGIA
O Município do Recife apresenta atualmente cerca de 10 parques públicos e inúmeras praças
espalhadas pelos 94 bairros da cidade que equivalem a 0,2% do território municipal (Figura 1).
Além das Unidades de Conservação Municipais que contribuem com cerca de 14% da cobertura.
Nesta primeira, etapa do projeto foram aplicados 621 questionários, adaptados ao modelo
utilizado por Akpinar (2016) e Camargo et al. (2018) para a coleta de dados sobre a percepção das
populações em relação aos benefícios gerados pelos parques e a valoração dos serviços culturais (de
recreação) providos por essas áreas.
Foram selecionados três parque urbanos (Parque da Jaqueira, Parque de Santana e Parque da
Macaxeira), em todos existe a presença de acadamia da cidade e outros equipamentos para prática
de atividades de esporte e lazer com diferentes caracteristicas de arborização respectivamente
muito, médio e pouco arborizado.

Figura 1 – Principais Parques Urbanos da cidade do Recife.

Utilizou-se o método de valoração contingente – MVC para estimar a Disposição a Pagar –


DAP, como estimativa do valor dessas áreas para atrividades de recreação e lazer. Para tanto foram
utilizados modelos conhecidos como Double-Bound Model ou modelos de dupla ligação e um de
seus benefícios é oferecer uma opção de resposta intermediária de modo que os respondentes

502
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incertos da pesquisa não são forçados a construir um valor de disposição a pagar ou disposição a
receber ao responder a uma questão de escolha dicotômica (GROOTHUIS; WHITEHEAD,2002).

3. RESULTADOS
Os resultados obtidos com os questionários obtidos demonstraram aspectos interessantes, a
Disposição a Pagar média estimada foi de R$ 42.18 para o parque da Jaqueira, R$ 25.72 para o
parque da Macaxeira e R$ 16.64, para o parque de Santana. Esses valores evidenciam que o Parque
com maior arborização e melhor infra-estrutura para a prática de atividades de lazer é aquele onde
as pessoas apresentam maior disposição a pagar pela sua conservação. Além disso, como os dados
demonstram os aspectos de características socioeconômicas e educacionais tiveram influência na
percepção por parte da população circundante dos benefícios providos pelos parques.
Outro resultado importante em termos de orientação e sinalização de informações para o
poder público é o valor estimado a partir das DAP’s. Este valor foi calculado considerando apenas o
quantitativo da população dos bairros onde se encontram os parques avaliados. Dessa forma o total
encontrado foi de R$ 640.376,74. Isso corresponde apenas aos benefícios referentes a serviços
ecossistêmicos culturais, ou seja, aqueles ligados a atividades de lazer praticadas nesses parques.
Dessa forma é como se esses parques gerassem um benefício anual desse montante para a
população do seu entorno imediato.

4. CONCLUSÕES
Apesar de ainda preliminares, os resultados levam a crer que há sim uma percepção positiva
da população do entorno e que frequenta os parques urbanos do Recife sobre os benefícios gerados
por essas áreas. Observa-se também que há um entendimento que quanto mais arborizadas melhores
são os resultados das práticas de esporte e lazer para a saúde e física e mental dos usuários. Pode-se
concluir também que a dimensão dos benefícios gerados para as populações do entorno e usuários
justificam uma maior atenção do poder público para com essas áreas.

5. REFERÊNCIAS
AKPINAR, A. How is quality of urban green spaces associated with physical activity and health?.
UrbanForestry & UrbanGreening, (16) 2016, p.76-83. https://doi.org/10.1016/j.ufug.2016.01.011

AMATO-LOURENÇO, L. F., MOREIRA, T. C. L., ARANTES, B. L., SILVA FILHO, D. F.,


MAUAD, T. (2016). Metrópoles, cobertura vegetal, áreas verdes e saúde. Estudos Avançados,
30(86), 113-130. https://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142016.00100008

ARANA, A. R. A.; XAVIER, F. B. Qualidade ambiental e promoção de saúde: o que determina a


realização de atividades físicas em parques urbanos? Geosul, v. 32, n. 63, p. 179, 2017.
BINGHAM, Gail et al. Issues in ecosystem valuation: improving information for decision
503
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

making. Ecological economics, v. 14, n. 2, p. 73-90, 1995.

CAMARGO DM, RAMÍREZ PC, QUIROGA V, RÍOS P, FÉRMINO RC, SARMIENTO OL.
Physical Activity in Public Parks of High and Low Socioeconomic Status in Colombia Using
Observational Methods. J Phys Act Health. 2018 Aug 1;15(8):581-591. doi:10.1123/jpah.2017-
0318.

GROOTHUIS, P. A.; WHITEHEAD, J. C. Does don't know mean no? Analysis of'don't
know'responses in dichotomous choice contingent valuation questions. Applied Economics, v. 34,
n. 15, p. 1935-1940, 2002.

LAI, H. et al. The impact of green space and biodiversity on health. Frontiers in Ecology and the
Environment, v. 17, n. 7, p. 383–390, 2019.

LONDE, P.R., MENDES, P.C. 2014. The influence of green areas in the quality of urban life.
Revista Brasileira de Geografia Médica e da Saúde– Hygeia10 (18): 264 – 272

NOCON, M., HIEMANN, T., MÜLLER-RIEMENSCHNEIDER, F., THALAU, F., ROLL, S.,
&WILLICH, S. N. (2008). Association of physical activity with all-cause and cardiovascular
mortality: a systematic review and meta-analysis. European Journal of Cardiovascular
Prevention & Rehabilitation,15(3), 239–246. https://doi.org/10.1097/HJR.0b013e3282f55e09

MAAS, J., VERHEIJ, R. A., GROENEWEGEN P.P. Green space, urbanity, and health: how strong
is the relation? Journal of Epidemiology & Community Health 2006; 60:587-592.
http://dx.doi.org/10.1136/jech.2005.043125.

MACKAY, G., NEILL J. T. The effect of “green exercise” on state anxiety and the role of exercise
duration, intensity, and greenness: A quasi-experimental study, Psychology of Sport and Exercise,
Volume 11, Issue 3, 2010, Pages 238-245, ISSN 1469-0292,
https://doi.org/10.1016/j.psychsport.2010.01.002.

SILVEIRA, I. H., JUNGER, W. L. Espaços verdes e mortalidade por doenças cardiovasculares no


município do Rio de Janeiro. Revista de Saúde Pública,52, 49. Epub May 03,
2018.https://dx.doi.org/10.11606/s1518-8787.2018052000290

TAMOSIUNAS A, GRAZULEVICIENE R, LUKSIENE D, DEDELE A, REKLAITIENE R,


BACEVICIENE M, VENCLOVIENE J, BERNOTIENE G, RADISAUSKAS R,
MALINAUSKIENE V, MILINAVICIENE E, BOBAK M, PEASEY A, NIEUWENHUIJSEN MJ.
Accessibility and use of urban green spaces, and cardiovascular health: findings from a Kaunas
cohort study. Environ Health. 2014 Mar 19;13(1):20. doi: 10.1186/1476-069X-13-20.
UNITED NATIONS. World Urbanization Prospects: The 2019 Revision Population Database
[online]. Population Division of the Department of Economic and Social Affairs, 2007. consultado
em: 20 julho 2019. URL: http://www.esa.un.org/unup/.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PERCEPÇÃO AMBIENTAL EM ÁREAS URBANIZADAS: UMA ANÁLISE


DO PARQUE NATURAL MUNICIPAL DE NOVA IGUAÇU E DO BAIRRO
DA COREIA EM MESQUITA (RJ)
ENVIRONMENTAL PERCEPTION IN URBANIZED AREAS: AN ANALYSIS OF THE
MUNICIPAL NATURAL PARK OF NOVA IGUAÇU AND NEIGHBORHOOD OF COREIA IN
MESQUITA (RJ)

Lucas da Silva Quintanilha*, Mariana Oliveira da Costa*, Edileuza Dias de Queiroz**


Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGEO), UFRRJ, Brasil.¹
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGGEO), UFRRJ, Brasil.²
Professora Doutora do Curso de Geografia da UFRRJ, Departamento de Geografia, Instituto Multidisciplinar, UFRRJ,
Brasil.³

1. INTRODUÇÃO
Não é recente o debate afirmando a importância das Unidades de Conservação (UC) no
contexto brasileiro, sobretudo nas áreas urbanizadas. Atualmente é possível observar o crescente
desmatamento das áreas naturais, a ampliação da exploração econômica dos elementos ecossistêmicos
encontrados nesses espaços, o crescimento urbano acompanhado da redução dos “espaços verdes” nas
grandes cidades, a ação antrópica comprometendo o equilíbrio ecossistêmico, entre outros problemas
ambientais.
Dentre os problemas citados, destacamos o crescimento de áreas construídas e a redução das
áreas naturais nas pequenas e médias cidades, tendo em vista que na maioria das grandes cidades as
UC não conseguiram se estabelecer a tempo, e o que pode ser visto hoje são áreas construídas e um
cenário completamente moldado pela ação do homem.
Dentro desse cenário de expansão e ocupação urbana em muitas cidades brasileiras, pôde-se
observar que o processo acelerado de urbanização contribuiu para a criação de espaços de riscos e
assentamentos precários, onde as áreas ambientalmente frágeis, como as margens de rios e encostas são
ocupadas de maneira desordenada, iniciando uma intensa degradação dos recursos naturais
(CARVALHO et al, 2008).
A discussão acerca dos problemas socioambientais urbanos permite compreender a complexa
relação e dinâmica que envolve a sociedade e a natureza, na qual diferentes processos de produção e
apropriação do espaço podem gerar uma pressão sobre o meio natural, desconsiderando as fragilidades
do ambiente e contribuindo para o surgimento de novas áreas de riscos e de populações em condições
de vulnerabilidade social.
Nesse sentido, as UCs têm obtido um olhar especial pela população e alguns órgãos públicos e
privados, pois, pode-se analisar a importância dessas áreas naturais para as gerações atuais e futuras,
505
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

tendo em vista que durante o processo de evolução urbana das grandes cidades muitas áreas
preservadas foram devastadas para dar origem a construções, a fim de propiciar a ocupação humana,
como por exemplo, a retirada da mata ciliar das margens dos rios.
Os espaços naturais inseridos próximos às áreas urbanizadas possuem algumas problemáticas
que são considerados grandes desafios para a equipe gestora, tais como: conflitos relacionados a
moradia, caça predatória, poluição, violência urbana, a degradação dos recursos naturais, entre outros.
Em contrapartida verificamos que as UC inseridas em áreas urbanizadas trazem diversas garantias no
que tange o equilíbrio ambiental, a garantia de vida das espécies de fauna e flora, a garantia da
qualidade do corpo hídrico, entre outros.
Ao analisar esse contexto, realizamos um aprofundamento teórico e vinculamos as análises e
discussões acerca das áreas protegidas e urbanização à realidade do Parque Natural Municipal de Nova
Iguaçu (PNMNI) e do Bairro da Coréia – localizado no entorno do PNMNI, no município de Mesquita
(RJ).
O objetivo central da pesquisa consiste em analisar a importância do PNMNI no processo de
redução dos impactos antrópicos no seu entorno e a percepção dos moradores do bairro da Coréia
acerca das dinâmicas da cidade no contexto da conservação da UC analisada.
Buscamos apresentar um breve histórico da área estudada, as problemáticas ambientais na
relação sociedade-natureza, a percepção dos moradores em relação aos impactos ambientais e às
diferenciações na paisagem ao longo do percurso entre a área urbanizada e o PNMNI.
Após o Decreto Municipal (6.001 de 1998) que possibilitou a criação do PNMNI, iniciaram os
diversos trabalhos no interior da Unidade com objetivos maiores que a conservação e/ou preservação
de sua biodiversidade. A UC possui importância biológica e social, apresentando marcas de
acontecimentos simbólicos e culturais no seu processo histórico e de criação. Sendo assim, Mello
(2008, p. 25) considera que o principal elemento para criação do Parque ocorreu em julho de 1985,
pois foi nesse período que

(...) o Governo do Estado do Rio de Janeiro, através da CEHAB, comprou as terras


da Gleba Modesto com o objetivo de ali assentar 44 mil pessoas, no programa
“Cada Família, Um Lote”. Este evento provocou a reação imediata da Prefeitura de
Nova Iguaçu, que já havia declarado o imóvel como de Utilidade Pública para fins
de desapropriação, em 19 de março do mesmo ano, pelo Decreto no 2858.

Como todo processo de criação de UC, muitas discussões acontecem nos bastidores e com o
PNMNI não foi diferente. Segundo Duarte (2010), foi a possibilidade de ocupação do espaço natural e
a destruição total dos remanescentes de fauna e flora através do projeto habitacional do Governo que
fez com que o município de Nova Iguaçu se posicionasse no processo de construção da UC. Duarte
(op. cit, p. 108), afirma que “(...) um dos fatores para a criação do Parque Municipal era proteger um
506
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

sistema hidrológico de grande importância regional”, entre as bacias está o Rio Dona Eugênia (vide
figura 1 e 2).
Neste artigo buscamos refletir acerca das ações antrópicas no entorno do PNMNI, porém neste
breve relato ressaltamos percepção dos moradores em relação ao Rio Dona Eugênia - corpo hídrico
localizado no bairro da Coréia, em Mesquita (RJ) - e optamos por apresentar os problemas
relacionados ao descarte inadequado do lixo e a retirada da mata ciliar, onde a pressão urbana sobre o
meio natural torna-se problemática, contribuindo para o processo de degradação dos recursos hídricos.
Esse cenário de degradação pode potencializar a frequência e a intensidade de eventos de
inundações. Esse fenômeno faz parte da dinâmica das bacias hidrográficas e têm sua ocorrência
explicada por fatores associados a morfometria da bacia, ao tipo de relevo, as características edáficas,
ao regime de chuvas, mas também podem ser induzidas pelo tipo de uso e ocupação do solo das
planícies e das margens fluviais (AMARAL & RIBEIRO, 2009).
As análises de percepção foram feitas a partir da aplicação de questionários com a comunidade
do entorno e a seguir discorreremos os procedimentos realizados.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para esta pesquisa foram aplicados questionários aos moradores da zona de amortecimento
do PNMNI – num total de 36 –, sendo elaborados com questões fechadas e questões abertas
(semiestruturado). Optamos pelos que residem nas ruas principais de acesso ao Parque.
Para uma análise mais aprofundada da percepção dos moradores realizamos uma adaptação da
Análise Textual Discursiva (ATD), de autoria de Moraes e Galiazzi (2016). A ATD é um processo
analítico que se constitui em quatro etapas: desmontagem dos textos, estabelecimento de relações,
captura do novo emergente e auto-organização. Elegemos as seguintes Unidades de Análise: (a)
Identidade, (b) Serviços Ecossistêmicos, (c) Problemas socioambientais e (d) Participação.
Os dados coletados nos permitiram entender o perfil dos visitantes, no que diz respeito
municípios de origem, frequência das visitas, idade, principal atividade realizada no Parque, sugestões,
entre outros. Atentamos para o fato de que caracterizar os visitantes bem como o seu perfil são
importantes para elaboração de programas específicos de uso público, o que auxilia a gestão da UC. A
análise das respostas dos moradores nos levou à compreensão de seus saberes e entendimentos
relacionados com o território do Parque e o lugar onde residem, apontando caminhos que devem ser
realizados pela gestão.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Através das análises foi percebido a compreensão da natureza utilitarista, ou seja, uma
perspectiva antropocêntrica, pois, tanto “serviços ecossistêmicos” (citados por 39% dos entrevistados),
507
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quanto “melhoria ambiental” (que foi citado por 17% dos entrevistados) estão relacionando com
melhoria para o território.
O principal problema apontado pelos moradores é o lixo nas margens e leito do rio Dona
Eugênia, mas a maioria das pessoas não atribui isso à coleta inadequada, e sim aos próprios moradores.
A poluição causada por este problema também é ressaltada, assim como a falta de saneamento básico.
Verificamos que há ainda pouco envolvimento dessa população com a UC, com necessidade de
uma aproximação junto à comunidade do entorno, objetivando estimular o sentimento de
pertencimento e assim contribuindo para a preservação. Desta forma, podemos observar poucas
interações entre as instituições de proteção ambiental e as comunidades dos entornos, o que sugere a
necessidade de trabalhos informativos/formativos realizados pela gestão para que essa população
compreenda os objetivos de uma UC para o lugar.

4. CONCLUSÃO
As metodologias utilizadas para a construção desta pesquisa e as análises dos resultados
obtidos nos leva a concluir que o as UC inseridas no contexto urbano possuem uma importância
significativa no processo de conservação dos elementos ecossistêmicos, além de conter a
urbanização em direção aos espaços naturais.
Os questionários aplicados nesta afirmam que grande parte dos moradores do entorno destacam
problemas ambientais, tais como: o lixo, a poluição do corpo hídrico, o desmatamento, a falta de
saneamento e as inundações como os principais problemas do bairro.
Com isso, pode-se observar que poucos moradores percebem a relação existente entre a UC
conservada e os problemas antrópicos que podem ser visualizados em um contexto muito próximo.
Conforme Botelho (2011), a degradação dos recursos hídricos a partir das alterações dos
padrões geomorfológicos da bacia, a poluição e contaminação dos canais fluviais colaboram para esse
cenário.
Através dos resultados obtidos observamos que há um distanciamento considerável da
comunidade do entorno do PNMNI com a UC, o modo com que essa comunidade compreende os
elementos naturais reafirma a necessidade da expansão dos trabalhos que são realizados no Parque,
com o objetivo de alcançar esses moradores.
Com esta pesquisa compreendemos a importância da aproximação entre a gestão da UC e os
moradores do entorno das UC, a fim de fortalecer os vínculos e reduzir os impactos gerados ao meio
ambiente natural. Durante o período de pesquisa foi possível observar a ação eficiente do PNMNI no
processo de redução dos impactos antrópicos no interior da UC e na zona de amortecimento, com isso,
afirmamos a necessidade de apresentar aos moradores que ações efetivas de conservação pode alcançar
o bairro onde ele está inserido, como ocorre no interior da UC.
508
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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARAL, R. e RIBEIRO, R. R. Inundações e Enchentes. In: TOMINAGA, L. K; SANTORO, J.
AMARAL, R. Desastres Naturais: conhecer para prevenir. São Paulo: Instituto Geológico, 2009.

BOTELHO, R. G. M. Bacias Hidrográficas Urbanas. In: Geomorfologia Urbana, Guerra. A. J. T.


(Org.). – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.

CARVALHO, C. S; COUTINHO, R. Q e GALVÃO, T. Gestão e Mapeamento de Riscos


Socioambientais: Curso de capacitação. Brasília: Ministério das Cidades; Universidade Federal
de Pernambuco – UFPE, 2008.

DUARTE, P.A. História ambiental de uma unidade de conservação: o parque municipal de


Nova Iguaçu-RJ. Dissertação (Mestrado). UERJ, 2010.

MELLO, F.A.P. Ordenamento da malha de trilhas como subsídio ao zoneamento ecoturístico e


manejo de visitação no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu-RJ. Dissertação (Mestrado
em Geografia). Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.

MORAES, R.; GALIAZZI, M. C. Análise textual discursiva. 3aed. ver. e ampl. – Ijuí: Ed. Inijuí,
2016.

QUEIROZ, E.D. Uso Público no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu-RJ: trilhando
entre possibilidades e dificuldades. Tese de Doutorado em Geografia. Niterói: UFF, 2018

QUINTANILHA, L. S. O Uso Público em Unidades de Conservação: uma análise das


diferentes atividades desenvolvidas no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (RJ).
Monografia de Graduação em Geografia. Nova Iguaçu: UFRRJ-IM. 2017.

SEMUAM. Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente da Cidade de Nova Iguaçu.


Rio de Janeiro, 2001.

509
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AVALIAÇÃO DE IMPACTO À SAÚDE NA IMPLEMENTAÇÃO DE UM


MOSAICO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO URBANO
HEALTH IMPACT ASSESSMENT IN IMPLEMENTATION OF A MOSAIC OF URBAN
CONSERVATION UNITS

Ana Schramm*, Sandra de Souza Hacon**


Programa de Saúde Pública e Meio Ambiente, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de
Janeiro, Brasil.* (Autora correspondente)
Programa de Saúde Pública e Meio Ambiente, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de
Janeiro, Brasil.** (Professora orientadora)

1. INTRODUÇÃO
As áreas protegidas têm impactos positivos na saúde e na qualidade de vida nas cidades.
Prestam serviços ecossistêmicos e salutogênicos, como a regulação térmica, escoamento superficial,
redução de ruídos, qualidade do ar, modulação de doenças infecciosas, bem como, possibilitam a
preservação dos valores históricos, sociais e culturais, a geração de oportunidades educativas,
econômicas, emprego, renda e ecoturismo, sendo decisivas para a sustentabilidade urbana em longo
prazo. (AMATO-LOURENÇO et al., 2016; CAMPOS; CASTRO, 2017; SHANAHAN et al.,
2016). Existem evidências de associações positivas entre a biodiversidade e bem-estar psicológico e
físico e entre diversidade de ecossistemas e regulação do sistema imunológico (AERTS et al.,
2018).
Por outro lado, as áreas protegidas urbanas quando desamparadas geram impactos negativos
na saúde e no ambiente como, por exemplo, degradação ambiental, violação de direitos, grilagem,
especulação imobiliária, conflitos sobre o uso da terra; doenças relacionadas à água e ao
saneamento; doenças transmitidas por vetores; estresse psicossocial e violência; além de
contribuírem, para o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade,
hipertensão e diabetes, que sobrecarregam os serviços de saúde e a economia (AMATO-
LOURENÇO et al., 2016).
A resolução CONAMA 01/1986, que dispõem sobre os critérios da avaliação de impacto no
processo de licenciamento ambiental no Brasil, apesar de definir como impacto ambiental qualquer
mudança no ambiente que afete direta ou indiretamente a saúde, a segurança e bem estar da
população, não determinam metodologias, nem parâmetros específicos que considerem a saúde nos
estudos de impacto ambiental. O setor saúde vem trabalhando adicionalmente, por meio da
implementação da Avaliação de Impacto à Saúde (AIS) (HACON et al. 2018).

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A AIS é uma combinação de procedimentos, métodos e ferramentas com os quais políticas,


programas e projetos podem ser julgados pelos seus efeitos potenciais na saúde da população, assim
como pela distribuição de tais efeitos dentro da população (QUIGLEY et al., 2006). Destina-se a
prever as consequências futuras para a saúde de possíveis decisões, identificando tantos os impactos
negativos e positivos, quanto as ações apropriadas para gerenciar os impactos fornecendo subsídios
para a tomada de decisão (KEMM, 2014). O processo da AIS é cognitivo e inclusivo, onde a
participação social é considerada como um de seus elementos centrais.
As áreas protegidas são frequentemente criadas e implementadas sem levar em consideração
os impactos na saúde e também sem a participação da população local. Uma abordagem de AIS
feita antes da implementação de áreas protegidas urbanas traz evidências que complementam os
estudos ambientais, contribuindo no planejamento e implantação dessas áreas. A AIS pode
potencializar os impactos positivos da criação de uma área protegida urbana, além de mitigar os
impactos negativos atuais do território e dos que virão com a sua implementação, promovendo à
saúde e a melhoria da qualidade de vida nas cidades. Por ser um processo pedagógico, pode também
capacitar os atores locais para atuarem na resolução de outros problemas sociais e econômicos.
Tendo como base empírica o processo de criação e implementação do Mosaico de Unidades
de Conservação da zona urbana do Ribeirão Sobradinho no Distrito Federal, Brasil, está sendo
desenvolvido no âmbito do doutorado em Saúde Pública e Meio Ambiente, da ENSP/Fiocruz, uma
pesquisa que propõe construir um modelo de AIS por meio de métodos participativos para envolver
as comunidades locais e obter dados e informações qualitativas e quantitativas, priorizando técnicas
primárias de coleta de dados, incluindo a rede de atores sociais envolvidos, com intuito de subsidiar
a formulação da política do mosaico e o desenvolvimento local. O presente trabalho relata a
experiência do planejamento metodológico inicial da proposta da AIS.

2. MATERIAL E MÉTODO
A AIS é um processo desenvolvido por meio da revisão das evidências científicas
disponíveis, das opiniões, experiências e expectativas dos atores sociais, bem como da produção e
análise de novos dados. Os modelos de AIS, em geral, seguem as etapas: 1 - Triagem, 2 - Escopo, 3
- Análise e mitigação, 4 -Tomada de decisão e 5 - Avaliação e Monitoramento (BRASIL, 2014). A
primeira etapa da proposta da AIS para as UCs de Sobradinho-DF, aqui apresentada, faz uma
análise da sua viabilidade, a partir da identificação dos potenciais impactos da área de abrangência e
das vulnerabilidades sociais do território das UCs, além da constituição de um grupo de trabalho
(GT) que irá planejar, coordenar e monitorar a AIS. A metodologia da pesquisa ação conduzirá a
construção participativa do modelo de AIS utilizando diferentes abordagens participativas e
pedagógicas (THIOLLENT, 2011).
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Para isso, propõe-se as seguintes ações: desenvolver a rede de atores sociais interessados na
criação do mosaico que irão integrar o GT da AIS; realizar uma cartografia social na área de
abrangência, com caracterização dos grupos populacionais e dos recursos e ativos locais; elaborar e
aplicar materiais e ações de comunicação e difusão da AIS. Para efetivar a inclusão de atores
representativos das comunidades presentes na área de abrangência, o projeto prevê a formação de
agentes da comunidade, por meio da concessão de bolsas de pesquisa, ensino e extensão, e a
inclusão de voluntários na equipe de pesquisa, baseado nos princípios da ciência cidadã. Até o
momento foi feita a caracterização do território, utilizando pesquisa bibliográfica e de campo, para
estruturação teórico metodológica da proposta de AIS, e atividades políticas junto à rede de atores
local, por meio de reuniões e acompanhamento da agenda ambiental local.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
O território do Ribeirão Sobradinho, abrange as Regiões Administrativas (RA) de
Sobradinho e de Sobradinho II, localizadas na região norte do DF, a 26 km do Plano Piloto, com
população estimada de 145,651 mil habitantes (PDAD, 2018). Pertence à bacia do Rio São
Bartolomeu, que deságua no Rio Paraná. O ribeirão é o principal conector ambiental entre as UCs:
Reserva Biológica da Contagem, APA da Cafuringa e APA do Rio São Bartolomeu, e se sobrepõe a
APA do Planalto Central (GDF, 2012).
A zona urbana do ribeirão possuía cinco parques: Parque Recreativo e Ecológico Canela de
Ema (1997), Parque Ecológico e Vivencial de Sobradinho (1997), Parque Recreativo Sobradinho II
(1995), Parque Centro de Lazer e Cultura Viva (2007) e o Parque Ecológico dos Jequitibás (1994),
único parque que foi implantado (GDF, 2014). Desses, os três primeiros tiveram suas leis revogadas
em Ação Direta de Inconstitucionalidade por vício de iniciativa. A implementação das áreas
protegidas do ribeirão é uma demanda reprimida da população local, que ao longo do processo de
urbanização das RAs têm se mobilizado para efetiva-las.
O Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do DF (IBRAM), órgão vinculado à
Secretaria de Estado de Meio Ambiente, que executa as políticas públicas ambientais e de recursos
hídricos no DF iniciou, no ano de 2015 o processo de Recategorização dos parques do DF, para
enquadra-los no Sistema de Distrital de Unidades de Conservação. Desde então, formou-se uma
rede de articulação intersetorial entre pesquisadores, gestores, técnicos e comunidade local, que
vem atuando no processo de criação das UCs de Sobradinho. A rede construiu uma proposta de um
mosaico de unidade de conservação que integra os parques e nascentes do ribeirão. Essa proposta,
atualmente é objeto de um diagnóstico ambiental e aguarda a realização dos estudos necessários que
subsidiarão o processo de recriação e implementação das UCs.

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A área de entorno do ribeirão possui zoneamento favorável a expansão urbana, e apresenta


alguns processos de licenciamento de parcelamento de solo. A regularização fundiária de
condomínios e a urbanização da Fazenda Paranoazinho, em Sobradinho II, exigiu o pagamento de
recursos de Compensação Ambiental e está em fase de obtenção da Licença de Instalação de um
condomínio vertical para mais de 120 mil habitantes. Diante desse cenário, ao longo do ano de 2019
essa pesquisa ação iniciou o processo de imersão no território e realizou: reuniões de planejamento
e mobilização com atores sociais locais; a construção de uma proposta de aplicação dos recursos
oriundos da compensação ambiental para a realização da AIS; o acompanhamento do diagnóstico
do Ribeirão Sobradinho; a análise do Estudo de Impacto Ambiental e a participação na audiência
pública do processo de licenciamento desse empreendimento.

Figura 1 – Mapa do campo da pesquisa

Fonte: Própria
4. CONCLUSÃO
O desenvolvimento da AIS no mosaico de UCs de Sobradinho-DF permitirá a inclusão dos
atores interessados no processo de criação, implantação e gestão, que ao se apropriarem das UCs
contribuirão para sua conservação efetiva, como também promoverá a integração dos setores
governamentais e sociedade civil, levando a uma aplicação eficiente dos recursos públicos e com
isso, garantindo a viabilidade da implementação e manutenção das UCs. A pesquisa contribui
diretamente com a construção de indicadores socioambientais, no desenvolvimento de novas
abordagens e ferramentas para o uso de evidências qualitativas para subsidiar políticas públicas.
Contribui para a qualificação da participação da comunidade na gestão do território e o
fortalecimento de instituições públicas e privadas, promovendo ações intersetoriais para a promoção
da saúde e o alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

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5. AGRADECIMENTOS
Essa pesquisa agradece a participação ativa dos atores locais do grupo Amigos do Parque
Canela de Ema, da Associação SOS Ribeirão, e do IBRAM, e o apoio institucional da Escola
Nacional de Saúde Pública da Fiocruz.

6. REFERÊNCIAS
AERTS, R., HONNAY, O., NIEUWENHUYSE, A. V., Biodiversity and human health:
mechanisms and evidence of the positive health effects of diversity in nature and green spaces,
British Medical Bulletin, Volume 127, Issue 1, September 2018, Pages 5–22, Disponível em:
<https://doi.org/10.1093/bmb/ldy021>. Acessado em: 24 de ago. 2019.
AMATO-LOURENCO, L. F. et al. Metrópoles, cobertura vegetal, áreas verdes e saúde.
Estudos Avançados, São Paulo, v. 30, n. 86, p. 113-130, 2016.

CAMPOS, R. B. F.; CASTRO, J. M. Saúde & Transformação Social, ISSN 2178-7085,


Florianópolis, v.8, n.1, p.106-116, 2017.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância em


Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador. Avaliação de Impacto à Saúde: metodologia adaptada
para aplicação no Brasil. Brasília, Ministério da Saúde, 2014.

GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL. Instituto Brasília Ambiental, Secretaria de Estado de Meio


Ambiente. Brasília. Guia de Parques do Distrito Federal. 2014.

GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL. Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do


DF. Relatório de Diagnósticos e Soluções para a Recuperação Ambiental do Ribeirão Sobradinho.
2012. Disponível em:
<http://www.cbhmaranhao.df.gov.br/ribeirao_sobradinho/documentos/Diagnostico_Solucoes.pdf>.
Acessado em: 17 de mar. de 2017.

KEMM, J. Health impact assessment: past achievement, current understanding, and future
progress. Oxford: Oxford University Press, 295 p., 2012.

QUIGLEY, R., BROEDER, L. D., FURU, P., BOND A., CAVE, B., BOS, R. Health impact
assessment: international best practice principles. Fargo, USA: International Association for
Impact Assessment, 2006.

HACON, S. S., PÉRISSÉ, A. R. S., SIMOS, J., CANTOREGGI, N. L., WINKLER, M. S.


Challenges and Prospects for Integrating the Assessment of Health Impact in the Licensing
Process of Large Capital Project in Brazil. International Journal of Health Policy and
Management x(x), 1- 4, 2018.

SHANAHAN, D. F., BUSH, R., GASTON, K. J., LIN, B. B., DEAN, J., BARBER, E., &
FULLER, R. A. Health Benefits from Nature Experiences Depend on Dose. Scientific Reports,
514
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6(28551), 1–10, 2016. Disponível em: <DOI: 10.1038/srep28551>. Acessado em: 24 de ago. de
2019.

THIOLLENT, M. Metodologia da Pesquisa-Ação. 18o ed. São Paulo: Cortez, 2011.


GT 8 – Cultura, biodiversidade, conhecimentos tradicionais e manejo comunitário do ambiente

515
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

QUINTAIS QUILOMBOLAS E A SUA RELEVÂNCIA PARA A


COMUNIDADE NO CONTEXTO DA EXPANSÃO URBANA
QUILOMBOLAS´S HOMEGARDENS AND THEIR RELEVANCE TO A COMMUNITY IN
THE CONTEXT OF URBAN EXPANSION

Laís Alves de Souza*, Maria Vitória Fernandes Barbosa da Silva**, Rita de Cássia Martins
Montezuma***

*Bolsista PIBIC, Graduanda do Departamento de Geografia, Universidade Federal Fluminense, Brasil


**Bolsista do PIBIC ENSINO MÉDIO, Escola Estadual Professor Teófilo Moreira da Costa, Brasil (Autora
Correspondente)
***Departamento de Geografia, Universidade Federal Fluminense, Brasil (Professora orientadora)

1. INTRODUÇÃO
O termo quintalcarrega consigo diferentes significados e pode se apresentar de diferentes
formas sobre o espaço. Segundo Holthe (2003), nas obras do século XIX, a palavra era utilizada
para conceituar as áreas não edificadas. Nesse período, os jardins substituíam os quintais, o que não
significava a sua inexistência, ou tenham sofrido alguma transformação social.
De forma sistemática, o quintal pode ser descrito como um espaçoque se encontra externo à
casa e que pertence à propriedade. A partir de diferentes funcionalidades, ele pode servir como área
de lazer, área de produção de jardins, hortas, criações de animais e pomares, área de rituais e área de
convívio social (HOLTHE, 2003).
Por longos anos, os quintais foram zonas de serviços das casas, onde os escravos
cozinhavam, lavavam as roupas e os utensílios domésticos dos seus senhores. Considerado como
espaço fundamental para o desempenho dessas tarefas, a área ainda tinha que possuir um acesso
facilitado, que permitisse o contínuo fluxo: entrada e saída – de escravos e empregados, ao
executarem as suas tarefas sem perturbar a tranquilidade dos moradores (HOLTHE, 2003).
No entanto, tinham uma grande importância na dimensão econômica, visto que oferecia uma
série de possibilidades para ganhar lucro. Ainda no século XIX, Holthe (2003) afirma que pelas
condições naturais do clima, pelo pouco acesso aos alimentos, por falta de poder aquisitivo e pela
dificuldade de armazenar certos alimentos, o cultivo de hortas em seus quintais era privilégio de
poucos. Esse cenário trazia como consequência o contínuo contato dos moradores com os
comerciantes locais, submetendo-se às suas políticas sempre –favoráveis e justas – de fixação dos
preços dos principais artigos consumidos. As flores cultivadas nos jardins também eram
encaminhadas para o comércio com destinos às procissões religiosas, celebrações e velórios.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A sua principal característica era de execução de funções sociais (alimentícias, medicinais,


ritualísticas, de encontros e sociabilidade) e ambientais (manejos sustentáveis, culturas sem adição
agrotóxicos, preservação de grande diversidade de espécies), além de contribuírem para o
desenvolvimento de saberes, sustentabilidade, segurança e soberania alimentar (SERAFIM, 2018).
Para a compreensão da importância dos quintais frente às políticas da expansão urbana o
recorte geográfico de estudos é a Comunidade Quilombola Cafundá-Astrogilda. Localizada no
Bairro de Vargem Grande, na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, onde dados estão sendo
levantados a partir das visitas em campo afim de entender e problematizar de que forma a
urbanização se reflete e age nesses quintais quilombolas.
Em diálogo com o Trabalho de Conclusão de Curso construído pela autora Serafim (2018),
dados estão sendo levantados para ser construído um quadro comparativo, com intuito de analisar
os avanços e/ou regressões nessa área de estudo.
O presente trabalho considera a relação que os moradores possuem com as plantações dos
seus quintais, e apresenta como objetivo geral identificar as espécies existentes nas áreas nos
quintais, suas formas de consumo, os manejos e saberes que os moradores possuem com as suas
plantas, além de buscar analisar as categorias etnobotânicas e a importância do seu cultivo para
alimentação dos moradores da área das Vargens.
A partir do projeto do Vetor Oeste esta área de estudo recebe instalações e empreendimentos
que não consideram o modo de vida local da comunidade e contrariam as dinâmicas do ecossistema.
Dessa forma, a ruptura cultural, a retirada de populações locais e a perda da biodiversidade são
umas das ações que estão por trás das publicidades de empreendimentos imobiliários, que trazem
utilização da natureza como forma para obter lucro.
A presente análise direciona para diferentes discussões que vão desde a escala do corpo à
escala da cidade. Na escala do corpo, o quintal tem a capacidade de beneficiar a saúde de seus
cuidadores ao contribuir com uma atividade de status terapêutico, no qual é possível entrar em
contato direto com a terra, com os ritmos da natureza, trazendo bem estar e sanidade mental
(SERAFIM, 2018).
Diante da frequência de visita às residências dos moradores do Quilombo, das conversas
feitas com os moradores, fica claro entender o quanto o quintal tem uma grande importância na vida
deles, pois é dali que saem os seus alimentos, o remédio para a família e vizinhos e, mais ainda, é
dali que “nasce” o “antídoto” que traz a paz, reequilíbrio emocional e autoestima para as mulheres,
as que mais ganham destaque como protagonistas que cuidam dos quintais.
Este trabalho faz parte do projeto de extensão do Departamento de Geografia da UFF “Meu
quintal é maior do que o Mundo”, ao qual se integra o projeto de Iniciação Científica, em
desenvolvimento, da primeira autora - PROJETO IC/FAPERJ) -e o projeto PIBIC/EM com as
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bolsistas da Escola Professor Teófilo Moreira da Costa Maria Vitória Fernandes Barbosa e Yasmin
Alves Melo, ambas participam como pesquisadoras de uma das etapas desse estudo, que consiste
em analisar as categorias de uso etnobotânicodas espécies presentes nos quintais quilombolas da
área das Vargens (Vargem Grande, Vargem Pequena, Camorim e Recreio).

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para elaborar a pesquisa em tela, foram entrevistadas 48 moradores e/ou quilombolas de
Vargem Grande e Vargem Pequena, Zona Oeste do município do Rio de Janeiro. O questionário
contendo 16 perguntas foi aplicado pelas pesquisadoras do Ensino Médio.
No quilombo Cafundá-Astrogilda a coleta dos dados contou com 4 visitas até o momento.
Dependendo do tamanho do quintal, das quantidades de espécies e das condições de tempo, estas
visitas se estendiam para duas ou mais vezes.
Nas visitas as pesquisadoras foram recebidas pelas moradoras quilombolas, que com doces e
salgados preparados por elas, davam boas-vindas com a presença das pesquisadores. Em alguns
momentos, elas eram abordadas de surpresa e paravam as suas ações para nos atender. Era nítido
nos olhos de cada pessoa o prazer de poder falar sobre a sua relação com o quintal, sobre a sua
história naquele local e sobre a importância que há na sua vida.
Para a coleta dos dados, foi utilizada a técnica “bola de neve”, uma abordagem proposta por
Bayley (1994) – presente em Guarim Neto (2008). Esse procedimento consiste em uma pessoa, que
possui uma grande influência na comunidade, indicar a próxima pessoa considerada como
informante-chave a ser a próxima informante e assim por diante. Este procedimento considera a
existência de ligação entre essas pessoas e isso faz com que o questionário e as visitas alcancem
diversos indivíduos assim como os seus quintais. Neste caso a presidenta do Quilombo, Sra. Maria
Lúcia dos Santos Mesquita, foi a principal informante.
O segundo procedimento consistiu na aplicação de 50 questionários em 2 turmas de Ensino
Médio na Escola Estadual Prof. Teófilo Moreira da Costa, com o apoio da professora de biologia
Fátima Sampaio de Carvalho Pego. O questionário aplicado permitiu caracterizar os tipos de
espécies de plantas existentes nos quintais e o perfil socioeconômico, baseado nas categorias e
terminologias definidas pelo IBGE (2010) adaptado, a saber: faixa salarial, faixa etária, gênero, cor
ou raça1, escolaridade e número de moradores que vivem no local.
Para registrar as informações foram utilizadas câmeras fotográficas, gravador de
smartphone, observação direta e cadernos de campo para as anotações foram empregados.

1
Terminologia adotada conforme IBGE, 2010 e consiste na autodeclaração do informante:
https://censo2010.ibge.gov.br/images/pdf/censo2010/questionarios/questionario_basico_cd2010.pdf
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Gráficos e tabelas foram feitos a partir do programa Excel, versão 2007, auxiliando a análise
estatística. Antes da confecção dos gráficos, um treinamento em Excel, resultando em produção de
um tutorial de uma das pesquisadoras foi realizado para a sistematização e análise junto às bolsistas
do ensino médio.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir das entrevistas realizadas, dados preliminares foram gerados. A princípio, as
pessoas entrevistadas somaram um total de 48 (não identificadas), em que 29 se consideram
pertencentes ao gênero feminino e 19 ao gênero masculino, foi certificado que as mulheres são as
protagonistas nos cuidados dos seus quintais. A faixa etáriapredominante é de entre17 a 26 anos e a
escolaridade é de nível fundamental incompleto para 12 entrevistados e de nível superior para 4
entrevistados. A rendapredominanteé de 1 a 3 salários mínimos e a média de moradores por quintal
é de até 3 pessoas. Essa característica socioeconômica demonstra que ainda que a área se
caracterize por um processo de transformação urbana em curso, as condições vigentes se traduzem
em uma forma intermediária entre o padrão dos quintais quilombolas e as formas condominiais que
vêm sendo implantadas.
Quanto ao perfil decor ou raça1, dos 24 entrevistados, 23 se autodeclaram brancos, 23 pardos
e 2 negros. Provavelmente há neste dado uma interferência em relação ao entrevistado no que tange
à realidade da famíliaassim como fatores que afetam oauto-reconhecimento, sobretudo em relação à
população negra.
Sobre o uso do quintal, ou equivalente, 12 pessoas afirmaram ter quintal, 18 afirmaram que
não possuem quintal ou equivalentes para plantios diversos, 1 afirmou que um dia existiu um
quintal e 17 não responderam.
Os principais cultivos dos quintais são ervas e frutas, plantação de mudas e confecção de
doces. Em um desses quintais o cultivo de hortaliças para comercialização é realizado, dado similar
ao que é registrado por outros autores ((AMARAL; NETO, 2008; TROTTA et al., 2012).Segundo
um dos entrevistados, que tem como atividade a agricultura familiar orgânica, plantar e cultivar é
levar saúde para os seus clientes, nesta mesma lógica, um outro entrevistado cria animais para
serem vendidos.
Durantes as entrevistas, foram feitas algumas perguntas sobre técnicas, manejos e
conhecimentos. Com os relatos, foi possível notar que todo o conhecimento compartilhado foi
passado de geração para geração, um saber-fazer que corresponde à comunidade e à vida no
“mato”.

1
Conforme https://censo2010.ibge.gov.br/images/pdf/censo2010/questionarios/questionario_basico_cd2010.pdf
519
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Apesar das mulheres cuidarem do seu quintal, elas também cuidam da sua casa e possuem
uma outra atividade principal, como cozinheira, vendedora, entre outras.
Foi observado que a relação dessas mulheres com o seu respectivo quintal está para além de
cuidar. É neste local que elas se distraem ao conversarem com a planta, se refrigeram diante de
tantas demandas que as deixam atarefadas. Durantes às idas de campo é notório que com uma flor
que nasce, um fruto e/ou uma fruta que cai eram sinônimos de um sorriso e alegria. Pois elas sabem
que ali nascem o remédio e o alimento para os seus e, em muitas vezes, a cura para o seu
reequilíbrio emocional. Segundo o relato de uma entrevistada, que outrora foi vítima de violência
doméstica e carrega em um dos seus olhos uma marca deixada pela última agressão feita pelo seu
ex-marido, e hoje ela vive com seus 7 filhos, ouvir as águas, lidar com as suas plantas e com
animais é o mesmo que viver no paraíso. É se sentir um passarinho fora da gaiola. É se sentir feliz
consigo mesma.
Em relação às plantas, verificou-se um total de 53 espécies nos quintais, sendo 38
comestíveis e 15 ornamentais
Vale ressaltar que esses resultados são frutos de dados preliminares e que ainda se
encontram em análise. Mesmo assim, é possível levantar algumas discussões enquanto o perfil
socioeconômico e das espécies utilizadas.

4. CONCLUSÃO
A presente pesquisa encontra-se em andamento para as devidas finalizações. Porém, através
dos dados já obtidos foi possível compreender a importância dos quintais para as famílias
quilombolas, no que se refere à alimentação, remédios naturais e até rendimento financeiro.
Torna-se visível a satisfação dos moradores em possuir uma área exclusiva para seu plantio,
confecção de roupas e acessórios, além de fabricação de doces e comidas típicas do senso comum
das suas diversas culturas.
O estudo demonstra relevância no que diz respeito à compreensão de outros saberes por
meio de culturas distintas implantadas pelos seus ancestrais, visto que foram diversos objetos que
apresentam estranheza para a sociedade contemporânea como, fogão à lenha, pilões, jiraus, entre
outros que poderão servir como assuntos para futuras pesquisas.

5. AGRADECIMENTOS
Ao CNPq pela concessão da bolsa PIBIC e ao apoio do Quilombo Cafundá-Astrogilda e à
equipe da Escola Estadual Prof. Teófilo Moreira da Costa, principalmente do diretor Prof. Carlos
Motta e professores Fátima Pego e Júlio Dória.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6. REFERÊNCIA
AMARAL, C. N.; NETO, G. G. Os quintais como espaços de conservação e cultivo de
alimentos: um estudo na cidade de rosário oeste (Mato Grosso, Brasil). Boletim do Museu
Paraense Emílio Goeldi Ciências Humanas, SciELO Brasil, v. 3, n. 3, p. 329–341, 2008.

GUARIM, G. N. Os quintais como espaços de conservação e cultivo de alimentos: um estudo


na cidade de Rosário Oeste (Mato Grosso, Brasil). Ciências Humanas, Belém, v3, n3, p. 329-
341, set. dez, 2008.

HOLTHE, J. M. O. V. Quintais urbanos de salvador. Realidades, usos e vivências no século, v.


19, p. 257, 2002.

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2010


https://censo2010.ibge.gov.br/images/pdf/censo2010/questionarios/questionario_basico_cd2010.pdf
. Consultado em 03/03/2019.

SERAFIM, L. A. R. Quintais Quilombolas e a Soberania Alimentar: Espaços Produtivos


Familiares no Contexto da Expansão Urbana no Rio de Janeiro. 2018. 62 f. Trabalho de
Conclusão de Curso. Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2018.

TROTTA, J. et al. Análise do conhecimento e uso popular de plantas de quintais urbanos no


estado de São Paulo, Brasil. Revista de estudos ambientais, v. 14, n. 3, p. 17–34, 2012.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PROJETO “FAVELA-PARQUE”: PROCESSOS PARTICIPATIVOS PARA A


INCLUSÃO SOCIAL NO PARQUE NACIONAL DA TIJUCA
Gustavo Mendes de Melo*, Marcio Lima Ranauro**, Marta de Azevedo Irving*

*Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, EstratégiasDesenvolvimento/Instituto de Economia. Programa de


Pós-Graduação em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social (EICOS)/
Instituto de Psicologia - Governança, Ambiente, Políticas Públicas, Inclusão e Sustentabilidade (GAPIS*/ **)

1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho apresenta alguns dos resultados do Projeto Processos para a Inclusão
Social no Parque Nacional da Tijuca, ou, como é mais conhecido, “Favela-Parque”, desenvolvido
ao longo de 2018em parceria entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro e o Parque Nacional
da Tijuca/ICMBio, tendo como objetivos a elaboração de um Diagnóstico Socioambiental
Participativo das favelas do Cerro-Corá, Guararapes, Vila Cândido e Prazeres, como atividade
base para a construção subsequente do Programade Educação Socioambiental do Parque Nacional
da Tijuca para estas favelas, localizadas no entorno do parque, na cidade do Rio de Janeiro.
O Parque Nacional da Tijuca foi criado pelo Decreto nº 50.923 de 06 de julho de 1961 e está
localizado na cidade do Rio de Janeiro. O parque envolve aproximadamente 3.958 hectares e, além
da sua exuberante fauna e flora, abriga em seu entorno diversas comunidades de baixa renda que se
autodenominam como favelas, entre elas, as do Guararapes, Cerro-Corá, Vila Cândido e Prazeres,
áreas focais do projeto.
Segundo o IBGE, em 2010, essas as quatro favelas juntas abrigam um total de 4.941
moradore. As favelas Morro dos Prazeres e Vila Cândido são aquelas que apresentam a maior
população, com 2.136 e 1.424 respectivamente, seguidas pelo Cerro-Corá (708 habitantes) e
Guararapes (673 habitantes).
Neste contexto, pensar a sociedade a partir de uma ética orientada pela democratização das
oportunidades e justiça social representa um compromisso essencial no plano de políticas públicas
de gestão das áreas protegidas, especialmente, no caso brasileiro confrontado a um grave passivo de
exclusão social.
Esse movimento se justifica, ainda mais, no contexto da liderança do país em termos de
megadiversidade biológica, uma condição ímpar que se expressa como um diferencial estratégico
para o desenvolvimento, a médio e longo prazo, orientado por diretrizes que tenham como
compromisso central a proteção da natureza, a participação e a inclusão social dos diversos grupos,
conforme debatido por Irving (2018).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Assim, um dos principais desafios no plano de gestão de áreas protegidas é como


transformar o debate teórico envolvido no compromisso de um processo participativo qualificado na
gestão das unidades de conservação em propostas consistentes, capazes de orientar ações cotidianas
neste sentido.
Segundo Irving (2018), o compromisso de participação social deve ter seu alicerce na
premissa de exercício da cidadania e no reconhecimento das diferenças em uma sociedade plural e
em transformação. Este constitui, portanto, um desafio estratégico na gestão das unidades de
conservação, o que implica a construção de uma proposta de planejamento compartilhado,
envolvendo os atores da gestão pública e os representantes dos diferentes grupos sociais no
território de influência da unidade de conservação.
Segundo Dallari (1983), a participação social qualificada acontece, de fato, quando se
trabalha em conjunto, por um objetivo comum, em uma dinâmica permanente de aquisição de
conhecimento e aprendizagem. Esse movimento, segundo Irving (2018), está associado à ideia de
que, exercida de forma qualificada, a participação social constitui elemento-chave na produção de
novos conhecimentos e no reconhecimento das necessidades essenciais dos grupos sociais
envolvidos para a transformação da realidade.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Na pesquisa qualitativa, a principal preocupação é a compreensão de um grupo social e as
dinâmicas a ele associadas, considerando as nuances socioeconômicas e culturais envolvidas. Com
essa orientação, o presente trabalho foi desenvolvido em sete etapas, brevementeresumidas a seguir.
A primeira atividade consistiu no levantamento bibliográfico, documental e de dados
secundáriossobre o Parque Nacional da Tijuca e sobre as favelas localizadas no seu entorno.A
segunda etapa foi de seleção e capacitação dos Pesquisadores Comunitários (universitários
moradores das 4 favelas), sendo realizados diversos eventos de formação e capacitação sobre o
tema da pesquisa.
Na etapa seguinte foram elaborados e aplicados questionários dirigidos aos moradores das
favelas envolvidas, sendo aplicados 168 questionários dirigidos aos moradores das favelas
envolvidas (37 Cerro-Corá, 32 Guararapes, 31 Vila Cândido e 68 Prazeres), para o mapeamento e a
análise do perfil socioeconômico e interpretação do modo de relação dessas comunidades com a
gestão do Parque Nacional da Tijuca. A quarta etapa consistiu na aplicação de questionários
dirigidos às lideranças das Organizações Comunitárias, sendo aplicados 32 questionários junto às
organizações comunitárias locais.
Na quinta etapa foram realizadas Oficinas com base em Grupos Focais, dirigidas às
lideranças e aos moradores das favelas, sendo realizadas 17 oficinas com o objetivo de se buscar
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

conhecer a dinâmica das organizações e dos coletivos locais.ATabela 1, a seguir, busca sistematizar
as atividades relacionadas às oficinas dirigidas aos Grupos Focais.
Tabela 1 - Grupos Focais realizados com Segmentes Sociais das Favelas
Favela Segmentos envolvidos
Levante Popular da Juventude; Coletivo Cerro Corá
Moradores em Movimento
Senhoras do Cerro Corá
Cerro - Corá
Coletivo Cerro Corá Moradores em Movimento
Grupo de Igrejas
Alunos Pré-Vestibular Comunitário
Capoeira
Guararapes e Anfitriões do Cosme Velho
Vila Cândido Aventureiros e Desbravadores, Igreja Adventista
Promundo
PROA
Pólen; SAMP; Black Santa; PROA; Instituto Precisa
Prazeres Ser/Vai Na Web; FIRJAN/SSESI Cidadania;
UBUNTU; CFA
Mães do Casarão

As oficinas com base em Grupos Focais envolveram 77 pessoas e, durante o processo, foram
elaboradas 51 propostas de pré-projetos e ações entendidas como essenciais para serem
implementadas nas favelas.
Na sexta etapa foram realizadas Oficinas Participativas nas Favelas,visando mobilizar e
discutir com os moradores as impressões sobre a dinâmica de suas próprias comunidades. Nessa
etapa, 112 moradores participaram das oficinas e, a partir delas, foram qualificadas 68 propostas de
pré-projetos e ações para orientar as estratégias futuras de ação comunitária.O quadro 2, a seguir,
busca sistematizar a dinâmica e os resultados de pré-projetos decorrentes das Oficinas
Participativas.

Quadro 2 - Sistematização das Oficinas Participativas


Nº de Pré-Projetos
Favela Data e Local
Participantes Elaborados
16 de junho –
Cerro Corá Quadra de 41 20
Esportes
23 de junho –
Guararapes e
Salão de Festas 34 31
Vila Cândido
Laje do Careca
9 de junho –
Prazeres Casarão dos 37 17
Prazeres
Total 112 68
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Como a sétima e última etapa do projeto foi realizada uma Conferência do Projeto Favela-
Parque, envolvendo cerca de 80 moradores das favelas, na sede do Parque Nacional da Tijuca e, na
ocasião, todos os participantes puderam debate e contribuir para a versão final dos documentos
mencionados.

3. RESULTADOS
Os principais resultados do Diagnóstico Socioambiental Participativo das favelas do
Guararapes, Cerro-Corá, Vila Cândido e Prazeres podem ser sintetizados a seguir em: a) população
de baixa renda, sendo as áreas estudadas caracterizadas por populações de baixa renda e com
limitado acesso a diversos serviços públicos ou a programas que gerem oportunidades de trabalho e
renda; b) juventude como o grupo mais vulnerável, já que os jovens representam o grupo mais
vulnerável em todas as favelas estudadas; c) planejamento territorial precário nas favelas, o que está
associado a diversos problemas como a sobrecarga de demanda se serviços públicos; d) resíduos
sólidos como um problema ambiental prioritário, já que todas as favelas pesquisadas apresentam
graves problemas relacionados ao descarte e à destinação de resíduos sólidos; e) protagonismo local
em demandas comunitárias, pois em todas as favelas há grupos, coletivos e organizações que
desenvolvem práticas que visam dar respostas aos problemas locais; f) limitado nível de
institucionalização, já que o movimento de coletivos na realização de práticas e projetos sociais
para o desenvolvimento comunitário é ainda limitado também pela condição de restrito nível de
institucionalização dos grupos locais, e; no contexto da interação com o parque nacional da tijuca as
lideranças comunitárias, organizações e moradores locais expressam um claro desejo de maior
aproximação com a gestão do parque para as ações de desenvolvimento comunitário.
Já os principais resultados em relação ao Programa de Educação Socioambiental do Parque
Nacional da Tijucaapontam para a importância do apoio ao desenvolvimento local sustentável das
favelas Guararapes, Cerro-Corá, Vila Cândido e Prazeres, fortalecendo as organizações
comunitárias, o protagonismo social, e as ações dirigidas à geração de renda, saúde, educação,
cultura, além de iniciativas ambientais engajadas, por meio de projetos voltados ao compromisso de
transformação social, frente ao reconhecimento das vulnerabilidades socioambientais, dos objetivos
de gestão do Parque Nacional da Tijuca e dos compromissos de conservação da biodiversidade.
Para tal, oPrograma estabeleceu, de forma participativa, as diretrizes de:a) investimento na
coletividade; b) fortalecimento das organizações comunitárias; c) fomento à qualidade de vida; d)
desenvolvimento local sustentável; e) apoio às ações de educação socioambiental, e; f)
transparência na aplicação dos recursos

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
Diante dos inúmeros desafios para a gestão participativa de unidades de conservação, a
inovação deste Programa se expressa na forma através da qual se pensou a sua implementação,
projetando-se, para tal, uma dinâmica na qual as favelas não sejam apenas beneficiárias, mas sim
protagonistas e responsáveis pela implementação das ações previstas, em todas as etapas.
É neste ambiente de busca por cooperação e construção de laços de confiança que a lógica
de implementação do Programa foi concebida, esse entendido não como uma ação “para as
comunidades”, mas sim “com as comunidades”. Essa escolha buscou valorizar o “saber fazer” das
favelas, partindo do pressuposto de que os processos de conservação da biodiversidade podem e
devem estar cada vez mais alinhados às demandas e percepções das comunidades que vivem no
entorno das unidades de conservação.
Essa experiência de construção participativa do Programa de Educação Socioambiental do
Parque Nacional da Tijuca pode ser entendida, também, como uma importante lição apreendida,
tanto para a academia quanto para a gestão pública em termos de ações dirigidas à proteção da
natureza. Isso porque o resultado obtido só foi possível a partir de muitos anos de diálogo e
construção de laços de confiança entre todas as partes envolvidas frente aos inúmeros conflitos, que
caracterizam a dinâmica de implementação da unidade de conservação. Por essa razão, essa
experiência, que culminou em um importante pacto social, representa, a médio e longo prazos, uma
inspiração para o processo de gestão de outras unidades de conservação no país.

4. AGRADECIMENTOS
Ao Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento, do
Instituto de Economia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, à equipe do Parque Nacional da
Tijuca, à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e ao Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), aos membros da equipe
supervisora do projeto e do Conselho do Parque Nacional da Tijuca/ICMBio, à Concessionária
Trem do Corcovado Ltda, e nossos agradecimentos especiais às lideranças e aos moradores das
favelas Guararapes, Cerro-Corá, Vila Cândido e Prazeres.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Lei n° 9.985, de 18 de julho
de 2000 e Decreto 4.340, 2002. Brasília: MMA, 2000.

BRASIL. Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002 que regulamenta os artigos da Lei nº 9.985,
de 18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências. Brasília, 2002.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

DALLARI, D. A., 1983. Elementos da Teoria Geral do Estado. São Paulo: EditoraSaraiva.

IBGE. www.ibge.gov.br <consultado em 12/03/2019.

IRVING, M.A. ; AZEVEDO, J; LIMA, M.G. (Orgs. ). Turismo:ressignificando sustentabilidade.


Rio de Janeiro: Folio Digital, 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

AVALIAÇÃO DOS IMPACTOS AMBIENTAIS DA BR-163 EM ÁREAS


PROTEGIDAS: ESTUDO DE CASO DA FLONA DO TAPAJÓS
Letícia Alves de Araújo*. Diego Freitas Rodrigues**. Janaína AccordiJunkes***.

Engenheira Ambiental pelo UNIT/AL, mestranda no Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Tecnologias e


Políticas Públicas (SOTEPP-UNIT/AL). * (Autor Correspondente)
Doutor em Ciência Política, pesquisador do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP) e professor do Programa de Pós-
Graduação em Sociedade, Tecnologias e Políticas Públicas (SOTEPP-UNIT/AL). ** (Professor Orientador)
Doutora em Ciência dos Materiais, pesquisadora do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP) e professora do Programa
de Pós-Graduação em Sociedade, Tecnologias e Políticas Públicas (SOTEPP-UNIT/AL). *** (Professora
Coorientadora)

1. INTRODUÇÃO
A pavimentação e a construção de estradas consistem no principal determinante dos futuros
padrões de desmatamento da Amazônia. Comparando os corpos hídricos e as rodovias como meio
de transporte, ambos têm potencial expressivo para expandir o desflorestamento, porém, as rodovias
são mais efetivas, permitem um fluxo maior e tornam mais rápido o transporte de material, cargas e
pessoas, que são responsáveis pelo surgimento de ramais, povoamentos e exploração dos recursos
naturais (RODRIGUES & PINHEIRO, 2011; FEARNSIDE, 2005; SOARES-FILHO et al, 2005).
A construção dessas rodovias no bioma amazônico veio a ocorrer a partir de 1950, com a
abertura da ligação Brasília-Belém e Brasília-Acre, e posteriormente, a partir de 1969, no governo
militar, onde ocorreu a abertura de diversas outras rodovias e consolidação das rodovias já
instaladas, como o caso da BR-163. (NETO & NOGUEIRA, 2017).
De acordo com o ICMBio (2010), desde o asfaltamento da BR-163 houve um aumento de
500% do desmatamento nessa região.Pfaff (et. al, 2010) cita que este acesso gerado pelas estradas
reduz e fragmenta habitats, degrada corpos hídricos, fomenta a propagação de espécies exóticas
invasivas e pode causar mudança do microclima da região.
Com isso, o objetivo do presente trabalho é identificar quais são os impactos ambientais
mais significativos oriundos da BR-163 na Floresta Nacional do Tapajós (PA), a partir da análise do
Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).

2. METODOLOGIA
“Quais são os impactos significativos observados no interior e na área de influência da
Floresta Nacional do Tapajós, gerados pela BR-163?” Para responder à pergunta de pesquisa optou-
se pela realização de uma pesquisa descritiva-exploratória na Floresta Nacional do Tapajós e na
BR-163 a partir de um estudo de caso, pois trata-se de “uma investigação cuja finalidade é
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

descrever e analisar acontecimentos, agentes e situações complexas, com dimensões variáveis em


interconexão” (ALMEIDA, 2016, p. 61).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Analisando o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) da BR-163, o Plano de Manejo da
Floresta Nacional do Tapajós (PA) e a partir de informações obtidas pelo trabalho de campo, foi
possível identificar impactos bióticos e físicos discutidos abaixo.
No meio físico, foram identificados os seguintes impactos: a) Intensificação dos processos
erosivos; b) Aumento de ruídos; c) Aumento na dispersão de poluentes e Alteração na Qualidade do
Ar.
A intensificação dos processos erosivos é um impacto que afeta diretamente o solo da região
principalmente nas margens da rodovia (figura 1). É um impacto preocupante pois o avanço da
erosão pode originar as ravinas e voçorocas na estrada. Já o aumento de ruídos ocorre devido ao
aumento do tráfego na região e é uma das principais causas do afugentamento de fauna. Segundo
Forman e Alexander (1998 apud DA ROSA, 2012) os ruídos provenientes de fontes antrópicas
podem causar efeitos tanto fisiologicamente (ex. aumento dos níveis de hormônios de stress), como
no comportamento (ex. interferência da comunicação).

Figura 1– Processo erosivo encontrado nas margens da BR-163.

Fonte: Autores (2018).

Por fim, foi identificado o aumento na dispersão de poluentes e alteração na qualidade do ar,
impactos que são interligados. A dispersão de poluentes se dá pelo aumento de emissões
atmosféricas oriunda dos veículos que passam pela rodovia, na qual, pode alterar a qualidade do ar
da região.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

No meio biótico, foram observados os seguintes impactos: a) Aumento no comércio de


animais silvestres; b) Atropelamento de animais; c) Extração ilegal de madeira; d) Proliferação de
vetores; f) Afugentamento de fauna; g) Perda e fragmentação de vegetação; h) Risco de extinção de
espécies; i) Aumento no risco de queimadas acidentais.
A partir da melhoria da trafegabilidade da BR-163 têm-se a atração de pessoas, que
consequentemente facilita o acesso à floresta. Com isso, espera-se o aumento do comércio de
animais silvestres e a extração ilegal de madeira (figura 2).

Figura 2 - Apreensão de madeira extraída irregularmente da Flona do Tapajós.

Fonte: Autores (2018).

O aumento do comércio de animais silvestres é oriundo dessa facilidade citada


anteriormente, visto que antes da pavimentação, a BR-163 ficava intrafegável em períodos
chuvosos. O mesmo ocorre com a extração ilegal de madeira, pois a partir da pavimentação da
estrada, induz a criação de estradas não oficiais, e aumenta o desmatamento em formado “espinha
de peixe”, clássico da exploração madeireira.
Com o tempo mais seco, as queimadas nas margens da BR-163 são mais frequentes. Nas
margens da rodovia é possível identificar diversos pontos, tanto de queimadas recentes (figura 3),
quanto de floresta queimada em processo de regeneração.
As queimadas acidentais associam-se com outros impactos identificados, como:
afugentamento de fauna, perda da biodiversidade, alteração na qualidade do ar, aumento no risco de
extinção de espécies e aumento na incidência de doenças respiratórias.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 3 - Queimada dentro da Floresta Nacional do Tapajós.

Fonte: Autores (2018).

Além desses impactos, destaca-se o atropelamento de fauna, principalmente de pequenos


vertebrados como aves, anfíbios, entre outros. Porém os grandes vertebrados não escapam, como o
caso das Antas (Tapirus terrestres), que foram encontradas 16 atropeladas entre 2015 e 2017
(FREITAS et. al 2017).
A proliferação de vetores também é o impacto significativo, pois com o aumento do tráfego,
assim como a construção desordenada de assentamentos nas margens da rodovia, tende-se a
aumentar o número de vetores relacionados com a ausência de saneamento e descarte inadequado
de resíduos sólidos.
Como citado anteriormente, o aumento de ruídos causa afugentamento de fauna, ou seja, o
impacto físico desencadeia um impacto biótico. Esse afugentamento também pode ser causado
pelas queimadas, onde o animal procura escapar do fogo. Com isso, todos esses impactos
relacionados a fauna citados anteriormente podem causar e/ou corroborar para a extinção de
espécies.
Por fim, a supressão vegetal pode ser considerada o maior impacto oriundo da pavimentação
da BR-163, pois essa supressão pode desencadear diversos impactos que põem em risco a
biodiversidade da Floresta Nacional do Tapajós. Nas margens da rodovia é possível perceber que a
antropização afeta diretamente a floresta, visto que é perceptível o efeito de borda induzido pela
estrada.
Vale ressaltar que nas margens da BR-163 a vegetação encontra-se em um estágio de
regeneração, devido à alta pressão antrópica encontrada. Mesmo em locais onde não houve casos de
queimadas, a vegetação só consegue desempenhar seu papel ecossistêmico à medida que ela se
afasta da AID.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
A Floresta Nacional do Tapajós (PA) é uma unidade de conservação de uso sustentável que,
assim como as outras que compõem o cinturão de conservação da BR-163, tem um papel
fundamental na conservação da biodiversidade local.
A BR-163 precisa ser encarada como um potencial gerador de impactos, tanto positivos,
como negativos, e são necessárias diversas políticas públicas e estudos para mitigar os danos
causados pela sua construção e pavimentação.
A partir deste trabalho, foi possível constatar que: (1) A rodovia causa diversos impactos
significativos, porém, do ponto de vista biótico e antrópico, os impactos são predominantemente
negativos; (2) A Flona do Tapajós desempenha um papel crucial para evitar a propagação de
impactos, porém, são necessárias maiores fiscalizações e monitoramentos; (3) A BR-163 constitui
um dos principais vetores de pressão e ameaça na AP.

5. AGRADECIMENTOS
Agradeço à CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pela
concessão da bolsa neste período de mestrado, ao ICMBIO e à Flona do Tapajós pela autorização
de pesquisa.

6. REFERENCIAS
ALMEIDA, R. de.Estudo de caso: foco temático e diversidade metodológica. In Métodos de
pesquisa em Ciências Sociais: Bloco Qualitativo. Sesc São Paulo/CEBRAP. São Paulo, 2016

DA ROSA, C. A. Efeito de borda de rodovias em pequenos mamíferos de fragmentos florestais


tropicais.2012. 90 fl. Dissertação (Mestrado em Ecologia e Conservação de Recursos em Paisagens
Fragmentadas e Agrossistemas) – Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas,
Universidade Federal de Lavras, Lavras, 2012.

FEARNSIDE, P. M. Desmatamento na Amazônia brasileira: história, índices e


conseqüências. Megadiversidade, v. 1, n. 1, p. 113-123, 2005.

FREITAS, M. A. de et. al. Roadkill records of Lowland Tapir Tapirusterrestris(Mammalia:


Perissodactyla: Tapiridae) between kilometers 06 and 76 of highway BR-163, state of Pará,
Brazil. JournalofThreatened Taxa9(11): 10948–10952;

ICMBIO. A FLORESTA NACIONAL DO TAPAJÓS. (2010). Disponível


em:<http://www.icmbio.gov.br/flonatapajos/> Acesso em 05 de jul. 2019.

NETO, T. O.; NOGUEIRA, R. J. B. Rodovias na Amazônia Brasileira. Manaus:_____, 2017


PFAFF, A. et al. Roads impacts in Brazilian Amazonia. In: In: Amazonia and global change.
Washington: American Geography Union, 2009.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

RODRIGUES, E. P; PINHEIRO, E da S. O desflorestamento ao longo da rodovia BR-174


(Manaus/AM - Boa Vista/RR). Soc. nat., Uberlândia , v. 23, n. 3, p. 513-528, Dez. 2011

SOARES-FILHO, B. S. et al . Cenários de desmatamento para a Amazônia. Estud. av., São Paulo,


v. 19, n. 54, p. 137-152, Aug. 2005.

533
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

MAPEAMENTO DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DA APA ESTUARINA


DO RIO PARATIBE COMO SUBSÍDIO À SUA DEMARCAÇÃO E
CONSERVAÇÃO
MAPPING OF USE AND OCCUPATION OF THE SOIL OF THE APA ESTUARINE OF THE
PARATIBE RIVER AS AN AID TO ITS DEMARCATION AND CONSERVATION

Julio César da Silva*, Victor Leonardo Silva, Sunamita Iris Rodrigues Borges da Costa**

*Departamento de Ciências Geográficas, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de


Pernambuco, Brasil
**Doutora em Geografia, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil

1. INTRODUÇÃO
Regulamentado no ano de 2000, por meio da lei Nº 9.985, o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza (SNUC) objetiva dar proteção a áreas com atributos naturais de valor
especial no Brasil. Nesse sentido, as Unidades de Conservação (UCs) constituem-se numa
denominação conferida aos territórios legalmente instituídos pelo poder público sujeitos à
administração concentrada e à aplicação de leis específicas que estabelecem as normativas visando
à manutenção da biodiversidade, a gestão da ocupação humana, bem como assegurar a continuidade
dos recursos naturais (BRASIL, 2000).
As UCs são compostas pelas Unidades de Proteção Integral (uso indireto) e de Uso
Sustentável (uso direto). Dentre as Unidades de Uso Sustentável, tem-se a categoria de Área de
Proteção Ambiental (APA), que propõe conciliar a conservação ambiental ao uso sustentável dos
recursos, com a permanência das ocupações humanas dentro da delimitação (NASCIMENTO &
FOLETO, 2014).
Em se tratando da esfera estadual, Pernambuco tem realizado esforços, desde o final do
século anterior, em preservar sua fauna e flora dos estuários que possuem características de
mangues. Com essas iniciativas, todas suas treze áreas estuarinas foram transformadas em APAs,
visando à sustentabilidade desses ambientes. Entretanto, nenhumas das treze APAs Estuarinas
apresentam Plano de Manejo, e três delas (Rio Paratibe, Rio Beberibe e Rio Capibaribe) ainda não
foram sequer demarcadas desde 2007, em razão da descaracterização ambiental provocada pela
especulação imobiliária (CPRH, 2014). Dentre as Áreas de Proteção Ambiental ainda pendentes de
demarcação está a APA Estuarina do Rio Paratibe, que, devido às grandes construções dos
conjuntos habitacionais da Companhia de Habitação do Brasil (COHAB), nas décadas de 1980 e
1990, sofreu forte impacto sobre sua vegetação costeira, especialmente no município de Paulista
(SILVA, 2016).

534
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Para que as Unidades de Conservação tenham uma eficácia na sua gestão ambiental, e
consequentemente, na proteção de suas áreas naturais, é necessário que se tenha um procedimento
administrativo especial e delimitação do espaço. Isso porque,a falta dessas estratégias ocasionaria a
ineficácia do papel das UCs.
A partir desse cenário de degradação ambiental, o Sistema de Informação Geográfica (SIG)
pode auxiliar no fornecimento de produtos cartográficos que subsidiem o planejamento e gestão
dessas APAs através da análise espacial, observando a situação vigente e integrando dados
temáticos para sustentar a tomada de decisão estratégica (SILVA & SILVA, 2019).
Um dos produtos cartográficos que pode contribuir para a observação da cobertura vegetal e
das interferências humanas no espaço, com o intuito de identificar as paisagens fortemente
modificadas, é o mapa de uso e ocupação do solo (NASCIMENTO & FOLETO, 2014).
Diante disso, o presente trabalho objetiva, por meio do mapeamento do uso e ocupação do
solo da APA Estuarina do Rio Paratibe, analisar a situação ambiental presente da área e, assim,
contribuir para sua conservação e planejamento, oferecendo subsídios à sua demarcação.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo selecionada localiza-se entre os municípios de Olinda e Paulista na zona
estuarina, próxima a Floresta Urbana da Mata do Janga. O local de pesquisa respeita o buffer
indicado pela Agência Estadual do Meio Ambiente (CPRH) para a sua respectiva delimitação. Para
a realização deste trabalho foram realizadas pesquisas bibliográficas, análise de foto aérea extraída
do Google Earth e a construção de um mapa síntese (software QGIS versão 3.0) do uso e ocupação
do solo da APA Estuarina do Rio Paratibe. Para isso, foram vetorizados os elementos naturais e
humanos dentro da área indicada com o objetivo de demonstrar a fisiografia do local e a pressão
antrópica presente. A caracterização fitofisionômica da restinga seguiu a proposta de Silva &Britez
(2005).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir do mapeamento da APA Estuarina do Rio Paratibe (Figura 1), ficam evidentes a
presença de dois ecossistemas: manguezal e restinga. Na estrutura do manguezal se pôde mapear
três feições: a) o Bosque de mangue caracterizado pela predominância de espécies lenhosas do
mesmo estrato, como exemplo, Rhizophoramangle L., responsável pelo sequestro do carbono,
manutenção do clima local e global, e como berçário para as espécies marinhas e de agua doce
(GASPARINETTI, et al., 2018); b) o Apicum, uma área hipersalina de transição entre outros
ecossistemas com espécies herbáceas resistentes à salinidade e com forte potencial de
armazenamento de nutrientes muito importante para a manutenção da biota costeira; c) Por fim, a
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feição Lavado correspondente a um banco de lama exposto na maré baixa (ICMBIO, 2018). Os
manguezais também são ambientes ricos em serviços ecossistêmicos de provisão, por ofertar
alimentos ricos em proteínas (caranguejo, peixes, marisco e entre outros) e madeiras resistentes para
as comunidades locais (GASPARINETTI, et al., 2018). Esses serviços de provisão são as principais
fontes de renda e sobrevivência para a população que residem próximo as APAs Estuarinas e vivem
desta atividade, por isso existe uma necessidade de conservação destas unidades, para resguardar a
biodiversidade local e garantir de forma sustentável a soberania familiar dos povos ribeirinhos. Essa
relação corresponde a um dos papéis fundamentais das APAs,no sentido de administrar a ocupação
humana e possibilitara sustentabilidade de seus recursos (NASCIMENTO & FOLETO, 2014).
Na fisionomia da restinga foram mapeadas duas características: Campo (espécies
herbáceas) bastante degradado e Floresta (espécies arbóreas) com grande predominância na Floresta
Urbana da Mata do Janga e fora de sua delimitação. As restingas ocupam no Estado de Pernambuco
apenas 5% das áreas costeiras (ZICKEL, et al., 2004), com uma flora característica de solos
arenosos e salinos. O reconhecimento dessas áreas auxilia no planejamento de conservação e
protege contra o desaparecimento total desses ambientes.

Figura 1 - Mapa de uso e ocupação do solo da APA Estuarina do Rio Paratibe. Fonte: Autores, 2019.

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Também a partir da análise do mapa de uso e ocupação do solo, foi possível observar que a
APA Estuarina do Rio Paratibese encontra bastante suprimida pela ocupação humana através dos
conjuntos habitacionais, sustentando o cenário de impacto causado pela COHAB sobre a vegetação
de Paulista (SILVA, 2016). Isso confere urgência à demanda por sua demarcação territorial para a
sua gestão e proteção, posto que, seu interior abriga ambientes naturais com valor singular,
importantes por fornecerem serviços ecossistêmicos essenciais para o funcionamento sócio-
econômico-ambiental (ICMBIO, 2018). Visto que, os ambientes costeiros são muito sensíveis à
pressão antrópica, se não forem assegurados dentro dos critérios e normas do SNUC, esses
ambientes serão rapidamente deteriorados pela ação humana (SILVA & SILVA, 2019).

4. CONCLUSÃO
A partir da observação do mapa de uso e ocupação do solo da APA Estuarina do Rio
Paratibe foi possível identificar dois ecossistemas costeiros (manguezal e restinga) e a supressão
desses ambientes provocada pela pressão antrópica, que, apesar da área indicada ter como
predominância a mancha urbana, isso não isenta a responsabilidade da CPRH em realizar a
demarcação da APA, conforme as normas do SNUC. A utilização do SIG (construção do mapa de
uso e ocupação do solo) confirmou a existência de uma área alterada antropicamente, e que, com
esses dados primários é possível fornecer informações para a aplicação de uma gestão mais
adequada e sustentável. Ademais, cabe ressaltar que através do mapeamento foi permitido analisar
que a unidade estudada apresenta ainda uma extensa área natural de valor ecológico significante, na
qual, a falta de sua demarcação somente irá intensificar a degradação ambiental resultante da
especulação imobiliária e a deficiênciade um planejamento eficiente para a sua conservação.

6. REFERÊNCIAS
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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538
GT 7
Políticas públicas, governança
ambiental e inclusão social em áreas
protegidas
Discutir os avanços, desafios e tendências das políticas públicas para as áreas
protegidas no Brasil, à luz dos compromissos assumidos pelo país no âmbito da
Convenção da Diversidade Biológica (1992) desde a sua origem até as atuais
Metas de Aichi (2015). Busca também ressaltar a importância de articulação da
política de áreas protegidas com outras políticas setoriais, inclusive aquelas
dirigidas à proteção social, e ao direito de povos e populações tradicionais. Para
tanto, parte-se do pressuposto que somente a partir de bases democráticas se
pode chegar a contextos sustentáveis de desenvolvimento. Para tanto, é
fundamental discutir o papel da participação cidadã e o compromisso de
governança democrática na gestão de áreas protegidas, a partir do
reconhecimento da importância de diferentes espaços colegiados, como é o caso
dos Conselhos Gestores de Unidades de Conservação. Outro debate necessário
nesse sentido diz respeito ao delineamento de estratégias para o maior
envolvimento da sociedade com relação à valorização do patrimônio natural e
cultural protegido, para que seja mais clara a relação dessas áreas com a
melhoria de qualidade de vida, através de atividades produtivas, inspiradas em
bases sustentáveis.

Coordenadores:
Beatriz Mesquita (FUNDAJ)
Carla Rocha (UFSC)
Grazielle Rodrigues (CEPEHC)
Henrique Kefalas (Instituto Linha Dágua)
Iara Vasco (ICMBIO)
Vanice Selva (UFPE)
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POLÍTICAS PÚBLICAS Y ESPACIOS MARINOS PETROLIZADOS:


CRÓNICA MEXICANA DE LA EXCLUSIÓN PESQUERA1

Alejandro Espinoza-Tenorio* y Dora E. Ramos-Muñoz**

*ECOSUR-Campeche. aespinoza@ecosur.mx
**ECOSUR-Villahermosa.dramos@ecosur.mx

La extracción de hidrocarburos es una de las actividades económicas marinas más


redituable. Sin embargo, el impacto de esta industria al medio ambiente marino es recurrente y,
ocasionalmente, catastrófico. Inclusive, tiene repercusiones sobre otras actividades humanas que
dependen del mismo espacio marino, como la pesca. Las pesquerías pueden ser afectadas tanto
directa: a) intoxicando a las especies sujetas a pesca y al humano que las consume, b) afectando las
artes de pesca ya sea “manchándolas” o destruyéndolas y c) interfiriendo con las actividades al
cancelarles rutas y áreas de pesca; como indirectamente al d) impactar a los recursos pesqueros por
medio de perturbaciones al ecosistema o e) crear una competencia desleal en los precios y servicios
que se brindan en zonas costeras petrolizadas.
En México existen condiciones naturales para extraer petróleo y la pesca, y ambas son
clasificadas, desde una óptica económica, como recursos comunes pertenecientes a una colectividad
(en este caso a los mexicanos). Esto significa que su uso por parte de un miembro de la comunidad
disminuye la capacidad de otros miembros de utilizarlos, y en la práctica es el Estado quien otorga
licencias de uso, puesto que estrictamente hay acceso para todos los miembros de la comunidad.
Desde de la Reforma Energética (2013), hay varios actores involucrados en el aprovechamiento del
Golfo de México, todos con el desafío de lograr un desarrollo sostenible, así que se propone
examinar la construcción del espacio compartido entre el petróleo y la pesca y analizar este caso
como un Sistema Socioambiental (SSA) acoplado; donde el espacio tridimensional (el sistema en
donde se encuentran los recursos) y el sistema de gobernanza son compartidos.

EL GOLFO DE MÉXICO
El Golfo de México es un gran mar costero semicerrado (1,623,00 km2) y compartido (EE.
UU., México y Cuba) con una gran variedad de topografía y productividad que permite una alta
diversidad biológica y de biomasa de peces, aves marinas y mamíferos marinos, aunque algunas de
estas especies en peligro de extinción local (e.g., Pristis pristis).

1
Texto apresentado pelo autor em Palestra proferida durante o IX SAPIS e IV ELAPIS.
540
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

La pesca en el Golfo de México representa alrededor del 26% de la producción nacional


(García-Cuéllar, 2006) se basa en la captura de camarones (de mayor valor económico), pulpos,
meros, cangrejos, róbalos, pargos rojos, sardinas, atunes, langostas, tiburones, salmonetes y sierras.
La flota artesanal es la de mayor número de embarcaciones (principalmente en Veracruz y
Tabasco), mientras que la flota de arrastre camaronera se concentra en los estados de Tamaulipas y
Campeche (Fig. 1). La flota escamera se ubica principalmente en Yucatán.
La industria petrolera de México no solo es un actor importante en la economía de la nación,
sino también la fuente principal de ingresos del gobierno, el 18% de los ingresos netos en 2018
(SHCP, 2019). Petróleos Mexicanos (PEMEX), que surgió de las compañías expropiadas en 1938,
es la octava compañía petrolera más grande del mundo, con operaciones totalmente integradas en
toda la cadena productiva del petróleo y gas. Si bien la producción en el mar normalmente se
considera costosa, las condiciones geológicas del Golfo de México son favorables y los costos de
extracción son bajos, por lo que actualmente más del 82% de la producción de PEMEX se realiza en
aguas poco profundas de este mar semicerrado (Statista, 2019). Específicamente, en la Sonda de
Campeche se encuentra el megaproyecto Cantarell, que data de la década de 1980, cuando las
ganancias inesperadas del primer boom petrolero permitieron a México desarrollar una
infraestructura en el mar que actualmente incluye más de 200 plataformas y 2,600 km de tuberías
submarinas (Hernández Arana, Warwick, Attrill, Rowden, & Gold-Bouchot, 2005). Sin embargo,
en 2019 México tienen una menor producción de crudo, una decreciente importancia económica de
su exportación y un incremento sustancial de las importaciones de productos petrolíferos, así que
existe un déficit de la balanza petrolera de México (Lajous, 2019).
Palacios y colaboradores (2015) reconstruyeron la dramática coexistencia de la―alguna vez
muy redituable―pesca del camarón rosado y del sector petrolero en el banco de Campeche, e
identificaron tres etapas históricas: 1) territorios en expansión (1940-1970), donde predomina la
expansión pesquera; 2) territorios en competencia (1970-2000), disminuye la actividad pesquera
(e.g., la producción del camarón cae 50% entre 1989 y 2001; García-Cuéllar, 2006) e inicia el
crecimiento de la actividad petrolera; la coexistencia fue armónica, excepto por los efectos del
derrame del Ixtoc (1979); y 3) territorio en exclusividad y disputa (2000-2013), cuando se consolidó
la hegemonía del petróleo y la casi total exclusión de la pesca. Fue así como se transitó de un
pasado armónico a un presente lleno de tensiones y con un claro ganador: el sector petrolero.

EXTRACCIÓN Y DISPOSICIÓN DEL PETRÓLEO


El petróleo, extraído de las entrañas de la tierra, se comercializa como energético y materia
prima para obtener ganancias. Dado que a la fecha es el energético más utilizado, el petróleo es una
pieza clave del capitalismo a escala global. Es geoestratégico y hay altas apuestas para garantizar su
541
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

suministro ininterrumpidos a todo el mundo. También la ubicación del petróleo es clave para el
capitalismo global y se ha documentado extensamente las relaciones sociales de poder que se
generan en torno a la extracción de petróleo y la mercantilización (Ross, 2001). Su extracción
implican una mezcla de explotación y violencia; su extracción y transferencia a gran escala
moviliza recursos energéticos y riqueza entre sitios de producción (generalmente pobres) a los de
consumo (ricos); implica acumulación en entidades globales, pero no necesariamente una
distribución equitativa de las ganancias (Rogers, 2015). El conflicto violento es a menudo el
resultado de muchas las luchas por el petróleo (Sachs & Warner, 1995).
En ese contexto descrito existe la búsqueda por reparar las injusticias percibidas e
incrustadas en la separación de aquéllos que se benefician y disfrutan de los beneficios de la
producción y la mercantilización del petróleo (la alianza transnacional de petro-estado,
multinacionales petroleras y élites gobernantes), de los otros, esos desposeídos en las comunidades
locales de debajo de cuyas tierras o aguas se extrae el petróleo. Esta tensión entre la extracción y el
progreso fue muy evidente en los años 1970-1990; pero sin duda la industria de hidrocarburos
encontró en el agua una salida para limar asperezas (Ross, 2001).
Por ello, algunos autores consideran que las plataformas petroleras son uno de los mejores
ejemplos de desterritorialización de espacios en los que el despojo no es tan evidente como en la
tierra y, más aún, allí en el mar, las compañías petroleras existen más allá del Estado (Austin et al.,
2008). No obstante, las plataformas también se generan tensiones y despojo con los pescadores.
Zalik (2009) da cuenta del proceso de cooptación que imperaba en el Golfo de México, pero que
poco a poco ha sido reemplazado por una exclusión de facto por parte de la Marina mexicana
(Ramos-Muñoz et al., 2019). Las plataformas mexicanas hoy son enclaves y mantenerlas seguras
depende en gran medida de la alianza estatal y de capital (Watts, 2004). Está bien documentado
cómo esta relación aplasta la protesta y la resistencia a las operaciones de la industria petrolera
usando la militarización, pero también como fuerzas policiales como estados subterráneos (Mason
& Michael, 2015). De esta manera, la élite gobernante que maneja PEMEX, y sus socios
transnacionales, utilizan la riqueza petrolera para reforzar el control y continúan reproduciendo la
acumulación transnacional (Khanna, 2017). Más allá de la armonía-tensión, las normas de exclusión
impuestas alrededor de las plataformas invalidan permisos previos de capturas de pescadores y los
ponen en una situación de ilegalidad (Ramos-Muñoz et al., 2019).

ADMINISTRACIÓN SECTORIAL; PETRÓLEO SIN PESCA


Las plataformas petroleras aisladas están lejos de la observación ciudadana que ocurre en
tierra, pero pueden ser fácilmente interrumpidas por actores externos. Así que en la industria se
entiende como una ventaja el aislamiento y se documenta un esfuerzo legal para generar las zonas
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de exclusión. Eso reduce la pesca cerca de las plataformas, las tuberías o los lugares de tránsito de
los buques, pero incrementa el interés del gobierno mexicano por transformar la producción
pesquera en acuacultura y sacar a los pescadores del mar (Zalik, 2013).
La acuacultura busca esa coexistencia pesca-petróleo pero tiene una limitada eficacia en
México, como sucedió con el Fondo de Reconversión Pesquera del Golfo de México
(FIFOPESCA), implementado en 2004 para aminorar los efectos de las zonas de exclusión en las
costas de Tabasco. Se documenta que gran parte de estos programas sectoriales, como el Programa
de Apoyo a la Comunidad y Medio Ambiente (PACMA), tienen problemas en su diseño, por el
escaso entendimiento de las condiciones sociales de pobreza, las estrategias de subsistencia locales
y el estado de los mercados y organizaciones de producción (Pérez- Sánchez, Muir, & Lindsay,
2000). Una consecuencia es lo que algunos autores denominan la “industria de la reclamación”; esto
es, una búsqueda de subsidios para los pescadores ante una percibida disminución por efectos de la
actividad petrolera (Liina-Maija & Nygren, 2015).
En 2014, la reforma energética emprendida en México abrió una oportunidad para que las
compañías petroleras privadas exploren, instalen y produzcan petróleo en tierras y aguas mexicanas
sin la intervención de PEMEX. Esa reforma es una respuesta jurídica para incrementar la inversión
y extracción petrolera en el Golfo, pero refleja la naturaleza multiescalar del proceso regulatorio, la
disputa territorial sobre el proyecto involucra a actores estatales en la administración federal y
diversos sectores, como los sindicatos (Rubio-Morales, 2016). Cada grupo han tomado posiciones
divergentes sobre el tema de la subcontratación a empresas extranjeras y existen amplias críticas por
contravenir la constitución mexicana que prohíbe a las empresas extranjeras participar en la
extracción directa (Puyana-Mutis, 2017). En medio de este entramado, la reactivación de la
industria petrolera genera un ambiente de optimismo, aunque a las comunidades les gustaría tener
más información; por lo que es urgenteconstruir vínculos con las comunidades para mejorar la
comunicación y tomar acuerdos con capacidad de consenso y bajo reglas claras y transparentes. Los
años por venir pondrán en entredicho el tipo de aprovechamiento para los mares mexicanos, donde
un espacio de oportunidad será documentar los desafíos del desarrollo sostenible de acuerdo con las
teorías de SSA. Este enfoque sistémico facilita la planeación estratégica y socialmente inclusiva
para consolidar la coexistencia sostenible (convivencia con menos desigualdad y una amplia
empatía) de la pesca y la extracción de petróleo y, por ende, el ordenamiento de sus mares.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

INTERFACES TERRITORIAIS E PROCESSOS DE GESTÃO EM CURSO


ENTRE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E TERRAS
INDÍGENAS:COMPONENTES DO SISTEMA ESTADUAL DE ÁREAS
NATURAIS PROTEGIDAS DO ACRE

Flávia Dinah Rodrigues de Souza*; Roberto de Alcântara Tavares**;Juliana Fortes e Silva***

* ** SEMA - Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Acre, Rua Benjamin Constant, 856 – Centro CEP. 69.900-
160 – Rio Branco – Acre – Brasil, sema@ac.gov.br
*** FUNAI/CR Alto Purus – Estrada Dias Martins, 2111-Chacaras Ipê – Rio Branco – Acre – Brasil,
funai.ac@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
O Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas -SEANP, foi criado através da Lei
Estadual nº 1.426 de 27 de dezembro de 2001, Seção II, Art. 14, sendo composto pelo conjunto de
Unidades de Conservação (UC), Estadual e Municipais. Ainda na mesma Lei, o seu Art. 15 cita que,
as UC Federal no Estado do Acre e as Terras Indígenas são reconhecidas pelo SEANP. Esta Lei traz
também uma definição do conceito de Unidade de Conservação baseado na Lei no 9.985 de 18 de
julho de 2000, Decreto no 4.340 de 22 de agosto de 2002, que dispõem sobre o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza – SNUC.
A Lei Estadual nº 2.095/2008, foi promulgada para modificar itens concernentes ao Sistema,
no que tange as competências de gestão e execução de ações nas Unidades de Conservação criadas
pelo Estado do Acre. E adiciona ao Art. 14 as áreas de: II - reservas legais das propriedades; III -
áreas de proteção permanente - APPs; e IV - pelas áreas destinadas ao manejo florestal.
Embora anteceda a Política Nacional de Áreas Protegidas - PNAP, Decreto nº 5.758, de 13
de abril de 2006, o SEANP é conceitualmente alinhado por considerar Unidade de Conservação
(federal, estadual e municipais) e Terras Indígenas, e tornar acessível às políticas, programas e
inciativas públicas desenvolvidas pelo governo estadual para esses territórios. Além dessa, a
Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas – PNGATI (Decreto 7747
de 05 de junho de 2002) também reconhece a interface de atuação da FUNAI e indígenas em
territórios sobrepostos com Unidades de Conservação demonstrando também alinhamento com o
SEANP.
Em 2019, 33,6% do território acreano é delimitado por Unidades de Conservação (UCs):
três Unidades de Conservação (UCs) de Proteção Integral (2 federais e 1 estadual), 19 UCs de Uso

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Sustentável (9 federais, 8 estaduais, 1 municipal e 1 particular) e 14,55% é destinado à 36 Terras


Indígenas utilizadas por 15 etnias de três famílias linguísticas distintas (Tabela 01, Figura 01).

Tabela 01: Áreas Naturais Protegidas no Acre. ZEE Acre, fase 02, editado.

Categorias das Aps ÁREA (ha) % DO ESTADO

I. UC de Proteção Integral

Parque Nacional da Serra do Divisor 846.633 4,77%

Estação Ecológica Rio Acre 77.500 0,51%

Parque Estadual Chandless 695.303 4,23%

Subtotal de I 1.619.436 9,86%

II. UC de Uso Sustentável

APA Igarapé São Francisco 30.004,12 0,18%

APA Lago do Amapá 13.531 0,08%

APA Raimundo Irineu Serra 909 0,01%

ARIE Seringal Nova Esperança 2.575 0,01%

ARIE Japiim Pentecoste 25.750,97 0,15%

Reserva Extrativista Alto Juruá 506.186 3,08%

Reserva Extrativista Chico Mendes 970.570 5,91%

Reserva Extrativista Alto Tarauacá 151.200 0,94%

Reserva Extrativista Cazumbá-Iracema 750.795 4,57%

Reserva Extrativista Riozinho da Liberdade 325.602 1,98%

Floresta Nacional Macauã 173.475 1,05%

Floresta Nacional Santa Rosa do Purus 230.257 1,40%

Floresta Nacional São Francisco 21.600 0,13%

Floresta estadual do Afluente do complexo do seringal Jurupari 155.121,06 0,93%

Floresta Estadual do Antimary 57.629 0,35%

Floresta Estadual Mogno 143.897 0,87%

Floresta Estadual Rio Liberdade 126.360 0,76%

Floresta Estadual Rio Gregório 216.062 1,31%

RPPN – Santuário Ecológico Amazônia Viva 38 0,00%

Subtotal de II 3.901.562,15 23,71%

TOTAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO 5.520.998,15 33,60%

III. Terras Indígenas

Manchineri do Seringal Guanabara NÃO IDENTIFICADA

Kaxinawá do Seringal Curralinho NÃO IDENTIFICADA

Kuntanawa NÃO IDENTIFICADA

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Nawa NÃO IDENTIFICADA

Jaminawa do Guajará NÃO IDENTIFICADA

Jaminawa do Rio Caeté 60.000 0,37%

Mamoadate 313.646 1,91%

Kaxinawá Nova Olinda 27.533 0,17%

Katukina/Kaxinawá 23.474 0,14%

Kaxinawá do Rio Humaitá 127.383 0,78%

Kaxinawá do Rio Jordão 87.293 0,53%

Kaxinawá do Baixo Rio Jordão 8.726 0,05%

Kaxinawá do Seringal Independência 11.584 0,07%

Igarapé do Caucho 12.317 0,08%

Kaxinawá da Colônia 27 105 0,00%

Rio Gregório 187.400 1,14%

Campinas/Katukina 32.623 0,20%

Poyanawa 24.499 0,15%

Nukini 27.263 0,17%

Kaxinawá-Ashaninka do Rio Breu 31.277 0,19%

Kampa do Rio Amônea 87.205 0,53%

Alto Rio Purus 263.129 1,60%

Riozinho do Alto Envira 260.972 1,59%

Kampa e Isolados do Rio Envira 232.795 1,42%

Jaminaua/Envira 80.618 0,49%

Kulina do Rio Envira 84.364 0,51%

Kulina do Igarapé do Pau 45.590 0,28%

Kaxinawá da Praia do Carapanã 60.698 0,37%

Kampa do Igarapé Primavera 21.987 0,13%

Arara do Igarapé Humaitá 87.571 0,53%

Jaminawa-Arara do Rio Bagé 28.926 0,18%

Jaminawa do Igarapé Preto 25.651 0,16%

III. Terras Indígenas 2.254.629,00 13,73%

TOTAL DE ÁREAS NATURAIS PROTEGIDAS 7.775.627,15 47,35%

ÁREA TOTAL DO ESTADO 16.422.136 100,00%

Essas áreas totalizam aproximadamente 7.775.627hectares (47,35% do território do estado


do Acre), com uma população estimada de 51 mil moradores e segundo dados da Unidade Central
de Geoprocessamento do Estado do Acre (UCEGEO, 2018), o desmatamento acumulado até o ano
de 2017, é de aproximadamente 308.357 ha. ou seja, cerca de 5% dessas áreas (3% Ucs e 2% TIs).

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Enfatizando os instrumentos de gestão preconizados pelo SNUC, das 22 Unidades de


Conservação, 68% possuem plano de gestão e 77% já formaram seus Conselhos Gestores. Ao
considerar as nove UCs estaduais, esses números são de 100% das UCs com planos de manejo
elaborados ou em elaboração e oito Ucs com conselhos gestores instituídos.
Sobre as TIs e ancorados pela PNGATI, 30 das 36 Tis existentes no estado possuem seus
Planos de Gestão Territorial e Ambiental PGTIs discutidos e elaborados. Cerca de 70% tiveram esse
processo facilitado pelo Estado e as demais pela Comissão Pró-Índio do Acre.
Em território acreano, principalmente nas proximidades das fronteiras internacionais, dez UCs são
limítrofes à 14 Tis, sendo que quatro dessas possuem alguma sobreposição com mais seis territórios
indígenas, demarcados ou não. Assim, as relações interetnicas e interculturais são constantes entre
as populações desses territórios e a demanda para atuação conjunta entre os órgãos que são
responsáveis pelo apoio e gestão dessas áreas, existente.
Partindo desse arcabouço jurídico e da implementação das políticas de governo no estado do
Acre, entre os anos de 2016 a 2019, gestores das APs públicas reuniram-se em encontros
presenciais anuais para debater temas, atividades estratégicas, intercambiando experiências e
articulando ações pontuais como forma de dar materialidade ao SEANP, junto a instituições
públicas estaduais e organizações da sociedade civil organizada.
O WWF-Brasil foi o principal parceiro financeiro e técnico para a realização desses
encontros e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Acre, juntamente à Coordenação Regional
01 e 07 do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e às Coordenações regionais
da Fundação Nacional do Índio, parceiras para a construção das pautas dos encontros. Nessa
publicação daremos ênfase ao resultado das atividades em grupo que versaram sobre as interfaces
territoriais entre Ucs e Tis, a partir da perspectiva institucional dos gestores públicos das
Coordenações Regionais da FUNAI, ICMBIO, da SEMA, bem como da sociedade civil, CPI-AC,
com relação aos anos de 2018 e 2019.

2. OBJETIVOS
Realizar diagnóstico sobre as interfaces territoriais entre Unidades de Conservação e Terras
Indígenas no estado do Acre, a partir do alinhamento e socialização de informações dos gestores
públicos e da sociedade civil que atuam nesses espaços, como forma de visibilizar os processos de
gestão em curso.

3. MATERIAL E MÉTODOS
3.1. Localização da área de estudo

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Em território acreano das 22 Ucs, dez UCs são limítrofes à 14 Tis, sendo que quatro dessas
possuem alguma sobreposição com mais seis territórios indígenas, demarcados ou não. Dessa forma
a área de estudo das interações territoriais entre Ucs e Tis, foram as seguintes:
1) Resex Alto Juruá – TI Arara do Rio Amônia, TI Kaxinawa/Ashaninka do Rio Breu, AI
Kuntanawa;
2) Resex Alto Tarauacá – TI Kaxinawa do Rio Jordão e Índios Isolados;
3) Parque Nacional do Serra do Divisor – AI Nawa1, TI Nukini;
4) Resex Riozinho da Liberdade – TI Campinas Katukina;
5) Flona Santa Rosa do Purus – Tis: Kaxinawa de Nova Olinda, Kulina do Igarapé do Pau,
Jaminaua-Envira;
6) Resex Cazumbá Iracema – TI Jaminawa do Caeté;
7) Parque Estadual Chandless – TI Alto Rio Purus, Índios Isolados e TI Mamoadate;
8) Estação Ecológica rio Acre – índios isolados;
9) Resex Chico Mendes – TI Mamoadate e AI Riozinho do Iaco.
10) Área de Relevante interesse ecológico Japiim Pentecoste – TI Poyanawa2

1
O povo Nawa faz parte do tronco linguístico pano e hoje luta para resgatar sua língua materna. Atualmente, a
população é de aproximadamente 700 pessoas, divididas em quatro aldeias - Sete de setembro, Zulmira, Aquidabã e
Novo Recreio - localizadas no Rio Moa, numa área de 83.218 hectares que está em processo de regularização fundiária.
Esses tinham sido considerados extintos entre os anos 1904 e 1998. Em 1999, o Conselho Indigenista Missionário
(Cimi) reconheceu os índios que habitavam à margem direita do Rio Moa, na área do Parque Nacional da Serra do
Divisor, como sendo remanescentes dos Nawa. Desde então, se iniciou o processo de reconhecimento étnico e o início
da luta pela regularização fundiária do seu território. Disponível
em><http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/3348-funai-e-icmbio-se-reunem-para-discutir-areas-de-
sobreposicao> Acesso em: 03 de agosto de 2019.

2
Nessa última área o debate entre os gestores não identificou o status das interfaces, embora as duas áreas sejam
vizinhas
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Figura 01: Áreas Naturais Protegidas no Acre e entorno. Em laranja Terras Indígenas e verde Unidades de Conservação

3.2. Metodologia
Nos encontros de gestores do SEANP, dos anos de 2018 no Parque Estadual Chandless (município
de Manaoel Urbano) e de 2019 no Projeto de Assentamento Agroextrativista Cachoeira (município
de Xapuri), debateu-se sobre a interface de atuação das instituições públicas e da sociedade civil em
APs sobrepostas e ou vizinhas localizadas no Acre.
A forma escolhida para a condução desse trabalho foi a de realizar uma análise coletiva sobre o
contexto atual dessas interfaces territoriais, caracterizando as formas de atuação e contextos locais
sob a perspectiva, conhecimento e vivência dos gestores da FUNAI (indigenistas especializados das
coordenações regionais Alto Purus e Juruá), da SEMA (técnicos das Divisões do: Etnozoneamento e
do Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas), do ICMBIO (gestores de UCs federal e
coordenação regional 07) e da Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Ac). Assim, foi atualizado o status
processual de determinadas demandas, relações de usos entre populações e as ações institucionais
em curso.

4. RESULTADOS
Segue abaixo o quadro resumo construído nos encontros de gestores do SEANP.

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Tabela 02: Quadro síntese das relações e interfaces entre Unidades de Conservação e Terras Indígenas no Acre.
UC Terras e Áreas STATUS Julho 2018 STATUS Junho 2019
Indígenas
Continua. Concluída indenização, mas com 03 famílias aguardando
TI Apolima Arara Demarcação da terra em processo avançado correção da indenização e com depósito já em juízo. Aguardando segunda
(sobreposta à UC)
instância.
TI Ashaninka do rio Ashaninkas reivindicam ampliação da TI para as áreas Por sugestão externa reivindicam ampliação.
Amônea(vizinha à UC) da UC.
1 Resex Alto Juruá TI Kaxinawa Ashaninka Somente algumas áreas na RESEX são de uso dos Utilizam a terra, mas não reivindicam. Associados na associação como
do rio do Breu (vizinha
kaxinawa extrativistas. Não residem na TI.
à UC)
AI Trabalhando o Plano de gestão com acompanhamento da FUNAI e apoio
Kuntanawa(sobreposta à Pleito de demarcação de TI da SEMA. Em processo de formalização de GT para identificação da
UC) área.
TI Kaxinawa do rio Interface de uso sem conflitos. Melhor articulação e integração de acordos
Jordão (vizinha à UC) e parcerias entre territórios indígenas e a Resex a partir do projeto
2 Resex Alto Tarauacá Interfaces de uso
executado pela CPI. Atividades conjuntas sendo realizados pelos dois
Índios Isolados territórios.
Definido como status não avançado, considerando a política de não
demarcação assumida pelo governo federal. Apesar disso, demarcação em
AI Nawa (sobreposta à
Demarcação da terra em processo avançado. andamento e PGTA elaborado. Termo de Compromisso para trabalho
UC)
conjunto- ICMBio, SEMA, FUNAI, Comunidades.
3 Parque Nacional do
Querem ampliar a TI, e pedem a revisão de limites. A etnia se sente no
Serra do Divisor Baixo Risco de conflito hoje, mas necessita
TI Nukini (vizinha à monitoramento e facilitação do diálogo de envolvidos direito e a FUNAI, com certo distanciamento, não se manifesta. 1°
UC) Festival Nukini e relações com a comunidade e possibilidade de Acordo
locais por ICMBio e FUNAI.
de Convivência.
Indígenas entraram no Ministério Público alegando que os moradores
estão caçando em suas áreas. Indicação de que representantes da
Resex Riozinho da TI Campinas Katukina Possui TI na vizinhança/entorno. associação da TI Campinas-Katukina seja convidada a entrar no
4 Liberdade (vizinha à UC)
Conselho. Há indícios de que indígenas querem criar mais uma aldeia no
“Vai e Vem” dentro da Resex.
A Flona, atualmente sem gestor, tem sobreposição com
TI Kaxinawa de Nova várias TIs e o futuro gestor deve considerar diálogo e A Flona tem sobreposição com 03 Tis e o ICMBio não pode deixar de
5 Olinda (sobreposta à alinhamento permanente com a Funai e com as enxergar esta realidade.
Flona Santa Rosa do UC)
comunidades e organizações indigenistas.
Purus

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TI Kulina do Igarapé do
Pau (sobreposta àUC)

TI Jaminaua
Envira (sobreposta à
UC)
TI Alto Rio Purus
(vizinha à UC)
Somente uso, sem conflito. Houve dois pareceres
favoráveis à Resex em que comprovam que a ocupação
do grupo indígena se estabeleceu em 2000, apenas dois A Resex foi delimitada em 2018 (demarcação e sinalização). Atualmente
anos antes da criação da UC, e não foi caracterizada existem encontros e reuniões sistemáticas e regulares entre lideranças TI e
TI Jaminawa do com terra de usos tradicional histórico. Mas permancerá Resex.
6
Resex Cazumbá Caeté(no interior da a área Indígena, em convívio de vizinhança pacífica A Terra Indígena Jaminawa será convidada para fazer parte do Conselho
Iracema UC, mas área não com a Resex. Existe um diálogo (encontro/reuniões) da Resex.
sobreposta) entre ICMBio, lideranças indígenas Jaminawa do Caeté Há agenda para uma reunião entre agosto e setembro deste ano entre as
e FUNAI para discussão de acordos de uso de coletivo lideranças das duas áreas protegidas.
de algumas áreas desta UC.

