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Núcleos de Significação
como Instrumento para a
Apreensão da Constituição
dos Sentidos
The meaning core as an instrument for the
understanding of the sense constitution
Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo
Artigo
Para iniciarmos nossa discussão sobre a dessa perspectiva metodológica, a crítica radical
categoria sentido e suas implicações das visões reducionistas, objetivistas e
1
metodológicas, torna-se necessário, subjetivistas, a discussão sobre a relação
inicialmente, que se destaque, mesmo que aparência - essência, parte - todo, a
brevemente, alguns aspectos teórico- importância da noção de historicidade, de
2
metodológicos desenvolvidos especialmente processo e a noção de mediação.
por Vigotski, como : a importância de um
método materialista dialético, as categorias Desse modo, frisamos que nossa reflexão
linguagem e pensamento e as noções de metodológica sobre a apreensão dos sentidos
significado e sentido. estará pautada numa visão que tem no
empírico seu ponto de partida, mas a clareza
Desde 1927, quando escreve O Significado de que é necessário irmos além das aparências,
Entendemos,
Histórico da Crise da Psicologia – uma não nos contentarmos com a descrição dos
dessa forma, que Investigação Metodológica, Vigotski destaca a fatos, mas buscarmos a explicação do processo
indivíduo e importância de um método que desse conta de constituição do objeto estudado, ou seja,
sociedade não
mantêm uma
da complexidade do que entendia como estudá-lo no seu processo histórico. No
relação isomórfica objeto da Psicologia, ou seja, o Homem e entanto, ao nos referirmos aos pontos
entre si, mas uma suas funções psicológicas. Fica evidente que essenciais a serem considerados sobre o
relação onde um
constitui o outro.
a Psicologia seria impotente para superar as método, não podemos deixar de mencionar a
tarefas práticas que se lhe apresentavam se impossibilidade de se construir um método
não contasse com uma infra-estrutura lógico- alheio a uma concepção de homem. Assim,
metodológica própria. Revela-se, dessa forma, falamos de um homem constituído numa
nas reflexões do autor, a necessidade de uma relação dialética com o social e com a História,
teoria que fizesse a mediação entre o método sendo, ao mesmo tempo, único, singular e
materialista histórico e os fenômenos histórico. Esse homem, constituído na e pela
psíquicos. Vejamos: ainda nesse texto, o autor atividade, ao produzir sua forma humana de
afirma ter a clareza de que não padece de existência, revela - em todas as suas expressões
mania de grandeza, pensando que a história -, a historicidade social, a ideologia, as relações
começa com ele, mas tem a pretensão de sociais, o modo de produção. Ao mesmo
realizar a Psicologia como ciência. A ciência, tempo, esse mesmo homem expressa a sua
nessa perspectiva, deve ter como pedra singularidade, o novo que é capaz de produzir,
angular a idéia da inseparabilidade do lógico, os significados sociais e os sentidos subjetivos.
da base material, da dialética e do histórico. Indivíduo e sociedade vivem uma relação na
Dessa forma, concordamos com Vigotski qual se incluem e se excluem ao mesmo
quando este afirma que a tarefa daqueles que tempo. Quando afirmamos se incluem,
1 Ver mais sobre essa
pretendem aplicar o marxismo à ciência deve lembramos Vigotski (2001), quando afirma que
questão em Vygotski - ser a de elaborar um método, “...um sistema o indivíduo é “quase o social”; para ele, não
Obras Completas, vol. I -
El Significado Histórico de procedimentos mediadores concretos de há invenções individuais no sentido estrito da
de la Crisis de la
Psicología. Una
organização dos conhecimentos que podem palavra. Em todas, existe sempre alguma
Investigación ser aplicados precisamente à escala dessa colaboração anônima. E, quando afirmamos se
Metodológica.
ciência.....A dialética ( metodologia) é chamada excluem, se diferenciam, destacamos a
2 Ver mais sobre a
questão em Vygotski.
a reproduzir, no plano do cognitivo, a dialética singularidade do sujeito. Entendemos, dessa
Formação Social da objetiva do psiquismo (1996, p.471). forma, que indivíduo e sociedade não mantêm
Mente. Ed. Martins
Fontes, 1994 , cap. 5, e uma relação isomórfica entre si, mas uma
Gonzalez Rey - La Sem a intenção de nos determos na análise relação onde um constitui o outro.
Investigación Cualitativa
em Psicología : Rumbos dos aspectos que definem tal método, Concordamos quando Vigotski (1999) afirma
y Desafios. Ed. Educ,
1999.
destacamos, como decorrência da adoção que o Processo de Internalização deveria ser
a função de apenas ligar a singularidade e a atividade interna. A palavra, signo por de Significações, Ed.
Artmed, 2004,
universalidade, mas de ser o centro excelência, representa o objeto na Smolka,A.L.B. discute
mais profundamente a
organizador objetivo dessa relação. Ao consciência. Podemos, desse modo, afirmar questão do Signo.