Os indígenas estão no conselho do parque desde 2017 com discussão


TI Alto Rio Purus Conflitos com indígenas da TI Alto rio Purus e
ampla foram realizados acordos de uso/gestão entre moradores da TI e
(vizinha à UC) moradores do PEC
UC, nos anos de 2015, 2016 e 2017. Conflitos por furtos de objetos dos
7 Parque Estadual
Chandless ribeirinhos por indígenas da TI, acordos sociais não cumpridos.
Na zona intangível do Parque, tem-se áreas de uso e rotas dos isolados,
Algumas áreas são rota e de uso temporário dos
Índios Isolados atuação conjunta com a FUNAI para qualificação das informações em
isolados
2015, 2018 e 2019.
Assim como no Chandless é rota dos índios isolados
Estação Ecológica rio Algumas áreas são de uso temporário dos isolados Não tem uma definição de uma área de uso. Em 2014, houve algumas
8 Índios isolados
Acre
interações do ICMBIO com a FUNAI sendo feito diagnóstico nesta área.
TI Mamoadate (vizinha
à UC)
Verificar com FUNAI situação de processo de
A formalização do GT de identificação da TI está em processo de
AI Jaminawa do identificação da TI Guanabara e Guajará, com
9 Resex Chico Mendes inicialização.
Guajará e Manchineri possibilidade de conectar ao corredor com Resex Chico
do Guanabara (vizinha Mendes, TI Mamoadate e setor sul do PE Chandless. Famílias de ambas os povos fazem uso de Recursos Naturais da Resex.
à UC)

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5. DISCUSSÃO
Gestores de 277 das 313 UCs federais responderam ao diagnostico organizado pela
Coordenação Geral de Gestão Socioambiental. Diretoria de Ações Socioambientais e
Consolidação Territorial em Unidades de Conservação(COCGOT) do ICMBIO que objetivava
analisar as interfaces territoriais existentes nas UCs. Desse universo, a análise dos dados indicou
haver 185 interfaces com UC federais, sendo 132 em 94 UC de Proteção Integral e 53 em 44 UC
de Uso Sustentável, na Amazônia, esse número corresponde à 84 interfaces existentes em 107 UCs
(MADEIRA, et al. 2015).No que tange a sobreposição com Territórios Indígenas (TIs), em 2012
eram mais de 60 casos em 42 UCs federais no Brasil (ICMBIO, 2012).
No Acre, Tis e UCs vizinhas ou sobrepostas representam cerca de 40% das áreas criadas ou
reconhecidas, configurando-se num contínuo de áreas conservadas e que se conectam também com
as Aps peruanas fronteiriças, formando um mosaico de Aps que totaliza 8 milhões de ha.
Das nove Ucs e quatorze Terras ou Áreas Indígenas (tabela 02), observou-se que em cerca
de 70% dos casos há algum tipo de interação entre as instituições públicas responsáveis pelas áreas
ou atuação da sociedade civil com projetos de cunho transfronteiriço.
A Floresta Nacional de Santa Rosa do Purus, que tem mais de 80% de sua área sobreposta
com Tis: Kaxinawa de Nova Olinda, Kulina do igarapé do Pau e Jaminau-Envira e faz divisa com a
TI Alto Rio Purus, atualmente se configura como um território com maior uso e gestão indígena e
da FUNAI, uma vez que essa UC apresenta baixos níveis de implementação da gestão 1.
Na região de Assis Brasil que engloba a Resex Chico Mendes, a TI Mamoadate e duas Áreas
Indígenas em estudo: Manchineri do Guanabara e Jaminawa do Guajará, com a facilitação da CPI
Acre iniciou-se em julho de 2019, no âmbito do projeto Corredores Socioambientais, financiado
pela Rainforest, diálogos e atividades que visam discutir e propor ações conjuntas entre
extrativistas, indígenas e instituições públicas responsáveis pelas Aps 2.
Além dessa iniciativa, a Comissão Pró Índio do Acre, tem atuado de maneira contínua nas
três Tis Kaxinawa do rio Jordão, rio Breu e também com a gestão da Resex Alto Tarauacá e da
SEMA, atua ainda com uma assessoria contínua de mais de 10 anos junto aos Ashaninka do rio
Amônea e recentemente à Resex Alto Juruá.
As áreas onde foram relatados casos de atuação conjunta entre as instituições gestoras são:
Resex Cazumbá Iracema e TI Jaminawa do Caeté, Parque Estadual Chandless e TI Alto Rio Purus e
Parque Nacional Serra do Divisor e AI Nawa e TI Nukini. Nesses locais as discussões sobre acordos

1
Há mais de cinco anos não apresenta quadro funcional mínimo de servidores para realizar a gestão
2
Esse processo ainda está em seu início por isso não apresenta ainda maiores desdobramentos, exceto uma oficina entre
representantes institucionais dessas áreas no 2 semestre de 2019.
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de uso e de gestão, aconteceram ou ainda estão em curso em razão do estreitamento das relações
entre a SEMA, FUNAI e ICMBIO.
Esses acordos mencionados são pautados pela IN 26 de 2012 do ICMBIO, que estabelece as
diretrizes e regulamenta os procedimentos para elaboração, implementação e monitoramento de
Termos de Compromisso entre o Instituto Chico Mendes e populações tradicionais residentes em
unidades de conservação onde sua presença não seja admitida ou esteja em desacordo com os
instrumentos de gestão.
Esse instrumento é visto como uma conquista, pois traz embasamento, segurança jurídica e
administrativa, sendo mais um estímulo institucional ao diálogo na gestão das unidades de
conservação com comunidades que lá residem (TALBOT, 2016).
A Resex Alto Juruá é a mais emblemática em relação às interfaces territoriais, uma vez que,
em seus 506 mil hectares há dois casos de reinvindicação territorial: os Apolima Arara e os
Kuntanawa. A primeira encontra-se em processo avançado de demarcação dos mais de 20 mil
hectares e já estão na etapa indenizatória das famílias não indígenas que estão inseridas em seus
limites. No caso dos Kuntanawa o processo de formalização de Grupo de Trabalho institucional
para a identificação, ainda está tramitando junto a FUNAI, mas a demanda já se encontra
judicializada.
Há ainda de se destacar a relação de uso que os kaxinawa da TI Kaxinawa Ashaninka do rio
Breu fazem de áreas referentes à RESEX e uma discussão inicial sobre ampliação de limites da TI
Ashaninka do rio Amônea. Esses indígenas protagonizaram discussões transfronteiriças
desenvolvida por intermédio da associação APIWTXA, e recursos de projeto financiado pelo Fundo
Amazônia entre os anos de 2015-2018, que buscou aumentar a integração entre as comunidades
locais (indígenas e extrativistas).
A gestão da Esec Rio Acre atua junto aos indígenas da TI Cabeceira do Rio Acre, apoiando
a comunidade com a elaboração e execução de projetos e institucionalmente atuou com a FUNAI
de forma pontual, com a qualificação de vestígios após avistamentos de índios isolados nas
imediações da sede da UC no ano de 2014.
Como pode ser observado a partir desse exercício, das nove Ucs analisadas, seis
apresentaram avanços na forma de conceber e realizar a gestão, ampliando sua área de atuação
também para o seu entorno ou nas áreas sobrepostas. Com isso, percebe-se que aos poucos os
gestores de Ucs compreendem que gestão participativa e integrada, que inclui as comunidadesna
tomada de decisões e administração desse território são saídas para a diminuição dos problemas.

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No caso da FUNAI, muitas parcerias em favor dos indígenas têm ocorrido pois o nível de
implementação de Ucs que contam com recursos do Programa Áreas Protegidas da
Amazônia1disponibiliza arranjos que favorecem a integração de ações.
De outro lado a sociedade civil organizada também começa a olhar sua atuação ampliando os
horizontes sobre as paisagens, seja por intermédio de Ongs seja pela atuação comunitária, haja
visto o caso da APIWTXA.
Odiagnóstico apresentado demonstra que no Acre tem havido por parte dos atores que
apoiam a gestão uma tendência a ampliar o olhar sobre o território evidenciado por uma atuação
conjunta entre órgãos e instituições ecom observância aos direitos em questão. Um dos primeiros
passos para essa integração tem sido a construção de planos conjuntos e termos de compromisso,
que reconhecem o modo vida dos povos indígenas e extrativistas que vivem no território.

6. CONCLUSÃO
Assuntos de poder e a natureza transescalar das instituições deixam à vista as limitações de
ações para uma gestão integrada. De forma contrária, a transparência e a existência de canais de
comunicação devem ser priorizados para que o conhecimento e ações sejam compartilhados e
legitimados.
A partir da atividade proposta nos encontros de gestores do SEANP Acre, o
reconhecimento dos casos de conflitos, estratégias exitosas, entre outras atuações de forma
coletiva e alinhada entre gestores, foi uma ferramenta importante, ao passo que, qualificou e levou
a público as estratégias de atuação conjunta que estão ocorrendo nesses territórios e que podem vir
a ser replicadas com os ajustes necessários à outras realidades.
Ressaltamos ainda que o coletivo de gestores dessas APs sugeriu que os projetos de
assentamento sejam incluídos nas discussões dos próximos encontros, devido a relação territorial
que os mesmos possuem com as Aps em questão.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ACRE, Governo do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico Econômico. 2ª edição. 2009 .

ACRE,LEI ESTADUAL nº 1.426 de 27 de dezembro de 2001. Institui a Lei de Florestas e e cria o


Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas -SEANP. Secretaria de Meio Ambiente do Acre,
Rio Branco.

BRASIL. 2000. Lei nº 9.985, de 18 de Julho de 2000. Institui o Sistema Nacional de unidades de
conservação da Natureza e dá outras providências. Ministério do Meio Ambiente, Brasília.

1
No Acre, o Parque Estadual Chandless, o Parque Nacional Serra do Divisor, as RESEX: Alto Tarauacá, Riozinho do
Liberdade, Cazumbá Iracema, Chico Mendes e a ESEC Rio Acre, contam com recursos do programa ARPA há mais de
10 anos para realizar a gestão.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BRASIL. 2006. DECRETO nº 5.758, de 13 de abril de 2006. Institui a Política Nacional de Áreas
Naturais Protegidas. Ministério do Meio Ambiente, Brasília.

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Acesso em : 12 de Agosto de 2019.

557
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO BIOMA CAATINGA DE CLIMA


SEMIÁRIDO: O CASO DO ESTADO DE PERNAMBUCO

João Rafael Gomes de Morais*, Cristiano Wellington Noberto Ramalho **

Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Sociologia, PPGS/UFPE, Brasil. *


Professor Orientador do Programa de Pós-Graduação em Sociologia, PPGS/UFPE, Brasil.**

1. INTRODUÇÃO
Na atualidade inúmeros países concebem proteção da biodiversidade por intermédio da
constituição de áreas protegidas (unidades de conservação). Certamente que ela não é a única
medida adotada pelos governos para preservação de espécies (animais, vegetais) e do patrimônio
genético e paisagístico. No entanto, é apontada como a medida mais eficaz para tal fim, e por isso
mesmo, ganha proeminência dentro das ações governamentais voltadas a proteção dos recursos
naturais (VALLEJO, 2002, p. 57). No Brasil essa estratégia protetiva é discutida, regulamentada e
implantada desde a década de 1930, como demonstram estudos (COSTA JUNIOR, COUTINHO,
FREITAS, 2012; SOUZA, 2014; SOUZA, 2016). Entretanto, apenas em 2000, com a Lei Federal
N° 9.985, é instituído o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).Emâmbito
estadual, apenas em 2009 o Estado de Pernambuco instituiu o Sistema Estadual de Unidades de
Conservação da Natureza (SEUC-PE) através da Lei Estadual N° 13.787.
Porém, tanto o SNUC quanto o SEUC-PE demonstram dificuldades em proteger o bioma
caatinga. Esse espaço territorial possui inúmeras particularidades, isto é: a primeira é que a Caatinga
é o único bioma genuinamente brasileiro (FREIRE et al., 2018),que ocupa quase 10% do território
do país (IBGE,2004), e se situa na região semiárida mais habitada do mundo, tendo, atualmente,
46,6% de sua vegetação desmatada (IBGE, 2015). Em segundo lugar, a agricultura camponesa
circunscrita no bioma é parte majoritária dos 42,26% dos estabelecimentos rurais do país
localizados no Nordeste, ocupando apenas 37% da área total disponível da região (IBGE,2006),
onde não por acaso se concentram os menores índices de produtividade e abriga quase a metade da
população rural empobrecida do Brasil (BUAINAIN; GARCIA, 2013; NAVARRO; CAMPOS,
2014; COSTA; SILVA, 2014; MORAIS, 2019).
Pernambuco possui 83% de sua área territorial coberta pela caatinga (IBGE, 2004) no
entanto ,54,9% desta área já está desmatada (IBGE, 2015).Mesmo sendo um dos biomas mais
densamente povoados, a política pública de áreas protegidas do governo federal e estadual têm
implantado majoritariamente Unidades de Conservação (UC) na modalidade de proteção integralem
Pernambuco.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Buscando uma compreensão mais apurada sobre esse quadro, este artigo faz um
levantamentodasUCs (e suas respectivas modalidades) implantadas pelo SNUC e o SEUC-PE no
Bioma Caatinga no Estado de Pernambuco. O argumento presente neste estudo é que ambas as
políticas públicas atuam de maneira tardia e errática no bioma. A pesquisa apoiou-se em
procedimentos metodológicos qualitativos, como a análise documental, bibliográfica e dados
secundários. O estudo está estruturado em quatro partes: (a) introdução;(b)apresentaremos os
materiais e métodos utilizados no levantamento das UCs constituídas pelo SNUC e SEUC-PE no
bioma Caatinga em Pernambuco; (c) realizaremos uma discussão sobre os resultados da pesquisa; e
(d) faremos as considerações gerais sobre o processo de pesquisa.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A legislação federal e a estadual definiram duas modalidades de UCs, as de proteção integral
e as de uso sustentável. A primeira modalidade tem o objetivo de preservar a natureza, sendo
admitido apenas o uso indireto (fins educacionais, pesquisa e turismo) dos seus recursos naturais,
com exceção dos casos previstos em Lei. Por outro lado, as unidades de uso sustentável têm o
objetivo de compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela de seus
recursos naturais.
Essas duas modalidades são compostas por vários tipos de categorias. No diploma legal
federal (SNUC) a Estação Ecológica (ESEC), a Reserva Biológica (REBIO), o Parque Nacional
(PARNA), o Monumento Natural (MONA), a Floresta Nacional (FLONA) e o Refúgio da Vida
Silvestre (RVS) compõem a modalidade de proteção integral. Já as Áreas de Proteção Ambiental
(APA), Relevante de Interesse Ecológico (ARIE) e as Reservas Extrativista (RESEX), de Fauna
(RFAU), a de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e a Reserva Particular do Patrimônio Natural
(RPPN) ligam-se à modalidade de uso sustentável. Dentro dos marcos legais de Pernambuco
(SEUC-PE) foram replicadas as modalidades e categorias contidas no SNUC, sendorealizadas
apenas modificações na nomenclatura de algumas categorias contidas na modalidade de proteção
integral (Parque Estadual – PE) e de uso sustentável (Floresta Estadual – FLOE; Reserva Estadual
de Fauna – REF) sem que existissem mudanças em seus objetivos e finalidades. Nesta última
modalidade citada, o SEUC-PE instituiu uma nova categoria de UC, a Reserva de Floresta Urbana
(FURB).
Esclarecida as nuances relacionadas as modalidades e as categorias de UCsexistentes no
SNUC e no SEUC-PE, iniciamos o levantamento das UCsimplantadas no bioma caatinga de
Pernambuco pelo governo federal e estadual por intermédio de dados secundários e de pesquisa
bibliográfica. O levantamento das UCs implantadas pelo governo federal na caatinga pernambucana
tomou como referência os dados contidos no estudo realizado por Bragança (2014 apud SOUZA,
559
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2014),porém, essas informações(ver quadro abaixo) foramconfirmadas, complementadas e


atualizadas através do cadastro de UCs disponível no sitio eletrônico do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBIO).

Tabela 1 -Unidades de Conservação criadas pelo Governo Federal no Bioma Caatinga no Estado
de Pernambuco
Unidades de Conservação constituídas anterior a Lei Federal n˚ 9.985/2000 (SNUC)
Ano Governo UC Nome Tamanho (ha) UF
1982 Figueiredo REBIO Serra Negra 624,85 Pernambuco
1997 FHC APA Chapada do Araripe 972.590,45 Ceará / Pernambuco
/ Piauí
Unidades de Conservação constituídas posterior a Lei Federal n˚ 9.985/2000 (SNUC)
Ano Governo UC Nome Tamanho (ha) UF
2002 FHC PARNA Catimbau 62.294,14 Pernambuco
2007 Lula FLONA Negreiros 3.004,52 Pernambuco
Fonte: Adaptado pelo autor a partir de Bragança (2014 apud Souza, 2014, p. 411-432) e complementado
com informações coletadas no sitio eletrônico do ICMBIO no dia 08/07/2019
(<http://www.icmbio.gov.br/portal/unidadesdeconservacao/biomas-brasileiros/caatinga/unidades-de-conservacao-
caatinga>).* No sistema do ICMBIO não consta o registro de nenhuma RPPN implantada pelo governo federal no bioma caatinga
de Pernambuco.

O levantamento relacionado dasUCs implantadas pelo governo do estado de Pernambuco foi


realizado, uma parte, através do sítio eletrônico da Agência Estadual de Meio Ambiente de
Pernambuco (CPRH), outra parte, foi extraída do sítio eletrônico da Assembleia Legislativa do
Estado de Pernambuco (ALEPE) através da análise de projetos de lei.

Tabela 2 -Unidades de Conservação criadas pelo Governo do Estado de Pernambuco no Bioma


Caatinga
Unidades de Conservação constituídas anterior a Lei Federal n˚ 9.985/2000 (SNUC)
Ano Governo UC Nome Tamanho (ha) Municípios
1998 Miguel Arraes ESEC Serra da Canoa 7.598,7 Floresta
Unidades de Conservação constituídas posterior a Lei Federal n˚ 9.985/2000 (SNUC) e a Lei Estadual n˚
13.787/2009 (SEUC-PE)
Ano Governo UC Nome Tamanho (ha) Municípios
2001 Jarbas Vasconcelos RPPN Pedra do Cachorro 22,9 São Caetano
2008 Eduardo Campos RPPN Karawa-tá 100,58 Gravatá
2012 Eduardo Campos Parque Estadual Mata da Pimenteira 887,24 Serra Talhada
2012 Eduardo Campos ESEC Serra da Canoa 7.598,71 Floresta
2014 Eduardo Campos Parque Estadual Serra do Areal 1.596,56 Petrolina
2014 Eduardo Campos RVS Riacho Pontal 4.819,63 Petrolina
2014 Eduardo Campos MONA Pedra do Cachorro 1.378,67 Brejo da Madre de
Deus / São Caetano /
Tacaimbó
2014 Eduardo Campos RPPN Santo Antônio 119,75 Passira
2015* Paulo Câmara RVS Tatu-Bola 110.110,25 Petrolina / Lagoa
Grande / Santa Maria
da Boa Vista
2019 Paulo Câmara RVS Serra do Giz 310,20 Afogados da
Ingazeira / Carnaíba
2019 Paulo Câmara RVS Serras das 21.687,62 Petrolina
Caatingueiras

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Fonte: Adaptado pelo autor a partir de informações coletadas no sitio eletrônico da CPRH-PE no dia
08/07/2019 (<http://www.cprh.pe.gov.br/Unidades_de_Conservacao/descricao_das_unidades/41788%3B48981%3B5001%3B0%3B0.asp>) e
no sitio eletrônico da ALEPE (<http://legis.alepe.pe.gov.br/>)..
* A constituição do RVS Tatu-Bola gerou inúmeros conflitos com a sociedade civil local, após negociação, o governo do estado de
Pernambuco se comprometeu em encaminhar um Projeto de Lei para a Assembleia do Estado de Pernambuco (ALEPE) com o
objetivo de modificar a categoria e a modalidade da unidade de conservação implantada, de RVS para APA.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
As tabelas apresentadas acima evidênciam que a maior parte dessas áreas protegidas estão
circunscritas na modalidade deproteção integral (exceto pela APA constituída em 1997 pelo
governo federal que abrange uma pequena parte de Pernambuco e pelas três RPPN’s constituídas
pelo governo estadual), Essa estratégia, de salvaguarda dos recursos naturais no bioma, termina por
replicar uma abordagem preservacionista do processo de proteção da natureza, paradigma esse
historicamente hegemônico no País há décadas (DIEGUES, 1996) e que não tem conseguido atingir
seus objetivos como demonstrado pela pesquisa do IBGE (2015). Ademais, as APA, diferentemente
das RESEX’s e RDS, guardam um caráter mais maleável, amplo e difuso.
Em Pernambuco essa tendência foi amenizada apenas com a constituição das três RPPN’s
nos municípios de São Caetano, Gravatá e Passira (todas circunscritas na região do agreste do
estado). Porém, mesmo que tais áreas tenham sido decretadas pelo governo do estado,
diferentemente das demais categorias de UCs de ambas as modalidades (proteção integral ou uso
sustentável) que são constituídas e geridas pelo ente governamental, a RPPN é constituída por
iniciativa e interesse do proprietário do imóvel rural (privado) que se compromete em conservar a
diversidade biológica da área. Essa UC, em sua grande maioria, é composta pela área de Reserva
Legal (RL) ou pelas Áreas de Proteção Permanente (APP) existentes dentro dos imóveis rurais. Por
esse motivo Souza (2014, p. 208) considera que a alocação desta categoria dentro da modalidade de
uso sustentável nos diplomas legais (SNUC e SEUC-PE) é um equívoco, principalmente porque
nessas áreas só é permitido o uso indireto dos recursos (turismo, educação e pesquisa) com
autorização prévia do órgão ambiental. Em sua essência a RPPN não se presta ao desenvolvimento
de práticas de uso sustentável dos recursos naturais.A constituição de uma RPPN, bem como sua
gestão, é fruto de um interesse particular, num imóvel privado,onde o poder público tem apenas o
papel de homologar e fiscalizar esse interesse. Por esse motivo, a nossa análise irá mirar nas demais
categorias de unidades de conservação, pois nelas a prerrogativa de constituição é produto
exclusivamente do interesse do poder público.
A partir dos dados coletados é possível realizar algumas inferências. Uma delas é de que a
atuação do governo federal no bioma caatinga em Pernambuco é tardia, pois a primeira unidade foi
constituída apenas em 1982, demorando mais de 15 anos para que fosse constituída a segunda. Pode
ser considerada também uma atuação errática. Isto fica evidente na pesquisa realizada pelaFundação

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Joaquim Nabuco (FUNDAJ). Neste estudo Freire et al. (2018, p. 11, 182) constata que a
conservação da biodiversidade do bioma está ameaçada. A pesquisa analisou 14 (quatorze)UCs de
proteção integral, das 27 (vinte e sete) áreas existentes em todo o bioma, em todas elas foram
identificadas problemas, a saber: existência de graves conflitos socioambientais com as
comunidades do entorno; ausência de integração desses equipamentos ambientais com as escolas
próximas; pouco reconhecimento e envolvimento das populações locais sobre sua importância; e
pouco investimento governamental (infraestrutura e recursos humanos). Os pesquisadores concluem
que esses equipamentos ambientais estão quase abandonados.
Em âmbito estadual o quadro não é diferente,a primeira UC constituída pelo governo de
Pernambuco foi em 1998. Mesmo com a regulamentação do SNUC em 2000 e do SEUC-PE em
2009, apenas em 2012 o estado retorna a constituir áreas de proteção na caatinga. Por este fato é que
também dizemos que atuação do governo estadual foi tardia. Por este fato é que também dizemos
que atuação do governo estadual foi tardia ou, por lado, pode não ter sido suficientemente
pressionado pelos movimentos sociais para tal fim. Consideramos também errática pelo fato de que
das oito unidades constituídas, apenas o Parque Estadual Mata da Pimenteira possui conselho gestor
constituído e com um funcionário designado pela CPRH-PE para gestão e controle da área. Outro
fato importante a ser destacado é que mesmo num bioma densamente povoado o governo do estado
só constituiu UCs de proteção integral, denotando que o poder executivo não vem construindo
alternativas de proteção ambiental com as populações rurais que perpasse pelo uso sustentável dos
recursos naturais.
O ápice da atuação errática do estado se deu com a constituição do RVS Tatu-Bola no ano de
2015 através do Decreto n˚ 41.546 de 16 de março. Foi definido o objetivo ambicioso de proteger
110.110,25 hectares da caatinga, abrangendo, em maior grau, o município de Lagoa Grande, parte
expressiva de Santa Maria da Boa Vista, e uma pequena parte de Petrolina. Além do significativo
tamanho, os estudostécnicos realizados sugeriram que fosse constituído umRVS. A área prevista
para constituição da área abrangia um grande número de imóveis rurais em posse da agricultura
familiar, vários assentamentos da reforma agrária, além de pedaços territoriais das sedes de alguns
municípios. Lacerda, Albuquerque e Galvíncio (2017, p. 195) ressaltam que o poder público
estadual não havia envolvido devidamente no debate as comunidades rurais e urbanas que estariam
circunscritas nessa área protegida. O governo do estado havia realizado apenas uma audiência
pública no município de Lagoa Grande, fazendo com que as comunidades rurais, movimentos
sociais e poderes públicos dos três municípios alegassem não ter conhecimento dos detalhes e dos
impactos da implantação deste equipamento ambiental. Por força da mobilização realizada pelo
movimento sindical rural de Pernambuco e os poderes públicos locais, o decreto do governo
estadual que instituiu o RVS Tatu-Bola foi suspenso politicamente (oficiosamente revogado), ficou
562
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

negociado(em 2015)que o poder executivo estadual iria encaminhar para a ALEPE um Projeto de
Lei para modificar a categoria e a modalidade da UC, de RVS para APA, compromisso esse que até
o momento não foi cumprido.

4. CONCLUSÃO
O levantamento das unidades de conservação constituídas no bioma caatinga no estado de
Pernambuco demonstrou que tanto o SNUC quanto o SEUC-PE além de atuarem tardiamente, não
conseguem implantar arranjos protetivos da caatinga que não perpassem pela constituição de áreas
de proteção integral. De certa forma, os dados demonstram que o poder governamental (federal e
estadual) possui dificuldades em articular e construir,em conjunto com as populações rurais que
densamente povoam o bioma, estratégias de conservação ambiental através douso sustentável dos
recursos naturais.Tudo isso também pode revelar que os movimentos sociais organizados não
pressionam, na mesma medida que outros pautas, questões vinculadas a uma agenda ambiental de
uso sustentável da caatinga.

5. AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. Agradecemos a leitura e as
sugestões de aperfeiçoamento indicadas pelos/as avaliadores/as do GT 7 (Políticas Públicas,
Governança Ambiental e Inclusão Social em Áreas Protegidas) da SAPIS/ELAPIS 2019.

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alguma chance como agricultores? IN: NAVARRO, Z. S.; CAMPOS, S. K. A “pequena produção
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564
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

OS DESAFIOS DO LICENCIAMENTO DE MANEJO FLORESTAL


COMUNITÁRIO NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO, SEGUNDO A
LEGISLAÇÃO VIGENTE, NA AMAZÔNIA BRASILEIRA
THE CHALLENGES OF LICENSINGCOMMUNITY FOREST MANAGEMENT IN
CONSERVATION UNITS ACCORDING TO CURRENT LEGISLATION IN BRAZILIAN
AMAZON.

Carolina Marçal dos Santos*, Dr. Gil Vieira**


(*) Mestranda do programa de Mestrado Profissionalizante em Gestão de Áreas Protegidas (MPGAP), INPA, Brasil
(**) Coordenação de Pesquisa Tecnológica e Inovação (COTEI). PhD em Ecologia Tropical Universidade de Oxford,
Reino Unido

INTRODUÇÃO
Mudanças nas políticas florestais, agrárias, e o reconhecimento dos direitos originários dos
povos indígenas tiveram um reflexo no reconhecimento legal da posse de terras na
Amazônia(PACHECO et al., 2016). No Brasil, cerca de 50% das florestas públicas, ou seja, cerca
de 157 milhões de hectares são destinados ao uso comunitário1, a maioria desse montante se
encontra na Amazônia (CNFP/SFB, 2017). Contudo, as reformas nas políticas florestais não
abordaram algumas restrições críticas enfrentadas pelos pequenos produtores no manejo de suas
florestas, tanto individualmente quanto coletivamente (PACHECO et al., 2016).
O uso sustentável dos recursos florestais e a renda gerada aos pequenos produtores
propiciam, por sua vez, seu interesse na conservação dessas vastas extensões ao invés de sua
conversão em outras formas de uso da terra, como a agricultura e pecuária (AZEVEDO-RAMOS et.
al, 2017).Na América Latina, como em outras partes do mundo, o Manejo Florestal Comunitário
(MFC) é entendido como uma das opções mais promissoras para resolver o grande dilema de
conciliação entre a preservação da natureza e o desenvolvimento econômico (SABOGAL et. al,
2008).
Apesar dos avanços na legislação e do apoio técnico ao manejo florestal comunitário, ainda
há entraves no processo de licenciamento para que este possa ser considerado uma alternativa de
renda real para as comunidades da Amazônia legal, contribuindo com os objetivos de conservação e
o desenvolvimento rural. E para que esta iniciativa possa se concretizar como uma alternativa para

1
As florestas de uso comunitário correspondem às terras indígenas, às Unidades de Conservação sob as categorias
Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e Reserva Extrativista (Resex), assim como aos assentamentos
sustentáveis federais dos tipos Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS), Projeto de Assentamento Florestal
(PAF) e Projeto Agroextrativista (PAE) (CNFP 2017).

565
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

reduzir o processo acelerado de degradação ambiental devido à expansãoda fronteira agrícola e à


exploração predatória de madeira (ADEODATO et al., 2011, CARVALHEIRO et al., 2008,
AZEVEDO-RAMOS et al., 2017).
O presente trabalho teve a finalidade de analisar os desafios durante o processo de
licenciamento do manejo florestal comunitário nas unidades de conservação de uso sustentável,
segundo a legislação vigente (estadual e federal) nos estados do Amapá, Amazonas, Pará e Acre,
localizados na Amazônia brasileira. Existe um processo de acentuação da dinâmica do
desmatamento dentro das unidades de conservação na Amazônia. Com o avanço dessa dinâmica, há
uma necessidade cada vez maior de uma aliança em torno da defesa desses territórios, sua
efetividade passa pela possibilidade de que essa defesa seja impulsionada por meio do uso desses
territórios, e do uso pelas comunidades que o habitam. O desenvolvimento de uma economia
florestal é imprescindível para a manutenção dessas florestas sociais. No entanto a regulamentação
atual que normatiza o manejo florestal comunitário e familiar não está adequada.

MATERIAL E MÉTODO
São focos deste estudo,todas as unidades de conservação de usos sustentável nas quais são
permitidas a presença de populações tradicionais e que são passíveis de realização da atividade de
MFC sob administração federal e estadual. Foram analisadas as Reservas de Desenvolvimento
Sustentável (RDS), Reservas Extrativistas (Resex), Florestas estaduais e Florestas nacionais, nos
estados do Amapá, Acre, Pará e Amazonas. Ao todo, são 101 unidades de conservação abrangidas
neste estudo.
Como técnica de pesquisa foi utilizada a documentação indireta por meio da pesquisa
documental de fontes primárias (LAKATOSet al., 2017), utilizando como fonte os arquivos e
documentos oficiais, marcos legais vigentes que normatizam o manejo florestal sustentável na
esfera federal e nos estados do Amazonas, Pará, Acre e Amapá. Para complementar as informações
obtidas, também foi realizada pesquisa bibliográfica(LAKATOSet al., 2017). Com base nessas
informações, foi feito:a)Quadro síntese e análise comparativa da legislação vigente, nas diferentes
esferas administrativas; b)Representação geral do fluxo para elaboração e aprovação de Planos de
Manejo Florestal Sustentável (PMFS) para licenciamento de MFS nos diferentes estados. c)Análise
comparativa e quadro síntese dos fundamentos técnicos e científicos previstos para as diferentes
categorias de manejo segundo a legislação vigente.
Para complementar e qualificar as informações levantadas na pesquisa documental e na
pesquisa bibliográficae ter a oportunidade de obter dados que não se encontram em fontes
documentais (LAKATOSet al., 2017), foram aplicadas duas técnicas adicionais de pesquisa. A
observação direta intensiva a partir da realização de entrevista semiestruturada para quatro atores de
566
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

diferentes segmentos e a observação direta extensiva por meio da aplicação de questionário para os
gestores das 101 unidades de conservação foco do estudo (LAKATOS et al., 2017).
Visando levantar o número total dos planos madeireiros de MFC protocolados nos últimos
10 anos em cada uma das Unidades de Conservação foco do estudo, foi utilizada como técnica de
pesquisa a documentação indireta por meio de pesquisa documental de fontes primárias.As etapas
do método de análise podem ser ilustradas pelo esquema a seguir:

Figura 1: Etapas do método de análise

Fonte: Carolina Santos

RESULTADO E DISCUSSÃO
A legislação vigente que regulamenta o licenciamento do MFC tal como ela está hoje é um
empecilho para concretização da atividade e para que essa possa ser, de fato, uma ferramenta
estratégica e efetiva no alcance dos objetivos de conservação da natureza e desenvolvimento
rural.Os processos são longos, burocráticos, envolvem custos e conhecimentos técnicos, os quais as
comunidades normalmente não têm. Na contramão do que estabelece a Lei 12.651/2012 que
exigeprocessos simplificados para o manejo florestal exercido pelo pequeno produtor, com exceção
do Amazonas, não há procedimento diferenciado e simplificado para o licenciamento de MFC em
nenhum dos estados estudados e nem mesmo na esfera federal.
Com a instituição do Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos
Florestais(Sinaflor) - previsto no art. 35 da Lei Federal Nº 12.651, de 25 de maio de 2012 -
teoricamente o licenciamento das atividades de MFS deveriam passar a se dar em plataforma

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eletrônica por meio da internet. Apesar da adesão ao Sinaflor o sistema eletrônico estadual nos
quatro estados estudados, com exceção do Acre, ainda não está operante. Portanto, os proponentes
ainda precisam protocolar fisicamente os documentos nas sedes dos órgãos licenciadores ou em um
de seus poucos núcleos regionais espalhados pelos estados. Esse fator, em uma região com a
dimensões continentais como a amazônica, onde a logística de locomoção é extremamente cara e
lenta, onde muitas vezes só é possível por via fluvial, encarece demais e por vezes acaba
inviabilizando o processo.
Outro fator bastante relevante é que a maioria das unidades de conservação não possui um
instrumento de gestão determinante para realização do MFC no interior das unidades de
conservação, o plano de manejo, com zoneamento, da unidade de conservação, no qual deve estar
previsto apossibilidade de desenvolvimento da atividade. A existência de um plano de manejo da
UC é muitas vezes condição legal para se aprovar o MFC nesses territórios.Das 101 unidades de
conservação foco do estudo, apenas 36 delas possuemPlano de Manejo da Unidade (CNUC/MMA
2018).
No que se refere as iniciativas de MFS encontradas nas UCs foco do estudo diante das
diferentes estratégias de obtenção de dados, das 59 unidades de conservação federais foco do
estudo, sob esfera de competência do ICMBio, apenas sete delas possuem PMFS comunitários
aprovados e vigentes ou em processo de aprovação (ICMBio 2018).Das 64 unidades de conservação
foco do estudo referentes aos estados do Amazonas, Acre e Amapá,nas esferas federal e estadual,
foram identificadas movimentação de madeira através do sistema DOF (2007 – 2018) em 24 delas,
distribuídas dentro desse recorte temporal de 11 anos.
Os dados acima permitem notar a falta de continuidade da exploração florestal em muitas
unidades de conservação que tiveram a atividade desenvolvida em algum momento ao longo dos
últimos dez anos. Portanto, a prática de manejo não se estabeleceu como uma rotina dentro da
realidade das comunidades, ou seja, não se concretizou como uma alternativa econômica viável
para aquelas comunidades.

CONCLUSÃO
Para viabilizar a legalização da atividade de MFS por pequenos produtores, sendo estes os
proponentes que dão entrada no processo de licenciamento na categoria comunitário ou pequena
escala, o tramite deveria ser diferente do usado para regulamentar a atividade em escala
empresarial, ele deveria ser simplificado. Recomenda-se o estabelecimento de regulamentação
especifica com procedimentos simplificados para o MFC na esfera federal e também estadual.
Pensando em entender e contemplar nessas normativas as especificidades das comunidades, das
diferenças ecológicas do bioma e sazonalidade e a própria limitação do Estado em garantir a
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existência de pré-requisitos legais para realização da mesma, como plano de manejo da unidade e
regularização fundiária, sugere-se um amplo processo de escuta/consulta pública, com foco nos
pequenos produtores e nas comunidades.

AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Carlos Santos e Deolinda Marçal, que sempre me guiaram e me incentivaram no
meu desenvolvimento pessoal. Seu amor, carinho e cuidado são a minha energia diária.
Ao meu orientador, Dr. Gil Vieira, que me guiou com dedicação e sabedoria nesse longo caminho.

REFERÊNCIAS
ADEODATO, S.; VILLELA, M.; BETIO, L. S.; MONZONI, M. Madeira de ponta a ponta, o
caminho desde a floresta até o consumo. 1° edição, São Paulo, SP: FGV RAE, 2011

ATTRIDE-STIRLING, Jennifer. Thematic networks: an analytic tool for qualitative research. Sage
Journals. London, p. 385-405. dez. 2001.

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undesigned public forests slow Amazon deforestation? Land Use Police, v. 73, p.125 – 127, 2018.

LAKATOS, E. M; MARCONI, M. A. Fundamentos de Metodologia Científica. 8. ed. São Paulo:


Editora Atlas, 2017

PACHECO, P.; MEJIA, E.; CANO-CARDONA, W.; DE JONG, W. Smallholder Forestry in the
Western Amazon: Outcomes from Forest Reforms and Emerging Policy Perspectives. CIFOR.
2016

REIS, E.A., REIS I.A. (2002) Análise Descritiva de Dados. Relatório Técnico do Departamento
de Estatística da UFMG. Disponível em: www.est.ufmg.br

SABOGAL, C.; JONG, W.; POKORNY, B. Manejo forestal comunitário en América Latina
Experiencias, lecciones aprendidas y retos para el futuro. CIFOR – CATIE. Belém, Brasil – 2008

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INCREMENTANDO A INTEGRAÇÃO ENTRE A UNIVERSIDADE E A


GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS
INCREASING INTEGRATION BETWEEN UNIVERSITY AND MANAGEMENT OF PROTECTED
AREAS

Gabriel Fernando Rezende


Analista ambiental – ICMBio, Mestre em Ciência Ambiental. Núcleo de Gestão Integrada São Mateus - ES – Brasil
gfrezende@gmail.com

RESUMO
Discorremos sobre o processo de cooperação entre o Núcleo de Gestão Integrada (NGI) ICMBio
São Mateus e o Centro Universitário Norte do Espírito Santo (CEUNES) da Universidade Federal
do Espírito Santo (UFES), cuja formalização se dará através de Termo de Cooperação Técnica,
num processo com elementos inovadores. As justificativas principais residem na necessidade de se
encontrar alternativas administrativas e de cunho técnico-gerencial, que possibilitem que as
unidades de conservação (UCs) integrantes do NGI São Mateus continuem gerando resultados tanto
para a conservação como para a sociedade, dado o atual cenário escassez de recursos humanos e
orçamentários, além da possibilidade de realização de diversas atividades de forma integrada com o
CEUNES/UFES, ampliando seu escopo de atuação, tais como: apoio a programas de voluntariado,
incremento dos projetos de pesquisa, apoio na formação e fortalecimento dos conselhos gestores e
na revisão e implementação de planos de manejo entre outras, que passariam a ser tratadas sob o
prisma de uma matriz territorial mais ampla e dentro de uma perspectiva ecossistêmica regional,
congregando esforços técnicos e diferentes visões, com melhor alocação de capital humano e
recursos materiais.

Palavras-chave: Termo de Cooperação Técnica; Núcleo de Gestão Integrada; Parcerias


Interinstitucionais

INTRODUÇÃO
O presente relato de experiencia traz informações e considerações sobre o processo de
cooperação, atualmente em curso, entre o Núcleo de Gestão Integrada (NGI1) ICMBio São Mateus
e o Centro Universitário Norte do Espírito Santo (CEUNES) da Universidade Federal do Espírito
Santo/UFES e que tem por objetivo estabelecer um regime de mútua cooperação técnico-científica,
nos esforços de planejamento, organização, apoio, desenvolvimento, implementação e realização de
pesquisas, manejo, ensino e extensão para execução de ações de conservação e gestão da
biodiversidade da Mata Atlântica.
A previsão de gestão integrada de conjunto de Unidades de Conservação (UCs) que
estiverem próximas ou justapostas foi descrita no art. 26 da Lei n° 9.985, de 18 de julho de 2000,

1
Um arranjo organizacional estruturador do processo gerencial entre unidades de conservação federais.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

"de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o


desenvolvimento sustentável no contexto regional."
Com o intuito de operacionalizar esta previsão do SNUC, o art. 30 do Decreto nº 8.974, de
24 de janeiro de 2017, estabeleceu in verbis: "O Instituto Chico Mendes poderá dispor de bases
avançadas e núcleos de gestão integrada, a serem instituídos em caráter transitório ou permanente,
por ato de seu Presidente, em qualquer ente federativo, para a melhoria de gestão das unidades
descentralizadas".
Dentro desta ótica, foi instituído pela Portaria nº 925 de 06/11/2018, o NGI São Mateus,
que integra a gestão de 03 (três) UCs federais, a saber, a Floresta Nacional do Rio Preto (2.817,4
ha), a Reserva Biológica do Córrego Grande (1.503,8 ha) situadas em Conceição da Barra/ES e a
Reserva Biológica do Córrego do Veado (2.375,8 ha) situada em Pinheiros/ES (figura 01) .
Estas UCs, todas situadas na Bacia Hidrográfica do Rio Itaúnas no extremo norte do Estado
do Espírito Santo, protegem uma área aproximada de 6.700 hectares de remanescentes da Floresta
Atlântica de Tabuleiros, abrangendo diferentes tipos de ecossistemas com grande número de
espécies de fauna e flora, incluindo endêmicas, vulneráveis e em risco de extinção, constituindo-se
os últimos remanescentes florestais expressivos a nível regional., Todavia estão imersas numa
matriz de paisagem regional dominada por monoculturas de eucalipto, cana de açúcar, além de
outras culturas e pastagens, numa região que apresenta um quadro de escassez hídrica acentuada o
que por sua vez tem como uma disputa cada vez maior pelo uso dos recursos hídricos pelos atores
sociais presentes.
No tocante ao CEUNES/UFES, sua criação se deu a partir de 2005 como resultado do Plano
de Expansão e Consolidação da Interiorização da UFES, com a oferta inicial de 09 (nove) cursos de
graduação, com as atividades acadêmicas inicialmente desenvolvidas numa Sede Provisória em São
Mateus/ES.
Posteriormente, através de parceria firmada com a Prefeitura Municipal de São Mateus,
houve a doação de uma área de 532.000 m² onde o Campus foi instalado e gradativamente se
consolidou, possuindo atualmente uma área de 86.000 m², com uma infraestrutura de qualidade para
realização de atividades acadêmicas (17 cursos de graduação e 06 Programas de Mestrado) além de
uma Fazenda Experimental, com 196 ha. Entre alunos de graduação e pós-graduação, o Centro
possui mais de 3.100 alunos de graduação, 220 alunos de pós-graduação e um quadro de mais de
200 professores efetivos e 111 Técnicos Administrativos em Educação.

JUSTIFICATIVA
Notadamente a importância e pertinência do estabelecimento desse processo de cooperação está
ancorada na:
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

 Necessidade de se encontrar alternativas do ponto de vista administrativo e técnico-


gerencial, que possibilitem que as UCs continuem gerando resultados em termos de valores
para a conservação como valores para a sociedade, considerando o atual cenário de crônica
escassez de recursos humanos e orçamentários e as políticas de ajuste orçamentário da
administração federal;
 E na possibilidade de realização de diversas atividades integradas com o CEUNES/UFES
ampliando o seu escopo de atuação, num leque de ações, que passariam a ser tratadas sob o
prisma de uma matriz territorial mais ampla e dentro de uma perspectiva ecossistêmica
regional, congregando esforços técnicos e diferentes visões, com melhor alocação de capital
humano e recursos materiais;

OBJETIVOS
Dentre os objetivos esperados, estão uma maior compreensão dos contextos ambientais,
sociais, políticos e econômicos nos territórios abrangidos por estas UCs, estimulando a articulação
entre os diferentes setores, com vista ao fortalecimento da participação social e promoção da justiça
ambiental, tendo por alicerces a Constituição Federal e as atribuições do ICMBio, seus objetivos e
missão institucional.
Dessa forma espera-se que as atuais UCs integrantes do NGI São Mateus em cooperação com o
CEUNES/UFES, implementem de forma mais abrangente:
 o desenvolvimento de pesquisas científicas;
 atividades de extensão universitária junto às comunidades rurais situadas nas zonas de
amortecimento (ZA’s) e entorno regional das UCs;
 Consolidem as UCs como locais para a realização de estágios e formação didática de
graduandos e pós-graduandos, além de espaço para o desenvolvimento sistematizado de
atividades extracurriculares para os alunos, como por exemplo, Bolsas de Iniciação
Científica e participação em Programas de Voluntariado;
Na forma de contrapartida a administração do CEUNES-UFES disponibilizaria espaço interno
adequado para desenvolvimento de atividades administrativas do NGI São Mateus.

ATIVIDADES DESENVOLVIDAS:
Já remonta há alguns anos, em processos de discussão informal, a ideia da possibilidade do
estabelecimento deste processo de cooperação, todavia tais discussões se deram de forma pontual e
individualizada, haja vista o NGI São Mateus ter sido formalmente criado somente em novembro de
2018. Entretanto, após a criação do NGI São Mateus ocorreu uma maior aproximação com a
administração do CEUNES/UFES no sentido do estabelecimento deste acordo de cooperação.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Dessa forma, foi formalmente solicitado pelo NGI São Mateus ao CEUNES/UFES, o
estabelecimento de um Termo de Cooperação, elencando diversas atividades, destacando-se:
 A disponibilização, pelo CEUNES/UFES, de espaço interno adequado no campus, sem ônus
para o ICMBio, com acesso à telefonia fixa, internet, energia elétrica, local para reuniões
ocasionais e estacionamento;
 Realização de atividades de pesquisa conjunta, básica e aplicada, de manejo in situ e ex situ
e de educação ambiental, de interesse de ambas as instituições;
 Intercâmbio de membros das instituições para a análise de documentos técnicos e elaboração
de manifestações científicas relativas a temas de interesse para a gestão e manejo das UC
e/ou de interesse regional;
 Implementação de programas de estágio, programas de iniciação científica e/ou
programas de voluntariado nas UC, direcionados a alunos de graduação e pós-graduação;
 Atividades de capacitação e treinamentos de servidores, professores e/ou acadêmicos de
ambas as instituições;
 Produção de materiais técnicos, voltados para a conservação da biodiversidade da Mata
Atlântica, com ênfase na Mata Atlântica dos Tabuleiros;
 Como contrapartida, o NGI ICMBio São Mateus se comprometeria, a:
 assegurar em suas bases operacionais, a manutenção da infraestrutura física e material
permanente, necessários ao desenvolvimento das atividades relacionadas;
 disponibilizar, sempre que possível, alojamentos, salas de escritório, equipamentos e
veículos das UCs do NGI São Mateus, para o desenvolvimento de pesquisas;
 colaborar diretamente na execução de projetos e atividades propostas pelo CEUNES/UFES,
realizando uma avaliação conjunta de seus resultados e reflexos;
 apoiar as iniciativas de implantação de cursos de nível superior (graduação e pós-graduação)
nas áreas de interesse de ambas as instituições e, em especial, no que diz respeito à
conservação e de gestão dos recursos naturais e da biodiversidade da Mata Atlântica;
 proporcionar consultoria técnica, treinamento ou qualquer outra capacitação necessária ao
desenvolvimento das atividades e projetos voltados à missão institucional do ICMBio, assim
como às atividades voltadas a assessorar e subsidiar políticas públicas;
Em prosseguimento, o CEUNES/UFES confirmou formalmente ao ICMBio o interesse no
estabelecimento deste Termo de Cooperação e cedeu a partir de março/19 uma sala, nas
dependências físicas campus nos moldes solicitados acima.
Foram então elaboradas, de forma conjunta as minutas do Termo de Cooperação e seu
respectivo Plano de Trabalho, com vigência prevista de 05 (cinco) anos e que após análise jurídica

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

da Procuradoria Federal Especializada do ICMBio, encontra no presente momento em fase de


aprovação pela Presidência do ICMBio bem como pela Reitoria da UFES.

RESULTADOS ESPERADOS
Após a formalização legal do presente Termo de Cooperação Interinstitucional, se darão
prosseguimento às atividades previstas no Plano de Trabalho, com destaque para a implementação
dos Programas de Voluntariado, Estágio e de Iniciação Científica.
Está previsto também a realização do I Workshop de Integração e Pesquisa /ICMBio/
CEUNES/UFES, no mês de novembro/2019 cujo objetivo é a discussão, planejamento e a
implementação das atividades previstas no Plano de Trabalho do presente Termo de Cooperação.

CONCLUSÕES
A proposição do presente Termo, advém da convicção que tal cooperação, de caráter
inovador, tanto em termos administrativos como em termos acadêmicos, representa também a
melhor alternativa de otimização dos recursos institucionais de ambos os parceiros, num
alinhamento com a estratégia institucional do ICMBio de implementar novos arranjos gerenciais
que incorporem a perspectiva ecossistêmica como organizadora da gestão nos territórios protegidos.

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MONITORAMENTO PARTICIPATIVO DA BIODIVERSIDADE: CAMINHOS


PARA MOBILIZAÇÃO E PROTAGONISMO DE ATORES LOCAIS NA GESTÃO
DE ÁREAS PROTEGIDAS NA AMAZÔNIA
BIODIVERSITYPARTICIPATORY MONITORING: PATHWAYS FOR MOBILIZATION AND
PROTAGONISM OF LOCAL ACTORS IN THE AMAZONIAN PROTECTED
AREASMANAGEMENT

Pollyana F. Lemos*, Cristina F. Tófoli*, Katia Torres Ribeiro**

*IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas.


**ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

INTRODUÇÃO
O Brasil é um dos líderes mundiais no percentual de áreas que são formalmente protegidas.
Tem aproximadamente 20% do seu território sob diferentes categorias de proteção. Considerado um
país megabiodiverso, o Brasil supera as 200 mil espécies registradas(Lewinsohn 2006). A
sociodiversidade brasileira é igualmente rica. São mais de 300 etnias indígenas e diversas
comunidades tradicionais, como quilombolas, caiçaras, extrativistas e ribeirinhos (IBGE, 2012). A
utilização de métodos participativos tem sido um elemento-chave na agenda de conservação e
desenvolvimento após a década de 1980, desencadeadas pelo trabalho de Diagnóstico Rural
Participativo (DRP ou RPA). Eles tinham a intenção de representar uma mudança de paradigma nas
formas de aproximação da população local para coletar informações combinada com o
reconhecimento do valor do conhecimento local e indígena (Chambers, 1981).
Para além de todas as adversidades e considerando os desafios estruturais das Unidades de
Conservação, como o número de unidades descentralizadas em todo o território nacional com
recursos financeiros e equipe técnica escassas, a gestão dessas áreas protegidas tem sido otimizada
por meio de iniciativas de envolvimento da população local (Padua & Chiaravalloti, 2012). Entre
elas destaca-se o monitoramento participativo da biodiversidade, que tem o intuito de auxiliar a
gestão de áreas protegidas criando uma cultura de questionamento e respeito da floresta e seus
recursos e uso, e ser um importante mecanismo para garantir a efetividade da gestão, como acesso
à recursos, uso, conservação e distribuição de benefícios (Evans & Guariguata, 2008).
No sentido de promover o envolvimento das populações locais na gestão e conservação da
biodiversidade em UC, o Ministério do Meio Ambiente (MMA), por meio do Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em parceira com IPÊ – Instituto de Pesquisas
Ecológicas, executam o Projeto de Monitoramento Participativo da Biodiversidade em Unidades de

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Conservação Na Amazônia (MPB), no âmbito do Programa Nacional de Monitoramento da


Biodiversidade (Monitora) do ICMBio.
MATERIAL E MÉTODOS
O MPB é desenvolvido em 17 unidades de conservação federais da Amazônia (Figura 1) e
tem sua implementação cinco macroações (Figura 2).

Figura 1 – 17 Unidades de Conservação com Projeto MPB.

Figura 2 – Modelo de implementação do Projeto MPB.

No MPB, considerou-se a realidade local da UC: como as pessoas se apropriam da gestão;


quais as condições operacionais da UC; o manejo e uso da biodiversidade; características
geográficas e sociais; e inciativas de monitoramento existentes (Tófoli et al., 2019). A seguir o
detalhamento das macroações norteadoras do projeto MPB:
Articulação e envolvimento: Primeiros passos para a implementação das macroações,
envolvimento de gestores das unidades de conservação e identificação de parceiros institucionais.
Um dos aspectos importantes foi o mapeamento das inciativas locais de monitoramento, na busca
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

por parceiros e sinergias, visando o fortalecimento dessas iniciativas, planejamento conjunto e


formação de uma rede de parcerias.
Construção coletiva de protocolos e implementação da coleta de dados: O Monitora está
dividido em dois grupos alvos de monitoramento (Figura 3): alvos globais (escala nacional) e alvos
complementares (locais e regionais). No primeiro espera-se entender como sistema de UC responde
ao objetivo de conservação da biodiversidade brasileira através de indicadores padronizados. Os
alvos locais foram construídos para cada UC e os regionais na escala de territórios para um conjunto
de UCs, ambos desenhados em etapas: 1. Identificação dos alvos e colheita de subsídios para
estruturação dos protocolos; 2. Estruturação e ajustes no protocolo; e 3. Colocar o protocolo em
campo e ajustes.

Figura 3 - Alvos de monitoramento.

Capacitações: Os cursos foram essenciais para adesão ao monitoramento, com perspectiva


metodológica baseada na participação efetiva de pessoas locais, na valorização dos diferentes
conhecimentos e saberes. Foram organizados de modo a possibilitar (re)conhecer a realidade local
das UCs envolvidas como parte integrante de um sistema que tem a intenção de monitorar a
biodiversidade envolvendo comunitários e instituições locais nos processos de planejamento,
execução, avaliação e aplicação de resultados.
Construção coletiva do conhecimento e avaliações: Momentos de construção de
conhecimento acontecem nos encontros de saberes, uma imersão, diálogo, avaliação e interpretação
coletiva dos dados do monitoramento com diferentes atores do em um único espaço. Monitores,
pesquisadores e moradores da UC e entorno discutem informações, elaboram interpretações e
incrementam o que foi analisado e planejam aplicações de resultados, em um dia, mas com etapas
de preparação. As avaliações são parte desse debate e aprimoramento das ações do projeto, sendo
realizadas com conselheiros das UC, gestores, monitores e comunidades.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Entre 2013 e 2018 foram realizados 211 eventos com 5642 participações. Visando a
promoção de diálogo e ações conjuntas foram realizados 86 eventos de articulação - 1647
participações. Para a identificação de alvos de monitoramento e construção de protocolos foram
realizados 45 eventos, com 1335 participações e capacitados 269 pessoas que atuam na coleta de
dados e encontros de saberes, no total de 44 eventos. Obteve-se 9101 registros de mamíferos e aves
cinegéticas, 5372 registros de borboletas e 849 registros de plantas lenhosas. Para os alvos de
expressão local e regional foram 592 indivíduos de castanha da Amazônia e 23.222 frutos, 925
indivíduos de quelônios aquáticos e 1621 ninhos monitorados; 1624 registros de pesca de tucunarés;
23 espécies caçadas para subsistência; e 47320 fotos de 70 espécies de mamíferos e aves cinegéticas
em áreas de concessão florestal e em áreas de conservação ambiental. Para a biodiversidade
aquática, tais como pesca de autoconsumo (automonitoramento) - 5512 registros de 123 espécies,
odonatas - 3 registros de anizoptera e 32 de zigoptera, assembleia de peixes - 15 espécies, pesca
experimental - 2298 registros de 118 espécies, habitats de igarapés, pirarucu – sem implementação.
O monitoramento regional da castanha-da-Amazônia não iniciou a coleta de dados. Também foram
realizadas 32 avaliações totalizando 966 participações e dois encontros de saberes piloto em duas
UC.
Os resultados trarão um retrato da importância das UC na conservação da
sociobiodiveridade, subsidiarão gestão, políticas públicas e pesquisas, sendo o envolvimento e
pactuação com parceiros e moradores das UC e entorno de fundamental importância.

CONCLUSÃO
Envolvimento e pactuação com comunidades e instituições locais são essenciais para
consolidação do monitoramento participativo, possibilitando complementar ações já realizadas
localmente. O processo participativo demanda tempo e um grande esforço, e iniciativas
participativas criam um senso de pertencimento entre gestão e comunidades, promovem
reconhecimento pessoal dos monitores e da conservação da biodiversidade.

AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao ICMBio, a participação essencial dos gestores, monitores da
biodiversidade, educadores nas capacitações, a equipe IPÊ, aos moradores das UC e seu entorno. Às
associações e instituições locais que acreditaram e contribuíram na implementação do projeto e à
Gordon and Betty Moore Foundation, ARPA/MMA e USAID pelo apoio e parceria.

REFERÊNCIAS

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CHAMBERS R. Rapid rural appraisal: rationaleandrepertoire’.


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2008.
IBGE. Censo Demográfico 2010: Características Gerais dos Indígenas. Rio de Janeiro, IBGE. 245
p., 2012.

LEWINSOHN, T. Avaliação do Estado do Conhecimento da Biodiversidade Brasileira. Brasília,


MMA. 520 p., 2006.

PADUA CV & CHIARAVALLOTI RM. Pesquisa e Conhecimento na Gestão de Unidades de


Conservação. In: Gestão de Unidades de Conservação: compartilhando uma experiência de
capacitação. p. 139–155, 2012.

TÓFOLI, C. F.; LEMOS, P. F.; CHIARAVALLOTI, R. M.; PRADO, F. (orgs.). Monitoramento


Participativo da Biodiversidade: Aprendizados em Evolução. 2 ed. Nazaré Paulista / SP. Instituto
de Pesquisas Ecológicas / Memnon; 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO


CONSELHO DELIBERATIVO DA RESEX DO PIRAJUBAÉ
Dayani Guero*Karina de Oliveira Teixeira**

* Analista ambiental da Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé, ICMBio, Brasil


** Analista ambiental, chefe da Resex Baía de Tubarão e Resex Itapetininga, ICMBio, Brasil

1. INTRODUÇÃO
Este trabalho relata a experiência da avaliação da efetividade da gestão participativa no
Conselho do Conselho Deliberativo (CD) da Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé (Resex
Pirajubaé), realizada por meio da elaboração de um diagnósticoe de indicadores construídos e
aplicados no período compreendido entre os meses de setembro de 2016 a setembro de 2018.
A avaliação objetivou a elaboração de estratégias para melhoria na gestão da unidade de
conservação (UC). Os indicadores propostos no trabalho podem ser utilizados no planejamento e
avaliação periódicos, possibilitando a comparação de resultados. O esforço também poderá ser
aplicado em outros conselhos gestores, para a inter-relação da efetividade da participação em
diferentes categorias de unidades de conservação.
A Resex Pirajubaé, criada em 1992, localizada no coração de Florianópolis, é a primeira
Resex Marinha do Brasil, símbolo da resistência da sua população tradicional, em contexto urbano,
pela proteção dos modos de vida, memórias e saberes dos seus 235 pescadores e pescadoras
artesanais beneficiários. Ela assegura o uso sustentável dos recursos naturais, a conservação do
estuário do rio Tavares e do maior fragmento contínuo de manguezal mais ao sul do Brasil.Quanto à
participação social, o principal espaço para sua realização é o conselho deliberativo, composto por
22 cadeiras, que foi formado em 2009 e que teve sua última modificação de composição em 2015.
Desde então, o CD monitora sistematicamente seus encaminhamentos, mas nunca havia realizado
uma avaliação dos resultados, impactos e efetividade de suas ações.Essa realidade pode ser
transferida para a maioria dos conselhos gestores, cuja avaliação ainda não é uma prática absorvida
como cultura organizacional. A percepção da efetividade dos esforços realizados contribui para o
pertencimento e engajamento dos atores envolvidos.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O primeiro produto da avaliação constitui na geração de um diagnóstico por meio da
construção e análise de um banco de dados das ações do conselho nas 15 reuniões ocorridas no

580
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período.Uma das classificações trabalhadas foi denominada como “demandas de gestão”, visando
diferenciar as ações de atribuição exclusiva do órgão gestor, que não estão vinculadas à existência
do colegiado daquelas demandas dos demaisinteresses sociais. Outra classificação dos dados foi
denominada “impacto”, que classifica e orienta onde a ação contribui, indicando em qual área a
deliberação poderá gerar mais impacto.Após a tabulação desses dados, foi realizado diagnóstico da
participação por meio da construção de gráficos e tabelas. A pauta da reunião, convocada pela
chefia foi analisada separadamente dos encaminhamentos propostos após os debates do colegiado
para possibilitar uma análise diferenciada das demandas do órgão e decisões do colegiado.
Por fim, foram construídos os indicadores de efetividade que possibilitam a análise e
replicação em outras UC. Os indicadores foram indicados de acordo com a proposta da IUCN
(União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais) para tratar a questão
da governança das áreas.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
O motivador principal para criação dos conselhos gestores de unidades de conservação é a
promoção da participação social definida por Avelar, 2004 como:

Participação é uma palavra latina cuja origem remonta ao século XV. Vem de participatio,
participacionis, participatum. Significa “tomar parte em”, compartilhar, associar-se pelo
sentimento ou pensamento. Entendida de forma sucinta, é a ação de indivíduos e grupos
com o objetivo de influenciar o processo político. De modo amplo, 'a participação é a ação
que se desenvolve em solidariedade com outros no âmbito do estado ou de uma classe, com
o objetivo de modificar ou conservar a estrutura (e, portanto, os valores) de um sistema de
interesses dominantes' (PIZZORNO, 1966) (AVELAR, 2004).

Amplos são os conceitos de participação, mas em geral todos procuram sintetizá-la na


capacidade dos participantes em alterar a conjuntura política Dentre os entendimentos, um dos mais
difundidos e utilizados em capacitações é a ilustração em degraus apresentados por Arnstein (1969),
que passam de não participação (manipulação e terapia); para os degraus de participação passiva
(informação e consulta) e chegam até a participação ativa a partir do degrau parceria.
De acordo com o conceito adotado de participação, tomar parte inclui o sentimento e
pensamento. Defere-se, portanto, que o desafio é tornar a participação mais qualificada dentre os
níveis apontados pelos autores, de forma que as consequências seriam a redução das desigualdades
e assimetrias sociais pelos impactos oriundos de decisões mais significativas social e politicamente.
Apesar de a Constituição incluir os conselhos como espaços de gestão descentralizada,
muitos pareceres oficiais e legislações, como o SNUC, ainda tem determinado seu caráter apenas
consultivo, sem que suas decisões sejam vinculantes às ações do poder público. “É preciso,
portanto, que se reafirme, em todas as instâncias, seu caráter essencialmente deliberativo porque a

581
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

opinião apenas não basta” (GOHN, 2006).O que se observa é que a legislação federal não
reconheceu os conselhos gestores de UC com poderes efetivos de decisão, e o decreto no
4.340/2002 e demais normativas são muito vagas em relação às suas atribuições. Para Santos
(2008), os conselhos deliberativos e consultivos acabam tendo praticamente as mesmas atribuições
legais que podem ser resumidas em: “i) serem consultados antes da tomada de decisão, listadas no
artigo 20 do decreto no 4.340/2002; ii) opinar sobre as questões listadas no mesmo artigo; e iii)
acompanhar a gestão com poder apenas de exigir informações e encaminhar denúncias a outros
órgãos de controle, como o tribunal de contas e Ministério Público”.
Mesmo que as competências legais sejam limitadoras, pois não lhes é possível aos legislar, o
poder de efetividade de suas ações é muito maior, pois são nesses colegiados que as questões não
previstas em legislação, que são específicas daquele território geopolítico são tratadas e acordadas,
muitas vezes materializadas nos Planos de Manejo.
Para Almeida (2017) a participação social está passando por uma “crise de meia idade”, já
que os conselhos deixaram de ser a novidade motivadora e atualmente não existem estudos que
comprovem sua efetividade.A construção de indicadores é essencial para a avaliação e
monitoramento na gestão pública.Januzzi (2006) relata que importantes contribuições para o
conceito de indicadores sociais já aconteceram a partir dos anos 20 e 30 do século passado, mas
houve um grande descrédito em relação à utilidade desses indicadores sobretudo nos anos 1970 com
a crise fiscal do Estado. Esse ceticismo durou pouco e já nos meados dos anos 1980, com as
experiências de planejamento local e participativo, sua importância voltou a reestabelecida.
Antes de apresentar os indicadores estabelecidos nesse trabalho e seus resultados, passo a
analisar algumas das principais informações apreendidas na construção do diagnóstico.Quanto às
“demandas de gestão”, constituem 64% dos itens de pauta das convocatórias, ou seja, mais da
metade da pauta proposta é relacionada aos assuntos de a atribuição do órgão gestor. Já, ao analisar
os encaminhamentos, ou seja, que foram decididos após os debates, observa-se o percentual
praticamente é o inverso, ou seja, 33% são “demandas de gestão”.
Ao analisar os “impactos” das deliberações das reuniões, apreendeu-se que a maioria das
pautas propostas (47%) tem impacto relacionado à População Tradicional. Logo após, com 19%,
estão os assuntos relacionados ao funcionamento e gestão do conselho, como exemplo a criação de
grupos de trabalho, organização e funcionamento do colegiado.E empatados, com 17% ambos,
seguem os impactos na gestão da UC e atuação política do espaço colegiado. Esta atuação política
quase sempre está relacionada à temática dos licenciamentos ambientais.
Em relação aos encaminhamentos, o impacto sobre a População Tradicional segue empatado
com a atuação política do colegiado, ambos com 30%. Importante destacar que o período analisado
foi marcado pelo encaminhamento de dois processos, cujas autorizações para licenciamento
582
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ambiental acabaram sendo emitidas pela diretoria da sede de forma divergente às manifestações do
Conselho, fato que gerou muitos conflitos no grupo e diversos encaminhamentos em relação à
atuação política do colegiado.Em seguida, com 28%, seguem os encaminhamentos relacionados à
gestão do Conselho e 12% gerando impacto direto à gestão da UC.Quanto ao protagonismo,
conclui-se que 60% dos encaminhamentos são protagonizados pelos conselheiros, sendo atribuições
individuais ou por meio dos grupos de trabalho.
A partir do diagnóstico, foram construídos os indicadores para que possam ser replicados em
outras UC, conforme Tabela 1.

Tabela 1 – Indicadores de efetividade e resultados na Resex do Pirajubaé no período analisado


Princípio Indicador Fórmula Resultado
(IUCN)

Legitimidade e Percentual de respostas às Número de demandas atribuídas ao órgão gestor 94,12%


Voz demandas do Conselho atendidas x 100 /Total de
demandas/encaminhamentos atribuídos ao órgão
gestor
Legitimidade e Número de atos Número de atos administrativos em desacordo 2
Voz administrativos em com as decisões do conselho gestor
desacordo com as decisões
do Conselho
Legitimidade e Taxa de conselheiros Número de presenças de conselheiros no período 67,30%
Voz presentes nas reuniões de x 100 / Número total de cadeiras no período
conselho (presenças + ausências)
Desempenho Taxa de execução dos Número de encaminhamentos executados x 81,00%
encaminhamentos do 100/Número total de encaminhamentos no
conselho período
Responsabilidade Taxa de encaminhamentos Número de encaminhamentos atribuídos para 60,00%
e Prestação de não atribuídos ao órgão demais conselheiros x 100/ Número total de
Contas gestor encaminhamentos no período

Justiça e Taxa de Número de encaminhamentos com impacto no 30,00%


Direitos encaminhamentos com modo de vida tradicional x 100/Número total
impacto no modo de vida de encaminhamentos no período
tradicional
Fonte:A Autora, 2019

4. CONCLUSÃO
Quanto ao princípio Legitimidade e Voz, conclui-se que os interesses da população
tradicional são representados e discutidos. Mesmo que as pautas iniciais contemplem em sua
maioria assuntos técnicos, após as discussões em plenária, a maioria das decisões relacionam-se
com outras demandas. Outra importante aferição foi que a maioria das pautas e encaminhamentos
geram impactos à população tradicional.
O reconhecimento pelo órgão gestor como espaço de deliberação foi demonstrado quando se
aferiu que o percentual de execução de encaminhamentos atribuídos exclusivamente ao Instituto
Chico Mendes (94%) é ainda maior que os demais (82%).
583
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Resta esclarecer que a gestão local, em quase todas as temáticas, consegue atender essas
demandas sem necessariamente envolver demais hierarquias da Instituição, o que não acontece
necessariamente às demandas relacionadas ao licenciamento ambiental. Um dos indicadores
construídos foi o número de atos administrativos em desacordo com as decisões do Conselho. Além
da pequena governabilidade sobre o licenciamento, os custos da participação são altos devido à
condição bastante desfavorecida em termos econômicos e educacionais. A taxa de participação da
população tradicional (68%) demonstra que este é um assunto que necessita ainda de maiores
esforços.O grande desafio presente é construir mecanismos capazes de minorar os efeitos das
desigualdades sociais no interior dos processos deliberativos, de forma a permitir que a construção
dos acordos não esteja sujeita à influência de fatores endógenos como o poder, a riqueza ou as
desigualdades sociais pré-existentes. (MACEDO, 2008).
A avaliação em relação ao princípio Orientação Estratégica demonstrou menos efetividade
que os demais princípios. Relaciona-se à ausência de Plano de Ação do Conselho e do próprio
Plano de Manejo.
Quanto ao terceiro princípio, Desempenho, verificou-se que o colegiado contribui para o
alcance dos objetivos da UC, pois gera impactos diretos à sua gestão e também contribui para o
fortalecimento da atuação política do colegiado. Além disso, a capacidade de concretização dos
acordos do colegiado se mostrou bastante alta e a contribuição dos demais conselheiros nas reuniões
e grupos de trabalho também apresenta comprometimento, tanto que mais da metade dos
encaminhamentos são protagonizados pelos conselheiros. Responsabilidade e prestação de contas é
o quarto princípio analisado e aferiu-se que há uma distribuição de responsabilidade sobre os
acordos e decisões.
O questionamento central de toda a discussão a respeito da participação social se dá para
responder justamente esse princípio, Justiça e Direitos. Uma sociedade pode ser escrupulosamente
fiel a procedimentos democráticos e ainda assim injusta. (DE VITA, 2003).Mesmo que esse
trabalho consiga apontar que os interesses da população tradicional estão representados, não houve
informações suficientes para assegurar que o colegiado é efetivo para a garantia desse princípio,
permitindo de forma permanente o acesso a todos os direitos associados aos povos e comunidades
tradicionais. Mas, pela própria categoria da UC e demais resultados apontados, não há dúvidas que
esse espaço contribui substancialmente para garantia desses direitos.

5. REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Debora Cristina Rezende de. Os desafios da efetividade e o estatuto jurídicoda
participação: a Política Nacional de Participação Social. Soc. estado. [online]. 2017, vol.32, n.3,
pp.649-680. ISSN 0102-6992. http://dx.doi.org/10.1590/s0102-69922017.3203005.

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ARNSTEIN, S.R. Uma escada de participação cidadã. In: Revista Participe. Rio de Janeiro.

ARRETCHE, Marta T. S. Tendências no estudo sobre avaliação. In: RICO, Elizabeth M. (Org.).
Avaliação de políticas sociais: uma questão em debate. São Paulo: Cortez, 2009. p. 29-39.
Associação Brasileira de Promoção da Participação, 2002.AVELAR, L. Participação Política. In:
Avelar, L. E Cintra, A.C. Sistema político brasileiro: uma introdução. São Paulo: EditoraUnesp,
2004.

BORRINI-FEYERABEND, G., N. Dudley, T. Jaeger, B. Lassen, N. Pathak Broome, A. Phillips

DE VITA, A. Democracia deliberativa ou igualdade de oportunidades políticas? In: Novos


Estudos, nº 66, 2003.

GOHN, M. da G. Conselhos gestores e gestão pública. In: Ciências Sociais Tunisinos, v. 54, n. 2.
São Leopoldo, 2006.

JANNUZZI, Paulo de Martino. Indicadores sociais do Brasil. 3. Ed. Campinas, SP: Editora
Alínea, 2006. 141p.

MACEDO, Heitor Schulz. Processos participativos na gestão de áreas protegidas: estudos de


caso em unidades de conservação de uso sustentável da zona costeira do sul do Brasil.
Florianópolis, 2008.

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AGENTE VOLUNTÁRIO AMBIENTAL (AVA): PROTAGONISMO SOCIAL


CONTRIBUINDO PARA A GESTÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
ESTADUAIS DO CEARÁ
ENVIRONMENTAL VOLUNTARY AGENT (EVA): SOCIAL PROTAGONISM
CONTRIBUTING TO THE MANAGEMENT OF CEARA STATE PROTECTED AREAS

Hermógenes Henrique Oliveira Nascimento*, Hívila Pâmella Morais Silva **, Andréa de Sousa
Moreira ***

Célula de Conservação da Diversidade Biológica (CEDIB), Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Ceará, Brasil.*
Graduanda em Ciências Ambientais, Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR), Universidade Federal do Ceará
(UFC), Brasil. **
Célula de Conservação da Diversidade Biológica (CEDIB), Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Ceará, Brasil.
***

1. INTRODUÇÃO
Segundo a ONU (2011), o voluntariado é uma das expressões mais básicas do
comportamento humano e surge das antigas tradições de partilha e trocas mútuas, que há muito
tempo já foram estabelecidas. No seu núcleo estão os relacionamentos e o seu potencial para
engrandecer o bem-estar dos indivíduos e da comunidade. A coesão social e a confiança, por
exemplo, prosperam onde o voluntariado é prevalente.
O voluntariado não é apenas a coluna vertebral das organizações da sociedade civil, social e
dos movimentos políticos, mas também da saúde, educação, habitação e programas ambientais e
uma série de outros segmentos da sociedade, programas do setor público e privado em todo o
mundo. É uma parte integrante de toda a sociedade. A história do voluntariado confunde-se com a
própria história das ações dos indivíduos em relação aos seus semelhantes. Alguns autores, como
Hudson (1999) avaliam essa história sob o ponto de vista de todo um segmento dedicado a causas
sociais.
Um dos principais temas que ganha ampla atenção da comunidade internacional para a
formulação de políticas públicas ambientais está relacionado com a biodiversidade, o que tem
levado debate sobre os processos necessários para a conservação da diversidade biológica do
mundo. As áreas protegidas são mundialmente consideradas como uma estratégia chave para a
conservação da biodiversidade e para a provisão de serviços ecossistêmicos. No entanto, as
mudanças na relação sociedade e natureza implicaram o avanço das ações antrópicas no ambiente
alterando as características físicas, químicas e biológicas do meio. O desafio atual é assegurar que
considerável parte da natureza seja protegida.
Outra tendência para a conservação de áreas protegidas ao redor do mundo é o
reconhecimento do voluntário como um componente essencial para promover cooperação entre
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

comunidades, encorajar participação de entidades de outros setores e contribuir com a harmonia do


uso dos recursos naturais.
É importante preconizar que o conceito de desenvolvimento humano coloca as pessoas
exatamente no centro do desenvolvimento. O relatório dos Voluntários das Nações Unidas também
adota esse conceito, reconhecendo a importância da realização imaterial para o bem-estar individual
e social. Logo, percebe-se que melhorias materiais – saúde, educação e trabalhos apropriados –
continuam essenciais; porém, também vital é a participação e a cidadania ativa das quais os
voluntários são fortemente expressivos.
Atualmente, o Estado do Ceará possui 27 Unidades de Conservação Estaduais e 01 Corredor
Ecológico. O Ceará tem uma grande biodiversidade que compõe o seu patrimônio natural, tanto ao
longo dos 573 quilômetros de litoral com dunas, falésias, manguezais, como no sertão de
umburanas, pau-d'arco, juremas, angicos e tantos outros exemplares de natureza privilegiada.
Com esse cenário apresentado, a Secretaria do Meio Ambiente (SEMA) integrante da
administração direta do Governo do Estado do Ceará, no ano de 2015, publicou normativa que cria
o Agente Voluntário Ambiental (AVA) nas Unidades de Conservação estaduais. Assim, a SEMA
instituiu um programa que tem o objetivo de transformar os voluntários em multiplicadores das
ações de proteção e gestão das UC.

2. MATERIAL E MÉTODO
A metodologia científica pode ser compreendida, de forma resumida, como a soma de
técnicas e processos empregados na realização de uma pesquisa, sendo que as técnicas
corresponderiam às atividades sistematizadas e racionais que permitem alcançar os objetivos,
delineando o caminho metodológico a ser seguido (MARCONI; LAKATOS, 2003).
Nesse sentido, foram duas técnicas empregadas nessa pesquisa:
1- Documentação indireta: refere-se ao levantamento de dados em fontes primárias e secundárias
por meio de:
- Pesquisa documental: realizada no acervo histórico de voluntarismo em áreas protegidas, onde foi
possível ter acesso aos arquivos e dados estatísticos sobre o assunto.
- Pesquisa bibliográfica: baseou-se no levantamento, análise e interpretação de obras pertinentes ao
tema, a partir de quatro eixos principais:
I – Voluntarismo, II – Unidades de Conservação, III – Gestão, IV – Educação Ambiental
2 – Documentação direta: correspondeu ao levantamento de dados produzidos pelos próprios
voluntários mensalmente por meio de relatórios de atividades que são executadas nas UC
contempladas pelo Programa.

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3. RESULTADO E DISCUSSÃO
O trabalho voluntário em UC do Estado do Ceará pode ser uma importante ferramenta para a
democratização da gestão da unidade, possibilitando um maior envolvimento da população na
preservação dos recursos naturais de forma sincera, consciente e espontânea. Por meio do
engajamento dos voluntários se garante um comprometimento com a causa ambiental e um auxílio
importante nos serviços de manutenção da UC, incentivando a proteção das áreas naturais para
gerações presentes e futuras.
No início de 2015, o Programa de Agente Voluntário Ambiental foi estruturado legalmente
com a expedição de uma Instrução Normativa (IN) nº05/2015/SEMA e a partir dessa formalização,
deu-se início às ações de lançamento no final de 2016 do edital de chamamento, divulgação, seleção
de candidatos e todo o processo de cadastramento e convocação dos aprovados. Por meio de uma
análise da demanda para o trabalho voluntário e a necessidade interna da SEMA foi realizada uma
priorização das atividades voluntárias que seriam ofertadas nas seguintes UC: Parque Estadual do
Cocó, Parque Estadual Botânico, Parque Estadual do Sítio Fundão, Estação Ecológica do Pecém,
APA da Serra de Baturité, APA da Bica do Ipu e na Célula de Conservação da Diversidade
Biológica – CEDIB.
Já, no ano de 2019, a Secretaria do Meio Ambiente, por meio da Célula de Conservação da
Diversidade Biológica – CEDIB, publicou o 2º edital para selecionar 20 (vinte) voluntários que irão
executar atividades relacionadas à gestão das Unidades de Conservação estaduais.
Vale destacar a inserção de mais UC para esta edição do Programa. Além das já citadas
anteriormente, o AVA abriu vagas também para o Monumento Natural Os Monólitos de Quixadá, o
Monumento Natural das Falésias de Beberibe e para a Área de Relevante Interesse Ecológico do
Sítio Curió.
As atividades priorizadas para os voluntários atuarem são: prestação de informações aos
visitantes; desenvolvimento de projetos de educação ambiental e pesquisa; manutenção de trilhas e
instalações; apoio às populações do entorno; desenvolvimento de trabalhos administrativos; auxilio
na brigada de incêndios; apoio na busca e resgate; recuperação de áreas degradadas; e auxílio na
implementação de projetos de manejo das UC.
Os processos seletivos de 2016 e 2019 foram realizados levando em consideração o
conhecimento e a experiência do candidato correspondente à atividade escolhida, bem como aos
trabalhos em andamento na UC. Os critérios adotados baseavam na análise do currículo e da ficha
cadastral, como também desempenho em entrevista.
Constata-se que o Programa está sendo satisfatório em vários aspectos, dentre eles: a efetiva
participação cidadã de voluntários (moradores do entorno) em atividades de conservação e
conscientização na UC; a parceria com importantes órgãos públicos e Universidades; além de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

continuar tendo uma boa repercussão nos meios de comunicação por meio de várias matérias e
reportagens na TV, jornais e redes sociais. Destaca-se que as atividades do programa de voluntários
têm contribuído para o encaminhamento de estratégias de solução para uma série de problemas e
conflitos ambientais nas UC do Estado do Ceará.

4. CONCLUSÃO
Assim, é importante que a experiência bem-sucedida do Programa AVA se espalhe para
outras UC estaduais do Ceará. Com novas iniciativas e demandas que se multiplicam, cada vez mais
pessoas se juntam à causa do meio ambiente e passam a exercer sua cidadania ambiental e a cuidar
das áreas protegidas do Estado.
Logo, cabe ressaltar que o trabalho do voluntariado é algo constante e atemporal, o sucesso
do programa depende do aumento da sensibilidade da comunidade em enxergar o Programa AVA
como uma parceiro a mais para a conservação da biodiversidade cearense. No caso prático, a
avaliação feita pela coordenação do AVA é positiva, pois até o momento já foi efetivada 01(uma)
voluntária no quadro permanente de funcionários da UC do Parque Botânico.

5. AGRADECIMENTOS
Primeiramente, à direção superior da SEMA por apoiar o Programa. Também é primordial
agradecer a todos os Gestores de UC que contribuem para o sucesso do AVA, como também a
todos os voluntários que acreditaram e prestaram serviços em prol da gestão das Unidades de
Conservação estaduais.

6. REFERÊNCIAS
CEARÁ. Instrução Normativa nº 05 de 06 de julho de 2015. Cria o Programa Agente Voluntário
Ambiental (AVA) em Unidades de Conservação da Secretaria do Meio Ambiente. Diário Oficial
do Estado: série 3, Fortaleza, CE, ano VII, n. 124, p. 1-175, 08 jul. 2015.

HUDSON, M. Administrando organizações do terceiro setor. São Paulo: Makron Books, 1999.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed. São


Paulo: Atlas, 2003.

ONU. Relatório do estado do voluntário no mundo. Reino Unido: Prime Production, 2011.

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A RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO AVENTUREIRO,


ILHA GRANDE-RJ: PERSPECTIVAS E DESAFIOS
SUSTAINABLE DEVELOPMENT RESERVE OF AVENTUREIRO, ILHA GRANDE-RJ:
PROSPECTS AND CHALLENGES

Córa Hisae Hagino*

*Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito, UFF, Brasil

INTRODUÇÃO
O objeto de estudo desta pesquisa é a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do
Aventureiro, localizada em uma praia da Ilha Grande, no estado do Rio de Janeiro. Esta área inclui
uma porção terrestre e uma área marítima.
Anteriormente, este território terrestre fazia parte de uma Reserva Biológica instituída em
1981: a Reserva Biológica da Praia do Sul. A Reserva biológica é uma unidade de conservação de
proteção integral, de acordo com o SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação). Logo,
este tipo de unidade não permite a presença humana em seu interior, exceto para fins de pesquisa
com a autorização do órgão competente.
No entanto, antes da criação da Reserva Biológica da Praia do Sul, já existia um povo
tradicional há mais de um século que vivia da pesca, roça e caça: o povo do Aventureiro (Vilaça;
Maia, 2000). Esta unidade de conservação foi implementada sem consulta à população local, que
sofreu muitas limitações em seu modo de vida, pois foi impedida de praticar os atos necessários à
sua sobrevivência (roçar, caçar e construir) ou mantê-los na clandestinidade.
Os conflitos foram aumentando com o passar do tempo, enquanto a população do
Aventureiro aumentava e com o início do turismo esta situação se agravou. Com a implementação
da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual surgiram novas perspectivas aos moradores
que puderam viver do turismo de base comunitária, no entanto ainda há diversos desafios na
implantação efetiva da RDS, que serão apresentados no artigo.
Sobre a escolha do objeto de estudo ser um conflito ambiental utilizo a intervenção de Henri
Acserald (2004, p.10):

Estudar estes mesmos conflitos é, por sua vez, para os envolvidos na busca dos processos
mais democráticos de ordenamento do território, a ocasião de dar visibilidade, no debate
sobre a gestão das águas, dos solos, da biodiversidade e das infra-estruturas urbanas, aos
distintos atores sociais que resistem aos processo de monopolização dos recursos
ambientais nas mãos dos grandes interesses econômicos.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Por esta razão, realizamos um estudo de caso do conflito socioambiental do Aventureiro e a


implementação de uma nova unidade de conservação, a fim de dar visibilidade aos seus atores
sociais e suas demandas.

MATERIAL E MÉTODO
Esta pesquisa possui como objetivo analisar o impacto da Reserva de Desenvolvimento
Sustentável do Aventureiro no modo de vida dos seus moradores, buscando averiguar os impactos
ambientais e sociais desta nova unidade de conservação cerca de cinco anos após sua
implementação legal.
A pesquisa relatada foi realizada através de observação participante em 8 reuniões e 1
oficina do Grupo de Trabalho Aventureiro que contaram com a participação de moradores, gestores
e pesquisadores (anos de 2007 e 2008), além de entrevistas semiestruturadas1 aos moradores e
gestores2 do período em que participaram do Grupo de Trabalho para propor a exclusão da Vila do
Aventureiro dos limites da Rebio-Sul. Em período posterior à implantação da RDS (2018 e 2019)
foram realizadas entrevistas exploratórias não estruturadas e 30 questionários aos moradores3 do
Aventureiro sobre o impacto da RDS e observação participante no dia-a-dia da população local, em
especial no período de grande impacto turístico, como réveillon e feriados prolongados.
A metodologia utilizada se baseia no referencial teórico de Geertz (1997) e Oliveira (2000).
Como realizo uma etnografia, tendo vivido 55 dias em uma primeira fase na Praia do Aventureiro
(2007-2008) e 26 dias em um segundo momento (2018-2019), utilizo o referencial teórico como
aporte no being there e being here, no qual Geertz (1997) marca a distinção entre o trabalho no
campo e fora dele. Por outro lado, Oliveira (2000) apresenta o “Ver, ouvir e escrever”, sendo as
duas primeiras fases no campo e a última na solidão da escrita do pesquisador.

RESULTADO E DISCUSSÃO
A implementação da RDS
A criação da Rebio-sul em área anteriormente ocupada pelo povo do Aventureiro, sem
qualquer tipo de participação da comunidade na decisão, trouxe inúmeros conflitos.
Inicialmente, a ideia do Estado do Rio de Janeiro era retirar os moradores e realizar uma
desapropriação, o que não ocorreu. Estes foram vivendo de forma precária até os anos 90 com o

1
Do total de 127 nativos no período (2008) e boa parte recusar a entrevista por temer os órgãos ambientais, obtemos o
total de 15 ou 12,5%.
2
15 moradores, 6 membros de órgão ambientais (Feema – Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente, Sea –
Secretaria Estadual do Ambiente do Estado do RJ, PEIG – Parque Estadual da Ilha Grande, IEF – Instituto Estadual de
Florestas), 2 membros de ONGs locais e 1 pesquisadora da UFRRJ que acompanhou o processo de recategorização.
3
Atualmente vivem 90 nativos no Aventureiro, logo cerca de 30% responderam o questionário.
591
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início do turismo após o fim do presídio na Ilha Grande. O turismo era neste momento incipiente e
baseado em campings no quintal dos moradores (Ferreira, 2004).
Na década de 1990, com o Decreto estadual no 15.983, de 27 de novembro de 1990, foi
criado o Parque Estadual Marinho do Aventureiro, sendo “vedadas a exploração dos recursos
naturais, especialmente a pesca, e qualquer atividade potencialmente poluidora. Sob controle e
fiscalização da FEEMA, será permitida a pesca artesanal”. O referido artigo 3º da lei provocou
confusão por não estabelecer uma regra clara e de acordo com cada fiscal determinada malha de
pesca era considerada ou não artesanal. Por vezes até mesmo a pesca na linha foi proibida, afetando
as atividades de subsistência e as práticas sócio-culturais como o cerco à tainha (Hagino, 2009).
Com o Decreto Federal 6.040 de 2007, povos e comunidades tradicionais foram definidos
como:
grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas
próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como
condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral, e econômica, utilizando
conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

Este Decreto reconheceu povos tradicionais que não seriam índios ou quilombolas, como no
caso do povo do Aventureiro que se autoidentica como caiçara. Antes do Decreto 6040 havia
apenas as definições de pesquisadores como Diegues (1994) que já entendia as populações
tradicionais não indígenas, como as que viviam

com isolamento relativo, essas populações desenvolveram modos de vidas particulares que
envolvem uma grande dependência dos ciclos naturais, um conhecimento profundo dos
ciclos biológicos e dos recursos naturais, tecnologias patrimoniais, simbologias, mitos e até
uma linguagem específica, com sotaques e inúmeras palavras de origem indígena e negra
(p.12)
.
Durante os anos de 2007 e 2008 houve um processo de mudança de unidade de conservação
que reduziu parte da Reserva Biológica com o objetivo de retirar o Aventureiro da Rebio-Sul. Esta
alteração se deu com a participação de moradores do Aventureiro, ONGs, pesquisadores e dos
órgãos ambientais, por meio da criação do Grupo de Trabalho do Aventureiro. Neste grupo, havia
duas hipóteses centrais, uma de transformar a área em uma APA, outra de criar uma RDS. Nos
gestores públicos em sua maioria havia o interesse em formar a primeira RDS do estado do Rio de
Janeiro. Os moradores ficaram divididos entre APA e RDS, já que alguns acreditavam que a APA
seria mais benéfica por lhe permitir a venda da casa, mesmo estando em uma ilha. Neste embate
prevaleceu a visão dos gestores e de parte da comunidade, sendo criada a primeira Reserva de
Desenvolvimento Sustentável do Rio de Janeiro: RDS do Aventureiro.

592
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Após a criação da RDS


Acriação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Aventureiro pela Lei estadual nº
6793 de 28 de maio de 2014 reduziuo limite da Reserva Biológica Estadual da Praia do Sul em 2,7
por cento e extinguiu o Parque Estadual Marinho do Aventureiro. Esta RDS tem por objetivo:
“conciliar a preservação dos ecossistemas locais com a cultura caiçara, valorizando os modos de
vida tradicionais, assim como as práticas em bases sustentáveis desenvolvidas pela população
tradicional beneficiária da unidade” (artigo 3º).
Apenas a população beneficiária da RDS após à publicação da lei estadual pode residir e
pescar de modo artesanal na reserva. São elas: as pessoas que já residiam no povoado do
Aventureiro à época de criação da Reserva Biológica da Praia do Sul; seus descendentes;
ou ainda, as pessoas casadas ou em regime de união estável com quem já lá morava. No entanto, no
decorrer da pesquisa de campo nota-se a presença de pessoas “de fora” do Aventureiro ali residindo,
que não se encontravam no período da implementação da lei estadual.
A lei de criação de RDS estabeleceu ainda que a posse, assim como o uso das áreas
ocupadas seriam regulados por contrato vitalício e sucessório de Concessão de Direito Real de Uso
e foram vedadas novas construções na área da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do
Aventureiro. Estes contratos previstos não foram realizados. E, ainda, as reformas de expansão e
melhoria e o aumento do número de construções, em especial de quartos para aluguel de turistas,
têm sido feitos pelos moradores sem qualquer análise do INEA.
Por fim, a legislção previa que o Poder Executivo, em noventa dias, procederia no
cadastramento da população tradicional beneficiária, até a aprovação do Plano de Manejo da RDS
do Aventureiro. No entanto, a crise econômica que afetou o Estado do Rio de Janeiro a partir de
2014, seguida por uma crise política não permitiu que se desse andamento a maior parte das
propostas previstas na lei da criação da RDS. Nem mesmo a fiscalização da lotação máxima total de
560 turistas vem ocorrendo. Não houve criação do plano de manejo e nem do conselho deliberativo.
Os próprios moradores do Aventureiro também se desmobilizaram com a criação da RDS, não
havendo mais liderança na associação de moradores.

CONCLUSÃO
Esta pesquisa encontra-se em andamento, mas já é possível concluir que não foram muitas
as alterações trazidas de fato pela RDS para a comunidade do Aventureiro. A Reserva de
Desenvolvimento Sustentável do Aventureiro não teve um conselho formado e nem plano de
manejo realizado mesmo após cinco anos de sua criação por lei.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Além disso, continua não havendo um controle efetivo sobre a quantidade de turistas na
RDS, fato que já ocorria, mas com menor frequência no período em que o Aventureiro se
encontrava na Rebio-Sul.
Não há dúvidas de que a RDS foi a melhor solução para a comunidade do Aventureiro por
permitir sua existência e reprodução sócio-cultural, no entanto a ausência de um conselho e plano
de manejo que possam regular como se dará esta vivência e o impacto dos turistas representam uma
ameaça ao meio ambiente e ao próprio povo do Aventureiro.

AGRADECIMENTOS
Agradeço à Capes pela bolsa de mestrado entre os anos de 2007 e 2009, que me permitiram
fazer esta pesquisa. E aos moradores do Aventureiro que me acolheram e continuam acolhendo nas
minhas inúmeras idas e retornos ao campo.

REFERÊNCIAS
ACSELRAD, Henri. 2004. Conflitos Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro, Relume Dumará.

BRASIL. Decreto Federal nº 6.040 de 7 de Fevereiro de 2007. Institui a Política Nacional de


Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Brasília.

________ Lei Federal nº 9.985 de 18 de Julho de 2000. Institui o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (Snuc). Brasília.

DIEGUES, Antonio Carlos. 1994. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo, Editora
Huicitec.

FERREIRA, Helena Catão Henriques. Redefinindo territórios: preservação e transformação no


Aventureiro – Ilha Grande RJ. Dissertação de mestrado, CPDA-UFRJ, 2004.

GEERTZ, Clifford. O saber local: fatos e leis em uma perspectiva comparativa. In: Clifford Geertz,
O Saber Local. Tradução de Vera Mello Joscelyne. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

HAGINO, Córa Hisae. O conflito sócio-ambiental no processo de recategorização da Reserva


Biológica da Praia do Sul, Ilha Grande, Angra dos Reis-RJ: a Praia do Aventureiro em
disputa. Dissertação de Mestrado, PPGSD/UFF, 2009.

OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. “Identidade Étnica, Identificação e Manipulação” In: Identidade,
Etnia e Estrutura Social. São Paulo: Livraria Pioneira Editora, 1976.

OLIVEIRA, Roberto Cardoso de. O trabalho do antropólogo. 2 ed. São Paulo: Editora, Unesp,
2006.

RIO DE JANEIRO. Lei nº 6793 de 28 de maio de 2014.Dispõe sobre a criação da Reserva de


Desenvolvimento Sustentável do aventureiro, na Ilha Grande, município de Angra dos Reis,
resultante da redução do limite da Reserva Biológica Estadual da Praia do Sul e da recategorização
do Parque Estadual Marinho do Aventureiro, e dá outras providências. ALERJ, 2014.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

VILAÇA, Aparecida; MAIA, Angela. 2000. “O povo do Aventureiro” In Prado, Rosane Manhães
(org). Ilha Grande: do sambaqui ao turismo. Rio de Janeiro, Garamond /EDUERJ.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

RESTRIÇÕES A PESCA ARTESANAL NO COMPLEXO ESTUARINO DE


PARANAGUÁ
Mayra Jankowsky*; Jocemar Tomasino Mendonça**; Diego Morroni***

*Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio, mayra@fundepag.br; **Instituto de Pesca/SAA/SP,


jocemar.mendonca@gmail.com; ***Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio, diego@fundepag.br

1. INTRODUÇÃO
A atividade pesqueira desenvolvida pelos pescadores do litoral paranaense em sua grande
maioria é artesanal (BRASIL, 2015) e de baixa escala (MENDONÇA et al., 2018). No entanto, é
regida especialmente na porção estuarina por um complexo aparato normativo que em grande parte
coloca a pesca artesanal na irregularidade (CALDEIRA et al., 2014). A dificuldade em reconhecer a
importância e dar o devido valor da pesca artesanal é uma dificuldade encontrada no mundo todo
(JOHNSON, 2018). No Complexo Estuarino de Paranaguá historicamente não houve o
reconhecimento dos direitos das comunidades tradicionais. Em 1982, foi criada a Estação Ecológica
de Guaraqueçaba, sobre extensa área de manguezal. Em 1985, foi decretada a APA de
Guaraqueçaba e finalmente, em 1989, foi decretado o Parque Nacional do Superagui. Nas três
Unidades de Conservação haviam moradores e usuários, com destaque aos pescadores artesanais.
Com a aprovação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação em 2000, e seu decreto
regulamentador, a necessidade de reconhecer as comunidades tradicionais residentes das Unidades
de Conservação foi estabelecido por lei. Na região de estudo, a partir de 2004 foi criada a Câmara
Técnica de Pesca (CT Pesca), reconhecendo a existência da atividade tradicional nas UCs (TEBET
et al., 2018).
Somado as restrições impostas pela criação da Estação Ecológica e do Parque Nacional, o
Estado do Paraná possui várias normativas que trazem restrição a pesca(CALDEIRA et al.,
2014).Destaca-se que na elaboração destas regulamentações haviam poucos dados do setor
produtivo, e sua construção se deu no processo conhecido como top-down, sem a participação da
comunidade pesqueira.
O presente trabalho visa analisar as normativas pesqueiras existentes na porção norte do
Paraná no contexto de produtividade e pescadores envolvidos, bem como as perspectivas de gestão
pesqueira da região.

2. MATERIAL E MÉTODO

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Este trabalho utiliza o recorte geográfico do Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP), que
abrange o território pesqueiro utilizado por pescadores artesanais de Guaraqueçaba, Antonina e
Paranaguá. Inicialmente, foram estudadas as restrições a cada tipo de pesca e petrecho,
estabelecidos pelas UCs e Portarias IBAMA nº102-N, de 1992 (BRASIL, 1992) e nº 12 de 2003
(BRASIL, 2003) que trazem diversas restrições a pesca no complexo estuarino. Devido a
importância do recurso caranguejo-uçá também consideraremos a Portaria IAP nº 180 de 2002.
Dada a forma como é permitido o emalhe-de-superfície na IN IBAMA nº 166 de 2007, que tornou
esta prática inviável, a mesma também será considerada. Com o uso do Quantum GIS, sobrepomos
as restrições com os dados do monitoramento pesqueiro.
O monitoramento pesqueiro no litoral do Paraná iniciou em outubro de 2016. É realizado de
forma censitária(MIRANDA et al., 2016), por 13 agentes de campo, membros da comunidade
pesqueira ou com inserção na mesma para monitorar 110 pontos de desembarque ou portos de saída
nos seis municípios. As etapas de armazenamento, processamento, análise e disponibilização das
informações são realizadas através do Sistema Gerenciador de Banco de Dados de Controle
Estatístico de Produção Pesqueira Marítima – ProPesqWEB (ÁVILA-DA-SILVA et al., 1999). Os
dados coletados permitem caracterizar a viagem de pesca (JANKOWSKY et al., 2017).
Assim, este trabalho quantifica as pescarias proibidas, com base nos dados coletados no ano
de 2018, e traz sua importância econômica para a comunidade pesqueira. Somado a este resultado,
trazemos um panorama do funcionamento da CT Pesca e perspectivas para a gestão de conflitos na
região.

3. RESULTADOS
A primeira restrição é posta pela criação da Estação Ecológica, em áreas de manguezal,
colocando a retirada de caranguejo-uçá, ostra e mexilhão do mangue ilegais nessa região. O mesmo
ocorre posteriormente, como a criação do Parque Nacional. Já em 1992, a Portaria IBAMAnº 102-N
traz um polígono na baía de Paranaguá com restrição ao uso de redes de qualquer tipo, pesca
subaquática e captura de sardinha. Em 2003, a Portaria IBAMA nº 12 regulamenta a pesca em todos
os estuários e regiões lagunares do Paraná. Ela permite nessas regiões apenas o gerival e tarrafa,
com tamanho de malha 2.5 cm, sendo a tarrafa permitida apenas pra captura de camarões e isca-
viva; rede tipo feiticeira com malha mínima de 20 cm, redes fixas com malha mínima de 10 cm e
altura máxima e 3 metros, redes de cabo para captura de sardinhas, redes de calão para captura de
parati, com malha mínima de 10 cm, e emalhe na modalidade de lanço com malha mínima de 6 cm.
A rede de caceio é permitida apenas em um pequeno polígono entre a Ilha das Peças, Ilha das
Cobras e Ilha do Mel. Todas as outras artes de pesca foram proibidas. A instrução IAP para o
caranguejo-uçá permite sua captura apenas entre o mês de dezembro e início de março, sem o uso
597
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de armadilhas e a IN IBAMA nº 166 estabelece que o emalhe de superfície fique abaixo de 2 metros
na superfície.
A Tabela 1 traz a quantidade de pescado capturado de forma irregular e/ou ilegal e a Tabela
2 o número de unidades produtivas (pescador ou embarcação) que praticaram pescas irregulares
e/ou ilegais no ano de 2018. Aqui unidade produtiva se refere diretamente ao pescadorou a
embarcação, podendo uma embarcação representar mais de um pescador.

Tabela 1. Quantidade e porcentagem de pescas permitidas, proibidas e não classificada em cada


município e no CEP
Legalidade Guaraqueçaba Antonina Paranaguá Total Porcentagem
Permitida 129.997,04 8.387,86 74.806,14 213.191,04 25,56
Proibida 185.555,15 8.788,44 345.911,45 540.255,04 64,77
Não classificado 80.680,00 - - 80.680,00 9,67
Total 396.232,19 17.176,30 420.717,60 834.126,09 -

Tabela 2. Número de unidades produtivas de cada município atuando no período e quantidade de


praticando alguma pescaria irregular/ilegal.
Município Total Proibida %
Guaraqueçaba 560 392 70,00
Antonina 67 56 83,58
Paranaguá 346 241 69,65
Total 973 689 70,82

Na Tabela 1 consideramos como não classificado a pesca da sardinha-xingó. O aparelho de


pesca utilizado estaria permitido, não entanto, a permissão se dá apenas para sardinhas. Ainda que o
nome popular da espécie em questão seja “sardinha”, se trata de uma manjuba, Cetengraulis
edentulus. Assim, há uma dúvida se esta pesca estaria permitida ou proibida.
Ainda desconsiderando essa dúvida sobre a interpretação do aparato legal, os resultados
mostram que cerca de 70% das unidades produtivas praticam alguma pesca irregular/ilegal.
Aproximadamente 65% de todo o pescado do CEP também foi obtido de forma irregular/ilegal em
2018.
Ainda que os resultados sejam preocupantes, na CT Pesca, único fórum possível para a
discussão das normativas. Embora exista esta câmara, a que tem tomado suas ações é a CT de
Comunidades Tradicionais, que vem se debruçando sobre a permissão, em caráter experimental da
pesca com cerco-fixo, também proibido pela IN IBAMA nº 12/2003. Além disso, os pescadores
mais envolvidos na CT também estão buscando definir um protocolo de consulta para a pesquisa
nas comunidades tradicionais, o que tem tomado a agenda do grupo, impedindo uma análise mais
abrangente da atividade pesqueira na região e buscando resultados mais rápidos e produtivos.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. DISCUSSÃO
O aparato normativo desrespeita as dinâmicas locais da pesca e as múltiplas escalas
relacionadas ao seu contexto, dificultando a resiliência e sustentabilidade desse sistema
socioecológico(MEDEIROS et al., 2014). A legislação estanque, proibindo qualquer atividade,
como ocorre na Estação Ecológica e no Parque Nacional, ou proibindo qualquer pesca não citada
em uma lista restrita de petrechos, como na IN IBAMA nº 12/2003, são contrárias a proposta de
gestão adaptativa e compartilhada. No Brasil e no mundo, há diversas iniciativas bem-sucedidas
para a gestão pesqueira que se pautaram no compartilhamento da gestão (SEIXAS et al., 2005;
BERKES et al., 2006; FERNANDES et al., 2014; MADEIRA et al., 2018). Destaca-se ainda que a
pesca artesanal tem sido apontada como uma prática mais sustentável, muitas vezes ligada a
segurança alimentar e manutenção do modo de vida tradicional (PAULY, 2006). Mesmo de forma
contraditória, o único fórum de discussão local que reconhece o direito dos pescadores é a CT de
Comunidades Tradicionais instituída devido a existência das Unidades de Conservação (TEBET et
al., 2018). No entanto, este fórum ainda apresenta limitações, não tendo conseguido avançar para
um modelo efetivo de gestão compartilhada.

5. CONCLUSÃO
Não há indicativo ecológico da necessidade de restringir ao menos 65% da pesca artesanal
no CEP. Pelo contrário, ao considerarmos a pesca artesanal inserida em um sistema socioecológico
complexo, a manutenção da atividade remete a continuidade do modo de vida tradicional, o qual
pode trazer ricos elementos a gestão, desde que esta seja compartilhada. Há necessidade urgente de
revisão completa das normativas aqui colocadas, especialmente da IN IBAMA nº 12/2003, que traz
um modelo estanque para a pesca.

REFERÊNCIAS
ÁVILA-DA-SILVA, A.O., CARNEIRO, M.H. e FAGUNDES, L. Gerenciador de banco de dados
de controle estatístico de produção pesqueira marítima – ProPesq® In: Anais do XI Congresso
Brasileiro de Engenharia de Pesca. Recife: p. 824-832. 1999.

BERKES, F.; MAHON, R.; MCCONNEY, P.; POLLNAC, R.; POMEROY, R. (authors English
version). KALIKOSKI, D.C. (Org. Portugueseversion). Gestão da pesca de pequena escala:
diretrizes e métodos alternativos, Ed. Furg (Brasil) &IDRC (Canada), Rio Grande, 360 p. 2006.

CALDEIRA, G.A.; MAFRA, T.V.; MALHEIROS, H.Z. (2016). Limites e possibilidades para a
gstão participativa da pesca no litoral do Paraná, sul do Brasil: experiências do Projeto “Nas malhas
da Inclusão”. Desenvolvimento e Meio Ambiente. V. 36, p. 331-353.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FERNANDES, T. A. C.; MACHADO, I.; JANKOWSKY, M.; NORDI, N. Reserva Extrativista


como espaço de gestão compartilhada: a atuação coletiva na Resex do Mandira, SP. In: Manejo e
Conservação de Áreas Protegidas.1ed.Viçosa: UFV, 2014, v.1, p. 119-136.

MADEIRA, J. A.; MÜLLER, B.R.; MEDEIROS, R.P.; GIRALDI, A.C.; MENDONÇA, J.T.;
ALVITE, C. STEENBOCK, W.; CORRE, F.M. 2018. Termo de Compromisso: Conciliação
permite a pesca em unidade de proteção integral recém-criada pelo poder legislativo. In: Boas
práticas na gestão de unidades de conservação – ICMBio, Brasília. 149-152p.

MEDEIROS, R.P.; SERAFINI, T.Z.; McCONNEY, P. (2014). Fortalecendo o


ecosystemstewardship na pesca artesanal: perspectivas para a América Latina e Caribe.
Desenvolvimento e Meio Ambiente. V. 32, p. 181-191.

MENDONÇA, J.T., LUCENA, A.C.M., MUEHLMANN, L.D., & MEDEIROS, R.P. (2017).
Socioeconomia da pesca no litoral do estado do Paraná (Brasil) no período de 2005 a 2015.
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MIRANDA, L.V.; KINAS, P.G.; MOREIRA, G.G.; NAMORA, R.C.; CARNEIRO, M.H. (2016).
Survey sampling for fisheries monitoring in Brasil: implementation and analysis. Brasilian Journal
of Oceanography. V.64(4), p. 401-414.

PAULY, D. (2006) Major trends in small-scale marine fisheries, with emphasis on developing
countries, and some implications for the social science. Marit. Stud. 4(2):7-22.

SEIXAS, C.S.; KALIKOSKI, D.C., ALMUDI, T., BATISTA; V.S.; COSTA, A.L.; DIOGO, H.L.;
FERREIRA, B.P.; FUTEMA, C.R.T.; MOURA, R.L.; RUFFINO, M.L.; SALLES, R.; THÉ, A.P.G.
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nacional. Ambiente&Sociedade. V. 14(1), p. 23-44.

TEBET, G.; TRIMBLE M. & MEDEIROS, R.PE. (2018) Using Ostrom´s principles to assess
institutional dynamics of conservation: Lessons from marine protected area in Brazil. Marine
Policy.V. 88, 174-181.

600
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A QUALIDADE DA GOVERNANÇA NO ÂMBITO DO CONSELHO


GESTOR DA RESEX CHICO MENDES, ESTADO DO ACRE, BRASIL
QUALITY OF GOVERNANCE WITHIN THE RESEX CHICO MENDES MANAGEMENT COUNCIL,
STATE OF ACRE, BRAZIL

Íria de Oliveira Santos*, Carlos Eduardo Marinelli**, Rogério Cabral***


Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
(INPA).*(Autor Correspondente). E-mails: iriadeoliver@gmail.com
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). **(Orientador). E-mail: caenscgrupo@gmail.com
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Brasil. ***(Co-orientador). cabral.rogerio@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
Ao longo dos 28 anos de criação das Reservas Extrativistas no Brasil, há esforços em
diversas organizações para que a governança local das áreas protegidas possa ser exercida, de forma
a consolidar a gestão dos Conselhos Gestores enquanto espaço de tomada de decisão local. No
entanto, mesmo com os avanços, dificuldade em chegar à “boa governança” é uma realidade para
muitas Unidades de Conservação - UCs (LOCKWOOD, 2010; COZZOLINO et.al., 2015 e
MARINELLI, 2016).
Portanto, partindo do pressuposto de que o Conselho Gestor Deliberativo da Resex Chico
Mendes (CGD da RCM) está entre os Conselhos com dificuldade em chegar à “boa governança”,
sobretudo no processo de tomada de decisão e operacionalização destas, a pesquisa que embasou
este trabalho teve por objetivo analisar o processo de governança local no âmbito do CGD da RCM.
Estas dificuldades ocorrem por que nem sempre o que está “no papel” (leis e regulamentos) torna-se
prática. A prática não ocorre, muitas vezes, por falta de estruturação dos Conselhos para a tomada
de decisão adequada à realidade local (MARINELLI, 2016).
Diante ao exposto, neste trabalho destacar-se-á a análise da qualidade da governança do
CGD da RCM, cujo objetivo é verificar se o conselho atende aos parâmetros de “boa governança”
elencados por Lockwood (2010), que é parte da pesquisa que analisou a governança no âmbito do
CGD da RCM. A pesquisa foi desenvolvida por pesquisador que atua em UCs há 12 anos, dentre os
quais atua como um gestor da Resex Chico Mendes desde 2012 até os dias atuais.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi realizado no Conselho Gestor Deliberativo da Resex Chico Mendes (CGD da
RCM).A RCM teve seu Conselho criado em maio de 2003, composto por 27 instituições, renovado
em 13/02/2014, composta por 24 representações.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O processo de governança no CGD da RCM foi analisado, principalmente, quantoà


qualidade e operacionalização da tomada de decisão. Para isso, os métodos foram definidos com
foco em um dos pilares da governança (Como são tomadas as decisões) elencados por Graham et al.
(2003).
A análise da qualidade da governança local do CGD da RCM foi realizada com base em
observação participante natural em duas reuniões (reuniões 1 e 2) deste Conselho. Esta técnica de
coleta de dados permite perceber e examinar aspectos da realidade (MICHEL, 2015) quando o
observador pertence à mesma comunidade ou grupo que investiga (GIL, 2008).Além de análise das
Atas das 12 últimas reuniões do Conselho (período de maio de 2013 até março de 2018).Assim,
utilizou-se os parâmetros de governança adotados por Marinelli (2016, adaptado de LOCKWOOD,
2010). Lockwood (2010) define a boa governança com base em 7 princípios (legitimidade,
transparência, responsabilização, inclusão, resiliência, conectividade e justiça) subdivididos em 30
parâmetros. Adotou-se a proposta de Marinelli (2016) que mantêm 19 desses parâmetros e excluem
outros 11 aplicáveis a sistemas de áreas protegidas e não a uma área protegida em específico.
Para analisar o atendimento a esses parâmetros foram utilizadas as seguintes categorias de
avaliação: sim, predominantemente sim, em parte, predominantemente não e não. Quando
constatado algo contrário ao parâmetro de boa governança isso influenciou a classificação do
mesmo em uma categoria menos desejada.
Utilizou-se os resultados dos outros doisobjetivos da dissertação que originou este artigo: 1.
Diagnóstico da estrutura de tomada de decisão da RCM, cujo principal metodologiafoi a análise de
Atas do CG da RCM; e 2. Avaliação do Processo de Tomada de Decisão no Âmbito do CG da
RCM Adotando Parâmetros da Metodologia de Apoio à Governança denominada Sistema de
Indicadores socioambientais para Unidade de Conservação – SISUC (MARINELLI, 2011).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Sete parâmetros foram classificados como atendido “em parte”. As categorias “sim” (=
parâmetro atendido) e parâmetro “predominantemente atendido”, atingiram outros 7 parâmetros. As
categorias parâmetro “não” atendido e parâmetro “predominantemente não” atendido, totalizaram
outros 5 parâmetros.
O atendimento aos parâmetros de boa governança ocorreu mais na segunda reunião
observada do que na primeira reunião observada para todos os 07 (sete) princípios
analisados(Legitimidade, Transparência, Responsabilidades, Inclusão, Justiça, Conectividade e
Resiliência). Portanto, quando a classificação atingiu resultados mais desejados (“sim”,
“predominantemente sim” e “em parte”) o único evento que diferenciou essas reuniões das demais

602
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

foi o Plano de Ação e seu monitoramento. A análise foi organizada de acordo com os 07 (sete)
princípios.
Quanto ao princípio legitimidade, ou seja, quem tem o direito de fazer as regras e como a
própria autoridade é gerida no Conselho (LOCKWOOD, 2010), observou-se que, em parte, o CGD
da RCM atua de acordo com o seu mandato e com o propósito da Unidade de Conservação (UC). O
Conselho “em parte” está atuando de acordo com seu mandato, pois apesar de existir a relação de
instituições-membro do Conselho da RCM aprovada pelo mesmo, ainda não foi publicado portaria
atualizando a nova composição do Conselho, conforme indicado em seu Regimento Interno (RI)
(IBAMA, 2005).
Parte do que foi proposto pelos membros do Conselho Gestor (CG) e pelos demais
participantes da reunião está de acordo com os propósitos da UC. Mas, foram apresentadas
propostas, que embora explícitas no Plano de Utilização da UC (ICMBio, 2012), verificou-se
conflito sobre como deve ser tomada a decisão em relação a elas.
Em relação ao princípio transparência, embora tenha sido observada, majoritariamente,
situação positiva evidenciando tendência à transparência, há alguns pontos negativos que devem ser
considerados. Mesmo que a governança e tomada de decisão estejam sendo abertas para
participação dos conselheiros, e no caso do CGD da RCM, aberto também para os demais
participantes, nem sempre as informações são suficientes e/ou são socializadas/apresentadas de
forma adequada às necessidades dos Conselheiros e demais participantes. Isso pode levar ao fato de
que nem sempre seja possível verificar se as razões por trás das decisões são evidentes, o que
contribui para que conselheiros não consigam enxergar claramente os sucessos e falhas, o que a
médio e longo prazo pode comprometer o nível de transparência hoje verificada no Conselho.
Quanto ao princípio da responsabilidade, pode-se inferir que “em parte” é exercitado e
evidenciado no âmbito prático, muito embora, este não seja plenamente exercido dentro do CGD da
RCM. Lockwood (2010) expõe que definir papéis e responsabilidades e ter aceitação destas
responsabilidades por meio de planos e atividades são condições que auxiliam a promoção de
prestação de contas eficaz e a chegada à boa governança de áreas protegidas. Neste sentido,
verificou-se que o Conselho possui seu Regimento Interno (IBAMA, 2005), documento que define,
entre outras questões, os papéis e responsabilidades dos conselheiros. Porém, apenas parte dos
conselheiros tem clareza sobre seus papéis e responsabilidades.
Ainclusão pode ser identificada no âmbito do CGD da RCM. Porém, não é plenamente
aplicado. Isto leva a inferir, quando se propõe “inclusão como um elemento de participação”
(ALBUQUERQUE, 2016, p. 101), que a falta de plena inclusão dos residentes da UC em sua gestão
pode interferir nos resultados das decisões tomadas pelo Conselho. A questão não é a inclusão em si
dos conselheiros que leva à classificação de “em parte” o Conselho é inclusivo, mas sim, se há uma
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

justa representatividade dos moradores da Unidade no Conselho ou se o fluxo de informação entre


ICMBio, Conselho e comunidades possibilita a inclusão/participação dos residentes na Unidade.
Quanto ao princípio justiça, nota-se que o Conselho procura respeitar tantos os direitos
humanos quantos os direitos das populações tradicionais e procura refletir sobre os direitos sociais e
sobre alternativas para socializar tanto os direitos quantos deveres das populações residentes.
Mesmo assim, nem sempre as decisões são tomadas de maneira consistente e sem enviesamento.
Isso pode influenciar na justiça e levar a questionamentos, tais como: 1. Até que ponto o Conselho
está sendo justo ao tomar decisões e pode confiar na veracidade das informações repassadas? e 2.
Até que ponto as decisões tomadas refletem o que de fato se discute nas reuniões?
Em linhas gerais, a conectividade do Conselho é um tanto baixa. O CG “predominantemente
não” é efetivamente conectado com colegiados de diferentes níveis de governança, visto que
existem os colegiados dos Coordenadores de Núcleos de Base na Unidade, mas os mesmos não
apresentam funcionamento uniforme em todas as áreas da UC. A falta de conectividade com
colegiados de diferentes níveis pode trazer mais problemas para o Conselho e consequentemente
para a gestão da Unidade e interferir no fluxo de informação entre moradores, Conselho e órgão
gestor. Isso pode interferir no principio transparência, que reflete na adequação de informações
para tomada de decisões condizentes com a realidade da Unidade.
Do ponto de vista prático, o princípio da resiliência, foi pouco exercido no Conselho nas
duas reuniões observadas. Apesar de constar nos diversos regulamentos sobre Conselhos de Resex
que é permitido e até incentivado que o Conselho deva ser um espaço de troca de experiências e
aprendizagem contínua, realizar planejamento (participativo) e gestão adaptativa, na prática,
verificou-se que não é bem assim que acontece. Um dos fatores que pode explicar esta questão é a
falta de um planejamento estruturado.Apenas há registros de construção de um plano de ação
estruturado do Conselho no ano de 2017, elaborado a partir da compilação do que os conselheiros
discutiram em plenário, com a utilização da ferramenta SISUC, quando houve a possibilidade de
iniciar processo de gestão adaptativa (MARINELLI, 2016).