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
sujeito produz frente a uma realidade. Como Para que se possa melhor compreender a
coloca Gonzalez Rey (2003), o sentido categoria sentido, retomamos um dos
subverte o significado, pois ele não se submete princípios do materialismo dialético: a unidade
a uma lógica racional externa. O sentido contraditória existente na relação simbólico -
refere-se a necessidades que, muitas vezes, emocional. Para se avançar na compreensão
ainda não se realizaram, mas que mobilizam do homem, ou melhor dizendo, dos seus
o sujeito, constituem o seu ser, geram formas sentidos, temos que, nas nossas análises,
de colocá-lo na atividade. O sentido deve ser considerar que todas as expressões humanas
entendido, pois, como um ato do homem sejam cognitivas e afetivas.
mediado socialmente. A categoria sentido
destaca a singularidade historicamente Concordamos com González Rey (2003) ao
construída. Como coloca Namura, afirmar que o pensamento é um processo
psicológico, não só por seu caráter cognitivo,
“A análise da relação do sentido com a palavra mas por ser sentido subjetivo, pelas
Entendemos,
mostrou que o sentido de uma palavra nunca significações e emoções que se articulam em dessa form“A
5
é completo, é determinado, no fim das contas, sua expressão. análise da relação
do sentido com a
por toda a riqueza dos momentos existentes palavra mostrou
Como afirma Heller, “...não pode haver um
na consciência.[....]o sentido da palavra é que o sentido de
rosto completamente desprovido de uma palavra
inesgotável porque é contextualizado em
expressão” (1986, p .74). Segundo a autora nunca é
relação à obra do autor, mas também na completo, é
(1986), o sentir – seja positiva ou
compreensão do mundo e no conjunto da determinado, no
negativamente, sempre significa estar fim das contas, por
estrutura interior do indivíduo” (2003, p.185).
implicado em algo; a implicação vai, assim, toda a riqueza dos
ser vista como um fator constitutivo e inerente momentos
Fica evidenciada, desse modo, a complexidade existentes na
do atuar e do pensar. As emoções não podem, consciência.[....]a,
de tal categoria, fato que, sem dúvida, gera
assim, ser vistas como passivas, como que indivíduo e
grande dificuldade nas formas de apreendê- sociedade não
epifenômenos. Em Teoria da Emoções,
la. No entanto, é esse o caminho que nos mantêm uma
Vygotski, citando Spinosa, destaca o aspecto relação isomórfica
propomos a seguir: apreender o processo
fundamental e constitutivo dos afetos: entre si, mas uma
constitutivo dos sentidos bem como os “...afetos são estados corporais que aumentam relação onde um
elementos que engendram esse processo. constitui o outro.
ou diminuem a capacidade do corpo para a
Queremos apropriar-nos daquilo que diz ação, favorecem-na ou limitam-na, assim como Namura
respeito ao sujeito, daquilo que representa o as idéias que se tem sobre esses estados”(
novo, que, mesmo quando não colocado 2004, p.16).
explícita ou intencionalmente, é expressão do
sujeito, configurado pela unicidade histórica e Na perspectiva adotada, portanto, a separação
social do sujeito, revelação das suas entre pensamento e afeto jamais poderá ser
possibilidades de criação. feita, sob o risco de fechar-se definitivamente
o caminho para a explicação das causas do
O sentido coloca-se em um plano que se próprio pensamento, pois a análise do
aproxima mais da subjetividade que com mais pensamento pressupõe necessariamente a
precisão expressa o sujeito, a unidade de todos revelação dos motivos, necessidades e
os processos cognitivos, afetivos e biológicos. interesses que orientam o seu movimento. 5 Em Sujeito e
Subjetividade,São Paulo:
No entanto, dada a sua complexidade, Desse modo, além de apontarmos a relação Ed. Thomson, S.P, 2003,
Gonzalez Rey faz uma
afirmamos como nossa possibilidade dialética entre o aspecto afetivo e o simbólico, discussão aprofundada
aproximarmo-nos de algumas zonas de destacamos a importância de agregarmos a sobre a questão das
emoções, necessidades e
sentido. noção de necessidade e motivos para a motivos.
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
compreensão do sujeito e, assim, dos como estado dinâmico, ainda não dão uma
sentidos. Isso posto, vemos como importante, direção ao comportamento. Esse processo, de
mesmo que de maneira breve, apresentarmos ação do sujeito no mundo a partir das suas
algumas reflexões feitas no campo da necessidades, só vai completar-se quando o
Psicologia sociohistórica sobre esses conceitos. sujeito significar algo do mundo social como
As necessidades são entendidas como um possível de satisfazer suas necessidades. Aí
estado de carência do indivíduo que leva a sim, esse objeto/fato/pessoa vai ser vivido
sua ativação com vistas a sua satisfação, como algo que impulsiona/direciona, que
dependendo das suas condições de existência. motiva o sujeito para a ação no sentido da
Temos, assim, que as necessidades se satisfação das suas necessidades. Tal
constituem e se revelam a partir de um movimento, ou seja, a possibilidade de realizar
processo de configuração das relações sociais, uma atividade que vá na direção da satisfação
processo esse que é único, singular, subjetivo das necessidades, com certeza modifica o
e histórico ao mesmo tempo. Além disso, é sujeito, criando novas necessidades e novas
fundamental ressaltar que, pelas características formas de atividade. Afirmamos, assim, que a
do processo de configuração, o sujeito não necessidade não conhece seu objeto de
necessariamente tem o controle e, muitas satisfação, ela completa sua função quando o
vezes, a consciência do movimento de
“descobre” na realidade social. Entendemos
constituição das suas necessidades. Assim, tal
que esse movimento se define como a
processo só pode ser entendido como fruto
configuração das necessidades em motivos.