4. CONCLUSÃO
Pode-se inferir que o que consta nas legislações/regulamentos são orientações que, se
seguidos, permitem ao Conselho chegar à boa governança, visto a grande semelhança entre o que
elas determinam e os parâmetros de boa governança. A maior parte do que foi acordado no CGD da
RCMestá formalizado nos marcos regulatórios e, portanto, a qualidade da governança melhora
quando se coloca em prática o acordado.
Estruturar as informações contribuiu para elevar o cumprimento dos princípios de boa
governança e, consequentemente, a qualidade da governança do CGD da RCM.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A falta de padrão nas atas analisadas e a falta de registro de informações importantes


discutidas e deliberadas em Plenário dificultam a avaliação de governança com base apenas nas
Atas do CGD da RCM.

5. AGRADECIMENTOS
Ao Inpa, IFAC, SEMA e ICMBio, que ofertaram a oportunidade de cursar o MPGAP.

6. REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE. M.C.F. (2016). Modelo de Análise da Governança do TBC: Uma proposição
adaptativa a partir de diversos olhares. Tese de doutorado em administração, Universidade
Federal de Pernambuco, Recife. 291 pp.

COZZOLINO, L. F., Irving, M. D. A., & Soares, D. G. (2015). Gestão de áreas protegida: análise
dos marcos legais à luz dos princípios de governança democrática, 138–156.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. (A.S.A., Ed.), Journal Of The American
Medical Association (6th ed., Vol. 264). São Paulo, 2008.

GRAHAM, J., AMOS, B. & PLUMPTRE, T., 2003. Governanceprinciples for Protected Areas
in the 21st century: Prepared for The Fifth World Parks Congress Durban, South Africa.
Institute on Governance.

IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) (2005).
Regimento Interno do Conselho Gestor Deliberativo da Reserva Chico Mendes. Brasília: 2005.

ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) (2012). Plano de Utilização


da Reserva Extrativista Chico Mendes.Rio Branco: Resex Chico Mendes, 2012.

LOCKWOOD, M. (2010).Good governance for terrestrial protected areas: A framework, principles


and performance outcomes.Journalof Environmental Management, 91: 754-766.

MARINELLI, C. E (2011). De olho nas unidades de conservação: Sistema de Indicadores


Socioambientais para Unidades de Conservação da Amazônia Brasileira / Carlos Eduardo
Marinelli. -- São Paulo: Instituto Socioambiental, 2011.

MARINELLI, C. E (2016). Aprimoramento da governança no âmbito de Conselhos gestores


para a efetividade de unidades de conservação na Amazônia: fatores-chave, mecanismos e
impactos. Brasília. Tese de Doutorado, Universidade de Brasília, Brasília. 174 pp.

MICHEL, M. H (2015). Metodologia e pesquisa científica em ciências sociais: um guia prático


para acompanhamento da disciplina e elaboração de trabalhos monográficos. – 3. ed. – São
Paulo: Atlas, 2015.

605
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UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL: UMA


REFLEXÃO SOBRE AS RESERVAS EXTRATIVISTAS NO BRASIL
PROTECTED AREAS AND LOCAL DEVELOPMENT: A REFLECTION ON EXTRACTIVE
RESERVES IN BRAZIL

Claudia Simone da Luz Alves*, Mario Vasconcellos Sobrinho**


* Aluna do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local da
Amazônia-PPGEDAM/UFPA, Belém, PA, cluzalves@gmail.com
** Professor do Programa de Programa de Pós-Graduação em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento
Local da Amazônia-PPGEDAM/UFPA, Belém, PA, mariovas@ufpa.br

1. INTRODUÇÃO
A preocupação com a qualidade ambiental e o bem-estar humano tem gerado importantes
debates sobre a necessidade do estabelecimento de áreas protegidas, como forma de garantir a
manutenção dos recursos naturais e o desenvolvimento sustentável. A consolidação da legislação
ambiental brasileira abriu espaço para o estabelecimento de diferentes áreas protegidas, dentre elas,
as unidades de conservação da categoria Reserva Extrativista que surge como um modelo possível
de desenvolvimento social e econômico, ao mesmo tempo em que propõe a conservação do meio
ambiente. Ao destinar um territórioespecífico para uma determinada parcela da população, propõe
um novo arranjo territorial, onde a população extrativista tem a possibilidade de gerir o espaço e os
recursos naturais, direcionar os interesses sociais, econômicos e políticos e enfrentar as imposições
do capital sobre o social.
Este trabalho tem como objetivo fazer um breve apanhado sobre os principais marcos legais
aplicados às reservas extrativistas no Brasil e o papel das unidades de conservação no
desenvolvimento local. O ordenamento jurídico brasileiro é muito amplo, com diversas leis e
normativas que regulamentam o uso do território, o acesso aos recursos, o direito das populações
beneficiárias, a elaboração dos instrumentos de gestão, dentre outros. Portanto, o aprofundamento
no tema é necessário e este trabalho, embora incipiente na temática, traz uma visão geral do quanto
é necessário avançar na gestão das unidades de conservação.

2. MATERIAL E MÉTODO
Este estudo foi realizado a partir de levantamento bibliográfico sobre a legislação brasileira
aplicada às unidades de conservação e sobre o papel das reservas extrativistas no desenvolvimento
local.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
A forte industrialização e a produção de bens de consumo constituíram, por algum tempo, o
ideal de desenvolvimento de vários países. Nessa busca, a preocupação com o meio ambiente
passou a ser tema secundário. Entretanto, à medida que avançavam nos processos industriais e
econômicos, líderes locais, cientistas e sociedade em geral começaram a perceber a deterioração da
qualidade ambiental e a consequente diminuição do bem-estar do ser humano.
Essa percepção tornou-se crescente e, em 1972, em Estocolmo (Suécia), aconteceu a
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, numa tentativa de estabelecer
metas sobre o uso dos recursos naturais e proteção ao meio ambiente. Entretanto, enquanto os
países ricos defendiam a estagnação do desenvolvimento econômico, os países pobres defendiam o
crescimento “a qualquer custo”. Embora não tenham sido estabelecidas metas, o principal resultado
da Conferência foi a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente
Humano, um marco no direito internacional, pois traz no seu cerne a noção do direito humano ao
meio ambiente de qualidade.
Ainda que no Brasil tenha havido uma resistência aos princípios ambientais discutidos em
Estocolmo, pois o país vivia a era do “milagre econômico brasileiro”, investindo fortemente em
infraestrutura de estradas e energia, com a construção de hidrelétricas e o estabelecimento do
Programa Nuclear Brasileiro, esses princípios foram ganhando robustez e sendo inseridos
paulatinamente na legislação brasileira, norteando o estabelecimento da Política Nacional de Meio
Ambiente em 1981 e compondo o texto constitucional de 1988.
A Política Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei n° 6.938, de 31 de agosto de
1981, estabeleceu os princípios, objetivos e instrumentos para se alcançar o desenvolvimento
socioeconômico, amparados no respeito ao meio ambiente e no bem-estar humano. Esta lei é ampla
no sentido de estabelecer diretrizes para a política ambiental brasileira. Porém, neste trabalho, foi
feito um recorte para as unidades de conservação da categoria reserva extrativista.
Em relação às unidades de conservação, entre os princípios estão o “planejamento e
fiscalização do uso dos recursos ambientais e a proteção dos ecossistemas, com a preservação de
áreas representativas”, tendo como objetivo a “definição de áreas prioritárias de ação
governamental relativa à qualidade e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União,
dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios”, que será alcançado a partir do
instrumentode “criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público
federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse
ecológico e reservas extrativistas”;

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Com a Constituição Federal de 1988, esses princípios e objetivos foram ratificados no artigo
225, incluindo no inciso III a necessidade de se definir espaços territoriais especialmente
protegidos. A partir da Constituição de 1988, novas leis e decretos foram acrescentados ao
ordenamento jurídico brasileiro, dentre eles o Decreto Federal n° 98.897, de 30 de janeiro de 1990,
que dispõe sobre as reservas extrativistas, definindo-as como “espaços territoriais destinados à
exploração auto-sustentável e conservação dos recursos naturais renováveis, por população
extrativista”e o Decreto n° 2.519, de 16 de março de 1998, que promulga a Convenção da
Diversidade Biológica, assinada durante a Conferência do Rio de janeiro de 1992, que traz em seu
bojo as definições de “área protegida”, “diversidade biológica” e “utilização sustentável”.
Dois importantes marcos legais para as unidades de conservação foram alcançados com a
Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, definida como Lei dos Crimes Ambientais, que traz como
agravante ou qualificador da pena a ocorrência do crime dentro de unidades de conservação e a Lei
n° 9.985, de 18 de julho de 2000, que estabeleceu o Sistema Nacional de Unidades de
Conservaçãoda Natureza-SNUC, onde foram consolidadas as definições da Convenção da
Diversidade Biológica e definidos os critérios e normas para a criação, implantação e gestão das
unidades de conservação.
O avanço na legislação brasileira também reflete a pressão internacional sobre um dos países
com uma das maiores biodiversidades do mundo. A criação de órgãos como o Instituto Brasileiro de
Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis-IBAMA, através da Lei nº 7.735, de 22 de
fevereiro de 1989, e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade-ICMBio (Lei nº
11.516, de 28 de agosto de 2007) e o estabelecimento de áreas protegidas em todo o território
brasileiro tornaram o Brasil uma referência mundial na proteção ambiental.
Outro passo importante nessa consolidação ambiental foi a realização da Conferência do Rio
de Janeiro em 1992, a ECO-92, na qual foi definida a Agenda-21 que constituiu um instrumento de
planejamento para o desenvolvimento sustentável, com foco na proteção ambiental,
desenvolvimento econômico e justiça social. A partir dessa conferência, diversos debates sobre
sustentabilidade, mudanças climáticas e aquecimento global ocorreram em todo o mundo,
apontando para a necessidade de se mudar os padrões de produção, consumo e descarte, além de
trazer a concepção de que o homem não está dissociado do meio ambiente. Em 2010, durante a
10° Conferência das Partes das Nações Unidas (COP 10) da Convenção sobre Diversidade
Biológica foram estabelecidas as 20 Metas de Aichi com o objetivo de reduzir as perdas de
biodiversidade, com planejamento de ações até 2020. Ampliando essa discussão, em 2015, dando
um passo a mais na busca desse equilíbrio homem-natureza, líderes mundiais definiram, durante a
Conferência da ONU em Nova Iorque, os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (Agenda
2030).
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Decorrentes dos marcos legais citados surgiram novas legislações e decretos


regulamentadores aplicados às unidades de conservação, dentre as quais:

Tabela 01 – Normativas aplicadas às unidades de conservação


Normativa O que estabelece
Decreto n° 4.340 de 22 de agosto de 2002 Regulamenta artigos da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000.
Decreto n° 5.051 de 19 de abril de 2004 Promulga a Convenção no169 da Organização Internacional
do Trabalho - OIT sobre Povos Indígenas e Tribais.
Decreto n° 5.758 de 13 de abril de 2006 Institui o Plano Estratégico Nacional de Áreas Protegidas -
PNAP, seus princípios, diretrizes, objetivos e estratégias, e dá
outras providências..
Decreto n° 6.040 de 07 de fevereiro de 2007 Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável
dos Povos e Comunidades Tradicionais.
Instrução Normativa ICMBio n° 09 de 05 Disciplina as diretrizes, normas e procedimentos para
de dezembro de 2014 formação, implementação e modificação na composição de
Conselhos Gestores de Unidades de Conservação Federais.
Instrução Normativa ICMBio n° 07, de 21 Estabelece diretrizes e procedimentos para elaboração e
de dezembro de 2017 revisão de planos de manejo de unidades de conservação da
natureza federais.
Portaria Conjunta n° 96 de 04 de abril de Institui a Comissão das Reservas Extrativistas Federais -
2018 CONAREX no âmbito do Ministério do Meio Ambiente e do
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.
Das normativas relacionadas na tabela 01, há legislações específicas que garantem a
participação social na gestão da reserva extrativista e resguardam o direito de povos e comunidades
tradicionais. Embora o Decreto n° 8243/2014 que instituiu a Política Nacional de Participação
Social tenha sido revogado (Decreto nº 9.759/2019), o Conselho Gestor das unidades cumpre seu
papel de garantir que a população tradicional seja ouvida e que tenha papel decisório na gestão das
unidades.
Trazendo as concepções dos marcos legais brasileiros e das conferências internacionais ao
campo das unidades de conservação de uso sustentável, notadamente as reservas extrativistas, sobre
as quais se debruça este trabalho, percebe-se que ainda há um longo caminho a ser percorrido para
garantir tanto a proteção ambiental quanto o desenvolvimento das comunidades locais.
Embora nas unidades de conservação o Conselho Gestor tenha um papel preponderante, cuja
relevância é ainda maior numa reserva extrativista por se tratar de Conselho Deliberativo, percebe-
se que a população tradicional não se apropriou dos direitos conquistados pela legislação brasileira,
uma vez que esses direitos permanecem no plano teórico enquanto no dia-a-dia das populações
tradicionais o desenvolvimento sustentável é uma utopia.
Promover o desenvolvimento sustentável nas unidades de conservação implica considerar, a
partir de uma abordagem territorial, os fatores que influenciam nesse território. Saquet (2013)
aponta quatro perspectivas para essa análise: econômica; geopolítica; baseada na dinâmica política
cultural; e baseada nos conceitos de sustentabilidade e desenvolvimento local.

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Não obstante o papel das unidades de conservação na proteção de determinados


ecossistemas, as reservas extrativistas tem um papel diferenciado, pois surgiram a partir da
necessidade de se incluir na lógica de desenvolvimento populações historicamente exploradas e
esquecidas do poder público. Desde a criação da primeira RESEX, a Alto Juruá no Acre, em 1990,
o modelo se espalhou pelo país promovendo novas configurações territoriais e relações de poder
para enfrentar os processos globalizantes determinados pelo capital.
Essa resposta dada pelos atores locais à globalização foi bem explorada por Barqueiro
(2007) ao discorrer sobre desenvolvimento endógeno. O autor enfatizou a necessidade de pensar o
desenvolvimento local considerando as especificidades sociais, econômicas, políticas, culturais,
institucionais e ambientais de um determinado lugar. Froelich (1998), por sua vez, apontou o
desenvolvimento endógeno como uma possibilidade devendo-se evitar o particularismo nos
sistemas sociais e políticos buscando o equilíbrio entre o local e o global.
Nesse sentido, a reserva extrativista, além de garantir um território físico, surge também
como uma nova forma de promover o desenvolvimento social e econômico de determinada
população. Social, no sentido de que os atores locais passam a ditar as regras de como será gerido o
espaço físico e seus recursos, saindo da condição de “submissos”. Econômico, visto que saem da
situação de “explorados” e passam a estabelecer eles próprios o valor de seu trabalho. Eles buscam
o desenvolvimento econômico, o progresso, mas de forma que respeite suas tradições, seu modo de
viver, suas relações históricas e culturais com aquele espaço geográfico. Nas reservas extrativistas
marinhas isso inclui a relação do homem com as marés, o respeito ao ir e vir das águas. Nelas, o
conceito de território se amplia e alguns já chamam o território das marés de “maretório”.
Essa identidade socio-territorial foi apontada por Boiser e Canzanelli (2008) como fator
preponderante no desenvolvimento, considerando que esses processos endógenos atuam nos níveis
políticos, econômicos, científico-tecnológico (mudanças qualitativas) e cultural. Nesse sentido, é
necessário promover a coalisão entre os diversos sujeitos: população local, poder público e entes
privados. Os pactos territoriais é que promovem essa “concertação social” e transformam a
economia e a sociedade, como defendido por Tapia (2005). A estratégia de pactos territoriais se
apresenta como um dos caminhos que podem impedir o fracasso de muitos projetos, pois considera
a participação social como um dos componentes do processo de desenvolvimento.

4. CONCLUSÃO
Reservas extrativistas podem contribuir para o desenvolvimento local à medida que se
apresentam como novo arranjo territorial, com fatores sociais, econômicos, culturais e políticos
próprios, além de recursos naturais que podem impulsionar os projetos e promover o bem-estar
social. O envolvimento de diversos atores sociais (população, poder público, iniciativa privada,
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

dentre outros) é um fator-chave para que propostas de desenvolvimento tenham êxito. É preciso
pensar desenvolvimento local a partir da lógica territorial, contemplando os anseios e limitações das
populações envolvidas.

5. AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a todos que contribuíram para a realização deste trabalho.

6. REFERÊNCIAS
BARQUEIRO, A.V. Desarrollo endógeno: Teorias y políticas de desarrollo territorial. Madrid.
2007.

BOISIER, S.; CANZANELLI, G. Globalization and Local Development. Universitas Forum, 1,1,
2008.

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário
Oficial da União, 02 de setembro de 1981. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm.> Acesso em: 01 abr. 2019

BRASIL. Decreto n° 98.897, de 30 de janeiro de 1990 que dispõe sobre as reservas


extrativistas e dá outras providencias. Diário Oficial da União, 31 de janeiro de 1990. Disponível
em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D98897.htm> Acesso em: 30 abr.2019.

BRASIL. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 quedispõe sobre as sanções penais e


administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras
providências. Diário Oficial da União, 17 de fevereiro de 1998. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm>. Acesso em: 29 abr.2019.

BRASIL. Decreto nº 2.519, de 16 de março de 1998 que promulga a Convenção sobre


Diversidade Biológica, assinada no Rio de Janeiro, em 05 de junho de 1992. Diário Oficial da
União, 17 de março de 1998.Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1998/anexos/and2519-98.pdf> Acesso em: 29
abr.2019.

BRASIL. Lei n° 9.985, de 18 de julho de 2000 que regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e
VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências. Diário Oficial da União, 19 de julho de 2000. Disponível
em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>.Acesso em: 30 abr. 2019.

FROEHLICH, J.M. O Local na Atribuição de Sentido do Desenvolvimento. Revista paranaense


de desenvolvimento, 98, 1998.

ICMBIO. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Disponível


em:<https://icmbio.gov.br>. Acesso em: 20 mar. 2019.

SAQUET, M.A. Abordagens e concepções de território. São Paulo:Expressão Popular,2007.

611
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TAPIA, J. R. B. Desenvolvimento Local, Concertação Social e Governança: a experiência dos


pactos territoriais na Itália. São Paulo: São Paulo em Perspectiva, 19,1,132-139, 2005.

612
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA CONSTRUÇÃO DE ESTRATÉGIAS PARA


CONSERVAÇÃO DE ECOSSISTEMAS MARINHOS E COSTEIROS
SOCIAL PARTICIPATION IN THE CONSTRUCTION OF CONSERVATION STRATEGIES
FOR MARINE AND COASTAL ECOSSYSTEMS

Elizabeth Santos de Araújo*, Fabricio Escarlate-Tavares, Gabriela Menezes Cruz Marangon

Coordenação de Identificação e Planejamento de Ações para Conservação, Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade - ICMBio, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Os Planos de Ação Nacional para Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção (PANs)
são instrumentos de gestão e de formulação de políticas públicas que são construídos de forma
participativa, com o propósito de identificar e orientar ações prioritárias para reverter ou reduzir o
efeito negativo de atividades que expõem as espécies a riscos de extinção (LINS et al., 2018).
Dentre as medidas adotadas para a mudança do estado de conservação de espécies ou ambientes
destacam-se ações relacionadas às Unidades de Conservação (propostas de criação, ampliação e
implementação), uso sustentável da biodiversidade, ordenamento e gestão territorial, licenciamento
e compensação ambiental, pesquisas aplicadas à conservação, comunicação e educação ambiental,
manejo populacional, manejo de habitat, manejo ex situ, fiscalização ambiental, entre outros.
Os PANs contemplam a participação multilateral, envolvendo diversos segmentos da
sociedade para potencializar os esforços e racionalizar a captação e gestão dos recursos para
conservação de espécies ou ambientes foco dos PANs, buscando alcançar maior êxito na
implementação do plano. Para assegurar o comprometimento dos atores envolvidos, além de
garantir que o planejamento seja seguido da melhor forma possível, são realizadas reuniões anuais
de monitoria, para acompanhar a execução das ações e entrega de produtos, além de possibilitar os
ajustes necessários para o bom andamento do Plano.
Historicamente os PANs foram construídos com ampla participação da comunidade
acadêmica, sendo estes os principais envolvidos na definição das estratégias. Este modelo de
construção, baseado no método desenvolvido pela União Internacional para Conservação da
Natureza (IUCN/SSC, 2008), ao longo do tempo mostrou-se pouco efetivo, uma vez que não era
possível mensurar e acompanhar a execução destes planejamentos e na prática, o principal resultado
era a elaboração de documentos extremamente técnicos e completos, mas pouco aplicáveis.
O primeiro PAN foi elaborado em 2004 e, até 2009 outros nove planos, contemplando
pouco mais de 3% do total de espécies ameaçadas da fauna, foram estruturados seguindo este

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

mesmo modelo. Contudo, ao longo da implementação destes planos foi observado que a abordagem
taxonômica, por vezes em nível específico, tornava quase impossível elaborar estratégias para todas
as espécies consideradas ameaçadas de extinção. Assim, foi fundamental aprimorar e desenvolver
novos meios para que os PANs tivessem um impacto real na conservação dos organismos e seus
ambientes. Neste contexto, a inclusão de diferentes atores sociais teve um importante papel no
aprimoramento metodológico da ferramenta.
O presente trabalho pretende compartilhar a experiência de três Planos de Ação Nacionais
que contaram com ampla participação de comunidades tradicionais em sua elaboração e na
implementação de ações de conservação.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para o presente relato, foram selecionados três Planos de Ação Nacionais: PAN Manguezal,
PAN Corais e PAN Lagoas do Sul. Estes foram elaborados com enfoque em ecossistemas dos
biomas costeiro e marinho onde Povos e Comunidades Tradicionais (PCT) vivem, trabalham e se
alimentam, explorando os recursos em atividades como pesca, artesanato, turismo de base
comunitária, entre outros. Dentre os mais de 50 PANs já elaborados até o presente, estes foram, sem
dúvida, os que contaram com a maior e mais efetiva participação das comunidades locais, que são
diretamente afetadas ou beneficiadas por ações de conservação. Foram consultados os processos
administrativos de cada PAN, que constam de documentos como relatórios de oficinas, matrizes de
ações, notas técnicas, comunicações, entre outros.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
No âmbito das políticas públicas de meio ambiente, a efetiva participação social é
imprescindível para a criação e implantação de Unidades de Conservação (BRASIL, 2000), onde
também é necessário que sejam realizadas consultas públicas para elaboração e revisão de Planos de
Manejo, além da composição do Conselho, seja ele consultivo ou deliberativo, instrumentos
essenciais para a gestão da UC (BRASIL, 2002). Com o passar dos anos, a experiência mostrou que
os PANs que envolviam em sua maioria apenas acadêmicos e especialistas não obtiveram o sucesso
esperado em sua execução, uma vez que esses atores não possuíam governança para colocar em
prática ações que demandam, por exemplo, articulações internas em órgãos governamentais ou
atuação da sociedade civil no uso sustentável dos recursos ambientais. Buscando melhorar o
processo, constatou-se que é necessária a inclusão de uma maior diversidade de atores da esfera
governamental, empresas privadas, e, em alguns casos, de representantes de Povos e Comunidades
Tradicionais. Três iniciativas foram particularmente importantes neste processo de ampliação da
participação social e da representatividade de diferentes setores e esferas. Nos três casos, observa-se
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que houve ganhos tanto no processo de elaboração, agregando perspectivas e particularidades


locais, e também, potencializando a mobilização em torno das propostas elaboradas.

O Plano de Ação Nacional para Conservação das Espécies Ameaçadas e de Importância


Socioeconômica do Ecossistema Manguezal na Costa Brasileira (PAN Manguezal) é uma estratégia
para conservação e uso sustentável dos manguezais estabelecida pelo Governo Federal. Tem como
objetivo geral “Aumentar o estado de conservação dos manguezais brasileiros, reduzindo a
degradação e protegendo as espécies-alvo, mantendo suas áreas e usos tradicionais, a partir da
integração entre as diferentes instâncias do poder público e da sociedade, incorporando os saberes
acadêmicos e tradicionais, até 2019”, e sua elaboração teve duração aproximada de dois anos, com a
realização de nove oficinas participativas no total: sete em nível regional e duas em nível nacional.
Durante esse processo, houve a participação de cerca de 300 pessoas, representando 50 instituições
entre universidades, instituições governamentais e não-governamentais, e representantes de Povos e
Comunidades Tradicionais de todo o país.
O Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Ambientes Coralíneos (PAN Corais),
elaborado em parceria com o Projeto Coral Vivo, tem o objetivo de “melhorar o estado de
conservação dos ambientes coralíneos por meio da redução dos impactos antrópicos, ampliação da
proteção e do conhecimento, com a promoção do uso sustentável e da justiça socioambiental”. Foi
elaborado e consolidado em 2014, em oficinas que contaram com a presença de organizações não-
governamentais (ONGs) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), sendo
estas voltadas principalmente para a pesca artesanal e turismo de base comunitária, atividades
praticadas por populações locais, que podem impactar diretamente os ambientes recifais. Além das
reuniões anuais de monitoria, o Projeto Coral Vivo promoveu quatro encontros regionais, que
contaram com a participação de membros do PAN e outros atores locais, onde se buscou agregar
parceiros e identificar trabalhos desenvolvidos nas áreas definidas do PAN e como estes podem
contribuir para atingir os objetivos do Plano. Esses encontros possibilitaram que mais pessoas de
comunidades locais tomassem conhecimento das ações, incentivando o diálogo e troca de
experiências, e trazendo palestras com temas de interesse para associar a conservação com a
melhoria do contexto socioambiental. Entre os temas apresentados, destacam-se "Desafios e
Oportunidades para a Participação de Pescadores em Projetos de Conservação Marinha", "Programa
Pesca + Sustentável da Conservação Internacional", "Etnoconservação de Organismos Recifais" e
"Pesca Artesanal e Conservação no Espírito Santo: a visão dos pescadores".
O Plano de Ação para Conservação de Ecossistemas Lacustres e Lagunares da Região Sul
do Brasil (PAN Lagoas do Sul) envolve espécies ameaçadas da flora e fauna que ocorrem ou
utilizam esses habitat. O PAN tem como objetivo geral "melhorar o estado de conservação das
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

espécies ameaçadas e dos ecossistemas das lagoas da planície costeira do sul do Brasil, promovendo
os modos de vida sustentáveis e/ou tradicionais associados ao território". Esse Plano surgiu da
necessidade de conservação das lagoas e lagunas, juntamente com o interesse de reunir e fortalecer
iniciativas que já se encontravam em implementação na região, agregando práticas e experiências
da pesca artesanal, agroecologia, gestão de Unidades de Conservação, pecuária, educação, pesquisa,
valorização dos modos de vida tradicionais, entre outros temas.
Ao longo da implementação dos três PANs, foi observado que a participação social agregou
ao planejamento uma percepção distinta daquela estritamente acadêmica e permitiu a realização de
ações locais com efeitos regionais e globais, sobretudo pela melhoria na sensação de pertencimento
e no consequente empoderamento dos participantes. Neste sentido, a chave para a mudança de
patamar alcançado foi a ampliação da participação. O termo "participação" pode ser usado para
descrever apenas a adesão ou aceitação à proposta previamente elaborada, o que define
simplesmente um trabalho de convencimento (QUINTAS, 2006). Por outro lado, pode-se entender
que a participação "ocorre quando a população contribui, influi e usufrui de forma mais efetiva e
direta, na construção e transformação de sua realidade, através de ações organizadas" (IBAMA,
1997).

4. CONCLUSÃO
A valorização de culturas regionais, a atenção dada a opiniões de pessoas locais, e o respeito
à diversidade de ideias, podem ser chaves em processos de envolvimento comunitário (PADUA;
TABANEZ, 1997). No processo de elaboração e implementação de políticas públicas de
conservação ambiental, são essenciais, uma vez que a perda da biodiversidade também se relaciona
com a perda de diversidade cultural humana, quando modifica o modo de vida das populações
tradicionais.
Um planejamento como o PAN Manguezal encontraria dificuldades para sair do papel sem o
engajamento das comunidades, onde o mangue é fortemente associado à cultura popular,
envolvendo entidades religiosas e folclore, personagens que protegem o manguezal e afastam
aqueles que procuram destruí-lo. Este PAN, além da proteção de espécies ameaçadas de extinção,
também traz espécies de comprovada importância social e econômica, elencadas por usuários e
especialistas, para que seja promovido seu uso sustentável.
O sucesso das ações está diretamente ligado ao bom planejamento, tornando imprescindível
a atuação conjunta com diferentes instituições durante todo o processo, desde a etapa de diagnóstico
do estado de conservação das espécies até a proposição de medidas para a melhoria da situação das
espécies ameaçadas. Foi possível potencializar ações já existentes e também impulsionar iniciativas
independentes. Além disso, o aumento da representatividade de diversos setores na elaboração e na
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

implementação dos PANs proporcionou uma maior agregação de valores, conhecimentos e


experiências.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei nº 9985 de 18 de julho de 2000, que regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III
e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza e dá outras providências. Diário Oficial da União, 19 de jul. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm>. Acessado em agosto/2019. 2000.

BRASIL. Decreto nº 4340 de 22 de agosto de 2002, que regulamenta artigos da Lei nº 9.985, de
18 de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da
Natureza - SNUC, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 23 de ago. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4340.htm>. Acessado em agosto/2019. 2002.

IBAMA. Diretrizes para a operacionalização do Programa Nacional de Educação Ambiental. Série


Meio Ambiente em Debate 9, 27p. Brasília: Ibama, 1997.

IUCN/SSC. Strategic Planning for Species Conservation: A Handbook. Version 1.0. Gland,
Switzerland: IUCN SpeciesSurvivalCommission. 104p. 2008.

LINS, A. C. R; GALVÃO, A; DALMOLIN, C. C; POLAZ, C. N. M; PERINA, D. P; ARAÚJO, E.


S; ESCARLATE-TAVARES, F; OLIVEIRA, F. P. A; MARANGON, G. M. C; FERRAZ, J. M;
VILELA, J. F; SOUZA, N. A. Guia para gestão de planos de ação nacional para conservação
das espécies ameaçadas de extinção: PAN - elabore - monitore - avalie. Brasília: ICMBio, 2018.

PADUA, S; TABANEZ, M. F. (Orgs.). Educação Ambiental: Caminhos Trilhados no Brasil.


Brasília: IPE - Instituto de Pesquisas Ecológicas. 283p. 1997.

QUINTAS, J.S. Introdução à gestão ambiental pública. Série Educação Ambiental 2, 134p.
Brasília: Ibama, 2006.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

SOCIEDADE CIVIL (DES)ORGANIZADA: INCLUSÃO DA COMUNIDADE


LOCAL NO CONSELHO GESTOR DO PARQUE ESTADUAL DO TAINHAS
– RS.
KetulynFüster Marques¹

¹Analista Ambiental, Divisão de Unidades de Conservação, Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Rio
Grande do Sul, Pesquisadora do Grupo de Gestão Ambiental e Negociação de Conflitos – GANECO, Universidade
Estadual do Rio Grande do Sul, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Os conselhos gestores de unidades de conservação são espaços de gestão participativa, onde
representantes de setores que apresentem relação com a área protegida podem se apropriar das
discussões pertinentes a estas, seremconsultados e inclusive auxiliar na tomada de decisões sobre
pautas pertinentes à sua implantação.
Porém, em alguns casos, setores diretamente envolvidos, que tem seu modo de vida ou suas
atividades econômicas diretamente relacionadas a implantação da unidade de conservação não
possuem organização enquanto grupo para pleitear vaga nos conselhos gestores.
Este relato discorre a criação do conselho consultivo do Parque Estadual do Tainhas (PET),
unidade de conservação de proteção integral criada em 1975 pelo Decreto Estadual 23.798/1975,
mas que durante muitas décadas não dispôs de esforços efetivos para sua implantação. Somente nos
anos 2000 ações mais concretas tiverem início, como a nomeação de um gestor com dedicação
exclusiva (2007), a publicação do Plano de Manejo (RIO GRANDE DO SUL, 2008), a aquisição da
primeira área particular, em 2009 e a criação do seu conselho, somente em 2018 (RIO GRANDE
DO SUL, 2018).
Essa morosidade na implantação do Parque gera, entre diferentes aspectos, um considerável
atraso na aquisição das áreas particulares inseridas em seus limites e que irão compor a unidade de
conservação, sendo que mesmo após 44 anos da sua criação, menos de 10% da área do PE Tainhas
já foram adquiridas pelo Estado para fins de regularização fundiária.
Assim, há um grupo de moradores e proprietários que possivelmente terão que vender suas
áreas, e já vivenciam situações de limitação de uso de suas áreas, assim como os moradores da zona
de amortecimento que necessitam se adequar as normas e restrições estabelecidas para esta área.
Com a estabelecimento de ações mais efetivas de implantação do PET, alguns movimentos e
condutas por parte dos moradores e proprietários em relação a unidade de conservação ocorrerem,
mas geralmente de forma isolada ou sem propósito claro. Em algumas situações, informações

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

escassas e a falta de diálogo com a gestão da unidade de conservação agravaram situações de


conflito entre as partes envolvidas.
Com o objetivo de compartilhar com os setores envolvidos com o PET a gestão do mesmo,
melhorando a relação com a sociedade e entidades relevantes para sua efetivação, em 2017, teve
início o processo de formação do conselho consultivo desta unidade de conservação, oficialmente
instituído em 2018.
Entre os diferentes aspectos que permearam esse processo, o presente relato objetiva expor
os aspectos relacionados a inclusão dos moradores e proprietários de áreas situadas no Parque
Estadual do Tainhas e sua zona de amortecimento, visando assim compartilhar estratégias e
experiências vinculadas a grupos sociais que necessitam de articulações específicas para possibilitar
para sua representação junto aos conselhos gestores.
A Teoria dos Esquemas de Ação Coletiva (HERNÁNDEZ e LÓPEZ, 2007; SABUCEDO et.
al. 2001; SALAZAR, 2007), teoria oriunda da Sociologia Política, é utilizada como aporte para a
análise da falta de organização formal desses grupos.

2. MATERIAL E MÉTODO:
Para a realização deste estudo de caso houve o acompanhamento das ações de criação do
Conselho do Parque Estadual do Tainhas. São utilizados dados coletados durante as observações de
reuniões, documentos, análise de legislação e revisão bibliográfica.
Por tratar-se de uma pesquisa qualitativa, o diálogo com os atores envolvidos no processo de
formação do conselho e seu atual desempenho, foi substancial para compreender a situação
apresentada.

3. RESULTADOS E DICUSSÃO
O Parque Estadual do Tainhas abrange áreas situadas nos municípios de São Francisco de
Paula, Cambará do Sul e Jaquirana, na região denominada de Campos de Cima da Serra. De acordo
com o Plano de Manejo do PET:

“O modo de viver e de pensar na região dos Campos de Cima da Serra estabelece valor
simbólico (1) à propriedade, vista como terra, pois é da sua posse efetiva que se origina o
sistema de criação extensiva; (2) ao manejo (tradicional) da criação, que envolve a
organização do estabelecimento em pasto nativo, sistemas de invernadas, renovados pela
prática de queimadas; e (3) ao significado da quantidade de terras em posse que notabilizam
a pessoa do proprietário-criador, hábitos e costumes ligados ao mundo vivido que reúnem
um universo culinário, festivo, de “lidas” campeiras etc. Todo esse conjunto naturalmente
se opõe às novidades que vêm ameaçar essa tradição.”(RIO GRANDE DO SUL, 2008,
p.30)

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Considerando a implantação do Parque como potencial ameaça à propriedade privada, o


incremento de regras e limitações, tanto aos situados dentro de seus limites quanto aos da zona de
amortecimento, há por parte de alguns grupos sociais, restrições e resistências quanto a implantação
da unidade de conservação, motivada inclusive pelo sentimento de ineficiência do órgão gestor da
mesma, dada a morosidade do processo.
O fato de configurarem um grupo com um aspecto em comum quanto ao que pode ser
evidenciado como uma injustiça pode ser considerado como um motivo para a organização para
ações coletivas. Segundo Gamson, à compreensão dos aspectos chaves para entender a ação
coletiva possuem três componentes:

Injustiça: a privação de certos direitos que o indivíduo acredita que lhe pertencem;
Identidade: o sentimento de identificação mútua que existe entre os que compartilham um
mesmo sentimento de justiça;Eficácia: crença de que uma situação de injustiça pode mudar
através da ação e de sua participação. (Hernandez e López, 2007, p. 124, tradução
nossa)

Em conversa com alguns moradores e proprietários, foi possível identificar um sentimento


de injustiça, bem como de identificação mútua com outras pessoas que vivenciam a mesma situação
de insegurança e restrições de pose e uso de suas áreas, porém, parece haver na maioria deles, certo
conformismo com a situação, em que o PET é um fato posto, e que dificilmente será destituído, o
que pode inibir ações mais efetivas e coletivas na tentativa de desafetação do mesmo.Por outro, é
possível observar o desejo de resolver a situação, mesmo que isso signifique a venda das áreas para
o Estado.
Durante as primeiras etapas de formação do conselho do PET, que consistiram na formação
de um grupo de trabalho e a caraterização do território e seus usos, objetivando identificar os
setores relacionados à unidade de conservação, foi ratificada a importância da participação dos
moradores e proprietários de áreas dentro do Parque e sua zona de amortecimento, porém, não foi
identificada uma entidade ou organização formal que representasse esses sujeitos.
Como forma de conhecer esse grupo, estreitar o diálogo e divulgar o processo de formação
do conselho, foi realizada uma reunião destinada a população local, havendo mobilização da equipe
da unidade para convidar os moradores e proprietários.
A reunião ocorreu em novembro de 2017 e reunião mais de 40 pessoas na Sede do Parque,
com expressiva representação do público alvo. Como nos anos anteriores momentos como este não
haviam ocorrido, muitos aproveitaram a oportunidade para expressar sua angustias e sentimentos de
injustiça, tornando a reunião em alguns momentos tensa, porém, por meio do dialogo e do grupo
que conduzia a reunião, puderam conhecer a equipe da unidade, limites, caraterísticas e tirar
dúvidas.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Houve uma pauta especial referente ao conselho, explicando seus objetivos, forma de
funcionamento e importância da representação dos moradores e proprietários, considerando
inclusive a possibilidade de tornar-se um fórum de articulação e negociação referente à
regularização fundiária do PET e entendimentos quanto às normas, restrições e potencialidades da
zona de amortecimento. Porém, a organização para a participação no Conselho ainda não estava
formalizada.
Segundo Salazar (2007, p. 55, tradução nossa) “a combinação de oportunidades políticas e
estruturas de mobilização dá aos grupos sociais um certo potencial para a ação coletiva”, porém,
ainda segundo este mesmo autor:

(...) estes fatores, de maneira isolada, não são suficientes para explicar o que faz as pessoas
definirem sua situação como um problema e que valorizem sua participação em um
movimento social como o mais apropriado para atuar em sua transformação (2007, p. 55).

Nesse sentido a equipe que estava conduzindo o processo de formação do conselho optou
por “provocar” uma organização dos moradores e proprietários, e indicou aos presentes que
designassem seus representantes para o conselho escolhendo entre os participantes da reunião, e que
formalizassem por meio de Ata, assinada por todos os presentes. Considerando a significativa
representação desse grupo na reunião, a indicação realizada.
Foram escolhidos três representantes, sendo um titular e dois suplentes, dos quais dois são
proprietários de área dentro da unidade e um na zona de amortecimento. Além disso, outros
moradores e proprietários buscaram se inserir por meio de entidades de classe das quais
participavam, pois tomaram conhecimento do processo de formação do conselho e seus objetivos e
poderiam se inserir por meio dessas representações.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora a inserção dos moradores e proprietários de áreas situadas dentro do Parque
Estadual do Tainhas e sua zona de amortecimento não tenha ocorrido por inciativa exclusiva dos
mesmos, a estratégia utilizada se mostrou efetiva considerando que os representantes noemados tem
participado do conselho de forma ativa e representativa, com participação em dois grupos de
trabalho (manejo de campo e regularização fundiária), além de possibilitar a interlocução com
outros atores locais relevantes à implantação da unidade de conservação. Além disso, outros quatro
proprietários e moradores da área do parque e/ou zona de amortecimento se integraram ao conselho
por meio de representações de classes.
Embora a representação dos moradores eproprietários ainda esteja inserida em um
emaranhado de disputas, interesses e interpretações acerca do PET, a oportunidade de diálogo e

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

aproximação com atores centrais no processo de implantação da unidade de conservação tem se


apresentado como uma estratégia eficaz de gestão ambiental e negociação de conflitos.

5. AGRADECIMENTOS
Aos conselheiros do Parque Estadual do Tainhas, que vem contribuindo de maneira
relevante com a gestão da unidade e para o diálogo sobre os diferentes aspectos relacionados a
implantação da mesma.
Aos colegas da SEMA, em especial as colegas LuisaLockshin, Fabiana Pinto Bertuol e
Susana Medianeira Faistauer, que foram fundamentais na formação deste colegiado.
Aos conselheiros Douglas Andeliere, Jorge Luiz Valim e Junior Motta, e a parceira Silvana
Oliveira, por comporem o grupo de trabalho de formação do Conselho de forma voluntária e
eficiente, sendo fundamentais para sua materialização e representatividade.
Aos colegas do grupo de pesquisa GANECO, pelas reflexões, oportunidades e por
oportunizar a manutenção do interesse pela pesquisa e difusão do conhecimento.

6. REFERÊNCIAS
HERNÁNDEZ, A. R. C.; LÓPEZ, J. S. Los movimientossociales y lo social em movimiento:
Unestudiopsicosocial sobre laaccióncolectiva a través del sector social. Psicologia Política, Madrid,
nº 34, p. 7-38, mai. 2007.

RIO GRANDE DO SUL. Plano de Manejo do Parque Estadual do Tainhas. Disponível em:
https://www.sema.rs.gov.br/upload/arquivos/201610/24172412-plano-manejo-petainhas.pdf.
Acesso em 24/09/18. 2008

_____. PORTARIA SEMA N° 093, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2008.Institui o Plano de Manejo


do Parque Estadual do Tainhas. Diário Oficial do Estado, 8 de dez. Disponível em
https://www.sema.rs.gov.br/upload/arquivos/201611/16122029-pe-tainhas-pm-portaria-sema-093-
2008.pdf. Acesso em 23 de dez. 2008

SABUCEDO, J. M.; et. al. Identificación Grupal, Eficacia y Protesta Política. Psicología Política,
Madrid, nº 23, pp. 85-95, nov. 2001.

SALAZAR, R. D. Los marcos de accióncolectiva y susimplicacionesculturales en laconstrucción de


ciudadanía. Universitas Humanística, Bogotá, nº 64, pp.41-66, jul./dez., 2007.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA DEFINIÇÃO DO USO DE IMÓVEIS


PÚBLICOS: O CASO DO MIRANTE DO BOLDRÓ NA APA DE FERNANDO
DE NORONHA

Felipe Cruz Mendonça*, Viviane Santi Martins**, Grazielle Rodrigues***


* analista ambiental do ICMBio/Sede felipe.mendonca@icmbio.gov.br;
** arquiteta da Ohásis Arquitetura Sustentável ohasisarquitetura@gmail.com
*** coordenadora de pesquisa e educação CEPEHC, pesquisadora CEIS20/UC e doutoranda Universidade de
Coimbra/ grazirodrigues@cepehc.org.br

Fernando de Noronha, único conjunto de ilhas oceânicas brasileiras habitadas, possui em seu
território duas Unidades de Conservação (UC) federais: Parque Nacional Marinho de Fernando de
Noronha (PARNAMAR FN), unidade de proteção integral criada em 1988, em cerca de 70% de sua
área, e a Área de Proteção Ambiental de Fernando de Noronha – Rocas – São Pedro e São Paulo,
que ocupa o restante da parte terrestre (30%), criada em 1986.
Após o ato de criação do Parque Nacional, em 14 de setembro de 1988 e a perspectiva com
a promulgação da Constituição Federal (que de fato ocorreu em 5 de outubro de 1988), da
transferência da administração político-administrativa do arquipélago, passando de um território
federal para um território estadual de Pernambuco, o Decreto n°.96.879 de 29 de setembro de 1988,
buscou dar destinação há alguns imóveis públicos com vistas a contribuir com a gestão da APA e
do PARNAMAR FN1.
Com isso, toda a estrutura da Hotel Esmeralda (primeiro da ilha) passou para o patrimônio
do órgão gestor das unidades de conservação federais do arquipélago. Hoje parte dos imóveis ainda
é utilizada e outros necessitam de projeto de reforma, requalificação e até mesmo reconstrução.
Entre estes, está o Bar do Mirante, conhecido pela comunidade como Mirante do Boldró.
Apesar de ter um potencial para se transformar em um centro educativo, de exposição e de
interpretação ambiental, o órgão gestor das Unidades sempre teve bastante dificuldade em realizar a
manutenção e uso deste imóvel, muito em função dos poucos recursos disponíveis e indefinição do
objetivo do seu uso. Com a perspectiva da aplicação de recursos oriundos de compensação
ambiental, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em 2016, teve

1
Quando da criação o Parque ficou sob gestão do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF),
posteriormente passou para o IBAMA (1989-2007) e desde 2007 está sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

necessidade de pensar uma destinação para o espaço e uma estratégia para a sua manutenção perene
ao longo do tempo.

Figura 1 – Mirante do Boldró Condição Atual / Foto: Viviane Martins

HISTÓRICO DE USO DO MIRANTE DO BOLDRÓ


O Mirante do Boldró é testemunho histórico da vocação de Fernando de Noronha para a
segurança do Atlântico Sul. Em 1956, com a presença dos americanos no Arquipélago para a
instalação de um Posto de Observação de Mísseis Teleguiados (P.O.T.), era a região do Boldró o
lugar escolhido. Esse P.O.T. era o penúltimo dos sistemas que através de 8.000 Km acompanhava o
percurso dos projéteis, lançados de Patrick Field, no então Cabo Canaveral.
Com o término do contrato de cessão aos Estados Unidos da América, em 1965, as
instalações do P.O.T. foram incorporadas como patrimônio do Território Federal de Fernando de
Noronha (TFFN), funcionando a Guarnição do Exército Brasileiro. No final de 1980, esse mesmo
espaço, foi integrado ao complexo do Hotel Esmeralda que teve grande importância
socioeconômica à época. Passou a ser um dos principais pontos de encontro da comunidade
noronhense, até o momento em que foi entregue aos cuidados do órgão gestor da APA e do
PARNAMAR FN, há época o IBDF.

ESTRATÉGIA ADOTADA PARA DEFINIÇÃO DO USO


A partir da compreensão de que historicamente o “Mirante” sempre foi visto como um
imóvel de uso comunitário, sobressaindo essa sua vocação frente ao uso institucional pelos órgãos
públicos, o ICMBio Noronha em parceria contratual com a Ohásis Arquitetura Sustentável1, definiu
como estratégia para a construção do projeto um processo de consulta a comunidade local sobre que
função seria dado àquele imóvel público.

1
Responsáveis técnicas: arquitetas Vika Martins e Cecília Prompt

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A participação social na elaboração de projetos arquitetônicos de uso coletivo é


imprescindível para o sucesso de empreendimentos de interesse público (Alexander, 2005).
Segundo Barone e Dobry,

O processo participativo tem sido apresentado como uma forma de enfrentar a dimensão
social e política dos projetos de interesse coletivo, fazendo valer a opinião e desejo dos
usuários, com o fim de garantir maior cidadania e democracia na concepção de espaços
urbanos. (Barone, A. C. C., & Dobry, S. A., 2004)

Projetos implementados a partir de uma prática participativa, comprovadamente são


assimilados pela coletividade como de sua responsabilidade, adotando espontaneamente sua
manutenção e organicidade na dinâmica social. São espaços vivos e apropriados pela dinâmica
social local e, geralmente, se tornam referências locais de uso público.
Do ponto de vista do órgão gestor da APA, a estratégia buscou contribuir com a
democratização do uso do território ilhéu tanto para turistas como para os moradores, melhorar a
governança local aproximando a população local do ICMBio e contribuir com o desenvolvimento
social da ilha, um dos pilares do desenvolvimento sustentável1.

OS PASSOS DO PROCESSO PARTICIPATIVO


No processo participativo para a elaboração do Projeto de Requalificação do Mirante do
Boldró foi possível perceber o potencial de engajamento social, tendo em vista a grande
participação em todas as atividades oferecidas. Estiveram presentes diversas entidades
representativas da comunidade Noronhense: órgãos públicos, pesquisadores e os próprios cidadãos,
demonstrando a importância que este espaço público tem para a coletividade local.
A metodologia participativa aplicada, que foi desenvolvida entre julho e outubro de 2016,
contou com os seguintes passos:
1° passo – O que já foi o mirante?: Estudo do histórico de uso e projetos desenvolvidos
para o Mirante do Boldró. Também foram realizadas diversas consultas a órgãos, como o Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Autarquia Territorial Distrito Estadual de
Fernando de Noronha (ATDEFN) e Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH), para melhor
compreensão das exigências legais que precisávamos estar atentos para o projeto;
2° passo - Apresentação da proposta de construção participativa: com o objetivo de
gerar engajamento e ajustar a proposta, o desenho do processo de construção foi apresentado aos

1
Desenvolvimento sustentável é “o desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, significa possibilitar que
as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização
humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da terra e preservando as espécies e os
habitats naturais.” (Relatório Brundtland)

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

funcionários do ICMBio e ao Conselho da APA com a participação de representantes de diferentes


atores socias locais e do Estado de Pernambuco. Neste momento, conseguimos colher importantes
contribuições para o processo;
3° passo - Sensibilização e percepção ambiental: em encontros com representantes locais
de vários segmentos da comunidade: estudantes (Agentes Mirins), praticantes de yoga e capoeira,
educadores ambientais, historiadores e gestores locais, foram realizadas visitas ao imóvel e reuniões
com o objetivo de levantar possibilidades de uso do espaço. Dessas atividades resultaram algumas
diretrizes para o projeto: redução do impacto visual da edificação na paisagem; valorização do eixo
institucional presente no trajeto até o Mirante; espaço multiuso; arquitetura e paisagismo como
elementos de educação ambiental; acessibilidade universal; valorização da memória de uso
comunitário do espaço; espaço de referência para o fortalecimento da APA; respeitar a vocação do
local como Mirante; valorização dos potenciais naturais: ondas, pôr do sol, ventilação e paisagem.
Nesta etapa, cabe destacar que os integrantes do Projeto Agentes Mirins do Arquipélago,
programa de educação patrimonial executado pelo Centro de Pesquisa Histórico e Cultural de
Fernando de Noronha (CEPEHC) e que reúne crianças e adolescente da ilha, realizaram entrevistas,
com moradores em diversos pontos da ilha, sobre qual uso deveria ter o Mirante do Boldró. O
resultado foi a elaboração de um vídeo apresentado na etapa final do processo participativo.

Figura 2 e 3 - Agentes Mirins do Arquipélago em monitoramento da Vila do Boldró e "Mirante" e o debate e


tabulação da pesquisa (acervo Cepehc, 2016)

4° passo - Consulta popular aberta: A ação teve como objetivo ampliar a participação
popular, via envio de propostas por mensagens eletrônicas ou correio eletrônico. A ação foi
amplamente divulgada e teve grande participação social. A consulta confirmou as diretrizes de uso
resultantes das reuniões do passo anterior. No entanto, sobre a natureza do uso ficou evidente uma
disputa de interesses: a comunidade local o reivindica o uso comunitário e o empresariado, como
empreendimento com foco no turista.
5° passo – Assembleia aberta a comunidade: no início de setembro de 2016, foi realizado
uma ampla audiência na Escola Arquipélago que marcou o fim do processo participativo, onde se
definiu claramente como o projeto seria. Em termos gerais, o resultado final da proposta foi de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

transformar o Mirante do Boldró em um espaço multiuso, de uso pelos turistas e moradores, onde a
comunidade iria poder desenvolver suas atividades de yoga, capoeira, meditação, artes marciais
entre outras com uma exposição permanente sobre a presença americana na ilha e a visão do
mirante aberta a todos.
Ao longo do processo, a ideia de concessão privada do Mirante para um empreendimento
(um restaurante, por exemplo), gerou tensão durante a consulta pois, a partir de alguns exemplos da
ilha, o entendimento que a comunidade tem é de que ao conceder a iniciativa privada, ela seria
proibida de acessar o local. No entanto, era importante esclarecer a importância do ICMBio pensar
numa estratégia de manutenção do espaço no longo prazo e o Instituto defendia que ter um parceiro
para manter o espaço era importante. Então, por definição da gestão local do Instituto, foi definido
que o projeto teria um quiosque ao lado do Mirante para ser concedido a iniciativa privada com
vistas a explorar seu uso e ajudar a manter o espaço multiuso do imóvel.

Figura 4 e 5–Assembleia aberta a comunidade e projeto resultado da construção participativa (fonte:


arquivos ICMBio Noronha)

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONCLUSÃO
A opção pelo processo participativo para definição do uso a ser dado para o Mirante do
Boldró se mostrou bastante acertada tendo em vista o interesse que gerou na comunidade. O pouco
tempo determinado em contrato para a construção do projeto, trouxeram desafios para o processo,
mas não impediram de chegar ao fim.
O processo que custou cerca de 60 mil, incluindo o processo participativo e a elaboração do
projeto propriamente dito, já foi aprovado pelo IPHAN e encontra-se hoje em análise dentro da
Administração Distrital de Fernando de Noronha. Ainda que esteja em processo avançado, a disputa
pelo espaço ainda desperta grande interesse de outros agentes econômicos. O desafio que se
apresenta hoje é como garantir a efetivação de um projeto construído a partir da consulta com a
comunidade local, frente as mudanças de governo e orientação da gestão dos órgãos públicos e a
pressão econômica sobre um espaço bastante disputado.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ALEXANDER, Christopher (2001-2005) The Nature of Order: Books One to Four (Center for
Environmental Structure, Berkeley, California).

Assessoria de Comunicação do Projeto Golfinho Rotador (2017). Adolescentes opinam sobre


futuro do Mirante do Boldró em Fernando de Noronha. Disponível em
https://golfinhorotador.org.br/2016/08/29/adolescentes-opinam-sobre-futuro-do-mirante-do-boldro-
em-fernando-de-noronha/visitado em 26/09/2019, as 14:12.

BARONE, A. C. C., & DOBRY, S. A. (2004). Arquitetura participativa na visão de Giancarlo de


Carlo. Pós – Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da FAU-
USP, 15(15), 18-31.

https://g1.globo.com/pe/pernambuco/blog/viver-noronha/post/2019/09/17/icmbio-anuncia-licitacao-
do-mirante-do-boldro-em-fernando-de-noronha-para-exploracao-da-iniciativa-privada.ghtml,
visitado em 26/09/2019, as 10:30.

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UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA: A EXPERIÊNCIA DE


ELABORAÇÃO DE PLANOS DE MANEJOEM RECIFE (PE)
NATURE CONSERVATION UNITS: AN EXPERIENCE OF PREPARING MANAGEMENT
PLANS IN RECIFE (PE)

Maíra Batista Braga*, Sandra Cristina Soares da Luz, Débora Maria Barreto da Silva
Secretaria Meio Ambiente e Sustentabilidade - Prefeitura da Cidade do Recife – PE, Brasil
(maira.braga@recife.pe.gov.br, sandra.luz@recife.pe.gov.br, debora.maria@recife.pe.gov.br)

INTRODUÇÃO
A questão ambiental vem se constituindo como uma preocupação crescente da humanidade
e é um dos grandes desafios para o poder público, sendo a conservação um tema que sensibiliza
governantes e populações. As Unidades de Conservação (UCs) vêm adquirindo maior importância e
visibilidade,em resposta às ameaças sofridas pela natureza, transformando-se em espaços de refúgio
e proteção para a fauna e a flora, promoção do desenvolvimento sustentável e valorização dos
aspectos socioculturais das populações locais e tradicionais, além de instrumentos para manutenção
dos serviços ecossistêmicos. A aproximação e vivência da sociedade com esses espaços e o contato
com a natureza devem proporcionar oportunidades de sensibilização para sua proteção, inclusive
através de visitações com fins educacionais,contemplativos e recreativos. As estratégias de
conservação, planejamento e gestãodevem envolver, portanto, os diversos segmentos relacionados
às Unidades de Conservação, estimulando processos de participação.
No Brasil, o avanço na participação social nas tomadas de decisões da gestão pública vem
crescendo desde os anos 80, a partir da Constituição Federal/88, que estabeleceu em seu texto
garantias dos processos de interação social como afirmação e consolidação da democracia e da
cidadania. O desafio dos órgãos públicos é realizar a gestão das Unidades de Conservação
considerando a participação dos váriossegmentos e atores sociais na tomada de decisão, com vistas
à conservação da biodiversidade, economia sustentável e estímulo à pesquisa edesenvolvimentodo
turismo, buscando parcerias com instituições de ensino e pesquisa, empresas,organizações da
sociedade civil e de basecomunitária.
A cidade doRecife possui 25 Unidades de Conservação da Natureza (UCNs), das quais21
foram criadas a partir da Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS – Lei 16.176/96), sendo
corroboradas em 2008, quando da revisão do Plano Diretor (PD – Lei 17.511/08) – ano em que foi
publicada a maior parte dos decretos de regulamentação das UCNs . A partir de 2014, com a criação
do Sistema Municipal das Unidades Protegidas (SMUP – Lei 18.014/14), as UCNs foram
incorporadas ao Sistema, permanecendo com seus decretos de regulamentação.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

As UCNs apresentam realidades distintas, considerando suas características, tamanhos,


condições de conservação, pressões de usos e ocupação do solo, situação fundiária, apropriação
pelos atores sociais, entre outros. Estas áreas têm em comum a proteção de fragmentos do Bioma
Mata Atlântica, com seus ecossistemas associados, como florestas ombrófilas densas, restingas e
manguezais, cercados e às vezes entremeados pelo ambiente urbano. Elas protegem biodiversidade
em importantes áreas verdes, que prestam serviços ambientais e ecossistêmicos, como amenização
climática, produção e proteçãodaságuas, prevenção de enchentes, provimento de alimentos, áreas de
lazer e de sensibilização ambiental, entre outros. Ressalta-se que são consideradas áreas prioritárias
para a conservação e contribuem para a possível formação de corredores ecológicos urbanos.
As áreas verdes do Recife vêm sofrendo grandes pressões de usos e ocupações, em função
das demandas e tensões do crescimento urbano. No sentido de aprimorar a gestão ambiental e
atender ao indicativo apontado pelo SMUP sobre a necessidade deque as UCNs tenham seus planos
de manejo, a Prefeitura da Cidade do Recife, através da Secretaria de Meio Ambiente e
Sustentabilidade (SMAS), iniciou em 2018 a elaboraçãodestes documentos, que são considerados o
principal instrumento orientador para a gestão socioambiental destes territórios.Este trabalho
oportuniza uma visão integrada das UCNs, favorecendo o estabelecimento de uma estratégia de
conservação e gestão alinhada, que busca uma coerência conceitual emetodológica.
Este resumovisa apresentar a experiência do processo de elaboração dos planos de manejo
das Unidades de Conservação da Natureza da Cidade do Recife, destacando a importância da
participação social e apresentando os principais resultados e indicativos para a governança das
UCNs.

MATERIAL E MÉTODO
Das 25 Unidades de Conservação de gestão municipal, cincosão denominadas Áreas de
Proteção Ambiental (APAs), umaé Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), umaé Parque
Natural Municipal e 18 UCNs ainda não são categorizadas. O processo de elaboração dos planos de
manejo das UCNs do Recife também visaà revisão e categorização das Unidades, de acordo com os
critérios do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC – Lei 9.985/2000), adaptados à
realidade urbana do município.
Somadas, as áreas das 25 UCNs correspondem a cerca de 38% do território do Recife,
evidenciando a relevância destas Unidades e a necessidade de estabelecimento de instrumentos de
gestão apropriados para a conservação e normatização de possíveis usos e ocupações. Seis destas
UCNs possuem sobreposição com UCsestaduais, o que corresponde a 53,52% do território das
Unidades de Conservação municipais. Este fator aponta para a necessidade de uma maior
aproximação entre a gestão municipal e estadual, no sentido de se estabelecer uma governança
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

territorial integrada. Neste contexto, foi firmado um Acordo de Cooperação Técnica entre a SMAS,
a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS) e a Agência Estadual do
Meio Ambiente (CPRH).A elaboração dos planos de manejoestá sendo realizada envolvendo
diversos segmentos e atores sociais, conjugando aspectos técnico-científicos com contribuições
decorrentes da participação social. Para o diagnóstico das UCNs foram feitoslevantamentos e
sistematizações de dados secundários, visitas a campo, aerolevantamento comuso de drone e
geoprocessamento,além da realização deOficinas de Diagnóstico – as quais tiveram como principais
metodologias a formulação do mapa social, do mapa falado e da FOFA (levantamento de pontos
fortes, pontos fracos, oportunidades e ameaças das UCNs). Posteriormente, foram realizadas as
Oficinas de Categorização, Zoneamento e Programas. Decorrentes deste processoestão sendo
estabelecidas ações estratégicas de gestão socioambiental, visando à proteção das UCNs e a
normatização dos possíveis usos das áreas.
Além das oficinas, a participação social ocorretambém a partir da atuação em reuniões,
debates, seminários,visitas e diálogos com comunidades e instituições, grupos de trabalho,
conselhos, entre outros. Destacam-se como espaços de participação social: o Grupo de Trabalho das
Instâncias Municipais (SMAS, Secretaria de Governo e Participação Social - SEGOV, Instituto da
Cidade Pelópidas Silveira - ICPS, Procuradoria Geral do Município – PGM e Secretaria de
Mobilidade e Controle Urbano - SEMOC); o Grupo de Trabalho da Cooperação Técnica entre
Município e Estado (SMAS, SEMAS e CPRH) e o Conselho Municipal de Meio Ambiente
(COMAM), com sua Câmara Técnica de Unidades Protegidas.

RESULTADO E DISCUSSÃO
Até o presente momento, foram realizados um Seminário de Apresentação da Estratégia de
Elaboração dos Planos de Manejo das UCNs, 11 Oficinas de Diagnósticoe 13Oficinas de
Categorização, Zoneamento e Programas, com a participação direta de 1.056 pessoas. Os eventos
contaram com a presença de moradores e instituições locais, lideranças comunitárias, proprietários
de áreas, empresas com atuação local, instituições de ensino e pesquisa eórgãosdo poder público,
incluindo profissionais das áreas do meio ambiente, saúde, educação, segurança pública, assistência
social e planejamento urbano, entre outros.
A forte presença dos diversos atores sociais reforça o interesse e a importância que a
sociedade demonstra pelas questões ambientais locais. Nestes espaços que propiciam discussões
sobre as realidades territoriais, os participantes dialogam com o poder público, fazendo reflexões e
proposições que visam melhores condições ambientais e de qualidade de vida, evidenciando a
percepção dos benefícios ambientais gerados pelas UCNs, a necessidade de conservaçãoe
possibilidades de usos sustentáveis.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O GT das Instâncias Municipais tem cumprido o papel de articular a política ambiental de


elaboração dos planos de manejo com as diversas políticas setoriais, agregando a compreensão e
direcionamento da gestão ambiental urbana, e integrando o olhar para outros instrumentos de gestão
territorial, a exemplo do Plano Diretor, que se encontra em processo de revisão.O GT da
Cooperação Técnica entre Município e Estado tem discutidoa integração dos instrumentos para a
gestão das áreas de sobreposição entre UCNs e UCs. O COMAM tem acompanhado o processo e
deliberado sobre os Planos de Manejo.
Até o momento foram aprovados pela plenária do COMAM oitoplanos de manejo, incluindo
suas respectivas categorizações, zoneamentos e programas. A UCN Sítio dos Pintos foi
categorizada como APA e as UCNs Jiquiá, Lagoa do Araçá, Açude de Apipucos, Mata da Várzea,
Mata das Nascentes, Matas do Curado e Curado, como ARIE. As demais Unidades serão apreciadas
pelo Conselho até o primeiro semestre de 2020. Tendo representação dos diversos setores sociais,
incluindo poder público e sociedade civil, esta instância colegiada proporciona a participação
cidadã e o exercício da governança democrática, sendo esta, de acordo com o SMUP (2014), a
instância responsável pela deliberação de questões relativas às Unidades de Conservação da
Natureza da cidade do Recife.
Espaços como estespermitem o desenvolvimento de uma consciência política comprometida
com o coletivo (SILVA, 2012) e buscam assegurar resultados comprometidos com os atores sociais
envolvidos e a gestão pública (COSTA, 2012).Os planos de manejo e os conselhossão instrumentos
que visam garantir a execução dos objetivos das Unidades de Conservação, através, por exemplo,
do monitoramento participativo, o qual possibilita o diálogo entre o conhecimento popular e
acadêmico com a gestão (ICMBio, 2015).
Através desses espaços de participação social, como as oficinas, grupos de trabalho e
conselhos, os atores são envolvidos e sensibilizados para a conservaçãodas UCNsdo Recife,
passando a conhecermais profundamente suas realidades e assimampliando suas condições de atuar
pela sua proteção e desenvolvimento sustentável.A troca de experiências tem despertadoo
sentimento de pertencimento em relação às Unidades,ratificando aparticipação social na gestão das
UCs como uma das premissas para a conservação dos ambientes naturais e sua biodiversidade,
assim considerada peloICMBio (MENDONÇA; TALBOT, 2013). Bezerra et al. (2018) reforçam
estas instânciascolegiadas como espaços de barganha, nos quais a participação social na construção
dos documentos de políticas públicas ambientais evidencia necessidades da população local e
prioridades de conservação e sustentabilidade.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONCLUSÃO
O trabalho de elaboração dos planos de manejo das UCNs do Recife tem apresentado bons
resultados na aplicabilidade de sua metodologia técnica e de participação social, destacando-se que
o envolvimento direto de populações e instituições relacionadas aos territórios das Unidades tem
oportunizado a ampliação do conhecimento sobre estas áreas e a corresponsabilização para os
cuidados com as mesmas.
Esta formulação aponta para indicativos de gestão e governança, no sentido do
fortalecimento da estrutura institucional da SMAS/PCR para a gestão efetiva das UCNs e a
formação dos Conselhos Gestores das UCNs (com prováveis agrupamentos das Unidades), visando
o fortalecimento da gestão participativa e a implantação dos programas previstos nos planos de
manejo, com ações voltadas à recuperação ambiental; fiscalização e monitoramento; produção
técnica e científica; interação socioambiental; e desenvolvimento sustentável. No âmbito das áreas
sobrepostas entre UCNs municipais e UCs estaduais, continuará sendo realizado o esforço de
fortalecimento da gestão integrada entre município e estado, podendo-se constituir no futuro a
gestão dessas áreas com a visão de mosaicos de Unidades de Conservação, com a possibilidade de
evoluir para a formação de Núcleos de Gestão Integrada.

AGRADECIMENTOS
Agradecemos à SMAS/PCR e a todas as pessoas e instituições públicas, privadas e
organizações sociais envolvidas no processo de elaboração dos Planos de Manejo.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art.225, § 1º, incisos I, II, III e VII
da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
e dá outras providências. Brasília: DOU de 19/07/2000.

COSTA, G. B.;SOARES,A. Os Desafios da Gestão Participativa de Áreas de Proteção Ambiental


(APAs) no Brasil e as Contribuições da Noção de Negociação Política. Revista Gestão e Políticas
Públicas, n. 2, v. 2, p. 441-459, 2012.

ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da biodiversidade. A participação social e a ação


pedagógica na implementação da unidade de conservação. Série educação ambiental e
comunicação em unidades de conservação. Caderno 2. BRASÍLIA, 2015.

MENDONÇA, F. C.; TALBOT, V. Participação social na gestão de unidades de conservação: uma


leitura sobre a contribuição do Instituto Chico Mendes. Biodiversidade Brasileira, n. 1, p. 211-
234, 2014.

RECIFE. Lei 16.176, de 9 de abril de 1996. Estabelece a Lei de Uso e Ocupação do Solo da
Cidade do Recife.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

RECIFE. Lei 18.014, de 9 de maio de 2014. Institui o Sistema Municipal das Unidades
Protegidas e dá outras providências.

RECIFE. Lei 17.511, de 29 de dezembro de 2008.Promove a revisão do Plano Diretor do


município do Recife.

SILVA, A. S. Psicologia Política, Movimentos Sociais e Políticas Públicas. Tese de Livre-


Docência. Universidade de São Paulo.2012.

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MEMÓRIAS DO RETIRO: O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO TERMO


DE COMPROMISSO NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DO CIPÓ
MEMORIES OF RETIRO: THE PROCESS OF CONSTRUCTION OF THE COMMITMENT
TERM IN THE NATIONAL PARK OF SERRA DO CIPÓ

Renata Corrêa Apoloni*, José Geraldo de Araújo**


*Analista Ambiental, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - ICMBio Cipó-Pedreira
(e-mail: renata.apoloni@icmbio.gov.br)
** Analista Ambiental, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade ICMBio Cipó-Pedreira
(e-mail: jose-geraldo.araujo@icmbio.gov.br )

1. INTRODUÇÃO
O Parque Nacional da Serra do Cipó (Decreto nº. 90.223, de 25 de setembro de 1984)
reconhece desde sua criação, reforçado em seu Plano de Manejo (ICMBio, 2009), a situação de
populações locais no interior do Parque. Por mais que condições diferenciadas se deram em relação
a aquisição de terras, que antes mesmo da criação do Parque tiveram cerca de 40% das terras
adquiridas em seu nome, alguns pontos estratégicos permanecem com a situação fundiária
conflitante, com destaque a região do rio Bocaina, que mesmo após mais de 30 anos da criação do
Parque, concentra territórios de moradia e uso, em diferenciados regimes, de um conjunto de
pessoas com intrínseca relação com o território, reconhecidos por pesquisadores como comunidade
tradicional.
A situação das famílias dessa região conhecida como Retiro foi sendo tratada de diferentes
maneiras de acordo com os perfis de gestão à época, agravado pela ausência e fragilidade de marcos
legais e instrumentos que fundamentam os direitos das comunidades locais/ tradicionais em sua
relação com unidades de conservação de proteção integral.
Bases importantes que possibilitaram a construção de acordos no formato de termo de
compromisso estão na Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais, Convenção sobre
Diversidade Biológica, no Sistema Nacional de Unidades de Conservação, na Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais e na Instrução Normativa
ICMBio nº 26/2012, que enfim “estabelece diretrizes e regulamenta os procedimentos para a
elaboração, implementação e monitoramento de termos de compromisso entre o Instituto Chico
Mendes e populações tradicionais residentes em unidades de conservação onde sua presença não
seja admitida ou esteja em desacordo com os instrumentos de gestão" (ICMBio, 2012, pág. 84).
A partir de 2013 pesquisadores do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (GESTA)
vinculados à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) iniciam o registro das histórias das
famílias que viviam no território que, a partir de 1984, se tornou Parque Nacional da Serra do Cipó.
Até 2017 foram desenvolvidos os projetos “O Parque Nacional da Serra do Cipó (MG) epopulações
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

locais: desvelando conflitos e histórias marginalizadas” e “Construindo histórias locais, pensando


questões globais: ascomunidades tradicionais atingidas pelo Parque Nacional da Serra do Cipó
(MG)”, queteve como objetivo a produção de um documentário paradar visibilidade às histórias das
famílias que viviam e vivem na área do Parque.
Ao longo desse período, o Ministério Público Federal desempenhou relevante papel na
defesa dos direitos das famílias da região do Retiro, especialmente em momento crítico no ano de
2013, quando as famílias receberam notificação administrativa para a desocupação definitiva do
Parque. Além disso, promoveu diálogos coletivos de esclarecimento sobre direitos das comunidades
tradicionais.
Frente a ausência de instrumentos para impedir a retirada das famílias, a mobilização e
posicionamento do Conselho Consultivo do Parque tornou-se a abertura essencial, o instrumento
que viabilizou a discussão interna no ICMBio bem como garantiu a base para que uma violação
maior de direitos não acontecesse e que um acordo pudesse ser estabelecido.
A partir dos marcos e instrumentos regulatórios existentes, bem como do embasamento do
GESTA e do MPF, o ICMBio Cipó-Pedreira incluiu em seu planejamento estratégico 2018-2021 a
construção do termo de compromisso com dez núcleos familiares do Retiro, processo realizado
entre julho a dezembro de 2018.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O processo de construção do termo de compromisso seguiu todas as etapas previstas na
Instrução Normativa ICMBio nº 26/2012. Para o acompanhamento do processo foi constituído
Grupo de Trabalho Interinstitucional (Portaria nº 767, de 31 de agosto de 2018, publicada no DOU
em 04 de setembro de 2018), com a participação de representantes ICMBio, com representação da
Sede, da Coordenação Regional 11 (CR11 - Lagoa Santa) e do Núcleo de Gestão Integrada
ICMBIO Cipó-Pedreira; representante ligado ao GESTA/ UFMG; representantes do Ministério
Público Federal - Procuradoria da República em Minas Gerais; e representante do Conselho
Consultivo do Parque Nacional da Serra do Cipó.
Em respeito à dinâmica de organização local, os momentos de participação dos moradores e
usuários foram assegurados e registrados em todas as fases do processo por meio de reuniões
individuais e coletivas em suas residências e na Associação Comunitária da Serra do Cipó, nas
quais as famílias puderam ser ouvidas e suas demandas incorporadas ao termode compromisso.
A elaboração de laudo antropológico das famílias do Retiro/vale do rio Bocaina realizado
por Mendes (2018) foi peça fundamental no embasamento ao ICMBio sobre a tradicionalidade das
famílias. Uma vez estabelecido que não é de competência do ICMBio essa decisão, um impasse que
há muito tempo se delongava, pôde ser resolvido.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Após reuniões individuais e coletivas, a minuta do termo de compromisso foi escrita no


âmbito do GTI e foi apresentada às famílias em reunião coletiva para ajustes e aprovação do termo,
ocorrida no dia 10 de outubro de 2018.
O processo instruído no ICMBio foi enviado para análise da Procuradoria Federal
Especializada do ICMBio, que emitiu parecer favorável, bem como à Coordenação Geral de
Consolidação Territorial, que reforçou a necessidade de publicação do termo.
Por fim, a presidência do ICMBio assinou o termo e houve a publicação do último termo de
compromisso no Diário Oficial da União em 31 de dezembro de 2018.
Desde então, a equipe tem se dedicado à implementação do termo de compromisso, através
do acompanhamento dos acordos junto às famílias, abertura de processos para atendimento às
solicitações passíveis de autorização, realização de vistorias, e, de forma geral, orientação e apoio
na organização das atividades previstas.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
O processo de construção do termo de compromisso, quando se refere estritamente aos
termos da instrução normativa do ICMBio, se efetivou de forma objetiva e relativamente rápida,
num período de cerca de seis meses, culminando no contrato assinado entre ICMBio e
morador/usuário, no qual se estabelecem as regras de uso e manejo dos recursos naturais, com
permissões e restrições estabelecidas para as famílias compromissárias.
As dimensões dos desafios se amplia em um tempo maior, relativo às histórias e memórias
construídas desde a criação do Parque até os dias de hoje, bem como aos caminhos futuros de
convivência que serão construídos na co-gestão desse território. Em um olhar para trás, um grande
desafio tem sido interagir com todas as dimensões de restrição de direitos que devem ser reparados,
quando da análise das solicitações de novas de famílias para serem integradas ao processo.
Explica-se: ao construir o termo de compromisso foram identificadas e abarcadas diversas
formas de se relacionar com o território, relacionadas a diferentes necessidades e formas de
resistência dessas famílias na manutenção do vínculo com o território: sejam de moradia; de uso
esporádico da casa (porém contínuo ao longo dos anos); ou de manejo dos recursos naturais,
através, principalmente, da criação dos animais de montaria e cabeças-de-gado, e dos plantios de
subsistência.
Posteriormente, ainda dentro do universo das famílias tradicionais do Retiro, uma outra
dimensão se apresentou: reivindicação de manutenção dos vínculos de famílias que nasceram e
moraram grande parte da vida em território do Parque, no período entre 1996 até 2012, que por
diferentes razões e formas de violência e expropriação do território, não se mantiveram de forma

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predominante em nenhuma das formas anteriores, mas ainda sim fortemente no âmbito da memória.
Após análise e embasamento do GTI, esses casos puderam ser incorporados.
Para além da definição do universo de famílias tradicionais abarcadas pelo termo, outros
desafios na implementação do termo são o processo de sensibilização para a mudança da visão da
comunidade local, colaboradores e servidores sobre o reconhecimento da tradicionalidade e dos
novos direitos que passam a partir disso serem garantidos.
Tem sido observado também, ao longo do período de implementação, uma tendência a
utilizar o termo de compromisso como um instrumento de comando e controle e não um
instrumento de gestão e mediação de conflitos. A fragilidade nesse aspecto também se relaciona
com o fato de que a sustentação do processo de gestão destes territórios regidos pelo termo de
compromisso está atrelado a necessidade de existência de perfis específicos dentro da equipe na
condução desse tema, pois, a depender da visão, as relações de comunicação, orientação e
construção conjunta de soluções podem ser facilmente abaladas.
Por fim, ressalta-se que as oportunidades e desafios também presentes na relação do termo
de compromisso com as atividades vinculadas ao uso público, sendo no Retiro uma das Portarias do
Parque que permite o acesso a diversos atrativos: Bambuzal, Cachoeiras do Gavião, Andorinhas e
Tombador. Nesse sentido, a implementação do termo de compromisso nessa região tem se focado
na consolidação da Zona Histórico-Cultural do Retiro, já prevista no Plano de Manejo do Parque,
porém com outro enfoque. Quando da escrita do Plano de Manejo, essa zona seria para preservar a
história local através da manutenção apenas das casas e estruturas que representariam parte da
cultura local. Nesse novo contexto, o Retiro, enquanto zona de proteção cultural, permanece
pulsando, com as pessoas em sua interação com o espaço, garantindo a manutenção dessa cultura
viva e sua interação com o turismo local.

4. CONCLUSÃO
A fragilidade dos marcos legais na garantia dos direitos das comunidades locais em seus
territórios tradicionais; a ausência de cultura institucional e formação de pessoal para atuação com
instrumentos de mediação de conflitos em casos de coexistência de direitos entre a área ambiental e
de comunidades tradicionais; e o número ainda pequeno de outras experiências similares que
permitam a consolidação desse instrumento são alguns dos desafios que perpassam a experiência de
construção e implementação do termo de compromisso das famílias do Retiro.
Esse relato tem como objetivo, através do registro e compartilhamento dos desafios, o
fortalecimento dessas experiências ainda incipientes, mas fundamentais para o desenvolvimento de
políticas ambientais coerentes com as dinâmicas locais em territórios tradicionais, reforçando
resultados benéficos para as partes.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

5. REFERÊNCIAS
ICMBio. Portaria nº 55: Plano de Manejo do Parque Nacional da Serra do Cipó e Áreade
Proteção Ambiental Morro da Pedreira – Encarte 4. Diário Oficial da União, nº 127, Seção 1,
pág.139, em 06/06/2009.

ICMBio. Instrução Normativa nº 26 de 04 de julho de 2012, que estabelece diretrizes e


regulamenta os procedimentos para a elaboração, implementação e monitoramento de termos
de compromisso entre o Instituto Chico Mendes e populações tradicionais residentes em
unidades de conservação onde a sua presença não seja admitida ou esteja em desacordo com
os instrumentos de gestão. Diário Oficial da União, nº 130, Seção 1, pág. 84, em 06/07/2012.

MENDES, A.B.V. Laudo antropológico das famílias tradicionais do Retiro/Vale da Bocaina.


(Laudo Técnico). Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais, Departamento de Antropologia e
Arqueologia, Universidade Federal de Minas Gerais, 40 p., 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

GOVERNANÇA AMBIENTAL E INCLUSÃO SOCIAL EM ÁREAS


PROTEGIDAS
ENVIRONMENTAL GOVERNANCE AND SOCIAL INCLUSION IN PROTECTED AREAS

Marcela de Melo Soares Sales*, Vanice Santiago Fragoso Selva**


*Doutoranda do PRODEMA – UFPE, Brasil. E-mail: marcelasmm@gmail.com.
**
Orientadora e Professora Doutora do PRODEMA – UFPE, Brasil. E-mail: vanice.ufpe@gmail.com.

1. INTRODUÇÃO
A biodiversidade compreende as diferentes formas de vida, de micro-organismos, fauna e
flora silvestres, à espécie humana, compondo um sistema funcional, cujos componentes precisam
coexistir harmoniosamente. Quaisquer desequilíbrios nessa relação podem gerar impactos, mais ou
menos graves, a depender do tipo de interferência antrópica, como: redução da cobertura vegetal,
erosão, poluição, mudanças climáticas, enchentes, entre outros (ANDREOLI et al., 2014).
Na perspectiva de conter o desmatamento e a crise ambiental, foi realizada no Rio de
Janeiro, em 1992, a Conferência das Organizações das Nações Unidas (ONU) sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento, que resultou na assinatura da Convenção sobre Diversidade
Biológica (CDB). Esse acordo estabeleceu diretrizes para a proteção das espécies, ecossistemas,
paisagens e populações tradicionais, com a delimitação de áreas protegidas. Apesar dessa iniciativa,
os países signatários da CDB não conseguiram controlar a perda da biodiversidade, suscitando a
aprovação, em 2010, das 20 Metas de Aichi que determinaram a criação de novas unidades de
conservação e introduziram questões como representatividade ecológica e governança nesses
territórios (PRATES; IRVING, 2015).
Mesmo sendo instituídas por dispositivos legais, as áreas protegidas não estão livres de
conflitos, principalmente as de domínio público, pois impõem a desapropriação de terras, a exemplo
da Estação Ecológica, Reserva Biológica e Parque Nacional. Esses embates afetam, sobretudo, as
comunidades locais e tradicionais (quilombolas, ribeirinhos, indígenas, caiçaras, pequenos
agricultores, pescadores) que têm menor influência na arena decisória das unidades de conservação
(SILVA; SOUZA, 2012).
Dessa forma, a governança surge para articular os interesses dos diferentes atores das áreas
protegidas, Estado, instituições públicas e privadas, e sociedade civil organizada, evitando
protagonismos no processo decisório em políticas públicas e os impactos negativos da exploração
dos recursos naturas pelas atividades econômicas locais. Apenas uma gestão compartilhada,
integrando as demandas da população desses territórios, conseguirá promover uma inclusão social

640
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de fato, com decisões que reflitam a vontade coletiva e sejam ambientalmente responsáveis
(BREDARIOL; GONÇALVES, 2015).
Com base no exposto, surgiu o seguinte questionamento: como a comunidade científica vem
discutindo as temáticas relacionadas à governança ambiental na gestão de áreas protegidas? A
resposta dessa indagação ensejará a compreensão acerca dos arranjos instituições de governança nas
unidades de conservação e da participação social da população local nas instâncias colegiadas de
gestão. Por conseguinte, o objetivo principal desta pesquisa é fazer uma revisão sistemática da
literatura científica referente à governança ambiental na gestão de áreas protegidas.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para averiguar a governança ambiental na gestão de áreas protegidas foi realizado um estudo
qualitativo, tendo como parâmetro a participação social da comunidade desses territórios. Essa
abordagem permite compreender os aspectos subjetivos e as interações dos fenômenos pesquisados
(KÖCHE, 2011).
A pesquisa é caracterizada comoexploratória edescritiva, sendo o método principal a revisão
sistemática de literatura científica, por meio de palavras-chave inseridas nas plataformas
acadêmicas nacionais de acesso gratuito: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES) e Scientific Eletronic Library Online (SciELO). Como critério de seleção, foram
excluídos os artigos cujos procedimentos metodológicos envolviam apenas revisão bibliográfica e
relatos de experiência. Os estudos selecionados nessas bases de dados contemplaram as duas
principais temáticas desse estudo: “governança” e “áreas protegidas”.
Não foram aplicados filtros para efetuar um recorte temporal, tampouco para selecionar os
artigos por campos do saber. Os resultados da CAPES e SciELO estão discriminados por autoria-
ano, títulos e temáticas centrais nos Quadros 1 e 2, respectivamente. A análise dos resultados foi
baseada na verificação da relação das informações obtidas das publicações com as temáticas deste
estudo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
No levantamento realizado na CAPES utilizando concomitantemente os descritores
“governança” e “áreas protegidas”, na busca avançada pelos termos dentro do assunto dos artigos,
foram encontrados três estudos. Pelo critério de exclusão foi desconsiderado o que descrevia a
evolução histórica das áreas protegidas na Colômbia, ficando os estudos de Lima; Selva; Rodrigues
(2016) e Souza; Barbosa (2018), conforme Quadro 1 abaixo. Vale ressaltar que não foi colocada a
palavra-chave “governança ambiental”, pois o fato de tratar de áreas protegidas já é um indicativo

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da categoria de governança existente no local e ao fazer essa discriminação apenas o estudo de


Lima; Selva; Rodrigues (2016) era selecionado.
Foi averiguada a quantidade de publicações que contém “governança” no assunto, sendo
encontrados 1.147 artigos, sem a realização de refinamentos por categoria de governança, nem
recorte temporal. O mesmo foi feito para “áreas protegidas”, obtendo-se 392 estudos no portal da
CAPES.
Os artigos de Lima; Selva; Rodrigues (2016) e Souza; Barbosa (2018) analisaram a
efetividade da participação social nas instâncias colegiadas das áreas protegidas, percebendo nos
dois estudos as fragilidades ainda existentes na governança e os diversos conflitos de interesses dos
atores locais. Ambas as pesquisas concluem que a conservação dos ecossistemas só é possível com
uma gestão participativa considerando as demandas das populações tradicionais.

Quadro 1: Artigos com os termos “governança” e “áreas protegidas” na CAPES


Autoria - Ano Título Temáticas Centrais
Lima; Selva; Rodrigues (2016) Gestão participativa nas reservas Gestão participativa,
extrativas: a atuação do Instituto Chico políticas públicas efetivas,
Mendes da Biodiversidade inclusão dos povos
tradicionais
Souza; Barbosa (2018) Conservação ambiental,
Conservação e governança em áreas governança na gestão de
protegidas de Pernambuco/Brasil unidades de conservação

Fonte: Organizado pelos autores (2019).

Utilizando o mesmo protocolo na SciELO, com as duas palavras-chave “governança” e


“áreas protegidas” obtiveram-se 06 estudos, sendo descartados 03, o mesmo excluído anteriormente
no levantamento feito na CAPES, um que descrevia a evolução da relação humana com os recursos
pesqueiros marinhos e outro que elencava os desafios e potencialidades da gestão privada de áreas
protegidas, sendo os resultados dispostos no Quadro 2, abaixo. Foram encontrados 1.130 artigos
com apenas o descritor “governança” e 505 com “áreas protegidas”.

Quadro 2: Artigos com os termos “governança” e “áreas protegidas” na SCIELO


Autoria - Ano Título Temáticas Centrais
Cardozo et al. (2012) Discussões do Conselho Deliberativo da Tomada de decisão
Reserva Extrativista de Canavieiras, participativa, governança
Bahia, Brasil: da gestão pesqueira à ambiental, uso sustentável
ambiental dos recursos naturais
De La Cruz (2014) Participative management of tourism in Política ambiental, gestão
protected areas: Case-study from Lands participativa
of Priolo, São Miguel, Azores
Pereira et al. (2016) The collective action on governing the Conflitos de interesses
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commons in the surroundings of protected produtivos e ambientais,


areas modelo de gestão,
autogovernança
Fonte: Organizado pelos autores (2019).

As pesquisas de Pereira et al. (2016), De La Cruz (2014) e Cardozo et al. (2012) enfatizaram
os conflitos existentes na gestão de áreas protegidas ao se tentar compatibilizar interesses
econômicos e ecológicos. Também revelaram as deficiências existentes nos modelos de gestão
participativa vigentes, pois as decisões adotadas privilegiaram segmentos sociais com maior poder
econômico, a exemplo da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul
(FAMASUL) que indicava como seriam utilizados os recursos naturais no Parque Nacional da Serra
da Bodoquena, conforme estudo de Pereira et al. (2016).
De La Cruz (2014) também evidenciou assimetrias na participação, pois o plano de ação
para o turismo sustentável em Priolo, teve adesão significativa das grandes empresas relacionadas
ao turismo, mas não conseguiu um efetivo engajamento das instituições locais e representantes da
comunidade que não tiveram suas demandas contempladas. A pesquisa de Cardozo et al. (2012)
constatou a ausência de ações efetivas de preservação ambiental na unidade de conservação.

4. CONCLUSÕES
Embora tenham sido selecionados poucos artigos nas plataformas CAPES e SciELO, eles
forneceram um indicativo dos problemas para se incluir efetivamente as populações tradicionais na
gestão das áreas protegidas, enfatizando a relação entre o nível de envolvimento dos agentes locais
e a eficiência das políticas públicas implementadas que precisam conciliar os interesses das
comunidades e a preservação dos ecossistemas.
É notório o papel da governança na articulação dos entes políticos e sociais com diferentes
interesses e graus de influência no processo decisório. A participação popular na fiscalização do
cumprimento das diretrizes ambientais, bem como a reivindicação de ações que beneficiem as
comunidades contribuirão para o desenvolvimento sustentável dos territórios.
Pela importância das temáticas desse estudo, faz-se necessário ampliar a presente revisão
sistemática utilizando banco de dados internacionais como a ScienceDirect ou Scopus.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao Laboratório de Apoio à Pesquisa Integrada em Gestão Ambiental
(LAPIGA), do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA),
da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), pelo apoio para o desenvolvimento da minha

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pesquisa de doutorado e pelas discussões no âmbito da atividade do Laboratório de Conhecimento


Interdisciplinar (LCI).

6. REFERÊNCIAS
ANDREOLI, C. V. et al. Biodiversidade: a importância da preservação ambiental para a
manutenção da riqueza e equilíbrio dos ecossistemas. In: Andreoli, Cleverson V.; Torres, Patrícia
Lupion. (Org.). Complexidade: redes e conexões do ser sustentável. 1aed.Curitiba: SENAR/PR,
p. 443-464, 2014.

BREDARIOL, T. O. e Gonçalves, V. Instituições e Governança Ambiental: uma revisão teórica.


Revista Iberoamericana de Economia Ecológica, v. 24, p. 153-162, 2015. Disponível em:
http://www.redibec.org/IVO/rev24_10.pdf. Acesso em: 20 set. 2019.

CARDOZO, L. S. et al. Discussões do Conselho Deliberativo da Reserva Extrativista de


Canavieiras, Bahia, Brasil: da gestão pesqueira à ambiental. RGCI, Lisboa, v. 12, n. 4, p. 463-475,
dez. 2012. Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1646-
88722012000400006&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 20 set. 2019.

DE LA CRUZ, A. et al . Participative management of tourism in protected areas: case-study from


Lands of Priolo, São Miguel, Azores. RGCI, Lisboa, v. 14, n. 2, p. 289-299, jun. 2014.
Disponível em: http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1646-
88722014000200010&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 20 set. 2019.

KÖCHE, J. C. Fundamentos de metodologia científica: teoria da ciência e iniciação à pesquisa.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

LIMA, M. E. A.; SELVA, V. S. F.; RODRIGUES, G. G. Gestão participativa nas reservas


extrativistas: a atuação do Instituto Chico Mendes da Biodiversidade. Revista Brasileira de
Geografia Física, v. 9, n. 4, p. 1072-1087, out. 2016. Disponível em:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/rbgfe/article/view/233904. Acesso em: 20 set. 2019.

PEREIRA, M. A. et al . The collective action on governing the commons in the surroundings of


protected areas. Ambient. soc., São Paulo, v. 19, n. 4, p. 21-38, Dez. 2016. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-
753X2016000400021&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 20 set. 2019.

PRATES, A. P. L.; IRVING, M. A. Conservação da biodiversidade e políticas públicas para as


áreas protegidas no Brasil: desafios e tendências da origem da CDB às metas de Aichi. Revista
Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, n. 1, p. 27-57, 2015.

SILVA, M. S. F.; SOUZA, R. M. Territórios protegidos e arenas de conflito nas Unidades de


Conservação de Uso Sustentável em Sergipe, Brasil. Scripta Nova. Revista Electrónica de
Geografía y Ciencias Sociales, jul. 2013, vol. XVII, nº 445. Disponível em:
http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-445.htm. Acesso em: 19 set. 2019.

SOUZA, T. S.; BARBOSA, M. P. Conservação e Governança em Áreas Protegidas de


Pernambuco/Brasil. Revista Brasileira de Geografia Física, v. 11, n. 2, p. 713-727, jun. 2018.
Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/rbgfe/article/view/233407. Acesso em: 20 set.
2019.

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CONTRIBUIÇÕES DO PLANO DE MANEJO E DO CONSELHO GESTOR


EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
CONTRIBUTIONS FROM THE MANAGEMENT PLAN AND THE MANAGEMENT
COUNCIL TO CONSERVATION UNITS

Valdilene Valdice de Santana¹*, Patrício Rinaldo dos Santos¹, Marilene Vieira Barbosa¹

¹Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA\UFPE), Centro de Filosofia e Ciências Humanas,


Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.*E-mail:valdilene-valdenice@hotmail.com

INTRODUÇÃO
As Unidades de Conservação são espaços ambientalmente restritos a conservação e
preservação dos recursos naturais, não passiveis de exploração para fins inteiramente econômicos e
lucrativos. Nesta esteira entende-se por Unidade de Conservação (UCs), como sendo o espaço
territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais
relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites
definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de
proteção, conforme aponta o artigo 2º, inciso I da referida Lei 9.985/2000 que institui o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC.
Entre os instrumentos previstos nesta norma encontra-se o Plano de Manejo e o Conselho
Gestor. O Plano de Manejo diz respeito a um apontamento de caráter técnico e obrigatório para
todas as unidades de conservação. Conforme descrito na Lei 9.985\00, do SNUC,o Plano de Manejo
consiste em um documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma
Unidade de Conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da
área e manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias á
gestão da unidade, (BRASIL, 2000).
O Conselho Gestor diz respeito ao poder decisório de atitude democrática e descentralizado
exercido por quem lhe fizer parte. De acordo com Santos (2008), é o fórum de exercício da
democracia participativa ou direta que, visando à conservação in situ de dado ecossistema e sua
gestão territorial, de um espaço técnico, político e juridicamente determinando, age, em nome da
coletividade, das futuras gerações e da vida, estabelecendo limites à propriedade e a livre iniciativa
econômica.
Diante do exposto, objetivou-se com este estudo descrever as contribuição dos instrumentos
de Plano de Manejo e do Conselho Gestor em Unidades de Conservação UCs, no Brasil.

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MATERIAL E MÉTODOS
O estudo em tela é do tipo exploratório e descritivo, uma vez que se utiliza de outras fontes
literárias para embasamento do estudo em comento, para tanto realizou-se consultas a literatura
especializada no tema, como, jurisprudências, leituras de leis, manuais da legislação ambiental
brasileira e projetos técnicos desenvolvidos,disponibilizados pelos órgãos gestores de unidades de
conservação e Organizações Não-Governamentais (ONGs) como o Instituto Chico Mendes da
Biodiversidade (ICMBio) e Instituto de Pesquisas Ecológicas – IPÊ, nesta etapa também foram
consultados dados quantitativos disponibilizados peloMinistério do Meio Ambiente referentes ao
percentual de UCs que tem palno de manejo e conselho gestor no Brasil.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Segundo dados disponibilizados pelo Ministério do Meio Ambiente, Brasil (2019),
atualmente o Brasil tem 2376 UCs,distribuídas nas esferas municipais, estaduais e federias, figura
01.
Figura 01: Distribuição das Unidades de Conservação por Esfera Administrativa.

Fonte:Brasil (2019).

A maior parte das Unidades de Conservação brasileiras, de acordo com o Ministério do


Meio Ambiente (2019), ainda não possuem seus Planos de Manejo nem Conselhos Gestores,figura
02, e quando existem, a participação das populações locais é, na maioria das vezes, inviabilizada
pela falta não só de comunicação adequada, mas também de incentivos e recursos financeiros,
caracterizando, mesmo que involuntariamente, uma forma de exclusão social. (IBAMA, 2007).

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Figura 02: Plano de Manejo e Conselhor Gestor em Unidades de Conservação no Brasil.

2a 2b

Fonte:Brasil(2019).

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o Plano de Manejo constitui um conjunto de


normas, restrições para o uso, ações a serem desenvolvidas e manejo dos recursos naturais da UC
em seu entorno e, quando for o caso, os corredores ecológicos a ela associados, podendo também
incluir a fundação de estruturas físicas dentro da UC, visando minimizar os impactos negativos
sobre a UC, garantindo a manutenção dos processos ecológicos e prevenir a simplificação dos
sistemas naturais.
A Lei nº 9.985/2000, que instituiu o SNUC, prever a elaboração de plano de manejo para
todas as categorias de UCs e lhes atribui o papel de principal instrumento de gestão de uma unidade
de conservação (BARROS; LEUZINGER, 2018). Para Silva (2015), o Plano de Manejo deve
abranger não apenas a área da Unidade de Conservação, mas deve ainda estabelecer as normas e
restrições para utilização da zona de amortecimento e dos corredores ecológicos.O Plano de Manejo
deve ser elaborado em um prazo máximo de cinco anos, após a criação da UC, a elaboração deve
serem função dos objetivos gerais pelos quais ela foi criada (BRASIL, 2000).
Toda UC deve ter um conselho gestor, que tem como função auxiliar o gestor nas tomadas
de decisões , e que integre à população às ações realizadas na unidade e em seu entorno.O
Conselho Gestor, elemento central dos princípios de democratização, cidadania e participação
social na gestão pública das unidades de conservação (IRVING et al, 2005). O mesmo deve ter em
sua composição, representantes de órgãos públicos, tanto da área ambiental como de áreas afins
(pesquisa científica, educação, defesa nacional, cultura, turismo, paisagem, arquitetura, arqueologia
e povos indígenas e assentamentos agrícolas), e sociedade civil, como a população residente e do
entorno, população tradicional, povos indígenas, proprietários de imóveis no interior da UC,

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trabalhadores e setor privado atuantes na região, comunidade científica e organizações não-


governamentais com atuação comprovada na região, (BRASIL, 2019).
O Conselho Gestor de uma UC possibilita a expressão das perspectivas, dos interesses, das
preocupações dos valores de diferentes publicos podendoproporcionar ao Poder Público a
aprovação, confiança e cooperação da população local (ANDRADE; LIMA, 2016). O Decreto
4.340\02, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC,
estabelece que as categorias de Unidades de Conservação poderão ter conselho consultivo ou
deliberativo, que serão presididos pelo chefe da Unidade de Conservação, o qual designará os
demais conselheiros indicados pelos setores a serem representados (SILVA, 2015).
Para Silva (2015),o Conselho Consultivo é o órgão de consulta, apoio e participação na
definição das linhas gerais de atuação no que se refere ás Unidades de Conservação da natureza. Já
o Conselho Deliberativo é aquele que, após análise e discussão, exata decisão com caráter
vinculante. A ideia de deliberação é precisamente a de resolução, de ratificação de atos, de decisão
das questões colocadas á sua apreciação.
Observa-se que a legislação brasileira é abundante em dispositivos que permitem e
normatizam a criação de Unidades de Conservação no país. Entretanto, apenas estes dispositivos
não são suficientes para que sejam devidamente criadas e implementadas estas unidades UCs,
(HASSLER, 2005).

CONCLUSÃO
Os artifícios de Plano de Manejo e Conselho Gestor inclusos no Sistema de Unidades de
Conservação , necessitam serem implantados na maior parte das UCs existentes no Brasil , a fim de
assegurar o gerenciamento e democratização nas tomadas de decisão respectivamente no âmbito da
gestão das UCs, e dentre outros atributos e competências determinados pela normatização.
Os Conselhos Gestores em geral são consultivos, mas podem ser deliberativos, como é o
caso das Reservas Extrativistas e das Reservas de Desenvolvimento Sustentável. Essas últimas UC
abrigam populações tradicionais, e por isso o Conselho Gestor tem a competência para aprovar
determinadas ações empregadas na unidade.
A criação de Unidades de Conservação (UCs) ao longo do tempo pela legislação ambiental
em vigor, se fazem mister para conservação e preservação da biodiversidade levando sempre em
consideração o princípio in dubio pro natura ou in dubio pro ambiente, ou seja, nos acontecimentos
em que não for admissível uma explanação parecida, a alternativa deve incidir sobre a interpretação
mais favorável ao meio ambiente, materializado pelo plano de manejo em comjunto com as
deliberações do conselho gestor, por outro lado, o conselho gestor também pode funcionar como

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

uma ferramenta que garante a participação dos atores sociais envolvidos no processo de criação e
gestão das UC e residentes nestas, ou em seu entorno.

REFERÊNCIAS
. Lei 11.516/2007. Dispõe sobre a criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade – Instituto Chico Mendes.

ANDRADE, F. A. V.; LIMA, V. T. A. Gestão participativa em unidades de conservação: uma


abordagem teórica sobre a atuação dos conselhos gestores e participação comunitária. RELEM –
Revista Eletrônica Mutações, v. 7, n. 13. julho – dezembro, 2016.

BARROS, L.S.C.; LEUZINGER, M. D. Planos de manejo: Panorama, desafios e perspectivas.


Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito. v. 13, n. 02, 2018. BRASIL. Constituição
(1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro
Gráfico, 1988. 292 p.BRASIL, Ministerio do Meio Ambiente. 2019.

BRASIL. IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.
Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação- SNUC. no 9.985, de 18 de julho de 2000

BRASIL, Ministério do Meio Ambiente. Conselhos Gestores. Disponível em:


https://www.mma.gov.br/areas-protegidas/unidades-de-conservacao/conselhos-gestores.html.
Acesso em: 27 de set. 2019.

BRASIL, Ministério do Meio Ambiente.Plano de Manejo. Disponível em:


https://mma.gov.br/areas-protegidas/unidades-de-conservacao/plano-de-manejo. Acesso em: 15 de
set. 2019.

HASSLER, M.L. A importância das unidades de conservação no Brasil. Revista Sociedade e


Natureza. v.17. n. 33, 2005.

IBAMA-Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Efetividade


de gestão das unidades de conservação federais do Brasil. Ibama, WWF-Brasil. Brasília: Ibama,
2007.

IRVING, M. A., et al. Governança e áreas protegidas: Pensando o Contexto Brasileiro. Capítulo
para olivro Áreas protegidas e Inclusão Social: Construindo Novos Caminhos, em elaboração, 2005

NETO, A. S. G. Proteção de Unidades de Conservação da Amazônia.Número de Conselhos


Gestores de Unidades de Conservação criados na Esfera Federal. Disponível em:
https://www.mma.gov.br/component/k2/item/11254-conselho-gestor. Acesso em: 15 de set. 2019.

SANTOS, A. A. B. Conselhos gestores de unidades de conservação. 2008. 199 f. Tese.


(Doutorado em Ciências Florestais) – Universidade de Brasília – Distrito Federal.

SILVA, Romeu Faria Tomé. Manual de Direito Ambiental. 2015. 5. ed. rev. e atual.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ANÁLISES DOS PROCESSOS DE CAPACITAÇÃO REALIZADOS NO


ÂMBITO DO PROJETO GEF MAR
ANALYSIS OF THE TRAINING PROCESSES CARRIED OUT UNDER THE GEF MAR
PROJECT

Erika de Almeida*, Maura Machado Silva **


Oceanóloga, Msc. Gestão Social e desenvolvimento territorial, pesquisadora Projeto GEFMar- Capacitação, Diretoria
de Criação e Manejo de Unidades de Conservação, Instituto Chico mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil *
Bióloga, PhD(c) em Ecologia, Analista Ambiental -Departamento de Áreas Protegidas, Ministério do Meio Ambiente,
Brasil **

1.INTRODUÇÃO
O Projeto Áreas Marinhas e Costeiras Protegidas (GEF Mar) é um projeto do Governo
Federal1, criado e implementado em parceria com instituições privadas e da sociedade civil, para
promover a conservação da biodiversidade marinha e costeira. Busca apoiar a criação e
implementação de um sistema globalmente significativo, representativo e eficaz de Áreas Marinhas
e Costeiras Protegidas (AMCPs) no Brasil a fim de reduzir a perda de biodiversidade nos
ecossistemas marinhos e costeiros. (MMA, 2019)
O desenvolvimento e implementação de um plano estratégico de capacitação para a gestão
de áreas protegidas marinhas e costeiras está previsto no subcomponente 1.2. Implementação das
áreas marinhas e costeiras protegidas, linha de ação de capacitação.Desde 2014, o Projeto GEF
Mar vem apoiando distintos processos formativos que visam qualificar suas unidades executoras
para que estas atuem de maneira mais eficaz e com um ferramental mais adequado aos desafios da
gestão das unidades de conservação e centros de pesquisa apoiados pelo projeto.
Neste sentido, o presente trabalho tem o objetivo de analisar os processos formativos já
implementados no âmbito do Projeto GEF Mar, bem como tecer considerações a respeito da
elaboração de diretrizes estratégicas para a formação continuada e permanente para a gestão
ambiental que considerem as especificidades da zona costeira e marinha, especialmente no que
tange à gestão de UCs.

1
O Governo Federal implementa o Projeto GEF-Mar por meio de uma parceria técnico-financeira com o Fundo
Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo financiado com recursos do Global Environment Facility (GEF) – por
meio do Banco Mundial, e recursos provenientes do Termo de Compromisso com o IBAMA como parte da
compensação ambiental para adequação das plataformas marítimas de produção da Petrobrás em relação ao descarte de
água de produção.

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2. MATERIAL E MÉTODOS
A partir de dados consolidados1 sobre capacitações pretéritas apoiadas pelo Projeto GEFMar
entre os anos de 2015 e 2018, cada capacitação foi categorizada de acordo com os marcos
referenciais2 do Projeto e seu ano de execução.
Para aferir o alcance das metas estabelecidas no Projetodo GEF, utiliza-se a ferramenta de
monitoramento da gestãodenominada Tracking Tool(TT). Esta ferramenta, aplicada anualmente,
avalia os avanços na gestão e conservação da biodiversidade pelas UCs. De acordo com essa
ferramenta, o objetivo de fortalecimento das áreas protegidas é medido como o avanço no nível de
gestão que uma UC possui, baseando-se na pontuação total (P) obtida por essa UC na aplicação da
ferramenta de monitoramento TT.Nesse sentido, são considerados 3 níveis de gestão: nível 0: P <
35%: não funcional; nível 1 : 35% ≤ P≤ 75%: funcionamento básico; e nível 2: 75% < P: alto nível
de funcionamento (MMA. 2019).
Além das categorias já estabelecidas pelo projeto foram adicionadas três novas categorias
para melhor agrupamento das capacitações e análises, são elas: “GEF Mar/Funbio” referente as
capacitações relacionadas ao sistema operacional do Projeto e processos de planejamento;
“Governança” com atividades que envolveram articulações externas às UCs, como participação em
eventos, comissões ou reuniões de maior abrangência e com temáticas mais transversais; e “Gestão
de UC” se referindo a processos internos às UCs, como capacitações sobreo Sistema de Análise e
Monitoramento de Gestão (SAMGe),Sistema Eletrônico de Informações (SEI) e licenciamento.
A partir dessa categorização, algumas análises foram feitas de acordo com a frequência das
capacitações em cada marco referencial, totalizando 215 capacitações e distribuídas nos seguintes
marcos referenciais conforme apresentado na tabela 1:

Tabela 1 –Frequência de ocorrência em capacitação de cada Marco Referencial do Projeto.


Marco Referencial Frequência de ocorrência
Equipamentos e infraestrutura 11
GEF Mar/Funbio 32
Gestão Participativa e Integração Comunitária 32
Gestão UC 11
Governança 26

1
Provenientes da unidade de coordenação do Projeto Departamento de Áreas Protegidas do Ministério do Meio
Ambiente (DAP/MMA)
2
Os marcos referenciais do projeto foram estabelecidos para o subcomponente de implementação de áreas marinhas e
costeiras protegidas, a fim de direcionar as atividades desse subcomponente e viabilizar a consolidação das UCs, com
metas específicas para cada um deles.
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Pesquisa e Monitoramento 67
Plano de Manejo, Acordos de Gestão e Termo de Compromisso 5
Sistema de Proteção 7
Uso Público 24
Total Geral 215

Fonte: Almeida, 2019 (dados não publicados).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da análise da frequência de capacitações realizadas, conforme exposto na Tabela 1,
pode-se apontar que 31% das capacitações foram destinadas para o marco referencial de Pesquisa e
Monitoramento, 15% para o de Gestão Participativa e Integração Comunitária e 15% de
capacitações relativas ao GEFMar/Funbio, sendo que estas perfazem 61% de todas as capacitações
executadas. Governança, com frequência de 12%, também foi um marco importante para as
capacitações, bem como Uso Público, com 11% das atividades. Todos esses marcos perfazem um
total de 84% das atividades de capacitação executadas no âmbito do projeto.

Figura 1 – Análise das capacitações de cada marco referencial por ano de execução

Fonte: Almeida, 2019 (dados não publicados)

Nos anos de 2017 e 2018 houve um incremento em ações de capacitação, diversificando os


marcos referenciais. Já em relação aos avanços nos marcos referenciais do projeto, de acordo com o
último relatório de progresso técnico financeiro do Projeto GEF Mar (MMA, 2019), pode-se notar
que houve mais avanços justamente nos marcos referenciais em que realizou-se mais esforços de
capacitação: pesquisa e monitoramento e gestão participativa, que também foram marcos
referenciais que se destacaram por não apresentarem regressão desde o início da execução do
projeto (figura 2).

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Figura 2 - Acompanhamento da situação das UCs federais e estaduais em relação aos Marcos Referenciais
do Projeto (2013 – 2018)

Fonte: Projeto GEF Mar/Ministério do Meio Ambiente (2019)

4. CONCLUSÃO
A partir dessas análises, compreendendo melhor o histórico de investimento das
capacitações ao longo do processo de execução do GEF Mar, percebe-se que os marcos referenciais
que tiveram um investimento contínuo em capacitações também foram os que se destacaram no
avanço do projeto, de acordo com as ferramentas de análise e acompanhamento do projeto.Neste
sentido destaca-se que os marcos referenciais de pesquisa e monitoramento, bem como o de gestão
participativa, são os que mais avançam em direção às metas do projeto.
No âmbito da implementação das ações de monitoramento, a capacitação tem um papel
fundamental, pois tais ações dependem de desenvolvimento de competências específicas para sua
implementação. Já no que concerne à gestão participativa, considera-se ações formativas centrais
neste processo, visando tanto a qualificação da participação social na gestão de UCs como a
capacitação dos gestores para sua implementação, evidenciando-se a participação ativa e crítica de
mulheres e jovens em distintas atividadesdas UCs, promovendo a ampliação da participação e
protagonismo desses grupos na gestão (MMA, 2019). As análises aqui apresentadassobre os
processos de capacitação executados corroboram para o avanço nestes marcos referenciais, pois
estes tiveram investimentos em capacitação desde o início da execução do projeto.
Com o intuito de continuidade e com base nas experiências de capacitação desenvolvidas
pelo projeto, atualmente está em curso a elaboração de projeto político pedagógico para a zona
costeira e marinha, abarcando as regiões foco do projeto. Dessa forma, entende-se que as
capacitações serão articuladas de forma integrada e de acordo com as necessidades dos territórios.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Destaca-se que embora os investimentos em capacitações do projeto entre os anos 2016 e


2018 foram em demandas espontâneas, pode-se considerar que para as temáticas de pesquisa e
monitoramento e gestão participativa tal esforço foi assertivo e contribuiu para um maior alcance
das metas estabelecidas pelo projeto e consequentemente para o fortalecimento das unidades em
conservação.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecimentos ao Global Environmental Facility (GEF); ao Banco Mundial; ao Fundo
Brasileiro para a Biodiversidade - Funbio; ao Ministério do Meio Ambiente; e ao Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade, pelo apoio e fomento à pesquisa em capacitação eao
processo de apoio na consolidação das unidades de conservação costeiras e marinhas.

6. REFERÊNCIAS
MMA – MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTERelatório de Progresso Técnico-Financeiro do 2º.
Semestre de 2018 do Projeto Áreas Marinhas e Costeiras Protegidas GEF Mar. Brasília, 2019.
90 páginas. Disponível em:
https://www.mma.gov.br/images/arquivo/80229/8o%20Rel%20Progresso%20GEF-
Mar_2sem2018.pdf

MMA – MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE https://www.mma.gov.br/areas-


protegidas/programas-e-projetos/projeto-gef-mar acesso em 25/09/2019

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DOS TERRITÓRIOS


QUILOMBOLAS CERTIFICADOS NO ESTADO DE PERNAMBUCO
ANALYSIS OF GEOGRAPHIC DISTRIBUTION OF THE QUILOMBOLASTERRITORIES
CERTIFICATEDIN PERNAMBUCO STATE

Arthur Felipe de Melo Teixeira*, Clarissa Marques**, André Carneiro Leão***

PRODEMA, UFPE, Brasil.ameloteixeira23@gmail.com*


Departamento de Direito, UPE,Brasil. marquesc2504@gmail.com**
Defensoria Pública da União, Brasil. andrecarneiro.dpu@gmail.com***

INTRODUÇÃO
As populações tradicionais são formadas por cidadãos e cidadãs que, através de suas
territorialidades ao longo da história de consolidação no território, promoveram e/ou promovem um
manejo de baixo impactono que tange aos elementos naturais encontrados nas áreas de influência,
isso se comparada à ordem mercadológica do sistema capitalista de produção.
É dentro deste contexto de grupos com especificidades culturais e práticas correlacionadas
ao meio ambiente que se encontramas comunidadesquilombolas. Esta parcela da população reúne,
para além dos elementos materiais e imateriais, um histórico que remete a luta pela terra e uma
origem vinculada, sobretudo, à atividade de exploração humana nas mais diversas regiões do Brasil.
Leite (2008)explana que a palavra “quilombo” significa acampamento de guerreiros na
floresta e foi empregada, no período conhecido como Brasil Colônia, para identificar as ‘unidades
de apoio mútuo’. Essas unidades foram criadas e consolidadas por ex-escravos fugitivos do sistema
escravista. Ainda segundo o autor, a criação de quilombos, vista anteriormente como a reunião de
um número superior a5 negros, é retratada na história como um marco contra o sistema
exploratóriovigente na época.
Na data de 22 de agosto de 1988, ano de criação da Constituição da República Federativa do
Brasil (CRFB), foi instaurada, pelo Governo Federal, a Fundação Cultural Palmares (FCP). Desde
então, a FCP trabalhano sentido de manutenção dos valores históricos e socioeconômicos
relacionados à influência negra na formação da sociedade brasileira. Somado a isso, a fundação
almeja a promoção de uma política cultural igualitária e inclusiva para estas comunidades, isso na
busca pela valorização da história e das diferentes formas de manifestações culturais e artísticas
negras.
Dentro das suas funções enquanto entidade, a FCPrealiza a emissão de certidões de
comunidades quilombolas e a inscrição no cadastro geral. Segundo dados dainstituição, já foram
emitidas 3.217 certificações para comunidades quilombolas no Brasil.
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Segundo Little (2004), acerca da questão fundiária dos grupos caracterizados como povos
tradicionais no Brasil, ocorreram mudanças de enfoque no que permeia a demarcação e
regularização territorial ao longo da história. O autor coloca ainda que o conceito de territorialidade
deve abarcar o esforço de um grupo de indivíduos para usufruir e realizar suas práticas, com
identidade e pertencimento, num recorte espacial.
Assim, diante do contexto de lutas sociais e a relevância na construção sociocultural
brasileira, o presente estudo direciona o olhar às comunidades quilombolas do estado de
Pernambuco, com o objetivo de compreender e analisar a espacialização dessas comunidades na
escala estadual.Esse trabalho é fruto das atividades desenvolvidas pelo Projeto de Inovação
Pedagógica"Ser Quilombola", coordenado pela parceria desenvolvida entre o Grupo de Estudos e
Pesquisas Transdisciplinares sobre Meio Ambiente, Diversidade e Sociedade (GEPT-UPE/CNPq) e
a Defensoria Pública da União (DPU), com ações acompanhadas pelo Grupo de Pesquisa
Movimentos Sociais e Espaço Urbano (MSEU-UFPE/PRODEMA).

MATERIAL E MÉTODO
Caracterização da área de estudo
A presente pesquisa tem como área de estudo o território do estado de Pernambuco,
enquanto delimitação macro do trabalho. Entretanto, pelas particularidades elencadas anteriormente,
o objeto de estudo refere-se, especificamente, às comunidades remanescentes de quilombos
certificadas.
O estado de Pernambuco possui uma área territorial de aproximadamente 98.070 km², com
uma população estimada, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatítica – IBGE
(2019), em 9.557.071 habitantes, ou seja, com uma densidade demográfica em torno de 97,4
habitantes por km².
Dentre as divisões adminstrativas que existem para Pernambuco, a subdivisão em
mesorregiões, proposta pelo IBGE, disseca o estado em 5 partes. Situada mais a leste e possuindo o
maior trecho de faixa litorânea, a Mesorregião Metropolitana (MM) é composta atualmente por 14
municípios. A MM é caracterizada, sobretudo, pela área de expansão da mancha urbana e,
concomitamente, pela zona de consolidação do turismo de sol e mar.
A segunda, partindo num sentido leste-oeste, compreende a Mesorregião Mata
Pernambucana (MMP), fortemente demarcada pelo cultivo da cana-de-açúcar. Já a Messorregião
Agreste (MA) pode ser enxergada como a mesorregião intermediária entre a MMP e o sertão
pernambucano, esse último fragmento subdivido em duas parcelas. A parcela mais a norte do
sertão, denominada Mesorregião do Sertão Pernambucano (MSP), é fortemente marcada pelo
rigoroso regime pluvimétrico e a inexistência de cursos fluviais tão expressivos. Em contrapartida, a
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

parcela do sertão mais a sul, denominada Mesorregião do São Francisco Pernambucano (MSFP),
tem como maior alento,frente à escassez pluviométrica, o rio São Francisco,delimitação retratada na
figura 1.

Figura 1 - Mapa de localização das messorregiões do estado de Pernambuco.

Fonte de dados:IBGE (2016). Organização: Arthur Teixeira (2019).

Procedimentos metodológicos
Para atingir o objetivo geral elencado foi necessária a realização de alguns procedimentos de
maneira integrada. O primeiro procedimento refere-se ao levamento bibliográfico básico que abarca
a temática proposta, isso para entender o contexto histórico no qual estas populações tradicionais
estão inseridas.
Já o segundo procedimento refere-se à aquisição das localizações geográficas das
comunidades quilombolas certificadasno estado de Pernambuco, junto à Fundação Cultural
Palmares, bem como dos dados vetoriais (limites estaduais e municipais) na base de dados do
IBGE.
E, por fim, para uma leitura e interpretação do que ocorre no estado, foi necessária a
utilização do software de geoprocessamento Arcgis 10.2 (licença estudantil) para a produção de um
mapeamento que elucida as localizações geográficas das comunidades quilombolas dentro do
território estadual e o quantitativo destas comunidades.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O principal resultado do estudo, atingido com a utilização da base de dados da FCP e a
manipulação dessa base no software de geoprocessamento, aponta para a distribuição geográfica
dos territórios quilombolas certificados em Pernambuco, conforme a figura 2.

Figura 2 - Mapa das comunidades quilombolas certificadas - Pernambuco.

Fonte de dados:IBGE (2016) e Fundação Cultural Palmares (2019).Organização: Arthur Teixeira (2019).

Com a análise dos dados secundários da Fundação Cultural Palmares, constatou-se que dos
184 municípios pernambucanos apenas 54 municípios reúnem territórios remanescentes de
quilombos certificados. Na Mesorregião Metropolitanaforam encontradas4 comunidades
quilombolas, distribuídas nos municípios de Olinda, Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca. Em
seguida, já na MesorregiãoMata Pernambucana, composta por 43 municípios,identificou-se o total
de5 comunidades, distribuídas nos municípios de Goiana, Lagoa do Carro, Vicência e Rio Formoso.
Na Mesorregião do Agreste, que reúne 71 municípios, foram contabilizadas 62 comunidades
quilombolas certificadas, ocorrendoà distribuição dessas comunidades em 22 municípios. A
mesorregião de transição é a área de maior concentração das comunidades quilombolas no estado.
Asegunda maior área de reunião de grupos quilombolas no estado é a Mesorregião do Sertão
Pernambucano com o número de52 comunidades, distribuídas em 14 dos 41 municípios presentes

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

nessa mesorregião. E, por fim, a Mesorregião do São Francisco Pernambucano reúne 24


comunidades quilombolas em 10dos seus 15 municípios.
Além disso, o município de Salgueiro, localizado no Sertão Pernambucano, e o de Terra
Nova, da Mesorregião do São Francisco Pernambucano, conforme a listagem da Fundação Cultural
Palmares, dividem fragmentosde uma mesma comunidade quilombola.

CONCLUSÃO
As reflexões sobre a distribuição territorial das comunidades quilombolas certificadasem
Pernambuco revelamuma lógica de distanciamento da faixa litorânea, pois essas comunidades estão
majoritariamente concentradas nas áreas que partem da Mesorregião Agreste e adentram o
continente no sentido leste-oeste.
Além da análise espacial, o estudo identificou um ponto crítico no que diz respeito à
regularização destes povos tradicionais em seus territórios, pois nenhuma das 148 comunidades
quilombolas elencadas na lista da Fundação Cultural Palmares possui o título da posse da terra de
maneira unificada, demonstrando uma fragilidade e, ao mesmo tempo, a necessidade de políticas
públicas assistencialistas que garantam o direito e a preservação das territorialidades desta parcela
da população.
Por fim, conclui-se que as comunidades quilombolas do estado de Pernambuco precisam ser
enxergadas e reconhecidas como povos tradicionais que resguardam símbolos e práticas que
modelam a história de construção social do povo pernambucano.

AGRADECIMENTOS
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa
concedida ao primeiro autor da pesquisa, bem como a Fundação Cultural Palmares pela
disponibilização de dados importantes para a análise realizada.

REFERÊNCIAS
FCP – Fundação Cultural Palmares. Apresentação. Brasília. Disponível em:
http://www.palmares.gov.br/?page_id=95. Acesso em: 04/09/2019.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. População. Brasília. Disponível em:


https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pe/panorama. Acesso em: 04/09/2019.

LEITE, I. B. O projeto político quilombola: desafios, conquistas e impasses atuais. Revista de


Estudos Feministas, 16, 3, 956-977, 2008.

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LITTLE, P. E. Territórios sociais e povos tradicionais no Brasil: Por uma antropologia da


territorialidade. Anais... In: 23ª Reunião Brasileira de Antropologia, Rio de Janeiro, 251-290,
2004.

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INFORMAÇÃO AMBIENTAL SOBRE CONSELHOS GESTORES EM


UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL
ENVIRONMENTAL INFORMATION ABOUT MANAGEMENT COUNCILS IN PROTECTED
AREAS OF RIO GRANDE DO SUL

Izadora Flores Rech*

*Mestrado Profissional em Ambiente e Sustentabilidade, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Brasil

1. INTRODUÇÃO
Em unidades de conservação, os conselhos gestores representam os espaços mais
reconhecidos para gestão participativa ao se constituírem como fóruns de discussão, negociação e
tomadas de decisão, onde se tratam assuntos relacionados às UC e ao interesse das comunidades
locais (BRASIL, 2002). Entretanto, a participação popular - seja através dos conselhos ou para além
desses - não é um processo autônomo da sociedade, exigindo estímulos constantes para o
desenvolvimento da consciência e da autonomia social nos processos decisórios sobre a gestão de
UC (MMA, 2015).
A informação como instrumento para a educação e comunicação ambiental tem sido
percebida como ferramenta para o fortalecimento da gestão e de políticas conservacionistas em
unidades de conservação, possibilitando a construção de conhecimentos e de saberes capazes de
qualificar os processos participativos em áreas com ameaças de perda da diversidade socioecológica
(MMA, 2015).
Assim, o acesso à informação primária, íntegra, autêntica e atualizada (BRASIL, 2011),
intermedia a participação popular em assuntos referentes às problemáticas ambientais que
interferem na qualidade de vida da sociedade, possibilitando a “democratização das políticas
públicas” (LOPES, 2006, p. 52). Esse é um papel que a informação vem a cumprir quando assume
um caráter objetivo e transparente para ampliação das iniciativas de deliberação popular
(QUEVEDO, MOREIRA; TYBUSCH, 2017).
Dessa forma, esse ensaio tem por objetivo fazer uma leitura sobre a disponibilização de
informação ambiental sobre os conselhos gestores de unidades de conservação administradas pelo
estado do Rio Grande do Sul, tendo em vista que a participação social em questões de interesse
coletivo tem como premissa o acesso a informações percebidas ainda sob controle, em sua maioria,
pelos órgãos governamentais (FURRIELA, 2004).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

2. METODOLOGIA
A proposta deste estudo se baseou na pesquisa documental, que, segundo Godoy (1995),
busca encontrar novas interpretações para uma temática através do exame de materiais que não
foram tratados previamente de forma analítica. Para tal, foi realizado um levantamento buscando-se
portarias de constituição dos conselhos, atas de reuniões, regimentos internos, resoluções de
conselhos deliberativos, etc.
A busca por esses materiais ocorreu especialmente pela internet, mais precisamente no site
da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do estado do Rio Grande do Sul (SEMA-RS),
buscando-se também analisar a popularização e disponibilização de informações sobre os resultados
da atuação do conselho gestor à sociedade.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O Sistema Estadual de Unidades de Conservação do Rio Grande do Sul foi criado através do
Decreto n° 34.256/1992 (RIO GRANDE DO SUL, 1992). Entretanto, em 2016 o SEUC passa a ser
regulamentado através do Decreto nº 53.037/2016, quando as unidades de conservação também
passam a ser vistas como espaços para “cooperação entre os órgãos públicos federais, estaduais,
municipais e as organizações da sociedade civil” (RIO GRANDE DO SUL, 2016).
Se no Decreto de 1992 o Cadastro Estadual de Unidades de Conservação (CEUC) tinha por
objetivo abrigar apenas informações sobre aspectos físicos e biológicos das UC, no Decreto de 2016
o CEUC passa a exigir uma série de informações, como a comprovação da participação da
sociedade no processo de criação da UC, através de consultas e audiências públicas, e a atualização
de informações a respeito da implementação da UC, tal como o funcionamento do conselho gestor,
para fins de renovação do cadastro da unidade no sistema.
No site da SEMA-RS, as informações sobre os conselhos gestores são encontradas em um
campo próprio. Informações a respeito de conselhos gestores de unidades de conservação
municipais não são apresentadas e, no caso de unidades de conservação federais as informações
sobre a existência de um conselho são apresentadas no Cadastro Nacional de Unidades de
Conservação, administrado pelo Ministério do Meio Ambiente.
Das 23 unidades de conservação estaduais, mais da metade possui conselho gestor. É
importante apontar que, apesar das unidades de conservação do estado serem em sua maioria
pertencente ao grupo de proteção integral, todas as unidades de conservação de uso sustentável (um
total de três) possuem conselho gestor. Essas unidades são Áreas de Proteção Ambiental (APA),
categoria que, justamente por possuírem grandes extensões territoriais e possibilitarem o uso do
território para diversas atividades humanas, denotam a importância que um conselho gestor tem
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

para a gestão territorial. Apesar do SNUC não definir a forma de conselho gestor para as APA, no
RS eles estão definidos como deliberativos, ou seja, deliberam decisões a respeito de assuntos
referentes à elaboração e implementação do Plano de Manejo, parcerias com organização da
sociedade civil de interesse público para gestão compartilhada e integração da UC com outros
segmentos sociais (BRASIL, 2002).
As portarias de criação dos conselhos são as informações mais recorrentes na página, e
apresentam, principalmente, a composição dos conselhos. Já os regimentos internos, menos
frequentes em sua publicidade, apresentam as finalidades dos conselhos, as atribuições do
colegiado, a estrutura organizacional, a condução das assembleias, o direcionamento das decisões
do fórum, etc. Essa seria uma forma de intermediar através da comunicação institucional a
divulgação nas comunidades sobre as competências do conselho, bem como os direitos e deveres
dos conselheiros (MMA, 2015).
O calendário anual de reuniões é bastante frequente, entretanto, as datas, na maioria das
vezes, estão desatualizadas e não apresentam horário e local das reuniões. Ainda menos frequentes
são os e-mails para contato com os conselhos gestores.
Para Dolabela e Bemfica (2006), a curta “validade” das informações, decorrente do
dinamismo dos processos que acompanham a questão ambiental, e a inexistência de padronização
na produção e publicação das informações são alguns dos aspectos que limitam o acesso da
sociedade à informação. Para esses autores, isso é reflexo do acúmulo de fluxos informacionais que
abrangem os órgãos governamentais sem que os mesmos consigam registrá-los e publicá-los,
exigindo uma priorização de determinadas áreas no tratamento de informações, o que nos remete a
uma ineficácia da política de informação ambiental.
A única unidade de conservação que disponibilizou os registros das reuniões através de atas
foi a Área de Proteção Ambiental do Banhado Grande, com as atas disponíveis entre os anos de
2014 e 2017. Essa é uma importante oportunidade para a sociedade analisar as pautas de discussão e
atuação dos conselhos e dos encaminhamentos de ações relacionadas à conservação da
biodiversidade e à gestão da UC de uma forma geral. Segundo Paes (2015), a natureza da
informação não é “pública” pelo fato de ter sido produzida pelos órgãos gestores, mas porque está a
serviço de interesses coletivos. Assim, no caso de conselhos gestores de unidades de conservação as
informações encontradas são públicas porque tratam de um “bem de uso comum do povo”
(BRASIL, 1988) e mostram que não basta existir a informação disponibilizada se ela for tratada
apenas como um dado, desvinculada de seu sentido político. Do contrário, a qualidade do processo
participativo será afetada, bem como as oportunidades que a sociedade tem de qualificar as decisões
públicas e de aumentar a efetividade das mesmas (PAES, 2015; DELNOY, 2005 apud MIRRA,
2010).
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4. CONCLUSÃO
Observa-se que a legislação brasileira apresenta a partir da década de 1980 a participação
social e o acesso à informação como instrumentos para a proteção do “meio ambiente equilibrado”,
tendo a cidadania como fundamento do Estado Democrático de Direito e aparecendo com mais
frequência a partir dos anos 2000.
Entretanto, observou-se que as informações que podem contribuir na construção de
processos participativos permanecem restritas ao órgão governamental, trazendo o sentido de
“público” relacionado à sua suposta origem (produzida pelo governo) e não à sua natureza, que é a
de interesse social.
No caso do Rio Grande do Sul, mais da metade das unidades de conservação possuem
conselho gestor, entretanto, as informações são divulgadas de forma esparsa, não havendo
uniformidade e periodicidade na divulgação dos registros. Da mesma forma, essa incipiência de
registros interfere na equidade nos debates e na qualificação dos processos decisórios, também
remetendo a uma ideia de participação fomentada e contida pelo Estado.
Por fim, sugere-se que além da maior publicidade dos processos participativos para as
unidades de conservação estaduais, sejam integrados também informações sobre os conselhos
gestores de áreas protegidas municipais e federais, a fim de contribuir para promoção e
fortalecimento da comunicação e da sensibilização pública para a participação e controle social na
gestão das unidades de conservação.

5. AGRADECIMENTOS
À SEMA-RS, pelas informações disponibilizadas através de sua página na internet.

6. REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da República
Federativa do Brasil. Brasília, 5 de outubro de 1988.

____. Decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002. Regulamenta artigos da Lei no 9.985, de 18 de


julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação daNatureza -
SNUC, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa doBrasil. Brasília, DF,
23 ago. 2002.

____. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto noinciso
XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3o do art. 37 e no § 2o do art. 216 da ConstituiçãoFederal;
altera a Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei no 11.111, de 5 demaio de 2005, e
dispositivos da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outrasprovidências. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 18 nov. 2011.

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DOLABELA, R. F.; BEMFICA, J. C. A produção de informação sobre o meio ambiente noBrasil.


In: Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação, 7, 2006, Marília/SP.Anais... Marília:
ANCIB, 2006. Disponível em:
http://enancib.ibict.br/index.php/enancib/viienancib/paper/view/2651/1779. Acesso em: 8 set.2019.

FURRIELA, R. B. A lei brasileira sobre acesso à informação ambiental como ferramenta para a
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GODOY, A. S. Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas,


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LOPES, J. S. L. Sobre processos de “ambientalização” dos conflitos e sobre dilemas da


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MMA. A participação social e a ação pedagógica na implementação da unidade de


conservação. Série Educação Ambiental e Comunicação em Unidades de Conservação. Brasília:
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MIRRA, A. L. V. Participação, processo civil e defesa do meio ambiente no direito brasileiro.


2010, 346, v.1. Tese (Doutorado em Direito). Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo. São
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PAES, L. M. Participação popular e acesso à informação ambiental para preservação do meio


ambiente ecologicamente equilibrado. Revista Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v.5, nº 2,
2015 p.277-287.

QUEVEDO, C.; MOREIRA, L. C.; TYBUSCH, J. S. O acesso à informação como instrumento e


garantia do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. In:
Congresso Internacional de Direito e Contemporaneidade, 4, 2017, Santa Maria/RS. Anais...Santa
Maria: UFSM, 2017. Disponível em: www.ufsm.br/congressodireito/anais/2017/4-4.pdf. Acesso
em: 8 set. 2019.

RIO GRANDE DO SUL. Decreto nº 34.256, de 02 de abril de 1992. Cria o Sistema Estadualde
Unidade de Conservação e dá outras providências. Diário Oficial do estado do RioGrande do Sul,
Porto Alegre, 02 abr. 1992.

____. Decreto nº 53.037, de 20 de maio de 2016. Institui e regulamenta o Sistema Estadual


deUnidades de Conservação – SEUC. Diário Oficial do estado do Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, 23 de maio de 2016.

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CONHECENDO A PESCA ARTESANAL NA APA COSTA DOS CORAIS:


MÉTODOS PARTICIPATIVOS

KNOWING ARTISANAL FISHNIG IN APA COSTA DOS CORAIS: PARTICIPATORY


METHODS

Rafael Sá Leitão Barboza*, Andrei Tiego Cunha Cardoso**, Carolina Neves Souza***

Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Brasil*. rafabarboza@gmail.com


Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Brasil**
Instituto Yandê: Educação, Cultura e Meio Ambiente, Brasil***

1. INTRODUÇÃO
A pesca artesanal no Brasil vem sofrendo com falta de apoio governamental notoriamente
com a ausência de um espaço no estado gestor/regulador da pesca de forma permanente ou com
ações contínuas. Após a extinção do Ministério da Pesca (MP), suas competências migraram para
Secretaria de Aquicultura e Pesca (SAP) no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
(MAPA), não demorou muito e foi redirecionada para o Ministério da Indústria, Comércio Exterior
e Serviços (MDIC), logo foi transformada em Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca (SEAP), e
atualmente, após muito jogo de empurra migrou novamente para a Secretaria de Aquicultura e
Pesca do MAPA, a qual retoma seu papel timidamente dentro do governo. Outro exemplo que
representa nitidamente a negligência do estado para com a pesca artesanal é a descontinuidade do
levantamento dos dados da estatística pesqueira, o qual encontra-se inativo desde 2011 (MAPA,
2019).
Frente à falta de prioridade com a pesca artesanal, declarada veladamente pelo estado
brasileiro, a equipe participante da Câmara Temática (CT) da Pesca e do Grupo de Trabalho (GT)
das espécies ameaçadas do Conselho Consultivo da Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais
(APACC) vem promovendo espaços de diálogo participativos que culminaram em um projeto
aprovado pelo Fundo Global do Meio Ambiente – GEFMar – e executado pelo Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), intitulado “Conhecendo a Pesca Artesanal na
APA Costa dos Corais”. A gestão da Unidade de Conservação (UC) conseguiu dar início à
execução do projeto graças a uma rede formada por lideranças comunitárias e pessoas dedicadas de
instituições parceiras que atuam há algum tempo com as comunidades pesqueiras na região.
O presente estudo relata com detalhes um recorte de uma das etapas da agenda da pesca da
APACC, o Diagnóstico da Pesca, e objetiva divulgar e difundir métodos participativos da gestão da
Pesca Artesanal da APA Costa dos Corais.

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2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Área de Estudo
Criada por meio de decreto em 23 de outubro de 1997, a Área de Proteção Ambiental Costa
dos Corais é a maior unidade de conservação federal costeiro-marinha do país. Abrange 12
municípios, cujas principais atividades econômicas são a monocultura da cana-de-açúcar, o turismo
e a pesca artesanal.
O estudo foi desenvolvido entre outubro de 2018 a maio de 2019 em onze municípios da
APACC.

2.2. Diagnóstico de Pesca


2.2.1. Círculos de Apoio
A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, por trinta coletores
da comunidade utilizando o método "bola de neve" para indicação dos informantes. Os coletores
tiveram um amplo suporte de um arranjo denominado Círculos de Apoio, o qual consiste em um
método elaborado para fortalecer e apoiar os coletores como um grupo de governança com atenção
constante. Desta forma, cada município tinha de um a quatro coletores que contavam com a
contribuição de um Articulador Local por município, compostos por lideranças comunitárias
reconhecidas para apoiar à execução das entrevistas, apresentar os coletores na comunidade, sugerir
propostas de logística, acompanhar a execução da atividade, verificar dificuldades dos coletores,
mediar o diálogo entre coletores, pescadores e ICMBio, etc. Quatro Articuladores Regionais
também cumpriram o mesmo papel, porém com maior diálogo e foco nos articuladores locais,
sendo uma figura ligada à pesca com atuação em maior escala.
i. Capacitação dos coletores
Todos os coletores tiveram uma capacitação com conteúdo sobre metodologia, orientações
sobre a realização das entrevistas, o caráter do sigilo, a conduta durante a aplicação das entrevistas,
o objetivo e experiências sobre alternativas utilizadas, inclusive por alguns coletores, para contornar
situações mais difíceis em entrevistas. Também foram realizados testes prévios utilizando o
questionário com todos os participantes.
ii. Mobilização e Reuniões Setoriais
Para poder contar com a participação máxima de pescadores, todas as reuniões do
diagnóstico aconteceram na sede de cada município, e até em mais de um local em cada município.
Na etapa de mobilização, que antecede as reuniões, várias estratégias foram empregadas, como

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carros de som, cartazes, mídia social (facebook, whatsapp, instagram, etc.), diálogos pessoais
casuais e com lideranças de cada localidade, incluindo Colônias de Pesca e Associações.

iii. Coleta de Dados e Comunicação Rápida


A coleta foi realizada utilizando questionário digital em smartphones dos próprios coletores,
por meio do aplicativo iSurvey (versão 2.14.4) e droidSurvey (versão 2.8.7) do
HarvestYourData.com.
O diálogo entre os participantes coletores, articuladores, gestores e pesquisadores aconteceu
de maneira ininterrupta e excepcional, por meio de um grupo criado no aplicativo Whatsapp.
iv. Ferramentas Participativas
Visando mapear os territórios pesqueiros, a primeira etapa da identificação das áreas de
pesca ocorreu por meio do mapeamento participativo, em cada município, com vários informantes-
chave representando múltiplas categorias da pesca artesanal (CHAMBERS, 1992).
Também de forma coletiva com os informantes-chave, foi aplicada a metodologia para
elaboração de calendários sazonais da pesca, a fim de compreender o período de captura das
principais espécies citadas (POFFENBERGER et al., 1992; SEIXAS, 2005).
b. Devolutivas
Os resultados do diagnóstico foram apresentados em todos os municípios, abrindo diálogo
para os pescadores se expressarem sobre incoerências dos resultados. Foram apresentados em forma
de banner, com informações gerais da APACC e de cada município, recheados de infográficos com
linguagem bastante visual e acessível. Ao final, os banners foram entregues para as Colônias de
Pesca e Associações de cada município.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram capacitados 30 jovens, com 23 anos em média, para coleta de dados, e atualmente
fazem parte de uma rede crescente de colaboradores da pesca na APACC. Uma das metodologias
estratégicas que foram aplicadas para execução do diagnóstico da pesca foi o arranjo formado por
vários atores dessa rede, denominado Círculos de Apoio, fundamentais para o sucesso dos
resultados e também são amplamente utilizados para acompanhar planejamentos e reestruturar
projetos de apoio à jovens em escolas (NUNES, 2018).
Ao todo foram realizadas 1439 entrevistas em 11 municípios da APACC, sendo a maioria
(62%) dos entrevistados pertencentes ao gênero masculino.
Mesmo com a comunicação facilitada, muitas dificuldades foram relatadas durante as
entrevistas. A todo instante eram enviados áudios, mensagens de incentivo, fotos, orientações,
assertivas para as atividades, textos norteadores e novas estratégias como forma de apoio para
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execução da atividade. As dúvidas eram sanadas pelo envio simultâneo de materiais curtos como
“orientações gerais”, “dicas de última hora” e “dúvidas mais comuns”.
Apesar do uso de ferramentas tecnológicas favorecer a coleta de dados, entende-se que esta
metodologia pode não representar um caráter inclusivo, levando em consideração que muitos não
possuem smartphones, porém, o papel funcional e social da tecnologia labora como uma estratégia
para alcançar e recrutar os jovens que tanto anseiam pela inovação (GREIN; AMARAL, 2015).
Após a atividade, os coletores e articuladores participaram da apresentação dos resultados e
avaliação de todo o processo, com o objetivo principal de fortalecimento da rede de colaboradores
da pesca. As devolutivas também foram realizadas de forma descentralizadas utilizando banners
recheados de infográficos com linguagem bastante visual e acessível, disponibilizados para as
colônias e associações de cada município (Figura 1). Infográficos são recursos da comunicação
definido pela fusão de imagens e textos para apresentar conteúdos informativos de maneira clara,
concisa e atraente (LAPOLLI, 2016). Apesar de ser utilizado há bastante tempo na comunicação
humana, principalmente no jornalismo e publicidade, ainda é pouco aplicado em comunidades
tradicionais. Funciona como um apelo visual que possibilita a compreensão da notícia, o consumo
de uma informação de forma rápida, por múltiplos estímulosalmejando favorecer a aquisição,
compreensão de informações por parte do público alvo (LIMA; CATELÃO, 2019).

Figura 1 – Conteúdo de um dos banners e cartilhas mostrando alguns Infográficos.

Foram elaborados doze calendários de pesca e doze etnomapas setoriais compondo áreas de
pesca em toda a APACC com a localização de 481 pesqueiros. O uso de conhecimentos de
comunidades tradicionais em Sistema de Informação Geográfica tem sido um importante
componente, principalmente na elaboração de mapas (ROBBINS, 2003).
Nos municípios que tiveram apoio das lideranças e da Colônia de Pesca a atividade de coleta
de dados e as reuniões aconteceram com excelência, porém, onde não houve esse apoio o número
de entrevistas foi abaixo da média e até reuniões foram canceladas. Assim, alguns dos dados
obtidos possuem pontos fracos devido à fatores como essa falta de apoio local. Todavia, o objetivo

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maior de usar metodologias participativas foi a (re)aproximação da comunidade pesqueira nos


espaços de diálogo e o fortalecimento da rede ligada à temática pesca artesanal.
3. CONCLUSÃO
A agenda da pesca na APA Costa dos Corais conseguiu avançar dentro de seu planejamento
da pesca, utilizando ferramentas que conseguiram fortalecer a relação entre gestão e comunidade
pesqueira.
O uso dos Círculos de Apoio com diálogo na base favoreceu o protagonismo local, o
envolvimento de jovens e promoveu o fortalecimento da rede de pesca, os quais deram subsídios
para novos frutos, como a criação do grupo de mulheres da APACC.
É explícito que o uso de métodos cada vez mais participativos, linguagem alcançável e o
emprego de inovação tecnológica e acessível facilitam o diálogo, favorecem maior participação e
qualificam os resultados. Para um processo mais participativo de cogestão, é necessário promover
mais autonomia da comunidade pesqueira na gestão dos projetos e realizar todas as etapas juntos,
desde o planejamento a análise conjunta dos dados, e assim vemos que cada experiência revela
demandas e desafios nunca antes experimentados a entrarem na vanguarda.

4. AGRADECIMENTOS
Agradecemos todo o esforço e qualidade dos resultados graças às parcerias entre as
lideranças comunitárias e representantes das Colônias de Pesca, Associações, FUNDAJ, IFAL,
UFPE, CEPENE, APACC, CPP, GEFMar, Fundação Toyota/SOS Mata Atlântica.

5. REFERÊNCIAS
CHAMBERS, R. Rural appraisal: rapid, relaxed and participatory. London: Institute of
Development Studies, 1992.

GREIN, P.P.B.; AMARAL, M.A. Teoria Crítica da Tecnologia e Design Participativo na


Construção de um Repositório de Recursos Educacionais Abertos Tecnologias, sociedade e
conhecimento 3, 1, 79-99, 2015.

LAPOLLI, M. Infografia além da objetividade. Revista Brasileira de Design da Informação 13,


2, 309-320, 2016.

LIMA, G.A.; CATELÃO, E.M. Infográfico: produção e possibilidades no uso educacional do


ensino de Geografia. Ens. Tecnol. R. Londrina 3, 1, 1-20, 2019.

MAPA. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em:


<http://www.agricultura.gov.br/assuntos/aquicultura-e-pesca/registro-monitoramento-da-
aquicultura-e-da-pesca>. Acesso em 09/09/2019. 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

NUNES, A.C.O. Diálogos e práticas restaurativas nas escolas: Guia prático para educadores.
São Paulo: Ministério Público do Estado de São Paulo e Secretaria de Educação do Município de
São Paulo, 145p, 2018.

POFFENBERGER, M.; MCGEAN, B.; RAVINDRANATH, N.H.; GADGIL, M. Diagnostic tools


for supporting joint forest management systems. New Delhi: SPWD. 1992.

SEIXAS, C. S. Abordagens e técnicas de pesquisa participativa em gestão de recursos naturais. In:


VIEIRA, P. F.; BERKES, F.; SEIXAS, C.S. Gestão integrada e participativa de recursos
naturais. Conceitos, métodos e experiências. Florianópolis: Secco/APED, 415p., 2005.

ROBBINS, P. Beyond ground truth: GIS and the environmental knowledge of herders, Professional
foresters, and other traditional communities. Human Ecology 31, 2, p.233-253, 2003.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FORTALECIMENTO DE LIDERANÇAS E INTEGRAÇÃO REGIONAL:


ESTRATÉGIAS PARA QUALIFICAR A PARTICIPAÇÃO DE
PESCADORES ARTESANAIS NA GESTÃO DE UNIDADES DE
CONSERVAÇÃO NO SUL DO BRASIL
LEADERSHIP STRENGTHENING AND REGIONAL INTEGRATION: STRATEGIES TO
QUALIFY THE PARTICIPATION ON FHISHERMEN IN THE MANAGEMENT OF PROTECT
AREAS IN SOUTH BRASIL

Carolina Mattosinho de Carvalho Alvite*, Aline Kellermann **, Ronaldo Cataldo Costa ***
Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais,
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil(carolina.alvite@icmbio.gov.br)*
Refúgio de Vida Silvestre da Ilha dos Lobos, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade,
Brasil(aline.kellermann@icmbio.gov.br)**
Área de Proteção Ambiental da Baleia Franca, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade,
Brasil(ronaldo.costa@icmbio.gov.br)***

1. INTRODUÇÃO
O presente relato de experiência apresenta uma síntese do Projeto “Fortalecimento de
Organizações e Lideranças da Pesca Artesanal do REVIS Ilha dos Lobos e da APA da Baleia
Franca e Integração Regional”, executado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio), por meio do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da
Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT), da Área de Proteção
Ambiental da Baleia Franca (APABF) e do Refúgio de Vida Silvestre da Ilha dos Lobos
(REVISIL), em parceria com a Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e
dos Povos e Comunidades Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (CONFREM). O projeto
integra uma iniciativa nacional protagonizada pela CONFREM no âmbito do Projeto GEF Mar e
que busca promover a integração das comunidades de pescadores artesanais na gestão das áreas
marinhas protegidas no Brasil.
A APABF é uma UC federal, criada para proteger o berçário da baleia franca e os ambientes
naturais da região, como os recursos pesqueiros que sustentam a pesca artesanal e a cultura das
comunidades de pescadores. Possui 130 km de costa, desde o sul da ilha de Florianópolis até o
Balneário Rincão, envolvendo áreas terrestres, marinhas, ilhas e lagoas, onde ocorrem tipos
variados de pescarias artesanais tradicionais. O REVISIL abriga a única ilha no litoral do Rio
Grande do Sul. Esta UC foi criada em 1983, com o objetivo de preservar os ecossistemas naturais e
oferecer proteção aos lobos e leões-marinhos que se deslocam do Uruguai e Argentina, no inverno,
para refugiarem-se na ilha em busca de descanso e alimentação. Situada a 2km da costa de Torres
(RS) e do rio Mampituba, a Ilha e seus arredores apresentam uma diversidade de ecossistemas

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

fundamentais para a pesca na região devido à sua importância para a reprodução e alimentação de
diversos peixes.
O projeto teve como objetivo promover o fortalecimento da pesca artesanal e a formação de
lideranças,como forma de qualificar a participação social e ampliar a inclusãodo conhecimento
ecológico local dos pescadores artesanais na gestão das unidades de conservação (UC).
Buscoupromover a articulação e fortalecimento institucional de organizações da pesca e
comunidades tradicionais na APABF e no entorno do REVISIL, visando à utilização sustentável de
recursos naturais. O fortalecimento não implica apenas na resolução das demandas finalísticas, mas
o processo de dotar as organizações de competências para mediar conflitos de enfrentamento aos
seus problemas e desafios, além de mobilizar potencialidades dos sujeitos e fortalecer a identidade
coletiva.A iniciativa contribuiu ainda para fomentar uma reflexão dos pescadores artesanaisdos
territórios da APABF e REVISIL com relação à valorização do patrimônio natural e cultural
protegido, evidenciando a relação dessas áreas com a melhoria de qualidade de vida e com o
empreendimento de atividades produtivas em bases sustentáveis.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O projeto foi executado entre março de 2018 e junho de 2019, por uma equipe
multidisciplinar, envolvendo gestores públicos do ICMBio, consultores e bolsistas do Projeto GEF
Mar.Foram desenvolvidas ações de capacitação para fortalecimento das lideranças e organizações
da pesca artesanal da APABF e do entorno REVISIL. A iniciativa promoveu encontros regionais
para integração entre pescadores artesanais da região sul do Brasil, envolvendo, além da APABF e
REVISIL, as seguintes UC: Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé (SC), Parque Nacional
Marinho da Ilha dos Currais (PR), Estação Ecológica de Carijós (SC), Reserva Extrativista de
Araranguá (SC), Baía da Babitonga (SC).
A partir do diálogo com os pescadores e das reuniões de planejamento da equipe de
execução do projeto,foi construída uma imagem da pesca artesanal fortalecida como forma de
orientar as ações empreendidas. Essa imagem abordou os seguintes aspectos: i) o pescador é
reconhecido e valorizado pelos próprios pescadores, pela sociedade em geral, pelas comunidades
locais e pelo poder público; ii) os pescadores estão organizados, agem coletivamente e existem
diversas organizações representativas que participam dos espaços de participação social e tomada
de decisão; iii) os pescadores participam da geração de dados e da elaboração das normas de
ordenamento pesqueiro; iv) os pescadores tem conhecimento sobre a legislação e respeitam as
normas existentes; v) os pescadores atuam em parceria com as UC, universidades, centros de
pesquisa, organizações ambientalistas; vi) o valor do pescador artesanal é maior do que o valor do

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recurso pesqueiro, pois traz em si o conhecimento das artes de pesca, história e natureza, cultura e
tecnologias sociais, e trabalha em sintonia com a natureza.
A estratégia de atuação do projeto se deu a partir deseguinte sequência de ações (figura 1):
mobilização dos pescadores artesanais nos territórios, eventos de capacitação para formação de
lideranças (duas etapas), evento de capacitação em elaboração e gestão de projetos, e encontros
regionais de integração (dois eventos).Esforços de mobilização, capacitação e fortalecimento de
lideranças e instituições pesqueiras devem ser entendidos como “processos” contínuos, onde se faz
necessário o estabelecimento de laços de confiança, muitas vezes conquistados dentro do ambiente
cultural e de trabalho do pescador artesanal.

Figura 1 – Fluxo de eventos previstos na execução do projeto.

As primeiras ações consistiram na identificação e mobilização das organizações e lideranças


da pesca artesanalnos territórios da APABF e entorno do REVISIL, visando apresentar o projeto e
colher subsídios para o planejamento das demais etapas, levantamento de informações sobre a
demanda dos pescadores e interfaces com a gestão das UC.Foram realizadas diversas visitas aos
pescadores em campo, nos ranchos de pesca, sede de associações e outros locais, criando maior
envolvimento e comprometimento dos atores com o projeto.
Os eventos de formação de lideranças foram realizadoscom os pescadores identificados
durante a mobilização, sendo realizados em duas etapas. A 1ª etapa teve por intuitoapresentar o
Projeto, estreitar os laços de parceria entre as comunidades pesqueiras e as UC, e realizar um
diagnóstico rápido participativo junto aos pescadores e pescadoras presentes para amadurecimento
das temáticas geradoras a serem trabalhadas. A 2ª etapa de formação de lideranças procurou
reconhecer as características de uma liderança e ampliar o conhecimento dos pescadores sobre os
espaços de governança e tomada de decisão existentes nos territórios, em especial os conselhos

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

gestores das UC. As ações de formação de lideranças na APABF consistiram emnove eventos,
realizados nas seguintes localidades: Pinheira (2), Garopaba do Sul, Barra do Torneiro, Praia do
Cardoso, Canto da Lagoa (2) e Ibiraquera (2). A formação de lideranças no REVISIL consistiu em4
eventos, realizados em Torres (RS) e Passo de Torres (SC).
A capacitação em elaboração e gestão de projetos teve como objetivo oferecer instrumentos
para que os pescadores e parceiros fossem capazes de transformar as demandas e potenciais dos
quais dispõem em planos de ação e projetos, concretizando parcerias entre a pesca artesanal e as
UC, em continuidade ao processo de mobilização e capacitação em andamento. Foram abordados
conhecimentos para compreensão do ciclo de desenvolvimento de projetos e do fluxo inter-
institucional entre organizações beneficiárias, parceiras e doadoras, e organização da ação coletiva,
a partir do compartilhamento das ideias de ações geradas na 2ª etapa da formação de lideranças.
Os encontros de integração regional envolveram a participação de pescadores artesanais de
diferentes regiões do sul do Brasil s e tiveram o intuito de construir uma imagem coletiva do
território pesqueiro, fortalecendo a identidade desses atores sociais, além de promover a troca de
experiências e incentivar a realização de iniciativas cooperativas entre os pescadores.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os eventos de capacitação e de integração regional do projeto atingiram cera de 200
pescadores artesanais. Os pescadores com maior participação nos eventos estiveram associados às
unidades familiares ou domésticas, característica determinante das comunidades de pescadores,
demonstrando a relevância de planejamentos que considerem as relações baseadas no parentesco na
elaboração de estratégias de mobilização e de atuação junto a esses atores sociais.No decorrer das
etapas de formação, os pescadores artesanais identificaram as diversas qualidades de uma liderança,
entre as quais destacamos: i) foco em objetivos coletivos e não individuais; ii) capacidade de
comunicação e interação com diferentes atores; iii) presença e comprometimento com as ações
empreendidas; iv) capacidade de estimular boas ideias e dar bons exemplos.
Durante o 1º Encontro de Integração Regional, reunimos informações sobre treze
experiências de ações coletivas protagonizadas por pescadores em parceria com as UC, e com
diversos segmentos da sociedade.Os pescadores, ao longo do fluxo de eventos do projeto, puderam
identificar e priorizar temáticas geradoras, estabelecendo planejamentos cooperativos para a
continuidade das ações de fortalecimento pesca artesanal.Durante o 2ª Encontro de Integração
Regional foram definidos planos de ações para as seguintes temáticas prioritárias: i) cadastramento
de pescadores artesanais e monitoramento da pesca nas UCs e entorno; ii) elaboração de roteiros
locais de turismo de base comunitária com foco na pesca artesanal; iii) continuidade do processo de
capacitação e de integração regional entre pescadores artesanais, unidades de conservação e
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

parceiros; iv) organização e protagonismo das mulheres pescadoras; v) elaboração de materiais


didáticos e capacitação dos pescadores sobre a legislação pesqueira, legislação aplicada aos povos e
comunidades tradicionais, e o conhecimento sobre a política de áreas protegidas; vi) organização
comunitária para a criação de micro-unidades de processamento de pescado e aproveitamento do
resíduos da pesca. Esses planejamentos irão orientar a continuidade das ações a serem
empreendidas na segunda fase do projeto.

4. CONCLUSÃO
A crise civilizatória que vivenciamos exige a busca por soluções inovadoras na gestão dos
recursos de uso comum que garantam a resiliência dos sistemas socioecológicos e promovam a
qualidade de vida das comunidades locais. O projeto desenvolvido aproximou os pescadores
artesanais da gestão das áreas marinhas protegidas, trazendo conhecimentos importantes sobre a
atuação de uma liderança, gerando ideias de ações coletivas para a continuidade do processo de
fortalecimento da pesca artesanal na região e fomentando a inclusão do conhecimento ecológico
local e uso sustentável dos recursos pesqueiros.

5. AGRADECIMENTOS
Aosbolsistas do Projeto GEF Mar, Janina Huk e Jonatas Prado, aos consultores Rafael
Ummus, Rodrigo Rodrigues de Freitas e Roberto Bruno Fabiano, a equipe do CNPT, Gabrielle
Soeiro e Iara Vasco Ferreira, ao MMA, ao ICMBio, à CONFREM e ao FUNBIO.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PEDAGOGIA SOCIAL E DESENVOLVIMENTO PESSOAL E


ORGANIZACIONAL COM LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS LIGADAS AO
PARNA ABROLHOS E ÀS RESEX CASSURUBÁ E CORUMBAU –
A EXPERIÊNCIA DO PROGRAMA GERMINAR EM CARAVELAS, BA

Renata Zambonim*, Erika Almeida**

*Bióloga, Msc Restauração de Áreas Degradadas / Área complementar Etnoecologia UFSC, Coletivo Iamani Ecologia
Social e Ass. ComViver de Desenvolvimento Humano, Brasil.
**Oceanóloga, Msc Gestão Social e Desenvolvimento Territorial UFBA, Coletivo Iamani Ecologia Social, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), ao incorporar a participação das
comunidades na criação, implementação e gestão das unidades de conservação (UCs) avança em
sua concepção de gerência de áreas protegidas, mas ainda enfrenta inúmeros desafios: oposição de
esferas político econômicas, conflitos de uso dos recursos naturais, problemas fundiários e
sobreposições territoriais, resistência de populações locais, lacunas na articulação institucional,
quadro deficitário de funcionários, poucos ou desatualizados dados para plano de manejo, entre
outros.Estudos propõem que parte desses desafios pode e deve ser enfrentada com a gestão
participativa (Quintas, 2006). No entanto, ainclusão social e produtiva de populações locais
beneficiárias, diretas ou indiretas, de UC, ainda encontram muitos desafios técnicos e operacionais,e
de conceituação básica, que gargalam a implementação de instrumentos de uma gestão participativa
integrada. Para a participação efetiva nessa governança, os grupos sociais deveriam exercer papel
ativo ao longo das diversas etapas do processo, ocupando espaços de diálogo e tomadas de decisão
conscientes e conectadas aopropósito socioambiental que permeia tanto seus grupos, como o da
UC.A participação ativa dessas comunidades implica também em uma abordagem de maior
compartilhamento de responsabilidades e em uma prática de um processo decisório que incluam
comunitários informados e atualizados. Essa abordagem representa, inclusive, uma mudança de
paradigma cultural institucional.
Para estruturar a participação representativa consciente, se faz necessário promoção de
espaços, ações e capacitações que impulsionem o desenvolvimento de habilidades nas
representatividades comunitárias. Habilidades essas necessárias para suas participações nos fóruns
de entendimento e tomada de decisões, para construção dos conhecimentos sobre os complexos
arranjos na governança integrada, para planejamento, para a articulação de políticas e acordose para
o claro julgamento dos efeitos desses acordos e interações nos territórios.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Tendo em vista o colocado acima e o objetivo de contribuir para um processo de inclusão


social das comunidades dos territórios do Parque Nacional (PARNA) Marinho de Abrolhos, da
Reserva Extrativistado Cassurubá e da Reserva Extrativista Marinha do Corumbau, sul da Bahia,
aAssociação de Estudos Costeiros e Marinhos – ECOMAR, dentro do Projeto EncantaMar, buscou
promover uma formação integrada com diferentes representatividades institucionais e comunitárias.
O presente trabalho se propõe a fazer um relato da experiência da realização,no Município de
Caravelas, BA, dessa formação, o “Programa Germinar – Desenvolvimento de Facilitadores”. O
Programa Germinar é uma formação que proporciona caminhos de desenvolvimento individual e
oportuniza ferramentas para a formação de lideranças sociais e empreendedores locais.Criado em
2003, a condução do Programa está sob a responsabilidade da Associação ComViver de
Desenvolvimento Humano, em parceria com o Instituto EcoSocial (SP). O Germinar realizou
turmas em 14 estados e no Chile, Argentina e México. Em 2015, foi certificado como tecnologia
social pela Fundação Banco do Brasil, e se fundamenta na Pedagogia Social.
A Pedagogia Social (também chamada de Ecologia Social) surgiu no início do século
passado, com Rudolf Steiner. Bernard Lievegoed, adaptou e divulgou seus conceitos e, desde então,
a Pedagogia Social tem inspirado um número crescente de profissionais e organizações em todo o
mundo. O foco da Pedagogia Social é a qualidade social que resulta da interação entre o indivíduo e
o ambiente social, como base para o desenvolvimento social. A pergunta central é: quais condições
precisam ser criadas em cada nível (indivíduo, grupo e instituições) para que possam contribuir de
forma saudável para o desenvolvimento dotodo (o ambiente social) e, de outro lado, quais
condições devem ser criadas ao nível do todo, para que se torne possível o desenvolvimento
saudável de cada parte?(Steiner, 2007; Bos, 2008, Erismann, 2018). Apresenta uma série de
ferramentas que impulsionam o indivíduo a desenvolver forças que lhe permitam construir, a partir
de si, uma nova realidade social – seja ela em contextos amplos, seja ela em um grupo de trabalho,
em reuniões, em oficinas. O Programa Germinar faz uso dessas bases em seu conteúdo
programático, visando fortalecer o protagonismo e o propósito de cada indivíduo e de seus
coletivos.

2. MATERIAL E MÉTODO
Esse trabalho foi realizado no Município de Caravelas,no extremo sul da Bahia, envolvendo
comunidades ligadas a três importantes unidades de UCs locais com alta relevância socioambiental
e que estão na"Região dos Abrolhos", apresentando importantes ecossistemas daí, a saber: O
PARNA Marinho de Abrolhose as RESEX do Cassurubá e Corumbau. Com a maior biodiversidade
marinha do Atlântico Sul, abrigando todas as espécies de corais pétreos do Atlântico Sul, com a
existência de espécies de coral endêmicas, principal área de reprodução da baleia jubarte,
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diretamente imbricadas com o complexo estuarino - manguezal da região. A população tradicional


beneficiária da RESEX do Cassurubá é composta por quilombolas e pescadores, e a do Corumbau é
fortemente marcada pela descendência da etnia Pataxó, possuindo algumas aldeias entre as
localidades que a compõem.As comunidades têm no extrativismo pesqueiro e marisqueiro sua
principal fonte de vida.
As etapas para a realização do Programa Germinar se basearam na autogestão da turma de
participantes, desde o início de sua formação. São elas: articulação institucional; captação
compartilhada de recursos (busca de recursos locais para a logística necessária- traslados,
hospedagem, alimentação, material didático e de apoio, apostilas, facilitação); mobilização
social(visita às comunidades e promoção de encontros e oficinas elucidativas sobre o Programa);
produção logística(compartilhada entre os técnicos da instituição proponente e os futuros
participantes do Programa); realização dos Módulos; avaliação e relatoria.O Programa aconteceu
em 5 módulos temáticos, de 4 dias cada, (30 horas cada) com intervalo médio de 2 meses entre cada
um. Com carga horária de 150 horas, estivemos em regime de imersão, hospedados em um espaço
coletivo em Caravelas.A assimilação dos conteúdos foi trabalhada em três níveis: compreensão
(pensar), vivência (sentir) e prática (querer/agir). Enfatizou-se o aprender fazendo, mesclando
conceitos com atividades artísticas e vivências corporais e de reflexão, contemplando as qualidades
trimembradas do ser humano. Assim, foram desenvolvidas: atividades de movimento (rodas
rítmicas, jogos cooperativos e de movimento);atividades artísticas (pintura, modelagem em argila,
desenho, teatro);atividades de reflexão (rodas de diálogo, apresentações, trabalhos em pequenos
grupos, plenárias);no âmbito do querer (agir) também considerou-se os encaminhamentos práticos e
o desenvolvimento de planos de ação individual e coletivo.Buscou-se promover estímulos para um
processo de sensibilização, autorreflexão e formação de consciência crítica.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante os meses de abril a dezembro de 2012, foram desenvolvidos 5 encontros temáticos
em uma turma de 23 pessoas, composta por lideranças indígenas, marisqueiras, pescadores,
quilombolas,profissionais da conservação de instituições de pesquisa atuantes nasUCs,funcionários
das UCs, representantes de movimentos sociais locais, gestores do ICMBio.
O Programa Germinar propõe o princípio da fraternidade econômica, que busca criar
condições para favorecer a participação de todos os que queiram efetivamente estar na turma,
independentemente de suas condições econômicas ou culturais. Participantes que apresentaram
maiores desafios para estarem presentes, foram “cuidados” pela turma como um todo, e por seus
apoiadores. Assim, o grupo, impulsionado pelo EcoMar, mobilizou recursos para os traslados de
todos, que envolviam, por exemplo, viagens marítimas mais distantes e mais custosas. Houve
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participações de participantes não alfabetizados, que receberam apoio dos demaias. Nessa
concepção da economia fraterna, todos contribuíram com suas produções para compor alimentação
e outras necessidades da turma – a cada encontro eram ofertados pelos comunitários pescado,
camarão, etc. Essa reflexão individual sobre a colaboração ao grupo,e como o grupo pode acolher as
necessidades individuais, fez parte dos exercícios da formação.
Os temas desenvolvidos nos encontros estão na Tabela 1.

Tabela 1 – Temas desenvolvidos por Módulo do Programa Germinar

Tema Desenvolvimento

Módulo 1 Entendendo a facilitação de Processo Visou a compreensão do papel de


facilitador de processos e da
dinâmica de desenvolvimento de
indivíduos, grupos e
organizações.

Módulo 2 Conhecendo as organizações e coletivos Aprofundou os conceitos e as


habilidades necessárias para a
facilitação do processo
organizacional.

Módulo 3 Entendendo a Dinâmica dos Conflitos Trabalhou o fenômeno conflito,


identificando suas características,
possíveis consequências e como
atuar nessas situações.

Módulo 4 Fazendo Acontecer Aplicou os conceitos aprendidos


para atendimento e elaboração de
planos de ação para clientes
externos, a partir de situações
reais trazidas pelos clientes.

Módulo 5 Biografia do Ser Humano Com a análise da biografia como


ferramenta de autoconhecimento,
o participante elaborou um plano
de ação para os próximos 04 anos.

A proposta dos temas acima e suas vivências integram,por um lado, uma reflexão individual,
e, por outro lado, seu espelhamento para o outro, para o processo social. Assim é o “baile” da
Pedagogia Social: o quanto eu me reconheço em meus processos, em minhas habilidades, em
minhas necessidades, e o quanto eu coloco esses talentos à disposição do “outro”, do social. E o
quanto eu me expresso e comunico minhas necessidades para o “outro”, e me sinto “cuidado” pelo
grupo. As avaliações dos parceiros e os relatos trazidos pelos participantes mostraram que muitas
das metodologias construídas e vivenciadas durante a formação foram aplicadas em outros fóruns
de compartilhamento de informações e tomadas de decisão, podendo-se destacar ferramentas de
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planejamento, feedbacks, e principalmente o conteúdo que destrincha e um modelo de processo


decisório. Esses fóruns foram descritos como variantes desde uma reunião de associação
comunitária até as participações no Conselho Gestor das RESEX. A construção do1o Semináriode
Política Pública da RESEX do Cassurubá fez uso das reflexões e processos desenvolvidos durante
o Programa Germinar.

4. CONCLUSÃO
Um modelo para uma participação efetiva na gestão de UCsainda está sendo experenciado,
com suas características peculiares de cada contexto de UC, e os aprendizados advindos dessas
experiências podem ajudar a compor uma base de instrumentos que favoreçam a participação
popular. Consideramos que o Programa Germinar pode representar um dos instrumentos de
fortalecimentodo protagonismo das comunidades na gestão de áreas protegidas, uma vez que sua
realização, em formato de autogestão, já de saída reconhece os movimentos sociais e entidades
representativas das populações tradicionais comoco-gestores e que seus temas abarcam as
demandas básicas para uma primeira capacitação para articulações de lideranças. O propósito do
programa é fortalecer processos inclusivos e de fortalecimento da cidadania, proporcionando esses
espaços deconstrução e compartilhamento de saberes, e meios que desencadeiam a tomada de
decisão de forma democrática, envolvendo todos os atores interessados na gestão da biodiversidade.

5. AGRADECIMENTOS
Ao Movimento Cultural ArteManha, à Conservação Internacional, ao ICMBio, à Associação
EcoMar, ao Instituto EcoSocial, à Associação ComViver

6. REFERÊNCIAS
BOS, LEX. Caminhos para Formação do Pedagogo Social. Cadernos de Pedagogia Social –
APS, São Paulo, SP, 2008

ERISMANN, R. Ecologia Social - O ser humano como ponte para uma nova realidade. Ed.
Quintaventura Livros. Botucatu,SP. 2018.

QUINTAS, J.S.Introdução à gestão ambiental pública. 2. ed. revista. Brasília: Ibama, 2006.

STEINER, R. Andar, Falar, Pensar. Ed. Antroposófica,São Paulo, SP, 2006.

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GESTÃO E PARTICIPAÇÃO SOCIAL EM UMA RESEX MARINHA:


EXPERIÊNCIAS NO DELTA DO PARNAÍBA
MANAGEMENT AND SOCIAL PARTICIPATION IN A MARINE RESEX: EXPERIENCES IN
THE PARNAÍBA DELTA

Tatiana Rehder*, Dayanne Batista Sampaio**, Christiana Cabicieri Profice***

*Analista Ambiental do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade e Conservação (ICMBio), Brasil (Autora
Correspondente). E-mail: tatiana.rehder@icmbio.gov.br
**
Docente da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Doutoranda pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC),
Brasil. E-mail: dayannepsisampaio@gmail.com
***
Docente do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas/UESC, Brasil (Orientadora). E-mail: ccprofice@uesc.br

1. INTRODUÇÃO
Este relato de experiência traz como enfoque temático a gestão de áreas protegidas,
especificamente, de uma Unidade de Conservação (UC) de Uso Sustentável,representada aqui pela
Reserva Extrativista (Resex) Marinha Delta do Parnaíba. Criada pelo decreto s/n de 16 de
novembro de 2000, a Resex está localizada no Estado do Maranhão (MA) e compõe o Delta do Rio
Parnaíba juntamente com o Estado do Piauí (PI) (BRASIL, 2000).Sendo formada por cinco
comunidades (Canárias, Passarinho, Torto, Caiçara e Morro do Meio), a relação entre natureza e
cultura é fundante na sua compreensão, porque, ao mesmo tempo em que a área protegida contribui
para a manutenção da biodiversidade, também constitui uma via de acesso à cultura local e ao
desenvolvimento de estratégias de participação comunitária.
A criação daResexe da Área de Proteção Ambiental (APA) Delta do Parnaíba é um
reconhecimento da importância da área deltaica do rio Parnaíba, que banha aqueles Estados e ao se
aproximar do mar, abraça mais de 75 ilhas, sendo o único delta em mar aberto das Américas. Trata-
se, pois, de um santuário de reprodução e alimentação de peixes, caranguejos, mariscos, lagostas e
camarões. Com manguezais, restingas, caatinga litorânea, carnaubais, dunas, praias e lagoas, este
território garante a reprodução e alimentação rica e variada à vida marinha, favorecendo o equilíbrio
ecológico da região (ICMBIO, 2016).
Essa riqueza ambiental também contribui para que 10 mil famílias possam viver da pesca
artesanal, utilizando seus conhecimentos e técnicas tradicionais. Somente nas ilhas abrangidas pelos
limites da Resex, são mais de 2.800 famílias que fazem o uso sustentável e a proteção do
ecossistema.Além disso, faz parte desse ambiente uma fauna rica e diversificada, com algumas
espécies ameaçadas de extinção como o peixe-boi marinho, tartarugas marinhas, cavalo marinho e
aves costeiras migratórias e residentes (ICMBIO, 2015).

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Nesse cenário, os moradores das comunidades ainda conseguem proteger seus


principaismodos de vida, por meio da pesca, da cata do caranguejo ede outras atividades
tradicionais como a cata de mariscos, retirada do pó da folha da carnaúba, aproveitamento de frutos,
agricultura familiar, artesanato einiciativas de turismo de base comunitária (TBC). Portanto, são as
atividades cotidianas de subsistência que também oferecem a renda principal das famílias e a
biodiversidade é indispensável para a manutenção da vida dessa população.
Tais informações só reforçam a importância da Resex como mantenedora de espécies
humanas e não humanas, o que a define como um ambiente-vida (INGOLD, 2000). Mas, no Brasil,
foi com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) em 2000, e a inserção das Resex
enquanto UC, que essa relaçãoíntima entre conservação da natureza e populações humanas
tradicionais foi evidenciada. Contudo, ainda há (in)definições na relação natureza-cultura nas Resex
Marinhas que precisam ser aprimoradas, entre elas, o avanço de atividades econômicas e turísticas
geralmente predatórias.
Nesse sentido, acredita-se que a construção de processos participativos em UC’s é via
primordial para o seu desenvolvimento qualitativo. Especialmente nas Resex, os exercícios de
protagonismo comunitário podem ampliar-se para novas perspectivas que avancem de fato, para
uma gestão responsável e participativa do ambiente. Portanto, este relato objetiva apresentar a
experiência de elaboração do Plano de Gestão do Caranguejo-Uçá no Delta do Parnaíba como fio
condutor de possibilidades de manejo comunitário da Resex.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A cata do caranguejo é a principal atividade das comunidades da Resex, e a região do delta é
a principal fornecedora do crustáceo para o Nordeste(LEGAT; PUCHNICK, 2003).Em vista disso,
a região estuarina do Delta do Rio Parnaíba foi contemplada pelo Projeto Manguezais do Brasil
como palco da experiência piloto de elaboração de um plano territorial de gestão participativa do
caranguejo-uçá (Ucides Cordatus).Para a construção do Plano,participaram 15 comunidades da
Resex e da APA em ações conjuntas entre ICMBio, Museu Paraense Emílio Goeldi, equipe
institucional compreendendo gestores, professores da UFPI e pesquisadores, juntamente com
colaborações dos compradores de caranguejo, pesquisadores de outras instituições, organizações
não governamentais e demais parceiros locais.
Realizado no biênio 2015-2016, o Plano de Gestão do Caranguejo-Uçá do Delta do Parnaíba
foi construído por e para os catadores da Resex e APA emdiversas ações de mobilização e três
rodadas de reuniões com metodologias participativas que visavam promover o entendimento das
questões sociais e culturais, a integração e o protagonismo dos sujeitos para uma gestão eficiente e
eficaz.O Plano de Gestão envolveu ainda as questões territoriais e ambientais decorrentes das inter-
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relações entre os sistemas socioculturais e o ambiente biofísico. Nesse processo, foi considerada a
diversidade das representações dos atores sociais presentes e a variabilidade envolvida nas
diferentes escalas espaciais (do local ao global) e temporais (do curto ao longo prazo).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Sabe-se que um processo de gestão pode ser permeado por conflitos entre os agentes sociais,
porque, naturalmente, há visões diversas sobre o território repletas de simbolismos coletivos e
individuais (BOURDIEU, 2005). Esse desafio foi evidente na Resex em decorrência de um grave
conflito entre comunidades e ICMBio, no ano de 2011, criando umavisão de descrédito e
desconfiança dos moradores em relação à UC e impactando a relação entre as próprias
comunidades. A partir de então, a participação das comunidades na gestão da UC restringiu-se à
presença nas reuniões anuais do Conselho Gestor. Contudo, a superação dos conflitos é feita em
exercícios de “sinergia entre as motivações dos vários atores” (ABERS, 2003, p. 270) e aos poucos
os atores percebem sua confluência de interesses.
O processo do Plano, então, foi facilitador dessa sinergia fundamental para ações
estratégicas de gestão compartilhada. Os exercícios de protagonismo impulsionaram novos
processosde mobilização e participação social na UC, de forma que este resumo é símbolo de
muitas vozes e um breve relato desta experiência. Para além dos regramentos pactuados no Plano,
foi identificada a necessidade de priorização de ações de fortalecimento da identidade das
comunidades com o seu território (a Resex), da organização social, da promoção e geração de
emprego e renda e do ordenamento das principais atividades produtivas.
Junto a essa solicitação, a organização social das comunidades da Resex avançou muito a
partir do ano de 2015 dando origem, no ano de 2017,à Associação Mãe da Resex Marinha Delta do
Parnaíba – AMAR DELTA, que representa as cinco Associações já existentes e recepcionou o
Contrato de Direito Real de Uso (CCDRU)da Resex para a regularização fundiária e o acesso às
políticas públicas e a programas de interesse da UC.
Um dos objetivos da AMAR DELTAé ser aglutinadora e operacionalizadora de projetos,
atuando, por exemplo, junto ao ordenamento e fomento de atividades de turismo. Assim, após a
reformulação do Conselho Deliberativo, em reunião realizada em novembro de 2017, foi orientada
uma proposta de TBC para a Resex, com base nos resultados de reuniões e oficinas anteriores, que
indicaram o fortalecimento das Associações ecursos de capacitação. Essas prioridades
impulsionaram uma proposta pedagógica para a contemplação no Programa de Acesso ao Ensino
Técnico e Emprego (PRONATEC Bolsa Verde). Em 2018, foram oferecidas 75 vagas para o Curso
de Condutor de Turismo em Unidade de Conservação, 25 vagas para Agente de Cooperativismo e

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25 vagas para Agricultor Agroflorestal. Os cursos foram executados em parceria com a Secretaria
de Educação do Estado do Piauí (SEDUC-PI).
Dessa experiência, foram desenhados e aprovados outros três projetos de gestão
compartilhada: o TBC Edital do ICMBio, o Projeto DGM-Brasil também de TBC (em
implementação) e o Projeto ASAS para o Delta, apoiado pela WorldWide Fundo of Nature (WWF-
Brasil), emexecução. O alicerce para a continuidade da implementação do TBC é o envolvimento
dos jovens da Resex, pois eles representam mais de 45% da população e já vislumbram no Turismo
uma importante oportunidade. Assim, o Plano de Gestão do Caranguejo Uçá no Delta do Parnaíba
foi potencializador de estruturas e de oportunidades de reconexão: proteção da relação caranguejo-
manguezal-caranguejeiro; sujeitos-comunidades-organização social;humano-não humano; atividade
econômica-ambiente; natureza-cultura.
Dentre as diversas diretrizes para garantir a sustentabilidade da Resex e do Caranguejo Uçá
está promoção do acesso do caranguejo uçá a um mercado diferenciado através do reconhecimento
de suas características de sustentabilidade, como qualidade dos manguezais, respeito às regras de
manejo, uso de petrechos não predatórios e o conhecimento tradicional associado à atividade. Nesta
iniciativa, como estratégia para dar visibilidade à riqueza cultural-ambiental, surgiu a proposta da
Marca Coletiva do Caranguejo Uçá da Resex Delta, e o ICMBio elegeu a Resex Delta como a
Unidade pioneira para implementar um “Selo Resex”, em uma iniciativa em parceria com os
Ministérios do Meio Ambiente, da Cidadania e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

4. CONCLUSÃO
A riqueza de saberes e o grau de maturidade das reflexões ao longo do processo de
elaboração doPlano de Gestão favoreceu o desenvolvimento de uma matriz multitemática e
multisetorial de objetivos e linhas de atuação prioritárias para a gestão da Resex.O reconhecimento
da complexa rede de inter-relações entre as comunidades, a biodiversidade e as atividades
produtivas, seus modos de vida e identidades, suas estruturas e organizações sociais, os repertórios
educacionais, as formas de uso e ocupação do território forneceu novas oportunidades e
perspectivas de futuro para a Resex.
Nesta experiência se evidenciou a importância do protagonismo e do diálogo profundo com
os diversos atores sociais para esclarecer as (in)definições na relação natureza-cultura. Alinhados e
planejados para se complementarem e se estruturarem, tanto os sujeitos quanto os projetos
favoreceram uma gestão exercida de modo compartilhado entre o ICMBio e a sua população
beneficiária.

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5. AGRADECIMENTOS

Reserva ExtrativistaMarinha Delta do Parnaíba, ICMBio, Associação Mãe da Resex


Marinha do Delta do Parnaíba - AMAR DELTA, WWF-Brasil, EMBRAPA, Governo Estadual do
Maranhão, UFPI/UFDPar; SEDUC-PI; Museu Paraense Emílio Goeldi.

6. REFERÊNCIAS

ABERS, R. Interesses e ideias em políticas participativas: reflexões a partir dos comitês de bacia
hidrográfica e os orçamentos participativos. Sociedade e Estado, v. 18, n. ½, p. 221-256, 2003.

BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. 6 ed. São Paulo: Perspectiva, 2005.

BRASIL. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. Lei n.º 9.985, de 18 de


julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui
o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. 2000.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L9985.htm>Lei Nº 9985/2000. Acesso em
10 de outubro, 2018.

ICMBIO. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Relatório técnico do


Processo de Identificação das Famílias Beneficiárias e Diagnóstico Sócio produtivos em
Unidades de Conservação Federais – Reserva Extrativista Marinha do Delta do Parnaíba –
PI/MA, 2015.

________. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Disponível em:


http://www.icmbio.gov.br/. Acesso em 5 de julho, 2016.

INGOLD, T. The perception of the environment: essays on livelihood, dwelling and skill.
London: Routledge, 2000.

LEGAT, J.F.A.; PUCHNICK, A. Sustentabilidade da pesca do caranguejo-uçá, Ucides cordatus,


nos Estados do Piauí e Maranhão: uma visão da cadeia produtiva do caranguejo a partir de fóruns
participativos de discussão. Parnaíba: EMBRAPA Meio Norte, 2003.

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PLANO DE GESTÃO LOCAL DA PESCA DO GUAIAMUM DA RESERVA


EXTRATIVISTA DE CANAVIEIRAS, BAHIA: CONTRADIÇÕES E
POSSIBILIDADES
GUAIAMUM FISHING MANAGEMENT PLAN FOR THE EXTRACTIVE RESERVE FOR
CANAVIEIRAS, BAHIA: CONTRADITIONS AND POSSIBILITIES

Carolina Silva Sapucaia*, Ana Flávia Ceregatti Zingra**

Geógrafa, Bolsista do Projeto GEFMAR (MMA/ICMBio) e membro do Grupo Costeiros, UFBA, Brasil –
carolina.sapucaia@gmail.com*
Engenheira Florestal, Analista Ambiental, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, MMA, Brasil –
ana.zingra@icmbio.gov.br**

1. INTRODUÇÃO
A Reserva Extrativista (RESEX) de Canavieiras, instituída pelo Decreto Presidencial s/n de
05 de junho de 2006, é uma unidade de conservação (UC) criada a partir da reinvindicação de
comunidades tradicionais pesqueiras, com o objetivo de proteger o território de uso tradicional
dessas populações e seus modos de vida, e assegurar o uso sustentável dos seus recursos naturais. A
UC beneficia aproximadamente 2.300 famílias que vivem da pesca artesanal, do extrativismo e da
agricultura familiar.
A Portaria do Ministério do Meio Ambiente (MMA) Nº445 de 17 de dezembro de 2014
(BRASIL, 2014) reconhece as espécies de peixes e invertebrados aquáticos ameaçados de extinção
constantes na “Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçada de Extinção”, e define
medidas de manejo, incluindo a proteção de modo integral de algumas espécies. Sua publicação
dividiu opiniões entre ambientalistas, pescadores, meio acadêmico e servidores públicos. Ainda que
seja consenso que a lista é um importante instrumento para o ordenamento da pesca no Brasil, o
documento é questionado quanto ao seu processo de elaboração e publicação. Como alegam os
movimentos sociais da pesca, não houve consulta ou a participação das comunidades tradicionais
pesqueiras, as principais impactadas por esse instrumento normativo. Contudo, a publicação fez
emergir um importante debate sobre a grave situação dos recursos pesqueiros, quer seja pela perda
de habitats ou pela pesca predatória, realizada sobretudo pela frota de pesca industrial. Essa situação
é agravada pelas falhas na gestão pesqueira, pela insuficiente quantidade de dados estatísticos
pesqueiros e deficiente fiscalização pelos órgãos competentes.
Desde então, as discussões entre o setor pesqueiro (artesanal e industrial), Estado, técnicos e
ambientalistas, tem produzindo uma série de reflexões e encaminhamentos. Destaca-se a criação do
Grupo de Trabalho Interministerial (Portaria MMA Nº 1/2015), composto por representantes

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indicados pelo MMA e Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA). Esse GT identificou 96 espécies
como de importância socioeconômica, das 475 espécies consideradas em risco de extinção. Tal
encaminhamento do GT possibilitou a elaboração de estudos específicos que retratem a situação dos
estoques em UCs ou áreas especialmente manejadas, a partir do estabelecimento de diretrizes,
medidas e recomendações para a conservação e recuperação das espécies, como o caso da Portaria
Interministerial Nº 38, de 26 de julho de 2018, que trata do plano de gestão local da atividade de
pesca do guaiamum (Cardisoma guanhumi).
O presente artigo versa sobre a experiência de elaboração do Plano de Gestão Local da
Pesca do Guaiamum (PGL Guaiamum) na RESEX de Canavieiras, destacando as contradições e
possibilidades identificadas durante o processo de construção desse instrumento de gestão.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Visando defender e garantir os modos de vida da sua população beneficiária e a conservação
da biodiversidade, a RESEX de Canavieiras, conduziu, através dos seus espaços de gestão,
discussões e atividades voltadas para a construção das diretrizes e medidas para a continuidade da
captura do guaiamum, espécie considerada como criticamente ameaçada pela Portaria Nº445/2014.
Para tal, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) realizou a
Oficina “Construção de Saberes Para a Gestão da Pesca Sustentável em UCs” em novembro de
2018. Essa oficina teve como objetivos discutir os problemas ambientais com relação aos recursos
pesqueiros a partir do levantamento de indicativos que evidenciam a existências destes problemas,
suas consequências sociais, culturais e econômicas, e quais as mudanças desejadas ao longo prazo
pelas unidades de conservação participantes, a fim de construir planos de pesca que promovam
ações para alcançar os objetivos traçados na oficina. Na oportunidade, a RESEX de Canavieiras,
trabalhou com a pescaria-piloto do guaiamum, buscando subsídios para a elaboração do PGL
Guaiamum da UC.
Localmente, a Câmara Temática (CT) de Pesquisa e Monitoramento definiu um plano de
ação e um grupo de trabalho específico – Grupo de Trabalho (GT) Guaiamum, responsável pela
condução das atividades planejadas, dentre elas: a) levantamento bibliográfico e sistematização do
etnoconhecimento da pesca, b) levantamento do quantitativo de goiamunzeiros beneficiários da UC,
visando o cadastro de pescadores para a obtenção de licença para pesca de espécie ameaçada; c)
mapeamento das áreas de ocorrência da espécie, de realização da pesca e conflitos associados à
captura; d) construção da ferramenta de monitoramento da captura e esforço de pesca, e e) rodadas
de sensibilização sobre o enquadramento do guaiamum como espécie ameaçada e sobre as

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

exigências postas pela Portaria Interministerial Nº38/2018 (BRASIL, 2018), que define as regras
para o uso sustentável e recuperação dos estoques de guaiamum (Cardisoma guanhumi).
Entre fevereiro e setembro de 2019 foram realizadas na RESEX de Canavieiras mais de 25
atividades que possibilitaram o amadurecimento da equipe envolvida sobre o tema, a governança e
produção continua de informações para gestão local da pesca e o fortalecimento da gestão
participativa, com destaque para a atuação da Associação de Goiamunzeiros e Goiamunzeiras de
Canavieiras (AGGC), entidade criada em 2017.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com o advindo da Portaria Nº445/2014 foi necessário que a gestão da RESEX de
Canavieiras se debruçasse sobre o tema, ainda que localmente o Acordo de Gestão da UC (Portaria
Nº1124/2018) já tivesse proporcionado o debate sobre a pesca e normatizado regras para a captura
de algumas espécies, com a definição de tamanhos mínimos e petrechos adequados. Particularmente
tratando da situação da pesca do guaiamum, a orientação para a construção do plano de pesca surge
apenas quatro anos após a classificação do animal como uma espécie criticamente em perigo, com a
publicação da Portaria Nº38/2018.
Com esse descompasso temporal, recaiu sobre a UC a urgência de elaboração do PGL
Guaiamum, restando um tempo limitando, quando posto na mesa todos os desafios para que o tema
chegasse até a população pesqueira, a principal interessada, mas sem dúvida o público mais
afastado do debate no cenário nacional. Essa crítica pode ser generalizada portodo segmento da
pesca artesanal, já que é amplamente denunciada pelo movimento social da pesca nas diferentes
mídias.
Sobre a situação emanada com a Portaria Nº445/2014, a lista publicada e as medidas de
manejo foram elaboradas por especialistas acadêmicos e de órgãos ambientais, seguindo a
metodologia de análise de risco de extinção das espécies desenvolvida pela União Internacional de
Conservação da Natureza (UICN). A respeito das causas que levaram o guaiamum a situação de
risco de extinção, está posto pela “Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçada de
Extinção- Peixes e Invertebrados Aquáticos” que a perda de habitat é a principal ameaça à espécie.
Por sua vez, a Portaria Nº38/2018, ao definir as regras para a captura e comercialização do
guaiamum, impõe ao pescador a responsabilidade de adaptar-se à regras e atribuições, como o
monitoramento permanente da captura e esforço de pesca, evidenciando o caráter limitado ou
insuficiente desta política pública para a conservação da espécie, visto que nada foi proposto para
evitar a perda de habitat da espécie.

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Atribuir ao pescador responsabilidades de produzir dados sobre a captura é importante para


a produção continuada de informações que subsidiem a gestão da pesca. Contudo, deixa o problema
sem solução. Ainda que a pesca fosse interrompida, a especulação imobiliária, a pecuária, a
carcinicultura continuam sem serem responsabilizadas pela degradação dos habitats da espécie
ameaçada, ou seja, é imposto ao pescador uma nova forma de conduzir a pescaria, agora com
registro obrigatório da produção, mas sem dar ao mesmo a garantia que o território e o recurso
pesqueiro estejam resguardados. Caso os planos de gestão local da atividade pesqueira não sejam
elaborados, o pescador de guaiamum estará criminalizado, enquanto a real ameaça à espécie não foi
considerada.
O compromisso dos atores locais foi motivado pelas lideranças de movimentos sociais,
como a Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos
Extrativistas Costeiros Marinhos (CONFREM), que fizeram toda a articulação para a elaboração
dos PGLs a nível nacional e consequente permissão de continuidade da atividade. Esse
protagonismo despertou localmente a discussão sobre a geração de dados pelos pescadores visando
atender não só a portaria, mas principalmente promover a visibilidade da pesca artesanal, e o
protagonismo dos pescadores na geração de dados da produção a partir do próprio pescador, tarefa
que o Estado brasileiro historicamente foi omisso. Essa estratégia de obtenção dos dados é o
chamado automonitoramento. O automonitoramento está se consolidando na UC a partir da adoção
de um caderno, que é a “ferramenta do pescador e pescadora para registrar sua pescaria e fortalecer
a pesca artesanal com dados da riqueza que é produzida na RESEX, combatendo a invisibilidade
que a categoria sempre sofreu, e que tanto dificulta o acesso às políticas públicas” (BRASIL, 2019).
Outro importante motivador é o fato de que inúmeras famílias do território dependem da
pesca do guaiamum para seu sustento. Já foram identificados 258 pescadores e pescadoras de
guaiamum, sendo que muitos deles têm sua renda obtida exclusivamente pela atividade.
O PGL Guaiamum está sendo finalizado, e será pactuado junto aos pescadores e pescadoras
de guaiamum e submetido à aprovação do Conselho Deliberativo da RESEX de Canavieiras em
outubro do presente ano.

4. CONCLUSÃO
Embora o Estado Brasileiro tenha a “Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçada
de Extinção- Peixes e Invertebrados Aquáticos” como um importante instrumento de gestão, a
Portaria Nº 38/2018 acaba não priorizando a ameaça já identificada para o Cardisoma guanhumi. A
elaboração de planos de gestão de recursos naturais em uma UC certamente é um passo importante
para a conservação de espécies e uso sustentável do recurso. Embora a importância do PGL

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Guaiamum seja reconhecida, sabe-se que esse instrumento não será o suficiente para a proteção da
espécie caso não sejam estabelecidas normas para o licenciamento no interior e entorno da RESEX
de Canavieiras. Para o interior da UC, isso é possível dada a governança do Conselho Deliberativo,
mas para o entorno, dependerá de muita articulação com os demais atores locais.
A gestão da RESEX de Canavieiras deverá adotar um constante processo de sensibilização
de pescadores e consumidores de guaiamum, além de um programa de monitoramento que
contemple a coleta e análise de dados da pesca e da população da espécie, com vistas a acompanhar
o uso e estado de conservação da mesma. Com esse processo, espera-se que a governança para a
gestão da pesca siga nesse empoderamento dos pescadores e pescadoras de guaiamum do território.

5. AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao Projeto GEFMAR – Áreas Marinhas e Costeiras Protegidas, projeto que
financia ações de gestão e conservação da biodiversidade na UC. Agradecemos também às
comunidades e lideranças da RESEX de Canavieiras, em especial aos membros da AGGC, que
tanto estão se empenhando para a elaboração do PGL Guaiamum.

6. REFERÊNCIAS
BRASIL. Portaria Nº 445 de 17 de dezembro de 2014, Ministério do Meio Ambiente. Diário
Oficial da União, 27 de set. Disponível em: < achar link do dou>. Acessado em agosto/2018.

BRASIL. Portaria Interministerial Nº38 de 26 de julho de 2018, Secretaria Especial de Aquicultura


e Pesca. Diário Oficial da União, 27 de set. Disponível em: < achar link do dou>. Acessado em
agosto/2018.

BRASIL. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Caderno de


automonitoramento da pesca artesanal da Reserva Extrativista de Canavieiras. 2019.
Canavieiras, Bahia, Brasil.

GALLI, Orlando B. S. Texto Base para a elaboração do Plano de Recuperação do Caranguejo


Guaiamum (Cardisoma guamhumi LATREILLE, 1825), Caravelas, julho de 2016.

Ministério do Meio Ambiente - MMA. Disponível em:


https://www.mma.gov.br/biodiversidade/conservacao-de-especies/gest%C3%A3o-
sustent%C3%A1vel-da-pesca.html#planos-de-recupera%C3%A7%C3%A3o-existentes. Acesso:
01/08/2019.

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PARTICIPAÇÃO NO CONSELHO DE GESTÃO DA RESEX DE


CANAVIEIRAS
PARTICIPATION IN THE RESEX DE CANAVIEIRAS MANAGEMENT COUNCIL

Beatriz Mesquita Pedrosa Ferreira

Fundação Joaquim Nabuco – Fundaj, Brasil


beatriz.mesquita@fundaj.gov.br

1. INTRODUÇÃO
O exercício da democracia preconiza a participação da sociedade nas decisões e gestão
pública. Após o fim da ditadura militar, a constituição cidadã de 1988 solidificou instrumentos
como: conselhos gestores, orçamentos participativos, fóruns nacionais, dentre outros. Esses
permitem controle social e descentralização de decisões, empoderando a sociedade e permitindo
que grupos de indivíduos participem da gestão pública, principalmente quando apontamos para a
gestão de bens comuns (Ostrom, 1999).
Os conselhos gestores são a arena de participação oficial mais local e têm o papel de
mediador na relação da sociedade com o estado. É suposto que esse instrumento tenha capacidade
de representar mudanças no ambiente institucional que incorporem as demandas da sociedade. São
instâncias coletivas que auxiliam na governança e estão presentes na área da saúde, educação,
desenvolvimento territorial, meio ambiente, dentre outras.
O instrumento mais utilizado na gestão ambiental é a proteção de territórios que possuem
características ambientais especiais. No Brasil, essas áreas são institucionalizadas como Unidades
de Conservação (Ucs) –existem outras institucionalidades que não serão aqui citadas- criadas pela
lei 9.985/2000 (SNUC), regulamentada pelo decreto 4.340/02, que define sobre a criação e
funcionamento de seus conselhos gestores.
Os conselhos de UCs são em sua maioria consultivos. Para Reservas Extrativistas (Resex) e
Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS), porém, são deliberativos. Essas se destacam por
serem categorias de UCs de uso sustentável que carregam, desde seu nascedouro, objetivos também
de garantia do modo de vida e subsistência das comunidades tradicionais que de seus ecossistemas
dependem. Esses extrativistas são reconhecidos no diferencial dos conselhos: deliberativos e
compostos por maioria de comunitários.
Este estudo está inserido no projeto “Ecologia política da pesca de crustáceos no Nordeste
brasileiro” da Fundação Joaquim Nabuco, em seu componente de análise da governança. O trabalho

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tem o objetivo de compreender o funcionamento do conselho da Resex de Canavieiras, verificando


como se dá a participação em suas discussões.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizada pesquisa de natureza qualitativa com base na análise documental, com
tratamento quantitativo dos dados, na qual utilizou-se o decreto de criação, o regimento interno, as
atas, listas de presença e demais documentos produzidos pelo Conselho. A abordagem utilizada foi
a Análise de Conteúdo (Bardin, 2010). Observação participativa em reunião do Conselho e
entrevistas semi-estruturadas com gestores e conselheiros também foram realizadas entre 2017 e
2019. Todas as autorizações foram realizadas.
A análise foi calcada em quatro dimensões das experiências institucionalizadas de
participação social, adaptado de Coelho (2011): 1) Inclusão – quem é incluído e grau de
heterogeneidade dos participantes; 2) Participação – como a agenda de trabalho é estabelecida e
como as discussões e deliberação se configuram; 3) Debates – temas presentes e proposições; 4)
Conexões – elos com o Executivo e Legislativo, outros fóruns participativos e outras organizações
públicas e privadas.
2.1 Localização - A Resex Marinha de Canavieiras situa-se no sul da Bahia, na região da
Costa do Cacau abrangendo os municípios de Canavieiras, Una e Belmonte (100.726,36 ha). Foi
criada em 2006, protege manguezais, água e terra (moradia dos extrativistas). A atividade principal
é a pesca estuarina. A implantação da Resex foi marcada por conflitos com representantes de
setores empresariais como turístico e da aquicultura, o que favoreceu a articulação social dos
pescadores e pescadoras. A organização social se dá em torno da criação de uma associação-mãe da
Resex, a Amex, a qual reúne 14 outras associações que se definem por território ou por tipologia de
pesca e se fazem representar no Conselho Deliberativo.
2.2 Dados – Foram tratados dados que representaram falas e decisões de 40 reuniões do
conselhos da Resex de Canavieiras entre os anos de 2010 e 1019. Esses dados foram obtidos nas
atas relativas às reuniões, não publicizadas, cedidas pela gestão da Unidade. Todas as análises
foram feitas a partir do software livre R, bem como um pacote específica para a execução da técnica
de análise de conteúdo – RQDA.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O Conselho da Resex de Canavieiras (CDRC) foi instituído em 2010. A participação dos
extrativistas (Quadro 1) é beneficiada pelo desenho institucional, que estabelece maioria para a
população beneficiária. Interessantea inserção no Regimento Interno da participação de
representantes de setores econômicos dos extrativistas como os artesãos de pesca, que não estão
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

organizados em associações. A Figura 1 mostra que esses atores detém a maior quantidade de falas
absoluta nas reuniões. Juntamente com o governo federal, representam 84,09% das falas, mostrando
que são os protagonistas nas decisões da Resex. A formatação da associação-mãe também centraliza
a organização comunitária, facilitando a comunicação e decisão. A inserção de lideranças locais em
instâncias nacionais e internacionais de decisão, nas políticas de biodiversidade e pesca, promove a
apropriação de conhecimento e torna a Resex alvo prioritário de diversas políticas públicas, como a
construção de 160 moradiaspara os pescadores em suas comunidades, aquisição deembarcação para
transporte escolar, criação deBanco Comunitário, projetos produtivos realizados por ONGs
internacionais.
Por outro lado, conflitos locais dificultam as relações com outros setores da sociedade e
prejudicam as ações do conselho. Um conselho de UC, porém, não deve ser espaço de resolução de
conflitos internos de setores da sociedade (PALMIERI; VERÍSSIMO, 2009).A constante
substituição de gestores da Resex durante o período analisado prejudicou a atuação do Conselho. A
falta de divulgação das ações da Resex, atas e documentos do Conselho na Internet, ao contrário do
observado em outras UCs, afasta o conselho da sociedade.

Quadro 1 – Resultados sobre a participação no Conselho da RESEX de Canavieiras


Variável Indicador Resultados
1 Inclusão Variação na distribuiçao territorial e Presença de todas as comunidades de pescadores, bem
ocupacional dos participantes como diferentes tipologias de pesca; pouca variação
outras atividades.
2 Inclusão Variação político-partidária dos Não observado
participantes
3 Inclusão Variação no perfil associativo dos Pouca renovação dos conselheiros (pessoas físicas).
participantes Lideranças sempre presentes.
4 Participação Procedimentos de seleção Interno às associações, aprovação no conselho de novas
instituições conselheiras, exclusão pelo conselho de
participantes indesejados

5 Participação Facilitação Sempre realizada pelo ICMBio (chefe ou deliberado)


6 Participação Agenda (quem a coordena, questões Participativa, pauta criada em conjunto com a Amex
sob discussão)
7 Participação Fornecimento de informações Conselheiros pouco informados, dificuldades logísticas,
informações centralizadas
8 Participação Intervenções nos debates Lideranças capacitadas para o debate
9 Participação Ambiente (deliberações, persuasão, Conflitos entre setores, deliberações realizadas
confrontação)
10 Participação Método de tomadas de decisão Apesar de decisões deliberadas, grande dependência do
ambiente externo: legislação, ICMBio, outras instâncias
governamentais

11 Participação Prestação de contas aos públicos Prestação de contas internas (ICMBio-Conselho) e


representados repasses às comunidades

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

12 Participação Satisfação com o desempenho do Deliberações conflituam com ambiente externo ao


conselho conselho e a pesca
13 Debates Aspectos relativos às políticas públicas Conselho propicia a absorção de políticas sócio-
ambientais: INCRA, projetos de inclusão produtiva;
influência em projetos econômicos impactantes
(licenciamento e compensação ambientais, criação de
políticas setoriais; porém conflitos com gestão local.
14 Debates Problemas locais Dicotomia entre conservação e desenvolvimento
econômico local dificultam incidência no município;
comunidades beneficiadas por projetos específicos da
Resex
15 Debates Influência política: discussão sobre Influência nacional em Fóruns de comunidades
participação em outros fóruns e extrativistas, movimentos sociais
processos decisórios
16 Debates Aspectos relativos a procedimentos: Existe discussão em relação à participação e
discussões referentes à organização, à procedimentos mas a operacionalidade é muito
participação e aos procedimentos dependente do ICMBio
eleitorais
17 Conexões Hierarquia: definições legais, delegação Boa conexão com as definições legais, tanto por
vertical e horizontal participação na elaboração e redesenho de instrumentos
legais nacionais quanto na elaboração de instrumentos
internos (acordo de gestão). Conexões horizontais
facilitadas pela presença de associações em cada
comunidade.
18 Conexões Variação na gama da rede de relações: Grande substituição de gestores da Resex dificultando a
conexões com gestores públicos conexão; boa conexão com gestores estaduais e federais.
19 Conexões Variação na gama da rede de relações: Baixa variação na conexões com políticos
conexões com politicos
20 Conexões Variação na gama da rede de relações: Boa conexão com fóruns externos e locais
conexões com fóruns participativos
21 Conexões Variação na gama da rede de relações: Excelente conexão com órgãos governamentais,
conexões com outras organizações, e pesquisa e outras organizações
órgãos governamentais

A Figura 2 mostra os temas mais discutidos nas reuniões. Fiscalização e regulação da pesca
e atividades que impactam a Resex e a atividade dos beneficiários assumiu a prioridade de conteúdo
nas atas (27,75%), seguido de discussões sobre o funcionamento do próprio conselho (22,25%).
Projetos socio-produtivos que beneficiam a comunidade, bem como a atividade de ONGs no
território sobressaem nas discussões (11,45%), seguido por pesquisas (9,47), mostrando que a
Resex é um ambiente beneficiado por esse tipo de ação externa.
A participação dos beneficiários da Resex em sua gestão, por meio do conselho, fortalece a
legitimidade da UC, e corrobora com Dias et al (2018) o qual afirma que a Resex de Canavieiras
cumpre os requisitos de legalidade e legitimidade, apesar de passar por vários questionamentos
quanto à sua criação.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 1 –Proporção de fala/ grupo setorial Figura 2 – Proporção de fala/temas

4. CONCLUSÃO
O conselho da Resex de Canavieiras é um espaço participativo de deliberação de gestão que
promove o protagonismo de sua população beneficiária: pescadores(as) artesanais e fortalecem a
participação da sociedade na gestão desses territórios. A análise das falas nos debates mostrou
protagonismo dos pescadores e limitações de poder de decisão devido a conflitos entre atores. Os
registros documentais são importantes para reconstrução do percurso da instituição e devem ser
incentivados.Projeto de comunicação é de vital importância para o esclarecimento da sociedade e
transparência de processos. A comunicação interna entre conselheiros e, entre esses e a gestão
também é importante, informa, mobiliza e qualifica o debate.

5. AGRADECIMENTOS
Aos pescadores que me proporcionaram muito conhecimento e acolhida e a possibilidade de
conhecer um ambiente tão rico. À gestão da Resex de Canavieiras por todo o apoio. À Fundaj pelo
financiamento da pesquisa.

6. REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo. 4.ed.Lisboa: Edições 70, 2010.

COELHO, V.S.P.C. Uma metodologia para a análise comparativa de processos participativos:


pluralidade, deliberação, redes e política de saúde. In: Efetividade das Instituições Participativas
no Brasil: estratégias de avaliação. Org. PIRES, R.R.C. Brasília: IPEA, 2011.

DIAS, M., GOMES, R., BATISTA, S. et al. Participação popular na criaçãode unidades de
conservaçãomarinha: o caso da ReservaExtrativista de Canavieiras. Revista Direito GV, v. 14, n. 3,
p. 912-936, 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

OSTROM, E. Governing the Commons: The Evolution of Institutions for Collective Action.
New York: Cambridge University Press, 1990

PALMIERI, R.; VERÍSSIMO, A. Conselhos de Unidades de Conservação:guia sobre sua


criação e seu funcionamento. Belém/São Paulo:Imazon e Imaflora, 2009. 95 p.

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DESAFIOS DA IMPLEMENTAÇÃO DE MECANISMOS REED+ COMO


FINANCIAMENTO PARA GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS NA
AMAZÔNIA
CHALLENGES OF IMPLEMENTATION OF REED + MECHANISMS AS A FINANCING FOR
MANAGEMENT OF PROTECTED AREAS IN AMAZON

Joab Hardman Fagundes*, Henrique dos Santos Pereira**


Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA, Brasil*
Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Brasil**
joabhf@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho coloca em discussão o financiamento da conservação da biodiversidade
para avaliar o potencial e a efetividade de mecanismo de Redução de Emissões por Desmatamento e
Degradação (REDD+) como fonte de recursos para a implementação da gestão de áreas protegidas -
APs. Nesse sentido, o REDD tem como importante fundamento a mitigação das emissões de Gases
do Efeito Estufa (GEE) por meio da redução de desmatamento e degradação florestal. Essa proposta
inclui: (I) conservação florestal; (II) o manejo sustentável das florestas e (III) o aumento de
estoques de carbono das florestas nos países em desenvolvimento.
O potencial dos mecanismos REDD+ para financiamento de APs deve ou deveria estar
expresso em seus marcos conceituais e regulatórios, enquanto que sua efetividade prática, no caso
brasileiro, está patente nos volumes de recursos destinados a este fim nos projetos já apoiados pelo
Fundo Amazônia que constitui no principal instrumento de captação e distribuição de recursos de
doação.
O objetivo geral é avaliar o potencial do mecanismo de REDD+ e sua efetividade como fonte
de recursos para a implementação da gestão de áreas protegidas; já os objetivos secundários são:
1) Identificar, nos marcos teóricos e práticos do REDD+, o potencial desse
mecanismo como estratégia para captação de recursos financeiros e econômicos para
o financiamento de áreas protegidas;
2) Analisar o Fundo Amazônia quanto a sua efetividade como instrumento de
REDD+ para o financiamento da gestão de áreas protegidas na Amazônia brasileira.

2. MATERIAL E MÉTODO
Este estudo se ocupa em refletir sobre como as estratégias de REDD tem sido aplicadas,
sobretudo para discutir os fenômenos relacionados com a conservação e manutenção das florestas,

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

como também formas de se reduzir as emissões e o desmatamento. Para tanto, o estudo


desenvolveu-se em etapas. Em um primeiro momento, discorre-se sobre a configuração do REDD
(seus conceitos e definições; sobre a sua evolução e aspectos históricos assim como sobre os seus
principais desafios). Posteriormente, são discutidas as estratégias de gestão para as áreas protegidas
do Brasil tendo como foco a Amazônia brasileira (aspectos gerais de gestão; Fundo Verde para o
clima; conferências e acordos; proteção da Amazônia e sobre o Fundo Amazônia). Em conclusão,
são apresentados aspectos inerentes à utilização e potencialização do REDD no contexto amazônico
para a proposição de ações futuras.
A pesquisa tem caráter exploratório-explicativo com a abordagem qualitativa por meio de
análise documental e de revisão bibliográfica.
Para alcançar o objetivo secundário 1, foram levados em consideração os marcos legais e as
decisões administrativas nacionais e internacionais (órgãos oficiais) no que diz respeito ao
financiamento e destinação de recursos para APs, tais como:
1) decisões da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a mudança do clima
(UNFCCC);
2) decisões da Comissão Nacional para o REDD (CONAREDD);
3) acompanhamento das movimentações da Estratégia Nacional Brasileira para o
mecanismo REDD+.
Para o objetivo secundário 2, foi utilizado como fonte de dados as séries históricas dos
projetos financiados pelo Fundo Amazônia, desde o ano de 2008, abordando-se: Projetos realizados;
Volume de recursos; Modalidade de projeto; e, proporção de recursos destinados à implementação
da gestão de APs sejam Unidades de Conservação ou Terras Indígenas.
A análise foi feita por meio de quadros e gráficos. Sendo a sua interpretação sempre
norteada pela estratégia nacional para o REDD+ (ENREDD+). Os dados do Fundo Amazônia foram
obtidos a partir da sua biblioteca virtual em seu site institucional e, logo em seguida, foram
analisados todos os projetos, contratos e desembolsos realizados pelo Fundo, sendo selecionado só
os projetos que em algum momento, abrangiam Unidades de Conservação e Terras Indígenas. Após
a triagem, cada projeto foi devidamente analisado em caráter individual para composição de
quadros e gráficos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEE) por meio da redução de emissões
provenientes de desmatamento e degradação florestal (REDD+) inclui: (I) conservação florestal;
(II) o manejo sustentável das florestas e (III) o aumento de estoques de carbono das florestas nos
países em desenvolvimento, sendo assim, o REDD+ tem como intuito principal apoiar
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

financeiramente todas as formas de iniciativas que colaboram para com a mitigação dos quadros
relacionados com as mudanças climáticas (SOUZA, 2013). O REDD+, segundo o Ministério do
Meio Ambiente (2018), é um mecanismo que é utilizado pelo Fundo Amazônia, sendo o Fundo
considerado uma iniciativa inovadora para o financiamento das ações de REDD+.
O Fundo Amazônia (2019) apoia 190 Unidades de Conservação, além de 65% da área das
terras indígenas, totalizando 45 milhões de hectares apenas de Terras Indígenas. Já em relação as
atividades produtivas e sustentáveis, o Fundo Amazônia, apoia 338 instituições de forma direta e
por meio de parcerias e, ainda, já beneficiou diretamente 162 mil pessoas. Em relação aos
indígenas, o Fundo Amazônia beneficiou 49 mil. Segundo o Ministério do Meio Ambiente (2019),
o Brasil possui 2.376 Unidades de Conservação, independemente da categoria (Proteção Integral ou
Uso sustentável) e esfera (Federal, Estadual e Municipal). Percebe-se, portanto que o Fundo
Amazônia apoiou apenas 7,99% de Unidades de Conservação (figura 1).
Atualmente, observa-se que o Fundo Amazônia (2019), recebeu doações da República
Federal da Alemanha por meio do KFW, da Petróleo Brasileiro S.A – Petrobras e do Governo da
Noruega. O total de doações equivalem a R$ 3.396.694.793,53 , desse montante, apenas R$ 560,52
milhões foram desembolsados para áreas protegidas, envolvendo 42 projetos entre os anos de 2009
ao ano de 2018, dos 103 projetos que o Fundo Amazônia mantém ou já manteve. A média anual de
valores disponibilizados para áreas protegidas chega à casa dos 56 milhões, o que representa uma
média de 34% do valor total do Fundo Amazônia.
Os desembolsos do Fundo Amazônia são por etapas e podem compreender o projeto de
forma integral ou parcial, a partir de data de contratação. Analisando os dados de desembolso e o
ano de contratação dos projetos, percebe-se que o Fundo Amazônia mantém um alto número de
desembolsos por projeto, sendo um financiador eficiente no que tange o quesito de repasse de
recursos. Observa-se, ainda, que quanto mais recente o projeto for, menor é a curva do desembolso,
justamente devido ao controle do repasse do Fundo, evidenciando que além de eficiente é uma fonte
financiadora eficaz no que tange aos desembolsos financeiros e fiscalizações.
Destaca-se, ainda, que as reduções de desmatamento em áreas protegidas sempre foram
diferentes em relação as áreas não protegidas. Segundo Soares-Filho (2016), a redução do
desmatamento dentro de Áreas Protegidas entre 2005 e 2015 contribuiu em 30± 3% para a
diminuição geral na Desmatamento da Amazônia, poupando de 1,4 a 1,7 Gigatons de emissões de
CO2.

700
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 1: Número de projetos e valores financiados pelo Fundo Amazônia (2009-2018) em áreas
protegidas (AP) e outros territórios.

Fonte: Fundo Amazônia (2019).

4. CONCLUSÕES
Este trabalhou buscou avaliar o potencial do mecanismo de REDD e a sua efetividade como
fonte de recursos para implementação da gestão de áreas protegidas, identificando nos marcos
teóricos e práticos as fraquezas e fortalezas. Percebe-se, portanto, que nos marcos teóricos não
houveram políticas substanciais a nível do Governo Federal e da Convenção-Quadro no tocante ao
binômio REDD e áreas protegidas. O Fundo Amazônia, por sua vez, desembolsou 34% de valores
recebidos por meio de doações para projetos em áreas protegidas, evidenciando a eficiência na
captação do Fundo e na destinação dos desembolsos em áreas protegidas.
O Brasil é um dos países com o maior potencial para a efetivação do REDD+ no mundo,
devido à extensão das suas florestas, é dever do governo investir, ativamente, em tais estratégias.
Também é o país que está mais próximo de cumprir as regras estabelecidas pelo Marco de
Varsóvia, além de ser o país com a maior possibilidade de acessar recursos do Fundo Verde para o
Clima por meio do mecanismo REDD+. Assim, transformar tal potencial em desenvolvimento
econômico para a Amazônia é uma estratégia para que haja uma espécie de conciliação entre as
metas de redução de emissão com as relacionadas com a redução da pobreza, promovendo, a
preservação da biodiversidade e desenvolvimento sustentável.
Destaca-se, por fim, que o principal captador de recursos do Brasil, Fundo Amazônia,
destinou apenas 1/3 de seus recursos para as áreas protegidas, sendo as áreas protegidas, o programa

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

mais efetivo contra o desmatamento no Brasil. Conclui-se, portanto, que falta uma diretriz
vocacionada para as áreas protegidas, tanto do Governo Federal, quando das Nações Unidas, uma
vez que as áreas protegidas, no Brasil, é a forma mais eficaz de combater o desmatamento e
degradação, em contrapartida, é a que menos recebe recursos.

5. AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, por poder proporcionar uma
experiência enriquecedora em conhecimentos teóricos e práticos sobre gestão de áreas protegidas e
ao meu orientador, professor Dr. Henrique Pereira, por ter me conduzido nesta jornada de pesquisa.