de um tipo específico de registro cognitivo e
Com isso, estamos dizendo que os motivos
emocional, ou seja, a constituição das
se constituirão como tal somente no encontro
necessidades se dá de forma não intencional,
com o sujeito, no momento que o sujeito o
tendo nas emoções um componente
configurar como possível de satisfazer as suas
fundamental. Pode-se dizer que tais registros
necessidades.
constitutivos das necessidades não são
necessariamente provenientes das
Ao se apreender o processo por meio do qual
significações, podendo constituir-se em
os motivos se configuram, avança-se na
afecções que ainda não foram significadas.
apropriação do processo de constituição dos
Como coloca González Rey, “Se a emoção
sentidos, definidos como a melhor síntese do
diz não, os meios não estão disponíveis.... A
emoção é que define a disponibilidade dos racional e do emocional. Aproximamo-nos,
recursos subjetivos do sujeito para atuar” dessa forma, do processo gerador da atividade,
(2003, p. 245). ao mesmo tempo gerado por ela.
Apreendemos o que é a atividade para o
Evidencia-se, desse modo, a complexidade sujeito, e, assim, algumas zonas de sentidos
desse processo, marcado especialmente pela da atividade, claro que atravessadas pelos
força dos registros emocionais, geradores de significados, mas, no caso, revelando uma
um estado de desejo, de tensão, que mobiliza forma singular de vivê-las e articulá-las.
o sujeito, que cria experiências afetivas que,
como atividade psíquica, têm papel regulador. A apreensão dos sentidos não significa
Esse estado emocional, que mobiliza, que, apreendermos uma resposta única, coerente,
como nos aponta González Rey, “...caracteriza absolutamente definida, completa, mas
o estado do sujeito ante toda a ação expressões do sujeito muitas vezes
fundamental” (2003, p.242), deve ser contraditórias, parciais, que nos apresentam
analisado para chegarmos aos sentidos. Mas indicadores das formas de ser do sujeito, de
ainda falta um elo. Essas necessidades, vividas processos vividos por ele.
Sabemos o quão difícil é sua apreensão; ele interferem no seu potencial de captação ou
não se revela facilmente, não está na apreensão dos sentidos e significados
aparência; muitas vezes, o próprio sujeito o buscados.
desconhece, não se apropria da totalidade de
suas vivências, não as articula.
● as entrevistas devem ser consistentes e
marcam esse instrumento e que, sem dúvida, entendendo aqui como contexto desde a
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
narrativa do sujeito até as condições histórico- Esse procedimento tem analogia com o que
sociais que o constituem. coloca Vigotski (1998, p.182) quando fala das
peculiaridades semânticas da fala interior e
Tendo o material gravado e transcrito, destaca a aglutinação como uma delas:
iniciamos várias leituras “flutuantes”, para que “Quando diversas palavras se fundem numa
possamos, aos poucos, nos familiarizar, visando
única, a nova palavra não expressa apenas uma
a uma apropriação do mesmo. Essas leituras
idéia de certa complexidade, mas designa
nos permitem destacar e organizar o que
todos os elementos isolados contidos nessa
chamaríamos de pré-indicadores para a
idéia”.
construção dos núcleos futuros. Irão
emergindo temas os mais diversos,
caracterizados por maior freqüência (pela sua Tentaremos aqui ilustrar com exemplos esse
repetição ou reiteração), pela importância processo, que resultará de dois elementos: os
enfatizada nas falas dos informantes, pela indicadores e sua relação com situações ou
carga emocional presente, pelas ambivalências conteúdos temáticos. Um exemplo que pode
ou contradições, pelas insinuações não esclarecer a organização de pré-indicadores e
concretizadas, etc. Geralmente, esses pré- indicadores pode ser encontrado no Anexo 1.
indicadores são em grande número e irão
compor um quadro amplo de possibilidades A partir dos pré-indicadores identificados,
para a organização dos núcleos. Um critério podemos avançar para indicadores do tipo:
básico para filtrar esses pré-indicadores é violência, drogas, gravidez, sexualidade, família,
verificar sua importância para a escola, consumismo, religiosidade, medo,
compreensão do objetivo da investigação.