6. REFERÊNCIAS
FUNDO AMAZÔNIA. Monitoramente e avaliação. Disponível em:
http://www.fundoamazonia.gov.br/pt/monitoramento-e-avaliacao/fundo-amazonia-em-numeros.
Acesso em: 25 junho 2019

FUNDO AMAZÔNIA. Relatório de Atividades de 2017. Disponível


em:http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/rafa/RAFA_201
7_port.pdf. Acesso em: 26 maio 2019.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Marco de Varsóvia para REDD+. Brasília, maio.


Disponível em: http://redd.mma.gov.br/pt/redd-unfccc/marco-varsovia. Acesso em: 07/05/2018.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. REDD+ nos estados da Amazônia: Mapeamento de


iniciativas e desafios para integração com a estratégia brasileira. Brasília, maio Disponível
em:http://redd.mma.gov.br/images/central-de-midia/pdf/artigos/redd-estados-amazonia-
mapeamento.pdf. Acesso em: 26 maio 2019.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Tabela consolidade das unidades de conservação.


Brasília, julho. Disponível em: www.mma.gov.br/cadastro_uc. Acesso em 07/08/2019.

SOARES-FILHO, BRITALDO SILVEIRA. O papel das áreas protegidas da Amazônia, em


especial as com apoio do ARPA, na redução do desmatamento. Rio de Janeiro: Funbio, 2016. 13
p

SOUZA, A. Caroline. A construção da estratégia brasileira de redd: a simplificação do debate na


priorização da Amazônia. Ambiente & Sociedade vol.16, no.1, 9 p, 2013.

702
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

GOVERNANÇA NO PARQUE NACIONAL DOS LENÇÓIS


MARANHENSES: ANÁLISE DO VOUCHER DIGITAL NA PERSPECTIVA
DO TRADE
GOVERNANCE IN NATIONAL PARK OF LENÇÓIS MARANHENSES: ANALYSIS OF
DIGITAL VOUCHER IN THE VIEW OF THE TRADE

Clênio Trindade Lucena*


David Leonardo Bouças da Silva*
Thays Regina Rodrigues Pinho*
Departamento de Turismo e Hotelaria, UFMA, Brasil*

1. INTRODUÇÃO
Ao tratar da gestão de destinos turísticos, destaca-se a compreensão de que essa atividade
econômica envolve uma série de atores que colaboram para seu desempenho (SCOTT, COOPER;
BAGGIO, 2008). O sucesso das localidades turísticas, portanto, pode se associar à qualidade das
interações existentes, principalmente quando se constata que a maioria dos negócios é de micro e
pequeno porte (BAGGIO; COOPER, 2010). Logo, as estratégias utilizadas na governança devem
ser estabelecidas em conjunto, na busca de um denominador comum (COSTA; SILVA;
NASCIMENTO, 2012).
Nesse contexto,a governança éum fenômeno para além do conceito de governo. Ela abarca
instituições governamentais, todavia envolve também mecanismos formais ou informais, de caráter
não-governamental, que fazem com que pessoas e organizações, dentro da sua área de atuação,
tenham uma conduta determinada, satisfaçam suas necessidades e respondam às suas demandas
(ROSENAU, 2000).
No turismo, essa concepção reforça o conceito de trabalho em rede, na qual para que a
atividade possa funcionar se faz necessária a articulação das mais distintas organizações presentes
no destino. Isto porque o turismo é uma atividade econômica, complexa que apresenta uma ampla
rede de serviços conexos e interdependentes que compõe o produto turístico (SCOTT;COOPER;
BAGGIO, 2008). Quanto mais articulado um destino, maiores são os retornos obtidos, comoa
atração de visitantes, a melhoria da qualidade de vida local e a mitigação dos impactos negativos.
Esta perspectiva é, sobremaneira, importante, ao se levar em conta que são os destinos que
competem entre si e não os negócios individuais (RITCHIE; CROUCH, 2003).
A governança em destinos turísticos enfrenta uma série de desafios.Em Barreirinhas (MA),
principal acesso ao Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (PNLM), esses desafios se somam à
condição especial de planejamento e gestão do espaço protegido (fator primordial de atratividade
703
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

local). O município vem passando, nasduas últimas décadas, por transformações em sua
governança, a fim de resolver questões relacionadas à visitação desta UC (SILVA; RIBEIRO,
2018).Diante deste cenário, o presente estudo visa analisar o voucher digital, um instrumento de
governança, aplicado em Barreirinhas, cujo objetivo é ordenar a visitação turística ao PNLM, a
partir da formalização das empresas e dos prestadores de serviços turísticos, na localidade, junto aos
órgãos públicos ligados ao turismo.Este estudo se justifica a partir das recomendações de pesquisa
de Costa, Silva e Nascimento (2012), e Silva e Ribeiro (2018) para que investigações mais
aprofundadas sobre a governança no PNLM seja sejam realizadas, em especial, a respeito da
proposta do voucher digital que configura o principal esforço na organização da visitação local.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O município de Barreirinhas dista 268 km da capital do estado do Maranhão, São Luís. A
sede da municipalidade está situada à margem direita do Rio Preguiças, ondese concentram os
equipamentos e serviços turísticos, representados, em sua maioria, por agências de viagens
receptivas e meios de hospedagem que recebem o fluxo turístico que se destina aos Lençóis
Maranhenses.
O estudo, em tela, é analítico-descritivo e qualitativo, com aplicação de pesquisas
bibliográficas e/ou documental, produção de dados primários e observações de campo, que retrata o
cenário atual do município maranhense, escolhido, sobretudo, por representar, atualmente, o
principal alvo de visitação turística do estado do Maranhão (SILVA; RIBEIRO, 2018). O universo
da pesquisa são as 46 agências cadastradas junto à prefeitura de Barreirinhas (AVBTUR - MA,
2019). A amostra compreendeu cinco agências de receptivo, cujo critério para determinação dos
informantes foi o de adesão (FONTANELLA; RICAS; TURATO, 2008). O instrumento de coleta
utilizado foi aentrevista com roteiro semiestruturado, presencial,com duração média de 20 minutos
egravada para posterior análise.A técnica de análise dos dados utilizada foi a Análise de Conteúdo
(BECKER, 2008), que consiste no agrupamento das respostas coletadas em categorias, facilitando
assim a interpretação dos resultados e garantindo o caráter científico (APPOLINÁRIO, 2009).
Aconcepção inicial para a adoção do voucher, em Barreirinhas, partiu de uma ação de
cooperação dos empresários, principalmente, das agências de receptivo. O objetivo desta iniciativa
foi o de ordenar o mercado formal e coibir ou eliminar os agentes clandestinos.Adesorganização da
oferta de serviços de receptivoprejudicou os negócios das agências formalizadas e exigiu a
organização do turismo local (COSTA; SILVA; NASCIMENTO, 2012).
Assim, surgiram propostas como o voucher único, em 2007, e, mais recentemente, a partir
da Lei Municipal nº 762/2017,o voucher digital, como possível solução para o avanço da
ilegalidade na prestação dos serviços turísticos e melhoria na qualidade dos serviços prestados
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

(SILVA; RIBEIRO, 2018).Silva (2008) relatou que sua concepção teve como premissa basilar a
tentativa de réplica ao modelo adotado em Bonito/MS, que utiliza voucher único para acesso aos
atrativos turísticos naturais.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com a implantação do voucher, a prefeitura municipal ganhou poderes para fiscalizar os
empreendimentos turísticos locais, constituindo uma ferramenta de governança voltada à
reordenação do funcionamento do turismo local, tendo suporte nas ações fiscalizadoras e punitivas
do poder público municipal junto às agências clandestinas.As expectativas quanto ao voucher foram
corroboradas pelos pesquisados que descreveram os principais motivos para a sua criação: eliminar
a concorrência desleal, controle de fluxo de visitação, melhorar a arrecadação municipal e melhorar
a governança do turismo local.
A investida frustrada para sua implementação, em 2011, esbarrou em questões relacionadas
à: insatisfações do empresariado local com o modelo de governança proposto, conflitos entre trade e
gestores públicos municipais, a rejeição dos turistas em pagar a taxa, devido à exiguidade na
transparência de aplicação dos recursos; e operacionalização dispendiosa para o empresariado,
embates que conduziram à sua suspensão, em 2012 (COSTA; SILVA; NASCIMENTO, 2012).
Silva e Ribeiro (2018) relataram os esforços para superação desses embates, objetivando a
retomada do voucher, o que pode ter culminado na sua regulamentação por meio de instrumento
legal, em 2017. Segundo consta no dispositivo, o voucher é um sistema de controle dos fluxos de
turismo aos atrativos naturais locais, assegurando a preservação do ecossistema, o controle das
informações, a carga de circulação nos atrativos, a segurança empregada na operação, os valores
acordados pelos produtos turísticos e a segurança do visitante.
Regulamenta, em paralelo, a relação entre o trade turístico (agências de turismo, meios de
hospedagem, guias, condutores de visitantes, transportadoras turísticas e serviços de alimentação) e
o município de Barreirinhas. Segundo Passos (2018), o voucher objetiva operacionalizar o
ordenamento turístico municipal e funciona fazendo uso de uma pulseira eletrônica, com o controle
de informações sobre origem, tempo de permanência, tipo de hospedagem, locais visitados e outros.
Pelo caráter inovador do projeto, Barreirinhas recebeu o Prêmio Nacional do Turismo de 2018,
concedido pelo MTur, um dos prêmios mais importantes do setor no país (PEREIRA, 2019). Os
recursos são provenientes do Imposto sobre Serviços (ISS) e são administrados pela prefeitura. Foi
feita uma câmara técnica para tratar da transparência dos recursos advindos com o voucher, mas se
desconhece os resultados concretos referente a isso (PINHO, 2019).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Por parte do trade turístico, após a implantação do voucher, com a cobrança do imposto, a
situação se agravou, pois os empresários não viram o valor arrecadado ser revertido em benefícios
para a cidade, principalmente para o setor do turismo.
As agências de viagens relataram que o voucher, como proposto, não solucionou o problema
da concorrência desleal praticada pelas agências clandestinas, ao contrário, gerou uma nova
concorrência. Outra questão não solucionada trata-se da infraestrutura local, que deveria ser
incrementada a partir dos recursos arrecadados com o voucher. Demonstraram a insatisfação no
pagamento de mais um imposto e na falta de fiscalização do poder público. Além disso, o voucher
não regulou o preço praticado pelas agências, gerando valores inconsistentes pelos passeios. E, por
fim, houve aumento da burocracia para o funcionamento das agências.
Na prática, a aplicação do voucher é permeada de contradições e carece de transparência
quanto a sua gestão e aplicação dos recursos(PINHO, 2019). Enquanto os gestores públicos
defendem a ampla utilização do voucher e o divulgamcomo um mecanismo de sucesso, para o
trade, em especial, as agências de receptivo, sua aplicação não é efetiva e ainda vem gerando
insatisfações.

4. CONCLUSÃO
A discussão sobre o novo momento do turismo de Barreirinhas, após a implementação do
voucher digital, reforça ser este um tema emergente e que requer maiores atenções. A pesquisa
indicou a ineficiência do modelo de governança adotado pelo poder público municipal, uma vez que
o voucher não alcançou, até o presente, os objetivos propostos.
Embora o sistema de governança adotado seja questionado, identificam-se alguns avanços
do turismo, na região, como o diálogo mais próximo intersetorial e entre os representantes da cadeia
produtiva do turismo e o ensejo de implementar o voucher digital como um instrumento de
ordenamento e arrecadação (SILVA; RIBEIRO, 2018).
O voucher, enquanto instrumento de governança, se bem implementado, permitirá fornecer
ao poder público municipal e trade todos os números referentes ao turismo na região, permitindo
aos gestores direcionarem suas ações, evitando massificação turística nos espaços do PNLM,
favorecendo a conservação ambiental e garantindo experiências turísticas positivas aos visitantes.

5. REFERÊNCIAS
APPOLINÁRIO, F. Metodologia da Ciência: filosofia e prática da pesquisa. São Paulo: Cengage
Learning, 2009.

AVBTUR – MA.Associação das Agências de Viagens e Turismo de Barreirinhas, 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BAGGIO, R.; COOPER, C. Knowledge transfer in a tourism destination: the effects of a network
structure. The Service Industries Journal, [s.l.], v. 30, n. 10, 2010, 1757-1771.

BECKER, H. S. Segredos e Truques da Pesquisa, Ed. Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 2008.
COSTA, H.A.; SILVA, D.L.B.; NASCIMENTO, E.P. A Governança sonhada para o Turismo: uma
análise sobre o voucher único de Barreirinhas (Maranhão, Brasil), a partir da visão dos empresários
do setor turístico. Revista Turismo & Desenvolvimento, [s.l.], 2, 2012, p. 701-715.

FONTANELLA, B.J.B., RICAS, J., TURATO, E.R. Amostragem por saturação em pesquisas
qualitativas em saúde: contribuições teóricas. 2007. Disponível em:
https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0102311X2008000100003&script=sci_arttext&tlng=pt
Acesso em: 27 de junho de 2019.

PASSOS, V. Barreirinhas terá controle digital do turismo em março. O Imparcial, São Luis, 11
jan. 2018. Negócios. Disponível em: https://oimparcial.com.br/negocios/2018/01/barreirinhas-tera-
controle-digital-do-turismo-em-marco/. Acesso em: 20 abr. 2018.

PEREIRA, S. Voucher digital contribui para desenvolvimento do turismo nos Lençóis


Maranhenses. G1 Maranhão. TV Mirante. Disponível em:
https://g1.globo.com/ma/maranhao/noticia/2019/01/04/voucher-digital-contribui-para-
desenvolvimento-do-turismo-nos-lencois-maranhenses.ghtml. Acesso em: 04 fev. 2019.

PINHO, Thays Regina Rodrigues. Mudanças socioambientais promovidas pelo turismo


litorâneo em comunidades que dão acesso a parques nacionais.2019. 376 fls. Tese (Doutorado
em Desenvolvimento e Meio Ambiente), UFC, Fortaleza, Brasil, 2019.

RITCHIE, J.R.B.; CROUCH, G.I. The competitivedestination: a sustainabletourism


perspective. Oxford, UK: CABI Publishing, 2003.

ROSENAU, J.N. Governança, Ordem e Transformação na Política Mundial. In: ROSENAU, J.N.;
CZEMPIEL, E. Governança sem governo: ordem e transformação na política mundial.
Brasília: Ed. Unb e São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000. pp. 11-46.

SCOTT, Noel; COOPER, Chris.; BAGGIO, R. Destination Networks: Four Australian Cases.
AnnalsofTourismResearch, [s.l.], v. 35, n. 1, p.169-188, 2008.

SILVA, D.L.B. Turismo em Unidades de Conservação: contribuições para a


prática de uma atividade turística sustentável no Parque Nacional dos Lençóis
Maranhenses. 2008. 206 fls. Dissertação (Mestrado), Universidade de Brasília,
Brasília, DF, Brasil.

SILVA, D.L.B.; RIBEIRO, R.T. Passado, presente e futuro: os desafios para o desenvolvimento
turístico sustentável do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. In: NASCIMENTO, Elimar
Pinheiro do; COSTA, Helena Araújo (orgs.). Turismo e sustentabilidade: verso e reverso. Rio de
Janeiro: Garamond, 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

TECENDO REDES: DIAGNÓSTICO DA PESCA PARA ELABORAÇÃO DE


TERMO DE COMPROMISSO COM PESCADORES ARTESANAIS NO
PARQUE NACIONAL DE JERICOACOARA
Alessandra Fontana*, Jerônimo Martins*, Nalu Maia Dias**, Carolina Ferreira Candido**
*
Parque Nacional de Jericoacoara, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil.
*
alessandra.fontana@icmbio.gov.br / jeronimo.martins@icmbio.gov.br
**Programa de Voluntariado do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil.
*
nalu_maia@hotmail.com / carol13_candido@hotmail.com

1. INTRODUÇÃO
A Vila de Jericoacoara, destino turístico mundialmente conhecido, possui ocupação que
remonta ao século XVII, conforme indicação em cartas geográficas da época (ICMBio, 2011). O
local, originalmente território dos índios Tremembé, foi escolhido para instalação do vilarejo e do
forte de Nossa Senhora do Rosário, que serviu como base de apoio aos portugueses nas batalhas
contra os franceses que ocupavam o Maranhão. A partir da década de 1970 o local começou a fluxo
de turistas, que se intensifica desde então. Em 1984 foi criada a Área de Proteção Ambiental
Federal de Jericoacoara e em 2002 a maior parte do território da APA tornou-se Parque Nacional -
excluindo-se a Vila de Jericoacoara. Atualmente a unidade de conservação (UC) conta com área de
8.850 ha, dividida entre os municípios de Cruz e Jijoca de Jericoacoara, e é gerida pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). A vila, por sua vez, é gerida pelo
município, e está completamente envolvida pelo parque.
O Parque Nacional de Jericoacoara é, atualmente, o terceiro mais visitado do Brasil
(ICMBio, 2019), recebendo diversas atividades de uso público, como turismo de sol e praia, banhos
em lagoas e no mar, esportes náuticos, corrida, ciclismo, natação, trekking e contemplação da
natureza. A despeito da predominância do turismo, a pesca tradicional ainda ocorre no território da
unidade de conservação.
Os pescadores artesanais atuantes no parque tiveram seu território pesqueiro afetado em
parte ou no todo pela criação do Parque Nacional de Jericoacoara. O Plano de Manejo do Parque
Nacional de Jericoacoara afirma que a pesca:

“(…) ocorre na atual área do PN de Jericoacoara desde muito antes do


advento de sua criação. Assim, se faz necessária a regularização da
atividade pesqueira, por meio de Termo de Ajuste de Conduta, que
normatizará a pesca local, restringindo o número de pescadores, locais e
equipamentos de pesca, visando minimizar o impacto negativo causado
sobre a fauna aquática local.” (ICMBio, 2011)
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

No ano de 2016, a Colônia de Pesca Z-30, solicitou autorização para realizar o arrasto de
camarão na UC, habitualmente autorizado em anos anteriores. A solicitação foi apresentada à chefia
da unidade e, de acordo com o presidente da Colônia, a mesma foi negada em reunião do Conselho
Consultivo do Parque, fato que não havia ocorrido até então. A demanda para arrasto de camarão
foi novamente protocolada no ICMBio em 2017, momento em que foi relatado à nova chefia do
Parque a situação exposta acima.
Como o Plano de Manejo afirma a necessidade de elaboração de um “Termo de Ajuste de
Conduta”, em 2012, foi aberto um processo para a elaboração de um Termo de Compromisso (no
02123.000627/2017-56), que permaneceu sem movimentação. A partir da solicitação apresentada
pela Colônia de Pescadores Z-30 em maio de 2017, foi retomado o processo. Adotou-se como
referência para a condução do processo a Instrução Normativa (IN) ICMBio no26/2012 (ICMBio,
2012), que define o procedimento para elaboração de termos de compromisso. O presente trabalho
apresenta os resultados da etapa de diagnóstico da pesca existente e comunidades pesqueiras
atuantes no interior do Parque Nacional de Jericoacoara.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A IN no 26/2012 define em seu artigo 8º as atividades a serem realizadas na “etapa de
construção participativa do termo de compromisso”, a saber: “I - sensibilização e mobilização do
grupo social envolvido; II - levantamento de informações secundárias; III - diagnóstico
socioambiental participativo do uso dos recursos naturais e da ocupação; IV - elaboração de
relação nominal das famílias compromissárias do termo de compromisso; V - discussão e
pactuação das normas de uso e ocupação com o grupo social envolvido; VI - avaliação da
necessidade e, se pertinente, proposição de alternativas de trabalho e renda com atividades de
baixo impacto ambiental para melhoria das condições de qualidade de vida das famílias; VII -
elaboração da minuta do termo de compromisso pelo grupo de trabalho, caso venha a ser
constituído; VIII - apreciação e validação coletiva da minuta do termo de compromisso com o
grupo social envolvido; IX - apresentação e apreciação da minuta de termo de compromisso pelo
conselho da unidade de conservação, caso instituído.”
Considerando essas atividades, além de levantamento de dados secundários, foram
realizadas reuniões com os pescadores em três localidades: Mangue Seco, Preá e Vila de
Jericoacoara, explicando o que são termos de compromisso, quais os elementos necessários para sua
construção e a motivação do ICMBio em elaborá-lo, para trazer segurança jurídica para a atividade
de pesca artesanal ali realizada. Bem como para a realização de um diagnóstico participativo, que se
concretizou em 4 etapas:

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

1 - Diagnóstico de uso dos recursos e dos territórios, por meio de mapa falado e calendário sazonal
da pesca;
II - Construção do Perfil do Pescador atuante na unidade, por meio de perguntas norteadoras;
III - Cadastramento dos pescadores, como subsídio ao cadastro nominal das famílias e para
validação das informações obtidas nos momentos anteriores, por meio da aplicação de questionários
e entrevistas semi-estruturadas;
IV - Monitoramento do Desembarque Pesqueiro e mapeamento dos pesqueiros, ainda em
andamento, por meio de aplicação de questionários e identificação das espécies e medidas de
comprimento e peso das capturas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram envolvidos nas reuniões de diagnóstico participativo, aproximadamente 150
pescadores, sendo 75 da localidade Mangue Seco, 50 do Preá e 25 da Vila de Jericoacoara. A seguir
são apresentados os resultados obtidos em cada etapa do diagnóstico participativo:
Diagnóstico do uso dos recursos e do território: no mapa falado, foram definidos os
territórios de pesca e identificadas outras referências geográficas necessárias à realização da
atividade, bem como os petrechos de pesca e embarcações utilizadas em cada trecho do território e
as espécies costumeiramente capturadas. No calendário sazonal foram identificadas as espécies
capturadas por época do ano e outras informações pertinentes sobre influência dos ventos e das
correntes marinhas. Observou-se que existe uma “delimitação” implícita dos territórios de atuação
de cada localidade ao longo da faixa de praia no interior do Parque Nacional, com eventuais
conflitos entre eles quando há “invasão” desses territórios.
Construção do Perfil do Pescador: a partir de perguntas como idade, local de nascimento e
moradia, gênero, com quem aprendeu a pescar, destinação do pescado, etc, foi construído um perfil
do pescador artesanal de cada uma das três localidades investigadas. Cadastramento dos pescadores:
foram realizados 252 cadastros para caracterização socioeconômica dos pescadores, com
informações tais como identificação do pescador e das embarcações, espécies capturadas, petrechos
utilizados, etc.
A pesca é predominantemente uma atividade masculina e o envolvimento das mulheres é
eventual e prevalente em atividades como cata de sururu, e raramente há participação feminina em
pesca embarcada.
A maioria dos pescadores de Jericoacoara e Mangue Seco situa-se na faixa entre 25 e 50
anos e no Preá acima de 50 anos. O início da atividade como pescador, independente do gênero,
ocorre aos 14 anos de idade e entre os entrevistados grande parte exerce a pesca há mais de 16 anos.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O aprendizado da atividade ocorre em família, predominantemente com os pais, e em segundo lugar


pelos tios e avôs.
A contribuição da pesca para a renda familiar é de 100%, para 61% dos entrevistados na
localidade do Preá. Já em Jericoacoara, essa contribuição ocorre para somente 26% dos
entrevistados, em virtude da pesca ser um complemento da renda familiar devido ao envolvimento
dos pescadores na atividade turística. No Mangue Seco, 40% dos pescadores pescam somente para
consumo familiar.
Há predomínio de canoas à vela,equipadas com motores do tipo “rabeta”, que são utilizados
na maior parte do tempo. O outro tipo de embarcação bastante utilizado são os paquetes,
assemelhados a pequenas jangadas e de propulsão manual. Na localidade do Preá a maioria dos
pescadores (70%) possuem embarcação própria. Em Jericoacoara, 40% tem embarcação própria e
46% pescam em embarcações de terceiros. Já em Mangue Seco 37% dos pescadores pescam em
embarcações de terceiros e 43% não utilizam embarcação.
As principais artes de pesca utilizadas no Preá são linha e anzol (21%), rede de espera (19%
), rengai (15%) e jererê (16%). Em Jericoacoara, são utilizadas principalmente linha e anzol (32%),
rede de espera (31%), tarrafa (16%) e rengai (10%). Em Mangue Seco são mais utilizadas a tarrafa
(20%), linha e anzol (16%), rede de espera (13%), cata manual e jererê (ambas com 8%) e rengai
(9%). Na localidade do Mangue Seco a utilização das artes de pesca é mais heterogênea que nas
outras localidades.
As capturas da pesca artesanal nessas comunidades se dividem em peixes, crustáceos,
elasmobrânquios e moluscos. Das capturas em Jericoacoara, 50% são peixes, 29% crustáceos, 18%
elasmobrânquios e 3% moluscos. No Preá 40% são peixes, 33% crustáceos, 17% elasmobrânquios e
10% moluscos. Em Mangue Seco 32% são crustáceos, 31% peixes, 23% moluscos e 14%
elasmobrânquios.
Monitoramento do desembarque: Nesta etapa foram identificados e mapeados os principais
pesqueiros e foram obtidos dados do desembarque na Praia Principal de Jericoacoara. Durante
entrevistas de desembarque foram identificados 27 diferentes pesqueiros. Aqueles mapeados pela
equipe durante trabalho embarcado foram: Marambaia, Pedrinha, Malhada, Pontal, Malhada do
Mero, Pedra Furada e Pontal da Pedra do Frade, com diferentes características de fundo e presença
de espécies distintas de pescado em cada um deles. O tempo médio de permanência de pesca varia
de 3 a 10 horas. Após o desembarque, os primeiros peixes são repartidos com pescadores que
auxiliam no processo de retirada do barco da água. A maioria já possui venda certa para
atravessadores e vendem o excedente para a comunidade ou turistas. No processo de venda as
espécies de maior tamanho são vendidas pela unidade, variando o preço por quilo. Já espécies de
menor porte são vendidas misturadas com outras espécies por um valor estimado pelo peso.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
A aproximação com os pescadores foi delicada no início e, em alguns casos perdurou até o
momento do cadastramento, devido ao histórico das gestões anteriores: alguns relataram descaso e
outros posturas repressivas em relação à atividade pesqueira.
Após a realização dessas atividades, percebe-se que os pescadores estão mais informados
sobre seus direitos enquanto população tradicional cujo território foi afetado pela criação de UC de
proteção integral. Além disso, observou-se que houve uma aproximação com a gestão do parque,
maior envolvimento na elaboração do termo de compromisso e qualificação da atuação de suas
representações no conselho consultivo da unidade. Vários relatos de avaliação das reuniões
demonstraram a satisfação dos pescadores em serem escutados e considerados pela gestão do
parque, com mais de 70% de avaliações positivas.
O monitoramento piloto do desembarque será melhorado, definindo-se um protocolo a ser
utilizado em toda a UC. Na elaboração das normas do termo serão retomadas algumas questões
identificadas até o momento, como conflitos derivados de disputas de território entre os pescadores,
será abordado pelo ICMBio, cuja conclusão é fundamental para a garantia dos direitos das
populações tradicionais envolvidas e segurança jurídica para a atuação do ICMBio na gestão da UC.

6. REFERÊNCIAS
ICMBio. Plano de Manejo do Parque Nacional de Jericoacoara. Encarte 4 – Planejamento.
Disponível em <http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/imgs-unida
des-conservacao/Planejamento.pdf> Acesso em: 26/09/2019. 2011.

ICMBio.Instrução Normativa 26 de 04 de julho de 2012. Disponível em:


<http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/DCOM_Instrucao_Normativa_26_2012.pdf>.
Acesso em: 28/09/2019. 2012.

ICMBio.Visitação em Parques Nacionais bate novo recorde em 2018.Disponível em:


<http://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/20-geral/10216-visitacao-em-parques-nacionais-
bate-novo-recorde-em-2018>. Acesso em: 26/09/2019. 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

INTEGRAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A SEGURANÇA


ALIMENTAR PELA CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE:
(RE)ORGANIZAÇÃO TERRITORIAL DO EXTREMO SUL DO ESTADO DA
BAHIA
FOOD SECURITY AND BIODIVERSITY PUBLIC POLICIES INTEGRATION: READING
TERRITORIAL (RE)ORGANIZATION OF THE EXTREME SOUTH OF THE STATE OF
BAHIA.

Victor A. N. Urzua*

* Departamento de Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade/PPG em Desenvolvimento, Agricultura e


Sociedade – CPDA/Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ e Núcleo de Agroecologia Pau
Brasil - NEA-PB/UFSB. Brasil. E-mail: vn.urzua@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
Este trabalho é um exercício metodológico de identificação das interrelações, integrações e
conexões entre as Políticas Públicas de segurança e soberania alimentar e nutricional com as de
proteção e conservação da biodiversidade e das áreas protegidas. Tendo como referência a
metodologia da Política Baseada em Evidências, identificaremos e definiremos, partir de marcos
legais e normativos, alguns “descritores” que nos permitam o reconhecimento de integrações entre
esses conjuntos jurídicos e relacioná-los com projetos socioambientais identificados no território do
Extremo Sul da Bahia.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Reconhecer, no território, formas de execução integrada de políticas públicas ambientais e
de segurança alimentar, inicia-se com identificar as integrações e interdependências entre os marcos
normativos dos Sistemas de Segurança Alimentar, das Unidades de Conservação e das Áreas
Protegidas (ou Conservação da Biodiversidade - CDB). Para isso, e perguntando-nos como a
execução de políticas públicas em projetos integrados pode tanto reorganizar o espaço produtivo
local e regional,como firmar bases para uma maior autonomia relativa das comunidades, adaptamos
a metodologia da Política Baseada em Evidências (Laurent, 2009; Sandroni, e Carneiro, 2016) para
identificar e definir palavras-chaves (ou “descritores”) que nos permitissem relacionar os conjuntos
jurídicos.
Realizaremos uma análise preliminar da Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), do
Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), do Plano Estratégico Nacional de Áreas
Protegidas (PNAP), da Lei da Mata Atlântica (LMA), a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), o Conselho Nacional de Segurança

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Alimentar e Nutricional (CONSEA), da Lei da Segurança Alimentar e Nutricional


(LOSAN/SISAN) e da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN). Em
seguida, com base nos descritores, reconhecer e qualificar alguns dos projetos e ações de segurança
alimentar e/ou conservação da biodiversidadena região do Extremo Sul da Bahia, para reconhecer a
de integrações entre Sistemas, em campo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 Principais marcos jurídico-normativos da conservação da biodiversidade e da segurança
alimentar e nutricional e identificação de palavras-chave (ou descritores)
A formalização das políticas de Meio Ambiente a serem elaboradas e executadas no Brasil
decorrem daLei No 6.938/1981, PNMA, que norteia a compatibilizaçãodo desenvolvimento
socioeconômico com o uso racional dos recursos ambientais. Seu principal instrumento é a criação
de territórios especialmente protegidos pelo Poder Público.A Lei No 9.985/2000, instituiu o SNUC
e a criação e a gestão das UC, definidas como territórios e seus recursos ambientais legalmente
instituídos pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos. Destaca a
proteção aos recursos naturais necessários à promoção social e econômica de populações
tradicionais.O PNAP(Decreto 5.758/2006), incorporou a inclusão social, potencializando o papel
das áreas protegidas no desenvolvimento sustentável e na redução da pobreza, na participação e
inclusão social e no exercício da cidadania.O Brasil, como signatário da Convenção da Diversidade
Biológica (CDB), oficializou, via PNAP, a abordagem ecossistêmica na gestão das áreas protegidas,
possibilitandouma repartição mais justa e equitativa da conservação da biodiversidade (Franco,
2012).
ALei No 11.428/2006 a Lei da Mata Atlântica, estabelece que o PoderPúblico dará apoio e
assistência às práticas de “manejo e exploração sustentáveis das espécies da flora nativa” realizadas
pelos "pequenos produtores rurais" e “populações tradicionais”. “Povos e Comunidades
Tradicionais”, comonos Decretos nº 8.750/2016 (CNPTC) e 6.040/2007 (PNPCT), faz referência a
“grupos culturalmente diferenciados, que se reconhecem como tais e possuem formas próprias de
organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para a sua
reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, por meio de conhecimentos, inovações
e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.
O CONSEA, organizado como instrumento de articulação entre governo e sociedade civil,
assumiu a coordenação da elaboração da Lei No 11.346/2006, aLOSAN, que criou e instituiu o
SISAN, para assegurar o direito humano à alimentação adequada (DHAA). Por ser uma concepção
abrangente, exigiu esforços conjuntos de governo e sociedade civil para formular, implementar e
monitorar a política de SAN. A soberania alimentar, como realização do livre direito dos povos de
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determinarem suas políticas e estratégias alimentares, fortalece e reforça seus modos de organização
dos territórios, com certo grau de autonomia. Essas características fariam da SAN um eixo de um
modelo de desenvolvimento mais justo (Maluf, 2013; Pacheco, 2014).A conservação ambiental é
abordada na adoção das políticas e ações queassegurem o DHAA e na diversidade cultural e
sustentabilidade ambiental das práticas alimentares. A PNSAN(Decreto No 7.272/2010), para
promover a segurança alimentar, tem como diretrizes o acesso universal à alimentação adequada e
saudável e à água de qualidade, a estruturação de sistemas alimentares sustentáveis de base
agroecológica, biodiversos e que fortaleçam a agricultura familiar e os povos e comunidades
tradicionais.

Quadro 01. Normas legais sobre Áreas Protegidas, UC, Populações Tradicionais e Segurança Alimentar e
descritores/palavras-chaves potencialmente integradoras de Políticas Públicas
Lei ou Decreto Descritores/Palavras-chaves
PNMA Conservação/preservação/proteção/recuperação (dos ecossistemas/áreas representativas); Recurso ambiental/natural;
Fiscalização; Uso racional/manejo dos recursos ambientais; Educação ambiental; Comunidade.

SNUC e PNAP Conservação/preservação/proteção (da natureza/biodiversidade); Recurso ambiental/natural; Diversidade


biológica/enriquecimento ecológico; Áreas protegidas;
Manejo/extrativismo; Repartição de benefícios da biodiversidade brasileira; Sistema representativo/participação social/controle
social;
Corredor ecológico/fluxo gênico; Direitos territoriais (como instrumento para conservação de biodiversidade).

LMA Pequeno produtor rural; população tradicional (definição); Manejo agroflorestal sustentável; prática preservacionista; exploração
sustentável; extrativismo sustentável; Enriquecimento ecológico.
Sistemas Participativos de Garantia da Qualidade Orgânica; Utilidade pública: segurança nacional e proteção sanitária;
Recuperação de vegetação nativa; Interesse social: proteção da integridade e recuperação da vegetação nativa.

PNPCT Povos e Comunidades Tradicionais; Territórios Tradicionais; Desenvolvimento Sustentável; Qualidade de vida;
Segurança alimentar e nutricional como direito dos povos e comunidades tradicionais; Alimentos de qualidade; Direitos
ambientais.Práticas alimentares ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis; Diversidade cultural; Pluralidade
socioambiental

LOSAN e SISAN Segurança alimentar e nutricional/alimentação adequada; Práticas alimentares


Intersetorialidade de políticas, programas e ações; Descentralização das ações e articulação entre as esferas de governo;
Monitoramento e promoção da política pública de segurança alimentar; Universalidade/equidade; Participação
social/cidadania;Autonomia; Conservação da Biodiversidade; Saúde, nutrição, educação.

PNSAN Intersetorialidade de políticas, programas e ações; Planos estadual, distrital ou municipal de segurança alimentar e nutricional;
Participação social/cidadania; Grupos populacionais vulneráveis; Oferta de alimentos; Transferência de renda; Agricultura
familiar (fortalecimento); Educação; sociobiodiversidade; Povos indígenas, quilombolas, demais povos e comunidades
tradicionais;Conservação, manejo e uso sustentável da agrobiodiversidade.

Fonte: elaboração do autor, 2019.

Os vínculos entre conservação da biodiversidade e alimentação começam a se estabelecer,


institucionalmente, com a adesão do Brasil à CDB, com o Programa Nacional da Diversidade
Biológica-PRONABIO (1994), no Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade
Biológica Brasileira - PROBIO (1996), às decisões da Conferência das Partes (COP), dos ODM
(2004), da biodiversidade agrícola (2006). Na Declaração de Tshwane (2011), na V Cúpula do
Fórum de DiálogoSul-Sul Índia, Brasil e África do Sul (IBAS) e com o projeto Conservação e Uso
Sustentável da Biodiversidade para Melhoria da Nutrição e do Bem-estar Humano (BFN), em 2012.
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3.2 Pesquisa documental e de campo: reconhecimento dos "descritores"


No âmbito do fomento à projetos, no aldeamento Boca da Mata inicia-se um projeto de
restauração florestal ao longo da área de sobreposição entre a TI Barra Velha e o Parque Nacional
do Monte Pascoal. Nessa TI, o projeto Quintais Agroflorestais, da Companhia Estadual de
Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), é estruturado no aldeamento de Meio da Mata. A CAR,
articulada com o Conselho Territorial (CODETER) da Costa do Descobrimento,pré-selecionou
projetos socioambientais para conservação e uso sustentável da biodiversidade, com foco na
SAN,em dezenove Manifestações de Interesse, nas linhas da gestão de recursos naturais,
sociobiodiversidadee segurança alimentar.
No campo da Compensação ambiental, o Programa Arboretum de Conservação e
Restauração da Diversidade Florestal, do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o MPE-
BA e as empresas Fibria e Suzano, opera para restauração florestal de propriedades rurais. O Projeto
Assentamentos Sustentáveis: Cultivando Agrobiodiversidade, executado pelo Núcleo de Apoio à
Cultura e Extensão em Educação e Conservação Ambiental - NACE-PTECA/Esalq resultadas
negociações por reparação dos impactos socioculturais da instalação de projetos de monocultivo do
eucalipto.
Dos processos coletivos e de associativismo, a Rede de Agroecologia Povos da Mata
pretende constituir e expandir o Sistema Participativo de Avaliação de Conformidade Orgânica
(SPG) no Sul da Bahia, agregando produtores da agricultura familiar, assentados da reforma agrária,
comunidades indígenas, quilombolas e consumidores. A Associação Regional de Agroecologia Teia
dos Povos, que se define como Movimento Agroecológico, mobilizaacampamentos e assentamentos
rurais, quilombolas, indígenas, mestres e lideranças, pequenos produtores, estudantes,
pesquisadores e profissionais em Agroecologia.

4. CONCLUSÕES
Buscamos no marco jurídico-normativo indicações dos níveis de integração entre as
políticas públicas de conservação da biodiversidade e de segurança alimentar na construção de uma
agenda de superação da pobreza, afirmação de direitos territoriais e ambientais e meios para
alcançar condições de maior autonomia alimentar. Adaptando a metodologia da Política Baseada em
Evidências, foi possível sistematizar descritores que poderão indicar possíveis integraçõescapazes
de orientar a (re)organização territorial. Uma perspectiva inicial dos descritores, foi possível
identificar a existência comum do que se poderia chamar de uma temática social na questão da
conservação ambiental, já identificada por Sandroni e Carneiro (2016). Essa temática teria na
participação social, na conservação da biodiversidade, educação, no manejo e uso sustentáveis dos

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recursos nos territórios e na superação da pobreza, os agenciamentos da integração entre as Políticas


Públicas de SAN e de CDB.
Foram preliminarmente identificadasexperiências nas linhas de financiamento público para o
fortalecimento da sociobiodiversidade, do licenciamento ambiental e ajustamento de conduta
empresarial e no âmbito do associativismo, em Terras Indígenas, Assentamentos Rurais e Territórios
Quilombolas e em UCs (RESEX),indicando a estruturação de um sistema de ações que
(re)organizam o território, em projetos de desenvolvimento.

5. AGRADECIMENTOS
Ao Núcleo de Estudos de Agroecologia Pau-Brasil (NEA-PB/UFSB) pelo suporte; ao
CODETER, pelas informações; ao Prof. Dr. Renato S. Maluf, pela generosidade na orientação e a
Ana, por todo o carinho nos debates e todo o afeto.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FRANCO, José L. de A. e DRUMMOND, José A.. História das preocupações com o mundo natural
no Brasil: da proteção à natureza à conservação da biodiversidade. In FRANCO, J.L., SILVA,G.G.
(orgs.). História Ambiental: fronteiras, recursos naturais e conservação da natureza. Rio de
Janeiro: Garamond, 2012. ISBN 978-85-7617-281-9.

LAURENT, C., TROUVE, A., PERRAUD, D. O debate sobre as abordagens Evidence-based ou


Evidence-awarepolicy no campo da agricultura. Revista Estudos Sociedade e Agricultura. Rio de
Janeiro, Ano 17 volume 02 - outubro de 2009: 139-226.

MALUF, R. Elementos para uma agenda pública de enfrentamento da pobreza e inclusão


socioprodutiva no meio rural na ótica do desenvolvimento territorial sustentável. In: Leite, S. P.
(org.). Políticas de desenvolvimento territorial e enfrentamento da pobreza rural no Brasil.
Brasília (DF), IICA: 2013 (Série DRS, 19, pg. 57-88).

PACHECO, Maria Emilia (2014). Uma conquista da democracia. Palestra proferida na Audiência
Pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, em 05 de
agosto de 2014. Disponível em: http://polis.org.br/wp-content/uploads/PDF_SEG.pdfAcessado em
12 de junho de 2019.
SANDRONI, Laila T e CARNEIRO, Maria J. Teixeira. “Conservação da Biodiversidade" nas
Ciências Sociais Brasileiras: uma revisão sistemática de 1990 a 2010. Ambiente & Sociedade.
São Paulo v. XIX, n. 3 n p. 21-46 n jul.-set. 2016.

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DIÁLOGOS DESAFIADORES NA ELABORAÇÃO DO PLANO DE MANEJO


DO PARQUE NACIONAL DO PICO DA NEBLINA
CHALLENGING DIALOGUES IN THEELABORATION OF THE PICO DA NEBLINA
NATIONAL PARK MANAGEMENT PLAN

Denis Helena Rivas* Desireé Cristiane Barbosa da Silva**


Leila de Sena Blos*** Luciana Yuakari Uehara****

* Geógrafo (USP), mestrando em Geografia Política (USP), Analista Ambiental do ICMBio – Equipe de Planejamento
do Plano de Manejo (COMAN/ICMBio). denishrivas@gmail.com
** Engenheira Florestal (UNB), Analista Ambiental da Coordenação de Elaboração e Revisão do Plano de Manejo
(COMAN/ICMBio) – Supervisora do Plano de Manejo. deflorestal@gmail.com
***Engenheira Florestal (UFAM), Analista Ambiental da Coordenação de Elaboração e Revisão do Plano de Manejo
(COMAN/ICMBio) – Supervisora Substituta do Plano de Manejo.leila.sena@icmbio.gov.br
**** Bióloga (USP), Técnica Ambiental – Chefe Substituta do Parque Nacional do Pico da Neblina / Coordenadora do
Plano de Manejo.luciana.uehara@icmbio.gov.br

INTRODUÇÃO
O Parque Nacional do Pico da Neblina, criado em 5 de junho de 1979, com 2.252.616
hectares, dos quais 1.617.473 hectares sobrepostos a quatro terras indígenas reconhecidas
posteriormente, está prestes a dar mais um passo em seu processo de implementação, através da
elaboração do seu Plano de Manejo.O estudo foi formalmente iniciado no ano de 2018, porém para
sua compreensão consideramos necessária uma retrospectiva desde sua criação, passando por
episódios fundamentais, que abordaremos brevemente nas páginas seguintes.

MATERIAL E MÉTODO
Em 2018o ICMBio pôde dar continuidade ao Plano de Manejo do PARNA Pico da Neblina,
utilizando-se de metodologia participativa testada a partir da nova abordagem para a elaboração dos
planos de Manejo, regulamentada e iniciada a partir da Instrução Normativa 7/2017 (ICMBio 2017)
e detalhada no Roteiro Metodológico para elaboração e revisão de Planos de Manejo das Unidades
de Conservação Federais. Segundo tal metodologia, a participação social ocorre em diversos
momentos durante a elaboração do plano de manejo, como na etapa preparatória e em especial na
oficina participativa, principal fonte de insumos para a elaboração do Plano de Manejo das UCs
federais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Quando o Parque Nacional do Pico da Neblina foi criado, o contexto histórico do Brasil sob
a ditadura militar (1964 – 1985) era marcado por uma visão de Amazônia sintetizada em expressões

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como “vazio demográfico”, utilizada como justificativa para “integrar para não entregar” a região.
No mesmo sentido dos slogans do governo militar, os estudos realizados para a criação do
Parque,nas montanhas do Norte do Amazonas, fronteira com a Venezuela e Colômbia,
foramdesdobramentos das indicações do projeto RADAM Brasil para a região.
Tais estudos destacaram ecótonos identificados como refúgios do pleistoceno, teoria que
buscou explicar a evolução da floresta amazônica a partir de estudos paleoclimáticos a respeito das
savanas, ou Campinaranas, existentes em meio à floresta amazônica. Também mencionam a
existência de uma missão Salesiana às margens do rio Cauaburis. No entanto, o estudo que propôs a
criação do parquenão se deteveao fato de que a missão Salesiana na Vila de Maturacá, foi fundada
em 1954 para estabelecer contato com o povo Yanomami, predominantehá séculos nas bacias do rio
Cauaburis e região do Rio Orinoco. O artigo 2° do Decreto 83.550/79 que cria o PARNA Pico da
Neblina, estabeleceu que o mesmo tem “a finalidade precípua de proteger flora e fauna e as belezas
naturais, no local existentes” sem qualquer menção aos povos indígenas.
Em uma outra perspectiva , Márcio Santilli (Instituto Socioambiental – ISA,2004) afirma
que “A política indigenista integracionista de então considerava os índios como sujeitos
provisórios de direito, que acabariam assimilados pela “comunhão nacional”. Vale notar que
alguns dos Parques Nacionais (Parna), quando foram criados, como os do Araguaia (1959), Monte
Pascoal (1961) e o do Pico da Neblina (1979), abrigavam aldeias indígenas. Os documentos que
subsidiaram a criação do Parna do Araguaia, por exemplo, destacavam a presença indígena como
argumento adicional a justificar a sua criação. Esta presença não era, então, considerada um
obstáculo para a política de conservação. Por sua vez, no início dos anos 1960, quando o governo
federal começou a demarcar terras em maior extensão para a proteção de povos indígenas, já no
embalo dos trabalhos realizados pelos irmãos Villas-Bôas e outros sertanistas na Fundação Brasil
Central, lançou mão da figura jurídica de Parque Nacional constante do Código Florestal para
criar o Xingu. Os indigenistas aplaudiram a iniciativa e não viram, então, uma intenção do poder
público em esbulhar direitos indígenas.”
Trazida pelos ventos da redemocratização no Brasil, a Constituição de 1988 trouxe seu
capítulo VIII dedicada aos direitos dos indígenas, dos quais destacamos o artigo 231§ 1º “São terras
tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas
para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais
necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos,
costumes e tradições.” Mesmo após os direitos previstos na CF1988, apenas com muita organização
e trabalho os povos indígenas, originários do território abrangido pelo Parque nacional do Pico da
Neblina, conseguiram paulatinamente o reconhecimento de seus territórios, conforme demonstra a
tabela a seguir:
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Tabela 1 - Situação das Terras Indígenas em relação ao Parque Nacional Pico da Neblina
Terra Indígena/Área/Situação Fundiária Sobreposição (ha) % da TI % da UC
Yanomami, 9.664.975ha, Homologadaem 1992 1.128.391 11,68% 50,08%
Médio Rio Negro II, 316.194ha, Homologada em 1998 48.416 15,31% 2,15%
Balaio,257.281ha, Homologada em 2009 240.816 93,60% 10,69%
Cué-CuéMarabitanas, 808.645ha, Declarada 2013 199.850 24,71% 8,87%
(Fonte: Funai e ICMBio)

Se por um lado o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), criado através da


Lei 9.985/2000 após anos de debates, foi importantíssimo na formulação de normas e diretrizes para
cada categoria de Unidade de Conservação, a previsão de criação de um grupo de trabalho para
resolver os casos de sobreposição de TIs e UCs não foi concretizada até hoje (ISA 2004).
Na ausência de um entendimento normativo mais abrangente, cada Unidade de Conservação
e TerraIndígena sobrepostas estabeleceu sua própria dinâmica de diálogo, até a publicação da
PNGATI em 2012, que passou a indicar um caminho de planejamento integrado, ao qual trataremos
em breve.
No caso do Parque Nacional do Pico da Neblina, o paradigma de Unidade de Conservação
de Proteção Integralaos moldes estabelecidos pelo SNUC, ou seja, seguindo o inciso VI do artigo 2º
do SNUC “entende-se por Proteção Integral a manutenção dos ecossistemas livres de alterações
causadas por interferência humana, admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais”
esteve vigente no planejamento daquela área protegida até 2003. Neste ano, uma ação do Ministério
Público Federal no Amazonas1 recomendou a suspensão da visitação ao parque e a urgência na
elaboração do Plano de Manejo, considerando principalmente o potencial turístico da região e o
interesse das lideranças indígenas pelo turismo. Na prática, a gestão da UC pouco possuía
instrumentos de diálogo e consulta efetivo às populações indígenas e permitia visitações à
montanha mais alta do Brasil sem a participação ou mesmo a anuência do povo Yanomami em
relação ao planejamento do turismo dentro de sua terra indígena e lugares sagrados.
A criação do conselho, através da portaria nº 75 de 2012, foi uma etapa importante.
Juntamente com a publicação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras
Indígenas (PNGATI, Decreto 7747 de 5 de julho de 2012), passaram a nortear os trabalhos de
diálogo com os indígenas.

1
Procedimento nº 1.00.000.009134/2000-49 e Portaria PRDC nº 09/2003
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Em 2014, durante as festividades da Reahu1 do povo Yanomami, foi construída a visão


Yanomami sobre a atividade do turismo.
Na ocasião também foi construída a Rede de Valor: Ecoturismo Yaripo2, na qual foram
detalhadas estratégias para a implementação da visitação a partir da perspectiva dos Yanomami. É
importante destacar que a partir de 2014, a gestão do Parque participa do Comitê Gestor dos Planos
de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas, instrumento de planejamento das Terras
Indígenas considerados importantes ferramentas de implementação da PNGATI.
Somente em 2018, com o apoio do programa “Parceria para a Conservação da
Biodiversidade da Amazônia”, o ICMBio pôde dar continuidade ao Plano de Manejo do PARNA
Pico da Neblina. No período de 4 a 29 de julho de 2018 o ICMBio realizou o “Reconhecimento de
campo para o plano de manejo do Parque Nacional do Pico da Neblina”3, etapa preparatória às
oficinas, que consistiram em uma série de reuniões de nivelamento com as instituições parceiras
atuantes em São Gabriel da Cachoeira, tais como a FOIRN, FUNAI (Coordenação Regional Rio
Negro e Frente de proteção Etnoambiental Yanomami e Yekuana), ISA, bem como uma etapa de
reconhecimento de campo com reuniões nas comunidades do Balaio e Vila de Maturacá e uma
expedição de avaliação da organização e condições gerais de visitação ao Pico da Neblina,
conforme proposto no projeto Yaripo.
Entre os dias 17 a 21 de Setembro, o ICMBio realizou na maloca da FOIRN a oficina
participativa de elaboração do Plano de Manejo, momento chave do processoquando ocorre a
definição dos elementos que compõem o plano de manejo,

Participantes da oficina participativa realizada em setembro de 2018.

Na oficina participativa para a elaboração do Plano de Manejosão definidos o propósito, a


significância, os recursos e valores fundamentais (chamados de componentes fundamentais), os

1
Cerimônia em homenagem aos mortos.
2
Yaripo significa Serra dos Ventos, nome dado pelos Yanomami para o Pico da Neblina
3
Atividade detalhada no “Relatório de Reconhecimento de Campo para o Plano de Manejo do Parque Nacional do Pico
da Neblina”.
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subsídios para a interpretação ambiental, a necessidade de dados e planejamento e sua priorização


(chamados componentes dinâmicos), além do zoneamento e as normas da Unidade de Conservação.
Uma segunda oficina foi realizada em Novembro de 2018 na T.I. Médio Rio Negro II, para suprir a
lacuna de informações devido à ausência de representantes desse território na oficina de Setembro.
Após duas reuniões da equipe de planejamento para a consolidação das informações obtidas
nas oficinas participativas, o ICMBio realizou em Março de 2019 uma oficina devolutiva em São
Gabriel da Cachoeira, novamente na Casa do Saber, com a participação dos mesmos atores sociais
da oficina de Setembro, para confirmação e refinamento final nas informações do Plano de Manejo.

CONCLUSÃO
Após construção coletiva com os atores locais, em especial as representações indígenas, o
propósito de criação do Parque Nacional do Pico da Neblina passará a ser:
“O Parque Nacional do Pico da Neblina, em regime de sobreposição às Terras Indígenas
Yanomami, Balaio, Cué-Cué Marabitanas e Médio Rio Negro II, compõe um dos maiores contínuos
de áreas protegidas da Amazônia que abrange lugares sagrados dos povos indígenas e
ecossistemas de extrema importância. O Parque e as Terras Indígenas promovem a dupla proteção
e a gestão integrada e compartilhada1 de imensos territórios na bacia do Rio Negro, reconhecendo
a diversidade de povos indígenas, sua cultura, modos de vida, áreas de usufruto, locais de viver,
fortalecendo direitos e a autodeterminação2 , e, conservando uma variedade de ambientes com
suas espécies raras da fauna, flora e belezas naturais únicas”.
Há de ressaltar que o processo de elaboração do Plano de Manejo do Parque Nacional do
Pico da Neblina pode ser considerado um documento inédito na instituição, onde não há diretrizes
claras de gestão de unidades de conservação com interface territorial, seja qual for a natureza desta:
com terras indígenas, quilombolas e populações tradicionais. Reflete portanto o esforço da equipe
do ICMBio na adaptação da metodologia de elaboração do plano de manejo para a especificidade
deste Parque Nacional.

1
Segundo o que estabelece o artigo 26 do SNUC: “Quando existir um conjunto de unidades de conservação de
categorias diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e
outrasáreasprotegidaspúblicasouprivadas,constituindoummosaico,agestãodoconjuntodeverá ser feita de forma integrada
e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de conservação, de forma a compatibilizar a presença da
biodiversidade, a valorização da sócio diversidade e o desenvolvimento sustentável no contextoregional.
2
A autodeterminação dos povos é o princípio que garante a todo povo de um país o direito de se autogovernar, realizar
suas escolhas sem intervenção externa, exercendo soberanamente o direito de determinar o próprio estatuto político. A
ratificação da Carta das Nações Unidas em 1945, depois do fim da Segunda Guerra Mundial, inseriu o direito de
autodeterminação no âmbito do direito internacional e diplomático. Enquanto direito dos povos indígenas, a
autodeterminação refere-se fundamentalmente ao reconhecimento das aspirações dos povos indígenas a exercer o
controle de suas próprias instituições e modos de vida; e ao direito de elegerem livremente suas prioridades de
desenvolvimento, de acordo com suas formas próprias de organização social, política, jurídica e econômica e dentro dos
marcos jurídicos do Estado Nacional soberano.
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AGRADECIMENTOS
Agradecemos a todas as representações indígenas, os servidores das instituições públicas e
parceiros da sociedade civil organizada que participaram ativamente da construção do Plano de
Manejo do Parque Nacional do Pico da Neblina.

BIBLIOGRAFIA
AB’SÁBER, A. N. (1977) Espaços ocupados pela expansão dos climas secos na América do
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Yanomami Kumirayoma. Plano de Visitação Yaripo, Ecoturismo Yanomami. 2017

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BOCARDE, F. RAMOS, S.M.; UEHARA, L.Y. Governança Indígena em áreas de sobreposição


territorial e a formação do conselho gestor do Parque Nacional do Pico da Neblina. In: Anais do
Seminário de Áreas Protegidas e Inclusão Social - SAPIS 2015.

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ICMBio, 2017. Instrução Normativa n° 07, de 21 de dezembro de 2017. Estabelece diretrizes e


procedimentos para elaboração e revisão de planos de manejo de unidades de conservação da
natureza federais. Brasília-DF

______.Relatório de Gestão PARNA Pico da Neblina 2010 – 2016. ICMBio em parceria com
AYRCA, Exército, FUNAI, PMSGC e ISA. 2017.

ICMBio, 2018. Roteiro Metodológico para elaboração e revisão de Planos de Manejo das Unidades
de Conservação Federais.

______.Relatório de reconhecimento de campo para o plano de manejo do Parque Nacional


do Pico da Neblina.

723
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Instituto Socioambiental – ISA, 2004. Terras Indígenas & Unidades de Conservação da


Natureza: o desafio das sobreposições.

GUIMARÃES, F. S; BUENO, G. T. 2016. As campinas e campinaranas amazônicas. Caderno de


Geografia, v.26, n.45, 2016.
HUECK, K. As florestas da América do Sul: ecologia, composição e importância econômica; Ed.
Universidade de Brasília, 1972

BRASIL. Lei 9985/2000, cria o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

PNGATI - Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas. Decreto


n.º 7747, de 5 de junho de 2012.

RADAM, 1976. Projeto Radambrasil – Programa de Integração Nacional – levantamento de


recursos naturais – Folha NA.19 Pico da Neblina. DNPM. Rio de Janeiro. 374p.

724
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL COMO FERRAMENTA DE GESTÃO DE UC


COM POPULAÇÕES TRADICIONAIS
SUSTAINABLE PRODUCTION AS A MANAGEMENT TOOL FOR CU WITH TRADITIONAL
COMMUNITIES

Cristiane Ramscheid Figueiredo*, Lílian de Carvalho Lindoso**, Stephany Caroline Vilela Alves
Rodrigues***, Bruna De Vita Silva Santos****.

* Coordenação de Produção e Uso Sustentável, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental)


** Área de Proteção Ambiental Serra da Ibiapaba, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental e Coordenadora do Curso
Produção Sustentável em UC)
*** Coordenação Geral de Populações Tradicionais, ICMBio, Brasil. (Colaboradora)
**** Coordenação Geral de Populações Tradicionais, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental e Coordenadora Geral)

1. INTRODUÇÃO
As Unidades de Conservação (UC)dos grupos uso sustentável e proteção integral, devem ser
entendidas como estratégias complementares, proporcionando a conservação da natureza através da
gestão integrada entre distintas modalidades de manejo dos recursos naturais (MERCADANTE,
2001). Dentro do grupo uso sustentável, as categorias Reservas Extrativistas (Resex) e Reservas de
Desenvolvimento Sustentável (RDS) destinam-se a garantir a preservação de práticas de uso de
recursos naturais desenvolvidas pelas comunidades tradicionais, como reconhecimento do serviço
que prestam à conservação, além das Florestas Nacionais (Flona), que também permite a
permanência.
A produção sustentável em UC engloba o uso ordenado da biodiversidade, racionalizando a
exploração dos recursos naturais através do manejo comunitário. Este enfoque adotado pelo
ICMBio busca, por um lado, dar visibilidade às populações tradicionais como peças fundamentais
para um equilíbrio entre homem e natureza (MOREIRA, 2007), e, por outro, fortalecer a dimensão
econômica da atividade, gerando bem estar social e contribuindo para a reprodução sociocultural
destas comunidades.
No Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a agendada
produção sustentável ainda é relativamente pouco difundida, na busca de se ampliar e também
qualificar a atuação institucional,e fortalecer entendimentos quanto ao uso da biodiversidade como
estratégia de conservação, foi formatado um curso corporativo, tendo como público alvo servidores
e lideranças comunitárias. O curso,é voltado exclusivamente para as UC do grupo Uso
Sustentávelcom população tradicional residente,e conta com duas edições, sendo a primeira no ano
de 2018.

725
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

No ano de 2019 foi realizada a segunda edição, que passou a enfocar a Produção Sustentável
em UC. A partir de discussão promovida no âmbito do curso, o presente artigo se propõe a discutir
a produção sustentável como ferramenta de gestão e consolidação destas UC,e os limites de atuação
do empresariado, do governo e da sociedade civil envolvidos nas iniciativas produtivas.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
O curso Produção Sustentável em UC foi dividido em 2 módulos nos meses de junho e
agosto de 2019, totalizando carga horária de 115 horas/aula.
Os gráficos abaixo mostram a distribuição geográfica e perfil dos 28 cursistas, dentre os
quais estão incluídas nove lideranças comunitárias (Figura 1). Em sala de aula, a vivência dos
modos de vida tradicionais alia-se ao conhecimento técnico dos servidores, promovendo um diálogo
de saberes que qualifica o debate e a prática institucional. Na Figura 2, a predominância de
participantes da região norte do Brasil reflete o recorte regional proposto no processo seletivo.

Figura 1 - Perfil dos cursistas - 2019 Figura 2 - Cursistas por região - 2019

O curso Produção Sustentável em UC se propôs a desenvolver nos educandos a


compreensão e valorização do uso sustentável enquanto estratégia de conservação da
biodiversidade, e da organização comunitária como condição para o sucesso das iniciativas
produtivas, bem como a habilidade de favorecer processos participativos de elaboração dos
instrumentos de gestão de UC e a gestão de empreendimentos comunitários.
O primeiro módulo foidestinado a discussões sobre organização tanto das comunidades
quanto das UC,criando a ambiência para que a produção sustentável possa acontecer de forma
ordenada.Já na segunda parte do curso, abordou-se o uso sustentável como estratégia de
conservação da biodiversidade, o manejo comunitário tradicional eos conceitos de cadeias
produtivas e de valor dos produtos da sociobiodiversidade.
No encerramento do curso foi aplicado um exercício em que os participantes foram
provocados ao debate por duas perguntas orientadoras: 1) Como o fortalecimento das iniciativas

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

produtivas interfere na gestão das Unidades de Conservação? 2) Quais os limites de atuação do


ICMBio, parceiros e organização comunitária nas iniciativas produtivas? No decorrer do debate,
através da coleta e estruturação de ideias, as principais contribuições foram sendo registradasem
painel moderário. O resultado desta atividade será objeto de discussão do presente artigo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
As problemáticas ambiental (como desmatamento, poluição das águas e efeito estufa) e
social (desigualdade e fome) fomentaram a emergência de movimentos sociais que questionavam o
modelo de desenvolvimento hegemônico no mundo e propunham um novo modelo pelo viés da
sustentabilidade (SILVA, D. W. et al., 2016).
A Convenção sobre Diversidade Biológica - CDB (ONU, 1992) trouxe o uso sustentável da
diversidade biológica como estruturabase para a conservação. O desenvolvimento de atividades
produtivas com responsabilidade ambiental e social emUC de uso sustentável com populações
tradicionais (categoria VI da IUCN)vem apresentando resultados que demonstram sua importância
tanto para aconservação da biodiversidade, quanto para o reconhecimento dos direitos fundamentais
e da cidadania das comunidades que habitam essas áreas com inclusão social e produtiva, segurança
alimentar e desenvolvimento sustentável (ICMBio, 2018).
O desenvolvimento de atividades produtivas proporciona a melhorgestão do território,
através da a promoção do bom uso dos recursos e do sentimento de pertencimento das
comunidadesenvolvidos nas atividades produtivas pela UC.
De acordo com PORTO-GONÇALVES (2008), devemos ser capazes de traduzir a questão
da Amazônia em propostas concretas, como também para encontrar as formas específicas de
ordenamento territorial na própria região. Como contribuição para a conservação da biodiversidade
e para a implementação das UC o fortalecimento das atividades produtivas podeauxiliar na
diminuição da pressão negativa sobre os recursos naturais de interesse econômico através do
ordenamento e estabelecimento participativo de regras, as ações deproteçãoorganizadas e
desenvolvidas pelas próprias comunidades para proteger um único recurso natural, geralmente
promove a conservação de todo ambiente. Como exemplo podemos citar o caso do manejo do
pirarucu, todas as ações realizadas para proteger o estoque selvagem dessa espécie resulta na
conservação dos lagos fluviais e consequentemente de toda a biodiversidade associada a esses
ambientes.
Outros pontos destacados durante o debatedemonstram que as atividades produtivas
desenvolvidas dentro de UC interferem de forma positiva sobre os seguintes aspectos: governança
comunitária, desenvolvimento de pesquisas científicas, aumento da escolaridade e qualificação
profissional de jovens e adultos nas comunidades, fortalecimento de iniciativas e promoção de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

diálogos. Já os aspectos negativos foram elencados osacidentes relacionados a segurança do


trabalho e o aumentoda demanda de proteção da UC devido a maior disponibilidade de informação
técnica relacionada ao monitoramento da produção, resultando na maior pressão sobre os recursos,
sobretudo por agentes externos, que atuam sem observar as regras de sustentabilidade definidas
pelas comunidades, demandando, do órgão gestor, um maior investimento em fiscalização.
Uma questão que merece destaque é que bons exemplos de uso sustentável da
biodiversidade e que resultem em conservação contribuem para advogar a favor desta prática, tanto
para dentro do ICMBio, quanto para toda a sociedade.
Quanto ao limite da atuação do ICMBio, organizações comunitáriase parceiros nas
iniciativas produtivas, foi consenso a dificuldade de identificar os limites de atuação entre os atores.
Esta dificuldadepode ser explicada pelas próprias características do modelo de produção
extrativista, alicerçado em uma realidade de deficiente acesso a serviços e infraestrutura básicos,
aliado à complexa logística de mobilidade e transporte, o que demanda soluções que na maioria das
vezes necessitam ser construídas.
Outra questão diz respeito à transformação de um território tradicional em UC, o que resulta
em burocracias alheias à organização tradicional para o seu funcionamento. O gestor deve ter
clareza dessa situação para, assim, melhor desempenhar o seu papel, contemplando tanto as
especificidades da realidade local e suas necessidades, como também as institucionais, para a
implementação da UC.
Ainda em relação ao papel dos órgãos gestores, destacou-se que um gestor comprometido no
fortalecimento das iniciativas faz muita diferença para o alcance de bons resultados. Frentes de
atuação identificadas na discussão: composição de atores da cadeia produtiva, articulação com
parceiros, promoção e difusão de informações, além de viabilizar espaços de diálogos entre as
comunidades envolvidas na produção - o que tem custo e, dependendo do nível de organização
local, pode não acontecer. Resta o desafio de resguardar o necessário protagonismo comunitário na
gestão dos empreendimentos e na negociação com agentes de mercado.

4. CONCLUSÃO
A promoção da produção sustentável extrativista valoriza as práticas tradicionais e
proporciona a melhoria da qualidade de vida das famílias e comunidades que vivem no interior da
UC. Diversas experiências têm promovido a participação feminina e da juventude, proporcionando
condições de permanência no território e de uma maior participação na tomada de decisões. Isso
traz reflexos diretos para a gestão da UC, na medida em que o sucesso das iniciativas produtivas
passa pela proteção do território, pela efetividade da conservação, pelo envolvimento da
comunidade e pela produção de conhecimento.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Pensar na perspectiva das cadeias produtivas e de valor, no entanto, nos remete à


necessidade de pensar para além dos limites da UC, pois sem a articulação entre os diferentes elos
da cadeia, compromete-se a capacidade de distribuir as responsabilidades e ganhos ao longo dela. O
que torna a gestão complexa e necessariamente feita em sincronia entre o órgão gestor, comunidade
e parceiros. Resta o desafio atuar as UC como estratégias de desenvolvimento territorial, superando
a imagem dos espaços de conservação como entraves ao desenvolvimento. Isso implica construir
uma matriz de incentivos adaptados à realidade socioambiental dos Biomas, garantindo o
protagonismo das comunidades na gestão de seus territórios e a necessária rede de apoio
envolvendo atores públicos e da sociedade civil, assegurando uma justa repartição dos benefícios
gerados pela atividade produtiva e a conservação dos recursos e de toda a biodiversidade.

5. AGRADECIMENTOS
Ao ICMBio e todos os participantes, servidores e lideranças comunitárias, instrutores e parceiros
das duas edições do curso, em especial à Agência de Cooperação dos Estados Unidos, USAID,
financiadora do Projeto Parceria para Conservação da Biodiversidade da Amazônia.

6. REFERÊNCIAS
BRASIL. ICMBio, 2019.Catálogo de Produtos da Sociobiodiversidade do Brasil Ofertados por
Povos e Comunidades tradicionais. Brasília, DF: ICMBio, 2019. 2ª edição. 53p.: il.Disponível
em: http://bit.ly/CatalogoSociobioBrasil2019 .

MERCADANTE, Maurício. Uma década de debate e negociação: a história da elaboração da Lei do


SNUC. In: BENJAMIN, Antonio Herman (org.). Direito ambiental das áreas protegidas: o
regime jurídico das unidades de conservação. Rio de Janeiro: Forense Universitária, p. 190-231,
2001.

MOREIRA, Eliane. Conhecimentos tradicionais e sua proteção. T&C Amazônia, 11, p. 33-41,
2007.

PORTO-GONÇALVES, C. W. Temporalidades amazônicas: uma contribuição à Ecologia Política.


Desenvolvimento e Meio Ambiente, n. 17, p. 21-31, jan./jun. 2008. Editora UFPR.

SILVA, D. W. et al. Extrativismo e desenvolvimento no contexto da Amazônia brasileira.


Desenvolv. Meio Ambiente, v. 38, p. 557-577, agosto 2016.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS- ONU, 1992. Convenção sobre Diversidade Biológica
(CDB). Disponível em: https://www.mma.gov.br/estruturas/sbf_dpg/_arquivos/cdbport.pdf . Acesso
em 30/10/2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PLANOS DE MANEJO DAS ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL


MARINHAS DO ESTADO DE SÃO PAULO E PARTICIPAÇÃO SOCIAL
SÃO PAULO STATE MARINE ENVIRONMENTAL PROTECTED AREAS: THE
EXPERIENCE OF ENCOURAGING SOCIAL PARTICIPATION FOR THE MANAGEMENT
PLANS CONSTRUCTION

Henrique Callori Kefalas*, Lucila Pinsard Vianna*,Fábio dos Santos Motta**

Instituto Linha D’Água, São Paulo, Brasil*


Laboratório de Ecologia e Conservação Marinha, Instituto do Mar, Universidade Federal de São Paulo, Campus
Baixada Santista, Brasil***

1. INTRODUÇÃO
A participação social é elemento fundamental na democracia. Em áreas complexas como a
daspolíticas ambientais voltadas ao oceano, a participação popular possibilita o controle social
sobre as políticas setoriais garantindo a democratização do espaço de discussão em áreas de atuação
restrita a técnicos (BENNETT, 2018). Nesse sentido, o relato de experiência em questão, trata do
fomento à participação social no processo de elaboração dos planos de manejo das três Áreas de
Proteção AmbientalMarinhas (APAM) do Estado de São Paulo, ocorridos em diferentes períodos1.
O plano de manejo é o documento que defineasaçõesaseremexecutadasna Unidade de
Conservação (UC), é um instrumentopor meio do qual a política pública para a conservação
dabiodiversidade éimplementada. Um plano de manejo deve ser, necessariamente, construído, de
maneira participativa, no âmbito dos conselhos gestores da unidade, com a finalidade de ampliar e
buscar novos padrões de participação e responsabilização anteriormente concentrados na mão do
Estado (BRASIL, 2000).
A partir do acompanhamento da construção dos Planos de Manejo no período entre 2014 e
2019 e em diálogo com os atores locais envolvidos com a gestão dessas UCs, o Instituto Linha
D’Água resolveu apoiar a construção dos Planos de Manejo. Tal decisão teve como premissa que as
APAM paulistas são uma importante ferramenta para a gestão dos espaços e recursos de uso
comum, servem enquanto fórum de acolhimento e resolução de conflitos e buscam atender o
interesse público.

2. MATERIALEMÉTODOS
O fomento para a participação social se deu a partir do estabelecimento de relações entre os
atores envolvidos (Figura 1) e foi organizado em três eixos:
1
Os planos de manejo das APAM do Litoral Centro e Litoral Sul foram finalizados em dezembro de 2018 e o plano de
manejo da APAM do Litoral Norte ainda está em fase de elaboração (2019).
730
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

I.Apoio à gestão para mobilização dos representantes dos diferentes segmentos sociais para
participar das reuniões e oficinas de construção dos Planos de Manejo. Através de parcerias com
organizações locais (Instituto Costa Brasilis, Projeto Albatroz), foi realizada a contratação de
mobilizadores e disponibilizado recursos financeiros para o custeio do deslocamento dos
representantes do segmento da Pesca Artesanal para as reuniões e oficinas;
II.Facilitação, sob demanda, de reuniões setoriais com os representantes da pesca artesanal
nas comunidades e territórios, para formalizar as contribuições desse setor para a construção dos
Planos de Manejo. Através do contato e do diálogo estabelecido entre mobilizadores e
representantes da Pesca Artesanal foram identificadas as dúvidas, os esclarecimentos necessários, o
pedido de mediação de reuniões, etc., que tinham o potencial de serem resolvidas a partir da
facilitação das informações sobre o processo de construção dos Planos de Manejo. As pessoas que
facilitaram essas reuniões conhecem e vivem nos territórios onde estão as APAM, além de terem
experiência em mediação de reuniões participativas nos temas da pesca e das políticas públicas.
III. Integração e sistematizaçãodas contribuições das reuniões setoriais facilitadas.
Basicamente, propôs-se a análise da construção de subsídios nos territórios, sistematização das
contribuições de maneira formal e participação nas oficinas participativas. Essa etapa ainda está
sendo realizada no plano de manejo da APAM do Litoral Norte.

Figura 2- Esquema da metodologia e relação entre participantes

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em primeiro lugar é preciso informar que o tempo de elaboração dos planos de manejo foi
diferente nas três APAM. No litoral centro e sul de São Paulo, o processo foi realizado no segundo

731
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

semestre de 2018. Já no litoral norte do estado, a construção do plano de manejo foi adiada em
2018, a pedido dos representantes da pesca artesanal, alegando a impossibilidade de cumprir o
cronograma junto às eleições então em curso no país.No início de2019 o processo foi retomado.
Mesmo assim, houve um novo período de suspensão das atividades, devido às negociações internas
do órgão gestor da UC, tendo ocorridoa nova retomada em agosto de 2019, e as atividades ainda
estão em andamento.
Portanto, a metodologia descrita foi concluída nas APAM do Litoral Centro e do Litoral Sul.
Na APAM do Litoral Norte o plano de manejo ainda está em elaboração e, por consequência, o
terceiro eixo, de integração e sistematização das contribuições, está em desenvolvimento para todas
as APAM.
O apoio à gestão para a mobilização dos representantes sociais foi realizado nas três APAM.
De maneira geral, a estratégia se mostrou falha. Como a escolha desses representantes se deu em
2016, muitas pessoas contatadas relataram não haver mais interesse em participar do processo.
Poucos atores (menos de 25% do total dos representantes eleitos) demonstraram o interesse de
participarnas oficinas realizadas em 2018. No litoral norte, com a suspensão do processo, a
mobilização dos representantes foi muito prejudicada, sendo que, em 2019, essa estratégia foi
descontinuada. Apesar dos parcos avanços nesse eixo de atuação, a mobilização se mostrou
oportuna para apresentação da possibilidade de reuniões setoriais facilitadas, o que deu condições
para a realização do segundo eixo.
Nas APAM do Litoral Centro e Sul foram realizadas, no total, 23 reuniões setoriais
conduzidas pelos agentes sócio técnicos. Dessas, 11 aconteceram no litoral centro e 12 no litoral sul
do estado. O número médio de participantes em cada reunião foi de 10 pessoas. Outras reuniões
setoriais foram agendadas em parceria com a gestão das unidades, sendo que as primeiras reuniões
serviram para identificar as principais demandas e dúvidas e as seguintes buscavam dirimir essas
questões e avançar para diálogos propositivos, envolvendo sugestões de zoneamento e programas
de gestão.
Na APAM do Litoral Norte a proposta tomou novos contornos. Ao invés do facilitador ser
um agente sócio técnico, optou-se por um projeto de formação de algumas lideranças da pesca
artesanal local, para que esses pudessem fazer a facilitação de reuniões com seus pares. O resultado
dessa inciativa, em termos quantitativos, foi semelhante ao das outras regiões do litoral paulista. O
número médio de participantes por reunião foi pouco superior (12) e foram realizadas 8 reuniões,
abrangendo apenas o município de Ubatuba – SP.
Atualmente, os planos de manejo das APAM Litoral Centro e Sul foram aprovados pelos
conselhos gestores das unidades e pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA). Falta
ainda o decreto executivo do governador de São Paulo e a publicação do mesmo em diário oficial.
732
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O plano de manejo da APAM do Litoral Norte segue em elaboração e tem a previsão de ser
finalizado em novembro de 2019.

4. CONCLUSÃO
Buscou-se ampliar as condições e a qualidade da participação social na elaboração dos
Planos de Manejo. Desde o princípio, o Instituto Linha D’Água oportunizou o protagonismo da
sociedade civil organizada, através de um processo de informação voltado às comunidades da pesca
artesanal.Com isso, um maior número de atores locais pode compreender econtribuir com as
decisões que estavam sendo tomadas no âmbito da gestão territorial marinha e costeira do litoral
paulista.
No entanto, para que a participação possa exercer um papel relevante de controle social, é
preciso planejar essas iniciativas levando em consideração os diferentes grupos sociais que se
pretende envolver. Ainda, orçamento e assessorias especializadas devem ser considerados a fim de
que as propostas metodológicas sejam implementadas de maneira satisfatória e que possa promover
uma interação de saberes que seja reconhecida e legitimada por aqueles que se propõe a participar.

5. REFERÊNCIAS
BENNETT, N.J. Navigating a just and inclusive path towards sustainable oceans. Marine
Policy, 2018.https://doi.org/10.1016/j.marpol.2018.06.001

BRASIL, Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos
I,II,IIIeVIIdaConstituiçãoFederal,instituioSistemaNacionaldeUnidades deConservação daNatureza
e dáoutras providências.

733
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

DESAFIOS A GESTÃO PESQUEIRA COMPARTILHADA: CONFLITOS


COM A PESCA DE EMALHE NA APAS MARINHAS DE SÃO PAULO
Letícia Quito1; Jocemar Tomasino Mendonça2; Mayra Jankowsky3
1
Fundação Florestal/SIMA/SP, leticiaq@fflorestal.sp.gov.br; 2 Instituto de Pesca/APTA/SAA/SP,
jocemar.mendonca@gmail.com; 3 Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa do Agronegócio/SP,
mayra.jankowsky@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
As redes de emalhe são um dos aparelhos de pesca mais primitivos, havendo registros de seu
uso desde o período neolítico (Diegues, 1983). No litoral sudeste-sul é o aparelho mais utilizado,
sendo importante tanto para a pesca industrial como artesanal e vem ganhando importância nos
últimos anos em razão ao custo de operação mais reduzido em relação a outros aparelhos (Valentini
e Pezzuto, 2006).
No litoral de São Paulo o emalhe é amplamente utilizado, principalmente pela frota artesanal
que pode chegar a envolver mais de 90% dos pescadores artesanais, como ocorre no litoral sul do
estado (Mendonça e Lucena, 2014). Com o elevado esforço pesqueiro, principalmente na área
costeira e devido às capturas ocorrerem sobre grandes volumes de espécies demersais, surgiu a
necessidade de ordenamento da atividade, visando a sustentabilidade das pescarias (Tomás, 2006),
além do fato da modalidade apresentar grandes variações físicas e operacionais e de envolver um
grande número de pessoas, gerando uma expressiva produção pesqueira (Ávila Da Silva e Paiva,
2011).
Normativas que buscam o ordenamento da pesca de emalhe têm sido publicadas há muito
tempo. De 1998 até o momento, foram criadas oito normativas que estão em vigor no litoral de São
Paulo, sendo sete federais e uma estadual. Estas normatizam aspectos como a estruturas das redes,
categorizam o uso conforme características da embarcação, estabelecem áreas e período de pesca,
além de proporem a criação de grupos de trabalho para debater e estabelecer medidas de gestão da
pesca de emalhe em águas jurisdicionais brasileiras. Embora bastante completas, algumas das
legislações federais vigentes têm trazido grandes conflitos com o setor pesqueiro, principalmente
artesanal pelo fato de, em sua maioria, abrangerem uma escala espacial regional (regiões Sudeste e
Sul) e acabarem por não considerar particularidades da pesca em escala local.
O presente trabalho visa descrever a pesca de emalhe no litoral paulista e as medidas de
discussão sobre a legislação em vigor, visando sua adequação para diminuir os conflitos existentes e

734
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

buscar melhor eficiência de proteção dos recursos pesqueiros e da fauna por meio da gestão
participativa em Unidades de Conservação do litoral de São Paulo.
2. METODOLOGIA
O trabalho foi desenvolvido no litoral do estado de São Paulo com dados do período de
2009 a 2019, sendo que as informações da caracterização de pesca de emalhe foi realizada no
período de 2008 a 2018. As informações de produção, área de pesca e número de unidades
produtivas que utilizam redes de emalhe foram obtidas através de entrevistas nos pontos de
desembarque, pontos de escoamento e/ou com o próprio pescador, conforme metodologia de
Mendonça e Cordeiro (2010) e Jankowsky et al. (2017). Os desembarques foram separados por área
de pesca, com o georreferenciamento de cada desembarque, sendo divididos pelo tipo de pesca
(artesanal e industrial) e local de pesca (estuarino, costeiro).
As discussões sobre o ordenamento pesqueiro foram desenvolvidas por meio de reuniões
dos Conselhos Gestores e das Câmaras Temáticas (CT) de Pesca que envolvem atores dos 15
municípios abrangidos pelas três Áreas de Proteção Ambiental Marinhas (APAMs) do litoral
paulista (APA Marinha do Litoral Norte, APA Marinha do Litoral Centro e APA Marinha do
Litoral Sul). Há 11 anos as CT Pesca atuam como fórum de encontros do setor produtivo,
comunidades caiçaras, especialistas e pesquisadores do tema, gestores públicos dos três níveis
federativos e demais interessados. Buscando conciliar a conservação ambiental com a garantia da
função social, as propostas elaboradas pela CT Pesca são fruto de esforço coletivo que alia o
conhecimento técnico-científico e os saberes dos atores locais. As propostas são levadas para a
discussão nos Conselhos Gestores e, uma vez aprovadas, são encaminhadas às instâncias de
decisão, sejam elas no âmbito estadual ou federal. Desde 2010 as CT Pesca das APAMs debatem
medidas para o ordenamento pesca de emalhe e em 2019, foi criado um Grupo de Trabalho
Integrado das três APAMs visando otimizar as discussões e buscar soluções conjuntas para a
resolução dos conflitos envolvendo esta arte de pesca. Todas as discussões e encaminhamentos
realizados nesses fóruns foram documentados por meio de atas das reuniões.

3. RESULTADOS
No período de 2009 a 2018 as descargas médias de pescado do litoral paulista foi de 22,1
mil toneladas, sendo que 19,6% são oriundas da pesca com redes de emalhe (4,3 t ± 0,6 t), sendo o
terceiro aparelho de pesca mais utilizado em volume descarregado no litoral. Em todo o litoral os
municípios que mais contribuem com as descargas com redes de emalhe são Cananéia (41,8%),
Iguape (18,1%), Ubatuba (16,7%) e Santos/Guarujá (11,2%). As descargas médias mensais de redes
de emalhe, no período de estudo, ficaram entre 285 a 485 toneladas, com os meses de outubro a
dezembro como os mais produtivos. As espécies mais descarregadas pelas unidades produtivas que
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

trabalham com redes de emalhe foram corvina (Micropogonias furnieri), pescada-foguete


(Macrodon ancylodon), manjuba-de-iguape (Lepidentostole anchoviella), mistura (peixes diversos
de baixo valor econômico) e betara (Menticirrhus sp.) que contribuíram com 62% da descargas, em
média.
A pesca artesanal contribui com 59% do volume descarregado oriundo da pesca com redes
de emalhe no litoral paulista e a industrial com 41%, sendo que o número de unidades produtivas
(pescador ou embarcação) somou 5933 unidades no período de 2009 a 2018 que trabalharam com
rede de emalhe. Este valor de unidades produtivas perfaz, em média 61,3% das unidades produtivas
pesqueiras do litoral paulista. Ou seja, embora a pesca com rede de emalhe contribua com próximo
de 20% do volume descarregado no litoral, as unidades produtivas contribuem com mais de 60%
dos que trabalham na região.
As redes de emalhe no litoral paulista são utilizadas de várias formas, sendo, em geral
encontradas as rede de emalhe de fundo, emalhe de praia, emalhe de superfície, emalhe de deriva de
superfície, rede feiticeira e rede estaqueada. Estas redes apresentam diferentes tamanhos de malha
de acordo com o pescado alvo. Essas diferentes formas de utilização das redes de emalhe e o fato
das normas vigentes não abordarem as especificidades de cada uma delas, acarretam em
incompatibilidades com a realidade local e consequentemente, em dificuldades quanto ao
cumprimento das normas pelos pescadores artesanais de São Paulo, o que acaba por marginalizar a
pesca artesanal.
Nos diversos encontros participativos proporcionados pela gestão das APAMs, os
pescadores apontaram a necessidade de propor medidas que solucionem os conflitos,
principalmente relacionados às normas federais, em especial à INI MPA/MMA nº 12/2012 que
regulamenta a pesca de emalhe de fundo e à IN IBAMA nº 166/2007 que regulamenta a pesca de
emalhe de superfície. Diante da importância da pesca de emalhe para os pescadores artesanais de
São Paulo e com base na caracterização da atividade por meio dos dados obtidos com o
monitoramento pesqueiro, foram realizadas discussões e levantamentos de informações, resultando
na elaboração de laudos técnicos, moções e deliberações dos Conselhos Gestores que subsidiaram
propostas encaminhadas aos ministérios responsáveis pela pesca. No caso específico da INI
MPA/MMA nº 12/2012, em 2014 e 2016 foram enviadas propostas de adequações ao Artigo 6º e
cobrada a criação e implementação do Grupo de Trabalho Estadual (GTE) previsto na referida
norma. Esses pedidos foram reiterados em anos subsequentes e novamente pautados em 2018 pelas
APAMs na 5ª Sessão Ordinária do Comitê Permanente de Gestão e Uso Sustentável dos Recursos
Pelágicos do SE/Sul (CPG Pelágicos SE-SS) quando foi reconhecido como legítimo e tecnicamente
adequado o pleito do estado de São Paulo, o que resultou na decisão de dar prosseguimento à
tramitação para a publicação de Instrução Normativa conjunta (MMA/MAPA) do ajuste proposto.
736
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Entretanto, até o presente momento, ainda não foi publicado tal ato normativo, tampouco os GTEs
foram criados. No caso da IN IBAMA nº 166/2007, foi solicitada a suspensão temporária da
aplicação dos Artigos 2º e 3º até a criação do GTE para propor nova normativa, compatível com as
pescarias locais. Diante da não criação dos GTEs no âmbito federal, em 2019, capitaneado pela
gestão das APAs Marinhas, foi criado um Grupo de Trabalho Integrado reunindo membros das três
Câmaras Temáticas de Pesca e outros atores convidados para debater possíveis soluções para esses
conflitos e diminuir as divergências entre a atividade e a legislação em vigor sobre as pescarias
praticadas com redes de emalhe, bem como para discutir estratégias para cobrar que sejam dados
devidos encaminhamentos pelos órgãos federais.

4. DISCUSSÃO
Considerando que a efetividade da gestão pesqueira ocorra em sistemas de gestão
compartilhados (Seixas et al., 2005; Berkes et al., 2006), a existência das CT Pesca das APAMs e
formação de um Grupo de Trabalho Integrado envolvendo os atores envolvidos junto ao poder
público, indica uma trajetória condizente com a gestão efetiva. No entanto, as maiores restrições
vivenciadas pelos pescadores de São Paulo, atualmente são impostas pelo poder público federal.
Ao contrário do esperado, durante o período em que houve um Ministério de Pesca e
Aquicultura (MPA), a pesca artesanal não teve a devida atenção, tendo sido valorizado a pesca
industrial oceânica e a aquicultura (Azevedo e Pierre, 2014). Após a extinção do MPA, a
responsabilidade sobre a gestão pesqueira mudou seguidamente, passando pelo MAPA, Ministério
da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), Secretarias Especial de Pesca da Presidência da
República (SEAP), estando hoje ligada novamente ao MAPA como Secretaria de Aquicultura e
Pesca (SAP).
Uma das medidas da atual gestão foi a extinção dos fóruns participativos de gestão da pesca,
os Comitês Permanentes de Gestão (CPGs). Assim, o que se nota é a dificuldade de avançar na
agenda regional de gestão. Ainda que não haja um modelo fechado de como seria a gestão
pesqueira ideal, estudos apontam para a complexidade do tema e indicam que sistemas de gestão
locais são melhor sucedidos (Ostrom, 2009). Além disso, observando as instituições que regulam a
pesca, a adoção sistemas que abordem o maior número de princípios institucionais (Ostrom, 1990)
são mais eficientes (Baggio et al., 2014). Dentre estes princípios, podemos apontar que hoje há um
fórum que reconhece o direito dos pescadores artesanais, havendo espaço para o diálogo e
construção conjunta de normativas. Entretanto, apesar dos esforços realizados pelas APAMs para o
estabelecimentos de medidas adequadas aos usuários e compatíveis com os objetivos da gestão,
fatores como a não adequação das normas às particularidades e características da pesca em esfera
local e a morosidade para a tomada de decisões pelos órgãos responsáveis continuam a contribuir
737
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

para geração de conflitos com o setor pesqueiro, trazendo prejuízos sociais com reflexos diretos na
eficiência da gestão e conservação do território. Diante disso, ainda que esforços de gestão
compartilhada estejam sendo empreendidos pelas APAMs, os espaços de discussão sobre a pesca
têm demorado a ser legitimados, uma vez que as conexões entre as diversas escalas de gestão se dá
de forma lenta e vem sofrendo modificações constantes.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÁVILA-DA-SILVA A.O.; PAIVA J. Análise dos padrões de captura com redes de emalhar no
Estado de São Paulo. Anais In... V Simpósio Brasileiro de Oceanografia. Oceanografia e Políticas
Públicas. Santos, SP. 2011.

AZEVEDO, N.T.; PIERRI, N. A política pesqueira no Brasil (2003-2011): a escolha pelo


crescimento produtivo e o lugar da pesca artesanal. Desenvolvimento e Meio Ambiente, 32, 61-80,
2014.

BAGGIO, J.A.; BARNETT, A.J.; PEREZ-IBARA, I.; BRADY, U.; RATAJCZYK, E.; ROLLINS,
N.; RUBINÕS, C.; SHIN, H.C.; Y.U, D.J.; AGGARWAL, R.; ANDERIES, J.M.; JANSSEN, M.A.
Explaining success and failure in the commons: the configural nature of Ostrom´s institutional
design principles. International Journal of the Commons. V 10 (2), 417-439. 2016

BERKES, F.; MAHON, R.; MCCONNEY, P.; POLLNAC, R.; POMEROY, R. (authors English
version). KALIKOSKI, D.C. (Org. Portuguese version). Gestão da pesca de pequena escala:
diretrizes e métodos alternativos, Ed. Furg (Brasil) & IDRC (Canada), Rio Grande, 360 p. 2006.

DIEGUES, A.C.S. Pescadores, camponeses e trabalhadores do mar. Ed. Ática, Série Ensaios,
São Paulo, nº 94, 287 p. 1983.

JANKOWSKY, M; MENDONÇA, J.T.; MORRONI, D.A. Monitoramento Pesqueiro no Litoral do


Paraná. In; Denardin, V.F. Anais In... II Simpósio Brasileiro de Desenvolvimento Territorial
Sustentável. 2017.

MENDONÇA, J.T.; CORDEIRO, A.G. Estatística Pesqueira do Litoral Sul de São Paulo -
Metodologia e Resultados. In: SILVA, R.B. e MING, L.C. (eds) Relatos de Pesquisas e Outras
Experiências Vividas No Vale do Ribeira. Capítulo 9: 171-190. 2010.

MENDONÇA, J.T.; PEREIRA, A.L. Management of gillnet fisheries in the south coast of the state
of São Paulo, Brazil. An Acad Bras Cienc,vol. 86, no. 3, p. 1227-1237. 2011.

OSTROM, E. Governing the commons, The Evolution of Institutions for Collective Action.
Cambridge University Press 302 p. 1990.

SEIXAS, C.S.; KALIKOSKI, D.C., ALMUDI, T., BATISTA; V.S.; COSTA, A.L.; DIOGO, H.L.;
FERREIRA, B.P.; FUTEMA, C.R.T.; MOURA, R.L.; RUFFINO, M.L.; SALLES, R.; THÉ, A.P.G.
Gestão compartilhada do uso de recursos pesqueiros no Brasil: elementos para um programa
nacional. Ambiente & Sociedade. V. 14(1), p. 23-44. 2011.

738
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

VALENTINI, H.; PEZZUTO, P. R. Análise das principais pescarias comerciais da região sudeste-
sul do Brasil com base na produção controlada do período 1986-2004. Série Documentos Revizee:
Score Sul / responsável Carmen Lúcia Del Bianco Rossi-Wongtschowski. 56 p. 2006.

739
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ASPECTOS SOBRE A CRIAÇÃO DO CONSELHO DELIBERATIVO DA


RESEX MARINHA MESTRE LUCINDO
ASPECTS ON THE CREATION OF DELIBERATIVE COUNCIL OF RESEX MESTRE
LUCINDO

Camila Lima de Oliveira*, Rubens Ramos Dias, Lidia Ferreira Amorim**

Geógrafa, Unopar, Brasil.*; Analista Ambiental, ICMBio, Unama, Brasil.**

INTRODUÇÃO
Reserva Extrativista (RESEX) é uma categoria de Unidade de Conservação (UC) de Uso
Sustentável que apresenta a participação como um princípio essencial de sua existência, desde as
etapas de criação, implantação e gestão (BRASIL, 2002; DAGNINO, 2002; ALMEIDA e
PANTOJA, 2004; CUNHA, 2011). O Sistema Nacional de Unidade de Conservação (SNUC), por
meio do Decreto Federal 5.758, regulamenta a inclusão da sociedade na gestão de Áreas Protegidas
como condição essencial para que alcancem seus objetivos (BRASIL, 2006).
As RESEX’s de uso sustentável são utilizadas por populações tradicionais, o governo
federal é quem protege essas áreas, o órgão gestor é o ICMBio – Instituto Chico Mendes
deConservação a Biodiversidade. Logo após a criação das reservas extrativistas tem-se a criação do
conselho deliberativo.
O conselho deliberativo é um importante meio para que a gestão apresente os problemas e
conquistasda RESEX. As reuniões deste conselho preveem a participação da sociedade civil nas
decisões referentes a questões de ordem ambiental, cultural, social e econômica, dentro da Unidade
de conservação e na sua área de influência (BRASIL, 2007).
O conselho deliberativo é a instância de gestão participativa que favorece as negociações e o
exercício da democracia (Loureiro & Cunha, 2008) e pode ser compreendida como instrumento de
governança ambiental por enfatizar as formas de ingresso da base comunitária para a gestão
(Dearden et al., 2005; Kapaciauskaite, 2011).
Esse trabalho concentra-se na ResexMarinha Mestre Lucindo – Pará. O estudo tem como
objetivo apresentar a Criação do Conselho Deliberativo e mostrar as atividades que vêm sendo
desenvolvidas na UC.

METODOLOGIA

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O presente trabalho foi realizado na Reserva Extrativista Marinha Mestre Lucindo –


Marapanim/PA, aRESEX foi criadaatravés do Decreto - s/n - 10/10/2014 com uma área aproximada
de 26.465ha de conservação ambiental.
Mapa 1: Limites da Unidade de Conservação

Fonte: ICMBio

A elaboração deste se deu por meio de pesquisas documentais como: atas e documentos
sobre cada etapa da criação, os mesmos foram disponibilizados pela gestão da unidade. De acordo
com GIL 2008, A pesquisa está em materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou
que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa. Além de analisar os
documentos de “primeira mão” (documentos de arquivos, igrejas, sindicatos, instituições etc.),
existem também aqueles que já foram processados, mas podem receber outras interpretações, como
relatórios de empresas, tabelas etc.

RESULTADOS
Considerando a Instrução Normativa do ICMBio n° 09 de 05/12/2014, foi criado um grupo
de trabalho para dar prosseguimento as etapas de criação do conselho deliberativo. Onde seriam
aplicadas ferramentas de gestão participativa em algumas oficinas de gestão como forma de
identificar as representatividades que fariam parte do conselho.
Para dar inicio a criação do conselho, abriu-se um processo administrativo. Em sua segunda
etapa teve-se uma ação de mapeamento das comunidades, identificando suas localizações frente ao
Mapa da referida UC, assim confirmando as prerrogativas contidas no diagnostico socioambiental,
do agrupamento das comunidades bairros. Agora, com 09 (nove) polos ao total, em que as
comunidades extrativistas usuárias da ResexMestre Lucindo, se fazem representar. Diferenciando a
criação do POLO 9 - denominado Polo Juventude, em atendimento a demanda dos usuários.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Tabela 1. Identificação dos polos

Fonte: Resex Mestre Lucindo

Dando continuidade ao processo, foi realizada uma reunião no polo 04 (quatro) com a
participação de instituições publicas, de ensino e da sociedade civil. Em seguida iniciaram oficinas
de gestão participativa com o objetivo de identificação dos setores do Poder Público e da sociedade
civil que iriam compor o conselho, foi apresentado em uma das oficinas o acontecimento histórico
para Marapanim, que é o exercício da conservação local, com a criação de uma reserva, através do
então presidente da AUREMLUC, Sr. Luiz Gutenberg.
Logo após as oficinas foi cosolidado o uso do território apresentando a identificação do uso
de baixa e alta intensidade, como a pesca artesanal do caranguejo, cata de ostras como o sarnambi,
sururu, pesca do camarão, identificação da agricultura familiar, extração de frutos, mariscagem e
turismo nas praias. Esse uso do território foi acordado através de uma das ferramentas do
diagnostico rápido que é a matriz dos setores e das instituições participativas, para assim haver a
elaboração do relatório final, o plano de trabalho(são todas as atividades que a Resex terá que
desenvolver), publicação da portaria no DOU, e por fim, houve a posse dos novos membros do
conselho deliberativo.Hoje o conselho é formado por uma parte da sociedade civil, instituições
publicas e a gestão do ICMBio.
A gestão com o apoio do conselho vem desenvolvendo trabalhos como: levantamento dos
beneficiários das unidades de conservação (SISFAMILIA), que é um levantamento socioeconômico
que tem como objetivo levar políticas publica para os usuários da unidade, Projeto Monitora de
vegetação e Caranguejo, que tem como objetivo a identificação da vegetação do mangue e analisar
o tamanho da carapaça do caranguejo-uçá, Projeto Voluntariado, visa levar a educação ambiental
para as escolas,educação ambiental, com o seminário anual de saúde da família extrativista,
operação de defeso do caranguejo-uçá, através da conscientização ambiental e ações de fiscalização,
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

entre outras atividades que poderão ser desenvolvidas conforme o plano de ação da gestão. Em
todos os projetos há a participação de moradores locais e a participação da presidência da
AUREMLUC, que tem a frente o Sr. Lourival Fernandes Braga, nas atividades exercidas pela
gestão.

Imagem 1: Levantamento dos Beneficiários Imagem 2: Projeto Monitora

Fonte: Halysson Silva Fonte: Camila Lima

CONCLUSÕES
Conclui-se que uma Unidade de Conservação é de extrema importância para o uso
sustentável dos recursos naturais, e o quão importante é o trabalho da gestão de uma Resex junto ao
conselho deliberativo, juntos trazem benefícios para as unidades, de forma a contribuir com a vida
dos povos tradicionais da comunidade de Marapanim/PA,muitas das vezes são esquecidos pelo
próprio governo. AResex Mestre Lucindo em parceria com a AUREMLUC tem papel fundamental
nas buscas de políticas públicas em beneficio desses povos, que cada vez mais tornar-se um elo
entre gestão e usuários locais em prol do desenvolvimento ambiental, social e cultural que uma
Resex também pode oferecer.

AGRADECIMENTOS
Nossos agradecimentos vão em primeiro lugar a Deus, segundo a SrªLidia Amorim, atual
gestora da Resex Mestre Lucindo, pois nos concedeu documentos importantes para o
desenvolvimento do nosso trabalho, a todos aqueles que colaboraram de forma direta e indireta com
a criação do conselho e principalmente as nossas famílias.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, M.W.B. e PANTOJA, M.C. 2004 Justiça local nas reservas extrativistas. Raízes, 23(1
e 2): 27-41.

BRASIL 2002 DECRETO 4.340 de 22 de agosto de 2002. Regulamenta artigos da Lei 9.985 de 18
de julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza –

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

SNUC, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1, 97: 9. 23/8/2002, Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br>.

BRASIL 2006 DECRETO Nº. 5.758 de 13 de abril de 2006. Institui o Plano Estratégico Nacional
de Áreas Protegidas - PNAP, seus princípios, diretrizes, objetivos e estratégias, e dá outras
providências. Diário Oficial da União, Seção 2, 73: 1. 17/4/2006. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Decreto/D5758.htm>

CUNHA, C.C. 2011 Institucionalização das Reservas Extrativistas: da política agrária a política
ambiental. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA, 15., Curitiba, 2011. Anais
eletrônicos... Curitiba: UFPR. Disponível em:
<http://www.anppas.org.br/encontro5/cd/resumos/GT3-15-77-20100511224756.pdf>

DAGNINO, E. 2002 Sociedade civil e espaços públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra. 304p.

DEADEN, P.; Bennett, M.; Johnston, J (2005) – Trends in Global Protected Area Governance,
1992-2002. Environmental Management, 36 (1):89-100. Doi 10.1007/s00267-004-0131-9

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

KAPACIAUSKAITE, L. (2011) – Environmental Governace in the Baltic Sea Region ande the role
of non-governmental actors. Procedia Social andBehavioralScieces, 14:90-100. Doi
10.1016/j.sbspro.2011.03.027

LOUREIRO, C.F.B.; CUNHA,C.C (2008) – Educação Ambiental e gestão participativa de unidades


de conservação: elementos para se pensara sustentabilidade democrática. Ambiente & Sociedade,
11(2):237-253. Doi:10.1590/S1414-753X2008000200003

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PROUCM EM AÇÃO: ESTRATÉGIAS DE INCENTIVO PARA A


EFETIVIDADE DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO MUNICIPAIS
PROUCM IN ACTION: INCENTIVE STRATEGIES FOR THE EFFECTIVENESS OF
MUNICIPAL PROTECTED AREAS

HívilaPâmella Morais Silva*, Hermógenes Henrique Oliveira Nascimento **,


Renan Gonçalves Pinheiro Guerra ***

Graduanda em Ciências Ambientais, Instituto de Ciências do Mar (LABOMAR), Universidade Federal do Ceará
(UFC), Brasil.*
Célula de Conservação da Diversidade Biológica (CEDIB), Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Ceará, Brasil.**
Célula de Conservação da Diversidade Biológica (CEDIB), Secretaria do Meio Ambiente do Estado do Ceará,
Brasil.***

1. INTRODUÇÃO
Segundo dados do Cadastro Estadual de Unidades de Conservação (CEUC), o panorama de
áreas protegidas por meio de Unidades de Conservação (UC) inseridas no território cearense
representa aproximadamente 7,8% da área do estado. Essa informação traz à baila inúmeros
desafios para a implementação e efetividade de conservação desses espaços protegidos.
Dessa forma, depreende-se que tanto a criação da Unidade de Conservação quanto a gestão
delas é um grande avanço e um passo fundamental para a preservação dos recursos naturais, mas o
desafio de conservar a biodiversidade, não pode ser feito sem a parceria da sociedade. Cada vez
mais se percebe que as estratégias de conservação devem considerar o cenário político e social. A
oportunidade de participação da sociedade na gestão das unidades de conservação, trazida pelo
SNUC, constitui um importante elemento para a sustentabilidade dessas áreas no longo prazo, pois
o apoio público legitima e assegura sua manutenção, já que a sua gestão não é uma tarefa fácil.
Partindo desse pressuposto, a Secretaria de Meio Ambiente – SEMA, desenvolveu desde
2017 o Programa de Incentivo às Unidades de Conservação Municipais (ProUCm), através da
Instrução Normativa nº02/2017, com o objetivo de elevar a qualidade das áreas protegidas no estado
e propor o aumento das Unidades de Conservação, apoiando os municípios tanto na criação quanto
na efetividade da gestão dessas áreas protegidas. O programa irá contribuir para a proteção da
biodiversidade cearense, principalmente da caatinga e para a manutenção de serviços
ecossistêmicos, incentivando a proteção de áreas ambientais relevantes inseridas nos municípios.

Constata-se que a contribuição dos governos locais para a conservação da biodiversidade


tem pouca visibilidade. Os recursos financeiros que dispõem são limitados. Raramente as iniciativas
são integradas nos processos de planejamento e estratégias de desenvolvimento territorial. Além
disso, falta a compreensão e conhecimento sobre a importância das áreas protegidas e medidas de
conservação para o desenvolvimento sustentável local.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Por isso, uma das missões do ProUCm é contribuir para melhorar as condições dos governos
locais para conservar a biodiversidade por meio da gestão efetiva e equitativa das Unidades de
Conservação e de outras medidas de conservação. O Programa centra-se no fortalecimento das
capacidades técnicas e da governança municipal, bem como no papel de implementar o Sistema
Estadual de Unidades de Conservação (SEUC).

2. MATERIAL E MÉTODO

Do ponto de vista da sua natureza, trata-se de uma pesquisa aplicada, pois busca alcançar
resultados que possam ser utilizados na solução de problemas que ocorrem na realidade
(MARCONI; LAKATOS, 2007, p. 20). Caracteriza-se como um estudo teórico-empírico, pois
utiliza tanto dados secundários oriundos de pesquisa bibliográfica quanto dados primários oriundos
de pesquisa de campo nos municípios cearenses.
Quanto à forma de abordagem do problema, classifica-se como uma pesquisa qualitativa, na
medida em que, segundo Silva e Menezes (2001, p. 20):

[…] considera que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é,
um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que
não pode ser traduzido em números. A interpretação dos fenômenos e a atribuição
de significados são básicas no processo de pesquisa qualitativa. Não requer o uso
de métodos e técnicas estatísticas. O ambiente natural é a fonte direta para coleta
de dados e o pesquisador é o instrumento chave. É descritiva. Os pesquisadores
tendem a analisar seus dados indutivamente. O processo e seu significado são os
focos principais de abordagem.

A pesquisa foi desenvolvida em três etapas: pesquisa bibliográfica, pesquisa de campo e


construção de modelo, conforme apresentadas na Figura 01.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 01 - Estrutura metodológica

PESQUISA
Unidades de Conservação
EXPLORAT
ÓRIA Pesquisa
Bibliográfica Governança de áreas protegidas

IUCN – International Union for


ConservationofNature

Processos sobre políticas


Pesquisa de
públicas em Unidades de
Campo Conservação Municipais

PESQUISA Escopo gerencial técnico-


Construção
administrativo do ProUCm
DESCRITIVA do Modelo

Fonte:Elaborado pelo autor(2019)

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Hoje, o Ceará tem 12 (doze) Unidades de Conservação municipais cadastradas no banco de
dados da SEMA. Pouco se comparado às 27 (vinte e sete) áreas estaduais protegidas, segundo dados
do Cadastro Estadual de Unidades de Conservação, coordenado pela Célula de Conservação da
Diversidade Biológica (CEDIB) da Secretaria do Meio Ambiente (SEMA). Com o intuito de
melhorar esse quadro e de elevar a qualidade da gestão de UC nos municípios cearenses, a Sema
lançou o editaldo ProUCm em maio/2018 – Programa de Incentivo às Unidades de Conservação
Municipais.
O ProUCm irá contribuir para a proteção da biodiversidade cearense, principalmente da
caatinga e para a manutenção de serviços ecossistêmicos, mapeando Unidades de Conservação
Municipais já existentes com vistas ao registro no CEUC.
São estratégias do programa: promover a descentralização da gestão de UC; estimular a
criação de Sistemas Municipais de Unidades de Conservação; incluir as áreas relevantes municipais

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

no contexto das áreas prioritárias para a conservação do estado do Ceará; elevar o percentual de UC
do grupo de proteção Integral no Estado do Ceará.
Para participar do processo foi necessário que as prefeituras que têm áreas protegidas
submetessem uma carta proposta à SEMA, via site, com os atributos e características ambientais
importantes da área proposta. O edital selecionou 06 propostas municipais e está apoiando em três
linhas temáticas de atuação: capacitação de agentes locais em gestão e manejo de UC; regularização
de atos legais e formalização de conselho gestor das UC e estudos complementares e redefinição de
poligonais das UC.
Em relação a linha de capacitação de agentes locais, o Programa selecionou o município de
Iguatu que submeteu a proposta da Área de Proteção Ambiental (APA) da Lagoa da Bastiana. A
equipe da CEDIB/SEMA ministrou um curso de duração de 20h, divididos em três dias, para a
Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB) da Prefeitura, outros órgãos e entidades do
município com o objetivo de capacitar os atores envolvidos com a temática da APA sobre os
processos de criação à gestão de Unidades de Conservação.
Já, em se tratando da linha de regularização de atos legais e formalização de conselho gestor.
O ProUCm atuou nos municípios de Crateús e Icapuí com atividades de capacitação para formação
do conselho gestor das UC, Monumento Natural Cavaleiros da Esperança e APA da Praia de Ponta
Grossa, respectivamente.Para esse mesmoeixo foi selecionado também o município de Sobral,
porém com ações voltadas para a regularização dos atos legais da APA do Rosário.
Por fim, foram selecionados os municípios de Araripe e Barbalha, com as respectivas UC,
Parque Ecológico do Araripe e Parque Natural Municipal Luís Fernando Correia Sampaio. A
atuação da SEMA nestas localidades se concentraram em realizar os estudos complementares e
redefinição da poligonal por meio da elaboração de Termos de Referências para ajustar as
necessidades e especificidades de cada UC.

4. CONCLUSÃO
Conclui-se, de forma parcial, que o ProUCm está atingindo as suas metas e objetivos de
acordo com o cronograma de execução estabelecido por um Plano de Ação específico para cada
área. Este acompanhamento se dará por um período de 1 (um) ano na qual os municípios terão total
apoio e suporte da SEMA nas tomadas de decisão sobre possíveis intervenções nas UC municipais,
afim de regularizar e efetivar a gestão dessas áreas protegidas.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

5. AGRADECIMENTOS
Primeiramente, à direção superior da SEMA por apoiar desde o início o Programa. Vale
ressaltar e agradecer o comprometimento de todas as Prefeituras que colaboraram para o sucesso
das atividades realizadas até o momento.

6. REFERÊNCIAS
CEARÁ. Cadastro Estadual de Unidades de Conservação – CEUC. Secretaria do Meio
Ambiente – SEMA. Fortaleza, Setembro. Disponível em:
https://datastudio.google.com/reporting/19F2ts_110C43nbZRVdtRJTB41uV38c0q/page/OKhT.
Acesso em: 21 set. 2019. 2019.

CEARÁ. Instrução Normativa nº 02 de 04 de outubro de 2017. Institui o Programa de Incentivo às


Unidades de Conservação Municipais – ProUCm e estabelece a sua estruturação e seus
procedimentos. Diário Oficial do Estado: série 3, Fortaleza, CE, ano IX, n. 191, p. 70-71, 10 out.
2017.

MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M..Técnicas de pesquisa: planejamento e execução de


pesquisas, amostragens e técnicas de pesquisas, elaboração, análise e interpretação de dados. 6. ed.
3. reimp. São Paulo: Atlas, 2007

SILVA, E. L. de; MENEZES, E. M..Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 2. ed.


rev. Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância da UFSC, 2001.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

AÇÕES DE ORGANIZAÇÃO E PROTAGONISMO DE MULHERES


PESCADORAS NA REGIÃO SUL DO BRASIL
ORGANIZATION AND PROTAGONISM ACTIONS OF FISHING WOMEN IN THE
SOUTH BRAZIL REGION

Janina HukSchamberg *, Maria Aparecida Ferreira **, Carolina Mattosinho de Carvalho


Alvite ***
Bolsista GEF Mar, Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades
Tradicionais, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil(janina.huk@gmail.com )*
Coordenação regional da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos e Comunidades Tradicionais,
Brasil(cidaibiraquera@gmail.com)**
Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais, Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil(carolina.alvite@icmbio.gov.br)***

1. INTRODUÇÃO
O presente relato de experiência apresenta uma síntese das ações de organização e
protagonismo das mulheres pescadoras no âmbito do desenvolvimento do projeto “Fortalecimento
de Organizações e Lideranças da Pesca Artesanal do REVIS Ilha dos Lobos e da APA da Baleia
Franca e Integração Regional”, executado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade (ICMBio), por meio do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da
Sociobiodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT), da Área de Proteção
Ambiental da Baleia Franca (APABF) e do Refúgio de Vida Silvestre da Ilha dos Lobos
(REVISIL), em parceria com a Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e
dos Povos e Comunidades Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (CONFREM). O projeto
integra uma iniciativa nacional protagonizada pela CONFREM no âmbito do Projeto “Áreas
Marinhas e Costeiras Protegidas - GEF Mar” e que busca promover o uso sustentável dos recursos
naturais e a integração das comunidades de pescadores artesanais na gestão das áreas marinhas
protegidas no Brasil.
O projeto teve como objetivogeral promover o fortalecimento institucional da pesca
artesanal e a formação de lideranças, como forma de qualificar a participação social na gestão das
UCs. Foi realizado por meio de ações de organização do planejamento para execução, mobilização
social nos territórios das UCs, capacitações de organizações e lideranças da pesca artesanal, e
eventos de integração regionais.
Não diferente dos demais territórios pesqueiros do mundo, na região sul do Brasil o trabalho
no mar, por muito tempo, tem sido marcado como trabalho e território masculino. A mulher que
trabalha com a pesca conquistou a identidade de pescadora há pouco tempo (Pellegrini, 2003).
Mesmo com a recente visibilização do papel da mulher pescadora na região de desenvolvimento das
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ações do projeto, ao longo da etapa da mobilização social nos territórios da APABF e do REVISIL
era notório o engajamento das pescadoras em todo o cenário da pesca artesanal. Elas se apresentam
como profissionais do setor, que por muitas vezes encontram-se à margem do reconhecimento, do
acesso às políticas públicas, e da segregação das tarefas por elas desenvolvidas, determinadas pela
divisão sexual do trabalho, condicionando a rentabilidade da atividade, que acaba sendo inferior a
do homem, além do desafio de ter que conciliar o trabalho com os afazeres domésticos, incluindo a
educação dos filhos.
Partindo do princípio da equidade de gênero, inspirado em diversas iniciativas Brasil a fora,
e pela necessidade de um espaço de diálogo sobre a temática da mulher, a estratégia doprojeto
previu ações específicas para o envolvimento das mulheres pescadoras em todas as atividades
previstas, oportunizando o espaço de fala, facilitando o acolhimento das demandas específicas de
gênero e dos desafios enfrentadopor elas diariamente.

2. AÇÕES DE ORGANIZAÇÃO E PROTAGONISMO DA MULHER PESCADORA


O exemplo tocante que motivou a discussão em busca da valorização e equidade de gênero é
o protagonismo da mulher no beneficiamento do pescado, além da atuação nos demais afazeres que
envolvem a atividade pesqueira. Assim, num primeiro exercício, tratamos de compreender a
dimensão da pesca no contexto do sul do país, eainda nas especificidades de cada localidade dentro
dos territórios das UCs, tendo em vista que a presença de pescadoras de mar, de praia e de lagoa,
diversificando a arte de pesca, o produto, a forma de comercialização, e ainda a legislação vigente
para regular cada atividade.
A participação de mulheres pescadoras ocorreu em todas as ações de formação de
lideranças, capacitação e integração regional desenvolvidas ao longo do projeto. Cerca de 40
mulheres se envolveram na execução das ações.
Os eventos de formação de lideranças e capacitação em gestão de projetos não contaram
com temáticas específicas sobre a mulher na pesca. No entanto, em todas as discussões o papel da
mulher ficou evidenciado ao longo de toda a cadeia produtiva da pesca artesanal, desde a partir do
ato de extrair o recurso pesqueiro do mar, beneficiar o pescado em terra, além da organização
comunitária e familiar, entre outros.
Na ocasião da 1ª Oficina Regional (Imagem 1), que aconteceu no município de
Tubarão/SCentre os dias 08 à 10 de novembro de 2018, houve uma primeira manifestação pela
formação de um grupo de trabalho sobre a mulher na pesca. Entretanto, diante do interesse das
mulheres presentes na Oficina em participar dos demais GTs que foram propostos ao longo dos
eventos anteriores não se criou um momento específico para reunir as mulheres e debater a
temática.
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Os GTs trataram dedesenvolvimento territorial: poluição e acesso as áreas de uso comum e


pesqueiro, agregação de valor na cadeia produtiva do pescado, gestão e monitoramento da pesca
artesanal em áreas protegidas, e turismo de base comunitária. Contaram com a participação de
atores que vêm atuando em iniciativas semelhantes em outras regiões do país, promovendo assim
troca de experiência e potenciais formas de implementação de ações no território. Permeando os
GTs, foi determinante a atuação das mulheres nas discussões e no planejamento de ações a serem
desenvolvidas ao longo do projeto, tais como a implantação do turismo de base comunitária,
monitoramento da produção pesqueira e estratégias aprimoramento do beneficiamento e
comercialização do pescado.

Imagem1.Participantes da 1ª Oficina Regional

Após este evento, outros encontros foram realizados nos territórios, a 2ª Etapa do Curso de
Formação de Lideranças, que tinha como objetivo aprofundar a discussão acerca da importância da
atuação de lideranças pesqueiras na gestão das áreas protegidas e tomada de decisões sobre o
território. Um segundo evento, o Curso de Gestão Projetos, promoveu a familiarização com o
processo de submissão de projeto a editais, da execução e prestação de contas, na perspectiva de
contemplar o objetivo do Subcomponente de Fortalecimento e Integração da Pesca Artesanal, do
Projeto GEF Mar, que as associações comunitárias sejam protagonistas e executoras dos projetos,
como o exemplo da Associação Mãeda ReservaExtrativistade Canavieiras – AMEX, do Sul da
Bahia.
Permeando as demandas levantadas e as discussões dosGTs, eram fortalecidas as estratégias
para a realização de ações de organização e protagonismo das mulheres pescadoras na região sul do
Brasil, iniciativas tomadas pelas pescadoras, enalteciam as necessidade de ter um GT voltado
exclusivamente para ao tema da equidade de gênero, porém este não poderia conflitar com os
demais, pois tratam de espaços de fala já conquistado para a discussões de demandasatuais do dia a
dia destas trabalhadoras.

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Como resultado do amadurecimento dos temas entre os pescadores e que deveriam serem
aprofundados ao longo da execução das atividades do projeto, a temática da mulher na pesca
artesanal foi incorporada na programação da 2ª Oficina de Integração Regional. O tema foi
abordado na mesa de diálogo de abertura do evento, denominada “O papel da mulher e da juventude
na pesca artesanal”, com a participação da pescadora Ana Paula Oliveira, conselheira da APA Costa
dos Corais (AL/PE) e da Tainara Vidal, da Associação de Catadoras de Mangaba (SE).
Durante a Oficina os participantes priorizaram temáticas para serem desenvolvidas em
trabalhos de grupo. Como resultado dessa priorização, foram selecionados seis temas para
elaboração de ações cooperativas entre o conjunto de pescadores artesanais, sendo elas: i) roteiros
locais de turismo de base comunitária; ii) capacitação em legislação pesqueira e de populações
tradicionais; iii) unidades de processamento e beneficiamento de pescado; iv) cadastramento de
pescadores artesanais e automonitoramento da produção pesqueira; v) fortalecimento de
organizações da pesca e formação de lideranças, e vi) . organização e protagonismo das mulheres
pescadoras na região sul do Brasil.
A seleção da temática de organização e protagonismo das mulheres na pesca foi um
resultado inesperado e que indicou a importância da continuidade das ações voltadas para a
equidade de gênero na pesca artesanal na região sul do Brasil. Estas ações vem sendo chamadas
nesse primeiro momento de Rede de Mulheres do Sul do Brasil (imagem 2) com a proposta de
integrar esta organização regional com as demais iniciativas de articulação de mulheres em outras
regiões, com diferentes níveis de estruturação, como a do Sul da Bahia, Alagoas e Maranhão.

Imagem2. Integrantes de “Rede de Mulheres do Sul do Brasil”

Durante a plenária final da II Oficina, as mulheres presentes se comprometeram em ceder


hospedagem e alimentação para receber as pessoas que vierem de outras localidades e para que
ocorram os encontros entre as pescadoras. Além disso fio criado o grupo no Whatsapp,

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dinamizando a comunicação entre as mulheres pescadoras da região, que passaram a trocar


informações sobre a pesca e demais conhecimentos e práticas. Além disso, cada participante voltou
para seu território como olhar para mais companheiras que queiram aderir ao grupo, ampliando
assim a Rede e expandindo a discussão nos territórios.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das mulheres terem um papel crucial no cotidiano da pesca artesanal, em geral há
uma invisibilidade das suas atividades por parte da sociedade, baixa identidade como pescadora e
muitas vezes seus direitos não são respeitados. Este relato de experiência buscou mostrar os
esforços empreendidos para buscar o envolvimento das mulheres e fortalecer seu protagonismo na
gestão da atividade pesqueira, no âmbito de um projeto de fortalecimento de lideranças da pesca
artesanal em duas UCs da região sul do Brasil. A ação visa, em longo prazo, ampliar a participação
das pescadoras nos espaços de tomada de decisão existentes nos territórios protegidos, promovendo
maior equidade na gestão das UCs.
Traz como desafios a necessidade de fomentar a visibilidade da mulher como pescadora e
criar estratégias para a afirmação das questões de gênero na pesca por meio de políticas públicas
voltadas para este grupo nos territórios da APABF e REVISIL. A inclusão dessa temática nas ações
empreendidas pelo projeto sugere que o estreitamento de laços entre as mulheres de diferentes
localidades contribuiu com a integração regional e deve ser objetivo de continuidade das ações de
integração comunitária e fortalecimento da pesca artesanal a serem empreendidas pelos gestores do
ICMBio e organizações da pesca na região sul do Brasil.

4. REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA
Pellegrini, E. Trabalho feminino na Maricultura de Florianópolis / SC. XI Congresso Brasileiro de
Sociologia. Campinas/SC 2005

754
GT 8
Cultura, biodiversidade,
conhecimentos tradicionais e manejo
comunitário do ambiente
Discutir as relações entre diversidade cultural e biodiversidade, fortalecendo a
importância da base cultural e das subjetividades e significados sobre a natureza
protegida que são intermediados por códigos culturais, usualmente
negligenciados nesse debate. Se pretende fomentar a reflexão sobre a
indissociabilidade entre natureza e cultura, no âmbito de unidades de
conservação e territórios tradicionais e, apoiar o debate sobre a relação entre
conhecimentos tradicionais e biodiversidade envolvendo transformações e
produção das paisagens, mudanças de mentalidades e práticas, transformações
institucionais e memórias territoriais e comunitárias. Nesse contexto um tema
essencial no plano de gestão de áreas protegidas e também para a produção
acadêmica é o conceito de COMUM e as formas de manejo comunitário de
recursos naturais. Essas experiências concretas são expressões de formas não
necessariamente capitalistas de reprodução da vida material e imaterial que
começam a revelar significados novos para a compreensão da convivência
positiva entre unidades de conservação e comunidades humanas.
Este GT inclui uma diversidade de abordagens históricas a respeito da relação
entre a diversidade humana e a diversidade biológica, envolvendo
transformações e produção das paisagens, mudanças de mentalidades e práticas,
transformações institucionais e memórias territoriais e comunitárias.

Coordenadores:
Alexandre Brito (ICMBIO)
Cristiano Ramalho (UFPE)
Ivani Faria (UFAM)
Pedro Silveira (FUNDAJ)
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

QUEIMA EM MOSAICO: COMO O CONHECIMENTO TRADICIONAL


ESTÁ CONTRIBUINDO PARA REDUÇÃO DE INCÊNDIOS NO JALAPÃO,
BRASIL
PATCHMOSAIC BURNING: TRADITIONAL KNOWLEDGE CONTRIBUTION INTO
REDUCE WILDFIRES IN JALAPÃO, BRASIL

Marco Assis Borges*, Máximo Menezes Costa, Ana Carolina Sena Barradas

* Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
A queima em mosaico é uma prática realizada por muitos povos e comunidades tradicionais
que usam o fogo no manejo da paisagem(BILBAO; LEAL; MENDÉZ,2010).Um mosaico de áreas
queimadas representa um padrão de paisagem formado por áreas em diferentes estágios
sucessionais provocados pela passagem do fogo em diferentes regimes.
A abordagem de queimas em mosaico vem inspirando a gestão do fogo em várias áreas
protegidas em savanas tropicais, como na África do Sul (VAN WILGEN, 2009) e Austrália
(RUSSEL-SMITH et al.,2013). Porém, no Brasil, ainda é comum que essa prática ancestral seja
entendida como uma técnica arcaica e de baixa tecnologia, sendo comumente proibida ou
marginalizada (BARRADAS, 2017).
Localizada na região do Jalapão, a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins (ESEC Serra
Geral do Tocantins)é um exemplo deunidade de conservação que vem transformando percepções da
gestão ambiental sobre uso tradicional do fogo no país, impulsionando a incorporação de
conhecimentos tradicionais às práticas gerenciais de manejo do fogo em áreas protegidas no
Cerrado, especialmente no que diz respeito à prescrição de queimas.
Criada em 2001, a ESEC Serra Geral do Tocantins abrange os municípios Mateiros, Ponte
Alta, Almas e Rio da Conceição, no Tocantins, e Formosa do Rio Preto, na Bahia, com cerca de 716
mil hectares (ICMBio, 2017). A unidade de conservação (UC) foi instituída sobre territórios
ocupados há centenas de anos por povos e comunidades tradicionais que, como comum em savanas
tropicais, fazem uso do fogo para práticas produtivas, culturais e, por que não dizer, ecológicas,
dado o manejo da paisagem.
A ESEC Serra Geral do Tocantins é considerada uma UC emblemática e prioritária na
gestão do fogo para o país (BARRADAS, 2017). Não só porque é uma das áreas protegidas que
mais queimam anualmente, representando até 35% da área total queimada em unidades de
conservação de proteção integral da esfera federal, como também porque é uma UC que
marcavanguarda nacional na ampliação do uso do fogo para ações de manejo e conservação da

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

biodiversidade no âmbito da gestão ambiental pública, sendo a primeira UC a elaborar e


implementar formalmente um Plano de Manejo Integrado do Fogo no Brasil.
O objetivo desse trabalho é, a partir da experiência daESEC Serra Geral do Tocantins,
aprofundar reflexões sobre a importância de se reconhecer e integrar conhecimentos tradicionais aos
projetos de conservação da sociobiodiversidade cerratense, no sentido de estimular adoção de
abordagens de gestão mais holísticas e participativas que levem em consideração a complexidade
das relações entre pessoas, fogo e áreas protegidas.

2. MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa essencialmente exploratória e descritiva, que considera também a
experiência pessoal dos autores, que atuam como gestores ambientais pelo Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) lotados na ESEC Serra Geral do Tocantins há quase
dez anos, inclinando o trabalho para um ensaio etnográfico da gestão do fogo nesta unidade de
conservação.
Realizamos levantamento e análise de documentos institucionais e instrumentos de
planejamento e avaliação da gestão do fogo na ESEC Serra Geral do Tocantins, disponíveis nos
seus arquivos físicos e digitais, no sentido de buscar entender como se deu a ampliação do uso do
fogo na UC e identificar as contribuições dos saberes tradicionais.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Desde a criação da ESEC Serra Geral do Tocantins, o fogo tem sido o principal mote de sua
gestão (BARRADAS, 2017). As formações campestres de Cerrado cobrem 80% da área da UC, que
se tornam altamente inflamáveis na estação seca, favorecendo a ocorrência de fogo, que muitas
vezes se transformam em grandes incêndios.
Amplamente utilizado pelas comunidades jalapoeiras, o fogo é considerado uma ferramenta
para manejo de pastagens, abertura de roças, extrativismo do capim-dourado, caça, limpeza de
áreas, proteção de casas e infraestruturas, dentre outros fins.
Contudo, entre 2001 e 2012, a abordagem de gestão do fogo na ESEC Serra Geral do
Tocantinsfoi voltada para exclusão do fogo na UC. Nesse período, o uso do fogo pelas comunidades
tradicionais, apesar de tolerado, era visto pelos órgãos gestores como uma atividade precária e sem
técnica:
“... há décadas as comunidades residentes nos ‘gerais’ utilizam o fogo sem controle [...]” (Memorando
GAB/IBAMA/TO nº 294/2003)

“É sabedor que a ESEC tem problemas com a má utilização do fogo por posseiros e/ou fazendeiros da
Unidade, e em consequência, vários registros de incêndios no interior da área.” (Informação
CGUC/IBAMA nº 16/2004)
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

“Queimadas agrícolas em fazendas no interior e no entorno da UC, com frequência é feita sobre a
vegetação nativa sem qualquer tipo de controle, destruindo grandes extensões de cerrado.” (Planos
Operativos 2008 e 2009)

“O uso sazonal das nascentes dos rios localizados no interior da UC também é um grande problema, já
que a comunidade regional queima indiscriminadamente e ilegalmente essas regiões.” (Plano
Operativo 2008)

“... no município de Mateiros há diversos moradores do entorno da Unidade que a enxergam como uma
terra sem dono e colocam seus pequenos rebanhos dentro da EESGT, o que vemsempre acompanhado de
queimadas sem controle. (Planos de Proteção 2011 e 2012)

Essa percepção negativa do uso do fogo desprezou, por mais de uma década, oportunidades
de incorporar as comunidades locais no projeto de conservação do território da UC.Kull (2002) e
Laris (2002) também observaram que povos e comunidades tradicionais africanas foram acusadas
pelos colonizadores de fazerem mal-uso do fogo e deflagrarem incêndios. Na América do Sul,
Bilbao et al. (2010) indicaram que os gestores do Parque Nacional de Canaima também
acreditavam que os indígenas eram responsáveis pela degradação das terras devido ao uso
inadequado do fogo. No Brasil, o estudo conduzido por Leonel (2000) igualmente aponta a
existência de uma percepção negativa associada ao uso do fogo em terras indígenas, onde os índios
comumente são vistos como incendiários.
A proibição e marginalização do uso do fogo são frequentemente relatadas na literatura
como uma das principais fontes de conflitos socioambientais ligados ao uso e manejo do fogo em
áreas protegidas (KULL 2002; BILBAO; LEAL; MENDÉZ,2010; FALLEIRO; SANTANA;
BERNI, 2016). O manejo integrado do fogo é uma abordagem que vem se destacando como
instrumento de gestão desses conflitos (MYERS 2006).
Myers (2006) é o autor que se consagra na conceituação e descrição de uma abordagem de
gestão do fogo que considera expectativas e objetivos de uso do fogo por povos e comunidades
tradicionais e comunidades agrícolas bem como pela sociedade em diversas escalas, inclusive no
que tange emissões de gases de efeito estufa. Sua obra “Living with fire” apresenta o manejo
integrado do fogo (MIF) como uma abordagem de gestão que associa aspectos ecológicos,
socioeconômicos e técnicos do fogo de forma holística para abordar os problemas sociais e de
conservação e as questões resultantes da queima da vegetação.
Entre 2012 e 2014 a ESEC Serra Geral do Tocantins assumiu o desafio de mudar
paradigmas da gestão do fogo, migrando de uma postura gerencial pirofóbica para outra voltada ao
manejo integrado do fogo. Essa transição foi especialmente forçada pelo protagonismo das
comunidades quilombolas do Jalapão na luta pelos seus direitos de uso da terra, o que inclui,
intrinsecamente, liberdade para uso do fogo.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O rompimento dessa barreira potencializou a ampliação da compreensão dos gestores


ambientais sobre o papel ecológico e social do fogo, que assumiram a necessidade de realizar
queimas prescritas, em mosaico, para diminuir a ocorrência de grandes incêndios, o que aconteceu
em 2014. Essa expectativa vai ao encontro da recomendação proposta pelos ecólogos Martin e
Sapsis (1992), que defendem a adoção de diversos regimes de fogo para favorecimento e
manutenção da biodiversidade pela criação de uma variedade de habitats que podem abrigar
diferentes espécies, tal qual um padrão de queima em mosaico, como já era praticado na região
antes da chegada dos órgãos ambientais. Assim, foi necessário buscar inspiração nas práticas
tradicionais jalapoeiras de uso do fogo, o que se deu tanto no acompanhamento de queimas dos
comunitários como no estabelecimento e monitoramento de termos de compromisso e contratação
de comunitários para realização de queimas prescritas na ESEC.
Apenas cinco anos após o início das prescrições de queimas, o resultado de uma paisagem
mosaicada pela ação do fogo já é perceptível (Figuras 1 e 2) e atualmente tanto os gestores
ambientais como os quilombolas comemoram a erradicação da ocorrência de grandes incêndios
decorrente da desmarginalização do uso do fogo no território.

Figura 1. Padrão de áreas queimadas nos anos Figura 2. Padrão de áreas queimadas nos anos
2013 e 2014 (em vermelho, destaca-se a 2017 e 2018 (destaque para heterogeneidade de
ocorrência de grandes incêndios no auge da habitats: consequência do padrão de queima em
estação mosaico)
seca)

4. CONCLUSÃO
O caso da ESEC Serra Geral do Tocantins nos faz refletir sobrepossibilidades de transformar
e ampliar compreensões institucionais sobre o papel ecológico e social do fogo em áreas protegidas
de Cerrado, de forma a integrar práticas tradicionais às práticas da gestão estatal voltadas ao manejo
do fogo gerando resultados efetivos na proteção da biodiversidade, de forma socialmente justa.

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5. AGRADECIMENTOS
Às comunidades da região do Jalapão, em especial as quilombolas, pelos aprendizados
diários e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

6. REFERÊNCIAS
BARRADAS, Ana Carolina Sena. 2017. A Gestão do Fogo na Estação Ecológica Serra Geral
do Tocantins, Brasil. Dissertação apresentada ao Mestrado Profissional em Biodiversidade em
Unidades de Conservação, Escola Nacional de Botânica Tropical, Instituto de Pesquisas Jardim
Botânico do Rio de Janeiro.

BILBAO, B. A., LEAL, A. V., & MÉNDEZ, C. L. 2010. Indigenous use of fire and forest loss
in Canaima National Park, Venezuela. Assessment of and tools for alternative strategies of fire
management in Pemón indigenous lands. Human Ecology 38(5), 663-673.

FAGUNDES, G. M. 2016. O cru e o combustível. Manipulações do fogo nos gerais do


Jalapão (TO). Projeto de Tese. Departamento de Antropologia. Universidade de Brasília.

FALLEIRO, R. M., SANTANA, M. T., & BERNI, C. R. 2016. As contribuições do Manejo


Integrado do Fogo para o controle dos incêndios florestais nas Terras Indígenas do Brasil.
Biodiversidade Brasileira, 6(2), 88-105.

KULL, C. A. 2002. Madagascar aflame: landscape burning as peasant protest, resistance, or a


resource management tool ? Political Geography 21:927–953.

LARIS, P. 2002. Burning the seasonal mosaic : Preventative burning strategies in the wooded
savanna of Southern Mali. Human Ecology 30:155–186.

MARTIN, R. E., & SAPSIS, D. B. 1992. Fires as agents of biodiversity: pyrodiversity promotes
biodiversity. In Proceedings of the conference on biodiversity of northwest California ecosystems.
Cooperative Extension, University of California, Berkeley.

MYERS, G.F.I., 2006. Living with fire-Sustaning ecosystems & livehoods through integrated
fire management.

RUSSEL-SMITH J., COOK G. D., COOKE P. M., EDWARDS A. C., LENDRUM M., MEYER C.
P. &WHITEHEAD P. J. 2013. Managing fire regimes in north Australian savannas: applying
Aboriginal approaches to contemporary global problems. Frontiers in Ecology and the
Environment 11, e55-e63.

VAN WILGEN, B. W. 2009. The evolution of fire management practices in savanna protected
areas in South Africa. South African Journal of Science, v. 105, n. 9-10, p. 343-349.

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CENTRO DE FORMAÇÃO OLGA BENÁRIO PRESTES – CECAPE: UM


LUGAR TRANFORMADOR DE CONHECIMENTO
Armando Wilson Tafner Junior*

*Graduado em Economia pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Mestre e Doutor pelo Núcleo de Altos
Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA); Docente do Departamento de Sociologia e
Ciência Política da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT)

1. INTRODUÇÃO
Em 1998, trabalhadores camponeses sem-terra, tiveram a inciativa de acampar na beira da
Rodovia BR-163, no perímetro domunicípio de Várzea Grande, região metropolitana de Cuiabá,
localizada no Estado de Mato Grosso na região Centro-Oeste do Brasil, dentro do território da
Amazônia Legal. O acampamento foi denominado de Ezequiel Ramín.

Figura 1 – Mapa de Localização de Várzea Grande

Fonte: Arte G1

Em frente havia uma fazenda improdutiva até então, que empregava apenas 6 trabalhadores,
e devedora da União, denominada de Fazenda Bom Cristal.Em 2004 parte dessa fazenda foi
desapropriada (1.200 hectares, sendo definido que 200 hectares seriam destinados à área verde e 21
hectares à área comum), formando o Assentamento DorcelinaFolador, onde habitam atualmente 33
famílias. Após a ocupação, em 2004, o Movimento Sem Terra (MST) identificou a necessidade de
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

um espaço estratégico, voltado para a capacitação do conjunto das organizações da classe


trabalhadora, e que o representasse de forma jurídica, promovendo parcerias e convênios e que
elaborasse contratos e projetos, orientando toda a burocracia necessária para que os
acampados/assentados da região pudesse atingir melhores níveis estruturais.
Foi na Marcha Nacional de Goiânia à Brasília, em 2005, que a direção nacional e regional
do MST decidiu pela construção do Centro na área comum do assentamento que é de 21 hectares.
Todos militantes, levantaram as construções, caracterizando um Centro Educacional campesino,
com alojamentos, cozinha, biblioteca, salas operacionais utilizada pela direção e casas onde hoje
moram 17 pessoas, sem terra, que trabalham diretamente no estabelecimento que foi batizado de
Centro de Capacitação e Pesquisa Olga Benário Prestes – (CECAPE).
Nesse cenário, surgiu o pensamento em promover no espaço, encontros, seminários,
oficinas, de forma teórica e prática, ligada as atividades agroecológicas, visando alcançar uma
matriz produtiva que possibilite a construção de uma justiça social e ambiental, promovendo um
modo de vida voltado para a equidade social. O objetivo geral desse trabalho, é relatar como as
experiências de transformação do conhecimento, promovidas pelo CECAPE, tem a capacidade de
mudar as expectativas do humano dentro de um assentamento. Para atingir este objetivo geral, três
objetivos específicos foram estabelecidos: demonstrar o histórico de luta daqueles que fizeram o
CECAPE acontecer; explicitar as atividades que ocorrem dentro do CECAPE; dar voz àqueles que
estiveram vivenciando o CECAPE em suas atividades, recebendo as suas percepções.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Para a execução do presente trabalho, incialmente, foi feita uma pesquisa bibliográfica, na
qual verificou-se uma identidade teórica com o materialismo histórico dialético (MARX, 2011), no
qual, a história da CECAPE, remonta a uma resistência a evolução da ordem econômica mundial,
que está voltada para o rompimento do metabolismo homem-natureza. Posteriormente, uma
pesquisa documental foi feita nos arquivos do CECAPE, onde está arquivada todas as capacitações
voltadas à Transformação do Conhecimento pela Racionalidade Ambiental, gerando um horizonte
possível determinado pelo saber da Educação Ambiental (LEFF, 2001).
Entrevistas também foram feitas, com os atores que lutaram pela aquisição da terra, com os
assentados que participam das capacitações, e que são responsáveis por manter a floresta em pé, e
com os colaboradores que são responsáveis pelos eventos. Ilustrações também serão utilizadas para
melhorar a compreensão do leitor.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O CECAPE passou à ser referência na promoção de encontros voltados à Educação
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Ambiental. O CECAPE além de atender as demandas de formação dos trabalhadores rurais também
recebe atividades de organizações urbanas e estudantis na intenção de estabelecer vínculos sociais
entre campo e cidade, garantir um intercâmbio de experiências de vida e de luta, atuando na defesa
dos direitos humanos e na formação popular. As diversas atividades realizadas no CECAPE têm
duração variada, indo de reuniões de apenas um dia e etapas de cursos de formação de até 90 dias.
O CECAPE já realizou eventos com centenas pessoas como o encontro estadual dos assentados
(mais de 320 pessoas); encontro das mulheres do campo (mais de 200 pessoas), encontro dos
amigos da reforma agrária (mais de 150 pessoas); entre outros.
Apesar de ser utilizado, o espaço ainda é um lugar em construção, necessitando de ajuda
para manter seus estabelecimentos. Com ajuda da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT),
foi instituído a Associação dos(as) Amigos(as) do Centro de Formação Olga Benário prestes
(AAMOBEP), que colaboram, não só financeiramente, mas doando também o seu tempo,
colaborando com a Educação Ambiental, implementações de práticas agroecológicas e de Sistemas
Agroflorestais (SAFs), repasse de conhecimento teórico e prático à todos e a todas que participam
dos eventos e cursos educativos que ocorrem no CECAPE.

Figuras 2, 3, 4, 5 e 6 – Estrutura do CECAPE

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A primeira imagem é uma visão panorâmica do CECAPE. Seguindo, da esquerda para a


direita, uma das salas de reuniões, alojamento para 200 pessoas, horta agroecológica e viveiros de
mudas, utilizados para intercâmbio entre assentados e acampados.
Camponeses e camponesas passam a replicar os conhecimentos dentro de seus
assentamentos, promovendo a produção de alimentos em um Estado dominado pela produção de
commodities, estabelecendo uma resistência ao avanço da fronteira agropecuária Amazônia a
dentro.

4. CONCLUSÃO
O atual poder público federal, alicerçado em uma necropolítica, ataca a classe trabalhadora
por meio de decretos, legitimando a violência que vai sendo difundida na sociedade, principalmente
contra os movimentos sociais, exigindo uma organização pessoal e estrutural da classe trabalhadora.
O CECAPE, desde a sua origem, foi estabelecido com o intuito de ser um ponto onde os
assentados e acampados, pudessem se organizar diante da luta pela Reforma Agrária. Tal espaço
passou a atender as demandas da classe trabalhadora, que foram surgindo ao longo do tempo.
Parcerias foram sendo estabelecidas, com Movimentos sindicais, estudantis, com a UFMT, sempre
com o intuito da defesa da Democracia. Faz-se a lembrança, que o CECAPE é mantido pela
solidariedade de militantes que colaboram não só financeiramente, mas com o seu tempo e
dedicação ao espaço.
Diante disso, o CECAPE, passa a ser uma espaço de resistência, de autonomia política, de
emancipação do humano, sempre por meio do conhecimento e pela sua capacitação, voltada à uma
racionalidade ambiental e eqüidade social, sendo uma trincheira a lógica do agronegócio imposto ao
Estado.

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5. AGRADECIMENTOS
Dirijo os agradecimentos á toda a Comunidade do CECAPE e ao Núcleo de Estudos Rurais
(NERU) da UFMT, e solidariedade ao Centro de Formação Paulo Freire em Caruaru que resiste
bravamente, promovendo a transformação do conhecimento.

REFERÊNCIAS
LEFF, H. Epistemologia Ambiental. São Paulo, Cortez, 2001.

MARX, K. O Capital. São Paulo, Boitempo, 2011.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

AVALIAÇÃO PARTICIPANTE DO POTENCIAL DE PRODUTOS


FLORESTAIS NÃO MADEIREIROS NA RDS DO UATUMÃ, AMAZONAS
Otávio Ferrarim Giatti*, Pedro Henrique Mariosa** e Henrique Dos Santos Pereira***
*
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Manaus-AM, Brasil. E-mail: otaviogiatti@gmail.com
**Universidade Federal do Amazonas, Manaus-AM, Brasil. E-mail: pedromariosa@ufam.edu.br
***
Orientador, Universidade Federal do Amazonas, Manaus-AM, Brasil. E-mail: henrique.pereira.ufam@gmail.com

INTRODUÇÃO
Compreender os fatores que condicionam o manejo e a produção sustentáveis de produtos
florestais não madeireiros (PFNMs) no contextosocioeconômicodas áreas protegidas, ou seja, os
seus locais de coleta,o estoque dos produtos, as práticas de manejo, os interesses das populações
tradicionais, os usos dos produtos, o custo de produção, a produtividade, a rentabilidade do trabalho
e a percepção dos moradores sobre a potencialidade dos diferentes produtos, é fundamental para a
elaboração de avaliações mais coerentes sobre a potencialidade dos diferentes PFNMs.
O conceito "Produto Florestal Não Madeireiro" refere-se a todos os materiais biológicos
(frutos, óleos, folhas, fibras, raízes e animais silvestres, entre eles o peixe) extraídos das florestas
nativas, com exceção da madeira (De Beer e McDermott 1989). Porém, neste trabalho abordar-se-
áapenas os produtos de origem vegetal.A prática de coletar PFNMs acontece em diversos países
pelo mundo (Shackleton e Pandey 2014). Na floresta amazônica, a pluriatividade dos moradores ao
realizarem o manejo da agrobiodiversidade, tais como, extrativismo madeireiro e não madeireiro;
caça; pesca; e a agricultura garantem a manutenção de milhares de famílias (Filho 2000; Pereira et
al. 2015).
Para incentivar o fortalecimento da produtivasdos PFNMs que resulte em uma melhora
socioeconômica às comunidades tradicionais, é necessário que as unidades de produção familiar
tenham: interesse em trabalhar com o produto; detenham conhecimento cultural sobre o uso e
beneficiamento dessas espécies;disponham de mão-de-obra e tecnologia de coleta e beneficiamento;
abundância suficiente do produto; que o mercado apresente demanda; existência do mercado(
Homma 2015; Silva, Costa e Pereira 2015).
Mesmo que nas florestas extrativas protegidas exploradas pelas comunidades tradicionais
ainda haja diversidade de subcomponentes do agroecossistema, de produtos ofertados pela natureza
e manejados pelas comunidades tradicionais,há carência e necessidade de implementação de
políticas públicas que propiciem a inclusão produtiva dessas populações e que contemplem a
diversidade cultural e étnica dos povos (Shackleton e Pandey 2014; SEMA 2017).Neste sentido,

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

considerando-se que a categoria Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) é um instrumento


de gestão e política pública que visa à preservação ambiental e melhoria na qualidade de vida das
populações moradoras, a presente pesquisa oferece bases teórico-metodológicas para o auxílio na
tomada de decisão quanto à implementação da gestão territorial da RDS do Uatumã. Para tanto, o
objetivo desta pesquisa é avaliar o potencial socioeconômico dos 6 principais PFNMs
comercializados pelas famílias residentes. Desse modo, busca-se avaliar o extrativismo vegetal
enquanto atividade econômica sustentável, na percepção das unidades familiares da RDS do
Uatumã.

METODOLOGIA
O estudo foi realizado na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã, criada em
2004 a partir da assinatura do decreto 295 de 25/06/04. A RDS possui 424.425ha-1 e está localizada
a 200 km ao nordeste da cidade de Manaus, entre as coordenadas 59º 10` 58, 4` Sul e 2º 27` 2, 4`
Oeste.A coleta de dados ocorreu em 2018 durante quatrovisitas nos períodos de 11 de janeiro a 10
de fevereiro; 5 a 20 de março; 13 a 24 de abril; e de 19 a 26 de junho. Os dados foram coletados
através de entrevistas semiestruturadas com 23 unidades familiares (UF) de seis comunidades que
comercializam PFNMs.
As entrevistas estruturadas foram realizadas com auxílio de formulários com o intuitode se
avaliara percepção das unidades familiares quanto aos pontos fortes e fracos de cada produto
extrativo de maior importância comercial na Reserva. Foram selecionados nove indicadores de
potencial: preço comercializado, demanda de comercialização, tempo gasto com a atividade,
distância da área de coleta, abundância do produto, sazonalidade do produto, perecibilidade do
produto, dificuldade de trabalhar com o produto e regime de posse (comunitária ou particular). Com
exceção do último indicador, que foi avaliado em apenas dois níveis, médio (2) quando a área está
em áreas comunitárias, e bom (3), quando em áreas particulares, os demais indicadores foram
avaliados em uma escala de três níveis: ruim (1), médio (2) e bom (3).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Potencial dos produtos - Indicadores de tomadas-de-decisão
O óleo-de-copaíba (Copaifera spp.) foi o produto comercializado melhor avaliado (FIGURA
1) entre os entrevistados.Todos indicadores obtiveram média acima de dois (médio). Quando as
familiares coletoras de copaíba foram questionadas sobre a preferência por estePFNM, foram
unânimes em afirmarque a copaíba apresenta maior potencial por sua produção ser contínua (i.e.,
não sujeita a sazonalidades), não perecível e haver alta demanda pelo produto. No entanto,
registrou-se um baixo número de unidades familiares que trabalham com a copaíba. Tal fato parece
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

estar relacionado ao não conhecimento da prática.Treze entrevistados alegaram nunca ter trabalhado
com o produto.

Figura 1 - Avaliação dos Indicadores de Percepção das Unidades Familiares sobre os PFNMs

Como segundo produto melhor avaliado, o breu (espécies da família burseraceae)também


apresentou os indicadores com média acima de dois. Porém, o indicador “demanda de
comercialização” foi avaliado como “bom” (3) por três famílias que relacionaram a alta demanda
existente em Itacoatiara, enquanto que nas cidades próximas da RDS há poucos compradores, como
afirma um dos três entrevistados: “tem muito comprador de breu, mas lá em Itacoatiara. Aqui perto,
acho que tem um por cidade” (Entrevista realizada com unidade familiar do Caribi, em 15 de abril
de 2018).
Apesar de ter sido avaliado com alto preço, o fruto do tucumã (Astrocaryum aculeatum)
apresentou demanda inferior ao nível médio, devido a duas famílias de Maracarana e uma família
do Livramento avaliarem não haver demanda para comprar tucumã dentro da RDS, no porto das
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

comunidades. Outros indicadores importantes foram: a alta perecibilidade do fruto, que resulta em
perda da maioria da produção; e a dificuldade de trabalhar com a espécie devido ao perigo de se
cortar com os espinhos, como relata uma família de Maracana: “Tirar o tucumã é muito trabalhoso e
perigoso, tem que tomar muito cuidado para não se furar” (Entrevista realizada em 19 de março de
2018).
Os entrevistados avaliaram o trabalho com artesanatos de cipós (Cipó-titica, Heteropsis
flexuosa; cipó Ambé, Philodendron spp. ) como difícil e demorado.Além disso, julgaram o preço e
a demanda como médios. Apesar dessas avaliações, metade dos entrevistados alegaram gostar de
trabalhar com cipó, pois gostam de tecer e realizam o trabalho em casa: “Eu gosto de tecer e posso
trabalhar aqui em casa, sentada na sombra e cuidando das crianças e das outras coisas”(Entrevista
realizada com família de Jacarequara em 29 de janeiro de 2018).
O óleo de andiroba (Carapa guianensis) foi avaliado por duas unidades como produto de
abundância média devido àpequena quantidade de sementes produzidas nos sítios dessas unidades
familiares, e não pela quantidade de óleo produzido. Outros fatores importantes foram levantados
por um produtor que compara a andiroba ao tucumã ao se referir à comercialização do óleo ocorrida
em 2017, quando vendeu o produto no porto de sua casa: “eu prefiro a andiroba, apesar de ser mais
trabalhoso, é mais rentável e menos perigoso e eu vendo aqui em casa, não preciso ir para cidade”.
(Entrevista realizada com unidade familiar de Maracarana, em 20 de janeiro de 2018).
Produto com maior número de unidades famílias produtoras, apesar de apresentar alta
demanda, a castanha (Bertholletia excelsa) teve o preço considerado próximo ao médio. Além
disso, a produção dos ouriços apresenta sazonalidade.O alto número de famílias que coletam a
castanha está relacionado com diferentes processos, como o aprendizado adquirido com os
familiares, a alta demanda e a necessidade de pouca tecnologia para executá-la. As famílias
alegaram não trabalhar com esse produto, principalmente. por não ter acesso aos castanhais.
A dificuldade na obtenção de melhores preços de comercialização indicada para os produtos
estudados é discutido por Nogueira e Santana (2018) em quatro principais fatores: alto número de
extratores, revendedores e compradores que exercem um papel negligenciável sobre o preço dos
produtos; os preços já estarem estabelecidos na cadeia-de-valor; a permeabilidade na cadeia de
valor, onde não há barreiras para entrada ou saída de produtores; a não conscientização do
consumidor sobre origem das castanhas e das populações coletoras.

CONCLUSÕES
Verificou-se a existência do potencial socioeconômico em 6 principais dos 23 PFNMs
registrado na Reserva. Na percepção das famílias quanto aos indicadores do potencial
socioeconômico dos produtos, a copaíba foi o produto melhor avaliado dentre os comercializados,
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

seguido pelo breu. Os outros quatro produtos foram avaliados de modo semelhante. A falta de
conhecimento sobre o manejo da copaíba e dos cipós foram as principais razões alegadas pelos
moradores quenão trabalham com esses produtos, enquanto que para o tucumã e a castanha, o
principal obstáculo para as famílias que não trabalham com esses produtos foi a falta de acesso aos
mesmos.
A dinamização das cadeias de valor desses produtosnecessita ser trabalhada com o
envolvimento, a organização e o apoio do conselho deliberativo, da associação de moradores e das
prefeituras para realização de um planejamento estratégico principalmente das atividades que
envolvem o manejo e comercialização com melhores preços, de modo que se possa desenvolver o
potencial dos PFNMs na RDS, efetivamente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COSTA, F.G; MCGRATH, D.G; PEZZUTI, J.C.B; HOMMA, A.K.O. 2016. Parcerias
institucionais e evolução do extrativismo de jaborandi na Floresta Nacional de Carajás, Pará, Brasil.
Sustentabilidade em Debate - Brasília, v. 7, n.3, p. 91-111, dez/2016.

CRUZ, M.E.G.; SILVA, S.C.P.; COSTA, M.S.B.; PEREIRA, M.C.G. 2015. Mapeamento
participativo e especificações técnicas para uso dos dados cartográficos dos recursos naturais. In
Pereira, H.S.; Pedroza, M.A, - Manaus: EDUA. p 15-22.

DE BEER, J.H.; MCDEMOTT, M. 1989. The Economic Value of Non-Timber Forest Products
in South East Asia. Amsterdam: The Netherlands Committee for IUCN.

FILHO, A.C. 2000. Os principais produtos extrativistas e suas áreas de produção. In: EMPERAIRE,
L (Ed). A floresta em jogo. O extrativismo na Amazônia central. UNESP, São Paulo, p. 91- 98.

HOMMA, A.K.O. 2015. Em favor de uma nova agricultura na Amazônia. In: Terceira Margem:
Amazônia.Outras Expressões – v.1,n.5 p. 59-74.

PEREIRA, H.S.; VINHOTE. M.L.A.; ZINGA, A.F.C.; TAKEDA, W.M. 2015. A


multifuncionalidade da agricultura familiar no Amazonas: desafios para a inovação sustentável. In
Terceira Margem: Amazonia. Ed: Outras Expressões – v.1,n.5 p. 59-74.

SEMA. 2017. Revisão do plano de gestão da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do


Uatumã. Itapiranga, São Sebastião do Uatumã – Amazonas. 115p.

SHACKLETON, C.M., PANDEY, A.K., 2014. Positioning non-timber forest products on the
development agenda. Forest Policy and Economics.38, 7p.

NOGUEIRA E SANTANA. 2018. Influência das chuvas na oferta de castanha-do-brasil e o


impacto no benefício socioeconômico e ambiental, no Oeste do estado do Pará.Desenvolv. Meio
Ambiente, v. 45, p. 215-230, abril 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O MANEJO COMUNITÁRIO DOS RECURSOS NATURAIS E A LUTA


PELO TERRITÓRIO NA LOCALIDADE DE AREAIS DA RIBANCEIRA EM
IMBITUBA, SANTA CATARINA - BRASIL
THE COMMUNITY MANAGEMENT OF NATURAL RESOURCES AND STRUGGLE FOR
TERRITORY IN THE AREAIS DA RIBANCEIRA AREA IN IMBITUBA, SANTA CATARINA –
BRAZIL

Graziela Elias*, Sabrina Baesso Cadorin*, Carlyle Torres Bezerra de Menezes**

Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais,Mestrandas, Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC,


Brasil. * grazizehnder@gmail.com; *bcadorin.sabrina@gmail.com
Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais,Doutor em Engenharia Mineral, Universidade do Extremo Sul
Catarinense - UNESC, Brasil. **cbm@unesc.net

1. INTRODUÇÃO
A relação homem/natureza tem norteado reflexões e discussões acerca das questões
ambientais, principalmente as que envolvem a exploração dos recursos disponíveis.Leff (2001)
explica,que dentro de um território, essa relação está submetida a determinações físicas e ecológicas
ao ato de habitar de uma determinada população humana. Isso significa, que o território é ocupado e
transformado de acordo com as práticas culturais e produtivasdo organismo que o habita, e que o
espaço geográfico é projetado pelos sujeitos sociais, conforme a forma de apropriação que é feita da
natureza para atender suas necessidades.
Neste sentido, nem toda apropriação da natureza é degradadora e destruidora, a julgar o
exemplo das comunidades tradicionais, portadoras de um modo de vida marcado historicamente
pela conservação do meio ambiente. No Brasil, os povos e comunidades tradicionais foram
reconhecidos por meio do Decreto nº 6.040, de 07 de fevereiro de 2007, que institui a Política
Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Este decreto, em
seu Art. 3, conceitua estes grupos como “culturalmente diferenciados e que se reconhecem como
tais, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e
transmitidos pela tradição. ”(CNDH, 2018).
Esterci (2008)discorreque, nos territórios das comunidades tradicionais,o cultivo a terra
ocorre com técnicas de exploração de baixa agressão a natureza e como a produção é voltada
basicamente para o consumo, a coletividade é priorizada, e os recursos naturais são considerados de
uso comum. Nestes casos, segundo Feeny et.al (2001), o acesso à terra é livre e aberto a qualquer
pessoa, estabelecendo o direito da propriedade comunal, em que os recursos são manejados por uma

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

comunidade identificável de usuários interdependentes. Portanto, os direitos aos recursos não são
exclusivos ou transferíveis, mas sim igualitários em relação ao acesso e ao uso.
Frente a este cenário, o presente trabalho resultou de atividades teóricas e práticas de campo
desenvolvidas na disciplina de etnobiologia, ministrada no curso de Pós-Graduação em Ciências
Ambientais da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC), mestrado e doutorado.A
pesquisatem como objetivo reconhecer o modo de vida da comunidade tradicional dos Areais da
Ribanceira em Imbituba (SC) na perspectiva do uso comum dos recursos naturais, por meio de uma
análise histórica e da identificação das práticas de manejo.

2. MATERIAL E MÉTODOS
A pesquisa configurou-se como qualitativa, de caráter descritivo. Quanto aos instrumentos
de pesquisa, para a coleta de dados primários optou-se pela visita a campo com observação direta e
observação participativa, e, para a coleta de dados secundários levantamento e análise bibliográfica.
A análise histórica e contextualização partiu dos dados publicados sobre pesquisas
desenvolvidas nesta comunidade, dentre os quais, os trabalhos desenvolvidos por Mombelli (2013)
e Hanazaki et. al (2012). Estes dois trabalhos discorrem sobre a comunidade, perpassando por
relatos de conflitos, luta pela sobrevivência e reconhecimento, modos de vida e estruturação social,
bem como a proposição da criação neste território de uma unidade de conservação de uso
sustentável, uma RDS – Reserva de Desenvolvimento Sustentável.
Para identificar as práticas de manejo e organização da comunidade tradicional de Areais da
Ribanceira frente ao uso comum dos recursos naturais disponíveis no território em que ocupam,
realizou-se trabalho de campo, com reconhecimento do local e dos recursos naturais utilizados pela
comunidade.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
A região de Areais da Ribanceira está inserida no município de Imbituba,localizado no
litoral centro-sul de Santa Catarina (Figura 1). A cidade possui uma população de aproximadamente
40.000 habitantes e fica a 90 km da capital Florianópolis. A ocupação da região começou a partir de
1715, por colonizadores açorianos e bandeirantes. Na década de 1960, as principais atividades
desenvolvidas eram a agricultura familiar, com destaque para o cultivo de mandioca, e a pesca
artesanal, que se manteve até o final dos anos 1970. A partir deste momento, a comunidade
começou a sofrer pressões com o aumento das atividades turísticas, com a implantação da BR-101 e
com a intensa especulação imobiliária, além da implantação do Complexo Industrial de Imbituba,
na região dos Areais da Ribanceira. Este estímulo ao “progresso” fez com que muitas pessoas

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

fossem para os centros urbanos e para outras atividades econômicas, provocando assim, uma
descaracterização da comunidade (HANAZAKI et.al., 2012).
Figura 3 - Mapa de localização da comunidade de Areais da Ribanceira em Imbituba

(SC).
Fonte: Autores (2019)

A pesquisade Mombelli (2013) relata que ocorreram processos de desterritorialização com


os projetos de desenvolvimento estabelecido pelo Estado, principalmente por parte dos interesses
dos setores industriais, portuários e imobiliários. Por estar situada em uma região litorânea e possuir
o Porto Henrique Lages, Imbituba foi escolhida para implantação de um projeto de ampliação do
complexo carbonífero de Santa Catarina,por meio da instalação de indústrias para aproveitamento
dos resíduos provenientes do beneficiamento do carvão mineral. Com isso, muitas famílias foram
forçadas a deixar as terras que cultivavam para sua subsistência, porque não possuíam documentos
das áreas que ocupavam. Este processo desencadeou inúmeros conflitos, devido a transações
duvidosas, apoiada pelas potências econômicas da região, por meio de uma ação estatal passaram o
domínio das terras de uso comum da comunidade ao domínio privado das empresas. Como
resultado, a comunidade perdeu 96% do território original, onde viviam mais de 2000 famílias, e
hoje,restam menos de 100 famílias que lutam ainda pelo reconhecimento dos seus direitos.
Apesar das ameaças, a comunidade se organizou e fundou a Associação Comunitária Rural
de Imbituba (ACORDI), a fim de se articular e participar de espaços de gestão pública ambiental,
dentre as quais em unidades de conservação já instituídas, tais como a Área de Proteção Ambiental
(APA) da Baleia Franca.Neste contexto, no ano de 2005, a ACORDI propôs a criação de uma
Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) na comunidade de Areais da Ribanceira. A área
proposta para RDS é de aproximadamente 2100 hectares e abrange ambientes de agricultura, de
ecossistemas de restinga e de floresta ombrófila densa, que sãoutilizados para a extração de recursos

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

vegetais não madeireiros, como as plantas medicinais,dentre as quais o butiá (Butia Catarinesis),
espécie nativa endêmica da região, e que se encontra atualmente ameaçada de extinção.
Durante as atividades de campo foi possível perceber os mosaicos formados pelos diferentes
tipos de vegetação, com as roças de mandioca, principal cultivo da comunidade que são integradas
ao ambiente local. As plantações ficam em pontos estratégicos, pois dividem espaço com os
butiazais, que servem de barreira vegetal (quebra-vento) e com áreas de pousio, cujo objetivo é
deixar a terra se regenerar por meio da suspensão do plantio em um determinado tempo, para
crescimento natural da vegetação.
A organização do espaço onde cada família cultiva a mandioca é decidida em reunião, e a
abertura das roças e do plantio ocorre com a colaboraçãode todos, bem como o processamento da
mandioca. Este é realizado em um engenho construído pela ACORDI, onde é produzida a farinha
de mandioca, que serve de base para produção de várias comidas típicas vendidas todo ano na Feira
da Mandioca, principal evento de divulgação da cultura da comunidade (Figura 2).

Figura 2: A) Banner de apresentação da Feira da Mandioca, B) Produtos artesanais e farinha de


mandioca,C) Engenho utilizado pela comunidade para a produção da farinha.

Fonte: Autores (2019).

Todo este patrimônio cultural está ameaçado, devido à perda das terras, muitos agricultores
buscam outras formas de complementação de renda nos centros urbanos.Os poucos que ficam,
veem seus filhos migrarem em busca de outras oportunidades impostas pelo sistema econômico.
Alguns, não abandonam seus cultivos por amor a história, território e tradição.

4. CONCLUSÃO
As comunidades tradicionais,cada uma com suas peculiaridades possuemum modode
viverque é referência no que diz respeito à preservação ambiental. No caso da comunidade
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tradicionalde Areais da Ribanceira, o interesse dos diversos setores econômicos no território onde
realizam suas atividades, ameaça não só a reprodução da tradição das famílias, mas também a
preservação dos recursos naturais existentes na região. A comunidade nos ensina, por meio da
promoção do uso comum, que é possível viver em um ambientalmente equilibrado e saudável.
Frente aos problemas apresentados neste estudo, percebe-se a necessidade do envolvimento de toda
sociedade e de órgãos estratégicos,no engajamento das causas das comunidades tradicionais, dando-
as visibilidade e voz.

5.REFERÊNCIAS
CONSELHONACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS. Povos livres, territórios em luta:
relatório sobre os direitos dos povos e comunidades tradicionais. Brasília, 2018. p. 20-22.
Disponível em: <http://www.dedihc.pr.gov.br/arquivos/File/2018/RELATRIO
SOBREOSDIREITOSDOSPOVOSECOMUNIDADESTRADICIONAISv2.pdf >Acesso em 05 de
setembro de 2019.

ESTERCI, N. Populações tradicionais. In: Almanaque Brasil Socioambiental: Uma nova


perspectiva para entender a situação do Brasil e a nossa contribuição para crise planetária.
São Paulo, 2008, p. 223.

FEENY, D. et al. A tragédia dos comuns: vinte e dois anos depois. In: DIEGUES, A. C.;
MOREIRA, A. C. C. (Orgs.). Espaços e recursos naturais de uso comum. São Paulo:
NUPAUB/LASTROP-USP, 2001, p.21.

FELIPIM, A. P.; RESENDE, R. W.; RIBEIRO, R. J. Agricultura de pousio e controle ambiental. In:
DIEGUES, A. C.; VIANA, V. M. (Org.). Comunidades tradicionais e manejo dos recursos da
mata atlântica. 1. ed. São Paulo: NUPAUB/LASTROP-USP, 2004, p. 114.

HANAZAKI, N.; et al. Etnobotânica nos Areais da Ribanceira de Imbituba: Compreendendo a


Biodiversidade Vegetal Manejada para Subsidiar a Criação de uma Reserva de
Desenvolvimento Sustentável. ICMBIO. Seção: Uso e Manejo de Recursos Vegetais em Unidades
de Conservação, 2012. Disponível em:
<http://www.icmbio.gov.br/revistaeletronica/index.php/BioBR/article/view/273/185> Acesso em:
05 de setembro de 2019.

LEFF, E. Saber Ambiental: Sustentabilidade, Racionalidade, Complexidade e Poder. São


Paulo, 2. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001, p. 282-284.

MOMBELLI, R. Comunidade tradicional dos Areais da Ribanceira, Imbituba (SC):


desenvolvimento, territorialidade e construção de direitos. Estudos sociológicos, v.18 n.35 p.325-
345 jul.-dez. 2013. Disponível em: < https://periodicos.fclar.unesp.br/estudos
/article/view/6457/4766> Acesso em 05 de setembro de 2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONSTRUÇÃO COLETIVA DO PLANO DE USO DOS RECURSOS


(CAMARÃO E PEIXES) DA RESEX PIRAJUBAÉ
Andrea Lamberts*, Dayani Guero *, Heitor Schulz Macedo**

* Analista ambiental da Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé, ICMBio, Brasil


** Analista ambiental da Área de Proteção Ambiental do Anhatomirim, ICMBio, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Este trabalho relata a experiência da realização de oficinas participativas para elaboração dos
Planos Específicos de Uso de Recursos de Peixes e Camarão da Reserva Extrativista Marinha do
Pirajubaé (Resex Pirajubaé), no período compreendido entre os meses de dezembro de 2015 a
setembro de 2019.
A Resex Pirajubaé, criada em 1992, localizada no coração de Florianópolis, é a primeira
Resex Marinha do Brasil, símbolo da resistência da sua população tradicional, em contexto urbano,
pela proteção dos modos de vida, memórias e saberes dos pescadores e pescadoras artesanais.
Existem na Resex artes de pesca únicas, praticadas nos ambientes de águas quentes e rasas,
conhecidas localmente como baixios. A pesca artesanal em ambiente urbano representa o sustento,
segurança alimentar e complemento de renda para os 235 beneficiários cadastrados.
Os trabalhos para construção dos acordos e normativas locais da unidade foram iniciados em
2015, quando eram chamados de Acordo de Gestão, sob a luz da Instrução Normativa (IN) ICMBio
29/2012. Atualmente, a IN ICMBio 29/2012 foi revogada e substituída pela IN ICMBio nº 07/2017,
que estabelece diretrizes e procedimentos para elaboração e revisão de planos de manejo e abre a
possibilidade para planos específicos, como o de uso de recursos.
Durante a 18ª reunião do Conselho Deliberativo (CD), em 05/10/2015, foi deliberado que o
Acordo de Gestão seria construído por recursos (camarão, berbigão, peixes, caranguejo). A primeira
reunião para discutir o Acordo de Gestão dos Peixes ocorreu no dia 09 de janeiro de 2016 com a
presença de 33 pescadores e a segunda reunião ocorreu em 20 de fevereiro de 2016, com 17
pessoas. Para a mobilização, foram distribuídos convites nos ranchos de pesca. Nas reuniões do CD
e em seus grupos de trabalho, os conselheiros representantes da pesca artesanal demonstravam
preocupação com o público que participava das reuniões de regramento. Segundo eles, era
constituído de pessoas que “não pescavam” e que não eram beneficiárias da Resex.
A partir dessa realidade e tendo entendimento da importância da legitimação dos acordos a
serem construídos, a equipe moveu esforço para a construção do Perfil da Família Beneficiária,
formalmente efetivado com a publicação da Portaria ICMBio nº 532/2017. Os beneficiários da
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Resex são hoje subdivididos em três categorias, a saber: Categoria A, caso o beneficiário dependa
prioritariamente dos recursos naturais da UC; Categoria B, caso a atividade exercida pelo
beneficiário seja fonte de renda secundária e suas demais fontes de renda somadas sejam de até
cinco salários mínimos; e Categoria C, para o beneficiário que não seja abrangido pelas categorias
A e B, e que utilize a Resex para manutenção de sua tradição e a transmissão cultural aos seus
descendentes.
No segundo semestre de 2018 iniciou-se a construção dos planos específicos de uso de
recursos. O presente trabalho relata o processo de construção coletiva dos regramentos dos recursos
(peixes e camarões) e os resultados até agora alcançados.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O Grupo de Governança do Plano de Manejo da Resex Pirajubaé decidiu que seriam feitas
oficinas para cada uma das categorias de beneficiários (A, B e C) e que cada uma delas elegeria
três representantes para uma oficina final na qual participariam também instituições de pesquisa, de
fiscalização e de regulação.
Para planejamento das oficinas iniciais, durante o mês de março de 2019 foram realizadas
cinco reuniões preparatórias, entre o Grupo de Governança, os servidores da Resex Pirajubaé e o
moderador, também servidor do ICMBio. Nestas reuniões foram definidas as estratégias de
mobilização, a metodologia das oficinas, além de questões logísticas.
Para as oficinas com as categorias, foi definida a seguinte programação: a) apresentação da
Resex e do processo de elaboração do Plano de Manejo; b) construção coletiva dos regramentos a
partir de cinco perguntas norteadoras: “Quem pode pescar camarão na Resex?”; “Onde pode pescar
camarão na Resex?”; “Como pode pescar camarão na Resex?”; “Quando pode pescar camarão na
Resex?”; “Como apoiar o pescador de camarão da Resex?”; c) Escolha dos três representantes de
cada categoria para oficina geral.
A oficina final teve como sujeitos os três representantes de cada categoria, além de
instituições de pesquisa, de regulação e de fiscalização relacionados à temática. Nesta oficina foram
apresentados os resultados das etapas anteriores, observados os consensos construídos e os
dissensos ainda existentes, além das possibilidades legais de efetivação (ou não) dos regramentos
propostos pelos beneficiários.

3. RESULTADOS
3.1 As oficinas com os pescadores
Foram realizadas no total cinco oficinas com os pescadores, que ocorreram nos meses de
março, abril e maio de 2019.
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Inicialmente colocamos na mesma oficina os pescadores das categorias A e B para discutir o


recurso “camarão”, pois julgávamos que estas duas categorias poderiam ser juntadas por se
contituírem de pescadores que dependem da pesca para a sobrevivência. No entanto, ficou
demonstrado que os beneficiários da Categoria A se sentiam desconfortáveis para propor
regramentos especialmente relacionados à primeira pergunta sobre uso dos recursos, ou seja,
restrições de pesca para outras categorias, então decidiu-se, a pedido deles, que seriam realizadas
novas reuniões, separando as categorias A e B. Nessa primeira reunião também se percebeu a
possibilidade de unir na mesma reunião a discussão sobre peixes e camarões (e não fazer uma
reunião para cada recurso, como anteriormente previsto).
Foram então realizadas duas reuniões com a categoria A (visto que na primeira o quórum foi
baixo), uma com B e uma com C. Em cada uma delas foram eleitos três representantes para
participarem da Oficina de Consolidação da Proposta do Plano de Uso de Recursos (camarão e
peixe).

Oficina de Consolidação da Proposta


Ocorreu em 18/06/2019, com duração de um dia inteiro. A programação iniciou com
apresentação dos participantes, Em seguida, houve uma apresentação do contexto das reservas
extrativistas, sobre o processo de construção do Plano de Uso dos Recursos e os objetivos da
oficina, seguido de uma apresentação sobre legislação pesqueira e a pesca na Resex Pirajubaé.
Após, os participantes foram separados em dois grupos: a) representantes dos beneficiários
da Resex; b) instituições e representantes da pesca. O primeiro grupo buscou a construção de
consensos entre as propostas de regramentos das três categorias (construídas nas oficinas
anteriores), enquanto ao segundo grupo foi apresentado todo o processo e os resultados até agora
alcançados. Na parte da tarde, os grupos voltaram para a plenária, quando foi apresentada e
avaliada a proposta consensuada dos beneficiários para as instituições e demais representantes.

3.2. Participação x categoria


A segunda reunião exclusiva da Categoria A (total 39 beneficiários), cuja mobilização foi
feita pelos próprios pescadores, teve o maior percentual de presença da categoria (31%), sendo
maior que a participação da categoria B (60 beneficiários no total): 25% na reunião com A e B e
30% na segunda reunião exclusiva com B.
A categoria C conta com maior número de beneficiários (74), apresentando maior presença
absoluta (30) e proporcional (41%).

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3.3. Principais propostas


Sobre “quem pode pescar”, a categoria A propõem restringir pesca da categoria C, só
poderia pescar com tarrafa e berimbau. As categorias B e C propuseram a pesca livre para todos e
na oficina final ficou meio termo, C pesca com rede se estiver acompanhado de A e B.
Em relação ao tamanho das malhas, para as redesda arte de pesca caceio de camarão, ficou
consensuado o tamanho de 5cm. Já para a pescaria de camarão com tarrafa, não houve consenso.
Na oficina da Categoria A foram propostos os tamanhos de 18 e 20 carreira/palmo1, sem que
houvesse uma decisão final dos representantes; oficina da categoria B, 20 e 21 carreira/palmo; na
da Categoria C, 21 carreira/palmo. Na oficina de consolidação, os pescadores propuseram o
tamanho de 20 carreira/palmo e as instituições insistiram na necessidade de manter o tamanho já
permitido em lei, 18 carreira/palmo.
Acerca do petrecho chamado “berimbau”, que pode ser interpretado como um arrasto de
fundo, o que é proibido em baías, nas oficinas de pescadores houve o consenso de permitir e
regulamentar o berimbau. Na oficina de consolidação, alguns representantes das instituições de
fiscalização demonstram apreensão quanto à regulamentação do petrecho mas, mesmo assim,
foram analisadas as propostas de regramento das categorias, como o tamanho da malha, número de
petrechos por embarcação e permissão de uso de motor. O entendimento final dos pescadores, não
validado pelas instituições, é de regramentos distintos para locais do território: no baixio, onde se
pesca desembarcado na arte de pesca denominada pegada, o tamanho seria de 20 carreira/palmo e
no restante do território, onde se pesca embarcado, o tamanho mínimo proposto é de 18
carreira/palmo e se poderá utilizar o motor da embarcação.
No caso da rede fundeada, na oficina da categoria A decidiu-se pela proibição da rede
fundeada, que já é proibida. Na oficina da Categoria C, ficou o proposto um tamanho máximo de
comprimento, horário para permissão utilização e formas de iluminação para não atrapalhar a
navegação. Essa proposta de regramentos foi consensuada na oficina de consolidação.
Em relação ao conflito entre caceio e berimbau na localidade chamada no “buraco da
draga”, para a pesca do camarão no local chegou-se ao consenso de regrar as artes de pesca por
horários, restringindo o uso do berimbau nessa localidade entre as 6h até as 14h.

3.4. Regras menos restritivas dentro de unidades de conservação?


Um dos grandes desafios encontrados está relacionado à conciliação entre as propostas de
regramentos e a legislação nacional e regional vigente, que em geral não atende aos usos
tradicionais da comunidade. A conclusão, em muitos casos, é que a legislação em vigor pode

1
O palmo equivale a 22 cm.
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colocar em risco a continuidade dos modos de vida, já que proíbe artes de pesca locais tradicionais.
Como exemplos, temos o uso de redes de emalhe de tamanho de 60 milímetros, tradicionalmente
utilizadas em diversas artes de pesca, como o caceio de camarão e o “caicai” do Pirajubaé (parati);
a proibição, pela Lei Geral da Pesca, do uso de tarrafas pelos pescadores amadores, no caso da
Resex inclui pescadoresda categoria C e que têm a tradição de pescar com redes; conflitos
relacionados entre as propostas e as normas nacionais/regionais acerca das redes fixas, ao tamanho
mínimo do camarão e à prática do berimbau.
Diante deste cenário uma série de dilemas surgem, ao refletirmos sobre a possibilidade de,
no interior de uma reserva extrativista, estarmos propondo normas menos restritivas do que no
exterior. Mas essa visão deve ser relativizada pois, ao mesmo tempo que pode haver uma “maior
permissividade” no que se refere aos petrechos e artes de pesca, esta é acompanhada por uma
restrição no número de usuários, já que não consiste em área de acesso livre. Somente pescadores
cadastrados podem atuar no interior da Resex Pirajubaé.

3.5. Processo de tomada de decisão


Existem cinco pontos que precisam de amadurecimento: proibição pesca nos rios, tamanho
mínimo da malha da tarrafa, permissionamento da rede fundeada, regramentos para berimbau e
proibição de uso de redes pela categoria C. Até o fechamento deste resumo, não foi possível dizer o
encaminhamento final dado aos resultados da Oficina de Consolidação e os passos seguintes.

4. CONCLUSÃO
A Resex Pirajubaé, em seus vinte e sete anos de existência, passou por uma série de
transformações, às quais impactaram e impactam a dinâmica socioambiental de acesso e uso dos
recursos e as comunidades tradicionais que inicialmente a idealizaram. Desta maneira percebe-se
que processos participativos de tomada de decisão na unidade, mais do que produzirem
regramentos, são oportunidades para a reaproximação dos usuários com as estruturas e instituições
formais-legais; oportunidades também de ressignificação, enquanto unidade proposta e gerida pela
comunidade.
É claro que (re)significar, (re)aproximar e em suma (re)legitimar um território não são
tarefas simples nem de curto prazo, ainda mais em um ambiente marcado por experiências e
expectativa frustradas. Por isso consideramos que, ainda que incompletas e imperfeitas, as normas
propostas devem ser adotadas pelo órgão gestor da Resex, pois foram fruto de um debate
democrático entre os beneficiários da unidade.
A edição de ordenamentos relacionados ao uso de recursos naturais deve, idealmente,
embasar-se em estudos prévios que demonstrem a sustentabilidade das medidas propostas. Mas
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muitas vezes os estudos só são passíveis possíveis de serem realizados a partir de amostragens do
manejo real exercido, permitindo comparar os diferentes tipos de manejo. Além disso, estamos
lidando com uma unidade de conservação de uso sustentável, na qual o uso já está ocorrendo,
independentemente da existência ou não dos regramentos. Deste modo, consideramos que os
ordenamentos que se intenta que estão sendo construídos na Resex Pirajubaé sejam considerados
não como “produtos finais”, mas como experimentos de gestão adaptativa, legitimados pelas
comunidades, seguidos de processos de monitoramento participativo e em constante processo de
adaptação e aprimoramento. Deverão ser monitorados e revisados quando não se mostrarem
factíveis ou sustentáveis. Para que os monitoramentos, que devem sempre ser feitos de forma
participativa com os usuários dos recursos, tenham a eficiência esperada, é importante que se possa
modificar os ordenamentos construídos de forma relativamente simplificada e rápida, permitindo
um ciclo de retroalimentação e de reflexão sobre as possíveis melhorias necessárias.

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REEF CHECK NA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DO


CORUMBAU: CIÊNCIA CIDADÃ EXERCIDA POR PESCADORES LOCAIS
REEF CHECK AT THE MARINE EXTRACTIVE RESERVE OF CORUMBAU: CITIZEN
SCIENCE CARRIED OUT BY LOCAL FISHERMEN

Karina Lopes Ramos*, Fábio Negrão Ribeiro de Souza**


* Doutora em Ecologia e Conservação da Biodiversidade, GEFMar, RESEX Corumbau/ICMBio, Brasil. E-
mail: karina.ramos.bolsista@icmbio.gov.br
** Bolsista de pesquisa do Projeto GEF Mar, CEPENE/Caravelas, ICMBio, Brasil
Email: fabio.souza.bolsista@icmbio.gov.br

1. INTRODUÇÃO
Recifes de corais são ambientes de grande biodiversidade e importância ecossistêmica, além
de abrigarem espécies de importância socioeconômica para a pesca artesanal e gerarem renda para o
setor turístico (FERREIRAet al. 2018). O aumento da temperatura dos oceanos devido ao
aquecimento global tem favorecido a ocorrência de doenças nos corais e causado o seu
branqueamento, que pode resultar em impactos mais graves dependendo da frequência e intensidade
deste fenômeno (LEÃO; KIKUCHI; OLIVEIRA, 2008).
A Reserva Extrativista Marinha do Corumbau, que abrange os municípios de Prado e Porto
Seguro (BA), está inserida na Região de Abrolhos, que abriga as mais importantes áreas de recifes
de corais e bancos de rodolitos do Brasil (MARCHIOROet al. 2005). Especificamente na RESEX
Corumbau, Unidade com mais de 800 famílias beneficiárias com meios de vida e cultura
diretamente ligados à pesca artesanal, dez pescadores locais foram capacitados na metodologia
ReefCheck Brasil para atuar no monitoramento recifal de base comunitária, em um típico exemplo
de Ciência Cidadã.Em vários lugares do mundo já vem ocorrendo o engajamento e treinamento de
cidadãos sem formação científica em projetos de pesquisa variados (Bonneyet al. 2014), gerando
dados de boa qualidade para o monitoramento da biodiversidade a nível mundial (CHANDLERet
al. 2017). Porém, de uma maneira geral, prevalece entre estes cidadãos voluntários a participação
somente na coleta de dados, faltando ainda uma capacitação e envolvimento em outras etapas da
pesquisa, como o delineamento amostral, análise e interpretação de dados (SCHRÖTERet al. 2017).
Frente à necessidade de monitorar os ambientes recifais e a evolução dobranqueamento das
colônias de corais na Unidadee incentivar o monitoramento comunitário, o presente trabalho tem
como objetivo apresentar um relato de experiência de monitoramento recifal e Ciência Cidadã
exercidos por pescadores da comunidade de Corumbau, apresentando os principais resultados
obtidos, assim como os desafios percebidos.

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2. MATERIAL E MÉTODOS
Dez pescadores da comunidade de Corumbau praticantes da pesca de mergulho de apneia
realizaram cursos avançados de mergulho livre e treinamento téorico-prático para a metodologia
ReefCheck Brasil, viabilizados por recursos do Projeto GEF Mar.Logo na sequência, as expedições
de monitoramento recifal na RESEX Corumbau foram iniciadas, já com a participação ativa destes
pescadores na escolha dos pontos amostrais e na coleta de dados subaquáticos, sob a supervisão do
coordenador regional do ReefCheck Brasil, Fábio Negrão, e apoio da Universidade Federal de
Pernambuco/UFPE e do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do
Nordeste/CEPENE Tamandaré.
Até o momento, foram realizadas 5 expedições de monitoramento recifal na Unidade, entre
abril de 2018 e abril de 2019. Além das coletas de dados ReefCheck, foram realizadas marcações de
colônias branqueadas com boias em 4pontos da Unidade. As colônias branqueadas foram marcadas
e monitoradas com o uso de bóias, para acompanhamento da evolução do branqueamento. Também
estão sendo feitos fotoquadrats e videotransectos para obter dados complementares de estimativas
de percentual de cobertura e do estado de saúde dos organismos.
Foram amostrados recifes das comunidades de Caraíva, Corumbau (Itacolomis), Veleiro e
Cumuruxatiba (Figura 1),nos meses de novembro a abril, período de melhor visibilidade da água;
porémtem ocorrido outras expedições ao longo do ano para monitoramento de colônias branqueadas
das espécies coral-de-fogo Milleporaalcicornis e coral-vela Mussismiliaharttii.

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Figura 1 – Pontos amostrados na RESEX Corumbau. Fonte: Marília Mesquita (CEPENE/Caravelas)

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
No total, foram realizadas 23 coletas de dados do protocolo de peixes, 23 de substrato, 20 de
invertebrados e 9 de coral avançado (Figura 2), assim como saídas para monitoramento de colônias
de corais branqueadas. Os pescadores envolvidos na pesquisa têm participado do delineamento
amostral, indicando os pontos de coleta de acordo com o tipo de uso da área (área fechada pra
pesca, área de visitação turística, área de recrutas, etc.) e as melhores épocas de mergulho de acordo
com a visibilidade da água. Cabe salientar que os recifes locais encontram-se muito próximos à
costa e portanto carecem de boa visibilidade na maior parte do ano, restringindo os períodos de
coleta.

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Figura 2 – Coleta de dados do ReefCheck Brasil. Fonte: Fábio Negrão

Ao longo do trabalho já foram realizadas quatroencontros de sensibilização ambiental com


as comunidades para levantar informações com a comunidade, fazer devolutivas dos resultados do
trabalho e promover educação ambiental sobre os recifes. Também foi feita uma reunião com os
pescadores envolvidos na pesquisa e alguns outros membros da comunidade para apresentação dos
resultados preliminares e também para coleta de percepções e sugestões para aprimoramento das
coletas e sugestões de novos pontos a serem amostrados.
Quanto ao evento de branqueamento que vem sendo registrado na RESEX Corumbau e em
outros lugares do mundo, e que ainda não terminou, os pescadores percebem que a espécie mais
amplamente afetada na Unidade é o coral-de-fogo (M.alcicornis), enquanto as outras espécies
parecem estar ainda lutando e tentando resistir ao evento de branqueamento.

4. CONCLUSÕES
A pesquisa segue um ritmo específico de acordo com a disponibilidade dos mergulhadores
locais, que estão em contínuo treinamento e aprimoramento de suas habilidades de coleta de dados
ReefCheck, assim como depende das condições meteorológicas e das condições de visibilidade
destes recifes costeiros. Além disso, como o evento de branqueamento ainda não terminou, este
fenômeno ainda está em processo de coleta e análise de dados, não sendo possível ainda
dimensionar seu real impacto.
Os resultados do envolvimento ativo de pescadores no ReefCheck na RESEX Corumbau
mostram uma experiência bem-sucedida de Ciência Cidadã e empoderamento comunitário,
proporcionando também um espaço de integração entre saberes acadêmicos e tradicionais,
envolvendo os pescadores não somente na coleta de dados, mas também em diferentes etapas da
pesquisa.

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5. AGRADECIMENTOS
Gostaríamos de agradecer ao Projeto GEF Mar, Universidade Federal de
Pernambuco/UFPE, CEPENE/Tamandaré, Associação dos Nativos de Caraíva/ANAC, Associação
da Reserva Extrativista Marinha do Corumbau/AREMACO, Associação dos Pescadores de
Cumuruxatiba/APEC e Associação de Pescadores e Agricultores Rurais de Veleiro/ASPARV.

6. REFERÊNCIAS
MARCHIORO, G.B; CIRANO, M; SILVEIRA, I; CAMPOS, R.O. Subsídios para a delimitação
das zonas de amortecimento do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e Reserva Extrativista
Marinha do Corumbau por meio da avaliação de impactos potenciais de derramamentos de óleo.
Conservação Internacional, Caravelas, 142 p., 2005.

LEÃO, Z.M.A.N; KIKUCHI, R.K.P; OLIVEIRA, M.D.M. Branqueamento de corais nos recifes da
Bahia e sua relação com eventos de anomalias térmicas nas águas superficiais dos oceanos. Biota
Neotropica 8(3), 69-82, 2008.

FERREIRA, B.P; GASPAR, A.L.B; COXEY, M.S; MONTEIRO, A.C.G. Manual de


monitoramento ReefCheck Brasil 2018. Brasília: MMA, 108 p., 2018.

BONNEY, R; SHIRK, J.L; PHILLIPS, T.B; WIGGINS, A; BALLARD, H.L; MILLER-RUSHING,


A.J; PARRISH, J.K. Next steps for citizenscience. Science Magazine 343, 1436-1437, 2014.

CHANDLER, M; SEE, L; COPAS, K; BONDE, A.M.Z; LÓPEZ, B.C; DANIELSEN, F; LEGIND,


J.K; MASINDE, S; MILLER-RUSHING, A.J; NEWMAN, G; ROSEMARTIN, A; TURAK, E.
Contributionofcitizensciencetowardsinternationalbiodiversitymonitoring. BiologicalConservation
213, 280-294, 2017.

SCHRÖTER, M; KRAEMER, R; MANTEL, M; KABISCH, N; HECKER, S; RICHTER, A;


NEUMEIER, V; BONN, A. Citizenscience for assessingecosystemservices: status,
challengesandopportunities. Ecosystem Services 28, 80-94, 2017.

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PROTAGONISMO SOCIAL NA CONSERVAÇÃO DO PEIXE BOI


MARINHO NA RESERVA EXTRATIVISTA DA BAÍA DO TUBARÃO
SOCIAL PROTAGONISM IN THE CONSERVATION OF THE ANTILLEAN MANATEE
(Trichechus manatusmanatus)IN THE EXTRACTIVIST RESERVE OF THE SHARK BAY

Karina de Oliveira Teixeira*, Alexandre Caminha de Brito**

* Analista ambiental, chefe da Resex da Baía do Tubarão e Resex Itapetininga, ICMBio, Brasil
** Analista ambiental, chefe da Resex Arapiranga-Tromaí, ICMBio, Brasil

1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa relatar a experiência bem-sucedida da participação social e
envolvimento comunitário que protagoniza a conservação do Peixe Boi marinho (Trichechus
manatus) na Reserva Extrativista da Baía do Tubarão (Resex da Baía do Tubarão. Os esforços para
a conservação do peixe boi marinho vigoram na área desde a Expedição “Igarakuê” realizada em
1992, quando os trabalhos de sensibilização popular para a conservação da espécie tiveram início
no estado do Maranhão.Em 2001, o Centro de Mamíferos Aquáticos – CMA/MA foi implementado,
tendo priorizado a realização de campanhas educativas e implantação de pontos físicos de
observação dos peixes-boi em vida livre.
Em 2006, o IBAMA/MA, elaborou um Plano de Gestão Compartilhada para a Baía do
Tubarão como experiência de gestão piloto no estado, que envolvia, entre outros, a realização de
levantamentos biológicos para subsidiar a criação da reserva extrativista.
A campanha “Não Mate o Peixe-Boi” foi lançada em julho de 2007, quando a parceria do
CMA/MA, Fundação Mamíferos Aquáticos, Alumar e Instituto Alcoa realizaram o I Festival de
Preservação do Peixe Boi na comunidade da Ilha do Gato, município de Humberto de Campos –
MA, também implantando a primeira torre de observação do peixe-boi no local, ficando a referida
torre sobre a responsabilidade de um monitor, morador da comunidade.
No ano de 2009, a base do CMA no Maranhão por decisão institucional deixa de existir, mas
mesmo após a saída do CMA da área, os moradores continuaram realizando o Festival de
Preservação do Peixe Boi e monitorando a espécie ameaçada de extinção. O festejo se tornou uma
manifestação cultural importante para as comunidades de toda região e é realizado uma vez por ano,
permanecendo como símbolo de organização social e resistência, contexto que inspirou o
reconhecimento da área como Unidade de Conservação federal, denominada Reserva Extrativista da
Baía do Tubarão, criada por meio do Decreto Federal nº 9.340de 05 de abril de 2018.Os estudos de
criação da Unidade de Conservação - UC foi protagonizado pelo Centro Nacional de Pesquisa e

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Conservação da Sócio biodiversidade Associada a Povos e Comunidades Tradicionais –


CNPT/ICMBio. A criação da RESEXsó se tornou realidade após 14 anos de luta e organização
social, quando o decreto de criação foi publicado, durante esse período houve diversas alterações na
proposta de limites e envolvimento de novas comunidades, que se juntaram na busca desse
propósito, visando serem reconhecidas como População Tradicional que conserva o território.
No final do ano de 2018, foi publicada a portaria nomeando a primeira gestora da Reserva
Extrativista. Em maio de 2019, representantes da comunidade da Ilha do Gato solicitaram reunião
com a gestão, reivindicando que o ICMBio participasse de forma ativa na construção e execução
participativa do Festival de Preservação do Peixe Boi, considerando que após muitos anos de luta
agora comemoram a conquista da Reserva Extrativista instituída pelo poder público, gerando
grande esperança na comunidade em comunicar a sociedade regional a resistência e vitória que o
Festival representa, pois mesmo com as dificuldades de articulação, de organização, de logística e
orçamentárias os extrativistas nunca desistiram, sendo protagonistas orgulhosos de sua cultura e
tradição.
No período de 02 a 08 de setembro de 2019, tivemos o primeiro festival com a gestão da
unidade de conservação instituída. O XIII Festival de Preservação do Peixe Boi foi visto pela
População Tradicional como momento de comemoração pela conquista da criação e gestão da
Reserva Extrativista. O projeto do festival foi construído por meio de planejamento participativo
facilitado pelo ICMBio, analista ambiental Karina Teixeira, com a intencionalidade da gestão em
valorizar e reafirmar a importância de manter o protagonismo da comunidade tradicional na
organização e desenvolvimento de todas as atividades.

2. MATERIAL E MÉTODOS

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Figura 1: Mapa de Localização da Resex da Baia do Tubarão


Autoria do mapa da Figura 1: Samuel Gomes – Bolsista GEF Mar

No dia 21 de junho de 2019, realizamos na comunidade da Ilha do Gato, uma Oficina de


Planejamento Participativo para a construção do XIII Festival de Preservação do Peixe Boi com a
participação de mais de 60 pessoas, todas as famílias da comunidade da Ilha do Gato estavam
representadas.

Figura 2: Planejamento Participativo


Créditos da Foto, Figura 2: Alexandre Caminha de Brito – Analista Ambiental do ICMBio

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Figuras 3 e 4: Resultado do planejamento organizado por meio de tarjetas


Créditos das Fotos das Figuras 3 e 4: Karina de Oliveira Teixeira – Analista Ambiental do ICMBio

Temática do XIII Festival do Peixe Boi:


Peixe Boi preservado, território conservado!

Propósito do Festival do Peixe Boi


• Proteção do Peixe Boi Marinho e do Meio Ambiente;
• Manter a Tradição da População;
• Fortalecer o orgulho de ser da Ilha do Gato e pertencer a
Reserva Extrativista da Baía do Tubarão;
• Divulgar a RESEX e conscientizar sobre a preservação
do Peixe Boi.
• Promover a participação social

Figuras 5,6 e 7: Tema, propósito e faixapara o festival pensados junto com a comunidade.
Elaboração e autoria das Figuras 5, 6 e 7: Karina de Oliveira Teixeira – Analista Ambiental do ICMBio

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O planejamento gerou uma matriz de responsabilidades e um plano de ação participativo,


onde as atividades propostas para o evento e seus respectivos responsáveis comunitários foram
definidos, respeitando o protagonismo dos atores locais na execução do Festival.

3. RESULTADO E DISCUSSÃO
Mesmo considerando que o tempo e a forma de fazer dosmoradores da Ilha do Gato, não
é,obrigatoriamente, a mesma dos processos organizacionais inerentes ao serviço público, podemos
considerar que o processo de garantia do envolvimento da comunidade no protagonismo da
execução do XIII Festival de Preservação do Peixe Boi foi bem-sucedida. Uma das estratégias,
intencionalmente pensada pela equipe de gestão da Resex para envolver os jovens e as crianças da
comunidade com o festival foi o processo de exumação e montagem de dois esqueletos de Peixes
Boi, que haviam sido enterrados na Ilha há cerca de 15 anos. A força pedagógica desse momento
foi surpreendente! O processo de resgate começou na própria identificação dos locais onde os
corpos dos espécimes deManatis haviam sido enterrados pelas equipes do CMA/IBAMA. Todo o
processo oportunizou à comunidade ativar lembranças muito vivas do trabalho realizado em favor
da conservação do Peixe Boi na Ilha, para os comunitários mais jovens foi um importante momento
de aprendizado e envolvimento, para os pescadores mais velhos foi uma oportunidade de reafirmar
seu compromisso delongas datas com a preservação da espécie. O esqueleto montado foi levado
para uma exposição sobre a Ecologia e Conservação do Peixe-Boi, em um espaço cedido e
preparado pela comunidade para esse fim, onde também foram expostos os painéis e maquetes de
mamíferos marinhos doados aos moradores da Ilha do Gato, por ocasião do encerramento das
atividades da referida base avançada do CMA no Maranhão.
Motivados por essa prática pedagógica envolvente, toda comunidade passou a “respirar”
ativamente a atmosfera do Festival, participando e se doando em todas as atividades pensadas no
planejamento participativo. As Oficinas ocorridas durante o festival, de Educomunicação, de
Procedimentos em resgate e encalhes de animais marinhos, a de Permacultura e Bioconstrução
contaram com uma significativa participação dos jovens e mulheres da comunidade, além dos
pescadores artesanais, gerando um compromisso da gestão em implementar o Turismo de Base
Comunitária – TBC, pautado na construção de estruturas pensadas dentro da lógica da permacultura
e da bioconstrução. Podemos afirmar que, o XIII Festival de Preservação do Peixe Boi, assumiu um
caráter técnico científico, extremamente positivo, o que não havia acontecido ainda em suas edições
anteriores, agregando valor ao importante festival protagonizado pela comunidade.
A noite cultural, pensada e organizada integralmentepela comunidade, foi um momento
extremamente especial, pois o grupo folclórico de Bumba Meu Boi, denominado Unidos da Ilha,

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

com seu sotaque de matraca, se apresentou trazendo uma toada (música autoral típica dos bumbas
boi do Maranhão), umacomposição elaborada especialmente para o Festival, enaltecendo o orgulho
dos moradores da Ilha do Gato, população tradicional de pescadores artesanais, em pertencer a
Reserva Extrativista da Baía do Tubarão.

4. CONCLUSÃO
A experiência do Festival de Preservação do Peixe Boi da Resex da Baia do Tubarãomostra-
se como um caso de sucesso do envolvimento e da participação social das populações tradicionais
na conservação ambiental, onde oprocesso educativo a longo prazo, a afetividade, a cultura, o
sentimento de orgulho e pertencimento de uma comunidade pode se reverter em mudança de
comportamentose valores em favor da proteção de uma espécie, gerando a conservação de todo o
território. A criação da Reserva Extrativista trouxe novas perspectivas de trabalho e envolvimento
comunitário, que passam agora a se consolidar, como o monitoramento participativo das espécies
ameaçadas, o Turismo de Base Comunitária - TBC e a Educomunicação. Na perspectivada gestão
da Unidade de Conservação, o processo de educação ambientalvivo e já enraizado nos moradores
da comunidade da Ilha do Gato apresenta-se como uma oportunidade extremamente positiva, que
deve servir de exemplo e estímulo para outras comunidades do interior da Resex, assim como, deve
ser estimulada a ganhar escala por meio da promoção de intercâmbios socioculturais com outras
experiências exitosas de comunidades diversas no Brasil. Nesse sentido, essa importante iniciativa
e envolvimento comunitário se transformou em uma mola propulsora de esperança, compromisso e
criatividade, fundamentais para o processo de implementação e consolidação da Área
Especialmente Protegida.
A oportunidade do relato de experiência, em nossa concepção, considera o território local
como palco das transformações necessárias, sejam elas ecológicas, econômicas, culturais, éticas ou
socioambientais, mostrando que a participação social das populações tradicionais se torna cada vez
mais ampla, decisiva e importante para garantir o avanço qualitativo da gestão das unidades de
conservação, estabelecendo uma nova aliança de respeito nas relações sociedade – natureza,
promovendo à autonomia e o protagonismo social das comunidades na busca pela justiça
ambiental.

5. REFERÊNCIAS
ALVITE, CAROLINA MATTOSINHO DE CARVALHO. Indicadores populacionais e
ecológicos de peixes-bois-marinhos (Trichechusmanatusmanatus) em duas áreas de
manguezais e marismas no Maranhão. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do
Maranhão, Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade de Ecossistemas, 2008.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

LOREIRO, CARLOS FREDERICO B.; CONCEIÇÃO CUNHA, CLAÚDIA. Educação Ambiental


e Gestão Participativa de Unidades de Conservação. Revista Prâksis, vol. 1,pp. 35-42; Centro
Universitário Feevale; Novo Hamburgo, Brasil, 2008.

MMA. Áreas Protegidas. Gestão Participativa do SNUC. Brasília: Ministério do Meio


Ambiente, 2004.

SOARES, ANNA KARINA ARAÚJO. Estudo Socioambiental para criação da Reserva


Extrativista Baía Do Tubarão, Municípios de Icatu e Humberto de Campos, Estado do Maranhão.
ICMBio, 2017.

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CONSTRUÇÃO COLETIVA DE APRENDIZADOS E CONHECIMENTOS


NO PROGRAMA NACIONAL DE MONITORAMENTO DA
BIODIVERSIDADE – PROGRAMA MONITORA
COLLECTIVE CONSTRUCTION OF LEARNING AND KNOWLEDGE IN THE NATIONAL
BIODIVERSITY MONITORING PROGRAM – PROGRAMA MONITORA

Leonardo da Silveira Rodrigues*, Débora Lehmann*; Tathiana Chaves de Souza**


* Projeto Monitoramento Participativo da Biodiversidade, IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas, Brasil
** Coordenação de Monitoramento da Biodiversidade, ICMBio, Brasil

1. INTRODUÇÃO
O Programa Monitora - Programa Nacional de Monitoramento da Biodiversidade (BRASIL,
2017), realizado in situ em Unidades de Conservação (UC), é coordenado pelo Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). O Monitora vem sendo construído desde
2010 com o apoio de diversos instituições e parceiros com renomada experiência em
monitoramento da biodiversidade (Tófoliet al.; 2019).
Os dados gerados por meio do monitoramento têm por objetivo oferecer informações do
status da biodiversidade em cada UC, que possam ser utilizadas para gestão e tomadas de decisão,
não só por parte dos gestores das unidades, mas também por moradores dessas áreas e entornos,
além de representantes do poder público local.
O Monitora nas UC amazônicas conta com a parceria do IPÊ - Instituto de Pesquisas
Ecológicas em 17 delas, por meio do Projeto Monitoramento Participativo da Biodiversidade em
Unidades de Conservação Amazônicas (MPB), desenhado em 2013 e executado a partir de 2014.
Esse projeto busca o aspecto interativo com os atores locais, considerando a multiplicidade de
motivações e as diferentes interpretações sobre a realidade dos territórios e o uso dos recursos
naturais. Parte do princípio de que o monitoramento participativo deve ser o reconhecimento da
participação ampliada de atores locais, em convergência com as diretrizes do Programa Monitora
(Tófoliet al.; 2019).
À medida que o MPB e o Monitora avançaram em sua fase de implementação desde 2013,
algumas necessidades afloraram e passaram a ser percebidas pelas coordenações dos projetos.
Dentre elas, o interesse e necessidade de se criar espaços de análise, interpretação e discussão
coletiva dos dados do monitoramento, a fim de se gerar novos conhecimentos aplicados à gestão e a
participação em todo o processo.
Com isso, a partir de 2018 inicia-se o processo de criação de um espaço estruturado de
Construção Coletiva de Aprendizados e Conhecimentos do Programa Monitora, o CCAC/Monitora.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Essa iniciativa é uma estratégia desenhada de forma participativa que tem por meta inserir o
monitoramento da biodiversidade e as informações que ele gera na realidade da gestão, avançando
na escada de participação cidadã (Arnstein; 2002), ampliando o pertencimento e empoderamento
dos diferentes atores envolvidos nesse processo.
A promoção do debate e troca de conhecimentos tradicionais, científicos, jurídico-
administrativos e empresariais é parte dessa iniciativa, buscando fazer com que as informações do
monitoramento se tornem, efetivamente, utilizáveis pelos diferentes atores atuantes nas UC para
conservação da biodiversidade. Ou seja, fomentar a construção coletiva de aprendizados e
conhecimentos no monitoramento da biodiversidade é ampliar discussões sobre biodiversidade local
e promover diálogos e interpretações das informações sob diferentes pontos de vista, promovendo
assim um grande encontro de saberes em prol da conservação.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O CCAC Monitora é desenvolvido por meio do que foi chamado Encontro de Saberes.
Estessão momentos de imersão, diálogo e interpretação coletiva dos dados do monitoramento
envolvendo os diferentes atores do Monitora. Os encontros têm duração de pelo menos um dia e o
processo passa por 6 etapas:
1ª Etapa: ANÁLISE DOS DADOS - as informações levantadas no monitoramento são
analisadas e interpretadas por analistas ambientais e pesquisadores dos centros de pesquisas do
ICMBio, com produção de tabelas, gráficos e análises descritivas.
2ª Etapa: ELABORAÇÃO DO MATERIAL INFORMATIVO - a partir das análises dos
dados, são elaborados materiais informativos, como cartilhas e banners onde os gráficos e tabelas
são adaptados e adequados para linguagem mais acessível, para serem trabalhados com diferentes
públicos.
3ª Etapa: DIÁLOGO COM EQUIPE LOCAL - o material informativo produzido é então
apresentado e discutido com os pesquisadores locais do IPÊ, monitores e gestores das UC. A equipe
local traz suas próprias interpretações sobre o conjunto de informações produzido cientificamente
pelos pesquisadores dos centros de pesquisa do ICMBio.
4ª Etapa: MOBILIZAÇÃO INFORMATIVA - inicia pelo menos um mês antes do encontro
dos saberes. Os materiais informativos são apresentados para os moradores da UC e de seu entorno,
e para a comunidade envolvida com a UC, como poder público local, sociedade civil organizada,
pesquisadores locais e comunidade estudantil. Esses materiais apresentados fazem parte do convite
para participação no encontro de saberes em si, e já promove diálogo e apresenta resultados do
monitoramento.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A mobilização é realizada com antecedência para que o público se aproprie das informações
e possa construir suas próprias ideias e interpretações sobre a situação da biodiversidade em sua
UC. Esse intervalo provoca um período de discussões sobre a biodiversidade e a culminância dessa
mobilização é o encontro de saberes.
5ª Etapa: REALIZAÇÃO DO ENCONTRO DE SABERES - os participantes discutem as
informações, elaboram interpretações e discutem o que foi analisado. Os monitores relatam suas
experiências de campo e como é fazer parte dessa atividade, além de detalhar como funciona o
trabalho de monitoramento na prática. Os pesquisadores trazem detalhes técnicos dos porquês de
cada protocolo de monitoramento e apresentam interpretações científicas sobre os dados. No
segundo momento, os participantes são convidados a circularem pelos cartazes, banners e
exposições fotográficas com os resultados do monitoramento de cada protocolo. O grande público
tem espaço e oportunidade de debate mais próximo e profundo com monitores e pesquisadores
sobre cada monitoramento específico. É o momento onde surgem novas questões, interpretações e
ideias sobre a condição da biodiversidade local. Na sequência são trabalhadas questões em grupos
com intuito de levantar demandas sobre a realidade local, que são transformadas em plano de ação
envolvendo gestão da UC, comunidades e parceiros locais, no intuito de fomentar o fortalecimento
e integração local.
6ª Etapa: AVALIAÇÃO - após o encontro, e com as novas ideias e ações que surgem em
mãos, são realizados a avaliação e planejamento para próximos passos. Os encontros servem de
subsídio para gestão da UC e propiciam os ajustes necessários à metodologia aplicada até o
momento no CCAC Monitora.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Até o momento foram realizados encontros de saberes em seis UC na Amazônia: Resex
Tapajós-Arapiuns (PA), Parna Montanhas do Tumucumaque (AP), ResexCazumbá-Iracema (AC),
Flona Jamari (RO), Resex do Rio Unini e Parna do Jaú (AM).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 1–Encontro do Saber na ResexCazumbá-Iracema, 2019.Fonte: Débora Lehmann.


Mais de 500 pessoas participaram diretamente dos Encontros de Saberes. Muito aprendizado
tem sido gerado e a metodologia e materiais utilizados são constantemente ajustados a partir das
avaliações que contam com a participação de representantes de todos os atores envolvidos (Figura
1). Até 2021 ainda serão realizados encontros em outras 10 UC.
Alguns resultados concretos já alcançados são: aproximação e apoio logístico e financeiro
formalizado das empresas de concessão florestal da Flona Jamari com o Monitora localmente;
parceria entre a secretaria estadual de educação em Santarém e o Monitora na Resex Tapajós
Arapiuns com construção de projetos pedagógicos voltados para biodiversidade, envolvendo a
participação, como tutores dos alunos, dos monitores locais; produção de vídeos com relatos e
narrativas de monitores sobre sua atuação e sobre a importância de se monitorar a biodiversidade;
aproximação do Monitora com instituições de pesquisa e pesquisadores locais em cada uma das UC
citadas.
Além disso, os encontros de saberes por si só se apresentam como um processo formativo
para todos os envolvidos. Os pesquisadores do ICMBio e de instituições de pesquisa em contato
direto com monitores e comunidades, criam uma ponte de diálogo que propiciou realizar algumas
interpretações de dados do monitoramento e vice-versa. Um exemplo disso aconteceu na
ResexCazumbá-Iracema, onde monitores e moradores trouxeram as explicações sobre os porquês
das flutuações percebidas pelos pesquisadores nos dados de borboletas, aves e mamíferos entre os
anos de 2016 e 2018. Nessa época houve a queda dos tabocais, seguindo seu ciclo biológico de 30
anos, onde essas plantas “morrem”, abrindo clareiras e alterando a disponibilidade de nutrientes e
insolação na floresta. Ao mesmo tempo, os moradores relatam como o monitoramento da castanha
ampliou seus conhecimentos, considerando que hoje tem mais condições de manejar seus castanhais
por reconhecer e protegeras plântulas de novas castanheiras, saber adquirido com os pesquisadores.

4. CONCLUSÃO
Todos esses resultados são apenas uma demonstração do potencial que CCAC Monitora têm
para fortalecer a sociedade em prol da conservação da biodiversidade, por meio do diálogo que
geram construção de novos conhecimentos. As comunidades têm espaço para apresentarem suas
interpretações e análises sobre os dados, os pesquisadores conseguem entender especificidades
locais que ampliam sua compreensão sobre a UC e o poder público possui ferramentas suficientes
para realizar a gestão participativa de fato. Os novos conhecimentos e informações que surgem a
partir do monitoramento promovem portanto, o fortalecimento comunitário local, a gestão das UC e
a conservação da biodiversidade, por meio do envolvimento e participação efetiva.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

5. AGRADECIMENTOS
Às associações comunitárias e instituições como EMBRAPA Rondônia,FVA,UFAC,UFAM,
UFOPA, UFRO e UNIR, que se envolveram e contribuíram para o desenvolvimento do CCAC
Monitora e à Gordon and Betty Moore Foundation, ARPA/MMA e USAID pelo apoio e parceria.

6. REFERÊNCIAS
ARNSTEIN, S. R. 2002. Uma escada da participação cidadã. Revista da Associação Brasileira
para o Fortalecimento da Participação – PARTICIPE, Porto Alegre / Santa Cruz do Sul 2.2: 4-13.

BRASIL. Instrução Normativa Nº 3 de 04 de setembro de 2017, que institui o Programa


Nacional de Monitoramento da Biodiversidade. Disponível em
http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/portarias/DCOM_ICMBio_Instrucao_Normativa_0
3_de_04_de_setembro_de_2017.pdf.pdf

TÓFOLI, C. F.; LEMOS, P. F.; CHIARAVALLOTI, R. M.; PRADO, F.; LEMKE, C. M.; SOUSA,
I.; FERNANDES, L.; BONAVIGO, P. H.; SANTOS, R. S. S.; MADURO; R. G. A.; BERNARDES,
V. C. D.Projeto de monitoramento participativo da biodiversidade em Unidades de
Conservação da Amazônia. In: Monitoramento Participativo da Biodiversidade: Aprendizados em
Evolução. Tófoli, C. F.; Lemos, P. F.; Chiaravalloti, R. M.; Prado, F. (orgs.). 2 ed. Nazaré Paulista /
SP. Instituto de Pesquisas Ecológicas / Memnon; 2019.

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RIQUEZA PERCEBIDA DE AVESE SUA CONSERVAÇÃO NO PARQUE


NACIONAL DE SETE CIDADES, PIAUÍ, BRASIL
PERCEIVEDRICHNESSOFBIRDSANDYOURCONSERVATION IN THENATIONAL PARK
OF SETE CIDADES, PIAUÍ, BRASIL

Isis Tamara Lopes de Sousa Alves, Reinaldo Farias Paiva de Lucena, Kallyne Machado
Bonifácio**
Pós-Doutoranda (PNPD/CAPES) do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente
(PRODEMA), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Brasil.(Professor orientador e autor correspondente). E-mail:
kallynebonifacio@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
Considerado o grupo taxonômicomais representativo em número de espécies, as aves são
reconhecidas como animais demaior relevância cinegética no mundo (NÓBREGA; BARBOSA;
ALVES, 2011) e indicadoras de conservação da biodiversidade (FAHRIG, 2003).A riqueza de
espécies de aves no Brasil é de 1919, o correspondente a quase 20% do total
mundial(PIACENTINI, 2105), muito embora, seja apontado no quadro de ameaça como sendo o
País com maior número de espécies correndo risco (165).
No cenário de conservação, mudanças no habitat natural se configuram como uma das
principais causas da ameaça a essas espécies (MARIANI; GARCIA, 2005). Assim sendo,
informações acerca da ocorrência de aves em determinado local torna-se relevante para direcionar
iniciativas de conservação futuras, particulamente para aquelas espécies com certo grau de ameça;
pressão de uso pelas pessoais locais, por exemplo. Esse é o objetivo do presente estudo, o qual
parte do pressuposto que a riqueza de espécies de aves conhecidas pelas pessoas locais pode dar
indicativo de quais espécies estão disponíveis no ambiente, bem como, quais delasvem sofrendo
pressão de uso.
O Parque Nacional (PARNA) de Sete Cidade, além de se inserir em área prioritária para a
conservação da biodiversidade do bioma Cerrado (BRASIL 1999), constitui-se em uma das regiões
com mais alta riqueza de espécies de aves do Piauí (SANTOS et al., 2013). Todavia, inexiste, até o
momento, pesquisas voltadas às relações entre as comunidades do entorno e as aves com ênfase na
conservação.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Criada pelo Decreto Federal n° 50.744/61 e contemplando uma área de 6.221 ha, o PARNA
de Sete Cidades se trata de uma Unidade Conservação Federal de Proteção Integral localizada no
estado do Piauí, entre os municípios de Brasileira e Pirarucura (IBDF, 1979) (Figura 1).Essa Área
Protegida dispõe de um Plano de Manejo (elaborado em 1979) como instrumento de Gestão
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

No entorno do PARNA, contabiliza-se 23 comunidades, sendoescolhida a comunidade


Cachoeira para realização da pesquisa por questão de logística. Essa comunidade se localiza na
região rural do município de Brasileira, a aproximadamente 10,9 km da sede administrativado
PARNA. Nela, estão inseridas 24 casas, no entanto 2 delas não possuiam residentes e uma das
casas os chefes de família se recusaram a particpar da entrevista, com isso não foram incluídos
nesta pesquisa.

Figura 1: Localização da Comunidade Cachoeira no entorno do Parque Nacional de Sete Cidades, Piauí, Brasil. Mapa:
Ezequiel da Costa Ferreira (2018).

2.1 Coleta dos dados


Obteve-se os dados, de maio a dezembro de 2018, através da utilização de formulário,
englobando os seguintes aspectos: as aves conhecidas e seus usos, bem como, questões sobre o
perfil(idade, sexo, tempo de moradia na comunidade etc.).
A identificação das espécies relatadasfoi realizada através da visualização direta durante as
entrevistas, através de fotos e baseado em estudos realizados previamente na área da pesquisa
(TELINO-JÚNIOR et al., 2005). Na identificação da nomenclatura científica, utilizou-se a Lista de
Aves do Brasil, disponibilizada pelo Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO, 2015).
Antes de cada entrevista, explicou-se o objetivo do trabalho, e esses foram convidados a
assinar o TCLE,autorização CAAE: 02669718.9.0000.5188. Também se obtevea autorização do
SISBIO, registro nº 64999-1.

800
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 Perfil dos entrevistados
De maneira geral, os 31 entrevistados compreendem jovens (N= 2; 7%), adultos (N= 19;
61%) e idosos (N= 10; 32%), segundo delimitação do IBGE (2010), com idade variando entre 20 e
73 e tempo de moradia no local 10 e 30 anos. Essas pessoas têm como atividade de subsistência,
principalmente a agricultura (17; 55%)

3.2. Riqueza percebida de espécies


Um total de 118 etnoespécies foram mencionadas. A família Columbidae (10 espécies)
destacou-se com o maior número de espécies citadas, seguida da Thraupidae (7), Psittacidae (6),
Accipitridae (5) e Icteridae (5). Estudos avifaunísticos desenvolvidos no PARNA de Sete Cidades,
Piauí, documentaram uma ampla riqueza de espécies. Em uma pesquisa de campo realizada em
apenas 5 dias foram registradas 83 espécies de aves (COIMBRA-FILHO e MAIA, 1977). Santos et
al. (2013), durante 75 dias de coletas, entre 2002 e 2009, registrou um total de 238 espécies
distribuídas, das quais 75 destas espécies foram constatadas na presente pesquisa, demonstrando
que os entrevistados conhecem uma parcela das aves da região.
Espécies como Rhea americana (Linnaeus, 1758) (Ema) e Ara ararauna (Linnaeus,
1758)(Arara), mencionadas por um dos informantes e consideradas raras por eles, são informações
corroboradas pelo Plano de Manejo realizado pelo IBDF (1979), em que apontou a ocorrência
dessas espécies, destacando o declínio desses animais na região, associado à perda de hábitat ao
longo do tempo.
Em relação ao status de conservação, constatou-se que das 81 espécies identificadas, 80
encontram-se na categoria Pouco Preocupante (LC) e apenas uma, a R. americana, apresenta-se
Quase Ameaçada (NT).

3.3. Categorias de uso


Dos 31 entrevistados, 27 (87%) mencionaram o uso de espécies de aves com a finalidade
para a criação, 25 (81%) - A. aestiva (papagaio; 12 citações), C. cela (xexéu; 14), C. squammata
(rolinha fogo apagou; 10) e L. verreauxi (juriti; 9); para o uso alimentício - L. verreauxi (juriti; 18
citações), P. superciliaris (jacú; 16), C. talpacoti (rolinha sangue de boi; 17), C. squammata
(rolinha fogo apagou; 14) e Crypturellusparvirostris (Wagler, 1827) (nambú pé vermelho; 10); para
o uso mágico-religioso 5 (16%) - urubu (C. atratus), rolinha fogo apagou (C. squammata) e 3
(10%) para o medicinal - Coragypsatratus(Bechstein, 1793) (urubu), L. verreauxi (juriti), C.
cyanopogon (cancão), N. griseus (mãe da lua) e A. aestiva (papagaio).Esse baixo percentual nas
categorias medicinais e mágico-religioso foi observado também no estudo realizado por Bezerra et
801
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

al. (2013), em que concluiu que esse resultado seja decorrente da redução da transferência desses
conhecimentos as gerações mais atuais.

3.4. Aspectos conservacionistas


Na ótica dos entrevistados, foram consideradas como aves “menos encontradas” na região
do PARNA as seguintes espécies, P. superciliares (jacu verdadeira) (23%; n= 7),
Crypturellustataupa (Temminck, 1815) (nambu pé roxo) (10%; 3) e Rhynchotusrufescens
(Temminck, 1815) (nambu capote) (10%; n=3). No caso do jacu, o maior número de menção se
deve P. superciliaris, está sofrendo impactos negativos pela perda e fragmentação do seu habitat,
como também pela caça desenfreada, contribuindo rapidamente com o declínio dos indivíduos
dessa espécie (CEMAVE, 2010). Contudo, foi possível observar durante a pesquisa uma
disponibilidade considerável desses animais no interior do PARNA de Sete Cidades, mostrando que
a área protegida, atualmente, tem servido de refúgio para esses animais.

4. CONCLUSÃO
Os moradores da Comunidade Cachoeira detem de um vasto conhecimento da avifauna,
associando e diferenciando esses animais, geralmente, por suas cores e canto.
Dentre as categorias de uso apresentadas, ressalta-se que, nos dias atuais, a categorias de uso
presente no cotidiano do grupo estudado é a criaçãocomo pet mostrando que, possivelmente, seja
alguma das principais causas de declínio da população de algumas espécies local.
É perceptível também, a necessidade de pesquisas mais aprofundadas sobre a abundância de
espécies animais no PARNA de Sete Cidades. Fato que chamou atenção foi a notoriedade do jacú
como a espécie menos encontrada pelos informantes da comunidade Cachoeira, embora facilmente
observamos essas aves nas áreas internas do PARNA de Sete Cidades bem próximas a ambientes
com presença constante de pessoas.

5. AGRADECIMENTOS

ITLS Alves e KM Bonifácio agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de


Nível Superior (CAPES) pelas bolsas de Mestrado e de Pós-Doutorado, respectivamente.
Agradecimento especial aos informantes daComunidadede Cachoeira que foram indispensáveis
para a realização desta pesquisa.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

6. REFERÊNCIAS

BEZERRA, D. M. M.; ARAUJO, H. F. P.; ALVES, A. G. C.; ALVES, R. R. N. Birdsandpeople in


semiaridnortheasternBrazil: symbolicand medicinal relationships. Journal of Ethnobiology
andEthnomedicine9:3, 2013.

BRASIL. Ações prioritárias para a conservação da biodiversidade do cerrado e pantanal.


Disponível em:<http://www.conservation.org.br.>Acessado em dezembro/2018.1999.

CEMAVE (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres). Ficha da espécie:


Penelopesuperciliaris. Disponível em: <http://www.cemave.net/listavermelha>. Acessado em:
dezembro/2018. 2010.

COIMBRA-FILHO, A. F.; MAIA, A. A. Preliminares acerca da Situação da Fauna do Parque


Nacional de Sete Cidades, Estado do Piauí. Relatório. 1977.

CBRO. Annotated checklist ofthebirdsofBrazilbytheBrazilianOrnithologicalRecords Committee.


Revista Brasileira de Ornitologia23:2, 91-298,2015.

IBDF. Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal. Plano de manejo: Parque


Nacional de Sete Cidades. Brasília: MA / Fundação Brasileira para a Conservação da
Natureza (FBCN). 1979.

MARINI, M. A.; GARCIA, F. I.; Conservação de aves no Brasil. Megadiversidade 1, 95–102,


2005.

NOBREGA, V. A.; BARBOSA, J. A.; ALVES, R. R. N. Utilização de aves silvestres por


moradores do município de Fagundes, semiárido paraibano: uma abordagem etnoornitológica.
Sitientibus 11:2, 165 - 175, 2011.

PIACENTINI, V.Q.; ALEIXO, A.; AGNE, C.E.; MAURÍCIO, G.N.; PACHECO, J.F.; BRAVO,
G.A.; BRITO, G.R.R.; NAKA, L.N; OLMOS, F.; POSSO, S.; SILVEIRA, L.B.; BETINI, G.S.;
CARRANO, E., FRANZ, I.; LEES. A.C.; LIMA, L.M.; PIOLO, D.; SCHUNCK, F.; AMARAL,
F.R.; BENCKE, G.; COHN-HAFT, M.; FIGUEIREDO, L.F.A.; STRAUB, F.C; CESARI, E.
Revista Brasileira de Ornitologia23:2, 91-298, 2015.

SANTOS, M. P. D.; SOARES, L. M. S.; LOPES, F. M.; CARVALHO, S. T.; SILVA, M. S.;
SANTOS, D. D. Birdsof Sete Cidades National Park, Brazil: econotalpatternsand habitat use.
Revista Cotinga35: 50-62, 2013.

TELINO - JÚNIOR, W. R.;DIAS, M. M.; AZEVEDO-JÚNIOR, S. M.; LYRA-NEVES, R. M.;


LARRAZÁBAL, E. L. Estrutura trófica da avifauna na Reserva Estadual de Gurjaú, Zona da Mata
Sul, Pernambuco, Brasil. Revista Brasileira de Zoologia 22: 962-973. 2005.

803
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ESTRATÉGIAS DE PESCA E PESCADOS EM UMA COMUNIDADE DE


PESCADORES DO LITORAL NORDESTINO
Carlos Henrique de Vasconcelos Nascimento*; Gilberto Gonçalves Rodrigues**

*Mestrando em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de
Pernambuco, E-mail: carlos.vasconcelos46@gmail.com
**Professor Associado no Departamento de Zoologia, Centro de Biociências, Universidade Federal de Pernambuco,
E-mail: gilbertorodrigues.ufpe@gmail.com

INTRODUÇÃO
A pesca artesanal constitui uma atividade praticada de forma individual, grupo familiar ou
em parcerias, utilizando pouco aparato tecnológico, embarcações de pouca autonomia, instrumentos
rudimentares e toda captura é destinada a subsistência e comercialização em pequena escala
(DIEGUES, 1983; CLAUZET, 2009) em feiras livres ou através de um atravessador
(intermediário). A pesca no Brasil vem sendo realizada antes do período colonial, em que as
comunidades indígenas utilizavam variedades de peixes, crustáceos e moluscos na sua alimentação.
Após o período de colonização, a atividade da pesca abrange novos grupos sociais como oscaiçaras,
jangadeiros, açorianos, catadores de caranguejos, siris, marisqueiras, sururuzeiras e ostreiras
(DIEGUES, 1999, CIDREIRA-NETO & RODRIGUES, 2018).Segundo Maldonado (1986) e
Begossi (1992), a pesca artesanal difere da pesca industrial devido as características que são bem
diversificadas em relação ao habitat, estoques pesqueiros e as técnicas utilizadas assim como o
conhecimento empírico dos pescadores artesanais.
As artes de pesca são todos os meios, instrumentos e técnicas utilizados pelos pescadores
para captura do pescado (peixe, crustáceo ou molusco) (SILVA, 2009). Segundo Ramalho (2016),
essas artes são chamadas de pescarias que são processos tecno-tecnológicos e formas de saber fazer
pesqueiro que se recriam através das gerações. A produção e o domínio dessas artes de pesca mais
“tradicionais” são passados de geração para geração através da oralidade, no entanto fatores como a
diminuição de matéria prima, industrialização, inclusão de novas tecnologias aplicadas a pesca,
diminuição dos pescadores artesãos e a migração para outras profissões tem diminuído a produção
dessas artes e apetrechos. A diversidade dessas artes de pesca está diretamente relacionada com o
conhecimento ecológico local que os pescadores detêm acerca dos peixes.
A etnoictiologia, ciência que estuda o conhecimento tradicional dos pescadores acerca da
biologia, reprodução, comportamento alimentar, nomenclatura popular (etnotaxonomia), dentre
outros aspectos relacionados aos peixes é fundamental para a criação de estratégias de manejo e
conservação de espécies (CLAUZET, 2009). Além disso, os estudos etnoictiológicos buscam
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investigar como os pescadores se relacionam com os peixes e os recursos marinhos (BEGOSSI


1992; CLAUZET, 2009). Nesse sentido, o objetivo do estudo é descrever as artes de pesca e peixes
numa comunidade de pescadores no litoral nordestino.

MATERIAIS E MÉTODOS
A área de estudo foi o Porto de Congaçari, onde se localiza no município de Caaporã – PB
que está inserido na Reserva Extrativista (RESEX) Marinha Acaú-Goiana. A RESEX é uma
unidade de conservação criada pelo Governo federal através do Decreto s/nº de 26 de Setembro de
2007, a área possui 6.676,60 hectares e abrange as comunidades de Carne de Vaca, Tejucupapo,
Povoação de São Lourenço, Baldo do Rio em Goiana (Pernambuco) e Acaú (Pitimbu) e Porto de
Congaçari (Caaporã) na Paraíba. Suas principais atividades econômicas estão ligadas a pesca e
coleta de recursos marinhos e estuarinos (FADIGAS & GARCIA, 2010), em forma de subsistência,
artesanal e comercial. O porto de Congaçari é constituído de pescadores e pescadoras que moram no
local e outros que moram no centro de Caaporã e só vão para o porto para exercer a pesca. Os dados
foram coletados com 18 pescadores, desses 16 homens e 2 mulheres, com idades variando entre 24
e 76 anos, através de entrevistas semiestruturadas, a partir da técnica de “bola de neve” (snow ball).
Nas entrevistas foram levantados aspectos sobre as artes de pesca usadas e pescados capturados na
área.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nas entrevistas foram citadas 12 artes de pesca (anzol, linha de mão, rede de camboa, rede
de espera, pindaúba, jereré, tainheiro, caçoeira, mangote, covo e pitimbóia) e 14 espécies de peixes
(tainha, camorim, bagre, amoré, sanhoá, bauna, papuda, ticupá, piau, mandi, xaréu, pescada,
curimatã e xilapo). Segundo Moraes (2005) os apetrechos de pesca são divididos em três
categorias: os destinados a fisgar o peixe, redes (de emalhar e de envolver) e as armadilhas (fixas ou
flutuantes).
Dentre as artes com o intuito de fisgar o peixe estão a linha de mão (anzol) correspondente a
um fio de náilon e um ou dois anzóis presos com a possibilidade de acompanhar pesos de chumbos.
A pitimbóia e a pindaúba correspondem a um galho de árvore reto e um fio de náilon preso
juntamente com uma isca normalmente usada para capturar não só peixes, mas também siris e
aratus, porém não se tem registros detalhados na literatura.
Na categoria de redes estão a caçoeira que possui um comprimento de 50 a 200m e 3 a 5
metros de altura, a parte inferior contem pesos de chumbos e a superior bolas de isopor que ficam
flutuando. O tainheiro possui a mesma estrutura diferindo apenas no comprimento da malha para a
captura da tainha ou peixes menores. A rede de espera corresponde as redes que ficam
805
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

verticalmente a coluna d’água comumente usada tanto nos mares quanto nos rios e o tamanho da
malha vai variar de acordo com a espécie que vai ser capturada, também são usados pesos e
flutuadores. A rede de camboa constitui uma rede de espera instalada verticalmente com o auxílio
de estacas de madeira nas camboas que são canais ou trechos do rio onde o peixe entra na maré
cheia e sai na maré baixa, momento em que os pescadores fazem a captura (SILVA, 2006). O
mangote constitui um tipo de rede de arrasto com duas estacas de madeira nas extremidades e é
executado com o auxílio de dois pescadores.
Em relação as pescarias de armadilha, foram citadas o Jereré e o Covo. O Jereré que é um
artefato de madeira semelhante a uma raquete de madeira composta por uma rede circular ou
triangular com aproximadamente 40 centímetros e que no Nordeste é amplamente utilizado para a
captura do peixe voador Dactilopterus volitans (MORAES, 2005). O covo constitui uma armadilha
em formato cilíndrico com duas entradas, onde se coloca uma isca para a captura de camarões. Essa
diversidade de artes de pesca faz com que haja um dinamismo na coleta das espécies de peixes e em
diferentes habitats (estuários, rios, manguezais e praias) sobretudo num cenário local de
superexploração de recursos pesqueiros, poluição advinda de rejeitos da cana-de-açúcar e da
carcinicultura.

CONCLUSÃO
A produção dessas pescarias está diretamente ligada ao conhecimento ecológico do pescador
em relação ao ambiente marinho e ao comportamento, hábitos e a abundância das espécies, visto
que tal conhecimento é passado entre as gerações através da oralidade. Dessa forma, se faz
necessário manter e valorizar os saberes tradicionais que produzem essas estratégias de pesca que
fazem com que a atividade da pesca artesanal seja dinâmica e a exploração pesqueira seja executada
de forma sustentável e não aplicada unicamente a uma espécie-alvo.

AGRADECIMENTOS
Agradeço aos pescadores e pescadoras da comunidade do Porto de Congaçari pelo
conhecimento transmitido, ao suporte do Laboratório ARRE Água – UFPE, ao Programa de Pós-
Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente e ao apoio concedido pelo Centro de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.

REFERÊNCIAS
BEGOSSI, A. Food taboos at Búzios Island (Brazil): their significance and relation to folk
medicine. J. Ethnobiol., 12:117-139, 1992.

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CIDREIRA-NETO, I. R.G.; RODRIGUES, G. G. Construções sociais e complexidades na gestão


da pesca artesanal. Revista Movimentos Sociais e Dinâmicas Espaciais, Recife, V. 7, N. 2, pp 46-
61, 2018.

CLAUZET, M. Etnoictiologia e uso de recursos naturais por pescadores artesanais costeiros


no Brasil. Tese (Doutorado em Ambiente e Sociedade) 2009. Campinas. Universidade Estadual de
Campinas. 2009.

DIEGUES, A. C. S. Pescadores, Camponeses e Trabalhadores do Mar. São Paulo: Ática, 1983.

FADIGAS, A. B. M.; GARCIA, L.G. Uma Análise do Processo Participativo para a Conservação
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MALDONADO, S.C. Pescadores do mar. São Paulo: Ática. 77p. 1986.

MORAES, S. C. Saberes da pesca: uma arqueologia da ciência da tradição. Tese (Doutorado


em Educação) 2005, Natal. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 2005.

RAMALHO, C. W. N. Pescados, pescarias e pescadores: notas etnográficas sobre processos


ecossociais.Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, vol. 11, núm. 2,
mayoagosto, pp. 391-414, 2016.

SILVA, A. F. Pesca Artesanal: seu significado cultural. Ateliê Geográfico, v. 3, n. 1, p. 142-159,


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SILVA, J. B. Territorialidades da pesca no estuário de Itapessoca: Técnicas, petrechos,


espécies e impactos ambientais. Dissertação (Mestrado em Geografia) 2006, Recife. Universidade
Federal de Pernambuco. 2006.

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ETNOCONHECIMENTO E MANEJO NA PESCA ARTESANAL DE ARATU


NA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA ACAÚ-GOIANA

Marília Lacerda Barbosa Fragoso*, Gilberto Gonçalves Rodrigues**

*Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Centro de Filosofia e Ciências


Humanas, Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: marilialbf@gmail.com
**Professor associado ao Departamento de Zoologia, Centro de Biociências, Universidade Federal de Pernambuco.
E-mail: gilbertorodrigues.ufpe@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
A RESEX é uma categoria de área protegida composta de áreas utilizadas por populações
tradicionais que dependem principalmente dos seus recursos, e tem como objetivo proteger a cultura
destas populações através da busca pelo uso sustentável dos recursos naturais(BRASIL, 2000). Tal
categoria, apesar de possuir o cuidado com a manutenção cultural de comunidades, não torna as
populações livres de possuírem seus modos de vida impactados (CASTRO e OLIVEIRA, 2016) de
forma a extinguir ou alterar características e práticas culturais, com o surgimento de novas práticas
devido à necessidade de adaptação às novas regras de gestão estabelecidas nestas áreas (MALLOL
e GOÑI, 2019).
A catação de aratu (Goniopsis cruentata, Latreille, 1803) é uma das principais atividades de
pesca realizada entre as comunidades beneficiárias da Reserva Extrativista (RESEX) Acaú-Goiana,
essa atividade é regulada por acordo de gestão estabelecido através da portaria nº 851 de 2017, que
contém regras e proibições responsáveis por criar problemáticas entre os pescadores. Apesar de
serem estabelecidas em conjunto e com a finalidade de conservação dos recursos naturais, as regras
do acordo de gestão partem do princípio que as artes de pesca são as principais atividades
causadoras de impactos na área da RESEX, e não consideram outras atividades potencialmente
impactantes realizadas por grandes empresas nas áreas de entorno em suas normativas.
Sendo conhecidos como populações tradicionais, os pescadores artesanais se tornam
importantes aliados à conservação com a utilização de seus conhecimentos e práticas para esforços
de conservação, quando alternativas de subsistência, como incentivos econômicos e educação,
básica e ambiental, são oferecidas (SODHI et al, 2010). Além disso, caracterizar a presença dessas
populações como algo danoso a natureza é desconsiderar a contextualização da relação que implica
na necessidade da coexistência de ambas (PEREIRA e DIEGUES, 2010).
Com o intuito de fornecer subsídios para a melhoria da gestão da pesca do aratu, esta
pesquisa está fundamentada nas bases da etnobiologia, etnoecologia e ecologia humana. E possui
como norteadoras questões referentes à instabilidade existente na atividade de catação: (i) como os
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

pescadores mantém suas práticas e modos de vida frente às regras estabelecidas nos decretos de
pesca e acordos de gestão? (ii) quais os impactos socioeconômicos existem devido às limitações?
(iii) quais subsídios, utilizando o etnoconhecimento dos pescadores sobre fatores ambientais locais
e características biológicas dos recursos, podem ser criados para a melhoria da gestão?
A partir disso, esta pesquisa tem como objetivo caracterizar a atividade da pesca de aratu nas
comunidades beneficiárias da Reserva Extrativista Marinha Acaú-Goiana, investigando o
etnoconhecimento das pescadoras sobre aspectos ambientais e suas características socioeconômicas.

2. METODOLOGIA
2.1 Área de estudo
O Estudo é realizado nas comunidades pesqueiras existentes na Reserva Extrativista
(RESEX) Acaú-Goiana, que foi estabelecida em 26 de setembro de 2007 através de Decreto
Presidencial (BRASIL, 2007). Localizada na divisa dos estados de Pernambuco e Paraíba, a RESEX
ocupa uma área de 6.678 hectares dos municípios de Caaporã e Pitimbu (Paraíba) e do município de
Goiana (Pernambuco). Os sujeitos da pesquisa são as pescadoras e pescadores que atuam na catação
dos aratus em Baldo do Rio, Tejucupapo, São Lourenço, Carne de Vaca, Congaçari e Acaú,
comunidades beneficiarias da RESEX Acaú-Goiana.

2.2 Métodos
A pesquisa de caráter quali-quantitativo possui uma metodologia exploratória participante,
na qual o pesquisador participa ativamente junto com os sujeitos da pesquisa (GIL, 2010) e
compreende a coleta de dados em campo com os pescadores através da observação no local de
pesca e/ou a utilização método “bola de neve”, no qual indivíduos inicialmente identificados como
informantes-chave (FERNANDES, 2011) indicam novos indivíduos para participar da pesquisa, aos
quais são aplicadas entrevistas semiestruturadas (HUNTINGTON, 2000) para obter informações
sobre as experiências e etnoconhecimentos obtidos durante as trajetórias de pesca.

2.3 Autorizações para a pesquisa


O projeto possui aprovação do ICMBio através do SISBIO - Sistema de Autorização e
Informação em Biodiversidade (N° 68878-1) por se tratar de um estudo em Unidade de
Conservação Federal, assim como da gestão da RESEX através da carta de anuência (N° 5349772)e
do Comitê de Ética Humana da Universidade Federal dePernambuco (n° 92768418.0.0000.5208).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A relação com a natureza na pesca de aratu existe desde o momento da escolha de dia de
pesca, visto que a atividade é regida pela maré, até às formas de captura utilizadas na atividade. Esta
relação harmônica com a natureza com um viés conservacionista, que visa a utilização mínima dos
recursos na busca pela sustentabilidade econômica e ambiental local(RAFFESTIN, 1993), é
característica em povos tradicionais, como os pescadores artesanais, que ao longo do tempo
desenvolveram sistemas de manejo diversos, nos quais atuam protegendo, conservando e
potencializando a diversidade biológica, (DIEGUES, 2008), da qual eles dependem.
Na RESEX Acaú-Goiana, os pescadores e pescadoras de aratu trabalham em sua maioria em
grupos familiares ou sociais. Os que não possuem barco próprio, alugam por 50 reais a semana e
dividem com seus grupos, que podem ser de até 10 pessoas, dependendo do tamanho do barco.
Dentre as formas de manejo observadas na pesca do aratu, se destaca a escolha dos locais de
captura, pois devido a abundância da espécie nas áreas de pesca, segundo os pescadores, os locais
são escolhidos de maneira visual, onde existe maior abundancia de indivíduos. Devido a escolha
aleatória de local de captura, os locais nunca se repetem a cada maré, dessa forma, não existe
pressão excessiva em apenas um ponto de captura.
A principal forma de captura de aratu na RESEX Acaú-Goiana é realizada durante o dia e
consiste na utilização de um instrumento simples, conhecido popularmente de “pindaúba”,
composto por um galho reto e uma linha, com a utilização de iscas que podem ser pequenos peixes,
pedaços de carnes ou frango, caranguejos e até mesmo o aratu, e um balde para armazenamento dos
recursos capturados. Existe também a captura noturna, realizada com a utilização de lanternas que
paralisam os indivíduos e facilitam a captura, está é realizada principalmente pelos homens.
Com relação aos conhecimentos biológicos das pescadoras sobre o aratu, as pescadoras
possuem conhecimento sobre a morfologia dos aratus, podendo identificar as diferenças entre
machos e fêmeas. E no que se refere a época reprodutiva, as pescadoras afirmam que as fêmeas
ficam ovadas (“patrona”) de 15 e 15 dias e que este ciclo possui influência da maré. Em estudo
realizado no sul da Bahia,Santos e colaboradores (2013) descrevem o período de reprodução do
aratu como sazonal-continuo, e relatam a presença de fêmeas ovígeras durante todo o ano, pesar da
elevação das ocorrências durante dois períodos, de janeiro a março (desova de verão) e de agosto a
outubro (desova entre o inverno e a primavera).
Estes resultados demonstram que as pescadoras e pescadores de aratu possuem
conhecimentos sobre condições ambientais, ecológicas e biológicas sobre as espécies e muitos
outros fatores, bióticos e abióticos,adquiridos ao longo da pesca, que se valorizados, podem ser
utilizados em ações conservacionistas dentro de áreas protegidas. Como na construção de critérios
para o etnomanejo de espécies a partir de estudos etnobiológicos, ou como critério para definição de

810
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

áreas prioritárias para a conservação, decorrentes do conhecimento tradicional e do manejo


tradicional (DIEGUES, 1995, 2000).

4.CONSIDERAÇÕES FINAIS
A relação harmônica com a natureza existente na pesca artesanal pode ser utilizada como
modelo para ações conservacionista em áreas protegidas. Apesar do viés protecionista para
populações tradicionais ainda existem diversos conflitos relacionados à gestão de RESEX, a
mediação destes conflitos deve partir da inclusão destes pescadores e da valorização de seus
conhecimentos e formas de manejo em todos os processos de criação e implementação e gestão.

5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto s/n de 26 de setembro de 2007, que cria a Reserva Extrativista AcaúGoiana,
nos Municípios de Pitimbú e Caaporã, no Estado da Paraíba, e Goiana, no Estado de
Pernambuco, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 27 de set. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Dnn/Dnn11351.htm >. Acessado em
março/2017. 2007.

BRASIL. Lei nº 9.98 5de 18 de julho, Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e
dá outras providências.Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,Brasília, DF, 18 de
julho de 2000.

CASTRO, R. R. A. de; OLIVEIRA, M. C. C. de. “Contradições em meio à tradição”: o processo de


criação da Reserva Extrativista Rio Xingu, Terra do Meio, Pará, Brasil. Desenvolv. Meio
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CIDREIRA-NETO, I. R. G.; RODRIGUES, G. G. Racismo Ambiental e a Pesca Artesanal: o caso


da Ilha de Deus, Pernambuco. Guaju, Matinhos, v. 4, n. 2, p. 125-141, jul./dez. 2018.

DIEGUES, A. C. Povos e Mares: Leituras em Sócio-Antropologia Marítima. São Paulo,


NUPAUB-USP, 1995.

DIEGUES, A C. Conhecimento e manejo tradicionais: ciência e biodiversidade. São Paulo:


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DIEGUES A. C. S. O mito moderno da natureza intocada. 6 ed. ampl ed. São Paulo: Hucitec:
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GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2010.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

MATTOS, P. P.; KONIG, A.; FREIRE, F. A. M.; ALOUF, M. A. I. Etnoconhecimento e percepção


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RAFFESTIN, C. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.

RAMIRES, M.; MOLINA, S. M. G.; HANAZAKI, N. Etnoecologia caiçara: o conhecimento dos


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M.Aspectos populacionais do aratu goniopsis cruentata (latreille, 1803) (decapoda, grapsidae) no
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SODHI, N. S. et al. Local people value environmental services provided by forested parks.
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812
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

MONITORAMENTO AMBIENTAL COMUNITÁRIO: PESQUISA-AÇÃO E


GESTÃO DO BEM COMUM NA RESERVA EXTRATIVISTA DE
CASSURUBÁ
COMMUNITY ENVIRONMENTAL MONITORING: ACTION RESEARCH AND
MANAGEMENT OF COMMON ON GOODS IN CASSURUBÁ EXTRACTIVE RESERVE

Marcelo Lopes*, Priscilla C. de Moura Estevão**, Pedro Henrique Dias Marques***


* Analista Ambiental, ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, Brasil. E-mail: marcelo.lopes@icmbio.gov.br
** Analista Ambiental, ICMBio/Ministério do Meio Ambiente, Brasil. E-mail: priscilla.estevao@icmbio.gov.br
*** Consultor do MMA para apoio da execução dos projetos de integração com as Comunidades do Sul da Bahia. E-
mail: pedro.ufmg.dias@gmail. com

INTRODUÇÃO
O conflito socioambiental entre Povos e Comunidades Tradicionais (PCT) e Unidades de
Conservação (UC) é mais evidente quando analisados os casos relacionados às UC de proteção
integral, por possuírem normas de uso mais restritivas. Esse tipo de conflito é estudado por diversos
especialistas e possui como referencial teórico na literatura científica a obra de Antônio Carlos
Diegues (2001b), ‘O Mito Moderno da Natureza Intocada’. Entretanto, as categorias de UC de uso
sustentável, que permitem o uso manejado dos recursos naturais, dentre essas, as Reservas
Extrativistas (RESEX), apesar de representarem um importante avanço conceitual e normativo do
Estado brasileiro (DIEGUES, 2001a), por si só, não são capazes de dirimir uma série de conflitos
socioambientais entre o Estado e os PCT (CHRISTMANN; VIEIRA, 2014).
A fiscalização ambiental, tratada como atribuição exclusiva do Estado e geralmente exercida
pelos órgãos ambientais (ANDRADE, 2014), é fator presente em grande parte dos conflitos
existentes entre os PCT e as UC, sendo utilizada como principal instrumento para coibir e punir as
ações de degradação, previstas como crimes ambientais. Por se tratar de atividades fundamentadas
na coerção e punição como opção ao controle social, é inevitável que, em diversas situações, a
fiscalização ambiental resulte no indesejável aumento da tensão entre os agentes públicos
fiscalizadores e os PCT (GALDINO, 2016). Nesse sentido, Elinor Ostrom (2000, p. 80)
problematiza a atuação coercitiva do Estado sobre os usos do “bem comum”1 ao citar uma das 1

formulações da teoria de Hobbes, segundo a qual os indivíduos que se envolvem em atividades de


proteção investem demais em armas e supervisão, fato que resultaria numa sensação permanente de
medo. Apesar de seu elevado custo social, tanto para o Estado quanto para os PCT, os métodos

1
Bem comum é a denominação escolhida por Ostrom (2000) para os territórios e/ou seus elementos naturais manejados
pelas populações locais de acordo com a sua própria cultura, não passíveis de algum enquadramento, incontestável, que
esteja fundamentado na dicotomia de natureza privada ou pública-estatal.
813
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

convencionais adotados pelos órgãos ambientais para executar a fiscalização ambiental,


combinados a uma estrutura administrativa insuficiente (FEENY et al., 1990; DI PIETRO, 2012),
possuem reduzida eficácia e eficiência nas UC de uso sustentável. Dentre as razões, algumas são: a
previsibilidade das ações, já que os PCT são capazes de perceber e comunicar entre si os momentos
de chegada, incursão e saída das equipes de fiscalização; o conhecimento insuficiente, por parte dos
agentes de fiscalização, sobre o território e os processos naturais destes ambientes, tais como a
maré, o clima, a noturnidade; as nuances de uma cultura institucional, na qual subsiste certa postura
policialesca e ostensiva; a diminuta participação, empatia e colaboração por parte dos PCT; os
elevados custos das operações de fiscalização e os recursos administrativos deficitários em relação
ao tamanho e à complexidade das áreas protegidas (GALDINO, 2016; DI PIETRO, 2012; FEENY
et al., 1990).
A experiência objeto deste relato ocorreu na RESEX Cassurubá, uma UC federal de uso
sustentável, gerida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio),
autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio Ambiente. Abrangendo uma área de
aproximadamente 100 mil hectares, os objetivos da RESEX são proteger o modo de vida tradicional
de pescadores, marisqueiras e pequenos agricultores e promover o uso sustentável do complexo
estuarino e faixa costeira de mar localizados entre os municípios de Alcobaça, Caravelas e Nova
Viçosa, no extremo-sul da Bahia. Dentre as dezenas de artes e saberes de pesca praticados pelos
extrativistas, destacam-se, pela quantidade de praticantes, a pesca do camarão e a captura do
caranguejo-uçá. A partir do segundo semestre de 2015, na busca por superar as limitações
conceituais, estruturais e fáticas acima expostas, a equipe gestora e os pescadores artesanais da
RESEX Cassurubá conceberam e iniciaram a execução do Monitoramento Ambiental Comunitário
(MAC).

MATERIAL E MÉTODO
Esta pesquisa-ação procurou apresentar soluções para os seguintes problemas: os PCT
podem ou devem estar envolvidos na proteção ambiental das RESEX, dos seus territórios
tradicionais e recursos naturais? É possível aprimorar a proteção ambiental de uma RESEX ao
complementarem-se as ações convencionais de fiscalização ambiental, exercidas exclusivamente
pelos agentes estatais, com a participação ativa dos PCT? Buscou-se responder a essas questões
com medidas e processos de aprendizado práticos, resguardando-se institucionalmente pelo
princípio constitucional que assegura ser a proteção ao meio ambiente um direito e um dever de
todos (BRASIL, 1988). Inspirado no Programa de Agentes Ambientais Voluntários do IBAMA
(2005), o MAC foi iniciado como um projeto piloto adaptado à realidade local no segundo defeso
do camarão de 2015 (IPE, 2016). A partir dos conhecimentos e decisões coletivas, a experiência foi
814
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

desenvolvida com o apoio dos seguintes métodos: mobilização dos pescadores artesanais
interessados; realização de reuniões circulares com o objetivo de compartilhar e nivelar os
conhecimentos tradicionais e institucionais, organizar os grupos e as equipes de monitores, escolher
os coordenadores das campanhas de monitoramento, definir as estratégias de atuação, planejar a
logística, compreender o papel a ser desempenhado pelos monitores ambientais comunitários,
equipe gestora e parceiros; e rodas de conversa para acompanhamento e avaliação dos trabalhos,
bem como para resolução dos conflitos ocorridos entre os participantes (THIOLLENT, 1985). O
MAC contou com o apoio de recursos financeiros do Projeto Áreas Marinhas e Costeiras Protegidas
(GEFMAR) (BRASIL, 2014; LEÃO, 2017), utilizados para o pagamento de diárias e compra de
combustível para os monitores comunitários, nos moldes do “estímulo positivo”conceituado por
Mancur Olson (2015).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como um projeto piloto, o MAC começou com a participação de 12 pescadores da
comunidade da Barra de Caravelas, durante o defeso do camarão no segundo semestre de 2015,
sendo expandido para outros 16 períodos de defeso, acrescidos os defesos do caranguejo-uçá e do
robalo. Até janeiro de 2019, já haviam participado 113 pescadores da região ribeirinha, de Ponta de
Areia, de Barra de Caravelas, das cidades de Caravelas e Nova Viçosa, além de Aparaju, distrito
situado no município de Alcobaça. Os depoimentos registrados pelo documentário Cuidando do
Meu Lugar2 traduzem com sabedoria e simplicidade a compreensão dos pescadores artesanais
1

envolvidos no MAC.
Quanto aos aspectos formais e institucionais relacionados ao MAC, menciona-se que o
plano de ação do Conselho Deliberativo da RESEX Cassurubá orienta que a gestão do ICMBio
envolva os extrativistas nas ações de proteção ambiental da UC, assim como há indicação do MAC
no Plano de Manejo da RESEX, que aguarda publicação. O envolvimento dos PCT na proteção dos
recursos naturais e do meio ambiente no âmbito de uma RESEX exige uma disputa conceitual e
uma práxis transformadora. Quase não há soluções disponíveis para essa questão no concretizado
‘lugar comum’ institucional.
No entanto, Ostrom (2000) estabelece oito princípios que são comuns aos casos exitosos em
autogoverno do “bem comum” nas mais diversas partes do mundo. Entre esses, encontra-se o
‘monitoramento comunitário’. A obra de Elinor Ostrom e do seu grupo de pesquisa demonstra, por
meio de levantamento, análise, sistematização e apresentação de centenas de exemplos empíricos
em diversas regiões do mundo, a real possibilidade de existência de uma gestão comunitária

2
Produzido pelo cineasta e produtor cultural Jaco Galdino (2016), este documentário apresenta o MAC por meio dos
depoimentos de pescadores, analista ambiental e parceiros.
815
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

participativa responsável pelo ordenamento e uso sustentável dos recursos naturais


(CHRISTMANN; VIEIRA, 2014). Assim, compreende-se que experiências dessa natureza são
perfeitamente compatíveis com os preceitos legais e conceituais constitutivos das RESEX
(BRASIL, 2000; CHRISTMANN; VIEIRA, 2014) por serem as ações coletivas, nesses casos,
desejáveis, viáveis e efetivas (FEENY et al., 1990). Observa-se que ao menos seis dos oito
princípios estabelecidos por Ostrom (2000), com base nos casos empíricos investigados e
considerados exitosos quanto ao autogoverno do “bem comum”, ocorrem no MAC (GALDINO,
2016; IPE, 2016).
Há que se superar a cultura estatal conservadora, que compreende a proteção ambiental
como atribuição exclusiva dos agentes de Estado, passível de ser constatada pela ausência de
previsões legais e infralegais, que permitam o envolvimento dos PCT nas ações de proteção
ambiental (ANDRADE, 2014). Percebe-se na análise da experiência do MAC que os referenciais
supracitados, sejam esses: conceituais, teóricos, empíricos ou legais, harmonizam-se sobremaneira
com o modelo de participação popular desenvolvido por mais de três anos pelos pescadores
artesanais, equipe gestora e parceiros da RESEX Cassurubá.

CONCLUSÃO
Ao se observarem o histórico e as características do MAC, por meio das lentes conceituais e
teóricas adotadas pelos estudiosos da “gestão do bem comum”, constata-se um exemplar das boas
práticas de soluções locais estudadas, que, além de desafiar o modelo hegemônico e limitado pela
dicotomia direito público x direito privado, é capaz de oferecer soluções eficientes, genuinamente
participativas e respeitosas em relação aos direitos do PCT sobre os seus territórios tradicionais.

REFERÊNCIAS
ANDRADE, Yumei Oliveira. O poder de polícia ambiental exercido pelo particular e a
(i)legalidade no Direito Brasileiro. Belo Horizonte:ESDHC, 2014.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 20
set. 2018.

BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII
da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá
outras providências. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC. Brasília:
Diário Oficial da União, 2000.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Portaria n. 349, de 2014. Disponível em:


<http://www.mma.gov.br/images/arquivos/areas_protegidas/gef-mar/Portaria-349-26set14-
Dou29set14.pdf>. Acesso em: 20 set. 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CHRISTMANN, L. L.; VIEIRA, Ricardo Stanziola. Gestão de bens comuns: Tragédia dos comuns
ou tragédia dos comunitários? Reflexões em torno da gestão de unidades de conservação de uso
sustentável. In: CAMPELLO, Livia Gaigher Bosio; PADILHA, Norma Sueli; ANTUNES, Paulo de
Bessa. (orgs.). Direito Ambiental I. Florianópolis: CONPEDI, 2014. p. 361-389.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade administrativa na Constituição de 1988.


3. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

DIEGUES, Antonio Carlos. Espaços e recursos naturais de uso comum. São Paulo: NUPAUB,
2001a.

DIEGUES, Antonio Carlos. O Mito moderno da natureza intocada. São Paulo: HUCITEC,
2001b.

FEENY, D. H.; BERKES, F.; MCCAY, B. J.; ACHESON, J. M. The Tragedy of the Commons:
twenty-two years later. Human Ecology, v. 18, n. 1, p. 1-19. 1990.

GALDINO, Jaco Santana. Cuidando do meu lugar. 2016. Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=useyifCdAsg&list=PLwIoEO_omXz1LosaETWIZM8eskhBq
u0y-&index=1>. Acesso em: 20 set. 2018.

IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Instrução
Normativa Ibama n° 66, de 12 de maio de 2005. Disponível em:
<http://www.icmbio.gov.br/cepsul/images/stories/legislacao/Instrucao_normativa/2005/in_ibama_6
6_2005_programasagentesambientaisvoluntarios.pdf>. Acesso em: 20 set. 2018.

IPE - Instituto de Pesquisas Ecológicas. Boas práticas na gestão de unidades de conservação.


2016. p.126-128. Disponível em: <http://www.ipe.org.br/ultimas-noticias/805-revista-boas-praticas-
na-gestao-de-unidades-de-conservacao-leia-aqui-2>. Acesso em: 15 set. 2018.

LEÃO, Adriana Risuenho. Do projeto a um plano nacional de conservação e uso sustentável


dos manguezais do Brasil em unidades de conservação. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisas
Jardim Botânico do Rio de Janeiro, Escola Nacional de Botânica Tropical, 2017.

OLSON, M. A lógica da ação coletiva: os benefícios públicos e uma teoria dos grupos sociais São
Paulo: EDUSP, 2015.

OSTROM, Elinor. El gobierno de los bienes comunes: la evolucion de las institu de acción.
México, UNAM-CRIM-FCE, 2000.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da pesquisa-ação. São Paulo: Cortez, 1985.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CULTIVANDO AS NOSSAS RAÍZES – CULTURA E CONSERVAÇÃO NA


RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DE SOURE
GROWING OUR ROOTS – CULTURE AND CONSERVATION ON SOURE MARINE
EXTRACTIVE RESERVE

Cilene Andrade*,Bruna Maria Lima Martins, Gabriella Calixto Scelza**

Associação de Moradores do Bairro do Pacoval, Brasil. *


Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade**

1. INTRODUÇÃO
O município de Soure está localizado no arquipélago do Marajó, ou “Ilha Barreira do Mar”
como canta o Mestre Diquinho, do Grupo de Carimbó Tambores do Pacoval. A ilha é uma barreria
física as ações das correntes do oceano Atlantico, da Foz do Rio Amazonas e da Baía do Marajó. O
munícipio tem uma população total de 23.001 habitantes (IBGE, 2010), os quais são decendentes de
povos ancestrais que habitavam a região, com costumes e identidades que formam o que se
considera hoje como a cultura marajoara (SCHAAN; MARTINS, 2010). Algumas dessas
expressões e valores que versam a relação instrinseca “homem e natureza” podem ser visualizados
nos tempos atuais, em parte, graças ao resgate da memória e identidade feitas por líderes
comunitários, como o artesão Ronaldo Guedes. Nos últimos anos, a população do município tem
aumentado consideravelmente, somado a isso, o êxodo rural provocado pela propria dinâmica
costeira da região, e por mudanças de atividades econômicas tem resultado em uma ocupação
urbana desordenada, o que originou novos bairros entre eles o bairro do Pacoval. A vila do
Araruna, uma antiga vila de pescadores situada na faixa de litoral, por exemplo foi empurrada pelas
marés, e hoje os pescadores e extrativistas que viviam no centro do mangue, passaram a ocupar as
periferias da sede do munícipio de Soure. Mestre Diquinho era um desses moradores, que no centro
urbano, passou por anos de ostracismo até ser resgatado pela Associação de Moradores do Bairro do
Pacoval – AMPAC – onde hoje pode transmitir seu conhecimento tradicional aos jovens do grupo
de Carimbó.
Como fruto da luta pela garantia do território ancestral, os pescadores e extrativistas,
especialmente os caranguejeiros, tiveram no ano de 2001 o decreto de lei que estabeleu a Reserva
extrativista – RESEX- Marinha de Soure (ICMBIO, 2018). A criação da unidade, com uma area de
27.463 hectares, tem como objetivos a proteção de áreas costeiras, estuarinas, praias e vegetação de
restinga e a manutenção dos modos de vida tradicionais. A RESEX MAR de Soure, conta com mais
de 1.300 famílias cadastradas como beneficiárias ou usuárias desta área e apresenta um forte
contexto cultural, marcado pelos saberes que envolvem o extrativismo, a relação próxima com o

818
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ambiente natural, e outras manifestações diversas, como a gastronomia característica, produção de


cerâmica, ritmos e danças tradicionais (Boi, Lundum Marajoara e Carimbó).
A garantia do território foi a primeira luta de pescadores, no entanto essa luta por território
não foi vencida com a criação da RESEX. Ainda emerge o conflito com fazendeiros locais por
acesso a áreas de mangue e praias. O enfrentamento também exige melhoria de qualidade de vida, e
num aspecto mais profundo passa-se a observar também a necessidade de resgatar auto-estima de
mulheres, homens e jovens que tem diariamente seus valores e identidades negados pelas mídias,
pela sociedade e pelo meio urbano.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Entrevistas semi-estruturadas: condução de entrevistas junto ás famílias da comunidade do
bairro do Pacoval, no período em dezembro de 2016. Foram realizadas 53 entrevistas com intuíto
delevantar a percepção da comunidade em relação ás ações da Associação de Moradores do Bairro
do Pacoval e do grupo de carimbó Tambores do Pacoval.
Oficina participativa junto ao grupo de carimbo Tambores do Pacoval: com auxilio de
ferramentas de diganóstico participativo foram levantadas a linha do tempo do grupo, sua atuação e
participação na comunidade. Ao mesmo tempo buscou-se identificar o sentimento dos participantes
do grupo em relação ao orgulho de pertencer a uma prática cultural.
Observação participante: relatos que buscam apartir da propria experiência identificar os
principais desafios e oportunidades percebidos pelos participantes na prática da realização de
eventos periódicos na comunidade. Diz respeito as apresentações de carimbó realizadas na sede da
associação e participação em eventos culturais regionais.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ao visitar as ruas do municipio de Soure destacam-se as questões de infraestrutura,
saneamento básico, asfaltamento e iluminação das vias públicas (FUNDO VALE, 2018). Ao
adentrar espaços familiares torna-se aparente a má qualidade do atendimento de saúde e do
abastecimento de água. Não menos invisível está acentuado o tráfico de drogras, a violência
doméstica e a prostituição infantil. Essa é a realidade enfrentada pelos comunitários e extrativistas
que vivem proximos a maior faixa contínua de manguezais do mundo.
Pescadores e extrativistas que precisam enfrentar diariamente distâncias e cercas para
acessar seus territórios, mulheres sem alternativa de renda para suprir a demanda dos lares, jovens e
crianças, distantes de exercer seus direitos de cidadania. Como esperar que os membros dessa
comunidade se encontrem, se organizem, deliberem sobre suas necessidades, quando a maré parece
estar contra a esses desejos? Como trazer alegria, lembrar a relação ancestral com a natureza,
819
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

valorizar os traços, os modos? Como resgatar valores e transformar essa realidade? Como diante de
tudo isso, esperar que essa comunidade possa se reconhecer, valorizar e proteger a maior faixa
continua de manguezais do mundo? É nesse sentido que se ressalta a importância da existência de
espaços como associações, grupos organizados, etc, para promover o resgate e a valorização das
expressões culturais locais, desenvolvendo maior sentimento de pertencimento e protagonismo da
comunidade na gestão do território. Como ressalta o relato de uma socio fundadora da Associação
de Moradores do Bairro do Pacoval – AMPAC-, que mostra o contextoda experiência desenvolvida
pela associação:
“A gente quer chamar atenção não só dos visitantes, mas principalmente da nossa
comunidade. Do quanto que é importante cuidar desse lugar, do quanto é importante a gente saber
do lugar que estamos pisando. Nós aqui do Pacoval estamos na aréa de entorno da Resex, então é
muito significativo essa relação. Inspira muito cuidado para com as nossas áreas de proteção, para
os nosssos lugares de convivência e nós esstamos aqui deixando nosso recado por meio do
carimbó, da cerâmica, e outras atividades. Eu sou conselheira, do conselho deliberativo da
Reserva Extrativista Marinha de Soure. E enquanto conselheira, é nosso dever também cuidar
desse lugar sensível.” (Cilene Andrade, socio-fundadora da Ampac e conselheira do conselho
deliberativo da Resex Marinha de Soure).
O processo que remonta o ano de 2005 tem protagonizado mudanças sociais reais na vida da
comunidade e da RESEX. Por meio de atividades educativas, culturais e ambientais, observa-se a
inclusão de jovens e mulheres e o próprio estímuloa participação na gestão do território.A prática é
reconhecida pelos moradores do bairro: valorizar a cultura marajoara (30%), trazer reconhecimento
ao bairro (21%) e tirar os jovens das drogas (19%) são os principais beneficios percebidos pela
comunidade do bairro. No ateliê arte mangue do artista plástico Ronaldo Guedes, uma das iniciativa
da associação, a produção de cerâmica gera renda para mulheres e inclui jovens em um espaço de
expressão artistica, convívio e aprendizagem. O contato com a materia prima fomenta também
discussoes de boas praticas, hoje as peças são comercializadas com valores que agregam a cultura e
o território. “Eu sou Marajoara”, Mestre Diquinho, canta com orgulho, suas letras e melodias que
ecoam nas vozes de crianças e jovens que compõe o Grupo de Carimbó Tambores do Pacoval, outra
iniciativa da AMPAC. O resgate de mestres é feito pelo grupo desde 2008, ano em que os jovens, se
agregam ao movimento e se mostram detentoras do patrimonio cultural.
“ (..) Poder celebrar a nossa memória, a nossa história. É um espaço realmente muito forte,
um espaço onde a gente pode contemplar, difundir e emanar a nossa satisfação de ser marajoara,
de ser da Amazônia, de fortalecer o nosso eu, a nossa relação com a nossa terra com o nosso
lugar, com a nossa história, e nada melhor do que fazer tudo isso dançando e sendo feliz. Então
vamos curtir carimbó.” (Artesão Ronaldo Guedes, socio fundador da Ampac).
820
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
Ao sair do centro do mangue e da praia, os extrativistas ficaram periféricos de um centro
urbano em crescimento desordenado, marginalizados dos serviços basicos de saúde, educação e
segurança (FUNDO VALE, 2018). A lacuna de geração de renda e ocupação para os jovens foi
preenchida pela violência, tráfico de drogas e baixa auto-estima da comunidade, e assim aos poucos
os moradores foram perdendo a conexão com a natureza e participação no território da Resex. A
partir do resgate da identidade cultural por meio produção de cerâmica e do carimbó, os moradores
do bairro se organizaram em associação e coletivo e conseguiram de forma concreta gerar renda
para jovens e mulheres, valorizar e divulgar a identidade local, e assim estimular maior participação
social dos moradores da gestão do território. Atualmente os membros da associção participam do
corpo consultivo da reserva e protagonizam ações de cuidado com o território. A Associação é
referencia no município de Soure no que diz respeito ao desenvolvimento de atividades culturais e
inclusão social. É importante destacar que fortalecer esses espaços endereça o proprio objetivo das
reservas extrativistas em garantir o modo de vida das comunidades. São mãos fortes as que tocam
os tambores, são mãos delicadas que moldam o barro, são essas mãos que se unem para transformar
a realidade local, são ações que inspiram mudança, são vozes que discutem gestão do territorio, que
resgatam sua culturae dizem que sem regar essas raízes a natureza não prospera.

5. AGRADECIMENTOS
Ao projeto “Valores e Identidades Culturais da RESEX Marinha de Soure: o grupo de
carimbo Tambores do Pacoval” (ICMBio). Aos mestres e mestras que sustentam a cultura popular,
em espcial a cultura costeiro-marinho, e aos jovens que estão na manuntenção dessa prática.

6. REFERÊNCIAS
FUNDO VALE. O caranguejo-uçá e o camarão regional-da-amazônia no estado do Pará: as
cadeias de valor da pesca artesanal de camarão e caranguejo na Costa Amazônica do Brasil;
contexto social, econômico, ambiental e produtivo. – Brasília, 256 p.; il. - (Série Pesca Sustentável
na Costa Amazônica, 3), 2018.

IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:


https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pa/soure/panorama. Acesso em 16/09/2019.

ICMBIO- Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Plano de Manejo da


Reserva Extrativista Marinha de Soure. Disponível em
:http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/plano-de-
manejo/plano_de_manejo_resex_marinha_de_soure_v19.pdf. Acesso em 16/09/2019.

SCHAAN, D. P.; MARTINS, C. P. Muito além dos campos: arqueologia e história na


Amazônia Marajoara. – 1. ed. – Belém : GKNORONHA, 2010. 200 p. Inclui bibliografias. ISBN
978-85-62913-01-3
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

SE FAZENDO DO MAR: TERRITORIALIDADE E CONHECIMENTO


TRADICIONAL DOS PESCADORES ARTESANAIS DE SÃO JOSÉ DA
COROA GRANDE, PERNAMBUCO
MAKING FROM THE SEA: TERRITORIALITY AND TRADITIONAL KNOWLEDGE OF
ARTISIAN FISHERS OF SÃO JOSÉ DA COROA GRANDE, PERNAMBUCO

Ramona Raissa do Nascimento Guerra Melo Ribeiro*, Cristiano Wellington Noberto Ramalho**

Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia pela UFPE, Brasil.


Doutor do Departamento de Sociologia pela UFPE, Brasil.

INTRODUÇÃO
A pesquisa desenvolvida propôs-se a estudar os pescadores artesanais situados na praia de
São José da Coroa Grande, Pernambuco, cujo enfoque central do trabalho foi a figura do mestre de
pesca, o qual é também um formador, um educador dos novos pescadores, de modo que não possa
haver o trabalho da pesca artesanal embarcada (pescaria feita por meio de embarcações: barcos
motorizados, canoas e/ou jangadas) sem que haja a presença do mestre, assim como não pode
existir este sem aquele. O mestre da pesca artesanal é o pescador mais habilidosos no manuseio com
as águas, sabedor de seus percursos, possuindo conhecimento sofisticado sobre o ciclo das espécies
de pescados, formas de marcação dos pesqueiros, capacidade de articular questões meteorológicas
como tipos de ventos e marés, fases da lua, bem como é aquele que detém um reconhecimento do
seu saber-fazer, respeito e autoridade por parte dos demais tripulantes/pescadores (MALDONADO,
1993), o que conseguimos certificar em campo.
No que diz respeito as pesquisas desenvolvidas nas ciências sociais, sabe-se que durante
décadas os pescadores artesanais foram abordados como subcategoria do campesinato, devido a
algumas semelhanças por eles partilhados, visto que, além de serem atribuídos como produtores
primários (de alimentos), a sociabilidade desses grupos sociais se constituiriam pelo núcleo familiar
e por laços de compadrio. Porém, tais semelhanças não foram suficientes para explicá-los, uma vez
que para o pescador artesanal, o pescado capturado não teria apenas um "valor de uso", mas,
principalmente, um caráter de mercadoria. O pescador seria resultado das transformações históricas
vividas pela pesca e pelas regiões litorâneas, sendo, portanto, um desdobramento, em algumas
localidades, do primeiro tipo pescador mencionado anteriormente, graças a perda de terras em
decorrência da especulação imobiliária ou o avanço dos grandes empreendimentos agrícolas.
Sendo assim, o processo de afastamento do continente - que ocorre quando o pescador
artesanal passa a maior parte do seu tempo de vida e de trabalho nas águas do mar - acaba
resultando na construção de um conhecimento tradicional que possui particularidades objetivas e
subjetivas. Este conhecimento tradicional, abarca as dimensões da territorialidade e do trabalho
822
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

ofertando profundas singularidades socioculturais a esse sujeito social. Tal processo exige a
existência de uma relação de cooperação e reciprocidade entre os pescadores, que se desenvolveria
a partir do perigo representado pelo mar em sua magnitude e o tipo de trabalho aí exigidos para se
pescar em águas marinhas. Sendo, neste momento que emerge a figura do mestre de pesca,
historicamente, como alguém portador de uma autoridade que detém de um conhecimento particular
e rico sobre a natureza, sendo fator determinante para a produção pesqueira acontecer e o
conhecimento tradicional artesanal fazer-se.
A importância da pesca artesanal no país enquanto setor produtivo de grande relevância
configura-se na inserção de mais de 1 milhão de pessoas diretamente na atividade, onde o Nordeste
brasileiro responde por mais de 400.000 desse universo. No caso de Pernambuco, a mesma cumpre
vários papeis de destaque, seja na segurança alimentar de inúmeras famílias em muitos municípios
costeiros, seja por ser também um trabalho que emprega números expressivos em várias cidades
litorâneas do nosso estado (Goiana, Itapissuma, São José da Coroa Grande e Tamandaré, por
exemplo), o que é apontado por pesquisas realizadas pelo Ministério da Pesca e Aquicultura em
2013 e pelo Instituto Oceanário-UFRPE em 2010.
São José da Coroa Grande, litoral sul do Estado de Pernambuco (distante a 150 km da
capital, Recife), representa, por sua vez, um local em que uma das principais atividades
socioeconômicas é a pesca artesanal -sendo o município responsável pela maior produção pesqueira
do Estado em seu litoral sul (RAMALHO, 2016) - que, assim como em outros lugares, passa por
reformulações em suas práticas decorrente das mudanças socioambientais, da especulação
imobiliária e das interferências industriais em seu meio, de modo que se fez relevante analisar, a
partir do ponto de vista das comunidades pesqueiras, como essas mudanças são concebidas e
compreendidas.
Diante da necessidade política e social de conciliar as demandas por utilização de recursos
naturais costeiros, a presente pesquisa teve como objetivo principal responder a seguinte pergunta:
Qual a relação do mestre com a territorialidade? Analisando como a construção dos territórios
pesqueiros poderia vir a se relacionar com a elaboração de conhecimentos ecológicos, além de
buscar em seus objetivos específicos repostas a questões relevantes como: Qual a relação do mestre
com o afeto? E conhecimento tradicional, também chamado por Diegues de etnoconhecimento
pesqueiro? Partindo da socioantropologia marítima das populações tradicionais, de modo a garantir
a conservação da biodiversidade e a permanência dos serviços ambientais inerentes a esses
ecossistemas, assim como a sustentabilidade das importantes atividades que deles dependem, como
a pesca.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

MATERIAL E MÉTODOS
Para alcançar tais objetivos, a metodologia realizada seguiu o modelo proposto nos estudos
da socioantropologia da pesca, que busca subsídio nas práticas etnográficas, com uma análise
qualitativa dos dados obtidos, a fim de identificar os elementos constitutivos do saber-fazer que se
faz presente no conhecimento pesqueiro desses homens do mar, com realização do campo ocorrida
entre o período de setembro de 2017 até maio de 2018, ao qual foram entrevistados 10 mestres de
pesca embarcado da localidade. Ademais, através dos recursos já citados, fez-se possível identificar
a configuração do mestre de pesca local, ao qual possui algumas especificidades, sendo interessante
destacar a presença de dois tipos de perfil do mestre em São José da Coroa Grande, cuja
racionalidade diferencia-se entre uma racionalidade mercantil e uma racionalidade simbólica.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
Em São José da Coroa Grande, a pesca artesanal desenvolvida em alto-mar conta,
geralmente, com a presença de três pescadores nas embarcações, sendo sempre um deles, o mestre.
O pescado adquirido nas navegações através da pesca de linha, em alguns casos, é dividido de
forma igualitária entre os pescadores, havendo apenas uma parcela específica para o dono do barco
- devido aos gastos com o custo da embarcação -, que pode ou não ser o mestre. Ou seja, se forem
três tripulantes, a produção é dividida por quatro (a dos três pescadores que embarcaram e a parte
destinada ao barco – incluísse aí a manutenção). Tal divisão/partilha existe há séculos na pesca,
recebendo o nome de quinhão.
No caso de ser uma pesca mais mercantil (lagosta, camarão), a divisão ocorre de forma
desigual. A função do mestre se apresenta aqui como financeiramente mais benéfica, cujo mestre
detém de um terço do valor obtido pela produção, o que faz com haja uma racionalidade voltada
para esta produção, associando a função do mestre como algo que traz consigo alguns privilégios,
como destacou seu Clarimundo:

Se não fosse pra ganhar mais eu não queria ter sido mestre. O mestre tem seus
privilégios, né? Ganha mais, dorme melhor. Se me oferecessem um emprego
melhor em terra eu ia, mas como não tinha, ser mestre é melhor do que ser um
proeiro, por exemplo. Eu mesmo não pesco mais porque já me aposentei, vendi até
meu barco, mas enquanto pescava preferia ser mestre por isso (56 anos, mestre de
pesca aposentado em São José da Coroa Grande).

O local escolhido para atracarem os barcos à beira do mar oferece uma visão privilegiada da
Colônia Local dos Pescadores, facilitando o trajeto de descarregamento dos peixes, visto que ao
voltar da pescaria, alguns dos pescados são encaminhados para Colônia, facilitando também o
carregamento do barco de acordo com os elementos necessários para o ofício da pescaria. Cabe

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

dizer que também existem casos em que o pescado não é direcionado a colônia, devido a existência
de atravessadores - pessoas responsáveis por receber o pescado e direcioná-los a empresas como a
Qualimar - e comerciantes, além de serem vendidos também autonomamente pelos próprios
pescadores.

CONCLUSÃO
A presente pesquisa se propôs a estudar os pescadores artesanais em São José da Coroa
Grande, observando a partir da figura do mestre de pesca sua relação com a territorialidade e,
consequentemente, sua relação com o afeto e o conhecimento tradicional por eles desempenhados.
Posto isto, a partir dessas esferas - territorialidade e afeto - foi possível identificar o modo
organizacional em que vivem.
Tais dimensões, aqui compreendidos como elementos constitutivos do etnoconhecimento
pertencente ao mestre de pesca, foram de suma importância para o entendimento de que, sem o
mestre, os conhecimentos ficarão cada vez mais técnicos, perdendo o seu caráter artesanal. Neste
sentido, fez-se possível estabelecer de forma mais veemente a necessidade acerca do domínio das
águas para o exercício da pesca, onde o mestre não deve ser reconhecido através da habilidade de
manusear aparelhos tecnológicos como por exemplo o GPS, este, em sua maioria, não faz uso de tal
equipamentos.
Para os mestres entrevistados, a dimensão da territorialidade está ligada ao fato de saber
marcar, de identificar os pesqueiros, há um mapa geográfico dentro de sua mente que o faz ser
capaz de guiar-se pela lua e estrelas, pelo sol e pelo vento, para que então venha a exercer o saber-
fazer pesqueiro. Neste sentido, tais recursos inovadores como o GPS caso viessem a ser utilizados
no processo de aprendizado da pesca, serviriam apenas como recurso inicial, sendo necessário
dominar muito além do que um simples objeto.

AGRADECIMENTOS
Esta pesquisa originou-se de uma Pesquisa de Iniciação Cientifica - PIBIC iniciada em
2017, e intitulada “Territorialidade, trabalho e etnoconhecimento pesqueiro em São José da Coroa
Grande” sob a orientação do Dr. Cristiano Wellington Noberto Ramalho e financiamento da
Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco – FACEPE, resultante no
Trabalho de Conclusão de Curso, o qual compete ao resumo aqui exposto.

REFERÊNCIAS
DIEGUES, Antonio Carlos. A pesca construindo sociedade. São Paulo: Nupaub/USP, 2004

825
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

______. Etnoconservação: novos rumos para a conservação da natureza. São Paulo. Nupauh-
USP, 2000

______.Pescadores, camponeses e trabalhadores do mar. São Paulo: Ática, 1983

______.Diversidade biológica e culturas tradicionais litorâneas: o caso das comunidades


caiçaras, São Paulo, NUPAUB-USP, Série Documentos e Relatórios de Pesquisa, n. 5, 1988

FURTADO, Lourdes Gonçalves. Pescadores do rio Amazonas: um estudo antropológico da


pesca ribeirinha numa área amazônica. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 1993

MALDONADO, Simone Carneiro. Mestre e Mares: Espaços e Indivisão na Pesca Marítima.


São Paulo, Annablume, 1993
______.Pescadores do mar. São Paulo: Ática, 1986

MARX, Karl. O capital. v.01. Boitempo; Edição: 2ª. 2017

RAMALHO, Cristiano. Ah, esse povo do mar! Um estudo sobre trabalho e pertencimento na
pesca artesanal pernambucana. São Paulo: Polis, SP: CERES, 2006

______.A formação histórica da pesca artesanal: Origens de uma cultura do trabalho apoiada
no sentimento de arte e de liberdade. Cadernos de Estudos Sociais. Recife. jul/dez. V. 24 nº2
p.261-285, 2008

______.A desnecessidade do trabalho entre os pescadores artesanais. Sociologias, Porto Alegre,


ano 17, no 38, jan/abr 2015

______.Elos de pertencimento na pesca artesanal. In: CASTELLUCCI JÚNIOR, Wellington;


BLUME, Luiz Henrique dos Santos. Populações litorâneas e ribeirinhas na América Latina: estudos
interdisciplinares (vol. 2). Salvador: Eduneb, 2017

______.Embarcadiços do encantamento: trabalho sinônimo de arte, estética e liberdade na


pesca marítima. Campinas: Ceres-Unicamp; São Cristóvão, Editora da UFS, 2017

WEBER, Max. Á ética protestante e o “espirito” do capitalismo. São Paulo. Companhia das
Letras, 4º reimpressão. 2004.

826
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONHECIMENTO ETNOECOLÓGICO DAS COMUNIDADES


PESQUEIRAS DE CRUSTÁCEOS NO NORDESTE BRASILEIRO
ETHNECOLOGICAL KNOWLEDGE OF THE FISHING COMMUNITIES OF CRUSTACEANS
IN THE NORTHEAST BRAZIL

Marina Correia Lima*, Gilberto Gonçalves Rodrigues**, Gilberto Nicacio***

*Pós-Graduação em Morfotecnologia, Centro de Biociências, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.


**Departamento de Zoologia, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.
***Pós-Graduação em Morfotecnologia, Centro de Biociências, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.

1. INTRODUÇÃO
Ambientes de mangue destacam-se quanto à sua produtividade biológica, pois pela natureza
dos seus componentes são encontradas espécies de todos os elos da cadeia alimentar. Os estuários,
quando associados a bosques de mangue recebem uma infinidade de compostoshúmicos,
favorecendo a continuidade da alta produção biológica proveniente dos manguezais. Outro ponto
diretamente relacionado a alta produtividade biológica destes ambientes é o fato de espécies de
peixes, moluscos e crustáceos encontrarem as condições ideais para o desenvolvimento das suas
próximas gerações (SCHAEFFER-NOVELLI, 1982; 1995).
Crustáceos decápodos são imprescindíveis membros das comunidades biológicas em regiões
estuarinas. Algumas pequenas espécies deste grupo auxiliam também no crescimento,
desenvolvimento e funcionamento dos ecossistemas tropicais, já as espécies de maior tamanho são
utilizadas como fonte de alimento e subsistência pelas comunidades tradicionais/locais
(HENDRICKX, 1995). A importância dos ambientes de mangue tem sido cada vez mais difundida
entre os administradores governamentais, porém, este conhecimento já vem sendo perpetuado em
comunidades costeiras há muito tempo. Além da importância ecológica, biológica e econômica, os
manguezais também detêm alto valor visual, possibilitando até mesmo a implementação do turismo
de base local, atividade limpa que geraria renda e impulsionaria a economia (LANDIM, 2003) e
desenvolvida em algumas localidades do nordeste brasileiro.
Na classificação de Unidades de Conservação vigentes, a Reserva Extrativista (RESEX)
destaca-se por ser uma categoria que possui certo grau de atividades humanas baseadas no
extrativismo, sendo utilizada por populações tradicionais com objetivo de proteger os meios de vida
e a cultura dessas populações, assegurando o uso sustentável de recursos naturais (BRASIL, 2000;
2011), como os florestais e pesqueiros. As organizações sociais dessas comunidades juntamente
com suas propostas permitem a consolidação destas áreas, visto que os mesmos detêm elevado
conhecimento acerca da biodiversidade relacionada e dos processos naturais de áreas protegidas
827
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

(ARRUDA, 1999), promovendo o manejo sustentável de áreas como estuários e manguezais e


desempenhando um papel essencial para a conservação e gestão desses ecossistemas. Diegues
(2019) reitera ainda a relevância do conhecimento empírico detido por comunidades tradicionais no
desenvolvimento de novas frentes eco científicas e conservacionistas.
Deste modo, entendendo a importância da relação das comunidades pesqueiras com os
ecossistemas locais e seus advindos recursos, o presente trabalho buscou examinar os aspectos da
pesca extrativista e o conhecimento dos pescadores associados à captura de crustáceos no litoral
norte de Pernambuco e sul da Paraíba.

2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1 Área de estudo
O estudo foi realizado na RESEX Acaú-Goiana, localizada entre os municípios de Caaporã e
Pitimbu, no estado da Paraíba, e Goiana, no estado de Pernambuco, Nordeste do Brasil. As duas
localidades escolhidas foram Porto de Congaçari, localizada às margens do Rio Goiana, no
município de Caaporã, e Povoação São Lourenço, às margens do Rio Megaó, no município de
Goiana.

2.2 Coleta de dados


As coletas foram realizadas nos meses de janeiro e fevereiro de 2019. Através de
metodologia exploratória participante (HUNTINGTON, 2000), foram realizadas entrevistas com
questionários semiestruturados aos pescadores e pescadoras. Os entrevistados maiores de 18 anos
participaram da pesquisa voluntariamente nas comunidades de Congaçari e São Lourenço. O
questionário abordou aspectos socioeconômicos e produtivos, conhecimento dos crustáceos como
recurso e meio ambiente, aspectos reprodutivos e de defeso, e impactos ambientais na
biodiversidade. A pesquisa foi realizada sob autorização do ICMBIO (SISBIO n° 63618-1) e do
Comitê de Ética Humana da Universidade Federal de Pernambuco (n° 92768418.0.0000.5208).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram entrevistados 20 pescadores e pescadoras de crustáceos, sendo dezoito homens e duas
mulheres, todos com idades entre 24-76 anos. A maioria está acima de 40 anos e têm a pesca como
a principal fonte econômica e/ou de subsistência há mais de 20 anos, chegando os idosos até 60
anos de atividade pesqueira. Por isso, os mesmos detêm de ampla experiência e conhecimento
acerca dos crustáceos, visto que aprenderam a pescar e acompanharam os parentes desde jovens,
principalmente os anciões (>70 anos), que pescam desde os 6-8 anos. Apesar disso, Cavalcanti et al.
(2019) apontam que muitos desses pescadores preferem que seus filhos estudem e não sigam com a
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

atividade de pesca, afetando o conhecimento tradicional que é passado e adquirido por seus
ancestrais. Dito isto, a relação das comunidades tradicionais pesqueiras com o ambiente se torna de
extrema relevância (ARRUDA, 1999), pois o conhecimento transmitido através de experiências
físicas e intelectuais desenvolve uma educação singular acerca das práticas socioculturais da própria
comunidade (RAMALHO, 2011), apesar disso, estes se orgulham de serem pescadores.
No decorrer do ano, a sazonalidade influencia na reprodução dos crustáceos e taxa de
produtividade da pesca. Apesar de pescarem durante todo o ano, os meses com maior produtividade
correspondem de setembro a março, sendo janeiro o mês com maior incidência para a pesca de
“aratu” Goniopsiscruentata(Latreille, 1803). Como apontado por Cavalcanti et al., (2019), a pesca
de crustáceos como o “guaiamum” Cardisomaguanhumi (Latreille, 1828) ocorre com maior
incidência na primavera e verão, coincidindo com a época de maior movimento na região “uçá”
Ucidescordatus (Linnaeus, 1763) Esses meses condizem com os de menor incidência de chuvas e
com o período de andada dos crustáceos, que é de janeiro a março. Sendo assim, os pescadores
dependem de diversos fatores ambientais para a pesca dos crustáceos. Para a coleta de “siri”
Callinectesspp, por exemplo, preferem a maré baixa. Já para guaiamum, a maior possibilidade de
captura é no início da manhã, pois à medida que as temperaturas aumentam durante o dia, diminui a
possibilidade de o indivíduo ser coletado pela técnica/apetrecho chamado ratoeira.
A pesca ainda é influenciada pelas fases da lua, oportunidade e principalmente
disponibilidade dos recursos, para que haja uma maior produtividade pesqueira. Dessa forma, as
atividades pesqueiras acabam sendo associadas com os aspectos reprodutivos e sazonais das
populações de crustáceos. Os pescadores relataram que a disponibilidade dos recursos se tornou
escassa e o tamanho dos indivíduos diminuiu em decorrência dos impactos ambientais causados na
área, como por exemplo, a fábrica de cimento, o viveiro de camarões, esgoto dos municípios
próximos da área e captura dos indivíduos menores, afetando os períodos reprodutivos.
Sobre a reprodução, os pescadores detêm conhecimento da importância dos períodos de
andada, tanto para o caranguejo-uçá e quanto o guaiamum, informando que acontece entre os meses
de janeiro a março. Os entrevistados apontaram diferenças morfológicas entre os indivíduos machos
e fêmeas (formato da carapaça, rastro de fezes nas tocas e coloração), os comportamentos e os
aspectos ecológicos de cada espécie. Não recomendam a pesca e o consumo quando esses animais
estão de muda ou “de leite”, devido à mudança das características dos animais, havendo assim, um
saber tradicional etnoecológico e conservacionista acerca dos aspectos biológicos dos crustáceos.
Os resultados obtidos destacam a ampla experiência dos pescadores sobre essas espécies,
indicando um elevado conhecimento ecológico das comunidades tradicionais. A relevância do uso
destas informações como subsídios à gestão pesqueira já foi discutida com resultados similares aos
observados no litoral norte do Estado da Paraíba, litoral sul do Estado da Bahia e litoral sul do
829
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Estado de Pernambuco (FIRMO et al., 2012). Esses conhecimentos são apontados como adquiridos
pela complexa relação das populações tradicionais com a natureza através de gerações. Isto permite
que essas comunidades apliquem os seus conhecimentos sobre a diversidade biológica,
desempenhando um importante papel para a conservação (DIEGUES, 2008).

3. CONCLUSÃO
As comunidades tradicionais e pesqueiras no litoral norte do Estado de Pernambuco
possuem elevado conhecimento acerca dos processos ecológicos e biologia dos crustáceos da
RESEX Acaú – Goiana. Além disso, a relação dessas comunidades com os ecossistemas locais e
seus advindos recursos pode auxiliar e subsidiar planos de manejo e gestão pesqueira em áreas de
Unidades de Conservação.

4. AGRADECIMENTOS
À FACEPE eà CAPES, pelo financiamento ao projeto de pesquisa (APQ-0353-2.06/17).
Aos pescadores e pescadoras da RESEX Acaú Goiana, por construírem e contribuírem com o nosso
aprendizado. À Associação de Marisqueiras de Acaú (AMA) , pelo apoio que sempre nos foi dado.

5. REFERÊNCIAS
ARRUDA, Rinaldo. "Populações tradicionais" e a proteção dos recursos naturais em unidades de
conservação. Ambiente & sociedade, n. 5, p. 79-92, 1999.

BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII
da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá
outras providências. Diário Oficial da União, 2000.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. SNUC – Plano Estratégico Nacional de Áreas


Protegidas: Decreto nº 5.758, de 13 de abril de 2006. Brasília: MMA, 2011. 76 p.

CAVALCANTI, Brunna de Andrade Lima Pontes et al. Socioeconomic aspects of the production
chain of species Cardisomaguanhumi in the Northeast coast of Brazil. Journal of
EnvironmentalAnalysis and Progress, v. 4, n. 1, p. 065-070, 2019.

DIEGUES A.C.S. 2008.O mito moderno da natureza intocada. São Paulo, Nupaub, 189 p.

DIEGUES, Antonio Carlos. Conhecimentos, práticas tradicionais e a etnoconservação da natureza.


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FIRMO, Angélica MS et al. Capture and commercialization of blue land crabs (" guaiamum")
Cardisomaguanhumi (Lattreille, 1825) along the coast of Bahia State, Brazil: an ethnoecological
approach. Journal of ethnobiology and ethnomedicine, v. 8, n. 1, p. 12, 2012.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

HENDRICKX, Michel E. Checklist of brachyuran crabs (Crustacea: Decapoda) from the eastern
tropical Pacific. Bulletin de l’Institut royal des Sciences naturelles de Belgique, Biologie, v. 65,
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HUNTINGTON, Henry P. Using traditional ecological knowledge in science: methods and
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LANDIM, Myrna. A importância da preservação dos Manguezais. A lição do caranguejo uçá em


Sergipe. Jornal da Cidade, Aracaju, p. 4, 2003.

RAMALHO, Cristiano Wellington Noberto. O sentir dos sentidos dos pescadores artesanais.
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SCHAEFFER-NOVELLI, Yara. Importância do manguezal e suas comunidades. ALICMAR/Inst.


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SCHAEFFER-NOVELLI, Yara. Manguezal ecossistema entre a terra e o mar. 1995.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FLORÍSTICA E FITOSSOCIOLOGIA DA VEGETAÇÃO ARBUSTIVO


ARBÓREA NA COMUNIDADE MONTE ALEGRE, MONTE SANTO, BAHIA
FLORISTIC AND PHYTOSOCIOLOGICAL OF ARBUSIVE ARBOREAL VEGETATION IN
THE MONTE ALEGRE COMMUNITY, MONTE SANTO, BAHIA.

Cheila Deisy Ferreira*; Joanna Letícia Diniz Melo*; Magno Antonio Amaro da Costa Ramos
Feitosa**
*Unidade Acadêmica de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Campina Grande, Campus de Patos, PB
**Fundação para o Desenvolvimento Sustentável do Araripe – Fundação Araripe, Crato, CE

1 INTRODUÇÃO
As comunidades de Fundo de Pasto retratam um aspecto sui generis de organização do
trabalho tradicionalmente estabelecida, com manejo de rebanhos de menor porte (suínos e aves) nas
posses individuais e atividades de agricultura em menor escala, que se admitem ao extrativismo
vegetal e ao manejo de outros rebanhos (geralmente ovinocaprinocultura) nas terras de uso comum
(MARQUES, 2016).
A realização do inventário florestal dessas comunidades é a base para o planejamento do uso
dos recursos florestais e o estabelecimento do seu manejo em base sustentável. Com isso, é uma
ferramenta fundamental para a definição das potencialidades forrageiras, madeireiras e não
madeireiras da vegetação da Caatinga local, bem como a mensuração de seu uso em critérios
sustentáveis, permitindo a quantificação da produção da sua potencialidade de inserção econômica
mensurável ou não na economia familiar e local.
Dessa forma, o inventário florestal realizado, procurou definir um retrato da vegetação no
que se refere a composição florística, sanidade e comportamento das espécies e sua estrutura.

2 MATERIAL E MÉTODOS
O inventário florestal foi conduzido na comunidade do Monte Alegre, localizada no
município de Monte Santo, microrregião de Euclides da Cunha, na Bahia, mais especificamente no
semiárido baiano.
A região apresenta o tipo climático tropical semiárido (Bsh), conforme a classificação de
Köppen. A precipitação média não ultrapassa 601 mm/ano e as temperaturas médias anuais são de
23.1 °C. Já os solos da região de acordo com Reis (2015), são rasos e pedregosos.
Foram alocadas 28 parcelas quadradas de 20 m × 20 m (400m²), seguindo as
recomendações dos trabalhos da Rede de Manejo Florestal da Caatinga(RMFC, 2005). As parcelas
foram distribuídas de forma aleatória simples e mensurou-se todos os indivíduos que apresentaram

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circunferência a altura do peito (CAP) ≥ 6,0 cm. Registrando-se as variáveis: circunferência a altura
do peito (CAP); altura total (HT) e reconhecimento botânico (nome comum) das espécies. Para
identificação dos principais usos para a vegetação da comunidade foram realizadas entrevistas com
os agricultores.
Foram determinados os parâmetros fitossociológicos de densidade, frequência, dominância e
índice de valor de importância (IVI). A diversidade alfa da comunidade foi avaliada pelo índice de
Shannon-Wienner (H’) e o índice de equabilidade de Pielou (SOUZA; SOARES, 2013). Para
determinação da suficiência amostral, utilizou-se como base a curva coletora correspondente curva
de acumulação de espécies usada por Colwell; Coddington (1994).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
De acordo com a curva do coletor, a amostragem foi validada e atendida com 15 parcelas,
quando houve a estabilização da ocorrência de novas espécies, sendo possível supor que com o
aumento do esforço amostral, não seriam identificadas novas espécies para essa área, como pode ser
confirmado, já que foram amostradas 28 parcelas.
No levantamento arbustivo/arbóreo realizado na Comunidade Fundo de Pasto Monte Alegre,
foram amostrados um total de 1.089 indivíduos, distribuídos em 13 famílias botânicas, 24 espécies e
24 gêneros. O número de espécies amostradas foi distinto do número de espécies encontrado por
Dario (2017) em área de caatinga em estágio inicial de sucessão ecológica na Paraíba, que
encontrou 20 espécies. Não foi possível a identificação do nome científico e família botânica de
uma espécie que sequer foi registrado o nome vulgar. E quanto ao hábito dessas espécies 87,5%
possuem hábito arbóreo e 12,5% arbustivo (Tabela 01).

Tabela 01. Lista de espécies da vegetação arbustivo/arbórea inventariada na Comunidade Fundo de


Pasto Monte Alegre, município de Monte Santo, Bahia.
NOME USOS
FAMÍLIA / NOME
COMU POTENCIAI N DA FA DoA VC VI
CIENTÍFICO
M S
ANACARDIACEAE
Myracrodruon Aroeira FO., MAD. e 4,09
6 5,357 21,43 0,332 7,918
urundeuva Allemão MED. 7
Schinopsis brasiliensis Braúna MEL., FO. e 34,82 8,77
39 25 0,486 13,236
Engl. MAD. 1 7
Spondias tuberosa Umbuze 9,64
AL. e FO. 11 9,821 21,43 0,808 13,464
Arruda iro 2

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ANNONACEAE
Annona crassiflora Araticu MAD., AL. e 10,71 1,71
12 25 0,057 6,171
Mart. m MED. 4 2
APOCYNACEAE
Aspidosperma Pereiro
1,48
pyrifolium Mart. & MAD. 11 9,821 10,71 0,044 3,394
3
Zucc.
CAPPARACEAE
Capparis jacobinae Íco 42,85 6,69
FO. e MED. 48 32,14 0,214 12,431
Moric. ex Eichl. 7 9
EUPHORBIACEAE
Croton conduplicatus Quebra FO., MAD. e 11,60 1,54
13 14,29 0,033 4,094
Humb. Bonp & Kunth. faca MED. 7 6
Cnidoscolus Faveleir
phyllacanthus (Muell. a FO., MAD., 1,65
7 6,25 14,29 0,095 4,202
Arg.) Pax et K. AL. e MED. 4
Hoffman
Jatropha mollissima Pinhão 179,4 20,2
MED. 201 92,86 0,167 36,803
(Pohl) Baill. bravo 64 43
Manihot glaziovii Maniçob 0,32
FO. 2 1,786 7,14 0,013 1,596
Muell. Arg. a 2
FABACEAE
Anadenanthera Angico
MAD., FO., 1,22
colubrina (Vell.) de 6 5,357 7,14 0,063 2,496
MED. e TN. 2
Brenan caroço
Amburana cearensis Ambura MAD. e 5,12
11 9,821 21,43 0,385 8,948
(Allemão) A.C.Sm na MED. 6
Poincianella Catingue
FO., MEL. e 408,0 92,0 107,37
pyramidalis (Tul.) L. P. ira 457 85,71 4,692
MED. 36 9 6
Queiroz
Senna macranthera São João
0,28
(DC. ex Collad.) MAD. 3 2,679 3,57 0,001 0,925
8
H.S.Irwin & Barneby
Mimosa arenosa Calumbi 15,17 2,09
MAD. e FO. 17 21,43 0,05 5,921
(Willd.) Poir. 9 9
LECYTHIDACEAE
Cariniana legalis Pau 152,6 30,7
MAD.e MED. 171 71,43 1,411 43,511
(Mart.) Kuntze caixão 79 72

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MALVACEAE
Ceiba glaziovii Barrigud 2,60
MED. 2 1,786 3,57 0,227 3,243
(Kuntze) K. Schum. a 6
NYCTAGINACEAE
Maria 0,17
Guapira sp. AL. e MEL. 1 0,893 3,57 0,008 0,811
mole 4

RUBIACEAE
Amaioua guianensis Canela 0,10
MAD. e AL. 1 0,893 3,57 0,001 0,744
Aubl. de veado 7
Randia armata (Sw.) Esporão 0,79
MED. 4 3,571 7,14 0,04 2,07
DC de galo 6
SAPINDACEAE
Talisia esculenta (A. Pitombei MAD., AL. e 2,40
11 9,821 17,86 0,13 5,587
St.-Hil.) Radlk ra MED. 2
SAPOTACEAE
Manilkara rufula (Miq.) Maçaran 14,28 1,91
MAD.e MED. 16 7,14 0,042 3,192
H.J. Lam duba 6 8
Sideroxylon Quixabe
MED., MAD., 0,28
obtusifolium (Roem. & ira 1 0,893 3,57 0,018 0,923
AL. e FO. 6
Schult.)
VERBENACEAE
Alecrim
30,35 3,43
Lippia gracilis Schauer do OL. e MED. 34 25 0,029 7,893
7 4
campo
- 0,50
Indeterminada 4 3,571 14,29 0,013 3,051
3
108 972,3 560,7
Total 9,361 200 300
9 2 1
FO = Forrageiro; MAD = Madereiro; MED = Medicinal; MEL = Melífera; Alimentício = AL; OL =
Oleaginosa (produção de óleo); TN = Tanino. N = Número de Indivíduos nas Parcelas; FA = Frequência
Absoluta; DA = Densidade Absoluta (árvores por hectare); DoA = Dominância Absoluta (em metros
quadrados por hectare); VI = Índice de Valor de Importância; VC = Índice de Valor de Cobertura.

Das famílias botânicas amostradas, as que apresentaram maior número de espécies, foram:
Fabaceae com 5 táxons, o que representa 20,83% da riqueza florística, seguido da Euphorbiaceae
com 4 táxons, o que equivale a 16,67%, Anacardiaceae com 3 espécies, ou seja, detém 12,5%.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Essas três famílias botânicas juntas representam 50,0% das espécies registradas nessa comunidade.
As demais espécies estão concentradas nas outras 10 famílias. Foi observado que os principais usos
das espécies arbustivo/arbórea na área são madeireiro, forrageiro e medicinal.
Em relação a diversidade e distribuição dessas espécies nas parcelas inventariadas nesta
comunidade, foram estimados o Índice de Diversidade de Shannon-Weaver (H') de 1,94 e Índice de
Equabilidade de Pielou (J') de 0,6. Pode-se inferir que a comunidade Monte Alegre apresenta baixa
diversidade da vegetação lenhosa (arbustivo/arbórea), bem como a baixa equidade na distribuição
das espécies na área inventariada.
Na Comunidade Monte Alegre, as espécies que se destacaram quanto ao maior número de
indivíduos foram a Catingueira (Poincianella pyramidalis) com 457 indivíduos, o Pinhão Bravo
(Jatropha mollissima) com 201 indivíduos e o Pau Caixão (Cariniana legalis) com 171 indivíduos.
Apenas essas três espécies são responsáveis 76,12% dos indivíduos amostrados.
A Catingueira teve frequência absoluta de 85,71, apresentando também densidade de 408
indivíduos por hectare, uma dominância de 469 m²/ha, o que lhe conferiu o maior valor de
importância e cobertura da população, com 107,77 e 92,09 respectivamente. Ressaltamos que esta
espécie tem hábito arbóreo, com potencial madeireiro e forrageiro, com forte pressão de uso
energético, podendo suprir diversas necessidades para os moradores da comunidade, desde que bem
manejada.
Quanto a vitalidade dos indivíduos amostrados na área, pode inferir que estado fitossanitário
dos indivíduos pode ser considerado bom, sem observados aparente de anormalidades. Onde
80,44% dos indivíduos amostrados encontram-se vivos, 9% encontram-se doentes e 10,56% mortos.
O maior percentual de indivíduos doentes (15,75%) e mortos (14,66%) foram verificados
para a Catingueira, de forma que dos 457 individuos amostrados, cerca de 69,58% estavam sadios,
seguida da espécie Angico - Anadenanthera colubrina com 16,67% e 66,67% de indivíduos doentes
e mortos respectivamente, neste caso foram identificados apenas seis indivíduos, estando apenas um
vivo sadio. É possível que a catingueira tenha tantos indivíduos nestes estágios de desenvolvimento
em função do próprio comportamento pioneiro da espécie, agravado pela escassez de água no
recente período de seca que acometeu a região. No caso do angico, é uma espécie rara na área, e
pode ter também sido afetado pela seca ou pelo excesso de uso desta espécie.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A vegetação amostrada na comunidade apresenta expressiva espécies forrageiras, que são
passiveis de manejo para esta finalidade.
As espécies atendem as necessidades do sistema de criação em fundo de pasto, podendo
ainda serem potencializadas com intervenções como raleamento e rebaixamento.
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5. REFERÊNCIAS
COLWELL, R.K.; CODDINGTON, J.A. Estimating terrestrial biodiversity through
extrapolation.Philosophical Transactions of the Royal Society of London, B 345:101-118, 1994.

DARIO, F. R. Estudo fitossociólogico de uma área de caatinga em estágio inicial de sucessão


ecológica no Estado da Paraíba, Brasil. GEOTemas, Pau dos Ferros, v. 7, n. 1, p. 71-83, 2017.

MARQUES, L. S. As comunidades de fundo de pasto: um intento de construção conceitual.


Revista Pegada, v.17, n.2, 2016.

REIS, F. S. Associativismo em comunidades de fundo de pasto no município de Monte Santo


(BA): mobilização social, dinâmica de poder. 2015. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) –
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Bahia, 2015.

RMFC - Rede de Manejo Florestal da Caatinga. Protocolo de Medições de Parcelas


Permanentes. Recife. Associação de Plantas do Nordeste; Brasília, MMA, PNF, PNE. 28 p. 2005.

SOUZA, A. L.; SOARES, C. P. B. Florestas nativas: estrutura, dinâmica e manejo. Viçosa,


MG: Ed. UFV, 322 p. 2013.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

REDE DE MULHERES DE COMUNIDADES EXTRATIVISTAS DO SUL DA


BAHIA - 10 ANOS DE LUTA
EXTRACTIVIST COMMUNITIES WOMEN'S NETWORK IN SOUTHERN BAHIA
- 10 YEARS OF STRUGGLE

Isabela Baleeiro Curado*,Elialda Avelino**, D. Maria do Caranguejo***, Luana Pinto dos Santos,
Maria da Conceição Cardoso, Lenice Sant’Ana Santos ****

*FGV/EAESP, assessora da Rede de Mulheres, **Coordenadora da Rede de Mulheres, ***Veterana Rede de


Mulheres,****Rede de Mulheres

Em 2019 a Rede de Mulheres de Comunidades Extrativistas da Bahia e a AMEX-


Associação Mãe da Resex Canavieiras completam 10 anos. A Rede de Mulheres é o braço feminino
e feminista da AMEX. Com o objetivo de empoderar as mulheres extrativistas por meio da
sororidade, da capacitação, da geração de renda e do apoio mútuo, a Rede desenvolveu uma
tecnologia social que se tornou um exemplo de organização de comunidades tradicionais em UCs.
A RESEX Canavieiras, com o território perpassando os municípios de Una Canavieiras e
Belmonte, na Bahia, tem 8.000 pessoas beneficiárias. O território da RESEX, que, em 2009 era
constituído por muitas comunidades invisíveis, ao longo do trabalho de integração da AMEX foram
adquirindo visibilidade e, consequentemente, fortalecendo-se, a exemplo das pescadoras e
marisqueiras. Percebe-se que nessas comunidades as estruturas de dominação são construídas pelos
valores do patriarcado, que define o sexo masculino como autor principal das atividades produtivas,
ficando a mulher com um papel secundário.
Esse fator é determinante para a divisão de trabalho no extrativismo realizado por homens e
mulheres na RESEX Canavieiras. Enquanto o homem se desloca para fora do entorno de sua casa
para exercer a atividade da pesca em alto mar, cabe quase que exclusivamente para a mulher a
tarefa da mariscagem (coleta manual de moluscos e crustáceos).
A transformação dessas relações e o empoderamento feminino, por meio de relações de
sororidade, pode ser fomentado de diferentes formas. O relato de experiência irá apresentar a
trajetória da Rede de Mulheres e o desenvolvimento da tecnologia social, assim como os resultados
tangíveis e intangíveis dos 10 anos de luta das mulheres da Rede.

HISTÓRICO DA REDE
A REDE DE MULHERES, que se define como o braço feminista/feminino da AMEX –
Associação Mãe dos Extrativistas da RESEX de Canavieiras, foi estabelecida em 2010, com o apoio
da ONU Mulheres (convênio UNIFEM 103/2009). Em 2010 foi realizado o 1º Encontro Regional
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

da rede de mulheres pescadoras e marisqueiras congregando 150 mulheres de cinco municípios


contemplados no projeto. Nesse encontro foram realizados trabalhos em grupo para definir
princípios e formas de articulação da rede de pescadoras e marisqueiras do sul da Bahia e
estratégias para a continuidade da mobilização; mapeamento dos principais problemas, definição de
prioridades e estratégias de luta para a inserção das mulheres em políticas públicas de afirmação de
gênero; organização de debates sobre o papel das mulheres na implementação da RESEX;
encaminhamentos das demandas de políticas públicas das mulheres aos órgãos competentes. A
partir das demandas desse encontro foram realizados cursos de capacitação em associativismo,
legislação pesqueira, trabalhista, e previdenciária, políticas publicas, equidade de gênero
(envolvendo 6 municípios em cada encontro).
Em 2011 o Projeto foi renovado, e, com o apoio da UNIFEM, foram beneficiadas cerca de
200 mulheres pescadoras e marisqueiras diretamente envolvidas no processo.
No inicio de 2012 a Rede de Mulheres continuou suas atividades, com o apoio da
Associação Mãe e das Associações locais e, a partir do meio de 2012, passou a contar com o apoio
da UESC, Universidade Estadual de Santa Catarina, com recursos do Projeto CID/FAPESB/RESEX
CANAVIEIRAS. Em 2013 foram realizados vários encontros com o apoio da Secretaria de Política
para as Mulheres e, em 2014, a I Oficina de Planejamento da Rede de Mulheres,com participação
de 200 mulheres.
Esse processo de organização e empoderamento teve um revés nos anos subsequentes, parte
por questões de gestão interna da Rede, parte por falta de financiamento para a realização dos
encontros. Depois de quase dois anos "adormecida", com poucos encontros e dificuldade de
mobilização das mulheres, foi realizada a Assembleia da Rede, com o apoio da Secretaria de
Mulheres da Bahia. Nessa Assembleia foi institucionalizada um coletivo de gestão, composto por 6
coordenadoras, 6 suplentes, 4 veteranas e 3 assessoras.
Com a estruturação da gestão, iniciou-se um novo ciclo para a Rede de Mulheres iniciando
uma reflexão interna sobre a tecnologia social da Rede -"nosso jeito de fazer as coisas".

A TECNOLOGIA SOCIAL DA REDE DE MULHERES


O processo de articulação em rede, sororidade, fortalecimento da auto-estima e
empoderamento das mulheres participantes da Rede tem sido fundamental para o enfrentamento dos
problemas vividos pelas mulheres da RESEX Canavieiras.
Entre os principais problemas destacam-se a desvalorização do trabalho da pesca,
principalmente do trabalho feminino; o desconhecimento dos direitos, tanto de população
tradicional beneficiária da RESEX, quanto trabalhistas e previdenciários; as condições precárias de
trabalho; a gravidez precoce e a violência doméstica (SANTIAGO e TORRALBA, 2018).
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A tecnologia social da Rede envolve um processo de aproximação das mulheres a partir de


temas femininos e feministas, considerando 4 dimensões (Figura 1): o EU feminino (a mulher com
ela mesma); a SORORIDADE (a mulher e suas companheiras); a FAMÍLIA (a mulher no ambiente
doméstico, mãe, esposa, filha) e a COMUNIDADE (a mulher e o seu território de atuação). A Rede,
por meio da sua atuação, endereça diferentes facetas dessas dimensões. Por exemplo, na dimensão
EU, questões de auto-estima, cuidados pessoais; na dimensão SORORIDADE, participação e
organização, boas práticas, cooperativismo; na dimensão FAMÍLIA, violência doméstica, educação,
filhos e na dimensão COMUNIDADE, Povos e Comunidades Tradicionais, Território, RESEX.
Esses temas são alguns exemplos de como a tecnologia social da Rede atua.

Figura 1 - Dimensões da tecnologia social Rede de Mulheres.

O sucesso da tecnologia social desenvolvida pela Rede de Mulheres de Comunidades


Extrativistas Pesqueiras do Sul da Bahia está sendo replicado para outras UCs e novas Redes de
Mulheres estão sendo implementadas.

ALGUMAS CONQUISTAS CONCRETAS


Atualmente a Rede engloba, diretamente, 1.000 pescadoras e marisqueiras e indiretamente
2.000, na RESEX Canavieiras. Esse número baseia-se na participação efetiva nas capacitações,
reuniões, treinamentos, mobilizações e intercâmbios. Cada mulher marisqueira e pescadora é uma
célula de articulação havendo transferência de conhecimentos adquiridos para a efetivação do
fortalecimento institucional da Rede de Mulheres.
A gestão participativa é uma premissa das Unidades de Conservação de Uso Sustentável. As
RESEX possuem conselhos deliberativos, com garantia que, pelos menos 51% dos assentos sejam
ocupados por representantes das populações tradicionais. Quando do início da Rede de Mulheres,
em 2009, a participação extrativista feminina representava menos de 10% das vagas disponíveis no
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Conselho Deliberativo e, incipiente nas associações comunitárias. Em 2019 pode se observar um


aumento significativo do protagonismo feminino.
Além de dar visibilidade às demandas das mulheres, a Rede também contribui para o
engajamento político e garantia de direitos das pescadoras e marisqueiras. Segundo Figueiredo
(2013), a primeira filiação de uma mulher à Colônia de Pescadores de Canavieiras Z-20 (órgão de
classe dos trabalhadores do setor artesanal da pesca) ocorreu em 1979 e até o ano 2000 apenas
dezenove mulheres estavam filiadas. Porém, se olharmos o número de novas filiações de mulheres à
Colônia por ano, no gráfico 3, houve um aumento significativo no engajamento a partir de 2009,
ano de criação da Rede de Mulheres.

Gráfico 1 - Número de novas filiações de mulheres à Colônia por ano

Fonte: Figueiredo (2013)

Outras conquistas da Rede de Mulheres podem ser citadas: organização coletiva para
tabelamento dos preços dos produtos produzidos por elas em três comunidades da RESEX e
estruturação do processo de comercialização.
Mas, a maior conquista da Rede está relacionada ao processo de fortalecimento feminino e
feminista da última década, que pode ser sintetizada nesse trecho. Nas entrevistas realizadas por
Batista e Santiago (2018) as "entrevistadas disseram que os encontros da Rede mudaram suas vidas
e as libertaram, pois foi a partir deles que conseguiram incentivos para “sair do anonimato”,
terminar os estudos, compreender seus direitos e se orgulhar da profissão de pescadora.

"Eu tinha vergonha também de dizer que eu sou pescadora [por causa da imagem,
das mãos e corpo desgastados]. Eu não tenho vergonha mais não, subo num palco e
falo que sou pescadora. Eu mudei de ideia mais depois que surgiu esse projeto da
Rede de Mulheres. Hoje em dia eu reconheço que o pescador tem valor".
(Moradora da comunidade de Campinhos)

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

REFERÊNCIAS:
BATISTA, Jonas Torralba & SANTIAGO, Isabella Cruvinel Mãe do Mangue: trabalhos e
desafios das mulheres marisqueiras da RESEX de Canavieiras. Isabella Cruvinel Santiago,
Jonas Torralba Batista]. – 2018. 52p. Orientadora: Isabela Baleeiro Curado. Monografia (bacharel)
– Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas.

FIGUEIREDO, Marina Morenna A. Trabalho e participação política das pescadoras na Reserva


Extrativista (RESEX) Canavieiras – BA / Marina Morenna A. Figueiredo. - Salvador, 2013. 115
f. : il. Orientadora: Profa. Dra. Catherine Prost. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Programa
de PósGraduação em Geografia,Universidade Federal da Bahia, Instituto de Geociências, 2013.

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PROTETORES DA MATA: REPRESENTAÇÃO LOCAL DA


CONSERVAÇÃO DE UMREFÚGIO DA MATA ATLÂNTICA
GUARDS OF FOREST: LOCAL REPRESENTATION OF THE CONSERVATION OF A
ATLANTIC FOREST REFUGE

Brunna de Andrade Lima Pontes Cavalcanti *, Gilberto Gonçalves Rodrigues **


Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, UFPE, Brasil* (Autor Correspondente)
Professor do Departamento de Zoologia-CB, UFPE, Brasil ** (Professor Orientador)

1. INTRODUÇÃO
A sobreposição de áreas protegidas, de proteção integral e uso sustentável (BRASIL, 2000),
inclui diversas regiões habitadas por populações locais (KEMF, 1993). Contudo, o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) não faz nenhuma referência mais profunda sobre a
compatibilização entre a necessidade de se aumentar as áreas de proteção da natureza e a presença
de "moradores" na maioria dos ecossistemas a serem preservados.
Discussões sobre a importância e o valor do Conhecimento Ecológico Local (CEL) para a
conservação da biodiversidade (SCHIMINK et al., 1992; GADGIL et al., 1993), dos ecossistemas e
das populações tradicionais e/ou locais, começaram a ser vistas como inseparáveis visto que as
populações locais têm percepções únicas sobre o uso de recursos e o ambiente que são importantes
para a conservação (LOPES, 2017) e a gestão tradicional (MITTERMEIER et al., 2003) da
biodiversidade.
Nesse contexto, o presente trabalho teve como objetivo analisar as mudanças da fauna ao
longo do tempo e a representação local em uma região de Mata Atlântica do nordeste brasileiro. Os
questionamentos desse estudo foram: Como a população local percebe as mudanças das espécies de
animais neste refúgio de biodiversidade ao longo do tempo? O que esse fragmento de mata
Atlântica representa para a comunidade local?

2. MATERIAL E MÉTODO
A Unidade Conservação (UC) Refúgio de Vida Silvestre Matas do Sistema Gurjaú(RVS
Gurjaú) (Figura 1)é categorizada como Unidade de Proteção Integral.

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Figura 1: O Refúgio de Vida Silvestre Matas do Sistema Gurjaú (RVS Gurjaú) e Comunidades
estudadas.

Fonte: Google Earth, Instituto Brasileiro de Geografia Física (IBGE), Ministério do Meio Ambiente (MMA).
Mapa desenvolvido por: Maurício Dália Neto, 2019.

O trabalho de campo foi realizado durante os anos de 2017 e 2018, onde utilizou-se os
métodos de observação e entrevista semiestruturadas de modo individual e conversas informais. Foi
utilizada a técnica bola de neve (Snow Ball – em inglês) (BERNARD, 1988), onde foi solicitado
aos gestores da UC a indicação de informantes-chave em cada comunidade afim de facilitar a
aproximação, acompanhar a dinâmica local e estreitar os laços entre o pesquisador e a população
local para realizar as entrevistas com os moradores locais.
A pesquisa foi aprovada através do protocolo 002856/2018 pela Agência Estadual de Meio
Ambiente (CPRH)e pelo Comitê de Ética Humana da UFPE, CAAE 93454218.1.0000.5208

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dentre os 76 entrevistados, foi observado que a maior frequência dos informantes (24%)
afirmou residir na RVS Gurjaú em média a 40-49 anos. Em relação a profissão, a maior parte
afirma ser agricultores (33%), que utilizam a agricultura familiar (37%), seguidamente de
aposentados (28%), pessoas que possuem outra profissão (serviços autônomos ou donas de casa,
que correspondem a 22%) e em menor parte exercem cargos de funcionário público (13%). Os
entrevistados citaram um total de 69 espécies de animais, sendo aves (n = 29), seguido dos
mamíferos (n = 18), répteis (n = 13), peixes (n = 6), anfíbios (n = 2), e crustáceos (n= 1).
Todos os participantes da pesquisa afirmaram que dos animais silvestres da região possuem
diferentes níveis de importância que foram aprendidas comalgum familiar (p.ex. pais, avós, tios ou
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

irmãos), como para aalimentação, domésticação, uso cultural (como amuletos ou troféus) e
controle,pois entre alguns motivos as pessoas possuem medo do aspecto do animal, acreditam que
possa ser venenoso ou representam riscos à criação de animais domésticos, como cães, gatos e
galinhas.
Aqueles que sentem a pressão mais rápida sobre a naturezarecursos são as pessoas que usam
essas florestas de maneira diretamaneira de atender às demandas da vida cotidiana
(AMOROZO,1996). Essas mudanças estão sendo identificadas entre os informantes, todos
identificaram a diminuição da fauna como algo negativo para a região.
“Os animais estão desaparecendo, o que antes tinha de muito e hoje não tem quase nada, a
culpa é do homem que não sabe como cuida...”
“Era pra ter mais passarinho, as pessoas ficam pegando”
Relataram mudanças na quantidade de espécies, principalmente as de médio e grande porte
como cachorro do mato e capivaras.A diminuição de habitat, comida e vegetação contribui para o
processo de defaunaçãoque, de acordo com Parry et al.(2009), está intrinsecamente ligado ao
elevado número depopulações locais de baixa renda que usam a caça comofonte de alimento em
regiões florestais isoladas (BROCARDO,2011). Os moradores consideram a fragmentação da
vegetação causada pela plantação da cana e pelo uso de agrotóxicos, que acreditam que pode
intoxicar os animais e o solo.
Outra forma de conhecimento ecológico local identificado foi a bioindicação de organismos
que se relacionam com os fatores do meio ambiente(SCHUBERT, 1991). Foi relatado, por
exemplo, que alguns representantes da herpetofauna como o teju e serpentes, possuem modificações
no corpo para suportar o calor do solo, já que são animais que rastejam ou ficam com o corpo
próximo ao chão, diferentes de alguns grupos de mamíferos (sagui e paca) que preferem estar acima
das árvores ou apreciando a sombra.
Através de estudos dessa natureza, é possível identificar mudanças em diversas regiões, cada
uma com sua particularidade, utilizando a "visão" das comunidades locais, já que a população local
pode indicar quais espécies entraram em declínio ao longo dos anos, e essas informações podem ser
usados para apoiar projetos de restauração (SILVA et al., 2014) e a manutenção sustentável dos
recursos locais atividades que utilizam recursos naturais (LOPES et al., 2017).
O conhecimento ecológico localpode contribuir significativamente para programas
epolíticas que desejam mitigar os danos causados pelas perdas de habitats e proteger a diversidade
de espécies, já que áreas de proteção onde populações residem dentro e compreendem a região pode
propor uma gestão que considere as populações locais como “protetoras da mata”. Para isso é
necessário a compreensão das necessidades dos moradores locais e melhorando as condições
socioeconômicas das comunidades.
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

4. CONCLUSÃO
Os moradores locais da RVS Gúrjaupercebem o quanto a diversidade de espécies de animais
e seus níveis populacionais foi alterado ao longo do tempo. Segundo os entrevistados, a mata de
Gurjaú auxilia na recordação de suas relações familiares com a biodiversidade e a importância da
RVS como fonte de recursos recreativos e cotidianos. Todas as informações relacionadas as
espécies de animais e a representação da biodiversidade podem ser consideradas e atreladas aos
planos de manejo da região. Portanto as futuras políticas públicas devem investigar regionalmente e
incorporar essas informações na conservação dos recursos naturais.

5. AGRADECIMENTO
Agradecemos aos moradores das comunidadesque concordaram em participar desta pesquisa e
aos Gestores da UC pelo apoio.Agradecemos a CAPES, pela bolsa de pesquisa.

6. REFERENCIAS
AMOROZO, M. C. M. Um sistema de agricultura camponesaem Santo Antônio de Leverger,
Mato Grosso, Brasil. 1996. 243f.Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade
Estadualde São Paulo, São Paulo. 1996.

BERNARD, H. R. Researchmethods in anthropology: qualitativeandquantitative approaches.


Lanham, MD: AltaMira Press, 2005

BRASIL. Lei 9.985 de 18 de julho de 2000. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da


Natureza. Brasília, DF, 2000.

BROCARDO, C. R. Defaunação de uma área contínua de MataAtlântica e consequências para


o sub-bosque florestal. 2011. 60. Dissertação (Mestrado em Ciências Biológicas – Zoologia) –
Universidade Estadual Paulista, Rio Claro. 2011.

GADGIL, M.; BERKES, F.; FOLKE, C. Indigenousknowledge for biodiversityconservation.


Ambio, 22 (2-3): 151-156, 1993.

KEMF, e. Indigenouspeoplesandprotectedareas. Earthscan, London, 296 pp, 1993.

LOPES, S. F.; RAMOS, M. B.; ALMEIDA, G. R. The roleofmoutains as refugia for biodiversity in
Brazilian Caatinga:conservationsimplications. Revista Caatinga, Mossoró v. 23, n. 3, p. 63-70,
2017.2017.

MITTERMEIER, R. A.; MITTERMEIER, C. G.; BROOKS,T. M.; PILGRIM, J. D.; KONSTANT,


W. R.; FONSECA, G.A. B.; KORMS, C.
Wildernessandbiodiversityconservation.ProceedingsoftheNationalAcademyofSciencesofthe
UnitedStatesofAmerica, Washington, v. 100, n. 18, p. 10309-10313,2003.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PARRY, L.; BARLOW, J.; PERES, C. A. Hunting for sustainabilityin tropical secondaryforests.
ConservationBiology, San Francisco,v. 23, n. 5, p. 1270-1280, 2009.

SCHIMINK, M.; REDFORD, K. H.; PADOCH, C. TraditionalpeoplesandtheBiosphere:


framingtheissuesanddefiningtheterms. In: Redford, K. H. &Padoch, C. (eds). Conservationof
Neotropicalforests: workingfromtraditionalresource use. Columbia University Press. New
York, p. 3-13, 1992.

SCHUBERT, R. Bioindikation in terrestrischenÖkosystemen.Jena: Fischer Verlag,338 p. 1991.

SILVA, T. C.; RAMOS, M. A.; SCWAR, M. L.; ALVAREZ, I. A.;KILL, L. H. P.;


ALBUQUERQUE, U. P. Local
representationsofchangeandconservationoftheriparianforestsalongthe SãoFrancisco River
(NortheastBrazil). Forest PolicyandEconomics,Göttingen, v. 45, n. 2, p. 1-12, 2014

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O PLANO DE MANEJO DA RESERVA EXTRATIVISTA DE CASSURUBÁ E


SUAS ESTRATÉGIAS PARA O USO SUSTENTÁVEL DO BUDIÃO-AZU E
GUAIAMUM
CASSURUBA EXTRACTIVE RESERVE’S MANAGEMENT PLAN AND ITS STRATEGIES FOR THE
SUSTAINABLE USE OF GUAIAMUN AND BUDIAO AZUL

Lílian de Carvalho Lindoso*, Marcelo Lopes**, Marília das Graças Mesquita Repinaldo***, Alan
dos Santos Machado****, Rodrigo Bacellar Melo*****, Pedro Henrique Dias Marques******.
* Área de Proteção Ambiental Serra da Ibiapaba, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental).
**Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental).
*** CEPENE Base Caravelas, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental).
***** Colônia de Pescadores e Aquicultores Z-25 de Caravelas/BA, Brasil. (Presidente).
****** Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba, ICMBio, Brasil. (Analista Ambiental).
Departamento de Ciências Ambientais, UFSB, Brasil. (Mestrando).

1. INTRODUÇÃO
No final de 2014, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) publicou a Portaria 445/2014
(BRASIL, 2014) que, reconheceu as espécies de peixes e invertebrados aquáticos da fauna
brasileira ameaçadas de extinção, e estabeleceu uma série de restrições ao seu uso, dentre elas, a
proibição de captura. Algumas espécies listadas, no entanto, possuem considerável importância
socioeconômica para as comunidades tradicionais da Reserva Extrativista (Resex) de Cassurubá, em
especial o Guaiamum (Cardiosmaguanhumi) e o Budião-azul (Scarustrispinosus) (BRASIL, 2016).
O processo de avaliação da fauna brasileira é coordenado pelo Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e utiliza o método de avaliação de espécies em risco de
extinção, mundialmente reconhecido, da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN,
2012). A construção da referida Portaria contou com a participação de 1.270 pesquisadores, de mais
de 250 instituições nacionais e internacionais (BRASIL, 2016). No entanto, os movimentos
representativos dos pescadores discordavam das medidas propostas envolvendo algumas espécies
manejadas nos seus territórios tradicionais.
No encontro da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e
Marinhas (CONFREM), realizado entre os dias 06 e 08 de maio de 2015, em Caravelas/BA,
representantes de três Resex marinhas - Cassurubá, Corumbau e Canavieiras - debateram os graves
impactos socioeconômicos da proibição da pesca do Guaiamum e do Budião-azul, incluindo a
criminalização dos extrativistas. No documento elaborado no encontro, conhecido como Carta de
Caravelas (CONFREM, 2015), eles contestam a ausência de consulta às comunidades pesqueiras
sobre os níveis de estoque dessas espécies em seus territórios; e as estratégias de manejo propostas
para sua recuperação populacional.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Nesse cenário, as equipes técnicas da Resex de Cassurubá e do Centro Nacional de Pesquisa


e Conservação da Biodiversidade Marinha do Nordeste (CEPENE), no âmbito local, com apoio das
equipes dos setores técnicos do ICMBio-sede envolvidos com as agendas, juntamente com as
comunidades tradicionais, o Conselho Deliberativo da Resex e diversos parceiros, abriram, no
início de 2015, as discussões e construções de propostas que resultariam no Acordo de Gestão da
Resex no âmbito do Plano de Manejo (PM), que é o documento técnico norteadorda gestão das
Unidades de Conservação (UC); assim como, nos primeiros Planos de Recuperação de espécies
ameaçadas de extinção no âmbito da Portaria MMA 445/2014.
Este artigo propõe demonstrar como a mobilização social gerada em torno de um processo
de alcance local, o PM da Resex de Cassurubá, influenciou e foi influenciado pela implementação
de uma política nacional de proteção de espécies ameaçadas; e, por outro lado, realçar a relevância
do uso sustentável realizado por povos e comunidades tradicionais como estratégia de conservação,
inclusive de espécies ameaçadas de extinção.