alegria, tristeza, prazer, etc. Entretanto, tais
indicadores podem ter significados diferentes
Os indicadores e conteúdos dentro de condições específicas (lembrem-se
temáticos dos critérios de aglutinação citados acima:
semelhança, complementaridade,
Uma segunda leitura permitirá um processo contraposição). Um indicador como a violência
de aglutinação dos pré-indicadores, seja pela pode ter potências e coloridos diferentes em
similaridade, pela complementaridade ou pela
condições diversas, tais como: fases ou etapas
contraposição, de modo que nos levem a
de sua trajetória na vida, nas relações com
menor diversidade; já no caso dos indicadores,
“outros” (família, trabalho, autoridades,
que nos permitam caminhar na direção dos
namorada), em experiências de vida, etc. Estes
possíveis núcleos de significação. Esses critérios
seriam os conteúdos temáticos junto aos quais
para aglutinação não são necessariamente
os indicadores adquirem algum significado. De
isolados entre si. Por exemplo, alguns
posse desse conjunto (os indicadores e seus
indicadores podem ser complementares pela
semelhança do mesmo modo que pela conteúdos), devemos, nesse momento, voltar
contraposição: um fato identificado como pré- ao material das entrevistas e iniciar uma
indicador, ao ser aglutinado, pode indicar o primeira seleção dos trechos que ilustram e
caráter impulsionador/motivador para ação em esclarecem os indicadores.
uma determinada condição. Inversamente, o
mesmo fato pode funcionar como paralisador Esse momento já caracteriza uma fase do
da ação em outro momento, mas ambos processo de análise, mesmo que ainda
podem ser indicadores importantes no processo empírica e não interpretativa, mas que ilumina
de análise. um início de nuclearização.
Uma sugestão para a nomeação dos núcleos Caminhando na compreensão dos sentidos,
é extrair da própria fala do informante uma ou relembramos a importância da análise das
mais de suas expressões, de modo a compor determinações constitutivas do sujeito, e, para
uma frase curta que reflita a articulação isso, é importante apreendermos as
realizada na elaboração dos núcleos e que necessidades, de alguma forma colocadas pelos
explicite o processo e o movimento do sujeito sujeitos e identificadas a partir dos indicadores. 7 Consultar obras citadas
dentro dos objetivos do estudo. Entendemos que tais necessidades são na nota de rodapé número
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
individuais ocorridas durante as sessões de ... ambas as profissões têm algo em comum,
orientação profissional, que compuseram um sedutor e glamuroso. São afirmações
total de 15 encontros. explicadas principalmente por imagens, onde
a compreensão do que sejam as profissões se
A partir da organização das entrevistas, que faz a partir de experiências marcadamente
resultaram nos indicadores e nos conteúdos visuais:
importantes para o objetivo do estudo, Célia
construiu seis núcleos de significação: “...eu não consigo ver quando tem operação e
tiram as partes de dentro da gente, o cara coloca
a mão, não gosto de olhar.”
● a realidade que o confunde e incomoda;
● a experiência estética das profissões A referência às profissões parece moldada por
reificadas; relações sensíveis, segundo Rafael, oriundas
● a vida sob controle ou o atrevimento do real; de filmes da TV, que agradam aos sentidos e
● o prazer como causa e conseqüência ; excitam o sujeito.
● as contradições e ambigüidades entre a
autonomia protegida e a rotina sempre nova; Rafael se refere à profissão como um produto,
● a condição de impotência do ser natural. cujo uso deve agregar valor a quem o possui e
identificar o sujeito enquanto classe de
Por problemas de espaço editorial, iremos aqui consumidor a que pertence:
ilustrar a análise com apenas um dos núcleos.
“...lugar desvalorizado ...num lugar que não
Entretanto, todos eles, de alguma forma, estão
te valorizam ...deve ter coisa melhor que
muito inter-relacionados e imbricados entre
Medicina ...coisa que eu goste mais, me der
si, configurando a integração pretendida no
melhor” (p.128).
procedimento proposto anteriormente.
É interessante destacar aqui como a autora
A experiência estética da conduz sua análise. Célia articula dados do
profissão reificada sujeito, quebra a seqüência cronológica da
entrevista e busca a articulação entre fatos até
Esse núcleo se constituiu a partir das narrativas então não articulados pelo sujeito, revela
referentes às duas profissões que pautavam a relações, e, para isso, recorre, além das
dúvida de Rafael: a Medicina e o Direito. categorias de análise da sociohistórica, a
conteúdos de outras áreas das ciências
“...acho a Medicina legal porque é a maior humanas e sociais para explicar (por exemplo)
adrenalina ...tem sempre um caso novo ...uma o poder da mídia na constituição dos sujeitos.
história toda complicada pra gente resolver ...tem A autora continua sua análise:
várias pessoas pra resolver junto com você
...você tem a maior galera pra ajudar você.” “A escolha se faz sobre um conjunto de
profissões-coisas que são avaliadas pelo seu
Quanto ao Direito, sua referência pode ser valor de troca na sociedade, quanto de retorno
identificada como: poderá ser obtido com sua posse. Há um
distanciamento do sujeito com a função social
“...aquela roupa ridícula ...tem que ler muito, do exercício das profissões, avaliadas como
os livros são enormes ...é muito tudo sozinho produtos para uso, consumo e troca... A
...ali na hora você decide a parada, tem que hierarquização das profissões, feita pelas
convencer as pessoas, e se errar? ...também é escolas, e o respectivo status daqueles que as
uma profissão poderosa como a Medicina.” escolhem, participam, também, da
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
Outro destaque a ser feito se refere ao uso Celia conclui, articulando seus sentidos e
da literatura, não se prendendo apenas às falas significados com o grupo social onde Rafael
do sujeito, para justificar, e, dessa forma, está imerso.
ampliar e contextualizar suas considerações.