2. MATERIAL E MÉTODO
Cumpre esclarecer que atualmente o instrumento adotado para prever as regras comunitárias
de uso dos recursos é o Plano Específico de Uso dos Recursos Naturais, espécie de anexo ao Plano
de Manejo (BRASIL, 20172), não se utilizando mais o Acordo de Gestão, como em 2015. Naquele
então, percebeu-se a necessidade de adequação das normas de uso dos recursos da Resex às
exigências estabelecidas pela Portaria MMA 445/2014. A simultaneidade dos processos possibilitou
à mobilização social em torno do PM, de alcance local, tornar-se oportunidade de influenciar em
uma política de alcance nacional.
A elaboração do PM da Resex deCassurubá percorreu as seguintes etapas: 1) Formação do
Grupo de Acompanhamento; 2) Sistematização de informações sobre a UC; 3) 1ª Rodada de
Reuniões Comunitárias: O que é Plano de Manejo Participativo? 4) 2ª Rodada de Reuniões
Comunitárias: Perfil da Família Beneficiária; 5) Oficina Troca de Saberes, realizada com o objetivo
de sistematizar o etnoconhecimento local; 6) Elaboração da Missão e Visão de Futuro; 7) 3ª Rodada
de Reuniões Comunitárias e Assembleia Geral: Elaboração das regras de uso dos recursos e
levantamento de informações para o zoneamento; e 8) Oficina de Planejamento Participativo, para
consolidar o zoneamento e Programas de Sustentabilidade da UC.
Ao todo, o processo contou com aproximadamente 1.000 presenças, em sua maioria de
beneficiários da UC. Apenas durante a etapa relacionada à elaboração do Acordo de Gestão, foram
realizadas 11 reuniões comunitárias, com 437 participantes, e uma Assembleia Geral que reuniu 96
representantes das comunidades da Resex de Cassurubá (GALDINO, 2016). Paralelamente, os

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

servidores responsáveis peloPMe algumas lideranças participaram ativamentedas discussões sobre


os Planos de Recuperação do Guaiamum e Budião-azul.
Enquanto os pescadores em Cassurubá discutiam as regras de uso para os mais variados
recursos disponíveis na Resex, o espaço de discussão proporcionado pelo processo de elaboração do
PM, e mais especificamente do Acordo de Gestão, possibilitava não apenas a construção de
propostas de manejo das espécies ameaçadas em sintonia com as discussões em nível nacional,
influenciando-as e sendo influenciados por elas, mas também o amadurecimento político de suas
lideranças, que se fortaleciam na defesa da Resex e seus pescadores.
O presente artigo foi construído a partir da vivência direta dos autores em diferentes fases do
processo, apoiados em registros documentais, e também contou com breve revisão de literatura,
para fundamentar a reflexão sobre a prática cotidiana de gestão.

3. RESULTADOS e DISCUSSÃO
Para além do espaço local, proporcionado pelo PM, as lideranças de Cassurubáse
articularam a lideranças de outras Resex, e de outros movimentos, como atesta o documento
“Posição dos Movimentos da Pesca Artesanal” (CONFREM et al, 2015). Neste documento, os
movimentos defendem a Portaria MMA 445/2014 como estratégia para enfrentar a grave situação
causada pela “pesca industrial, pela ausência de gestão pesqueira e fiscalização dos órgãos
competentes e pela quase total ausência de dados estatísticos pesqueiros”.
Com esse posicionamento, os movimentos demarcaram seu papel político, demonstrando
que suas práticas tradicionais vinham assegurando a conservação das espécies, mesmo contra todos
os fatores de pressão que levavam ao status de ameaça de extinção das espécies fora de seus
territórios. A Carta de Caravelas ainda reconhece as UC como parte da estratégia de apoio à pesca
artesanal:
Em nossa região há um mosaico de Unidades de Conservação são eles: Parque Nacional
Marinho dos Abrolhos, Resex de Cassurubá, Canavieiras, Corumbau, estas garantem a
sustentabilidade destas espécies funcionando como áreas de reprodução, berçário e
repositoras, tendo no manejo feito pelas comunidades tradicionais pesqueiras extrativistas a
base de estratégia de conservação destes recursos.

Exemplo dessa estrategia, cite-se que mesmo antes do início das discussões do Plano de
Manejo, os pescadores do budião, já adotavam regras de manejo que extrapolavam as previsões
legais vigentes, e que foram levadas para o Plano de Recuperação dos Budiões, reconhecido pela
Portaria MMA 129/2018(o do Guaiamum foi reconhecido pela Portaria MMA 128/2019, sendo que
as normas de uso foram regulamentadas pelas Portarias Interministeriais SEAP-MMA nº 38/2018 –
guaiamum, e nº 59-B/2018 -budião-azul). A pesca de arpão/apnéia, que é mais seletiva, é um
exemplo de comportamento já praticado pela maioria dos pescadores de budião-azul, e que foi

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

levado para a norma nacional. Além disso, no PM, eles desenvolveram regras adicionais às regras
da portaria: estabelecimento de cota de captura por pescador e áreas fechadas (de reprodução, como
eles preferem chamar), dentro dos seus propriosterritorios.
Por outro lado, o papel da gestão da Resex nesse processo foi proporcionar espaços de
discussão, promovendo informação e o diálogo de saberes na construção de alternativas para os
complexos problemas socioambientais. Os técnicos responsáveis pela coordenação do PM de
Cassurubá, imersos em meses de discussões com as comunidades, também contribuíram ativamente
nos debates em nível nacional, mesmo ante a resistência de grande parte da comunidade acadêmica
envolvida na discussão (ESTADÃO, 2018).

4. CONCLUSÃO
O Plano de Manejo da Resex de Cassurubá já se encontra na fase final, de homologação pela
Presidência do ICMBio. Com as medidas relacionadas às espécies ameaçadas de extinção em
vigência através das portarias do MMA, outras ações estão sendo consolidadas, como o
automonitoramento de captura das espécies no âmbito do Programa Nacional de Monitoramento da
Biodiversidade, do ICMBio – Programa Monitora (BRASIL, 2017).
Os resultados desse acompanhamento devem orientar a dinâmica de proteção das espécies,
tendo maior chance de sucesso quando os pescadores locais participarem da concepção e
implementação do processo. Ao intervir na definição de medidas nacionais de proteção para
espécies ameaçadas, os movimentos sociais dos pescadores evidenciam que suas práticas
promovem conservação, o que se confirma no fato de que os estoques em seus territórios
tradicionais, quando efetivamente protegidos, têm uma situação sensivelmente diferente daqueles
em áreas sem proteção.
O desafio para o gestor é que normativas ambientais devem ser dinâmicas, para acompanhar
os fenômenos que se propõem a proteger. Sendo assim, a simples imposição de regras de cima para
baixo promoveria impactos sociais, sem que necessariamente houvesse ganhos de conservação.
Enquanto que o caminho de negociar as regras de uso para promover o potencial de conservação
das práticas tradicionais, aliadas ao status de proteção especial, que lhes possibilita um mínimo
aparato de gestão, se torna uma medida socialmente justa e ecologicamente equilibrada.

5.REFERÊNCIAS
BRASIL. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Instrução Normativa Nº 3,
de 04 de Setembro de 2017. Disponível em:
<http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/portarias/DCOM_ICMBio_Instrucao_Normativa_
03_de_04_de_setembro_de_2017.pdf.pdf>. Acessado em: 19/09/2019.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

BRASIL2. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Instrução Normativa 07, de


21 de dezembro de 2017. Disponível
em:<http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/portarias/intrucao_normativa_07_2017.pdf>.
Acessado em 18/09/2019.

BRASIL. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Livro Vermelho da Fauna


Brasileira Ameaçada de Extinção, 2016. Disponível em:
http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/comunicacao/publicacoes/publicacoes-
diversas/dcom_sumario_executivo_livro_vermelho_ed_2016.pdf>. Acessado em: SET/2019.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Portaria nº 445, de 2014. Disponível em:


<http://www.icmbio.gov.br/cepsul/images/stories/legislacao/Portaria/2014/p_mma_445_2014_lista
_peixes_amea%C3%A7ados_extin%C3%A7%C3%A3o.pdf>. Acessado em: SET/2019.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente.Portaria nº 128, de 27 de abril de 2018. Disponível em:


<http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=515&pagina=107&data
=30/04/2018&totalArquivos=210>. Acessado em: SET/2019.

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente.Portaria nº 129, de 27 de abril de 2018. Disponível em:


<http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=515&pagina
=108&data=30/04/2018&totalArquivos=210.> Acessado em: SET/2019.

Comissão Nacional de Fortalecimento dos das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas


(CONFREM). A Posição dos Pescadores de Budião e dos Tiradores de Goiamum das RESEX
da Bahia Referente à Portaria MMA 445, Canavieiras/Bahia. 2015.

Comissão Nacional de Fortalecimento dos das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas


(CONFREM)et al. Pela manutenção da Portaria 445 do MMA desde que garanta os direitos de
consulta e participação nos processos de definições às comunidades tradicionais pesqueiras.
Disponível em: <https://brasil.oceana.org/pt-br/imprensa/ comunicados-a-imprensa/nota-dos-
movimentos-da-pesca-artesanal-em-apoio-portaria-445>. Acessado em 18/09/2019. 2015.

ESTADÃO. Blog Herton Escobar. Cientistas criticam novo regramento para pesca deespécies
ameaçadas de extinção. Disponível em: <https://ciencia.estadao.com.br/blogs/ herton-
escobar/cientistas-criticam-novo-regramento-para-pesca-de-especies-ameacadas-de-extincao/>.
Acessado em 27/09/2019. 2018.

GALDINO, Jaco Galdino Santana. Cuidando do meu lugar. Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=useyifCdAsg&list=PLwIoEO_omXz1LosaETWIZM8eskhBq
u0y-&index=1>. Acessadoem: 20/09/2018.2016.

IUCN. (2012). IUCN Red List Categories and Criteria: Version 3.1. Second edition. Gland,
Switzerland and Cambridge, UK: IUCN. iv + 32pp.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

CONSTRUÇÃO DE ACORDOS COMUNITÁRIOS COMO INCENTIVO À


PRÁTICA DE GESTÃO COMPARTILHADA NA RESERVA
EXTRATIVISTA MARINHA DE GURUPI-PIRIÁ
CONSTRUCTION OF COMMUNITY AGREEMENTS TO ENCOURAGE SHARED
MANAGEMENT PRACTICE IN THE GURUPI-PIRIÁ MARINE EXTRACTIVE RESERVE

Claudia Simone da Luz Alves*, Jose Carlos Tavares Silva**


*Analista Ambiental, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Bragança/PA
claudia.alves@icmbio.gov.br
**Presidente da Associação de Usuários da Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá, Viseu/PA.
josecarlost10@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
A gestão de uma reserva extrativista requer a somatória de esforços entre o órgão gestor e a
população extrativista beneficiária, com vistas a manter os recursos e garantir que a unidade de
conservação cumpra os objetivos para os quais foi criada. Nesses esforços, está incluído o incentivo
à participação comunitária na tomada de decisão e a mediação de conflitos entre usuários, de modo
a criar condições para que a população extrativista realmente exerça seu papel na gestão do
território.
Cumprindo seu papel como órgão gestorda Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá, o
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade-ICMBio, em parceria com a Associação
de Usuários da Reserva Extrativista Marinha de Viseu, Piriá e Gurupi-ASSUREMAV, desenvolveu
um projeto voltado à construção de acordos comunitários e de estímulo à organização e cooperação
entre os moradores e entre os moradores e parceiros locais, tais como escolas, igrejas, associações,
dentre outros, na busca pela melhoria da qualidade ambiental e redução dos conflitos gerados pelo
acesso desordenado aos recursos.
Este trabalho tem por objetivo mostrar como se deu a construção desses acordos nas
comunidades e de que maneira os usuários foram envolvidos no projeto, visto que o envolvimento
dos comunitários éfator primordial para a manutenção da biodiversidadenumareserva extrativista,
sobretudo das áreas de manguezais e rios, que são suas fontesbásicas de alimento e recursos
financeiros.

2. MATERIAL E MÉTODO
O projeto foi desenvolvido em 2016 em parceria com as comunidades, utilizando
metodologias participativas. Asatividades ocorreram em três etapas: a) realização de uma oficina
onde foram apresentados aos comunitários os instrumentos de gestão da unidade, o papel do Órgão
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Gestor e da Associação de Usuários; b) uma reunião comunitária, exclusiva para moradores,onde


foram discutidas as regras a serem inseridas nos Acordos Comunitários; c) uma oficina onde o
Acordo Comunitário foi concluído e assinado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade, pela Associação de Usuários da Reserva Extrativista Marinha de Viseu, Piriá e Gurupi
e pelo Comitê Comunitário.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá foi decretada em 20 de maio de 2005 com o
objetivo de “proteger os meios de vida e garantir a utilização e a conservação dos recursos
naturais renováveis tradicionalmente utilizados pela população extrativista residente na área de
sua abrangência”. Localiza-se no município de Viseu, nordeste do Estado do Pará, e possui
74.081hectares, contemplando manguezais, espelho d’água e pequena porção de terra firme. A
população beneficiária, cerca de cinco mil famílias, está distribuída por quarenta e sete
comunidades, localizadas em sua maioria no entorno da unidade. A principal atividade econômica
dos usuários é a pesca artesanal - incluindo peixes, caranguejo e mariscos - complementada pela
agricultura de subsistência, cujo principal produto é a farinha de mandioca, e a apicultura tanto em
áreas de mangue quanto em terra firme.
A gestão da unidade é realizada de forma harmônica entre o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade-ICMBIO e Associação de Usuários–ASSUREMAV, fundada em
2005, que detém os direitos do Contrato de Concessão do Direito Real de Uso assinado em 2010.
Outros instrumentos de gestão existentes na unidade são Conselho Deliberativo, criado em 2008 e
Acordo de Gestão, publicado em 2019. Não há Plano de Manejo.
Os conflitos gerados pelo acesso aos recursos pesqueirosconstituem os principais entraves à
gestão. Tais conflitos são motivados por sobreposição de territórios de pesca, uso de petrechos
proibidos, pesca em período de defeso e desrespeito às regras de uso do território. Outros problemas
relacionados ao entorno da Unidade e que contribuem para o surgimento de conflitos são os
desmates e queimadas para plantios de roça, deposição de lixo nas margens dos rios e manguezais,
avanço das áreas de moradia sobre os manguezais e a pesca industrial de arrasto que, embora ocorra
além dos limites de uma milha náutica, causa transtornos aos pescadores locais. Conflitos por
recursos naturais, principalmente os relacionados ao uso dos recursos pesqueiros, é tema de
diversos autores como Furtado (2004), Isaac-Nahum (2006), Costa & Murata (2015), Cañete,
Ravena-Cañete & Santos (2015) e Canto et al (2017) que abordam os conflitos no ambiente Amazônico.

Analisando esse cenário, o ICMBio, em parceria com a Associação de Usuários, idealizou o


projeto de construção dos acordos comunitários, surgido a partir da necessidade de se estimular a
participação comunitária na gestão da Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá e de incentivar
854
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

as comunidades a pensarem o território como algo que lhes pertence, refletindo sobre seu papel na
gestão da unidade. Por outro lado, as comunidades desejavam incluir regras para atividades no
entorno da reserva extrativista, as quais não foram contempladas pelo Acordo de Gestão discutido
em 2015, pois neste documento estão incluídas somente as normas estabelecidas para a área contida
no decreto de criação da unidade.
Aliado a isso, a experiência adquirida com acordos comunitários de pesca realizados entre
2014 e 2015 em duas comunidades desta reserva extrativista mostraram a eficácia dos acordos na
manutenção dos ambientes da Unidade de Conservação, diminuindo a pressão sobre os recursos.
Embora não haja estudos técnicos para afirmar o quanto a pressão foi reduzida, relatos dos
comunitáriosapontam um maior comprometimento dos usuários na manutenção dos recursos
pesqueiros, pois a maioria cumpre os acordos firmados, incentivando outras comunidades a
demandar por acordos semelhantes.
Assim, para desenvolver as ações do projeto e considerando a disposição dos comunitários
em colaborar com a gestão da Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá, foram selecionadas as
comunidades de Santa Rosa, Piquiateua, Levada e Fazenda Real, definidas a partir de critérios
estabelecidos pelo ICMBio e Associação de Usuários, dentre os quais a predisposição das
comunidades em fazer os acordos, a localização próxima ao manguezal e a existência de tiradores
de caranguejo. Todavia, no decorrer do desenvolvimento do projeto, houve demanda de outras
comunidades para que Acordos Comunitários fossem firmados em outras áreas como forma de
compartilhar experiências e dividir a responsabilidade pela gestão do território.
Os acordos comunitários têm como objetivo contribuir para a redução dos impactos causados
aos manguezais próximos às comunidades, uma vez que estabelece regras de acesso e de uso dos
recursos, e pararedução de impactos sobre os rios e igarapés, ao estabelecer áreas de proteção para
margens e nascentes. Esses rios e igarapés, além de garantir o fornecimento de água para as
comunidades, auxiliam na manutenção dos manguezais, pois compõem a rede hídrica que fornece o
aporte de água doce para a manutenção desse ecossistema.
A criação da Reserva ExtrativistaMarinha de Gurupi-Piriá é resultante de umprocesso
iniciado com acordo comunitário, o Acordo de Pesca do Rio Itaquiboque, a partir do movimento de
Emaús, coordenado por padres italianosna comunidade do Giz. Esse acordo de pesca, que resultou
em beneficio econômico para os pescadores refletindo na melhoria da qualidade de vida, aos poucos
foi influenciando as comunidades vizinhas até culminar com a criação da reserva extrativista.
Para estimular a participação comunitária, as oficinas foram planejadas de modo que todos
pudessem participar e opinar sobre a construção das regras. Foram estabelecidosdois momentos: um
exclusivo dacomunidade, quando os moradores discutiriam as regras sem influência externa, e outro

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

com a presença do ICMBio e da Associação de Usuários, quando as ideias seriam organizadas em


forma de Acordo.
Em cada comunidade foram realizadas duas oficinas com a presença do ICMBio e
Associação de Usuários e uma reunião exclusiva da comunidade para discussão das regras. A
primeira oficina foi planejada para ter um momento lúdico, com dinâmicas que estimularam a
comunidade a refletir sobre a importância da participação, da construção coletiva e do engajamento
na gestão do território. Além da apresentação do projeto e dos informativos sobre o Acordo de
Gestão e Contrato de Concessão do Direito Real de Uso, foram discutidos os problemas que
afetavam a comunidade e como o projeto poderia ajudá-los na gestão do território. Também foram
estabelecidos os primeiros esboços do monitoramento dos acordos. A segunda oficina, ocorrida
após a reunião comunitária, foi pensada para finalizar os Acordos e registar as normas em forma de
documento, após ampla discussão em assembleia comunitária.
Concluídos os Acordos, cópias dos documentos gerados foram entregues à Secretaria de
Meio Ambiente de Viseu para conhecimento das regras existentes nas comunidades. Havia
reclamações dos moradores quanto à emissão de autorizações para realizar atividades em locais
impróprios, principalmente as relacionadas à supressão vegetal próxima às margens e nascentes de
rios, causando conflitos entre os moradores.
No texto abaixo, constam exemplos de regras definidas nos Acordos Comunitários:

Fica proibido desmatamento e queimadas nas cabeceiras/nascentes e margens de rios em


toda a área da comunidade;
Qualquer atividade próxima aos rios deve respeitar uma distância mínima de 50 metros das
margens e nascentes. (Acordo Comunitário da Fazenda Real, 16 de setembro de 2016).

Nas oficinas participaram cerca de 150 pessoas, discutindo as regras e aprovando os acordos.
Indiretamente, porém, as ações resultantes alcançaram cerca de 180 famílias distribuídas pelas
quatro comunidades participantes.A partir das oficinas, observou-se a mudança decomportamento
dos moradores quanto à adequação de suas atividades às regras estabelecidas, fortalecimento da
organização comunitária, construção de parcerias entre comunidade e escola e maior cobrança da
presença do órgão gestor nas comunidades, sobretudo em ações de fiscalização.
Percebeu-se também que há sempre um grupo de frente, que se mobiliza, que articula as
ações, enquanto os demais moradores ficam apenas aguardando que seus problemas sejam
solucionados sem se envolver diretamenteou participando apenas de ações pontuais. Tal exemplo
configura o que Olson (1999) denominou de “free-rider” que são os “caroneiros” que se beneficiam
das ações coletivas, mas não colaboram para o bem-estar de todos. Isso é um ponto negativo que

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

deve ser considerado em outros projetos, porém serve como um incentivo na busca de soluções para
estimularo compromisso dos moradorescom a gestão.

4. CONCLUSÃO
As ações desenvolvidas foram muito positivas para as comunidadese para a gestão da
Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá. Com a conclusão dos Acordos, os comunitários
realizaram ações autônomas como retirada de lixo da margem dos igarapés e plantio de árvores nas
margens do rio, refletindo a preocupação com a manutenção dessas áreas. A demanda por ações
semelhantes em outras comunidadesmostra que há interesse na gestão compartilhada do território.
Entretanto, há necessidade de se implementar um sistema de monitoramento desses acordos e das
ações resultantes a partir do desdobramento do projeto, com foco na efetividade da gestão.
A realização do projeto mostrou a importância de o Órgão Gestor estar junto com as
comunidades, de entender suas dificuldades, de pensar em soluções participativas para os problemas
de gestão. O engajamento comunitário e a parceria com a associação de usuários é um ponto
positivo na Reserva Extrativista Marinha de Gurupi-Piriá, entretanto, essa parceria precisa ser
incentivada e fortalecida através de ações do órgão gestor para que surta efeitos concretos na gestão
da unidade de conservação.

5. AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a colaboração das comunidades e lideranças comunitárias que
participaram da articulação e discussão para a construção dos acordos.

6. REFERÊNCIAS
CAÑETE, U.M.R.; RAVENA CAÑETE, V.; SANTOS, S.M.S.B.M. Pesca artesanal e manejo:
conflito socioambiental em uma área de unidade de conservação do Parque Nacional do Cabo
Orange, Oiapoque, Amapá.Novos Cadernos NAEA, UFPA, Belém-PA, v.18, n.3, p. 179-198,
2015.

CANTO, L.O.; VASCONCELLOS SOBRINHO, M.; VASCONCELLOS, A. M. A.; ABREU, A.


G.; MENEZES, J.; REBELO, C. Uso de redes na análise de conflito socioambiental e gestão do
território na Reserva Extrativista Mãe Grande de Curuçá/PA. In: SILVA, C.N.; LIMA, R.A.P.;
SILVA, J.M.P.(Org.). Territórios, ordenamentos e representações na Amazônia. 1ºed.Belém:
GAPTA/UFPA, v. 1, p. 341-356, 2017.

COSTA, A.C.G.; MURATA, A.T. A problemática socioambiental nas Unidades de Conservação:


conflitos e discursos pelo uso e acesso aos recursos naturais. In Sustentabilidade em Debate, v. 6,
n. 1, p. 86-100, 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FURTADO, L.G. Dinâmicas sociais e conflitos na pesca na Amazônia. In: ASCELRAD, H. (Org).
Conflitos Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro:Relume Dumará:Fundação Henriche Böll, p. 57-
71,2004.

ISAAC-NAHUM, V.J. Explotação e manejo dos recursos pesqueiros do litoral amazônico: um


desafio para o futuro.Ciência e Cultura, São Paulo, v. 58, n.3, 2006.Disponível
em:<http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php>.Acesso em: 20 set. 2019.
OLSON, M. A lógica da ação coletiva: os benefícios públicos e uma teoria dos grupos sociais.
São Paulo: Edusp, 1999.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

O LUGAR DOS CONHECIMENTOS TRADICIONAIS NO CURSO DE


BIOLOGIA
THE PLACE OF TRADITIONAL KNOWLEDGE IN THE BIOLOGY COURSE

Flávia Rossato*, Thayná Karine de Castro*, Carina CatianaFoppa**


Graduandas de Ciências Biológicas, Universidade Federal do Paraná, Brasil.*
Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná, Brasil. **

1. INTRODUÇÃO
A construção do conhecimento científico, orientado pelo paradigma analítico reducionista,
parte de uma perspectiva disciplinar e, distante do contexto das urgências cotidianas da sociedade,
orienta-se e reafirma as dicotomias entre natureza e cultura, sujeito e objeto. Tratado como
homogêneo e organizado de forma hierárquica, a partir de perspectivas culturais e científicas
partilhadas pelos atores que o produzem, subjugou outras formas de conhecimento (MORIN, 2005,
SANTOS, 2004).
A lógica de produção do conhecimento que se mostra como detentora do saber, distancia-se
cada vez mais de outros saberes e tem acarretado um epistemicídio e injustiça cognitiva aos povos e
comunidades tradicionais (SANTOS, 2004). Nessa ótica e em diálogo com o marco do
socioambientalismo (DIEGUES, 2000; SANTILLI, 2005) colocamos em evidência o lugar que
outros conhecimentos, ditos não científicos, como o conhecimento tradicional, ocupa no Curso de
Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná, uma vez que contribuem com a orientação
profissional que adotarão nas temáticas relacionadas à conservação e o desenvolvimento.

2. MATERIAL E MÉTODOS
Essa pesquisa levantou dados da estrutura curricular do curso de Ciências Biológicas da
Universidade Federal do Paraná, formulado em 2008. O curso possui duração de 5 anos, nas
habilitações de Licenciatura e Bacharelado². Para a avaliação utilizamos os planos de ensino das
trinta e sete disciplinas obrigatórias que totalizam 2.235 horas disciplinas do Núcleo Comum, do
Bacharelado e Licenciatura. Além disso, foram identificadas vivências e outros espaços de
aprendizagem formalizados como atividades complementares ao currículo, tais como: i) estágio não
obrigatório de Iniciação Científica no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio) na área de conflito territorial entre Unidades de Conservação de Proteção Integral e os
povos indígenas; ii) Projeto de Extensão e Licenciar Ecologia de Saberes com povos e comunidades
tradicionais no Estado do Paraná; iii) encontros organizados pelos(as) estudantes do Curso de

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Biologia e por movimentos sociais, como o Encontro Regional dos estudantes de Biologia (2016,
2017 e 2018), iv) a Jornada de Agroecologia dos anos de 2016, 2018 e 2019 e v) a participação do
III Grande Encontro de parteiras, benzedeiras e Pajés da Chapada dos Veadeiros no ano de 2018.
Os planos de ensino das disciplinas foram avaliados considerando a presença das temáticas
e/ou autores(as) com aderência socioambiental. A partir dessa avaliação, as disciplinas foram
categorizadas em níveis de proximidade ou potencial à temática socioambiental da seguinte forma:
Nível 1 (abrange a temática) Nível 2 (com potencial ao tema) Nível 3 (não abrange/não aproxima).
A proximidade com a temática usou como critério de aproximação a presença de autores(as) ou de
termos-chave relacionados à ecologia humana, etnoecologia, inter e transdisciplinaridade ou diálogo
de saberes. A vivência nas disciplinas avaliadas como estudantes do Curso ofereceu um repertório
reflexivo e que pretendeu retratar os limites e potencialidades do processo formativo como biólogas
para tratar das dimensões socioambientais e do diálogo de saberes com povos e comunidades
tradicionais.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 A estrutura curricular obrigatória do Curso de Ciências Biológicas
Das trinta e sete disciplinas obrigatórias que compõem o núcleo comum, apenas uma,
ofertada no terceiro período, denominada Fundamentos da Educação Ambiental (60h), abrange
diretamente a temática socioambiental (Nível 1). Consta em seu plano de ensino: “Compreender o
papel da educação ambiental frente aos problemas socioambientais (causas e consequências), suas
possibilidades e limites”. Na sequência, contemplando o Nível 2, foram contabilizadas seis
disciplinas consideradas com potencial ao tema, sendo elas: Biologia de Campo I, Seminários II,
Didática, Seminários III, Ciências Ambientais e Metazoa IV (total 300 horas). As outras trinta
disciplinas não abordam a temática, categorizadas no Nível 3, totalizando 1.935 horas.
A partir da análise das ementas das disciplinas observa-se carência e o distanciamento da
temática socioambiental e diálogo com as dimensões sociais/humanas dentro das disciplinas
obrigatórias do curso. Essa realidade demonstra uma formação distanciada dos profissionais em
relação à problemática socioambiental e pode reafirmar a dicotomia sociedade/natureza.
Tal questão pode ser problematizada quando se fala de inclusão social e áreas protegidas, já
que a conservação das florestas, fauna e flora está intimamente conectada aos modos tradicionais
das comunidades que habitam esses locais (DIEGUES, 2004, 2019). É essencial que os
profissionais, sobretudo da área das ciências biológicas e ambientais, concluam o curso conscientes
de que não há conservação da natureza e das áreas protegidas sem a inclusão das dimensões sociais
e humanas na formação (PIMBERT; PRETTY, 2000).

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

3.2. Outros componentes curriculares


O currículo exige, além das disciplinas obrigatórias, uma carga extra de horas, denominadas
disciplinas optativas. Para o Bacharelado são exigidas 390 horas e para Licenciatura 180 horas. As
disciplinas optativas são ofertadas pelos departamentos e se distribuem nas várias áreas do
conhecimento das ciências biológicas, entretanto, nem mesmo nessa categoria existem disciplinas
com um enfoque socioambiental.
Além das disciplinas optativas, são exigidas horas formativas: para o Bacharelado são 150
horas e para a Licenciatura 135 horas. Na nossa experiência enquanto acadêmicas tivemos a
oportunidade de participar de um estágio não obrigatório de Iniciação científica no Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), na área de conflito territorial entre Unidades
de Conservação e povos indígenas, nos anos 2018/2019. Nesse tempo, pudemos acompanhar o
processo de gestão de um Parque Nacional e a atuação dos gestores, profissionais da área ambiental,
frente ao conflito territorial e abordagem com a comunidade. Além disso, tivemos acesso a muitos
relatos de caso e autores que abordam a temática do conflito.
Dos encontros técnico-científicos é possível destacar que eles permitiram o contato com o
protagonismo das comunidades locais, que pelos de seus modos de vida tradicionais
proporcionaram a nós estudantes, um diálogo de saberes e o papel que desempenham na
conservação da natureza. Para nós, a vivência nesses espaços, seja curriculares ou extracurriculares,
demonstra que a conservação no Brasil ainda tem sido orientada pelo mito da natureza intocada, tal
qual relatado por Diegues (2004).
O insucesso das áreas protegidas se devem as normas e práticas da ciência da conservação,
visto que a investigação científica foi marcada pelo paradigma cartesiano, o qual supõe que a
realidade é movida por leis imutáveis. E é sob esse paradigma que os profissionais biólogos são
“treinados”, para atuarem como cientistas da conservação e agentes de campo, que tendem a olhar
os ecossistemas pela perspectiva estreita de sua disciplina profissional. Com frequência, a formação
desses profissionais age contra o entendimento dos fatores que podem garantir o êxito do manejo de
recursos naturais, uma vez que tratam a presença humana nas áreas protegidas como um fenômeno
negativo, um transtorno (PIMBERT; PRETTY, 2000).
Ainda, de acordo com Diegues (2019), é necessária a elaboração de novas alternativas de
conservação que sejam mais democráticas e participativas, que beneficiem a conservação da
biodiversidade e da diversidade cultural, mais interdisciplinares e intensivas em ciência e
conhecimentos tradicionais. Para o autor, “esse novo modelo em construção, denominado de
etnoconservação, pode resultar numa proteção mais eficaz dos habitats e numa melhoria de vida dos
povos e comunidades tradicionais (p.117)”.
861
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Atualmente, participamos do projeto de extensão Ecologia de Saberes com Povos e


Comunidades Tradicionais do Estado do Paraná, no qual, nos aproximamos dos povos indígenas no
sentido de com eles compreender os sentidos do diálogo de saberes e um compromisso
socioambiental comum. É nessa perspectiva que a ecologia de saberes facilita a pesquisa-ação em
duas vias, de forma que ocorra uma mudança epistemológica de fora para dentro da universidade e
vice-versa, onde através de espaços institucionais haja construção de uma “ponte dialógica” entre os
saberes científicos e os tradicionais (SANTOS, 2004; SANTOS; MENEZES, 2010).
Os estágios e encontros extracurriculares na nossa formação como biólogas contribuíram
para compreender as conexões socioambientais e as relações não dicotômicas entre sociedade/
natureza e cultura/natureza. Entretanto, as dimensões curriculares oferecidas pelo conjunto de
disciplinas obrigatórias e não obrigatórias criam abismos no processo formativo que poderiam ser
supridos com uma reformulação curricular que recepcionasse as dimensões sociais e humanas e da
aliança com os povos e comunidades tradicionais, sob a perspectiva do diálogo de saberes e a
etnoconservação.

4. CONCLUSÃO
O diálogo de saberes no curso de ciências biológicas da UFPR, no componente curricular
das disciplinas obrigatórias, está restrito à disciplina da Educação Ambiental. Os outros espaços
curriculares, como os estágios e horas formativas têm favorecido a vivência de experiências para
compreender outras formas de produção de conhecimento e as limitações do pensamento positivista
e cartesiano que ainda pauta a formação dos(as) biólogos(as). Estar em contato com povos
tradicionais e seus territórios alavanca um processo de troca de saberes e aprendizagem entre nós
estudantes dispostas a pensar a conservação numa perspectiva da aliança com os povos,
considerando outras formas de conhecimento, como o conhecimento tradicional, e no diálogo aberto
com as pessoas que vivem diariamente a conservação, a proteção da natureza, através de seus
modos de vida. No contexto brasileiro atual, com tantas desigualdades sociais, o debate sobre o
desenvolvimento deve promover não só a sustentabilidade estritamente ambiental, como também a
sustentabilidade social, ou seja, deve contribuir também para a redução da pobreza e das
desigualdades sociais (SANTILLI, 2005) e esse também é um compromisso da Biologia

5. REFERÊNCIAS
DIEGUES, A. C. S. Conhecimentos, práticas tradicionais e a etnoconservação da
natureza.Desenvolv. Meio Ambiente, v. 50, Diálogos de Saberes Socioambientais: desafios para
epistemologias do Sul, p. 116-126, abril 2019.

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DIEGUES, A. C. S. Etnoconservação da natureza: enfoques alternativos. In: DIEGUES, A. C. S.


(Ed.). Etnoconservação: novos rumos para a conservação da natureza nos trópicos. 2. ed. São
Paulo: Editora AnnaBlume, Editora Hucitec, NUPAUB/USP, p. 1–46, 2000.

DIEGUES, A. C. S. O Mito Moderno da Natureza Intocada. 5ª Edição - São Paulo - Editora:


Hucitec; Núcleo de apoio a pesquisa sobre populações humanas e áreas úmidas brasileiras, USP,
2004.

MORIN, E. Ciência com consciência. Ed. revista e modificada pelo autor - 8ª ed. - Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2005.

PIMBERT, M. P.; PRETTY, J. N. Parques, comunidades e profissionais: incluindo “participação”


no manejo de áreas naturais protegidas. In DIEGUES, A. C. S. (org) Etnoconservação: novos
rumos para a proteção da natureza nos trópicos. São Paulo: Hucitec/Nupaub, p. 183 -189, 2000.

SANTILLI, J. Livro Socioambientalismo e Novos Direitos: proteção jurídica à diversidade


biológica e cultural. Editora Peirópolis, Instituto Socioambiental e Instituto Internacional de
Educação do Brasil, 2005.

SANTOS, B. S.; MENEZES, M. P. (Orgs.) Epistemologias do Sul. Editora Cortez: São Paulo,
2010.

SANTOS, B. S. A Universidade no século XXI: Para uma reforma democrática e


emancipatória da Universidade, Editora Cortez, 2004.
Grade Curricular do Curso de Ciências Biológicas da UFPR. Disponível em:
http://www.bio.ufpr.br/portal/cbio/wp-content/uploads/sites/3/2014/11/Grade-Curricular1.pdf.
Acesso em: 25/07/2019.

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MÉTODOS DE COLETA EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO UTILIZADOS


POR PESCADORES DE CRUSTÁCEOS NA RESERVA EXTRATIVISTA DE
ACAÚ-GOIANA NO NORDESTE BRASILEIRO
WORKING STAGES AND COLLECTION METHODS USED BY CRAB CATCHERS IN THE
ACAÚ-GOIANIA EXTRACTIVE RESERVE.

Renilson Jesus de Luna*, Gilberto Nicácio Batista**, Gilberto Gonçalves Rodrigues***


Graduação em Licenciatura em Ciências Biológicas, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil*
Pós-graduação em Morfotecnologia, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil**
Departamento de Zoologia, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil***

1. INTRODUÇÃO
A Reserva Extrativista Acaú-Goiana (RESEX) é uma Unidade de conservação marinha,
localizada na divisa entre os estados da Paraíba e Pernambuco, possuindo 6.676,69 hectares
protegidos de mata atlântica, rios, estuário e manguezal. Entre os animais presentes dentro dos
limites da área protegida, destacam-se alguns crustáceos, pois, apresentam relevante importância
econômica e ecológica dentro do ecossistema de manguezal. O aratu (Goniopsis cruentata),
caranguejo-uçá (Ucides cordatus), guaiamum (Cardisoma guanhumi) e o siri-azul (Callinectes
sapidus) são os principais animais coletados.
A coleta e catação de crustáceos fornece aos pescadores (as), principalmente, renda familiar.
Essa prática, além de garantir retorno algum financeiro quando o animal é comercializado, serve
também como fonte de alimentação humana (subsistência) e é associado diariamente à dieta das
famílias pescadoras, logo, apresenta-se também como uma importante fonte para dieta de proteínas
dessas populações pesqueiras, que vivem quase que exclusivamente da pesca.
Durante a jornada de trabalho, os pescadores passsam horas de pesca e catação,
contabilizando uma jornada de trabalho que pode variar entre 6 e 10 horas diárias. Durante esse
tempo, faz-se necessário o uso de diversos aparatos para realização dessas atividades de coleta
dentro do manguezal. Esses equipamentos de proteção individual rústicos (EPIr) de coleta
possibilitam um trabalho mais seguro do pescador, trazendo segurança e eficácia no momento da
pesca dos crustáceos.
Esse trabalho teve como objetivo descrever o material de trabalho e a indumentária (EPIr)
dos pescadores durante a pesca de crustáceos.

2. METODOLOGIA
Para o levantamento do material de trabalho dos pescadores foram realizadas observações
diretas das atividades dos pescadores em área de manguezal, apicum e estuário na Reserva

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extrativista de Acaú-Goiana. A partir dessas observações, foi possível descrever as técnicas e


métodos de coleta/catação, juntamente com o uso de aparatos (EPIr) que facilitam e possibilitam a
realização das atividades. Além da análise descritiva foram realizados registros fotográficos das
etapas de coletas e pesca.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 Indumentária de trabalho
Desde a preparação da embarcação no Porto de partida, nota-se alguns cuidados tomados
pelos pescadores, no qual a presença de pernilongos exige o uso de um caldeirão (Caçoá) com
madeira, queimando para produção de fumaça, que espanta os insetos.

Figura 1 - Caçoá com madeira para queimar

Fonte: O autor

Além do uso do Caçoá, alguns cuidados com vestimentas dos pescadores foram observados,
como o uso de (ii) calças, (iii) botas, (iv) camisas com mangas longas e (v) camisas cobrindo a
cabeça. Isso demonstra a preocupação em se proteger do sol e dos mosquitos, que podem
incomodar e atrapalhar a jornada de trabalho.

Figura 2 - Vestimenta de trabalho (EPIr)

Fonte: O autor

3.2 Coleta de siri-azul


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Dentre os crustáceos pescados, o siri-azul é o único que passa todo seu ciclo de vida na
água. Dessa forma, seu método de pesca é voltado para captura imersa na água. Além disso, sua
coleta só se torna possível nas regiões de maior salinidade (mais próximas da praia), pois a baixa
salinidade influencia em sua ocorrência

Figura 3 - Siri-azul macho.

Fonte: O autor

Após encostar e ancorar o barco na borda do rio o pescador utiliza a (vi) rede de arrasto.
Esse material serve para coleta do siri-azul, além disso, observa-se também a utilização de um (vii)
calçado confeccionado artesanalmente. O uso desse sapato garante a segurança evitando um
possível corte causado por materiais presentes no sedimento do rio, como conchas de ostras. Após a
realização do arrasto com a rede, os animais são armazenados em (vii) baldes.

Figura 4 - Rede de arrasto.

Fonte: O autor

3.3 Coleta do siri aratu

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O aratu é encontrado em bordas dos rios, nas quais esse animal utiliza-se da vegetação do
mangue para se proteger de possível predação. Sendo assim, no determinado local escolhido para
realização da coleta, o barco é encostado para captura dos animais.

Figura 5 - Local de coleta.

Fonte: O autor

O método de coleta de aratu passa por etapas necessárias para captura e apreensão do
animal. No início, os dois pescadores cercam o aratu (um pelo rio e o outro pela área da vegetação de
mangue). Após isso, é realizado arremesso de sedimento lamoso em cima do animal, que fica imóvel
quando atingido pela bola lamosa arremessada em sua direção. Logo após, o pescador coleta o aratu e
retira o acumulo de lama com uma lavagem da água do rio.

3.4 Coleta de caranguejos: caranguejo-uçá e guaiamum


Quando o barco está ancorado para a coleta, os pescadores devidamente equipados com
botas, e corpo todo coberto com vestimentas, adentram na vegetação de mangue em área de lama do
manguezal para coleta dos caranguejos, pois, esses animais estão localizados um pouco mais
afastados do rio, no qual só ficam cobertos quando a maré está alta.
Após acessar o manguezal, inicia-se a procura por galerias (tocas) com características de
atividade dos caranguejos (fezes e rastros). O pescador através do uso de um dos duas técnicas
permitidas pelo acordo de gestão da UC, fazem uso da (viii) técnica de braçada para realizar a coleta
do animal. A técnica consiste em deitar-se na lama e realizar inserção do braço nas galerias. Ao
encontrar o caranguejo-uçá, este é retirado para fora da galeria e capturado.

Figura 6 - Galerias de caranguejo-uçá.


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Fonte: O autor

O guaiamum é o que se encontra mais afastado do rio (mangue seco). Esse caranguejo é
encontrado em regiões secas, denominadas apicum, onde constrói suas galerias e completa seu ciclo
de vida.
O instrumento usado para coleta do guaiamum é chamado (ix) ratoeira, esse material é
confeccionado com garrafas pet, elástico, ferro e tampa de madeira. A ratoeira é posicionada nas
saídas das galerias desses animais, que ao tentarem se alimentar de uma (x) isca colocada em um
gatilho feito de ferro, o mecanismo é ativado e os animais ficam presos dentro da garrafa pet. Após
algum tempo, os pescadores retornam ao local onde as ratoeiras foram colocadas e coletam as
garrafas contendo os animais capturados.

Figura 7 – Ratoeira.

Fonte: O autor

4. CONCLUSÃO
Os usos de métodos de coleta específicos e vestimentas necessárias (EPIr) para trabalho no
manguezal permitem aos pescadores eficiência e segurança durante uma jornada de trabalho no rio,
estuário e manguezal. Dessa forma, torna-se possível melhor captura dos animais de forma
eficiente, evitando possíveis acidentes de trabalho e obtendo maior sucesso na pesca. Sugere-se que

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estes EPIr sejam adquiridos e incluídos como itens necessários para aquisição por meio de projetos
e/ou assistência dos governos.

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CARACTERIZAÇÃO DA VEGETAÇÃO ARBUSTIVO ARBÓREA NA


COMUNIDADE MUQUÉM, MONTE SANTO, BAHIA
CHARACTERIZATION OF ARBUSIVE ARBOREAL VEGETATION IN THE MUQUÉM
COMMUNITY, MONTE SANTO, BAHIA.

Joanna Letícia Diniz Melo*; Francisco das Chagas Vieira Sales* Ricardo Carneiro Barreto
Campello**
*Unidade Acadêmica de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Campina Grande, Campus de Patos, PB
**Fundação para o Desenvolvimento Sustentável do Araripe – Fundação Araripe, Crato, CE

1. INTRODUÇÃO
As comunidades tradicionais de fundo de pasto e agricultores familiares que habitam o
semiárido brasileiro são um exemplo claro de concepção de estratégias de subsistência e de
processos adaptativos às condições climáticas dessa região. É através das práticas de convivência
com o semiárido, como as atividades agropastoris e agroextrativistas, que os sertanejos sobrevivem
e se desenvolvem junto à Caatinga, reconhecendo no ambiente natural a base não só de sustento
próprio, mas de constituição da vida como um todo (ANDRADE; BRITO;TROILO, 2015).
O desenvolvimento socioeconômico necessário para as comunidades tradicionais, como
ocorre em grande parte das comunidades que usam a caatinga como fonte de manutenção alimentar,
de produção e sustento dos rebanhos, guardam uma relação de dependência muito estreita com as
formas de uso dos recursos florestais da Caatinga. Assim, adotar ou definir práticas de manejo que
permitam assegurar seu uso em base sustentável é vital para o desenvolvimento regional, além de
assegurar a manutenção dos serviços ecossistêmicos.
Essas práticas devidamente qualificadas são responsáveis no nível local pela implementação
dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável – ODS, dessa forma a realização do inventário
florestal desta comunidade é a base para o planejamento do uso dos recursos florestais e o
estabelecimento do seu manejo em base sustentável.
Portanto, objetivou-se caracterizar a vegetação, quanto sua composição florística e estrutura,
visando subsidiar estratégias de uso sustentável para a comunidade.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O inventário florestal foi realizado na comunidade do Muquém, situada no município de
Monte Santo, microrregião de Euclides da Cunha, na Bahia. O local de estudoapresenta
características de região semiárida, com clima tropical semiárido, e classificado de acordo

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comKöppen como BSh (ALVARES et al., 2014), com temperaturas médias anuais de 23.1 °C, e
pluviosidade média anual de 601mm. Com solos rasos e pedregosos (REIS, 2015).
O sistema de amostragem utilizado foi o de Amostragem Aleatória Simples, foram lançadas
14 parcelas quadradas (20 m x 20 m), seguindo as recomendações dos trabalhos da Rede de Manejo
Florestal da Caatinga(RMFC, 2005).Nestas parcelas foram mensurados todos os indivíduos que
apresentaram circunferência a altura do peito (CAP) ≥ 6,0 cm. Registrando-se além do CAP, a
altura total (HT) ereconhecimento botânico (nome comum) das espécies.Foram também realizadas
entrevistas com agricultores, objetivando identificar os principais usos para a vegetação da
comunidade.
Para interpretação da diversidade foram utilizados os índices de diversidade de Shannon e
índice de equabilidade de Pielou (SOUZA; SOARES, 2013). A estrutura horizontal da comunidade
foi analisada com os parâmetros: densidade, frequência, dominância, índice de valor de
importância, índice de valor de cobertura dos indivíduos amostrados. Para atender a suficiência
amostral, adotou-se a curva coletora como equivalente a curva de acumulação de espécies usada por
Colwell eCoddington (1994).

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Validando a amostragem de acordo com a curva do coletor, a amostragem foi atendida com
11 parcelas, quando houve a estabilização da ocorrência de novas espécies, sendo possível supor
que com o aumento do esforço amostral, não apresentariam novas espécies para essa área.
No levantamento arbustivo/arbóreo realizado na Comunidade Fundo de Pasto Muquem
foram amostrados um total de 1.281 distribuídos em 17 famílias botânicas, 34 em nível de espécie e
36 gêneros. Porém, ocorreram três espécies que não foram identificadas: Bico de Papagaio, Sapinho
e Casca Grossa. E quanto ao hábito dessas espécies aproximadamente 70,0% possuem hábito
arbóreo e 30,0% arbustivo.
A Candeia verdadeira (Eremanthuserythropappus) teve sua ocorrência registrada em 13 das
14 parcelas alocadas, com frequência absoluta de 92,86. Vale lembrar que esta espécie tem hábito
arbóreo, com potencial madeireiro e pode ser uma importante opção de manejo para os moradores
da comunidade, já que a densidade absoluta estimada foi de 792 indivíduos/hectare. Devido essa
alta densidade, a espécie também obteve o maior índice de Valor de Importância (61,29) e índice de
Valor de Cobertura (53,69) (Tabela 1).

Tabela 01. Lista de espécies da vegetação arbustivo/arbórea e seus parâmetros fitossociológicos da


inventariada na Comunidade Fundo de Pasto Muquém, município de Monte Santo, Bahia.

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FAMÍLIA / NOME NOME USOS


N DA FA DoA VC VI
CIENTÍFICO COMUM POTENCIAIS
ANACARDIACEAE
FO., MAD.,
MyracrodruonurundeuvaAllemão Aroeira 7 12,5 21,43 0,116 2,529 4,284
MEL. e MED.
MEL., FO. e
Schinopsis brasiliensisEngl. Braúna 5 8,929 7,14 0,109 2,263 2,848
MAD.
APOCYNACEAE
AspidospermapyrifoliumMart.
Pereiro MAD. 13 23,214 21,43 0,041 1,711 3,465
&Zucc.
ARECACEAE
SyagrusCoronata (Mart) Becc. Licuri AL., FO. e OL. 3 5,357 14,29 0,323 5,77 6,939
ASTERACEAE
Eremanthuserythropappus (DC.) Candeia
MAD. e FO. 444 792,857 92,86 1,109 53,686 61,288
Mcleisch verdadeira
BIGNONIACEAE
Anemopaegma sp. Catuaba MED. 2 3,571 7,14 0,015 0,407 0,992
Handroanthusselachidentatus
Pau darco MAD. e MED. 1 1,786 7,14 0,001 0,087 0,672
(A.H.Gentry) S.Grose
CAPPARACEAE

CapparisjacobinaeMoric. ex Eichl. Íco FO. e MED. 16 28,571 35,71 0,039 1,917 4,841

EUPHORBIACEAE

Jatrophamollissima (Pohl) Baill. Pinhão bravo MED. 9 16,071 42,86 0,012 0,902 4,411

ManihotglazioviiMuell. Arg. Maniçoba FO. 1 1,786 7,14 0,007 0,192 0,777


Cnidoscolusurens(L.) Arthur Cansanção FO. e MED. 2 3,571 14,29 0,005 0,237 1,407
Croton conduplicatusHumb.
Quebra faca FO. e MED. 15 26,786 14,29 0,076 2,473 3,642
Bonp&Kunth.
CrotonnepetaefoliusBaill. Pau leite MED. 6 10,714 21,43 0,162 3,242 4,996
ERYTHROXYLACEAE
Erythroxylum sp. Quiri MAD. 23 41,071 35,71 0,061 2,838 5,762
FABACEAE
AcaciapaniculataWilld. Lambe beiço FO. 8 14,286 21,43 0,009 0,777 2,531
Anadenanthera colubrina (Vell.) Angico de MAD., FO.,
46 82,143 50 0,449 11,29 15,384
Brenan caroço MED. e TN.
Parapiptadeniazehntneri (Harms) Angico MAD., FO.,
6 10,714 7,14 0,009 0,617 1,202
M.P. Lima & Lima manjolo MED. e TN.
Poincianellapyramidalis (Tul.) L. FO., MEL. e
Catingueira 11 19,643 21,43 0,12 2,909 4,663
P. Queiroz MED.
Mimosa tenuiflora (Willd.) Poir. Jurema preta MAD., FO. e TN. 3 5,357 14,29 0,043 0,965 2,135
Senna macranthera(DC. ex
São João FO. e MAD. 25 44,643 71,43 0,262 6,441 12,289
Collad.) H.S.Irwin&Barneby
Bauhimacheilantha (Bong.) Steud Mororó FO. e MAD. 13 23,214 50 0,019 1,345 5,439

Libidibiaferrea (Mart. exTul.) L. P. FO., MAD. e


Pau ferro 9 16,071 21,43 0,022 1,085 2,84
Queiroz MED.
Chloroleucondumosum (Benth.)
Arapiraca FO. e MAD. 6 10,714 28,57 0,015 0,73 3,069
G.P. Lewis
Poecilantheulei (Harms) Arroyo &
Carrancudo FO. e MAD. 104 185,714 42,86 0,212 11,751 15,26
Rudd
Mimosa arenosa (Willd.) Poir. Calumbi FO. e MAD. 139 248,214 100 0,757 23,846 32,033

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

LECYTHIDACEAE
MAD., FO., e
Carinianalegalis (Mart.) Kuntze Pau caixão 3 5,357 14,29 0,009 0,391 1,56
MED.
MALVACEAE
MAD., MED.,
LueheadivaricataMart. &Zucc. Açoitacavalo 4 7,143 21,43 0,023 0,702 2,456
TN. e ATR.
MYRTACEAE
Eugenia tapacumensis O. Berg Goiabinha MAD. 51 91,071 42,86 0,15 6,558 10,067
AL., MAD. e
Psidium guineenseSw. Araçá 64 114,286 57,14 0,093 6,587 11,265
MED.
Campomanesiaaromatica(Aubl.)
Guabiraba MED. 25 44,643 7,14 0,061 3,001 3,586
Griseb.
NYCTAGINACEAE
Guapira sp. Maria mole MED. e MEL. 33 58,929 85,71 0,208 6,138 13,156
RUTACEAE
ZanthoxylumrhoifoliumLam. Limãozinho MAD. e MED. 7 12,5 7,14 0,025 0,98 1,565
SAPINDACEAE
Cipó de
Cardiospermumcorindum L MED. e ATR. 1 1,786 7,14 0,009 0,24 0,825
vaqueiro
Allophyluslaevigatus (Turcz)
Estraladeira MAD. 36 64,286 28,57 0,22 6,584 8,923
Radlk.
MAD., AL. e
Talisiaesculenta (A. St.-Hil.) Radlk Pitombeira 69 123,214 50 0,161 8,153 12,247
MED.
SOLANACEAE
Physalis sp. Juá de bode FO. e MED. 2 3,571 7,14 0,012 0,367 0,952
Solanumpaniculatum L. Jurubeba MED. 2 3,571 14,29 0,004 0,225 1,395
VERBENACEAE
Alecrim do
LippiagracilisSchauer FO., OL. e MED. 14 25 35,71 0,019 1,415 4,339
campo
Indeterminada Casca grossa - 18 32,143 21,43 0,098 3,081 4,835
Indeterminada Sapinho MAD. 30 53,571 28,57 0,146 4,853 7,192
Bico de
Indeterminada MAD. e FO. 5 8,929 21,43 0,602 10,716 12,47
papagaio
Total 1281 2287,5 1221,43 5,829 200 300
FO = Forrageiro; MAD = Madereiro; MED = Medicinal; MEL = Melífera; Alimentício = AL; OL =
Oleaginosa (produção de óleo); TN = Tanino; ATR = Artesanal.N = Número de Indivíduos nas Parcelas;
FA = Frequência Absoluta; DA=DensidadeAbsoluta(árvoresporhectare);DoA = Dominância Absoluta
(em metros quadrados por hectare); VI=ÍndicedeValordeImportância; VC=ÍndicedeValordeCobertura.

O número de espécies amostradas neste levantamento (38) está de acordo com outras áreas
de caatinga estudadas. Pois, segundo Lima e Coelho (2018)para áreas de caatinga este número varia
entre 35 e 96 espécies. Esses autores explicam que o maior ou menor número de espécies nos
levantamentos realizados deve ser resposta a um conjunto de fatoresedafoclimáticos, além da ação
antrópica que, se realizada de forma não sustentável pode determinar as espécies do local.
Das espécies identificadas, 54,0% tem potencial forrageiro, expressando alto potencial de
atendimento ao sustento dos rebanhos no sistema de fundo de pasto, desde que adequada a
capacidade de suporte da área, visando manter a oferta de forragem e nutrição dos rebanhos.

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Em relação a diversidade e distribuição dessas espécies nas parcelas inventariadas nesta


comunidade, foram estimados o Índice de Diversidade de Shannon-Weaver (H') de 2,62 e Índice de
Equabilidade de Pielou (J') de 0,71. Evidenciando-se uma importante diversidade sobre a vegetação
lenhosa (arbustivo/arbórea), e que as espécies estão distribuídas de forma equitativa sobre toda área
levantada.
Das famílias botânicas amostradas, as que apresentaram maior número de espécies, foram:
Fabaceae e Euphorbiaceae com 16 táxons, o que representa 44,44% da riqueza florística
identificada do total amostrado. Myrtaceae e Sapindaceae possuem três espécies cada uma, ou seja,
em conjunto detém 16,67%. Essas quatro famílias botânicas juntas representam 61,11% das
espécies registradas nessa comunidade. As demais espécies estão concentradas nas outras 13
famílias com apenas dois ou um táxon.
As espécies que se destacaram quanto ao maior número de indivíduos foram: Candeia
verdadeira (444), Calumbi(139), Carrancudo (104), Pitombeira (69) e Araçá (64). Nestas cinco
espécies estão concentrados 63,95% dos indivíduos amostrados.
Quanto a vitalidade dos indivíduos amostrados na comunidade de Muquém, 88,52% dos
indivíduos encontram-se vivos, doentes apenas 2,26 e 9,21% mortos inferindo-se que estado
fitossanitário dos indivíduos pode ser considerado bom, sem observados aparente de anormalidades.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerado como alta a diversidade e os hábitos de uso da vegetação presente na
comunidade, possibilita-se a adoção de intervenções que favoreçam a oferta forrageira, como
raleamento e rebaixamento na Caatinga, assim, potencializando paraatender os anseios do sistema
de criação em fundo de pasto.

1. REFERÊNCIAS
ALVARES, C. A.; STAPE, J.L.; SENTELHAS, P.C.; GONÇALVES, J.L.M.; SPAROVEK,
GERD. Koppen’s climate classification map for Brazil.MeteorologischeZeitschrift, v. 22, n. 6, p.
711–728, 2014.

ANDRADE, N. S.; ANDRADE, J. P. GABRIEL TROILO, G. Compreendendo a problemática


agrária do território: uma experiência de.mapeamento participativo com educandos da Escola
Família Agrícola do Sertão, Monte Santo (BA). Anais do II Seminário Internacional de Educação
do Campo. Feira de Santana-BA, 2015.

COLWELL, R.K.; CODDINGTON, J.A. Estimating terrestrial biodiversity through


extrapolation.PhilosophicalTransactionsofthe Royal Societyof London, B 345:101-118, 1994.

LIMA, B. G.; COELHO, M. F. B. Fitossociologia e estrutura de um fragmento florestal da caatinga,


Ceará, Brasil. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 28, n. 2, p. 809-819, abr.- jun., 2018.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

REIS, F. S. Associativismo em comunidades de fundo de pasto no município de Monte Santo


(BA): mobilização social, dinâmica de poder. 2015. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) –
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Bahia, 2015.

RMFC – Rede de Manejo Florestal da Caatinga. Protocolo de Medições de Parcelas


Permanentes. Recife. Associação de Plantas do Nordeste; Brasília, MMA, PNF, PNE. 28 p. 2005.

SOUZA, A. L.; SOARES, C. P. B. Florestas nativas: estrutura, dinâmica e manejo. Viçosa,


MG: Ed. UFV, 322 p. 2013.

SOUZA, B. B.; BATISTA, N. L.; OLIVEIRA, G. J. C. Utilização da faveleira


(Cnidoscolusphyllacanthus) como fonte de suplementação alimentar para caprinos e ovinos no
semiárido brasileiro. ACSA, v.8, n.3, p. 01-05, 2012.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

FAUNA ASSOCIADA ÀS RAÍZES DO MANGUE DO RIO GOIANAE SEU


USO NA PESCA
Nirhvana Felipe da Silva¹, Cláudio Antônio de Moura Pereira², Ivo Raposo Gonçalves Cidreira
Neto³

Graduanda em Bacharelado Ciências Biológicas ênfase em Ambientais, UFPE¹


Bacharel Ciências Biológicas, UFPE²
Mestre em Desenvolvimento em Meio Ambiente, UFPE³

1. INTRODUÇÃO
A mistura entre as águas doces e salgadas criam a característica típica do ambiente
estuarino, e consequentemente, a distribuição de salinidade influencia a paisagem desse ambiente
com a colonização e sobrevivência da fauna e da flora associada ao ecossistema (ALVES, 2001). O
manguezal é considerado um ambiente de transição entre o mar e a terra, sendo comuns em áreas
tropicais e subtropicais e está sempre interligado com as variações das marés. As ações das marés
influenciam nas espécies que transformam a estrutura do manguezal (SCHAEFFER-NOVELLI,
2015). Esse ambiente possui uma elevada produtividade e serve como fonte de alimento para vários
organismos, como crustáceos, moluscos e peixes.
Os três tipos de mangue mais populares são: o mangue-vermelho (Rhizophoramangle), o
mangue-preto (Avicenniaschaueriana) e o mangue-branco (Laguncularia racemosa) (PEIRÓet al.,
2018). As raízes são estruturas que auxiliam na retenção de matéria orgânica de sedimentos, que são
transportados pela água, e também, servem de abrigo para animais que utilizam o ambiente durante
a reprodução. Na espécie R. mangle essas estruturas são chamadas de raízes-suporte que oferecem
sustentação e também absorção dos nutrientes no solo. Diversos organismos vivem associados às
raízes podendo modificar a biodiversidade de alguns manguezais.
As Reservas Extrativistas são áreas onde a utilização dos recursos naturais ocorrem de
maneira sustentável aliada a cultura e valores das populações tradicionais. As comunidades de
pescadores artesanais dentro das reservas garantem o respeito à natureza e à tradição com atividades
que evitam perdas dos saberes locais (CHAMY, 2002).Os pescadores artesanais possuem uma
grande diversidade de interações com o ambiente através da pesca, são capazes de compreender a
dependência do meio ambiente que o cerca, e com isso desenvolve formas de manejo dos recursos
naturais que são menos degradantes ao meio ambiente para a sobrevivência em sua atividade
profissional e subsistência (CUNHA, 2001).Partindo deste pressuposto o atual estudo possui o
objetivo de descrever a fauna associada as raízes de mangue comparando o gradiente de salinidade

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para observar a distribuição dos organismos, identificar quais são utilizados como mercadoria e
quais as estratégias pesqueiras.
Há uma grande importância no conhecimento acerca dos organismos associados aos as
raízes de mangue, visto que no Brasil existem poucos dados sobre este tipo de associação. Também
é possível identificar uma redução quanto aos estudos que correlacionam esses organismos com a
pesca, tendo a finalidade para mercadoria e/ou subsistência.

2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1 Área de estudo
A área de estudo está inserida na Reserva Extrativista Acaú-Goiana criada por decreto
federal em 26 de setembro de 2007 (BRASIL, 2007), que possui aproximadamente 3.192,20 ha de
manguezal, 466,69 ha de formação florestal e 405,94 ha de recurso hídrico (MAPBIOMAS, 2019).
Localizada nos Municípios de Pitimbú e Caaporã, no Estado da Paraíba, e Goiana, no Estado de
Pernambuco, a RESEX possui uma área aproximada 6.676,69 hectares e de coordenadas
geográficas de 7°33'58.86"S e 34°50'13.79" WGR (IBAMA 2007) e possui beneficiários
comunitários que utilizam diversos recursos naturais, como catadoras(es) de mariscos, de
caranguejo, siri, sururu, ostras, peixes, entre outros.
O estuário, objeto deste estudo, está localizado no Rio Goiana, que tem como principais
cursos d’água os rios Capibaribe-Mirim, Siriji, Tracunhaém e Goiana. A nascente se localiza no
município de São Vicente Férrer até as proximidades de Timbaúba e apresenta regime fluvial
intermitente. O Rio possui uma extensão de aproximadamente 18 km até a foz no Oceano Atlântico
(APAC, 2019) e sua foz desagua entre as praias de Acaú (PB) e Carne de Vaca (PE)

2.2. Procedimento em campo


As coletas foram realizadas em duas estaçõesde coleta em quatro pontos, que variaram de
acordo com o grau de salinidade. Foi realizada a coleta de dois pontos em uma região mais próxima
do mar, e consequentemente, com o gradiente de salinidade maior, e mais duas no leito do rio com
o grau de salinidade menor.Em cada estação foram delimitadosdois pontos de coleta. Os pontos 1 e
2, identificados como Cajueirinho e Anta e os pontos 3 e 4, identificados como Ilha dos Cachorros e
Camboa Velha. Todo procedimento de coleta da fauna associada as raízes de mangue,foi aplicado
para amostras de R.mangle e de A.schaueriana.

2.2.1 Coleta das raízes de mangue

877
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Para obtenção das partes vegetativas foram posicionados em cada ponto 3 quadrantes de 5
metros paralelamente às margens do Rio, com 2 metros entre eles. Ocorreu a coleta de 3 amostras
em cada transecção, totalizando 9 amostras por ponto.
Todas as áreas de coletas foram feitas as aferições de temperatura e salinidade com o auxílio
de um termômetro erefratômetro. As coordenadas geográficas foram obtidas através do auxílio de
GPS. A obtenção do material de coleta foi feita com o auxílio de uma tesoura de poda, e após serem
retiradas, as raízes coletadas foram acomodadas em sacos de plásticos e depois inseridas em formol
a 4% para fixação dos organismos associados.

2.2.2 Coletas de dados etnobiológicos


A coleta de dados sobre a catação dos organismos utilizados para alimentação e/ou
comercialização, ocorreu durante as coletas das raízes do mangue, com os pescadores, em técnicas
de observação participativa e entrevistas semi-estrututradas.Através das coletas em campo foi
observado que dentre os moluscos, as ostras, são os organismos associadas as raízes que são mais
pescados na região, por este motivo foi necessário enfatizar sobre o procedimento dos
pescadoras(es) com a pesca e comercialização deste produto..

2.3 Procedimento em laboratório


Após o procedimento em campo, as amostras foram levadas para o Laboratório de
Avaliação, Recuperação, Restauração de Ecossistemas (ARRE Água-UFPE). Todas as raízes
passaram pelo primeiro processo de triagem com as amostras sendo lavadas com água corrente.
Todo sedimento presente foi raspado e peneirado. Em seguida, ocorreu a segunda parte do processo
de triagem com a observação dos organismos através do auxílio de uma lupa e a separação em potes
com álcool 70% para a conservação dos organismos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 Identificação da fauna associada
Foram identificados na primeira coleta 288 indivíduos, distribuídos em dezespécies. Dentre
eles, foi possível verificar a presença de quatromorfotipos deGastropoda, dois de Bivalvia, um
Decapoda,um Cirripedia, umAmphipoda e um Isopoda.
Quanto a resposta sobre a triagem realizada no laboratório, foi possível analisar a presença
de 12 organismos em Cajueirinho, 13 na Anta (Estação 1), 44 na Ilha dos cachorros e 219 em
Camboa Velha (Estação 2). Quanto ao gradiente de salinidade foi analisado, que nos pontos 1 e 2, a
salinidade aferida foi de 5 e 3 respectivamente, e nos pontos 3 e 4, a salinidade foi de 15 e 18
respectivamente.
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Sobre a diferenciação entre a biodiversidade entre as duas espécies de raízes, avefoi


evidenciado um maior número de organismos nas raízes de R.manglee durante a coleta foi possível
verificar a presença de Aschauerianasomente na Ilha dos Cachorros (Ponto 3, Estação 2).
Referente a associação das ostras nas raízes, foi identificado um total de 71 ostras
incrustadas nas raízes de R. mangle, enquanto a A. schaueriana não foi possível observar
incrustações pelo molusco.

3.2 Pesca das ostras


Através das entrevistas livres e observação participativa foi possível obter a delimitação da pesca de
ostra no Rio Goiana, sendo esta ação realizada com mais frequência próximo ao ponto 4 (Camboa
Velha), que possui maior biodiversidade de animais e maior gradiente de salinidade. Também foi
possível identificar os pescadores de ostras perto das praias pois, o comércio é feito pelos próprios
pescadores sem a necessidade de um atravessador. Segundo CIDREIRA, 2019 a ostra é o molusco
mais rentável, para algumas comunidades inseridas na RESEX Acaú-Goiana. O valor pode chegar
até R$ 25,00 reais o quilo na venda diretamente por quem pesca, e em média R$ 13,00 reais o quilo
para atravessador.

4. CONCLUSÃO
Foi possível verificar alta biodiversidadena Reserva ExtrativistaAcaú-Goiana e a influência do
gradiente de salinidade sobre a distribuição dos organismos, além da preferência do tipo de mangue
pelo qual os organismos encontram-se em maior número associado. Houve a observação referente a
dependência da população sobre os mangues presentes no local por possuir animais utilizados na
mercadoria e subsistência, principalmente no local onde está presente o maior número de
organismos sendo consequentemente o local com maior gradiente de salinidade influenciando no
aparecimento de ostras ideais.

5. REFERÊNCIAS
Agência Pernambucana de Águas e Climas. Bacias Hidrográficas, Rio Goiana.
Disponívelem<http://www.apac.pe.gov.br/pagina.php?page_id=5&subpage_id=15>. Acesso em 08
ago. 2019.

ALVES, Jorge Rogério Pereira. Manguezais: educar para proteger. Rio de Janeiro: Fundação de
Estudos do Mar & Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, v. 96,
2001.

BRASIL. Decreto de 26 de setembro de 2007. Cria a Reserva Extrativista Acaú-Goiana, nos


Municípios de Pitimbú e Caaporã, no Estado da Paraíba, e Goiana, no Estado de Pernambuco. 2007.

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CHAMY, Paula. Reservas Extrativistas Marinhas: um estudo sobre posse tradicional e


sustentabilidade. Anais do I Encontro da Associaçao Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em
Ambiente e Sociedade, 2002.

CUNHA, L. H. de O. Reservas extrativistas: Uma alternativa de produção e conservação da


biodiversidade. Encontro dos povos do Vale do Ribeira, 2001.
INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE – ICMBio. Atlas
dos manguezais do Brasil.Brasília: ICMBio, 2018.

PEIRÓ, Douglas F.; SALMAZO, Julia. R. & SEMPREBOM, Thais R. Revista Biologia Marinha
de Divulgação Científica. Ubatuba-SP, Brasil, Editora: Bióicos, 2018: Vol 1, pp. 32- 42.

MAPBIOMAS. v3.1 Mapas de Limite Unidade de Conservação e Cobertura classes Mangue.


Disponível em <http://mapbiomas.org/map#coverage>. Acesso em 11 ago. 2019.

NETO, CIDREIRA; GONÇALVES, Ivo Raposo. Pescadoras da maré: conhecimento local como
subsídio para gestão pesqueira no Nordeste brasileiro. 2019. Dissertação de Mestrado. Universidade
Federal de Pernambuco.

SCHAEFFER-NOVELLI, Yara; VALE, Cláudia Câmera do; CINTRÓN, Gilberto. Monitoramento


do ecossistema de manguezal: características funcionais. Protocolos para monitoramento de habitats
bentônicos costeiros-rede de monitoramento de habitats bentônicos costeiros-rebentos, 2015.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

A COLETA ARTESANAL DO SURURU: DIVERSIDADE DE HABITATS E


DE ARTES DE PESCA
Rebeca Carvalho do Monte*, Ivo Raposo Gonçalves Cidreira Neto**
*
Departamento de Zoologia, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil. rebecarvalho98@gmail.com.
*
Departamento de Zoologia, Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.ivo.raposo@hotmail.com.

1. INTRODUÇÃO
A pesca artesanal é a principal atividade econômica que ocorre na costa nordeste do Brasil.
Um dos mais comuns tipos de pescaria é a do sururu (Mytella ssp), um molusco bivalve encontrado
normalmente em ambientes de manguezais, possuindo ampla distribuição na América central e na
América do Sul, podendo ser encontrado tanto na costa Atlântica, quanto na costa do Pacífico. No
Brasil, o a pesca do sururu se encontra presente nas regiões Nordeste como forma de subsistência de
muitas comunidades pesqueiras. Por apresentarem a filtração como hábito de vida, se tornam
importantes na regulação da poluição e salinidade do ambiente em que está inserido, que neste caso
são os manguezais. Além desses benefícios, a pesca do sururu propicia a movimentação
da economia, considerando seu uso na culinária sendo servido como caldo de sururu, no azeite de
dendê e no leite de côco e no artesanato, como exemplo de seus usos.
O sururu habita ambientes de manguezais podendo ser encontrados associados as raízes de
mangue, como Rizophera mangle, Avicenia, Laguncularia, e etc.O sururu é conhecido também
como lambe pau quando associado as raízes do mangue. Esses ocorrem também enterrados no
substrato, sendo chamados de sururu de mangue e de maré.
Se faz necessária formas diferentes de pesca (artes de pesca), como a (i) raspada, que serve
para a retirada do sururu lambe pau, como é popularmente chamado; (ii) retirada manual com
instrumento cilíndrico, que é inserido no sedimento/lama onde há o vestígio da presença do
organismo (orifício); (iii) retirada com mão na areia da croa.
Esse trabalho teve como objetivo fazer uma breve descrição dos diferentes
ambientes/habitats que o sururu está inserido, e as diversas formas de artes de pesca ocorridas na
RESEX Acaú-Goiana.

2. METODOLOGIA
Área de estudo:

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RESEX Acaú-Goiana. Uma importante unidade de conservação marinha que abrange cerca
de 6.676,69 hectares, que é composta por 6 comunidades no total, são elas: Carne de Vaca, São
Lourenço, Balde do rio no estado de Pernambuco. Na Paraíba, estão inclusas Congaçari e Acaú,
compostas pelos municípios de Caaporã e Pitimbu. Este relato foi presenciado na comunidade de
São Lourenço.

Métodos:
Para a extração dos dados aqui citados, foi feito entrevistas livres (conversas informais) e o
acompanhamento do trabalho de pesca (observação participativa) com informante-chave na catação
do sururu durante o mês de agosto de 2019.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
 Sururu lambe pau
Este tipo de sururu vive associado as raízes do mangue. O principal instrumento usado é o
facão, que a partir dele se fazer a extração das raízes. Essas raízes de escora são transportadas pelos
pescadores até o local onde o sururu vai ser tratado e beneficiado ou debulhado, como é falado
popularmente.
O tratamento envolve a remoção da bucha (esponjas e outros materiais aderidos)
manualmente, e a preparação de um fogaréu para o cozimentoparcial (cocção) do sururu, para que
sua concha se abra e o beneficiamento possa ser concluído.
 Sururu de mangue
Nesse ambiente, o sururu se encontra enterrado no substrato dos manguezais deixando
aparente apenas a abertura indicando onde se encontram. A partir dessas aberturas (orifícios), os
pescadores inserem um instrumento/apetrecho que se assemelha a um gancho. Porém nem todos os
pescadores se utilizam desse aparato, alguns retiram o sururu pressionando o dedo contra o orifício
em que ele está inserido.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Fontes: Rebeca Carvalho, 2019

 Sururu de maré
A pescaria do sururu de maré se assemelha a dos mariscos(Anomalocardia brasiliana) que
se dá retirando-os das croas (bancos de areia) como são conhecidos os locais mais comuns desse
tipo de catação. Para tal, os pescadores catam manualmente e utilizam baldes,como os principais
apetrechos de pesca, o que torna este tipo de pesca não oneroso aos pescadores. A forma artesanal
de pesca nesse ambiente é a manual, onde os pescadores retiram em pequenas quantidades o sururu
e colocam em baldes até atingir a quantia desejada. O beneficiamento é realizado do mesmo modo
que os anteriores.

Fonte: Rebeca Carvalho, 2019

BENEFICIAMENTO:
A mão de obra da pesca de sururu é uma das mais cansativas, se comparado ao marisco por
exemplo, pois segundo os informantes a retirada da bucha e o pré-cozimento são processos que são
considerados relativamente longos, podendo durar até mais de 12 horas corridas, desde a pesca até o
beneficiamento.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O sururu é um importante recurso para os pescadores que dependem dele para alimentação
de subsistência e também para a comercialização. A diversidade de habitats, em que o sururu é
encontrado, requer formas adaptadas de pesca de acordo com esse ambiente, variando nos
apetrechos utilizados, mas se assemelhando na forma de beneficiamento. O que todos esses tipos de
artes de pesca têm em comum, é o trabalho manual, pois mesmo que osinstrumentos sejam
utilizados, em alguns casos como no sururu de mangue, a sua retirada pode ser feita apenas manual.

883
GT 9
Áreas protegidas e a questão agrária
A conservação da biodiversidade se relaciona à dinâmica agrária de diversas
formas, dentre elas as próprias lutas associadas à reforma agrária e ao direito à
terra, como aquelas conduzidas pelo movimento ambientalista e outros, e se
associam, ainda, aos conflitos e articulações entre assentamentos rurais e
unidades de conservação. Esse tema abrange, também, as questões relativas às
Reservas Legais e Áreas de Proteção Permanente das propriedades rurais, bem
como as iniciativas agroecológicas dos sindicatos de trabalhadores rurais e
ONGs assessoras dos agricultores familiares, ou ainda interação entre os
agricultores e as universidades, em projetos de pesquisa e extensão, ou em
cursos de Educação do Campo. A questão das áreas protegidas nesse contexto se
situa também no plano dos conflitos no campo, em função da expansão do
agronegócio. Nesse sentido discute-se ainda a relação entre conservação
ambiental e produção agrícola em um país onde impera um dos maiores índices
de concentração fundiária em termos de propriedade da terra, definido por um
modelo agrícola baseado na monocultura. Este GT visa, portanto, discutir a
relação entre as questões agrárias, as áreas protegidas e o compromisso de
conservação da biodiversidade na zona rural, em todas estas dimensões.

Coordenadores:
Ana Motta Ribeirp (UFF)
Janaína Tude Sevá (UFF)
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AGROBIODIVERSIDADE DE QUINTAIS AGROFLORESTAIS: PARA


ALEM DA PRODUÇÃO DIVERSIFICADA
AGROBIODIVERSITY OF AGROFORESTRY FARM: BEYOND DIVERSIFIED
PRODUCTION

Marilene Vieira Barbosa*, Tiago da Silva Pinto**, Monica Cox de Britto Pereira***
* Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Universidade Federal de Pernambuco-UFPE,
Recife, Pernambuco, Brasil, e-mail: mary-t.a@hotmail.com.
** Agente da Comissão Pastoral da Terra- CPT, João Pessoa, Paraíba, Brasil.
*** Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal de Pernambuco-UFPE, Recife, Pernambuco,
Brasil, e-mail: monicacoxbp@gmail.com

1. INTRODUÇÃO
A concepção de agrobiodiversidade tem sido desenvolvida nas ultimas décadas,
ressaltando a dimensão da relação sociedade-natureza. Para Santilli (2012) agrobiodiversidade
possui caráter interdisciplinar e reflete as dinâmicas e complexas relações entre sociedades
humanas, plantas cultivadas e ambientes em que convivem, bem como dimensões políticas.
A Convenção da Diversidade Biológica traz como“um termo amplo que inclui todos os
componentes da biodiversidade que têm relevância para a agricultura e alimentação, bem como
todos os componentes da biodiversidade que constituem os agroecossistemas: as variedades e a
variabilidade de animais, plantas e de microrganismos, nos níveis genético, de espécies e de
ecossistemas, os quais são necessários para sustentar as funções chaves dos agroecossistemas, suas
estruturas e processos”. Agrobiodiversidade pode ser compreendida também como a parte da
biodiversidade utilizada pela humanidade na agricultura, em práticas de coleta e sistemas de
manejos desenvolvidos ao longo do tempo (NAIME, 2016).
Segundo Santilli (2005) e Pereira (2012), o pacote desenvolvimentista da revolução verde
tem sido a principal ameaça a agrobiodiversidade, resultando na erosão dos saberes da
agrobiodiversidade. As pesquisadoras apontam os “povos da terra ” como os grupos que resistem a
essa pressão, por meio de diferentes estratégias, sendo os quintas produtivos apontados uma por
Esmeraldo, et al. (2017); Gonsalves e Lucas (2017); Patricia, et al (2018).
Esta pesquisa teve por objetivo compreender a relação das famílias com quintais produtivos
e as diferentes contribuições da agrobiodiversidade para a qualidade de vida das famílias da
comunidade de Antônio Pinto no município de Caaporã na Mata Sul da Paraiba, Nordeste do Brasil.

2. MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo tem caráter descritivo exploratório com abordagem qualiquantitativa,
conforme Ferreira (2016), visto que esta contribui para melhor compreensão das

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

complexidadesenvolvidas. A pesquisa foi desenvolvida no Acampamento Antônio Pinto, município


de Caaporã na Mata Sul paraibana, divisa dos estados da Paraíba e Pernambuco.
A coleta dos dados foi realizada a partir de visitas aleatórias aos quintais produtivos dos
agricultores e aplicação de questionários semiestruturados, constituídos de perguntas de cunho
social, sobre o conhecimento da agrobiodiversidade e seus usos. Este modelo de questionário
possibilita maior liberdade de expressão ao entrevistado, viabilizando analise das características
individuais e coletivas, e para tanto se fez uso da metodologia da análise do conteúdo
(MORAIS,1999).

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
A comunidade Antônio Pinto é um acampamento de posseiros (as) que trabalhavam na
produção da cana de açúcar da usina Maravilha, situada no Município de Goiana-PE. Com a
redução da atividade canavieira e adesão aos negócios imobiliários pelos acionistas da usina no
final da década de 90 (JC, 2014) os trabalhadores foram demitidos, não receberam os direitos
trabalhistas e foram orientados pelos usineiros a saírem da terra.
Sem ter para onde ir, os trabalhadores resolveram se organizar e reivindicar o direito a
posse da terra e buscaram apoio da Comissão Pastoral da Terra- CPT. Em aproximadamente oito
anos de luta os agricultores vem enfrentando conflitos, sofrendo ameaças, despejos com destruição
das casas e lavouras. Apesar desta realidade, os acampados resistem e seguem firmes em busca da
posse definitiva da terra.
O acampamento é constituído por 60 famílias que residem em “casa de taipa”, cultivam a
terra. Produzem principalmente macaxeira, inhame, milho, feijão, batata, hortaliças e frutas
diversas, abastecendo o mercado de Caaporã e Goiana. Além de plantar nos roçados, os
agricultores(as) plantam e criam ao redor das residências principalmente para consumo.
Os colaboradores desta pesquisa tem os núcleos familiares composto uma media de 4
quatro pessoas, 80% possuem o ensino fundamental incompleto e 10% completo, 60% estão na
faixa etária dos 29 a 40 anos, enquanto que 40% possuem de 41 a 61 anos, 80% dos entrevistados
são do sexo feminino, fato também observado por Patricia et al (2018).
No momento da visita, algumas mulheres estavam cuidando dos filhos, da casa ou do
terreiro/quintal, assim, verificou-se que o quintal produtivo é um espaço familiar, porém é,
sobretudo, um espaço construído e transformado pelas mulheres, Esmeraldo et al. (2017) expõe que
as mulheres são as principais protagonistas nas relações existentes dentro dos quintais produtivos
envolvidas por processos históricos.
Durante o campo, percebeu-se que os quintais produtivos, também conhecidos pelos
agricultores como “terreiros” não possuem tamanho nem formato definido e tem como referência o
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

entorno na casa, porém foi perceptível os limites destes, através da diferença entre as culturas
trabalhadas. A área do quintal é ocupada por maior diversidade de plantas, sobretudo de frutíferas e
plantas medicinais (tabela 1), fato também observado por Santos et al. (2013), que realizou estudo
de caracterização, delimitando estes espaços por meio de cartografia social.
A agrobiobiversidade dos quintais foram categorizadas de acordo com a forma de uso,
foram citadas 96 espécies, sendo 94 de plantas e 02 de aves distribuídas nas categorias descritas na
Tabela 1 abaixo. Verificou-se que a produção dos quintais são majoritariamente destinada ao
consumo, estendendo-se a ações solidárias, de doação a vizinhos, familiares e amigos, conforme
relato:
“ ... o povo chega aqui e diz: dona Maria me dê uma macaxeirinha, eu digo pode
levar meu filho, aqui acolá, chega outro dizendo que esta com dor de barriga e pede
uma aguinha de coco, pegue lá, leve meu filho... aqui é assim, é, esta com tosse
mando levar alguma coisa pra fazer lambedor...”
Mulher de 58 anos, 2019.

Tabela 1: Descrição da Agrobiodiversidade e usos nos quintais produtivos agroflorestais dos agricultores (as)
da comunidade de Antônio Pinto, município de Caaporã na Paraíba, Brasil.
Categorias de uso
Das plantas Total
Saião, couve, hortelã da folha miúda, hortelã da folha grossa, erva
cidreira, capim santo, melão de são Caetano, camomila, canela,
Medicinais louro, babosa rajada, babosa da grande, romã, musambé, 33
manjericão, mastruz, colônia, sabugueiro, boldo, cabaça, amoreira,
cana de macaco, boa noite branca, goiabeira, abacateiro,
vassourinha, rasteirinha, pega pinto, acerola, xambá, alecrim,
maracujá.
Frutíferas: Coqueiro anã, coqueiro da praia, laranjeira, goiabeira,
abacaxi, maracujá, mamão, manga, umbucajá, sapota, siriguela,
caju, acerola, mangaba, limão, oliveira, bananeira prata, bananeira
anã, pinha, abacateiro, cajá, pitanga, graviola, carambola, amora,
jaca, sapota, jambo, poponha.
Alimentícias Culturas anuais/ lavoura branca: batata, macaxeira, inhame, cana 44
caiana, feijão.
Hortaliças: tomate, coentro, jerimum, pimenta, couve, quiabo,
cebolinha, chuchu, maxixe do pará.
Nim, espada de são Jorge, rabo de macaco, boa noite da branca, boa
Ornamentais/ noite da roxa, cefe, Imbé, friso, jasmim do branco e do vermelho, 19
Jardim dedinho, pião roxo, margarida, mais sete não identificadas.
Silvestres Flor de mel, imbaúba, pau-brasil 3
Total de plantas 94*
ANIMAIS
Aves Galinha, patos 2
TOTAL 96
Fonte: Autores, 2019.
* cinco plantas citadas possuem duas utilidades, motivo do numero total de plantas citadas
totalizar um número menor que a soma do total por categoria.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Percebeu-se nos relatos, a alegria e orgulho em falar dos seus quintais, que para as
agricultoras e agricultores são mais que produção diversificada, ganham significados maioresda
liberdade, mudança de vida com mais oportunidade e qualidade, solidariedade entre os moradores,
bem como faz parte da resistência, da história individual e coletiva.

“ ...é ter mais um meio de vida melhor, com mais saúde, mais oportunidades
com alimentos mais saudáveis, com mais tipos de plantas.”
Mulher de 29 anos, 2019.

“ ...é chegar em casa e ter uma agua de coco no quintal pra tomar e
oferecer as visitas, é ter as coisas sem ir comprar na rua, isso é tudo, é
saúde e tranquilidade...”
Homem de 58 anos, 2019.

“... quando tem frutas a gente já não compra, porque tem sempre alguma
coisa pra colher, pra fazer um suco, tem um limão com limpar a galinha que
a gente mata...”
Mulher de 38 anos, 2019.

“...Isso aqui é minha vida... eu morei em cidade, tinha vontade de vi pro


sitio e ter minhas coisas, por isso zelo por meu terreiro, agora eu sou rica,
queria ter mais, plantar mais, pra mim comer e da pra quem precisa...
Muitas plantas que tenho aqui foi que trouxe de outras comunidades quando
fui pras atividades da CPT, sempre que vou pra algum canto trago uma
planta de lembrança...”
Mulher de 61 anos, 2019.

Características semelhantes foram apontas por Carneiro et al, (2013) e Gonsalves e Lucas
(2017); e Patricia, et al (2018).

4. CONCLUSÕES
Na comunidade estudada, os quintais produtivos são espaços com limites não definidos, que
se diferencia do seu entorno pela presença de maior agrobiodiversidade, sendo estes um espaço de
conservação das espécies.
As mulheres juntamente com os filhos, são os principais responsáveis pela constituição dos
quintais agroflorestais, estas desenham a agrobiodiversidade ao seu redor, os saberes e recursos a
serviço da família, da comunidade e consequentemente da humanidade.
Por fim, o contato com os agricultores(as), permitiu perceber e compreender os quintais
produtivos como um espaço de relações multidimensionais, de construção e transmissão de saberes,
de promoção do pertencimento, cuidado com a vida e com a natureza, com a agrobiodiversidade. É
um espaço de construção política, pois é onde a família se organiza e constrói sua autonomia, um

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

refugio individual e ao mesmo tempo coletivo, bem como um espaço de produção diversificada que
contribui com a segurança alimentar.
5. REFERENCIAS
CARNEIRO, M. G. R; CAMURÇA, A. M.; ESMERALDO, G. G. S. L.; SOUSA, N. R. de.
Quintais Produtivos: contribuição à segurança alimentar e ao desenvolvimento sustentável local na
perspectiva da agricultura familiar (O caso do Assentamento Alegre, município de
Quixeramobim/CE).Rev. Bras. de Agroecologia. 8(2): 100-111,2013.

ESMERALDO, G. G. S.V.; CAMURÇA, A. M.; VIANA, L. A.; ABRANTES, K. K. de J.


Mulheres camponesas e quintais: anúncio de esperança e re(existência) para a vida planetária.
miolo_agroec, V3, 312, 13:51:49,2017.

FERREIRA, C. A. L. Pesquisa quantitativa e qualitativa: perspectivas para o campo da educação.


Revista Mosaico, Vassouras, v. 8, n. 2, p. 173-182, 2015.

GONÇALVES, J. P.; LUCAS, F.C.A. Agrobiodiversidade e etnoconhecimento em quintais de


Abaetetuba, Pará, Brasil.R. bras. Bioci., v. 15, n.3, p. 119-134. 2017.

JORNAL DO COMERCIO. Usinas enfrentam crise abandonando o açúcar para vender


terrenos, 2014. Disponível em:https://jconline.ne10.com.br.Acesso em 27 setembro de 2019.

MORAES, Roque. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, p. 7-32,
1999.

NAIME. Roberto. Agrobiodiversidade.2016 Disponível em: https://www.ecodebate.com.br. Com


acesso em 27 de setembro de 2019.

PATRICIA, M.; MAGALHÃES, F.; SEABRA, D.; GOMES, S.; MENINEA, A. Caracterização de
quintais produtivos: Uso, agrobiodiversidade e divisão do trabalho Anais... Seminário Internacional
em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia, v. 5. Manaus: EDUA. 2018.

PEREIRA, M. C. de B. Revolução Verde. In: Caldart, Roseli Salete; Pereira, Isabel Brasil;
Alentejano, Paulo; Frigotto, Gaudêncio (ORGS.). Dicionário da Educação do Campo. RJ, SP:
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 685-689, 2012.

SANTILLI, J. A Lei de Sementes brasileira e os seus impactos sobre a agrobiodiversidade e os


sistemas agrícolas locais e tradicionais. Bol. Mus.Cienc. Hum., v. 7, n.2, p.457-475, 2012.

SANTOS, A. da S. dos1; OLIVEIRA, L. C. L. de2; CURADO, F. F.; AMORIM, L. O.


Caracterização e desenvolvimento de quintais produtivos agroecológicos na comunidade Mem de
Sá, Itaporanga d’Ajuda-Sergipe. Rev. Bras. de Agroecologia. 8(2): 100-111,2013.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

PNATER E A AGROECOLOGIA: ANÁLISE DEASSENTAMENTO RURAL


EM ÁREA DE CONSERVAÇÃO NO NORDESTE BRASILEIRO
PNATERANDAGROECOLOGY: ANALYSIS OF RURAL SETTLEMENT IN A
CONSERVATION AREA IN BRAZILIAN NORTHEAST

Marina de Sá Costa Lima*,Sonia Maria P. Pereira Bergamasco**

*ARRE Água, Universidade Federal de Pernambuco, Brasilmarina.scl@gmail.com


**Faculdade de Engenharia Agrícola, Universidade Estadual de Campinas, Brasil

1.INTRODUÇÃO
Asanálises de Políticas Públicas para a agricultura familiar, através de estudos motivados
pela reflexão da ação do Estado e a atuação de instituições de Assistência Técnica e Extensão Rural
– ATER, juntamente com as organizações não governamentais e de agricultores familiares, vem
adquirindo um espaço relevante nas pesquisas agrárias e sociais(SCHERER-WARREN, 2006;
SABOURIN, 2012). Em que pese sua relevância, pouca atenção ainda tem sido dada às implicações
dos assentamentos de reforma agrária em relação às áreas de conservação ondemuitos estão
inseridos.
Diante das novas exigências dos movimentos sociais e da sociedade aos papéis que o Estado
deve assumir em decorrência da crise socioambiental,decorrente do modelo de “modernização
conservadora” da produção, encontra-se o desafio de incentivar estratégias de desenvolvimento
local que incluam uma sustentabilidade socioeconômica e ambiental (CAPORAL, 2009).Das
mudanças institucionais, fez-se necessário validar uma política extensionista que visa priorizar
preceitos da agroecologia,incluindo, não apenas a dimensão de um manejo de base ecológica, como
também a autonomia desses agricultores,comequidade e justiça social, num contexto
histórico(TOLEDO;BARRERA-BASSOLS, 2008; CAPORAL, 2009).
Constituída no final de 2003, a Rede ATER Nordeste é uma articulação de 16 entidades que
se baseiam nos processos de construção coletiva de transição agroecológica, frente à crítica da
extensão rural convencional para a implementação de uma nova política de extensão ruraladaptada
ao Nordeste brasileiro (PARANHOS et al., 2007.). Em Pernambuco, a entidade responsávelpela
Rede ATER Nordeste atuar no assentamento Amaraji é o Centro de Desenvolvimento
Agroecológico Sabiá.
Considerando que boa parte dos entraves encontrados nas gestões de assentamentos rurais
em áreas de conservação estão na própria estrutura interna, o presente trabalho tem como objetivo
fazer uma análise multidimensional da atuação da Rede ATER Nordeste ao implementar a Política

890
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Nacional de Assistência Técnica e ExtensãoRural – PNATER, no assentamento Amaraji, da Zona


da Mata Sul de Pernambuco.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Campo de estudo desta pesquisa, o assentamento Amaraji possuiuma área de 1.082,97 ha,
localizado no município de Rio Formoso, na Zona da Mata Sul de Pernambuco. Parte de seu
território estáinserido na Área de Proteção Ambiental – APA Estadual de Guadalupe e na Reserva
Biológica de Saltinho. Ao ser desapropriado em 1996, o Engenho Amaraji passou a ser um
assentamento rural estabelecido por meio de um decreto, em nove de julho de 1997, constituindo 96
parcelas para famílias de trabalhadores rurais(CPRM, 2005).
Esta pesquisa parte de um conjunto de indicadores elaborado para a pesquisa “Avaliationof
Rural Extension”, adaptando uma pequena parte, para facilitar a avaliação da PNATER, a partir de
uma perspectiva dos agricultores e extensionistas (entrevistas semi-estruturadas e roteiros dirigidos)
no assentamento Amaraji – PE. Os indicadores foram os seguintes: 1. Frequência de ATER; 2.
Organização Social e Comunitária; 3. Trabalho; 4. Infraestrutura Rural; 5. Soberania e segurança
alimentar; 6. Questão ambiental; 6.1 Agroecologia; 7. Gênero, geração e etnia; 8. Concepção
pedagógica; 9. Acesso aos Recursos Naturais; 10. Relação de ATER com outras Políticas Públicas;
11. Recursos tecnológicos e de gestão.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A população total no Assentamento Amaraji é de 96 famílias, das quais foram entrevistados
49 indivíduos pertencentes à 43 Unidades Domésticas - UD, distribuídas em 41 lotes de terra.
Dessas famílias, o total de habitantes corresponde à 225 indivíduos, o que daria uma média de 5
pessoas por UD. A grande maioria das famílias habita em casa própria, feita de alvenaria e com
média de quatro compartimentos. Apenas 10 agricultores afirmaram não receber serviços de ATER.

Aplicação dos Indicadores no assentamento Amaraji


A análise dos indicadores aplicados no assentamento Amaraji apresentou uma melhor
avaliação para a Questão Ambiental, com enfoque na agroecologia (62%), e a Soberania e
Segurança Alimentar (57%). Enquanto os indicadores que obtiveram os resultados mais fracos,
foram a Qualidade de Vida (22%) e a Relação de ATER com Outras Políticas Públicas (18%)
(Figura 1).

891
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Figura 1. Percepção dos Agricultores do assentamento Amaraji, município de Rio Formoso-


PE. Fonte: Dados da Pesquisa, 2018.

Questão Ambiental, com enfoque na agroecologia


O resultado mais favorável a dimensão ambiental se deve, em parte, à área do assentamento
Amaraji estar inserido em uma rica APA de Guadalupe e REBIO de Saltinho, com diversas
nascentes e fontes de ‘olho d’água’, próximo a um complexo estuarino, contendo uma variedade de
ecossistemas de floresta atlântica, mata de restinga e manguezal.
Por sua vez, a parceria e atuação conjunta com o Cento Sabiá tem proporcionado o
desenvolvimento de diversos projetos de reflorestamento de matas ciliares no entorno de nascentes
e a implantação de sistemas agroflorestais - SAFs, adquirindo importantes premiações. Há no total,
cerca de 42 nascentes no assentamento Amaraji, sendo 22 delas trabalhadas com replantio, por meio
de colheita de sementes e o preparo de mudas no local.
Neste caso, o Projeto “Águas do Céu” recebeu o Prêmio Internacional de Dubai, promovido
pelo Best Practicesand Local LeadershipProgramme, como uma das vinte ações premiadas na
última edição do Prêmio Melhores Práticas, 2015/2016. Este projeto trabalhou com as famílias
assentadas em áreas próximas a nascentes e florestas, no intuito de reconhecê-las e torná-las
responsáveispela regeneração dessas áreas,através Sistemas Agroflorestais –SAFs, gerando renda
para a comunidade e mantendo o acesso à água, via manejo e conservação das nascentes.
As estratégias desses programas do Centro Sabiá possuem três focos principais: o Programa
Agrofloresta; a Segurança e Soberania Alimentar; e a Soberania do Agricultor. Todas essas três
abordagens perpassam pela noção de autonomia, em especiala alimentar, do agricultor e sua
família,o que contribui para a conservação do remanescente de Mata Atlântica.
De acordo IBPES (2012), Intergovernmental Platform onBiodiversityandEcosystem
Services, referente à grande propriedade, pós revolução verde (latifúndio e agronegócio), há cerca

892
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

de 30 mil espécies conhecidas de plantas cultivadas, mas apenas 30 culturas fornecem 95% dos
alimentos consumidos pelas populações humanas, um padrão de baixíssima variabilidade de
espécies.
Isto tem causa direta na perda de muitas variedades tradicionalmente manejadas, incluindo
“sementes crioulas”, com sérios danos ao abastecimento e soberania alimentar, podendo
desencadear processos de desmatamento em áreas mais conservadas. A erosão genética desses
recursos vem lançando luz à busca pela valorização dos saberes associados à agrobodiversidade em
territórios de populações rurais, baseados na premissa agroecológica (PERONI; HANAZAKI, 2002;
TOLEDO;BARRERA-BASSOLS, 2008).
De acordo com Guzmán Casado et al. (2000), existem três dimensões que sustentamas bases
da agroecologia: 1. ecológica e técnico-agronômica; 2. socioeconômica e cultural; e 3. sócio-
política, as quais não podem ser analisadas separadamente, pois se inter-relacionam enecessitam de
uma abordagem multidisciplinar. Neste sentido, a agroecologia se fundamenta enquanto uma
ciência integradora que reconhece e se baseia nos saberes, conhecimentos e experiências dos
agricultores(as) de base familiar, em conjunto comoutros atores sociais envolvidos nos processos de
desenvolvimento rural, assumindo o potencial endógeno, no “local”.
Ao compreender que o potencial endógeno é um elemento fundamental para iniciar
quaisquerprojetos que busque trabalhar uma transição agroecológica, a abordagemda agroecologia,
respaldadas pela PNATER, pode ser uma importante estratégia deconservar a biodiversidade pelo
empoderamento dos povos tradicionais, comunidades e assentamentos rurais.

4. CONCLUSÃO
A análise dos resultados dos indicadores possibilitou determinar quais dimensões os
assentados consideram que recebem um maior apoio na parceria com o Centro Sabiá, em destaque
para a Questão Ambiental, com enfoque Agroecológico e a Soberania e Segurança Alimentar.
Enquanto os aspectos que são necessários dedicar maiores esforços, se refere a Qualidade de Vida e
a Relação de ATER com Outras Políticas Públicas.
A construção das metodologias, em termos de concepção pedagógica, utilizada pelo Centro
Sabiá foi implementada de forma “Botton Up” (de baixo para cima), através dos extensionistas e
agricultores nas constantes trocas de experiências, do nível local ao Nacional. Defender os saberes e
bem viver desses povos pode representar uma potente estratégia para contribuir na conservação de
áreas protegidas e emancipação social.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

5. AGRADECIMENTOS
Aos agricultores do Assentamento Amaraji-PE, ao Centro de Desenvolvimento
Agroecológico Sabiá (Rede ATER Nordeste) e à CAPES.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAPORAL, F.R. Extensão Rural e Agroecologia: temas sobre um novo desenvolvimento rural,
necessário e possível. Brasília: 398, 2009.

CPRM - Serviço Geológico do Brasil. Projeto cadastro de fontes de abastecimento por água
subterrânea estado de Pernambuco: diagnóstico do município de Rio Formoso. Recife:
CPRM/PRODEEM, 2005.

GUZMÁN CASADO, G.; GONZÁLEZ DE MOLINA, M.; SEVILLA GUZMÁN, E. (Coords.).


Introducción a laAgroecología como desarrollo rural sostenible. Madrid: EdicionesMundi-
Prensa, 2000.

INTERGOVERNMENTAL PLATFORM ON BIODIVERSITY AND ECOSYSTEM SERVICES -


IPBES, 2019.

PARANHOS, M.G.; SILVEIRA, L.M.; NOUGUEIRA,F. A trajetória da Rede ATER Nordeste:


construindo conhecimento agroecológico pelo Nordeste brasileiro. In: Articulação Nacional de
Agroecologia, Construção do Conhecimento Agroecológico: Novos Papéis, Novas
Identidades,56-70, 2007.

PERONI; HANAZAKI Current and lost diversity of cultivated varieties, especially cassava, under
swidden cultivation systems in the Brazilian Atlantic Forest. Agriculture,
EcosystemsandEnvironment, 92, 171–183, 2002.

SABOURIN, E. Reciprocidade e análise de políticas públicas rurais no Brasil. Ruris, 6, 2, 2012.


SCHERER-WARREN, I. Das mobilizações às redes de movimentos sociais. Sociedade eEstado.,
21, 1, 109-130, 2006.
TOLEDO, V.M.; BARRERA-BASSOLS, N. La Memoria Biocultural: laimportancia ecológica de
lassabiduríastradicionales. Barcelona: ICARIA Editorial, 232, 2008.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

SITUAÇÃO TERRITORIAL E AMBIENTAL DO ENTORNO DA TERRA


INDÍGENA PACHECA, NO SUDESTE DO RIO GRANDE DO SUL
TERRITORIAL AND ENVIRONMENTAL SITUATION OF THE PACHECA INDIGENOUS
LAND SURROUNDING IN SOUTHEAST RIO GRANDE DO SUL

Mateus Menezes Straceione*, Rafaela Biehl Printes**, Ricardo S. Pereira Mello***

*Graduando do Curso de Bacharelado em Gestão Ambiental (BGA), Universidade Estadual do Rio Grande do Sul
(UERGS), Unidade Universitária em Tapes, Tapes, RS, email:mateus-straceione@uergs.edu.br
**Professora da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), Unidade Universitária em Tapes, Tapes, RS,
rafaela-printes@uergs.edu.br
***Professor da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), Unidade Universitária em Tapes, Tapes, RS,
ricardo-mello@uergs.edu.br

1. INTRODUÇÃO
Um dos maiores problemas socioambientais da atualidade é a conversão dos remanescentes
de vegetação nativa florestal para uso em atividades agrícolas e pecuárias em larga escala,
principalmente nos limites das áreas protegidas. As Terras Indígenas (TIs) são consideradas áreas
protegidas, instituídas através da publicação do Plano Nacional de Áreas Protegidas (PNAP). A
função das áreas protegidasestá diretamente ligada à sua base ecológica, seja ela para proteção de
um ambiente potencialmente ameaçado ou para preservar suas características originais, protegendo
espécies raras ou ameaçadas de extinção (MEDEIROS, 2005).
Esta pesquisa teve como objetivo caracterizar a distribuição territorialdas propriedades
rurais no entorno da TI Pacheca(Mbya Guarani), identificar as áreas de remanescentes de vegetação
nativa no entorno desta TIe avaliar os desafios e possibilidades para implementação de dois
objetivos da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI),
conforme o Plano Integrado de Implementação da PNGATI.
O entorno da TI Pacheca vem sofrendo inúmeros impactos socioambientais, por estar
situada em uma região com características favoráveis a produção agrícola. Para Balsan (2006), o
modelo de agricultura baseado na monocultura trouxe diversos impactos ambientais e alterações no
espaço rural como a supressão de florestas para expansão agrícola que acarretou em grande perda
da biodiversidade genética, erosão dos solos e a degradação e poluição dos recursos naturais. A
caracterização da situaçãoterritorial está relacionada com a questão fundiária mostrando o avanço
das propriedades rurais sobre a TI, já que no entorno da TI são desenvolvidas atividades
agrícolas,principalmente as referentes à rizicultura, com consequências diretas sobre as áreas
remanescentes de vegetação nativa.

895
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

No território Centro Sul do RS onde se localiza a TI Pacheca mais de 50% dos municípios
utilizam agrotóxicos, fazendo uso da aviação agrícola para pulverizações causando graves
problemas socioambientais (BOMBARDI, 2017).
É importante ressaltar que o aumento das áreas convertidas para atividades agrícolas,
acarreta em diversos impactos ambientais, como a contaminação dos efluentes através do uso de
agrotóxicos aplicados nas lavouras, comprometendo em grande parte as águas superficiais
(KOLINSKI, et al., 2015).
A PNGATI tem fundamental importância na contribuição para gestão das TIs, nela são
constituídos os Planos de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas (PGTAs), baseados
em princípios como: Protagonismo indígena, Legalidade, Sustentabilidade e estabelecimento de
acordos/pactos (FUNAI, 2019).

2. MATERIAL E MÉTODOS
A área deestudo foi o entorno da Terra Indígena Pacheca (TI Pacheca), delimitada por um
raio de 3km a partir da borda da TI, localizada no município de Camaquã - RS sob as coordenadas:
Latitude (UTM) 6554022.44 m S e Longitude (UTM) 424578.91 m E. A TI Pacheca possui área
territorial demarcada em 1852ha (INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL, 2019). E está situada às
margens do rio Camaquã, mais especificamente na foz do Rio Camaquã.
As áreas do entorno são consideradas de extrema relevância ecológica, e reconhecidas como
Áreas de Especial Interesse Ecológico, pois a área está justaposta ao Parque Estadual do Camaquã e
as áreas de Matas e Banhados da Pacheca (HANSEN, et al., 2007; KOLINSKI, et al., 2015).

Figura 4: Localização da Terra indígena Pacheca

Fonte: Autor (2019)

Os métodos utilizados para a pesquisa foram desenvolvidos por meio de dados secundários,
revisão bibliográfica, pesquisa documental e relatórios técnicos de caráter contemporâneo. Também
foram realizadas análise de dados estatísticos e declaratórios, obtidos em fontes de órgãos públicos
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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

Federais e Estaduais, de livre acesso (internet), seguindo os procedimentos metodológicos descritos


por Marconi e Lakatos (2010).
Para identificar as áreas de remanescentes de vegetação nativa florestal que compõe o
entorno da TI, além da revisão bibliográfica, foram utilizadas imagens de satélite e dados de
mapeamento obtidas dos programas Google Earth e MapBiomas, combinadas com a análise dos
dados públicos disponibilizados pelo Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR).
Para melhor visualização dos componentes vegetacionais que se encontram no entorno da TI
Pacheca, foi delimitado um perímetro de 3 (três) km a partir da borda da TI, onde os mapeamentos
dos remanescentes de vegetação nativa florestal foram realizados nos limites e no entorno da TI.
A situação territorial foi caracterizada através da análise quantitativa e qualitativa
comparando tamanho e distribuição das propriedades rurais, com objetivo de compreender a
estrutura territorial dos municípios e do entorno da TI.Para análise das possibilidades e desafios de
implementação dos objetivos da PNGATI fez-se uma leitura documental do Decreto 7.747/2012,
posteriormente verificado junto aos órgãos públicos municipais as ações que são realizadas nas
aldeias indígenas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os imóveis que compõem o limite da TI Pacheca, distribuem-se em 46 propriedades rurais e
foram analisadas quanto ao seu tamanho, seguindo o critério de estarem dentro do limite de 3 km a
partir da borda da TI. Os resultados obtidos estão demonstrados na figura 2:

Figura2 - Frequência dos Imóveis Rurais no entorno da TI Pacheca

Fonte: SICAR, adaptado pelo autor (2019).

Observando os resultados podemos caracterizar os imóveis que compõem o entorno da TI,


como imóveis rurais de grande e médio porte.A maior problemática que envolve as atividades
agrícolas que compõem as áreas do entorno da TI, é o uso de agroquímicos, pois estes

897
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

comprometem a integridade dos componentes vegetais e da fauna que circunda e transita dentro da
aldeia, bem como o escoamento das águas superficiais utilizadas na produção de arroz irrigado
polui os rios próximos (KOLINSKI, GOBBI, et al., 2015).
Na análise da vegetação nativa com formação florestal no entorno da TI Pacheca, foram
identificados no ano de 1985 a existência de 4.587ha de vegetação nativa florestal, no ano de 2007
4.834ha e no ano de 2017 4.278ha. Considerando que a partir da data de 22 de julho de 2008, após a
promulgação da Lei de crimes ambientais, todas as áreas de vegetação nativa florestal que foram
suprimidas de forma irregular devem ser recuperadas, o entorno da TI Pacheca atualmente tem um
passivo ambiental de aproximadamente 555ha de vegetação nativa florestal a serem recuperadas,
como mostram as (Figuras3 e 4).

Figura 3 - Comparativo entre áreas de vegetação Figura 4 - Passivos ambientais no entorno da


nativa florestal nos anos de 1985 - 2007 - 2017 TI Pacheca

Fonte: Autor (2019)

Na TI Pacheca não foram identificadas ações relacionadas a implementação dos objetivos da


PNGATI, somente o material preliminar de etnomapa construído em conjunto com os Mbya
Guarani que residem na aldeia Pacheca, também não há participação do poder executivo municipal,
sob justificativa da TI se encontrar em local de difícil acesso.

4. CONCLUSÃO
Verifica-se que os imóveis rurais do entorno são em sua maioria de grandes propriedades e
que em alguns casos ocorre a sobreposição destes com a TI Pacheca. A vegetação nativa florestal
mostra-se bem fragilizada evidenciando áreas prioritárias para restauração e regularização fundiária,
considerando a constituição de corredores ecológicos.
Dada à importância do tema, torna se necessário o desenvolvimento de programas e ações
que reforcem a articulação entre a comunidade indígena e a população do entorno, para que haja
maior entendimento por parte dos não indígenas sobre a importância das TIs, nos ambientes onde
são demarcadas. Também se faz necessário um maior aprofundamento em diálogos interculturais
898
IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

com a comunidade indígena, trabalhando diretamente com dados primários, para que sejam
construídos modelos de Etnomapeamento que incluam recursos naturalmente localizados no
entorno das TIs, e que sejam utilizados pelos indígenas.
As áreas limítrofes da TI Pacheca, mostram-se como ambientes fragilizados pela expansão
das atividades agropecuárias ao longo das décadas. Porém, a proximidade da TI com o Rio
Camaquã e com o Parque Estadual do Camaquã (PEC), proporcionam maiores possibilidades de
proteção e manutenção dos ambientes do entorno com a obrigatoriedade de se manter um limite
mínimo de APPs exigido por lei, além da zona de amortecimento doPEC, aspectos que favorecem
que o entorno da TI Pacheca mantenha-se minimamente protegido e conservado.

5. REFERÊNCIAS
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TERRITÓRIO: revista de geografia agrária, Rio Grande, RS, v. 1, p. 123-151, 2006.

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IX SAPIS | IV ELAPIS 2019: Áreas protegidas e inclusão social em cenários de mudanças | Comunicação científica e relatos de experiências

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