8
8 Rocha, Everaldo. A “Rocha (1995) nos mostra que a sociedade “Rafael constrói a experiência do seu grupo
Sociedade do Sonho. Rio na mídia é uma sociedade de abundância, social enquanto é por ele constituído, através
de Janeiro: Mauad
Editora, 1995. resolvida e absolutamente bem sucedida das significações que produz a partir das
funções distintivas de sua classe social. Essas A autora enfatiza o caráter e a importância
funções se realizam por diversos aspectos, desse núcleo de significação,
pela posse de determinados objetos, pelo tipo
e forma de consumo e freqüência a lugares e, “O prazer como causa e conseqüência, em
também, por práticas e partilhas de si mesmo, é essencial em qualquer avaliação
significados que são formas de ser e vivências que faz, se constitui na métrica daquilo que
emocionais, configurando o mundo de Rafael ele observa, analisa, consome e decide, isto
e ensejando novas experiências reais em sua é, a realidade é aferida pelo estado de ânimo
vida” (p.140). que propicia. É ponto de partida, processo e
objetivo. Rafael diz que quer encontrar algo
O prazer como causa e de que goste, e que só assim vai querer
conseqüência estudar e terá garantido o sucesso e a
realização profissional. Os atributos da
profissão deverão fazê-lo sentir-se animado o
Nesse núcleo, a autora trabalha um dos
suficiente para querer tal profissão. Ele a quer
aspectos centrais no discurso de Rafael,
porque ela é uma garantia de que terá prazer.
relacionando-o com o caráter hedonista
Pode inclusive não ser a Medicina, pois indaga
presente nos jovens, particularmente nos do
sobre se
segmento socioeconômico de Rafael e que
parece nortear não apenas suas escolhas
‘...tem alguma coisa que eu possa gostar mais
profissionais mas também sua própria vida.
...que seja melhor pra mim.’
“Escolher aparece fortemente vinculado ao
prazer como critério decisório e que, ao ser Mas não pode ser qualquer outra profissão,
atendido, efetivamente deverá levar a um tem que preencher seus vários critérios, numa
resultado igualmente prazeroso. Todo o liberdade de escolha que só permite um
processo seria um único momento de um resultado – o sucesso em todas as suas
prazer que se expande. A certeza de Rafael nuances” (p.149).
de que isso é possível vem de sua experiência
de vida. Frente ao que lhe desagrada, ele Mais adiante, Célia tenta compreender melhor
simplesmente não olha, troca de canal, como a questão do compromisso e do custo-
nas cenas dos filmes de TV que lhe desagradam benefício presente nas decisões de Rafael.
ou apenas exclui, como as partes da cidade
onde mora, “Rafael define a dose de compromisso que
está disposto a investir, o tempo em que
‘...eu até penso nisso, mas não vejo saída e aí,
permanecerá na sessão e o término dos
desligo.’
assuntos abordados. Tem dificuldade para se
Afirma que, quando está a fim de alguma comprometer com o outro, despejando
coisa, sempre a consegue, seja passar de ano informações, fatos, alegrias e sofrimentos sem
no colégio, seja um carro novo. Sua se deter sobre sua própria história.
preocupação principal não é com seu
desempenho na profissão, mas com a ‘...Eu até penso nisso, mas não vejo saída e
manutenção de um estado de prazer com o aí, desligo.’
que vai fazer, que, por sua vez, é a garantia
do sucesso. Esse gostar não só deve existir no Mais que um processo de defesa circunstancial,
momento da escolha como deve manter-se é uma forma de lidar com a experiência do
no futuro, condição para que permaneça cotidiano e um estilo de vida. Não lhe ocorre
exercendo qualquer profissão”(p.129). procurar ou construir saídas que dependam
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
Essa pesquisa teve como objetivo analisar o organização dos núcleos, pretende-se, cada
processo de constituição dos sentidos vez mais, criar as condições de nos
subjetivos de duas professoras de educação apropriarmos daquelas determinações que
infantil acerca da inclusão escolar de crianças constituem o sujeito
com deficiência no ensino regular (deficiências
essas que geram necessidades educacionais A autora (idem) frisa que o levantamento e
especiais). organização dos núcleos de significação já
constitui um momento de análise, pois o ato
Foram realizadas entrevistas com quatro de “recortar” é realizado a partir dos critérios
professoras e uma coordenadora. O critério, propostos pelo pesquisador, e esses critérios
como não poderia deixar de ser, foi qualitativo. são sempre escolhidos em função dos objetivos
Desse modo, foram escolhidos profissionais da pesquisa, e, como diz Ozella (2003, p.114),
que podiam falar com propriedade do tema a “[...]nunca são neutros”.
ser pesquisado. Dentre esses quatro, foram
escolhidas duas professoras que, no entender Os núcleos de significação resultantes foram:
da pesquisadora, melhor se adequavam aos
propósitos da pesquisa. Com o intuito de ● o encontro com a religiosidade;
qualificar as informações obtidas, foram
● ser normal ou estar deficiente: eis a questão;
realizadas cinco entrevistas recorrentes com
● o papel do professor;
cada professora.
● inclusão/projeto creche inclusiva/sociedade
Utilizaremos como exemplo apenas a análise inclusiva.
referente a uma das professoras, denominada
Ferreira. A título de exemplo, utilizaremos um dos
núcleos: “O encontro com a religiosidade”.
Como coloca Agnes (p.124), partindo do
pressuposto que a análise é construtiva e
interpretativa, o procedimento para a
“O encontro com a
apreensão dos indicadores deu-se da seguinte religiosidade”
forma: após a transcrição, foi realizada uma
Segundo Agnes, esse núcleo é capital porque
leitura flutuante do material; em seguida,
foram sendo levantados indicadores, ou seja, evidencia a religiosidade como um dos pontos
questões que se repetiam, que eram fundamentais e constitutivos da vida de
enfatizadas, que revelavam envolvimento da Ferreira, sendo, portanto, um aspecto essencial
professora e que se mostraram importantes, que atravessa a forma como ela sente, pensa
considerando o objetivo da pesquisa, ou seja, e age sobre o mundo. Assim sendo, a
apreender os sentidos e significados sobre religiosidade marca profundamente a maneira
inclusão. Como exemplo, destacamos a como ela atribui sentidos à inclusão, à
questão da religiosidade, que se mostrou um deficiência, à sua vida profissional e às suas
indicador fundamental para a organização de relações interpessoais. Entendemos que a
um dos núcleos, por atravessar e mostrar-se importância dada por Agnes a esse núcleo é
constitutivo de muitas das experiências vividas adequada, dado ser uma das funções centrais
pela professora. Após esse momento, estavam do núcleo de significação, que é destacar
criadas as condições para se organizar, no caso, aqueles aspectos fundamentais para a
um dos núcleos de significação, ou seja, para compreensão do sujeito, aqueles aspectos que
articularmos os conteúdos relacionados às são constitutivos do sujeito a ser pesquisado.
experiências que tinham a religiosidade como Para fundamentar esse movimento de análise
elemento essencial. Com esse processo de que levantou o núcleo, Agnes destaca partes
da fala de Ferreira que evidenciam a relevância remédio. Depois que eles (os familiares) viram
da religiosidade em sua vida, o quanto ela foi que o remédio estava me deixando daquela
constitutiva das suas formas de ser, pensar e maneira.... [...] Assim, me deixando... é, ...
sentir. Segundo Agnes (p.125), Ferreira nos apática. Então eles ficaram preocupados.
revela, por meio da sua história de vida, que, Como é que eles iam deixar eu sair sozinha
por ter sido diagnosticada aos 14 anos de idade pra ir pra algum lugar.... Então o dia que eu...
como pessoa com sofrimento mental, teve que me internei,....o doutor falou que eu não tinha
tomar “remédio controlado”, era vigiada pela nada, que eu ia melhorar, esse dia eu renasci
família e não tinha autonomia para gerir a pra vida.[..]a doença que eles achavam que
própria vida. “[...] os médicos falavam com eu tinha era um engano, não era doença,
minha mãe que isso (os sintomas apresentados) porque mediunidade não é doença.... Aí
era um princípio de loucura”. Ela relata que, comecei a decidir minha vida, a andar
nesse período, trabalhou e que não pôde sozinha.[...]O que faziam comigo eu comecei
estudar de forma sistemática. Após os 24 anos a fazer pras pessoas [.......]E assim, comecei
de idade, e a partir da intervenção de um a ajudar as pessoas mais... humildes que me
médico espírita e da sua internação em hospital procuravam, porque eu comecei a trabalhar
psiquiátrico no qual a Doutrina Espírita no espiritismo.”
orientava a atividade de alguns profissionais,
Ferreira se sente curada e ressignifica sua Na sua análise, Agnes destaca que a fala de
existência. A Doutrina Espírita passa, então, a Ferreira traz à tona sentimentos e emoções
nortear de maneira profunda a sua vida. sobre sua forma de ser e agir no mundo “antes
“(o médico) [...] fez
e depois da sua cura”. Num esforço de análise um tratamento
“(o médico) [...] fez um tratamento comigo, e portanto, de apreensão do processo de comigo, me
constituição dos sentidos configurados por desintoxicou, me
me desintoxicou, me internou, tirou... todo o internou, tirou...
remédio, melhorou e me deu...ânimo. Ferreira, a pesquisadora em questão traz todo o remédio,
[...] categorias que têm o potencial de iluminar a melhorou e me
realidade estudada. Vejamos um trecho de sua deu...ânimo.
[...]
Quando ele me levou no Centro Espírita, foi análise, realizada por meio de algumas
onde eu melhorei, foi aonde que, que tudo categorias da Psicologia sociohistórica.
pra mim mudou, que eu fui ter vida... nova.
“Segundo Rey (2003, pp. 241-254), as
Foi onde eu tive minha vida renovada, minha
emoções estão estreitamente ligadas às ações,
vida melhorou, porque, eu... eu vi a vida com
por meio das quais caracterizam o sujeito no
outros olhos, eu não precisava de ninguém
mais pra ficar me vigiando.” espaço de suas relações sociais. Para ele, a
vivência da pessoa que é constituída
Ferreira deixa claro como o período historicamente gera um conjunto de emoções,
compreendido entre os 14 e 24 anos foi que, por sua vez, geram necessidades. As
doloroso e o quanto ser considerada “doente” necessidades são entendidas, aqui, como
a incomodava. Dessa forma, após “sua cura”, “estados produtores de sentido, associados à
de pessoa que necessitava da ajuda de outros, atuação do sujeito numa atividade concreta”;
passa a ajudar. Ajudar os outros se torna, essas necessidades geram motivos que levam
então, sua filosofia de vida. Fica evidente o o sujeito a atuar de forma particular no mundo.
prazer e a felicidade que ela sente em tomar Podemos, então, estabelecer relações entre
a responsabilidade de sua própria vida para si as emoções vividas por Ferreira na fase em
e o prazer de dedicá-la à ajuda ao próximo. que se via e era vista como “incapaz”, a
entrada da religiosidade em sua vida e a sua
“[...] o médico falou que eu tinha que tomar forma atual de ação no mundo.
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
A Doutrina Espírita – que foi sua salvação – É necessário ressaltar que as falas de Ferreira
passa a ser parte constituinte de sua vida e os são reveladoras dos sentidos que se foram
preceitos que norteiam essa Doutrina passam constituindo através das experiências vividas
a nortear também suas ações e sua vida. por ela, ou seja, os sentidos foram sendo
Assim, ajudar, doar, abdicar e a caridade construídos ao longo das suas experiências.
permeiam não só todo o discurso de Ferreira Entretanto, esses sentidos, que são
mas também sua ação/atividade” (pp.127- particulares, são, ao mesmo tempo, compostos
128). pelos significados sociohistóricos da
humanidade. Rey (2003, p. IX) nos ajuda a
Podemos perceber, então, que a partir do
compreender esse caráter dialético da
momento em que Ferreira começa a ‘viver
construção dos sentidos quando, ao tratar das
uma nova vida’, as múltiplas necessidades
questões referentes à produção dos sentidos
constituídas historicamente encontram novas
e dos significados em Vigotski, afirma que :
formas possíveis de se configurar em motivos.
Dessa maneira, diante de sua realidade
“[.....] as criações humanas são produções de
profissional, ela passa a ajudar as pessoas, a
sentidos, que expressam de forma singular os
doar seu tempo, a fazer caridade, a amar a
complexos processos da realidade nos quais o
todos como irmãos, a encontrar novos motivos
homem está envolvido, mas sem constituir um
que impulsionam sua vida.
reflexo destes. Em outras palavras, esses
Vejamos: processos são uma criação humana, os quais,
‘[...] e assim, eu não cobro nada de ninguém, integrando os diferentes aspectos do mundo
eu não peço nada pra ninguém, meu trabalho, em que o sujeito vive, aparecem em cada
meu trabalho é gratuito.’ sujeito ou espaço social concreto de forma
única, organizados em seu caráter subjetivo
A APAE entra, então, em sua vida, como uma pela história de seus protagonistas.”
benção,
“Ser normal ou estar deficiente:
[...] eu não estou trabalhando só prá me eis a questão!”
sustentar; eu estou trabalhando por
prazer.[...]Eu estou trabalhando também por Segundo Agnes (pp.130-131), um ponto
amor.” importante para a análise refere-se à forma
como, também inundada pelos princípios da
Segundo Agnes (pp.128-129), “...sentir-se útil religiosidade, Ferreira concebe a deficiência e
a tira da esfera dos inválidos, incapazes. Ajudar o deficiente. Esse aspecto constitui, portanto,
as outras pessoas passa a ser uma necessidade o segundo núcleo de significação.
Como explicitado anteriormente, nesse núcleo ‘Olha, eu não vejo elas como deficientes não.
de significação, foram agrupadas e articuladas Eu vejo elas como ser humano. Eu trato elas
as falas/conteúdos (indicadores) que se igual, eu não tenho esse negócio de que elas
referem às concepções, sentimentos e práticas são coisa não. Na hora de cuidar delas a gente
sobre deficiência e sobre a pessoa deficiente. cuida... com mais carinho, cuida de... com um
Segundo a pesquisadora em questão (idem), meio mais... adequado, mas olhar pra elas eu
ao ser solicitado a Ferreira que explicitasse sua olho como ser humano. Como um irmão...
forma de ver as pessoas com deficiência, ela igual! eu não olho elas como deficientes não.
parte do senso comum, de uma visão Porque deficientes somos todos, né?’
estereotipada dessas pessoas. Atribui a elas
características tais como: “eles são dóceis”, A idéia de que todos somos deficientes, de
“carinhosos”, “inteligentes”, capazes”, “não que todos temos uma deficiência, ou de que
todos nós, em algum momento de nossas vidas,
metem medo”, “são bonzinhos”, “gratos”,
vivenciamos uma situação de “estar deficiente”,
“calmos”. Percebe-se aqui que Ferreira
foi muito difundida por Mantovan (1997) e
apresenta uma visão ingênua, ideologizada,
Werneck (1999); entretanto, observa-se que
que descontextualiza o deficiente como ser
muitos de nós, educadores, nos apropriamos
historicamente situado, sendo essa uma visão
dessa fala sem pensar nas implicações que ela
que em nada contribui para a transformação
traz. Mais uma vez, nega-se a diferença e, de
das práticas educacionais, uma vez que se trata
uma forma simplista, reduzem-se as implicações
da educação de seres abstratos e idealizados.
político-pedagógicas, tais como: eliminação das
Retomando nossa intenção de exemplificar
barreiras programáticas e arquitetônicas, maior
possíveis formas de se realizar uma análise,
investimento em formação dos professores,
na perspectiva sociohistórica, vale destacar a etc., necessárias, por exemplo, para a
importância de se buscar não apenas descrever alfabetização de uma criança cega ou surda.
os fatos, mas explicá-los, ou seja, buscar Concordamos com Sá (1992, p.14) quando
formas de explicitar a gênese social do afirma que a ‘corrente máxima de que ‘somos
individual. Agnes pretende, com sua análise, todos iguais’ serve antes para ocultar o
evidenciar que a fala da professora tem como preconceito e justificar a exclusão do que para
elemento constitutivo, determinante, a reconhecer a diferença’”.
ideologia, e o quanto esse tipo de visão
(ideologizada) descontextualiza o problema, Nesse trecho da análise, destacamos a
não contribuindo para a sua superação. relevância do movimento empreendido pela
pesquisadora, de não se contentar
Voltando à análise realizada por Agnes (pp.130), simplesmente em relatar a fala, mas em
ela afirma: “Interessante observar também que apreender as contradições presentes e buscar
Ferreira, ao tentar apropriar-se dos ‘discursos outras formas de se compreender o fenômeno.
politicamente corretos’ como aqueles que Ainda nesse trecho, evidencia-se a necessidade
apregoam que somos todos iguais e, portanto, de o pesquisador conhecer as várias leituras da
todos somos deficientes, ela incorre em uma questão estudada, de conhecer a literatura
contradição, pois, ao declarar a igualdade de sobre o tema para que possa realizar uma
todos, nega exatamente aquilo que nos análise crítica, questionadora, que possa
singulariza – a diferença. Igualdade, propiciar novas formas de se olhar os
normalidade, deficiência, direito, diferença, fenômenos.
necessidades especiais são conceitos que ela
parece não dominar, ou, no mínimo, são pouco Para se evidenciar a importância de uma
elaborados”. compreensão mais completa da questão a ser
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Núcleos de Significação como Instrumento para a Apreensão da Constituição dos Sentidos
que, nesse movimento de articulação dos núcleos entre si, e com as condições sociais, históricas,
ideológicas, condição de classe, gênero, e, sem dúvida, com os conhecimentos cientificamente
produzidos sobre a área em questão, uma nova realidade surge, mais complexa, integrada, reveladora
das contradições, movimento esse fundamental para a apreensão da constituição dos sentidos.
Temos a clareza, no entanto, da complexidade desse exercício de explicar, de como são múltiplas
as determinações dos fatos. Desse modo, percebemos que, sem dúvida, outros determinantes
poderiam ser contemplados nas explicações realizadas, mas que este é um momento do
conhecimento atingido.
Como já afirmamos anteriormente, uma das marcas desse tipo de análise é ter como meta
desvelar fatos e fenômenos, explicitar contradições e assim, ousar apontar caminhos mais críticos,
menos naturalizantes e ideológicos . Anexo 1
● a importância do assumir.
Indicadores resultantes da aglutinação dos pré-indicadores
visando à organização de núcleos
● amizade e balada;
● amizade e diversão;
● amizade e apoio a situações de depressão;
● amizade e “derrubar” (falsidade, inveja...);
● amizade e idades dos amigos (funções diferentes);
● necessidade de gays serem unidos (não concretizada);
● homossexualidade e gueto x outros lugares;
● gay x heterossexual (iguais e normais);
● aceitação (ou não) pelos pais/parentes e por homens e mulheres (chavões ao exemplificar a relação gay x bandido,
gay x ladrão, etc.);
● não aceitação da homossexualidade da mãe (no início);
● o aceitar por parte de amigos.
● assumir para a família (mesmo para quem rejeita? exemplifica apenas os que aceitam!!!!!!);
● não assumir para outros;
● assumir para si / não assumir para o outro;
● assumir-se determinando aceitar a mãe como homo;
● Assumir e mudança na vida pessoal (positivamente);
● assumir x estabilidade profissional ou econômica;
● normalidade (sentir-se normal);
● a importância do assumir.
Sergio Ozella
Professor associado da Faculdade de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Rua Martiniano de Carvalho, 669/1101 - Bela Vista 01321-001 São Paulo/SP
E-mail:ozella@uol.com.br
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